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Instituto Superior de Ciências da Saúde – Norte 1.º Ano – Medicina Dentária Introdução à Medicina Dentária Discente: Bárbara Joana Gonçalves Rodrigues Deontologia e Ética: Eutanásia: perspectivas axiológicas e éticas A eutanásia é uma prática tão antiga quanto o Homo Socius. Desde tempos imemoriais esta tem vindo a ser utilizada pelas comunidades mais distintas, desde esquimós do Alasca ou os índios brasileiros. O termo Eutanásia vem do grego e traduz-se como "boa morte" ou "morte apropriada". De um modo geral, entende-se por eutanásia, quando uma pessoa causa, voluntária e deliberadamente, a morte de outra pessoa que está fraca, debilitada ou em sofrimento. A discussão, acerca dos valores sociais, culturais e religiosos, envolvidos na questão da eutanásia, vem desde a Grécia antiga. Os que defendem tal pratica apoiam-se no facto de que, em medicina, existem quadros clínicos irreversíveis, sendo que os doentes que muitas vezes passam por dores terríveis e sofrimento anseiam pela antecipação da morte como forma de aliviar o sacrifício que se tornou viver. Assim sendo, para estes, a morte não só satisfaria o desejo do paciente

Exame Introdução à medicina Dentária

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Instituto Superior de Ciências da Saúde – Norte

1.º Ano – Medicina Dentária

Introdução à Medicina Dentária

Discente: Bárbara Joana Gonçalves Rodrigues

Deontologia e Ética:

Eutanásia: perspectivas axiológicas e éticas

A eutanásia é uma prática tão antiga quanto o Homo Socius. Desde tempos

imemoriais esta tem vindo a ser utilizada pelas comunidades mais distintas, desde

esquimós do Alasca ou os índios brasileiros.

O termo Eutanásia vem do grego e traduz-se como "boa morte" ou "morte

apropriada". De um modo geral, entende-se por eutanásia, quando uma pessoa causa,

voluntária e deliberadamente, a morte de outra pessoa que está fraca, debilitada ou em

sofrimento. A discussão, acerca dos valores sociais, culturais e religiosos, envolvidos na

questão da eutanásia, vem desde a Grécia antiga.

Os que defendem tal pratica apoiam-se no facto de que, em medicina, existem

quadros clínicos irreversíveis, sendo que os doentes que muitas vezes passam por dores

terríveis e sofrimento anseiam pela antecipação da morte como forma de aliviar o

sacrifício que se tornou viver. Assim sendo, para estes, a morte não só satisfaria o

desejo do paciente de morrer com dignidade, mas também reforçaria a autonomia para

decidir sobre a mesma.

Por sua vez os que se opõe à prática da eutanásia acreditam que é dever do

Estado preservar a vida humana, proporcionando aos cidadãos o bem-estar e evitar que

estes sejam mortos ou colocados em situações de risco. Neste caso, os direitos dos

pacientes estão na maioria das vezes subordinados à vontade de outros, tendo como

intenção prolongar a vida do doente, até mesmo contra sua vontade.

Axiologicamente, a eutanásia vai de encontro com a sobrevivência, ficando entre

um desejo de morte que surge devido à degradação da qualidade de vida causada por

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uma doença terminal ou irreversível, quer pela dignidade da vida quer pela dignidade na

morte.

A eutanásia, segundo o prisma axiológico, vai da máxima ligação imposta pelas

condições da vida, à entrega vital, pelo conteúdo dos valores e das pessoas. Segundo

esta fenomenologia de valores a eutanásia necessita de uma revisão axiológica: Videre

(o doente que vê que desapareceu a dignidade da vida); Judicare (intençao de terminar

com a vida biológica); Agere (realizar a acção quer por terapia farmacológica ou

cirúrgica determinar a morte). No entanto, perante a perspectiva da eutanásia nem todos

os doentes apresentam o mesmo comportamento axiológico devido não só a

religiosidade e crença mas também ao utilitarismo ou positivismo no viver e morrer.

Desta forma, só na percepção dos valores se compreenderá o valor moral da

eutanásia. O bem ou o mal da eutanásia são os valores do sujeito, da pessoa que tem

experiência deles. Na eutanásia dos valores morais revelam-se na percepção do valor do

ser humano como sujeito, significa que os valores morais não são só objectos da

vontade.

O amor à vida e o ódio ao morrer onde se encontra a eutanásia são fonte

fundamental do conhecimento dos valores, da sua experiência cognitiva e do proceder

emocional do sujeito.

Axiologicamente pensando a quem pertence a vida, segundo a religião esta

pertence a Deus, aparecendo como um direito irrenunciável da qual o Homem não pode

dispor. Assim o gesto da eutanásia será tomar o lugar de Deus. Esta é portanto

inaceitável porque sendo a vida um dom de Deus não nos pertence. Porém, eutanásia

significa fazer depender a vida de um indivíduo pela vontade de outro. Esta está

orientada para um desejo axiológico que na sua actuação comporta uma decisão

formada por outro.

Ninguém poderá privar legitimamente um homem da vida pois o valor o valor da

vida inalienável e nenhum doente ou médico pode dispor dela.

Assim sendo, a questão ética da eutanásia é um problema axiológico que pressupõe uma

hierarquização de valores.

O acto de provocar a morte por motivos de compaixão sempre foi motivo de

reflexão por parte da sociedade. Devido aos avanços da medicina, criaram-se diversas

possibilidades de salvar mais vidas e, estando por seu turno o médico, por questões

éticas no dever de cumprir o julgamento hipocrático de assistir o doente procurando

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assegurar a sua sobrevivência, surgem inevitavelmente dilemas éticos que dificultam

um conceito mais ajustado do fim da existência humana.

Cada dia que passa maior é a crença que é possível uma morte digna e famílias

já admitem o direito de decidir sobre os doentes sem salvação confinados pelo

sofrimento.

Assim, todos devem ser orientados por uma ética alicerçada em princípios e

sentimentos preocupados em entender as dificuldades do final da vida.

SIDA: aspectos imunológicos e caracterização ética

A Síndrome de Imunodeficiência Adquirida (SIDA) é o conjunto de sintomas e

infecções em seres humanos resultantes do dano específico do sistema imunológico

ocasionado pelo vírus da imunodeficiência humana (VIH).

Segundo interpretações religiosas a SIDA é considerada fruto da desordem

moral da sociedade, insistindo-se sobretudo na permissividade sexual.

Esta doença infecciosa que pode ser transmitida por relações sexuais; contacto

com sangue infectado; de mãe para filho durante a gravidez ou o parto e pela

amamentação.

Sendo a Sida uma doença infecciosa, é necessário atender-lhe, para além da

forma como se permite, também o grau de infecciosidade, a possibilidade de tratamento

e cura da doença, prevenção e duração. São estas quatro últimas que lhe conferem um

quadro sombrio, uma vez que, contraída a doença, esta é mortal, nem terapêutica

etiológica, nem profiláctica surtem efeito. A duração do contágio é indefinida. Os

seropositivos, mesmo os que não contraíram a doença, se-lo-ão toda a vida até à morte.

Actualmente, contam-se com mais de 20 milhões pessoas mortas pelo HIV e

mais de 3,7 milhões de pessoas convivendo com o vírus em todo o mundo.

Assim, por ser considerada um dos princípios reguladores do desenvolvimento

histórico-cultural da humanidade a ética vem à tona com o advento da sida, que por se

tratar de uma doença que até ao momento não tem cura, que tem um carácter epidémico

e mobiliza a sociedade, originou uma revolução em todos os sentidos, principalmente na

discussão ética sobre pesquisa, pois a pesquisa é a maneira confiável pela descoberta de

vacinas e tratamentos eficazes que proporcionem melhor qualidade da infecção.

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A SIDA trouxe então consigo pontos éticos bastante delicados, pois surge a

necessidade de balancear os direitos e as necessidades do individuo e o bem público. A

par com essas questões, há as preocupações com a privacidade e a confidencialidade, já

que quem pesquisa entra na vida particular e na intimidade dessas pessoas.

Tendo em conta que cuidar de pessoas com a síndrome de imunodeficiência

adquirida faz parte do dia-a-dia de muitos profissionais da área da saúde, é preciso

resgatar a verdadeira essência do cuidado para possibilitar maior amorosidade entre os

seres humanos, e com isso, criar um mundo com mais valor, valor esse assente nos

preceitos éticos necessários para se viver em comunidade e, nessa vida em comunidades

essencial para se compreender as necessidades do outro, principalmente se esse e

portador de uma doença estigmatizada como a sida.

No entanto, a resistência a tratar doentes de SIDA é real e crescente. Surge uma

nova geração de médicos com dúvidas crescente sobre o seu papel, ao aceitar riscos em

benefício de seus doentes. E a par destes cresce a tendência geral da sociedade para

marginalizar os infectados.

É necessário pois, no domínio da ética social, insistir no direitos dos infectados

manterem o seu emprego, não sendo discriminados e recebendo a ajuda necessária nos

tratamentos.

Fala -se pouco da mudança de atitudes para deter a pandemia, porem, a maior

esperança está numa revalorização moral da sociedade

Ética e Moral: relações e fundamentos

A palavra Ética vem do grego “ethos” que significa modo de ser, e Moral tem a

sua origem no latim, que vem de “mores”, significando costumes.

Moral é um conjunto de normas que regulam o comportamento do homem em

sociedade, e estas normas são adquiridas pela educação, pela tradição e pelo quotidiano.

Durkheim explicava Moral como a “ciência dos costumes”, sendo algo anterior à

própria sociedade. Já a palavra Ética, era definida como um “conjunto de valores que

orientam o comportamento do homem em relação aos outros homens na sociedade em

que vive, garantindo, o bem-estar social”, ou seja, Ética é a forma que o homem se deve

comportar no seu meio social.

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A Moral sempre existiu, pois todo o ser humano possui a consciência Moral que

o leva a distinguir o bem do mal no contexto em que vive. Surgindo realmente quando o

homem passou a fazer parte de agrupamentos, isto é, surgiu nas sociedades primitivas,

nas primeiras tribos. A Ética, por sua vez, teria surgido na Grécia Antiga, no seio da

polis pois exigiu-se um maior grau de cultura, foi oriunda de inquietações sobre a vida

com dignidade, apesar das inúmeras dificuldades. Ela investiga e explica as normas

morais, pois leva o homem a agir não só por tradição, educação ou hábito, mas

principalmente por convicção e inteligência. Assim, Ética é teórica e reflexiva, enquanto

a Moral é eminentemente prática. Uma completa a outra, existindo um inter-

relacionamento entre ambas, pois na acção humana, o conhecer e o agir são

indissociáveis.

A ética é a teoria ou ciência do comportamento moral dos homens em sociedade.

A capacidade ética tem por objectivo a reflexão critica do acto moral, ou seja, sobre o

que é (ou pode ser) errado. Assim, a ética não é moral. Moral é o objecto de estudo da

ética, diz respeito aos costumes, valores e normas de conduta de cada sociedade.

A ética, então, pode ser a lei do que seja acto moral, o controlo de qualidade da

moral. Daí os códigos de ética que servem para as diferentes micro-sociedades dentro de

um sistema maior. A moral, por sua vez, de acordo com Kant, “é aquilo que precisa ser

feito, independentemente das vantagens ou prejuízos que possa trazer”. Deste modo,

quando praticamos um acto moral, podemos até sofrer consequências negativas, pois o

que é moral para uns pode ser amoral ou imoral para outros.

A Moral, afinal, não é somente um acto individual, pois as pessoas são, por

natureza, seres sociais, assim percebe-se que a Moral também é um empreendimento

social. E esses actos morais, quando realizados por livre participação da pessoa, são

aceites, voluntariamente.

O desafio actual é repensar o modo de ser egoísta que a sociedade actual cultiva

no íntimo de cada cidadão e trabalhar formas que levem os homens a actuarem na

dimensão da colectividade, preservando valores universais humanos e as

microrealidades históricas, fazendo com que seja preservada a biodiversidade, com que

se reconheçam as especificidades locais e respeitadas as diferenças de género, raça,

religião e outras mais.

Em suma, Ética e Moral são os maiores valores do homem livre. Ambos

significam "respeitar e venerar a vida". O homem, com seu livre arbítrio, vai formando

o seu meio ambiente ou destruindo-o, ou ele apoia a natureza e as suas criaturas ou ele

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subjuga tudo o que pode dominar, e assim ele mesmo se torna no bem ou no mal deste

planeta. Deste modo, Ética e a Moral formam-se numa mesma realidade.

História da Medicina:

Medicina Hipocrática: Anatomia, Patologia, Cirurgia, Terapêutica e Código

Deontológico

A medicina hipocrática teve a sua origem na Grécia, em meados do séc. IV e no

séc. V a.C. e teve como principal figura Hipócrates. Tal como testemunham os textos de

Platão e Aristóteles que o consideram o modelo do grande médico e a própria

personificação da medicina, Hipócrates foi um dos mestres mais importantes da escola

médica de Cós.

Hipócrates define que a medicina “é libertar completamente os doentes dos seus

sofrimentos ou amortecer a violência das doenças, e não tratar dos doentes que se

encontram vencidos pelas doenças, sabendo que a medicina pode tudo isso”.

Qualificar a medicina hipocrática como científica requer algum cuidado pois não

se pode tentar comparar a “ciência” produzida naquele tempo com a ciência actual.

Mas, se entender por ciência, em sentido lato, a produção racional de leis gerais

explicativas dos fenómenos, baseada na observação sistemática de casos individuais

acompanhada de princípios e métodos de investigação, então está-se, indubitavelmente,

perante uma nova atitude face à doença, o primeiro esforço da medicina para se libertar

do pensamento mágico e constituir-se como racionalidade.

Antigamente, algumas doenças, como por exemplo a epilepsia, era atribuída a

causas sobrenaturais. No entanto, segundo Hipócrates, a atribuição de uma causa

sagrada ou sobrenatural a uma doença não é mais do que uma maneira de esconder a

ignorância. Para ele, “ aqueles (mágicos, purificadores, charlatães) que por não

conseguirem tratar remetem-se para a superstição e chamam-lhe sagrada, para que a sua

ignorância não se manifeste”.

Na teoria hipocrática, o corpo é composto por quatro líquidos ou humores: o

sangue, a pleura, a bílis amarela e a bílis negra. Foi estabelecida uma correspondência

entre os quatro humores com os quatro elementos (terra, ar, fogo e água), com as quatro

qualidades (frio, quente, seco e húmido) e com as quatro estações do ano (Inverno,

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Primavera, Verão e Outono). O estado de saúde seria o resultado do equilíbrio ideal

entre os quatro humores, sendo a doença o excesso ou a falta deles, que poderiam ser

alterados por causas externas ou internas.

A doença não é encarada como exterior ao sujeito mas como algo que no seu

interior se desequilibra. A saúde, por seu lado, identifica-se com o “estado natural”

sendo o “natural” o modelo do “normal”. O conceito de “normal” como “natural”

inscreve-se, mais uma vez, no pensamento filosófico que precedeu e, segundo alguns

autores, constituiu mesmo a possibilidade da emergência da medicina hipocrática.

Segundo a concepção hipocrática da patologia humoral, quando uma pessoa se

encontra enferma, há uma tendência natural para a cura; a natureza (Physis) encontra

meios de corrigir a desarmonia dos humores (discrasia), restaurando o estado anterior de

harmonia (eucrasia).

Assim, a medicina hipocrática conhecia e explicava o adoecer na relação entre o

homem doente e o seu meio envolvente. O olhar do médico não se dirigia apenas ao

corpo doente; era requisitado para estar atento aos sinais transmitidos pela natureza, no

seu todo.

Quanto às terapêuticas utilizadas, os meios utilizados pelos médicos hipocráticos

para restabelecer a saúde, centravam-se, sobretudo, no regime alimentar e em regras de

comportamento adequadas. Esta medicina higiénica era utilizada não só como medida

curativa mas também como medida de prevenção, de conservação do estado

“normal”.Originalmente os Homens consumiam sobretudo carne e vegetais crus, no

entanto houve a necessidade de se adequar a alimentação à natureza do homem o que

provocou diminuição da mortalidade precoce e a percepção que a alimentação dos

homens saudáveis não era a mais conveniente para os homens doentes.

A escola hipocrática retoma assim a ideia fundamental de dieta, observando

cautelosamente a relação entre os alimentos e os sintomas, assim como a influência de

outros aspectos da vida humana, tais como o sono, os passeios, a ginástica, as e ainda

condições exteriores como o clima, a estação do ano, a hora do dia, o calor, o frio.

Por sua vez, O juramento hipocrático constitui o paradigma da ética médica e,

como documento de maior vigência no curso da história da medicina ocidental,

estabelece a profissão médica como um compromisso público, contraído perante Deus,

exigindo daquele que o professa a excelência no que faz, mediante uma grande

qualidade moral e responsabilidade ética. Este juramento solene e sagrado definia o

carácter interno, privado e moral da responsabilidade profissional do médico

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hipocrático, acarretando um forte compromisso de exercer a profissão conforme suas

normas.

Para os hipocráticos de todos os tempos, a acção do médico deve ser realizada

primariamente em benefício do paciente, deixando o interesse da sociedade em plano

secundário e o seu próprio benefício em terceiro lugar. Tal postura evita caracterizar

como acção primariamente comercial o que deve ser uma relação de ajuda e confiança.