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ESTUDOS HIDROGEOAMBIENTAIS COM OBJECTIVO A UMA NOVA UNIDADE TERMAL EM SANTA COMBA DÃO

Luís M. FERREIRA GOMES Professor Associado, Univ. da Beira Interior, Dep. de Engª Civil e Arquitectura, [email protected]

Teresa C. GOMES DA COSTA Técnica Superior, Câmara Municipal de Santa Comba Dão, [email protected]

Elisabete PIRES PLÁCIDO Técnica Superior, Câmara Municipal de Trancoso, [email protected]

Maria das Neves PINTO DE ALMEIDA Técnica Superior, Geotécnica da Ria; [email protected]

RESUMO Na aldeia do Granjal, nas proximidades de Santa Comba Dão, há um local que os autores designam por “Termas a Céu Aberto”, e desde que há memória, são abastecidas por uma pequena mina com um pequeno caudal de água sulfúrea. Com objectivo a potenciar o desenvolvimento do interior do País, desenvolveram-se estudos, numa primeira fase no âmbito académico e numa segunda fase em parceria com a C. M. de Santa Comba Dão.

Assim, o presente trabalho apresenta os resultados de um conjunto de estudos geomorfológicos, geológicos, geoambientais, hidrológicos e geofísicos. Avança-se com o modelo geohidráulico da água sulfúrea do Granjal como o resultado de todos os estudos anteriores e que serviu de sustentação à localização das sondagens de prospecção mecânica. O modelo geohidráulico, no essencial, baseia-se na existência de uma grande falha geológica, que se desenvolve ao longo de cerca de 90 km segundo um alinhamento NE-SW, e que será a responsável pelas ressurgências que servem várias unidades termais, ou seja, as Caldas da Cavaca a norte, depois para sul, as Termas de Alcafache, as Termas de Sangemil e por fim ainda mais a sul, na zona terminal, junto a Santa Comba Dão, a ressurgência do Granjal e onde nunca existiu uma unidade termal a sério, mas que a partir de agora, devido aos resultados obtidos, há condições de se construir.

Por fim, ainda se apresentam os resultados obtidos nas sondagens de prospecção mecânica, e em especial, os aspectos sobre o recurso obtido e que orienta para caudais de exploração de pelo menos 10 l/s.

Devido aos interessantes resultados obtidos, referem-se ainda alguns aspectos sobre a situação de se avançar com uma unidade termal especial, não só associada a situações de saúde clássicas, como também de saúde no conceito de bem-estar e lazer, além de se estarem a prever incluir aspectos associados ao turismo, tirando partido da localização geomorfológica e proximidade da albufeira do Rio Dão. Palavras-chave: Água sulfúrea, modelo geohidráulico, prospecção e pesquisa, captação, unidade termal, e turismo.

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1 INTRODUÇÃO O presente artigo corresponde a uma fase de estudos que se incluem num conjunto mais vasto de

trabalhos de um projecto de investigação aplicada, que visa como objectivo final, construir uma nova Unidade Termal na freguesia do Granjal, do concelho de Santa Comba Dão. As várias fases de trabalhos foram programadas em Protocolo de Cooperação estabelecido entre a Universidade da Beira Interior (UBI) e a Câmara Municipal de Sta Comba Dão (CMSCD), assinado em 30 de Abril de 2004. O objectivo em questão, resultou na sequência de trabalho académico (COSTA et al., 2003) efectuado por um grupo de alunas de Engenharia Geotécnica da Universidade da Beira Interior (co-autoras no presente artigo), realizado no ano lectivo 2003/2004, no âmbito da Cadeira de Projecto do 5º ano, intitulado de “Projecto de legalização de uma nova água mineral: Granjal – Santa Comba Dão”.

Entende-se que o presente trabalho tem considerável interesse, não só pelo aspecto económico e desenvolvimento local, como também pelo aspecto estritamente científico no sentido do conhecimento do Modelo Geohidráulico de uma água sulfúrea especial e de um interessante e particular aquífero de água mineral que pouco ou nada se sabe, a não ser, que em alguns locais se verificam algumas ressurgências.

2 SITUAÇÃO INICIAL O que actualmente existe ou faz parte do que algumas pessoas chamam por “Termas do Granjal”, é

uma captação do tipo mina de pequeno diâmetro, com cerca de 18 m de comprimento (segundo informação) e que termina numa bica, que por sua vez faz parte de um fontanário como se observa na Figura 1; este faz parte de um interessante conjunto de tanques que terão servido um género de termalismo colectivo e comunitário, como se tratasse de umas “Termas a céu aberto”, em que os aquistas provavelmente ficariam em grupo, de pé ou sentados, e aí passariam algum tempo, a esquecer os seus males e a conversar.

Figura 1 – Imagens sobre as “Termas a céu aberto” do Granjal – Sta Comba Dão. a) imagem global tirada de sul para norte, com o fontanário a norte e a zona de tratamentos a sul; b) imagem detalhada obtida de sul para norte sobre a zona de tratamentos; c) imagem detalhada obtida de norte para sul sobre a zona de tratamentos (FERREIRA GOMES, 2004a).

Esse pequeno complexo, de interessantes características sob os pontos de vista arquitectónico e histórico, é de granito porfiróide explorado no local, e apresenta uma inscrição de 1877, e que de acordo com COSTA et al. (2003) corresponde a uma obra da responsabilidade da Câmara Municipal. A

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bica apresenta um pequeno fio de água que sem qualquer dúvida corresponde a uma água do tipo sulfúrea, que pelas suas características apresenta potencial de ser classificada como uma água mineral termal, se o caudal e as características de nova captação o vierem a justificar. Os parâmetros físicos expeditos, que serviram de base aos trabalhos em desenvolvimento, são de acordo com o seguinte: COSTA et al. (2003) FERREIRA GOMES (2004a) - pH 8.14 8.36 - condutividade (µS/cm) 647 723 - temperatura (ºC) 16.2 21.6 - caudal ( l/s) 0.04 0.006 3 ELEMENTOS ANTERIORES

A ocorrência da água sulfúrea em questão é referida na Notícia Explicativa da Folha 17-C, Santa Comba Dão, da Carta Geológica de Portugal (TEIXEIRA et al., 1961) no item das fontes termais, com a designação de Nascente sulfurosa de Granjal. Também merece referência o facto daquela ocorrência estar registada na Carta das Nascentes Minerais de Portugal (DGMSG, 1970). Mais recentemente, foi alvo de estudo físico-químico por ALMEIDA e ALMEIDA (1975), classificando a água como sulfúrea sódica, fluoretada e hipotermal. Sobre aplicações, foi referido por ALMEIDA e ALMEIDA (1975) que esta água era usada essencialmente para doenças de pele. De acordo com informação oral transmitida aos autores em 2004, esta água foi usada por volta de 1960, em doenças do foro reumatológico, com banhos de imersão em banheiras no interior duma casa, que ainda hoje está nas vizinhanças da nascente sulfúrea e imediatamente a NW desta. Entretanto, salienta-se por constatação directa, que, há ainda actualmente pessoas que recolhem água em recipientes e a transportam para casa, e segundo informação, é usada para tratamentos de vários foros, nomeadamente do ginecológico.

Neste item, entende-se ainda salientar o que foi referido por FERREIRA GOMES (2004a) sobre a situação do provável modelo geohidráulico global da água sulfúrea do Granjal, em que a recarga poderá ter o seu início numa zona muito distante, ou seja em Aguiar da Beira, e que se situa nas áreas de cabeceira da bacia global do Rio Dão, onde o Granjal está incluído; esta noção torna-se ainda mais consistente ao se verificar que há um alinhamento global de direcção NE-SW (Figura 3), a passar pela nascente sulfúrea de Caldas da Cavaca a norte, evoluindo para sul, e a passar exactamente sobre as outras nascentes sulfúreas, em Sangemil, em Alcafache, e por fim, no Granjal. FERREIRA GOMES (2005c) entende que este alinhamento fará parte de uma grande falha geológica associada ao Rio Dão e que terá papel fundamental, para fazer evoluir os fluxos subterrâneos de NE para SW, e nos locais referidos por questões de singularidades geológicas, aqueles ascendem dando origem às águas minerais dos locais referidos anteriormente. No sentido de analisar a consistência deste raciocínio pesquisou-se na literatura de águas subterrâneas e foi possível em trabalhos anteriores (ALMEIDA e ALMEIDA, 1975; e IGM, 1994) obter os resultados de análises físico-químicas de águas colhidas naqueles locais, e que se apresentam no Quadro 1.

Dos elementos dos estudos físico-químicos apresentados no Quadro 1, tomando como referência o resíduo seco, verifica-se que, a água quanto mais para jusante na bacia hidrográfica do Rio Dão, mais mineralizada se apresenta, dando assim consistência à ideia de que existe uma grande falha (a falha ou sistema de falhas do Rio Dão) de direcção global NE-SW, muito extensa e profunda e que ao servir de barreira aos fluxos que se infiltram na zona NW de toda a bacia, os colecta para jusante até à zona de Sta Comba Dão. Estes aspectos foram importantes na orientação dos trabalhos desenvolvidos. Este assunto será retomado neste artigo ao apresentar-se o modelo geohidráulico da água sulfúrea de Sta Comba Dão, pois a “chave” de todo o processo é saber com rigor onde circula a água subterrânea do tipo sulfúrea na zona do Granjal.

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Quadro 1 – Resultados de análises físico-químicas em águas sulfúreas da Bacia do Rio Dão. Cavaca Alcafache Sangemil Parâmetro

(in ALMEIDA e ALMEIDA,

1975)

(in IGM, 1999)

(in ALMEIDA e ALMEIDA,

1975)

(in IGM, 1999)

(in ALMEIDA e ALMEIDA, 1975)

(in IGM, 1999)

Sta Comba Dão

(in ALMEIDA e ALMEIDA, 1975)

Temperatura - ºC (natural)

29.6 - 50.9 - 49.5 - -

pH (em laboratório) 8.2 8.28 8.38 8.44 8.12 8.11 7.80 Condutividade (µScm–1 ) - 357 - 458 - 528 - Dureza p.p.105CaCO3 1.6 1.5 - 1.2 1.3 1.4 0.16 CO2 total ( mmol/l ) 5.1 < 5.0 - - - <5 4.7 Alcalinidade (HCl 0.1N) - ml/l 2.66 27.5 - 30.0 30 30.7 24.0 Sulfuração total (I2 0.01N)- ml/l - 4.0 8.68 2.5 - 19.1 - Sílica (mg/l) 51.8 57.2 63.6 57.7 73.5 89.8 58.5 Resíduo seco a 180ºC (mg/l) 271.6 261.0 320.0 311.0 384.4 390.0 426.8 Mineralização total (mg/l) - 336.7 - 392 - 475.0 - Na+ 76.7 79.4 105.0 99.8 120.3 116.0 150.0 Ca2+ 4.2 5.9 4.46 4.3 1.6 5.2 1.6

Catiões K+ 4.4 2.7 3.43 2.7 3.8 4.5 - (mg/l) Mg2+ 1.34 0.09 0.31 0.15 2.2 0.13 1.0

Li+ 0.3 0.43 0.37 0.75 - 1.5 - NH4+ - < 0.10 - <0.10 - 0.32 - HCO3- 162.3 154.0 187.9 163.0 176.3 179.0 146.1 Cl- 23,8 20.2 37.0 35.9 56.1 54.0 73.1

Aniões SO42- 1.7 1.9 1.6 2.7 4.2 4.4 38.4 F- 2.6 14.0 14.5 18.1 17.5 16.6 26.0 (mg/l) NO3- 0.20 <0.12 0.040 0.27 - 0.33 - NO2- - <0.02 - <0.02 - <0.02 - HS- 0.2 - 1.37 - 3.7 - 1.78 Al - - < 0.010 - - - - As - - < 0.010 - - - - Elementos Ba 0.01 - - - - - - Secundários Br 0.02 - 0.02 - - - -

Cu 0.02 - 0.0088 - - - - (mg/l) Fe 0.08 - 0.10 - 0.08 - 0.08

Mn 0.01 - 0.018 - - - - Pb - - <0.002 - - - - Sr 0.02 - - - - - - Zn 0.02 - 0.062 - - - -

4 ASPECTOS GEOMORFOLÓGICOS A Nascente Sulfúrea do Granjal, localiza-se na zona central de uma sub-bacia muito pequena

(Fig.2), duma linha de água de grau 1 em relação à classificação de STRAHLER (LENCASTRE e FRANCO, 1984). Esta pequena linha de água, na zona da Nascente Sulfúrea, apresenta uma direcção NW-SE, para no seguimento para jusante, tomar uma direcção NNE-SSW e confluir com o Rio Dão; a pequena sub-bacia da referida linha de água apresenta um comprimento total de apenas 575m e largura média de cerca de 125m e integra-se na bacia da Ribª do Treixedinho. Em relação a altitudes, a zona a montante da Nascente Sulfúrea da pequena sub-bacia apresenta uma cota máxima de 198m, a nascente tem cerca de 164m, e o local de confluência com o rio Dão, corresponde-lhe apenas 125m.

Entretanto, por uma análise detalhada dos aspectos geomorfológicos e geológicos da região, entende-se ser à partida a bacia da Ribª do Treixedinho, aquela que poderá influenciar a curto e médio prazo a zona da Nascente Sulfúrea por infiltrações de águas superficiais. Esta sub-bacia com forma em planta aproximada a uma elipse, apresenta um comprimento de cerca de 4,3 km e largura máxima de cerca de 1,5 km, com a zona mais alta à cota de 320m, e a zona de confluência com o Rio Dão à cota de 125m. Em termos globais os declives são relativamente suaves, na ordem de 4,5 %. A Ribª do Treixedinho corresponde a um pequeno afluente da margem direita da bacia do Rio Dão.

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Figura 2 - Enquadramento do local da Nascente Sulfúrea do Granjal, em relação à sua pequena sub-bacia hidrográfica e em relação à bacia da Ribª do Treixedinho, e Rio Dão. Escala ≈1/43000. Extracto da Carta Militar de Portugal (IGE, 1993).

A particularidade das águas minerais similares à água sulfúrea do Granjal, apresentarem

frequentemente um extenso circuito geohidráulico, levou FERREIRA GOMES (2004a) a salientar o facto da nascente sulfúrea em estudo, se localizar quase no extremo dum particular alinhamento de direcção global NE-SW, definido aproximadamente pelo percurso do Rio Dão; este alinhamento, como já se referiu, no item anterior, desenvolve-se desde a zona do Granjal, a sul, e evolui para montante, passando pelas nascentes minerais de Sangemil, Alcafache, e ainda mais para montante, por Caldas da Cavaca. Entende-se, assim, haver uma extensa fractura, de acordo com o registado na Figura 3, de direcção global N45ºE, com alguns ressaltos, mas em continuidade na horizontal; esta provavelmente será a principal responsável pela ascensão da águas sulfúreas destas nascentes e que em algumas situações a sua água é relativamente quente, como é o caso de Alcafache e Sangemil, com cerca de 50ºC, atestando a grandiosidade desta extensa fractura e em particular a profundidade que poderá ser na ordem de 1 a 2 km.

A bacia global do Rio Dão tem desenvolvimento desde a zona de Aguiar da Beira a NE, a cotas geralmente da ordem de 850 m, e que pontualmente chegam a atingir em dois pontos mais elevados 925 e 988m na fronteira com a bacia do Rio Távora que corre para norte, para o Rio Douro. Também se salienta que o ponto mais elevado de toda a bacia situa-se à cota de 1043 m, a norte de Tondela. O território da bacia do Rio Dão, a montante da Nascente Sulfúrea do Granjal, corresponde a uma faixa aproximadamente rectangular, de direcção global NE-SW, com cerca de 69 km de comprimento e 12 km de largura aproximadamente. Salienta-se também que o trajecto em termos de alinhamento global do Rio Dão é aproximadamente paralelo ao trajecto do Rio Mondego na zona em que as bacias são contíguas, e entretanto o Rio Dão conflui para o Mondego, a cerca de 12 km para jusante da zona da Nascente Sulfúrea do Granjal.

Bacia da ribª de Trexedinho

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5 GEOLOGIA 5.1 Geologia Regional

A região em estudo e considerando toda a bacia do Rio Dão, desde o seu início, até à zona de Sta Comba Dão, geologicamente a grande escala situa-se na Zona Centro Ibérica e é constituída essencialmente por granitóides de idade Hercínica (Figura 3). Predominam os maciços graníticos sin-tectónicos relativamente a F3 e em especial os da Série intermédia (γII2b) nas áreas de Santa Comba Dão e ainda os tardi a pós-tectónicos em relação a F3 e em especial os da Série Tardia (γII3b) nas zonas para montante. Destaca-se ainda o maciço granítico da zona de Tondela (γII1), a norte de Santa Comba Dão, fazendo parte da Série precoce da fase sin-tectónica relativamente a F3, e portanto mais antigos que os anteriores. Ocorrem ainda, com fraca expressão os maciços de rochas xistentas, do Complexo Xisto-Grauváquico, e em particular as formações do Rosmaninhal (CBR) constituídas por rochas xistentas resultantes de turbiditos finos e conglomerados da Série média do Câmbrico. Outras formações ocorrem desde pequenas estruturas de diferentes granitóides, a terrenos de cobertura, mas sem grande significado para o presente trabalho.

Em termos de estruturas lineares é de salientar os alinhamentos de direcção global NE-SW (Figura 3) que correspondem a fracturas antigas preenchidas por filões de microgranitos, de quartzo, e de rochas básicas. Estas estruturas lineares, chegam a atingir mais de uma dezena de metros na sua espessura. São com certeza elementos fundamentais no contributo da recarga de água subterrânea em profundidade e em alguns casos no condicionamento da direcção e sentido das linhas de fluxo da água subterrânea da região. Caso particular que se entende enfatizar é a ocorrência de duas estruturas lineares na zona de Sta Comba Dão, e em especial a localizada mais a norte (ver Figura 3), que se desenvolve desde o maciço granítico mais antigo da região de Tondela, com uma extensão total de cerca de 9 km, até aos granitóides a norte do Granjal. Este poderá ter um papel importante no contributo da recarga em profundidade do aquífero mineral da zona do Granjal, permitindo a circulação de fluxos subterrâneos desde a zona de Tondela.

Salienta-se também neste item, a particularidade da grande falha de direcção Global N45ºE, que se passa a designar por Falha Termal do Rio Dão, com desenvolvimento desde a zona das Caldas da Cavaca a norte, até à zona de Sta Comba Dão a sul, numa extensão global segundo a horizontal de 90 km aproximadamente, com profundidade provável da ordem de 1 a 2 km.

Tendo em atenção o presente estudo, salientam-se ainda alguns aspectos associados às nascentes minerais sulfúreas da Bacia do Rio Dão. A água mineral das Termas das Caldas da Cavaca, no fundo do vale da Ribª da Coja, ressurge à cota de 530m na Nascente Nª Srª dos Remédios (IGM, 1999); naquela zona há fracturação frequente de direcção NE-SW e que tende a intersectar outro sistema de direcção NW-SE; aí, a nascente mineral, está associada a uma fractura de direcção N30 – 40º E; também ocorrem filões básicos e quartzosos com atitudes semelhantes aos principais sistemas de fracturas, orientando para fracturações profundas favoráveis a recargas em grande e com potencial geotérmico. Em Alcafache, as nascentes de água mineral ocorrem por volta da cota 223 m, havendo vários pontos, onde a água ressurge mesmo no leito do Rio Dão; as fracturas associadas às ressurgências são orientadas segundo uma direcção aproximada N80ºW (IGM,1999); também nesta zona, e em especial na margem direita do Rio Dão, ocorrem filões essencialmente pegmatíticos que chegam a atingir 15 m de extensão e 2 a 8 cm de espessura. Em Sangemil, as ressurgências localizam-se no próprio Rio Dão e junto à sua margem direita; toda a zona foi afectada por sistema de fracturação N50-60 ºE, e ainda N-S em associação a falhas de alívio N30ºE (IGM, 1999); segundo MORAIS (1993) que estudou esta zona com muito detalhe, as ressurgências estão condicionadas pela intersecção de duas falhas com direcções N40-50ºE e N25ºW, em que a estrutura principal é a “Falha Termal de Sangemil ou de designação, segundo sua expressão mais Regional, por Falha do Rio Dão, sendo a ressurgência facilitada pela falha N25ºW.

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Figura 3 – Enquadramento da zona da Nascente Sulfúrea do Granjal com os principais alinhamentos estruturais e

unidades geológicas da região, em mapa à escala ≈ 1/ 770 000, a partir da Carta Geológica de Portugal (SGP,1992).

Tondela

S.Comba Dão

Falha Termal do Rio Dão

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5.2 Geologia Local Para a zona em estudo existe a carta geológica à escala 1/50 000 (TEIXEIRA et al., 1961), da qual

se apresentou em COSTA et al. (2003) e FERREIRA GOMES (2004a) um extracto da zona de maior interesse, e que corresponde a uma extensa área monótona de apenas granitóides, não sendo, nesse documento, distinguidos diferentes tipos de alteração, nem fracturas eventuais com significado ao estudo em análise e por isso, efectuou-se um levantamento geológico-geotécnico à escala 1/1000, para a zona do Granjal, do qual se apresenta um extracto na Figura 4. Salienta-se que raros são os alinhamentos a partir de registos directos de campo, devido ao facto de não serem visíveis, como consequência de elevado grau de alteração dos granitos e cobertura vegetal.

O facto mais importante a registar é o grau de alteração diferenciado que se verifica em particular na zona onde ocorrem águas sulfúreas, e em particular na zona da Nascente Sulfúrea e na zona da Capela de N. Sra da Saúde, onde também foram registados furos/captações com águas sulfúreas, sempre em associação a granito porfiróide “muito são”. As zonas envolventes são constituídas essencialmente por solos residuais de granito. Ainda, observando o referido mapa (Figura 3), pelo paralelismo com o que se passa em Sangemil, é digno de registo o alinhamento N30ºW da pequena linha de água onde se localiza a nascente principal, designando-se por falha do Ribº da Nascente Sulfúrea. Foi ainda inferida uma provável fractura de direcção W-E (Falha do Granjal), e que se entende ser uma falha aberta, resultante de esforços de tracção ao longo da mesma e será por aí que a ascensão do fluxo hidromineral se verifica e em especial favorecida pela intersecção da fractura N30ºW com a grande Falha do Rio Dão.

Figura 4 – Esboço geológico-geotécnico da área das ressurgências de água Sulfúrea do Granjal – Sta Comba Dão.

202850 202900 202950 203000

38

2500

3

8255

0

382

600

382

650

382

700

38

2500

3

8255

0

382

600

382

650

382

700

Escola Primária

Capela

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6 ASPECTOS HIDROGEOAMBIENTAIS No sentido de haver uma noção sobre o potencial de recarga de água subterrânea para a região em

estudo, FERREIRA GOMES (2004a) apresentou alguns aspectos climatológicos ao longo da Bacia Hidrográfica do Rio Dão, de acordo com os registos de elementos de precipitação e temperatura dos postos climatológicos disponíveis em “O Clima de Portugal” (FERREIRA, 1970), correspondentes a períodos de medições durante cerca de 30 anos seguidos. Sobre aqueles elementos verificou-se estarem consistentes com os elementos do Atlas do Ambiente de Portugal (CNA,1975), sendo de realçar que para a Bacia do Rio Dão, a temperatura do ar média diária anual ronda os valores entre 12,5 e 15,5 ºC aproximadamente, para a zona a NE e SW, respectivamente. Em relação à precipitação média anual, os valores ao longo de toda a bacia, apresentam-se entre 1200 e 1400 mm para toda a área. Uma reflexão e análise mais detalhada sobre estes elementos deverá ser efectuada em fases de estudos posteriores quando se conhecer com maior rigor o circuito geohidráulico da água Sulfúrea do Granjal; entretanto, adianta-se que em termos relativos, as boas precipitações, em associação às moderadas temperaturas, e ainda a particularidade de ocorrer um vasto maciço de granitóides muito fracturados e por vezes alterados, são situações que orientam para recargas com muito significado, capaz de produzir bons caudais de exploração em futuras captações, desde que intersectem o circuito hidromineral.

No sentido de clarificar a situação hidrogeológica foi efectuado um levantamento exaustivo de vários pontos de água por COSTA et al. (2003) e FERREIRA GOMES (2004a) para a zona do Granjal e alargado à zona da Ribª do Treixedinho, resultando um inventário de 65 pontos estudados com algum detalhe, nomeadamente os parâmetros de pH, condutividade e temperatura da sua água.

Uma análise global e optimizada de todos os registos permitiu elaborar mapas de diferentes áreas prováveis de valores de condutividade e de pH, apresentados na Figura 5. Tendo em atenção os parâmetros da Nascente Principal (Nascente Sulfúrea, Figura 1) e que correspondem a situações típicas de água sulfúrea, em que o pH toma valores entre 7 e 9 e a condutividade entre 400 e 900 µS/cm, ao observar os mapas em análise, verifica-se que as zonas que poderão ter interesse, ou seja com potencial de intersectar água sulfúrea, são aquelas em que há a coincidência em ambos os mapas dum alinhamento global NW-SE e ainda outras, onde ocorrem duas zonas anómalas, uma mais a norte onde se situa a Nascente Principal, segundo um pequeno alinhamento W-E, e outra mais a sul, muito localmente na proximidade da Capela de N. Sra da Saúde. Todos os outros pontos com valores eventualmente anómalos de pH mas que o não são pela condutividade, e vice-versa, atribuem-se a situações resultantes de poluições locais.

Assim, basicamente a partir daqueles estudos e tendo em consideração os aspectos geológicos, na zona do Granjal, foram considerados dois sistemas aquíferos principais (FERREIRA GOMES, 2004 a):

1) um aquífero de água sulfúrea semi-confinado, muito profundo (> 300m ?), do tipo fissural, associado às principais fracturas da região, onde só muito localmente ocorrem ressurgências como é o caso da Nascente Principal do Granjal; a água deste aquífero apresenta valores de pH entre 8 e 9 e valores de condutividade acima de 600 µS/cm; a zona de recarga deste aquífero ocorrerá a grande distância do Granjal, desde as zonas a NE de toda a bacia do Rio Dão, até à região de Tondela, a norte do Granjal;

2) um aquífero de águas normais e pouco mineralizadas, superficial livre (água essencialmente nos primeiros 70 a 100m de profundidade), e numa situação mista em relação à sua porosidade, ou seja, frequentemente fissural mas também por vezes intersticial devido a ocorrerem extensas áreas arenizadas (granito alterado); a zona de recarga é essencialmente ao longo da bacia do Treixedinho; os parâmetros físicos expeditos da água não poluída deste aquífero, frequentemente apresentam valores entre 5.5 e 6.5 para o pH e valores inferiores a 200 µS/cm, para a condutividade.

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Figura 5 - Cartas de áreas de diferentes valores de pH e condutividade a partir de registos nos pontos de água principais

da zona da Nascente Sulfúrea do Granjal e Bacia do Treixedinho – Santa Comba Dão.

7 ESTUDOS GEOFÍSICOS Estudos geofísicos do tipo sísmica de refracção foram realizados na zona do Granjal e

apresentados com algum detalhe em FERREIRA GOMES (2004b). Usou-se um Sismógrafo de 6 canais de marca ECHOSEI. Efectuaram-se 40 perfis com tiro directo e inverso. Os geofones colocaram-se separados de 2 em 2 metros; a “pancada” ou local de emissão de sinal, efectuou-se igualmente à distância de 2m do primeiro ou último geofone, consoante se tratou do tiro directo ou inverso, respectivamente. A extensão global de cada perfil teve sempre a distância de 14 metros.

A interpretação efectuou-se de um modo não convencional, calculando velocidades com base no uso directo da distância entre o ponto de tiro e o geofone, e o tempo respectivo; aos valores obtidos designaram-se por velocidades aparentes virtuais e foi possível obter 12 mapas, seis para os tiros directos (a 2, 4, 6, 8, 10 e 12m) e outros seis para os tiros inversos. Após uma análise detalhada da globalidade dos vários mapas, constatam-se com maior evidência zonas de maior velocidade em dois locais em especial, e em ambos os mapas de velocidades dos tiros directos e inversos; são os locais: i) imediatamente junto à Escola Primária, do lado norte; ii) zona da Capela de N. Sra da Saúde; nestas zonas ocorrem velocidades que correspondem a manchas consideradas como zonas anómalas quer nos mapas de tiros directos quer nos mapas de tiros inversos; esta situação é particularmente bem visível nos mapas que se apresentam como exemplo na Figura 6; entretanto, salienta-se que se verificaram zonas bem evidentes como anómalas apenas num dos mapas (o directo ou o inverso), não se verificando anomalias nas mesmas áreas no outro mapa (o inverso ou o directo) resultante para o mesmo geofone; nestes locais entendeu-se não terem qualquer interesse para o objectivo em questão.

Entretanto, efectuaram-se algumas interpretações dos perfis de sísmica de refracção de acordo com

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o método clássico, de modo a obter uma noção das características mecânicas das zonas onde se verificaram as anomalias referidas no parágrafo anterior. Daqueles resultou um modelo de três zonas em profundidade: a primeira com velocidades reais inferiores a 500 m/s, corresponde a uma zona superficial inferior a 1 m de espessura e que coincide aproximadamente com a zona de terra vegetal; depois, por baixo ocorre uma zona com velocidades reais entre 500 e 1000 m/s, com espessura máxima de cerca de 2m, e que corresponde ao maciço granítico muito alterado e com solo residual; por fim, por baixo, ocorre uma zona com velocidades reais superiores a 1000 m/s. É de realçar, que em alguns locais onde a rocha muito resistente aflorava, esperava-se em especial para o nível mais profundo, velocidade real superior a 3500 m/s; porque tal situação não aconteceu atribui-se a uma situação provável do maciço granítico estar com algumas fracturas abertas, levando à redução da velocidade real, no entanto salienta-se que tal situação não é observável nos afloramentos existentes.

Figura 6 – Cartas de áreas de velocidades aparentes virtuais, a partir de registos do tiros directo e inverso com os geofones

a 6 m do local de emissão do sinal, em ensaios geofísicos na zona da Nascente Sulfúrea do Granjal – Sta Comba Dão.

8 MODELO GEOHIDRÁULICO DA ÁGUA SULFÚREA DO GRANJAL Uma relação dos vários aspectos geomorfológicos com as litologias e as principais estruturas

geológicas como é o caso das falhas, grandes filões e ainda os contactos entre as principais unidades geológicas, nomeadamente o contacto das formações xistentas com os granitóides apresenta-se na Figura 7.A maior singularidade geohidráulica a registar é a ocorrência da estrutura geológica designada por Falha Termal do Rio Dão e que é a responsável principal das ressurgências de águas minerais sulfúreas de Caldas da Cavaca, Alcafache, Sangemil e provavelmente também a do Granjal, cuja mineralização total aumenta à medida que se evolui de NE para SW, ou seja, de zonas de montante para jusante de toda a bacia do Rio Dão.

Mapa de velocidades, (m/s) para o tiro directo, do Geofone a 6 m

Mapa de velocidades, (m/s) para o tiro inverso, do Geofone a 6 m

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Figura 7 – Esboço sobre aspectos do modelo geohidráulico da água Sulfúrea do Granjal, sobre extracto da Carta Geológica de Portugal (SGP, 1992). Ver legenda sobre aspectos geológicos na Figura 3.

Escala: ≈ 425 000

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Esta grande estrutura, servirá de barreira a fluxos que se infiltram nas zonas a Oeste da mesma, e em simultâneo serve de caminho preferencial, junto a si, desses mesmos fluxos, de NE para SW, até à zona de Sta Comba Dão, e em particular até às zonas de contacto granitóides/rochas xistentas. Note-se que na Figura 7 regista-se mesmo um local extremamente favorável a ser aquele que terá mais potencial de ressurgir naturalmente água subterrânea e em especial água sulfúrea, mas que provavelmente se associará a zonas submersas pelo Rio Dão.

Esta situação verifica-se porque ocorre uma zona de contacto entre os granitóides e as rochas xistentas, e sendo estas últimas quase impermeáveis em relação aos granitóides, formam como que uma barragem aos fluxos subterrâneos que circulam de montante para jusante, tornando assim as zonas imediatamente a montante potencialmente produtivas de água subterrânea.

Assim, a vasta área do território da Bacia do Rio Dão, com temperaturas amenas, com precipitações moderadas, e maciços graníticos frequentemente alterados e fracturados, em associação à grande falha, favorecem as recargas profundas dos sistemas aquíferos minerais, e como consequência, há com certeza na região de Sta Comba Dão grande potencial para se obterem bons caudais de exploração.

Na zona do Granjal (Figura 8), a água sulfúrea ressurge numa zona onde ocorre excepcionalmente uma área de granito “muito são”, e que provavelmente se associa a uma fractura de direcção N30ºW (coincidente com o alinhamento da pequena linha de água onde se localiza a nascente principal – Falha do Ribº da Nascente Sulfúrea) e intersecta a grande Falha Termal do Rio Dão de direcção global NE-SW. Em associação às duas fracturas anteriores também haverá uma terceira e pequena fractura de direcção W-E (designada por Falha do Granjal), e que se entende ser ao longo da mesma que a ascensão do fluxo mineral se verifica. A ressurgência natural nesta zona é de pequeno caudal, situação que se atribui a aspectos geomorfológicos pois está a uma altitude de cerca de 50 m acima do leito do Rio Dão e admite-se que se verifiquem fugas e ressurjam no próprio rio. 9 ELEMENTOS DA PROSPECÇÃO MECÂNICA

A partir de todos os estudos desenvolvidos, efectuou-se uma análise detalhada dos mesmos e entendeu-se avançar para a prospecção mecânica com a realização de três furos à roto-percussão, nos locais referenciados na Figura 8.

Até ao momento efectuaram-se os furos 1 e 2, com a profundidade de 151m e 154 m respectivamente, tendo debitado em fase final de perfuração os caudais de 28.6 l/s e 25.0 l/s, respectivamente. Há interferência entre os furos em termos hidráulicos, sendo de salientar que a água em ambos é similar, do tipo sulfúrea, sendo o Furo 2, o que apresenta melhores condições e em especial por ter artesianismo repuxante com um caudal de 3.3 l/s, pH de 9.26, condutividade de 690 µS/cm e temperatura 19.4ºC, com cheiro intenso a sulfídrico.

A Figura 9 apresenta alguns detalhes obtidos na fase de realização dos referidos furos, sendo ainda de salientar que os terrenos intersectados foram sempre granitos com alguma alteração, frequentemente do tipo W2 e W3 (note-se que se considera W1, grau sem alteração, W5 granito totalmente alterado) tendo possibilitado atingir as profundidades referidas sem necessidade a qualquer tipo de entivação, revestimento ou cimentação.

Neste momento, devido aos excelentes resultados obtidos, decidiu-se não haver necessidade de avançar para o Furo 3, estando-se a ponderar e a projectar uma captação na zona onde foram já efectuados os furos de prospecção, ou, até mesmo, transformar o Furo F1 em Captação Definitiva, evoluindo-o ao longo de pelo menos 500 m de profundidade, de modo a possibilitar a obtenção do recurso mais puro e mais quente.

Está tudo em aberto; de qualquer modo, há a garantia de que no local existe forte potencial, para efectuar uma excelente captação com água do tipo sulfúrea e similar à água que há muitos anos ressurge e abastece as já referidas “Termas a céu aberto” do Granjal.

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Figura 8 – Síntese de elementos principais dos estudos efectuados, e localização de sondagens de prospecção mecânica, com objectivo à captação de água sulfúrea na zona do Granjal – Sta Comba Dão.

Zona de anomalia hidrogeoambiental (pH e condutividade) Zona de anomalia geofísica (velocidades aparentes altas)

Localização de sondagem de prospecção mecânica

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Figura 9 - Aspectos sobre prospecção e pesquisa de água sulfúrea na zona do Granjal:1) Furo 2 em realização; 2 a 9) Elementos do Furo 1 em realização: a água era tanta, que evadia a zona do

fontanário (3) e evoluía pela linha de água (5), e numa fase inicial o caudal só se conseguia medir a cerca de 600m a jusante (6) com cerca de 28.6l/s; no seguimento efectuou-se uma mini-barragem (7)

para se efectuar o controlo do caudal; como o furo ficou com um artesianismo de 3.3 l/s ao fim de alguns dias, o local de queda da água desenvolveu a biogeleia típica de água sulfúrea (8 e 9).

9 CONCLUSÕES

Dos estudos apresentados merecem referência as seguintes principais conclusões: 1. Na zona de rochas graníticas do Granjal ocorrem dois principais aquíferos, de acordo com o seguinte:

i) um aquífero semi-confinado de água sulfúrea, muito profundo (provavelmente abaixo de 300m ), do tipo fissural, associado às principais fracturas da região; deste aquífero só muito localmente ocorrem ressurgências como é o caso na Nascente Sulfúrea do Granjal; a água deste aquífero na zona de estudo apresenta valores de pH entre 8 e 9 e condutividade acima de 600 µS/cm;

ii) um aquífero freático de águas normais e pouco mineralizadas, superficial (água essencialmente nos primeiros 70 a 100m de profundidade), e ainda numa situação mista em relação à sua porosidade, ou seja, fissural mas também por vezes intersticial devido a ocorrerem extensas áreas arenizadas (granito alterado); os parâmetros físicos da água não poluída deste aquífero, frequentemente apresentam pH entre 5.5 e 6.5 e valores inferiores a 200 µS/cm para a condutividade.

3 2 1 3

5 4

6

7 8 9

Evidência da biogeleia esbranquiçada

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2. É a água sulfúrea do aquífero semi-confinado que interessa à presente investigação, e por isso desenvolveram-se vários estudos geomorfológicos, geológicos, hidrogeoambientais, geofísicos e outros e que levaram à idealização do modelo geohidráulico para este recurso e que em síntese é traduzido pela Figura 7.

3. As conjecturas efectuadas à volta do referido modelo, levaram à implantação de furos de prospecção e pesquisa para atingir o circuito hidráulico mineral, sendo de enfatizar que se verificou um total êxito, na medida em que não havia passado sobre o assunto e logo “à primeira”, obtiveram-se caudais de ordem de 28 l/s em fase de perfuração, e cuja qualidade orienta para uma água do tipo sulfúrea da família da água das Termas de São Pedro do Sul, onde, actualmente são frequentadas por cerca de 25000 aquistas por ano.

4. Está neste momento em projecto uma captação que se prevê atingir pelo menos 500 metros de profundidade, de modo a ter um considerável troço inicial (superficial) isolado de águas eventualmente contaminadas e frias, no sentido de não só se obter água de qualidade como eventualmente quente, para aproveitamentos geotérmicos, de modo a viabilizar uma unidade moderna de termalismo e lazer, não só de aplicações de saúde no sentido clássico, como também nos conceitos de bem estar e turístico.

AGRADECIMENTOS Os autores agradecem as facilidades concedidas à UBI na primeira fase de trabalhos e ao CECUBI onde o primeiro autor se insere em termos de investigação; agradece-se também à Câmara Municipal de Santa Comba Dão, e em particular nesta fase mais recente de trabalhos, não só pelo considerável esforço financeiro efectuado, como também pela confiança e sensibilidade sobre o presente projecto. BIBLIOGRAFIA

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