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PRO M O TO RIA DE JUSTIÇ A DO C O NSUMIDO R Rua Ria c huelo 115, sa la 130 – C entro – Sã o Pa ulo/ SP - CEP 01007-904 Fone: 3119-9061 / Fa x: 3119-9060 EXC ELENTÍSSIM O SENHO R DO UTO R JUIZ DE DIREITO DA ___ª VARA DA INFÂNCIA E JUVENTUDE DO FORO REGIONAL DE SANTO AMARO – COMARCA DA CAPITAL O 0,1,67e5,2 3Ô%/,&2 ’2 (67$’2 ’( 6fi2 3$8/2, por intermédio de seu Promotor de Justiça do Consumidor que a final assina, vem respeitosamente à presença de Vossa Excelência, com fundamento no art. 129, inc. III, da Constituiçã o da República, nos arts. 81, parágrafo único, incs. I, II e III, e 82, inc. I, ambos do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90), no art. 5° FDSXW, da Lei Federal 7.347/85, e no art. 25, inc. IV, letra “a”, da Lei Federal 8.625/ 93, p ro p o r $dfi2&,9,/3Ô%/,&$, a ser processada pelo rito ordinário, contra 1(67/e %5$6,/ /7’$, pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ so b 60.409.075/ 0001-52, com endereço na Av. Doutor Chucri Zaidan, 246, Vila C o rd eiro , Sã o Pa ulo / SP, CEP 04.583-110 e .(//2** %5$6,/ /7’$, pessoa jurídica de direito p riva d o, insc rita no CNPJ sob nº 55.002.133/ 0001-99, c om endereço na Rua Augusto Ferreira de Moraes, 602, C a p e la d o So c o rro , Sã o Pa ulo / SP, CEP 04.763-001,

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ª …dos Direitos do Homem que, em seu art. 25, estabeleceu que “a maternidade e a infância têm direito a ajuda e a assistência

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PROMOTORIA DE JUSTIÇA DO CONSUMIDOR Rua Riachuelo 115, sa la 130 – Centro – Sã o Paulo/ SP - CEP 01007-904

Fone: 3119-9061 / Fa x: 3119-9060

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ___ª

VARA DA INFÂNCIA E JUVENTUDE DO FORO REGIONAL DE

SANTO AMARO – COMARCA DA CAPITAL

O 0,1,67e5,2� 3Ô%/,&2� '2� (67$'2� '(� 6®2�

3$8/2, por intermédio de seu Promotor de Justiç a do

Consumidor que a fina l assina , vem respeitosamente à

p resenç a de Vossa Excelênc ia , com fundamento no a rt. 129,

inc . III, da Constituiç ã o da Repúb lic a , nos a rts. 81, pa rágra fo

únic o, inc s. I, II e III, e 82, inc . I, ambos do Código de Defesa

do Consumidor (Lei 8.078/ 90), no a rt. 5° FDSXW, da Lei Federa l

7.347/ 85, e no a rt. 25, inc . IV, letra “ a ” , da Lei Federa l

8.625/ 93, p ropor $d®2�&,9,/�3Ô%/,&$, a ser p roc essada pelo rito

ord iná rio, c ontra

1(67/e� %5$6,/� /7'$�, pessoa juríd ic a de d ireito p rivado,

insc rita no CNPJ sob nº 60.409.075/ 0001-52, c om

endereç o na Av. Doutor Chuc ri Zaidan, 246, Vila

Cordeiro, Sã o Paulo / SP, CEP 04.583-110

e .(//2**� %5$6,/� /7'$�, pessoa juríd ica de d ireito

p rivado, insc rita no CNPJ sob nº 55.002.133/ 0001-99, c om

endereç o na Rua Augusto Ferreira de Moraes, 602,

Capela do Socorro, Sã o Paulo / SP, CEP 04.763-001,

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LQD��

em razão dos fundamentos de fa to e de d ireito

e c om os pedidos a seguir deduzidos:

$�&203(7È1&,$�$%62/87$�'2�-8Ì=2�'$�,1)Ç1&,$�(�-89(178'(

A p resente aç ão c ivil púb lic a d iscute a violaç ão

de d ireitos d ifusos a fetos à c rianç a , inc lusive mediante

violaç ão de d ireitos e garantias previstos no ECA – Esta tuto

da Crianç a e do Adolesc ente (Lei 8.069/ 90).

Em ta is c irc unstânc ias, inc ide à espéc ie a regra

de c ompetênc ia do a rt. 148, inc . IV, do ECA, que p revê:

Art. 148. A Justiça da Infânc ia e da Juventude é c ompetente para : (...) IV�- conhec er de aç ões c ivis fundadas em interesses ind ividuais, d ifusos ou c oletivos a fetos à c rianç a e ao adolesc ente, observado o d isposto no Art. 209;

E essa c ompetênc ia é absoluta , c onsoante

rea firmado em rec entíssimo p recedente do E. Tribuna l de

Justiç a de São Paulo: TJSP – Apelaç ão 994.06.037247-6, Rel.

Des. Elc io Trujillo ; j. 07/ 04/ 2010, v.u. (c ópia anexa).

26�)$726

$�DWXDomR�GDV�UpV�QR�PHUFDGR�GH�DOLPHQWRV�

As rés são empresas p rivadas que a tuam no

merc ado c omo fornecedoras de c onsumo. Produzem e

põem no merc ado de c onsumo p rodutos a limentíc ios,

dentre os quais os c hamados c ereais matinais, Y�J�: (a )

1HVFDX, 6QRZ� )ODNHV, (VWUHOLWDV e &UXQFK, da NESTLÉ; e (b )

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LQD��

6XFULOKRV, &KRFR�.ULVSLV, )URRW�/RRSV, &KRNRV e +RQH\�1XWRV,

da KELLOGG.

A p ropósito de suas estra tégias de pub lic idade

e PDUNHWLQJ, relac ionadas aos a lud idos p rodutos do setor de

a limentos industria lizados, a Promotoria de Justiç a do

Consumidor da Capita l (São Paulo) instaurou o inquérito c ivil

MP 14.161.924/ 08-2, c ujos autos instruem a p resente petiç ão

inic ia l.

3XEOLFLGDGH�H�PDUNHWLQJ�SDUD�FULDQoDV�

Para inc rementa r as vendas de ta is p rodutos, as

rés desenvolvem prá tic as de pub lic idade e PDUNHWLQJ�

nitidamente voltadas para o púb lico infantil, segmento

importante no c onsumo dos p rodutos que elas c onduzem ao

merc ado de c onsumo.

Na implementaç ão de ta is estra tégias

c omerc iais, as rés a todo tempo utilizam imagens de

personagens p róprios do universo lúd ic o infantil, seja na

pub lic idade d ireta , seja na apresentaç ão de p rodutos em

emba lagens rep letas daquele conteúdo imagétic o e lúd ico.

A par d isso, “ seduzem” as c rianças a assimilar

suas marc as mediante oferta de jogos e de “ b rindes” , tudo

de modo a fazer c om que o c onvite a c onsumir os p rodutos

se apresentem no imaginário infantil como um convite à

b rincadeira .

A oferta de jogos hoje não se limita às

emba lagens ou “ b rindes” a ela agregados, porque agora

são oferec idos também em sítios de Internet desenvolvidos

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LQD��

pelas rés espec ia lmente para esse fim, Y�J�, nos endereç os

eletrônicos

http :/ / www.nestle.c om.br/ maisdivertido/

(ac esso em 30 de abril de 2010)

ou http :/ / www.suc rilhos.c om.br/ site/ game.php

(ac esso em 30 de abril de 2010.

2�UHVXOWDGR�VREUH�R�FRQVXPR�

Essas estra tégias agressivas de pub lic idade sem

dúvida surtem efeitos p roveitosos à indústria de a limentos,

não apenas em virtude de extrema vulnerabilidade da

c rianç a à c omunic aç ão mercadológic a , mas também

porque resultam na construção de novos padrões de hábitos

a limenta res que, incutidos em tenra idade, ac ompanha rão

o c onsumidor na adolescênc ia , na juventude e na vida

adulta .

RITA DE CÁSSIA DE AQUINO e SONIA TUCUNDUVA PHILIPPI,

do Departamento de Nutriç ão da Fac uldade de Saúde

Púb lic a da USP – Universidade de São Paulo, em matéria

pub licada na Revista de Saúde Púb lic a , destac am a

sensibilidade da infânc ia à formaç ão dos hábitos

a limenta res:

A d iversidade e o aumento da oferta de

a limentos industria lizados podem influenc ia r os

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pad rões a limenta res da populaç ão,

p rinc ipa lmente a infantil, uma vez que os

p rimeiros anos de vida se destacam como um

período muito importante para o

estabelec imento de háb itos. O c onsumo

inadequado, em exc esso e muito frequente

destes a limentos, pode comprometer a saúde

nesta fase e na idade adulta . Muitos a limentos

industria lizados são ricos em gorduras e

c a rboid ra tos refinados, ap resentando elevado

va lor energétic o. Além disso, os hábitos

adquiridos c om o aumento do c onsumo de

a limentos industria lizados podem reduzir o

c onsumo de a limentos "in na tura ".1

Não por ac aso é que se vem notic iando a

c resc ente ingestão de ta l sorte de p rodutos por

c onsumidores infantis. 9�J�, qua l notic iado na Seç ão

Gastronomia e Negóc ios, do porta l Universo Online:

Estud os apontam q ue c erc a d e 15% das c rianç as b rasileiras so frem d e obesida d e - um a umento signific a tivo quando c ompa ra do c om a d éc a d a d e 80, onde a penas 3% d as c rianç as eram ob esas.

1 &RQVXPR�LQIDQWLO�GH�DOLPHQWRV�LQGXVWULDOL]DGRV�H�UHQGD�IDPLOLDU�QD�FLGDGH�GH�6mR�3DXOR. Rev. Saúde Púb lic a , vol. 36, no. 6; São Paulo: Dezembro/ 2002; d isponível também em http :/ / www.sc ielosp .org/ sc ielo.php?p id=S0034-89102002000700001&sc rip t=sc i_arttext; ac esso em 27 de novembro de 2009.

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Um dos fa tores importa ntes q ue c ontribuíram p a ra esse a umento fo i o c resc imento do c onsumo de a limentos ric os em gord uras e a ç úc a res, c om a lto va lo r c a ló ric o , assoc iado a um sed enta rismo exc essivo (a s c rianç as têm gasto muito tempo em passa tempos pouc o a tivos c omo assistir a TV, joga r vid eogames e usa r c omp uta dores).2

A efetiva influênc ia da pub lic idade d irig ida ao

púb lico infantil, a liás, é a únic a razão merc adológic a de a

indústria de a limentos persistir na ap lic aç ão substanc ia l de

rec ursos nessas estra tégias de PDUNHWLQJ que visam a

c rianç a consumidora .

2�',5(,72�

$�KLSHU�YXOQHUDELOLGDGH�GD�FULDQoD�QR�'LUHLWR�,QWHUQDFLRQDO�

O exame da lide que ora se p ropõe requer a

c onsideração de uma de suas p remissas com espec ia l

p roeminênc ia : D� FULDQoD� p� LQGLYtGXR� GH� HVSHFLDO�

YXOQHUDELOLGDGH�H�FRP�HVSHFLDO�WXWHOD�QR�RUGHQDPHQWR.

Desde 1924 a humanidade reconhec e o d ireito

das c rianç as à espec ia l p roteç ão. Naquele ano, “ a

Assembleia da Soc iedade das Naç ões adop tou uma

resoluç ão endossando a Dec la ração dos Direitos da Crianç a

p romulgada no ano anterior pelo Conselho da União

2 Disponível em http :/ / gastronomiaenegoc ios.uol.c om.br/ home/ tendenc ias/ ver/ 346/ imagens/ banners/ BannerRAVI.swf; ac esso em 27 de novembro de 2009.

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Internac iona l de Protec ç ão à Infânc ia (Save the Child ren

Interna tiona l Union), organização de c a rác ter não-

governamenta l. Nos termos da Dec la raç ão, os membros da

Soc iedade das Naç ões são c hamados a guia r-se pelos

p rinc íp ios deste doc umento, o qua l passou a ser c onhec ido

por Dec la raç ão de Genebra ” .3

Em 1946, a Dec la raç ão de Genebra teve sua

adoç ão recomendada pela ONU, que naquela ocasião

fundou o UNICEF (então um Fundo de Emergênc ia das

Naç ões Unidas para as Crianç as), que qua tro anos depois

tornou-se um fundo de a tuaç ão permanente na p roteç ão

da infânc ia p laneta a fora . Dois anos se passaram e a

Assembléia Gera l da ONU instituiu a Dec la raç ão Universa l

dos Direitos do Homem que, em seu a rt. 25, estabelec eu que

“ a ma ternidade e a infânc ia têm direito a a juda e a

assistênc ia espec ia is” .

Mas foi em 20 de novembro de 1959 que a

Assembléia Gera l da ONU promulgou o doc umento juríd ico

mais importante na história da p roteç ão e defesa da

infânc ia : a Dec la raç ão Universa l dos Direitos da Crianç a ,

que no Princ íp io II p roc lama soberanamente que ´$�FULDQoD�

JR]DUi�GH�SURWHomR�HVSHFLDOµ.

$�KLSHU�YXOQHUDELOLGDGH�GD�FULDQoD�QR�'LUHLWR�&RQVWLWXFLRQDO�

SiWULR

3 http :/ / www.gddc .p t/ d ireitos-humanos/ onu-p rotec c ao-dh/ orgaos-onu-estudos-c a-dc .html# IA; ac esso em 27 de novembro de 2009.

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No Direito interno, c oerente com os p rinc íp ios

adotados pelas Naç ões Unidas, a Constituiç ão Repub lic ana

de 1988 definiu a p roteç ão à infânc ia c omo GLUHLWR� VRFLDO,

integrante dos Direitos e Garantias Fundamenta is (Título II).

E no Título VIII, ded ic ado à Ordem Soc ia l, a

Carta Constituc iona l imputou ao Estado e a toda a

soc iedade a p roteç ão à c rianç a como DEVROXWD�SULRULGDGH:�

�$UW�������e�GHYHU�GD�IDPtOLD��GD�VRFLHGDGH�H�GR�

(VWDGR� DVVHJXUDU� j� FULDQoD� H� DR� DGROHVFHQWH��

FRP� DEVROXWD� SULRULGDGH�� R� GLUHLWR� j� YLGD�� j�

VD~GH��j�DOLPHQWDomR��j�HGXFDomR��DR� OD]HU��j�

SURILVVLRQDOL]DomR�� j� FXOWXUD�� j� GLJQLGDGH�� DR�

UHVSHLWR��j� OLEHUGDGH�H�j�FRQYLYrQFLD� IDPLOLDU�H�

FRPXQLWiULD�� DOpP� GH� FRORFi�ORV� D� VDOYR� GH�

WRGD� IRUPD� GH� QHJOLJrQFLD�� GLVFULPLQDomR��

H[SORUDomR��YLROrQFLD��FUXHOGDGH�H�RSUHVVmR���

$� KLSHU� YXOQHUDELOLGDGH� GD� FULDQoD� QR� 'LUHLWR�

,QIUDFRQVWLWXFLRQDO

Na órb ita infrac onstituc iona l, são dois os

d ip lomas legais fundamenta is que melhor traduzem essa

p reoc upaç ão com a tutela espec ia líssima à infânc ia : o ECA

– Esta tuto da Crianç a e do Adolescente (Lei 8.069/ 90) e o

CDC - Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/ 90).

Destac am-se do (&$ os a rt. 15 e 71, que

impõem tutela d iferenc iada à c rianç a em virtude de se

4 Sublinhamos ao transc rever.

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c uidar de ind ivíduo em situação pec ulia r, merc ê de

enc ontra r-se em processo de desenvolvimento:

$UW������$�FULDQoD�H�R�DGROHVFHQWH�WrP�GLUHLWR�j�OLEHUGDGH�� DR� UHVSHLWR� H� j� GLJQLGDGH� FRPR�SHVVRDV� KXPDQDV� HP� SURFHVVR� GH�GHVHQYROYLPHQWR� H� FRPR� VXMHLWRV� GH� GLUHLWRV�FLYLV�� KXPDQRV� H� VRFLDLV� JDUDQWLGRV� QD�&RQVWLWXLomR�H�QDV�OHLV���$UW������$�FULDQoD�H�R�DGROHVFHQWH�WrP�GLUHLWR�D�LQIRUPDomR�� FXOWXUD�� OD]HU�� HVSRUWHV�� GLYHUV}HV��HVSHWiFXORV�H�SURGXWRV�H�VHUYLoRV�TXH�UHVSHLWHP�VXD� FRQGLomR� SHFXOLDU� GH� SHVVRD� HP�GHVHQYROYLPHQWR�

Do &'& desponta igua lmente a tutela espec ia l

à c rianç a :

$UW�� ���� e� SURLELGD� WRGD� SXEOLFLGDGH� HQJDQRVD�RX�DEXVLYD���� ���� e� DEXVLYD�� GHQWUH� RXWUDV�� D� SXEOLFLGDGH�GLVFULPLQDWyULD� GH� TXDOTXHU� QDWXUH]D�� D� TXH�LQFLWH� j� YLROrQFLD�� H[SORUH� R� PHGR� RX� D�VXSHUVWLomR�� VH� DSURYHLWH� GD� GHILFLrQFLD� GH�MXOJDPHQWR� H� H[SHULrQFLD� GD� FULDQoD��GHVUHVSHLWD� YDORUHV� DPELHQWDLV�� RX� TXH� VHMD�FDSD]� GH� LQGX]LU� R� FRQVXPLGRU� D� VH� FRPSRUWDU�GH�IRUPD�SUHMXGLFLDO�RX�SHULJRVD�j�VXD�VD~GH�RX�VHJXUDQoD���

$�KLSHU�YXOQHUDELOLGDGH�GD�FULDQoD�QD�$XWRUHJXODPHQWDomR�

GR�&21$5

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Mesmo para os p rofissionais da pub lic idade —

pa ra quem evidentemente não pode ser a traente abdica r

de um merc ado rentável como o dos c onsumidores infantis5

— não mais é possível rec usar a espec ia l vulnerabilidade

das c rianças d iante da pub lic idade que lhes possa ser

d irig ida .

Como se sabe, o CONAR é um c onselho p rivado,

formado e gerido pelos p róprios p rofissionais de PDUNHWLQJ.

Não tem poder de instituir normas OHJDLV e, obviamente, nem

o fa ria em prejuízo de seus p róprios membros. Mas mesmo o

CONAR, ao instituir o seu Código Brasileiro de Auto

Regulamentaç ão Pub lic itá ria , ac abou por admitir a peculia r

vulnerabilidade da c rianç a em fac e da a tividade

pub lic itá ria :

$UWLJR� ���� 2V� HVIRUoRV� GH� SDLV�� HGXFDGRUHV��

DXWRULGDGHV�H�GD�FRPXQLGDGH�GHYHP�HQFRQWUDU�

QD� SXEOLFLGDGH� IDWRU� FRDGMXYDQWH� QD� IRUPDomR�

GH� FLGDGmRV� UHVSRQViYHLV� H� FRQVXPLGRUHV�

FRQVFLHQWHV�� 'LDQWH� GH� WDO�SHUVSHFWLYD�� QHQKXP�

DQ~QFLR� GLULJLUi� DSHOR� LPSHUDWLYR� GH� FRQVXPR�

GLUHWDPHQWH�j�FULDQoD��(�PDLV��������

,,� �� 4XDQGR� RV� SURGXWRV� IRUHP� GHVWLQDGRV� DR�

FRQVXPR� SRU� FULDQoDV� H� DGROHVFHQWHV� VHXV�

DQ~QFLRV�GHYHUmR��

D�� SURFXUDU� FRQWULEXLU� SDUD� R� GHVHQYROYLPHQWR�

SRVLWLYR�GDV�UHODo}HV�HQWUH�SDLV�H�ILOKRV��DOXQRV�H�

5 Por isso, c ertamente, os public itá rios em gera l e o p róp rio CONAR não c hegam a admitir a ilic itude da pub lic idade infantil.

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LQD��

SURIHVVRUHV�� H� GHPDLV� UHODFLRQDPHQWRV� TXH�

HQYROYDP�R�S~EOLFR�DOYR��

E�� UHVSHLWDU� D� GLJQLGDGH�� LQJHQXLGDGH��

FUHGXOLGDGH�� LQH[SHULrQFLD� H� R� VHQWLPHQWR� GH�

OHDOGDGH�GR�S~EOLFR�DOYR��

F�� GDU� DWHQomR� HVSHFLDO� jV� FDUDFWHUtVWLFDV�

SVLFROyJLFDV� GR� S~EOLFR�DOYR�� SUHVXPLGD� VXD�

PHQRU�FDSDFLGDGH�GH�GLVFHUQLPHQWR��

Quando a pub lic idade c onc erne a a limentos, o

item 2, do Anexo H, do Cód igo de Auto Regulamentaç ão

Pub lic itá ria , ac resc enta :

��� 4XDQGR� R� SURGXWR� IRU� GHVWLQDGR� j� FULDQoD��

VXD� SXEOLFLGDGH� GHYHUi�� DLQGD�� DEVWHU�VH� GH�

TXDOTXHU� HVWtPXOR� LPSHUDWLYR� GH� FRPSUD� RX�

FRQVXPR�� HVSHFLDOPHQWH� VH� DSUHVHQWDGR� SRU�

DXWRULGDGH� IDPLOLDU�� HVFRODU�� PpGLFD�� HVSRUWLYD��

FXOWXUDO�RX�S~EOLFD��EHP�FRPR�SRU�SHUVRQDJHQV�

TXH� RV� LQWHUSUHWHP�� VDOYR� HP� FDPSDQKDV�

HGXFDWLYDV�� GH� FXQKR� LQVWLWXFLRQDO�� TXH�

SURPRYDP�KiELWRV�DOLPHQWDUHV�VDXGiYHLV��

Não há então ponto de aná lise que não

c onduza à ind isc utível KLSHUYXOQHUDELOLGDGH da c riança no

merc ado de consumo e no a rrosta r as mais va riadas e

onip resentes mensagens pub lic itá rias que lhes d irigem os

fornecedores de c onsumo e seus marqueteiros.

$�SXEOLFLGDGH�

Na d icç ão de CARLOS ALBERTO BITTAR, pub lic idade

é “ a a rte e téc nic a de elabora r mensagens para , por meio

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LQD��

de d iferentes formas de manifestaç ão e de veiculaç ão,

fazer c hegar aos c onsumidores determinados p rodutos ou

serviços, despertando neles o desejo de adquiri-los ou deles

d ispor” .6

Como observa ISABELLA VIEIRA MACHADO HENRIQUES,

“ O c onc eito de ‘pub lic idade’ não está p revisto em lei, mas,

em vista das d iversas definições já elaboradas por ilustres

doutrinadores – a lgumas das quais a seguir ap resentadas –,

pode ser sintetizado c omo sendo uma forma de oferta e,

portanto, de p rá tica c omerc ia l, que se va le dos meios de

c omunicaç ão soc ia l de massa para d ifund ir os benefíc ios e

vantagens de determinado p roduto ou serviç o, c ujo

c onsumo se p retende inc entiva r, perante o respec tivo

púb lico c onsumidor potenc ia l ou efetivo.” 7

Mesmo na linguagem leiga , não é d iverso o

sentido dos termos SXEOLFLGDGH� e PDUNHWLQJ. Segundo o

Dic ionário Eletrônic o Aurélio , PDUNHWLQJ é o “ Conjunto de

estra tégias e ações que p rovêem o desenvolvimento, o

lançamento e a sustentação de um produto ou serviç o no

merc ado consumidor” . O renomado d ic ionário tra ta o

vocábulo SXEOLFLGDGH c omo sinônimo de SURSDJDQGD� e

ap resenta a seguinte definição: “ Difusão de mensagem, ger.

de c a rá ter informativo e persuasivo, por pa rte de

anunc iante identific ado, mediante c ompra de espaço em

TV, jorna l, revista , etc .”

6 BITTAR, Ca rlos Alberto . 'LUHLWR�GH�DXWRU� QD�REUD�SXEOLFLWiULD. São Paulo: RT, 1981. p .73.

7 HENRIQUES, ISABELLA VIEIRA MACHADO. 3XEOLFLGDGH� $EXVLYD� 'LULJLGD� j� &ULDQoD. Curitiba : Juruá , 2006, p . 36.

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3iJ

LQD��

6HGX]LU� o c onsumidor é então intento imanente

a toda a tividade pub lic itá ria , c uja razão de ser c onfunde-se

mesmo c om ta l desidera to.

Em tempos a tua is de VRFLHGDGH�GH�FRQVXPR�GH�

PDVVD, a pub lic idade assume papel p reponderante na

IRUPDomR das vontades ind ividua is e c oletivas, c riando

novos padrões de c omportamento — e sobretudo de

c onsumo — mediante infusão de novos hábitos de

a limentaç ão, de lazer, de estudo etc .

Na lição de CLAUDIA LIMA MARQUES, “ A mensagem

pub lic itá ria tem, porém, c a rac terísticas p róprias (exiguidade

do tempo, inc itaç ão à fantasia , apelo visua l etc .) que

deverão ser levados em conta . Mas hoje ninguém duvida da

forte influênc ia que a pub lic idade exerc e sobre a

populaç ão e sobre sua c onduta na soc iedade de c onsumo.

Nesse sentido, o CDC regula a pub lic idade, c omo meio de

informaç ão ao c onsumidor, pa ra lhe vinc ula r a lguns efeitos

nos a rts. 30, 31, 35, 36, 37 e 38.” 9

No âmbito dos háb itos a limenta res, p rec iosas

são as observaç ões de SUSANA INEZ BLEIL10:

8 O voc ábulo VHGX]LU evidentemente não é aqui empregado no sentido juríd ic o penal.

9 MARQUES, Claud ia Lima. &RQWUDWRV� QR� &yGLJR� GH� 'HIHVD� GR� &RQVXPLGRU� ²� R�QRYR�UHJLPH�GDV�UHODo}HV�FRQWUDWXDLV, 5ª ed . São Paulo: RT, 2006, p . 780/ 781.

10 BLEIL, SUZANA INEZ. 2� 3DGUmR� $OLPHQWDU� 2FLGHQWDO�� FRQVLGHUDo}HV� VREUH� D�PXGDQoD�GH�KiELWRV�QR�%UDVLO. Artigo pub lic ado no Vol. VI/ 1998 da Revista Cadernos de Deba te, uma public aç ão do Núc leo de Estudos e Pesquisas em Alimentaç ão da UNICAMP, páginas 1-25 (d isponível em http :/ / www.uftm.edu.b r/ d isc ednu/ AVId isc ednu090303095918.pd f; ac esso em 27 de novembro de 2009).

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LQD��

A c omida é uma forma de c omunic aç ão, na qua l o ind ivíduo vai exp lic ita r inc lusive sua visão de mundo, ou seja , “ c omer é revela r-se” . A esc olha do a limento revela muitas vezes a que grupo se deseja pertenc er, seja este soc ia l, étnic o ou de idade. (...) Hoje somos levados c omo rebanhos para tudo que possa fac ilita r o traba lho na c ozinha . Os a limentos são c omprados quase prontos para o c onsumo e daí o boom dos c ongelados, do p ré-c ozido (a rroz, p rinc ipa lmente) e do que já vem pré-temperado (a c a rne de frango). Estes p rodutos, inventados pela indústria , são novos ao pa ladar e aos háb itos. Assim, pa ra fac ilita r sua aquisição, normalmente a indústria va i se va ler de a lguns estra tagemas. De um lado a embalagem va i ser extremamente c olorida para c hamar a a tenç ão do c onsumidor. De outro lado os p rodutos passam a ser fab ricados inc orporando enormes quantidades de aç úcar, sa l e gordura .

Além disso os aditivos químic os

tornaram-se cada vez mais c omuns.

(...) As p referênc ias a limenta res na soc iedade moderna estão c ada vez mais influenc iadas pela pub lic idade” .É interessante assina la r que o significado dos a limentos vai ser elaborado p rinc ipa lmente no a to da sua transformaç ão e do seu c onsumo. No que c onc erne à sua p roduç ão pouc os significados serão inc orporados. A indústria tem sido eficaz nesta funç ão, qua l seja , a de outorgar símbolos a tudo que p roduz. Muitas vezes o que tem va lor simbólico pode trazer p rejuízos: é gostoso mas não tem va lor nutric iona l.

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LQD��

Os métodos e os resultados que

c onceitua lmente se a fetam à pub lic idade a lc ançam todo

ind ivíduo exposto ao PDUNHWLQJ e à pub lic idade. Mas de

modo espec ia l — e ilíc ito — agem sobre as c rianç as.

$�SXEOLFLGDGH�GLULJLGD�j�FULDQoD�

Como se d isse, toda c rianç a é KLSHU�YXOQHUiYHO e

c redora , por definiç ão do ordenamento juríd ico, de tutela

espec ia l.

A UDWLR� MXUH dessa p roteção d iferenc iada e

p reva lente não é senão decorrente de sua c ondição

pec ulia r de pessoa em proc esso de desenvolvimento, c omo

p roc lamado no art. 15 do ECA (Lei 8.069/ 90).

Porque a inda se enc ontra em p rocesso de

desenvolvimento, a c rianç a não está desenvolvida

emoc iona l, psicológic a e soc ia lmente. Por isso não tem

c ondições a inda de c ompreender a intenç ão da

pub lic idade, tampouc o de ava liar-lhe a c redib ilidade e a

adequaç ão às suas nec essidades c omo ind ivíduo.

É c oisa notória que as c rianç as não possuem

maturidade (psicológic a , emoc iona l e intelec tua l) bastante

pa ra entender o c a rá ter pub lic itá rio dos mais va riados

expedientes de PDUNHWLQJ�que hoje lhes são d irec ionados. E

é isso, a liás, que inspira a tendênc ia do PDUNHWLQJ�

c ontemporâneo a c ada vez mais busc ar a c rianç a c omo

destina tá rio de suas estra tégias. É c omum hoje se ver roupas

de bebês estampando logotipos de marc as de automóveis,

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LQD��

c ampanhas pub lic itá rias de banc os com animaç ões e

músic as infantis, b rindes pa ra c rianç as na c ompra

eletrodomésticos etc .

Tão óbvia é a fac ilidade de seduzir o

c onsumidor infantil, que agressivas estra tégias de PDUNHWLQJ�

c hegam a extremos surp reendentes, c omo o c aso em que

Pepsi, Dr. Pepper e Seven-Up licenc ia ram nos EUA seus

logotipos a um fabric ante de mamadeiras. O ob jetivo?

Inc utir nos bebês a a feição pelas marcas e lhes estimula r o

futuro c onsumo de refrigerantes.11 Tra ta -se da estra tégia de

c ria r consumidores “ do berç o ao túmulo” , c omo destac a

SUSAN LINN, notável estudiosa norteamericana dos abusos da

pub lic idade no universo infantil.12

Convidado pelo Conselho Federa l de

Psicologia , YVES DE LA TAILLE — Professor Titula r do Instituto de

Psicologia da USP e de 0RUDO� H� eWLFD� �� GLPHQV}HV�

HGXFDFLRQDLV�H�DIHWLYDV, venc edor do Prêmio Jabuti 2007 —

emitiu pa rec er sobre o Projeto de Lei 5921/ 200113 em que

destac ou que o ob jetivo da pub lic idade é “ penetra r a

psique a lheia ” , p a ra “ transformá-la em benefíc io p róprio” 14.

���

0 � ����� � )� -������������� c ita um estudo que c onsta tou que as c rianç as estão qua tro vezes mais sujeitas a tomar refrigerantes quando essas mamadeiras são usadas [/LTXLG�&DQG\�KWWS���ZZZ�FVSLQHW�RUJ�VRGDSRS�OLTXLGBFDQG\�KWP (ma io 03)].

12 LINN, SUSAN. &ULDQoDV� GR� &RQVXPR�� $� ,QIkQFLD� 5RXEDGD. Traduç ão Cristina Tognelli. São Paulo: Instituto Alana , 2006.

13 Referido p rojeto leg isla tivo tra ta da adoç ão de restrições ma is exp líc itas à pub lic idade infantil.

14 Doc umento anexo a esta petiç ão inic ia l, c om reproduç ão a fls. 432/ 441 do inquérito c ivil.

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LQD��

Essa “ invasão” psicológic a pode enc ontra r

adultos mais ou menos ap tos a d iscernir sufic ientemente o

quanto lhe poderá c onvir. Ao menos em tese, o adulto tem

desenvolvimento c omp leto e bastante para o exerc íc io de

suas defesas psico lógic as e emoc ionais.

Mas a c rianç a não o tem, porque seu

desenvolvimento é a inda inc ipiente. Da í esta r “ em proc esso

de desenvolvimento” .

A rep rovabilidade de ta l sorte de exped iente é

d iretamente p roporc iona l à fac ilidade de seu suc esso de

merc ado: a fina l, pa rec e não ser muito d ifíc il persuadir um

c onsumidor que, não ra ro, a inda ac red ita em “ Papai Noel” ,

“ Coelhinho da Pásc oa” e “ Fada do dente” ! Seduzir esse

ind ivíduo, mais que uma ba rbada , é mesmo uma covard ia .

Da í a c erteza de que se a pub lic idade p roduz

ta is importantes efeitos sob re o púb lico adulto, sua influênc ia

é avassa ladoramente potenc ia lizada quando o destina tá rio

do PDUNHWLQJ�é a c rianç a .

9LRODomR�GR�SURFHVVR�GH�GHVHQYROYLPHQWR�GD�FULDQoD�

Como se anotou, toda c rianç a é KLSHU�

YXOQHUiYHO e sua espec ia l tutela no ordenamento resulta de

sua c ondiç ão pec ulia r de pessoa em p roc esso de

desenvolvimento, nos termos do d isposto no a rt. 15 do ECA

(Lei 8.069/ 90).

Também já se viu ac ima que o ob jetivo da

pub lic idade é “ penetra r a psique a lheia ” , pa ra “ transformá-

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la em benefíc io próp rio” , c onsoante exp lic ado por YVES DE LA

TAILLE.15

Em brilhante traba lho sobre o tema, PEDRO

AFFONSO DUARTE HARTUNG destac ou “ o estudo do soc iólogo

sueco Erling Bjurström, elaborado a ped ido do Estado suec o,

que c onc luiu que c rianç as, a té por volta dos oito e 10 anos,

não c onseguem d istinguir pub lic idade de c onteúdo de

p rogramaç ão televisiva e c rianç as de a té 12 anos não

c ompreendem o c a rá ter persuasivo da pub lic idade.” 16

$�LQJHUrQFLD�GD�SXEOLFLGDGH�QD�IRUPDomR�GRV�YDORUHV�

A p roteç ão à c rianç a é, no Estado Democ rá tic o

e de Direito, SULRULGDGH�DEVROXWD do Estado e da soc iedade,

c omo p rec eitua o a rt. 227, da Constituição da Repúb lic a .

As normas do Código de Defesa do Consumidor

que visam resguarda r a c rianç a dos malefíc ios da

pub lic idade pernic iosa são, pois, c orolá rio da p roteç ão

p rioritá ria consagrada c onstituc iona lmente.

Igua l p redic ado têm as normas esta tuídas pela

Lei 8.069/ 90 – Esta tuto da Crianç a e do Adolesc ente,

notadamente nos a rts. 15 e 17. O p rimeiro (a rt. 15) p roc lama

indelével o respeito à espec ia l c ondição de pessoa HP�

SURFHVVR�GHVHQYROYLPHQWR. O segundo (a rt. 17) faz exp líc ito

15 Doc umento anexo a esta petiç ão inic ia l, c om reproduç ão a fls. 432/ 441 do inquérito c ivil.

16 HARTUNG , PEDRO AFFONSO DUARTE. $�3URLELomR�/HJDO�GD�3XEOLFLGDGH�'LULJLGD�j�&ULDQoD�QR�%UDVLO. Em http :/ / www.a lana .org .b r/ banc o_arquivos/ a rquivos/ doc s/ b ib liotec a / a rtigos/ Proib ic ao_pub lic idade_infantil_PHartung .pd f (ac esso em 25 de março de 2010).

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que o d ireito ao respeito c ompreende a p reservaç ão dos

va lores e da integridade mora l.

Não se pode c onc eber que o c onsumismo, que

se conc ebe c omo um fim em si mesmo e domina o

c omportamento humano, sub tra indo-lhe qua lquer traç o de

razoabilidade, possa ser adotado pac ificamente c omo YDORU

a ser ensinado às nossas c rianças.

Como adverte SUSAN LINN, ´TXDQGR�R�DVVXQWR�p�

IDODU�VREUH�R�LPSDFWR�GD�PtGLD�FRPHUFLDO�H�GD�SXEOLFLGDGH�

VREUH�DV�FULDQoDV��FRQWXGR��WHPRV�GH�IDODU�VREUH�YDORUHVµ.17

A p roliferaç ão e universa lizaç ão dos meios de

c omunicaç ão de massa a liou-se nas últimas déc adas ao

notável desenvolvimento das técnic as de PDUNHWLQJ, de

sorte que hoje todos estamos, inc lusive as c rianç as,

submetidos à pub lic idade durante p ra tic amente todo o

tempo em que estamos acordados. Fác il, em ta is

c ondições, ap reender a influênc ia que a pub lic idade pode

exerc er sobre o púb lico infantil.

O esc la rec imento de SUSAN LINN é novamente

oportuno: adverte a estudiosa que inóc ua pode ser nossa

p reoc upaç ão em verific a r os va lores das pessoas que

c uidam de nossas c rianç as (p .ex.: babás, p rofessores e

médicos), se c onsidera rmos que ´FRP� D� SUROLIHUDomR� GD�

PtGLD� HOHWU{QLFD�� FRQWXGR�� D� YLGD� GH� QRVVRV� ILOKRV� p�

SURIXQGDPHQWH� PROGDGD� SRU� SHVVRDV� TXH� QmR� RV�

� �

LINN, SUSAN. Ob . c it., p . 221.

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FRQKHFHP� H� WrP� GH� VH� MXVWLILFDU� VRPHQWH� SHUDQWH� VHXV�

FROHJDV�GH�WUDEDOKR��FKHIHV�H�FOLHQWHVµ.18

Toda a tividade pub lic itá ria , c omo se viu, tem

por fina lidade c onc eitua l a persuasão de seu destina tá rio ao

c onsumo de p rodutos e serviç os. Evidentemente, ela não

c onsidera a ind ividua lidade de c ada pessoa exposta ao

PDUNHWLQJ, c om suas partic ula ridades, nec essidades e

posses. O PDUNHWLQJ não tem por p ressuposto que

determinado c onsumidor tenha , ou não, nec essidade de

c onsumir o p roduto anunc iado, ou mesmo que o possa

c onsumir sem p rejuízo de outras nec essidades mais

p rementes.

O YDORU transmitido, enfim, é d ireto e singelo:

“ consuma” .

O ECA não definiu os YDORUHV c uja p reservaç ão

determina . E não existe, rea lmente, p revisto em lei, um rol

dos va lores que a soc iedade deva p restig ia r e,

c onsequente, o d ireito p roteger.

Os va lores são na tura lmente dependentes da

c ultura e do tempo que se tem em c onsideraç ão, nos quais

se insere c omo c ânone ac eito a observânc ia de um

determinado va lor mora l. Como doc umento não apenas

juríd ico, mas sobretudo político, a Constituiç ão se ap resenta

então c omo um prec ioso referenc ia l pa ra enc ontra r os

va lores a serem jurid icamente tutelados.

� �

LINN, SUSAN. Ob . c it., p . 224.

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Na soc iedade e tempo a tua is, há c erteza de

que está urgente p roteger a infânc ia e a ela assegura r um

desenvolvimento sadio e imune a qua lquer sorte de

exp loraç ão, física , intelec tua l ou emoc iona l. E esse va lor de

p roteç ão à infânc ia , na soc iedade c ontemporânea , está

dentre os mais a ltos va lores a serem jurid icamente tutelados.

Di-lo a Constituiç ão da Repúb lic a , que p roc lama, sem

rodeios, tra ta r-se de DEVROXWD�SULRULGDGH do Estado b rasileiro

(CF, a rt. 227).

Veja -se que para Constituição a “ d ignidade da

pessoa humana” é mesmo fundamento do p róp rio Estado

Democ rá tic o de Direito (CF, a rt. 1°, inc . III).

Professor de Direito da USP por quase qua tro

déc adas, Coordenador da cá tedra Unesco-USP de Direitos

Humanos, Membro do Conselho de Defesa dos Direitos da

Pessoa Humana e Juiz do Tribuna l Permanente dos Povos, o

jurista DALMO DE ABREU DALLARI conc edeu entrevista durante a

qua l d isc orreu sobre a d ignidade da pessoa humana:

“ Uma c oloc aç ão muito feliz foi feita [pelo filósofo] Pic o della Mirandola , já há vá rios séc ulos, quando ele pub licou um traba lho sobre a d ignidade humana, no qua l define o ser humano como a pessoa que p roduz a si mesma, ou seja , ela é p roduto do seu p róprio desenvolvimento. Faz parte da d ignidade a possibilidade do c resc imento interior da pessoa , que exige o c uidado c om o físic o, mas também o c uidado da mente e a possib ilidade de ac esso aos c onhec imentos. Isso é da essênc ia da d ignidade humana. É o rec onhec imento de que o ser humano nasce c om direitos fundamenta is, c omo

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dec la ra enfá tica e expressamente a p rópria Dec la raç ão de 1948, mas também faz parte da d ignidade a possibilidade de auto-rea lizaç ão de c ada pessoa .” 19

$�LGHQWLILFDomR�GD�SXEOLFLGDGH�H�VXD�DEXVLYLGDGH�

Conforme se exp lanou, a c riança é ind ivíduo

em proc esso de desenvolvimento, sem c ondiç ões

b iopsíquic as de d istinguir, c ompreender, ava lia r e fazer juízo

c rític o das mensagens pub lic itá rias que hoje bombardeiam

o seu c otid iano.

Em termos mais ob jetivos, a c rianç a não tem

c ondições sequer de perc eber que uma pub lic idade é uma

pub lic idade.

O Código de Defesa do Consumidor, no seu a rt.

36 estabelec e que:

$UW�� ���� $� SXEOLFLGDGH� GHYH� VHU� YHLFXODGD� GH� WDO�

IRUPD� TXH� R� FRQVXPLGRU�� IiFLO� H� LPHGLDWDPHQWH�� D�

LGHQWLILTXH�FRPR�WDO��

Se a c rianç a não pode identific a r qua lquer

pub lic idade como ta l, é materia lmente impossível a

veic ulaç ão de pub lic idade d irigida a c rianç as que não viole

a norma do a rt. 36/ CDC, que é norma “ de ordem púb lic a e

interesse soc ia l” (a rt. 1°/ CDC), verdadeiro coro lá rio da

19 Disponível em http :/ / www.mpd.org .b r:80/ Artic leAc tion.php?ac tion=mostra r&id=22701, ac esso em 10 de outub ro de 2008.

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LQD��

proteç ão espec ia l que a Constituiç ão da Repúb lic a

p resc reveu para os c onsumidores em gera l e, c om distinto

relevo, pa ra a c rianç a .

Equivoc am-se, pois, aqueles que tentam

sustenta r a inexistênc ia de violaç ão d ireta , pela pub lic idade

infantil, de normas de d ireito positivo. Há , c omo visto,

flagrante e c ontundente a fronta ao c omando do a rt. 36 do

Código de Defesa do Consumidor.

De mais a mais, a pub lic idade para c rianç as

na tura lmente se p reva lece de sua KLSHU�YXOQHUDELOLGDGH, que

traduz d ificuldade de juízo c rític o e inexperiênc ia . Noutros

termos, se p reva lec e “ da defic iênc ia de julgamento e

experiênc ia da c riança ” , de sorte que também sob a ótica

do a rt. 37, § 2°, do CDC, se tra ta de pub lic idade abusiva ,

defesa no ordenamento.

Afina l, p� SURLELGD� WRGD� SXEOLFLGDGH� HQJDQRVD�

RX�DEXVLYD, d iz o FDSXW do a rt. 37/ CDC:

$UW�� ��� É p roib ida toda pub lic idade enganosa ou abusiva . (...) �� ��� É abusiva , dentre outras, a pub lic idade d isc rimina tória de qua lquer na tureza , a que inc ite à violênc ia , exp lore o medo ou a superstiç ão, se aproveite da defic iênc ia de julgamento e experiênc ia da c riança , desrespeita va lores ambienta is, ou que seja capaz de induzir o c onsumidor a se c omporta r de forma p rejudic ia l ou perigosa à sua saúde ou segurança .20

20 Sublinhamos ao transcrever.

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LQD��

A KLSHU� YXOQHUDELOLGDGH do c onsumidor infantil

rep resenta , c onceitua lmente, a sua defic iênc ia assim de

julgamento c omo de experiênc ia , L�H�, a sua imperfeita

c apac idade cognitiva e emoc iona l pa ra c ompreender e

ava lia r a mensagem pub lic itá ria .

3URWHJHU�D�OLEHUGDGH�GH�TXHP"�

Não ra ro se ouve a defesa da inexistênc ia de

limites à pub lic idade d irig ida à c rianç a com base, nem

sempre por interesses confessáveis, no sofisma de que

estabelec er limites à pub lic idade c onstituiria violaç ão da

liberdade de expressão p revista no a rt. 5°, IX, da

Constituiç ão da Repúb lic a .

Há c onstituc iona listas, c omo JOSÉ AFONSO DA

SILVA21, que vêm na liberdade de expressão um “ aspec to

externo” de outras liberdades, c omo as liberdades de

pensamento ou de c redo. Pode-se então d izer que a

liberdade de expressão é instrumenta l de outras liberdades.

Mas a p rópria Constituiç ão estabelec e os limites

substanc ia is dessa liberdade instrumenta l, ao identificá -la

c omo “ expressão da a tividade intelec tua l, a rtístic a ,

c ientífic a e de c omunicaç ão” . Resultado: todos somos livres

pa ra expressar nossos pensamentos em gera l, qua l a nossa

p roduç ão intelec tua l, c ientífica , a rtístic a , filosófic a , relig iosa

etc .

21 SILVA, JOSÉ AFONSO DA. &XUVR� GH� 'LUHLWR� &RQVWLWXFLRQDO� 3RVLWLYR� 11ª ed. Sã o Paulo:

Malheiros, 1996; p. 237/238.

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LQD��

Fundamenta l então verific a r se uma peç a

pub lic itá ria é, ou não, um exempla r dessa exp ressão que a

Constituiç ão p retende livre. E aqui a resposta é simples

deveras, porque a pub lic idade que nos interessa , pa ra efeito

desta aná lise, é a pub lic idade c omerc ia l. Não tra tamos

aqui, a fina l, de c oisas onto logicamente d istintas, c omo a

p ropaganda eleitora l, o anúnc io de um c ulto ec umênic o ou

a d ivulgaç ão de um evento c ientífic o. O foc o de nossa

a tenç ão, por agora , é exc lusivamente a pub lic idade

c omerc ia l, assim entend ida toda forma de comunic aç ão

soc ia l massific ada tendente a persuadir o maior número de

pessoas ao c onsumo de determinado p roduto ou serviço.

Dada a sua fina lidade p rec ípua , a pub lic idade

não tem então a fina lidade de p romover o deba te de

ideias, a c ontraposiç ão de opiniões d íspa res, o c onfronto de

aná lises sob re determinado ob jeto. Ao c ontrá rio , a

pub lic idade traba lha , por definição, baseada em uma ideia

únic a , uma c onc epç ão únic a de determinado ob jeto: a

c oncepç ão de que o destina tário da mensagem deve

adquirir o p roduto ou serviç o do anunc iante.

Nela , portanto, o autor da pub lic idade não

externa um pensamento seu, não p rofessa um c redo

pessoa l, não manifesta sua intimidade sensível por meio da

linguagem artístic a . Não ra ro, o próprio p rofissiona l c riador

da pub lic idade não é consumidor do p roduto anunc iado,

mas sim de seu concorrente.

Não se tra ta , absolutamente, de expressão na

ac epç ão do a rt. 5°, IX, da Constituição. Donde não ser

possível c ogita r da violaç ão dessa garantia c onstituc iona l

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quando se pensa em sustenta r limites à pub lic idade,

notadamente no que c onc erne ao púb lico infantil.

De mais a mais, o pensamento, em todas as

suas d imensões, deve esta r livre. Isso é garantia

c onstituc iona l, c omo se sabe (a rt. 5°, IV). A invasão da

psique do ind ivíduo, c om a manipulaç ão de seu

pensamento, pode ser então a antítese da liberdade do

pensamento.

Como antes se d isse, os mais autorizados

espec ia listas no assunto garantem que a c rianç a ,

d iferentemente do adulto em gera l, é desprovida da p lena

c apac idade de perc epç ão, c ognição e juízo de va lor sobre

as mensagens pub lic itá rias. A depender da idade, sequer

está ap ta , por exemp lo, a d iferenc ia r a pub lic idade do

p rograma de televisão em que interc a lada .

Resulta certo então que a invasão de sua

psique (para inc utir-lhe o desejo e impulso de c onsumo),

mais que influenc ia r, vem lhe tolher substanc ia lmente a

liberdade de pensamento, pa ra lhe impingir sorra teiramente

ideias, vontades e va lores que não são genuinamente seus

ou de seus responsáveis.

A esse p ropósito , o emérito Professor YVES DE LA

TAILLE, firmando parec er téc nico em nome do CRF - CONSELHO

REGIONAL DE PSICOLOGIA nos autos de inquérito c ivil que

c uidava de tema parelho (Inquérito Civil 269/ 08, da

Promotoria de Justiç a de Defesa dos Interesses Difusos e

Coletivos da Infânc ia e da Juventude da Cap ita l), c hegou

mesmo a c lassifica r esse tipo de pub lic idade c omo

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´PDQLSXODomR�VLPEyOLFD�H�DIHWLYDµ da c rianç a (c fr. c ópia a

fls. 868/ 871, do inquérito c ivil que instrui a p resente petição).�

Em pa lavras b reves, se for possível pensar em

violaç ão de liberdade, é a pub lic idade que viola a garantia

c onstituc iona l da liberdade de pensamento da c rianç a . Eis

a verdade a ser d ita .

2�VLORJLVPR�H�VXD�FRQFOXVmR�

Tais fundamentos dão lastro efetivo ao silogismo

e c onc lusão apresentados nesta petição inic ia l, que assim

ficam resumidos:

1. A c rianç a é hiper vulnerável nas relações juríd icas,

inc lusive nas relaç ões de consumo.

2. A c rianç a não tem c ondiç ões b io lógicas, psíquicas e

emoc ionais de d istinguir, ava lia r e fazer juízo c rítico

sobre mensagens pub lic itá rias.

3. A pub lic idade d irig ida à c rianç a lhe c ompromete a

formaç ão de va lores.

4. A pub lic idade d irig ida à c rianç a ingere indevidamente

sobre sua liberdade de pensamento.

5. A pub lic idade d irig ida à c riança não permite a sua

identificaç ão como ta l.

6. A pub lic idade d irig ida à c rianç a se aproveita de sua

inexperiênc ia e d ific uldade de julgamento.

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7. A pub lic idade d irig ida à c riança viola a Constituição

da Repúb lic a , o ECA (Lei 8.069/ 90) e o CDC (Lei

8.078/ 90).

26�3(','26�

2�SHGLGR�SULQFLSDO�

Merc ê de todo o exposto, o autor p leiteia a

p rocedênc ia desta aç ão c ivil púb lic a , c om o acolhimento

do seguinte pedido:

&RQGHQDomR� GDV� UpV� j� REULJDomR� GH� QmR� ID]HU�

FRQVLVWHQWH� HP� VH� DEVWHU� GH� SURPRYHU�� YHLFXODU� RX�

GH� TXDOTXHU� IRUPD� FRQWULEXLU� SDUD� D� GLYXOJDomR� GH�

SHoD� SXEOLFLWiULD�� PHQVDJHP� SXEOLFLWiULD� RX� RXWUD�

IRUPD� GH� FRPXQLFDomR� SXEOLFLWiULD� GLULJLGD� D�

FULDQoDV�� LQFOXVLYH� DV� DSUHVHQWDGDV� VRE� IRUPD� GH�

MRJRV�� EULQGHV� RX� EULQTXHGRV� O desc umprimento

desta condenação deverá sujeita r a ré infra tora a

multa c omina tória (Lei 8.078/ 90, a rt. 84; e Lei

7.347/ 85, a rt. 11), no va lor de R$1.000.000,00 (um

milhão de rea is), por peç a , mensagem ou

c omunic aç ão pub lic itá ria desc onforme à dec isão

jud ic ia l.

3HGLGRV�DFHVVyULRV

O autor requer a inda :

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D��Seja determinada a c itação e intimaç ão posta l das rés,

nos endereç os ac ima informados, a fim de que, c om

expressa advertênc ia sobre os efeitos da revelia (CPC,

a rt. 285) e no p razo de 15 (quinze) d ias, ap resentem

resposta , se lhes aprouver, aos pedidos ora deduzidos;

E��Seja determinada a exped ição e pub lic aç ão no órgão

ofic ia l do edita l de que tra ta o a rt. 94 da Lei 8.078/ 90, a

fim de que eventuais interessados possam intervir c omo

litisc onsortes;

F��A c ondenaç ão das rés ao pagamento das c ustas

p rocessuais, devidamente a tua lizadas;

G��A dispensa do autor ao pagamento de c ustas,

emolumentos e outros enc argos, desde logo, tendo em

vista o d isposto no a rt. 18 da Lei 7.347/ 85.

H��Sejam as intimaç ões do autor feitas pessoa lmente,

mediante entrega dos autos c om vista , na Promotoria

de Justiç a do Consumidor, sediada na Rua Riac huelo,

115, 1° andar, sa la 130, Centro, São Paulo/ SP, à vista do

d isposto no a rt. 236, § 2°, do Cód igo de Proc esso Civil, e

no a rt. 224, inc . XI, da Lei Complementa r Estadua l

734/ 93 (Lei Orgânica do Ministério Púb lic o).

Protesta o autor por p rovar o a legado por todos

os meios de p rova em d ireito admitidas, espec ia lmente

pelas p rovas testemunha l, peric ia l e doc umenta l, bem assim

por todos os demais meios que se apresenta rem úteis à

demonstraç ão dos fa tos aqui a rtic ulados, observado a inda

o d isposto no a rt. 6°, inc . VIII, do Código de Defesa do

Consumidor, no que toc a à inversão do ônus da p rova em

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favor da c oletividade de c onsumidores substituída

p rocessua lmente pelo autor.

Anota , outrossim, que a p resente petição inic ia l

va i instruída com os autos do inquérito c ivil MP 14.161.924/ 08-

2, instaurado e instruído pela Promotoria de Justiça do

Consumidor da Cap ita l.

Para efeito de a lç ada , à c ausa a tribui o va lor

de R$500.000,00.

De tudo pede deferimento.

São Paulo, 4 de maio de 2010

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