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Universidade de São Paulo | USP Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas | FFLCH Departamento de História | DH Ensino de História: Teoria e Prática Profa. Dra. Antônia Terra 1o semestre 2015 | vespertino Sophia Gutierrez, 8030252

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Universidade de São Paulo | USP Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas | FFLCH Departamento de História | DH Ensino de História: Teoria e Prática Profa. Dra. Antônia Terra 1o semestre 2015 | vespertino Sophia Gutierrez, 8030252

Sequência Didática Tema: Holocausto ­ o resgate de histórias e memórias escondidas

Público alvo: alunos do nono ano do Ensino Fundamental e do Ensino médio

Duração: 2 aulas

Objetivos: Trabalhar com os alunos as noções de "construção de discurso" e de “memória histórica” ­ enquanto formulações construídas, alteráveis ao longo do tempo, e que adquirem significado de acordo com um contexto histórico específico ­ através do resgate das histórias dos diversos grupos perseguidos pelo nazismo, jogando luz especialmente sobre aqueles que não possuem muita visibilidade nas discussões acerca do Holocausto. Pretende­se, assim, que sejam mobilizadas com os alunos tanto questões de maior abstração teórica, quanto conteúdos formais do currículo padrão de História (exigidos pelo vestibular). Para tanto, propomos a utilização de instrumentos variados ­ documentos textuais de época, vídeos e imagens (fotografias, propagandas etc) ­ para levantar as discussões sobre o tema, buscando desenvolver nos alunos habilidades de leitura e interpretação crítica de fontes e discursos. Pretende­se também que seja articulada com os alunos uma discussão política a respeito da temática do preconceito, através de debate acerca de ideias como racismo, segregação, violência e genocídio. Alguns conceitos gerais, de maior complexidade teórica, deverão ser apresentados e/ou esclarecidos aos alunos no decorrer das atividades, conforme pertinentes às discussões ­ a ideia de construção ideológica, por exemplo. Sugerimos que a atividade seja incluída entre as aulas do currículo formal sobre a Segunda Guerra Mundial. Desta forma, não é necessária uma introdução teórica por parte do professor. A atividade foi elaborada em três seções. Seção 1 O professor deverá passar o vídeo que se segue aos alunos, uma propaganda produzida pelo jornal Folha de São Paulo, no ano de 1987, projetando­o em tela. (Como o vídeo se trata de uma propaganda dos serviços do jornal, sugerimos que o professor corte os últimos segundos do vídeo, exibindo­o apenas até os 00:49 segundos, evitando assim qualquer apologia publicitária. Caso não seja possível, é importante que o professor oriente os alunos a levar em consideração que o vídeo é uma ação publicitária, e portanto também deve ser questionado.)

https://www.youtube.com/watch?v=pY4FCKlQISA Após passar o vídeo, o professor deve incitar um debate com os alunos, através de perguntas. (As perguntas a seguir são sugestões para que o professor possa encaminhar a discussão. Dependendo das respostas dos alunos, no entanto, o professor poderá cortar algumas das perguntas, deixando ainda mais espaço para a fala dos alunos.)

­ Sobre o que o vídeo trata? A qual período histórico se refere? ­ Quem é sua personagem principal? ­ Quais são as informações fornecidas sobre Hitler? ­ Essas informações, à primeira vista, são positivas? Elas nos levam a crer que o

vídeo fala de um bom político? ­ Qual era a situação alemã após a Primeira Guerra Mundial? E logo antes da

Segunda Guerra? ­ Se nós não soubéssemos o que Hitler representa, enquanto líder do partido nazista,

nós continuaríamos achando que as informações fornecidas sobre ele eram positivas?

­ Qual a mensagem do vídeo? Ele está criticando o quê? ­ Uma mesma história pode ser contada de diversas maneiras? ­ Dados verdadeiros, como os apresentados no vídeo sobre a situação econômica

alemã ou sobre os gostos pessoais de Hitler, são suficientes para que saibamos a verdade?

­ Como sabemos que uma história está sendo falseada? ­ Por que histórias falsas são construídas? Que interesse há nisso?

Justificativa: Através desta primeira discussão, formulada a partir do vídeo, pretende­se que os alunos possam compreender melhor a ideia de "construção de discurso", percebendo como uma história pode ser manipulada de acordo com a forma como é contada. O professor deve ajudar os alunos a entender que a veracidade de fatos ou dados, não é o suficiente para que se tenha acesso a uma visão ampla sobre acontecimentos passados. Seção 2 O professor deverá, então, projetar também em tela, as seguintes imagens, junto de suas respectivas legendas, explicando que os cartazes e fotografias se constituem em propagandas idealizadas pelo regime nazista. Após mostrar cada imagem, o professor pode realizar algumas perguntas, para estimular os alunos a analisarem seu conteúdo. A discussão maior, no entanto, deverá ser mantida para o final da exposição.

A legenda diz: "[Quem está] Por trás das forças inimigas: o Judeu”. Alemanha, cartaz

divulgado por volta do no ano de 1942. (Acervo do US Holocaust Memorial Museum, Gift of Helmut Eschwege)

Perguntas do professor:

­ O que o cartaz está representando? ­ O que significam as bandeiras? Quem é o homem representado? (Com a ajuda da

legenda, os alunos devem ser capazes de identificar as bandeiras dos Estados que conformavam a frente "Aliada" ­ Grã­Bretanha, EUA e URSS ­, e que o homem representa o "judeu maligno" ­ identificado pela Estrela de Davi, que, segundo o regime nazista, estava por detrás deles.)

­ Como o judeu é representado? (Os alunos deverão apontar para as feições caricatas e estereotipadas ­ como o nariz grande ­, de um judeu com traços maléficos.)

Cartaz promovendo a publicação mensal nazista Neues Volk, i.e. "Novo Povo". A legenda diz: "Esta pessoa, que possui uma doença hereditária, custará para a nossa comunidade nacional 60.000 marcos [moeda alemã da época] do Reich no decorrer de sua vida.

Cidadão, é do seu dinheiro". Alemanha, cartaz divulgado em meados da década de 1930. (Acervo do Deutsches Historisches Museum)

Perguntas do professor:

­ Qual a mensagem do cartaz? ­ O que significa "doença hereditária"? ­ Por que o cartaz fala no "custo" que essa pessoa traz à sociedade? ­ Quando o cartaz apela ao "cidadão", a quem ele se dirige? E por que, ele se dirige a

esse "cidadão"?

Cartaz adverte os alemães sobre os perigos dos "subumanos" do leste europeu. A legenda

diz principal diz: "Assim? ou Assim?". Alemanha, s/d. (Acervo da Robert Hunt Library)

Perguntas do professor: ­ Quem são as pessoas representadas no cartaz? Como é possível identificá­las? (O

aluno devera se ater sobretudo aos símbolos ­ suástica e foice e martelo ­, ao fundo de cada personagem.)

­ Esses dois personagens são representados da mesma forma? (O aluno deverá notar a altivez e seriedade com que é representado o alemão ariano, e o tom depreciativo e gozador conferido à representação do homem do leste europeu, identificado diretamente ao comunismo.)

­ A pergunta, inserida na legenda, indica o quê? Uma oposição? Uma escolha? (Pretende­se aqui que o aluno perceba que o espectador da propaganda é incitado a escolher entre se identificar com o alemão ­ bonito, sério, bem arrumado ­ ou como o soviético ­ caricato, de postura desdenhosa etc.)

Foto utilizada em propaganda nazista mostra a amizade entre uma mulher branca e uma negra. A legenda diz: "O resultado! A perda do orgulho racial." Alemanha, 1939. (Acervo do

US Holocaust Memorial Museum) Perguntas do professor:

­ O que a imagem mostra? ­ Essa amizade, de acordo com a legenda, é algo bom? Por quê? (O aluno deve

apontar que a "perda do orgulho racial", através da mistura de raças, é algo vergonhoso, vexado pelo regime nazista neste cartaz. Mesmo que a imagem não indique isso de imediato, o tom é dado pela legenda.)

O professor deve então ler o seguinte trecho para os alunos:

"Eu me associei ao Nacional­Socialismo [ou Partido Nazista] porque a ideia da Comunidade Nacional me inspirava. O que eu nunca havia percebido era o número de alemães que não eram considerados merecedores de pertencer a tal comunidade". – Trecho retirado das memórias de uma alemã ativa nos programas da juventude nazista. (Depoimento retirado do site do Museu do Memorial do Holocausto dos Estados Unidos).

Após a leitura, deve iniciar um debate, buscando estabelecer com os alunos conexões entre o trecho lido e as imagens exibidas, novamente levantando indagações e incitando a participação da turma.

­ O que essa antiga ativista do partido nazista quis dizer com "o que eu nunca havia percebido era o número de alemães que não eram considerados merecedores de pertencer a tal comunidade"? A que comunidade ela se refere? (Os alunos devem compreender que a comunidade referida é aquela construída pelo partido nazista sob os ideais da superioridade ariana alemã.)

­ Quais eram essas pessoas que o regime não julgava "merecedoras" de fazer parte da comunidade alemã? Nós as observamos em algumas das fotos? (Os alunos deverão apontar os judeus, os deficientes físicos e mentais, negros, comunistas, eslavos etc.)

­ O uso de propagandas, como as que acabamos de ver, demonstra essa exclusão? ­ Quais motivos são alegados nas propagandas para justificar essa exclusão?

(Motivos higienistas, raciais, políticos etc.) ­ Essas pessoas eram consideradas "indesejáveis"? Por quê?

Justificativa: A partir do contato com essa documentação de época, pretende­se que os alunos possam identificar a construção do discurso nazista de segregação, tomando conhecimento de seu alcance, que não se restringia ao povo judeu. Além disso, é nosso intuito estimular o senso crítico dos alunos, através do contato com fontes visuais de caráter ideológico e propagandístico.

Seção 3

O professor deverá distribuir para os alunos, os seguintes documentos, pedindo que os leiam atentamente. Cada documento se constitui em uma ficha com breve biografia e depoimento de pessoas perseguidas pelo regime nazista.

O professor deverá, em seguida, projetar para a sala as tabelas listadas abaixo, que explicam o sistema utilizado pelo regime nazista para a identificação de seus prisioneiros, nas cadeias e campos de concentração. Cada grupo étnico, político, ou social era sinalizado com triângulos de cores específicas, pregados nos uniformes.

O sistema de identificação por triângulos nos uniformes dos prisioneiros do regime nazista.

Cartaz original, 1936.

Após a leitura das tabelas, os alunos deverão se dividir em grupos, conforme as fichas que pegaram. Cada grupo representará os diferentes "triângulos" que sinalizavam os prisioneiros. (Exemplo: Maria, José e Carolina pegaram fichas referentes a prisioneiros homossexuais, eles se reunirão como o grupo dos "triângulos rosa"; Antônio e Manuel estão com fichas de prisioneiros ciganos, eles se reunirão enquanto grupo dos "triângulos marrom", e assim por diante.)

O professor deverá pedir para que alguns dos alunos de cada grupo leiam em voz alta as histórias contidas em suas fichas. Os alunos deverão ficar livres para expressar suas impressões de cada história, comentando o que lhes chamou atenção, lhes causou horror etc. Quando necessário, o professor poderá fazer apontamentos, retomando temas das discussões anteriores (seria importante destacar a multiplicidade de grupos violentados ­ as Testemunhas de Jeová por sua posição pacificista e anti­nacionalista, se negando em servir ao exército e a saudar Hitler e a bandeira; judeus, ciganos e eslavos por sua ascendência étnica; comunistas por seu posicionamento político etc. Também é interessante que os alunos notem a ascendência de cada pessoa ­ franceses, romenos, tchecos, italianos,

alemães, poloneses ­ o que demonstra a abrangência dos ideais fascistas para além da Alemanha), bem como pontuando semelhanças e diferenças entre cada uma das biografias.

Justificativa: Através do contato com histórias de pessoas reais, que foram submetidas à opressão nazista, pretende­se recuperar parte das memórias muitas vezes esquecidas pelos livros e manuais didáticos. O aluno terá contato com a vida dos prisioneiros, verá seu rosto, conhecerá alguns de seus gostos, se deparará com seu sofrimento, podendo ter assim outra dimensão do que foi o Holocausto.

Trabalho de encerramento das discussões: Para encerrar e sintetizar as discussões, o professor entregará aos alunos uma folha contendo os seguintes textos e questão. Sugerimos que o professor leia com os alunos a proposta, a fim de esclarecer possíveis dúvidas, e designe a atividade como dever de casa. ­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­ Leia os trechos a seguir, tendo em mente os debates realizados em sala de aula.

1) A palavra “holocausto” deriva do termo grego "holókaustos", que significa “completamente queimado”. Utilizado anteriormente para designar os sacrifícios realizados aos deuses em antigas religiões não cristãs, o termo passou a ser largamente empregado no sentido de perseguição de um grupo, após a Segunda Guerra Mundial. Judeus, ciganos, eslavos, homossexuais, Testemunhas de Jeová, comunistas, democratas, deficientes físicos e mentais, foram considerados aqueles que deviam ser "completamente queimados" pelo regime nazi­fascista.

2) Um fator crucial para criar um grupo coeso é marcar suas fronteiras sociais, ou

seja definir quem dele não poderá participar. Os propagandistas nazistas trabalhavam de acordo com a política do regime, identificando publicamente os grupos destinados à exclusão. Além disto, havia o incitamento ao ódio contra eles e o cultivo da indiferença popular em relação ao destinos dos excluídos, justificando seu status de pária junto à população.

A propaganda nazista cumpriu uma função crucial para disseminar o mito da "comunidade nacional" para os alemães, que desejavam a unidade, o orgulho e a grandeza nacional, bem como a eliminação da rígida estratificação social do passado. Porém, um aspecto mais sinistro do mito nazista era que nem todos os cidadãos alemães eram bem­vindos à nova comunidade. A propaganda ajudava a definir quem seria excluído da nova de sociedade e justificava as medidas contra os "isolados": judeus, ciganos Sinti e Roma, homossexuais, dissidentes políticos e alemães considerados geneticamente inferiores e nocivos à "saúde nacional" (pessoas com problemas mentais e intelectuais ou

incapacidade física, epilépticos, surdos e cegos de nascença, alcoólatras crônicos, usuários de drogas e outros). (Trecho retirado do artigo "Definindo o Inimigo: Os Excluídos", do site do Museu Memorial do Holocausto dos Estados Unidos ­ http://www.ushmm.org/wlc/ptbr/article.php?ModuleId=10007819)

3) Em 9 de dezembro de 1948, sob a sombra recente do Holocausto, as Nações Unidas aprovaram a "Convenção para a Prevenção e Punição de Crimes de Genocídio", estabelecendo o "genocídio" como crime de caráter internacional, definindo­o sob os seguintes termos:

Por genocídio entende­se quaisquer atos cometidos com a intenção de destruir, total ou parcialmente, um grupo nacional, étnico, racial, ou religioso.

(Versão integral da Convenção no site: http://www.gddc.pt/direitos­humanos/textos­internacionais­dh/tidhuniversais/dih­conv­genocidio.html)

Levando em consideração as definições dadas nos trechos acima para “holocausto”, “exclusão” e “genocídio”, você é capaz de identificar outras situações históricas, além da Segunda Guerra Mundial, onde estas questões, relacionadas com preconceito, violência e segregação, estiveram presentes? Quais?

Redija uma breve dissertação (de 10 a 15 linhas) explicando as relações possíveis ­ tanto de semelhança quanto de diferença ­ entre estes momentos históricos.

Referências bibliográficas:

BITTENCOURT, Circe. Ensino de História: fundamentos e métodos. São Paulo: Cortez, 2004. ZABALA, Antoni. Os enfoques didáticos. In: COLL, César; MARTÍN, Elena (org.). O construtivismo em sala de aula. São Paulo: Ática, 1996. Páginas da web consultadas: Textos, propagandas e fichas de depoimentos ­ Site do Museu Memorial do Holocausto dos Estados Unidos. Disponível em: <http://www.ushmm.org> Acesso em: 20/06/2015 Sobre a Convenção Internacional para Prevenção e Punição de Crimes de Genocídio. Disponível em: <http://www.gddc.pt/direitos­humanos/textos­internacionais­dh/tidhuniversais/dih­conv­genocidio.html> Acesso em: 21/06/2015 Sobre o caso específico das Testemunhas de Jeová. Disponível em: <jw.org> Acesso em: 18/06/2015 Imagens sobre os símbolos de identificação dos prisioneiros. Disponível em: <http://fatoefarsa.blogspot.com.br/2014/04/voce­conhece­o­motivo­de­os­nazistas.html> <https://pt.wikipedia.org/wiki/Triângulos_do_Holocausto> Acesso em: 20/06/2015