34
UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO SEMI-ÁRIDO DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS ANIMAIS CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM CLINICA MÉDICA DE PEQUENOS ANIMAIS CARLA BIANCA BASTOS DE FIGUEIREDO FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS: REVISÃO DE LITERATURA BELÉM PARÁ 2009

FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO SEMI-ÁRIDO

DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS ANIMAIS

CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM CLINICA MÉDICA DE PEQUENOS

ANIMAIS

CARLA BIANCA BASTOS DE FIGUEIREDO

FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS: REVISÃO DE

LITERATURA

BELÉM – PARÁ

2009

Page 2: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

CARLA BIANCA BASTOS DE FIGUEIREDO

FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS: REVISÃO DE

LITERATURA

Monografia apresentada à Universidade Federal

Rural do Semi-Árido (UFERSA), como exigência

final para obtenção do título de especialização em

Clínica Médica de Pequenos Animais.

Orientador: Prof. Dr André Marcelo Conceição

Meneses – UFRA

BELÉM – PARÁ 2009

Page 3: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

CARLA BIANCA BASTOS DE FIGUEIREDO

FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS: REVISÃO DE

LITERATURA

Monografia apresentada à Universidade Federal

Rural do Semi-Árido (UFERSA), como exigência

final para obtenção do título de especialização em

Clínica Médica de Pequenos Animais.

APROVADA EM: 08 / 08 / 2009

BANCA EXAMINADORA

________________________________________

Profo Dr. André Marcelo Conceição Meneses (UFRA)

Presidente e Orientador

________________________________________

Profº Msc Paulo Henrique Sá Maia (ANCLIVEPA)

________________________________________

Profª Dra Silvia Maria Mendes Ahid (UFERSA)

Page 4: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

Dedico esta a todos os gatos

indiscriminadamente tratados, boas

poderiam ser as intenções, mas pouco o

conhecimento, a estes animais que, por

infinitas razões conseguiram sobreviver

ou infelizmente foram a óbito, e também

aos clínicos que ajudam a dignificar nossa

profissão ao tratá-la com sabedoria e

honram o nosso juramento de graduação.

Page 5: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

AGRADECIMENTOS

A Deus agradeço infinitamente por me dar forças para jamais desistir;

Ao Professor orientador Dr. André Marcelo Conceição Meneses, sempre muito paciente e

principalmente bastante otimista, mesmo muito atarefado, conseguiu fazer-se presente pra me

ajudar neste trabalho, e me mostrar que “dá sim pra fazer”, basta um pouco de paciência e

dedicação;

Aos professores da banca que disponibilizaram seu tempo para avaliar meu trabalho;

Às minhas amigas Carime Calzavara, que me ofereceu seu tempo, sua paciência e foi de uma

incomensurabilidade única. Não sei como teria começado sem a sua ajuda;

A Luiza Pereira, por trabalhar por mim, para que eu pudesse escrever este trabalho, agradeço

infinitamente;

A Nívia Freitas, que, pesquisando seus assuntos, ainda encontrou assuntos para eu adicionar

ao meu trabalho;

A Karla Negrão, por me emprestar seus valiosos livros, que muito contribuíram para este

trabalho;

Ao meu amado esposo Milton Neto, que com muita paciência e dedicação, também me

ajudou a dar continuidade a este trabalho, contribuindo bastante para que ficasse pronto a

tempo.

Page 6: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

“Não existe nada que não seja

veneno, o que diferencia o

medicamento do veneno é a

dose”

Paracelsus (1493-1541)

Page 7: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

RESUMO

O crescente entendimento sobre a fisiologia da espécie felina tem sido de ampla importância

ao se apresentar no mercado produtos voltados apenas para esta espécie e estudos científicos

que colaboram com a determinação de doses seguras para os demais medicamentos que

devem ser usados com muita cautela nestes animais. No entanto, este estudo demonstra

concentradamente o uso de medicamentos que são extremamente contra-indicados em gatos.

Diante do exposto, estudaram-se detalhada e individualmente os efeitos danosos da

administração indiscriminada de medicamentos humanos na espécie felina, objetivando

estabelecer um guia para intoxicação medicamentosa em gatos, e seu tratamento, as bases

químicas foram relacionadas aos principais produtos disponíveis no mercado. Com este

estudo reforça-se a idéia de que é necessário estabelecer um aprofundamento nesta questão,

maiores informações sobre as causas que levam a tantas ocorrências e óbitos em gatos, que

possa haver um maior esclarecimento aos proprietários sobre este assunto, visto que os

medicamentos são obtidos em estabelecimentos farmacêuticos humanos, a única forma de

controle destes casos é a informação.

Palavras-chave: Contra indicação; Felinos; Intoxicação medicamentosa; Farmacologia Felina.

Page 8: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

8

ABSTRACT

The growing understanding of the feline’s physiology is extremely important because a

spread number of products manufactured specially for this species and assist with scientific

studies to determine safe doses of all medicines that can be used with extreme caution in these

animals. However, this study demonstrates concentrate the use of drugs that are extremely

contra-indicated in cats. Considering the above, is detailed and studied individually harmful

effects of the indiscriminate administration of human drugs in feline species, to establish a

guide to drug poisoning in cats, and their treatment, the chemical bases were related to major

products on the market. This study reinforces the idea that it is necessary to establish a

deepening in this, more information on the causes that lead to so many events and deaths in

cats, there may be a better explanation to the owners about this, since the drugs are obtained

in human pharmaceutical establishments, the only way to control these cases is information.

Key – words: Counter indication; Felines; drug intoxication; Pharmacology Feline.

Page 9: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – População felina no mundo, importante nicho de mercado....................... 11

Figura 2 – Principais causas de intoxicação em gatos atendidos no HV/FMVZ/USP. 14

Figura 3 – Desenho esquematizando as vias de metabolização do paracetamol ......... 18

Figura 4 – Toxicidade por acetaminofeno em gato causando coloração cianótica em

língua. ...................................................................................................................... 20

Figura 5 – Gato com edema de face por intoxicação com aspirina ............................ 22

Page 10: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................... 11

2. OBJETIVOS ............................................................................................................... 14

3 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA.................................................................................... 15

3.1 INTOXICAÇÃO FARMACOLÓGICA EM FELINOS .............................................. 15

3.2 DESCRIÇÃO DA INTOXICAÇÃO MEDICAMENTOSA ........................................ 17

3.2.1 Ácido valpróico ...................................................................................................... 17

3.2.2 Acetaminofeno (paracetamol) ............................................................................... 18

3.2.3 Azul de metileno .................................................................................................... 21

3.2.4 Fenazopiridina ....................................................................................................... 21

3.2.5 Ácido acetilsalicílico .............................................................................................. 22

3.2.6 Piroxican ................................................................................................................ 23

3.2.7 Diclofenacos de sódio e de potássio ....................................................................... 23

3.2.8 Benzoato de benzila ............................................................................................... 24

3.2.9 Benzocaína ............................................................................................................. 24

3.2.10 Hidrocarbonetos clorados ................................................................................... 24

3.2.11 Hexaclorofeno ...................................................................................................... 24

3.2.12 Carbamatos e organofosforados ......................................................................... 25

3.2.13 Cloranfenicol........................................................................................................ 26

3.2.14 Fenilbutazona ...................................................................................................... 26

3.2.15 Cisplatina ............................................................................................................. 26

3.2.16 5 – Fluorouracil ................................................................................................... 27

3.2.17 Vitamina K ........................................................................................................... 27

3.2.18 Difenoxilato .......................................................................................................... 27

3.2.19 Azatioprina .......................................................................................................... 28

3.2.20 Estreptomicina e diidroestreptomicina ............................................................... 28

4 DISCUSSAO ................................................................................................................ 29

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 31

REFERÊNCIAS ............................................................................................................. 32

Page 11: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

11

1 INTRODUÇÃO

Compartilhar a vida com animais de estimação tem raízes profundas na evolução da

sociedade humana, por isso a domesticação do gato completa mais de 9 mil anos, uma

convivência pacífica e recíproca, no sentido do gato controlar as pragas como roedores e insetos

da prática da agricultura, enquanto o homem fornece proteção aos seus maiores predadores

(LOBÃO, 1992).

A população de gatos no Brasil está hoje em cerca de 13 milhões. O gato representa o pet

do século XXI, pois sua tendência é crescer, já que este felino é o animal doméstico que mais se

ajusta ao estilo de vida atual: precisa de menos espaço e, comparado ao cão, é mais

independente.

Segundo levantamento da Associação Nacional dos Fabricantes de Alimentos para

Animais de Estimação (Anfal Pet), entre 2003 e 2005 o número de cachorros registrados no país

aumentou 7%, de 27 milhões para 28,8 milhões; já o de gatos saltou 20%, de 11 milhões para 13

milhões (Figura 1) (ANFAL PET, 2007).

Figura 1. População felina no mundo, importante nicho de mercado. Fonte: Anfal Pet, 2007.

No entanto, engana-se quem pensa que um gato pode ser tratado como um pequeno cão.

Os gatos têm muitas particularidades, suas doenças e tratamentos são únicos e devem ser

Page 12: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

12

acompanhados por um veterinário. De preferência um profissional que tenha conhecimento da

medicina felina, hoje tão definida em virtude da crescente importância adquirida por esta espécie

(ANFAL PET, 2007).

Nestes últimos anos, tem-se dado grande ênfase à terapêutica felina na medicina

veterinária, em virtude do aumento da popularidade do gato como animal de estimação. Hoje em

dia, o veterinário está muito mais atento às particularidades da terapêutica e do manejo hospitalar

dos gatos (SOUZA; AMORIM, 2008)

Hansen (2006) descreveu em sua dissertação que, atualmente o aumento da indústria

farmacêutica tem observado um problema muito comum na medicina humana e veterinária que é

a intoxicação por medicamentos. Enquanto para os cães as principais causas de toxicoses são

pesticidas e medicamentos, para os gatos os principais agentes são os medicamentos, mesmo a

maioria das causas sendo acidentais seguidas de medicação sem prescrição veterinária.

Há muitos anos os veterinários têm conhecimento de que os gatos respondem de maneira

diferente à dos cães a uma variedade de drogas. Existem muitos relatos na literatura de

intoxicações e reações adversas após o uso de diversos medicamentos nesta espécie (ARAÚJO et

al, 2000).

Segundo Souza e Amorim (2008), ainda não existem esquemas terapêuticos seguros para

a maioria dos fármacos utilizados nos tratamentos das doenças felinas, resultando em erros nas

prescrições medicamentosas. As autoras relatam ainda que os erros também podem ocorrer pela

escolha inadequada das apresentações das formas farmacêuticas dos medicamentos que, na sua

maioria, são inviáveis para os felinos, ou seja cápsulas, comprimidos grandes e soluções

parenterais extremamente concentradas.

A extrapolação de esquemas de doses e indicações terapêuticas dos fármacos de outras

espécies, em particular do cão, para o felino deve ser vista com muita cautela. Muitos

proprietários e veterinários vêem os gatos como pequenos cães, quando se tratam de

determinados esquemas de doses e indicações terapêuticas, porém isso nem sempre é viável, pois

existe um grande potencial às reações adversas e intoxicações (SOUZA; AMORIM, 2008).

Para Araújo et al. (2000), embora estas extrapolações sejam freqüentemente bem

sucedidas, deve-se ter em mente as variações da farmacocinética e do metabolismo de drogas

entre as espécies, que são responsáveis pelas reações adversas.

Alguns felinos podem ter severas reações anafiláticas /alérgicas a determinadas

medicações neles aplicadas, a exemplo da ivermectina, que é tradicionalmente aplicada no

controle de pequenos parasitos como carrapatos, pulgas e piolhos, em determinadas situações,

essa substância pode ocasionar edema cerebral, provocando mialgia intensa, ataxia e paresia,

Page 13: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

13

cegueira temporária, hiporexia ou anorexia, retenção de urina, hipertermia, chegando a levar, em

casos mais graves, o animal ao estado de coma.

Comparativamente ao que ocorre em cães, os felinos mostram-se mais sensíveis aos

efeitos colaterais de diversos fármacos, como o anteriormente citado. Como o uso

indiscriminado destes medicamentos pode levar o animal ao óbito, é altamente recomendado que

o médico veterinário conheça o mecanismo de ação destas drogas e seu tratamento e/ou antídoto,

quando for o caso, alertando os proprietários contra seus efeitos danosos.

A facilidade de obtenção de diversos medicamentos de uso corrente em seres humanos,

sem a necessidade/exigência de receituário médico, aumenta as chances da utilização inadequada

de diversas bases farmacológicas na espécie felina. Há, portanto, a necessidade que medidas

sensatas sejam tomadas para assegurar que tal situação não ocorra, diminuindo, deste modo, a

possibilidade de que as prescrições para pequenos animais não sejam utilizadas de forma abusiva

pelos seres humanos.

Page 14: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

14

2. OBJETIVOS

O objetivo deste trabalho foi realizar revisão bibliográfica ampla a respeito dos

fármacos que são utilizados na terapêutica felina, sejam de uso corrente veterinário ou não,

inclusive citando suas principais indicações e contra-indicações para a espécie em questão.

Page 15: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

15

3 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

3.1 INTOXICAÇÃO FARMACOLÓGICA EM FELINOS

Dentro da medicina veterinária, a medicina felina tem demonstrado grande interesse

por parte das novas gerações de veterinários, que buscam, em sua maioria, uma

especialização constante.

Diversos são os fármacos comumente utilizados na medicina felina, e muitos deles

não têm referencial teórico que fundamentem suas aplicações terapêuticas, e muito menos,

seus efeitos adversos naqueles pacientes que porventura venham a recebê-los.

Xavier e Kogika (2002) avaliaram no Hospital Veterinário da Universidade de São

Paulo as causas mais comuns de intoxicação em gatos (Figura 1), os dados obtidos mostram

o quanto é essencial conhecer a toxicidade destes agentes para reduzir os índices destes

acidentes. Metade das intoxicações medicamentosas em gatos ocorre devido aos

antinflamatórios não-esteroidais (50%), e ainda por agentes antimicrobianos (7,2%) e outros

(42,8%).

Figura 2 - Principais causas de intoxicação em gatos atendidos no HV/FMVZ/USP. Fonte: adaptado

de Xavier e Kogika (2002).

Diante do colocado, o volume de informações acerca das intoxicações em gatos são

fartas, menos por seu comportamento, e mais por seu metabolismo e fisiologia particulares.

O gato é um animal muito mais seletivo que o cão, não se intoxicando acidentalmente com a

mesma freqüência e gravidade, mas sim de forma indiscriminada tanto pelo seu proprietário

Page 16: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

16

que desconhece os efeitos daquele medicamento em seu felino, como por clínicos

veterinários que desconhecem a dose de segurança de muitos fármacos que têm apresentado

toxicidade nesta espécie (ANFAL PET, 2007).

Neste ínterim, o Quadro 1 exemplifica alguns fármacos já previamente estudados,

que possuem contra-indicação absoluta ou relativa para a espécie felina, por provocarem

efeitos colaterais já descritos na literatura especializada e seus respectivos nomes

comerciais.

Princípio ativo Nome Comercial Efeitos Colaterais

Acetoaminofeno Paracetamol (H); Tylenol (H) Mucosas cianóticas,

salivação, vômitos,

anorexia, edema facial

coma e morte

Ácido acetil salicílico Aspirina (H) Inapetência, edema de face,

incoordenação, vômitos,

diarréia, icterícia, coma e

morte

Alcatrão Sebolytic (V), Polytar Shampoo e

sabonete (H)

Ataxia, coma e óbito

Apomorfina Uprima (H) Depressão do sistema

nervoso central

Azatioprina Imunen, Imuran (H) Supressão medular

Azul de metileno Cystex (H), Sepurim (H) Anemia hemolítica e

oxidação irreversível da

hemoglobina

Benzoato de benzila Timbaco Spray (V), Matacura

Sarnicida (V) e Miticoçan (H)

Ataxia, coma e óbito

Benzocaína Cepacaína (H), Malvona (H) Metamioglobinemia, edema

laringiano

Cisplatina Platistine CS (H), Tecnoplatin (H) Edema pulmonar agudo

(fatal)

Diclofenacos de

potássio e sódio

Voltaren (H) e Cataflan (H) gastrenterite hemorrágica

grave

Difenoxilato Lomotil (H) Excitação, midríase,

cegueira e ataxia

Fenitoína Epelin (H), Fenital (H), Episol (V) Anorexia, ataxia, atrofia

dérmica, sedação

Fosfato de sódio Fleet Enema (H) Ataxia, depressão, êmese e

hematoquezia

Page 17: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

17

Hexaclorofeno Phisiohex (H) Êmese, depressão, ataxia,

paralisia

Permetrina Pulgoff Pour-on (V), Pulvex Pour-

on (V)

Hepercinesia, hiperestesia,

mioclonia

Propiltiouracil Propil (H) Letargia, astenia, anorexia,

diáteses hemorrágicas

Sulfeto de selênio Selsun Azul (H) e Selsun Ouro (H) Ataxia, coma e óbito

Tiacetarsamida Caparsolate (V) Pirexia, dispnéia e edema

pulmonar (fatal) Quadro 1 - Exemplos de fármacos, seus respectivos nomes comerciais e efeitos colaterais. Humano

(H), Veterinário (V). Fonte: Modificado de Spinosa et al (2006).

3.2 DESCRIÇÃO DA INTOXICAÇÃO MEDICAMENTOSA

Quando se administra um fármaco para um determinado paciente, é extremamente

importante conhecer seus efeitos colaterais/adversos, que, dependendo do medicamento,

dose administrada, via de administração, e principalmente, de fatores individuais de cada

paciente, devem ser amplamente reconhecidos, para que, caso venham a acontecer, sejam

rapidamente revertidos.

Dentre aqueles medicamentos com efeitos colaterais sabidamente descritos na

literatura especializada para a espécie felina, mas que, ainda são utilizados por médicos

veterinários desavisados ou inexperientes, podemos citar:

3.2.1 Ácido valpróico

Zoran et al. (2001), observou o caso de um gato castrado de 1 ano de idade que

apresentou alopecia e hiperatividade durante 4 a 5 meses. O animal ingeria alimento

destinado a uma criança, o qual continha ácido valpróico. Após a remoção da droga, houve

recuperação do animal, porém não ficou comprovado que ocorreu intoxicação pelo fármaco.

Os autores relatam que o animal desenvolveu sinais clínicos devido à eliminação hepática

prolongada do ácido valpróico, uma vez que este exige glucuronidação para ser

metabolizado. Nome comercial na linha humana: Depakene.

Page 18: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

18

3.2.2 Acetaminofeno (paracetamol)

O paracetamol é um agente antiinflamatório inibidor fraco das enzimas

Clicloxigenase 1 (COX – 1) e Clicloxigenase – 2 (COX – 2), atuando mais especificamente

sobre uma substância denominada prostaglandina sintetase na região cerebral, cuja ação

principal é promoção de atividade antipirética por bloqueio da ação de pirógenos (SPINOSA

et al., 2006).

As cicloxigenases (COX) produzem prostanóides (mediadores que sensibilizam

receptores da dor),e o paracetamol, por sua vez, inibe a cicloxigenase, impedindo, deste

modo, a conversão do ácido aracdônico em metabólitos de prostaglandina (HANSEN,

2006). Este fármaco se liga à COX de forma reversível e não competitiva, e é metabolizado

por uma série de vias (BOOTH, 1992), assim como descrito na Figura 1.

Os gatos são especialmente sensíveis à ação do paracetamol, pois esta espécie animal

não realiza bem a conjugação pela glicuroniltransferase, enzima hepática necessária para

correta eliminação deste antinflamatório. Os gatos intoxicados apresentam inicialmente

mucosa de coloração azulada, salivação e vômitos, que se iniciam nas primeiras 4 horas de

exposição; Também se observa depressão, anorexia, e edema facial após cerca de 3 dias:

Casos graves levam à um quadro de coma e morte (SPINOSA et al., 2006).

Page 19: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

19

Figura 3 - Desenho esquematizando as vias de metabolização do paracetamol. Fonte:

adaptado de Booth (1992).

Segundo Wills e Wolf (1995), o paracetamol é extremamente tóxico para os gatos e

nunca deve ser usado, pois sua conjugação como ácido glicurônico é muito limitada. Este

fármaco se oxida para formar um composto intermediário altamente restivo que é

hepatotóxico e que proporciona a conversão da hemoglobina em metahemoglobina. Os

sinais clínicos incluem ainda edema pulmonar, cianose, apatia, hipotermia e vômito.

Em caso de administração inadvertida em gatos ou overdose em cães, o animal deve

ser levado ao veterinário para este proceder à desintoxicação Os efeitos da intoxicação

podem incluir danos ao fígado, anemia hemolítica, danos oxidativos às hemácias e

tendências à hemorragia. Não existem antídotos caseiros, e os danos irreversíveis ao fígado

dependem da rapidez com que é iniciada a intervenção veterinária (VILLAR et al., 1998).

O tratamento farmacológico da overdose de paracetamol pode envolver o uso de

terapia fluida (solução de NaCl 0,9%), acetilcisteína, metionina ou S-adenosilmetionina

Page 20: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

20

(SAMe) para retardar os danos ao fígado e cimetidina para proteger contra a ulceração

gástrica. Quando há hepatotoxicidade, não é possível revertê-la. (MANNING, 2007).

Para Norsworthy et al. (2004), a utilidade da cimetidina ainda não foi comprovada,

e, portanto, não deve ser tratamento exclusivo para a toxicose. O autor ressalta que o

tratamento compreende a remoção da toxina pela indução da êmese, em caso de ingestão

recente. Também se pode ser utilizado carvão ativado, mas apenas se a ingestão tiver

ocorrido nas duas horas precedentes ao atendimento veterinário. Seu uso deve ser cauteloso,

caso o animal esteja vomitando ou em caso de indução da êmese. Se o paciente estiver sendo

medicado com acetilcisteína por via oral (VO), o carvão ativado poderá se ligar o fármaco.

A acetilcisteína em solução a 5% é recomendável como antídoto específico. A dose

inicial por via oral ou intavenosa de 130 a 140 mg/kg deve ser seguida por 70 mg/kg VO ou

intra venoso (IV) a cada 4 a 6 horas, podendo haver necessidade de dar continuidade ao

tratamento durante durante 2 a 3 dias. O prognóstico é grave quando forem muito intensas a

metahemoglobinemia e anemia hemolítica por corpúsculos de Heinz e não houver resposta á

terapia apropriada. Para os felinos que se recuperam, não foram relatados efeitos em longo

prazo (NORSWORTHY et al., 2004).

Em gatos, o seu uso promove hemólise intra e extravascular em virtude da formação

do corpúsculo de Heinz. Em todas as espécies ele é metabolizado por meio de três trajetos:

glicuronidação, sulfatação e oxidação mediada por citocromo P450. Os metabólitos da

glicuronidação e da sulfatação não são tóxicos, mas o trajeto de oxidação produz um

metabólito tóxico reativo (acredita-se que seja N-acetil-p-benzoquinoneimina). Esse

metabólito é normalmente conjugado com glutationa, mas quando a glutationa hepática

esgota-se, o metabólito se conjuga covalentemente com resíduos de aminoáciods de

proteínas no fígado, resultando em necrose hepática centrilobular (CHANDLER, et al.,

2006).

A glicuronidação é o principal trajeto metabólico na maior parte das espécies, mas os

gatos possuem baixa concentração de glicuronil-transferase, que catalisa a etapa final, de

forma que a excreção por esse trajeto é pequena. A sulfatação é o principal trajeto

metabólico em gatos, mas sua capacidade é limitada à medida que a dose é aumentada, uma

porcetagem maior do fármaco é oxidada (CHANDLER et al., 2006).

Intoxicação por acetaminofeno (Paracetamol) causa uma coloração enegrecida

cianótica na pele e na mucosa oral, incluindo língua, edema facial, anemia, icterícia e

hemoglobinúria (BURROWS, 2002) (Figura 4). Se houver se passado menos de 4 horas

Page 21: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

21

desde a ingestão, deve-se tentar eliminar o tóxico através da indução da êmese, lavagem

gástrica e administração de carvão ativado (LUENGO; GUTIÉRREZ, 2008).

Figura 4 - Toxicidade por acetaminofeno em gato causando coloração cianótica em língua. Fonte: Vets Alliance Pty Ltd ( 2007).

3.2.3 Azul de metileno

Segundo Tilley et al. (2008), trata-se de um antisséptico urinário fraco, que pode

causar formação de corpúsculos de Heinz e anemia hemolítica, pois ocorre oxidação

irreversível da hemoglobina. Araújo et al. (2000) concordam e complementam que além dos

achados anteriores, ocorre também diarréia, depressão e anorexia, sendo, portanto, contra-

indicado para a espécie felina.

Hejtmancik et al. (2001) administraram azul de metileno a várias espécies, incluindo

felinos domésticos e constataram que esta espécie é muito sensível à droga, pois foram

descritas alterações hematológicas após uma única administração, assim como diminuição

da hemoglobina e aumento do número de reticulócitos.

3.2.4 Fenazopiridina

É o analgésico mais comumente adicionado a produtos para o tratamento das

infecções urinárias. A administração oral da droga na dose de 65mg/kg/dia a um gato com

disúria e hematúria, produziu hemólise com icterícia, anemia, presença de corpúsculos de

A

B

Page 22: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

22

Heinz nas hemácias e morte do animal 48 horas após a administração da última dose

(SOUZA; AMORIM, 2008).

Segundo os mesmos autores, doses mais baixas (10-20mg/kg/dia), administradas

durante períodos maiores, não resultam em sinais de intoxicação ou anemia, porém o

número e o tamanho dos corpúsculos de Heinz e os níveis de metahemoglobinemia no

sangue aumentam.

3.2.5 Ácido acetilsalicílico

Trata-se de um agente oxidante causador de anemia hemolítica por corpúculos de

Heinz. Causa muitos efeitos tóxicos, tais como: inapetência, incoordenação, vômitos,

diarréia, icterícia, coma e morte. Apesar disso, existem indicações para seu uso no

tratamento para insuficiência renal aguda, cardiomiopatia hipertrófica e episódio

tromboembólico, usada para redução da agregação plaquetária. Esta dose oscila de 25mg/kg

a cada 24hs a 42mg/kg a cada 72hs (WILLS; WOLF 1995).

Contudo, para Norsworthy et al. (2004), esse fármaco pode ser administrado com

segurança em gatos na dose de 10 a 20 mg/kg cada 48hs. O autor relata que, se na ocasião da

intoxicação não for confirmada a ingestão de ácido acetilsalicílico, é difícil fazer o

diagnóstico específico.

Segundo o mesmo autor, é maior a probabilidade de angústia respiratória, distúrbios

ácido-básicos, convulsões e hemorragia gastrintestinal com a repetição das doses deste

fármaco. A hepatite induzida pela medicação pode levar ao surgimento de icterícia.

Com a repetição das doses de aspirina, torna-se maior a probabilidade de surgir

angústia respiratória, distúrbios ácido-básicos, convulsões e hemorragia gastrintestinal.

Dentro de poucos dias poderão ocorrer astenia muscular, ataxia, convulsões, coma e morte

(NORSWORTHY et al., 2004).

Page 23: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

23

Figura 5. Gato com edema de face por intoxicação com aspirina. Fonte:

Beco Dos Gatos (2009).

3.2.6 Piroxican

Este medicamento é contra indicado em gatos, mas não por ser prejudicial, mas sim

porque seus efeitos nesta espécie não foram avaliados, portanto, efeitos tóxicos são

desconhecidos (TILLEY et al., 2008).

3.2.7 Diclofenacos de sódio e de potássio

O diclofenaco pertence ao grupo dos antiinflamatórios não-esteróides (AINEs), neste

grupo incluímos os diclofenacos sódico e potássico, ambos com pronunciadas propriedades

analgésica, antiinflamatória e antipirética; é um antiinflamatório de ação dual (atua sobre a

inibição da cicloxigenase e da lipoxigenase), possui alta potência antiinflamatória e

analgésica (SPINOSA et al., 2006)

Estes fármacos são muito utilizados na medicina humana, mas não devem ser usado

em cães e nem em gatos, pois podem causar gastrenterite hemorrágica grave. Porém, seu uso

tópico diminui a incidência de efeitos colaterais, graças à baixa absorção sistêmica, sendo

Page 24: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

24

por isso bastante utilizado na oftalmologia em forma de colírio e em contusões e distúrbios

musculoesqueléticos em forma de gel ou pomada (ANDRADE, 2008).

3.2.8 Benzoato de benzila

Este fármaco já foi muito utilizado para o tratamento de parasitoses cutâneas em

pequenos animais, sendo empregado até hoje no tratamento da escabiose e pediculose em

humanos. É contra-indicado para gatos, pois provoca dor abdominal, vômito e diarréia,

hiperexcitabilidade e convulsões. Em caso de intoxicação, deve-se remover o produto da

pele do animal e iniciar tratamento sintomático (ARAÚJO et al., 2000; SOUZA; AMORIM,

2008).

3.2.9 Benzocaína

Para Araújo et al. (2000), uso deste anestésico local em gatos está associado à

metahemoglobinemia após administração tópica na pele para controle de prurido, ou na

laringe para facilitar a intubação traqueal.

Segundo Souza e Amorim (2008), o mecanismo de oxidação da hemoglobina pela

benzocaína é desconhecido, mas deve estar relacionado ao metabolismo de produtos tóxicos.

Os sinais clínicos observados nos gatos após o uso tópico de creme ou pulverizações

contendo o fármaco são vômito, dispnéia, mucosa cianótica, taquicardia, taquipnéia e

prostração.

O tratamento para a intoxicação por benzocaína inclui a administração de oxigênio,

de N-acetilcisteína e a transfusão sanguínea (ARAÚJO et al., 2000)

3.2.10 Hidrocarbonetos clorados

Page 25: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

25

Presente em alguns produtos de combate à pulgas e outros parasitas. A reação pode

ser imediata ou levar dias para ocorrer. Começa com uma resposta exagerada ao estímulo,

tremores, progressão para tremores cada vez mais fortes até um estado convulsivo, febre

(NORSWORTHY, 1993).

3.2.11 Hexaclorofeno

Agente germicida, encontrado em xampus, desinfetantes e sabonetes, (como o

Phisiohex). É rapidamente absorvido através da pele e trato intestinal. Causa em gatos

fadiga, fraqueza, incoordenação dos membros posteriores, febre, ausência de urina, vômito,

depressão, ataxia, hiper-reflexia, que progride para hiporreflexia e, paralisia flácida

completa. O tratamento consiste na remoção da droga, através de banhos, lavagem gástrica e

catárticos, associados a tratamento de suporte (NORSWORTHY, 1993; ARAÚJO et al.,

2000)

3.2.12 Carbamatos e organofosforados

Os carbamatos são usados em medicamentos contra pulgas como coleiras, sabonetes,

sprays, talcos, xampus, causando lesão no SNC e morte por parada respiratória

(NORSWORTHY, 1993). Afetam o sistema nervoso por inibir a acetilcolinesterase (AChE)

na junção neuromuscular, resultando no excesso de AChE e em prolongada despolarização

da membrana pós-sináptica; os órgãos efetores são estimulados (NORSWORTHY et al,

1994).

Os gatos são mais suscetíveis aos efeitos tóxicos dos organofosforados do que as

outras espécies de animais. Essa intoxicação ocorre especialmente pelo emprego de coleiras

contra pulgas que têm com base o citado fármaco (SOUZA; AMORIM, 2008).

Segundo os autores supracitados, sinais clínicos da intoxicação aguda são

decorrentes do acúmulo de acetilcolina, miose, salivação e fasciculação muscular. O

tratamento é de suporte, associado à administração de sulfato de atropina, na dosagem de 0,1

0,2mg/kg, por via intavenosa (IV), lentamente, sendo necessária a repetição a cada 10

minutos até a diminuição dos tremores musculares e, posteriormente, a cada 60 minutos.

Page 26: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

26

Souza e Amorim (2008) relatam ainda que os tratamentos associando sulfato de

atropina e cloridrato de pralidoxima trazem melhores resultados. Administra-se este fármaco

na dose de 20mg/kg, IV, podendo ser repetido após 60 minutos. O emprego do sulfato de

atropina pode ser requerido após 24 a 48 horas.

3.2.13 Cloranfenicol

Araújo et al. (2000) relatam que, quando este fármaco é administrado em gatos na

mesma dose recomendada para cães, induz à anorexia, depressão, anemia e mielossupressão.

Na maioria dos casos, esses efeitos são reversíveis após a interrupção da administração da

droga.

Os mesmos autores afirmam que a intoxicação por cloranfenicol causa hipoplasia de

medula, ausência de maturação das células eritróides, inibição da atividade mitótica e

vacuolização de linfócitos e de precursores iniciais das séries mielóide e eritróide. No

sangue periférico observa-se diminuição do número de neutrófilos, linfócitos e, reticulócitos

pontilhados e plaquetas. Embora a gravidade da intoxicação seja aparentemente dose-

dependente, a administração contínua também parece contribuir para o desenvolvimento de

efeitos adversos.

3.2.14 Fenilbutazona

Nos gatos, a fenilbutazona deve ser usada com cautela. A dose deve ser menor que a

usada nos cães. Uma dose de 5-12mg/kg administrada via oral (VO), duas vezes ao dia não

deve causar toxicidade. Deve ser usado por curto período e deve-se suspender o uso se

houver qualquer sinal de inapetência ou apatia. Os sinais clínicos da intoxicação

compreendem inapetência, vômito e perda de peso (WILLS; WOLF, 1995).

Porém, para Araújo et al. (2000), o uso de fenilbutazona em gatos está associado a

uma alta incidência de intoxicação. Os autores relatam que existem controvérsias quanto ao

uso deste fármaco no gato, pois enquanto autores recomendam a dose de 6 a 12mg/ kg,

outros dizem que o fármaco não deve ser utilizado na espécie felina.

Page 27: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

27

3.2.15 Cisplatina

O uso sistêmico deste fármaco é contra-indicado em gatos, devido à toxicidade

pulmonar primária espécie-específica e dose relacionada. A toxicidade se manifesta como

hidrotórax grave, edema pulmonar e mediastinal fatais. Apesar do efeito letal quando usada

IV, a cisplatina pode ser administrada com sucesso na forma intralesional, por meio de uma

suspensão em óleo ou matriz colágena na dose de 1,5mg/cm3, sem toxicidade sistêmica

aparente (SOUZA; AMORIM, 2008; TILLEY et al., 2008).

3.2.16 5 – Fluorouracil

É um antineoplásico cujo mecanismo de ação se dá através da interferência na síntese

de DNA, podendo se incorporar no RNA para causar efeitos tóxicos. É indicado para

tratamento de carcinomas gastrointestinais, pulmonares, hepáticos e mamários (sistêmicos) e

carcinomas cutâneos (tópicos), porém a administração tópica em gatos resulta em

neurointoxicação e hepatointoxicação fatais (MERCK, 2001).

Souza e Amorim (2008) descrevem que essa toxicidade também ocorre por via

sistêmica, assim como pela via tópica, sendo, portanto, seu uso contra-indicado na espécie

felina.

3.2.17 Vitamina K

Grandes quantidades (acima da dose usualmente recomendada) causam anemia

hemolítica por corpúsculos de heinz e dano hepático oxidativo (TILLEY et al., 2008).

3.2.18 Difenoxilato

Page 28: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

28

É encontrado em medicamentos antidiarréicos, mas é tóxico e não deve ser usado.

Seu uso em gatos tem efeitos desfavoráveis tais como excitação e midríase que avança até a

cegueira e ataxia (WILLS; WOLF, 1995).

3.2.19 Azatioprina

Os gatos são particularmente sensíveis à toxicidade medular deste fármaco, pois, por

ser um imunossupressor potente, os felinos geralmente demonstram leucopenia e

trombocitopenia fatais. A dose recomendada é de 1,5 a 3,125 mg/gato a cada 48 horas.

Muitos autores não recomendam o uso da azatioprina em gatos, e como alternativa, o

clorambucil pode ser empregado para o tratamento de doenças imunomediadas nesta espécie

(SOUZA; AMORIM, 2008).

3.2.20 Estreptomicina e diidroestreptomicina

Estes fármacos são aminoglicosídeos que podem induzir neurotoxicidade nos gatos.

Os sinais clínicos observados de intoxicação incluem ataxia, andar cambaleante, alteração na

postura e perda de audição. Em doses muito elevadas causa completo bloqueio

neuromuscular e paralisia respiratória. Nos felinos, deve-se ter o cuidado especial na

administração de fármacos contendo penicilina e estreptomicina associadas (SOUZA;

AMORIM, 2008).

Page 29: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

29

4 DISCUSSÃO

A medicina felina ganhou importante espaço na medicina veterinária de animais de

companhia, fato este já percebido e relatado por Souza e Amorim (2008). Isto se deve,

provavelmente, ao fato de que, com o crescimento das cidades e aumento das populações

viventes nelas, buscou-se, cada vez mais otimizar os espaços urbanos. Como os felídeos

ocupam menos espaço físico, comparados aos caninos de modo geral, e possuem hábitos

ímpares, como o de auto-limpeza, a preferência por esta espécie tem se tornado evidente.

Um dos grandes problemas observados na medicina felina diz respeito à terapêutica, uma

vez que a maioria dos medicamentos utilizados nesta espécie, não tem sequer, indicação

específica para a espécie, além do fato que a maioria dos felinos responde de maneira

diferente à alguns fármacos comparativamente aos cães, assim como descrito por Araújo et

al. (2000).

Dentre os medicamentos utilizados na farmacopéia felina podemos destacar diversos

cujas indicações, ações farmacológicas, e efeitos colaterais ainda são obscuros, como ácido

valpróico, paracetamol, azul de metileno, dentre outros, assim como citado por Souza e

Amorim (2008).

Um dos fármacos amplamente utilizados, em especial por proprietários que ainda

anão buscaram auxílio veterinário, é o paracetamol, Os gatos são especialmente sensíveis à

ação deste medicamento, pois esta espécie animal não realiza bem a conjugação pela

glicuroniltransferase, enzima hepática necessária para correta eliminação deste

antinflamatório, assim como relatado por Spinosa et al.(2006). Na maioria dos casos,

quando os animais chegam até o médico veterinário, os sinais clínicos, como mucosas de

coloração azulada, salivação e vômitos, já estão evidentes, e o veterinário tem pouco a fazer

nestas situações.

Em relação ao ácido acetil salicílico existem diversas situações onde sua indicação é

importante, por sua ação de anti agregante plaquetária, como naqueles pacientes com

cardiomiopatia hipertrófica, porém, grande parte dos veterinários tem receio de usar tal

fármaco, necessitando de maior conhecimento por parte destes acerca de suas indicações e

seus efeitos colaterais.

Problemas dermatológicos são comuns em felinos, como dermatoses parasitárias,

hormonais e de origem bacteriana, dentre outras. Um dos fármacos utilizados na

dermatologia veterinário é o benzoato de benzila, cujos efeitos colaterais podem levar os

Page 30: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

30

pacientes inclusive à óbito, assim como descrito por Araújo et al. (2000). Portanto, seria

extremamente interessante que avisos ou tarjas fossem colocados nos produtos que possuem

em sua composição tal fármaco, evitando que o uso inadequado seja realizado na espécie

felina.

Dentre os agentes antimicrobianos, estreptomicina e diidroestreptomicina são

destaque, pois devido seu amplo espectro de ação, são usualmente prescritos, em especial

quando a doença de base tem fundo bacteriano, assim como descrito por Souza e Amorim

(2008). Porém, devido seus efeitos colaterais, em especial relacionados ao sistema nervoso,

devem ser evitados na espécie felina.

Estudos farmacológicos mais profundos devem ser realizados nos felídeos de modo

geral, para que se possa, a partir daí, utilizar um maior número possível de medicamentos

para a espécie felina, cujos efeitos colaterais sejam diminutos ou mesmo inexistentes.

Page 31: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

31

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Muito se estuda, mas pouco se sabe a respeito da farmacopéia de felídeos

domésticos, e com esta pesquisa buscou-se, de forma ampla e abrangente, na medida do

possível, buscar informações a respeito dos fármacos rotineiramente utilizados na medicina

interna de animais de companhia, enfatizando as diferenças presentes quando da prescrição

dos mesmos à espécie felina.

Vale ressaltar ainda que, com o avançar da medicina felina, muitos fármacos que

antes não eram utilizados na terapêutica desta espécie, hoje são de uso comum, entretanto há

necessidade de se conhecer profundamente os benefícios e idiossincrasias que os mesmos

podem provocar nos felinos domésticos.

Pesquisas adicionais são necessárias para que, num futuro próximo, se possa

verdadeiramente conhecer a fisiologia e metabolismo da espécie felina e com isso, a

terapêutica será muito mais segura e eficaz, tanto para o paciente quanto para o veterinário

que a prescreveu.

Page 32: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

32

REFERÊNCIAS

ANDRADE, S. F. Manual de terapêutica veterinária. 3 ed. São Paulo: Roca, 2008. 912 p.

ANFAL PET. Mercado aponta problemas. 2007. Disponível em:

<http://www.feedfood.com.br/noticias_diarias. php?busca=425>. Acesso em: 16 de março de

2009.

ARAÚJO, I. C., POMPERMAYER, L. G., PINTO, A. S.Metabolismo de drogas e

terapêutica no gato: revisão. Clínica Veterinária, Ano V, n. 27, jul/ago, 2000. p 46 -53.

BECO DOS GATOS. Gato com edema de face por intoxicação por ácido acetilsalicílico.

Disponível em: <http://www.becodosgatos.com.br/medica.htm>. Acesso em: 25 de fevereiro

de 2009.

BOOTH, N.H., Farmacologia e Terapêutica Veterinária. 6.ed. Rio de Janeiro, 1992. 997 p.

BURROWS, C.F. Gastrointestinal Disorders. In: Clinical Medicine of the Dogs and Cats.

Univ. of Florida: Blackwell Publishing Professional, 2002. p. 251-269.

CHANDLER, A. E., HILBERY, A. D. R., GASKELL, C. J. Medicina e terapêutica de

felinos. 2 ed. São Paulo: Manole, 1998. 449 p.

______. Vets Alliance Pty Ltd. No pain relief for our pets – A Panadol Warning. 2007.

Disponível em: <http://www.fitzroyvet.com.au/files/images/Max-cat-panadol%20poisoning-

blue%20swollen%20gum.img_assist_custom.jpg> . Acesso em: 16 de março de 2009.

______. Vets Alliance Pty Ltd. No pain relief for our pets – A Panadol Warning. 2007.

Disponível em: <http://www.fitzroyvet.com.au/files/images/charlie-cat-

panadol%20poisoning-recovered.img_assist_custom.jpg>. Acesso em: 16 de março de 2009.

HANSEN, D.T.K. Prevalência de intoxicações de cães e gatos em Curitiba. Universidade

federal do Paraná. Dissertação de mestrado, 2006.

HEJTMANCIK, M. R et al. Hematological Effects in F344 Rats and B6C3F1 Mice during

13 – week Gavage Toxicity Study of Methylene Blue Trihydrate. Division of Toxicology

Research and Testing Program,National Institute of Environmental Health Sciences, Research

Triangle Park. North Carolina, 2001.

Page 33: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

33

LOBÃO, A. O. Animais de Companhia - A domesticação do gato doméstico. Jornal de

Piracicaba, Piracicaba – São Paulo, pg 16, junho de 1992. Disponível em:

<http://www.cesaho.com.br/ biblioteca_virtual/ livro.aspx?l=21> Acesso em: 16 de março de

2009.

LUENGO, M.; GUTIÉRREZ-ARAGON, J. Tratamiento de urgencia de las intoxicaciones

en perros y gatos. (parte 2). Colegio de Veterinarios de La Provincia de Buenos Aires. 2008.

Disponível em: <http://www.cvpba.org/ articulos/assets/pdf/pdf_pequenos/

tratamiento_urg_intox_frecuentes_part2.pdf. >. Acesso em: 16 de março de 2009.

MANNING, A. M. Acetaminophen Toxicity in Dogs, 2007. Disponível em:

<http://www.petplace.com/dogs/acetaminophen-toxicity-in-dogs/page1.aspx.> . Acesso em:

13-01-2009.

MANUAL MERCK DE VETERINÁRIA. 8 Ed. São Paulo: Roca, 2001. p 1520 – 1521.

NORSWORTHY, G. D. Feline Practice. Lippincott - Philadelphia, 688p, 1993.

NORSWORTHY, G.D et al. O Paciente felino: Tópicos essenciais de diagnóstico e

tratamento. 2 ed. São Paulo: Editora Manole, 2004.

SOUZA, H.J.M, AMORIM, F.V. Terapêutica felina: Cuidados com o Uso de fármacos em

gatos. In: ANDRADE, S. F. Manual de Terapêutica veterinária. 2. Ed. São Paulo: Roca,

2008. 912 p.

SPINOSA, H.S; GÓRNIAK, S.L; BERNARDI, M. M. Farmacologia aplicada à medicina

veterinária. 4 ed. Rio de janeiro: Guanabara Koogan, 2006. 897 p.

TILLEY, L.P; SHIRES, P.K.; SMITH JR, F.W.K. Manual de Consulta Veterinária em 5

Minutos: Espécies Canina e Felina. Editora Manole. 272p, 2008.

VILLAR, D.; BUCK, W. B.; GONZALEZ, J. M. Ibuprofen, aspirin and acetaminophen

toxicosis and treatment in dogs and cats. Vet Hum Toxicol 40 (3): 156–62. 1998.

XAVIER, F.G.; KOGIKA , M. M.; DE S. Common causes of poisoning in dogs and cats in

a Brazilian veterinary teaching hospital from 1998 to 2000. Vet Hum Toxicol.

Apr;44(2):115-6, 2002. Disponível em:< http://www.ncbi.nlm.nih.gov/sites/entrez>. Acesso

em: 16 de março de 2009.

Page 34: FARMACOPÉIA DE FELINOS DOMÉSTICOS

34

WILLS, J; WOLF, A. Manual de medicina felina. Editorial Acribia SA. 1993. 466p.

ZORAN, D.L.; BOECKH, A; BOOTHE, D.M. Hyperactivity and alopecia associated with

ingestion of valproic acid in a cat. Department of Small Animal Medicine. J Am Vet Med

Assoc. 2001 May 15;218(10):1587-9, 1580. College of Veterinary Medicine, Texas A&M

University. USA, 2001.