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Exegese do Antigo Testamento

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Dr. Nelson Célio de Mesquita RochaRio de Janeiro – RJ

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EXEGESE DO ANTIGO TESTAMENTO Dr. Nelson Célio de Mesquita Rocha

Sumário

A finalidade deste pequeno trabalho é equipar o estudante de Teologia para a

elaboração de exegese nos textos do Antigo Testamento, proporcionando uma

visão prática para análise do texto no vernáculo apresentando as melhores versões.

Escolha do texto. Delimitação da perícope. Melhor sedimentação do texto. Melhor

tradução do texto. Sitz im Leben. Estrutura do texto. Comentários da perícope.

Contextualização. Estrutura da Exegese.

Introdução

1. Princípios para a elaboração de Exegese nos textos do Antigo

Testamento

2. Visão prática para análise – Movimento para fora

3. Melhores Versões

4. Escolha de um Texto

5. O Texto do Antigo Testamento

6. Métodos: Diaconia, Acronia, Anacronia e Sincronia

7. O Sitz im Leben

8. Estrutura da Exegese - Exemplo

Conclusão

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Introdução A autoridade da Bíblia provém do seu próprio autor, que é Deus.1 O Senhor fala através da Escritura. Aí está a base de sua autoridade: é a Bíblia a Palavra de Deus. Aqueles que escutam ou lêem a Escritura, encontram o poder da majestade divina, que é superior aos desejos e conhecimentos humanos. Todos nós somos incapazes de compreender os mistérios de Deus sem termos sido iluminados pela divina graça. Essa iluminação se dá através do “testemunho interno do Espírito Santo”. Deus é suficiente no testemunho do seu ser revelado na Sua Palavra, que opera no coração das pessoas, confirmado pelo testemunho interno do Espírito Santo. Está confirmado que Deus fala ao ser humano através da Escritura, e é verificado pelo Espírito Santo agindo em seu interior. O exegeta deve estar certo de que é assim mesmo, convencido da autenticidade da Bíblia e que na sua autonomia, comunica a verdade. Tem de haver da parte do exegeta reverência e humildade no ato de recorrer à Bíblia.2 O Senhor tem estabelecido um tipo de conexão mútua entre a certeza de Sua Palavra e de Seu Espírito. É preciso considerar como certo o que se pode afirmar sem titubeios, sobre o conceito de uma inspiração sobrenatural das Escrituras. Mas, o Espírito não transformou a Escritura numa dificuldade, de se entender o Seu ensino. Por isso,

aqueles que a interpretam, devem estar conscientes de alguns pontos fundamentais.

A se

1

32

33

1. Princípios para a elaboração de Exegese nos

textos do Antigo Testamento Seguem abaixo os Oito Princípios Exegéticos 3 para a realização de um trabalho de interpretação das Escrituras:

. O princípio de clareza e brevidade Deve ser clara a explanação da Sagrada Escritura, porque ela em si é clara. Isto e constitui uma virtude elevada. A exposição de um texto da Escritura deve ser claro em si mesmo transparente; deve ser clara e concisa a exposição na ordem para ser

KRAUS, Hans-Joachim. Calvin’s Exegetical Principles. Published by them in vol. 79 (1968), 29-41. Tradução: Nelson Célio de Mesquita Rocha, RJ, setembro de 1998. Cf. KRAUS, Hans-Joachim. Calvin’s Exegetical Principles. Published by them in vol. 79 (1968), 29-41. O texto em epígrafe se fixa apenas a um resumo retirado do original em inglês.

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claramente compreendida. O primário labor do exegeta é a interpretação do texto. “Um livro é escrito para seus leitores, não para seus exegetas”.

B. O princípio que determina a intenção do autor O exegeta não pode desviar-se da intenção de sua pesquisa, e na sua luz todos os comentários prolixos são vistos como aberrações. A constante descoberta da intenção do autor é característica dos comentários de João Calvino, por exemplo, que teve conseqüências para sua metodologia. A descoberta da intenção do autor tem como pressuposição a investigação do distintivo habitat

lingüístico específico do autor.4 Calvino dá um exemplo, e chega à conclusão de que as diferenças na linguagem que 2 Pedro apresenta, mostram que essa carta não foi escrita pelo autor de 1 Pedro. Calvino expressou opiniões críticas dessa natureza.5 C. O princípio elementar de investigação das circunstâncias históricas,

geográficas e institucionais Esses elementos são determinantes para a situação do autor. Nos discursos dos textos que fazem menção ao batismo, Calvino escreveu: “Existem muitos relatos na Escritura, em que o entendimento depende das circunstâncias em que foram escritos”. O Reformador fez uso de todos os meios possíveis para entender aquelas circunstâncias. Ele claramente segue a direção de Erasmus, que expressa na sua “Introdução a Edição do Novo Testamento Grego” (1516). Erasmus fez sua leitura procurando estudar cuidadosamente a situação geográfica e histórica, os costumes, instituições, e outros fatores que são relacionados. No comentário dos Salmos, Calvino investigou cuidadosamente e descreveu as ocasiões cúlticas e instituições por trás delas. Ele falou da “Assembléia Solene” em que cânticos de orações eram entoados; por exemplo, “ocasião pública de Ação de Graças”. D. Princípio do real sentido do relato ou da passagem deve ser colocado à vista

se a intenção do autor está sendo evidenciada Seu real sentido é também chamado sentido original, verdadeiro sentido, simples sentido, ou sentido gramatical. Esta tarefa somente pode ser efetuada através de um sólido conhecimento das línguas grega e hebraica. Em relação à carta aos Hebreus,

4 O habitat lingüistico específico do autor significa a sua maneira de escrever. O porquê da sua linguagem, a sua forma, que denotam a sua intenção. Se o exegeta não tiver essa percepção, não conseguirá entender e muito menos passar a mensagem adiante. 5 Diante disso, o que importa é o fato do escrito ter sido inspirado por Deus, pelo Seu Espírito, e não a pessoa que foi tomada por Deus, pois ela foi apenas um mero instrumento para que o registro fosse elaborado.

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Calvino utilizou o trabalho feito por David Kimchi, Abraham ibn Ezra e Raschi, para determinar o sentido real de uma escritura.

A relação de Calvino com os grandes exegetas judeus da Idade Média é uma área de descoberta quase totalmente negligenciada. É bem conhecido que Nicholas de Lyra foi o primeiro exegeta Cristão a fazer uso extensivo da tradição exegética judaica e Calvino deve ter se espelhado em sua Enciclopédia Postillen. Um notável exemplo de como a exegese de Calvino de um texto foi orientada para o real sentido, é seu tratamento de Gênesis 3.15. “Eu porei inimizade entre Ti e a mulher, e

entre a Tua semente e a dela; ele esmagará a Tua cabeça, e Tu esmagarás seu calcanhar”. Na interpretação da Igreja, estas palavras de Deus para “semente” foram entendidas como “Protoevangelium”, como a primeira promessa do evangelho. Mas, Calvino olhou o sentido real e elaborou o seguinte comentário:

“As palavras são claras, mas eu não concordo com os outros exegetas que não hesitaram em tomar a palavra semente para referir-se a Cristo, assim, o sentido real transformou-se: fora dos descendentes da mulher surgirá aquele que esmagará a cabeça da serpente. Esta visão, de qualquer maneira eu devo concordar, fazendo mais violência à palavra semente. Quem pode insistir que este substantivo coletivo aqui se refere tão somente a uma pessoa? Prefiro usar o real sentido como sendo a contenda contínua entre Satã e homem, mas no curso do tempo a humanidade será vitoriosa”.

Calvino sempre revelou cuidado ao interpretar o Antigo Testamento quando raramente se chega a interpretações cristológicas. No Salmo 72.1 ele observa, “Nós devemos sempre ser cuidadosos em não dar aos judeus nenhuma razão para afirmação que nos tentam descobrir referência a Cristo em passagens não diretamente referentes a Ele”. Numerosos exemplos podem ser citados do Antigo e Novo Testamento, de como o Reformador em sua exegese pesquisou sobre o sentido real e a intenção do autor. Calvino sempre observou o bem conhecido princípio, “A Sagrada Escritura é seu próprio intérprete”.6 E. Investigar o contexto de uma passagem Muitos problemas exegéticos podem ser explicados e corretamente definidos quando o intérprete investiga o contexto de sua passagem.

6 É importante saber que a Escritura não necessita da opinião de quem quer que seja, e de quem esteja diante dela, pois a Bíblia tem a sua mensagem peculiar. O que se precisa fazer é extrair dela a mensagem para toda vida.

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A totalidade de cada texto complexo, seu ambiente, deve ser cuidadosamente investigada. A maneira que Calvino usou em demanda contra um ecletismo7 bíblista é altamente significativo. A real força de seus comentários bíblicos está em sua constante descoberta das distintas feições do ambiente do texto e a direção em que sua mensagem se move. Assim, se pode obter o sentido daquilo que foi escrito sob a inspiração do Santo Espírito de Deus. O texto não pode ser considerado fora de seu contexto, uma vez que existe uma inter-relação e uma integridade redacional.

F. O princípio de que a exegese pode ir além da redação

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bíblico-literal Calvino afirma ser um perigo adicionar à lei divina um apêndice de comentários e explanações humanas que se desviaria da verdade. Contudo, se a exegese for bem feita, pode ir além de palavras, assim, nós devemos observar “a precisa intenção relevante do legislador”, e na exposição que é firmada em sua confiável intenção original. A única questão é como nós justificamos esse ir. É

reciso observar a “viva explanação”, verificar o que o mandamento, por exemplo, uer dizer, e qual é a intenção do autor. O que a Palavra quer dizer, verificando-se o ntento do autor.

. O princípio de uma expressão metafórica O princípio de que o exegeta confronta um problema especial quando ele chega interpretar uma expressão metafórica, uma figura de linguagem em que a coisa ignificada é transferida para a figura de linguagem de maneira que deve ser uidadosamente trabalhada fora.

A metáfora deve ser delimitada em dois lados. Ela não é alegoria. Não é para ser ntendida como hipérbole. As hipérboles pertencem ao reino da poética. Na metáfora ontém a expressão: “Isto é o meu corpo”, o “nome do sinal visível é colocado tracado à coisa que está representada no sinal”.

. O princípio do escopo de Cristo O Princípio do significado do “escopo de Cristo” é percebido claramente nos rabalhos exegéticos de Calvino. Segundo ele deve-se ler a Escritura com o propósito e descobrir Jesus Cristo nelas. Assim, qualquer mensagem bíblica tem de ser ristocêntrica, uma vez que Cristo é o centro.

Uma advertência para os teólogos: se alguém que se desvie dessa oportunidade”, ainda que tenha o trabalho de se afadigar e estudar por toda a sua ida, não virá a possuir um conhecimento verdadeiro. Não devemos pensar que

As diversas formas.

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somos mais sábios do que a sabedoria de Deus. Em Cristo, “temos todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento” (Col.2.3). Deve-se considerar que, Jesus Cristo é observado como o critério que explana toda a verdade canônica, ou ser assumido o conteúdo de um conhecimento prévio, que nos conduz em nosso trabalho de interpretação. Tem sido freqüentemente argumentado que Calvino aboliu a distinção entre Antigo e Novo Testamento, mas não existe base para essa afirmação. Pelo contrário, há uma similaridade entre o Primeiro e o Segundo Testamento. O método exegético de Calvino foi fundamentado em estudos humanísticos, e foi mais estritamente orientado para a história do que a de Lutero. A interpretação cristológica dos comentários de Calvino no Antigo Testamento vê para o futuro o cumprimento de promessas e profecias, e eram seus comentários do Novo Testamento como fatores determinativos para a exegese, com um movimento em direção a Cristo, baseado sempre na convicção de que a clareza da Sagrada Escritura está firmada somente em Cristo. Os princípios exegéticos em questão fazem parte do trabalho elaborado por Calvino. A exposição feita por Calvino modificou as avaliações gerais sobre a exegese bíblica da Reforma; e esse trabalho formou de modo aprofundado o perfil dos métodos exegéticos posteriores. 2. Visão prática para análise – Movimento para fora

8

pp9

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■ A exegese 8 consiste em compreender o texto em sua

forma e em sua essência: compreendê-lo como literatura (por meio da análise literária), e como produto histórico cultural (por meio da análise sociológica).9

Retirar do texto a mensagem real, e não dar ao texto uma mensagem particular.

Para tanto, é necessário escolher um trecho do texto que tenha sentido completo (cuja palavra técnica é “perícope”, um trecho do texto que tem sentido completo).

Por João Luiz Correia Jr. [O texto a seguir foi extraído, com permissão do autor, da obra "Chave ara análise de textos bíblicos: com exercício de análise." São Paulo: Paulinas, 2004, pp. 7-9 (no relo, com carta de aceite).] "Não se "sai" do texto (ex-egese, do grego ago, "conduzir / guiar") trazendo um sentido puro nele ecolhido, como um mergulhador traz um coral à superfície do mar ou como se tira um objeto de m cofre. Antes, a partir de um horizonte vivencial novo que repercute significativamente na rodução de sentido que é a leitura, "entra-se " no texto (eis-egese) com perguntas que nem sempre ão as de seu atuor". CROATTO, J. Severino. Hermenêutica bíblica: para uma teoria da leitura omo produção de significado. São Paulo: Paulinas; Porto Alegre: Sinodal; 1986, p.59.

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■ Seguem abaixo alguns pontos fundamentais que nos ajudam a fazer exegese de texto das Sagradas Escrituras:

2.1. Delimitação da perícope

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1

1

O que é uma perícope?

Perícopes e não versos soltos, isolados de seu contexto. A exigência fundamental da exegese de texto é que seja de perícopes.10 A palavra técnica perícope se refere a um

recho do texto que tem sentido completo. Os manuais de metodologia explicam, asso a passo, como deve ser a exegese de perícopes. Mas nas prédicas dos anti-rinitarianos é comum encontrar frases isoladas, usadas como comprovação de seu onto de vista. As mais comuns são Deut 6.4, João 10.30 e 17.3. Essas frases teriam s significados que lhes é dado por unitarianos depois de uma exegese de perícopes?

Para responder a essa pergunta, tomemos como exemplo Deut 6.4 “Ouve, Israel, Senhor, nosso Deus, é o único Senhor”.

Consideremos de modo resumido as perícopes que acompanham essa confissão:

A primeira perícope (Deut 6.1-3) identifica: o a) O sujeito, o Deus de Israel, o b) O destinatário, Israel, e o c) O assunto, Deus exorta Israel para guardar seus estatutos e mandamentos.

A segunda perícope (Deut 6.5-9) resume os estatutos e mandamentos em um mandamento total:

o “Amarás, pois, o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma e de toda a tua força”; e instrui para que estas palavras sejam lembradas em todo momento do cotidiano.

A terceira perícope (Deut 6.l4) está relacionada com a locução “o único Senhor”:

o O Deus zeloso proíbe que Israel siga outros deuses e, em uma passagem

paralela (Deut 7.5), ordena que os israelitas destruam os ídolos e tudo o que está relacionado com eles, quando tomarem posse da terra prometida. E isto confirma o que foi dito no artigo anterior: a confissão

0 Cf. WEGNER, Uwe. Exegese do Novo Testamento: manual de metodologia. Sinodal/Paulos, 998. Parte do Glossário. É um manual que vale muito considerar para o estudo exegético.

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da unicidade de Deus está sempre relacionada com o combate aos ídolos, determinado por um Deus zeloso.

Passemos à interpretação feita por Jesus. A pergunta do escriba a respeito do “primeiro” ou “grande” mandamento e a resposta de Jesus (Mar 12.28-34) confirmam que o assunto de Deut 6.4 e 5 não é afirmar que Deus é um, como querem os unitarianos. Segundo a resposta de Jesus, “Ouve, Israel... amarás o Senhor teu Deus...” é o primeiro mandamento. Através da recitação diária do Schema, todo israelita piedoso reconhece isso. Se o assunto fosse como os unitarianos querem, Jesus teria dito: “O primeiro mandamento é Ouve, Israel, o Senhor teu Deus é um (ou único)”. Na resposta de Jesus, a locução “o único Senhor” é deixada de lado, pois a especulação a respeito de Deus está fora de cogitação. Na perícope paralela de Mateus, a referência de Jesus aponta para o duplo mandamento do amor: amar a Deus e amar o próximo. E afirma: “Destes dois mandamentos dependem toda e lei e os profetas” (Mat 22.40). Ou seja, toda a revelação de Deus no Antigo Testamento se resume nos mandamentos do amor e não em crer que Deus é “um”. A pergunta pelo cenário no qual a frase de Deut 6:4 foi proferida conduz a exegese à análise histórica, social e cultural, para saber quem são os destinatários e porque a unicidade de Deus foi expressa dessa maneira. Segundo Deut 5.22-26, o cenário é o monte Sinai. Ali Javé se revela em pessoa, mas ele mesmo permanece oculto atrás da nuvem, da escuridade e do fogo. No sopé, no vale, os israelitas estão congregados, ouvindo temerosos a voz de Javé. Os destinatários são israelitas recém libertos da escravidão, organizados em clãs, o remanescente de várias gerações que viveram no Egito sob forte influência dos ídolos. Gente caracterizada na Escritura pela “dureza do coração (da mente)”, que tinha enormes dificuldades para reconhecer a unicidade de Deus e aceitar de boa vontade suas instruções e exigências. Atitudes que Moisés resumiu na seguinte frase: “Rebeldes fostes contra o Senhor, desde o dia em que vos conheci” (Deut 9:24). Ali no Sinai, mesmo vendo a manifestação pessoal de Javé e depois de testemunharem tantos milagres no trajeto do Egito até a montanha santa, essa gente mostrou que estava sempre pronta para adorar os ídolos (Deut 9.6-24). Por causa da “dureza do coração”, a maioria foi sentenciada para morrer no deserto, em vez de herdar a terra prometida. Como Deus poderia revelar-se a essa gente primitiva, inculta e caracterizada pela “dureza do coração”? O melhor que podia fazer era pedir que o amassem de todo o seu coração, de toda a sua alma e de toda a sua força. Se Deus tivesse se revelado no Sinai como o fez em Cristo, como Pai, Filho e Espírito Santo, sua unicidade jamais seria compreendida. Aliás, tal é a “dureza do coração” dos israelitas, que eles são incapazes de reconhecer, até os dias de hoje, a unicidade de Deus como é proclamada no Novo Testamento (Mar 12.29, 32; João 8.41; 17.3; Rom 3.29-30; 16.27; 1Cor 8.14, Gál 3.20; Efe 4.6; 1 Tim 1.17. 2.5; Jud 25). Segundo a profecia de Eze 11.17-19 e 36.26, a “dureza do coração” seria eliminada no tempo da graça que é o novo tempo inaugurado por Jesus Cristo, o mediador da graça.

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Foi em sua atividade terrena e em sua pessoa que Jesus Cristo revelou a Deus de uma maneira definitiva e absolutamente nova aos “homens de boa vontade”. Revelação que chocou e ainda choca judeus, muçulmanos, testemunhas de Jeová e outros grupos religiosos que ainda insistem em viver sob a tutela de Moisés. Para os que recusam receber a graça, ela permanece sem efeito e a “dureza do coração” aumenta, como aconteceu com o Faraó do êxodo. Mesmo uma exegese simples e resumida como essa, seria suficiente para mostrar que também as passagens de João 10.30 e 17.3 dizem algo diferente do que as prédicas dos unitarianos as fazem dizer, citando-as de forma isolada e situando-as na perspectiva da própria crença deles. A exegese requer que o intérprete tenha uma visão global da Escritura, de sua história da salvação, já que a interpretação é feita sempre a partir do detalhe em direção ao todo e do todo em direção ao detalhe; e que tenha um conhecimento suficiente a fim de determinar em que situação histórica, religiosa, cultural e social esses termos e conceitos foram usados e com que finalidade. Portanto, a exegese confiável rejeita a forma generalizada de usar passagens isoladas, interpretadas segundo a significação atual dos termos e conceitos e sem relacioná-los com o todo da Escritura, como fazem trinitarianos e anti-trinitarianos em sua prédica apologética. Por “delimitação da perícope” trata-se de observar o corpo da perícope, em sua delimitação interna e externa. A. Delimitação interna da perícope

■ Para que a perícope seja mais bem compreendida, é

B ■

importante perceber a sua delimitação interna, isto é, onde a perícope começa e onde termina, bem como sua estrutura interna, isto é, as subunidades da perícope.

■ Para tanto se faz necessário estar atento a alguns

detalhes:

o Mudança de cenário (através, por exemplo, de conectivos). o Mudança de ação (mudança dos tempos verbais) o Mudança de sujeito o Mudança de personagens o Mudança de destinatário o Mudança de assunto o Mudança de vocabulário

. Delimitação externa da perícope

Trata-se de observar o contexto literário em que a perícope está inserida no texto, isto é: em seu contexto literário imediato e em seu contexto literário mais amplo.

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2.2. Análise de paralelos ■ Consiste em observar os textos paralelos, por meio de perícopes que tratam do

mesmo assunto, no próprio livro que se está estudando ou noutros livros da Bíblia, tanto do Antigo como do Novo Testamento.

2.3. Análise dos Fenômenos Literários ■ É importante observar os fenômenos literários mais importantes:

• Vocabulário (palavras-chave do texto) • Imagens e figuras literárias • Repetições de frases e palavras • Ênfases • Paralelismos (procedimento literário de frases paralelas: sinonímico,

antitético, progressivo ou sintético.) • Recursos de construção: palavras ou frases que organizam o documento ou

texto: “Assim diz...”; “No dia seguinte...”; • Quiasmo: forma de organizar um texto por assunto; normalmente a parte

central é a parte enfatizada. Exemplo (Jo 6.37-39):

a. Todos aqueles que o Pai me dá virão a mim. b. e de modo nenhum jogarei fora aqueles que vierem a mim. c. Pois desci do céu para fazer a vontade daquele que me enviou e

não a minha própria vontade b’. Quem me enviou quer que eu faça isto: que nenhum daqueles que o Pai me deu se perca, a’. Mas que eu ressuscite todos no último dia.

2.4. Gênero Literário e Estilo ■ Façamos a distinção entre gênero literário e estilo, ainda que de modo sucinto.

Toma-se aqui por base para a presente análise reflexiva o conteúdo da obra de Uwe Wegner, um completo manual de metodologia para a exegese do Novo Testamento.11

11 WEGNER, Uwe. Exegese do Novo Testamento: manual de metodologia. São Leopoldo: Sinodal; São Paulo: Paulus, 1998, pp. 147, 168-170. Embora esta parte se refira à exegese do NT, pode-se aplicar também à exegese do AT o seu método.

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■ Essa distinção é necessária em face de uma tomada de entendimento, com o

propósito de se poder melhor retirar do texto escriturístico inspirado a sua mensagem real.

A. Gênero Literário ■ O Gênero Literário compreende o conjunto de textos que apresentam a mesma

estrutura formal básica, acrescidos de conteúdos ou outras características similares. Fala-se de gênero, portanto, quanto sobre ditos ou narrativas que apresentam um conjunto de formas idênticas, acrescidas de outros elementos comuns.

■ A diferença que é mais antiga, generalizada e ampla é a distinção entre prosa e verso. Pode ser em Prosa (narrativa, retórica e expositiva) ou Verso (poemas épicos, líricos ou dramáticos).

■ Como exemplos de gêneros no material discursivo podem ser citados: ditos proféticos, ditos sapienciais, ditos de seguimento, hipérboles e parábolas. No material narrativo temos os gêneros dos relatos de milagres, das controvérsias, dos relatos da paixão, entre outros.

Material narrativo Material discursivo

o Relatos de milagres, subdivididos

em milagres de cura e da natureza.

o Narrativas históricas e lendas, que

compreendem várias narrativas da

pré-história e infância de Jesus (Mt

1.18-25; 2.1-23; Lc .,26-38); os

textos do batismo, da tentação e

transfiguração (Mc 1.9-13; Mt 4.1-

11 e Mc 9.2-10); a narrativa da

paixão e os relatos da ressurreição e

das aparições aos discípulos.

o Apotegmas (ditos sentenciosos de

pessoas célebres, sentenças,

máximas, proposições, provérbios),

que podem ser subdivididos em:

1. Apotegmas de controvérsias (Mc

2.23-28 e 3,1-6)

2. Apotegmas biográficos (Mc 1,16-20;

6,1-6 e 10,13-16)

3. Ditos de Jesus, subdivididos em ditos

sapienciais, proféticos e

apocalípticos, ditos legais e regras

eclesiásticas, ditos iniciados com

“eu”, e parábolas ou palavras

similares.

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■ Convém diferenciar entre gêneros maiores e menores:

o Como “gêneros maiores” podem se destacar os dos Evangelhos, dos Atos dos Apóstolos, das Cartas (Epístolas), e do Apocalipse.

o Como “gêneros menores” podem-se encontrar uma multiplicidade, tais como: homologias (repetição das mesmas palavras, conceitos, figuras, no mesmo discurso); doxologias (fórmula de louvo à glória de Deus; enunciado de uma opinião comumente admitida), liturgias, catálogos de virtudes e vícios e outros encontrados nas Epístolas e no Apocalipse.

■ Os gêneros estão diretamente ligados às necessidades e tarefas das comunidades

às quais o texto é dirigido. Assim, por exemplo:

o Gênero dos paradigmas: narrativas breves e sucintas, sem descrição de pormenores históricos, que costumam culminar num dito incisivo de Jesus, com o objetivo da pregação.

o Gênero dos ditos de Jesus: têm a tarefa da parênese, ou seja, a necessidade de orientar a conduta dos cristãos.

o Gênero das narrativas de milagres: com o objetivo de fomentar a fé e a cura no interior das comunidades

B. Estilo ■ O Estilo é a criatividade do autor (ou da comunidade em que o texto foi

produzido, por meio do seu círculo literário), o jeito próprio de escrever dentro do Gênero Literário escolhido, previamente conhecido naquela cultura.

■ O “estilo” de um texto engloba toda a sua forma de apresentação, como introduções ou finais típicos. E descrições breves ou pormenorizadas dos eventos.

■ Tomemos o estilo de Marcos como exemplo que nos permita fazer as seguintes constatações:

o Pertence ao estilo característico de Mc o emprego da “parataxe” (prática de

iniciar os textos ou as frases com o emprego de “e” (kaí, em grego), em vez de particípios ou orações subordinadas. Este estilo está bem presente em 2.15-17, pois, além de todos os versículos principiarem com “e”, a parataxe é também empregada adicionalmente no v. 15b).

o Outra característica do estilo de Mc é o uso freqüente do presente histórico. Isto pode ser igualmente confirmado em 2.15-17 (v.15: e acontece estar ele reclinado...; v. 16: “tendo visto que come...”; v. 17: e, tendo ouvido, o Jesus diz a eles...).

o Ao estilo próprio de Mc pertence também o emprego do grego οτι no sentido interrogativo “por quê?”, como o segundo οτι do v. 16. Nenhum dos demais

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evangelhos emprega o termo neste sentido. Mc o faz ainda por outras duas vezes (9.11,28).

3. Versões e melhores versões da Bíblia

VERSÕES

DO

ANTIGO

TESTAMENTO

1. SEPTUAGINTA (LXX) - Esta é uma tradução do original hebraico do Antigo Testamento para o grego. Foi feita em Alexandria, entre os séculos III e I a.C., por diversos tradutores.

2. LATIM ANTIGO - Esta denominação é para distinguir dos manuscritos posteriores, como os da Vulgata. Estes manuscritos já existiam ao final do II Século d. C. Suas traduções são da LXX e chegaram até nós muito fragmentadas.

3. VULGATA LATINA - Feita ao final do Séc. IV d.C., por Jerônimo. Ele fez três traduções do livro de Salmos, sendo que a segunda é que foi adotada. Sua tradução do Antigo Testamento, a princípio, deixou de lado os livros apócrifos, por não desejar que os mesmos fossem incluídos em sua versão, embora já houvesse traduzido os livros de Judite e Tobias. Ao final, estes livros foram adicionados, fazendo parte da Vulgata. Esta foi a Bíblia oficial durante toda a Idade Média, na Europa ocidental. Existem cerca de oito mil manuscritos da Vulgata.

4. SIRÍACO PESHITTA - Foi traduzida do hebraico, no II Século d. C. e era o texto padrão dos cristãos sírios. Posteriormente houve uma revisão, pela LXX.

5. HEXAPLA SIRÍACA - Foi traduzida com base na LXX de Origines, pelo bispo de Tela, em 617 d.C. Este manuscrito foi bastante estudado no exame da LXX, em virtude de ter preservado as notas críticas do original grego de Origines.

6. COPTA (egípcio) - São quatro as versões do Antigo Testamento nesta língua. A saídica ou tebaica foi preparada no século II d. C., no sul do Egito, com base

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na LXX. No século IV d. C., no norte do Egito, foi preparada a versão boárica ou menfítica. Com poucos fragmentos, conhecem-se também as versões fayúmica e akhmímica.

7. VERSÕES MENORES - Foram traduzidas para o gótico, etíope e o armênio, no século IV d. C.

1. A BÍBLIA EM PORTUGUÊS

■ Traduções parciais - D. Diniz (1279-1325), rei de Portugal, traduziu da

Vulgata os primeiros vinte capítulos do livro de Gênesis. O rei D. João I (1385-1433) ordenou que houvesse uma tradução para o português. Alguns padres católicos, a partir da Vulgata, traduziram os evangelhos, Atos e as epístolas de Paulo. O próprio rei traduziu o livro de Salmos. Com esses livros publicaram a obra. Mais tarde foram preparadas outras traduções de porções Bíblicas: os evangelhos, que a infanta Dona Filipa, neta do rei D. João I, traduziu do francês; o evangelho de Mateus e porções dos outros evangelhos, da Vulgata, pelo frei Bernardo de Alcobaça; os evangelhos e as epístolas, pelo jurista Gonçalo Garcia de Santa Maria; uma harmonia dos evangelhos, por Valentim Fernandes, em 1495; em 1505, por ordem da rainha Leonora, foram publicados o livro de Atos e as epístolas gerais. Outras traduções realizadas em Portugal foram: os quatro evangelhos, traduzidos pelo padre jesuíta Luiz Brandão; e, no início do século XIX, os evangelhos de Mateus e Marcos, pelo padre Antonio Ribeiro dos Santos. Salienta-se que a dificuldade em se traduzir para os diversos idiomas era a oposição da Igreja Católica Romana que, ao longo dos séculos, fez implacável perseguição a estas obras, amaldiçoando quem conservasse traduções da Bíblia em "idioma vulgar", como diziam. Por isso, também de muitas traduções escaparam somente um ou dois exemplares.

■ Traduções completas 2.1. Tradução por João Ferreira de Almeida. Por conhecer o hebraico e o grego,

usou os mss., dessas línguas para sua tradução. Quanto iniciou o empreendimento era pastor protestante. Almeida utilizou-se do Textus Receptus, que representa os mss. do grupo bizantino, possivelmente o mais fraco entre os mss. gregos. Primeiramente traduziu e editou o N.T. publicado em 1681, em Amsterdã, Holanda. Essa tradução apresentava muitos erros. Almeida mesmo fez uma lista de dois mil erros. Muitos desses erros foram feitos pela comissão holandesa, que procurou harmonizar a tradução de Almeida com a versão holandesa de 1637. A dificuldade de Almeida é que não havia papiro algum e os unciais (mss. em letras maiúsculas) eram poucos. Esta a razão porque teve que lançar mão de fontes inferiores. Ele utilizou-se da edição de Elzevir do Textus Receptus, de 1633. As edições mais modernas muito progrediram na tradução. Com base nesta tradução

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foram lançadas a Revista e Atualizada, A Edição Revista e Atualizada e a Versão Revisada de acordo com os melhores textos em Hebraico e Grego.

2.2. Tradução de Antônio Pereira de Figueiredo. Teve como base a Vulgata Latina. Em 1896 fez sua primeira tradução em colunas paralelas da Vulgata e de sua tradução para o português. Essa tradução foi usada pela Igreja de Roma. Por ter sido utilizada a Vulgata como base, tem a desvantagem de não representar o melhor texto do N.T. que conhecemos pelos mss. unciais mais antigos e pelos papiros.

2.3. A Bíblia de Rahmeyer. Manuscrito do comerciante hamburguês Pedro Rahmeyer, que residiu em Lisboa, e traduziu em meados do século XVIII. Este manuscrito se encontra na Biblioteca do Senado de Hamburgo, Alemanha.

3. A Bíblia no Brasil. Traduções parciais 3.1. No Brasil, a primeira tradução, somente do Novo Testamento, foi feita por

frei Joaquim de Nossa Senhora de Nazaré, traduzida da Vulgata e somente do N.T. Foi publicada em São Luiz do Maranhão. Esta obra teve forte impacto por trazer em seu prefácio acusações contra as "bíblias protestantes", que estariam "falsificadas" e falavam "contra Jesus Cristo e contra tudo quanto há de bom”.

3.2. Primeira Edição Brasileira do Novo Testamento de Almeida - Esta edição foi revista por José Manoel Garcia, pelo pastor M.P.B. de Carvalhosa e pelo pastor Alexandre Blackford, agente da Sociedade Bíblica Americana no Brasil. Esta obra foi lançada em 1879 pela Sociedade de Literatura Religiosa e Moral do Rio de Janeiro.

3.3. Harpa de Israel, título dado à tradução do Livro dos Salmos, em 1898, por F.R. dos Santos Saraiva.

3.4. O Evangelho de Mateus, traduzida do grego em 1909 pelo padre Santana. 3.5. O Livro de Jó, publicado em 1912 por Basílio Teles. 3.6. O Novo Testamento, traduzido da Vulgata Latina por J. L. Assunção, em

1917. 3.7. O Livro de Amós, traduzido do idioma etíope por Esteves Pereira, em 1917. 3.8. O Novo Testamento e o Livro dos Salmos, baseados na Vulgata, em 1923,

por J. Basílio Pereira. 3.9. Lei de Moisés (O Pentateuco) preparada em hebraico e português, pelo rabino

Meir Masiah Melamed. Não há indicação de data. 3.10. Tradução do Padre Humberto Rodhen. Foi o primeiro católico a fazer uma

tradução diretamente do grego. Traduziu o N.T. que foi publicado pela Cruzada de Boa Imprensa em 1930. Tal como Almeida utilizou-se de textos inferiores, por isso, sofreu severas críticas.

3.11. Nova Versão Internacional. Lançada em 1993 pela Sociedade Bíblica Internacional.

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4. A Bíblia no Brasil. Traduções completas 4.1. Tradução Brasileira - Iniciada em 1902 e concluída em 1917, sob a direção

do Dr. H. C. Tucker. A comissão tradutora utilizou-se de mss. melhores do que os de Almeida. Entretanto, nunca foi muito popular.

4.2. Tradução do Padre Matos Soares - Foi baseada na Vulgata. É de 1930, e em 1932 recebeu apoio papal. É muito popular entre os católicos.

4.3. Revisão da tradução de Almeida (Edição Revista e Atualizada) - O trabalho de revisão iniciou-se em 1945, por uma Comissão formada pela Sociedade Bíblica do Brasil. A linguagem foi muito melhorada, até porque foram usados mss. gregos dos melhores.

4.4. Tradução pelos monges Meredsous (1959) (Bélgica) - Editada pela Editora Ave Maria e traduzida do hebraico e grego para o francês e em seguida para o português por uma equipe do Centro Bíblico de São Paulo sob a supervisão do Frei João José Pedreira de Castro.

4.5. Revisão da tradução de Almeida (Imprensa Bíblica Brasileira) - Foi publicada em 1967. Esta revisão segue os melhores manuscritos e, por isso, foi bem acolhida pelos estudiosos da Bíblia.

4.6. A Bíblia de Jerusalém editada no Brasil em 1981 por Edições Paulinas - traduzida pelos padres dominicanos da Escola Bíblica de Jerusalém, incluindo alguns exegetas protestantes. A edição brasileira foi feita sob a coordenação de Ludovico Garmus e editada pela Editora Vozes e pelo Círculo do Livro.

4.7. A Bíblia na Linguagem de Hoje (Novo Testamento). Publicada em 1988 pela United Bible Societies, através de seu ramo brasileiro e baseia-se na segunda edição do texto grego dessa sociedade. A intenção da United Bible Societies foi de publicar em vários idiomas, Novos Testamentos em conformidade com a linguagem comum e corrente.

4.8. Edição Contemporânea da Tradução de Almeida foi editada em 1990 pela Editora Vida. Essa edição eliminou arcaísmos do texto de Almeida.

• CÓDICES BÍBLICOS EM MANUSCRITOS UNCIAIS

A. CODEX ALEXANDRINUS. Contém a Bíblia toda. Foi escrito em grego no século V d.C. Encontra-se no Museu Britânico. Embora muito bem conservado, apresenta algumas lacunas em Gênesis, I Reis, Salmos, Mateus, João e I Coríntios. O AT é da LXX, com algumas variações do tipo de texto. Os evangelhos seguem o texto bizantino, o restante do NT o alexandrino.

B. CODEX VATICANUS. Este manuscrito, do século IV d.C., que também abrange toda a Bíblia encontra-se na Biblioteca do Vaticano. Apresenta algumas lacunas: Os 45 capítulos iniciais de Gênesis partem de II Reis, alguns Salmos, final da epístola aos Hebreus e o Apocalipse. O AT é da LXX. O NT é alexandrino.

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C. CÓDEX EPHRAEMI SIRY RESCRIPTUS. Manuscrito da Bíblia toda, do

século V d.C., e que está guardado na Bibliothèque Nationale de Paris. É chamado de "rescriptus" porque o texto original foi apagado, embora tenha ficado vestígios leves, e o material reutilizado no século XII para anotar as obras de Efraem, o sírio. Duzentos e oito páginas foram usadas para este fim e são as páginas que chegaram até nós. O texto Bíblico foi restaurado por métodos modernos de recuperação. Estas páginas contêm parte dos livros de Jó, Provérbios, Eclesiastes, Sabedoria de Salomão, Eclesiástico, Cantares e quase todo o Novo Testamento, com exceção de II Tessalonicenses e II João.

D. CÓDEX D OU DE BEZAE. Este manuscrito, do século V ou VI d.C., foi escrito nas línguas grega, lado esquerdo e latina, lado direito. Contém os quatro evangelhos; Atos, com algumas lacunas; e uma parte de I João.

E. CODEX WASHINGTONIANUS II. É um manuscrito do século VII d.C., que se encontra na Coleção Freer do Instituto Smithsoniano de Washington, USA. Contém partes das epístolas de Paulo, e a carta aos Hebreus depois de II Tessalonicenses.

F. CODEX REGIUS. Manuscrito do século VIII d.C. que está na Biblioteca Nacional de Paris. Neste o evangelho de Marcos termina no final de 16:9. Em seguida apresenta dois finais alternativos deste evangelho.

G. CODEX WASHINGTONIANUS I. Foi produzido no século IV ou V d.C. e também pertence à Coleção Freer do Instituto Smithsoniano de Washington, USA. Contém os quatro evangelhos, na ordem ocidental: Mateus, João, Lucas e Marcos. Foi copiado de outros manuscritos, pois apresenta diversos tipos de textos. Apresenta dois finais para o evangelho de Marcos.

H. ALEPH: CODEX SINAITICUS. O achado deste manuscrito envolve um drama vivido por Tischendorf, que o encontrou. Em 1844 Constantino Tischendorf trabalhava na biblioteca do mosteiro de Santa Catarina, na península do Sinai, e notou uma cesta cheia de páginas soltas de manuscritos. Ficou eufórico quando notou que acabara de encontrar um dos mais antigos manuscritos Bíblicos na língua grega. Tirou 43 páginas, que atendendo seu pedido foram-lhe dadas. Outro bibliotecário alertou que duas cestas contendo o mesmo tipo de material fora consumido na fornalha do mosteiro, para aquecer os monges. Entretanto, cerca de oitenta páginas do AT ainda existiam. Não conseguiu ir mais longe a sua busca, porque ao observar seu entusiasmo, os monges suspeitaram e deixaram de cooperar. Tischendorf voltou à Europa com suas 43 páginas. Em 1854 retornou ao mosteiro, mas não foi desta vez que os monges concordaram em falar sobre o restante das páginas de sua descoberta. Mas, em 1859, voltando novamente ao mosteiro, sob o patrocínio do Czar Alexandre II, patrono da igreja grega. Assim mesmo os monges não quiseram discutir sobre seu achado. Entretanto, um dos monges, inocentemente falou de uma cópia da Septuaginta que possuía e teria prazer em mostrar-lhe. Para surpresa de Tishendorf, o manuscrito era o mesmo do qual ele encontrara as 43 páginas. Continha o NT completo e parte

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do AT. Debalde Tischendorf tentou convencer o monge em presenteá-lo ao Czar russo. Mas o czar ofereceu um presente ao mosteiro, de acordo com costumes orientais, e levou o manuscrito (livrando-o do risco de aquecer a fornalha dos monges). Em 1933 o Museu Britânico adquiriu o manuscrito, onde se encontram até hoje. O manuscrito contém parte dos livros de Gênesis, Números, I Crônicas, II Esdras, os livros poéticos, Ester, Tobias, Judite e os livros proféticos, com exceção de Oséias, Amós, Miquéias, Ezequiel e Daniel. Estão ali incluídos também I e IV Macabeus. O NT está completo. As epístolas de Barnabé e uma porção do Pastor de Hermas também estão no manuscrito. O Texto assemelha-se ao Vaticanus e ao Alexandrinus.

I. THETA: CODEX KORIDETHIANUS. Texto bizantino, do século IX d.C. J. PI: CODEX PETROPOLITANUS. Manuscrito do século IX d.C.

1. OS MINÚSCULOS - São 2.646 escritos em pergaminhos entre os séculos IX e XV, em letras minúsculas.

2. OS LECIONÁRIOS – 1997 pergaminhos levam este nome. Trazem textos selecionados para serem lidos nas igrejas. Foram escritos nas mesmas datas dos unciais e minúsculos.

3. AS OSTRACAS - Trechos do N.T. foram escritos em pedaços de cerâmica. Temos 25 exemplares, que contém breves porções do N.T.

4. Escolha de um Texto

Será que às vezes substituímos o texto bíblico pelas nossas próprias idéias e opiniões? Quando vamos interpretar um

p a qp

1

1

trecho da Sagrada Escritura, estamos cientes de que precisamos respeitá-lo?12

Quando abordamos o texto bíblico, deixamos que ele nos conduza ou, ao contrário, impomos a ele um direcionamento? É de fundamental importância ter a consciência de que a Bíblia é um livro vivo, não porque nos conduz à salvação, mas porque cada um dos escritos que a compõem passou

or um longo processo de formação e possui uma história digna de uma biografia.13

Precisamos aprender a ler. Mas, o que é ler? Sabemos ler a Bíblia? Cada vez que tomamos nas mãos, lembramo-nos de que a Bíblia é uma obra literária?

Esse questionamento nos insere diante de algo que é de suma importância: a uestão do método. Isso quer dizer: quais sãos os instrumentos de que lançamos mão ara ler a Sagrada Escritura?

2 Cf. DA SILVA, Cássio M. Metodologia de Exegese Bíblica. São Paulo: Paulinas, 2003, p. 21. 3 Cf. Ibid., p. 22.

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O que é um texto? Do latim textus = tecido, trama. Para compreendermos o significado de um texto é preciso abordar algumas características de um texto literário. Antes de qualquer coisa, convém lembrar que o texto pode ser decomposto em elementos menores, chamados FRASES. Estas por sua vez, decompõem-se em elementos menores ainda: as PALAVRAS. Assim, as palavras se articulam e interagem em frases, que, por sua vez, se articulam e interagem no texto.14 Os fatores que concorrem para a articulação e a interação desses elementos pertencem a distintos aspectos lingüísticos. Vejamos a seguir:

Outra das qualidades do texto é a sua DELIMITAÇcomeço, meio e fim. A ciência bíblica utiliza um termo cunidade literária que preenche tais requisitos: PERÍCOPE.1

14 Cf. DA SILVA, Cássio M. Metodologia de Exegese Bíblica, p. 2415 Cf. DA SILVA, Cássio M. Metodologia de Exegese Bíblica, p. 24

Estilístico

Sintático

Morfológico

Fonético

Aspectos Lingüísticos

A elegância do texto (mais poético ou não, mais redundante ou

não).

Os signos lingüísticos menores e suas

propriedades, as categorias gramaticais (verbos, substantivos,

etc.).

pa

A configuração sonora do texto, as assonâncias.

A articulação das lavras no todo, como

estrutura.

ÃO. Um texto precisa ter lássico para designar uma 5

.

.

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Delimitação da Perícope

Início da Perícope

Fim da Perícope

Meio

Fim

Começo

Meio da Perícope

Várias perícopes formam um texto mais complexo, e assim por diante, até compor um livro. Nenhum texto é uma unidade isolada, mas se insere no amplo contexto do processo da comunicação lingüística. Também, todo texto é construído sobre um sistema sígnico determinado. Assim, tanto o autor quanto o leitor devem ter um sistema sígnico comum, para que o processo comunicativo aconteça. No caso da Bíblia, é mister levar em consideração as distâncias entre autor e leitor: tempo, espaço, cultura, língua, etc.16 O texto – Da produção à leitura Quando o autor decide produzir um texto, de sua parte, concorrem os seguintes fatores:

A idéia ou o aspecto dela que ele quer transmitir.

Suas fontes (orais ou escritas).

O material simbólico que está disponível em sua cultura e em sua língua.

A idéia que ele faz do leitor a quem escreve.

O efeito que quer produzir no leitor.

O texto, após sair das mãos do autor, tem vida própria, é autônomo. Eis o que acontece com a Sagrada Escritura. E tendo em vista que a comunicação entre autor

16 Cf. Ibid.

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bíblico e seu leitor baseia-se somente no texto e não em dados extratextuais, a compreensão do escrito, por parte do leitor, deve levar em consideração que:17

O autor e leitor pertencem a mundos e culturas diferentes: os signos e as categorias do primeiro nem sempre são naturais ao segundo.

O leitor de hoje não foi previsto pelos autores da Bíblia.

Até chegar a nós, o texto bíblico teve de superar obstáculos, sofreu mutações, foi interpretado sob diversas perspectivas, foi lido e aplicado a novas situações e, muitas vezes, acabou produzindo efeitos diferentes dos pretendidos pelo autor.

O texto tornou-se estável, pois, as edições impressas eliminam o risco de deturpações quanto à letra escrita. As divergências ficam por conta das interpretações. Em caso de dificuldades, o leitor não pode consultar diretamente o autor, mas pode sempre reler o texto, confirmando ou modificando suas interpretações.

5. O texto do Antigo Testamento O cânon e o sentido do Antigo Testamento O CÂNON DO ANTIGO TESTAMENTO O Antigo Testamento não é a totalidade da literatura produzida pelo povo hebreu.18 É o resultado de uma seleção de livros aos quais se reconhece autoridade e que são, por isso, chamados canônicos (a palavra kanôn em grego significa "regra"). O TEXTO DO ANTIGO TESTAMENTO E SUA TRANSMISSÃO

A língua do Antigo Testamento

1

1

R

Os livros do Antigo Testamento foram escritos essencialmente em hebraico. Essa língua semítica - aparentada, portanto, com o árabe e o babilônico - é bastante diferente das línguas européias. Para compreender certas notas, talvez seja útil conhecer algumas de suas características, que são as mesmas para o aramaico língua de alguns textos do Antigo Testamento.

7 Cf. DA SILVA, Cássio M. Metodologia de Exegese Bíblica, p. 25. 8 Cf. SIMIAN-YOFRE, Horácio (Org.). Metodologia do Antigo Testamento. [Tradução: João ezende Costa];São Paulo: Loyola, 2000, pp. 39-71.

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A maior parte das palavras (verbos e substantivos, por exemplo) é formada a partir de "raízes" caracterizadas por consoantes (habitualmente três, o único elemento a ser escrito, ao menos no princípio). As vogais (variáveis) e um certo número de prefixos e sufixos servem para indicar as funções gramaticais: gênero e número dos nomes, modos dos verbos etc. Assim, a raiz brk, que exprime a idéia de bênção, pode tomar formas tais como: barek = abençoar, berak = ele abençoou, beraku = eles abençoaram, yebarek = ele abençoará, baruk = abençoado, beruká = abençoada, beraká = bênção. Como o contexto é que determina o sentido das palavras, geralmente é fácil constatar na leitura quais vogais devem figurar em cada palavra: por isso, essa escrita abreviada (sem vogais) foi suficiente para o hebraico durante o tempo em que permaneceu uma língua viva. Quando deixou de ser falado pelo povo, foram criados diversos sistemas para a notação das vogais. Nos verbos, o hebraico exprime sobretudo o aspecto da ação: as noções temporais de passado, presente, futuro nas quais se desenrola a ação são indicadas pelo contexto. A forma verbal descreve a ação como realizada ou não-realizada. A ação realizada corresponde geralmente ao passado (perfeito ou mais-que-perfeito), mas pode também ter valor para o futuro, se olhar a ação em sua totalidade como uma realidade acabada. A ação não-realizada vale sobretudo para o futuro, mas também para o presente e o passado, quando a ação continua ou se repete (imperfeito). De fato, só o contexto permite saber se a ação está no passado ou no futuro, mas o próprio sentido do contexto nem sempre é evidente, o que explica numerosas divergências entre as diversas traduções da Bíblia. Como toda língua, o hebraico possui certo número de expressões idiomáticas: para falar do santo Templo de Deus, o hebraico diz "o Templo de sua santidade"; para descrever alguém que empreende uma viagem, o hebraico diz "levantou-se e foi"; para apresentar-se diante de Deus o hebraico diz "vir ante a face de Deus". As primeiras traduções gregas da Bíblia transpuseram numerosas expressões desse gênero, bem como outros hebraísmos. Desse modo criaram uma língua particular: o grego bíblico utilizado no Antigo Testamento grego e no Novo Testamento. A estrutura é quase a mesma do grego que se falava em toda a bacia do Mediterrâneo entre o século II a.C. e o século I de nossa era; mas muitas palavras tomaram um sentido especial, e esse idioma utiliza figuras próprias ao hebraico ou aramaico. A transmissão do texto - Os livros transmitidos em hebraico (ou em aramaico) ■ O texto massorético Os livros que o povo judeu, no fim do século I d.C., considerou como livros santos (Bíblia judaica, Antigo Testamento dos protestantes, livros deuterocanônicos do Antigo Testamento para a Igreja católica) foram conservados em sua língua original (aramaico para uma grande parte de Daniel e algumas passagens de Esdras, hebraico para todo o resto).

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Chama-se texto massorético a forma textual oficial definitivamente fixada no judaísmo por volta do século X d.C., época na qual floresciam em Tiberíades, na família dos Ben Asher, os mais célebres massoretas (= transmissores e fixadores da tradição textual). O mais antigo manuscrito "massorético" que possuímos foi copiado entre 820-850 d.C. e contém apenas o Pentateuco. O mais antigo manuscrito completo, o códice de Alepo - hoje infelizmente amputado - foi copiado nos primeiros anos do século X d.C. Nossas Bíblias hebraicas modernas reproduzem esse texto tal como foi copiado no manuscrito B 19a (L), de Leningrado (c. 1008). O fato de a escrita hebraica anotar de modo preciso apenas as consoantes tornou ambíguos certos textos bíblicos. Por volta do século VII d.C., encontrou-se um meio preciso para anotar as vogais e para indicar a vocalização tradicional das frases e membros de frases, graças a um sistema complexo de pontos e de traços que acompanham o texto consonântico. Assim se fixou por escrito uma tradição de leitura e de exegese desenvolvida no judaísmo no curso do primeiro milênio de nossa era e da qual os rargumin (traduções aramaicas da Bíblia hebraica) são as testemunhas fiéis. Resquícios de algumas traduções gregas realizadas sob a influencia do rabinato no curso dos dois primeiros séculos (as de Teodocião, de Áquila e de Símaco) permitem remontar ainda mais longe na história desta tradição de exegese. ■ O texto protomassorético e as formas textuais não-massorélicas O texto consonântico que serviu de base para a atividade dos massoretas (= texto protomassorético) tinha já suplantado no judaísmo todas as outras formas textuais rivais pelo fim do século I d.C. A partir de 1947, foram descobertas, às margens do mar Morto, em grutas ao redor da ruína de Khirbet Qumran', alguns rolos de livros bíblicos quase completos e de milhares de fragmentos abandonados no século I de nossa época. Isso permitiu constatar que, na época de Jesus, circulavam na Palestina, certo número de livros bíblicos em formas textuais por vezes divergentes do texto protomassorético. Conheciam-se já, antes da descoberta dos manuscritos de Qumran e do Deserto de Judá, algumas formas não-massoréticas do texto do Antigo Testamento: por exemplo, aquele que a comunidade dos samaritanos conservou para o Pentateuco, ou então o que serviu de base para a antiga tradução grega dos Setenta (Septuaginta). Essas duas últimas formas textuais, apesar de conservadas em manuscritos mais recentes que os manuscritos do Deserto de Judá, remontam aos três últimos séculos antes de Cristo. Em todas essas formas do texto pré-massorético podemos encontrar por vezes um texto mais claro e inteligível do que o massorético. Daí a tentação de muitos exegetas, sobretudo entre 1850 e 1950, de a elas apelar para corrigir o texto massorético nos trechos considerados alterados. ■ Alterações textuais É certo que determinado número de alterações diferenciam o texto protomassorético do texto original.

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Por exemplo, o olho do copista saltou de uma palavra a outra semelhante, situada algumas linhas abaixo, emitindo tudo aquilo que as separava. Do mesmo modo, certas letras, sobretudo quando mal-escritas, muitas vezes foram mal-lidas e mal-reproduzidas, pelo copista seguinte. Ou então um escriba inseriu no texto que ele copiava, e às vezes num lugar inadequado, uma ou várias palavras que encontrara à margem: termos esquecidos, variantes, glosas explicativas, anotações etc. Ou ainda alguns escribas piedosos pretenderam melhorar por meio de correções teológicas uma ou outra expressão que lhes parecesse suscetível de interpretação doutrinalmente perigosa. Algumas dessas alterações podem ser detectadas e corrigidas graças às formas textuais não-massoréticas, quando estas se verificam isentas de alteração. ■ Crítica textual Que forma de texto escolher? Noutras palavras, como chegar a um texto hebraico o mais próximo possível do original? Alguns críticos não hesitam em "corrigir" o texto massorético cada vez que ele não lhes agrada, seja por motivo literário, seja por motivo teológico. Por reação, outros se atêm ao texto massorético, mas quando ele é manifestamente insustentável, procuram encontrar numa ou noutra das versões antigas uma variante que lhes pareça preferível. Esses métodos não são científicos, sobretudo o primeiro. São perigosamente subjetivos. Atualmente, um melhor conhecimento da exegese targúmica e das literaturas antigas do Oriente Próximo permite explicar certas passagens até hoje obscuras. Mas a solução verdadeiramente científica consistiria em fazer com a Bíblia hebraica o que se faz com o Novo Testamento e com todas as obras da Antiguidade: um estudo bastante minucioso do conjunto das variantes, estabelecendo "a árvore genealógica" dos testemunhos que possuímos - texto massorético, múltiplos textos de Qumran, Pentateuco samaritano, versões gregas da Septuaginta (com suas três revisões sucessivas), da Quinta (de Orígenes), de Áquila, de Símaco, de Teodocião, versões aramaicas dos targumin, versões siríacas peshitto, filoxeniana, siro-hexaplar, harqleana, versões latinas antigas e Vulgata de Jerônimo, versões coptas, armênias etc. - e assim, sem nenhuma conjetura subjetiva, restabelecer o arquétipo à base de todas as testemunhas. Geralmente esse arquétipo remonta ao século IV a.C. Em alguns casos privilegiados (certas passagens das Crônicas), pode-se provar que o arquétipo assim obtido é o próprio original. Quase sempre o arquétipo está separado do original por um período mais ou menos longo, e então se está obrigado, para passar do arquétipo ao original, a recorrer a algumas conjeturas, com a aplicação prudente de princípios críticos bem estabelecidos. Infelizmente, os textos de Qumran ainda não estão todos publicados, e o trabalho crítico exige tanta competência e pesquisa que ele levará ainda várias décadas. Por isso, para evitar as fantasias de correções falaciosas, os responsáveis pela Bíblia - Tradução Ecumênica decidiram seguir, o mais perto possível, o texto massorético,

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esclarecendo-o pelo trabalho dos grandes exegetas judaicos da Idade Média: Rashi, Ibn-Ezra, Qimhi etc. ■ Os livros transmitidos em grego Fiel nesse ponto mais a Orígenes do que a Jerônimo, a presente tradução não quis manter o apego à tradição rabínica a ponto de eliminar os livros que, desde a fundação, as Igrejas herdaram do judaísmo de língua grega (classificados como deuterocanônicos na tradição católica). Pelo fato de os judeus de língua hebraica não os terem conservado na lista oficial de seus livros santos e de o judaísmo ter cessado de assegurar-lhes a tradição textual no curso do século I de nossa era, eles nos oferecem tradições textuais geralmente menos unificadas que, por vezes, perderam o enraizamento semítico de onde a maior parte deles surgira. O SENTIDO DO ANTIGO TESTAMENTO ■ Para os judeus Para ler a Bíblia (= "Lei escrita"), o judaísmo elaborou sua própria tradição interpretativa durante o período rabínico clássico, do século II a.C. ao século VIII da nossa era. Primeiramente "Lei oral" ou "tradição dos antigos" (porque transmitida de mestre a discípulo sem a mediação escrita), essa tradição foi codificada e posta por escrito na Mishiná (que, com o seu comentário, a Guemará, forma o Talmud) e nas diversas coletâneas midráshicas. Ela se desenvolve essencialmente sobre dois pontos: a interpretação livre e homilética, visando alimentar a reflexão religiosa (Hagadá) e a definição das regras de conduta cotidiana (Halaká). "Lei escrita" e "Lei oral", texto de referência e interpretação ininterrupta, constituem a tradição religiosa viva do judaísmo. Deixemos a palavra a dois autores judeus contemporâneos:

"Se existe uma coisa no mundo que mereça o atributo de divino, é a Bíblia. Há inúmeros livros sobre Deus. A Bíblia é o livro de Deus. Revelando o amor de Deus pelo homem; ela nos abriu os olhos, a fim de que pudéssemos ver que aquilo que tem um sentido para a humanidade é, ao mesmo tempo, o que é sagrado para Deus. Ela mostra como a vida de um indivíduo pode se tornar sagrada, e sobretudo, a vida de uma nação. Oferece sempre uma promessa às almas honestas quando perdem o ânimo, enquanto os que a abandonam vão de encontro ao desastre".19

19 HESCHEL, A., Dieu en quête de l'homme, Paris, Seuil, 1968, p. 263 [port: Deus em busca do homem, São Paulo, Paulinas, 1975].

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"A teologia judaica ligando o universalismo da criação ao particularismo de Israel confirma aquilo que toda a Bíblia ensina, a saber, que Deus se revela ao homem e que Israel está no centro da humanidade criada à imagem espiritual de Deus:`Vós sereis para mim um povo de eleição entre todos os povos, um reino de sacerdotes, uma nação santa' (Ex 19,5-6); `Santos vos tornareis, pois Eu sou Santo, Eu, o Senhor, vosso Deus' (Lv 19,2). "Compreende-se então que o judaísmo conceda à Bíblia o lugar mais eminente no ensinamento sinagogal, visto que ela é o `Livro da Aliança' que une Deus a seu povo (Ex 24,7), a carta que, em Abraão, tornou todo Israel bênção para todas as nações (Gn 12,3), de sorte que a terra inteira reconheça um dia e proclame a Realeza e a Unidade de Deus' (Zc 14,9)".20

■ Para os cristãos O Antigo Testamento só é antigo em relação ao Novo, isto é, a nova aliança instaurada por Jesus Cristo. Mas não se deve exagerar a diferença entre ambos, como se a antiga aliança e a literatura que dela dá testemunho tivessem caducado. Essa visão das coisas, que foi a de Marcião no século II, reaparece periodicamente na história da teologia. Ora, ela atinge mortalmente o próprio Novo Testamento. O Antigo Testamento foi a única Bíblia de Jesus e da Igreja primitiva. Como livro da educação judaica, de algum modo, moldou a alma de Jesus. Este assumiu os valores do AT como fundamentos do seu evangelho: não veio para "ab-rogar" a Lei e os profetas, mas "para cumpri-los". Cumpri-los era primeiramente levá-los a um ponto de perfeição no qual o sentido primitivo do; textos se superassem a si mesmo, para traduzir em sua plenitude o mistério do Reino de Deus. Cumpri-los era também fazer entrar na experiência humana o conteúdo real das promessas que polarizavam a esperança de Israel. Era desvendar o sentido definitivo de uma história ligada a uma educação espiritual, mostrando sua relação com o mistério da salvação, consumado pela cruz e ressurreição de Jesus. Era enfim dar à oração que aí se expressava uma riqueza de conteúdo que ultrapassassem os seus limites provisórios. Sob todos estes aspectos. Jesus cumpriu em sua pessoa as Escrituras que estruturavam a fé de Israel. Por isso a Igreja apostólica encontrou nas Escrituras o ponto de partida necessário para anunciar Jesus Cristo. À luz da Páscoa, ela não somente rememorou os feitos e gestos de Jesus, a fim de compreender o seu sentido profundo; também releram todos os textos antigos que the recordavam a história preparatória, com suas peripécias contrastantes, suas instituições provisórias, seus sucessos e fracassos, seus pecadores e santos. Não se encontravam esboçados, anunciados e prefigurados já no Primeiro Testamento a mensagem de Jesus, sua missão redentora, a constituição e o mandato da Igreja? Por isso os livros do Novo Testamento, sem perder de vista as lições positivas contidas nos preceitos do Antigo, habitualmente reinterpretam os

20 ZAOUI, A., Catholiyues, juifs, orthodoxes, prntestants lisent la Bihle Introductions ìt la Bible, t. I, Paris, Cerf, 1970, p 76.

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textos do AT para fazer emergir neles a presença antecipada do Evangelho. Dessa forma o Antigo Testamento pôde tornar-se a Bíblia Cristã, sem nada perder de sua consistência própria, antes adquirindo o estatuto de Escritura "consumada". Tal é a perspectiva na qual a primitiva teologia cristã foi construída, para explicitar o conteúdo do Evangelho e explicar quem é Jesus. Messias judeu e Filho de Deus. As imagens de Adão e de Moisés, de David e do Servo sofredor, do Emanuel e do Filho do Homem vindo sobre as nuvens permitiram elaborar a linguagem fundamental da fé cristã. Certamente a linguagem do Novo Testamento apresenta diversidade notável. Mas embora não despreze os recursos do universo cultural no qual viviam seus autores e leitores, foi tecido com as palavras e as frases da Escritura, as quais lhe conferem densidade. A relação entre Deus e seu povo, manifestação de sua graça e fidelidade, tomou assim sua verdadeira dimensão: tudo aconteceu a nossos pais "para servir de exemplo" e Deus quis que isso fosse consignado por escrito "para nos instruir, a nós a quem coube o fim dos tempos" (1 Cor 10,1 I). O Novo Testamento, por conseguinte, pôs as bases de uma leitura cristã do Antigo. Descoberta do Espírito sob o véu da letra. Revelação do sentido definitivo sob invólucros provisórios. Tal trabalho não se realizou, no decorrer dos séculos da história cristã, sem suscitar problemas complexos, que cada época formulou de modo novo. Herdeiro dessa tradição interpretativa, sempre orientada por uma visão de fé, vê esses problemas se apresentarem a nós. Que pode haver de extraordinário nisso, uma vez que a Palavra de Deus veio até nós no meio de uma história verdadeiramente humana e sob a forma de palavras verdadeiramente humanas? Para além dessa história e desses textos, a Igreja se esforça por perceber a Palavra de Deus da qual é portadora, a fim de lhe responder na "obediência da fé". Por isso é importante que a Escritura inteira se tenha transformado no tesouro comum das igrejas, divididas por tantos dramas históricos. A obediência comum à única Palavra de Deus não é o indício mais seguro de uma unidade que se procura construir? É vivendo da mensagem bíblica, do modo como dela viveram os apóstolos, que os cristãos de hoje reencontrarão o caminho da reunificação em Jesus Cristo.

6. Métodos: Diacronia, Acronia, Anacronia e Sincronia ■ Conceitos “Método” designa um conjunto de procedimentos que permitem

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acesso mais objetivo a um objeto de pesquisa.21 Deve ser transmissível. Também, é preciso que possa ser ensinado e aprendido. Uma exegese por mais bela que seja, e eventualmente também verdadeira, que se possa aprender ou repetir não é um método, mas, quando muito, leitura livre que pode ser mais ou

1 Cf. SIMIAN-YOFRE, Horácio (Org.). Metodologia do Antigo Testamento, p 74.

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menos rica. O “Método” deve ser compreensível, imitável e controlável com elementos ao alcance das mãos de quantos têm certa familiaridade com a disciplina que se dedicam. O termo “histórico” implica reconhecer que os textos bíblicos foram concebidos e compostos em tempos idos, que se desenvolveram num processo histórico e que, por conseguinte, a relação com aquele tempo tem provavelmente algo a dizer sobre o sentido de tais textos, embora possam ter ainda vida e sentido atuais. A palavra “crítico”, tal como se costuma interpretar, significa estabelecer distinções e com base nelas poder julgar os diversos aspectos do texto ligados à história: o processo de constituição do texto, a identidade do autor, o tempo da composição, a relação com outros textos contemporâneos, e a referência do conteúdo do texto à realidade extra-textual (por exemplo, a história política, social e religiosa que o texto subentende). ■ Diacronia: O método histórico-crítico

O que chamamos de método histórico-crítico é o método de estudo e pesquisa bíblica que procura levar em conta o contexto histórico que envolve o texto, fazendo uma avaliação acurada (crítica) de todas as relações desta informação com o sentido do texto.

Uma ênfase quanto ao sentido gramatical e histórico do relato bíblico é o alvo deste método. Realiza-se a tarefa de um historiador, que avalia um documento antigo com o alvo de compreendê-lo. Isto revela pouco sobre como vamos trabalhar, já que esta metodologia é largamente empregada por "teólogos" que não crêem na inspiração plena das Escrituras. Apesar do mau uso do método por alguns, queremos empregar o método histórico-crítico na exegese por acreditarmos que ele fornece o significado original do texto. Usaremos este método orientado pela fé, que já temos na absoluta inspiração e autoridade das Escrituras. Também acreditamos ser a humildade a maior virtude de um exegeta.

É um método histórico porque leva em conta a época e a situação original em que o texto foi escrito. A Bíblia é a palavra de Deus dada através das palavras de pessoas históricas (Hb 1.1-2). Assim, o trabalho de entender a Bíblia é o trabalho de um historiador. A história é uma ferramenta de trabalho. O próprio texto bíblico no geral contém elemento histórico suficiente para dar uma idéia da situação original, dispensando-nos do uso de muito material estranho. E necessário ser prudente ao utilizar "ajudas" externas.

Dois elementos precisam ser levados em conta quanto tratamos da Palavra de Deus: sua particularidade histórica contrabalançada por sua validade eterna. A particularidade histórica diz respeito ao que estava acontecendo na situação original. Por exemplo, Paulo escreveu o livro de Gálatas para combater doutrinas judaizantes que se infiltravam na igreja. A relevância eterna leva em conta que mesmo em uma situação diferente, a mensagem de Gálatas tem importância para cada geração de cristãos.

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Em último lugar, usaremos o método histórico na tentativa de entender cada

texto da Bíblia na situação, pensamento e época da própria Bíblia. Nosso método também é um método crítico porque requer o uso de nossas

faculdades mentais em raciocínios, julgamentos, estudos e esforços. A eterna inteligência e bom senso de Deus estão refletidos no seu livro. É necessário que usemos a inteligência que ele nos deu para compreendê-lo. A palavra “crítico” tem geralmente uma coloração negativa. Não queremos usá-la desta forma. O método é crítico em avaliar os resultados obtidos e em pesá-los. Nunca deve tornar-se crítico contra a Bíblia.

O uso da razão deve ser subordinado à fé na revelação. Não podemos chegar a Deus com a razão; Deus é quem chega a nós com a revelação de sua razão, Jesus Cristo, o logos eterno (logos: palavra grega que pode significar razão). Exegese e hermenêutica.

Nossa tarefa é dupla: Primeiro, descobrir o que o texto significava originalmente, esta tarefa é chamada exegese; em segundo lugar, devemos aprender a discernir esse mesmo significado, na variedade de contextos novos ou diferentes dos nossos próprios dias, esta é a tarefa da hermenêutica. Em definições clássicas a hermenêutica abrange ambas as tarefas, mas em tratados recentes a tendência tem sido separar as duas.

Para nós, exegese é ler e explicar os textos em empatia (e simpatia) com os escritores bíblicos. O exegeta é primeiramente um historiador que analisa os documentos. Todavia, ele tem de ir além da análise impessoal: é necessário assumir a fé que o escritor possuía para entender seus escritos. A exegese é um trabalho literário-espiritual.

A hermenêutica é necessária para a exegese. Exegese é uma palavra que vem da língua grega, sendo composta da preposição EK (de) e da forma substantiva do verbo HEGEOMAI (ir, guiar, conduzir) e significa "conduzir para fora" o sentido original de um texto. Na exegese procuramos entrar no texto (EIS), e ficar nele (EN), para então sairmos dele (EK) tirando lições para nós. Hermenêutica é a síntese dos resultados da exegese, tornando-a relevante para o leitor, ou auditório. ■ Pressuposições

Pressuposições são idéias, hipóteses ou fatos que aceitamos ou carregamos conosco antes de iniciar nossa análise de um texto. O bom exegeta procura libertar-se ao máximo deles para que a sua compreensão do texto não seja distorcida pela sua pré-compreensão. Um exemplo prático ajuda a ver a importância das pressuposições. Se um exegeta pressupõe que "milagres não podem acontecer", todo seu estudo dos evangelhos e de Atos vai revelar ceticismo quanto aos fatos narrados e vai procurar explicá-los por meio de causas naturais, ignorância do povo, erro do escritor, etc. As pressuposições vão guiar nossa capacidade de entender e explicar o texto.

Por outro lado, as pressuposições existem e sempre existirão. O que importa é a sua validade. O critério da validade de uma pressuposição é a sua base cristológica,

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que Jesus Cristo é o filho de Deus. Devemos ler a história do Novo Testamento com a pressuposição cristológica revelada pelos escritores. Esta é uma pressuposição básica para entender o Novo Testamento, e até mesmo o Velho, tomadas as devidas precauções. A pressuposição cristológica é válida para sempre.

Quando as nossas pressuposições são iguais às pressuposições dos escritores do Texto Sagrado, temos as melhores condições possíveis para entender o que eles estão falando e escrevendo. Não há um raciocínio em círculo aqui. A fé em Cristo, mantida pelos escritores do Novo Testamento, precedeu a obra escrita que produziram sob a influência do Espírito Santo. Logo, para que possamos acompanhar o pensamento desses homens, precisamos participar da fé que tiveram.

Ver o texto como o autor o viu é o nosso alvo. Buscando as pressuposições do autor, não entraremos em choque com ele. Encontrar as pressuposições do escritor pode ser a chave para não introduzir nossas idéias no texto. Cristo é o princípio de unidade e da verdade na interpretação da Bíblia. ■ Acronia: Os métodos estruturalistas Os métodos estruturalistas surgiram como resposta não só às insuficiências objetivas dos métodos histórico-críticos, mas também às consideradas tais por falta de adequada compreensão.22

■ ESTRUTURALISMO Metodologia científica aplicável ao estudo do texto literário a partir de princípios universais que governam o uso da linguagem, isto é, a partir de todos os elementos que o constituem e que estão relacionados entre si por um sistema único, de significação a que se chama estrutura.23 Segundo Roland Barthes, trata-se de uma “atividade” que tem um fim específico: “O fim de toda a atividade estruturalista, seja ela reflexiva ou poética é de reconstituir um ‘objeto’, de maneira a manifestar nesta reconstituição as regras do funcionamento (as ‘funções’) deste objeto.” 24

O estruturalismo não é uma corrente exclusiva dos estudos literários: podemos encontrá-lo na psicologia, na sociologia, na antropologia, na filosofia, na psicanálise e na lingüística. Na psicologia, a noção de estrutura (Gestalt) aparece no princípio do século XX e Jean Piaget publica em 1968 um livro fundamental nesta área Le Struturalisme; na sociologia, Talcott Parsons, em Structure and Process in Modern Sciences (1960), apresenta-nos uma visão ontológica da estrutura social; na antropologia social, a primeira referência é Lévi-Strauss, cuja Antropologia Estrutural (1958) há de ser decisiva para o nascimento da teoria estruturalista na literatura; na filosofia, Louis Althusser tentou uma interpretação estrutural da obra de

22 Cf. SIMIAN-YOFRE, Horácio (Org.). Metodologia do Antigo Testamento, pp 109-122. 23 Carlos Ceia, ESTRUTURALISMO, E-Dicionário de Termos Literários, coord. de Carlos Ceia, ISBN: 989-20-0088-9, <http://www.fcsh.unl.pt/edtl> (23 de abril de 2009). 24 “A Atividade Estruturalista”, in O Método Estruturalista, de Luc de Heush et al., Rio de Janeiro, 1967, p.58.

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Marx, em Lire le Capital (1965); na psicanálise, os trabalhos de Jacques Lacan partem do pressuposto de que o inconsciente está “estruturado como uma linguagem” (Écrits, 2 vols., 1966-1971); na lingüística, os estruturalistas consideram a língua como um sistema de relações ou mais precisamente como um conjunto de sistemas ligados uns aos outros, cujos elementos (fonemas, morfemas, palavras, etc.) não têm nenhum valor independentemente das relações de equivalência e de oposição que os ligam. Estas possibilidades de aplicação do estruturalismo levantam vários problemas, a começar na ligação desta metodologia à lingüística. Greimas, que publica em 1966 um dos mais radicais livros programáticos do estruturalismo lingüístico, Sémantique structurale , coloca assim a questão mais tarde: “O paradoxo desta lingüística não lingüística continua: o seu chefe de fila, em França, Claude Lévi-Strausse, não é um lingüista e a teoria da linguagem, conhecida pelo nome de estruturalismo, tem aí o seu lugar, reservado, até a pouco, à metodologia diabética; nada de estranho, portanto, que na revisão dilacerante de hoje, Saussure seja invocado como um grande filósofo da história (Merleau-Ponty) ou que se considere Marx como o precursor do estruturalismo.” (Du sens, Paris, 1970, p.20). A história do estruturalismo lingüístico tem de começar com os cursos ministrados por Saussure em Genebra, entre 1906 e 1911, que ficaram conhecidos após a publicação, pelos seus alunos, três anos depois da morte do professor, com o título Curso de Lingüística Geral (1916). Ao mesmo tempo, mas não de forma relacionada, surge o americano Leonard Bloomfield, que será considerado o pai da lingüística estrutural norte-americana (a primeira versão da sua obra teórica – Introduction to the Study of Language (1914) – veio a ser refundida e publicada em versão definitiva em 1933 com o título Language). Por outro lado, devemos considerar também outra obra de referência do estruturalismo lingüístico, também nos E.U.A.: Language: An Introduction to the Study of Speech (1921), de Edward Sapir. Estas perspectivas norte-americanas foram decisivas para a sistematização dos estudos sobre lingüística estrutural. Z. S. Harris tentou com Methods in Structural Linguistics (1951) encontrar uma descrição coerente de todos os mecanismos de atuação do dos fonemas e dos morfemas. Entre as teorias do Círculo Lingüístico de Moscovo (1914-1922) e esta teoria de Harris, assistimos a um esforço no sentido de descrever abstratamente os elementos constitutivos da língua como fonema, morfema, palavra, etc. É necessário esperar pelos primeiros trabalhos do discípulo de Harris, Noam Chomsky, que em 1955 divulga The Logical Structure of Linguistic Theory, para termos uma primeira descrição empírica das regras lingüísticas, trazendo agora para o centro da discussão conceitos como o de gramática, regra, nível, transformação, descrição estrutural, etc., quase sempre articulando a especulação lingüística com a matemática e a lógica moderna. Contudo, o estruturalismo enquanto teoria literária só é genericamente divulgado nos Estados Unidos quando Jonathan Culler publica Structuralist Poetics (1975), que lhe mereceria um prêmio importante atribuído pela Modern Language Association of America.

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A maior parte das teorias estruturalistas vêm de França e são divulgadas sobretudo no sul da Europa. Por razões que estão por explicar, quer o Reino Unido quer a Alemanha nunca permitiram que o estruturalismo se impusesse no seu espaço nacional. Invocar a tradição pragmatista da Universidade britânica e a tradição especulativa da Universidade alemã pode ajudar a explicar, pelo menos em parte, esta resistência. Quando falamos ainda hoje em estruturalismo literário, reportamo-nos com rigor ao movimento da nouvelle critique francesa da década de 60. Todorov, Barthes, Genette, Jakobson, Greimas e outros propõem nessa altura uma filosofia diferente das até então praticadas pela crítica tradicional francesa. As abordagens marxistas, existencialistas e psicanalíticas que dominavam então a cena da teoria literária francesa são agora contestadas em nome de uma abordagem imanente, empírica e estrutural do texto literário. O fenômeno é, pois, essencialmente francês e tem como referência mais próxima a Antropologia Estrutural (1958) de Lévi-Strauss e como referências mais distantes, por assim dizer, os marxistas Louis Althusser e Lucien Goldmann e o psicanalista Jacques Lacan. O que os une é a crença no estudo sincrônico de estruturas ou sistemas que produzem o sentido (não no estudo propriamente dito do sentido ou nos mecanismos de interpretação do sentido). Um dos méritos do estruturalismo foi o de tentar sistematizar conceitos literários dispersos e fazer doutrina em disciplinas que não conheciam suporte teórico atualizado. Barthes (Introdução à Análise Estrutural da Narrativa, 1966) foi decisivo neste capítulo, por exemplo, distinguindo três tipos de análise textual: a leitura simples, a crítica literária e a ciência da literatura. Esta última teria a grande missão de criar os modelos de análise do texto literário, que não pode ser considerado como expressão de estruturas e conflitos sociais, históricos, psicológicos, etc. O texto literário contém em si o princípio da sua inteligibilidade. É considerado um sistema coerente de signos lingüísticos – sistema que não inclui um critério de verdade ou de reprodução mais ou menos mecânica da realidade –, trazendo-se para frente da investigação a natureza simbólica do texto, ou, por outras palavras, a sua literariedade, que, como se sabe, foi um dos objetos de estudo do formalismo russo. Esta filosofia pressupõe a existência apriorística de um determinado número de princípios universais que supostamente presidem à natureza literária de todos os textos. Por esta via, Barthes propõe-nos códigos de leitura (na verdade, uma variante terminológica e operacional das funções de Propp), o que significa que um texto já está de alguma forma escrito-lido antes da escrita-leitura, pois que se propõe a existência de uma gramática reguladora de todos os elementos do texto. Este princípio não significa que ao leitor seja captada a sua capacidade de intervenção no texto, pelo contrário, Barthes assegura-nos que o texto é polissémico, o que na linguagem estruturalista significa que há um código lingüístico que se acrescenta ao código estabelecido. Daqui nasce a língua plural que o texto literário veicula.

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A pluralidade de sentidos que a obra literária faz nascer é uma prova do seu caráter aberto. A ambigüidade é fundamental para a construção da definição de literariedade, porque, ao contrário da linguagem comum que reduz a polissemia ao contexto em que ocorre, a linguagem literária que não nos remete para nenhuma situação, empurra para o leitor a responsabilidade total da decodificação do sentido. Assim nasceram algumas das mais divulgadas leituras estruturalistas: as da literatura fantástica (Todorov), as da literatura tradicional (Greimas), as da poesia anglo-saxônica (Jakobson) e as de narrativas bíblicas (Barthes). Quer Barthes em Critique et verité quer Todorov em “Poétique” (in Qu’est-ce que le structuralism?) procuraram emprestar à teoria da literatura uma forte componente lingüística, sob a forma de uma poética, ou um grande sistema metaliterário, que, em última análise, define o que foi o estruturalismo literário. Todorov, por exemplo em Grammaire du Décaméron (1969), tenta fixar as leis de uma gramática geral dos elementos que formam a narrativa, apresentando a poética como ciência da literatura, que inclui formulações do tipo: categorias gramaticais (agente ou nome próprio, adjetivos, funções sintáticas, etc.), aspecto verbal, sintaxe narrativa, etc. Sobre a relação personagem/narração, e seguindo muito de perto as propostas de Pouillon (Temps et roman, 1946), Todorov descreve as perspectivas possíveis: a visão com (quando o narrador sabe tanto quanto a personagem), a visão por detrás (quando o narrador sabe mais do que a personagem) e uma visão de fora (quando o narrador sabe menos - finge saber menos, é mais carreto - do que qualquer das personagens). As personagens da narrativa também são objeto de estudos sistemáticos. Um dos mais populares é aquele que o lituano A. J. Greimas apresentou, a partir dos modelos de Propp e de Sourieu (Les 200 000 situations dramatiques, 1950). O desenvolvimento da ciência da narratologia deve muito ao empenhamento dos teóricos estruturalistas, em particular Greimas, Genette, Barthes e Todorov, que, no geral, acreditavam que todas as narrativas possuem estruturas comuns, condição necessária para a fundação de qualquer teoria da narrativa. Genette, que reclamava ser o estruturalismo mais do que uma metodologia, para ser uma verdadeira ideologia, no seu Discours narratif (1972), apresenta uma muito divulgada sistematização de alguns conceitos narratológicos, por exemplo, a distinção na narrativa entre (1) récit, a ordem dos acontecimentos do texto, (2) histoire, a seqüência na qual esses acontecimentos ocorreram “realmente”, como podemos deduzir do próprio texto e (3) narration, o próprio ato de narrar. As duas primeiras categorias equivalem à distinção clássica dos formalistas entre “trama” e “história”. Genette também teorizou sobre a perspectiva narrativa, apresentando um modelo também muito divulgado: o narrador – seguindo o modelo de Pouillon/Todorov – pode saber mais do que as personagens, menos do que elas, ou estar no mesmo nível; a narração pode ser também focalizada de formas diferentes: “não localizada”, feita por um narrador onisciente, exterior à ação, ou “focalizada internamente”, feita por uma personagem de uma posição fixa, de várias posições, ou do ponto de vista de várias personagens. Genette utiliza o termo focalização para

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dizer os diferentes pontos de vista (o termo é uma tradução do inglês focus of narration). Para superar o problema do ponto de vista, Genette quis definir o narrador em relação a duas coisas: a sua situação diante da personagem (colocada não mais em termos de saber, como em Pouillon e e Todorov, mas em termos existenciais) e a sua situação diante da história que conta. Optando, em Figures III, por chamar diegese à história narrada pelo discurso do narrador, e, posteriormente, em Noveau discours du récit, entendendo que é preferível reservar o termo para designar o universo espácio-temporal no qual se desenrola a história. Para a construção de uma hipotética ciência da literatura, muito contribuíram também os trabalhos de Roman Jakobson, que procurou demonstrar o caráter estrutural da ambigüidade, formulando-a em termos da relação código-mensagem e definindo-a como constituinte fundamental da mensagem poético-literária. O modelo de Jakobson inclui a identificação de seis funções da linguagem: expressiva, referencial, fática, metalingüística, conotativa e poética. Esta última dominará as restantes, porque, nela, a mensagem está voltada para si própria. Jakobson deu-nos ainda outra teoria muito divulgada, sobretudo nos meios escolares secundários, por força da sua aparente simplicidade e operacionalidade: o modelo de comunicação, que envolve necessariamente seis elementos (emissor, receptor, mensagem passada entre eles, um código comum que torna a mensagem inteligível, um contato ou meio físico de comunicação, e um contexto a que a mensagem se refere). A afirmação da ambigüidade da obra literária introduz na teoria estruturalista da literatura vários pares conceituais que procedem da lingüística geral e que constituem pontos de partida para a formação de uma poética estruturalista:

• Conotação/denotação, significação/sentido, forma/conteúdo, estrutura/forma, sintaxe/semântica, enunciado/enunciação, etc.

Todas as ciências que recorrem ao método lingüístico utilizam estas dicotomias, desde a psicanálise de Lacan até à antropologia de Lévi-Strauss. O objetivo é alcançar uma formulação de caráter científico, demonstrável por provas irrefutáveis, para a configuração do texto literário. Neste campo, é importante referir os trabalhos de Julia Kristeva, que publica em 1969 um livro fundamental (e dos mais complexos) para a história do estruturalismo (embora muitos aceitem que é mais carreto situar a sua obra numa fase dita “pós-estruturalista”): Séméiotikè, onde concebe o texto como o espaço de um trabalho autógeno que consiste em desarticular a língua natural, baseada na representação, que é substituída por uma multiplicidade de sentidos que o leitor (ou mesmo o autor) pode gerar a partir de uma cadeia aparentemente fixa. Kristeva chama a esse trabalho do texto significância, que, ao contrário da significação, não poderia ser reduzida à comunicação, à representação, à expressão. Kristeva chega a uma dupla articulação fundamental dessa produtividade do texto: a de feno-texto e a de geno-texto, a primeira recobrindo o plano do enunciado concreto, o discurso manifesto, a segunda englobando todos os jogos subjacentes a essa

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estrutura aparente. Kristeva introduz então a experiência da semanálise na fronteira entre a semiótica (o texto continua a ser um sistema de signos) e a psicanálise (o signo torna-se o lugar das pulsões individuais ou coletivas, que o investem dos seus próprios símbolos). O texto é uma permutação de textos, remete-nos para a intertextualidade, conceito válido ainda hoje amplamente: vários enunciados, tomados a outros textos, cruzam-se formal e/ou conceitualmente. Na sua tentativa de estabelecer uma tipologia dos “textos”, Kristeva introduz o conceito de ideologema, inseparável do conceito de intertexto: a função pela qual a história e a sociedade se lêem na produção do texto. O ideologema funciona à maneira dos topoi (“lugares”) de Aristóteles, como princípios reguladores subjacentes aos discursos sociais a que conferem autoridade e coerência. A preocupação do estruturalismo com os aspectos lingüísticos foi radical e redutora, deixando de fora muitos aspectos importantes e igualmente inscritos do texto literário, tais como a sexualidade, o gênero, a ideologia, o poder político, as influências culturais, etc., ficando também de fora as questões da literatura como prática social, como forma de produção não necessariamente esgotada pelo próprio produto. O primeiro a discutir a eficiência científica da atividade estruturalista foi Jacques Derrida. Aceita-se hoje sem grande discussão que a conferência que Derrida pronunciou em 1966 na Johns Hopkins University, “La structure, le sign et le jeu dans le discours des sciences humaines”, marca não só o primeiro momento do pós-estruturalismo nos Estados Unidos como o primeiro texto de crítica ao estruturalismo literário e cultural, que claramente aponta um novo caminho e que, por pretender ultrapassar o estruturalismo e por não se ter encontrado melhor termo até à data, se convencionou chamar pós-estruturalismo. A esse ensaio juntaríamos um outro: “Force et signification”, ambos os textos incluídos na coletânea: L’Écriture et la différence (1967). Noutro livro fundamental aparecido no mesmo ano, De la grammatologie, Derrida continua a sua crítica ao estruturalismo observando que, no pensamento ocidental e particularmente no pensamento francês, o discurso dominante continuava a ser o estruturalismo, permanecendo preso da sua estratificação dentro da metafísica, caracterizada pelo logocentrismo. A reclamação de uma textualidade dentro do texto e a crítica da “estruturalidade da estrutura”, isto é, a crença na centralização das estruturas de sentido de um texto, constituem teses que pertencem já a uma nova fase do pensamento (pós) estruturalista. Fora do contexto francês, os críticos mais visíveis do estruturalismo foram os críticos marxistas. Terry Eagleton, por exemplo, resume assim a sua posição: “Quais as conquistas do estruturalismo? Primeiramente, ele representa uma impiedosa desmistificação da literatura. (...) Numa palavra, o estruturalismo era espantosamente não-histórico: as leis da mente que ele dizia isolar – paralelismos, oposições, inversões, e todo o resto – agiam em um nível de generalidade bastante distante das diferenças concretas da história humana.” 25

25 (Teoria da Literatura – Uma Introdução, Martins Fontes, São Paulo, 1994, pp. 113 e 116).

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■ Anacronia: Hermenêutica

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Anacronia - Termo grego que provém de ana- contra e chronos – tempo.26 Refere-se às alterações entre a ordem dos eventos da história e a ordem em que são apresentados no discurso. Assim, o narrador pode antecipar acontecimentos ou informações (prolepse) ou recuar no tempo (analepse). O uso de anacronias pode ter vários motivos, como por exemplo a caracterização

etrospectiva de personagens, a reintegração de acontecimentos que não foram ocados no devido tempo ou manter a expectativa do leitor ao fornecer informações ntecipadas. Quando nos referimos a anacronias, devemos ter em conta a sua amplitude dimensão da história coberta pela anacronia) e alcance (distância no tempo a que se rojeta a anacronia - horas, meses, séculos).

As anacronias podem ser externas se a sua amplitude começa e acaba antes do nício da diegese da narrativa primária (narrativa a partir da qual as anacronias se efinem como tal); internas se a amplitude começa depois do início da diegese da arrativa primária; mistas se a amplitude começa antes do início da diegese da arrativa primária e termina depois dele. As anacronias internas podem ser eterodiegéticas quando se referem a uma personagem ou acontecimento que não igura na narrativa primária, ou homodiegética quando figura. Exemplo de uma obra que contém anacronias é A Sibila (1954) de Agustina essa Luís. A narração começa depois da morte de Quina e há um recuo no tempo ara contar a sua história, que está repleta de avanços e recuos na ordem dos eventos a história.

Anacronia e Sincronia: Hermenêutica e Pragmática

Na tomada de uma interpretação da Escritura há uma necessidade de se indicar ma interpretação que conecta o sentido histórico do texto com seu significado para o eitor atual em cada momento da história do texto.27

Quem é o legítimo sujeito da leitura da Bíblia, e, em correspondência a essa ergunta, quem é seu destinatário? É sujeito o teólogo ou bíblista, que sabe mais e lê Bíblia para o seu povo, ou é o “povo”, a comunidade crente, que, não obstante suas imitações naturais, lêem a Bíblia por si mesmo, inaugurando assim uma nova forma e leitura?

É importante observar o povo pobre como intérprete da Escritura, uma vez que s pobres são a imensa maioria da população do Planeta Terra. A falta dessa reflexão os faria recair no elitismo de uma interpretação elaborada nos centros da cultura rica oferecida, no melhor caso, ou imposta ao indefeso povo de Deus.

6 Vanda Rosa, ANACRONIA, E-Dicionário de Termos Literários, coord. de Carlos Ceia, ISBN: 89-20-0088-9, <http://www.fcsh.unl.pt/edtl> (23 de abril de 2009). 7 Cf. SIMIAN-YOFRE, Horácio (Org.). Metodologia do Antigo Testamento, pp 149-170.

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Parece, portanto, tarefa iniludível de uma reflexão hermenêutica que queira ser válida para a maioria das pessoas criar uma metodologia de leitura bíblica capaz de encontrar na Escritura não só a inspiração para uma ação política libertadora, quando necessária, mas, para além dessa finalidade, limitada teoricamente a um período de transição, estabelecer a pobreza como chave definitiva de leitura: uma pobreza entendida como dom de Deus, cultivada voluntariamente e não produto de opressão; oposta ao consumismo e ponto de partida de liberdade interior, de vontade de compartilhar os bens da terra, de respeito pelo universo.

■ Uma leitura contextualizada - O horizonte ou contexto

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Desde Schleiermacher, em hermenêutica, fala-se de horizonte, ou contexto.28 Ou melhor, trata-se, não apenas de um, mas de vários contextos. O horizonte do intérprete deve abarcar os vários horizontes.29

O contexto do texto

Em primeiro lugar, deve-se considerar o contexto do próprio texto. Nenhum exto cai do céu, nem mesmo o texto bíblico. Embora seja inspirado, tenha valor bsolutamente especial para quem crê, surge, mesmo assim, num determinado mbiente social, político, econômico, cultural e religioso. Assim entendido, pode-se dmitir que também, no caso das Sagradas Escrituras, estamos diante de um texto que e não de todo, ao menos em grande parte é um produto social. A literatura ntrodutória, em grande parte, ajuda a tomarmos consciência desse contexto. Ela nos roporciona a oportunidade de entrarmos em contato, tanto quanto isso é possível, om as realidades concretas dos tempos bíblicos.

Compreende-se, assim, inclusive a importância de certas obras que parentemente não passariam de curiosidade. É caso de um artigo sobre a técnica grícola no plantio de trigo nos tempos bíblicos.

Essa pesquisa, que o autor apresenta nesse breve artigo, constitui-se numa chave ara a compreensão da parábola do semeador (Mc 4,3-9 par.), que até então mais arecia um enigma do que uma parábola, levando as pessoas a lerem com mais nteresse, não a parábola propriamente dita, mas a alegoria dos terrenos que segue Mc 4,13-20).

Este foi apenas um exemplo bem individualizado. Na verdade, existe atualmente ma literatura muito ampla sobre todos os aspectos da realidade dos tempos bíblicos. sso nos permite ter um conhecimento bastante seguro dos processos sociais, olíticos, econômicos e culturais das diversas épocas da história bíblica. O seja, é ossível identificar o chão em que o texto bíblico brotou.

8 Cf. CORETH, E. Cuestiones fundamentales de hermenéutica. Barcelona: Herder, 1972, specialmente o capítulo IV: El horzonte de la Intelección, p. 95-106. 9 RABUSKE, I. J. Teocomunicação, Porto Alegre, v. 37, n. 156, p. 249-258, jun. 2007.

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O contexto do leitor Toda essa atenção em relação ao contexto bíblico, contudo, não basta por si só. No mínimo torna-se necessário considerar ainda o contexto de quem está lendo a Bíblia. É o contexto do leitor, de quem atualmente está interrogando o texto bíblico e seu contexto. Assim como é fundamental o conhecimento do contexto bíblico, é também indispensável que o leitor tenha consciência do contexto atual, também em suas dimensões sociais, políticas, econômicas e culturais. Não se trata, contudo, de simplesmente armazenar informações sobre a atualidade. A informação precisa ser trabalhada com um adequado instrumental de análise. Sem isso, corre-se o perigo de proceder a uma leitura inadequada ou inclusive ingênua da realidade. Conseqüentemente, as perguntas que, a partir do contexto atual, forem dirigidas ao texto bíblico, correrão também o risco de serem irrelevantes, impertinentes ou ingênuas. Logo, torna-se necessário adquirir um mínimo de instrumentos críticos de análise da realidade atual. Desse modo, poderá ocorrer um diálogo frutífero entre o contexto do leitor ou do grupo de leitores, e o contexto bíblico. O resultado poderá ser que, examinando determinado texto, surjam ou se realcem aspectos até então completamente ignorados ou julgados sem importância alguma. A análise de conjuntura pode tornar-nos sensíveis aos fenômenos de exclusão e marginalização, bem como de dominação e opressão. O texto não é univocamente parcial ou imparcial, sendo por isso importante que, a partir da compreensão do contexto atual, se possam dirigir perguntas adequadas ao texto. Tais perguntas poderão colaborar na identificação de aspectos que, numa leitura superficial, poderiam permanecer inexpressivos, ou mesmo poderiam inclusive passar despercebidos. E é extremamente importante que, na leitura, possa emergir também a voz dos subjugados pelo sistema sóciopolítico da época. Para isso, é decisiva a consciência que o intérprete tem do seu lugar social, ou do lugar social, a partir do qual aborda o texto. Quanto à produção literária, a rigor só existem dois contextos possíveis para o surgimento de um texto: o das classes dominantes e o das classes subalternas. Há textos bíblicos que têm seu lugar vivencial nas classes menos privilegiadas, até mesmo nas marginalizadas e excluídas. Há outros, cuja origem está nas classes dirigentes. Há textos, ainda, que, no processo de transmissão, sofreram influência de um e de outro ambiente. Assim sendo, toda a atenção é necessária, para que se possa descobrir com mais rigor possível, qual a origem social do texto. É possível inclusive identificar características da literatura produzida em cada um desses contextos.

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7. O Sitz im Leben

■ “Sitz im Leben” é uma expressão alemã, geralmente traduzida por setting in life ou situação na vida. De forma simples, pode-se dizer que ela descreve para que ocasiões certas passagens bíblicas foram escritas, uma questão ligada aos “gêneros literários” – a Sitz im Leben que um gênero literário tem na comunidade e a Sitz im Leben que essa comunidade tem na história.

A determinação da situação sociocultural ou somente literária do gênero literário em pauta é o ponto mais interessante e delicado da crítica do gênero literário.30

O pressuposto dessa determinação é a hipótese de que o texto está ligado de alguma forma a circunstancias culturais, sociais, econômicas, políticas e religiosas. Não há textos de tal modo neutros que não acusem suas “intenções” de modo muito concreto. A determinação da situação sociocultural de um gênero literário apóia-se em acurada crítica da forma de diversos textos, com particular atenção a seu horizonte literário, e em conhecimento suficiente do universo do texto. ■ O Texto

está situado dentro de uma história ■ O

Universo do Texto

■ O Texto situado em seu Contexto

Texto

O universo do texto é o conjunto das circunstâncias do mundo extrabíblico (momento histórico-político, situação econômica e social, tendências religiosas e culturais) que ajudam a entender seu significado e intenção.

30 Cf. SIMIAN-YOFRE, Horácio (Org.). Metodologia do Antigo Testamento, p 102 ss.

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O conhecimento do universo do texto não se atinge somente a partir do texto sob análise, mas também requer conhecimento da história política, religiosa, institucional do Antigo Testamento ou do Novo Testamento. Esse conhecimento exige familiaridade com os diversos textos da Bíblia e do mundo antigo, e alcança-se mediante a bibliografia secundária (estudos monográficos sobre problemas históricos, culturais, econômicos, etc.). Uma vez que se analisa o Sitz im Leben de um texto bíblico, juntamente com outras análises teológico-gramatical, se poderá retirar a sua mensagem para a atualidade, porque sendo o contrário, o texto perde o seu sentido. Assim, deve-se excluir qualquer forma de fundamentalismo, colocando o texto bíblico em risco de não atingir o seu fundamento último.

8. Estrutura da Exegese Novos rumos na pesquisa bíblica 31

O campo da pesquisa bíblica tem se modificado consideravelmente nas três últimas décadas. Não há mais a exclusividade dos modelos históricos regendo o conjunto das disciplinas que compõe a pesquisa bíblica. Uma pluralidade de métodos e teorias tem se apresentado entre nós, beirando uma quase fragmentação dos estudos. Fronteiras disciplinares e geográficas se diluem, e novos paradigmas são afirmados. De todos os lados, o que vemos no campo da pesquisa bíblica pode ser descrito como um período de transição paradigmática. Esta situação não é peculiar à pesquisa bíblica, mas se insere no quadro maior de revisão paradigmática nas ciências humanas, descrita como virada lingüística, paradigma da complexidade, Pós-Modernidade, etc. Neste breve palavra Zabatiero procura apresentar uma versão da história da pesquisa bíblica moderna, e oferece uma avaliação do quadro atual de nosso campo de pesquisa, reconhecendo o caráter transitório e parcial de suas afirmações e propostas. Como uma versão possível da história da pesquisa, este artigo se constitui, então, numa proposta de diálogo com vistas ao aperfeiçoamento de nosso trabalho como pesquisadoras e pesquisadores da Bíblia.

31 ZABATIERO, Júlio Paulo Tavares. Novos rumos na pesquisa bíblica. Dr. Júlio P. T. Zabatiero é professor de Antigo Testamento na Escola Superior de Teologia (EST). em São Leopoldo, RS. Este artigo oferece uma visão panorâmica dos fundamentos teóricos e epistemológicos da pesquisa bíblica nos períodos chamados de Modernidade e Pós-Modernidade. Estuda as relações da pesquisa bíblica com a filosofia do sujeito e com a razão instrumental, características de boa parte do pensamento moderno, descrevendo sinteticamente sua crise paradigmática no presente. Oferece, por fim, a partir das novas possibilidades abertas pela leitura feminista e pela leitura popular da Bíblia, a descrição de um possível novo paradigma para a pesquisa bíblica, centrado nos textos e na ação humana, a partir da incorporação das novas possibilidades epistêmicas contemporâneas. A intenção do artigo é contribuir para o diálogo teórico em curso no campo da pesquisa bíblica atual.

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1 - Acertando as contas com a Modernidade 1.1 - A exegese como crítica do poder religioso As primeiras comunidades cristãs, seguindo o exemplo de Jesus, praticaram uma leitura bíblica que criticava a redução da palavra de Deus aos dogmas do judaísmo oficial da época. A Reforma protestante retomou essa forma crítica de leitura da Bíblia, afirmando que o cristianismo oficial (Igreja = instituição) não poderia impor à Bíblia sua interpretação dogmática. A Igreja é quem deveria submeter-se à palavra de Deus emanada da Escritura e lida por um sujeito racional livre (o apelo de Lutero à consciência, que ajuda a fundar o sujeito moderno). Esse princípio crítico-emancipatório da Reforma foi uma das forças geradoras da Modernidade, que o ampliou com sua defesa da autonomia do ser humano diante de toda e qualquer autoridade que não a razão somente. A Modernidade desenvolveu o chamado paradigma do sujeito (ou, da consciência): fundado na distinção entre sujeito (racional), que dirige toda atividade de pensamento, e objeto (realidade), que se submete à ação epistêmica do sujeito. Nesse paradigma, através do método (razão instrumental), a objetividade da pesquisa é garantida, juntamente com sua cientificidade. A exegese moderna desenvolveu-se dentro dos limites do paradigma do sujeito: um sujeito racional interpreta metodicamente o sentido do texto (objeto), que deve corresponder tanto à intenção do seu autor quanto à coisa de que se fala no texto (referente). A atividade interpretativa foi dividida em duas grandes “ciências”: a hermenêutica, tributária da filosofia, que formula os princípios gerais da interpretação e da atualização do sentido, e a exegese, tributária da história, que formula os princípios metodológicos da descoberta do sentido do texto em seu próprio contexto. A exegese moderna, concebida como ciência crítica de tipo histórico, gerou dois modelos concorrentes:

1) O modelo histórico-gramatical que subordinou a crítica racional à autoridade do texto bíblico, buscando ser fiel à dimensão religiosa da Reforma. Diluiu, assim o aspecto crítico aceitando apenas os conceitos que não entrassem em contradição com o texto bíblico. Nele, a historicidade do texto bíblico foi entendida como um a priori: por ser fruto da ação de Deus, o que o texto diz é historicamente verdadeiro, mas o próprio texto é visto como que “suspenso” do juízo histórico. As tensões do modelo existem até hoje, ao lidar com questões como datação e autoria de textos bíblicos e, especialmente, com temáticas do “sobrenatural”, podendo incorrer nos extremos do fideísmo (a fé explica tudo), ou do fundamentalismo (a doutrina é a verdade absoluta).

2) O modelo histórico-crítico que aplicou ao texto bíblico a crítica racional histórica, buscando ser fiel à dimensão emancipatória da Reforma. Assim, a historicidade dos eventos narrados no texto bíblico não foi considerada como um a priori, mas deveria ser comprovada – questionava-se, em especial, tudo o que teria a ver com o “sobrenatural”, ou que entrasse em

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contradição com cânones da ciência. A historicidade do texto bíblico foi assumida de forma crítica: por estar na história, o texto tem uma história, e explicar essa história do texto está na base da pesquisa histórico-crítica. Também este modelo experimenta uma forte tensão até hoje, podendo incorrer nos extremos opostos do racionalismo (a razão explica tudo), ou do fideísmo.

1.2 - A crise da exegese bíblica moderna O paradigma do sujeito está em profunda crise já há algumas décadas. Diante da crise do paradigma do sujeito, a exegese histórico-crítica tem realizado um interessante trabalho de autocrítica: refletindo sobre as bases teóricas de sua metodologia; incorporando metodologia, conceitos e perspectivas derivadas das ciências sociais e das teorias lingüísticas e literárias; incorporando novas temáticas de pesquisa; refletindo mais intensamente sobre o seu lugar público na contemporaneidade. O modelo histórico-gramatical também teve de lidar com a crise paradigmática, e em sua autocrítica reafirmou a vinculação do sentido à intenção do autor – ainda que do autor último: Deus; aceitou de forma menos traumática a historicidade da produção dos textos bíblicos; releu o gramatical como literário; revisou as suas bases teóricas, a fim de escapar do fundamentalismo – distinguindo a validade do método da verdade confessional. 1.3 - Novos modelos de exegese moderna Além da crítica metodológica, a crise do paradigma moderno exigiu a crítica ao sujeito do saber. A exegese não ficou de fora desse processo e passou a afirmar novos sujeitos da leitura bíblica – pobres, mulheres, negros, hispanos, etc. –; novos espaços de pesquisa fora da academia e da igreja-instituição (igreja engajada, luta política, movimentos sociais); novos interesses críticos (libertação, fim do sexismo, racismo, empoderamento, etc.); novas metodologias de crítica; nova perspectiva para a exegese, que não foca mais o então dos textos, mas sua significação para os leitores e leitoras atuais. A leitura popular da Bíblia na América Latina, por exemplo, propõe um novo sujeito de interpretação bíblica: não mais a academia, mas o povo oprimido. Devolver a Bíblia ao povo e reencontrar o papel libertador da Bíblia nas lutas do presente se tornaram as prioridades do estudo da Bíblia. O texto é fonte de motivação para a vida e não fonte de sentido para a doutrina. A apropriação acadêmica da leitura popular da Bíblia, na América Latina, deu à luz a leitura sociológica, gestada também em diálogo com a vertente sociológica do modelo histórico-crítico no hemisfério norte. A leitura feminista da Escritura nasce nos vários lugares sociais e culturais de luta das mulheres pela dignidade, igualdade e justiça. Dirige sua crítica primariamente ao sexismo presente na sociedade e nos textos bíblicos. Propõe – nas palavras de Elizabeth S. Fiorenza – um paradigma “’retórico-emancipatório’ de

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interpretação bíblica, que entende a leitora da Bíblia como uma pessoa ‘pública’, ‘transformadora’, ‘ligada’, ou ‘integrada’, capaz de comunicar-se com diferentes públicos e de buscar transformações pessoais, sociais e religiosas com vistas à justiça e ao bem-estar”. Os novos modelos de leitura bíblica, porém, mantiveram-se dentro dos limites do paradigma da consciência em sua compreensão do sentido textual. Ou seja, não modificaram radicalmente a concepção sujeito-objeto, nem a dependência do sentido para com a intenção autoral e a referencialidade extratextual. Neste aspecto, pode-se dizer que solucionaram apenas parcialmente a crise paradigmática da Modernidade. Além desses, os dois modelos históricos continuam sendo praticados em ambientes teológicos. Apesar das distinções radicais, ambos mantêm em comum: a concepção de sentido (significado = intenção + referente) e texto (documento histórico); a tarefa de descobrir o sentido verdadeiro do texto em seu próprio contexto; a distinção entre exegese e hermenêutica, na qual esta depende daquela; a concepção de história, centrada na descrição dos fatos “como verdadeiramente ocorreram”; a filologia como guia para a análise semântica do texto. Os novos modelos, ainda dentro do paradigma do sujeito, permanecem tributários da exegese histórico-crítica: a) partilham do mesmo espírito crítico do modelo histórico-crítico, centrado na razão instrumental, embora com um interesse emancipatório claramente acentuado em distinção ao interesse científico do modelo histórico; b) baseiam sua interpretação do texto em resultados da exegese histórico-crítica. Diferem dos modelos históricos em: conceber a história (ciência) como crítica (não descrição) da história (factual), a partir dos novos sujeitos da leitura; subordinar a exegese à hermenêutica – a verdade buscada não é a do sentido do texto então, mas a transformação social no presente. 2 - A exegese como crítica da produção e difusão dos sentidos (superando o paradigma do sujeito, ou da consciência) Ao final dos anos sessenta, do século passado, a crítica do paradigma da consciência se expande a ponto de fazer surgir um novo paradigma, o da ação intersubjetiva. Aplicado à pesquisa bíblica, o paradigma da intersubjetividade postula que: o sentido não deve mais ser visto como correspondente à intenção do sujeito, nem ao referente do texto, mas como fruto da interação humana (ou seja, passamos da crítica do sujeito para a intersubjetividade crítica); a distinção entre hermenêutica e exegese se dilui, já que não se trata mais de dois objetivos distintos: saber o que o texto significava e, depois, aplicá-lo à realidade atual; ler é fazer dialogar entre si os discursos do presente com os do passado; a historicidade passa a ser vista, principalmente, como parte da cadeia sem fim da produção de sentido na interação humana, e não como uma cadeia objetiva de acontecimentos. Superar o paradigma do sujeito significa livrar a pesquisa do binômio sujeito-objeto e integrá-la à concepção da construção do saber como um processo intersubjetivo. A produção dos saberes será vista como fruto das ações e interações humanas em sociedade, sob o eixo da enunciação: agente (autor/a), “texto”, contexto,

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referente, leitor/a. A pesquisa do sentido será vista como um diálogo entre discursos, mediado pelo intérprete = co-enunciador. Nesse sentido, esta nova proposta se insere no fluxo histórico aberto pelas leituras feminista e popular da Bíblia, encontrando nelas suas parceiras privilegiadas (não únicas) de diálogo. O foco da exegese passa a recair sobre as múltiplas relações do processo de significação, não mais sobre o texto à luz da intenção e do referente. De acordo com Knierim, A principal tarefa da exegese será, portanto:

a) Interpretar este sistema [o sentido] como um todo, e não apenas um ou outro de seus aspectos.

b) Por mais difícil que possa ser, a exegese não deve simplesmente descrever o que o texto diz; deve também reconstruir as pressuposições sobre as quais ele se assenta. [...]

c) Uma vez que o texto reclama para si a verdade, ela [a exegese] deve verificar e avaliar esta reivindicação, precisamente porque o texto, ao apresentar-se como verdade, pede esta verificação.

Um modelo de interpretação dentro do novo paradigma pode ser a leitura sêmio-discursiva greimasiana. A teoria greimasiana em sua forma mais recente, centrada na enunciação, trata:

1. O sentido como fruto da interação em um contexto discursivizado e manifestado por textos.

2. A interpretação como um processo complexo que focaliza as relações entre texto, autor, leitor e contextos. O método de leitura é centrado no percurso gerativo do sentido e visa analisar o processo de produção, circulação e interpretação dos sentidos, não apenas o resgate do sentido preso no texto. As perspectivas interna e externa da leitura se complementam, e a história “real” entra de novo no processo interpretativo, tanto em relação à época do texto, quanto à da leitora ou leitor do texto.

Na leitura crítico-discursiva, a atualização (hermenêutica) do texto não é vista como um passo posterior ao resgate do sentido original do texto (exegese), mas perpassa todo o processo interpretativo. Os outros modelos não são negados, na medida em que tratam adequadamente de outros aspectos da pesquisa (autoria, referente histórico, crítica do sujeito da leitura, formas de elaboração e estruturação dos textos), são, porém, relocalizados no conjunto da mesma. Apresenta-se, de forma muito sintética, o campo da pesquisa bíblica à luz do paradigma crítico-discursivo:

■ As críticas genéticas da exegese histórica continuam indispensáveis para a explicação do processo de produção do texto ao longo da história e para a

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reconstrução das lutas discursivas e práticas em Judá e Israel (o que é indispensável para o estudo das diversas correntes traditivas e processos redacionais envolvidos na produção de idéias e de textos), mas não são necessárias para a compreensão do sentido do texto propriamente dito (seja em sua forma final, seja nas suas reconstruções hipotéticas), na medida em que o sentido não está mais determinado por sua relação, seja com a intenção do autor, seja com o referente extralingüístico. A pesquisa especificamente histórica não estaria centrada nos fatos encobertos pelas fontes, mas na história já interpretada através das fontes. Um enfoque mais global da história seria bem-vindo, rompendo com as fronteiras rígidas e desnecessárias entre história factual, história política, história da religião e história cultural. Anular-se-ia, assim, tanto o dualismo entre o “mínimo historicamente assegurado e o máximo querigmaticamente confessado” como o abismo entre passado e presente: [...] a história emerge de tradições, nas quais os limites da relação do passado com o presente são ultrapassados: o passado torna-se consciente enquanto tal, adquire uma qualidade temporal em seu conteúdo experiencial, fornecendo, assim, com essa nova qualidade temporal, novos elementos de compreensão da dimensão temporal da vida humana prática.

■ Uma das aporias da teologia bíblica recente é o seu status perante a religião

de Israel. Albertz, por exemplo, afirma a história da religião como disciplina viável, no lugar da teologia bíblica. Schmidt escreve sua Fé do Antigo Testamento como um meio-termo entre teologia do AT e história da religião de Israel. Na leitura discursiva, a religião praticada é o significante da teologia, que é o significado da religião. Não há oposição, mas complementaridade – uma não existe sem a outra. Religião vivida é religião significada, ou, na linguagem de Foucault, uma prática discursiva. A teologia bíblica passa, então, a priorizar os processos de construção de significado da fé vivida e as formas como esses significados se relacionam entre si na Escritura. Rolf Knierim é um dos autores que já têm proposto, no âmbito do paradigma histórico-crítico, este tipo de metodologia para a teologia bíblica. Duas obras recentes, no campo da Teologia do Antigo Testamento, por exemplo, tentam lidar com as novas possibilidades pós-paradigma do sujeito – as teologias de W. Brueggemann e E. Gerstenberger.

■ A disciplina de introdução à Bíblia teria como objeto os textos bíblicos

enquanto significantes, pesquisando, então: sua localização nas formações discursivas e ideológicas ao longo da história do povo de Deus (Antigo e Novo Testamentos) – que inclui as questões de autoria, datação, fontes, transmissão, redação e canonização, bem como relações interculturais; e sua configuração retórica – prosódia, estilística e argumentação (que inclui as questões literárias); e sua configuração intertextual e interdiscursiva (não

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restrita aos textos canônicos, nem aos textos do povo de Deus) – inclui as questões da história das tradições e dos processos de leitura intrabíblica.

■ A geografia do mundo bíblico visará à compreensão da discursivização do

espaço, ou seja, da atribuição sócio-cultural de sentidos ao território ocupado em sua seqüência temporal. Em outros termos: os significantes geográficos (território e clima – com seus derivados) serão estudados em sua relação com os significados geo-antropológicos dos quais são expressão – o trabalho de Alt pode ser visto como um precursor deste modelo. Milton Santos dedicou sua carreira acadêmica à construção de uma teoria geográfica do espaço, na qual discute a ontologia do espaço em relação com a ação humana em sua temporalidade, e a racionalidade do espaço e suas transformações, incluindo as relações entre o global e o local, que pode servir como referencial para a geografia bíblica.

■ A arqueologia tratará os artefatos como diferentes significantes dos discursos

histórico-culturais, sujeitos a regras de interpretação discursiva. Segundo Pedro Funari, [...] a cultura material pode ser concebida como constituída por uma série de signos metacríticos, signos cujo sentido mantém-se radicalmente disperso por uma cadeia aberta de significantes-significados. O sentido do registro arqueológico, nesta perspectiva, não se reduz aos seus elementos constitutivos, mas o que se busca são as estruturas e os princípios que compõem essas estruturas, subjacentes a tangibilidade visível da cultura material. A análise visa, assim, descobrir o que está oculto nas presenças observáveis, levar em conta as ausências, as co-presenças e co-ausências, as semelhanças e diferenças que constituem o padrão da cultura material em um contexto espacial e temporal específico.

■ A área em que o novo paradigma provocaria uma transformação mais radical

seria a do ensino das línguas bíblicas. No paradigma do sujeito, o ensino de línguas era identificado com o estudo da gramática, centrado na morfologia. A sintaxe e a semântica sempre vinham depois do estudo morfológico. No jargão da lingüística, era um estudo da língua (sistema estático) e do significante (ou plano da manifestação) e não do discurso (língua em ação), do significado (ou plano do conteúdo). Servia bem ao modelo histórico, na medida em que fornecia boa base para a crítica textual e para a análise do conteúdo textual – centrada na semântica das palavras. No paradigma intersubjetivo, o eixo do processo é a enunciação. Passam a ser priorizados: a) o mundo-da-vida (cultura) constituído de discursos – que estabelece os limites e possibilidades da significação e comunicação; b) a estruturação sintático-semântica do texto (pois não temos mais a fala das línguas antigas); c) a retórica estilística e argumentativa da língua em uso. Neste caso, os dicionários teológicos e as “teologias bíblicas” seriam ferramentas mais úteis

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do que as tradicionais gramáticas (que seriam usadas como obras de consulta e não como manuais). Os livros-texto de grego e hebraico passariam, a seguir, a lógica seqüencial “cultura-discurso-gramática”.

Podemos destacar alguns ganhos para a pesquisa bíblica que decorrem de superar o paradigma do sujeito: a) Teríamos viabilizadas uma boa dose de unidade teórica e metodológica, bem como a pluralidade de enfoques e interesses; b) simultaneamente, porém, abrir-se-iam as portas para a inter e a transdiciplinaridade. Pelas vias da ação e do discurso podem se estabelecer relações fecundas com as demais divisões do campo teológico e com as ciências humanas, cuja mediação viabilizaria o diálogo com as ciências “naturais”; c) fé e razão não seriam mais vistas como antagônicas, mas como distintos olhares discursivos para a realidade – dilui-se o risco de fideísmo ou racionalismo. Há que se lembrar que, em ciências humanas, a mudança de paradigmas não significa que os anteriores não tenham mais qualquer validade. Os paradigmas anteriores devem ser incorporados pelo novo, que deve tirar proveito dos avanços que cada uma deles possibilitou. Um novo paradigma não é um começar “do zero”, nem um reinventar da roda. Da mesma forma, um novo paradigma não se consolida mediante a intenção de alguns e algumas pesquisadoras. Começa assim, mas precisará ser testado e aplicado amplamente, até que encontre, ou não, ampla aceitação. Nesse sentido, pensa-se que alguns rumos se impõem: em um período de transição paradigmática, estudo intenso e “certezas incertas” são companhias constantes – não é possível se fazer juízos de valor contundentes. Há que se abrir ao novo, sem perder a história da nossa disciplina – a crítica aos modelos anteriores não pode ser totalisante, mas destacar os limites e possibilidades dos mesmos. É necessário abrir-se ao diálogo, sem perder a convicção previamente formulada, ambas atitudes indispensáveis para o avanço da ciência que quer estar a serviço de Deus e da sua criação. Cooperação, ao invés de concorrência, deveria ser a filosofia de trabalho, pois em um momento de transição como o nosso não existem mais modelos únicos e fechados, mas diversas contribuições são necessárias para a consolidação do paradigma emergente. Como ciência a serviço, uma renovada paixão pela Palavra tornar-se-ia uma exigência ímpar – não como uma busca “moderna” da verdade, mas como um colocar-se à disposição da palavra que liberta e transforma integralmente. Por fim, a pesquisa bíblica deveria ser vista como um momento da ação cristã libertadora hoje – e esta seria a sua principal prioridade.32

32 Cf. as referências utilizadas por ZABATIERO: FIORENZA, Elisabeth S. Rhetoric and Ethic: The Politics of Biblical Studies. Minneapolis: Fortress Press, 1999. ______. Sharing her Word: Feminist Biblical Interpretation in Context. Boston: Beacon Press, 1998. ______. Wisdom Ways: Introducing Feminist Biblical Interpretation. Maryknoll: Orbis Books, 2001. FOUCAULT, M. As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas. São Paulo: Martins Fontes, 1981. ______. A ordem do discurso. São Paulo: Loyola, 1996. ______. O que são as luzes? In: MOTTA, M. B. da (Org.). Arqueologia das ciências e história dos sistemas de pensamento. Rio de

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EXEMPLOS: Tema: “HÁ ESPERANÇA PARA O TEU FUTURO” Texto bíblico: Jeremias 31.16-17 Introdução O futuro sempre foi objeto de preocupações das pessoas de todas as épocas e lugares. Desde a mais remota antiguidade, sempre tem havido um fascínio pelas coisas relacionadas ao futuro. Atualmente a humanidade está preocupada com o futuro. Surgem indagações: “Como será o nosso mundo daqui a cinco anos ou dez?” “Que mundo nossos filhos e netos estarão vivendo?”

Janeiro: Forense Universitária, [s.d.]. p. 335-351. GREIMAS, Algirdas Julien. Da imperfeição. São Paulo: Hacker Editores, 2002. ______. On Meaning: Selected Writings in Semiotic Theory. Minneapolis: Univ. of Minnesota Press, 1987. ______; COURTÉS, Joseph (Ed.). Sémiotique: Dictionnaire raisonné de la théorie du langage. Paris: Hachette, 1986. Tome 2. ______; COURTÉS. Joseph. Dicionário de semiótica. São Paulo: Cultrix, 1989. ______; FONTANILLE, Jacques. Semiótica das paixões. São Paulo: Ática, 1993. FUNARI, Pedro P. Lingüística e Arqueologia. DELTA Revista de Estudos de Lingüística Teórica e Aplicada, São Paulo, v. 15, n. 1, p. 161-176, 1999. HABERMAS, Jürgen. El discurso filosófico de la modernidad. Madrid: Taurus, 1989. ______. Concepções da Modernidade: um olhar retrospectivo sobre duas tradições. In: HABERMAS, J. A constelação pós-nacional: ensaios políticos. São Paulo: Littera Mundi, 2001. p. 167-198. ______. O que é a pragmática universal? In: HABERMAS, J. Racionalidade e comunicação. Lisboa: Edições 70, 2002. p. 9-102. ______. Para uma crítica da teoria do significado. In: HABERMAS, J. Racionalidade e comunicação. Lisboa: Edições 70, 2002. p.149-182. MESTERS, C. Por trás das palavras: um estudo sobre a porta de entrada no mundo da Bíblia. Petrópolis: Vozes, 1974. v. 1. KNIERIM, Rolf. A interpretação do Antigo Testamento. São Bernardo do Campo: Editeo, 1990. p. 10s. KNIERIM, R. Criticism of Literary Features, Form, Tradition, and Redaction. In: KNIGHT, D. A.; TUCKER, G. M. (Ed.). The Hebrew Bible and its Modern Interpreters. Philadelphia: Fortress Press, 1985. p. 123-166. 33 Novos rumos na pesquisa bíblica. ______. A interpretação do Antigo Testamento. São Bernardo do Campo: Editeo, 1990. OLIVEIRA, Manfredo Araújo de. Reviravolta lingüístico-pragmática na filosofia contemporânea. São Paulo: Loyola. 1996. PIXLEY, J. Toward a Militant Biblical Scholarship. Biblical Interpretation, Leiden, IV/1, p. 72-75, 1996. RENDTORFF, R. The Paradigm is Changing: Hopes and Fears. Biblical Interpretation, Leiden, I/1, p. 34-53, 1993. RORTY, Richard. A filosofia e o espelho da natureza. Lisboa: Dom Quixote, 1988. RÜSEN, J. Razão histórica: teoria da história: os fundamentos da ciência histórica. Brasília: Editora UnB, 2001. SANTOS, M. A natureza do espaço. Rio de Janeiro: Hucitec, 1997. SEGOVIA, F. F. Decolonizing Biblical Studies: A View from the Margins. Maryknoll: Orbis Books, 2000. SEGOVIA, F. F.; TOLBERT, M. A. (Ed.). Teaching the Bible: The Discourses and Politics of Biblical Pedagogy. Maryknoll: Orbis Books, 1998. THISELTON, A. C. New Horizons in Hermeneutics: The Theory and Practice of Transforming Biblical Reading. Grand Rapids: Zondervan, 1992.

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Explicação do Texto Ao lermos a Palavra de Deus, descobrimos que há esperança para o nosso futuro. Jeremias foi um profeta que viveu em dois períodos distintos da história de Judá, cortados pelo ano de 609 a.C., data da morte do rei Josias. Os anos que antecedem a este acontecimento estão marcados pelo sinal de otimismo: independência política e prosperidade, bem como a reforma religiosa. Os anos que se seguem constituem período de rápido declínio. Judá se verá dominado, primeiro pelo Egito, depois pela Babilônia. As tensões internas e as lutas de partidos vão acompanhadas pelas injustiças sociais e por nova corrupção religiosa. O povo vai caminhando rumo ao seu fim. No ano 586 Jerusalém cai em poder dos babilônios e o reino de Judá desaparece definitivamente da história. Jeremias viveu esses momentos fortes, junto ao povo de Deus. Sua pregação era um convite ao arrependimento e a uma volta para Deus. Mas o povo continuava inveterado na prática do mal e depois de todo empenho, Jeremias viu o povo de Deus sendo arrastado como gado para o cativeiro da Babilônia. Lá aquele povo sofreu humilhações atrozes, muitos perderam a fé, a motivação para viver e até a esperança. A prova disto está retratada no Salmo 137. É numa conjuntura adversa que se ouve a voz calorosa do servo de Deus alentando a alma daqueles judeus aflitos, apresentando-lhes uma mensagem de ânimo e restauração das forças: HÁ ESPERANÇA PARA O TEU FUTURO. 1. HÁ ESPERANÇA QUANDO SE TÊM OBJETIVOS DEFINIDOS E SINAIS

QUE SIRVAM PARA BALIZAR O CAMINHO (V. 21) A) A causa do declínio de uma pessoa ou de um povo é a perda do rumo pelo

caminho certo. B) O poste é um sinal de referência; o marco sinaliza, identifica. C) As coisas não acontecem como por um toque de mágica. 2. PARA SE EXPERIMENTAR A REALIDADE DA ESPERANÇA, HÁ QUE

SE TER A PALAVRA DE DEUS PARA DIRIGIR A VIDA (V. 33) A) A Palavra de Deus é fonte de luz e de vida. B) Os judeus voltaram as costas à Palavra de Deus. Não gostavam mais dela; a

desprezaram... C) A obediência ao que Deus ensina em sua Palavra é fundamental para o êxito do

viver. D) O Evento Jesus Cristo é o referencial, o sinal, o marco, para uma vida bem

sucedida. Ele é a Palavra de Deus.

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3. É PRECISO EXPERIMENTAR A GRAÇA MARAVILHOSA DO PERDÃO

DE DEUS EM NOSSAS VIDAS (V.34) A) Deus é perdoador e quer a nossa felicidade e a alegria reinando em nossos

corações. B) Havia pessimismo e mal estar no meio do povo, mas eis que Deus derrama uma

chuva de pétalas sobre o coração daquela gente, visando restaurar o ânimo naqueles corações endurecidos e separados do Senhor.

C) Deus é maravilhoso e concede-nos a plena alegria de sua paz e do seu perdão. CONCLUSÃO Hoje, para quem está em Cristo Jesus não pode temer o futuro. Em Cristo somos perdoados por Deus e acolhidos na força do seu Espírito. Jesus é a concretização da esperança que tanto aguardavam os crentes do Antigo Testamento.

Prof. Nelson Célio de Mesquita Rocha

EXEGESE DE MATEUS 13.31-32 TEMA: “A VIDA QUE BROTA DA MORTE”

Em cumprimento parcial às exigências da disciplina EXEGESE NO NOVO

TESTAMENTO

■ Por: Arnildo, Darly, Eduardo, Giovani, Nilson, Paulo César e Wellington ■ SUMÁRIO

I. INTRODUÇÃO 03 II. LEITURA SINCRÔNICA 1. Preparação do Texto 2. Análise Lingüístico-Semântica 3. Estrutura Literária

04 04 07 12

III. LEITURA DIACRÔNICA

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IV. ANÁLISE CONTEXTUAL a) Contexto Próximo b) Contexto Remoto c) Contexto Canônico

19 19 22 25

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V. TEXTO E SUA COMUNIDADE 26 VI. ATUALIZAÇÃO 27 VII. CONCLUSÃO 29 VIII. BIBLIOGRAFIA 30

2. Análise Lingüístico-Semântica Léxico

PAL. TEXTO RAIZ TRADUÇÃO DA RAIZ αγρω ajgrovvς campo, terreno; aparece 36 x no N.T. Αλλην alloς outro/a (155) ανθρωπος ====. ανθρωπος homem; ser humano. αυτοις aujtovς ele(a); mesmo(a) 5593 αυτου aujtovς ele(a); mesmo(a) 5593 ο oJ, hJ, tov o / a αυτου aujtovς ele(a); mesmo(a) 5593 αυξηθη aujxavnw eu cresço; eu aumento 22 βασιλεια basileuvς rei 115 δε . δε conj. enc. Mas, porém, no entanto; e,

também, 398. δενδρον . δενδρον árvore 25 ελθειν jevrcomai eu vou; venho 632 εν . εν dat em; entre; dentro de, no meio de; com;

por εσπειρεν speivrw eu semeio 52 εστιν eijmiv eu sou 2.462 γινεται givnomai eu me torno, venho a ser 665 η jovς o(a) qual; que 1.409 και . και conj e; mas; a saber; adv também; a ponto

de κατασκηνουν kataskhnovw viver, morar, aninhar-se κλαδοις klavdoVς ramo(a), ramagem 11 κοκκω kovkkoς semente, grão λαβων lambavnw eu tomo, recebo 257 λαχανων lavcanon hortaliça, verdura λεγων levgw eu digo, eu falo µειζον mevgaς grande 194

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µεν . µεν part correl muitas vezes sem tradução µικροτερον mikrovς pequeno(a), adv um pouco 46 Οµοια omoioς semelhante ον Jovς o(a) qual; que 1.409 οταν otan adv sempre que; quando ουρανου oujranovς céu(s) ουρανων oujranovς céu (s) παντων pa^ς todo(a); cada παραβολην parabolhv parábola, ilustração 50 παρεθηκεν parativqhmi eu preparo; coloco diante de πετεινα (aves) peteinovn pássaro, passarinho, ave σιναπεως sivnapi (sivnanti) mostarda σπερµατων spevrma semente,2.sobrevivente, descendentes,

filhos, τα . ? τα os (as) ? τοις . τοις dat.: às; loc.: nas; inst: com, pelas του . του Gen.: Da; Abl.: da; τω . τω Dat.: à; loc.: na; instr.: com, pela. των . των Gn: das; Ab: das των . των Gen.: das; Abl.: das ωστε . ωστε portanto, por isso, de modo que, a fim de

que. DIVISÃO POR CLASSE GRAMATICAL Substantivos

PAL. TEXTO RAIZ TRADUÇÃO DA RAIZ αγρω ajgrovvς campo, terreno; aparece 36 x no

N.T. ανθρωπος ====. ανθρωπος homem; ser humano. αυτοις aujtovς ele(a); mesmo(a) 5593 αυτου aujtovς ele(a); mesmo(a) 5593 αυτου aujtovς ele(a); mesmo(a) 5593 αυτου aujtovς ele(a); mesmo(a) 5593 βασιλεια basileuvς rei 115 δενδρον . δενδρον árvore 25

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κλαδοις klavdoVς ramo(a), ramagem 11 κοκκω kovkkoς semente, grão λαχανων lavcanon hortaliça, verdura ουρανου oujranovς céu(s) ουρανων oujranovς céu (s) παραβολην parabolhv parábola, ilustração 50 σιναπεως sivnapi (sivnanti) mostarda σπερµατων spevrma semente,2.sobrevivente,

descendentes, filhos, Adjetivos

Αλλην alloς outro/a (155) µειζον mevgaς grande 194 µικροτερον mikrovς pequeno(a), adv um pouco 46 ο oJ, hJ, tov o / a Οµοια omoioς semelhante ον Jovς o(a) qual; que 1.409 παντων pa^ς todo(a); cada πετεινα (aves) peteinovn pássaro, passarinho, ave

Verbos

αυξηθη aujxavnw eu cresço; eu aumento 22 ελθειν jevrcomai eu vou; venho 632 εσπειρεν speivrw eu semeio 52 εστιν eijmiv eu sou 2.462 γινεται givnomai eu me torno, venho a ser 665 κατασκηνουν kataskhnovw viver, morar, aninhar-se λαβων lambavnw eu tomo, recebo 257 λεγων levgw eu digo, eu falo παρεθηκεν parativqhmi eu preparo; coloco diante de

Classes variadas

δε . δε conj. enc. Mas, porém, no entanto; e, também, 398.

εν . εν dat em; entre; dentro de, no meio de; com; por η jovς o(a) qual; que 1.409 και . και conj e; mas; a saber; adv também; a ponto de µεν . µεν part correl muitas vezes sem tradução

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οταν otan adv sempre que; quando τα . ? τα os (as) ? τοις . τοις dat.: às; loc.: nas; inst: com, pelas

■ LEGENDA ■ u Substantivo ■ u Adjetivo ■ u Verbo ■ u Variadas Classes

Estrutura Literária A força da parábola está no contraste estabelecido pela figura da semente e da árvore. É interessante observar que o texto não apresenta um estágio intermediário, isto é, não descreve o desenvolvimento da semente até se tornar árvore, alias isso pouco importa na mente oriental. O mais importante para ele (o leitor oriental) é ver de um lado a “sementinha” morta e do outro lado o “esplendor” da árvore viva que acolhe. Baseado nisso, podemos traçar o seguinte gráfico: Estabelecimento do contraste O reino dos céus é semelhante Fase inicial Um grão (semente) mostarda Característica da Figura menor das sementes Fase final Quando cresce torna-se árvore É o caminho entre os dois extremos (morte e vida) é efetuado por Deus. São dois estágios naturais e inevitáveis, ou seja, uma semente de mostarda lançada na terra se tornará uma árvore. De igual modo Deus pode tornar a morte em vida. Uma outra aplicação a ser feita é que aquilo que aparentemente era inexpressivo - o movimento e ministério de Jesus - se tornaria em algo grandioso que abrigaria a muitos, ainda que tivesse que primeiro passar pela morte. SEMENTE = MORTE / ESTÁGIO INICIAL ÁRVORE = VIDA / ESTÁGIO FINAL III. LEITURA DIACRÔNICA Gênero literário (Crítica das Formas) O texto em si deixa claro que o gênero é Parábola, contudo esta conclusão não se limita a simples terminologia, se não entendermos o funcionamento deste recurso didático muito usado por Jesus.

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O que é então uma parábola? A palavra provém do termo grego παραβαλλω, que significa “lançar ou colocar ao lado de”. Assim, a parábola é algo que se coloca ao lado de outra coisa πθρθ efeito de comparação. A parábola típica utiliza-se de um elemento comum da vida natural para acentuar ou esclarecer uma importante verdade espiritual. A Escritura apresenta duas finalidades básicas das parábolas. A primeira é revelar verdade aos crentes com o intuito de deixar uma impressão duradoura, amiúde muito mais efetivamente do que um discurso comum. A outra finalidade parece diametralmente oposta a primeira; ocultar a verdade daqueles que endurecem o coração contra ela. (Mt 13.10,15). Sendo assim, caracteriza-se o gênero empregado na perícope como parábola. Forma Muito tem se discutido sobre a forma da parábola, discussões estas que indagam se uma parábola possui em sua mensagem somente um centro ou foco, e se os detalhes são relevantes para a mensagem. Jesus, ao interpretar as parábolas do Semeador e do Joio e Trigo (Mt 13), mostrou-nos a importância tanto do centro como dos detalhes. Deste modo, se pudermos extrair quaisquer interferências na interpretação das parábolas, a relação feita entre o foco/centro e os detalhes do texto, a possibilidade de aproximar da idéia original da mensagem será bem mais útil. Com isso segue-se a seguinte proposta de estruturação de parábola do grão de mostarda em Mateus:

Palavra do autor v. 31a Outra parábola lhes propôs dizendo:

Caracterização do Gênero v. 31b O reino dos céus é semelhante a um grão de mostarda

Adesão e ação v. 31c que um homem tomou e plantou no seu campo

Relevância do reino e seu poder de ação

v. 32a O qual, é na verdade, a menor de todas as sementes, e, crescida, a maior que as hortaliças ese faz árvore.

Centro da parábola e ação terapêutica da Igreja

v. 32b De modo que as aves do céu vêm aninhar-se nos seus ramos.

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Sitz im Leben Podemos fazer esta análise a partir de dois pontos de vista: 1o) A parábola relação aos seguidores de Jesus Jesus instaurou o Reino de Deus, reino de justiça que trás liberdade e vida para todos, a começar por aqueles que foram esmagados pela injustiça. Os pobres que dependem da justiça até para sobreviver, ouviram a sua palavra e viram a sua ação libertadora. Ficaram admirados e puseram-se a segui-lo, primeiro os discípulos depois a multidão. A coisa não era tão fácil. Tanto Jesus como seus seguidores começaram a enfrentar dificuldades, problemas, conflitos e até ameaças de morte. Nem todos querem a justiça, pois muitos conseguem abundância, prestígio, poder e riqueza as custas da injustiça. Para esses, a justiça só atrapalha. Em um ambiente como este Jesus usa o recurso da parábola para que aqueles que estão em meio a injustiça, não desanimem mas encontrem um lugar de repouso para renovar suas forças. Lutar pela justiça é como pingar uma gota d’água no deserto da injustiça. O Reino da justiça não vem por imposição mas pela ação inteligente daqueles que aderem ao projeto de Jesus, contribuindo para que o Reino de Deus seja relevante a serviço da comunidade dos injustiçados. 2o) A parábola em relação aos de fora Com a parábola Jesus quer afirmar que o grupo de seus seguidores se tornará o grande povo de Deus. Isso porque no momento em que foi proferida havia manifestações de dúvidas sobre a missão do jovem rabino. O grupo de seguidores de Jesus era uma “turba miserável” (J.Jeremias p.151) dos quais ninguém julgaria ser “a comunidade salvífica das núpcias de Deus” (J.Jeremias p.151). Jesus pretende dizer que Deus fará daquela pequena turma o grande povo de Deus que vai abarcar todas as nações. Jesus pretende dar destaque para o poder de Deus que transforma o inexpressivo em notável, a morte em vida. “Dos inícios míseros, dum nada para os olhos humanos, Deus realiza o seu reino poderoso que abarcará os povos do mundo” (J.J p.150) Mensagem Deus estava fazendo grande coisa na terra por meio de Jesus. A mensagem de Jesus estava reunindo um grupo de pessoas marginalizadas que seriam a comunidade idealizada por Deus para promover a justiça e acolher os injustiçados das diversas partes do mundo. O milagre da transformação já estava ocorrendo, isto é, aqueles insignificantes e exclusos eram arrebanhados e fortalecidos. Aquilo que parecia estar morto começa a dar sinais de vida; aquela pequena semente já apodrecida começava a germinar para se tornar grande e indispensável na tarefa de abrigar a muitos. Por trás de tudo isso está a ação de Deus. É ele que transforma a morte em vida, o fraco em forte, o pequeno em grande. Um reflexo dessa idéia da ação de Deus se evidencia no apóstolo Paulo que diz aos coríntios: “Deus escolheu as cousas loucas

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do mundo para envergonhar os sábios e escolheu as cousas fracas do mundo para envergonhar as fortes”. O agente da transformação é Deus, e nesse processo Ele age sem que os olhos percebam; é visível a fase inicial e a final, mas entre elas sabe-se que um milagre acontece. IV. ANÁLISE CONTEXTUAL Encontramos neste bloco textual (Mt 13.31,32) um relato que diz respeito ao Reino de Deus. Mas não é só isto. O texto possui o antes e o depois, possui também uma relação teológica com seu contexto bem como com toda a Escritura. O presente trabalho tem por fim mostrar a relação da perícope em epígrafe com seu contexto, seja ele próximo, remoto ou com a Bíblia. A) Contexto Próximo Trataremos aqui da relação do texto de Mateus 13.31,32 com seu meio mais próximo, mostrando que ele está totalmente amarrado aos seus vizinhos. Perícope Anterior A partir do assunto, podemos ver que há uma relação muito grande entre os textos. Compreendendo o bloco dos vv. 24-30, esta perícope é conhecida como a “parábola do joio”. A primeira relação está no fato de que ambas são “parábolas” - grego “ παραβολη∗ν ” - uma figura de linguagem encontrada na boca de Jesus. Grosseiramente falando, “é uma narração alegórica que encerra uma doutrina moral” [1]. Esta, por sua vez, tem como figuras ilustrativas o “joio” - grego “ ζιζα&νια ” - e o “trigo” - grego “ σι∼τον ” - e aquela diz respeito ao “grão de mostarda” - grego “ κο&κκω/ σινα&πεω" ” - é notório a qualquer pessoa o fato de que ambas as ilustrações parabólicas são relacionadas à agricultura, ao produto da terra, apontando inclusive, para o fato de que o contexto era o mesmo. Também o tema é o mesmo “Reino dos céus” - grego “βασιλει&α τω⎯ν ου∗ρανω⎯ν ” -. Na parábola do joio o tema aparece no primeiro versículo (v. 24) da perícope, semelhantemente à do grão de mostarda (v. 31). Percebe-se que se trata do mesmo tema entendendo assim o forte relacionamento entre os dois textos. Do ponto de vista gramatical, os dois textos começam com a mesma oração: “Outra parábola lhes propôs dizendo: o reino dos céus é semelhante…” - grego “ Αλλην παραβολη∗ν παρε&θηκεν αυ∗τοι∀ λε&γων: δοµοι&α ε∗στι∗ν ν& βασιλει&α τω⎯ν ου∗ρανω⎯ν ” - , evidenciando o mesmo tempo verbal e pessoa que passa a nortear o texto. Do ponto de vista da aplicação, também há uma relação entre as parábolas, a do “joio e do trigo” tratam dos problemas na implantação do reino, sugere a pergunta: “Por que tantos conflitos?” [2], já na seqüente parábola, a do “grão de mostarda”, a sugestão é: “Será que tudo falhou? Não, é grande a luta.” [3], uma mensagem de apoio e incentivo àqueles que lutam pela implantação do referido reino. 57

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Conclui-se que a perícope em epígrafe tem íntima afinidade com a sua precedente. Perícope Posterior Semelhantemente à perícope anterior (vv. 24-30) a posterior possui um grande grau de proximidade com a perícope analisada. Formada unicamente pelo v. 33, a, chamada, parábola do “fermento” apresenta de igual modo a anterior uma forte relação com a parábola do grão de mostarda. A começar pelo fato de que também o v. 33 diz respeito a uma parábola - grego “παραβολη∗ν ” - como no caso anterior. Se, diferentemente dos casos anteriores, a parábola do “fermento” - grego “ ζυ&µν/ ” - não trata ilustrativamente de derivados agrícolas (Joio e trigo, grão de mostarda), semelhantemente fala de algo que era do dia a dia da comunidade, “grão de mostarda” - “κο&κκω/ σινα&πεω" ” - e fermento eram extremamente comum até mesmo aos mais indoutos. Conclui-se portanto que os assuntos eram comuns. Do ponto de vista do tema, não há nada de novo, igualmente ao caso anterior, também a parábola do fermento fala do “reino dos céus” - “βασιλει&α τω⎯ν ου∗ρανω⎯ν ” - (v. 33, segundo hemistíquio). A observar pelo lado gramatical e da redação, também o narrador joga o discurso para a mesma pessoa (Jesus v. 1) e este se dirige ao mesmo auditório: grão de mostarda (v. 31 a): “Outra parábola lhes propôs dizendo…” - Αλλην παραβολη∗ν παρε&θηκεν αυ∗τοι⎯∀ λε&γων: - fermento (v. 33 a): “Disse-lhes outra parábola…”. - Αλλην παραβολη∗ν ε∗λα&λησεν αυ∗τοι⎯": - Observe que o redator final do texto não tem a mínima preocupação em relevar o destinatário do presente discurso devido sua confiança de que não há dúvidas de sobre quem se refere, é como se os textos tivessem uma vida própria mas ao mesmo tempo amarrados ainda ao início do discurso (v. 10). A partir deste fato, percebe-se que, além das pessoas serem as mesmas, também o tempo verbal das parábolas são iguais. Quanto a aplicação, há também uma forte relação entre as duas parábolas. Se na parábola do grão de mostarda há uma forte evidência de mostrar o crescimento do reino (as aves do céu que vem aninhar-se), na parábola do fermento também há o sentido do poder transformador do reino e de que o fermento faz tomar novos rumos a massa, rumo de crescimento. Não há dúvidas, as duas perícopes estão de mãos dadas e formam uma seqüência muito importante dentro do propósito do Evangelho da implantação do reino. 58

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Apêndice Observe a relação da perícope da parábola do grão de mostarda com seu contexto:

Parábola do joio Resistência ao reino Parábola da

mostarda Reino aberto para todos

Parábola do fermento

Reino em crescimento

Há uma seqüência lógica nos fatos amarrando-as umas as outras. B. Contexto Remoto (Livro) O presente capítulo, pretende mostrar a relação da perícope em epígrafe com o seu livro. O Evangelho não é um amontoado de idéias sem nexo, mas um trabalho idealizado, de modo que o texto possui um propósito dentro deste montante maior. Para tal, vejamos sua relação com seu capítulo e com todo o corpo do livro. Capítulo Mateus “agrupa aqui as 7 parábolas referentes ao reino dos céus” [4]. Parábola significava “lançar duas coisas semelhantes uma da outra; colocar uma coisa do lado da outra para estabelecer a semelhança ou distinção … seu objetivo era fixar as verdades nas mentes dos ouvintes” [5]. Como vimos, Jesus tinha um propósito todo pedagógico no uso das parábolas e Mateus as agrupa no capítulo 13 onde a parábola estudada exegeticamente se encontra. Observe o quadro:

Versíc. Parábola 01-23 Parábola do semeador 24-30 Parábola do joio e do trigo 31-32, 36-

43 Parábola da mostarda

33 Parábola do fermento 44 Parábola do tesouro 45-46 Parábola da pérola 47-50 Parábola da rede

Podemos ver que o texto estudado tem uma relação muito forte com o restante do capítulo. Abre-nos espaço até mesmo para compreendermos aqui estrutura uma quiástica: Observe o exemplo:

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Profissão comum - Parábola do Semeador

B Fonte de renda - Parábola do Joio

C Relativo ao campo - Parábola do Grão de Mostarda

D Trabalho doméstico - Parábola do Fermento

C’ Relativo ao campo - Parábola do Tesouro Escondido

B’ Fonte de renda - Parábola da Pérola

Profissão comum - Parábola da Rede Compreende-se que a parábola do Grão de mostarda é fundamental para a vivência do capítulo. Além de sua relação contextual quiástica, ela também está ligada pelo tema, pois, todas as parábolas falam do Reino de Deus e de fatos relacionados ao dia a dia dos ouvintes. Livro Mateus “registra de maneira explícita o ensino de Jesus quanto a ensinar por parábolas… …explicando até porque Ele fala por parábolas” [6] (Mt 13.34-35). É explicito a força do Evangelho nesta área e a perícope da exegese expressa sua relação com o restante do livro em ser uma parábola. Quanto ao tema - “Reino dos céus” “ βασιλει&α τω⎯ν ου∗ρανω⎯ν ” - da perícope, segundo um programa de computador com uma Chave Bíblica que correlaciona palavras, só no Evangelho é encontrado em 27 versículos tal expressão. Hei-los: Mateus 3.2; 4.17; 5.3, 10, 19; 7.21; 8.11; 10.7; 11.11; 13.11, 24, 31, 33, 44, 47, 52; 16.19; 18.1, 3, 23; 19.12, 14, 23; 20.1; 22.2; 23.13; e 25.1. Sem dúvidas, o texto de Mateus 13.31,32 segue a finca o assunto predominante no Evangelho. C. Contexto Canônico (Bíblia) “Jesus instaurou o Reino de Deus, Reino de Justiça que traz liberdade e vida a todos” [7]. A ênfase da instauração do Reino de Deus, assunto em pauta na perícope

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em epígrafe, para Storniolo não era reivindicação somente do texto nem também somente do Evangelho de Mateus, mas de todo o ministério de Jesus Cristo. Esta mesma perícope é também mencionada por Marcos 4.30-32 diferenciado apenas por detalhes como: este não faz questão de especificar que um homem plantou a semente, e usa a expressão Reino de Deus ao invés de Reino dos céus, a introdução é feita por uma pergunta de Jesus. E também por Lucas: 13.18-19 que também usa a expressão Reino de Deus, introduz pela pergunta de Jesus, e acrescenta que o plantio é feito em uma horta. Apesar dos detalhes, a essência é a mesma nos 3 Evangelhos Sinópticos. “A frase “vem as aves do céu e se aninham nos seus ramos” (v. 32), se encontra em diversos textos do Velho Testamento (Ez 17.23; 31.5; Sl 104.12; Dn 4.12,21). É semelhante a Dn 4.21 na LXX. Estas referências fornecem a explicação da parábola: Em Ez 17, a “árvore” é o novo Israel. Isto é o Reino dos Céus mencionado na parábola. Mas, em Ez 31 e Dn 4, a árvore representa os impérios do mundo gentio (Assíria e Babilônia) respectivamente. Desta maneira a parábola antecipa o desenvolvimento da igreja…” [8]. Possivelmente tais textos foram usados como pano de fundo para parábola confirmando assim sua relação com outras partes das Escrituras. V. TEXTO E SUA COMUNIDADE Para quem escreve Mateus? Como seria essa comunidade? Qual a relação do texto com a comunidade? São as perguntas levantadas e que nem sempre podem ser respondidas com precisão. Scheweitzer admite a Palestina ou a Síria como local mais provável para a comunidade mateana, apesar do Egito e Babilônia serem também candidatos para essa comunidade, porém em escala menor de probabilidade. Jerusalém é descartada pelo fato de que a língua grega não seria admitida, e muito menos textos diferentes dos originais. Pelo que nos parece, a comunidade de Mateus era afligida por carismáticos (uma espécie de falsos profetas), por isso, se tornara uma comunidade preguiçosa e cansada de esperar a vinda do Senhor (24.37-25.35). Havia algumas divisões na comunidade. Os mais fracos eram quase que desprezados (18.5-14). No entanto, essa comunidade era missionária, e, talvez aí se encaixa melhor a mensagem da parábola do grão de mostarda para a comunidade, que, mesmo insignificante, se torna uma grande árvore capaz de abrigar os pássaros cansados. VI. ATUALIZAÇÃO Podemos analisar a parábola em dois ângulos, que embora distintos, são complementares. Em primeiro lugar, “Através da parábola, Jesus ensina que o reino de Deus pode parecer sem importância e insignificante”[9], no entanto, esta nova proclamada por

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Ele provocou o maior impacto que o mundo conheceu. Os seguidores de Jesus eram formados por um seleto grupo de pescadores rudes, a quem foi outorgado essa mensagem do reino. De pessoas desacreditadas diante dos olhos humanos, surge o Reino de Deus. O pequenino grão se transforma em grande árvore. A única explicação plausível para o fato é o poder divino. Esta árvore então seria a Igreja (muitos teólogos assim defendem), pois a mesma brotou da morte de sua semente, de seu fundador; também tem a função magnífica de proporcionar alento e descanso aos cansados e oprimidos. A segunda questão é mais individual, pois a mensagem de Jesus se resume no seguinte: “Quem não tomar a sua cruz e vier após mim não é digno de mim. Quem acha a sua vida perdê-la-á; quem, todavia, perde a vida por minha causa, achá-la-á” (Mt 10.38-39). O reino de Deus é formado por indivíduos que acreditam nisso. Só podem fazer parte do projeto de expansão do reino pessoas que carregam a própria cruz. A questão da morte da semente pode estar teologicamente ligada com o fato de que, praticar o reino é questão prioritária. Alguém que faz parte do reino o coloca em primeiro plano. Sua própria vida é desvalorizada em favor do reino. Este é mais importante do que a própria vida. Quem faz parte do reino procura viver para dar alento às cansadas aves. Interessante que a partir disso é que se pode enfim abrigá-las, pois necessitam urgentemente de descanso. O próprio Paulo escreve referindo-se ao fato de que depois de conhecer o valor do reino não procurava mais fazer a própria vontade, mas sim a vontade de Deus, para expansão deste reino: “...Não sou mais eu quem vivo, mas Cristo vive em mim...” (Gl 2.20). Isto figura bem o a questão do entregar-se complemente de corpo e alma para o projeto de crescimento do Reino. Embora paradoxais, as duas conotações representam o reino divino, partindo de um interior individual para um alcance coletivo abrangente. As duas são enfáticas quanto a transformação. Sem transformação não existe reino. A transformação não parte do homem, é obra divina. A mensagem: de insignificante à relevante; o indivíduo: de defunto a alguém com vida. Nós cristãos contemporâneos é que precisamos acreditar mais no projeto divino que transforma o pequeno no grande, o insignificante em relevante, o nada em tudo, a morte em vida. VII. CONCLUSÃO A transformação na parábola do grão de mostarda é algo intrigante. Um grãozinho insignificante que dá vida á uma grande árvore que por sua vez têm a função de abrigar as aves do céu. Cremos que, ao longo deste trabalho gratificante, conseguimos responder (mesmo que com pressupostos e muitas vezes parcialmente) as perguntas levantadas no início. Nossa análise do texto também desafiou-nos a procurar demonstrar maior empenho na vivência cristã, e como não poderia deixar de ser, trouxe-nos também

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certo alento, pois nem sempre nos sentimos como árvores, prontos e dispostos para oferecer abrigo, porque muitas vezes, somos como as aves do céu que necessitam renovar suas forças para prosseguirem voando, e a mensagem cristã são os galhos nos quais podemos descansar.33

CONCLUSÃO GERAL Percorrer o caminho do estudo aprofundado da Escritura do Antigo Testamento constitui-se uma tarefa de grande valor. E sendo desta forma, precisa-se de muito esforço e tempo para ser investido nessa empreitada, no sentido de extrair do texto bíblico a sua mensagem real. O presente trabalho, ainda que conciso, procurou percorrer o caminho certo considerando que as obras consultadas de autores renomados, foram extremamente úteis, para que o estudante de teologia tenha plena habilidade. Uma tal habilidade que se junte com a devoção, com o intuito de preparar o leitor estudioso da Palavra de Deus a ser melhor conhecedor do que Deus quer para o ser humano nesta terra.

33 Cf. a bibliografia utilizada: BÍBLIA SAGRADA. Ed. Revista e atualizada no Brasil. Trad. João Ferreira de Almeida. Brasília-DF: CIA. Brasileira de Impressão e Propaganda, 1988. BÍBLIA VIDA NOVA. Ed. Revista e atualizada no Brasil. Trad. João Ferreira de Almeida. 13a ed.São Paulo: Ed. Vida Nova & Sociedade Bíblica do Brasil, 1990. BUENO, Silveira. Minidicionário da língua portuguesa. 6a ed. Ed. Lisa S/A: São Paulo, 1992. CHAVE BÍBLICA. Brasília: Sociedade Bíblia do Brasil, 1990. DAVIDSON, F. O novo comentário da Bíblia: Vol. I. Tradução de: The New Bible Commentary, Trad. Dr. Russell P. Shedd (Título orig. em inglês). 9a ed. São Paulo: Ed. Vida Nova, 1990. FEE & STUART, Gordon D. & Douglas. Entendes o que Lês? Um guia para entender a Bíblia com o auxílio da exegese e da hermenêutica. São Paulo: Ed. Vida Nova, 1986. FRIBERG, Barbara e Timothy, O Novo Testamento Grego Analítico. 1.a ed. São Paulo: Ed. Vida Nova, 1987. GINGRECH, F.W./DANKER, F.W. Léxico do NT. Trad: Júlio P.T. Zabatiero. São Paulo: Ed. Vida Nova, 1984. JEREMIAS, Joachim. As Parábolas de Jesus. Trad: João R. Costa, 7.a Edição, São Paulo: Ed. Paulus, 1976. KISTEMAKER, Simon J. As Parábolas de Jesus. Trad: Eunice Pereira de Souza. São Paulo: Casa Ed. Presbiteriana, 1992. STORNIOLO, Ivo. O Evangelho de Mateus: o caminho da justiça: série: Como Ler. São Paulo: 3a ed. Paulus, 1991. TASKER, R. V. G. Mateus: introdução e comentário. Série Cultura Bíblica. São Paulo 1a ed. Vida Nova. 1980. TRADUÇÃO ECUMÊNICA DA BÍBLIA: T.E.B. Trad. Ecumênica. 2a ed. São Paulo: Ed. Loyola, 1994. VIRKLER, Henry A. Hermenêutica: Princípios e Processos de Interpretação Bíblica. Miami,Flórida, E.U.A.: Ed. Vida Nova. 1987. ZUMSTEIN, Jean. Mateus o Teólogo. Coleção Cadernos bíblicos. São Paulo: Ed. Paulinas, 1990. pp 57-76.

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