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 IV Encontro Nacional de Ensino de Ciências da Saúde e do Ambiente Niterói/RJ, 2014 1 “EXPLORANDO” UM SÍTIO ARQUEOLÓGICO SOB DIVERSOS OLHARES: DAS PRÁTICAS DE ENSINO AO ENSINO DAS PRÁTICAS EXPLORING AN ARCHAEOLOGICAL SITE IN OTHER PERSPECTIVES: TEACHING PRACTICE OF THE TEACHING PRACTICE Kelly Araújo Ferreira Krauzer 1 , Thamires Bello de Jesus 2 , Michele Pires Carvalho 3 , Josilene Erlacher Werneck Machado Falk 4 , Carlos Roberto Pires Campos 5  1 Instituto Federal do Espírito Santo/ Educimat/ [email protected] 2 Instituto Federal do Espírito Santo/ Educimat /  [email protected] 3 Instituto Federal do Espírito Santo/ Educimat / [email protected] 4 Instituto Federal do Espírito Santo/ Educimat /  josivida@ho tmail.com 5 Instituto Federal do Espírito Santo/ Educimat / [email protected] RESUMO Este trabalho propõe uma re flexão sobre a educação cientifica realizada em espaços não formais de aprendizagem, da perspectiva da teoria histórico- cultural de Vygotsky, base  para a práxis pedagógica. Discute, nessa abordagem , a importância das aulas de campo, destacando como estas podem favorecer um olhar crítico sobre o cotidiano e o conhecimento científico imersos nos fenômenos naturais e culturais observados. A  pesquisa empregada foi qualitativa, com procedimentos caracterís ticos da observação  participante. O espaço de investigação foi delimitado em um sítio arqueológico, constituído por um sambaqui, em Presidente Kennedy, sul do Espírito Santo. A prática foi mediada pelo professor e desenvolvida pelos sujeitos de forma investigativa e interdisciplinar, sendo o local explorado por meio de determinação da poligonal e análise malacológica dos elementos encontrados. A experiência vivida rompeu com  paradigmas de uma educaçã o tradici onal, quando enfatizou a construção do conhecimentos de forma significativa. Palavras-chave: práticas pedagógicas; espaços não formais; educação cientifica, sítios arqueológicos. ABSTRACT This paper proposes a reflection on science education held in non-formal learning spaces , from the perspective of cultural-historical theory of Vygotsky , basis for  pedagogi cal praxis . Discusse s this approach, the importance of field classes , highlighting how they can encourage a critical look at the everyday and scientific knowledge immersed in natural and cultural phenomena observed . The maid was a qualitative study with procedures characteristic of part icipan t o bserv ation . T he research area was delimited in an archaeological site consisting of a sambaqui in President Kennedy , south of the Holy Spirit . The practice was mediated by the subject teacher and developed investigative and interdisciplinary way , being the site explored by determining the polygonal malacological and analysis of elements found . The experience broke with traditional paradigms of education, when he emphasized the construction of knowledge in a meaningful way . Key words: práticas pedagógicas; espaços não formais; educação científica, sítios arqueológicos.

Explorando Um Sítio Arqueológico Sob Diversos Olhares Das Práticas de Ensino Ao Ensino Das Práticas

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Este trabalho propõe uma reflexão sobre a educação cientifica realizada em espaços não formais de aprendizagem, da perspectiva da teoria histórico- cultural de Vygotsky, base para a práxis pedagógica. Discute, nessa abordagem, a importância das aulas de campo, destacando como estas podem favorecer um olhar crítico sobre o cotidiano e o conhecimento científico imersos nos fenômenos naturais e culturais observados. A pesquisa empregada foi qualitativa, com procedimentos característicos da observação participante. O espaço de investigação foi delimitado em um sítio arqueológico, constituído por um sambaqui, em Presidente Kennedy, sul do Espírito Santo. A prática foi mediada pelo professor e desenvolvida pelos sujeitos de forma investigativa e interdisciplinar, sendo o local explorado por meio de determinação da poligonal e análise malacológica dos elementos encontrados. A experiência vivida rompeu com paradigmas de uma educação tradicional, quando enfatizou a construção do conhecimentos de forma significativa.

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    EXPLORANDO UM STIO ARQUEOLGICO SOB DIVERSOS OLHARES:

    DAS PRTICAS DE ENSINO AO ENSINO DAS PRTICAS

    EXPLORING AN ARCHAEOLOGICAL SITE IN OTHER PERSPECTIVES:

    TEACHING PRACTICE OF THE TEACHING PRACTICE

    Kelly Arajo Ferreira Krauzer1, Thamires Bello de Jesus

    2, Michele Pires Carvalho

    3,

    Josilene Erlacher Werneck Machado Falk4, Carlos Roberto Pires Campos

    5

    1Instituto Federal do Esprito Santo/ Educimat/[email protected]

    2Instituto Federal do Esprito Santo/ Educimat / [email protected] 3Instituto Federal do Esprito Santo/ Educimat /[email protected]

    4Instituto Federal do Esprito Santo/ Educimat /[email protected] 5Instituto Federal do Esprito Santo/ Educimat /[email protected]

    RESUMO

    Este trabalho prope uma reflexo sobre a educao cientifica realizada em espaos no

    formais de aprendizagem, da perspectiva da teoria histrico- cultural de Vygotsky, base

    para a prxis pedaggica. Discute, nessa abordagem, a importncia das aulas de campo,

    destacando como estas podem favorecer um olhar crtico sobre o cotidiano e o

    conhecimento cientfico imersos nos fenmenos naturais e culturais observados. A

    pesquisa empregada foi qualitativa, com procedimentos caractersticos da observao

    participante. O espao de investigao foi delimitado em um stio arqueolgico,

    constitudo por um sambaqui, em Presidente Kennedy, sul do Esprito Santo. A prtica

    foi mediada pelo professor e desenvolvida pelos sujeitos de forma investigativa e

    interdisciplinar, sendo o local explorado por meio de determinao da poligonal e

    anlise malacolgica dos elementos encontrados. A experincia vivida rompeu com

    paradigmas de uma educao tradicional, quando enfatizou a construo do

    conhecimentos de forma significativa.

    Palavras-chave: prticas pedaggicas; espaos no formais; educao cientifica,

    stios arqueolgicos.

    ABSTRACT

    This paper proposes a reflection on science education held in non-formal learning

    spaces , from the perspective of cultural-historical theory of Vygotsky , basis for

    pedagogical praxis . Discusses this approach, the importance of field classes ,

    highlighting how they can encourage a critical look at the everyday and scientific

    knowledge immersed in natural and cultural phenomena observed . The maid was a

    qualitative study with procedures characteristic of participant observation . The research

    area was delimited in an archaeological site consisting of a sambaqui in President

    Kennedy , south of the Holy Spirit . The practice was mediated by the subject teacher

    and developed investigative and interdisciplinary way , being the site explored by

    determining the polygonal malacological and analysis of elements found . The

    experience broke with traditional paradigms of education, when he emphasized the

    construction of knowledge in a meaningful way .

    Key words: prticas pedaggicas; espaos no formais; educao cientfica, stios

    arqueolgicos.

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    INTRODUO

    As tendncias para educao cientfica da atualidade se constituem em grandes

    desafios a serem enfrentados pelos professores de cincias, quando tocam na questo de

    que a metodologia de ensino e o suporte terico-pedaggico precisam estar ancorados

    em uma teoria da aprendizagem. Isso, porque o conhecimento ativamente construdo

    pelo aprendiz, no sendo, pois, somente repassado pelo professor. Essa perspectiva

    aponta para a relevncia da abordagem scio-cultural, aproximando a psicologia

    histrico cultural de Vygotsky dos processos de aprendizagem fundados no

    desenvolvimento integral do educando, promovendo o homem cidado.

    O ensino de cincias na atualidade, segundo Cachapuz (2009), depende de

    intensa renovao e precisa avanar nas questes relativas cidadania, utilizando temas

    do cotidiano dos estudantes, que sejam de interesse social e que se associem a aspectos

    tecnolgicos, sociais e econmicos. Tudo isso com o objetivo de propor reflexes sobre

    os diversos conhecimentos com vistas a uma formao crtica, que incentive a o debate

    poltico, social e ambiental. Esta uma preocupao em nvel mundial, presente

    sobretudo no movimento CTSA (Cincia, Tecnologia, Sociedade e Ambiente).

    Demo (2010), quando discorre sobre a educao cientfica, usa como

    parmetro as exigncias do mundo atual. Neste contexto, compreende que a necessidade

    dos indivduos vai alm da obteno de acervos de conhecimento, busca, sobretudo, o

    desenvolvimento de habilidades diferenciadas, tais como a competncia comunicativa, a

    habilidade para trabalhar em grupo, de forma multidisciplinar, em uma perspectiva

    cidad. Assim, no ambiente formal escolar, a aprendizagem - por transmisso - de uma

    cincia fechada, de feitos cientficos, de contedos prontos e acabados, no condiz com

    as necessidades do mundo globalizado.

    Partindo do pressuposto que o espao estritamente formal escolar no possui

    condies de acompanhar todos os avanos cientficos e seus impactos na sociedade

    como afirmam Krasilchik e Marandino (2007), que se acredita que espaos no

    formais de educao, como instituies museais, reservas ambientais, ambientes

    naturais e culturais, podem ser fundamentais no desenvolvimento da prxis pedaggica

    mediada. Nestes termos, a educao formal, atuando em espaos no formais de

    educao (ENFE), amplia seus horizontes, favorecendo aos estudantes o contato direto

    com o fenmeno a ser investigado, oferecendo-lhes a possibilidade de agir em situaes

    prticas, que culminem com reflexo, discusso e conscientizao.

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    Um outro elemento importante a ser considerado em prticas pedaggicas em

    ENFE diz respeito possiblidade de realizar um trabalho transdisciplinar, pois in loco

    os fenmenos naturais e culturais encontram-se entrelaados, constituindo a realidade

    total do ambiente de estudo. Esta uma outa mudana que precisa ser incorporada pela

    escola, porque a fragmentao do conhecimento, como afirma Morin (2003), a falta de

    dilogo entre as disciplinas, no permitem a construo de um estado de unidade. Para

    Morin (2003 p.38) preciso unificar em vez de separar, j que vivemos submersos na

    complexidade do mundo. A fragmentao em cincias biolgicas e humanas tem

    anulado a noo de vida e de homem, pois unidades complexas, como o ser humano ou

    a sociedade, so multidimensionais: dessa forma, o ser humano ao mesmo tempo

    biolgico, psquico, social, afetivo e racional.

    Os espaos no formais de educao possuem, tambm, o condo, segundo

    Gohn 2011, de propiciar aes interativas entre os indivduos, as quais so

    fundamentais para a aquisio de novos saberes, em que:

    ...O agir comunicativo dos indivduos, voltado para o entendimento dos fatos

    e fenmenos sociais cotidianos, baseia-se em convices praticas, muitas delas advindas da moral, elaboradas a partir das experincias anteriores,

    segundo as tradies culturais e as condies histrico-sociais de

    determinado tempo e lugar. (GOHN, 2011 p .112).

    Neste lance, a aula de campo possibilita que o professor trabalhe nesses

    espaos com atividades que valorizam e problematizam temas da atualidade,

    impossveis de virem tona dentro da sala de aula, caso de um stio arqueolgico, por

    exemplo, o qual se constitui em um ambiente culturalmente construdo, dotado de

    mltiplas potencialidades temticas.

    A educao no formal trazida por Gohn (2011) tem como meta o aprender a

    conviver com a diversidade, socializando-se com adaptao do grupo a diferentes

    culturas e construo da identidade coletiva de um grupo. Alm de se preocupar com a

    reconstituio da memria e da identidade local, a educao no formal contribui para

    desenvolver vnculos sociais, contribuindo para a apropriao e ressignificao de

    espaos pblicos.

    A MEDIAO NOS ESPAOS EDUCATIVOS NO FORMAIS

    Vygotsky fundamenta-se no materialismo dialtico, que confere a sua teoria

    uma perspectiva histrico-cultural por meio da qual, Scalcon (2002) ressalta que,

    [...] o homem um ser histrico que se constri atravs de suas relaes

    como o mundo natural e social. Mais do que isso, um homem que se

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    diferencia como espcie pela capacidade de transformar a natureza atravs de

    seu trabalho, por meio de instrumentos por ele mesmo criados e

    aperfeioados ao longo do desenvolvimento histrico humano (SCALCON,

    2002, p. 51).

    Vygotsky, (2005, 2007) ao conceber o social como o princpio da

    aprendizagem, defende que toda relao do indivduo com o mundo se processa por

    meio de instrumentos, tcnicas e linguagem. Assim, ao estudar os mecanismos

    psicolgicos do ser humano, identificou que desenvolvimento das funes psicolgicas

    superiores ocorrem por meio de processos de mediao caracterizados pela relao do

    homem com o mundo e tambm com outros homens, e tambm, que esta relao

    mediada por instrumentos e signos. Decorre desta relao o instrumento, compreendido

    como algo

    [...]entre o trabalhador e o objeto de seu trabalho, ampliando as

    possibilidades de transformao da natureza. Ele carrega consigo, portanto, a

    funo para o qual foi criado e o modo de utilizao desenvolvido durante a

    histria do trabalho coletivo. , pois um objeto social e mediador da relao entre o indivduo e o mundo (OLIVEIRA, 2008, p. 29).

    Partindo do pressuposto de que o ensino de cincias pode ocorrer em diversos

    contextos educacionais e espaciais, defenderemos que uma aula de campo em ENFE

    pode colaborar para a formao do homem cidado, visto que, pautado em pressupostos

    histrico culturais, em contato com o meio, com a historicidade, de forma interativa, sob

    interveno do professor, o trabalho em campo pode desenvolver nele um olhar crtico

    sobre a realidade e relacionar o conhecimento cientfico com seu cotidiano.

    Neste sentido, a importncia da aula de campo reside no fato de possibilitar o

    contato dos estudantes com inmeras vivncias que podem se tornar em um

    conhecimento significativo, corroborado pelas interaes com objetos de aprendizagem

    e com as relaes estabelecidas entre as pessoas e o meio.

    Muitos trabalhos tm sido publicados em diversos eventos apontando as

    vantagens desse tipo de estratgia de ensino, entre os quais citamos Oliveira e Correia

    (2013); Santos, Bezerra, Firmino e Rangel (2013) e Seniciato e Cavassan (2004).

    Entretanto, sair da sala de aula, levar alunos para espaos no formais e continuar a

    trabalhar de forma expositiva no significa alcanar o carter inovador apontado por

    estudos no ensino de cincia. De acordo com Viveiro e Diniz (2009), importante que a

    atividade de campo no compreenda s a sada, mas todas as outras etapas como o

    planejamento, a execuo, a explorao dos resultados e a avaliao.

    No trabalho de Albuquerque, Angelo e Dias (2012) fica claro que um trabalho

    de campo, realizado dentro de um contexto metodolgico organizado, estimula a

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    produo de um conhecimento crtico. Oliveira e Gastal (2009) afirmam que o processo

    de ensino aprendizagem pode ter sua eficcia melhorada quando o conhecimento

    trabalhado se torna mais facilmente assimilvel pelo aluno.

    Dessa forma, pretendemos defender nesse trabalho, de uma perspectiva

    histrico-cultural, as aulas de campo como uma estratgia didtica capaz de promover

    dilogos para a construo do saber de forma significativa, ultrapassando a

    compartimentalizao das fronteiras entre as disciplinas curriculares.

    PERCURSO METODOLGICO E A EXPERINCIA EM UM SAMBAQUI

    A aula de campo no stio arqueolgico foi realizada no dia 29 de junho de

    2013, em um sambaqui, sitio arqueolgico pr-histrico, caracterstico de ambientes

    costeiros, localizado na bacia sedimentar adjacente ao rio Itabapoana em Presidente

    Kennedy, no sul do Espirito Santo. Participaram desta ao, professores da educao

    bsica das disciplinas de Matemtica, Biologia e Geografia.

    Para Silva (2010), as aulas de campo so consideradas caminhos alternativos

    para se construir o conhecimento, a autora ainda ressalta a importncia dos trs

    momentos de planejamento necessrios para que tal estratgia tenha sucesso, o pr-

    campo, o campo e o ps-campo. Este processo importante pois propiciar maior

    interao dos alunos, destacando que em campo, a todo momento, relaciona-se teoria e

    prtica: [...] O trabalho de campo objetiva trazer ao aluno um olhar crtico sobre a

    realidade e a teoria compreendendo-a dialeticamente (SILVA 2010, p. 188).

    De acordo com Silva (2010), aulas de campo no devem servir para repetio

    de conhecimentos, mas para uma construo cientfica. importante evidenciar que no

    pode haver desconexo com o conjunto de matrias, ou seja, os contedos esto dentro

    de uma mesma rede de saberes e os alunos s constroem conhecimentos quando estes

    saberes so apresentados de forma interdisciplinar no fragmentada. As trs etapas

    necessrias para o trabalho de campo so, assim, apresentadas por Silva (2010).

    1- Pr-campo: Etapa considerada fundamental para situar o aluno com apresentao

    de roteiros, objetivos da aula e finalidade daquele estudo.

    2- Campo: Precisa ser visto pelos alunos como um lugar de discusso e

    compreenso da prtica relacionada s teorias discutidas em sala de aula. Deve-

    se estimular a curiosidade, o respeito de opinies, a percepo e os debates.

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    3- Ps-Campo: o momento de se propor uma leitura crtica do espao observado.

    Pode-se extrair o conhecimento dos alunos por meio da produo de relatrios,

    feiras culturais, teatros, construo de maquetes, mesas redondas etc

    O objetivo desta experincia foi trabalhar diferentes prticas de ensino, sob

    diferentes olhares, interagindo contedos de trs disciplinas, a fim de um propsito

    maior: a delimitao do stio arqueolgico visando a explorar a regio sem danificar ou

    intervir fisicamente na mesma, a fim de contribuir para sua preservao. Para tanto,

    foram utilizadas as seguintes ferramentas para a realizao da prtica: trena, teodolito

    caseiro, GPS (Sistema de Posicionamento Global), mquina fotogrfica, trip, estacas e

    pranchetas, conforme imagem abaixo.

    Figura 1: Ferramentas utilizadas no campo

    O teodolito caseiro um instrumento utilizado para medir ngulos (verticais e

    horizontais), confeccionado com uma transferidor de 360, um canudo de sorvete, um

    copo de requeijo e uma superfcie rgida para apoio como um pedao de madeira ou

    papelo. Este instrumento pode ser confeccionado pelos prprios alunos durante as

    aulas de matemtica ou geografia. Na ocasio foi confeccionado o teodolito caseiro

    conforme imagem seguinte.

    Figura 2: Teodolito caseiro

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    RESULTADOS E DISCUSSO

    A experincia foi realizada no stio arqueolgico pr-histrico, intitulado

    Sambaqui Campinho. Os sambaquis so stios arqueolgicos construdos com material

    conchfero, de complexa estratigrafia, formada por contnuas deposies de conchas e

    material faunstico como restos de peixes, moluscos, aves e mamferos, atestando

    formas de ocupao e atividade diversificadas. O termo sambaqui deve ser utilizado

    para caracterizar stios arqueolgicos localizados s margens de volumosos cursos

    dgua, tais como o mar, grandes rios, lagunas e manguezais, constituindo-se

    plataformas secas que se destacam em meio a uma paisagem, constituindo-se, por fim,

    elas mesmas, cultura material (GASPAR, 2000). Na experincia, foi possvel explorar

    diferentes prticas de ensino, e diferentes contedos de trigonometria, geometria,

    semelhana de tringulos, permetro e rea, distncias, coordenadas do plano, sistemas

    de posicionamento, noes de lateralidade e espao, estudos cartogrficos,

    caractersticas fsicas e qumicas de materiais geolgicas do solo, cartografia,

    caractersticas de fauna e flora, teorias evolucionistas, classificao biolgica, aspectos

    da histria dos assentamentos humanos na costa brasileira e preservao ambiental e

    patrimonial.

    Tambm foi trabalhado o ensino considerando outros tipos de contedos como

    os procedimentais, ao incentivar o uso de diversos instrumentos para desempenhar

    diferentes prticas, como a utilizao do GPS, do teodolito e da trena, a construo do

    teodolito e o trabalho em equipe. Incialmente, fizemos o reconhecimento do local a ser

    delimitado com o objetivo de verificar os seus limites. O objetivo era construir uma

    poligonal conforme ilustrada na figura 7. Aps o reconhecimento do espao, fizemos a

    identificao dos vrtices da poligonal e, nestes pontos, colocamos as estacas ( fig. 3).

    As perguntas que direcionaram o prosseguimento do trabalho foram: Como

    determinar a distncia exata entre os vrtices da poligonal? Como determinar o ngulo

    exato entre os vrtices? As respostas das indagaes nos conduziram a prticas de

    ensino que pudessem abordar todos os contedos listados anteriormente, alm de

    direcionar para prticas de delimitao de poligonais realizadas por profissionais da

    topografia1.

    1 a cincia que estuda e determina analiticamente as medidas de rea e permetro,

    localizao, orientao, variaes no relevo e ainda as representa graficamente em cartas (ou plantas) topogrficas.

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    Uma vez postas todas as estacas nos limites do terreno a ser mapeado,

    iniciamos a delimitao da poligonal. A delimitao compreende o processo de

    determinar o comprimento dos lados e o ngulo interno () formado pelos lados (fig. 4).

    Figura 3: Estaqueamento da rea Figura 4: ngulo de uma poligonal

    Inicialmente, posicionamos o teodolito no ponto 2, apontamos para o ponto 3 e

    zeramos a medio, ou seja, apontamos a marcao zero grau para o ponto 3, depois

    giramos o teodolito at que a mira chegasse ao ponto 3, conforme figura 3.

    Figura 5: Medio dos ngulos internos da poligonal

    Com esta prtica, trabalhamos o conceito de tipo de ngulos e trigonometria.

    Uma vez determinado o ngulo , medimos a distncia entre os pontos 1 e 2 e depois

    entre os pontos 2 e 3, com o auxlio de uma trena de 50 metros, com isso determinamos

    a medida dos lados, como ilustra a figura 4. Este processo foi repetido em todos os

    vrtices da poligonal, demarcado pelas estacas

    Figura 6: Medindo a distncia entre as estacas

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    Como forma de registrar a localizao geogrfica de cada ponto, utilizamos o

    GPS, o qual nos forneceu as coordenados geogrficas de cada ponto em um sistema de

    latitude e longitude (tabela 1). Com esta prtica foi possvel trabalhar os conceitos de

    localizao espacial, visto que era possvel estabelecer estimativas para as coordenadas

    de cada ponto a serem calculadas pelo GPS, com base na sua localizao.

    Tabela 1: Coordenadas dos vrtices da

    Ao determinar todos os ngulos internos e o comprimento dos lados, enfim,

    delimitamos a poligonal que determina os limites do stio arqueolgico. Aps registar

    todos os pontos que constituem a poligonal, utilizamos o software Google Earth,

    programa gratuito, para localizar a poligonal por meio de uma imagem de satlite,

    conforme imagem seguinte ( fig. 7).

    Figura 7: Representao da poligonal no Google Earth e vista

    COORDENADAS

    PONTOS LATITUDE LONGITUDE

    1 2112'38.47"S 41 3'28.32"O

    2 2112'38.59"S 41 3'28.71"O

    3 2112'38.48"S 41 3'28.84"O

    4 2112'38.75"S 41 3'29.21"O

    5 2112'38.69"S 41 3'29.31"O

    6 2112'38.97"S 41 3'29.77"O

    7 2112'39.61"S 41 3'29.39"O

    8 2112'39.42"S 41 3'29.12"O

    9 2112'39.26"S 41 3'29.12"O

    10 2112'39.20"S 41 3'28.82"O

    11 2112'38.96"S 41 3'28.60"O

    12 2112'38.99"S 41 3'28.45"O

    13 2112'38.75"S 41 3'28.27"O

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    importante ressaltar que as medidas encontradas possuem uma margem de

    erro considervel, visto que o instrumento utilizado para medida dos ngulos, o

    teodolito, um instrumento caseiro, que possui suas limitaes. Entretanto, o prprio

    conceito de estimativas e margem de erros so contedos importantes a serem

    trabalhados numa prtica como essa.

    Aps determinao a rea do stio, foram coletadas amostras de solos de

    diferentes pontos, que foram etiquetadas com a localizao da coleta e depois

    caracterizados segundo anlise granulomtrica, tais como tipos de sedimentos,

    transporte, tamanho, colorao segundo Tabela Munsell, para isso, foram utilizadas,

    pequenas colheres e sacos coletores de solo. Trabalhamos com uma escala

    granulomtrica.

    Considerando os conhecimentos da rea biolgica, um dos aspectos que foram

    analisados pelos participantes da aula no stio arqueolgico corresponde a

    caracterizao da fauna, flora e da degradao ambiental.

    Alm disso, os alunos tambm puderam exercitar a classificao de grupos biolgicos

    encontrados no stio com auxilio de chaves de classificao, uma atividade que foi

    executada de forma prtica, a qual, em sala de aula, os professores trabalham de forma

    abstrata ou apenas terica.

    Na aula, os participantes puderam observar a degradao ambiental da regio,

    que sofre ao antrpica decorrente da explorao de recursos naturais. Alm disso, foi

    possvel perceber o descaso com stios arqueolgicos. O Sambaqui Campinho, por

    exemplo, somente possui, segundo relato de moradores, 20% do que j foi um dia. A

    utilizao das conchas como base para pavimentao de vias vicinais e como matria

    prima para a cal devastou pelo menos mais da metade dos sambaquis do sul capixaba.

    Outro fator relacionado degradao ambiental foi direcionado para o solo, o

    qual foi analisado em relao a sua granulometria e caractersticas organolpticas,

    inserido, conhecimento da rea de geologia e dos cuidados necessrios no usufruto e na

    conservao de espaos de stios arqueolgicos.

    Ao coletar pequenas amostras de solo e realizar o teste com cido clordrico,

    conseguimos identificar o potencial de carbono contido, o que atesta aes culturais.

    Testes simples assim ajudam a ampliar a compreenso de tempo, espao e histria, pois

    as reaes qumicas dos testes realizados nos materiais coletados podem explicar

    fenmenos naturais que aconteceram ao longo de tempo naquela regio.

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    As atividades propuseram uma intima ligao entre os saberes geolgicos,

    qumicos, histricos e biolgicos, ultrapassando o carter meramente disciplinar,

    propondo um olhar mais sobre a cincia a partir de sua complexidade. Em relao aos

    aspectos geogrficos da regio, os participantes puderam analisar os tipos de relevo que

    compem a regio, conhecer o processo de formao de uma bacia sedimentar, estudar

    intemperismo, eroso, formao de ambientes de sedimentao, e compreender a

    importncia dos rios no componente da paisagem local.

    Por meio das situaes encontradas em campo tambm foi possvel

    problematizar ou criar resolues de problemas a serem trabalhadas pelos alunos,

    trazendo a criticidade como elemento componente de contedos atitudinais a serem

    considerados como relevantes para formao cidad.

    O trabalho de explorao do stio arqueolgico de forma interdisciplinar

    permite que as disciplinas de matemtica, geografia e biologia dialoguem em favor de

    um conhecimento interligado. Alm disso, em uma experincia como a descrita, as

    cincias escolares so relacionados ao prprio ambiente de ao. , portanto, por meio

    da interao entre sujeito aprendiz e objetos de conhecimento, mediada pelos

    instrumentos de aprendizagem, que os olhares crticos so construdos.

    CONSIDERAES FINAIS

    Os espaos de educao no formal so capazes de auxiliar na ampliao de

    conceitos e na construo do conhecimento por meio da interao com os objetos que os

    constituem e que estimulam a significao descrita por Vygotsky como importante para

    compreenso do mundo e sobre ele atuar. Os instrumentos utilizados em uma aula de

    campo em um EENF possibilitam que o ensino de diferentes prticas sejam executadas.

    As prticas realizadas no campo, como a delimitao da poligonal, promoveram

    a interao do homem com o meio visando produo de conhecimentos. Estes

    conhecimentos, por sua vez, possibilitaram a criao de sujeitos mais crticos e

    conscientes das potencialidades de ensino encontradas em um EENF. , portanto, por

    meio deste olhar crtico que um sujeito ser capaz de relacionar o conhecimento

    cientfico com o conhecimento adquirido nas experincias, tornando-se sujeito de seu

    prprio conhecimento. O trabalho tambm buscou ampliar o conhecimento sobre

    assentamentos humanos pr-histricos e contribuir para sua preservao.

  • IV Encontro Nacional de Ensino de Cincias da Sade e do Ambiente

    Niteri/RJ, 2014

    12

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