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ISSN: 0873-2019 ESTUDOS L%ò%\ji%x\j\ INSTITUTO SUPERIOR DE CONTABILIDADE E ADMINISTRAÇÃO 1995

Estudos do ISCAA (2ª série) - Nº1, Ano 1995

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ISSN: 0873-2019

ESTUDOS

L%ò%\ji%x\j\

INSTITUTO SUPERIOR DE CONTABILIDADE E ADMINISTRAÇÃO 1995

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ESTUDOS DO I.S.C.A.A. il SÉRIE • N°l • 1995 REVISTA DE PUBLICAÇÃO ANUAL

DIRECÇÃO: Joaquim José da Cunha

COORDENAÇÃO: José Fernandes de Sousa Virgínia Maria Granate Costa e Sousa

CONSELHO CONSULTIVO:»Comissão Científica das Comemorações •Professores Coordenadores das Áreas

ou domínios científicos do I.S.C.A.A.

EDIÇÃO E PROPRIEDADE: Instituto Superior de Contabilidade e Administração de Aveiro

APOIO ADMINISTRATIVO E ASSINATURAS: Biblioteca do I.S.C A A. R. Associação Humanitária dos Bombeiros Velhos de Aveiro Apar t . 58 - 3800 - Aveiro Tel.:034)381977«381911;Fax.:28975

Preço deste N°: 3 000$00

ISSN: 0873-2019

Depósito legal n°: 922 54/95 Capa: Design. Francisco Espíndola Composição/impressão: Tipografia Minerva Central, Lda./1995

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ESTATUTO EDITORIAL

1. Carácter da Revista

1.1. A Revista Estudos do I.S.C.A.A. será publicada anualmente, pre-vendo-se a sua distribuição para o mês de Outubro.

1.2. Objectivos

1.2.1. Reforçar a identidade do I.S.C.A.A. no espaço técnico, cien­tífico e cultural das Escolas de Ensino Superior.

1.2.2. Criar um espaço de reflexão interdisciplinar de acordo com as exigências de uma abordagem científica da complexa realidade empresarial e seus enquadramentos.

1.2.3. Dinamizar a análise crítica de experiências concretas no in­terior das empresas com base na observação, em estudos empíricos e em dados estatísticos.

1.2.4. Acompanhar, na medida do possível, os resultados da pes­quisa e da reflexão científica no interior da Escola - e, quanto possível, no país e no estrangeiro - nos domínios relevantes para a actualização dos profissionais diplomados e formados no I.S.CA.A.

1.2.5. Promover a criação de um Centro do Património Contabilís­tico Português que permita enraizar as soluções criativas para os desafios actuais na tradição técnico científica e cultural dos estudiosos portugueses da Contabilidade e conexas Ciências empresariais.

2. Colaboradores

2.1. A revista Estudos está aberta a todos os estudiosos e profissionais dispostos a reflectir sobre quaisquer questões e experiências que reforcem os valores humanos, aprofundem conhecimentos e promovam a eficácia no desempenho das múltiplas tarefas

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exigidas ao profissional saído do I.S.C.A.A., sem discriminação de paradigmas teóricos ou de correntes de pensamento.

2.2. Os colaboradores naturais da Revista Estudos do I.S.C.A.A. são os Docentes da Escola e seus diplomados, cujas páginas se podem constituir em espaço privilegiado de divulgação dos seus trabalhos académicos, após adaptação ao seu modelo editorial.

2.3. Não sendo uma revista para consagrados acolherá, com gosto, trabalhos de personalidades com prestígio no mundo da contabilidade e vizinhos domínios científicos - podendo mesmo solicitar a sua colaboração.

2.4. Toda a colaboração não solicitada deverá ser acompanhada de uma síntese do curriculum vitae.

2.5. A colaboração dá direito a seis exemplares de Estudos do I.S.C.A.A, podendo o autor solicitar algumas separatas, sem qualquer encargo adicional para a Revista, cujo número não poderá ultrapassar 10% da edição.

3. Responsabilidade dos artigos

3.1. Os textos publicados são da total responsabilidade dos seus auto­res.

3.2. A Revista não se responsabiliza pela devolução do material envia­do para publicação.

4. Reprodução dos artigos

4.1. A reprodução integral ou parcial dos textos publicados fica depen­dente de autorização da Revista, sendo sempre exigida a indicação da origem.

4.2. Esta limitação não abrange a pequena citação indispensável ao comentário crítico.

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Comemorações do Centenário do Nascimento do Professor

Jaime Lopes Amorim (1891-1991)

Instituto Superior de Contabilidade e Administração de Aveiro

1992

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INDICE

I Parte

Objectivos e Organização 13

Patrocinadores 19

Participantes 21

Sessão de Abertura 29

• Prof. Dr. Joaquim José da Cunha 31

• Prof.a Dra Virgínia Maria Granate Costa e Sousa 33

• Prof.a Doutora Graça Fialho 37

• Prof. Doutor Camilo Cimourdain de Oliveira 39

• Dr. José Ribeiro Pereira 45

• Dra Maria Luísa Amorim Braun 47

Comunicações 53 Carlos Moreira da Silva O Cientista Português da Contabilidade 55

Rogério Fernandes Ferreira Lopes de Amorim — Um Grande Mestre da Contabilidade 59

A. Lopes de Sá A Essência Filosófica da Doutrina Contabil de Lopes de Amorim e sua Influência Científica 63

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Enrique Fernandez Pena Actualidad de los Estúdios de Historia de la Contabilidad en el Mundo — Referencia Especial a Espana 91

Fernando Martin Lamouroux La Inversion de Signos D y H en el Libro de Cuentas del Colégio de los PP. Jesuitas de Villagarcia de Campos 105

Hernâni Olímpio Carqueja Lopes Amorim e a Escola do Porto 135

Victor Dordio José Ribeiro O Ensino da Contabilidade para não Contabilistas 143

Antonio M. Lopez Hernandez La Contabilidade Publica en la Administracion Espanola. Situacion Actual 149

Sessão de Encerramento Moção — Aprovada por Aclamação 171

II Parte

José Fernandes de Sousa

Jaime Lopes Amorim — Contributo para uma Biobibliografia. 175

Textos escolhidos publicados na Revista de Contabilidade e Comércio 189

Fim da Contabilidade 191

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Aparências e Realidades 195

Palavras e Ideias 199

Um Programa 211

Cousas e Lousas 215

Tentativas Novas por Caminhos Velhos 217

Est Modus in Rebus 221

Est Modus in Rebus... Ill 225

Est Modus in Rebus... IV 227

Est Modus in Rebus... X 229

A Contabilidade como Base de Sustentação e Propulsão

da Actividade Económica 233

Progresso ou Retrocesso... 1 237

Progresso ou Retrocesso...II 241

Uma Obra Que se Impõe pelos Seus Próprios Méritos 245

Jaime Lopes Amorim e Eu: a Nossa Polémica 251

Dumarchey e a Sua Obra 297

Metodologia Geral da Contabilidade 305

Nunca é Demasiado Tarde Para Desfazer Enganos 337

Amortizar ou Reintegrar? 339

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Amortizar ou Reintegrar? 345

Prof. Doutor José António Sarmento 351

Os Números Que Governam o Mundo Económico 353

Teoria Dinamista 357

Teoria Reditualista 361

As Mais Valias e as Reavaliações 367

Considerações Acerca do Plano Geral de Contabilidade 371

De Minimis Non Curat Praetor 377

Sugestões para apresentação dos originais 381

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I Parte

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Objectivos e

Organização

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1. Objectivos

Compreender a multifacetada personalidade de Jaime Lopes Amorim Dar a conhecer a produção científica do mestre Aprofundar temas específicos da sua obra Avaliar a actualidade dos temas em estudo

2. Organização

Comissão de Honra • Ministro da Educação • Reitor da Universidade de Aveiro • Governador Civil • Presidente da Câmara • Presidentes dos Conselhos Directivos dos Institutos Superiores de

Contabilidade e Administração

Comissão Científica • Professor Doutor Camilo Cimourdain de Oliveira • Professor Doutor Rogério Fernandes Ferreira • Professor Doutor Enrique Fernandez Pena

Comissão Executiva Constituída por três grupos dinamizadores liderados, em Aveiro, pela

Prof. Virgínia Maria Granate Costa e Sousa; em Lisboa, pela Prof. Maria Adelaide Lopes Moreira; e, no Porto, pelo Prof. A. Silva Carvalho.

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3. Programa —10/10/1992

10.30 h. — Sessão de Abertura

11.00 -12.30 h. — Ia Sessão de Trabalho

Prof. Doutor Camilo Cimourdain de Oliveira • Aspectos da Personalidade de Jaime Lopes Amorim Dr. José Ribeiro Pereira • Dr. Jaime Lopes Amorim. . . Para Aquém e Para Além das

Contabilidades Dra Maria Luísa Amorim Braun, filha do homenageado • Testemunho familiar Carlos Moreira da Silva • O Cientista Português da Contabilidade

Visita à Exposição Biobliográfica (Biblioteca do I.S.C.A. de Aveiro)

13.00 h. — Almoço no Hotel Imperial

15.00 -16.20 h. — 2a Sessão de Trabalho (Ia Parte)

Prof. Doutor Rogério Fernandes Ferreira • Lopes Amorim — Um Grande Mestre da Contabilidade Prof. Doutor A. Lopes de Sá • A Essência Filosófica da Doutrina Contabil de Lopes Amorim e a sua

Influência Científica Prof. Doutor Enrique Fernandez Pena • Actualidad de los Estúdios de Historia de la Contabilidade en el

Mundo — Referencia Especial a Espana

16.20 h. — Pausa para Café

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16.40-18.20 h. — T Sessão de Trabalho (2a Parte )

Prof. Doutor Fernando Martin Lamouroux • La Inversion de Signos D Y H en el Libro de Cuentas del Colégio de

Los Jesuitas de Villagarcia de Campos desde 1742 a 1757. Prof. Dr. Hernâni Olímpio Carqueja • Jaime Lopes Amorim e a Escola do Porto Prof. Dr. Victor Dordio e Prof. Dr. José Ribeiro • O Ensino da Contabilidade para não Contabilistas Dr. Antonio M. López Hernandez • La Contabilidad Publica en la Administracion Espanola: Situacion

Actual.

18.30 h.— Sessão de Encerramento

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P A T R O C I N A D O R E S

Alves, Costa e Comercial Associados

Caixa Geral de Depósitos

Câmara Municipal de Aveiro

Comissão Regional de Turismo da Rota da Luz

Extrusal - Companhia Portuguesa de Extrusão, SA.

Lacticoop - União de Cooperativas de Produtores de Leite de Entre Douro e Mondego, U.C.R.L.

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Participantes

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Inscritos

Abel Folhas Lúcio Adélio de Oliveira Macedo Aldina Maria Matos Cirne Ramos Alfredo do Carmo Gomes Alice Carla Freitas Nogueira Silva Campos Alzira Estima da Silva Santos Neto Amândio Costa Santos Ana Maria Barradas Serrano Laranjo António Afonso da Silva Carvalho António Alberto Andrade Santos António Augusto dos Santos Carvalho António Braz da Silva Mendes Campos António Carlos Nunes Teixeira António Joaquim Ferreira Lorvão António José Miranda Poças Pereira António Leite da Silva Ribeirinho António Lopes de Sá António M. Lopez Hernandez António Manuel Azevedo de Oliveira António Manuel Fernandez Ramos António Rocha Dias de Andrade António Rodrigues Neto António Victor de Almeida Campos Arlindo Baltazar Montai Armanda Augusta Ferreira de Oliveira Armando Rui Torres Baptista Avelino Azevedo Antão Camilo Cimourdain de Oliveira Carlos Alberto Afonso Rebelo Carlos Alberto Baptista da Costa Carlos Alberto da Rocha Moreira da Silva Casimiro da Costa Ferreira Domingos José da Silva Cravo Edgar Nuno Bernardo Elísio Maia Oliveira Emanuel Vinagre da Naia Sardo

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Emídio Rodrigues Lima Enrique Fernandez Pena Fausto Luís Gomes do Carmo Rocha Fernando Augusto Cardoso Fernando Manuel Domingues Pedrosa Fernando Manuel Faria Varelas Graça Fernando Martin Lamouroux Francisco José Ramalho de Melo Albino Gladys da Cruz Nascimento Henrique Simões de Figueiredo Hernâni Olímpio Carqueja Horácio Afonso Rebelo Jaime Abrantes da Silva Matos Joaquim Ferreira Ribeiro Joaquim José da Cunha João Correia Colaço João Manuel Batista Martins João Marcos da Silva Cravo João Martins Viana João Serrana da Naia Fortes José Alberto da Silva Oliveira José António de Almeida Marques Sobreiro José Eduardo Castro Ferreira José Fernandes de Sousa José Fernando Nogueira da Costa José Luís Arsénio Rochinha José Luís Gaspar de Melo Albino José Manuel Matos de Carvalho José Maria Albuquerque Lopes Antunes José Maria Simões Ribeiro José Pedro Oliveira Coelho José Ribeiro Ferreira José Rodrigues de Jesus Leopoldina Maria Andrade Serôdio e Silva Leopoldo de Assunção Alves Luís Alberto Calado Simões Luís Manuel Pereira Lima Luís Manuel Santiago da Silva

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Luís Manuel Susana e Maia Manuel Ferreira das Neves Manuel Jacinto de Abreu Serrano Manuel Pereira Pacheco Manuel Santos Martins Marco Paulo Barroso Ferreira da Silva Maria Adelaide Lopes Moreira Maria Armanda Teixeira Simões Dias Maria da Conceição da Costa Tavares Maria Elisabete da Silva Pereira Maria Fernanda Barata Marques Fardilha Maria Fernanda Duarte Ramalho Cravo Maria Helena de Almeida Campos Maria João Dias de Almeida Maria José Resende de Almeida Lopes Maria Luísa Bastos da Silva Maria Manuela de Jesus Pereira Duarte Mário de Oliveira Queiroz Nelson Manuel Machado Rebelo Noémia Augusta de Araújo Alves Portugal Guichard Paulo Alexandre Gamboa Monteiro Paulo Roberto de Sousa Mathias Lima Rogério Fernandes Ferreira Sérgio Ferrão Fernandes de Oliveira Sílvio Carvalho de Oliveira Telmo Manuel Rebola Pascoal Tiago da Costa Mendes Victor Manuel Candeias Dordio Victor Manuel Conceição Campos Virgínia Maria Granate Costa e Sousa

Familiares

Eva Castália Rego Amorim Henrique da Silva Amorim

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Joaquim Manuel da Rocha Amorim João de Araújo Correia José Amorim Lopes Martins Júlio Dinis Freitas Coelho Manuel Mendes Simões Maria Augusta Amorim de Araújo Simões Maria Eduarda Mota Leal de Araújo Maria Fernanda da Rocha Amorim Maria Luísa Amorim Braun Maria Teresa Lima Lobo Lopes Amorim Teresa Amorim Lopes Martins

Entidades Públicas ou Privadas

Administrador da Extrusal Associação Portuguesa de Contabilistas — Z. Norte Bispo de Aveiro Comandante da G.N.R. de Aveiro Comandante da Guarda Fiscal de Aveiro Comandante da P.S.P. de Aveiro Comandante do Batalhão de Infantaria de Aveiro Comandante do D.R.M. de Aveiro Comandante do Porto de Aveiro Director da Delegação da Alfândega em Aveiro Director da Polícia Judiciária de Aveiro Director de Finanças do Distrito de Aveiro Director do Diário de Aveiro Director do Instituto da Juventude em Aveiro Gerente da Caixa Geral de Depósitos em Aveiro Gerente do Banco E. S. e C. Lisboa em Aveiro Governador Civil de Aveiro Juiz Presidente do Círculo Judicial de Aveiro Juiz Presidente do Tribunal da Comarca de Aveiro Presidente da Assembleia Municipal de Aveiro Presidente da Associação Comercial de Aveiro Presidente da Associação de Estudantes do I.S.C A A .

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Presidente da Associação Industrial de Aveiro Presidente da Câmara Municipal de Aveiro Presidente da Comissão da Rota da Luz de Aveiro Presidente da Junta de Freguesia da Glória Procurador Geral da República em Aveiro Reitor da Universidade de Aveiro Secretário do Governo Civil de Aveiro Secretário do I.S.C.I.A. de Aveiro Vice-Presidente dos Serviços Sociais de Aveiro

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Sessão de Abertura

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PALAVRAS PROFERIDAS pelo

PROF. DR. JOAQUIM JOSÉ DA CUNHA Presidente do Conselho Directivo do I.S.C.A.A.

(Texto Indisponível)

O Prof. Cunha começa por saudar as numerosas entidades presentes, cuja honrosa participação agradece.

Saúda especialmente as representações dos I.S.C.A/s, nomeadamente o Instituto Superior de Contabilidade e Administração do Porto, cidade onde o homenageado exerceu a sua actividade, o Exm° Sr. Governador Civil de Aveiro, que a política roubou ao I.S.C.A.A., mas que esta Escola não terá desistido de o recuperar; a Exma Sr.a Directora Geral do Ensino Superior que, em representação do Sr. Ministro, ouve algumas preocupações da Escola e o pedido de uma venera para o homenageado - enquanto aos I.S.C.A.'s é proposto a criação em todos eles, de uma sala com o nome do Prof. Jaime Lopes Amorim; a Comunicação Social e a filha e familiares do Professor.

Reitera os mais sinceros agradecimentos a todos os presentes, não deixando de assinalar que a ideia de homenagear a figura do Prof. Jaime Lopes Amorim nasce no I.S.C.A.A., nesta sala - o auditório - por sugestão do Prof. Doutor Camilo Cimourdain de Oliveira.

Seguidamente realça que a melhor homenagem que se pode prestar a quem tanto dignificou a Contabilidade passa pela valorização e afirmação dos C.E.S.E. e pela criação do Mestrado em contabilidade - tarefa em que estão empenhados os Professores Doutor Rogério Fernandes Ferreira e Doutor Amílcar Gonçalves - seja nos Politécnicos ou em ligação com a Universidade.

Terminou o Prof, com uma agradecida saudação a todos os presentes, deixando à Comunicação Social um cumprimento especial com votos de que os problemas da Escola nela conquistem espaço crescente.

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PALAVRAS PROFERIDAS pela

PROF.a DR.a VIRGÍNIA MARIA GRANATE COSTA E SOUSA,

em representação da Comissão Executiva

Ex.ma Senhora Directora Geral do Ensino Superior Ex.mo Senhor Governador Civil Ex.mo Senhor Presidente da Assembleia Municipal Ex.ma Senhora Vice Reitora da Universidade de Aveiro Ex.mo Senhor Presidente do Conselho Directivo do I.S.C.A. de Aveiro Ex.mo Senhor Prof. Cimourdin de Oliveira Ex.ma Senhora Dr.a Luísa Amorim-Braun e Ex.mos Familiares do Prof. J. L. Amorim

Senhores Convidados Senhores Palestrantes Minhas Senhoras e meus Senhores

Nas passadas Jornadas de Contabilidade, realizadas em Aveiro, em Novembro de 1991, o Senhor Professor Doutor Camilo Cimourdin de Oliveira lembrou — sempre oportuno — a passagem dos 100 anos do nascimento do Prof. Jaime Lopes Amorim.

Os I.S.C.A.'s, alertados para o facto e conscientes da importância da obra do Mestre no mundo científico da Contabilidade, decidem, finalmente, empreender esta homenagem que, para corresponder à dimensão do Prof. Amorim, não deverá, de forma alguma, parar hoje e aqui.

Coube-me a grata tarefa de integrar um grupo de trabalho que me deu oportunidade de conviver com actuais mestres e de regressar, com outras perspectivas, à obra do nosso homenageado. Conheci-a, pela primeira

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vez, nos bancos das Escolas do Porto, reli-a e divulguei-a, mais tarde, como Professora e estudiosa das problemáticas da Contabilidade e da Economia.

O vasto labor intelectual de Lopes Amorim abarca o domínio económico — estudos publicados em separatas dos Anais do Instituto do Vinho do Porto —, o domínio da Contabilidade — coberto por trabalhos de carácter científico, pedagógico-didáctico, teórico-metodológico, crítico, polémico, histórico — e, ainda, outros que abordam problemas relacionados com a gestão empresarial.

As obras de Contabilidade permanecem autênticos pilares do saber contabilístico português. Gostaria de realçar a "Digressão Através do Vetusto Mundo da Contabilidade", aquela que, penso, melhor traduz o brilho das suas reflexões, o vigor do seu pensamento, a clareza da sua exposição e a sua vasta cultura.

Jaime Lopes Amorim, acérrimo defensor da Contabilidade como ciência — a do equilíbrio patrimonial —, realça o papel fundamental da observação: vê o património — objecto da Contabilidade — como um cosmos em movimento contínuo e observável através do método contabilístico. Destaca a importância da classificação — "processo de raciocínio indutivo que consiste em agrupar os objectos ou fenómenos segundo determinados pontos de vista(...) e que tem o "mérito de contribuir para introduzir a ordem no conhecimento do património e para unificar a verdade"— ordem e verdade, conceitos tão queridos do Mestre. E que, segundo Lopes Amorim — em perfeita consonância com a actualidade — , o método é sinónimo de ordem — aquela que nos permite chegar à verdade com maior segurança e rapidez; e, sendo a ciência um sistema de verdades dependentes de um princípio único, a ciência contabilística depende de um princípio — o princípio básico do equilíbrio patrimonial.

A eficácia pedagógica das "Lições" do Prof. Amorim radica na defesa intransigente do método positivo que assenta numa inteligente e escrupulosa observação dos factos. A sua confiança no rigor e na ordem transmitidos pela Contabilidade à observação leva-o a perfilhar a tese de Ehrenberg centrada na importância do método logismológico para a ciência económica. Lopes Amorim defende a aplicação dos processos de análise contabilística à investigação económica, considerando que eles podem prestar valiosos serviços ao ensino da ciência económica sob o ponto de vista nacional.

Apoiado em valores que considera fundamentais — agora de regresso à nossa sociedade trazidos por um certo revivalismo neoliberal — Lopes Amorim considera a concorrência, baseado em princípios morais e

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económicos, um poderoso estímulo ao progresso económico da humanidade e uma forma de aperfeiçoar a eficiência das organizações. Avança que o contributo decisivo para o progresso económico de uma Nação não deriva da quantidade mas da qualidade dos concorrentes — qualidade, esse "somatório de conhecimentos teóricos e técnicos e de predicados morais". Não se esquece do consumidor: condena a fraude como um processo de concorrência desleal.

Consciente da importância do comércio verbera — em defesa da livre circulação de pessoas, mercadorias e capitais — as altas tarifas aduaneiras, as restrições às importações, às exportações e ao movimento de capitais e a manipulação artificial dos câmbios, — tudo "fruto de um vesgo nacionalismo económico". Contudo, não se esquece de lembrar que o livre cambismo só é possível através da existência de um equilíbrio de meios e recursos conseguido através de uma cooperação económica e financeira entre os povos.

Lopes Amorim condena a irregular dis tr ibuição de recursos económicos e financeiros entre os vários países — autêntico obstáculo a uma política económica baseada na iniciativa individual. Adepto da liberdade económica, condição indispensável para a liberdade dos povos, confia no futuro da Europa ao afirmar: "A Europa sempre se refez de todos os reveses que sofreu no passado, e que não foram poucos, e nada nos indica que ela se mostre incapaz de vencer as enormíssimas dificuldades em que agora se debate porque o seu passado nos leva a crer no seu futuro".

Esta rápida e incompletíssima passagem por sobre a obra do Prof. J. Lopes Amorim vai, hoje, ser completada, ao longo do dia, por vários pales t rantes que nos vão ajudar a atingir os objectivos que estas Comemorações se propuseram.

O Programa destas jornadas de trabalho integram uma Exposição bibliográfica, patente na Biblioteca do I.S.C.A.A., que resulta de um Projecto inacabado, concebido para reunir as obras da Biblioteca do Prof. Amorim, os Trabalhos por ele publicados e os Estudos a que a sua vida e obra deram origem.

Pretendemos continuar a homenagear o Prof. Jaime Lopes Amorim: iniciaremos com a edição do Livro das Comemorações — que integrará as diferentes intervenções de hoje, outras que, ainda, nos possam chegar e uma pequena selecta de textos do homenageado — e sonhamos com a publicação de algumas obras suas e de outros i lustres mestres da

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Contabilidade. Não quero terminar sem agradecer a todos aqueles que ajudaram — e

vão, certamente, continuar a ajudar — a Comissão executiva, muito especialmente à Comissão Científica, por intermédio do Prof. Cimourdin de Oliveira, e ao C. Directivo do I.S.C.A.A., por via do seu Presidente, Prof. Joaquim José da Cunha.

A todos os presentes, em especial à família — cuja presença nos honra e apraz registar — e aos palestrantes, o nosso muito obrigado.

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PALAVRAS PROFERIDAS pela

Directora Geral do Ensino Superior, PROF.a DOUTORA GRAÇA FIALHO,

em representação de S/ Exa o Ministro da Educação

(Texto indisponível)

A Ex.ma Senhora Doutora Graça Fialho começou por afirmar sentir-se muito honrada com a possibilidade de estar presente nesta homenagem ao Prof. Jaime Lopes Amorim, cuja personalidade ficou a conhecer melhor após ter recebido a síntese biobibliográfica. Que a ausência de Sua Exa o Ministro da Educação — que gostaria de estar presente — se devia à coincidência de um importante Conselho de Reitores, já que o Ministério da Educação considera importante que os profissionais que dignificam o ensino e a investigação sejam homenageados.

A Ex.ma Senhora Directora Geral do Ensino Superior, após ter realçado alguns aspectos que considera relevantes na personalidade do homenageado, mostrou-se receptiva à ideia de propor superiormente a concessão de uma "Venera" a tão ilustre cientista e pedagogo.

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PALAVRAS PROFERIDAS pelo

PROF. DOUTOR CAMILO CIMOURDAIN DE OLIVEIRA Comissão Científica, discípulo e colega do homenageado

Vou ter uma intervenção muito mais ligeira do que esperava, dando assim o exemplo, pedindo àqueles oradores que terão de falar nesta Sessão da manhã que, tanto quanto possível, reduzam também a sua intervenção, sem prejuízo da finalidade que aqui nos traz, que é prestar homenagem a esse grande mestre da Contabilidade que se chamou Jaime Lopes Amorim.

Jaime Lopes Amorim foi, como todos sabem, um grande mestre da Contabilidade em Portugal, e foi, para a época, o maior dos mestres da Contabilidade em Portugal, e nunca haverá mais nenhum que consiga dar o salto, no ensino da Contabilidade, que deu o Prof. Jaime Lopes Amorim; e não haverá mais nenhum, por esta razão: é que ele partiu de muito baixo.

O ensino da Contabilidade, mesmo a nível superior, em Portugal, era muito elementar, e Jaime Lopes Amorim, com a sua docência no velho Inst i tuto Superior de Comércio do Porto, com as suas "Lições de Contabilidade Geral", publicadas em 1929, deu um salto enorme; e, daqui por diante, os saltos que se dão são todos muito pequeninos, em relação ao salto anterior.

Todos nós temos procurado contribuir para a melhoria do estudo científico da Contabilidade em Portugal, mas nenhum de nós poderá dar nunca, o salto que ele deu, porque ele partiu exactamente, praticamente, digamos, do zero, do "quase" nada, e portanto, deu um salto enorme... Agora, os saltinhos são mais pequenos . Foi, por tanto , um homem extraordinário, e que, por isso mesmo, estamos aqui a homenagear.

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Eu conheci-o muito bem porque fui aluno dele em duas cadeiras, Contabilidade Geral e Contabilidade Industrial, que era como se chamava então, a depois chamada Contabilidade de Exploração, ou Contabilidade Analítica, simplesmente, ou Contabilidade de Custos, que não são expressões exactamente sinónimas, mas enfim, os entendidos percebem o que quero dizer; fui aluno dele nessas duas cadeiras e, depois, por força duma injustiça legislativa que foi praticada, fui colega dele no Instituto Comercial do Porto, e digo que fui colega, porque ele, tendo a categoria de assistente no Instituto Superior de Comércio do Porto, mas regendo as cadeiras, tal e qual como outros professores, como por exemplo Jacinto Moniz Travassos, nas Matemáticas, o Eduardo Severo Maia de Medina e o Marques Dias, nas Químicas — e não sei se me esqueço de mais algum —, eram assistentes que regiam cadeiras num estabelecimento de ensino superior e foram levados a assistentes duma Escola que era médio-superior — era o antigo Instituto Comercial do Porto, portanto; e, como eu também fui convidado para assistente, passámos a ser colegas, por virtude dessa circunstância. Contactei, portanto, com ele como aluno, e contactei com ele como colega no Instituto Comercial do Porto, e tive muitos outros contactos porque se criou entre nós, também, uma certa amizade.

Não vou falar agora — não vale a pena, porque outros o irão fazer ou já o fizeram — do que foi o Prof. Jaime Lopes Amorim para a evolução dos estudos universitários da Contabilidade em Portugal; vou apenas referir, muito ligeiramente, alguns aspectos que me levaram a reflectir sobre a sua vida profissional, e um deles já o referi.

A Contabilidade era ensinada a nível superior, nessa altura — quando ele publicou as suas "Lições" —, nos Institutos Superiores de Comércio do Porto e de Lisboa; era aí que se ministravam os conhecimentos de matéria económica e financeira.

Tinham um regulamento comum — Regulamento dos Institutos Superiores de Comércio de Lisboa e Porto — aprovado pelo Dec.-Lei n° 14 291, de 14 de setembro de 1927 e, portanto, os estudos de matéria económica e de matéria financeira obedeciam a um plano exactissimamente igual para os dois Institutos.

Em 29 publicou Jaime Lopes Amorim a sua principal obra; são dessa época as "Lições de Contabilidade Geral", e são elas que representam exactamente a entrada da Contabilidade a um nível verdadeiramente científico, no ensino universitário português, sem sombra de dúvida.

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Depois, em 1933, é extinto o Instituto Superior de Comércio do Porto; melhor, são extintos os dois Institutos Superiores de Comércio, de Lisboa e do Porto, e é criado então o Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras, em Lisboa, portanto, ficando o Porto sem escola nenhuma que a nível universitário ensinasse as ciências económicas e financeiras.

É nesta altura então que o Prof. Jaime Lopes Amorim passa a assistente do Instituto Comercial, como já disse. Publicou muitos trabalhos, que V. Exas conhecem todos tão bem como eu; e publicou — e isto é que acho que tem de referir-se — quando já tinha quase 80 anos de idade, publicou um livro notável que é a "Digressão através do vetusto m u n d o da Contabilidade", que também todos conhecem e também já hoje aqui foi referido. É um livro que vale a pena 1er de vez em quando, porque tem matéria realmente muito interessante, e em que ele dá a medida — como aliás já tinha dado muitos anos antes, com a publicação das "Lições de Contabilidade Geral" —, em que ele dá a medida da sua extraordinária cultura, não apenas económica, não apenas contabilística, mas sobretudo uma cultura filosófica e histórica, que é notável. Aliás, vamos ter o prazer de ouvir aqui, na sessão da tarde, o Prof. Lopes de Sá, que tem um trabalho também notabilíssimo sobre a obra do Prof. Jaime Lopes Amorim.

Eu queria, ainda falando do Prof. Jaime Lopes Amorim, dizer o seguinte: o Prof. Jaime Lopes Amorim está claro que foi vítima dessa ex­tinção do Instituto Superior de Comércio do Porto, ou melhor, de, nessa altura, não se ter criado, a par do Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras de Lisboa, também o Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras do Porto, onde ele teria continuado a sua vida de prof, catedrático, que afinal eram as funções que ele desempenhava na altura da extinção do Instituto Superior de Comércio do Porto. A vida é assim mesmo; e, portanto, ele passou a ser, no Instituto Comercial do Porto, assistente de professores que estavam longe de ter a sua cultura na área da Contabilidade; para passar de assistente a professor teve de aceitar a regência de cadeira da área das ciências económicas, pois creio que foi professor de Geografia, área em que foi também um grande professor, pois sê-lo-ia em qualquer ramo a que se dedicasse.

Foi, também, ilustre colaborador do Instituto do Vinho do Porto, dessa qualidade nos indo hoje falar o senhor Dr. José Ribeiro Pereira que ali muito contactou com o prof. Jaime Lopes Amorim, que, também nessas funções, publicou interessantes trabalhos de natureza económica, que muito o notabilizam. Foi, portanto, um tratadista emérito, foi um grande publicista

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de matérias económicas e contabilísticas, principalmente, e foi um grande polemista — e é aqui que o Prof. Jaime Lopes Amorim tem, porventura, uma faceta menos agradável —, porque o Prof. Jaime Lopes Amorim, que era encantador no trato, falava com as pessoas e nós sentíamo-nos muito bem, nada agressivo — nunca o ouvi levantar a voz —, falava sempre muito calmamente, mas a escrever, fazia-o, como eu já escrevi noutro lugar, não com uma caneta, mas com um varapau. Ele escrevia com um varapau...

Eu tive uma polémica com ele, a propósito da posição das reintegrações no mapa analítico de balanço, porque ele metia nessa altura as reintegrações numa massa da situação líquida (rectificativa) e eu dizia que não, as reintegrações não podem fazer parte da situação líquida, porque então situação líquida deixaria de ser equivalente a capital próprio. Enfim, a polémica durou uns dois anos, na Revista de Contabilidade e Comércio. Ele, finalmente, alterou aquilo que havia escrito até à 3a edição dos seus "Elementos de Contabilidade" e, na 4a, adaptou-se à minha posição.

Mas, quero dizer que o Prof. Jaime Lopes Amorim não me tratou tão mal como a outros; mas, também não me tratou lá muito bem... Apesar disso, e apesar de ter depois adaptado os seus livros à minha teoria, e abandonado a dele, apesar disso, depois, quando me oferecia os seus livros, as dedicatórias eram as mais amigas e as mais encomiásticas. Quer dizer, ele não ficou com o mínimo ressentimento da circunstância de o aluno que se tinha licenciado poucos anos antes — eu não tinha nessa altura trinta anos, escrevia ainda a minha idade com o algarismo 2 na casa das dezenas... —, se "meter" com o grande mestre que era, já nessa altura, e muito considerado, Lopes Amorim; mas não reteve disso o mínimo ressentimento e continuou a dedicar-me palavras muito elogiosas e amigas.

Foi um homem extraordinário. Como homem, como elemento da sociedade, era uma pessoa a quem todos nós reconhecíamos apenas qualidades; não dizíamos, nas nossas conversas sobre Jaime Lopes Amorim, que ele tinha este ou aquele defeito, porque não lhe conhecíamos defeito nenhum... apenas o de bater muito forte, naqueles com quem tinha de discutir, em polémica, as suas ideias.

Eu quero, ao deixar este apontamento, que é um depoimento sobre o meu pensamento a respeito de Jaime Lopes Amorim, agradecer aos Institutos Superiores de Contabilidade e Administração do País, especialmente ao de Aveiro, o terem pegado numa afirmação que eu fiz neste lugar, aqui há onze meses, nas 4as Jornadas de Contabilidade de Aveiro, quando ainda estávamos no ano em que se deveria ter festejado o nascimento do grande

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mestre que foi Lopes Amorim, porque ele nasceu em 15 de Janeiro de 1891. Não foi possível, nessa altura, fazê-lo em 91; mas, antes fazê-lo agora,

em 92, do que deixar de o fazer... não o fazer. Quero agradecer, portanto, aos I.S.C.A.'s que colaboraram nesta

homenagem, e especialmente àquele que tomou a seu cargo a execução desta sessão de trabalhos, deste dia; e agradecer também a todos a vossa presença, mas especialmente — e vão perdoar-me que eu distinga três pessoas: distinguir o Prof. Lopes de Sá, grande mestre do nosso grandíssimo país amigo, que é o Brasil; e agradecer também a presença aqui dos professores Fernando Martin Lamouroux e Enrique Fernandez Pena, os quais eu tenho o prazer de conhecer já há 32 anos, quando estivemos juntos na Ia

Reunião Científica do ITECA, em Léon, em Espanha, onde tive o prazer de conhecer dezenas de colegas espanhóis e, entre os quais, os Professores Enrique Pena e Fernando Lamouroux. Muito gosto em voltar a vê-los aqui.

Não estive estes trinta e dois anos sem os ver; nós temo-nos encontrado já mais algumas vezes, muito mais com o Prof. Fernandez Pena, porque é meu colega aqui, neste Instituto, como professor orientador dos cursos de licenciatura, deste Instituto.

Minhas senhoras e meus senhores: devo ter cometido algumas faltas, deixando de fazer alguma referência, mas peço que me perdoem. Por outro lado, quero dirigir, finalmente, os meus cumprimentos à família de Lopes Amorim e dizer-lhes o quanto realmente estimo a memória do vosso pai e do vosso parente.

Meus senhores, acabei.

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PALAVRAS PROFERIDAS pelo

DR. JOSÉ RIBEIRO PEREIRA, Colaborador do homenageado no Instituto do Vinho

do Porto

Prof. Dr. Jaime Lopes Amorim. . . Para Aquém e Para Além das Contabilidades

Resumo*

— Agradecimento pela honrosa lembrança deste modesto mas sincero amigo do Dr. Lopes Amorim para dar o seu depoimento e enaltecer a vigorosa personalidade de tão ilustre Homem.

— Seria "ensinar o Padre-Nosso ao Vigário" falar a tão ilustre auditório e em tão solene ocasião nos méritos e nas virtudes do cabouqueiro da Contabilidade em Portugal, impondo-a como uma Ciência; é, com efeito, a área em que com menos autoridade do homenageado poderia falar mas há tanto... para aquém e para além disso que não mingua pano para mangas.

— Assim, ocupar-me-ei do trabalhador indefesso, do intelectual polivalente e versátil, profissional competente, do escritor da linguagem clara, tersa, do mestre e colega simples, generoso... em suma, do Homem.

— Elementos biográficos. — O brio na recolha de elementos para ser... Professor de Geografia,

depois de uma longa vida distante de tal matéria. — O funcionário do Instituto do Vinho do Porto, de Chefe de Secção

a Director de Serviços.

* A doença impediu que nds fizesse chegar o seu "Depoimento" na versão definitiva.

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— O seu dia a dia a mostrar, a cada passo, que a economia, o direito e a política económica eram campos onde se sentia como peixe na água.

— Os livros que escreveu; melhor o que foi publicado em livro, da sua autoria. O muitíssimo que deixou disperso por dossiers, por revistas e periódicos e que daria bem mais livros.

— Muito lhe deve o Vinho do Porto, sobretudo no domínio do comércio externo e da política de qualidade.

— A sua real ou aparente timidez nas possíveis reacções que, diz-se, são próprias dos tímidos.

— Neste capítulo um exame, superficial mas com algum pormenor do autor de uma "Lição a um Mestre de Ideias bailarinas, revolucionárias e destruidoras".

— Procurarei desfazer a ideia que, julgo, necessariamente fará do Dr. Lopes Amorim quem o conheça, apenas, por esta publicação.

— Embora eu próprio não seja capaz de o demonstrar, tentarei convencer de que ele foi um Homem superior e, nem de perto nem de longe, corresponde ao que ele próprio diz de si, escrevendo... só escrevendo.

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PALAVRAS PROFERIDAS pela

DR.a MARIA LUÍSA AMORIM BRAUN, "filha do homenageado"

Ex.mos Membros da Comissão Organizadora desta homenagem Ex.mos Professores Minhas Senhoras Meus Senhores

Eu não vou fazer um discurso. Vários foram já feitos e, considerando a densidade do programa desta sessão de trabalhos, deve o tempo ser bem aproveitado. Mas há necessidade — para mim uma obrigação moral — de dizer algumas palavras singelas, muito breves, também em nome da minha irmã, a agradecer esta homenagem prestada ao nosso pai.

Sinto-me muito inibida por vários motivos: pr imeiro , por o homenageado ser o nosso pai e, portanto, não ter eu o distanciamento necessário para poder falar sobre ele como os outros; em segundo lugar, porque, afastada há meia vida deste país, já não consigo falar aquele português escorreito doutros tempos. Por isso, peço desculpa a todos os presentes, invocando, ao mesmo tempo, a benevolência do meu pai.

Eu penso que, se esta homenagem tivesse sido feita pouco depois de ele ter falecido, seria, por assim dizer, a última pàzada: um modo de encerrar uma biografia e abrir caminho ao esquecimento, em boa consciência. Uma vez que, porém, se passaram já quase 20 anos sobre o seu falecimento, penso que esta homenagem tem, realmente, uma importância e um significado maiores. E o certo é que já os oradores que me precederam deram relevo e reconheceram o valor da pessoa do meu pai e da sua obra.

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Eu pergunto a mim própria qual teria sido a sua reacção, se lhe fosse proposta uma homenagem enquanto vivo. Suponho que ele teria ficado embaraçadíssimo e tudo teria feito para impedir tal iniciativa. Porque as pessoas que o conheciam melhor — algumas disso deram já testemunho — sabem que o nosso pai era uma pessoa muito modesta e, para além disso, tímida.

Felizmente — ou infelizmente porque ele já não se encontra entre nós, — não é capaz de impedir a sessão solene de hoje em sua memória; e imagino que se ele, por hipótese, tivesse a possibilidade de estar aqui a ver-nos e a ouvir-nos, estaria muito contente pelo facto em si, mas, não menos, por se achar impedido de comparecer fisicamente.

Eu não tenho habilitações, capacidade ou competência para me referir ao meu pai como homem de ciência, como intelectual. Essas referências foram aqui feitas. O nosso pai teve a pouca sorte de ter duas filhas que não percebem nada de Economia e, mais especificamente, de Contabilidade. Além disso, o nosso pai era uma pessoa que, em casa, pouco falava, minimamente aludia às suas tarefas profissionais; trabalhava intensamente, quase com devoção, mas em recato. Às vezes, é certo, assistíamos a uma conferência sua, ou éramos testemunhas casuais de conversas tidas com colegas, amigos ou discípulos e relacionadas com trabalhos ou livros seus; mas saber, em profundidade, as matérias a que ele se dedicava não sabíamos — aqui, eu pecadora me confesso. Em resumo, não me cabe a mim emitir juízos de valor sobre o profissional, homem de Ciência ou professor, outros o fizeram já ou farão ainda. Eu vim aqui aprender novos aspectos do meu pai e, até, só por isso, teria de estar muito obrigada a V. Excelências.

Aquilo a que me posso e quero essencialmente referir, para além das qualidades do homem intelectual, é, dito por simplificação, a dimensão moral do meu pai; uma dimensão a que só talvez posteriormente tenha dado o devido valor, depois de ter vivido tanto tempo fora de casa e da família, ter contactado com tanta gente de vários falares e nações. Quem o conhecia sabia que ele era um indivíduo recto, isento de carácter, com grande sentido de responsabilidade e do cumprimento do dever e de uma modéstia que, se já no seu tempo era invulgar, hoje em dia passou totalmente de moda. Pela minha parte posso afirmar que ainda não encontrei em parte alguma, nem dentro nem fora do país, alguém que se lhe assemelhe, que congregue essas várias facetas da sua personalidade.

O que se pede a uma filha, na situação presente, é, sobretudo, um testemunho familiar. Falar da relação pai/filha é possível, mas não é fácil.

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As impressões são subjectivas e grande é o receio de esgravatar emoções, de tocar e reavivar a esfera íntima que pertence ao passado. É com esse receio que eu digo que, em criança, via o meu pai como uma pessoa bastante distante, extremamente séria, com uma grande autoridade natural — sem ser autoritário — mas que, de certo modo, me inspirava medo. Lembro-me de, ainda muito pequenita, querer quebrar essa distância, tentar fazê-lo rir por meio de cócegas e diabruras, tentativas essas que pouco frequentemente eram coroadas de êxito. Mas, se ele achava mesmo graça e se ria, tinha umas gargalhadas tão sonoras e um brilho tão travesso nos olhos, que não se me esbatem na memória. Talvez por serem momentos raros.

Antes de mim houve já quem, tendo privado de mais perto com ele, relatasse pormenores e reacções típicas, um tanto inesperadas para os que conheciam o nosso pai só de nome ou "por fora". Eu poderia aqui citar, por exemplo, muitas saudosas e santas tardes de domingo, em que ele nos levava ao cinema — à mãe, às filhas e às amigas das filhas — para ter toda a gente satisfeita. A família estava entretida e ele, refastelado numa cadeira do camarote, na sua santa paz. Se o filme não lhe interessava — e a nossa escolha devia, em muitos casos, parecer-lhe execrável —, dormitava, sendo preciso, às vezes, dar-lhe uma cotovelada para anunciar o fim da sessão!

O curioso é que, precisamente em determinados filmes de cowboys ou em cenas de pancadaria, o pai estava bem acordado, gozava a cena, esfregando as mãos e chegando mesmo a exprimir-se em voz alta, adepto cem por cento do bom ou do vilão da fita! Tudo menos "lamechices", como ele dizia.

Assim também, na vida real, detestava sentimentalismos bacocos; mas creio que o que mais lhe custava suportar era a estupidez humana. Ele que era uma pessoa tão comedida, avesso a exuberâncias temperamentais, chegava a exaltar-se, a barafustar, a romper intempestivamente os muros do seu autodomínio ante um dito ou uma atitude estúpida. Bem me lembro do medo que também nós, filhas, tínhamos de lhe mostrar, nos tempos da escola, os erros "estúpidos" produzidos em exercícios ou deveres de casa. Por isso é que só muito raramente o consultávamos ou lhe pedíamos ajuda; nenhuma professora era tão severa como ele nas suas avaliações.

Outra faceta muito típica do nosso pai, a que ainda ninguém aludiu até ao momento, era a sua enorme capacidade de distracção, correlativa da sua enorme capacidade de concentração — a famosa distracção dos concentrados. Ele era capaz de, em sociedade, se o tema da conversa ou as pessoas não lhe interessavam sobremaneira, alhear-se, ausentar-se, fugir em

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espírito. Como nós dizíamos, quando éramos miúdas: lá está o pai na lua, é preciso puxá-lo para a terra pelos pés... Mas era visível que não estava superficialmente distraído; o jogo mímico, os trejeitos do rosto traíam uma funda concentração, o seu cérebro trabalhava febrilmente sobre algo a que não tínhamos acesso.

Essa extrema distracção deu origem a muitas anedotas que circulavam a respeito do nosso pai. Não vou entrar em pormenores, mas posso afirmar que ele conseguia bater todos os recordes, tratando-se de trocar quaisquer objectos que não trouxesse bem agarrados ao corpo. As gabardines, os chapéus, os guarda-chuvas que ele levava para casa nunca eram os dele e, depois, era o eterno problema de descobrir a quem pertenciam e proceder à destroca.

Recordações da infância, quase remotas, estas. As de pessoa adulta são outras. E, em ambos os casos, falei e falo mais por mim própria, porque a relação da minha irmã com o nosso pai era, por certo, diferente. Uma vez que não há relações idênticas entre pais e filhos, ela deve tê-lo visto com outros olhos e estará mesmo surpreendida com o teor destas minhas recordações. Pelo que me toca, devo dizer que o tal medo que confessei ter tido em relação ao pai se transformou, ao tornar-me adulta, ou pelo menos menos criança, numa grande admiração e num carinho muito especial, que dispensava os gestos repetidos ou espectaculares.

Se eu tivesse de sintetizar numa palavra aquilo que mais me impressionava no meu pai era, sem dúvida, a sensação de grande dignidade humana que dele emanava. Sensação de verticalidade, no amplo sentido da palavra. Para ilustrar este vocábulo, que se me impõe sem substituto, vou citar um pequeno episódio que, oxalá, não lhes pareça absurdo.

Uma vez, numa noite de Inverno, no passeio em frente ao Instituto do Vinho do Porto, na Praça do Infante, o meu pai escorregou e caiu, ficando estendido no chão a todo o comprimento. O facto de ele ter caído — e acrescento que ele não se magoou, foi, felizmente, uma queda sem consequências — de ter perdido, assim, por um momento, a "verticalidade física" impressionou-me tanto, que ainda hoje sonho com este episódio. Claro que não foi a queda em si, mas a "vulgaridade" da queda, que se me apresentou como um vexame por ele sofrido e que eu, por pudor, não devia ter presenciado. Reconsiderando, a toda esta distância, talvez fosse já e também o medo inconfessado da horizontalidade última da condição humana.

Não posso nem quero alongar-me — o tempo é escasso —, mas não

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devo calar-me sem agradecer, mais uma vez, a todos os organizadores desta homenagem o empenho que nela puseram e a todos os presentes o terem vindo aqui e se terem a ela associado. Para nós, filhas, é motivo de regozijo e até — pondo de parte falsas modéstias — de orgulho e vaidade pelo pai que nos foi dado ter.

Aqui se prova que, afinal, sempre é possível ultrapassar a morte física, ir protelando a morte cabal, terminal, na medida em que se conservam vivos na memória aqueles que estimamos ou admiramos. Também e, sobretudo, por este motivo, quero ainda agradecer a todos o facto de terem ajudado a prolongar a vida do nosso pai.

Muito obrigada.

J^&Ù?^^

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Comunicações

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O CIENTISTA PORTUGUÊS DA CONTABILIDADE

CARLOS MOREIRA DA SILVA

O primeiro livro de contabilidade que me foi dado para os meus estudos escolares tinha como título "Compêndio de Contabilidade"; não era da autoria do Professor Jaime Lopes de Amorim, e entre muitas afirmações que se me apresentavam como inconsequentes, ilógicas ou sem significância, referia como "o mais próximo de uma definição de Contabilidade" (de que aliás noutros livros, o mesmo autor, até contestava a existência)

que a contabilidade "ensina a representar, interpretar e seguir na sua evolução todas as transformações por que passa o património de modo a poder conhecer-se, em qualquer época, a sua composição e o seu valor".

Referia-se pois só à Escrituração onde se representavam, interpretavam e seguiam as transformações do património, não referindo nunca "causas" nem "consequências" das transformações, nem sequer a natureza das transformações, nem os objectivos com tal trabalho. Até o valor que refere, não seria o de cada componente do património, mas o valor do património global. Nem comparava valores de épocas diferentes, pois referia simplesmente "uma época". O fim seria singelamente conhecer-se, pois excluía-se quaisquer espécie de raciocínio, quaisquer conclusões sobre tais conhecimentos.

Enfim, uma contabilidade talvez do século XVIII! ou anterior? ... Mas não era ... Isto passava-se em 1944 numa escola portuguesa oficial.

* Contabilista ICP — aluno do homenageado.

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Eis senão quando, me chega às mãos o livro "Elementos de Contabilidade" do já muito conhecido Professor Jaime Lopes de Amorim, livro como o anterior destinado aos alunos das Escolas Comerciais. Apresentava já uma definição de Contabilidade, em que distinguia "Ciência" e "Arte":

"Ciência que se ocupa do património das empresas, encarando-o sob os pontos de vista qualitativo e quantitativo num dado instante e na sucessão dos instantes".

Era realmente outra Disciplina, detentora de uma Utilidade, de uma Finalidade humana regida por uma Lógica, dava conhecimento da existência de um ponto de vista "Quantitativo", não se limitando ao monetário. Transmitia realmente já uma Ciência aos alunos, não a parte mais diminuta dessa ciência, que nem Arte chegava a ser, era mais um amontoado de conhecimentos para formar seres ignorantes, sem pensamento, amorfos.

Não devemos esquecer-nos de que o Porto já detinha Tradição nestes conhecimentos, como nos mostrou Júlio Diniz, na sua publicação "Uma Família Inglesa" em primorosa apresentação de um Guarda-Livros no tempo retratado pelo Escritor.

Mas, continuemos. Outros livros que iam aparecendo fui lendo, que eram infelizmente

quase sempre do mesmo autor inicial, e onde o meu interesse pela contabilidade ia quebrando pelas irracionalidades que detectava, pelos facciosismos, pelas confusões que apresentava, pelas indefinições sucessivas ou definições sem orientação de Objectivos, etc... As maledicências todavia não tinham fim, os portugueses com provas dadas ficavam no olvido quando não eram desancados, mas apareciam referências a nomes desconhecidos, e que quando se vinham a conhecer decepcionavam. A Ciência já tinha dois séculos de existência em diversos países estrangeiros, mas aqui estávamos voltando à estaca zero.

Um dos livros verdadeiramente tristes, tinha o pomposo título de "Doutrinas Contabilísticas", mas não apresentava senão defeitos dos respectivos autores e estendia-se a mostrar que afinal não eram também doutrinas. Em "Definições de Contas" ia buscar os maiores disparates para apresentar, mas esquecia-se dos escritores mais aceites. Em "Definições de Contabilidade" encontrava maneira de negar até definições que ele próprio construía, e t c . . Enfim vangloriava-se do seu saber que não apresentava, e também mesmo quando o fazia era uma decepção total.

Foi no meio desta irracionalidade barulhenta e zaragateira, que tive a

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sorte de ouvir referir amiúde o Grande professor de contabilidade que dava aulas no Porto, e se dedicava mais a estudar e ensinar os seus alunos, que a buscar favores indevidos e a arengar aos ignorantes... E a essa sorte, correspondeu a sorte maior de vir a tornar-me seu aluno.

Conheci, então, o entus iasmo que pode haver em ensinar a Contabilidade, e em a aprender, onde à irracionalidade de outros se apresenta uma racionalidade total avassaladora, onde tudo tem um Objectivo orientador útil e digno, pois o que não o tenha deve ser abandonado por homens racionais. Ensinar desta maneira, requer uma vontade, um esforço, um estudo, uma inteligência, uma dedicação que só os predestinados possuem.

Temos pois que desculpar os ignorantes... Afinal, se não conhecem a Ciência Contabilística, nem a definição do que é a Contabilidade, nem as Correntes Doutrinárias, nem as Causas nem os Objectivos Contabilísticos... qual a culpa em apregoarem a sua ignorância?!... Talvez só em utilizarem o termo de contabilidade, enganando os que acreditem de que vão aprender isso. Trata-se de publicidade enganadora...

A diferença destes para o superior saber do Professor Jaime Lopes de Amorim, poderá sugerir que os outros autores eram anteriores, mas na verdade é o contrário, são posteriores. Poderia então supor-se que seriam desconhecidos os trabalhos do Professor, o que já não abonaria a competência dos outros, mas como evitam citá-lo até... parece mais um "complot" ou pelo menos uma intenção amesquinhadora que nada justificaria. E representa a diferença entre uma "corrente obscurantista" e a "corrente progressista e científica" da Contabilidade.

Os discípulos do Professor Jaime Lopes de Amorim beneficiando dos seus ens inamentos , além de um desenvolvimento general izado de conhecimentos contabilísticos, podem apresentar Ciência Original Portuguesa que amplia até ao infinito o Campo de utilização da Contabilidade, como:

1) A Contabilidade Transgráfica, sua criação, que utiliza como "meio de aplicação" a Multigrafia também de sua criação, e que também só eles dominam. Os outros confinam-se à Digrafia... como há séculos.

2) A Contabilidade de Actividade, isto é, aplicável a toda e qualquer Actividade, Causas e Efeitos, e não em exclusividade à Economia e ao Património, é mais um Desenvolvimento obtido pelos contabilistas portugueses. A Contabilidade pode aplicar-se por exemplo, e só como exemplo, às actividades: Estatal, Social, Bancária, Seguradora, Transportadora, Exportadora, Autárquica,

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Empreendimentos, Campanhas, Económica, Jurídica, Hospitalar e Médica, Engenharia, etc.

3) A Contabilidade Científica (já hoje é relativamente fácil de observar na sua multifacetada actuação, orientação e vastos Objectivos, pelo que penso terem desaparecido os seus velhos do Restelo...) abarca todo e qualquer sistema de medida necessário aos Objectivos Contabilísticos, quebrando o ainda recente monolitísmo do Sistema Monetário (que os incompetentes agoirentos ainda defendem).

A Contabilidade é detentora de mentalidade própria que nenhuma outra Ciência pode substituir, sem perder a sua própria, a sua unidade, a sua dinâmica, a sua lógica, os seus objectivos. Mas poucos conhecem esta Contabilidade... e não são os seus "paraquedistas".

As Associações dos Técnicos de Contas já falaram em interesses obscuros e inconfessáveis, de grandes grupos de poder que lutam contra a aprovação do seu Código Deontológico! Quem sabe?...

Cingi-me exclusiva e ligeiramente ao livro do Professor Jaime Lopes de Amorim para o ensino comercial, que é suficiente, a meu ver, para mostrar a sua superioridade com os de outros autores universitários, mesmo os destinados até a especialistas. Mas também "As Lições de Contabilidade" do Professor são demasiado suculentas para eu ter a estultícia de as abordar com tão pouco tempo. Iria certamente transmitir a quem as não tenha seguido, uma ideia que não poderia corresponder, nem proximamente, à extensão da sua influência no conhecimento actual da Contabilidade.

E terminei. Disse tanta coisa... e tão pouco.

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LOPES AMORIM — UM GRANDE MESTRE DA CONTABILIDADE

ROGÉRIO FERNANDES FERREIRA

Devem homenagear-se aqueles que na sua vida iluminam, norteiam, dão exemplos, trabalham, deixam obra.

Será lugar comum, mas é verdade,que todos temos de realçar que o homenageado, o falecido Professor Lopes Amorim, foi o grande pedagogo da contabilidade do seu tempo. Renovou e racionalizou métodos de ensino e com as suas obras a Contabilidade adquiriu no nosso País um estatuto de ciência que antes dificilmente se lhe poderia atribuir. Há questões de então que hoje se encontram perfeitamente clarificadas, mas, na época, envolveram acesas polémicas. E o Professor Lopes Amorim também foi um brilhante polemista.

As Lições de Contabilidade Geral do Professor tiveram a primeira edição impressa no ano de 1929. Foram uma verdadeira revolução para a época, pelo conhecimento que propiciaram de contributos de autores estrangeiros de nomeada da época, tendo o Mestre exercido grande influência na abolição de receitas empíricas para uso de práticos que era então a forma corrente de ensinar e aprender a Contabilidade.

Através do Professor Lopes Amorim os estudiosos do nosso País viram relatadas e algo vulgarizadas as mais significativas teorias contabilísticas que nesse tempo foram aparecendo, procurando o Mestre cotejá-las, tecendo-lhes juízos sobre o seu mérito, não lhes dando crédito quando o não merecessem ou quando fossem ideias bailarinas, como uma vez o disse, na sua muito expressiva linguagem.

Além das citadas Lições de Contabilidade Geral para os alunos dos cursos de contabilidade avançada preocupou-se também o Mestre em

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publicar para os estudantes do então ensino técnico secundário, obra mais acessível e a que deu o nome de Elementos de Contabilidade, para, mais tarde, converter em Noções Básicas de Contabilidade, livros estes pelos quais se passou, nas então chamadas escolas técnicas, a substituir velhos apontamentos que apenas traziam puros receituários ou exemplificações práticas sobre "Deve" e "Haver".

Colaborou o Professor Lopes Amorim intensamente com a prestigiosa Revista de Contabilidade e Comércio. Aí deixou escritos demonstrativos da sua grande cultura e do seu poder crítico. Foi polemista vigoroso, criou prosélitos e admiradores que o respeitavam muito, até à veneração. Isto derivava da sua grande capacidade de comunicação e do vigor dos seus escritos.

Muitos discípulos do Mestre foram e são ainda, felizmente, profissionais de excepção ou professores ilustres, seguidores das suas obras e teorias. Foram diversos os prestigiosos discípulos do Mestre. Nestes se contam o também falecido e saudoso Mestre José António Sarmento e o distinto colaborador dos ISCA's de Aveiro e do Porto o Professor Cimourdain de Oliveira, professor catedrático jubilado da Faculdade de Economia do Porto.

Durante muito tempo se falou e se fala ainda de "Escola do Porto" como alfobre de pensadores e escritores de contabilidade, de profissionais competentes, de professores de excepção.

O Mestre Lopes Amorim, por razões de má memória, que foram as da anterior extinção do ensino superior de comércio em 1933, a que acresceram insuficiências no número de lugares de professor de contabilidade no Quadro do Instituto Comercial do Porto então criado, não ficou a ensinar contabilidade. Foi lamentável que tal sucedesse. Mas um Grande Homem sê-lo-à sempre. Lopes Amorim, como é confirmado por colaboradores e alunos, teve acção meritória no exercício de funções profissionais no Instituto do Vinho do Porto e foi também um grande professor de outras matérias — ensinou Geografia, disciplina de que ficou encarregado quando deixou de dar aulas de Contabilidade.

O seu prestígio conduzia cultores da contabilidade e os seus antigos discípulos a procurarem nele a palavra de encorajamento ou a crítica severa, conforme o Mestre julgava adequado. Era afável, por via de regra, mas não perdoava o que ele entendesse de atrevimentos ou de percepções erradas sobre a Contabilidade.

Frequentemente instado para conferências e comentários a livros e para colaborar com artigos em revistas, privilegiou sempre a Revista de

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Contabilidade e Comércio onde, em muitos artigos, se pode ver a sua garra, as suas qualidades de polemista e de crítico, com vasto saber da ciência contabilística.

O Professor Lopes Amorim veio a surpreender, já quase no fim da sua vida, com um vastíssimo e notável volume de 670 páginas em que faz a História da Contabilidade. Começa o seu trabalho com referências aos primórdios, na Antiguidade, faz um desenvolvido exame do Tratactus de Fr. Luca Paciolo, prosseguindo com a apreciação de períodos seguintes. Culmina as suas análises com a crítica das principais teorias contabilísticas que desde o século passado e até à década de 1970 (morreu em Julho de 1973) foram aparecendo nos diversos países.

Este seu trabalho é repositório notável, completo e indispensável para quem procure conhecer as bases de inspiração de actuais posições sobre problemas essenciais de contabilidade, como sejam, os dos seus objectivos, o problema do valor e das avaliações, o papel do balanço e da demonstração de resultados, as ligações da contabilidade com outras disciplinas, o relevo da contabilidade como predecessora da ciência da Administração.

Como História de Contabilidade o trabalho também é notável e tem-se esperado que outros autores portugueses continuem este tipo de pesquisas, o que se lamenta não suceder, considerando que a Ciência se constrói por adição, parte-se do empreendido pelos antecessores para novas elaborações científicas.

Sobre outras matérias administrativas, designadamente planeamento da gestão, seu controlo e gestão financeira encontram-se nos trabalhos do Mestre sábias análises, demonstrativas da sua competência nas diversas matérias de gestão e que também mostram a sua grande e diversificada cultura, as suas invulgares qualidades de simultaneamente pesquisador, historiador, comentarista, tratadista.

Curioso observar que a propósito da gestão das empresas já então referia Lopes Amorim que "o problema" reside menos no movimento dos capitais e na condução das máquinas e mais nos recursos humanos, na direcção dos homens, sendo portanto às ciências sociais e à psicologia que se deverá recorrer para a sua adequada solução. E sublinhava em conformidade que a tarefa de quem administra consiste essencialmente em conjugar os esforços de cada um para que o trabalho de conjunto resulte muito mais produtivo do que o somatório de trabalhos individuais. Era o sublinhar do que mais tarde se chamou efeitos sinérgicos. Também o Mestre sublinhava que a qualidade primordial de um dirigente não será saber

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executar com perfeição mas sim saber delimitar as atribuições de cada um e estabelecer tipos de gestão em que o controlo surja com naturalidade e conduzindo cada qual a fazer o seu serviço, detectando-se as falhas cometidas, responsabilizando quem tiver de o ser e corrigindo de modo a evitar ou reduzir erros.

Estas ideias que constam da sua obra "O Mundo da Contabilidade", pág. 607/608, hoje são axiomáticas, quase entendimentos comuns, mas na época representaram não só sabedoria mas visão futura, visão do que veio a consignar-se mais tarde como regras de gestão e de seu controlo. Em particular, as importantes teorias que estão no cerne do desenvolvimento da actual ciência contabilística e da teoria da administração encontraram no Mestre estudo exaustivo e importante comentário, em sucessivos capítulos daquele seu importante livro.

Por tudo quanto se aponta os trabalhos do Mestre devem ser lembrados aos actuais estudiosos da contabilidade, em particular dos mais novos. É que, para além de encontrarem aí ainda matéria com actualidade, podem verificar que os pensamentos do Autor não eram conjunturais e também que certas matérias, hoje assentes e pacíficas, antes não o eram, gerando então interessantes e acérrimas controvérsias. Em toda a sua obra se denota o carácter polemista do Mestre. É a obra fonte proveitosa de ensinamentos, farol que iluminou caminhos que a ciência contabilística foi depois percorrendo.

O grande livro de História e de Teoria da Contabilidade que é o Mundo da Contabilidade, de autoria do Mestre, contém contr ibutos significativos e do melhor que há para se conhecer a progressão da ciência, vincando os árduos esforços dos cientistas, as achegas que cada um foi dando para a construção científica.

Parafraseando um distinto orador que é o nosso amigo Prof. Lopes de Sá direi, como ele, que a obra de Lopes Amorim não se pode confinar a simples exame através de uma Comunicação — é demasiado abrangente, vasta, tecnológica, científica, filosófica, direi, sábia.

O Professor Lopes Amorim foi, na verdade, luz inapagável. Esta homenagem, no ano centenário do seu nascimento, tinha de fazer-se. É uma mostra de gratidão para com esse grande Mestre e homem de cultura.

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A ESSÊNCIA FILOSÓFICA DA DOUTRINA CONTABIL DE LOPES AMORIM E SUA INFLUÊNCIA CIENTÍFICA

PROF. DR. A. LOPES DE SÁ*

"Igitur, quod temperamentum omnes in illo subito pietatis calore servamus, hoc singuli quoque meditatique teneamus sciamusque nullum esse neque sincerius neque acceptius genus gratiarum, quam quod illas acclamationes aemulemur, quae fingendi non habent tempus."

Plini Caecili Secundi Panegyricus

Precursores d e u m a c i ê n c i a c o n t a b i l L u s o Bras i l e ira

A his tór ia d a s d o u t r i n a s con tábe i s , n o c a m p o d o c o n h e c i m e n t o racional, científico, possue limites n í t idos na l i teratura específica e m l íngua por tuguesa .

E possível d is t inguir en t re os que se p o s t a r a m como "segu idores" e aque les que b u s c a r a m " n o v a s áreas conce i tua i s" , en t re os q u e a p e n a s d i fundi ram e os que se e m b r e n h a r a m pela filosofia de nosso conhecimento .

* Presidente do IPAT-UNA e Vice-Presidente da Academia Brasileira de Ciências contábeis — Presidente da ACICE — Associação Científica Internacional de Contabilidade e Economia — Director Geral do Centro de Estudos Superiores de Contabilidade do Conselho Regional de Contabilidade de Minas Gerais (Órgão Público Federal), Brasil.

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A década de 20, desse século XX em meu modo de entender, ofereceu no seu final, obras de dois grandes luminares: Francisco d'Auria no Brasil e Jaime Lopes Amorim em Portugal, ambos criadores de ideias no campo superior da contabilidade.

D'Auria ensaiou um Positivismo Contabil (cuja tese apresentou ao Congresso Internacional de Contabilidade, em Barcelona) e Lopes Amorim brindou-nos com uma obra de grande envergadura na qual enunciava a sua Teoria do Equilíbrio Patrimonial.

Ambos seguiam a trilha de Masi, patrimonialista, mas cada um com o seu peculiar toque de genialidade.

É sobre a grandeza do pensamento do emérito mestre lusitano que pretendemos desenvolver o presente trabalho, como homenagem ao seu Centenário, como reconhecimento que pretende fazer justiça a um egrégio mestre; ou ainda como transcrevemos como exórdio utilizando as expressões de Plinio o Jovem, em seu Panegirico a Trajano sem deixar-nos perturbar por um afeto que poderia perturbar a medida de uma justa referência, sem qualquer sombra de fingimento que possa empanar o brilho de quem já tem luz própria e da nossa não carece.

Como escreveu Homero, "A todos Deus não dá a mesma grandeza de valor (Odisseia VIII, 141-178"); a nós nos cabe, todavia, reconhecer a diferenciação, mensurar a magnitude atribuída pela divindade, sob, a ótica de nossos próprios ângulos, buscando destacar as diferenças qualitativas, a partir da essência de sua utilidade, no campo que militamos; assim se justificam, perante a história, trabalhos da natureza deste agora apresentado.

Pensamento e razões lógicas essenciais de Lopes Amorim

Dentre as diversas funções patrimoniais, a de equilíbrio foi a principal preocupação de Lopes Amorim, a ponto de considerá-la como finalidade central nos estudos da contabilidade, inserida, mesmo, como complemento de objecto científico.

Ele a visualizou como uma "posição do patr imónio", basilar e relevante.

Para assimilar, entretanto, o conceito do mestre é preciso aprofundar

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em sua obra e buscar a interpretação de suas "razões lógicas essenciais". Entendeu ele que o movimento que gera o fenómeno patrimonial

nasce da "acção administrativa" e que a finalidade do mesmo é a preservação de um estado de equilíbrio .

A base lógica, essencial, sequencial, de seu pensamento, estribou-se, por conseguinte, em um complexo natural de relações: a administração (Ad), implica em uma acção patrimonial (Ap) que implica logicamente no fenómeno patrimonial (Fp) e, esse, para ser eficaz (Ea) deve equivaler a um estado de equilíbrio (Eq):

(Ad->Ap) => (Fp s Ea) <—> Eq

Ou, ainda, a acção administrativa implicará em eficácia, se e somente se, o equilíbrio patrimonial produzir-se:

Ad <=> Ea <—> Eq

Excluiu, o "auto-movimento" no Património (P), ou seja, não concebeu o fenómeno patrimonial (Fp) por si só:

P ^ > F p

Logo:

Fp <—> ApA Ap <—> Ad

Ou ainda: o património, por si só, não implica em fenómeno e a acção patrimonial que promove tal fenómeno só pode existir se a administração accionar a substância ou massa patrimonial.

Buscou a mais pura acepção, afirmando que:

"O património é um todo material, e, como tal, insusceptível de se movimentar ou modificar por si próprio.(1)"

(1) Jaime Lopes Amorim — Lições de Contabilidade Geral, vol. I pág. 335, Edição E.I.G., Porto, 1929.

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Fundamentos e relações lógicas básicas derivavam-se, para ele dos conceitos de que:

A — O património é matéria: B — O estado patrimonial natural é inercial.

E prosseguiu, afirmando que:

"...qualquer modificação que nele se opere terá necessariamente de emanar de um agente ou duma entidade moral com a capacidade e a autoridade suficientes para decidir da melhor oportunidade para a realização de certos actos... <2>"

Logo, o movimento patrimonial, no entender do mestre, depende de um "causa agente", sem o que o seu estado será sempre o inercial.

Essa "causa agente" ele bem a define, atribuindo-a ao pessoal das aziendas, ou seja, em geral, a administração.

O mestre seguia os pensamentos de Villa e de Rossi, mas, com o seu próprio modo de enfocar.

Rossi afirmara:

"La matéria amministrabile, durante la vita, sociale dell'ente, va soggetta a continue metamorfosi che provengono dall'esercizio délie funzioni amministrative. Tra le funzioni ed il loro effetti stano i fatti amministrativi che sono corne le funzioni in atto<3)".

Se Giovanni Rossi, o genial personalista (que Masi entendia mais profundo intelectualmente que o próprio Cerboni, chefe da escola) afirmava que a função administrativa era a causa agente de todas as metamorfoses, Lopes Amorim, não só consagrava e homologava tal lógica, mas, atribuía-lhe uma responsabilidade objectiva maior e que era a do equilíbrio.

Não há duvida, todavia, que o mestre lusitano seguia a tendência mais pura e elevada de sua época (aquela na qual formara sua cultura),

<2> Idem, idem, pág. 335. (3> Giovanni Rossi — L'ente económico-administrativo, vol.II, pág. 388, Edição

STL degli Artigianelli, Reggio Emilia, 1882.

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mas, sua inquietude intelectual o levava a ampliar as bases lógicas do entendimento geral.

Embora Rossi não figurasse na bibliografia do livro maior do mestre lusitano (de 1929), existem citações ao mesmo no texto, assim como dos grandes vultos da época como Zappa, Masi, Schmalenbach, Dumarchey, Alfieri, Besta, Bellini, Quesnot e outros; Lopes Amorim manteve-se em uma linha invejável de coerência e respeito a cultura contabil superior do tempo que editou sua obra maiúscula sobre contabilidade geral.

Repetimos, todavia, que Lopes Amorim não foi um compilador, um mero reprodutor de ideias, mas um inquieto pensador que trazia contribuições importantes; tinha uma convicção inabalável em seus pontos de vista (o que é próprio dos génios) o que nos valeu, a mim e a ele, tertúlias através das páginas da Revista de Contabilidade e Comércio, do Porto (na década de 50).

Se discordamos em alguns poucos pontos, estávamos de acordo na maioria deles e nossas discussões jamais extrapolaram o imenso respeito que sempre nos dedicamos.

Se hoje entendemos que o património pode por si, gerar seus próprios fenómenos (assim tratamos em nossa Teoria Geral do Conhecimento Contabil) não podemos negar que só à custa de muitos esforços e como fruto do ocorrido nessa segunda metade do século XX, foi-nos possível tal admitir (pelos efeitos da robótica, da informática etc.).

Sabemos, na actualidade, que o património, em muitos casos, já não mais depende de actos administrativos e nem do próprio homem, como, também, os efeitos do ambiente exógeno tende hoje a provocar sérias mudanças na expressão quantitativa e qualitativa da riqueza, no tempo e no espaço.

O curso de nossas atuais ideias, todavia tiveram lastro inequívoco nos pontos de vista lógicos de Lopes Amorim, principalmente no que tange aos aspectos filosóficos e metodológicos (como se apoiaram, também, em Masi, Giannessi, D'Auria e outros mestres).

Comungamos com o mestre em pontos deveras básicos que formaram desenvolvimentos de ideias nossas, na década de 60 e só a partir do fim da década de 70 enveredamos para um campo de maior amplitude que fez gerar a nossa Teoria Geral (que em muitos pontos conserva o sabor da filosofia de Lopes Amorim).

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O objecto científico na doutrina do equilíbrio

Que o mestre pretendeu dar destaque ao equilíbrio patrimonial, como algo relevante e fundamental, não há duvida.

Em várias correspondências que me dirigiu destacava sempre tal ponto central de sua ideia.

A base conceituai já havia claramente expressa em seu texto:

"Por fenómenos pat r imonia is devemos , pois en tender as repercussões dos movimentos patrimoniais sobre o equilíbrio geral do património das empresas(4)

Como patrimonialista, distinguiu a fixação do objecto de seus estudos de forma peculiar: enquanto Masi atribuía ao objecto uma generalidade, Lopes Amorim condicionava tudo ao equilíbrio.

Para que o fenómeno, pois, ocorresse, era preciso que se chegasse ao equilíbrio, sem o que não se poderia considerar exercida a finalidade.

O mestre prendia-se ao conceito hegeliano (muito influente no início do século) de que o fenómeno é o exercício da essência'5' e não podia aceitar, pois, como fenómeno patrimonial o que não modificasse o estado inercial.

Nisto existia uma coerência lógica sobre os aspectos da natureza na riqueza e de sua incapacidade para o "automovimento".

É obvio que o equilíbrio, no entender do mestre, era buscado, analogicamente, nos domínios da física, pois, é claro o posicionamento que nos dá de suas razões:

"A administração da empresa, apresenta-se como um sistema de forças em atitude de actuação permanente, (6)

Quando tal "sistema de forças" é harmónico a eficácia se produz através do equilíbrio, segundo o mestre, em sua forma de conceber as relações

<4) Jaime Lopes Amorim — Lições... pág. 340. <5) G.W.F. Hegel — Enciclopédia das Ciências Filosóficas, vol I, pág. 140, ed.

Athena, Rio de Janeiro 1938. <6) Jaime Lopes Amorim — Lições... pág. 341.

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lógicas essenciais em sua doutrina'7' A mente filosófica de Lopes Amorim, a sua ambição intelectual, seu

espírito epistemológico invulgar, fizeram dele um dos grandes mestres de nosso século, e seus fundamentos teóricos representaram, inequivocamente, um avanço; isso é ainda mais notável se compreendermos que na primeira metade deste século XX, como seus coevos, tivemos expoentes máximos de nossa doutrina e revoluções profundas na sociedade, na ciência e no comportamento humano.

Lei da conservação patrimonial

Em sua abstracção científica, Lopes Amorim edificou uma lei, a partir de razões lógicas que desenvolvera em seu trabalho.

Sua pretensão era a de nivelar a Contabilidade aos demais ramos superiores do conhecimento humano, notadamente aqueles tradicionais, como bem se referiu (Física, Química etc.) em sua Contabilidade Geral (1929).

Nesse seu esforço aceitou como verdade basilar a "lei da conservação" do equilíbrio, fiel ao raciocínio filosófico no mais alto e tradicional nível.

Confessa, expressamente, a analogia contabil com as leis da mecânica e apoia-se nas bases dos "contrários" que movera desde o berço da filosofia, os filósofos jónicos (notadamente Heraclito, de Efeso) e, enunciou:

"Toda alteração de valor, ocorrida em qualquer elemento no património, provoca invariavelmente uma alteração igual noutro ou noutros elementos, destinada a neutralizar o equilíbrio da primeira<8)."

Sua aceitação ao princípio do filósofo Rosmini, como se refere, é um modelo, ou seja, um paradigma da situação que admitiu como de "conservação", pois, a anulação de um desequil íbrio representa , inequivocamente, a promoção de equilíbrio, por influência lógica.

(7) Idem, idem, pág. 342. (8> Idem, idem, pág. 343

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Ao inspirar-se no pensador italiano*9', Lopes Amorim aceitou a generalidade de um conceito de verdade que elegeu como paradigma; admito que o mestre tomou por base as razões do filósofo referido no que tange ao modelo eleito, para orientar a sua metodologia (ele não se refere, ao texto e nem a obra, mas, podemos admitir que seja o que também Masi seleccionou e estampou à pág. 11 de sua "La Ragioneria come Scienza dei Património"), ou seja:

"II vero e il falso é una qualité di giudizi e degli assensi dei uomo. Se 1'uomo assente a cio che é, il suo assenso e verace; se assente a cio che non e, il suo assenso e mennace... colui che aderisce a molti errori, crede di sapere molto: perció volgarmente si appella sapere anche quello che non e altro se non una falsa persuasione che 1'errante ha di sapere."(9)

Isto porque o mestre lusitano afirma:

"Esta lei constitui aquele princípio único, de que nos fala Rosmini, que nos vai servir de base à dedução de todo um sistema de verdades — e que, como tal, deverá estar sempre presente na nossa memória."(10)

Portanto, para a fixação de um objecto científico, que ele sempre proclamou como "orientador nas metodologias", necessário se fazia deixar bem claro que o equilíbrio, na sua forma de observar, fazia parte na própria essência do entendimento, ou, ainda, era condição natural, vinculada à natureza na matéria.

É nesse sentido que admitimos possa justificar-se uma "lei de conservação", como fundamento da preservação do conceito de um objecto racional.

Teve ele o zelo de dar à terminologia que utilizava o sentido profundo sob o qual deveria ser entendida.

(9) A. Rosmini — Introduzione alia filosofia, Bolonha, 1924. <10) Jaime Lopes Amorim — Lições... pág. 343.

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A associação entre o "termo científico" e o "pensamento científico" deve dar teor específico à ideia, de modo que ela possa transcender ao uso comum, como bem advertiu Einstein (11) e como Lopes Amorim teve o zelo de efetivar, para bem caracterizar sob que sentido o "equilíbrio patrimonial" deveria ser entendido.

Foi um conciliador de verdades científicas, sem, contudo, ser um imitador vulgar .

Não era dos que repetiam para difundir, mas, mantinha a inquietude de acrescentar ao conhecimento contábil, sempre, novos horizontes.

Suas hipóteses sobre o equilíbrio, pois, podem parecer ter um sabor daquelas da Teoria Positivista do escritor francês Dumarchey, mas, no âmago, guardam as razões lógicas essenciais do desenvolvimento próprio do mestre lusitano.

Hoje, em minha Teoria Geral do Conhecimento, é óbvio, não me preocupam o Activo, o passivo e nem a situação dita Liquida, como bases de raciocínio, mas, sim "Sistemas de Funções" dos elementos patrimoniais, porque nossa metodologia se direcciona para a eficácia, como anulação da necessidade aziendal, mas, não posso considerar como inaceitáveis ou inaproveitáveis os raciocínios passados de Lopes Amorim: é natural a evolução dos métodos e a mudança de posicionamento de pontos de vista no campo da ciência, mas, é anti-natural o abandono e o repúdio ao que serviu de base ao conhecimento (assim também entende Einstein quando discorreu sobre a Evolução da Física).

As mudanças conceituais não invalidam os esforços precedentes.

Se Lopes Amorim criou suas hipóteses de equilíbrio e de desequilíbrio a partir de volumes quantitativos e qualitativos de Activo, Passivo e Situação Liquida, não fez, senão, aceitar o que era tido como válido e mais importante, sendo coerente com o ambiente intelectual de seu tempo.

Os casos e as hipóteses que formulou, sobre efeitos "aumentativos" e "diminuitivos" de agregados de bens, centravam-se, de forma lógica, nos

(11) Albert Einstein — A Evolução da Física, pág. 21, edição Zahar, Rio de Janeiro, 1980 (4a ed.).

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conceitos de "massa em movimento constante", sob um só aspecto "o da manutenção do equilíbrio patrimonial" que em minha teoria denominei como Função de estabilidade (e que compõe o conjunto de sete funções: liquidez, resul tabi l idade, es tabi l idade, economicidade, p rodu t iv idade , invulnerabilidade e elasticidade).

Assim, por exemplo, em sua primeira hipótese leciona que:

"O desequilíbrio ocorrido no património quando a variação aumentativa for superior à variação aumentativa do passivo, será neutralizado por uma correlativa variação da situação líquida, igual à diferença entre as variações daqueles componentes patrimoniais. "(12)

Fez o mestre questão de deixar claro que a lei da Conservação Patrimonial estava além de um simples jogo gráfico de contas, da informação apenas, porque os reconhecia como "instrumentos" e não como a própria matéria de estudo de uma ciência.

O património como matéria, como substância, era a forma como deveria ser observado, cientificamente e por isto uma lei que analogicamente se conectava com a Física mecaniscista, parecia-lhe principal.

A preocupação do mestre era a de dar conotação superior aos estudos e de buscar, em seu método de desenvolvimento, apoio em outros conhecimentos consagrados, quer na ciência, quer na filosofia.

Se hoje, também por analogia, buscamos outros posicionamentos, eles em nada desmerecem os alicerces do pensamento do grande mestre lusitano, muito opostamente, nossas posições atuais foram prodigiosamente enriquecidas com as bases do pensamento de Lopes Amorim.

Hipóteses de equil íbrio — avanços terminológicos e metodológicos

O desenvolvimento teórico do mestre levou-o à formulação de hipóteses combinatórias entre as variações ocorridas em Activo, Passivo e Situação Liquida (esta recebendo os reflexos).

A visão do eminente cientista sempre nos pareceu ampla, bastando

<12> Jaime Lopes Amorim — Lições... pág. 347.

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lembrar os conceitos "ferrenhos" que debateu em tomo da reintegração e da amortização'13' tais debates dimensionam bem a sua intransigência intelectual dentro da verdade científica, dentro da realidade patrimonial essencial.

A ótica sob a qual observava era coerente com os mais elevados conceitos de nossa doutrina, de cunho nitidamente patrimoniatista (e Masi muito o louvou por isto), mantinha-se fiel ao que elegera, como razão lógica essencial de sua directriz no campo da ciência.

Preocupava-se com a posição de Dumarchey (em sua Teoria Positiva) porque eram muito evidentes na época, ele as respeitava, em vários pontos a endossava, mas, mantinha-se fiel aos princípios da alta doutrina italiana e àqueles que ele acrescentara e valorizara em seus trabalhos.

O mestre preocupou-se em evidenciar uma educação (que é uma relação), ou seja, uma posição de igualdade, mantida mesmo quando diferente é o comportamento entre Activo e Passivo.

As demais hipóteses, nos demais casos, seguem sempre a mesma linha filosófica.

Apezar do rigor matemático demonstrado pelas hipóteses, entendo que ele não se p rendeu exclusivamente a eles (sua dout r ina era profundamente epistemológica).

Por esta razão, ao partir para as suas conclusões<14) fala-nos de "avigoramento" e de "afrouxamento" do equilíbrio, sob certas circunstâncias, nas quais reconhece perda ou acréscimo do poder patrimonial."

Assim, por exemplo, na Ia conclusão, estabelece com clareza:

"Que as variações aumenta t ivas do Activo, i so ladamente consideradas, avigoram o equilíbrio patrimonial, porque aumentam a Situação Liquida, enquanto que as variações aumentativas do Passivo afrouxam o equilíbrio patrimonial, porque diminuem a situação líquida(14)..."

A situação Liquida, pois, fica claro nas expressões do mestre, é a indicadora das variações do equilíbrio, funcionando como uma "base de aferição; tal raciocínio era predominante no início do século XX e o mestre o absorveu para os fins de seus aspectos de convicção doutrinária.

(i3) Revista de Contabilidade e Comércio, pág. 107 e seg., n" 105, Jan"-Março de 1959.

(14) Idem, idem, pág. 355.

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O que difere, entretanto, em sua maneira de enfocar a questão, é a metodologia científica que emprega, fruto de um aspecto particular de apresentação do objecto que admitia para a disciplina.

Para a doutrina que defendia, o relevante estava na "diferença" ou "adição" da riqueza líquida (haveres menos obrigações).

Sabemos o quanto custou à teoria contabil, e, ainda custa, a libertação desses conceitos eminentes ligados à "propriedade".

Não se poderia, pois, admitir que o grande mestre abandonasse a linha predominante de seu tempo, mas, é inequívoca a sua rebeldia intelectual (e é ela que faz evoluir o conhecimento) quando busca a analogia em outras metodologias cientificas (como a Física), basta um exame ligeiro de suas ideias para que se perceba esse desejo de uma passagem para outros cursos de raciocínios, como, por exemplo, em sua frase, seguinte:

"E a posição em que as massas do Activo e Passivo têm precisamente o mesmo volume e que, como tais, se mantêm num equilíbrio que a menor oscilação destruirá num instante."(15)

Os termos por nós grifados (massa,equilíbrio, volume, oscilação) são típicos da terminologia da física, mas, logo, e a seguir, no parágrafo imediato, o mestre já indica o condicionamento jurídico (de propriedades e obrigações) predominante na época em que produz sua Contabilidade Geral:

"É, por conseguinte, uma posição crítica ou equivoca de equilíbrio, susceptível de produzir o maior desequilíbrio ou perturbação moral no proprietário da empresa, cujo património se apresenta em tais condições, e que tenha na devida conta a honra na satisfação de seus compromissos.<16)

As figuras do dono, no compromisso e da obrigação, destacam bem a orientação personalista, vizinha do Direito.

O que é extraordinário, entretanto, em sua obra é essa ruptura de compromissos teóricos de sua formação cultural (que ele faz sem ferir as conquistas já havidas), para acenar os aspectos mais elevados e a introdução de novas terminologias como as que emprega ao falar em "zona de

(15> Idem, idem, pág. 357. (16) Idem, idem, pág. 357/8.

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estabilidade", "zona da instabilidade"07 ', "equilíbrio quantitativo integral" e "equilíbrio serial".™

Influências, pontos convergentes e variações em torno de uma teoria do equilíbrio

A preocupação que no fim da década de 20, deste século XX, orientou o rumo das doutrinas de Lopes Amorim, criaram fortes raízes.

Não posso afirmar que elas tenham sido a inspiração de Ceccherelli, Riparbelli e Amaduzzi f19-20-21», nas décadas de 40 a 60, mas é inequívoco que os estudos desses eminentes mestres também se direccionaram em sentido análogo.

Quanto a nós, sim, podemos afirmar que os postulados de Lopes Amorim, somados aos aludidos mestres italianos, muito nos inspiraram em nossa teoria do equilíbrio'22' e que foi apresentada à Universidade do Brasil.

Buscávamos conhecer "em que proporções" o equilíbrio se verificava e, nisto, muito nos ajudavam as zonas de estabilidade de Lopes Amorim e os estudos de balanços-tipos, de Ceccherelli.

Correspondências que troquei com o mestre lusitano despertaram-me a atenção para importantes pontos de vista, e muito nos estimulariam a uma busca de "limites de equilíbrio".

(17) Idem, idem, pág. 360. <18) Idem, idem, pág. 361. (19> Alberto Ceccherelli — II linguggio dei bilanci, edição Felice Le Monier,

Florença, 1950. (20) Alberto Riparelli — II contributo delia Ragioneira nella analisi dei dissesti

aziendal, ed. Valechi, Florença 1950. (21) Aldo Amaduzzi — Indagini sull'efficienza, teoria dell'equilibrio nella

dinâmica aziendale, pianificazione intégrale dell'azienda, ed. Cupsi, Pisa, 1960. <22> António Lopes de Sá — Teoria do Capital das Empresas, ed. FGV, Rio de

Janeiro, 1964.

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Uma intensa pesquisa empírica foi por nós desenvolvida até que pudéssemos observar que não eram, apenas, as expressões dimensionais quantitativas e qualitativas que influiam, mas, especialmente, o processo circulatório ou de giro, tão como a natureza dos ciclos operacionais.

O conceito de equilíbrio passava, então para nós, por algumas correcções, onde predominavam as relações lógicas dimensionais de Tempo e Espaço.

Desequilíbrios em certas épocas poderiam ser o caminho do equilíbrio em outras, tudo dependendo dos ciclos e das funções.

O equilíbrio da Situação Líquida, considerado por Lopes Amorim, como o modelo daquele "Integral", para a nossa Teoria passava a ter importância relativa e restrita, embora continuasse a ser importante.

O mestre enunciava:

"Ao equilíbrio patrimonial expresso na Situação líquida, poder-se-à dar o nome de equilíbrio quantitativo integral, visto que é o somatório de todas as posições de equilíbrio quantitativo elementar ou parcial, isto é, dos diferentes elementos patrimoniais.(23)"

Para nós, entretanto, o equilíbrio dependia não só da harmonia estática da "massa patr imonial" , mas, de uma "dinâmica" competente para manter a vitalidade aziendal.

Não podemos, todavia, negar que a metodologia doutrinária de Lopes Amorim tivesse influenciado a nossa Teoria.

Se apresentávamos alguns enfoques diferentes, mantinhamos, todavia, o escopo.

O mestre buscava na situação líquida a posição de estabilidade, e, nós, as proporções definidas competentes para exprimirem o equilíbrio.

Mais tarde, e, quase 20 anos mais tarde, é que a posição de equilíbrio, tão importante para nós, passaria a se inserir como apenas uma "função patrimonial", em meio de outras seis; nesse caso a Teoria do Equilíbrio situava-se como uma Teoria Derivada em um conjunto de outras Teorias Derivadas de uma grande Teoria Geral das Funções Sistemáticas do Património Aziendal (como apresentamos em nossa obra Introdução à Ciência da Contabilidade).

Jaime Lopes Amorim — Lições... pág. 361.

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O caminho das ciências está cheio de exemplos similares, ou seja, a construção de teorias que emergem de outras, antes tidas como exclusivas formas de observação.

Para nós, hoje, a Eficácia Global não se traduz apenas pelo equilíbrio, mas, pela somatória da eficácia das seguintes funções sistemáticas:

Liquidez ; Resultabilidade ; Estabilidade ; Economicidade; Produtividade ; Invulnerabilidade e Elasticidade.

A Estabilidade e que é a que desempenha a capacidade de equilíbrio, apresenta, apenas, a "harmonia estrutural" , sendo, apenas, uma das funções que o património precisa exercer para que seja plenamente eficaz.

Talvez, todavia, também aí, exista, apenas, uma questão de terminologia, mas, a estrutura de nossas relações lógicas abrangem três grandes grupos (Essenciais, Dimensionais e Ambientais).

Admito, sem forçar intelectualmente os conceitos, que Lopes Amorim quisesse observar no Equilíbrio o que apresentamos como "Eficácia" (até certo ponto, apenas).

Isto porque o mestre abrangia "todas as variações", de todos os fatos, para a projecção de um Equilíbrio Integral.

Não posso afirmar que o mestre aceitasse nosso posicionamento interpretativo, mas, ouso admitir essa correlação de ideias.

Minha teoria admite uma "independência sistemática", ou seja, uma azienda pode ter produtividade e não ter resultabilidade; pode ter liquidez e não ter produtividade; pode ter equilíbrio e não ter resultabilidade; pode ter liquidez e não ter invulnerabilidade e, assim, por diante.

Isolamos as funções em sistemas e dimensionamos desempenhos (em Tempo, Espaço, Qualidade, Quantidade, causa e efeito).

Para nós existem "meios" e "necessidades" inseridas no património e cada Sistema exige, de cada componente, um comportamento específico.

Os estoques, para a liquidez, são meios de pagamentos, mas, para a resultabilidade são "meios de lucros" (e nele se inserem como necessidades que conduzem à conversão do lucro, através das receitas e que são os meios genuínos).

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O tempo do estoque pode satisfazer a liquidez (entre investir e desinvestir), mas, pode não satisfazer a resultabilidade, por isto, o mesmo estoque pode ser eficaz como meio de pagamento e ineficaz como necessidade que conduz ao lucro.

Basta que um estoque se venda, com facilidade em uma liquidação, para que se transforme em dinheiro e satisfação a liquidez, mas, pode não satisfazer à margem de lucros necessária e que seria alcançada em uma venda normal, a maior tempo.

O que é bom para a produtividade pode não ser para a liquidez. Em suma, hoje entendemos que a eficácia como meta, deve ser integral

e que cada sistema de funções tem a sua própria. Em nossa Teoria, onde muitas são as proposições lógicas, admitimos,

como uma das básicas que:

A eficácia tende a ser constante se a função patrimonial é eficaz constantemente.

E, entendemos por eficácia (Ea), a anulação da necessidade (n), em conceito restrito e relativo a cada tempo, ou seja:

Ea<=> (n = O)

Para nós o património inerte não exerce função (máxima absorvida de Lopes Amorim) e esta só é competente se anula a necessidade.

A necessidade aziendal (que não se confunde com a do indivíduo) é a fonte da finalidade aziendal e os meios patrimoniais existem para suprir as necessidades e tornarem a finalidade eficaz (essa a base filosófica de nossa Teoria).

Nas relações de essência, com as quais construímos nossa Teoria, buscamos muito na lógica de Lopes Amorim, e, embora, hoje, os aspectos metodológicos sejam diferentes, em muitos ângulos, não deixam de conservar as raízes do grande mestre lusitano.

Intuição científica do aspecto social do património

Preservando os conceitos básicos que formam sua linha de grande coerência lógica, o mestre Lopes Amorim brindou-nos com as suas "Noções Básicas de Contabilidade", em dois volumes, no início da década de 60.

Enviou-nos o livro com uma preciosa dedicatória que conservamos

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como rara jóia de amizade e consideração: "Ao meu mui prezado amigo e colega Prof. Dr. A. Lopes de Sá, em testemunho de muita consideração e apreço pela sua inteligência e pelo seu saber, oferece, Jaime Lopes Amorim, porto, 17-VI-1966".

O mestre dos mestres, o mestre de um emérito como Camilo Cimour-dain de Oliveira, outra grande luz no cenário intelectual lusitano, tinha, de minha parte, recíproca consideração, acrescida de um enorme respeito.

Se algumas vezes tertuliamos, foi pelo excessivo amor na ciência que ambos predilecionávamos, mais que por qualquer outro motivo.

Em verdade, minha imensa admiração pelo mestre, era a mesma que dedicava a D'Auria, Masi, Onida, Melis, Giannessi, Fernandez Pirla, Fernandez Pena, Gonçalves da Silva, Fernandes Ferreira, Lamouroux, Ortigueira Bouzada, Schneider, Garner, e, tantos outros com os quais mantinhamos correspondência firme e troca de ideias permanente.

Essa irmandade intelectual contribuiu, em muito, para o nosso permanente progresso intelectual.

Sempre admirei em Lopes Amorim as suas sinceridade e intransi­gência com os postulados de sua doutrina e que defendia ferrenhamente.

Nada mais justo, pois, que hoje render-lhe a minha expressa homenagem, discorrendo sobre os seus pontos de vista científicos e filosóficos, com o colorido e calor humano de uma amizade sólida que sempre lhe dediquei.

Esse exórdio fazia-se necessário para enforcar uma "semente de ideia" que o mestre deixou em nossos trabalhos e que frutificou em várias outras.

O Objecto de nossa disciplina Lopes Amorim bem o reconheceu no campo social.

Entendo que tal convicção não se lastreou apenas no fato de ter sido esta a tendência que já se prenunciara desde 1836, quando a Academia de Ciências de Paris assim a reconheceu (através da obra de Coffy e da proposição de Costay).

Nesse particular é preciso absorver as entrelinhas e bem penetrar no espírito do mestre.

Assim, por exemplo, em sua frase seguinte, muito se pode sentir do que imaginava:

"A enorme importância social que nos tempos atuais desempenha a prática dessas operações faz com que seja o património das entidades (empresas) que se dedicam à especulação económica o

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que vai constituir objecto exclusivo de nosso estudo'25'.

Previa ele o gigantismo e a importância que as empresas estavam tomando no ambiente social e tinha consciência de que tal efeito teria destaque sobre os demais estudos.

Tal a influência crescente dessas aziendas que visam ao lucro (empresas) que o mestre antevia a própria análise do mundo social, através da pressão que poderiam exercer.

As "Operações" a que se referia no texto citado eram exactamente dessas células sociais.

No momento em que escreveu essa obra referida, começava a formar-se uma consciência da economia através dos balanços das sociedades e não estavam maduras, ainda, as tecnologias do Balanço Social ou do Valor Acrescentado ou Adicionado.

Em verdade a Bélgica, desde 1948 instalara uma Central de Balanços, o Banco da Alemanha em 1967 já informatizava balanços e em 1968, na França, também se constituía uma central similar.

Em 1960, também nós, reunindo grande número de balanços partíamos para uma pesquisa empírica que fez gerar parte do material de nossa Teoria do Equilíbrio.

As ligações entre a Contabilidade e mundo social e a posição inversa, eram condições irreversíveis de nossa tecnologia, mas, Lopes Amorim a tudo pressentiu, mesmo sem dedicar-se a uma análise ou estudo específico; se o tivesse feito, possuímos certeza, produziria algo compatível com a sua genialidade.

Sabemos que ele ao tomar a contabilidade como ciência social, citou Charpentier, em quem parece ter-se apoiado e do qual com maior convicção absorvera tal posicionamento'26'- mas o desenvolvimento que dá ao assunto nos convence de que Lopes Amorim mais por visão própria que por concordância com terceiros possuía tal convicção; e é aí que seu pensamento se amplia e faz inequívocas conjecturas sobre um futuro (que já estamos vivendo).

<25) Jaime Lopes Amorim — Lições... pág. 199. (26) Idem, idem pág. 87

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A ciência contabil e Lopes Amorim

O ponto alto da obra de Lopes Amorim, todavia, para nós, está na sua firmeza científica e na sua postura filosófica com inequívocas ambições de evolução.

Dono de um conhecimento amplo das obras clássicas de nossa disciplina não só europeias mas americanas ele traça um quadro de tal seriedade e profundidade que só podemos reverenciar com entusiasmo e respeito.

São dignos de um especial louvor, para mim, os conceitos que emite e as críticas que faz, do capítulo X ao capítulo XIV de sua magistral "Lições de Contabilidade Geral" (1929), percorrendo o curso no pensamento contabil no tempo.

A contestação que o mestre lusitano faz à Terranova e a defesa que empreende sobre as razões lógicas e científicas da Contabilidade não é apenas um monumento literário, mas, algo filosófico de altíssimo jaez<27).

O paragrafo "A Contabilidade é uma ciência e como tal, reúne todos os atributos", do capítulo XIV, evidencia toda a força de convicção do grande mestre e seu verdadeiro espírito epistemológico.

Ao adoptar a máxima do filósofo Rosmini (9), assume uma inarredavel posição de reconhecimento científico à Contabilidade, por entendê-la como "um sistema de verdades dependentes de um princípio único"(28).

Do filósofo italiano absorve as condições essenciais do enquadramento de uma ciência, ou sejam:

I e — Fixação e delimitação de seu posto dentro do grande corpo das ciências,

2o — Determinação do seu objecto, 3o — Escolha do método de investigação adequado, 4o — Formulação da definição. Os capítulos XV, XVI e XVII de sua obra de 1929 são verdadeiros

monumentos doutrinários e da página 197 à 310, pulveriza as teses de

(27) p J e r r a v o v a — u vero posto delia ragioneria di fronte alia scienzomania moderna, ed. Hoepli, 1924.

(28) Jaime Lopes Amorim — Lições... pág. 193.

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Terranova e ergue um monumento de rara dignidade ao nosso conhecimento. Em nossa obra actual conservamos ainda as mesmas convicções,

embora que ampliando os limites de Rosmini que o mestre lusitano absorveu, por isto, em nosso livro "Introdução à Ciência da Contabilidade" inserimos um longo elenco de razões que nos levam a considerar como ciência a Contabilidade e cujo texto é o seguinte(29):

A Contabilidade insere-se dentro de todos os requisitos modernos das ciências factuais, pois: 1 — Tem objecto próprio, o património das aziendas, e estuda

os seus Factos ou ocorrências, é, pois factual. 2 — estuda os factos com rigor analítico, os dissocia, remonta,

reunindo um conjunto prodigioso de acontecimentos de forma metódica, com metodologia própria;

3 — as verdades que enuncia sobre as relações entre os factos que estuda são de valor geral e válidas em todas as partes;

4 — tem observações, teorias, h ipóteses , leis, fontes de informações e demonstrações, tudo organizado Sistema­ticamente;

5 — tem uma história de mais de 8.000 anos e seus conhecimen­tos se acumularam sempre no sent ido de um aper­feiçoamento e utilizando-se das conquistas do passado;

6 — não enuncia teorias em carácter absoluto, mas, ao contrário, acolhe correntes de doutrinas;

7— tudo se enuncia como verdade é verificável, sendo, nitidamente experimental;

8 — seu conhecimento baseia-se em factores de prova , devidamente explicativos;

9 — enseja previsão do futuro através de um sistema próprio orçamentário;

10 — seu conhecimento produz uso prático e útil como protecção da riqueza humana, equilíbrio e bem estar social;

11 — tem correlação com os demais ramos do conhecimento humano.

(29) António Lopes de Sá — Introdução à Ciência da Contabilidade, pág. 29 e seg., Edição Tecnoprint, Rio de Janeiro Ia edição, 1987.

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A Contabilidade é ciência porque reúne todas as condições necessárias a tal classificação, no mesmo nível dos demais ramos do saber humano.

A citação de nosso livro amplia, bastante, os ângulos de Rosmini, enquadrando-se dentro das convenções actuais, mas, chega ao mesmo fim, à mesma conclusão de Lopes Amorim.

Podemos ter desenvolvido aspectos que o grande mestre não enfocou, mas, isto, em nada deslustra a conclusão a que ele chegou e com a qual, de forma absoluta, nos identificamos em sentido amplo e irrestrito.

Lopes Amorim atribue a Besta o grande destaque do património como objecto da Contabilidade'30'.

Pode parecer, à primeira vista, conflitante atribuir-se ao chefe da escola do Controlismo um cunho de Patrimonialista; Masi, o criador da escola, entretanto, é da mesma opinião de Lopes Amorim e acha que Besta, mesmo atribuindo como objecto de estudos o "controle económico da riqueza", desenvolveu suas teses todas dentro de um autêntico patrimonialismo.

A obra de Besta a que Lopes Amorim se refere não se encontra em sua bibliografia, mas, admitimos que seja "La Ragioneria", produzida em 1891 e com segunda edição em 1922 (edição Vallardi).

A percepção do mestre lusitano é justa e com ela concordamos sempre. Ele reconhecia o Património como objecto, mas, não se alardeava em

um criador de escola de pensamento, embora, de facto, o tenha sido, pelos aspectos peculiares que enfocou (e como o eminente Prof. Camilo Cimourdain de Oliveira escreveria quando escreveu sobre a Escola do porto).

Lopes Amorim tinha uma cultura muito actualizada de Masi, Schmalenbach, Zappa, Dumarchey, Paton, Quesnot, em suma, dos luminares seus coevos e por irto, com seu espírito de analista, podia distinguir os diversos ângulos doutrinários e lecionar com autoridade.

Segundo o que o saudoso mestre Vincenzo Masi revelou-me, pessoalmente, quando de nosso encontro em Bolonha, em 1974, a ideia de atribuir ao património o objecto da ciência contabil, ocorreu-lhe em Dezembro de 1926; na Revista Italiana de Contabilidade, publicaria artigo a respeito, a primeira obra do grande mestre italiano, a respeito, sairia em 1927 — La Ragioneria Come Scienza dei Património, e Lopes Amorim já citava em sua

(30)Jaime Lopes Amorim — Lições... pág. 303/4.

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obra de 1929 mostrando a grande actualização que mantinha. O que nos impressiona, todavia, em tudo isto, é que a intuição de

Lopes Amorim desde a década de 20, confirmada nas edições de 1960, se dirigisse em um sentido de "maior amplitude" da metodologia (não se contentou em fixar o património mas vinculou-lhe a posição de equilíbrio).

O mestre, todavia, não só identifica as condições básicas científicas, mas, preocupa-se com a defesa delas.

A diferenciação que traça entre o "registrar" e o "interpretar" o que se registrou, oferece um argumento lógico tão irrefutável que fecha todo o circuito das muitas outras alegações que produz.

Leciona:

"Escrever números uns por baixo dos outros é, sem dúvida, uma arte, e uma arte das mais simples, que se aprende com um pouco de prática, mas a sua conveniente interpretação é alguma coisa de mais trascendente que ultrapassa as forças da prática*31'"

"A dificuldade, diz Yves Guyot, não está em alinhar números, mas, surge nitidamente, quando se trata de saber o que é que esses números compreendem*31'"

E, enfaticamente concluí:

"E, para isto, a prática só não basta, será preciso alguma coisa mais que a prática, será necessário uma teoria, e não uma teoria superficial, mas, sim, uma teoria profunda'31'"

A frase do ilustre chefe na Escola do Porto, tinha, nesse part iculars mesma est rutura conceituai daquela de um dos maiores génios da Humanidade, o iluminado Leonardo Da Vinci:

"Quelli che s'innamorano di pratica senza scienza, son come l'nocchiere, ch'entra in naviglio senza timone o bússola, che mai ha certezza dove si vada. Sempre la pratica deve essere edificata sopra la bona teórica."

(31) Idem, idem pág. 305.

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Lopes Amorim, todavia, além de sua intransigente e justa defesa do campo científico, conjugava-se, uma vez mais com Masi, para condenar a subordinação da contabilidade a uma "Economia de Empresa" que vicejava nas escolas na Alemanha, da Itália (com Zappa e sua escola) e entre escritores belgas, franceses Anglo-saxões.

O mestre fez a defesa enérgica da "autonomia" de nosso campo, sem aceitar (com muita justiça) qualquer subordinação; ainda aí mostrou toda a sua grande visão de um futuro, pois, a dita Economia Aziendal terminou por não resistir ao tempo e até hoje não justificou logicamente a sua existência.

Enfaticamente o mestre evidenciou que aquele "modernismo", (na época) não o impressionava e que não abandonaria as suas convicções de autonomia científica na Contabilidade, para filiar-se a ideias nas quais não acreditava, pela debilidade conceituai e confusão que se estabelecia'32'.

O que o tempo veio demonstrar, foi o que o mestre havia previsto; a partir da década de 60 a Contabilidade enveredou-se por fortes teorias novas que, cada vez mais, garantiam a sua autonomia.

Entendemos, como o mestre, que os conhecimentos se entrelaçam, mas, que nada justifica a mescla de aspectos de observação.

A mim me parece absurdo admitir que a Contabilidade se subordine a uma "Economia de Empresas", primeiro porque a Economia tem seu objecto amplo no social e segundo porque a Contabilidade não se aplica só à empresa, mas, também as instituições.

Além do mais, não há vantagem nenhuma em mesclar-se diferentes metodologias e interesses, uma coisa é estudar a riqueza aziendal e outra o pessoal de uma empresa.

Absurdo semelhante seria afirmar que a Economia subordina-se à Astronomia, porque o facto económico se produz na sociedade, a sociedade está inserida no planeta e o planeta está inserido no Cosmos...

Não é o lugar onde o objecto se situa, mas o método de estudá-lo que caracteriza uma ciência, um mesmo objecto pode (e é) ser visto de várias formas, segundo o método científico que é analisado.

Seria ridículo afirmar que a Física se subordina à Psicologia ou à Administração porque alguns corpos se movem ou alguns fenómenos se

(32) Idem, idem pág. 308.

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produzem porque o homem os comanda ou provoca. Quando Galileu estudava a velocidade (do som e da luz), tomando

por base um disparo de canhão, a ele pouco importava quem era o "proprietário" do canhão, que General comandava o ataque, que estratégias moviam o disparo, quem era o dono do terreno onde se achava o canhão etc., etc..

Não era "onde estava o produtor do fenómeno", mas, a propagação do som e da luz que o interessavam; como observa o eminente mestre do I.S.C.A.-Aveiro, Prof. Amilcar Amorim, foi a impossibilidade de abarcar com eficácia a totalidade de factos ou fenómenos que ensejou a divisão científica'33', essa a tendência moderna, ou seja, a de dar autonomia a várias ciências e não o inverso.

O fenómeno patrimonial, como situamos em nossa Teoria Geral do Conhecimento Contabil, produz-se por efeitos diversos e que podem ser os do próprio património, das administrações, do pessoal da azienda, políticos, ecológicos, científicos e tecnológicos, legais, sociais, económicos, jurídicos etc.

Próprias, por exemplo, como ocorre com a robotização, onde o trabalho se executa pelo património mesmo, pela informática (que emite ordens de compras automaticamente, por exemplo).

Das administrações, que se processam pelas decisões, do pessoal, pelas iniciativas de actos mesmo sem a acção administrativa, políticos, quando mudam condições operacionais que afectam a riqueza, ecológicos quando os agentes naturais alteram os elementos do património, científicos e tecnológicos quando os bens se superam e se tornam obsoletos, por acção externa, legais quando as leis tornam inválidas as funções de bens (confiscos, restrições de operação etc.) ou alteram comportamentos da riqueza, dos custos, das vendas etc., sociais quando a massa atinge o património (quebradeiras, greves, revoluções etc,), económicos, pelas alterações do mercado, modificações de políticas cambiais e financeiras etc., jurídicos, por acção de decisões judiciais que invalidam actos, estabelecem sansões etc.

É inequívoca a produção de fenómenos patrimoniais por acção múltipla, de variadíssimos factores, mas é igualmente inequívoco que tais factos são peculiares e não se confundem com os demais que ocorrem na vida das empresas ou das aziendas em geral.

(33) Amílcar Amorim — Introdução às Ciências Sociais, vol. I pág. 9, Aveiro, 1987.

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Tal posição conceituai Lopes Amorim assumiu com convicção e o tempo se incumbiu de provar todo o acerto com que se houve.

Aspectos filosófico-contábeis na doutrina de Lopes Amorim

Muito difícil é, em doutrina superior, dissociar -se o aspecto filosófico daquele científico.

Em verdade a ciência, tão como a intuição científica, nascem, na História, agasalhadas pela Filosofia; se depois se separaram, por longo tempo, a tendência desse século foi a de novamente reuni-las.

As obras filosóficas, no campo contábil, não são muitas, mas, encontramos em Giovanni Rossi, Vincenzo Masi e Jaime Lopes Amorim (para citarmos apenas três nomes) reflexões nitidamente desse género.

É digno de citação e de análise o texto do grande mestre lusitano que passamos a transcrever:

"...se tomarmos para princípio fundamental da construção logismológica a lei do equilíbrio da variação das contas, não podemos logicamente considerar o sistema unigráfico, na sua fase inicial, como a primeira tentativa feita no sentido de demonstrar a Ciência da Contabilidade, por quanto nessa altura ainda não existiam as contas do património, e, no entretanto, Dumarchey é o primeiro a reconhecer que o sistema em questão representa o primeiro passo dado para uma demonstração científica. Nestas condições, não podemos tomar para a base da construção logismológica um princípio ou uma lei em que se fala de materiais já manipulados dessa mesma construção e que, por conseguinte, é posterior ao próprio início da Contabilidade. Assim, por exemplo, quando em Química se diz que o peso do composto é igual à soma dos componentes, enuncia-se uma verdade eterna, absoluta e constante que já se verificava mesmo antes de o homem dela se ter apercebido. Neste caso, pois, não foi o homem que forjou esta verdade, porque ela existiu, existe e existira sempre, somente as manifestações dessa verdade serviram ao homem como que directriz invisível para

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que ele, numa dada altura, se apercebesse de sua existência. No nosso caso, porém, as coisas passam-se duma maneira completamente diferente, porque o princípio do equilíbrio das variações das contas é uma verdade resultante de um arranjo ou duma construção prévia e que, como tal, só daí para cá terá consistência possível'34'."

O mestre, em sua dissertação, nitidamente filosófica, buscava, no âmago, na essência, encontrar a verdade sobre os eventos, ou sejam, as razões lógicas fundamentais no fenómeno patrimonial, em face de outros.

Buscava o caminho do "fenómeno construído" e a distinção com o "fenómeno natural" que não depende da existência da acção humana; diferenciava os efeitos das leis cósmicas naquelas que advêm da acção do homem.

Na realidade, como bem situou o mestre do I.S.C.A.-Aveiro, Prof. Amílcar Amorim, os modelos, os eventos, tudo o que ocorre pelo efeito do homem, ou naquilo que directamente ao mesmo se vincula, ou sobre ele influe, promove uma classe especial de fenómenos*35'.

Os fenómenos contábeis, em nosso modo de entender (na teoria que edificamos), nascem da necessidade aziendal (n), transforma-se na finalidade aziendal (Fi) e, então, gerando meios (m) patrimoniais, pelo exercício na capacidade desses mesmos meios, ou, funções, (f), suprem as necessidades e a finalidade torna-se eficaz (Ea).

n —> Fi => m —> f f —> (n=o) = Ea

O que entendemos, pois, como essencial, é o desempenho da função do património no sentido de obter a satisfação das necessidades aziendais.

Lopes Amorim, por conseguinte, em sua concepção filosófica, ao falar do "fenómeno produzido", não se distância muito do que entendemos, ou melhor, nós não muito dele distanciamos, pois, a necessidade patrimonial é a génese de tudo.

O grande mestre, com a sua genialidade peculiar, de titã da nossa doutrina, não confundiu "mecânica de contas", nem "expressões escriturais",

<34) Jaime Lopes Amorim — Lições... pág. 455. (35) Amílcar Amorim — Introdução... pág. 36 e seg.

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com a "essência do fenómeno" e lecionou:

"Parece-nos, portanto, que nos colocamos dentro da boa lógica, fazendo assentar o edifício logismológico, não sobre o princípio das varia­ções das contas, mas, sim sobre o princípio do equilíbrio da variação dos elementos..."<36>

A obra de Lopes Amorim não se pode confinar em uma comunicação, nem em uma monografia, dada a sua grandeza e profundidade de seus pensamentos, mas, podemos sumarizar afirmando que ela foi plena, abrangente, atingindo vastíssima área no nosso conhecimento em todas as suas hierarquias: tecnológica, científica e filosófica.

(36) Jaime Lopes Amorim — Lições... pág. 459.

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ACTUALIDAD DE LOS ESTÚDIOS DE HISTORIA DE LA CONTABILIDAD EN EL MUNDO

Referencia especial a Espana.

ENRIQUE FERNANDEZ PENA*

Excmos. Senores, senoras y senores:

Es para mi una alta distinción estar de nuevo en Aveiro en un acto académico en su Instituto Superior de Contabilidad y Administración, que tantas y bien organizadas reuniones celebra.

Y en esta ocasión lo es para conmemorar el centenário dei nacimiento dei que fue experto destacadísimo de la disciplina de la contabilidad en Portugal, profesor Jaime Lopes Amorim, ampliamente conocido en Espana, como lo prueba que en libros espanoles publicados en las décadas de los anos cuarenta y cincuenta se le cita con frases de encómio a su obra.

Así, el profesor Antonio Lasheras Sanz, catedrático de la Escuela de Altos Estúdios Mercantiles de Madrid, y para la cátedra de Contabilidad Superior de dicho centro, publico un libro en 1948 en el que se lee en su página 14: Y es así, como dice el célebre y culto tratadista português Doctor Lopes Amorim que en tanto los expertos alemanes iban diseccionando el balance en todas direcciones y penetrando en la propia medula de sus células, para así enfocar la complicada circulación de la caprichosa savia dei valor, sus colegas ingleses iban elaborando las bases del control de la Contabilidad; los americanos, verificando en bases doctrinales su "ciência de los costes"; los italianos, conversando con sus clásicos, sondando sus actitudes,

* Catedrático de la Escuela de Estúdios Empresariales de la Universidad Complutense de Madrid; Profesor Extraordinário de la Universidad de Navarra.

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engarzando sus conceptos y procurando nuevos caminos que les permitiesen alcanzar lo más rapidamente posible la meta que sus predecesores habian querido lograr, pero de la cual habian quedado bastante distantes; y, finalmente, los franceses, cuyos clásicos, en el periodo anterior, habian dado pruebas de gran actividad, iban procurando asentar, ahora sobre nuevas bases, más sólidas, los materiales mal estructurados de esos clásicos, a fin de construir un nuevo edificio con las necesarias condiciones de equilibrio y resistência.

Como anticipaba el profesor Lasheras, solo con una cultura générales y específica muy grandes en su tiempo, se podia saber y escribir lo que hemos leido.

En el libro Ciência de la Contabilidad, volumen I, del profesor Emigdio Rodriguez Pita, publicado en Barcelona en 1956, páginas 18 a la 36, clasifica las definiciones de contabilidad y sus autores en a) rutinarias; b) registrales c) comercialistas; d) contistas; e) matemáticas; f) mecânicas; g) controlistas; h) administrativistas; e i) científicas. Pues bien, en este último grupo cita al profesor Jaime Lopes Amorim y reproduce su definición de contabilidad como "ciência del equilibrio patrimonial".

Por último menciono que el profesor José Ma Fernandez Pirla, autor de la obra que más influjo ha tenido en Espana desde su aparición en 1957, Teoria Económica de la Contabilidad, en su página 11 expone literalmente: El profesor português J. Lopes Amorim, que ha reelaborado y expuesto con gran brillantez la nueva metodologia contable según las directrices de la doctrina italiana, dice que la Contabilidad puede conceptuarse bajo su doble aspecto: como Ciência y como Arte.

De la Contabilidad como Ciência dice: "Ciência que se ocupa do património das empresas, encarando — os pontos de vista qualitativo, quantitativo e valorativo num dado instante e na sucessão dos instantes".

Y como Arte: "Arte de relevar as modificações ocorridas na composição qualitativa, quantitativa e valorativa de património de qualquier empresa o de determinar periodicamente os aumentos ou disminuições que elas imprimen ao valor desse património".

Estar presente — repito — en un acto académico como este, en el que se conmemora el centenário del nacimiento dei profesor Lopes Amorim, es para mi una alta distinción y un alto honor, ai que deseo corresponder no solo con mi presencia sino también con algunas informaciones sobre un aspecto correlativo ai acto que se celebra, sin duda relacionado con la historia de nuestra disciplina en la península ibérica; por ello a continuación voy a

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exponer algunos aspectos del desarrollo de los estúdios de la Historia de la Contabilidad en Espana, precedidos de unas breves consideraciones de la cuestión a nivel mundial.

Los estúdios históricos en el âmbito de la economia en general y de la contabilidad y las empresas en particular ha tenido un considerable desarrollo en el siglo XX y en especial en su segunda mitad, lo que ha dado lugar al nacimiento de instituciones académicas y de publicaciones periódicas, como el Journal of Economie History, el Journal of Economic and Business History, el Bulletin of the Business Historical Society, etc.

En la disciplina de la contabilidad, su historia comprende, según ha sido definido recientemente por la American Accounting Association, "el estúdio de la evolución dei pensamiento contable, así como de sus prácticas e instituciones, producida como respuesta ai proceso cambiante dei entorno y de las necesidades sociales".

El desarrollo de estos estúdios ha sido — reitero — extraordinário en esta segunda mitad dei siglo XX y buena prueba de ello son los seis Congresos Internacionales de Historia de la Contabilidad que se han celebrado desde 1970 hasta 1992. El primero tuvo lugar en Bruselas en 1970, el segundo en Atlanta, Estados Unidos de Norteamérica en 1976, el tercero en Londres en 1980, el cuarto en Pisa en 1984, el quinto en Sidney, Australia, en 1988, y el sexto acaba de celebrarse el pasado mes de agosto en Kioto, Japon. El proximo se celebrará en 1996 en Canada y para el aho 2000 esta previsto que se celebre en Madrid.

Otra prueba del desarrollo a nivel mundial de los estúdios sobre historia de la contabilidad son la constitución y funcionamiento de la Academy of Accounting Historians, de los Estados Unidos de Norteamérica, la Accounting History Association del Japon, el Comité International des Historiens de la Comptabilité, de Bélgica, el Institut Français des Historiens Comptables, la Accounting History Society de la Gran Bretana y la Societi Italiana di Storia délia Ragioneria. Y según informaciones que he recibido recientemente se está gestionando la creación de la Asociación Europea de Historia de la Contabilidad.

Concretándonos a Espana, fue a comienzos del siglo XX, Alicante 1902, cuando apareció un primer trabajo sobre Historia de la Contabilidad. Fernando López y López, profesor que fue de la Escuela de Comercio de Alicante, tradujo y publico uno de los estúdios del checo Karl Peter Kheil, gran historiador de la contabilidad, que hacía referencia a un aspecto parcial de la misma.

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Terciado el siglo, en 1933 se publico en Málaga por otro profesor, esta vez José Ma Canizares Zurdo, de la Escuela de Comercio de Málaga, un Ensayo Histórico sobre Contabilidad.

Ha de esperarse ai comienzo de la segunda mitad de nuestro siglo para ver una cierta continuidad, continuidad que la da, sobre todo, la publicación de artículos de autores nacionales y extranjeros, entre los que recuerdo ai profesor Gonçalves da Silva, en la Revista Técnica Contable. En el análisis que de esta publicación ha realizado el prof. Martin Lamouroux, y referido a sus primeros cuarenta anos de ediciõn, ha encontrado cuatro periodos claramente definidos:

— de 1949 a 1956, período de aportaciones esporádicas, — de 1957 a 1965, periodo en el que Vincenzo Masi acapara todo el

tema histórico contable, — de 1966 a 1980 periodo sin publicaciones sobre esta materia, — de 1980 a 1987, periodo de importantes publicaciones nacionales y

extranjeras. Otra revista que tambien contribuyó a la publicación de trabajos sobre

Historia de la Contabilidad, fue la Revista Técnica Económica, que dirigi durante diez anos, desde 1956 a 1965 en su etapa de cobertura nacional. Conocedor de las dificultades que encontraba el investigador José Ma

Gonzalez Ferrando para dar a la luz sus trabajos, desde el primer momento le ofrecí las páginas de la Revista. En el ano 1956 apareció "Gaspar de Texeda precursor de la Teneduría de Libros en Espana"; en 1958 publico "Antich Rocha y la primera obra impresa en Espana sobre Contabilidad por partida doble, primera parte", mientras que la segunda parte lo fue en el ano 1960.

A finales de 1957 y al mandarme la primera parte de su trabajo sobre Antich Rocha me incluyó el índice dei libro Historia y Doctrinas de la Contabilidad de J. H. Vlaemminck, que algunas editoriales de campanillas de la época habían rechazado. En 1961 la version espahola revisada y ampliada sustancialmente por José Ma Gonzalez Ferrando era una realidad. Como asesor de la Editorial Estúdios Jurídicos, Económicos y Sociales, EJES, propuse y defendi la edición, que acaba de cumplir treinta anos; su cita por parte de estudiosos ha sido y es constante e ineludible.

En 1959 se publico en Barcelona la obra del prof. Boter Mauri, Las Doctrinas Contables; aunque se trata de un libro de tipo divulgador, valora correctamente las contribuciones de Antich Rocha y de Bartolomé Salvador de Solórzano.

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Diversas investigaciones han sido publicadas en el Anuário de Historia dei Derecho Espanol (1965), Hispânia (volumen 26, n° 101) y Cuadernos de Historia de Espana. Tambien pueden mencionarse diversas investigaciones realizadas por profesores franceses, como son Henry Lapeyre y Pierre Jouanique, en nuestros archivos, y posteriormente presentadas en diversos congresos y publicaciones.

Con referencias a trabaios de profesores de Escuelas y Facultades de Ciências Empresariales recordamos que en 1974 el prof. Antonio Goxens Duch présenté en la Facultad de Ciências Empresariales de la Universidad de Barcelona su tesis doctoral sobre "Evolución de la Contabilidad en Barcelona entre 1795 y 1901. Aportación a la historia de la contabilidad en Espana en su relación con la historia mundial de las doctrinas contables". Y en el mismo ano el prof. Francisco Javier Luna Luque, présenté otra tesis doctoral de carcater histórico, "Salvador de Solórzano: Teoria y práctica contable en Espana durante el siglo XVI. Actividad comercial y dineraria de los mercaderes".

En 1984 es el prof. Fernando Martin Lamouroux el que présenta su tesis doctoral en la Facultad de Ciências Empresariales de la Universidad Complutense con el título "La revelación contable en la Salamanca Histórica". A finales de 1985, la profesora Maria del Pilar Pérez Garcia, présenta su tesina de licenciatura en la Facultad de Ciências Empresariales de Valladolid, con el título, "La Real Fábrica de Moneda de Valladolid a través de los registros contables." Posteriormente ha publicado "La bancarrota de un banco emisor: El Banco de Valladolid".

En 1983 el prof. José Ma Fernandez Pirla, que solo habia hecho breves referencias históricas en su Teoria Económica de la Contabilidad, se incorpora al conjunto de investigadores y desde su cargo de Presidente del Tribunal de Cuentas de Espana publica el trabajo "Las cuentas del Gran Capitan"; en 1985 da a la imprenta un nuevo trabajo "Las Ordenanzas contables de Juan II de Castilla" y en 1986, "El Tribunal Mayor de Cuentas de Fernando VII".

En el ano 1988 las publicaciones espanolas sobre historia de la contabilidad adquirieron un caracter extraordinário. La Revista Espahola de Financiación y Contabilidad dedico dos números monográficos a esta materia; los coordinó el Doctor Esteban Hernandez Esteve, al que me referiré más adelante. Como en ese aho se conmemoraba el cuarenta aniversario de la Revista Técnica Contable tuve la satisfaccién de dirigir un volumen extraordinário con el título de "La Contabilidad en Espana en la segunda mitad del siglo XX"; en el que entre otros colaboro el profesor Martin

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Lamouroux, aqui presente. Otros muchos estúdios y publicaciones se han hecho, pêro no me es

posible citarlos; ahora solo voy a hacer referencia a un autor que por si solo ha hecho casi tanto como todos los demás investigadores juntos. Me refiero ai Doctor Esteban Hernandez Esteve. Desde que comenzó sus publicaciones en 1981 no cesa de dar a la luz nuevos trabajos, de intervenir en congresos, de recibir nombramientos y designaciones de revistas y asociaciones dedicadas ai estúdio de la historia de la contabilidad en el más amplio sentido.

En 1980 conocí ai Dortor Esteban Hernandez. Me llamó para ver si colaboraba en un trabajo que le habían encargado sobre Spanish Accounting — from past to present. É1 iba a escribir sobre el pasado, yo me encargaria del presente, según sugerencia que le había formulado en Londres el prof. Forrester, de Glasgow, que me había conocido en Berlin en 1977 con motivo del IV Congreso Internacional sobre Educación en Contabilidad.

Teniendo en cuenta la extraordinária capacidad de trabajo del Doctor Esteban Hernandez y el interés que nacional e internacionalmente adquirían durante la década de los anos ochenta las investigaciones sobre historia de la contabilidad, a mediados de la década de los ochenta propuse en AECA, Asociación Espanola de Contabilidad y Administración de Empresas, la constitución de una Comisión de Estúdio sobre Historia de la Contabilidad. La propuesta no obtuvo éxito, pero no la eché en olvido; una nueva propuesta a comienzos de 1992 si ha tenido éxito y por ello tan solo hace quince dias que ha quedado constituida en AECA una Comisión de Estúdio sobre Historia de la Contabil idad bajo la presidência del Doctor Esteban Hernandez.

La constitución de la Comisión ha tenido lugar dentro de un Encuentro de Trabajo sobre Historia de la Contabilidad organizado por el Colégio Oficial de Titulados Mercantiles y Empresariales de Madrid, en colaboración con AECA y la Universidad Autónoma de Madrid.

Durante três dias, dei 24 ai 26 de septiembre se han celebrado sesiones en las que se han presentado y comentado ponencias de los profesores Yamey, de la Escuela de Economia de Londres; Pierre Jouanique, de Paris; Forrester, de Glasgow; y de los espanoles Rafael Conde, José Ma Passola, José Ma Gonzalez Ferrando, Antonio Miguel Bernai, Rafael Ramos Cerveró, Fernando Martin Lamouroux, Salvador Carmona y del que os habla. La conferencia de clausura la desarrolló el conocido historiador económico Doctor Felipe Ruiz Martin, y estuvo presidida por Ricardo Bolufer, Presidente

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del Instituto de Contabilidad y Auditoria de Cuentas. Hizo presentation de la Comisión de Estúdio de Historia de la Contabilidad de AECA el prof. Leandro Canibano Calvo, vicepresidente primero de AECA y actual presidente de la European Accounting Association.

Por lo que de forma esquemática he expuesto puede deducirse que Espana se ha incorporado al movimiento mundial que sobre Historia de la Contabilidad se está produciendo.

Yo me permito animar a los estudiosos portugueses a unirse a este movimiento. Este acto y el homenaje al profesor Gonçalves da Silva que se desarrolla en Lisboa, son prueba de la sensibilidad de los profesores y centros universitários portugueses a recordar a quienes se han destacado en el estúdio de la amplia panorâmica de la Contabilidad.

La Historia de Portugal es riquisima en descubrimientos y gestas asombrosos; su império colonial y las relaciones comerciales de gran magnitud, tanto entre la metrópoli y las colónias, como entre la metrópoli y el resto de los paises de Europa occidental, por lo que estoy seguro y espero se conservarán en sus archivos una riquisima documentation que los estudiosos de la contabilidad pueden hacer asequibles al resto de sus compatriotas y de la comunidad internacional en la década final del siglo XX.

Para AECA y para la Comisión de Estúdio de Historia de la Contabilidad de AECA seria muy satisfactorio que con motivo de este acto académico, algun investigador português formase parte de dicha Comisión de Estúdio y que las investigaciones sobre Historia de la Contabilidad alcancen en Portugal el lugar que merecen, en parangon con el de paises que se encuentran a la cabeza de la civilization mundial.

Por mi parte, despues de agradecer su atención, nada mas. Muchas gracias.

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Anexo 1

Version espanola del índice que, para una posible historia de la contabilidad en Espana en el siglo XX, incluí en el trabajo Developments in Accounting Research in Spain.

Este trabajo forma parte del volumen European Contributions to Accounting Research. The Achievements of the last Decade, editado por VU Uitgeverij/Free University Press de Amsterdam en 1984.

1. Aspectos fundamentales de Contabilidad. 1.1 Regulaciones générales y aplicaciones.

Código de Comercio. Ley de Sociedades Anónimas. Ley de Socedades de Responsabilidad Limitada. Legislación fiscal. Regularización de Balances de Situación. Regulaciones del Banco de Espana. Regulaciones de la Dirección General de Política. Financiera. Regulaciones bursátiles. Plan General de Contabilidad. Planes Sectoriales de Contabilidad. Contabilidad de Costes. Contabilidad de Grupos de Sociedades. Análisis financiero. Organización de la Contabilidad:Mecanización. Auditoria. Contabilidad de Recursos Humanos.

1.2 Aplicaciones prácticas. Contabilidad de Grandes Compartias. Banco de Espana. Bancos en general. Cajas de Ahorros. Seguros. Telefónica de Espana. Campsa.

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Tabacalera. Renfe. Grandes Almacenes. INI. Cooperativas. Agricultura.

1.3 Educación, profesionales, asociaciones, invest igación, publicaciones. Ensenanza de la Contabilidad. Profesionales y organizaciones profesionales. Influencia de los exámenes para oposiciones. Profesores destacados. Congresos Internacionales celebrados en Espana. Conferencias nacionales. Instituto de Contabilidad y Auditoria de Cuentas. AECA. Real Academia de Ciências Económicas y Financieras. Archivos economico-contables. Regulación contable en el período 1936/1939. Revistas. Editoriales y publicaciones. Traducciones.

2. Contabilidad Pública. Contabilidad de la Administración Central. Contabilidad local y provincial. Seguridad Social. Mutualismo. Fuerzas Armadas. Prisiones. Câmaras de Comercio. Puertos. Iglesia. Asociaciones. Partidos políticos. Tribunal de Cuentas.

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3. Contabilidad Nacional. Contabilidad Nacional. Input-Output. Balanza de Pagos. Flujos monetários y financieros.

4. Contenido de cada capítulo. Líneas générales para adecuar en cada uno de ellos. — Concepto, descripción o definición. — Antecedentes. — Evolución de las regulaciones légales. — Evolución de la realidad práctica. — Situación actual. — Perspectivas. — Bibliografia.

Anexo II

Recopilación cronológica de trabajos en los que recojo aspectos diversos dei estúdio, conocimentos y aplicación de la contabilidad en Espana en el siglo XX.

Ano 1960 — Studi e tendenza delia moderne ragioneria nella Spagna. Rivista

Italiana di Ragioneria, julio-agosto. Ano 1969 — Primer catálogo de publicaciones y otros trabajos de Censores

Jurados de Cuentas.Editorial ICJC. Ano 1973 — Hacia un ano espanol de la Contabilidad. Cataluna Económica,

septiembre. Ano 1975 — Vida, Obra y Ejemplo. Sección de la Revista Técnica Contable que

ha recogido desde su iniciación en 1975 hasta mediados de 1992, cincuenta y seis biobibliografías de expertos en contabilidad; de ellos veintitrés de expertos espanoles.

Ano 1977 — XXV aniversario de la Ley de Regimen Jurídico de la Ley de

Sociedades Anónimas. Revista Técnica Contable.

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Ano 1981 — Spanish Accounting — from past to present. La parte referida al

presente con la colaboración de Jose Miguel Prado Caballero y Francisco Esteo Sanchez. La parte referica ai pasado la redactó el doctor Hernandez Esteve.

— La contabilidad en Espana en el Siglo XX. Revista Técnica Contable, octubre.

— La ensehanza de la contabilidad en Espana en 1980. Revista de Contabilidade e Comercio, febrero. Oporto.

Ano 1983 — Código de Leyes Contables. Editorial SEMSA. Ano 1984 — European Contr ibut ions to Account ing Research. The

Achievements of the last decade. VU Uitgeverij/Free University Press.

— Código de Leyes Contables, volumen III. Editorial SEMSA. Ano 1985 — Antigùedad de la profesión de auditoria en Espana: Referencias

diversas sobre ella y la contabilidad. Revista Técnica Contable. — Código de Leyes Contables, volumen II. Editorial SEMSA. Ano 1988 — La Revista Técnica Contable de 1949 a 1952 con algunas notas a su

entorno, enero. — La Revista Técnica Contable de 1953 a 1956 con algunas notas de

su entorno, febrero. — La Revista Técnica Contable de 1957 a 1960 con algunas notas a su

entorno, marzo. — Revista Técnica Contable de 1961 a 1964 con algunas notas su

entorno, abril. — Revista Técnica Contable de 1965 a 1968 con algunas notas su

entorno, mayo. — Revista Técnica Contable de 1969 a 1972 con algunas notas su

entorno, junio. — Revista Técnica Contable de 1973 a 1976 con algunas notas su

entorno, julio. — Revista Técnica Contable de 1977 a 1980 con algunas notas su

entorno, agosto-septiembre.

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— Revista Técnica Contable de 1981 a 1984 con algunas notas su entorno, octubre.

— Revista Técnica Contable de 1985 a 1988 con algunas notas su entorno, noviembre.

Ano 1989 — La Contabilidad en Espana en la segunda mitad dei siglo XX.

Publicación de la Revista Técnica Contable al cumplir su XL Aniversario.

— La auditoria legal en Espana. Trabajo incluido en el volumen La Contabilidad en Iberoamérica, coordinado por el prof. Jorge Tua Pereda. Editado por el Instituto de Contabilidad y Auditoria de Cuentas .

— La Contabilidad y la Auditoria en el VI Congreso Internacional de Contabilidad de la AIC. Revista Técnica Contable, noviembre.

Ano 1991 — Código de Leyes de Contabilidad. Editorial Pirâmide. — La contabilidad y sus profesionales en la Espana de los siglos XIX

y XX. Cuadernos de Estúdios Empresar ia les . Editorial Complutense. Traducido ai inglês con firma de Franscisco J. Martinez Pérez se ha incluido, sin cita de su autor, en el libro The European Accounting Guide, editado en 1992, en Europa, por Academic Press Limited, y en Estados Unidos de América y el Canadá, por HBJ Miller Accounting Publications Inc.

Afio 1992 — Código de Leyes de Auditoria. Editorial Pirâmide. — La contabilidad en Espana en el siglo XX, trabajo incluido en el

volumen Contabilidad en Espana 1992 coordinado por el prof. José Antonio Gonzalo Angulo. Hay version inglesa en el volumen Accounting in Spain 1992, editada por Arthur Andersen. La edición espanola se ha realizado por el Instituto de Contabilidad y Auditoria de Cuentas.

— Prólogo al volumen Plan de Contabilidad para la Administración Local. Nuevo sistema de información contable local e instrucciones de contabilidad. Editorial Lex Nova. Valladolid.

— Leandro Cahibano pres idente de la European Accounting Association, en el Boletin AECA del primer cuatrimestre de 1992 y: en la Revista Técnica Contable del mes de junio.

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LA INVERSION DE SIGNOS D Y H EN EL LIBRO DE CUENTAS DEL COLÉGIO DE LOS PP. JESUÍTAS DE

VILLAGARCIA DE CAMPOS

desde 1742 a 1757

En homenaje a la dimension histórica del Profesor Jaime Lopes Amorim en el centenário de su nacimiento.

por

Fernando Martin Lamouroux Universidad de Salamanca

Introducción

El primer estúdio que hicimos en torno a la forma invertida de los signos o secciones Debe y Haber lo fué tomando como punto de partida un pasaje citado por Vlaemmimck al analizar la actividad bancaria dei Egipto Helénico en la localidad de Fayum y en concordância con el critério generalizado de la época en la que el Debe significa Salidas y el Haber Entradas'1'.

Con posterioridad descubrimos en los expositores de la Sacristia de la Colegiata de San Luis de Villagarcia de Campos, en la provincia de Valladolid, entre los documentos más antiguos dei Colégio fundado en 1576, un libro de cuentas desde 1741 a 1757 con la particularidad de usar las secciones D y H invertidas, esto es, Debe como Salidas ai lado derecho dei

(1) F. Martin Lamouroux La Revelación Contable en la Salamanca Histórica. Tésis Doctoral leída en la FCEE de la Universidad Complutense en 1985. Fue premiada por el Centro de Estúdios Salman tinos y editada en 1988 por la Diputacion de Salamanca.

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folio y Haber como entradas en la parte izquierda del folio. Libro sorprendente por cuanto plantea la cuestión de como era posible

que en pleno siglo XVIII (1747) cuando la Partida Doble está claramente implantada y las secciones o signos con su funcionamiento actual, aparece de nuevo esta forma invertida que ya se creia definitivamente desaparecida desde la Edad Media. Este libro es una prueba irrefutable de su empleo .

Adernas, tiene garantizada su relevância histórica cualquiera que sea la interpretación que queramos hacer de él:

— Tanto si por su medio se prueba la Continuidad en el tiempo de esta forma invertida, lo cual seria una evidencia histórica importante; ahora con la certidumbre de su contenido puntual sin vacilaciones interpretativas,

— Como si un contable o administrador singular lo aplica sin vacilaciones en un momento en que la Partida Doble está claramente asentada. Con el atractivo ahadido de que si se da unicamente esta segunda posibilidad, seria tan interesante como la primera por el juicio de valor que implica, si un intérprete de la realidad económica que tiene a su disposición un método tradicional en uso perfectamente conocido, decide no obstante utilizar otro — la forma invertida — aparentemente desaparecido12'.

No obstante manteníamos cierta insatisfacción ai constatar que la investigación no habia agotado el análisis documental, sobre todo en el supuesto de tratarse de un administrador aislado, en cuyo caso ^quién era este? y ^por qué en pleno siglo XVIII no duda en aplicarlo? Este último aspecto ya forma parte dei presente estúdio.

Conenido Empírico: razonabilidad de esta forma.

(2) De su análisis surgió un nuevo trabajo que aportamos ai Fifth World Congress & Exhibition of accounting Historians celebrado en Sidney (Australia) en 1988 con el titulo The Reversal of the Accounting Symobols D (Debit) and H (Credit) and Their Correct Interpretation, cuya traducción al castellano fue publicada por Técnica Contable, Madrid Julio de 1990 n° 499.

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Este interesantísimo manuscrito, existente en la Colegiata de San Luis de Villagarcia de Campos, villa situada en el corazón de Castilla, corresponde al Colégio fundado en 1576 por Dona Magdalena de Ulloa, a expensas de sus propios bienes, al mismo tiempo que, en cumplimiento dei testamento de su esposo, Don Luis de Quijada, Senor de Villagarcia, Mayorodomo del Emperador Carlos V y Ayo y Tutor de Don Juan de Austria, procedia a hacer en la parroquia de San Pedro una Capilla (hoy Colegiata) que sirviera de Panteón para toda la familia<3).

Se trata de un libro encuadernado en pergamino, con tejuelos de badana y lazos de sujeción, en tamano de 21 x 31. En portada figura:

"Borrador de Estudiantes y algunos Particulares Mayo 1742... Capellanes y Músicos Caj 3°, N° 5

<3) Debido a que la Iglesia de San Pedro era muy pequena, el propio Don Luis ofrece a sus testamentários otras soluciones alternativas, a saber :

Cláusula 41: Adosarla a la Iglesia de San Pedro, tomando casa de Juan Calleja... Cláusula 46 : Si no fuere prosible adosarla, se haga separada de ella, pero al

lado de ella, mediante la compra de una casa o corrales que son de Juan Bermejo Zapatero y de Felipe, que confinan con el...

Cláusula 57: Da opción a su mujer Dona Magdalena para hacer una capilla, o si no, un monasterio de frailes o monjas excepto de Descalzas, que por ser la Tierra de Campos muy fria, no podrían vivir allí. Dona Magdalena resolvió hacer las dos cosas: una Iglesia más suntuosa y adosado a ella un Colégio Noviciado para los jesuítas. Lo cual no fue tampoco fácil, pues se adujo no solo que no era esa la voluntad de Don Luis, por no estar situada en la Parroquia de San Pedro, sino adernas, que los jesuítas no eran "frailes". Dona Magdalena, consulto ai respecto con su hermano Fray Domingo de Ulloa Dominico; este la remitió ai Padre Baltasar Alvarez, jesuíta; trato luego con un seglar que no conocía a los jesuítas y finalmente acudió a los teólogos de la Universidad de Alcalá de Henares y de Salamanca, que aclararon que bajo el nombre de "frailes" se comprendía toda clase de religiosos. Por fin la Colegiata se llevó a cabo a partir de los planos de Rodrigo Gil de Hontanón, si bien con numerosas modificaciones posteriores, y el Colégio con los dei napolitano Giuseppe Valeriano que había entrado en la Cumpanía de Jesus en 1574.

V. C Perez Picon S.J. Villagarcia de Campos. Estúdio Histórico Artístico. Institucíon Cultural de Simancas. Dipucatión de Valladolid. 1982 pág. 69 y ss.

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En el interior hay una hoja suelta que dice :

"Caj 3 N° 5 Libro de Quentas con Estudtes Partres y con Capps y músicos desde as de

1742 asta 1757"(4)

Lleva incorporado un ABCdario con el título:

"Libro de Particulares, para Capellanes, Músicos y mas dela Igsa. desde 1° de En° 1749. Q comienzan de folio 102...

Cuentas de Estudiantes<4).

Está dividido en dos bloques, el primero comprende 61 folios desde 1742 a 1752 y el segundo de 1751 a 1757 empieza en el folio 61 y termina en el 253. La numeración es sin embargo correlativa.

Su contenido llama inmediatamente nuestra atención:

Io. La numeración es la típica de los Libros Mayores. El número dei folio es el mismo para la página de la izquierda que para la pagina de la derecha, ambas contrapuestas.

2o. Sin embargo, todas las páginas tienen dos columnas, una para el Haber a la izquierda y otra para el Debe a la derecha,precisamente en este orden.

3o . El lenguaje empleado atribuye a los signos contables el sentido de

Haber = Entradas

Debe = Salidas

4o . El contenido está limitado ai control de cuentas de tipo personal. Alguna de ellas cruzadas, por transferencia de

(4) Estudtes — Estudiantes. Partres — Padres. Capps — Capellanes as — agosto. Igsa — Iglesia. En° — Enero.

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cuenta a cuenta, y más de una, colectiva. Los movimientos son tanto en dinero como en espécie, y en su caso, cuando la cuenta tiene ambos datos, en reaies y trigo p.e., los posiciona en columnas separadas, tanto en el haber como en el debe.

5°. Las cuentas se cierran por anos, fijando el Alcance de las Mismas, esto es, el Saldo o diferencia entre el haber y debe y este Alcance, con su correcto sentido activo o pasivo, es la primera partida dei ano siguiente, por cuenta nueva.

6°. No hay referencia alguna ai manual o diário, ni tampoco a la Cajá. Unicamente en el folio 243 apunta la existência de un "borradorcillo". Si en cambio está claro que hay libros de igual contenido de anos anteriores, por la referencia: "Del libro viejo" o "traspaso ai libro nuevo".

iQue interés tiene este libro, que recoge la vida cotidiana de la administración de caudales con destino a la educación de estudiantes y al mantenimiento de padres, músicos y capellanes para que liame nuestra atención?

Fundamentalmente, por el hecho de utilizar, en el ano 1742, en pleno Siglo XVIII, los signos contables D y H invertidos es decir, Haber/Entradas, y Debe/Salidas, ai igual que lo hacían griegos y romanos, antes de que esta "forma" desapareciera a finales de la Edad Media. Lo cual nos plantea dos temas relevantes:

— Uno sobre la Causalidad de la Inversion de Signos Debe y Haber y el juicio histórico que ello merece.

Para entenderlo en su trayectoria histórica es preciso destacar unos hechos suficientemente documentados, que nos permitan centrar el conocimiento "global" de los contables antiguos y que en buena medida los determinan en su propio contexto histórico.

Nos situamos en Babilónia, en los anos 2002 a 1960 Ac. Primero los sumerios y después Babilónia concebían ai Universo como nacido de la evolución de la materia. La divinidad no era otra cosa que la fuerza que gobernaba o dirigia esta evolución y tanto los dioses como los hombres actuaban en obediência a las leyes dei Universo.

El poder emanaba dei dios Mardouk y el Rey era el representante de

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la autoridad y de la propia Ley entre los hombres. Venía a ser expresión, a la vez divina y humana, de la Ley Universal'5'.

En este tiempo, Hammourabi sexto, rey de la dinastia de Babilónia, sin duda el más importante de los monarcas amorreos contemporâneo de Abraham, realiza una obra inmensa de unificación política, dotando a sus estados de un mismo código que lleva su nombre y que constituye la colección legislativa más antigua que conocemos, mezcla de Código Civil, de Comercio y Marítimo, Penal y Procesal, de incalculable trascendencia, que inmediatamente se convirtió en la Costumbre internacional del comercio de toda el Asia Anterior, llegando enseguida, transportado por medio de los mercaderes hasta Siria.

Pêro lo mas importante es que en él estaban reglamentadas todas las manifestaciones de la vida económico-jurídica de la monarquia, tales como la venta divisa e indivisa, ai contado y a término, condicional o no, el préstamo, la prenda, la caución, la anticresis. Anticipa ya nuestro moderno concepto de hipoteca y ensancha el campo dei crédito como base dei comercio.

Por su medio, el propio contrato de préstamo motiva la aparición de la sociedad comercial, bien que ai principio lo fuera por medio de la asociación y la comandita y al reglamentar la cláusula de reembolso ai portador, hace aparecer el pagaré a la orden.

A su vez, el depósito irregular créa la banca, por transformación natural de los cambistas y la cuenta corriente y combinada con el mandato, introduce el uso ordenado dei cheque que, endosado a un tercero, da lugar al nacimiento de la letra de cambio.

Templos y Banqueros se normalizan por su medio y contribuye al esplendor de esa época y fue tal su importância, que ha sobrevivido a la ruina de varias civilizaciones y sutilmente persiste en el trasfondo del lenguaje jurídico moderno.

jRecordemos que estamos en el ano 2000 antes de Cristo,!

Y lo que es aún más importante, conocen y usan la moneda escriturai, la cancelación de un débito y de un crédito sin desplazamiento de moneda,

(5) V. J.Pirenne Les Grands Courrants de l'Histoire Universelle Tomo. I. Ed. Elbin Michel, Paris 1950 pág. 34/.

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a través de los asientos, lo que implica una innovación financiera de enorme relevância, puesto que la transferencia de cuenta ha hecho franquear la frontera de la mera cuenta corriente. En esta, el efecto era simplemente entre las dos partes de la cuenta. En la transferencia de cuenta por el contrario, hace pasar a un tercero la propiedad de un valor.

Fusionando el pago con el asiento contable, la orden de transferencia ejecutada confiere a un asiento contable el poder jurídico de transmitir un valor de un património a otro por medio de una escritura abstracta<6).

Se ofrece asi un mecanismo tremendamente versátil a nivel financiero, pêro sobre todo, reveladoramente contable. La Contabilidad posibilita este mecanismo por medio de sus cuentas permitiendo la regularización crediticia, dicotómica, de derechos y obligaciones, con la máxima perfección jurídica.

Y si este perfeccionamiento es tan grande ^Cómo es posible que el Debe y el Haber jueguen un papel tan contradictorio, unas veces entradas, otras salidas, unas veces a la izquierda, otras a la derecha?

No es aceptable una interpretación casual de la inversion de signos, y menos aún, contradictoria. Ello no concuerda con la realidad histórica:

Io . Por el conocimiento jurídico de la época.

2°. Los comerciantes, pêro sobre todo los Banqueros, conocían muy bien los contratos y sabian redactarlos con toda perfección. Si esto es

así, es lógico pensar que sus anotaciones contables no les plantearian dudas en cuanto ai sentido deudor o acreedor de una operación cualquiera.

3o. Luego, si ponen el Debe como Salida y el Haber como entrada, no es posible imaginar una confusion, ni del sentido jurídico, ni del contable del hecho empírico, sino que lo hacen con pleno conocimiento, ai ejecutar una instrumentación contable diferente. Una inversion equívoca, seria una pura contradicción(7).

(6) V.R. Savatier El Derecho Contable ai Servicio del Hombre. Version espanola de F.M.Lamouroux. ICE. Madrid 1972.

(7) El carácter dicotómico de los signos contables aparece en otros testimonios curiosos. Así Pierre Villar cita un pasaje dei Poema dei mio Cid cantando la toma de Valencia en 1094:

"Todos eran ricos — cuantos alli ha Mio Cid don Rodrigo — la quinta mando tomar

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— Otro sobre la Persistência en el tiempo de esta "forma", cuando la Partida Doble está difundida y aplicada.

Debemos insistir en que es preciso aprender a distinguir entre los conocimientos contables de los administradores antiguos y lo que luego explicitan en sus cuentas.

Sobre este pun to podemos aportar una prueba ampl iamente documentada en nuestra Tesis Doctoral sobre las cuentas de la Universidad de Salamanca que con una antigùedad que va desde el siglo XV (1403) hasta el siglo XIX, se llevan por el arcaico método de Cargo y Data y convive, por tanto, con épocas en las que la Partida Doble ya está totalmente implantada ( ! ) ■

Dos razones son esenciales para comprender el argumento:

1 — Los administradores han de someterse a los procesos de rendición de cuentas impuestos por los destinatários de la información, que la regulan dentro de un método arcaico y rudimentario, pêro que entienden.

2 — Esto conviene al Admnistrador, pues hace de la rendición de cuentas un proceso simple, pêro está claro que él necesita un sistema mas perfecto de contabilidad, teniendo en cuenta adernas que los propios Administradores, dado el retraso en cancelar sus deudas, no tendrían interés en dejar trás de si pruebas tan completas como sus propios libros contables y aún dejandolos, posiblemente sus herederos no apreciarían su importância ni el interés de su conservación. En cambio, si los trendría bien ordenados y con buenas anotaciones frente a la definitiva rendición de cuentas.

El interés de una buena Contabilidad juega a favor dei propio administrador y no para otras personas. Este aspecto hay que entenderlo muy claramente para juzgar la escasez de documentos y para no sacar

en el aver amonedado — treynta mil marcos le caen e los otros avères — i quien los podrie contar ? Keynes escribió "... y el estancamiento en la Edad media no fué invetablemente

causado por su "débil haber" en metales..." El débil haber de oro en la Edad Media. Es curioso que esta expresión no recoge una idea acreedora, ai estilo contable sino especificamente deudora. Aqui el "haber" se traduce por existências. Decir el escaso haber de oro equivale a decir escaso capital en oro, en donde capital — haber, es un concepto de fuente, mientras que el oro es precisamente su existência real, su materialización. Hace referencia a la cantidad de oro en el mercado. V. F.Martin Lamouroux, Técnica Contable op. cit.

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conclusiones falsas sobre los conocimientos contables de los administradores. Y no es casualidad que los archivos encontrados, los mas importantes

como son los de Simon Ruiz Embito, los de Miguel y Garcia de Salamanca, Bernardino Vallejo, Diego de Bernuy, lo son por Partida Doble. Y qué diremos entonces de los Banqueros de Corte dei estilo de Ochoa Perez de Salinas*8' y de los judios, genoveses, florentinos, milaneses etc., que traficando por toda la geografia espanola, contribuyen a la internacionalización dei Comercio.

La ausência de pruebas concretas no implica la continência de ignorância, siendo como es un hecho el progreso económico que no hubiera sido posible sin la Contabilidad.

Lo que nos lleva a una reflexion interesante como una primera hipótesis:

Que el empleo invertido de signos, a saber, Debe/salidas Haber/ entradas, Persiste a lo largo dei tiempo y aqui el manuscrito lo emplea como normalmente sabido. Este libro hace viable por si mismo esta hipótesis. Como adernas el Colégio fue fundado en 1576 y dada la especialización de profesores y alumnos, puede ser razonable una herencia contable de este tipo perdurando en el tiempo, aunque a ello se opone, en gran medida, el propio proceso de normalización en el uso actual de los signos, que ha sido radical.

Por eso es importante preguntarse de nuevo por qué el manuscrito que estamos estudiando emplea la inversion de signos.

Los redactores de las cuentas dei Colégio de Villagarcía de Campos, por la via de inversion de signos, hacen uso dei principio de unidad de inscripción, igual que modernamente lo hace el Decalco, con una metodolgía que les permite ponerse en el lugar dei tercero y explicitar, ai mismo tiempo, su propia posición en la relación causal, que los une con el hecho contable, sin modificar el contenido doctrinal del fenómeno patrimonial que es su substrato.

Unicamente lo ha hecho en la Forma Externa. Por otra parte, poner el Haber, como primera partida, es esencialmente

más perfecto que ai contrario, puesto que está claro que sin financiación no hay inversion, y si esto es asi, es condición necesaria el Haber de una cuenta.

(8) y. Fernando Martin Lamouroux. El Libro mayor del Banquero de Corte Ochoa Pérez de Salinas (1498 -1500). Revista Espanola de Financiación y Contabilidad. XVII. Número 56. Madrid 1988.

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Adernas, la concepción jurídica de la propiedad está tan fuertemente arraigada en el intérprete que, unido a su responsabilidad en el cargo, hace que prime el critério de rendición de cuentas por encima de otro cualquiera y es por ello que toda la prueba contable la pone, como los banqueros de la antiguedad, en función de un tercero, como depositário de los caudales recibidos.

Y lo curioso dei caso es que esta forma le permite explicitar, sin hacerlo, la materialización dei ingreso, dado que el Haber de la cuenta de un tercero como entrada, consagra y confirma la propia entrada, sin que ambos aspectos se contradigan, pues esta claro que son Irrtagen una de la otra. Imagen dicotómica, bilateral que luego se escinde en dos partidas o dimensiones, una en términos reaies, otra, en términos imaginados , impu tada , monetariamente hablando.

Es por esto que los contabilitarios como el de nuestro estúdio no precisan dei Debe de sus cuentas, les basta con controlar el Haber/entradas, pues este, siendo la imagen monetária del Debe real, con su sola lectura tiene ambas cosas.

Han llevado a la práctica la idea unitária dei fenómeno patrimonial. El procedimiento contable seguido por el intérprete, es un alarde de economia de procedimiento, un refinamiento reflexivo en la manifestación patrimonial, que explicita ai mismo tiempo, simultaneamente, los dos términos de la relación causal de la transación, un sutil e ingenioso proceso de reflexion contable, fruto de la relación económico-financiera que le permite, de una sola vez, hacer dos interpreteciones diferentes de una misma manifestación registrai, es decir, un doble proceso de revelación contable, esto es, con una sola anotación tiene todos los datos que le interesan, a saber:

— El Haber reconoce ai titular su derecho por la entrega efectuada. Pêro está claro que lo que aqui apunta no es el dinero recibido, sino, la obligación contraida, la deuda a favor dei Titular de la cuenta, y lo es en su más puro sentido jurídico.

— El Haber tiene una segunda lectura como Debe de su propia contabil idad. EL significado es ahora dinero real recibido que el administrador incorpora a sus arcas.

De este modo el administrador tiene una doble información: — Informa ai titular de su Haber, el importe de la deuda.

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— Se informa a si mismo de su propio Debe, dinero real recibido.

Lo que explica la redacción de los asientos. El administrador ha disenado un control de las cuentas, facil para el Titular. Asi, cuando este quiere saber el estado de su cuenta, el administrador le ensena los libros y le informa:

— He apuntado a tu favor en el Haber lo que me has entregado/ Entradas.

— He apuntado en el Debe, los Pagos/Salidas que yo he efectuado por tu cuenta.

La Partida Doble como método, no es más que un camino para llegar ai conocimiento interno dei hecho empírico, capaz de ilustrar ai intérprete en el mejor sentido de la Gestion.

Ese carácter dicotómico proviene por la mutación, primero dei concepto de utilidad ai concepto de valor y finalmente ai valor de cambio, que como ya sabemos, es el resultado de la comparación de las utilidades respectivas de dos bienes.

Descendamos ahora a lo cotidiano de las cuentas. <<,Qué anota en ellas?

La moneda que emplea son los Reaies de vellón (Rs) con una equivalência de 34 maravedis (mrs. ms. o m) cada real. Para separar las unidades de miliar emplea el Calderón = U

En el "Hauer" colocado a la Izquierda de cada folio figuran los siguientes conceptos:

1. Apertura de cuenta y cuenta nueva:

Folio 12. Cuenta del P. Prior Hauer Deue 2 U 484.28 Prosigue la quenta dei P. Prior U 687

Folio 12 Cuenta del P. Prior. Cuenta nueva Hauer Primeramente Hauer los 1 U 279 rs.17 m. dei Deue 1 U 279 alcance de arriva que se avonan por principio

desta

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Hauer U600

Hauer U259.30

Folio 25 Cuenta de Fermin Musico

Livro 4° en 19 de julio 1746

Folio 253 Cuenta de Bernardo del Valle Bernardo del Valle deve y haver como parece al folio 239 en este(9)

Deue

Deue U 253.37

Hauer U006

Hauer U600

2. 3.

Hauer U040

Hauer U300

Folio 1. Cuenta de Manuel Corral Pago otros 6 reales Deue

Folio 12 Cuenta de b. Sanz con Joseph Bailado Dicho dia entrego D. Antonio 600 rs. vellón Deue para quenta de gastos

Dinero recebido dei Titular de la cuenta: Dinero recibido de terceros a favor dei Titular de la Cuenta.

Folio 12 Cuenta dei Prior Hauer 40 rs. por la limosna de 20 misas de Deue que dio un vezino

Folio 253 Cuenta de Bernardo Valle Hauer 300 rs. que me remitio el P. R° Deue

4. Letras y libranzas a su favor:

Folio 83 Cuenta de B. Sanz en folio 132 Hauer Hauer 500 rs. de letra recibida a 8 enero dada U 500 en Villar de Rena por qa Dn. Juan de? Y la

endosé a Altolaguirre.V.Lámina n°2

Deue

<9> Llama la atención que al hacer el traspaso de los totales desde el folio 239 dice textualmente "Bernardo dei Valle deve y haver (!) cuando en buena lógica debería haber puesto "Bernardo dei Valle haver y deve que seria lo mormal, para ser consequente con la inversion de signos que está empleando.

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5. Por venta de mercancias:

Folio 12 Cuenta dei Prior Hauer Hauer 86 rs. de 10 cantaras de vino maleado U 086 que vendio a Joseph Carriedo

Deue

6. Cantidades devengadas por servicios prestados por el Titular.

Folio 12 Cuenta dei Prior Hauer Item otros 40 rs. de 40 misas que le encargue Deue U 040 en Diciembre de 1756

7. Traspasos de cuenta:

Folio 167 Cuenta de Iturrioz Hauer Item. 50 rs. que dicho dia dijo se le cargasen pa

U 050 Francisco Rauanillo vezino de Cabrerizos a quien se le auonan en su quenta.

Deue

En cuanto ai "Deue" colocado a la Derecha de cada página figuran los siguientes conceptos:

1. Cantidades pagadas por cuenta dei Titular: Folio 1 Cuenta de Manuel Corral

Hauer

Hauer

Deue 6 1 /2de una montera Deue 4 3/4 de hilo, seda y botones pa chupa Cuenta de los dos Portugueses Posada un mes a 16 junio (1747)(10>

Folio 25 Cuenta de Fermin Musico

Posada un mes (1746) 6 rs.

Deue U 006 1/2

U 0043 /4

U012

Deue U006

(10) En menos de un ano el precio de la posada ha pasado de 6 reaies al mes a 12 reales. El Doble. Seria curioso averiguar el IPC ligado a este hecho inflacionário.

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Hauer

Hauer

Hauer

Hauer

Folio 32 Cuenta de los Zorrilla

Posada de 2 meses (1747) 12 rs.

2 pares de zapatos

Folio 95 Cuenta de Iturrioz

11 corderos a 11 rs. y 70 de lana a 36 rs.

Folio 96 Cuenta de Dosai, Coronel y 2 Herrada

Los 3 Virgilios,3 Concilios, 3 Valerios 3 Cicerones, 3 San Geronimo a 4 rs.

2. Cantidades con destino a si mismo o a un tercero:

Folio 12 Cuenta del Padre Prior Deue

Deue 798 rs. 33 ms. que en 30 de 8° de 1756 U 798.33 entregue al P. Prior.(V. Lamina n° 4)

Deue U012 U 023 1/2

Deue U373

Deue

U060

3. Compensación de pagos efectuados:

Hauer

Hauer

Folio 25 Cuenta de Fermin Musico

Deue al Pasante Palomino del mes de may o e junio n

U008 Folio 95 Cuenta de J. Iturrioz febrero 1753

Se le cargan 159 1/2 rs. de un vestido para el ^ Estudiante Serrano de Villa Oxante. En nota aparte T j i cq 1/2 figura el detalle de dicho vestido. (V.L.n°3)

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4. Cantidades por mercancias diversas:

Folio 32 Cuenta de Rueda presente ano 1747 Hauer

Hauer 24 3/4 que el Sr. Tomas de Rueda dio de quenta dei H° Emetherio ai Prior de San Ambrósio a quien los cargo

5. Cargos para cerrar la cuenta:

Folio 12 Cuenta dei Prior

Deue U 024 3/4

Hauer Deue 1 U 279.17 It (tem) se cargan 13279 rs. 17 m para cerrar

igual esta quenta y se avonan por principio a la nueva de acuerdo con el Prior en 1 de enero de 1757

Traspaso de folio a folio: Folio 12 Rua ai folio 145 dei libro nuevo Folio 16 Al folio 200 Folio 32 Pasa ai folio 38 Folio 95 Prosigue la quenta y sumas a la vuelta.

Rendicion de cuentas: Algunas cuentas como la de Los Arredondos se remitían todos los

anos, tal vez con la misma "forma" ai Obispo de Salamanca enfonces Don José Zorrilla, para su aprobación.

Precios y otras particularidades

Del folio 224 cuyo facsímil damos en Lamina n° 5 tomamos los siguientes datos:

"Gabriel Hernandez del Corral llegó a esta villa para aprender a leer y escrivir en 20 de Nov (iembre) de 1754: Está en Casa de Cathalina Bustino: se le da de Pátria 8 Rea (les) y la Ia se le dió en 23 dei referido mes, con cinco panes cada semana. Sus asistencias corren de qta de Dn Alonso Hernandez del Corral Secret (ario) del S (enor) Ob (ispo) de Salamanca. Dasele 4 q (uartos) cada semana p (ara) olgarse."

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Cada cuarto equivale a 4 maravedis. Por tanto 4 x 4 = 16 maravedis a la semana para divertirse (olgarse = holgarse). Es la paga semanal de este estudiante en 1754. Compárese, a efectos de incremento de precios y nivel de vida, con lo que dispone cualquier estudiante en 1992.

En lo tocante a la posada, el Colégio no disponía de internado por lo que los estudiantes se repartian por las casas del pueblo convertidas en posadas, en grupos de 8 o 10 en cada una. Había posadas de três categorias, cobrándose 80, 70 y 50 reaies al mes respectivamente, incluyéndose en el precio, adernas del almuerzo, comida y cena, el lavado y arreglo de la ropa(11>.

Los precios que por estudiante figuran en este manuscrito son de 6 reaies en 1746 y de 12 reaies en 1747. Como en cada posada se albergan de 8 a 10 estudiantes, tendriamos los siguientes importes:

1746 6 reaies x 8 estudiantes = 48 reaies al mes x 10 estudiantes = 60 reaies al mes

1747 12 reaies x 8 estudiantes = 96 reaies al mes x 10 estudiantes = 120 reaies al mes

cifras que conciliarian la información global.

Las familias ricas enviaban con sus hijos un ayo o criado que cuidaba de ellos. Para el resto existian los llamados páuperes o pobres, mantenidos por los propios estudiantes, aunque muy en precário, a cambio de su servicio. Ello motivo después, la aparición de una cierta picaresca en aquellos que, por este medio, comían a costa dei prójimo(11).

Las atenciones de los estudiantes enfermos dependían de un médico no siempre residente en la Villa y a menudo quejoso del poço salário que recibía, a pesar de que, tanto el pueblo como los estudiantes, contribuían ai estipendio, y con frecuencia cobraba consultas particulares.

En el folio 224: Cuenta dei estudiante Gabriel Hernandez, consta que cuando estuvo enfermo, se le anotaron en el deue (cargados en ella) los siguientes conceptos: V. Lâmina n° 5

(11) V. Conrado Perez Picon S.J. Villagarcía de Campos. Estúdio Histórico artístico. Institución Cultural Simancas. Diputación Provincial de Valladolid. 1982.

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1 barra de chocolate 6Rs 17 mrs Bizcochos y Camuesas l R s 6 mrs Botica 4Rs

11 Rs 23 mrs x 34 mrs. un Rs 374 mrs

Total 397 mrs

Cifra muy elevada, teniendo en cuenta los precios que regian entonces. He aqui alguno de ellos

1 fanega de trigo 12Rs.1/2 = = 425 mrs Unos zapatos nuevos 13 Rs. = 442 mrs 1 Sombrero 6Rs. 204 mrs 1 Cordero 11 Rs. = 374 mrs 1 Gallina 3Rs. = 102 mrs 1 Colchón 35 Rs. = 1190 mrs 1 Jergón 9Rs. = 306 mrs 1 vara de lienzo 3 Rs.1 / 2 119 mrs 1 Libra de tocino 1 Rs. 1/2 51 mrs Cortar el pelo 1/2 Rs. 17 mrs

La Dimension Humana

El redactor de las cuentas: Herencia conservada a lo largo del tiempo o descubrimiento de esta forma por un administrador singular.

Una segunda hipótesis es que se trata de un administrador cualificado, conocedor dei latin y del griego que toma contacto con los discursos de los clásicos, tal vez con Cicerón (pro Roscio, II, 5; pro Fonteius, 23; Verrine II, 76, 187; OR. 47), Catón (De re Rústica), o el alegato contra Calipso de Demóstenes, todos ellos de contenido contable, llega al convencimiento de que de esa "forma" es mas operativa y sin vacilación la emplea, y la ensena, dejando un testimonio histórico de inapreciable valor para la Contabilidad.

Tarea nada fácil, que hemos intentado resolver tratando de localizar activamente ai administrador en cuestión, próximo o remoto, por persistência en la forma. Para ello hemos investigado de nuevo "in situ" sin êxito.

La expulsion de los jesuitas del Colégio de Villagarcía de Campos, que tuvo lugar el dia 3 de Abril de 1767 a las 5 de la mahana, previa lectura

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del Decreto Real de Carlos III de fecha 27 de Febrero de 1767<12), ordenando su expulsion'13', hizo desaparecer la mayoria de la documentación existente, o al menos desperdigarse con el êxodo.

El propio libro de cuentas que estamos comentando, según consta en una nota suelta, Uegó en 1906 a Villagarcia, traído desde Valladolid.

No obstante, en ese período 1742-1757, algunos datos personales pueden pe rmi t imos formular una pr imera aproximación sobre el Administrador de esa época, y con el hecho significativo de en su caso, entender el mecanismo invertido.

Ante todo, la instalación de una imprenta privada, cuyo fin era surtir ai Colégio de ediciones de autores clásicos bien corregidos para sus escolares. Para ello, se designa un equipo selecto de profesores a las ordenes dei Padre Idiaquez, que es nombrado Rector dei Colégio el 10 de Mayo de 1755. Al ano siguiente, ya tiene montada la imprenta'14'. Está claro que este hecho es posterior a las fechas dei manuscrito, pêro pone de relieve dos cosas:

a) La selección dei profesorado, y

b) Amplio conocimiento exigido dei latin y del griego para ediciones de autores clásicos bien corregidas. El Padre Provincial de Castilla, Pedro Solis, queria que se mantuvieran los clásicos griegos y latinos en el estado floreciente en que los habia conocido siendo novicio en Villagarcia'15'.

El Padre Idiaquez puso ai frente de la imprenta ai Hermano Juan José Palácios, nacido en Tudela de Navarra el dia 12 de Febrero de 1712. Entro en el Noviciado de Villagarcia el 6 de Octubre de 1738 a los 26 anos de edad. Habia trabajado en Madrid y Salamanca como tipógrafo en la composición griega y latina, antes de entrar en la Companía. En 1742 tendría 30 anos. Desde el primer ano figura como Oeconomus Typographiae, Admistrador de la imprenta.

Hasta aqui nada de particular. Sin embargo, en la cuenta abierta a Antolin Garcia, Entonador, folio 148, aparece una nota curiosa que dice:

(12) V. Novíssima Recopilación. I XXVI, 3 El encargado de llevarlo a efecto, con poderes ilimitados, fue el Conde de Arana.

(i3) y_ Conrado Perez Picon S.J. op. cit. <14' V. Conrado Perez Picon S.J. Un Colégio ejemplar de letras humanas en

Villagarcia de Campos (1576 - 1767 ) Ed. Sal Terrae pag. 102 y ss. <15> V. Conrado Perez Picon op.cit. pag.42.

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Pa Juan Palazios dará uste(?) 100 Reales Antolin Garcia Villagarcia y noviembre 20/1753(?) Manuel Corral*16» V.Lámina n° 1.

El Padre Juan Palácios, que no tieno abierta cuenta alguna a su nombre es experto en griego y latin, que conoce no solo como novicio, sino que le viene de más atrás como tipógrafo en Madrid y Salamanca, aparece como destinatário de una orden, que en buena lógica, solo puede cumprimentar si fuese el Administrador, y de ser así, estaríamos a un paso de identificarlo como uno de los redactores de las cuentas, a titulo de tal. Pêro ello no nos autoriza a considerarlo como adoptando coscientemente la forma invertida de los signos. Todo lo más heredero formal.

Juicio Crítico

Este manuscrito tiene a nuestro entender gran importância, no solo desde el punto de vista de la Historia de la Contabilidad, sino desde el punto de vista Doctrinal, puesto que, tanto si el procedimento o "forma" persiste hasta el siglo XVIII, como si un Administrador aislado lo emplea con tal perfección, en competência con otros procedimientos más modernos, que sin duda conoce pêro, que no emplea, en cualquier caso es una prueba de la eficácia de esta "forma" como procedimiento contable y lo conveniente de su actual validación.

Iindice de Laminas

Lâmina n° 1, Facsimil orden de pago J. Palácios. Lâmina n° 2, Facsimil dei folio 83. Lâmina n° 3, Facsimil nota dei vestido dei estudiante Serrano. Lâmina n° 4, Facsimil dei folio 12. Lâmina n° 5, Facsimil dei folio 224.

<16> Este Manuel Corral era el Mozo de la Huerta. Tiene, a su vez, cuenta abierta.

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Lâmina n° 1

Facsímil orden de pago Juan Palácios

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Lâmina n° 2

Facsímil folio n° 83

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Lâmina n° 3

Facsímil nota dei vestido dei estudiante Serrano

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Lâmina n° 4

Facsímil dei folio n° 12

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Page 112: Estudos do ISCAA (2ª série) - Nº1, Ano 1995

Lâmina n° 5

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Facsímil folio n° 224

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LOPES AMORIM E A ESCOLA DO PORTO

H. 0. CARQUEJA*

Justificando a Ousadia

Faz parte da Comissão Científica desta jornada de homenagem o Prof. Doutor Camilo Cimourdain de Oliveira que, num trabalho publicado na Revista de Contabilidade e Comércio, n.° 187/192, pág. 515 e seguintes, "Lopes Amorim e a Escola do Porto", esclarece que não foi ele quem tomou a decisão sobre o seu trabalho. Aqui e agora faço vénia ao pudor que o impediu de dizer claramente que o movimento iniciado por Lopes Amorim causou adesões, reacções e esclarecimentos como é natural quando se propõe uma "Teoria" e que o Senhor Professor é boa testemunha porque estava lá e não só entrou no jogo como, felizmente, o continua.

Invoco o trabalho do meu ilustre Professor como o melhor dos apoios para a minha ousadia ao defender que Lopes Amorim deve ser creditado não só pelo que directamente nos deu mas ainda por ter despoletado o interesse que legitima o falar na Escola do Porto.

* Ex-encarregado de curso e equiparado a professor auxiliar da Faculdade de Economia da Universidade do Porto, foi Revisor Oficial de Contas e sócio da extinta Cooper's & Lybrand & Carqueja, SROC, actualmente é administrador de empresas e recentemente retomou a direcção interina da Revista de Contabilidade e Comércio que vai voltar a ser distribuída.

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Questões de Ontem ou de Hoje?

Não fiquei surpreendido quando, ao folhear o último número distribuído (Setembro de 1992) da "Revue belge de la Comptabilité", deparei com o texto, em abertura de assunto, sob o título "Mécanique comptable", que equivale em português a:

"A definição de contabilidade

Técnica auxiliar das disciplinas de Direito e Economia, a contabilidade é uma técnica de registo e classificação dos fenómenos que constituem o seu campo de observação".(1)

As questões de ontem são ainda de hoje, mas estou certo que Lopes Amorim não concordaria nem com a opinião nem com o realce que a ideia tem como primeiro parágrafo do primeiro artigo publicado na citada revista.

Na "Digressão através do vetusto Mundo da Contabilidade" já Lopes Amorim afirmava, relativamente à classificação da contabilidade como ciência ou técnica

...o "ser" ou "não ser" não se apresenta ao meu espírito como uma questão apaixonante .. .(2)

depois de notar que a aprendizagem e ensino da Contabilidade tinham o seu lugar nas preocupações do ensino superior e universitário.

Seja ciência ou técnica a Contabilidade pode ser abordada como teoria,. e essa abordagem é um legado recebido de Lopes Amorim e que dá substância à Escola do Porto.

Ouso prestar aqui o meu testemunho sobre a obra de Lopes Amorim porque, ao que ainda hoje se lê ou se ouve, sinto-me herdeiro do trabalho

(1) Joseph Colleye, pág. 3: "La definition de la comptabilité Technique auxiliaire des disciplines Droit et Economique, la comptabilité

est une technique d'enregistrement et de classement des phénomènes qui entrent dans les limites de son champ d'observation."

(2) Pág. 554 da obra citada.

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feito ao deixar nos seus alunos ou leitores a convicção de que a necessidade de coerência entre as soluções contabilísticas implica apoio numa teoria articulada racionalmente,, cuja compreensão exige trabalho e suor.

Quando numa universidade, instituto, localidade ou grupo social se mantém acesa a chama do interesse por um tema de estudo que é abordado com metodologia semelhante por vários professores e estudiosos pode falar-se numa Escola. Em tal sentido, penso que existiu uma escola no Porto: Lopes Amorim acendeu a chama com as suas lições em 1929, o Prof. Doutor Camilo Comourdain de Oliveira e o saudoso Doutor José António Sarmento alimentaram o fogo, interventores de ocasião avivaram as chamas e José Henrique Garcia deu valioso contributo propagando-as. Ainda existem focos desse incêndio feito de interesse pela teoria da contabilidade.

Mas a Escola do Porto não existiu isolada nem ignorada. Um mestre a que espero prestar pequena homenagem concluindo

escrito iniciado há alguns meses, Vicente Gonçalves da Silva, em cujos livros, no meu tempo de estudante, se buscaram as respostas concretas aos problemas que a Escola do Porto tendia a deixar na sombra, em correspondência particular escrevia sobre Lopes Amorim:

"Concordo inteiramente com o que diz acerca da influência que as "Lições de Contabilidade Geral" tiveram na contabilidade nacional.

Do marasmo em que esta jazia foram elas que a tiraram. O nível que os estudos contabilísticos atingiram entre nós deve-se,

sem dúvida, a esse impidso inicial".'3'

A carta com os parágrafos supra foi dirigida a outro mestre, também com abordagem não enquadrável na Escola do Porto, Noel Martin Monteiro, após o testemunho deste sobre a obra de Lopes Amorim.

Nas três últimas décadas a Contabilidade muito deve ao Professor Doutor Rogério Fernandes Ferreira cuja participação nesta jornada em memória de Lopes Amorim evidencia o seu apreço pelo ilustre mestre.

(3) Vide testemunho de José Henrique Garcia, a pág. 215 do n.° 159 da revista de Contabilidade e Comércio.

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Porque está posicionado fora da Escola do Porto tem ainda mais valor a sua visão sobre o que significou Lopes Amorim e se estarão correctos os que, como eu, consideram que ele encabeça a Escola do Porto.

A trave mestra da diversidade de opiniões da Escola do Porto é o aceitar que a contabilidade não pode acolher soluções só porque hoje funcionam. Para a escola do Porto cada solução contabilística, além de ser eficaz, tem que ser compatibilizável com as outras coexistentes. As regras que, embora eficazes, não são justificáveis, não são recurso com acolhimento na linha de pensamento da Escola do Porto.

Pequenos ... ou Grandes Problemas?

A Teoria da Contabilidade deve responder aos grandes ... e aos pequenos problemas.

Por exemplo, ao técnico português não se põem problemas ao contabilizar os descontos de pronto pagamento, sejam concedidos ou obtidos. A redacção em vigor do POC esclarece o conteúdo quer da conta 686 quer da 786 nos termos seguintes:

686 — Descontos de pronto pagamento concedidos: Inclui os descontos desta natureza, quer constem da factura, quer sejam atribuídos posteriormente.

786 — Descontos de pronto pagamento obtidos: Inclui os descontos desta natureza, quer constem da factura, quer sejam atribuídos posteriormente.

Apesar de toda esta evidência portuguesa, num teste escolar nos E.U., fui penalizado porque contabilizei, tanto na C/C como em Vendas, o valor de uma factura ilíquida do desconto de pronto pagamento e contabilizei este como encargo! No desenrolar do trabalho de auditoria numa grande empresa, que alugava ou lavava fardas e fatos de trabalho, confirmei que todas as facturas eram consideradas pelo valor l íquido e o não aprovei tamento pelo cliente do desconto de pronto pagamento era considerado proveito financeiro!

O que é correcto?

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Muito apreciei, já lá vão anos, um escrito em que Rogério Fernandes Ferreira questionava as soluções contabilísticas adoptadas para as Letras a Receber.

Agora temos um outro problema cujo enquadramento contabilístico deve ser discutido: como classificar e tratar contabilisticamente os cheques pré-datados recebidos de clientes e endossados a um banco em garantia de financiamento?

Uma outra experiência de dificuldades inesperadas no estrangeiro: contabilizar uma hipoteca (traduzindo "mortgage" por hipoteca, o que é discutível). Se o crédito hipotecário for titulado, e se o título representa a propriedade do imóvel, e se o devedor tem que o resgatar, de que balanço deve constar o imóvel: do credor ou do devedor?

No enquadramento jurídico em questão a posição do devedor é muito mais próxima do titular do direito de readquirir o imóvel, representado no título respectivo, do que do titular actual do direito de propriedade.

E que dizer do tratamento e enquadramento da conta Compras de Existências no Plano de Contas em vigor? Pertence à classe de existências? Ou será um cuco em ninho alheio?

A entrada tímida na prática contabilística portuguesa corrente do mapa de origem e aplicações de fundos é uma fonte de problemas para quem balanço há só um, o da situação patrimonial, e só consegue assimilar o balanço de resultados rotulando-o de demonstração. Vamos continuar a dizer que balanço só há um e qualificar o balanço de origem e aplicação de fundos de "demonstração", copiando a solução já utilizada para o(s) balanço(s) de resultados!

Tendo concordado que acções ou quotas próprias não são activo e que os cortes para separação de períodos contabilísticos implicam Acréscimos e Diferimentos quer no Activo quer no Passivo, e que no Passivo se compreendem as obrigações convertíveis em Acções, como distinguir Activo, Passivo e Situação Líquida? E nas contas consolidadas os interesses minoritários são Passivo ou Situação Líquida?

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Os planos de contabi l idade adop tados pelos Bancos e pelas Seguradoras são minimamente coerentes?

Poderia estender por muitos outros casos os pequenos ... ou grandes problemas não resolvidos ou cuja solução, embora contida no POC, deve ser repensada.

Não me parece difícil "avaliar a actualidade dos temas em estudo" na obra de Lopes Amorim se, como ele, nos preocupar a coerência entre as soluções encontradas para cada problema. A busca e actualização, face às realidades presentes da teoria da Contabilidade subjacente, parece a única via. Entretanto, quero desde já deixar claro que melhor é resolver alguma coisa do que não fazer nada em nome da busca de uma solução geral, e articulada com a elegância exemplificada por Lopes Amorim.

A Abordagem da Escola do Porto

Enquanto os profissionais reclamam respostas para os seus problemas em aberto e professores como Vicente Gonçalves da Silva, Rogério Fernandes Ferreira, ou estudiosos como Noel Martins Monteiro, têm como preocupação em destaque dar-lhes resposta directa, a Escola do Porto viveu e continua obcecada pelo afinar de conceitos e conhecimento das traves mestras.

Sendo verdade que parece melhor aprender a pescar do que receber um peixe, também é verdade que não se ensina a pescar quem morreu à fome.

Subscrevo o reparo à obra de Lopes Amorim implícito na apreciação do professor Camilo C. de Oliveira quando faz notar que 60% do total de páginas das Lições constituem a 1." parte da obra e é na 2.a parte que Lopes Amorim trata do objecto, da composição do património e classificação das massas patrimoniais e segue até fechar com um capítulo sobre "Dinâmica Logismológica".

Na sua peugada, José António Sarmento, como encarregado do curso de Teoria da Contabilidade, dedicava à introdução à Contabilidade cerca de metade do ano lectivo, a que correspondem mais de metade das folhas dos

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apontamentos em que os alunos resumiram as suas aulas e que são de facto introdução visando enquadrar o trabalho.

A perda de José António Sarmento colocou-me sobre os ombros o curso de Teoria da Contabilidade e, depois de muita reflexão, acabei por distribuir o curso por 4 partes com pesos escolares sensivelmente iguais:

— Introdução — Expressão contabilística — Medida contabilística — Análise contabilística

A Introdução passou a significar cerca de um quarto do total.

Dos 60% de páginas dedicadas à observação do passado, como desbravar do terreno para trabalho, na exposição de Lopes Amorim, a redução parece significativa, mas de facto a atitude básica não mudou: em cada passo a justificação continuou mais importante do que qualquer solução encontrada.

Ao Prof. Doutor Camilo Cimourdain de Oliveira coube a parte ingrata de me ensinar Contabilidade Aplicada, curso que continha as questões mais relevantes da Contabilidade das sociedades e a Contabilidade industrial. O nome da disciplina poderia diminuir a tentação de teorizar mas ... comecei por ouvir analisar o problema da língua em que a contabilidade deveria ser feita e continuei a ser empurrado para, relativamente a cada dificuldade, analisar o passado, as condicionantes presentes, as opiniões avalizadas e só depois ter o atrevimento de buscar uma solução. Quem me ouve imagina o desespero dos que só estavam interessados na solução final?

A abordagem do meu mestre, que tenho a felicidade de ter hoje como um dos meus ouvintes, é típica da Escola do Porto. Não foi por acidente que tanto contribuiu para apurar conceitos e terminologia contabilística; o gosto pela teoria tornou-a o problema de fundo.

Também não foi por acidente que Lopes Amorim, no último trabalho que publicou na revista de Contabilidade e Comércio*4', se ocupa da conceituação adoptada por empresas de seguros: é este o tipo de problemas que o atrai tal como aqueles que pessoalmente, ou através dos livros, influenciou.

(4) "De minimis non curat praetor" a pág. 93 e seguintes do n.° 153.

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Não consideraria este breve recado completo sem uma apreciação muito pessoal: a Escola do Porto é paralisante tal como o óptimo é inimigo do bom. Onde estão as críticas aos planos adoptados por bancos e seguradoras? Onde estão as opiniões acessíveis sobre o POC? Onde estão as respostas aos pequenos ... grandes problemas ?

Felizmente que fora da Escola do Porto vamos encontrando respostas ... um obrigado muito especial ao Prof. Doutor Rogério Fernandes Ferreira porque resolve, passo a passo, enquanto esta gente afectada pela Escola do Porto continua com o padrão de Lopes Amorim, e este é grandioso ... mas paralisante.

Melhor seria honrá- lo a alimentar a fogueira que acendeu não deixando extinguir o interesse pela Teoria da Contabilidade a que dedicou tantos cuidados. Os pequenos problemas são grandes problemas, quando são os Nossos Problemas.

Lopes Amorim abordou muitos pequenos problemas, às vezes talvez com demasiado ardor, o que complementa uma obra em que o pano de fundo é sempre Teoria da Contabilidade.

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O ENSINO DA CONTABILIDADE PARA NÃO CONTABILISTAS

VICTOR DORDIO JOSÉ RIBEIRO'''

1. Introdução

Quando no já longínquo ano lectivo de 1973/74 iniciava as minhas funções docentes na Escola Secundária de Montemor-o-Novo e recomendava aos meus alunos da disciplina de Escrituração Comercial a obra "Noções de Contabilidade Geral" de Jaime Lopes de Amorim, editada pela Livraria Avis, do Porto, estava longe de imaginar que volvidos quase vinte anos teria ocasião de falar numa sessão de homenagem a esse autor então "ilustre desconhecido" do primeiro co-autor deste texto.

Depois, foi um percurso de dois decénios a ensinar (e estudar) contabilidade, grande parte dos quais em colaboração com o meu colega José Ribeiro. Por esse motivo, esta comunicação pretendendo ser uma homenagem a um dos grandes vultos do ensino, da pesquisa e da divulgação da Contabilidade em Portugal, é, por outro lado, um testemunho e um apelo sobre o que tem sido e deve ser o ensino da Contabilidade, quando os seus destinatários não são "profissionais do ofício", isto é, estudantes de bacharelatos ou licenciaturas fora da área da Contabilidade-Gestão-Economia.

Com efeito, os estudantes de Sociologia, de Direito, de Engenharia (qualquer que seja o seu ramo), de Agronomia, de Tecnologia das Indústrias Agro-Alimentares, para só citar uns poucos, vêem nos curricula dos seus

(*) Professores Adjuntos do Instituto Politécnico de Beja

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cursos disciplinas de Contabilidade, ou em que estudam matérias próprias da Contabilidade. Como é notório, não se exige a estes estudantes que executem contabilidades, ou que efectuem escrituração comercial. Cremos que o objectivo da inserção daquelas matérias nos curricula dos respectivos cursos tem a ver sobretudo com a necessidade que estes profissionais terão mais tarde de apreciar a situação económico-financeira das empresas para onde irão trabalhar, através da consulta dos elementos contabilísticos fundamentais. É, se assim se pode afirmar, como se antes de partirmos para a China nos ensinassem alguma coisa da língua chinesa...

Nesta breve comunicação iremos tentar exprimir a nossa posição sobre o que e como deve ser o ensino da Contabilidade para não contabilistas e relatar duas situações bem características desta eventualidade, uma que ocorre no ensino da Contabilidade a futuros Engenheiros Agrícolas e Zootécnicos e outra que ocorre c o m o s advogados quando têm que lidar com processos de falência ou outros semelhantes.

2. Que Matérias? Que Didáctica?

O campo das matérias abarcadas pela Contabilidade é demasiado vasto, pelo que carece de delimitação. Assim, têm surgido ramos da Contabilidade que, ou delimitam as matérias, ou a repartem por sectores de actividade. Podemos então falar de Contabilidade Geral, Contabilidade Analítica (ou Industrial), Contabilidade de Gestão, Contabilidade Agrícola, Contabilidade Bancária, Contabilidade Pública, Contabilidade Autárquica, etc.

Todas as matérias agrupadas sob aquelas designações podem, com todo o cabimento, ser incluídas num curriculum de bacharelato ou licenciatura em Contabilidade, Gestão ou afins. Já quanto a outros cursos o problema tem que ser devidamente ponderado.

A primeira questão que se deve colocar é a seguinte: qual a utilidade da contabilidade para o respectivo profissional? A resposta é quase sempre a mesma: servir de instrumento para avaliar a situação económico-financeira da empresa. Esta poderá ser abordada por várias ópticas, um engenheiro privilegiará a rentabilidade, um jurista a responsabilidade perante terceiros.

Então para responder cabalmente a estas exigências coloca-se a questão de saber qual o conteúdo das matérias a ministrar (estudar) e qual a didáctica

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mais apropriada para o seu ensino. Pensamos que os anglo-saxónicos e os franceses com, respectivamente, a sua "Management Accounting" e a sua "Comptabilité de Gestion", poderão ter involuntariamente dado uma achega para a resposta à nossa questão.

Estas disciplinas tratam, de um modo geral, matérias como: — Conceitos e métodos contabilísticos; — Determinação ou avaliação do capital e do rendimento; — Dados contabilístico para planeamento e controlo da gestão.

Pensamos que uma abordagem deste tipo, sem o fastidioso estudo das contas uma a uma, o "debitar" e o "creditar", etc., poderia ser a solução para o ensino da contabilidade a não contabilistas. Talvez possa parecer "heresia" para alguns financeiros, mas seria também desejável a inclusão de alguma da matéria que é geralmente estudada na disciplina de Análise Financeira.

Quanto à didáctica ela terá que ser profundamente diversa da que é usualmente utilizada para os estudantes de Contabilidade, Gestão e afins, para os quais se supõe, no ensino superior, que tiveram preparação adequada no ensino secundário. Esta situação não se verifica com os estudantes dos outros cursos pelo que a sua progressiva familiarização com as matérias contabilísticas deverá ser feita a partir de "terra firme", isto é, a partir de matérias e assuntos que sejam do seu conhecimento.

Na Engenharia (agrícola ou zootécnica) partir-se-á da análise do processo produtivo — plantação, fertilização, colheita, nascimento, venda de gado, engorda, etc. — para se chegar à contabilidade, vendo como são essas operações tratadas e reflectidas nas peças contabilísticas. No Direito, dar-se-á relevância aos aspectos patrimoniais e às obrigações, composição e representação do capital social, etc.

O estabelecimento de um programa disciplinar, perfeitamente adequado a cada curso fora da área das Ciências Empresariais, deverá ser obtido após diálogo profundo e construtivo entre os responsáveis pelo curso e o(s) docente(s) da disciplina de Contabilidade. Tal como em gestão, o controlo permanente efectuado através de acções de "feed-back" deve ser implantado e utilizado para manter permanentemente actualizada aquela disciplina e introduzir correcções necessárias em tempo útil. Tal como em contabilidade, impõe-se um "balanço" final...

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3. Do i s Exemplos: Enga Agrícola e Enga Zootécnica e Direito.

Por várias vezes tivemos ocasião de assegurar a docência da Contabilidade a alunos dos cursos de licenciatura em Engenharia Agrícola e em Engenharia Zooténica. Guardamos dessa experiência uma recordação gratificante, mas sempre nos assaltou a dúvida de qual a utilidade e, sobretudo, o que restaria nos estudantes da aprendizagem da Contabilidade, depois de concluído o respectivo curso.

Antes de mais tivemos que partir do axioma que a Contabilidade é, para estes estudantes, um "corpo estranho" no respectivo elenco curricular e cuja presença se justifica pelo facto de se tratar, de um modo geral, de futuros quadros superiores que terão necessariamente que lidar com elementos de natureza contabilística, nomeadamente o balanço, a conta de resultados, o anexo e o relatório de gestão. Exige-se, portanto, o conhecimento de algumas noções elementares e respectiva terminologia, bem como do tipo de informação veiculada por cada uma daquelas peças contabilísticas e, ainda, o domínio de algumas técnicas de análise que permitam obter mais informação do que a que está ali explicitamente apresentada.

No campo das técnicas utilizadas, também nos tem merecido atenção a distinção entre processos de execução manual, especialmente vocacionados para sistemas de contabilidade simplificada, do tipo RICA, por exemplo, e a processos de execução informatizada destinados preferencialmente à execução da contabilidade "devidamente organizada", como é exigido na lei fiscal para as explorações agrícolas de maior dimensão. Do cotejo dos dois processos de execução retiramos, depois, ilações quanto à qualidade e quantidade de informação obtida para efeitos de gestão.

O(a) engenheiro(a) Agrícola ou Zootécnico(a) não é um executor de contabilidade (salvo raras excepções), por isso não tem que aprender a "fazer" contabilidade. Deve, isso sim, possuir conhecimentos suficientes para ser capaz de, no exercício das suas funções, ser capaz de utilizar com conhecimento de causa qualquer documento de natureza contabilística ou ser capaz de compreender adequadamen te qualquer s i tuação de administração que envolva o conhecimento específico desta disciplina.

Na sua qualidade de docente do Ensino Superior, tem sido, o segundo co-autor deste texto, várias vezes chamado a servir de perito em processos judiciais que envolvem questões relacionadas com a uti l ização da contabilidade.

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Na maior parte dos casos tem deparado com aquilo a que se poderia chamar "uma ignorância não assumida" por parte dos intervenientes nestas questões (juízes, advogados, etc.) causada por um conceito que se tem vindo a instalar (talvez porque a própria Lei Fiscal assim o admite) de que qualquer pessoa, independentemente da sua preparação, pode perceber ou fazer contabilidade.

Um dos casos que mais o chocou foi a sua intervenção como acessor não-oficial de um advogado defensor de um réu num caso de pedido judicial de apresentação de contas, de uma sociedade por quotas.

O primeiro choque chegou com a recusa do Juiz em aceitar a contabilidade da firma apresentada conforme a Lei estabelece, ou seja através dos balancetes mensais, dos livros selados, do balanço e da demonstração de resultados. O Juiz informou o defensor do réu de que, de acordo com o n° 1 do artigo 1016°, do Código do Processo Civil, a apresentação de contas pelo réu deve ser feita sob a forma de conta-corrente.

Não pretendendo meter a "foice em seara alheia" não nos pareceu lógico que sendo uma sociedade obrigada por Lei a manter contabilidade organizada para fins fiscais e de prestação de contas perante o exterior, venha a ser obrigada a transformar essa contabilidade numa "conta-corrente" que resulta pouco clara e pouco esclarecedora. Mas... manda quem pode e assim foi feito.

Apresentada a contabilidade sob a forma de conta-corrente, chama-nos, de novo, o defensor do réu para apreciar a contestação apresentada pela outra parte. Pensando ir encontrar uma contestação baseada na opinião de um profissional devidamente habilitado, eis senão quando deparamos com um texto elaborado pelo próprio advogado de acusação em que se demonstra o mais completo desconhecimento dos princípios da contabilidade e da Lei Fiscal.

Toda a argumentação se baseava na contestação dos valores apresentados como lucro; pois, segundo o advogado de acusação, as amortizações não devem ser deduzidas aos lucros mas sim somadas, o IVA incluído na facturação emitida pela empresa é um proveito e as despesas pagas por um dos sócios com dinheiro da empresa não são custo da empresa mas sim do sócio porque foi este quem efectuou o pagamento.

Para além de constituir uma pura perda de tempo a contestação infelizmente necessária destes argumentos, é triste verificar que alguém que tem como profissão assistir um cidadão ou uma instituição num processo legal, apresente um tal desconhecimento básico das técnicas contabilísticas

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e não tente sequer recorrer a um técnico especializado na matéria. Este pequeno episódio demonstra, mais uma vez, quão necessário se

torna incluir nos diversos cursos que formam profissionais, que de alguma forma tenham que vir a lidar com a técnica e os princípios contabilíticos, matérias desta área científica para que, um dia mais tarde, estes mesmos profissionais possam, pelo menos, reconhecer a sua ignorância nestes domínios.

4. Conclusão

Homenagear uma pessoa Ilustre como o Professor Jaime Lopes do Amorim, que tanto da sua vida dedicou ao ensino e progresso da Contabilidade, e não só recordar a sua obra, mas principalmente tentar contribuir para a dignificação desta área científica e profissional que hoje se encontra, por via legal, tão menosprezada, mas é cada vez mais necessária.

Esta dignifição passa pelo reconhecimento dos seus profissionais como os únicos especialistas capazes de nela intervir, mas também pela revisão e adaptação às diversas circunstâncias do seu ensino.

Infelizmente cada vez mais se verifica que "a árvore oculta a floresta" e se privilegia o ensino do POC (Plano Oficial de Contabilidade) esquecendo-se o ensino da própria contabilidade.

O POC é apenas um plano de contas, passageiro, alterável. A Contabilidade é um conjunto de princípios, de técnicas, uma forma de pensar e de agir, em suma uma Filosofia de base, que permanece e que, portanto, deve ser privilegiada como objectivo de ensino. Não se deve, portanto, reduzir o seu ensino ao estudo do POC, como parece quererem fazer alguns.

Só conhecendo e dominando a filosofia de base se pode pretender dominar os ins t rumentos que a servem, mesmo não se sendo um "profissional" do ramo. Contudo a crescente interdisciplinaridade que caracteriza a actividade quotidiana, requer a utilização de técnicas e de ciências afins daquela em que nos especializámos. Saber qual a profundidade a dar a este estudo é questão que requer resposta a fornecer mercê de aturados e diligentes esforços que só poderão dar bons resultados se (também eles) forem conduzidos com espírito interdisciplinar.

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LA CONTABILIDAD PUBLICA EN LA ADMINISTRACION ESPANOLA: SITUACION ACTUAL

ANTONIO M. LOPEZ HERNANDEZ*

1. Delimitacion del Sector Publico Espanol

En base a lo establecido en el artículo 4° de la Ley Orgânica 2/1982, de 12 de mayo, del Tribunal de Cuentas, el sector público Espanol tendra el siguiente contenido:

a) La Administración del Estado. b) Las Comunidades Autónomas. c) Las Corporaciones Locales. d) Las Entidades Gestoras de la Seguridad Social. e) Los Organismos Autónomos, y f) Las Sociedades Estatales y demás Empresas Públicas.

Por otra parte, el Texto Refundido de la Ley General Presupuestaria, en su artículo 139, senala que, a efectos de Contabilidad Nacional, el sector público se dividirá en los subsectores siguientes:

— Administraciones Públicas, Incluída la Seguridad Social. — Empresas Públicas. — Instituciones Financieras Públicas.

* Departamento de Economia Financiera y Contabilidad de la Universidad de Granada

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A partir de la delimitación anterior, podemos clasificar el amplio espectro de Entes que integran el sector público, desde una óptica esencialmente contable, en dos grandes grupos:

• Subsector Administraciones Públicas. • Subsector Empresas Públicas. Dentro de Administraciones Públicas se incluyen todas las Entidades

enumeradas en el artículo 4a de la Ley Orgânica dei Tribunal de Cuentas, excepción hecha dei apartado f)-sociedades estatales y demás empresas públicas — que constituyen el segundo subsector público.

El conjunto de Entidades no lucrativas que configuran este subsector, a pesar de su cierta heterogeneidad, comparten unas notas identificativas comunes, que influyen de forma determinante en sus sistemas contables. Estas características comunes se pueden sintetizar como sigue(1):

a) Ausência de accionistas o propietarios particulares. Estas entidades dependen, en último termino, de un órgano de representación política de los ciudadanos.

b) Servicio público: Su función principal es la producción de servicios para la colectividad, sin ânimo de lucro.

e) Redistribución: Adernas, y en su caso, efectúan operaciones de redistribución de la renta y la riqueza nacional.

d) Financiación: Los recursos principales proceden de pagos obligatorios exigidos sin contraprestación.

e) Regimen de p resupues to : Están somet idos ai regimen presupuestario público; el presupuesto es la manifestación de la voluntad política en materia económica del correspondiente órgano político, siendo vinculante para la entidad.

f) Rendición de cuentas: Están obligados a rendir cuentas de su actividad.

La Contabilidad a aplicar a los Entes públicos sin ânimo de lucro que presentan las notas anteriores es la que denominamos, en sentido técnico-económico, Contabilidad Pública y el análisis de su situación actual, en el marco espanol, constituye el objetivo dei presente trabajo.

(1) Puede verse en este sentido: Pou Diaz, J.: "Algunas Reflexiones sobre la Contabilidad Pública". Partida

Doble. n° 11, Abril 1991, pág. 51. Intervención General de la Administración dei Estado: Documento sobre

Princípios Contables Públicos. Madrid, 1991.

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2. El Plan General de Contabilidad Publica Espanol

La reforma de la Contabilidad Pública en Espana ha venido de la mano de la Ley General Presupuestaria de 1977 (LGP), que sento las bases légales para llevarla a efecto y, posteriormente, se ha visto asumida en el Texto Refundido de la Ley General Presupuestaria de 1988 (TRLGP).

La LGP incorpora al sector público al movimiento de normalización contable. Asi, el artículo 125, senala como competências de la Intervención General de la Administración del Estado (IGAE) someter a la decision del Ministério de Economia y Hacienda el Plan General de Contabilidad Pública, al que se adaptarán las Corporaciones, Organizaciones y demás Entidades incluidas en el sector público, según sus características y peculiaridades'2'. Dispone también, el mencionado artículo, que corresponde a la IGAE promover el ejercicio de la potes tad reglamentar ia en orden a la determinación de la estructura, justificación, tramitación y rendición de las cuentas y demás documentos relativos a la Contabi l idad Pública. Consecuente con lo anterior dispone, en su apartado c), que es misión de la IGAE aprobar los planes parciales o especiales de contabilidad pública que se elaboren conforme al Plan General, así como los de las Sociedades estatales respecto al Plan General de Contabilidad de la Empresa espanola.

La elaboración de un Plan General de Contabilidad para el sector público ha sido un factor esencial en la modernización del sistema contable público. Este hecho significo el paso de un modelo tradicional de ejecución presupuestaria y de tesorería a uno más acorde con los principios de contabilidad generalmente aceptados y con las prácticas vigentes en el âmbito empresarial . De igual forma, resulta indudable que su progresiva implantación ha afianzado definitivamente el proceso de normalización de la Contabilidad Pública en nuestro país.

La IGAE, haciendo uso de sus facultades, elaboro el Plan General de Contabilidad Pública (PGCP) que fue aprobado con carácter provisional por el Ministério de Hacienda, por la Orden de 14 de octubre de 1981, (BOE 29-10-81). Esta provisionalidad viene justificada en el Preâmbulo de dicha Orden, al sehalar que "ante la trascendencia de dicho Plan, tanto por la razón de la

(2) Vid. Díaz Garcia, R.: "La Contabilidad en la Ley General Presupuestaria". Incluído en Análisis de la Ley General Presupuestaria. Instituto de Estúdios Fiscales, Madrid, 1977. págs. 283-297.

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materia como por la amplitud del sector público, parece prudente iniciar un período experimental en el que se aplique con carácter provisional y solo para el subsector Estado". Esta aplicación de carácter provisional se realizo de forma centralizada y con base en la estructura de la contabilidad administrativa entonces vigente en las distintas oficinas de Contabilidad del Estado.

Tras un ano de aplicación al Subsector Estado, fue aprobada una nueva version por resolución de la IGAE de fecha 11 de noviembre de 1983 (BOE 19 y 20-1-84), que puso fin a la provisionalidad del Plan anterior.

Tanto en la primera como en la segunda version del PGCP se tenia previsto el Grupo 9 para recoger la contabilidad analítica, aunque solo se había desarrollado la contabilidad externa. El texto que desarrolla dicho Grupo, fue aprobado por Orden Ministerial de 20 de septiembre de 1983, dei Ministério de Economia y Hacienda.

Posteriormente, la Resolución de 27 de diciembre de 1989, de la IGAE (BOE 121-90) ha aprobado algunos câmbios ai PGCP, relacionadas esencialmente con el tratamiento contable dei inmovilizado material e inmaterial, afectando a los Grupos 1, 2, 6 y 7.

El modelo de referencia dei PGCP es el Plan de Cuentas aprobado por Decreto 530/1983 para el sector privado. Sobre la base de este se hicieron una serie de modificaciones, para recoger las singularidades de los Entes a los que había de aplicarse, intentando conciliar la necesaria armonización contable con las diferencias entre los Entes públicos y la Empresa privada. A este respecto, el PGCP ha sido objeto algunas críticas que ponen de relieve su inadecuación, por considerarlo una copia demasiado fiel dei modelo contable dei sector privado y no adaptado suficientemente a la especialidad de los Entes a los que ha de aplicarse.

En esta línea se situa el profesor Requena Rodriguez'3' cuando afirma que "Nos parece obligado subrayar que los entes públicos y privados, aún con similar fenomenologia económico-financiera, difieren no obstante, en la forma de atender a la realización de sus funciones, en especial por el distinto

(3> Requena Rodriguez, J. M.: "La Contabilidad en el Sector Público Espanol". Economistas núm. 31, abril-mayo, 1988, pág. 11.

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orden externo que los condiciona. Ello quiere decir, pues, que cualquier intento de planificación contable dei sector público no puede quedar en una mera copia adaptada, sin más, de un modelo propio dei sector privado, cual es el caso que nos ocupa, con un resultado, como no podia menos que suceder, poço acorde ai propósito que debía presidir el intento".

Evidentemente uno de los rasgos más característicos que diferencia el sistema contable de las Entidades públicas respecto dei adoptado por las Empresas es la coexistência de dos subsistemas contables que necesariamente han de ser considerados: subsistema presupues ta r io y subsis tema patrimonial.

El PGCP présenta como características fundamentales las siguientes: abierto, pues se autoriza a incorporar cuantas modificaciones, tendentes a su perfeccionamiento, aconseje la experimentación dei mismo; flexible, teniendo en cuenta la magnitud y diversidad de Entes destinatários dei mismo; y realista, ya que se ha pretendido asegurar las condiciones para su aplicación más que un perfeccionamiento en su elaboración.

El PGCP establece como objetivo general el ofrecer información sistemática de carácter económico y como objetivos particulares especifica los siguientes:

— Modernizar la contabilidad pública, acercándola a las concepciones vigentes en la actualidad en la disciplina contable.

— Normalizar los datos ofrecidos por la contabilidad de los diversos agentes dei sector público, de forma que sean comparables y agregables.

— Integrar los datos normal izados dei sector público en la Contabilidad Nacional.

Por otra parte, hay que destacar que, según se establece en su introducción, el Plan es aplicable a todo el sector público, a excepción de las Sociedades estatales. Aunque no sea de aplicación directa a los distintos Entes integrantes dei sector público, se convierte en el marco de referencia obligado para todas las adaptaciones que se realicen.

2.1 Estructura del Plan General de Contabilidad Pública.

En primer lugar, hemos de precisar que no pretendemos hacer un análisis en profundidad de su contenido, más bien dar una visión general

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de su estructura<4). La ultima version del PGCP consta de las siguientes partes:

Primera: Cuadro de Cuentas. Sigue una clasificación decimal, las cuentas se integran en 10 grupos, designados por números de una cifra, cada grupo se desarrolla a su vez en subgrupos (dos cifras), cuentas de primer orden (três cifras) y de segundo orden (cuatro cifras).

El modelo dei PGCP es dualista, apareciendo claramente diferenciadas la Contabilidad Externa (Grupos 1 ai 8 y Grupo 0), y la Contabilidad Analítica (Grupo 9). Asimismo, dentro de la Contabilidad Externa están integradas:

— La Contabilidad Patrimonial — La Contabilidad de Gestion — La Contabilidad Presupuestaria

La Contabilidad Patrimonial está recogida en los Grupos 1 ai 5. • El Grupo 1 recoge la Financiación Básica, es decir, los recursos

dei ente destinados a financiar el activo permanente. • El Grupo 2, Inmovilizado, recoge los elementos patrimoniales

que constituyen las invérsiones permanentes. • El Grupo 3, Existências, recoge las mercancias, productos, matérias

primas y auxiliares, etc. • El Grupo 4, Acreedores y Deudores, está destinado principalmente

a reflejar los que se deriven de la ejecución dei presupuesto: Acreedores presupuestarios y Deudores presupuestarios.

• El Grupo 5, Cuentas Financieras, recoge los acreedores y deudores a corto plazo por operaciones financieras y extrapresupuestarias adernas de los médios líquidos disponibles y cuentas de enlace y de movimientos internos.

(4) Para un estúdio más profundo del contenido del Plan General de Contabilidad Pública puede consultarse:

Aranguren Castro, J.: "El Plan General de Contabilidad Pública (I)". Revista Espanola de Financiación y Contabilidad, núms. 37, Vol. XI, enero-abril, 1982.

Aranguren Castro, J.: "El Plan General de Contabilidad Pública (II)". Revista Espanola de Financiación y Contabilidad, núms. 40, Vol. XII, enero-abril, 1983.

Intervención General de la Administración dei Estado: Curso sobre el Plan General de Contabilidad Pública. Version mayo 1991.

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Page 133: Estudos do ISCAA (2ª série) - Nº1, Ano 1995

La Contabilidad de Gestion queda reflejada en los Grupos 6 y 7. • El Grupo 6, Compras y Gastos por naturaleza, se destina a recoger

los gastos comentes del ejercicio y las transferencias de capital concedidas.

• El Grupo 7, Ventas e Ingresos por naturaleza, refleja los recursos dei ente público procedentes tanto de su capacidad impositiva, como de los rendimientos del ejercicio de su actividad.

La Contabilidad Presupuestaria está integrada por un conjunto de cuentas ubicadas en los Grupos 0 y 4.

• El Grupo 0, Cuentas de Control presupuestario y de Orden, refleja las operaciones presupues tar ias que no producen efectos económico-patrimoniales, mientras que en el Grupo 4 se reflejan las que producen dichos efectos.

Completa la Contabilidad externa el Grupo 8: Resultados, que refleja los flujos de gastos e ingresos originados por la actividad dei ente público, tanto los procedentes de la actividad normal como los atípicos.

Respecta a la Contabilidad Analítica, esta queda integrada en el Grupo 9 y se orienta a satisfacer los siguientes fines:

— Determinar el coste y rendimiento de los servicios públicos. — Facilitar información económica a los gestores responsables de los

organismos para la toma de decisiones. — Medir la eficiência y eficácia, haciendo posible enjuiciar la gestion

realizada bajo dichos critérios. — Hacer posible el "feed-back" en el proceso presupuestar io

programático. El cuadro de cuentas dei Grupo 9 está estructurado de forma que

permite disponer de três niveles de información: — Categorias o clases de costes. — Centros Orgânicos de coste. — Costes de los programas.

De lo expuesto se deduce que, con excepción dei Grupo 0, se ha respetado la misma estructura por grupos que presentaba el Plan Privado de 1973. Por otra parte, también se intenta una estrecha relación ai descender a otros niveles de desagregación, aunque distintas consideraciones, fundamentalmente relacionadas con la especialidad de los Entes a los que se

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aplica, impiden una analogia absoluta. Como afirman los profesores Requena, Garcia y Carrasco<5> "Son multiples las peculiaridades específicas que encontramos en los bienes, derechos y obligaciones de las unidades económicas dei sector público para que, logicamente, muchas de sus cuentas representativas, o incluso subgrupos de ellas, contenidas en el Plan General de Contabilidad Pública, deba ser contempladas en forma distinta a como lo hace su homónimo privado".

En este sentido, las notas diferenciadoras más destacables las presentan los grupos 0 y 4, por la necesidad de integrar los aspectos relativos ai presupuesto en el cuadro de cuentas. En el PGCP el grupo 0, adernas de recoger las cuentas de orden, destina otras rubricas para reflejar aquellas fases de ejecución presupuestaria que todavia no tienen repercusión patrimonial. Su desarrollo se realiza por conceptos presupuestarios a efectos de poder rendir la liquidación del presupuesto. Sin embargo, tal como antes mencionamos, el grupo 0 no contiene todas las cuentas de control presupuestario, ya que las fases de ejecución presupuestaria en las que se produce el reconocimiento de derechos y obligaciones de contenido económico son contabilizadas en el grupo 4 "Acreedores y Deudores", cuyas cuentas, por tanto, también tienen carácter de control presupuestario. Así, los subgrupos 40 "Acreedores por obligaciones reconocidas", 41 "Acreedores por pagos ordenados" y 43 "Deudores por derechos reconocidos" participan de una doble naturaleza: presupuestaria y patrimonial.

Segunda: Definiciones y Relaciones Contables. Comprende las correspondientes a grupos , subgrupos y cuentas de pr imer orden, describiendo los principales motivos de cargo y abono de las mismas. Los contenidos de esta parte son muy semejantes a los del Plan General de Contabilidad de 1973, siendo las definiciones y relaciones contables correspondientes a los grupos 0 y 4 los que presentan una mayor diferencia al respecte

Tercera: Cuentas Anuales. Recoge los modelos correspondientes a las siguientes:

• Balance de situación. • Cuentas de resultados, con el siguiente detalle:

(5) Requena Rodriguez, J. M, Garcia Martin, V. y Carrasco Díaz, D.: "La Contabilidad Pública Actual en Espana", incluido en Ponencias y Comunicaciones dei III Encuentro de Profesores Universitários de Contabilidad, Málaga, 26 a 28 de mayo, págs. 65 y 66.

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— Resultados corrientes del ejercicio. — Resultados extraordinários. — Resultados de la cartera de valores. — Modificación de derechos y obligaciones de ejercicios

anteriores. — Resultados dei ejercicio.

• Cuadro de financiamiento anual

Cuarta: Critérios de Valoracion. Adaptados en lo posible a los establecidos en el Decreto 530/1973, por el que se aprobó el Plan privado. En esta parte el Plan se ocupa de los principios de contabilidad generalmente aceptados, enunciando los cuatro principios expresamente recogidos en el Plan General de Contabilidad de 1973: precio de adquisición, continuidad, devengo y gestion continuada.

A este respecte, hay que tener en cuenta que los principios recogidos en el Plan General de Contabilidad Pública están en sintonia con los asumidos en el Plan General de Contabilidad de 1973, y no podemos olvidar que en ese momento no se existia en nuestro país ningún pronunciamiento que abordara la aplicación de los principios contables a la Contabilidad Pública. Es de esperar, por tanto, que este apartado del Plan sufra modificaciones sustanciales en la próxima reforma, máxime si tenemos en cuenta la emisión, por parte de la IGAE, de un Documento sobre Principios Contables Públicos.

Por último, hemos de hacer mención a la necesidad de abordar con prontitud la reforma dei modelo contable instituido por el Plan General de Contabilidad Pública como consecuencia, principalmente, de la aprobación mediante Real Decreto 1643/1990, de 20 de diciembre (BOE 27-12-90) dei nuevo Plan General de contabilidad para la empresa espanola<6). El cambio en el modelo de referencia, representado en el Plan de Contabilidad para el sector privado, provocará modificaciones en la planificación realizada en la Contabilidad Pública, tanto en el propio Plan como en las numerosas adaptaciones que dei mismo se han efectuado durante el período de su vigência. 3. La Contabilidad Publica en La Administracion dei Estado

(6) A este respecta, puede verse: Pou Diaz, J. y Carlos de Caso Fernandez, J. C: "La Contabilidad de

las Administraciones Públicas ante el Nuevo Plan General Contable Espanol". Partida Doble, n° 2, junio 1990, págs. 59-65.

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3.1 El Sistema de Información Contable en la Administración General dei Estado: el SICOP.

Uno de los pilares básicos en orden a la modernización y normali-zación de la Contabilidad de la Administración dei Estado ha sido la implantación dei denominado SICOP (Sistema de Información Contable de la Administración dei Estado y Reestructuración de la Función de Ordenación de Pagos), regulada mediante el Real Decreto 324/1986, de 10 de febrero (BOE 18-2-86).

Este Sistema de Información se basa en los siguientes princípios'7': — Intenta abarcar todas las operaciones de naturaleza económico-

financiera que se den en el âmbito de las competências de la Administración dei Estado.

— Se configura como una contabilidad cuyo objetivo primário es el de ofrecer información sistemática de carácter económico y como una herramienta imprescindible para la buena gestion y la toma puntual de decisiones.

— Se basa en el método de la partida doble, mediante la aplicación del Plan General de contabilidad Pública.

— Se basa en la descentralización de funciones de gestion contable en una serie de oficinas de contabilidad, establecidas lo más cerca posible de cada centro responsable de la gestion económica, sin que por ello se pierda la garantia de la agregación y consolidación de los datos contables.

— Está soportado informáticamente y basado en el automatismo. — Persigue la simplificación de los procedimientos contables-

administrativos mediante el registro y proceso de los datos objeto de la contabilización en el punto más cercano a su generación.

— Seguridad de funcionamiento dei sistema, mediante la unicidad de los critérios contables, el tratamiento informático homogéneo en todos los centros contables y la comunicación y coordinación entre los mismos.

(7) Puede verse: Intervención General de la administración dei Estado. Sistema de Información

Contable de la administración dei estado. La Central Contable. Descripción dei Sistema de Información Contable. Ministério de Economia y Hacienda, Madrid, 1992, págs. 15-18.

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Con el diseno e implantación del SICOP se pretende conseguir cinco grandes objetivos: Implantación del Plan General de Contabilidad Pública; aplicación de un modelo contable descentralizado; simplificación de los procedimientos contables-administrativos; y seguridad de funcionamiento dei sistema.

Por otra par te , merece la pena destacar que la implantación descentralizada del Plan General de Contabilidad Pública supone la adopción de un modelo contable en el que quedan integradas la Contabilidad externa, presupuestaria y analítica, permitiendo responder satisfactoriamente, segun reconoce el artículo 3.2 del mencionado Real Decreto, a los siguientes fines:

a) Obtener el balance de situación integral del estado, poniendo de manifiesto la composición y situación de su Património así como sus variaciones.

b) Determinar los resultados desde el punto de vista económico patrimonial.

c) Determinar los resultados analíticos, poniendo de manifiesto el coste y rendimiento de los servicios públicos.

d) Registrar la ejecución de los Presupuestos Générales del Estado, poniendo de manifiesto los resultados presupuestarios.

e) Registrar las operaciones de administración de los recursos de otros entes públicos gestionados por la Hacienda Pública.

f) Registrar los movimientos y la situación dei Tesoro Público. g) Proporcionar los datos necesarios para la formación y rendición

de la Cuenta General dei Estado, así como de las cuentas, estados y documentos que deben elaborarse o remitirse ai Tribunal de Cuentas.

h) Facilitar los datos y demás antecedentes que sean precisos para la confección de las cuentas económicas dei Sector Público y las Nacionales de Espana,

i) Rendir la información económico financiera que sea necesaria para la toma de decisiones, tanto en el orden político como en el de gestion,

j) Posibilitar el ejercicio de los controles de legalidad, financiero y de eficácia,

k) Suministrar información para posibilitar el análisis de los efectos económicos de la actividad desarrollada por la administración dei Estado.

1) Posibilitar el inventario y control del inmovilizado material,

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Page 138: Estudos do ISCAA (2ª série) - Nº1, Ano 1995

inmaterial y financière), el control del endeudamiento y el seguimiento individualizado de la situación acreedora o deudora de los interesados que se relacionen con la Administración dei Estado.

De acuerdo con los principios y objetivos anteriormente expuestos, el SICOP se configura como un sistema in tegrado de elaboración, contabilización y control de la ejecución de los Presupuestos y de toda la actividad financiera dei subsector Estado. El sistema aparece dividido en dos áreas fundamentales: la contable y la presupuestaria.

El área contable está orientada ai seguimiento y contabilización de todas las operaciones de naturaleza económico financiera que se den en el âmbito de la Administración dei Estado. Por su parte, el área presupuestaria tiene como misión la elaboración de los Presupuestos Générales del Estado. La información recogida en ambas áreas no permanece de forma inconexa, sino que existe una total interrelación(8).

La estruetura organizativa en que se apoya el SICOP(9), se basa en una organización contable descentralizada integrada por las siguientes oficinas contables:

A) Intervención General de la Administración dei Estado, a través de la Subdirección General de Gestion Contable, que actua como Central Contable.

B) Oficinas de Contabilidad de las Intervenciones Delegadas en los Departamentos Ministeriales de carácter civil y la Subdirección General de Contabilidad dei Ministério de Defensa.

C) Oficinas Presupuestarias de los Departamentos Ministeriales. D) Oficina de Contabilidad de la Intervención Delegada en la

Dirección General dei Tesoro y Política Financiera. E) Intervenciones Territoriales de las Delegaciones de Hacienda.

<8) Puede verse: Pou Diaz, J. y Ortigosa López, R.: "El Proyecto SICOP. Características

Générales". Partida Doble. n° 4, septiembre 1990, págs. 55-60. m Puede verse en este sentido: Menoyo Gonzalez, J. L. y Caso Fernandez, J. C: "El Proyecto SICOP (II):

Vision Organizativa y Funcional". Partida Doble, n° 5, octubre 1990, págs. 56-61. Pou Diaz, J. y Sobrino Moreno, J. M.: "El Sistema Contable y Presupuestario".

Presupuesto Y Gasto Público, n° 1, Vol. 28,1990, págs. 165-181.

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En desarrol lo del SICOP / se han e laborado Instrucciones de Contabilidad (IC) para los siguientes Centros Contables(10):

— IC de los Centros Gestores del Presupuesto de Gastos del Estado (O.M. 31-3-86).

— IC de las Delegaciones de Hacienda (O.M. 16-12-86). — IC de la Dirección General del Tesoro y Política Financiera (O.M.

23-12-86). — IC de la Central Contable (O.M. 28-7-88).

En las mencionadas Instrucciones se recogen las normas contables aplicables a cada Centro y las adaptaciones del PGCP para cada uno de ellos.

3.2. La Contabilidad Pública en la Administración Institucional y en las Entidades Gestoras de la Seguridad Social.

Los Organismos Autónomos del Estado constituyen una figura característica de la descentralización institucional del sector público, que aparece como una necesidad impuesta por la ampliación de los objetivos básicos de los Estados. En el Derecho espanol se regulan por la Ley de Regimen Jurídico de las Entidades Estatales Autónomas de 26 de diciembre de 1958.

En lo referente a la contabilidad, los Organismos Autónomos quedan expresamente sometidos ai Regimen de Contabilidad Pública, de acuerdo con lo establecido en el artículo 122 del TRLGP. En desarrollo de lo preceptuado en la Ley General Presupuestaria de 1977, y con carácter provisional hasta tanto no fuera aprobado el Plan General de Contabilidad Pública, se dictaron la Orden de 16 de junio de 1978, por la que se establecen normas sobre la contabilidad de los Organismos Autónomos de carácter no administrativo, y la Orden de 10 de julio de 1978, para los Organismos Autónomos de carácter administrativo, posteriormente desarrolladas por otras disposiciones.

(io) pu ede verse: Montesinos Juive, V. y Orón Moratal, G.: Normas de Contabilidad Pública. Técnos,

Madrid, 1989.

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El proceso de modernización y reforma dei sistema de contabilidad de los Organismos Autónomos se inicia con el Real Decreto 2145/1985, de 23 de octubre. La citada norma regula las competências contables en la Administración Institucional dei Estado, asignando la gestion de la contabilidad de los Organismos Autónomos a la dirección general o unidad administrativa equivalente de las mismas.

En el ejercicio de sus funciones la IGAE elaboro la Instrucción de Contabilidad de los Organismos Autónomos dei Estado, aprobada por Orden de 31 de marzo de 1986 (BOE 22 y 23-5-86), que vino a sustituir la normativa vigente hasta enfonces. Mediante dicha Instrucción se aprobó el Plan Contable adaptado a la Administración Institucional y se dispuso su aplicación obligatoria a partir dei ejercicio 1987. Asimismo se elaboro un paquete informático contable denominado SICAI, con similares objetivos a los pretendidos por el SICOP en la Administración General dei Estado.

La aplicación del Plan General de Contabilidad Pública en los distintos Organismos Autónomos se efectuará, tal como establece la Regia 11 de la Instrucción de Contabilidad, a través de planes parciales o especiales que serán elaborados por cada Organismo, bajo la dirección y asesoramiento de la IGAE, en base ai citado Plan General. De igual forma, podrá elaborarse, cuando vários Organismos coincidan en el tipo de actividades que desarrollan, un plan sectorial que será de aplicación a cada uno de ellos. En todo caso, los planes parciales, especiales o sectoriales habrán de ser aprobados por la IGAE.

Por otra parte, en relación con las Entidades Gestoras de la Seguridad Social, cabe senalar que las normas para la contabilidad de las mismas quedan reguladas en la Orden dei Ministério de Trabajo y Seguridad Social, de 11 de febrero de 1985, que aprobó el Plan General dei Sistema de Seguridad Social. En su introducción se establece que el Plan será aplicable a las distintas entidades y dependências que conforman la Seguridad Social, mediante las correspondientes adaptaciones dei mismo.

Asimismo, la Intervención General de la Seguridad Social, a través de su Subdirección General de Contabilidad ha disenado un "Sistema Integrado de Contabilidad" denominado SICOSS, que sigue las pautas marcadas en la Administración General dei Estado y tiene como principal objetivo la implantación del PGCP para la Seguridad Social, aprobado por la Orden mencionada.

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4. La Contabilidad Publica en las Comunidades Autónomas.

En primer lugar, hay que senalar que respecto a las Comunidades Autónomas no existe una norma que regule de forma uniforme la materia contable y presupuestaria. Cada Comunidad ha elaborado su propia Ley de Hacienda que cubre el mismo espacio jurídico que el TRLGP en el âmbito estatal, recogiéndose prácticamente en todas la necesidad de aplicación del Plan General de Contabilidad Publico.

En este sentido, conviene recordar que la Ley 12/1982, de 14 de octubre, del Proceso Autonómico (LOAPA) establece en su artículo 13,1, que: "en tanto que la Ley del Estado no establezca un regimen distinto, en virtud de lo previsto en el artículo 149,1,18 de la Constitución, serán de aplicación a la Administración de las Comunidades Autónomas y a los Organismos y Empresas que de ella dependan las mismas regias sobre contabilidad y control económico financiero aplicables a la Administración dei Estado, sin perjuicio de las especialidades que se deriven de sus respectivos Estatutos".

A este respecto, la Ley General de la Hacienda Pública de la Comunidad Autónoma Andaluza, en su artículo 89, establece entre las competências asignadas a la Intervención General de la Junta, como Centro Directivo de la Contabilidad Pública de la Comunidad las siguientes:

— Someter a la decision del Consejero de Hacienda el Plan General de la Junta, sus organismos, instituciones y empresas, al objeto de su posible coordinación y articulación en el Plan General de Contabilidad dei sector Público estatal.

— Aprobar los planes parciales o especiales de Contabilidad Pública que se elaboran conforme al Plan General.

Al igual que ocurre en la Comunidad Autónoma de Andalucía, en el resto de Comunidades es el Centro Directivo correspondiente el encargado de elaborar el modelo contable propio que, como consecuencia de la necesaria armonización, no será muy distante dei vigente para el sector público estatal. En opinion de Pou Díaz

(n), es necesario establecer mecanismos que posibiliten

una coordinación entre los diferentes sistemas contables, citando los siguientes:

—■ Encuentros entre las distintas Intervenciones Générales — del Estado y de cada Comunidad Autónoma — ai objeto de discutir problemas contables concretos.

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— Colaboraciones entre el Ministério de Economia y Hacienda, a través de la IGAE, y Comunidades Autónomas concretas, instrumentadas mediante convénios de colaboración.

— Unificación de critérios contables que, sin perjuicio de los utilizados internamente por cada Administración, permitan la presentación homogénea de estados contables.

5. La Contabil idad Publica en Las Corporaciones Locales

La reforma y modernización de la Contabilidad Pública en la Administración Local ha encontrado su soporte jurídico en la Ley 39/1988, de 28 de diciembre, reguladora de las Haciendas Locales.

El desarrollo en materia contable de la Ley 39/88, se ha concretado a través de la aprobación de la Instrucción de Contabi l idad para la Administración Local de 1990, de la que forma parte como Anexo el Plan General de Contabilidad Pública adaptado a la Administración Local. Asimismo, en cumplimiento de lo preceptuado en el artículo 183 de la Ley 39/88, que prevê un tratamiento especial simplificado para la contabilidad de las Entidades Locales cuyo âmbito territorial tenga una población inferior a 5.000 habitantes, se ha dictado una Instrucción de Contabilidad dei tratamiento especial simplificado para las mencionadas Entidades. El nuevo modelo contable local ha entrado en vigor, con carácter obligatorio, el 1 de enero de 1992<12».

(11) Pou Diaz, J: "La Situación de la Contabilidad Pública en Espana". Ponencia presentada a las Jornadas sobre Contabilidad y Auditoria del Sector Público, Valencia, marzo de 1992. Sin publicar.

(12) Para un estúdio más amplio del contenido y estructura de la Instrucción de Contabilidad y del Plan General de Contabilidad Pública adaptado a la Administración Local puede consultarse:

Montesinos Juive, V.: "El Nuevo Modelo Contable para la Administración Local (I)". Partida Doble. n° 18, diciembre 1991, págs. 54-60.

López Hernandez, Antonio M.: "La Reforma de la Contabilidad Pública Local en Espana. El Plan General de Contabilidad Pública Adaptado a la Administración Local". Comunicación presentada a las IV Jornadas de Contabilidad. Instituto Superior de Contabilidad y Administración de Aveiro (Portugal), octubre 1991.

López Hernandez, Antonio M.: "La Reforma Contable en la Administración Local y sus Instrumentos: La Instrucción de Contabilidad y la adaptation del Plan General de Contabilidad Pública". Incluído en Plan Contable para la Administración Local. Lex Nova, Valladolid, 1992, págs. 15-33.

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El Plan de Cuentas para la Administración Local (PGCAL) es una adaptación del Plan General de Contabilidad Pública de 1983, que a su vez, constituye una adaptación del Plan General de Contabilidad para las empresas espanolas aprobado por Decreto 530/1973, de 22 de febrero. La sustitución de este texto por uno nuevo en diciembre de 1990, para ser adaptado a las normas contables de la Comunidad Económica Europea, hace que, a nuestro juicio, el PGCAL surja con "vocación de transitoriedad" ya que la próxima adaptación del PGCP al modelo actualmente vigente para el sector privado, conllevará una revision del Plan de Cuentas de los Entes Locales.

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ADDENDA

Con posterioridad a la presentación de este trabajo se han producido câmbios importantes en el marco normativo de la Contabilidad Pública espanola que es necesario cuanto menos mencionar.

Como se puso de relieve en párrafos anteriores, la modificación del Plan Contable espanol para el sector empresarial, que constituye el marco de referenda de la planificación contable en el âmbito de la Contabilidad Pública, para adaptarlo a las Directivas de la Comunidad Europea en la materia, exigirá igualmente la modificación del Pan Público de 1983, hasta ahora en vigor.

Esta reforma ha tenido como antecedente inmediato el desarrollo por parte de la Comisión de Principios y Normas Contables Públicas de la IGAE dei soporte conceptual y teórico dei modelo contable público.

Ahora bien, el elemento más sobresaliente dei proceso de adaptación y modernización que está experimentando la Contabilidad Pública espahola es la aprobación del nuevo Plan General de Contabilidad Pública(1) (NPGCP), por la Orden de 6 de mayo de 1994 (BOE de 20 de mayo de 1994). El nuevo modelo contable de las Adminis t rac iones Públicas se aplicará obligatoriamente a partir dei 1 de enero de 1995 ai sector estatal, aunque, su entrada en vigor exigirá, consecuentemente, la revision de las adaptaciones que hasta ahora se habían realizado, partiendo dei modelo general, a los distintos niveles de la Administración espanola, las cuales se han materializado en las denominadas

(1) Sobre el contenido dei nuevo Plan General de Contabilidad puede verse, entre otros:

Carrasco Díaz, D. (Coordinador): La Nueva Contabilidad Pública /4CODI- ARIEL, Barcelona, 1994; Casado Robledo, S y De Caso Fernandez, J. C: "El Nuevo Plan General de Contabilidad Pública", Revista Espanola de Financiación y Contabilidad, n° 79, abril-junio, 1994, págs. 503-542.

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Instrucciones de Contabilidad. A este respecto, la IGAE está trabajando en una nueva Instruction de

Contabilidad para la Administración general del Estado, así como en la correspondiente a los Organismos autónomos estatales. Paralelamente, está desarrollando las aplicaciones informáticas por las que discurrirán todos los câmbios realizados, las cuales responden al nombre de SICOP-2 para la Administración dei Estado, y de SICAI-2 para los Organismos autónomos.

Por otra par te , la revision del Plan de Contabi l idad para la Administración Local, adaptándolo al NPGCP, está previsto realizarse para que entre en vigor el 1 de enero de 1997.

Por lo que se refiere a la Seguridad Social, hay que senalar que a diferencia del resto del sector público estatal, donde la IGAE es el Centro Directivo de la Contabilidad, las competências en esta materia corresponden a la Secretaria General para la Seguridad Social. Es de esperar que en breve plazo se produzca la necesaria adaptación al NPGCP al objeto de armonizar la información contable elaborada en todo el sector público espanol.

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Sessão de Encerramento

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MOÇÃO

Apresentada à Assembleia pelo

Exm° Senhor Professor Doutor Camilo Cimourdain de Oliveira, sendo aprovada por aclamação.

— Considerando a personalidade científica do insigne mestre da contabilidade;

— Considerando o seu contributo para a sistematização do saber contabilístico;

— Considerando o impulso dado ao arranque da contabilidade científica em Portugal e no estrangeiro;

— Considerando o brilho intelectual com que iluminou toda a sua actividade de cientista, doutrinário, pedagogo e profissional;

— Considerando a exaltante dignidade ética e moral de cidadão impoluto;

— Considerando a sua verticalidade e "franqueza" de notável polemista;

— Considerando o seu aturado e profundo labor intelectual de trabalhador incansável;

Os participantes nas Comemorações de homenagem ao professor Jaime Lopes Amorim, no centenário do seu nascimento, solicitam ao Exmo Senhor Ministro da Educação que conceda ao professor Jaime Lopes Amorim uma venera que traduza o reconhecimento incontestado da sua personalidade multifacetada e prestigiosa, cujo fulgor intelectual se impõe à consideração do exigente mundo da Contabilidade.

Pela Comissão Executiva

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II Parte

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Jaime Lopes Amorim — Contributo para uma Biobibliografia*

por José Fernandes de Sousa

*As Bibliotecas de Porto - Dra. Adelaide Galhardo - e Aveiro - Dra Albina Pinto, D. Gracinda e D. Paula - acompanharam a realização deste Projecto, nomeadademente ao nível das actividades que conduziram à exposição biobibliográfica, cujo empenho se agradece.

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1. Nome: Jaime Lopes Amorim

2. Filiação: 2.1. Pais:

• Manuel Lopes Gonçalves Amorim • Maria da Rocha Amorim

2.2. Avós paternos: • José Gonçalves Amorim • Maria Margarida

2.3. Avós maternos: • Henrique Gonçalves Amorim • Ana da Rocha

3. Naturalidade: 3.1. Lugar: Rio Mau 3.2. Freguesia: Sebolido 3.3. Concelho: Penafiel 3.4. Distrito: Porto

4. Nascimento e Morte: 15.01.1891/30.06.1973

5. Baptismo: 17 de Janeiro de 1891

5.1. Lugar: Igreja de S. Paulo de Sebolido 5.2. Diocese: Porto 5.3. Padrinhos:

• Augusto Coelho Vieira de Seabra • Maria Margarida

5.4. Reitor: • José Rodrigues da Cunha

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6. Casamento: Casou, em 21 de Agosto de 1930, com D. Isolina Cármen Lima

Lobo Lopes Amorim, Licenciada em Línguas Clássicas e ilustre Prof do Ensino Técnico. O casal fixou residência na Rua Duque da Terceira — Porto.

7. Formação Escolar e Académica 7.1. Colégio de Nossa Senhora do Carmo, em Penafiel. 7.2. Instituto Industrial e Comercial do Porto. 7.3. Instituto Superior de Comércio do Porto, onde aparece aos 25 anos,

em 1916, para, em 1920, se licenciar com a elevada classificação de 16 valores. A sua tardia Licenciatura tem uma explicação.* A exigente disciplina clerical que experimentou no colégio de Penafiel tornou-se, parece, demasiado insuportável para o jovem de Rio Mau. A recusa do pai em aceitar uma alternativa levou-o a um acto de aparente rebeldia que o fez abandonar os estudos e entrar num período pouco conhecido da sua vida. Parece não ter resistido ao apelo sedutor dos trópicos e emigrou para o chamativo e mítico Brasil, onde trabalhou, tendo regressado por razões de saúde. Após uma recuperação, que parece não ter sido fácil — o facto de ter ficado "isento definitivamente", do serviço militar por decisão de uma Junta de Revisão, em 1917, terá algo a ver com as sequelas da doença que apressou o seu regresso? —, retomou os seus estudos. Contudo, faz questão de suportar todas as despesas, dando explicações de inglês e alemão — disciplinas, cuja frequência lhe merecem a classificação de 20 valores, tendo-lhe a de alemão conquistado uma "menção honorífica", conferida pelo Conselho Escolar, em 1918.

* A fruste cobertura deste hiato na vida do jovem Jaime Lopes Amorim só foi possível devido à memória das vagas informações que chegaram ao conhecimento da Exma Senhora D. Maria Teresa Lopes Amorim, primogénita do professor, e a alguns documentos pessoais que teve a amabilidade — que vivamente agradecemos — de nos dispensar.

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Page 152: Estudos do ISCAA (2ª série) - Nº1, Ano 1995

8. Actividade Profissional 8.1. Instituto Superior de Comércio, desde 1920, contratado como mestre

de língua inglesa. Torna-se Io Assistente temporário em 22 de Março de 1924 e

Assistente efectivo, desde 25 de Setembro de 1927. - D. G. de 15.10.1927 -, tendo tomado posse em 17.10.1927.

Regeu as cadeiras de Contabilidade Geral e Seguros Reais.

8.2. Instituto Comercial do Porto, desde 30 de Outubro de 1933, onde rege as cadeiras de Trabalhos Práticos de Contabi l idade , Contabilidade Industrial e Geografia Económica.

8.3. Professor Jubilado, em 14 de Janeiro de 1961, por limite de idade, profere a sua última lição na cadeira de Geografia Económica de Portugal e Províncias Ultramarinas.

A sua última lição "sobre os agentes interiores e exteriores que actuam sobre o globo terrestre, transformando a sua fisionomia", como refere o Comércio do Porto de 15 de Janeiro de 1961, demonstra a sua enorme bagagem de cientista e a versatilidade de pedagogo.

A Jubilação transformou-se numa concorrida homenagem, onde estiveram presentes para além dos seus alunos vários colegas, amigos e diversas representações: o Dr. Carlos Proença, Director Geral do Ensino Técnico e Profissional, representa o governo; o Dr. Fernando Seabra, Director da Faculdade de Economia, aparece acompanhado dos Professores Sarmento e Camilo de Oliveira — uma das personalidades justamente homenageadas nas recentes V Jornadas de Contabilidade, no Porto; o Eng° Brito e Cunha, Director de Instituto do Vinho do Porto, representa uma instituição onde o Professor jubilado desenvolveu actividade e deixou obra de mérito; o Eng° Lima Aires, Director do Inst i tuto Indus t r ia l , vem acompanhado dos Professores Prado e Castro e Custódio Guimarães; Carlos Clavel do Carmo torna presente a Associação Comercial do Porto; Augusto Mart ins Moreira, pres idente da Associação

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Portuguesa de Contabilidade, trouxe o apreço dos profissionais que Jaime Lopes Amorim prestigiou; etc.; e, naturalmente, o Dr. António Tavares Junior, Director do Instituto Comercial, que por razões de doença, se fez representar pelo decano do corpo docente da Escola, Prof. Dr. Damião Marques Moura.

A Imprensa do Porto — nomeadamente o Comércio do Porto, que deixa um documento fotográfico do salão, tornado pequeno, onde decorria a lição do Mestre, e o Jornal de Noticias — fez eco das palavras dos oradores que homenagearam o Professor Jubilado.

O sentido das palavras, então pronunciadas, o qual ficou exarado nas colunas destes periódicos, e a descrição do evento definem, com clareza, a personalidade do homenageado.

O Comércio do Porto considera que o Mestre terminou "a sua larga e luminosa carreira de pedagogo" com uma " magnífica lição", enquanto o Jornal de Notícias repara no agradecimento de um aluno "em nome de todos aqueles que tiveram a felicidade de beneficiar dos seus altos ensinamentos".

Que foi sublinhado, continua o Comércio do Porto, o valor do Mestre "como pedagogo, homem de ciência e verdadeiro criador no campo contabilístico" (decano do Instituto Comercial) ao mesmo tempo que o Jornal de Notícias ouviu realçar o seu "papel desempenhado na estruturação da contabilidade como corpo científico de conhecimentos" e reconhecer "ao seu ensino uma elevação que, sem o seu trabalho apurado e criador, possivelmente não teria sido alcançado entre nós tão cedo". (Presidente da Associação Portuguesa de Contabilidade).

O Jornal de Notícias refere-se ao Professor Jubilado como uma "individualidade de prestígio no meio contabilístico nacional" e mostra como o decano do Instituto Comercial, habituado à sua convivência, "exal tou o alto valor intelectual e mora l do homenageado e as qualidades da sua camaradagem sincera, enquanto o Comércio do Porto assinala a comoção que assalta o Professor Jubilado na hora da despedida, face ao "calor e afecto manifestado por antigos alunos, velhos camaradas e simples funcionários" que lhe manifestam o seu apreço em "prolongados e sinceros aplausos".

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O Director Geral do Ensino Técnico e Profissional fechou a sessão, deixando no ar um voto premonitório: "disse esperar, de acordo com as palavras do Comércio do Porto, que o Professor Jaime Lopes Amorim continuaria como tem vindo a fazer há 40 anos, a prestar os seus valiosos serviços ao País e a todos quantos estão ligados à sua obra de investigador". De facto, a jubilação não interrompeu o seu intenso labor intelectual: os anos que decorreram até à sua morte, em 30.06.1973, permitem-lhe erguer obra de mérito, nomeadamente a "Digressão Através do Vetusto Mundo da Contabilidade" .

O testemunho dos que o conheceram é incisivo no relevo dado à sua multifacetada personalidade de pedagogo empenhado, atento aos progressos da ciência e das práticas profissionais, de investigador criativo e rigoroso, cujo elevado nível intelectual não o afasta de uma ética exigente nem o faz perder o pendor afável — profundamente emotivo nos escritos polémicos — de homem sensível.

Actividade Empresarial 9.1. Instituto do Vinho do Porto.

Nesta instituição exerce actividade desde 1944, tornando-se Director da 3a Divisão — a de propaganda e Estudos Económicos.

9.2. Teixeira & Amorim, Lda. Uma firma familiar, hoje extinta, em Vila Nova de Gaia, de que foi Sócio Gerente ao longo dos anos 20 e 30.

Actividade Associativa Foi sócio efectivo da Associação de Jornalistas e Homens de Letras

do Porto.

Publicações Jaime Lopes Amorim deixou uma vasta obra, de inegável significado

teórico e prático, plasmada em monografias, em revistas portuguesas e estrangeiras, tais como: Anais do Instituto do Vinho do Porto; Brotéria; Revista Paulista de Contabilidade e Comércio; Revista de Contabilidade

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e Comércio, em cujas páginas se tornou uma presença constante ao longo de décadas; etc.

Proferiu inúmeras conferências (várias delas publicadas) em diversos espaços culturais: Escolas, Associações profissionais, Associações culturais; etc.

A extensa obra do Prof. Amorim — realizada em consonância com os seus afazeres de intelectual, docente, empresário e alto funcionário do Instituto do Vinho do Porto — assume feições diversificadas que, numa tentativa de sistematização, de acordo com as orientações básicas, poderíamos agrupar da seguinte forma: obras de carácter pedagógico-didáctico; polémico; crítico; teórico-metodológico, histórico-doutrinal; e, finalmente, estudos económicos.

11.1. Monografias 1. Lições de Contabilidade Geral: prelecções feitas ao curso de

contabilidade geral..., Porto, Empresa Industrial Gráfica do Porto, 1929.

2. Elementos de Contabilidade e Escrituração Comercial: para uso das escolas comerciais, Ia edição, Porto, Tipografia Sequeira, 1934 (foram publicadas várias edições).

3. Lição a um Mestre de Ideias Bailarinas Revolucionárias e Destruidoras: refutação das insinuações feitas por Higino Gaspar Gil, Porto, s.n., 1939.

4. Influência da Política Aduaneira da Grã-Bretanha Sobre o Comércio de Vinhos deste País, Porto, Instituto do Vinho do Porto, 1942.

5. Ronda dos Mercados Externos em 1946, Porto, Instituto do Vinho do Porto, 1946 (separata dos Anais do Instituto do Vinho do Porto).

6. Aspectos do Problema da Protecção das Marcas de Origem Vinícolas e sua Evolução, Porto, Instituto do Vinho do Porto, 1947 (separata dos Anais do Instituto do Vinho do Porto).

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7. Ronda dos Mercados Externos em 1947, 1948 e 1949. Porto, Instituto do Vinho do Porto, 1950 (separata dos Anais do Instituto do Vinho do Porto).

8. Repercussões da Evolução da Política Económica..., Lisboa, Sindicato Nacional dos Comercialistas, 1951.

9. Geografia Económica do Mundo Português, Porto, Instituto Comercial do Porto, 1957.

10. Noções Sumárias de Geologia, 1957-1958.

11. Digressão Através do Vetusto Mundo da Contabilidade, Porto, Liv. Avis, 1969.

12. Evolução do Comércio do Vinho do Porto em 1965, Porto, Instituto do Vinho do Porto, 1965.

11.2. Artigos Publicados na Revista de Contabilidade e Comércio

1. Fim da Contabilidade, Revista de Contabilidade e Comércio, Ano III, N° 9, Janeiro-Março, 1935.

2. Aparências e Realidades, Revista de Contabilidade e Comércio, Ano III, N° 11, Julho-Setembro, 1935.

3. Palavras e Ideias, Revista de Contabilidade e Comércio, Ano III, N° 12, Outubro-Dezembro, 1935.

4. Um Programa, Revista de Contabilidade e Comércio, Ano IV, N° 13, Janeiro-Março, 1936.

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5. Cousas e Lousas, Revista de Contabilidade e Comércio, Ano IV, N° 14, Abril-Junho, 1936.

6. Tentativas Novas por Caminhos Velhos , Revista de Contabilidade e Comércio, Ano IV, N° 15, Julho-Setembro, 1936.

7. Est Modus in Rebus...I, Revista de Contabilidade e Comércio, Ano V, N° 17, Janeiro-Março, 1937.

8. Est Modus in Rebus...II, Revista de Contabilidade e Comércio, Ano V, N° 18, Abril-Junho, 1937.

9. Est Modus in Rebus. . .I l l , Revista de Contabi l idade e Comércio, Ano V, N° 19, Julho-Setembro, 1937.

10. Est Modus in Rebus.. .IV, Revista de Contabi l idade e Comércio, Ano V, N° 20, Outubro-Dezembro, 1937.

11. A Escola Perante a Evolução do Pensamento Logismológico, Revista de Contabi l idade e Comércio, Ano VI, N° 21, JaneiroMarço, 1938.

12. Est Modus in Rebus...V, Revista de Contabilidade e Comércio, Ano VI, N° 22, Abril-Junho, 1938.

13. Est Modus in Rebus.. . VI, Revista de Contabil idade e Comércio, Ano VI, N° 23, Julho-Setembro, 1938.

14. Est Modus in Rebus...VII, Revista de Contabi l idade e Comércio, Ano VI, N° 24, Outubro-Dezembro, 1938.

15. Est Modus in Rebus...VIII, Revista de Contabilidade e Comércio, Ano VII, N° 26, Abril-Junho, 1939.

16. A Contabilidade como Base de Sustentação e Propulsão da Actividade Económica, Revista de Contabilidade e Comércio, Ano VII, n° 27, Julho-Setembro, 1939.

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17. Est Modus in Rebus... IX, Revista de Contabil idade e Comércio, Ano VII, N° 28, Outubro-Dezembro, 1939.

18. Est Modus in Rebus.. X, Revista de Contabilidade e Comércio, Ano VIII, N° 29, Janeiro-Março, 1940.

19. Progresso ou Retrocesso? I, Revista de Contabilidade e Comércio, Ano VIII, N° 30, Abril-Junho, 1940.

20. Progresso ou Retrocesso? II, Revista de Contabilidade e Comércio, Ano VIII, N° 31, Julho-Setembro, 1940.

21. Uma Obra que se Impõe pelos seus Próprio Méritos, Revista de Contabilidade e Comércio, Ano IX, N° 36, Outubro-Dezembro, 1941.

22. Pondo os Pontos nos ii . . . , Revista de Contabil idade e Comércio, Ano X, N° 37, Janeiro-Março, 1942.

23. Pondo os Pontos nos ii . . . , Revista de Contabil idade e Comércio, Ano X, N° 39, Julho-Setembro, 1942.

24. Pondo os Pontos nos ii . . . , Revista de Contabil idade e Comércio, Ano XI, N° 41, Janeiro-Março, 1943.

25. Pondo, finalmente, os Pontos nos ii x , Revista de Contabilidade e Comércio, Ano XII, N° 45, Janeiro-Março, 1944.

26. Dumarchey e a sua Obra, Revista de Contabi l idade e Comércio, Ano XV, N° 57, Janeiro-Março, 1947.

27. Metodologia Geral da Contabilidade, Revista de Contabilidade e Comércio, Ano XIX, N° 73, Janeiro-Março, 1951.

28. Nunca é demasiado Tarde para Desfazer Enganos, Revista de Contabilidade e Comércio, Ano XXIV, N° 94, Abril-Junho, 1956.

29. Amortizar ou Reintegrar?, Revista de Contabi l idade e

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Comércio, Ano XXVII, N° 105, Janeiro-Março, 1959.

30. Amortizar ou Reintegrar?, Revista de Contabi l idade e Comércio, Ano XXXI, N° 122, Abril-Junho, 1964.

31. Prof. Doutor José António Sarmento, Revista de Contabilidade e Comércio, Ano XXXI, N° 122, Abril-Junho, 1964.

32. Os Números que Governam o Mundo Económico, Revista de Contabilidade e Comércio, Ano XXXII, N° 126, Abril-Junho, 1965.

33. Teoria Dinamista, Revista de Contabilidade e Comércio, Ano XXXIV, N° 133, Janeiro-Março, 1967.

34. Teoria Reditualista, Revista de Contabilidade e Comércio, Ano XXXIV, N° 136, Outubro-Dezembro, 1967.

35. As Mais Valias e as Reavaliações, Revista de Contabilidade e Comércio, Ano XXXVII, N° 146, Abril-Junho, 1970.

36. Considerações Acerca do Plano Geral de Contabilidade, Ano XXXVIII, N° 150, Abril-Junho, 1971.

37. De Minimis Non Curat Praetor, Ano XXXIX, N° 153, Janeiro-Março, 1972.

11.3. Artigos Publicados n' outras Publicações*

1. A Contabilidade na Indústria I. in O Trabalho Nacional, N° 78, Junho, 1926.

2. A Contabilidade na Indústria II. in O Trabalho Nacional, N° 79, Julho, 1926.

3. A Contabilidade na Indústria III. in O Trabalho Nacional, N° 81, Setembro, 1926.

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4. A Contabilidade na Indústria IV. in O Trabalho Nacional, N° 83, Novembro, 1926.

5. Actividade Económica e Actividade Moral, in relatório da actividade ... do Instituto Comercial do Porto (1933-1945), Porto, Imprensa Moderna, Lda, 1945.

6. Crise do Douro e suas Soluções, in Brotéria, Vol. XLV, Julho, 1947.

12. Significado da sua Obra

As suas "Lições de Contabilidade Geral", 1929, trazem a Portugal as modernas teorias da Contabilidade.

O Professor Doutor F. V. Gonçalves da Silva, interlocutor de uma das mais vivas polémicas com J. L. Amorim, não deixa de reconhecer, com a dignidade da sua estatura científica e moral, que as Lições foram aquele " impulso inicial" que elevou o nível e a d ign idade da Contabilidade em Portugal, fazendo-a sair do "marasmo em que jazia".

Acerca da sua fogosa veia polémica, uma das faces mais controversas desse incontornável paladino da Contabilidade, refere o mesmo Professor "a bossa que tinha para as sentenças dogmáticas e para as críticas verrinosas".

De facto, causa alguma perplexidade o contraste entre a urbanidade do seu comportamento, o feitio sociável e intimista que conseguia dar ao seu relacionamento e a "ruralidade" da força radical desse vocabulário popular que à saciedade maneja, nos escritos polémicos, contra quem se aventura a calcorrear território por onde tenha passado ou considere seu.

O Prof. M. Noel Monteiro, que com ele privou, interpreta a sua vivacidade polémica como expressão da sua "intimorata franqueza" e não de "malevolência", enquanto o Dr. Hernâni Carqueja, com laivos de ironia, considera o seu "ardor de polemis ta" um sinal de "compreensão entre contabilistas"!

* Esta listagem não consegue ser exaustiva.

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O Prof. Doutor Camilo Cimourdain de Oliveira, um dos promotores da presente homenagem — que na década de 40 polemizou com Lopes Amorim —, no Seminário internacional sobre Contabilidade e Gestão, comemorativo das Bodas de Ouro da Revista de Contabilidade e Comércio, 1933-1983, — aquela em que o "Mestre" deixou assídua colaboração — afirmava, com a autoridade que se lhe reconhece, que as "Lições..." marcam "o início da fase científica do Ensino Universitário da Contabilidade em Portugal".

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Textos escolhidos publicados na

Revista de Contabilidade e Comércio*

* Estes textos são publicados com a anuência — que vivamente agradecemos — da Família do homenageado e do actual Director da Revista de Contabilidade e Comércio, Dr. Olímpio Hernâni Carqueja.

Por opção e facilidade de transcrição, o sabor coevo e pessoal dos texto foi totalmente respeitado

A escolha teve a participação de colegas do I.S.C.A.A., nomeadamente alguns dos professores ligados à área de Contabilidade, e a supervisão da Comissão Científica, embora a responsabilidade última seja da Comissão Executiva de Aveiro.

É de toda justiça assinalar, como, aliás, facilmente se perceberá, que a parte relativa à polémica do homenageado com o Prof. Doutor Camilo Cimourdin de Oliveira foi recriada, dentro dos limites das páginas sugeridas, por este ilustríssimo membro da Comissão Científica das comemorações.

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FIM DA CONTABILIDADE**»

O balanço não é, como muitos supõem, um simples expediente doloroso que surge no fim do ano para efeito de determinação dos resultados e de encerramento de contas.

O balanço é, pelo contrário, uma expressão permanente e móvel que surge com o património; que foca a sua evolução na sucessão dos instantes; e que nos dá a conhecer a sua composição qualitativa e quantitativa na sucessão desses mesmos instantes.

E é precisamente nesta permanente informação ou conhecimento que o balanço nos proporciona, que reside o verdadeiro fim da contabilidade sistemática.

O balanço é, em suma, para o património qualquer coisa de parecido com o que a objectiva de uma máquina de filmar é para as paisagens que caem sob o seu alcance.

É, portanto, absolutamente erróneo o modo de expressão traduzido por qualquer das frases "dar balanço" ou "deitar balanço" que são o fruto natural dos longos séculos em que e a contabilidade, jazeu no seu estado empírico de incubação e em que, de facto, a equação ou conta de balanço só anualmente era estabelecida com o auxílio do inventário geral.

É devido a esta terminologia empírica que muitos contabilistas, muitos administradores de empresas, muitos professores e muitos tratadistas crêem que o balanço é assim uma espécie de ave de arribação que só o frio de Dezembro consegue fazer chegar até nós.

"Dar balanço" ou "deitar balanço" são expressões inadequadas e anacrónicas, nascidas do empirismo secularmente enraizado, absolutamente

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incompatíveis com a ideia de um facto preexistente e, como tais, nuvens confrangedoramente negras que se opõem à passagem da luz radiante da moderna ciência logismológica, e que dão aso a que se façam afirmações como aquela a que acabamos de aludir, ou seja, a de que a contabilidade não tem um fim que lhe dê uma individualidade própria.

Em vez destas expressões empíricas, que não têm a recomendá-las, nem a propriedade dos termos nem a clareza das ideias, achamos preferível o emprego de qualquer das expressões seguintes: rectificar o Balanço ou regularizar o Balanço.

Com a adopção dos termos rectificar ou regularizar, que nos fazem sugerir imediatamente a ideia de qualquer coisa preexistente, desaparecerá, a nosso vêr, de uma vez para sempre, a falsa ideia da periodicidade da existência do balanço, resultante do uso dos termos "dar" ou "deitar", que levou o elaborador do programa de contabilidade das nossas escolas de ensino técnico profissional a incluir nele a pepineiral exigência da contabilização do um Balanço!!!

A este respeito recebemos, há tempos, uma carta dum ilustre colega, em que nos perguntava se sabíamos o que vinha a ser a tal "contabilização dum Balanço", visto que não havia meio de atinar com o alcance de tão peregrina expressão.

E não atinou, nem podia atinar, pela simples razão de que, sendo, como é, um professor honesto, não tem passado o tempo a engolir, como o fêz o autor do referido programa, as caraminholas que pejam as obras dos tratadistas clássicos, através das quais se tem formado a mentalidade da maior parte dos nossos actuais professores de contabilidade.

Para honra da sua classe e prestígio do nosso ensino técnico elementar, o colega em questão tem feito alguma coisa mais do que digerir pacatamente as estafadas árias dos clássicos.

Tem feito esta coisa — que para muitos se afigura extraordinariamente simples, mas que é na verdade bastante difícil — de submeter essas árias à análise meticulosa do seu esclarecido raciocínio.

Ora, esta expressão "contabilização de um balanço" é uma dessas expressões verdadeiramente infelizes que têm o grande condão de irritar a sensibilidade intelectual de quem tenha dois dedos de entendimento, precisamente por ter sido vomitada no mesmo estado de integridade em que foi engolida.

E isto porque o balanço não é uma coisa esporádica e independente, que possa existir à margem de qualquer contabilização.

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Sendo o balanço, como é, o ponto de partida e o ponto de chegada da contabilidade, ele é implicitamente a própria contabilidade, ou se se preferir, a própria contabilização.

Dizer "contabilizar um balanço" o mesmo é, portanto, que dizer contabilizar a contabilização; é, como se vê aquilo a que com toda a propriedade se poderá chamar um autêntico pleonasmo.

Porque não é o balanço que se contabiliza, como o elaborador do programa — que naturalmente deve ter sido escolhido entre os mais cotados professores de ensino técnico comercial — erroneamente supõe.

O que se contabiliza é a evolução económica do património de qualquer empresa, que, por esse facto, se projecta no balanço.

O balanço é, em suma, a própria contabilização ou representação do património na sucessão dos instante.

In Revista de Contabilidade e Comércio. Ano III, n° 9, Janeiro-Março (1935), p. 9-13.

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APARÊNCIAS E REALIDADES

A mais do que uma pessoa tem causado bastante espécie o termo relevação por mim empregado no livro de que sou autor e que se denomina "Elementos de Contabilidade".

Considerado em si mesmo, posso garantir a quem quer que seja, sem receio de ser desmentido, que êle é muito velho; possivelmente muito mais velho até do que a famosíssima Sé da nossa cidade de Braga.

E se a alguém restar a menor dúvida àcêrca do que acabo de afirmar, esse alguém nada mais precisará de fazer para a dissipar por completo do que recorrer a qualquer bom diccionário da língua portuguesa, porque aí verá que o termo "relevação" é derivado do verbo "relevar" que é usualmente empregado na acepção de perdoar" ou de "desculpar", mas que tem também a significação de "pôr em relevo" ou "em evidência", "tornar saliente", etc., etc.

E é precisamente esta a acepção em que eu o tomei ao servir-me do termo em referência.

"Relevação" é pois, a percepção, que nos é dada, pelo próprio acto que a inculca, ou seja, o acto de relevar.

Vou procurar explicar a propriedade e necessidade do termo relevação e provar que a ideia que com êle pretendo exprimir não é nova: mas sim velha, bastante velha mesmo, e que, além disso, êle não se achará deslocado numa língua em que existem os termos "registo", "assentamento", e outros quejandos, por qualquer dos quais êle — na opinião dos meus contraditores — poderá ser vantajosamente substituído.

Com efeito, estes entendem que há uma perfeita coincidência entre as

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ideas expressas pelo termo registo e pelo termo "relevação", porque, se assim o não entendessem, não faria sentido que eles defendessem o uso do primeiro para exprimir a mesma idea traduzida pelo segundo termo.

E é precisamente aqui que está a lamentável confusão dos meus antagonistas, porque eles foram educados numa escola de horizontes bastante restritos que não soube ensinar-lhes a distinguir as aparências das realidades.

De sorte que o seu espírito não se encontra suficientemente espevitado para poder fazer a conveniente dissociação de ideas distintas, mas que no seu cérebro se acham completamente amalgamadas e confundidas.

E isto porque o registo não é um fim em si mesmo, mas apenas um meio de se atingir um desejado fim, ou seja a relevação contabilística.

Por conseguinte, embora o registo sirva para a relevação contabi­lística, não se pode nem se deve afirmar que onde há registo há relevação contabilística, porque nem todo o registo satisfaz aos necessários requisitos desta.

Para que um registo satisfaça a tais requisitos é preciso, em primeiro lugar, que nele se conjugue a descrição cronológica com a quantitatização concretizada em números referidos a uma unidade monetária.

Em segundo lugar, faz-se mister que os registos sejam devidamente coordenados e enquadrados de maneira a darem-nos a conhecer não só as variações de valor que se produziram nas parcelas, do património, a que eles se refiram, e as suas causas, mas também os efeitos dessas variações sobre os primitivos valores dessas parcelas, ou seja, os valores novos que essas parcelas vão sucessivamente tomando após a ocorrência de cada uma das referidas variações .

De sorte que, para quem não fôr completamente leigo em assuntos de contabilidade, as considerações que venho de produzir bastarão para lhe fazer compreender que a "relevação" resulta de um conjunto de registos convenientemente coordenados e integrados para um fim determinado, fim este que é precisamente o conhecimento do valor de qualquer parcela do património (conta), num dado instante, e das causas que contribuíram para a sua emergência nesse mesmo instante.

Confundir, portanto, o registo com a relevação equivale evidentemente a tomar a parte pelo todo ou o sinal pela coisa significada, e é isto precisamente o que se verifica entre os meus levianos contraditores.

Mas, para que o registo possa ser realmente considerado como um processo de relevação, é necessário que, como acima se disse êle obedeça a

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condição absolutamente indispensável de conjugar em si a descrição cronológica com a quantitatização, condição esta que é muito importante para nos fazer compreender que também não há coincidência absoluta entre a relevação patrimonial e aquilo a que tecnicamente se dá o nome de escrituração comercial.

E isto porque a escrituração comercial, como a sua própria denominação nos faz sugerir, abrange todo o trabalho (ou o seu resultado) de escrever ou de fazer registos em livros de comércio, embora estes registos não obedeçam aos requisitos daqueles sobre que se apoia a relevação.

Assim, um indivíduo, que transcreve uma acta no livro respectivo, escritura, escreve ou regista, mas não faz relevação contabilística.

Também a não faz o empregado que escritura, regista ou assenta num Borrão as operações que diariamente se vão efectuando numa casa comercial, porque os registos ali feitos não põem em evidência as parcelas do património (contas) afectadas, por essas operações.

E até se pode afirmar que o técnico que escritura digràficamente o Diário geral não faz relevação contabilística propriamente dita, porque, embora os registos feitos neste livro ponham em relevo ou em evidência as parcelas do património (contas) que foram afectadas pelas diferentes operações realizadas, e nos mostrem já a orientação ou o sentido em que deverá ser feita a sua ulterior integração com outros registos concernentes às mesmas parcelas patrimoniais, o certo é que nos deixam na mais completa ignorância pelo que respeita ao conhecimento do efeito das referidas operações sobre essas parcelas, ou seja, o conhecimento dos valores novos que elas vão tomando à medida que as operações se vão realizando. E isto porque o Diário geral é apenas o órgão colector dos registos que terão de ser, em seguida, polarizados ou enquadrados nas diferentes contas a que eles dizem respeito, mediante regras ou leis próprias, para que nós fiquemos, então, perfeitamente habilitados a relacionar as causas com os efeitos e a chegar, portanto, a conclusões rigorosas e úteis à gestão dos negócios.

A relevação resultante dos registos feitos no Diário geral é, como se vê, uma relevação incompleta, precisamente porque é promíscua e, por conseguinte, desarticulada.

A relevação completa ou sistematizada só nos aparece naqueles livros em que integralmente aplica o método de relevação da conta, ou seja, nos Diários sistemáticos e nos Razões.

E, dito isto, vou rematar as minhas já longas considerações com as

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seguintes conclusões que constituem, em grande parte, uma síntese do que acima se disse:

1.° — Que a idea para cuja expressão proponho o termo "relevação" corresponde a uma realidade ou a um facto contabilístico absolutamente inegável;

2.° — Que essa realidade ou esse facto é inteiramente distinto dos factos expressos respectivamente pelos termos "registo" e "escrituração", porque, sendo mais amplo do que aquele é, no entanto, menos vasto do que este;

3.° — Que a ideas ou a factos distintos terão logicamente de corresponder denominações ou termos distintos, necessidade essa que se impõe tanto mais imperiosamente quanto é certo que a contabilidade é um ramo de conhecimento que pretende ser alguma coisa mais do que uma simples arte, porque já hoje é considerada como uma autêntica ciência;

4.° — Que essa necessidade há muito levou os tratadistas italianos a servir-se do termo rilevazione, a-pesar-de na língua italiana haver todos os termos equivalentes aos da nossa língua que os meus censores entendem que poderão continuar a substituí-lo com a mesma justeza e propriedade;

5.° — Que essa idea não é nova, mas, pelo contrário, tam velha que se perde na espessa poeira acumulada pelo rolar de muitos séculos, visto que a poderemos fazer remontar à própria origem da contabilidade sistemática;

6.° — Que nestas condições, é absolutamente impróprio exprimir essa idea pelos termos "registo" ou "escrituração comercial".

7° — Que, não podendo, portanto, por-se em dúvida a existência dessa idea, poderá, no entanto, duvidar-se da absoluta propriedade do termo "relevação" que eu proponho e uso há mais de uma dezena de anos, mas que nem sequer me atrevo a considerar como o mais próprio, visto que poderá haver outro que em mais alto grau possua tão desejada virtude e de que eu não tenha conhecimento;

8.° — Que não fazendo eu do termo que proponho uma questão fechada, estou inteiramente disposto a perfilhar esse outro termo, logo que êle me seja indicado.

In Revista de Contabilidade e Comércio. Ano III, n.° 11, Julho-Setembro (1935), p. 231-241.

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PALAVRAS E IDEAS

Reportando-nos, pois, ao artigo "L'Amortissement Bloque", em que Mr. Delaporte desenvolve o assunto com aquela elegância de estilo tam característica nos franceses e que não poucas vezes contribui para suprir neles, em grande parte, a pobreza das ideas expendidas, teremos de começar por nos determos um pouco na análise do termo "amortissement" que em português se costuma traduzir por "amortização". Diz Mr. Delaporte que a palavra "morte" (mort) está no têrmo "amortissement" e parece-me que a tal respeito não poderá haver duas opiniões.

Porém, a nossa opinião começa por divergir da sua no ponto em que êle afirma quê o termo "amortissement" cobre uma morte: morte de um empréstimo ou morte parcial ou total de uma imobilização (v. pág. 205)

E isto porque o nosso senso crítico nos diz que um empréstimo não morre natural e espontaneamente; não cai por si, exactamente como caem da árvore os figos depois de maduros, porque, se tal sucedesse, o pedir dinheiro emprestado seria um meio de enriquecer facilmente.

Não. Um empréstimo não morre; toma, pelo contrário, redobrado alento, se não houver o cuidado de pôr cobro ao seu contínuo crescimento.

Para que êle morra, pois, é necessário extingui-lo, é necessário liquidá-lo, é necessário matá-lo.

Esta noção é, aliás, tam corrente no nosso país.que já entrou nos próprios domínios da filosofia popular, visto que ela a consagrou e concretizou na seguinte sentença muito bem observada, por sinal: "os anos de vida, os juros de dívida e as soldadas dos criados correm de dia e de noite".

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De facto, os juros, que vão crescendo de instante para instante, tendem a avolumar o montante das dívidas a que êles digam respeito.

De sorte que uma dívida contraída por via de um empréstimo poder-se-á comparar com um incêndio que, se não houver o cuidado de debelar, de extinguir, de amortizar, de matar pouco a pouco, irá assumindo proporções cada vez mais avantajadas, podendo mesmo chegar a devorar todo o património da entidade devedora.

Por aqui se vê que o têrmo "amortissement" não cobre a morte de um empréstimo, como diz Mr. Delaporte, porque um empréstimo não morre de morte natural.

Um empréstimo extingue-se, liquida-se, mata-se lentamente, e é 'precisamente a esta operação de extinguir, de liquidar ou de matar progressivamente um empréstimo que se dá o nome de amortização (amortissement).

A amortização de um empréstimo é, em suma a própria morte, a morte gradual, desse mesmo empréstimo.

Ora a morte não pode servir de cobertura a si mesma, a não ser que ela fosse morte e ressurreição ao mesmo tempo, facto este que evidentemente sairia do acanhado domínio das possibilidades terrenas para entrar direitinho no domínio ilimitado da divina Providência.

E, dito isto, supomos que nada mais será preciso acrescentar para fazermos ver que a acepção, em que Mr. Delaporte pretende empregar o têrmo "amortissement", ou seja, a de cobrir uma morte, está em manifesta contradição com o seu significado etimológico que nos faz sugerir a idea da acção de "dar ou levar a morte ao empréstimo" ou, por outras palavras, a acção de o extinguir, de o liquidar, de o reembolsar.

Fica assim demonstrado que o significado etimológico do têrmo "amortissement" (amortização) corresponde ou traduz rigorosamente a realidade dos factos, quando — como dissemos —• se trate do reembolso gradual de um empréstimo, e que é, portanto, o têrmo cuja adopção está naturalmente indicada para este caso.

Mas o leitor vai já ter ocasião de ver que não é impunemente que num ramo de conhecimento — como a contabilidade — que já adquiriu foros de ciência, se fazem andar as palavras às bulhas com as próprias ideas que com elas se pretende exprimir, e que as nossas considerações, longe de lhe parecerem inúteis, por serem estéreis, terão pelo contrário, o grande condão de lhe fazerem compreender determinadas subtilezas em que a sua

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curiosidade possivelmente nunca o levou a reparar com verdadeiro cuidado e interesse.

Para tanto, nada mais lhe será preciso fazer do que fixar bem a noção de que a palavra amortização, etimologicamente considerada, significa a acção de dar a morte, de extinguir, de liquidar gradualmente, e que é esta a única acepção em que rigorosamente se deve tomar a referida palavra.

Uma vez bem assente esta noção, tratemos de seguir o raciocínio de Mr. Delaporte acerca daquilo a que êle chama "amortissement dans un sens particulier", ou seja, no caso da depreciação dos elementos do capital imobilizado (prédios, instalações, maquinaria, mobiliário, etc.), e procuremos averiguar se realmente, neste caso, estaremos ou não em face de qualquer coisa a que r igorosamente se possa dar o nome de "amortização" (amortissement).

Para isso, teremos de começar por atentar no facto evidente de que os elementos do capital imobilizado a que, por comodidade, passaremos a designar simplesmente por instrumentos, se depreciam, se gastam ou se consomem gradualmente por efeito da acção destruidora que sobre eles exerce o tempo e ainda por efeito do uso mais ou menos intenso que deles se faça, de sorte que, ao fim de um número de anos variável segundo a maior ou menor resistência dos referidos instrumentos, estes ficarão absolutamente incapazes de continuar a prestar serviços.

No momento em que tal aconteça a qualquer desses instrumentos, poder-se-á dizer que êle se encontra virtualmente morto.

Ora, se os instrumentos morrem por efeito das causas naturais, inerentes ao seu próprio destino, que acabamos de indicar, evidente se tornará, também, que não será preciso matá-los, liquidá-los ou extingui-los como sucede no caso de um empréstimo.

Pelo contrário, o que importa é fazer face à sucessiva decadência física, à morte, dos instrumentos, reintegrando-os periodicamente do valor da sua depreciação, o que praticamente nos conduzirá à possibilidade de os fazer ressurgir no momento em que eles sejam surpreendidos pela morte.

E, se à sucessiva decadência física dos instrumentos não se poderá dar o nome de "amortização" (amortissement), porque a presença deste termo implicaria necessariamente a idea de uma morte provocada, de um atentado premeditado, que, neste caso, terá de ser logicamente posta de parte, muito menos êle se poderá dar à operação que tem por fim fazer face à referida decadência, porque ela, como acabámos de ver, nos conduziria a uma ressurreição, ou seja, a um facto que está em manifesto antagonismo com o

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significado etimológico do termo em questão. Razão e muita razão teve, pois, Mr. G. Faure para pretender distinguir esta última operação da operação de amortização de um empréstimo, porque elas diferem muito na sua essência, a-pesar-de Mr. Delaporte declarar no artigo, a que vimos fazendo referência, "qu'il n'a jamais saisi exactement le but de cette distinction (v. pg. 206)". Somente Mr. G. Faure e outros autores, que se aperceberam bem de uma diferença que Mr. Delaporte ainda não conseguiu descortinar, não são lógicos, adoptando em ambos os casos o termo "amortissement" apenas modificado pelo adjectivo "financier", quando se trate de um empréstimo, e pelo adjectivo "industriei" ou "comptabel", quando se trate de fazer face à progressiva decadência ou depreciação dos instrumentos, para efeito de pôr em evidência a referida diferença.

Ora a lógica é uma condição absolutamente indispensável para se poder dar um carácter de seriedade e imprimir um cunho de elevação aos estudos em que estamos empenhados; e a boa lógica diz-nos que a operações distintas na sua essência deverão corresponder denominações distintas e suficientemente precisas para que as suas respectivas índoles fiquem convenientemente estremadas.

E se passarmos, agora, uma vista retrospectiva por sobre as considerações já feitas, nenhuma dificuldade teremos em reconhecer que, se "amortização" é o termo que mais convém à identificação da operação que tem por fim a liquidação ou o reembolso gradual de um empréstimo, o termo que, por outro lado, mais convirá à identificação da operação que tem por fim fazer face à sucessiva decadência física ou depreciação dos instrumentos será "reintegração".

A "reintegração" é, em suma, aquilo a que, por analogia, se poderá chamar, com bastante propriedade, o seguro de vida dos instrumentos, porque é ela que, de facto, cobre a sua morte, e não a "amortização", como afirma Mr. Delaporte, visto que esta é a própria morte provocada, é o assassinato enfim.

Por conseguinte, se é certo que a administração de uma empresa deverá ligar sempre o maior cuidado ao reembolso de um empréstimo, observando escrupulosamente todas as condições aceitas (amortização), também é igualmente certo que ela não deverá ser menos cuidadosa em fazer o seguro de vida dos seus instrumentos (reintegração), para que ela possa dispor dos fundos necessários à sua substituição, quando eles hajam atingido o limite máximo da sua duração.

E aqui têm os técnicos conservadores que se aferram aos termos

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empíricos com a mesma gana com que os náufragos se agarram à derradeira tábua de salvação, a razão de ser da presença de um novo termo (reintegração) para a expressão de uma idea velha, mas que tem andado erroneamente associada à idea contrária expressa pelo termo "amortização".

Cumpre-nos, porém, declarar que não fomos nós quem improvisou o termo "reintegração", porque, antes de o adoptarmos, já êle era empregado pelo distintíssimo tratadista italiano, Dr. Vincenzo Masi, e não sabemos se, antes deste, alguém mais dele se tenha utilizado.

Mas isso, para o caso, pouco importa; o que sobremaneira importa 'é frisar que, depois de madura reflexão', não tivemos a menor dúvida em perfilhá-lo, em virtude da manifesta impossibilidade, em que nos vimos, de encontrar outro que melhor se adaptasse à idea que com êle se pretendia exprimir.

Tôdas as considerações, que temos vindo produzindo, tendem a mostrar-nos que a "amortização" (amortissement dans son sens le plus général) e a "reintegração" (amortissement dans un sens particulier) são operações diferentes não só na sua essência, mas também — e o que é muito importante — nas suas consequências económicas, visto que a primeira se traduz normalmente por uma aplicação dos lucros líquidos da empresa, ao passo que a segunda apenas se comporta como um factor que contribui para a formação desses mesmos lucros.

Quer isto dizer, em suma, que as empresas fazem normalmente a amortização dos seus empréstimos a longo prazo (empréstimos por obrigações) à custa dos lucros líquidos auferidos durante os seus exercícios, depois de se lhes ter abatido, já se vê, o montante das reintegrações respectivas.

Lucro e reintegração são, pois, duas coisas ou dois factos económicos que não poderão coexistir ou justapor-se na medida da extensão desta, visto que a reintegração, diminuindo o lucro, corresponde rigorosamente a um prejuízo. Mas, como este prejuízo não se traduz por uma saída imediata de substância activa, Mr. Delaporte diz que esta substância deve ser um chiffre bloqué no activo (v. pág. 206).

De que ela deve ficar no activo não poderá restar a menor dúvida, e nisso estamos, portanto, de perfeito acordo.

Mas que êsse chiffre se deverá considerar como bloqué é que me parece um disparate que as considerações já feitas nos permitirão reconhecer.

Com efeito, sabendo-se, como já sabemos, que a reintegração é a substituição ou conversão gradual dos elementos do capital imobilizado em elementos do capital circulante (mobilisable), evidente se tornará, também,

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que o atributo de bloqué dado por Mr. Delaporte à substância da reintegração está em manifesta contradição com a índole circulante (mobilisable) da massa activa em que por virtude da própria reintegração, ela foi oportunamente incorporada, a não ser que se queira admitir a hipótese, aliás absurda, de uma coisa poder ser a negação de si mesma. Porque não há maneira de se poder apresentar em condições de ser aceite sem alguma relutância pelo nosso espírito o estado de bloqueio associado à idea de livre circulação.

De duas uma: ou a substância apresenta todas as características inerentes à matéria circulante e, neste caso, está naturalmente indicada a sua inclusão no capital circulante, ou não apresenta e terá, então, de ser dele logicamente excluída.

Só no caso especial de uma empresa se dispor a depositar num banco as importâncias correspondentes às cotas anuais de reintegração e a não levantar essas importâncias a não ser para lhes dar o destino devido, ou seja, para a substituição ou renovação dos instrumentos que tenham atingido o limite máximo da sua duração, é que se poderia dizer que tal substância se encontrava bloqueada por determinação administrativa.

Porém, reparando bem, reconhecer-se-á que nem mesmo, neste caso, o têrmo "bloqué" seria usado com absoluta propriedade, porque, para o ser, far-se-ia mister que o levantamento das importâncias depositadas estivesse dependente da autorização de uma entidade estranha, como sucede, por exemplo, com os depósitos dos valores afectos às reservas matemáticas efectuados pelas companhias seguradoras, circunstância esta que, impedindo-os de circular, acarreta naturalmente a obrigação de os excluir do capital circulante.

Mas a haver "amortissement bloqué" teria necessariamente de admitir-se a existência de um "amortissement" que o não fosse, diferente daquele portanto, para se poder justificar a necessidade do atributo «bloqué", ou de outro qualquer, como meio imprescindível de distinção.

Julgo, porém, que será muito difícil a Mr. Delaporte provar que há, de facto, uma outra espécie de "amortissement" com caracteres distintos dos do "bloqué".

E como todo o têrmo técnico deve corresponder a uma necessidade ou a um facto constatado pela técnica hodierna ou a uma idea que a informe, e, como essa necessidade não existe no caso em questão, nenhuma dúvida temos em afirmar que não há razão séria para a adopção do têrmo "bloqué" proposto por Mr. Delaporte, a não ser que ela se filie na estulta teimosia de se pretender adaptar a terminologia contabilística às circunstâncias críticas

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do momento que estamos atravessando e em que tanto se fala de guerra, de bloqueios, de bombardeamentos e de torpedeamentos.

De resto, os termos, como este, que tanto cheiram a motim, a distúrbio, a guerra e a gazes asfixiantes, em nada se coadunam com a índole pacífica e essencialmente metódica da contabilidade, porque esta é o próprio símbolo do equilíbrio, da ordem, do comedimento, da justiça e do bom senso.

E supomos que, em vez de se dizer, como diz Mr. Delaporte, qu'un amortissement effectué n'aura d'efficacité que'sil est bloqué dans l'actif (v. pág. 208), a lógica e a clareza lucrariam muito mais se se dissesse que o valor correspondente à reintegração deve estar integralmente incorporado no capital circulante, enquanto não fôr empregado no resgate (rachat) dos instrumentos reintegrados.

E até me quer parecer que deveria ter sido esta a idea de Mr. Delaporte, se ela tivesse conseguido transpor impunemente o bloqueio do termo com que êle pretendeu exprimi-la, tanto mais que se nos afigura que não passa de uma ingenuidade angelical da sua parte o supor que com a simples aposição do adjectivo "bloqué" ao termo amortissement fará com que a substância deste fique suficientemente entaipada no seio do activo, para que se torne absolutamente impossível a sua volatilização.

Finalmente, as considerações já feitas habilitar-nos-ão a dizer que é erróneo afirmar, como afirma Mr. Delaporte, que a substância correspondente à reintegração deve ser um quantum bloqueado no activo, aumentando o valor deste (v. última linha da pág. 206). E isto porque, sendo a reintegração, como já se disse, fundamentalmente a substituição gradual dos elementos do capital imobilizado por elementos do capital circulante, substituição essa que praticamente se traduz por uma sucessiva diminuição de valor dos primeiros e por um correlativo aumento de valor dos segundos, evidente se torna que o valor global do activo não sofrerá, com isso, a menor alteração.

Não é, pois, o activo que aumenta; o que aumenta, de facto é o capital circulante que é apenas uma parte, aliás muito importante, daquele, na qual se incorpora a substância da reintegração, ou seja, o valor novo destinado a substituir ou a compensar o valor extinto correspondente à deterioração anual dos instrumentos da empresa.

Sucede, porém, que na prática corrente nem sempre se registam as sucessivas deminuições de valor dos instrumentos, correspondentes à sua deterioração e já incorporadas no capital circulante, nas suas respectivas

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contas, de modo que, no fim de cada exercício, os saldos destas contas encontrar-se-ão indevidamente aumentados de uma importância igual à da referida deterioração, e daí resultará consequentemente um aumento do activo que é apenas "fictício".

Mas este aumento fictício acarretará, por sua vez, um correlativo aumento —igualmente fictício — da situação líquida adquirida e, como tal, denunciador de uma prosperidade que não corresponde à realidade dos factos.

Nestas condições, evidente se torna, também, que se este aumento fictício da situação líquida adquirida, fosse distribuído pelos proprietários da empresa, eles receberiam, não uma parcela dos lucros definitivamente adquiridos durante o exercício, mas sim uma parcela correspondente do capital próprio preexistente.

E é precisamente para evitar este facto altamente nocivo para a estabilidade da empresa, porque ocasionaria o seu gradual empobrecimento e, finalmente, a sua morte, que se retira da situação líquida adquirida a tal parcela fictícia, transferindo-a para a conta de Reintegração que nos surge, assim, como uma necessidade imprescindível de rectificar o erro, quando conscientemente cometido, de se haver feito figurar, no balanço, os instrumentos por um valor superior àquele que, na ocasião, realmente lhes competia, e que se poderá, portanto, considerar como uma conta de mera rectificação do balanço.

A esta modal idade de reintegração poder-se-á dar, com toda a propriedade, o nome de reintegração explícita para a distinguir de uma outra modalidade em que a depreciação dos instrumentos é directamente incorporada no valor de elementos do capital circulante, sem interferência, portanto, da conta de Reintegração, e a que, por isso, se poderá dar, por sua vez, o nome de reintegração implícita.

Isto equivale a dizer que a operação da reintegração se poderá levar a cabo por dois processos distintos, ao primeiro dos quais se poderá chamar processo indirecto e ao segundo processo directo, mas escusado será dizer que qualquer deles nos conduzirá precisamente ao mesmo resultado, ou seja, o de evitar que do capital circulante saia, sob a forma de lucros indevidamente distribuídos pelos sócios, importância correspondente à depreciação sofrida pelos instrumentos.

Ao primeiro desses processos poderemos fazer corresponder os lançamentos seguintes:

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No caso de a depreciação dos Instrumentos ser periodicamente incluída no preço de custo dos produtos a cujo fabrico, manutenção ou movimentação eles se destinem.

1° — EXPLORAÇÃO, PRODUTOS EM CURSO DE FABRICAÇÃO, MANUFACTURAS, ETC. (nas empresas industriais)

OU ARMAZÉM, FAZENDAS GERAIS, MERCADORIAS, etc. nas empresas comerciais

A REINTEGRAÇÃO DE (Imóveis, Instalações, Máquinas, Móveis e Utensílios, etc.)

Pela depreciação sofrida pelos durante o período considerado (ano, semestre, trimestre, mês, etc.)

No caso de a depreciação dos instrumentos não ser incluída no preço de custo dos produtos, mas sim deduzida dos lucros.

2° — LUCROS E PERDAS a REINTEGRAÇÃO DE (Imóveis, Instalações, Máquinas, Móveis e

Utensílios, etc.) Pela depreciação do durante o período considerado

3.° — REINTEGRAÇÃO DE (Imóveis, Instalações, Máquinas, M. e Utensílios, etc.).

a IMÓVEIS (Instalações, Móveis e Utensílios, etc.) A) Pela reintegração da depreciação sofrida pelos... ...durante...

(No caso de o lançamento se fazer no fim de cada per íodo administrativo, ou no fim de cada uma das suas fracções).

Ou: B) Pela reintegração do valor dos...

inutilizados e substituídos

(No caso de o lançamento se fazer pela totalidade do valor de cada instrumento ou grupo de instrumentos, à medida que estes forem sendo postos de parte e substituídos, que é justamente o caso mais geralmente seguido entre nós).

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No caso (B), os instrumentos figurarão no balanço pelo seu valor inicial durante todo o tempo que deles se faça uso; e, no caso (A), eles figurarão lá pela diferença entre o seu valor no momento inicial e a depreciação por eles sofrida desde esse aumento até à data a que o balanço se reportar.

Procuremos finalmente analisar aquela passagem do artigo em que Mr. Delaporte trata daqui lo a que êle chama "Representa t ion des Amortissements au Bilan" (v. pág 208).

Mr. Delaporte considera esta representação sob dois pontos de vista diferentes, a saber:

a) "Au point de vue de la Comptabilité (les comptes)"; b) "Au point de vue du Bilan (les valeurs)" Resta, porém, saber se Mr. Delaporte, com os seus dois pontos de

vista, estará ou não a confundir as imagens, ou antes, se êle estará ou não a ver duas coisas distintas, onde rigorosamente só deveria ver uma. De que esse exagero visual existe, de facto, não poderá restar a menor dúvida a quem quer que repare na incoerência flagrante em que cai Mr. Delaporte, considerando a reintegração (amortissement dans un sens particulier) primeiramente sob o ponto de vista da contabilidade e, depois, sob o ponto de vista do balanço, como se a contabilidade não fosse balanço e o balanço não fosse contabilidade.

Haverá, por ventura, alguém, por mais superficiais que sejam os seus conhecimentos de contabilidade, que seja capaz de afirmar que o balanço não é o precipitado de toda a contabilidade?

Responda a esta pergunta quem se sinta com coragem para o fazer. É certo que Mr. Delaporte dá uma explicação para o escandaloso

divórcio que êle, sem propósito interesseiro já se vê, resolveu impor à Contabilidade e ao Balanço, mas fá-lo de uma maneira tam pouco feliz que se poderá dizer afoitamente que é pior a emenda do que o soneto.

Essa explicação consiste em dar a perceber (entre parêntesis) que a Contabilidade é um conjunto de contas e que o Balanço é, pelo contrário, um conjunto de valores.

Mas esta explicação (entre parêntesis) levar-nos-á necessariamente a concluir que, na opinião de Mr. Delaporte, a contabilidade não se ocupa de valores, mas apenas de contas.

Todavia, no congresso nacional de contabilidade realizado em Angers durante o mês de Setembro de 1932, Mr. Delaporte foi o maior apologista da

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adopção da teoria positivista, cuja criação se deve ao esforço do talentoso logismólogo francês, J. Dumarchey, concretizado na sua obra intitulada "Théorie Positive de la Comptabilité" publicada em Lyon em 1914.

Nesta obra, Dumarchey começa por fazer uma longa e interessante dissertação acerca daquilo que se deverá entender pelo substractum ou objecto da contabilidade para concluir que o objecto desta é o "valor".

E, nesta conformidade, formula a sua definição de conta em que esta nos é apresentada como uma "classe de unidades de valor essencialmente variável no espaço e no tempo".

Não se explica, portanto, que Mr. Delaporte pretenda, agora, dissociar a contabilidade do balanço e imputar só a este aquilo que se não deverá regatear àquela, tanto mais que no referido congresso, êle defendeu aquele ponto de vista afirmando que "a explicação da contabilidade requere a simplicidade da realidade; e a realidade encontra-se nos valores das contos e não nas pessoas a que esses valores parecem querer referir-se. As contas de valores são elementos da nossa teoria (teoria positiva), na qual só há, pois, contas de movimentos de valores homogéneos, de troca e de diferentes naturezas, que no entanto, poderão possuir propriedades diversas."

Por conseguinte, se o conteúdo das contas é o valor e se, por outro lado, a contabilidade é um conjunto de contas, como Mr. Delaporte dá a entender, evidente se torna que o valor é o próprio substractum da contabilidade.

Não é, porém, com incoerências resultantes, muitas vezes, de uma flagrante contradição entre os termos e as ideas que se poderá fazer progredir a ciência da contabilidade.

A continuação de tais sofismas, pelo contrário, só servirá para a fazer recuar aos tempos, já volvidos, do metafisicismo clássico, e para dar, assim, ocasião a que alguém repita o estribilho de que a contabilidade é uma admirável mitologia, visto que, agora, como então, as palavras e as ideas continuam a aparecer-nos num compadrio esdrúxulo susceptível de nos causar tanta admiração como a vista inesperada do gato e do rato a comer no mesmo prato.

Porto, 8 de Outubro de 1935.

In Revista de Contabilidade e Comércio, Ano III, n° 12, Outubro-Dezembro (1935), p. 365-390.

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UM PROGRAMA

Há, ainda, um outro ponto a focar que reputamos da maior importância para a história do ensino elementar da contabilidade no nosso país, porque nos vai mostrar que esse ensino é hoje feito em moldes muito mais nefelibáticos do que no próprio momento em que êle aqui foi oficialmente introduzido.

Ora, este ensino começou a fazer-se, entre nós, na Aula de Comércio criada em Lisboa, no tempo do grande Marquês de Pombal, por alvará régio de 19 de Maio de 1759.

O primeiro professor (lente, assim se chamava ao tempo) de contabilidade neste estabelecimento de ensino foi João Henrique de Souza que baseou o seu curso nas obras dos t ra tadis tas franceses seus contemporâneos, especialmente na de De la Porte.

Mas quem se detiver a confrontar as lições de João Henrique de Souza com as obras dos referidos tratadistas será flagrantemente impressionado pela preocupação dominante do mestre em aperfeiçoar os conceitos daqueles.

Assim, por exemplo, os princípios que êle coloca na base da relevação do dinamismo patrimonial são muito mais lógicos e mais compreensivos do que os formulados pelos clássicos franceses em que êle se inspirou.

Podemos mesmo afirmar que eles só diferem dos modernos princípios similares nos termos em que se encontram redigidos, porque, de resto, as ideas que os informam são sensivelmente as mesmas.

Por aqui se vê que o mestre procurou integrar-se completamente nas suas funções de pedagogo, contribuindo para que a escola em que professava fosse um autêntico instrumento de progresso e não se limitasse ao mísero papel de andar a reboque da rotina da época.

Para isso, bastará atentar nos pontos mais salientes do curso feito por João Henrique de Souza em 1765, que se divide em duas partes distintas, na primeira das quais trata exclusivamente da contabilidade e, na segunda, do

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cálculo comercial. O programa da primeira parte (contabilidade) desenvolve-se nos

termos que vamos passar a relatar. O professor começa por dar o conceito de escritura dobrada (digrafia) e

por estabelecer a diferença entre esta e a escritura simples (unigrafia) para, em seguida, se ocupar dos livros de escrituração: da sua classificação, das suas funções e da sua importância.

Depois disto, trata da maneira por que os livros se devem escriturar, demorando-se principalmente no que respeita à escrituração do Diário geral.

Para isso, ocupa-se da formação e classificação das contas, das suas funções e da sua movimentação, ilustrando-as por meio de exemplos a que correspondem lançamentos de diferentes espécies.

Depois da escrituração do Diário, seguem-se as instruções para a escrituração do Razão.

Em seguida, expõe os métodos que poderão utilizar os mercadores de loja para terem as suas contas com clareza, reduzindo-os a dois métodos essenciais.

Depois disto, trata do Balanço. E, finalmente, trata das aplicações da escritura dobrada (digrafia) às

Companhias gerais, às Fábricas, às Casas dos fidalgos e às Administrações de negócios alheios.

Resumindo, agora, o programa acima exposto nas suas linhas gerais, obteremos o seguinte programa sintético:

1) Escrituração por partidas simples e dobradas;

2) Livros de escrituração: a) Sua classificação, b) Suas funções, c) Sua importância;

3) Escrituração dos livros: I) Escrituração dos livros originários; II) Escrituração do Diário geral:

a) Formação das contas b) Classificação das contas c) Movimentação das contas (diferentes modal idades de

lançamentos). III) Escrituração da Razão

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4) Sistemas de coordenação

5) Balanço

6) Aplicações da digrafia a diferentes espécies de organismos económicos.

Se se confrontar o elenco das matérias deste programa com o conteúdo do programa actualmente em vigor nas nossas escolas elementares e complementares de ensino técnico comercial, notar-se-á naquele uma preocupação de dar aos assuntos uma sequência metódica, uma directriz, um equilíbrio, em suma, que neste ninguém logrará descortinar.

Acolá os assuntos sucedem-se em obediência ao critério bem evidente de se pretender atingir a máxima eficiência pedagógica, ao passo que aqui os assuntos andam a jogar a cabra-cega uns com os outros, porque se sucedem sem nexo e sem lógica, em constantes atropelos e alternativas coreográficas que abonam muito pouco a solidez dos conhecimentos teóricos e a capacidade pedagógica de quem os relacionou.

Cometeríamos, porém, uma grande e indesculpável injustiça se não declarássemos aqui, da maneira mais peremptória, para que o leitor não fique a fazer da pedagogia da contabilidade nas nossas escolas elementares de ensino técnico comercial um juízo desfavorável, que neste ramo de ensino há professores muito distintos que orientam os seus cursos de uma maneira racional, passando assim por cima das enormidades e incongruências do programa em torno do qual vimos bordando as nossas considerações.

Alguns desses conhecemos nós, e, como esses, muitos outros professores deverá haver, por certo, que imprimirão aos seus cursos uma feição moderna, porque cingir-se ao programa equivaleria a fazer ensino confuso, tumultuário e, como tal, absolutamente ineficaz.

E isto porque — repetimos — o programa não é propriamente um programa de ensino na verdadeira acepção da palavra, mas um desajeitado montão de grelos, que nem sequer tem a quebrar-lhe a monotonia da côr verde o apetitoso ovo estrelado dos grelos à provinciana, naturalmente por ter sido feito por algum afiambrado janota da capital.

Porto, 15 de Janeiro de 1936.

In Revista de Contabilidade e Comércio. Ano IV, n° 13, Janeiro-Março (1936), p. 54-72.

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COUSAS E LOUSAS

Porém, antes de entrar no âmago da questão, é preciso que se diga que o nosso contraditar abusa da palavra método, pretendendo ver métodos diversos, onde só deveria ter visto dados diferentes.

E isto porque a Contabilidade tem o seu método próprio de relevação que é uno e se aplica em obediência a regras fixas que não poderão, portanto, variar ao sabor de cada um.

O que poderá variar são os critérios segundo os quais se poderão encarar os factos ao encontro dos quais o método terá de ir; mas é um erro imperdoável confundir a divergência de critérios com diversidade de métodos.

O método de relevação logismológica revela-se tecnicamente no acto de debitar uma conta e de creditar simultaneamente qualquer outra, e não se poderá afirmar que, quando um técnico debita ou credita indevidamente uma conta, êle esteja a seguir um método diferente do normal.

Quando tal acontece, o técnico comete muito simplesmente aquilo a que se chama um erro ou uma incoerência.

Por conseguinte, sempre que na relevação de um mesmo movimento patrimonial dois técnicos lhe atribuam incidências e reflexões diferentes, não se poderá concluir daí que esses técnicos seguem ou têm métodos diferentes; o que eles têm é pontos de vista diversos o que não é bem a mesma coisa. Mas, como a verdade é só uma, um deles ou até ambos poderão estar em erro, embora tanto um como o outro se julguem senhores da sua verdade e procurem impô-la reciprocamente.

Empregar, portanto, o termo quinhão para designar a parte do capital subscrita por cada um dos membros de uma sociedade em nome colectivo é, cremos nós, fazer dele um uso que está em manifesta contradição não só com o seu significado jurídico, mas também com a própria acepção em que êle é vulgarmente empregado para designar a parte ou cota resultante da

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divisão de um rendimento (produtos agrícolas, pescaria, utilização de águas para rega, etc.).

In Revista de Contabilidade e Comércio. Ano IV, n° 14, Abril-Junho (1936), p. 171-197.

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TENTATIVAS NOVAS POR CAMINHOS VELHOS

Se voltarmos, agora, ao conceito que do Activo e do Passivo nos dá a Escola de que nos estamos ocupando, e se repararmos bem nesse conceito, novos pontos de contradição nos surgirão como facilmente se poderá depreender das considerações que vamos fazer.

Com efeito, nós já vimos que esta Escola considera o Passivo como um conjunto de direitos de propriedade e o Activo como um aglomerado de bens ou de valores, entre os quais, claro está, poderão figurar, como normalmente figuram, os créditos que a empresa tem sobre terceiros.

Posto isto, ocorrerá perguntar muito naturalmente: Porque é que os créditos da empresa sobre terceiros são por esta

Escola, considerados como valores, no Activo, quando é certo que ela, por outro lado, considera como direitos, no Passivo, os créditos que terceiros têm sobre a mesma empresa?

Como explicar semelhante divergência de critérios em pontos cuja analogia é singularmente impressionante?

Terá, por ventura, à entrada, uma significação diferente daquela que tem, à saída, o dinheiro em que invariavelmente se traduzirá o crédito da empresa sobre um seu cliente e com o qual ela poderá, pagar um correspondente débito seu para com um terceiro?

Será, por ventura, o dinheiro que entra por via da cobrança de um crédito um valor de natureza específica diferente daquele que êle tem, quando com êle se extingue um débito assumido para com um fornecedor?

A estas perguntas responderemos afoitamente: não. Todavia, esta Escola, pela boca dos seus dois principais representantes,

afirma categoricamente que um valor só poderá ser activo, ou, por outras palavras, que no activo só poderão figurar valores e isto para poder ser coerente com os seus próprios conceitos fundamentais, quando afirma que

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o Passivo não poderá ser constituído por valores, mas unicamente por direitos. Para esta Escola um valor passivo é um verdadeiro contra-senso, porque

— afirma ela — admitir a sua existência equivaleria a admitir a existência do inverso ou do antónimo do valor, do desvalor, se assim nos fosse permitido exprimir-nos.

Porém, esta concepção é inteiramente errónea; e, para se ver que é, de facto, errónea, bastará atentar em que a satisfação de um débito para com um fornecedor em nada afecta a grandeza económica do património da empresa, porque a importância que terá de sair do Activo para ocorrer a essa satisfação tem uma contra partida prévia no valor das mercadorias que, por efeito do referido débito, nele haviam anteriormente entrado.

Um valor passivo só poderia ser, em suma, um desvalor ou uma inutilidade, como proclama esta Escola, se, de facto, êle não fosse a consequência lógica da obtenção de mercadorias ou de serviços num valor equivalente.

Por conseguinte, o atributo passivo não pode nem deve, em boa doutr ina, ser tomado como sinónimo de "inexistente", "contrár io", "antónimo" e quejandos, mas apenas para indicar uma tendência subtractiva, visto que um valor passivo é um valor que terá de sair ou de ser abatido ao Activo; mas este facto em nada lhe fará perder a sua qualidade de valor aos olhos daqueles que o hajam de pagar e que o queiram pagar.

Nem outra poderá ser, neste caso, a nossa atitude de espírito, porque pensar como pensa a Escola em questão equivaleria a dar inteira razão ao procedimento dos caloteiros, ou seja, daqueles que têm o mau hábito de não pagarem as suas dívidas, porque as consideram como verdadeiras inutilidades ou, antes, como verdadeiras prejudicialidades.

Porém, aqueles que possuem dividas e que têm o brio de as satisfazer pontualmente sabem, por experiência própria, que um débito é um valor, e um valor autêntico, porque a sua satisfação se traduz por um desembolso de dinheiro, cuja obtenção, muitas vezes, lhes faz suar as estopinhas.

De resto, se a .satisfação de uma divida se traduz sempre por uma saída de dinheiro, ou seja, de um valor autêntico, nenhum motivo poderá haver para que a sua expressão no Balanço se haja de considerar como um direito e não como o valor que, por força desse direito, se deverá entregar a outrem.

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;-».

Às vezes, em lugar do atributo passivo, também se utiliza o atributo negativo; mas a este termo não se deverá ligar o mesmo sentido que êle tem em álgebra, ou seja, para exprimir o contrário ou o inverso de "positivo".

Neste caso, o termo negativo é empregado numa acepção idêntica à de passivo para designar um valor que terá de ser subtraído ou abatido ao Activo.

Quere isto dizer que o termo negativo não deve ser aqui tomado na .acepção algébrica, mas sim na significação aritmética do sinal (-), de que esse valor é usualmente precedido na equação do Balanço.

E, procedendo assim, nenhuma ofensa grave se comete para com a sensibilidade dos puritanos da Contabilidade, porque, para efeito de cálculo ou de determinação da medida monetária do património, os valores passivos se comportam como quantidades negativas relativamente aos valores activos, de modo que dizer que essa medida é igual à diferença entre o valor do Activo e o valor do Passivo o mesmo é que dizer a soma algébrica dos valores destas duas massas patrimoniais.

Não deixamos, contudo, de reconhecer que se faz mister tomar certas precauções para que não sejamos induzidos em erro pelo abuso incontrolado da linguagem ou terminologia algébrica nos domínios da Contabilidade, porque esta não é uma ciência matemática, mas sim uma ciência sui generis, cujas soluções ou conceitos, embora em certos casos possam ser esclarecidos pela utilização de processos matemáticos.

In Revista de Contabilidade e Comércio, Ano IV, n° 15, Julho-Setembro (1936), p. 274-289.

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EST MODUS IN REBUS...

No penúltitmo número desta Revista demos uma idea geral dos conceitos que enformam a teoria da Escola patrimonialista francesa.

Hoje, é nosso propósito ocuparmo-nos da teoria positivista, cuja paternidade o conhecido logismólogo francês, Mr. René Delaporte, pretende reclamar para si.

Mas, para uma mais fácil fixação de ideas, visto que teremos de ser um pouco extenso, vamos começar por enumerar os pontos da sua teoria, sobre os quais principalmente terá de incidir a nossa critica, socorrendo-nos, para isso, de algumas das obras por êle publicadas, especialmente dos seus "Concepts raisonnes de la comptabilité", "La Comptabilité d'après les principes rationnels basés sur les mouvements des valeurs et les grandeurs arithmétiques", "Quelques idées sur la doctrine comptable", e de vários artigos insertos na revista francesa "Experta".

Nesta ordem de ideas, serão por nós sucessivamente abordados os tópicos seguintes:

1) — Denominação da teoria e seu fundamento; 2) — Conceito de Contabilidade; 3) — Objecto ou fundamento da Contabilidade: a) — Operação económica? b) — Património? c) — Contas? 4) — Movimento de valores; 5) — Balanço; 6) — Consequência da omissão da Situação líquida; 7) — Recapitulação; 8)— Conclusão. E, uma vez enumerados os pontos a abordar, passemos imediatamente

à sua análise.

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1) Denominação da teoria e seu fundamento.

Diz Mr. Delaporte que a sua teoria é positiva, parce qu'elle emploie des moyens scientifiques comptes +, comptes - .valeurs +, valeurs - jouent dans l'entreprise + sous des lois bien déterminées... et parce qu'elle rejette les fictions pour ne se fonder que sur les réalités (V. Experta, n.° 124, de Janeiro de 1935, pg. 20).

Como se depreende da leitura deste período, o autor faz assentar o positivismo da sua teoria na presença de contas, de valores e de leis bem determinadas.

Mas, a ser assim, teremos logicamente de concluir que a presença de contas, de valores e de leis não constitue o apanágio exclusivo da sua teoria, porque todas as teorias até hoje formuladas nos falam , mais ou menos claramente, de contas, de valores e de leis ou regras, e que, por conseguinte, todas elas são tam positivas como a teoria para a qual o autor pretende a primasia do referido atributo.

Pretender relacionar o positivismo de uma teoria logismológica com a presença de contas e de valores, quer estes sejam positivos ou negativos, e de leis ou regras, muitas vezes formuladas por via de raciocínios superficiais e ilógicos, é, cremos nós, ignorar a própria essência do positivismo.

E isto porque entendemos que uma teoria positiva, na verdadeira acepção da palavra, so poderá ser elaborada com o auxílio do método positivo, ou seja, daquele método que, partindo do simples para o complexo, nos permita formular ou estabelecer uma série de princípios ou de conhecimentos por tal forma interdependentes e encadeados que qualquer deles seja a consequência lógica do precedente e sirva de fundamento ou de explicação ao conhecimento subsequente, baseando-se, para isso, em dados fornecidos pela observação ou pela experiência.

Posto isto, ocorrerá preguntar: estará, de facto, a teoria positiva de Mr. Delaporte elaborada em estrita conformidade com o método positivo?

Temos sérias razões para duvidar de que o esteja, e talvez não nos seja muito difícil prová-lo, bastando-nos, para isso, apontar as flagrantes contradições em que o autor cai de instante para instante.

Para auspicioso começo, vamos transcrever o período que, na citada Revista, se segue imediatamente àquele a que atrás fizemos referência e que é concebido nos termos seguintes "Elle (la théorie positive) est cela dans sa généralité, mais elle peut exceptionnemement, et dans l'attente de réalités inconçues, adopter l'hypothèse et même la fiction pour s expliquer; c'est pourquoi nous

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admettons l'artifice de comptabilité appliqué à des cas spéciaux qui sortent de cette généralité.

Aproximando, portanto, estes dois períodos, fácil nos será concluir que o segundo é a negação do primeiro, visto que neste se afirma que a teoria positiva regeita as ficções para apenas se basear nas realidades, ao passo que naquele se admite a hipótese e a ficção para as suas explicações.

Chama-se a isto dar uma no cravo e outra na ferradura; e a teoria positiva de M. Delaporte ressente-se tam consideravelmente desta sua incerteza de mão que todo o seu positivismo não passa de uma simples bola de sabão que se desfaz de encontro a mais ténue corrente de ar.

Mas acresce ainda o seguinte. Muito antes de Mr. Delaporte haver dado à luz a sua teoria positiva,

já um seu compatriota e colega, Mr. Dumarchey, tinha elaborado uma teoria positiva da Contabilidade.

Por isso é que, quando o famigerado Congresso nacional de Conta­bilidade, reunido em Angers, em Setembro de 1932, aprovou a adopção da teoria positiva, ficámos com a impressão de que era a teoria positiva de Mr. Dumarchey que o dito Congresso tinha aprovado, porque não conhecíamos, então, outra teoria positiva que não fosse a de este ilustre autor.

Porém, a leitura dos artigos doutrinários publicados na revista francesa "Experta", no decurso dos anos de 1934 e 1935, por Mr. Delaporte e Mr. Lefort, fez-nos finalmente compreender o engano em que havíamos caído.

E até nos parece que, por uma questão de camaradagem e de lealdade para com o seu ilustre colega, Mr. Delaporte se deveria ter abstido de dar à sua teoria o mesmo atributo porque já era conhecida a desse seu colega, mesmo que esse atributo fosse realmente bem cabido e bem merecido, porque há confusões que em nada abonam a pureza dos intuitos de quem as pretenda provocar.

E, neste caso, não deve haver confusões possíveis, porque a teoria positiva de Mr. Dumarchey é realmente a primeira e, por enquanto, a única teoria positiva francesa que nós conhecemos.

Na elaboração da sua teoria Mr. Dumarchey seguiu, de facto, fielmente o método positivo. A prová-lo está a lógica, a clareza e o equilíbrio com que ela se encontra elaborada, e que contrastam de uma maneira tam flagrante com a desordem, a confusão e o desiquilibrio que se notam na teoria positiva de Mr. Delaporte, que está ao pé da daquele merece ser rigorosamente apelidada de teoria negativa, justamente porque está cheia das mais disparatadas nefelibatices, como iremos ter ocasião de provar. ..

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É preciso ver para crer; e a exposição das provas há-de acabar por levar a convicção ao espírito de quem nos seguir com suficiente paciência e atenção.

In Revista de Contabilidade e Comércio, Ano V, n° 17, Janeiro-Março (1937), P. 11-32.

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EST MODUS IN REBUS...

Ill

Nesta ordem de ideas, é muito vulgar dizer-se que esta ou aquela conta se movimentaram, quando é certo que, rigorosamente, se deveria dizer que tais contas foram afectadas por movimentos, porque as contas não se movimentam por si mesmas, mas sim por efeito da actuação que certas forças exercem sobre o património e que fazem com que alguns dos seus elementos — não todos — se desloquem e se transformem.

Quanto a nós, os pontos de vista que maior interesse poderão merecer para a classificação dos movimentos patrimoniais são os que se reportam às causas, ao local, ao tempo, aos seus efeitos sobre a estrutura do património, à sua composição e à sua correlação. Quanto às cansas que os originam, poderemos classificar os movimentos em normais e anormais, consoante eles derivarem da actuação normal ou anormal das forças propulsoras do património, devendo aqui entender-se por anormalidade uma sequência de factos imprevisíveis para a entidade directiva da empresa e por cujas consequências ela não poderá ser considerada responsável, desde que tenha tomado todas as providências inerentes à circunscrição dos seus efeitos.

Quanto ao local, poderemos dividir os movimentos patrimoniais em dois grupos distintos: o das mutações e o das permutações.

Por mutações dever-se-ão entender todos aqueles movimentos que se desenrolam no próprio seio da empresa, em virtude dos quais vários elementos patrimoniais, às vezes da natureza mais diversa, se transformam em elementos complexos de natureza idêntica, como, por exemplo, os movimentos relacionados com a fabricação de produtos.

Entram, por sua vez, na categoria das permutações todos aqueles movimentos que se desenrolam entre a empresa e o mundo exterior, tais

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como os concernentes a compras e vendas, recebimento de créditos, pagamento de débitos, saques, aceites, etc..

Quanto ao tempo, podê-los-êmos classificar em contínuos, como o desgaste produzido pelo tempo nos imóveis, nos móveis, nas ferramentas, etc., a formação dos juros, etc., e descontínuos ou intermitentes, como a compra e a venda de determinados produtos.

Quanto aos seus efeitos sobre a estrutura do património, podê-los-êmos classificar em qualitativos, quantitativos e mixtos, segundo eles se manifestem por uma simples mudança na qualidade dos elementos patrimoniais, mas sem que daí resulte a menor alteração no valor do património, como, por exemplo, o recebimento de um crédito; por uma alteração no valor do fundo patrimonial, como por exemplo a contagem de juros; ou simultaneamente por uma mudança na qualidade e alteração no valor do fundo patrimonial, como sucede nas vendas com lucro ou prejuízo.

Quanto à sua composição, podê-los-êmos classificar em simples e complexos.

Dizem-se simples, quando em cada um dos seus extremos apenas se encontra uma conta, como por exemplo, o saque ou o aceite de uma letra; e complexos, quando o movimento se bifurca e vai terminar em duas contas, ou começa em duas contas para terminar numa só.

Como exemplo do primeiro caso, poder-se-á citar o recebimento de um crédito simples, parte em dinheiro e parte em letra endossada pelo devedor. Para exemplo do segundo caso, poder-se-á citar o pagamento de um débito, parte em dinheiro e parte em cheque.

Os movimentos complexos poder-se-ão decompor sempre em dois movimentos simples que têm, no entanto, ou ponto de partida comum e pontos de chegada diversos, ou vice-versa.

Finalmente, quanto à sua correlação, podê-los-êmos classificar em principais e derivados. Dizem-se derivados os movimentos que são uma consequência directa de outros a que, por isso, se dá o nome de principais ou originários.

Para exemplo, poderemos citar uma venda de mercadorias com lucro. Neste caso, o movimento principal ou originário será o que se dá da conta de Mercadorias para a conta de Caixa; e o derivado será, pelo contrário, o que se dá daquela conta para a conta de Lucros e perdas.

In Revista de Contabilidade e Comércio. Ano V, n.° 19, Julho-Setembro (1937), p. 289-308.

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EST MODUS IN REBUS...

Porque é preciso que se diga, de uma maneira bem categórica, que não será fácil chegar á formulação de um princípio do qual seja possível deduzir um sistema de verdades verdadeiramente interdependentes e constituindo, como tal, uma doutrina informadora da técnica contabilística, sem que nós nos detenhamos a contemplar o património das empresas sob o duplo aspecto estático e dinâmico.

Ora, a experiência e a observação do dinamismo patrimonial fazem sugerir a qualquer espírito regularmente espevitado a seguinte verdade ou o seguinte princípio fundamental, aliás muito comezinho, tam comezinho que a sua enunciação não poderá deixar de despertar em muitos um sentimento análogo ao despertado pelo ovo de Colombo: «Toda e qualquer variação de valor ocorrida num elemento do património provoca Infalivelmente uma variação reflexa e igual noutro elemento ou componente».

Tal é, na sua empolgante singeleza, a verdade fundamental, a base ou o ponto de partida para a arquitectação da teoria e da técnica contabilísticas.

Foi precisamente para seguir sistematicamente a relação de causa e efeito, definida por este princípio basilar, que o técnico instintivamente foi forjando materiais e processos adequados; e, por outro lado, foi seguindo essa mesma relação até às suas mais remotas repercussões sobre a estrutura e consistência do património das empresas que o teórico conseguiu formular regras precisas para a aplicação desses processos e para a interpretação racional dos factos por eles interceptados e localizados.

In Revista de Contabilidade e Comércio. Ano V, n° 20, Outubro-Dezembro (1937), p. 349-374.

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EST MODUS IN REBUS...

X

Com efeito, a invasão do campo teórico da Contabilidade pelos práticos só tem contribuído para que o empirismo dos seus conceitos se tenha inveterado de uma maneira tam profunda que, quando aparece um revolucionador do quilate de Mr. Dumarchey, a sua obra é depreciativamente criticada precisamente naquilo em que ela fundamentalmente difere das dos seus predecessores e contemporâneos franceses, ou seja, na sua lógica cientificamente conduzida.

O que fundamentalmente distingue a obra de Mr. Dumarchey das dos seus colegas franceses não é o facto de os assuntos naquela e nestas versados serem diferentes, mas sim o rigor do seu método verdadeiramente positivo, mercê do qual os assuntos são logicamente apresentados, definidos e coordenados.

Mercê do método científico por êle adoptado, nota-se na sua obra uma sequência tam natural, tam lógica e tam sugestiva no tratamento das questões postas, que quem quer que esteja habituado à argumentação científica, e que haja lido a sua obra, ficará com mui pouca vontade de folhear obras, em cuja elaboração se nota uma ausência absoluta de atitude científica.

E, para que Mr. Dumarchey, que não é positivamente um prático, mas tam somente uma individualidade com cultura superior, produzisse a melhor obra que até hoje veio a lume em França, não foram precisos tantos anos como aqueles por que se estende a prática de Mr. Delaporte e da qual este tirou os materiais necessários à elaboração dos seus "Concepts raisonnes", "Méthode rationnelle" e outras de menor vulto.

E isto porque não basta ser-se versado numa.determinada técnica,

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para que se possa entrar triunfalmente nos domínios da teoria dessa técnica, sem outro título de recomendação que não seja o exercício efectivo e prolongado dessa mesma técnica.

; ■ » •

Os campos de acção do teórico e do técnico da Contabilidade são diferentes, e, como tais, requerem aptidões e atitudes de espírito diversas, que nem sempre se encontram reunidas no mesmo indivíduo.

E, felizmente, a Contabilidade já atingiu um grau de desenvolvimento suficientemente elevado, para que a necessidade da destrinça destes dois campos se imponha como uma condição indispensável para o seu futuro progredimento.

Teóricos e técnicos têm demasiado que fazer nos seus respectivos campos, para que se entreguem à pratica condenável de invadir o campo uns dos outros.

E o teórico da Contabilidade não é aquele que, embora amadurecido por uma longa e variada experiência e possuindo até, às vezes, uma boa cultura geral, se debruça por sobre a balaustrada daquilo a que se chama a realidade da prática para a observar nos seus mais pormenorizados detalhes, mas só consegue apreendê-la pelo seu lado exterior, pelas suas falsas aparências, e ter dela, portanto, um conhecimento superficial, imperfeito e inconsistente.

O teórico da Contabilidade é, pelo contrário, aquele que se debruça, sim, sobre a realidade da prática, mas que consegue surpreender essa realidade naquilo que ela tem de mais concreto, de mais verdadeiro e de mais convincente e tirar conclusões lógicas da relacionação dos factos por que ela se revela.

Para isso, precisa êle de possuir o dom de observar e raciocinar cientificamente, dom esse que se aperfeiçoará e desenvolverá com a cultura científica, quando fôr inato, e que até certo ponto se poderá criar, por efeito da dita cultura, no caso contrário.

A primeira condição do sucesso científico é saber observar: é possuir o dom da observação.

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A observação rigorosa é, pois, a condição que deve estar na base do método positivo.

Se ao estudioso faltar o dom da observação, só por acaso poderá chegar a conclusões verdadeiras.

Mas, para que a observação dê os resultados que dela é lícito esperar, será necessário adquirir primeiramente a consciência daquilo que se deve observar.

Por isso é que a determinação do objecto, sobre o qual terá que incidir a observação, adquire uma importância muito grande sob o ponto de vista científico.

Ora, Mr. Delaporte começou por atribuir à Contabilidade o objecto erróneo da operação económica, mas considerando-a como um movimento de geração espontânea, quando é certo que ela não é um facto espontâneo, mas sim o efeito da actuação de várias forças sobre um cosmos económico, um complexo de riqueza, a que se dá o nome de património, sem cuja presença a operação económica (compra-venda) não se poderá gerar, porque, sem êle, as referidas forças nada teriam sobre que actuar.

O estudo dessas forças (Estado, Tempo, Acaso, Oferta, Procura, Terra, etc.) não diz respeito à Contabilidade; é objecto de outras diciplinas.

O que à Contabilidade fundamentalmente interessa — visto ser esse o seu objecto — é o resultado da actuação dessas forças naturais e da actividade do sujeito, que procura coordenar essa actuação, sobre a composição, quantitativa, qualitativa e valorística do seu património.

É, em última análise, o património no movimento que essas forças e a acção coordenadora do homem (actividade administrativa) continuamente lhe imprimem.

Ora, tendo Mr. Delaporte escolhido, como escolheu uma base inconsistente para campo das suas observações, não é para admirar que todas as suas deduções se tenham ressentido tam fortemente da inconsistência dessa base, que nada há que se aproiveite na sua teoria positiva, a não ser as chocantes contradições e ficções de que ela se encontra repleta.

Tudo o que Mr. Delaporte aqui diz não constitue novidade nenhuma para aqueles que andem a par daquilo que, em França, se tem passado nos domínios da Contabilidade.

/ • • ■ /

Mercê da ausência de método científico, a sua teoria positiva apresenta-

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se como um precipi tado essencialmente amorfo, no qual se acham concentradas não só as contradições e ficções existentes nas teorias anteriores, mas também aquelas que o autor introduziu por sua própria conta.

Mr. Delaporte bem proclama, a pág. 8 do seu "Méthode Rationnelle", que "Elle (sa doctrine rationnelle des comptes) a cherché à être simple et vraie, s'efforçant de rattacher la comptabilité à la science universelle, suivant la loi de canse à effet dans notre entendement humain, rejetant toute métaphysique, toute fiction, et recherchant dans nos exposés à éviter toute confusion et aussi toute équivoque. C'est la réalité que nous avons voulu servir".

Mas, infelizmente, a sua demonstração ficou muito aquém daquilo que seria legítimo esperar de um autor que voltou ousadamente as costas ao passado para empreender a tarefa de edificar um futuro melhor sobre os alicerces do realismo da prática, porque o resultado desse empreendimento foi o aumento dos equívocos e da confusão existentes pela falta de lógica com que êle foi levado a cabo.

E se, por um lado, a consciência nos diz que seria injusto terminar a nossa crítica sem cumprirmos o gostoso dever de prestar homenagem às boas intenções de Mr. Delaporte — por reconhecermos que as suas intenções são realmente excelentes, quando diz "c'est la réalité que nous avons voulu servir" — por outro lado, ordena-nos que sintetizemos toda a nossa descrença perante os seus tam louváveis quam improfícuos esforços para nos apresentar a Contabilidade como uma ciência universal, como uma ciência que abrange o domínio de todas as outras, na seguinte frase latina: Est modus in rebus...

In Revista de Contabilidade e Comércio. Ano VIII, n° 29, Janeiro-Março (1940), p. 56-75.

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A CONTABILIDADE COMO BASE DE SUSTENTAÇÃO E PROPULSÃO

DA ACTIVIDADE ECONÓMICA

Voltemo-nos para qualquer grande obra moderna daquelas que temos aqui à mão — para qualquer das magestosas pontes construídas sobre o leito do nosso rio Douro —, para as quais tantas vezes temos olhado sem fazermos a nós mesmos o exame de consciência que a sua própria grandiosidade parece contrariar pelo sentimento de pasmo e estonteamento que em nós faz despertar, e depressa se focarão na retina do nosso espírito as imagens dos forjadores que deram forma às diferentes peças metálicas que constituem o seu esqueleto; as imagens dos montadores que realizaram a tarefa de ligar essas peças umas às outras de maneira a transformar o caos numa maravilha de arte, de harmonia e de beleza; as imagens dos desenhadores, empunhando réguas, esquadros, compassos, etc., que traçaram no papel, em escala reduzida, o esquema abstracto a que os obreiros precedentes deram realização concretamente satisfatória; e, finalmente, a imagem dos engenheiros que idealizaram a configuração da ponte e que calcularam matematicamente a resistência de todas as peças ou partes metálicas a empregar na construção.

Depressa nos aperceberemos de que para esta construção foi necessária a colaboração de muitos indivíduos com aptidões e preparações diversíssimas e a utilização dos mais variados materiais e dos mais engenhosos maquinismos.

Parecer-nos-á ouvir o roncar das forjas, o martelar dos malhos, o marulhar dos balancés, o cantar das serras, o sibilar das limas, o ciciar das brocas e o rodar das zorras.

Há, porém, um figurante —um obreiro—por cuja presença certamente

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nunca ninguém deu pelo facto de se tratar de um operário que não manejou nenhum dos barulhentos instrumentos que tiveram de ser utilizados para a realização da obra em referência, porque a sua tarefa não consistiu em afeiçoar materiais de construção, mas sim em exprimir em unidades de valor não só as diferentes quantidades desses materiais, mas também o trabalho de todos os membros do organismo operante e dos maquinismos por eles comandados, graças ao qual se tornou possível o próprio motivo da nossa admiração.

(■4,

E esse trabalhador silencioso, recatado e circunspecto, que quási propositadamente se coloca à margem dos acontecimentos para ter maior autoridade para os coligir, registar e interpretar, contribuindo, assim, para coordenar e dar maior eficiência ao esforço dos outros trabalhadores, foi o contabilista da empresa construtora.

Se, para a deslocação e afeiçoamento dos materiais, aos quais correspondem sempre movimentos económicos, foi necessário aos operários servir-se de maquinismos e utensílios adequados e complicados, o contabilista, para a representação desses movimentos, não precisou de outros meios que não fossem o papel, a tinta e a caneta ao serviço da sua inteligência.

A sua tarefa passa despercebida aos olhos dos vulgares mortais, porque ela não se concretiza em obras susceptíveis de impressionar e de atrair os olhares dos espectadores, porque é uma tarefa de puro raciocínio que os seus aproveitadores, longe de terem interesse em expor e divulgar, tratam, pelo contrário, de subtrair o mais possível às vistas de entendidos e profanos, contr ibuindo, assim, para que aquilo que é demasiado abstracto e assimptótico, por natureza, se torne ainda mais abstracto e mais assimptótico, por conveniência própria.

Se o orgulho dos outros trabalhadores reside na boa impressão que a sua obra possa causar naqueles que se detenham a observá-la, o orgulho do contabilista apenas poderá residir na convicção íntima de que os seus números traduzam a verdade dos factos ocorridos com absoluta fidelidade, embora essa verdade não tenha o condão de agradar àqueles que, muitas vezes, desejariam vê-la através de um prisma mais côr de rosa.

Se os outros trabalhadores se comprazem em despertar no observador uma sensação de encantamento pela beleza e perfeição da obra realizada, o contabilista não poderá aspirar a outro objectivo que não seja a satisfação da sua própria consciência pela verdade revelada.

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Mas havemos de convir em que o trabalho do contabilista, que contribue para que se consiga se mantenha a desejada harmonia e o indispensável equilíbrio na esfera de acção de todos os trabalhadores da empresa, tem uma importância que nem todos estão à altura de poder reconhecer-lhe, porque ela se prende mais com a vida íntima do organismo empresarial do que com as suas manifestações, digamos, exteriores, ou seja, com as realizações por êle operadas.

Só a Contabilidade nos permite desvendar os segredos dessa vida íntima, dessa energia económica que tem —no valor— o seu fluxo característico, e só ela também, na sua qualidade de medidora desse fluxo, é que nos poderá elucidar sobre o maior ou menor grau de eficiência do funcionamento dos diferentes órgãos integrados no todo ou complexo empresarial.

É por seu intermédio que se poderão corrigir os defeitos existentes na função de qualquer desses órgãos e manter, assim, em estado de perfeita salubridade todo o corpo da empresa a que ela seja aplicada.

O contabilista desempenha, pois, um papel importantíssimo na moderna organização económica e social, papel esse que as dificuldades económicas da hora que passa vão tornando cada vez mais evidente e mais convincente.

Porque não poderá haver organização verdadeiramente eficiente no mundo dos negócios, onde não haja uma contabilidade.racionalmente concebida e escrupulosamente aplicada.

Sem plano, sem método e sem ordem não será possível haver organização eficazmente produtiva, e a contabilidade é o intrumento que nos permite introduzir o ritmo e o equilíbrio na vida económica, porque é o próprio símbolo da ordem, do método e da actuação planificada.

Ela começou por ser modestamente a base de sustentação da empresa capitalística na sua fase inicial, na sua fase embrionária, para se converter num poderoso instrumento propulsor da sua expansão e assegurador da sua continuidade no espaço e no tempo, a-pesar da curta duração das pessoas que dela façam parte.

As pessoas da empresa mudam ou morrem, mas a empresa poderá prosseguir graças à sequência que a contabilidade permite imprimir às suas operações.

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Poder-se-á, pois, afirmar que foi a contabilida que permitiu à empresa capitalística passar da sua fase pessoal inicial para a sua fase anónima actual, porque ela contribuiu para que a sua vida se tomasse independente da vida das pessoas e para que a administração.económica revestisse, nos nossos dias, aquela feição impessoal ou objectiva que nós lhe conhecemos, e tanto mais objectiva quanto mais amplo e mais complexo fôr o seu domínio.

In Revista de Contabilidade e Comércio, Ano VII, n° 27, Julho-Setembro (1939), p. 272-282.

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PROGRESSO OU RETROCESSO"...

I

O método das Partidas Dobradas, diz o articulista, não é um método racional, um método científico, porque teima em manter as contas do Capital concreto (Activo) na companhia indesejável e nociva dessas enteadas sibilinas (contas da Situação líquida), que envenenam a atmosfera familiar com o seu comportamento escandaloso e sobejamente impertinente.

As Partidas Dobradas, enfim, não são um método científico, porque, na opinião do articulista, toda a sua compleição se ressente do artificialismo do equilíbrio indefinível: que elas obstinadamente procuram e em que não menos obstinadamente se mantêm.

Tirem-se às Partidas Dobradas as contas da Situação líquida e dos bens imateriais (Despesas do primeiro estabelecimento, organização, exploração, estudos técnicos, etc.) e chegar-se-á, diz o articulista a pág. 130, a um novo tipo de escrituração que não se poderá dizer simples nem dobrada, porque é apenas escrituração racional, isenta dos defeitos das outras.

Mas este tipo de escrituração, que o articulista pretende apresentar-nos como uma grande novidade, nada tem de novo; é pelo contrário, bastante velho, muito velho mesmo, muito mais velho do que o das Partidas Dobradas, pelo simples motivo de que êle representa justamente o tipo intermediário na transição das Partidas Simples, na sua forma mais rudimentar, para as Partidas Dobradas, que, a nosso ver, constituem o tipo acabado, o tipo perfeito, o tipo racional, o tipo verdadeiramente lógico dos métodos de escrituração justamente porque êle liga às contas da Situação líquida a mesma importância que êle atribue às contas do Activo e do Passivo, e, como tal, as mantêm todas dentro do mesmo quadro de relevação integral e numa correlação

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absolutamente idêntica àquela que se verifica na ocorrência dos factos que nelas se vêm polarizar.

Não foi, pois, sem um forte motivo que os técnicos de contas ultrapassaram a meta em que o articulista nos vem dizer, agora, que se deveria ter parado, e esse motivo dever-se-á filiar no impulso que os animava, de atingirem aquela perfeição ideal que eles não puderam encontrar no tipo de escrituração, cuja adopção o articulista tam acrisoladamente procura defender e inculcar.

Tanto assim é que a passagem do tal tipo intermédio preconizado pelo articulista, que não tem características bem definidas porque não é simples nem dobrado, para o tipo definido, racional e perfeito das Partidas Dobradas foi considerada como um acontecimento da mais transcendente importância, do qual adveio grande prestigio para Itália por ser neste país que tal passagem foi primeiramente operada numa altura que. deve remontar, pelo menos, ao século XIV.

Para a Itália convergiram, então, indivíduos das mais variadas e longínquas procedências, atraídos pela apregoada maravilha e excelência das Partidas Dobradas e an imados pelo desejo tam ardente de se familiarizarem com a sua complicada técnica como aquele que levou os Magos a empreender uma arriscadíssima e extenuante jornada para efeito de irem ver com os seus próprios olhos o Redentor do mundo que acabava de nascer no presépio de Belém.

Não foi, nem poderia ter sido pelo simples motivo de se familiarizarem com as manifestações caprichosas e malabarísticas do tal equilíbrio convencional, fictício e irracional das Partidas Dobradas, a que o articulista se refere que tantos estrangeiros abandonaram o seu país, os seus lares, a sua família e os seus amigos para tomarem o caminho da alta Itália. Não. Porque não foi também atrás desse equilíbrio indefinível e inexplicável que correu o técnico italiano que primeiramente empregou o método das Partidas Dobradas na sua forma definitiva; porque êle não poderia correr atrás de uma coisa de cuja probabilidade êle nem sequer suspeitava.

E isto é tanto mais verdadeiro quanto é certo que, mais de cinco séculos depois, há quem afirme que esse equilíbrio nenhuma razão tem de ser, porque não se baseia em nada de concreto, em nada de palpável, em nada de criteriosamente justificável.

No entanto, a explicação da maneira por que se chegou a esse equilíbrio, que nada tem de enigmático nem de subtil, surgirá natural e

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nitidamente ao espírito de quem haja atentado na evolução das preocupações que levaram o homem a volver a sua atenção para factos, cujo conhecimento entrava no domínio dos seus próprios interesses.

Ora, a história da Contabilidade ensina-nos que a preocupação que primeiramente assediou o espírito do comerciante dos tempos idos foi a de conhecer, na sucessão dos instantes, os motivos das suas dívidas activas e passivas e a extensão dessas mesmas dívidas.

Para alcançar tal conhecimento em termos de dar completa satisfação à sua preocupação, o homem viu-se na necessidade de descobrir um método que lhe permitisse dar-se conta não só das importâncias dos seus créditos e dos seus débitos para com terceiros, num dado instante, mas também das variações que elas fossem sofrendo de instante para instante, de maneira a poder justificar plenamente a legitimidade da sua formação e da sua sucessiva evolução.

E a preocupação de obter um conhecimento exacto e detalhado do estado dos seus créditos e dos seus débitos foi a primeira a apresentar-se à consideração do homem (comerciante) precisamente por se tratar de parcelas do seu património, cujo valor dependia de operações feitas a prazo com estranhos que poderiam discordar consciente ou inconscientemente da sua exactidão.

E assim surgiu a escrituração por Partidas Simples, no que ela tem de mais primitivo e de mais característico.

Sem dúvida, o que caracteriza este tipo de escrituração primitivo, que constitue o ponto de partida de uma sequência de esforços que haviam de culminar nas Partidas Dobradas, é o facto de êle assentar num sistema de representação patrimonial incompleto, porque apenas compreendia as contas representativas dos créditos e dos débitos para com terceiros, e de haver aqui uma perfeita correspondência entre o significado contabilístico dos termos Deve e Haver usados pelo método e o seu significado jurídico.

Mas nos negócios de certo vulto, o comerciante viu-se na necessidade de se rodear de auxiliares e intermediários e de fazer o controle dos valores confiados à sua guarda, necessidade essa que se foi tornando tanto mais premente, quanto mais extenso se foi tornando também o seu património e mais variada a sua composição.

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E, para isso nada mais lhe foi preciso fazer do que aplicar aos elementos concretos do seu património o mesmo método de relevação que êle havia concebido e aplicado à determinação da extensão das suas dívidas activas e passivas.

Por isso é que na relevação das contas desses elementos ainda hoje se nota a presença dos termos Deve e Haver nitidamente indicativos de relações entre pessoas, e por isso, também, é que começa a deixar de haver aquela coincidência que primitivamente existia entre o seu significado jurídico e o seu significado contabilístico.

E assim se passou da escrituração por Partidas Simples para aquele tipo de escrituração preconizado pelo articulista, que nem é Simples nem Dobrada, porque, estando a meio caminho entre as duas, é mais complexa do que a primeira, mas mais simples do que a segunda.

À medida que os técnicos de contas iam estendendo o método de relevação da conta por Deve e Haver a um número cada vez maior de elementos patrimoniais, mais se iam distanciando, também, da unigrafia na sua fase inicial para se aproximarem cada vez mais, da digrafia que, como e fácil de concluir, constitui a última etapa, a etapa definitiva, na evolução dos sistemas de representação patrimonial.

Esta última etapa só foi atingida, quando os técnicos de contas impulsionados, não por um simples capricho ou por um simples acaso, mas pela mesma preocupação que os levou a estender o

referido método de relevação a todos os elementos directos (activos e passivos) do patr imónio, submeteram à disciplina deste método os componentes derivados ou ideais (Capital social, reservas, e os diversos componentes de resultados), dando assim lugar a que surgisse a série das contas da Situação líquida.

In Revista de Contabilidade e Comércio, Ano VIII, n° 30, Abril-Junho (1939), p . 171-188.

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PROGRESSO OU RETROCESSO?...

II

Esta noção é muito importante; tam importante que a sua ausência leva muitos tratadistas à convicção de que é um erro o afirmar-se que as contas da Contabilidade se reportam a valores, visto que, para eles, os valores de conta são apenas as unidades monetárias que exprimem a medida dos elementos económicos; e não estes mesmos elementos considerados como bens ou componentes do capital concreto.

Segundo a nossa maneira de ver, quando dizemos que as contas se referem a valores ou encerram valores, não tomamos aqui a palavra valor no sentido de simples medida monetária dos elementos patrimoniais, mas sim no sentido objectivo dos próprios elementos a que esta medida se reporta.

Nesta ordem de ideas, todo o valor, ou seja, todo o elemento que possue valor é para nós um bem económico.

Por isso é que um prédio é para nós um valor porque é um bem económico; e, da mesma sorte, uma mercadoria, uma máquina, um utensílio, etc., são valores porque são bens económicos.

E, dito isto, já não será difícil de compreender, agora, a diferença que existe entre as expressões "Capital-valor" e "Valor do capital". Por "Capital-valor" ou "Capital-bens"; dever-se-á entender um conjunto de elementos económicos independentemente da medida monetária que lhe possa ser atribuída; e por "Valor do Capital" dever-se-á entender a medida monetária atribuída ao referido conjunto.

Daqui se conclue, pois, que a um mesmo "Capital-valor" ou "Capital-bens" podem ser atribuídos valores diversos, consoante o critério das entidades a quem haja de ser cometida a tarefa da sua avaliação ou medida monetária.

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E não é nesta medida, ou seja, na determinação do valor do capital que, em nossa opinião, se deverá procurar o verdadeiro objecto da Contabilidade.

O verdadeiro objecto da Contabilidade deve procurar-se e encontrar-se no estudo da evolução do conjunto dos elementos patr imoniais , devidamente avaliados ou expressos em unidades monetárias, porque os números representativos da sua avaliação ou medida monetária constituem o meio absolutamente indispensável, para que o referido estudo se faça em condições de nos poder proporcionar a maior soma de conhecimentos úteis.

Quer isto dizer, pois, que, embora a medida monetária atribuída aos diferentes elementos do património e que determina o seu valor, seja apenas uma consequência ou um efeito da presença ou existência desses elementos e não consti tua, por isso, o verdadeiro objecto ou fundamento da Contabilidade, esta não pode deixar de recorrer a essa medida para bem se desempenhar da delicada e importante tarefa de focar e estudar a evolução económica do complexo patrimonial no espaço e no tempo.

Mas, para nós, a substituição da noção de bem pela de valor tem ainda a vantagem de um rigor muito maior na delimitação do conteúdo das contas, visto que, se é verdade que todo o valor é um bem , outro tanto, porém, já se não poderá dizer da inversa, se se atender a que nem sempre um bem será necessariamente um valor. Com efeito, ninguém poderá afirmar, com verdade, que um bem livre (o ar, a luz solar, etc.) seja um valor; e, como não é um valor, também não pode constituir objecto das contas da Contabilidade. Porém, quando se encarem apenas os bens económicos, que são os únicos que poderão fazer parte do património dos indivíduos, poder-se-á notar a existência de uma perfeita sinonímia entre o termo bem e o termo valor no sentido em que aqui o empregamos, ou seja, para exprimir tudo aquilo que goza da propriedade de ter importância para nós pelo facto de nos ser útil e de estar na posse de alguém.

Por outro lado, quando se atenda ao aspecto qualitativo ou físico dos valores do património, não se poderá deixar de reconhecer que ao lado dos valores materiais, corpóreos ou concretos há quási sempre valores imateriais,

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incorpóreos ou abstractos. A noção de valor, nos primeiros, é-nos inculcada pelo elemento

material em si, ou seja, por aquilo que êle representa como objectivação de um esforço conscientemente exercido pelo homem sobre a matéria de que êle é constituído.

Essa noção é aqui, como se vê, qualquer coisa de absolutamente distinto e independente da medida monetária ou quantidade de moeda que lhe possa ser atribuída, seja qual fôr o critério de avaliação que para isso se adopte.

Nos segundos , pelo contrário, a noção de valor confunde-se vulgarmente com a medida monetária por que eles se achem expressos. É isto o que acontece, por exemplo, no caso de um crédito ou de um débito que, embora sob o ponto de vista da economia social se não possam considerar como elementos de riqueza ou bens económicos, têm, no entanto de ser como tal considerados na economia privada.

E aqui surge uma grande dificuldade para aqueles que, como o articulista, consideram o Capital concreto, o Capital-bens, como o objecto exclusivo da Contabilidade, porque, colocando eles os créditos entre os elementos do Capital concreto, não poderão furtar-se à objecção inevitável de que uma coisa abstracta, como é um crédito, nunca poderá fazer parte de um todo em cuja constituição só entram elementos concretos. Mas, como para todas as dificuldades se procura sempre uma saída ou uma explicação, é natural que também, neste caso, se procurasse encontrar uma saída adequada.

Toda a administração empresarial tem os olhos postos num resultado a conseguir com a movimentação de elementos patrimoniais; e, se é para ela da maior importância o conhecimento destes elementos, não lhe será de menos importância o conhecimento da extensão desse resultado e dos factos ou motivos que para ela contribuíram.

O conhecimento da extensão do resultado é fundamentalíssimo para a administração, porque o próprio objectivo que preside a constituição do património é a obtenção desse resultado e a sua distribuição; e, por sua vez, o conhecimento dos factos ou motivos que contribuem para a sua formação é igualmente importante, por ser êle que dá à administração a possibilidade de manobrar no sentido de conseguir o maior resultado possível.

E o Balanço estático de fim de exercício, na sua qualidade de síntese de toda a Contabilidade, terá de reflectir, do modo mais completo e mais compatível com a sua estrutura sintética, a realidade que a justifica e que

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lhe dá a importância que todos lhe reconhecem. Suprimir, pois, da Contabilidade dados ou factos (elementos imateriais

e factores dos resultados) que estão intimamente relacionados com o seu próprio objecto e com a sua finalidade específica de instrumento informador e orientador, como nos é inculcado pelo articulista, equivaleria a mutilar essa realidade e a sacrificar muito daquilo que o Balanço deve apresentar, por desconhecimento dos modos por que a sua apresentação terá de ser feita.

E, para evitar a supressão dos dados ou factos a que o articulista alude e conseguir simultaneamente que o Balanço apresente o Capital concreto nos termos que êle sugere, nenhum outro caminho há a seguir que não seja o da aplicação integral da metodologia das Partidas dobradas, visto que só ela nos permite criar uma categoria ou classe apropriada (Situação líquida potencial passiva) para a inclusão desses dados ou factos que, em sua opinião, não devem figurar no Activo.

É, portanto, para a metodologia integral que se deve caminhar, e que se está caminhando, e não para a metodologia truncada e esquelética apregoada pelo articulista, porque o caminhar para semelhante meta constituiria um evidente retrocesso. A primeira recolhe todos os dados que se relacionam com a administração do património das empresas, e tenham interesse para esta, para os apresentar em termos de ser por ela facilmente confrontados e apreciados num esquema único, onde há um lugar apropriado para cada um deles segundo as suas características especiais.

A segunda alija certos dados pela impossibilidade em que se encontra de lhes dar, no Balanço, um lugar que corresponda não só à sua própria essência, mas também ao efeito que eles possam ter sobre a extensão dos resultados da exploração

A primeira conduz-nos a soluções completas porque combina a suficiência do pormenor qualitativo com a precisão da informação valorística.

A segunda, pelo contrário, conduz-nos a soluções incompletas ou imperfeitas por serem acanhados e obsoletos os conceitos que a informam e obviamente improgressivas ou retrogradas as autoridades que a sustentam.

In Revista de Contabilidade e Comércio. Ano VIII, n° 31, Julho-Setembro (1940), p. 285-304.

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UMA OBRA QUE SE IMPÕE PELOS SEUS PRÓPRIOS MÉRITOS

Antes do aparecimento da "Théorie positive de la Comptabilité" do professor J. Dumarchey era vulgaríssimo ouvir-se falar, em França, da ciência das contas, visto que quási todos os tratadistas franceses se serviam do termo ciência para designar um aglomerado de dados empiricamente concebidos e, por conseguinte, absolutamente insusceptíveis de inserção num todo harmonicamente arquitectado, graças à ausência daquele espírito de análise cientifica que procura descobrir as analogias de coisas aparentemente diferentes.

Ora nenhum amontoado de matéria, diz Bacon, constitui por si mesmo uma ciência.

Do que a ciência precisa, afirma Bacon, é de filosofia, ou seja, da análise do método científico e da coordenação dos objectivos e resultados científicos, sem o que toda a ciência seria superficial.

E foi precisamente esta lacuna que a "Théorie positive de la Comptabilité" do professor J. Dumarchey veio preencher em grandíssima parte nos domínios da Contabilidade.

Foi a definição e a coordenação lógica dos dados, baseadas nas afinidades reveladas por uma investigação conduzida com espírito rigorosamente cientifico que levou à elaboração de um sistema de conceitos e de processos racionais, que deu à Contabilidade pela primeira vez, em França, uma indumentária verdadeiramente cientifica.

Antes de Dumarchey, predominava ali a tendência para encontrar e realçar diferenças que, muitas vezes, apenas serviam para pôr em evidência o talento anódino daqueles que conseguiram modificar ou acrescentar uma nova coluna aos esquemas de relevação e que viam nisto motivo bastante para um assinalado triunfo pessoal.

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Com Dumarchey surge, pelo contrário, a preocupação de descobrir as analogias susceptíveis de transformarem os fossos das diferenças em pontes de passagem para a constituição de um todo em que cada uma das partes tem o seu lugar bem determinado pelo grau de analogia e de dependência que ela apresenta relativamente às partes restantes.

Para isso, começou êle por analisar e definir a própria matéria ou objecto sobre que se deveria basear uma construção técnica racional operada pelo emprego de vários processos do método cientifico, especialmente a classificação e a seriação porque o emprego lógico destes dois processos pressupõe o conhecimento daquilo que se deve classificar e seriar.

Não queremos, com isto, dizer que antes de Dumarchey a classificação e a seriação não tivessem sido empregadas. Não.

A Contabilidade surgiu com a classificação e não se poderá, portanto, pensar em Contabilidade sem que concomitantemente a ideia da classificação aflore naturalmente ao nosso espírito.

Ao exprimirmo-nos assim, apenas queremos frisar que antes de Dumarchey a classificação, em França, não incidia sobre o seu verdadeiro objecto, considerado como substância primária susceptível de sofrer variações mais ou menos frequentes no espaço e no tempo, por efeito do movimento que lhe é imprimido por forças de natureza diversa que o homem precisa de aprender a bem coordenar para poder realizar os seus fins da maneira mais completa.

Incidia, pelo contrário, sobre estas variações dos elementos (valores patrimoniais) integrados no todo económico a que se dá o nome de património da empresa.

E é nisto que principalmente se revela a diferença entre a construção técnico-cientifica elaborada por Dumarchey e a construção técnico-empírica apresentada pelos seus predecessores franceses, que ainda hoje domina não só nas obras da grande maioria dos tratadistas contemporâneos, mas também nos círculos mais modestos dos técnicos de contas.

Antes de Dumarchey, o estudo da Contabilidade, em França, fazia-se de fora para dentro, da periferia para o centro ou, se se preferir, do vértice para a base; e, sendo assim, compreende-se que esta, por estar no extremo oposto, fosse aquilo que mais tardiamente se impôs à consideração dos que seguiram uma orientação que era ditada mais pela tentação das aparências ou das manifestações exteriores do que pelo raciocínio científico que procura descobrir as causas para destas descer aos respectivos efeitos.

Ora foi justamente este raciocínio construtivo que Dumarchey seguiu

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o que o levou a dar-nos, da conta, como fruto directo da classificação, um conceito muito diferente daquele em que ela era tida por todos os outros tratadistas franceses, para quem a conta não passava de uma denominação sob a qual se reuniam todas as transacções de uma mesma espécie, enquanto que, para Dumarchey, a conta é a própria matéria (valor patrimonial) que constitue o objecto das referidas transacções, visto êle no-la apresentar como uma classe ou categoria de unidades de valor essencialmente variável no espaço e no tempo.

Do confronto destes dois conceitos se conclue, logo, que a definição de conta dada pelos clássicos franceses foi elaborada com os olhos postos no método de que a Contabilidade normalmente se vem servindo para focar as variações que o seu verdadeiro objecto (valor patrimonial ou elemento patrimonial) vai sofrendo na sucessão dos instantes.

E, postas as coisas neste pé, o primeiro grande mérito da definição racional de conta apresentada por Dumarchey reside no facto de se haver separado definitivamente o verdadeiro objecto da conta do método de que a Contabilidade praticamente se serve para fazer a relevação das suas sucessivas variações de valor.

Por efeito desta nova concepção de conta, o âmbito da classificação, teoricamente, alarga-se de uma maneira quasi ilimitada, porque a sua criação deixa de obedecer ao estreito critério das transacções da empresa que são apenas um dos muitos motivos que fazem variar a extensão do seu objecto, para se filiar na existência deste mesmo objecto cuja extensão poderá variar em virtude de outras causas.

Praticamente, pois, a possibilidade de criar contas só poderá ter como limite o ponto para além do qual não seja conveniente levar a análise das variações que se produzam na composição qualitativa e quantitativa do património das empresas, na certeza, porém, de que a possibilidade e necessidade desta análise dependem menos das transacções do que da variedade e multiplicidade dos elementos que entrem na sua constituição. Por outro lado, por mais numerosas que possam ser as contas criadas por efeito do emprego do processo da classificação, o facto de elas serem vistas através do seu próprio conteúdo, sugerido pela denominação precisa que a cada uma delas se dá, permite-nos operar, na sua criação, por meio de gradações sucessivas e estabelecer assim a sua sequência lógica, partindo da unidade para a pluralidade ou da simplicidade para a complexidade e vice-versa, sem que pelo caminho se perca aquela solução de continuidade que é aqui assegurada pela presença de um substrato comum — o valor.

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Mas a existência de um número maior ou menor de parcelas assim obtidas pressupõe, por sua vez, a existência de um critério racional para o seu arranjo ou para a sua disposição atinente à representação do todo económico (património), de que elas são partes integrantes, nos termos precisos para que se possa ajuizar não só da sua estrutura qualitativa e quantitativa, mas também das condições de vida da empresa que sobre esse todo se baseie.

E dispor as parcelas ou contas representativas do património de uma empresa segundo um critério que permita chegar a conclusões apreciáveis para a administração da empresa é a tarefa que envolve a ideia da aplicação do processo de análise científica a que se dá o nome de seriação.

Neste capítulo, importa também dizer que não foi Dumarchey o introdutor deste processo, porque, já antes, outros autores o aplicaram nos domínios da Contabilidade; mas é preciso que se saiba quem foi Dumarchey o primeiro tratadista francês a empregá-lo com a intuição necessária para que dele se possam tirar todos os benefícios que êle é susceptível de proporcionar no que toca ao conhecimento da verdadeira situação da empresa em função da estrutura qualitativa e quantitativa do seu património.

Antes de Dumarchey, o processo da seriação foi empregado pela primeira vez em França, se não estamos em erro, por Eugène Léautey, na sua obra intitulada "La Science des Comptes", e este emprego foi então considerado como expediente de grande sucesso pela novidade de que se revestia.

Mas, como o critério ou ponto de vista a que obedecia a seriação das contas do dito autor era uma suposta ordem pela qual as contas surgiam no sistema de representação, sem a menor preocupação de distinguir as zonas do Balanço a que elas pertenciam, a seriação assim obtida não só não tinha interesse sob o ponto de vista prático, porque não nos permitia chegar a qualquer conclusão útil para fins administrat ivos, mas também não apresentava o menor valor sob o ponto de vista técnico por não corresponder a qualquer realidade que tivesse a confirmá-la a sanção da experiência adquirida.

Com Dumarchey, a seriação não é feita em subordinação a um único ponto de vista directivo, como era com o autor precedente, mas sim em obediência a três pontos de vista diferentes, consoante se trate de contas do Activo, do Passivo e da Situação Líquida, cada um dos quais não é o fruto de uma quimérica fantasia de espírito, mas, pelo contrário, a encarnação mesma de uma rea l idade que se impõe à nossa observação pela

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incontestabilidade da sua existência. Com efeito, não se pode contestar que todos os elementos do Activo

apresentam a tendência comum para se converterem em dinheiro, embora nem todos eles ofereçam idêntica possibilidade de conversão.

E, sendo assim, a disposição das contas do Activo segundo o ponto de vista do grau de possibilidade da sua conversão em dinheiro ou da sua realização é uma seriação racional que tem o grande mérito de nos dar a conhecer o volume do fundo de maneio de qualquer empresa num dado momento e de nos habilitar a prever com bastante segurança o seu volume provável numa data ulterior.

Também não se pode contestar que as dividas da empresa não são todas exigíveis na mesma altura e que o conhecimento das datas exactas ou aproximadas do vencimento dessas dividas é um elemento de informação que a Contabilidade pode e deve fornecer normalmente, porque se trata aqui, igualmente, de uma realidade (embora nem sempre agradável) e não de uma ficção.

Seriar, portanto, as contas representativas das dívidas da empresa — contas do Passivo — segundo a ordem de exigibilidade do seu conteúdo é contribuir para colocar diante dos nossos olhos as necessidades da empresa pelo que respeita aos fundos necessários para a satisfação oportuna dos seus compromissos.

E o confronto destas necessidades com o volume do fundo de maneio, cujo conhecimento nos é dado, como há pouco se viu, pela seriação das contas do Activo, habilita-nos, por sua vez, a fazer um juízo sobre a situação financeira da empresa.

Finalmente, é igualmente incontestável que o objectivo principal da empresa capitalistica é a consecução de um acréscimo de riqueza por efeito da movimentação de uma riqueza preexistente por ela inicialmente reunida.

Este acréscimo é determinado por períodos que têm usualmente a duração de um ano, nada obstando, porém, a que a sua análise se faça a intervalos mais curtos, o que equivale a dizer que a sua formação é uma função do factor tempo.

Dispondo, portanto, as diversas contas da Situação líquida pela ordem cronológica da sua formação ficaremos habilitados a confrontar o ponto de partida (Capital social) com a distância percorrida (Reservas constituídas e

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Resultados adquiridos) e a fazer uma ideia da marcha económica da empresa. Conjugando, agora, as três ordens de conhecimentos obtidos através

da seriação das contas das três massas patrimoniais — Activo, Passivo e Situação líquida — ficaremos assim em condições de fazer um juízo seguro àcêrca da situação da empresa sob o ponto de vista económico e financeiro, de uma maneira geral, sem contar, claro está, com outras indicações apreciáveis para a sua administração, que o estudo das relações entre determinados grupos de contas assim seriadas normalmente fornece.

É preciso, porém, que se diga que alguns tratadistas modernos, antes de Dumarchey, já faziam a seriação das contas do Activo em subordinação ao ponto de vista da possibilidade de realização dos valores nelas incluídos em três escalões que eram geralmente apresentados sob as denominações de: Disponível, Realizável e Imobilizado. Mas ainda não tinham estendido o processo da seriação nem às contas do Passivo, nem às contas da Situação líquida, embora não seja nada para admirar esta ausência de seriação entre eles pelo motivo muito simples de ser Dumarchey o primeiro tratadista francês, pelo menos de todos os que conhecemos, a fazer a destrinça entre Passivo e Situação líquida na representação contabilística, visto que a última destas duas massas patrimoniais era geralmente, mas indevidamente, incluída na primeira.

E é justamente nesta destrinça e, sobretudo, na classificação do Balanço em géneros, espécies e variedades por efeito da seriação das Contas da Situação líquida que reside a verdadeira originalidade da teoria positiva de Dumarchey.

Em toda essa teoria se nota a atraente beleza própria da aplicação do método científico ao estudo da Contabilidade que, antes, se encontrava eivado, em França, de uma orientação toda impregnada daquele empirismo ou, melhor d izendo, daquele mist icismo assimptót ico em que ela teoricamente vinha vegetando há uns poucos de séculos.

In Revista de Contabilidade e Comércio. Ano IX, n° 36, Outubro-Dezembro (1941), P. 419-426.

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JAIME LOPES AMORIM E EU: A NOSSA POLÉMICA

Camilo Cimourdain de Oliveira*

Conheci o Prof. Jaime Lopes Amorim em 1931, altura em que me matriculei no Io ano do há muito extinto Instituto Superior de Comércio do Porto.

Convém recordar que, nessa época, o ensino superior das ciências económicas e financeiras era ministrado nos Institutos Superiores de Comércio de Lisboa e do Porto e obedecia ao estabelecido no respectivo regulamento comum, aprovado pelo Decreto n° 14.291, de 14 de Setembro de 1927.

Em 27 de Outubro de 1931, pelo Decreto n° 20.440, são extintos os dois referidos Institutos Superiores de Comércio e é criado, em Lisboa, o Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras, ficando, assim, privado o Norte do País do ensino universitário destas matérias, situação que se manteve até a criação, em 28 de Maio de 1953, da Faculdade de Economia do Porto. Acrescente-se, porém, que o Instituto Superior de Comércio do Porto continuou funcionando em regime de período transitório até o fim do ano lectivo de 1935/36, para que os alunos nele então matriculados pudessem terminar as suas licenciaturas.

Por altura da sua extinção, já o quadro dos seus professores catedráticos estava muito desfalcado. Talvez porque já superiormente se pensava na sua extinção, há muito que as vagas existentes não eram preenchidas — daqui resultando que as regências de aulas teóricas de muitas

* O Prof. Doutor Camilo Cimourdain de Oliveira é actualmente Vice-Reitor da Universidade Portucalense e Director e Professor do Departamento de Gestão.

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cadeiras estavam confiadas a professores-assistentes; e esse era o caso, entre outros, do Prof. Lopes Amorim, que tinha a categoria de assistente e a quem estavam entregues as regências de Contabilidade Geral (do 3o ano) e de Contabilidade Industrial (do 4o ano). Daí que o Prof. Lopes Amorim só no ano lectivo de 1933/34 viesse a ser meu professor.

Por agora, limitar-me-ei a dizer que era um excelente expositor, muito competente e muito claro, mas, também, muito avaro em notas: eu fui o seu melhor aluno desse ano e obtive apenas 16 valores — a mais baixa nota de toda a minha licenciatura... No ano seguinte, em Contabilidade Industrial, foi um pouco mais generoso e "deu-me" 17...

Em Maio de 1935, termino a licenciatura em Ciências Económicas e Financeiras, nas Secções Aduaneira, de Finanças e de Administração Comercial. Faço concurso para professor provisório do ensino técnico e, em Novembro desse ano, sou colocado no Porto, na Escola Comercial Mousinho da Silveira, onde fiz uma passagem meteórica, visto que — tendo-se aberto uma vaga de assistente no então Instituto Comercial do Porto — hoje Instituto Superior de Contabilidade e Administração, ainda, por sinal, a funcionar no mesmo edifício da Rua de Entreparedes —, fui pelo respectivo Conselho Escolar convidado a preenchê-la. E aceitei — tendo, portanto, de deixar o lugar de professor do ensino técnico, por não ser permitida a acumulação.

Aliás, neste ano lectivo de 1935/36, à minha actividade de assistente do Instituto Comercial do Porto juntava-se a de aluno do Instituto Superior, pois me faltava terminar a Secção Diplomática e Consular.

Os leitores vão já perceber por que estou a falar de mim... Ora, apesar de eu ter ingressado no Instituto Comercial como assistente

do grupo das Químicas (matéria que, então, estudávamos nos Institutos Superiores de Comércio durante três ou quatro anos), além de práticas de Química, também me foram distribuídas aulas práticas de Cálculo Financeiro e de Contabilidade Bancária.

Este — o meu itinerário. Agora, o do Prof. Lopes Amorim. O Decreto que extinguiu os Institutos Superiores de Comércio de

Lisboa e do Porto garantiu aos docentes deste último a sua colocação no Instituto Comercial do Porto com as categorias que tinham no Instituto Superior — do que resultou que alguns docentes, entre os quais Lopes Amorim, que no Instituto Superior tinham funções de professores mas categorias de assistentes, passaram a ter, no Instituto Comercial, meras funções de assistentes.(1)

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E, assim, nos anos lectivos de 36/37, 37/38 e (parte de) 38/39,(2) o Prof. Lopes Amorim e eu éramos assistentes de cadeiras do grupo das Contabilidades.

Havia no último andar do já referido edifício de Entreparedes uma sala muito comprida (de há muitos anos dividida em duas) que ocupava toda a ala poente do prédio; e, nessa sala, tínhamos, o Prof. Amorim e eu, aulas práticas de Contabilidade, ao mesmo tempo: os alunos do Prof. Lopes Amorim ocupavam as mesas de um extremo da sala e os meus as do outro extremo. E, nós, conversávamos sensivelmente a meio da sala, nos intervalos em que não estávamos sendo solicitados por perguntas dos alunos, ocupados com a realização dos exercícios ou com a confecção das monografias.

Foi nessa situação que melhor conheci o Prof. Lopes Amorim. Não só a sua invulgar cultura — que estava longe de limitar-se ao âmbito da Contabilidade ou, mesmo, das Ciências Económicas e Financeiras, alastrando-se à História, à Filosofia, ao Direito, às Matemáticas e a tantos outros ramos do conhecimento —, mas também o seu afável trato e a simpatia que emanava do seu relacionamento com o seu semelhante.

A sua palavra era sempre calma, moderada, serena — no tom e na essência. Ou, como agora diriam os contabilistas: na substância e na forma — sem predominância de uma sobre a outra... Nunca, naquela sala, ou na sala dos professores, ou noutras circunstâncias, lhe ouvi levantar a voz ou o vi mostrar-se irritado. Nunca — nem mesmo quando...

... naquela sala comprida, em certa ocasião lhe anunciei pessoalmente, em conversa casual, que iria escrever um artiguito para a Revista de Contabilidade e Comércio*3', sobre a posição das reintegrações no mapa de balanço, pois entendia que tais contas não poderiam ter acolhimento na situação líquida (activa, é claro), posição em que o Prof. Lopes Amorim as colocava.

Não alterou a sua voz, meneou quase imperceptivelmente a cabeça,

(1) Outros docentes nas mesmas condições foram, por exemplo, o Dr. Jacinto Moniz Travassos, das Matemáticas, e, das Químicas, os Drs. Marques Dias e Eduardo Severo Maia de Medina.

(2) Em Janeiro de 1939, deixo o meu cargo de assistente do Instituto Comercial do Porto por ter sido aprovado, em Io lugar, em concurso público (eu tinha-me licenciado com a raríssima média final de 17 valores), para uma vaga de Sub-Inspector Contabilista da Inspecção-Geral de Finanças, do Ministério das Finanças, a que só podiam concorrer licenciados em Ciências Económicas e Financeiras com as quatro Secções.

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n ã o disse que s im n e m que n ã o , n e m modif icou, a par t i r daí , o nosso t ra to , que con t inuou como antes .

O art igo sai — p o r sinal bas tan te ma is tarde: e m 1941, n o n° 36 da Revista — q u a n d o , c o m o o leitor já sabe, eu já t inha de ixado o Ins t i tu to Comercial e era, então , Sub-Inspector Contabi l is ta da Inspecção-Geral de Finanças. Sai p rec i samente com o t í tulo "A posição das re integrações n o m a p a analít ico de ba lanço" . E abre desta maneira: '4 '

"Como claramente indica a epígrafe deste ligeiro trabalho, vou ocupar-me d o prob lema, m u i t o impor t an t e , da posição, n o m a p a de ba lanço, das verbas que t r a d u z e m as re in tegrações dos e lementos d o capital imobi l izado das empresas económicas , verbas essas que , como se sabe, n ã o r ep re sen tam senão a correcção d u m activo p r o p o s i t a d a m e n t e h iper -ava l iado . Porém, a necess idade d e da r certa clareza e a l g u m m é t o d o à exposição que se segue,

1 Aliás, eu andava há muito a ser solicitado para dar colaboração àquela Revista pelo seu Director de então (grande Director! — para quem vão as minhas sentidas e saudosas homenagens), o meu, depois, muito querido Amigo, Senhor José Henriques Garcia, que, apesar de mais velho do que eu, tinha sido meu aluno no referido Instituto Comercial, porém — pasme-se! — não de Contabilidade, mas de... Química!

(4) Manterei, quer nas transcrições dos meus escritos de então, quer nas dos do Prof. Amorim, a ortografia e a terminologia que nessa altura usámos. O leitor não deverá, portanto, ocupar-se em encontrar divergências com as actuais: é óbvio que hoje, passado mais de meio século, um e outro, alguma coisa alteraríamos — não no essencial, mas no formal. Não podendo, porém, fazê-lo o Prof. Amorim quanto aos seus escritos, não me pareceu leal fazê-lo eu quanto aos meus.

Por outro lado, quero deixar desde já uma informação aos leitores. E é esta: foi inicialmente pensado pelos organizadores desta publicação transcrever neste volume toda a polémica produzida entre o Prof. Amorim e eu — o que seria o ideal. Verificou-se, porém, que tal seria financeiramente incomportável. Terei, portanto, de reduzir os nossos escritos — os do Prof. Amorim e os meus — aos passos essenciais. Todavia, se isto é fácil quanto aos meus, torna-se muito espinhoso e delicado quanto aos do Prof. Amorim. E isto fundamentalmente por duas razões: Ia) porque o Prof. Amorim é invulgarmente prolixo nos seus artigos, baralhando os assuntos, procurando estabelecer confusões, gastando páginas e páginas com matérias que não estão em discussão — e com as quais ele, eu e toda a gente está de acordo, mas que ele trata como se estivesse argumentando com alguém que afirmasse o contrário, talvez com o objectivo de desviar o leitor da verdadeira discussão, enveredando, como hoje se diria, por uma manobra de diversão...; 2a) porque, sendo eu a seleccionar os passos a transcrever, corro o risco de me acusarem de deixar de reproduzir passagens essenciais dos seus artigos — o que, desde já o garanto aos meus leitores, não acontecerá.

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obriga a tratar, como que em entróito, da noção de reintegração e da necessidade da sua consideração nos registos contabilísticos das empresas — questões batidíssimas e cujos resultados são já incontrovertíveis, mas cujo tratamento aqui, motivos de ordem metodológica, repito, impõem.

Antes, portanto, de enfrentar propriamente o problema fundamental que me ocupa neste momento, tratarei, tam resumidamente quanto possível, da noção de reintegração e da necessidade de a registar na contabilidade das empresas."

E, depois de cumprido o prometido neste último parágrafo, o que fiz em cerca de nove páginas da Revista, entrei propriamente no tema que me havia proposto: a posição das reintegrações no balanço.

E escrevi:

"(...) passo a focar propriamente a questão da representação das respectivas verbas no mapa analítico de balanço. Nesta parte vou afastar-me por completo dos critérios que têm sido adoptados, e que, sem dúvida, necessitam ser substituídos por outros, de modo a evitar erros graves que se têm vindo cometendo.

Comecemos, pois. Admitamos que determinada empresa continua, como entendo

preferível, mantendo sucessivamente no activo os elementos do capital imobilizado pelo seu valor inicial. Neste caso, torna-se necessário, como se disse, criar as correspondentes contas de reintegrações, a colocar no lado do passivo, rectificando, assim, um activo propositadamente hiper-avaliado.

O Prof. Dr. Jaime Lopes Amorim — que tive a sorte de ter como meu Mestre de Contabilidade —, sem dúvida o mais ilustre logismólogo português, chama ao conjunto das contas de reintegração, situação líquida rectificativa e, como tal, integra esta massa patrimonial na situação líquida, ao lado da situação líquida inicial (capital e reservas) e da situação líquida adquirida (resultados do exercício).

De qualquer forma, terei de correr aquele risco, embora eu fique com a consciência de que transcreverei tudo o que entenda ser essencial. E, por outro lado, procurarei dar ao Prof. Lopes Amorim pelo menos tanto "tempo de antena" (expressão impossível há cinquenta anos...) quanto o por mim utilizado.

A finalizar esta nota, um conselho: os leitores interessados nesta polémica farão bem em consultar os nos. 36 a 41 da Revista de Contabilidade e Comércio.

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Que o distinto Prof, desculpe a irreverência, mas afasto-me, neste ponto, da sua opinião. Para mim, a situação rectificativa (note-se que lhe não chamo situação líquida rectificativa; a expressão "situação rectificativa", tout court, serviria para o efeito, mas entendo preferível, por uma questão de clareza, substituí-la pela de "rectificação do capital imobilizado" ou outra equivalente) deve ser, no balanço, anterior à situação líquida e não um compartimento desta — sob pena, ou de termos de abandonar o conceito de situação líquida, ou de apresentarmos uma situação líquida maior do que a real. Com efeito:

Suponhamos, para facilidade de exposição, o balanço seguinte, em que só entram as contas que interessam à nossa questão:

Activo

Imobilizações 100

100

Situação líquida

Capital Reintegrações.

80 20

100

Se se seguisse o sistema — que, quanto a resultados, tem de ser equivalente ao sistema contrário — de diminuir directamente o activo imobilizado, das importâncias correspondentes à depreciação, aquele balanço apresentaria o aspecto seguinte:

Activo

Imobilizações .. 80

Situação líquida

Capital. 80

Comparando estes dois balanços, concluir-se-á que, no segundo caso, a situação líquida é de 80 e, no primeiro, de 100 — o que resulta de ter-se,

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erradamente, considerado como situação líquida o que não passa duma verba de rectificação dum activo de propósito exageradamente avaliado.

Incluir a situação rectificativa ou, como prefiro, a conta "rectificação do capital imobilizado" — assim chamarei ao conjunto das reintegrações — na situação líquida, é considerar como existentes bens que já desapareceram, em virtude do tempo, do uso e, possivelmente até, do abuso que deles se fêz. É, em suma, falsear o balanço ou repudiar a noção que se adoptou de situação líquida: "aquilo que restaria à empresa se ela, para satisfazer todos os seus compromissos, transformasse em dinheiro todos os seus bens activos."

De harmonia com o que ficou exposto, o balanço tem de tomar o aspecto seguinte, em que se supõe a hipótese, mais vulgar, de o activo exceder o passivo. A adaptação do balanço à hipótese contrária não apresenta, é claro, a mais insignificante dificuldade.

O balanço que proponho apresenta, pois, a seguinte configuração:

Activo Passivo

Capital Maneável Exigível a curto prazo Capital Permutável Exigível a longo prazo Capital Imobilizado Condicionado Capital Condicionado

Rectificação do capital imobilizado

Reintegração de Móveis e Uten­sílios Reintegração de Instalações Reintegração de Imóveis Reintegração de Máquinas etc.

Situação líquida

Inicial Adquirida

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Da análise do quadro acima se conclui que, na hipótese, admitida, de o activo exceder o passivo, o lado esquerdo do mapa de balanço apresenta o activo, subdividido nas necessárias contas compostas: maneável, permutável, imobilizado e condicionado.

(Visto interessar-me, apenas, como se sabe, revelar os traços fundamentais do balanço que proponho, e para não me afastar demasiado do assunto que estou tratando, não apresento a desintegração das contas compostas que entram no balanço).

O lado direito do mapa analítico do balanço comporta, num primeiro grau de desintegração, as três contas recompostas seguintes: passivo, rectificação do capital imobilizado e situação líquida, cada uma das quais se desintegraria, numa segunda fase de decomposição, nas contas compostas que se tornasse necessário criar. Finalmente, estas decompor-se-iam, ainda, nas contas complexas indispensáveis.

O que interessa reter, em resumo, é que se torna indispensável retirar da situação líquida as contas de reintegrações, formando com elas uma outra conta recomposta, a incluir no lado direito do quadro de balanço, a qual se poder ia , por exemplo, denominar "rectificação do capital imobilizado".

Terminado este meu ligeiro trabalho, não me resta senão confessar que não tive outro intuito além de contribuir, embora modestamente, para a redacção, em termos correctos e precisos, do importantíssimo documento logismológico que é o mapa de balanço, colocando dentro dele as reintegrações no único lugar que lhes é permitido ocupar."

Porto, Outubro de 1941.

No número seguinte da RCC, o n° 37, já de 1942, o Prof. Lopes Amorim responde num artigo que intitulou "Pondo os pontos nos ii. . ." e que começa assim:

"Num artigo publicado no último número desta Revista, subordinado ao título "A posição das reintegrações no mapa analítico do Balanço", o seu autor, Dr. Camilo Cimourda in de Oliveira, en tendeu discordar da denominação de Situação líquida rectificativa por mim preconizada e da situação que no Balanço lhe atribuo, incluindo-a na Situação líquida total.

E não tenho a menor dúvida de que a opinião do distinto articulista é compartilhada por todos os que, não possuindo a sua preparação teórica

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nem a sua valiosa e já longa experiência, que a própria natureza das suas funções especiais lhe tem proporcionado estão sempre propensos a encarar as coisas pelo seu lado simplista, pouco se preocupando com a justeza dos argumentos que se possam invocar para rebater aquilo que eles consideram como verdades daquelas que se metem pelos olhos dentro.

Mas é precisamente nestas noções mais correntias e mais comezinhas em que, pela sua grande banalidade, ninguém repara com a mesma atenção que se deve dispensar a coisas mais sérias e menos banais, e em que todos julgam ter opinião própria e infalivelmente formada, que muitas vezes se dão passos em falso, embora o relevo do terreno não seja de molde a dar-lhes justificação.

E o assunto das reintegrações é uma matéria que, por estar agora tanto na berlinda, parece que já se deveria apresentar absolutamente desprovida de todas aquelas adjacências inúteis que ainda pudessem dar pano para mangas. Mas, por mais que se corte e se recorte o estofo de que aqui se trata, e por melhor que, muitas vezes, se nos afigure a combinação dos retalhos feitos, haverá sempre lugar para produzir alvitres e ideias, cuja novidade, as mais das vezes, deriva do simples facto de se visar apenas este ou aquele aspecto particular do problema que se pretende resolver e não este mesmo problema na sua mais ampla generalidade.

E escusado será dizer que uma solução parcial do problema nunca se poderá sobrepor a uma solução geral, mesmo quando ela se apresente emoldurada por aquela aliciante simplicidade que tão simpática se torna à vista dos que estão habituados a encarar os factos pelo lado das enganadoras aparências de que eles muitas vezes se revestem.

Toda a gente sabe e diz que o errar é próprio dos homens e que não há, portanto, ninguém que se possa gabar de ter dito a última palavra sobre qualquer ponto do conhecimento humano; e isto pressupõe, sem dúvida, a admissão daquele conhecido estribilho que diz que é da discussão que nasce a luz.

E, para mim, a luz num assunto da natureza daquele que se encontra em causa só poderá resultar de uma análise conduzida dentro das mais rigorosas regras da lógica e da coerência teórica que a técnica racional não deverá desprezar para não perder a nobilitante virtude de descender de conceitos verdadeiros e estáveis.

Ora, o articulista baseia a sua discordância da minha solução, segundo a qual as reintegrações se situam na Situação líquida, constituindo aquela sua parte ou parcela a que dei o nome de Situação líquida rectificativa, na noção

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de que a Situação líquida é "aquilo que restaria à empresa depois de ela haver satisfeito todos os seus compromissos ou as suas dívidas pela conversão em dinheiro dos precisos elementos do seu activo".

Não há dúvida de que esta noção é profundamente verdadeira e realista, e é também, por isso, que ela se apresenta como eminentemente adequada para dar aos principiantes uma ideia concreta daquilo que se deve entender por Situação líquida.

Todavia, embora esta noção corresponda ou traduza a situação em que normalmente se encontram as empresas que têm uma vida estável e seja a que mais concretamente fala à inteligência do principiante, ela terá de ser completada, mais tarde, à medida que os seus conhecimentos forem avançando e ele vá adquirindo uma ideia precisa dos factores que usualmente contribuem para a formação dos resultados do exercício e da influência que eles poderão ter, não só na extensão, mas também no sentido ou na natureza da Situação líquida.

E isto porque, se nós déssemos à Situação líquida apenas aquele sentido que o articulista lhe atribue, afirmando que ela é aquilo que restaria à empresa depois de ela haver satisfeito todas as suas dívidas, ver-nos-íamos seriamente atrapalhados para podermos manter esta noção no caso de o Activo ser menor do que o Passivo, caso este que, embora sendo menos frequente do que o seu inverso, não deixa, no entanto, de constituir uma realidade com a qual se faz mister contar."

Começando (ou continuando?...) a "baralhar" os assuntos, o Prof. Amorim continua:

"Claro está que, no caso de o Activo ser menor do que o Passivo, não só nada restará à empresa para que se possa justificar a existência de uma Situação líquida concebida à luz de semelhante critério, mas até se dará ainda por cima a circunstância de lhe faltar qualquer coisa e de ficarmos, assim, com a impressão de que a Situação líquida tanto poderá ser o que resta ou o que sobra, como o que não chega ou o que falta, ou, por outras palavras, que ela poderá ser a negação de si mesma.

Todavia, embora o Activo seja menor do que o Passivo, nem por isso deixará de haver, de facto, uma Situação líquida ou um saldo; mas o que não haverá, com certeza, é Capital próprio.

E isto levar-nos-á naturalmente a fazer uma destrinça necessária entre Situação líquida e Capital próprio.

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A Situação líquida, na sua qualidade de saldo da conta de Balanço, é sempre a diferença entre o Activo e o Passivo, ao passo que o Capital próprio (soma do capital estatutário com as reservas e os resultados positivamente adquiridos) também é a diferença entre o Activo e o Passivo, mas só no caso de aquele ser maior do que este e de ambos figurarem no Balanço pelo seu verdadeiro valor.

Só neste caso — repetimos — é que haverá uma perfeita coincidência entre Situação líquida e Capital próprio.

Porém, se o Activo ou o Passivo não figurarem no Balanço pelo seu verdadeiro valor, e se se tomarem, ao mesmo tempo, as disposições necessárias para que o erro existente não afecte a extensão do Capital próprio, deixará este de coincidir com a Situação líquida, podendo então ser maior ou menor do que esta.

Assim, no caso, versado pelo articulista, de se fazerem figurar no Balanço do fim de exercício os elementos do Capital imobilizado pelo seu valor inicial (valor por que foram adquiridos) e, portanto, por um valor superior àquele com que eles lá deveriam figurar, em virtude de não se haver entrado em linha de conta com a depreciação por eles posteriormente sofrida por efeito do uso que dêles se fêz e dos estragos produzidos pelo tempo (envelhecimento), e de se tomarem as disposições necessárias para que o erro ocasionado por tal maneira de proceder não venha a reflectir-se no valor do Capital próprio, a Situação líquida é maior do que este, porque terá a mais precisamente a extensão do erro cometido".

O Prof. Amorim sempre ensinou aos seus alunos (e ensinou bem!) que situação líquida (activa, entenda-se) e capital próprio eram (e são!) expressões sinónimas. Mas, porque dar o braço a torcer não faz parte do seu comportamento intelectual, começa a meter-se por maus caminhos e escreve:

"l E em que parte da Situação líquida é que se irá reflectir o erro cometido pela manutenção do primitivo valor das Imobilizações no Balanço?

Esse erro irá reflectir-se justamente nos Resultados do exercício que virão, assim, indevidamente aumentados de 24; quere dizer, correr-se-á o risco de se estar a ver um Resultado positivo de 70 onde, de facto, só se deverá ver um Resultado de 46.

Tornar-se-á, portanto, necessário rectificar o saldo da conta de Resultados do Exercício para que se não dê o caso de se distribuírem indevidamente pelos membros da empresa, sob a forma de lucros, a parte

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no saldo daquela conta correspondente ao valor da depreciação das Imobilizações, o que se conseguirá mediante o lançamento seguinte:

Resultados do exercício a Reintegração de Imobilizações Pela depreciação de 20% sofrida pelas Imobili­zações durante o exercício 24

Depois de feito este lançamento de rectificação, o Balanço apresentar-se-á nos termos seguintes:

BALANÇO

ACTIVO PASSIVO

Contas diversas 880 Contas diversas 350 Imobilizações 120

SITUAÇÃO LÍQUIDA

Reintegração de Imobilizações 24 *3 o r— Capital estatutário 500 * ï 1 'S. ^ < — Reservas 80 (B "g 1 U o. v.— Resultados do exercício 46

1.000 1.000

Por aqui se vê, pois, que, enquanto a extensão do Capital próprio (500 + 80 + 46) é de 626, a extensão da Situação líquida é de 650, isto é, contém a mais do que o Capital próprio precisamente o montante do excesso de valor atribuído às Imobilizações.

E — porque quer manter as reintegrações na situação líquida — insiste:

"E assim deve suceder, na realidade, porque, sendo a Situação líquida

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o saldo da conta "Balanço", ou seja, a diferença entre o Activo e o Passivo, nela se virão reflectir sempre os erros cometidos na avaliação destas duas massas patrimoniais.

Porém, o articulista esqueceu-se de atender à distinção entre Situação líquida e Capital próprio e toda a sua argumentação decorre como se tal distinção ou diferença não existisse.(5)

Causa-lhe, por isso, espécie que dentro da Situação líquida possa existir qualquer coisa a mais do que aquilo que logicamente se deva considerar como fazendo parte integrante do Capital próprio.

E para se desembaraçar de tão torturante impressão, pegou na parcela da Situação líquida que lhe pareceu estar a mais e lançou-a pela borda fora enfiada no salva-vilas da Rectificação do capital imobilizado, condenando-a, assim, a boiar indefinidamente no mar que se estende até às escarpadas e, para ela, inacessíveis praias do Passivo que a repele por incompatibilidade de naturezas.

E ficou, ao que parece, bastante satisfeito com este simples acto de alijamento oportuno, com o qual não podem deixar de estar de acordo todas as criaturas bem formadas por verem que a esse alijamento presidiu a louvável intenção de não atirar com a intrusa para o mar largo sem o indispensável cinto de salvação."

Estes três úl t imos parágrafos são um razoável exemplo dos "argumentos" do Prof. Lopes Amorim... — exemplos que se repetem neste e noutros dos seus artigos desta polémica.

Para salvar a sua tese de que as reintegrações (e amortizações) deveriam ser incluídas na situação líquida activa, o Prof. Amorim tem a luminosa ideia de criar (agora) uma distinção (que nunca havia feito...) entre situação líquida activa e capital próprio. E, assim, escreve:

"Suponho ter explicado de uma maneira suficientemente acessível a diferença existente entre Situação líquida e Capital próprio e o motivo por que as contas de rectificação dos Resultados do exercício, quando o erro apresentado por esta conta seja uma consequência ou um efeito de avaliação defeituosa, mas consciente, dos elementos directos do património (elementos activos e elementos passivos), devem ser incluídas na Situação líquida e não postas à margem desta, como se fora dela pudesse haver lugar para outros

(5) Distinção que, até aí, nunca o Prof. Amorim fez nem ensinou...

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elementos que não sejam os que possuem as características próprias dos elementos directos ou reais do património."

Mais adiante, continua o Prof. Amorim:

"E poder-se-á dizer, também, que é na simplicidade que se estriba o articulista cujos conceitos estou apreciando, porque, embora abordando o assunto como técnico que é, e por sinal dos mais distintos, chega a conclusões que, pela sua aparente clareza, não podem deixar de agradar aos leigos ou quási leigos que desejariam ver a Contabilidade reduzida a uma fórmula simples que todo o bicho careta pudesse entender e discutir."

Como se fosse pecado o ter-me eu estribado na simplicidade! Mas, o certo é que não foi em critérios de simplicidade ou de

complexidade que eu me apoiei — mas sim na preocupação da exactidão do balanço e dos conceitos contabilísticos pertinentes.

E, quanto a este primeiro artigo do Prof. Amorim, fiquemos por aqui, até por falta de espaço — o que é pena, pois nos poderíamos deliciar com bons bocados de prosa de quem deseja conciliar o inconciliável. Mas, o leitor pode 1er o texto completo no n° 37 da RCC. E vale a pena, creia.

No n° 38 da Revista, eu respondo ao Prof. Amorim, em artigo que intitulei "Pondo, na verdade, os pontos nos ii. . ." e que começa assim:

"1 — A matéria das três páginas que constituem à parte final do artigo que publiquei no n° 36 desta Revista — a qual deu o nome à exposição — levou o sr. Dr. Jaime Lopes Amorim a publicar a resposta inserta a fis. 71 a 84 do número seguinte.

Antes de mais nada, quero agradecer ao ilustre articulista, não só a honra que me concedeu gastando com tão fraco defunto a cera de catorze páginas, como as palavras amáveis que me dirigiu — filhas, sem dúvida, mais da sua já tantas vezes comprovada amizade, do que duma atitude de merecida justiça. jMuito obrigado!

2 — A exposição do sr. Dr. Lopes Amorim tem um duplo interesse: o interesse literário e o interesse doutrinário. Na minha resposta, que se segue, desprezarei o primeiro e cuidarei do segundo. Não é que eu não respeite a erudição do sr. Dr. Lopes Amorim sobre os sacristães e os seus cantochões,

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o Egito e os seus escribas, etc., etc. Mas... é que entendo que, por agora, a questão se reduz ao problema da posição das reintegrações no mapa de balanço...

Posto isto, comecemos.

3 — Depois de algumas considerações de vária ordem, aparece como primeira passagem de natureza doutrinária, a crítica à noção que apresentei, de situação líquida: "aquilo que restaria à empresa se esta, para satisfazer todos os seus compromissos, transformasse em dinheiro todos os seus bens activos" — noção que, de resto, justo é dizê-lo, pertence ao sr. Dr. Lopes Amorim.

Ora, vejamos como o ilustre articulista entendeu dever criticar-me nesta parte.

Principia por afirmar que "não há dúvida de que esta noção é profundamente verdadeira e realista" — ao que acrescenta: "e é também, por isso, que ela se apresenta como eminentemente adequada para dar aos principiantes uma ideia concreta daquilo que se deve entender por Situação líquida".

Logo a seguir, porém, confessa se seriamente atrapalhado para poder "manter esta noção no caso de o Activo ser menor do que o Passivo".

[Por amor de Deus! Estamos todos fartos de saber que a situação líquida pode ser activa

(ou positiva) e passiva (ou negativa). Mas também estamos igualmente fartíssimos de saber que, quando se fala em situação líquida, tout court, se quere dizer situação líquida activa. Leia, pois, o sr. Dr. Lopes Amorim, se fizer o favor, situação líquida activa onde, no meu artigo, vir situação líquida, simplesmente. Deste modo, desembaraçar-se-á da torturante impressão que lhe fez o facto de não poder manter a definição referida, no caso de o activo ser inferior ao passivo.

Eu tive, apesar de tudo, o cuidado de deixar registado que estava enfrentando "a hipótese, mais vulgar, de o activo exceder o passivo". Ao que acrescentei: "a adaptação do balanço à hipótese contrária, não apresenta, é claro, a mais insignificante dificuldade".

De resto, dá-se, aqui, com a situação líquida aquilo que se dá em Álgebra, com os números: quando se não fazem preceder do sinal (-), supõem-se positivos. Assim também, quando se não diz que a situação líquida é negativa, supõe-se positiva. ;E sempre assim tem sido!

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Finalmente, quero deixar registado que o que acabo de afirmar é o que se verifica nos próprios escritos do sr. Dr. Lopes Amorim. Sempre que quere referir-se à situação líquida activa diz simplesmente, e muito bem, situação líquida.

Parece-me, portanto, ficar suficientemente esclarecido que a noção que utilizei de situação líquida (entenda-se: situação líquida activa ou positiva) não padece, felizmente, daqueles males de que foi acusada.

4 — Seguindo a exposição do ilustre articulista, encontra-se a certa altura a seguinte passagem:

"Todavia, embora o Activo seja menor do que o Passivo, nem por isso deixará de haver, de facto, uma Situação liquida ou um saldo; mas o que não haverá, com certeza, é Capital próprio".

Sem dúvida, sr. Dr. Lopes Amorim, que haverá situação líquida... passiva; jmas o que não haverá, com certeza, é situação líquida activa ou capital próprio!

E, logo a seguir, o articulista ilustre escreve:

"E isto levar nos-á naturalmente a fazer uma destrinça necessária entre Situação líquida e Capital próprio".

Ora, chegámos a um ponto muitíssimo importante da exposição do sr. Dr. Lopes Amorim! Vou procurar dedicar-lhe a atenção que merece...

5 — Antes de mais nada: Afirma o sr. Dr. Lopes Amorim que me "esqueci (!) de atender à

distinção (!) entre Situação líquida e Capital próprio" e que "toda a minha argumentação decorre como se tal distinção ou diferença não existisse".

Ora, como, pelo contrário, toda a argumentação do ilustre articulista decorre como que se existisse distinção entre situação líquida (situação líquida activa, entenda-se...) e capital próprio — parece-me que, desde que se demonstre que tal diferença não existe ficará implicitamente provado que a argumentação produzida pelo sr. Dr. Lopes Amorim não colhe.

6 — A fim de evitar que este meu artigo seja, em parte, uma repetição

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dos por mim publicados nos dois últimos números desta Revista(6) limitar-me-ei, pela minha parte, a reafirmar que, até por uma questão de definição, são absolutamente sinónimas, tendo, portanto, o mesmíssimo conteúdo, as expressões "capital próprio" e "situação líquida activa". E, por julgar que a melhor forma de demonstração consistirá em provar que sempre o sr. Dr. Lopes Amorim entendeu, e muito bem, que "situação líquida"'1' e "capital próprio" eram uma e a mesma coisa — vou levar o leitor em passeio pela obra do ilustre articulista para mostrar—lhe que sempre este emprestou igual conteúdo a qualquer das duas referidas expressões. Partamos, pois.

7. — Comecemos pelo maravi lhoso l ivr inho "Elementos de Contabilidade". Folheie-o comigo, ao acaso, e encontrará, a páginas 37(2), a rubrica "Situação líquida ou capital próprio", que começa assim: "A diferença entre o Activo e o Passivo, ou entre o Capital funcional e o Capital alheio, dá-se o nome de Situação líquida ou capital próprio da empresa". Depois de toparmos, mais adiante, com a passagem "situação líquida ou capital próprio" — chegamos ao último período da referida rubrica, o qual reza textualmente assim:

"Resumindo, poderemos, pois, dizer que o património de qualquer empresa é susceptível de uma primeira decomposição em três grandes massas, a saber: o Activo ou Capital Funcional, o Passivo ou Capital alheio e a Situação líquida ou Capital próprio".

O leitor, se não tem pressa, prossiga sozinho na nossa digressão, que eu fico-me por aqui. Mas recomendo-lhe as páginas 40, 54, 62, 67, 75, 77..., nas quais encontrará a prova de que o próprio Dr. Lopes Amorim sempre tratou como expressões sinónimas "situação líquida" e "capital próprio"'3 '.

(6) Eu havia publicado no n° 37 da Revista, mas fora do âmbito da polémica, um outro trabalho intitulado "Ensaio sobre o problema da uniformização dos balanços" — aliás, um dos primeiros escritos portugueses sobre normalização contabilística, isto, portanto, em 1942!...

(1> Como é evidente, quando o Sr. Dr. Lopes Amorim escreve simplesmente "situação líquida... quere referir-se à situação líquida activa" — embora, segundo parece, não queira conferir aos outros igual direito.

<2) Sirvo-me da 2a edição. p) Estou mesmo a ouvir o Sr. Dr. Lopes Amorim dizer que... "tal noção é

eminentemente adequada para dar aos principiantes..." etc., etc., etc., Mas...

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8. — Agora, que o leitor regressou do passeio que lhe aconselhei, reùnamo-nos outra vez e vejamos qual é a paisagem das sapientes "Lições de Contabilidade Geral" que, por si só, bastariam para consagrar o sr. Dr. Lopes Amorim como tratadista eminente das questões logismológicas.

Aqui, o campo é mais vasto; por isso, principiemos logo pela página 319, onde o leitor vai encontrar, quási ao fundo, uma passagem a que achará graça (1); salte para a página 327, onde encontrará a confirmação do passo anterior; na página seguinte dará mais uma vez com a expressão "situação líquida ou capital próprio"; e na página 333 verá um esquema de balanço em cujo lado direito, abaixo do Passivo, está o seguinte:

Situação Líquida

Capital Social J Reservas > = Capital próprio

por onde concluirá, certamente, que, mais uma vez, situação líquida e capital próprio são (ou melhor: eram...) para o sr. Dr. Lopes Amorim, e muito bem, uma e a mesmíssima coisa.

Para terminar, vamos passar pela página 400, onde se lê: A Situação líquida é, pois, aquela parte do património que representa aquilo que é exclusivamente da empresa... ".

9. — Em resumo: nunca, até agora, o sr. Dr. Lopes Amorim tinha estabelecido qualquer diferença entre "situação líquida" e "capital próprio". A destrinça que agora nos apresenta foi o cinto de salvação de que se serviu para tentar livrar-se da incongruência que o meu primeiro artigo veio revelar.

De resto, tais foram os termos em que apresentei os meus pontos de vista, que eu — modéstia posta de parte... — não poderia nunca deixar de ter razão. Com efeito, havia eu escrito: "ou se retiram da situação líquida as

(1) Diz, textualmente: "A diferença entre a parte activa e a parte passiva do património dá-se o

nome de parte líquida ou Situação líquida, ou seja, aquela parte do património que restaria à empresa se esta, para liquidar a parte passiva, traduzisse em dinheiro toda a parte activa do património".

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reintegrações, ou se repudia a noção que se tem adoptado de situação líquida". Ora, ao passo que eu preferi manter a noção, com que continuo concordando, de situação líquida, mas remover do seu seio as reintegrações — o Prof. Lopes Amorim preferiu, a fim de manter a posição das reintegrações no mapa de balanço, repudiar a noção, que sempre tem abraçado, de situação líquida, tratando-a como a qualquer filho ilegítimo a quem agora se detesta. Mas, como se vê, as duas atitudes a que me referi, é que eram incompatíveis: não se poderia, simultaneamente, continuar, por um lado, a incluir as reintegrações na situação líquida, e, por outro, a dar desta massa patrimonial a noção que sempre se tem perfilhado. A meu ver, porém, repito, o erro está na inclusão das reintegrações na situação líquida, e não na própria noção de situação líquida."

E acabo assim:

13 — Antes de terminar esta ligeira exposição, quero deixar registado o seguinte:

Ao publicar o meu artigo intitulado "A posição das reintegrações no mapa analítico de balanço", tive apenas — em virtude de ter sido chocado pela incompatibilidade entre a noção de situação líquida e a inclusão das reintegrações neste departamento do balanço — a intenção de pôr em evidência essa incompatibilidade. E, para a desfazer, preferi — e ainda hoje prefiro — adoptar o critério que indiquei, segundo o qual se criaria, no lado direito do mapa de balanço, uma conta recomposta que poderia chamar-se, por exemplo, "situação rectificativa", "rectificação do activo imobilizado", ou coisa equivalente: sei que há quem prefira que a importância das reintegrações seja directamente subtraída, no próprio balanço, do montante do activo imobilizado. Outros prefeririam que o mapa de balanço fosse acompanhado dum anexo, relativo às reintegrações.

Ora, pretendo esclarecer que a parte formal, material ou externa do caso — a maneira de desfazer a incompatibilidade referida — me não interessa senão secundariamente. O que tem para mim interesse primário, é a parte substancial, essencial, da questão — segundo a qual as reintegrações deverão ser colocadas fora da situação líquida. A forma de o conseguir, repito, já tem somente interesse de segunda ordem — embora eu conceda as minhas preferências à solução que indiquei.

14 — Pondo, portanto, os pontos nos ii...:

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Io) A situação líquida, tal como o sr. Dr. Lopes Amorim a definiu e eu repeti, está muito bem definida.

2o) Não existe qualquer diferença (nem se torna necessário procriá-la) entre "situação líquida" e "capital próprio". Portanto,

3o) Não podem incluir-se na si tuação l íquida as contas de reintegração.

Muito mais haveria ainda a escrever aqui. Mas... este artigo já vai demasiado longo e o essencial ficou dito.

Lisboa, Maio de 1942"

Este meu artigo, este meu segundo artigo ocupou dez páginas da Revista. A ele riposta o Prof. Amorim, no número seguinte, o n° 39 (a Revista era trimestral), com o seu segundo "Pondo os pontos nos ii...", ocupando 27 páginas!...

Pode parecer que acrescentou muito à discussão. Nada disso! Posso mesmo dizer que não acrescentou literalmente nada. Mas, aconselho o leitor a fazer, se puder, a leitura dessas quase três dezenas de páginas, pois alguma coisa aproveitará: verificará a habilidade coleante com que o respectivo articulista foge à questão fundamental (a posição das reintegrações no mapa de balanço), o baralhar de assuntos que não teriam de vir à colação, os "argumentos" totalmente desapropriados, a intencional mistura de verdades incontestáveis que ninguém impugnou, o insulto mais ou menos diplomático, mas quase sempre menos..., etc. Mas, o melhor é 1er, visto que aqui só disporei de espaço para algumas transcrições, procurando seleccionar as que mais directamente respeitem à tese em discussão: se as reintegrações (e amortizações) são (ou não, como eu defendo, em oposição a }. L. Amorim) parte da situação líquida activa.

As primeiras catorze das referidas vinte e sete páginas giram à volta da equivalência, ou não, das expressões "situação líquida activa" e "capital próprio" — para mim, expressões equivalentes; para o Prof. Amorim, umas vezes sim, outras vezes não.

Mas, apesar de tudo, vejamos como começa o segundo artigo daquele articulista:

"No último número desta Revista, e em resposta ao meu artigo publicado no número precedente, a propósito da questão da posição das

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reintegrações no mapa analítico do Balanço, o sr. Dr. Camilo de Oliveira procura sustentar opiniões suas, já expostas num artigo anterior.

Nada teria eu que ver com estas suas opiniões, se a pág. 445 do n° 36 desta Revista o articulista não me tivesse pedido desculpa da irreverência de se afastar, neste ponto, da minha opinião.

Parece-me, porém, que para se ter opiniões próprias, nenhuma necessidade haverá de pedir desculpa a quem tem ideias diferentes.

Não é tampouco de admitir que o seu pedido de desculpa tenha tido unicamente por fim chamar a minha atenção para uma divergência de opiniões, visto que, se eu não tivesse o hábito de 1er a Revista, tal pedido em nada poderia contribuir para que eu nela reparasse. jCom que intenção teria, então, o articulista formulado semelhante pedido?

Naturalmente com o propósito de provocar discussão. E eu gosto muito de discutir, sobretudo com quem possa aprender

alguma coisa de novo. Mas, afinal de contas, tudo o que o ilustre articulista pretende

apresentar como originalidade sua, não passa de uma apreciação incompleta daquilo que eu já escrevi.

Se não, vejamos. No seu último artigo, o articulista termina por dizer — a pág. 190 e

191 — o seguinte:

"Em resumo: nunca, até agora, o sr. Dr. Lopes Amorim tinha estabelecido qualquer diferença entre "situação líquida" e "capital próprio".

"A destrinça que agora nos apresenta foi o cinto de salvação de que se serviu para tentar livrar-se da incongruência que o meu primeiro artigo veio revelar".

Mas, exprimindo-se assim, o articulista dá mostras de ter perdido uma boa ocasião de revelar a originalidade do seu espírito inventivo, porque poderia ter estabelecido a diferença entre "situação líquida" e "capital próprio" primeiro que eu.

Agora, já é demasiado tarde para que o articulista possa reclamar a glória de tão extraordinário feito que, aliás, se encontra bem focado nos meus "Elementos de Contabilidade" — naquele livrinho que o articulista apelidou de maravilhoso, mas que parece não ter lido com a devida atenção.

Convém, porém, notar de passagem que o articulista pertence ao número daqueles que entendem que os homens devem permanecer sempre apegados aos mesmos princípios, às mesmas opiniões e aos mesmos

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conceitos, mesmo quando se convençam de que estão fora da razão. Mas eu vejo as coisas por um prisma diferente, e não tenho, por isso,

a menor dúvida em modificar ou até em repudiar conceitos já expostos, quando me convença de que eu ou outros chegaram a conclusões mais lógicas e mais racionais. Mas não é caso disso, aqui.

Prosseguindo, diz o articulista a pág. 191:

"De resto, tais foram os termos em que apresentei os meus pontos de vista, que eu — modéstia posta de parte... — não poderia nunca deixar de ter razão".

Aqui já se revela uma presunção de infalibilidade tal que deixa a modéstia muito a perder de vista. Bem se vê que o articulista não deixa a sua modéstia por mãos alheias.

E o articulista prossegue nos termos seguintes:

"Com efeito, havia eu escrito: "ou se retiram da situação líquida as reintegrações, ou se repudia a noção que se tem adoptado de situação líquida".

"Ora, ao passo que eu preferi manter a noção — com que continuo concordando, de situação líquida, mas remover do seu seio as reintegrações — o Prof. Lopes Amorim preferiu, a fim de manter a posição das reintegrações no mapa de balanço, repudiar a noção, que sempre tem abraçado, de situação líquida, tratando-a como a qualquer filho ilegítimo a quem agora se detesta."

Façamos aqui uma pequena paragem para dizer que as preferências ou os gostos não se discutem; e, como não se discutem, não podem utilizar-se como argumentos científicos.

Se o articulista viu nisto, de entrada, uma questão de preferências ou de gostos, melhor teria sido o haver-me pedido desculpa, não da irreverência de ter opinião diferente da minha, mas sim de ter gostos diferentes dos meus, porque, nesse caso, não seria eu quem lhe haveria de estragar os gostos.

Mas isto, no fundo, não é uma questão de simples preferências ou gostos, mas, pelo contrário, uma questão de argumentos que o articulista resume na seguinte alternativa: "ou se retiram da situação líquida as

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reintegrações ou se repudia a noção que se tem adoptado de situação líquida".

Eis um dos abundantes exemplos da argumentação "científica" do Prof. Lopes Amorim...

E agora, por falta de espaço e desnecessidade de mais transcrições sobre a equivalência, ou não, das expressões "situação líquida" "(activa) e "capital próprio", convido o leitor a abrir o n° 39 da RCC e a 1er as páginas 342 a 355, cujas duas últimas já se aproximam do tema da polémica: a posição das reintegrações (e amortizações) dentro ou fora da situação líquida activa — como, respectivamente, defendiam o Prof. Amorim e eu.

Aí, o Prof. Amorim escreve:

"Ora, o caso de que se trata, e à volta do qual gira toda a discussão entre mim e o articulista, é precisamente o de um Balanço errado, pelo facto de se haver atribuído aos elementos do activo imobilizado um valor superior ao seu valor real e de os saldos das contas respectivas reflectirem aquele valor — o valor errado por excesso.

Pois bem: toda a argumentação do articulista se desenvolve no sentido de pretender convencer o leitor de que num Balanço que não se encontra nas condições que a teoria exige para que se verifique uma perfeita coincidência entre a Situação líquida positiva e ó Capital próprio — por se tratar de um Balanço errado — tal coincidência existe de facto.

E, para isso, serve-se de um expediente muito simples e que aliás parece saltar na tura lmente aos olhos dos que não reflitam um pouco nas consequências que daí poderão resultar.

Esse processo consiste em retirar da Situação líquida a parte desta correspondente ao erro originariamente cometido na avaliação dos elementos do activo imobilizado, e em afirmar que, procedendo assim, ficará automaticamente eliminado esse êrro que se veio necessariamente repercutir na extensão da situação líquida — saldo da conta Balanço — dentro da qual a referida parte terá, portanto, de permanecer, enquanto não fôr eliminado o dito êrro originário de que ela é consequência directa.

E, para se convencer a si e aos outros de que, feito isto, eliminou o êrro originariamente cometido nas contas dos elementos do activo imobilizado, não se limitou a retirar da Situação líquida as parcelas desta correspondentes aos efeitos desse êrro, relevados nas contas de reintegrações; levou ainda a sua sem-cerimónia até ao ponto de colocar por cima dessas parcelas a seguinte legenda: "Rectificação do capital imobilizado" (Pág. 447, n°

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36 desta Revista). Trata-se aqui, como eu já tive ocasião de dizer, de um simples expediente

que impressiona pela ingenuidade de que se reveste e que o seguinte exemplo nos ajudará a pôr em plena evidência:

BALANÇO

Activo Passivo

Contas diversas 880 120 Imobilizações 880 120 Rectificação do capital Imobilizado

Reintegrações 20 370

Situação líquida

1000 Contas diversas 630

1000 1000

No Activo deste Balanço fazem-se figurar por 120 imobilizações que apenas valem 100.

O Activo acha-se, portanto, errado, porque o seu valor global não é 1.000, mas apenas 980.

Toda a gente que olhar para este Balanço e que saiba que as imobilizações (elementos do activo imobilizado) só valem 100 (S) e não os 120 com que lá figuram, reconhecerá que o Activo está errado e que continuará errado enquanto não se suprimir o erro respectivo, isto é, enquanto o saldo da conta de Imobilizações não fôr harmonizado com o valor real destas.

(7) Na opinião de Lopes Amorim, estes 20 estariam somados aos 630 da situação líquida, que passaria, incorrectamente, para 650...

(8) Nota minha: Só se o leitor do balanço adivinhar! Por isso mesmo, é que eu defendi que os tais 20 deveriam sair da situação líquida — pondo-os no lado direito do mapa de balanço como elemento aditivo, ou (como veio muito mais tarde a preferir-se), no lado esquerdo, como elemento subtractivo.

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E enquanto isto se não fizer, também a Situação líquida — saldo da conta Balanço — que é sempre a diferença entre o Activo e o Passivo, será 650, e não 630 como o articulista pretende sustentar.

Para que fosse 630, seria necessário que as reintegrações fossem consideradas como elementos passivos, isto é, como dívidas da empresa para com estranhos; mas, como o não podem ser, torna-se absolutamente inadmissível a hipótese de elas serem incorporadas no Passivo.19'

E como o Balanço é a relação entre três massas com características próprias e bem definidas — o Activo, o Passivo e a Situação líquida — evidente se torna que qualquer que seja a conta que resulte da sua desintegração ela só poderá situar-se ou ter lugar numa destas três massas — Activo, Passivo ou Situação líquida."

E, repetindo-se, o articulista continua:

"Que as reintegrações que são, afinal de contas, contra-partidas de aumentos de valor atribuídos aos elementos do activo imobilizado não devem figurar no Passivo, di-lo não só a inconformidade das reintegrações com a natureza do Passivo que é constituído pelas dívidas da empresa para com terceiros, mas também o seguinte raciocínio que poderá fazer qualquer indivíduo que possua umas noções elementares de dinâmica contabilística.(10)

Com efeito, desde que há um ou mais elementos do Activo, cujo valor foi hiper-avaliado, é natural preguntar: ^em que parte do património é que esse aumento de valor se foi reflectir?

,jTeria sido noutra parte do Activo? Não; não é aqui o caso, porque desse aumento nenhuma alteração resultou no valor de quaisquer dos restantes elementos do Activo.

^Teria sido, então, no Passivo? No Passivo também não, porque dele não resultou aumento nas

dívidas da empresa. Por conseguinte, se o aumento de valor dos elementos do activo

imobilizado não foi compensado por uma diminuição equivalente no valor de qualquer outro ou outros elementos do Activo, nem equilibrado por qualquer aumento equivalente nas dívidas da empresa ou no seu Passivo,

(9) E eu disse alguma vez que as reintegrações eram passivo?!... (10) Dá a impressão de que o autor destas linhas está a argumentar contra

alguém que tenha afirmado que as reintegrações fazem parte do passivo...

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só será legitimo pensar-se em que ele se foi reflectir na Situação líquida. É isto mesmo o que aliás nos está inculcando a própria equação geral

do Balanço A = P±S, da qual facilmente se depreende que qualquer aumento dado a A se irá reflectir em P ou em S.

Mas como a hipótese de êle se reflectir em P não é de admitir aqui, porque as dívidas da empresa nenhum aumento sofreram, não temos mais para que apelar a não ser para dizer que o aumento de valor nos referidos elementos do activo imobilizado se vem reflectir na Situação líquida — saldo da conta Balanço.

E como, por outro lado, este aumento é meramente fictício, ou seja um aumento contabilizado mas que não corresponde a nenhum facto realmente ocorrido, o valor do Activo resultante da soma dos saldos de todas as contas que o representam é um valor errado; e errado é também o valor da Situação líquida activa que deixará, por isso, de representar a medida exacta do fundo patrimonial, o que equivale a dizer que ela deixará de coincidir com o Capital próprio".(11)

Outro bom naco da infeliz argumentação do articulista é o seguinte:

"E isto vem aqui a propósito (12) daquela passagem do artigo do articulista em que êle, pretendendo basear-se na afirmação, por mim feita nas minhas "Lições de Contabilidade Geral", de que a Situação líquida activa é aquela parte do património que representa aquilo que é exclusivamente da empresa, diz que "ninguém será capaz de sustentar que as reintegrações fazem parte do património da empresa e que, portanto, ainda daqui se conclui que as reintegrações não podem incluir-se na Situação líquida".

Ora, do que eu disse não se pode chegar a semelhante conclusão; mas do que o articulista diz pode-se chegar facilmente à conclusão de que ainda aqui êle dá uma prova flagrante de grande superficialidade de espírito.

E isto porque se ele pesasse convenientemente o conteúdo das suas

(11) Nota minha: Passado mais de meio século, ao reler este (des)arrazoado do Prof. Lopes Amorim, parece-me incrível que ele tenha escrito tudo isto! Se houver no Céu (onde tenho a certeza que está a alma daquele Professor) um Conselho Superior de Contabilidade, alguns maus bocados ele deve lá ter passado — mas, dados os muitos anos já decorridos, desses pecados já há muito deve ter sido perdoado...

(12) A mim, parece-me a despropósito...

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afirmações, depressa se teria apercebido de que as reservas e os lucros que êle entende — e eu também — que devem figurar na Situação líquida, são contra-partidas valorimétricas de elementos activos e de que é, portanto, por estes elementos que é constituída a parte material do património em que a Situação líquida se concretiza.

E as reintegrações lá têm também, como as reservas e os lucros, a sua contra-partida no aumento de valor atribuído aos elementos do activo imobilizado, a que elas se referem, encontrando-se, portanto, nas condições requeridas para figurarem na Situação líquida, enquanto a contabilidade não substituir a ficção pela realidade ou, por outras palavras, enquanto a contabilidade continuar a considerar como existente aquilo que realmente não existe, infringindo assim o preceito do rigor que a teoria não dispensa."

E, logo a seguir, continua:

"Bastará atender à própria natureza diferencial das reintegrações, visto que elas correspondem a hiper-avaliações dos elementos do activo imobilizado, para que nenhuma dúvida nos reste de que é dentro da Situação líquida, e não fora dela, que elas devem ser colocadas, visto ser o motivo "diferencial", "derivado" ou "consequente" que caracteriza a natureza de todos os componentes da Situação líquida.

Toda a argumentação e conclusões do articulista brigam com este raciocínio elementaríssimo, mas que, por isso mesmo, se terá de colocar na base de raciocínios que se encaminhem para a generalização.

E isto sem falar já nas anomalias de ordem técnica a que nos poderá conduzir a colocação das reintegrações fora da Situação líquida."(13)

Cada vez se afundando mais na sua desastrosa argumentação, J. L. A., na linha seguinte à última transcrita — dando a perceber que a posição das reintegrações no quadro de balanço dependeria dos seus montantes, isto é, de aspectos quantitativos —, escreve:

"Se não veja-se, o que aconteceria, por exemplo, no caso de no cálculo das reintegrações não se haver adoptado o processo das cotas constantes,

<13> E J. L. Amorim insiste em que as reintegrações devem integrar a situação líquida!...

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que é o mais empírico de todos e, por isso, o menos seguido nas grandes empresas industriais, mas sim qualquer dos diferentes processos das cotas variáveis, crescentes ou decrescentes.

Neste caso, dar-se-á a circunstância de, em todos os anos em que a cota de reintegração fôr superior à cota média, se colocarem fora da Situação líquida importantes somas que dentro dela deveriam estar; e de se deixar, pelo contrário, de colocar fora dela somas que o deveriam ser, em todos os anos em que a cota de reintegração seja inferior à cota média.

Claro está que o articulista me virá dizer no próximo número: "Mas, por amor de Deus, todos nós sabemos muito bem que, nesse

caso, se dividiria a cota anual de reintegração de cada elemento do activo imobilizado em duas partes distintas: uma correspondente ao valor da cota média e a outra correspondente à diferença entre o valor desta cota e o da referida cota anual"; a primeira colocar-se-ia fora da Situação líquida, e a segunda dentro ou fora dela consoante ela representasse excesso ou deficiência relativamente à primeira.(14)

Quere isto dizer que, em tal caso, as reintegrações andariam a dançar o "vira" com a Situação líquida".(15)

Já vai longa esta mostra dos argumentos apresentados pelo Mestre Lopes Amorim — que o foi, sem qualquer sombra de dúvida — para demonstrar que, ao contrário do que eu (que andava, então, ainda na casa dos vinte anos), do que eu defendia, as reintegrações deveriam estar dentro (e não fora, como eu queria) da situação líquida.

E, para avançarmos na análise que estou fazendo, vou transcrever a conclusão deste artigo do Prof. Amorim. Diz textualmente o seguinte:

"Em conclusão: não vejo motivos para que seja preciso repudiar a noção de Situação activa; mas acho que é, pelo contrário, absolutamente necessário que não se desvirtue o ambiente teórico dentro do qual ela foi concebida e dentro do qual conserva todo o seu valor lógico; para que nela se não vejam defeitos que só podem e devem ser legitimamente atribuídos a deficiências de observação por par te de quem a cri t ique; e, nesta conformidade, também acho que é absolutamente necessário que as

"4) Claro que eu não disse nem diria nada disto — mas o Prof. Amorim, aqui como em muitos outros passos, faz e baptiza...

(is) "Argumentação" muita à maneira de Jaime Lopes Amorim...

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"reintegrações" fiquem onde devem ficar — dentro da Situação líquida e não fora dela."

A meu ver, o que levou o Prof. Lopes Amorim a escrever, no decurso desta polémica, tantas inconveniências foi exactamente este propósito: o de, contra mim (eu era um "miúdo" e ele era, indiscutivelmente, o maior Mestre português de Contabilidade), contra mim e contra tudo, pretender defender — antes que dar o braço a torcer — que o lugar certo para colocar, no balanço, as reintegrações, era a situação líquida. Em vez de endireitar a vara, ele preferiu tentar endireitar a sombra da vara torta!...

Quando, e como, respondi eu ao longo articulado a que acabo de fazer larga referência?

Evidentemente, no número seguinte, o 40, da RCC. E como — é o que vai ver-se. Intitulei o meu artigo "Pondo, finalmente, os pontos nos ii" e encabecei-

o com esta frase, retirada do livro "La Comptabilité Moderne", do eminente Professor Jean Dumarchey:

"É assim que alguns dêles (dos inimigos do esforço — do esforço intelectual, sobretudo) não satisfeitos em se abismarem na contemplação do seu saber definitivo, pretendem vedar a outrem toda a pesquisa e consideram — é preciso notar com que desprezo — os inovadores como utopistas e abstracteurs de quintessence".

}. Dumarchey, La Comptabilité Moderne

E comecei:

"No último número desta Revista, apresentou o Sr. Dr. Jaime Lopes Amorim um longo artigo cujo objectivo, no final de contas, é o de demonstrar que tudo quanto S. Exa. havia escrito até a publicação do meu primeiro artigo — n° 36 desta Revista, Outubro de 1941 — estava certo, não havendo, pois , nada a alterar à dou t r ina por si sempre exposta, sendo, consequentemente, despropositada a minha tese, então trazida a público, segundo a qual eram incompatíveis estas duas ati tudes: considerar equivalentes as expressões "situação líquida" (activa) e "capital próprio", definindo-as como aquilo que restaria à empresa se esta, para liquidar o seu Passivo, convertesse em dinheiro os precisos elementos do seu Activo, e incluir naquela massa patrimonial as reintegrações.

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No que se segue, procurarei continuar dissociado de métodos de discussão cujo uso não aprovo. Refiro-me a métodos relativos h forma externa da exposição, à maneira de argumentar e à natureza dos argumentos.

Há quem se não importe dos meios utilizados para atingir determinado fim, não se p reocupando , por tan to , que lhe não possam chamar excessivamente delicado, intelectualmente sincero, etc. Quanto a mim, confesso que desaprovo em absoluto a opinião dos que assim pensam.

Como o leitor sabe, a posição deste problema antes de eu ter publicado o meu primeiro artigo, em 1941, era a seguinte:

Tanto nas suas "Lições de Contabilidade Geral" (págs. 319, 327, 333...) publicadas em 1929, como nas três primeiras edições dos seus "Elementos, de Contabilidade" (3a edição, pags. 37, 38, 40, 62, 67, 68, 75...), a última das quais foi publicada em 1941, antes da publicação do meu artigo — o Sr. Dr. Jaime Lopes Amorim considerava sinónimas as expressões "situação líquida" (activa) e "capital próprio", definindo-as como "aquilo que restaria à empresa se esta, para liquidar o seu Passivo, convertesse em dinheiro os precisos elementos do seu Activo" (pág. 37, 3a edição), e incluía naquela massa patrimonial a importância das reintegrações, como se verifica pela reprodução, que se encontra na página seguinte, da página 55 da 3a edição dos seus "Elementos".

Esta a posição do problema antes da minha intervenção; e daqui o meu artigo do n° 36.

Pois, apesar disto, e com a maior sem-cerimónia deste mundo, o articulista, longe de confessar que alterava a sua opinião anterior, escreveu no n° 37 desta Revista (págs. 74, 75...):

"a Situação líquida é maior do que este (o Capital próprio) porque terá a mais precisamente a extensão do erro cometido (a importância das reintegrações)".

apresentando, então, o seguinte esquema:

Situação Líquida

_ 0 Reintegração de Imobilizações 24 S a, Jf Capital estatutário 500 Q \ \ Reservas 80

^Resul tados do Exercício 46

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no qual, como se vê, as reintegrações já não se incluem no capital próprio, contrariamente ao que acontecia nas três primeiras edições dos "Elementos de Contabilidade". Na 4a edição, saída há poucas semanas, o referido esquema deixou de ser encimado pela designação "Situação líquida ou Capital próprio" para aparecer sob o título de "Situação líquida" simplesmente.

Sem comentários.

Reproduzo a seguir a página 55 da 3" edição (anterior ao meu primeiro artigo):

Massas patrimoniais

Situação l íquida ou Capital próprio

1) — Situação líquida rectificativa a) — Reintegração de Móveis e Utensílios. b) — Reintegração de Instalações. c) — Reintegração de Imóveis. d) — Reintegração de Trespasse.

2) — Situação líquida inicial a) — Capital. b) — Fundo de Reserva Legal. c) — Reservas Especiais.

3) — Situação Líquida adquirida (Resultados do Exercício) a) — Lucros e Perdas b) — Comissões c) — Juros e Descontos d) — Diferenças de Câmbio e) — Despesas Gerais f) — Despesas de Venda g) — Conservação e Reparação de Imóveis h) — Conservação e Reparação de Instalações e Mobiliário.

Reprodução da pág. 55 da 3° edição dos "Elementos de Contabilidade"

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Repito: sem comentários. E a minha última resposta continuava assim:

"Quem tenha lido e apreendido bem o que escrevi no n° 36 desta Revista e repeti no n° 38, por certo concluiu ter eu afirmado que, "desde que se considerem equivalentes as expressões situação líquida (activa) e capital próprio, e se definam como atrás ficou registado, não poderão incluir-se na situação líquida (activa) as reintegrações"'. E propus — ponto secundário da minha tese, segundo afirmei — que se criasse uma nova conta recomposta, chamada, por exemplo, situação rectificativa, rectificação do capital imobilizado ou coisa equivalente (n° 36, pág. 446), a inscrever no lado direito do mapa de balanço e comportando as reintegrações.

Reduz-se ao que nestas úl t imas l inhas se diz, tudo quanto fundamentalmente escrevi a este respeito. No entanto, a págs. 355 do último número desta Revista, o Sr. Dr. Jaime Lopes Amorim escreveu:

"Que as reintegrações que são, afinal de contas, contra-partidas de aumentos de valor atribuídos aos elementos do activo imobilizado não devem figurar no Passivo, di-lo não só a inconformidade das reintegrações com a natureza do Passivo que é constituído pelas dívidas da empresa para com terceiros, mas também o seguinte raciocínio que poderá fazer qualquer indivíduo que possua umas noções elementares de dinâmica contabilística."

Ora, como eu nunca afirmei que as reintegrações devessem incluir—se no Passivo, ficaria seriamente admirado ao 1er este período, se já antes eu não houvesse concluído acerca do grau de sinceridade com que o articulista tem tratado esta questão.

Mas, como sei que, por exemplo, o Grande Logismólogo francês Dumarchey (o Mestre dos mestres...) inclui as reintegrações no Passivo sob a rubrica de "Passivo de Ordem" (La Comptabilité Moderne, págs. 102, 104, 106/7,108...), sou, como todos os meus leitores sinceros, obrigado a concluir que este período foi escrito para aqueles que metem as reintegrações no Passivo e, portanto, para Dumarchey; e que, consequentemente, Dumarchey não possui, na opinião do articulista,

"umas noções elementares de dinâmica contabilística"

que lhe permitam fazer o profundo raciocínio a que alude o Sr. Dr. Jaime

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Lopes Amorim, e que expõe nos seguintes termos: "Com efeito, desde que há um ou mais elementos do Activo, cujo

valor foi hiper-avaliado, é natural preguntar: ^em que parte do património é que esse aumento de valor se foi reflectir?

^Teria sido noutra parte do Activo? Não; não é aqui o caso, porque desse aumento nenhuma alteração resultou no valor de quaisquer dos restantes elementos do Activo.

^Teria sido, então, no Passivo? No Passivo também não porque dele não resultou aumento nas dívidas

da empresa. Por conseguinte, se o aumento de valor dos elementos do activo

imobilizado não foi compensado por uma diminuição equivalente no valor de qualquer outro ou outros elementos do Activo, nem equilibrado por qualquer aumento equivalente nas dívidas da empresa ou no seu Passivo, só será legítimo pensar-se (jque beleza de raciocínio, leitor! jque profundeza de espírito!) em que ele se foi reflectir na Situação líquida."

E continua:

"É isto mesmo o que aliás nos está inculcando a própria equação geral do Balanço A=P±S, da qual facilmente se depreende que qualquer aumento dado a A se irá reflectir em P ou em S."

jOra, este articulista ainda não percebeu que, na hipótese de o Activo estar hiper-avaliado por englobar as verbas correspondentes às depreciações dos elementos imobilizados, o que está em causa é precisamente a equação A=P±S de que se serviu para concluir que, se o aumento se não verifica em P, tem de operar-se em S! [Este articulista ainda não percebeu que o que eu afirmo é que, na hipótese em causa, a equação de balanço é

A'=P+R+S,

em que R são as reintegrações e A' é o activo hiper-avaliado (portanto: A'=A+R, sendo A o activo exacto)!

jÊste articulista ainda não percebeu que, a rgumentando como argumenta, utiliza como premissa precisamente aquilo que pretende demonstrar — visto que, para demonstrar que o tal aumento, não se tendo dado em P, teria de verificar-se em S, parte do princípio de que é, necessariamente, A=P±S!

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jE é este articulista que vem falar em superficialidade de espírito, noções elementares de dinâmica contabilística, etc./ Parece que o articulista goza da propriedade curiosa de ver nos outros os seus próprios defeitos..."

Depois escrevi: "(..) a terminar, vou oferecer ao leitor, para seu deleite (ou, como me

aconteceu a mim, para sua tristeza), a comparação entre os seguintes períodos paralelos da 3a e da 4a edições dos "Elementos de Contabilidade", do Sr. Dr. Jaime Lopes Amorim, acompanhada das informações seguintes:

Ia) A 3a edição foi a última publicada antes de eu escrever o meu primeiro artigo no n° 36 desta Revista;

2a) Esta 3a edição, na parte que vou transcrever, é igual às duas anteriores — a primeira das quais é de 1934 — e apresenta a mesma doutrina que o seu autor já vinha expondo pelo menos desde 1929;

3a) A 4a edição, publicada há poucas semanas, é a primeira vinda a público após a publicação do meu artigo no n° 36 desta Revista e, portanto,

4a) A publicação daquele meu primeiro artigo está situada entre a saída da 3a e da 4a edições; e, por último,

5a) Que tencionava limitar à exposição que se segue, a minha última resposta ao Sr. Dr. Jaime Lopes Amorim, o que, afinal, não fiz por não ter podido resistir à tentação de apresentar ao leitor uma amostra da profunda argumentação do citado articulista".

Eis a comparação entre os textos das 3a e 4a edições:

3a edição 4a edição

pág. 37

Situação líquida ou Capital próprio Situação líquida À diferença entre o Activo e o À diferença entre o Activo e o

Passivo, ou entre o Capital funcio- Passivo dá-se o nome de Situação nal e o Capital alheio, dá-se o nome líquida, que poderá ser activa ou de Situação líquida ou Capital próprio passiva quando o Activo fôr maior da empresa. que o Passivo e passiva ou negativa

no caso contrário.

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Page 252: Estudos do ISCAA (2ª série) - Nº1, Ano 1995

Por conseguinte, a Situação líquida é uma massa patrimonial consti tuída por tudo aquilo que restaria à empresa, se esta, para liquidar o seu Passivo, convertesse em dinheiro os precisos elementos do seu Activo.

P ag

Sempre que o Activo ou o Passivo figure nesta equação com o seu verdadeiro valor (1), a Situação líquida, quando fôr activa ou positiva, coincidirá com aquilo a que se chama Capital próprio e que vem a ser tudo o que restaria à empresa se esta, para liquidar o seu Passivo, convertesse em dinheiro os precisos elementos do seu Activo (2); e, q u a n d o fôr passiva ou negativa, coincidirá com aquilo a que se dá o nome de Passivo descoberto, e que representa o prejuízo que os credores da empresa sofrerão pelo facto de o Activo ser insuficiente para a satisfação dos seus créditos. 38

É, porém, um erro grave não só sob o ponto de vista contabilís­tico, mas também sob o ponto de vista jurídico, considerar a Situação líquida ou Capital próprio da empresa como uma massa com as mesmas características que o Capital alheio.

É, porém, um erro grave não só sob o ponto de vista contabilís­tico, mas também sob o ponto de vista jurídico, considerar a Situação líquida da empresa como uma massa com as mesmas características que o Passivo.

(1) Como estaria bem seria assim: "Sempre que o Activo e o Passivo figurem nesta equação com os seus verdadeiros valores..."

(2) Repare, leitor. Esta passagem é muito importante. Não mais voltaremos a ouvir o Sr. Dr. Jaime Lopes Amorim dizer que "Situação líquida (activa, é claro) é aquilo que restaria à empresa se...", mas sim que, sempre que o Activo figure no balanço com o seu verdadeiro valor — portanto, quando no balanço não aparecem as reintegrações — a situação líquida, se, fôr activa, coincidirá com aquilo a que se chama Capital próprio e que vem a ser tudo o que restaria à empresa se..." É bem diferente, £não é assim?

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Resumindo, poderemos, pois, dizer que o património de qualquer empresa é susceptível de uma pr imeira decomposição em três grandes massas, a saber: o Activo ou Capital funcional, o Passivo ou Capital alheio e a Situação líquida ou Capital próprio.

Pág

Resumindo, poderemos, pois, dizer que o património de qualquer empresa é susceptível de uma pr imeira decomposição em três grandes massas, a saber: o Activo ou Capital funcional, Passivo ou Capital alheio e a Situação líquida.

40

Situação líquida ou Capital próprio

pág. 62

Situação líquida to

No capí tulo precedente , expusemos a orientação a seguir na preparação do património de uma empresa comercial, que tenha de ser objecto da aplicação do método de relevação, e vimos que êle se poderá decompor, primeiramente, em três grandes massas: Activo ou Capital funcional, Passivo ou Capital alheio e Situação líquida ou Capital próprio.

Pág-

No capí tulo precedente , expusemos a orientação a seguir na preparação do património de uma empresa comercial, que tenha de ser objecto da aplicação do método de relevação, e vimos que êle se poderá decompor, primeiramente, em três grandes massas: Activo ou Capital funcional, Passivo ou Capital alheio e Situação líquida.

67/8

E, finalmente, dizem-se recom­postas aquelas contas que abrangem várias contas compostas, tais como: Capital funcional ou Activo, Capital alheio ou Passivo, Capital próprio ou Situação líquida e Balanço.

E, finalmente, dizem-se recom­postas aquelas contas que abrangem várias contas compostas, tais como: Capital funcional ou Activo, Capital alheio ou Passivo, Situação líquida e Balanço.

m Note-se: aqui, por a situação líquida ser activa e não incluir reintegrações, o autor poderia ter mantido a redacção da 3.a edição; mas, ficou com tanto medo à associação da situação líquida com o capital próprio que nem neste caso permitiu que continuassem juntas as duas referidas expressões.

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Pág. 75

Essa alguma coisa a mais é Essa alguma coisa a mais é precisamente a Situação líquida ou precisamente a Situação líquida que, Capital próprio da empresa. neste caso, coincide com o Capital

próprio da empresa.

Aí ficam as transcrições^) para que o leitor compare, aprecie e avalie do grau de sinceridade intelectual do seu autor.

E é este articulista, que andava há pelo menos treze anos a dizer que situação líquida e capital próprio eram uma e a mesma coisa, e que agora se põe de acordo com a doutrina que eu apresento — que fala da

"... atitude que tomam as pessoas que amam ou detestam o que os outros produzem por uma simples questão de gosto ou de preferência, porque nunca tiveram jeito para fazer obra sua", quando o que eu fiz foi precisamente não aceitar aquilo a que êle chama sua obra!...

Aveiro, Novembro de 1942."

Por mim e para mim, a polémica ficava encerrada.

Como se viu, o Prof. Lopes Amorim continuou a manter até o fim (dar o braço a torcer não era com ele...) que as reintegrações faziam parte da situação líquida, embora, para isso, tivesse tido necessidade de "inventar" distinções entre situação líquida activa e capital próprio — "invenções" que, aliás, felizmente, não fizeram carreira em Portugal, nem, que eu saiba, fora dele...

(') Como se vê, agora já está melhor. Pode mesmo dizer-se que está bem, porque já há harmonia entre o mapa de balanço que o articulista defende e os conceitos teóricos que enuncia — sendo, porém, conveniente não esquecer que esta harmonia se obteve à custa do repúdio da antiga noção que o Sr. Dr. Jaime Amorim apresentava, de situação líqidâa activa.

No próximo número, num artigo em que exporei a minha concepção acerca da equação geral do balanço, mostrarei como entendo que poderia continuar a dar­se a mesma noção de situação líquida activa, até agora perfilhada, atitude que continuo a julgar preferível à de abandonar um conceito já generalizado que há muito adquiriu foros de cidade.

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Apesar, porém, de a polémica, pela minha parte, ter chegado ao fim, o Prof. Amorim ainda publicou, no n° 41 da RCC, outro artigo, também com o título "Pondo os pontos nos ii.. ."

Acontece, porém, que, no mesmo n° 41, publiquei eu, já fora do âmbito da polémica — como, aliás, havia prometido na parte final da nota do meu anterior artigo —, outro trabalho, intitulado "A expressão matemática do balanço", e em que expus a minha concepção da equação geral de balanço e em que mostro como conciliar, por um lado, a identidade das expressões capital próprio e situação líquida activa, e, por outro, a exacta medida desta massa patrimonial.

Resumindo, tanto quanto possível, o conteúdo dessas sete páginas da Revista de Contabilidade e Comércio, eu dizia que, quando o activo (entenda-

se, imobilizado) se encontra inscrito no balanço pelo seu valor inicial, ou de aquisição, que designei por A' (com, evidentemente, A' = A + R, em que A representa o valor actual do activo imobilizado e R o montante das reintegrações e amortizações acumuladas) ■— quando tal acontece, a equação de balanço passa a ser

A' - R = P + S <16>

Este meu artigo do n° 41 da RCC já não fazia parte, portanto, da polémica com o Prof. Amorim, a qual tinha, por meu lado, terminado no n° 40.

Porém, o Prof. Amorim ainda ripostou ao meu último artigo da polémica; e fê-lo, naturalmente, no mesmo n° 41, em que eu publiquei, como já disse, o meu trabalho sobre a expressão matemática do balanço.

Como era seu hábito, produziu um longo escrito de cerca de trinta páginas, em que, infelizmente, a quantidade é inversamente proporcional à qualidade.

De facto, neste seu artigo — que julgo o mais infausto dos que, nesta discussão, elaborou —, o Prof. Amorim, desorientado como estava, confundiu, mentiu, baralhou, destrambelhou, mas continuou, como o tal náufrago com apenas a cabeça fora de água, a escrever:

"Para mim, as reintegrações são partes integrantes da Situação líquida

(16) E, agora, acrescento: isto, e esta fórmula, escrevi eu em 1943. Agora, mais de meio século decorrido, é, exactamente, sem tirar nem pôr, e

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Page 256: Estudos do ISCAA (2ª série) - Nº1, Ano 1995

activa e ao mesmo tempo do Capital próprio." Parece incrível que isto tenha sido escrito pelo Prof. Jaime Lopes

Amorim; mas, o leitor pode confirmar que foi exactamente assim, sem alteração de um ponto ou de uma vírgula, que o Prof. Amorim escreveu, lendo a pág. 96 do referido n° 41 da RCC !

E na 99 continua a insistir nesta ideia, afirmando que pode fazer—se a prova (!) de que

"(...) as reintegrações podem e devem situar-se na Situação líquida e ao mesmo tempo no Capital próprio (...)"

Estava completamente de cabeça perdida! Se o leitor desejar divertir-se mais, leia o original e veja a forma como

JLA tenta provar. . . o improvável. Vai até o ponto de assemelhar as reintegrações às "reservas técnicas nas empresas seguradoras" — confusão imperdoável em quem deveria ter noções básicas da Ciência e do Cálculo Actuarial!

Mas, JLA não desiste de defender a sua opinião. E logo na página 101 lá está ele a insistir na sua tese:

"Se há contas, portanto, que tenham direito a figurar na Situação líquida (...), essas contas são justamente as das reintegrações (...)"

Quer dizer: não são as contas do Capital Social e das Reservas que "têm o direito" de figurar na Situação Líquida. São — di-lo o Prof. Amorim —, prioritariamente, as Reintegrações!...

Era teimoso, não era?... É que o Prof. Jaime Lopes Amorim — de quem, aliás, tenho muita

honra e obtive muito proveito em ter sido aluno — não podia aceitar que um seu antigo discípulo discordasse das suas opiniões. Aliás, ele não deixou de revelar este sentimento — de que não levava a bem ser corrigido por um seu ex-aluno —, pois não evitou escrever:

"(...) o articulista/17 'que começou por querer dar mostras de possuir

sta a expressão matemática do balanço tipo actualmente em vigor em Portugal. Mas, o certo é que ninguém, até aí, tinha escrito isto — perdoem a imodéstia... (Ver Revista de Contabilidade e Comércio, n° 41,1943, pág. 54.)

(17) O articulista sou eu.

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já a independência mental necessária para poder ensinar quem o ensinou (...)"

Este sentimento — que se revela com frequência nos seus diversos escritos desta nossa polémica — ainda volta, mais uma vez, a aflorar nas últimas linhas do artigo em análise quando diz que não teve

"a pretensão de convencer o articulista do erro em que labora, porque o não fiz com semelhante propósito, mas apenas para justificar, perante o leitor, a orientação por mim seguida e que o mesmo articulista se permitiu apresentar-lhe como inadequada." (O sublinhado é meu.)

Claro! "Magister dixit" — e o aluno... que se reduzisse à sua insignificância!...

Chegados aqui, estamos habilitados a comparar o impetuoso, injusto e agressivo polemista que foi o Prof. Jaime Lopes Amorim com o homem afável e de gentil trato pessoal que ele também foi. Parece que o Prof. Amorim, tal como o Frankenstein do filme "O Médico e o Monstro", se transformava diametralmente quando, no seu gabinete de trabalho, empunhava uma caneta para polemizar! Isto me levou já a dizer que, como polemista, o Prof. Lopes Amorim escrevia com... um varapau!

E com que força ele batia! Eu tive a sorte de ser, sem dúvida, o menos mal tratado de todos os que com ele mantiveram discussões escritas. No entanto, não deixou de me mimosear com expressões que não me favoreciam.

Um aspecto, porém, não quero deixar de registar aqui. Estou crendo que o Prof. Amorim (não sei se quanto a outros, mas, pelo menos, quanto a mim) não guardou ressentimentos, duma maneira geral, contra os seus antagonistas.

Digo-o porque o senti eu próprio: depois, como antes da polémica, o Prof. Amorim, sempre, em todos os contactos pessoais, me tratou com a mesma afabilidade e creio que, até, com maior consideração — o que reverte a seu favor. Para o provar, vou reproduzir aqui algumas dedicatórias que apôs em livros seus, que me ofereceu.

Assim, em 1937, quando ambos éramos assistentes do antigo Instituto Comercial do Porto, teve a gentileza de oferecer-me as suas notáveis "Lições de Contabilidade Geral", com a seguinte dedicatória:

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Em 1950, já, portanto, alguns anos depois de terminada a nossa polémica, estava, então, o Prof. Lopes Amorim dirigindo uma divisão de estudos económicos do Instituto do Vinho do Porto, onde elaborou vários trabalhos que sempre me ofereceu com amáveis e amigas dedicatórias, de que, a título de exemplo, transcrevo as seguintes:

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Í0NDA DOS MERCADOS EXTERNOS EM Í94S

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Muito mais tarde, em 1969 — quando o Prof. Lopes Amorim se estava já aproximando dos seus oitenta anos de idade (!), publica o notável trabalho que intitulou "Digressão Através do Vetusto Mundo da Contabilidade",(18) de que me ofereceu um exemplar, enriquecido com a seguinte dedicatória:

(18) Embora o exemplar que gentilmente me ofereceu esteja cheio de observações discordantes que em muitos passos lhe apus, considero essa obra um excelente trabalho, cuja leitura aconselho aos cultores da Contabilidade. Infelizmente, encontra-se há muitos anos esgotado.

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Como se verifica por estas transcrições, o Prof. Lopes Amorim não guardou qualquer ressentimento da... "irreverência" de um seu ex-aluno, ainda, então, na casa dos vinte anos — quase trinta... —, ter discordado de alguns dos seus pontos de vista. É que o Prof. Lopes Amorim era estruturalmente um homem sério. Ele era, fundamentalmente, uma pessoa de bem!

E é esta mais uma homenagem que não pode deixar de ser-lhe feita.

Porto, Janeiro de 1995.

u i ^ 7

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N O T A APENDICULAR

Entre a data em que enviei para a tipografia o material deste trabalho e aquela em que revi as suas primeiras provas, procurei esclarecer-me sobre os conteúdos da legislação a que faço referência na primeira página; e, sem ter podido ficar inteiramente elucidado, obtive, pelo menos, a informação bastante para agora me emendar de certa inexactidão.

Com efeito, o Decreto n° 20.440, de 27/10/31, contrariamente ao que digo no texto, não extinguiu coisa nenhuma, pois simplesmente aprova o regulamento do Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras.

Antes dele, porém, em 02/12/30, é publicado o Decreto n° 19.081, que cria a Universidade Técnica de Lisboa, em que se inclui o "Instituto Superior de Comércio (obviamente de Lisboa, acrescento eu), que passará a denominar-se Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras."

Uns meses mais tarde, em 05/06/31, é publicado no Diário do Governo o Decreto nc 19.848, de 02/06/31, que aprova o Estatuto da Universidade Técnica de Lisboa.

Portanto, a partir de 1930, os estudos superiores de Ciências Económicas em Portugal passaram a fazer-se:

— Em Lisboa, no Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras, em cuja Universidade Técnica foi integrado, com aquela designação, o Instituto Superior de Comércio de Lisboa;

— no Porto, no Instituto Superior de Comércio do Porto.

Acontece, por outro lado, que, em 1933, pelo Decreto-Lei n° 22.739, de 26 de Junho, é extinto — agora sim, e não em 1931, como erradamente digo na primeira página deste texto — o Instituto Superior de Comércio do Porto, que, todavia, funcionou em regime de período transitório até o ano lectivo de 35/36, inclusive.

Assim, é que tudo fica certo.

Porto, 19/02/95

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DUMARCHEY E A SUA OBRA

Posto isto, DUMARCHEY inicia, a seguir, um novo capítulo em que trata de classes e séries e que, para mim, é um dos mais interessantes e mais importantes da sua Théorie Positive, porque estes assuntos se prendem intimamente com a noção de conta que, por outro lado, se baseia na noção de produto e que não passa duma simples generalização desta mesma noção.

Com efeito, classificar objectos ou factos é agrupar esses objectos ou factos segundo uma característica comum que faz com que todo o objecto ou facto que a possua se deva considerar como elemento do grupo em subordinação à qual este se tenha constituído.

Se o grupo fôr muito extenso, isto é, se ele contiver um número apreciável de objectos ou de factos será sempre possível decompô-lo em grupos menos extensos em que se torne cada vez mais nítida a semelhança específica dos elementos agrupados, cuja natureza nos é indicada pela denominação particular que a cada um dos grupos deve ser atribuída.

Essa denominação deve ser suficientemente precisa para que por ela se possa definir, com o maior rigor possível, o seu verdadeiro âmbito, ou seja a categoria dos elementos que será lícito incluir em cada um dos grupos constituídos, cuja extensão, que nos é dada pelo número dos elementos agrupados, poderá ir desde o elemento, simples e, portanto, insusceptível de decomposição ou de desintegração até à universalidade dos elementos que reúnam a característica comum que serviu de ponto de vista ou de directriz ao agrupamento empreendido.

E isto já nos deixa ver que a denominação, a que se dá o nome de compreensão, será pois tanto mais precisa ou tanto mais inteligível quanto menor for o número de elementos do grupo a que ela se aplique.

O máximo da inteligibilidade atingir-se-á, pois, quando o grupo comportar um único elemento.

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A disposição dos grupos assim obtidos segundo o grau da sua extensão ou da sua complexidade constitui aquilo a que se chama série.

Seriar grupos de objectos ou de factos é dispor, portanto, esses grupos de maneira que a transição de um para o seguinte se faça em subordinação a um grau crescente de compreensão ou decrescente de extensão ou vice-versa, consoante se desça do complexo para o simples, da universalidade para a unidade, ou se suba desta até àquela.

A cada um desses grupos, mais ou menos extensos, a que a classificação poderá dar lugar, dá-se o nome de classe; e a cada classe assim obtida dá DUMARCHEY O nome de Conta que ele define exactamente como definiu "Produto", on seja como uma classe de unidades de valor variável no espaço e no tempo, visto que a Conta poderá consistir de um ou mais elementos e, como tal, apresenta os mesmos caracteres que a estes são atribuídos porque com eles se confunde.

A superioridade desta definição sobre a formulada pelos predecessores de DUMARCHEY, que consideravam a conta como um registo metódico das operações relativas a um mesmo valor ou efectuadas com uma mesma pessoa, e indiscutível e representa um progresso real ou positivo no caminho da Contabilidade para a sua meta científica.

Enquanto esta última definição se reporta a meros acidentes por que se manifesta o movimento da conta concretizado nas variações que o valor desta sofre na sucessão do tempo e que nem sempre se verificam, sem que com isso a conta deixe de existir, a definição dada por DUMARCHEY coloca-nos imediatamente diante do seu próprio objecto.

Segundo o conceito de DUMARCHEY a conta aparece-nos como uma relação lógica entre o sujeito e o objecto; e é de relações como esta que se faz o próprio estofo do conhecimento, porque este encontra a sua razão de ser na percepção da verdade pela inteligência.

A conta tal como DUMARCHEY no-la apresenta é a afirmação duma realidade à qual o nosso espírito nenhuma dúvida tem em dar a sua adesão, porque assenta na existência dum objecto conhecido.

Isto equivale, pois, a dizer que Dumarchey define a conta por aquilo que ela realmente é; ao passo que os seus predecessores a definiram por aquilo que ela parece ser.

A diferença entre estes dois conceitos é, como claramente se vê, tão

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grande como aquela que realmente existe entre ser e parecer, com todas as consequências lógicas que ela necessariamente implica:

A falta de objectividade na sua definição de conta, a que há pouco aludi, deve atribuir-se à propensão que DUMARCHEY revela, tanto nesta como noutras obras suas, para aplicar à Contabilidade, absolutamente intactos, conceitos respigados noutros ramos de conhecimento com ou sem nenhumas afinidades com o seu sistema doutrinário.

Com efeito, é êle mesmo que nos diz que chegou à noção de conta pela generalização do conceito económico de produto a elementos abstractos ou imateriais, tais como um débito, um crédito, uma concessão, etc.

Mas a generalização do conceito económico de produto aos créditos e aos débitos para justificar a possibilidade de serem objecto de contas é economicamente inadmissível, porque a Economia geral não considera os créditos e os débitos como elementos de riqueza ou, para me servir das próprias palavras de DUMARCHEY, como classes de unidades de valor.

Os créditos e os débitos só adquirem realmente valor e são, portanto, considerados como elementos de riqueza dentro do domínio ou do âmbito patrimonial, o que equivale, pois, a dizer que a justificação da existência das contas representativas dos ditos elementos terá de ser procurada e encontrada dentro desse domínio, que é o objecto privativo da Contabilidade, e não ser importado de domínios estranhos.

Por aqui se vê que, embora a generalização seja um processo ou um modo corrente de raciocinar, não deve no entanto ser usado de uma maneira atrabiliária e indiscriminada para que se não dê como aqui se deu, o caso de as conclusões, a que se chega, estarem em contradição com as próprias premissas de que se partiu.

Ora a classificação seriada de que DUMARCHEY aqui nos fala é a classificação natural utilizada nas Ciências da natureza para se chegar ao conhecimento racional dos seres simultaneamente coexistentes na sucessão dos instantes e que consiste na redução da multiplicidade indefinida desses seres a um número finito de tipos que representam o que eles têm de comum e as relações gerais que os unem entre si.

Este modo de classificação agrupa pois os seres segundo características essenciais e permanentes; mas é preciso que se diga que tais características não se verificam nos elementos incluídos nas séries da Contabilidade que desempenham um papel decisivo no estudo da fenomenologia patrimonial.

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Com efeito, seria uma tarefa praticamente impossível seriar, por exemplo, rigorosamente os elementos do Activo segundo o grau da sua realização ou da sua conversão em dinheiro por desconhecimento do momento preciso em que ela se verificará.

E como é praticamente impossível tal seriação, nós contentamo-nos com aquele modelo de série que DUMARCHEY preconiza na sua obra, mas que está muito longe de possuir aquela virtude informativa que ele atribui à série natural.

Nem mesmo na seriação dos elementos daquelas secções do património, cuja homogeneidade específica mais se assemelha ao laço comum da animalidade dos seres estudados pela Zoologia, como, por exemplo, a secção constituída pelas Mercadorias, nós conseguiremos formar séries que rigorosamente se possam apelidar de naturais.

E isto porque a construção da série natural tem por fim encontrar e exprimir a ordem seguida pela Natureza no meio das dessemelhanças quase infinitas dos seres; ao passo que a construção da série logismológica não passa do resultado duma simples decomposição ou desintegração dum sector do património em sectores mais pequenos e mais homogéneos em obediência àquele princípio que nos diz que o todo é igual à soma das suas partes, embora nessa decomposição se deva adoptar um determinado ponto de vista.

As séries que a Contabilidade constrói e de que normalmente se utiliza só se assemelham às séries naturais na forma ou no aspecto, mas divergem profundamente destas no tocante ao seu critério informativo e aos seus fins.

A série natural é, como diz DUMARCHEY, realmente um verdadeiro instrumento científico, mas tenho sérios motivos para duvidar de que ela seja, também como ele o diz, a classe geral de todos os nossos conhecimentos relativos a um determinado domínio.

Porém, a série logismológica não passa duma série artificial que tem por fim orientar o nosso raciocínio na análise do património das empresas para que possamos chegar a conclusões exactas, no que respeita ao conhecimento da sua situação económica e financeira presente e futura, em função das relações valorativas das diferentes massas que no património se integram.

Ela possui, portanto, o grande mérito de introduzir a ordem no próprio seio do turbilhão patrimonial e de servir, digamos de corredor ao nosso raciocínio que o poderá assim sulcar em todas as direcções e chegar pronta e seguramente a esse conhecimento.

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Em suma, a série logismológica facilita enormemente o exercício do raciocínio indutivo e dedutivo, mas este não se confina nela como a avezinha enclausurada na sua acanhada gaiola; transcende-a e sobreleva-a sem se deixar enlear nas suas apertadas- malhas, porque estas são para ele balizas ou pontos de referência e não torturantes grilhetas.

/ - / A série logismológica não só não é, pois, o objecto da Contabilidade,

mas também não resume em si toda a trama do método de que Ela normalmente se serve no estudo do seu objecto.

Está, porém, provado que todas as doutrinas verdadeiras que têm aparecido no mundo e que, justamente por serem verdadeiras, acabaram por triunfar pelo decorrer do tempo, conheceram uma época de luta e de contradição.

E a Contabilidade, como qualquer outro sistema de verdades, não pôde escapar a esse fatal percalço, havendo até motivo de sobra para afirmar que esse período de luta e de contradição parece prolongar-se talvez por mais tempo do que seria para desejar, visto que ele dura ainda e nos reduz assim àquele papel de apologista e defensor, que o falecido professor Dumarchey tão galhardamente desempenhou.

Por isso é que a sua valiosa obra que, além da Théorie Positive de la Comptabilité e de La Comptabilité Moderne, compreende várias conferências e artigos em revistas da especialidade, não se pode avaliar bem por aquilo que ela é, e que não é pouco.

Para bem a podermos avaliar teremos de a encarar sob o ponto de vista daquilo que ela representa de esforço perseverantemente desenvolvido pelo seu insigne autor para dotar a Contabilidade duma armadura verdadeiramente científica.

É preciso que nos lembremos de que este grande revolucionador e impulsionador do pensamento logismológico, possuidor duma cultura superior extensa e muito variada, estudou afincadamente durante cerca de dez anos para produzir a sua primeira obra "Théorie Positive de la Comptabilité" que é, para mim — repito — a sua melhor obra.

É impossível, diz Bacon, aperceber as partes mais íntimas duma ciência particular, enquanto se permaneça ao nível desta mesma ciência e se não suba, por assim dizer, a uma ciência mais elevada para a ver daí como que dum miradouro.

DUMARCHEY subiu realmente, porque tinha condições para isso, a uma

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posição mais elevada do que nenhum dos seus predecessores franceses para daí poder abranger e penetrar nesse sibilino mundo da Contabilidade que estes haviam, concebido e descrito duma maneira impressionante pela ingenuidade quase infantil com que o fizeram.

Foi ele, que eu saiba, o primeiro autor francês que procurou aplicar o método científico ao estudo da Contabilidade e reduzir gradualmente as proposições obscuras e ilógicas dos seus predecessores a proposições mais simples e racionais, partindo da intuição das coisas mais fáceis e tratando de se elevar, por sucessivas etapas, ao conhecimento de todas as outras.

As verdades gerais abstractas ou os princípios básicos não despertam logo de início a nossa atenção; para que eles nos impressionem e para que nós deles nos apercebamos distintamente é preciso que as nossas reflexões sobre certos factos percebidos nos forcem a chegar a eles e a dar-nos conta de que eles são a sua origem, a sua explicação e a sua justificação.

Mas nós não poderemos adquirir uma noção exacta desses princípios basilares a não ser com o auxílio de manifestações encontradas no fundo do nosso ser, as quais nos fazem passar dos factos aos seus princípios, chamando para eles a nossa atenção que constitui a trave-mestra da observação que é o principal processo do método de investigação das ciências concretas.

A ciência só pode ser a resultante dum esforço intelectual que nos ponha em relação com uma realidade e que ligue entre si os diversos elementos de que ela se compõe por meio de relações lógicas, mercê das quais nós nos apercebamos do que ela é, da sua natureza e de todos os seus atributos.

Esse esforço intelectual desenvolvido no sentido de criar, parcela por parcela, a ciência da Contabilidade revela-se claramente ao menor, contacto com a obra de DUMARCHEY, não só pelo quilate do sumo do seu conteúdo mas até pelo simples aspecto dos seus textos, como facilmente se reconhecerá folheando a sua "Comptabilité Moderne", publicada em 1925.

Mercê desse esforço adquir iu uma fé inabalável no futuro da Contabilidade, ciência desconhecida, depois mal conhecida, cuja hora, diz ele, ainda não soou, mas que — ele o diz também — está iminente, baseando-se para o dizer na velocidade do seu desenvolvimento que, de infinitesimal que era em princípio, se vem acelerando como a de um corpo que cai, partindo das nuvens para o centro da Terra.

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Meditemos, portanto, por uns momentos, na grandeza do esforço e da fé desse obstinado cabouqueiro dos alicerces da Ciência da Contabilidade e aproveitemos esse momento para nos curvarmos, em espírito, perante a saudosa memória de quem conservara o nome do nosso País bem junto do seu coração como prova de profunda gratidão pelo bom acolhimento que a sua obra aqui sempre encontrou, para o qual alguma coisa contribui, e que o levou a fazer, numas notas autobiográficas que me foram enviadas por pessoa amiga, a seguinte honrosa afirmação:

"Em Portugal, terra de élite, a minha obra encontrou o seu verdadeiro meio, o centro a partir do qual ela se espraia dia a dia em ondas que se vão estendendo em direcção às que vêm de outros países".

In Revista de Contabilidade e Comércio. Ano XV. n° 57, Janeiro-Março (1947), p. 23-50.

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METODOLOGIA GERAL DA CONTABILIDADES)

O método está para o trabalho intelectual numa relação idêntica àquela em que a alavanca e outros instrumentos, que multiplicam o rendimento da força do homem estão para o rude trabalho braçal.

Não é, pois, para admirar que ele desempenhe um papel preponderantíssimo em todos os ramos de conhecimento, tão preponde­rante que a sua presença é a condição absolutamente indispensável à existência de qualquer ciência.

Método é sinónimo de ordem; e a ordem permite chegar á verdade com a maior segurança e a maior rapidez possíveis.

Ele constitui o caminho maior curto para se chegar à descoberta da verdade, porque ordena e canaliza o esforço cerebral em determinado sentido, pondo as coisas nos seus respectivos lugares e proporcionando, com isso, uma apreciabilíssima economia de tempo e de energia intelectual.

Acanhado, como é, o cérebro do homem e servido, para mais, de sentidos muito falíveis, em que, por conseguinte, se não pode depositar confiança absoluta, ele seria impotente para, por si só, alcançar a verdade, se não tivesse a corrigi-lo nos seus desvios as balizas orientadoras dos diferentes processos em que o método geral se desdobra.

Com efeito, sendo o método o caminho mais curto para se poder atingir a verdade, só poderá ser transposto em dois sentidos opostos: no sentido de ida e no sentido de regresso.

Embora, pois, o método geral seja um só para todos os ramos de conhecimento, ele reveste e admite, no entanto, praticamente, duas

(*) Conferência proferida pelo Autor, a convite da Sociedade Portuguesa de Contabilidade, na sua sede, Instituto Comercial de Lisboa, no dia 19 de Dezembro de 1950.

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modalidades correspondentes às duas direcções em que o seu percurso se poderá fazer e que têm respectivamente os nomes de indução e dedução.

Estas duas modalidades gerais poderão, por sua vez, decompor-se em tantos processos ou tantos métodos especiais quantos forem os diversos veículos de que nos utilizemos para a realização do percurso nos dois sentidos que elas naturalmente implicam.

Daí o definir-se o método em geral como um conjunto de processos que correspondem, no domínio da locomoção material, ao conjunto de meios de transporte de que nos poderemos servir para nos deslocarmos de um para outro local.

E assim como, no domínio da locomoção material, os meios de transporte a utilizar poderão variar consoante a distância e a posição geográfica do lugar que se pretende atingir, também no domínio do transporte das ideias os meios ou processos a utilizar para se chegar à verdade poderão variar consoante a natureza e a complexidade do objecto a que as ideias se reportem.

Poder-se-á, pois, fazer indução e dedução por vários processos, na certeza, porém, de que nem todos têm o mesmo grau de importância para qualquer ramo de conhecimento que se considere, ramos havendo em que é notório o predomínio ou até o exclusivismo de determinado processo.

Assim, enquanto as matemáticas se servem quase exclusivamente da demonstração que é um processo eminentemente dedutivo, as ciências naturais especialmente a Botânica e a Zoologia, servem-se quase exclusivamente da classificação e da comparação que são processos inerentes à indução.

Posto isto, já não teremos dificuldade em definir a metodologia de um determinado ramo de conhecimento como o estudo dos processos de raciocínio mais adequados à descoberta das verdades que lhe dizem respeito.

E a Contabilidade, como ramo de conhecimento humano que é, também possui a sua própria metodologia ou o seu próprio instrumental para chegar à verdade dentro dos seus próprios domínios.

Estudar, portanto, a metodologia ou o método geral da Contabilidade o mesmo é que estudar os diferentes processos de raciocínio de que ela se serve para poder chegar à verdade complexa sinteticamente representada por aquilo a que vulgarmente se chama a equação do Balanço e às verdades menos complexas, mas talvez mais transcendentes ou mais abstractas que com aquela se relacionam.

A Contabilidade ocupa-se do património das empresas considerado

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como um conjunto de elementos económicos, respeitantes a uma determinada entidade e susceptíveis de expressão em moeda de conta.

Mas como o patr imónio está animado de um movimento que continuamente lhe é imprimido por forças naturais de natureza diversa, a verdade que ele traduz varia de instante para instante por efeito desse mesmo movimento.

É uma verdade inconstante, uma verdade que nos está sempre a fugir e que exige de nós a posse de um instrumental muito sensível e complexo para podermos correr atrás dela e surpreendê-la através da sua fuga.

Esse instrumental no seu objectivo final é qualquer coisa de parecido com a rede de arrasto de que os pescadores se servem para apanhar nos nossos rios o peixe que, vindo do mar no tempo da desova, sobe por eles acima em louca correria para dar cumprimento ao destino, que a Natureza lhe impôs, de assegurar a continuação da espécie.

Tal instrumental constitui, portanto, o arsenal que terá de ser continuamente mobilizado em obediência a uma táctica que será tanto mais eficaz e tanto mais de recomendar, quanto mais cómoda e rapidamente ela permitir que nos colemos à verdade.

Esta tarefa implica a utilização de processos vários de observação que, no seu conjunto, se concretizam naquilo a que vulgarmente se dá o nome de técnica contabilística.

A técnica contabilística consiste, pois, na utilização de processos de observação que permitam estabelecer, se nos é permitida a expressão, um sistema de sinalizações que nos coloque na peugada da verdade essencialmente mutável de instante para instante, e nos proporcione a possibilidade de a agarrar no momento desejado.

A Contabilidade surgiu, pois, como uma técnica que, ab initio, teve de fazer largo apelo ao arsenal da metodologia geral e que a sua forma actual, na sua forma acabada, nos aparece como um verdadeiro enfeixamento de processos metodológicos.

atingir a verdade, só poderá ser transposto em dois sentidos opostos: no sentido de ida e no sentido de regresso.

Embora, pois, o método geral seja um só para todos os ramos de conhecimento, ele reveste e admite, no entanto, prat icamente, duas modalidades correspondentes às duas direcções em que o seu percurso se poderá fazer e que têm respectivamente os nomes de indução e dedução.

Estas duas modalidades gerais poderão, por sua vez, decompor-se em tantos processos ou tantos métodos especiais quantos forem os diversos

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veículos de que nos utilizemos para a realização do percurso nos dois sentidos que elas naturalmente implicam.

Daí o definir-se o método em geral como um conjunto de processos que correspondem, no domínio da locomoção material, ao conjunto de meios de transporte de que nos poderemos servir para nos deslocarmos de um para outro local.

E assim como, no domínio da locomoção material, os meios de transporte a utilizar poderão variar consoante a distância e a posição geográfica do lugar que se pretende atingir, também no domínio do transporte das ideias os meios ou processos a utilizar para se chegar à verdade poderão variar consoante a natureza e a complexidade do objecto a que as ideias se reportem.

Poder-se-á, pois, fazer indução e dedução por vários processos, na certeza, porém, de que nem todos têm o mesmo grau de importância para qualquer ramo de conhecimento que se considere, ramos havendo em que é notório o predomínio ou até o exclusivismo de determinado processo.

Assim, enquanto as matemáticas se servem quase exclusivamente da demonstração que é um processo eminentemente dedutivo, as ciências naturais especialmente a Botânica e a Zoologia, servem-se quase exclusivamente da classificação e da comparação que são processos inerentes à indução.

Posto isto, já não teremos dificuldade em definir a metodologia de um determinado ramo de conhecimento como o estudo dos processos de raciocínio mais adequados à descoberta das verdades que lhe dizem respeito.

E a Contabilidade, como ramo de conhecimento humano que é, também possui a sua própria metodologia ou o seu próprio instrumental para chegar à verdade dentro dos seus próprios domínios.

Estudar, portanto, a metodologia ou o método geral da Contabilidade o mesmo é que estudar os diferentes processos de raciocínio de que ela se serve para poder chegar à verdade complexa sinteticamente representada por aquilo a que vulgarmente se chama a equação do Balanço e às verdades menos complexas, mas talvez mais transcendentes ou mais abstractas que com aquela se relacionam.

A Contabilidade ocupa-se do património das empresas considerado como um conjunto de elementos económicos, respeitantes a uma determinada entidade e susceptíveis de expressão em moeda de conta.

Mas como o patr imónio está animado de um movimento que continuamente lhe é imprimido por forças naturais de natureza diversa, a

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verdade que ele traduz varia de instante para instante por efeito desse mesmo movimento.

É uma verdade inconstante, uma verdade que nos está sempre a fugir e que exige de nós a posse de um instrumental muito sensível e complexo para podermos correr atrás dela e surpreendê-la através da sua fuga.

Esse instrumental no seu objectivo final é qualquer coisa de parecido com a rede de arrasto de que os pescadores se servem para apanhar nos nossos rios o peixe que, vindo do mar no tempo da desova, sobe por eles acima em louca correria para dar cumprimento ao destino, que a Natureza lhe impôs, de assegurar a continuação da espécie.

Tal instrumental constitui, portanto, o arsenal que terá de ser continuamente mobilizado em obediência a uma táctica que será tanto mais eficaz e tanto mais de recomendar, quanto mais cómoda e rapidamente ela permitir que nos colemos à verdade.

Esta tarefa implica a utilização de processos vários de observação que, no seu conjunto, se concretizam naquilo a que vulgarmente se dá o nome de técnica contabilística.

A técnica contabilística consiste, pois, na utilização de processos de observação que permitam estabelecer, se nos é permitida a expressão, um sistema de sinalizações que nos coloque na peugada da verdade essencialmente mutável de instante para instante, e nos proporcione a possibilidade de a agarrar no momento desejado.

A Contabilidade surgiu, pois, como uma técnica que, ab initio, teve de fazer largo apelo ao arsenal da metodologia geral e que a sua forma actual, na sua forma acabada, nos aparece como um verdadeiro enfeixamento de processos metodológicos.

Tanto assim é que o seu método tem sido e continua a ser erroneamente tomado ou confundido, por muitos, com o seu verdadeiro objecto.

Esta tendência para confundir o objecto da Contabilidade com o seu método ainda se mantém em França com aquela crença e aquela perseverança que tanto caracterizam a bibliografia logismológica do referido país.

Não nos deve, porém, causar estranheza esta atitude mental dos tratadistas franceses e dos de outros países em que predomina a influencia daqueles, visto que o objecto próprio da Ciência são mais as leis do movimento da matéria do que a matéria propriamente dita.

De facto, se o património nos aparecesse como um todo eminentemente estático nenhum lugar haveria para a arquitectação de uma técnica contabilística porque lhe faltaria o motivo fundamental da sua existência.

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Dizer, portanto, técnica, neste caso o mesmo é que dizer um método geral, cuja aplicação implica utilização de processos vários que melhor se coadunam com os objectivos que se pretende atingir.

Ora nos ramos de conhecimento que, como a Contabilidade, se servem da indução, a observação desempenha um papel muito importante, tão importante que não falta quem considere como o único método positivo, ou seja o único método que permite ao homem sentir a realidade das coisas e tornar-se consciente delas, adquirir conhecimentos e atingir a verdade.

A observação poder-se-á definir como a operação mental mediante a qual fixamos a nossa atenção num objecto ou num fenómeno para chegarmos a ter dele um conhecimento o mais completo possível.

Prat icamente , a observação apresenta-se como um processo metodológico bastante complexo que se poderá desdobrar em processos mais simples correspondentes às diferentes maneiras de observar.

Daí, o poder-se considerar, ao lado da observação directa na sua mais simples expressão, outros processos de observar de que em Contabilidade se faz mister lançar mão para que se consiga alcançar a verdade com, a maior rapidez e a maior segurança possíveis.

Assim, quando se trata de adquirir um conhecimento genérico do património de uma determinada entidade, limitamo-nos a observar os diferentes elementos de que ele se compõe tais como eles se apresentam aos nossos sentidos. A esta atitude mental se reduz, pois, a observação naquilo que ela tem de mais simples e mais elementar. Mas se pretendermos ter dele um conhecimento mais profundo no seu aspecto qualitativo, necessário se tornará decompô-lo em categorias qualitativas mediante a utilização de outros processos de investigação entre os quais se destaca, pela sua importância dentro dos domínios da Contabilidade, a classificação.

Por classificação, em Contabilidade, dever-se-á entender o processo de raciocínio indutivo que consiste em agrupar os objectos ou os fenómenos segundo determinados pontos de vista que tanto poderão reportar-se à analogia qualitativa desses objectos ou fenómenos como à função que eles desempenham dentro da mecânica do complexo patrimonial.

A classificação permite-nos reduzir a pluralidade do cosmos que praticamente se apresenta, de uma maneira geral, como um complexo de um grande número de elementos de ordem vária, a um número limitado de categorias de elementos patrimoniais, e simplificar enormemente o conhecimento do todo, oferecendo-nos uma visão de conjunto através dos seus aspectos mais salientes e mais reveladores.

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A classificação alivia a memória, faculta uma extensão ilimitada dos nossos conhecimentos e facilita a interpretação dos fenómenos gerados pelo movimento de que o património se encontra naturalmente animado.

Porém o processo da classificação pressupõe o recurso prévio a outros processos, especialmente à abstracção analítica e à generalização.

Para bem se compreender o papel desempenhado por estes dois processos, e preciso ter em conta que a classificação implica uma ideia ou um ponto de vista que terá de ser definido por um termo ou denominação apropriada que exprima ou reproduza essa ideia ou ponto de vista o mais fielmente e claramente possível.

Ora a abstracção analítica consiste precisamente em verificar ou distinguir, em cada objecto ou facto de um aglomerado complexo, o requisito essencial para que ele seja incorporado na classe que lhe competir.

Assim, ao constituir a classe "Mercadorias" ter-se-ão de pôr de parte as diferentes analogias qualitativas para apenas nos fixarmos no ponto de vista geral que o termo "mercadorias" nos inculca e que se reporta a todos os objectos que a empresa compra para os vender em seguida.

O termo "mercadorias" é, de facto, suficientemente amplo para que dentro dele caibam objectos sem a menor analogia qualitativa e, neste caso, não foi, portanto nessa analogia que se baseou a abstracção; todas as considerações que tal analogia nos poderia sugerir tiveram de ser postas de parte para se atender apenas ao requisito comum que no mundo dos negócios é atribuído ao referido termo.

Qualitativamente, não se poderá afirmar que o ácido sulfúrico, por exemplo, se parece, com a pedra-pomes e esta com o trigo roxo, e este, por sua vez, com o papel para apanhar moscas; no entanto, todos estes produtos e muitos mais, que não apresentam entre si qualquer analogia qualitativa, são agrupados ou incluídos na classe "Mercadorias" na contabilidade das empresas que se dediquem ao comércio de drogaria.

Porém, quanto menos genérico e mais específico for o ponto de vista expresso pela denominação da classe a constituir, tanto mais a abstracção se terá de circunscrever ao aspecto qualitativo dos elementos a agrupar.

Com efeito, se se pretendesse constituir, por exemplo a classe cereais, a abstracção teria de incidir sobre o requisito específico que nos é inculcado pelo termo cereais.

Por isso, é que há pouco dissemos que a classificação tanto poderá obedecer ao critério qualitativo ou específico dos elementos ou fenómenos a agrupar como da função que eles desempenham dentro do mecanismo do

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complexo patrimonial, na certeza, porém, de que quanto maior for o âmbito da classe, menos importância terá para nós o ponto de vista qualitativo ou específico.

Uma vez decompostos e individualizados os elementos da realidade complexa por meio da abstracção analítica, entra em jogo uma nova operação mental complementar — a generalização —que consiste em aproximar certos pontos de analogia verificados em diferentes elementos e reuni-los numa única ideia que os abranja a todos, e com o que se culmina na classe tal como há pouco a definimos.

A generalização faz desaparecer os caracteres particulares para só tomar em consideração as propriedades comuns, reunindo assim numa mesma ideia todos os elementos de uma mesma índole, mas sem traduzir tudo o que neles se contém de particularmente específico.

A generalização, por seu turno, apoia-se na comparação ou seja a aproximação ou cotejo de um ou mais requisitos comuns verificados em objectos diferentes, mediante o qual se chega ao seu agrupamento ou à sua classificação que os abrange a todos sob um mesmo aspecto ou um mesmo ponto de vista definido por uma denominação adequada.

Pela abstracção analítica isolam-se determinadas qualidades de um todo complexo, dando-se assim à nossa mentalidade possibilidades de melhor as observar, de as avaliar e de as comparar do ponto de vista de cada uma dessas qualidades.

Pela comparação, seleccionam-se essas qualidades segundo o seu grau de semelhança ou de dessemelhança e assim se prepara o caminho para a generalização das qualidades semelhantes e para a obtenção de uma ideia geral, de uma particularidade comum, verificada em muitos e variados objectos ou fenómenos, sob a qual todos são agrupados e classificados.

A generalização é uma operação mental que se faz mister executar com a maior prudência e o maior discernimento possíveis, para que se não chegue a erros ou a falsos raciocínios que geralmente resultam de atitudes atrabiliárias ou precipitadas.

Toda a generalização que não se baseie na abstracção e na comparação não nos poderá oferecer a menor garantia de estar de acordo com a realidade das coisas.

Na generalização encontram-se intimamente associados os dois aspectos, sob os quais ela poderá ser encarada: a extensão e a compreensão.

O primeiro desses aspectos — a extensão — é a generalização considerada quanto ao maior ou menor número de objectos a que se aplica

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uma ideia geral que se mede, pois, pelo número de objectos ou de seres por ela, abrangidos e aos quais se aplica o termo ou denominação que a exprime.

Assim, a ideia de "Activo" é mais extensa do que a de "Mercadorias" e esta, por sua vez, mais extensa do que a de "Tecidos"; e esta, por seu turno, mais extensa do que a de "Lanifícios"; e esta, mais extensa ainda do que a de "Estambres".

O segundo dos seus aspectos — a compreensão — é a generalização considerada quanto ao maior ou menor número de propriedades comuns a todos os objectos a que se poderá atribuir um termo ou denominação.

O âmbito da compreensão avalia-se pelo maior ou menor número de particularidades comuns a que se deverá atender para a formação da ideia geral, na certeza, pois de que esta será tanto mais precisa ou tanto mais inteligível quanto mais rigorosamente essa ideia expressa por uma denominação adequada nos permita fazer a individualização dos objectos por ela abrangido?

Assim a ideia de "Activo" é muito menos inteligível do que a ideia expressa pelo termo "Mercadorias", visto que pela enunciação do termo Activo não nos poderemos aperceber exactamente da natureza dos diferentes elementos que entram na sua formação; ao passo que pela enunciação do termo Mercadorias o nosso espírito é naturalmente levado a fixar-se numa categoria de objectos, embora estes possam diferir enormemente uns dos outros sob o ponto de vista qualitativo.

A ideia expressa pelo termo "Mercadorias" é, como acabamos de ver, muito menos vaga do que a expressa pelo termo "Activo" que é, portanto, muito menos preciso ou muito menos inteligível do que aquele.

Por sua vez, a ideia expressa pelo termo "Tecidos" é muito mais precisa ou mais inteligível do que a expressa pelo termo "Mercadorias" que, além dos tecidos, poderá abranger as coisas mais diversas que possam ser objecto de transacções comerciais.

E, por seu turno, a ideia expressa pelo termo "Lanifícios" é mais precisa do que a expressa pelo termo "Tecidos" que poderá abranger, não só os lanifícios, mas também os os algodões, as sedas, os linhos, etc., etc..

Daqui se conclui, pois, que os termos mais gerais, isto é, os termos que abrangem um maior número de objectos diferentes, são os de maior ensino e os de menor compreensão ou de menor inteligibilidade e que extensão está, portanto, na razão inversa da compreensão.

Esta é a síntese de que aquela é a análise; mas, por sua vez, a síntese de um determinado grau permite-nos fazer a análise no grau imediatamente

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superior. É da simbiose da extensão e da compreensão que resulta a generalização,

ou seja a operação mental graças à qual se transpõe o limiar da classificação e se alcançam as vantagens que esta nos pode proporcionar como processo do método geral da Contabilidade, simplificando todo o trabalho mental por meio de uma análise prévia dos elementos observados e suprindo, assim as deficiências da nossa inteligência e a infidelidade da nossa memória.

Para ser racional ou perfeita, a classificação deve incluir todos os objectos ou fenómenos a classificar no grupo competente, não devendo qualquer desses objectos ou fenómenos figurar em dois grupos diferentes.

Em Contabilidade, porém, a classificação não reveste a feição natural com que se apresenta nas ciências biológicas, especialmente na Botânica e na Zoologia, mas sim um cunho artificial, visto que não se baseia em analogias profundas e imutáveis como aquelas que se notam nos seres da Natureza, mas apenas em analogias meramente convencionais.

Mas isso em nada altera o seu grande méri to de contr ibuir poderosamente para introduzir a ordem nos nossos conhecimentos do complexo patrimonial e para unificar a verdade entre a multiplicidade dos elementos que nele se contêm.

E preciso não esquecer que o complexo patrimonial é um cosmos de riqueza que se movimenta continuamente e que o método geral da Contabi l idade encontra a razão da sua aplicação precisamente no conhecimento contínuo da verdade acerca da sua composição quantitativa qualitativa e valorativa, que vai variando de instante para instante por efeito do referido movimento.

Por outro lado, faz-se mister não esquecer que os elementos patrimoniais não se movimentam todos ao mesmo tempo nem com igual intensidade e que, ao falarmos em movimento, se não deverá inferir que se trata de movimento físico, mas sim de movimento económico que praticamente se traduz por variações no valor, na qualidade e na quantidade dos referidos elementos e, por via de reflexão, na estrutura valorativa, qualitativa e quantitativa do todo de que fazem parte, transformado por meio da classificação numa sobreposição de camadas que nos dão uma visão escalonada dessa estrutura.

Para o conhecimento desta no seu tríplice aspecto — quantitativo, qualitativo e valorativo — teremos, portanto, de começar por conhecer, de uma maneira permanente, o número, a qualidade e o valor de cada elemento, quando isso seja possível e necessário ou, pelo menos, a qualidade e o valor

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de cada grupo de compreensão acessível, isto é, de compreensão que nos permita fazer uma análise rápida e satisfatória do todo patrimonial.

Para isso, recorre-se à combinação de três processos de investigação que, no seu conjunto, constituem um método especial que é característico ou privativo da Contabilidade e a que poderemos dar o nome de método de relevação da conta, entendendo-se aqui por conta cada um dos elementos ou grupo de elementos obtidos por meio do processo de classificação a que, directa ou indirectamente, se aplique este método.

Os três processos integrados no método de relevação são: 1) — A descrição cronológica dos motivos das variações quantitativas e

valorativas ocorridas no elemento ou grupo de elementos a que o método se aplica e que nos fornece a própria história dessas variações;

2) — A tabulação dos números inerentes às quantidades e aos valores iniciais e às variações que aí se vão produzindo, a qual nos mostra a medida desses valores ou dessas variações;

3) — A comparação que nos permite determinar a quantidade e o valor do elemento ou grupos de elementos após cada uma das variações ou de toda uma série de variações ocorridas entre o momento inicial e o momento posterior que se deseje.

Praticamente o processo da comparação resume-se naquilo a que correntemente se chama o balanceamento que consiste em estabelecer a diferença entre a soma do valor inicial de cada elemento ou grupo de elementos com as suas variações aumentativas, de um lado, e a soma das suas variações diminutivas até ao momento considerado, de outro lado.

Para tal efeito, a tabulação poderá apresentar várias disposições consoante a maior ou menor necessidade de se conhecer a quantidade e o valor, ou só o valor, de cada elemento ou grupo de elementos após cada uma das variações ocorridas.

O método especial de relevação da conta permite-nos realizar a análise através da descrição cronológica dos diferentes motivos das variações dos elementos ou grupos de elementos e da tabaulação dos respectivos valores, e fazer a prova ou a demonstração da exactidão da situação existente numa determinada data, apurada por meio da comparação.

Pode afirmar-se, sem receio de desmentido, que a técnica contabilística começou com a concepção e aplicação deste método que, repetimos, é privativo da Contabilidade, embora haja muita gente culta que suponha erroneamente que este foi importado da estatística.

Os que assim pensam, porém, ignoram que a tabulação na estatística

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só começou a ser utilizada a partir do século XVIII, quando é certo que a Contabilidade, cujas origens remontam a tempos muito recuados, surgiu com a própria tabulação.

A presença dos termos Deve e Haver, que encimam as colunas destinadas a tabulação e inculcam respectivamente obrigações e direitos, mostram-nos claramente que o método da relevação da conta começou por ser utilizado para se determinar a posição devedora e credora de cada um dos indivíduos a quem o comerciante vendia ou comprava mercadorias a crédito.

Tratava-se aqui, como se vê, de entidades que poderiam duvidar da veracidade do valor do débito ou do crédito apresentado pelo comerciante e daí a necessidade de este inventar um método que lhe permitisse provar a veracidade desse valor, pelo registo cronológico das operações realizadas com cada um dos seus devedores ou dos seus credores.

A medida que o tráfico de mercadorias se foi intensificando e exigindo a inversão de capitais cada vez mais avultados com a prática do comércio internacional em grande escala e com a feição grandemente aleatória que ele revestia, pelos perigos das travessias marítimas feitas em pequenos navios de vela e dos grandes intervalos de tempo que mediavam entre a partida e o regresso desses navios, o comerciante, para seu governo, viu-se na necessidade de ter sempre à mão um registo actualizado das quantidades e valores das mercadorias que constituíam o objecto especial do seu comércio.

Perante tal necessidade, o seu contabilista passou a aplicar mui naturalmente a essas mercadorias o mesmo método de relevação que já vinha aplicando às dívidas activas e passivas.

Para isso, bas tou- lhe proceder por analogia, ass imi lando indevidamente, claro está, as coisas do seu património às pessoas e passando a ver naquelas os atributos que só a estas seria legítimo conferir.

Embora teoricamente aqui se produzisse uma distorção de conceitos, praticamente chegava ao resultado desejado que era justamente o que lhe convinha.

A medida que os contabilistas iam prosseguindo no caminho de estender o método de relevação da conta aos diferentes elementos materiais do património dos comerciantes, a Contabilidade ia-se aproximando, cada vez mais, da sua forma definitiva que só foi atingida quando o referido método passou a ser aplicado também no Capital e aos resultados da exploração.

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Depois que isto sucedeu, caiu-se num sistema de representação patr imonial completo que tem o grande mérito de permitir que se mantenham em estreito confronto as causas (elementos activos e passivos) e os seus efeitos (componentes ideais do capital próprio).

Para se chegar ao conhecimento desta verdade, teremos de nos socorrer do processo histórico observando o que sobre este assunto foi escrito pelos diferentes tratadistas em várias épocas.

Analisando as obras desses escritores não só se verifica que a sistemática logismológica evoluiu no sentido que acabamos de apontar, mas também se verifica que a marcha ou o caminho seguido se deu do simples para o complexo, do elemento individualmente considerado para a síntese máxima t raduzida pela Equação do Balanço, sem quaisquer etapas intermediárias.

Esta fase da sistemática logismológica, que se nos depara na obra do primeiro tratadista da Contabilidade e nas obras dos que se lhes seguiram, perdurou durante séculos e ainda nos aparece em escritores do século findo.

O Razão geral, em que modernamente só se relevam contas complexas, antigamente servia para a relevação das contas elementares, o que prova que o processo da classificação, mediante o qual se constituem as contas complexas, só mais modernamente do que muita gente seria levada a crer é que começou a fazer parte do arsenal da sistemática da Contabilidade.

Do século XVIII para trás, naquilo a que hoje se chama "Razão geral" relevavam-se as contas de cada crédito e de cada dívida que o comerciante ia contraindo, as contas de cada espécie de mercadoria, dos depósitos em cada banco, etc., etc..

Era um Razão de feição puramente analítica; e a sua feição sintética só surgiu por efeito do sucessivo desenvolvimento do comércio e da necessidade inerente de uma extensão cada vez maior dos patrimónios das empresas privadas, cujo conhecimento não se poderia fazer comodamente através da análise dos variadíssimos elementos que entravam na sua composição.

Para superar esta dificuldade é que se recorreu à classificação ou agrupamento dos elementos patrimoniais, graças à qual se pôde alcançar um conhecimento satisfatório do complexo patrimonial através das categorias ou grupos resultantes da classificação, sem corrermos o risco de nos embrenharmos na imensa teia dos diferentes elementos que nos impediria uma visão rápida e concludente do conjunto.

Mas o desenvolvimento da empresa capitalística está muito longe de

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ter atingido o seu derradeiro limite, embora actualmente assuma por vezes aspectos que nos pareçam dificilmente inultrapassáveis e que talvez fizessem morrer de susto os contabilistas dos tempos do Razão geral analítico, se eles se vissem confrontados com a tarefa de dirigirem a contabilidade dos grandes "trusts" dos nossos dias.

Nesta fase do desenvolvimento da empresa capitalística, a classificação, introduzida para feito de constituir uma plataforma de raciocínio entre a análise e a síntese extremas, já não bastava para, por si só, introduzir a ordem nos nossos conhecimentos atinentes à obtenção de uma visão sumária, mas suficiente, de toda a realidade patrimonial e da situação económica e financeira que dela naturalmente decorria.

Para dominar esta nova dif iculdade enr iqueceu-se o arsenal metodológico da Contabilidade com um novo processo — a seriação — que consiste em dispor ou alinhar as contas resultantes da classificação por uma determinada ordem de harmonia com determinados critérios que, embora diferentes segundo se trate do Activo, do Passivo ou da Situação líquida, são, no entanto, solidariamente convergentes.

Por meio da seriação, a visão sintética que essas contas nos proporcionam acerca da composição qualitativa e valorativa do património das empresas e que nos permite observá-lo sem corrermos o risco de que o nosso espírito seja ofuscado pela limalha do pormenor escusado, ganha muito em extensão e profundidade em virtude da ordem simplificadora resultante da introdução do referido processo.

Todos os processos que acabamos de enumerar — a observação, a abstracção analítica, a comparação, a generalização, a classificação, a analogia, a história, a análise e a síntese — constituem os principais veículos do raciocínio logismológico de que a técnica contabilística se utiliza para o levantamento da estrutura que, partindo da observação como base, servirá, por sua vez, de base à observação para que se chegue à indução de princípios ou leis informadoras do equilíbrio patrimonial.

Embora pois, no ponto em que nos encontramos tenha terminado o trabalho da técnica propriamente dita, não se poderá dizer que tudo esteja terminado e que nada mais haverá a fazer de importante no domínio da investigação patrimonial.

No ponto em que acaba o referido trabalho, começa outra tarefa de grande relevo, que vem a ser a de formular não só os princípios gerais que servem de fundamento à própria técnica contabilística e orientam a sua actuação, mas também os princípios orientadores da interpretação da situação

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económico-financeira da empresa através do equilíbrio existente entre as diferentes massas do património que lhe serve de base.

Alguns séculos decorreram após a técnica contabilística ter atingido a sua feição definitiva, sem que, contudo, se houvesse formulado o princípio ou a verdade fundamental justificativa da sua existência, embora ela procedesse como se realmente obedecesse ao seu misterioso influxo.

Esse princípio basilar, que se pode enunciar dizendo que "toda a variação de valor ocorrida em qualquer elemento do património provoca uma variação reflexa, igual e de sinal contrário, noutro elemento ou componente, em virtude da qual se neutraliza o desiquilíbrio produzido pela primeira variação," só recentemente foi introduzido pela observação dos fenómenos por que se revela o movimento do complexo patrimonial através do registo das variações dos seus elementos.

Estabelecido este princípio e sabendo, por outro lado, que todos os elementos são enquadrados em classes ou contas, em que se reflectirão as suas variações de valor, poderemos estabelecer este outro princípio que poderá ser enunciado nos termos seguintes: "toda a variação de valor ocorrida em qualquer conta provoca uma variação reflexa, igual e de sinal contrário, noutra conta."

E como os sinais ou símbolos utilizados para a identificação das variações de valor nas contas são os termos "Deve", que é sinónimo de débito, e "Haver", que é sinónimo de crédito na terminologia contabilística, termos esses que se apresentam como a antítese ou o contrário um do outro, poderemos estabelecer sem grande esforço este outro princípio de que "a uma variação devedora numa conta se contrapõe sempre uma variação credora de igual montante noutra conta".

Para determinar qual a conta em que deve ser anotada a variação devedora e qual a conta em que deve ser anotada a variação credora, a simples observação da extensão, a todas as classes de elementos patrimoniais, do método de relevação inicialmente idealizado e aplicado às dívidas activas e passivas, permitiu induzir as leis ou os princípios seguintes:

1.° — Os valores iniciais das contas do Activo e as suas variações aumentativas inscrevem-se na coluna do "Deve"; e as suas variações diminutivas, na coluna do "Haver";

2.° — Os valores iniciais das contas do Passivo e as suas variações aumentativas, inscrevem-se na coluna do "Haver", e as suas variações diminutivas, na coluna do "Deve";

3.° — Os valores iniciais das contas da situação líquida bem como as

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suas variações inscrevem-se na coluna do "Haver", sempre que daí resulte aumento do Capital próprio; e na coluna do "Deve", no caso contrário.

Por sua vez, como essa oposição entre um "débito" e um "crédito" de igual montante se verifica a partir do próprio momento em que começa existência do patr imónio ou em que este se cria, também nenhuma dificuldade haver em estabelecer este outro princípio de que, seja qual for o momento em que nos detenhamos a examinar o trabalho de relevação contabilística executado até esse momento, a soma dos débitos é sempre igual à soma dos créditos, ou por outras palavras, que depararemos sempre com uma posição de equilíbrio.

E isto porque a equação do Balanço, tradutora desse equilíbrio, resulta da integração das sucessivas equações ou expressões de equilíbrio entre as variações de valor dos elementos patrimoniais, realizada através da classificação hierarquizada e seriada que o próprio mecanismo metodológico permite estabelecer.

Por outro lado, sendo a conta "Balanço", na sua forma eminentemente sintética uma integração de contas menos complexas, coordenadas no sentido de se chegar à equação (A = P ± S) que traduz a relação existente entre as três massas (Activo, Passivo e Situação líquida), evidente se torna que toda a variação de valor ocorrida em qualquer das contas integradas em cada uma destas três massas, que não seja neutralizada por uma variação de igual montante noutra conta da mesma massa, se irá reflectir infalivelmente na referida relação.

Esta relação (A = P ± S) sofrerá, nesse caso, variações consequentes, cuja ocorrência é definida pelo seguinte princípio tradutor do equilíbrio das variações de valor das massas patrimoniais: "Toda a variação de valor ocorrida em qualquer massa do património (Activo, Passivo ou Situação líquida) provoca uma variação reflexa de igual montante noutra massa, ou variações reflexas parciais nas outras duas massas que totalizem o mesmo montante".

A noção deste princípio se poderá chegar directamente pela simples observação da referida relação; e, partindo dela como base, poderíamos deduzir todos os princípios anteriormente estabelecidos por via indutiva.

Para a realização da integração acima referida, que nos transporta do simples ao complexo ou do elementar ao geral, a técnica contabilística dispõe, além disso, duma série de processos de coordenação que, embora nada tenham que ver com os processos do raciocínio especulativo atrás enunciados, contribuem, no entanto, para que se tire o maior partido possível do seu emprego, apressando ou facilitando a aludida integração.

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Se o principio primeiramente enunciado, sobre o qual se baseia toda a construção contabilística tem muita importância sob o ponto de vista teórico e pedagógico, por ser um princípio geral e racional e, portanto, anterior à existência de qualquer técnica, o princípio da igualdade constante entre a soma dos débitos e a soma dos créditos, tem também uma importância muito grande sob o ponto de vista técnico propriamente dito, por que constitui a própria base da verificação de todo o trabalho de relevação das contas, denunciando os erros que nesta se cometam e dando assim ao método de relevação contabilística a notável particularidade de contar em si o seu próprio controle.

A aplicação do método em obediência aos princípios que acabámos de enunciar e aos que presidem à relevação das contas permitir-nos-iam chegar, pois, a um conhecimento absolutamente exacto, matematicamente exacto poderíamos mesmo acrescentar, porque ela nos conduz a uma sistematização duma consistência inexcedível, se os números que caem sob a sua alçada fossem números abstractos.

Porém os números a registar e a correlacionar pelos processos integrados no referido método não são números abstractos, mas sim números concretos representativos da medida de uma grandeza que é demasiado caprichosa para que se deixe medir exactamente pelos processos físicos e mecânicos correntemente utilizados na medida de grandezas de outra índole.

Com efeito, o aspecto da matéria patrimonial que maior interesse tem para a Contabilidade é o do seu valor, justamente pelo facto de ser o único aspecto comum a todas as partículas da referida matéria e, portanto, o único susceptível de fornecer uma base comum de conteúdo e de apreciação.

Ora para a formação do valor dos elementos patrimoniais concorrem vários factores entre os quais avulta o factor psicológico, para o qual até hoje não foi possível descobrir nenhum processo de avaliação inteiramente satisfatório.

Por outro lado, esta dificuldade é ainda praticamente aumentada pelo facto de a unidade de medida commumente usada — a unidade monetária — não ser absolutamente estável; e, sem estabilidade de medida, não se poderá ter pretensão de chegar a um rigor absoluto nas medições de qualquer grandeza.

Muitos vêem nisto um ponto fraco da Contabilidade susceptível, só por si, de tirar todas as veleidades, que ela possa ter, de aspirar à dignidade de ciência.

Esquecem-se, porém, os que assim pensam de que este estado de

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coisas não se verifica apenas no domínio da Contabilidade; verifica-se também, por exemplo, no domínio da ciência actuarial que, embora se sirva do método matemático, que é o símbolo mesmo da precisão e do rigor absoluto, nas suas aplicações práticas trabalha com números determinados por via estatística, aos quais faltam as condições de exactidão necessárias para que se possa chegar a resultados absolutamente rigorosos.

No entanto, ninguém se lembrou de negar categoria científica ao calculo acturial só porque os números com que praticamente opera não estejam, no que respeita a rigor, à altura dos créditos de precisão absoluta de que goza o método de que ele se serve.

De resto, na prática corrente não há necessidade de ir até um rigor absoluto que, mesmo no caso de se poder atingir, poderia não ser economicamente vantajoso pelo facto de a sua determinação dar muitas vezes origem a um acréscimo de trabalho e, portanto, de despesa, que não seria compensado pelo maior grau de aproximação a que ele nos poderia levar.

Na prática, contentamo-nos, por isso, com aquela dose de rigor relativo que nos permita chegar a conclusões suficientemente consistentes para que a administração se possa orientar com a objectividade e a segurança que a gestão patrimonial superiormente requer.

Mas isso não quer dizer, de maneira nenhuma, como muitos são geralmente levados a crer, que o rigor teórico, ou seja aquele rigor que seria legítimo esperar-se da aplicação de um método exacto como é o da Contabilidade, nenhuma influência tenha no alinhamento dos números de que esta se serve e na idoneidade do seu significado concreto.

Não. O rigor teórico ou absoluto que nós poderemos atribuir a símbolos ou a números abstractos sobre os quais especulemos — e na Contabilidade também há lugar para especulação — é a meta ou o alvo que normalmente comanda a actuação do técnico de contas, visto que é dessa meta ou desse alvo que ele procura aproximar-se o mais possível, embora reconhecendo a impossibilidade de chegar até lá.

E só depois de empregados todos os esforços para avançar o mais possível em tal direcção é que o técnico de contas, que tem pela verdade o culto que ela merece, ficará satisfeito com a sua consciência, porque isso põe em jogo a sua própria competência.

O facto de o técnico de contas sentir a impossibilidade de atingir o rigor absoluto em nada faz diminuir a sua confiança nos méritos do método geral da Contabilidade, desde que tenha a certeza de que o manejou segundo

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os princípios que informam a sua aplicação. E esses méritos não se reduzem à formulação de tais princípios que,

aliás não são aquisições provisórias nem parciais, mas sim aquisições definitivas e gerais; alargam-se também ao campo da previsão que é o fim supremo de todo o conhecimento científico.

Com efeito, depois de convenientemente classificados, coordenados, e organizados todos os fenómenos patrimoniais num sistema em torno do qual se polariza um conjunto de ideias concatenadas, enfeixadas e reduzidas a um pequeno número de princípios obtidos pelos processos mentais próprios da indução, fácil nos será extrair desse sistema, que exprime, em última análise, uma posição de equilíbrio geral do património, os princípios orientadores das relações de equilíbrio entre algumas das partes que o constituem e que são de grande valor para o necessário governo de quem presida aos destinos do complexo patrimonial.

De facto, uma vez seriadas as contas do Activo, do Passivo e do Capital próprio, em obediência aos critérios gerais, respectivamente, da sua realização, da sua exigibilidade e da sua formação cronológica, nas condições genéricas já expostas para a estruturação do referido sistema, a comparação da parcela do Activo realizado e do que está próximo da sua realização com a parcela do Passivo exigível a curto prazo fornecer-nos-á uma sólida base para a apreciação da situação financeira da entidade proprietária do património e permitir-nos-á concretizá-la no princípio de que "essa situação será tanto melhor ou tanto mais desafogada quanto maior for o excesso do valor do Activo realizado e proximamente realizável sobre o valor do Passivo exigível a curto prazo; e será pelo contrário, tanto pior quanto maior for o excesso do valor deste sobre o daquele".

No desempenho da sua delicada missão, nenhum administrador poderá deixar de ter este princípio permanentemente na sua mente e de atender a situação revelada pela contabilidade, quando haja de realizar compras, se não quiser correr o risco de ter o seu espírito assaltado por incómodas preocupações.

É, em geral, o desconhecimento da verdadeira posição de equilíbrio existente entre as duas referidas massas patrimoniais, por falta de uma contabi l idade adequada e actual izada, que leva mui tas vezes os administradores de empresas a deixarem-se seduzir pela miragem de compras excepcionalmente vantajosas, mas absolu tamente desproporcionadas para as suas possibilidades financeiras, e a incorrerem nas consequências desagradáveis que invariavelmente resultarão da infracção

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de tal princípio. Por sua vez, a comparação do valor do Activo circulante com o valor

do Passivo total fornecer-nos-á igualmente uma base para à apreciação das possibilidades de resistência da empresa, alicerçada no princípio de que "essa resistência será tanto maior quanto maior for o excesso do valor da primeira sobre o valor da segunda massa patrimonial; e será, pelo contrário, tanto menor quanto maior for o excesso do valor desta sobre o daquela".

Por outro lado, a comparação do valor do Capital próprio num dado momento com o seu valor num momento ulterior permitir-nos-á ajuizar da marcha ou do progresso económico da empresa, baseando-nos, para isso, no princípio de que ele será tanto melhor ou tanto mais favorável, quanto maior for o excesso do segundo sobre o primeiro valor.

A estas e outras conclusões de igual utilidade, resultantes do confronto dos valores de parcelas importantes do património das empresas, somos naturalmente levados pelo processo da "comparação", que desempenha um papel muito importante dentro da trama do método geral da Contabilidade, conclusões essas que permitem à administração tomar antecipadamente as medidas necessárias para fazer face às futuras situações ou contingências que a sistemática contabilística lhe deixa antever.

Prever é deduzir do presente o futuro; é extrair das leis, dos princípios e conceitos estabelecidos por indução, que exprimem relações permanentes de fenómenos observados no passado, toda a experiência que neles se condensa para se poder agir com absoluto conhecimento de causa perante fenómenos idênticos que venham a dar-se no futuro.

O conhecimento desses princípios, dessas leis ou desses conceitos da­nos a convicção de que há relações de fenómenos que são independentes do tempo e do lugar, e que se mantêm, portanto, fixos e constantes na efectiva variabilidade qualitativa e valorativa da substância patrimonial; e o nosso pensamento, que assim se deixa de cingir ao passado e ao presente, alarga enormemente os seus horizontes voltando-se confiadamente para o futuro.

Baseado nesse conhecimento o administrador nenhuma dificuldade terá em prever a evolução do património que esteja administrando e em pressentir nitidamente os factos a que ela dará lugar, porque ele sabe que a sua previsão e o seu pressent imento se fundamentam em verdades conquistadas pelo emprego consciente dos diferentes meios ou processos de raciocínio em que se divide e subdivide o método geral da investigação científica.

A previsão assim baseada na experiência é a única que se poderá

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considerar como racional e constituir o único fundamento seguro para uma acertada actuação no futuro, tendo o seu domínio a possibilidade de se alargar praticamente tanto mais; quanto mais divulgadas se tornarem as aquisições da experiência provenientes de empresas que explorem o mesmo ramo de actividade económica.

Com efeito, pela comparação da composição qualitativa e valorativa dos patrimónios de muitas dessas empresas, com situações económicas e financeiras diversas, depois de convenientemente sistematizados pelo método contabilístico no fim de cada exercício, poder-se-ão estabelecer os limites dentro dos quais poderão oscilar as relações de equilíbrio entre as diferentes secções ou massas dos ditos patrimónios e conseguir assim uma sólida base de orientação para aqueles que tenham a seu cargo a gestão de empresas similares.

O estabelecimento dessas relações implica o recurso ao processo estatístico, mercê do qual tais relações se poderão reduzir a um número básico ou "ratio" que servirá de termo de comparação.

Por outro lado, os dados sinteticamente fornecidos pelo Balanço no fim de cada exercício precisam de ser acompanhados de desenvolvimentos que permitam aos interessados na administração das empresas fazer uma ideia adequada da sequência dos factos que maior projecção tenham tido na situação económica e financeira da empresa.

Para a apresentação desses desenvolvimentos a contabilidade terá igualmente de recorrer ao processo estatístico, estabelecendo confrontos entre números referentes a séries de exercícios e exprimindo esses confrontos em percentagens .

É, por exemplo, da maior utilidade e conveniência para se poder apreciar a marcha da empresa sob o ponto de vista económico, apresentar um quadro comparativo dos números representativos dos montantes brutos das vendas e das deduções a esses montantes, e dos respectivos lucros.

Para efeito de se poder ajuizar da eficiência de certos aspectos da actividade da empresa, quando se trate de uma empresa industrial, é da maior utilidade estabelecer quadros do mesmo género, pelos quais se possa chegar a conclusões rigorosas e fazer mais facilmente previsões sobre o futuro desenvolvimento desses aspectos.

Quanto mais longe se levarem tais previsões e mais extensas e mais complexas se apresentarem as mutações ou transformações por que haja de passar a matéria patrimonial, maior se tornará também a necessidade de recorrer ao processo estatístico.

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Se as previsões se estenderem a todos os escaninhos da actividade da empresa e aos resultados dela derivados, haverá, então, necessidade de enquadrar os números em que elas se concretizam num plano geral bem coordenado que represente um programa de acção completo a executar no futuro, baseado nas indicações fornecidas pelo sistema geral das contas quanto ao passado, plano esse que tem o nome de orçamento.

Um orçamento bem elaborado, em que sejam pruden temente estabelecidos os quantitativos e os valores das compras, da produção, das vendas e de todas as despesas necessárias à manutenção e impulsionamento da empresa, constitui a base melhor e mais simples para a sua eficiente administração, porque ele se baseia em factos verídicos do passado e não em simples conjecturas; e, facilitando a coordenação das actividades da empresa, contribui para que toda a organização se encaminhe para um objectivo comum.

E, por sua vez o confronto dos números alinhados no orçamento referente a um determinado espaço de tempo com os números efectivos ou reais fornecidos pelo método de relevação contabilística no mesmo espaço de tempo, dar-nos-á a noção da medida em que as previsões excederam ou ficaram aquém da realidade.

O orçamento é, pois, a própria perspectiva do futuro, vista através de números estatísticos extraídos dos registos cronologicamente feitos mediante o emprego do processo de classificação e do método de relevação a que atrás se fez referência.

Ele constitui todo um panorama de deduções baseadas na experiência ou nos resultados do passado, que o processo e o método referidos nos permitem focar em todos os seus pormenores, visto que toda a metodologia contabilística, nas suas aplicações concretas tende, pelo próprio espírito que informa, a pôr em pleno e sucessivo confronto a causa com o efeito.

Porém, a função do orçamento não se limita unicamente a constituir uma base de realizações futuras; ele desempenha, além disso, uma outra função muito importante que vem a ser a possibilidade de controle que ele permite exercer sobre todas as operações da empresa e, portanto sobre todas as pessoas que as realizam ou que nelas superintendem e sobre todos os produtos a que elas se reportem.

Ele contribui para tornar mais eficaz a coordenação de todos os sectores da empresa que o seu sistema de contas ajuda a estabelecer, e proporciona, de uma maneira sintética, dados valiosos acerca dos diferentes aspecto da sua actividade.

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Em face do orçamento, todos os superintendentes poderão fiscalizar as inversões e despesas inerentes às suas esferas de acção e não pensarão apenas nos seus próprios departamentos mas sim na empresa como um todo e nos meios de se eliminarem desperdícios e de melhor se realizarem as tarefas que a cada um incumbem.

A grande variedade de processos de investigação integrados no método contabilístico, que compreende quase todos os processos utilizados nos diferentes ramos do conhecimento humano, têm dado à Contabilidade a possibilidade de ela se adaptar às mais complicadas e mais difíceis situações que o desenvolvimento sempre crescente da empresa capitalística lhe tem criado na prática.

Sem a grande maleabilidade que tão vincadamente caracteriza o método da Contabil idade esse desenvolvimento ficaria gravemente comprometido e poder-se-á mesmo afirmar que talvez não tivesse atingido o altíssimo nível que actualmente apresenta nos países industrialmente muito evoluídos.

É este, sem dúvida, o maior serviço que a humanidade lhe está a dever no campo da sua aplicação prática; mas, para que dentro deste campo se colham os melhores resultados, necessário se tornará ter do método uma noção teórica o mais pormenorizada e fundamentada possível.

Neste ponto de vista nenhuma dúvida poderá restar de que se têm feito assinalados progressos no nosso país nas últimas décadas, por se haver dissociado definitivamente a noção de método da noção de objecto da Contabilidade e de se ter colocado, portanto, o seu ensino no seu verdadeiro trilho.

E ensino bem carrilado, isto é, ensino que comece por onde deve começar e termine por onde deve terminar, não poderá deixar de ser ensino racional e, por conseguinte, ensino eficiente.

Se o método se destina à exploração ou investigação de um objecto e se, nos domínios da Contabilidade, aquele está tão intimamente ligado a este que a sua recente separação ainda hoje aparece aos olhos de muitos como um verdadeiro acto profano e sacrílego, isto só provará, se bem se atentar nesta circunstância aparentemente tão intrigantes que o método foi especialmente concebido para o objecto e que este constitui, portanto, o terreno privativo que com aquele se pretende explorar.

Importa, porém, frisar que esta particularidade não se estende a toda a metodologia contabilística, onde, como acabámos de ver, se integram processos de investigação e erroneamente usados por outros ramos de

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conhecimento. Tal particularidade só é válida para o método especial de relevação

que tem, entre outras finalidades, a de focar ou registar as variações de valor que se vão produzindo nos diferentes elementos do património em obediência a uma lei que exprime a constância da relação de equivalência entre a causa e o efeito.

Os registos ou lançamentos, feitos no Diário geral, em que se põe em evidência essa relação, constituem a própria expressão dialéctica de toda a fenomenologia patrimonial.

O método e o objecto encontram-se aqui, pois, tão profundamente enleados que não foi pequeno mérito para a escola moderna ter feito definitivamente a sua separação e haver inculcado que, no estudo da contabilidade, se deve começar sempre pelo seu objecto que é, como sabemos, o património das empresas.

De resto, é absolutamente admissível e inteiramente lógico que, sem o conhecimento prévio da estrutura do património e das forças que o obrigam a movimentar-se, não se poderá fazer um uso inteligente do método, mesmo quando teoricamente dele se houvesse obtido um conhecimento detalhado.

Se o método contabil íst ico tem na relevação dos fenómenos patrimoniais um dos seus maiores pilares para todo o trabalho de análise e síntese futuro, o conhecimento prévio daquilo que se releva ou regista é condição necessária e imprescindível para a boa compreensão desse trabalho e para a conveniente interpretação dos factos nele implicados.

De todos os professores de contabilidade categorizados, com quem temos trocado impressões sobre este assunto, temos ouvido as mais lisonjeiras referências à eficiência pedagógica que eles têm conseguido com o emprego do método positivo, ou seja, do método que se alicerça numa inteligente e escrupulosa observação dos factos.

De facto, a aplicação consciente de todos os processos integrados no método contabilístico em conformidade com os princípios que a governam conduz-nos à estruturação de um sistema explicativo da fenomenologia patrimonial pelas suas causas e pelas suas leis.

A explicação que o sistema nos proporciona é, pois, uma explicação integral, porque resulta de uma operação mental — a sistematização — que retine num todo solidário, concatenado e interdependente nas suas diferentes partes as verdades referentes ao objecto em torno do qual se enleiam as ideias, os conceitos, os juízos e os raciocínios.

Ora uma das características mais salientes da explicação integral é a

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sua simplicidade e o seu poder de penetração no intelecto das almas, porque ele se dirige à raiz dos factos e os põe, portanto, a descoberto em toda a sua sedutora inteireza.

A simplicidade e inteligibilidade da explicação integral assentam no facto de que a sistematização se baseia numa síntese total essencialmente ordenadora e descongestionadora, que despreza a redundância e a superfluidade dos pensamentos, em virtude das quais se estabelece a confusão intelectual e se faz perder a nitidez da visão global e solidária dos fenómenos.

Por isso é que a "sistematização" nos aparece naturalmente como o último degrau, como a etapa mais avançada, da organização dos nossos conhecimentos acerca do departamento ou do domínio cognoscível a que ela se reporte.

Ela coloca-se assim, por direito próprio, no extremo superior de todo o nosso trabalho intelectual e nela se resume a convergência de todos os esforços despendidos para se chegar à verdade.

Ela é, em suma, o remate natural do enfeixamento de todas as etapas que se tornou necessário percorrer para se chegar até à verdade, utilizando os diferentes veículos do método geral da Contabilidade no sentido da ida — indução — ou sejam a observação na sua feição mais simplista, a abstracção analítica, a analogia, a generalização, a classificação, a seriação, a análise, a história e a estatística; e no sentido do regresso — dedução — ou sejam a abstracção, a demonstração, a síntese e a previsão.

Dada a complexidade do método geral da Contabil idade e a diversidade de circunstâncias em que ele poderá ser utilizado, visto que o património das empresas poderá ser pouco ou muito heterogéneo quanto à sua composição qualitativa, estar pouco ou mui espalhado e tornar-se sede de movimentos internos pouco ou muito emaranhados, o seu emprego exige do operador a posse de um espírito de observação muito apurado servido por uma peculiar tendência inata para a ordenação das coisas, dos factos e das ideias.

Todo o indivíduo que não seja por sua natureza mesma ordenado nos seus actos e na sua maneira de pensar terá mui poucas probabilidades de poder vir a ser um bom manejador do método geral da Contabilidade e de ter, por esta, aquela simpatia e aquele entusiasmo que por ela costumam nutrir os que reúnem as condições psicológicas que o manejo do método superiormente demanda.

Nenhum indivíduo de hábitos mentais e corporais desordenados se

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poderá sentir bem a manejar um instrumento de compleição tão caprichosa e de funcionamento tão delicado, como é o método logismológico, porque o próprio clima ideológico, que a aplicação deste exige, constitui para esse indivíduo um tormento a que não se poderá sujeitar, a não ser que possua a força de vontade necessária para virar do avesso a sua própria natureza.

Se esta condição se não verificar, da desarmonia dos requisitos em presença há-de necessariamente resultar trabalho lento e defeituoso, que ficará muito aquém das exigências que a busca da verdade naturalmente implica e que a utilidade e o rigor do método da Contabilidade não dispensam.

Pena é que os meios académicos ainda se não tenham apercebido destas facetas do método logismológico e que a Contabilidade continue a ser considerada como uma actividade profissional sem qualquer interesse sob o ponto de vista da preparação e valorização científicas.

E dizemos que é pena, porque os resultados já conseguidos na Alemanha, primeiramente por Thunen e, depois, pelo prof. Éhrenberg, com a aplicação dos processos da análise contabilística à investigação económica, merecem o reconhecimento de todos os economistas.

Tais processos podem prestar, igualmente inestimáveis serviços ao ensino da ciência económica sob o ponto de vista nacional, especialmente ao ensino do funcionamento económico da máquina do Estado.

Éhrenberg dá, além disso, g rande importância ao método logismológico para as ciências económicas em geral por se tratar de um método de investigação exacto, onde quer que haja relações comensuráveis a estudar, visto que a mensuração das realidades económicas pressupõe a sua determinação exacta por meio de uma relevação das mesmas, feita nos moldes da relevação contabilística.

Esta relevação apresenta-se como o método mais importante que essas têm à sua disposição para obterem um material suficiente de realidades económicas em bases dignas de confiança.

Uma vez obtido tal material, este poderá ser utilizado como termo de comparação com outros factos económicos para se averiguar em que medida eles condizem e investigar os motivos das diferenças se as houver.

Este método, empregado por Éhrenberg para deduzir leis gerais atinentes à explicação das causas dos fenómenos económicos concretos por meio da descrição monográfica do progresso do movimento comercial de estabelecimentos isolados e resumo sintético das principais circunstâncias que condicionam os factos económicos neles ocorr idos , beneficia

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especialmente a teoria do movimento ou do progresso económico. Só pela observação e descrição exactas, que nos permitam uma visão

mais profunda no presente e no futuro da vida económica, se poderão estabelecer bases de negócio e abrir caminho a uma teoria da economia privada.

Escusado será porém, dizer que serão insuficientes para a dedução de leis gerais os resultados das investigações que se limitem a algumas empresas importantes.

Só o exame mais profundo a muitos estabelecimentos de categorias diferentes e de diferentes ramos de actividade económica, agindo e funcionando sob diferentes condições, conjugado com os resultados fornecidos pela aplicação do método contabilístico é que poderá conduzir à formulação de leis gerais do progresso económico.

Infelizmente é ainda muito reduzido o número dos que se encontram em condições de poderem fazer uma análise desta natureza à prática e ajuizar dos acontecimentos com espírito crítico e científico.

Para o ensino da economia em geral e o ensino do funcionamento da economia em particular, o estudo do desenvolvimento real dos factos económicos nas grandes empresas pela observação directa e pela análise dos processos da contabilidade e das informações prestadas pelos chefes dessas mesmas empresas em forma de relatórios, monografias, memórias, etc., tem um interesse primário, porque os dados emalhados na rede do método contabilístico não só actuam como elementos de correcção sobre essas informações, mas também fornecem descrições parciais dos factos e das circunstâncias, embora tanto estas como aqueles pertençam ao passado.

O material que a Contabilidade fornece e que permite a interpretação dos fenómenos ocorridos na vida dos organismos da economia privada através dos números por ela alinhados tem, pois, a maior importância não só para o ensino desta mas também para o estudo da economia política, na medida em que o conhecimento da vida daqueles for necessário a esta.

Ora esse conhecimento é muito útil à investigação dedutiva e indutiva no estudo das ciências económicas, respectivamente, como controle das teorias elaboradas a priori e como material de observação e de análise.

Passando agora uma vista retrospectiva por tudo o que acabamos, de expor, poderemos resumir as nossas considerações fixando-nos nos tópicos seguintes:

— O método geral da Contabilidade é um método bastante complexo, dentro do qual se enquadram quase todos os processos de investigação

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utilizados noutros ramos de conhecimento. — O núcleo inicial desse método encontra-se na íntima associação

dos três processos de investigação que, no seu conjunto, constituem o método especial de relevação da conta. Estes processos são, como atrás se disse, a descrição cronológica que nos proporciona a história das causas das variações ocorridas na quantidade e no valor de cada elemento ou grupos de elementos, a que o referido método se aplique; a tabulação que nos permite dispor os números representativos da extensão das ditas variações de maneira a poder-se operar facilmente com esses números; e a comparação que nos habilita a determinar o efeito ou o resultado destas variações à medida que se vão produzindo ou no fim de um período considerado, resultado esse que vem a ser o valor do elemento ou grupo de elementos em que elas se produziram.

— A necessidade de idealizar e utilizar o método especial de relevação da conta surgiu com a introdução do crédito nas operações comerciais, em virtude do que ao comerciante se tornou absolutamente impossível reter na sua limitada memória a natureza e o valor das transacções efectuadas a prazo com cada um dos seus clientes e dos seus fornecedores, as quais deram origem ao aparecimento das suas dívidas activas e das suas dívidas passivas.

— A provar que o método especial de relevação da conta foi o núcleo inicial do método geral da Contabilidade, na forma em que ele hoje se nos apresenta, está o facto de as colunas destinadas à tabulação dos números representativos dos valores das ditas transacções serem encimadas pelos termos "Deve" e "Haver", que são indiscutivelmente indicativos de relações entre pessoas.

— A necessidade de conhecer, em qualquer altura, os valores de outros elementos do património, além das dívidas activas e passivas, levou os técnicos de contas a aplicar o mesmo método especial a esses outros elementos materiais individualmente considerados, para o que estes foram assimilados a pessoas como claramente se depreende do próprio facto de, ainda hoje, os termos que entram na formação das denominações das contas de valores se escreverem com letra maiúscula no princípio, como se de nomes de pessoas realmente se tratasse.

E daí resultou a velha teoria da personificação das contas. — A extensão do método especial de relevação da conta aos diferentes

elementos corpóreos do património não se operou de um jacto, mas sim por etapas sucessivas, à medida que as necessidades da sua administração o foram impondo. E assim se foi alargando o sistema de representação

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logismológica do património das empresas. — Os últimos componentes patrimoniais a serem submetidos à

investigação do método de relevação da conta foram os representativos do Capital próprio.

— Antes da aplicação do referido método aos citados componentes, os contabilistas trabalhavam com sistemas de representação incompletos, sobre os quais se baseava a Contabilidade chamada "unigráfica" ou "por partidas simples", embora muitas operações da empresa, já dentro de tais sistemas, dessem lugar a lançamentos em duas contas isto é, a lançamentos característicos da "digrafia" ou "Contabilidade por partidas dobradas".

Assim, por exemplo, num sistema de representação patrimonial em que além das contas das dívidas activas e passivas, figurasse a conta "Caixa", sempre que se recebesse de qualquer devedor ou se pagasse a qualquer credor uma de te rminada importância a operação teria de ser simultaneamente registada na dita conta "Caixa" e nas contas do respectivo devedor ou credor.

Se, além das contas consideradas, o sistema de representação se alargasse de maneira a incluir também a conta "Mercadoria" seriam digràficamente registadas não só as operações acima referidas, mas também todas as operações provenientes da compra e venda de mercadorias a prazo ou a pronto e imediato pagamento.

— À medida que se foi avançando na extensão do método de relevação da conta a todos os elementos directos ou reais do património e aos seus componentes ideais ou diferenciais, foi-se concomitantemente passando de um sistema de representação patrimonial menos completo ou menos perfeito para outro sistema mais completo ou mais perfeito.

— A evolução dos sistemas de representação patrimonial terminou, portanto, quando todos os referidos elementos e componentes passaram a ser objecto de investigação por meio do método de relevação, e se chegou assim à obtenção de um sistema de representação patrimonial completo e absolutamente solidário em todas as suas partes, tão solidário que toda e qualquer variação de valor ocorrida num dos seus elementos ou componentes provocará uma variação reflexa, igual e de sinal contrário, noutro elemento ou componente, que neutralizará o desiquilíbrio produzido pela primeira variação. E assim se chegou naturalmente à digrafia.

— A passagem da unigrafia para a digrafia não se operou, pois, por uma mudança de método mas sim por uma extensão de método, o que nos autoriza a afirmar que a digrafia é a última etapa da evolução da unigrafia

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que, praticamente, abrange todos os sistemas de representação patrimonial incompletos, seja qual for a distância que os separe do sistema completo.

— Durante os primeiros séculos que se seguiram ao estabelecimento da digrafia, o sistema de representação patrimonial era constituído por contas elementares, que proporcionavam uma visão analítica; porém, à medida que os patrimónios se foram tornando mais volumosos e mais complexos para corresponder às exigências da intensificação do tráfico comercial, e que concomitantemente foi aumentando o número dessas contas, tornou-se necessário introduzir a síntese para se poder alcançar uma ideia geral da composição qualitativa e valorativa do património, mais rápida e mais elucidativa do que a obtida analiticamente através de uma longa série de contas elementares.

Para isso, recorreu-se ao processo da "classificação" e dos seus processos auxiliares com cuja presença se enriqueceu o método geral da Contabilidade.

— Porém o comércio entre os povos continuou a desenvolver-se à medida que se iam inventando e pondo em prática meios de comunicação mais rápidos e mais eficientes; e as empresas privadas tiveram necessidade de dispor de meios materiais mais avultados e, portanto, de patrimónios mais volumosos e de composição mais variada.

E daí resultou ter crescido o número das contas complexas ou sintéticas de uma maneira tal que a análise do património através dessas contas passou a exigir que elas fossem dispostas por determinada ordem, em virtude do que se lançou mão do processo da "seriação", que passou assim a fazer parte integrante do método geral da Contabilidade.

A seriação contribuiu, pois, grandemente para reforçar o poder da sistematização deste método e facilitar ao mesmo tempo a interpretação da situação actual e a previsão da futura situação económica e financeira da empresa através da estrutura qualitativa e valorativa do seu património.

— Por outro lado, à medida que se foi apresentando a necessidade de inverter capitais cada vez maiores em empresas de grande projecção económica, possuidoras de patrimónios mui vastos e de estrutura mui complexa, mais premente se foi tornando também a necessidade de recorrer aos processos estatísticos, como preciosos auxiliares, que são, para a conveniente compreensão do significado dos números emalhados na apertada rede da relevação contabilística.

Quanto mais extenso e mais complexo for o património de uma empresa e mais variadas forem as mutações que no seu seio se produzam,

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maior será, portanto, a necessidade de fazer uso dos processos estatísticos. E isto é, tanto assim que, nas grandes empresas modernas, há secções

especiais de estatística que funcionam não só como coadjuvantes da contabilidade propriamente dita, e constituindo, como tais, prolongamentos naturais dela, mas também como centros de recolha e manipulação de dados de outra espécie, cujo conhecimento é da maior util idade para uma administração consciente das grandes concentrações capitalísticas do nosso tempo em que distância praticamente já não conta como impedimento sério ao alargamento das arrojadas iniciativas dos homens de negócios.

Em suma: a Contabilidade dispõe de um método que, pela ordem e rigor que consegue in t roduzi r no desenvolvimento e conveniente representação da fenomenologia do património das empresas, é para estas qualquer coisa de parecido com o que o espírito é para o corpo.

Com efeito, assim como o espírito constitui para o corpo aquele departamento invisível que fomenta e orienta a actividade do homem, também o método logismológico constitui, para as empresas que o utilizam, um centro externamente invisível em torno do qual e em função do qual se ordena e se avalia, directa ou indirectamente, a actuação e a eficiência das pessoas que nelas se integram.

A Contabilidade, com toda a sua sistemática privativa, constitui essa força oculta, esse centro misterioso de irradiação ordenadora, em torno do qual gravita a actuação das pessoas a quem foi confiada a missão de velar pela manutenção e movimentação da matéria que entra na formação do património das empresas, para que dessa movimentação resulte, na maior escala possível, aquele acréscimo de riqueza que ambicionadamente se procura.

"A ordem, diz o grande economista alemão professor Sombart, aumenta as nossas forças em todas as manifestações da nossa actividade sem excluir a actividade económica; e essa ordem, fomentadora de tal actividade, foi definitivamente estabelecida com a adopção da partida digráfica ou contabilidade sistemática, cujo método e processos nos ajudam a desenvolver aquele sistema de ideias, por meio do qual nós estamos habituados a projectar no nosso espírito o mundo da economia capitalística.

"De facto, a noção de capital fixo e de capital circulante, da circulação e transformação do capital, dos preços de custo industrial, e de muitos outros factos é o resultado da aplicação das ideias fundamentais da digrafia, sem as quais nós nunca teríamos chegado a compreendê-los, de uma maneira tão precisa e tão clara.

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"É ela, pois, que cria, pela primeira vez, o conceito de capital e que nos dá, ao mesmo tempo, o conceito de empresa capitalística;

"Por meio da digrafia, continua o referido professor, não poucas vezes se têm criado iniciativas e possibilidades, sem as quais as ideias, que são próprias do sistema capitalístico, não teriam podido atingir o seu completo desenvolvimento.

"Em face do que acabamos de dizer, continua ainda Sombart, haverá motivo de sobra para ficar em dúvida sobre se foi o capitalismo que criou a digrafia para aumentar o rendimento das suas próprias forças, ou se foi, pelo contrário, a digrafia que, pelo seu próprio espírito, gerou o capitalismo".

Assim se exprimiu este insigne professor que é justamente considerado como um dos maiores expoentes do pensamento económico contemporâneo; e parece que ele está realmente dentro da verdade, se se atentar no estreito paralelismo existente entre a evolução do método logismológico e a evolução da empresa capitalística, como claramente se depreende da exposição sumária que atrás se fez.

Poder-se-á, pois, ter como certo que a Contabilidade está para a empresa capitalística na mesma relação em que a palavra está para o pensamento.

Sem a palavra seria, de facto impossível ao homem exprimir adequadamente o seu pensamento; e sem a Contabilidade seria igualmente impossível à empresa capitalística exprimir-se de uma maneira inteligível e satisfatoriamente convincente.

E, na verdade, através da Contabilidade que a empresa capitalística adquire consciência de si própria; que ela se dá conta de quando e como nasceu, das transformações sofridas, das suas realizações no passado, da sua actuação no presente e das boas ou más oportunidades que o futuro lhe poderá reservar.

E tudo isto porque — não será demais repeti-lo — a Contabilidade dispõe de um método que auxilia o homem a coordenar e a tirar partido de todas as forças que incidem sobre o cosmos patrimonial, em que se radica e se desenvolve a sua actividade criadora, dando-lhe assim possibilidade de realizar todos os seus planos por mais arrojados e mais extravagantes que eles possam parecer e seja qual for o domínio económico a que sua actividade se aplique.

In Revista de Contabilidade e Comércio. Ano XIX, n° 73, Janeiro-Março (1951), p. 31-60.

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NUNCA E DEMASIADO TARDE PARA DESFAZER ENGANOS

Toda esta série de considerações nos leva naturalmente à conclusão de que o estudo do equilíbrio patrimonial não pressupõe apenas o conhecimento da Estática; pressupõe também o conhecimento da Dinâmica.

E, se para o es tudo do equilíbrio patr imonial é necessário o conhecimento da Estática e da Dinâmica, esse estudo abarca indubitavelmente todo o domínio da Contabilidade, que não pode nem deve ser alargado até ao ponto de se invadir licenciosamente o domínio da administração empresarial que constitui um departamento de conhecimentos diferente do da Contabilidade, embora estreitamente ligado e aparentado com o desta.

Essa invasão, porém, é muito do agrado dos tratadistas italianos, assim se explicando os equívocos em que laboram os leitores desprevenidos das suas obras.

E o conceito de Dinâmica que o Professor LOPES DE SÁ nos dá na sua Filosofia ressente-se nitidamente da influência desses tratadistas para quem a Contabilidade se confunde com a própria Administração, não sendo, portanto, para admirar que ele tenha uma certa propensão para a colocar fora do âmbito do equilíbrio patrimonial, visto que a doutrina deste, segundo o conceito de MASI, por ele citado na pág. 88 e aí perfilhado, é antes de tudo o objecto da Estática.

Mas, para isso, ainda foi preciso que o ilustre Autor da Filosofia tivesse forçado um pouco o pensamento de MASI, porquanto da sua afirmação de que a Estática é antes de tudo doutrina do equilíbrio de valores não se poderá concluir rigorosamente que o equilíbrio de valores é matéria de ordem exclusivamente estática.

O que em boa lógica se pode e deve concluir das palavra de MASI é que a Estática é principalmente (e não exclusivamente) matéria que entra

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nos domínios da doutrina do equilíbrio patrimonial em cujo estudo — repito — vem fundir-se os conhecimentos da Estática e da Dinâmica contabilística.

E isto porque a Dinâmica não passa de uma sucessão de posições de equilíbrio com cada uma das quais se prende ideia da Estática, de modo que esta se encontra no próprio seio daquela, visto consistir numa posição correspondente a qualquer momento ou instante da Dinâmica, evolucionando com esta na sucessão dos instantes.

Isto equivale a dizer que a Dinâmica arrasta consigo a Estática, podendo, portanto, admitir-se sem grande esforço de imaginação que a cada instante da Dinâmica corresponde uma posição estática, porquanto o facto de o património estar animado de um movimento não impede que nós tomemos conhecimento do seu conteúdo e do seu equilíbrio no momento que se queira, sendo até este o ideal teórico que a técnica contabilística procura atingir, utilizando, para isso, maquinaria cada vez mais aperfeiçoada que os construtores vão pondo à sua disposição.

In Revista de Contabilidade e Comércio. Ano XXIV, n° 94, Abril-Junho (1956), p. 137-147

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AMORTIZAR OU REINTEGRAR?

/ • • ■ /

Com efeito, o que se pretende significar com o termo reintegração é a reposição do Capital próprio no nível em que se encontrava antes de haver sofrido qualquer diminuição por efeito da depreciação de determinados elementos do Activo.

E isto porque há realmente certos elementos do Activo que se vão gastando com o tempo, o uso, o abuso, o desuso, etc., caminhando assim para a sua morte física que acarreta concomitantemente a sua morte económica ou valórica que, por sua vez, se repercute no Capital próprio das empresas, desfalcando-o no valor correspondente.

Ora o homem nada poderá fazer para evitar a morte física desses elementos porque ela se produzirá inevitavelmente ao fim dum certo tempo que ele apenas terá probabilidade de prolongar um pouco mais, se dedicar o maior cuidado à sua conservação e manuseamento.

Poderá, porém, tomar as precauções necessárias para evitar a morte valórica desses elementos e a consequente diminuição do Capital próprio, fixando periodicamente no Activo circulante o valor correspondente a essa diminuição e assim se operando a sua reintegração.

Encontramo-nos aqui, como se deixa ver, perante uma noção muito simples e duma clareza meridiana; e essa simplicidade e essa clareza é que têm contribuído para que o emprego do termo reintegração se tenha generalizado entre nós com grande arrelia do A. que, não sendo capaz de apreender o sentido que ele encerra, atribui ignaramente a sua generalização e boniteza do termo, dando assim a perceber que os técnicos de contas, que o utilizam não passam duns parvos dignos de lástima pelo facto de, ao contrário de todos os seres pensantes, raciocinarem com os olhos em vez de raciocinarem com o cérebro.

E que termo propõe o A. para exprimir a noção que acabo de expor?

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Propõe o termo amortização. E que é que, na opinião do A., se deverá entender por amortização? Ele di-lo a pág. 434 ao definir amortizar nos termos seguintes: amortizar

é reduzir, extinguir, "matar" os valores por que se inscreveram nas contas certos elementos patrimoniais.

Ora o que se tem em vista não é extinguir ou "matar" os valores de certos elementos patrimoniais, mas, pelo contrário, evitar que eles morram mediante a sua substituição pelos valores correspondentes de outros elementos, ou, a sua incorporação nos valores destes para que o Capital próprio não seja afectado na sua integridade.

Quando dizemos, por exemplo, "Reintegração de Máquinas, servimo-nos duma expressão abreviada que corresponde rigorosamente a esta outra mais extensa: "Reintegração do Capital próprio desfalcado no valor correspondente em Máquinas".

No fundo, o que se verifica é a deslocação do valor de elementos de determinada zona do Activo para outros de zona diferente, deslocação essa que não implica de maneira alguma a ideia do seu desaparecimento, da sua extinção ou, em suma, da sua morte para a empresa a que respeita.

Isto mesmo se poderá depreender da conjugação dos dois seguintes lançamentos b) e c) que o A. apresenta a pág. 460:

b) Utilização dos bens: Exploração a Diversos Custo dos artefactos a Matérias (consumo) 10 a Máquinas (depreciação) 17 27

c) Recuperação dos custos: Caixa a Diversos Vendas (ao preço de custo) a Exploração Venda de artefactos 27 a Máquinas Venda de sucata 3 30

Com efeito, o segundo lançamento mostra-nos que a depreciação das Máquinas incluída no preço de custo dos artefactos no primeiro lançamento foi recuperada na venda desses mesmos artefactos, evitando-se assim que o

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Capital próprio fosse desfalcado num montante correspondente à referida depreciação.

E onde há recuperação não se poderá falar com propriedade de amortização que nos inculca precisamente a ideia contrária ou seja a ideia de extinção, de morte, que é bem evidente no caso, por exemplo, da liquidação ou amortização dum empréstimo, porque se traduz no seu desaparecimento.

Neste caso, o termo amortização emprega-se no seu sent ido rigorosamente etimológico, claramente denunciado pela presença nele do radical "morte".

Por outro lado, o A. ainda não conseguiu aperceber-se da distinção existente entre "reintegração física" e "reintegração valórica"; para ele, só pode haver "reintegração" quando se atenda à reposição do elemento incapacitado ou consumido, o que equivale a dizer que para ele só existe a "reintegração física" como se poderá concluir do lançamento d) por ele apresentado na pag. 461 nos termos seguintes

d) Reintegração do stock e do equipamento: Diversos a Caixa Compras Matérias 10 Máquinas 20 30

Por este lançamento se vê que a reintegração é aqui por ele considerada como a reposição material ou física do stock e do equipamento, sendo esta, portanto, a única operação a que, em sua opinião, se poderá dar tal denominação.

No entanto, todos os técnicos de contas atacados pela perigosíssima infecção reintegracionista e que, segundo se depreende das próprias palavras do A., já constituem legião no nosso país, não têm a menor dificuldade em compreender que a reintegração física é precedida pela reintegração valórica como condição indispensável para assegurar a integridade do Capital próprio e que, como tal, não poderá deixar de constituir motivo de sérias preocupações para os administradores das empresas sejam elas de que natureza forem, visto ser ela que fundamentalmente se tem em vista.

Intimamente relacionada com a acanhada visão do A. acerca dos domínios abrangidos pela Contabilidade está a sua afirmação de que o

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exemplo dos que encaram as depreciações não como custos mas como prejuízos e que mandam registar separadamente a depreciação e a reintegração não deve ser seguido (V. pág. 459).

E isto porque as depreciações não podem ser encaradas como custos, no sentido em que o A. emprega este termo, em todos aqueles organismos que não tenham um fim lucrativo e em muitos outros que realmente o têm (empresas bancárias, empresas seguradoras, etc.) e que não podem dispensar o precioso concurso da Contabilidade para a sua eficiente administração.

Por aqui se vê que o A. é um catedrático que tem um conceito muito deformado do verdadeiro campo de aplicação da Contabilidade, em virtude do qual se atreveu a generalizar o emprego da solução dum caso particular, quando é certo que ela não passa duma simples derivação ou variante da solução geral aplicável a todos os casos que possam apresentar-se na vida prática.

Passando agora a abordar a questão da situação das contas de "Reintegrações" no Balanço, comecemos por reparar na definição de "Passivo" dada pelo A. nas suas "Noções de Contabilidade" que vêm a ser o único livro de texto superiormente autorizado para o ensino da Contabilidade nas escolas comerciais do nosso país, circunstância esta que dá a esse livro categoria oficial duma espécie de evangelho para o referido ensino.

Na pág. 2 do primeiro volume (segunda edição), o Passivo, é definido nos termos seguintes: é o conjunto dos valores passivos; compõe-se de todas as dívidas a pagar.

Mas, numa nota a esta definição, o A. adverte que se trata duma definição aproximativa. Ora isto equivale a dizer que se trata duma definição que não nos dá uma ideia exacta daquilo que se deverá entender por Passivo, e que, como tal, contribui para desclassificar, pedagogicamente, o compêndio onde ela é apresentada e onde se deveriam encontrar noções precisas e inequívocas, tratando-se para mais, como realmente se trata, dum livro para principiantes a quem a matéria a ensinar deve ser exposta com a maior clareza e exactidão e, portanto, inteiramente à margem do subterfúgio das aproximações que só serve para estabelecer confusão no seu espírito.

Todavia, nos vários exemplos que o A. insere nas páginas seguintes, o Passivo é por ele apresentado como um conjunto de dívidas de várias espécies de modo que se fica com a impressão de que ele tem do Passivo a mesma noção que nos é dada por outros tratadistas da Contabilidade e que entrou nos arraiais da jurisprudência onde ele é realmente considerado como o

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conjunto das dívidas ou encargos duma empresa, dum casal ou duma herança.

Não é, por isso, sem grande espanto que, ao chegar à página 138, do segundo volume do referido compêndio, se depara com a inclusão, no Passivo, da conta "Amortização do instrumento A", visto esta conta não representar qualquer dívida, encargo ou obrigação da empresa para com terceiros e falsear-se assim a noção que, de início, havia sido dada, aproximativamente, daquela importante massa patrimonial.

Mas também só agora é que a gente se apercebe claramente do motivo que levou o A. a não dar, de início, aos leitores do seu compêndio uma definição exacta do "Passivo"; esse motivo reside no facto de o A. também não possuir uma noção exacta desta massa patrimonial.

E isto porque, para o A., o Passivo poderá representar, além dum conjunto de dívidas, tudo o mais que nele seja preciso incluir para compensar erros de valorimetria do Activo.

É isto o que realmente se poderá depreender duma passagem inserta na pág. 138 em que o A. nos diz que a parte fictícia da verba inserida no Activo é compensada pela verba que figura no Passivo,

Ora todo e qualquer técnico de contas, por mais modesta que seja a sua condição, sabe perfeitamente que, se qualquer elemento do Activo não figurar no Balanço pelo seu valor exacto, o erro cometido se irá reflectir, não no Passivo, mas sim na Situação líquida, ficando esta, portanto, errada enquanto o erro não for corrigido na sua origem.

E é muito de lastimar que o senhor professor catedrático que no citado compêndio reproduz certamente as mesmas noções fundamentais que está a ensinar aos seus alunos no Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras de Lisboa e que, portanto, tem responsabilidades muito maiores do que aqueles que não desempenham idênticas funções, dê a conhecer ao respeitável público que continua a ensinar contabilidade inferior num estabelecimento de ensino Superior.

Como se fosse possível fazer ensino superior, dando pontapés à coerência, à lógica, ao bom senso ou, em uma, desrespeitando as premissas ou os princípios sobre os quais terá que assentar o raciocínio metodológico para a formulação das verdades cujo conjunto constitui a teoria do ramo de conhecimentos em cujo progresso se esteja interessado !

In Revista de Contabilidade e Comércio. Ano XXVII, n° 105, laneiro-Março (1959), p. 107-117.

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AMORTIZAR OU REINTEGRAR?

Vejamos agora as consequências resultantes do fenómeno posto em evidência por este lançamento, que é a síntese dos dois lançamentos seguintes:

1) Depreciação de Instalações a Instalações Pela depreciação sofrida pelas instalações neste exercício 300

1) Resultados do exercício a Depreciação de instalações Pela cobertura da depreciação das instalações neste exercício 300

O facto de se ter atribuído às instalações o valor de 900 contos quer dizer que elas custaram esta verba que saiu do capital inicialmente reunido pela empresa; ou, por outras palavras, quer dizer que a empresa, de início, inverteu 900 contos do seu capital na montagem das suas instalações.

Nessa altura, pois, o binómio "Instalações — Capital" caracterizava-

se pela presença de uma verba comum: Neste seu raciocínio, eles atendem apenas ao assassinato das

instalações, sem admitirem que esse assassinato teria como consequência directa e imediata o desaparecimento da parcela correspondente do Capital da empresa.

/ • • ■ /

Eu já tive ocasião de explicar com a maior clareza possível — suponho eu — num trabalho publicado, há dois anos, intitulado "Amortizar ou Reintegrar?", este aspecto da questão, afirmando que quando dizemos "Amortização das instalações", a que eu chamo "Reintegração das

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Instalações", nos servimos de uma legenda abreviada que corresponde à seguinte legenda mais extensa: "Reintegração do Capital desfalcado no valor correspondente em Instalações".

O que fundamentalmente nos interessa é — repito — a reconstituição do Capital desfalcado pela depreciação das instalações ou de quaisquer outros elementos do Activo imobilizado em que ele foi inicialmente invertido, porque isso nos habilitará a dispor dos fundos correspondentes na altura em que seja necessário proceder à sua futura substituição.

E é prendendo-se exclusiva e unilateralmente à ideia da substituição dos elementos obsoletos por outros novos que eles admitem que a essa substituição se dê o nome de "reintegração", porque, dizem eles, o termo "reintegração" significa recolocação de um indivíduo no lugar ou no emprego em que se encontrava e do qual foi ou esteve temporariamente afastado; e, no caso dos elementos do Activo imobilizado, as coisas processam-se de uma maneira idêntica.

Mas, exprimindo-se assim, nada mais fazem do que confundir as aparências com as realidades, como noutro lugar se mostrará.

Por agora, importa frisar que a substituição de qualquer dos referidos elementos tornado obsoleto por outro novo é uma consequência ou, melhor dizendo, um benefício proporcionado pela "reintegração" da parcela do Capital representada por esse elemento.

Mediante a "reintegração" dessa parcela, a empresa disporá de recursos que poderá utilizar em tal substituição quando seja necessário fazê-lo, o que nem sempre sucede porque nem sempre essa necessidade se impõe.

Com efeito, suponhamos que as instalações atrás consideradas, no valor de 900 contos, pertencem a uma empresa que explora um serviço público mediante concessão de uma autarquia local durante o prazo de dez anos, no fim do qual ela terá de entregar a essa autarquia as suas instalações sem direito a qualquer indemnização.

Nesse caso, evidente se torna que a empresa não terá o menor interesse em substituir essas instalações por outras novas; mas o facto de ela ter reintegrado a parte do capital nelas investido coloca-a em condições de garantir aos accionistas o reembolso dessa parte que doutro modo constituía uma perda para eles.

Outro caso análogo sucedido há meses, e de que tive conhecimento directo por nele ter intervido uma pessoa das minhas relações, é o da compra de uma patente de invenção pela empresa de que essa pessoa faz parte, pela quantia de 3.000 contos, cujo exclusivo termina dentro de três anos.

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Isto implica para a empresa compradora a necessidade de reter 1.000 contos dos seus lucros no seu património no fim de cada um desses três anos para evitar que a parte correspondente do seu capital seja absorvida pela depreciação da patente, mas não para a substituir por outra precisamente idêntica, porque a hipótese da substituição neste caso não é de admitir.

Estes dois exemplos servem para vincar bem a ideia de que a depreciação de qualquer elemento do Activo imobilizado ocasiona uma perda ou uma diminuição do Capital da empresa respectiva e de que a "reintegração" deste se impõe para que não seja desfalcado e para que a empresa não empobreça.

A "reintegração" poder-se-á fazer directamente levando o valor da depreciação à conta de "Resultados do exercício" ou indirectamente, utilizando contas que se interpõem entre aquela conta e as de depreciações quando estas se contabilizam.

Se as depreciações não se contabilizam regular e oportunamente como a teoria claramente o inculca, então a prática, que neste ponto se afasta da teoria, costuma utilizar uma conta de recurso para a qual, no fim de cada exercício, se transfere a parcela do resultado necessária para constituir a provisão destinada a preencher o vácuo deixado pela depreciação na altura desejada, que, no caso dos elementos do activo imobilizado, poderá coincidir com o momento em que eles tenham de ser postos de parte por obsolescência física ou económica ou pela sua cedência gratuita à entidade concedente quando se trate de empresas que explorem concessões feitas por entidades públicas.

Referindo-me a esses elementos nas minhas "Noções Básicas de Contabilidade Geral", eu aconselho, em estreita obediência ao imperativo da teoria — e nem poderia deixar de o ter feito por se tratar de uma obra em que se expõem os fundamentos teóricos da Contabilidade — a pôr em evidência tanto a depreciação como a respectiva reintegração por meio de lançamentos adequados.

E isto porque a expressão analítica dos conceitos teóricos da "depreciação" e da "reintegração" por meio desses lançamentos nos faz compreender melhor a trama desses conceitos, porque tais lançamentos são

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a sua literal tradução contabilística. Ei-los:

Io. Depreciação de instrumentos (instalações, máquinas, etc.) a Instrumentos Pela depreciação sofrida pelos instrumentos durante o exercício 300

2". Resultados do exercício a Reintegração de instrumentos Pela provisão destinada a cobrir o desfalque do capital ocasionado pela depreciação dos instrumentos durante o exercício 300

3o. Reintegração dos instrumentos a Depreciação dos instrumentos Pela aplicação da provisão constituída à cobertura da depreciação dos instrumentos 300

Como claramente se vê, o primeiro destes lançamentos põe em evidência a "depreciação" dos instrumentos; o segundo revela-nos a ma­neira como se formou a provisão destinada à "reintegração" e o motivo da sua formação; e o terceiro mostra-nos o fim a que esta se destina e que consiste em fazer face à depreciação.

Fazendo agora a síntese destes lançamentos cairemos no lançamento atrás citado:

Resultados do exercício a Instrumentos (instalações, máquinas, etc.) Pela depreciação dos instrumentos e sua respectiva cobertura 300

Quer isto dizer que os três lançamentos anteriores constituem a análise dos fenómenos implicitamente relevados neste último lançamento, pelos quais se vê que a "reintegração" do Capital na parte desfalcada pela depreciação dos instrumentos equivale à progressiva reconstituição do valor dos instrumentos incapacitados por obsolescência.

Este processo de relevação explícita da "depreciação" dos instrumentos e da sua respectiva "reintegração" a que eu chamo "processo integral"

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justamente porque nos mostra o circuito das operações em que elas se resolvem, proporciona-nos o conhecimento do seu valor actual dos instrumentos e da sua depreciação, bem como o conhecimento do seu valor inicial porque este é a soma daqueles.

Tem, porém, o inconveniente de ordem prática resultante do facto de os instrumentos mudarem de valor no fim de cada exercício e de essa mudança nos obrigar a descrevê-los no respectivo Balanço analítico; o que ocasiona bastante trabalho quando sejam numerosos, como sempre sucede nas grandes empresas industriais de aparelhagem muito variada e muito complexa.

Ora não há ninguém de são critério que possa ver uma atitude lógica em quem recomende o uso do termo "amortização" numa língua em que existe o termo "depreciação".

Que se deverá, porém, entender por "amortização"? O referido Dicionário diz-nos que os contabilistas usam a palavra

"amortização" para significar o registo contabilístico da depreciação ou redução de valor operada numa conta de Imobilizado (amortização industrial).

Ora, se a "amortização" é o registo contabilístico da "depreciação", ocorrerá naturalmente fazer a seguinte pergunta: poderá o registo contabilístico de qualquer facto ou fenómeno patrimonial alterar a essência desse facto ou desse fenómeno?

Suponho que ninguém se atreverá a responder afirmativamente a esta pergunta, porquanto a finalidade do registo contabilístico de qualquer facto ou fenómeno patrimonial consiste justamente em pôr em evidência esse facto ou esse fenómeno e não outro que com estes nada tenha que ver.

E é precisamente nesta incoerência que caem aqueles que persistem em confundir duas coisas absolutamente distintas, porque "amortização", como a própria etimologia deste termo naturalmente nos está a inculcar, é a acção de matar, de aniquilar, de fazer desaparecer, qualquer coisa que, se não se matasse se não se aniquilasse, se não se fizesse desaparecer, continuaria a viver, a existir, a impor-se pela sua presença.

A "depreciação", pelo contrário, é uma morte natural, espontânea, inevitável, à qual nenhuma força humana se poderá opor para a deter no seu catastrófico desenlace.

Importa, porém, frisar que a "amortização", só se poderá referir aos valores dos elementos incorpóreos e não a estes considerados em si mesmos, porque, sendo eles abstractos ou invisíveis, pretender matá-los equivaleria

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a cometer uma façanha tão disparatada como a que cometeria quem pretendesse matar sombras fantasmas ou almas penadas.

E é exactamente nesta acepção que eu também o emprego, porque — não será demais repeti-lo — me refiro ao "valor" e não ao objecto a que diga respeito; ao valor desse objecto como parte integrante do Capital da empresa que ficará desfalcado em igual montante se não se tiver operado a sua "reintegração" como já noutro lugar foi convenientemente e claramente explicado.

In Revista de Contabilidade e Comércio. Ano XXXII, n" 122, Abril-Junho (1964), p. 157-175.

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PROF. DOUTOR JOSÉ ANTÓNIO SARMENTO

No Prof. Sarmento tudo se congregava para fazer dele um pedagogo modelar, porque possuía não só profundos conhecimentos das matérias que ensinava mas também uma tendência inata para se fazer compreender sem dificuldade por aqueles que tiveram a felicidade de terem sido seus alunos tanto no ensino superior como no ensino secundário, e que eram unânimes em considerá-lo como um professor de categoria excepcional.

Nisso ele era muito ajudado pelo seu feitio metódico. E isto porque, nele, o método era uma espécie de imperativo orgânico a que ele obedecia tão naturalmente como se obedece à necessidade orgânica de ingerir alimentos.

Esse método instintivo, como se fosse uma parcela inseparável do seu próprio ser, contribuía para que ele tirasse o maior partido possível dos seus vastos conhecimentos na difícil tarefa de os tornar acessíveis aos seus alunos.

Inatos nele eram também o seu aliciante aprumo moral e a sua propensão para prestar desinteressadamente serviços a quem deles carecesse, assim se explicando que ele tivesse granjeado amizades sinceras não só entre os seus condiscípulos e os seus alunos, mas também entre todas as pessoas que tiveram a oportunidade de com ele contactar.

Todos estes predicados contribuíram igualmente para que tivesse sido um modelar chefe de família e que tivesse constituído para ela um exemplo de respeito pelos direitos e necessidades do próximo, de perseverança e dedicação ao trabalho, de coragem no enfrentamento das contrariedades da vida, de cumprimento da palavra dada e, enfim, de tudo o que se insere e se define na expressão "integridade de carácter".

Para a família a sua morte representou, como não podia deixar de ser,

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uma perda irreparável que só a recordação daquilo que ele foi e como foi poderá ajudar a suportar com estóica resignação.

Mas o seu falecimento não foi apenas uma perda para a família que ele tão carinhosamente amava e para a qual vivia com os olhos postos principalmente nos seus dois filhos que correspondiam ao seu zelo paternal com o amor ao estudo e acatamento dos bons conselhos e exemplos que ele lhes soube dar.

O seu falecimento foi também uma grande perda para a Faculdade que tão devotada e inteligentemente serviu e em que recentemente se havia doutorado, sem que para isso tivesse de abandonar por muito tempo o seu labor pedagógico, o que equivale a dizer que ele se preparou para o doutoramento ao mesmo tempo que exercia as suas funções docentes com a competência e eficiência que todos os seus alunos reconheciam.

E, embora seja certo que não há ninguém que seja insubstituível, também é igualmente certo que a equivalência de méritos, neste caso, é um problema que não poderá deixar de criar justificadas preocupações a quem quer que venha a suceder-lhe no desempenho das suas funções docentes.

Era um apaixonado pelas várias facetas da especulação científica e só essa paixão poderia ter contribuído para que se decidisse a tomar posição no ensino superior que ele serviu com uma devoção e um entusiasmo que só os verdadeiramente apaixonados sabem pôr nos empreendimentos em que conscientemente se metem.

Mas, como tudo o que nasce neste mundo está condenado a morrer, ninguém poderá escapar a este indesejado aniquilamento cósmico e de nada valeria a nossa revolta individual ou colectiva contra esta arripiante fatalidade.

In Revista de Contabilidade e Comércio. Ano XXXII, n° 122, Abril-Junho (1964), p. 219-223.

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OS NUMEROS QUE GOVERNAM O MUNDO ECONÓMICO

Os factos que acabei de apontar e que se verificam correntemente, aos quais outros se poderiam acrescentar, bastam, suponho eu, para que nos convençamos de que não se tem ligado a devida importância à apresentação dos números que governam o mundo económico em condições de tornarem mais fáceis a sua interpretação e o seu significado, porque no tratamento da Contabilidade se nota não apenas ausência de espírito científico e filosófico, mas, o que é ainda mais grave, até ausência por vezes do mais comezinho bom senso, por via da qual em Contabilidade as palavras infelizmente continuam a jogar à cabra cega com as ideias.

De facto, poder-se-ão contar pelos dedos os tratadistas que têm procurado aplicar ao estudo da Contabilidade o método científico, embora sejam muito numerosos aqueles que nos falam de "ciência das contas"; mas que, no entanto, não são capazes de no-la apresentar em termos que nos possam convencer da veracidade das suas falas.

E os poucos que se têm esforçado por lhe imprimir cunho científico não têm encontrado ambiente propício à adopção dos seus conceitos, porque os utilizadores da Contabilidade, que constituem legião imensa, não possuem, na sua maior parte, a agudez intelectiva suficiente para poderem distinguir o absurdo ou o sofisma da realidade ou da verdade.

Importa, porém, que se diga e que se saiba que seria uma grande injustiça deixar de reconhecer que não faltam técnicos de contas tão convencidos como eu da existência de tais absurdidades, mas que, no entanto, nada podem fazer para as evitar, não só porque elas, às vezes, são impostas por entidades oficiais que superintendem no comportamento de certos ramos de actividade económica e social, mas em quem a sua posição de comando em nada tem contribuído para suprir as deficiências da sua preparação

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teórica, mas também porque eles — técnicos de contas — na sua qualidade de subalternos das administrações; muitas vezes do tipo discricionário e tradicionalista, não se sentem muito à vontade para poderem modificar a linha de rumo que anteriormente vinha sendo seguida.

Segundo o conceito da escola de Aristóteles e de S. Tomás a verdade não é nem impossível, nem fácil, mas, pelo contrário, difícil de atingir pelo homem; e, perante tal dificuldade, ele propende para seguir a lei do menor esforço, enveredando por caminhos mais curtos e menos fatigantes que lhe façam poupar o excesso de esforço que teria de despender para atingir uma meta mais distante, mas de horizontes que, por serem mais abertos, mais límpidos e mais fascinantes para o seu espírito e para a sua razão, o compensariam sobejamente desse excesso de esforço porque lhe permitiriam apreender a realidade objectiva constituída pelas verdadeiras relações das coisas, que estão na própria base do conhecimento científico que deve ser válido para todos.

Tal inércia mental contribui para que os factos e acontecimentos que apresentam novidade e variedade sejam menosprezados e deturpados na medida precisa para que entrem no domínio comum da crença habitual em obediência à qual se estabelece o silêncio em torno de iniciativas cujos resultados, pela lógica do raciocínio que conduziu à sua obtenção, se situam naturalmente fora da vulgaridade das ideias fossilizadas.

Trata-se de uma atitude correntemente verificada em Contabilidade onde se nota uma lamentável ausência de consciencialização no tocante ao rigor do ajustamento dos conceitos a muitos factos de observação quotidiana, atribuível a um imobilismo inibitivo que não deixa ver com meridiana clareza a finalidade do labor científico, que consiste em realizar uma adaptação cada vez mais precisa do nosso espírito à realidade e em elaborar uma representação cada vez mais adequada do objecto a estudar, não só para melhor o compreendermos e para passarmos da compreensão à previsão, mas também para entrarmos em acção com verdadeiro conhecimento de causa.

Para isso, necessário se torna abandonar a lei do menor esforço a que muitos se apegam sem medirem convenientemente o alcance das suas responsabilidades que serão tanto maiores quanto mais culturalmente qualificados forem os fiéis observadores dessa lei, cujo acatamento em tão larga medida se poderá atribuir à falta de críticos com a autoridade suficiente para atacarem o mal na sua raiz e modificarem o clima de absurdidades actualmente existente, tornando possível pela proscrição teimosamente

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sistemática de tudo aquilo que não se adapte aos cânones atrabiliàriamente estabelecidos e pela aversão e desinteresse que ela fomenta contra todas as aquisições válidas que apresentem a marca inconfundível da novidade.

In Revista de Contabilidade e Comércio. Ano XXXII, n° 126, Abril-Junho (1965), p. 121-137.

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TEORIA DINAMISTA

Esta teoria é assim chamada por ter sido exposta numa obra denominada "Dynamische Bilanz", da autoria de E. Schmalenbach, antigo professor da Universidade de Colónia, da qual possuo a edição, cuja publicação teve lugar em 1926.

Com efeito, já passou o tempo em que os empresários só se preocupavam com a obtenção de elevadas margens de lucro relativamente ao capital investido, julgando ter desempenhado a sua missão tanto melhor quanto mais avantajadas fossem essas margens.

Modernamente, porém, o "lucro" aparece no fim da lista das preocupações dos chefes das empresas verdadeiramente possuidores do sentido das suas responsabilidades, porque antes dele colocam a introdução de novas ideias e de novos métodos para que as suas organizações trabalhem sem atritos, melhorem e aumentem as suas possibilidades de produção e o número de empregados, alcancem estabilidade, segurança e sobrevivência, promovam o bem-estar não só dos seus empregados mas também do público, fornecendo-lhe produtos cada vez melhores e a preços mais económicos.

A primeira preocupação do dirigente de uma empresa é conduzi-la com êxito, que deverá ser mais importante que o lucro, porquanto ele pressupõe a enfrentação resoluta e a solução adequada dos grandes problemas sociais que estão na ordem do dia e que serão tanto mais complicados quanto maior for a vastidão dos aglomerados humanos constituídos e encarados quer ao nível de nações, quer de províncias, quer de cidades, quer de grandes, médias e pequenas empresas.

O simples facto de se compreender o modo como as pessoas vivem e trabalham em conjunto tem ainda maior importância do que a maquinaria, o processo tecnológico, o dinheiro ou qualquer outro elemento material.

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Hoje o empresário não deve pensar somente na maneira de se servir a si, mediante o trabalho dos seus colaboradores, mas também na maneira de servir esses colaboradores — operários e empregados de várias categorias —, os seus clientes, os seus fornecedores, a localidade onde a empresa está situada, o ramo de actividade económica que está a ser explorado e a economia nacional.

O exercício do comércio e da indústria já não pode continuar a ser mantido num ambiente de rigoroso segredo que terá, no interesse de todos os que o praticam, de ser substituído por uma franca troca de impressões e de informações que a todos aproveite.

Nos tempos que vão correndo, o verdadeiro sentido das realidades sociais já se não compadece com a atitude condenável, por desumana, dos empresários de atender unicamente aos seus próprios interesses com absoluto menosprezo dos interesses dos seus servidores, especialmente dos material e intelectualmente menos dotados que, bem vistas as coisas, noutros tempos só contavam para esses empresários pelo trabalho que lhes forneciam e na medida em que lho forneciam, pouca ou nenhuma atenção lhes merecendo a conservação das suas pessoas porque estas não representavam para eles um investimento de capital cuja integridade se fizesse mister assegurar.

No plano do interesse material em que se movia o velho capitalismo, os trabalhadores, verdadeiros seres humanos, encontravam-se, portanto, numa condição inferior à de alguns animais irracionais, nomeadamente os bovinos cujos possuidores procuram alimentar o melhor possível não só para utilizarem o seu trabalho, mas também para não desfalcarem o capital que eles representam.

Mas, segundo a nova concepção que, felizmente, está a generalizar-se no mundo dos negócios, aquilo a que antigamente os empresários ligavam pouca ou nenhuma importância está a constituir motivo da sua maior preocupação por se ter finalmente reconhecido que o capital humano, o capital social, é muito mais importante do que o capital financeiro, quer se trate do velho quer do novo (lucro) de que nos fala Schmalenbach e por ele considerado como o máximo expoente na finalidade da actividade empresarial.

Assim se explica que a sua teoria se mostre indefensável no domínio social pela sua inconciliação com a mudança de clima operada nesse domínio nas últimas décadas, depois de se ter mostrado igualmente indefensável no plano contabilístico propriamente dito pelas razões que atrás se expuseram

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e que se poderão resumir nos seguintes reparos:

1. O "Balanço dinâmico em que se apoia não passa de um farisaico sucedâneo do produto do mesmo nome do sistema patrimonialista, constituído por um rebento degenerado deste mesmo sistema;

2. Antepõe a determinação do "lucro", que é uma consequência da existência de qualquer empresa especulativa, ao conhecimento da situação patrimonial da qual depende a continuidade dessa mesma empresa;

3. Inclui indevidamente na conta "Perdas e ganhos" elementos que no sistema patrimonialista são racionalmente integrados nas contas "Exploração", "Produtos fabricados", "Produtos inacabados" e "Produtos vendidos" (Vendas), porque desconhece os requisitos metodológicos da "conta".

4. Mercê de tal circunstância não permite o conhecimento do valor dos materiais e existentes na sucessão dos instantes pelo facto de o desenvolvimento das contas desses materiais não constar do "Balanço dinâmico geral";

5. Pelo mesmo motivo, não permite seguir, em contas próprias, a evolução dos gastos realizados na fabricação de cada espécie de produto, quando se fabriquem várias espécies ao mesmo tempo nem averiguar em que medida cada uma dessas espécies contribuiu para a formação do "lucro" de exploração;

6. Baseia-se na concepção errónea de que o "lucro" é a fonte de onde promana tudo o que é necessário à vida da empresa especulativa;

7. A estreiteza de tal concepção contribui para que a teoria dinamista não possua a amplitude necessária para se poder aplicar às entidades ou organismos que não prossigam fins lucrativos mas para cuja administração é indispensável a existência de uma contabilidade adequada;

8. Serve-se de uma terminologia equívoca e, portanto, imprecisa no seu significado, que dá origem a confusões sempre de lamentar numa disciplina que se deve impor pela ponderação nas suas realizações;

9. Desconhece toda a trama da complexa metodologia da Contabilidade que tem nesta disciplina uma importância enorme, dada a circunstância de o processamento metodológico constituir todo o seu arcaboiço funcional;

10. Toda a sua temática naquilo que ela tem de mais vincadamente original constitui uma verdadeira subversão da estruturação racional da Contabilidade;

11. Não considera o "lucro" (capital novo) como fazendo parte

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integrante do património (capital velho), mas sim como uma massa independente que, surgindo providencialmente do nada, promove e domina a sua formação, equiparando-se, assim, nas suas ilógicas inferências ao piadético conceito segundo o qual foi o ovo que surgiu antes da galinha e não esta antes daquele;

12. Reconhece a impossibilidade da determinação exacta do lucro (capital novo) que é o objectivo fundamental do seu "Balanço dinâmico", por ela considerado como modelo acabado de perfeição científica, mas critica o "Balanço estático", cujo conteúdo e constituído pelo dito capital novo (lucro) e pelo capital velho de cuja movimentação aquele resulta, pelo facto de ele não apresentar, com o necessário rigor, nem a situação patrimonial nem o valor do património, circunstância esta que, segundo a teoria em referência, lhe tira todo o cunho científico, como se a ciência fosse o mesquinho produto da nefelibática atitude de ver na obra dos outros defeitos que somos incapazes de descortinar na nossa própria obra, quando esta não está isenta desses mesmos defeitos.

In Revista de Contabilidade e Comércio. Ano XXXIV, n° 133, Janeiro-Março (1967), p. 5-43.

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TEORIA REDITUALISTA

No fundo, trata-se de uma teoria patrimonialista em que se dá especial relevo ao aumento do capital por meio do "rédito" entendido como "rendimento" , " lucro", "ganho", "provei to", "benefício", "resultado positivo", etc., e que, na prática, também tem os nomes de "provento", "renda", "dividendo", "aluguer", etc.

No centro desta teoria situa-se a marcante figura do grande tratadista italiano GINO ZAPPA, que foi professor da Faculdade de Economia e Comércio de Veneza e autor de várias obras entre as quais se destaca II Reddito di Impresa que resultou da amalgamação de dois fascículos publicados respectivamente em 1920 e 1929, sob as denominações de "La determinazione dei reddito nelle imprese commerciali" e "I valori di conto in relazione alia formazione dei bilanci", e cuja terceira reimpressão da 2." edição foi feita em Milão, em 1950.

Exacerbou-se a concorrência entre os industriais e começou a corrida à redução dos preços de venda, tendo muitos industriais, entre os menos bem organizados, fixado preços de venda na base dos preços dos concorrentes mais bem organizados, porque, ignorando os seus verdadeiros preços de custo, supuseram ilusoriamente que, assim, obteriam lucros; mas, em lugar de lucros, tiveram perdas gravíssimas por via das quais muitos sucumbiram nessa competição.

Isso impressionou o Governo Federal mas, desta vez, por um motivo oposto àquele que anteriormente o havia impressionado tendo pelas indagações a que mandou proceder averiguado que, em 250 000 empresas industriais, 70 por cento delas obtinham lucros irrisórios e que só 5 por cento dessas empresas conheciam com precisão, os seus próprios preços de custo.

Produziu-se então um facto maravilhoso. O próprio Governo Federal

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promoveu uma campanha de p ropaganda em favor da difusão do conhecimento dos preços de custo nas empresas industriais por meio de uma "Federal Trade Commission".

As numerosas Associações industriais, não menos preocupadas do que o Governo, tomaram-se, por sua vez, iniciadoras e condutoras dessa campanha, levada até ao ponto de predispor os industriais para a utilização, se não de um método uniforme de contabilização de custos, pelo menos de um método uniforme de determinação do preço de custo por categorias de industrias.

E é surpreendente o volume e a qualidade da nova literatura sobre "costing" que inundou o mercado livreiro norteamericano, o que faz pensar e concluir que se apaixonaram por este género singular de literatura económica não só as casas industriais interessadas, mas também a população operária.

O facto a que aqui se alude mostra-nos que, enquanto as empresas mais bem organizadas progrediam normalmente porque contabilizando e controlando os custos de fabricação, os preços de custo dos seus produtos baixavam para um nível tal que os poderiam vender a preços que lhes proporcionavam um lucro razoável, as empresas menos bem organizadas não podiam competir com elas em matéria de preços, porque estes resultavam demasiado elevados por falta de economia nos gastos de fabrico que ela lhes permitiria fazer, de modo que, em vez de lucros, tinham prejuízos.

Como, no seu sistema, ZAPPA visa exclusivamente o lucro, prende-se, por isso mesmo, essencialmente com o aspecto económico das empresas e relega para um plano secundário o aspecto financeiro das mesmas , considerando as contas que reflectem intrinsecamente esse aspecto como coisas insusceptíveis de figurarem nele, sem se aperceber de que são as finanças da empresa que estão na base da sua economia, dada a circunstância de serem os seus recursos financeiros que lhe permitem adquirir todos os elementos materiais de cuja movimentação resulta o rédito.

No sistema zappiano, o rédito é um resultado todo imbuído de um conceito meramente quantitativo que constitui a característica fundamental do dito sistema, quando é certo que tal conceito não basta para, por si só, se poder fazer uma análise adequada da situação patrimonial de qualquer empresa e das possibilidades da continuidade da sua existência sem risco da ocorrência de preocupantes percalços.

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Por isso é que o aspecto quantitativo terá de ser completado pelo aspecto qualitativo, que é fundamental na análise da situação patrimonial das empresas, mediante uma seriação adequada das contas das três grandes massas patrimoniais — Activo, Passivo e Situação líquida.

Ora o menosprezo do aspecto qualitativo da composição do património das empresas resulta precisamente do facto de ZAPPA ter relegado para um plano secundário, para efeito de gestão, o conhecimento da situação patrimonial decorrente do "Balanço estático", visto ele o considerar como um simples expediente de rotina sem importância, a que se costuma recorrer apenas no último dia de cada exercício mas que se abandona desde o dia imediato até ao fim do exercício subsequente.

Isto leva-nos a crer que ele não possui a noção do "Balanço estático contínuo" ou, por outras palavras, que ele não possui a noção de que as situações patrimoniais se sucedem no tempo por força dos impulsos dinâmicos que se vão produzindo no seio do "cosmos" patrimonial, após cada um dos quais se apresenta uma configuração estática, qualitativa ou valorativamente diferente da configuração precedente, porque o "Balanço estático", representativo dessa configuração, é, como já noutro lugar foi dito, a síntese do "Balanço dinâmico".

Em suma, ele não tem a noção de que o termo "situação" não pode ser tomado no sentido de "paragem", "estacionamento" ou "imobilização", mas sim no sentido de perspectiva geral num dos inúmeros e sucessivos momentos em que o tempo se pode considerar decomposto.

/ . . . / E isto equivale a repetir aqui, agora, o que já foi dito acerca da teoria

"dinamista", ou seja, que o "estático" está dentro do "dinâmico", sendo por este, por assim dizer, empurrado em cada, um dos impulsos por que se manifesta, de maneira que o "estát ico" acompanha o "d inâmico" , particularidade esta que nenhuma dificuldade haverá em compreender e admitir no ponto de vista teórico.

O que estorva a compreensão dessa particularidade é a dificuldade ou mesmo a impossibilidade, que se nos deparam no domínio da prática contabilística, de se conseguir a representação da continuidade da situação patrimonial na sucessão dos instantes por carência absoluta de meios materiais adequados ao conseguimento dessa representação, dada a

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complexidade qualitativa normalmente verificada na composição do património das empresas e o volume das operações realizadas.

Nos casos em que o património seja constituído por um só elemento ou por um número muito limitado de elementos de diferente natureza específica e de movimentação pouco intensa, as dificuldades atenuar-se-ão consideravelmente até ao ponto de permitirem uma grande aproximação do ideal teórico da representação contínua da situação patrimonial.

Um dos indícios mais relevantes de que a imaginação humana se tem vindo a esforçar, de há tempos a esta parte, por encontrar meios de tornear ou até de superar tais dificuldades, poder-se-á ver na concepção e construção de máquinas cada vez mais perfeitas e mais eficientes destinadas ao encurtamento do tempo exigido pelo trabalho manual para a relevação de toda a fenomenologia patrimonial.

Graças ao prestimoso concurso dessas máquinas, há hoje empresas cuja contabilidade se encontra em condições de poder apresentar a situação patrimonial não apenas no fim do ano, mas a intervalos tão curtos que já nos dão a impressão de que nos encontramos muito perto do conseguimento do ideal da situação patrimonial contínua decorrente do respectivo "Balanço estático".

Analogamente ao que já foi di to a propós i to das obras de SCHMALENBACH, verifica-se na obra de Zappa a ausência de uma visão suficientemente ampla e aprofundada da complicada e subtil trama da metodologia geral da Contabilidade, concebida como o enfeixamento de diversos processos metodológicos que dão a esta disciplina a maleabilidade necessária para ela se poder adaptar às exigências específicas de todos os casos que se lhe deparem na vida prática.

Como o património das empresas é um "cosmos" de riqueza que se movimenta constantemente , embora o movimento não se verifique simultaneamente em todas as moléculas do seu conteúdo, na sua relevação adopta-se o critério cartesiano que consiste em decompô-lo nas suas diferentes partes homogéneas e em analisar cada uma dessas partes nos seus aspectos específico, jurídico, económico, financeiro, tecnológico, administrativo e contabilístico e em recompô-lo mediante uma coordenação racional dessas diferentes partes (contas), que nos conduzirá ao conhecimento harmónico do todo em que se integram.

Assim se obtém uma construção metodológica à qual poderá servir de base ou de planta o sistema "patrimonialista": e de alçado o sistema

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"positivista", porque, enquanto o primeiro nos proporciona uma análise interpretativa da natureza dos elementos abrangidos pelo património, considerados nos seus aspectos "qualitativo" e "valorativo", o segundo proporciona-nos, por sua vez, o conhecimento e a utilização dos processos mais adequados para que o património se nos apresente como uma síntese ou um conjunto de sucessivas integrações dos ditos elementos em classes (contas) de extensão cada vez maior mas de compreensão cada vez menor, ou vice-versa, conforme se parta do simples para o complexo ou se caminhe no sentido contrário.

Pela conjugação dos conceitos informadores dos dois referidos sistemas obter-se-á uma representação patrimonial em que cada classe (conta) só comporta os elementos inculcados pela sua denominação e ocupa sempre o mesmo lugar no sector que lhe é determinado no Balanço que é a expressão metológica dessa representação, de modo que os elementos incluídos em cada classe (confa) obedecem sempre às características distintivas inculcadas pela denominação da classe (conta) respectiva e das classes (contas) mais complexas a que esteja subordinada em conformidade com o princípio coordenador da sua integração no todo (património) de que fazem parte.

Verifica-se, assim, a existência de uma coerência metodológica que é uma das características fundamentais dos dois referidos sistemas, graças à qual as máquinas, as matérias-primas, os produtos inacabados, os produtos fabricados, os créditos, o dinheiro, etc, são objecto de contas próprias integradas na massa patrimonial chamada "Activo", nunca podendo suceder, portanto, que qualquer dos ditos elementos seja considerado, umas vezes, como "custo", entendido no sentido de perda ou diminuição do capital ou, mais precisamente, do "Activo" e, outras vezes, como componente desse mesmo "Activo", como sucede nos sistemas "reditualista" e "dinamista", o primeiro dos quais é a reprodução fiel do segundo.

No entanto, esta incoerência metodológica, como já foi explicado, faz parte integrante da problemática destes dois sistemas, a qual se mostra impotente para conciliar a concepção estática com a concepção dinâmica do capital ou do património das empresas sem incorrer em contradições que a desacreditam como conjunto doutrinário merecedor de categoria científica.

In Revista de Contabilidade e Comércio. Ano XXXIV, n° 136, Outubro-Dezembro (1967), p. 329-376.

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AS MAIS VALIAS E AS REAVALIAÇÕES

Neste intervalo, porém, sobre o mesmo assunto apareceu em Anexo ao n.° 123 desta Revista um valioso estudo da autoria do distinto Prof. Dr. Rogério Fernandes Ferreira, em que alude ao facto de até então não ter visto nitidamente desenhadas as distinções entre os termos "reavaliação" e "revalorização monetária", quer em autores nacionais quer estrangeiros (Pág. 18).

Repor tando-me, pois, aos dois termos — "reaval iação" e "revalorização" —, parece-me que há uma certa diferença nos seus significados que não nos autoriza a tomá-los indiferentemente um pelo outro.

Com efeito, "reavaliação" é a atribuição de um novo valor a um bem já anteriormente avaliado, novo valor esse que poderá ser superior ou inferior ao valor antigo.

Por sua vez, a "revalorização" verifica-se quando um bem, depois de ter mantido até certa altura um determinado valor, perde subsequentemente uma parte desse valor que, mais tarde, vem a recuperar total ou parcialmente.

Assim, se a nossa moeda readquirisse o valor que ela possuía antes da primeira guerra mundial, nós diríamos que ela se havia revalorizado e, neste caso, a sua revalorização seria total para a distinguir da revalorização parcial , no caso de ela ter recuperado apenas uma par te da sua desvalorização; mas, de qualquer maneira, o novo valor será sempre superior ao valor imediatamente precedente.

Estreitamente ligado à "revalorização" está o termo "valorização", que entra na sua composição e que se verifica quando o valor de um bem, num determinado momento, é considerado superior ao que ele tinha antes, mas sem que a diferença (aumento) seja resultante da desvalorização da moeda.

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Este termo também se emprega no sentido de dar ou atribuir valor a qualquer coisa como, por exemplo, na expressão "os professores procedem à valorização das provas dos seus alunos", mas não é neste sentido que, no caso em questão, ele é empregado.

Tanto a "reavaliação" como a "valorização" e a "revalorização" são operações destinadas a actualizar valores de bens que não correspondem à realidade no momento em que se procede a essas operações, de modo que, no fundo, a "actualização" é uma correcção que, no caso de que aqui se trata, ou seja, na atribuição de um novo valor aos elementos do activo imobilizado por efeito da "desvalorização da moeda", consiste em adicionar ao seu valor primitivo o aumento por ela ocasionado.

Neste caso, porém, esse aumento é meramente fictício e, como tal, não pode nem deve ser considerado como uma "mais-valia", porque esta é um factor de enriquecimento, ao passo que aquele não torna mais rico o possuidor do bem reaval iado, quando esse bem se des t inar a ser transaccionado, mas será indicativo de empobrecimento, quando se tratar de um bem de uso, como mais adiante se verá.

Por isso é que não me parece apropriado o emprego do termo "revalorização", nem mesmo do termo "valorização", para exprimir este fenómeno, porque qualquer deles nos sugere a ideia de um aumento verdade i ro que não se poderá confundir com o aumento fictício correspondente à "inflação valórica", verificado no momento a que a "reavaliação" se reporte e que me parece poder ser mais correctamente expresso pelo termo "actualização".

Embora, quer num quer noutro caso, o valor dos bens tenha aumentado, as causas que determinaram o aumento são diferentes e diferentes são também os seus efeitos, assim se justificando também que sejam individualizados por denominações diversas, porquanto — repito — a "mais-valia" é um factor de enriquecimento e a "inflação valórica" é um factor de empobrecimento.

Poder-se-á, porém, dar o caso de a "mais-valia" resultante da valorização de um bem se achar amalgamada com a "inflação valórica", ou seja, o caso em que esta se encontra no prolongamento daquela e em que convirá, para efeito de justiça tributária, saber em que ponto termina a "inflação valórica", e começa a "mais-valia", a propósito da qual o Autor faz considerações muito judiciosas no seu estudo.

Com efeito, como exemplos de "mais-valias", ele cita os seguintes:

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a) os acréscimos operados no valor das terras de cultura por virtude da realização de obras públicas de hidráulica agrícola, de melhoria nas vias de acesso aos mercados dos produtos agrícolas, do embaratecimento ou rapidez dos novos meios de transporte, da criação próxima de núcleos populacionais a abastecer com produtos da terra, etc.;

b) os acréscimos do valor dos edifícios e terrenos para construção, em virtude de se situarem em zonas que beneficiaram de rápidos surtos populacionais ou da realização de obras ou serviços públicos de utilidade, como, por exemplo, arruamentos, redes de esgoto, novas estradas, instalações de electricidade no local, etc.;

c) os acréscimos operados no valor de equipamentos, viaturas, e outros imobilizados existentes nas empresas, em resultado de terem surgido, por exemplo, agravamentos nos impostos aduaneiros ou taxas especiais sobre bens dessa natureza a adquirir em primeira mão".

Todos os acréscimos ou "mais-valias" verificadas nestes exemplos resultam da "valorização" dos bens respectivos, tendo, portanto, aqui o termo "valorização" o significado que há pouco lhe atribuí e que é aquele que realmente lhe compete.

Por conseguinte, a "mais-valia" aparece-nos aqui como um aumento de valor resultante de determinadas condições natural ou artificialmente criadas e verificadas nos bens por elas beneficiados; ao passo que a "inflação valórica" resultante da desvalorização da moeda afecta todos os bens económicos, inclusivamente os beneficiados pela "mais-valia", caso em que, como há pouco se disse, se juntam ou se somam os efeitos destes dois fenómenos económicos

E nisto reside também outra diferença entre eles porque, enquanto a "inflação valórica" é um fenómeno de carácter geral, visto ele afectar todos os bens económicos, a "mais-valia" é um fenómeno de ordem restrita ou especial, porquanto se verifica apenas em bens beneficiados por determinadas ocorrências que influem nos seus préstimos.

In Revista de Contabilidade e Comércio. Ano XXXVII, n° 146, Abril-Junho (1970), p. 129-143.

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CONSIDERAÇÕES ACERCA DO PLANO GERAL DE CONTABILIDADE

(Anteprojecto — Ia Fase)

No entanto, eu incluo-me no número daqueles que não supõem que a elaboração de qualquer plano geral, por mais bem concebido que ele seja, resolva cabalmente o problema constituído por tal conveniência, visto esta ser mais um produto de preocupações estranhas às próprias empresas do que um imperativo ditado por considerações de eficiência empresarial.

A prová-lo está o facto de que a inexistência, até ao presente, de uma normalização contabilística oficial nunca constituiu impedimento sério para que as empresas pudessem exercer a sua actividade especulativa com aquele sucesso que muitas conseguiram alcançar e as tornou conhecidas não só entre nós, mas também no estrangeiro.

De resto, a normalização em nada facilita o estudo comparativo da composição e valor do património das empresas que não são obrigadas a publicar os seus Balanços, estudo esse que, neste caso, não seria realmente facilitado pela adopção de iguais denominações para as contas homólogas.

Por outro lado, também o estabelecimento dessa igualdade não é, por si só, um factor decisivo para tal estudo nas empresas que são obrigadas a publicar os seus Balanços, porquanto as contas isoladamente consideradas em nada contribuem para o facilitar, apesar da uniformização das suas denominações.

E isto porque a realização desse es tudo se terá de basear na coordenação de todas as contas representativas de um mesmo património, para o que se fará mister constituir grupos de contas afins em cada uma das diferentes secções do Balanço.

Assim se explica, pois, que o facto de uns utilizarem a conta "Clientes" onde outros adoptam a conta "Devedores gerais" não constitua qualquer estorvo para a análise de um Balanço, visto essa análise não se poder fazer

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atendendo a cada conta isoladamente considerada, mas, sim, ao grupo em que ela deva ser incluída.

O que fundamentalmente interessa é que, embora com, denominações diferentes, cada conta seja integrada no grupo da secção do Balanço que legitimamente lhe compita e que se definam concretamente os elementos que se deverão considerar const i tut ivos do Activo e do Passivo e componentes da Situação líquida dos Balanços em geral e do de fim de exercício em especial.

Por isso é que eu entendo que importaria sobretudo proceder a uma uniformização da nomenclatura dos diferentes grupos de contas, em que se decompõem o Activo, o Passivo e a Situação líquida, e que o objecto dessas contas possua as características próprias destas três massas patrimoniais, o que nem sempre se verifica.

No entanto, a uniformização do Balanço nas empresas seguradoras ressente-se obviamente da ignorância de quem a concebeu e impôs a essas empresas, como se poderá verificar pela análise do esquema de Balanço padronizado que a seguir se reproduz:

BALANÇO Activo Passivo

Reserva matemática $ Reserva de garantia $ Valor de emprego das reservas $ Valores em depósito $

Mobiliário e material $ Empréstimos hipotecários $ Empréstimos sobre títulos $

Reserva de garantia $ Reserva de seguros vencidos $ Credores por valores em depósito $ Credores gerais $ Indemnizações a pagar $ Comissões a pagar $ Provisões $

Situação líquida activa

Capital $ Fundo de reserva legal $ Fundos de reserva livres $ Fundo para flutuação de valores ... $

Accionistas $ Devedores gerais $ Quota-parte indem. a receber $ Prémios em cobrança $ Letras a receber $ Títulos de crédito $

Reserva de garantia $ Reserva de seguros vencidos $ Credores por valores em depósito $ Credores gerais $ Indemnizações a pagar $ Comissões a pagar $ Provisões $

Situação líquida activa

Capital $ Fundo de reserva legal $ Fundos de reserva livres $ Fundo para flutuação de valores ... $ Depósitos em bancos $

Situação líquida passiva Flutuação de valores $

Reserva de garantia $ Reserva de seguros vencidos $ Credores por valores em depósito $ Credores gerais $ Indemnizações a pagar $ Comissões a pagar $ Provisões $

Situação líquida activa

Capital $ Fundo de reserva legal $ Fundos de reserva livres $ Fundo para flutuação de valores ... $ Depósitos em bancos $

Situação líquida passiva Flutuação de valores $ ~~ _ _ ^

Totais $ Totais $

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Com efeito, quem reparar neste esquema de Balanço padronizado ficará imediatamente impressionado com o disparate resultante da colocação de contas de "Reservas" tanto no Activo como no Passivo, que eu sublinhei, porquanto tal procedimento dá logo a perceber que o .seu idealizador desconhecia por completo as noções de Activo e Passivo que são as mais comezinhas da Contabilidade.

Trata-se aqui de um afrontoso ultraje à esclarecida consciência dos contabilistas portugueses que têm de subordinar-se, sem poderem refilar, a uma determinação desassisada que chega a ferir o seu amor próprio naquilo que ele tem de mais sensível e de mais respeitável, porque o padrão que lhes foi imposto já era indefensável à luz dos conhecimentos existentes na altura em que essa determinação foi tomada e que daí para cá não deixaram de evoluir no sentido de uma maior perfeição, de maneira a poder elaborar-se um Balanço racional de contextura muito diferente daquela que se verifica no Balanço padronizado actualmente adoptado no nosso País.

A Contabilidade não é uma disciplina estática mas, pelo contrário, uma disciplina dinâmica, uma disciplina que evolui constantemente e que, como tal, não se compadece com um dirigismo atrofiante que se comporte como uma camisa de forças que impeça a sua técnica de se ir aperfeiçoando à medida que os seus progressos teóricos se forem acentuando; mas o protótipo de Balanço proposto no Anteprojecto já se acha desactualizado em face de novos critérios já existentes antes mesmo da sua elaboração.

Será, portanto, de aplaudir aquela passagem da "Justificação Prévia" contida na pág. 2 do Anteprojecto, em que a pedagogia contabilística do Fisco se exprime nos termos seguintes:

"Hoje em dia, não se costuma discutir o interesse da normalização, mas tão-sòmente as "más normalizações". Na verdade, quer a ausência de normalizações quer a existência de normalizações mal concebidas ou mal executadas dificultam a necessária ordem administrativa nas empresas e acarretam inexactidões e quebras de actividade perturbam a gestão e impedem comparações inter-empresariais, dificultando os objectivos das próprias empresas e de todas as entidades que necessitem de examinar, comparar ou agregar dados contabilísticos.

Ora, não me parece que seja exacta a afirmação de que a existência de normalizações mal concebidas ou mal executadas dificultem a necessária ordem administrativa nas empresas e acarretem inexactidões e quebras de

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actividade e perturbem a gestão, porquanto isso não se tem verificado nas empresas seguradoras, apesar de a padronização dos seus Balanços ser a coisa mais infeliz que se poderia imaginar.

O que poderá contribuir para tudo isto é, pelo contrário, a adopção de uma nova nomenclatura das contas, diferente daquela a que estivessem habituados os administradores das empresas e com a qual sempre se tivessem dado bem, mas que se vissem forçados a adaptar-se a outra que viesse ferir os seus hábitos e obrigá-los ao necessário esforço de adaptação.

Trata-se, como se deixa ver, de uma afirmação mais tendente a justificar a atitude da pedagogia contabilística do Fisco do que a servir os interesses das administrações das empresas visto que estas, longe de se sentirem perturbadas no exercício da sua função gestorial, passam mas é a sentir as dificuldades da sua adaptação a uma nova ordem de coisas com que elas não contavam.

O Anteprojecto ressente-se do facto de ter sido elaborado com os olhos postos em dois sistemas contográficos diferentes — o da conta de saco e o tradicionalmente utilizado entre nós — do que resultou a proposição de denominações diferentes para contas com o mesmo conteúdo.

Em relação com o último destes dois sistemas, diz-se na pág. 1 do Anexo que a elaboração do "Plano Geral de Contabilidade" obedeceu ao propósito de separar a Contabilidade geral da Contabilidade analítica de exploração para manter a autonomia das duas Contabilidades.

Em minha opinião, porém, a manutenção de tal autonomia resultar de uma apreciação meramente superficial, porque não tem a fundamentá-la argumentos válidos sugeridos pelo próprio conceito de empresa, visto esta ser uma unidade económica e a Contabilidade dever reflectir essa unidade, o que equivale a dizer que numa mesma unidade não poderá haver lugar para duas contabilidades distintas e autónomas.

Não se pode nem se deve ignorar o prestimoso manancial de princípios, normas e noções racionais que estão na base da construção teórica da Contabilidade e cuja importância não é de desprezar, quando se tenha em vista produzir um trabalho modelar, como convirá que seja a elaboração de um Plano de contas para servir de guia aos técnicos que fazem da contabilidade a sua predilecta profissão.

Finalmente, para remate desta longa exposição, não será descabido sintetizá-la nas seguintes conclusões:

a) A normalização da Contabilidade é uma conveniência mais sentida

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fora dos meios empresariais do que dentro destes; b) A prová-lo está o facto de que, apesar de a normalização da

contabilidade das empresas seguradoras ser o maior manancial de trapalhice que imaginar se pode, nem por isso elas deixaram de desenvolver-se e de progredir à margem de tal normalização, como se esta não existisse;

c) A normalização que se pretende instituir entre nós é nitidamente decalcada no modelo francês, apenas com ligeiras alterações, algumas das quais não contribuem para o melhorar, por se pretender enxertar vícios de nomenclatura que nele não se verificam;

d) Isto verifica-se, por exemplo, na substituição do nome da conta "Produits par nature" do Plano francês pela denominação "Proveitos por natureza", geradora de confusões que não são de admitir num trabalho que se destina a servir de evangelho aos contabilistas portugueses;

e) Na elaboração do Balanço não se respeitam certos conhecimentos cuja aquisição, por sinal, nada tem de recente, de modo que a apresentação do seu conteúdo se ressente da imprecisão resultante desse facto;

f) A denominação "Plano geral" que lhe foi atribuída não corresponde à sua verdadeira amplitude, visto esta abranger apenas as empresas do ramo comercial e do ramo da indústria transformadora;

g) Para efeito de comparações inter-empresariais é muito mais aconselhável a elaboração de planos de contabilidade para empresas de cada ramo de actividade económica do que a elaboração de um "Plano geral", que, além de ser difícil, tem o inconveniente de dar lugar a indecisões na escolha das denominações das contas nele alinhadas, motivadas pela sua grande extensão;

h) Esta orientação tem sido seguida em alguns países, nomeadamente na Suécia, onde se elaboraram Planos de contabilidade para diversos ramos de actividade que são largamente aplicados, mas não impostos;

(i) A elaboração desses planos é de iniciativa das associações de técnicos de contas e não de qualquer organismo estatal que tem sempre tendência para impor os seus pontos de vista que nem sempre são os mais defensáveis, organismos esses que constituem um estorvo para a introdução de alterações aconselhadas pela teoria ou pela técnica da contabilidade;

(j) A elaboração do Plano de Contabilidade por profissionais especia­lizados por uma longa prática resultante do exercício da sua profissão em empresas de cada ramo de actividade económica é o único processo capaz de conduzir a uma solução satisfatória, porque eliminará os inconvenientes resultantes da iniciativa ou da simples intervenção de entidades oficiais,

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dada a circunstância de a sua interferência constituir uma espécie de espar t i lhamento impedi t ivo da in t rodução de aperfeiçoamentos proporcionados pelos sucessivos progressos realizados nos vastos domínios da Contabilidade. E isto para que se evite a repetição daquilo que tem vindo a verificar-se na celebérrima normalização da contabilidade das empresas seguradoras do nosso País.

In Revista de Contabilidade e Comércio. Ano XXXVIII, n° 150, Abril-Junho (1971), p. 133-162.

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DE MINIMIS NON CURAT PRETOR

Quando acabei de 1er esta passagem do seu artigo deu-me uma grande vontade de rir e de dizer cá para comigo: o Dr. Campeão até parece um papudo anjinho celestial, certamente porque ainda não atingiu a provecta idade dos oitenta e um anos por mim já completados.

De contrário, a longuíssima experiência da vida já lhe teria ensinado que não é nada de espantar que os comentadores dos seus actos e dos seus escritos nunca lhe tivessem pegado pelos erros e batido apenas no que estava certo, porquanto essa é a atitude normal dos louvaminheiros que têm apenas interesse em agradar, embora, para isso, muitas vezes não tenham a coragem de dizer aquilo que realmente sentem, para não incorrerem no desagrado do seu amigo ou do seu superior hierárquico.

Muito mais de louvar seria que lhe tivessem pegado pelos erros para evitar ao Dr. Campeão a perda de tempo e a maçadoria de os descobrir; e, neste aspecto, o meu artigo, longe de poder ser considerado como uma agressão pessoal, porquanto nele não me referi à sua pessoa nem a qualquer outra, mas apenas a um facto verdadeiramente insólito de que qualquer leitor dos balanços das empresas seguradoras publicados nos jornais se poderá certificar, deveria ter sido antes saudado como uma boa achega para ele poder corrigir um evidente deslize da sua indesculpável ignorância.

Infelizmente, o domínio privativo da Contabilidade entre nós e noutros países ainda é geralmente considerado como um terreno maninho que quem quer poderá invadir e arrotear à sua vontade em todas as direcções e em todos os seus pontos, mesmo naqueles em que a sua constituição rochosa aconselharia a desviar daí a charrua para evitar a sua inevitável destruição.

Apesar de o Dr. Campeão enfileirar desenvoltamente ao lado dos que assim procedem, ele está convencido de que o balanço por ele imposto às

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empresas seguradoras é uma das maiores maravilhas do mundo hodierno. E isto porque, em sua douta opinião, se trata de um insignificante

barril do lixo dividido em dois compartimentos — o do lado esquerdo e o do lado direito — nos quais cada qual poderá meter aquilo que lhe der na gana, sem atender à natureza do que lá se deverá meter, porque nisto, para ele, é o olho que manda e não o senso crítico que muita gente parece não possuir ou possui apenas em proporções inferiores às que seria de desejar.

/ • • ■ /

Com efeito, em face desses princípios seria absolutamente erróneo que a conta "Caixa", por exemplo, figurasse, não com o seu saldo apenas do lado do Activo e só neste lado, mas com a totalidade do dinheiro entrado durante o exercício no Activo e com a totalidade do dinheiro saído no Passivo, como no-lo mostra o seguinte esquema:

Balanço

Activo Passivo

Caixa 100.000.000$00 Caixa 99 990 000$00

E é a soluções destrambelhadas como esta que chegam os supervigários da estirpe do Dr. Campeão, quando se metem a fazer coisas que são próprias do foro privativo dos sacristãs que se mantêm coerentemente dentro desse foro e não invadem o foro alheio, porque têm a plena consciência daquilo que lhes compete fazer e dizer.

De disparates de tal quilate é que o Diabo nunca se poderia ter lembrado, porque ele é suficientemente esperto para não fazer coisas que possam prejudicar o prestígio das altas funções mefistofélicas em que se acha olimpicamente investido e que o levam a desprezar

as nefelibatices de vigários presumidos que têm a mania de alardear a transcendência pouco convincente dos seus conhecimentos.

/ - / a) Não há lei alguma no nosso País que impeça que as contas se

escriturem segundo as leis formuladas pela Contabilidade, mercê das quais as contas de "Reservas" poderão ter movimento a crédito e a débito e ser, como tal, creditadas e debitadas, como quaisquer outras contas;

b) Não há lei alguma no nosso País, em que se determine que as

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contas de "Reservas" deverão figurar obrigatoriamente no Balanço de fim de exercício com a totalidade do movimento registado no seu "Deve" no lado esquerdo do Balanço e com a totalidade do movimento registado no seu "Haver" no lado direito, ao contrário do que sucede com todas as outras contas que, segundo as leis da Contabilidade, só podem figurar com os seus saldos, num dos lados do Balanço, determinado pela natureza desses "saldos": as de saldos devedores no lado esquerdo e as de saldos credores no lado direito do Balanço;

c) A projecção das contas de "Reservas" no Balanço segundo a maneira defendida pelo Dr. Campeão, em vez de contribuir para simplificar a leitura e interpretação do Balanço, como ele pretende insinuar, só serve para as dificultar, porquanto por essa projecção se quebra a unidade metodológica do Balanço, absolutamente indispensável para mais rápida e mais seguramente se poder fazer o seu estudo e ajuizar da situação jurídica, económica e financeira da empresa respectiva;

d) Se as leis jurídicas em nada contribuem para que se infrinjam as leis contabilísticas, muito menos poderão fazer os usos ou costumes, de modo que estes não poderão ser invocados como justificação plausível para a infracção de tais leis, justificação essa que colocaria os infractores na situação desagradável de serem considerados como crassamente ignorantes em matéria de Contabilidade naquilo que esta tem de mais elementar, de mais simples, de mais peculiar e de mais basilar;

e) Na sua qua l idade de soba-mor que " impôs" às empresas seguradoras um modelo de Balanço em que tal infracção é oficialmente admitida, o Dr. Campeão mostrou não possuir um conhecimento adequado acerca do conteúdo do lado esquerdo e do lado direito do Balanço e, consequentemente, da natureza dos elementos ou componentes das três secções que ele comporta, a saber: Activo, Passivo e Situação líquida.

In Revista de Contabilidade e Comércio. Ano XXXIX, n.° 153, Janeiro-Março (1972), p. 93-102.

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SUGESTÕES PARA APRESENTAÇÃO DOS ORIGINAIS

1. Os originais devem ser acompanhados por uma nota biográfica que não exceda três linhas.

2. Os textos devem fazer-se acompanhar de um resumo com o máximo de 10 linhas - se possível traduzido em inglês e francês.

3. Os artigos não poderão exceder 20 páginas, folhas A4 dactiografadas a um espaço; sempre que a sua extensão o justifique, devem ser divididos em capítulos mesmo que não sejam titulados. As recensões não devem ultrapassar as três paginas.

4. Os originais serão acompanhados de registo em diskete, de acordo com as seguintes normas de processamento de texto:

4.1. Sistema Operativo: Indicar o sistema e programa. De preferência Windows / Excel /PageMaker PC ou Mac nos Programas Macwhaiter salvo para texto, Word também salvo para texto, Pagemaker 4.0 ou 5.0.

4.2. Tipo de Letra :Times para os ultilizadores de PC e Palatino para os utilizadoresde Mac , tamanho lOp; notas e referên­cias, tamanho 9p.

4.3. Alinhamento do Texto de acordo com a mancha da Revista: Espaço - 3,3 mm; Margens, Top. - 55 mm; Bottom. -55 mm; Inside - 35 mm; Outside - 50 mm; Tabulação dos parágrafos 10 mm.

5. Bibliografia, referências bibliográficas, citações e notas.

5.1. A Bibliografia deve ser ordenada com base no apelido do autor. Ex: Amorim, Jaime Lopes. Se a obra for colectiva -- normalmente mais de três autores - refere-se pelo nome do 1° autor e pelo vocábulo latino alii ( ou apenas al). Ex: Amorim, Jaime Lopes et al. {ou e o.}.

5.2. As referências bibliográficas devem seguir as orientações vulgarmente aceites: rigorosas, precisas e uniformes -, respeitando o seu carácter específico. As monografias - Livros - devem inserir as seguintes informações: Autor, (eventualmente o ano da 1° ed.), título, volume, edição, local da edição, editor, ano da edição consultada. Os artigos -Publicações Periódicas - devem referir: autor, título do artigo, in título da publicação, local da publicação, série, volume, n°, data (mês(es)) e ano, pags (50-75) em que se encontra o artigo.

5 3 As referências bibliográficas coladas às l"s citações devem acrescentar aos campos enunciados em 5.2. a(s)página(s) (p. ou pp ) e se for caso disso, como nos Dicionários e Jornais, etc. a(s) coluna(s).Ex: Godinho, Vitorino Magalhães, Complexo histórico-geográfico, in Joel Serrão (Dir. de), Dicionário de História de Portugal, Vol.I/A-D,Porto, Iniciativas Editoriais/Figueirinhas, p. 645 col. 2. As referências bibliográficas relativas as 2's citações colhem a vantagem da sequência das notas: aparecem abreviadas recorrendo aos vocábulos latinos: idem (autor), ibidem (obra) e, às vezes, passim ( em vez de uma indicação precisa da página). A redução dos campos bibliográficos acontece igualmente quando as referências têm por suporte a bibliografia geral. Ex: Amorim, Jaime Lopes A (ou B), ( de acordo com o número de obras listadas desse autor), p. 20.

5.4. Localização das referências bibliográficas.

5.4.1. A s referências bibliográficas podem aparecer em nota de rodapé - na totalidade ou articuladas com a bibliografia geral.

5.4.2. Podem igualmente surgir em alguns casos restritos no interior do texto logo a seguir à citação, seguindo o modelo mais sintético de referência. Ex: ... "equilíbrio patrimonial" (Amorim - sendo o único listado -, 1947A, p. 20.

5.4.3. A s notas podem também aparecer no final do texto, devendo esta opção prevalecer sempre que o artigo exige longas notas informativas ou explicativas, que em rodapé tomam demasiado pesado o seu desenvolvimento.

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