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CULTURA 31lSegunda-feira, 25 de maio de 2009 l Jornal de Brasília Editor: Guilherme Lobão [[email protected]]. Subeditor: Gustavo Falleiros [[email protected]]. Fone: 3343-8059 Mande sua sugestão de pauta para o Jornal de Brasília: Nosso telefone é 3343-8051 , ou mande para o e-mail [email protected] . LANÇAMENTO Eterno Nelson Gonçalves divulgação DVD resgata um dos maiores cantores do País às vésperas dos 90 anos de seu nascimento Cristiano Bastos [email protected] Adelino Moreira. De fora da edição, ficou o pot-pourri que, originalmente, abria o es- petáculo: as clássicas Normalista-Maria Be- thânia-A Volta do Boêmio-Saudade – essa última, um samba-canção de Lupicínio Rodrigues. Na verdade, o maestro que regeu este número, no concerto da Globo, exigiu quantia milionária para liberar sua "prestigiosa" imagem. Isso explica porque o especial começa direto do samba O Dono das Cal- çadas", do xará Nelson Cavaquinho, que o compôs para o álbum Nelson Até 2001, editado em 1981. A mesma razão levou ao corte duas outras músicas: o dueto com Tim Maia, em Renúncia (primeiro sucesso re- tumbante do Metralha, de 1942), e a orquestral-pop Deusa do Amor, ao lado do amigo Lobão. No fim das contas, as perdas foram compensadas com uma apresentação no Fantástico, nos anos 70, na qual Nelson (trajado como gangster) seresteia com seu fiel escudeiro, Dino Sete Cordas. Dentro de um belíssimo enquadramento, os dois tocam A Volta do Boêmio, Folhas Mortas e Deusa do Asfalto. Certas imagens são precursoras da linguagem videoclíptica: caso da autobiográfica Auto-Retrato, por exemplo, cuja gravação traz de volta imemoriais tempos pré-MTV, nos anos 80. Contínua na página 32 A edição de Eternamente Nelson é histórica. Não apenas por ser o principal registro audiovisual do Rei do Rádio, mas por incrível coleção de extras e depoimentos reveladores do baluarte. No vídeo, Nelson detalha sua célebre fase junkie, entre o final dos anos 50 e meados dos anos 60: "Em casa, eu tinha guardado um quilo de pó", conta, de forma drástica e honesta, dentro de um ringue, seu habit fora do palcos Beirando os 60 anos, em 1981, quando Eternamente Nelson foi gravado, Nelson ainda cantava de maneira soberba – a voz, no auge da força e vigor. No show, que tem participações especiais do compositor Evaldo Gouvêa. Outra história desfiada por Nelson Gonçalves envolve o "cabeça-dura" Ary Barroso, irreverente autor de Aquarela do Brasil. No primeiro teste feito por Nelson, no Rio de Janeiro, nas ondas do radiofônico A Hora do Gongo, Barroso perguntou o que ele fazia em São Paulo: "Eu jogo boxe", respondeu o jovem Nelson. Ary aproveitou a deixa: "Então volta pra lá, vai jogar boxe, que tu não canta é nada!", enxotou. Felizmente, estava redondamente enganado. Cantor e compositor, Nelson Gonçalves (21-06-1919/18-04-1998) foi também jornaleiro, mecânico, polidor, tamanqueiro, engraxate, garçom e boxeador. Viveu a glória de ser coroado Rei do Rádio e o inferno do vício em cocaína. Apaixonado e lutador, tornou-se um dos personagens mais ricos da história brasileira. Nos cálculos dele próprio, da gravação de estréia – a valsa Se Eu Pudesse um Dia (outubro de 1941) – ao derradeiro CD Ainda é Cedo(1997), são mais de dois mil registros fonográficos. No Brasil, só perde para o mitólogico Roberto Carlos. Cancioneiro sulcado em 183 discos de 78 rotações, cem compactos, 200 fitas K-7 e 127 long-plays. Só o registro de A Volta do Boêmio vendeu dois milhões de exemplares. Algarismos que nem o colega de RCA, Elvis Presley, superou, com suas cerca de 1,6 mil canções e 63 álbuns. O ano é 1981. Soa o gongo. Nelson Gonçalves – o "Metralha", alcunha decorrente da fala rápida e entrecortada – galga a trote as escadarias que conduzem ao galante palco ilu- minado, sobre o qual cantará nos festejos de 40 anos de uma obra sem igual no Brasil. Quiçá, no mundo. As cinco frases enunciadas, na abertura do espetáculo Eternamente Nelson, resumem sua história nos palcos e na vida: "Meu nome é Antônio Gonçalves Sobral. Gaúcho de Livramento. Minha vida sempre foi uma luta. Minha arma, minha voz. Meu destino: cantar." O registro, filmado pela Rede Globo, há 28 anos, ganha lançamento póstumo, em DVD, pela Sony&BMG, que detém, atualmente, toda a fonografia de Nelson Gonçalves na extinta gravadora RCA Victor. O elegante especial, dirigido pelo ha- bilidoso Augusto César Vanucci (1934-1992), leva o subtítulo Especial e Registros Raros da Carreira de Nelson Gonçalves e encaixa-se nas prateleiras das lojas especializadas às vésperas dos 90 anos do seu nascimento: 21 de junho de 1919. O título justifica-se. Em meio às pérolas revolvidas, nos abissais arquivos da Globo, há duetos com Fafá de Belém (O Negócio é Amar), Alcione (Louco, Ela é seu Mundo) e Martinho da Vila (Lembranças); e cenas raras, como a homenagem prestada, no Fantástico, ao herói de Nelson: Orlando Silva, o Cantor das Multidões. O Rei do Rádio – como popularizou-se, a partir dos anos 40 –, pagou seu tributo a Orlando, falecido em 1979, cantando a Ultima Estrofe e Pedestal de Lágrimas, composições do parceiro

Eterno Nelson Gonçalves

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DVD resgata um dos maiores cantores do País às vésperas dos 90 anos de seu nascimento. Jornal de Brasília

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Page 1: Eterno Nelson Gonçalves

C U LT U R A31lSegunda-feira, 25 de maio de 2009 l Jornal de Brasília

Editor: Guilherme Lobão [[email protected]]. Subeditor: Gustavo Falleiros [[email protected]]. Fone: 3343-8059

Mande sua sugestão de pautapara o Jornal de Brasília:

Nosso telefone é 33 43 - 8 0 5 1 , ou mande parao e-mail c i d a d e s @ j o r n a l d e b ra s i l i a . c o m . b r .

L A N Ç A M E N TO

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� Cristiano Bastosc r i st i a n o . ba sto s @ j o r n a l d e b ra s i l i a . c o m . b r

Adelino Moreira. De fora da edição, ficou opot-pourri que, originalmente, abria o es-petáculo: as clássicas Normalista-Maria Be-thânia-A Volta do Boêmio-Saudade – essa última,um samba-canção de Lupicínio Rodrigues.

Na verdade, o maestro que regeu este número, noconcerto da Globo, exigiu quantia milionária paraliberar sua "prestigiosa" imagem. Isso explica porque oespecial começa direto do samba O Dono das Cal-çadas", do xará Nelson Cavaquinho, que o compôspara o álbum Nelson Até 2001, editado em 1981. Amesma razão levou ao corte duas outras músicas: o duetocom Tim Maia, em Renúncia (primeiro sucesso re-tumbante do Metralha, de 1942), e a orquestral-popDeusa do Amor, ao lado do amigo Lobão.

No fim das contas, as perdas foram compensadas comuma apresentação no Fantástico, nos anos 70, na qual Nelson(trajado como gangster) seresteia com seu fiel escudeiro, DinoSete Cordas. Dentro de um belíssimo enquadramento, os doistocam A Volta do Boêmio, Folhas Mortas e Deusa do Asfalto.Certas imagens são precursoras da linguagem videoclíptica:caso da autobiográfica Auto-Retrato, por exemplo, cuja gravaçãotraz de volta imemoriais tempos pré-MTV, nos anos 80.

Contínua na página 32

A edição de Ete r n a m e n te

N e l so n é histórica. Não apenaspor ser o principal registroaudiovisual do Rei do Rádio,mas por incrível coleção deextras e depoimentosreveladores do baluarte. Novídeo, Nelson detalha suacélebre fase junkie, entre ofinal dos anos 50 e meados dosanos 60: "Em casa, eu tinha guardado umquilo de pó", conta, de forma drástica ehonesta, dentro de um ringue, seu habit forado palcos

Beirando os 60 anos, em 1981, quando Ete r n a m e n teNelson foi gravado, Nelson ainda cantava de maneirasoberba – a voz, no auge da força e vigor. No show,

que tem participações especiais do compositorEvaldo Gouvêa.

Outra história desfiada por Nelson Gonçalvesenvolve o "cabeça-dura" Ary Barroso,irreverente autor de Aquarela do Brasil. Noprimeiro teste feito por Nelson, no Rio deJaneiro, nas ondas do radiofônico A Hora doGongo, Barroso perguntou o que ele fazia emSão Paulo: "Eu jogo boxe", respondeu o jovemNelson. Ary aproveitou a deixa: "Então voltapra lá, vai jogar boxe, que tu não canta énada!", enxotou. Felizmente, estavaredondamente enganado.

Cantor e compositor, Nelson Gonçalves(21-06-1919/18-04-1998) foi também jornaleiro,mecânico, polidor, tamanqueiro, engraxate, garçom e

boxeador. Viveu a glória de ser coroado Rei do Rádioe o inferno do vício em cocaína. Apaixonado elutador, tornou-se um dos personagens mais ricos dahistória brasileira.

Nos cálculos dele próprio, da gravação deestréia – a valsa Se Eu Pudesse um Dia(outubro de 1941) – ao derradeiro CD Ainda éCedo(1997), são mais de dois mil registrosfonográficos. No Brasil, só perde para omitólogico Roberto Carlos. Cancioneirosulcado em 183 discos de 78 rotações, cemcompactos, 200 fitas K-7 e 127 long-plays. Sóo registro de A Volta do Boêmio vendeu doismilhões de exemplares. Algarismos que nem ocolega de RCA, Elvis Presley, superou, comsuas cerca de 1,6 mil canções e 63 álbuns.

O ano é 1981. Soa o gongo. Nelson Gonçalves – o "Metralha",alcunha decorrente da fala rápida e entrecortada – galga atrote as escadarias que conduzem ao galante palco ilu-

minado, sobre o qual cantará nos festejos de 40 anos de uma obrasem igual no Brasil. Quiçá, no mundo. As cinco frases enunciadas,na abertura do espetáculo Eternamente Nelson, resumem suahistória nos palcos e na vida: "Meu nome é Antônio GonçalvesSobral. Gaúcho de Livramento. Minha vida sempre foi uma luta.Minha arma, minha voz. Meu destino: cantar."

O registro, filmado pela Rede Globo, há 28 anos, ganhalançamento póstumo, em DVD, pela Sony&BMG, que detém,atualmente, toda a fonografia de Nelson Gonçalves na extintagravadora RCA Victor. O elegante especial, dirigido pelo ha-bilidoso Augusto César Vanucci (1934-1992), leva o subtítuloEspecial e Registros Raros da Carreira de Nelson Gonçalves eencaixa-se nas prateleiras das lojas especializadas às vésperas dos90 anos do seu nascimento: 21 de junho de 1919.

O título justifica-se. Em meio às pérolas revolvidas, nosabissais arquivos da Globo, há duetos com Fafá de Belém (ONegócio é Amar), Alcione (Louco, Ela é seu Mundo) e Martinho daVila (Lembranças); e cenas raras, como a homenagem prestada, noFantástico, ao herói de Nelson: Orlando Silva, o Cantor dasMultidões. O Rei do Rádio – como popularizou-se, a partir dosanos 40 –, pagou seu tributo a Orlando, falecido em 1979, cantandoa Ultima Estrofe e Pedestal de Lágrimas, composições do parceiro