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Wagner Martins
EXEGESE DO ANTIGO TESTAMENTOCOMENTÁRIO DO GÊNESIS CAP 3: 1-7
Trabalho realizado para cumprimento da disciplina Exegese do Antigo Testamento.
Faculdade Batista Brasileira2010
O texto
Bíblia TEB
Ora, a serpente era o mais astuto de todos os animais do campo que o Senhor havia feito. Ela disse à mulher: “Deus vos disse realmente: ‘não comerePis de todas as árvores do jardim'?..." A mulher respondeu à serpente: “Podemos comer do fruto das árvores do jardim, mas do fruto da árvore que está no meio do jardim, Deus disse: ‘dela não comereis e não a tocareis, para não morrerdes’”. A serpente disse à mulher: “Não, vossa morte não está marcada. É que Deus sabe que no dia em que dele comerdes, vossos olhos se abrirão e sereis como deuses, possuindo o conhecimento do bem ou do mau.” A mulher viu que a árvore era boa de comer, sedutora de se olhar, preciosa para agir com clarividência. Apanhou um fruto e dele comeu, deu-o também a seu homem que estava com ela, e ele comeu. Os olhos de ambos se abriram e souberam que estavam nus; Tendo costurado folhas de figueira, fizeram tangas para si.
Stuttgartencia
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João Ferreira de Almeida
Ora, a serpente era mais astuta que todas as alimárias do campo que o SENHOR Deus tinha feito. E esta disse à mulher: É assim que Deus disse: Não comereis de toda a árvore do jardim? E disse a mulher à serpente: Do fruto das árvores do jardim comeremos, mas do fruto da árvore que está no meio do jardim, disse Deus: Não comereis dele, nem nele tocareis para que não morrais. Então a serpente disse à mulher: Certamente não morrereis. Porque Deus sabe que no dia em que dele comerdes se abrirão os vossos olhos, e sereis como Deus, sabendo o bem e o mal.E viu a mulher que aquela árvore era boa para se comer, e agradável aos olhos, e árvore desejável para dar entendimento; tomou do seu fruto, e comeu, e deu também a seu marido, e ele comeu com ela. Então foram abertos os olhos de ambos, e conheceram que estavam nus; e coseram folhas de figueira, e fizeram para si aventais.
Introdução
O texto em questão trata, na tradição bíblica, da
entrada do pecado no mundo. O texto mostra como e por
quem o mal veio a terra e atingiu os seres humanos.
Por tradição, Gênesis 3 tinha a sua origem situada no
século X a.C. Esta data era fortemente aceita e justificada
pela teoria das fontes. E o texto em questão trata-se de
uma escrita Javista. Mas há divergência. Milton Schwantes,
por exemplo, tenta situar a origem do texto no século VIII
a.C. no contexto das polêmicas proféticas contra a idolatria.
Segundo Haroldo Reimer, a linguagem de Gênesis 3 é
uma linguagem mítica, isto é, “um evento imaginário é
retroprojetado para um momento das origens, o in illo
tempore. “
Divisão do Capítulo:
V. 1 – A apresentação do tentador
V. 2 a 5 – Diálogo entre o tentador e o tentado
V. 6 a 7 – O ato após ser tentado e às consequências.
Exposições das Divisões e Problemática
Convém a nós, primeiro, analisar o tentador. A bíblia
fala de uma serpente. Observemos, pois, que a serpente é
obra da mão de Deus (a mais astuta dos animais que Deus
criara). Quem é a serpente e porque ela esta atrelada à
imagem do mal? Para alguns estudiosos – como é o caso de
Reimer e Croatto – essa imagem da serpente vem do
Zoroastrismo persa do período. A serpente, como já se
sabe, neste relato trata-se de um símbolo. Mas os símbolos
têm vários sentidos, ele é polissêmico. Assim, é mister
saber que a serpente no oriente antigo também podia
significar muitas coisas. Dentre elas, eis algumas:
No Egito, era símbolo de poder e sabedoria.
Os Faraós governavam sob o símbolo da serpente.
Alguns estudiosos até falam de que a serpente no Éden
simboliza os faraós e que a escolha por ouvir à serpente
simboliza a aceitação da dominação dos reis sobre Israel.
A serpente também era símbolo de sabedoria e
fertilidade. E as mulheres estariam relacionadas com este
culto, daí o fato de a mulher ter sido seduzida pela
serpente.
Há, também, a questão do Zoroastrismo onde a
serpente era um símbolo negativo ligado à terra. Onde os
astros são valorizados, os elementos da terra sofrem
negações.
Assim, pois, o que temos de certeza é que a serpente
de forma alguma tem haver com a ideia de Satanás que a
igreja Cristã impôs.
O diálogo entre o tentado e o tentador é interessante.
Corrijo-me, pois, chamando não de tentado, mas de
tentada, pois o texto quer apontar a mulher como vítima e
causa da entrada do pecado no mundo.
A serpente tenta colocar na mulher uma dúvida sobre
Deus: “É assim que Deus disse?” (v.1) Questionando, então,
se Deus de fato dissera o que disse, abriria então a larga
porta para corrigir Deus e colocar o ser humano contra ele:
“Certamente não morrereis...”. Fica claro, pois, que o
intuito da serpente nos versículos de 2 a 5 é colocar o
homem contra Deus, querendo mostrar que o que Javé
disse não é bem o que de fato irá acontecer. Deus é
mentiroso, enganador, manipulador...
Mas o que vem a ser a árvore do bem e do mal? Não
que a árvore tinha fruto mal e, comendo do fruto mal, se
estivesse cometendo uma maldade; mas que, como diz
Santo Agostinho, o mal está em ter comido o fruto, isto é,
desobedecido à ordem de Deus.
O homem não desejou nenhuma natureza má ao
comer da árvore proibida, mas cometeu uma ação
má ao renunciar ao superior, pois superior a todas
as coisas criadas é o Criador, cujo mandado não
devia ser descumprido para comer do proibido,
ainda que fosse bom, porque renunciando ao
superior, se desejava uma coisa boa, mas contra o
mandado do Criador. (...) A árvore foi proibida a
Adão não porque fosse má, mas porque era bom
para o homem estar submetido a Deus. Proibira-o,
com efeito, com a finalidade de demonstrar-lhe
que a alma racional não tem por natureza ser
independente, mas deve estar submetida a Deus e
conservar, pela obediência, a ordem da sua
salvação e não violá-la pela desobediência. Eis por
que a árvore de que proibira comer Ele a chamou
de a “árvore da ciência do bem e do mal” ( Gn
2,9 ), para que, quando o homem o fizesse contra
a sua proibição, experimentasse a pena do pecado,
e, assim, conhecesse a diferença que há entre o
bem da obediência e o mal da desobediência. (Sto.
Agostinho)
Ainda que o fruto fosse bom, ter comido o fruto bom
sem a ordem de Deus, seria um ato mal. E foi esta a
façanha da serpente: ludibriar para que um ato mal fosse
feito.
Mas vale notar que o mito não coloca o mal como algo
essencial e intrínseco à humanidade; o mal foi fruto de uma
escolha, fruto de um ato de liberdade.
Como já sabe, aconteceu que o “fruto foi comido”, que
a curiosidade foi mais forte, que a tentação venceu. Vendo,
pois, que o fruto era bom, bonito e gostoso foi impossível
de resistir.
Conclusão
Ao meu pensar, porém, nada melhor para a
humanidade do que ter comido o fruto, cedido à tentação,
mergulhado na curiosidade. Somos seres livres e criativos,
e, por esta razão, porque não estendermos as mãos e
arrancarmos o fruto do pé? Ora, seria mais fácil que o fruto
não estivesse ali posto. Não era pra comer, pra que
plantou?
Comemos o fruto porque estava ali, bonito e gostoso.
E comemos – e eu haverei de continuar comendo – porque
“sou condenado a ser livre” (Sartre). A condenação não
veio após ceder à tentação, mas, já éramos condenados.
Não vejo a tentação como um problema. Repito: se
não era pra comer, porque colocou lá? Como diz o Oscar
Wilde: “Eu posso resistir a tudo, menos a uma tentação”.
Fato é que este texto é muito rico e que nos abre
varias possibilidades de interpretação. Penso que
deveríamos nos desvencilhar dessa interpretação ortodoxa
que, primeiro, coloca a mulher como culpada pela entrada
do pecado no mundo (coisa que Paulo já discordava pois
como ele mesmo disse, “o pecado entrou no mundo por um
homem, Adão.” (Rm 5:12), também deveríamos pensar
numa teologia da transgressão, colocando os textos pelo
avesso e tentando encontrar outros sentidos e outros
caminhos.
BIBLIOGRAFIA
AGOSTINHO. A Natureza do Bem. editora Sétimo Selo, p. 47.
Bíblia de Tradução Ecumênica, TEB, São Paulo: Loyola, 1994
REIMER, Haroldo; CEBI-GO. Gênesis. Casa comum: espaço
de vida, cuidado e felicidade. São Leopoldo: Cebi, 2007, p. 25-29
KIDNER, Derek. Gênesis: introdução e comentário. São
Paulo: Vida Nova, 2004, p. 62-65.