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Fanzine Ocupação Chico Science

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A Ocupação Chico Science é uma oportunidade de conhecer e se aprofundar no universo criativo que rodeava o dia a dia do músico de Pernambuco, um dos criadores da chamada cena mangue. Na exposição foram mostradas suas músicas, letras, alguns objetos pessoais, seus livros e seus gibis. Além disso, foi dado destaque às músicas que ele gostava de escutar e que o inspiravam, os lugares que gostava de frequentar, seus amigos e heróis. Documentos pertencentes à família e aos parceiros musicais ajudaram a refletir sobre essa trajetória – e inspiraram esta publicação. Esse fanzine traz também textos atuais de pessoas que testemunharam e fizeram ressoar a revolução cultural que se produzia em Recife na década de 1990.

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Page 1: Fanzine Ocupação Chico Science
Page 2: Fanzine Ocupação Chico Science

A Ocupação Chico Science é uma oportunidade de conhecer e

mergulhar no universo criativo que rondava o cotidiano do músico

pernambucano, um dos criadores da chamada cena mangue. Na

exposição estão suas músicas, seus escritos, alguns de seus objetos

pessoais, seus livros e seus quadrinhos. Os beats que gostava de

ouvir e que lhe inspiravam, os lugares de afeto, os amigos e os heróis

também são reverenciados. Documentos pertencentes à família e

aos companheiros musicais ajudam a refletir sobre essa trajetória – e

inspiram esta publicação.

 Parte da exposição, este fanzine traz textos atuais daqueles que, de longe

ou de perto, testemunharam e fizeram ecoar a revolução cultural que

acontecia no Recife na década de 1990. Chico Science foi uma espécie de

sol, de força maior dessa história. Sua obra reposicionou o Brasil no cenário

da música e reverberou no cinema, no design e nas artes plásticas, na

moda, na cibernética. Os caminhos e os percalços do movimento que o

músico ajudou a criar são contados nos textos a seguir. 

Instituto Itaú Cultural

Page 3: Fanzine Ocupação Chico Science

A Ocupação Chico Science é uma oportunidade de conhecer e

mergulhar no universo criativo que rondava o cotidiano do músico

pernambucano, um dos criadores da chamada cena mangue. Na

exposição estão suas músicas, seus escritos, alguns de seus objetos

pessoais, seus livros e seus quadrinhos. Os beats que gostava de

ouvir e que lhe inspiravam, os lugares de afeto, os amigos e os heróis

também são reverenciados. Documentos pertencentes à família e

aos companheiros musicais ajudam a refletir sobre essa trajetória – e

inspiram esta publicação.

 Parte da exposição, este fanzine traz textos atuais daqueles que, de longe

ou de perto, testemunharam e fizeram ecoar a revolução cultural que

acontecia no Recife na década de 1990. Chico Science foi uma espécie de

sol, de força maior dessa história. Sua obra reposicionou o Brasil no cenário

da música e reverberou no cinema, no design e nas artes plásticas, na

moda, na cibernética. Os caminhos e os percalços do movimento que o

músico ajudou a criar são contados nos textos a seguir. 

Instituto Itaú Cultural

Page 4: Fanzine Ocupação Chico Science

Capítulo I

No começo dos anos 1980, época em que a cultura hip hop despontava no Brasil via videoclipes escassos nos poucos canais de TV que apresentavam programas musicais, eu frequentava uma associação de moradores em Rio Doce, em Olinda, onde todos os sábados à noite rolavam umas rodas de breakdance. Lá, conheci outro maloqueiro aficionado a batidas electrofunk (Kraftwerk, Afrika Bambaataa, Neucleus, Zapp, Grand Master Flash...) e soul music, chamado Chico Vülgo. Na semana seguinte, fui levado por um amigo ao trabalho de Chico (uma clínica radiológica no centro do Recife, em que numa sala com apenas um birô ele já tirava algumas batidas e mostrava uns raps). Amizade selada, passamos a trocar ideias e a mostrar nossas pequenas coleções de vinis e, na sequência, garimpar sebos (a intenção era roubar os livros da estante de casa e vender nos sebos para comprar discos novos ou usados).

Naquele tempo, lançavam-se Duck Rock, de Malcolm McLaren; Electric Café, do Kraftwerk; e Planet Rock, de Afrika Bambaataa & Soulsonic Force. O contato com esse tipo de música nos fez passar a frequentar rodas de break nas ruas do centro do Recife (7 de Setembro, Avenida Guararapes, Parque 13 de Maio) com gravadores gigantes puxando energia dos postes com gambiarras – quando não dava para fazer uma vaquinha para comprar pilhas. Fizemos a “Legião Hip Hop”, uma das primeiras equipes de b-boys da cidade. O som era à base de fitas cassete, às vezes tão mal gravadas que só dava para identificar as batidas, mas era o que importava na ocasião.

Jorge du peIxe

Page 5: Fanzine Ocupação Chico Science

Capítulo I

No começo dos anos 1980, época em que a cultura hip hop despontava no Brasil via videoclipes escassos nos poucos canais de TV que apresentavam programas musicais, eu frequentava uma associação de moradores em Rio Doce, em Olinda, onde todos os sábados à noite rolavam umas rodas de breakdance. Lá, conheci outro maloqueiro aficionado a batidas electrofunk (Kraftwerk, Afrika Bambaataa, Neucleus, Zapp, Grand Master Flash...) e soul music, chamado Chico Vülgo. Na semana seguinte, fui levado por um amigo ao trabalho de Chico (uma clínica radiológica no centro do Recife, em que numa sala com apenas um birô ele já tirava algumas batidas e mostrava uns raps). Amizade selada, passamos a trocar ideias e a mostrar nossas pequenas coleções de vinis e, na sequência, garimpar sebos (a intenção era roubar os livros da estante de casa e vender nos sebos para comprar discos novos ou usados).

Naquele tempo, lançavam-se Duck Rock, de Malcolm McLaren; Electric Café, do Kraftwerk; e Planet Rock, de Afrika Bambaataa & Soulsonic Force. O contato com esse tipo de música nos fez passar a frequentar rodas de break nas ruas do centro do Recife (7 de Setembro, Avenida Guararapes, Parque 13 de Maio) com gravadores gigantes puxando energia dos postes com gambiarras – quando não dava para fazer uma vaquinha para comprar pilhas. Fizemos a “Legião Hip Hop”, uma das primeiras equipes de b-boys da cidade. O som era à base de fitas cassete, às vezes tão mal gravadas que só dava para identificar as batidas, mas era o que importava na ocasião.

Jorge du peIxe

Page 6: Fanzine Ocupação Chico Science

de que lado voCê samba

Com novas aquisições, tornando a discoteca cada vez maior, vieram as festas. Franci’s Drinks, Adilia’s Place, Mauritztadt, Galeria Joana d’Arc, Soparia e Oficina Mecânica serviram de palco. E, na base do faça-você-mesmo, fazíamos os cartazes, os flyers, produzíamos, divulgávamos e discotecávamos. Eram os caranguejos com cérebro bombando nas noites. Esse foi o começo da “diversão levada a sério”, frase predileta e mote maior de Chico – por sinal, um grande festeiro.

De 1986 a 1992, trabalhei numa companhia aérea. Morava praticamente no aeroporto e passeava em casa. Nesse meio tempo vieram filhos, responsabilidades e pouco tempo para diversão.

Mas Chico continuou sua peleja sonora. E nessas andanças pelo centro, frequentando lojas para atualizar os ouvidos, ele ia conhecendo uma rapaziada que já tinha banda, como Fred Zeroquatro (a Mundo Livre S/A), Renato L. e Herr Doktor Mabuse, que nos mostrou outras vertentes sonoras de sua coleção de vídeos e vinis. E dessas audiências nasceu o Bom Tom Rádio, com uma bateria eletrônica, um baixo velho e scratches feitos num “três em um”, com o qual Chico já ensaiava suas intenções de futuro malazarte dos palcos. E, entre uma folga e outra, eu pude comparecer a algumas dessas jam sessions que adentravam a madruga na residência de Mabuse, em Casa Caiada, em Olinda.

No final dos anos 1980, em Rio Doce ainda, Chico conheceu Lúcio Maia e Dengue, que se tornaram parceiros nessas primeiras experiências com banda. Nasceu então a Orla Orbe, que depois virou Loustal, com uma formação convencional, tocando covers de soul, ska e rock dos anos 1970 e algumas poucas composições próprias.

Daí para a frente, Chico conseguiu um emprego numa empresa de processamento de dados da prefeitura do Recife, e o salário dele era praticamente gasto com ensaios e gravações em estúdio. Na mesma instituição, conheceu Gilmar Bolla Oito, que o levou ao Daruê Malungo, centro de apoio à comunidade carente de Chão de Estrelas, em Peixinhos, entre Recife e Olinda, capitaneado pelo mestre Meia- Noite. Nesse quilombo, crianças e adolescentes aprendiam capoeira, música e outras artes. Lá foi feita parte da ciência de Chico: o encontro dos tambores do Lamento Negro (um bloco afro que ali

residia, com Toca Ogam, Canhoto, Gira e outros batuqueiros) com a guitarra de Lúcio e o baixo de Dengue. Aí nascia a formação Chico Science & Lamento Negro.

***

Mangue. Essa foi a palavra que ouvi de repente quando estava indo de Olinda para o Recife dentro de um ônibus com Chico. “Não tem jazz, mambo, soul? Então vou fazer mangue!!!” Daí para a frente a diversão ficou ainda mais séria. E, junto com Fred e Renato, fizeram o primeiro manifesto: Chamagnatus granulatus sapiens – ou Caranguejos com Cérebro.

No começo dos anos 1990, numa folga do trampo quase escravo do aeroporto, fui assistir a um show deles no Teatro do Parque, com a banda ainda usando o nome Chico Science & Lamento Negro. Vi então a ciência evoluindo, os tambores ainda se ajustando, mas dava para sentir o que estava por vir. Depois do show, fui ao camarim ainda atordoado pelo que tinha visto. Chico, quase mordendo as orelhas com sua empolgação constante, vibrava. Troquei algumas ideias com os caras e fui para casa pensando no que aquilo iria dar.

Alguns anos depois, recém-saído do emprego, fui convidado por Chico para fazer parte do combo percussivo do que já se chamava Nação Zumbi, às vésperas de uma viagem para o Sudeste junto com a Mundo Livre S/A. Fizemos shows no Recife junto com a Mundo Livre para levantar uma grana, e àquela altura havia umas gravadoras orbitando a banda que nem mosca. A CSNZ já tinha uma boa projeção na cidade e contava com apoio da mídia local. Essa empreitada, que chamamos de Caravana da Coragem, foi feita de ônibus de linha até São Paulo – com várias aventuras, programas de TV, hospedagem em albergues, casas de amigos –, regada a galetos, cervejas, ressacas e muitos PFs.

O passo seguinte foi a gravação do Da Lama ao Caos, com contrato assinado e muitos planos. A lama se mexeu... O Recife mudou e a ciência de Chico começou a ferver... Até hoje.

XILA, RELÊ, DOMILINDRÓ!!!

Jorge du peIxe, grande companheiro de Chico, segurou a onda da partida do amigo e, a seu modo, com a Nação, deu continuidade, transformou e ampliou os sonhos do parceiro. Além da música, se dedica ao design e assina, junto com sua Valentina, a arte de capas de CDs, cenografias e cartazes.

Page 7: Fanzine Ocupação Chico Science

de que lado voCê samba

Com novas aquisições, tornando a discoteca cada vez maior, vieram as festas. Franci’s Drinks, Adilia’s Place, Mauritztadt, Galeria Joana d’Arc, Soparia e Oficina Mecânica serviram de palco. E, na base do faça-você-mesmo, fazíamos os cartazes, os flyers, produzíamos, divulgávamos e discotecávamos. Eram os caranguejos com cérebro bombando nas noites. Esse foi o começo da “diversão levada a sério”, frase predileta e mote maior de Chico – por sinal, um grande festeiro.

De 1986 a 1992, trabalhei numa companhia aérea. Morava praticamente no aeroporto e passeava em casa. Nesse meio tempo vieram filhos, responsabilidades e pouco tempo para diversão.

Mas Chico continuou sua peleja sonora. E nessas andanças pelo centro, frequentando lojas para atualizar os ouvidos, ele ia conhecendo uma rapaziada que já tinha banda, como Fred Zeroquatro (a Mundo Livre S/A), Renato L. e Herr Doktor Mabuse, que nos mostrou outras vertentes sonoras de sua coleção de vídeos e vinis. E dessas audiências nasceu o Bom Tom Rádio, com uma bateria eletrônica, um baixo velho e scratches feitos num “três em um”, com o qual Chico já ensaiava suas intenções de futuro malazarte dos palcos. E, entre uma folga e outra, eu pude comparecer a algumas dessas jam sessions que adentravam a madruga na residência de Mabuse, em Casa Caiada, em Olinda.

No final dos anos 1980, em Rio Doce ainda, Chico conheceu Lúcio Maia e Dengue, que se tornaram parceiros nessas primeiras experiências com banda. Nasceu então a Orla Orbe, que depois virou Loustal, com uma formação convencional, tocando covers de soul, ska e rock dos anos 1970 e algumas poucas composições próprias.

Daí para a frente, Chico conseguiu um emprego numa empresa de processamento de dados da prefeitura do Recife, e o salário dele era praticamente gasto com ensaios e gravações em estúdio. Na mesma instituição, conheceu Gilmar Bolla Oito, que o levou ao Daruê Malungo, centro de apoio à comunidade carente de Chão de Estrelas, em Peixinhos, entre Recife e Olinda, capitaneado pelo mestre Meia- Noite. Nesse quilombo, crianças e adolescentes aprendiam capoeira, música e outras artes. Lá foi feita parte da ciência de Chico: o encontro dos tambores do Lamento Negro (um bloco afro que ali

residia, com Toca Ogam, Canhoto, Gira e outros batuqueiros) com a guitarra de Lúcio e o baixo de Dengue. Aí nascia a formação Chico Science & Lamento Negro.

***

Mangue. Essa foi a palavra que ouvi de repente quando estava indo de Olinda para o Recife dentro de um ônibus com Chico. “Não tem jazz, mambo, soul? Então vou fazer mangue!!!” Daí para a frente a diversão ficou ainda mais séria. E, junto com Fred e Renato, fizeram o primeiro manifesto: Chamagnatus granulatus sapiens – ou Caranguejos com Cérebro.

No começo dos anos 1990, numa folga do trampo quase escravo do aeroporto, fui assistir a um show deles no Teatro do Parque, com a banda ainda usando o nome Chico Science & Lamento Negro. Vi então a ciência evoluindo, os tambores ainda se ajustando, mas dava para sentir o que estava por vir. Depois do show, fui ao camarim ainda atordoado pelo que tinha visto. Chico, quase mordendo as orelhas com sua empolgação constante, vibrava. Troquei algumas ideias com os caras e fui para casa pensando no que aquilo iria dar.

Alguns anos depois, recém-saído do emprego, fui convidado por Chico para fazer parte do combo percussivo do que já se chamava Nação Zumbi, às vésperas de uma viagem para o Sudeste junto com a Mundo Livre S/A. Fizemos shows no Recife junto com a Mundo Livre para levantar uma grana, e àquela altura havia umas gravadoras orbitando a banda que nem mosca. A CSNZ já tinha uma boa projeção na cidade e contava com apoio da mídia local. Essa empreitada, que chamamos de Caravana da Coragem, foi feita de ônibus de linha até São Paulo – com várias aventuras, programas de TV, hospedagem em albergues, casas de amigos –, regada a galetos, cervejas, ressacas e muitos PFs.

O passo seguinte foi a gravação do Da Lama ao Caos, com contrato assinado e muitos planos. A lama se mexeu... O Recife mudou e a ciência de Chico começou a ferver... Até hoje.

XILA, RELÊ, DOMILINDRÓ!!!

Jorge du peIxe, grande companheiro de Chico, segurou a onda da partida do amigo e, a seu modo, com a Nação, deu continuidade, transformou e ampliou os sonhos do parceiro. Além da música, se dedica ao design e assina, junto com sua Valentina, a arte de capas de CDs, cenografias e cartazes.

Page 8: Fanzine Ocupação Chico Science

Os ecos daquela quarta-feira, podem acreditar, ainda me acompanham. Eis uma data que milhares de “mangueboys” relembrarão por muitos e muitos anos: 9 de dezembro de 2009. Sim, eu estava lá, fui um dos quase 100 mil privilegiados que participaram, no Marco Zero do Recife, da gravação do segundo DVD ao vivo da Nação Zumbi. A festa não era só para celebrar a abertura de um histórico e audacioso evento, no caso a segunda edição da Feira Música Brasil. No fundo, o que a maioria de nós pretendia naquela noite era compartilhar essa espécie de orgulho coletivo, como se disséssemos a nós mesmos: que outro lugar do mundo pode dizer, com tanta propriedade, que é o legítimo depositário desse legado?

Quando eu subi no palco para cantar Rios, Pontes e Overdrives com Jorge du Peixe e os outros parceiros da Nação, senti que a energia de Francisco França não só me

alimentava, mas era combustível de altíssima potência para todos aqueles alucinados

garotos e garotas (de todas as idades) espremidos na praça pública em pleno meio

de semana. E a herança maior que seus versos certeiros, seu carisma e seu senso de

ritmo incomum deixaram é justamente esta: depois de toda a avalanche estética provocada pela disseminação da envolvente, sinuosa e fluida simbologia mangue bit,

a autoimagem dos pernambucanos jamais será a mesma.

Fred Zeroquatro

Mais do que uma sensibilidade privilegiada ou uma espécie de “antena ambulante”, o Francisco França que eu conheci era um líder nato, um entusiasmado ativista urbano. Pelo que eu pude avaliar, acredito que foi baseado principalmente no convívio intenso com as diversas subculturas que coexistiam – nas últimas décadas do século XX – na periferia da capital pernambucana que ele foi desenvolvendo aquele talento extraordinário para a invenção estética. E, hoje não há quem duvide, no campo da música popular o meu parceiro “mangueboy” aprendeu a usar esse potencial mobilizador como poucos nordestinos de sua geração.

Não é exagero afirmar que sua criação suprema, o frontman Chico Science – um mix de Flavor Flav (o endiabrado clown do Public Enemy) com caboclo de lança –, reformulou para sempre, a partir de um diálogo consciente com a grande indústria do entretenimento planetário, a representação da cultura jovem do Nordeste brasileiro nas grandes esferas de interlocução globais. E o povo dessas bandas, sempre que tem oportunidade, faz questão de revalidar o fenômeno. Como aconteceu, de forma emblemática, poucos dias atrás.

Fred Zeroquatro viu o que era uma brincadeira de mesa de bar

se transformar em algo que mudaria para sempre uma cidade –

e a história da música brasileira. À frente da banda Mundo

Livre S/A, é Fred quem assina o primeiro Manifesto Mangue.

Tem quatro discos aclamados pela crítica, é casado com Maria

Eduarda e pai de dois filhos.

Page 9: Fanzine Ocupação Chico Science

Os ecos daquela quarta-feira, podem acreditar, ainda me acompanham. Eis uma data que milhares de “mangueboys” relembrarão por muitos e muitos anos: 9 de dezembro de 2009. Sim, eu estava lá, fui um dos quase 100 mil privilegiados que participaram, no Marco Zero do Recife, da gravação do segundo DVD ao vivo da Nação Zumbi. A festa não era só para celebrar a abertura de um histórico e audacioso evento, no caso a segunda edição da Feira Música Brasil. No fundo, o que a maioria de nós pretendia naquela noite era compartilhar essa espécie de orgulho coletivo, como se disséssemos a nós mesmos: que outro lugar do mundo pode dizer, com tanta propriedade, que é o legítimo depositário desse legado?

Quando eu subi no palco para cantar Rios, Pontes e Overdrives com Jorge du Peixe e os outros parceiros da Nação, senti que a energia de Francisco França não só me

alimentava, mas era combustível de altíssima potência para todos aqueles alucinados

garotos e garotas (de todas as idades) espremidos na praça pública em pleno meio

de semana. E a herança maior que seus versos certeiros, seu carisma e seu senso de

ritmo incomum deixaram é justamente esta: depois de toda a avalanche estética provocada pela disseminação da envolvente, sinuosa e fluida simbologia mangue bit,

a autoimagem dos pernambucanos jamais será a mesma.

Fred Zeroquatro

Mais do que uma sensibilidade privilegiada ou uma espécie de “antena ambulante”, o Francisco França que eu conheci era um líder nato, um entusiasmado ativista urbano. Pelo que eu pude avaliar, acredito que foi baseado principalmente no convívio intenso com as diversas subculturas que coexistiam – nas últimas décadas do século XX – na periferia da capital pernambucana que ele foi desenvolvendo aquele talento extraordinário para a invenção estética. E, hoje não há quem duvide, no campo da música popular o meu parceiro “mangueboy” aprendeu a usar esse potencial mobilizador como poucos nordestinos de sua geração.

Não é exagero afirmar que sua criação suprema, o frontman Chico Science – um mix de Flavor Flav (o endiabrado clown do Public Enemy) com caboclo de lança –, reformulou para sempre, a partir de um diálogo consciente com a grande indústria do entretenimento planetário, a representação da cultura jovem do Nordeste brasileiro nas grandes esferas de interlocução globais. E o povo dessas bandas, sempre que tem oportunidade, faz questão de revalidar o fenômeno. Como aconteceu, de forma emblemática, poucos dias atrás.

Fred Zeroquatro viu o que era uma brincadeira de mesa de bar

se transformar em algo que mudaria para sempre uma cidade –

e a história da música brasileira. À frente da banda Mundo

Livre S/A, é Fred quem assina o primeiro Manifesto Mangue.

Tem quatro discos aclamados pela crítica, é casado com Maria

Eduarda e pai de dois filhos.

Page 10: Fanzine Ocupação Chico Science

Estuário. Parte terminal de um rio ou lagoa. Porção de rio com água salobra. Em suas margens se encontram os manguezais, comunidade de plantas tropicais ou subtropicais inundada pelos movi-mentos das marés. Pela troca de matéria orgânica entre a água doce e a salgada, os mangues estão entre os ecossistemas mais produtivos do mundo.

Estima-se que 2 mil espécies de micro-organismos e animais vertebrados e invertebrados estejam associadas à vegetação do mangue. Os estuários fornecem áreas de desova e criação para dois terços da produção anual de pescados do mundo inteiro. Pelo menos 80 espécies, comercialmente importantes, dependem dos alagadiços costeiros.

Não é por acaso que os mangues são considerados um elo básico da cadeia alimentar marinha. Ape-sar das muriçocas, dos mosquitos e das mutucas – inimigos das donas de casa –, para os cientistas os mangues são tidos como símbolo de fertili-dade, diversidade e riqueza.

Fred Zer

oquatro

(Manifesto)

Page 11: Fanzine Ocupação Chico Science

Estuário. Parte terminal de um rio ou lagoa. Porção de rio com água salobra. Em suas margens se encontram os manguezais, comunidade de plantas tropicais ou subtropicais inundada pelos movi-mentos das marés. Pela troca de matéria orgânica entre a água doce e a salgada, os mangues estão entre os ecossistemas mais produtivos do mundo.

Estima-se que 2 mil espécies de micro-organismos e animais vertebrados e invertebrados estejam associadas à vegetação do mangue. Os estuários fornecem áreas de desova e criação para dois terços da produção anual de pescados do mundo inteiro. Pelo menos 80 espécies, comercialmente importantes, dependem dos alagadiços costeiros.

Não é por acaso que os mangues são considerados um elo básico da cadeia alimentar marinha. Ape-sar das muriçocas, dos mosquitos e das mutucas – inimigos das donas de casa –, para os cientistas os mangues são tidos como símbolo de fertili-dade, diversidade e riqueza.

Fred Zer

oquatro

(Manifesto)

Page 12: Fanzine Ocupação Chico Science

A planície costeira onde

Recife foi fundada

é cortada por seis rios.

Após a expulsão dos

holandeses, no século XV

II, a (ex-) cidade

“maurícia” passou a cres

cer desordenadamente à c

usta

do aterramento indiscrim

inado e da destruição de

seus manguezais.

Em contrapartida, o desvar

io irresistível de uma

cínica noção de “progresso

”, que elevou a cidade

ao posto de “metrópole” do

Nordeste, não tardou a

revelar sua fragilidade.

Bastaram pequenas mudanç

as nos “ventos” da histó

ria

para que os primeiros si

nais de esclerose econôm

ica

se manifestassem, no iní

cio dos anos 1960. Nos

últimos 30 anos a síndro

me da estagnação, aliada

à

permanência do mito da “

metrópole”, só tem levad

o

ao agravamento acelerado

do quadro de miséria e

caos urbano.

Recife detém hoje o maio

r índice de desemprego

do país. Mais da metade

dos habitantes mora em

favelas e alagados. Segu

ndo um instituto de estu

dos

populacionais de Washing

ton, é hoje a quarta pio

r

cidade do mundo para se

viver.

Page 13: Fanzine Ocupação Chico Science

A planície costeira onde

Recife foi fundada

é cortada por seis rios.

Após a expulsão dos

holandeses, no século XV

II, a (ex-) cidade

“maurícia” passou a cres

cer desordenadamente à c

usta

do aterramento indiscrim

inado e da destruição de

seus manguezais.

Em contrapartida, o desvar

io irresistível de uma

cínica noção de “progresso

”, que elevou a cidade

ao posto de “metrópole” do

Nordeste, não tardou a

revelar sua fragilidade.

Bastaram pequenas mudanç

as nos “ventos” da histó

ria

para que os primeiros si

nais de esclerose econôm

ica

se manifestassem, no iní

cio dos anos 1960. Nos

últimos 30 anos a síndro

me da estagnação, aliada

à

permanência do mito da “

metrópole”, só tem levad

o

ao agravamento acelerado

do quadro de miséria e

caos urbano.

Recife detém hoje o maio

r índice de desemprego

do país. Mais da metade

dos habitantes mora em

favelas e alagados. Segu

ndo um instituto de estu

dos

populacionais de Washing

ton, é hoje a quarta pio

r

cidade do mundo para se

viver.

Page 14: Fanzine Ocupação Chico Science

Um choque rápido ou Recife morre de

infarto! Não é preciso ser médico para s

aber que a

maneira mais simples de parar o coração

de um sujeito

é obstruir suas veias. O modo mais rápid

o, também, de

enfartar e esvaziar a alma de uma cidade

como Recife

é matar seus rios e aterrar seus estuári

os. O que

fazer para não afundar na depressão crôn

ica que par-

alisa os cidadãos? Como devolver o ânimo

, deslobot-

omizar e recarregar as baterias da cidad

e? Simples!

Basta injetar um pouco de energia na lam

a e estimular

o que ainda resta de fertilidade nas vei

as de Recife.

Em meados de 1991, começou a ser gerado

e articu-

lado em vários pontos da cidade um núcle

o de pesquisa

e produção de ideias pop. O objetivo é e

ngendrar um

“circuito energético”, capaz de conectar

as boas vi-

brações dos mangues com a rede mundial d

e circulação

de conceitos pop. Imagem símbolo: uma an

tena para-

bólica enfiada na lama.

Emergencia!

Os mangueboys e as manguegirls são indivíduos interessados em quadrinhos, TV interativa, anti-psiquiatria, Bezerra da Silva, hip hop, midiotia, artismo, música de rua, John Coltrane, acaso, sexo não virtual, conflitos étnicos e todos os avanços da química aplicada no terreno da alteração e expansão da consciência.

Page 15: Fanzine Ocupação Chico Science

Um choque rápido ou Recife morre de

infarto! Não é preciso ser médico para s

aber que a

maneira mais simples de parar o coração

de um sujeito

é obstruir suas veias. O modo mais rápid

o, também, de

enfartar e esvaziar a alma de uma cidade

como Recife

é matar seus rios e aterrar seus estuári

os. O que

fazer para não afundar na depressão crôn

ica que par-

alisa os cidadãos? Como devolver o ânimo

, deslobot-

omizar e recarregar as baterias da cidad

e? Simples!

Basta injetar um pouco de energia na lam

a e estimular

o que ainda resta de fertilidade nas vei

as de Recife.

Em meados de 1991, começou a ser gerado

e articu-

lado em vários pontos da cidade um núcle

o de pesquisa

e produção de ideias pop. O objetivo é e

ngendrar um

“circuito energético”, capaz de conectar

as boas vi-

brações dos mangues com a rede mundial d

e circulação

de conceitos pop. Imagem símbolo: uma an

tena para-

bólica enfiada na lama.

Emergencia!

Os mangueboys e as manguegirls são indivíduos interessados em quadrinhos, TV interativa, anti-psiquiatria, Bezerra da Silva, hip hop, midiotia, artismo, música de rua, John Coltrane, acaso, sexo não virtual, conflitos étnicos e todos os avanços da química aplicada no terreno da alteração e expansão da consciência.

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A cidade de Olinda fica na região metropolitana do Recife. De tão próximas, podemos dizer tratar-se de uma cidade dentro da outra. Com Jaboatão dos Guararapes não é diferente. A primeira fica ao norte do Recife, e a segunda, ao sul. O mar transforma as três cidades em um lugar único.

E foi em Olinda, em 1991, que assisti à primeira apresentação da banda Chico Science & Lamento Negro (depois transformada em Nação Zumbi). O lugar chamava-se Oásis – nome muito apropriado. E o show abria para a Mundo Livre S/A (Fred Zeroquatro como líder). Naquele momento, na prática, o movimento mangue se tornava público (público pequeno e interessante).

Hilton Lacerda

Essa identificação é importante para

mim por ter dado a largada a uma

frente de ataque cultural bastante

representativa dos anos 1990 no

Brasil (e seus ecos ainda influenciam a

cultura contemporânea).

Mas antes disso os caranguejos já

estavam soltos. As tramas existiam.

Desde o início dos anos 1980, o “Rato”

(apelido de Fred Montenegro – mais

tarde Zeroquatro) já estava colocando

sua imaginação efervescente a

serviço de uma mudança mais radical

na cultura oficial de Pernambuco,

dominada pelos excessos

tradicionalistas do movimento armorial.

A Mundo Livre S/A já embalava, desde

1984, uma pequena fauna de fãs.

Pessoas que estavam por trás daquele

cenário magrinho, necessitando de

vitaminas para engordar.

Eram anos de muito pouco dinheiro.

A informação era rasa, curta e

conformada. E era nesse cenário que

Fred ensaiava sua mistura explosiva

de mensagem cerebral anarquicamente

construída em parceria com uma busca

incessante de conceitos populares.

A periferia estava onde sempre esteve,

mas mandava seu recado ainda sem

canal. Mas o canal estava chegando.

E a ideia do mangue como símbolo de

diversidade já estava em andamento.

No fim dos anos 1980, Recife centraliza

o encontro entre os mundos de

Jaboatão dos Guararapes e de Olinda.

Várias pessoas participam desse

momento. Chico (com o Orla Orbe

e o Loustal) e Fred (sempre Mundo

Livre S/A) se encontram. Um vinha com sua herança da black music e do hip hop (junto com seus companheiros Jorge du Peixe, Lúcio Maia, Dengue e o DJ Aranha). Do outro lado, a herança anarcossambista e punk rock dos Montenegros e seus seguidores. O caldo principia a engrossar. E aí, num cenário bem diferente, os caranguejos começam a esboçar um cérebro.

O início dos anos 1990 trazia uma ressaca sem proporções. Uma eleição (o primeiro pleito direto para presidente desde o golpe militar de 1964) tinha levado ao poder o que considerávamos – pelo menos assim acredito – a parte mais conservadora de nossa política. Mas o que parecia danoso serviu de alimento, a vitamina que faltava.

Page 17: Fanzine Ocupação Chico Science

A cidade de Olinda fica na região metropolitana do Recife. De tão próximas, podemos dizer tratar-se de uma cidade dentro da outra. Com Jaboatão dos Guararapes não é diferente. A primeira fica ao norte do Recife, e a segunda, ao sul. O mar transforma as três cidades em um lugar único.

E foi em Olinda, em 1991, que assisti à primeira apresentação da banda Chico Science & Lamento Negro (depois transformada em Nação Zumbi). O lugar chamava-se Oásis – nome muito apropriado. E o show abria para a Mundo Livre S/A (Fred Zeroquatro como líder). Naquele momento, na prática, o movimento mangue se tornava público (público pequeno e interessante).

Hilton Lacerda

Essa identificação é importante para

mim por ter dado a largada a uma

frente de ataque cultural bastante

representativa dos anos 1990 no

Brasil (e seus ecos ainda influenciam a

cultura contemporânea).

Mas antes disso os caranguejos já

estavam soltos. As tramas existiam.

Desde o início dos anos 1980, o “Rato”

(apelido de Fred Montenegro – mais

tarde Zeroquatro) já estava colocando

sua imaginação efervescente a

serviço de uma mudança mais radical

na cultura oficial de Pernambuco,

dominada pelos excessos

tradicionalistas do movimento armorial.

A Mundo Livre S/A já embalava, desde

1984, uma pequena fauna de fãs.

Pessoas que estavam por trás daquele

cenário magrinho, necessitando de

vitaminas para engordar.

Eram anos de muito pouco dinheiro.

A informação era rasa, curta e

conformada. E era nesse cenário que

Fred ensaiava sua mistura explosiva

de mensagem cerebral anarquicamente

construída em parceria com uma busca

incessante de conceitos populares.

A periferia estava onde sempre esteve,

mas mandava seu recado ainda sem

canal. Mas o canal estava chegando.

E a ideia do mangue como símbolo de

diversidade já estava em andamento.

No fim dos anos 1980, Recife centraliza

o encontro entre os mundos de

Jaboatão dos Guararapes e de Olinda.

Várias pessoas participam desse

momento. Chico (com o Orla Orbe

e o Loustal) e Fred (sempre Mundo

Livre S/A) se encontram. Um vinha com sua herança da black music e do hip hop (junto com seus companheiros Jorge du Peixe, Lúcio Maia, Dengue e o DJ Aranha). Do outro lado, a herança anarcossambista e punk rock dos Montenegros e seus seguidores. O caldo principia a engrossar. E aí, num cenário bem diferente, os caranguejos começam a esboçar um cérebro.

O início dos anos 1990 trazia uma ressaca sem proporções. Uma eleição (o primeiro pleito direto para presidente desde o golpe militar de 1964) tinha levado ao poder o que considerávamos – pelo menos assim acredito – a parte mais conservadora de nossa política. Mas o que parecia danoso serviu de alimento, a vitamina que faltava.

Page 18: Fanzine Ocupação Chico Science

A junção dos fatores fortalecia a necessidade de uma alavanca que tirasse nosso mundo daquele isolamento. O mundo virtual estava batendo na porta. O bitnet já mostrava um canal. Faltava isso se alargar. Questão de tempo – que não demorou muito. E foi aí que aconteceu o show do Oásis. Depois disso...

O Manifesto Mangue, junto com uma viagem para São Paulo, em 1993, catapultou o mangue de uma exacerbação local para o patamar de excelência exigido pela província Recife. A recepção mais que positiva na pauliceia (Xico Sá, Bia Abramo e Alex Antunes ajudando a balançar esse coreto) abriu as portas da própria casa. Recife agora era a Manguetown que os

cérebros dos caranguejos desejavam. Fred Zeroquatro, Renato L. (“ministro da informação do mangue”) e Chico Science na vanguarda. Em volta deles estavam os diluidores do movimento. E que uma coisa fique clara: o mangue não é um tipo de música, mas uma frente que foi capaz de abrir brechas de visibilidade, antenar a periferia com o mundo e trazer esse mundo de volta.

Não só o público começou a prestar atenção naqueles meninos, mas as gravadoras se colocaram à disposição (tudo tem seu ônus). Chico Science & Nação Zumbi saem na frente: em 1994 lançam o disco Da Lama ao Caos (isso mesmo – disco). Eu e Helder Aragão (DJ Dolores) fomos convidados pela banda para elaborar o projeto gráfico do disco. Formávamos uma dupla de criação chamada Dolores & Morales (e assim o projeto foi assinado). Um trabalho conjunto foi posto em prática. Muita gente interessante em volta e uma resistência constante da gravadora. Mas deu certo. O disco saiu e até hoje está como um dos mais importantes da música brasileira contemporânea.

Logo depois do Da Lama ao Caos,

vieram o Samba Esquema Noise (Mundo

Livre S/A) e Mestre Ambrósio (Mestre

Ambrósio). Esse pequeno panorama já

é capaz de descortinar a diversidade do

movimento, que se irmanou com outras

correntes artísticas, como as artes

plásticas e o cinema – esse namoro

começou com os curtas-metragens

Maracatu, Maracatus (Marcelo Gomes)

e Cachaça (Adelina Pontual) e com

o longa Baile Perfumado (Paulo Caldas e

Lírio Ferreira). E uma manifestação não

estava atrelada à outra: foram circuitos

paralelos que desaguaram no mesmo rio.

O mangue bit ganhou chancela de

batida. Sua dimensão alimentou discussões apaixonadas. Alguns ficaram pelo caminho, mas o movimento continuou a influenciar uma

gama de acontecimentos culturais

que reverberam até hoje – seja por

concordância, seja por afirmar sua superação.

Mas o que realmente é importante

aí? Para mim foi o canal aberto na

periferia: o alto-falante que, a partir de

uma possibilidade, levou ares desse cosmopolitismo de pobre para o mundo. Claro que isso pipocou, com maior ou menor brilhantismo, em várias partes do planeta. Mas o mangue teve algo muito interessante: o constante interesse no universo tecnológico como forma de mudança, como instrumento de transformação. Batidas envelhecem, os bits rejuvenescem todos os dias.

Mas uma coisa que instiga é o papel da periferia (em todos os níveis de relação). A vez foi ocupada pela insistência? Tem a ver com o momento histórico? A periferia agora é mercado? Todas essas questões, e mais algumas, juntas? Aí deixo minha dúvida em vez de minhas certezas. Há muito cientista social deitado sobre o tema. Eu fico da janela, querendo fazer parte, e torcendo para que os discursos sejam mais e mais radicais. E que dos excessos e da banalização possamos descobrir um novo mundo, que balança nas pontas para reverberar ali, bem no centro.

Hilton Lacerda é roteirista. Assina os roteiros de Baile Perfumado (1997), Texas Hotel (1999), Amarelo Manga (2002) e Baixio das Bestas (2007). É o Morales da dupla Dolores & Morales, que dirigiu os primeiros clipes da cena mangue, a exemplo de Maracatu de Tiro Certeiro (Chico Science & Nação Zumbi) e Samba Esquema Noise (Mundo Livre S/A).

Page 19: Fanzine Ocupação Chico Science

A junção dos fatores fortalecia a necessidade de uma alavanca que tirasse nosso mundo daquele isolamento. O mundo virtual estava batendo na porta. O bitnet já mostrava um canal. Faltava isso se alargar. Questão de tempo – que não demorou muito. E foi aí que aconteceu o show do Oásis. Depois disso...

O Manifesto Mangue, junto com uma viagem para São Paulo, em 1993, catapultou o mangue de uma exacerbação local para o patamar de excelência exigido pela província Recife. A recepção mais que positiva na pauliceia (Xico Sá, Bia Abramo e Alex Antunes ajudando a balançar esse coreto) abriu as portas da própria casa. Recife agora era a Manguetown que os

cérebros dos caranguejos desejavam. Fred Zeroquatro, Renato L. (“ministro da informação do mangue”) e Chico Science na vanguarda. Em volta deles estavam os diluidores do movimento. E que uma coisa fique clara: o mangue não é um tipo de música, mas uma frente que foi capaz de abrir brechas de visibilidade, antenar a periferia com o mundo e trazer esse mundo de volta.

Não só o público começou a prestar atenção naqueles meninos, mas as gravadoras se colocaram à disposição (tudo tem seu ônus). Chico Science & Nação Zumbi saem na frente: em 1994 lançam o disco Da Lama ao Caos (isso mesmo – disco). Eu e Helder Aragão (DJ Dolores) fomos convidados pela banda para elaborar o projeto gráfico do disco. Formávamos uma dupla de criação chamada Dolores & Morales (e assim o projeto foi assinado). Um trabalho conjunto foi posto em prática. Muita gente interessante em volta e uma resistência constante da gravadora. Mas deu certo. O disco saiu e até hoje está como um dos mais importantes da música brasileira contemporânea.

Logo depois do Da Lama ao Caos,

vieram o Samba Esquema Noise (Mundo

Livre S/A) e Mestre Ambrósio (Mestre

Ambrósio). Esse pequeno panorama já

é capaz de descortinar a diversidade do

movimento, que se irmanou com outras

correntes artísticas, como as artes

plásticas e o cinema – esse namoro

começou com os curtas-metragens

Maracatu, Maracatus (Marcelo Gomes)

e Cachaça (Adelina Pontual) e com

o longa Baile Perfumado (Paulo Caldas e

Lírio Ferreira). E uma manifestação não

estava atrelada à outra: foram circuitos

paralelos que desaguaram no mesmo rio.

O mangue bit ganhou chancela de

batida. Sua dimensão alimentou discussões apaixonadas. Alguns ficaram pelo caminho, mas o movimento continuou a influenciar uma

gama de acontecimentos culturais

que reverberam até hoje – seja por

concordância, seja por afirmar sua superação.

Mas o que realmente é importante

aí? Para mim foi o canal aberto na

periferia: o alto-falante que, a partir de

uma possibilidade, levou ares desse cosmopolitismo de pobre para o mundo. Claro que isso pipocou, com maior ou menor brilhantismo, em várias partes do planeta. Mas o mangue teve algo muito interessante: o constante interesse no universo tecnológico como forma de mudança, como instrumento de transformação. Batidas envelhecem, os bits rejuvenescem todos os dias.

Mas uma coisa que instiga é o papel da periferia (em todos os níveis de relação). A vez foi ocupada pela insistência? Tem a ver com o momento histórico? A periferia agora é mercado? Todas essas questões, e mais algumas, juntas? Aí deixo minha dúvida em vez de minhas certezas. Há muito cientista social deitado sobre o tema. Eu fico da janela, querendo fazer parte, e torcendo para que os discursos sejam mais e mais radicais. E que dos excessos e da banalização possamos descobrir um novo mundo, que balança nas pontas para reverberar ali, bem no centro.

Hilton Lacerda é roteirista. Assina os roteiros de Baile Perfumado (1997), Texas Hotel (1999), Amarelo Manga (2002) e Baixio das Bestas (2007). É o Morales da dupla Dolores & Morales, que dirigiu os primeiros clipes da cena mangue, a exemplo de Maracatu de Tiro Certeiro (Chico Science & Nação Zumbi) e Samba Esquema Noise (Mundo Livre S/A).

Page 20: Fanzine Ocupação Chico Science

Uma metáfora foi criada em meados de 1991, representando a relação direta entre a riqueza do ecossistema dos manguezais recifenses e a cena pop que na época florescia entre as cidades de Olinda, Recife e Jaboatão dos Guararapes. Muito foi escrito sobre o assunto, mas a crença de que ainda faltam alguns pontos importantes a ser explorados e o entendimento de sua centralidade no que se desenrolou desde então levaram à criação do presente texto.

Neste momento, antes de continuarmos nossa viagem ao centro do mangue, cabe alinhar os entendimentos sobre metáforas: somos levados, como que por hábito, a considerar o uso delas na poesia ou na retórica, ou seja, sempre no exercício exclusivo da linguagem.

h.d. mabuse

Acreditamos, caro leitor,

que não é assim que as coisas

acontecem. A influência direta

da metáfora do mangue pode ser

observada como motor de ações

das pessoas expostas à sua influência,

direcionando o comportamento

dos indivíduos e os caminhos

que foram tomados por grupos

sociais e instituições.

E do que fala a metáfora do mangue?

De água salobra, comunidades

de plantas tropicais ou subtropicais

inundadas pelo movimento das marés,

fertilidade, diversidade e riqueza.

Para nosso pequeno ensaio,

vamos tomar como ponto de partida

da análise dessa metáfora o papel

do acaso nesse processo.

Assim como existe uma conjunção

de circunstâncias e uma constelação

de influências que possibilitam a explosão

de vida nos estuários do Recife, também

uma diversidade de fatores, por meio de

várias tradições pop e vários professores,

estudantes e amigos, alimentou o

caldo cultural enormemente complexo

que permitiu uma tão improvável

combinação na produção musical

contemporânea. Essa combinação levou a uma modificação do eixo da indústria fonográfica de então, abrindo caminho para a produção não só do Recife, mas de todo o Norte e o Nordeste, não apenas na música, mas em formas de expressão artística tão diversas como moda, cinema, literatura e software.

Page 21: Fanzine Ocupação Chico Science

Uma metáfora foi criada em meados de 1991, representando a relação direta entre a riqueza do ecossistema dos manguezais recifenses e a cena pop que na época florescia entre as cidades de Olinda, Recife e Jaboatão dos Guararapes. Muito foi escrito sobre o assunto, mas a crença de que ainda faltam alguns pontos importantes a ser explorados e o entendimento de sua centralidade no que se desenrolou desde então levaram à criação do presente texto.

Neste momento, antes de continuarmos nossa viagem ao centro do mangue, cabe alinhar os entendimentos sobre metáforas: somos levados, como que por hábito, a considerar o uso delas na poesia ou na retórica, ou seja, sempre no exercício exclusivo da linguagem.

h.d. mabuse

Acreditamos, caro leitor,

que não é assim que as coisas

acontecem. A influência direta

da metáfora do mangue pode ser

observada como motor de ações

das pessoas expostas à sua influência,

direcionando o comportamento

dos indivíduos e os caminhos

que foram tomados por grupos

sociais e instituições.

E do que fala a metáfora do mangue?

De água salobra, comunidades

de plantas tropicais ou subtropicais

inundadas pelo movimento das marés,

fertilidade, diversidade e riqueza.

Para nosso pequeno ensaio,

vamos tomar como ponto de partida

da análise dessa metáfora o papel

do acaso nesse processo.

Assim como existe uma conjunção

de circunstâncias e uma constelação

de influências que possibilitam a explosão

de vida nos estuários do Recife, também

uma diversidade de fatores, por meio de

várias tradições pop e vários professores,

estudantes e amigos, alimentou o

caldo cultural enormemente complexo

que permitiu uma tão improvável

combinação na produção musical

contemporânea. Essa combinação levou a uma modificação do eixo da indústria fonográfica de então, abrindo caminho para a produção não só do Recife, mas de todo o Norte e o Nordeste, não apenas na música, mas em formas de expressão artística tão diversas como moda, cinema, literatura e software.

Page 22: Fanzine Ocupação Chico Science

Em um dos vários centros desse ecossistema em forma de rede estava Chico. Encontramo-nos a primeira vez pelo capricho do acaso, em uma das gravações de um programa de rádio produzido por Fred Zeroquatro. Um Chico que ainda assinava como Vülgo apareceu com discos de Biz Markie, Afrika Bambaata & Soulsonic Force e a trilha de Beat Street (1984) embaixo do braço. O interesse pela música negra, e pela eletrônica alemã e a proximidade geográfica (ele morava em Rio Doce e eu em Casa Caiada, bairros de Olinda) nos uniram e pavimentaram o caminho para a amizade.

Em meados de 1987, junto com Jorge du Peixe, em tardes com pouco dinheiro e muita vontade, montamos o Bom Tom Rádio (espécie de laboratório onde

músicas como A Cidade e intenções que deram no coletivo de criação Re:combo foram gestadas). No início dos anos 1990, um salto: depois de nos mudarmos para o Edifício Capibaribe, na Rua da Aurora, e com o convívio diário, pude presenciar sua capacidade de construção de complexas redes de significados. Se o conhecimento dos aspectos biológicos dos manguezais estava mais aprofundado em Fred, o batismo do que ainda era entendido como apenas um ritmo foi de Chico.

Com uma velocidade que nos passou despercebida, por estarmos no mesmo movimento, todo o tecido de sentidos tomou forma. E assim as conexões entre teoria do caos, funk, Josué de Castro, samba, guitarras pesadas, punk, faça-você-mesmo, hacking, subversão no entretenimento, maracatu, internet, psicodelia, ficção científica e estados alterados estavam informadas na música.

Naquele momento, vários motivos acabaram me afastando do convívio de Chico e de muitos outros amigos queridos. Então, em fevereiro de 1997, a mais de 3 mil quilômetros de distância

do Recife, recebi um telefonema anunciando que mais uma vez o acaso

(na forma da troca de um carro ou de

um cinto de segurança quebrado) tinha

interrompido, de forma brutal e precoce, a vida de um amigo e seu fluxo vertiginoso de produção,

que mal tinha começado.

Neste momento peço que o leitor volte à

metáfora do mangue: o ciclo de transformações da vida que borbulha

nos manguezais, os processos químicos

que ocorrem nos líquidos viscosos,

grãos sólidos e bolhas gasosas, a contínua transformação líquida.

Agora, com um distanciamento de mais

de uma década dos fatos ocorridos,

podemos dimensionar os efeitos desse processo: a produção musical

pernambucana continua uma das mais

ricas do país, no momento enfrentando

(e aproveitando) os novos desafios

de uma mudança radical na indústria

fonográfica. O cinema ganhou uma força

que não se via desde o início do século

passado. Novas praias e portos surgiram

para reforçar as conexões entre arte

e tecnologia. Da produção de games

aos softwares, vimos o surgimento de

dois grandes fenômenos:

uma comunidade de software livre militante no melhor estilo punk do faça-você-mesmo e uma indústria pautada diretamente pelas ideias do mangue, com o entendimento de que, se foi possível promover essa mudança cultural e de negócios na indústria fonográfica, o mesmo é possível na indústria do software.

As mudanças produzidas pelas ideias e pelos conceitos tecidos por Chico e outros, depois de tanto tempo, já chegam a nos passar despercebidas. Mas elas continuam mudando a nossa realidade, a cada dia e em várias proporções, é só dar mais um passo à frente e ter sempre a mente na imensidão.

Herr Doktor Mabuse é o codinome de José Carlos Arcoverde, webdesigner pernambucano e “ministro da tecnologia” do movimento mangue. Foi Mabuse quem apresentou a turma de Rio Doce (Olinda), Jorge du Peixe, Chico Science e Lúcio Maia, àquela de Candeias (Jaboatão dos Guararapes), Fred Zeroquatro e Renato L. (o “ministro da comunicação” do movimento).

Page 23: Fanzine Ocupação Chico Science

Em um dos vários centros desse ecossistema em forma de rede estava Chico. Encontramo-nos a primeira vez pelo capricho do acaso, em uma das gravações de um programa de rádio produzido por Fred Zeroquatro. Um Chico que ainda assinava como Vülgo apareceu com discos de Biz Markie, Afrika Bambaata & Soulsonic Force e a trilha de Beat Street (1984) embaixo do braço. O interesse pela música negra, e pela eletrônica alemã e a proximidade geográfica (ele morava em Rio Doce e eu em Casa Caiada, bairros de Olinda) nos uniram e pavimentaram o caminho para a amizade.

Em meados de 1987, junto com Jorge du Peixe, em tardes com pouco dinheiro e muita vontade, montamos o Bom Tom Rádio (espécie de laboratório onde

músicas como A Cidade e intenções que deram no coletivo de criação Re:combo foram gestadas). No início dos anos 1990, um salto: depois de nos mudarmos para o Edifício Capibaribe, na Rua da Aurora, e com o convívio diário, pude presenciar sua capacidade de construção de complexas redes de significados. Se o conhecimento dos aspectos biológicos dos manguezais estava mais aprofundado em Fred, o batismo do que ainda era entendido como apenas um ritmo foi de Chico.

Com uma velocidade que nos passou despercebida, por estarmos no mesmo movimento, todo o tecido de sentidos tomou forma. E assim as conexões entre teoria do caos, funk, Josué de Castro, samba, guitarras pesadas, punk, faça-você-mesmo, hacking, subversão no entretenimento, maracatu, internet, psicodelia, ficção científica e estados alterados estavam informadas na música.

Naquele momento, vários motivos acabaram me afastando do convívio de Chico e de muitos outros amigos queridos. Então, em fevereiro de 1997, a mais de 3 mil quilômetros de distância

do Recife, recebi um telefonema anunciando que mais uma vez o acaso

(na forma da troca de um carro ou de

um cinto de segurança quebrado) tinha

interrompido, de forma brutal e precoce, a vida de um amigo e seu fluxo vertiginoso de produção,

que mal tinha começado.

Neste momento peço que o leitor volte à

metáfora do mangue: o ciclo de transformações da vida que borbulha

nos manguezais, os processos químicos

que ocorrem nos líquidos viscosos,

grãos sólidos e bolhas gasosas, a contínua transformação líquida.

Agora, com um distanciamento de mais

de uma década dos fatos ocorridos,

podemos dimensionar os efeitos desse processo: a produção musical

pernambucana continua uma das mais

ricas do país, no momento enfrentando

(e aproveitando) os novos desafios

de uma mudança radical na indústria

fonográfica. O cinema ganhou uma força

que não se via desde o início do século

passado. Novas praias e portos surgiram

para reforçar as conexões entre arte

e tecnologia. Da produção de games

aos softwares, vimos o surgimento de

dois grandes fenômenos:

uma comunidade de software livre militante no melhor estilo punk do faça-você-mesmo e uma indústria pautada diretamente pelas ideias do mangue, com o entendimento de que, se foi possível promover essa mudança cultural e de negócios na indústria fonográfica, o mesmo é possível na indústria do software.

As mudanças produzidas pelas ideias e pelos conceitos tecidos por Chico e outros, depois de tanto tempo, já chegam a nos passar despercebidas. Mas elas continuam mudando a nossa realidade, a cada dia e em várias proporções, é só dar mais um passo à frente e ter sempre a mente na imensidão.

Herr Doktor Mabuse é o codinome de José Carlos Arcoverde, webdesigner pernambucano e “ministro da tecnologia” do movimento mangue. Foi Mabuse quem apresentou a turma de Rio Doce (Olinda), Jorge du Peixe, Chico Science e Lúcio Maia, àquela de Candeias (Jaboatão dos Guararapes), Fred Zeroquatro e Renato L. (o “ministro da comunicação” do movimento).

Page 24: Fanzine Ocupação Chico Science

Me encantam os nomes das

ruas, dos bairros e das

favelas do Recife: Linha do

Tiro, Planeta dos Macacos,

Entra a Pulso, Roda de Fogo,

Rua da Harmonia, da Amizade,

das Flores ou simplesmente

– não estou inventando, é

verdade! – Rua da Merda.

Eu morava na Rua da Aurora,

de frente para a Rua do

Sol, separadas pelo Rio

Capibaribe, que, reza a mania

de grandeza do recifense, se

junta ao Beberibe para formar

o Oceano Atlântico.

Naquele dia Chico vinha

de Rio Doce, um bairro

popular de Olinda. Para chegar ao meu minúsculo

apartamento, ele descia na Cabunga e andava uns

quatro quarteirões embaixo desse sol matador que

nos torra diariamente. é importante pensar nesse

trajeto longo, primeiro de ônibus e depois a pé,

porque o sujeito estava completamente fantasiado,

usando um figurino que, bondosamente, eu chamaria

apenas de maluco.

Recife, “a maior cidade pequena do mundo”, cultiva

seus doidos de rua com pão, cachaça e pedras;

portanto, é espantoso que ele tenha sobrevivido

sem um galo na testa, impecavelmente limpo e sem

rasgões na roupa.

Deixe-me descrever o que vi: na cabeça, aquele

chapeuzinho de palha sem aba e óculos enormes com

pinta de brechó; no pescoço, um colar de contas

meio com sabor de candomblé; a camiseta, uma

Hering branca, contrastava, por ser discreta,

com uma calça folgada de chita florida, que se

encerrava no meio das canelas, mostrando um meião

que descia até um tênis conga.

ABEC

A DJ Dolores

Page 25: Fanzine Ocupação Chico Science

Me encantam os nomes das

ruas, dos bairros e das

favelas do Recife: Linha do

Tiro, Planeta dos Macacos,

Entra a Pulso, Roda de Fogo,

Rua da Harmonia, da Amizade,

das Flores ou simplesmente

– não estou inventando, é

verdade! – Rua da Merda.

Eu morava na Rua da Aurora,

de frente para a Rua do

Sol, separadas pelo Rio

Capibaribe, que, reza a mania

de grandeza do recifense, se

junta ao Beberibe para formar

o Oceano Atlântico.

Naquele dia Chico vinha

de Rio Doce, um bairro

popular de Olinda. Para chegar ao meu minúsculo

apartamento, ele descia na Cabunga e andava uns

quatro quarteirões embaixo desse sol matador que

nos torra diariamente. é importante pensar nesse

trajeto longo, primeiro de ônibus e depois a pé,

porque o sujeito estava completamente fantasiado,

usando um figurino que, bondosamente, eu chamaria

apenas de maluco.

Recife, “a maior cidade pequena do mundo”, cultiva

seus doidos de rua com pão, cachaça e pedras;

portanto, é espantoso que ele tenha sobrevivido

sem um galo na testa, impecavelmente limpo e sem

rasgões na roupa.

Deixe-me descrever o que vi: na cabeça, aquele

chapeuzinho de palha sem aba e óculos enormes com

pinta de brechó; no pescoço, um colar de contas

meio com sabor de candomblé; a camiseta, uma

Hering branca, contrastava, por ser discreta,

com uma calça folgada de chita florida, que se

encerrava no meio das canelas, mostrando um meião

que descia até um tênis conga.

ABEC

A DJ Dolores

Page 26: Fanzine Ocupação Chico Science

Bom, havia os anéis, o relógio de pulso e,

para completar, a munganga de b-boy, suingada

e flutuante.

Hoje seria completamente admissível ver

alguém vestido com aquela mistura de

trabalhador da cana-de-açúcar/b-boy do Parque

13 de Maio, mas, amigos, entendam, era o

começo da década de 1990, e pela primeira vez

vimos Science encarnando o personagem que o

consagraria.

Estavam comigo Fred Zeroquatro, cantor

da Mundo Livre S/A, e Renato L., também

conhecido como o “ministro da informação

do mangue”. A surpresa foi geral, assim como

a galhofa. E verdade que Zeroquatro também

usava uns adereços bizarros na roupa, como

chips e botons, além de um enorme chapéu

de palha, mas nada que chegasse perto da

excentricidade de Science.

O objetivo daquele encontro era a primeira entrevista para a MTV, a mais importante fonte de informação musical naquele Brasil sem internet, alimentado por revistas amadoras e jornalistas picaretas.

A roupa de Chico contrariava e, consequentemente, inovava um estilo de se vestir dentro da cultura da música pop brasileira. Especialmente pela ocasião, havia uma forte ironia, pois a MTV chegou formatando, ensinando a molecada como se vestir de roqueiro, clubber ou b-boy, e a roupa de Chico rompia com os parâmetros trazidos por quem ia entrevistá-lo. Seu forte senso de comunicação impunha um conceito baseado no maracatu rural com o background de dançarino de break beat. Estava lá um manifesto inteligente e original, dialogando com a essência do pop internacional ao mesmo tempo que falava com o povão castigado do interior.

Os ecos da nossa “greia” – assim a chacota é chamada no Recife – se perderam no tempo, mas aquela roupa insólita vai ficar na cabeça das pessoas até um futuro que a vista não alcança.

Dj Dolores é o nome de Helder Aragão, sergipano que chegou ao Recife na década de 1980 e se tornou ativista da cena mangue. Elaborou cartazes e panfletos de festas sensacionais, dirigiu com Morales (Hilton Lacerda) os primeiros clipes da época e concebeu a capa do primeiro disco de CSNZ.

Page 27: Fanzine Ocupação Chico Science

Bom, havia os anéis, o relógio de pulso e,

para completar, a munganga de b-boy, suingada

e flutuante.

Hoje seria completamente admissível ver

alguém vestido com aquela mistura de

trabalhador da cana-de-açúcar/b-boy do Parque

13 de Maio, mas, amigos, entendam, era o

começo da década de 1990, e pela primeira vez

vimos Science encarnando o personagem que o

consagraria.

Estavam comigo Fred Zeroquatro, cantor

da Mundo Livre S/A, e Renato L., também

conhecido como o “ministro da informação

do mangue”. A surpresa foi geral, assim como

a galhofa. E verdade que Zeroquatro também

usava uns adereços bizarros na roupa, como

chips e botons, além de um enorme chapéu

de palha, mas nada que chegasse perto da

excentricidade de Science.

O objetivo daquele encontro era a primeira entrevista para a MTV, a mais importante fonte de informação musical naquele Brasil sem internet, alimentado por revistas amadoras e jornalistas picaretas.

A roupa de Chico contrariava e, consequentemente, inovava um estilo de se vestir dentro da cultura da música pop brasileira. Especialmente pela ocasião, havia uma forte ironia, pois a MTV chegou formatando, ensinando a molecada como se vestir de roqueiro, clubber ou b-boy, e a roupa de Chico rompia com os parâmetros trazidos por quem ia entrevistá-lo. Seu forte senso de comunicação impunha um conceito baseado no maracatu rural com o background de dançarino de break beat. Estava lá um manifesto inteligente e original, dialogando com a essência do pop internacional ao mesmo tempo que falava com o povão castigado do interior.

Os ecos da nossa “greia” – assim a chacota é chamada no Recife – se perderam no tempo, mas aquela roupa insólita vai ficar na cabeça das pessoas até um futuro que a vista não alcança.

Dj Dolores é o nome de Helder Aragão, sergipano que chegou ao Recife na década de 1980 e se tornou ativista da cena mangue. Elaborou cartazes e panfletos de festas sensacionais, dirigiu com Morales (Hilton Lacerda) os primeiros clipes da época e concebeu a capa do primeiro disco de CSNZ.

Page 28: Fanzine Ocupação Chico Science

Renata Pinheiro é artista contemporânea, diretora de arte e cineasta. Dirigiu o premiado Superbarroco (2009), com várias participações em festivais internacionais como a Quinzena dos Realizadores, em Cannes, e o Festival de Havana. Com Chico Science, aprendeu que basta um passo para sair para o mundo.

Page 29: Fanzine Ocupação Chico Science

Renata Pinheiro é artista contemporânea, diretora de arte e cineasta. Dirigiu o premiado Superbarroco (2009), com várias participações em festivais internacionais como a Quinzena dos Realizadores, em Cannes, e o Festival de Havana. Com Chico Science, aprendeu que basta um passo para sair para o mundo.

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O cotidiano do Recife segundo a utopia mangue, representado graficamente por Dolores & Morales. HQ feita sob encomenda para o encarte do disco Da Lama ao Caos

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O cotidiano do Recife segundo a utopia mangue, representado graficamente por Dolores & Morales. HQ feita sob encomenda para o encarte do disco Da Lama ao Caos

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No front cultural, os anos 1990 também representavam uma espécie de contrafluxo. Para minha turma, pelo menos. Na década anterior, tínhamos tentado construir uma síntese entre as diversas forças históricas que nos formaram.

De um lado, havia o compromisso (não escrito, é claro, mas profundamente arraigado) de continuar sendo de oposição, do contra, de esquerda. Mas as alternativas formuladas pela cultura brasileira dos anos 1960/1970, tanto em sua vertente mais nacionalista e de resistência como em sua vertente mais hedonista, hippie, patinavam numa espécie de autocondescendência

estética no mínimo repetitiva, quando não simplesmente patética. De outro, nossa geração, para o bem e para o mal, era mais internacionalizada do que a anterior, o que significava, nos anos 1980, que sentíamos o nacionalismo estreito como uma prisão. Queríamos estar onde a juventude do mundo estava – e um desses lugares era o rock e a música pop revoltas depois do punk inglês; outro era o cinema de Martin Scorsese, Francis Ford Coppola e Wim Wenders; e um terceiro era toda a literatura norte-americana e inglesa que a Brasiliense começava a editar.

Ou seja, queríamos ouvir rock aparentado com o pós-punk inglês (sabíamos que punk, punk mesmo, não dava para ser, inclusive por uma questão de classe), mais intelectualizado do que aquele pop que já começava a tocar no rádio, mas que, de certa forma, fizesse a crítica da música brasileira e, por fim, que ainda fosse de esquerda. O projeto parecia complicado, mas os mais habilidosos e corajosos entre nós estavam inspirados e embalados pela palavra de ordem punk – faça-você-mesmo – e, portanto, parecia possível.

Não me lembro bem da primeira vez

em que vi ou ouvi Chico Science.

Lá se vai algo entre 15 e 20 anos.

É fácil, entretanto, reconstituir com certa

precisão em que mundo aterrissaram

Chico e Nação Zumbi, Mundo Livre S/A

e Fred Zeroquatro e toda a turma

pernambucana que veio em seguida.

O início dos anos 1990 foi estranho.

Tínhamos tido eleições diretas em

1989, finalmente, mas tínhamos sido

derrotados: o eleito era o outro, filho

da elite mais atrasada, arrogante,

cheirador, provinciano. Em 1992,

a aposta do centro e da direita contra

PT e Lula começava a fazer água,

e já, de novo, voltávamos à rua para

pedir o impeachment de Fernando

Collor de Mello.

Bia Abramo

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No front cultural, os anos 1990 também representavam uma espécie de contrafluxo. Para minha turma, pelo menos. Na década anterior, tínhamos tentado construir uma síntese entre as diversas forças históricas que nos formaram.

De um lado, havia o compromisso (não escrito, é claro, mas profundamente arraigado) de continuar sendo de oposição, do contra, de esquerda. Mas as alternativas formuladas pela cultura brasileira dos anos 1960/1970, tanto em sua vertente mais nacionalista e de resistência como em sua vertente mais hedonista, hippie, patinavam numa espécie de autocondescendência

estética no mínimo repetitiva, quando não simplesmente patética. De outro, nossa geração, para o bem e para o mal, era mais internacionalizada do que a anterior, o que significava, nos anos 1980, que sentíamos o nacionalismo estreito como uma prisão. Queríamos estar onde a juventude do mundo estava – e um desses lugares era o rock e a música pop revoltas depois do punk inglês; outro era o cinema de Martin Scorsese, Francis Ford Coppola e Wim Wenders; e um terceiro era toda a literatura norte-americana e inglesa que a Brasiliense começava a editar.

Ou seja, queríamos ouvir rock aparentado com o pós-punk inglês (sabíamos que punk, punk mesmo, não dava para ser, inclusive por uma questão de classe), mais intelectualizado do que aquele pop que já começava a tocar no rádio, mas que, de certa forma, fizesse a crítica da música brasileira e, por fim, que ainda fosse de esquerda. O projeto parecia complicado, mas os mais habilidosos e corajosos entre nós estavam inspirados e embalados pela palavra de ordem punk – faça-você-mesmo – e, portanto, parecia possível.

Não me lembro bem da primeira vez

em que vi ou ouvi Chico Science.

Lá se vai algo entre 15 e 20 anos.

É fácil, entretanto, reconstituir com certa

precisão em que mundo aterrissaram

Chico e Nação Zumbi, Mundo Livre S/A

e Fred Zeroquatro e toda a turma

pernambucana que veio em seguida.

O início dos anos 1990 foi estranho.

Tínhamos tido eleições diretas em

1989, finalmente, mas tínhamos sido

derrotados: o eleito era o outro, filho

da elite mais atrasada, arrogante,

cheirador, provinciano. Em 1992,

a aposta do centro e da direita contra

PT e Lula começava a fazer água,

e já, de novo, voltávamos à rua para

pedir o impeachment de Fernando

Collor de Mello.

Bia Abramo

Page 38: Fanzine Ocupação Chico Science

combativo, mas profundamente ligado à questão racial.

Só que aí vieram Chico e Zero, com um manifesto a tiracolo. Ficamos eufóricos. Eles tinham um manifesto de verdade, tinham armado uma cena que não era limitada à música (tinha cinema, moda e cibercultura), falavam em computadores ainda na aurora da internet, faziam pop brasileiro de ares cosmopolitas, tinham uma percussão que, aqui no Sudeste, soava nova e vibrante e, ainda por cima, tinham sido influenciados por aquela mesma cena que, anos atrás, minha turma tinha inventado. Eles eram inteligentes e articulavam muito astutamente sua intervenção na imprensa. Eram de esquerda.

Era como se aquele esforço de síntese de alguns anos antes tivesse dado frutos de uma maneira inesperada e muito, mas muito, melhorada.

E Chico era, digamos assim, o cara que vinha da cena roqueira, pop, que mais tinha condições de transitar no coronelato da MPB. Apesar de nossa postura crítica em relação à geração dos 1960/1970, tínhamos

E foi, de certa forma. São Paulo fez uma

cena underground divertida, criativa,

“de oposição” e respeitável. Tentou criar,

espelhado na experiência da Factory,

em Manchester, um circuito alternativo

de shows e discos; tomou de assalto

a revista de uma grande corporação

e fez política como se estivesse num

fanzine; provocou um barulho razoável.

Éramos, entretanto, muito precários

diante da máquina da indústria

fonográfica e muito arrogantes diante

do público, que preferiria a versão

mais salerosa (Paralamas) ou mais teen

(Legião Urbana) ou mais quadrada (Titãs)

dessa inquietação.

Nos anos 1990, todo esse cenário

estava sendo desmontado. Várias

das bandas tinham dado com os burros

n’água quando foram para gravadoras.

Outras tinham cansado da obscuridade.

A entrada da MTV iria mudar tudo.

E mesmo o eixo criativo do rock

e do pop tinha se deslocado da

Inglaterra para os Estados Unidos,

com a emergência do grunge, anti-

intelectual por excelência, e do hip hop,

uma enorme admiração pelo que eles haviam feito – e como gostaríamos que alguém conseguisse atar as pontas entre a tal linha evolutiva proposta pelos tropicalistas,e interrompida, de alguma forma,em algum momento da década de 1970, e os novos tempos. A geração paulistana dos anos 1980 era de combate e de negação, o mangue beat, uma retomada mais invocada do tropicalismo, e Chico, seu homem de frente e capaz de peitar o longo reinado de Caetano & Gil, Chico & Milton na MPB.

O diabo é que Chico se foi cedo demais, e não deu tempo para tudo isso. Nem sei nem temos como saber se esse nosso plano para ele batia com os dele. Desconfio que pelo menos parcialmente sim.

Bia Abramo é jornalista e professora das Faculdades de Campinas (Facamp). Nos anos 1980, trabalhou na revista Bizz e, na década de 1990, foi editora dos cadernos Folhateen e Ilustrada, da Folha de S.Paulo. Junto com os jornalistas Alex Antunes e Xico Sá, representa a recepção mais do que positiva da pauliceia à cena mangue.

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combativo, mas profundamente ligado à questão racial.

Só que aí vieram Chico e Zero, com um manifesto a tiracolo. Ficamos eufóricos. Eles tinham um manifesto de verdade, tinham armado uma cena que não era limitada à música (tinha cinema, moda e cibercultura), falavam em computadores ainda na aurora da internet, faziam pop brasileiro de ares cosmopolitas, tinham uma percussão que, aqui no Sudeste, soava nova e vibrante e, ainda por cima, tinham sido influenciados por aquela mesma cena que, anos atrás, minha turma tinha inventado. Eles eram inteligentes e articulavam muito astutamente sua intervenção na imprensa. Eram de esquerda.

Era como se aquele esforço de síntese de alguns anos antes tivesse dado frutos de uma maneira inesperada e muito, mas muito, melhorada.

E Chico era, digamos assim, o cara que vinha da cena roqueira, pop, que mais tinha condições de transitar no coronelato da MPB. Apesar de nossa postura crítica em relação à geração dos 1960/1970, tínhamos

E foi, de certa forma. São Paulo fez uma

cena underground divertida, criativa,

“de oposição” e respeitável. Tentou criar,

espelhado na experiência da Factory,

em Manchester, um circuito alternativo

de shows e discos; tomou de assalto

a revista de uma grande corporação

e fez política como se estivesse num

fanzine; provocou um barulho razoável.

Éramos, entretanto, muito precários

diante da máquina da indústria

fonográfica e muito arrogantes diante

do público, que preferiria a versão

mais salerosa (Paralamas) ou mais teen

(Legião Urbana) ou mais quadrada (Titãs)

dessa inquietação.

Nos anos 1990, todo esse cenário

estava sendo desmontado. Várias

das bandas tinham dado com os burros

n’água quando foram para gravadoras.

Outras tinham cansado da obscuridade.

A entrada da MTV iria mudar tudo.

E mesmo o eixo criativo do rock

e do pop tinha se deslocado da

Inglaterra para os Estados Unidos,

com a emergência do grunge, anti-

intelectual por excelência, e do hip hop,

uma enorme admiração pelo que eles haviam feito – e como gostaríamos que alguém conseguisse atar as pontas entre a tal linha evolutiva proposta pelos tropicalistas,e interrompida, de alguma forma,em algum momento da década de 1970, e os novos tempos. A geração paulistana dos anos 1980 era de combate e de negação, o mangue beat, uma retomada mais invocada do tropicalismo, e Chico, seu homem de frente e capaz de peitar o longo reinado de Caetano & Gil, Chico & Milton na MPB.

O diabo é que Chico se foi cedo demais, e não deu tempo para tudo isso. Nem sei nem temos como saber se esse nosso plano para ele batia com os dele. Desconfio que pelo menos parcialmente sim.

Bia Abramo é jornalista e professora das Faculdades de Campinas (Facamp). Nos anos 1980, trabalhou na revista Bizz e, na década de 1990, foi editora dos cadernos Folhateen e Ilustrada, da Folha de S.Paulo. Junto com os jornalistas Alex Antunes e Xico Sá, representa a recepção mais do que positiva da pauliceia à cena mangue.

Page 40: Fanzine Ocupação Chico Science

A ferrugem da espera nos olhos da mulher feita.E agora?

O que sobrou para dizer um ao outro?Só areia e lonjura.

Nem as tentações e as vagabundagens foram submetidas, o que daria algum suspense na história. Foi uma ausência engolida a seco. E pronto.Se olharam, se olharam.

Cada qual com seus “lá dentros” pedrados de arrecifes.

Ela ainda tentou achar no corpo dele um cravo que só ela – e mais nenhuma rapariga –

conseguia espremer em suas tardes de calma e ternura.

Ele não se moveu do canto e parecia afundar em suas movedices de criança.Aí uma brisa intriguenta bafejou nos seus cangotes uma pergunta:— Por amor ou por besteira?

Ele só quer escutar o que ela quer dizer.Ele tem uma tatuagem de Corto Maltese no lado esquerdo do peito.

Balada do Mar Salgado, ela decifra.

Seu coraçãozinho de maria-farinha à milanesa não sentia amor nem cócegas de tanto aperto.

Ele pensou “dois perdidos no paraíso”, mas nada disse, de tão besta e óbvio que seria quebrar o silêncio com uma loa tão morna.

Será que havia jeito?Ele pensou em outra coisa:

“Eu sou um caranguejo e estou de andada. Só por sua causa”.Já era algo, mas ela não sabia mais ler os seus pensamentos.

Coisa triste, repita comigo.

Ele pensou melhor: "Quem sabe molhando as ideias com uma cerveja".

Não havia um mascate da espumosa a léguas.Teria magoado a moça ao ponto?

(Com base nas músicas Amor de Muito e Risoflora, de Chico Science & Nação Zumbi)

Lembrou que havia um samba de regeneração batucando na cabeça. Aí tem coisa, suspeitara.

Havia feito sim uma promessa.

DE MUDAR DE VIDA.

Mas como todo homem: memória gasta pela ferrugem do desleixo.Flores apenas para enfeitar o pós-barraco.Movediço na frouxa areia da sabotagem.Chega.

Tramela nos ares, som forte de batida de porta.

Ilustração: a partir de desenho assinado por Renata Pinheiro para este fanzine

Page 41: Fanzine Ocupação Chico Science

A ferrugem da espera nos olhos da mulher feita.E agora?

O que sobrou para dizer um ao outro?Só areia e lonjura.

Nem as tentações e as vagabundagens foram submetidas, o que daria algum suspense na história. Foi uma ausência engolida a seco. E pronto.Se olharam, se olharam.

Cada qual com seus “lá dentros” pedrados de arrecifes.

Ela ainda tentou achar no corpo dele um cravo que só ela – e mais nenhuma rapariga –

conseguia espremer em suas tardes de calma e ternura.

Ele não se moveu do canto e parecia afundar em suas movedices de criança.Aí uma brisa intriguenta bafejou nos seus cangotes uma pergunta:— Por amor ou por besteira?

Ele só quer escutar o que ela quer dizer.Ele tem uma tatuagem de Corto Maltese no lado esquerdo do peito.

Balada do Mar Salgado, ela decifra.

Seu coraçãozinho de maria-farinha à milanesa não sentia amor nem cócegas de tanto aperto.

Ele pensou “dois perdidos no paraíso”, mas nada disse, de tão besta e óbvio que seria quebrar o silêncio com uma loa tão morna.

Será que havia jeito?Ele pensou em outra coisa:

“Eu sou um caranguejo e estou de andada. Só por sua causa”.Já era algo, mas ela não sabia mais ler os seus pensamentos.

Coisa triste, repita comigo.

Ele pensou melhor: "Quem sabe molhando as ideias com uma cerveja".

Não havia um mascate da espumosa a léguas.Teria magoado a moça ao ponto?

(Com base nas músicas Amor de Muito e Risoflora, de Chico Science & Nação Zumbi)

Lembrou que havia um samba de regeneração batucando na cabeça. Aí tem coisa, suspeitara.

Havia feito sim uma promessa.

DE MUDAR DE VIDA.

Mas como todo homem: memória gasta pela ferrugem do desleixo.Flores apenas para enfeitar o pós-barraco.Movediço na frouxa areia da sabotagem.Chega.

Tramela nos ares, som forte de batida de porta.

Ilustração: a partir de desenho assinado por Renata Pinheiro para este fanzine

Page 42: Fanzine Ocupação Chico Science

A tarde mais longa do século.

Quem sabe a breguice de um belo pôr-do-sol nos tire dessa, ela em raro tic-tac de esperança.

Uma romântica?"Antigamente", ela respondeu ao seu próprio desconfiômetro.

A menina que esperava o seu homem chegar havia perdido as graças do mar.

Ele afundava com seus pés de pato movediços. Ela ainda tentou dizer coisas. Mas ele não estava mais à sua altura.

A menina que esperava o seu homem chegar

A menina que esperava o seu

A menina

(Repete até o completo entendimento do sujeito!)

havia perdido as graças do mar.

homem chegar havia perdido as graças do

que esperava o seu homem chegar havia perdido as

mar.

graças do mar.

Aí ela disse ao vento: "Por que ele está aqui mesmo?".Deu vontade (nela) de escrever no balãozinho tatuado do Corto Maltese:

"Eu sou um marinheiro fuleiro!".O mar devolvia à praia esculturas do acaso, como em uma antiga exposição do artista Paulo Bruscky. Ela gostava.

Page 43: Fanzine Ocupação Chico Science

A tarde mais longa do século.

Quem sabe a breguice de um belo pôr-do-sol nos tire dessa, ela em raro tic-tac de esperança.

Uma romântica?"Antigamente", ela respondeu ao seu próprio desconfiômetro.

A menina que esperava o seu homem chegar havia perdido as graças do mar.

Ele afundava com seus pés de pato movediços. Ela ainda tentou dizer coisas. Mas ele não estava mais à sua altura.

A menina que esperava o seu homem chegar

A menina que esperava o seu

A menina

(Repete até o completo entendimento do sujeito!)

havia perdido as graças do mar.

homem chegar havia perdido as graças do

que esperava o seu homem chegar havia perdido as

mar.

graças do mar.

Aí ela disse ao vento: "Por que ele está aqui mesmo?".Deu vontade (nela) de escrever no balãozinho tatuado do Corto Maltese:

"Eu sou um marinheiro fuleiro!".O mar devolvia à praia esculturas do acaso, como em uma antiga exposição do artista Paulo Bruscky. Ela gostava.

Page 44: Fanzine Ocupação Chico Science

Eduardo BiD

Conheci o Chico em um ônibus, em 1995, quando eu ainda tocava na banda Professor Antena. O destino era o Sesc Bauru, no interior de São Paulo, uma longa viagem de ida e volta, partindo da capital. Não conhecia o som deles, só tinha ouvido falar. O percurso nos permitiu um papo sobre música e planos musicais. Ali nascia a parceria que resultou na produção do tão especial segundo disco da Nação Zumbi, o Afrociberdelia.

Page 45: Fanzine Ocupação Chico Science

Eduardo BiD

Conheci o Chico em um ônibus, em 1995, quando eu ainda tocava na banda Professor Antena. O destino era o Sesc Bauru, no interior de São Paulo, uma longa viagem de ida e volta, partindo da capital. Não conhecia o som deles, só tinha ouvido falar. O percurso nos permitiu um papo sobre música e planos musicais. Ali nascia a parceria que resultou na produção do tão especial segundo disco da Nação Zumbi, o Afrociberdelia.

Page 46: Fanzine Ocupação Chico Science

Um mês depois desse encontro, Chico e Jorge du Peixe

passaram no meu estúdio para umas sessões laboratoriais de

novos sons. Desses encontros nasceram Macô e a releitura de

Roda Rodete Rodeano, da dupla Caju & Castanha.

Ali, uma coisa já estava bem clara: os beats, os samplers, os

scratches e os sintetizadores se encontrariam e reforçariam

a força rítmica do Gilmar Bolla 8 e do Toca Ogan, a magia

da guitarra de Lúcio Maia e a solidez do baixista Dengue.

Maracatu, África, rock e psicodelia se uniriam para a

nova etapa do grupo que estaria por vir. Até Isaac Asimov

marcaria um encontro com Santos Dumont no céu.

Fiquei muito feliz com o convite do Chico para produzir o

segundo disco da banda. Vivíamos em um universo musical

muito semelhante, curtindo os mesmos sons. Era só Jorge

Ben das antigas, Willy Bobo, KRS-1, Sugarhill Gang, Tricky,

Goldie, Kraftwerk, Mano Dibango e outras doideiras.

Estávamos certos de que viria um disco porrada.

Como eu não havia produzido nenhum disco antes, a Sony

Music, surpresa por Chico ter me escolhido como produtor, me

mandou para o Recife. A ideia era preparar uma demo em que a

gravadora pudesse ouvir o que estávamos planejando gravar.

Voltei com sete músicas, entre elas Cidadão do Mundo, Samba

do Lado e Peixinhos, que foi criada durante as sessões de

gravação e após uma dura da polícia – que levou o walkman

do Gilmar Bolla 8 por ele não estar com a nota de compra.

Chico continuou firme em trabalhar comigo, e para nossa felicidade a gravadora terminou comprando a ideia. Rapidamente, estávamos no estúdio Nas Nuvens, no Rio de Janeiro.

Para engordar o som, chamei o G-Spot, um engenheiro de som americano que trabalhou com grandes nomes do hip hop e do rock no estúdio Battery, em Nova York. E, com meu computador, samplers e toca-discos unidos à incrível musicalidade e ao conceito da Nação Zumbi, mergulhamos fundo, com liberdade e expressão, no universo do Afrociberdelia.

Os três tambores receberam o tratamento merecido: três microfones para cada um, sendo um colado no corpo do tambor, um captando a pele bem de perto e o outro afastado, pegando a sala. O peso dos tambores do “ao vivo” finalmente estava ali, sendo gravado. Chico ficou vibrante.

Os metais de Tiquinho, Hugo Hori, Bidinho e Serginho Trombone entraram em faixas como Peixinhos e Amor de Muito. Outra mudança significativa: o rufar da caixa tocada pelo virtuoso Pupilo, que ocupou o lugar do Canhoto um pouco antes do início das gravações e passou a ter a companhia de um Hi-Hat e um bumbo.

Lembro-me bem da rapaziada levando gelo no término das sessões de gravação para tomarem água fresca no casarão de Santa Teresa onde Chico e Nação estavam hospedados. Lá, a falta de uma geladeira e colchões bem distribuídos no chão ilustravam um clima de acampamento de refugiados, onde nem uma tevezinha rolava. Lembro-me ainda que chovia muito, e a luz acabava quase que diariamente no estúdio, interrompendo as sessões, cortando o barato e atrasando um pouco a entrega do disco para a gravadora. Talvez a força e a energia que apareceram no disco venham desses perrengues que rolaram durante a gravação.

Page 47: Fanzine Ocupação Chico Science

Um mês depois desse encontro, Chico e Jorge du Peixe

passaram no meu estúdio para umas sessões laboratoriais de

novos sons. Desses encontros nasceram Macô e a releitura de

Roda Rodete Rodeano, da dupla Caju & Castanha.

Ali, uma coisa já estava bem clara: os beats, os samplers, os

scratches e os sintetizadores se encontrariam e reforçariam

a força rítmica do Gilmar Bolla 8 e do Toca Ogan, a magia

da guitarra de Lúcio Maia e a solidez do baixista Dengue.

Maracatu, África, rock e psicodelia se uniriam para a

nova etapa do grupo que estaria por vir. Até Isaac Asimov

marcaria um encontro com Santos Dumont no céu.

Fiquei muito feliz com o convite do Chico para produzir o

segundo disco da banda. Vivíamos em um universo musical

muito semelhante, curtindo os mesmos sons. Era só Jorge

Ben das antigas, Willy Bobo, KRS-1, Sugarhill Gang, Tricky,

Goldie, Kraftwerk, Mano Dibango e outras doideiras.

Estávamos certos de que viria um disco porrada.

Como eu não havia produzido nenhum disco antes, a Sony

Music, surpresa por Chico ter me escolhido como produtor, me

mandou para o Recife. A ideia era preparar uma demo em que a

gravadora pudesse ouvir o que estávamos planejando gravar.

Voltei com sete músicas, entre elas Cidadão do Mundo, Samba

do Lado e Peixinhos, que foi criada durante as sessões de

gravação e após uma dura da polícia – que levou o walkman

do Gilmar Bolla 8 por ele não estar com a nota de compra.

Chico continuou firme em trabalhar comigo, e para nossa felicidade a gravadora terminou comprando a ideia. Rapidamente, estávamos no estúdio Nas Nuvens, no Rio de Janeiro.

Para engordar o som, chamei o G-Spot, um engenheiro de som americano que trabalhou com grandes nomes do hip hop e do rock no estúdio Battery, em Nova York. E, com meu computador, samplers e toca-discos unidos à incrível musicalidade e ao conceito da Nação Zumbi, mergulhamos fundo, com liberdade e expressão, no universo do Afrociberdelia.

Os três tambores receberam o tratamento merecido: três microfones para cada um, sendo um colado no corpo do tambor, um captando a pele bem de perto e o outro afastado, pegando a sala. O peso dos tambores do “ao vivo” finalmente estava ali, sendo gravado. Chico ficou vibrante.

Os metais de Tiquinho, Hugo Hori, Bidinho e Serginho Trombone entraram em faixas como Peixinhos e Amor de Muito. Outra mudança significativa: o rufar da caixa tocada pelo virtuoso Pupilo, que ocupou o lugar do Canhoto um pouco antes do início das gravações e passou a ter a companhia de um Hi-Hat e um bumbo.

Lembro-me bem da rapaziada levando gelo no término das sessões de gravação para tomarem água fresca no casarão de Santa Teresa onde Chico e Nação estavam hospedados. Lá, a falta de uma geladeira e colchões bem distribuídos no chão ilustravam um clima de acampamento de refugiados, onde nem uma tevezinha rolava. Lembro-me ainda que chovia muito, e a luz acabava quase que diariamente no estúdio, interrompendo as sessões, cortando o barato e atrasando um pouco a entrega do disco para a gravadora. Talvez a força e a energia que apareceram no disco venham desses perrengues que rolaram durante a gravação.

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Nesse dia maluco, quem caiu de paraquedas no estúdio foi o produtor Mário Caldato Jr. (do Beastie Boys e do Jack Johnson), que, de férias no Brasil, acabou passando o resto daqueles dias com a gente. Ele pirou no Chico.

Quando terminamos a mixagem, foi uma festa. Fizemos uma audição e celebramos o resultado. A missão estava cumprida. Comprei uma “champa” Dom Perignon e brindamos todos na cozinha da Soul City, minha produtora, com copinhos na mão e em pequenas doses, já que éramos nove. Saúde!

Com o disco nas mãos, viajei com Chico para Los Angeles e Nova York, onde mostramos pessoalmente as músicas ao David Byrne, na gravadora Luaka Bop. Recebemos os aplausos e o convite para lançarmos o disco na Europa, no Japão e nos Estados Unidos. Infelizmente, a gravadora nacional, que tinha prioridade nesses territórios, cresceu o olho. O lançamento de Afrociberdelia aconteceu ao lado de artistas como Julio Iglesias e Gloria Estefan. Foi um grande erro.

Coloquei o CD Afrociberdelia para ouvir enquanto escrevia este texto e fiquei emocionado por me lembrar das gravações, dos sentimentos e da coragem que tivemos no processo todo desse trabalho. Como o disco ainda é atual e à frente de seu tempo! Escuto vários detalhes nos arranjos e nos interlúdios, com experimentações e muita viagem. E a pura verdade acima de tudo.

Hoje, recordo bem minhas conversas com o Chico sobre como preparar a molecada, a geração interessada em música e que estava por vir, para o que vinha por aí. Tenho certeza de que, de alguma forma, conseguimos, com o poderoso e atemporal Afrociberdelia.

Obrigado, Chico, pela oportunidade, pela amizade e pela confiança. E por ter aberto essa porta que é hoje minha vida e meu trabalho, com muito amor e orgulho.

Eduardo BiD é músico, produtor musical e pai de família. Trabalha em sua

produtora, a Soul City (www.soulcity.com.br), e vive em São Paulo. Produziu

o CD Afrociberdelia, um desafio na tentativa de captar o som das alfaias. A

experiência foi considerada “incrível” por aqueles que a viveram.

Terminada a temporada de madrugadas adentro em estúdio, e eu moran

do

em um hotel meio zoado no coração de Copacabana por mais de um mês

,

fomos para São Paulo mixar o disco.

Para ganhar tempo, metade seria feita pelo G-Spot, pois ele tinha de

retornar a Nova York. As outras músicas seriam mixadas pelo Luís

Paulo Serafim, do estúdio Mosh.

No primeiro dia de mixagem no Mosh, fomos convencidos a gravar

Maracatu Atômico, pois a Sony achava que era radiofônica. Já tínhamos

tentado gravar a música de Mautner, mas a descartamos porque o

sampler que usaríamos na introdução, I Am the Sun I Am the Air, dos

Smiths, não ficou bom. No final das contas, eu mixava Manguetown em uma

sala, com o Luís Paulo, ao mesmo tempo que gravava Maracatu Atômico em

outra, com o G-Spot.

Acervo Soulcity:photos

Page 51: Fanzine Ocupação Chico Science

Nesse dia maluco, quem caiu de paraquedas no estúdio foi o produtor Mário Caldato Jr. (do Beastie Boys e do Jack Johnson), que, de férias no Brasil, acabou passando o resto daqueles dias com a gente. Ele pirou no Chico.

Quando terminamos a mixagem, foi uma festa. Fizemos uma audição e celebramos o resultado. A missão estava cumprida. Comprei uma “champa” Dom Perignon e brindamos todos na cozinha da Soul City, minha produtora, com copinhos na mão e em pequenas doses, já que éramos nove. Saúde!

Com o disco nas mãos, viajei com Chico para Los Angeles e Nova York, onde mostramos pessoalmente as músicas ao David Byrne, na gravadora Luaka Bop. Recebemos os aplausos e o convite para lançarmos o disco na Europa, no Japão e nos Estados Unidos. Infelizmente, a gravadora nacional, que tinha prioridade nesses territórios, cresceu o olho. O lançamento de Afrociberdelia aconteceu ao lado de artistas como Julio Iglesias e Gloria Estefan. Foi um grande erro.

Coloquei o CD Afrociberdelia para ouvir enquanto escrevia este texto e fiquei emocionado por me lembrar das gravações, dos sentimentos e da coragem que tivemos no processo todo desse trabalho. Como o disco ainda é atual e à frente de seu tempo! Escuto vários detalhes nos arranjos e nos interlúdios, com experimentações e muita viagem. E a pura verdade acima de tudo.

Hoje, recordo bem minhas conversas com o Chico sobre como preparar a molecada, a geração interessada em música e que estava por vir, para o que vinha por aí. Tenho certeza de que, de alguma forma, conseguimos, com o poderoso e atemporal Afrociberdelia.

Obrigado, Chico, pela oportunidade, pela amizade e pela confiança. E por ter aberto essa porta que é hoje minha vida e meu trabalho, com muito amor e orgulho.

Eduardo BiD é músico, produtor musical e pai de família. Trabalha em sua

produtora, a Soul City (www.soulcity.com.br), e vive em São Paulo. Produziu

o CD Afrociberdelia, um desafio na tentativa de captar o som das alfaias. A

experiência foi considerada “incrível” por aqueles que a viveram.

Terminada a temporada de madrugadas adentro em estúdio, e eu moran

do

em um hotel meio zoado no coração de Copacabana por mais de um mês

,

fomos para São Paulo mixar o disco.

Para ganhar tempo, metade seria feita pelo G-Spot, pois ele tinha de

retornar a Nova York. As outras músicas seriam mixadas pelo Luís

Paulo Serafim, do estúdio Mosh.

No primeiro dia de mixagem no Mosh, fomos convencidos a gravar

Maracatu Atômico, pois a Sony achava que era radiofônica. Já tínhamos

tentado gravar a música de Mautner, mas a descartamos porque o

sampler que usaríamos na introdução, I Am the Sun I Am the Air, dos

Smiths, não ficou bom. No final das contas, eu mixava Manguetown em uma

sala, com o Luís Paulo, ao mesmo tempo que gravava Maracatu Atômico em

outra, com o G-Spot.

Acervo Soulcity:photos

Page 52: Fanzine Ocupação Chico Science

Numa misteriosa ação de expressão artística não coordenada e não planejada

(se assim fosse, certamente não teria valor nem teria ido para lugar nenhum), surgia, paralelamente ao mangue beat , um novo espasmo de cinema em Pernambuco, um novo ciclo. Esse fenômeno ainda aguarda estudo do porquê e do como ter ocorrido, embora teorias sejam abundantes, uma delas creditada à quantidade de coentro usada na cozinha local.

O acadêmico e crítico pernambucano Alexandre Figueiroa havia definido muito bem que o cinema feito no estado parecia existir em fases. Esses ciclos de produção surgiam e logo morriam, como o Ciclo do Recife, nos anos 1920, ou o Ciclo de Cinema Super-8, nos anos 1970.

A minha versão, que provavelmente não sustenta fortes argumentações científicas, é de que a geração de 1990, tanto na música como nas imagens, viu-se livre num Pernambuco onde o estado de espírito histórico e sociocultural é o da monocultura açucareira. Essa é a fonte de muitas desgraças, mas também, creio eu, de fagulhas brilhantes de insatisfação e rebeldia que geraram e geram pensamento artístico.

Tudo isso com a chegada gradual de novas tecnologias que anunciavam liberdade dos meios pesados e burocráticos de produção. De repente, a promessa de um mundo interligado que estava para acontecer (e a gravação e a captação de imagens) viu em Chico Science o mais destacado entusiasta desse estado de coisas.Popularmente reconhecido como um cara iluminado, a casa de força que foi Chico iluminou a todos, e seus amigos, colaboradores e comparsas devolveram à altura o tipo de energia que ele gerava.

Fome de tudo

KLEBER MENDONÇA FILHO

Page 53: Fanzine Ocupação Chico Science

Numa misteriosa ação de expressão artística não coordenada e não planejada

(se assim fosse, certamente não teria valor nem teria ido para lugar nenhum), surgia, paralelamente ao mangue beat , um novo espasmo de cinema em Pernambuco, um novo ciclo. Esse fenômeno ainda aguarda estudo do porquê e do como ter ocorrido, embora teorias sejam abundantes, uma delas creditada à quantidade de coentro usada na cozinha local.

O acadêmico e crítico pernambucano Alexandre Figueiroa havia definido muito bem que o cinema feito no estado parecia existir em fases. Esses ciclos de produção surgiam e logo morriam, como o Ciclo do Recife, nos anos 1920, ou o Ciclo de Cinema Super-8, nos anos 1970.

A minha versão, que provavelmente não sustenta fortes argumentações científicas, é de que a geração de 1990, tanto na música como nas imagens, viu-se livre num Pernambuco onde o estado de espírito histórico e sociocultural é o da monocultura açucareira. Essa é a fonte de muitas desgraças, mas também, creio eu, de fagulhas brilhantes de insatisfação e rebeldia que geraram e geram pensamento artístico.

Tudo isso com a chegada gradual de novas tecnologias que anunciavam liberdade dos meios pesados e burocráticos de produção. De repente, a promessa de um mundo interligado que estava para acontecer (e a gravação e a captação de imagens) viu em Chico Science o mais destacado entusiasta desse estado de coisas.Popularmente reconhecido como um cara iluminado, a casa de força que foi Chico iluminou a todos, e seus amigos, colaboradores e comparsas devolveram à altura o tipo de energia que ele gerava.

Fome de tudo

KLEBER MENDONÇA FILHO

Page 54: Fanzine Ocupação Chico Science

Fome de tudo

No cinema, essa nova geração se alimentava naturalmente da música, e surgia não apenas do cinema 35 mm, mas também do vídeo. Aquele impacto inicial de ouvir Da Lama ao Caos em 1993 trouxe uma vontade enorme de imagens,

certamente em mim.

Essencial deixar claro um aspecto de Da Lama ao Caos naquele momento em específico. O disco, sua cadência narrativa, me sugeria estar vendo

um filme. Num cinema pernambucano que, naquele ano, começava a engatinhar mais uma vez, o primeiro disco de Chico Science &

Nação Zumbi preenchia a lacuna de algum grande filme que, na época, nós ainda não tínhamos.

Havia uma força inspiradora inicial naquele disco, um universo visual que começava no encarte e seguia intacto

nas letras de imagens ricas e férteis. E ainda veio Samba Esquema Noise, da Mundo Livre S/A, para confirmar a nossa

nouvelle vague pernambucana audiovisual.

Diferentemente de alguns movimentos que só fizeram sentido numa visão retrospectiva, aquilo era algo sentido

na hora, a cada disco, show, festa e lote de imagens que nasciam. Falo de uma reação em cadeia, que puxou mais bandas, mais músicas, mais desejo de imagem

gravada, filmada, editada.

Na época, havia um estímulo claro (e único, anos antes de a internet se firmar), representado pela então

jovem MTV Brasil, espelho pop universal abrasileirado que validava o que estava acontecendo na música do Recife.

Videoclipes eram imaginados em mesas de bar com produções executivas da mais pura “brodagem” e

orçamento zero. E geraram alguns dos momentos mais felizes (quase esquecidos, perdidos na nossa crônica

incompetência de arquivar) da imagem pernambucana, como os promos feitos por Dolores & Morales (Hilton Lacerda e Helder Aragão, o DJ Dolores) para a Nação

Zumbi e a Mundo Livre S/A. Kleber Mendonça Filho é crítico de cinema e cineasta. Em 1997, dirigiu O Enjaulado, filme cuja trilha sonora resultou na primeira coletânea de músicas da cena mangue recifense. Seus filmes Vinil Verde (2004), Eletrodoméstica (2005) e Noite de Sexta Manhã de Sábado (2007) viajaram o mundo. O trabalho mais recente, Recife Frio (2009), ganhou o prêmio de melhor filme na opinião da crítica na última edição do Festival de Cinema de Brasília.

Curiosamente, quando as bandas assinaram com as gravadoras, os primeiros clipes “oficiais” foram realizados por equipes de grifes publicitárias do Sudeste. Sem brodagem, com orçamentos finalmente adequados, os resultados pasteurizados pareciam buscar certo padrão MTV, mesmo que a banda sonora fosse diferente de tudo o que a MTV tocava.

Enfim, víamos naqueles clipes “profissa” produtos que não pareciam entender muito bem aquilo que nós tínhamos ouvido no vinil e no CD no Recife.

Ao checarmos a linha do tempo dessa misteriosa ação não coordenada entre música e cinema no Recife dos anos 1990, vemos que realizadores como Marcelo Gomes, Lírio Ferreira e Paulo Caldas não perderam tempo, incorporando em seus filmes da hora aquela música que parecia casar tão naturalmente com suas imagens.

No curta Maracatu, Maracatus (1994) e no longa Baile Perfumado (1996), temos a versão sala de cinema, e em som Dolby Stereo, daquilo que definira o mangue inicialmente, puxando muita coisa boa que também surgia na chamada cena musical pernambucana, como Mestre Ambrósio e Stela Campos, paulistana exilada no Recife.

No centro de tudo estava Chico. Suas imagens espetaculares já reconfirmadas em Afrociberdelia (1995) e nas suas mungangas de palco nos garantiam um artista que sugeria algo muito forte de um roteirista dotado de um senso especial de mise-en-scène.

Curioso que o termo “cena musical”, usado para descrever o que acontecia no Recife da época – provavelmente trazido do inglês music scene –, soa perfeitamente cinematográfico para intermediar música e imagem. Chico foi o elemento catalisador de tudo isso, e é lindo ver que ainda ilumina procedimentos atuais.

Naquela época, por exemplo, ele viajou o mundo com sua música da mesma forma que, ao longo da década de 2000, o cinema pernambucano tem viajado o mundo de Cannes, Veneza, Berlim, Locarno e Roterdã. Cada novo festival parece lembrar os festivais internacionais de música dos anos 1990, que nos mostraram, à época, que “falar de onde você vive é o que há de mais importante e verdadeiro, e que, por mais que se viaje, as cidades são todas parecidas com a sua”. As palavras são dele, mas já são minhas também há algum tempo.

Page 55: Fanzine Ocupação Chico Science

Fome de tudo

No cinema, essa nova geração se alimentava naturalmente da música, e surgia não apenas do cinema 35 mm, mas também do vídeo. Aquele impacto inicial de ouvir Da Lama ao Caos em 1993 trouxe uma vontade enorme de imagens,

certamente em mim.

Essencial deixar claro um aspecto de Da Lama ao Caos naquele momento em específico. O disco, sua cadência narrativa, me sugeria estar vendo

um filme. Num cinema pernambucano que, naquele ano, começava a engatinhar mais uma vez, o primeiro disco de Chico Science &

Nação Zumbi preenchia a lacuna de algum grande filme que, na época, nós ainda não tínhamos.

Havia uma força inspiradora inicial naquele disco, um universo visual que começava no encarte e seguia intacto

nas letras de imagens ricas e férteis. E ainda veio Samba Esquema Noise, da Mundo Livre S/A, para confirmar a nossa

nouvelle vague pernambucana audiovisual.

Diferentemente de alguns movimentos que só fizeram sentido numa visão retrospectiva, aquilo era algo sentido

na hora, a cada disco, show, festa e lote de imagens que nasciam. Falo de uma reação em cadeia, que puxou mais bandas, mais músicas, mais desejo de imagem

gravada, filmada, editada.

Na época, havia um estímulo claro (e único, anos antes de a internet se firmar), representado pela então

jovem MTV Brasil, espelho pop universal abrasileirado que validava o que estava acontecendo na música do Recife.

Videoclipes eram imaginados em mesas de bar com produções executivas da mais pura “brodagem” e

orçamento zero. E geraram alguns dos momentos mais felizes (quase esquecidos, perdidos na nossa crônica

incompetência de arquivar) da imagem pernambucana, como os promos feitos por Dolores & Morales (Hilton Lacerda e Helder Aragão, o DJ Dolores) para a Nação

Zumbi e a Mundo Livre S/A. Kleber Mendonça Filho é crítico de cinema e cineasta. Em 1997, dirigiu O Enjaulado, filme cuja trilha sonora resultou na primeira coletânea de músicas da cena mangue recifense. Seus filmes Vinil Verde (2004), Eletrodoméstica (2005) e Noite de Sexta Manhã de Sábado (2007) viajaram o mundo. O trabalho mais recente, Recife Frio (2009), ganhou o prêmio de melhor filme na opinião da crítica na última edição do Festival de Cinema de Brasília.

Curiosamente, quando as bandas assinaram com as gravadoras, os primeiros clipes “oficiais” foram realizados por equipes de grifes publicitárias do Sudeste. Sem brodagem, com orçamentos finalmente adequados, os resultados pasteurizados pareciam buscar certo padrão MTV, mesmo que a banda sonora fosse diferente de tudo o que a MTV tocava.

Enfim, víamos naqueles clipes “profissa” produtos que não pareciam entender muito bem aquilo que nós tínhamos ouvido no vinil e no CD no Recife.

Ao checarmos a linha do tempo dessa misteriosa ação não coordenada entre música e cinema no Recife dos anos 1990, vemos que realizadores como Marcelo Gomes, Lírio Ferreira e Paulo Caldas não perderam tempo, incorporando em seus filmes da hora aquela música que parecia casar tão naturalmente com suas imagens.

No curta Maracatu, Maracatus (1994) e no longa Baile Perfumado (1996), temos a versão sala de cinema, e em som Dolby Stereo, daquilo que definira o mangue inicialmente, puxando muita coisa boa que também surgia na chamada cena musical pernambucana, como Mestre Ambrósio e Stela Campos, paulistana exilada no Recife.

No centro de tudo estava Chico. Suas imagens espetaculares já reconfirmadas em Afrociberdelia (1995) e nas suas mungangas de palco nos garantiam um artista que sugeria algo muito forte de um roteirista dotado de um senso especial de mise-en-scène.

Curioso que o termo “cena musical”, usado para descrever o que acontecia no Recife da época – provavelmente trazido do inglês music scene –, soa perfeitamente cinematográfico para intermediar música e imagem. Chico foi o elemento catalisador de tudo isso, e é lindo ver que ainda ilumina procedimentos atuais.

Naquela época, por exemplo, ele viajou o mundo com sua música da mesma forma que, ao longo da década de 2000, o cinema pernambucano tem viajado o mundo de Cannes, Veneza, Berlim, Locarno e Roterdã. Cada novo festival parece lembrar os festivais internacionais de música dos anos 1990, que nos mostraram, à época, que “falar de onde você vive é o que há de mais importante e verdadeiro, e que, por mais que se viaje, as cidades são todas parecidas com a sua”. As palavras são dele, mas já são minhas também há algum tempo.

Page 56: Fanzine Ocupação Chico Science

Em meados de julho de 2009, a

equipe do Itaú Cultural iniciou

a discussão da programação

deste ano. Quando começamos a

levantar os possíveis artistas

a ser homenageados pelo projeto

Ocupação e surgiu o nome de

Chico Science, veio-me uma

deliciosa sensação de poder

voltar a trabalhar com um universo

que faz parte de minha vida.

Intensamente. Topamos todos,

então, nos debruçar em torno da

obra de Chico.

Entramos em contato com a família

do artista, representada pela irmã,

Goretti, e pela filha, Louise,

com o músico Jorge du Peixe e com

o produtor Paulo André. A reação

de todos foi encantadoramente

positiva. Além destes, pensamos em

trazer para perto outras pessoas

que pudessem nos ajudar a conceber

a exposição. Foi natural pensar em

rejuntar a dupla Dolores e Morales

– que havia sido muito importante

para a construção da estética

mangue dos anos 1990.

Com este projeto, estávamos

descobrindo um formato de

trabalho coletivo muito saboroso,

em que não existe a imposição de conceito. Pensamos em tudo juntos e as boas ideias são executadas, melhoradas, ampliadas, mudadas e vão gerando algo, de fato, novo, relevante, bonito. E talvez mais próximo de Chico, que tinha esse espírito de criação compartilhada, de colaboração, de coletividade, de parceria.

Partimos para o Recife para arredondar o conceito da exposição e entrar em contato com os acervos de dona Rita (mãe de Chico) e de Paulo André (produtor da banda nos anos 1990). Foi na casa de

dona Rita que me deparei com outro brilho do artista – o filho querido, o irmão carinhoso, a pessoa que deixou uma saudade sem fim, um ser normal que viram nascer, crescer e prematuramente partir. Cada objeto dele tinha uma história, e Goretti foi quem as contou para nós. Foi ela quem nos emocionou a cada novo relato e a cada lágrima que insistia em tentar controlar. Ainda lhe dói

Ana de Fátima Sousa

Page 57: Fanzine Ocupação Chico Science

Em meados de julho de 2009, a

equipe do Itaú Cultural iniciou

a discussão da programação

deste ano. Quando começamos a

levantar os possíveis artistas

a ser homenageados pelo projeto

Ocupação e surgiu o nome de

Chico Science, veio-me uma

deliciosa sensação de poder

voltar a trabalhar com um universo

que faz parte de minha vida.

Intensamente. Topamos todos,

então, nos debruçar em torno da

obra de Chico.

Entramos em contato com a família

do artista, representada pela irmã,

Goretti, e pela filha, Louise,

com o músico Jorge du Peixe e com

o produtor Paulo André. A reação

de todos foi encantadoramente

positiva. Além destes, pensamos em

trazer para perto outras pessoas

que pudessem nos ajudar a conceber

a exposição. Foi natural pensar em

rejuntar a dupla Dolores e Morales

– que havia sido muito importante

para a construção da estética

mangue dos anos 1990.

Com este projeto, estávamos

descobrindo um formato de

trabalho coletivo muito saboroso,

em que não existe a imposição de conceito. Pensamos em tudo juntos e as boas ideias são executadas, melhoradas, ampliadas, mudadas e vão gerando algo, de fato, novo, relevante, bonito. E talvez mais próximo de Chico, que tinha esse espírito de criação compartilhada, de colaboração, de coletividade, de parceria.

Partimos para o Recife para arredondar o conceito da exposição e entrar em contato com os acervos de dona Rita (mãe de Chico) e de Paulo André (produtor da banda nos anos 1990). Foi na casa de

dona Rita que me deparei com outro brilho do artista – o filho querido, o irmão carinhoso, a pessoa que deixou uma saudade sem fim, um ser normal que viram nascer, crescer e prematuramente partir. Cada objeto dele tinha uma história, e Goretti foi quem as contou para nós. Foi ela quem nos emocionou a cada novo relato e a cada lágrima que insistia em tentar controlar. Ainda lhe dói

Ana de Fátima Sousa

Page 58: Fanzine Ocupação Chico Science

Ana de Fátima Sousa é conhecida por todos como Aninha. Recifense que mora há 13 anos em São Paulo, trabalha no Itaú Cultural (é gerente do Núcleo de Comunicação). Produziu algumas das primeiras imagens em vídeo da cena mangue. Observando tudo de perto, dedicou-se a duas pesquisas acadêmicas sobre o assunto: Movimento Rock em Recife nos Anos 90 (1993) e Recife Jam (1996). Aninha faz parte da equipe que concebeu a Ocupação Chico Science.

lembrar. E ela lembra diariamente.

Faz esforços para não esquecer

nenhum detalhe, porque sabe que

a memória do irmão precisa ser

preservada, cuidada e relatada.

Paulo André também parecia saber

disso desde o primeiro dia em

que trabalhou com Chico. Ele

guardou cuidadosamente cada

crachá usado, todos os cartazes

de shows (pequenos e grandiosos),

playlists, fotos, documentos,

cartas, objetos, rascunhos.

Em seus manuscritos de 1996,

Paulo já fazia propostas de uma

exposição com tudo o que havia

juntado. Achei muito bacana poder

ajudá-lo a fazer com que parte

de suas ideias se concretizasse,

14 anos depois. As conversas com

o produtor renderam dezenas de

sugestões para a exposição e me

levaram de volta para o início dos

anos 1990, quando nos conhecemos.

Ele já era produtor, e eu, uma

estudante obcecada pela cena

musical recifense.

Eu pesquisava e catalogava tudo o

que tinha acontecido musicalmente

na cidade. Dividia meus

levantamentos com o jornalista e

amigo Marcos Toledo; falávamos,

respirávamos e ouvíamos uma

produção que começava nos anos

1970 (com Ave Sangria, Lula

Cortes, Alceu Valença, movimento

armorial) e tentávamos compilar

entrevistas, histórias e sons

para entender o que seria o

”novo“ na cidade duas décadas

depois. Foi no primeiro Abril

Pro Rock, em 1993, que entendemos

que estávamos testemunhando

algo muito maior. E foi Chico quem nos mostrou isso. Com um show no começo da tarde de 25 de abril, abrindo a programação do festival, o artista se apresentou com aquele jeitão de frontman, de pop star. Não havia isso no Recife. Chico tocou o terror. Ele era o novo. E na sequência veio uma Mundo Livre completamente diferente da que conhecíamos desde os anos 1980 nos festivais underground. Não era mais punk rock... Era samba esquema noise!!! Gravamos tudo e continuamos acompanhando a cena durante os anos que se seguiram – Abril Pro Rock, Pokoloko, Soparia, Recbeat, Mangue Feliz, Franci’s Drinks, Adília’s Place,Galeria Joana d’Arc, MTV...

Sabíamos que, para fazer a Ocupação Chico Science acontecer, precisaríamos envolver os personagens centrais para recontar

tudo. E eles nos contaram e ainda estão nos contando a história do artista e do movimento que ajudou a criar. Vários desses nomes estão nas páginas deste fanzine; outros estão na exposição – como é o caso dos fotógrafos Fred Jordão e Gil Vicente, dos artistas Félix Farfan e Evêncio, e dos amigos do músico Fred Zeroquatro, Renata Pinheiro, Sonally, Roger de Renor, Renato L., Stella Campos... Uma lista que não se encerra enquanto escrevo, e que não vai se encerrar depois. Muitos já deram depoimentos, disponibilizados no site do projeto (www.itaucultural.org.br/ocupacao), e outros ainda vão fazê-lo. Porque o legado de Chico Science vai permanecer.

Sinto-me premiada por vários motivos: por trabalhar numa instituição que apoia a

construção e a preservação de obras e o legado de artistas brasileiros; por ter visto de perto o impacto causado pela

música e pela presença de Chico;

por ter agora uma oportunidade

de reverenciá-lo por ter mudado

tudo na música (e na cultura

da cidade); por ter feito de

minha juventude algo histórico

(para mim, para a cidade, para

o país); e, finalmente, por ter

me feito dançar, rir, cantar e

ter a certeza de que meu trabalho

seria sempre tentar aproximar

a arte das pessoas. Aproximem-

se (ou reaproximem-se) então do

universo artístico de Chico! Pois

como ele mesmo vociferava: “[...]

chegou a hora dessa roda começar,

samba makossa da pesada, vamos

todos celebrar!”.

Page 59: Fanzine Ocupação Chico Science

Ana de Fátima Sousa é conhecida por todos como Aninha. Recifense que mora há 13 anos em São Paulo, trabalha no Itaú Cultural (é gerente do Núcleo de Comunicação). Produziu algumas das primeiras imagens em vídeo da cena mangue. Observando tudo de perto, dedicou-se a duas pesquisas acadêmicas sobre o assunto: Movimento Rock em Recife nos Anos 90 (1993) e Recife Jam (1996). Aninha faz parte da equipe que concebeu a Ocupação Chico Science.

lembrar. E ela lembra diariamente.

Faz esforços para não esquecer

nenhum detalhe, porque sabe que

a memória do irmão precisa ser

preservada, cuidada e relatada.

Paulo André também parecia saber

disso desde o primeiro dia em

que trabalhou com Chico. Ele

guardou cuidadosamente cada

crachá usado, todos os cartazes

de shows (pequenos e grandiosos),

playlists, fotos, documentos,

cartas, objetos, rascunhos.

Em seus manuscritos de 1996,

Paulo já fazia propostas de uma

exposição com tudo o que havia

juntado. Achei muito bacana poder

ajudá-lo a fazer com que parte

de suas ideias se concretizasse,

14 anos depois. As conversas com

o produtor renderam dezenas de

sugestões para a exposição e me

levaram de volta para o início dos

anos 1990, quando nos conhecemos.

Ele já era produtor, e eu, uma

estudante obcecada pela cena

musical recifense.

Eu pesquisava e catalogava tudo o

que tinha acontecido musicalmente

na cidade. Dividia meus

levantamentos com o jornalista e

amigo Marcos Toledo; falávamos,

respirávamos e ouvíamos uma

produção que começava nos anos

1970 (com Ave Sangria, Lula

Cortes, Alceu Valença, movimento

armorial) e tentávamos compilar

entrevistas, histórias e sons

para entender o que seria o

”novo“ na cidade duas décadas

depois. Foi no primeiro Abril

Pro Rock, em 1993, que entendemos

que estávamos testemunhando

algo muito maior. E foi Chico quem nos mostrou isso. Com um show no começo da tarde de 25 de abril, abrindo a programação do festival, o artista se apresentou com aquele jeitão de frontman, de pop star. Não havia isso no Recife. Chico tocou o terror. Ele era o novo. E na sequência veio uma Mundo Livre completamente diferente da que conhecíamos desde os anos 1980 nos festivais underground. Não era mais punk rock... Era samba esquema noise!!! Gravamos tudo e continuamos acompanhando a cena durante os anos que se seguiram – Abril Pro Rock, Pokoloko, Soparia, Recbeat, Mangue Feliz, Franci’s Drinks, Adília’s Place,Galeria Joana d’Arc, MTV...

Sabíamos que, para fazer a Ocupação Chico Science acontecer, precisaríamos envolver os personagens centrais para recontar

tudo. E eles nos contaram e ainda estão nos contando a história do artista e do movimento que ajudou a criar. Vários desses nomes estão nas páginas deste fanzine; outros estão na exposição – como é o caso dos fotógrafos Fred Jordão e Gil Vicente, dos artistas Félix Farfan e Evêncio, e dos amigos do músico Fred Zeroquatro, Renata Pinheiro, Sonally, Roger de Renor, Renato L., Stella Campos... Uma lista que não se encerra enquanto escrevo, e que não vai se encerrar depois. Muitos já deram depoimentos, disponibilizados no site do projeto (www.itaucultural.org.br/ocupacao), e outros ainda vão fazê-lo. Porque o legado de Chico Science vai permanecer.

Sinto-me premiada por vários motivos: por trabalhar numa instituição que apoia a

construção e a preservação de obras e o legado de artistas brasileiros; por ter visto de perto o impacto causado pela

música e pela presença de Chico;

por ter agora uma oportunidade

de reverenciá-lo por ter mudado

tudo na música (e na cultura

da cidade); por ter feito de

minha juventude algo histórico

(para mim, para a cidade, para

o país); e, finalmente, por ter

me feito dançar, rir, cantar e

ter a certeza de que meu trabalho

seria sempre tentar aproximar

a arte das pessoas. Aproximem-

se (ou reaproximem-se) então do

universo artístico de Chico! Pois

como ele mesmo vociferava: “[...]

chegou a hora dessa roda começar,

samba makossa da pesada, vamos

todos celebrar!”.

Page 60: Fanzine Ocupação Chico Science

MAnguE nO CInEMA

quinta 25 a domingo 28 março 2010sala itaú cultural

quinta 20h

Programa 1 (93 min)

Baile PerfumadoPaulo Caldas e Lírio Ferreira, PE, 1997, 93 minRoteiro: Hilton Lacerda; fotografia: Paulo Jacinto dos Reis (Feijão); direção de arte: Adão Pinheiro; música: Fred Zeroquatro, Lúcio Maia e Siba; elenco: Jofre Soares, Duda Mamberti e Luís Carlos Vasconcelos Este filme, que cria um making of das filmagens realizadas por Benjamin Abrahão com o bando de Lampião em plena caatinga nordestina, é um dos mais instigantes retratos do cangaço no cinema nacional. Apoiado num rico acervo de pesquisa, Baile Perfumado traz para a sombra do mundo pop o personagem do Capitão Virgulino Ferreira (vulgo Lampião). Importante ponto de convergência entre o cinema pernambucano e o movimento mangue beat. Interessante a presença de Roger de Renor e Ortinho como cangaceiros, além da participação de toda a banda Mestre Ambrósio durante uma festa no filme.

sexta20h

Programa 2 (100 min)

Texas HotelCláudio Assis, PE, 1999, 14 minRoteiro: Hilton Lacerda; fotografia: Walter Carvalho; direção de arte: Renata Pinheiro; elenco: Jeison Wallace, Jonas Bloch, Conceição Camarotti, Jones Mello e Fernando PeresEste curta-metragem é um curioso estudo de linguagem para a construção narrativa do longa Amarelo-Manga. Tendo um hotel como personagem, o filme  inventa  tipos que formam a fauna urbana de um imaginado Recife. A frase “O que acontece enquanto a vaca vai e vem” foi a provocativa sinopse usada durante seu lançamento. Aqui, o mangue beat está presente na música e na interpretação – que conta com a participação de Gilmar Bolla Oito e Otto no elenco.

O Mundo é uma CabeçaBidu Queiroz e Cláudio Barroso, PE, 2004, 17 minRoteiro: Cláudio Barroso e Bidu Queiroz; fotografia: Paulo Jacinto dos Reis (Feijão)Por meio de depoimentos do próprio Chico Science e de outros integrantes do movimento mangue beat, o filme revela-nos de maneira muito próxima o pensamento de Science. Interessante a participação de Roger de Renor como guia em partes do depoimento. Filme-chave.

“Não recomendado para menores de 14 anos” 14

vISITAçãO ExPOSIçãO

quinta 4 fevereiro a domingo 4 abril 2010terça a sexta 10h às 21hsábado domingo feriado 10h às 19h

Page 61: Fanzine Ocupação Chico Science

MAnguE nO CInEMA

quinta 25 a domingo 28 março 2010sala itaú cultural

quinta 20h

Programa 1 (93 min)

Baile PerfumadoPaulo Caldas e Lírio Ferreira, PE, 1997, 93 minRoteiro: Hilton Lacerda; fotografia: Paulo Jacinto dos Reis (Feijão); direção de arte: Adão Pinheiro; música: Fred Zeroquatro, Lúcio Maia e Siba; elenco: Jofre Soares, Duda Mamberti e Luís Carlos Vasconcelos Este filme, que cria um making of das filmagens realizadas por Benjamin Abrahão com o bando de Lampião em plena caatinga nordestina, é um dos mais instigantes retratos do cangaço no cinema nacional. Apoiado num rico acervo de pesquisa, Baile Perfumado traz para a sombra do mundo pop o personagem do Capitão Virgulino Ferreira (vulgo Lampião). Importante ponto de convergência entre o cinema pernambucano e o movimento mangue beat. Interessante a presença de Roger de Renor e Ortinho como cangaceiros, além da participação de toda a banda Mestre Ambrósio durante uma festa no filme.

sexta20h

Programa 2 (100 min)

Texas HotelCláudio Assis, PE, 1999, 14 minRoteiro: Hilton Lacerda; fotografia: Walter Carvalho; direção de arte: Renata Pinheiro; elenco: Jeison Wallace, Jonas Bloch, Conceição Camarotti, Jones Mello e Fernando PeresEste curta-metragem é um curioso estudo de linguagem para a construção narrativa do longa Amarelo-Manga. Tendo um hotel como personagem, o filme  inventa  tipos que formam a fauna urbana de um imaginado Recife. A frase “O que acontece enquanto a vaca vai e vem” foi a provocativa sinopse usada durante seu lançamento. Aqui, o mangue beat está presente na música e na interpretação – que conta com a participação de Gilmar Bolla Oito e Otto no elenco.

O Mundo é uma CabeçaBidu Queiroz e Cláudio Barroso, PE, 2004, 17 minRoteiro: Cláudio Barroso e Bidu Queiroz; fotografia: Paulo Jacinto dos Reis (Feijão)Por meio de depoimentos do próprio Chico Science e de outros integrantes do movimento mangue beat, o filme revela-nos de maneira muito próxima o pensamento de Science. Interessante a participação de Roger de Renor como guia em partes do depoimento. Filme-chave.

“Não recomendado para menores de 14 anos” 14

vISITAçãO ExPOSIçãO

quinta 4 fevereiro a domingo 4 abril 2010terça a sexta 10h às 21hsábado domingo feriado 10h às 19h

Page 62: Fanzine Ocupação Chico Science

O Rap do Pequeno Príncipe contra as Almas SebosasPaulo Caldas e Marcelo Luna, PE, 2000, 75 minRoteiro: Paulo Caldas, Marcelo Luna e Fred Jordão; fotografia: André Horta; direção de arte: Cláudio Amaral; trilha sonora: DJ Dolores e Garnizé

Dois personagens reais, Helinho e Garnizé, formam o eixo do documentário. Helinho, justiceiro, 21 anos, conhecido como ”pequeno príncipe“, é acusado de matar 65 bandidos de bairros da periferia recifense. Garnizé, músico, 26 anos, componente da banda de rap Faces do Subúrbio, militante político e líder comunitário em Camaragide, usa a cultura para enfrentar a difícil sobrevivência na periferia. Os dois são opostos e ao mesmo tempo iguais na condição de filhos de uma guerra social silenciosa, travada diariamente nos subúrbios das grandes cidades brasileiras.

sábado20h

Programa 4 (87 min)

CachaçaAdelina Pontual, PE, 1995, 13 minRoteiro: Adelina Pontual; fotografia: Jane Malaquias; trilha sonora: Fred Zeroquatro e Otto; direção de arte: Cláudio Cruz e Péricles Duarte; elenco: Chico Diaz, Edmilson Barros e Jones MelloNum bar no centro da cidade, dois homens fazem uma aposta: ver quem aguenta tomar mais cachaça. A noite transcorre com suas revelações e seus personagens. Os primeiros raios de sol revelarão o vencedor.

Se Liga na Parada... Ou um Abraço Michelle Assumpção, PE, 1997, 22 minO vídeo dá uma geral no movimento hip hop do Recife dos anos 1990. Ao som da banda Faces do Subúrbio, o maior nome do rap pernambucano daqueles anos, as imagens e as falas resumem ideias e articulações dos jovens suburbanos que faziam da dança, do grafite e da atitude hip hop sua principal ferramenta de expressão social.

A Perna Cabiluda  Marcelo Gomes, Beto Normal, Gil Vicente e João Vieira de Melo Veira Júnior, PE, 1997, 19 minElenco: Chico Science, Fred Zeroquatro e Danuza LeãoUma das lendas urbanas mais surrealistas observada pelos olhos atentos, divertidos e inteligentes dos realizadores. Para uma pessoa distante, o documentário parece uma ficção.  Celebridades locais e nacionais, misturadas ao relato e às lembranças de populares, transformam A Perna Cabiluda num dos filmes mais interessantes da cena audiovisual pernambucana. 

um Passo à Frente e você Está Mais no Mesmo Lugar Cláudio Assis, PE, 50 minA partir de uma montagem inteligente, este documentário feito para a TV é uma das referências mais interessantes sobre Science, em que o cineasta Cláudio Assis não se contenta em se dobrar diante do artista, mas, sim, em revitalizá-lo por meio da memória visual e oral de toda uma geração.

sábado18h

Programa 3 (89 min)

Maracatu, Maracatus  Marcelo Gomes, PE, 1995, 14 minRoteiro: Marcelo Gomes; fotografia: Jane Malaquias; trilha sonora: Chico Science e Antônio Carlos Nóbrega; elenco: Jofre Soares e Meia-NoiteMisturando documentário e ficção, este filme fala sobre o choque entre as gerações que fazem parte de um grupo maracatu. A história dessa manifestação observada com um olhar agudo, colocando em confronto a tradição e a modernidade ao revelar de que maneira as manifestações se revitalizam. Participação importante de Mestre Salustiano, uma das principais referências da cultura popular para Chico Science.

“Não recomendado para menores de 14 anos” 14

“Não recomendado para menores de 14 anos” 14

“Não recomendado para menores de 14 anos” 14

Page 63: Fanzine Ocupação Chico Science

O Rap do Pequeno Príncipe contra as Almas SebosasPaulo Caldas e Marcelo Luna, PE, 2000, 75 minRoteiro: Paulo Caldas, Marcelo Luna e Fred Jordão; fotografia: André Horta; direção de arte: Cláudio Amaral; trilha sonora: DJ Dolores e Garnizé

Dois personagens reais, Helinho e Garnizé, formam o eixo do documentário. Helinho, justiceiro, 21 anos, conhecido como ”pequeno príncipe“, é acusado de matar 65 bandidos de bairros da periferia recifense. Garnizé, músico, 26 anos, componente da banda de rap Faces do Subúrbio, militante político e líder comunitário em Camaragide, usa a cultura para enfrentar a difícil sobrevivência na periferia. Os dois são opostos e ao mesmo tempo iguais na condição de filhos de uma guerra social silenciosa, travada diariamente nos subúrbios das grandes cidades brasileiras.

sábado20h

Programa 4 (87 min)

CachaçaAdelina Pontual, PE, 1995, 13 minRoteiro: Adelina Pontual; fotografia: Jane Malaquias; trilha sonora: Fred Zeroquatro e Otto; direção de arte: Cláudio Cruz e Péricles Duarte; elenco: Chico Diaz, Edmilson Barros e Jones MelloNum bar no centro da cidade, dois homens fazem uma aposta: ver quem aguenta tomar mais cachaça. A noite transcorre com suas revelações e seus personagens. Os primeiros raios de sol revelarão o vencedor.

Se Liga na Parada... Ou um Abraço Michelle Assumpção, PE, 1997, 22 minO vídeo dá uma geral no movimento hip hop do Recife dos anos 1990. Ao som da banda Faces do Subúrbio, o maior nome do rap pernambucano daqueles anos, as imagens e as falas resumem ideias e articulações dos jovens suburbanos que faziam da dança, do grafite e da atitude hip hop sua principal ferramenta de expressão social.

A Perna Cabiluda  Marcelo Gomes, Beto Normal, Gil Vicente e João Vieira de Melo Veira Júnior, PE, 1997, 19 minElenco: Chico Science, Fred Zeroquatro e Danuza LeãoUma das lendas urbanas mais surrealistas observada pelos olhos atentos, divertidos e inteligentes dos realizadores. Para uma pessoa distante, o documentário parece uma ficção.  Celebridades locais e nacionais, misturadas ao relato e às lembranças de populares, transformam A Perna Cabiluda num dos filmes mais interessantes da cena audiovisual pernambucana. 

um Passo à Frente e você Está Mais no Mesmo Lugar Cláudio Assis, PE, 50 minA partir de uma montagem inteligente, este documentário feito para a TV é uma das referências mais interessantes sobre Science, em que o cineasta Cláudio Assis não se contenta em se dobrar diante do artista, mas, sim, em revitalizá-lo por meio da memória visual e oral de toda uma geração.

sábado18h

Programa 3 (89 min)

Maracatu, Maracatus  Marcelo Gomes, PE, 1995, 14 minRoteiro: Marcelo Gomes; fotografia: Jane Malaquias; trilha sonora: Chico Science e Antônio Carlos Nóbrega; elenco: Jofre Soares e Meia-NoiteMisturando documentário e ficção, este filme fala sobre o choque entre as gerações que fazem parte de um grupo maracatu. A história dessa manifestação observada com um olhar agudo, colocando em confronto a tradição e a modernidade ao revelar de que maneira as manifestações se revitalizam. Participação importante de Mestre Salustiano, uma das principais referências da cultura popular para Chico Science.

“Não recomendado para menores de 14 anos” 14

“Não recomendado para menores de 14 anos” 14

“Não recomendado para menores de 14 anos” 14

Page 64: Fanzine Ocupação Chico Science

Josué de Castro – Cidadão do Mundo Silvio Tendler, RJ, 1995, 52 minLocução: José Wilker; entrevistas: Jorge Amado, Betinho, Dom Helder Câmara, Milton Santos, Chico ScienceInspiração para o movimento mangue, a vida e a obra do geógrafo e humanista Josué de Castro guiam este documentário. Indicado ao Prêmio Nobel da Paz, Josué de Castro morreu no exílio, em Paris, em 1973. Ele é o autor de Geografia da Fome e de Homens e Caranguejos, livros referenciais para o mangue beat.

domingo 15h

Programa 5 (87 min)

Maracatu de Tiro Certeiro Videoclipe, PE, 1993, 4 minBanda: Chico Science & Nação ZumbiDireção: Dolores & Morales; produção: X-FilmesAinda na fase pré-Sony, Chico Science & Nação Zumbi rodaram esta experiência imperdível em vídeo Hi8. Contém alguns dos elementos recorrentes da mitologia Science: citações à violência urbana, lama e deboche.

Samba Esquema noise Videoclipe, PE, 1995, 5 minBanda: Mundo Livre S/ADireção: Dolores & Morales; produção: Etapas VídeoQuatro amigos se encontram numa praia deserta. Sob efeito de aditivos químicos, começam um delírio lisérgico. Todo filmado em preto e branco, é um dos clipes mais radicais da Mundo Livre S/A. Seu formato e sua narrativa terminaram por exilá-lo dos programas de TV especializados em música. Sua realização foi completamente independente, o que lhe dá completa liberdade. Um clipe para revelar a banda, não para vender o disco.

A CidadeVideoclipe, PE, 1993, 4 minBanda: Chico Science & Nação ZumbiDireção e produção: TV Viva A versão demo de um dos maiores sucessos de Chico Science & Nação Zumbi, realizada pela TV Viva, nas ruas do Recife. Trata-se do primeiro clipe realizado para a banda. Nesse caso, precisa ser relevado o papel da produtora (TV Viva), uma das principais parceiras do movimento mangue nos anos 1990.

Maracatu AtômicoVideoclipe, RJ, 1996Banda: Chico Science & Nação ZumbiDireção: Raul Machado; produção: Chaos/Sony MusicImagens marcantes da versão explosiva feita por Chico Science & Nação Zumbi para a lendária música de Jorge Mautner.

Manguetown Videoclipe, RJ, 1996Banda: Chico Science & Nação ZumbiDireção: Gringo Cárdia; produção: Chaos/Sony MusicO clipe segue a explosão da banda após o lançamento de seu segundo CD, Afrociberdelia. A foto que compõe a entrada na exposição Ocupação Chico Science foi feita por Roberto Amadeo, fotógrafo deste filme.

Samydarsh – Os Artistas da RuaAdelina Pontual, Cláudio Assis e Marcelo Gomes, PE, 1993, 12 minRecife, uma capital deteriorada. Ruas, becos e mercados do centro estão apinhados de vendedores, pedintes, pregoeiros. No meio dessa Babel com sotaque latino, os cantadores de rua, ou, como se intitulam, os músicos populares, cumprem seu ritual de cantoria.

Punk Rock Hard Core – Alto José do Pinho – é do Caralho! Marcelo Gomes, Adelina Pontual e Cláudio Assis, PE, 1995, 13 minUma comunidade considerada carente está totalmente integrada ao mundo por meio de seus jovens, que passam a impor respeito não pelo calibre da arma que carregam, mas pela voltagem do amplificador que usam para suas guitarras. Dentro do documentário há o clipe da música Punk Rock Hard Core, do Devotos do Ódio (hoje apenas Devotos), todo realizado em 35 mm, com os restos dos negativos do filme Maracatu, Maracatus, de Marcelo Gomes.

De Malungo pra Malungo Alexandre Alencar, PE, 1999, 42 minO documentário registra a chamada ”cena musical pernambucana“. Narrado por seus 53 entrevistados, o vídeo apresenta uma espécie de ”versão oficial“ de como funciona a cena, não apenas na área musical, mas também na moda, no cinema e nas artes plásticas.

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Josué de Castro – Cidadão do Mundo Silvio Tendler, RJ, 1995, 52 minLocução: José Wilker; entrevistas: Jorge Amado, Betinho, Dom Helder Câmara, Milton Santos, Chico ScienceInspiração para o movimento mangue, a vida e a obra do geógrafo e humanista Josué de Castro guiam este documentário. Indicado ao Prêmio Nobel da Paz, Josué de Castro morreu no exílio, em Paris, em 1973. Ele é o autor de Geografia da Fome e de Homens e Caranguejos, livros referenciais para o mangue beat.

domingo 15h

Programa 5 (87 min)

Maracatu de Tiro Certeiro Videoclipe, PE, 1993, 4 minBanda: Chico Science & Nação ZumbiDireção: Dolores & Morales; produção: X-FilmesAinda na fase pré-Sony, Chico Science & Nação Zumbi rodaram esta experiência imperdível em vídeo Hi8. Contém alguns dos elementos recorrentes da mitologia Science: citações à violência urbana, lama e deboche.

Samba Esquema noise Videoclipe, PE, 1995, 5 minBanda: Mundo Livre S/ADireção: Dolores & Morales; produção: Etapas VídeoQuatro amigos se encontram numa praia deserta. Sob efeito de aditivos químicos, começam um delírio lisérgico. Todo filmado em preto e branco, é um dos clipes mais radicais da Mundo Livre S/A. Seu formato e sua narrativa terminaram por exilá-lo dos programas de TV especializados em música. Sua realização foi completamente independente, o que lhe dá completa liberdade. Um clipe para revelar a banda, não para vender o disco.

A CidadeVideoclipe, PE, 1993, 4 minBanda: Chico Science & Nação ZumbiDireção e produção: TV Viva A versão demo de um dos maiores sucessos de Chico Science & Nação Zumbi, realizada pela TV Viva, nas ruas do Recife. Trata-se do primeiro clipe realizado para a banda. Nesse caso, precisa ser relevado o papel da produtora (TV Viva), uma das principais parceiras do movimento mangue nos anos 1990.

Maracatu AtômicoVideoclipe, RJ, 1996Banda: Chico Science & Nação ZumbiDireção: Raul Machado; produção: Chaos/Sony MusicImagens marcantes da versão explosiva feita por Chico Science & Nação Zumbi para a lendária música de Jorge Mautner.

Manguetown Videoclipe, RJ, 1996Banda: Chico Science & Nação ZumbiDireção: Gringo Cárdia; produção: Chaos/Sony MusicO clipe segue a explosão da banda após o lançamento de seu segundo CD, Afrociberdelia. A foto que compõe a entrada na exposição Ocupação Chico Science foi feita por Roberto Amadeo, fotógrafo deste filme.

Samydarsh – Os Artistas da RuaAdelina Pontual, Cláudio Assis e Marcelo Gomes, PE, 1993, 12 minRecife, uma capital deteriorada. Ruas, becos e mercados do centro estão apinhados de vendedores, pedintes, pregoeiros. No meio dessa Babel com sotaque latino, os cantadores de rua, ou, como se intitulam, os músicos populares, cumprem seu ritual de cantoria.

Punk Rock Hard Core – Alto José do Pinho – é do Caralho! Marcelo Gomes, Adelina Pontual e Cláudio Assis, PE, 1995, 13 minUma comunidade considerada carente está totalmente integrada ao mundo por meio de seus jovens, que passam a impor respeito não pelo calibre da arma que carregam, mas pela voltagem do amplificador que usam para suas guitarras. Dentro do documentário há o clipe da música Punk Rock Hard Core, do Devotos do Ódio (hoje apenas Devotos), todo realizado em 35 mm, com os restos dos negativos do filme Maracatu, Maracatus, de Marcelo Gomes.

De Malungo pra Malungo Alexandre Alencar, PE, 1999, 42 minO documentário registra a chamada ”cena musical pernambucana“. Narrado por seus 53 entrevistados, o vídeo apresenta uma espécie de ”versão oficial“ de como funciona a cena, não apenas na área musical, mas também na moda, no cinema e nas artes plásticas.

Page 66: Fanzine Ocupação Chico Science

domingo17h

Programa 6 (100 min)

Amarelo-MangaCláudio Assis, PE, 2003, 100 minRoteiro: Hilton Lacerda; fotografia: Walter Carvalho; direção de arte: Renata Pinheiro; música: Jorge du Peixe e Lúcio Maia; elenco: Matheus Naschtergaele, Dira Paes, Conceição Camarotti, Chico Diaz e Leona CavalliGuiados pela paixão, os personagens de Amarelo-Manga vão penetrando num universo feito de armadilhas e vinganças, de desejos irrealizáveis, da busca incessante da felicidade. O universo aqui é o da vida-satélite e dos tipos que giram em torno de órbitas próprias, colorindo a vida de um amarelo hepático e pulsante. Não o amarelo do ouro, do brilho e das riquezas, mas o amarelo do embaçamento do dia a dia e do envelhecimento das coisas postas. Um amarelo-manga, farto.

COnvERSA DE MAnguE

domingo 28 março 201019h sala itaú cultural

Especialistas musicais e protagonistas do movimento mangue debatem os ecos da cena no Brasil e no mundo.

Beco Dranoff Produtor musical brasileiro que vive em Nova York, Dranoff criou a Ziriguiboom, produtora e selo musical responsável pelo lançamento internacional de artistas como Suba, DJ Dolores, Trio Mocotó e Bebel Gilberto.

Borkowski AkbarUm dos fundadores da Womex, uma das mais importantes feiras de negócios da música alternativa no mundo. Produtor do festival alemão Heimatklange, que significa “sons da terra”, e também do Piranha Records, selo de Berlim pioneiro em lançar a world music na Europa.

Fred ZeroquatroLíder da banda Mundo Livre S/A, amigo de Chico Science e protagonista do movimento mangue beat, Fred é também o autor do manifesto Caranguejos com Cérebro, marco na criação da cena.

Bill Bragin Diretor de programação do Lincoln Center, em Nova York, onde supervisiona os festivais de verão Midsummer Night Swing e Lincoln Center Out of Doors. É também cofundador e produtor do evento anual Global Fest, em sua sétima edição. Velho fã da música brasileira, abriu espaço internacional para artistas pioneiros do movimento mangue beat, incluindo o lançamento nos Estados Unidos de Chico Science & Nação Zumbi, no SummerStage, em 1995.

Paulo André PiresParceiro, amigo e produtor musical de Chico Science, Paulo André criou, em Recife, um dos mais importantes festivais alternativos de música do país: o Abril Pro Rock. Sua primeira edição foi em 1993 e teve papel fundamental para que o movimento mangue fosse catapultado ao resto do país. Chico Science & Nação Zumbi e Mundo Livre S/A fizeram apresentações memoráveis no festival.

Carlos Eduardo Miranda Entusiasta da cena mangue, o produtor de Porto Alegre esteve presente nas primeiras edições do festival pernambucano Abril Pro Rock. Fundou o Banguela Records, importante selo brasileiro de música independente e responsável pelo lançamento nacional da Mundo Livre S/A.

MAnguE SHOwS

quinta 1 a domingo 4 abril 2010sala itaú cultural

quinta20hColetivo Instituto

sextaMundo Livre S/A e convidados

sábadoMundo Livre S/A e convidados

domingo Orquestra Popular da Bomba do Hemetério

saiba mais em itaucultural.org.br/ocupação

“Não recomendado para menores de 18 anos” 18

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domingo17h

Programa 6 (100 min)

Amarelo-MangaCláudio Assis, PE, 2003, 100 minRoteiro: Hilton Lacerda; fotografia: Walter Carvalho; direção de arte: Renata Pinheiro; música: Jorge du Peixe e Lúcio Maia; elenco: Matheus Naschtergaele, Dira Paes, Conceição Camarotti, Chico Diaz e Leona CavalliGuiados pela paixão, os personagens de Amarelo-Manga vão penetrando num universo feito de armadilhas e vinganças, de desejos irrealizáveis, da busca incessante da felicidade. O universo aqui é o da vida-satélite e dos tipos que giram em torno de órbitas próprias, colorindo a vida de um amarelo hepático e pulsante. Não o amarelo do ouro, do brilho e das riquezas, mas o amarelo do embaçamento do dia a dia e do envelhecimento das coisas postas. Um amarelo-manga, farto.

COnvERSA DE MAnguE

domingo 28 março 201019h sala itaú cultural

Especialistas musicais e protagonistas do movimento mangue debatem os ecos da cena no Brasil e no mundo.

Beco Dranoff Produtor musical brasileiro que vive em Nova York, Dranoff criou a Ziriguiboom, produtora e selo musical responsável pelo lançamento internacional de artistas como Suba, DJ Dolores, Trio Mocotó e Bebel Gilberto.

Borkowski AkbarUm dos fundadores da Womex, uma das mais importantes feiras de negócios da música alternativa no mundo. Produtor do festival alemão Heimatklange, que significa “sons da terra”, e também do Piranha Records, selo de Berlim pioneiro em lançar a world music na Europa.

Fred ZeroquatroLíder da banda Mundo Livre S/A, amigo de Chico Science e protagonista do movimento mangue beat, Fred é também o autor do manifesto Caranguejos com Cérebro, marco na criação da cena.

Bill Bragin Diretor de programação do Lincoln Center, em Nova York, onde supervisiona os festivais de verão Midsummer Night Swing e Lincoln Center Out of Doors. É também cofundador e produtor do evento anual Global Fest, em sua sétima edição. Velho fã da música brasileira, abriu espaço internacional para artistas pioneiros do movimento mangue beat, incluindo o lançamento nos Estados Unidos de Chico Science & Nação Zumbi, no SummerStage, em 1995.

Paulo André PiresParceiro, amigo e produtor musical de Chico Science, Paulo André criou, em Recife, um dos mais importantes festivais alternativos de música do país: o Abril Pro Rock. Sua primeira edição foi em 1993 e teve papel fundamental para que o movimento mangue fosse catapultado ao resto do país. Chico Science & Nação Zumbi e Mundo Livre S/A fizeram apresentações memoráveis no festival.

Carlos Eduardo Miranda Entusiasta da cena mangue, o produtor de Porto Alegre esteve presente nas primeiras edições do festival pernambucano Abril Pro Rock. Fundou o Banguela Records, importante selo brasileiro de música independente e responsável pelo lançamento nacional da Mundo Livre S/A.

MAnguE SHOwS

quinta 1 a domingo 4 abril 2010sala itaú cultural

quinta20hColetivo Instituto

sextaMundo Livre S/A e convidados

sábadoMundo Livre S/A e convidados

domingo Orquestra Popular da Bomba do Hemetério

saiba mais em itaucultural.org.br/ocupação

“Não recomendado para menores de 18 anos” 18

Page 68: Fanzine Ocupação Chico Science

Expediente FanzineOcupação Chico Science

O fanzine da Ocupação Chico Science é uma experiência editorial de Mariana Lacerda (edição, com o auxílio de Marco Aurélio Fiochi), Liane Tiemi Iwahashi (direção de arte), Estevan Pelli e Jader Rosa (ideias e ilustrações), Rodrigo Silveira (arte dos textos assinados por Bia Abramo, Mabuse e Hilton Lacerda), Laura Daviña (arte dos textos assinados por Xico Sá, Dolores e du Peixe) e Renata Pinheiro (ilustração encartada). Participam Jorge du Peixe, Fred Zeroquatro, h. d. mabuse, Kleber Mendonça Filho, Bia Abramo, Xico Sá, Eduardo BiD, Aninha de Fátima Sousa, Hilton Lacerda e Helder Aragão (com textos), além de Caio Camargo (produção editorial), Rachel Reis e Polyana Lima (revisão). A fonte dos títulos foi feita por Fernando Peres.

Agradecimentos: Marcelo Calheiros, Patrícia Cornils, Hilton Lacerda, Helder Aragão, Jorge du Peixe, Carlinha Sarmento, h. d. mabuse, Fred Zeroquatro, BiD, Luciana Veras, Joana Amador e Denis Russo

Ficha Técnica Ocupação Chico Science

A exposição Ocupação Chico Science é resultado da curadoria coletiva de Helder Aragão e Hilton Lacerda (Dolores & Morales), Goretti e Louise França, Paulo André Pires e Núcleo de Música, de Comunicação e de Produção do Itaú Cultural

Curadoria musical dos showsJorge du Peixe e Núcleo de Música do Itaú Cultural Projeto expográficoHelder Aragão e Hilton Lacerda (Dolores & Morales) e Equipe Itaú Cultural

Comunicação visual e produção gráficaNúcleo de Comunicação do Itaú Culturalvideoinstalação LandauMarcelo Pedroso/Símio Filmes (Recife) grafiteDerlon Almeida

AcervosFamília França, Paulo André Pires, h. d. mabuse, TV Viva, Videoteipe e Marcos Toledo (imagens) Fotografias do acervoFred Jordão, Gil Vicente, Família França, Paulo André Pires e Roberto Amadeo

Fotografias do Espaço Sósias de ChicoCia de Foto (São Paulo e Rio de Janeiro) e Projeto Lambe-Lambe (Recife) Captação de depoimentosMarcelo Pedroso/Símio Filmes (Recife), Guga Gordilho (São Paulo e Rio de Janeiro) e Cia de Foto (São Paulo)

Produção do siteNúcleo de Comunicação do Itaú Cultural

Produção da mostra de filmesNúcleo de Audiovisual do Itaú Cultural

AgradecimentosDona Rita, Goretti, Janusse, Louise e Família França. Sonaly Macêdo Cavalcanti, Paulo André Pires, Jorge du Peixe e Nação Zumbi. Dolores & Morales, Amanda Barroso, Sonally Pires, Marcelo Pedroso, Fred Jordão, Gil Vicente, Roberto Amadeo, Evêncio, h. d. mabuse, TV Viva, Fred Zeroquatro, Videoteipe, Projeto Lambe-Lambe, Félix Farfan, Roger de Renor, Marcos Toledo, Melina Hickson, Adriana Vaz, Maria Duda e Renato L.

Page 69: Fanzine Ocupação Chico Science

Expediente FanzineOcupação Chico Science

O fanzine da Ocupação Chico Science é uma experiência editorial de Mariana Lacerda (edição, com o auxílio de Marco Aurélio Fiochi), Liane Tiemi Iwahashi (direção de arte), Estevan Pelli e Jader Rosa (ideias e ilustrações), Rodrigo Silveira (arte dos textos assinados por Bia Abramo, Mabuse e Hilton Lacerda), Laura Daviña (arte dos textos assinados por Xico Sá, Dolores e du Peixe) e Renata Pinheiro (ilustração encartada). Participam Jorge du Peixe, Fred Zeroquatro, h. d. mabuse, Kleber Mendonça Filho, Bia Abramo, Xico Sá, Eduardo BiD, Aninha de Fátima Sousa, Hilton Lacerda e Helder Aragão (com textos), além de Caio Camargo (produção editorial), Rachel Reis e Polyana Lima (revisão). A fonte dos títulos foi feita por Fernando Peres.

Agradecimentos: Marcelo Calheiros, Patrícia Cornils, Hilton Lacerda, Helder Aragão, Jorge du Peixe, Carlinha Sarmento, h. d. mabuse, Fred Zeroquatro, BiD, Luciana Veras, Joana Amador e Denis Russo

Ficha Técnica Ocupação Chico Science

A exposição Ocupação Chico Science é resultado da curadoria coletiva de Helder Aragão e Hilton Lacerda (Dolores & Morales), Goretti e Louise França, Paulo André Pires e Núcleo de Música, de Comunicação e de Produção do Itaú Cultural

Curadoria musical dos showsJorge du Peixe e Núcleo de Música do Itaú Cultural Projeto expográficoHelder Aragão e Hilton Lacerda (Dolores & Morales) e Equipe Itaú Cultural

Comunicação visual e produção gráficaNúcleo de Comunicação do Itaú Culturalvideoinstalação LandauMarcelo Pedroso/Símio Filmes (Recife) grafiteDerlon Almeida

AcervosFamília França, Paulo André Pires, h. d. mabuse, TV Viva, Videoteipe e Marcos Toledo (imagens) Fotografias do acervoFred Jordão, Gil Vicente, Família França, Paulo André Pires e Roberto Amadeo

Fotografias do Espaço Sósias de ChicoCia de Foto (São Paulo e Rio de Janeiro) e Projeto Lambe-Lambe (Recife) Captação de depoimentosMarcelo Pedroso/Símio Filmes (Recife), Guga Gordilho (São Paulo e Rio de Janeiro) e Cia de Foto (São Paulo)

Produção do siteNúcleo de Comunicação do Itaú Cultural

Produção da mostra de filmesNúcleo de Audiovisual do Itaú Cultural

AgradecimentosDona Rita, Goretti, Janusse, Louise e Família França. Sonaly Macêdo Cavalcanti, Paulo André Pires, Jorge du Peixe e Nação Zumbi. Dolores & Morales, Amanda Barroso, Sonally Pires, Marcelo Pedroso, Fred Jordão, Gil Vicente, Roberto Amadeo, Evêncio, h. d. mabuse, TV Viva, Fred Zeroquatro, Videoteipe, Projeto Lambe-Lambe, Félix Farfan, Roger de Renor, Marcos Toledo, Melina Hickson, Adriana Vaz, Maria Duda e Renato L.

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