Existe Bolha no Mercado Imobiliário Brasileiro?

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White Paper - Flaws of Finance

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  • 1762

    EXISTE BOLHA NO MERCADO IMOBILIRIO BRASILEIRO?

    Mrio Jorge MendonaAdolfo Sachsida

    Misso do IpeaProduzir, articular e disseminar conhecimento para aperfeioar as polticas pblicas e contribuir para o planejamento do desenvolvimento brasileiro.

  • TEXTO PARA DISCUSSO

    EXISTE BOLHA NO MERCADO IMOBILIRIO BRASILEIRO?

    Mrio Jorge Mendona*Adolfo Sachsida**

    B r a s l i a , a g o s t o d e 2 0 1 2

    1 7 6 2

    * Tcnico de Planejamento e Pesquisa da Diretoria de Estudos e Polticas Macroeconmicas (Dimac) do Ipea. Correio eletrnico: .** Tcnico de Planejamento e Pesquisa da Dimac do Ipea. Correio eletrnico: .

  • Texto paraDiscusso

    Publicao cujo objetivo divulgar resultados de estudos

    direta ou indiretamente desenvolvidos pelo Ipea, os quais,

    por sua relevncia, levam informaes para profissionais

    especializados e estabelecem um espao para sugestes.

    Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada ipea 2012

    Texto para discusso / Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada.- Braslia : Rio de Janeiro : Ipea , 1990-

    ISSN 1415-4765

    1.Brasil. 2.Aspectos Econmicos. 3.Aspectos Sociais. I. Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada.

    CDD 330.908

    As opinies emitidas nesta publicao so de exclusiva e

    inteira responsabilidade do(s) autor(es), no exprimindo,

    necessariamente, o ponto de vista do Instituto de Pesquisa

    Econmica Aplicada ou da Secretaria de Assuntos

    Estratgicos da Presidncia da Repblica.

    permitida a reproduo deste texto e dos dados nele

    contidos, desde que citada a fonte. Reprodues para fins

    comerciais so proibidas.

    JEL: E31, E52, E62, C32.

    Governo Federal

    Secretaria de Assuntos Estratgicos da Presidncia da Repblica Ministro Wellington Moreira Franco

    Fundao pbl ica v inculada Secretar ia de Assuntos Estratgicos da Presidncia da Repblica, o Ipea fornece suporte tcnico e institucional s aes governamentais possibilitando a formulao de inmeras polticas pblicas e programas de desenvolvimento brasi leiro e disponibi l iza, para a sociedade, pesquisas e estudos realizados por seus tcnicos.

    Presidenta InterinaVanessa Petrelli Corra

    Diretor de Desenvolvimento InstitucionalGeov Parente Farias

    Diretora de Estudos e Relaes Econmicas e Polticas InternacionaisLuciana Acioly da Silva

    Diretor de Estudos e Polticas do Estado, das Instituies e da DemocraciaAlexandre de vila Gomide

    Diretor de Estudos e PolticasMacroeconmicas, SubstitutoClaudio Roberto Amitrano

    Diretor de Estudos e Polticas Regionais,Urbanas e AmbientaisFrancisco de Assis Costa

    Diretor de Estudos e Polticas Setoriaisde Inovao, Regulao e InfraestruturaCarlos Eduardo Fernandez da Silveira

    Diretor de Estudos e Polticas SociaisJorge Abraho de Castro

    Chefe de GabineteFabio de S e Silva

    Assessor-chefe de Imprensa e Comunicao, SubstitutoJoo Cludio Garcia Rodrigues Lima

    Ouvidoria: http://www.ipea.gov.br/ouvidoriaURL: http://www.ipea.gov.br

  • SUMRIO

    SINOPSE

    ABSTRACT

    1 INTRODUO ..........................................................................................................7

    2 PRS E CONTRAS ACERCA DA EXISTNCIA DE BOLHA IMOBILIRIA NO BRASIL ....10

    3 DEFINIO DE BOLHA: ABORDAGEM TRADICIONAL VERSUS ESCOLA AUSTRACA..... 13

    4 TEORIA AUSTRACA DE CICLO DE NEGCIOS .................................................................18

    5 ABORDAGEM EMPRICA .....................................................................................................22

    6 CONSIDERAES FINAIS ....................................................................................................52

    REFERNCIAS ...........................................................................................................53

    APNDICE ................................................................................................................58

  • SINOPSE

    Este estudo tem por objetivo avaliar a possibilidade de existncia de bolha especulativa no mercado imobilirio brasileiro. Para tanto, estudou-se e empregou-se diversas metodologias, tanto em nvel microeconmico quanto em nvel macroeconmico. De maneira geral, os resultados apontam para a possibilidade concreta de existncia de uma bolha no mercado de imveis no Brasil. De maneira objetiva, a Teoria Austraca do Ciclo Econmico (Tace), reforada por tcnicas estatsticas, fornece uma base terica slida para apontar o governo federal, por meio de suas polticas fiscais e de estmulo ao crdito, como o principal responsvel pelo surgimento desta bolha. A insistncia do governo em aquecer ainda mais um mercado imobilirio j aquecido s tende a piorar o resultado final.

    Palavras-chave: bolha imobiliria; Escola Austraca; modelos de vetores autorregressivos (VAR); poltica monetria; poltica fiscal.

    ABSTRACTi

    This article verifies the occurrence of a real estate bubble in the Brazilian economy. Overall, our results suggest the existence of a bubble in the real estate sector of the economy. The Austrian School of economics provides a solid explanation to this phenomenon, which are reinforced by statistical techniques, suggesting the Federal government, with equivocate fiscal and monetary policy, as the main responsible for the creation of this problem.

    Keywords: real estate bubble; Austrian School; VAR models; monetary policy; fiscal policy.

    i. The versions in English of the abstracts of this series have not been edited by Ipeas editorial department.As verses em lngua inglesa das sinopses (abstracts) desta coleo no so objeto de reviso pelo Editorial do Ipea.

  • Texto paraDiscusso1 7 6 2

    7

    Existe Bolha no Mercado Imobilirio Brasileiro?

    1 INTRODUO

    Este estudo tem por objetivo avaliar a possibilidade de existncia de bolha especulativa no mercado imobilirio brasileiro. Tal possibilidade tem sido levantada pela imprensa e por acadmicos, em virtude das diversas notcias divulgadas acerca de elevao sig-nificativa do preo dos imveis. Atualmente, parecem existir fortes indcios de que o setor imobilirio est fortemente aquecido no Brasil. Isto pode ser visto pelo nmero de novos lanamentos e pelo vigoroso crescimento do preo de venda dos imveis ocorrido nos ltimos anos.

    De janeiro de 2010 a maro de 2012, houve uma variao de 43% no preo mdio de venda dos imveis em todo o Brasil.1 Das regies metropolitanas (RMs) consideradas, a cidade do Rio de Janeiro foi aquela que apresentou a maior valoriza-o, seguida pela cidade de So Paulo. No Rio de Janeiro e em So Paulo, o preo de venda dos imveis teve variao, entre janeiro de 2008 a maro de 2012, de 168% e 132%,2 respectivamente. Tomando-se apenas o perodo de janeiro de 2010 a maro de 2012, a variao do preo do imvel no Rio de Janeiro foi de 58,86%, enquanto em So Paulo a variao ficou em 43,16%. Concomitantemente, ocorreu um vigoroso aumento do estoque de crdito imobilirio, que mostrou variao de 130% em termos reais no mesmo perodo.

    Muitos motivos podem ser apontados para explicar a expanso imobiliria presen-ciada nos ltimos anos. A estabilidade de preos, a queda na taxa de juros e a expanso do crdito direcionado, alm dos programas de obras pblicas, so as explicaes mais recorrentes para este fenmeno. Com a inflao controlada, a economia pode sentir os efeitos benficos da estabilizao. A queda da taxa de juros, por sua vez, diminui o custo do financiamento, fator fundamental neste mercado, tendo em vista que grande parte das transaes imobilirias levada a cabo com financiamentos de longo prazo.

    Tambm deve-se ressaltar que o crescimento da economia, com o consequente aquecimento do mercado de trabalho, elevou a renda do trabalhador, facilitando seu acesso ao mercado imobilirio. Outro fator importante se refere s mudanas na

    1. Clculo com base no ndice FipeZap. 2. O ndice Bovespa variou no mesmo perodo apenas 8,4%, enquanto os certificados de depsitos interfinanceiros (CDIs) apresentaram rendimento de 52,3%. A taxa de inflao medida pelo ndice Nacional de Preos ao Consumidor Amplo (IPCA, do IBGE) no perodo foi de 25%.

  • 8B r a s l i a , a g o s t o d e 2 0 1 2

    legislao que tornaram o investimento no setor mais seguro. Evidentemente, as polti-cas pblicas do governo especficas para este setor tambm ajudaram a aquecer o mer-cado imobilirio. Tais aes pblicas tm como objetivo facilitar o acesso casa prpria a grupos especficos da populao, sobretudo aos grupos pertencentes ao extrato de baixa renda.3 Alm disso, o programa de obras pblicas visando modernizar e dinami-zar algumas cidades para atender Copa do Mundo em 2014 e s Olimpadas no Rio de Janeiro em 2016 vem contribuindo para a valorizao dos imveis.

    No entanto, tendo em vista esse intenso crescimento no preo e na oferta de imveis no Brasil, alguns analistas tm chamado ateno para a possvel existncia de uma bolha no mercado imobilirio. Segundo eles, o preo dos imveis residenciais e comerciais tem crescido alm do que pode ser explicado pelos fundamentos que deveriam reger o movimento de preos neste setor e em qualquer outro. Tal apreenso tem relao com a crise de proporo catastrfica que ocorreu na economia americana em 2008, cujo estopim foi o setor imobilirio, e mais recentemente com os casos de Espanha, Portugal e Grcia. Sendo assim, na seo dois, apresentam-se alguns dos argu-mentos mais comumente usados a favor da existncia de bolha imobiliria no Brasil, e mostra-se que nenhum deles possui consistncia terica para servir de base para qual-quer argumentao mais robusta.

    Embora seja comum verificar o aparecimento do termo bolha especulativa, tanto na literatura acadmica quanto na imprensa, o conceito de bolha especulativa no sentido usado na literatura hegemnica (mainstrean)4 est longe de ser algo trivial. A ideia que comumente aparece associada existncia de bolha de um comportamento irracional dos agentes econmicos, que acreditam que o preo ir crescer indefinidamente, ou pelo menos se comportar assim em um horizonte temporal bem longo. To complicado quanto conceituar uma bolha especulativa a sua verificao emprica neste tipo de abordagem. Neste trabalho, isto se torna impraticvel, tendo em vista a insuficincia de dados de preo de venda e aluguel para o mercado imobilirio no Brasil. Por este motivo, e tambm por no se considerar apropriado o modo convencional de definir o conceito de bolha, usa-se neste estudo uma definio alternativa cuja base terica est associada Escola Austraca de economia. Esta discusso o objeto de anlise na seo trs deste trabalho.

    3. O programa Minha Casa, Minha Vida tem como foco as famlias que possuem renda de at trs salrios mnimos (SMs). No obstante, houve redirecionamento dos recursos da poupana para o sistema de financiamento da casa prpria. A medida, aprovada pelo Conselho Monetrio Nacional (CMN), incrementou em R$ 1,6 bilho os recursos para o setor.4. Expresso em geral usada na literatura para definir a corrente acadmica preponderante de uma rea do conhecimento.

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    Existe Bolha no Mercado Imobilirio Brasileiro?

    Como ser visto, de acordo com a perspectiva da Escola Austraca, uma bolha de mercado no surge por fora de um comportamento irracional, mas por consequncia de um sinal exogenamente criado que faz com que os agentes direcionem erroneamente os investimentos em um determinado segmento da economia, fazendo com que os preos deste mercado sigam uma trajetria fortemente ascendente. Tal elevao no poder se estender indefinidamente, fazendo com que os agentes em algum instante o ponto de ruptura percebam que o retorno sobre o investimento se situa aqum do esperado. Neste momento, haver uma reviso dos projetos, com uma perda acentuada de capital inerente ao processo. Para entender como isto funciona, a seo quatro faz uma apresentao da Teoria Austraca do Ciclo Econmico (Tace). Mais precisamente, a Tace foi elaborada com o intuito de explicar por que em uma economia ocorrem fases de expanso e recesso, ou mesmo uma depresso. Contudo, como ser visto, muito do que acontece hoje no mercado imobilirio pode ser explicado com base nos preceitos desta teoria. Diferente da perspectiva convencional sobre bolha especulativa, a Tace permite obter meios para verificar, pelo menos indiretamente, a possibilidade de existncia de bolha no mercado imobilirio.

    Com base na teoria do ciclo de negcios, proposta pela Escola Austraca, na seo cinco, introduz-se uma sequncia de procedimentos empricos com objetivo de examinar se existe evidncia de bolha especulativa no mercado imobilirio brasileiro. Inicialmente, feita uma anlise qualitativa acerca do comportamento de algumas variveis relaciona-das construo civil e ao mercado imobilirio, tais como produto industrial da constru-o civil, preo de venda e aluguel dos imveis, evoluo do crdito bancrio e custo da construo. O intuito verificar se existe alguma evidncia de descolamento da evoluo destas variveis em relao ao restante da economia. A seguir, empregam-se procedimen-tos estatsticos mais consistentes para observar o que acontece no mercado imobilirio tanto em nvel microeconmico quanto macroeconmico.

    A anlise microeconmica feita com base na anlise economtrica, a fim de verificar se o preo corrente dos imveis responde aos seus fundamentos. Alm disso, examina-se a existncia de presso sobre a estrutura de custo dos imveis. A abordagem emprica sob a tica macroeconmica se baseia em dois procedimentos. O primeiro deles visa determinar o estado da poltica fiscal no Brasil. Neste estudo, uma medida quantitativa do estado da poltica fiscal til por permitir saber se a condio fiscal tem exercido presso sobre o produto da economia. A importncia disso decorre do fato de

  • 10

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    que se o produto se situar acima do potencial por efeito da poltica fiscal, isto poder se refletir em uma elevao da inflao. Se isto acontecer, a taxa de juros ter de sofrer ajuste para cima em algum momento. O aumento da taxa de juros pode ter impacto significativo no mercado imobilirio pelo seu efeito sobre a elevao do custo do finan-ciamento. Neste caso, um teste subsequente feito com base no modelo estrutural de vetores autorregressivos (SVAR), com o propsito de averiguar o efeito de um choque contracionista de poltica monetria sobre variveis relacionadas ao mercado imobili-rio, tais como o produto industrial da construo civil e o fluxo de crdito imobilirio.

    2 PRS E CONTRAS ACERCA DA EXISTNCIA DE BOLHA IMOBILIRIA NO BRASIL

    Vejam-se alguns dos argumentos sobre bolhas imobilirias levantados por estudiosos do assunto. De acordo com Lima Jnior (2011, p. 3), a evidncia de bolha se d porque o preo dos imveis residenciais est acima do seu valor justo. Valor no atributo de qualquer bem, mas o preo justo equivale a um valor justo. Seguindo o mesmo raciocnio, Lima Jnior acrescenta que o preo justo deve cobrir os custos de produo, bem como conter uma margem para cobertura das incertezas. Acrescenta ainda:

    Com os preos atuais, se contarmos os custos, as margens, a estrutura tradicional de funding, com

    financiamento produo no SFH [Sistema Financeiro da Habitao], encontraremos taxas de

    retorno desequilibradas para a atratividade do real estate, nos padres reconhecidos no mercado

    brasileiro (...) Se os preos esto acima do preo justo, h um valor sem lastro que est sendo

    comprado pelo mercado nesta conjuntura (Lima Jnior, 2011, p. 3-4).

    A falcia dessa argumentao decorre de que, como ponto pacfico na teoria eco-nmica, o valor de um bem decorre da utilidade marginal que os indivduos atribuem a ele; a utilidade, por sua vez, definida pelas preferncias dos agentes. Isto , o preo de mercado determinado pelo valor subjetivo que as pessoas tm pelo bem. Decorre da que a estrutura de custos de um produto est indiretamente relacionada a quanto os indivduos aceitam pagar pelo produto. Fatores de produo usados na confeco de um bem altamente valorado tendem a se tornar mais caros, e vice-versa. Desse modo, o preo de um fator de produo deve refletir sua contribuio marginal ao valor do pro-

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    Existe Bolha no Mercado Imobilirio Brasileiro?

    duto at o ponto em que no exista mais possibilidade de arbitragem.5 Assim, a ordem de causalidade de cima para baixo, ou seja, a valorao de um bem o que determina seu custo, e no o contrrio. No caso dos imveis, pode estar acontecendo que, por um motivo ou outro, como uma mudana na estrutura de preferncia, os agentes estejam atribuindo maior valor aos imveis, elevando a demanda e os preos como consequn-cia. Da, o diferencial entre o preo e o custo est propiciando uma expectativa de alta margem de lucro que ser gradualmente eliminada desde que no existam restries ampliao da oferta. Afinal, existe uma defasagem de tempo para que a estrutura de custo acompanhe esta maior valorao, a qual com o passar do tempo ser diminuda, e a lucratividade neste setor acompanhar aquela existente no restante da economia.

    Outro motivo usado para antever a ocorrncia de bolha imobiliria est no atual descompasso entre o preo do imvel e o preo do aluguel. Portanto, no valeria a pena comprar um imvel, tendo em vista o baixo preo do aluguel. Veja-se o seguinte exemplo proposto pelo especialista Samy Dana.6

    Hoje, o valor de um imvel no centro paulistano est em torno de R$ 10 mil/m. Sendo assim,

    um apartamento de 100 m vai custar R$ 1 milho, aproximadamente, sem considerar algum

    desconto que possa ter. Se esse dinheiro fosse colocado em uma aplicao conservadora, como a

    poupana, iria render em torno de 0,5% ou 0,6% ao ms, ou seja, R$ 6 mil. (...) Eu duvido que

    algum pague R$ 6 mil ou mais para morar em um imvel de 100 m no centro do So Paulo.

    melhor deixar rendendo no banco e pagar aluguel (Rizzi, 2012).

    Segundo esse raciocnio, o investimento em imvel no apresenta retorno compa-tvel com o desembolso realizado. O contraponto a este argumento pode ser colocado da seguinte forma. Tal como qualquer ativo, a deciso acerca de um investimento tem como base a equao (1), em que tq representa o preo do ativo em t; 1+td o rendi-mento do ativo; tr , a taxa de desconto, que pode ser aquela que ofereceria um retorno

    5. Em termos genricos, segundo a perspectiva da Escola Austraca, o preo de um fator de produo corresponde em equilbrio contribuio que uma unidade a mais deste fator ir adicionar ao produto descontado; ou seja, o preo do fator deve ser igual ao valor presente do produto marginal. Este o ponto em que o lucro alcana o nvel timo. Suponha-se que o preo unitrio do fator esteja abaixo da receita marginal que o fator adicionaria ao negcio. Neste caso, existe margem para o empresrio aumentar o uso deste fator na confeco do seu produto. Desse modo, a demanda pelo fator aumenta e, por consequncia, o seu preo se eleva at que o equilbrio seja alcanado (Rothbard, 1962). A fragilidade da teoria que tenta justificar o valor com base no custo no explicar de onde se origina, por sua vez, o valor de troca dos fatores de produo (Wicksell, 1980).6. Professor da Escola de Economia da Fundao Getulio Vargas de So Paulo (FGV-SP).

  • 12

    B r a s l i a , a g o s t o d e 2 0 1 2

    livre de risco ou algum investimento alternativo; e tE , a expectativa futura formada com base em um conjunto de informao tI disponvel no perodo t. Pode ser visto, pela equao (1), que o valor do ativo depende no apenas do seu retorno (rendimento), mas tambm da valorizao,

    1+tq , da taxa de juros e das expectativas.

    [ ]t

    tttt r

    IdqEq

    |1 += + (1)

    Portanto, de acordo com (1), o fator importante na tomada de deciso se concen-tra naquilo que os indivduos acreditam que acontecer, e no exatamente no que est ocorrendo no tempo presente. Tambm fcil perceber que a expectativa de valorizao to importante quanto o rendimento do ativo, o que foi desconsiderado no exemplo apresentado. Pode-se argumentar que o preo dos imveis j esteja to elevado a ponto de uma valorizao futura ser improvvel de acontecer. De fato, esta uma justifica-tiva que tem sido levantada para apontar possveis problemas no mercado imobilirio. Contudo, deve-se perceber que o preo do aluguel pode tambm se elevar, e, com efeito, parece que o que ocorre pelo menos com maior intensidade da cidade do Rio de Janeiro nos ltimos dois anos.

    Outra questo importante que a argumentao exposta no leva em considerao que a prpria taxa de juros pode variar. Se a taxa de juros diminui, o que vem acon-tecendo recorrentemente com a economia brasileira, o custo de oportunidade diminui. Disso decorre a possibilidade de ganho de arbitragem, dado que, mantido o resto cons-tante, o valor presente esperado de ganho, lado direito da equao (1), aumenta frente ao capital investido na compra do imvel. O impacto da taxa de juros na demanda por imvel algo j conhecido h muito tempo. A taxa de juros est entre as variveis que possuem maior impacto sobre o setor imobilirio. Uma mudana nela pode alterar significativamente a situao do muturio, uma vez que o termo de um contrato de financiamento pode se estender at trinta anos. Portanto, tambm pouco pode ser dito sobre a verdadeira situao no mercado imobilirio, porque no se sabe quantificar o efeito de uma variao da taxa de juros sobre a funo de demanda por imveis. Assim, o simples fato de os preos dos imveis terem subido muito nos ltimos anos pode ser simplesmente o efeito da queda da taxa de juros devido estabilizao da economia.

  • Texto paraDiscusso1 7 6 2

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    Existe Bolha no Mercado Imobilirio Brasileiro?

    3 DEFINIO DE BOLHA: ABORDAGEM TRADICIONAL VERSUS ESCOLA AUSTRACA

    3.1 Abordagem tradicional

    A definio de bolha de acordo com a abordagem tradicional aparece bem descrita em Stiglitz (1990): se o aumento do preo de um ativo decorre apenas da crena de que seu preo de venda ser maior no futuro, quando os fundamentos no parecem justificar isso, ento existe bolha. Neste caso, a causa bsica de movimentos de preos determinada apenas pela expectativa autorrealizvel da prpria variao de preos, levando a uma espiral de elevao contnua at que em decorrncia de algum fator a bolha estoure. Um dos axiomas da teoria das expectativas racionais que os agentes no cometem erros sistemticos. Neste sentido, a existncia de bolhas impe uma restrio ideia de que o mercado age sempre de forma eficiente na alocao dos recursos, pois a formao do preo de um ativo estaria sendo imposta apenas pelas expectativas que se autorrealizam, independentemente dos fundamentos de mercado. Para entender isto, reescreve-se a equao (1) da seguinte forma:

    [ ]t

    t

    t

    ttt r

    d

    r

    IqEq += +

    |1 (1)

    Tomando-se a taxa de desconto constante de modo que ra 1= , tem-se que:

    (2)

    Resolvendo-se recursivamente e usando-se a lei das expectativas iteradas,7 tem-se que:

    [ ] [ ]tTtTT

    itit

    it IqEaIdEaq || 1

    1

    0++

    +

    =+ += (3)

    Supe-se aqui que o segundo termo de (3) converge para zero. Ento, se [ ] 0|lim 11 =+++ tTtTT IqEa , tem-se que:

    [ ]

    =+=

    0

    |i

    titi

    t IdEaq (4)

    7. Essa lei se define da seguinte forma: .

  • 14

    B r a s l i a , a g o s t o d e 2 0 1 2

    A equao (4) implica que o preo de um ativo igual ao valor presente descontado de seus rendimentos futuros. A equao (4), embora seja soluo de (1), no a nica soluo. Ela foi derivada impondo-se a condio de transversalidade de que o preo do ativo no se torne infinitamente grande. Naturalmente, esta hiptese pode ser relaxada de modo que (1) possa admitir vrias solues. Fazendo-se com que ttt bqq +=

    * , veja-se que tipo de restrio deve ser imposta sobre tb de forma que tq seja tambm uma soluo para (1). Se ttt bqq +=

    * , ento [ ] [ ] [ ]ttttt IbEIqEIqE t ||| 1*1 1 ++ += + . Substituir estas duas equaes em (1) implica que:

    (5)

    Pela definio de *tq em (4), tem-se que . Ento, para qualquer

    tb que satisfaa (5), ttt bqq +=* uma soluo de (1). Blanchard e Fischer (1989)

    apresentam alguns processos distintos que tb pode seguir e que se enquadram noo popularmente associada bolha especulativa. Por esta razo, enquanto *tq chamada de soluo fundamental, tb denominada de bolha.

    Blanchard e Fischer (1989) enumeram algumas situaes em que o prprio mer-cado se incumbiria de eliminar a existncia de bolhas. Por exemplo, caso um ativo pudesse ser posto de lado sem custo, no haveria possibilidade de existir bolha negativa. Para um ativo real que possua um substituto com oferta elstica, a hiptese de bolha estaria igualmente descartada. Mesmo no mercado de aes, a elevao contnua do preo das aes motivaria o mercado a ofertar mais deste ativo. Admitindo-se que a demanda no pode se estender indefinidamente, a valorizao das aes tenderia a arrefecer, eliminando a ocorrncia de bolha. Portanto, neste tipo de abordagem, o descolamento do preo do ativo em relao aos seus fundamentos seria mais provvel de ocorrer nos mercados em que a informao acerca dos fundamentos seja de difcil obteno. Por exemplo, em mercados especficos, tais como o mercado de artes, de ouro ou de moedas estrangeiras.

    Obviamente, o aparato descrito apenas uma definio, e no d indicaes de por que tal comportamento se justifica. Como ele tem pouca base em fundamentao econmica, sempre houve dificuldade em interpretar o porqu de uma bolha existir, ou tratar a questo em termos empricos com o objetivo de predizer sua ocorrncia. Existem diversas dificuldades economtricas para se detectar a existncia de bolhas no

  • Texto paraDiscusso1 7 6 2

    15

    Existe Bolha no Mercado Imobilirio Brasileiro?

    modelo descrito. Em primeiro lugar, as expectativas no so observadas. Em segundo lugar, muitos testes no apresentam um procedimento livre de crtica para tratar a taxa de desconto, que geralmente tomada como constante. Terceiro, no h como diferenciar se o descolamento do preo do ativo em relao aos fundamentos advm da ocorrncia de uma bolha ou da m especificao dos prprios fundamentos (Flood e Garber, 1980; Hamilton e Whiteman, 1985; Casella, 1989).

    Os primeiros testes visando detectar a existncia de bolha neste tipo de modela-gem foram os de Shiller (1981), Leroy e Porter (1981) e West (1987). Inicialmente, os testes procuravam detectar bolhas de qualquer tipo, sem especificar a sua natureza. Basicamente, estes testes centravam-se em determinar limites para a varincia, consi-derando o preo ex post do ativo, 'tp , e o valor presente de seus dividendos. O teste de Shiller adota o preo presente da ao como o melhor previsor do valor futuro descontado dos dividendos. Definindo o preo ex post como:

    =+

    +=0

    1'

    iit

    it dap

    tem-se que: ttt upp +=

    ' , onde [ ] 0| =tt IuE . Supondo-se que ttt upp +=' seja no correlacionado com o preo corrente, tem-se que )()()( ' ttt uVpVpV += , em que V representa a varincia. Isto implica )()( ' tt pVpV , de modo que a varincia do preo ex post deve exceder a do preo observado. Assim, desde que tp um preditor de

    'tp , deve-se variar menos que este. A srie de

    'tp toma a equao (6) como base:

    '1

    0

    1'T

    TT

    iit

    it padap

    =+

    + +=

    (6)

    em que: T representa o final da amostra. Shiller (1981) constri 'tp tomando a mdia amostral de tp . Os desvios de

    'tp e tp em relao tendncia determinstica

    so usados para construir as varincias destas duas variveis. O teste de Shiller gera somente estimativas pontuais para a varincia, de modo que sua significncia estatstica no pode ser testada.

    Tanto Tirole (1985) quanto Blanchard e Watson (1982) sugeriram que o limite da varincia pudesse ser violado devido presena de bolhas. Sendo assim, a primeira linha de ataque para o teste de Shiller (1981) recai sobre as propriedades das distribuies estatsticas advindas do teste. Contudo, deve-se ressaltar que, embora uma violao do

  • 16

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    limite da varincia construda possa ser devida presena de bolhas, estes testes tm variados problemas para sua implementao, tornando-os inaptos a detectar a presena de bolhas. Flavin (1983) mostrou que, em relao rejeio da hiptese de bolha para pequenas amostras, usar o preo mdio para representar o preo terminal ex post enviesa o teste. Kleidon (1986) discute um ponto mais sutil: as varincias em questo so de corte transversal em um ponto no tempo, mas na estimao as varincias usadas so construdas por sries temporais. Ele mostra que o dado elaborado do modelo do valor presente lquido viola a hiptese de varincia limitada quando sries no estacionrias so usadas. Marsch e Merton (1983) igualmente fornecem um exemplo interessante da inabilidade do teste de varincia limitada quando os dividendos e o preo das aes so no estacionrios.

    Vrios testes interessantes foram subsequentemente desenvolvidos para verificar a hiptese de bolha especulativa (West, 1988; Campbell e Shiller, 1988; 1989; Diba e Grossman, 1987; Evans, 1991). Contudo, em uma resenha acerca dos vrios tipos de metodologias economtricas empregadas para testar a existncia de bolha racional, Grkaynak (2005) mostra que, apesar dos avanos recentes nesta rea, a deteco eco-nomtrica de bolhas no preo dos bens no pode ser obtida com um grau de certeza satisfatrio. Entre os principais problemas economtricos, destaca-se a incapacidade de se distinguirem bolhas de um modelo com mudana de regime, ou com quebra estrutural nos fundamentos, ou ainda com os problemas economtricos relacionados inferncia em pequenas amostras.

    3.2 Abordagem fundamentalista

    So diversas as dificuldades que surgem quanto ao emprego da abordagem descrita na subseo anterior para tratar a questo da bolha especulativa. Primeiro, em relao abordagem emprica, muitas questes so levantadas quanto dificuldade do emprego de tcnicas economtricas para detectar bolhas no preo dos ativos. Segundo, neste estudo, existe ainda um complicador adicional referente insuficincia de dados sobre preo de imveis no Brasil. Terceiro, conforme bem salientou Blanchard e Fischer (1989), a ocorrncia de bolha deve-se justificar mais em mercados propensos a proble-mas de informao, o que no parece ser o caso do mercado imobilirio. Quarto, a pr-pria definio de bolha, tal como est escrita na subseo anterior, suscita controvrsia.

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    Existe Bolha no Mercado Imobilirio Brasileiro?

    Gaber (1980) analisou trs casos famosos usados como exemplos de bolha na literatura, e encontrou fortes indcios de que tal apelo para a existncia de bolhas est longe de ser uma resposta convincente a estes trs eventos. Em todos estes casos foi pos-svel encontrar alteraes nos fundamentos de mercado que justificaram as mudanas observadas no preo dos ativos, ou no estado da economia.

    Por fim, admitir a ideia de bolha dentro da concepo hegemnica aceitar que, em certas situaes diferentes das j previstas pela teoria econmica,8 o mecanismo de preo falha em promover a sinalizao correta para a alocao eficiente de recursos.

    Como se pode notar, o estudo sobre bolhas especulativas permeado de dificul-dades tcnicas. Alm disso, tais dificuldades se tornam maiores quando se levam em considerao os problemas estatsticos relacionados a pequenas amostras. Sendo assim, analisar a existncia de uma bolha no mercado imobilirio brasileiro est longe de se constituir uma tarefa trivial.

    Para direcionar esta pesquisa de maneira a ser possvel contornar os problemas explicitados anteriormente, a anlise ser realizada partindo-se de uma ideia simples: se os preos em determinado mercado se alteram, isto acontece por basicamente dois motivos. Primeiro, ocorreu uma mudana nos fundamentos deste mercado ou em mercados correlatos que estariam levando a tal situao. Nesse sentido, as prprias foras de mercado conduziriam a um equilbrio compatvel com a nova ordenao.

    Segundo, uma mudana de preo pode decorrer tambm devido interferncia do governo. Em uma situao especfica, em que o preo de um ativo parece se elevar indefinidamente sem base nos fundamentos de mercado, tal como se verifica no caso da bolha especulativa, parte-se do pressuposto de que algum sinal, ou incentivo, estaria induzindo os agentes a entrar naquela empreitada. Assim, o estouro da bolha evidencia, por definio, que erros de avaliao sistemticos foram cometidos de modo generalizado.

    Tendo-se em mente que o mercado oferece um treino para que os agentes econ-micos possam aprimorar suas habilidades quanto gerncia dos seus prprios negcios, e que boa parte dos mercados no apresenta problemas significativos de informao,

    8. Em situaes denominadas de falhas de mercado, a literatura tradicional mostra que o mecanismo de preos resultante do mercado no conduz a uma alocao eficiente de recursos para a sociedade.

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    pergunta-se como erros de previso sistemticos foram cometidos por to longo tempo e de forma generalizada. De outro modo, como explicar que indivduos bem treinados se deixem iludir acerca das reais oportunidades de negcios? De acordo com a Escola Austraca de economia, o responsvel por tais erros de julgamento so as polticas governamentais de interferncia a manipulao da taxa de juros ou do direciona-mento do crdito pelo governo um exemplo de tais polticas. Para a Escola Austraca, as polticas governamentais fazem com que os agentes sejam levados a direcionar seus investimentos de modo a cometer erros sistemticos de avaliao.

    4 TEORIA AUSTRACA DE CICLO DE NEGCIOS

    O ciclo econmico ou ciclo de negcios na viso da Escola Austraca algo mais especfico que aquilo que se entende por apenas flutuao econmica. Segundo esta escola, as flutuaes econmicas so geradas pela prpria incerteza e algo inerente ao prprio ambiente econmico. As pessoas tentam prever e se antecipar s mudanas do ambiente da forma mais eficiente possvel. Os empresrios tentam prever os movimentos na demanda e na oferta por seus produtos. Os mais bem-sucedidos so exatamente aque-les que da melhor maneira so capazes de se antecipar s condies futuras nos seus respectivos ramos de atividade. Entretanto, ocorre que a previso de forma alguma perfeita, caso contrrio no existiriam lucros e perdas nos negcios.9

    No entanto, o ciclo econmico se caracteriza por um largo perodo de prosperidade econmica (expanso), sendo seguido de uma forte contrao (depresso) incidente sobre os diversos setores da economia. A teoria austraca do ciclo de negcios, tal como origi-nalmente concebida, pode ser descrita da seguinte forma. Segundo Von Mises (1953; 1966) e Hayek (1933; 1935), as crises econmicas decorrem do emprego da poltica monetria na manipulao da taxa de juros, e o consequente aumento no crdito bancrio sem ter em contrapartida o crescimento da poupana. Segundo a Escola Austraca, em uma situao em que no exista interferncia de qualquer ordem, o aumento do crdito bancrio deriva de uma queda da preferncia temporal, o que faz com que a relao entre poupana e consumo aumente. Isto tem como consequncia a ampliao de recursos para emprstimos no setor bancrio, conduzindo diminuio da taxa de juros. A queda na

    9. Inmeros fatores podem contribuir para o erro de previso, tais como mudanas nos gostos ou na preferncia temporal, choques de oferta, mudanas no esperadas na oferta de trabalho, choques tecnolgicos etc.

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    preferncia temporal permite ainda a liberalizao de fatores de produo. Mais poupana significa menos gastos e mais disponibilidade de recursos para ampliar o crdito bancrio. Em relao ao setor real, mais poupana significa menos utilizao de fatores produtivos, que agora podero ser utilizados para novos investimentos, por fora da diminuio da taxa de juros, sem presso sobre o nvel de preos.

    Um ponto que deve ser ressaltado que, quando a taxa de juros se reduz devido ao aumento da poupana, os empresrios ficam propensos a aprofundar a estrutura de capital pela expanso, sobretudo, dos processos intermedirios. Isto , pelo apro-fundamento de bens de ordem mais alta (bens de capital) em detrimento de bens de mais baixa ordem (bens de consumo). Para que o crescimento possa ser sustentado, ele deve ser gerado por meio do aumento do crdito bancrio saudvel, que ocorre devido queda da preferncia temporal. Neste processo, recursos outrora canalizados para o consumo passam a ser conduzidos para a criao de novos bens de capital. Dessa forma, uma nova estrutura de produo mais aprofundada tem origem.

    No obstante, o governo pode igualmente fomentar a expanso do crdito banc-rio pela expanso dos meios de pagamentos, o que ter o mesmo efeito de reduo da taxa de juros. Assim, a expanso do crdito bancrio pode tambm ocorrer pela criao de moeda nova. Neste caso, o aumento da quantidade de moeda eleva a disponibilidade de recursos financeiros para emprstimos. Embora, inicialmente, os efeitos sobre a eco-nomia sejam similares ao caso anterior, neste caso, por parte do setor real da economia, o aumento do crdito bancrio no tem como contrapartida um crescimento no fluxo de fatores de produo disponveis para serem empregados em novos investimentos. Ao contrrio, aqui a queda na taxa de juros por manipulao da autoridade monetria pode reduzir a poupana, tendo em vista a queda do retorno, diminuindo mais ainda o volume de recursos produtivos para fazer face aos novos investimentos por fora do aumento do consumo. Assim, interessante observar que, embora existam mais recursos financeiros disposio do setor bancrio para emprstimos motivados pela expanso dos meios de pagamentos , na melhor das hipteses a mesma quantidade de recursos produtivos se encontrar disponvel para atender demanda por novos investimentos, levando fatalmente presso sobre os preos.

    A criao de moeda nova conduz queda da taxa de juros devido ao maior fluxo monetrio disponvel para ser utilizado como crdito. Isto faz parecer que existe um

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    fluxo aumentado de poupana para ser aplicado em novos investimentos. Neste caso, os empresrios sero levados a acreditar que a expectativa de lucros dos novos projetos so maiores do que realmente ir ocorrer. A limitao de fatores de produo disponveis ir gerar, futuramente, aumento no seu preo, tendo como consequncia a diminuio na taxa de lucratividade dos empreendimentos.

    Devido ao aumento da renda do trabalho no setor de bens de capitais, e tambm no alterao na preferncia temporal, em algum momento o preo dos bens de consumo comear gradualmente a crescer, pois no existe disponibilidade imediata de fatores de produo livres para atender ao crescimento da demanda neste setor. Portanto, haver disputa por fatores que esto nos estgios da cadeia produtiva mais prximos ao consumo, levando acelerao do nvel de preos dos setores voltados ao consumo de forma mais rpida que nos outros estgios da produo. Isto faz com que o lucro neste setor se torne relativamente maior que no setor de bens de capital, levando os empresrios a repensarem seus investimentos.

    Vendo os custos de produo se elevarem, devido disputa por fatores de produ-o que se estabelece com as indstrias produtoras de bens de consumo, os tomadores de recursos recorrem a novos emprstimos. Os bancos, por sua vez, tendem a prolon-gar este processo na medida em que socorrem os tomadores de recursos como forma de preservar seus prprios investimentos. Contudo, o processo no pode perdurar indefinidamente. Logo se constatar que houve uma percepo errnea quanto viabilidade econmica dos novos projetos, levando reviso dos planos de inves-timentos. Assim, muitos projetos devero ser abandonados, gerando uma onda de liquidaes. Este fenmeno conduz retrao da economia, ou mesmo depresso.

    Algumas colocaes so necessrias para melhor qualificar o processo de formao do ciclo econmico da Escola Austraca. Quando o aumento da poupana deriva da queda da preferncia temporal, existe uma intensificao no investimento em bens de capital devido a trs motivos. Primeiro, devido ao aumento da poupana existir diminuio dos lucros nos setores que operam na produo de bens de ordem mais baixa. Segundo, aparecer o efeito Ricardo. O crescimento da poupana leva a uma queda no preo dos bens de consumo, orientando a economia a aprofundar o inves-timento em bens de capital. Isto leva ao aumento dos salrios reais, tornando mais atrativo a intensificao de estgios de produo mais capital intensivo, pois o custo do

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    Existe Bolha no Mercado Imobilirio Brasileiro?

    capital diminui em relao ao da fora de trabalho. Por fim, importante observar que a queda na taxa de juros decorrente do aumento da poupana afeta o valor dos bens de capital, sobretudo daqueles que esto nas etapas mais distantes do consumo. O valor de mercado dos bens de capital tende a ser o valor esperado do fluxo de renda descon-tado da taxa de juros. Igualmente, investimentos que antes no eram viveis se tornam agora economicamente viveis pela diminuio da taxa de juros.

    No caso anmalo em que a expanso do crdito deriva da criao de moeda nova, ocorrer um efeito Ricardo s avessas. A elevao do preo dos bens de consumo faz com que a remunerao real do fator trabalho diminua em relao remunerao do capital. Isto faz com que se torne atrativa a substituio de capital por trabalho, diminuindo a demanda por bens de capital, o que agrava ainda mais a queda no lucro das companhias produtoras de bens intermedirios e de ordem mais alta.

    Um ponto importante a ser ressaltado a demora na mudana de atitude dos empresrios no sentido de diminuir o ritmo do investimento. Para Hayek isto ocorre porque o processo de investimento em bens de capital conduz a uma demanda subse-quente por novos bens de capital (complementares). O processo se aprofundar quanto maior a crena dos investidores de que os projetos devam ser completados.

    comum se propalar que as crises econmicas so geradas por insuficincia no consumo. Contudo, observa-se durante os perodos de prosperidade, e tambm de depresso, que a demanda por bens de consumo flutua muito menos que a demanda por bens de capital. De acordo com a Escola Austraca, a fase de expanso deve ser considerada um estgio de investimento mal induzido, e no de sobreinvestimento, como alguns costumam nomear. O perodo de depresso deve ser entendido como o momento em que a economia liquida os investimentos induzidos erroneamente, de modo a reestabelecer uma estrutura de produo adequada sua preferncia temporal. Portanto, a depresso, antes de ser entendida como um mal, o modo benfico e eficiente pelo qual a economia retorna a seu ritmo normal, aps as distores geradas pelo governo no perodo de prosperidade econmica. Quanto maior e mais prolongada for a expanso do crdito, mais longa e forte se dar a expanso da economia. Contudo, maior tambm ser a depresso, de modo que a economia restaure a estrutura de capital adequada sua preferncia temporal.

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    A teoria exposta assume por hiptese que o instrumento de poltica monetria se concentra fundamentalmente no controle da moeda. Contudo, a nfase quanto ao instrumento a ser utilizado pela autoridade monetria tem mudado nos tempos mais recentes para o controle da taxa de juros.10 Por exemplo, esta poltica comeou a ser adotada nos Estados Unidos a partir do final da dcada de 1980, enquanto no Brasil isto se consolidou a partir de 1999, quando foi introduzido o regime de meta de infla-o. O controle da taxa de juros propicia de modo mais frequente o uso da sintonia fina, que consiste em promover uma poltica discricionria de ajustamento da taxa de juros visando atingir uma meta estabelecida de poltica econmica. Tomando-se o caso dos Estados Unidos, entende-se aqui que a aplicao da poltica de sintonia fina no controle da taxa de juros tem gerado forte instabilidade do produto e ampliao do ciclo econmico, e que o mesmo vlido para o Brasil.

    5 ABORDAGEM EMPRICA

    Trata-se agora de ver como a Tace pode auxiliar no estudo sobre a existncia de bolha especulativa no mercado imobilirio. Embora a esta teoria tenha sido elaborada para elucidar as crises econmicas de carter mais geral, alguns elementos podem ser usados para analisar esta questo. Veja-se ento como se pode melhor qualificar a Tace, para propiciar hipteses testveis empiricamente que ajudem a elucidar a questo da bolha especulativa no mercado de imveis no Brasil.

    De acordo com a teoria austraca, o ciclo econmico se caracteriza por um largo perodo de expanso na economia, seguido de uma forte contrao, ambos incidentes sobre os diversos setores da economia. No entanto, possvel observar situaes em que a expanso econmica, provocada de modo artificial, pode se concentrar inicial-mente em determinados setores. Foi isto o que ocorreu na crise do mercado imobilirio americano. A conjugao de trs fatores contribuiu para que houvesse uma expanso neste segmento da economia. Primeiro, manteve-se a taxa de juros em um patamar muito baixo por um longo perodo. Segundo, polticas pblicas orientadas no sentido de universalizar a aquisio do imvel prprio para o segmento de baixa renda, promo-vidas pelas agncias, foraram o sistema bancrio a baixar sobremaneira os requisitos para obteno de crdito (Leibwitz, 2008). Por fim, as restries de diversas categorias

    10. Como sabido, no se pode controlar simultaneamente a taxa de juros e a oferta de moeda.

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    impostas sobre a construo de imveis, em determinadas reas dos Estados Unidos, limitaram a oferta, elevando acentuadamente o preo (Leesburg, San Jos, Palo Alto, Manhattan etc), enquanto em outras localidades, como Houston e Dalas, o cresci-mento do preo da moradia foi bem mais modesto (Sowell, 2009a).

    A Tace aponta que as crises econmicas decorrem do emprego da poltica mone-tria na manipulao da taxa de juros, e do consequente aumento no crdito bancrio, sem ter em contrapartida o crescimento da poupana. Sabe-se que a taxa de juros incidente sobre o financiamento imobilirio, embora seja ainda muito alta em relao quela praticada nos pases desenvolvidos, subsidiada, variando aproximadamente entre 8% e 12% ao ano (a.a.). Tal taxa depende tanto de caractersticas socioeconmi-cas do tomador de emprstimo quanto de caractersticas do imvel. Apesar de alta para os padres de pases desenvolvidos, tal taxa se situa em um nvel muito abaixo do que cobrado em outras operaes bancrias convencionais. Isto porque aproximadamente 70% dos recursos para o crdito imobilirio so fornecidos pela caderneta de pou-pana, que paga ao depositante uma taxa ainda menor, em torno de 6% a.a., a qual ir reduzir-se em decorrncia das novas regras aprovadas pelo governo para a remunerao da caderneta de poupana.11

    Tambm no Brasil existe uma poltica pblica instituda de fomento da indstria da construo civil, tanto em obras no setor de infraestrutura quanto em segmentos do setor imobilirio. Os megaeventos da Copa do Mundo em 2014 e das Olimpadas do Rio de Janeiro em 2016 fizeram o governo iniciar um grande nmeros de obras pblicas, que esto trazendo alteraes importantes para os locais onde tais obras esto acontecendo. Isto tem gerado uma perspectiva de valorizao dos imveis cuja localiza-o sofra influncia de alguma delas. Conjuntamente, o emprego do crdito subsidiado para a compra de imvel residencial tem ajudado substancialmente a aquecer o mercado imobilirio. Alm disso, de modo semelhante ao que aconteceu nos Estados Unidos, o governo tem promovido polticas visando aquisio da casa prpria para certos segmentos de baixa renda, tal como o programa Minha Casa, Minha Vida. Assim, natural que a conjuno destes importantes fatores de direcionamento de investimen-tos tenha criado um ambiente que faz com que a demanda esteja fortemente aquecida no setor imobilirio.

    11. As novas regras de remunerao da caderneta de poupana passaram a vigorar em maio de 2012.

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    Tendo em vista o que foi dito anteriormente, seguem-se agora cinco diferentes abordagens empricas, engendradas com base nos fundamentos da Tace, para verificar a existncia de bolha no mercado imobilirio. Na subseo 5.1, Conjuntura, verifica-se o comportamento de algumas variveis relacionadas construo civil e ao mercado imobilirio produto industrial da construo civil, lanamentos imobilirios, preo de venda e aluguel, evoluo do crdito bancrio, custo da construo etc , para avaliar se existe alguma evidncia de descolamento da evoluo destas variveis em relao ao restante da economia. A seguir, na subseo 5.2, verifica-se se o preo corrente dos imveis responde aos fundamentos com base na equao (1). De acordo com os preceitos da Escola Austraca, o efeito acusado pelo contnuo aumento da atividade na construo civil ir cedo ou tarde repercutir no custo na construo. Assim, na subseo 5.3, efetua-se um exerccio economtrico com o objetivo de verificar se existe presso sobre a estrutura de custo de construo advinda da demanda por imveis no setor.

    Os dois testes seguintes se concentram na perspectiva macroeconmica. O pri-meiro deles visa examinar o estado da poltica fiscal no Brasil, enquanto o segundo tem por objetivo medir o efeito de um aumento inesperado da taxa de juros sobre variveis fundamentais, tais como o produto industrial da construo civil e o crdito imobilirio. Conhecer o estado da poltica fiscal til por permitir verificar em que medida a poltica fiscal tem exercido presso sobre a taxa de inflao. No caso de existir uma forte presso sobre a taxa de inflao decorrente de uma poltica fiscal expansiva, a taxa de juros ter que em algum momento se ajustar, e o efeito deste ajuste pode ter impacto importante sobre variveis fundamentais ligadas ao setor imobilirio. Assim, o teste subsequente, implementado com base no modelo estrutural de vetores autorre-gressivos, tem exatamente o propsito de observar o efeito de um choque de poltica monetria, representado pelo aumento da taxa de juros, sobre variveis como o produto industrial da construo civil e o fluxo de crdito imobilirio.

    5.1 Conjuntura

    Conforme apontado no incio da seo, trs causas fundamentais contriburam para a crise do mercado imobilirio da economia americana em 2008. No obstante, tambm como visto, o preo dos imveis no se elevou de modo homogneo. Houve localidades onde os preos tornaram-se exorbitantes, como foi o caso de Palo Alto e Manhattan, enquanto em outras localidades, como Dalas, o preo do imvel cresceu moderada-mente ou se manteve estvel. Segundo alguns autores, fatores exgenos, como restries

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    impostas sobre a construo, contriburam largamente para a elevao do preo nestas localidades (Sowell, 2009a). Tais restries esto associadas defesa do meio ambiente, preservao de reas histricas, limite de altura etc. Todos estes fatores conduzem diminuio da oferta de unidades, e o consequente aumento do preo do imvel.12 evidente que tal comportamento prejudica quem no possui imvel e favorece aque-les que j o possuem.

    De incio, veja-se se houve diferenciao da evoluo do preo do imvel em rela-o disperso geogrfica. Infelizmente, as estatsticas acerca do mercado imobilirio no Brasil so ainda muito rudimentares. Sero usados aqui os dados da pesquisa FipeZap (Fundao Instituto de Pesquisas Econmicas Fipe, 2011) para as estatsticas de preo e aluguel de imvel. Os dados para preo esto disponveis apenas para sete cidades,13 enquanto o preo do aluguel est disponvel somente para as cidades de So Paulo e do Rio de Janeiro. Tambm a dimenso temporal da amostra no homognea.14 A tabela 1 condensa algumas informaes interessantes acerca da variao do preo dos imveis. A primeira linha mostra a variao do preo para o perodo de janeiro de 2008 a maro de 2012 e abrange somente as cidades de So Paulo e do Rio de Janeiro. Na segunda linha, a amostra se inicia em abril de 2009, data a partir da qual h informaes para a cidade de Belo Horizonte. Por fim, na terceira linha, a amostra tem incio em agosto de 2010 e abrange as demais cidades.

    Conforme pode ser visto na terceira linha da tabela 1, a cidade do Rio de Janeiro foi aquela onde houve a maior variao no preo de venda do imvel, seguida das cida-des do Recife e de So Paulo. Interessante notar que a valorizao nas demais cidades ficou muito aqum dos valores obtidos para estas trs cidades, sobretudo para o Rio de Janeiro. Deve-se ressaltar que talvez o preo nestas outras cidades tenha se elevado de maneira significativa antes do comeo do perodo amostral, o que pode dificultar a comparao. As informaes contidas na linha dois mostram que o preo de venda

    12. A questo que se coloca por que a elevao de preo de um ativo real cresce indefinidamente. Se existe arbitragem, por que os investidores no tiram proveito desta ampliando a oferta do bem e fazendo com que o preo convirja para o equilbrio? As restries sobre a construo, ao limitar o nmero de unidades ofertadas, tenderiam a diminuir a velocidade de ajustamento do preo, de modo que este se mantivesse em um nvel elevado. Entretanto, o problema poderia se tornar ainda pior caso a demanda pelo ativo em questo fosse inflada artificialmente.13. So Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Salvador, Recife, Fortaleza e Distrito Federal.14. So Paulo: janeiro de 2008 a maro de 2012; Rio de Janeiro: janeiro de 2008 a maro de 2012; Belo Horizonte: abril de 2009 a maro de 2012; Salvador: agosto de 2010 a maro de 2012; Recife: junho de 2010 a maro de 2012; Fortaleza: maro de 2010 a maro de 2012; e Distrito Federal: agosto de 2010 a maro de 2012.

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    quase duplicou no Rio de Janeiro em relao a Belo Horizonte, enquanto em relao a So Paulo a variao do preo no Rio de Janeiro foi cerca de 34% acima. Tomando-se uma srie mais longa, desde janeiro de 2008, a valorizao do imvel no Rio de Janeiro muito significativa, apresentando uma marca de 165%, cerca de 25% acima, em relao ao que se verificou para So Paulo no mesmo perodo.

    TABELA 1 Variao no preo de venda do imvel (Em %)

    Perodo So Paulo Rio de Janeiro Distrito Federal Recife Salvador Belo Horizonte Fortaleza

    Jan./2008 a fev./2012 132 165 _ _ _ _ _

    Abr./2009 a fev./2012 87 127 _ _ _ 64 _

    Ago./2010 a fev./2012 43 58 27 51 12 36 22

    Elaborao dos autores.

    GRFICO 1Taxa de variao do preo de venda do imvel(Em %)

    3.50

    0.00

    0.50

    1.00

    1.50

    2.00

    2.50

    3.00

    4.00

    Fev./200

    8

    Abr./200

    8

    Jun./2

    008

    Ago./2

    008

    Out./200

    8

    Dez./2

    008

    Feb./2

    009

    Abr./200

    9

    Jun./2

    009

    Ago./2

    009

    Out./200

    9

    Dez./2

    009

    Fev./201

    0

    Abr./201

    0

    Jun./2

    010

    Ago./2

    010

    Out./201

    0

    Dez./2

    010

    Fev./201

    1

    Abr./201

    1

    Jun./2

    011

    Ago./2

    011

    Out./201

    1

    Dez./2

    011

    Fev./201

    2

    INDPRSP INDPRRJ

    Elaborao dos autores.

    Uma informao importante refere-se ao comportamento da taxa de variao do preo do imvel. O grfico 1 explicita tal informao. Tomando-se as sries de preo apenas para as cidades do Rio de Janeiro e So Paulo, pode-se ver que a trajetria para esta varivel, em ambos os casos, parece ser descrita na forma de um U invertido, o que mais ntido no caso do Rio de Janeiro. Em outras palavras, embora tenha existido

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    Existe Bolha no Mercado Imobilirio Brasileiro?

    uma forte tendncia de valorizao dos imveis, a presso sobre os preos parece estar perdendo fora no perodo mais recente, sobretudo a partir de 2010. A partir do que foi apresentado nos dois ltimos pargrafos, pode-se fazer as seguintes colocaes. Existe, de fato, uma tendncia de valorizao dos imveis desde 2008. Contudo, esta tendncia no ocorreu com magnitude equnime em todas as cidades analisadas. Em algumas cidades, sobretudo no Rio de Janeiro, o crescimento do preo do imvel se mostrou muito mais acentuado que nas demais. Por fim, importante ressaltar que esta tendncia de elevao acentuada parece estar diminuindo mesmo no Rio de Janeiro.

    A segunda forma empregada de analisar conjunturalmente a possibilidade de bolha no mercado imobilirio consiste em verificar se existe um aumento nos custos dos fatores de produo associados ao setor. De acordo com a Escola Austraca, em um estgio mais avanado, os efeitos da expanso do crdito induzida de forma artificial comearo a ser sentidos nos preos de insumos associados ao mercado em questo. Todo este processo foi descrito no incio da seo cinco. O que interessa nesta altura ressaltar que a disputa por fatores de produo entre os setores produtores de bens de consumo e de capital conduzir, cedo ou tarde, ao aumento da inflao, devido ao aumento dos custos de produo.

    Para aferir se existe presso sobre o custo de produo no setor imobilirio, sero usados trs diferentes ndices: ndice da construo civil (ICC); custo unitrio bsico (CUB); e ndice nacional da construo civil (INCC). O ICC calculado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE) a partir do levantamento de preos de materiais e salrios pagos na construo civil, para o setor habitao.15 O CUB um indicador monetrio que mostra o custo bsico para a construo civil. Sua avaliao feita pelo sindicato da indstria da construo civil de cada estado. Por fim, o INCC, elaborado pela Fundao Getulio Vargas (FGV), tambm afere a evoluo dos custos de construes habitacionais.16 um dos trs itens que compem o ndice Geral de Preos (IGP), representando 10% do ndice.

    Na tabela 2, compara-se a evoluo das taxas de inflao desses trs ndices de custo da construo civil com o ndice Nacional de Preos ao Consumidor Amplo

    15. A partir de 1997 ocorreu a ampliao do ndice, que passou a abranger o setor de saneamento e infraestrutura.16. uma estatstica contnua, de periodicidade mensal, para dezoito capitais brasileiras: Aracaju, Belm, Belo Horizonte, Braslia, Campo Grande, Curitiba, Florianpolis, Fortaleza, Goinia, Joo Pessoa, Macei, Manaus, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro, Salvador, So Paulo e Vitria. O ndice nacional levantado pela FGV desde janeiro de 1944.

  • 28

    B r a s l i a , a g o s t o d e 2 0 1 2

    (IPCA) do IBGE. Embora o ICC e o CUB sejam calculados para todos os estados, apenas disponibilizam-se na tabela aqueles que aqui se julgam os mais significativos. Conforme pode ser visto, para o perodo de janeiro de 2008 a fevereiro de 2012, todos os indicadores de custo apresentam uma variao bem acima da inflao geral medida pelo IPCA. Interessante analisar a evoluo do INCC, dado que este ndice participa da composio do IPCA. Verifica-se que o INCC variou de 35% para 25% do IPCA.

    TABELA 2 Variao do CUB, ICC, INCC e IPCA(Em %)

    SP RJ DF PE BA MG ES RS CE

    CUB 29 30 31 46 25 34 33 35 23

    ICC 33 36 38 35 31 32 33 31 36

    INCCJan./1908 a fev./2012

    35Jan./1999 a fev./2012

    104IPCA Jan./1908 a fev./2012

    25Jan./1999 a fev./2012

    65

    Elaborao dos autores.

    GRFICO 2Evoluo do INCC, IPCA e ICC (jun./2000 a dez./2011)

    0

    50

    100

    150

    200

    250

    300

    jun.200

    0

    dez.200

    0

    jun.200

    1

    dez.200

    1

    jun.200

    2

    dez.200

    2

    jun.200

    3

    dez.200

    3

    jun.200

    4

    dez.200

    4

    jun.200

    5

    dez.200

    5

    jun.200

    6

    dez.200

    6

    jun.200

    7

    dez.200

    7

    jun.200

    8

    dez.200

    8

    jun.200

    9

    dez.200

    9

    jun.201

    0

    dez.201

    0

    jun.201

    1

    dez.201

    1

    INCC IPCA ICC

    Elaborao dos autores.

    O grfico 2 mostra a evoluo de ambos os indicadores com o ICC geral desde junho de 2000. Neste grfico, pode-se observar que a partir de meados de 2003 ocorre um descolamento entre os dois ndices de custo de construo e o IPCA. O INCC e o ICC geral se posicionam sempre acima do IPCA, e esta discrepncia parece se aprofun-dar cada vez mais. Como pode ser visto na tabela 2, a variao do INCC se mostrou bem superior ao IPCA. Tomando-se a amostra a partir de junho de 2000, as variaes

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    29

    Existe Bolha no Mercado Imobilirio Brasileiro?

    do INCC e do ICC geral foram, respectivamente, de 159% e 158%, enquanto o IPCA teve variao de 134%.

    Por fim, a expanso artificial do crdito um dos fatores propulsores da bolha especulativa, sobretudo quando o crdito orientado para promover determinado setor. Como mencionado anteriormente, o governo tem utilizado vrios tipos de meca-nismo para subsidiar o crdito ao setor imobilirio. No Brasil, cerca de 95% do estoque de crdito habitacional oriundo de recursos direcionados.17 A taxa de juros bsica incidente sobre o financiamento se situa muito abaixo daquela cobrada pelo mercado. Isto somente possvel porque a remunerao paga pela caderneta de poupana fica ainda aqum daquela exigida em um financiamento imobilirio e, por vezes, no cobre nem mesmo a inflao.

    Tendo isso em vista, o cenrio vivenciado hoje pode se alterar sensivelmente caso ocorra um recrudescimento da inflao. Em primeiro lugar, parte expressiva do finan-ciamento imobilirio indexada taxa de juros de longo prazo (TJLP). Uma elevao desta decorrente de um aumento da inflao pode alterar significativamente a situ-ao do muturio. Tambm, devido volta da inflao, os recursos da poupana pode-riam se reduzir; afinal, as regras de remunerao da poupana desestimulam investir neste fundo quando existe expectativa de alta na inflao. O governo teria de encontrar outras fontes de recursos para fomentar o setor da construo civil. Assim sendo, oportuno verificar a evoluo do crdito imobilirio no perodo mais recente.

    De 2003 a 2010, a relao entre crdito e produto interno bruto (PIB) elevou-se de 24% para 46%. De acordo com Arajo (2012), o ciclo de expanso de crdito durante este perodo foi marcado por dois fatos distintos. At a ecloso da crise financeira de 2008 a 2009, a expanso do crdito foi liderada pelos bancos privados, os quais expan-diram as operaes de crdito a uma taxa superior dos bancos pblicos. Quando se analisa o estoque de crdito, por propriedade de capital e por setor de atividade, pos-svel perceber que os bancos privados,18 com exceo do crdito habitacional, estiveram frente durante os anos iniciais do ciclo nos setores industrial, rural, comercial e de pessoas fsicas. Contudo, desde 2008, a situao se inverteu. Em relao ao crdito

    17. Os recursos de crdito direcionados so oriundos do Fundo de Garantia do Tempo de Servio (FGTS) e da caderneta de poupana.18. De propriedade privada ou estrangeira.

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    B r a s l i a , a g o s t o d e 2 0 1 2

    para habitao, sua taxa de crescimento tem se mantido em geral bem acima daquelas alcanadas por outros setores. Durante o perodo assinalado, a taxa de crescimento do estoque de crdito para habitao se situou em 17% a.a. Contra a mdia geral, que inclui outras atividades indstria, crdito rural, comrcio, pessoa fsica e outros servios , a taxa foi de 12% a.a. No caso dos bancos pblicos, a taxa mdia de expanso do crdito para habitao ficou em 19% a.a.

    A relao crdito habitacional-PIB no Brasil, embora ainda seja baixa com-parada aos demais pases desenvolvidos, tem crescido muito nos ltimos anos. O crdito para a compra da casa prpria alcanou R$ 205,8 bilhes em janeiro de 2012 segundo dados do Banco Central do Brasil (BCB).19 No sem razo que, entre todas as categorias de empregos do setor privado indstria de transformao, comrcio, servios e construo civil , foi exatamente o setor da construo civil que apresentou a maior expanso no emprego.

    De acordo com os dados do Departamento Intersindical de Estatsticas e Estudos Socioeconmicos (Dieese) e da Fundao Sistema Estadual de Anlise de Dados (Seade, do estado de So Paulo), entre janeiro de 2011 e janeiro de 2012, de um total de 135 mil vagas de emprego criadas nas Regies Metropolitanas do Recife (RMR), de Salvador (RMS) e de Fortaleza (RMF), 76 mil (56,3%) estavam no setor de construo civil. Tal resultado levou a RMR a apresentar sua menor taxa de desemprego (11,9%) desde que a srie comeou a ser computada em 1997. Para a RMF, a construo civil criou 19 mil empregos, enquanto o mau resultado dos outros setores ocasionou uma reduo de 8 mil vagas de emprego. Em relao RMS, a construo civil criou 23 mil vagas, ao passo que a indstria eliminou 14 mil empregos.

    Em relao Regio Metropolitana de So Paulo (RMSP), em maio de 2010, o nvel de emprego na construo alcanou a marca de quase 735 mil trabalhadores, um recorde na srie histrica. Nos cinco primeiros meses do ano, a taxa de crescimento do emprego neste setor atingiu 7,5%, perfazendo uma elevao de 13% em doze meses. S no municpio de So Paulo, em maio de 2010, trabalhavam no setor de construo 341 mil trabalhadores, o maior valor da srie histrica.

    19. Do total de crdito habitacional, a maior parte (R$ 191,3 bilhes) corresponde a crditos direcionados operaes com recursos do governo, como o programa Minha Casa, Minha Vida, ou da parcela que os bancos so obrigados a recolher ao BCB, a qual tem juros mais baixos. Os R$ 14,5 bilhes restantes tm origem em operaes com recursos livres.

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    Existe Bolha no Mercado Imobilirio Brasileiro?

    De acordo com informaes do Sindicato da Indstria da Construo Civil do Estado de So Paulo (Sinduscon-SP), nos oito primeiros meses de 2011, o emprego no setor cresceu 9,4% no Brasil. Nos oito primeiros meses de 2010, tal crescimento foi de 14,8%. Entre maio de 2010 e maio de 2009, o crescimento foi de 16,3%, aproximadamente 380 mil novos empregos. Em setembro de 2011, eram 3 milhes de trabalhadores empregados no setor de construo civil com carteira assinada.

    Em fevereiro de 2012, de acordo com dados do Cadastro Geral de Emprego e Desemprego (CAGED) do Ministrio do Trabalho (MTE), o setor de construo civil apresentou crescimento do emprego com carteira assinada, em relao ao ms anterior, da ordem de 0,95%, contra 0,6% do setor de servios, -0,08% do comrcio, e -0,03% da agricultura. Assim, enquanto o estoque de empregos formais cresceu 0,4% em fevereiro de 2012, o setor de construo civil apresentou um crescimento duas vezes superior.

    Para janeiro de 2012, o crescimento do emprego com carteira na construo civil, em relao ao ms anterior, foi de 1,5%, contra 0,4% no setor de servios, -0,6% no comrcio varejista. Assim, enquanto o estoque de empregos formais cresceu 0,31% em janeiro de 2012, o setor de construo civil apresentou um crescimento trs vezes maior.

    Em janeiro de 2011, o crescimento do emprego com carteira assinada em relao ao ms anterior foi de 1,3% para a construo civil; 0,5% para o setor de servios; 0,5% para a agricultura; 0,7% para a indstria de transformao; e -0,2% para o comrcio. Para a economia como um todo, o crescimento no ms foi de 0,4%. Outros meses podem ser analisados, mas, de maneira geral, o resultado permanece sempre o mesmo: o setor de construo civil continua sempre entre os que apresentam o maior crescimento percentual do emprego. Isto mostra que a taxa de crescimento do emprego no setor de construo civil est extremamente alta, sendo sistematicamente superior dos demais setores.

    5.2 Estimao da equao fundamental

    Nesta subseo, apresentam-se os resultados da estimao da equao fundamental para o preo dos imveis, utilizando-se dados de sries de tempo agrupados para as cidades de So Paulo e do Rio de Janeiro. A informao acerca do preo de venda do imvel est disponvel para outras capitais, mas no acerca do preo do aluguel. Nas estimativas de sries temporais, ser estimada uma vertente da seguinte regresso:

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    B r a s l i a , a g o s t o d e 2 0 1 2

    . (7)

    na qual tq o preo de venda do imvel, td o preo do aluguel, ti a taxa de juros, e uma varivel dummy para diferenciar a cidade de So Paulo. Como proxy para 11 +tqE , ser usado o prprio valor da varivel tq em t+1, procedi-mento que embute um erro de medida, e para a taxa de juros, a taxa Selic. Os sinais esperados para os parmetros associados s variveis 11 +tqE e td possuam sinal positivo; para a varivel ti , o sinal esperado negativo.

    Usam-se aqui trs procedimentos economtricos distintos para estimar a equao (7): mtodo de mnimos quadrados ordinrios (MQO); mtodo de variveis instrumentais; e mtodo de momentos generalizados (GMM). O emprego do mtodo de variveis instrumentais para estimar (1) decorre do operador de expectativas racionais na equa-o que no observado. Tomando-se [ ] 111 | +++ += tttt vIqEq , em que [ ] 0|1 =+ tt IvE , tem-se que usando 1+tq em vez de [ ]tt IqE |1+ se est sujeito crtica relativa ao erro de medida caso a estimao seja feita por MQO.

    Antes de se comentarem os resultados, faa-se uma digresso acerca dos testes eco-nomtricos adotados aqui para verificar se a regresso est bem especificada. Embora muitos estudos utilizem a abordagem GMM para estimao de modelos com expecta-tivas racionais, deve-se assinalar que esta metodologia no necessariamente superior estimao por variveis instrumentais. Tal como ressaltam Baum, Schaeffer e Stillman (2007), a vantagem da abordagem GMM se d na presena de heteroscedasticidade.20 Neste caso, a vantagem da consistncia do estimador GMM na presena de heterosce-dasticidade contrabalanada pelo custo de uma performance fraca no caso de pequenas amostras. Deste modo, quando o problema da heteroscedasticidade no se faz presente, prefervel ainda o emprego do estimador de variveis instrumentais. Usa-se neste estudo o teste de Pagan e Hall21 (1983) para verificar a ocorrncia de heteroscedastici-dade no modelo.

    Para que a aplicao do mtodo IV seja adequada, necessrio que os instru-mentos sejam bons instrumentos, no sentido de serem relevantes bem como vlidos. No jargo economtrico, isto significa que as variveis usadas como instrumentos devem

    20. O estimador, embora seja consistente, ineficiente na presena de heteroscedasticidade (Baum, Schaeffer e Stillman, 2007). 21. Esse teste assume a hiptese nula de homoscedasticidade.

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    Existe Bolha no Mercado Imobilirio Brasileiro?

    ser correlacionadas com os regressores endgenos e ao mesmo tempo ortogonais ao dis-trbio da regresso. Neste sentido, tambm so mostrados na tabela 3 o teste de subiden-tificao22 (Cragg e Donald, 1993), o teste de sobreidentificao de Sargan e Hansen23 e o teste de endogeineidade dos regressores de Durbin, Wu e Hausman24 (DWH), alm do teste de Stock e Yogo (Stock e Yogo, 2005), para verificar se os instrumentos so fracos.25

    A pesquisa terica economtrica mais recente sobre o mtodo de variveis intru-mentais tem enfatizado muito a questo dos instrumentos fracos (Stock, Wright e Yogo, 2002; Moreira, 2003; Stock e Yogo, 2005). Ma (2002) aponta que o uso de instrumentos pode ser um srio problema em modelos economtricos. Quando os instrumentos so fracos, dois problemas srios ocorrem na estimao por dois estgios (2SLS). O primeiro a questo do vis. Embora o mtodo 2SLS seja consistente,26 as estimativas so sempre enviesadas para pequenas amostras. Segundo, quando os instrumentos so fracos, o erro padro estimado se torna muito pequeno. Neste caso, o intervalo de confiana no fidedigno, porque, alm de o ponto mdio deste estimador ser enviesado, o intervalo de confiana se torna pequeno. Isto tudo faz com que o procedimento de teste de hiptese na estimao por 2SLS se fragilize no caso da ocorrncia de instrumentos fracos.

    Vrios testes so sugeridos na literatura para testar a hiptese de instrumentos fracos.27,28 De acordo com Murray (2006), a mais recente abordagem em relao ao

    22. Para que uma equao seja identificada no modelo IV, tanto a condio de ordem (L>=K) em que L o nmero de variveis instrumentais, e K o nmero de regressores como a condio do posto devem ser preenchidas. Esta ltima assinala que Qxz=E(XZ) deve ser de posto completo, em que X a matriz de regressores, enquanto Z a matriz dos ins-trumentos. Quando isto no ocorre, diz-se que o modelo subidentificado ou no identificado. No teste de Cragg e Donald (1993), a rejeio da hiptese nula sugere que o modelo identificado. 23. A independncia do instrumento com relao ao distrbio somente pode ser acessada se, e somente se, houver uma abun-dncia de instrumentos, isto , se a equao sobreidentificada. Isto se d quando a condio de ordem satisfeita na desigual-dade: o nmero de instrumentos excludos superior ao de regressores endgenos. O teste de Sargan-Hansen usado para testar a hiptese de sobreidentificao. Sob a hiptese nula os instrumentos so vlidos, ou seja, no correlacionados com o distrbio. Ainda sob esta hiptese, a estatstica de teste tem distribuio qui-quadrado com L-K restries sobreidentificadas. 24. Sob a hiptese nula, este teste especifica que o regressor tomado como endgeno pode ser tratado como exgeno. A estatstica DWH possui distribuio qui-quadrado com grau de liberdade igual ao nmero de regressores endgenos. 25. Instrumentos que explicam pouco a variao da varivel explicativa endgena (fraca correlao entre Z e X) so considera-dos instrumentos fracos. O teste de Stock e Yogo (2005) calculado com base na estatstica F de Cragg e Donald (1993). Sob a hiptese nula o estimador fracamente identificado, no sentido de que o vis verificado inaceitavelmente grande. 26. De modo que quase certamente o valor mdio do estimador 2SLS se aproxima do verdadeiro valor do parmetro quan-do o tamanho da amostra convirja para o infinito. 27. Stock e Yogo (2005) sugerem um teste em que a hiptese nula, o vis do estimador 2SLS, menor que uma frao (diga-se, 10%) do estimador OLS.28. O teste de Stock e Yogo (2005) no mais recai na estatstica F que comumente aparece na prtica economtrica, mas em uma generalizao da estatstica de Cragg e Donald. Os valores crticos deste teste so obtidos a partir de uma distribuio no padro.

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    problema de teste de hiptese com instrumentos fracos e um nico regressor endgeno o teste da razo de verossimilhana condicional, desenvolvido por Moreira (2003) e aperfeioado por Andrews, Moreira e Stock (2006). O teste de Moreira (2003) supera as distores encontradas nos testes convencionais ajustando os valores crticos do teste de hiptese de acordo com cada amostra, de modo que o intervalo de confiana corrigido gere um nvel de significncia correto. Assim, seus valores crticos so condicionados nos dados disposio e no constante.

    Passe-se agora anlise dos resultados economtricos obtidos para a equao (7) apresentados na tabela 3. Estranhamente, na regresso estimada da coluna (1), apenas com exceo do preo futuro do imvel, os sinais para a taxa Selic e o preo do aluguel so contrrios ao esperado. Na coluna (2), estima-se por MQO uma equao em que somente o preo de venda futuro est fora do conjunto de regressores. Pode-se observar que agora ambas variveis taxa Selic e aluguel apresentam os sinais esperados. Embora no seja mostrada aqui por economia, estimou-se uma regresso contendo apenas a taxa Selic como varivel importante, e observou-se que o sinal negativo se manteve. Enquanto outro exerccio usando apenas o preo do aluguel na regresso mostrou tam-bm que o sinal positivo para esta varivel se preserva.

    Algumas possveis respostas podem ser dadas para explicar por que a regresso da coluna (1) no apresenta os sinais esperados enquanto tm-se os sinais apropriados para aquela da coluna (2). Primeiro, o termo 11 +tqE representa na equao (7) a expectativa de valorizao do imvel. Contudo, espera-se naturalmente que isto ocorra em um perodo de tempo adiante, mas no imediatamente frente, tal como no ms seguinte. No caso de um imvel comprado na planta, estipula-se que o prazo mnimo razovel para sua revenda de um ano e meio a dois anos, pelo menos. Assim, quando usam-se dados com frequncia temporal mensal a formao de expectativa um ms frente no capta o efeito da valorizao futura no preo corrente do imvel. Neste caso, o uso de dados anuais seria bem mais apropriado com vista a captar tal efeito.29 Segundo, tendo em vista a rigidez por fora dos contratos no caso do preo do aluguel, uma alterao nesta varivel ocorre somente com certa defasagem. Por este motivo, o valor corrente do preo do aluguel tem significncia no preo corrente do imvel. Terceiro, admite-se a hiptese de que o preo futuro de venda altamente correlacionado com o preo corrente do aluguel ou a taxa Selic. Veja-se se esta hiptese convincente.

    29. Infelizmente, neste estudo, o tamanho da amostra para dados anuais de apenas quatro anos.

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    Existe Bolha no Mercado Imobilirio Brasileiro?

    Na segunda coluna da tabela 3, estima-se a mesma regresso por MQO. O objetivo aqui verificar se existe a existncia de multicolinearidade no modelo por meio da estats-tica VIF (variance inflation factor). De fato, o valor 18.39 para esta estatstica excede em muito o devido, pois a literatura assinala que existe indicao de multicolinearidade se o VIF for maior que 5 (Judge et al., 1982). Na coluna (3), refaz-se a estimao por MQO para incluir o preo futuro de venda. Note-se que agora tanto o preo do aluguel quanto a taxa de juros se mostram significativos e com os sinais esperados. Tambm neste caso, a estatstica VIF indica que no existe problema de multicolinearidade na regresso. Na coluna (4), apresenta-se uma maneira indireta de tentar captar o efeito da expectativa do preo futuro de venda na equao fundamental. Isto foi feito introduzindo-se no conjunto dos regressores, em vez do preo futuro, o resduo da regresso (RES) desta varivel contra a taxa de juros e o preo do aluguel. O resultado disto, mostrado na coluna (4), parece indicar que a expectativa de valorizao tem efeito sobre o preo corrente do imvel. A varivel RES significativa e mostra ainda o sinal esperado.

    O exerccio efetuado nas duas ltimas colunas da tabela 3 consiste fundamentalmente em empregar a expectativa em relao ao preo futuro do aluguel em vez do seu valor cor-rente. Na coluna (5), deixa-se de fora a expectativa de preo futuro de venda, enquanto na coluna (6), o mtodo descrito usado para detectar o efeito desta varivel. Tendo em visto a presena de heteroscedastidade no modelo indicada pelo teste de Pagan e Hall, a estimao foi feita usando o mtodo GMM. Tambm a estimativa foi refeita usando os mtodos VI robustos,30 mas os resultados no apresentaram mudana significativa.

    Por fim, o teste DWH indica que nos casos analisados das colunas (1), (5) e (6); expec-tativa do preo futuro de venda ou do aluguel no pode ser tratada como varivel exgena no modelo. No que se refere ao problema de instrumentos fracos, os testes de Moreira e de Sock e Yogo no indicam qualquer sinal de que as variveis instrumentais empregadas sejam instrumentos so fracos. Tambm de acordo com o teste de Cragg e Donald, em todos os casos, os modelos esto identificados onde se aplica o mtodo IV. Igualmente, nestes casos, para todos os modelos no se rejeita a hiptese de sobreidentificao.

    30. Especifica a aplicao do estimador de Eicker, Huber e White para a varincia do estimador VI.

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    B r a s l i a , a g o s t o d e 2 0 1 2

    TABELA 3Varivel dependente: preo do imvel1

    Variveis(1)IV2

    (2)MQO

    (3)MQO

    (4)MQO

    (5)GMM

    (6)GMM3,4

    Lindpr (t+1) 1.0344 (.000) 1.025 (.000)

    Lindalg (t) -.0685 (.000) -.0574 (0.005) 1.520 (0.000) 1.522 (.000)

    Lindalg (t+1) _ _ _ _ 1.527 (.000) 1.542 (.000)

    Selic (t) .0011 (.002) .0010 (.006) -.0059 (.003) -.0058 (.000) -.0057 (.003) -.0038 (.000)

    RES _ _ _ 1.022 (.000) _ .9626 (0.000)

    D1 .0027 (.016) .0023 (.040) .0190 (.062) .0023 (.000) .0140 (.0720) .0353 (.000)

    Constante .3644 (.000) .3088 (.000) -5.959 (.000) -5.966 (.000) -6.034 (.000) -6.255 (.000)

    Observaes 92 100 102 100 92 92

    R2 Ajustado _ .998 0.969 .998 _ _

    VIF _ 18.39 1.00 1.00 _ _

    Teste Pagan e HallChi-sq (5) = 26.6P-value = 0.000

    Chi-sq (1) = 20.6P-value = 0.00

    Chi-sq (1)=2.25P-value = 0.134

    Chi-sq (1)=22.5P-value = 0.000

    Chi-sq (4)= 7.354P-value = 0.11

    Chi-sq (5)= 13.76P-value = 0.001

    Teste de subidentificaoChi-sq (2) =308.3

    P-val = 0.00 _Chi-sq (2) = 1175P-val = 0.000

    Chi-sq (2) = 317P-val = 0.000

    Teste de Sargan e HansenChi-sq (2)= 308.3P-val = 0.000

    Chi-sq (1) =3.624 P-val = 0.056

    Chi-sq (1) =6.341 P-val = 0.018

    Teste de DWHChi-sq (1)= 54.15P-val = 0.000 _

    Chi-sq (1)= 4.249P-val = 0.0385

    Teste de Stock e Yogo1125.62 (rejeito

    H0 a 5%) _5577.96

    (rejeito H0 a 5%)1321.12

    (rejeito H0 a 5%)

    Teste de MoreiraLR = 6324.79 25 (rejeito H0 a 5%)

    LR=2923.25(rejeito H0 a 5%)

    LR=1768.13(rejeito H0 a 5%)

    Elaborao dos autores.

    Notas: 1 Lindpr: ln do ndice de preo de venda do imvel. Lindalg: ln do ndice de preo do aluguel. 2 A expectativa foi instrumentalizada pelas defasagens de segunda e terceira ordem da varivel preo de venda.3 As estatsticas so robustas para resduos heteroscedsticos. Os valores entre parnteses so valores-p. 4 A expectativa foi instrumentalizada pelas defasagens de segunda e terceira ordem da varivel preo do aluguel.

    5.3 Existe presso inflacionria na construo civil?

    Conforme visto na seo dois, determinados pesquisadores argumentam que a bolha imobiliria brasileira se comprovaria porque o preo dos imveis estaria acima daquilo que se supe como o preo justo. Tal preo, segundo este raciocnio, deve cobrir os custos de produo, bem como conter uma margem para cobertura das incertezas. De acordo com os fundamentos da Escola Austraca, o erro desta argumentao est em que o valor de um bem decorre da utilidade que os indivduos do a ele. O preo de mer-cado determinado pela importncia que as pessoas atribuem a ele. Decorre deste racio-cnio que a estrutura de custo de um produto est indiretamente relacionada a quanto os indivduos aceitam pagar por ele. Fatores de produo usados na confeco de um bem altamente valorado tendem a se tornar mais caros, e vice-versa. Assim, segundo a Escola Austraca, a causalidade mais em direo do preo para o custo que o contrrio, isto , a valorao de um bem o que determina seu custo, e no o contrrio.

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    Existe Bolha no Mercado Imobilirio Brasileiro?

    Uma maneira de verificar se a hiptese de que a causalidade no sentido do preo do imvel em direo ao seu custo e no o contrrio pode ser feita testando-se a hip-tese de exogeneidade do preo do imvel ( tq ) na equao que descreve o custo de construo ( tc ). Esta equao pode ser posta da seguinte maneira:

    (8)

    em que: tc o custo de construo; ti a taxa de juros; tq o preo de venda do imvel; e SP uma varivel dummy para diferenciar a cidade de So Paulo. Como proxy para o custo de construo, usa-se aqui o ndice do custo da construo calculado pelo IBGE, e para a taxa de juros, a taxa Selic. Espera-se que o sinal para o parmetro associado varivel tq seja positivo, ao passo que para a varivel ti o sinal esperado para o parmetro negativo. A informao de preo de venda ( tq ) usado aqui o preodo imvel anunciado (Fipe, 2008), quando a varivel certa deveria ser preo de venda do imvel novo. Assim, a hiptese admitida aqui para contornar esta restrio de que ambas as medidas seguem a mesma tendncia de crescimento ao longo do tempo, o que parecer ser uma suposio razovel.

    Em modelos com somente uma equao, caso as variveis do lado direito no sejam exgenas, a regresso no ser eficiente e pode ser melhorada por um sistema de equaes. Por isso, em um modelo de uma equao, necessrio verificar se as variveis explicativas so exgenas. Sero usados trs procedimentos para testar a questo da exogeneidade da varivel tq na equao (8), que ser denotada por equao condicio-nal (EC). Em virtude de existir mais de uma maneira de definir exogeneidade, aqui se trabalha com o conceito de exogeneidade fraca. Os dois primeiros testes de exogenei-dade fraca requerem construir uma equao marginal para a varivel no lado direito da equao que se supe possa no ser exgena. Deve-se admitir que no existe uma maneira geral de construir a equao marginal (EM). Usam-se duas equaes marginais para tratar o processo gerador de tq tal como descrito na tabela 4.

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    B r a s l i a , a g o s t o d e 2 0 1 2

    TABELA 4 Equaes marginais para o preo do imvel

    EM_1 EM_2

    Elaborao dos autores.

    Obs.: td o preo de venda do imvel.

    A literatura aponta diversas maneiras de se testar exogeneidade fraca.31 Neste estudo, usam-se trs formas diferentes para verificar se o preo do imvel atende a esta proprie-dade na equao do custo (8). O primeiro teste foi proposto por Engle (1982) e consiste em verificar a correlao entre os erros das equaes marginais (1 e 2) com os erros da equao condicional (8). Uma baixa correlao seria um sinal em favor da aceitao da hiptese de fraca exogeneidade e, portanto, a estimao com base em uma nica equa-o eficiente. A tabela 5 mostra o resultado. Conforme pode ser visto, observa-se uma baixa correlao entre os erros das equaes condicional e marginal.

    TABELA 5 Correlao entre o erro das equaes marginal e condicional

    EM_1 -0.0107 EM_2 -0.0125

    Elaborao dos autores.

    O segundo teste usado para verificar exogeneidade fraca uma modificao do teste de Engle (1984). Aqui, o erro da equao condicional includo nas equaes marginais. Se o erro da equao condicional no estatisticamente significativo no processo marginal, isto significa que o preo do imvel fracamente exgeno na equa-o condicional. A tabela 6 mostra os resultados deste teste. Verifica-se que o erro da equao condicional no apresenta significncia estatstica em ambos os processos marginais. Com base no teste modificado de Engle (1984), conclui-se que o preo do imvel fracamente exgeno na equao condicional (8).

    O terceiro procedimento para verificar endogeneidade se faz usando o teste de Durbin, Wu e Hausman (DWH), que tem como base a estimao da equao con-dicional pelo mtodo VI com o objetivo de verificar a existncia de endogeneidade nesta equao. A hiptese nula do teste assinala que a estimao por MQO da equao renderia estimativas consistentes. A rejeio da hiptese nula indica que o regressor

    31. Sachsida (1999) faz uma ampla reviso sobre o tema de exogeneidade, ilustrando inclusive os procedimentos necessrios para se operacionalizarem os testes.

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    Existe Bolha no Mercado Imobilirio Brasileiro?

    endgeno e, por consequncia, a estimao por VI exigida. Este teste foi aplicado tomando o preo tq como endgeno e usando os conjuntos de instrumentos definidos pelas equaes marginais (1) e (2). Em ambos os casos, o teste de DWH no rejeitou a hiptese nula de exogeneidade para esta varivel. Assim, tendo em vista os trs testes desta subseo, conclui-se que a estimao da relao entre custo e preo do imvel por somente uma equao eficiente.

    TABELA 6Teste modificado de Engle (1984)

    Significncia estatstica do erro da EC na EM_1P-valor: 0.991

    Significncia estatstica do erro da EC na EM_2P-valor: 0.5971

    Elaborao dos autores.

    No conjunto, esses testes sugerem que o preo do imvel exerce presso sobre o custo, e no o inverso, o que se constitui em um argumento favorvel percepo da Escola Austraca.

    5.4 Avaliando a condio fiscal no Brasil

    O objetivo desta subseo avaliar o estado da poltica fiscal no Brasil. Uma medida quantitativa do estado da poltica fiscal til por pelo menos duas razes. Em primeiro lugar, saber quo restritiva ou expansiva a condio fiscal no momento corrente ajuda o formulador de poltica a determinar o curso da poltica fiscal necessrio a manter a dvida pblica em uma meta estabelecida, para um dado horizonte de tempo, o que contribui para o controle da inflao. Em segundo lugar, uma medida quantitativa da posio fiscal importante por razes histricas, indicando os perodos precisos em que a poltica fiscal foi mais acomodativa ou mais restritiva.

    Infelizmente, no h nenhum mtodo universalmente aceito para mensurar o estado da poltica fiscal. Difere