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FUNDAÇÃO ARMANDO ALVARES PENTEADO FACULDADE DE ECONOMIA EURO: DA CRIAÇÃO À CRISE NAYARA FURLAN ROCHA LEME Monografia de Conclusão de Curso apresentada à Faculdade de Economia para obtenção do título de graduação em Relações Internacionais, sob orientação do Prof. Eduardo Mekitarian. São Paulo, 2010

Euro: Da criação à crise Nome do Autor: Nayara Furlan Rocha

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FUNDAÇÃO ARMANDO ALVARES PENTEADO

FACULDADE DE ECONOMIA

EURO: DA CRIAÇÃO À CRISE

NAYARA FURLAN ROCHA LEME

Monografia de Conclusão de Curso apresentada à Faculdade

de Economia para obtenção do título de graduação em

Relações Internacionais, sob orientação do Prof. Eduardo

Mekitarian.

São Paulo, 2010

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FURLAN, Nayara R. Leme. EURO: DA CRIAÇÃO À CRISE. São Paulo, Fundação Armando Alvares Penteado, 2010, 81 p. (Monografia Apresentada ao Curso de Graduação em Relações Internacionais da Faculdade de Economia da Fundação Armando Alvares Penteado) Palavras-chave: Integração Europeia – Euro – Crise do Euro

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AGRADECIMENTOS

Ao excelente professor e orientador exemplar, Eduardo Mekitarian, que durante um

ano inteiro de trabalho sempre esteve à disposição para esclarecimentos, correções e apoio.

Obrigada pela confiança em mim depositada, desde o início, quando nos conhecemos nas

aulas do 7° semestre, e por ter participado ativamente da elaboração deste trabalho, do qual

tenho muito orgulho de ter concluído.

Agradeço à minha família, que de maneiras diversas, me apoiou e supriu as minhas

necessidades enquanto me dedicava ao desenvolvimento do trabalho. Tenho plena certeza de

que as orações a mim dirigidas, com carinho e amor, me protegeram e me ajudaram a chegar

até aqui. Obrigada!

Ao meu companheiro de todas as horas, André, por ter sido sempre tão prestativo e

compreensivo, até mesmo em meus piores momentos. Obrigada pelo tempo que dedicou me

ajudando, com detalhes tão importantes, e me completando com seus conhecimentos e amor.

Estendo também estes agradecimentos à sua família.

Aos amigos queridos que sentiram a minha ausência nos últimos meses e que me

desejaram inúmeras vezes: boa sorte. Obrigada pelas palavras de incentivo e por toda a

amizade.

Aos professores que marcaram a minha passagem pela faculdade: Mário Sacchi,

Álvaro Bado, George Landau, Paulo Dutra, Bichir, e também aos que não estão mais na

instituição, Caroline Freitas, Pedro Brasil e Guilherme Assis.

À Fundação Armando Alvares Penteado, pela estrutura oferecida e a todos os

profissionais sempre muito dedicados da Diretoria, do Apoio, da Sala de Monografia, da

Biblioteca, dos corredores, e especialmente à Fernanda Magnotta. Enfim, à faculdade como

um todo.

Por se tratar de um trabalho de conclusão de curso e, portanto, da finalização de uma

etapa importante da minha vida, estendo ainda estes agradecimentos a todas as pessoas que

me acompanharam durante estes quatro anos de constante aprendizagem e que contribuíram

para o meu desenvolvimento.

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RESUMO

Esta monografia versa sobre a história do Euro, desde sua criação até o os dias de hoje,

em que enfrenta sua primeira crise. Traz, portanto, toda a parte histórica referente à integração

do continente europeu que possibilitou a formação da União Europeia, reconhecida como a

maior área de integração regional do mundo.

Tem como objetivo destacar o assunto extremamente atual que é a crise do Euro, e

como a União Europeia tem lidado com os novos desafios. O trabalho destaca as falhas da

integração europeia e aponta as possíveis soluções.

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ABSTRACT

This essay deals with the history of the Euro, from its creation until today, when

Europe is facing her first Euro crisis. Bring therefore all the historic part on the integration of

the European continent that made possible the formation of the European Union, recognized

as the largest area of regional integration in the world.

Aims to highlight the Euro crisis, an extremely current issue, and how the EU has

dealt with the new challenges. This paper brings in evidence the European integration’s

failures and indicates the possible solutions.

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SUMÁRIO

Lista de Figuras

Lista de Quadros

Lista de Tabelas

Lista de Siglas

INTRODUÇÃO.........................................................................................................................1

1. A CRIAÇÃO DO SISTEMA DE BRETTON WOODS E SEU COLAPSO...........8

2. A ORIGEM DO EURO NA INTEGRAÇÃO EUROPEIA....................................18

3. A UNIÃO EUROPEIA E O EURO HOJE...............................................................34

3.1 A Origem da Crise do Euro.....................................................................................36

3.2 Os PIIGS.................................................................................................................37

3.2.1 Grécia..........................................................................................................39

3.2.2 Portugal.......................................................................................................43

3.2.3 Espanha.......................................................................................................45

3.2.4 Irlanda.........................................................................................................49

3.2.5 Itália............................................................................................................49

3.3 Problemas e Planos de Austeridade Ultrapassam os PIIGS...................................50

3.4 A França e o Caso da Reforma da Previdência......................................................53

3.5 O plano de Socorro e as Soluções Propostas Até Agora........................................56

CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................................68

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS................................................................................72

APÊNDICES............................................................................................................................I

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Posição das populações europeias em relação ao Euro...........................................28

Figura 2 – Indicadores dos 5 países mais vulneráveis da zona do Euro..................................38

Figura 3 – Projeção da dívida grega.........................................................................................40

Figura 4 – Greves e manifestações na Europa..........................................................................53

Figura 5 – As principais reformas da Previdência na Europa..................................................55

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Relação de Tratados da União Europeia................................................................33

Quadro 2 – Adesão dos países à União Europeia ao longo do anos.........................................33

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Performance macroeconômica antes e depois da introdução do Euro....................32

Tabela 2 – Comparação entre preços no mercado europeu.......................................................34

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LISTA DE SIGLAS

BCE – Banco Central Europeu

CCEE – Comissão para Cooperação Econômica Europeia

CECA – Comunidade Europeia do Carvão e do Aço

CE – Comunidade Europeia

CEE – Comunidade Econômica Europeia

CEEA – Comunidade Europeia do Átomo

C20 – Comitê dos Vinte

ECU – European Currency Unit

EFSF – European Financial Stability Facility

EURATOM – Comunidade Europeia do Átomo

FED – Federal Reserve

FME – Fundo Monetário Europeu

FMI – Fundo Monetário Internacional

GIP – Gold Import Point

GEP – Gold Export Point

IME – Instituto Monetário Europeu

NPE – Nova Política Econômica

OCDE – Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico

OECE – Organização Europeia de Cooperação Econômica

OIT – Organização Internacional do Trabalho

PEC – Pacto de Estabilidade e Crescimento

PESC – Política Externa e Segurança Comum

PIB – Produto Interno Bruto

SME – Sistema Monetário Europeu

TCE – Tratados de Roma

UE – União Europeia

UEME – União Econômica e Monetária Europeia

UFE – União Federalista Europeia

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INTRODUÇÃO

Conhece-se a União Europeia como sendo o modelo de integração regional de maior

sucesso. Alcançar os patamares já alcançados pela UE exige um alto grau de convergência de

interesses por parte de todos os membros; no caso da UE, os próprios interesses nacionais dos

Estados membros da União levaram à integração.

Para entender todo o processo de unificação da Europa é preciso analisar as teorias de

integração e as possíveis razões que motivam os países a se integrar e convergir nos interesses

nacionais. Os primeiros processos de integração podem ser datados entre 1812 e 1914, sendo o

mais significante deles a criação do Zollverein em 1833, que consistiu na abertura das fronteiras

de 18 Estados alemães e a adoção de uma pauta comum para as relações exteriores. Já mais

próximo da UE, o primeiro passo dado no sentido da integração foi a criação da organização

regional Benelux em 1944, envolvendo Bélgica, Holanda e Luxemburgo, formando uma união

aduaneira (HERZ e HOFFMANN, 2004)

Quanto à classificação das etapas de integração, não existe até o momento um consenso

entre os autores sobre o assunto. Pode-se destacar a classificação feita por B. Balassa que engloba

cinco fases distintas: zona de livre comércio, união aduaneira, mercado comum, união econômica

e integração econômica total e a classificação de R. Tamames composta, por sua vez, de quatro

fases: preferências aduaneiras, zona de livre comércio, união aduaneira e união econômica

(VIEIRA, 2004). Para Balassa a integração econômica total, que ele identifica como último

estágio da integração, pressupõe a unificação de políticas monetárias, fiscais e até sociais, e em

consequência disso exige a existência de uma autoridade supranacional (BALASSA, 1961 apud

VIEIRA, 2004).

De acordo com a proposta funcionalista de Mitrany (1946 apud HERZ e HOFFMANN,

2004) a cooperação está conectada à segurança internacional. Primeiramente, atos de cooperação

seriam firmados em áreas mais técnicas e específicas relacionadas às esferas econômica e social

para só depois atingir a esfera política ao criar valores comuns e atingir outras áreas; é o chamado

processo de spillover. A ideia do autor era a da criação de um sistema de paz onde o bem-estar

alcançado pela população não seria creditado ao Estado nacional, mas sim, à cooperação

internacional e aos seus benefícios. A aceitação dos Estados por esse modelo de cooperação, dar-

se-ia pelo fato de que as soberanias não seriam suprimidas, apenas uma parte da soberania de

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cada país passaria para uma autoridade central, mas nas decisões sobre política externa a

soberania individual pautaria o interesse nacional. Seguindo a linha do funcionalismo, surgiu o

neofuncionalismo. “(...) um conjunto de autores e líderes concluiu que o funcionalismo como

teoria e prática deveria ser reformulado e apropriado para a discussão sobre a natureza do

processo de integração em curso na Europa Ocidental” (HERZ e HOFFMANN, 2004). A nova

teoria ainda seguia o processo de spillover, ou seja, uma integração gradual através de setores

específicos tem a capacidade de se espalhar para novas áreas e setores e promover neles a

integração. O neofuncionalismo também propõe que a existência de órgãos supranacionais

confere um nível mais elevado de integração e cooperação aos Estados que se submetem a eles

(SARFATI, 2005).

Entre as razões que levam um grupo de países a se integrar estão contidas, além da

econômica, razões políticas e sociais. No caso específico da UE foram principalmente os motivos

políticos que levaram à criação da CEE.

Para analisar a fase mais profunda desse bem sucedido processo que é a integração

monetária, é preciso entender os motivos que levaram os países a optarem por esse caminho. A

decisão foi tomada com base no cenário mundial daquele momento e nos ensinamentos das

experiências passadas durante o período do padrão ouro com o câmbio fixo e após com o câmbio

flexível.

O padrão ouro foi um sistema de taxas de câmbio fixas que funcionou no mundo de 1880

até 1914 quando eclodiu a Primeira Guerra Mundial. Suas origens são da época em que as

moedas passaram a ser utilizadas como meio de troca, no mercantilismo.

Neste sistema o ouro era o único ativo das reservas internacionais, e cada nação era

responsável por estabelecer o conteúdo de ouro equivalente à sua moeda. Dessa forma, o

conteúdo de ouro de uma unidade de cada moeda era fixo, assim como as taxas de câmbio. Era o

chamado sistema de paridade da moeda, e nele as taxas de câmbio podiam flutuar dentro de uma

pequena margem acima e abaixo da paridade (SALVATORE, 1998). Era tarefa do Banco Central

de cada país garantir a paridade de sua moeda com o ouro e para tanto precisavam ter a

quantidade suficiente da moeda em estoque (KRUGMAN, 2005).

Foi através de David Hume em 1752 que o mundo conheceu o sistema que ele denominou

de fluxo-espécie-preço. O mecanismo explicado por Hume para se contrapor às ideias

mercantilistas assumia que o sistema do padrão ouro possuía um ajuste automático e que os

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superávits contínuos no balanço de pagamento dos países, pregado pelos mercantilistas, não era

eficiente. Hume explicou através de seus argumentos que a acumulação de capitais tão

perseguida pelos mercantilistas afetava a oferta interna da moeda e consequentemente elevava os

preços e os salários internos, causando inflação. Além disso, o aumento nos preços internos e nos

salários ocasionava ao país perda de competitividade externa o que dificultava a obtenção de

excedentes comerciais.

O mecanismo monetário internacional fluxo-espécie-preço baseava-se em duas premissas

básicas da Teoria Quantitativa da Moeda. Para resolver o problema entre um país superavitário e

um deficitário apenas o ouro das reservas internacionais seria o suficiente. Suponha-se que os

Estados Unidos estão em déficit enquanto que a Ingleterra está em superávit. Para equilibrar os

balanços de pagamentos de ambos os países os Estados Unidos devem exportar ouro para a

Inglaterra, enquanto esta exporta seus bens e serviços para os Estados Unidos. Ao realizar a saída

de divisas, os Estados Unidos sofrem uma queda em suas reservas e consequentemente na sua

oferta interna de moedas. O momento que se segue é de forte pressão sobre os preços internos

que caem e levam à depreciação cambial. Com a depreciação o país ganha competitividade, passa

a exportar mais do que importar e em resultado reduz seu déficit. Do outro lado da balança, a

Inglaterra vai receber as divisas e aumentar suas reservas. Ao contrário do que acontece nos

Estados Unidos, o país passa por um aumento na oferta monetária, e a pressão sobre os preços faz

com que eles subam e assim ocorre a apreciação cambial. Em decorrência da apreciação o país

perde competitividade, suas exportações diminuem, enquanto as importações crescem e o

resultado final é a redução do superávit inicial. Então, como resultado deste mecanismo, se obtém

o equilíbrio entre os balanços de pagamentos dos dois países.

Como mencionado anteriormente, as taxas de câmbio que vigoraram neste sistema, eram

fixas, uma vez que as moedas equivaliam a um conteúdo fixo de ouro. Mesmo assim, havia uma

margem pequena de flutuação, devida aos preços de importação e exportação do ouro chamados

de gold importing point (GIP) e gold exporting point (GEP) respectivamente.

Apesar de existir um mecanismo de ajuste no sistema do padrão ouro, muitos dos ajustes

não ocorreram de acordo com suas regras. Basicamente foram os países em déficit que arcaram

com as consequências de equilibrar todo o sistema, enquanto os países em superávit adotavam

uma postura menos rígida em relação às suas políticas monetárias (KRUGMAN, 2005). Mesmo

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assim, o sistema funcionou tranquilamente por cerca de 30 anos, e de acordo com Salvatore

(1998) isso só foi possível devido às condições especiais durante o período.

Foi um período de grande expansão econômica e estabilidade na maior parte do mundo. A libra esterlina era a única moeda internacional importante, e Londres, o único centro monetário internacional. Por esses motivos, não poderiam existir falta de confiança na libra e trocas para outras moedas e outros centros monetários rivais. Havia maior flexibilidade de preços do que nos dias de hoje, e as nações subordinavam o equilíbrio interno ao externo. Em tais circustâncias, qualquer sistema monetário internacional teria atuado de maneira razoavelmente tranquila (SALVATORE, 1998:391).

O mundo viu o fim do padrão ouro clássico em 1914, quando teve início a Primeira

Guerra Mundial e o câmbio flutuante foi adotado. Durante o episódio, ficou claro que a ideia

aplicada até aquele momento de que o ajuste no balanço de pagamentos dos países ocorria de

forma automática, não era real. Os principais países participantes da guerra passaram a emitir

moeda quase que sem controle com o objetivo de financiar seus gastos militares; os resultados da

guerra e das emissões desenfreadas trouxeram problemas graves à economia como o elevado

nível de preços e a consequente inflação. A Alemanha e outros países da Europa Central foram os

mais atingidos pela inflação, sendo o caso da hiperinflação alemã o mais comentado e

impressionante. De acordo com Krugman, o índice de preços do país passou de 262 em 1919 para

126.160.000.000.000 em 1923. Grande culpa disso é imposta ao Tratado de Versalhes que

condenou a Alemanha a enormes indenizações (KRUGMAN, 2005)

A situação econômica pouco agradável que se seguiu, fez com que os países desejassem o

retorno do padrão ouro principalmente devido à sua estabilidade. A guerra terminou em 1918, e o

primeiro país a retornar ao antigo padrão foram os Estados Unidos logo em 1919. Em 1922, a

Conferência de Gênova, que reuniu Itália, Grã-Bretanha, França e Japão, reconheceu o problema

de a disponibilidade total do ouro não ser suficiente e optou por um padrão câmbio-ouro, o que

significa que tanto o ouro quanto as moedas conversíveis em ouro serviram como reservas

internacionais (KRUGMAN, 2005). No entanto, em 1925, a Grã-Bretanha com o ministro da

Fazenda Winston Churchill retornou ao conhecido padrão ouro e reestabeleceu a conversibilidade

de sua moeda, a libra, ao preço do ouro vigente antes da guerra. Aos poucos, os outros países

também retornaram ao padrão ouro, mas não deram a devida atenção à nova situação e nem se

atentaram para o que outros países estavam estabelecendo (KENEN, 1998).

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Segundo Salvatore (1998), O fato de o sistema funcionar mais como um padrão ouro-

câmbio do que como o padrão ouro clássico, diminuiu substancialmente a quantidade de ouro no

comércio mundial. “Naquela época, a substituição do ouro por moedas foi vista como um modo

de reduzir a dependência que o sistema monetário possuía da oferta de ouro, mas acabou sendo

uma grande falha do sistema” (KENEN, 1998:507).

Ao fim da década de 1920, já com a Inglaterra estagnada, o mundo enfrentou a grande

depressão ocasionada a partir da quebra da bolsa de Nova York no ano de 1929. A crise alastrou-

se por todas as partes e os países endividados por causa da guerra não mais pagaram seus

empréstimos por não terem na verdade de quem tomar emprestado. O pânico prosseguiu e

resultou no fim do padrão ouro primeiramente por parte da Inglaterra em 1931 e outros países na

sequência. Em 1934, de volta ao padrão ouro de que haviam saído um ano antes, os Estados

Unidos desvalorizaram o dólar em 70% e estabeleceram um novo preço para o ouro, passando de

US$ 20,67 para US$ 35,00 a onça (KENEN, 1998).

As medidas tomadas pelos países para enfrentar a depressão repercutiram em custos

significativos à economia global. Até 1939 muitos ainda se encontravam afundados em dívidas,

graças aos profundos cortes nas relações comerciais que prometiam melhora. Ao ficar claro que a

nova postura não trazia benefícios, o comércio internacional livre foi cotado como possível

solução e o fato foi essencial para estabelecer o sistema monetário internacional que seria

implementado no pós-guerra: o acordo de Bretton Woods (KRUGMAN, 2005).

A conferência de Bretton Woods veio então em resposta ao complicado período das

décadas de 20 e 30 em que os países do mundo todo enfrentaram complicações no sistema

monetário internacional. O histórico das negociações, os resultados, suas implicações e seu

posterior colapso serão o assunto do primeiro capítulo deste trabalho.

Em seguida, o segundo capítulo tratará da criação da União Europeia. Serão abordadas

todas as fases da integração, desde o nascimento das primeiras ideias até a conclusão da

integração monetária com a implantação da moeda única, os passos dados em direção à formação

do mercado comum, os países favoráveis à unificação e os contrários, as dificuldades enfrentadas

para se concluir o ambicioso plano, e os primeiros resultados sentidos.

Ficará claro ao longo do capítulo que o processo de integração da Europa foi desde seu

início um movimento crescente e dinâmico e ainda o é até hoje. Os altos e baixos das

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negociações foram necessários para que se chegasse à melhor solução que de início tinha como

principal objetivo constituir uma força econômica estável para depois, no começo dos anos 1980,

enfrentar Estados Unidos e Japão na área comercial.

Também serão destaque as vantagens e a importância da unificação para as populações

europeias que antes tinham em comum apenas suas fronteiras, mas que hoje são consideradas

uma única Europa tendo o idioma como principal e quase que exclusivo diferencial para os que a

veem de fora. Os fatores que diferenciam franceses de alemães sempre existiram e ainda

permanecem; o ponto chave para a unificação total ter obtido sucesso foi que as próprias

populações entenderam que seria possível realizá-la sem deixar de lado suas características

nacionais – “o nacionalismo econômico não vai conseguir modificar o cultural” (SILVA e

SJOGREN, 1991:79). Ou seja, apesar de políticas iguais em muitas áreas, franceses continuaram

franceses, alemães continuaram alemães e hoje todos circulam livremente pelo continente e

grande parte divide uma mesma moeda, o que trouxe facilidade para suas vidas. Silva e Sjogren

(1991:78) definem da seguinte forma: “A unificação pode envolver uma euromoeda, eurobancos,

euroleis, mas as ‘McEuro’ vão vender sanduíches ingleses, franceses, gregos e holandeses”.

A realidade hoje para os cidadãos dos países que compõem a União Europeia é o Euro.

Fazer parte de uma união econômica e monetária, há tanto esperada e planejada, traz expectativas

a cada uma das populações que traz o Euro nos bolsos. Será que tais expectativas foram

realmente alcançadas após 11 anos da criação da moeda? Existem arrependimentos entre os

países que optaram por fazer parte da união monetária? E quanto ao projeto, existem falhas? E

diante de problemas, quais as soluções propostas pela UE? O terceiro e último capítulo ocupar-

se-á da situação mais atual e responderá a estas perguntas, mostrando o presente das economias

que compartilham o Euro.

A União Europeia recebeu grande destaque ao ser criada e em sequência aconteceu o

mesmo com a criação do Euro e sua implantação. Hoje a UE e o Euro estão mais uma vez em

destaque ao redor do mundo, porém, não mais por sua inovação e sucesso. As notícias atuais

tratam da crise que atingiu aquele continente e que preocupa governos bem posicionados na lista

das maiores economias mundiais. Os cinco países, adotantes do Euro, que se encontram em

situação mais delicada já são inclusive classificados através do acrônimo PIIGS, dando um tom

pejorativo a Portugal, Itália, Irlanda, Grécia e Espanha (Spain em inglês).

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O caso trouxe à luz críticas feitas anteriormente que apontavam falhas na criação da união

econômica e monetária. Estas falhas poderiam ter sido minimizadas e até mesmo solucionadas ao

longo dos anos em que o Euro está em circulação; não foi o caso. E agora? A União Europeia

recorrerá à ajuda externa, demonstrando suas fraquezas ou, reencontrará sozinha o caminho do

sucesso? O capítulo irá apontá-las em paralelo ao relato da situação atual dos países da zona do

Euro.

Após esta introdução sobre a economia mundial no momento anterior à Conferência de

Bretton Woods e a breve explanação dos capítulos que virão a seguir, vale ressaltar que a

relevância deste trabalho está relacionada principalmente ao processo de integração mais

completo da atualidade e possivelmente da história da humanidade. Analisar a União Europeia e

estudar seu modelo de integração, incluindo todas as suas fases, sucessos, dificuldades e

problemáticas ajuda a compreender outros processos de integração regional que ainda estão em

andamento, como o caso mais próximo do Brasil, o Mercosul. Especialmente hoje, devido à crise

que enfrenta, a UE traz-nos lições do que deixou de ser feito e que acabou dificultando seu pleno

sucesso.

Por ser o processo de integração mais completo de que se tem conhecimento, a UE

merece a atenção do campo acadêmico. Seu grande diferencial está em sua última fase: a adoção

da moeda única acompanhada de uma única política monetária para todos os membros. Alterar o

sistema monetário de um país não é uma tarefa simples e exige intensos esforços dos que se

dispõem a integrar o novo sistema; afinal, os maiores obstáculos encontram-se internamente.

Para países que já enfrentaram reformas monetárias, como o Brasil, a população está de

certa forma acostumada, pois em poucos anos passou por três sistemas monetários antes de

chegar ao atual. Já para os europeus a mudança foi uma novidade completa e apresentou o fator

dificultador de modificar não apenas o sistema monetário de um país, como no nosso caso, mas

sim, de várias economias distintas e governos com políticas fiscal e monetária diversas, além de

diferentes interesses nacionais e características culturais muito distintas.

Portanto, entender os passos que foram dados visando ao objetivo final de unificar as

moedas, as dificuldades pelas quais passaram os países participantes, as consequências advindas

da implantação e os sucessos alcançados até o momento presente, bem como os erros cometidos

que culminaram na crise atual, torna-se relevante, e foi o tema escolhido para este trabalho.

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1. A CRIAÇÃO DO SISTEMA DE BRETTON WOODS E SEU COLAPSO

A hegemonia britânica que havia chegado ao fim praticamente com o início da Primeira

Guerra Mundial, deu lugar, ao longo dos anos, à hegemonia dos Estados Unidos que,

aproveitando-se dos estragos da guerra, se posicionaram como credor internacional

transformando-se em um novo poder econômico do mundo. No período, porém, entre guerras e

principalmente no final dos anos 1920, os Estados Unidos optaram por não atuar como este poder

econômico dominante, apesar de já o serem, e ficaram voltados mais para dentro praticamente,

ignorando os problemas que atingiam a quase totalidade dos países. Em relação ao

posicionamento dos Estados Unidos frente à grande depressão, Edward M. Bernstein declarou

que: “(...) Os Estados Unidos, que poderiam ter assumido a liderança numa ação solidária,

estavam desatentos aos perigos de uma deflação mundial e preocupavam-se mais com sua

economia doméstica do que com a economia mundial” (BERNSTEIN apud MOFFITT, 1984:18).

No começo dos anos 1940, porém, o Reino Unido, através dos consultores de política

externa de Roosevelt, soube que o isolamento dos Estados Unidos não perduraria por muito mais

tempo, pois não havia outra escolha para eles a não ser colocar-se à frente da formulação da nova

ordem econômica mundial pós Segunda Guerra (MOFFITT, 1984). Entre 1940 e 1941, ambos os

países deram início ao desenvolvimento dessa possível nova ordem monetária, mas a

concretização dos planejamentos só se deu em julho de 1944, quando representantes de 44 países,

totalizando 730 delegados, se reuniram na cidade de Bretton Woods, New Hampshire na

conferência que levou o nome da cidade. O objetivo central da Conferência de Bretton Woods era

criar mecanismos que futuramente evitassem os principais problemas sofridos no período entre

guerras, como a falta de liquidez e a desorganização do comércio mundial.

Na ocasião foram apresentadas duas propostas. A primeira delas idealizada por John

Maynard Keynes, homem de renome da teoria econômica, representando o Reino Unido, e a

segunda chefiada por Harry Dexter White, economista do Tesouro, representando os Estados

Unidos. O debate entre Keynes e White esteve fundamentado em importantes diferenças contidas

em seus planos. A proposta de Keynes trazia como um dos pontos principais a criação de um

organismo financeiro internacional que o próprio Keynes denominou de Câmara de

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Compensações Internacionais e que funcionaria nos moldes de um banco central com caráter

mundial e teria como função supervisionar o balanço de pagamentos dos países e regular a

liquidez mundial. Além disso, o organismo seria o responsável pela emissão de uma nova moeda

intitulada “bancor” que serviria para o acerto de contas entre países deficitários e superavitários.

A ideia de Keynes ao criar tal organismo era a de que, ao estabelecer uma única moeda para

liquidar as contas de um país em relação a outro, não haveria mais desequilíbrios. Entre os outros

pontos da proposta de Keynes estavam intervenções dos bancos centrais dos países com a

finalidade de regular as taxas cambiais e inibir flutuações exageradas, valorizações das moedas

dos países credores e desvalorizações das moedas dos países devedores e a divisão do peso das

medidas de correção entre países credores e devedores. Já a proposta de White estabelecia o dólar

norte-americano como a principal moeda do sistema internacional, garantindo assim a sua

conversibilidade em ouro ao preço de US$35,00/onça, um sistema de câmbio fixo das moedas

dos outros países em relação ao dólar, permitindo pequenas flutuações de até 1% acima e abaixo

do estabelecido, criação de um fundo de estabilização para a resolução dos problemas de curto

prazo do balanço de pagamentos e para os problemas de longo prazo a criação de um banco de

reconstrução visando primeiramente à Europa.

A principal diferença entre os planos dos dois especialistas “estava nas obrigações que

eles impunham aos países credores na flexibilidade das taxas de câmbio e na mobilidade do

capital por eles admitidas” (EICHENGREEN, 2000:135). Enquanto o plano de Keynes

trabalhava com um sistema cambial flutuante, permitindo aos países alterar suas taxas de câmbio

se necessário, o de White tinha sistema cambial fixo. O banco de reconstrução proposto por

White previa a adoção de políticas austeras aos países que tomassem crédito, enquanto a Câmara

de Compensações de Keynes praticamente não previa limites para o empréstimo de “bancores”,

o que na visão da comissão norte-americana, com razão, estimularia o endividamento. Por último,

as valorizações e desvalorizações das moedas contidas na proposta de Keynes desagradaram aos

Estados Unidos profundamente, uma vez que eram os maiores credores mundiais e, portanto,

sofreriam desvalorizações contínuas, além de o mecanismo ser prejudicial aos investimentos e ao

comércio internacional.

Após os debates, com algumas alterações, a proposta norte-americana de Harry Dexter

White foi a escolhida para vigorar como a nova ordem monetária mundial, e nada proposto por

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John Maynard Keynes foi implantado. A escolha, além de consagrar os Estados Unidos como o

poder hegemônico, consagrou também o dólar como a moeda dominante do sistema.

Como parte da proposta norte-americana foram criadas as instituições que serviriam de

base para o novo sistema monetário internacional. A primeira delas, o Fundo Monetário

Internacional (FMI), nasceu com três objetivos principais: supervisionar o balanço de

pagamentos dos países, coordenar as paridades monetárias e fornecer recursos aos países com

desequilíbrios temporários no balanço de pagamentos. Um dos requisitos para que o FMI

cumprisse suas tarefas era exatamente o que já havia proposto White: taxas de câmbio fixadas em

dólar. A opção por um sistema cambial fixo foi feita com base nos anos anteriores. “Certos ou

errados, os criadores do Fundo estavam convencidos, devido à experiência do período entre

guerras, de que as taxas de câmbio flutuantes provocavam instabilidade especulativa e eram

prejudiciais ao comércio internacional” (KRUGMAN, 2005:407). Ainda de acordo com

Krugman, além da escolha pela paridade fixa para combater as dificuldades do passado, os

artigos do Acordo do FMI continham medidas com vistas a combater a instabilidade financeira, a

instabilidade dos níveis de preço, o desemprego e a desintegração econômica internacional.

Para conseguir atuar com sucesso e ser aceito pelos países o FMI precisou se fixar-se,

como bem apontou Krugman (2005), em uma mistura entre disciplina e flexibilidade. Disciplina

para fazer com que os países cumprissem suas regras e flexibilidade para não prejudicá-los a

alcançarem o equilíbrio interno no favorecimento do equilíbrio externo. Para garantir a

flexibilidade o FMI implantou as facilidades de crédito e as paridades ajustáveis. A primeira diz

respeito ao modo como o FMI realiza seus empréstimos; cada país, ao ingressar no Fundo, obtém

uma cota de contribuição que consiste em um quarto de ouro e três quartos em moeda do próprio

país. São estes recursos, captados através das cotas, que permitem ao FMI emprestar aos países

membros em desequilíbrio. As paridades ajustáveis estão relacionadas às possíveis alterações nas

taxas de câmbio, mesmo elas sendo fixas, se assim o FMI autorizar, por razão de um

‘desequilíbrio fundamental’ no balanço de pagamentos. Por ‘desequilíbrio fundamental’

entendem-se alterações internacionais adversas e permanentes que prejudicam a demanda por

produtos de determinados países e consequentemente prejudicam o balanço de pagamentos. Os

países identificados com este problema e autorizados pelo FMI poderiam realizar valorizações ou

desvalorizações na moeda nacional em relação ao dólar para evitarem o aumento do desemprego

e do déficit nas transações correntes (KRUGMAN, 2005).

Page 21: Euro: Da criação à crise Nome do Autor: Nayara Furlan Rocha

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Dentre as cláusulas do acordo estava a exigência de que os países tornassem suas moedas

nacionais conversíveis em ouro o quanto antes, para que todo o comércio internacional

funcionasse com mais facilidade. Havia também uma segunda opção: fixar as moedas nacionais

em relação ao dólar, com o câmbio fixo de US$ 35,00 a onça; a conversibilidade referia-se à

aceitação e liquidez internacional para facilitar os movimentos de capital e comércio. Quando

todas as moedas nacionais tivessem a sua conversibilidade instaurada, uma transação comercial

ocorrida, por exemplo, entre Holanda e França em que uma das partes receberia o pagamento em

moeda nacional do outro país, não seria problema, pois esta moeda poderia ser facilmente

utilizada para qualquer outra transação de conta corrente, bem como ser vendida para o banco

central do país que a recebeu para posteriormente ser convertida em moeda nacional ou até

mesmo em dólares. Apesar da recomendação de que a conversibilidade deveria ser feita

imediatamente, a total conversibilidade das moedas dos países europeus só ocorreu em 1958. O

principal motivo para o processo ter ocorrido mais lentamente do que o solicitado foi em razão da

Inglaterra que adotou a conversibilidade em 1947 e logo a cancelou, devido à grande corrida por

parte dos outros países que sacaram tudo o que tinham depositado em Londres para comprar

dólares (KENEN, 1998).

A vigência das regras impostas por Bretton Woods teve continuidade, e a situação do

mundo passou à seguinte: dólar como a principal moeda do comércio internacional e por ter sido

a primeira a se tornar conversível em ouro também passou a exercer o papel de unidade de conta

e de reserva de valor; os Estados Unidos como a economia mais forte do mundo exercendo o

papel de credores para a reconstrução da Europa e Japão, então devastados pela guerra; muitos

países com economias mais fracas e também prejudicados pela guerra apresentando déficits nas

contas correntes, e corrida pela compra de dólares por praticamente todos os países, uma vez que

a maioria dos serviços e também mercadorias eram importados dos Estados Unidos. Toda essa

nova situação que perdurou por anos se transformou no período de escassez de dólares e levou

preocupação aos Estados Unidos que passaram a conviver com excedentes comerciais.

Em busca de uma solução para os problemas do comércio mundial que naquele momento

prejudicavam inteiramente o maior produtor do mundo, em 1948 foi lançado o Plano Marshall. O

plano, apresentado por Truman, consistiu em doações de dólares para o Japão e para a Europa

que não tinha mais condições de bancar os financiamentos para sua reconstrução e

consequentemente em breve estaria falida e sem capacidade de comprar dos Estados Unidos que

Page 22: Euro: Da criação à crise Nome do Autor: Nayara Furlan Rocha

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entrariam em recessão. De acordo com o professor Block: “O Plano Marshall só se tornou

possível com a deteriorização do clima político internacional em 1947. Sem a intensificação da

Guerra Fria, seria impossível vislumbrar o envio ao Congresso de tão maciço programa de ajuda”

(MOFFITT, 1984:26).

A duração do plano não foi tão longa, mas os recursos enviados ultrapassaram em grande

escala os valores que o FMI e o Banco Mundial poderiam ter oferecido em conjunto no mesmo

período. Entre 1948 e 1952 foram enviados mais de US$12 bilhões aos países da Europa e ao

Japão. Foi através do Plano Marshall que a escassez de dólares foi resolvida e que a Europa

começou a se recuperar (MOFFITT, 1984).

Além de dar início à recuperação europeia, o Plano Marshall contribuiu em três pontos

principais para a Europa: possibilitou a compra de bens de capital e de matérias-primas

necessários para reaquecer as indústrias, levou ao fim os controles sobre o comércio e

pagamentos que visavam a conservar os dólares, permitindo assim o aumento do comércio intra-

europeu e, por fim, ajudou a adquirir reservas tanto em ouro como em dólares (KENEN, 1998).

Ao final dos anos 50, já não havia mais o problema da escassez de dólares; pelo contrário,

agora o problema estava em seu excesso. Robert Triffin, foi o primeiro a detectar que os

contínuos déficits no balanço de pagamento dos Estados Unidos não funcionariam para sempre

como fonte de moeda internacional, enquanto o dólar estivesse atrelado ao ouro. O chamado

“dilema de Triffin”, como ficou conhecido, foi a primeira constatação de que o sistema criado em

Bretton Woods era fraco e que não daria conta de uma nova escassez de dólares. (MOFFITT,

1984). Foi exatamente neste ponto da história que o Sistema de Bretton Woods passou a se

enfraquecer. Em 1959, os Estados Unidos já não possuíam mais grandes reservas de ouro como

na criação do sistema em que eram detentores de 70% do ouro mundial; o que possuíam nesse

ano era insuficiente para garantir toda a conversibilidade de dólares.

Essa nova realidade, apoiada no “dilema de Triffin”, deu origem à crise de confiança do

dólar. Os países detentores de grandes quantias de dólares começaram a perceber que os Estados

Unidos talvez não fossem capazes de garantir a conversibilidade de dólares em ouro, se todos

decidissem realizá-la, e a desconfiança gerou uma crise monetária internacional. Acreditava-se

que os Estados Unidos desvalorizariam sua moeda a qualquer momento para combater o déficit

em transações correntes, o que deixaria a maioria dos países em situação complicada. Devido à

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especulação, o preço do ouro subiu para US$40,00/onça, e o presidente Kennedy, recém eleito

nos Estados Unidos, precisou prometer que seu país manteria o lastro do dólar em ouro

(MOFFITT, 1984). Essa primeira corrida ao ouro ficou conhecida como o primeiro movimento

especulativo contra o dólar, em que praticamente todos os países optaram por converter grande

parte de suas reservas em dólares para ouro.

A década de 60 não trouxe uma solução definitiva ao problema, e, apesar de relativa

calmaria entre 1961 e 1965, a situação foi-se deteriorando cada vez mais com o estoque norte-

americano de ouro acabando e os déficits crescendo. O problema no balanço de pagamentos dos

Estados Unidos pode ser entendido pelo ressurgimento das economias europeias e japonesa na

disputa por mercados, o que desestabeleceu a supremacia dos Estados Unidos e pelos imensos

gastos militares devido à Guerra do Vietnã que contribuiu com bilhões para o déficit (MOFFITT,

1984). A manutenção da desconfiança e a falta de solução geraram o segundo movimento

especulativo contra o dólar no final dos anos 60, tendo a França de Charles De Gaulle na

dianteira, que, além de correr para trocar seus dólares por ouro, exigiu que todos os déficits com

seu governo fossem saldados em ouro, pois a intenção era ter em suas reservas apenas ouro e não

mais dólares.

A situação de corrida ao ouro não era mais sustentável, e em março de 1968 os bancos

centrais europeus criaram um mercado duplo de ouro (Two Tier Agreement) que contemplava um

preço oficial de US$35,00/onça utilizado para transações entre bancos centrais e um preço livre

utilizado por negociadores privados (KRUGMAN, 2005). Frente às especulações e às

movimentações de países importantes na economia mundial, o então presidente norte americano

em 1971, Richard Nixon, fortemente influenciado pelo secretário do Tesouro John Connally, foi

à televisão e decretou unilateralmente importantes mudanças que mexeram com o mundo todo.

Primeiramente congelou salários e preços, reduziu gastos públicos e impostos de modo a

estimular o emprego e reduzir a inflação, depois sobretaxou em 10% todas as importações norte-

americanas como saída para forçar seus parceiros comerciais a desvalorizarem suas moedas em

relação ao dólar e, para completar, a medida mais grave de todas: colocou fim à conversibilidade

do dólar em ouro.

A mudança que ficou conhecida como a Nova Política Econômica (NPE) foi duramente

criticada, e o presidente Nixon juntamente com John Connally foram os responsabilizados. Em

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dezembro do mesmo ano, após longas reuniões de negociações, foi assinado, em dezembro de

1971, o Acordo de Washington no Smithsonian Institution, que retirou a sobretaxa de 10% das

importações em troca do realinhamento da taxa de câmbio que obrigou principalmente a moeda

alemã e a japonesa a se valorizarem, o que consequentemente desvalorizou o dólar em uma

média de 8%. Ainda na reunião ficou acertado o novo preço oficial do ouro em US$ 38,00/onça e

confirmado que os Estados Unidos não mais venderiam ouro aos bancos centrais estrangeiros

(KENEN, 1998; MOFFIT 1984; EICHENGREEN, 2000).

Richard Nixon, dando créditos a si mesmo, declarou que o Acordo de Washington ficaria

marcado como ‘o acordo monetário mais significativo na história mundial’. Sua vontade durou

pouco mais de um ano, e em fevereiro de 1973 teve início um novo ataque especulativo ao dólar

que exigiu uma desvalorização complementar de 10%. Durante este novo movimento

especulativo, os mercados de câmbio foram fechados por duas vezes, sendo a última em 1° de

março e sua reabertura apenas no dia 19 do mesmo mês com a moeda japonesa e as seis

principais moedas europeias flutuando juntas em relação ao dólar, no que ficou conhecido como a

‘serpente monetária’. De início pensou-se que a flutuação das taxas de câmbio era apenas

temporária, mas o que, de fato, aconteceu foi que as mudanças do começo de 1973

permaneceram e não permitiram mais o retorno do câmbio fixo, dando início ao colapso do

sistema monetário internacional criado em Bretton Woods (KRUGMAN, 2005; KENEN, 1998).

De acordo com Kenen (1998), a partir daí as décadas de 70, 80 e início da década de 90

ficaram marcadas por tentativas de juntar os pedaços do sistema monetário internacional. No

decorrer dos anos 70, a frente europeia e a norte-americana desentenderam-se constantemente.

Ambas defendiam um sistema mais simétrico, mas discordavam na ideia dessa simetria.

Ainda de acordo com Kenen, em 1972 foi criado o Comitê dos Vinte (C20) para

representar o interesse de todos os países participantes do FMI. O Comitê tentou formular uma

proposta de reforma para o sistema de paridades cambiais; porém, dois anos depois seus trabalhos

foram encerrados sem qualquer sucesso. Seu fracasso deu-se não apenas pelas opiniões

divergentes de reforma entre os grupos de países como pelo acontecimento de eventos

internacionais importantes como o primeiro choque do petróleo em 1973 e todos os problemas

que o seguiram.

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A forte recessão sofrida pela economia mundial provocada pela queda do consumo e

diminuição dos investimentos, ambos resultados do aumento no preço do petróleo de US$ 3,00

para US$ 12,00/barril, causou o fenômeno da estagflação que é a combinação da estagnação do

PIB com alto índice de inflação. A decisão de grande parte dos países frente ao problema foi

adotar políticas monetária e fiscal expansionistas, o que permitiu aos países industrializados

retornarem ao equilíbrio logo em 1976. Krugman (2005) afirma que a escolha pelas taxas de

câmbio flutuantes foi o que proporcionou a melhora.

O período inicial das taxas flutuantes deu ao dólar uma valorização importante em relação

às principais moedas mundiais, o que permitiu aos Estados Unidos se recuperarem da recessão

com mais rapidez do que Alemanha e Japão. Tal vantagem, porém, transformou-se em problema,

quando as outras economias demoraram demais para reagir, o que elevou os preços norte-

americanos fazendo o país perder competitividade e encarar déficits em conta corrente logo no

ano de 1977. O dólar, portanto, enfraqueceu-se e a medida tomada pelos Estados Unidos no ano

seguinte foi unir-se ao Japão e à Alemanha para a adoção de políticas expansionistas, visando a

retirar a economia mundial da recessão. Além disso, para restabelecer a confiança no dólar o

então presidente norte-americano Jimmy Carter escolheu Paul Volcker para a presidência do

Federal Reserve que reajustou com rigor e de maneira restritiva a política monetária do país.

Em 1979 mais um evento internacional de grandes proporções atrapalhou a reestruturação

do sistema monetário mundial. O segundo choque do petróleo provocado pela queda do xá do Irã

elevou os preços do barril de US$ 13,00 para US$ 32,00 e os países importadores viram-se mais

uma vez de frente com a estagnação e a elevada inflação. Diferente do que ocorreu depois do

primeiro choque, no segundo as medidas adotadas pelos países foram restritivas ao crescimento

monetário, uma vez que o combate à inflação era prioritário.

A adoção, em 1973, das taxas de câmbio flutuantes devido ao problema da estagflação foi

o início do fracasso do Sistema Monetário de Bretton Woods. De acordo com Eichengreen (2000)

o evento é considerado um divisor de águas ainda mais importante do que quando houve a

reconstrução do padrão ouro em 1925 ou quando a conversibilidade foi reinstaurada em 1958.

“(...) o fim de Bretton Woods transformou as questões monetárias internacionais” (2000:183).

Enquanto países como Estados Unidos e Japão adotaram o câmbio flutuante logo no

começo das transformações, os países em desenvolvimento optaram pelo estabelecimento do

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câmbio fixo; porém, não aguentaram por muito tempo manter a escolha, uma vez que ao não

liberalizarem seus mercados financeiros estavam perdendo investidores estrangeiros e

prejudicando sua economia. Então, aos poucos, os países em desenvolvimento também adotaram

a flutuação de suas moedas (EICHENGREEN, 2000).

Durante este mesmo período, a Europa passava por uma transformação um pouco

diferente. Em 1979 foi criado com iniciativa francesa o Sistema Monetário Europeu (SME) que

formou uma união monetária como complemento à união aduaneira já existente. O primeiro

passo para essa nova união foi dado em 1973, quando seis países do continente optaram por uma

flutuação em conjunto que ficou conhecida como “serpente monetária”. Em seguida, em virtude

da proposta da França e da Alemanha de estabelecer um acordo mais formal, foi criada a Unidade

Monetária Europeia (ECU) composta por uma cesta de moedas dos países participantes do acordo

que criaram um sistema de câmbio fixo ao fixarem um valor às suas moedas em função da ECU

(KENEN, 1998).

Ao longo da década de 80, o dólar passou por uma intensa valorização devido ao

abandono das metas cambiais das outras duas economias importantes, alemã e japonesa, e

também graças ao aumento na taxa de juro norte-americana. Em 1984 o dólar alcançou um

patamar de valorização tão elevado que foi impossível evitar uma intervenção no mercado de

câmbio. No ano seguinte reuniram-se secretamente no Hotel Plaza, em Nova York, os ministros

das finanças e os presidentes dos bancos centrais dos países pertencentes ao G-5. O objetivo

dessa reunião era pressionar o dólar para baixo e impedir a aprovação de uma legislação

protecionista pelo Congresso norte-americano. Seu resultado, que ficou conhecido como Acordo

do Plaza, foi uma declaração que defendia a valorização das outras moedas em relação ao dólar.

Imediatamente ao seu anúncio o dólar caiu 4% em relação ao marco alemão e ao iene e seguiu

em queda. Em 1986 europeus e japoneses estavam prejudicados com essa desvalorização

contínua e foi necessária uma nova reunião, desta vez com a participação dos ministros das

finanças do G-7, para discutir a adoção de ajustes mais fundamentais. No Acordo do Louvre,

como foi chamado, firmado em fevereiro de 1987, ficou acertada a estabilização do dólar em

torno dos níveis correntes (EICHENGREEN, 2000).

Mas, ainda de acordo com Eichengreen (2000), os problemas cambiais na Europa

permaneceram. A “serpente monetária”, que surgiu em 1973 para dar lugar às políticas de

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Bretton Woods, não atingiu o sucesso. Um dos motivos que explica seu fracasso é o primeiro

choque do petróleo no mesmo ano em que foi implantada e a consequente perda de

competitividade dos países europeus. Além disso, alguns países foram obrigados a sair do

esquema da serpente em determinados momentos, como a França fez em 1974 para flutuar

livremente sua moeda e retornou no ano seguinte. É evidente que a estabilidade cambial da

Europa não foi alcançada através deste método e os impactos foram sofridos assimetricamente,

enquanto o marco alemão era a moeda de referência e o Bundesbank regulava a política

monetária do continente. Com isso, os outros países não tinham qualquer influência na escolha da

política adotada, o que os fez abandonar a serpente.

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2. A ORIGEM DO EURO NA INTEGRAÇÃO EUROPEIA

A União Europeia que se conhece hoje é fruto de intensos e variados processos ocorridos

ao longo de muitos anos, e a própria ideia de integração envolvendo o continente europeu possui

origens muito antigas. Por mais de dois séculos, intelectuais e homens do poder buscaram formar

uma unidade europeia (BACHE e GEORGE, 2006). Uma das primeiras tentativas de que se tem

notícia, partiu do abade de Saint-Pierre em 1713, visando à paz perpétua para o continente, e sua

ideia era a constituição de uma associação federativa formada pelos Estados europeus soberanos

que se organizariam em um tipo de aliança permanente e debateriam através de assembleias ou

congresso (PFETSCH, 2001). Já um pouco mais tarde, durante o Congresso de Viena de 1815, o

Conde Henri de Saint-Simon propôs um tipo de confederação envolvendo primeiramente França

e Inglaterra. Apesar de ter despertado certo interesse, a proposta não foi implementada, e os

Estados europeus saíram do congresso sem qualquer aproximação (HERZ e HOFFMANN,

2004).

Ao longo dos anos, principalmente depois da Primeira Guerra Mundial, alguns

movimentos foram sentidos a favor de uma integração pacífica, mas com o fracasso da Liga das

Nações que pretendia garantir um mundo de paz, ressurgiram os nacionalismos, e a preocupação

com uma possível integração foi deixada de lado. Em seguida, o início da Segunda Guerra

Mundial destruiu toda e qualquer possibilidade de uma união, derrubando inclusive a esperança

dos que ainda acreditavam nela (BACHE e GEORGE, 2006). Foi necessário que a Europa

enfrentasse duas guerras em seus territórios para que finalmente uma atitude mais concreta em

direção à integração fosse tomada: “Foi ainda nos anos escuros da II Guerra Mundial que veio à

luz o documento considerado hoje o esforço formal da ideia de uma Europa unida: o Manifesto

de Ventotene escrito em 1941 pelos intelectuais italianos Altiero Spinelli e Ernesto Rossi” 1

(MANTOVANI e MARATTIN, 2008:18, tradução nossa).

Com o fim da II Guerra Mundial, em que grande parte dos Estados europeus a

enfrentaram em seus próprios territórios, a prioridade foi dada para a reconstrução econômica e

1 T.A.: “E fu nel pieno degli anni bui della seconda guerra mondiale che vide la luce il document considerate oggi l’ `esordio formale` dell’idea di Europa unita: il Manifesto di Ventotene (1941) (…) scritto dagli intellecttuali italiani Altiero Spinelli (di ispirazione social-comunista) ed Ernesto Rossi (di tradizione liberale) confinati nell’isola dal regime fascista”.

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política e para a criação de estruturas que garantissem a segurança e a paz coletivas (PFETSCH,

2001). Não havia outra opção, uma vez que a Europa estava intensamente destruída: sem

infraestrutura, com a produção paralisada e com grande deslocamento social. “Estradas, ferrovias,

e pontes haviam sido destruídas pelo bombardeio dos aliados ou pela Alemanha para conter o

avanço das forças aliadas. (...) Havia milhões de refugiados vagando pela Europa tentando

retornar para suas casas, ou sem nenhuma casa para retornar” 2. O ponto crucial que deu início às

mudanças que estavam por vir, foi que em todo o continente, exceto Alemanha e Áustria, havia

um sentimento a favor de mudanças; um sentimento de que a situação de antes da guerra não

deveria mais retornar. Foi esse sentimento que favoreceu alguns partidos de esquerda a ganharem

o poder e que países como a Itália, que haviam sofrido com o Fascismo, se tornassem a favor de

acabar com os nacionalismos. Assim, a ideia de um federalismo europeu ganhou apoio e passou a

ser partilhada pelo continente, menos na Inglaterra e nos países escandinavos (BACHE e

GEORGE, 2006:83, tradução nossa). “Ficou claro que a divisão interna da Europa havia sido a

causa de duas guerras mundiais em menos de trinta anos e provocado a morte de 60 milhões de

pessoas. Iniciar um processo gradual de integração política no continente pareceu ser o modo

mais eficiente para evitar futuros conflitos e divisões” 3 (MANTOVANI e MARATTIN, 2008:18,

tradução nossa).

De acordo com os autores havia duas possibilidades para atingir o objetivo: a proposta

federalista que constituía na criação imediata de instituições comuns a todos os países, formando

os “Estados Unidos da Europa” e a proposta funcionalista que apontava para um processo gradual

que eliminaria aos poucos os motivos de um conflito futuro, começando pela unificação

econômica, porque naquele momento, após duas guerras mundiais, seria utópico e provavelmente

impossível começar por uma união política (idem, ibidem).

Em 1946 foi colocada em prática a proposta federalista e criada a União Federalista

Europeia (UFE), mas foi só dois anos depois que a primeira conferência foi finalmente

organizada para dar início à nova constituição. O Congresso Europeu reuniu-se em maio de 1948

2 T.A.: “Roads, railways and bridges had been destroyed by allied bombing or by the retreating German army in its attempt to slow the advance of the allied forces. (…) There were millions of refugees wandering around Europe trying to return to their homes, or without any homes to return to”. 3 T.A.: “(…) visto che le divisione interne all’Europa erano state la causa di due guerre mondiali in meno di trent’anni e di sessanta milioni di morti, ci si convinse che iniziare um processo graduale di integrazione politica del continente fosse il modo più sicuro per evitare future conflitti e divisioni ”

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na cidade de Haia, Países Baixos, e contou com Winston Churchill como presidente honorário. Já

naquela ocasião ficou claro que a Inglaterra não estava interessada em participar de uma união

supranacional que implicaria perda de sua soberania. O próprio Churchill declarou que a

Inglaterra ficaria de fora dos “Estados Unidos da Europa”, pois já contava com o seu regime de

commonwealth e que seu papel, portanto, seria de amiga e apoiadora da nova união, assim como

fariam os Estados Unidos da América (BACHE e GEORGE, 2006).

A UFE não obteve sucesso. As discussões ocorridas em seu âmbito foram dominadas

pelos governos nacionais, o que desviou completamente sua intenção, e, ainda, as preocupações

da época estavam mais voltadas para a reconstrução econômica de cada país. O que sobrou dessa

tentativa foi o Conselho da Europa, formado durante a UFE, que existe até hoje e que não deve

ser confundido com o Conselho Europeu. O primeiro conta com 46 membros e não está ligado à

União Europeia, o que o diferencia do segundo. Enquanto a UFE ainda estava viva, em 5 de

junho de 1947, o secretário de Estado Americano, George Marshall, anunciou uma ajuda

financeira e o envio de alimentos para a Europa de modo a colaborar com a sua reconstrução. A

ajuda foi direcionada a todo o continente; porém, a URSS desconfiou da súbita bondade e optou

por rejeitar a oferta (idem, ibidem).

O Plano Marshall, como ficou conhecido, dispôs de 13 bilhões e 150 milhões de dólares

norte-americanos para a economia europeia (LOGNE, 1965 apud PFETSCH, 2001). A quantia

era destinada para a reconstrução econômica da Europa e possibilitaria as trocas comerciais entre

os Estados europeus e os Estados Unidos e também entre os próprios Estados europeus. Para os

Estados Unidos era um grande negócio retomar o comércio com o velho continente,

principalmente para as indústrias voltadas para exportação (BACHE e GEORGE, 2006).

Como condição para a ajuda os Estados Unidos insistiram para que a distribuição fosse

feita de maneira conjunta entre os Estados europeus, e dessa forma surgiu em julho de 1947 a

Comissão para a Cooperação Econômica Europeia CCEE. A ideia proposta era de que cada

Estado teria total autonomia para decidir onde investir, mas o fato é que os próprios Estados

Unidos estavam presentes no comitê e, portanto, influenciavam nas decisões. A CCEE passou por

algumas alterações para se tornar mais sólida e em 1948 recebeu o nome de Organização

Europeia de Cooperação Econômica (OECE) (idem, ibidem). Para o Plano Marshall foram

identificados 16 países receptores dos recursos monetários; foram eles: Reino Unido, França,

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Benelux, Turquia, Grécia, Itália, Portugal, Irlanda, Áustria, Suécia, Noruega, Dinamarca e

Islândia (HERZ e HOFFMANN, 2004).

A ideia por trás de uma organização como a OECE era a de preparar as bases para uma

Europa supranacional que viria no futuro. Naquele momento, década de 50, ninguém tinha

definições claras sobre a supranacionalidade. O que se sabia era que estava de certa forma

relacionada à perda de soberania nos assuntos econômicos. Apesar das intenções, a OECE

avançou muito pouco em direção à integração, mas realizou seus trabalhos durante doze anos e

foi peça chave para que os países da Europa entendessem sua mútua dependência econômica: “e

que eles prosperariam ou fracassariam juntos” 4 (BACHE e GEORGE, 2006:89, tradução nossa).

Em 1961 a organização mudou de nome mais uma vez e passou a ser Organização para a

Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Em 9 de maio de 1950 Robert Schuman, então ministro das Relações Exteriores da

França, apresentou sua proposta que ficou conhecida como Plano Schuman para integrar as

produções de carvão e de aço da França e da Alemanha com a possibilidade de participação de

outros países. A proposta havia sido elaborada pelo político francês Jean Monnet que já havia

participado de importantes decisões do governo da França e era defensor da integração europeia

desde o fim da II Guerra Mundial (HERZ e HOFFMANN, 2004). A ideia era “subordinar a

produção de carvão e aço franco-germânica a uma autoridade independente e supranacional, com

competência para decidir sobre estes assuntos” (SABA, 2002:17).

Se concluída, a organização permitiria à França obter o carvão necessário para a

reconstrução de sua economia e ainda controlaria o rearmamento da Alemanha. Konrad

Adenauer, chanceler alemão, apoiou e aceitou o plano por vislumbrar nele uma chance de

ampliar o prestígio de seu país. Juntamente com a Alemanha, os países do Benelux e a Itália

aderiram ao acordo, enquanto o Reino Unido, maior produtor de carvão e aço daquela época, se

recusou a participar através da declaração de Churchill que “o Reino Unido jamais poderia

subordinar sua política industrial a uma entidade supranacional” (idem, ibidem). Sendo assim, os

seis países assinaram em abril de 1952 o Tratado de Paris que colocou em operação a partir de

julho do mesmo ano a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (CECA) que foi a primeira

organização europeia transnacional. De acordo com Bache e George (2006:93, tradução nossa), o

Plano Schuman seria “o primeiro passo decisivo em direção à uma unidade europeia e faria com

4 T.A.: “(…), and that they prospered or failed together”.

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que uma guerra entre França e Alemanha se tornasse não apenas impensável, mas também

materialmente impossível” 5.

Já no preâmbulo da Ceca se pode notar a forte convergência de interesses dos Estados-

membros bem como a profundidade dos objetivos que não ficavam apenas na área econômica.

Segundo Pfetsch (2001), dentre os motivos apresentados para a instituição da Ceca estavam: a

busca pela paz mundial, a construção de uma Europa organizada como contribuição para a

civilização, o estabelecimento de uma base comum para o desenvolvimento econômico, a

elevação do nível de vida e a cooperação ao invés de rivalidades centenárias. O Tratado de Paris

estabeleceu que a Ceca trabalharia “em harmonia com os Estados-membros e através do

estabelecimento de uma área de livre comércio carbo-siderúrgico, para a expansão econômica,

para o aumento do emprego e para a melhoria do nível de vida nos Estados participantes (art. 2°)”

(SABA, 2002:18).

Paralelamente às negociações da Ceca estava a elaboração de uma plano de defesa mútua

que criaria a Comunidade Europeia de Defesa e ainda uma Comunidade Política Europeia com o

objetivo de coordenar a política externa dos Estados. A ideia envolvia mais uma vez a divisão das

soberanias e os Estados continuavam não preparados para este grande passo, o que fez com que

ambas as propostas fracassassem (BACHE e GEORGE, 2006).

Quanto à Ceca , nos primeiros anos de operação a comunidade ganhou destaque na arena

internacional e passou a ter credibilidade. Conseguiu empréstimos norte-americanos e participou

de negociações de acordos bilaterais de comércio, dos quais se pode destacar o Acordo de

Associação com o Reino Unido. Muito do seu sucesso se deve, porém, à conjuntura econômica

favorável que deu início ao “milagre alemão” e relaxou as tensões leste-oeste (HERZ e

HOFFMANN, 2004). De acordo com o The Economist de agosto de 1956 (apud BACHE e

GEORGE, 2006), em seus últimos anos a Ceca provou que o mercado comum era viável e

vantajoso, porém, que a integração por setores gerava problemas de distorção e descriminação.

O passo seguinte veio então em 1957, quando foram assinados o que se conhece como os

Tratados de Roma (TCE) que deram origem à Comunidade Europeia do Átomo (CEEA ou

Euratom) e à Comunidade Econômica Europeia (CEE) mais tarde chamada apenas de

Comunidade Europeia (CE), tendo esta última dado um grande passo em direção à integração dos

5 T.A.: “It would be a decisive first step towards European unit. It would make war between France and Germany not only unthinkable, but also materially impossible”.

Page 33: Euro: Da criação à crise Nome do Autor: Nayara Furlan Rocha

23

povos europeus, pois não tinha pretensões meramente econômicas. Mais uma vez Jean Monnet

participou da evolução da integração e dessa vez, junto com ele, estava Paul-Henri Spaak,

chanceler belga. A proposta de Spaak versava sobre a criação de uma comunidade para

administrar o desenvolvimento de energia atômica e ía um pouco além ao apostar na formação de

um mercado comum geral que ampliasse os objetivos do Tratado de Paris (SABA, 2002). A

França foi o primeiro país a se opor à criação do mercado comum geral, pois temia por suas

indústrias, enquanto os países do Benelux, a Itália e a Alemanha se posicionaram a favor.

Posteriormente, com a mudança do primeiro ministro francês, a França se alinhou aos outros, não

sem antes levantar algumas concessões. Os Tratados de Roma representaram a promessa de que a

integração continuaria avançando (BACHE e GEORGE, 2006).

As duas novas organizações, Euratom e CEE, tiveram suas sedes instaladas em Bruxelas

e seguiram a estrutura institucional já implementada na Ceca (HERZ e HOFFMANN, 2004).

Segundo as autoras, com a assinatura dos Tratados de Roma, que entraram em vigor em janeiro

de 1958, os Estados-membros passaram a adotar um número cada vez maior de decisões

comunitárias e a dividir as operações das três comunidades que funcionavam no âmbito da

integração: Ceca, CEE e Euratom. Apesar das diferentes funções, as atuações dessas três

comunidades passaram a gerar problemas, pois os objetivos de uma atrapalhavam o andamento

das outras e, além disso, os gastos com as três estruturas tornaram-se alvo de preocupação. Frente

ao problema, a solução proposta foi a criação de uma estrutura organizacional idêntica para as

três instituições que foi assinada e estabelecida pelo Tratado de Bruxelas, em 1965, pela Europa

dos Seis.

Tal fusão não transformou as três comunidades em uma única; cada uma continuou com

suas competências. Foi também através do Tratado de Bruxelas que a integração europeia

recebeu seu primeiro alargamento em 1972, uma vez que o documento de integração estava

aberto à novas adesões, como já previam os tratados anteriores de Paris e Roma. Os novos países

a ingressar formando a Europa dos Nove foram: Reino Unido, que já havia sido vetado duas

vezes pelo presidente francês de Gaulle, Dinamarca e Irlanda. A Noruega, que também se havia

candidatado, não pôde ratificar, pois sua adesão foi negada em referendo popular. No ano

seguinte, o primeiro alargamento já entrou em vigor, e Londres recebeu destaque importante por

representar novo interesse no processo que antes se havia colocado apenas como apoiador. As

ampliações continuaram: Grécia em 1981, Portugal e Espanha em 1986.

Page 34: Euro: Da criação à crise Nome do Autor: Nayara Furlan Rocha

24

Após algumas turbulências, incluindo o primeiro choque do petróleo, em 1979 foi

aprovada a criação do Sistema Monetário Europeu (SME) que consistiu no agrupamento das

moedas dos Estados-membros em uma cesta de moedas em que cada uma participava

ponderadamente. Este passo significou apenas a parte inicial do plano de unificação que tinha

como fim a criação da moeda comum e do banco central europeu. Neste momento ocorre a

primeira convergência das taxas de inflação dos países membros. Mais um choque do petróleo e

outras turbulências complementares esfriaram o processo da União Econômica e Monetária que

só voltaria à pauta das decisões no ano de 1989, graças à queda do muro de Berlim e ao

consequente desmoronamento dos regimes do Leste europeu.

Então, após o período de esfriamento no ritmo da integração durante os primeiros anos de

1980 que ficou conhecido como a “eurosclerosis”, a Comissão das Comunidades Europeias

decidiu publicar em 1985 um projeto para a criação de um mercado único europeu dando novo

fôlego ao processo. A ideia principal da Comissão era suprir barreiras físicas, técnicas e fiscais

para melhorar a livre circulação de mercadorias (COMISSÃO DAS COMUNIDADES

EUROPEIAS, 1992; HERZ e HOFFMANN, 2004).

A primeira revisão do Tratado de Roma foi apresentada em 1986 pelo francês Jacques

Delors, então presidente da Comissão Europeia. Seu projeto visava a acelerar e aprofundar a

integração e foi intitulado de Ato Único Europeu. A ideia contida no documento era futuramente

formar uma União Europeia que incluísse, além da área comercial, cooperação em política

externa e uma política comum de segurança. Ao entrar em vigor no ano seguinte, consolidou

modificações importantes nos tratados constitutivos da comunidade que naquele momento era a

Europa dos Doze (SABA, 2002).

O Relatório Delors foi composto de três fases distintas e pode-se dizer que grande parte

de seu sucesso foi devido à reunificação alemã. Jacques Delors focou seu relatório na questão das

disparidades econômico-monetárias e propôs como solução uma maior unificação dos Estados

nesse nível. Dentre as mudanças, a mais importante está na inclusão definitiva do SME no quadro

comum dos países de modo a conferir maior coesão econômica e monetária à comunidade (idem,

ibidem). De acordo com Krugman (2005), as fases propostas pelo Relatório Delors foram:

primeiramente todos os membros deveriam ingressar no mecanismo de taxa de câmbio; em

seguida, as margens das taxas de câmbio passariam por uma redução e as decisões

macroeconômicas estariam sob a responsabilidade da UE e, por fim, seria criada a moeda única

Page 35: Euro: Da criação à crise Nome do Autor: Nayara Furlan Rocha

25

europeia, e as decisões de política monetária passariam para as mãos de um sistema europeu de

bancos centrais, tendo o FED norte-americano como modelo, com a direção de um banco central

europeu. A previsão de Delors era de que o processo levaria cerca de dez anos para se completar.

Mais tarde, devido a suas propostas, Delors seria considerado um dos mentores do Euro

(BITTENCOURT, 2002).

“A ênfase dada por Delors no mercado único fazia parte de uma cuidadosa estratégia” 6

(BACHE e GEORGE, 2006:162, tradução nossa). De acordo com os autores, o mentor viu neste

projeto sua única chance de conquistar o apoio dos governos mais céticos, principalmente o da

Grã-Bretanha. Através do mercado comum, seria possível alcançar a especialização e a melhorar

as economias de escala, tornando as firmas europeias mais competitivas no mercado

internacional, o que naquele momento era de extrema importância para enfrentar Estados Unidos

e Japão. Apesar de ter apresentado apenas mudanças modestas na visão dos federalistas, o Ato

único Europeu rejuvenesceu todo o processo de integração no continente. Além disso, para

Delors a concretização do mercado comum europeu não representava o fim do seu projeto, mas

sim, o primeiro passo para o aprofundamento da integração. Sua ideia particular era agregar uma

dimensão social e para tanto enfrentou a oposição da primeira ministra britânica, Margaret

Thatcher.

Mesmo sem a participação da Grã-Bretanha, os onze governos assinaram um protocolo de

políticas sociais que continha os seguintes objetivos: promoção de empregos, melhorias nas

condições de vida e trabalho, proteção social adequada, diálogo, desenvolvimento de recursos

humanos para garantir mais qualidade no nível de empregos e a integração da população excluída

do mercado de trabalho (idem, ibidem).

Como resultado do aprofundamento da integração, o mercado comum passou a se

desenvolver, o que consequentemente afetou a vida dos cidadãos europeus. “Empresários e

trabalhadores começaram a compartilhar de fato um mercado único. Paralelamente a sociedade

civil se foi transnacionalizando (...). A divisão entre as sociedades nacionais e a sociedade

europeia tornou-se cada vez mais fluida”. A queda do muro de Berlim, a reunificação da

Alemanha em 1990 e o fim da União Soviética no ano seguinte transformaram o processo de

integração e proporcionaram maior evolução (HERZ e HOFFMANN, 2004:185).

6 T.A.: “The emphasis that Delors put on the single market was part of a carefully considered strategy”

Page 36: Euro: Da criação à crise Nome do Autor: Nayara Furlan Rocha

26

“Devido ao colapso do comunismo no leste europeu e à reunificação da Alemanha, o

futuro da integração europeia foi novamente colocado em foco” 7 (BACHE e GEORGE,

2006:166, tradução nossa). A conferência intergovernamental de 1990, que tinha em pauta a

criação da União Econômica Europeia (UEM) e que posteriormente estendeu suas discussões

para a criação de uma união política, deu origem ao Tratado de Maastricht de 1992, em vigor

desde o ano seguinte. Maastricht transformou a Comunidade Econômica Europeia em uma união

levando a integração à sua mais importante fase. O novo tratado que criou a União Europeia,

apresentou significativas modificações, sendo a mais importante delas a implantação de uma

moeda única que entraria em circulação até 1999. As outras novidades contidas no tratado

versavam sobre: novos direitos para os cidadãos da União, melhorias na saúde, infraestrutura,

cooperação para o desenvolvimento, mais poderes para o Parlamento Europeu e introdução de

uma política externa e de segurança comum, entre outras. De acordo com o tratado, a UE foi

constituída sobre três pilares, sendo o primeiro deles o pilar comunitário composto pelas três

comunidades já existentes (Ceca, CE e Euratom), o segundo contendo a política externa e a de

segurança comum (Pesc), que previa a formação de uma identidade europeia única no âmbito

internacional, e o terceiro formado pela cooperação dos Estados na área de justiça e negócios

internos, objetivando, através da atuação comunitária, intensificar o combate a assuntos delicados

como tráfico, terrorismo e xenofobia (SABA, 2002). Este novo tratado foi o responsável por

ampliar a atuação da Comunidade Europeia e estabeleceu metas importantes que permitiram a

conclusão do mercado comum perfeito e a introdução da moeda única. Desde o início das

negociações, a polêmica sobre a divisão de soberania esteve presente, e diversas propostas de

inclusão de áreas importantes no âmbito comunitário não obtiveram consenso (HERZ e

HOFFMANN, 2004).

Como já citado, a criação da moeda única foi o ponto mais importante levantado em

Maastricht. Para a União Econômica e Monetária Europeia (UEME) se concretizar, o tratado

previa três fases que permitiriam realizar as alterações necessárias. Na primeira fase, com

previsão de duração de 1990 a 1993, ocorreria a plena liberalização dos movimentos de capitais

assim como o estreitamento das políticas econômicas de cada Estado. Estes dois pontos seriam a

base para o funcionamento da UEME. Já na segunda, que duraria até 1999, seriam criadas as

7 T.A.: ”Following the collapse of Communism in eastern Europe and the reunification of Germany, the future of European integration was once again brought into focus”.

Page 37: Euro: Da criação à crise Nome do Autor: Nayara Furlan Rocha

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bases institucionais. Os bancos centrais de cada Estado tornar-se-iam independentes e não

poderiam mais financiar os déficits dos países, e o Instituto Monetário Europeu (IME), recém-

criado e precursor do Banco Central Europeu (BCE), seria o responsável por supervisionar as

políticas econômica e financeira de cada país-membro. Por fim, a partir de 1º de janeiro de 1999

a fase monetária e cambial da integração seria concluída. Cada país-membro passaria sua

autonomia em políticas monetária e cambial para o Sistema Europeu de Bancos Centrais formado

pelos bancos centrais de cada um e pelo BCE (BITTENCOURT, 2002).

Foi também no Tratado de Maastricht que o conceito de cidadania europeia foi

introduzido. Através dele os cidadãos da Europa ganharam o direito não só de circular livremente

pelos países-membros como também de morar, votar e candidatar-se para eleições europeias e

municipais no Estado em que reside e receber proteção diplomática ou consular de qualquer outro

país-membro que não o de sua origem, quando se encontra fora de um país-membro (BACHE e

GEORGE, 2006).

Pode-se notar que, a partir do Tratado de Maastricht, foi dada grande ênfase ao fator

desenvolvimento, seja ele econômico ou social, mas de maneira comum a todos os Estados-

membros, visando a uma harmonia, inclusive no que diz respeito às instituições. De acordo com

Herz e Hoffmann (2004:187/188), também foi após a implantação do tratado que a população

europeia passou a ter mais consciência sobre o processo de integração que estava definitivamente

mudando sua vida. Houve então uma maior participação da coletividade principalmente após

1995, quando o Acordo de Schengen, parte do Tratado de Amsterdã, estabeleceu a eliminação

dos controles fronteiriços entre os países signatários e que posteriormente se estendeu a toda a

UE, o que “significou a implementação da liberdade de circulação de pessoas no âmbito do

mercado comum. O impacto da possibilidade de cruzar fronteiras livremente sem controle de

passaporte foi, sem dúvida, enorme”. Foi também no ano de 1995 que a UE se expandiu para

quinze Estados agregando Suécia, Finlândia e Áustria (BACHE e GEORGE, 2006).

Após Maastricht, em meados dos anos 1990, ainda que alguns agiram com relutância, a

maioria dos Estados-membros demonstrou ser favorável à adoção da moeda única. Alguns

governos passaram a aplicar referendos para dar à população o poder da decisão. Sendo assim,

em junho de 1992, a Dinamarca rejeitou a adoção da moeda por 50,7%, e a principal

concentração de opinião contrária foi em Copenhagen e outros centros urbanos (idem, ibidem). O

gráfico abaixo representa a porcentagem da população de cada Estado a favor ou contra à adesão

Page 38: Euro: Da criação à crise Nome do Autor: Nayara Furlan Rocha

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do Euro. Nota-se que a maior parte dos países apresenta porcentagem de 50% ou acima a favor

da adesão, sendo que apenas Grã Bretanha (UK) e Dinamarca (DK), como já citado, têm mais

porcentagem contra do que a favor. A população que mais demonstrou ser a favor foi a Itália,

atingindo em torno de 70%, e a média (EC) de todos os Estados ficou em torno de 50%.

Figura 1 – Posição das populações europeias com relação ao Euro

Fonte: Comissão das Comunidades Europeias. O Dossier da Europa, 2001.

Para que os Estados-membros interessados na adoção do Euro fizessem realmente parte

da união econômica e monetária foi preciso seguir os critérios de convergência propostos em um

dos protocolos de Maastricht. Tais critérios foram elaborados para que houvesse certa

homogeneidade econômica e estabilidade entre os futuros parceiros de moeda. Primeiramente,

cada país deveria apresentar, no ano anterior ao seu ingresso, uma taxa média de inflação de no

máximo 1,5% acima da mesma taxa apresentada pelos países com maior estabilidade de preços;

portanto, o futuro país a adotar a moeda comum deveria mostrar-se capaz de combater a inflação.

Em segundo lugar, com relação ao câmbio, o país deveria ter respeitado as margens de flutuação

propostas no SME, pelo menos nos dois anos anteriores. Por fim, mas não menos importante, o

déficit público anual de cada país candidato não poderia ultrapassar 3% do seu PIB, e sua dívida

pública não ser mais de 60% do seu PIB (BITTENCOURT, 2002). Posteriormente, por iniciativa

Page 39: Euro: Da criação à crise Nome do Autor: Nayara Furlan Rocha

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alemã, foi criado o Pacto de Estabilidade e Crescimento com o objetivo de assegurar o

cumprimento dos critérios de convergência no futuro e não apenas no momento da adesão à

moeda (LIBERATO, 2002).

De acordo com os autores Bache e George (2006), entre 1995 e 1996 foram decididos

pontos importantes sobre a união econômica e monetária, mesmo que nem todos os membros

tivessem decidido sua posição final. Por exemplo, ficou decidido que o Banco Central Europeu

teria sede em Frankfurt e que a nova moeda se chamaria Euro, contrariando o desejo francês de

nomeá-la ecu. Foi em meio a estas reuniões que se colocou em dúvida se o prazo limite para

atingir os critérios de convergência seria alcançado, o que fez com que os países candidatos se

esforçassem mais e se aproximassem mais claramente das metas. Apesar da torcida contrária da

Grã-Bretanha que temia por sua economia e por sua influência na Europa, ao final de 1997 ficou

claro que a moeda única poderia ser adotada dentro do prazo, mesmo que ainda não se tivesse

plena certeza dos Estados-membros capazes de adotá-la.

Buscando dar mais flexibilidade ao projeto de integração, em 1997 a União Europeia deu

outro passo importante para o aprofundamento do processo através do Tratado de Amsterdã, em

vigor a partir de 1999. Este novo tratado revisou os anteriores, Roma e Maastricht, e os

consolidou. Neste foi lançada a ideia de uma extensão da UE para o Leste europeu, apoiada

fortemente pela Alemanha e em menor escala pela Grã-Bretanha e pelos países escandinavos,

mas com dificuldades de aceitação na França, Itália e Espanha. O motivo crucial que fez com que

a Alemanha se posicionasse a favor, foi sua própria segurança, pois via na adesão de seus

vizinhos o fator de estabilidade para a região. “Enquanto os governos da França e dos Estados-

membros do Mediterrâneo entendiam os argumentos a favor do alargamento para o leste, e até

mesmo os aceitavam, estavam apreensivos quanto aos efeitos que seriam causados na UE” 8. Grã-

Bretanha e França já haviam concordado, alguns anos antes, que, quanto mais países integrassem

a UE, maior seria a diversidade entre o grupo e mais difícil seria manter as linhas federalistas

(BACHE e GEORGE, 2006:182, tradução nossa; SABA, 2002).

Os resultados do Tratado de Amsterdã quanto ao alargamento para o leste foram muito

modestos e não representaram qualquer decisão concreta. Portanto, em fevereiro de 2001 mais

um tratado foi agregado à constituição da UE: o Tratado de Nice, em vigor desde 2003. Mas, 8 T.A.: “While the governments of France and the Mediterranean member states could see the arguments for enlargement to the east, and even accepted them, they were apprehensive about the effect that such an enlargement would have on the EU”.

Page 40: Euro: Da criação à crise Nome do Autor: Nayara Furlan Rocha

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antes disso, é preciso destacar que em 1999 o Euro finalmente entrou em operação em onze

países e se tornou a moeda oficial. Cédulas e moedas nacionais continuaram em circulação até a

data limite de 1º de março de 2002 (SABA, 2002). “(...) os países aptos a adotar o Euro:

Alemanha, Áustria, Bélgica, Espanha, Finlândia, França, Holanda, Irlanda, Itália, Luxemburgo e

Portugal” (BITTENCOURT, 2002:32). A Grécia candidata a integrar a zona do Euro foi

previamente excluída por não ter cumprido os critérios de convergência pré-estabelecidos, mas

teve a oportunidade de melhorar sua situação e foi aprovada em 2001. Grã-Bretanha, Dinamarca

e Suécia optaram por não dividir a moeda única (BACHE e GEORGE, 2006; PAPADIA e

SANTINI, 1998).

O Tratado de Nice, negociado durante onze meses e assinado em 2001, tratou

principalmente de modificações no âmbito institucional da UE. Algumas destas modificações

são: para o Parlamento Europeu foi introduzido um novo sistema de distribuição de cadeiras,

baseado no critério demográfico e houve ampliação dos seus poderes; introduziu-se um número

máximo para eurodeputados – 732; ampliaram-se os casos em que serão consideradas as decisões

por maioria qualificada (BACHE e GEORGE, 2006; SABA, 2002). Por fim, o mais recente

tratado da UE é o Tratado de Lisboa, assinado em 2007 e ratificado em 2009. Lisboa teve como

objetivo modernizar as instituições europeias, principalmente por causa da globalização e dos

alargamentos, dotando-as de mais instrumentos para atuação (EUROPA, 2010).

Na visão de Bache e George (2006), diferentemente do esperado por algumas economias,

a nova moeda marcou seu início com exagerada cautela e, mesmo assim, deparou-se com

dificuldades. O principal problema logo ficou claro: a zona do Euro é uma área econômica

composta pela diversidade dos países que precisam ter uma taxa única de juro. Sendo assim, os

efeitos foram diferentes em cada membro; Espanha e Irlanda imediatamente começaram a sentir

sintomas de inflação, enquanto Alemanha e França se deparavam com crescimento. Como

proposta de melhora, os ministros das finanças, alemão e francês, pediram que o Banco Central

Europeu promovesse a queda da taxa de juro, visando a estimular o crescimento nos países que já

apresentavam dificuldades; porém, o presidente da instituição negou-se a aplicar a medida, e a

maioria dos países da zona do Euro continuou a apresentar taxas de crescimento mínimas e

aumento no número de desempregados. Enquanto isso, os países que permaneceram com suas

moedas nacionais, demonstravam condições melhores.

Page 41: Euro: Da criação à crise Nome do Autor: Nayara Furlan Rocha

31

Para que onze países compartilhassem uma mesma moeda foi necessária a adoção de uma

política monetária única determinada pelo BCE, instituição criada com o objetivo de manter a

estabilidade dos preços na zona do Euro. Para tornar possível a atuação do BCE foi preciso

adicionar elevado grau de supranacionalidade à UE, o que consequentemente implicou a perda de

soberania dos países que adotaram o Euro. Determinado pelo Tratado de Maastricht, o BCE tem

total independência para conduzir a política monetária da zona do Euro, e além dele, existem os

bancos centrais nacionais também independentes de seus governos; o conjunto de todos estes

compõe o Sistema Europeu de Banco Central (PAPADIA e SABATINI, 1998). O BCE é,

portanto, um órgão supranacional e de personalidade jurídica. As decisões são tomadas pelo

Conselho de Governadores composto pelos governadores de cada Banco Central nacional; cada

um tem direito a um voto. Cabe a este Conselho definir a política monetária e fixar a taxa de juro,

enquanto cabe a uma comissão executiva aplicar as medidas decididas. Compete somente ao

BCE a emissão de papel-moeda, o que implica um forte controle quanto à quantidade de Euro em

circulação (LIBERATO, 2002; BITTENCOURT, 2002).

Com o decorrer deste capítulo, ficou claro que o processo da integração europeia passou

por inúmeras dificuldades. Desde o seu princípio, fatores externos e internos afetaram o

andamento das negociações e foi preciso muito planejamento e paciência para que as ideias de

fato saíssem do papel e alcançassem os resultados aguardados. A importância de uma moeda

como o Euro não versa apenas na esfera econômica e monetária, mas também na política e social.

De acordo com Liberato (2002), a adoção do Euro é a parte mais vasta da integração europeia e

tem grande relevância no desenvolvimento do continente como um todo. “Para os europeus a

realidade mais tangível da unificação monetária está no próprio Euro, sobretudo, na sua forma

concreta de notas e moedas” (PAPADIA e SANTINI, 1998:7).

O impacto do Euro sobre o processo de integração ultrapassa seus aspectos técnicos. A moeda é considerada um dos símbolos da soberania estatal. Além disso, certas moedas, como o franco francês e o marco alemão, tinham um valor cultural particular, o primeiro tendo sido criado por Napoleão, e o segundo, após o conturbado período das hiperinflações. (...) A queda inicial de seu valor frente ao dólar e a percepção da ‘inflação escondida’, decorrente de ajustes de preços, contribuíram para uma apreensão geral. No entanto, à medida que os ganhos econômicos decorrentes da eliminação de gastos com conversões e a facilidade do manuseio em viagens de negócios e turismo foram sendo percebidos e a população foi se identificando com a nova moeda (HERZ e HOFFMANN, 2004:193).

Page 42: Euro: Da criação à crise Nome do Autor: Nayara Furlan Rocha

32

Também no que diz respeito ao campo externo, a UE atingiu seu objetivo que era ser

reconhecida como um ator único, sem diferenciações de seus Estados-parte (HERZ e

HOFFMANN, 2004). Após trinta anos da primeira ideia de introduzir uma moeda única, isso de

fato se concluiu, o que marcou a história do mundo de maneira singular. Em relativamente pouco

tempo a UE ganhou as proporções desejadas e os desafios que estavam por vir começaram a ser

traçados.

A tabela a seguir traz indicadores macroeconômicos tanto da zona do Euro, como da UE,

e especifica os casos da Itália, Alemanha e França, além dos Estados Unidos, para motivo de

comparação, antes e depois da implantação da moeda única.

Tabela 1 – Performance macroeconômica antes e depois da introdução do Euro

Zona do

Euro Itália Alemanha França

Fora da zona do

Euro EUA

Aumento do PIB 1989 - 1998 2,2 1,6 2,5 1,9 2,5 3,0

1999 - 2008 2,1 1,4 1,6 2,2 2,9 2,6

Aumento do 1989 - 1998 1,8 2,5 1,8 1,5 2,1 1,8

PIB per capita 1999 - 2008 1,6 1,0 1,5 1,4 2,4 1,5

Taxa média 1989 - 1998 9,6 10,1 7,0 10,6 11,2 5,9

de desocupação 1999 - 2008 8,2 8,2 8,4 8,9 7,7 5,0

Novos postos de 1989 - 1998 7,9 0,1 1,5 0,9 5,3 16,5

trabalho (milhões) 1999 - 2008 17,3 1,5 2,0 2,5 11,4 15.9

Aumento da 1989 - 1998 1,6 1,5 1,9 1,6 1,5 1,3

Produtividade 1999 - 2008 0,8 0,1 1,0 1,1 0,7 1,8

Taxa de juros 1989 - 1998 4,8 5,3 3,3 4,9 5,8 2,1

1999 - 2008 1,2 1,1 1,7 1,4 0,7 0,5

Fonte: Fundo Monetário Intenacional, World Economic Outlook, OCSE Economis Outlook, Comissão Europeia, BCE apud SMAGHI, 2008:207. (Os dados de 2008 são previsões).

Page 43: Euro: Da criação à crise Nome do Autor: Nayara Furlan Rocha

33

Quadro 1 – Relação de Tratados da União Europeia

Fonte: HERZ e HOFFMANN, 2004:194, adaptada.

Quadro 2 – Adesão dos países à União Europeia ao longo dos anos

Fonte: HERZ e HOFFMANN, 2004:194, adaptada.

Principais Tratados

Data de Assinatura

Data da Entrada em Vigor Principais Características

Tratado de Paris 18/4/1951 25/7/1952 Criação da CECA Tratados de

Roma 25/3/1957 14/1/1958 Criação da CEE e Euratom

Tratado de Fusão 8/4/1965 1/7/1967 Unificação das instituições das 3 comunidades

Ato único Europeu 17/2/1986 1/7/1987 Mais poder para o Parlamento Europeu

e metas para o mercado comum Tratado de Maastricht 7/2/1992 1/11/1993 Criação da UE e do Euro

Tratado de Amsterdã 2/10/1997 1/5/1999 Mais poderes para o Parlamento

Europeu e incorporação do Schengen

Tratado de Nice 26/2/2001 1/2/2003 Reformas institucionais para a ampliação

Tratado de Lisboa 13/12/2007 1/12/2009 Reformas para modernizar as instituições

ANO AMPLIAÇÕES DO PROCESSO DE INTEGRAÇÃO EUROPEU

1951 Alemanha, Bélgica, França, Itália, Luxemburgo e Países Baixos

1973 Dinamarca, Irlanda e Reino Unido

1981 Grécia

1986 Portugal e Espanha

1995 Áustria, Finlândia e Suécia

2004 Chipre, Eslovênia, Eslováquia, Estônia, Hungria, Lituânia, Letônia,

Malta, Polônia e República Checa

2007 Bulgária e Romênia

Candidatos Macedônia, Croácia e Turquia

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3. A UNIÃO EUROPEIA E O EURO HOJE

Os doze países que inicialmente adotaram o Euro como moeda, assim o fizeram visando a

adquirir certas vantagens específicas decorrentes de uma união monetária. De acordo com Lopes

(2003:123), as principais são: redução dos custos de transação, eliminação dos riscos de

flutuações cambiais, transparência nos processos de formação de preços, formação de mercados

financeiros mais fortes, estabilidade macroeconômica para a região, taxas de juros mais baixas e

aumento do crescimento econômico, além de existir a possibilidade de que futuramente a nova

moeda poderia representar uma nova fonte de reserva internacional. De acordo com a tabela

abaixo, havia significante variação de preços entre os países europeus antes da união monetária, e

atingir números mais igualitários foi uma das grandes vantagens.

Tabela 2 – Comparação entre preços no mercado europeu (março 1988)

Carros

Alemães Produtos

Farmcêuticos Seguro de Vida Eletrodomésticos

Bélgica 100 100 100 100

França 115 78 75 130

Alemanha 127 174 59 117

Itália 129 80 102 110

Holanda - 164 51 105

Grã-Bretanha 142 114 39 93

Fonte:European Economy, março de 1988; Nicolaides & Baden Fuller apud SILVA, Michael; SJOGREN, Bertil, 1991:99.

É óbvio que ao lado das vantagens também estão alguns custos. Os mais apontados deles

sempre foram a perda da soberania monetária e a impossibilidade de se utilizar a taxa de câmbio

como um instrumento para ajustar a economia. Ambos são de grande relevância, mas o segundo

merece maior destaque por ser a perda de um importante mecanismo macroeconômico antes

utilizado pelos países que enfrentaram problemas com suas moedas, como foi o caso de Portugal

entre as décadas de 70 e 80. O governo utilizou-se da taxa de câmbio para corrigir problemas no

Page 45: Euro: Da criação à crise Nome do Autor: Nayara Furlan Rocha

35

seu balanço de pagamentos e assim desvalorizou o escudo, então moeda nacional, para não

perder competitividade e não partir para medidas mais recessivas; funcionou. (SILVA LOPES,

1999).

Ainda de acordo com o mesmo autor, se já não existe mais a possibilidade de corrigir

desequilíbrios através da taxa de câmbio, então outras alternativas deverão ser buscadas. A opção

seguinte é mexer nos preços internos e nos salários, que normalmente não são devidamente

flexíveis para receber ajustes necessários, e a consequência será uma recessão acompanhada por

desempregos.

Este é o meu entender, o ponto mais fraco, é o mais preocupante da construção monetária da Europa. Na falta de mecanismos orçamentais automáticos que ajudem a estabilização das regiões mais afectadas por choques específicos, como sucede nos Estados Unidos, o único caminho que resta para correção dos desequilíbrios provocados por tais choques é o da recessão e do desemprego (SILVA LOPES, 1999:132).

Diferentemente do que acontece nos Estados Unidos, a união monetária da Europa não

prevê muitos mecanismos de compensação em casos de crises. Além disso, há o fator dificultador

da circulação de mão de obra na União Europeia, apesar de existir a liberdade que é a questão dos

diferentes idiomas e também alguns obstáculos culturais, inexistentes nos Estados Unidos (idem,

ibidem).

Ao acompanharmos as notícias atuais sobre a Europa deparamo-nos com o que vem sendo

chamada de a “crise do Euro”. Desde o início de 2010 os jornais do mundo todo foram tomados

pelos assuntos econômicos daquela que costumava ser o melhor modelo de integração de todos

os tempos, a União Europeia. Hoje, dos 27 países que compõem a união, 20 deles estão altamente

endividados e dos 16 que compartilham o Euro 5 estão em situação muito delicada.

Mantendo a linha de pensamento de Silva Lopes (1999:133) durante um ciclo de

conferências em Lisboa, em 1998, faltou e ainda falta à União Europeia uma espécie de

federalismo financeiro para os países que fazem parte da união monetária. Estabelecê-la foi um

enorme passo; isso é certo. Porém, sua mais séria deficiência está na “falta de um orçamento

comunitário de maiores dimensões”. Sem ele, a construção da união monetária é de certa forma

incompleta e traz prejuízos aos países membros.

Page 46: Euro: Da criação à crise Nome do Autor: Nayara Furlan Rocha

36

Quando a moeda única foi criada e os primeiros doze países passaram a compartilhá-la,

muitos economistas argumentaram que nenhuma união monetária sobreviveria sem uma união

política. A primeira foi desenvolvida e implementada na UE; porém, a segunda não. Quando na

formação da zona do Euro, há dez anos, os países decidiram por realizar a unificação econômica,

mas continuarem politicamente independentes. “Em suma, (a Europa) quis o melhor dos dois

mundos e, por algum tempo, pareceu ter obtido êxito” (NORRIS, 2010:B6).

Tais falhas, apontadas durante a formação da zona do Euro por alguns autores, estão

sendo atualmente sentidas verdadeiramente pela primeira vez, e os países estão lutando para lidar

com os prejuízos, não corrigindo os erros num primeiro momento, mas aprendendo a lidar com

eles para num futuro próximo corrigir as imperfeições.

Em meio a este momento, a UE descobriu um problema que sempre existiu, mas que em

outros casos nunca provocou tantas dificuldades: as enormes diferenças entre os países que a

formam. Desta vez não ficaram claras apenas as diferenças econômicas entre, por exemplo,

Alemanha, maior economia europeia, e a Grécia, contribuinte de 2% do PIB do continente, mas

também traços culturais muito marcantes que fizeram com que cada país tomasse uma posição

diferente diante dos mesmos problemas.

Mas, antes de se aprofundar nas diversas reações causadas dentro da própria UE, quando

ela se deparou com sua crise, é preciso entender como ela começou.

3.1 A Origem da Crise do Euro

A crise do subprime que teve início nos Estados Unidos no segundo semestre de 2008,

atingiu não só aquele país, mas o mundo todo. Antes dela, os países europeus atraíam grandes

quantidades de capital estrangeiro, o que os fez apresentar números dentro dos limites permitidos

pelo Tratado de Maastricht e até mesmo positivos em alguns países durante alguns anos. Com a

crise, os investimentos vindos de fora secaram e tornou-se impossível manter os mesmos

desempenhos, fazendo com que os déficits aumentassem (KRUGMAN, 2010a). Cada um desses

Page 47: Euro: Da criação à crise Nome do Autor: Nayara Furlan Rocha

37

países teve que encontrar as soluções mais apropriadas para não ser completamente absorvido

pelos efeitos da crise, e assim surgiram pacotes bilionários de incentivo às economias.

Na Europa não foi diferente. Os governos utilizaram-se de medidas de incentivo para

setores específicos que apresentavam maior dificuldade, na esperança de que as taxas de

crescimento não fossem abaladas; porém, existe aí um problema. As altas taxas de crescimento

alcançadas por alguns países da União Europeia, entre eles a Grécia entre 2001 e 2008 que

cresceu 4% ao ano, criaram bolhas em alguns setores, como no imobiliário a exemplo dos

Estados Unidos. Assim, quando a crise do subprime se espalhou por outros continentes e os

governos tiveram que implementar pacotes de incentivo eles já não foram 100% eficazes. Devido

à crise, os créditos, antes abundantes, praticamente secaram e as bolhas passaram a não ter mais

condições de serem financiadas, o que gerou problemas muito maiores (CHADE, 2010a).

Na União Europeia, o primeiro país a escancarar seus problemas e alertar toda a

comunidade internacional foi a Grécia. Os mercados reagiram; o Euro atingiu sua menor cotação

em meses em relação ao dólar; houve muita especulação; os governos europeus ora se

entenderam, ora não, e o problema inicial da Grécia contagiou outros parceiros da zona do Euro,

deixando a UE em situação extremamente delicada.

3.2 Os PIIGS

O que antes parecia ser um problema grave de uma só nação, no caso, da Grécia, foi

colocado em xeque pelo mercado financeiro internacional. Os problemas fiscais de outros quatro

países da UE vieram à tona, e o grupo passou a ser chamado de PIIGS, contemplando Portugal,

Itália, Irlanda, Grécia e Espanha, os cinco países mais vulneráveis da Europa e protagonistas do

“momento mais crítico da história do Euro” (CHADE, 2010a:B8; MILANESE, 2010). A cada

nova notícia, a sensação de que a crise da Grécia era apenas a ponta do iceberg, parecia se

confirmar (KHAIR, 2010).

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38

Como cada um desses países possui características próprias e se encontram em situações

particulares, vale a pena abordá-los primeiramente em separado, para depois fazer uma análise da

crise como um todo. Abaixo, a figura aponta os principais números, divulgados em fevereiro, que

fizeram os cinco países receberem a denominação de PIIGS.

Figura 2 – Indicadores dos 5 países mais vulneráveis da zona do Euro

Fonte: Eurostat apud O Estado de S. Paulo, São Paulo, 7 fev. 2010a, Economia, B8.

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39

3.2.1 Grécia

Como se sabe, o Pacto de Estabilidade e Crescimento firmado no Tratado de Maastricht

prevê que para um país aderir ao Euro ele precisa ter respeitado algumas regras. Dentre elas, seu

déficit orçamentário não deve ultrapassar 3% do PIB e sua dívida pública 60% também do PIB.

De acordo com os números apresentados pela Grécia em 2001, ela estava apta a aderir ao seleto

grupo do Euro. Entretanto, após a situação grega ter sido colocada sobre a mesa, surgiram

desconfianças quanto à veracidade dos números do país, quando na adesão ao Euro. O governo

do primeiro ministro George Papandreou, ao final de 2009, revelou que a herança deixada pelo

governo anterior de Costas Caramanlis era muito pior do que se conhecia e que o déficit fiscal

passaria de 10% do PIB. O fato abriu as portas para as futuras desconfianças e logo de início

entregou ao novo governo imensos desafios. O anúncio ocasionou, em dezembro do ano passado,

o rebaixamento da nota da dívida grega pelas agências Fitch, Moody`s e Standart and Poor`s, e o

ágio cobrado do país passou a ser de 7,1%, muito acima do que o exigido para qualquer outro

país da zona do Euro (MILANESE, 2010).

Em fevereiro deste ano, já em momento desconfortável, a Grécia passou de fato a ser

acusada de se utilizar de ‘criatividade contábil’ para poder fazer parte da zona do Euro. Para

mascarar seus números o governo grego anterior teria realizado um swap cambial com o banco

norte-americano Goldman Sachs, onde teria obtido US$ 1 bilhão, tornando assim possível atingir

as metas do Pacto de Estabilidade e Crescimento. A quantia teria sido obtida através de operações

de derivativos, “instrumentos financeiros sobre os quais não há regulamentação e que não são

negociados nas bolsas públicas”, entre 2000 e 2001, e a instituição financeira Goldman Sachs

teria arrecadado cerca de US$ 300 milhões com essas operações. De acordo com a própria

instituição, foram elas que permitiram a redução da dívida externa da Grécia em € 2,36 bilhões e

que, portanto, permitiram ao país ser aceito na união monetária. O caso passou a ser examinado

pelo banco central norte-americano, o Federal Reserve, mesmo o ministro das finanças grego

tendo declarado que, quando os acordos foram realizados, eram totalmente legais e que o país não

se utilizou mais deste tipo de mecanismo (CHADE, 2010b; SCHWARTZ, 2010:B14).

À parte desta situação estão os impactos da crise financeira global. No ano de 2009, a

Grécia acumulou uma dívida de € 300 bilhões, acompanhada de um déficit fiscal primeiramente

Page 50: Euro: Da criação à crise Nome do Autor: Nayara Furlan Rocha

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avaliado em 12,9% do PIB e depois revisado em abril para 13,6%, muito acima dos 3%

permitidos pelo Tratado de Maastricht (NETTO, 2010a). Ambos os números são resultado de

baixas arrecadações e altos gastos, inclusive para reaquecer o país atingido pela crise mundial,

que passou a gastar mais do que arrecada e foi contraindo suas dívidas (G1, 2010). Para agravar

ainda mais a situação do país, grande parte dessas dívidas deveriam ser refinanciadas em breve e

previsões apontaram que o governo precisaria de mais € 40 bilhões para cobrir as novas dívidas

do primeiro semestre de 2010. Em declarações no começo do ano, o governo revelou que 10% de

sua dívida pública total precisaria ser refinanciada até maio, dando caráter de urgência ao caso

(QUALIMETRIA FAAP, 2010). O gráfico abaixo apresenta a projeção da dívida grega até 2020,

caso o governo não interfira com medidas de austeridade.

Figura 3 – Projeção da dívida grega

Fonte: Comissão Europeia apud O Estado de S. Paulo, São Paulo, 12 fev. 2010b, B8 .

Além dos dados adulterados e da crise financeira mundial, existe ainda outro fator que

contribuiu para o endividamento da Grécia: elevados gastos militares. O Exército grego recebe

enormes quantias, e dados da OTAN apontam que o país é o segundo na lista de orçamento

militar em relação ao PIB, estando atrás apenas do gigante Estados Unidos. Tal absurdo de € 6,8

bilhões por ano justifica-se pela relação tensa que o país tem com a Turquia, há séculos. O ponto

aqui é que nenhum destes dois países tem condições de manter gastos elevados em defesa e

Page 51: Euro: Da criação à crise Nome do Autor: Nayara Furlan Rocha

41

precisam mudar de atitude. Há ainda um detalhe curioso: Alemanha e França seriam as maiores

fornecedoras do Exército grego (LAPOUGE, 2010a).

Assim que seus números foram revelados, o governo grego começou a tomar

providências. O primeiro plano de austeridade foi apresentado em 15 de janeiro para a Comissão

Europeia com a meta de diminuir o déficit fiscal para 8,7% ainda este ano e de alcançar os 3%

permitidos em 2012. No plano estão presentes as seguintes medidas: aumento da idade mínima da

aposentadoria de 61 anos para 63; reforma no sistema tributário ineficiente; fim dos bônus para

presidentes de estatais; redução na renda básica do funcionalismo entre 1% e 5,5%;

congelamento dos salários de ministros e chefes de governo e benefícios cortados em 10% (O

ESTADO DE S. PAULO, 2010c).

Um dos maiores problemas da Grécia e que já dura há anos é a corrupção. Ela está

presente tanto nas empresas públicas como nas agências do governo, o que dificulta maiores

fiscalizações. George Papandreou, o primeiro-ministro grego, em entrevista à revista alemã Der

Spiegel revelou alguns erros: hospitais públicos gastam mais do que o necessário exatamente por

causa da forte corrupção; o sistema político é marcado pelo nepotismo e pelo desperdício de

dinheiro; o funcionalismo tem muitos empregados (quase um quarto do total); e o princípio da

meritocracia há muito tempo foi deixado de lado (QUALIMETRIA FAAP, 2010).

Os números pouco confortáveis da Grécia, além de serem um problema por si só, geraram

a perda da credibilidade do país. O próprio primeiro-ministro declarou que o maior déficit do seu

país é o de credibilidade e não o financeiro (PAPANDREOU, 2010). A declaração é facilmente

comprovada ao se verificar que o governo não consegue melhores taxas para tomar crédito no

mercado; em abril era preciso pagar 5,5 pontos porcentuais acima do valor pago pela Alemanha

(NETTO, 2010a). A perda de credibilidade também conta com o fato de que, de acordo com o

professor de economia e políticas públicas Kenneth Rogoff, a situação de inadimplência na

Grécia ocorre, em média, a cada dois anos, desde sua independência no século 19 (ROGOFF,

2010).

Mesmo tendo iniciado seu plano de austeridade para lidar com os problemas econômicos,

o mercado financeiro internacional não perdoou, e os especuladores começaram a agir. A

primeira semana de fevereiro atingiu a posição de pior semana para o Euro desde março de 2009,

e pela primeira vez após a crise do subprime os investidores preferiram títulos de empresas

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americanas a títulos de governos europeus. Neste ponto, os principais mercados europeus

começaram a sentir as consequências da dívida grega, e o temor dos investidores não se limitava

mais apenas à Grécia, mas também à Espanha, Portugal e Irlanda (CHADE, 2010c).

Prevendo maiores complicações para todo o bloco, a UE resolveu mostrar seus poderes e

indicou publicamente que teria recursos suficientes para salvar a economia grega, caso

necessário. A declaração de Bruxelas foi positiva para o mercado financeiro, e o Euro voltou a

subir. Para a Grécia a declaração também foi positiva, uma vez que havia sido um pedido do seu

governo; porém, com ela vieram cobranças: seu governo deveria provar que o primeiro plano de

medidas era o suficiente; caso contrário, medidas adicionais deveriam ser anunciadas ainda em

março. O pedido da UE foi um consenso entre os 16 países que compartilham o Euro e que

consideraram as primeiras medidas insuficientes perto do resultado que precisaria ser alcançado

(CHADE, 2010d).

A partir daí, a UE passou a pressionar o governo grego para implantar novas medidas

rigorosas que representariam uma economia adicional de € 4 bilhões. Dentre as medidas

propostas estariam maiores impostos para itens de luxo; novas reduções nos salários dos

funcionários públicos; aumento de imposto sobre bebidas alcoólicas, tabaco e combustíveis;

reformas nos sistemas de previdência, de saúde e da administração pública; aumento da

produtividade e de empregos, entre outras. Todas elas visando à retomada da confiança externa

para a Grécia, pois a permitiria cumprir com a redução do seu déficit (idem,ibidem; O ESTADO

DE S. PAULO, 2010c; NETTO, 2010b).

Cumprindo com as exigências da UE, a Grécia anunciou em 5 de março de 2010 novos

cortes em sua economia. A maior parte deles ficou concentrada no setor público, nos salários dos

servidores que já haviam sofrido corte anterior, e no aumento de impostos. A previsão é de que

somados os novos cortes representem uma economia adicional de € 4,8 bilhões neste ano

(NETTO, 2010c). O primeiro-ministrou grego, antes mesmo da aprovação do novo pacote,

declarou que as novas medidas seriam dolorosas e que caberia aos servidores públicos aprender a

sobreviver com salários menores (PETRAKIS e WEEKS, 2010).

É fácil prever que todas as medidas impostas pelo governo grego nos primeiros meses do

ano não foram bem aceitas pela população. No dia 24 de fevereiro ocorreu a primeira grande

greve que reuniu os principais sindicatos do país, envolveu mais de um milhão de pessoas e teve

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duração de 24 horas. Repartições públicas, hospitais, universidades e quase a totalidade da rede

de transporte urbano pararam de funcionar, além de os canais de televisão e rádios não terem

transmitido os noticiários do dia. Tudo isso em função de cerca de 80% da população ser contra

as medidas do governo. A greve geral contou com inúmeros protestos e casos isolados de

violência entre manifestantes e polícia. O governo manifestou-se dizendo compreender a revolta,

principalmente pelo fato de as medidas atingirem diretamente os salários, mas também disse não

haver outra solução, pois o país não possui mais dinheiro. No mês de março deste ano, o número

de desempregados no país já chegava aos 514 mil, representando um aumento de 31% com

relação ao ano anterior, a maior alta no período de onze anos (NETTO, 2010d).

Como continuação de seu plano de austeridade, a Grécia anunciou no início de junho um

pacote de privatizações, visando a arrecadar € 1 bilhão por ano durante os próximos três anos.

George Papaconstantinou, o ministro das Finanças, disse que entre as empresas que serão

privatizadas estão a companhia férrea OSE (49%), cassinos, correios (39%) e companhias de

saneamento (O ESTADO DE S. PAULO, 2010d).

A Grécia representa apenas 2% do PIB total da UE, ou seja, é uma economia muito

pequena. Para Jamil Chade (2010e), o maior problema para a Europa neste momento de crise está

exatamente nas menores economias, uma vez que sua capacidade de reação e ajuste também é

pequena e, portanto, terão dificuldades para restabilizar suas finanças.

3.2.2 Portugal

Em uma situação não tão complicada como a da Grécia, porém, com problemas graves,

Portugal também preocupa a UE. Os números atuais do país são os seguintes: 9,3% do PIB de

déficit orçamentário e endividamento de 77,4% do PIB, ambos números de 2009. Apesar de o

déficit orçamentário ser o menor entre os PIIGS, a situação preocupa por causa dos fatores que

serão explicados posteriormente. Quanto ao endividamento total, o número apresentado está

relativamente próximo ao permitido pela UE que é de 60%, mas a previsão para o endividamento

em 2010 é que ele chegue aos 85% do PIB (QUALIMETRIA FAAP, 2010; MILANESE, 2010).

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Atualmente o governo português está enfraquecido por não contar com a maioria no

parlamento. O primeiro-ministro José Sócrates tem enfrentado dificuldades para governar, o que

acaba por dificultar a implementação de um plano de austeridade que é de extrema necessidade

(SCHULTZ, 2010). Quando assumiu o governo pela primeira vez, em 2005, o partido socialista

de Sócrates foi bem recebido e começou a atuar com eficiência, criando 150 mil postos de

emprego. Mas, no segundo semestre de 2009, seu partido perdeu a maioria absoluta no

parlamento e daí para frente passou a ser muito difícil administrar o país. Além disso, seu nome

está envolvido em escândalos, o que faz com que a população não lhe dê mais confiança

(LAPOUGE, 2010b).

Mas os problemas de Portugal são muito mais antigos e profundos. O setor agrícola do

país jamais atingiu o desenvolvimento necessário para ser considerado forte e é até hoje

considerado ineficiente. A crise atual não permite que mudanças sejam realizadas e, portanto, o

setor não contribuirá para que o país consiga recuperar-se. O setor do turismo, por sua vez,

contribuirá muito pouco. Assim como o agrícola, não é desenvolvido, mas caminha para o ser no

futuro, o que também não significa uma ajuda de peso no momento atual (SCHULTZ, 2010).

O que mais preocupa a UE e os investidores internacionais em relação a Portugal é o seu

fraco desempenho nos últimos anos. O país apresentou o menor crescimento do PIB entre todos

os países que compõem a zona do Euro e dificilmente reverterá a situação (MILANESE, 2010).

Por causa do baixo desenvolvimento de setores importantes para a economia, anteriormente

citados, Portugal apresenta perspectivas limitadas de expansão, o que faz com que as expectativas

de melhora sejam quase inexistentes e ainda, para completar, as projeções da OCDE também não

trazem boas notícias: Portugal crescerá apenas 0,8% em 2010 (NETTO, 2010e).

Em fevereiro de 2010, o governo português elaborou seu primeiro projeto para um plano

de austeridade. A maioria do parlamento, oposição do governo, não aprovou o projeto e a

situação tornou-se ainda mais tensa para o país (CHADE, 2010c). No mês seguinte, o governo

elaborou o Programa de Estabilidade e Crescimento (PEC), visando a conter a expansão das

contas públicas. Dentre as medidas estão: congelamento dos salários do funcionalismo por quatro

anos, redução dos programas sociais, redução dos planos de investimento e elevação dos

impostos sobre as maiores rendas e ganhos no mercado de ações, representando cortes

significativos nos gastos do governo (NETTO, 2010e). O objetivo do programa é reduzir o déficit

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orçamentário de 9,3% para o limite da UE de 3% até 2013. O governo está contando com o

crescimento econômico, mesmo que pequeno, para atingir sua meta, uma vez que os cortes nos

gastos públicos serão equivalentes a, no máximo, 50% da redução necessária (O ESTADO DE S.

PAULO, 2010e)

3.2.3 Espanha

A Espanha tem importante peso na zona do Euro, pois representa a quarta maior

economia do bloco. Em 2009 a dívida pública espanhola ficou abaixo do limite permitido pela

UE, 54,3% do PIB; porém, as expectativas são de que ela dispare durante este ano de 2010. Seu

déficit orçamentário já havia atingido 11,2% do PIB, sendo apenas 3% o permitido

(QUALIMETRIA FAAP, 2010).

O que mais preocupa na Espanha não são especificamente esses dois números, mas sim,

que sua economia é quatro vezes maior que a grega, o que significa que a qualquer sinal de

tremor toda a estabilidade do Euro será comprometida (idem, ibidem).

Pouco antes de a crise chegar à Europa e comprometer o desempenho de diversos países,

a Espanha era vista praticamente como um modelo para os outros membros da UE por apresentar

superávits orçamentários e possuir uma regulamentação bancária muito eficiente. Os números

eram claros: em 2007 a dívida espanhola equivalia a 43% do PIB, enquanto a alemã, maior

economia da Europa, 66% (KRUGMAN, 2010b).

Grande parte de seu desempenho positivo foi impusionado por suas condições geográficas

e climáticas. Ainda de acordo com Krugman (2010b), com seu clima quente e suas praias, a

Espanha passou a ser a Flórida da Europa, inclusive na questão do boom imobiliário. Durante

anos houve pesada entrada de capitais estrangeiros, principalmente da Alemanha, que serviu para

financiar o boom que por sua vez era o responsável pelo crescimento do emprego. Em

consequência, o país experimentou rápido crescimento que veio acompanhado de inflação. Entre

os anos 2000 e 2008, houve aumento de 35% nos preços de bens e serviços produzidos no

próprio país, enquanto no mesmo período os preços na Alemanha subiram apenas 10%. A alta

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dos custos não só causou prejuízos para a população, mas também para a competitividade externa

do país que apresentou quedas significativas.

Além dos capitais estrangeiros, entre 1990 e 2007, a Espanha recebeu grandes

transferências de recursos dos Fundos de Coesão e Estruturais da UE para financiar obras

públicas por ser um país em crescimento acentuado. O dinheiro desses fundos permitiu que o país

estimulasse ainda mais seu setor de construção civil que permaneceu em expansão e se

aproveitou de eventos como as Olimpíadas de Barcelona de 1992. Com o forte crescimento

econômico, que fez da Espanha a preferida do bloco, ocorreu um boom no consumo que

proporcionou em um primeiro momento à elevação do PIB; porém, com a chegada de novos

países à UE, principalmente os do Leste-Europeu, o dinheiro repassado pelos fundos foi reduzido

e a Espanha experimentou pela primeira vez em anos a queda nos investimentos, o que

prejudicou sua expansão. O setor da construção civil que já estava aquecido perdeu seu principal

cliente, o Estado, e teve que partir para a sociedade que por sua vez contribuiu fortemente para a

especulação imobiliária. O resultado da mudança foi que em 2005 as famílias espanholas

acumulavam uma dívida de € 651 bilhões referentes à compra de imóveis, o que resultou em sete

trimestres consecutivos de crescimento negativo (NETTO, 2010f).

Com a chegada da crise ao continente, o setor imobiliário que havia sido o motor da

economia espanhola desde o ano 2000 e que em dez anos impulsionou a construção de mais casas

no país do que na Itália, na França e na Alemanha somadas, desmoronou, e a bolha do setor não

resistiu, provocando altas taxas de desemprego: quatro milhões de espanhóis, ou seja, 20% de

toda a população. O setor imobiliário contribuiu com 3,6% da contração da economia espanhola

em 2009 (QUALIMETRIA FAAP, 2010; CHADE, 2010f).

A explosão da bolha do mercado imobiliário nos Estados Unidos, em 2007 e 2008, marcou o início do fim de um ciclo de ouro da Espanha. Desde o início dos anos 90, a economia espanhola vivia um período ininterrupto de expansão que transformou o país em um eldorado na Europa. Mas o peso exagerado da construção civil na economia agora expõe as fragilidades de um mercado pouco produtivo e competitivo e defasado na exploração de alta tecnologia (NETTO, 2010f:B15).

Diante dos fatos, o país precisaria urgentemente promover a reestruturação de toda a sua

economia, o que o colocava em situação mais complicada do que a de outros países da zona do

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Euro. Para tanto seria preciso que o governo implantasse um regime econômico rígido que o

permitisse pagar as dívidas contraídas e que colocasse o déficit público no patamar permitido

(SCHULTZ, 2010). Enquanto as decisões eram tomadas, a agência Standard & Poor`s rebaixou a

nota da Espanha de AA+ para AA (NETTO, 2010g).

As primeiras medidas para conter o déficit público foram anunciadas no início do mês de

maio e aprovadas por um conselho extraordinário de ministros, alguns dias depois, e seguiram a

tendência dos outros países que é a redução dos cargos públicos. O governo apostou na redução

de 30% do número de estatais, no corte de 500 cargos executivos de empresas públicas e na

eliminação de 32 postos de confiança do governo, aqueles considerados cargos de alto escalão.

Além disso, a ideia é de que 24 companhias estatais passem por um processo de fusão e de que a

maioria das fundações mantidas pelo Estado sejam eliminadas, tudo para diminuir os gastos

públicos e conter o déficit. Quanto aos salários do funcionalismo, os cortes anunciados foram

entre 0,56% e 7%, com porcentagens um pouco maiores para cargos de diretores gerais e

secretários de Estado. A soma esperada com os cortes é de € 15,25 bilhões até 2011 (CHADE,

2010g; O ESTADO DE S. PAULO, 2010f). O texto também continha uma medida que previa

cortes profundos nas aposentadorias e que, após protestos da população, foi imediatamente

retirada (SCHULTZ, 2010).

Para a vice-presidente da Espanha, María Teresa Fernández de la Vega, todas as medidas

têm como objetivo reestruturar a máquina estatal de modo que ela se torne mais eficiente.

“Atuamos com rigor, decisão e responsabilidade. Os cortes significam mais trabalho com menos

recursos humanos”, declarou (apud CHADE, 2010g:B13).

Poucos dias após o plano de cortes ter sido anunciado, surgiu o boato de que a Espanha

precisaria da ajuda financeira da UE em algo em torno de € 280 bilhões. José Luiz Rodríguez

Zapatero, primeiro-ministro do país, logo desmentiu o caso e afirmou estar confiante na

recuperação econômica espanhola e pediu a atenção dos investidores para que os dados e fatos

sejam verdadeiramente analisados (O ESTADO DE S. PAULO, 2010g).

Ainda no mês de maio, preocupada com sua condição fiscal, a Espanha anunciou um

pacote maior de cortes nos gastos públicos. Desta vez agregou a redução de 5% a partir do mês

de junho nos salários do funcionalismo, o congelamento dos mesmos até o ano que vem ,

suspensão dos reajustes nas aposentadorias mais elevadas, contenção nos investimentos públicos,

Page 58: Euro: Da criação à crise Nome do Autor: Nayara Furlan Rocha

48

além de um corte de € 300 milhões em ajudas oferecidas a pessoas com alguma limitação. Com

as novas medidas estima-se que a economia seja de mais € 15 bilhões até 2011. O projeto foi

aprovado no congresso com dificuldade: 169 a 168 (NETTO, 2010h; NETTO, 2010i).

Assim como na Grécia, a população reagiu negativamente ao conjunto de medidas

impostas. Os efeitos começaram a ser sentidos ainda no mês de maio e os sindicatos

manifestaram-se através de protestos e prometeram a convocação de uma greve geral. O

desemprego no país já atingia 4,6 milhões de pessoas, colocando a Espanha no alto do ranking de

desempregados em toda a Europa Ocidental. A população jovem é a mais afetada: 40,3% dos

trabalhadores com idade inferior a 25 anos estão sem emprego. A situação é ainda pior, quando

se analisa a perspectiva de crescimento médio anual. Crescendo menos de 2,0% ao ano, a

Espanha só conseguirá criar novos postos de trabalho que absorvam todos os desempregados em

2016 (NETTO, 2010h; O ESTADO DE S. PAULO, 2010i).

Para complicar ainda mais a situação do país, o Banco Central espanhol anunciou no fim

do mês de maio o socorro financeiro a um banco que estava à beira da falência. As previsões são

de que o resgate custe ao Estado cerca de € 2,7 bilhões, agravando suas contas públicas e

colocando a Espanha no foco principal dos investidores. Apesar dos cortes de € 15 bilhões

anunciados pouco tempo antes, o FMI resolveu apertar a cobrança ao país e cobrou “reformas

urgentes”, pedindo total prioridade para a reforma do mercado de trabalho (NETTO, 2010j:B7).

Na sequência, mais uma agência de classificação de risco rebaixou o rating da Espanha,

prejudicando sua relação com os investidores. A agência Fitch que antes tinha a Espanha no nível

mais elevado da sua escala (AAA), agora a classifica como AA+, que ainda é considerado um

bom nível, mas demonstra tendência de baixa. A justificativa para o rebaixamento foi de que por

causa das medidas de austeridade, a taxa de crescimento do país será muito baixa em médio

prazo. O episódio na Espanha agora deixa apenas Alemanha, França, Holanda, Suécia e Reino

Unido no patamar de confiança mais elevado da Europa (NETTO, 2010g).

Page 59: Euro: Da criação à crise Nome do Autor: Nayara Furlan Rocha

49

3.2.4 Irlanda

A Irlanda foi o primeiro país europeu a ser atingido pela crise do subprime, oriunda dos

Estados Unidos. Dados da Comissão Europeia apontaram que a economia irlandesa encolheu

7,5% em 2009, o que deixou o BCE em alerta. O déficit orçamentário do país também preocupa

por ser o segundo maior entre os PIIGS, (12,5% do PIB), atrás apenas da Grécia (SCHULTZ,

2010).

Por ter sido a primeira vítima do continente, o governo reagiu com reformas antes de

qualquer outro país implementar seus planos de austeridade. Os salários do setor público também

receberam cortes, e o setor bancário foi reestabilizado, dando novo fôlego à economia; porém, se

outros aspectos forem analisados, a situação mostra-se ainda muito delicada. Pela primeira vez

em 15 anos, as pessoas que emigraram do país, foram mais do que as que chegaram; 65,1 mil

pessoas deixaram a Irlanda em 2009 para viver em outros países com melhores condições, sendo

que muitas delas já eram emigrantes, havendo vindo para lá buscar a mesma coisa. A falta de

oportunidade de emprego é o fator motivador de toda essa emigração. Grandes empresas como,

por exemplo a Intel, diminuíram significativamente a presença no país e outras, como a Dell,

saíram definitivamente para se instalar em um país com mão de obra mais barata, no caso a

Polônia. O número total de empresas que fecharam suas portas só em 2009 é espantoso: 1500.

Com isso, mais de 170 mil postos de empregos foram engolidos em um ano, e a previsão é de que

mais 80 mil desapareçam em 2010, representando 12% de desemprego (QUALIMETRIA FAAP,

2010).

3.2.5 Itália

A Itália tem a maior dívida pública não apenas entre os PIIGS, mas também entre os

países da UE, chegando à surpreendente cifra de 117% do PIB, contabilizando US$ 2,5 trilhões

(CHADE, 2010h). Seus números não são consequência da crise, como no caso dos outros países

analisados. A situação de déficit italiana vem desde 2006, quando a crise ainda não havia

Page 60: Euro: Da criação à crise Nome do Autor: Nayara Furlan Rocha

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nascido, e, desde então, o que o governo mais tem feito é ignorar o tamanho da sua dívida

(SCHULTZ, 2010).

De acordo com a maioria dos economistas, apesar da elevada dívida, a Itália não se

encontra na mesma situação grave que a Grécia. Isso porque seus números não foram

manipulados como fez o governo grego; sua economia não teve as fundações abaladas por

consequência de uma bolha imobiliária, como teve a Espanha, e a crise não destruiu seu sistema

financeiro como aconteceu na Irlanda, porque a fiscalização bancária na Itália é devidamente

rígida e controlada (QUALIMETRIA FAAP, 2010).

Apesar disso, o governo italiano também teve que tomar providências. O primeiro pacote

de medidas foi elaborado no fim de maio, enquanto os outros PIIGS já sofriam com as

consequências de seus cortes. A previsão é de que os cortes na economia italiana rendam € 26

bilhões nos próximos dois anos. Dentre as medidas não estão a elevação de impostos e nem

cortes nas pensões, mas, sim, diminuição dos gastos com o funcionalismo que somará € 6 bilhões

e constituirá no congelamento dos salários por três anos e diminuição em 10% no número de

funcionários; redução dos repasses aos governos locais, o que prejudicará principalmente o sul do

país; reforma nos gastos com a saúde pública, uma medida inédita entre os países que já

aplicaram seus pacotes de austeridade; aumento da fiscalização aos sonegadores de impostos;

aumento da idade mínima para a aposentadoria; instalação de pedágios em Roma e criação de

taxas sobre transações acima de € 5 mil para aumentar a arrecadação do governo (CHADE,

2010i; CHADE, 2010j).

3.3 Problemas e Planos de Austeridade Ultrapassam os PIIGS

Após a UE ter dado sinais claros de que poderá, se necessário, resolver os problemas dos

PIIGS, principalmente da Grécia, através do fundo criado em conjunto pelos 27 Estados-

membros, foi a vez de as grandes economias do bloco aplicarem seus planos de austeridade.

Os números do primeiro trimestre de 2010 para a Europa deixaram evidente que o

problema não estava restrito apenas às economias mais fracas. As seis maiores potências

Page 61: Euro: Da criação à crise Nome do Autor: Nayara Furlan Rocha

51

europeias apresentaram crescimento muito próximo a zero entre janeiro e março, o que serviu

para aumentar o receio dos países. A Itália foi o país com o melhor desempenho: 0,5% de

crescimento. Já Alemanha, Reino Unido e Holanda cresceram apenas 0,2% e França e Espanha

menos ainda: 0,1% (NETTO, 2010k). O desemprego é outro fator que deve ser levado em conta

para concluir que os poblemas realmente se espalharam por toda a Europa. Em abril, o índice

atingiu 10,1%, o maior em doze anos, afetando 15,860 milhões de trabalhadores (O ESTADO DE

S. PAULO, 2010i). Os números por si só já são bastante ruins, mas as previsões são ainda mais

sombrias. De acordo com Olli Rehn, comissário de Economia da UE, se os países não realizarem

suas reformas, a Europa enfrentará entre 2010 e 2020 uma “década perdida”, e a economia irá

atingir a estagnação (REHN apud CHADE, 2010j:B9).

O déficit da Irlanda continuou sendo o mais elevado, seguido pelos da Grécia e Espanha;

em média, os países da zona do Euro apresentam 6,3% de déficit, estendendo o problema para as

economias mais resistentes. França e Reino Unido foram as primeiras economias de peso a

demonstrarem que também implantariam seus próprios planos de rigor seguindo o que fizeram

os PIIGS (NETTO, 2010l; NETTO, 2010m).

A França de Nicolas Sarkozy, que apresenta um déficit de 7,5%, anunciou ter como

objetivo a redução em 10% de seus gastos nos próximos três anos, o que a permitirá alcançar o

patamar de 3% em 2013. Para atingí-lo, o governo elevará a idade mínima para a aposentadoria,

assunto que será discutido mais tarde neste mesmo capítulo; reduzirá o funcionalismo através da

extinção de 100 mil cargos, e benefícios sociais como os concedidos para famílias com mais de

três filhos, poderão ser cortados. O Reino Unido, que elegeu seu novo governo este ano, anunciou

primeiramente cortes de € 7,2 bilhões, ultrapassando em € 283 milhões o número inicial previsto.

De acordo com os dados do governo, o déficit britânico já atinge € 181 bilhões, equivalentes a

11,1% do PIB. Para atingir a redução desejada, o governo apostou primeiramente na suspensão

de um ano das contratações para o funcionalismo, no fim dos programas de apoio para trabalhos

temporários, no corte de postos de trabalhos no setor público, além de redução nos investimentos

para alguns serviços públicos, como educação e transporte. Posteriormente, em meados do mês

de outubro, o governo anunciou cortes adicionais que afetaram benefícios sociais, o orçamento de

defesa e a segurança pública, além da elevação de impostos. Em declaração, a própria rainha

Elizabeth II afirmou que a prioridade número 1 do governo do Reino Unido será a redução de sua

dívida. O problema, porém, é que o governo optou por mexer nos benefícios da educação,

Page 62: Euro: Da criação à crise Nome do Autor: Nayara Furlan Rocha

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colocando em pauta o aumento das anuidades, o que causou forte onda de protestos e levou

jovens universitários às ruas (O ESTADO DE S. PAULO, 2010h; CHADE, 2010i; CHADE,

2010j; NETTO, 2010m; NETTO, 2010n; O ESTADO DE S. PAULO, 2010j).

A Alemanha, maior economia da Europa, também precisou apresentar um pacote de

austeridade fiscal que pretende até 2016 realizar os cortes necessários para recolocar sua

economia em ordem. A princípio, os cortes não atingiram nem educação nem fundos de pensão,

mas principalmente desempregados (CHADE, 2010i). Se as consequências da crise do Euro

atingiram até mesmo as grandes economias, é de se imaginar que outras, menos expressivas que

as da Alemanha, França e Reino Unido, e que tão pouco pertencem aos PIIGS, também foram

atingidas. É o caso da Hungria. Em meio aos anúncios de cortes dos outros países, seu governo

admitiu estar enfrentando uma forte crise e que precisa urgentemente de um plano para evitar

igualar-se à Grécia. Em certo ponto, porém, a Hungria já se igualou à Grécia: o governo anterior

manipulou os dados econômicos para esconder a crise que o atingia (O ESTADO DE S. PAULO,

2010k). Em julho de 2010, a inflação na UE atingiu seu nível mais alto em 20 meses e preocupou

o BCE que não soube qual taxa de juro adotar. O índice de 2,1% foi obtido considerando os 27

países que compõem o bloco, sendo que o permitido é 2%, e o ponto principal do problema é a

disparidade econômica entre os países (CHADE, 2010k).

Em resposta aos planos de austeridade aplicados por quase a totalidade dos países e a

exemplo do que aconteceu na Grécia, manifestantes europeus foram às ruas protestar sob o lema:

“não à austeridade”. Os sindicatos europeus organizaram-se para realizar greves em toda a

Europa com a intenção de mantê-las, enquanto os trabalhadores continuarem sendo os principais

prejudicados pelas medidas. De acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), a

crise mundial já deixou mais de 30 milhões de pessoas sem emprego em apenas dois anos, e

grande parte delas está na Europa onde, nos dias mais críticos, ocorreram 10 mil demissões por

semana. A figura abaixo aponta os países que enfrentaram greves por causa dos planos de

austeridade implantados, e em destaque os países que aderiram à greve geral proposta pela

Confederação de Sindicatos Europeus, e que se encontravam em greve no dia 29 de setembro de

2010 (CHADE, 2010l:B10).

Page 63: Euro: Da criação à crise Nome do Autor: Nayara Furlan Rocha

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Figura 4 – Greves e manifestações na Europa

Fonte: INFOGRÁFICO/AE apud O Estado de S. Paulo, 29 set. 2010l, Economia, B10.

3.4 A França e o Caso da Reforma da Previdência

Dentre os países europeus, a França era o que apresentava a idade mínima mais baixa para

a aposentadoria: 60 anos. Quando os planos de rigor tiveram de ser estendidos para as maiores

economias do continente, o governo francês incluiu em suas medidas a reforma da previdência

pública (NETTO, 2010o).

Implementar uma reforma previdenciária não é simples em nenhum país. No caso da

França, desde 1993, os governos planejam a reforma, tomam a iniciativa, mas não a realizam. A

proposta de Nicolas Sarkozy foi a sexta iniciativa desde então e, a cada dia que passava, ela se

tornava mais necessária. A combinação do aumento da expectativa de vida com a redução da taxa

de natalidade e com a degradação do mercado de trabalho acendeu o sinal de alerta do governo,

ainda mais quando a perspectiva para 2010 foi divulgada: o déficit na previdência chegará a 10%

(idem, ibidem).

Page 64: Euro: Da criação à crise Nome do Autor: Nayara Furlan Rocha

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O projeto de Sarkozy, dentre outras medidas, previa o aumento de 60 para 62 na idade

considerada mínima para um trabalhador francês se aposentar. Apesar de necessária, a proposta

de reforma na previdência não foi bem aceita pelos sindicatos e pela opinião pública que em

números é 80% a favor de uma reforma, mas apenas 39% aceitam a elevação na idade mínima

para a aposentadoria. Sendo assim, os sindicatos organizaram-se e conseguiram reunir, no dia 7

de setembro, milhares de pessoas nas ruas do país, as quais protestaram não só contra a medida,

mas também contra a corrupção e a política migratória, ambos os temas muito delicados. Em

resposta às manifestações, o governo admitiu estar disposto a realizar concessões, mas deixou

claro que a medida da idade mínima não seria alterada (idem, ibidem; NETTO, 2010p).

A primeira greve pareceu não ser suficiente e a população voltou a protestar nas ruas no

dia 24 de setembro, quando o projeto de aumento da idade mínima para a aposentadoria já havia

sido aprovado pela Assembleia Nacional, faltando, portanto, apenas o voto do Parlamento

(NETTO, 2010q). E assim se seguiram outras greves que contaram com a participação do setor

público, do setor privado e de estudantes; em alguns casos, inclusive, resultando em choques

entre manifestantes e polícia e até mesmo prisões (NETTO, 2010r). “A França está um caos.

Segundo pesquisas de opinião, a popularidade de Nicolas Sarcozy é a menor já registrada por um

presidente francês nas últimas décadas” (ROCARD, 2010:A14).

A batalha de Nicolas Sarkozy para aprovar a reforma da Previdência Social não foi fácil,

mas ele conseguiu. O ponto que lhe causou maior problema foi, de fato, a elevação da idade

mínima da aposentadoria de 60 para 62 anos, o que, na verdade, se mostrou extremamente

necessária por dois motivos. O primeiro deles é que entre as maiores economias da UE, a França

era quem tinha a menor idade mínima para aposentadoria. Quanto ao segundo, de acordo com

dados da OCDE, por causa da alta expectativa de vida, os trabalhadores franceses eram os que

passavam mais tempo de vida aposentados (NETTO, 2010s).

A revolta da população francesa, traduzida em diversas greves e manifestações, e que

contou com o apoio de 66% da opinião pública do país, tinha fundamentos. Atualmente,

trabalhadores com mais de 50 anos não conseguem reposicionar-se no mercado com facilidade e

muitos chefes de família estão sem emprego; porém, é preciso notar que a França, assim como

outros países da Europa, enfrenta dois problemas relacionados à previdência. O alto índice de

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desemprego e o fenômeno denominado “papy boom”, que significa elevado número da

população na terceira idade, deram caráter de urgência à reforma (idem, ibidem; NETTO, 2010t).

Depois de assistir às manifestações nas ruas e da oposição, que tentou implementar

diversas emendas à sua reforma, no dia 22 de outubro, Sarkozy finalmente obteve sua vitória com

a aprovação do Senado, e em seguida, em 28 de outubro, com a aprovação final da Assembleia

Nacional (336 votos favoráveis e 233 contrários), quebrando um tabu que vinha desde 1982.

Outras reformas no sistema previdenciário já haviam sido implementadas em 1993, 1995, 1999,

2003 e 2007, sem alterar a idade mínima. A aprovação, porém, não significou o fim dos

protestos; sindicatos e estudantes comprometeram-se a dar continuidade às manifestações,

visando a um desgaste da imagem do presidente (NETTO, 2010u; NETTO, 2010v).

Com a reforma, a França se aproxima mais dos outros países europeus em termos de

idade mínima para a aposentadoria. Alguns desses países já realizaram reformas anteriores,

enquanto outros ainda estão elaborando-as. A figura abaixo traz as informações de sete países da

UE que se encontram nessas condições.

Figura 5 – As principais reformas da Previdência na Europa

Fonte: INFOGRÁFICO/AE apud O Estado de S. Paulo, 24 out. 2010m, Economia, B11.

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3.5 O Plano de Socorro e as Soluções Propostas Até Agora

No meio do caminho, entre as exigências feitas pela UE à Grécia e os novos cortes

implementados pelo governo grego, surgiram notícias de que o bloco, liderado por Alemanha e

França, socorreria a Grécia através de um plano de ajuda debatido nas reuniões de cúpula da UE.

O plano teria sido elaborado visando a impedir maiores desgastes no Euro e recuperar sua

credibilidade (CHADE, 2010m). Entre fevereiro e março foram noticiadas algumas

possibilidades de socorro da UE, ora com a participação do FMI, ora sem; ora Alemanha e

França concordando, ora não. No início, todas as possibilidades foram publicadas e logo

desmentidas pela UE.

Em um primeiro momento, os países da união mostraram-se divididos em termos de como

ajudar a Grécia financeiramente. Os europeus que se encontram fora da zona do Euro sugeriam o

envolvimento do FMI; já os que compartilham o Euro, principalmente Alemanha e França,

rejeitavam a possibilidade. Não se chegava à conclusão de quem pagaria a conta (CHADE,

2010n). Em seguida, foi publicado que Alemanha e França, em acordo, resgatariam a Grécia

juntamente com os outros países da UE e sem a participação financeira do FMI, que apenas

auxiliaria o plano (CHADE, 2010m). Desta vez até houve a confirmação do plano; porém, as

declarações deixaram claro que a ajuda propriamente dita não era imediata, e o plano só seria

colocado em prática, caso necessário, coisa que no momento era vista como improvável

(CHADE, 2010o). Mais tarde foram divulgados números na publicação alemã Der Spiegel em

que a ajuda consistiria entre € 20 e € 25 bilhões, logo desmentida novamente tanto pela UE que

afirmou não existir tal plano, como pela Grécia através de seu primeiro-ministro que declarou não

querer ajuda externa por se tratar de uma “questão de honra e orgulho” (NETTO,2010w:B8;

NETTO, 2010x). Já no mês de março, a ministra da economia da França, Christine Lagarde,

admitiu a existência de não apenas um, mas de vários planos de ajuda, deixando claro, porém,

que acreditava na capacidade de a Grécia em se recuperar sozinha (NETTO, 2010y). Logo em

seguida, a UE desmentiu as declarações da ministra e voltou a afirmar que não haveria dinheiro

público dos países-membros para resgatar a Grécia, pois ainda não havia tal necessidade. A

declaração colocou novamente Alemanha e França em paridade de ideias, já que a Alemanha não

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cessou em dizer, através da chanceler Angela Merkel, sobre o descarte de empréstimos ao país

(NETTO, 2010z).

França e Alemanha voltaram a discordar sobre o assunto quando o presidente francês,

Nicolas Sarkozy, declarou ser obrigação de os países que compõem a zona do Euro, apoiarem os

que se encontram em dificuldade. “O governo grego tomou as medidas que nós esperávamos, e

os Estados da zona do Euro devem daqui para a frente estar prontos a tomar as que se esperam

deles” e ainda apontou que a ajuda seria totalmente europeia, descartando o FMI. “Um país da

zona do Euro deve antes de mais nada contar com os outros países da zona do Euro. Caso

contrário, por que teríamos feito uma moeda única?”, enquanto a Alemanha continuava a se

recusar a fazer parte de um plano de salvamento para a Grécia por qualificá-la como desleixada

em relação às suas contas públicas e corrupta (NETTO, 2010c; NETTO, 2010aa:B8).

Na sequência, as duas maiores economias da zona do Euro voltaram a se entender e

lideraram as discussões para a criação do que seria chamado Fundo Monetário Europeu (FME),

um organismo aos moldes do FMI, com o objetivo de promover a cooperação econômica entre os

países do bloco em casos de endividamento. A ideia da Europa não é criar uma concorrência ao

FMI, mas, sim, garantir que a zona do Euro tenha condições de manter sua estabilidade e possua

recursos de fiscalização e intervenção. A criação de um fundo europeu serviria para que nas

próximas crises o continente não precisasse depender do FMI, o que, se dessa vez acontecer de

fato, demonstrará fraqueza no bloco. A proposta da criação do FME teria sido aprovada pelos

outros membros da zona do Euro (O ESTADO DE S. PAULO, 2010n).

Os primeiros sinais de que a economia grega finalmente seria salva, surgiram em meados

de março, quando nenhum país do bloco desmentiu as notícias sobre o futuro acordo de socorro

elaborado pelos ministros de Finanças dos 16 países que compartilham o Euro. Todos os

membros da zona do Euro aprovaram “um programa de contribuições bilaterais coordenadas, na

forma de empréstimos ou garantias de empréstimos, para a Grécia, caso Atenas se veja incapaz

de refinanciar sua gigantesca dívida”. Algumas fontes declararam que o pacote poderia chegar a €

25 bilhões. Além da ajuda financeira, foram discutidas mudanças nas regras do Euro que

concederão à Eurostat, agência de estatísticas da UE, maiores poderes de inspeção (TRAYNOR,

2010:B14).

Page 68: Euro: Da criação à crise Nome do Autor: Nayara Furlan Rocha

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Enquanto os ministros de Finanças da zona do Euro continuaram a decidir sobre o plano

de socorro, a Grécia demonstrou sua disposição em recorrer ao FMI, provocando os países do

bloco que se opunham à solução. No início das discussões sobre a ajuda financeira, todos os

países se posicionaram contra o envolvimento do FMI, mas, com o passar do tempo e com a falta

de soluções, alguns países mudaram de opinião e já apoiavam a manifestação grega. Dentre os

países que concordaram com a participação do fundo, estão Alemanha, Holanda e Finlândia,

além de Reino Unido e Suécia, que não compartilham a moeda única. França é a principal

opositora e propõe uma ajuda somente europeia à Grécia (NETTO, 2010ab).

Após quase dois meses de negociações, a UE finalmente decidiu os moldes do mecanismo

de socorro à Grécia e a outros países com dificuldades. Na última semana de março, foi

anunciado que o plano de financiamento contaria com 60% a 70% de recursos dos 27 países que

formam a UE e 30% a 40% de participação do FMI. O dinheiro não será imediatamente liberado,

pois ainda prevalece a crença de que a Grécia consiga reerguer-se sozinha. “O acordo é

claramente de natureza preventiva. O objetivo é não usá-lo” afirmou Nicolas Sarkozy. Caso

contrário, o mecanismo será acionado e automaticamente uma linha de refinanciamento rápido

será criada, com juros baixos, e os recursos virão principalmente de empréstimos bilaterais dos

países da UE. A contribuição de cada país dependerá do valor com o qual ele contribui ao BCE,

que é elaborado de acordo com o PIB e o tamanho da população. Herman van Rompuy,

presidente do Conselho Europeu, declarou: “O mecanismo tem de um lado o FMI e, de outro

lado, os membros da Eurozona. É um mecanismo misto, no qual o componente dominante será o

europeu”. Consta ainda no texto do acordo que a quantia necessária só será entregue ao país que

acionar o mecanismo, caso haja a aceitação unânime dos 27 países da UE e o parecer positivo do

BCE juntamente com a Comissão Europeia. Além disso, em breve serão elaboradas

contrapartidas para os países que solicitarem a ajuda financeira de modo a prevenir futuras crises

e aplicar sanções aos que descumprirem o Pacto de Estabilidade, fixado pelo Tratado de

Maastricht (NETTO, 2010ac:B12).

Apesar das declarações positivas de que a Grécia conseguiria sair da crise com suas

próprias mãos, em 23 de abril, o primeiro-ministro grego, Georges Papandreou, anunciou em um

canal de televisão ter ativado o mecanismo de ajuda mista. A quantia liberada seria de

aproximadamente € 45 bilhões, sendo € 30 bilhões provenientes da UE e os outros € 15 bilhões

do FMI a juros de até 5%, enquanto no mercado privado os juros cobrados estavam em torno de

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8,5%. A data estipulada, para que a primeira parte do valor fosse liberada, foi 19 de maio, a

tempo de o país honrar os títulos com vencimento no fim do mesmo mês (NETTO, 2010ad).

O pedido de ajuda feito pela Grécia marcou a história da UE por ter sido o primeiro caso

de resgate financeiro a um país do bloco em onze anos de sua existência. A forte pressão dos

mercados financeiros fez com que a Grécia não tivesse outra saída a não ser recorrer à ação

conjunta dos países do bloco e do FMI. O socorro impediu a moratória grega, mas não veio sem

exigir mais esforços por parte do governo: Alemanha e França concederam o empréstimo,

prometendo cobrar medidas mais rígidas da Grécia que já havia implementado diversas outras (O

ESTADO DE S. PAULO, 2010o).

Antes da liberação em maio, os valores para o socorro foram revistos e ficou constatado

que os € 45 bilhões seriam insuficientes. Juntos, a UE e o FMI chegaram à enorme cifra de € 100

bilhões, podendo ser ainda maior, € 120 bilhões, em três anos. Além do aumento da quantia, o

socorro faz-se cada vez mais urgente, e não mais para salvar apenas a Grécia, mas toda a zona do

Euro. As declarações preocupadas começaram a surgir: “Há necessidade absoluta de decidir

rapidamente”, disse o presidente do BCE e “Cada dia perdido será um dia na qual a situação vai

piorar” anunciou o diretor-gerente do FMI (NETTO e CHADE, 2010:B6).

As novas medidas de austeridade exigidas, tanto pelo FMI quanto pelos países

financiadores, provocaram reações negativas na população grega e nos sindicatos. Os novos

cortes, que poderão contabilizar até € 24 bilhões, preveem o aumento do imposto sobre valor

agregado e o congelamento salarial de três anos do setor público. Ficou evidente, através das

manifestações e também de pesquisas, que a maior parte da população grega se opõe ao

envolvimento dos outros países da UE e do FMI na economia de seu país (O ESTADO DE S.

PAULO e NETTO, 2010).

A ajuda, propriamente dita, demorou a ser liberada, e a Alemanha foi a grande

responsável pelo atraso que quase provocou o naufrágio do Euro. Angela Merkel, chanceler

alemã, realizou sucessivos atrasos na decisão do parlamento alemão quanto ao pedido de ajuda

grego, mostrando-se em alguns momentos claramente contra a ideia de seu país contribuir

financeiramente. De acordo com Roland Doerhrn, membro do Instituto de Pesquisas RWI, em

entrevista ao Estado de S. Paulo, a pressão exercida pela Alemanha, através dos atrasos, foi

programada e teve como objetivo alertar os outros países da zona do Euro quanto ao perigo de

Page 70: Euro: Da criação à crise Nome do Autor: Nayara Furlan Rocha

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não cumprir o Pacto de Estabilidade. Mas a estratégia deixa a desejar, quando se nota que a

própria Alemanha está 0,3% acima do permitido para o déficit orçamentário. Aliás, dentre os 16

países que compartilham o Euro, apenas Luxemburgo e Finlândia cumprem os critérios pré-

estabelecidos, apresentando déficits de 0,7% e 2,2% respectivamente. Após praticamente dois

meses e meio de demora, a própria Alemanha passou a criticar Merkel e um jornal denominou-a

como a “responsável pela crise do Euro” (NETTO, 2010l:B15).

O acordo para a liberação da ajuda só foi finalmente finalizado no dia 2 de maio de 2010,

no valor de € 110 bilhões, sendo € 80 bilhões repassados pela UE e € 30 bilhões pelo FMI em um

período de três anos. Quanto aos juros que serão cobrados, não houve alteração, em torno de 5%.

Através da quantia a Grécia conseguirá refinanciar mais de 30% de sua dívida total que está

avaliada em € 300 bilhões, mas não sem passar pelo intenso processo de reformas proposto em

conjunto pela UE e pelo FMI, principalmente nos setores de administração pública e mercado de

trabalho (NETTO, 2010ae).

Poucos dias após o anúncio da decisão final, o parlamento grego aprovou as medidas de

austeridade sugeridas pela UE e pelo FMI, mesmo com fortes protestos da população que voltou

a entrar em choque com a polícia durante manifestações. A aprovação grega não foi facilmente

alcançada (172 votos contra 121), uma vez que o país se mostra dividido quanto à maneira que a

ajuda será concedida. Durante a votação no parlamento, acusações duras foram trocadas entre os

partidos socialista e conservador; o primeiro acusa o segundo de ser o responsável pela crise

grega por ter manipulado os números e escondido por anos a real situação da economia. O

primeiro-ministro, do partido socialista, fez as seguintes declarações: “Vamos mudar a Grécia,

lamentavelmente com grandes sacrifícios para garantir sua prosperidade” e “A situação é

simples: ou aprovamos cortes duros ou estamos condenados à falência”. O ministro das finanças,

George Papaconstantinou, também demonstrou sua opinião dizendo que: “Temos de implementar

as medidas mais difíceis já tomadas por esse país” (CHADE, 2010p:B4).

Para o economista Barry Eichengreen (2010) o plano de ajuda mista não é o suficiente

para dar sossego à Grécia. Para ele a única saída existente é a reestruturação da dívida, e a UE e o

FMI falharam ao não incluírem esse processo no pacote de ajuda. Quanto mais tempo demorar

para que a reestruturação seja feita, mais prejuízos incorrerão sobre a Grécia, porque será cada

vez mais difícil e caro pagar suas dívidas. Já para Nouriel Roubini (2010), também economista, o

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fornecimento de dinheiro à Grécia apenas adia o problema central, porque a imposição de tantos

cortes na economia pode gerar queda na produção e consequentemente na participação nos

mercados, além do aumento do desemprego. Roubini então sugere a elaboração de um plano B

que vai de encontro com a proposta de Eichengreen: reestruturação do endividamento.

Na mesma reunião em que o pacote de ajuda à Grécia foi aprovado, foram propostos

novos cortes de gastos para todos os países, a criação de um mecanismo de estabilização da

moeda e de um fundo para socorrer países com problemas. Uma das maiores urgências para a UE

é regular os mercados financeiros, de modo que países com problemas não contaminem outros e

que o Euro não seja diariamente ameaçado em tempos de crise; desde novembro de 2009, o Euro

desvalorizou-se em 15% (CHADE, 2010q).

Em agosto, a UE, o FMI e o BCE decidiram que, para que a última parcela da ajuda

financeira, prevista para este ano, fosse liberada, o governo grego teria que arcar com mais cortes.

O pedido em conjunto foi para que a Grécia aprofundasse ainda mais suas reformas e as

acelerasse para então receber a quantia planejada. As novas exigências feitas tinham relação com

privatizações e aumento de impostos, o que não causou reação muito positiva do governo

(CHADE, 2010r). O problema é que o governo grego já aplicou tantas medidas de austeridade

desde o início do ano que a Grécia se tem afundado ainda mais na recessão. O segundo trimestre

deste ano apresentou queda de 1,5% na economia em comparação ao primeiro trimestre, o que

demonstra que a contração tem aumentado. Depois de ter caído 2% ano passado, a projeção do

FMI é de que, ao fim do ano, a economia grega apresente contração total de 4% (CHADE,

2010s).

No primeiro país resgatado pela UE, os cortes nos gastos parecem não ter um fim

próximo. Para conseguir cumprir com sua meta parcial de atingir em 2011 um déficit de 7,6% do

PIB, o governo precisa levantar € 4,5 bilhões rapidamente. É do sucesso de suas medidas de

austeridade que depende a liberação da terceira parcela de ajuda prevista para este ano; ajuda esta

que permitiu à Grécia não decretar o calote da dívida em maio. Já é certo, porém, que a meta

deste ano, de diminuir o déficit para 8,1%, não será cumprida. A baixa coleta de impostos e a

mais nova revisão dos números de 2009, que estimou o déficit em 15,4% e não em 13,8%, como

se acreditava, fez com que o governo anunciasse que os cortes feitos nos gastos permitirá reduzir

o déficit para apenas 9,3%. E mais, a dívida pública de 2009, também revista, atingiu 126% do

Page 72: Euro: Da criação à crise Nome do Autor: Nayara Furlan Rocha

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PIB, colocando a Grécia no topo da lista dos endividados europeus (CHADE, 2010t; O ESTADO

DE S. PAULO, 2010p).

Na situação atual, a única solução vista pelo governo grego, é continuar com os cortes de

gastos. A diferença, porém, é a promessa feita pelo primeiro-ministro que a população não será a

maior atingida, como nas medidas anteriores; desta vez o foco estará no setor público, e a ideia é

de reorganizá-lo. Além disso, Papandreou admitiu que solicitará o prolongamento do prazo de

pagamento da dívida para depois de 2015 (CHADE, 2010t).

Na contramão da Grécia está a Alemanha. A maior economia do bloco foi a responsável

pelo crescimento de 1% apresentado em agosto na zona do Euro em relação ao trimestre anterior,

que contou também, em menor participação, com a França. A notícia reanimou o bloco e

surpreendeu economistas que não esperavam tamanho crescimento da Alemanha: 2,2% na

comparação trimestral. “A alta no Produto Interno Bruto (PIB) ocorreu principalmente graças às

exportações, já que o mercado interno continua relativamente frágil”. Em todo caso, porém, a

previsão a partir do segundo semestre é de desaceleração, uma vez que o governo alemão

também já aplicou seu plano de austeridade, e que os países que importam seus produtos,

apresentaram queda no crescimento. É por estes motivos que a chanceler Angela Merkel afirmou

que o plano de austeridade não será alterado, ou seja, os impostos continuarão os mesmos e os

cortes nos gastos públicos seguirão. O governo francês acredita que a Alemanha ainda pode

colaborar para a recuperação do bloco, se criar um mercado doméstico significante, que compre

as exportações dos outros países que enfrentam enormes dificuldades de crescimento (O

ESTADO DE S. PAULO, 2010q; CHADE, 2010u:B9).

Enquanto a Alemanha crescia, a Espanha anunciou a continuação do seu plano com a

aprovação da reforma do mercado de trabalho. Com sua população extremamente atingida pelo

desemprego, a reforma busca dar novo fôlego ao setor, através de mais flexibilidade de horários,

redução no valor das indenizações por demissões, mais facilidade para a dispensa de funcionários

por motivos econômicos e redução de 90 para 30 dias o pagamento do auxílio desemprego (O

ESTADO DE S. PAULO, 2010r).

A seguinte reunião da Cúpula da União Europeia significou um grande passo em direção à

cooperação entre os países que formam o bloco. Denominado primeiramente de ‘mecanismo de

estabilização’, os países concordaram na criação de um fundo para “combater crises sistêmicas na

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Zona do Euro e nos países do bloco que ainda adotam moedas nacionais”. O objetivo é que o

mecanismo de estabilização dê origem, futuramente, ao Fundo Monetário Europeu (FME), que

ainda não pode ser criado por causa de impedimentos nos tratados de constituição da União

Europeia. De acordo com as informações cedidas, o fundo contará com a disponibilidade de

€ 500 bilhões, dos quais € 60 bilhões já pertencem a um fundo da Comissão Europeia, e o

restante virá dos países-membros. Há ainda a possibilidade do FMI complementar o fundo com

mais € 250 bilhões. O dinheiro será liberado para os países com problemas mediante a

autorização de todos os 27 Estados-membros através de contratos de empréstimos bilaterais ou

garantias a juros do FMI (NETTO, 2010af:B1).

A decisão foi o sinal mais forte de que a UE tem realmente condições de salvar sua

moeda. Apesar de a decisão não significar o desembolso do dinheiro de fato e ter sido apenas

uma demonstração do que os países-membros podem fazer, os mercados finalmente

demonstraram ânimo. Nas palavras de Celso Ming (2010a:B2), “a decisão tomada em Bruxelas é

uma convincente demonstração de unidade”, o que desde o começo da crise vinha sendo esperado

e, “os compromissos consagrados pelo Tratado de Maastricht e pelo Pacto de Estabilidade e

Crescimento (PEC) não são suficientes para assegurar a necessária austeridade fiscal dos

membros da área do Euro”, exigindo novas providências da UE.

Dentre os chefes de Estado, a alemã Angela Merkel foi a primeira a declarar que o pacote

de resgate elaborado pelos membros da UE, incluindo a própria Alemanha, seria insuficiente para

devolver a tranquilidade ao continente. Para ela o ponto crucial é resolver as disparidades

econômicas entre os membros do bloco que compartilham o Euro, e as medidas tomadas até o

momento serviram apenas para ganhar tempo. De acordo com a chanceler, a UE precisa fazer

mais para combater a especulação contra sua moeda (O ESTADO DE S. PAULO, 2010s).

De certa forma, as afirmações de Merkel abriram espaço para que os ministros de finanças

da UE reconhecessem a necessidade de impor mais medidas de rigor em todo o bloco. A mais

importante delas foi, sem dúvida, a criação de punições para os países que não conseguirem

controlar suas dívidas, como vem acontecendo. A sugestão alemã, acatada pelo restante dos

países, pede que os governos apresentem orçamentos equilibrados e prevê punições para os que

não cumprirem a meta como, por exemplo, a suspensão do direito de voto em decisões do bloco e

até mesmo o não recebimento da verba disponível para ajuda. O objetivo das medidas é

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realmente punir os países que ultrapassarem repetidamente o limite de 3%, imposto pelo Tratado

de Maastricht para o déficit (O ESTADO DE S. PAULO, 2010t).

O próximo passo dado pela UE com vistas a estabelecer o equilíbrio econômico no bloco

referiu-se à criação de novos mecanismos de controle comunitários tanto sobre os déficits como

sobre as dívidas nacionais. Os ministros de Finanças decidiram, na reunião ocorrida no início de

junho, o que já era esperado: aumento do rigor. Como resultado da reunião, o escritório

responsável pelas estatísticas das Comunidades Europeias, o Eurostat, vai ganhar mais

atribuições e poder, e não mais apenas receberá dos países seus dados macroeconômicos; agora

também verificará e investigará a solidez dos números apresentados. Será uma espécie de

fiscalização que permitirá à UE analisar os orçamentos de cada Estado-membro seis meses antes

de os respectivos parlamentos os terem aprovados, impedindo assim que outros países

apresentem dados manipulados. A supervisão dos orçamentos nacionais terá início em 2011 e os

orçamentos deverão ser encaminhados com programas de estabilidade e a fiscalização não mais

permitirá “a contração excessiva de dívidas ou a explosão dos déficits” (NETTO, 2010ag:B6;

NETTO, 2010ah).

No decorrer das discussões surgiu o que parece ser a solução mais ambiciosa para que a

UE volte a desfrutar seus dias de paz: governança fiscal. Só através de um mecanismo de

governança fiscal é que os déficits orçamentários serão impedidos; porém, a implantação de um

mecanismo desse tipo implica, em primeiro lugar, a perda de soberania política, assunto pouco

agradável para os países. Além disso, devido ao Euro ser compartilhado por 16 países-membros e

não pela totalidade de países que formam a UE, para vigorar um mecanismo de governança fiscal

seria necessária a elaboração de novos tratados que apenas dissessem respeito aos países da zona

do Euro, bem como novas instituições supranacionais; essa é a ideia francesa. Já na ideia alemã,

não pode haver maiores divisões dentro da UE, ou seja, criar novos tratados e novas instituições

para os países da zona do Euro está fora de questão. As duas potências europeias concordam que

a governança fiscal é uma das saídas possíveis, porém dificilmente concordarão em subtrair ainda

mais suas soberanias e não cederão às ideias uma da outra com relação de como a governança

deverá funcionar (MING, 2010b; LAPOUGE, 2010c).

A França ainda foi além e apresentou a proposta mais profunda de solução para o bloco.

Na verdade, a solução ultrapassa os limites do bloco, atingindo todo o sistema financeiro

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internacional, uma vez que a proposta é exatamente sua reforma. A França de Sarkozy, que

assumiu agora em novembro a presidência do G-20, anunciou sua intenção de negociar o que

seria um novo “Bretton Woods”. Sua intenção é, já a partir de 2011, “consolidar os mecanismos

de coordenação” e “reforçar a supervisão multilateral”, visando a recuperar a estabilidade

monetária mundial. A intenção do presidente francês é boa, porém, algumas barreiras impedem

que seja colocada em prática. A primeira delas é que, atualmente, nenhuma moeda é capaz de

substituir o dólar; portanto, a reserva internacional de valor continuará sendo a moeda norte-

americana. E a segunda, realmente importante, é que nenhuma proposta que tire o dólar do lugar

que se encontra hoje, será aceita pelos Estados Unidos (NETTO, 2010ai:B9; MING, 2010c).

Até setembro de 2010, o maior avanço dado para solucionar os problemas de toda a UE

havia sido a criação de um fundo de socorro que está sob o comando do economista alemão,

Klaus Regling. A denominação do fundo é a seguinte: Fundo Europeu de Estabilização

Financeira (EFSF é a sigla em inglês). Regling tem à sua disposição € 440 bilhões e uma difícil

missão: devolver o Euro à estabilidade. A abrangência de suas medidas é a zona do Euro, ou seja,

16 países, e o objetivo é de que em casos de emergência fiscal em qualquer um deles, o fundo

esteja pronto para intervir financeiramente. O mecanismo funcionará pelos próximos três anos, e

por ter sido criado com a quantia de € 440 bilhões à sua disposição, elimina a necessidade de

arrecadações entre os países do bloco, que, como visto no caso da Grécia, complica e atrasa as

resoluções. No fundo, o EFSF é mais uma medida de precaução, e o desejo da UE é que ele não

precisasse interferir em nenhum país (REIERMAN, 2010). O problema, porém, é que a

possibilidade do EFSF não precisar salvar os países durou pouco. Os acontecimentos mais

recentes colocaram a Irlanda como a maior ameaça ao Euro, e um plano para salvá-la com os

recursos do fundo precisou ser elaborado.

A crise na Irlanda deteriorou-se quando um resgate aos bancos do país foi anunciado no

começo do mês de outubro. A soma dos recursos necessários para o salvamento foi de € 40

bilhões, quantia muito elevada para um país em contenção de gastos, e que resultará na elevação

do déficit público de 2010 ao seu recorde: 32% do PIB, dez vezes acima do permitido pela UE.

Mesmo assim, à época do anúncio, o governo irlandês manteve sua meta de derrubar o déficit

para 3% até 2014, exigindo cortes ainda mais drásticos. Na ocasião, o ministro das Finanças

deixou claro não precisar de nenhum tipo de empréstimo, ao mesmo tempo em que a UE declarou

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não ter a intenção de socorrer o país, por mais uma vez acreditar, como fez com a Grécia, que o

governo irlandês se reerguiria sozinho (O ESTADO DE S. PAULO, 2010u).

A sequência dos fatos foi ainda pior, pois mesmo com os cortes de gastos a economia

irlandesa não pareceu reagir, o que fez com que a ideia de um novo socorro por parte da UE se

tornasse cada vez mais clara. Prevendo maiores complicações para todo o bloco, o presidente da

Comissão Europeia, José Manuel Durão Barroso, anunciou em novembro, que a UE estaria

pronta para ajudar a Irlanda através do EFSF, caso fosse necessário (CHADE, 2010v). Em

seguida, os ministros de Finanças das cinco maiores economias da Europa, durante a Cúpula do

G-20 realizada em Seul, reforçaram a declaração de Barroso, na intenção de devolver a confiança

aos mercados em relação ao Euro. Ainda assim, o governo irlandês manteve sua posição de não

recorrer ao fundo, acreditando que mais medidas de austeridade seriam o suficiente para

conseguir realizar o pagamento da dívida (O ESTADO DE S. PAULO, 2010v)

O ‘Tigre Celta’, como o país foi chamado durante seus anos de crescimento, vive agora

sua pior realidade. A Irlanda passou uma década com as maiores taxas de crescimento do

continente, que está prestes a ser trocada por uma década de estagnação. Desde 2008 o PIB do

país já declinou 13%, e o único fator que tem afastado a depressão é a exportação, equivalente a

mais de 50% da produção industrial. Especialistas apontam que se essa base exportadora não

existisse, o país teria sido resgatado muito antes (CHADE, 2010w). E os problemas não param

por aí. A situação irlandesa é tão grave que a expectativa é que sua população diminua 5% entre

2009 e 2011, o que representará a saída de 200 mil pessoas do total de 4 milhões de habitantes.

Só neste ano 70 mil já deixaram a Irlanda (O ESTADO DE S. PAULO, 2010w).

Finalmente, em 21 de novembro, o pacote de resgate para a Irlanda foi anunciado. Apesar

de o governo ter se mostrado relutante no início, não houve outra saída; Dublin foi incapaz de

solucionar seus problemas sozinho, e aceitou a intervenção da UE e do FMI. A quantia estipulada

para a ajuda foi entre € 80 e € 90 bilhões, sendo que, a previsão é que a maior parte seja

direcionada para os bancos e o restante para as contas públicas. Como no caso da Grécia, o

resgate veio acompanhado de novas medidas: reforma dos bancos, demissão de funcionários

públicos, redução no salário mínimo, novas cargas tributárias, entre outras. Os cortes

representarão uma diminuição de 10% do PIB e atrasarão a recuperação da economia (CHADE,

2010x; CHADE, 2010y).

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A União Europeia não esperava que a “crise do Euro” se alongasse por tanto tempo, e tão

pouco não previa ter que resgatar outros Estados-membros além da Grécia. Tal realidade fez com

que o bloco reconhecesse a necessidade de elaborar um mecanismo permanente de socorro. Com

a existência de um mecanismo permanente, qualquer país da zona do Euro seria resgatado ao

enfrentar problemas de insolvência, sem que se dispendesse meses à procura da solução ideal.

Agora, a UE propõe que esse mecanismo seja criado antes de 2013, data em que expira a validade

do fundo de socorro comandado por Klaus Regling (O ESTADO DE S. PAULO, 2010x). Tudo

indica que esta medida é apenas parte da solução para reencaminhar a União Europeia ao

caminho do sucesso.

Page 78: Euro: Da criação à crise Nome do Autor: Nayara Furlan Rocha

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em maio de 2010 a União Europeia completou 60 anos de aniversário; porém, o momento

que deveria ser de comemorações, foi de constatações a respeito das falhas presentes no projeto

que permitiram à UE perder-se na crise. Uma coisa, porém, não se pode negar: “o processo é o

maior projeto de paz já conduzido pela humanidade em séculos”, e, além disso, alguns dos países

que formam o bloco, apresentam os maiores índices de desenvolvimento social do mundo. Mas,

por ser um bloco muito heterogêneo, a UE enfrenta dificuldades para reorganizar-se e sair de sua

primeira crise (CHADE, 2010z:B6). A crise mundial de 2008 afetou a UE de tal maneira que foi

possível enxergar com clareza as falhas originais do projeto, tanto em relação à adoção da moeda

única, quanto em relação à união de países tão diferentes e tão orgulhosos de suas diferenças

(LAPOUGE, 2010d). Até o momento, o que se vê, é que a UE tomou algumas medidas de caráter

mais emergencial visando a devolver confiança à sua moeda, mas em termos de melhorias na

integração, ainda nada foi colocado em prática.

França e Alemanha, as duas maiores economias da zona do Euro, demonstraram muito

bem que existem diferenças fundamentais entre elas, durante os primeiros meses do ano em que

se buscava a solução para a crise grega. Enquanto a França pendia mais para o lado da Grécia,

pedindo que a UE a socorresse, a Alemanha não pendia para lado nenhum, a não ser o seu

próprio. Assim, tropeçamos no pecado original da moeda comum europeia, que foi impor uma mesma moeda a países que tudo separa, países que não têm a mesma população, nem o mesmo parque industrial, não têm os mesmos talentos, as mesmas regras em matéria de salário, compatibilidade, recursos, energia para o trabalho (idem, ibidem) e (...) foi estúpido impor uma mesma moeda a 16 países que são separados por tudo: força, hábitos, leis, necessidades. Como impor uma mesma moeda a um gigante racional e laborioso como a Alemanha e a um pigmeu irracional e frívolo como a Grécia? (LAPOUGE, 2010e).

A ideia principal contida nesse argumento é que economias tão diversas não podem ser

submetidas às mesmas regras, pois não funcionam da mesma maneira e, portanto, não conseguem

atingir os mesmos objetivos. Para corrigir a queda da competitividade entre economias diversas e

colocar novamente um país no jogo do comércio mundial, é preciso praticar a depreciação

cambial. O problema é que entre os países da zona do Euro, a depreciação cambial é

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impraticável, exatamente por utilizarem a mesma moeda. Para exemplificar, Krugman

(2010a:B3) utiliza-se do caso da Espanha:

O problema econômico central do país é que custos e preços se desalinharam dos vigentes no resto da Europa. Se a Espanha ainda tivesse sua antiga moeda, a peseta, ela poderia remediar o problema com uma rápida desvalorização – por exemplo, baixando em 20% o valor da peseta ante outras moedas europeias.

Em casos deste tipo, não restam muitas saídas para o governo. A competitividade só será

retomada através da deflação, um processo não só lento, como também desgastante, atingido pelo

aumento de impostos e cortes nos gastos; medidas já praticadas nos PIIGS. Krugman conclui que

o principal problema da crise do Euro está na inflexibilidade imposta à moeda e não nos enormes

déficits dos países. Vai ainda mais longe ao dizer que a adoção da moeda única foi precipitada,

pois a Europa não possuía, e ainda não possui, as características fundamentais para este

importante passo (idem, ibidem; PASTORE, 2010).

Como então corrigir o problema que acompanha a zona do Euro desde o seu nascimento?

Especialistas do mundo todo foram surpreendidos com o sucesso obtido pelo Euro em seus

primeiros anos; a maioria deles esperava que sem a unificação política, o Euro não chegaria a

lugar algum (NORRIS, 2010). Até antes da crise, o que aconteceu foi o contrário; mas agora

parece que sem o aprofundamento da integração, que leve à unificação política, o Euro não terá

um futuro promissor.

Durante o ano, muito foi dito sobre o que deveria ser feito para salvar a União Europeia e

sua moeda. Sugestões como: expulsar os maiores devedores da zona do Euro, retornar às moedas

nacionais, aplicar punições aos governos irresponsáveis, recorrer à ajuda externa do FMI,

aprofundar a integração, criar um fundo para a Europa (FME) e ampliar as atribuições do BCE.

A União Monetária Europeia funcionou bem durante praticamente dez anos. A crise

mundial chegou ao continente e revelou alguns problemas graves; um deles referiu-se à união

monetária. Por incluírem a mesma união monetária, não deveria existir desequilíbrio entre as

economias fortes e as menores, que colocam em risco a resistência da união. Se um dos países

está em contração, todos os outros devem seguir o mesmo caminho, para que nenhum deles seja

prejudicado. Agora, se dentro da União Monetária Europeia existem países em expansão, ao

mesmo tempo em que outros estão em contração, é evidente que haverá prejuízos, pois o bloco

ainda não conta com a plena mobilidade de mão de obra, que resolveria o problema, e muito

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menos com uma entidade supranacional que consiga controlar os gastos públicos de toda a região

(PASTORE, 2010). É, portanto, o desequilíbrio entre as economias, provocado marjoritariamente

pela Alemanha, que precisa ser resolvido em primeiro lugar.

Em seguida, diferente do que pensam alguns, para a zona do Euro recuperar-se é preciso

avançar nas negociações em direção à união política, e não desfazer o projeto de integração. Só

uma união política permite trabalhar com um orçamento centralizado, dotado de um mecanismo

automático de equilíbrio; é o caso dos Estados Unidos. Por lá, as divergências financeiras entre os

países são amenizadas através de redistribuições do orçamento federal, sem que se seja preciso

reuniões intermináveis que decidam o futuro de um país (GRAUWE, 2010). A união política,

portanto, conferiria à zona do Euro a solidariedade que lhe falta e resolveria grande parte de seus

problemas atuais. Mas é preciso lembrar que este não é um tema fácil para negociações e uma

conclusão neste sentido levará tempo.

Ainda assim, aprofundar o processo de integração é, de fato, muito importante. A demora

pressenciada durante os primeiros meses deste ano para chegar a um consenso sobre a ajuda à

Grécia, não pode mais se repetir.

Muito tempo foi perdido e muitos danos cometidos antes de governos da zona do Euro criarem seu fundo de estabilização. Uma união política teria garantido que as políticas fiscais fossem mais coordenadas, impedindo as grandes diferenças nos resultados fiscais. Sem ela, a união monetária não tem futuro. Ela caminhará de uma crise para outra (idem, ibidem).

Outro ponto que precisa passar por modificações é a questão das regras para adesão de

novos países à zona do Euro. As regras atuais precisam ser atualizadas de modo a conferir uma

maior harmonização entre os países do bloco, e devem contar com mais rigor, para garantir que

fraudes como a da Grécia não ocorram mais (CHADE, 2010z).

Seguindo com as reformas, o Pacto de Estabilidade e Crescimento que impõe os limites

de 3% do PIB para o déficit orçamentário, e de 60% do PIB para a dívida pública, precisa ser

complementado porque não prevê nenhum tipo de punição aos países que ultrapassam tais

limites. Além disso, as limitações institucionais do BCE devem ser eliminadas para que ele possa

finalmente controlar as instituições financeiras europeias, dando estabilidade à moeda únida

(MING, 2010d).

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As medidas acima citadas, se colocadas em prática, dariam à zona do Euro novas

características importantes e provavelmente a conduziriam à tranquilidade. Mesmo assim, em

alguns momentos, foi levantada a possibilidade dos países saírem da zona do Euro. Países com

dificuldades deixariam o bloco e retornariam às suas moedas nacionais visando a praticar

desvalorizações cambiais, que por sua vez, devolveriam ao país a competitividade perdida e a

estabilização das contas públicas. Além do que, tiraria o Euro do foco dos especuladores. Mas é

importante destacar que a hipótese de sair da zona do Euro não é a melhor opção. O país que

fizesse esta escolha continuaria com suas dívidas em Euro e teria ainda mais dificuldade para

pagá-las, pois sua moeda estaria desvalorizada em relação ao Euro. Além do que, não contaria

mais com a ajuda do bloco, como ocorreu com a Grécia e a Irlanda, e sua única saída, portanto,

seria recorrer exclusivamente ao FMI e aplicar as pesadas medidas por ele impostas.

Por fim, tão necessária quanto as outras medidas, é a simplicação da estrutura

organizacional da UE. Hoje, são três presidentes: o rotativo, que assume a presidência por seis

meses; o permanente, Herman Van Rompuy; e José Manuel Barroso, presidente da Comissão

Europeia. Além deles, são 27 ministros de relações exteriores e mais a chefe da diplomacia,

baronesa Chaterine Asthon de Upholland. A estrutura pouco prática, facilita a competição entre

os interesses nacionais e não minimiza as diferenças políticas em questões de alta importância

para o bloco. Ironizando o projeto de integração europeia, há 30 anos, o norte-americano Henry

Kissinger perguntou para qual telefone deveria ligar se quisesse falar com a Europa; ainda hoje

este comentário é válido (CHADE, 2010aa; CHADE, 2010ab).

Trata-se de um momento de definição de todo um projeto, que completou 60 anos e

parece ainda ter esperanças de manter-se vivo no velho continente.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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APÊNDICES

As tabelas e gráficos abaixo são complementares ao terceiro capítulo.

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