Extratos de 4 Bestiários Medievais

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Le Bestiaire (c. 1121-1152)

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Extratos de 4 Bestirios medievais

Extratos de 4 Bestirios medievais1. Le Bestiaire (c. 1121-1152)vv. 25-390 [1]Philippe de Than

O Leo

O que em grego se chama leo significa rei em francs. O leo, de vrias formas, domina muitos animais. Por isso o leo rei. Escutai agora suas propriedades.

Tem a expresso ardente, o pescoo grosso e com juba; o peito, na frente, quadrado, valente e agressivo, os quartos traseiros, delgados; tem um grande rabo e as patas lisas e geis prximas aos ps; os ps, grossos e cortados, tm unhas largas e curvadas. Quando tem fome, enfurecido, trata os animais como a esse asno que urra e fala [2]. Escutai, pois, com toda a convico, o significado disso.

O leo significa o Filho da Virgem Maria. , sem dvida alguma, o rei de todos os homens; por sua prpria natureza, tem poder sobre todas as criaturas. Com atitude feroz e terrvel vingana aparecer aos judeus quando os julgar, pois eles obraram mal quando o cravaram na cruz, e devido a esta ao perversa no tm rei prprio. O peito quadrado representa a fora divina; os quartos traseiros muito delgados mostram que Ele foi humano depois de divino; o rabo, a justia que se fecha sobre ns; mediante a pata, que tem lisa, mostra que Deus rpido, e que foi conveniente se entregar por ns; o p, que tem cortado, mostra que Deus rodear o mundo e o ter no punho; atravs das unhas, se entende a vingana contra os judeus, e pelo asno entendemos evidentemente aos judeus. O asno estpido por natureza, como diz a Escritura, e no sair de seu caminho a menos que o arranquem dali. A mesma natureza tm os judeus, que so uns nscios: no crem em Deus, a no ser pela fora; no se convertero, a menos que Deus lhes d essa merc. Escutai agora outra natureza, segundo o texto sagrado.

Quando o leo quer caar e comer uma presa, traa um crculo no solo com seu rabo, como est comprovado; sempre que quer apanhar uma vtima, deixa uma abertura que sirva de entrada aos animais que deseja e que quer converter em sua presa. Tal sua natureza que no haver besta alguma que possa ultrapassar seu limite, nem ir alm. Isto o que mostra a ilustrao [3], e tem um sentido figurado.

O rabo, conforme indica o texto sagrado, a justia que pende sobre ns; pelo crculo, temos que entender naturalmente o Paraso, e a brecha a entrada disposta para ns, se fazemos o bem e abandonamos o mal; e ns somos representados pelas bestas, naturalmente.

Quando o leo est enfurecido, golpeia com suas patas, pisoteia a terra quando se encontra desgostoso, e esta propriedade est refletida pelo desenho.

Atravs do leo entendemos a Jesus Cristo, e ns somos sua terra em figura humana. Ento, quando nos castiga com alguma desgraa sem que tenhamos cometido maldade nem tenhamos m vontade, isto significa sua ira, e que o maltratamos de alguma maneira. Quando no se porta com as gentes conforme todos os seus desejos e se vem encarcerados ou com enfermidades, dizem ento os infelizes que Deus no os ama em absoluto e que no merecem que os castigue assim; no sabem os afligidos que Deus no os castiga antecipadamente, que Deus pe em dificuldades a quem estaria menos atribulados se pudesse decidir e fazer o que quisesse. Mas Deus os acorrenta ao mal para que no cometam maldades. Deus ama muito a quem quer castigar; recordai, pois este o significado.

Tambm diz a Escritura que o leo tem a seguinte natureza: quando o homem o persegue, vai com o rabo apagando suas pegadas do solo enquanto foge, para que o caador no saiba como encontr-lo. Isto tem um grande sentido, e deveis record-lo.

O leo, ao fugir, vai cobrindo suas pegadas: o rastro do leo representa a Encarnao que Deus quis tomar na terra para conquistar novas almas. E certamente o fez secretamente: se colocou nos degraus em que se encontrava cada ordem - profetas, apstolos - at que chegou ao nosso, se converteu em homem de carne e osso, se fez mortal por ns e assim, segundo uma ordem aceitvel, venceu o demnio. O demnio enganou o homem; Deus venceu o homem, que no o reconheceu, e depois ao diabo, mediante sua adequada virtude. Se o demnio tivesse sabido que aquele homem mortal era Deus, no o havia conduzido crucificao. Assim Deus obrou habilmente, sem que o demnio se dessa conta; Deus se ocultou de nosso inimigo, que no soube que Deus era aquele homem at que o comprovou. Deus se ocultou tanto que os anjos do cu que estavam no Paraso no o reconheceram. Por isso, quando voltou o Filho de Deus em majestade para o lugar de onde havia partido quando se encarnou por ns, perguntaram aos anjos que estavam com ele:

- Quem esse rei de glria que regressa com o triunfo? Os que estavam com Deus deram a seguinte resposta: - Este o rei de glria que regressa com o triunfo. E os anjos que estavam no cu tambm perguntaram: - Por que carrega roupas de cor vermelha? Os anjos e Nosso Senhor responderam: - Pelo martrio que temos sofrido na terra para conquistar vossas almas. E assim entendemos, atravs das pegadas do leo, que Deus quis ocultar-se para enganar o demnio.

O leo teme o galo branco e o rudo dos carros em movimento, e tal sua ndole que dorme com os olhos abertos. E isso haveis de entender nas figuras que vs.

O galo branco significa os homens de vida virtuosa que anunciaram sua morte antes que Deus falecesse. Ele muito a temia, pois era homem, e o texto sagrado demonstra que o prprio Deus disse: - Pai, perdoa-Me pela morte que devo sofrer: que Tua vontade no se detenha por mim. Assim mostrou ser homem em sua morte. Tal e como o homem alma e corpo, Cristo Deus e homem. E sabeis que Deus disse a So Pedro o seguinte: que lhe negaria trs vezes antes que o galo cantasse. Em sua honra, o galo canta todas as horas, dia e noite, e ns, igualmente, cantamos a prima, a tera e meio-dia, e rezamos dia e noite para o Nosso Criador [4]. Por isso, cantam os freires da matinas ao alvorecer: ento Deus foi julgado, golpeado e atado; e ao sair o Sol os clrigos cantam a prima, pois ento Deus ressuscitou e nos arrancou da morte. E cantamos a tera, quando a hora da tera, pois ento Deus foi castigado e elevado na cruz. E s doze, os clrigos cantam a hora do meio-dia: ento se produziu a escurido, quando foi morto na cruz; o Sol se escureceu e no deu luz devido autntica luz da dor que Deus sofreu devido Sua humanidade, no Sua divindade.

E falamos tudo isso lendo a Paixo; recorde-a, pois tem um profundo sentido. Cantamos as nonas, porque a essa hora o esprito se retirou, tremeu a terra e se quebraram rochas de diversas formas. Recorde-o, pois tem um profundo sentido. E se cantam as vsperas ao entardecer, porque ento Seu corpo autntico foi encerrado no sepulcro. Assim, ficam cumpridas as vsperas, que significa que Deus cumpriu tudo ao vencer o demnio; ento veio silencium, que chamamos silncio. Comea o repouso, e ento nos calamos e os diabos se movem, que sempre atuam de noite, quando deixamos de rezar eles se pem a deambular: pela noite, os demnios, que chamamos de negros, tm o poder de obrar, pois so filhos de Neron [5]. Por isso, quando chega o dia, eles fogem da luz e ns, com a claridade, louvamos o Criador, nos levantamos com o dia e recitamos nossas preces. Ouvi, graas ao magistrio, o que significa o carro.

O carro designa, na verdade, os quatro filhos de Deus: Marcos, Mateus, sem dvida, Lucas e So Joo, e o rudo significa a morte do Filho de Maria que eles anunciaram ao mundo, em virtude da qual as gentes ficavam redimidas: Jesus, por ser homem, tinha medo.

E sabeis outra atitude do leo: ele de tal ndole que dorme com os olhos abertos. Sabeis que isto representa o Filho da Virgem Maria, enquanto velava em Sua morte, quando destruiu a morte mediante a morte, chamou o demnio morte e disse que seria sua morte, sua destruio e nosso descanso. E em Sua morte velou, quando encarcerou o demnio; mediante Sua morte, venceu a Satans, nosso inimigo. E merc morte do Senhor, nos foi dado repouso, e assim entendemos o sonho do leo.Figuradamente, o leo tambm tem outra propriedade: no dia em que v um homem a primeira vez, se pe a tremer; e podeis comprovar isso mirando essas ilustraes [6].

O temor do leo mostra razoavelmente que Deus se humilhou ao encarnar-Se em um homem, pois teve divindade primeiro que humanidade, assim como o homem alma e corpo, do mesmo modo foi Deus e homem. E isso suficiente a esse respeito. Escutai outra questo.

Sabeis que a leoa trs ao mundo seu filhote morto, e quando o tem, chega o leo, que tantas voltas d em seu redor, rugindo, que no terceiro dia o filhote ressuscita. E esta propriedade mostra o sentido seguinte. Sabeis que a leoa representa a Virgem Maria e o leozinho a Cristo, que morreu pelos homens. Durante trs dias jazeu na terra para conquistar nossas almas, segundo sua natureza humana, no segundo a divina. Igualmente obrou Jonas, que permaneceu dentro do peixe. Entendemos pelo rugido do leo a virtude de Deus; merc a ela, Cristo ressuscitou, arrancado do Inferno. Tal o significado que no deveis esquecer. Na verdade, isto diz sobre a autoridade do leo. Mas no vou tratar mais desse assunto.

2. Bestirio catalo (sculo XV)Texto do manuscrito B [7] Este livro chamado Espelho de exemplos das naturezas de alguns animais, concordante com muitas sentenas da Sagrada Escritura, e possui um estilo muito gentil, feito por um reverendo freire da Ordem de So Francisco, dos claustrais, o qual, para evitar a vanglria e por humildade, no coloca seu nome. um livro antiqssimo. Laus Deo.

Promio certo que todas as coisas que os homens deste mundo sabem, existem por duas razes [8]: a primeira razo pelo sentido, a segunda razo pela cincia. E cada uma dessas duas razes tem dois companheiros, que so estes: do sentido [9], um a graa de Deus e outro o conhecimento da razo; e os companheiros da cincia, um a administrao das Escrituras [10] e outro o entendimento do bom engenho. [11]

Digo-vos o que conta a santa Escritura. Ela diz que o sentido mais nobre coisa que o ouro e a prata, porque d forma. [12] E que seja verdadeiro o que a Sagrada Escritura conta de Salomo, que foi quase o primeiro homem sbio do mundo e que, em sua juventude, pediu a Nosso Senhor Deus que lhe desse sentido. E Nosso Senhor, que tudo sabe, viu que seu pedido era a coisa mais gentil que poderia ser pedida. Assim, enviou-lhe um anjo para lhe dizer que ele teria um tero do sentido que teve Ado. V-se que este sentido foi pela graa de Deus. Ainda diz a Santa Escritura que o anjo lhe disse: - Por que vs pedistes este dom? E Salomo respondeu: - Porque com o sentido conseguirei tudo o que mais necessrio ao corpo e alma. E como todos os bons dons vm de Nosso Senhor Deus, o sentido um dos mais nobres dons que o homem pode ter de Deus (por razo do conhecimento). [13]

A verdadeira Escritura diz, e assim o cr o homem forte, que os filsofos que foram retos foram homens que tiveram um bom corao e um bom crebro, e conheceram o corpo do Sol, da Lua, das estrelas e de todo o firmamento. E atravs do sentido natural, eles conheceram as naturezas dos oceanos, das bestas da terra e dos peixes do mar; e conheceram as naturezas das rvores, das ervas e das pedras preciosas; e conheceram os quatro elementos dos quais o mundo feito, as quatro complexes do homem das quais ele complexionado; e conheceram muitas outras coisas que seriam largas de dizer, e ainda, conheceram, por razo do conhecimento (e da razo), que aquele era Nosso Senhor Deus, que todas as coisas havia criado. E assim mesmo, os profetas e muitos outros santos conheceram Nosso Senhor Deus [14], pois So Joo Batista o conheceu e disse: Ecce agnus Dei qui tollit peccata mundi [15], e So Joo Evangelista conheceu ainda grande parte das coisas celestiais, tanto que no houve nenhum homem que pudesse saber mais que ele, o mesmo vos posso contar de muitos outros.

Vs que atravs das maneiras ditas acima os homens conhecem o mundo, uns pelo sentido, o qual lhes d Nosso Senhor Deus por graa, e o mesmo daqueles que o conhecem pelo conhecimento da razo. E como Deus agiu dando tudo ao homem, o homem o chama sentido natural, pois Deus verdadeiramente fez a natureza e o que a ela pertence.

Agora haveis entendido alguma coisa do sentido (e da cincia). Agora entendereis como os homens sabem pela cincia.

O primeiro companheiro da cincia a boa administrao das Escrituras [16], pois as Escrituras e os ministros ensinam qual coisa a Gramtica, a Dialtica, a Retrica, a Aritmtica, a Geometria, a Msica, a Astrologia, sobre as Leis, a Medicina, a Cirurgia, como fazer naus e barcos, como pintar e talhar, e como fazer todas as outras coisas que pertencem ao homem. Dessa maneira os homens sabem e podem saber. Isaas, Elias, Jeremias, Daniel, Salomo, So Joo Batista, So Joo Evangelista, So Pedro, So Paulo e outros sbios profetas, cada um deles soube por escrito o que souberam e conheceram.

O segundo companheiro da cincia, qual ? O entendimento de bom engenho. Esse bom entendimento de bom engenho d a saber (e a conhecer) as grandes utilidades das profecias, das filosofias, das escrituras celestiais e das temporais; e d a conhecer muito mais. E atravs do entendimento de bom e sutil engenho os homens fazem agora experincias de medicinas e de coisas naturais que foram desconhecidas pelos outros homens, e sabem fazer muitos artifcios, afinando e desenvolvendo as coisas que foram primeiramente encontradas por outros. Pois atravs do entendimento os homens fazem melhor neste tempo mais belos palcios e muitas outras coisas que faziam h tempos atrs. E poder-vos-ia dizer muitas outras razes (mas isso basta).

Agora desejamos dizer quais so as principais razes pelas quais os homens desejam saber tudo o que sabem. E bem verdade que o homem pode nomear o sentido e a cincia natural. E a cincia no o sentido natural, isto , acidental. E deveis crer que o que os homens sabem naturalmente e acidentalmente o sabem porque Nosso Senhor Deus os conduziu a saberem isso por sua santa graa (de outra maneira no o poderiam saber, pois o anjo disse Virgem: Invenisti gratiam apud Dominum [17]: encontraste a graa com o Senhor). Pois Deus fez o homem Sua imagem e semelhana, fez o cu, a terra e todas as criaturas, do ar, da terra e da gua, e todas as virtudes das ervas e das pedras preciosas. Todas essas coisas Nosso Senhor Deus fez primeiramente para a utilidade dos homens. E mais: Deus fez os anjos para a utilidade dos homens; assim diz a Sagrada Escritura.

Logo, quanto valeria o que Deus fez para nossa utilidade, se a ns no tivesse dado a graa e o sentido de saber as propriedades e naturezas do que criou e fez sob os cus? Pois se o homem no soubesse curar as enfermidades que existem nos corpos dos homens, Deus teria feito tudo em vo. Essa a razo pela qual Nosso Senhor Deus quer que os homens saibam e conheam por natureza e acidente tudo o que Deus fez propriamente para a nossa utilidade.

Assim, guisa disso, rendamos graas quele que to misericordioso Pai e Senhor Nosso, quem mostrou para saber e conhecer todas as coisas para nossa utilidade, para que tomemos exemplo nossa edificao.

Das quais coisas ns contaremos algumas, para louvor de Nosso Senhor Deus (e de Sua bendita me), e para a utilidade da linhagem humana. [18]

3. XIV - Do Leo [19]

O leo a mais nobre besta que existe, e chamado senhor das outras bestas pelas nobres complexes que tem em si, entre as quais esta uma de suas naturezas: ele desfaz suas pegadas com o rabo de tal maneira que os caadores no encontram o caminho por onde ele passou. A outra natureza que o leo tem que, quando est no cume de uma montanha, desce-a correndo com uma grande fora (at o p da montanha). A outra natureza que a leoa faz seus filhos paream mortos; e estando mortos h trs dias, no fim o leo vem e grita com eles to fortemente que eles o escutam e tornam a viver. A outra natureza que quando ele come e algum homem passa diante dele e no o olha na cara, ele o deixa ir e no lhe faz mal; mas se o homem o olha na cara, incontinenti ele pula sobre ele e lhe faz todo o mal que pode. Ainda h uma outra natureza: quando est no bosque e o homem lhe passa na frente e se humilha muito humildemente, ele no lhe faz mal, pelo contrrio, lhe faz merc.

De cada uma dessas naturezas podemos apreender um bom exemplo. Assim como o leo desce correndo do cume da montanha com uma grande fora, Nosso Senhor Jesus Cristo desceu do cu para a terra com to grande fora amorosa que salvou a gerao humana.

E assim como o leo desfaz suas pegadas com o rabo e os caadores no encontram o caminho por onde ele vai, Nosso Senhor Deus, quando veio a este mundo para nos salvar, quis cobrir Sua divindade com a carne humana para que o diabo no pudesse reconhec-Lo, e para que as gentes que O vissem fazer milagres no pudessem saber que ele era o verdadeiro Deus e o verdadeiro homem; e apesar de O virem jejuar quinze dias, fazer vinho da gua, ressuscitar os mortos, curar os endemoniados e (tornar sos os doentes) purificar leprosos, satisfazer com cinco pes e dois peixes mais de cinco mil pessoas (e ainda terem sobrado doze cestos cheios de sobras) e muitas outras coisas que o viram fazer, as gentes no o reconheceram (at que Ele foi ao Inferno para livrar os santos pais e os santos profetas, e ento o diabo O reconheceu).

E assim como o leo ressuscita seus filhos ao fim de trs dias por sua grande voz, Nosso Senhor Jesus Cristo ressuscitou no terceiro dia de Sua morte, e por Sua ressurreio todos aqueles que crem nEle firmemente esto salvos, e tambm toda a gerao humana.

Assim como o leo no faz mal ao homem que no o olha na cara enquanto ele come, e depois, se o olha na cara, cai sobre ele e lhe faz todo o mal que lhe pode fazer, o mesmo acontece com este mundo: quanto mais o homem repousa e coloca seu corao aqui, mais trabalho tem, pois todos os tempos est em pavor de perder os filhos que tem, ou que aquelas suas abundncias a alma no possa levar; naquele momento, o mundo lhe vem abaixo, tomando-lhe um filho, depois os bens e depois dando-lhe trabalho, tribulaes e doenas, nunca lhe desejando o bem, somente o mal. Mas quando o homem no coloca seu entendimento neste mundo nem em suas bem-aventuranas, o mundo no lhe faz mal nem lhe pode fazer, pois quem no deseja avareza, a avareza no lhe pode tomar a alma; e tambm quem no deseja a luxria e a expulsa para trs dos ombros, a luxria no lhe pode tomar a alma, e o mesmo de todos os outros pecados. Pois Jesus disse no Evangelho: - Quem abandona o mundo por mim, Eu o farei grande em Meu reino. [20]

Assim como o leo tem piedade do homem que se humilha a ele, Nosso Senhor Deus tem piedade quando o homem sbio se humilha a Ele por boas obras, confessando seus pecados com dor e contrio do corao e pedindo-Lhe perdo e misericrdia. Ento Nosso Senhor Deus tem merc e piedade e perdoa a todos os seus pecados, chamando-o para Sua Glria celestial.

4. Texto do manuscrito G - LeoO leo uma forte besta. E por onde passa desfaz o rastro com ao rabo. E quando tem filhos, lhes faz de mortos e por trs dias grita to fortemente em suas orelha at que os veja vivos.

*Notas

[1] Philippe de Than. Le Bestiaire (ed. E. Walberg), H. Mller, Paris-Lund, 1900. In: MALAXEVERRA, Ignacio. Bestiario Medieval. Madrid: Ediciones Siruela, 2000. Esse o mais antigo bestirio francs, escrito em versos de seis slabas (3.194 versos), e segue com bastante fidelidade o texto latino do Physiologus (sc. III-V d.C.). Seu autor, de origem anglo-normanda, dedica sua obra a Aelis de Louvain, segunda esposa de Henrique I da Inglaterra (1100-1135), no manuscrito conservado em Londres; em outro exemplar, guardado em Oxford, a dedicatria para Eleonor, esposa de Henrique II (1154-1189). Os manuscritos, ilustrados ou com vazios reservados para as iluminuras, contm prlogos em latim e indicaes para o artista. Os 38 captulos deste bestirio, editado por Walberg, estudam os quadrpedes, as aves e as pedras (um pequeno lapidrio), sucessivamente, e Philippe se refere a suas fontes como Physiologus, bestiaire, un livre de grammaire, Ysidre (Isidoro) e escripture.

[2] O texto remete s iluminuras do bestirio.

[3] Mais uma vez o texto remete s iluminuras do bestirio.

[4] Nesta passagem a seguir o autor explica o simbolismo do canto dos clrigos: As horas do dia eram denominadas segundo as horas de oraes: matinas (meia-noite), laudes (trs da manh), primas (primeiras horas do dia, ao nascer do Sol ou cerca de seis da manh), vsperas (seis da tarde) e completas (na hora de dormir). - TUCHMANN, Barbara W. Um Espelho Distante. O terrvel sculo XIV. Rio de Janeiro: Jos Olympio Editora, 1990, p. 56.

[5] Satans.

[6] O texto remete s iluminuras do bestirio.

[7] Traduo e notas de Ricardo da Costa (Ufes) feita a partir da edio Bestiaris (a cura de Saverio Panunzio). Barcelona: Editorial Barcino, 1964, vol. II, p. 05-11. Este bestirio uma cpia de um bestirio toscano tambm do sculo XV.

[8] No original italiano strade.

[9] Que sente, dotado de sensibilidade, que recebe facilmente as sensaes externas.

[10] No original amaestrament, isto , no sentido de ensinamento, com o manuseio constante e a leitura regular da Bblia.

[11] Faculdade inventiva, talento.

[12] O editor sugere que se trata de uma corrupo ou lacuna do copista, pois em outros manuscritos ao invs de dar forma h e a fora. No entanto, optei por preservar o texto original, pois parece dar a idia que o sentido mais importante que o ouro e a prata porque d forma, estrutura o pensamento humano, isto , d sentido s coisas pensadas.

[13] Todos os parnteses tambm se encontram no texto crtico.

[14] Passagem que mostra que os medievais conheciam Deus atravs da natureza, isto , percebiam e buscavam Deus em Sua criao (o mundo como um espelho/reflexo da ao divina).

[15] Jo I, 29.

[16] Ver nota 6.

[17] Lc I, 30.

[18] Aqui termina o prlogo do Livro.

[19] Pg. 41-44.

[20] Mt 10, 39; Lc 9, 24 e 17, 33.

[21] Outro manuscrito do sculo XV. Traduo e notas de Ricardo da Costa (Ufes) feita a partir da edio Bestiaris (a cura de Saverio Panunzio). Barcelona: Editorial Barcino, 1964, vol. II, p. 116.