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FACULDADE DE LETRAS DA UNIVERSIDADE DO PORTO CENTRO DE ESTUDOS AFRICANOS DISSERTAÇÃO DE MESTRADO EM ESTUDOS AFRICANOS Élia Lopes Monteiro Outubro de 2009

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FACULDADE DE LETRAS DA UNIVERSIDADE DO PORTO

CENTRO DE ESTUDOS AFRICANOS

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO EM ESTUDOS AFRICANOS

Élia Lopes Monteiro

Outubro de 2009

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

FACULDADE DE LETRAS DA UNIVERSIDADE DO PORTO

CENTRO DE ESTUDOS AFRICANOS

Dissertação de Mestrado em Estudos Africanos

Orientador: Professor Doutor Carlos José Gomes Pimenta

Élia Lopes Monteiro

Outubro de 2009

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

AGRADECIMENTOS

Ao Professor Doutor Carlos Pimenta, pela orientação, por todo o seu acompanhamento,

disponibilidade e apoio, pelo sentido profundamente crítico, com que orientou o trabalho.

Aos meus colegas de curso e a todos quantos contribuíram com as suas ideias e opiniões. Ao

ISE pelo acolhimento. E ao Centro de Estudos Africanos por tudo durante essa caminhada.

Agradeço a todas às instituições que me facilitaram a consulta de livros e documentos e pelo

apoio bibliográfico, em especial a CRP, a OADISA, a FADEP, a Delegação do MADRRM,

aos seus funcionários que foram sempre muito simpáticos.

As ACD’s e aos meus entrevistados, pela disponibilidade e simpatia demonstrada nas

entrevistas, que ajudaram a dar respostas as minhas inquietações e dúvidas.

Um agradecimento também muito especial aos meus colegas do CEFP-SA, aos meus amigos

pela força, amizade e confiança que sempre me transmitiram. Muito obrigado a todos.

Finalmente o meu reconhecimento aos meus pais, aos meus irmãos, as minhas sobrinhas e

toda a minha família por tudo aquilo que fizeram por mim, agradeço-lhes pelo apoio, pela

força, pelo carinho, principalmente nos momentos mais difíceis, durante todos esses anos.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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ÍNDICE  

ÍNDICE ...................................................................................................................................... 4 

GLOSSÁRIO DE SIGLAS ........................................................................................................ 5 

ÍNDICE DE QUADROS ............................................................................................................ 7 

ÍNDICE DE GRÁFICOS ........................................................................................................... 7 

ÍNDICE DE FIGURAS .............................................................................................................. 8 

INTRODUÇÃO ......................................................................................................................... 9 

CAPITULO 1: A PROBLEMÁTICA DO DESENVOLVIMENTO ....................................... 14 

1.1 - O Conceito de Desenvolvimento ................................................................................. 14 

1.1.1 – Desenvolvimento local e luta contra a pobreza .................................................... 20 1.2 – Associativismo e Desenvolvimento ............................................................................ 23 

1.2.1 - Associações como agente de desenvolvimento .................................................... 23 1.2.2 - Relação associativismo e desenvolvimento local ................................................. 27 

CAPÍTULO 2 – CARACTERIZAÇÃO DO OBJECTO DE ESTUDO .................................. 30 

2.1 - Cabo Verde – breve caracterização .............................................................................. 30 

2. 2 - Caracterização socioeconómica de Santo Antão ........................................................ 38 

CAPÍTULO 3 – ACD’S: UM CONCEITO PARA ESTE TRABALHO ................................ 63 

3.1 - Organizações da Sociedade Civil: as ACD’s ............................................................... 63 

3.2 - As ACD’s em Santo Antão .......................................................................................... 66 

CAPÍTULO 4 - ANÁLISE DAS ASSOCIAÇÕES ................................................................. 76 

4.1 – Caracterização das ACD’s .......................................................................................... 76 

4.2 - O que levou a criação das ACD’s ................................................................................ 87 

4.3 - ACD’s e desenvolvimento local .................................................................................. 93 

4.3.1 - Principais áreas de intervenção ........................................................................... 100 4.4 - As ACD’s e Luta Contra A Pobreza .......................................................................... 114 

4.5. – Sustentabilidade das ACD’s ..................................................................................... 121 

4.5.1 - Sustentabilidade Financeira ................................................................................ 122 4.5.2. - Sustentabilidade Técnica ................................................................................... 146 4.5.3 - Sustentabilidade Política ..................................................................................... 148 

CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................. 150 

BIBLIOGRAFIA .................................................................................................................... 158 

ANEXOS ................................................................................................................................ 165 

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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GLOSSÁRIO DE SIGLAS

ACD – Associação Comunitária de Desenvolvimento

ACEP – Associação de Cooperação Entre os Povos

ADL - Associações de Desenvolvimento Local

AGR – Actividades Geradoras de Rendimento

AMI-PAUL – Liga dos Amigos do Paul

AMSA – Associação dos Municípios de Santo Antão

AMUSA – Associação de Mutualismo de Santo Antão

APD – Ajuda Publica ao Desenvolvimento

BAD - Banco Africano de Desenvolvimento

BCA – Banco Comercial do Atlântico

BCV – Banco de Cabo Verde

BM – Banco Mundial

CECV – Caixa Económica de Cabo Verde

CIAJ – Centro de Informação e Apoio Juvenil

CRP – Comissão Regional de Parceiros

CV – Cabo Verde

DGASP – Direcção Geral de Agricultura Silvicultura e Pecuária

EU – União Europeia

FADEP – Federação das Associações de Desenvolvimento de Porto Novo

FAIMO – Frente de Alta Intensidade de Mão-de-obra

FCS – Fundação Cabo-verdiana de Solidariedade

FIDA - Fundo Internacional para o Desenvolvimento Agrícola

GOP – Grandes Opções do Plano

GTI – Gabinete Técnico Intermunicipal

ICASE – Instituto Cabo-verdiano de Apoio Social Escolar

IDA - Associação Internacional para o Desenvolvimento

IEPALA - Instituto de Estudos Políticos para América Latina e África

INDP – Instituto Nacional de Desenvolvimento das Pescas

INE – Instituto Nacional de Estatísticas

IPAD – Instituto de Apoio ao Desenvolvimento

LEADER – Ligação Entre Acções de Desenvolvimento da Economia Rural

MAA – Ministério de Ambiente e Agricultura

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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MADRRM – Ministério de Ambiente Desenvolvimento Rural e Recursos Marinhos

MIT – Ministério de Infra-estruturas e Transporte

Morabi - Associação de Apoio à Auto-promoção da Mulher no Desenvolvimento

OADISA – Organização das Associações de Desenvolvimento Integrado de Santo Antão

OMCV – Organização das Mulheres de Cabo Verde

ONG – Organizações Não Governamentais

OP – Operação Esperança

OSC – Organização da Sociedade Civil

PAL - Plano de Acção de Lagos

PDSA – Plano de Desenvolvimento de Santo Antão

PDSS - Projecto de Desenvolvimento do Sector Social

PLPR – Programa de Luta contra a Pobreza no Maio Rural

PND – Plano Nacional de Desenvolvimento

PNLP – Programa Nacional de Luta contra a Pobreza

PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento

PSGD – Projecto de Promoção Socio-económica de Grupos Desfavorecidos.

RGA – Recenseamento Geral da Agricultura

SA – Santo Antão

UCP – Unidade de Coordenação do Programa

UNICEF – Fundo das Nações Unidas para a Infância

USAID - United States Agency for International Development (Agencia Internacional dos

Estados Unidos da América para o Desenvolvimento)

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ÍNDICE DE QUADROS

Quadro 1 – Indicadores de mortalidade infantil………………………………………. 33

Quadro 2 – Produto Interno Bruto, a preços constantes de 1980 (1999-2004)……….. 34

Quadro 3 – Estrutura populacional……………………………………………………. 40

Quadro 4 – Exploração agrícola segundo as actividades agrícolas (só explorações

familiares)…………………………………………………………………………....... 45

Quadro 5 – Tipo de exploração agrícola……………………………………………… 46

Quadro 6 – Área cultivável de sequeiro segundo as formas de exploração da terra….. 47

Quadro 7 – Área cultivável de regadio segundo as formas de exploração da terra…... 47

Quadro 8 – Efectivo pecuário por espécie……………………………………………. 49

Quadro 9 – Dados de pesca artesanal 1999…………………………………………… 51

Quadro 10 – Evolução comparativa dos desembarques (em toneladas) da pesca

artesanal (1997-2003)…………………………………………………………………. 51

Quadro 11 – Disponibilidade de camas por estabelecimento…………………………. 56

Quadro 12 – Disponibilidade de Quartos por estabelecimento……………………….. 57

Quadro 13 – Indicadores de pobreza………………………………………………….. 61

Quadro 14 – Montantes financiados as associações de 2006 à 2008…………………. 130

ÍNDICE DE GRÁFICOS

Gráfico 1 – População Urbana e Rural de Santo Antão……………………………… 41

Gráfico 2 – Taxa de analfabetismo da população da ilha por concelho……………… 42

Gráfico 3 – ACD’s de Santo Antão…………………………………………………... 77

Gráfico 4 – Comparação da Importância relativa da População e das ACD’s por

concelho, em %.............................................................................................................. 78

Gráfico 5 – Distribuição dos sócios por sexo………………………………………… 78

Gráfico 6 – Idade das Associações ………...………………………………………… 87

Gráfico 7 – Valor financiado por concelho ………..………………………………… 130

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ÍNDICE DE FIGURAS

Figura 1 – Mapa de Cabo Verde……………………………………………………… 30

Figura 2 – Mapa da ilha de Santo Antão……………………………………………… 38

Figura 3 – Divisão da ilha de Santo Antão por concelhos……………………………. 59

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INTRODUÇÃO

O nosso maior resultado é uma parte invisível que é mudança

de mentalidade, educação das pessoas, fazer as pessoas

entenderem que juntos podemos fazer muita coisa

enquanto um só pode ser mais difícil.(ent.6)

As Organizações da Sociedade Civil – OCS, estão cada vez mais a ocupar uma posição

central no discurso contemporâneo das ciências sociais e de desenvolvimento, sobretudo

quando se aborda a questão do desenvolvimento local. Muitos são os académicos e actores

político-sociais que olham essas organizações como um potencial incontornável para resolver

os problemas existentes tanto nas democracias estabilizadas, como nas emergentes, bem como

para o cumprimento dos objectivos de desenvolvimento justo e duradouro.

Para aqueles que lhes atribuem essa importância, defendem que não existe solução para os

problemas sociais, económicos e políticos no século XXI que não passe pelo envolvimento da

Sociedade Civil. O associativismo como forma de organizar essa mesma sociedade civil, vem

ganhando relevância nesse campo de estudo.

Cabo Verde, apesar de ser um país jovem, com apenas 34 anos de Independência, a sua

sociedade civil tem tido desde dessa altura uma postura autónoma, dinâmica, crítica e

actuante. Essa sociedade civil, tem sido promotora da democracia, do desenvolvimento e do

amadurecimento do país, e o Estado considera que é premente discutir e reflectir sobre o seu

papel. Para tal, tem promovido a revisão da legislação em matéria de apoios e incentivos às

organizações. Igualmente tem promovido a criação das melhores condições possíveis para a

efectiva participação das OSC nas grandes decisões de carácter político, económico, social e

cultural, incentivando e apoiando a constituição das OSC, espaço de reflexão, de coordenação

e de concertação que, de entre outros objectivos, é subsidiar as instituições do Estado em tudo

o que respeite à definição de políticas públicas e sociais, nas áreas de intervenção das

mesmas, e na clarificação de formas de relacionamento entre as organizações e o Estado. E

ainda, regista-se um abrir mão de alguns dos seus poderes para a sociedade civil.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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Com base nesse dinamismo da sociedade civil, verificou-se principalmente depois dos anos

noventa, um enorme crescimento do associativismo. Contudo o associativismo ligado a

problemática do desenvolvimento local proliferou, no país, depois do ano 2000.

Considerando que não seria possível, no espaço desse trabalho do mestrado, que o âmbito

dessa pesquisa abarcasse todo o universo de iniciativas associativas espalhadas pelas

diferentes ilhas, a opção foi de restringir o objecto empírico as Associações Comunitárias de

Desenvolvimento – ACD’s, da ilha de Santo Antão. Relevante, para essa escolha, foi o facto

de, na ilha existir hoje um total de 88 associação comunitárias legalmente constituídas, onde a

sustentabilidade das mesmas, constitui uma situação que exige um estudo sistemático.

Elegemos como objecto da nossa observação, as ACD’s que definam como associações de

âmbito comunitário e local, que visam promover o desenvolvimento das comunidades, assim

sendo, com essas características identificamos 61 associações na ilha.

Neste sentido, este trabalho brota da vontade de observar e conhecer qual tem sido o

contributo dessas associações no processo de desenvolvimento da ilha, que segundo as

estatísticas é a mais pobre do país. Também pretende-se produzir um estudo académico capaz

de colmatar alguma lacuna que existe nessa matéria.

O desígnio desta investigação é perceber o papel das associações comunitárias enquanto

agentes de desenvolvimento da ilha e verificar se os trabalhos das mesmas têm ou não

contribuído para a melhoria do nível de vida das populações, por via de desenvolvimento

local.

Em termos metodológicos, esta investigação é um estudo de caso, porque pormenoriza a

questão: as ACD’s enquanto agentes de desenvolvimento local. Procurou-se apresentar

traços gerais do associativismo na ilha, a dinâmica actual do associativismo e a sua

relação com o desenvolvimento local. É naturalmente impossível dar conta aqui da visão

de todos os envolvidos no processo de desenvolvimento local bem como de todos os

envolvidos no associativismo comunitário, sequer nos é possível tratar a

multiplicidade de interrogações que esta questão sugere. Limitar-nos-emos a analisar o

associativismo segundo a visão dos líderes, os documentos produzidos pelo associativismos,

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nomeadamente, relatórios de contas, relatórios de actividades, relatórios de auditoria, planos

de actividades, documentos estratégicos, regulamentos internos e estatutos, entre outros.

Partiu-se do questionamento inicial: Estarão as ACD’s a contribuir para o desenvolvimento da

ilha, melhorando desse modo as condições de vida das populações?

A partir daí, formularmos as seguintes hipóteses de trabalho:

As ACD’s têm actuado como reais agentes de desenvolvimento local, melhorado

assim o nível de vida das populações das comunidades pobres.

Apesar de estarem a conseguindo os seus propósitos, as ACD’s estão totalmente

dependentes dos financiamentos dos governos e de outras instituições, nacionais e

internacionais.

Foi delimitado o campo de observação, aplicadas técnicas de análise documental1 e não

documental tendo-se, para o efeito, preparado e aplicado os instrumentos de observação,

nomeadamente, questionários que serviram de suporte a entrevistas2 semi-estruturadas

realizadas a informantes privilegiados, seguido, em alguns casos, de observação directa.

Para recolha de material sobre o nosso objecto de estudo, procedemos à pesquisa documental

junto de instituições que diariamente trabalham com as ACD’s na ilha, nomeadamente a CRP,

a OADISA, a FADEP, a Delegação do MADRRM, bem como recolha de periódicos com

artigos relevantes para essa matéria.

O recurso à Internet revelou-se extremamente útil, sobretudo para obter bibliografia, uma vez

que o país ainda carece de grandes bibliotecas. Também para obter dados estatísticos e outras

1 A análise documental como técnica de recolha de informação esteve presente em todas as fases do trabalho. Numa primeira fase, a procura foi mais geral, procurava bibliografia que tratasse o tema em estudo. Num momento posterior, incidiu na análise de documentos relativos aos projectos e programas que trabalham junto das ACD’s, em fontes documentais e publicações periódicas que permitam a caracterização do ambiente e da população em estudo e tomar conhecimento das varias actividades desenvolvidas pelas associações. 2 A escolha da entrevista como técnica de recolha de dado ficou a dever-se ao facto de permitir recolher informação mais vasta e geral sobre o tema em estudo, sendo as entrevistas utilizadas fundamentadas em questões abertas que dava a possibilidade de recolher informações paralelas que enriquecessem os objectivos subjacentes à realização dessa dissertação. A estruturação das entrevistas variou consoante os actores que foram entrevistados e portanto, não houve um guião de entrevista rígido e fechado mas antes passível de reformulação/adaptação mediante o decorrer da mesma.

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informações disponíveis em sites, periódicos e artigos actualizados. Finalmente fez-se a

análise das informações e a formulação de considerações finais.

O resultado desse trabalho que se pretende aqui expor, obedecerá a uma estrutura de quatro

capítulos. O primeiro capítulo, A Problemática do Desenvolvimento, trata do enquadramento

teórico da problemática do desenvolvimento e sua relação com o associativismo. Procurou

apresentar fundamentos teóricos que ajudam a compreender o desenvolvimento local, caso

específico de Cabo Verde e Santo Antão. Passou-se, a seguir, a analisar a relação entre o

desenvolvimento local e a luta contra a pobreza, abordando esses conceitos. Outro aspecto

central desse capítulo é o conceito de associativismo. Não se deixou, contudo, de abordar a

relação entre o associativismo e desenvolvimento local.

O capítulo dois, sob o título, Caracterização do Objecto de Estudo, propõe-se dar a conhecer

o campo de actuação das ACD’s. Faz primeiramente uma breve caracterização de Cabo Verde

enquanto um pequeno estado insular, para seguidamente fazer uma caracterização, mais

pormenorizada, da situação sócio-económica de Santo Antão. Aportou-se questões que

permite ao leitor conhecer a ilha em termos políticos económicos e sociais, a partir de dados

oficiais, análise de documento estatísticos.

No terceiro capítulo, com o título, ACD’s: um conceito para este trabalho, inicia-se o real

estudo de caso. Efectuou-se a discrição das organizações de sociedade civil da ilha,

centralizando nas ACD’s.

O último capítulo, Analise das Associações, dá conta de toda a actividade das ACD’s, a partir

da análise documental e do tratamento de dados obtidos através da nossa pesquisa empírica,

realizada em toda a ilha de Santo Antão. Fez-se, primeiro, a caracterização geral das ACD’s

presentes na ilha, para saber que tipo de associativismo está-se a tratar, e os intentos dessa

forma de organização da sociedade civil. Observou-se em pormenor a relação entre ACD’s e

Desenvolvimento Local, através da análise das principais áreas de intervenção das mesmas,

como é que elas faz ou pretende continuar a trabalhar para esse desenvolvimento. Inclui-se,

neste capítulo, um ponto para nós considerado importante, a actuação das ACD’s com vista a

luta contra a pobreza. A sustentabilidade das ACD’s é o ponto que conclui esse capítulo,

centra nas questões de financiamento, técnica e politica. Aborda aspectos como a dependência

financeira perante os financiadores e condições para auto sustentabilidade.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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O trabalho finda com as considerações finais, em que apresentamos os resultados da nossa

investigação, procurando dar resposta a questão inicial do trabalho e as hipóteses que

orientaram-no.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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CAPÍTULO 1: A PROBLEMÁTICA DO DESENVOLVIMENTO

“Com efeito, não há desenvolvimento, especialmente desenvolvimento

local, sem agentes que o protagonizem nem sem

voluntarismo que o encaminhe.”

(José Reis, 1996: 35)

1.1 - O Conceito de Desenvolvimento

Um conceito que viu as atenções viradas sobre ele depois da Segunda Guerra Mundial numa

altura em que se verificava mudanças no crescimento dos países, altura que surge a

diferenciação entre países desenvolvido e países em desenvolvimento e uma forte mudança na

conjuntura internacional, e período de independência de grande parte as ex-colónias africanas.

Vários são os estudos, de diversos autores sobre a problemática do desenvolvimento, por ser

um conceito bastante alargado, não existe, até agora uma única definição aceita por todos os

estudiosos da matéria.

Não sendo um conceito que reúne consensos, Milando (2005:149) diz que todos os conceitos

prestam-se a variadíssimas interpretações, consoante o papel, o estatuto, a posição social ou a

organização da filiação e o sistema de valores de cada entidade singular ou colectiva na sua

utilização ou interpretação. O que o autor quer dizer, é que a sociedade onde encontramos

inserido determina as interpretações que damos ao conceito de desenvolvimento.

O conceito de desenvolvimento é uma matéria controversa, mas o que vamos adoptar no

presente trabalho é:

Desenvolvimento, é um processo que oferece as pessoas oportunidades de escolha de

um óptimo ambiente de vida, onde não enfrentam restrições a satisfação de

necessidades básicas como cuidados de saúde, acesso a educação e condições para

uma forma de vida digna.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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Pensamos ser um conceito que de forma geral dê atenção as pessoas, isto é, desenvolvimento

deve ser pensado e centrado nas pessoas, assente numa lógica de distribuição de rendimentos

com vista a um bem-estar generalizado, com ênfase em aspectos como redução da pobreza,

baixa mortalidade infantil, aumento da esperança de vida, ingresso a educação, habitação

condigna, acesso ao emprego e ao rendimento, liberdade e luta contra as desigualdades.

A escolha dessa posição resulta do facto de não entendermos o desenvolvimento resultante

exclusivamente do processo de crescimento económico. Posição essa que veio alterando,

graças a leitura e contribuição de vários autores, que desde a segunda guerra mundial vem

debruçando sobre esse assunto.

O conceito de desenvolvimento tem ganhados vários sentidos e sofrendo alterações, sobretudo

porque intensificou a tomada de consciência da problemática dos países subdesenvolvidos,

sem descuidar do papel que a evolução dos países africanos tivera nesse processo.

Em jeito de uma breve analise história, podemos dizer que, a década de 50 à 60, ficaram

conhecidos a “idade de ouro”3 das teorias desenvolvimentistas, assentes no pensamento

económico clássico e apoiadas na segurança de que o crescimento económico era ilimitado,

onde a acumulação do capital era vista como o motor de crescimento e, naturalmente do

desenvolvimento económico.

É de realçar aqui a importância que esse pensamento da ao papel do Estado como actor

dinâmico do desenvolvimento.

Olhando a acumulação de capitais como motor do desenvolvimento, surge as Instituições de

Bretton Woods, muito identificadas com as teorias que ligam o crescimento económico ao

investimento em capital, a defenderem uma injecção transitória de recursos4, provenientes do

exterior, com vista a acelerar o processo de crescimento.

Estas instituições, bem como os defensores dessa teoria, associam-se o desenvolvimento ao

crescimento económico, pelo facto de usarem constantemente indicadores de crescimento

económico para avaliar e qualificar o nível de desenvolvimento dos países. Nesse período pós

guerra, esses dois conceitos estiveram sistematicamente associados a um outro, a

3 Cabral (2005:21) 4 Fernandes e Afonso (2005:25)

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industrialização, pois os países considerados desenvolvidos eram os que conseguiram com

sucesso o processo de industrialização, e essa seria o caminho que os países do Terceiro

Mundo teriam de percorrer para atingirem o desenvolvimento.

Os anos subsequentes, a década de 705 ficou marcado por uma a desaceleração do ritmo de

crescimento e a recessão económica. O idealizado nas décadas anteriores, sobretudo para a

África, não vinha realizando, começou-se a notar dívida externa praticamente não

reembolsável, queda do investimento directo estrangeiro, falência técnica dos Estados, má

governação, guerras civis, falta de integração dos mercados regionais e até nacionais, ausência

de democracia interna, etc.6

Perante esse cenário da incapacidade política proteccionista dos Estados, surge os defensores

das teorias de desenvolvimento associado ao crescimento económico como forma de resolver

o problema do subdesenvolvimento7 e o fosso entre os países. Floresceram os pensamentos

dos que viam o desenvolvimento como algo unilinear, confiando no investimento de capital

como o motor do crescimento económico.

Essa visão do desenvolvimento, assento no crescimento económico entrou em crise nos anos

80. Período que alguns críticos viriam a chamar de década perdida do desenvolvimento,8

caracterizado por: recessões económicas e mesmo crescimento negativo na América Latina,

fome e miséria humana em África.

E neste contexto, que surgem, as políticas de estabilização9, e ajustamento estrutural10

advogadas pelo Fundo Monetário Internacional e pelo Banco Mundial. Politicas

5 Período marcado pela independência de muitos países, sobretudo africanos, onde muitos começaram por privilegiar politica de infra-estruturação como forma de iniciar os seus processos de desenvolvimento. 6 Reis (2000: 17) 7 Não é nossa pretensão nesse estudo debruçar sobre o conceito de ‘subdesenvolvimento’. Segundo Figueiredo e Costa, (1982:20/21), esse conceito ganhou ênfase a partir do discurso inaugural do Presidente dos EUA, Truman, em 1949. Os autores acrescentam ainda que foi a partir de então que o subdesenvolvimento ganho o estatuto de problema autónomo. Para uma possível aprofundamento da questão, remetemos para Pimenta (2004) e (2007) obras onde o autor aborda a globalização, e as suas relações com o subdesenvolvimento e desenvolvimento. 8 Fernandes e Afonso (2005:27) 9 Cabral (2005: 23), Milando (2005:112) 10 O ajustamento estrutural tinha como principal objectivo a redução do papel do Estado na produção e regulação da actividade económica.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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desenvolvidas essencialmente para os países menos avançados com vista a criarem condições

para ultrapassar a crise económica.11

Os programas de ajustamento estrutural, sobretudo a forma como foi imposta aos países,

concretamente a África, não atingiu os resultados preconizados, chegando mesmo a ter

resultados negativos. Gostaríamos de deixar aqui a opinião de Pimenta, a cerca disso.

Diz esse autor o seguinte:

“Além disso África foi provavelmente o continente mais fustigado pelas imposições

do FMI e do Banco Mundial, mais obrigada a adoptar programas de ajustamento

estruturas. Quando é manifesto em África que se precisa de mais e melhor Estado, a

ajuda ao desenvolvimento, as politicas preconizadas pelos organismos internacionais

geram menos Estado e Estados mais submissos, menos capazes de imporem uma

política própria, menos disponíveis para definirem uma estratégia inovadora,

democrática e popular a escala do continente.” (Pimenta 2007/01:19)

Não nos impõe aqui discutir o interesse dessa ajuda12, utilizamo-la para mostrar que a

injecção de capital por si só, sem ter em conta as realidades sócio-culturais de cada país, não

conduz ao desenvolvimento sonhado.

O aumento do fosso que separa os dois grupos de países, o aumento das desigualdades

sociais13 e essa visão do conceito em crise, muitos autores e organismos internacionais,

passaram a repensar o conceito de desenvolvimento, onde se dá ênfase a várias dimensões,

isto é, não concentrando exclusivamente no económico.

Essa pequena resenha mostra que o desenvolvimento assente no crescimento económico é um

paradigma a abandonar. O que se verificou ao longo desse período é que desenvolvimento

centrado no capital económico só beneficiara poucas pessoas ou poucos países. Sem tirar

importância aos factores económicos, é patente que muitos outros factores são indispensáveis

para haver desenvolvimento, dai a escolha do conceito acima referido.

11 Sobre a experiência do Ajustamento estrutural, seus efeitos em África ver Pimenta (2007:22) 12 Apesar de não ter, na maioria dos casos, atingido os seus objectivos, não nos cabe negar a importância do ajustamento, equaciona sim os modos da sua aplicação. 13 Pimenta (2007/01: 16) O autor afirma que, que as estatísticas a partir de 1983, comprovam que há um agravamento das desigualdades entre os diversos países do mundo.

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As críticas que poderão surgir é de não desenvolver as teorias que dão base as APD’s e

Ajustamento Estrutural, ou de não debruçar mais sobre esses dois assuntos, mas não era esse o

nosso objectivo, nessa resenha histórica queríamos mostrar que o conceito de

desenvolvimento sofreu as alteração.

Na década de 90 a abordagem desse tema ganha novos contornos e outras dimensões. De

destacar aqui, os trabalhos do PNUD, onde surge o conceito de Desenvolvimento Humano,

conceito que apareceu com o Relatório do Desenvolvimento Humano (RDH), publicado, pela

primeira vez, em 1990, sob tutela de dois economista, Mahbub Ul Haq e Amartya Sem, que

ficaram incumbidos de definir os indicadores de medida do conceito de desenvolvimento.

Desenvolvimento humano é, na óptica do PNUD14, o processo pelo qual se cria um ambiente

favorável ao aumento das capacidades e oportunidades das pessoas tanto das gerações

presentes como futuras. É definido como:

"o processo de aumento das escolhas das pessoas, que lhes permitam levar uma vida

longa e saudável, adquirir conhecimento, ter acesso aos recursos necessários para um

nível de vida digno, enquanto os preservam para as gerações futuras, proteger a

segurança pessoal e alcançar a igualdade para todas as mulheres e homens. "

O conceito alberga no seu seio, questões que tem a ver com condições básicas para o

desenvolvimento, como por exemplo, a existência de condições saúde que generalizem o

acesso à vida biológica longa, a escolaridade como condição de acesso ao conhecimento, e o

rendimento, enquanto condição para um padrão de vida digno. É um conceito que norteia todo

o nosso trabalho.

Essa nova visão que se passou a ter da problemática do desenvolvimento, deu origem a novos

conceitos, com esse relacionado. Roque Amaro, (2006: 24) afirma que na tentativa de

renovação do conceito de desenvolvimento, surgiram inúmeras designações, às quais ele

destaca seis:

14 PNUD, 1990 citado por Amaro (2006: 25)

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

19

Os seis novos conceitos são (com alguma ordem cronológica):

Desenvolvimento Sustentável

Desenvolvimento Local

Desenvolvimento Participativo

Desenvolvimento Humano

Desenvolvimento Social

Desenvolvimento Integrado

Todos esses conceitos são de alguma forma importante para o nosso estudo, pois o conceito

de desenvolvimento é a referência do nosso trabalho, porem concentraremos a nossa atenção

no conceito de desenvolvimento local, um conceito operacional, para nós.

Ao tratar a questão de desenvolvimento local, partilhamos da opinião do referido autor, que

afirma que o desenvolvimento deve acontecer "lá onde as pessoas vivem e estão".

Sendo assim, nos vemos o desenvolvimento local, como um processo que acontece na

comunidade local, onde os agentes desse desenvolvimento é a própria comunidade, são eles

os responsáveis pela satisfação das suas necessidades e de melhoria das condições de vida.

O interesse face ao conceito de desenvolvimento local, deve-se ao facto de ser a mais

utilizada pelas ACD’s, nosso objecto de estudo. Esse conceito está estritamente ligado a

metodologia participativa, aspecto destacado pelas ACD’s, como modelo utilizado as suas

actividades.

O desenvolvimento local tal como hoje se pratica tem por base a ideia de se potenciar a

mobilização dos recursos endógenos ou recursos localmente disponíveis. Este é um processo

que investe na consciencialização das populações, contribui sobretudo para a consolidação da

identidade local, do envolvimento colectivo e da afirmação da pertença a um determinado

território.

Esse envolvimento colectivo, é um fenómeno, que pressupõe a participação e cooperação das

várias partes que compõem as comunidades locais, ou seja, os agentes locais assim como as

instituições locais transformam-se nos protagonistas do seu próprio desenvolvimento, isto é,

articulação e envolvimento de todos os segmentos ou actores sociais na formulação e

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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implementação de um projecto colectivo de desenvolvimento. Resulta de um esforço conjunto

de procura de respostas aos problemas locais e/ou comunitários.

Além de mais, o desenvolvimento local apresenta uma abordagem integral e integradora das

dimensões económicas, sociais, políticas e técnicas.

1.1.1 – Desenvolvimento local e luta contra a pobreza

O desenvolvimento local é um conceito que surge associado à questão da luta contra a

pobreza, o que torna-o também um conceito operacional para esse trabalho. Quanto mais não

é, os programas de luta contra a pobreza são considerados projectos de desenvolvimento local,

uma vez que têm como objectivo resolver e prevenir necessidades das populações.

Dada a estreita relação entre o desenvolvimento local e o combate a pobreza, coloca-se então,

a questão de se saber qual o conceito de pobreza que melhor se ajusta ao objecto dessa

pesquisa, a ao conceito de desenvolvimento local por nós adoptado.

Lutar contra a pobreza, é lutar contra uma situação de privação marcada sobretudo pela falta

de recursos económicos, muitas vezes caracterizada por más condições de vida; emprego

precário; menor consumo de serviços médicos; baixos níveis de instrução. Como fenómeno

social a pobreza manifesta-se de diferentes formas, também pode verificar em vários

domínios, sendo os principais, habitação, educação, saúde e emprego.

O facto de considerarmos a pobreza, como uma carência de matérias, não quer dizer que o

encontramos apenas aos países pobres. A ideia de que a pobreza era só dos países pobres e

que os países ricos estavam livres desse problema devido aos seus progressos de

desenvolvimento e crescimento económico é um mito que foi ultrapassado nas últimas

décadas. Nos países ditos ricos, vem-se notado uma grande discrepância nos níveis de

desigualdade social e de rendimento. Os problemas de pobreza e exclusão social tem-se

agravado, como também surgem com novas manifestações e modalidades, como por exemplo,

desempregados de longa duração, situação precária dos reformados e pensionistas, das

famílias monoparentais, dos indivíduos com baixos níveis de escolaridade e das minorias

étnicas, o aumento dos sem-abrigo.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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O que se tem verificado, em muitos países, é que a luta contra a pobreza, é feita normalmente

a base de programas, cujo objectivo é a eliminação da pobreza, elas tem sempre um período

de actuação e esperam delas a melhoria das condições de vida dos beneficiários. O que se

espera é que elas sejam capazes de capacitar os pobres para saírem da situação em que se

encontram.

Em África, durante muito tempo, e em muitos casos, ainda hoje, muitos desses programas

foram pensados de fora para dentro, o que faz com que muito dos seus preceitos não sejam

atingidos, transformando-os em tipos de programas indefinidamente necessário, e a eficácia

de um projecto de luta contra a pobreza mede-se pela medida em que, ao fim de um certo

tempo, o mesmo deixa de ser necessário.

No caso concreto de Cabo Verde, existe o grande Programa Nacional De Luta Contra a

Pobreza15, é gerido por uma Comité Nacional de Luta contra a Pobreza (CNLP), tutelada pelo

Ministério de Trabalho, Formação Profissional e Solidariedade Social.

Importa-nos referir que a pobreza varia de sociedade para sociedade. E como tal, a luta contra

a pobreza implicam, de certa forma, um reforço de diálogo social, civil e político e o

enquadramento no local onde se aplica o programa, isto é, este deve adequar ao

desenvolvimento local. Não basta porém elaborar estratégias de luta contra a pobreza, se as

mesmas não forem adequadas a realidade que se vai actuar, se não forem pensadas

conjuntamente com os pobres.

Nessa linha de pensamento, um aspecto importante que deve marcar sempre os programas de

luta contra a pobreza é a integração da sociedade civil, em geral, e dos pobres, em particular,

nessa luta. Deste modo a parceria e o princípio de participação devem ser essenciais, pois o

princípio da participação procura incentivar a participação das populações, com a utilização

de formas de auscultação directa das populações para a expressão das suas necessidades e

aspirações.

15 Sobre esse programa ver capitulo 3.

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Para nós, a relação que existe entre esses dois conceitos, desenvolvimento local e luta contra a

pobreza, é que ambos acontecem na comunidade, onde é a própria comunidade, a responsável

pela satisfação das suas necessidades e de melhoria das condições de vida.

Sair ou não da situação de pobreza depende muito da capacidade de desenvolvimento local,

não basta elaborar planos de combate a pobreza e a exclusão social, se as mesmas não forem

associadas a um processo de desenvolvimento local, tal como a vimos, isto é, sem integrar os

mais interessados. Não é possível combater a pobreza sem o pobre, é necessário que ele se

sinta sujeito da sua própria história.

O desenvolvimento local enquanto estratégia de luta contra a pobreza reforça a coesão social

e as relações na comunidade, aspectos que devem ter como fruto a melhoria de nível de vida

dos seus habitantes. Voltando a realidade cabo-verdiana, pode-se dizer, que têm-se verificado

um esforço de coesão social, com vista ao desenvolvimento através do crescente movimento

associativo, com o surgimento de várias Associações Comunitárias de Desenvolvimento.

Resultados até agora conseguidos com muitos programas, mostram que, a luta contra a

pobreza, pensada e implementada sem participação da comunidade, ou seja, dos beneficiários

não tem grandes resultados. Da mesma forma, uma abordagem individual aos problemas

comunitários é insuficiente, uma vez que traz uma visão parcelar da realidade. Surge então, a

necessidade de uma acção em parceria. Para que sejam colocadas em prática medidas de

combate em vários domínios é necessário que o modo de intervenção seja alargado para um

nível colectivo, local, regional, nacional e mesmo internacional.

A noção de parceria é um elemento essencial do desenvolvimento de políticas sociais e

económicas. Tem sido um ponto fulcral nos programas de luta contra a pobreza. Em alguns

documentos dos projectos nacionais, de luta contra a pobreza, a parceria é referido como

“metodologia central” dos projectos. Uma acção em parceria pressupõe que as pessoas e as

organizações conjuguem esforços para atingirem determinados objectivos comuns. Assim

sendo, parceria local16 é uma rede de relações e de solidariedade local entre instituições,

grupos e/ou indivíduos de naturezas diferentes ou com vocações sectoriais distintas.

16 PNLP (1997).

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A abordagem em parceria proporciona uma conjugação de esforços, de experiências, de

conhecimentos e de recursos. Este conjunto de relações leva a que a comunicação e o diálogo

sejam alargados devido ao fortalecimento dos contactos formais e informais. A procura

constante de parceiros para as suas actividades, tem sido uma lógica das ACD’s.

1.2 – Associativismo e Desenvolvimento

1.2.1 - Associações como agente de desenvolvimento

O associativismo civil encontra-se na pauta dos estudos e debates nas ciências humanas e

sociais. As pesquisas no tema mostra que a difusão do associativismo é uma manifestação da

sociedade moderna, e as suas causas principais estão no processo de industrialização,

urbanização e instauração do regime democrático.

As Associações Locais, enquanto instituições autónomas criadas para responder as

necessidades sociais, muitas vezes em domínios onde a intervenção do Estado se revelou

insuficiente ou ineficaz, constituem no seio da democracia representativa um instrumento

precioso para o exercício da cidadania democrática.

As associações de caris sociais surgem e reestruturem com a democracia. Isso porque a

democracia estimula nos indivíduos a cultura participativa, e com ela o indivíduo exerce uma

participação consciente e autónoma no processo de decisão política que afecta a sua

comunidade.

Tocqueville17, enquanto grande investigador da democracia faz referência a essa relação,

associações com democracia, melhor dizendo, democracia participativa, afirmando que as

associações voluntárias constituíam-se no coração da sociedade civil.

Internamente, as associações incutem em seus membros hábitos de tolerância, cooperação,

solidariedade, participação e espírito público, bem como o senso de responsabilidade comum

nos empreendimentos colectivos, que vemos como base de uma democracia participativa.

17 Autor referido por Labra e Figueiredo (2002:5)

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A relação desse tipo de associativismo e democracia participativa prende com o facto de que o

associativismo pressupõe envolvimento de toda a sociedade civil em busca de soluções para

problemas comuns, contribuindo assim para inclusão social de boa parte da população.

O que se nota é que em vários países o associativismo ganhou força com a democracia ou

com o domínio da democracia, principalmente nos anos de 1970 e 1980. Como o caso de

Portugal, em que após o 25 de Abril, assistiu-se a um aumento do espírito associativo, isto é,

um aumento da participação social, em virtude do abrandamento da pressão social e política

em que o país se encontrava submergido.

Autores como Cristóvão e Miranda18 defendem que o aumento dessa participação social, foi

em parte, sobretudo na última década do século XX, incentivada em grande medida pela

integração na União Europeia, aspecto esse que trouxe novas exigências e novas aspirações.

Em Cabo Verde, um pouco a semelhança, do que decorria em Portugal, 1975 foi um ano

marcante para o início do associativismo. Depois da independência, tomou forma, a liberdade

de reunir, coisa que foi proibido durante muitos anos. Foi notável o número de cooperativas e

outras organizações que surgiram na pós-independência. Entretanto, foi só a partir dos anos

90, período que coincide com a abertura do país ao multipartidarismo que o número das

organizações começou a crescer de forma mais rápida e as suas actividades começaram a

ganhar uma maior dimensão social, política e económica.

Contudo, antes da independência, as populações sempre encontraram alguma forma de se

organizarem, mesmo com os poucos incentivos existentes. O associativismo cabo-verdiano

encontra as suas raízes nas formas tradicionais de solidariedade social, como por exemplo o

“djunta món19” as organizações funerárias, que perduram até hoje, principalmente no meio

rural, são de carácter social e desempenham um papel extremamente importante em ocasiões

de morte, nos mais jovens se conheceram experiências de associações de carácter desportivo,

cultural e recreativo. Essas formas de solidariedade comunitária ganharam maior expressão

com a Independência de Cabo Verde.

18 Cristóvão e Miranda (2006:4) 19 “Djunta mon”, expressão muito utilizado em Cabo Verde, sobretudo no pós independência, sobe o lema de juntar as mãos para construir o novo país. “Djunta mon” significa “juntar forças”, que consiste no sistema de troca de força de trabalho, na preparação do terreno para os trabalhos agrícolas e na colheita, na construção de casas, na reparação de caminhos, etc.

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Porém a expressão que as associações possuem hoje, pode-se dizer que começaram a

aparecer, a partir de 1987, com a publicação da Lei nº 28/III/87 que marcou o início de todo o

processo de organização da sociedade civil nos tempos modernos. Esse diploma regulava o

exercício da liberdade de associação e estabelece as bases do regime jurídico comum das

associações de fins não lucrativas.

As associações de carácter local são, pois, um elemento fundamental de incremento da

participação cívica e, como tal, um agente privilegiado de democratização, no sentido da

democracia participativa. Destacando assim como um importante agente de formação e de

desenvolvimento social dos cidadãos e das comunidades locais.

Além da democracia, a nível mundial, outros factores contribuíram para o reforço do

associativismo, nomeadamente a decadência do comunismo e a crise do capitalismo, enquanto

sistemas, que se julgava, capazes de resolver os problemas económicos das populações. O

autor Guilherme Silva (2005: 55) clarifica isso, afirmando que:

“A segunda metade do século XX assistiu à decadência dos dois sistemas econômicos

predominantes no mundo; o colapso do comunismo e a conseqüente entrada de quase

dois bilhões de pessoas no mercado mundial, e a obsolescência do capitalismo que, se

já não cumpria suas promessas de pleno emprego, justiça social, estabilidade

financeira, salários reais em ascensão, menos ainda quando os avanços tecnológicos

permitem um aumento de produtividade tal que teóricos de várias correntes apontam

como uma de suas conseqüências a redução de índices de emprego.”

Perante o cenário, em que a intervenção do Estado, muitas vezes, se revelou exíguo, o que

alguns autores chamaram uma crise dos Estados de Providencia20. É chamado então a

intervenção da Sociedade Civil em diferentes domínios, como protecção social, luta contra a

pobreza, luta contra a exclusão social, etc. Essa sociedade civil, assim organizada é

geralmente referida como o “terceiro sector” ou o “sector não lucrativo”, que contém todas as

associações, nas quais a participação e as actividades são voluntárias.

20 Sobre o conceito, bom como a sua relação com uma ‘sociedade providencia’, cf. Santos (1987) e Santos (1991)

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Outro aspecto impulsionador do associativismo é a globalização. Muitos estudos já mostraram

que a globalização gera poucos beneficiários e muitos excluídos e a necessidade das

comunidades e populações sentirem-se mais próximos e incluídos, leva a criação de

associações. A globalização tem papel essencial no processo em questão, pois fortalece

resistências locais, promove a emergência de identidades híbridas e faz ressurgirem

particularismos, principalmente étnicos, comunitários, regionais, entre outros.

Na década de 1990, sobretudo nos países em desenvolvimento, começa-se a verificar uma

nova dinâmica no movimento associativo, um crescimento do associativismo

institucionalizado, proliferação das ONG’s, e a abertura para uma participação cooperativa

com o Estado e, às vezes, com o mercado, sobretudo sob forma de parcerias, que a nível

internacional ganha a denominação de Terceiro Sector.

Aumentaram e diversificaram as esferas de intervenção. Hoje estão preocupadas com

questões como protecção ambiental, problemática da saúde, educação e formação

profissional, equidade de género, problemática do desemprego, AGR, entre outros.

Segundo Ramiro Azevedo verificou uma explosão de movimentos participativos na maioria

dos países em desenvolvimento, por um lado, devido ao facto de as associações terem

convencido os governos do valor da participação dos grupos comunitários e, por outro lado,

os doadores igualmente desencorajados pelos maus resultados da ajuda pública em geral

utilizam cada vez mais a rede das ONG’s para distribuir fundos. (Azevedo: 2002: 232)

No caso de Cabo Verde, a partir dessa mesma década, a sociedade civil cabo-verdiana têm

demonstrado um grande dinamismo, motivado pela necessidade de, com a participação das

populações, promover e construir uma vida melhor para todos. Desde então, as Organizações

da Sociedade Civil (OSC) cabo-verdianas, com particular destaque para Associações

Comunitárias de Desenvolvimento (ACD’s), têm intensificado acções em busca de respostas

para a resolução dos seus problemas, com recursos próprios e mobilizados, junto de

Instituições Públicas e Privadas, tanto dentro como fora do País.

Importa clarear, que ao referir associação, trata-se de uma organização da sociedade civil não

governamental, independente do Estado e dos poderes político partidários. São organizações

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sem fins lucrativos, autónomas e independentes de poderes públicos com uma forte

componente de voluntariado. São todas as formas de livre união com base na solidariedade.

1.2.2 - Relação associativismo e desenvolvimento local

Mesmo face a um mundo globalizado, uma importância particular é atribuída ao território

local, como espaço fisicamente delimitado, com identidade sócio-económica e cultural e uma

dinâmica própria, e às lógicas integradas de valorização dos seus recursos e capacidades, bem

como ao investimento numa educação que fortaleça a capacidade das pessoas para tomarem

em mãos as suas vidas, comunidades e recursos, assim como para participarem nos processos

de decisão locais.

Como já foi referido, o conceito de desenvolvimento adquire novos significados, onde se

passa a falar mais em desenvolvimento humano, numa lógica de promoção de

desenvolvimento centrado nas pessoas, exigindo que os cidadãos e os animadores do

desenvolvimento assumam novas responsabilidades e papéis. Aqui é que se entra as

associações como agentes de desenvolvimento.

Os movimentos sociais e as organizações não-governamentais, têm como um dos principais

objectivo, lutar pela resolução de problemas sociais, ampliação dos direitos políticos e da

consciência da cidadania. Estas associações reúnem indivíduos interessados em efectivar a

sua condição de cidadãos de uma forma activa, isto é, que pretendem agir e intervir na

sociedade procurando, deste modo, transformá-la. Sendo assim, as associações podem

revestir-se de uma acção fundamental na mediação das relações entre o indivíduo e o Estado.

E ao longo dos anos, os Estados têm valorizado o papel dessas organizações, vendo nelas

parceiras no atendimento de carências que não pode suprir sozinhos, são hoje mais do que

nunca vistos como companheiras de trabalho para o desenvolvimento.

O associativismo, tal com, é referida, possibilita uma participação colectiva que também se

desemboca numa gestão colectiva. Falamos aqui de uma participação, que não é meramente

formal, isto é organizada desde cima, mas sim promovida pelas populações locais, por

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iniciativa dos próprios grupos comunitários. Uma participação em que as pessoas estão no

cerne dos próprios projectos de desenvolvimento.

Por conseguinte, o associativismo, sobretudo o comunitário, facilita a participação das

pessoas excluídas, onde essas procuram ter alguma influência na escolha dos caminhos para o

seu desenvolvimento, bem como o acesso aos recursos que as podem ajudar, no sentido de

melhorar e sustentar os seus padrões de vida. Daí a interacção, proximidade entre o

desenvolvimento local e o associativismo.

As associações enquanto agentes de desenvolvimento local e regional, além das referidas, têm

outros factores que incitaram o seu surgimento. Como é o caso das associações que surgiram

em alguns países da Europa, mais vocacionadas para o desenvolvimento rural e impulsionadas

pelas políticas da União Europeia21.

“A história da constituição das diferentes organizações analisadas é enformada por

diversas motivações, referentes à panóplia de questões a que hoje responde o

desenvolvimento local em áreas rurais. Tais motivações não são alheias às dinâmicas e

políticas que a União Europeia e os Estados Português e Espanhol têm vindo a

promover, ao longo dos chamados Quadros Comunitários de Apoio, nomeadamente

através de medidas de promoção do desenvolvimento local, como as referentes à

transformação da agricultura e ordenamento do território, identificação e valorização

dos recursos locais e promoção do empreendedorismo e das dinâmicas associativas.”

(Cristóvão e Miranda: 2006:8)

Muitas foram as associações que surgiram, com o objectivo de captação e aproveitamento de

recursos disponíveis, técnicos, financeiros e institucionais; o aproveitamento do capital social

existente, como relações pessoais, institucionais e políticas que podem traduzir-se em

sinergias para a resolução de problemas comuns.

Em Cabo Verde22, assistiu também o surgimento de algumas associações motivadas pelos

fundos disponibilizados por diversos programas e projectos. Como é o caso do PNLP que

21 Os programas LEADER, é um exemplo claro disso. São programas de instigaram a criação de muitas associações de desenvolvimento local em Portugal. 22 O associativismo em Cabo Verde é um ponto que debruçamos no terceiro e quarto capítulo.

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recorre as associações e através de assinatura de contratos-programas23, esses executam as

actividades desse programa.

23 Contratos-programas é o instrumento permite a celebração de contratos, entre o Governo e as Organizações da Sociedade Civil legalmente constituídas para o financiamento de projectos de investimento.

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CAPÍTULO 2 – CARACTERIZAÇÃO DO OBJECTO DE ESTUDO

Figura 1 – Mapa de Cabo Verde (Fonte: Adaptado de www.caboverde.com )

Cabo Verde é reconhecidamente um estado vulnerável. A nossa vulnerabilidade é visível

tanto ao nível económico, sector no qual ainda não conseguimos desenvolver o bastante ao

ponto de nos tornarmos auto-sustentáveis, quanto ao nível da função segurança do Estado, em

que não temos conseguido manter o controlo efectivo sobre todo o território nacional,

particularmente o marítimo, e em razão disso nota-se um aumento significativo de actividade

criminosa em Cabo Verde.

2.1 - Cabo Verde – breve caracterização

Esta breve caracterização da situação socio-económica cabo-verdiana tem como objectivo

facilitar a compreensão das especificidades e limites que se impõem as ACD’s no que se

refere ao seu papel no desenvolvimento local.

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As restrições ao desenvolvimento, decorrentes de um conjunto de constrangimentos

estruturais evidentes, falta de recursos naturais, reduzida dimensão territorial, insularidade,

descontinuidade territorial, secas prolongadas, escassez de recursos hídricos, reduzido

potencial de terra cultivável, localização geográfica à margem das correntes principais do

comércio internacional, forte ritmo de crescimento demográfico, são bem evidentes em Cabo

Verde.

Cabo Verde é um arquipélago com uma área geográfica de 4033 km2, constituído por dez

ilhas, repartidas por dois grupos geográficos – o Sotavento, que integra as ilhas de Maio,

Santiago, Fogo e Brava, e o Barlavento, que integra as ilhas de Santo Antão, S. Vicente, Santa

Luzia, S. Nicolau, Sal e Boavista. Representa um ecossistema insular localizado a 450 km da

Costa Ocidental Africana (figura 1). Integra o Sahel, apresentando condições climatéricas de

tipo tropical seco e semi-árido, com alternância de uma longa estação seca e uma curta

estação húmida, caracterizada por um reduzido número de dias de precipitação por ano.24

Residiam no país em 2000, 434 625 pessoas o que eleva a densidade populacional a cerca de

107 habitantes por Km2 distribuído nas nove ilhas habitadas. Segundo o censo de 2000 a

população é jovem, com cerca de 42% com idade inferior a 14 anos e somente 6,2% com mais

de 65 anos. A média de idade dos cabo-verdianos é de 17 anos de idade. 25

Um país caracterizado por um forte crescimento da sua população com uma taxa de

natalidade, de 23,3 por mil habitantes, em 2000. Uma taxa de fecundidade 127,8 por 1000

mulheres em idade de procriação, sendo quatro o número médio de filhos por mulher.

Essa população, em constante crescimento, tem sido considerada como sendo a principal

riqueza do país. Sendo assim, a educação e formação dos recursos humanos do país tem

merecido grande atenção dos governantes.

O sistema educativo compreende os subsistemas de educação pré-escolar, da educação escolar

que abrange os ensinos básicos, secundários, médio, superior e modalidades especiais de

24 Cabo Verde (2002) interm Poverty Reduction Strategy Paper – iPRSP. Relatório (sem paginação) 25 Dados disponíveis no Website: www.ine.cv. Mais informações no ponto seguinte, onde se faz a caracterização de Santo Antão, e se usa dados nacionais para efeito de comparação.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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ensino, e da educação extra-escolar que comporta actividades de alfabetização e pós

alfabetização, com formação e formação profissional.

Até agora é garantido o ensino básico de seis anos e já com perspectiva de aumentar os anos

de gratuitidade no sistema de ensino. Ultrapassada essa fase, o jovem tem acesso ao

secundário, com duas vertentes de formação: via geral e via técnica. Este ensino é ministrado

em estabelecimentos públicos e privados e hoje, todos os concelhos do país disponham de

estabelecimentos de ensino secundário público, embora nem todos possuem instalações

adequadas, havendo casos de ocupação de espaços do ensino básico, e outras são ainda

anexos.

O Ensino Médio é de natureza profissionalizante. Tem geralmente a duração máxima de três

anos e é realizado em Institutos públicos e privados, tutelados pelo Ministério da Educação.

O Ensino Superior, começa a ser implementado em Cabo Verde a partir da criação da Escola

de formação de Professores do Ensino Secundário, conferindo o grau de bacharéis aos

diplomados por esta instituição. Não obstante é, a partir de 1992, que se cria a Comissão

Instaladora do Ensino Superior no âmbito da reforma de ensino, com o objectivo de se fazer o

enquadramento institucional das competências existentes e futuras e a coordenação de

projectos internacionais. Hoje encontra-se no país institutos privados e a Universidade de

Cabo Verde. Em 2004 encontrava-se matriculados no ensino superior nacional 3910

estudantes. Apesar das alterações significativas neste sector, a grande parte da formação

superior é realizada no exterior, e em muitos casos são bolseiro do Estado, o que

representando um encargo significativo para as finanças públicas.

Os sucessivos governos, desde a pós-independência vem apostando cada vez mais na

educação, e em 2005, as despesas públicas com educação era de 6,6 % do PIB.

No domínio da saúde, os objectivos gerais consistem no desenvolvimento dos cuidados de

saúde, aumento do nível de eficácia da prestação e redução das taxas de mortalidade infantil e

materna.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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Grandes ganhos, o país tem conseguido ao longo dos anos, ao ponto de realçarmos que em

200426, Cabo Verde tinha uma cobertura de 49 médicos por 100.000 pessoas um aumento

significativo em relação a 1995 que era de 29 por 100.000 pessoas.

Quadro 1: Indicadores de mortalidade infantil

Indicador 1970 1998 2004/5

Taxa de mortalidade infantil (por 1000 nados

vivos) 87 64 27

Taxa de mortalidade de menores de cinco

anos (por 1000 nados vivos) 123 73 36

Fonte: Relatórios do PNUD 2000 à2007/8

Da leitura do quadro, nota-se que o sector infantil evidencia esse crescimento. Um sector onde

em 2004 registava uma taxa de mortalidade infantil de 27 por mil nados vivos, ao mesmo

tempo que a taxa de mortalidade por menores de cinco anos era de 36 por mil nados vivos,

superando em larga medida as taxas que em 1998 eram de 54 e 73 respectivamente.

Essas melhorias têm como uma das razões principais o aumento da percentagem de crianças

que actualmente no país são vacinadas, com um ano, contra o sarampo (65%) e a tuberculose

(78%), as principais doenças, junto com a diarreia, que contribuía para que a mortalidade

infantil tivesse uma taxa elevada. Um outro aspecto que vem contribuindo é o facto de que

hoje poucos nascimentos de crianças acontecem em casa ou não são assistidos por um

profissional de saúde, 89% dos partos são assistidos.

O Sistema Nacional de Saúde continua a ser financiado através do Orçamento Geral do

Estado, em 2004, as despesas pública com a saúde era de 3,9 % do PIB, por entidades

gestoras da segurança social e por conta própria pela população não coberta por qualquer

forma de segurança social.

O aumento dos cuidados de saúde, de assistência médica e medicamentosa repercute no

aumento da esperança de vida, que em 1975 era de 57,5 anos atingindo em 2005 os 71 anos.

26 Dados extraídos dos relatórios do PNUD, 2006 – 2007/8

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

34

Cabo Verde, apesar de ser um país desprovido de recursos naturais economicamente

exploráveis e fortemente fustigado pela seca, a economia cresceu nos últimos anos a uma taxa

média anual de 6,4%, sob a impulsão de reformas visando a melhoria do ambiente económico

através da liberalização do mercado e o desenvolvimento do sector privado, incluindo a

privatização de empresas públicas. 27 Melhorias verificadas após a abertura ao

multipartidarismo.

Com base nos números dos relatórios do PNUD, podemos confirmar esse crescimento com

dados que permite uma certa comparabilidade, o valor nominal de 2001 do PIB per capita é

de (US$ 1.317), valor esse ultrapassado em larga medida em 2005, onde se registava (US$

1.940).28

As informações mais recentes sugerem uma evolução favorável da actividade económica em

2007. Assim, as estimativas do Banco de Cabo Verde apontavam para um crescimento

económico de 6,7% em termos reais.29

Quadro 2 – Produto Interno Bruto, a preços constantes de 1980 (1999-2004)

1999 2000 2001 2002 2003 2004

Sector Primário 1575 1679 1691 1607 1644 3508

Agricultura, pecuária, silvicultura 1286 1377 1406 1319 1323 3160

Pesca 152 166 127 123 144 159

Indústrias extractivas 137 136 158 165 177 189

Sector Secundário 3094 3073 3057 3439 3494 3644

Congelação, conservas de peixe 29 27 14 28 23 24

Outras indústrias alimentares 125 114 118 128 134 138

Tabaco 25 18 33 28 19 14

Bebidas Alcoólicas e Refrigerantes 337 345 217 198 181 173

Mecânica e reparação naval 44 14 21 13 11 15

Carpintaria 160 180 183 200 222 204

Outras indústrias transformadoras 289 251 232 217 222 210

Electricidade e água 204 314 347 441 490 663

Construção 1881 1810 1892 2186 2192 2203

27 Dados estriados de: Cabo Verde, 2002 28 A titulo de curiosidade, por ocasião da independência, em 1975, o PIB per capita era de (US$190) 29 BCV – Boletim Económico Fevereiro de 2008, pg15

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

35

SECTOR TERCIÁRIO 12433 13591 14719 15453 16318 17088

Comércio 2981 3388 3774 4278 4451 4684

Hotéis e restaurantes 401 525 678 666 817 921

Transportes rodoviários 556 653 675 857 887 1045

Transportes marítimos 614 646 465 511 182 195

Transportes aéreos 631 603 742 272 743 722

Serviços aos transportes 467 495 596 550 468 465

Comunicações 1218 1483 1696 1802 1933 2027

Bancos e seguros 604 495 583 616 590 595

Habitações e locais 1117 1171 1238 1325 1414 1588

Serviços governamentais 2272 2319 2333 2431 2613 2784

Outros serviços 277 297 313 309 335 356

Serviços bancários não imputados -453 -383 -401 -456 -514 -540

Direitos e taxas / importações 1748 1899 2027 2292 2399 2246

TOTAL 17102 18343 19467 20499 21456 24240

Percentagem (%) do PIB

Sector Primário 9 9 9 8 8 14

Agricultura, pecuária, silvicultura 7 7,5 7,2 6,4 6,1 13

Pesca 0,8 0,9 0,7 0,6 0,6 0,6

Indústrias extractivas 0,8 0,7 0,8 0,8 1 0,7

Sector Secundário 18 16 16 16 15 15

Congelação, conservas de peixe 0,1 0,1 0,07 0,1 0,01 0,09

Outras indústrias alimentares 0,7 0,6 0,6 0,6 0,6 0,5

Tabaco 0,1 0,09 0,1 0,1 0,08 0,05

Bebidas alcoólicas e refrigerantes 1,9 1,8 1,1 0,9 0,8 0,7

Mecânica e reparação naval 0,2 0,07 0,1 0,06 0,05 0,06

Carpintaria 0,9 1 1 1 1 0,8

Outras indústrias transformadoras 1,6 1 1,1 1 1 0,8

Electricidade e água 1,1 2 2 2 2 3

Construção 11 10 10 11 10 9

SECTOR TERCIÁRIO 73 75 75 76 77 71

Comércio 17 18 20 20 20 19

Hotéis e restaurantes 2 3 3 3 3 4

Transportes rodoviários 3 3 3 4 4 4

Transportes marítimos 4 3 2 2 0,8 0,8

Transportes aéreos 4 3 3 1 3 3

Serviços aos transportes 2 3 3 3 2 2

Comunicações 7 8 8 9 9 8

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36

Bancos e seguros 3 3 3 3 3 2

Habitações e locais 6 6 6 6 6 6

Serviços governamentais 13 12 11 11 12 11

Outros serviços 1 1 1 1 1 1

Serviços bancários não imputados -1 -2 -2 -2 -2 -2

Direitos e taxas / importações 10 10 10 11 11 9

TOTAL 100 100 100 100 100 100

Fonte: INE Cabo Verde – Contas Nacionais

Da análise do quadro, constata-se que o sector com mais peso no produto interno bruto foi o

sector terciário, reforçando a ideia de que a economia cabo-verdiana é fortemente centrada

nos serviços. Estes contribuíram com 71% para o PIB do país em 2004, destacando o peso do

comércio (19%), serviços governamentais (11%) e os direitos e taxas sobre as importações

(9%).

De modo geral essa é a leitura que se faz dos resultados, mas em termos comparativos, vemos

que o sector terciário, teve um aumento de 1999 para 2003, de 73% a 77 % respectivamente,

para em 2004, verificasse uma queda do peso desse sector na formação do PIB, para um total

de 71%. E nota-se que tomos as áreas de grande importância nesse sector, também

acompanhou essa queda.

O sector secundário corresponde a 15% da formação do PIB, onde só as construções

representam mais de metade desse valor (9%). É um sector que tem permanecido estável ao

longo desses anos em análise.

Apesar de Cabo Verde ser considerado um país de agricultores e pescadores, a agricultura e a

pesca contribuíram apenas com 13% e 0,6%, respectivamente, para o PIB. Apesar de ser um

país arquipelágico, ao contrário do que se pensa, a pesca tem um peso insignificante na

economia das ilhas, e nota-se uma pequena quebras dos valores ao longo desses anos. Já a

agricultura, tem-se mantido quase que constante, com tendência para uma ligeira queda nos

anos de 2002, 2003, para em 2004 dar um grande salto, passando de 6,1% (2003) para 13%

em 2004, duplicando assim os valores.

Uma economia fortemente dependente da ajuda externa, os governos de Cabo Verde, depois

de 1990, tem adoptado estratégias de desenvolvimento orientada para o exterior, permitindo

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37

uma articulação da economia cabo-verdiana com a economia global. Essa articulação é feita

sobretudo da cooperação internacional e da emigração. Esse é um outro aspecto que

caracteriza a vulnerabilidade do país, a completa dependência de Cabo Verde das remessas e

da ajuda pública ao desenvolvimento. Cabo Verde tem uma das ajudas externas mais elevadas

per capita no mundo, de US$317 em 2005, o que representa cerca de 16% do seu PIB30.

Não obstante o crescimento económico de Cabo Verde, a economia é frágil, o país tem

poucos recursos naturais e possibilidades agrícolas limitadas e a importação de alimentos é

crítica. Tendo que importar cerca de 80% dos alimentos de que necessita. Os cabo-verdianos

importam quase a totalidade dos produtos que consomem, desta forma as importações de bens

e serviços, em 2005 era equivalentes a 66% do PIB.

Em termos de organização política, a descoberta das ilhas do arquipélago remonta, segundo a

tese oficial, a 1460. Tudo indica que elas deveriam ser desabitadas. Decorridos cinco séculos

de colonização portuguesa, Cabo Verde alcança a independência em Julho de 1975. Desde

essa data, dois períodos políticos distintos se sucederam, passando de um regime

monopartidário a um regime multipartidário, e importantes transformações económicas e

sociais têm vindo a alterar as feições desse pequeno país.

O país goza de uma situação sócio-política estável caracterizada por um sistema legal baseado

na lei civil europeia, com grande influência do sistema legal Português. A democracia é o

regime político vigente em Cabo Verde, teve grande progresso com as primeiras eleições

multipartidário e das primeiras eleições democráticas para os órgãos municipais em 1992,

parlamentares e presidências em 1991. Esse período marca uma reforma política. As eleições

são efectuadas por sufrágio universal e os mandatos são por um período de cinco anos.

30 Relatório PNUD 2007/08

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

38

2. 2 - Caracterização socioeconómica de Santo Antão

Figura 2 – Mapa da ilha de Santo Antão (Fonte: Adaptado de www.caboverde.com)

a) - GEOGRAFIA31

Situado ao norte do arquipélago de Cabo Verde, a ilha de Santo Antão tem uma extensão de

779 Km2, sendo a segunda em extensão, a mais setentrional e a mais montanhosa do país.

Morfologicamente a ilha estrutura-se a partir de uma grande dorsal central que a percorre de

este a oeste com altitudes superiores aos 1.000 m, situando-se a maior cota no Topo de Coroa

com 1.979m. Desta cordilheira central partem, maioritariamente em sentido Norte-sul, as

grandes ribeiras que vão até à costa. Estas ribeiras, impressionantes barrancos de bordes

particularmente verticais, com paredes de várias centenas de metros de altura, são o resultado

das escavações por uma intensa erosão hídrica ao longo das eras geológicas. Trata-se talvez

do elemento mais singular da paisagem da ilha pela sua espectacularidade natural e pela

adaptação que deste acidentado território fez do homem para a actividade agrícola e o

assentamento de povoações. Aproximadamente 60% da área cultivável é feita pelo homem,

31 Caracterização feita com base em múltipla informação, recolhidos em documentos diversos, entre os quais, o Plano de Desenvolvimento de Santo Antão; documentos apresentados na Mesa Redonda de Desenvolvimento de Santo Antão-2008, Revista Iniciativa, nº13.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

39

construindo terraços com paredes de pedras nas encostas inclinadas. A costa é abrupta

predominando os alcantilados. As praias são praticamente inexistentes, localizando-se

essencialmente na desembocadura das principais ribeiras.

O clima é resultante de uma conjunção de factores que sujeita a ilha à influência saheliana e a

um regime de ventos cujo impacto produzido nas altas vertente das montanhas proporciona

espaços de microclima que vão desde a aridez até à acentuada amenidade. Devido às

condições climáticas existentes, as potencialidades hídricas são naturalmente escassas,

embora com relativa abundância nos vales mais importantes do norte e do nordeste. No resto

da ilhas, mais extensa e mais seco, só muito raramente são notórias algumas ressurgências de

fraco caudal, sendo de assinalar, hipóteses de existência de reservas subterrâneas.

De acordo com a pluviometria e a vegetação dominante a Ilha apresenta os seguintes

substratos climáticos:

Sub-humido/ Húmido

Neste estrato climático encontram-se as zonas de altitude do Nordeste da Ilha acima dos 600

metros de altitude bem assim as partes superiores da bacias que beneficiam de uma certa

nebulosidade e precipitações pela influencia dos alísios do nordeste proporcionando uma certa

amenidade e consequentemente uma vegetação natural.

Semi-Árido

A zona semi-árida da Ilha constitui o substrato climático com maior representatividade e

inclui as áreas da parte inferior das bacias vertentes do Nordeste, o litoral Norte (150-300 m

de altitude), o litoral Nordeste entre 100-800 metros, a parte central da Ilha entre 600-1200

metros e a zona Sudeste com mais de 1500 metros.

Árido/desértico

Nos anos de seca a diferenciação entre as zonas árida e desértica é praticamente inexistente

que ocupam toda a zona Sul e Sudoeste da Ilha. As árvores e arbustos que caracterizam a zona

semi-árida desaparecem na zona árida e dão origem à formações herbáceas.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

40

b) - DEMOGRAFIA

Quadro 3 - Estrutura populacional

Indicadores Cabo Verde Santo Antão

População Total 434625 47170

População residente nas famílias 431989 47042

População feminina 223995 22683

População masculina 207994 24359

População 0 a 14 anos 181993 19203

População 65 anos e mais 27122 4007

Idade mediana da população (anos) 17 18

População urbana 232147 14222

População rural 199842 32820

Densidade Populacional 107 60

Número de agregados familiares 93975 10193

Número médio de pessoas por agregado familiar 5 5

Fonte: Censo 2000 -INE

Em termos demográficos, Santo Antão é a terceira ilha mais populosa do arquipélago.

Segundo o ultimo Censo de 200032, a população da ilha era de 47170 cerca de 11% da

população total de Cabo Verde. Trata-se de uma população extremamente jovem, onde 40,7%

tem idade compreendida entre 0-14 anos. Com uma percentagem pequena de população com

mais de 65 anos (8,5%). A idade mediana da população é de 18 anos.

Ao contrário da tendência nacional, nessa ilha, a população masculina é superior à feminina.

Santo Antão conta com uma população feminina de 48% contra os 52% masculina, enquanto

que a nível nacional, a população masculina (48%) é inferior a feminina (52%).

Com uma densidade populacional de aproximadamente 60 habitantes por Km2. A população

encontra-se desigualmente repartida pelos três concelhos, com percentagem mais alta na

Ribeira Grande (46% do total da ilha) onde o tamanho médio dos agregados familiares é de

4,4 pessoas, seguida de Porto Novo e Paul correspondendo respectivamente a 37% e 17% da

32 Dados publicados pela INE em Junho de 2001

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

41

população total da ilha. Nestes concelhos o tamanho médio dos agregados familiares é de 4,6

e 5,1 pessoas respectivamente.

A maior parte da população da ilha está concentrada no norte da ilha, nos concelhos de

Ribeira Grande e do Paul, onde existem maiores potencialidades agrícolas, advenientes do

clima favorável e maior quantidade de água. Embora o Concelho do Porto Novo representar

2/3 da superfície da ilha tem uma menor densidade populacional.

A proporção da população que vive no meio urbano (30%) é inferior à percentagem nacional

(54%). Como se pode constatar, a partir do quadro seguinte, a população de Santo Antão é

essencialmente rural (cerca de 70%) o que demonstra a pressão sobre os recursos naturais

nomeadamente solo e água para a sobrevivência de uma parte significativa dos residentes.

Verifica-se ainda que nos concelhos do Paul e Ribeira Grande a taxa de urbanização é menor

do que no concelho do Porto Novo, em virtude de se tratar de concelhos agrícolas, onde as

possibilidades no meio rural são maiores. O gráfico 133 mostra-nos que esses dois concelhos

apresentam taxas de população rural de 79% e 78% respectivamente, enquanto que Porto

Novo apresenta uma taxa de 55%.

Gráfico 1 - População rural e urbana de Santo Antão

Fonte: Censo de 2000 – INE

33 Correspondente ao quadro 1 dos anexos

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

42

A alta taxa de urbanização do Porto Novo é uma consequência do grande êxodo rural e da

migração, devido as secas permanentes que assolam a ilha e com maiores repercussões neste

concelho.

c) – EDUCAÇÃO

O mesmo Censo de 2000, danos conta que, dentre a população com idade igual ou superior a

15 anos, cerca de 34% não sabe ler nem escrever, valor esse, superior á média nacional que

ronda os 25%. O analfabetismo é mais elevado no concelho do Paul (38,9%), seguido do

concelho do Porto Novo (36,3%) e do de Ribeira Grande (30,4%). Paul é aliás o concelho de

Cabo Verde com mais elevada taxa de analfabetismo.

Gráfico 2 – Taxa de analfabetismo da população da ilha por concelho

Fonte: Censo de 2000 – INE

Nesta ilha, as mulheres possuem nível de instrução mais baixo do que os homens. Entre a

população que sabe ler e escrever, 52% corresponde ao sexo masculino contra 48% do sexo

feminino. Esta tendência mantém-se de forma quase uniforme nos três concelhos, com

excepção do Paul onde a proporção dos homens que sabem ler e escrever é de 54%.

Em Santo Antão o nível pré-escolar é de uma cobertura de quase 95%. Nessa ilha a educação

pré-escolar é também um fenómeno recente. Dentre a população que sabe ler e escrever quase

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

43

dois terços (60%) possui nível de Alfabetização ou Ensino Básico Integrado, dos quais, 56%

são homens. Apenas 15% da população de idade igual ou superior a 4 anos possui nível

secundário, dos quais 51% são homens.

Em todos os concelhos de Santo Antão, a proporção da população que possui nível de

instrução equivalente a Alfabetização ou Ensino Básico Integrado é superior a 50%. Destes,

cerca de 58 em cada 100 são homens no concelho de Paul, proporção essa que atinge 56% no

concelho de Ribeira Grande e 45% no concelho de Porto Novo.

Em 200434 encontrava-se inscrito nesse sistema de educação de adultos, nas três fases, 591

pessoas, sendo 117 em Ribeira Grande, 227 no Paul e 173 no Porto Novo.

A proporção da população que possui nível secundário é mais elevada no concelho de Ribeira

Grande (24%) do que nos restantes concelhos (cerca de 14%). Apenas 34% dos homens

possuem nível secundário na Ribeira Grande. Nos outros concelhos, verifica-se uma

repartição quase equitativa entre os dois sexos no que se refere a esse nível de instrução.

No que toca ao ensino pós-secundario, Santo Antão apresenta também níveis mais baixo que a

media nacional, população com Curso Médio é de 0,2% sendo que a nacional é de 0,5. e com

Curso Superior é de 0,4% e a nacional de 1,1%.

Em termos de infraestruturas, a Ilha neste momento esta dotada de estabelecimento de ensino

básico em todas as comunidades e secundário em todos os concelhos, somando o total de

cinco escolas secundarias e uma escola técnica. Uma das lacunas ainda no sistema de ensino é

a falta de estabelecimento de ensino superior capaz de dar cobertura a grande franga de

população jovem.

d) - SAÚDE

Dividido em três Delegacias de Saúde, uma para cada concelho, Santo Antão conta com um

Hospital Regional localizado na Ribeira Grande para dar cobertura aos três concelhos.

34 www.ine.cv

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

44

Existem dois Centros de Saúde nos concelhos do Paul e Porto Novo que garantem os serviços

mínimos de saúde para a população da sua área de saúde.

Para complementar as actividades dos Centros de Saúde, existe na ilha 1135 Postos Sanitários,

assim distribuídos: 4 em Porto Novo, 5 em Ribeira Grande e 2 no Paul, em cada um existe um

enfermeiro que é o agente de saúde responsável. Executam actividades curativas, preventivas,

promocionais e administrativas.

Mais perto das populações, sobretudo das comunidades mais distantes, estão as Unidades

Sanitárias de Base, 26 em toda a ilha que prestam cuidados primários de saúde.

Ligadas a estruturas de saúde dos concelhos encontramos as Unidades de Saúde Reprodutiva,

que prestam os cuidados de saúde Materno-Infantil e Planeamento Familiar e em Ribeira

Grande um Centro de Saúde Reprodutiva.

O nível baixo da educação geral da população condiciona a compreensão da relação saúde

/doença e da mensagem da educação para a saúde, que possam contribuir para mudança de

comportamento e promoção da saúde. Campanhas de sensibilização e esclarecimento de

doenças e prevenção de epidemias são constantemente realizadas pelas estruturas de saúde.

É uma ilha onde prevalece ainda bom número de doenças respiratórias e nutricionais,

resultante sobretudo da acentuada pobreza vivida em muitas comunidades. Também ainda é

deficitário o saneamento básico em boa parte da ilha, sobretudo mo meio rural, o que faz com

que prevalece doenças diarreicas, doenças da pele e parasitoses intestinais, sobretudo nas

crianças.

e) AGRICULTURA

A ilha com maior área agrícola cultivável, em Cabo Verde, é a de Santiago com 52,7% do

total, seguida de Santo Antão com 20,8% e da do Fogo que tem 15,8% do total. As restantes

ilhas detêm apenas 10,7% do total de área agrícola cultivável.36

35 GEPC - Ministério de Saúde, 2007, Relatório estatístico do ano de 2006, Praia. 36 Os dados utilizados nesse ponto são do Recenseamento Geral da Agricultura (RGA) - 2004

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

45

Apesar de ser a segunda a nível nacional, de uma superfície total da Ilha estimada em cerca de

77.900 ha, somente 10% é cultivada: no regime de regadio (1%), sequeiro (5%), e floresta

(4%). A restante área, pelas suas características edafo-climáticas vem sendo usado no regime

de pastoreio extensivo (cerca de 40%) ou constituídas por escarpas/formações rochosas e

áreas de características áridas ou desérticas e portanto inadequadas a qualquer uso (50%).

Na ilha de Santo Antão encontra-se um pouco mais de metade da área irrigável do país,

51,3%. Mais de metade das parcelas de sequeiro e regadio encontra-se na ilha de Santo Antão

(57,3%), mais precisamente no concelho de Ribeira Grande, com 80% do total da área de

sequeiro e regadio desta ilha.

Como mostra o quadro seguinte, na ilha da Santo Antão 38,6% das explorações agrícolas são

de agricultura de regadio, atingindo os 45% no concelho de Ribeira Grande e 42% no

concelho do Paul, números significativos comparado com a média nacional.

Quadro 4 - Exploração agrícola segundo as actividades agrícolas (só explorações

familiares)

Ilha/

Concelho

Total Actividades Agrícolas

Sequeiro Regadio Pecuária Agro-florestal

Nº % Nº % Nº % Nº %

Cabo Verde 44.450 33895 76,3 7593 17,1 40887 92 1112 2,5

Santo Antão 6.789 4563 67,2 2622 38,6 6044 89 5 01

Ribeira Grande 3.237 2370 73,2 1457 45 2847 88 3 0,1

Paul 1.129 675 59,8 471 41,7 951 84,2 1 0,1

Porto Novo 2.423 1518 62,6 694 28,6 2246 92,7 1 0

Fonte: Recenseamento Geral da Agricultura, RGA - 2004

A agricultura de regadio é geralmente praticada no leito dos vales embora nas zonas de

sequeiro se encontrem, por vezes, manchas de cultura em regime de regadio tradicional nas

encostas alimentadas por pequenas nascentes captadas por meio de diques. As áreas actuais

potencialmente irrigáveis dependem dos recursos hídricos disponíveis, das necessidades das

culturas e da eficiência de rega.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

46

Contudo nas áreas vocacionadas para as culturas de sequeiro, o milho, o feijão, a batata-doce,

a mandioca são as culturas dominantes. Muitas vezes a agricultura é consociada com fruteiras,

em particular nas zonas de altitude, destacando-se mangueiras, papaieiras, coqueiros,

marmeleiro, nespereiras, abacateiro, macieira, citrinos, etc. Santo Antão é também uma ilha

vocacionada para produção de frutas. Na ilha encontra-se 38% das plantas fruteiras do país e

59% das que são cultivadas em pomar. Nesta ilha, 83% das árvores de fruta são cultivadas em

pomares, esse número é essencialmente bananeira.

Nos perímetros de regados praticam-se as culturas de mandioca, banana, cana sacarina,

batata-doce, batata comum, hortaliças e fruteiras. Por vezes a quantidade de água disponível

para rega é tão irrisória que mal chega para a sobrevivência das plantas resultando por esta

razão as quebras de produção devido aos rendimentos muito baixos.

A água destinada as explorações agrícolas de regadio faz-se a partir de captações, em diques

de captação e galerias, poços e furos.

O sistema de rega em Santo Antão é ainda hoje um dos constrangimentos ao desenvolvimento

da agricultura. Ela baseia-se sobretudo em métodos tradicionais com fraca eficiência. A rega

por alagamento é ainda utilizada em 95%, das explorações agrícolas em Santo Antão, sendo a

média nacional de 82%. A rega gota a gota, que é um método mais moderno, e mais eficaz, só

é utilizada em 2% sendo a media nacional 10% (Fogo 64%). Rega por alagamento e gota a

gota 3%, sendo nacional 6%.

A agricultura em Cabo Verde, e especificamente em Santo Antão tem carácter de

subsistência, isso vê pela proporção das explorações do tipo familiar, a quase inexistência de

empresa nessa área, bem como do espírito associativo e cooperativo. O quadro a seguir

mostra que a exploração do tipo não familiar é uma pequena percentagem.

Quadro 5 – Tipo de exploração agrícola

Ilha/

Concelho

Total Tipo de exploração agrícola

Familiar Não Familiar

Total Cooperativa Associações Entidade

Publica

Empresa Outros

CV 44.506 44.450 56 1 6 23 8 18

SA 6.795 6.789 6 0 1 5 0 0

Fonte: Recenseamento Geral da Agricultura - 2004

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47

A estrutura agrária continua a ser caracterizada pelo minifúndio. Considerando a forma de

exploração directa como sendo por conta própria e a forma indirecta a parceria, o

arrendamento, o comodato, o usufruto e o aforamento, pode-se concluir que estão exploradas

de forma indirecta 37 e 38% das áreas respectivamente no sequeiro e regadio, (ver quadros a

seguir).

Quadro 6 - Área cultivável de sequeiro segundo as formas de exploração da terra.

Ilha/

Conce-

lho

Total Conta

Própria

Parceria Renda Usufruto Comodato Aforamento

Litros Litros % Litros % Litros % Litros % Litros % Litros %

CV 402948 216652 53,8 93458 23,2 59013 14,6 21405 5,3 10331 2,6 2090 0,5

SA 71027 44821 63,1 20910 29,4 1504 2,1 2444 3,4 125 0,2 1224 1,7

RG 28951 19873 68,6 8029 27,7 334 1,2 658 2,3 53 0,2 5 0

Paul 11242 5959 5,3 5085 45,2 132 1,2 58 0,5 8 0,1 0 0

PN 30834 18989 61,6 7797 25,3 1038 3,4 1728 5,6 64 0,2 1219 4

Fonte: Recenseamento Geral da Agricultura - 2004

Quadro 7 - Área cultivável de regadio segundo as formas de exploração da terra.

Ilha/

Conce-

lho

Total Conta

Própria

Parceria Renda Usufruto Comodato Aforamento

Litros Litros % Litros % Litros % Litros % Litros % Litros %

CV 34755 21441 61,7 7388 21,3 3447 9,9 2132 6,1 305 0,9 41 0,1

SA 17829 11010 61,8 5406 30,3 1027 5,8 331 1,9 45 0,3 11 0,1

RG 8592 5515 64,2 2610 30,4 342 4 89 1 30 0,3 6 0,1

Paul 4337 2534 57,9 1475 33,7 291 6,6 63 1,4 15 0,3 0 0

PN 4861 2961 60,9 1322 27,2 394 8,1 179 3,7 0 0 5 0,1

Fonte: Recenseamento Geral da Agricultura – 2004

A parceria, de entre as formas indirectas, é a mais utilizada em Santo Antão com 30,3% das

áreas totais de regadio e de 29,4% das de sequeiro. O peso das relações de parceria é mais

elevado no concelho do Paul tanto no sequeiro como no regadio. Cerca de 45,2% e 33,7% das

áreas totais estão exploradas em parceria no sequeiro e no regadio respectivamente.

Um dos principais constrangimentos à prática da agricultura na Ilha é a grande incidência de

pragas e doenças nas culturas, como é o caso dos mil pés37, causa do embargo impostos aos

37 Os mil-pés, de nome cientifico Spinotarsus caboverdus, uma praga que alimenta de plantas, principalmente tubérculos e raízes, e frutas. Estão presentes na ilha de Santo Antão desde 1969. Em 1975 começaram a dar nas

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produtos de Santo Antão. Mesmo com essa situação, verifica-se pouca aplicação de pesticidas

e adubos orgânicos e químicos. Associados também com dificuldades técnicas e meios para o

combate a determinadas pragas.

Os dados mostram que Santo Antão tem níveis baixo em relação a média nacional no que toca

ao uso de sementes melhoradas 38%, sendo percentagem nacional de 44; Adubos 31% sendo

a nacional 38%; Pesticidas 28% sendo nacional 38%, a situação se inverte no que toca ao uso

de adubos de origem animal, na Ilha, 80% dos agricultores utilizam Estrumes sendo a nível

nacional de 66%, isso no que toca a agricultura de regadio.

Sendo a agricultura uma actividade essencialmente de subsistema e prática de forma

tradicional, a produção é em número reduzida logo, a comercialização é muito baixa. Pode-se

dizer que o mercado da ilha não se encontra devidamente desenvolvido e estruturado, pelo

que o excedente produzido e canalizado para a ilha de São Vicente.

A comercialização para outras ilhas enfrenta dificuldades no que toca a conservação e

transporte dos produtos, uma vez que não existe nenhuma forma de conservação estabelecida,

cada produtor ou comerciante transporta-os de forma aleatória, o que faz com que muitas

vezes chegam em São Vicente em péssimas condições.

Os dados aqui apresentados mostra que Santo Antão é, sem dúvida, uma ilha com vocação

agrícola, porem ainda enfrenta graves problemas: o agravamento da situação do meio

ambiente, causada pela persistência da seca e com isso a diminuição potencial de recursos

hídricos de caudal médio explorável; falta de inovação e investimento no sector, pelo facto de

serem familiares não existe, nessa área o espírito empreendedor, logo verifica-se uma perda

de mercado por falta de competitividade; o carácter de subsistência impede o investimento.

Um outro obstáculo é o facto de Santo Antão ser uma ilha onde a geomorfologia menos

favorece a mobilidade de pessoas e bens, impõe uma grande dificuldade à implementação de

vistas no vale da Ribeira Grande, zona de agricultura de irrigação. Há mais de 20 anos, tomaram a proporção de uma praga de tal ordem que as autoridades não tiveram outro remédio senão proibir a exportação de produtos agrícolas de Santo Antão, deixando apenas que os mesmos chegassem à vizinha ilha de São Vicente, que, por isso, entrou, também, no regime de quarentena. (Nascimento:2004)

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vias de acesso terrestre, o que influencia no escoamento dos produtos das localidades mais

distantes e consequentemente o preço final do mesmo.

f) PECUÁRIA

A pecuária em Santo Antão é do tipo familiar ligado às explorações agrícolas servindo de

apoio à actividade agrícola no tocante ao fornecimento de adubo orgânico, complemento

orçamental para as famílias mais carenciadas.

O quadro que a seguir se apresenta, quantifica por espécie o efectivo pecuário da Ilha bem

assim a sua posição em relação ao efectivo nacional.

Quadro 8 - Efectivo pecuário por espécie

Ilha/

Concelho

Efectivo pecuário

Bovinos Ovinos Caprinos Suínos Aves Patos e

Perus

Equídeos Coelhos

Nº Nº Nº Nº Nº Nº Nº Nº

CV 22306 10400 148094 77316 327562 15558 11302 4458

SA 832 165 23791 7786 38721 629 1997 1288

RG 365 60 8246 3292 19328 331 613 595

Paul 206 32 2131 1561 6910 81 177 26

PN 261 73 13414 2933 12483 217 1207 667

Fonte: Recenseamento Geral da Agricultura – 2004

A produção de Santo Antão centra-se sobretudo nas espécies caprinos (23791), aves (38721) e

suínos (7786), reflectindo a tendência nacional.

No concelho do Porto Novo, dadas as características da região, as explorações já se

aproximam do tipo extensivo em que muitas famílias se dedicam ao pastoreio. Nota-se que é

o concelho que mais produz caprinos na ilha, com 13414 efectivos, sendo essa a espécie mais

praticada no concelho e que adapta a esse tipo de exploração.

Nas zonas do regadio e em grande parte das áreas onde se pratica a agricultura de sequeiro, a

pecuária é essencialmente estabulada, constituindo os subprodutos agrícolas a base principal

da nutrição silvopastoril. Os dados do RGA de 2004 mostra que a associação da agricultura e

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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pecuária é significativa na ilha. Associações das actividades de sequeiro, regadio e pecuária é

mais elevada em SA, de 26,2% chegando a atingir em Ribeira Grande 32%, sendo que a

percentagem nacional é de 13,2%. O regadio e a pecuária associados são também importantes

na ilha de Santo Antão, relativamente ao valor global (2,1%), com valores de 5,8% no

concelho da Ribeira Grande, 11,2% no Paul e 5,3% no Porto Novo.

A nível da comercialização de produtos pecuários é de mencionar as condições deficientes

existentes, resultantes da falta ou mau funcionamento de matadouro e talhos, prevalecendo

abates e vendas ao nível caseiro de animais sem, portanto, as mínimas condições de higiene e

sanidade.

Tal como na agricultura, existe um fraco investimento no sector da pecuária no que toca a

factores de produção, introdução de raças melhoradas, tratamento e conservação dos produtos,

o que faz com que a produção se faça sem grandes cuidados em termos de maneio e nutrição

animal, sanidade ou qualquer outro tipo de assistência técnica.

Transformação de produtos agro-pecuários é uma área ainda pouco explorada em Santo

Antão, pese embora, apresentar uma das maiores taxas de actividades desse género a nível

nacional. A ilha apresenta um dos valores mais elevados 24%, nos concelhos do Paul (34%) e

da Ribeira Grande (30%)38.

g) PESCA

O sector das pescas ocupa um lugar preponderante na economia de Santo Antão, não só por

constituir uma fonte importante de emprego e de receitas para muitas famílias, como também

por contribuir significativamente com proteínas de origem animal para a população da ilha.

A faina é praticada com botes de boca aberta de madeira com dimensões compreendidas entre

os 4,5 metros e 6,0 de comprimento, e 1,8 metros de largura, de fabrico local, tripulada

normalmente por 4 pescadores. Para a pesca de pequenos pelágicos, utilizam pequenas

embarcações de 6 à 8 m com convés fechado, uma rede de cerco de 100 à 180 braços de

comprimento e 10 à 18 braços de altura, normalmente tripulados por 10 à 14 pescadores.

38Recenseamento Geral da Agricultura – 2004

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

51

Utilizam motores fora de borda de 8 a 15 cavalos para botes de pesca à linha, e 25 a 40 HP

para botes de rede de cerco numa taxa de motorização de 85%.39

Predomina a pesca artesanal dirigida a uma variedade muito significativa de espécies junto à

costa. Contando um total de 12 desembarcadouros e ou arrastadouros de pouca expressão

pelas condições de desembarque.

Quadro 9 – Dados de pesca artesanal 1999

Nº de botes

com motor

Nº de botes

sem motor

Nº de

pescadores

Rede de

cerco

Rede de

praia

Rede de

emalhar

Santo

Antão

105 27 534 8 11 6

Cabo

Verde

929 335 4283 25 53 69

Fonte: Boletim estatístico da INDP, ano 2003

A ilha de Santo Antão possuiu, de acordo dos dados estatísticos de 2003, 534 pescadores,

equivalente a 12% do nacional, 132 botes, que equivale a 11% do nacional.

Quadro 10 - Evolução comparativa dos desembarques (em toneladas) da pesca artesanal

(1997-2003)

Anos 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003

Santo Antão 715 747 588 568 776 738 779

Cabo Verde 4920 5241 5968 6977 5649 5383 5206

Fonte: Boletim estatístico da INDP, ano 2003

Comparando os dados de 1997 com os de 2003 verifica-se que houve uma evolução positiva,

porém seguido de um grande decréscimo nos anos de 1999 e 2000, para depois começar a

crescer de novo, atingindo um máximo em 2003, mas com um ligeiro decréscimo em 2002,

em relação a 2001.

Em termos de toneladas desembarcadas Santo Antão é ultrapassada por Santiago e São

Vicente, ocupando o 3º lugar a nível nacional, representando um total de 15%. 39 Dados do Plano de Desenvolvimento de Santo Antão 1998-2001

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Santo Antão enfrenta grandes dificuldades no que toca a conserva e comercialização do

pescado. A ilha carece de instalações com câmaras de frio, máquinas de produção de gelo.

Nas comunidades onde existem essas condições, ainda existe uma certa resistência dos

pescadores em utilizar o gelo. Muitas vezes recorrem a métodos de secagem e salga ainda

muito tradicional.

A comercialização é muito irregular. Ela é feita essencialmente por peixeiras e rabidantes40

de compram em maior quantidade e em veículos fazem a distribuição por diferentes

comunidades, porem muitas zonas no interior não tem acesso a esse bem, devido ao

isolamento.

Segundo os dados disponíveis41, os recursos pesqueiros da Ilha estão ainda longe de serem

considerados sobre-explorados, isso devido a diversos factores como:

Condições naturais adversas que imprimem o sector um carácter vincadamente

sazonal;

Falta de infra-estruturas portuárias que impossibilitam o aproveitamento por parte dos

operadores dos incentivos governamentais para a introdução de embarcações

melhoradas;

Escassez de serviços complementares em muitas comunidades;

Fraca capacidade de investimentos dos operadores;

Problemas ligados a educação/formação básica (como por exemplo a utilização de

dinamite por parte de pequenos operadores de pesca artesanal, que é uma grande

ameaça ao ambiente marinho.

h) TRANSPORTE

As características da ilha, isto é, o seu carácter montanhoso, condiciona e muito o processo de

infra-estruturação da mesma. O que faz com que a construção civil seja, um sector ainda com

grandes problemas.

40 Vendedeiras ambulantes, principalmente do comercio informal. 41 Boletim estatístico da INDP, ano 2002

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As características geomorfologicas atrás descritas, pouco favorece a mobilidade de pessoas e

bens, tanto no interior como no intercâmbio com o exterior. Têm sido um grande obstáculo a

implementação de vias de acesso terrestre. Pelo que, a ilha ainda possuía muitas zonas

encravadas, de difíceis acessos. Caracterizada ainda pelo forte predomínio de caminhos

carroçáveis, que na sua maioria fica bloqueada ao tráfego por ocasião das cheias, a ilha possui

ainda uma rede de estradas pavimentadas. As estradas de penetração em todos os pontos da

ilha, são normalmente investimentos de grande capital. E os que já existem enfrentam ainda o

problema de manutenção e conservação da rede, uma vez que são na maioria estradas de

montanhas sujeitas a intensa acção erosiva.

No que toca aos transportes marítimos, é de referir o Cais acostável de Porto Novo, que

actualmente, é a porta de entrada e saída da ilha, quer de passageiros, quer de cargas. O Cais

pode receber navegação de longo curso até 5000 tdw.42 É uma infra-estrutura que ainda não

dispõe de um terminal de passageiro, nem de um parque para contentores. Dada a grande

importância na vida da ilha, esse cais já é insuficiente pelo movimento diário. A par disso,

encontramos ao longo da costa da ilha, pequenos desembarcadouros, que só dão acesso a

lanchas ou botes com dimensões não superior a 10 metros43, ocupados na faina da pesca.

Relativamente a via aérea, actualmente a ilha não tem cobertura de transporte aéreo. Possuía

unicamente um aeródromo com uma pista de 650 m de comprimentos, onde só podia aterrar

aviões de pequeno porte (20 passageiros).44 As ligações aéreas iniciaram em 1982 e desde o

ano 2000, esse aeródromo não recebe aviões.

i) INDÚSTRIA

No sector da indústria enquadra na maioria micro-empresas. Concentram-se essencialmente

na produção de pozolana, rações para animais, transformação agro-alimentar (queijo, doçaria)

e alguns produtores de aguardente e licores.

42 Plano de Desenvolvimento de Santo Antão 1998/2000 Tomo I, pg. 178 43 Idem, pg. 182 44 Idem, pg. 185

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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Estudos feitos45 mostraram que as reservas de pozolana eram estimadas em 10 milhões de

toneladas, isso no concelho do Porto Novo. A ilha já possui uma fábrica de cimento que

aproveita a pozolana.

Aguardente e derivados, embora em alguns casos já é produzido de modo industrial, muitos

produtores recorrem a processos empíricos. Isso faz com que a qualidade seja variada e os

preços diferentes de produtor para produtor, agravado pelo concorrente aguardente de açúcar.

Uma das grandes dificuldades na comercialização é a questão de embalagem. O melhor

mercado de escoamento do produto é São Vicente, mas não se sabe, ao certo, qual é o destino

a partir dessa ilha. Sabe-se que a exportação para o exterior pode ser um mercado de forte

potencial mas, para isso, é preciso cumprir requisitos na qualidade da aguardente, sendo essa

uma grande lacuna na produção da mesma.

O artesanato é um sector de potencial desenvolvimento. As principais matérias-primas

utilizadas são: o barro, madeira, caniço, linho, coco, entre outros. As actividades ligadas a

carpintaria/marcenaria, à cestaria e corte e costura são as mais relevantes na ilha.

O ambiente reinante não é muito favorável ao desenvolvimento industrial, uma vez que a

capacidade empresarial e o nível de qualificação são francamente diminutos. O extracto

seguinte descreve o panorama empresarial da ilha:

“Em Santo Antão a actividade empresarial é ainda muito rudimentar e pouco

diversificada como atesta o IIº recenseamento empresarial realizado pelo INE. Em

2002, o tecido empresarial de Santo Antão era construído por 484 empresas, que

empregavam 835 pessoas, com a facturação anual de cerca de 1 milhão e setecentos

mil contos, e tinha gastos anuais com o pessoal da ordem dos 72 mil contos. Dito de

outro modo, Santo Antão detém cerca de 9 em cada 100 empresas nacionais, apenas

3% do pessoal empregado e apenas 2% do volume de negócios. Em santo Antão,

como aliás ocorre no resto de Cabo Verde, o comércio é o sector de concentração da

actividade empresarial. Cerca de 71 de cada 100 unidades empresariais da ilha

dedicam-se ao comércio, com 56% do emprego, e 60% das despesas com o pessoal e

45 Plano de Desenvolvimento de Santo Antão 1998/2000 Tomo I, pg. 185

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

55

cerca de 83% do volume de negócios. Os restaurantes, estabelecimentos de bebidas e

caninas constituem um outro ramo de actividade com certa visibilidade, pois nela

laboram 71 empresas, com 119 empregados e uma facturação de cerca de 32 mil

contos ano.”46

A pequena industria, sobretudo a transformação agro-alimentar, é um sector que começa a dar

os primeiros passos.

j) TURISMO

A beleza natural, a diversidade paisagística, as montanhas, gozo de uma natureza menos

poluída a riqueza do património cultural, a genuinidade da gastronomia, da qualidade da sua

aguardente, a disponibilidade de áreas com baixa densidade de população, são referenciadas

com atractivo fundamental da ilha.47

Ilha de Santo Antão apresenta uma identidade especial sobretudo pela sua ruralidade. É

conhecida por ilha das montanhas, pois, morfologicamente a ilha estrutura-se a partir de uma

grande dorsal central que a percorre de este a oeste com altitudes superiores aos 1.000 m,

situando-se a maior cota no Topo de Coroa com 1.979m. o seu maior fascínio encontra-se na

imponência das sua montanhas e das suas falésias, que caem sobre o mar. A paisagem

íngreme, contrastando áreas verdes com regiões absolutamente secas, tem sido um forte

atractivo para os visitantes.

“Na grandiosidade das montanhas, no serpentear das profundas ribeiras, no maravilhoso

jogo de cores da própria terra, esteja ela seca e nua, ou coberta de vegetação no pós

chuvas, nossos olhos descobrem sempre algo estonteante em cada curva das

surpreendentes estradas, em cada miradouro natural, cada paragem para observar o que

nos rodeia.”48

46 Tavares, Francisco, Santo Antão, entre o presente e o futuro in Revista Iniciativa nº13, 2006 p54. (Tavares era na altura presidente da INE) 47 Plano de Desenvolvimento de Santo Antão – 1998-2001, pg.172. 48 Oliveira, José, “ Uma visão sobre o turismo na Ribeira Grande”, Painel apresentado na Mesa Redonda sobre o Desenvolvimento de Santo Antão, Janeiro de 2008, Ribeira Grande (policopiado.)

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

56

Junto com essa característica rural, a ilha apresenta uma riqueza enorme em lendas e estórias

que marcam profundamente o imaginário do santantonense, que veio passando de geração

após geração, nas longas conversas de boca de alambique, nas suadas jornadas de enxada ou

nas intermináveis travessias nocturnas a caminho do campo de cultivo no sequeiro. Essa

riqueza em conhecimentos orais constitui um património verdadeiramente atractivo.

Oliveira49, José defende que a vertente rural é a maior oferta da ilha, mas acrescenta que pode

ser acrescentado a vertente sol e mar, isto é complementar com o turismo náutico.

O mesmo acrescenta que a ilha possui capacidade para desenvolver a pesca desportiva e uma

prática piscatória que tem por finalidade apenas o desporto e/ou lazer. As excursões náuticas

são uma das principais e melhores formas para descobrir a beleza das costas marítimas, para

se deleitar com festas a bordo de embarcações, para apreciar tranquilamente a natureza a

bordo de um navio a vela ou ainda um sem número de modalidades de passeio turístico

concebido para o lazer no alto mar.

O desencravamento de algumas localidades, através de construção de vias de penetração e da

melhoria dos caminhos vicinais, tem sido factores importantes no desenvolvimento do

turismo. Todavia a dinâmica deste sector esta dependente do desenvolvimento do sector dos

transportes, em que a construção do aeroporto é fundamental para a diversificação da

actividade económica ao permitir a ligação aérea directa com as outras ilhas.

Em termos de oferta de alojamento turístico e 2004 Santo Antão contava com 310 camas,

distribuídas por 215 quartos em 17 estabelecimentos de alojamento turísticas.

Quadro 11 – Disponibilidade de camas por estabelecimento

Camas disponíveis segundo o tipo de estabelecimento por Ilha

Hotéis Pensões Pousadas Hotéis

Apartamentos

Aldeamentos

Turísticos

Residenciais Total

Ilha Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %

CV 5.953 100 712 100 153 100 363 100 1.009 100 638 100 8.828 100

SA 78 1 145 20 0 0 0 87 14 310 4

Fonte: INE – 2005

49 Empresário da área de Turismo.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

57

Quadro 12 – Disponibilidade de Quartos por estabelecimento

Quartos disponíveis segundo o tipo de estabelecimento por Ilha

Hotéis Pensões Pousadas Hotéis

Apartamentos

Aldeamentos

Turísticos

Residenciais Total

Ilha Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %

CV 3.049 100 500 100 89 100 222 100 561 100 415 100 4.836 100

SA 46 2 105 21 0 0 0 64 15 215 4

Fonte: INE - 2005

k) BANCA E SEGUROS

No que toca ao, o sector da banca e dos seguros, Santo Antão, tal como todo o Cabo Verde,

até 199150 contava apenas com três instituições, o Banco de Cabo Verde, a Caixa Económica

de Cabo Verde (CECV) e o Instituto de Seguros e Previdência Social, a partir desta data, a

diversificação, especialização e privatização de algumas instituições financeiras foi outro dos

passos para a criação de um sistema financeiro regulado pelo banco central – Banco de Cabo

Verde (BCV), mas também pelo mercado.

O sistema financeiro cabo-verdiano comporta actualmente as seguintes entidades bancárias:

um banco central, o Banco de Cabo Verde, o Banco Comercial do Atlântico (BCA) o Banco

Interatlântico, a Caixa Económica de Cabo Verde, o Banco Cabo-verdiano de Negocios e o

Banco Africano de Investimentos Cabo Verde. Em 1997, foi criado um banco “off-shore”,

com a designação de Banco Insular (IFI), Sarl. Presentes na ilha só o Banco Comercial do

Atlântico, com duas agências, uma em Ribeira Grande e outra no Porto Novo; a Caixa

Económica de Cabo Verde, com duas agencias em Ribeira Grande e Porto Novo e dois

balcões em Coculi e Paul e o Banco Cabo-verdiano de Negócios também com duas agencias,

tal como os outros bancos nos dois concelhos e um balcão em Ponta do Sol.

No que toca aos seguros, até 197851 actuavam no País pequenas representações de

companhias portuguesas. Após essa data, o exercício da actividade seguradora passou a

constituir reserva exclusiva do Estado, tendo sido para o feito criado o Instituto de Seguros e

Previdência Social. Em 1990, procedeu-se à reforma do quadro institucional da actividade

50 Grassi, (2003:140) 51 Idem

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seguradora, criando-se assim condições para a emergência de companhias de seguros

privadas. Em Santo Antão as pessoas contam com os serviços do Instituto Nacional de

Previdência Social, da seguradora Garantia e da seguradora Impar, que são os que existem no

país e são supervisionadas pelo Instituto de Seguros de Cabo Verde.

l) ORGANIZAÇÃO POLÍTICA E ADMINISTRATIVA DA ILHA

A Ilha, segundo reza a tradição oral – já que os arquivos são inexistentes e as poucas

informações disponíveis são por vezes contraditórias – teria sido descoberta a 17 de Janeiro

de 1462, por Diogo Afonso.

Os primeiros passos da organização administrativa e judicial da Ilha – confirmação de juízes,

nomeação de ouvidores, designação de oficiais de Câmaras – poderão ter-se iniciados no ano

de 1593 (17 de Outubro, pela doação da Ilha ao Conde da Orta, D. Francisco de Mascarenhas,

com o título de Conde de Santa Cruz, que funda a povoação de Santa Cruz. Hoje denominada

Vila da Ribeira Grande, foi a primeira sede do Concelho de Santo Antão e mais tarde do de

Ribeira Grande52.

No entanto, só em 1731, por decreto de 30 de Agosto, foi criado pela primeira vez o Concelho

de Santo Antão, com sede na “Povoação de Santa Cruz”.

A primeira divisão concelhia da Ilha acontece com o decreto de 3 de Abril de 1867, com a

criação de dois concelhos, com sede respectivamente na Vila da Ribeira Grande, que mais

tarde foi transferida para Vila Dona Maria Pia, e na Povoação das Pombas do Paúl. A actual

divisão da Ilha em três concelhos fica concluída a 2 de Setembro de 1962, com a criação do

Concelho do Porto Novo nessa data.

Então Santo Antão passa a contar com três concelhos (figura 3) e sete freguesias,

nomeadamente, Nossa Senhora do Rosário, Nossa Senhora do Livramento, Santo Crucifixo e

São Pedro Apostolo, no Concelho de Ribeira Grande, ocupando 166,7 km2 em extensão,

equivalente a 21% do território, Santo António das Pombas no Concelho do Paul, com 54,3

km2 em extensão, igual a 7 % do território, e São João baptista e Santo André no Concelho do

52 Descrição retirada em www.gov.cv/cmrg.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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Porto Novo, o maior em termos de extensão, com 558 km2, ocupando 72% do território da

ilha.

Figura 3 – Divisão da ilha de Santo Antão por concelhos

Hoje os três concelhos contam com Câmaras Municipais e Assembleias Municipais eleitas

desde 1991, altura em que, foram realizadas as primeiras eleições autárquicas. A partir dessa

data as autarquias passaram a ser instituições autónomas do poder central. E no sentido de

maior descentralização das suas funções, as diferentes câmaras foram criando nas diversas

localidades Delegações Municipais, onde os munícipes podem usufruir de serviços sem terem

de deslocar a sede do concelho.

A ilha conta com as seguintes delegações municipais:

Ribeira Grande53

Vila da Ribeira Grande

Ponta do Sol

Coculi

Chã d’Igreja

53 As Delegações Municipais do Concelho de Ribeira Grande situam nas sedes das freguesias.

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60

Paul

Pontinha de Janela

Janela

Cabo de Ribeira

Pico da Cruz

Porto Novo

Lombo de Figueira

Ribeira das Patas

Alto Mira

Tarrafal de Monte Trigo

Ribeira da Cruz

Chã de Morte

Com o objectivo geral de promoção, defesa, dignificação e representação do Poder Local, foi

criada a Associação dos Municípios de Santo Antão (AMSA) em 1994. É composta pelos

seguintes membros: Assembleia Intermunicipal, Concelho Directivos e o Presidente da

Associação. A AMSA tem sobre a sua tutela o Gabinete Técnico Intermunicipal (GTI) que é

uma estrutura técnica de planeamento e desenvolvimento regional onde o grande objectivo é

realização de estudos e projectos de incidência económica e social bem como

acompanhamento da sua execução.54

O governo encontra-se representado na Ilha através dos Serviços Desconcentrados do Estado,

constituídos por delegações e repartições nos concelhos que representam os diferentes

ministérios e os institutos nacionais.

54 II Plano de Desenvolvimento de Santo Antão 1998/2000 Tomo I pag. 193 e I Plano de Desenvolvimento de Santo Antão 1994/1997 Tomo I, pag. 151

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

61

m) POBREZA

A pobreza em Cabo Verde é de natureza fundamentalmente estrutural. As razões profundas

da pobreza estão enraizadas nos desequilíbrios estruturais que encontram uma explicação

primeira na fraqueza da base de recursos exploráveis e aos quais não se pôde dar resposta

adequada ao longo da história.

Santo Antão é, até agora, considerada a ilha mais pobre do arquipélago. Sendo uma ilha

essencialmente agrícola, a pobreza é também mais rural, onde a dependência da agricultura é

maior.

Segundo o IDRF 2001/0255, o rendimento das famílias de Santo Antão provém, sobretudo do

trabalho (60%), sendo que as remessas dos emigrantes representam 6%, as pensões apenas 5%

e as receitas de propriedades ou empresas apenas 4%. A origem dos rendimentos, aliado ao

nível de desemprego, ao nível de qualificação e aos baixos níveis de salário, explicam, em boa

parte, o nível de pobreza da ilha.

Quadro 13 – Indicadores de pobreza

Ilha/

Concelho

Indicadores da pobreza

Pobres Incidência Peso %

Cabo Verde 172.727 36,7% 100

Santo Antão 27.414 54,2% 15,9

Fonte: Perfil da Pobreza IDRF 2001/02 – INE

Segundo a cartografia da pobreza, em 2001/02, cerca de 54% da população de Santo Antão

era pobre, ou seja vivia com menos de 43.250 escudos por ano. A incidência da pobreza em

Santo Antão está cerca de 17 pontos percentuais acima da média nacional que é de 37%.

Santo Antão é a ilha com maior incidência, mas também com maior profundidade, da pobreza

de Cabo Verde. Nessa ilha, os pobres têm um nível de consumo cerca de 22% abaixo da linha

de pobreza, ou seja, em media, cerca de 9600 escudos abaixo da linha da pobreza, e tem,

assim, um nível de consume médio anual de 33576 escudos. Santo Antão é uma das ilhas com

55 Cartografia da Pobreza, IDRF 2001/02 - INE

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

62

maiores níveis de desigualdade (Índice de Gini = 0,48), porem suplantado por São Vicente e

Santiago, que detém o recorde a nível nacional (0,53). A nível nacional é de 0,57%

O alto índice de desemprego configura-se como a causa principal da pobreza. A taxa de

desemprego é naturalmente superior para os pobres. Em Cabo Verde, para o conjunto da

população, segundo o IDRF, a taxa de desemprego habitual era de 22%, para os pobres, essa

taxa era de 33%, o dobro da verificada para os não pobres, 16%. E Santo Antão apresenta

como a mais pobre uma vez que a sua taxa de desemprego (20,4%) é superior a media

nacional (17,8%)56

Santo Antão não foge a regra, segundo o documento quadro da PNLP57, situação da ocupação

das pessoas é motivo de preocupação, com o desemprego a atingir taxas elevadas (28% para

os homens e 36% para as mulheres). Boa parte dos trabalhadores rurais depende das FAIMO

para a obtenção de um rendimento mínimo.

No que toca a distribuição de riquezas, o mesmo documento diz que:

“As causas da pobreza não diferem substancialmente das apresentadas para o conjunto

nacional. Contudo, algumas causas específicas podem ser observadas em Santo Antão.

Se a desigualdade na distribuição dos rendimentos não parece constituir em Cabo

Verde um factor explicativo da pobreza, o mesmo já não se pode afirmar em relação à

ilha de Santo Antão, que apresenta uma forte concentração da riqueza, com o índice de

Gini58 a atingir os 0.5. Enfim, a riqueza é distribuída com menor igualdade do que nas

outras ilhas. O deficiente acesso à terra e à água é também um factor explicativo da

pobreza. O problema do isolamento das comunidades pobres põe-se com acuidade

devido à orografia particularmente montanhosa da ilha.”59

56 Inquérito ao emprego 2008 (IEFP e INE) em www.iefp.cv/ www.inw.cv 57 Documento quadro do PNLP 58 O índice de Gini de concentração de rendimentos é utilizado para informar sobre a distribuição do rendimento no interior dos grupos sociais. Varia entre 0 (igual distribuição) e 1 (a maior desigualdade possível) 59 Documento Quadro do PNLP, pg.9.

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CAPÍTULO 3 – ACD’S: UM CONCEITO PARA ESTE TRABALHO

Depois vimos que a população daquela zona estava abandonada, e

podemos dizer muito bem, que onde não há associação não

há luz, pelo que pegamos nela com mais força. (ent. 1)

3.1 - Organizações da Sociedade Civil: as ACD’s

O associativismo constitui uma das mais importantes formas de organização social e um

instrumento privilegiado para a satisfação das necessidades do ser humano, nas suas mais

diversas manifestações sociais, educativas, políticas, culturais e económicas. Ele acredita que

todos devem ter a oportunidade de participar, dando a sua contribuição de acordo com a sua

capacidade intelectual e/ou física.

Como já foi referido, em Cabo Verde, o associativismo tem suas raízes nas formas

tradicionais de solidariedade social, que apesar de existirem antes, ganham maior expressão

com a independência do país. Contudo, tal como estamos a vê-lo hoje, pode-se dizer que

começaram a aparecer, a partir de 1987, com a publicação da Lei nº 28/III/87 que marcou o

início de todo o processo de organização da sociedade civil nos tempos modernos.

A constituição de associações sem fins lucrativas é regida em Cabo Verde pela lei

nº25/VI/2003, de 21 de Junho. A livre vontade de associar é um direito que a Constituição da

República garante a todos os cabo-verdianos, através do seu artigo 51º (liberdade de

associação)

“1- É livre, não carecendo de qualquer autorização administrativa, a constituição de

associações.

2 – As associações prosseguem os seus fins livremente e sem interferências das

autoridades.”

A partir dos anos noventa, a sociedade civil cabo-verdiana tem demonstrado um grande

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dinamismo, motivado pela necessidade de, com a participação das populações, promover e

construir uma vida melhor para todos. Desde então, as Organizações da Sociedade Civil

(OSC) cabo-verdianas, com particular destaque para Associações Comunitárias de

Desenvolvimento (ACD’s), têm intensificado acções em busca de respostas para a resolução

dos seus problemas, com recursos próprios e mobilizados, junto de Instituições Públicas e

Privadas, tanto dentro como fora do País.

Segundo a Plataforma das ONG’s, nos últimos anos, o foco do associativismo passou a ser

precisamente as comunidade locais, tendo por objectivo confesso a luta contra a pobreza e

pela integração social a todos os níveis e a promoção da cultura, do desporto, da área social,

da infra-estruturação, entre outros, substituindo, em muitos casos, o papel do próprio Estado,

seja ele Governo ou Câmara Municipal.60

Esse dinamismo reflecte numa grande proliferação de organizações de diversas naturezas. De

acordo com um outro documento,61 existe hoje no país mais de duas dezenas de ONG’s e

cerca de 600 outras categorias de OSC’s, sob forma de associações comunitárias,

organizações socioprofissionais, ligas, fundações, redes cooperativas, mutualidades e grupos,

entre outros.

Segundo Ramiro Azevedo verificou uma explosão de movimentos participativos na maioria

dos países em desenvolvimento, por um lado, devido ao facto de as associações terem

convencido os governos do valor da participação dos grupos comunitários e, por outro lado,

os doadores igualmente desencorajados pelos maus resultados da ajuda pública em geral

utilizam cada vez mais a rede das ONG’s para distribuir fundos. (Azevedo: 2002: 232)

O guia62 produzido em Cabo Verde para orientar as actividades das associações, define

associação como: “(…) uma organização de pessoas com interesses comuns a defender e que

visa alcançar determinados objectivos sociais, económicos e culturais, com total respeito pela

lei vigente n país e pelas normas e regras do seu funcionamento.”

A nosso ver, principalmente as associações comunitárias, são uniões de pessoas ligadas de

60 Caminhar, Boletim Informativo da Plataforma das ONG’s, nº 15, Novembro de 2005, pg.1 61 Guia das ONG’s de Cabo Verde. Pg.9 62 Guia de Orientação Operacional para os Membros das Associações Comunitárias, produzido pelo Ministério da Agricultura Silvicultura e Pecuária.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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forma duradoura para um fim determinado que prosseguem em comunidade. Normalmente os

fins das associações estão bem clarificados nos seus estatutos.63

ACD’s São enquadradas dentro do grupo de associações de primeiro grau, ou seja,

organizações que tem como membros, cidadãos na base do voluntarido. Entretanto

encontram-se organizadas em estruturas assoxiativas de grau superior, como a OADISA.

Por que se cria uma associação?

Defender os interesses dos seus membros (agricultores, criadores, etc.);

Fazer ouvir os desejos e anseios dos moradores da zona ou ribeira;

Promover o desenvolvimento sócio económico da zona ou ribeira, promovendo

ideias ou projectos alternativos;

Promover a integração da mulher em todas as actividades sociais, económicas e

culturais;

Apoiar os mais carenciados;

Proporcionar a criação de postos de trabalho para os seus membros e não só;

Criar espaço de diálogo e circulação de informação na comunidade;

Impulsionar a formação profissional dos jovens (rapazes e raparigas);

Influenciar o aparecimento de pequenos empresários rurais;

Incentivar a formação e educação dos seus membros.

Fonte: Guia de Orientação Operacional para os Membros das Associações Comunitárias

O conceito - ACD

Em primeiro lugar cabe tentar definir, do ponto de vista conceptual, a identidade de uma

Associação Comunitária de Desenvolvimento – ACD. Trata-se de uma organização da

sociedade civil não governamental, independente do Estado e dos poderes político partidários.

63 Estatuto é o documento que todas as associações possuem, que estabelece um conjunto de princípios e normas de funcionamento de uma associação. A par do estatuto as mesmas possuem o regulamento interno que é o diploma que regulamenta determinadas situações dando maiores pormenores que os estatutos, permitindo um bom relacionamento entre os sócios. (podemos ver isso mais a frente no ponto dedicado a analise das associações).

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

66

Por princípio, a sua estrutura organizativa deve ser flexível, dinâmica e pouco hierarquizada.

São organizações sem fins lucrativos, autónomas com uma forte componente de voluntariado,

viradas para o desenvolvimento de projectos juntos das comunidades em que se inserem.

As ACD’s abrangem diversas áreas de actuação, nomeadamente: desenvolvimento

sustentável; desenvolvimento comunitário e/ou local; capacitação; micro-crédito;

desenvolvimento rural; segurança alimentar; saúde; educação, saneamento básico e melhoria

ou reabilitação de habitat; cooperação descentralizada; género; ambiente e desenvolvimento;

participação e cidadania; entre outras.

A grande maioria das ACD’s tem como principais objectivos: a redução da pobreza e

exclusão social, através de implementação de acções de desenvolvimento e de promoção das

populações pobres e muito pobres.

“A luta conta a pobreza e a exclusão social constitui um dos maiores desafios das

organizações da sociedade civil cabo-verdiana, que estão, mais do que nunca,

engajados no reforço da sua acção em todos os cantos do país, com vista a consolidar a

sua experiência de décadas em prol do desenvolvimento comunitário e da melhoria das

condições de vida dos cabo-verdianos.”64

Actualmente as áreas de intervenção são bastante diversificadas e o grande trunfo das ACD é

a sua metodologia de intervenção junto das comunidades locais e a sua consciência quanto a

necessidade de unir esforços para atingir os objectivo comuns.

3.2 - As ACD’s em Santo Antão

Tal como o resto do país, Santo Antão nos últimos anos verificou uma grande dinâmica de

associações, mas como já foi referido, as suas raízes estão no período a seguir a

independência.

Segundo o plano estratégico da OADISA65, em S. Antão, o movimento associativo terá

64 Dinâmica, Folha Informativa da Plataforma das ONG’s, nº 14. Série II, Julho de 2005. (Editorial) 65 OADISA, Plano Estratégico 2007-2011

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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surgido no segundo quinquénio da década de oitenta logo após a publicação da lei nº

28/III/87, que regula o estatuto geral das associações, em que emergiram algumas

Associações de Agricultores com o objectivo específico de travar o alastramento da

aguardente de açúcar. Essas Associações não tiveram o devido enquadramento e suporte

necessários ao seu desenvolvimento e acabaram por resumir as suas actividades.

A década de noventa surgiu como uma nova era para o associativismo, motivada,

essencialmente, pelas oportunidades de financiamentos. Porem outros factores, estiveram na

origem desse movimento, como por exemplo a exploração de furos, melhoria na gestão de

água de rega, abastecimento das comunidades, enfim uma série de actividades norteadoras do

surgimento de associações.

No sentido de unirem-se as suas forças, doze associações da ilha constituíram a Organização

das Associações de Desenvolvimento Integrado de Santo Antão – OADISA, em Janeiro de

2000. Hoje a Organização conta com cerca de 50 associações filiadas. A OADISA representa

as associações junto de diferentes parceiros como o Governo de Cabo Verde através dos

Ministérios do Ambiente e Agricultura, das Infraestruturas, Transporte e Mar e da Fundação

Cabo-verdiana de Solidariedade, com a ACDI – VOCA, Plataforma das ONG’S e CRP de

Santo Antão. E a nível internacional, com a ACEP – Associação de cooperação entre os

povos, com sede em Lisboa, o IPALA, com sede em Espanha e com o IPAD – Instituto de

Apoio ao Desenvolvimento da União Europeia.

A OADISA é uma organização de cobertura da ilha, mas recentemente, em 2007 surgiu uma

outra organização da mesma natureza, a FADEP - Federação das Associações de

Desenvolvimento de Porto Novo, com a finalidade de representar todas as associações do

Concelho de Porto Novo.

A OADISA e a FADEP66 são as organizações, que representam as associações da ilha. Essas

associações têm desenvolvido as suas actividades com apoio de vários projectos e programas

específicos e direccionadas para as suas áreas de intervenção.

66 Segundo o Guia (2000: 6), OADISA é uma associação de primeiro grau (uniões e organizações, possuem sócios) e FADEP é uma associação de terceiro grau (federações possuem delegados). As associações de primeiro grau (as ACD’s) normalmente criam organizações de segundo grau para prestação de determinados serviços.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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O Programa Nacional de Luta Contra a Pobreza (PNLP) é um dos principais programas

que trabalha junto das ACD’s em Santo Antão. Integra-se no Plano Nacional de

Desenvolvimento, bem como nos planos de desenvolvimento regionais e municipais e tem por

finalidade permitir uma intervenção focalizada nas camadas mais pobres da população.

O PNLP inscreve-se nos esforços do Governo de Cabo Verde na busca constante da melhoria

sustentável das condições de vida das populações mais pobres e vulneráveis do país, cuja

caracterização e perfil foram definidos através da informação do Inquérito ás Receitas e

Despesas das Famílias realizado em 1988/89.

O Programa assenta nos seguintes princípios orientadores:

1) Reduzir a pobreza de forma durável e sustentável;

2) Combater a pobreza no quadro descentralizado; e

3) Promover a participação e a coordenação de esforços.

A complexidade do Programa é traduzida pelo número e âmbito de sub-programas que o

compõem, nomeadamente:

• Sub-Programa 1: Integração dos grupos pobres na economia;

• Sub-Programa 2: Melhoria do acesso social dos grupos pobres da população;

• Sub-Programa 3: Melhoria social;

• Sub-Programa 4: Reforço da capacidade institucional.

O PNLP tem como objectivo promover a redução sustentada e durável da pobreza no país,

fixando-se como objectivos específicos os seguintes:

a) Promover a integração dos grupos pobres da população no processo de desenvolvimento;

b) Melhorar os indicadores sociais dos pobres;

c) Reforçar a capacidade institucional de planificação, coordenação e seguimento de

actividades de luta contra a pobreza.

O PNLP pretende focalizar a sua actuação na camada da população que vive abaixo do limiar

da pobreza, com prioridade para os seguintes grupos alvos, os quais se interpenetram:

Mulheres, sobretudo as mulheres chefes de família

Desempregados e, particularmente os jovens desempregados

Grupos em situação de vulnerabilidade

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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Trabalhadores das FAIMO.

No quadro do Programa Nacional de Luta Contra a Pobreza participa um importante leque de

intervenientes, quer a nível de financiamento do Programa, quer a nível de coordenação,

gestão e execução do mesmo.

Para implementar o PNLP, o Governo de Cabo Verde obteve apoio financeiro de várias

instituições credoras e doadores, entre as quais, a Associação Internacional para o

Desenvolvimento (IDA), o Fundo Internacional para o Desenvolvimento Agrícola (FIDA), o

Banco Africano de Desenvolvimento (BAD), o PNUD e a Cooperação Austríaca.

O PNLP agregou três programas/projectos:

Projecto de Desenvolvimento do Sector Social (PDSS). Orçado em 18,1 milhões USD, 90%

do montante do projecto era financiado pelo IDA e 10% pelo Governo de Cabo Verde. Esse

projecto tinha duração de 4 anos (2000-2004) e era de âmbito nacional.

Programa de Luta Contra a pobreza no Meio Rural (PLPR). O PLPR67, por sua vez, foi

orçado em 18,335 milhões USD, 50% financiado pelo FIDA; 36% Governo e 14%

beneficiários do programa. Pensado para um período de 9 anos (2000-2009) e para cobrir a as

ilhas de Santo Antão (Paul, Porto Novo e Ribeira Grande), São Nicolau, Fogo, Brava e

Santiago (São Miguel e Tarrafal).

As actividades do Programa Nacional de Luta contra a Pobreza no Meio Rural (PLPR)

tiveram o seu início em Santo Antão a partir de 2001, embora todo o Programa foi aprovado e

lançado a nível nacional durante o ano 2000.

Projecto de Promoção Socio-económica de Grupos Desfavorecidos (PSGD) No valor de

781 milhões ECV, o projecto tinha como principal financiador o BAD (90%) e 10% Governo

de Cabo Verde. Para um período de 5 anos (2000-2005) e destinado as ilhas de Santo Antão,

São Vicente e Santiago.

Ao que se pode ver, a ilha de Santo Antão foi abrangido por todos esses programas/projectos,

67 O programa PNLP, na sua variante PLPR é um modelo inspirado na metodologia LEADER (da União Europeia), que se adoptou para Cabo Verde depois de algumas adaptações.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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isso para fazer face a elevada taxa de pobreza que caracteriza a mesma.

O PNLP tem nas ACD’s os seus principais parceiros uma vez que consideram que o combate

eficaz à pobreza está, pois, em grande parte ligada à descentralização, enquanto processo

estimulador da participação dos cidadãos na vida política, económica, social e cultural, sendo

que, é crucial o envolvimento e responsabilização das estruturas municipais e locais, das

organizações não governamentais e comunitárias e das próprias populações, através do

estabelecimento de relações de parceria.

O PNLP no seu documento quadro, afirma que:

“Uma vez que a pobreza se manifesta a nível das famílias e das comunidades locais, a

mobilização social das populações pobres à volta do Programa deve fazer-se no local,

em função das especificidades de cada comunidade. Os objectivos procurados

consistem em, através do desenvolvimento de metodologias participativas, criar uma

capacidade local endógena, por forma a que os grupos pobres participem na

identificação e resolução dos seus próprios problemas, enfim, assumam o processo de

melhoria das suas condições de vida, em rotura com a mentalidade assistencialista e de

dependência em relação ao Estado-Providência. As medidas consideradas no âmbito

do PNLP devem: Reforçar, a capacidade da comunidade para que as populações

participem em todas as etapas, desde à identificação à execução e gestão das

actividades, mas também, que assegurem a sua perenidade. Para além do reforço da

qualificação técnica, é preciso investir no reforço da capacidade organizacional. A

organização comunitária constitui, neste sentido, a forma mais adequada de

influenciação na definição, gestão e implementação das actividades e de criação de

uma capacidade de diálogo junto a instituições exógenas à comunidade mas que

trabalham com ela e, logo, de conciliação das intervenções com as reais necessidades

das populações. A dinamização do associativismo comunitário revela-se, deste modo,

importante.”68

A nível da ilha o PNLP é executado pelo Conselho Regional de Parceiros de Santo Antão, que

é tutelado, a nível nacional pela Unidade de Coordenação do Programa que faz seguimento e

68 Documento quadro do PNLP, pg. 85

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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avaliação da execução das CRP’s. As CRP’s69 são definidas legalmente pela Lei nº

35/VI/2003.

O PNLP chega até as comunidades através da CRP, que assina com as associações contratos-

programas70 para execução de actividades no âmbito desse programa.

A CRP de Santo Antão conta com 98 membros, sendo 71 ACD’s, 19 ONG’s e 8 Serviços

Desconcentrados do Estado, a quando da fundação em 2006 fazia parte 36 ACD’s. E está

neste momento a executar somente o PLPR que já se encontra na sua 3ª fase. Essa 3ª fase foi

lançada no mês de Outubro de 2008, na Cidade da Praia. Nessa fase o programa está

orçamentado em 20 milhões USD, sendo 12 Milhões USD do Governo de Cabo Verde e 8

milhões financiado pelo FIDA.

Tendo em conta a situação socio-económica de Cabo Verde, atrás descrita, nomeadamente, a

vulnerabilidade em termos de habitação condigna, mais concretamente o grande número de

habitações degradadas, sem o mínimo de condições de habitabilidade que atinge sobretudo os

mais desfavorecidos, o Governo a criou o Programa Operação Esperança. É um Programa

do Governo que foi criado para a recuperação e melhoria de habitação própria de muitas

famílias pobres de todo o país, bem como da comunidade emigrada de São Tomé e Príncipe e

Moçambique. Foi criado em 2003 (Despacho 011/2003). É outro programa que trabalha junto

das ACD’s da Ilha.

A Fundação Cabo-verdiana de Solidariedade, com sede na cidade da Praia, é o responsável

pela coordenação de todo o Programa. A Fundação possui um Gabinete da Operação

Esperança, que intervém directamente no sentido de realizar os objectivos do programa e

69 As CRP’s são associações de direito privado, sem fins lucrativos, dotados de personalidade jurídica. Elas são constituídas por diferentes parceiros residentes na sua área de constituição, nomeadamente, representantes das ACD’s, das ONG’s, das Câmaras Municipais, dos Serviços Desconcentrados do Estado e demais parceiros locais. 70 Contratos-programas é o instrumento permite a celebração de contratos, entre o Governo e as Organizações da Sociedade Civil legalmente constituídas para o financiamento de projectos de investimento. A propósito dos contrato- programas, Sangreman (2005:27) afirma que os contratos programas baseiam-se na contratação de grupos ou comunidades organizadas para a realização, mediante condições preestabelecidas, de obras que normalmente eram executadas pelos Ministérios da Agricultura, Alimentação e Ambiente ou pelas Câmaras Municipais. O seu interesse para as comunidades tem a ver com as possibilidades que lhes oferece delas próprias identificarem as actividades prioritárias para as suas localidades e as executarem com benefícios financeiros em função da produtividade que conseguirem obter. Desta maneira, as associações, particularmente as mais dinâmicas, têm arrecadado alguns recursos para o seu próprio funcionamento. Em certas localidades e em determinadas épocas, as associações chegam a ser o único empregador.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

72

trabalha com as associações comunitárias que executam as obras de construção e reabilitação

das habitações.

O papel das associações nesse programa passa por fazer um cuidadoso levantamento das casas

e das necessidades das famílias da sua localidade, elaborar um dossier completo de cada caso,

onde constará todas as informações socio-económicas, com dados relativos a cada família.

Posteriormente envia ao FCS para apreciação e respectiva aprovação. Cabe ainda as

associações, com apoio de técnicos, fazer um orçamento de cada caso, contendo o total do

custo, indicando à intervenção específica a ser feito na casa.

Depois de aprovado, é assinado um Contrato Programa o Ministério das Finanças e

Planeamento, O FCS e as Associações Comunitárias. Após a assinatura do contrato, haverá

um desembolso de 50%. Os restantes 50% serão disponibilizados e mediante a apresentação

de justificativos das despesas realizadas, acompanhadas dos respectivos relatórios financeiros

que será avaliado pelo equipa de acompanhamento.

Alem desses programas já referidos, as ACD’s da ilha trabalham directamente com o Governo

no quadro dos chamados de contratos-programas que assinam com os Ministérios de

Ambiente e Agricultura (MAA) e o Ministério de Infra-estrutura e Transporte (MIT).

Com o MAA, através do Programa de Investimento e do programa de Emergência, as ACD’s

executam obras no domínio de agricultura, captação e construção de novas infra-estruturas de

água para rega conservação de solo e água, floresta. Tendo com objectivo específico o

desenvolvimento rural. Já com o MIT, no domínio de construção de pequenos troços de

estradas, construção e reparação de caminhos vicinais e muros de protecção.

Esses dois ministérios assinam os contratos com a OADISA e a FADEP que depois

disponibiliza para as associações locais desempenharem. De cada projecto executado a

OADISA e FADEP retém 3,5% do montante do financiamento para acompanhar e assessorar

os sócios na área de contabilidade, elaboração de projectos e fiscalização das obras.

Dos vários investimentos do MAA, muitos deles foram financiados pelo programa PL- 480. O

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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PL-48071 (Programa de ajuda alimentar) é um programa cujo objectivo principal é que

promove o desenvolvimento agrícola sustentável e a segurança alimentar financiado pela

agência americana USAID (United States Agency for International Development)72. Durante

dezasseis anos (terminou no final de 2007) esse programa foi implantado pela associação

norte americana, sem fins lucrativos, ACDI/VOCA73 e as agências de desenvolvimento do

Governo de Cabo Verde, trabalharam em conjunto no desenvolvimento do sector agrícola e

mundo rural. Com o objectivo de melhorar a produtividade agrícola e a segurança alimentar, a

nível local as associações e agricultores e produtores eram os principais parceiros.

A ajuda alimentar, fornecida a Cabo Verde é vendida no país e os fundos daí provenientes

foram geridos pela, ACDI/VOCA, que trabalhava em parceria com o Ministério de Ambiente

e Agricultura e com as Associações comunitárias.74

Os projectos financiados por esse programa, chegavam as Associações através de contratos

programas assinados entre ACDI/VOCA, a Direcção Geral de Agricultura Silvicultura e

Pecuária (DGASP) e a OADISA em representação das associações. Esses cobriam áreas como

organização e construção de obras de conservação de solos e água, implementação de técnicas

de agricultura moderna através do sistema gota a gota, organização e sustentabilidade das

associações, micro-crédito e pequenas empresas.

Além do Governo, as Câmaras Municipais da Ilha também trabalham com associações, esses

recorrem as associações para execução das suas obras, como manutenção das estradas e

caminhos vicinais, actividades na área de protecção ambiental, saneamento básico e do meio,

bem como habitação social, entre outros.

Um outro país que tem ajudado as ACD’s na materialização das suas actividades, é a

Dinamarca, através do seu projecto BORNEfonden75, projecto esse dedicado essencialmente

71 Barrett, Christopher B. e Maxwell, Daniel G., (2004) PL480 Food Aid: We Can Do Better in http://www.choicesmagazine.org/index.htm 72 http://www.usaid.gov/ 73 A ACDI/VOCA, uma ONG que promove o crescimento económico e o desenvolvimento da sociedade civil em democracias emergentes e países em desenvolvimento. 74 A Semana online, 27-05-07 75 “Created in 1972, BORNEfonden is a privately operated, Danish-directed sponsorship organization headquartered in Copenhagen, Denmark. BORNEfonden is politically and religiously independent and works in five west African countries – Benin, Togo, Mali, Burkina Faso and Cape Verde – with more than 50,000 sponsored children.” in http://www.bornefonden.dk/

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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ao apoio das crianças. BORNEfonden é uma organização não governamental, sem fins

lucrativos, e sem filiação política ou religiosa, dedicada aos cuidados e desenvolvimento das

crianças mais carenciadas, suas famílias e comunidades, em cinco países da África Ocidental.

Os fundos básicos da organização vêem exclusivamente dos padrinhos da criança

apadrinhada. (BORNEfonden Cabo Verde, 2003).

Sendo as crianças os principais beneficiados, o projecto também contribui também para o

desenvolvimento dos adultos, os trabalhadores, e solicitando a participação das famílias nas

actividades seleccionadas de acordo com as possibilidades das comunidades, contribuindo em

grande parte, para o desenvolvimento sócio-económico local. “BORNEfonden Todas as

crianças apadrinhadas e suas famílias recebem apoio na educação e saúde, e os mais

carenciados são assistidos com materiais para melhoramento das suas condições habitacionais

sendo o apoio na construção de sanitários familiares o mais notório.” (idem)

Em Santo Antão o projecto tem construído muitas habitações, em alguns casos só casas de

banho, em nome das crianças apadrinhadas, o que acaba por beneficiar todo o agregado

familiar, e a comunidade de forma mais abrangente. Outra área de intervenção do projecto é a

educação, com o fornecimento de matérias escolares às crianças, pagamento de propinas e,

subsidiando em muitos casos o transporte escolar e o alojamento em internatos de crianças

das comunidades encravadas.

BORNEfonden ainda presta apoios directos e muitas vezes cede empréstimos (sem juros) às

famílias para incentivo a actividades geradoras de rendimento, no sentido de melhorarem as

suas condições de vida. E hoje, em muitos casos, a forma de chegar as famílias é através das

associações. Também o Projecto, quando quer executar obras procura as associações para os

fazer. Por exemplo, no caso de transporte escolar, e muitos casos é partilhado entre a

Bornefonden, a associação e outros parceiros.

Uma outra área que as ACD’s de Santo Antão, já se encontram a intervir é no domínio da

Micro-finança. A ilha possui uma única associação mutualista a AMUSA.

O mutualismo é também um dos instrumentos de autopromoção de relevante importância na

resolução de vários problemas socio-económicos de Cabo Verde. A semelhança da AMUSA,

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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surgiram no país varias instituições financeiras cooperativas e/ou mutualistas, visando facilitar

o acesso ao crédito de unidades que operam a nível da economia social e que se dedicam a

autopromoção individual ou colectiva dos seus membros.

Importa realçar, que por ser uma área em franca expansão, o Ministério do Trabalho, Família

e Solidariedade, no âmbito das suas actividades de Luta contra Pobreza, Promoção e Inclusão

Social, promoveu iniciativas de normalização do sector das Micro-finanças, tendo em conta a

proliferação das OSC´s e ONG´s operando no sector das Micro-finanças, e em diversas áreas

do mesmo, tais como o Micro-crédito, poupança e crédito e as mutualidades entre outras

tradicionalmente praticadas.76

Em termos de micro-crédito na ilha é possível recorrer a outras instituições e ONG’s que

trabalham com essa vertente, como é o caso da OMCV e a Morabi, organizações

vocacionadas para o trabalho com as mulheres, visando a sua promoção.

Hoje as ACD’s de Santo Antão contam também com parcerias internacionais que os apoiam

na implementação das suas actividades, no campo Desenvolvimento Institucional e

Participação Comunitária como é o caso da ACEP e a IEPALA. Esta parceria é entre ACEP,

as ONG cabo-verdianas OADISA e AMIPAUL e a espanhola IEPALA77, e tem como

objectivo contribuir para o desenvolvimento sustentável de Santo Antão, através de sub-

projectos de reforço das organizações comunitárias e de iniciativas em diversos domínios da

luta contra a pobreza.

Essa parceria prevê um plano de formação, um conjunto de acções no domínio da

comunicação para o desenvolvimento e um leque de micro-iniciativas experimentais de

produção e transformação, não só para o auto-consumo, mas também que permitirão testar

soluções adequadas de valorização de produtos para o mercado e posterior reprodução por

outras organizações da ilha.

76 Página do Ministério do Trabalho Família e Solidariedade Social escrito em 25 de Julho de 2007, recolhido em Agosto de 2008 – sob o título “Assembleia Nacional aprove Lei de Micro-finanças.” 77 Essa parceria passa por actividades com formação, sensibilização, fornecimento de equipamentos para áreas de conservação de pescado, modernização da agricultura com rega localizada, transformação de produtos agro-alimentar.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

76

CAPÍTULO 4 - ANÁLISE DAS ASSOCIAÇÕES

“ (…) a nível de desenvolvimento, com associação podemos atingir um

desenvolvimento mais rápido tendo em conta que envolve

a população. Envolve a população na tomada de

decisões e na execução das obras.” (ent. 24)

4.1 – Caracterização das ACD’s

O ponto de partida para fazer a investigação foram os registos da OADISA e da FADEP,

enquanto organizações chapéus, e da CRP, as três maiores instituições que trabalham

directamente com as ACD’s da ilha. Cada uma dessas têm registos das associações nelas

inscritas, sendo que FADEP tem só do concelho do Porto Novo e as outras duas possuem de

toda a ilha.

Segundo os documentos dessas três organizações, a ilha possui cerca de 80 associações, mas,

de acordo com o nosso objecto de estudo, identificamos como Associação Comunitária de

Desenvolvimento, de interesse para o nosso trabalho 60 associações, as restantes possuem

características muito específicas, como por exemplo, Associações de Agricultores e

Produtores de Agro-indústria, Associações de Produtores e Criadores Gado, Associação de

Pescadores e Peixeiras. As consideradas para a análise, encontram distribuídas da seguinte

forma, por concelho.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

77

Gráfico 3 – ACD’s de Santo Antão

Fonte: Dados da pesquisa de terreno

O concelho de Ribeira Grande é o que apresenta o maior número de associações da ilha, isto

é, 28 equivalente a 46%, seguido de Porto Novo com 19, igual a 32% e, por último, o

concelho do Paul com 13, correspondente a 22% das associações da ilha.

Fazendo uma relação entre a percentagem de ACD’s de cada concelho com a respectiva

percentagem de população, em relação ao todo da ilha, o panorama é o seguinte:

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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Gráfico 4– Comparação da Importância relativa da População e das ACD’s por concelho, em%

Fonte: Dados da pesquisa de terreno

Pode-se dizer que Paul é o concelho onde a percentagem de ACD’s é muito maior que à da

população, com 17% do total da população da ilha, o mesmo concelho possui 22% das

ACD’s, o que nos leva a dizer que há uma maior cobertura de associações em relação a

população. Segue-se Ribeira Grande, onde a percentagem das ACD’s também é superior a

percentagem da população, 47% e 46% respectivamente, porém é uma curta diferença, e

Porto Novo, onde as ACD’s (32%) é muito inferior a percentagem da população (37%) do

total.

O nosso estudo concentra no total de 49 associações, desse conjunto de 60, que apresenta uma

população de 3354 sócios.

Gráfico 5 - Distribuição dos sócios por sexo.

Fonte: Dados da pesquisa de terreno

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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O número de associados aqui apresentados, não espelha na prática a existência de uma

comunidade muito participativa. Questionados se consideram as suas comunidades

participativas, respondem o seguinte:

“Nós o que temos vindo a fazer, a comunidade participa pouco, naquela zona a

comunidade participa pouco.” (ent. 1)

“De forma geral, o pessoal não é muito participativo, embora hoje muito já vêem a

necessidade de ter uma organização, já participam nas assembleias.” (ent.31)

Dessa forma, o pouco engajamento da população local em actividades associativas parece ter

relação directa com a forma como o associativismo local tem sido vivenciado pelos

indivíduos. Ao longo dessa pesquisa, conseguiu-se observar que em algumas comunidades, a

população local olha com uma certa desconfiança a actuação de algumas associações locais,

pois já vivenciaram casos de desvio por parte de certos dirigentes e casos em que alguns

líderes aproveitam destas para se projectar politicamente, em vez de priorizarem a realização

de algum trabalho direccionado para a melhoria das condições de vida das comunidades

locais.

O pouco engajamento deve-se ainda ao facto de, muitos verem associação como um lugar

para resolverem os seus problemas pessoais, ou as vezes como uma simples “agência de

emprego”. Se não vejamos:

“(…) apesar que as pessoas já estavam com essa ideia, mas nem tanto, porque há

pessoas que por mais que explicamos o que é associação, vêem associação como

proveito próprio. Por exemplo ouvimos coisas como «eu pago a minha quota e ainda

não obtive nenhum apoio então devolvem o meu dinheiro» não vêem no colectivo.”

(ent. 34)

“Problema é que associações, é complicado, porque maior parte das pessoas o vêem

como um lugar para ir arranjar um trabalho, hoje estas a trabalhar na associação,

tornas sócio, depois encontras um outro trabalho esqueces, ainda não conseguimos

cultivar a noção de associativismo, boa parte deles vêem com lugar de emprego,

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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então tem surgido casos interessantes. Pessoas vêm pedir algum apoio, ele é sócio,

dás esse apoio e quando resolver o seu problema, nunca mais aparece numa reunião e

muito menos pagar a quota. A maior parte das associações têm esse problema, a não

ser que queiram esconder.” (ent. 17)

Não só as entrevistas nos mostra isso, como se pode constatar em algumas assembleias, que

tivemos oportunidades de assistir, muitos sócios vão com o exclusivo propósito de colocar os

seus problemas pessoais ou do meio que lhe é muito próximo, e acham que os seus problemas

são sempre prioritários.

Dos 3354 sócios, apresentados no gráfico anterior, 1372 são mulheres e 1982 são homens, o

que em termos percentuais representa 41% e 59% respectivamente.

Se em termos percentuais, essa diferença de 19 pontos não é chocante, já no que toca a

diferença de género nos cargos de liderança dos órgãos essa já é muitíssimo evidente. Num

universo de 61 associações da ilha, encontramos seis mulheres presidente de Conselho

Directivo, ou seja, líder de uma associação, sendo três no concelho do Porto Novo, uma no

Paul e duas em Ribeira Grande. As outras mulheres que fazem parte dos órgãos directivos das

associações, ocupam na maioria postos de vogal ou secretária dos órgãos.

Em conversas com essas mulheres lideres, quisemos saber, como é ser mulher a frente de uma

associação, e obtivemos as seguintes respostas:

“É uma entrega total, entregas tanto de ti que se não tiveres vontade desistes. A

família reclama, as pessoas te procuram na rua, em tua casa, tens de ser uma pessoa

sensível, amiga e compreensível acima de tudo, para compreender as pessoas, e saber

dar-lhes uma resposta, porque se não fores uma pessoa paciente não consegues. De

resto estou cá com prazer, temos três anos de mandato, ainda vamos no primeiro,

faltam dois, esperamos conseguir os objectivos.” (ent. 11)

“Eu acho bom. Tem servido para mostrar que mulher tem a sua utilidade. Através de

mim consegui chamar outras mulheres. Também para mostrar que nós podemos

trabalhar para a nossa comunidade, podemos resolver problemas da nossa

comunidade. Também pode ser que não tenho tido esse apoio devido a mentalidade

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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das pessoas, logo no inicio disseram que eu não tinha competência, que não

conseguiria, olham essa mulher como fraca. No meu caso, se tivesse conseguido

financiamento dos projectos que enviei aos diversos parceiros, já tinha mostrado o

que uma mulher pode fazer.” (ent. 16)

Percebemos que a motivação para o trabalho de carácter social é igual, apesar de serem em

número reduzido. Dizem contar bastante com colaboração dos seus pares nos órgãos sociais,

contudo, as vezes são atacadas pelas pessoas, quer os que estão dentro das associações como

os que estão fora.

“Mulheres sabem mais das necessidades que as pessoas podem passar. Tem vantagem

e tem desvantagem. As vezes por ser mulheres as pessoas sentem mais força para te

enfrentar, e dizer-te alguma coisa. Mulher também se quiser trabalhar ou se

encontrar condições para trabalhar, ela trabalha. Por exemplo, uma vez estávamos

em dívida com algumas pessoas, era uma obra do MAA, houve demora nos

pagamentos e teve gente que veio me prometer tribunal, eu acho que só fizeram isso

porque sou mulher, porque se fosse homem, um outro homem não viria a sua casa

dizer-lhe assim. Mas se encontrares condições para trabalhar vai bem, tenho dois

colaboradores que me ajuda na elaboração de projectos, e noutros trabalhos, um é

presidente da assembleia e outro é tesoureiro. E sempre com eles que conto mais,

para qualquer trabalho.” (ent. 12)

Também nessa actividade ela é vista como ‘fraca’, como nos esclareceu uma das nossas

entrevistadas, apesar de serem, segundo elas, mais sensíveis aos problemas sociais. Esses

dados espelham as características da sociedade santantonense, muito assente numa tradição

marcadamente machista.

Em termos organizacionais, são todas elas constituídas por três órgãos sociais: o Conselho

Directivo, a Mesa da Assembleia-Geral e o Conselho Fiscal, variando entre 12 à 17 membros

para esses três órgãos, podendo existir comissões especializadas dentro dos órgãos. A título de

exemplo, a ADICBAST, uma associação do Porto Novo, a quando da eleição dos órgãos,

criou algumas comissões de trabalho, nomeadamente Comissão de Apoio à Construção,

Comissão Ambiental, Intercambio Cultura e Desporto, Comissão de Educação, Informação e

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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Comunicação, Comissão de Elaboração de Projectos, Protocolo e Comissão de Solidariedade

Social.

No que toca aos aspectos mais oficiais, sabe-se que uma associação pode funcionar de forma

informal sem estatutos, contudo, para que seja reconhecida pelos serviços do Estado, pelas

ONG’s, pelos Organismos Internacionais e demais organismos de cooperação para o

desenvolvimento, é preciso que a associação tenha os seus estatutos aprovados pelos seus

membros, ter sido feita a escritura pública no Cartório Notarial e ter personalidade jurídica

reconhecida pelo Ministério da Justiça. Essa é porém uma exigência que em alguns casos não

se verifica, ainda em Santo Antão há associações sem escritura pública, sem registo oficial,

mesmo assim trabalham com financiamento de programas, principalmente dos programas do

Governo.

No que concerne aos estatutos, documento que sintetiza as normas de funcionamento das

associações, podemos começar por ver como é que as associações se apresentam,

normalmente nos seus artigos 1º sobre a constituição, denominação, natureza, fins e duração:

“É constituída por tempo indeterminado a Associação Para o Desenvolvimento

Comunitário de (…), sem fins lucrativos, composta por um número ilimitado de

sócios, com objectivo de contribuir activamente para o desenvolvimento social,

económico, cultural e integrado da localidade acima referida, no sentido da melhoria

de nível e qualidade de vida das populações, dentro de uma perspectiva de

desenvolvimento harmonioso e equilibrado do Conselho da Ribeira Grande e de toda a

ilha.”

No que toca aos objectivos, ou fins das associações, os estatutos mostram o seguinte:

Artigo 4º

(Fins)

A Associação tem por objectivo contribuir para desenvolvimento social, económico,

cultural de (…), devendo para tanto:

a) – Congregar no seu seio todos quantos, residentes no país ou na diáspora

independentemente da sua naturalidade ou nacionalidade, queira dar a sua

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contribuição de forma desinteressada ao desenvolvimento dessas localidades;

b) – Criar um espaço de diálogo, concertação e convivência;

c) – Interessar os seus membros no estudo aprofundado dessas localidades,

nomeadamente nos seus aspectos históricos, sociológico, económico e cultural;

d) – Contribuir para a dignificação dos seus membros, apoiando o seu

desenvolvimento intelectual, cívico, moral e técnico-profissional;

e) – Promover, estabelecer e desenvolver relações de cooperação e intercâmbio

com Associações congéneres nacionais e estrangeiras;

f) – Promover, estabelecer e desenvolver relações com organizações nacionais e

estrangeiras, sejam elas governamentais os não governamentais;

g) – Promover e apoiar projectos de estudo e de execução que visam o

conhecimento profundo da realidade dessa localidade nos seus múltiplos

aspectos, para o desenvolvimento harmonioso nas diversas áreas,

designadamente da educação, da promoção social, da cultura, do desporto, da

economia, envolvendo os seus membros e mobilizando os meios humanos e

materiais que se julgarem necessários;

h) – Estimular o espírito de solidariedade e de interajuda entre a população nos

vários grupos sociais mais carenciados, como valor indispensável para o

desenvolvimento comunitário;

i) – Preparar, elaborar e divulgar documentação de informação sobre as várias

actividades da Associação e sobre os estudos ou quaisquer outros trabalhos que

se revestem de interesse para as finalidades perseguida pela Associação;

j) – Colaborar com as autoridades municipais, religiosas e outras em tudo

quanto diga respeito ao desenvolvimento dessa localidade;

l) – Colaborar com as organizações cujas as vocações estão viradas para o apoio

às vítimas de calamidades naturais.

Fonte: Estrato de estatuto da associação de Ribeira da Cruz

São esses os fins encontrados na maioria dos estatutos que analisamos. O que se conseguiu

apurar é que todos são semelhantes, havendo uma ou outra alteração de um estatuto de uma

associação para outro. Isso deve ao facto de que, a maioria delas, durante as suas criações,

serem orientadas pela mesma instituição, concretamente o MADRRM pelo serviço de

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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extensão rural, que no seu plano de actividade dedica um eixo ao associativismo. Assim,

segundo um técnico dessa instituição,

“ (…) o serviço de extensão tem sido um dos impulsionadores do processo de

criação, mesmo quando é a comunidade que mostra interesse na sua criação. (…) O

que tem acontecido, é que na criação das associações, pegamos num estatuto já

existente e vamos adaptando de forma a facilitar as associações, porque caso

contrário teriam de contactar um jurista para fazer os estatutos e teriam de pagar,

então vamos fazendo uma montagem.” (entrevista a um técnico do MADRRM)

Mas, há alguns em que já se note diferenças consideráveis, como mostra a caixa de texto

seguinte, mas isso justifica-se por ser uma associação só com dois anos de existência, criada

numa época diferente em que já se exige outras actividades e outras dinâmicas as associações,

logo esses vão adaptando os estatutos as novas exigências e novas situações, como é o caso de

“execução de obras públicas” que inicialmente não era uma das valências das ACD’s mas que

com o andar do tempo todos enveredaram para essa área78.

Artigo 4º

(Fins)

A Associação (…), visa congregar e fomentar a aplicação de meios que promovam o

desenvolvimento das zonas referidas no artigo 1º, prosseguindo os seguintes objectivos

específicos:

a) promover a elevação do nível económico, educacional, cultural e técnico/

profissional dos seus associados e da comunidade em geral;

b) promover, desenvolver e realizar contactos junto de Instituições

Governamentais e não Governamentais (ONG’s), nacionais ou estrangeiras,

para a resolução dos problemas da comunidade;

c) estimular condições para actividades geradoras de rendimentos na comunidade,

nomeadamente, agro-pecuárias, etc;

d) fomentar a prática de poupança e crédito no seio dos associados visando

dinamizar os seus esforços de produção;

78 Retomaremos a esse assunto mais a frente no 4.3, dedicado as principais áreas de intervenção.

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e) contribuir e participar em acções e programas que visam a preservação do

património ambiental;

f) promover e apoiar projectos que favoreçam o aumento do nível de vida das

populações, com plena integração dos objectivos económicos, ecológicos e

sociais;

g) promover e apoiar as iniciativas da mulher no desenvolvimento;

h) estimular o espírito de solidariedade e inter-ajuda entre a população, como

valor indispensável para o desenvolvimento comunitário;

i) colaborar com as autoridades governamentais, municipais, religiosas e outras,

em tudo quanto diga respeito ao desenvolvimento comunitário;

j) colaborar com as organizações cujas vocações estejam viradas para o apoio as

vítimas de calamidades;

k) promover, estabelecer e desenvolver relações de cooperação e intercâmbio com

associações congéneres nacionais e estrangeiras;

l) execução de obras públicas no domínio rural nomeadamente; diques de

correcção, reservatórios e infra-estruturas de conservação de solo e água.

Fonte: Estrato de estatuto da associação Top de M’randa

As associações mais recentes já contam com o apoio de outras instituições, nos seus processos

de criação, como a OADISA e FADEP que actualmente são contactados para participarem

nas assembleias constitutivas e em outras actividades das associações comunitárias.

Outros documentos que nos serviu de objecto de análise, foram os planos de actividade. Não

existe uma única linha de elaboração de plano de actividade, ela vária de associação para

associação e mesmo dentro da associação vária de direcção para direcção. Há associações que

o fazem anualmente, outros para um biénio e outros ainda para triénio. Quanto a elaboração

para biénio ou triénio, está relacionada com a duração dos mandatos dos órgãos sociais.

As associações defendem que, os planos de actividades reflectem as aspirações das

populações, porque baseiam na auscultação dos anseios das comunidades na altura da feitura

dos mesmos, visando sempre ajudar na melhoria das condições de vida, promover o

desenvolvimento sustentado e equilibrado. Os líderes entrevistados são unânimes ao

afirmarem que na comunidade não decidem nada sem ouvir antes as pessoas. Deste modo:

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“ (…) a nível de desenvolvimento, com associação podemos atingir um

desenvolvimento mais rápido tendo em conta que envolve a população. Envolve a

população na tomada de decisões e na execução das obras.” (ent. 24)

Da análise dos planos de actividade de algumas associações, nomeadamente os de um ano e

de dois anos, grande parte, contempla rubricas como: actividades, objectivos, beneficiários,

intervenientes, data de execução, previsão orçamental e financiadores de cada actividade,

esses são, os pontos encontrados em quase todos os planos. Outras associações acrescentam

ainda: resultados esperados, executor, localidade de cada actividade.

São sempre elaborados, tendo em conta as necessidades da comunidade, mas muitas vezes, de

olhos virados para os financiadores, pelo que a maioria nos seus planos de actividade

apresentam objectivos como:

Lutar contra a pobreza,

Saneamento do meio,

Protecção ambiental,

Formação profissional,

Educação,

Saúde,

Habitação,

Diminuir a carência de água,

Melhorar condições de criação de gado,

Agricultura,

Actividades geradora de rendimento,

Capacitação e reforço institucional.

Além de existir diferentes tipos de planos de actividades, podemos ver também que há

associações que elaboram dois ou mais modelos diferentes, consoante o possível financiador a

quem terão de enviar o respectivo plano, isso porque, cada financiador pode fazer uma

exigência na apresentação dos planos de actividades e dos programas das associações. Em

alguns casos os conteúdos dos dois planos são idênticos, variados só os formatos, mas

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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também verificamos casos em que mesmo os conteúdos são diferentes, com menos ou mais

informação, de acordo com o exigido pelo financiador.

Segundo a análise dos referidos documento, essas organizações devem estar estruturada, com

reuniões regulares, representantes reconhecidos, informações disponíveis para os sócios.

Incluem-se as associações que, embora não estejam inscritas nos órgãos públicos de registo de

pessoas jurídicas, possuam um grau significativo de estrutura interna.

4.2 - O que levou a criação das ACD’s

As associações da ilha são relativamente jovens, tomando 2008 como ano de referência. Num

universo de 61 associações analisadas, 17 possuem seis anos de idade, isso quer dizer que

2002 foi o ano em que surgiu mais associações na ilha, mas é um processo que teve inicio em

2000, ano em que surgiu 12 associações, teve uma quebra em 2001 para subir e atingir o

máximo em 2002. No gráfico seguinte, pode-se ver que as primeiras ACD’s surgiram,

praticamente, na segunda metade da década de noventa, com excepção de uma única que

surgiu em 1992, hoje com 16 anos.

Gráfico 6 – Idade das Associações

Fonte: Dados da pesquisa de terreno

O que se pode tirar das entrevistas, é que, as razões que levaram ao surgimento das

associações são várias, mas basicamente restringe a um grande objectivo, que todos indicam

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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como o mais importante, ser um parceiro de desenvolvimento da localidade. O seguinte

extracto é exemplificativo disso:

“O objectivo fulcral é contribuir para o desenvolvimento pessoal, social, económico

dos membros daquela comunidade a todos os níveis, por isso que actuamos, no âmbito

do estatuto, na área de saneamento, área de educação, de apoio a iniciativas locais

em agricultura, criação de gado, objectivo fundamental é contribuir para o

desenvolvimento pessoal, social e económico da comunidade, dando mais atenção

para os mais desfavorecidos.” (ent. 14)

Lutar contra a pobreza que existe nas comunidades, é sem dúvida uma outra razão que levou a

criação de muitas das associações, conforme nos explica um dos entrevistados.

“A pobreza extrema que tinha na comunidade na altura, em vários domínios, no

domínio económico, no domínio da educação. Pobreza foi um dos factores

principais.” (ent. 40)

Pode-se dizer que as fundamentos que levaram as pessoas a criarem as associações são várias,

mas dividem em dois períodos: antes de 2000 e depois de 2000, o que optamos por chamar

uma primeira fase e uma segunda fase do surgimento das associações na ilha, uma vez que

nessa segunda fase verificou um boom do associativismo em Santo Antão. De 2002 até hoje

nasceu na ilha 49 associações de carácter comunitário, cerca de 82 % do total das existentes

na ilha.

As com mais de 8 anos, no total de 11 associações, referente a primeira fase, surgiram na sua

maioria, por espontânea iniciativa da comunidade, tendo em vista objectivos como:

“Quando a associação foi criada, o nosso objectivo era arborizar a zona mais alta de

Lombo Branco, fazer a construção de alguns arretes, banquetes, diques, fazer a

correcção torrencial.” (ent. 5)

“Nessa altura estava a começar a surgir as associações, mas nós queríamos fazer

alguma coisa por aquela zona onde nascemos, e porque nós, já temos uma vida mais

ou menos organizado, e estávamos a ver que a nossa zona tinha muita carência e as

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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pessoas não tem muita capacidade para resolver os seus problemas, então criamo-la

com a ideia de dar o nosso contributo para o desenvolvimento de Costa Leste em

geral, e ainda acho que o sentimento é o mesmo.” (ent. 17)

Ainda, no que diz respeito aos principais objectivos da criação das associações, deve-se

sublinhar aspectos como lutar contra a pobreza, questões ambientais, a problemática de gestão

da água, destinado a agricultura, o acesso a água potável, a saúde, a educação são, de entre

outros.

“Então, ajudar a desenvolver a nossa comunidade é que nós levou a criar a nossa

associação, com intenções de ajudar membros da comunidade, não só sócios mas

todos os membros da comunidade, a encontrar um modo de subsistência, através de

actividades geradoras de rendimentos, no acompanhamento na saúde, na educação,

na agricultura, na criação de gado, ajudar as pessoas a encontrarem as suas

vocações e da melhor forma de investir para sair da pobreza e deixar de ser

dependente das FAIMO.” (ent. 6)

“Objectivo primeiro da nossa associação era o desenvolvimento integrado de João

Afonso, procurávamos atingir área de abastecimento de água, agricultura,

saneamento, educação, saúde, formação e também reanimar o espírito de inter-ajuda

naquela comunidade e cultivar aquilo que era tradição na zona (…).” (ent. 4)

Esses mesmos objectivos vão prevalecer, no que optamos chamar, segunda fase do

associativismo na ilha, altura em que, mesmo a nível nacional, emergia associações num

contexto organizacional diferente. Nessa, referida fase, consta todas as associações com

menos de oito anos, porém aqui, com um outro propósito: ter acesso aos fundos que diferentes

instituições e organismos estavam a disponibilizar para as associações79.

Neste caso, já não é só vontade da comunidade, iniciativa espontânea das pessoas, mas sim

houve outros impulsionadores como o MADRRM, as câmaras municipais, o PNLP e ONG’s.

Como pode-se ver:

79 Esse aspecto será tratado mais a frente no ponto referente a sustentabilidade das associações.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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“Na altura, já tinha alguns anos que estávamos falando nele, mas as pessoas não

acreditavam, entretanto o projecto PNLP para o meio rural, já algum tempo atrás,

estava a intervir na zona de Chã das Furnas e nos tinham avisado que depois

passariam para a zona de Monte Joana, porque estavam a atacar a zonas rurais com

mais pobreza, que tinha dificuldade de via de acesso e outros, mas era preciso que

houvesse uma associação, e na altura ainda não tínhamos conseguido organizar a

associação, e assim ficamos sem financiamento desse programa. Depois viemos criar

a associação.” (ent.7)

Na sequência desse exemplo, podemos acrescentar que o próprio PNLP, nas comunidades

onde não existiam associações de desenvolvimento comunitário, desenvolveu todo um

trabalho de sensibilização da comunidade, no sentido de mostrar a necessidade de um

instrumento de congregação das vontades e energias colectivas capaz de, através de uma forte

organização, revelar-se como um instrumento fundamental para o desenvolvimento da

comunidade e interlocutor válido junto a instituições e organismos exógenos à comunidade.

É um trabalho que levou anos a construir, e ainda hoje estão constantemente com programas

de sensibilização para o associativismo, mesmo que actualmente exige uma nova forma de

olhar para essas organizações de carácter comunitário.

“Na altura pessoas sentiram que era necessário estar mais unidos para tentar

resolver questões da comunidade, viram que individualmente não conseguiriam, só

conseguiriam formando uma família, posso dizer, com a organização, e através

também do pelouro da câmara ajudou no impulsionamento e formação das

associações. (ent.38)

No excerto acima transcrito, pode ver que as pessoas pouco a pouco começaram a ver essa

necessidade de organização que os impulsionadores queriam implementar nas comunidades.

Muitas vezes não acreditam que por si só poderão fazer alguma coisa, é sempre necessário um

suporte externo. E reconhecida por parte de muitos lideres, a importância dessas instituições

nesse processo de criação e materialização das associações.

“Na moda porque era uma coisa que estava a surgir, e mesmo os actores sociais que

vinham cá, as pessoas do MAA, da Câmara Municipal, sempre falava na criação de

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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associações, porque era com associações que poderíamos desenvolver a nossa

comunidade, e isso foi um dos pilares de arranque.” (ent. 31)

De tudo isso resulta a constatação de que essa grande intervenção dessas instituições e depois

de notada alguma dinâmica das primeiras comunidades organizadas, levou que esse

movimento associativo torna-se ‘moda’ não só em Santo Antão como em todo Cabo Verde.

Não só os organismos públicos e estatais deram “empurrões” para o surgimento do

associativismo, as mensagens de que havia benefícios e financiamento só para comunidades

organizadas, chegava de diferentes sectores. Como nos mostra o seguinte excerto de uma

entrevista:

“Associação foi criado numa altura que estavam a criar muitas associações a nível de

Cabo Verde. Até quem surgiu com essa ideia aqui, foi um Padre, que durante a missa,

disse que havia alguns projectos nacionais e só a comunidade, a sociedade civil tinha

acesso a eles através de associações, dai que surgiu essa ideia de formar uma

associação (…).” (ent. 9)

O associativismo é algo positivo, pelo que vários são os organismos que vêm impulsionando

as comunidades para de se organizarem, no sentido de conseguirem melhorar as condições de

vida das pessoas das suas comunidades. Porem, os impulsos externos, muitas vezes, tem suas

consequências menos positivas.

“O nome mesmo já diz, associar para um objectivo comum, sendo assim, quer dizer

que temos uma meta a atingir. Houve uma altura, não sei se foi só em Santo Antão ou

se foi em todo Cabo Verde, associativismo estava em moda, e creio que o surgimento

de quase maioria das associações veio nesse sentido, determinada comunidade esta

associada porque não associarmos também, sem antes fazer uma análise de fundo

para que as pessoas interiorizassem o que é isso de associativismo para que cada um

pudesse cumprir a sua parte em todo esse processo, é exactamente o que tem vindo a

acontecer. No nosso caso, na minha zona, já vi que pessoas não meteram na cabeça o

que é isso de associativismo. Por isso que digo que é preciso pensar essa coisa a

fundo mesmo. Embora a questão de associar não foi de iniciativa local, teve impulsos,

associação estava na moda, na altura a própria Câmara Municipal tinha um gabinete

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de associativismo, então estimulavam as pessoas a associar, mas foi coisa feito sem

pensar. O próprio estatuto é feito e levado já pronto, não deu as pessoas tempo de

interiorizar as coisas. Primeiro devia dar as pessoas noções do que é uma associação,

quais as suas finalidades, as suas vantagens, qual é o papel que cada um deve

executar. Há pessoas que estão na associação mas em termos de objectivos se

perguntares não sabem, há muitas coisas do estatuto que não sabem, esse não foi

discutido a fundo para que esses pudessem assimilar e pudessem contribuir de forma

interessada, porque é necessário.” (ent. 14)

Além de ter esse efeito, nem todos vivem o espírito associativo na íntegra, muitos não sabem

os seus preceitos, pode-se ainda correr o risco de não conseguirem andar sozinhos, sem apoio

dessa ajuda extrínseca, como nos disse um dos entrevistados:

“O grupo de pessoas que o criou, estavam a ver outros lugares a desenvolverem,

então criaram a associação para tentar tirara a localidade do marasmo que

encontrava. Mas teve um empurrãozinho de outras pessoas, e quando essas pessoas os

deixaram não conseguiram dar nem um passo, teve de 2000 até 2003 sem

conseguirem se quer legalizar a associação. (…) eram pessoas de baixa escolaridade

que ficavam sempre a espera de terceiros, não conseguiram dar passos. Foram

pessoas que veio de fora que tentaram empurra-los para criar a associação.” (ent.

25)

As passagens transcritas avança com possíveis efeitos de um incentivo externo que encontra

as populações, muitas vezes, sem preparação para o receber e interiorizar, nesses casos carece

de mais trabalho de sensibilização e informação sobre as questões de associativismo, no

sentido de todos saberem o que fazer, que funções terão de desempenhar, ou seja, quais são os

seus verdadeiro papéis no processo.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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4.3 - ACD’s e desenvolvimento local

Importância das associações

Quando se reconhece a importância do trabalho colectivo, os benefícios de ter um

comunidade organizada, é uma das condições essenciais para que deles emanem resultados

positivos e claros benéficos para a comunidade envolvente, principalmente quando se conta

com o envolvimento de todos.

No caso de Santo Antão, no que diz respeito a importância das associações, alguns

entrevistados defende a ideia que só quem está na comunidade conhece bem os problemas das

comunidades, juntos têm uma visão mais ampla das dificuldades vividas, e para os resolver é

preciso organizar. Deste modo:

“Quando uma comunidade tem associação, as pessoas conseguem identificar as suas

necessidades, identificar as suas prioridades, sabem o que é que os deixa mais falta.

Comunidade tem vantagem sim com a associação, quando estas a elaborar o plano de

actividade tens de ver as coisas que são necessárias, qual é mais urgente para

resolver.” (ent.12)

Este facto pressupõe o envolvimento, não apenas das associações e das pessoas da

comunidade, mas de todos os agentes interessados no processo de desenvolvimento da

comunidade ou da localidade. Assim em termos de envolvimento, que achamos, dever ser

intenso e dinâmico, foi-nos afirmado o seguinte:

“Umas das funções da associação é conhecer a comunidade, os problemas da

comunidade e tentar elaborar projectos e procurar financiadores, e actuar na área

onde está com falta de intervenção. (…) O nosso objectivo é ver na comunidade o que

tem problema e tentar solucionar juntamente com a comunidade, juntamente com a

Câmara Municipal, e com outros. Mas o nosso papel é ver os problemas e procurar

parceiros para ajudar a resolver esses problemas.” (ent. 11)

Depois de vista a importância para a localidade, questionados sobre a importância das

associações na ilha, todos são unânimes que são de uma importância intransferível, e que essa

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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mesma já é reconhecida por vários parceiros de desenvolvimento do país, conforme se pode

depreender do conteúdo dos dois excertos, que seguidamente apresentamos:

“É intransferível. Porque para desenvolver Santo Antão tem de ser uma intervenção

em rede, e o que a gente pensa com essa rede, quer dizer, todas as instituições

trabalhando em Santo Antão devem cooperar, integrar, em que os objectivos de uma

já são focados numa outra, quer seja privado, quer seja público, quer seja da

sociedade civil. E uma ACD não pode substituir a Câmara Municipal, uma instituição

do estado não pode substituir a ACD, tem que haver uma completa integração entre

elas. É algo de análise sistémica, a integração e complementaridade. Cabo Verde está

a dar um passo para o desenvolvimento médio, tem de ser um passo inclusivo, um

salto em que a mulher não fica de fora, os jovens não ficam de fora, um analfabeto

não fica de fora. E se esta rede trabalhar em termos sistémicos há integração.

Também aquele que tem algum handicap físico não fica de fora porque um fundo

social do sistema tem que cobrir os encargos com os doentes, com os velhos, com

aqueles que já deram os seus contributos.” (ent. 30)

“Praticamente hoje desenvolvimento de Santo Antão esta na base do associativismo

se não, podemos ver que, anos atrás, tínhamos grandes dificuldades, hoje com

associativismo as pessoas unem-se e resolvem os seus problemas, fazem com que os

seus problemas sejam visto por autoridades públicas, porque as suas preocupações

vão de baixo para cima, e antes era o contrário, chegavam e construía sem saber se

era importante para nós, por isso que digo que tem um papel extremamente

importante no desenvolvimento da ilha. Associação tem servido como um elo de

ligação da comunidade e instituições públicas. Recentemente fizemos a preparação

para elaborar o plano de actividade para 2009, onde foi chamado a comunidade para

dar a sua participação eles é que definem o que querem e nós procuramos fazer que

cheguem até a câmara, a CRP, a FADEP, a OADISA as suas preocupações, e nós

somos elo de ligação.” (ent. 29)

Segundo os nossos entrevistados, as associações são os impulsionadores do desenvolvimento

das suas comunidades, é onde todos têm oportunidade de dar opiniões e contributos para

melhorias das condições das localidades. Os mesmos estão convictos de que todos juntos

podem conseguir esse intento, uma luta que não pode ser feita de forma individual e isolada.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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O Desenvolvimento segundo as ACD’s

No capítulo I, analisou-se o conceito de desenvolvimento, como ela é vista por diferentes

autores e instituições, e definimos o conceito de desenvolvimento que nos serve de referência

nesse estudo. Nesse ponto pretende-se ver como é que as associações pensam e definem o

desenvolvimento.

O facto de Santo Antão ser, uma ilha muito pobre, contribui para construir a visão que as

pessoas têm do que é desenvolvimento. Fazendo uma análise de conteúdo das entrevistas, é

nos seguro dizer que todos olham o desenvolvimento como um processo para ultrapassar a

situação de pobreza.

“Para nós desenvolvimento é as pessoas melhorarem as suas condições de vida,

principalmente a nível de saneamento e habitacional, para nós aquilo é fundamental,

também a nível de emprego, para teres o teu auto-emprego, por isso, que estamos a

lutar muito para a formação, para que as pessoas tenham os seus auto-emprego. (…)

Temos resolvido um problema de iluminação pública, também é desenvolvimento,

quando tens iluminação pública tens segurança, aquilo é desenvolvimento, em termos

de água esta muito avançada, já temos um projecto a espera de financiamento de CRP

para ligação domiciliária. Tendo uma comunidade com água, luz, saneamento, com

escola, jardim, com arruamentos, já se vê mesmo o índice de desenvolvimento.

Desenvolvimento é melhoria de condições de vida, então é esse o nosso objectivo. Já

temos a nível de pesca um bom número de peixeiras e pescadores com as suas vidas

bastante organizada, exactamente pelo projecto, já têm uma arca compram peixe e

colocam na arca e vendem, então as suas vidas vão melhorando, o nosso sonho é ter

mais arcas. Já fizemos um projecto e enviamos a CRP para mais arcas para mais

peixeiras e para tentar ajudar a comunidade a desenvolver. Para nós desenvolvimento

queremos vê-lo assim.” (ent. 11)

E sem dúvida, para conseguir melhores condições de vida, como se pode ver no extracto

anterior, deve abranger todos os sectores da vida pessoal e comunitária.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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“Para mim, desenvolvimento é o estado de satisfação de pelo menos a maioria de

pessoas, tem de sentir bem no só economicamente mas sim cultural ou socialmente,

para mim é o nível de satisfação de pessoas.” (ent. 25)

O desenvolvimento só se atinge quando as pessoas já não são dependentes de ajuda externa,

não são dependente de terceiros mas sim se conseguem auto-sustentar. E os líderes

associativos estão certos que esse desenvolvimento passa essencialmente pelo sector do

emprego.

“Por exemplo, para mim o programa de luta contra a pobreza, não é só fazer uma

família uma casa ou uma casa de banho não quer dizer que a família esta a sair da

pobreza, porque se tem uma casa depois necessita de emprego para ter uma vida

estável. Para mim uma única forma de lutar com a pobreza é criar condições para

desenvolver algumas actividades que permite render para o desenvolvimento.” (ent.

8)

Já foi referido que, o conceito de desenvolvimento é um conceito controverso. Fomos buscar

contributos de autores como: Roque Amaro (2006: 28), que analisa diversos conceitos de

desenvolvimento, e no fim questionou se o conceito de Desenvolvimento Integrado80 não

seria o conceito integrador dos outros cincos, uma vez que ela é referida transversalmente por

todos os outros. Essa diversidade é também encontrada nas associações, basta vermos as

denominações das mesmas.81 São na maioria Associações Comunitário de Desenvolvimento,

Associações Comunitárias de Desenvolvimento ou Associações de Desenvolvimento

Integrado. Tendo em conta as denominações de cada associação, questionamos o que é para

eles cada um desses conceitos. Assim sendo, tivemos os seguintes esclarecimentos:

“Para nos é desenvolvimento integrado porque abrange todas as áreas, todas as

áreas consideradas vitais para vivência diária daquela comunidade.” (ent. 4)

“Desenvolvimento integrado para nós é o desenvolvimento sustentado. Sem

desenvolvimento sustentado não há desenvolvimento, e integrado porque podes

80 O autor concebe o Desenvolvimento Integrado como “o processo que conjuga as diferentes dimensões da vida e dos seus precursores de mudança e de melhoria”. (Amaro: 2006: 29) 81 Ver a lista de nomes das associações estudadas.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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integrar uma actividade na outra, por exemplo, apostamos na agricultura, porque da

agricultura, culturalmente vem a pecuária, mas também da pecuária vem a indústria,

porque temos a transformação, então temos de criar todo um mecanismo para que

numa família que inicia coma agricultura vai conseguir tudo isso, e conseguindo isso,

consegue emprego para a família, é um sistema integrado que nos dá um

desenvolvimento integrado, mesmo integrando o ambiente, o ambiente com o

desenvolvimento. Para nós, se não associarmos o ambiente com o desenvolvimento,

porque podes desenvolver e depois ter um ambiente poluído sem condições de viver”

(ent. 29)

Esse último extracto mostra-nos que, de certa forma, estão conscientes de que, o

desenvolvimento integrado, é um processo que se tem em conta a articulação de diferentes

dimensões da vida. Outras associações, que se denominam de Associações de

Desenvolvimento Comunitário, definem como:

“Desenvolvimento comunitário passa por duas vertentes, vertente económica e

vertente social. Quanto a vertente social, nós desejávamos que tivéssemos uma

comunidade mais ou menos com um desenvolvimento. Um desenvolvimento humano

de forma elevado, consciencializado, porque só se consegue um desenvolvimento

através da consciencialização, e uma pessoa pouco escolarizada é difícil de

consciencializar. Gostaríamos de ver a nível de desenvolvimento, famílias com um

nível de vida equilibrado, (…), depois gostaríamos de ver a nossa comunidade com

um nível económico mais elevado, com melhor produção na agricultura, melhor

produção na pecuária e que tivéssemos condições para conservar o produto quando

temos excedentes e que não conseguimos colocar no mercado.” (ent. 9)

O que se pode ver pelas entrevista, que essas designações são uma questão de nome, que na

prática quer dizer a mesma coisa, ou seja uma implica a outra, o facto de duas associações

terem nomes diferentes, não se nota diferenciação nas suas actuações. Não existe uma

clarificação de conceitos. Vejamos o seguinte:

“Nós vemos desenvolvimento comunitário de forma integrado, não de uma forma só

por exemplo, de construção de obras, ligado a todas as áreas e a todos os níveis,

desde educação, saúde, a nível profissional, a nível de habitação e saneamento do

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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meio e também criar as famílias condições próprias para sobreviver. É tudo isso junto

que se vê desenvolvimento comunitário, não podemos vê-lo só na educação

desgarrado da saúde, desgarrado de habitação, desgarrado de saneamento, nem tão

pouco desgarrado de AGR, sabemos que se conseguirmos implementar mais

actividades geradoras de rendimento as pessoas libertam mais do Estado, e o Estado

também liberta das pessoas, começam a criar o auto-sustento. É preciso todas as

áreas e todos os actores ligados para haver desenvolvimento.” (ent. 38)

Já vimos que o desenvolvimento se consegue com um conjunto de pequenas actuações

destinadas ao Desenvolvimento Local. Um dos nossos entrevistados diz-nos que o

desenvolvimento local se consegue com todas as actividades económicas e sociais.

“Desenvolvimento local é muito abrangente, desenvolvimento local tem de ser desde

desenvolvimento de agricultura, desenvolvimento de habitação, saneamento,

abastecimento de água, educação, mas principalmente educação de pessoas e

mudança de mentalidade, desenvolvimento é muito global. Desenvolvimento local é

quando conseguires que todas as pessoas da comunidade possa ser auto-suficiente,

independente, sabemos que é difícil de atingir mas é o sonho, pouco a pouco vão-se

eliminando os males que atinge uma sociedade ou a tua comunidade onde estas

inserida.” (ent. 31)

Não existe, por parte, das associações uma clarificação ou seja, uma distinção desses

diferentes conceitos: desenvolvimento comunitário, desenvolvimento local, desenvolvimento

integrado, desenvolvimento sustentado. As áreas de intervenção são idênticas, os estatutos são

semelhantes e a forma de actuar também igual.

Clarificado o que é o desenvolvimento, para esses actores sociais, a questão agora se coloca é,

como promover esse desenvolvimento? A maioria das respostas a essa pergunta nos mostra

que os líderes comunitários, estão sensibilizados de que a comunidade é o principal agente do

seu desenvolvimento, isto é, o desenvolvimento, e as actividades para promover o mesmo,

tem de ser pensado e executado com a participação da comunidade. Em jeito de resposta a

questão acima colocada, parece pertinente registar as seguintes opiniões:

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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“Para nós é através de assembleias comunitárias, encontros com as populações, levar

as pessoas a participarem, levar pessoas para animar palestras, pessoas para dar

testemunho de sucesso e também nesse investimento diário no sector humano, e na

procura de financiamento para projectos de desenvolvimento desde construção de

infra-estruturas de conservação de solo e água, desde agricultura à financiamento de

um jardim infantil.” (ent. 6)

“Promover o desenvolvimento é através de projectos. Primeiro tens de arranjar

parceiros para financiar projectos, depois tens de passar para sensibilização da

homem do campo ou do agricultor normalmente que é dono da terra por forma a ele

produzir melhor, porque a produção ali não é tanto, porque são pessoas que não

usam novas tecnologias de rega, as suas tecnologias é tudo rudimentar, existe uma

certa produção porque o terreno as vezes favorece, é um terreno pozolánico, para

produzir batata é óptimo. (…) Tem de passar também pela área de transformação de

produtos, temos pessoas com muita capacidade, também na área de artesanato, há

pessoas muito bons nessa área, mesmo na produção de brinquedos. No domínio social

gostaríamos de ver cada família com uma vida equilibrada, com memos problema de

doença, com um alto nível de rendimento escolar, que os pais tivessem oportunidade

de ter os seus filhos a fazer uma formação superior ou mesmo uma formação

profissional. Também temos uma ideia na área de pecuária, há ali um centro pecuário

que poderia ser muito mais aproveitado. Também o projecto de construção da nossa

sede é um elemento importante para o desenvolvimento económico. (ent. 9)

Também para atingirem esse desenvolvimento, estão conscientes de quais são as áreas

prioritárias, de acordo com as condições da ilha, áreas onde orientar as actividades das

associações, do público e do privado. No ponto a seguir analisamos as principais áreas de

intervenção das ACD’s, onde têm direccionado as suas actividades com vista ao

desenvolvimento.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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4.3.1 - Principais áreas de intervenção

Agricultura

Apesar da precariedade climática e a degradação ambiental porque tem passado o país, a

agricultura é, ainda hoje, uma importante actividade económica em Cabo Verde. Ela mobiliza

20% da mão-de-obra activa. Santo Antão, como vimos no ponto anterior é essencialmente

agrícola e sendo que, as associações têm por objectivo aproveitar as potencialidades

endógenas para promover o desenvolvimento, não poderiam deixar de dar uma atenção

especial a agricultura.

A conservação de solo, com a arborização, construção de dique, arretes, muros, socalcos e

outras formas de protecção, a construção de reservatórios de água para rega, a modernização

da agricultura, principalmente com a introdução do sistema de rega localizada, a correcção

torrencial, entre outras medidas infra-estruturais, introdução de novas espécies, são aspectos

onde as associações têm centrado as suas actividades.

“É quase tudo, mas trabalhos que mais temos feito são construções de arretes para

melhoramento de terrenos para proteger de erosão na altura das chuvas, são

financiado pelo MAA, é construção de socalcos fortes de modo a reter água e terra. É

enquadrado no projecto de bacia hidrográfica de Ribeira da Torre.” (ent. 7)

Construções de diques, construções de canais de rega argamassada e através de

tubagem, construção de reservatórios, instalação de rega gota a gota, modernização

da agricultura, reabilitação de estradas. (ent. 24)

As intervenções na área da agricultura tem normalmente carácter comunitário, onde todos são

beneficiários de forma directa, mas há porem intervenções mais destinados as famílias, o que

podemos dizer ser mais direccionadas a um beneficiário.

“Temos feito coisas mais virado para as famílias, já fizemos casas de banho, com a

FADEP, com OADISA fizemos depósitos familiares ou cisternas familiares para

melhoramento de agricultura, para famílias fazerem pequenos hortos, para melhorar

a sua alimentação.” (ent. 29)

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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“Falando de agricultura, conseguimos instalar rega localizada para algumas

famílias, conseguimos instalar varias parcelas junto com o MAA e com o

Bornefondem.” (ent.6)

Tem sido uma das áreas privilegiado pelo Ministério de Agricultura, logo são as que mais

financiamentos são disponibilizados e como tal, onde as intervenções das ACD também são

maiores.

Vimos nesses extractos uma outra preocupação das associações, a segurança alimentar. A

agricultura cabo-verdiana destina-se essencialmente a produção alimentar, embora o país

esteja longe de produzir o suficiente para satisfazer as populações. Mesmo com pequenas

intervenções, as associações, como a criação de pequenos hortos familiares, pensam conseguir

minimizar os efeitos dessa insegurança alimentar junto das famílias.

Nota-se por parte dessas, uma grande preocupação em aumentar a capacidade produtiva, mas

não se nota uma preocupação no sentido de valorização dos produtos, de preparação dos

mesmos para a comercialização. Em conversa com os entrevistados, nota-se que os

investimentos, as actividades caem sobretudo na infra-estruturação, descuidando de aspectos

como, reforço das capacidades técnicas humanas e sociais.

Pecuária

A semelhança da agricultura, aliás duas actividades que na ilha andam sempre associados, tem

merecido muitas intervenções de carácter colectivo, mas também é vista com AGR para

ajudar as famílias mais carenciadas a saírem da situação de pobreza.

“Sim, tendo em conta que candidatamos para alguns projectos na CRP, habitação

social não éramos prioridade, saneamento também não éramos prioridade, então

enveredamos para AGR, precisamente na área de pecuária, esse ano estamos a

construir pocilgas, tentaremos introduzir raças melhorado e as próprias famílias que

vão receber as pocilgas vamos ver se conseguiremos dar-lhes já os animais. E

estamos pensando ainda em 2008 no nosso programa de luta contra a pobreza

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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pensamos introduzir bovinos, vamos construir dois currais e adquirir dois bois.” (ent.

4)

“Já fizemos duas pocilgas familiares, mas temos projecto para mais, neste momento

temos o viveiro que fornecemos plantas para pessoas de toda a ilha e temos um

projecto lá para criação de animais, para reprodução e também uma pequena fábrica

de transformação de pastagens para rações de animais.” (ent. 23)

Também ao lado das melhorias na agricultura que se pretende com a modernização da mesma,

a pecuária tem merecido essa mesma atenção, sobretudo na introdução de raças melhoradas e

de outras espécies de animais capaz de garantir algum rendimento, aos pequenos criadores,

com o aumento da criação.

Água

Apesar da agricultura ser uma das principais actividades da ilha, a água disponível para essa

actividade é reduzida. Pelo que, a par da agricultura, a problemática da falta de água tem

merecido uma atenção grande por parte das associações. Mesmo sendo um bem raro, e apesar

da carência, em muitos casos verifica-se que uma quantidade significativa de água é

desperdiçada. A gestão da água, furos e outros sistemas de captação, a sensibilização para a

sua maximização através de novas formas de rega e armazenamento, têm sido algumas das

actividades desenvolvidas pelas ACD’s.

“Havia um furo aqui em Figueiral, foi equipado e deixado ali, então fomos um grupo

de onze pessoas que fizemos um pedido para a câmara com o objectivo de explorar

aquela água, e quando começamos a explorar vimos que era necessário fazer mais

alguma coisa para Figueiral, então criamos a associação, (…).” (ent .23)

Mas a água não é um bem que faz falta só a agricultura, muitas são as localidades que ainda

enfrentam dificuldade e termos de acesso a água potável para consumo doméstico, ainda

muito gente gasta boa parte do seu tempo e esforço na busca desse bem. O aumento da

produção e melhoria da qualidade de água, bem como o alargamento das redes de distribuição

domiciliar são outros aspectos que preocupam as ACD’s nesse sector.

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“Uma outra área é o abastecimento de água, hoje já temos bom número de famílias com

água domiciliária, foi um trabalho que fizemos juntamente com a Câmara, no sentido de

melhorar a qualidade ambiental.” (ent. 4)

Pesca

Sendo Cabo Verde um país arquipelágico, o sector das pescas é tido como estratégico para o

desenvolvimento das ilhas, inclusive para a redução da pobreza, já que muitos são os

agregados familiares que vivem dessa actividade.

É um outro sector em que se nota alguma intervenção por parte das ACD’s, mas já em menor

proporção, comparada com as anteriores, também porque as comunidades piscatórias são em

menor número, só seis associações possui actividade na área das pescas, o que representa 15%

do total das associações analisadas.

“Por acaso, já da para ver porque, ao menos o barco que já a muitos anos

andávamos a procurar de financiamento só agora foi possível, ainda com recurso a

empréstimo no banco, sobretudo para comprar as redes.” (ent. 2)

“Habitação social, pesca, essa zona é uma zona que tem muitos pescadores e

peixeiras, a zona que tem mais pescadores e peixeiras de Porto Novo, já executamos

um projecto na área de pesca, financiado pela Cooperação Francesa. Foi financiado

4 motores, um bote e 10 arcas frigoríficas.” (ent. 11)

As intervenções nessa área têm sido sobretudo na construção de botes e financiamento de

matérias de conservação e comercialização do pescado, sobretudo para as peixeiras. Todavia é

um sector que carece ainda de muita intervenção, como por exemplo, construção de novas

infra-estruturas, os informantes ainda queixam de não existir uma adequada modalidade de

financiamento do desenvolvimento do sector das pescas, como crédito bancário ou micro-

crédito.

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A habitação social/ Saneamento

A habitação social é um sector que encontramos sempre associado ao saneamento. A luta por

uma habitação condigna e uma comunidade com boas condições de higiene tem sido uma

constante junto as associações. Actividades como construção e reabilitação da habitação

sociais, construção casas de banho, fazem parte dos planos de actividades de quase todas as

associações. Também encontramos aspectos como instalação de redes de esgotos, construção

de fossas comunitárias.

“Só habitação social. Já fizemos uma casa de raiz, que foi feito com recursos de CRP,

três casas de banho de raiz, também com recursos de CRP e cobrimos algumas casas

com recursos da associação e de Operação Esperança.” (ent. 1)

“Também assinamos com o Governo através do programa PLPR, assinamos

contratos com a CRP, onde fizemos construções de casas de banhos e habitação

social. A Câmara financiou-nos também uma habitação social e tem co-financiado a

reabilitação de estradas.” (ent. 24)

É uma área que muitas associações intervêm, porque, também é um aspecto que o Governo,

principalmente através do Programa Operação Esperança, e do PNLP, e as ONG’s, elegeram

como prioritária porque a nível de Cabo Verde, a falta de habitação condigna é uma dos

principais indicadores de pobreza. Encontramos 12 associações que ainda não fizeram

nenhuma intervenção nessa área, isso porque ainda não tiveram financiamento para tal, mas

todos os nossos entrevistados tencionam intervir no sentido de melhorar as condições de

habitabilidade das pessoas mais carenciadas das suas comunidades.

Ambiente

A problemática de preservação do ambiente como forma de garantir a melhoria e a qualidade

de vida as suas populações, é uma questão que toca as associações, mas poucas têm feito

alguma coisa nesse ângulo. Boa parte delas tem feito, sobretudo, construções de casas de

banho e alguma arborização de áreas degradadas, que são sobretudo actividades financiadas

por terceiros.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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“Nós preocupamos muito com essa questão de saneamento porque é uma zona que

tinha uma bolsa de pobreza bastante acentuado, maior parte das pessoas, cerca de

95% das pessoas defecavam ao ar livre e de forma desorganizada, então tivemos de

investir muito na área de saneamento, neste momento já temos bom número de

famílias com as suas casinhas de banho para tentar minimizar esse problema. (…) Na

questão também de arborização e florestação, introduzimos um bom número de

plantas desde fruteiras e florestal no sentido de melhorar o aspecto ambiental.” (ent.

4)

Esse tipo de intervenção visa, sobretudo, mudar o cenário existente, a nível nacional, em que

muitas famílias não possuem casas de banho, segundo o QUIBB 200682, nível dos três

concelhos constata-se a mesma tendência, correspondendo essa proporção a mais de ¾ dos

agregados não possuem casa de banho com retrete, 76% no concelho do Porto Novo, a 85%

no concelho do Paul e a 80% no concelho de Ribeira.

A questão do ambiente está sempre associado ao saneamento, onde se destaca actividades de

sensibilização, como palestras, campanhas de limpeza entre outros. É de realçar o trabalho já

feito, no sentido de sensibilização das pessoas, é um grande ganho não ver as pessoas a

lançarem excrementos ao ar livre.

“E ambiente, para além de plantação de árvores participamos nas limpezas, por

exemplo arredores de escola e mesmo na comunidade participamos sempre nas

campanhas de limpeza.” (ent. 6)

“No ambiente o que temos vindo a fazer são essencialmente campanhas de limpeza,

mais no período do fim de ano, e pelas festas de São João, altura que temos mais

concentração de pessoas, então fazemos limpeza de vias públicas. E construção de

casas de banho, para reduzir os efeitos negativos que tem para a sociedade a

defecação ao ar livre.” (ent. 29)

Encontramos também, intervenções específicas em algumas áreas de protecção ambiental.

Como o caso de uma associação de uma comunidade piscatória que tem vindo a fazer um

82 www.ine.cv

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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trabalho meritório na protecção espécies em via de extinção, mas concretamente na guarda

das tartarugas durante o período de desova e nascimento das novas tartarugas, uma espécie

protegida em Cabo Verde.

“Temos vindo a trabalhar na protecção das tartarugas, é um excelente trabalho, que até

ao momento, a nível da ilha somos a única comunidade que tem feito um trabalho do

tipo.” (ent. 2)

Educação

Outro sector social que tem recebido grande atenção das ACD’s é a educação. Constitui uma

importante via para assegurar o desenvolvimento humano e é sem dúvida uma via para

romper o círculo da pobreza. Varias são as actividades apoiadas nesse ramo, desde construção

e reabilitação de edifícios escolares, apoio nas propinas, nos matérias escolares, nas cantinas

escolares, no transporte, na deslocação de alunos para estudarem fora da ilha, e fora do país,

até no pagamento de honorários de monitoras de educação de infância, pois a rede do pré-

escolar ainda não é coberto pelo Ministério de Educação de Cabo Verde, até agora tem estado

a cargo das Câmaras Municipais, das ONG’s, ACD’s, organizações religiosas e outros

instituições privadas. Os dois excertos de entrevistas que se segue mostram claramente esses

aspectos supra mencionados.

“Dentro da educação é muito vasto, neste momento há um rapaz na Rússia que

transferimos uma quantia mensalmente para os seus estudos, já ajudamos jovens a

estudar em Cabo Verde, alguns já concluíram a licenciatura, já ajudamos uma jovem

que já fez mestrado em Portugal, mas também fazemos algumas palestras sobre varias

temas que no fundo é uma forma de educação para a saúde, que está incluído dentro

da área da educação, também apoiamos as iniciativas da escola (…) apoiamos em

actividade como finalista, Natal, 1 de Junho. Ainda apoiamos crianças que não

conseguem pagar propina, no pagamento da contribuição para a cantina. Também

crianças no jardim de Tanque que não conseguem pagar propina do jardim e nos

ajudamos a pagar, para além de pagarmos as monitoras, ajudamos no lanche que se

dá todos os dias.” (ent. 6)

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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“Ao jardim infantil damos 60 mil escudos anualmente. Transporte escolar

mensalmente paga-se quase trinta contos. E escola, somos nós que o tem quase de pé,

somos parceiros número um daquela escola, em tudo, desde pintura, remodelação

total até pagamos para o transporte dos alimentos para a cantina. Ainda há cinco

estudantes no estrangeiro que fomos nós que pagamos as passagens, também alguns

que foram para a Praia. (ent.18)

Saúde

A par da educação, a saúde é outra área social que as ACD’s são sensíveis. Nesse sector, essas

têm dado apoio na aquisição de medicamentos, despesas de consultas e tratamentos,

evacuações e ainda nos funerais, isso mais em caso individuais, mas em caso colectivo,

apoiam actividades como aquisição de equipamentos para postos sanitários, manutenção de

estruturas locais de saúde, pagamento de salário de agentes sanitários, ente outros.

“Neste momento, estou aqui com um orçamento de equipamentos para o Posto

Sanitário. Evacuação, é outra coisa que sempre fizemos, ajudamos pessoas a deslocar

a São Vicente e Praia para fazerem algumas consultas. Neste momento, estamos com

um pedido de uma criança que vai para Portugal. (…) Intervimos também na ajuda a

funerais, já fizemos alguns funerais em tudo, desde caixão até transporte.” (ent. 18)

“Antes, quando tinha o posto sanitário, pagávamos uma pessoa para fazer limpeza,

depois as famílias carenciadas que não conseguiam compra remédios apoiávamos na

compra de remédios, as vezes também quando alguma pessoa vinha a consulta a

associação pagava custo de transporte. Também pessoas que eram evacuadas para

São Vicente apoiavam com 5 mil escudos para passagem de ida e volta. Mas neste

momento não intervimos nessa área tendo em conta com a nossa contabilidade tem

vindo a diminuir.” (ent. 5)

Esse tem sido um trabalho meritório mas como se pode ver no último extracto, esse apoio

vem diminuindo e segundo eles com perspectivas para mais redução. Pois são apoios que tem

de aparecer na hora e muitas vezes, dada a sua natureza, não podem esperar pela morosidade

das câmaras municipais ou pela burocracia dos serviços sociais do Estado, é a associação que

está mais próxima, que sente-se no dever de resolver esses problemas.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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Ainda em termos de saúde, além dos apoios já referidos, as associações participam na parte de

sensibilização para questões de saúde, e palestras e campanhas de sensibilização com

organização, principalmente de saúde pública, em diversas áreas que afecta a ilha, como por

exemplo o alcoolismo, a droga e a SIDA e outras DST. Os parágrafos mostram-nos essa

preocupação com a questão de saúde pública.

“Fizemos uma palestra sobre Sida com o Dr Manuel Faustino, temos feito palestras

sobre alcoolismo, toxicodependência, dependência de vários níveis. Participamos

junto com a delegacia de saúde de Ribeira Grande quando pretendem fazer alguma

campanha na zona, ajudamos na mobilização e sensibilização de pessoas.” (ent. 6)

“Procuramos na zona alguma necessidade, como falta na saúde pública, fazemos

algum documento, vamos ter com a Câmara, com o Posto Sanitário de Chã d’Igreja e

já fomos também ao Hospital de Ribeira Grande, fazer algum denúncia, por exemplo

alguma necessidade principalmente na escola. Agora dizer que já patrocinamos

alguma coisa, isso ainda não fizemos.” (ent.1)

A habitação social, saneamento, educação e saúde tem merecido investimento por parte da

própria associação, muitas vezes, sem ser através de assinatura de contratos com financiador,

em muitos casos esses apoios saem dos fundos das associações.

Formação Profissional

É uma área que pouca atenção tem merecido por parte das associações. Algumas já

promoveram, junto de parceiros, formações em áreas como rendas e bordados, corte e costura,

informática, tecelagem e cestaria, transformação de produtos. As que têm dedicado e essa

actividade, dizem que, deve ser uma aposta formar as pessoas em actividades que podem ser

desenvolvidas nas próprias comunidades, actividades capazes de garantir sustento as pessoas

que as dedicam bem como a família, como por exemplo, fazer artesanato destinado ao

turismo. Os dois parágrafos seguintes são exemplificativos dessas áreas de formação.

“ Já fizemos formação de informática a nível de utilizador, demos um curso de inglês

turístico, no ano passado e devemos dar outro no próximo mês de Fevereiro, também

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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estamos a procura de financiamento para um projecto de corte e costura, rendas e

bordados, tendo em conta passagem nessa comunidade de grande número de turistas,

já temos garantia da CRP.” (ent 29)

“Sim, conjuntamente com a CIAJ e CRP, fizemos algumas acções de formação. E

atribuímos bolsa a jovens que foram fazer formação profissional. Também já fizemos

formação na área de informática. Isso tudo são ganhos, mas que ficam muitas vezes

sem ser conhecido, não há uma divulgação.” (ent. 19)

Comércio

As AGR’s são actividades que agora vêm ganhando espaço no seio das associações. A título

de exemplo, são os pequenos comércios que as associações vêm ajudando os sócios a criarem,

além de que já as próprias ACD’s estão a fazer essa actividade, como forma de garantirem a

sua sustentabilidade.

O comércio é uma área de pouca intervenção das associações, mas já vem surgindo iniciativas

para actividades nessa área como forma de conseguir alguma sustentabilidade para as

associações. Algumas associações já começam a dar os primeiros passos nessa área, outros

manifestam esse interesse para o futuro.

Transformação agro-industrial

Um outro ramo de actividade que ultimamente as ACD’s vêm dando uma atenção é a pequena

indústria, mas concretamente a transformação de produtos locais. Uma actividade

impulsionada em certa forma pela União Europeia, e neste momento muito incentivado pelo

PLPR, como forma de ultrapassar a pobreza. Consiste em formar um grupo de pessoas,

essencialmente mulheres, nessa área e depois dá-las equipamentos para iniciarem as suas

próprias actividades, embora ainda a produção seja só para o consume interno.

“Nesse momento estamos com um projecto com a União Europeia, temos um grupo de

senhoras que vão fazer transformação. Os equipamentos já cá estão, falta é

arrancar.” (ent. 4)

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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Turismo

As intervenções das ACD’s no sector do turismo são ainda incipientes, apesar do governo e

muitos autores dizerem que é um dos principais sectores de desenvolvimento do país, um

motor de crescimento e desenvolvimento.

As acções nessa área por parte das associações, é fraco. Por exemplo, a nível do Concelho do

Porto Novo, um caso de referência no turismo são as actividades desenvolvidas pela ONG

Atelier Mar, sobretudo na formação de pessoas para o turismo rural e turismo de habitação.

Trabalham em algumas comunidades mas não através da associação.

“Temos em mira, mas ainda não fizemos nada nessa área. Temos elaborado alguns

projectos no sentido de ver o que fazer nessa área. Existe uma zona que é frequentado

por turista quase diariamente, uns subindo, outros descendo, é permanentemente e

tens de tirar proveito disso, estamos a incentivar as pessoas que tem algum jeito para

artesanato, para ver se conseguem produzir algumas peças, estamos a tentar

reactivar essas iniciativas, para poder aproveitar. Agora a nossa maior dificuldade é

fazer esse turismo rural. Estamos a incentivar as pessoas a pensarem no turismo

familiar, não são grandes investimentos mas são pequenas coisas. (ent. 4)

Temos um projecto e esse ano está para iniciar uma actividade. Pensamos numa

estalagem, o projecto já esta pronto, vamos agora a procura de parceria, mas não

capital público, parceiro interessado em turismo. (ent. 40)

Muitos são os turistas que procuram pequenas casas tradicionais ou que vão as zonas encravas

e não encontram locais para hospedagem pode ser um dos desafios da associação, junto da

população das comunidades, incentiva-las a prática de turismo de habitação. As actividades

podem ainda ser nas áreas de pequena indústria de transformação e comercialização de

produtos locais, e actividades desportivas e culturais.

Embora hoje já se nota um certa aposta nesse sector, como por exemplo formações de guias

turísticas locais, guias de montanha, ainda esses são a níveis mais macro, isto é, executado por

ONG’s e Instituições do Estado, não são actividades que as associações têm nos seus planos

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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de actividade. Mas prevê-se vir a ganhar mais forma, uma vez que a própria CRP está a

direccionar as ajudas para as AGR’s, e com isso as pessoas possam pensar em actividades

viradas para o turismo.

Mutualismo

O esquema de micro-crédito ou micro-finanças, dirigido aos grupos vulneráveis é de

importância relevante para a luta contra a pobreza. Trata-se de uma estratégia válida de

reconversão de uma assistência que tende a se perpetuar e a cristalizar a mentalidade do

assistido, ao oferecer, em alternativa, aos elementos economicamente activos desse grupo

oportunidades de inserção na economia e, logo, saídas da situação de pobreza.

Micro-finanças, segundo a lei de 15/VII/2007, é toda a “actividade exercida pelas entidades

autorizadas, sem o estatuto de instituições de crédito ou para-bancárias, e que praticam

habitualmente operações de crédito e/ou de recolha de poupança dos seus membros e oferece

serviços financeiros específicos a favor das populações que operam essencialmente à margem

do circuito bancário tradicional.”

É uma outra área que as associações comunitárias de Santo Antão, já se encontram a intervir.

Embora, como já foi referido, a ilha possui uma única associação mutualista a AMUSA, o

mutualismo é um instrumento de promoção do desenvolvimento, que está disponível para as

pessoas individuais ou em grupo poderem arrancar e desenvolver actividades geradoras de

rendimento.

A experiência do micro-crédito em Cabo Verde é, pois, recente e assenta sobretudo no crédito

não institucional, operando fora do sistema financeiro. E a AMUSA neste momento funciona

como uma agência de crédito, pessoas individuais e colectivas têm recebido crédito para

AGR’s. Fundada em 2004, tem como objectivo gerar poupança e continuar a ceder crédito.

Segundo um dos nossos entrevistados, líder de uma associação sócia da AMUSA, “Algumas

associações decidiram criar uma caixa de poupança e crédito, porque as associações não

têm vocação para ceder crédito, então algumas associações juntaram uma parte dos seus

excedentes e reuniram em assembleia-geral e decidiram criar uma associação de micro-

finanças, com o objectivo de arrecadar receitas e depois ceder crédito para pessoas.” (ent. 6)

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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Um outro sócio acrescenta que um outro objectivo da criação da caixa de poupança e crédito

era a erradicação da pobreza. Viram essa possibilidade das pessoas recorrerem ao crédito

como uma forma de conseguirem alguma actividade e saírem da situação de pobreza.

“Pensamos ao criar AMUSA era para vir erradicar um bocado da pobreza, e eu acho

que AMUSA tem contribuído um pouco, porque tem cedido alguns créditos,

principalmente para as mulheres, o nosso lema de bandeira é o desenvolvimento da

camada feminina, e já houve pessoas que beneficiaram de crédito e acho que

melhoraram as suas condições de vida. (ent. 40)

Apesar de ser uma iniciativa de algumas associações, a AMUSA não possui capital

exclusivamente das ACD’s, há participação de outras instituições como a ACDI. Assim

sendo,

“Ate 2007, fundo de AMUSA era só das associações mas foi-nos lançado um desafio

em 2007, se conseguisse-mos 1000 contos dentro dos sócios, ACDI dava-nos 1500

contos, então procuramos associações e não conseguimos encontrar esse montante,

então Vale Verde deu os 1000 contos para conseguir os 1500 da ACDI, neste

momento além do que tínhamos das associações temos mais 1500 da ACDI.” (ent. 6)

Essa associação ainda não é capaz de dar cobertura a ilha, o seu trabalho está restringido a

Ribeira Grande e Paul. A relação que as ACD’s têm com a AMUSA não é só ser sócia, em

muitos casos, quando uma pessoa ou grupo de pessoa da comunidade quer recorrer a um

crédito da AMUSA a associação comunitária pode ficar avalista do crédito.

Apesar de nos terem dito, que não é vocação das ACD’s conceder crédito, um bom número de

associações, tem cedido crédito a seus sócios, como forma de os ajudar a enveredarem para

actividades geradoras de rendimento, onde podem tirar os seus próprios sustentos, ou para

resolver um problema de carácter pontual, como nos mostra os seguintes extractos:

“Sim, já fizemos empréstimo a sócios, para corte e costura, para construção de blocos

para construção habitação e para educação. (…), mas terminamos porque não foi

uma boa pratica.” (ent. 29)

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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“No ano passado demos a nove sócios que queriam arrancar conjuntamente uma

AGR, a associação deu dos seus fundos 300 contos, e estão com muita dificuldade em

pagar. (…) não é fácil trabalhar essas coisas, uma camada rural, pouco escolarizada,

é difícil.” (ent. 9)

Muitos deram testemunho, de não ser uma boa prática por parte das associações, têm alguma

dificuldade em tomarem de volta o valor emprestado, o processo de retorno é muitas vezes

complicado. Segundo um dos nossos entrevistados deve surgir mais instituições mutualistas,

porque o crédito é um bom sistema capaz de acompanhar essa necessidade de enveredarem

para AGR com forma de garantirem auto-emprego.

“Mas nesse momento o crédito é que resolveria essa situação, temos muita gente

aberta, agricultores que tem terra, tem um pouco de água, temos gente com vocação

para fazer pecuária, não tem acesso a crédito então boicota muito.” (ent. 29)

Mas aqui o que se pede, são caixas de poupança e credito onde é possível os mais carenciados

terem acesso ao crédito, pois o que se verifica é que o acesso dos pobres ao crédito em Cabo

Verde é muito limitado porque, eles estão praticamente afastados do sistema formal do

crédito. Logo, a modalidade de micro-crédito, de fácil acesso aos grupos mais vulneráveis

pode ser vista como forma de melhorarem o nível de vida e sobretudo vencerem a barreira da

dependência.

Como já vimos, as associações tem um leque variado de actividades, em diferentes áreas de

intervenção, e em modo de conclusão, desse ponto, apresentamos esses dois extractos, que de

forma resumida, espelham bem as actividades das associações:

“Abastecimento de água, agricultura, saneamento, habitação social, educação, mas

prioritariamente na gestão do Jardim, nós é que fazemos a gestão do jardim de (João

Afonso), desde que Bornefondem saiu, nos assumimos. Assumimos a gestão financeira

do jardim, então criamos uma comissão de gestão do jardim. Em termos e educação,

outro sector que tínhamos vindo a apoiar também, no transporte escolar, quando não

tínhamos o liceu, também apoiamos as famílias mais carenciadas na aquisição de

uniformes e no pagamento de alguma propina. (ent.4)

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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Já fizemos alguma coisa a nível de pecuária, já construímos pocilgas, financiado pelo

MAA, já construímos casas de banho, financiado pela CRP, já reabilitamos moradias

através da Operação Esperança. Já construímos também um armazém na escola de

Branquinho, remodelamos casas de banho na escola do Alto Peixinho financiado pelo

Ministério de Educação. Já executamos também projectos do Programa de

Emergência do MAA, limpeza de estrada, forma de dar as pessoas trabalho. (ent. 12)

4.4 - As ACD’s e Luta Contra A Pobreza

Lutar contra a pobreza é um dos objectivos centrais evidenciados por todos os entrevistados,

isso justifica-se, por se tratar, segundo as estatísticas, da ilha mais pobre do país, onde quase

todas as comunidades são consideradas bolsas de pobreza. Como vimos anteriormente, esse é

um dos objectivos de criação de muitas associações. A grande questão que se coloca é como é

que essas associações estão fazendo para lutar contra a pobreza. Mas antes disso, do que é que

estamos a falar, o que é pobreza para essas pessoas:

“O pobre é aquele que as vezes só conseguem fazer uma refeição num dia, as casas

são muitas vezes sem terminar de construir, não tem um frigorífico, nem sempre tem

um televisor, não tem uma família emigrada para a subsidia-la. (…) Casas que são

autênticos cúbicos onde se encontra só camas, depois podes ver a qualidade das

camas. Uma família com 10 pessoas onde só uma trabalha, não sei se terão duas

refeições por dia.” (ent. 10)

“Para nós são as pessoas que tem não limite mínimo de resolução dos seus

problemas, a nível de alimentação, de habitação, a nível de saúde, a nível de

educação. Encontras um lar não apropriado para condição humana (…). São pessoas

que também as vezes têm uma certa dificuldade em organizar os seus filhos para irem

a escola, para dar acompanhamentos aos filhos. São pessoas que muitas vezes

encontrando doente não tem condições para compra um medicamento para tentar

superar o problema de saúde que tem, isso que nós consideramos pobreza, pessoas

com dificuldade de satisfazer as suas condições básicas de sobrevivência.” (ent. 9)

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Compreendemos aqui pobreza como sendo um estado de privação de acesso aos recursos

capazes de responder às necessidades básicas, entendendo-se estas como o acesso à

alimentação, à água potável, à uma moradia condigna e a recursos mínimos capazes de

assegurar o acesso aos serviços públicos essenciais, como saúde e educação.

Mais do que a análise de indicadores estatísticos ou da simples observação, os trabalhos de

terreno deixam claro que é preciso se aproximar das populações pobres para se aperceber da

dura realidade na qual vivem.

Em muitas das comunidades as condições naturais explicam a pobreza na medida em que

sendo comunidades rurais, as condições ecológicas, muito áridas, não permitem o

desenvolvimento da agricultura e da pecuária de uma forma previsível. Aliado a isto está o

facto de se tratar de ecossistemas relativamente frágeis, como já foi referido anteriormente.

Embora a pobreza esteja praticamente repartida entre os homens e as mulheres, a camada

feminina é, todavia, o segmento populacional que mais sofre os efeitos decorrentes do

subdesenvolvimento. Tal como nos mostra as estatísticas referidas no capítulo II, a pobreza é

maioritariamente feminina, e os entrevistados mostram que as associações têm noção disso.

“Pobreza é ter famílias numerosas, onde o chefe da família é uma mulher onde só ela

trabalha, ganhando o máximo 400 ou 450 escudos por dia, com três ou quatro filhos

em que o pai dos filhos não ajuda, é um bocado difícil, as vezes sem condições (...)”

(ent.5)

“Para mim, pessoas que não trabalham, principalmente as mulheres chefes de

família, com crianças para enviar a escola, para dar de comer, o que faz com que se

comerem uma vez por dia não é mais, mesmo trabalhando muitas vezes aquela coisa

que queres não consegues ter. Então imaginas uma pessoa que não trabalha como é

que sustenta a casa, quando não tens trabalho estás numa pobreza profunda em que

sair de lá não é fácil.” (ent. 22)

As relações de género desequilibradas colocam as mulheres em posição de desigualdade para

uma participação activa na vida económica. As mulheres apresentam as mais elevadas taxas

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de analfabetismo, taxa de desemprego mais acentuado e estão sobrecarregadas com os

trabalhos domésticos e com a educação das crianças, sofrem com os preconceitos mais

diversos.

Há mais probabilidade de se ser pobre quando é mulher rural e muito mais ainda quando se é

mulher chefe de família. Esta última situação assume contornos inquietantes quando se sabe

da elevada percentagem das famílias cabo-verdianas chefiadas por mulheres, e Santo Antão

não foge a regra.

Nota-se na ilha que grande parte das mulheres chefes de família, são mães solteiras, e

sobretudo mães de muitos filhos de pais diferentes, sem companheiro fixo, e que não podem

contar com a ajuda do(s) pai(s) de filho(s). Esta situação decorre fundamentalmente da não

assunção responsável da paternidade. Mas estará também ligada à falta de educação das

mulheres pobres quando estas consideram ser esse o “destino” das mulheres e aceitam a

situação como sendo normal. São essas famílias onde a pobreza se apresenta com gravidade.

Tendo em conta isso, as mulheres têm sido um dos públicos-alvo das principais acções de

muitas associações. O próprio PNLP estabelece como um dos grupos alvo prioritário,

mulheres pobres, sobretudo mulheres chefes de famílias desempregadas. Questionados sobre

quem são os seus público-alvo, percebemos que:

“É a camada mais pobre, as famílias mais carenciadas, mais propriamente mulheres

chefes de famílias, as famílias numerosas. Neste momento estamos a elaborar um

projecto juntamente com a Câmara e CRP para habitação social, alguns

melhoramentos e mesmo algumas habitações de raiz. Existe ali algumas famílias

numerosas, já fizemos nomeação de algumas, temos famílias onde quatro a cinco

pessoas dormem no mesmo quarto. É uma das preocupações actuais da associação.”

(ent. 5)

“E Berlim, é uma zona onde temos muitas mulheres chefes de família, o nosso

objectivo é que essas tenham auto-emprego e que possam desenvolver as suas AGR,

para não ficarem dependentes de FAIMO.” (ent. 11)

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Apesar de ser a mais pobre, ela não deixa de ser vista como a mais capaz de ajudar a família,

e a comunidade em geral, a combater a pobreza. Como nos mostra o seguinte excerto, mesmo

não sendo o público-alvo directo, através delas, melhor se pode chegar a comunidade.

“A principal beneficiária dos nossos projectos é a comunidade, agora só que

apoiamos aquela mulher chefe de família, que é uma mulher que é mãe de cinco

filhos, de seis filhos, de dez filhos e sozinha, no fundo estas a atingir aquela família

através daquela, então, não é bom dizer que o nosso público-alvo é a mulher, ela

utilizamos para poder lá chegar, no fundo é uma forma de utilizar aquela mulher de

uma forma positiva para atingir aquele futuro que muitas vezes para que aquela

criança estudar melhor, para ter melhor educação, agarras aquela mulher ali, mas o

teu objectivo não é satisfazer aquela mulher é satisfazer aquela comunidade, ou seja é

satisfazer o futuro dessa terra.” (ent. 6)

Se o grupo alvo dos principais financiadores,83 são as mulheres, principalmente mulheres

chefes de família, não era de esperar o diferente das ACD’s, pois essas trabalham,

essencialmente com fundo dos financiadores.

Os principais critérios que maiorias dos líderes utilizam para definir pobreza são: não possuir

habitação condigna, dificuldade na área de saneamento e falta de emprego, saúde e

educação/formação, famílias numerosas e principalmente chefiadas por mulheres.

A acrescentar a essa causa e a falta de oportunidades, na nossa sociedade, e em todo o Cabo

Verde, existem factores de ordem comportamental que interferem grandemente na formação

da pobreza. São o que já se convencionou de chamar a “pobreza de espírito”. É o espírito de

resignação e de fatalismo, e de dependência, nomeadamente do Estado, e a crença que

numerosos filhos constituem uma pensão social para a velhice. São os comportamentos que

levam o crescimento das famílias monoparentais chefiadas por mulheres. Enfim, são

comportamentos e atitudes do tipo que tendem a reproduzir situações de pobreza e a diminuir

a iniciativa própria do pobre em sair da situação de pobreza. E em muitos desses casos, a

pobreza é vista como um castigo divino e em relação à qual pouco se poderá fazer a não ser

resignar.

83 Por exemplo o PNLP apresenta como grupo - alvo mulheres, sobretudo chefes de família, desempregados, nomeadamente os jovens e trabalhadores das FAIMO.

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Durante o nosso estudo, verificamos que, nas suas acções, as associações enfrenta muito essa

questão de pobreza de mentalidade, e que grande parte dos seus trabalhos passa pela

sensibilização no sentido de conseguir mudar essa forma de pensar.

“Para nós são as famílias que vivem no limite de rendimento, o que abarca a maioria

daquela gente. Mas também existe uma grande pobreza de mentalidade, muitos

andam a utilizar esse termo para arranjar recursos. De facto há ali muita gente que

vive realmente em situação de pobreza.” (ent. 9)

“ (…) Temos uma rádio que informa, temos uma revista, que agora não está sendo

publicada mas informava e quando informa também procura formar, (…) há tabus, há

estereótipos que nessa cidadania plena a gente tem de saber informar, há uma

estereótipo que identificamos por LQC, (síndrome de lamurisse, queixumisse,

coitadeza)84 isso não deixa a pessoa ser cidadã, porque ela esta sempre a queixar-se

que os outros é que são responsáveis pela situação dela, uma lamuria constante, uma

mentalidade de que ‘eu nasci pobre vou morrer pobre, Deus é que quis’, uma

mentalidade medíocre, provocado por esse síndrome.” (técnico de CRP)

Essa mentalidade assistencialista vem sendo criada a muitos anos atrás. No período após a

independência surgiu os programas de emergência do Governo, como é o caso das FAIMO,

que desempenharam um papel social de relevo no domínio da subsistência da população,

eram programas de assistência aos grupos vulneráveis. Sendo uma das principais fontes de

emprego nas zonas rurais, as FAIMO transformaram-se na mais importante rede de segurança

para as camadas populacionais mais pobres. Embora de grande importância esses programas

criaram nos pobres uma mentalidade assistencialista, uma dependência perversa e

consequente perda de iniciativas autónomas geradoras de rendimento e emprego.

Nas palavras de Monteiro existe em Cabo Verde uma cultura de pobreza caracterizada por

uma não participação e integração efectiva do pobre nas maiores instituições da sociedade;

uma frágil estrutura do eu; um forte sentido de marginalidade, de impotência ou de

dependência e inferioridade; uma escassa capacidade de planificar o futuro e um sentido de

84 Expressão em crioulo que quer dizer “lamuriar, queixar-se e sentir-se coitado”. Expressão criada pela própria pessoa da entrevista.

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resignação e fatalismo. O mesmo acrescenta ainda que “A pobreza gera determinados

comportamentos individuais e sociais que acabam por enformar uma cultura própria,

conformistas e propícia à resignação e inibidora do espírito de iniciativa e autonomia. Uma

cultura de que a mentalidade, profundamente arraigada de fatalismo, o assistencialismo, o

apoio, a dependência em relação ao Estado e ao exterior e a chamada pobreza de espírito

constituem os principais ingredientes” (Monteiro, 2001: 423).

Essa mentalidade assistencialista e a forte dependência das pessoas em relação ao Governo, as

Autarquias e, até mesmo das ONG’s são confirmadas pelos entrevistados:

“ Portanto, se de um lado nós criamos o conforto das populações mas paralelamente

a esse conforto que nos criamos, criamos uma certa dependência, isso é preciso

cortar. Neste momento, o grande desafio das Câmaras Municipais, das ONG’s das

Associações é quebrar essa mentalidade assistencial que existe nas pessoas e levar as

pessoas a pensar que não, através da pesca eu posso organizar uma empresa e posso

sobreviver, através da agricultura eu posso fazer a mesma coisa (...)” (ent. 24)

Actualmente outros programas e projectos vem contribuindo para essa dependência, para o

aumento da denominada cultura de pobreza, como é o caso do PNLP que numa fase inicial,

pouco responsabilizava ou exigia algo dos beneficiários, por exemplo, se estavam a construir

uma habitação social, era dada a família sem que essa desse algo em troca. Os projectos,

como a Bornefonden também cultivaram essa forma de trabalhar, não incutiram nas pessoas o

espírito de trabalharem também para conseguir esse bem, que o seu contributo pode ser

quantificado. Porém hoje alguns desses programas, como o PNLP, mudou a metodologia de

trabalho, e está-se, paulatinamente, conseguindo outros resultados.

Lutar para mudar essa mentalidade passa essencialmente pela informação e formação das

pessoas, como realça o seguinte entrevistado:

“ (...) é uma questão da mentalidade, há uma pobreza de espírito das pessoas, é uma

questão mais psicológico, esse é um elemento caracterizador, por isso, combater isto,

sair desse estado de coisas é preciso justamente formação, informação, sensibilização

das pessoas em primeiro lugar e, depois criar condições materiais para que de facto

ele consiga sair.” (ent. 10)

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No entanto, sentimos que essa ‘pobreza de espírito’ não se toca a todos, nota-se que para

muitos, a pobreza resulta das condicionantes impostas pela sua própria história de vida, não

sendo por conseguinte uma fatalidade histórica e natural. Por esta razão, ultrapassadas estas

condicionantes a possibilidade de sair da condição de pobreza parece garantida. Não sendo

algo incontornável, o que é que as ACD’s tem feito nesse sentido, ou ainda como é que

perspectivam esse combate.

“Para nos lutar contra a pobreza, não é mão estendida a pedir, não é chorar a

lamuriar, e acusar outras pessoas. Para nós é uma construção de riqueza, fazer com

que um individuo, um grupo, a comunidade, a localidade, a ilha de Santo Antão

tenham uma capacidade de intervir para se auto sustentar. Por isso que nós fazemos

apelo a riqueza, ao potencial de Santo Antão. (…) Participar com geração de

empregos e rendimentos. Muita gente é pobre porque não tem oportunidade. Outro

objectivo é capacitar as pessoas com aposta no ensino a distância. Informar e

formar.” (técnico do CRP)

“Pobreza… passa pela própria consciencialização do indivíduo. O indivíduo tem ser

consciencializado que através da sua acção é capaz de combater a pobreza, se não o

incutirmos no espírito, se continuar a fazer tudo para ele, não é possível. Agora, há

que bater na forma de consciencializa-los, uma das formas, é leva-los a entender que

ninguém vai conseguir fazer nada por eles se não tiverem vontade. Se não tiveres

vontade por tudo o que os outros fazem, não é possível. Se aquele pessoal tivesse

vontade, não teria problema, pelo menos em AGR, porque sempre que executamos

projectos, fica sempre alguma coisa estávamos dispostos a ajudar, não teriam

necessidade de recorrer a nenhuma instituição. Agora muitas vezes é preguiça, há

preguiça de todas as formas e principalmente preguiça mental. (ent. 9)

Um dos principais factores de pobreza é o emprego, então essa luta passa por criar condições

para que as pessoas tenham emprego, e uma saída identificada pelas associações e criação de

actividades geradoras de rendimento. Essa deve ser uma das apostas das ACD’s, evitará de

certa forma a dependência e faz com que as pessoas possam lutar para conseguir as próprias

coisas.

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“Como forma de luta contra a pobreza tinhas de ajudar as pessoas a resolver as suas

necessidades básicas, também que houvesse uma politica de ajudar as pessoas a criar

as suas AGR, uma forma de ajudar as pessoas a melhorar as suas condições de vida.”

(ent. 3)

4.5. – Sustentabilidade das ACD’s

Visto quais são as politicas de intervenção das ACD’s, a questão da sustentabilidade é um

outros aspecto que esse trabalho visa concentrar.

Ocupa-nos primeiro esclarecer o que é isso de sustentabilidade das associações. Várias

leituras teóricas levam-nos a dizer que por muito tempo, a sustentabilidade de organizações

sociais esteve associada à eficiência económica. Mesmo no universo das nossas associações,

há uma forte tendência para tratar a questão da sustentabilidade centrado no elemento

económico-financeiro em detrimento de outras dimensões que podem, também, implicar

sustentabilidade.

A concepção de sustentabilidade é mais ampla, do que a referida, e abarca, além do elemento

financeiro, a dimensão técnica e política. Pelo que as organizações espera-se uma

sustentabilidade técnica, que diz respeito às metodologias de trabalho, qualificação dos

recursos humanos, qualidade do trabalho feito e capacidade de organização da instituição, isto

é, o seu desenvolvimento institucional. Uma sustentabilidade política, que é a inserção das

ACD’s em espaços políticos que aumentem a capacidade da sociedade civil se relacionar com

o Estado, e de alguma forma influenciar políticas públicas e as acções do Estado. E uma

sustentabilidade financeira, que significa ter os recursos financeiros necessários para

continuar desenvolvendo sua missão. Assim sendo, importante estar atentos para a inter-

relação necessária entre o técnico, o político e o financeiro para garantia da real

sustentabilidade organizacional, já que entendemos estas dimensões ocorrendo

simultaneamente na dinâmica organizacional.

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4.5.1 - Sustentabilidade Financeira

As nossas ACD’s vem desempenhando as suas actividades com base em recursos conseguido

pelas quotas dos sócios e, sobretudo, recursos oriundos dos sectores públicos e privado,

nacional e internacional, bem como através de alguma actividades própria da associação. A

busca de recursos financeiro tem sido uma das maiores preocupações delas.

a) As jóias e quotas

O associado, enquanto pessoa física, tem um conjunto de direito e deveres dentro da

associação, é uma delas e a obrigatoriedade de pagar a jóia85 a quando da sua admissão e de

pagar mensalmente uma quota86.

Questionados sobre a regularidade do pagamento das quotas, a resposta mais frequente, que

tivemos foi: “Só alguns pagam”. Isso tem sido um dos grandes constrangimentos das

associações, como se pode ver pelos trechos seguintes:

“O pagamento não é tão normal, sempre enfrentamos algumas deficiências, estamos

num meio extremamente difícil, embora os sócios pagam, mas só por volta dos 50 a

60% que pagam regularmente, os outros tem sempre dificuldade.” (ent. 29)

“(…), nem sempre os nossos sócios pagam quotas, dos 65 membros não sei se 20

pagam quotas, contamos é com os funcionários que fazem o desconto logo no banco,

os outros, sendo chefes de famílias, principalmente mulheres, se tiverem cem escudos

é para dar cobertura a um problema, não é fácil e a nossa quota mínimo é de cem

escudos, não ajuda.” (ent. 10)

Esses dois exemplos mostram a proporção dos sócios que pagam quota. As causas para o não

pagamento das cotas são diversas, desde não possuírem o dinheiro para esse fim, até ao facto

de não encontrarem em quem pagar no momento que tem a quantia, pois muitas das

associações não possuem sede, ou se têm não tem uma pessoa permanente, o que faz com que

os associados tenham de deslocar, muitas vezes, a casa do tesoureiro da associação para fazer

85 Contribuição exigida a um sócio quando ingressa numa associação (pode ser paga em prestações). 86 Contribuição pecuniária mensal em que cada sócio deve pagar para garantir o funcionamento da associação.

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o pagamento e muitos têm a tendência de deixar isso para fazer depois, levando a uma

acumulação de meses sem pagar a quota. Essa situação seria em parte ultrapassada, como se

disse no extracto anterior, com o pagamento via banco, mas só possível para os funcionários

do Estado ou por contra doutrem que recebe o salário via banco, o que é um número reduzido

o mundo do associativismo comunitário.

“Não sei se sabes mas associações praticamente não funciona com quotas, tem

alguma pessoa que paga, mas regularidade de quota não existe. Se as associações

estivessem a viver de quota, nem iniciariam funções. Algumas pessoas pagam quota,

também um problema que nós temos é que temos sede mas não temos um funcionário,

e isso dificulta porque as vezes pessoas vem pagar mas não encontram a porta aberta,

tem de ir a casa de uma outra pessoa, então isso dificulta mesmo a recolha do

dinheiro. Temos uma quota mínima de 50$00, e sócios novos que pagam quota com

mais regularidade que sócios fundadores. Associação não vive de quota porque não

dá.” (ent. 44)

Ao que se pode ver, as quotas são quantias irrisórias que não garante nem o funcionamento

das associações. Os dois valores mínimos estabelecidos pelas associações são 50$00 e

100$00. Isso tem sido uma das grande dificuldade das ACD’s, sensibilizar os membros para

pagarem as quotas, pois ao que conseguimos constatar é que em quase todas as associações

não encontramos 50% dos sócios a pagarem as quotas regularmente, e em alguns casos

ninguém paga, isto é, o valor das quotas é nulo.

Uma outra causa advém, em alguns casos, de uma má gestão das associações. Conhecemos

casos de, pelo menos, duas associações, que hoje nenhum associado paga as quotas devido a

desvio de dinheiro de dirigentes anteriores. Neste caso as pessoas recusam pagar, alegando

que não sabem o destino das suas contribuições, segundo um dirigente, nesse caso, é preciso

fazer antes um bom trabalho para que as pessoas possam de novo acreditar na associação e só

depois pedir que paguem quota, isto é, retribuir o crédito a associação e merecer a confiança

das pessoas.

Uma das consequências disso, é que as associações, no inicio do ano, ao elaborarem o plano

de actividade e o orçamento, contam com o valor das quotas, mas não pode prever se esse

valor entra ou não na sua contabilidade, é algo que não podem controlar. Além disso não ter

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sócios que cumprem com os seus deveres é uma má imagem da associação. Como nos disse

um técnico do MADRRM, que trabalha com as associações:

“Quota é uma questão complicada para as associações, tem associações que sócios

nem sequer pagam quotas, muitos queixam de não ter o dinheiro, um limite de cem

escudos, não pagam e isso cria muitos constrangimentos numa associação, por

exemplo se quiseres apresentar um projecto num financiador, as vezes querem saber

qual é a situação de sócios em termos de pagamento de quota.” (ent. técnico de

MADRRM)

Os estatutos das associações dizem que o sócio que não tem a situação de quotas em dias

perde o direito de sócio, ou seja, não pode participar nas assembleias, não pode votar nem

concorrer a algum cargo nos órgãos sociais. Contudo, muitas associações não tem seguido

com rigorosidade essas cláusulas do estatuto, porque assim sendo algumas ficariam sem

sócios. Senão vejamos uma resposta que obtivemos, quando questionamos se no estatuto não

há forma de fazer as pessoas pagarem.

“Tem, mas qualquer associação se for atrás das normas dos estatutos acabaremos

por ficar sem sócios. Contamos com 76 sócios mas é só formalidade, na prática não,

porque não pagam a cota e não pagando depois de uns meses tinhas de correr com

eles de acordo com o que diz o estatuto, mas não temos vindo a fazer isso, até muitos

sócios já pensaram em tomar as suas jóias que tem na associação, é um direito que

tem, quando saem toma as jóias, mas não temos feito isso.” (ent. 3)

Perante essas dificuldades, algumas associações vêm procurando diferentes mecanismos de

cobrança. E têm conseguido, pois não são todas as associações que enfrentam essa

problemática, mas também é um numero muitíssimo reduzido que não queixa disso. Uns

preferem apostar numa forte sensibilização das pessoas, mostrando os benefícios de um sócio

cumpridor dos deveres.

“Uns vão dando, as vezes pressionamos as pessoas, dizendo que se não paga a quota

não tem palavra, não tem direitos, então porque as vezes querem estar em cima vão

pagando. É um aspecto que eu acho positivo na nossa organização é a questão de

pagar as quotas.” (ent. 24)

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“Geralmente nós solicitamos, chamamos atenção e lembramos que tem quota em

atraso. Já sabem que se não pagarem perdem os seus direitos, se as pessoas não

cumprirem os seus deveres na associação perdem os seus direitos.” (ent. 6)

Um outro mecanismo de cobrança é descontar nos salários, embora só funcionem com as

associações que estão executando alguma obra, neste caso tenham uma frente de trabalho

aberto onde emprega os seus sócios. Quando não estão com actividades do tipo não

conseguem cobrar.

“Quota, por acaso na nossa associação só cerca de 50 à 60% é que paga a cota, o

resto das 40% é muito difícil. Temos utilizado um outro sistema que quando temos

trabalho, damos trabalho a essas pessoas e logo nos salários descontamos a quota.”

(ent. 27)

“Quotas, quase todas as associações tem dificuldade em receber quotas, dada a

dificuldades que as pessoas têm, falta de trabalho. Mas quando a associação tem

trabalho a quota tiramos do salário, é uma forma de conseguirmos até os atrasados.”

(ent. 28)

Esse mesmo mecanismo de cobrança não é defendido por todas as associações, achando que o

pagamento deve ser um acto espontâneo do sócio e nunca obrigado a fazer, é um dever que

está no estatuto e sendo assim devem paga-lo, independentemente de empregado ou não. É o

que defende os seguintes lideres:

“Quota neste momento é praticamente nulo, são pouco as pessoas que pagam. Temos

muitos sócios até inconscientes, porque aqueles que estão no trabalho, se fossemos

autoritários tiraríamos logo na folha de pagamento. Não pagam a quota, pouco ou

nada paga.” (ent. 18)

“Temos sócios que trabalham na frente e eles mesmos aderem, nós não podemos

forçar as pessoas a pagarem as quotas, tem de pagar de livre e espontânea vontade.

Mas sempre que fazemos pagamento, temos cerca de 190 pessoas no trabalho e

sempre pagam.” (ent. 25)

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A nosso ver, não é a forma mais apropriada de fazer a cobrança. Isso intensifica a ideia de que

a associação existe para dar trabalho ou para executar obras, será como pagar uma cota para

uma agência de emprego, ainda assim só quando estou a beneficiar. Essa ideia de pagar só

quando estão a beneficiar, confirma o que já foi dito anteriormente, existe uma falta de

formação das pessoas sobre o que é o associativismo, quais os seus papeis nesse movimento

associativo e quais as reais contribuição de uma associação comunitária.

Ao que se pode concluir desse ponto é que as associações não podem sobreviver com o que

entra das quotas, isto é, quando entra. Sendo assim tem de recorrer a parcerias no sentido de

poderem por em prática as suas actividades programadas.

b) Financiamentos e financiadores

No capítulo III, referimos os principais parceiros das associações. Pretendemos agora ver na

prática como é estabelecida essa relação. É com boa parte, das actividades que desenvolvem

com financiamento desses parceiros, que as associações conseguem ter algum fundo para o

seu auto-sustento.

Relação ACD’s e OADISA/ FADEP – MADRRM e MIT

Podemos dizer que a OADISA e a FADEP são os representantes dos Ministérios de

Agricultura e do Ministério das Infra-estruturas junto das associações, quando essas assinam

contrato com a OADISA e a FADEP os fundos vem de um desses ministérios. Ao que

acabamos de ver, os fundos das associações não são só das quotas e jóias, esses tem uma outra

origem.

“Nós não temos por onde sair algum fundo, as vezes é mais dos trabalhos com o

MAA, de acordo com o nosso desempenho, nossa gestão, tem tido um pequeno

excedente.” (ent. 36)

“É só nas obras de engenharia rural, construção de diques, naqueles sempre tinhas

excedentes, se tinhas um dique de mil e tal contos podias faze-lo por novecentos e tal,

dependendo da zona também. Mas podias motivar os trabalhadores para poderem

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produzir mais no sentido de poderes auxilia-los na compra de um medicamento,

transporte escolar, isso no sentido de poupares alguma coisa. Por exemplo de acordo

com a zona que vais construir, eles atribuem uma percentagem de transporte, uma

compensação de transporte, mas nesses outros programas não fazem isso. Nesses

davam 20 % a 30% acima do montante para compensar no transporte, mas nesses

mais recentes não há.” (ent. 4)

“Neste momento estamos num trabalho, que é do MIT, estamos a fazer um pedaço de

estrada.” (ent. 31)

As associações, têm conseguido algum fundo com execução de obras de construção civil, mas

concretamente dos contratos-programa assinados com o Ministério da Agricultura. Porém

num período anterior, época em que estava em Santo Antão o projecto PL480, foi o período

em que associações tiveram maior fonte de rendimento, fundo esse que muitos, ainda hoje

preservam.

“O que dava algum fundo as associações, era os trabalhos financiados pela ACDI,

por exemplo, os diques que construímos nos deram algum fundo, ao construíres um

dique já orçamentado consegues ter algum excedente.” (ent. 17)

“(…)por exemplo, ACDI financiava um projecto com um orçamento com uma margem

alargado e ai sempre previam um excedente, só por exemplo, no primeiro ano

conseguimos um excedente de mil e tal contos, embora foi num lugar difícil, esse foi

empregue na construção de uma estrada.” (ent. 24)

O Ministério da Agricultura, apesar de ser um dos principais financiadores das associações,

esses enfrentam grandes constrangimentos com esse financiador, que é o atraso no

desbloqueamento das verbas dos contratos assinados.

“A nossa associação neste momento não tem fundo a vista, tendo em conta que

executamos algumas obras com o nosso próprio fundo, agora estamos a espera que

nos reembolsam, Ministério da Agricultura é um dos parceiros que estamos a

espera.” (ent. 5)

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

128

“Estávamos fazendo uma estrada de acesso para um reservatório, mas esta parada.

Agora vamos trabalhar terreno para rega gota a gota, com o Ministério da

Agricultura. A estrada de acesso também era com o Ministério da Agricultura, mas

não estão desbloqueando verba, está parada.” (ent. 32)

Os embaraços que esses atrasos causam as associações, que tem contratos assinados, são

reconhecidos pelos próprios técnicos do Ministério.

“Há atrasos sim, principalmente de 2005/2006, que ainda não conseguimos resolver,

com algumas associações, principalmente no Porto Novo. É mesmo programa do

governo. Na altura foi criado o Programa Adicional de Emprego Público, é uma

verba que não saiu do tesouro.” (ent. técnico do MADRRM)

Além de serem através deles que as ACD’s estabelecem relação com os Ministérios, esses

dois organismos, OADISA e FADEP, apoiam as associações em áreas como elaboração de

projectos, que depois são encaminhados para os financiadores, e em contabilidade, áreas

importantes para a sobrevivência das mesmas, e que muitas vezes, por falta de capacitação

dos seus membros, têm de recorrer a esses organismos ou a pessoas particulares para os

prestar esses serviços. Esses organismos dos quais as associações são sócios, em alguns casos

fazem formações no sentido de capacitarem mais as associações, principalmente nessas duas

áreas e em outras capaz de garantir capacidade organizacional.

"Continuamos sim (na OADISA), eles pelo menos dão apoio técnico, na elaboração

de projectos, já tem mais experiência. Na contabilidade era mais pontual do que

agora, FADEP não tem um contabilista.” (ent. 33)

“OADISA acompanha em termos de contabilidade, e seguimento, se pedirmos na

OADISA sempre temos, agora CRP é diferente, está virado somente para o

financiamento de PLPR, agora beneficiamos das actividades, por exemplo, quando

dão formação.” (ent. 24)

Essas referidas instituições, apesar de serem financiadores indirectos das associações, pois são

financiamento que vem do Governo, ajudam as associações a procurarem outros financiadores

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

129

para as suas actividades87 e em casos pontuais apoiam em áreas diversas, como por exemplo,

ficar de fiador de uma associação que pretende contrair uma empréstimo numa instituição

financeira.

Relação ACD’s e CRP/PNLP

Como já foi referido anteriormente, a Comissão Regional de Parceiro - CRP é o responsável

para a implementação do PNLP a nível da ilha. A CRP tem como principal parceiro as

associações, tanto é que uma comunidade, mesmo sendo ela muito pobre, só beneficiará do

programa e dos financiamentos para diferentes intervenções, se esta estiver organizada. O

sub-programa PLPR, assente numa política de desenvolvimento rural, reflecte um cenário de

grande protagonismo destas organizações associativas tendo em conta o nível da dinamização

e envolvimento das comunidades locais.

Segundo o relatório de actividades de 2008, nesse mesmo ano, fazia parte das estruturas da

CRP 71 associações. Financiaram micro projectos de 23 associações dos três concelhos, no

total de 10.569.251$00. Sendo 7 do Paul em áreas como construção e reabilitação de

habitação social e casa de banho, transporte escolar, aquisição de gado de raça melhorada e

construção de reservatórios no valor de 5.246.208$00. Com 10 associações de Ribeira

Grande, a CRP financiou o montante de 3.355.713$00 destinado exclusivamente ao transporte

escolar e subsídio escolar para estudantes do ensino secundário que frequentam o Internato,

por pertencerem a comunidades encravadas do concelho. Com ACD’s de Porto Novo também

só financiaram transporte escolar, no total de 1.967.330 à seis associações. Mas para esse

relatório o montante de financiamento ficou a quem das expectativas uma vez que houve

grandes atrasos no desbloqueamento das verbas, pelo que, só conseguiram realizar as suas

actividades programadas a partir de Novembro de 2008.

A título de comparação, apresentamos no quadro seguinte que mostra os valores dos contratos

assinados com as associações em cada concelhos de 2006 à 2008.

87 Mais a frente poderemos ver um exemplo, o caso da relação entre as ACD’s e a União Europeia.

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Quadro 14 – Montantes financiados as associações de 2006 à 2008

2006 2007 2008

Associações Valor Associações Valor Associações Valor

Ribeira

Grande 14 14.474.486 17 26.265.475 10 3.355.713

Paul 10 9.464.319 10 18.631.470 7 5.246.208

Porto Novo 12 10.165.667 11 18.105.443 6 1.967.330

Total 36 34.104.472 38 63.002.388 23 10.569.251

Fonte: Relatórios de actividades da CRP

O quadro mostra um aumento do montante financiado em todos os concelhos, de 2006 à

2007, para no ano seguinte verificar uma acentuada quebra, quer do montante quer do número

das associações que vinha assinando contrato, de 38 passou a 23 associações que assinaram

contrato em 2008.

Gráfico 7

Valor financiado por concelho

0

5.000.000

10.000.000

15.000.000

20.000.000

25.000.000

30.000.000

2006 2007 2008

Ano

Esc

ud

os

Cab

ove

rdia

no

Ribeira Grande

Paul

Porto Novo

Fonte: Dados de pesquisa de terreno

O gráfico 8 mostra-nos, de forma mais perceptível essa quebra verificado em 2008. O

aumento de 2006 para 2007 foi de 28.897.9164$00 e a baixa de 2007 à 2008 foi de

52.433.137 escudos.

O programa, a nível local, procura fazer uma mobilização social das populações à volta de si

mesmo. Assim sendo uma das medidas identificado no Documento Quadro do PNLP é

reforçar, a capacidade da comunidade para que as populações participem em todas as etapas,

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

131

desde à identificação à execução e gestão das actividades, mas também, que assegurem a sua

perenidade e uma forma de conseguir isso é através de organização comunitária.

Dai que, como já vimos, o PNLP vem estimulando e apoiando o associativismo comunitário,

e consta dos seus programas, prestar assistência técnica e financeira às estruturas

comunitárias existentes no sentido de poderem assumir o processo de desenvolvimento a

nível local e a luta contra a pobreza e, também ajudar a capacitar os recursos humanos da

comunidade em áreas importantes para o desenvolvimento local e comunitário.

“Do CRP temos tido apoio na área de formação e também na área de financiamento

de projectos. No ano 2004/05 trabalhamos com PNLP na área de habitação social e

saneamento, construção de casas de banho, depois fumos suspenso mas agora

estamos de novo a trabalhar com CRP, somos beneficiários.” (ent. 4)

O PLPR define os seus grandes eixos de intervenção, e com base nisso, as ACD’s elaboram

projectos e candidatam a financiamento junto da CRP.

“Tem sido mais a área social. Tem financiado muito, já tivemos, junto com a PSGD,

construímos um jardim no Segundo Povoado, reabilitamos um jardim no Terceiro

Povoado. Junto com a CRP, já entregamos duas habitações de base, também

recuperamos outras duas habitações. Ainda com PSGD fizemos sete casas de banho.

(ent. 31)

Esse excerto aborda um aspecto que, a nosso ver, é pertinente esclarecer. O que já foi dito, da

relação ACD’s e CRP, são sobretudo forma de actuação e modalidade de financiamento mais

frequentes a partir de 2005, período esse que só ficou em Santo Antão o PLPR, os outros dois

programa dos PNLP, nomeadamente o PSGD e o PDSS findaram as suas actividades.

De 2001 a 2005 muitas outras áreas mereceram intervenção, de distinguir a infra-estruturação,

com grande destaque para reservatórios para distribuição de água, tanto para agricultura como

para consume domiciliário, construção de estruturas de ensino e de saúde, e construção de

Centros Sócio-Comunitários em várias localidades.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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A construção deste tipo de equipamentos visava directamente cobrir lacunas em diversas

aéreas, de entre os quais se deve destacar:

O funcionamento de serviços indispensáveis para garantir serviços e cuidados

básicos a população (a nível de educação, saúde, entre outros);

O estímulo ao convívio e a participação comunitária em espaços comuns,

locais de formação/informação, como é o caso dos Centros Sócio-

Comunitarios.

Em 2008 a CRP identificou como área de intervenção prioritária as AGR’s, como forma de

garantir auto-emprego e sustento do beneficiário e da família. Privilegiarão em 2009

actividades nesse sector. E uma aposta forte tem sido no sector de formação e capacitação

para o empreendedorismo.

Constata-se que, o Governo tem sido o maior financiador das actividades das ACD’s, quer

através dos fundos da Ajuda Norte Americana geridos pela ACDI, projecto PL480, quer pelos

contratos programas assinados com o MADRRM e com o MIT, através de programas de

emergências, projectos de investimentos ou programas de emprego publico, ou ainda pelos

financiamentos cedidos pelo PNLP.

Relação ACD’s e Operação Esperança

Um outro programa do Governo executado directamente pelas as associações é a Operação

Esperança. Como já foi dito na primeira abordagem a esse programa, ela está direccionada

para a área de recuperação de habitações degradadas, com o objectivo de proporcionar

habitação condigna aos mais carenciados.

“Remodelação de habitações. Neste momento já fizemos uma primeira fase, de

166.000$00 e estamos a espera da segunda tranche.” (ent. 18)

“Foi só reabilitação de pequenas coisas, da primeira vez foi 300 e tal contos, da

segunda vez foi cento e noventa contos, conseguimos alarga-lo a mais famílias,

construímos três pequenas habitações, contou bastante com a participação das

famílias.” (ent. 23)

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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O estrato seguinte espelha a modalidade de trabalho desse mesmo programa junto das

associações.

“Igualmente no programa operação esperança, fazes a identificação do beneficiário,

fazes intervenções, apresentas justificativos fazem um primeiro desbloqueio de verbas,

apareçam para fazer visitas e acompanham através de fotografias.” (ent. 4)

Relação ACD’s e Câmara Municipais

Para além das relações assumidas pelo Estado junto das associações locais, há que,

seguidamente, apontar também o envolvimento das Câmaras Municipais. As Câmaras da ilha

também têm sido parceiros e financiadores das actividades das associações em quase todas as

áreas de intervenção das mesmas.

“Tem sido uma boa relação. Câmara tem sido uma parceira, porque temos assinados

uns contratos com a Câmara, na altura de limpeza de estrada, é a traves de concurso

mas já ganhamos concursos duas vezes para limpeza dessa estrada de Boca de Curral

até Chã de Pedras. Já fizemos a Câmara também três habitações, mas nesses

programas quase que não ganhas nada, porque nos executamos mas são eles mesmo

que vêm fazer os pagamentos.” (ent. 4)

Em muitos casos as ajudas das autarquias são mais pontuais, através de serviços como

cedência de viaturas para transporte de matérias para uma determinada construção, apoio na

elaboração e seguimento de projectos arquitectónicos e de construção civil, transferência de

terrenos para construção de edifícios para funcionamento de associações, de entre outros.

Ao que se mostrou até aqui, pode-se afirmar, que muitas das associações não tem como

sustentar, e a dificuldade maior é conseguir uma sede própria, pelo que em algumas

comunidades, parte dos Centros Socio-comunitários são cedidos pelas Câmaras para o

funcionamento das associações. Nesse sentido, as associações aparecem aqui também como

parceiras das Câmaras na gestão de equipamento social, como é o caso do Centro Socio-

Comunitário de Sinagoga que é geria pela associação comunitária, que matem ali a funcionar

uma tele-centro.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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Além do Governo, e das câmaras municipais, através desses referidos programas, as ACD’s

têm conseguido financiamento para certas actividades de outros parceiros, como as

Embaixadas, ONG’s Internacionais, União Europeia, entre outras instituições.

Relação ACD’s e outros financiadores

o ICASE

O Instituto Cabo-verdiano de Apoio Social e Escolar foi pensado para apoiar as crianças mais

carenciadas para o acesso a educação. Apoiam em termos de fornecimento de materiais

escolares, nas cantinas escolares, no pagamento das propinas e nos transportes escolares, áreas

essas que também as associações são sensíveis.

O ICASE através de parcerias vem pondo em pratica essa sua missão, sendo um desses

parceiros as associações comunitárias:

“Não podemos fazer sozinhos, procuramos parceiros, nesse momento contamos com

parceria de ICASE, Câmara e CRP.” (ent. 39)

o Plataforma das ONG’s

A Plataforma das ONG’s uma organização da carácter nacional, tem como missão a

promoção, acessória, assistência técnica, formação, mobilização de parceiros e financiamento

das ONG’s, ou seja, dotar as suas associadas de condições para consolidação da sua

autonomia e sustentabilidade.

A participação da Plataforma das ONG’s, junto das associações comunitária, tem sido mais na

área de reforço institucional das ACD’s, um dos principais objectivos é capacita-las para que

possam andar com os seus próprios pés, isso através de acções de formação, assistência

técnica, fornecimento de equipamentos para as suas sedes, nomeadamente equipamentos

informáticos. Sobre esse aspecto vejamos os seguintes extratos:

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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“Na área de formação. Já fomos participar em algumas acções de formação na Praia

e em São Vicente. Também já metemos algumas fichas de projectos para ver se é

possível algum financiamento.” (ent. 4)

“Sim, a nossa associação nesse momento é a antena da plataforma no Paul, fomos

escolhidos, já tivemos algumas actividades com a Plataforma. Construímos uns

mobilares para o jardim, financiado pela Plataforma, e enviamos outros projectos,

mas não há nada de concreto ainda.” (ent. 25)

o Embaixadas e outros Organismos Internacionais

As políticas dos governos tem sido quase todos financiados pela cooperação internacional,

porém, os financiamentos externos não chega ao país somente através dos acordos bilaterais

mas sim através de ONG’s internacionais, consulados e embaixadas presentes no país.

Como já foi referido a Bornefonden é um exemplo de um organismo internacional a actuar

em Cabo Verde. Também um dos importantes financiadores das actividades das ACD’s, é

identificada pelos informantes como uma das principais parceiras em áreas como habitação

social, saneamento, educação e formação e AGR, para as famílias.

“Com apoio da Bornefondem construímos 50 pocilgas (…). Tem sido um parceiro

imprescindível desde o seu início, principalmente no melhoramento de condições de

vida, de condições habitacionais e saneamento. Também no apoio escolar. Ainda

estamos a construir duas habitações sociais.” (ent. 40)

Também já construímos junto com a Bornefondem uma sala de aula, um refeitório,

uma sala de professores e melhoramos uma casa de banho na escola de Tanque. (ent.

6)

A União Europeia, é outro organismo que trabalha com as associações, mas nesse caso, de

forma um pouco diferente, chegam as mesmas através da OADISA e da AmiPaul. O apoio da

União Europeia é sobretudo para actividades geradoras de rendimento, e nos últimos anos a

aposta é nos centros de transformação de produtos agrícolas, mais direccionadas para as

mulheres mais carenciadas das comunidades.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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“União Europeia financiou uns currais comunitários que é para cabras, objectivo é

incentivar as pessoas a fazerem o que fazíamos antigamente, todos tinham, uma cabra

que ajudava a comprar os materiais escolares dos filhos, e não só.” (ent. 17)

“Conseguimos com União Europeia, um bom material, todo o equipamento para

transformação e também a formação daquelas mulheres. Neste momento já temos um

espaço e com apoio da Bornefondem com um material para panificação, isso quer

dizer que vamos produzir doces e licores e também vamos produzir pão.” (ent. 23)

As embaixadas são outras instituições que através das associações aparecem apoiando o

processo de desenvolvimento local e luta contra a pobreza. Ao longo dos anos têm

estabelecidos acordos directos com as associações comunitárias, financiando actividades

diversas, como nos mostra os parágrafos seguintes.

“Temos intervindo a nível ambiental, onde fazemos campanha de limpeza,

conseguimos colocar contentores, junto com a Embaixada dos EUA, o projecto

incluía rede de esgoto e fossa comunitária, toda a comunidade tem cobertura de rede

de esgoto, foi aqui que ganhamos um premio, a máquina de gelo foi um premio que

ganhamos na embaixada. Ganhamos o premio e endereçamos para a pesca pensando

que assim poderíamos ajudar as famílias, (…).” (ent. 38)

“Com a cooperação francesa nós fomos ter com eles, temos um protocolo assinado a

vários anos, já uns anos marcamos uma audiência e falamos com o embaixador, três

meses depois ele veio a Ribeirão e a parti daquilo criamos laços de amizade. Também

hoje temos protocolo com a embaixada da América, com o mesmo sistema,

procuramos, convidamos a embaixadora para vir cá. Ami-Ribeirão sai a procura de

parceiros.” (ent. 40)

Como se pode ver as relações são estabelecidas muitas vezes de forma informal, através de

conhecimentos pessoais ou então as mesmas associações saem a procura de financiadores

para as suas actividades e batem a porta das embaixadas. Questionados sobre como

conseguiram estabelecer os acordos, ou como conseguiram os financiamentos, escutamos o

seguinte:

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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“Tínhamos um sócio que tinha conhecimento com o embaixador, ele trouxe o

embaixador para Lombo Branco para fazer uma visita. Mostramos um projecto que

tínhamos, achou que era viável e financiou-o, que era um depósito de captação de

água das chuvas. Isso foi financiado numa primeira fase, na segunda fase entrou

outro embaixador que achou que não era viável e nem financiou a segunda fase,

fizemos outros projectos e enviamos mas… com a mudança de embaixador o nosso

relacionamento não teve continuidade.” (ent.5)

“O meu colega enviou o projecto directamente, depois uma das senhoras deslocou cá

para ter um encontro connosco, corrigimos o que estava em falta no projecto.

Financiaram, vieram visitar e já assinamos fim de contrato, junto com o cônsul. E

agora nos sugeriram outro projecto, só que o outro projecto que sugeriram tem mais

dificuldade em faze-lo devido o facto de ser de fumagem de peixe e é preciso um

espaço e isso, não temos, e eles dizerem que não financiam edifício.” (ent. 11)

o Comunidade emigrada

Junto a comunidade imigrada, tem sido um outro lugar onde as ACD’s vão a procura de

recursos para as suas actividades. Os seus contributos são encaminhados para áreas como

educação, saúde, habitação e saneamento. Sobre isso, um dos nosso entrevistados afirma que:

“(…) Temos feito possíveis também juntos dos emigrantes que já enviaram coisas

para o hospital, alguns medicamentos. (…) Também na educação, no final do ano,

distribuímos muitos materiais escolares que enviaram.” (ent. 31)

Os emigrantes conseguem isso de forma isolada ou organizada. Existe organização de

emigrantes que além de financiarem directamente, também procuraram financiadores nos

países de acolhimento.

“Neste momento temos um projecto interessante de 30 computadores que esta quase a

chegar, financiado por um banco na Itália, onde pensamos equipar uma sala de

informática para começar a dar aulas de informática e o resto será distribuído as

outras escolas. (…) Foi através que uma emigrante cá da comunidade, uma senhora

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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cujo marido trabalha nesse banco, numa conversa, ele nos disse que o banco

financiava projectos desse tipo mas tinha de ser com alguma envergadura. Não tinha

de ser dez computadores, tinha de ser um projecto grande. Chegamos a um

entendimento onde são 30 computadores com 30 impressoras. Depois de

implementado virão ver o resultado do projecto e depois daí tentaremos novas

parcerias.” (ent. 25)

“Financiamento para habitação social é através de uma organização não

governamental Holandesa, que os financiou, mas através de uma outra organização

que é Amigos de Lagoa em Roterdão, eles é que arranjam financiadores lá, depois

vem e conjuntamente com Câmara executamos. Câmara faz a fiscalização das obras,

nós executamos mas o dinheiro vem directamente para a nossa conta.” (ent. 13)

A forma de conseguir esse tipo de financiamento, como se vê nos dois parágrafos é mais

informal, sobretudo baseia nos conhecimentos pessoais dos emigrantes.

Com base no atrás exposto, podemos afirmar que, os fundos das associações, são do pouco

das quotas arrecadadas, e dos excedentes que conseguem através de assinaturas de projectos

com o Governo ou outros organismos, para execução de obra.

“Não podemos falar da cota dos sócios, porque cem escudos por mês é insignificante

tendo em conta os nossos projectos, nosso financiamento tem vindo do governo de

Cabo Verde, (…) então nosso fundo é de obras que executamos e excedentes que

conseguimos das obras.” (ent. 6)

Constata-se que, o que as associações têm conseguido fazer até então, e com recurso que vem

de fora, uma vez que internamente, pouco ou quase nada podem gerar. Assim sendo, esse

excedente conseguido, destina-se sobretudo, para garantir o funcionamento da associação e

para as actividades de caris social, presentes nos seus planos de actividade. Os custos de

funcionamento, para as associações que já possuem uma sede, são com renda, luz, água,

telefone, gastos de secretaria e representação da associação.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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Ainda ao que toca a essa relação com esses financiadores, há dois aspectos que gostaríamos

de destacar, a atribuição de subsídios introduzido pela ACDI e a dependência das obras

adjudicadas, como meio de obter recursos.

Um outro elemento que vem pesando muito no custo de funcionamento de algumas

associações é a atribuição de subsídios aos dirigentes. Uma pratica adoptada por algumas

associações, sobretudo as que inicialmente trabalharam com financiamento da ACDI88.

“Isso é uma contrariedade. Temos vindo a fazer de seguinte forma, a medida que

vamos assinando projecto vamos atribuindo gratificação. É para presidente e

contabilista. É uma coisa que temos vindo a tentar eliminar. Intenção é eliminar,

porque é muita despesa e não temos nenhuma fonte de rendimento.” (ent. 33)

O trabalho das ACD’s tem base no voluntariado, contudo a ACDI, veio introduzir a

modalidade de gratificações para o presidente da associação e para o tesoureiro ou

contabilista. Essa era uma exigência da ACDI, para as associações que assinavam contratos,

isto é, quando a associação estivesse a trabalhar com financiamento da mesma. Segundo

conseguimos constatar era que esses pudessem prestar um trabalho de qualidade, para que não

tivesse nenhuma irregularidade.

“ACDI na altura publicou um manual operacional, que servia de guia de orientação

para associações, onde colocavam essa questão. Para evitar que cada associação

ditasse a sua gratificação então estabeleceram uma regra de quem teria gratificação,

presidente, secretário, contabilista e tesoureiro, isso porque, o presidente tem

necessidade de fazer algumas deslocações, muitas vezes usando os meios próprios, o

contabilista, por ser um trabalho que exigem uma certa responsabilidade e tesoureiro

88 Relembramos que a ACDI iniciou as actividades em Santo Antão numa altura que existia um número reduzido de associações, onde foi possível executar grandes projectos e conseguiram arrecadar bons fundos. Se não, vejamos: “Somos membros da direcção da OADISA e membro da mesa de CRP, e sempre temos vindo a debater nessa tecla, há muitas associações que vão fechar as portas, principalmente com a saída da ACDI, porque ACDI dava grande ajuda para associações e mesmo o sue modelo favorecia e os seus projecto dava margem para tornares num instituição sustentável, o que aconteceu é que muitos pensava que continuaria assim, e não fizeram uso dos recursos que conseguira da ACDI, alguns fizeram ma gestão dele e essas associações estão a passar serias dificuldades. As muitas associações que desde a saída da ACDI já trabalharam com 200 contos do Programa de Investimento num ano, o que lhes cria mais problemas porque esses programas passam muito tempo sem pagar. Há muitos que já existem só no nome, já não fazem assembleia como diz o estatuto e se não for tomado alguma medida muitas irão fechar as portas.” (ent. 24)

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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por ter responsabilidade de dinheiro e secretario porque tem de tratar de toda a

documentação da associação. Acontece é que cada um tem vindo a fazer a sua gestão

da sua maneira. Mas também depende da sensibilidade das associações, se uma

associação não esta fazendo nenhuma actividade, nenhuma obra, não é de bom-tom

ter gratificação, porque são para contactos. Há casos de pessoas a receber

gratificação sem estarem a fazer nada na associação, o que não é normal, tem de ter

capacidade de procurar meios.” (técnico do MADRRM)

Em alguns casos vem funcionando de forma regular, mesmo após o término dos programas

com ACDI, o que vem criando um grande peso as associações, que por meio próprios, não

podem garantir esses subsídios. Essa forma de actuação cria uma grande dependência, pode

levar que as pessoas possam concorrer aos cargos dos órgãos sociais só por causa dos

subsídios, e quando a mesmas não tiver como sustentar isso, correm o risco de abandonar

essas actividades.

“É algo que ficou estipulado, e quando tiver condições. Por exemplo desde Março

ainda não trabalhamos. Por exemplo eu recebo a gratificação mas quando tenho de

deslocar o que eu gastar não é reposto pela associação, tudo o que gasto é do meu

bolso.” (ent.15)

Há que realçar todo o trabalho até então realizado na base do voluntariado, que em muitos

casos, mesmo sendo gratuito, apresenta resultados positivos. O que se pode notar é que muitas

associações, concentraram-se as suas atenções nesses excedentes, conseguido através das

obras, tornando-se meras executoras de obras do Estado, das Câmaras ou de outros

organismos. O excerto seguinte traduz isso:

“Em princípio, associações estão a entrar noutro contexto, porque associação

arrancou num contexto e agora atingiu outro. Um deles é o seguinte, agora temos de

concorrer para obras, publicas ou privadas, em principio as associações terão de ter

um certificado para concorrer, em cada programa vai o máximo seis mil contos, isso

não te impede de concorrer a vários programas, mas tens de estar preparado para

concorrer, ai sim, podes ganhar nas obras a começar a ter sustentabilidade.” (ent.

24)

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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Com base nessa viragem para execução de obras, algumas associações transformaram em

meros empreiteiros. Questionados sobre esse aspecto, as respostas ronda a volta disso:

“Foi um defeito que todos nós adquirimos, nós quando criamos Ami-Ribeirão não

pensamos que viríamos ser empreiteiros, criamos com ideia de ser um parceiro activo

de desenvolvimento, (…), nunca com ideia que iríamos assinar contratos para

construir um dique, nos estamos cá para mobilizar recursos, agora, tivemos essa

grande oportunidade de executar obras, isso incutiu na cabeça de muitos e alguns

políticos que associações são executores, não é nada disso. Se fores ver, nenhuma

associação nos seus objectivos não tinha uma letra que diz «e executar», era algo que

estava fora das nossas cabeças, agora já é necessário ter essa alínea. Eu também não

acho que uma associação deve ser avaliada pelas obras executadas, muitas executam

obras e pouco ou nada fazem para a comunidade.” (ent. 40)

Tivemos oportunidade de participar em encontros, assembleias, onde essa problemática vinha

de cima. Em certos encontros as associações falam só de obras, em algumas assembleias onde

assistimos apresentação de relatório de actividades que constava somente execução de obras

financiados por terceiros.

Porém, nem sempre executam as obras de olhos posto nos lucros, fazem-na porque é a

comunidade a ganhar com a obra, mesmo que as associações não tenham excedente. O

parágrafo seguinte é exemplificativo disso.

“Também há obras que tem de ser feita por associações, há obras que nenhuma

empresa irá concorrer, por exemplo, se tens um dique no interior de Caibros, empresa

nenhum vai concorrer, porque não terá lucro, enquanto associação, por uma questão,

quere-lo feito e sabendo que vai produzir salários, fá-lo independentemente se vai

tirar lucro ou não. Por isso, que para mim é um agente fundamental para o

desenvolvimento dessa ilha, e como eu disse, temos de ter muita cautela para gerir

com transparência.” (ent. 24)

Um cenário diferente vem-se desenhando onde que, para qualquer obra, mesmo os do Estado,

que antes era adjudicada a uma associação sem muitas exigências, e onde se podia conseguir

algum lucro, hoje é exigida concurso público, onde se associação quiser concorrer vai ter de

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faze-lo em pé de igualdade com as empresas do ramo. Exigindo nesse caso alvará de

construção civil o que muitos não conseguirão adquirir.

Perante mais essa dificuldade, não havendo autonomia financeira, muito pelo contrário,

regista-se uma forte dependência do Estado, com a saída de Cabo Verde de alguns

financiadores, com o término de alguns programas, como por exemplo o PNLP, a

sustentabilidade financeira das associações, sem os referidos financiadores, está posta em

causa. E muitos dos intervenientes afirmam mesmo que sem financiamento as associações não

terão pés para andar.

“As associações são criadas por essas instituições, MAA, CRP e Câmara, foram

criadas com essa ideia, de trazer alguma coisa para a comunidade. Mas se essas

instituições deixarem essas parcerias, que não é o caso, eu acho que o sistema

acabaria, mas há associações que são acabados por si, praticamente não fazem nada,

quando aparece um projecto assinam o contrato e quando termina não fazem nada,

não fazem projectos, não procuram parceiros.” (ent. 31)

“Terminando esses programas será um bocadinho difícil para vida das associações e

particularmente para a minha também, porque neste momento há muitas associações,

com muitos projectos, o bolo tem de ser partido e logo ele será pouco. Antes éramos

poucas associações, por exemplo se éramos 4 o bolo era dividido por 4 agora

suponhamos que agora somos 40, um bolo dividido por 40 sairá pouco.” (ent. 5)

Todavia, encontramos opiniões mais positivas, pessoas que vêem a continuidade dependente

da vontade dos associados, das lideranças, da dinâmica de cada associação, na capacitação das

associações, do trabalho desenvolvido e de viverem mesmo o espírito do associativismo.

“Depende da direcção e dos sócios, se os sócios quiserem, mesmo com pouco

recursos a associação avançar ela avança, por exemplo, se tens um espaço próprio,

não tens renda para pagar, tendo uma sede comunitária, a nossa ideia e fazer uma

base com salas de reuniões, conferência, e fazer apartamentos nos pisos de cima, para

aluguer, se conseguirmos fazer esse projecto, associação não acaba nunca, terá um

fundo constante. Nosso objectivo é ter um fundo da associação.” (ent. 11)

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Acreditam que financiadores não faltarão, podem sim sair alguns, mas de certeza que novos

surgirão. Têm sim de ir a procura de parceiros, não esperando apenas pela boa vontade

política do Governo.

“É difícil, agora o que temos de fazer é procurar outras fontes de financiamento,

possíveis fontes de financiamento, temos organizações internacionais, ONG’s, há

organismos lá fora, que preferem financiar associações e não câmara e governo, ai é

uma oportunidade que temos para beneficiar de projectos, e também criar, não sei se

pequenas empresas comunitárias, mas ai ficamos com um pé atrás, tivemos as

cooperativas de consume, que era um tipo de associação económica, que produzia

riqueza que com o tempo acabaram por desaparecer por causa de má gestão.” (ent.

24)

“Associações conseguem algum fundo a partir de obras executadas, e se uma

associação não se executa obras está a correr risco de falir, mas nós estamos com

esperança que aparecerá mais projectos, por exemplo, neste momento junto com os

parceiros, CRP, Plataforma das ONG’s, FADEP, eles procuram parceiros nacionais e

internacionais, onde aparece financiamento sempre de projectos que dá

sustentabilidade que dá garantia a associações, porque associação só poderá avançar

com os parceiros, porque só de quota é impossível.” (ent. 11)

Essa forte dependência dos financiadores trás um outro problema as associações. Os grupos

da sociedade civil que dependem da bondade do Estado ou de outras instituições, para a

obtenção recursos, normalmente, têm que se submeter a regras por ele determinadas, regras

estas que, obviamente, restringem a actuação destes grupos apenas às áreas de operação que o

Estado se sente confortável em delegar-lhes ou que os outros organismos identificam que

devem ser as suas áreas de actuação.

O ponto de partida das acções de desenvolvimento, isto é, a vontade de auto desenvolvimento

deve caber aos destinatários dessas mesmas acções de desenvolvimento. Contudo acontece

algumas vezes definirem actividades sem contar com as comunidades, o MADRRM é um

caso, que muitas vezes decide a actividade, a localidade e só depois procura a associação para

executar, actividades que não fazem parte dos planos de actividades das mesmas.

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Associados aos problemas de gestão dessas organizações, a diversificação de fontes de

recursos, mesmo sendo uma necessidade, trás também uma série de desvantagens, como

aceitar doações que não são necessárias quando precisam de bens prioritários; terem que

adaptar sua actuação às exigências do parceiro, que nem sempre conhece as necessidades da

população-alvo e o modo mais eficaz de atendê-las; empregar formas de atender as

expectativas dos parceiros, entre outros problemas.

O extracto seguinte, fala-nos de como essa dependência, em alguns casos tem contribuído

para construção de infra-estruturas que são autênticos “elefantes brancos” nas comunidades,

embora hoje com menos frequência que no passado.

“Em 1998, a UNICEF financiou três chafarizes, discutimos com UNICEF, na altura,

que não queríamos chafarizes, então disseram que se não quiséssemos o

financiamento então tirariam de Ribeirão, na altura, não tínhamos poder de executar,

executaram eles mesmo, no dia da inauguração eu lhes disse que dentro de 45 dias

fecharíamos todos esses chafarizes, disse isso porque tínhamos algum dinheiro e logo

compramos materiais para fazer ligação de água na rede domiciliária e nos 45 dias

convidei o presidente da Câmara para vir abrir as torneiras, inauguramos água nos

domicílios. Os chafarizes ficaram abandonados, foi um dinheiro mal utilizado porque

não nos ouviram, para isso que as associações foram criadas, para negociar com

instituições o que é o melhor que servira a comunidade, é esse o papel.” (ent. 40)

E um risco que isso pode trazer é o facto de poder transformar essas associações em meros

executores das agendas dos doadores, sobretudo as estrangeiras. E nesses casos, uma das

lacunas e deficiências que assolam a vida associativa são promovidas pela existência de uma

obrigação de concordância com as condicionalidades dos doadores que conduzem a ajuda

internacional e os fundos governamentais. E as que não seguirem essa concordância são

meramente ignoradas ou excluídas por não estarem harmonizadas com as exigências formais

dos doadores, que passam a considerá-las como não essenciais para os seus objectivos de

desenvolvimento.

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c) Auto – sustentabilidade

O ponto anterior danos a ideia de como é que as associações vêm conseguindo realizar as suas

actividades, isto é, de onde sai financiamento para por em prática os seus objectivos. Um

outro aspecto abordado foi a auto-sustentabilidade das mesmas. Entendida aqui como a

capacidade de uma organização gerar, por meio de suas próprias actividades, os recursos

necessárias para garantir o financiamento de todos os seus programas e projectos, isso

significaria uma não dependência de terceiros.

Existe algumas associações que pensando na própria auto-sustentabilidade, já fizeram alguns

investimentos possíveis de dar algum lucro, muitas são aqueles que vejam os seus futuros

passar por AGR’s. Exemplos disso são casos de associações que já possuem alguma

actividade, como um comércio, um transporte de aluguer, tele-centros, exploração de

património, etc.

“Estamos a preparar uma proposta para adquirir uma viatura Dina, não só para

transporte do nosso material, estamos a pensar em apostar agora em AGR, porque só

assim conseguiremos continuar estável como estamos.” (ent. 25)

“Pode ser difícil mas não impossível, nós, por exemplo, temos cá a loja, o nosso

objectivo é melhora-la as condições e faze-la aumentar mais, como no caso de

transformação de produtos, mesmo que esteja directamente ligado ao grupo de

mulheres, mas também esta ligado a associação, estamos a pensar em adquirir uma

maquina universal para formar um grupo de jovens em carpintaria, vai ser financiado

pela CRP, de modo que podemos dar emprego para 4 ou 6 pessoas, há que ter luta

continua para ter como sustentar associação, e se todos os sócios assumirem as suas

responsabilidades de quotas vamos conseguindo lutar, mesmo que não haja

financiamento, é uma luta contínua.” (ent. 23)

Estamos certos que a actividade fim dessas organizações não é, e não podem ser, de produção

de bens para serem comercializados, o que não impede-as de desenvolverem esse tipo de

actividade como meio, ou seja, como forma de gerar recursos para a execução de suas

políticas sociais.

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4.5.2. - Sustentabilidade Técnica

Esse cenário de carência de financiamento vem juntar a outras dificuldades que as associações

hoje vêm enfrentando, que é a questão de organização interna. De modo geral, são marcadas

por uma carência de recursos técnicos que repercute no sistema organizacional das mesmas,

caracterizadas por uma organização interna débil.

“As vezes fico preocupado com essa situação, neste momento não está surgindo mais

associações. O que se vê é alguns com algum recuo, muitas comunidades com boas

associações hoje estão, passo o termo, em queda, primeiro há um crise de liderança,

onde muitas pessoas nas comunidades não querem assumir e depois outros fogem de

responsabilidade, outros vêm os cenários que estão sendo desenhado em termos de

financiamentos, então pessoas não querem muito assumir. E a outra questão que as

vezes têm levado muitas associações a estarem em queda, por causa de muito tempo

com mesmo presidente no poder, não há uma renovação de órgãos, e um outro é a

questão de própria capacidade da associação em envolver os seus membros na vida

da associação. Se formos ver, há, determinadas associações que sempre vejas as

mesmas pessoas nos encontros e há outros que se o presidente não tem tempo,

ninguém mais aparece.” (Ent. ao técnico do MAA)

Esse extracto é bastante elucidativo, dessa problemática de organização, ao longo desse

estudo, deparamos com caso de associações com dirigentes a mais de 10 anos a frente das

mesmas, o mais grave é que alguns com mandatos expirados a vários anos e ainda sem data

para renovação dos órgãos ou para realização de eleições. Duas razões explicam esse acto, a

primeira porque alguns dirigentes querem permanecer na liderança, uma outra os mesmos são

quase que obrigados a permanecer quando não aparece outras pessoas para assumir a

liderança da associação. Isso irá trazer um conjunto de problemas, uma vez que a associação

acaba por apresentar uma estrutura organizativa débil, onde muitas vezes, a associação

funciona quase só com o presidente do conselho directivo.

“(…), mas na verdade, as associações estão com necessidade de organizarem,

precisam de uma fiscalização mais cerrado, no que toca aos bens. Há muitas

associações que resume ao presidente, não fazem assembleia, o pessoal não diz nada,

não questionam, desde que apareça um dia de trabalho não importam com a vida da

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associação, e quando acontece algo vai ao ponto de acabar com a associação, foi o

que aconteceu com a nossa.” (ent. 31)

Vários são os problemas ligados a organização, por exemplo, muitas tem pessoas nos órgãos

com muito poucas instruções89, espelhando o que existe na comunidades, ou seja a

comunidade não possuiu recursos humanos com alguma qualificação, para melhor servir a

associação, muitas vezes, dada a pobreza da comunidade, principalmente as mais isoladas.

Essas têm alguma carência em aspectos como elaboração de projectos, contabilidade,

apresentação de contas e justificativos de despesas perante os financiadores, acesso a

informação, procura de parceiros e possíveis financiadores, de um modo geral carência de

gestão. E isso em alguns casos leva com que gastem um pouco dos seus recursos financeiro

para custear esses serviços. Porém existe casos, em que há recursos na comunidade mas esses

não querem assumir, como mostra os seguintes extracto:

“As vezes temos certas dificuldades de ter recursos humanos, pelos menos com um

certo equilíbrio com um certo nível para desempenhar certas funções, por exemplo

temos associações aqui na cidade que tem muitos quadros mas não estão interessados

em liderar.” (ent. 9)

“Precisamos de uma associação capaz de elaborar um projecto e ir a procura de

financiamento na União Europeia, capaz de ir negociar um projecto com outras

instituições, também porque muitos de nós ainda não temos competência técnica para

lá chegar e sem competência técnica ninguém avance. Agora enquanto não

conseguirmos trazer licenciados, doutorados, técnicos para o associativismo não

conseguiremos lá chegar. (ent. 6)

Não existe ainda nessas organizações nenhum tipo de profissionalização, não conseguem por

si só garantir o salário de um funcionário, que faça o serviço administrativo, a tempo inteiro,

como já vimos, alguns, atribuem subsídios aos dirigentes ou há algum outro colaborador, mas

em regime de part time. Um caso de excepção, é a Associação Dragoeiro, que mantém, um

grupo de funcionários, uma vez que tem a seu cargo um centro dia para idosos e um jardim-

de-infância, essas actividades, bem como o salário dessas pessoas é garantido pela

89 encontramos casos de lideres com 4ª classe, nem sequer o nível de escolaridade obrigatória,

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Cooperação Portuguesas, através de um acordo Assinado entre o Ministério da Solidariedade

Social de Portugal e o Ministério de Trabalho, Formação Profissional e Solidariedade Social

de Cabo Verde.

Outro aspecto que dificulta as actividades das ACD’s é a falta de espaço físico, muitos não

possuem uma sede, onde possa funcionar os seus serviços administrativos. Não ter um espaço

físico para funcionamento cria grandes constrangimentos, como, por exemplo, os documentos

das associações estão nas residências dos dirigentes, segundo um dos nossos entrevistados, o

facto de não terem uma sede dificulta até no pagamento das quotas, pois muitas vezes têm de

deslocar a casa do tesoureiro para fazer o pagamento.

A organização administrativa resulta, na maioria dos casos, na existência de um serviço

mínimo de registo e arquivo, feita pelos dirigentes e guardados nas residências dos mesmos.

A organização técnica é concebida em função de programas e projectos, por isso não tem um

carácter orgânico e permanente. A organização administrativa continua sendo uma das partes

mais frágeis do funcionamento das ACD.

4.5.3 - Sustentabilidade Política

Apesar de susterem a ideia de que a associação é o elo entre o Governo, outras instituições e a

comunidade, pode-se dizer que existe uma fraca capacidade de influenciar as políticas

públicas que, em muitos casos, são desenhados e só depois procuram as associações para os

executar. Embora já se verifica uma tenra participação em encontros para discutir políticas

sociais, sobretudo a partir das organizações chapéus, como ODISA e FADEP, e ainda através

do CRP que é maioritariamente constituída por ACD’s, e já com alguma capacidade de estar

junto de parceiro como o Estado.

A fraca capacidade institucional, a carência de recursos técnicos, influencia e muito a

sustentabilidade política, uma aposta forte nos recursos humanos poderá fortalecer a

sustentabilidade política, pois assim, estarão dotados de capacidade de negociar com

Governo, de dialogar com parceiros nacionais e internacionais, ao ponte de poderem

influenciar na definição de politicas sociais.

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Pelo exposto, a garantia da sustentabilidade será consequência de um processo de

fortalecimento institucional. Os mesmos estão conscientes da problemática de

sustentabilidade. Ela deve ser pensada por todos os actores intervenientes no processo de

desenvolvimento local e luta contra a pobreza, como nos mostra esses entrevistado:

“Sustentabilidade das associações é um problema que deve ter análise de todos os

actores, público, privado e da sociedade civil. Se nós pensarmos que cada localidade

deve posicionar diante dos desafios do milénio, então haverá muitas associações

como já existem, por exemplo a CRP já tem mais de 80 associações. O grande desafio

é de capacitação dessas instituições locais, e deve ser vista de uma forma objectiva e

de uma forma positiva, mas não esquecer que para ela se manter no tempo, ela deverá

rejuvenescer-se, deverá reestruturar-se, deverá investir neste sentido, portanto tem de

ter investimentos bem calculados. Não é só vontade de participar é que vai conseguir

trabalho útil, tem que ter também sistemas e meios, e tem de ter formas próprias para

orientar essa participação. Eu acho que as associações não devem ser meras

executoras dessas ou daquelas agências. As associações devem promover a cultura,

devem promover a cidadania, devem promover o desenvolvimento. Estar como uma

simples empresa de execução não é só isto a finalidade das associações.” (ent.

Técnico CRP)

Em suma, este capítulo teve como objectivo mostrar o contributo das ACD’s, as suas

dinâmicas, as formas como pensam o desenvolvimento e de onde tirar recursos para atingir

esse almejado desenvolvimento. Permite ainda ver ate que pondo se pode falar numa

sustentabilidade das associações comunitárias na ilha.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A situação como esta agora, me parece que futuramente

nem todos vão continuar, porque é preciso

recursos, e lideranças fortes. (ent.8)

Este último ponto de considerações gerais consiste na síntese da informação analisada, e da

linha de argumentação que conduziu esta dissertação.

O desenvolvimento de Cabo Verde tem sido marcado, nas últimas décadas, por avanços e

recuos resultantes da vulnerabilidade económica do país, da sua pobreza em termos de

recursos naturais, de uma fraca base produtiva e de uma forte dependência em relação aos

fluxos financeiros externos. A sua população, normalmente considerada como sendo o

principal recurso, apresenta ainda um baixo nível de qualificação técnica e profissional. Não

obstante tais condicionalismos, Cabo Verde tem conhecido, em alguns domínios, avanços

significativos designadamente nos sectores da educação, saúde, infra-estruturação,

democratização e participação política dos cidadãos, e o associativismo tem tido um papel

importante nesses resultados.

Com esta investigação, pretendeu-se abordar, por um lado, a dinâmica do associativismo em

Santo Antão e o seu contributo no processo de desenvolvimento local, por outro lado, ver até

que ponto as Associações Comunitárias de Desenvolvimento estão dependentes de

financiamento de outras instituições para por em pratica os seus objectivos.

Iniciou por ver as contribuições teóricas que servem de base a esse trabalho, e como tal

podemos dizer que o conceito de desenvolvimento sofreu inúmeras alterações e adquiriu

diferentes significados, formas e utilidades, que resultaram da influência de um vasto

conjunto de factores, entre os quais as mudanças no sistema económico a nível mundial, o

aumento do fosso entre países do norte e do sul, a problemática da pobreza mundial, as

desigualdades sociais a escala mundial. E como tal, diversos autores vem escrevem sobre esse

assunto, e o conceito vem ganhando definições específicos, segundo interesse teóricos e

políticos, como os de: desenvolvimento sustentável, desenvolvimento local, desenvolvimento

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participativo, desenvolvimento humano, desenvolvimento social, desenvolvimento integrado,

desenvolvimento comunitário, entre outros.

Centrado nos conceitos de Desenvolvimento local e Associativismo, constatamos que o

desenvolvimento local se faz com um envolvimento de todos, onde cada um tem um papel

importante a desempenhar junto a sua comunidade, e para isso o associativismo comunitário é

de grande valia. Uma vez que as associações são, pela sua natureza, organizações capazes de

motivar os seus membros a realizar acções que podem criar riquezas, combater a degradação

do meio ambiente, elevar o nível escolar, criar espaços de diálogo e de lazer, evitar a exclusão

social, etc.

A promoção e desenvolvimento do tecido associativo são cruciais para que o

Desenvolvimento Local seja uma realidade, pois é através da participação consciente e activa

das populações na resolução dos seus problemas, que se pode chegar a situação de erradicação

da pobreza. Pelos esclarecimentos feitos anteriormente podemos inferir, de que todos estão

certos que, hoje, não se pode fazer coisas para as pessoas mas sim fazer coisas com as

pessoas. Mas é crucial que os cidadãos intervenham, questionem e participem nos processos

de mudança, de forma a responsabilizarem-se de igual medida nas acções e nas consequências

destas acções, de forma que o desenvolvimento seja um processo que se constrói com as

pessoas.

Com motivações de diversas ordens, podemos dizer que o associativismo evolui na ilha

segundo fases, verificando uma expansão a partir de 2000, e actualmente encontramos num

momento de queda, dada a uma mudança que vem verificando nos processos de

financiamentos e dada a saída do país de alguns financiadores externos, mentores, até certa

medida dessa explosão. Cremos, pelos dados que temos, que após uma fase de crescimento, o

movimento se estabilizou e passou-se a uma nova fase, mais de consolidação e quiçá de

desaparecimento também de algumas iniciativas.

Com objectivos idênticos, é de realçar a importância que as mesmas assumem junto das

comunidades. O seu contributo no processo de desenvolvimento é notório, e reconhecido pela

Sociedade Civil, pelo Estado e mesmos pelas instituições internacionais. Esse contributo

deve-se ao facto de estarem mais próximo dos problemas, com elas é mais eficaz o processo

de identificação das necessidades, sua priorização e implementação, e segundo conseguimos

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constatar que a execução de projectos, que eram autênticos “elefantes brancos” para as

comunidades, reduziu com o surgimento das ACD’s, pois actualmente as necessidades das

populações são auscultadas, o que marca, corte com algumas perspectivas de intervenção do

tipo top-down.

O papel das ACD’s tem destacado em áreas importantes para o desenvolvimento comunitário,

como por exemplo, a educação, a saúde, a formação profissional, ambiente, habitação e

saneamento, bem como AGR com forma de libertar as pessoas da dependência de um

emprego público. E podemos dizer que o seu contributo tem sido valioso, conseguindo

resultados evidentes.

Ainda em relação a importância das ACD’s, no processo de desenvolvimento da ilha, ela é

bem vista junto dos programas de luta contra a pobreza, que contam com elas como os

principais parceiros. No que toca aos seus desempenhos nessa área, impõe nos dizer que, de

certo modo, as actividades escolhidas, embora algumas vezes não conduzem a uma saída

sustentável da pobreza, respondem de facto às necessidades das comunidades e/ou dos grupos

mais vulneráveis. Tal é o caso, por exemplo, da construção e/ou reabilitação da habitação que

leva a uma melhoria das condições de habitabilidade e de vida mas que, de per si, não retira

os beneficiados da situação de pobreza. As actividades geradoras de rendimento e as de

capacitação das pessoas, através da formação profissional se mostram mais propícias à saída

da situação de pobreza, uma vez que permitem o acesso a rendimentos permanentes ou ao

mercado de trabalho e os programas de luta contra a pobreza, bem como os líderes

associativos estão conscientes disso.

Nessa matéria, o trabalho das associações é a dobrar, ou seja, além de elaborarem projectos e

procurar financiamento para os por em prática, com o objectivo de melhorar o nível de vida

dos mais carenciados, tem de lutar contra a mentalidade de “desventurados” que encontra

incutido em boa parte dos santantonenses. O estudo mostra que um problema ainda a resolver

é mudar a mentalidade de dependência do Estado e a postura de passividade bem patente no

espírito de “coitados”, o que impede muitas vezes o sucesso de algumas politicas

direccionado para essa camada da população.

Convém, contudo, sublinhar que o trabalho desenvolvido pela associação permite que esta

alcance uma forte simpatia e visibilidade junto à comunidade, tornando-a uma parceira

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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credível interna e externamente. De igual modo, ela aumenta as exigências, a cobrança e a

pressão sobretudo por parte daqueles que ainda não tenham sido beneficiados. A gestão das

expectativas constitui, por conseguinte, o grande desafio dos dirigentes associativos. As

expectativas nelas depositadas são cada vez maiores, tanto de parte dos seus membros como

dos seus parceiros e da própria sociedade civil, ultrapassando sua real capacidade quer em

termos técnicos organizativos quer em termos de recursos, matérias e financeiros disponíveis.

A semelhança do país que temos, as ACD’s enfrentam algumas dificuldades, nomeadamente

as de ordem material e financeira com repercussões directas na sua organização e

funcionamento. Elas estão dependentes quase em exclusivo dos financiamentos dos seus

parceiros externos, nomeadamente organizações internacionais, instituições públicas

nacionais e internacionais, e principalmente do Estado, para poderem levar a frente as suas

actividades planificadas. Impõe-nos afirmar que a sustentabilidade, sobretudo a financeira, é

uma sustentabilidade até agora baseada nas obras adjudicadas por organismos nacionais e

internacionais, pelos donativos, pelos financiamentos de projectos sociais, como por exemplo,

luta contra a pobreza.

Essa quase dependência exclusiva de financiamentos, uma vez que apenas são capazes de se

auto-sustentar por muito pouco tempo sem a ajuda do Estado ou de doadores internacionais,

como nos mostrou os nossos entrevistados, conduz a casos de:

Forte influência do Estado enquanto fonte principal de financiamento, nomeadamente

no processo de combate a pobreza e do desemprego;

Falta de autonomia e independência das organizações;

Organizações diante de difíceis opções de financiamento;

Elaboração de planos de actividades que vai de encontro com os objectivos dos

financiadores;

As associações estão a enfrentar um período bastante conturbado. O modelo que as sustentou

até aqui está a ser posto em causa, nomeadamente através das obras que executavam. Não

gostaríamos de dizer que as associações apareceram só para gerir os dinheiros dos programas,

ou concretamente para executar obras, mas boa parte das associações ficaram restringidas a

isso. Porém, houve uma movimentação e uma dinâmica muito maiores que ultrapassaram

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claramente esse quadro, ainda que o tenham por referência. Ao mudarem-se estas condições,

também vão ter que se alterar as condições de sobrevivência e de gestão destas associações. E

como tal vimos, algumas associações estão a enveredarem por actividades geradoras de

rendimento, que possam garantir auto-sustetabilidade a associação.

A sustentabilidade financeira, embora seja evidenciada como um dos maiores desafios na

gestão das OSC, deve ser encarada como consequência de uma série de outros factores,

principalmente a sustentabilidade técnica ou institucional, um outro aspecto que muitas vezes

bloqueia o progresso das associações.

E de reconhecimento dos entrevistados que a sustentabilidade combina capacidade de obter

“receitas próprias” com capacidade de procurar fontes de financiamento públicas, privadas e

não-governamentais, nacionais e internacionais. Porem muitos não possui essa capacidade,

uma vez que as mesmas são marcadas por um deficit de recursos técnicos, reproduz um

deficiente sistema organizativo.

Reforço institucional é uma necessidade gritante junto das associações. O capítulo 4 mostra

que as mesmas precisam primeiramente organizarem internamente para poderem sair a

procura de parcerias para execução dos seus fins. Todavia, em algumas associações assistiu-se

um esforço colossal para melhorar o impacto das suas acções, ao nível organizacional e a

capacidade de coordenação e de articulação entre as várias organizações, e entre elas e o

Estado, ou outras entidades.

O estudo mostra, contudo, que ainda falta um reforço do processo de capacitação seja das

associações de desenvolvimento comunitário seja das populações e beneficiários. Uma vez

que, apesar de se verificar, numa dada altura, um explosão no surgimento de novas

associações, essa não constitui na pratica uma significativa participação das comunidades e

dos sócios. Os baixos níveis de envolvimento das populações na vida associativa dificultam

bastante a acção do associativismo. De igual modo, a participação precisa ser reforçada

visando uma actuação no quotidiano nas actividades e não apenas em momentos mais

importantes, como as reuniões das assembleias-gerais, ou então só quando o sócio vê na sua

participação um beneficio directo.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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Por outro lado, as associações comunitárias necessitam reforçar a participação quotidiana dos

membros, nomeadamente em termos de cumprimentos dos deveres estatutários, como os

exemplos que nos vimos, com o caso das quotas.

O baixo nível de participação dos associados nas dinâmicas organizativas deve-se, do nosso

ponto de vista, a três ordens de razões:

A visão generalizada, por parte dos associados, de que as organizações existem para

lhes resolver problemas, parecendo haver uma certa demissão de um papel mais activo

na procura de soluções colectivas, sendo a associação a detentora deste papel:

As lacunas em termos de actividades de dinamização da participação e de construção

de formas de comunicação colectiva. Este facto, associado a uma certa distância

identitária por parte dos sócios face às organizações, implica que a participação seja

pontual, restrita e, na maior parte das vezes, sem grande motivação.

Os escassos recursos humanos e financeiros das organizações, o que dificulta a

realização de uma acção mais enérgica e continuada. Sem dinheiro que apoie as

iniciativas da comunidade, faz com essas deixe de participar.

Um outro aspecto que influencia muito a organização das ACD’s, é facto de muitas

apresentarem comportamentos não democráticos por parte da liderança, necessidade de

renovação dos órgãos sociais, falta de debate das questões e problemas que dizem respeito às

operações, estruturas organizacionais hierarquizadas, autoridade e responsabilidade

centralizado numa ou duas pessoas e falta de transparência em alguns actos. Nota-se que as

nossas associações, são marcadas por um deficit de cultura democrática, como casos de

dirigentes com mais de dez anos e muitos outros sem fazer eleições internas, e achamos que a

resposta também passa pela comunicação, informação e formação: como trabalhar

colectivamente, como agir em grupo, como agir, gerindo distintas sensibilidades e formas de

olhar para a realidade e perceber quais são as soluções para essa realidade. Importa adquirir

novas competências técnicas e do foro relacional que possibilitem um efectivo investimento

em parceria na participação.

A renovação dos órgãos de direcção e uma maior equidade em termos de relações de género

em algumas comunidades é um outro aspecto a ter em conta. Apesar da mulher ser um alvo

prioritário em muitas das actividades, sobretudo na questão de luta contra a pobreza, viu-se

que a presença de mulheres nos órgãos sociais é muito baixa. Neste caso, um trabalho ainda

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de sensibilização no sentido de uma maior e melhor equidade nas relações de género impõe-

se. Pois os mesmos reconhecem a importância da mulher como agente de mudança e garantia

de um desenvolvimento comunitário.

A sustentabilidade técnica e o nível organizacional influenciam directamente a

sustentabilidade politica. A esse respeito, consideramos que apesar de serem hoje muito

escutados e reconhecidos, podemos dizer que a participação em definição de politicas

públicas ou politicas sociais é bastante fraca, e como já relatamos existe ainda casos de

actividades que são definidas por ministérios ou outras instituições e só depois chamam as

associações para execução do que já foi desenhado para as suas comunidades.

Nesse aspecto algum avanço que se tem conhecido é graças as intervenções das organizações

chapéus, mais concretamente a OADISA e a FADEP, que representando as associações da

ilha conseguem chegar, junto dos decisores, algo que de forma individual as mesmas

dificilmente conseguiriam fazer. É patente que a dinâmica associativa na ilha ganho uma

outra cara com o surgimento dessas organizações.

Colocando em frente a questão de fundo desse estudo “estarão as ACD’s a contribuir para o

desenvolvimento da ilha, melhorado desse modo as condições de vida das populações?”,

atribui-nos dizer que, mesmo com algumas dificuldades, as associações têm conseguindo,

paulatinamente, melhorar as condições de vida de muitas famílias santantonenses. E certo

que, dada a idade e a dinâmica de cada associação, nem todos tem alcançado os seus

propósitos, mas lá onde estão, alguma coisa é notório. Digamos que, de modo geral, as

mesmas tem agido como verdadeiros agentes de desenvolvimento local, quer elaborando

projectos de desenvolvimento, quer executando actividades que visa o desenvolvimento, que

procurando parceiro e recursos para essas idênticas actividades.

Quanto a questão de dependência financeira, rematamos dizendo que as mesmas estão

totalmente dependentes de terceiros, chegando ao ponto de referir que muitos desaparecerão

se não houver financiamento externo as mesmas. E o cenário é que ainda as ACD’s estão

longe de garantir as suas auto-sutentabilidade. E até então, para isso é de destacar o

financiamento do Estado e o contributo de instituições e ONG’s internacionais, de

embaixadas estrangeiras sediada em Cabo Verde, e mesmo da comunidade emigrada.

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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E em jeito de conclusão deixamos a seguinte excerto de um entrevista:

“Porque para desenvolver Santo Antão tem de ser uma intervenção em rede, e o que a

gente pensa com essa rede, quer dizer, todas as instituições trabalhando em Santo

Antão devem cooperar, integrar, em que os objectivos de uma já são focados numa

outra, quer seja privado, quer seja público, quer seja da sociedade civil. E uma ACD

não pode substituir a Câmara Municipal, uma instituição do estado não pode

substituir a ACD, tem que haver uma completa integração entre elas. É algo de

análise sistémica, a integração e complementaridade.”

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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ANEXOS Lista de ACD’s da Ilha de Santo Antão

Nome Sigla

Associação Comunitária de Desenvolvimento Integrado de Mocho* ACDIM

Associação Comunitária Nova Esperança Marítima de Cruzinha* ACNEMC

Associação Comunitária de Desenvolvimento Integrado de Chã d'Igreja* ACDICI

Associação para o Desenvolvimento Integrado de João Afonso* ADIJA

Associação para protecção do Ambiente e Desenvolvimento de Lombo Branco* APAD –LB

Associação Vale Verde para o Desenvolvimento de Tanque * Vale Verde

Associação de Desenvolvimento Integrado de Matinho e Monte Joana* MADIM

Associação para o Desenvolvimento Integrado de Boca de Ambas Ribeiras* ADIBA

Associação Desenvolvimento Comunitária de Lajedos* ADCL

Associação de Moradores a Amigos de Ribeira de Corujinha* AMARC

Associação Desenvolvimento Comunitária de Berlim* ACOMAB

Associação de Desenvolvimento Integrado de Chã de Camoca, Branquinho e Alto S.

Tomé*

ADICBAST

Associação de Desenvolvimento Integrado de Lagoa* Luz Viva

Associação Desenvolvimento Comunitária de Pedra das Moças - Voz Amiga* AVA - PM

Associação de Desenvolvimento Comunitária de Chã das Furnas* ADCF

Associação para o Desenvolvimento Integrado de Sinagoga* ADIS

Associação Desenvolvimento Comunitária de Costa Leste* ADCL

Associação para o Desenvolvimento Integrado de Fajã Domingas Benta e Arredores* Amafajã

Associação Recreativa Mãos Unidas de Companhia* ARMUC

Associação de Desenvolvimento Integrado da Comunidades de Longueira a Chã

d’Arroz *

Top de

M’randa

Associação Desenvolvimento Comunitária de Pico da Cruz* ADC-PC

Associação dos Filhos e Amigos para o Desenvolvimento Integrado de Figueiral* AFADIF

Associação de Desenvolvimento Integrado de Coculi/Fajã de Mato* ADICOFAM

Associação Boa Esperança de Caibros* ABEC

Associação de Desenvolvimento Comunitária de Figueiral de Paul*

Ami-

Figueiral

Associação de Desenvolvimento Comunitária da Ribeira de Penedo ACDRP

Associação Desenvolvimento Comunitária de Eito*

Esperança

de Eito

Associação de Desenvolvimento Comunitária de Praia de Gi e Ribeira das Pombas* ADCPG/RP

Associação de Desenvolvimento Integrado de Ribeira das Patas* ADIRP

Associação de Desenvolvimento Comunitária de Alto Mira* Alvateiros

Associação de Desenvolvimento Comunitária Jorge Luis* ADCJL

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O Contributo das ACD’s para o Desenvolvimento Local

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Associação de Desenvolvimento Comunitária Ribeira da Cruz* ADC-RC

Garça de Cima*

Associação Desenvolvimento Integrado de Boca de Coruja* ADIBOC

Associação Comunitária para o Desenvolvimento de Pontinha de Janela* ADC-PJ

Associação de Desenvolvimento Integrado de Chã de Pedras* ADIC

Associação Amigos de Martiene AAMART

Associação dos Amigos de Ribeirão Campo de Cão*

Ami-

Ribeirão

Associação Ami- Montanha

Ami-

Montanha

Associação para o Desenvolvimento Integrado de Corda MOVA

Associação para o Desenvolvimento Integrado de Figueiras* ADIF

Associação para o Desenvolvimento Integrado de Ribeira Alta ADIRA

Associação dos Amigos do Ambiente de Lombo de Santa e Losnas* AAALSL

Associação Desenvolvimento Comunitária de Ribeira de Janela ADCRJ

Associação Desenvolvimento Comunitária de Fajã de Janela* ADCFJ

Associação de Desenvolvimento Comunitária de Paço Paul a vista

Associação de Desenvolvimento Comunitária de Santa Isabel*

Associação Desenvolvimento Comunitária Beira Mar* ADCBM

Associação Desenvolvimento Comunitária de Ribeira dos Bodes e João Bento Solo e Água

Associação Desenvolvimento Comunitária de Tarrafal de Monte Trigo ADC –TMT

Associação das Mulheres de Planalto Leste * AMUPAL

Associação para o Desenvolvimento Integrado da Freguesia de Nossa Senhora do

Livramento*

ADIFNSL

Associação de Desenvolvimento Comunitária de Cabo de Ribeira* Dragoeiro

Associação de Desenvolvimento Comunitária Luz Verde do Norte* ALVEN

Associação Comunitária “União da Paz” – Ribeira das Patas UDP

Associação para o Desenvolvimento Comunitária de Penedo de Janela ADP

Associação de Desenvolvimento Comunitária Ribeira Fria

Água Boa

do Vale

Associação Comunitária Amigos Unidos Dominguinhas

Associação Comunitária Amigos Unidos Curral das Vacas/Cirio AUCVC

*Associações que se entrevistou os lideres.