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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS - 90ª Promotoria de Justiça Rua 23, esq. com a Av. Fued José Sebba, Qd. 06, Lts. 15/25, Jardim Goiás, sala 342, CEP 74.805-100, Goiânia - Goiás. EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) DOUTOR(A) JUIZ(A) DE DIREITO DA ___ VARA DA FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL DA COMARCA DE GOIÂNIA-GO. O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS, por intermédio da Promotora de Justiça que esta subscreve, titular da 90ª Promotoria de Justiça do Estado de Goiás, no uso de suas atribuições constitucionais, e com fulcro nos artigos 129, inciso III, da Constituição Federal, artigo 5º, inciso I, da Lei 7.347/85, na Lei Federal 8.429/92 e artigo 25, inciso IV, alínea “b” da Lei Federal 8.625/93, no artigo 46, inciso VI, alínea “b”, da Lei Complementar Estadual n. 25/98, vem perante Vossa Excelência propor AÇÃO CIVIL PÚBLICA PARA DECLARAÇÃO DE NULIDADE DE ATOS ADMINISTRATIVOS, IMPOSIÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER e RESTITUIÇÃO AO ERÁRIO observado o rito ordinário e disposições especiais previstas na Lei 7.347/85 contra VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO, ESTADO DE GOIÁS, pessoa jurídica de direito público, inscrita no CNPJ com nº 01.409.580/001-38, representada pelo Procurador-Geral do Estado

EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) DOUTOR(A) JUIZ(A) DE DIREITO ... · MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS - 90ª Promotoria de Justiça Rua 23, esq. com a Av. Fued José Sebba, Qd

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS - 90ª Promotoria de Justiça Rua 23, esq. com a Av. Fued José Sebba, Qd. 06, Lts. 15/25, Jardim Goiás, sala 342, CEP 74.805-100, Goiânia - Goiás.

EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) DOUTOR(A) JUIZ(A) DE DIREITO DA ___

VARA DA FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL DA COMARCA DE GOIÂNIA-GO.

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS, por

intermédio da Promotora de Justiça que esta subscreve, titular da 90ª Promotoria de Justiça do

Estado de Goiás, no uso de suas atribuições constitucionais, e com fulcro nos artigos 129,

inciso III, da Constituição Federal, artigo 5º, inciso I, da Lei 7.347/85, na Lei Federal

8.429/92 e artigo 25, inciso IV, alínea “b” da Lei Federal 8.625/93, no artigo 46, inciso VI,

alínea “b”, da Lei Complementar Estadual n. 25/98, vem perante Vossa Excelência propor

AÇÃO CIVIL PÚBLICA PARA DECLARAÇÃO DE NULIDADE DE ATOS

ADMINISTRATIVOS, IMPOSIÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER e RESTITUIÇÃO

AO ERÁRIO

observado o rito ordinário e disposições especiais previstas na Lei 7.347/85 contra

VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO,

ESTADO DE GOIÁS, pessoa jurídica de direito público,

inscrita no CNPJ com nº 01.409.580/001-38, representada pelo Procurador-Geral do Estado

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS - 90ª Promotoria de Justiça Rua 23, esq. com a Av. Fued José Sebba, Qd. 06, Lts. 15/25, Jardim Goiás, sala 342, CEP 74.805-100, Goiânia - Goiás.

Alexandre Eduardo Felipe Tocantins, com sede no Palácio Pedro Ludovico Teixeira - Rua

82, S/N Setor Sul, CEP: 74088-900, Goiânia – GO;

pelos fatos e fundamentos jurídicos a seguir expostos.

I – DO OBJETO DA PRESENTE AÇÃO

Objetiva o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE

GOIÁS, com o exercício do poder de ação, obter um provimento jurisdicional que declare a

nulidade do vínculo de VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO com a Assembleia

Legislativa do Estado de Goiás, no cargo de Assistente Administrativo, posteriormente

nominado pela Resolução 1007/1999 – Assistente Legislativo – categoria funcional

Assistente Administrativo -, no período de 05/10/1988 a 24/11/2015, em razão de sua

violação ao disposto no artigo 37, inciso II da CF e artigo 19 do ADCT, bem como a

declaração de nulidade do ato de aposentadoria de VALÉRIA JAIME PEIXOTO

PERILLO pelo Regime Próprio de Previdência Social, aposentadoria essa que lhe foi

concedida em razão do vínculo inexistente com a Administração Pública Estadual.

Subsidiariamente, caso não acolhidos os pedidos anteriores,

objetiva o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS a exclusão, dos proventos

de aposentadoria, da parcela da remuneração consubstanciada na VPNI – Vantagem Pessoal

Nominalmente Identificada -, fundada na Lei 15.614/2006, indevidamente incorporada aos

proventos de aposentadoria de VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO, por ter sido

julgada inconstitucional pelo Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, na ADI 274681-

82.2010.8.09.0000.

Também, objetiva o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO

DE GOIÁS obter um provimento jurisdicional que condene VALÉRIA JAIME PEIXOTO

PERILLO à restituição dos valores percebidos indevidamente, a título de VPNI – Vantagem

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Pessoal Nominalmente Identificada – a partir de 11/05/2010, data em que foram desfeitos os

atos concessórios, pela declaração de inconstitucionalidade da Lei 15.614/2006, nos autos da

ADI 274681-82.2010.8.09.0000, com efeitos ex tunc, corrigidos monetariamente, limitada a

restituição ao período de 05 (cinco) anos a contar da propositura da presente ação, nos termos

do artigo 54 da Lei 9.784/99.

Alfim, pretende o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO

DE GOIÁS obter um pronunciamento jurisdicional que imponha ao ESTADO DE GOIÁS a

obrigação de fazer de identificar os beneficiários da Lei 15.614/2006 e excluir da sua

remuneração ou dos proventos de aposentadoria, caso já concedida, os valores que ainda

estiverem sendo pagos a título de VPNI, fundada na Lei 15.614/2006, julgada

inconstitucional pelo Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, além da obrigação de fazer de

proceder ao desconto, a título de restituição, no contracheque dos beneficiários, dos valores

que tiverem sido pagos, de forma indevida, a partir de 11/05/2010, a título de VPNI, fundada

na Lei 15.614/2010, limitado ao período de 05 (cinco) anos, a contar da data da propositura

da presente ação, nos termos do artigo 54 da Lei 9.784/99.

II – DOS FATOS

Chegou ao conhecimento desta Promotora de Justiça, no âmbito

dos autos da “Operação Poltergeist”, notícia de irregularidades no exercício de cargo público

por parte de VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO, na Assembleia Legislativa do

Estado de Goiás (anexo I).

Segundo se apurou, a servidora VALÉRIA JAIME PEIXOTO

PERILLO foi contratada, pelo regime celetista, sem submissão a concurso público, pela

Assembleia Legislativa do Estado de Goiás para, a partir de 12 de junho de 1986,

desempenhar a função de Pesquisador Legislativo, do Quadro Especial de Empregos

Permanentes, do Poder Legislativo, conforme Portaria 22.529/1986 (anexo II).

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Posteriormente, pelo Decreto Administrativo 1.275 de 12 de

maio de 1988, editado com base na Lei 10.458 de 22 de fevereiro de 1988, a referida

servidora foi enquadrada, por transposição e em caráter efetivo, no cargo de Assistente

Administrativo, referência A (anexo II).

Por força da Resolução 1.007/1999, foi editado o Decreto

Administrativo 1.821 de 10 de maio de 1999, por meio do qual a servidora VALÉRIA

JAIME PEIXOTO PERILLO foi novamente enquadrada no cargo de Assistente

Legislativo, categoria funcional Assistente Administrativo (anexo II).

Promulgada a Constituição Federal de 1988, VALÉRIA

JAIME PEIXOTO PERILLO foi mantida no cargo de Assistente Administrativo, em

“caráter efetivo” sem que se submetesse a concurso público, em flagrante violação ao

disposto no artigo 37, inciso II, da Constituição Federal, haja vista que, além de não ter se

submetido a concurso público antes ou depois da promulgação da Constituição Federal,

VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO não fazia jus à estabilidade prevista no artigo 19

do ADCT, uma vez que sua admissão, pelo regime celetista, deu-se aos 12/06/1986. (anexo

III).

A “transposição” e a “efetivação” de VALÉRIA JAIME

PEIXOTO PERILO no cargo de Assistente Administrativo, operada pelo Decreto

Administrativo 1.275 de 12 de maio de 1988, com base na Lei 10.458 de 22 de fevereiro de

1988, ambos editados antes da Constituição Federal de 1988, por estarem em total

desacordo com o disposto no artigo 37, inciso II, da Constituição Federal, não foram por esta

recepcionados.

Apesar de os atos de admissão sem concurso público, de

“transposição” para o cargo de Assistente Administrativo e de “efetivação”, operados antes da

promulgação da Constituição Federal de 1988, não terem sido recepcionados pela

Constituição Federal de 1988, VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO foi mantida no

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS - 90ª Promotoria de Justiça Rua 23, esq. com a Av. Fued José Sebba, Qd. 06, Lts. 15/25, Jardim Goiás, sala 342, CEP 74.805-100, Goiânia - Goiás.

cargo e aos 24/11/2015 teve sua aposentadoria deferida pelo Presidente da Assembleia

Legislativa do Estado de Goiás, no Regime Próprio de Previdência Social. (anexo IV).

O ato de aposentadoria foi apreciado pelo Tribunal de Contas do

Estado de Goiás no mês de dezembro de 2015, para fim de registro (anexo IV).

Segundo consta do ato de concessão de aposentadoria e de

registro, VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO incorporou, aos proventos de

aposentadoria, VPNI – Vantagem Pessoal Nominalmente Identificada -, no valor de R$

7.602,53 (sete mil, seiscentos e dois reais e cinquenta e três centavos), obtida com base na Lei

15.614/2006, a qual foi julgada inconstitucional pelo Tribunal de Justiça do Estado de Goiás

na ADI 274681-822010.8.09.0000 (201092746811) (anexo IV).

Nos autos do ICP de Registro Atena nº 201500143233, em que

se investigaram os fatos, foi expedida a Recomendação 10/2015-90ª PJ ao Presidente da

Assembleia Legislativa do Estado de Goiás, antes mesmo que VALÉRIA JAIME

PEIXOTO PERILLO requeresse a aposentadoria, para que, dentre outras providências

relativamente a outras irregularidades verificadas, não abarcadas pelo objeto da

presente ação, declarasse administrativamente a nulidade do vínculo da servidora com a

Assembleia Legislativa do Estado de Goiás, por violação ao disposto no artigo 37, inciso II,

da CF e artigo 19 do ADCT (anexo V).

Em resposta, embasado em argumentos de segurança jurídica, o

Presidente da Assembleia Legislativa do Estado de Goiás não acatou Recomendação e,

posteriormente, em razão de requerimento da servidora, concedeu-lhe aposentadoria, com

proventos integrais, no Regime Próprio de Previdência Social (anexo V).

Nos proventos de aposentadoria, foi incorporada a parcela

relativa a VPNI – Vantagem Pessoal Nominalmente Identificável – no valor de R$ 7.602,53

(sete mil, seiscentos e dois reais e cinquenta e três centavos), embora julgada inconstitucional

pelo Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, nos autos da ADI 274681-82.2010.8.09.0000.

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS - 90ª Promotoria de Justiça Rua 23, esq. com a Av. Fued José Sebba, Qd. 06, Lts. 15/25, Jardim Goiás, sala 342, CEP 74.805-100, Goiânia - Goiás.

Nos autos de concessão de aposentadoria, resultou demonstrado

que, além de VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO outros beneficiários da Lei

15.614/2006 continuaram a perceber a VPNI após 11/05/2010, data em que foram desfeitos

os atos concessórios em razão da declaração de inconstitucionalidade da referida lei e,

inclusive, incorporaram-na aos proventos de aposentadoria (anexo IV – fls. 988/989).

Em razão do exposto, necessária a intervenção do Poder

Judiciário para a correção dos atos administrativos inconstitucionais narrados e restituição

dos valores pagos indevidamente.

III – DO DIREITO

1. DA LEGITIMAÇÃO ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO

A legitimação do Ministério Público para promover a defesa do

patrimônio público por meio da Ação Civil Pública advém tanto da Constituição Federal

quanto da legislação infraconstitucional.

Ao tratar das funções institucionais do Ministério Público, assim

estabeleceu a Constituição Federal:

Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:

III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a

proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e

de outros interesses difusos e coletivos;

A Constituição do Estado de Goiás, de seu turno, determina:

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS - 90ª Promotoria de Justiça Rua 23, esq. com a Av. Fued José Sebba, Qd. 06, Lts. 15/25, Jardim Goiás, sala 342, CEP 74.805-100, Goiânia - Goiás.

Art. 117. São funções institucionais do Ministério Público:

[…]

III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para

proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e

de outros interesses difusos e coletivos;

[…].

A Lei n.º 7.347 de 24 de julho de 1985, que disciplina a ação

civil pública de responsabilidade por danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, a

bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, em seu artigo 5º,

inciso, I, com redação dada pela Lei n.º 11.448, de 15 de janeiro de 2007, estabelece:

Art. 5º Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação

cautelar: (Redação dada pela Lei n.º 11.448, de 2007)

I - o Ministério Público; (Redação dada pela Lei n.º 11.448, de

2007)

[...]

A Lei Orgânica Nacional do Ministério Público – Lei 8.625 de

12 de fevereiro de 1993 – estabelece:

Art. 25. Além das funções previstas nas Constituições Federal

e Estadual, na Lei Orgânica e em outras leis, incumbe, ainda,

ao Ministério Público:

[...]

IV - promover o inquérito civil e a ação civil pública, na forma

da lei:

a) proteção, prevenção e reparação de danos causados ao meio

ambiente, ao consumidor, aos bens e direitos de valor artístico,

estético, histórico, turístico e paisagístico e a outros interesses

difusos, coletivos e individuais indisponíveis e homogêneos;

b) anulação ou declaração de nulidade de atos lesivos ao

patrimônio público ou à moralidade administrativa do

Estado ou do Município, de suas administrações indiretas ou

fundacionais ou de entidades privadas de que participem.

Por fim, prevê a Lei Complementar nº 25/98 – Lei Orgânica do

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS - 90ª Promotoria de Justiça Rua 23, esq. com a Av. Fued José Sebba, Qd. 06, Lts. 15/25, Jardim Goiás, sala 342, CEP 74.805-100, Goiânia - Goiás.

Ministério Público do Estado de Goiás:

Art. 46. Além das funções previstas na constituição Federal, na

Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, na Constituição

Estadual e em outras leis, incumbe, ainda, ao Ministério

Público:

[…]

VI – promover o inquérito civil e a ação civil pública, na forma

da lei, para:

a) proteção, prevenção e reparação de danos causados ao meio

ambiente, ao consumidor, aos bens e direitos de valor artístico,

estético, histórico, turístico e paisagístico, e a outros interesses

difusos, coletivos e individuais indisponíveis e homogêneos;

b) anulação ou declaração de nulidade de atos lesivos ao

patrimônio público ou à moralidade administrativa do

Estado ou do Município, de suas administrações direta,

indireta ou fundacional ou de entidades privadas de que

participem.

Os atos normativos ora mencionados, especialmente a

Constituição Federal, evidenciam a atribuição do Ministério Público para o exercício da Ação

Civil Pública e assentam a adequação dessa via para a defesa do patrimônio público.

2. DA NULIDADE DA ADMISSÃO DE VALÉRIA JAIME

PEIXOTO PERILLO SEM CONCURSO PÚBLICO. DA NULIDADE DA

TRANSPOSIÇÃO E DA EFETIVAÇÃO NO CARGO. NÃO-RECEPÇÃO PELA

CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. VIOLAÇÃO AO ARTIGO 37, INCISO II, DA

CONSTITUIÇÃO FEDERAL E AO ARTIGO 19 DO ADCT

Como é cediço, o Poder Constituinte Originário dá origem a

uma ordem jurídica que, uma vez instituída, constitui-se no fundamento de validade de todos

os atos, inclusive normativos, editados antes e após a sua instituição. Todos os atos,

administrativos ou normativos, que com a nova ordem constitucional não se compatibilizem,

perdem sua validade e, por isso, são considerados inexistentes diante da nova ordem

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constitucional. A questão, portanto, segundo Tavares1., situa-se no plano da existência: a lei

anterior à Constituição que com esta não se compatibilize não existe à luz da Constituição

anterior.

De outro lado, a nova ordem jurídica instituída revalida as

normas e atos jurídicos anteriores que com ela se harmonizam. É o que se chama recepção.

Feitos esses breves esclarecimentos, passemos à análise do caso

ora posto à apreciação do Poder Judiciário.

A fim de garantir e efetivar a impessoalidade, a transparência e

a eficiência no serviço público, o Constituinte Originário de 1988 estabeleceu no artigo 37 da

Constituição Federal de 1988:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de

qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito

Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de

legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e

eficiência e, também, ao seguinte:

[…]

II – a investidura em cargo ou emprego público

depende da aprovação prévia e concurso público de

provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza

e a complexidade do cargo ou emprego, na forma

prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo

em comissão declarado em lei de livre nomeação e

exoneração;

[…].

A referida disposição constitucional, além de impor a

1 TAVARES, André Ramos. Curso de direito constitucional. 11 ed. Rev. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2013.

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obrigatoriedade de concurso público para a investidura em cargo público, vedou toda forma

de provimento derivado de cargos públicos no âmbito da Administração Pública. É dizer:

toda investidura em cargo depende da aprovação em concurso público de provas e títulos,

especificamente realizado para o provimento de determinado cargo público.

Como se vê pela expressa disposição constitucional, a

realização prévia de concurso público para a investidura nos cargos e empregos públicos da

Administração Pública Direta e Indireta passou a se constituir em regra no âmbito da

Administração Pública, regra essa que, além de dar o suporte de validade a todas as

investiduras que foram efetivadas após a promulgação da Constituição, retirou a

validade de todos os atos antes realizados, sem sua observância.

Vale lembrar, ainda, que a exigência de concurso público para o

ingresso em cargos públicos já constava do artigo 97, § 1º, da EC 01/1969 e foi reafirmada

pela norma do artigo 37, inciso II, da Constituição Federal, razão por que as contratações

efetivadas antes da Constituição Federal de 1988, sem concurso público, já contrariavam a

ordem constitucional então vigente.

O Constituinte Originário de 1988, entretanto, ressalvou apenas

uma situação: no ADCT - Ato das Disposições Constitucionais Transitórias - garantiu a

“estabilidade” aos servidores que, embora contratados sem a prévia aprovação em

concurso público, já estivessem em exercício de cargo ou função pública havia mais de

05 (cinco) anos, na data da promulgação da Constituição Federal de 1988.

Eis o texto:

Art. 19. Os servidores públicos civis da União, dos

Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, da

administração direta, autárquica e das fundações

públicas, em exercício na data da promulgação da

Constituição, há pelo menos cinco anos continuados, e

que não tenham sido admitidos na forma regulada no

artigo 37, da Constituição, são considerados estáveis no

serviço público.

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§ 1º. O tempo de serviço dos servidores referidos nesta

artigo será contado como título quando se submeterem

a concurso para fins de efetivação, na forma da lei.

[…].

Ou seja: aqueles servidores que, embora sem a prévia aprovação

em concurso público, tivessem sido contratados até 05/03/1983, poderiam permanecer no

exercício do cargo ou função pública, na condição de “estáveis”. Entretanto, embora tenha o

Constituinte Originário reconhecido a tais servidores a validade do vínculo laboral com a

Administração Pública, nem mesmo a eles foi atribuída a efetividade, a qual, pelo novo

regramento constitucional, decorre exclusivamente da aprovação em concurso público.

Isso resultou claro do disposto no §1º do referido artigo 19, ao

garantir, aos servidores estáveis, na forma do caput, o direito de contar como título o tempo

de serviço exercido como estáveis, em concurso público, indispensável à efetivação.

Em suma: após a promulgação da Constituição Federal de 1988,

ressalvadas as exceções constitucionais, toda investidura em cargo público depende de

aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, resultando inválidos

e nulos de pleno direito todos os atos posteriores ou anteriores à Constituição

constituídos sem observância do novo regramento constitucional.

Nessa toada, ressoa evidente que a admissão de VALÉRIA

JAIME PEIXOTO PERILLO pela Assembleia Legislativa do Estado de Goiás, aos

12/06/1986, sem concurso público, pelo regime celetista, para o exercício da função de

Pesquisador Legislativo perdeu seu eventual fundamento de validade com a ordem

constitucional de 1988, que impôs, para a investidura em cargos públicos, a aprovação prévia

em concurso público, nos termos do artigo 37, inciso II, da CF, razão por que o ato de

admissão é, à luz da Constituição Federal de 1988, inexistente.

De outra rama, também perderam seu fundamento de validade

e, por essa razão, são inexistentes, por não terem sido recepcionados pela Constituição

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Federal de 1988, os atos de “transposição” e de “efetivação” no cargo de Assistente

Administrativo, operados pelo Decreto 1.275 de 12 de maio de 1988, editado com base na Lei

10.458 de 22 de fevereiro de 1988, os quais, por não encontrarem fundamento de validade

na Constituição Federal de 1988 e contrariarem, flagrantemente, o artigo 37, inciso II,

da Constituição Federal, não foram por esta recepcionados.

Ainda, necessário pontuar que VALÉRIA JAIME PEIXOTO

PERILLO foi admitida aos 12/06/1986, portanto, havia menos de 05 (cinco) anos da

promulgação da Constituição de 1988. Dessa forma, ausentes os requisitos constitucionais,

não lhe foi garantida a “estabilidade” prevista no artigo 19 do ADCT e, em consequência, o

direito de manter o vínculo laboral com a Administração Pública, de forma válida. E, não

tendo se submetido, após a promulgação da Constituição Federal, a concurso público para o

ingresso regular no cargo de Assistente Administrativo, posteriormente denominado

Assistente Legislativo – categoria funcional Assistente Administrativo (conforme Resolução

1.007/1999) – impositivo o reconhecimento da nulidade (inexistência) do vínculo laboral de

VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO com a Administração Pública Estadual, assim

como o ato de aposentadoria pelo Regime Próprio de Previdência Social, nele fundado.

O Supremo Tribunal Federal, nas diversas ocasiões em que foi

chamado a se pronunciar sobre a validade de investiduras em cargos públicos realizadas antes

ou depois da promulgação da Constituição Federal de 1988, sem concurso público, ausente a

situação excepcional descrita no artigo 19 do ADCT, reconheceu a nulidade de tais vínculos,

em razão da violação ao artigo 37, inciso II, da Constituição Federal. Em várias situações,

reconheceu a inconstitucionalidade de normas estaduais que ampliavam a exceção à regra da

exigência de concurso para o ingresso no serviço público já estabelecida no ADCT da

Constituição da República (ADI 100, Rel. Min. Ellen Gracie, j. 09/09/2004, Plenário, DJ

01/10/2004; RE 356.612AgR, Rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 31/08/2010, 2ªT, DJE

16/11/2010; ADI 114, Re. Min. Cármen Lúcia, j. 26/11/2009, Plenário, DJE 03/10/2011).

Recentemente, aos 08/04/2015, foi editada pelo Supremo

Tribunal Federal a Súmula Vinculante 43, in verbis:

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Súmula Vinculante 43: É inconstitucional toda

modalidade de provimento que propicie ao servidor

investir-se, sem prévia aprovação em concurso

público destinado ao seu provimento, em cargo que

não integra a carreira na qual anteriormente

investido.

Após longa discussão encetada no âmbito daquele Tribunal,

consubstanciada em precedentes jurisprudenciais, conforme relatado pela Ministra Cármen

Lúcia, no seu voto exarado no MS 27.673/DF, firmou o Supremo Tribunal Federal, mais

recentemente, o entendimento no sentido de que o vício de ato administrativo

flagrantemente inconstitucional pode ser reconhecido a qualquer tempo. Afastou-se,

assim, a possibilidade de eventual convalidação do ato, fundada em argumentos de segurança

jurídica.

Esse posicionamento foi consolidado a partir da decisão exarada

no MS 26.860/DF, Rel. Min. Luís Fux, assim ementado:

MANDADO DE SEGURANÇA. SERVENTIA

EXTRAJUDICIAL. INGRESSO. SUBSTITUTO

EFETIVADO COMO TITULAR DE SERVENTIA

APÓS A PROMULGAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO

DA REPÚBLICA. IMPOSSIBILIDADE. DIREITO

ADQUIRIDO. INEXISTÊNCIA. CONCURSO

PÚBLICO. EXIGÊNCIA. ARTIGO 236, § 3º, DA

CRFB/88. NORMA AUTOAPLICÁVEL.

DECADÊNCIA PREVISTA NO ARTIGO 54 DA

LEI 9.784/1999. INAPLICABILIDADE.

PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO DA CONFIANÇA.

PRINCÍPIO DA BOA-FÉ. OFENSA DIRETA À

CARTA MAGNA. SEGURANÇA DENEGADA.

1. O postulado do concurso público traduz-se na

necessidade essencial de o Estado conferir efetividade

ao princípio constitucional da igualdade (CRFB/88, art.

5º, caput), vedando-se a prática intolerável do Poder

Público conceder privilégios a alguns, ou de dispensar

tratamento discriminatório e arbitrário a outros.

Precedentes: ADI 3978, Rel. Min. Eros Grau, Tribunal

Pleno, DJe 11.12.2009; ADI 363, Rel. Min. Sydney

Sanches, Tribunal Pleno, DJ 03.05.1996.

2. O litisconsórcio ulterior, sob a modalidade de

assistência qualificada, após o deferimento da medida

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS - 90ª Promotoria de Justiça Rua 23, esq. com a Av. Fued José Sebba, Qd. 06, Lts. 15/25, Jardim Goiás, sala 342, CEP 74.805-100, Goiânia - Goiás.

liminar, fere os princípios do Juiz Natural e da livre

distribuição, insculpidos nos incisos XXXVII, LII do

art. 5º da Constituição da República. Precedentes do

Plenário: MS 24.569 AgR, Rel. Min. Sepúlveda

Pertence, DJ 26.082005; MS 24.414, Rel. Min. Cezar

Peluso, DJ 21.11.2003.

3. A delegação registral ou notarial, para legitimar-se

constitucionalmente, pressupõe a indispensável

aprovação em concurso público de provas e títulos, por

tratar-se de regra constitucional que decorre do texto

fundado no impositivo art. 236, § 3º, da Constituição da

República, o qual, indubitavelmente, constitui-se norma

de eficácia plena, independente, portanto, da edição de

qualquer lei para sua aplicação. Precedentes: RE

229.884 AgR, Rel. Min. Ellen Gracie, Segunda Turma,

DJ 05.08.2005; ADI 417, Rel. Min. Maurício Corrêa,

Tribunal Pleno, DJ 05.5.1998; ADI 126, Rel. Min.

Octavio Gallotti, Tribunal Pleno, DJ 05.6.1992.

4. In casu, a situação de flagrante inconstitucionalidade

não pode ser amparada em razão do decurso do tempo

ou da existência de leis locais que, supostamente,

agasalham a pretensão de perpetuação do ilícito.

5. A inconstitucionalidade prima facie evidente impede

que se consolide o ato administrativo acoimado desse

gravoso vício em função da decadência. Precedentes:

MS 28.371 AgR/DF, Rel. Min. Joaquim Barbosa,

Tribunal Pleno, DJe 27.02.2013; MS 28.273 AgR,

Relator Min. Ricardo Lewandowski, Tribunal Pleno,

DJe 21.02.2013; MS 28.279, Relatora Min. Ellen

Gracie, Tribunal Pleno, DJe 29.04.2011.

6. Consectariamente, a edição de leis de ocasião para a

preservação de situações notoriamente

inconstitucionais, ainda que subsistam por longo

período de tempo, não ostentam o caráter de base da

confiança a legitimar a incidência do princípio da

proteção da confiança e, muito menos, terão o condão

de restringir o poder da Administração de rever seus

atos.

7. A redução da eficácia normativa do texto

constitucional, ínsita na aplicação do diploma legal, e a

consequente superação do vício pelo decurso do prazo

decadencial, permitindo, por via reflexa, o ingresso na

atividade notarial e registral sem a prévia aprovação em

concurso público de provas e títulos, traduz-se na

perpetuação de ato manifestamente inconstitucional,

mercê de sinalizar a possibilidade juridicamente

impensável de normas infraconstitucionais

normatizarem mandamentos constitucionais autônomos,

autoaplicáveis.

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS - 90ª Promotoria de Justiça Rua 23, esq. com a Av. Fued José Sebba, Qd. 06, Lts. 15/25, Jardim Goiás, sala 342, CEP 74.805-100, Goiânia - Goiás.

8. O desrespeito à imposição constitucional da

necessidade de concurso público de provas e títulos

para ingresso da carreira notarial, além de gerar os

claros efeitos advindos da consequente nulidade do ato

(CRFB/88, art. 37, II e §2º, c/c art. 236, §3º), fere

frontalmente a Constituição da República de 1988,

restando a efetivação na titularidade dos cartórios por

outros meios um ato desprezível sob os ângulos

constitucional e moral.

9. Ordem denegada. (MS 26860, Relator(a): Min.

LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 02/04/2014,

ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-184 DIVULG 22-09-

2014 PUBLIC 23-09-2014)

Posteriormente, no MS 30.014/DF (anexo VI), Rel. Min. Dias

Toffoli, o Supremo Tribunal Federal, confirmando o posicionamento já consolidado, reiterou:

AGRAVO REGIMENTAL EM MANDADO DE

SEGURANÇA. CONSELHO NACIONAL DE

JUSTIÇA. DECISÃO QUE DETERMINA AO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ

QUE PROMOVA O DESLIGAMENTO DE

SERVIDORES IRREGULARMENTE

ADMITIDOS SEM CONCURSO PÚBLICO APÓS

A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988.

APLICAÇÃO DIRETA DO ART. 37, CAPUT, E

INCISO II, DA CF/88. DECADÊNCIA

ADMINISTRATIVA. ART. 54 DA LEI 9.784/1999.

INAPLICABILIDADE EM SITUAÇÕES

FLAGRANTEMENTE INCONSTITUCIONAIS.

RECURSO NÃO PROVIDO. 1. O concurso público é elemento nuclear da formação

de vínculos estatutários efetivos com a Administração,

em quaisquer níveis.

2. Situações flagrantemente inconstitucionais como o

provimento de cargo na Administração Pública sem a

devida submissão a concurso público não podem e não

devem ser superadas pela simples incidência do que

dispõe o artigo 54 da Lei 9.784/1999, sob pena de

subversão das determinações insertas na Constituição

Federal. (Precedente: MS nº 28.297/DF, Relatora

Ministra Ellen Gracie, Tribunal Pleno, DJ de 29/4/11).

3. Agravo regimental não provido. (AG.REG. em MS

30014/DF, Rel. Ministro Dias Tofoli, Plenário, j.

18/12/2013)

No julgado acima ementado, o Relator, Ministro Dias Toffoli,

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS - 90ª Promotoria de Justiça Rua 23, esq. com a Av. Fued José Sebba, Qd. 06, Lts. 15/25, Jardim Goiás, sala 342, CEP 74.805-100, Goiânia - Goiás.

em seu voto, advertiu que:

[...] no que se refere ao problema da boa-fé e da eficácia

continuativa das relações jurídicas, não pode haver

usucapião de constitucionalidade. A obrigatoriedade

da Constituição deriva de sua vigência. Não é

possível entender que o tempo derrogue a força

obrigatória de seus preceitos por causa de ações

omissivas ou comissivas de autoridades públicas”

(Ag.Reg em MS 30014/DF, Rel. Ministro Dias Tofoli,

Plenário, j. 18/12/2013).

E sintetizou:

[…] ser impossível atribuir-se legitimidade a qualquer

investidura em cargo público não comissionado

realizada sem prévia aprovação em concurso público

após a promulgação da Constituição Federal de 1988,

sob pena de se transpor a ordem constitucional e de se

caminhar de encontro aos ditames preconizados pelo

Estado Democrático de Direito (Ag.Reg em MS

30.014/DF, Rel. Min. Dias Toffoli)

Mais recentemente, no MS 27.673/DF (anexo VI), Rel. Min.

Cármen Lúcia, no qual se questionou decisão do Conselho Nacional de Justiça que

determinou a exoneração de servidores admitidos sem concurso público, após a

Constituição Federal de 1988 e a revisão de aposentadorias concedidas a funcionários

não concursados do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, a Corte Suprema, mais uma

vez confirmando o entendimento consolidado anteriormente, assim se pronunciou:

MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDORES DO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE GOIÁS.

INVESTIDURA DERIVADA EM CARGOS DE

PROVIMENTO EFETIVO. CONSELHO NACIONAL

DE JUSTIÇA: INOBSERVÂNCIA DO INC. II E DO

§ 2º DO ART. 37 DA CONSTITUIÇÃO DA

REPÚBLICA. ALEGADA AFRONTA AO

PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA.

DECADÊNCIA DO PODER-DEVER DA

ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DE REVER ATOS

ILEGAIS. INAPLICABILIDADE.

PRECEDENTES. DEVIDO PROCESSO LEGAL.

CITAÇÃO POR EDITAL. ATENDIMENTO POR

PARTE DOS INTERESSADOS. VALIDADE

PARCIAL DO ATO. MANDADO DE SEGURANÇA

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS - 90ª Promotoria de Justiça Rua 23, esq. com a Av. Fued José Sebba, Qd. 06, Lts. 15/25, Jardim Goiás, sala 342, CEP 74.805-100, Goiânia - Goiás.

PARCIALMENTE CONCEDIDO. 1. Não se há cogitar

de decadência do poder-dever de revisão pelo Conselho

Nacional de Justiça dos atos de investidura dos

Impetrantes, dependendo a estabilização das relações

jurídicas fundadas em patente desrespeito à

determinação expressa contida no inc. II e no § 2º do

art. 37 da Constituição da República da existência de

circunstâncias específicas e excepcionais, reveladoras

da boa-fé dos envolvidos, o que não se verifica na

espécie. Precedentes. 2. Não se há cogitar, na espécie

vertente, de contrariedade ao devido processo legal,

pois as normas legais e regimentais vigentes na data da

prática questionada foram cumpridas, incluído o art. 98

do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça,

declarado inconstitucional incidentalmente em

processo de natureza subjetiva posteriormente julgado.

3. Mandado de segurança denegado. (MS 27673,

Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Segunda Turma,

julgado em 24/11/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO

DJe-250 DIVULG 11-12-2015 PUBLIC 14-12-2015)

No voto condutor, a Relatora Min. Cármen Lúcia, observou:

[…]

A situação dos absorvidos por ato administrativo de

provimento derivado configura flagrante desrespeito à

constituição da República, permitindo o afastamento do

prazo decadencial para o exercício do poder-dever de

autotutela realizado pelo Conselho Nacional de Justiça,

nos termos da conclusão do Plenário deste Supremo

Tribunal no julgamento do Mandado de Segurança n.

26.860.

Irrepreensíveis, portanto, os fundamentos do

Conselheiro Relator no voto condutor do ato tido como

coator , no sentido de que 'dar guarida à tese da

segurança jurídica ou da inviabilidade da anulação do

ato em virtude do interstício do prazo de 5 anos só faria

corroborar a atitude dos administradores que adotaram

tais práticas, frustrando justamente a moralidade que a

Constituição tanto quis ver observada”, pelo que essa

flagrante afronta ao texto constitucional não poderia ser

protegida pelo prazo decadencial do art. 54 da Lei

9.784/1999, o qual deveria ser contado apenas 'quando

do ato de aposentadoria que põe fim à relação do

servidor com o tribunal'.

De fato. Não é possível admitir que a postura de gestores

públicos, descomprometidos com a coisa pública e movidos por razões outras que não o

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS - 90ª Promotoria de Justiça Rua 23, esq. com a Av. Fued José Sebba, Qd. 06, Lts. 15/25, Jardim Goiás, sala 342, CEP 74.805-100, Goiânia - Goiás.

interesse público, de manter uma situação flagrantemente inconstitucional, com o fim

único de atender a interesses particulares, tenha força derrogatória da Constituição e

possa ser invocada como argumento para, a pretexto de garantir uma falsa “segurança

jurídica” “convalidar” o ato inexistente à luz de uma ordem constitucional.

Isso, sem dúvida, seria negar a força normativa da Constituição

Federal, a obrigatoriedade de sua observância e a moralidade que deve nortear as relações

administrativas, com seríssimos prejuízos para o sistema constitucional brasileiro, pois estaria

o Poder Judiciário a chancelar e estimular a violação da Constituição para, uma vez

consolidada a ilegalidade, ser “convalidada” em razão do decurso do tempo!!!!

Manifesto absurdo!!!

Necessário relembrar, por oportuno, que o Poder Judiciário

é, por excelência, o guardião da Constituição!!!

Vale rememorar ainda que a obrigatoriedade de aprovação em

concurso público, na tipologia de normas constitucionais, caracteriza-se como regra. As

regras, segundo a doutrina constitucional brasileira, possuem caráter categórico e sujeitam-se

à lógica do tudo ou nada. É dizer: não há espaço, na aplicação das regras, para juízos de

ponderação para a sua aplicação em maior ou menor grau, de acordo com o caso concreto e

os interesses em conflito. Ou a regra é aplicada e observada será a Constituição ou lhe é

negada aplicação e consumada estará a violação à Constituição.

Assim, não há que falar, nessa seara, ou seja, de aplicação da

regra do concurso público, em juízos de ponderação para a garantia da segurança jurídica.

Aliás, falar em segurança jurídica no caso ora em discussão é negar o próprio conceito de

segurança jurídica, pois não há segurança jurídica em um sistema constitucional em que

as regras constitucionais são inobservadas pela recalcitrância do gestor público em fazer

valer a Constituição e manter, assim, situações flagrantemente inconstitucionais, com a

anuência do particular que da inconstitucionalidade se beneficia, para, após, ao

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argumento de “segurança jurídica”, ter a situação inconstitucional “convalidada”,

numa flagrante e inadmissível afronta à força normativa da Constituição.

Por outro lado, conforme bem pontuou o Conselho Nacional de

Justiça, na decisão impugnada por meio do MS 27.763/DF, para fundamentar a necessidade

de exoneração imediata dos servidores ilegalmente admitidos sem concurso público,“[...] a

nulidade dos atos de investidura não pode ser protegida pelo decurso do prazo porque

servem de fonte direta para o futuro da relação entre o servidor e a Administração”

(Procedimentos de Controle Administrativo de nº 200710000014437, 200710000012131 e

200810000003262).

De fato. Em razão do vínculo inconstitucionalmente mantido,

VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO obteve, aos 24/11/2015, aposentadoria pelo

Regime Próprio de Previdência Social, em total afronta ao que estabelece o artigo 40 da

Constituição Federal de 1988, porquanto, em razão da nulidade (inexistência) do vínculo, não

fazia VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO jus à aposentadoria pelo Regime Próprio de

Previdência Social, com todas as vantagens dele decorrentes, especialmente a integralidade.

Por todas as razões expostas, inafastável a necessidade de

declaração de nulidade dos atos de admissão, de transposição e de efetivação de

VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO no cargo de Assistente Administrativo,

posteriormente classificado pela Resolução 1.007/1999 como Assistente Legislativo –

categoria funcional – Assistente Administrativo, da Assembleia Legislativa do Estado de

Goiás, e do ato de aposentadoria pelo Regime Próprio de Previdência Social e seu

respectivo registro, como adiante será explanado.

3. DA NULIDADE DO ATO DE APOSENTADORIA

CONCEDIDA A VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO PELO REGIME PRÓPRIO

DE PREVIDÊNCIA SOCIAL

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS - 90ª Promotoria de Justiça Rua 23, esq. com a Av. Fued José Sebba, Qd. 06, Lts. 15/25, Jardim Goiás, sala 342, CEP 74.805-100, Goiânia - Goiás.

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 40, estabeleceu:

Art. 40. Aos servidores titulares de cargos efetivos

da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos

Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é

assegurado regime de previdência de caráter

contributivo e solidário, mediante contribuição do

respectivo ente público, dos servidores ativos e

inativos e dos pensionistas, observados critérios que

preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o

disposto neste artigo.

[…].

No âmbito federal, foi editada a Lei 9.717/98, a qual estabelece

regras gerais para a organização dos regimes próprios de previdência social dos servidores

públicos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos militares dos

Estados e do Distrito Federal e dá outras providências.

Nos termos do artigo 1º, inciso V, da referida lei:

Art. 1º. Os regimes próprios de previdência social dos

servidores públicos da União, dos Estados, do Distrito

Federal e dos Municípios, dos militares dos Estados e

do Distrito Federal deverão ser organizados, baseados

em normas gerais de contabilidade e atuária, de modo a

garantir o seu equilíbrio financeiro e atuarial,

observados os seguintes critérios:

[…]

V – cobertura exclusiva a servidores públicos

titulares de cargos efetivos e a militares, e a seus

respectivos dependentes, de cada ente estatal, vedado

o pagamento de benefícios, mediante convênios ou

consórcios entre Estados, entre Estados e Municípios e

entre Municípios;

[…].

No âmbito do Estado de Goiás, foi editada a Lei Complementar

nº 66 de 22 de janeiro de 2009, a qual instituiu a autarquia Goiás Previdência como entidade

gestora do Regime Próprio de Previdência dos Servidores Públicos – RPPS – e do Regime

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS - 90ª Promotoria de Justiça Rua 23, esq. com a Av. Fued José Sebba, Qd. 06, Lts. 15/25, Jardim Goiás, sala 342, CEP 74.805-100, Goiânia - Goiás.

Próprio de Previdência dos Militares do Estado de Goiás – RPPM.

Como se vê pelo disciplinamento constitucional e legal, o

Regime Próprio de Previdência Social destina-se à cobertura previdenciária de

servidores públicos titulares de cargos efetivos. As demais categorias de servidores

públicos (comissionados e temporários) e empregados públicos, sujeitam-se Regime Geral de

Previdência Social, nos termos do artigo 40, § 13, da CF.

Relativamente aos servidores estáveis, na forma do artigo 19 do

ADCT, por não ter VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO direito à estabilidade prevista

no artigo 19 do ADCT, uma vez que foi admitida aos 12/06/1986, não se fará, nesta peça,

maiores considerações sobre essa questão.

Como se vê, a natureza do vínculo do servidor público com a

Administração Pública condiciona o regime previdenciário a que se sujeitará o servidor, por

ocasião da aposentadoria.

Nesse rumo de intelecção, constata-se que a existência de um

vínculo efetivo válido, é dizer, decorrente da aprovação em concurso público, é condição

para que o servidor possa se filiar validamente ao Regime Próprio de Previdência Social e

obter os benefícios dele decorrentes.

Conforme se verificou dos relatos feitos nesta inicial, a

admissão da ré VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO para o exercício do cargo de

Pesquisador Legislativo na Assembleia Legislativa do Estado de Goiás, aos 12/06/1986, sem

concurso público, não foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988 e, em razão de sua

flagrante violação ao disposto no artigo 37, inciso II, da Constituição Federal de 1988 e no

artigo 19 do ADCT, é inexistente diante da nova ordem constitucional.

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS - 90ª Promotoria de Justiça Rua 23, esq. com a Av. Fued José Sebba, Qd. 06, Lts. 15/25, Jardim Goiás, sala 342, CEP 74.805-100, Goiânia - Goiás.

Da mesma forma, o ato de “transposição” para o cargo de

Assistente Administrativo e de “efetivação” no referido cargo, operados pelo Decreto 1.275

de 12 de maio de 1988, editado com base na Lei 10.458 de 22 de fevereiro de 1988, também

são inexistentes, por violação, também, ao artigo 37, inciso II, da Constituição Federal, que

vedou toda forma de provimento derivado de cargos públicos.

A nulidade (inexistência) do vínculo afasta toda e qualquer

possibilidade de que a ré VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO pudesse obter a

aposentadoria no Regime Próprio de Previdência Social. Nula a investidura no cargo

público, nulo também é o ato de concessão de aposentadoria fundado no vínculo

inexistente, por flagrante violação ao disposto no artigo 40, caput, da Constituição

Federal, no artigo 1º, inciso V, da Lei 9.717/98 e no artigo 1º, § 1º, inciso I, da LC

Estadual 66/2009.

Diante do exposto, imperiosa é, além da declaração de nulidade

do ato de admissão de VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO no cargo de Pesquisador

Legislativo, do ato de transposição para o cargo de Assistente Administrativo e do ato de

efetivação no referido cargo, operados pelo Decreto 1.275 de 12 de maio de 1988, editado

com base na Lei 10.458 de 22 de fevereiro de 1988, seja declarada a nulidade do ato de

concessão de aposentadoria a VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO pelo Regime

Próprio de Previdência Social do Estado de Goiás, bem como do ato de registro

efetivado pelo Tribunal de Contas do Estado de Goiás.

Sobre a questão, assim tem se pronunciado o Superior Tribunal

de Justiça:

RMS. SERVIDOR PÚBLICO. ADCT - ART. 19.

ADMISSÃO EM 1985 SEM CONCURSO.

1. Servidor público, admitido no ano de 1985, sem

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concurso, não está amparado pelo art. 19 do ADCT,

da Constituição Federal de 1988, seja quanto à

estabilidade ou à aplicação do regime jurídico único. 2. Recurso improvido.

(STJ - RMS 8.980/ES, Rel. Ministro LUIZ VICENTE

CERNICCHIARO, Rel. p/ Acórdão Ministro

FERNANDO GONÇALVES, SEXTA TURMA,

julgado em 18/10/1999, DJ 24/04/2000, p. 75)

RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE

SEGURANÇA. SERVIDOR ESTADUAL NÃO

OCUPANTE DE CARGO EFETIVO.

APOSENTADORIA COM PROVENTOS

INTEGRAIS. IMPOSSIBILIDADE. SUJEIÇÃO

AO REGIME GERAL DA PREVIDÊNCIA

SOCIAL E AO RESPECTIVO TETO. 1. A sujeição dos servidores não efetivos ao regime

geral da previdência social, tal como prevista no art.

40, § 13, da Constituição Federal, é matéria pacífica

na jurisprudência desta Corte. Precedentes. 2. Não obstante o quanto alegado pelo recorrente, as

provas nos autos não validam o direito que disse ter

porque não é a norma constitucional que se curva ao

ato administrativo, mas este é que se submete ao

ordenamento jurídico, sob pena de nulidade. Inteligência do art. 2º, parágrafo único, alínea "c" da

Lei n. 4.717/1965.

3. Ainda que o ato de aposentação tenha, em tese,

assegurado proventos integrais, não poderia,

validamente, prevalecer sobre os ditames da legislação

que o autoriza, por isso que se revelou acertada sua

revisão.

4. Recurso ordinário a que se nega provimento.

(STJ - RMS 31.986/MG, Rel. Ministro SÉRGIO

KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em

13/08/2013, DJe 19/08/2013).

O direito à previdência social, como é cediço, é direito

fundamental expresso na Carta Magna. Entretanto, tal direito deve ser exercitado dentro dos

limites constitucionais e legais.

A nulidade do vínculo de VALÉRIA JAIME PEIXOTO

PERILLO com a Administração Pública Estadual, após a promulgação da Constituição

Federal de 1988, embora a impeça de obter a aposentadoria pelo Regime Próprio de

Previdência Social, em função da chapada afronta ao disposto no artigo 37, inciso II e artigo

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS - 90ª Promotoria de Justiça Rua 23, esq. com a Av. Fued José Sebba, Qd. 06, Lts. 15/25, Jardim Goiás, sala 342, CEP 74.805-100, Goiânia - Goiás.

40, caput, ambos da Constituição Federal de 1988, não impede que o tempo de

contribuição efetivado no âmbito da Administração Pública seja contado, de forma

recíproca, no Regime Geral de Previdência Social – RGPS.

Isso porque, nos termos do artigo 201 da Constituição Federal:

Art. 201. a previdência social será organizada sob a

forma de regime geral, de caráter contribuitivo e de

filiação obrigatória, observados critérios que

preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e atenderá,

nos termos da lei a:

I – cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e

idade avançada;

[…].

Apesar da nulidade do vínculo laboral com a Administração

Pública Estadual, certo é que VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO, inicialmente

vinculada ao Regime Geral de Previdência Social, porquanto foi contratada para a

função de Pesquisador Legislativo, aos 12/06/1986, pelo regime celetista, efetivou

contribuições previdenciárias e, sendo o direito à previdência uma garantia fundamental e a

previdência social organizada na forma de regime geral de filiação obrigatória, irrecusável a

possibilidade de compensação financeira, na forma estatuída pelo artigo 201, § 9º, da

Constituição Federal, uma vez reconhecida a nulidade do ato de aposentadoria, pelo Regime

Próprio de Previdência Social. Eis o que dispõe o artigo 201, § 9º, da CF:

Art. 201. […]

§ 9º. Para efeito de aposentadoria, é assegurada a

contagem recíproca de tempo de contribuição na

administração pública e na atividade privada, rural e

urbana, hipótese em que os diversos regimes de

previdência social se compensarão financeiramente,

segundo critérios estabelecidos em lei.

A compensação financeira prevista no artigo 201, § 9º, da

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS - 90ª Promotoria de Justiça Rua 23, esq. com a Av. Fued José Sebba, Qd. 06, Lts. 15/25, Jardim Goiás, sala 342, CEP 74.805-100, Goiânia - Goiás.

Constituição Federal foi disciplinada pela Lei Federal 9.796/99, a qual foi regulamentada,

dentre outros diplomas normativos, pelo Decreto 3.112/99, Portaria MPAS 6.209/99 e

Portaria Interministerial MPS-MF 410 de 29/07/2009.

Assim, uma vez declarada a nulidade do ato de aposentadoria

pelo Regime Próprio de Previdência Social, poderá VALÉRIA JAIME PEIXOTO

PERILLO, após a devida compensação financeira, obter, caso preenchidos os requisitos

legais, a aposentadoria pelo Regime Geral de Previdência Social.

4. DA INDEVIDA INCORPORAÇÃO DE VPNI –

VANTAGEM PESSOAL NOMINALMENTE IDENTIFICADA - AOS PROVENTOS

DE APOSENTADORIA DE VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO

Conforme se extrai do processo de aposentadoria de VALÉRIA

JAIME PEIXOTO PERILLO, de nº 201500047002758/204-01, que tramitou no Tribunal

de Contas do Estado de Goiás, a referida ré aposentou-se com proventos integrais,

consubstanciados nas seguintes parcelas:

PARCELAS VALOR

Vencimento base R$ 5.069,27

Grat. Adc. Tempo de Serviço = 10% (1); 5% (4) R$ 1.520,78

Grat. Adic. de Aperfeiçoamento = 20% R$ 1.013,85

V.P.N.I R$ 7.602,53

Fundo de Aposentadoria 13,25% R$ 2.014,85

Total bruto R$ 15.206,43

Dentre as parcelas que compunham a remuneração bruta da ré

VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO, no mês anterior à aposentadoria, estava a VPNI

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– Vantagem Pessoal Nominalmente Identificada - no valor de R$ 7.602,53 (sete mil,

seiscentos e dois reais e cinquenta e três centavos), concedida pela Lei 15.614/2006.

Entretanto, referida lei foi declarada inconstitucional pelo

Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, na ADI nº 274681-82.2010.8.09.0000

(201092746811), proposta pelo Procurador-Geral de Justiça do Estado de Goiás, por decisão

não mais sujeita a recurso.

No acórdão, o Tribunal de Justiça entendeu que a norma atacada

ofendia o princípio da impessoalidade, da isonomia e da moralidade administrativa, previstos

no caput do art. 92 da Constituição Estadual, por privilegiar indevidamente um grupo de

servidores, dentre estes, VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO.

Eis a ementa do acórdão (anexo VI):

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE.

LEI ESTADUAL, GRATIFICAÇÃO,

INCORPORAÇÃO. PRIVILEGIAMENTO DE

DETERMINADOS SERVIDORES PÚBLICOS.

MALFERIMENTO DO PRINCÍPIO DA

IMPESSOALIDADE. ART. 92, CAPUT, DA

CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE GOIÁS.

MODULAÇÃO DE EFEITOS.

I – É provida de inconstitucionalidade material, lei

estadual que institui vantagem remuneratória a

determinados servidores públicos, permitindo-lhes

agregar aos estipêndios gratificação de representação

especial – GRE, convertida em VPNI, percebida pelo

prazo mínimo de 18 (dezoito) meses, no período de 1º

de janeiro de 1999 a 31 de maio de 2003, quando o

benefício foi conferido a integrantes do serviço

público estadual identificados pela anterior

composição da administração do atual Governador

do Estado, privilegiando-os, em irrespondível

afronta ao princípio da impessoalidade, contrastado

ao artigo 92, caput, da Carta Política do Estado de

Goiás.

II – Modulação de efeitos. AÇÃO JULGADA

PROCEDENTE.

Vistos, relatados e discutidos estes autos, ACORDA o

Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, pelos

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integrantes da Corte Especial, à unanimidade, julgar

procedente a inconstitucionalidade da Lei nº 15.614/06,

nos termos do voto do Relator.

Sobre a modulação de efeitos, assim se pronunciou o Relator:

[…] Nessa perspectiva, proclamada a

inconstitucionalidade da Lei 14.059/01, fomento e

suporte para a edição da Lei 15.614/06, a modulação

dos efeitos declaratórios deve ser ex tunc, a partir da

publicação do acórdão proferido na ADI nº 219-

2/220 (11/05/2010, que tornou sem eficácia a base

legislativa para a norma impugnada, porquanto não

se torna viável a indicação de outro marco, posto

que o desfazimento do ato legislativo, fonte e

derivado, surgiu naquele julgamento, ao que se adota

a solução permitida pelo art. 27, da Lei nº 9.868/99,

nessa calibragem. Ao cabo do exposto, julgo procedente

a ação. É, pois, como voto. (Voto do Relator Des. Luiz

Cláudio Veiga Braga – ADI 274681-

82.2010.8.09.0000)

Conforme se extrai do texto do acórdão, a modulação de efeitos

operada ex tunc objetivou considerar o efeito declaratório da decisão, com o desfazimento do

ato de incorporação operado pela Lei 15.614/20006, a partir da data da publicação do acórdão

exarado na ADI 219-2/220, qual seja 11/05/2010.

Isso porque, na ADI 219-2/220 reconheceu-se a

inconstitucionalidade da Gratificação de Representação Especial – GRE – que a Lei

15.614/2006 determinou a incorporação.

O que foi determinado na decisão da ADI 274681-

82.2010.8.09.0000 foi a modulação dos efeitos declaratórios e desconstitutivos da decisão. É

dizer: o desfazimento do ato legislativo inconstitucional e das incorporações por ele

efetivadas operou-se a partir de 11/05/2010. A partir de então, todas as incorporações de

VPNI fundadas na Lei 15.614/06 foram desconstituídas, assim como os seus efeitos – os

pagamentos decorrentes da incorporação.

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Nessa linha de intelecção, a modulação de efeitos teve o condão

de considerar desfeitos todos os atos inconstitucionais fundados na Lei 15.614/2006, a partir

da publicação da decisão da ADI 219-2/220, ou seja, 11/05/2010, cessando, a partir daí, todos

os seus efeitos, inclusive os pagamentos decorrentes da incorporação inconstitucional.

Vale ressaltar que a lei impugnada - Lei 15.614/2006 - ao

conferir a um grupo determinado de servidores (aqueles que no período de 1º de janeiro de

1999 a 31 de maio de 2003 perceberam Gratificação de Representação Especial – GRE – por

prazo ininterrupto de pelo menos 18 meses) vantagem pecuniária a ser incorporada no

vencimento, muito se aproximou de um ato administrativo, dada a concretude de seus

efeitos. Como é cediço, leis de efeitos concretos não irradiam seus efeitos para o futuro, pois

não regulam, de modo abstrato, relações jurídicas futuras, mas constituem ou desconstituem

situações jurídicas concretas, de modo exauriente.

Nessa linha, a Lei 15.614/2006, sendo de efeitos concretos,

exauriu todos os seus efeitos com a sua simples publicação, pois quem preenchia os requisitos

exigidos pela lei, naquele momento, incorporou os valores ao vencimentos a título de VPNI.

Não poderia a lei alcançar situações futuras diante de seus efeitos concretos e exaurientes.

Cuidava-se de uma lei tipicamente de efeitos concretos e sem efeitos pro futuro.

Como é cediço, a decisão em controle abstrato de

constitucionalidade que declara a inconstitucionalidade de uma lei de efeitos concretos tem o

condão de, além de “declarar” a inconstitucionalidade da lei e retirá-la do ordenamento

jurídico, de desfazer os atos administrativos diretamente dela decorrentes. Com a declaração

de inconstitucionalidade da Lei 15.614/2006, além de ter sido reconhecida a sua

inconstitucionalidade e operada a sua extirpação do ordenamento jurídico, foram desfeitos

todos os atos administrativos diretamente dela decorrentes.

Assim sendo, no momento em que o Relator conferiu efeito ex

tunc à decisão, para retroagi-la a data da publicação do acórdão da ADI 219-2/220, aos

11/05/2010, o que se deu foi a retroação do desfazimento dos atos de incorporação

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decorrentes da Lei 15.614/2010, com a cessação dos efeitos da incorporação a partir de

11/05/2010, porquanto foi naquela ocasião que se reconheceu a inconstitucionalidade do

pagamento da gratificação que a Lei 15.614/2006 incorporou.

Por essa razão descabida a interpretação dada, no âmbito da

Assembleia Legislativa do Estado de Goiás e do Tribunal de Contas do Estado de Goiás no

sentido de que, ao modular os efeitos, conferindo efeitos ex tunc à decisão, para retroagi-la à

data da publicação da decisão na ADI 219-2/220, em verdade o Tribunal de Justiça conferiu

efeito ex nunc à decisão e manteve íntegros os atos administrativos praticados antes da

declaração de inconstitucionalidade.

Isso porque, uma interpretação nesse sentido, considerando que

se cuidava de uma lei de efeitos concretos, que além de não ter efeito pro futuro, seus efeitos

exauriram-se com a sua publicação, entender que a declaração de inconstitucionalidade

somente pode alcançar as situações consolidadas após a declaração de inconstitucionalidade

seria a mesma coisa que dizer: a lei não tem efeitos para o futuro mas tudo o que se

constituir no futuro com base nela (ou seja, nada) será inválido!!!!

A prevalecer esse entendimento, a Lei 15.614/2006, de efeitos

concretos, tendo exaurido todos os seus efeitos com a sua publicação, os quais foram apenas

materializados em atos administrativos para a operacionalização da incorporação operada

com a publicação da lei, resultaria incólume, mesmo diante do reconhecimento de sua

inconstitucionalidade e nenhuma eficácia teria a jurisdição constitucional.

Nessa linha de intelecção laborou o Ministério Público de

Contas, por ocasião do registro da aposentadoria concedida a VALÉRIA JAIME PEIXOTO

PERILLO, ao pronunciar-se pela glosa de referido valor dos proventos de aposentadoria.

Entretanto, o Tribunal de Contas do Estado de Goiás

entendendo que ao conferir efeito ex tunc à decisão, para retroagi-la a 11/05/2010, data da

publicação do acórdão da ADI 219-2/220, em verdade o Tribunal de Justiça conferiu efeito ex

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nunc e manteve incólume todos os atos praticados antes da declaração de

inconstitucionalidade, incorporou, aos proventos de aposentadoria de VALÉRIA JAIME

PEIXOTO PERILLO a VPNI no valor de R$ 7.602,53 (sete mil, seiscentos e dois reais e

cinquenta e três centavos).

Pela decisão proferida na ADI 274681-82.2010.8.09.0000,

desde 11/05/2010 VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO não mais poderia ter percebido

a VPNI – Vantagem Pessoal Nominalmente Identificada – e, além de tais pagamentos

terem sido efetivados de forma indevida no período de 11/05/2010 até 24/11/2015 (data

da aposentadoria), sua incorporação aos proventos de aposentadoria também padece de

inconstitucionalidade, por violação ao princípio da legalidade estrita, uma vez que a

vantagem incorporada não encontra amparo legal, bem como à coisa julgada.

Forte nessas considerações e uma vez não acolhido o pedido

de declaração de nulidade do vínculo laboral de VALÉRIA JAIME PEIXOTO

PERILLO com a Administração Pública Estadual e, consequentemente, a nulidade da

aposentadoria concedida pelo Regime Próprio de Previdência Social e o respectivo

registro, impositiva é a exclusão, dos proventos de aposentadoria de VALÉRIA JAIME

PEIXOTO PERILLO, da parcela relativa a VPNI – Vantagem Pessoal Nominalmente

Identificada – no valor de R$ 7.602,53 (sete mil, seiscentos e dois reais e cinquenta e três

centavos).

Em razão de ter VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO

percebido indevidamente, a partir de 11/05/2010 a parcela relativa a VPNI – Vantagem

pessoal Nominalmente Identificada – impositiva é a restituição dos valores recebidos

indevidamente à Administração Pública Estadual, limitada essa restituição ao período

de 05 (cinco) anos, a contar da propositura da presente ação, nos termos do artigo 54 da

Lei 9.784/99, os quais totalizam, na data da propositura da presente ação, devidamente

corrigidos monetariamente, R$ 378.235,81 (trezentos e setenta e oito reais, duzentos e

trinta e cinco mil e oitenta e um centavos), conforme planilha de cálculo (anexo VIII).

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Conforme resultou demonstrado nos autos, além de VALÉRIA

JAIME PEIXOTO PERILLO, outros beneficiários da Lei 15.614/2006, julgada

inconstitucional, continuaram a perceber a VPNI após 11/05/2010 e, inclusive, incorporaram-

na aos proventos de aposentadoria, ao argumento de que em razão dos efeitos ex nunc da

decisão proferida nos autos da ADI 219-2/220, os atos de concessão das vantagens de que

tratavam os referidos atos normativos, aperfeiçoados antes da declaração de

inconstitucionalidade, não seriam alcançados por esta.

Os efeitos ex nunc em uma ação direta de inconstitucionalidade

que objetiva declarar a inconstitucionalidade de uma lei de efeito concreto, como já

enfatizado, tem o efeito de desconstituir, a partir da declaração (e não da própria

constituição do ato), os atos decorrentes da lei considerada inconstitucional, preservando

apenas os efeitos que até então foram produzidos.

Não obstante, nos autos do Processo nº 201100036004468

(Despacho 005790), 200300003001102 (Despacho AG nº 004009/2010) e Processo

201100025002800 (Despacho 005684), estes últimos mencionados no Despacho Ag 005790,

todos relativos a processos de aposentadoria, conforme documento acostado no anexo IV –

fls. 988/989 – ICP, foi reconhecido o direito de incorporação da VPNI aos proventos de

aposentadoria.

Diante da flagrante violação à decisão exarada nos autos da ADI

219-2/220 e na ADI 274681-82.2010.8.09.0000, necessário seja imposta ao ESTADO DE

GOIÁS a obrigação de fazer de identificar os beneficiários da Lei 15.614/2006 e excluir da

sua remuneração ou dos proventos de aposentadoria, caso já concedida, os valores que ainda

estiverem sendo pagos a título de VPNI, fundada na Lei 15.614/2006, julgada

inconstitucional pelo Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, bem como a obrigação de

fazer de proceder ao desconto, a título de restituição, no contracheque dos beneficiários,

dos valores que tiverem sido pagos, de forma indevida, a partir de 11/05/2010, a título

de VPNI, fundada na Lei 15.614/2010, limitado ao período de 05 (cinco) anos, a contar

da data da propositura da presente ação, nos termos do artigo 54 da Lei 9.784/99.

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IV – DA TUTELA PROVISÓRIA

O novel CPC, reformulou, de forma substancial e mais

sistemática, a tutela provisória no sistema processual brasileiro.

De acordo com a nova disciplina processual, a tutela provisória

pode fundamentar-se na urgência ou na evidência.

Conforme lição de Didier,

Em situação de urgência, o tempo necessário para a

obtenção da tutela definitiva (satisfativa ou cautelar)

pode colocar em risco sua efetividade. Este é um dos

males do tempo do processo.

Em situação de mera evidência (sem urgência), o

tempo necessário para a obtenção da tutela

definitiva (satisfativa) não deve ser suportado pelo

titular do direito assentado em informações de fato

comprovadas, que se possam dizer evidentes.

Haveria, em tais casos, violação ao princípio da

igualdade (grifou-se).

[…].

A principal finalidade da tutela provisória é abrandar os

males do tempo e garantir a efetividade da jurisdição

(os efeitos da tutela). Serve então, para redistribuir,

em homenagem ao princípio da igualdade, o ônus

do tempo do processo, conforme célebre imagem de

Luiz Guilherme Marinoni. Se é inexorável que o

processo demore, é preciso que o peso do tempo seja

repartido entre as partes e não somente o

demandante arque com ele. (DIDIER JR., Freddie.

BRAGA, Paula Sarno.OLIVEIRA, Rafael Alexandria

de. Curso de direito processual civil. Teroria da prova,

direito probatório, decisão precedente, coisa julgada e

tutela provisória. 10 ed. Rev. ampl. atual. Salvador:

Editora Juspodivm, 2015, Vol. 2.)

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A tutela provisória de urgência funda-se, além de na

probabilidade do direito, a fumaça do bom direito, no perigo de dano ou de risco ao resultado

útil do processo, ou seja, o periculum in mora (artigo 300, NCPC). Como se vê, o NCPC

superou a distinção entre os requisitos da concessão para a tutela cautelar e para a tutela

satisfativa de urgência, erigindo a probabilidade e o perigo da demora a requisitos comuns

para a prestação de ambas as tutelas de forma antecipada (Enunciado 143 do Fórum

Permanente de Processualistas Civis.

A tutela de evidência, como o próprio nome está a indicar,

funda-se na evidência. Como assere Didier,

A evidência é fato jurídico processual. É o estado

processual em que as afirmações de fato estão

comprovadas.

A evidência, enquanto um fato jurídico processual,

pode ser tutelada em juízo.

Perceba-se que a evidência não é um tipo de tutela

jurisdicional, a evidência é um fato jurídico processual

que autoriza que se conceda uma tutela jurisdicional

mediante técnica de tutela diferenciada. Evidência é um

pressuposto fático de uma técnica processual para a

obtenção da tutela. (DIDIER JR., Freddie. BRAGA,

Paula Sarno.OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso

de direito processual civil. Teroria da prova, direito

probatório, decisão precedente, coisa julgada e tutela

provisória. 10 ed. Rev. ampl. atual. Salvador: Editora

Juspodivm, 2015, Vol. 2.)

Ainda sobre a tutela provisória de evidência, ensina Didier,

[…] a evidência se caracteriza com conjugação de dois

pressupostos: prova das alegações de fato e

probabilidade de acolhimento da pretensão processual.

Dispensa-se a demonstração de urgência ou perigo. Por

isso, há quem prefira compreender a tutela provisória de

evidência simplesmente como aquela para cuja

concessão se dispensa a demonstração de perigo.

Seu objetivo é redistribuir o ônus que advém do tempo

necessário para transcurso de um processo e a

concessão de tutela definitiva. Isso é feito mediante a

concessão de uma tutela imediata e provisória para a

parte que revela o elevado grau de probabilidade de

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suas alegações (devidamente provadas), em detrimento

da parte adversa e a improbabilidade de êxito em sua

resistência – mesmo após a instrução processual.

Por essa razão se diz que o direito fundamental à

duração razoável do processo (art. 5º, LXXVIII, CF)

exige que o ônus do tempo processual seja gerido

com comedimento e moderação, considerando-se

não só a razoabilidade do tempo necessário para

concessão da tutela definitiva, como também a

razoabilidade na escolha da parte que suportará o

estorvo decorrente, concedendo uma tutela

provisória para aquela cuja posição processual se

apresenta em estado de evidência e com mais

chances de sucesso.

Por exemplo, se as afirmações de fato e o direito do

autor se colocam em estado de evidência, a injustiça

que pode decorrer da sua espera por uma cognição

exauriente, necessária para a concessão de tutela

definitiva, é muito mais provável do que aquela que

vitimaria o réu com um eventual erro judiciário advindo

da apreciação superficial da causa, por uma cognição

sumária, que funde uma tutela provisória.

É nesses casos e com esse propósito que se propugna

pela concessão de tutela de evidência em favor do

autor, desestimulando a resistência do réu para

quem se tornará desvantajoso procrastinar o feito e

vantajoso cooperar para seu deslinde ou, talvez,

partir para mecanismos alternativos de solução do

conflito. (DIDIER JR., Freddie. BRAGA, Paula

Sarno.OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso de

direito processual civil. Teroria da prova, direito

probatório, decisão precedente, coisa julgada e tutela

provisória. 10 ed. Rev. ampl. atual. Salvador: Editora

Juspodivm, 2015, Vol. 2.)

Assim dispõe o artigo 311 do NCPC:

Art. 311. A tutela de evidência será concedida,

independentemente da demonstração de perigo de dano

ou de risco ao resultado útil do processo, quando:

[…];

II – as alegações de fato puderem ser comprovadas

apenas documentalmente e houver tese firmada em

julgamento de casos repetitivos ou em súmula

vinculante;

[…].

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Nos termos do citado dispositivo legal, dois são os pressupostos

para a concessão da tutela provisória de evidência:

a) existência de prova das alegações de fato da parte requerente,

necessariamente documental ou documentada e que recaiam sobre fatos que justificam o

nascimento do direito afirmado;

b) probabilidade de acolhimento da pretensão processual, que se

configura exatamente em razão do fundamento normativo da demanda consistir em tese

jurídica já firmada em precedente obrigatório, mais especificamente em enunciado de súmula

vinculante ou em julgamento de demandas ou recursos repetitivos que vinculam o julgador e

devem ser por ele observados, inclusive liminarmente (art. 311, parágrafo único)2.

Segundo Didier,

A parte que postula com base em fatos provados por

documento e que sejam semelhantes àqueles que

ensejaram a criação de tese jurídica vinculante em

tribunal superior – tese esta invocada como fundamento

normativo de sua postulação 0 encontra-se em estado de

evidência. Demonstra não só a probabilidade de

acolhimento da sua pretensão processual como também

a improbabilidade de sucesso do adversário que se

limite a insistir em argumentos já rejeitados no processo

de formação do precedente, o que configuraria,

inclusive, litigância de má-fé (por defesa infundada ou

resistência injustificada, art. 80, NCPC). (DIDIER JR.,

Freddie. BRAGA, Paula Sarno.OLIVEIRA, Rafael

Alexandria de. Curso de direito processual civil.

Teroria da prova, direito probatório, decisão

precedente, coisa julgada e tutela provisória. 10 ed.

Rev. ampl. atual. Salvador: Editora Juspodivm, 2015,

2 Propõe Didier uma interpretação sistemática, teleológica e extensiva da regra para que se entenda que deve

ser possível a concessão de tutela de evidência também quando houver tese jurídica assentada em outros

precedentes obrigatórios, tais como aqueles previstos no art. 927, CPC. Seria o caso da tese fixada em

decisão do STF dada em sede de controle concentrado e dos enunciados das súmulas do Supremo Tribunal

Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional.

(DIDIER JR., Freddie. BRAGA, Paula Sarno.OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso de direito

processual civil. Teroria da prova, direito probatório, decisão precedente, coisa julgada e tutela provisória.

10 ed. Rev. ampl. atual. Salvador: Editora Juspodivm, 2015, Vol. 2.)

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Vol. 2.)

Os documentos que instruem a presente inicial demonstram

irrefutavelmente que VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO foi admitida sem concurso

público, aos 12/06/1986, para a função de Pesquisador Legislativo da Assembleia Legislativa

do Estado de Goiás, foi transposta para o cargo de Assistente Administrativo, posteriormente,

pela Resolução 1.007/1999, classificado como Assistente Legislativo – categoria funcional –

Assistente Administrativo, bem como efetivada no referido cargo, pelo Decreto 1.275 de 12

de maio de 1988, editado com base na Lei 10.548 de 22 de fevereiro de 1986, em flagrante

violação ao artigo 37, inciso II, da Constituição Federal e artigo 19 do ADCT, razão por que

referidos atos administrativos não foram recepcionados pela Constituição Federal de 1988.

Os documentos acostados aos autos também evidenciam que,

posteriormente, aos 24/11/2015, VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO, em razão da

transposição e efetivação no cargo de Assistente Administrativo, obteve aposentadoria

pelo Regime Próprio de Previdência Social, em total afronta ao disposto no artigo 40 da

Constituição Federal, artigo 1º, inciso V, da Lei 9.717/98 e artigo 1º da LC Estadual 66/2009.

Também demonstram os documentos acostados aos autos que

VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO obteve a incorporação ao seu vencimento de

VPNI – Vantagem Pessoal Nominalmente Identificada – no valor de R$ 7.602,53 (sete mil,

seiscentos e dois reais e cinquenta e três centavos), por força da Lei 15.614/2006, a qual foi

julgada inconstitucional por decisão do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás na ADI

274681-82.2010.8.09.0000. Apesar de o Tribunal de Justiça ter concedido efeito ex tunc à

decisão, para retroagir seus efeitos declaratórios e desconstitutivos a 11/05/2010, VALÉRIA

JAIME PEIXOTO PERILLO continuou a perceber a referida vantagem até a data de sua

aposentadoria e incorporou-a aos proventos de aposentadoria, em total violação ao princípio

da legalidade, estampado no caput do artigo 37 da Constituição Federal e à coisa julgada.

Todas as ilegalidades acima noticiadas, além de configurarem

flagrante violação à Constituição Federal e comprometerem de modo grave a sua força

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normativa, estão a causar um prejuízo material ao erário estadual, pois, em razão delas, o

erário estadual está arcar com o pagamento de proventos de aposentadoria de forma indevida

a VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO, em considerável valor, qual seja R$ 15.206,43

(quinze mil, duzentos e seis reais e quarenta e seis centavos), valor esse bem acima daquele

que ela auferiria se estivesse filiada ao Regime Geral de Previdência Social, caso já

preenchesse os requisitos legais para a aposentadoria nesse regime, o que não se verifica no

caso em debate, tendo em vista o fato de que VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO

conta apenas 53 (cinquenta e três) anos e os requisitos dispostos no artigo 201, § 7º, da

Constituição Federal.º

Por outro lado, a questão de fundo sobre a qual deverá se

pronunciar o Poder Judiciário no presente caso e que embasa toda situação de ilegalidade

noticiada – o provimento de cargos públicos sem concurso público - já foi objeto de

pronunciamento pelo Supremo Tribunal Federal, por meio, inclusive, da Súmula

Vinculante 43 e de outros reiterados pronunciamentos, pelo Supremo Tribunal Federal,

inclusive em controle concentrado de constitucionalidade, como exaustivamente

demonstrado nesta inicial.

Eis o teor da Súmula Vinculante 43 do STF:

Súmula Vinculante 43: É inconstitucional toda

modalidade de provimento que propicie ao servidor

investir-se, sem prévia aprovação em concurso

público destinado ao seu provimento, em cargo que

não integra a carreira na qual anteriormente

investido.

Diante da gravidade da violação à Constituição Federal de 1988,

fartamente comprovada pela prova documental acostada, corroborada pelo disposto na

Súmula Vinculante 43 do STF, bem como em razão da necessidade de fazer cessar a

situação inconstitucional e o dano experimentado pelo erário estadual, com o

restabelecimento da força normativa da Constituição Federal, imperiosa a concessão da

antecipação dos efeitos da tutela, fundada na evidência, para suspender os efeitos do

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS - 90ª Promotoria de Justiça Rua 23, esq. com a Av. Fued José Sebba, Qd. 06, Lts. 15/25, Jardim Goiás, sala 342, CEP 74.805-100, Goiânia - Goiás.

Decreto de 24 de novembro de 2015, editado pelo Presidente da Assembleia Legislativa do

Estado de Goiás que concedeu a VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO a aposentadoria

integral pelo Regime Próprio de Previdência Social do Estado de Goiás, em decorrência de

um vínculo inexistente com a Administração Pública Estadual, bem como do respectivo

registro efetivado pelo Tribunal de Contas do Estado de Goiás.

Uma vez suspensos os efeitos do ato de aposentadoria e do

respectivo registro, necessário, ainda, com fundamento na evidência, sejam suspensos os

efeitos do ato de admissão de VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO efetivada pela

Assembleia Legislativa do Estado de Goiás sem concurso público, bem como o ato de

transposição de VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO para o cargo de provimento

efetivo de Assistente Administrativo, posteriormente classificado, pela Resolução

1.007/1999, como Assistente Legislativo – categoria funcional Assistente Administrativo - e

de efetivação no referido cargo, operados pelo Decreto 1.275 de 12 de maio de 1988,

editado com base na Lei 10.458 de 22 de fevereiro de 1988.

Isso porque, embora estivesse VALÉRIA JAIME PEIXOTO

PERILLO, no momento da concessão da aposentadoria, em gozo de licença para interesse

particular (sem o direito de perceber remuneração pelos cofres públicos), suspensos os

efeitos do ato de aposentadoria, poderá ela retornar ao exercício do cargo, fazendo assim

perpetuar a violação à Constituição Federal, sabe-se lá por mais quanto tempo, até que a

questão seja definitivamente julgada pelo Poder Judiciário.

Razão não há para, evidenciada a violação, permitir que se

perpetue, com sérios prejuízos para o erário e para a força normativa da Constituição.

Vale lembrar, invocando novamente o escólio de Didier, que

impedimentos não há para a concessão de tutela provisória satisfativa (ou antecipada, na

terminologia da lei), no âmbito de ações constitutivas e declaratórias. Isso porque

[...] não se antecipa a própria tutela satisfativa

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(declaratória, constitutiva ou condenatória), mas, sim,

os efeitos delas provenientes. Pela decisão provisória,

apenas se permite que o requerente usufrua os efeitos

práticos (sociais, executivos) do direito que quer ver

tutelado, imediatamente, antes mesmo do seu

reconhecimento judicial.

Antecipa-se, pois, a eficácia social da sentença – seus

efeitos executivos – e, não, sua eficácia jurídico-formal.

Antecipar a tutela é satisfazer de imediato, na realidade

fática, o pleito do requerente.

É por isso que, no contexto da tutela provisória

satisfativa (ou antecipada, na terminologia da lei),

concedida em sede de ações constitutivas e

declaratórias, a antecipação que se opera não é da

declaração ou da constituição/desconstituição (efeito

jurídico-formal), vez que estas serão sempre definitivas

– e só assim serão úteis para a parte. O que pode ocorrer

é a antecipação dos efeitos fáticos, práticos, palpáveis

de tais tutelas (declaratória ou constitutiva). (DIDIER

JR., Freddie. BRAGA, Paula Sarno.OLIVEIRA, Rafael

Alexandria de. Curso de direito processual civil. Teroria

da prova, direito probatório, decisão precedente, coisa

julgada e tutela provisória. 10 ed. Rev. ampl. atual.

Salvador: Editora Juspodivm, 2015, Vol. 2.)

Necessário pontuar, ainda, que a possibilidade de concessão de

medida acautelatória liminar, em ação civil pública, é expressamente prevista no artigo 12 da

Lei 7.347/85:

Art. 12. Poderá o juiz conceder mandado liminar, com

ou sem justificação prévia, em decisão sujeita a agravo.

Assim sendo, presentes os requisitos esculpidos no artigo 311

do NCPC, imperiosa a concessão da antecipação dos efeitos da tutela fundada na evidência,

conforme acima requerido.

Vale ressaltar que, além da evidência que favorece o

MINISTÉRIO PÚBLICO, o ônus a ser suportado por VALÉRIA JAIME PEIXOTO

PERILLO com a concessão da tutela provisória de evidência ora requestada não a colocará

numa situação de vulnerabilidade a ensejar a aplicação das máximas da proporcionalidade.

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Isso porque, como é de conhecimento amplo e notório,

VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO não depende dos proventos de aposentadoria

para sua subsistência e, antes de requerer sua aposentadoria, solicitou licença não

remunerada para tratar de assunto de interesse particular, abdicando, assim, da percepção de

remuneração (anexo V).

Por outro lado, VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO

possui atualmente apenas 53 (cinquenta e três) anos de idade e, portanto, plena capacidade

laborativa. Tanto isso é verdadeiro, que VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO exerce,

segundo informação constante dos autos, a Presidência da OVG – Organização das

Voluntárias de Goiás – além de contribuir, segundo informação do Secretário de Estado da

Casa Civil e do próprio Governador do Estado de Goiás, ativamente, como Primeira-Dama do

Estado de Goiás, para a execução das políticas assistenciais do Estado (anexo V e anexo VII).

Ademais, se estivesse vinculada ao Regime Geral de

Previdência Social não teria, aos 53 (cinquenta e três) anos, obtido o benefício da

aposentadoria, em face dos requisitos explícitos no artigo 201, § 7º, da Constituição Federal.

Diante de todas essas circunstâncias, a concessão da tutela

provisória de evidência é medida que se impõe.

Importante ressaltar que, presentes os pressupostos de lei, o

juiz deverá conceder a tutela provisória. Não há discricionariedade judicial.

Não obstante, se assim não entender Vossa Excelência,

presentes estão também os requisitos do artigo 300 do NCPC para a concessão da tutela

provisória de urgência.

A probabilidade do direito resulta evidenciada pela

mesma prova documental que comprova os requisitos fáticos exigidos para a concessão da

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tutela provisória de evidência, conforme já demonstrado anteriormente, ou seja, que

VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO foi admitida sem concurso público, aos

12/06/1986, para a função de Pesquisador Legislativo da Assembleia Legislativa do Estado

de Goiás, foi transposta para o cargo de Assistente Administrativo, posteriormente, pela

Resolução 1.007/1999, classificado como Assistente Legislativo – categoria funcional –

Assistente Administrativo, bem como efetivada no referido cargo, pelo Decreto 1.275 de 12

de maio de 1988, editado com base na Lei 10.548 de 22 de fevereiro de 1986, em flagrante

violação ao artigo 37, inciso II, da Constituição Federal e artigo 19 do ADCT, razão por que

referidos atos administrativos não foram recepcionados pela Constituição Federal de 1988.

Ainda demonstram que, posteriormente, aos 24/11/2015,

VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO, em razão da transposição e efetivação no

cargo de Assistente Administrativo, obteve aposentadoria pelo Regime Próprio de

Previdência Social, em total afronta ao disposto no artigo 40 da Constituição Federal, artigo

1º, inciso V, da Lei 9.717/98 e artigo 1º da LC Estadual 66/2009.

Também demonstram os documentos acostados aos autos que

VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO obteve a incorporação ao seu vencimento de

VPNI – Vantagem Pessoal Nominalmente Identificada – no valor de R$ 7.602,53 (sete mil,

seiscentos e dois reais e cinquenta e três centavos), por força da Lei 15.614/2006, a qual foi

julgada inconstitucional por decisão do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás na ADI

274681-82.2010.8.09.0000. Apesar de o Tribunal de Justiça ter concedido efeito ex tunc à

decisão, para retroagir seus efeitos declaratórios e desconstitutivos a 11/05/2010, VALÉRIA

JAIME PEIXOTO PERILLO continuou a perceber a referida vantagem até a data de sua

aposentadoria e incorporou-a aos proventos de aposentadoria, em total violação ao princípio

da legalidade, estampado no caput do artigo 37 da Constituição Federal e à coisa julgada.

Assim sendo, patente a fumaça do bom direito necessária

ao deferimento da tutela provisória de urgência, na forma do artigo 300 do NCPC.

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS - 90ª Promotoria de Justiça Rua 23, esq. com a Av. Fued José Sebba, Qd. 06, Lts. 15/25, Jardim Goiás, sala 342, CEP 74.805-100, Goiânia - Goiás.

Por outro lado, presente também se faz o perigo de dano.

Tal requisito, que materializa o periculum in mora,

encontra-se consubstanciado na possibilidade de perpetuação da situação inconstitucional,

com sérios prejuízos ao erário estadual, haja vista que, até que se julgue definitivamente o

pedido, VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO perceberá, de forma totalmente

inconstitucional, proventos de aposentadoria pelo Regime Próprio de Previdência Social, de

forma integral, em expressivo valor, bem superior àquele que, porventura teria direito se

vinculada estivesse ao Regime Geral de Previdência Social, em razão de um vínculo

inexistente com a Administração Pública Estadual.

Por outro lado, se suspensos forem os efeitos do ato de

aposentadoria, necessário também que se suspendam os efeitos dos atos de admissão sem

concurso público, de transposição e de efetivação no cargo de Assistente Legislativo –

categoria funcional – Assistente Administrativo – a fim de evitar que VALÉRIA JAIME

PERILLO continue no exercício de cargo público, de forma totalmente ilegítima, ilegal e

inconstitucional, com a percepção de remuneração de forma indevida e com inegáveis

prejuízos à força normativa da Constituição.

Assim, com base nos fundamentos ora expendidos, bem como

forte nos argumentos expostos ao longo desta petição inicial, requer o MINISTÉRIO

PÚBLICO seja concedida a antecipação dos efeitos da tutela, com fundamento na

evidência (artigo 311 NCPC) e apenas de forma subsidiária, com fundamento na

urgência (artigo 300 NCPC), após a ouvida do Estado de Goiás, no prazo de 72 horas, nos

termos do artigo 2º da Lei 8.437/92, a fim de:

a) suspender os efeitos do Decreto de 24 de novembro de 2015,

da lavra do Presidente da Assembleia Legislativa do Estado de Goiás, que concedeu

aposentadoria a VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO pelo Regime Próprio de

Previdência Social, bem como do seu registro efetivado pelo Tribunal de Contas do Estado de

Goiás;

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b) suspender os efeitos dos atos de admissão sem concurso

público de VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO no cargo de Pesquisador Legislativo,

bem como dos atos de transposição para o cargo de Assistente Administrativo,

posteriormente classificado como Assistente Legislativo – categoria funcional – Assistente

Administrativo, da Assembleia Legislativa do Estado de Goiás, e de efetivação no referido

cargo, operados pelo Decreto 1.275 de 12 de maio de 1988.

Subsidiariamente, apenas na hipótese de não ser acolhido o

requerimento de tutela provisória (fundada na urgência ou na evidência), conforme requerido

anteriormente, requer o MINISTÉRIO PÚBLICO, sejam antecipados os efeitos da tutela,

nos termos do artigo 300 do NCPC, a fim de:

a) suspender o pagamento, nos proventos de aposentadoria ou

da remuneração (na hipótese de ser acolhido em parte o requerimento anterior), de

VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO, da parcela relativa a VPNI – Vantagem Pessoal

Nominalmente Identificada – porquanto seu pagamento, conforme já amplamente explanado

não encontra fundamento legal, uma vez que a Lei 15.614/2006, que a concedeu, foi

declarada inconstitucional na ADI 274681-82.2010.8.09.0000, em decisão não mais sujeita a

recurso.

O fumus boni iuris resulta demonstrado por toda prova

documental acostada aos autos que demonstra que o ato normativo que fundamentava a

concessão da VPNI – Lei 15.614/2006 - foi julgado inconstitucional na ADI 274681-

82.2010.8.09.0000, em decisão não mais sujeita a recurso e que, além de declarar a

inconstitucionalidade da norma, desconstituiu os atos administrativos de incorporação dela

decorrentes, a partir de 11/05/2010.

Por outro lado, presente também se faz o perigo de dano

exigido pelo referido artigo 300 do NCPC.

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS - 90ª Promotoria de Justiça Rua 23, esq. com a Av. Fued José Sebba, Qd. 06, Lts. 15/25, Jardim Goiás, sala 342, CEP 74.805-100, Goiânia - Goiás.

Tal requisito, que materializa o periculum in mora,

encontra-se consubstanciado na possibilidade de sérios prejuízos ao erário estadual em

razão da perpetuação dos pagamentos, de forma inconstitucional e ilegal, haja vista que,

até que se julgue definitivamente o pedido, VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO

perceberá, de forma totalmente inconstitucional, nos proventos de aposentadoria, parcela de

VPNI, em expressivo valor, sem que encontre amparo legal e com flagrante violação à

coisa julgada.

Tendo em vista a existência nos autos de informações de que

outras pessoas, alcançadas pela Lei 15.614/2006, continuaram a receber, após 11/05/2010, a

VPNI – Vantagem Pessoal Nominalmente Identificada -, bem como incorporaram-na aos

proventos de aposentadoria, requer o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS,

com base no artigo 84 do Código de Defesa do Consumidor – CDC – c/c artigo 21 da Lei

7.347/85, seja concedida a antecipação da tutela, a fim de:

a) impor ao ESTADO DE GOIÁS a obrigação de fazer

consistente em identificar todos os servidores públicos que se beneficiaram da Lei

15.614/2010 e glosar da remuneração ou dos proventos de aposentadoria, caso já deferida, a

parcela relativa a VPNI, julgada inconstitucional pelo Tribunal de Justiça do Estado de Goiás,

em cumprimento à decisão judicial exarada nos autos da ADI ADI 274681-

82.2010.8.09.0000;

b) impor ao ESTADO DE GOIÁS a obrigação de fazer

consistente em proceder ao desconto, a título de restituição, no contracheque dos

beneficiários, a dos valores que tiverem sido pagos, de forma indevida, a partir de

11/05/2010, a título de VPNI, fundada na Lei 15.614/2010, limitado ao período de 05

(cinco) anos, a contar da data da propositura da presente ação, nos termos do artigo 54 da Lei

9.784/99.

O fumus boni iuris para a concessão da medida consubstancia-

se, nos termos do artigo 84 do CDC, na relevância do fundamento da demanda, uma vez que

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS - 90ª Promotoria de Justiça Rua 23, esq. com a Av. Fued José Sebba, Qd. 06, Lts. 15/25, Jardim Goiás, sala 342, CEP 74.805-100, Goiânia - Goiás.

a VPNI fundada na Lei 15.614/2006 já foi declarada inconstitucional e, entretanto, continua

sendo paga aos seus beneficiários, numa flagrante violação ao princípio da legalidade e à

coisa julgada.

O periculum in mora resulta consubstanciado no fato de que, se

não for antecipada a tutela específica da obrigação ora requestada, em caráter liminar, vários

servidores públicos continuarão a perceber de forma totalmente inconstitucional parcelas

incorporadas à remuneração ou aos proventos de aposentadoria, com sérios prejuízos ao

erário estadual.

Para o cumprimento da referida obrigação, deverá Vossa

Excelência fixar prazo razoável.

V – DOS REQUERIMENTOS FINAIS E DO PEDIDO

Em razão do exposto e de tudo o que dos autos consta, requer o

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS:

a) o recebimento da petição inicial;

b) a adoção do procedimento comum, nos termos do disposto no

artigo 19 da Lei 7.347/85 c/c artigo 318 e seguintes do NCPC – Lei 13.105/2015;

c) a concessão da antecipação dos efeitos da tutela, nos termos

do artigo 311, inciso II (tutela de evidência), e do artigo 300 (tutela de urgência), ambos do

NCPC, bem como no artigo 84, § 3º do Código de Defesa do Consumidor, tudo conforme

requerimento formulado no item IV desta petição inicial, ouvido o Estado de Goiás, no

prazo de 72 horas, nos termos do artigo 2º da Lei 8.437/92;

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS - 90ª Promotoria de Justiça Rua 23, esq. com a Av. Fued José Sebba, Qd. 06, Lts. 15/25, Jardim Goiás, sala 342, CEP 74.805-100, Goiânia - Goiás.

d) tendo em vista a natureza da questão controvertida e não

sendo cabível a autocomposição, a citação de VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO e

do ESTADO DE GOIÁS, este na pessoa do Procurador-Geral do Estado de Goiás, para que

contestem o pedido no prazo legal;

f) a produção de todas as provas em direito admitidas, inclusive

testemunhal, cujo rol será oportunamente ofertado;

g) a isenção do pagamento de taxas e emolumentos,

adiantamentos de honorários periciais e quaisquer outras despesas processuais.

Postula, por fim, a PROCEDÊNCIA DO PEDIDO para:

1) DECLARAR A NULIDADE, por não recepcionado pela

Constituição Federal de 1988, do ato de admissão de VALÉRIA JAIME PEIXOTO

PERILLO no cargo de Pesquisador Legislativo da Assembleia Legislativa do Estado de

Goiás, sem concurso público, pelo regime celetista, do ato de transposição para o cargo de

Assistente Administrativo, posteriormente classificado como Assistente Legislativo –

categoria funcional – Assistente Administrativo, pela Resolução 1.007/1999 da Assembleia

Legislativa do Estado de Goiás, bem como do ato de efetivação de VALÉRIA JAIME

PEIXOTO PERILLO no referido cargo, operados pelo Decreto 1.275 de 12 de maio de

1988;

2) DECLARAR A NULIDADE do Decreto de 24 de novembro

de 2015, da lavra do Presidente da Assembleia Legislativa do Estado de Goiás, que concedeu

aposentadoria a VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO, com proventos integrais, pelo

Regime Próprio de Previdência Social, bem como do respectivo registro efetivado pelo

Tribunal de Contas do Estado de Goiás;

3) subsidiariamente, não sendo acolhidos os pedidos

anteriores, DECLARAR a inconstitucionalidade e ilegalidade da incorporação, aos proventos

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de aposentadoria de VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO da parcela relativa a VPNI –

Vantagem Pessoal Nominalmente Identificada -, no valor de R$ 7.602,53 (sete mil, seiscentos

e dois reais e cinquenta e três centavos), com a respectiva exclusão da parcela dos

proventos de aposentadoria;

4) IMPOR A OBRIGAÇÃO DE FAZER ao ESTADO DE

GOIÁS de identificar os beneficiários da Lei 15.614/2006 e excluir da sua remuneração ou

dos proventos de aposentadoria, caso já concedida, os valores que ainda estiverem sendo

pagos a título de VPNI, fundada na Lei 15.614/2006, julgada inconstitucional pelo

Tribunal de Justiça do Estado de Goiás;

5) IMPOR A OBRIGAÇÃO DE FAZER ao ESTADO DE

GOIÁS de proceder ao desconto, a título de restituição, no contracheque dos beneficiários, a

dos valores que tiverem sido pagos, de forma indevida, a partir de 11/05/2010, a título de

VPNI, fundada na Lei 15.614/2010, limitado ao período de 05 (cinco) anos, a contar da

data da propositura da presente ação, nos termos do artigo 54 da Lei 9.784/99;

6) CONDENAR VALÉRIA JAIME PEIXOTO PERILLO à

RESTITUIÇÃO ao ESTADO DE GOIÁS dos valores recebidos indevidamente, a título de

VPNI – Vantagem Pessoal Nominalmente Identificada – após 11/05/2010, data em que os

atos concessivos foram desfeitos, devidamente corrigidos monetariamente, limitados ao

período de 05 (cinco) anos, a contar da data da propositura da presente ação, nos

termos do artigo 54 da Lei 9.784/99, os quais totalizam, até a data da propositura da

ação R$ 378.235,81 (trezentos e setenta e oito mil, duzentos e trinta e cinco reais e

oitenta e um centavos) e de todos os valores que, porventura, forem pagos a VALÉRIA

JAIME PEIXOTO PERILLO, a título de VPNI, a partir da propositura da ação, todos

corrigidos monetariamente.

Dá à causa o valor de R$ 378.235,81 (trezentos e setenta e oito

mil, duzentos e trinta e cinco reais e oitenta e um centavos).

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS - 90ª Promotoria de Justiça Rua 23, esq. com a Av. Fued José Sebba, Qd. 06, Lts. 15/25, Jardim Goiás, sala 342, CEP 74.805-100, Goiânia - Goiás.

A presente petição inicial é instruída com documentos que

integraram os autos de ICP de protocolo nº 201500143233, em 08 (oito) anexos.

Goiânia, 18 de março de 2016.

FABIANA LEMES ZAMALLOA DO PRADO RODRIGO CÉSAR BOLLELI FARIA

PROMOTORA DE JUSTIÇA PROMOTOR DE JUSTIÇA

FELIPE OLTRAMARI RAFAEL SIMONETTI DA SILVA

PROMOTOR DE JUSTIÇA PROMOTOR DE JUSTIÇA