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FACULDADE ALFREDO NASSER INSTITUTO SUPERIOR DE EDUCAÇÃO CURSO DE PEDAGOGIA A CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS Cristiane Eufrásio Marques . APARECIDA DE GOIÂNIA 2010

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FACULDADE ALFREDO NASSER

INSTITUTO SUPERIOR DE EDUCAÇÃO

CURSO DE PEDAGOGIA

A CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO

NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS

Cristiane Eufrásio Marques

.

APARECIDA DE GOIÂNIA

2010

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CRISTIANE EUFRÁSIO MARQUES

A CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO

NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS

Artigo apresentado ao Instituto Superior de Educação da

Faculdade Alfredo Nasser, sob orientação do Prof. Ms.

Milton Luiz Pereira, como parte dos requisitos para a

conclusão do curso de Pedagogia, da União das Faculdades

Alfredo Nasser.

APARECIDA DE GOIÂNIA

2010

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FOLHA DE AVALIAÇÃO DA PRODUÇÃO DO TRABALHO (TCC)

A CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO

NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS

Aparecida de Goiânia, 13 de dezembro de 2010.

EXAMINADORES

Orientador - Prof. Ms. Milton Luiz Pereira - Nota:_____/ 70

Primeiro examinador - Prof. ________________________– Nota: _____/ 70

Segundo examinador - Prof. ________________________ – Nota:______/ 70

___________________________________________________________________________

Média Parcial - Avaliação da Produção do Trabalho: ____/ 70

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A CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E

ADULTOS

Cristiane Eufrásio Marques

RESUMO: O presente Artigo aborda algumas reflexões necessárias sobre a Educação de

Jovens e Adultos (EJA) de como deve ser o método de alfabetizar, desinibir e motivar seu

aluno a ler, a compreender textos e a produzir outros, pois são esses os objetivos básicos

de EJA, para o processo de ensino-aprendizagem. Sabe-se que não se pode construir

conhecimentos sem a interferência do outro. Através dessa visão, faz-se necessário a

contribuição das teorias de alguns pensadores para a formação da prática docente, como

também o uso de metodologias que direcione o professor para o processo pedagógico. O

processo de leitura deve ser permanente e exercitado com continuidade, pois, somente

com a prática, o leitor torna-se crítico.

PALAVRAS-CHAVE: Educação, Jovens, Adultos, Aluno, Professor.

Um estudo acerca da Alfabetização de Jovens e Adultos no Brasil é o tema deste

Artigo. O principal objetivo deste Artigo é mostrar a importância da leitura nas turmas da

EJA, destacando os conceitos, métodos e as práticas dos educadores no ensino neste processo

de ensino-aprendizagem. Os educando da EJA trazem experiências de vida, enriquecidos de

conhecimentos da sua história e das suas relações com a sociedade, embora não tenham

facilidade de se expressarem através da linguagem escrita e/ou oral.

A função do educador é, sobretudo, ser o mediador do conhecimento, motivar os

educandos a participarem do processo educativo. Possibilitar meios para que o próprio

educando tenha curiosidade e, por conseguinte, que sejam construtores do seu conhecimento.

O que se deseja é que os estudantes da Educação de Jovens e Adultos e seus professores

possam constituir-se como leitores e produtores de textos. Professores e alunos leitores

capazes de produzir a sua escrita, a sua comunicação no mundo, é a chave para qualquer

possibilidade de mudança das práticas tradicionais e repetitivas de leitura e escrita para

práticas mais significativas.

De acordo com a Edição Especial da Revista Nova Escola – Grandes Pensadores,

(p. 110-112), Freire dizia que ninguém ensina nada a ninguém, mas as pessoas também não

aprendem sozinhas, os homens se educam entre si mediados pelo mundo. O pensamento de

Paulo Freire é que o professor não é o único detentor do conhecimento e que não domina

Artigo apresentado ao Instituto Superior de Educação da Faculdade Alfredo Nasser, sob orientação do Prof.

Ms. Milton Luiz Pereira, como parte dos requisitos para a conclusão do curso de Pedagogia.

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todas as áreas do conhecimento e é de fundamental importância a troca de experiências entre

professor e aluno. O conhecimento de um completa o outro, todos são dotados de

inteligências e exercem inteligências, porém nem todos desenvolvem para a mesma área.

Muitas vezes um professor é excelente na sua profissão e não tem habilidades como pedreiro.

O pedreiro constrói lindas casas e edifícios, mas não é alfabetizado e quando esse professor

encontra este pedreiro podem trocar experiências distintas e ambos aprendem, exemplifica

Freire, citado em Grandes Pensadores da Revista Nova Escola - p. 110-112.

Esta pesquisa está fundamentada em algumas considerações teóricas de

pensadores que se empenharam nos estudos sobre a EJA no Brasil, destacando Paulo Freire,

Moacir Gadotti, Ghiraldelli Jr., Parecer n. 11 de 10 de maio de 2000, Magda Becker Soares,

Leôncio José Soares e Arlindo Lopes Corrêa, embasada ainda na Lei de Diretrizes e Bases da

Educação - LDB 9334/96.

O histórico da EJA no Brasil – a sua trajetória até o ano de 2010, reflexões

teóricas sob a visão de Paulo Freire que dedicou a sua vida a educação popular e é referencial

para a EJA, a importância da leitura nas turmas da EJA, trazendo à tona alguns pensadores

como Gadotti e Soares que muito influenciaram no desenvolvimento da EJA no Brasil, são

assuntos expostos neste artigo que, também, caracteriza o professor mediador do

conhecimento, através da leitura, em turmas da EJA, como parte principal do processo

aprendizagem dos educandos, durante toda a história da educação da EJA, como se verá a

seguir.

HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NO BRASIL

Para uma boa compreensão da Educação de Jovens e Adultos no Brasil é

necessário fazer um retrospecto na história da educação brasileira. Torna-se importante

observar os mais variados aspectos que envolvem essa modalidade de ensino, desde o fim dos

regimes das capitanias até o ano de 2010, relacionando fatos e datas considerados importantes

no que diz respeito ao desenvolvimento e evolução do processo de alfabetização de jovens e

adultos.

O desenvolvimento da alfabetização de adultos no Brasil acompanha a história da

educação e teve início com o trabalho de catequização e ensino das primeiras letras, realizado

pelos jesuítas, durante o Brasil colônia, em 1549. Ao longo do tempo, o avanço econômico e

tecnológico passou a exigir mão-de-obra cada vez mais qualificada e alfabetizada, com isso,

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várias medidas políticas e pedagógicas foram adotadas no decorrer dos tempos

(GHIRALDELLI JR. 2000, p. 15).

A alfabetização de jovens e adultos não é um ato apenas de ensino-aprendizagem,

é a construção de uma perspectiva de mudança. No início, período da colonização do Brasil,

as poucas escolas existentes era privilégio das classes média e alta. Nessas famílias, os filhos

possuíam acompanhamento escolar na infância; no qual acreditava não haver necessidade de

uma alfabetização para jovens e adultos, as classes pobres não tinham acesso a instrução

escolar e quando a recebiam era de forma indireta, de acordo com um dos filósofos mais lidos

e mais polêmicos do Brasil, Ghiraldelli Jr. (2008, p. 24), a educação brasileira teve seu início

com o fim dos regimes das capitanias, Ghiraldelli Jr. Cita que:

A educação escolar no período colonial, ou seja, a educação regular e mais ou

menos institucional de tal época, teve três fases: a de predomínio dos jesuítas; a das

reformas do Marquês de Pombal, principalmente a partir da expulsão dos jesuítas do

Brasil e de Portugal em 1759, e a do período em que D. João VI, então rei de

Portugal, trouxe a corte para o Brasil (1808-1821).

O ensino dos jesuítas tinha como fim não apenas a transmissão de conhecimentos

científicos, escolares, mas a propagação da fé cristã. A história da educação de jovens e

adultos no Brasil no período colonial se deu de forma assistemática. Nesta época, entre 1808 e

1821, não se constatou iniciativas governamentais significativas.

Ghiraldelli Jr. (2000), em História da Educação, explica que os jesuítas, quanto à

didática, dividia o ensino em duas séries: a inferior, com duração de seis anos, dedicada ao

estudo da Retórica, Humanidades e Gramática, e a superior, com duração de três anos, que

ensina Lógica, Moral, Física, Matemática e Metafísica. As aulas eram ministradas em grego,

latim e português, sem maiores preocupações técnicas ou de formação profissional.

Os jesuítas foram, sem dúvida, os primeiros educadores do Brasil. Mas

utilizavam, na educação, o velho sistema escolástico em que os mestres eram encarados como

exemplos vivos de virtude e de moralidade, passando a ser os únicos detentores do saber que

os estudantes deveriam adquirir subordinadamente. Esse saber estava normalmente

relacionado com textos de autores clássicos, rigorosamente censurados, descontextualizados

dos processos sociais. Todo um aparato disciplinar caracterizava a relação pedagógica,

voltando-se para a virtude e a renúncia de si mesmo na busca da verdade moralizadora, onde a

disciplina e a regulação da ordem nas salas de aula e no comportamento do colegial eram

bases do sistema de ensino (GHIRALDELLI JR., 2000, p. 17).

Os métodos jesuíticos permaneceram até o período pombalino, momento em que

tratou-se de simplificar e abreviar os estudos, o que fez com que um maior número de cidadão

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se interessasse pelos cursos superiores. Ao lado do estudo da língua portuguesa, procurou-se

dar maior ênfase aos estudos da natureza científica e de tornar o ensino o mais prático e

profissional possível. Com a expulsão dos jesuítas, neste período, Pombal organizava as

escolas de acordo com os interesses do Estado, com a chegada da família Real ao Brasil a

educação perdeu o seu foco que já não era amplo (GHIRALDELLI JR., 2000, p. 17).

De acordo com os Cadernos de Pesquisa da Fundação Carlos Chagas (1985), após

a Proclamação da Independência do Brasil foi outorgada a primeira Constituição Brasileira e

no artigo 179 dela constava que a “instrução primária era gratuita para todos os cidadãos”,

mesmo a instrução sendo gratuita não favorecia as classes pobres, pois estes não tinham

acesso à escola, ou seja, a escola era para todos, porém, inacessível a quase todos. A

desigualdade social tem sido uma preocupação das sociedades modernas, principalmente,

porque ela gera e é gerada pela desigualdade educacional. Esta preocupação com a educação,

no entanto, já conta com uma história de mais de um século. Soares (2002, p. 8) cita que:

No Brasil, o discurso em favor da Educação Popular é antigo: precedeu mesmo a

Proclamação da República. Já em 1882, Rui Barbosa, baseado em exaustivo

diagnóstico da realidade brasileira da época, denunciava a vergonhosa precariedade

do ensino para o povo no Brasil e apresentava propostas de multiplicação de escolas

e de melhoria qualitativa de Ensino.

Segundo Soares (2002), foi a partir da conscientização da desigualdade social que

políticas de democratização do acesso à escola foram implantadas, especialmente por meio do

aumento de escolas públicas. Apesar do grande aumento do número de escolas em todo o país

no período de trinta anos, esforços continuaram sendo feitos no sentido de buscar a

democratização integral do acesso à escola. Para o autor, essa realidade tem sido responsável

pela criação de diversos projetos voltados para a alfabetização e educação de jovens e adultos.

A procura por esses projetos tem-se tornado cada vez mais acentuada, levando-se em conta a

competitividade instalada no mercado formal de trabalho, em constante desarranjo, e o

conseqüente medo do desemprego.

A educação de adultos delimitou seu lugar na história da educação no Brasil por

volta da década de 1930, quando começa a se consolidar um sistema público de educação

elementar no país. Nesse momento, a sociedade brasileira passava por grandes transformações

políticas, econômicas, sociais e culturais aliadas ao processo de industrialização e à

concentração populacional nos centros urbanos. A década de 40, com o fim da ditadura de

Vargas em 1945 e o país vivendo a efervescência política da redemocratização, foi marcada

por algumas iniciativas políticas e pedagógicas que ampliaram a educação elementar. Tais

iniciativas foram impulsionadas pelo Governo Federal, que traçou diretrizes educacionais para

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todo o país, determinando as responsabilidades dos Estados e Municípios. Esse movimento

trouxe também esforços no nível nacional de extensão do ensino elementar aos adultos,

quando se detectou altos índices de analfabetismo da população adulta no país (SOARES,

2002).

Para Soares (2002), os movimentos sociais e políticos surgidos ao longo dos anos

20, o impacto da urbanização e industrialização e o forte jogo entre as várias concepções de

mundo presentes no Brasil e as experiências de outros países fizeram da Constituinte de 1933

um momento de grande discussão e mesmo mobilização. Diferentes forças sociais,

heterogêneas entre si, queriam ver seus princípios inseridos na Lei Maior.

De acordo com o Parecer 11/2000, a citação que vem a seguir regulamenta a

extensa do ensino primário aos adultos.

A Constituição de 1934 reconheceu, pela primeira vez em caráter nacional, a

educação como direito de todos e (que ela) deve ser ministrada pela família e pelos

poderes públicos (art. 149). (...) A Constituição de 1934 põe o ensino primário

extensivo aos adultos como componente da educação e como dever do Estado e

direito do cidadão (...).

A Constituição de 1934 não teve êxito, pois Getúlio Vargas o então Presidente da

República tornou-se um ditador através do golpe militar e criou um novo regime o qual

chamou de “Estado Novo” - (1937 a 1945), um regime totalitário no Brasil, semelhante ao

fascismo italiano, também chamado de getulismo. No setor educacional o Estado Novo

configura-se legalmente através de vários Decretos-Leis no período de 1942 a 1946 que ficou

conhecida como Reforma Capanema (fazendo referência ao então Ministro da Educação

Gustavo Capanema). Foram oito decretos que regulamentavam o Ensino Primário, o Ensino

Secundário e as distintas áreas do Ensino Profissionalizante (industrial, comercial, normal e

agrícola) (GHIRALDELLI JR., 2000, p. 25).

Para os estudantes oriundos das camadas médias e altas da sociedade o caminho

era: cursar o primário, depois o secundário em seus dois ciclos (ginásio e colégio) e

finalmente a profissionalização no ensino superior (tendo o direito de cursar qualquer curso

universitário). Para os filhos de famílias oriundas das camadas baixas o caminho era:

conseguir uma vaga em escola pública (que não garantia matrícula para todos) e assim

possivelmente cursar o primário (que contava com um quinto ano, preparatório ao Exame

Admissão ao Ginásio - os que não eram considerados aptos neste exame não podiam cursar o

ginásio), depois de entrar no ensino secundário profissionalizante também em dois ciclos (o

primeiro de quatro anos e o segundo de três anos) para enfim, poder cursar o ensino superior

em uma cadeira correspondente a habilitação no ensino secundário. As estudantes que

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fizessem o Ensino Normal, por exemplo, só poderiam freqüentar o Ensino Superior em um

dos cursos da “Faculdade de Filosofia” (GHIRALDELLI JR., 2008, p. 76).

A partir dessa discriminação social quanto aos estudos, criou-se uma nova

Constituição escrita por Francisco Campos. Ghiraldelli Jr. (2008, p. 78) cita que:

A Constituição de 1937 fez o Estado abrir mão da responsabilidade para com

educação pública, uma vez que ela afirmava o Estado como quem desempenharia

um papel subsidiário, e não central, em relação ao ensino. O ordenamento

democrático alcançado em 1934, quando a letra da lei determinou a educação como

direito de todos e obrigação dos poderes públicos, foi substituído por um texto que

desobrigou o Estado de manter e expandir o ensino público.

A Constituição de 1937 foi criada com o objetivo de favorecer o Estado, pois o

mesmo tira a sua responsabilidade, uma população sem educação (educação para poucos)

torna a sociedade mais suscetível a aceitar tudo que lhe é imposto, logo se entende que esta

Constituição não tinha interesse que o conhecimento crítico se propagasse, mas buscava

favorecer o ensino profissionalizante, naquele momento era melhor capacitar os jovens e

adultos para o trabalho nas indústrias (GHIRALDELLI JR., 2008, p. 77).

Na época do regime militar (1964 a 1985), que estabeleceu um novo governo no

Brasil, os movimentos populares que até então dominavam a sociedade reivindicando os

direitos humanos, foram contidos e extintos, incluindo os educacionais. Surge um movimento

de alfabetização de jovens e adultos, na tentativa de erradicar o analfabetismo, chamado

Movimento Brasileiro de Alfabetização - MOBRAL, esse método tinha como foco o ato de

ler e escrever. O MOBRAL propunha a alfabetização funcional de jovens e adultos, visando

“conduzir a pessoa humana (sic) a adquirir técnicas de leitura, escrita e cálculo como meio de

integrá-la a sua comunidade, permitindo melhores condições de vida” (CORRÊA, 1979).

O movimento, mantido pelo Governo Federal durante a Ditadura Militar, visava

instrumentalizar o cidadão e torná-lo capaz de exercer sua cidadania. No entanto, o MOBRAL

se limitou a alfabetizar de maneira funcional, não oferecendo uma formação mais abrangente.

Essa metodologia assemelha-se a de Paulo Freire com codificações, cartazes com famílias

silábicas, quadros, fichas, porém, não utilizava o diálogo como a de Freire e não se

preocupava com a formação crítica dos educandos.

A respeito do MOBRAL, Gadotti (2001) cita que:

O projeto MOBRAL permite compreender bem esta fase ditatorial por que passou o

país. A proposta de educação era toda baseada aos interesses políticos vigentes na

época. Por ter de repassar o sentimento de bom comportamento para o povo e

justificar os atos da ditadura, esta instituição estendeu seus braços a uma boa parte

das populações carentes, através de seus diversos Programas.

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Dentro dos programas do MOBRAL, algumas das metas era que não exigiria

freqüência e que a avaliação seria feita em dois módulos, uma ao final do modulo e outra pelo

sistema de educação. O fato de não exigir freqüência possibilitava o elevado índice de evasão

que se estabeleceu neste nível. A recessão econômica iniciada nos anos 80 inviabilizou a

continuidade do MOBRAL que demandava altos recursos para se manter. Seus últimos anos

foram marcados por denúncias que provocaram a criação de uma CPI, para apurar os destinos

e as aplicações dos recursos financeiros e o falso índice de analfabetismo emitido por conta do

programa. Foi extinto em 1985 e, por esse motivo, a educação popular autônoma ganhou

força e o governo lançou o III Plano Setorial de Educação Cultura e Desporto, que

incentivava a conquista da liberdade, a criatividade e a cidadania, o que provocou a ascensão

do ensino supletivo e os programas de caráter compensatório como a FUNDAÇÃO

EDUCAR, o Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos - MOVA, e o Programa de

Avaliação Seriada - PAS.

A Constituição Federal de 1988 enuncia o direito à educação como um direito

social no artigo 6º; específica a competência legislativa nos artigos 22, XXIV e 24, IX, dedica

toda uma parte do título da Ordem Social para responsabilizar o Estado e a família, tratar do

acesso e da qualidade, organizar o sistema educacional, vincular o financiamento e distribuir

encargos e competências para os entes da federação.

Além do regramento minucioso, a grande inovação do modelo constitucional de

1988 em relação ao direto à educação decorre de seu caráter democrático, especialmente pela

preocupação em prever instrumentos voltados para sua efetividade.

De acordo com o artigo 208 da Constituição de 1988, o dever do Estado com a

educação será efetivado mediante a garantia de: I - ensino fundamental obrigatório e gratuito,

assegurada inclusive, sua oferta gratuita para todos os que a ele não tiveram acesso na idade

própria.

O sentido do direito à educação na ordem constitucional de 1988 está intimamente

ligado ao reconhecimento da dignidade da pessoa humana como fundamento da República

Federativa do Brasil, bem como os seus objetivos, especificamente: a construção de uma

sociedade livre, justa e solidária, o desenvolvimento nacional, a erradicação da pobreza e da

marginalidade, redução das desigualdades sociais e regionais e a promoção do bem comum

(CONSTITUIÇÃO, 1988).

Segundo a Constituição de 1988, o tratamento constitucional do direito à educação

está intimamente ligado à busca do ideal de igualdade. Os direitos sociais abarcam

um sentido de igualdade material que se realiza por meio da atuação estatal dirigida

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à garantia de padrões mínimos de acesso a bens econômicos, sociais e culturais a

quem não conseguiu a eles ter acesso por meios próprios.

Em última análise, representam o oferecimento de condições básicas para que o

indivíduo possa efetivamente se utilizar das liberdades que o sistema lhe concede como

direito adquirido.

A História da Educação Brasileira, nesta fase, mostra que a EJA possui um foco

amplo, para haver uma sociedade igualitária e uma Educação eficaz é necessária que todas as

áreas da Educação sejam focadas e valorizadas, não é possível desvencilhar uma da outra.

A Educação de Jovens e Adultos deve ser tratada de acordo com a Lei de

Diretrizes e Bases da Educação (LDB) que define e regulamenta o sistema de educação

(público ou privado) do Brasil (da educação básica ao ensino superior), com base nos

princípios presentes na Constituição de 1988. A primeira LDB foi criada em 1961, seguida

por uma versão em 1971, que vigorou até a promulgação da mais recente em 1996 (BRASIL,

LDB, Lei 9394/96).

A Educação de Jovens e Adultos deverá, ainda, estar de acordo com as Diretrizes

Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos estabelecidas na Conferência

Internacional de Hamburgo, na Lei 9394/96, no Parecer CEB 11/00 e na Deliberação 08/00

CEB. As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos vieram

preencher uma lacuna no encaminhamento de ações para a elaboração das propostas

curriculares nos diversos segmentos, apontando princípios éticos, políticos e estéticos

importantes para a consolidação de formulações significativas, democráticas e criativas. Por

isso, a elaboração das propostas curriculares e o currículo delas constante incluirá o

desenvolvimento de competências básicas, conteúdos e formas de tratamento dos conteúdos

que busquem chegar às finalidades da educação de jovens e adultos.

Desta forma, a educação de jovens e adultos deve ser pensada como um modelo

pedagógico próprio, com o objetivo de criar situações de ensino-aprendizagem adequadas às

necessidades educacionais de jovens e adultos, englobando as três funções: a reparadora, a

equalizadora e a permanente, citadas no Parecer 11/00 da CEB/CNE.

Segundo o que consta o Parecer, a função reparadora significa a entrada no

circuito dos direitos civis pela restauração de um direito negado: o direito a uma escola de

qualidade e o reconhecimento de igualdade de todo e qualquer ser humano.

A função equalizadora dará cobertura a trabalhadores e a tantos outros segmentos

da sociedade possibilitando-lhes a reentrada no sistema educacional. A educação de jovens e

adultos deve ser vista como uma promessa de qualificação de vida para todos, propiciando a

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atualização de conhecimentos por toda a vida. Isto é a função permanente da educação de

jovens e adultos.

Finalmente, o pensamento pedagógico de Paulo Freire, assim como sua proposta

para a alfabetização de adultos, inspiraram os principais programas de alfabetização e

educação popular que se realizaram no país no início dos anos 60.

Paulo Freire (1979) dá início a trabalhos com iniciativas populares, quando decide

organizar, juntamente com paróquias católicas, projetos que abrangem desde o jardim de

infância até a educação de adultos, objetivando o desenvolvimento do currículo e a formação

de professores. O resultado desse trabalho foi partilhado com outros grupos: técnicas como

estudo em grupo, ação em grupo, mesas redondas, debates e distribuição de fichas temáticas

eram praticados nesse tipo de trabalho.

PAULO FREIRE - REFERENCIAL PARA A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS

O renomado educador, brasileiro, Paulo Reglus Neves Freire jamais concordou

com práticas educacionais que transmitissem aos sujeitos um saber já construído. Ele

acreditava que o ato de educar deve contemplar o pensar e o concluir, contrapondo a simples

reprodução de idéias impostas - alfabetização deveria ser sinônimo de reflexão,

argumentação, criticidade e politização. Se em práticas educacionais envolvendo

alfabetização em níveis de escolaridades “adequados”, metodologias tradicionais de ensino

não despertam interesse do educando, no EJA estas ações são um convite a evasão escolar.

Ao pensar em alfabetização de adultos, Freire (A Importância do Ato de Ler: em

três artigos que se completam, p. 62), considerou a ausência de sentido presente nas lições das

cartilhas, com frases desvinculadas da realidade do alfabetizando - que após trabalhar o dia

todo, sentava em uma cadeira, preocupado com o gás, a água, a energia elétrica, o alimento e

o salário do mês - e ouvia frases como “O boi baba e bebe” ou “Vovô viu a uva”. Em que

frases como estas contribuíram para seu cotidiano? Aprender a ler e escrever para quê? Uma

mudança seria eminentemente necessária.

As atividades apresentadas a Freire também eram desmotivantes ao processo, pois

traziam suas respostas prontas, sem a necessidade de uma reflexão sobre o assunto. Apesar de

não haver o que um adulto, trabalhador, assalariado pudesse analisar em frases - desprovidas

de informação - como as acima citadas. Então, realmente as práticas envolvendo a

alfabetização de adultos estavam desvinculadas da realidade de seus educandos.

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Paulo Freire (1979) iniciou suas pesquisas de campo, e através delas pode

confirmar que as metodologias e os materiais didáticos utilizados, estavam desmotivando os

alunos, que demoravam muito a apresentar resultados e acabavam abandonando os estudos.

Após esta conclusão, Freire elaborou seu método, montou sua equipe e partiu para o desafio

de alfabetizar para além das cartilhas.

O método utilizado por Paulo Freire (1979) é conhecido mundialmente, pois sua

forma de ensino quebrou barreiras. Com muito pouco de inovação, mas com uma interação

entre educando X aprendizagem e com o objetivo de desenvolver conceitos relativos ao

método de Paulo Freire, a educação passou a ser construída sob uma análise crítica da

metodologia utilizada por ele. O método de Paulo Freire parte do ponto de vista estritamente

metodológico veremos que, em termos do processo de apropriação da leitura e da escrita, o

método tem pouco de inovação, já que se utiliza de um processo analítico - sintético de

decodificação e codificação já bastante conhecido.

A metodologia analítica de Paulo Freire (2000) conseguiu dar, à educação, uma

nova dimensão, no âmbito das experiências dos “círculos de cultura”. Ele não parte de uma

atividade mecânica de memorização de letras, silabas e famílias aprisionadas em palavras sem

sentido. Parte da vida e dos saberes dos educandos, nos círculos de cultura a novidade é a

presença ativa dos educandos que passam a ser donos de seu processo de alfabetização.

Podemos afirmar ser a primeira vez que se pensa na aprendizagem da leitura com adultos, de

dentro para fora e não de fora para dentro.

O pensamento freireano tem como base enxergar a educação como um processo

que sirva de libertação, e não de domesticação do homem. Ele nos convoca a construir um

novo olhar para a educação como um todo, e faz isso a partir da Educação de Jovens e

Adultos. O seu método também diz respeito à necessidade de se estabelecer uma relação entre

o perfil dos educadores que atuavam nas primeiras experiências feitas nos anos de 1960, e o

perfil dos profissionais que hoje lecionam em classes de EJA (FREIRE, 2000).

As etapas do método Paulo Freire eram: etapa de investigação, em que a busca era

conjunta entre professor e aluno das palavras e temas mais significativos da vida do aluno,

dentro de seu universo vocabular e da comunidade onde ele vive; etapa de tematização, que

era o momento da tomada de consciência do mundo, através da análise dos significados

sociais dos temas e palavras e, a etapa de problematização, momento em que o professor

desafia e inspira o aluno a superar a visão mágica e acrítica do mundo, para uma postura

conscientizada (FREIRE, 2000).

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Paulo Freire antes de alfabetizar procurava saber em que seus alunos trabalhavam

e que tipo de vida levavam, mas seu principal objetivo não era saber a respeito da vida dos

seus educandos, mas sim, descobrir quais às palavras mais conhecidas e usadas por eles no

seu dia-a-dia para com isso alfabetizá-los. Ele usava as palavras que eram mais comuns entre

seus alunos e com elas formavam outras, eram as palavras geradoras, pois geravam tanto

outras como o conhecimento dos alunos (FREIRE, 2000, p. 32).

Sua forma de ensino era infalível, e a prova disso é que ele conseguiu alfabetizar

300 trabalhadores em apenas 45 dias. Isso impressionou profundamente a opinião pública.

A Importância da Leitura e da Escrita nas Turmas da Educação de Jovens e Adultos

A apropriação da escrita é diferente do aprendizado de ler e escrever. Aprender a

ler e a escrever significa uma tecnologia, a de decodificar e tornar a escrita própria. O

indivíduo alfabetizado não é necessariamente um indivíduo letrado, alfabetizado é aquele

indivíduo que sabe ler e escrever; já o indivíduo letrado é o indivíduo que vive em estado de

letramento, que usa socialmente a leitura e a escrita, pratica a leitura e a escrita, responde

adequadamente as demandas sociais da escrita (SOARES, 2003, p. 78).

Soares defende a complementaridade e o equilíbrio entre ambos e chama a

atenção para o valor da distinção terminológica:

Porque alfabetização e letramento são conceitos freqüentemente confundidos ou

sobrepostos, é importante distingui-los, ao mesmo tempo que é importante também

aproximá-los: a distinção é necessária porque a introdução, no campo da educação,

do conceito de letramento tem ameaçado perigosamente a especificidade do

processo de alfabetização, por outro lado, a aproximação é necessária porque não só

o processo de alfabetização, embora distinto e específico, altera-se e reconfigura-se

no quadro do conceito de letramento, como também este é dependente daquele

(2003, p. 90).

Assim como a autora, é preciso reconhecer o mérito teórico e conceitual de ambos

os termos. Analisando o movimento pendular das propostas pedagógicas (não raro

transformadas em modismos banais e mal assimilados), a compreensão que hoje temos do

fenômeno do letramento presta-se tanto para banir definitivamente as práticas mecânicas de

ensino instrumental, como para se repensar na especificidade da alfabetização. Na

ambivalência dessa revolução conceitual, encontra-se o desafio dos educadores em face do

ensino da língua escrita: o alfabetizar letrando.

As práticas de letramento podem ser influenciadas pela convivência com

familiares que utilizam materiais de escrita e, principalmente, pelo contexto social em que

vivem as classes sociais, o emprego, a região que moram etc. Um ambiente familiar rico em

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eventos de letramento influencia beneficamente o desenvolvimento da leitura e da escrita,

entretanto, tais práticas não são suficientes para que o indivíduo esteja de fato inserido nessa

sociedade letrada.

A intervenção do professor no processo de ensino-aprendizagem da leitura/escrita,

é necessária, independente de ser educação regular ou educação de jovens e adultos, uma vez

que é através da leitura de mundo que o educando se sociabiliza e se sente respeitado,

valorizando o seu “eu”.

(...) não há homem absolutamente inculto: o homem “humaniza-se” expressando-se,

dizendo o seu mundo. Paralelamente, dizemos que, numa sociedade letrada, não

existe pessoa iletrada, ou seja, pode-se observar que o indivíduo analfabeto possui

determinado grau de letramento por estar envolvido em práticas sociais de leitura e

escrita em seu dia-a-dia. Freire expõe a educação como forma de intervenção no

mundo e que isto vai muito além do conhecimento de conteúdos. O autor percebe o

ler e escrever como meio de apropriação e de inserção no mundo. Em outros termos,

“a alfabetização não é aprender a repetir palavras, mas a dizer a palavra, criadora de

cultura” (FREIRE, 1983, p. 13).

Como observa Soares (1998) os educadores precisam reconhecer que:

Um adulto pode ser analfabeto porque marginalizado social e economicamente, mas

se vive em um meio em que a leitura e a escrita tem presença forte, se interessa em

ouvir a leitura de jornais feita por um alfabetizado, se recebe cartas que os outros

lêem para ele, se dita cartas para que um alfabetizado a escreva. [...] se pede a

alguém que lhe leia avios ou indicações afixadas em algum lugar, esse analfabeto é,

de certo modo, letrado, porque faz uso da escrita, envolve-se em práticas sociais da

linguagem escrita (SOARES, 1998, p. 26).

Assim sendo, quando o aluno de EJA chega ou retorna à escola, há que se

considerar o repertório de conhecimento de mundo já adquiridos através da linguagem no

decorrer de suas vidas. Entretanto, é possível que não adquiriu ou está em processo de

construção acerca dos conhecimentos do sistema lingüístico, dos conhecimentos da

organização textual e dos conhecimentos de outros meios de abordagem.

O que se deseja é que os estudantes da Educação de Jovens e Adultos e seus

professores possam constituir-se como leitores e produtores de textos. Professores e alunos

leitores capazes de produzir a sua escrita, a sua comunicação no mundo, é a chave para

qualquer possibilidade de mudança das práticas tradicionais e repetitivas de leitura e escrita

para práticas mais significativas. O bom leitor sempre tem algo a contar sobre suas leituras e é

simplesmente motivante e contagiante quando alguém se interessa por nossas histórias. De

acordo com a abordagem freireana, há necessidade de educadores e educadoras de viver, na

prática, o reconhecimento óbvio de que nenhum de nós está só no mundo. Freire (2000) cita

que o direito dos educandos de falar corresponde ao nosso dever de escutá-los. De escutá-los

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corretamente, com a convicção de quem cumpre um dever e não com a malícia de quem faz

um favor para receber muito mais em troca.

Segundo o autor citado acima, o ser humano começa pela leitura de si e do

mundo, para depois proceder à leitura das palavras. Desse modo, a compreensão dos textos,

das palavras e das letras só tem sentido se houver uma contextualização com a sua experiência

vivencial. Toda e qualquer experiência de alfabetização desconectada com o mundo onde o

alfabetizando estiver inserido não tem sentido para ele, cai no vazio (FREIRE, 2000, p. 33). O

momento de criar e de interpretar o mundo a partir do novo referencial são codificações ou

ferramentas que representam a realidade, são leituras da leitura que o alfabetizando já fazia do

mundo antes de aprender as palavras. Assim, a alfabetização é a criação ou a montagem na

expressão escrita, da expressão oral. As palavras do povo vêm através da leitura do mundo,

depois voltam inseridas no que se chamou de codificações escritas, que são representações da

realidade.

A prática escolar de leitura deve aproximar-se o máximo possível da sua prática

social. Esta forma de leitura da sua prática social vem romper profundamente com toda a

tradição de ensino de leitura instalada há tempos na escola.

Para Freire (2000, p. 36), é necessário promover a reflexão e a criticidade através

da leitura. O educador é o orientador para que essa promoção aconteça. Ele precisa interagir

com o educando para que haja construção do sentido do texto. Deve levar o leitor a refletir

sobre sua realidade e tomar postura em relação à vida, à sociedade e à escola, interagindo com

o texto para que essa leitura venha a produzir sentido.

O Propósito do Educador da Educação de Jovens e Adultos

Para que o educador de jovens e adultos possa contribuir de fato com uma

aprendizagem significativa para o educando, deve estar preparado para atender esses alunos

em todas as suas especificidades, ele deve conhecer cada um deles, e partindo daí relacionar o

conteúdo a ser ministrado com o cotidiano e a realidade social de cada um considerando suas

aspirações por melhores condições de vida, de trabalho e de satisfação pessoal.

O educador deve estar embasado teoricamente para apontar métodos que

despertem no jovem e no adulto a conscientização, a criatividade e o interesse em querer

saber sempre mais. Para isso, é necessário que o material didático utilizado pelo educador seja

construído a partir de debates entre ele e os alunos com o objetivo de fazer um levantamento

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dos conhecimentos dos alunos, até mesmo do vocabulário que faz parte do universo de

comunicação destes alunos (FREIRE, 1998).

Como afirma Freire (1998, p. 72) “A prática docente, especificamente humana é

profundamente formadora e por isso ética”, ou seja, o educador tem em mãos uma grande

responsabilidade, pois sua prática é eminentemente formadora e por isso a maneira como age

em seu trabalho docente, a sua lucidez quanto a sua responsabilidade é de grande importância

para a formação de jovens e adultos.

A realidade das classes populares encontra-se desconhecidas pelos educadores,

que não levam em consideração esta realidade no processo de ensinar e aprender, contudo, o

professor deve conhecer a realidade que as classes populares enfrentam e de acordo com o

contexto levá-los à liberdade, ou seja, a autonomia, como fala Freire (1998, p. 121)

“Autonomia enquanto amadurecimento do ser para si é processo, é vir a ser, não ocorre em

data marcada, é neste sentido que uma pedagogia da autonomia tem de estar centrado em

experiências respeitosas da liberdade”.

A compreensão do “mundo” do educando é fundamental na prática pedagógica do

professor, pois é preciso ter uma visão ampla desta realidade social concreta, para se construir

uma educação crítica-reflexiva de acordo com o contexto em que vive o ser humano.

A Educação, como coloca Paulo Freire, em Pedagogia da Autonomia, leva o ser

humano a ser mais confiante em seus propósitos, e deste modo o contesto em que ele vive,

suas relações cotidianas, as situações regionais devem ser objeto de intensas reflexões no

processo educativo, principalmente por sabermos que vivemos numa sociedade opressora que

busca inibir todo tipo de ação de uma pedagogia libertadora, uma sociedade que impede

homens e mulheres de construírem sua liberdade no sentido de transformar sua realidade e de

tornarem-se mais críticos.

A partir da pedagogia libertadora, entende-se que a educação deve ser

desenvolvida de maneira mais dinâmica, na qual os elementos participativos trabalhem em

conjunto no processo de ensino-aprendizagem, o educador deverá interagir de forma

construtiva e coletiva fazendo com que os educandos participem conjuntamente no processo,

devendo para isso ter respeitadas as suas individualidades e dificuldades, principalmente por

se tratar de pessoas jovens e adultas.

Assim, ao manter contato com jovens e adultos o educador deverá ter humildade

de aceitar os conhecimentos já adquiridos por eles e tolerância para saber articular tais

conhecimentos com os que pretende fazê-los adquirir, assim, os jovens e adultos terão mais

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facilidade em aprender, se o que lhe estiver sendo ensinado estiver articulado com sua

realidade e com sua vivência (FREIRE, 1998, p. 78).

A alfabetização de jovens e adultos exige pois, um referencial teórico. Toda

prática já implica uma teoria adequadamente e não há prática pedagógica neutra, ela é sempre

política. Supõe sempre uma visão de mundo, de sociedade, de homem, supõe então, um

projeto histórico, uma teoria do conhecimento, a opção para uma concepção de educação e

uma concepção de metodologia.

Os autores mencionados neste artigo afirmam ser necessário que os educadores

sejam e estejam capacitados em nível inicial e comprometidos com sua formação continuada

para o exercício da docência. Jovens e adultos buscam na escola a sua inclusão social,

carregando consigo patrimônios culturais que dêem sentidos as suas vidas. A construção de

um saber novo não se realizará com eficiência se o educador não considerar a realidade desses

educandos que é, não só econômica, mas também social, e sobretudo, cultural.

O educador precisa saber aproveitar e trabalhar com o concreto, ou seja, com o

conhecimento que o aluno já adquiriu e tentar atualizar esses conhecimentos de acordo com a

nossa realidade do dia-a-dia, e de acordo com o que a sociedade exige desses educandos. “A

importância do papel do educador, o mérito da paz com certeza de que faz de sua tarefa

docente não apenas ensinar os conteúdos mas também ensinar a pensar certo” (FREIRE,

1996, p. 27).

A verdadeira função do professor é auxiliar o aluno a pensar e a ser crítico e não

torná-lo uma máquina, o professor tem que ensinar o aluno a lutar pelo que deseja, pelo que

acha certo, ou seja, o aluno tem que saber o que ele quer e que caminhos quer percorrer. “Às

vezes, mal se imagina o que pode passar a representar na vida de um aluno um simples gesto

do professor” (FREIRE, 2001, p. 9).

O professor que transmite ao seu aluno respeito, auto confiança, com certeza esse

aluno será um ser humano esplêndido, crítico e sempre lutará pelos seus objetivos, mas

quando o professor é rude, não se importa com o que o aluno pensa e nem tão pouco importa

se ele está aprendendo ou se tem algum tipo de problema emocional, dificuldade no

aprendizado ou se tem qualquer outro tipo de problemas, com certeza o aluno será um adulto

mal humorado, deesmotivado, e não se importará com nada, ou seja, para ele tanto faz como

tanto fez.

O importante é que o professor esteja realmente preparado para receber qualquer

tipo de aluno e com qualquer tipo de problema, ou seja, tem que ser um professor que se

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preocupa com seu aluno e o vê como um ser humano que precisa ser orientado para uma

aprendizagem significativa e como cidadão reflexivo e atuante na sociedade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A trajetória da EJA no Brasil tem sido pautada por campanhas ou movimentos

desenvolvidos a partir da administração federal, com envolvimento de organizações da

sociedade civil, visando à realização de propostas ambiciosas de eliminação do analfabetismo

e formação de mão-de-obra, em curtos espaços de tempo.

Atualmente (2010), a alfabetização não visa somente à capacitação do aluno para

o mercado de trabalho, é também necessário que a escola desenvolva no aluno suas

capacidades, em função de novos saberes que se produzem e que demande um novo tipo de

profissional, que o educando obtenha uma formação indispensável para o exercício da

cidadania.

Um momento de grandes despolitizações, isto é, momento em que a população,

com sua maioria, está completamente apática e desprovida de senso crítico com relação aos

seus governantes, é vivido por todos os que estão direta ou indiretamente ligados à educação,

mesmo assim, em sua última obra, Freire destaca que os seres humanos são seres

transformadores, capazes de adaptarem-se a concretude para melhor operar. Em sua análise,

as transformações do tempo (revolução tecnológica e aceleração da vida), trazem a

necessidade de interagir com o novo. Nesse propósito faz-se necessário ter um

posicionamento crítico de natureza política e ideológica, frente às mudanças e o

posicionamento do autor em favor da construção e aperfeiçoamento da verdadeira

democracia.

O educador é responsável por enriquecer a vida do aluno através das obras lidas e

ações educativas intencionais. Ele precisa observar e proporcionar aos educandos a leitura de

diversos textos com assuntos diferentes e então descobrir quais são os temas que mais atraem

esses leitores. A descoberta do assunto que mais aproxima os leitores vai depender da

realidade em que estão inseridos, do seu contexto social e faixa etária.

Os educadores que possuem o hábito da leitura conseguem formar ótimos leitores.

Os alunos de EJA precisam ser incentivados, de forma dinâmica e prazerosa para a leitura. É

muito importante a conscientização desses alunos, de que ler é uma forma de sonhar,

conhecer, aprender, imaginar, refletir, questionar, sendo assim, de participar mais

efetivamente daquilo que acontece na sociedade, na escola e na família.

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A importância da leitura para a EJA reflete a preocupação de educadores, mas

percebemos que são poucas as pesquisas que dão atenção para EJA, quando se trata da

formação de leitores. Portanto, deve-se incentivar a prática de leitura na modalidade de ensino

de EJA, tentando superar as marcas de exclusão, promovendo a entrada destes leitores, neste

universo cultural com direito democrático. Assim, os educando leitores terão espaço e lugar

para ampliar o universo cultural.

Os educadores percebem que só existe um caminho que conduz a eficácia do uso

das práticas pedagógicas sociais de leitura: a criação e implementação das políticas públicas e

programas que possibilitem o aprimoramento das práticas pedagógicas dos profissionais que

trabalham na EJA, como ficou explicado no decorrer deste artigo.

ABSTRACT: The present article discusses some considerations needed on the

Education of Young People and Adults (EYA) how it should be the method of

teaching, to read and write, to uninhibit and to motivate the student to read, to

understand texts and to produce others, because these are the EJA s goals, according

to the teaching-learning process. It is know that it is not possible to acquire

knowledge without some one else interference. Through such a vision it is needed to

take some thinker’s theories into account to the education of teaching practices, as

well as to make use of methodologies which direct teachers towards the pedagogical

process. The reading process to be a continuous and constant exercise in order to

make a passive read into a critical and skillful one.

KEY WORDS: Youth, Adult, Education, Student, Teacher.

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