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Estudos RDS da Foz do Rio Doce

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Estudos RDS da Foz do Rio Doce

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  • INSTITUTO DE PESQUISAS DA MATA ATLNTICA

    PROJETO APOIO CRIAO DE UNIDADES DE CONSERVAO NO ESTADO DO

    ESPRITO SANTO: UM PROCESSO PARTICIPATIVO INTEGRANDO AS COMUNIDADES

    LOCAIS

    CONTRIBUIO AO PROCESSO DE CRIAO DA

    RESERVA DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTVEL

    DA FOZ DO RIO DOCE

    VITRIA

    2009

  • FICHA TCNICA

    Instituio executora: Instituto de Pesquisas da Mata Atlntica (Ipema)

    Coordenao Geral: Elizete Sherring Siqueira

    Coordenao Administrativo-financeira: Leandro Vieira Chiesa

    Educao socioambiental: Roberta Cordeiro Fassarella

    Assessoria de Comunicao Social: Fernanda Couzemenco

    Assessoria de Mobilizao social: Deusdedet Alle Son

    Organizao: Geovanni Ribeiro Loiola

    Histrico: Roberto Sforza

    Consultores

    Flora: Marcelo Simonelli (coordenador), Luiz Fernando Silva Magnago, Andr Paviote

    Fontana, Ludovic Jean Charles Kollmann, Fabio Ribeiro de Mattos e Clara Esgrio

    Entomofauna: Karina Schmidt Furieri (coordenadora), Antonia Figueira Van de Koken,

    Francisco Candido Cardoso Barreto, Fernanda Tonini Gobbi e Geovanni Ribeiro Loiola

    Herpetofauna: Jos Luiz Helmer (coordenador), Edicarlos Pralon da Silva e Marcio Lopes

    Gomes

    Avifauna: Jos Eduardo Simon (coordenador) e Juliana Peres

    Mastofauna no-voadora: Daniela Munhoz Rossoni (coordenadora), Barbara Maria de

    Andrade Costa, Lauro Narciso e Anderson Duro

    Mastofauna voadora: Rodrigo Lemes Martins (coordenador), Luciany Ferreira de Oliveira,

    Rodrigo da Silva Cipriano, Renata Costa Carvalho e Mirela Scabello

    Geologia, Pedologia e Clima: Joo Antnio Motta Neto

    Socioeconomia: Aloisio Fritzen

    Perfil Fundirio: Maris Anandria dos Santos

    Educao Ambiental: Deusdedet Alle Son, Flavia Nascimento Ribeiro e Roberta Cordeiro

    Fassarella

  • PARCERIAS

    Instituto Estadual do Meio Ambiente e dos Recursos Hdricos (IEMA)

    Ministrio do Meio Ambiente, dos Recursos Hdricos e da Amaznia Legal/PDA (MMA/PDA)

    Secretaria Estadual de Cincia e Tecnologia (SECT)

    Instituto de Defesa Agropecuria e Florestal do Esprito Santo (IDAF)

    Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistncia Tcnica e Extenso Rural (INCAPER)

    Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovveis (IBAMA)

    Universidade Federal do Esprito Santo (UFES)

    Museu de Biologia Professor Mello Leito (MBML)

    Faculdade de Cincias da Sade de Vitria (FAESA)

    Conservao Internacional do Brasil (CI BRASIL)

    Associao de Certificao de Produtos Orgnicos do Esprito Santo Cho Vivo

  • FICHA TCNICA DO INSTITUTO

    DE PESQUISAS DA MATA

    ATLNTICA (IPEMA)

    CONSELHO DELIBERATIVO

    Presidente

    Elizete Sherring Siqueira

    Vice-presidente

    Luiz Son

    Conselheiros

    Luiz Paulo de Souza Pinto

    Marcelo Simonelli

    Srgio Lucena Mendes

    Antnio Claudino de Jesus

    Leonora Pires Costa

    CONSELHO FISCAL

    Conselheiros

    Hlio de Queiroz Boudt Fernandes

    Joo Carlos Alciati Thom

    Roberta Cordeiro Fassarella

    Valria Fagundes

    Rua Desembargador Sampaio, 40, Sala 702/704, Edifcio Top Center, Praia do Canto,

    Vitria, ES

    CEP 29055-250

    CNPJ 39.351.4320001-82

    Telefone: (27) 3314-2537

    E-mail: [email protected]

  • SUMRIO

    1. Introduo..................................................................................................................................... 1

    1.1. Histrico................................................................................................................................ 2

    2. Meio Abitico................................................................................................................................ 5

    2.1. Meio Fsico............................................................................................................................ 5 2.1.1. Introduo.................................................................................................................. 5 2.1.2. Objetivo...................................................................................................................... 5 2.1.3. Materiais e mtodos.................................................................................................. 6 2.1.4. Geologia...................................................................................................................... 6 2.1.5. Clima.......................................................................................................................... 7 2.1.6. Recursos hdricos...................................................................................................... 8 2.1.7. Solos............................................................................................................................ 12 2.1.8. Fatores antrpicos e impactos ambientais.............................................................. 18

    2.2. Perfil Fundirio.................................................................................................................... 21 2.2.1. Introduo.................................................................................................................. 21 2.2.2. Materiais e mtodos.................................................................................................. 22 2.2.3. Resultados.................................................................................................................. 23 2.2.3.1. Aspectos econmicos do municpio de Linhares.................................................... 23 2.2.3.2. Aspectos fundirios da rea de estudo.................................................................... 24 2.2.4. Discusso.................................................................................................................... 26

    3. Meio Bitico................................................................................................................................... 26

    3.1. Flora....................................................................................................................................... 26 3.1.1. Introduo................................................................................................................. 26 3.1.2. Materiais e mtodos.................................................................................................. 28 3.1.3. Resultados.................................................................................................................. 29 3.1.3.1. Enquadramento fitogeogrfico............................................................................... 29

    A. Restinga................................................................................................................... 29 B. Plancie aluvial........................................................................................................ 34

    3.1.3.2. Caracterizao fitofisionmica............................................................................... 36 A. Restinga................................................................................................................... 36

    A1. Herbcea No-inundvel................................................................................... 36

    A2. Formao Arbustiva Fechada No-inundvel (Ps-praia)............................. 37

    A3. Floresta No-inundvel (Mata Seca de Restinga)........................................... 37

    A4. Arbustiva Aberta No-inundvel (Aberta de Clusia)....................................... 38

    A5. Herbcea Inundvel (Brejos ou Alagados)...................................................... 41

    A6. Floresta Inundada e Inundvel (Floresta Paludosa)...................................... 41

    B. Floresta Aluvial...................................................................................................... 42 B1. Mata de cabruca................................................................................................ 42

    C. Culturas................................................................................................................... 43 C1. Pastagem............................................................................................................ 45

    3.1.3.3. Florstica................................................................................................................. 45 3.1.3.4. Espcies ameaadas de extino............................................................................ 54 3.1.3.5. Plantas endmicas e raras...................................................................................... 59 3.1.3.6. Plantas teis............................................................................................................ 59 3.1.4. Consideraes finais................................................................................................. 60

    3.2. Entomofauna......................................................................................................................... 61 3.2.1. Introduo................................................................................................................. 61 3.2.2. Materiais e mtodos.................................................................................................. 62 3.2.2.1. rea de estudo......................................................................................................... 62 3.2.2.2. Espcies de insetos ameaadas de extino........................................................... 63

  • 3.2.2.3. Odonata.................................................................................................................... 63 3.2.2.4. Lepidoptera frugvoros............................................................................................ 65 3.2.2.5. Vespas parasitides.................................................................................................. 66 3.2.2.6. Anlise dos dados.................................................................................................... 67 3.2.3. Resultados.................................................................................................................. 68 3.2.3.1. Espcies de insetos ameaadas de extino........................................................... 68 3.2.3.2. Odonata................................................................................................................... 68 3.2.3.3. Lepidoptera frugvoros........................................................................................... 70 3.2.3.4. Vespas parasitides................................................................................................. 70 3.2.4. Discusso.................................................................................................................... 71

    3.3. Herpetofauna........................................................................................................................ 72 3.3.1. Introduo................................................................................................................. 72 3.3.2. Materiais e mtodos.................................................................................................. 73 3.3.3. Resultados e discusso.............................................................................................. 76 3.3.4. Concluso................................................................................................................... 84

    3.4. Avifauna................................................................................................................................ 85 3.4.1. Introduo................................................................................................................. 85 3.4.2. Materiais e mtodos.................................................................................................. 86 3.4.2.1. rea de estudo......................................................................................................... 86 3.4.2.2. Ambientes amostrados............................................................................................. 87 3.4.2.3. Esforo amostral...................................................................................................... 89 3.4.2.4. Inventrio da avifauna............................................................................................ 90 3.4.2.5. Nomenclatura cientfica.......................................................................................... 92 3.4.3. Resultados.................................................................................................................. 93 3.4.3.1. Composio da avifauna local................................................................................ 93 3.4.3.2. Riqueza de espcies na rea de estudo................................................................... 104 3.4.3.3. Riqueza de espcies nos ambientes amostrados..................................................... 105 3.4.3.4. Riqueza das guildas trficas nos fragmentos florestais......................................... 105 3.4.4. Discusso.................................................................................................................... 106 3.4.5. Concluses.................................................................................................................. 107

    3.5. Mastofauna no-voadora..................................................................................................... 107 3.5.1. Introduo.................................................................................................................. 107 3.5.2. Caracterizao da rea de estudo............................................................................ 108 3.5.2.1. O distrito de Regncia............................................................................................. 108 3.5.2.2. O distrito de Povoao............................................................................................ 108 3.5.3. Materiais e mtodos.................................................................................................. 108 3.5.3.1. Mamferos de pequeno porte.................................................................................. 108 3.5.3.2. Mamferos de mdio e grande porte....................................................................... 111 3.5.4. Resultados.................................................................................................................. 112 3.5.4.1. Mamferos de pequeno porte.................................................................................. 112 3.5.4.2. Mamferos de mdio e grande porte....................................................................... 114 3.5.5. Sntese dos resultados............................................................................................... 117

    3.6. Mastofauna voadora............................................................................................................. 118 3.6.1. Introduo.................................................................................................................. 118 3.6.2. Materiais e mtodos.................................................................................................. 118 3.6.2.1. rea de estudo......................................................................................................... 118 3.6.2.2. Amostragem............................................................................................................. 119 3.6.2.3. Procedimentos laboratoriais................................................................................... 120 3.6.2.4. Anlises.................................................................................................................... 121 3.6.3. Resultados.................................................................................................................. 121 3.6.4. Discusso.................................................................................................................... 125 3.6.5. Concluses.................................................................................................................. 126

  • 4. Meio antrpico.............................................................................................................................. 127

    4.1. Socieconomia......................................................................................................................... 127 4.1.1. Introduo.................................................................................................................. 127 4.1.2. Objetivos.................................................................................................................... 128 4.1.3. Materiais e mtodos.................................................................................................. 128 4.1.4. Desenvolvimento........................................................................................................ 128 4.1.4.1. Informaes municipais.......................................................................................... 128

    A. Histrico................................................................................................................... 128 B. Populao................................................................................................................ 129 C. Educao e cultura.................................................................................................. 130 D. Sade........................................................................................................................ 131 E. Habitao e saneamento......................................................................................... 133 F. Atividade econmica e agropecuria...................................................................... 134 G. ndice de Desenvolvimento Humano (IDH) municipal......................................... 136

    4.1.5. Informaes sobre as comunidades locais............................................................... 136 4.1.5.1. Populao, infra-estrutura e organizao social................................................... 136

    A. Regncia................................................................................................................... 136 B. Povoao.................................................................................................................. 137 C. Comboios................................................................................................................. 137

    4.1.5.2. Problemas ambientais............................................................................................. 138 4.1.5.3. Potencialidades........................................................................................................ 139 4.1.6. Consideraes finais.................................................................................................. 140

    4.2. Educao Ambiental............................................................................................................ 140 4.2.1. Introduo................................................................................................................. 140 4.2.2. Materiais e mtodos.................................................................................................. 141 4.2.2.1. Definio dos agentes pesquisados......................................................................... 141 4.2.2.2. Coordenao da pesquisa........................................................................................ 141 4.2.2.3. Instrumentos de pesquisa........................................................................................ 141 4.2.3. Resultados.................................................................................................................. 142 4.2.3.1. Identificao dos entrevistados............................................................................... 142 4.2.3.2. Perfil socioeducacional........................................................................................... 142 4.2.3.3. Participao e organizao social.......................................................................... 144 4.2.3.4. Aspectos ambientais................................................................................................ 144 4.2.4. Concluso................................................................................................................... 148

    4.3. Comunicao Social.............................................................................................................. 149

    5. Apresentao e discusso dos estudos com as comunidades locais e demais participantes................................................................................................................................. 149

    5.1. Introduo............................................................................................................................. 149 5.2. Resultados............................................................................................................................. 150 5.3. Discusso e recomendaes propostas pelas comunidades locais e demais

    participantes.................................................................................................................... 151

    6. Consideraes finais...................................................................................................................... 153

    7. Referncias..................................................................................................................................... 154

    Anexo I. Relatrio do Workshop sobre a Proposta de Criao da Reserva de Desenvolvimento

    Sustentvel da Foz do Rio Doce................................................................................................. 170

    Anexo II. Diagnstico da Educao Ambiental sobre a rea de interesse para criao de Unidades de Conservao.................................................................................................................................201

  • 1

    1. INTRODUO

    A Mata Atlntica a segunda maior floresta tropical do continente americano, um dos maiores e

    mais relevantes centros de biodiversidade do planeta e um dos biomas mais ameaados do mundo.

    Originalmente o Estado do Esprito Santo possua quase 90% de sua superfcie coberta por este

    bioma, uma paisagem que ficou restrita a 11% do territrio estadual devido ao processo de

    ocupao desordenado. Apesar deste histrico, seus remanescentes florestais ainda abrigam uma

    enorme diversidade biolgica, incluindo um alto grau de endemismo, o que refora a necessidade

    de sua preservao. Das reas florestais estaduais, menos de 3,5% esto sob a forma de reas

    protegidas, no diferindo dos outros Estados brasileiros, que cobrem em conjunto menos de 2% de

    todo o seu territrio.

    Visando contribuir para o processo de criao de novas Unidades de Conservao no Estado do

    Esprito Santo e conservao da sociobiodiversidade da Mata Atlntica estadual, o Instituto de

    Pesquisas da Mata Atlntica elaborou e implementou o Projeto de Apoio Criao de Unidades de

    Conservao ou Projeto Saberes da Mata: Um Jeito Participativo de Cuidar da Mata Atlntica,

    uma iniciativa financiada pelo Kreditanstalt fr Wiederaufbau (KfW) e pelo Ministrio do Meio

    Ambiente, dos Recursos Hdricos e da Amaznia Legal (MMA).

    A etapa inicial de mobilizao para o desenvolvimento do projeto ocorreu em abril de 2005, com a

    realizao de um workshop que mapeou 30 reas prioritrias e potenciais para a criao de

    Unidades de Conservao, um esforo coletivo de vrios especialistas de diversas regies e Estados

    com representatividade no Esprito Santo. Cinco destas trinta reas foram priorizadas para a

    realizao do projeto: (1) Serra das Torres, compartilhada pelos municpios de Atlio Vivcqua,

    Mimoso do Sul e Muqui; (2) Santa Lcia, localizada no municpio de Santa Teresa; (3) Alto

    Misterioso, formada por reas dos municpios de Itaguau, Santa Teresa, Itarana e So Roque do

    Cana; (4) Santa Leopoldina, localizada no municpio de mesmo nome e como ltima rea de

    atuao o (5) Delta do Rio Doce, no municpio de Linhares.

    As etapas do projeto incluram: (1) realizao de estudos tcnicos, coletando informaes sobre o

    meio fsico, estrutura fundiria, flora, entomofauna, herpetofauna, avifauna, mastofauna no-

    voadora, mastofauna voadora e socioeconomia de cada rea; (2) fruns de divulgao e

    compartilhamento de informaes com entidades governamentais, empresariais, da sociedade civil

    organizada e comunidades locais, incluindo a realizao de uma Oficina de Integrao em cada

    rea; (3) atividades de Educao Ambiental, comunicao e mobilizao social; (4) realizao de

    um workshop tcnico para cada rea e (5) elaborao de um relatrio final para cada rea, contendo

    todas as informaes obtidas nas etapas anteriores, especialmente a proposta de criao de

    Unidades de Conservao, obtida e validada com a realizao da Oficina de Integrao.

    Os fruns e atividades de Educao Ambiental, comunicao e mobilizao social envolveram

    exposies itinerantes, encontros com pesquisadores, estmulo de atividades alternativas de renda e

    divulgao dos diagnsticos ambientais e socioeconmicos.

    Neste sentido, quatro Relatrios, referentes s reas de Serra das Torres, Santa Lcia, Alto

    Misterioso e Santa Leopoldina, contendo todas as informaes resultantes dos estudos e,

    especialmente a proposta de criao de Unidades de Conservao discutida e validada nas Oficinas

    de Integrao, j foram entregues ao Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hdricos

    (IEMA).

    Deste modo, este documento pretende contribuir para a criao do processo da Reserva de

    Desenvolvimento Sustentvel da Foz do Rio Doce, um processo iniciado no ano de 2002, com a

    elaborao do Plano de Desenvolvimento Integrado e Sustentvel para as Comunidades do Entorno

    da Reserva Biolgica de Comboios, ao longo de um extenso processo histrico.

  • 2

    Os estudos fsicos e pesquisas aqui expostos ampliam o conhecimento da regio e fornecem

    subsdios para a conservao e proteo da sociobiodiversidade local. Com este registro, espera-se

    que a experincia da proposta de criao da Unidade de Conservao no Esprito Santo possa

    contribuir para o desenvolvimento de mtodos que incluam contribuies da populao local, bem

    como incluso dos estudos socioambientais como um passo importante na gesto participativa de

    Unidades de Conservao.

    1.1 Histrico

    No ano de 2002, a Fundao Pr-TAMAR, com recursos captados junto ao Fundo Nacional do

    Meio Ambiente (FNMA), concluiu a elaborao do Plano de Desenvolvimento Integrado e

    Sustentvel para as Comunidades do Entorno da Reserva Biolgica de Comboios, situada na regio

    da foz do Rio Doce, municpio de Linhares, Estado do Esprito Santo.

    O assim chamado Plano Comboios foi construdo de forma participativa junto s comunidades de

    Regncia e Povoao e teve no seu Conselho Gestor a sua instncia de avaliao, orientao e

    validao das propostas apresentadas, sendo formada por representantes da Associao de

    Moradores de Regncia, Associao de Moradores de Povoao, Associao dos Pescadores de

    Regncia, Associao Indgena Tupiniquins de Comboios, Fundao Nacional do ndio (FUNAI),

    Fundao Pr-TAMAR, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais

    Renovveis (IBAMA), Reserva Biolgica de Comboios, Centro TAMAR e Prefeitura Municipal de

    Linhares.

    Um dos principais resultados do Plano Comboios constituiu-se na formulao da proposta para a

    criao da Reserva de Desenvolvimento Sustentvel da Foz do Rio Doce, visando garantir a

    conservao da rica biodiversidade local e buscando proporcionar instrumentos para a melhoria da

    qualidade de vida das comunidades de Regncia e Povoao. Estes objetivos tm como base a

    manuteno e elaborao de prticas sustentveis de uso dos recursos naturais historicamente

    desenvolvidas por estas comunidades.

    As Unidades de Conservao integrantes do Sistema Nacional de Unidades de Conservao da

    Natureza (SNUC), institudo pela Lei n 9985/2000 e regulamentado pelo Decreto n 4340/2002

    dividem-se em dois grupos de reas protegidas com caractersticas especficas: Unidades de

    Proteo Integral, cujo objetivo bsico preservar a natureza, sendo admitido apenas o uso indireto

    dos seus recursos naturais; e Unidades de Uso Sustentvel, cujo objetivo bsico compatibilizar a

    conservao da natureza com o uso sustentvel de parcela dos seus recursos naturais.

    Ainda de acordo com o SNUC, as Reservas de Desenvolvimento Sustentvel, Unidades de

    Conservao da categoria de Uso Sustentvel, compreendem reas naturais utilizadas por

    populaes extrativistas tradicionais, cuja subsistncia baseia-se em sistemas sustentveis de

    explorao dos recursos naturais, tendo como objetivos bsicos a preservao da natureza,

    melhoramento das condies de vida e explorao dos recursos naturais pelo aperfeioamento das

    tcnicas de manejo.

    Esta categoria de Unidade de Conservao foi selecionada pelo Conselho Gestor do Plano

    Comboios, por se enquadrar perfeitamente nas caractersticas da regio, marcada pela presena de

    comunidades tradicionais que vivem da pesca, agricultura e silvicultura e pela grande diversidade

    de ambientes em excelente estado de conservao. As praias arenosas e semidesrticas da regio

    abrigam o nico stio conhecido no Brasil de desova da tartaruga-de-couro (Dermochelys coriacea)

    e atuam como importante stio reprodutivo da tartaruga cabeuda (Caretta caretta), ambas

    constando na Lista Oficial Brasileira de Espcies Ameaadas de Extino. A regio tambm

  • 3

    apresenta formaes de restingas que variam desde vegetaes herbceas, arbustivas, at matas

    secas e matas de aluvio associadas ao cultivo de cacau, localmente conhecidas como mata de

    cabruca; bem como vrias lagoas costeiras, veredas e cursos dgua que abrigam diversificada

    fauna de aves, anfbios e insetos aquticos.

    O Rio Doce, que forma a bacia hidrogrfica de maior representatividade dos Estados do Esprito

    Santo e Minas Gerias, apresenta uma caracterstica impar na sua foz, um esturio projetado sobre a

    rea marinha contgua, sem a ocorrncia de manguezais na sua poro interna, dada a grande vazo

    do rio que dificulta a penetrao de gua do mar. Esta condio proporciona a ocorrncia de uma

    diversificada fauna aqutica, onde predominam espcies dulciaqucolas na poro interna da foz,

    alm de alta produtividade biolgica sobre a plataforma continental interna, suportando estoques

    pesqueiros de grande relevncia econmica e social, sendo explorados tanto pela pesca artesanal e

    de pequena escala praticadas pelas comunidades locais, quanto por frotas industriais provenientes

    de outras regies do Estado, do sul e sudeste do Brasil.

    Considerando a relevncia ambiental da regio, o Governo do Estado do Esprito Santo doou ao

    Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovveis (IBAMA), em janeiro

    de 2003, uma rea de aproximadamente 2700 ha, com o objetivo especfico de ampliar a Reserva

    Biolgica de Comboios ou para a criao de outra Unidade de Conservao em categoria

    compatvel com as necessidades de conservao e uso dos recursos naturais tradicionalmente

    praticados pelas comunidades da regio. Esta rea, que representa cerca de 30 % da superfcie

    continental total proposta para a Unidade, encontra-se escriturada em nome do Instituto Brasileiro

    do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovveis (IBAMA) e os procedimentos

    administrativos para indenizao das benfeitorias realizadas por posseiros ali instalados j se

    encontram em andamento.

    A proposta inicial de criao da Reserva de Desenvolvimento Sustentvel inclua somente as reas

    continentais na regio da foz do Rio Doce, limitando-se ao sul pela terra indgena de Comboios,

    abrangendo as formaes de restinga e lagoas costeiras no entorno da Reserva Biolgica de

    Comboios, alm da poro interna da foz do rio, a parte das matas de cabruca do Rio Doce,

    alcanando a regio da lagoa de Monsars ao norte.

    Entretanto, com o incremento de aes na regio marinha da foz do Rio Doce nos ltimos anos,

    como atividades petrolferas, da navegao de cabotagem, de capturas acidentais de tartarugas e

    botos nas pescarias e do aumento dos conflitos de pesca entre comunidades locais e pescadores de

    escala semi-industrial provenientes de outras regies, efetuou-se uma reviso da proposta original,

    havendo a incluso de uma rea marinha na plataforma continental interna at aproximadamente a

    isbata de 20 metros.

    Apesar da convergncia de interesses das instituies conservacionistas e das comunidades locais

    para a criao da Reserva de Desenvolvimento Sustentvel da Foz do Rio Doce, a proposta foi

    efetivamente formalizada junto ao Instituto Chico Mendes de Conservao da Biodiversidade

    (ICMBio) em novembro de 2007 no processo n 02009.002052/2007-41, aps reunies com as

    comunidades de Regncia e Povoao, proponentes da Unidade de Conservao, para a ratificao

    da incluso da rea marinha.

    Entre dezembro de 2007 e julho de 2008, por meio de recursos obtidos junto Organizao das

    Naes Unidas para a Educao, a Cincia e a Cultura (UNESCO) Brasil, foi realizado um

    diagnstico participativo da atividade pesqueira, abrangendo as comunidades de Barra do Riacho,

    localizada no municpio de Aracruz, alm de Regncia, Povoao e Degredo, localizados no

    municpio de Linhares, ambos no Estado do Esprito Santo e que realizam suas pescarias na regio

    estuarina da foz do Rio Doce. Tambm foram realizados os diagnsticos das atividades tursticas e

    dos empreendimentos industriais e de infra-estrutura, pblicos e privados existentes na regio,

  • 4

    visando contribuir para os estudos tcnicos realizados e necessrios para a criao da Unidade de

    Conservao.

    Com as contribuies dos estudos sobre os meios fsico, bitico e socioeconmico realizados pelo

    Instituo de Pesquisas da Mata Atlntica (Ipema) na rea proposta para a criao da Reserva de

    Desenvolvimento Sustentvel da Foz do Rio Doce (Figura 1), foram dados passos significativos

    para a concluso da etapa de estudos tcnicos, complementando as informaes necessrias para

    consolidar e fortalecer a iniciativa de criao da Unidade de Conservao e permitindo que se

    avance para a etapa de consulta pblica inerente ao processo de criao de Unidades de

    Conservao estabelecido pelo Sistema Nacional de Unidades de Conservao da Natureza

    (SNUC).

    Figura 1. rea em estudo para a criao da Reserva de Desenvolvimento Sustentvel da Foz do Rio

    Doce.

  • 5

    2. MEIO ABITICO

    2.1 Meio Fsico

    2.1.1 Introduo

    O Estado do Esprito Santo apresenta somente cerca de 11% da sua cobertura original (SOS Mata

    Atlntica, 2009), havendo a necessidade de esforos emergenciais para conter a devastao

    florestal e ampliar a rea coberta por este bioma.

    A melhoria das condies de vida das populaes direta e indiretamente dependentes dos recursos

    naturais tambm necessria e as Unidades de Conservao de Proteo Integral e Uso Sustentvel

    so ferramentas muito teis neste processo.

    Desta maneira, o compartilhamento de informaes cientficas aliadas a processos democrticos e

    participativos de criao de novas Unidades de Conservao caracterizam iniciativas estratgicas

    desenvolvidas e implatadas para viabilizar a superao de problemas e contribuir na formulao de

    novos caminhos sob a tica de um desenvolvimento sustentvel.

    2.1.2 Objetivo

    O objetivo dos estudos sobre o meio fsico consistiu em caracterizar parte do meio abitico da

    regio denominada Delta do Rio Doce, situada nos municpios de Aracruz e Linhares, incluindo

    especificamente as comunidades de Regncia e Povoao (Figura 2). Desta forma, foram descritos

    aspectos geolgicos, climticos, pedolgicos e hidrogrficos, alm de uma breve exposio sobre

    fatores antrpicos e impactos ambientais associados rea.

    Figura 2. rea de estudo.

  • 6

    2.1.3 Materiais e mtodos

    Os mtodos utilizados foram: (1) anlise de manuais, artigos, livros, mapas e fotografias areas

    sobre a rea de estudo; (2) visitas a campo para o reconhecimento da rea de estudo (Figura 3) e (3)

    registro fotogrfico da rea de estudo.

    Figura 3. Aspecto da estrada de acesso rea de estudo.

    2.1.4 Geologia

    A regio estudada encontra-se sob domnio dos Sedimentos Quaternrios, que se distribuem no

    litoral brasileiro desde o Estado do Par at o norte do Rio de Janeiro (Brasil, 1960). Estes

    sedimentos so constitudos por camadas arenosas (Figura 4), argilo-arenosas e argilosas, de cores

    variegadas, apresentando por vezes intercalaes de leitos laterticos. Tidos como sedimentos

    depositados em condies subareas, consolidados ou no, exibem frequentemente uma

    estratificao real.

    Figura 4. Ambientes sedimentares e alagveis caractersticos da regio.

  • 7

    Os Sedimentos Quaternrios distribuem-se em aluvies atuais ou antigos, ao longo dos vales e vias

    fluviais nas plancies costeiras e formam dunas, praias, aluvies, recifes de arenito e restingas; e

    podem estar associadas a depsitos de manguezais. Apresentam-se em geral no-consolidados e

    so constitudos por sedimentos arenosos (EMBRAPA, 1978).

    2.1.5 Clima

    A rea est localizada nos municpios de Linhares e Aracruz, com altitudes que variam de 10 a 20

    metros, sob um regime climtico do tipo Aw, de acordo com a classificao de Kppen (1948),

    caracterizado como um clima tropical mido com estao chuvosa no vero e seca no inverno, com

    temperatura mdia do ms mais quente superior a 22oC e do ms mais frio inferior a 18oC. A mdia

    mnima no ms mais frio pode variar entre 11,8 e 18oC, enquanto a mdia mxima no ms mais

    quente pode variar entre 30,7 e 34oC.

    A nica estao meteorolgica existente na regio est localizada em Linhares, denominada de

    Estao Automtica A614, pertencente ao Instituto Nacional de Metereologia (INMET) e

    componente do Centro Capixaba de Meteorologia e Recursos Hdricos (CECAM) do Instituto

    Capixaba de Pesquisa, Assistncia Tcnica e Extenso Rural (INCAPER) (Figuras 5 e 6).

    Figura 5. Precipitao mdia mensal e nmero de dias chuvosos (1976-2006). Fonte:

    CECAM/INCAPER.

    Figura 6. Mdia mensal da temperatura mxima e mnima (1976 a 2006). Fonte: CECAM/INCAPER.

  • 8

    Tratando-se da classificao das Unidades Naturais do Esprito Santo, pode-se enquadrar a rea

    como sendo de terras quentes, planas e transio seca e chuvosa (Feitoza et al., 2001),

    apresentando cerca de cinco meses secos (Tabela 1).

    Tabela 1. Caractersticas da unidade natural local (U = chuvoso; S = seco; P = parcialmente seco, com

    dois meses parcialmente secos contados como um ms seco)

    Zona Relevo Pluviosidade

    Terras quentes, planas e

    de transio seco-chuvosa

    (Zona 8)

    Declividade Meses secos, seco-chuvosos e chuvosos

    < 8%

    J F M A M J J A S O N D

    P P P P P P P S P U U U

    2.1.6 Recursos hdricos

    A regio em estudo situa-se na Bacia Hidrogrfica do Rio Doce (Figura 7), abrangendo

    integralmente os municpios de Afonso Cludio, guia Branca, Alto Rio Novo, Governador

    Lindemberg, Itarana, Itaguau, Laranja da Terra, Pancas, Marilndia, Rio Bananal, So Domingos

    do Norte, So Gabriel da Palha, So Roque do Cana, Sooretama e Vila Valrio. A bacia tambm

    abrange de forma parcial os municpios de Ibatiba, Ibirau, Ina, Jaguar, Joo Neiva, Linhares,

    Mantenpolis, Nova Vencia, Santa Teresa e So Mateus.

    Figura 7. Bacia Hidrogrfica do Rio Doce. Fonte: Sub-Gerncia de Geomtica do Instituto Estadual de

    Meio Ambiente e Recursos Hdricos (IEMA, 2007).

    A Bacia Hidrogrfica do Rio Doce abrange uma rea de 13807 quilmetros quadrados no Esprito

    Santo e sua rede de drenagem equivale a 10630 quilmetros (Figuras 8 e 9). O principal rio desta

  • 9

    bacia o Rio Doce, que tem como principais afluentes os Rios Guandu, Pancas, Santa Joana, Santa

    Maria do Rio Doce e So Jos.

    Figura 8. Bacia Hidrogrfica do Rio Doce com destaque para a rea de estudo delimitada por uma

    circunferncia vermelha. Fonte: Sub-Gerncia de Geomtica do Instituto Estadual de Meio Ambiente

    e Recursos Hdricos (IEMA, 2007).

    Figura 9. Sub-bacias hidrogrficas do Rio Doce com destaque para a rea de estudo delimitada por

    uma circunferncia vermelha. Fonte: Sub-Gerncia de Geomtica do Instituto Estadual de Meio

    Ambiente e Recursos Hdricos (IEMA, 2007).

  • 10

    O Rio Comboios tambm est presente na regio analisada, com cerca de 30 quilmetros de

    extenso, sendo formado pela drenagem das vrzeas litorneas, ao sul do Rio Doce. Este curso de

    gua corre no sentido norte-sul, desaguando no Rio Riacho (Fundao Pr-TAMAR, 2002). Uma

    srie de ilhas oriundas de deposio de sedimentos tambm encontrada prxima foz, sendo

    utilizadas para a explorao agrcola de cacau e banana.

    A regio apresenta diversas lagoas de menor ou maior porte (Figura 10), destacando-se as Lagoas

    Areal, Monsars, Cacimbas e Parda. As principais praias existentes so as de Regncia, Comboios,

    Povoao e Monsars, utilizadas principalmente para o lazer e a prtica de surf, sendo tambm um

    local essencial para desova de tartarugas marinhas (Fundao Pr-TAMAR, 2002).

    Figura 10. Rede de drenagem da Bacia Hidrogrfica do Rio Doce com destaque para a rea de estudo

    delimitada por uma circunferncia vermelha. Fonte: Sub-Gerncia de Geomtica do Instituto Estadual

    de Meio Ambiente e Recursos Hdricos (IEMA, 2007).

    Analisando-se as curvas de distribuio das chuvas nesta Bacia Hidrogrfica, pode-se notar que a

    pluviosidade corrente na rea de estudo varia entre 1190 a 1310 milmetros (Figura 11).

  • 11

    Figura 11. Curvas de precipitao da Bacia Hidrogrfica do Rio Doce com destaque para a rea de

    estudo delimitada por uma circunferncia vermelha. Fonte: Sub-Gerncia de Geomtica do Instituto

    Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hdricos (IEMA, 2007).

    2.1.7 Solos

    As classes encontradas na regio foram:

    1. Neossolos quartzarnicos hidromrficos A moderados, com fase de floresta subpereniflia de restinga e campos de restinga em relevo plano (RQ).

    2. Associao de gleissolos tiomrficos distrficos com textura argilosa (GJ) mais organossolos tiomrficos textura orgnica, em fase de campos de vrzea em relevo plano (OJ).

    3. Espodossolo humilvico A com proeminente textura arenosa em fase de campos de restinga e floresta pereniflia de restinga em relevo plano (EK).

    4. Neossolos flvicos eutrficos A fracos e moderados de textura argilosa, com fase de floresta pereniflia de vrzea relevo plano (RY).

    Na regio estudada os neossolos quartzarnicos distrficos foram predominantes e consistem em

    solos profundos, com textura arenosa em todo o perfil, excessivamente drenados, de rpida

    permeabilidade, porosos e pouco susceptveis eroso devido ao relevo plano. Possuem tambm

    um carter distrfico, com acidez variando de forte a extremamente cidos (Figura 12).

  • 12

    Figura 12. Neossolos quartzarnicos hidromrficos.

    Estes solos desenvolvem-se a partir de sedimentos arenosos, ocorrendo em relevo plano com

    altitudes que variam de 5 a 10 metros, tendo como vegetao natural os campos de restinga e

    floresta subpereniflia de restinga.

    Esta classe de solos apresenta uma sequncia de horizontes A e C, com espessura superior a 250

    centmetros. H pouca diferenciao entre os horizontes devido a uma pequena variao entre suas

    caractersticas morfolgicas, podendo ser evidenciada alguma diferenciao em relao

    colorao. Pode-se citar como elemento diferencial entre os horizontes A e C os pequenos teores de

    matria orgnica no horizonte superficial, que segue decrescendo com o aumento da profundidade.

    Tambm so encontrados solos conhecidos como gleissolos tiomrficos distrficos (Figura 13),

    que tem carter organo-mineral, rasos, pouco desenvolvidos e apresentando horizonte A com alto

    teor de matria orgnica, seguidos de horizontes fortemente gleizados. Esto situados em rea de

    relevo plano, com altitudes variando em torno de 10 metros, com drenagem dificultada e lenol

    fretico bastante elevado.

  • 13

    Figura 13. Associao de solos gleissolos tiomrficos distrficos mais organossolos tiomrficos.

    Estes solos tm sua origem relacionada s deposies orgnicas e de sedimentos aluviais argilo-

    arenosos, ambos do Holoceno e atualmente cobertos pelos campos de vrzea. A acidez varia entre

    fortemente cido, nos horizontes superiores; e extremamente cida nas partes inferiores.

    Ocorrendo de forma associada aos gleissolos tiomrficos distrficos, esto os organossolos

    tiomrficos, que consistem em solos relativamente jovens, pouco desenvolvidos, originados a partir

    de depsitos orgnicos e sedimentos fluviais, sob condies de alagamento permanente, com lenol

    fretico mantendo-se sempre bastante elevado, com exceo de reas drenadas. O relevo onde se

    localizam permanece plano, ocupando as cotas mais baixas com no mximo 20 metros e com

    declividade variando entre 0% a 10%.

    Apresentam drenagem dificultada e permeabilidade lenta, podendo ser impedida na parte inferior

    do perfil. O perfil apresenta-se constitudo por espessas camadas orgnicas assentadas sobre

    camadas minerais gleizadas (Horizonte IIC) podendo ocasionalmente originar um horizonte A.

    O material de origem desta classe caracteriza-se por acumulaes orgnicas sobre depsitos de

    natureza arenosa ou argilosa, apresentando uma litologia proveniente de sedimentos do Holoceno.

    As propriedades qumicas e fsicas destas classes de solos exibem uma variao extremamente

    diversificada (Tabelas 2, 3 e 4).

  • 14

    Tabela 2. Descrio fsica e qumica dos neossolos quartzarnicos hidromrficos A moderado em fase de floresta subpereniflia de restinga e campos de restinga

    relevo plano. Fonte: embrapa (1978).

    Horizonte Profundidade

    (cm)

    Composio granulomtrica

    da terra fina (%) pH

    da

    gua

    Complexo sortivo (mE/100 g) V m P

    (ppm)

    C

    orgnico

    % Areia

    grossa

    Areia

    fina Silte Argila Ca Mg K Na S Al H T %

    A11 0-10 72 18 7 3 4,4 4,8 0,8 0,06 0,11 5,8 0,7 13,1 19,6 30 11 3 2,72

    A12 10-25 79 16 4 1 4,4 0,6 0,03 0,04 0,7 0,8 3,5 5,0 14 53 5 0,84

    C1 25-140 77 19 3 1 5,4 0,1 0,01 0,02 0,7 0,0 0,4 0,5 20 0 12 0,05

    C2 140-250 + 67 25 7 1 5,4 0,1 0,01 0,02 0,7 0,0 0,3 0,4 25 0 < 1 0,06

    Tabela 3. Descrio fsica e qumica dos gleissolos tiomrficos distrficos textura argilosa fase campos de vrzea relevo plano. Fonte: embrapa (1978).

    Horizonte Profundidade

    (cm)

    Composio granulomtrica

    da terra fina (%) Densidade

    aparente

    (g/cm3)

    Porosidade

    (%)

    pH

    da

    gua

    Complexo sortivo (mE/100 g) V m P

    (ppm)

    C

    orgnico

    % Areia

    grossa

    Areia

    fina Silte Argila Ca Mg K Na S Al H T %

    A1 0-17 8 21 32 39 0,55 79 5,0 10,0 4,2 0,07 0,61 14,9 1,5 33,2 49,6 30 9 1 13,85

    B21g 17-34 1 12 38 49 1,12 55 4,9 1,8 1,8 0,27 0,44 4,3 2,4 5,0 11,7 37 36 < 1 0,84

    B22g 34-56 1 18 42 39 0,99 64 4,7 1,1 1,1 0,09 0,35 2,6 2,0 4,3 8,9 29 43 < 1 0,68

    B3g 56-76 2 51 24 23 1,07 59 4,3 0,7 0,8 0,08 0,26 1,8 2,0 3,7 7,5 24 53 < 1 0,05

    Cg 76-100+ 0 32 13 13 0,89 67 2,6 0,6 0,11 0,19 0,9 3,1 5,5 9,5 9 78 3 1,96

    Tabela 4. Descrio fsica e qumica dos organossolos tiomrficos textura orgnica fase campos de vrzea relevo plano Fonte: EMBRAPA (1978).

    Horizonte Profundidade

    (cm)

    Composio granulomtrica da

    terra fina (%) pH

    da

    gua

    Complexo sortivo (mE/100 g) V m P

    (ppm)

    C

    orgnico

    % Areia

    grossa

    Areia

    fina Silte Argila Ca Mg K Na S Al H T %

    1a camada 0-13 - - - - 4,9 8,1 6,6 0,74 1,18 16,6 2,5 62,9 82,0 20 20 2 37,88

    2a camada

    13-56 - - - - 4,8 7,7 6,0 0,83 1,50 16,0 3,6 75,8 95,4 17 18 < 1 44,18

    IIC 56-200+ 6 3 15 76 4,8 0,4 0,9 0,09 0,21 1,6 2,5 6,7 10,8 15 61 < 1 1,49

  • 15

    O espodossolo humilvico um solo profundo (Figura 14), constitudo por horizonte A

    proeminente, textura arenosa, tendo o horizonte B com acumulao de hmus aluvial

    imperfeitamente drenado, com permeabilidade rpida na poro superior, passando a lenta no

    horizonte B, sendo invariavelmente distrfico e com acidez variando entre fortemente a

    extremamente cida. So solos desenvolvidos a partir de sedimentos marinhos de carter

    arenoso, ocorrendo em relevo plano, com altitude em torno de 20 metros estabelecidos sob

    campos de restinga e floresta pereniflia de restinga.

    Figura 14. Espodossolo humilvico.

    Outra classe de solo encontrada foi a de neossolos flvicos eutrficos (Figura 15), mais

    comumente conhecidos como solos aluviais, aparecendo em associao com relevos planos e

    vizinhos aos cursos dgua.

    Figura 15. Neossolo flvico eutrfico.

  • 16

    Estes so solos minerais, recentes, pouco desenvolvidos, apresentando horizontes A/C sem

    relao pedogentica entre si, com camadas mais ou menos estratificadas, mas no

    consolidadas. Alm disto, caracterizam-se como solos frteis, com drenagem excessiva a

    imperfeita, apresentando muita desuniformidade textural. Esta caracterstica conhecida como

    anisotropia, que significa uma grande e catica variao espacial de atributos fsicos e qumicos

    explicada pelo seu processo de formao, que realizado atravs da deposio de sedimentos

    orgnicos e minerais em camadas alternadas depositadas nos perodos de secas e enchentes

    (EMBRAPA, 1999). Estas classes de solo variam quanto s diversas propriedades qumicas e

    fsicas entre as classes de solos (Tabelas 5 e 6).

  • 17

    Tabela 5. Descrio fsica e qumica do espodossolo humilvico A proeminente textura arenosa em fase de campos de restinga e floresta pereniflia de restinga em

    relevo plano

    Horizonte Profundidade

    (cm)

    Composio granulomtrica da

    terra fina (%) Densidade

    aparente

    (g/cm3)

    Porosidade

    (%)

    pH

    da

    gua

    Complexo sortivo (mE/100 g) V m P

    (ppm)

    C

    orgnico

    % Areia

    grossa

    Areia

    fina Silte Argila Ca Mg K Na S Al H T %

    A1 0-29 73 24 2 1 1,51 42 3,5 0,8 0,02 0,06 0,9 0,5 4,1 5,5 16 36 2 1,19

    A2 29-80 63 35 1 1 1,59 39 4,9 0,2 0,01 0,02 0,2 0,0 0,2 0,4 50 0 < 1 0,05

    B2h 80-129 54 41 3 2 1,59 37 4,2 0,7 0,4 0,01 0,03 1,1 3,0 13,2 17,3 6 73 < 1 2,83

    B3h 129-172+ 52 44 3 1 1,50 40 4,8 0,5 0,01 0,03 0,5 1,1 6,1 7,7 6 69 < 1 1,38

    Fonte: EMBRAPA (1978).

    Tabela 6. Descrio fsica e qumica do neossolo flvico eutrfico A fraco e moderado textura argilosa em fase de floresta pereniflia de vrzea em relevo plano

    Horizonte Profundidade

    (cm)

    Composio granulomtrica

    da terra fina (%) pH

    da

    gua

    Complexo sortivo (mE/100 g) V m P

    (ppm)

    C

    orgnico

    % Areia

    grossa

    Areia

    fina Silte Argila Ca Mg K Na S Al H T %

    A1 0-6 5 3 43 49 6,2 11,2 6,4 1,16 0,29 19,1 0,0 4,0 23,1 83 0 3,4 3,24

    B1 6-20 2 2 25 71 4,9 1,6 2,4 0,57 0,30 4,9 0,5 4,1 9,5 52 9 1,1 0,93

    B21 20-40 X 1 28 71 5,0 0,8 1,2 0,17 0,32 2,5 1,2 2,9 6,6 38 32 0,6 0,43

    B22 40-55 1 1 35 63 5,3 0,8 1,5 0,12 0,34 2,8 0,8 2,9 6,5 43 22 0,7 0,31

    B23 55-72 1 2 34 63 5,4 0,9 1,8 0,12 0,34 3,2 0,7 2,7 6,6 48 18 0,8 0,30

    C1 72-82 1 3 30 66 5,5 1,0 1,5 0,10 0,20 2,8 0,2 3,0 6,0 47 7 0,7 0,40

    C2 82-100 2 7 36 55 5,6 0,6 2,1 0,10 0,34 3,1 0,2 2,6 5,9 53 6 0,7 0,43

    IIC3g 100-125 23 42 21 14 5,7 0,4 1,0 0,04 0,11 1,6 0,4 1,2 3,2 50 20 2,2 0,25

    IIIC4g 125-180 94 4 0 0 6,5 0,4 0,1 0,02 0,11 0,6 0,0 0,3 0,9 67 0 1,3 0,05

    IIIC5g 180-190 17 68 9 6 5,8 0,5 1,1 0,07 0,28 2,0 0,2 1,1 3,3 61 9 1,5 0,09

    IIIC6g 190-220 2 1 0 0 6,5 0,5 - 0,02 0,08 0,6 0,0 0,2 0,9 75 0 1,1 0,03

    Fonte: EMBRAPA (1978).

  • 18

    2.1.8 Fatores antrpicos e impactos ambientais

    As principais atividades produtivas existentes na regio esto concentradas na explorao e

    transporte de petrleo, turismo, pesca, pecuria de corte, silvicultura, extrativismo e agricultura de

    subsistncia.

    Os sistemas de produo agrcolas so baseados na produo de gado de corte, cacau, banana,

    lavouras brancas e silvicultura, principalmente no cultivo de eucalipto, sendo conduzidos sob baixa

    base tecnolgica, com exceo dos plantios florestais.

    No foram encontrados sistemas de produo alternativos, como cultivo de produtos orgnicos e

    outras prticas sustentveis. Entretanto, as lavouras de cacau so conduzidas no sistema conhecido

    como mata de cabruca (Figura 16), mantendo algumas espcies nativas da Mata Atlntica para

    proporcionar o sombreamento necessrio ao cacau, coerente com os princpios da agricultura

    sustentvel.

    Figura 16. Lavoura de cacau.

    Este sistema de produo de certa forma responsvel pela manuteno de diversas pores de

    mata ciliar nas margens do Rio Doce. A criao de gado e as plantaes de eucalipto esto

    localizadas em propriedade rurais com extenses maiores (Figura 17), sendo algumas reas de

    propriedade da empresa Aracruz Celulose.

  • 19

    Figura 17. rea de produo de eucalipto.

    Os rebanhos de gado ocupam extensas reas de pastagens plantadas (Figura 18), circulando

    livremente e sem nenhuma tecnologia de rotatividade de pasto, o que provavelmente contribui para

    a compactao e degradao das propriedades fsicas destes solos.

    Figura 18. Pastagem com rebanho bovino.

    Neste sentido, a regio estudada encontra-se desmatada, com diversas reas originalmente alagadas

    sob efeito de drenagem e consequentemente impactadas quanto ao meio fsico (Figura 19). Podem

    ser relacionados problemas como degradao fsica a compactao de solos pelo pisoteio do gado e

    alteraes qumicas no pH e fertilidade, alm da utilizao de herbicidas e formicidas nas lavouras

    de eucalipto.

  • 20

    Figura 19. Canal aberto para desvio de curso de gua.

    Estes solos de carter tiomrfico so muito sensveis s variaes nos teores de umidade, pois

    quando drenados tornam-se extremamente cidos, devido formao de cido sulfrico

    proveniente do seu elevado teor de enxofre. Esta acidificao pode levar formao de um

    verdadeiro deserto qumico, onde pouqussimas plantas tm capacidade ecolgica para

    sobreviver (SEMA, 2008). Diversos trechos de mata ciliar foram eliminados da paisagem,

    provocando eroso e assoreamento do Rio Doce, havendo degradao qualitativa e quantitativa,

    com intenso aporte de sedimentos, esgotos, efluentes e resduos slidos ao longo do seu curso

    (Figura 20).

    Figura 20. Estrada vicinal construda em rea de mata ciliar.

  • 21

    Foram observadas diversas estruturas em operao pertencentes empresa Petrobras extraindo

    petrleo do subsolo (Figura 21). Os impactos desta atividade manifestam-se principalmente de

    forma indireta, atravs do fluxo de veculos e equipamentos utilizados em aes de manuteno

    para a conduo dos trabalhos.

    Figura 21. Poo de petrleo em atividade.

    Existem diversas iniciativas de carter ambiental na regio, como as atividades desenvolvidas pelo

    Projeto TAMAR, Organizaes No-Governamentais (ONGs) ligadas bacia hidrogrfica do Rio

    Doce e projetos de extenso e pesquisa de diversas instituies de ensino superior.

    De forma sinttica, pode-se concluir que a regio estudada representa uma rea importante para a

    desova de tartarugas marinhas, concentrando cerca de 70% a 80%, alm de apresentar comunidades

    de pescadores artesanais e tribos indgenas, com suas respectivas manifestaes folclricas e

    tradicionais diversas. Desta forma, alm da criao de uma Unidade de Conservao, recomenda-se

    implementao de aes e programas que visem recuperao e conservao dos seus atributos

    naturais, colaborarando para a manuteno da sociobiodiversidade existente.

    2.2 Perfil Fundirio

    2.2.1 Introduo

    As informaes seguintes referem-se ao perfil fundirio de uma rea localizada na zona rural do

    municpio de Linhares (Figura 22). Para tanto, buscou-se levantar e analisar dados a respeito da

    quantidade e do tamanho dos imveis rurais, a condio do produtor ou do sitiante e as principais

    atividades realizadas nas propriedades, permitindo uma caracterizao da realidade fundiria dos

    imveis localizados no interior da rea delimitada.

  • 22

    Figura 22. Localizao da rea de estudo no Delta do Rio Doce.

    2.2.2 Materiais e mtodos

    Os mtodos utilizados para a obteno dos dados da rea subdividiram-se em dois nveis: (1)

    levantamento e anlise de referncias e dados secundrios provenientes do Instituto Brasileiro de

    Geografia e Estatstica (IBGE), Instituto Jones dos Santos Neves (IJSN) e Instituto Nacional de

    Colonizao e Reforma Agrria e (2) visitas a campo para coleta de dados.

    Aps a realizao de uma reviso de referncias, alguns pontos essenciais foram estabelecidos

    servindo para orientar o levantamento de dados secundrios e direcionar o trabalho desenvolvido

    em campo.

    O trabalho de campo foi realizado nos dias 21 e 22 de outubro de 2008 e adotou abordagens diretas

    e indiretas sobre os imveis localizados na rea de estudo. Com o auxlio de materiais

    cartogrficos, o percurso com veculo foi realizado ao longo das estradas e caminhos da rea,

    visitando as propriedades de interesse.

    A coleta de dados ocorreu especialmente mediante a realizao de entrevistas, caracterizando-se os

    imveis quanto as suas dimenses, condio do produtor ou sitiante e o uso da terra.

    Para garantir as contextualizaes espaciais e manuteno da coleta de dados sem que fossem

    ultrapassados os limites da rea selecionada para o estudo, o processo foi auxiliado tomando como

    base a interpretao de fotografias reas do ano de 2008, fornecidas pelo Instituto de Meio

    Ambiente e Recursos Hdricos (IEMA).

    A partir do uso das fotografias areas e de um estereoscpio, foram delimitadas de forma

    aproximada s propriedades, identificando hidrografia, a malha viria, a cobertura florestal e o

    uso predominante da terra associados.

  • 23

    O Sistema de Posicionamento Global (GPS) foi utilizado para obter as coordenadas geogrficas dos

    locais das propriedades, um processo realizado mediante a coleta de pontos e coordenadas no

    sistema Universal Transversa de Mercator (UTM), nos limites e nas sedes das propriedades

    visitadas. Ainda foram coletadas trilhas utilizando Sistema de Posicionamento Global, passando

    posteriormente a fazer parte da atualizao da malha viria da base cartogrfica.

    Por fim, o tratamento dos dados e a elaborao dos mapas finais foram realizados com o auxlio

    dos softwares Microsoft Excel para organizao e compilao de dados do campo; TrackMaker no

    tratamento de dados coletados pelo Sistema de Posicionamento Global e ArcGis 9.1(ESRI, 2005)

    para a elaborao de mapas temticos e mapas de uso e ocupao do solo.

    2.2.3 Resultados

    Como a rea de estudo pertence em sua maior parte ao municpio de Linhares e apresenta uma

    pequena poro localizada no municpio de Aracruz, optou-se, em um primeiro momento, por uma

    breve contextualizao das caractersticas fundirias do municpio de Linhares, apresentando os

    resultados advindos do trabalho de campo realizado na rea delimitada para estudo.

    2.2.3.1 Aspectos econmicos do municpio de Linhares

    Como em outros municpios do norte capixaba, a economia de Linhares foi baseada na explorao

    de madeira nativa e expanso das atividades agrcolas at a dcada de 1970. Este modelo

    econmico foi adotado pelo Estado do Esprito Santo com o intuito de estimular o povoamento da

    regio norte estadual.

    A partir da dcada de 1990, a economia de Linhares passou a crescer baseada nas atividades

    industriais e agroindstrias, contando com a ampliao do plo moveleiro especialmente aps sua

    insero na rea de abrangncia da Superintendncia do Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE)

    no ano de 1998.

    Atualmente, o municpio apresenta uma economia bastante diversificada e com grande potencial

    produtivo. Entre as atividades presentes destacam-se as produes de frutas, caf, cacau, cana-de-

    acar, eucalipto, seringueira, indstria moveleira, indstria de confeces, agroindstrias,

    beneficiamento de rochas ornamentais, extrao de petrleo e gs natural.

    A maior parte de sua produo exportada para outros pases. Entretanto, h uma parte da

    produo destinada a abastecer os mercados consumidores do Esprito Santo, Rio de Janeiro e So

    Paulo, um abastecimento facilitado devido posio estratgica ocupada pelo municpio, que dista

    120 quilmetros da capital Vitria, o que facilita o acesso ao aeroporto e ao porto. O municpio

    tambm possui um aeroporto local que auxilia no escoamento de produtos.

    Devido ao processo de colonizao municipal, a maior parte da vegetao original foi retirada

    ainda nas primeiras dcadas do sculo XX, principalmente para o uso da madeira como

    combustvel empregado no funcionamento das usinas instaladas na Grande Vitria, alm de

    contribuir para a expanso da fronteira agrcola.

    A produo agrcola de Linhares voltada para a exportao e para o abastecimento das indstrias

    do municpio. Devido a este fato, a base da produo no a mo-de-obra familiar, o que foi um

    fator predominante nas outras reas de estudo; mas sim o trabalho assalariado, que na maior parte

    executado com auxlio mecnico.

    http://pt.wikipedia.org/wiki/Universal_Transversa_de_Mercator

  • 24

    Dentre os produtos cultivados no municpio de Linhares merecem destaque: (1) como lavoura

    permanente a banana, borracha, cacau, caf, coco, goiaba, laranja, limo, mamo, manga,

    maracuj, palmito, pimenta-do-reino e tangerina; (2) como lavoura temporria, cana-de-acar,

    feijo, mandioca e milho; e (3) na silvicultura, o carvo vegetal, a lenha e a celulose.

    2.2.3.2 Aspectos fundirios da rea de estudo

    As terras abrangidas pela rea de estudo no so utilizadas para o abastecimento das indstrias do

    municpio de Linhares, uma vez que no foi observado o seu uso em atividades de fruticultura,

    plantio de eucalipto, seringueiras ou extrao de madeira, com exceo da rea destinada para o

    plantio de cacau.

    A rea de estudo do Delta do Rio Doce possui 9070 ha distribudos em 140 propriedades. Destas,

    39 esto localizadas na rea de ampliao da Reserva Biolgica de Comboios. Se considerarmos o

    nmero total de propriedades, o tamanho mdio de aproximadamente 65 ha.

    Na poro localizada margem direita do Rio Doce, encontramos 13 famlias de caseiros, que so

    responsveis por gerenciar as propriedades, uma vez que os proprietrios residem, em sua maioria,

    na sede do municpio de Linhares. O principal uso da terra para a criao de gado bovino. Esta

    atividade hegemnica e est presente em quase todas as propriedades. H tambm pequenas reas

    de cultivo de coco e no foi observado nenhum outro produto agrcola. margem direita do Rio

    Doce tambm apresenta a Reserva Biolgica de Comboios, alm de uma rea destinada a sua

    ampliao, compreendendo aproximadamente 41% do total da rea de estudo, enquanto 11%

    pertencem ao leito do Rio Doce.

    Na poro localizada margem esquerda do Rio Doce, somente um proprietrio reside na terra,

    enquanto o restante mora na rea urbana de Povoao. Nesta parte, realiza-se o cultivo de coco em

    terrenos arenosos, mas no representa grandes propores. Alm desta cultura, o cacau cultivado

    em meio a espcies nativas, formando a mata de cabruca. H ainda grandes reas de pastagens.

    Quanto cobertura vegetal, pode-se observar a presena de vegetao tpica de Restinga,

    subdividindo-se em Formao Praial Graminide com arbustos, Formao Aberta de Clusia e

    Formao Mata Seca de Restinga. Na Formao Mata Seca de Restinga encontram-se reas com a

    vegetao bastante esparsa. Ainda existem reas sujeitas s inundaes com vegetao denominada

    Formao Brejo Herbceo. Prximo ao leito do Rio Doce existe uma vegetao com caractersticas

    similares a vegetao de Mata Atlntica florestal, ocorrendo tambm em algumas ilhas do Rio

    Doce, dividindo espao com reas de plantio de cacau.

    No ponto de coordenadas geogrficas 414900E e 7832350N, pode se visualizar uma bateria de

    fornos localizada em uma rea com pastagem entre a mata de cabruca a margem direita do Rio

    Doce.

    O uso e cobertura do solo so compreendidos entre 21,5% de Formao Mata Seca de Restinga,

    3,5% Formao Aberta de Clusia, 5% de Formao Praial Graminide com arbustos, pouco mais

    de 1% de vegetao de Mata Atlntica em estgios iniciais e mdios de regenerao, 12% de

    agrofloresta, 1% de reas de cultivo de coco, 0,5% de reas de cultivo de eucalipto, 7% de reas

    midas ou alagveis e 32% destinados as pastagens (Figura 23).

  • 25

    Figura 23. Utilizao do solo na rea de estudo.

    No foi observada a presena de grandes propriedades conforme a classificao do Instituto

    Nacional de Colonizao e Reforma Agrria (INCRA), pois uma grande propriedade deve possuir

    pelo menos de 15 mdulos fiscais de rea. No caso do municpio em questo, o mdulo fiscal de

    20 h. Apenas os imveis com rea superior a 300 ha seriam considerados como grande

    propriedade (Tabela 7).

    Tabela 7. Distribuio de propriedades na rea de estudo

    Grupo de reas

    (hectares)

    Nmero de

    imveis

    Participao

    (%)

    rea

    (hectares) rea (%)

    At 5 h 41 29,28 859 9,48

    5,1 a 18 16 11,42 1334 14,71

    18,1 a 50 41 29,28 2415 26,63

    51 a 100 34 24,28 3492 38,50

    > 100 8 5,71 969 10,68

    Total 140 100.00 9070 100

    Entretanto, a estrutura fundiria da rea de estudo mostrou-se relativamente concentrada. Se houver

    uma ponderao pelo tamanho das propriedades, que variam entre 1 a 187 ha, no h concentrao

    de terras. Contudo, se houver considerao de que uma mesma pessoa proprietria de mais de

    uma propriedade, pode-se afirmar que h concentrao de terras na regio estudada. Isto ocorre

    principalmente na poro localizada margem direita do Rio Doce, onde tambm esto as

    propriedades com extenses maiores. Na poro norte da rea de estudo encontra-se propriedades

    de dimenses menores, contando inclusive com um loteamento localizado entre a rea urbana de

    Povoao e o Oceano Atlntico. Quanto condio do ocupante do imvel, observa-se o

    predomnio de caseiros, uma vez que apenas um proprietrio residente nas propriedades presentes

    na rea de estudo, os demais residem nos ncleos urbanos prximos.

  • 26

    2.2.4 Discusso

    A partir do exposto, nota-se que a rea estudada possui potencial considervel para a preservao,

    levando-se em conta a presena da Reserva Biolgica de Comboios e de sua rea de ampliao,

    com ambas as reas localizadas no Delta do Rio Doce. Outro fator a ausncia de moradores nas

    propriedades, sendo encontrados apenas 13 indivduos que zelam pelas mesmas. Pode-se ainda

    ressaltar que a vegetao da regio encontra-se bastante descaracterizada apesar da presena de

    algumas reas remanescentes. Estas informaes expem a necessidade de interveno visando

    preservao e recuperao da cobertura vegetal nativa da regio, uma realidade possvel a partir da

    consolidao da criao de uma Unidade de Conservao com rea maior que a j existente na

    regio.

    3. MEIO BITICO

    3.1 Flora

    3.1.1 Introduo

    A Mata Atlntica composta por vrios ecossistemas associados (Rizzini, 1997) e apresenta

    feies vegetais que vo desde formaes herbceas at florestais. Estando entre as florestas

    tropicais mais ameaadas do planeta, a Mata Atlntica atualmente se encontra dramaticamente

    ameaada por um histrico de destruio que mais antigo que o da Amaznia (Ayres et al., 2005).

    O termo Mata Atlntica, quando referente ao Brasil, engloba um mosaico de comunidades de

    vegetao que se desenvolvem ao longo da cadeia montanhosa e de terras baixas que ladeiam o

    Oceano Atlntico, desde o Rio Grande do Sul at o Rio Grande do Norte. Sua rea principal situa-

    se nos limites das Serras do Mar e da Mantiqueira na regio sudeste (Siqueira-Filho & Leme,

    2006). Legalmente, segundo o Decreto Federal n0 750 de 1993, a Mata Atlntica composta por

    formaes florestais bem distintas, incluindo a Floresta Ombrfila do Litoral, a Floresta Decdua

    do Planalto, a Floresta com Araucria dos Estados sulinos, manguezais, restingas e campos de

    altitude (Tonhasca-Junior, 2005).

    Segundo Scarano (2002), estes diferentes ecossistemas ou comunidades vegetais que compe a

    Mata Atlntica esto sob efeito de uma vasta gama de condies ambientais, tais como

    temperaturas altas e baixas, incluindo congelamento; inundaes, secas, aes do vento e elevadas

    salinidades. Estes fatores ambientais so responsveis por criar a elevada diversidade de

    ecossistemas e fitofisionomias que compe a Mata Atlntica sensu lato, onde cada qual ocorre em

    uma faixa estreita de condies consideradas ideais para o seu estabelecimento.

    Apesar da sua importncia, a Mata Atlntica encontra-se hoje, segundo a Fundao SOS Mata

    Atlntica & INPE (2009), reduzida a aproximadamente 8% da sua cobertura nacional original. No

    Esprito Santo, restam apenas 11,3% de fragmentos florestais remanescentes.

    A Mata Atlntica ocupa trs provncias geomorfolgicas bem distintas no Esprito Santo: a Regio

    Serrana, os Tabuleiros Tercirios e as Plancies Quaternrias (Simonelli, 2007), sendo as duas

    ltimas encontradas na rea de estudo da rea proposta para a criao da Reserva de

    Desenvolvimento Sustentvel da Foz do Rio Doce. Sobre os Tabuleiros Tercirios erguem-se as

    denominadas Florestas de Tabuleiro, que apresentam fitofisionomias diferenciadas, principalmente

    quanto pedologia, influncia do lenol fretico, composio florstica e estrutural (Peixoto &

    Simonelli, 2007). Segundo Simonelli (2007), os maiores remanescentes das Florestas de Tabuleiro

  • 27

    esto no norte do Esprito Santo, sendo quase relquias comparadas s outras regies do Estado

    devido ao do desmatamento.

    As Plancies Quaternrias, que ocupam a maior parte da rea de estudo, apresentam as Restingas,

    que so definidas como o conjunto da vegetao litornea sobre solos arenosos marinhos

    depositados tanto no Pleistoceno, como no Holoceno, associadas com alguns pontos de sedimentos

    fluvio-marinhos presentes na costa. No Esprito Santo a Restinga abrange a maior parte da extenso

    da costa, sendo interrompida em alguns trechos pela foz de rios (Pereira, 2007).

    Apresentando-se como um ecossistema associado Mata Atlntica, as restingas ocorrem em

    diferentes faixas de extenso por toda a costa brasileira (Araujo, 2000; Tonhasca-Junior, 2005;

    Coutinho, 2006), ocupando cerca de 80% do litoral brasileiro (Lacerda et al., 1993), o que

    corresponde a 7110 quilmetros em extenso (Suguio & Tessler, 1984).

    Este ecossistema ocorre sobre sedimentos arenosos quartzosos que foram depositados por meio de

    diferentes processos durante o perodo Quaternrio (Rizzini, 1997). Tais processos ocorreram

    durante o Pleistoceno e Holoceno, havendo deposio predominante de areias quartzosas marinhas.

    Alguns trechos apresentaram entradas de areias fluviais, principalmente nas proximidades de

    grandes rios (Pereira, 2003).

    As regresses marinhas ocorridas durante o Pleistoceno deram origem aos cordes arenosos mais

    internos ao continente, sendo por isso mais antigos, com cerca de 120000 anos, j os cordes

    Holocnicos, mais recentes e com cerca de 5100 anos; so posicionados mais prximos aos limites

    do continente, fazendo divisa com as linhas de praia (Martin et al., 1997). Sobre estes cordes

    arenosos so encontradas as formaes vegetais no-inundveis de restinga (Araujo & Henriques,

    1984; Pereira, 1990; Menezes & Araujo, 2005; Magnago et al., 2007). A origem destes cordes

    litorneos implicou no aparecimento de lagoas, lagunas e baias (Bigarella, 2001). Alguns trechos

    destas reas alagadas, que ocorrem geralmente entre os cordes arenosos, sofreram deposio

    sedimentar dando origem a formaes de turfas (Martin et al., 1997) e sobre os intercordes so

    encontradas as formaes vegetacionais inundadas e inundveis de restinga (Araujo & Henriques,

    1984; Pereira, 1990; Menezes & Araujo, 2005; Magnago et al., 2007).

    Os solos que compe o ecossistema restinga so quimicamente pobres, apresentando como

    principal fonte de nutrientes o spray marinho (Araujo & Lacerda, 1987; Leo & Dominguez,

    2000). As classes de solos predominantes neste ecossistema so os Espodossolos e Neossolos

    Quartzarnicos (Moura Filho, 1998; Gomes et al., 1998; Rossi, 1999), muitas vezes apresentando

    um incipiente processo de podzolizao, levando-os a demonstrar caractersticas intermedirias

    para os Espodossolos (Gomes et al., 2007). As pores de argila e silte equivalem a 1% do total das

    amostras, evidenciando uma proporo pouco representativa em relao aos nutrientes quando

    comparados a outros ecossistemas. A quantidade de clcio, magnsio e potssio disponveis

    tambm so muito baixas, enquanto os nveis de alumnio so elevados (Pereira, 2003).

    As restingas apresentam formaes compreendidas desde fitofisionomias predominantemente

    herbceas, arbustivas e florestais, que podem ser divididas pelo nvel de influncia do lenol

    fretico de acordo com Pereira (2003). Entretanto, Menezes & Araujo (2005) indicam que outros

    fatores tambm possam contribuir para a caracterizao destas formaes. Este ecossistema

    apresenta maior extenso nos Estados do Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e Esprito Santo

    (Henriques et al., 1986), demonstrando por isso, uma expressividade considervel nas regies sul e

    sudeste da costa brasileira (Menezes-Silva & Britez, 2005).

    A restinga apresenta uma elevada diversidade fitofisionmica originada por diversos tipos de

    influncias biticas e abiticas (Pereira, 1990; Assis et al. 2004; Magnago et al., 2007), podendo

    estar associada ao gradiente no sentido mar/continente, onde a localizao da formao

  • 28

    vegetacional em relao aos cordes arenosos e depresses intercordes pode exercer uma

    influncia marcante sobre a composio florstica. A diversidade de fitofisionomias existente na

    restinga do Esprito Santo foi primeiramente descrita por Pereira (1990) para o Parque Estadual

    Paulo Cesar Vinha. Posteriormente outros autores tambm apontaram esta heterogeneidade

    fitofisionmica para outras localidades do Estado (Pereira & Gomes, 1994; Pereira, 2007; Magnago

    et al., 2007).

    3.1.2 Materiais e mtodos

    Para o levantamento florstico e fitofisionmico foram feitas amostragens em toda regio de

    Regncia e Povoao, localizados no municpio de Linhares, norte do Esprito Santo (Figuras 24 e

    25). Os levantamentos tiveram a durao de dez dias envolvendo um nmero total de seis pessoas,

    divididas em quatro botnicos e dois estagirios, revezando-se em grupos de trs.

    Figura 24. Localizao das reas de estudo em Regncia e Povoao, Linhares, Esprito Santo.

    Figura 25. Limites da Reserva de Desenvolvimento Sustentvel da Foz do Rio Doce em amarelo,

    Linhares, Esprito Santo. Fonte: Fundao Pr-TAMAR et al. (2002).

  • 29

    O enquadramento fitogeogrfico utilizou as classificaes propostas por Ruschi (1950), Azevedo

    (1962), RADAMBRASIL (1983), IBGE (1987) e Rizzini (1997). A caracterizao fitofisionmica

    foi realizada com base no levantamento de campo, onde foram feitas observaes percorrendo a

    rea estudada. A base para a classificao dos estgios de sucesso utilizada neste estudo est em

    conformidade com as recomendaes da Lei n 5361 de Poltica Florestal do Estado do Esprito

    Santo, seguindo as definies e terminologias para reconhecimento em campo. Estes critrios no

    foram utilizados para o estudo do ecossistema Restinga, adotando-se terminologias propostas por

    Pereira (2003).

    A caracterizao florstica tambm foi realizada com base no levantamento de campo, onde os

    espcimes em estgio de florao e/ou frutificao foram coletados e tratados conforme Mori et al.

    (1989). Tambm foram feitas observaes relativas s formas de vida, fisionomia, altitude e

    coordenadas geogrficas onde cada um foi encontrado.

    Para a identificao do material coletado foram utilizadas referncias especializadas e comparaes

    com espcimes depositados no herbrio VIES da Universidade Federal do Esprito Santo (UFES),

    sendo enviadas fotografias dos espcimes para especialistas quando necessrio, principalmente

    quando se tratavam de Famlias botnicas mais complexas.

    Alm das espcies coletadas foram incorporadas espcies observadas em campo em uma listagem

    florstica, porm no coletadas. Tambm foi consultado o banco de dados do herbrio do Museu de

    Biologia Professor Mello Leito (MBML), do herbrio VIES (UFES) e referncias cientificas com

    informaes sobre a rea de estudo.

    O sistema proposto por Cronquist (1981) foi adotado para a elaborao da listagem, com exceo

    para Leguminosae, que foi considerada como Famlia nica. As espcies ameaadas de extino

    foram citadas conforme a Lista Internacional da International Union for Conservation of Nature

    (IUCN, 2004); a Lista Oficial das Espcies da Flora Brasileira Ameaada de Extino via Portaria

    do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovveis (IBAMA) N 6-N de

    15 de janeiro de 1992 e de acordo com o Decreto n 1499-R, que homologa a Lista de Espcies

    Ameaadas de Extino no Esprito Santo.

    3.1.3 Resultados

    3.1.3.1 Enquadramento fitogeogrfico

    A. Restinga

    O principal fator que promoveu a sedimentao arenosa da plancie do Rio Doce foi variao do

    nvel relativo do mar, sendo que estes eventos regressivos expuseram grandes quantidades de areia

    na plataforma continental, constituindo-se na principal fonte de sedimentos que subsidiaram a

    progradao da zona arenosa (Dominguez et al., 1983). Os eventos transgressivos ento

    interromperam a progradao, erodindo e afogando as plancies costeiras, resultando no

    aparecimento de sistemas laguna-ilha barreira, passando ento a construir deltas nestas localidades.

    Segundo Dominguez et al. (1983), foi possvel estabelecer dois sentidos preferenciais para o

    trnsito litorneo de sedimentos durante a evoluo de sua plancie costeira do Rio Doce (Figura

    26). O primeiro seria de orientao norte/sul, tendo predominado na regio durante a construo

    dos terraos marinhos pleistocnicos, bem como na construo da primeira gerao de cordes

    holocnicos (Figura 27A). Em seguida, quando houve a construo do sistema de cordes

    litorneos associados ao intumescimento apresentado pela plancie costeira nas vizinhanas da

    Lagoa do Zacarias, o sentido da deriva inverteu-se para sul/norte. Em perodos mais recentes o

  • 30

    trnsito litorneo readquiriu seu sentido original norte/sul, como atesta o ponta1 arenoso associado

    desembocadura do Rio Doce (Figura 27B).

    Figura 26. Mapa geolgico da plancie costeira associada desembocadura do Rio Doce (Suguio &

    Tessler, 1984).

    Segundo Dominguez et al. (1983) possvel reconhecer oito estgios principais na histria do

    desenvolvimento das feies deltaicas do Rio Doce, embora estes nem sempre estejam bem

    representados (Figura 27).

  • 31

    Figura 27. Esquema evolutivo da sedimentao quaternria nas feies deltaicas da costa leste do

    Brasil (Dominguez et al., 1983).

    O Estgio I (Figura 27A) corresponde deposio da Formao Barreiras, durante o Plioceno.

    Nesta poca, ocorria um clima mais seco que o atual, sujeito a tempestades espordicas e violentas,

    dando lugar deposio de leques aluviais coalescentes no sop das encostas. Durante a deposio

  • 32

    desta formao, o nvel relativo do mar encontrava-se mais baixo que o atual, tendo seus

    sedimentos recobertos em parte da plataforma continental (Bigarella & Andrade, 1965).

    O Estgio II (Figura 27B) consistiu no processo em que deposio da Formao Barreiras foi

    interrompida assim que o clima passou a adquirir caractersticas midas. Este perodo coincide com

    o incio do episdio transgressivo mencionado por Bittencourt et al. (1979), como a transgresso

    mais antiga. Alm disto, erodiu a poro externa da Formao Barreiras, com o limite mximo

    atingido pelo mar sendo representado por antigas linhas de falsias entalhadas ao longo da

    formao.

    O Estgio III (Figura 27C) caracteriza o perodo em que o clima voltou a adquirir caractersticas

    semi-ridas aps o mximo alcanado pela transgresso marinha mais antiga e durante a regresso

    que se seguiu. Esta retomada de condies climticas semelhantes s prevalecentes durante a

    deposio da Formao Barreiras propiciou a formao de novos depsitos continentais do tipo

    leques aluviais coalescentes no sop das falsias esculpidas nas Barreiras ao longo do evento

    transgressivo anterior.

    O Estgio IV (Figura 27D) corresponde ao mximo alcanado pela penltima transgresso, h

    cerca de 120000 anos. Nesta poca, o nvel do mar erodiu total ou parcialmente os depsitos

    continentais colocados durante o estgio anterior. Durante este evento, os baixos cursos dos rios

    So Francisco, Jequitinhonha, Doce e Paraba do Sul foram afogados constituindo os esturios.

    Nesta ocasio, foram atingidos os locais em que o mar conseguiu erodir totalmente os sedimentos

    continentais depositados no estgio anterior, as ondas, por sua vez, retrabalharam a linha de falsias

    construda na Formao Barreiras durante a transgresso mais antiga.

    O Estgio V (Figura 27E) corresponde ao evento regressivo subsequente transgresso anterior.

    Nesta poca, foram construdos os terraos marinhos pleistocnicos, que possivelmente formaram

    plancies costeiras semelhantes s atuais.

    O Estgio VI (Figura 27F), refere-se ltima transgresso que erodiu e afogou parcialmente as

    plancies associadas ao Rio Doce durante seu curso. A rede de drenagem que havia se instalado nos

    terraos pleistocnicos, favorecida pela descida acentuada do nvel de base que caracterizou o

    evento anterior, foi invadida pelo mar da mesma maneira que foram escavados alguns valores na

    Formao Barreiras. Durante o mximo desta transgresso, os baixos cursos dos rios So

    Francisco, Jequitinhonha, Doce e Paraba do Sul foram mais uma vez parcialmente afogados,

    constituindo os esturios. Associado ao afogamento da plancie costeira pleistocnica iniciou-se o

    desenvolvimento de ilhas-barreiras, que eliminaram o contato direto entre o mar e o que restou dos

    terraos marinhos relacionados quelas plancies. Atrs destas ilhas instalaram-se sistemas

    lacustres que em algumas regies alcanaram dimenses considerveis, sendo condies datadas

    por volta de 6000 atrs a exemplo das plancies costeiras do Rio Doce.

    No Estgio VI1 (Figura 27G) foram construdos deltas intralagunares nas lagunas instaladas no

    estgio anterior pelos rios que penetravam. Este estgio encontra-se bem representado nas plancies

    costeiras dos rios Doce e Paraba do Sul. Suas feies constituem de fato as nicas acumulaes

    sedimentares presentes nas plancies costeiras aqui analisadas e podem ser consideradas como

    deltas tpicos, uma vez que foram construdas a partir dos aportes de sedimentares fluviais

    aprisionados nestas lagunas, exibindo uma morfologia caracterstica dos deltas de domnio fluvial.

    No Estgio VIII (Figura 27H), o abaixamento do nvel relativo do mar, que ocorreu com um

    mximo de retrasso h 5000 anos; se traduziu na formao de terraos marinhos a partir da ilha-

    barreira original, o que resultou na progradao da linha da costa. Para a plancie costeira do Rio

    Doce, a formao de uma primeira gerao de cordes holocnicos ocorreu entre 5100 e 3800 anos

    atrs. interessante notar que a construo da primeira gerao de cordes o Rio Doce ainda no

  • 33

    alcanava diretamente o mar, apresentando sua carga sedimentar totalmente retida na laguna,

    constituindo o delta intralagunar. Neste estgio, alm da construo dos terraos marinhos

    arenosos, o abaixamento do nvel relativo do mar tambm provocou o desaparecimento dos

    sistemas lagunares, uma vez que foram substitudos por zonas baixas pantanosas (Figuras 28 e 29).

    Figura 28. Esquema da evoluo paleogeogrfica da feio deltaica do Rio Doce durante o Holoceno.

  • 34

    Figura 29. Representao da situao atual da sedimentao do Rio Doce. Fonte: Instituto Estadual de

    Meio Ambiente e Recursos Hdricos (IEMA).

    B. Plancie aluvial

    As margens do rio Doce so constitudas por solos aluviais eutrficos, geralmente cobertos por

    matas de cacau e nas reas mais distantes do leito do rio predominam os aluviais distrficos, j com

    presena de pastagens, alm de vrios fragmentos de florestas (Rolim et al., 2006). Esta formao

    est assentada principalmente sobre sedimentos fluviais de origem holocnica, sendo depositados

    nas plancies aluviais nos ltimos 6,5 mil anos (Suguio & Tessler, 1984).

    O principal remanescente florestal sobre as plancies aluviais do Rio Doce encontra-se na Floresta

    Nacional de Goytacazes, sendo citada como o nico remanescente de Floresta Atlntica da Plancie

    Aluvial do Rio Doce (Rolim et al., 2006). A composio de espcies e caractersticas fitofisimicas

    encontrada sobre este tipo florestal apontada como semelhante s encontradas na Floresta de

    Tabuleiro (Rolim et al., 2006).

    Rolim et al. (2006) indica que a variao topogrfica observada nas margens do Rio Doce

    mnima, formando uma extensa plancie aluvial. Entretanto, podem ser observadas pequenas bacias

    de acmulo ao longo de vrios trechos as margens, propiciando mosaicos de umidade

    principalmente devido influncia do lenol fretico ou at mesmo das lagoas temporrias, onde

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    comum a ocorrncia de grandes cheias que se estendem por mais de 2 quilmetros de extenso

    sobre a plancie aluvial, havendo deposio de sedimentos nestas pocas.

    Esta floresta pode, ento, ser classificada como uma Floresta Estacional Semidecdua ribeirinha

    com influncia fluvial sazonal (Rolim et al., 2006), correspondendo Floresta Estacional

    Semidecidual Aluvial segundo a classificao do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica

    (IBGE) (Ve