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Universidade Federal de Pernambuco NEHTE / Programa de Pós Graduação em Letras CCTE / Programa de Pós Graduação em Ciências da Computação - 1 - “Facebooqueando” a Sala de Aula: a lógica de uso das redes sociais online e a reestruturação da escola. Mariana Marlière Létti 1 (UnB) Resumo: Os brasileiros são, atualmente, o povo que mais acessa as redes sociais online no mundo e, ao mesmo tempo, estão entre os países com o maior índice de evasão escolar. Como mudar estes números? A presente pesquisa buscou compreender qual o apelo do Facebook, partindo do princípio de que a escola é, também, uma rede social. A partir da análise de grupos focais em escolas públicas do DF concluímos que a solução para que a escola tenha tanto significado, para os alunos, quanto o Facebook, está longe da simples inserção da tecnologia no dia a dia escolar. Diante disto, passamos a traçar estratégias de transposição da estrutura e da lógica de uso dessas redes sociais virtuais visando a construção de uma nova escola. Palavras-chave: Educação, redes sociais, reestruturação da escola. Abstract: Brazilians are extremely connected to social media. At the same time, we are one of the countries with the highest school dropout rates. How can that trend change? This researche aims to unsderstand why kids love Facebook and dislike their schools. We found out that the solution does not rely on bringing social networks inside their classrooms, but rather restructuring our schools to become Facebook-like. Palavras-chave: Education, social network, school restructuring. Introdução A educação tradicional tem encontrado nas últimas décadas uma geração de alunos que não mais se satisfaz com a combinação “saliva e giz”. Esta expressão, retirada da linguagem popular, se refere aos recursos utilizados por essa “ideologia” educacional: o foco no professor e a aula restrita à sala, ao livro e ao 1 Mariana LÉTTI, Doutoranda. Universidade de Brasília (UnB) Faculdade de Educação [email protected]

“Facebooqueando” a Sala de Aula: a lógica de uso das redes ... · Palavras-chave: Education, social network, school restructuring. Introdução ... 13). Redes sociais são estruturas

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“Facebooqueando” a Sala de Aula: a lógica de uso das redes sociais online e a reestruturação

da escola.

Mariana Marlière Létti1 (UnB)

Resumo: Os brasileiros são, atualmente, o povo que mais acessa as redes sociais online no mundo e, ao mesmo tempo, estão entre os países com o maior índice de evasão escolar. Como mudar estes números? A presente pesquisa buscou compreender qual o apelo do Facebook, partindo do princípio de que a escola é, também, uma rede social. A partir da análise de grupos focais em escolas públicas do DF concluímos que a solução para que a escola tenha tanto significado, para os alunos, quanto o Facebook, está longe da simples inserção da tecnologia no dia a dia escolar. Diante disto, passamos a traçar estratégias de transposição da estrutura e da lógica de uso dessas redes sociais virtuais visando a construção de uma nova escola. Palavras-chave: Educação, redes sociais, reestruturação da escola.

Abstract: Brazilians are extremely connected to social media. At the same time, we are one of the countries with the highest school dropout rates. How can that trend change? This researche aims to unsderstand why kids love Facebook and dislike their schools. We found out that the solution does not rely on bringing social networks inside their classrooms, but rather restructuring our schools to become Facebook-like. Palavras-chave: Education, social network, school restructuring.

Introdução

A educação tradicional tem encontrado nas últimas décadas uma geração de

alunos que não mais se satisfaz com a combinação “saliva e giz”. Esta expressão,

retirada da linguagem popular, se refere aos recursos utilizados por essa

“ideologia” educacional: o foco no professor e a aula restrita à sala, ao livro e ao

1 Mariana LÉTTI, Doutoranda.

Universidade de Brasília (UnB) Faculdade de Educação [email protected]

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quadro. Percebe-se a necessidade que os jovens sentem de um “algo a mais” no

processo educacional. Essa nova geração de estudantes chega à rede de ensino com

uma demanda de conhecimento que a maioria dos professores não está pronta para

suprir. O advento das tecnologias em geral deu origem a um grupo de indivíduos

acostumados à velocidade, em contraste com as gerações anteriores que possuíam

a cultura da “contemplação”.

Essa velocidade que atualmente faz parte da vida em sociedade é devida,

em muito, ao fato das novas tecnologias estarem presentes em praticamente todas

as atividades realizadas no dia-a-dia. Além do caixa eletrônico, do bilhete

eletrônico, do microondas, da televisão e tantas outras tecnologias, temos o

crescimento do mercado de celulares com acesso à internet (smartphones) e de

computadores pessoais (notebooks). Só essas duas últimas inovações, por exemplo,

já abrem um leque quase infinito de possibilidades de recursos de socialização e

aprendizagem uma vez que o acesso à rede acontece, a qualquer momento, de

qualquer lugar.

Em vista disso, apontamos para a necessidade de refletir sobre o papel da

escola e do educador no desenvolvimento deste indivíduo que possui uma nova

forma de ver o mundo. A escola foi uma instituição “concebida com o objetivo de

atender a um conjunto de demandas específicas do projeto histórico que a

planejou e procurou pô-la em prática: a modernidade” (Sibilia, 2012:16). Logo,

estamos lidando com uma tecnologia ultrapassada e, como não nos livraremos dela,

precisamos atualizá-la.

Para tanto, acreditamos na necessidade de retirar, de nossas pesquisas, o

foco na instituição escolar e colocá-lo nos alunos e em suas subjetividades (Sibilia,

2012). Além disto, precisamos conhecer quem são estes novos sujeitos e o que eles

esperam de nós educadores, para então modificar a estrutura escolar para que ela

faça sentido dentro da sociedade atual.

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1 Problemática

Paula Sibilia, em seu livro Redes ou Paredes, afirma que a escola é uma

tecnologia: “podemos pensá-la como um dispositivo, uma ferramenta ou um

intrincado artefato destinado a produzir algo” (2012:13). Redes sociais são

estruturas sociais compostas por pessoas ou organizações, conectadas por um ou

vários tipos de relações, que partilham valores e objetivos comuns. Logo, se a

escola é uma tecnologia (e nós acreditamos que ela é), então ela é, sem dúvida,

uma tecnologia de rede social.

No entanto, se o Facebook é uma rede social e a escola também, porque os

alunos adoram tanto uma e detestam tanto a outra? Esta questão conduz à

delimitação do problema central da investigação proposta: como transformar a

“rede social escola” para que ela faça tanto sentido para os estudantes quanto as

redes sociais online?

1.1 Objetivo Geral

- Propor uma reestruturação da instituição escolar com base na lógica estrutural e

de uso das redes sociais virtuais.

1.2 Objetivos Específicos

- Compreender as expectativas pedagógicas dos atuais estudantes da rede pública

de ensino do DF;

- Compreender qual o apelo que as redes sociais online possuem para os jovens de

hoje.

- Por meio de uma antropologia de redes, separar os elementos positivos e

negativos da lógica estrutural e de uso dessas redes.

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- Transpor os elementos positivos desta lógica, a partir das expectativas estudantis,

para a estrutura escolar.

2 Referencial Teórico

2.1 Definições de Redes Sociais

Dentre as várias definições de rede social que encontramos na literatura,

optamos por adotar duas, uma vez que, por possuírem cada uma seu viés, as

entendemos como complementares.

Ao conceituar as redes sociais em termos mais exatos, a definição de Kiso

traz uma visão estrutural que julgamos ser importante no momento de analisar a

escola como rede social.

Rede social é uma estrutura social constituída por nós (no qual geralmente são pessoas, organizações e até conceitos) que são vinculadas por um ou mais tipos específicos de relações, como valores, visões, ideias, amigos, gostos, tipo sexual, entre outras características que agrupam os indivíduos por afinidades. As redes sociais encaram os relacionamentos sociais em termos de nós e lac os. Os nós são os indivíduos de dentro das redes, e os laços são os relacionamentos entre os indivíduos. Pode haver vários tipos de laços entre os nós (KISO, 2009 apud SILVA, 2010).

A forma como Rocha define as redes sociais, apesar se algumas semelhanças,

possui uma abordagem radicalmente diferente da de Kiso, uma vez que ela lança

um olhar bem mais social e crítico. Segundo a autora:

A palavra rede (originária da latina rete em lingua portuguesa remete a noçãoo de junção de nós – individuais ou coletivos – que, interligados entre si, permitem a união, a comutação, a troca, a transformação. Estar em rede – social, cultural, econômica, política – é (ou sempre foi) uma das condições de possibilidade de nossa convivência neste mundo, dada a necessidade (ou a obrigatoriedade) da contínua constituição de grupos comuns (ou comunidades) em limitados espaços e simultâneos tempos. (...) São sistemas abertos e em construção permanente possuindo como característica principal a grande capacidade de transmissão de informação. Estar em rede significa ser capaz de fazer uso da capacidade

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de ser sujeito (ativo e responsável), sugerir mudanças, administrar complexidades e incentivar a articulação, o fortalecimento e, se necessário, a (re)construção contínua das redes (ROCHA, 2005).

A junção destas duas definições nos oferece uma boa base de referência na

análise das redes sociais virtuais e, principalmente, da escola enquanto rede social.

2.2 Definições de Redes Sociais Virtuais

Assim como nas definições das redes sociais presenciais, é possível perceber

dois vieses claros quando se trata de conceituar as redes sociais virtuais. A primeira

se baseia em elementos estruturais e a segunda, em elementos sociais.

Boyd e Ellison trabalham com a seguinte ideia: Nós definimos sites de redes sociais como um serviço baseado na internet que permite que os indivíduos (1) construam um perfil público ou semi-público dentro do sistema, (2) articulem uma lista de outros usuários com os quais possuem conexão, e (3) ver e navegar dentro das suas próprias listas de conexão assim como nas listas de outros usuários dentro do sistema (Traduzido pela autora. BOYD; ELLISON, 2008:211).

Já Alex Primo, com um viés bem social, ressalta a importância da interação

na rede social, ao destacar que “[...] uma rede social não se forma pela simples

conexão de terminais. Trata-se de um processo emergente que mantém sua

existência através da interação entre os envolvidos (Primo, 2007 apud Silva,

2010 ”.

Para fins teóricos, porém, nos apropriaremos das definições elaboradas por

Raquel Recuero, por acreditarmos que elas possuem uma abordagem mais completa

do fenômeno.

Sites de redes sociais são caracterizados principalmente pela exposição

pública da rede de conexões de um indivíduo, que mostra aos demais quem são seus amigos e a quem está conectado; e pela construção de representações das pessoas ali envolvidas. (Esta última, enquanto fator necessário para que a primeira possa emergir.) Assim, as redes sociais na Internet não podem ser confundidas com a ferramenta que as suporta; são,

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por si, expressões de grupos sociais, de pessoas e instituições que estão permanentemente interconectadas pelas novas tecnologias de comunicação e informação. São constituídas pelas representações das pessoas (os perfis no Orkut, as páginas pessoais e etc) e as conexões que existem entre essas representações ("amigos" no Orkut, links em um blog, etc) (RECUERO, 2009).

2.3 Redes Sociais Virtuais e a Educação

2.3.1 Novos Sujeitos

Yves Chevallard, em seu livro La Transposición Didáctica (2005) afirmou que

o sistema educacional nada mais é do que o fruto das vontades e caprichos de um

grupo de indivíduos. Indivíduos estes, que o conceberam dentro de uma lógica que

objetivava atender a um conjunto de demandas de um período muito específico na

história: a modernidade (Sibilia, 2012). No entanto, este momento histórico

passou, abrindo a possibilidade de uma nova configuração de ser humano, de

tempo e de espaço.

Pierre Babin e Marie-France Kouloumdjian também abordaram, ainda nos

anos 80, o surgimento de um novo modo de ser e de pensar. Eles acreditavam que o

meio tecnológico moderno, em especial a utilização das mídias e dos aparelhos

eletrônicos no cotidiano, gerava um novo comportamento intelectual e afetivo.

Apontaram, então, para o nascimento de uma nova cultura. Afirmaram que era

preciso mesclar a tradicional cultura do livro com a que chamaram de audiovisual,

visando retirar o que havia de melhor dos dois mundos. Esta, segundo eles, seria a

única forma de atualizar a escola (1989).

Paulo Freire também apontava constantemente para a necessidade de

integrar as novas tecnologias à educação. “Eu continuo lutando no sentido de pôr a

escola à altura de seu tempo e isto não é soterrá-la nem sepultá-la, mas é refazê-la

(...). A escola não é em si mesma errada, ela está errada” (Freire, 1995 apud:

Medeiros; Gomes, 2008:18).

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Questionamos, porém, se seria desejável integrar as novas tecnologias ao

contexto de uma escola que continua acreditando em preceitos ultrapassados como

os planos de aula pré-estabelecidos e as grades curriculares totalmente fechadas.

(Lacerda, 2011). Pode-se facilmente pegar os computadores, ligá-los à internet e

usá-los em sala. Mas isto traria a instituição escolar para o século XXI? Isto tornaria

a escola significativa para esta nova geração de estudantes?

Vale ressaltar, porém, que ao especificarmos uma geração para a qual a

educação precisa mudar para fazer sentido, não estamos nos referindo à geração

conhecida como “nativos digitais” (Prensky, 2001). Esta delimitação com base em

uma data de nascimento, embora possa fazer sentido dentro de uma sociedade com

as configurações socioeconômicas dos Estados Unidos, não tem grande valia em um

país com a extensão territorial e com os índices de desigualdade e de distorção

idade-série do Brasil.

A geração a que nos referimos, que é criadora e criatura das redes sociais

online, é a “Geração C” um termo cunhado por Dan Pankraz (2009). Ao contrário

dos chamados “nativos digitais” ou “Geração Z” este novo grupo não tem sua

delimitação baseada em idade, e sim, em hábitos. Sua designação vem da ideia de

um “coletivo conectado”. São indivíduos que têm a necessidade de fazer parte de

um grupo e que se “movem” como um enxame: várias pessoas existindo como um

único ser, ativo, rápido e sem um líder. Eles se baseiam em três pilares:

expressionismo (criatividade), coletivismo (pertencimento) e escapismo

(competição lúdica). Para fazer com que a “GenC” se engaje em alguma ideia,

marca ou intituição, 5 questões precisam ser lembradas:

1. É sobre fazer, não dizer;

2. Se você não estimular a conversação e lhes der algo que valha a pena ser discutido, acabou;

3. Eles não são um público alvo, são parceiros na produção, na modulação, no

desenvolvimento e na distribuição de ideias;

4. ‘Comunicação Subversiva’ é o futuro – quando a Geração C acha que

realmente sabe sobre uma marca, sobre uma ideia, eles vão propagá-la dentro de seus coletivos;

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5. Você precisa se inspirar na cultura do coletivo que deseja alcançar.

(Traduzido pela autora. PANKRAZ, 2009: slideshare)

Nossas escolas não estão preparadas para lidar com este tipo de

subjetividade. A pedagogia atual e a estrutura escolar está, na melhor das

hipóteses, voltada para a “Geração X” (nascidos entre 1965 e 1979). E embora toda

a ideia da “Geração C” tenha sido desenvolvida pensando no mercado, ela, além de

se mostrar de grande valia para repensarmos a instituição escolar, também

encontra paralelos nos estudos realizados por educadores brasileiros. Segundo

Villela (2013), por exemplo, para que a escola se torne significativa, ela precisa

despertar três sentimentos em seus estudantes: acolhimento, o aluno precisa se

sentir bem, feliz, protegido fisica e emocionalmente; reconhecimento, deve se

sentir parte de uma comunidade de iguais, e não ser visto como um elemento

ameaçador; e pertencimento, precisa acreditar que a escola também é dele. Na

realidade, não há muita controvérsia em relação à necessidade de transformar a

instituição escolar em um ambiente que estimule postivamente os jovens. O grande

problema reside em como fazê-lo.

2.3.2 Novas Escolas

Jim Lengel traça em seu site um paralelo interessante entre a evolução da

educação e do trabalho nos séculos XIX, XX e XXI, chamando atenção para o fato de

que a o sistema escolar sempre acompanhou a evolução do mercado. No século XIX,

por exemplo, as pessoas costumavam trabalhar em grupos de dois ou três

indivíduos e, embora resolvessem os problemas juntos, cada exercia sua função.

Além disto, usavam ferramentas simples e, frequentemente, trabalhavam ao ar

livre. A escola desta época, a educação 1.0 como Lengel denominou, possuía a

mesma lógica estrutural do trabalho 1.0: pessoas de idades diferentes, estudando

juntas e com poucas ferramentas.

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O século XX trouxe consigo a consolidação do modelo fordista e do trabalho

nas fábricas, o que mudou significativamente a forma como os indivíduos se

portavam em seus ambientes de trabalho. As pessoas passaram a trabalhar

sozinhas, em estações individuais, realizando exatamente a mesma tarefa de seus

colegas ao lado. Da mesma forma, a educação, agora chamada de 2.0, acompanhou

a mudança. Nas escolas do século XX, encontramos salas de aulas fechadas e com

divisões etárias. Cada estudante é responsável pelo seu próprio desenvolvimento e

deve respeitar o tempo e o espaço determinados pela instituição.

A sociedade já modificou mais uma vez o seu sistema de trabalho, do 2.0

para o 3.0. Agora as pessoas voltam a trabalhar em pequenos grupo para a solução

conjunta de problemas, mas conjugam suas habilidades individuais à ferramentas

digitais e portáteis para a realização de uma multiplicidade de tarefas. A escola,

porém, continua operando na lógica 2.0 e este é o motivo, segundo Lengel, para o

desinteresse dos estudantes pela educação: são indivíduos vivendo sob a lógica 3.0,

mas estudando na 2.0 (Lengel, 2010).

Reservamos para esta teoria as mesmas críticas que fizemos para o conceito

de “Nativos Digitais” de Prensky (2001). No entanto, o panorama realizado por

Lengel levanta questões importantes e chega ao ponto que nos interessa: a escola

não acompanhou o desenvolvimento do indivíduo ao longo dos anos e, por isto,

perdeu seu sentido.

A realidade organizacional da Sociedade Industrial inspirava o sistema

escolar, visto que aquela escola formava Sujeitos que iriam viver naquele tipo específico de sociedade. Naquele momento, a metáfora máquina servia como representação da sociedade e, como não podia deixar de ser, a escola reproduzia estas características quer fosse em sua estrutura física (filas de carteiras, sinos para definir horários a serem cumpridos etc), quer fosse nos procedimentos adotados (instrução de ouvir e responder, memorização de textos desprovidos de contexto, disciplinas artificialmente separadas). Potencializada pelas tecnologias telemáticas, a Sociedade da Informação pressupõe uma nova metáfora para o sistema escolar: a rede (KERBAUY; SANTOS, 2011).

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2.3.3 As Redes Sociais Online e o seu Impacto na Educação

É devido a esta nova metáfora que o número de estudos e pesquisas sobre as

possibilidades pedagógicas das novas tecnologias, em especial da internet e suas

redes sociais, aumentou consideravelmente. Desde década de 1990, as

expectativas a respeito da revolução do ensino por meio destas tecnologias vem

crescendo. No entanto, “embora a adoção das tecnologias aplicadas ao cotidiano

da sala de aula tenha sido incentivada – e muito – pelas empresas fabricantes de

insumos computacionais, isso não garantiu qualidade na aprendizagem” (Kerbauy e

Santos, 2011).

O fato é que, seja por iniciativa da própria escola, seja por meio de

programas como o PROINFO, ou mesmo pelas mochilas dos alunos, os computadores

chegaram às salas de aula. Mas a inclusão destas tecnologias na educação não

ocorreu, ou melhor, não está ocorrendo tranquilamente. Existe uma forte

resistência dos docentes em aceitar esta nova ferramenta didática e,

historicamente, não havia porque esperarmos uma reação diferente. Sempre que

uma nova tecnologia chega à escola, há um um misto de sentimentos: uma

esperança de melhoras extremas no ensino e um temor de que ela acabará com

tudo. Em geral, nada disso se cumpre (Alvarez, 2013). “Hoje é difícil imaginar, mas

o próprio livro já foi uma tecnologia nova. Era algo subversivo imaginar um

estudante lendo sozinho. Além de se imaginar que o livro tiraria o papel do

professor, também se temia que ele acabasse com a memória dos estudantes”

(Tori, 2010). Ou seja, uma integração completa entre as novas tecnologias e a

escola vai acontecer mais cedo ou mais tarde, mas não sem, primeiro, superarmos

muitos obstáculos.

O problema, no entanto, é que, ao passo em que a escola tem se mostrado

muito lenta nesta transição, os estudantes e a tecnologia nunca estiveram mais

velozes. Enquanto os docentes ainda estudam alternativas para o uso do

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computador de mesa na educação, os jovens já estão com seus smartphones,

notebooks e tablets na mão.

Felizmente, tem havido um grande empenho por parte de alguns educadores

e estudiosos em trazer a escola para o seu tempo e, acompanhando o ritmo dos

estudantes, as redes sociais parecem ser “a bola da vez”.

Considerando o ser humano como ser social, que age e modifica o meio onde está e que responde às características desse ambiente, as redes sociais digitais passam a ser excelentes recursos de aprendizagem, pois favorecem o contato entre as pessoas, de tal forma que podem utilizar

diferentes mídias para se expressar (SILVA, 2010).

Uma pesquisa realizada em 2012 pelo Comit estor da nternet no rasil

mapeou o uso e os bitos na internet de crianc as e adolescentes com idades

entre e 1 anos. resultado mostrou que em m dia 0 dos indiv duos nessa

fai a et ria esta o nas redes sociais, mas que, quanto mais velhos, mais conectados,

chegando a 83% na faixa de 15-16 anos. Desses, mais da metade (53%) acessa seus

perfis nas redes diariamente.

Neste contexto, as práticas pedagógicas voltadas para a inovação têm

encontrado muitos espaços de reflexão dentro do meio acadêmico. O inverso

também é verdadeiro. A academia também tem se fartado de estudos de caso

sobre projetos desevolvidos com o intuito de conjugar a educação formal com a

utilização das redes sociais.

Percebem-se muitas iniciativas de professores em levar as redes sociais,

presentes no dia a dia das pessoas e, principalmente, dos alunos, para a sala de aula; ou, então, levar para as redes sociais atividades do contexto educacional. Os professores que aproveitam o potencial dos jovens em se comunicar e estabelecer relações na Internet estão propondo o seu uso com fins pedagógicos, e conseguindo provocar mudanças nas relações estabelecidas com os alunos. A partir da criação de comunidades específicas, por exemplo, como os fóruns e chats sobre temas específicos, mediados por professores ou estudantes, as informações e os conteúdos passam a ser construídos fora da escola (QUEIROZ, 2011).

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O que se percebe, porém, das tentativas de inserção dos sites de redes

sociais na educação é que, praticamente em sua totalidade, o que vem

acontecendo não é, de fato, uma ressignificação das práticas pedagógicas, mas

simplesmente a apropriação de uma nova ferramenta usada de uma maneira

antiga. O tempo continua sendo o determinado pelo professor: encontros com hora

marcada e prazos de entrega. O espaço também não apresenta grande mudança,

saímos da sala de aula presencial para a sala de aula virtual e, mesmo

virtualmente, a sala de aula tem um enorme potencial opressor. As tarefas não

mudaram: leiam o texto, assistam ao vídeo, pesquisem, escrevam, produzam; e os

conteúdos ainda menos. O que há realmente de inovador nestas iniciativas? Apenas

a ferramenta. No lugar do quadro e do caderno, temos o computador e o Facebook.

O processo ensino-aprendizagem em rede pode favorecer um aprendizado

autônomo, personalizado, menos invasivo e mais processual. Mas, para isto, é

preciso que se compreenda que não é levando as redes sociais online para dentro

da estrutura conservadora da escola que teremos uma mudança, e sim

transformando esta estrutura em uma rede social significativa para alunos e

professores.

3 Metodologia

Com o objetivo de explicitar as expectativas pedagógicas dos alunos da rede

pública de ensino do Distrito Federal foram realizados grupos focais em 3 escolas

públicas do DF: uma na asa norte (centro), uma em Planaltina (periferia) e uma no

Itapõa (periferia). No total, tivemos como sujeitos: 30 estudantes na faixa etária

de 10 a 17 anos; 20 meninas e 10 meninos; 10 do ensino fundamental e 20 do

ensino médio; todos escolhidos aleatoriamente. Cada grupo focal teve uma duração

média de 1 hora e todos contaram com um roteiro semi-estruturado.

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Este roteiro foi construído partindo do pressuposto de que os estudantes, de

modo geral, se sentem bem estando conectados às redes sociais online mas não em

suas escolas. Por isto as perguntas foram divididas em três blocos: “sentimentos a

respeito da escola”; “sentimentos a respeito das redes sociais online”; “no que

uma pode melhorar a outra”.

4 Análise dos Dados

As falas a respeito dos sentimentos pela escola não foram nenhuma surpresa.

Há anos as pesquisas mostram que o grau de insatisfação dos alunos em relação à

educação vem aumentando. Eles não querem ser obrigados a ir à escola; não se

sentem estimulados para estudar conteúdos que não compreendem o objetivo;

querem ter mais liberdade de expressão; querem ser respeitados pelos professores;

precisam de um tempo diferenciado; não querem ter que ser bons em tudo; não

conseguem ficar tanto tempo sentados prestando atenção em algo que não os

interessa; e querem ficar fora de sala.

As considerações sobre os seus sentimentos pelas redes sociais online

também começaram sem muitas novidades: amam as redes sociais, em especial o

Facebook, embora com a chegada dos familiares e professores estejam usando

bastante o Whatsapp; gostam de poder entrar e sair quando quiserem; de conversar

com os amigos; de ver e compartilhar coisas engraçadas; de poder deletar gente

chata; de só ver coisas que gostam; e adoram o fato de que na internet ninguém

manda neles.

No entanto, conforme a conversa foi evoluindo, sentimentos mais profundos

foram emergindo: adoram o acesso rápido e ilimitado às informações; a liberdade

de expressão; a valorização de suas habilidade individuais em detrimento de suas

falhas; a possibilidade de revisão ou mesmo exclusão do erro; a ausência de uma

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autoridade formal e autoritária; e, principalmente, a constante atualização das

plataformas. Estas foram as questões mais recorrentes nos três grupos.

Dentro do universo da internet, o Facebook não apenas foi citado como o

“local” mais frequentado por todos, mas era a única rede social que todos

participavam (com exceção de uma estudante que havia deletado seu perfil

recentemente a pedido do namorado). Além disto, praticamente todas as outras

redes sociais eram utilizadas de forma integrada à plataforma do Facebook, como o

Youtube e o Instagram. Neste sentido, no cruzamento dos sentimentos estudantis

pela escola, pelas redes sociais e as expectativas pedagógicas destes, com o intuito

de propor uma reestruturação da escola, optamos por focar a análise da lógica

estrutural e de uso de redes sociais online, no Facebook. Logo, a partir das falas

dos estudantes, fomos buscar no Facebook qual ferramenta tinha como objetivo

propiciar determinado sentimento.

4.1 Sentimentos e Ferramentas

4.1.1 “No Facebook a gente tem acesso rápido às informações

que nos interessam”.

O Facebook é construído com a estrutura de uma “lin a do tempo”. Cada

usuário possui a sua e nela ficam gravadas todas as suas ações dentro da

plataforma de forma cronológica, o que torna muito fácil o resgate de qualquer

informação. Além disto, há o “feed de not cias”. Este é o lugar onde o usuário

passa mais tempo, pois é nele que aparecem todas as informações sobre as quais

houve uma sinalização (direta ou indireta) de interesse. Se o indivíduo “curtiu”

uma página, entrou para um grupo, ou “assinou” algum perfil, terá, em seu “feed

de not cias” as atualizações que estas pessoas postaram em suas timelines.

Usando como base uma análise das interações que o usuário faz dentro da

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internet, o Facebook também poderá “sugerir” assuntos que acredita ser do seu

interesse. Se de fato houver interesse, basta que ele sinalize à plataforma, para

continuar recebendo estas informações. Caso contrário, ele pode “dizer” que não

quer ver mais esta notícia, que não quer mais ver nada deste indivíduo ou empresa,

ou ainda que acha o conteúdo irrelevante, ofencivo ou impróprio. Feito isto, o

Facebook irá bloquear este assunto do feed do usuário e propor novos temas de

interesse.

Além disto, as postagens podem possuir e, em sua maioria, possuem,

hiperlinks. Estes “atal os” possibilitam que com apenas um clique, o usuário saiba

mais do assunto que despertou seu interesse. Ele pode ser redirecionado, quando

quiser, para um texto que explique melhor a informação, para um vídeo que ilustre

o acontecido, ou para uma infinidade de recursos, didáticos ou não, disponíveis na

internet.

4.1.2 “Eu fico sabendo de coisas do mundo todo”.

Dentro da plataforma do Facebook, o primeiro espaço disponível para o

usuário é o de pesquisa. “Pesquise pessoas, locais e coisas” é a mensagem que vem

escrita neste campo. A partir dele, pode-se chegar a qualquer assunto que seja de

seu interesse, no mundo inteiro. É possível a busca por um termo qualquer dentro

de perfis de usuários, dentro de páginas, em locais, grupos, aplicativos, eventos,

publicações de amigos, atualizações públicas, publicações em grupo e no universo

da internet como um todo.

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4.1.3 “Eu tenho liberdade pra falar o que eu penso. No Facebook

eu tenho voz”.

“No que você está pensando?”; “ que você tem feito?”; “Como está se sentindo?”;

“Escreva algo”. Estas são algumas das frases que aparecem para o usuário no

campo “status” com o intuito de estimulá-lo a se expressar livremente. Além disto,

em todas as postagens (próprias e de outros usuários) há o convite: “Escreva um

coment rio...”. Todas as ferramentas do Facebook visam o estímulo ao diálogo,

mesmo ao diálogo silencioso de quem apenas curti ou compartilha. No evento

intitulado F8, em setembro de 2011, quando Mark Zuckerberg anunciou a

transformação da plataforma do Facebook no formato linha do tempo, ele afirmou:

“Queremos fazer da Timeline um lugar que você se orgulha de chamar de 'casa'.

Queremos que você expresse quem você realmente ” (Traduzido pela autora.

http://www.youtube.com/watch?v=9r46UeXCzoU).

4.1.4 “As pessoas me curtem por aquilo que sou bom. As coisas

em que sou ruim ficam em segundo plano”.

No Facebook há um botão de curtir, mas não há um de “não curtir”. O que implica

que dentro da rede, em princípio, apenas as habilidades positivas seriam

simplesmente reforçadas e o que fosse negativo teria que ser ignorado, ou

desestimulado por meio de um comentário escrito. Muitos usuários desta rede

afirmam que o botão de “não curtir” deveria existir e, em uma outra rede social,

chamada Quora, um internauta postou a pergunta: Porque não há o botão “não

curtir” no Facebook? Dentre várias respostas estava a de Tom Whitnah, engenheiro

de software do Facebook:

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(...) Enquanto muitos usuários amam a ideia do Facebook adicionar um botão “não curto” não creio que existam muitos usuários loucos para terem seu conteúdo desaprovado. (...) Apesar de existirem posts nos quais o botão “não curto” poderia ser usado para expressar simpatia ou comiseração, estimo que a grande maioria de seu uso seria apenas de negatividade ambígua, que desmoralizasse o autor da postagem. O que poderia frequentemente ser uma brincadeira para quem clicou “não curto” poderia gerar um sentimento de crítica ou julgamento em quem recebeu o “não curto”. As pessoas podem expressar sentimentos amplos em suas respostas nos comentários, incluindo críticas, negatividade, simpatia e piedade. Mas ao remover o aspecto negativo desses comentários e cimentá-los como uma interação proeminente, o Facebook estaria encorajando e facilitando muito mais negatividade do

que os usuários gostariam de ver fluindo em sua linha do tempo. “Não curto” dá um tipo de feedback que, de modo geral, desencorajaria o compartilhamento. “Curtir” dá feedback ao autor do conteúdo postado e é também um mecanismo que auxilia no compartilhamento de bom conteúdo com amigos nos Feeds de Notícia. “Não curto” resultaria em nada sendo compartilhado (porque algum de seus amigos gostaria de ver o conteúdo que você não gostou?), então seria uma funcionalidade bem mais castradora do que o “curtir” (Traduzido pela autora. http://www.quora.com/Facebook-1/Why-is-there-no-Dislike-button - step=5)

4.1.5 “O erro pode ser corrigido, editado, excluído”.

Qualquer postagem feita no Facebook é passível de edição e exclusão, mesmo os

comentários feitos no status de outra pessoa. A exclusão é uma ação permanente.

Uma vez excluído, o post é deletado de toda a estrutura do Facebook e não é mais

possível recuperá-lo. Já a ferramenta de edição deixa um “rastro” o que a torna

muito didática. Quando o usuário edita um texto, este é automaticamente marcado

como “editado” e qualquer pessoa pode ter acesso ao “histórico de edições” uma

lista com a forma original do post e todas as alterações feitas posteriormente.

4.1.6 “No Facebook não tem uma autoridade, ou melhor, a

autoridade é o respeito. Não, melhor ainda, a autoridade sou

eu, você, todo mundo”.

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No Facebook existe sim uma autoridade soberana: o próprio Facebook. É ele

quem determina se o que foi postado possui ou não algum conteúdo impróprio, se o

usuário está fazendo propaganda demais (spam), se está incomodando, etc. Porém,

em geral, o sistema só aplica estas regras se alguém “reclama”. Neste sentido, a

autoridade no Facebook acaba sendo compartilhada com os mais de 1 bilhão de

usuários, incentivando, desta forma, uma auto regulamentação da rede.

5 Conclusões

Após analisarmos cuidadosamente as ferramentas do Facebook que

proporcionavam tantos sentimentos positivos em nossos jovens e que, mais

importante que isto, conseguiam embutir neles um engajamento raramente visto

nas escolas contemporâneas, o que pareceu, em princípio, um mero desejo

adolescente de abandonar a escola, tomou contornos de expectativas pedagógicas

sóbrias e benéficas. É digno de nota que nenhum dos estudantes entrevistados

sugeriu que a escola deveria ser extinta ou mesmo questionou a necessidade da

figura do professor. Ou seja, eles compreendem que a instituição escolar tem sua

importância, mas não vêem sentido “nesta” escola. Isto se dá porque estes

indivíduos enxergam a relação escola-aluno-professor de uma maneira

completamente nova, moldada a partir da fôrma das novas tecnologias e das redes

sociais online.

Neste sentido, concluímos que a solução para o problema do desinteresse

desses estudantes em relação à escola reside, não no movimento de trazer o

Facebook para dentro da sala de aula mas, ao contrário, “transformar a escola em

um Facebook”. Ou seja, transformar a escola em uma rede social que gere tanto

engajamento e sentimentos positivos em seus alunos quanto as redes sociais

virtuais. Para tanto, a estrutura e a lógica escolar precisam sofrer uma revolução.

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6 Sugestões para “Facebooquear” a sala de aula

1. Dividir as disciplinas em obrigatórias e optativas. Desta maneira, o estudante vai

ganhando, gradativamente, a possibilidade de escolher as matérias que, de fato, o

interessam.

2. Modificar o sistema de avaliação, de forma que as habilidades individuais sejam,

não apenas respeitadas, mas valorizadas. “A escola se instaurou sob a égide da

cultura letrada” porém, “a sociedade contemporânea está fascinada pelos

sedutores feitiços das imagens” (Sibilia, 2012).

3. Acabar com o sistema de seriação. É preciso respeitar o tempo do estudante de

hoje que, certamente, não é o mesmo de seus pais e avós. Não faz mais sentido,

por exemplo, que um aluno seja obrigado a rever todo o conteúdo de uma

disciplina, se parte dela já foi assimilada. Ou, ainda, que ele “passe de ano” se

determinada habilidade não foi, de fato, adquirida.

4. Repensar totalmente a estrutura escolar baseada na hierarquia e dominação

soberana do professor. Este sendo o ponto mais fundamental pois, a partir dele,

seremos capazes de modificar a relação aluno/escola em seus aspectos mais

sensíveis: o monopólio do discurso e a consequente falta do diálogo; a

hierarquização e a estagnação do conhecimento; a ausência de significação da

instituição escolar.

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