Fasciculo 1 - Equidade Em Saude

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    1EQUIDADE EM SADE

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    Esdras Daniel dos Santos Pereira, Jos Ivo Pedrosa e Vera Dantas

    UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE - ensino a distncia

    Curso de formao e mobilizao para o reconhecimento e o

    enfrentamento das iniquidades (injustias e desigualdade de

    tratamento) em sade das populaes negra, quilombola, LGBT,

    campo e floresta, das guas, em situao de rua

    e populaes nmades.

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    Fascculo 1Equidade

    em sadeEsdras Daniel dos Santos PereiraJos Ivo Pedrosa

    Vera Dantas

    Objetivos

    5 Reconhecer e dialogar sobre a equidade em sade enquan-to princpio doutrinrio do sistema nico de sade.

    5 Promover ampliao do olhar sobre o territrio em sade esuas implicaes para a efetivao da ateno bsica sade.

    5 Compreender a determinao social em sade enquantoconceito terico e prtico do trabalho em sade.

    5 Fortalecer o trabalho dos prossionais de sade, especial-mente o Agente Comunitrio de Sade enquanto integrante daequipe de sade atuante na Ateno Bsica Sade.

    5 Problematizar as iniquidades em sade no estado do Cear.

    5 Aprimorar a capacidade de reexo e mobilizao dos tra-balhadores de sade, especialmente do Agente Comunitriode Sade, junto comunidade para o reconhecimento e en-frentamento das iniquidades em sade.

    Apresentao

    Neste fascculo, iremos discutir um princpio do SUS, muito pre-sente em nosso dia a dia, que por uma srie de razes a genteno percebe, que a equidade em sade. Vamos juntos enten-

    der o que mesmo este princpio quase invisvel, que signicadotem para as pessoas que vivem nos territrios, para ns prossio-nais de sade e para cada um em seu dia a dia e em seu processo detrabalho. Alm disso, vamos reetir porque a equidade em sade,mesmo estando to perto, parece distante de nossas vidas.

    E, para discutir uma coisa que est perto da gente, mas queno conseguimos ver, o primeiro passo descobrir pistas que tor-nem visvel o que antes estava escondido na correria da vida. No pri-

    EXPEDIENTE

    FUNDAO DEMCRITO ROCHAPresidnciaJoo Dummar Neto

    Direo GeralMarcos Tardin

    UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTECoordenaoAdministrativo-PedaggicaAna Paula Costa Salmin

    Curso Promoo da Equidade no SUS

    Concepo e Coordenao GeralCliff Villar

    Coordenao de ContedoNeusa Goya

    Coordenao de Edio

    Raymundo Netto

    Gerente de ProduoSrgio Falco

    Editora de DesignAndrea Araujo

    Editorao Eletrnicacaro Guerra

    IlustraesCarlus Campos

    InfogrficosCarlos Weiber

    Catalogao na FonteKelly Pereira

    Este fascculo parte integrante do curso Promooda Equidade no SUS, da Fundao Demcrito Rocha(FDR)/Universidade Aberta do Nordeste (Uane),em decorrncia da Carta-Acordo celebrado entre aOrganizao Pan-Americana de Sade (OPAS) e aFundao Demcrito Rocha (FDR), sob o cdigo BR/LOA/1300068.001.

    Fundao Demcrito RochaAv. Aguanambi, 282/A - Joaquim TvoraCep 60.055-402 - Fortaleza-CearTel.: (85) 3255.6037 - 3255.6148Fax: (85) [email protected]@fdr.com.br

    Curso promoo da equidade no SUS /coordenao, Neusa Goya; ilustrao, CarlusCampos. Fortaleza: Fundao DemcritoRocha /Universidade Aberta do Nordeste, 2014.288p. il. color; (Curso em 12 Fascculos)

    ISBN 978-85-7529-613-4

    1. Sade Pblica - SUS 2. Ensino a Distncia 3.Campos, Carlus I. Ttulo

    C939

    CDU 614

    2FUNDAO DEMCRITOROCHA - UNIVERSIDADEABERTA DO NORDESTE

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    meiro momento, nossa tarefa olhar com mais ateno para o que acontece no cotidianodo trabalho do agente, que percorre o territrio onde circulam pessoas que se relacionamentre si e com as coisas, criando estratgias para enfrentar os problemas que aparecem,e na Unidade de sade, onde acontece o encontro entre os usurios e o sistema de sadecom seus prossionais, normas, regras e limitaes.

    O segundo momento aquele em que iremos juntar, colar, pintar, misturar e discutir aspistas que foram encontradas. Tentaremos entender, compartilhando nossas ideias e pen-samentos, o que determina as situaes, nas quais a equidade encontra-se ausente, ou seja,

    a iniquidade; discutir qual o papel do setor sade nessa determinao e o que ns, cidadose trabalhadores de sade podemos fazer diante da Iniquidade e produzir, com nossas aes,a equidade na sade.

    No terceiro momento, vamos mergulhar no nosso cotidiano, no lugar e nas relaes detrabalho e construir nesse universo, de forma coletiva, aes que sejam estratgicas paraenfrentar as iniquidades.

    Para tanto, necessrio identicar os coletivos sociais, as potncias e as fragilidadesexistentes nos territrios; os sentidos, afetos e vontades dos sujeitos que neles vivem; aspossibilidades de superar situaes que limitam a plenitude da vida e o cumprimento do di-reito sade para construir, por meio do dilogo crtico, criativo e amoroso, aes nas quaisas pessoas se tornem protagonistas na construo de uma vida cidad.

    Neste percurso, vamos trabalhar de vrias maneiras para desenvolver habilidadesde perceber movimentos antes no percebidos, agregar pessoas e organizaes da so-ciedade para produzir espaos de dilogo e animar o processo de construo coletivadas intervenes de enfrentamento das iniquidades de forma a contribuir, efetivamen-te, com a produo de equidade.

    Dessa forma, apresentaremos cenas e situaes do cotidiano que acontecem nas re-laes das pessoas com os servios e com os trabalhadores de sade. Utilizando ques-tes problematizadoras, buscaremos entender o que determina as situaes apresen-tadas, por que e como acontecem, afastando-nos da ideia de que as coisas acontecemporque so assim mesmo.

    Nesse movimento de reexo, compreenderemos o papel das instituies, organizaese dos sujeitos sociais nesta determinao e nestas possibilidades de superao.

    Utilizaremos textos que fundamentam a reexo, aliados a exerccios, a partir dos quais,esperamos contribuir para que os que seguem conosco nesse curso, possam ampliar cada vezmais sua capacidade de entender qual o seu lugar no mundo, motivando a vontade de agir.

    Nestes exerccios, os participantes do curso constroem suas prprias cenas trazidas desua realidade e com base nas leituras e discusses analisam a situao para identicar osdeterminantes e as possibilidades de superao.

    A ideia que possamos, partindo de causos, como popularmente chamamos, histriasque partem de situaes cotidianas que expressam iniquidades, reetirsobre como e porque elas acontecem. Ao mesmo tempo, vamos localizaressas situaes em territrios distintos, porque os territrios so vivos,uma vez que neles existem as pessoas com suas histrias e sua cultura.

    Portanto, uma mesma situao pode ter signicados e consequnciasbem diferentes se acontece em uma regio da periferia de uma cidadegrande; como Fortaleza, em uma comunidade rural ou em uma comuni-dade indgena, por exemplo. Dessa maneira, olhando para as situaes eseus contextos, ser possvel pensarmos formas de transform-las com aspotencialidades locais.

    3CURSO PROMOO

    DA EQUIDADE NO SUS

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    Momento 1:Entendendo a equidade para identificara iniquidade em sade nos territrios

    Qual a sua cor?Preto, vermelho ou amarelo?

    Importa no, vale mais tua vontadede vir comigo, aprender a ser feliz

    na inquietude que nos traz um grande amor (Ray Lima)

    Vamos iniciar a discusso lembrando dois instrumentos legais muito importantes paratodos ns. O primeiro o Artigo 196 da Constituio Brasileirade 1988 e o segundo oArtigo 2 da Lei Orgnica da Sade:

    Art. 196. A sade direito de todos e dever do Estado, garantido mediante polticassociais e econmicas que visem reduo do risco de doena e de outros agravose ao acesso universal e igualitrio s aes e servios para sua promoo, proteoe recuperao (BRASIL, 1988).

    Art. 2 A sade um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover ascondies indispensveis ao seu pleno exerccio (BRASIL, 1988).

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    Para fazer valer o que est escrito na Lei, o Sistema nico de Sade (SUS) utili-za uma variedade de nomenclaturas e divises territoriais para operacionalizar suasaes, quais sejam: o municpio, o distrito sanitrio, a micro rea, a rea de abrangnciade unidades de sade, dentre outros.

    So reas de atuao de carter administrativo, gerencial, econmico ou poltico,que se estruturam no espao e criam territrios prprios dotados de poder. Muitasvezes, essa organizao desconsidera a dinmica de vida, os aspectos culturais, as re-

    laes de excluso e estigma, as condies e relaes de trabalho dos prossionais dasade, dentre outros aspectos.

    Entretanto, so essas relaes e dinmicas que fazem do Territrio em Sade um espaocomplexo, onde as diferenas culturais e sociais se expressam em acesso ou no ao direito sade e na efetividade ou no das aes desenvolvidas.

    Em algumas localidades, como as grandes cidades, os problemas de sade que se apre-sentam com maior frequncia so as doenas cardiovasculares, neoplasias, violncia, aci-dentes de trnsito etc. A ateno bsica se restringe ao fazer tcnico em sade, desconec-tada dos outros nveis de ateno e desarticulada de outras polticas sociais, no contemplaessa complexidade de problemas e consequentemente, no remete a resultados positivosna qualidade de vida das pessoas (VIANNA e FAUSTO, 2005, p. 160).

    Se pensarmos, por um lado, a complexidade presente no contexto dos grandes centrosurbanos, nos quais as questes e os aspectos clnicos das situaes de adoecimento soatravessados por uma srie de fatores culturais, sociais, econmicos, entre outros. Tem-se anecessidade das equipes da Estratgia Sade da Famlia recongurarem suas prticas e seuprocesso de trabalho, de forma a considerar esses aspectos. Por outro lado, fundamentalque os gestores construam estratgias de ampliao do acesso das populaes, especial-mente nas grandes cidades, onde se localizam no Brasil os menores ndices de coberturadessa estratgia de ateno.

    Tomando como exemplo a violncia nos grandes centros urbanos, dados do Mapada Violncia de 2013 revelam ndices alarmantes de mortalidade de nossa juventude,seja por homicdios, acidentes de trnsito, ou suicdio. De acordo com esse estudo, or-ganizado pelo Centro Brasileiro de Estudos Latino-americanos (CEBELA), Fortaleza foi

    a capital com a 6 maior taxa de assassinatos de pessoas entre 15 e 24 anos em 2011.Revela ainda a concentrao dessa e de outras formas de violncia juvenil envolvendoespecialmente jovens negros e provenientes das regies que costumamos chamar peri-fricas (WAISELFISZ, 2013).

    Considerando esses dados, vericamos a necessidade da incluso de aes voltadas paraesses atores juvenis no contexto das unidades de ateno bsica sade.

    Ao mesmo tempo, fundamental promover processos nos quais os prossionais possamreetir sobre o que gera e determina essas situaes de violncia, muito frequentes no coti-diano daqueles que atuam na periferia dos grandes centros. Muitas vezes, a prpria unidadede sade alvo dessas situaes.

    Assim, fundamental que as equipes de sade estabeleam dilogo com outras polticas

    e organizaes populares do territrio, construindo aes de superao que contribuampara que esses jovens, que muitas vezes se envolvem na produo de atos de violncia,percebam as possibilidades de ressignicar o seu papel social na comunidade.

    Nos municpios e localidades prximas aos grandes centros urbanos, a antiga dinmi-ca comunitria de convvio e afeto deu lugar lgica de comunidades dormitrio. Issodecorre da congurao desses locais ser feita em dependncia da distncia entre os aglo-merados residenciais e os postos de trabalho, gerando desde problemas gerenciais entremunicpios de fronteiras at o sentido de no pertencimento da comunidade.

    Ao mesmo tempo, a diversidade dos territrios vo revelar outras singularidades, con-siderando sua situao geogrca e seus aspectos culturais. Por vezes, pertinho de umgrande centro como Fortaleza, Sobral, Crato ou Juazeiro do Norte, temos aldeias indgenas,comunidades quilombolas, cujas singularidades no jeito de conceber a vida e a sade, de-

    Mapa da Violncia:elaborado por meio de

    estudos produzidos peloCentro Brasileiro deEstudos Latino-americanos(CEBELA). Disponvel em:http://www.mapadaviolencia.org.br/pdf2013/mapa2013_homicidios_juventude.pdf

    5CURSO PROMOO

    DA EQUIDADE NO SUS

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    mandam prticas prossionais que acolham seus saberes e suas vises de mundo.Dessa forma, fundamental que os trabalhadores de sade, principalmente as equipes

    de sade da famlia, compreendam as diversidades existentes no territrio, ultrapassandobarreiras culturais e modos de viver diferenciados, quando da promoo do cuidado emsade. Para que isso possa se efetivar, necessrio considerar aspectos como a prpria for-mao dos prossionais de sade ainda centrada em procedimentos clnicos, o que muitasvezes, diculta uma compreenso mais ampliada da realidade local.

    Outros territrios desvelam a situao de comunidades rurais, assentamentos, onde as

    pessoas tm a vida dicultada pelas distncias, escassez de recursos de comunicao e detransporte, pouco acesso aes e servios de sade, alm de grandes problemas como afalta da posse da terra e a diculdade de acessar os benefcios para sua produo.

    Alm dessas situaes, temos territrios que se apresentam como verdadeiros canteirospara a instalao de obras e postos de servios, nos quais a dinmica do comrcio e servioslocais, os conitos inerentes violncia e ao abuso de drogas, a inexistncia de aparelhossociais de segurana pblica, educao e lazer, ditam os riscos e interferem diretamente nasdoenas e agravos que adentram diariamente Unidade Bsica de Sade.

    Assim, questes ligadas diversidade de indivduos em cor, religiosidade, orientaosexual e identidade de gnero, alm de aspectos geracionais (relao entre crianas, jovens,adultos e idosos), determinam a realidade de sade e doena nas comunidades.

    No podemos esquecer que o cotidiano das populaes rurais, ribeirinhas, de pesca-dores, das populaes nmades como os ciganos, circenses e trabalhadores porturios,urbanos e rurais, das comunidades indgenas e de tantas outras formas de organizaocomunitria, atravessado por relaes sociais de explorao, preconceito, segregaosocial e, obviamente, de iniquidade no acesso sade. Esse contexto se reete direta-mente no processo e expresso das lutas e da mobilizao por parte dos movimentospopulares em todo Brasil.

    No Cear, essas populaes tm se organizado em movimentos, grupos e redes na pers-pectiva de lutar pelo acesso aos direitos de cidadania. Assim, no cenrio estadual podemosver a populao do campo, as populaes indgenas, LGBT (Lsbicas, Gays, Bissexuais, Tra-vestis e Transexuais); populao negra e quilombola, pessoas vivendo em situao de rua eartistas circenses, iniciando dilogos sobre as polticas de sade atravs de comits, proje -

    tos, redes, entre outras estratgias.

    Em sntese: A equidade nasce da ampliao do conceito de sade e da luta pelo direito sade por parte dos movimentos sociais. Sua reivindicao a oposio condio deiniquidade. A noo de equidade tem como fundamento a defesa da situao de justia aser instaurada mediante a denncia de desigualdades concretas. Outras formas de excluso,que no apenas as da lgica perversa do capital decorrem em condies precrias em rela-o sade. O estigma de grupos sociais um fator de risco na inviabilizao do acesso degrupos aos bens e benefcios estatais.

    Com base no texto acima, apresentamos a situao 1, que caracteriza bem alguns aspec-

    tos dessa realidade to conhecida por ns.

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    SITUAO 1 -NA COMUNIDADE BURACO DA ONA

    Em uma capital de um estado brasileiro, nordestino, existe a Comunidade Bu-raco da Ona, que representa uma micro rea da Equipe de Sade da Famliaque atua no territrio. Resultado de uma invaso de terras da Unio feita h

    2 anos, o lugar rene 5.000 famlias onde predominam crianas e mulheres,sendo que 25% destas so chefes de famlia. As ruas no so demarcadas, em-bora j tenham nomes, a numerao das casas irregular o que diculta sualocalizao. No tem pavimentao, coleta regular de lixo e esgoto. Os detritosso jogados em uma pequena lagoa que nos perodos de chuva transborda ecausa alguns alagamentos. A comunidade tem acesso gua, porm somenteexiste um ponto de distribuio em cada casa. Existe energia eltrica, mas ailuminao pblica deciente. Tem uma associao de moradores que lutapelos interesses da comunidade, que ca distante 10 km do posto de sade.Somente tem uma linha de nibus.Agora, reflita sobre a situao e faa a voc mesmo e a seu grupo as se-guintes perguntas:

    1.Como o Direito a Sade se expressa na comunidade Buraco da Ona?

    2.Em que momentos e espaos da vida das pessoas desta comunidade, o di-reito sade e o dever do Estado so desrespeitados?

    3. O que voc acha que deveria acontecer na comunidade porque direito docidado e direito sade?

    4. Que aspectos, dos que acontecem no Buraco da Ona, tm a ver com a rea-lidade do seu territrio?

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    DA EQUIDADE NO SUS

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    SAIBA MAIS...

    Na histria mundial, a Sade passa a ser encarada com direito, quando ADeclarao Universal dos Direitos Humanos (DUDH) foi aprovada em 1948,na Assembleia Geral da Organizao das Naes Unidas (ONU). Isso se deuaps todas as atrocidades, mortes e destruies sentidas aps a 2 Guerra

    Mundial. O documento a base da luta universal contra a opresso e a discri-minao, defende a igualdade e a dignidade das pessoas e reconhece que osdireitos humanos e as liberdades fundamentais devem ser aplicados a cadacidado do planeta.

    Os direitos humanos so os direitos essenciais a todos as pessoas, sem quehaja discriminao por raa, cor, gnero, idioma, nacionalidade ou por qualqueroutro motivo (como o direito ao trabalho e educao) e coletivos, como o direitoao desenvolvimento. A garantia dos direitos humanos universais feita por lei, naforma de tratados e de leis internacionais, por exemplo.

    No Brasil, passamos um bom perodo ignorando essa histria de direito sade, s quem possua vinculo empregatcio tinha acesso aos servios de

    sade, o restante tinha que contar com as Santas Casas e outras instituiesde caridade. Fora isso, a Ditadura Militar (1964 - 1985) significou o fim dedireitos de livre expresso, de violncia do Estado contra a populao.

    Aps o amplo movimento brasileiro pela redemocratizao, a 8 Confe-rncia Nacional de Sade, em 1986, estabeleceu a luta pela sade como di-reito universal de cidadania e dever do Estado. A participao dos movimen-tos sociais neste processo permitiu que a Constituio Federal reconhecesseas demandas especficas em sade da populao brasileira.

    Seguindo essa tendncia, a Assembleia Nacional Constituinte introduziuo Sistema de Seguridade Social na Constituio Federal de 1988, no qualincluiu a sade, passando a defini-la como direito universal, independen-temente de cor, raa, religio, local de moradia e orientao sexual, a serprovido pelo Sistema nico de Sade (SUS).

    A Constituio Federal conceituou a Seguridade Social como um valorsocial, configurada como um sistema que compreende um conjunto inte-grado de aes de iniciativa dos Poderes Pblicos e da sociedade, destina-das a assegurar os direitos relativos sade, previdncia e assistnciasocial (art. 194).

    Neste contexto, o SUS surge como estratgia descentralizada para aateno e o cuidado sade, tendo por base os princpios/diretrizes deuniversalidade, igualdade, integralidade e participao da sociedade, in-dicando que esta deve atuar na formulao e no controle das polticas p-blicas de sade de promoo, preveno e recuperao da sade de todos

    em nosso pas.

    Da discusso acima importante apreender duas coisas. A primeira que a igualdade dedireitos fundamental para que todos os cidados se sintam legitimados para lutar e gozar dosdireitos de cidadania assegurados na Constituio, dos quais fazem parte: a seguridade social(sade, previdncia, assistncia social), educao, segurana, transporte, moradia e outros direi-tos que a sociedade brasileira denir como tal.

    A segunda o entendimento de que a igualdade inclui a universalidade, que por suavez, inclui as regras e os valores de como o direito distribudo e as formas como odireito organizado.

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    No texto anterior, vimos que o surgimento da noo de direitos sociais e humanosna sociedade ocorre numa situao de opresso, de extrema desigualdade e exploraodos homens e mulheres excludos desses direitos, ou seja, a noo de direito baseadana noo de necessidades humanas.

    As formas e regras de distribuio dos direitos sociais objetivam atender as neces-sidades das pessoas, que numa sociedade to diversa e desigual, como a nossa, geranecessidades diferentes.

    Para entender melhor, vamos ver a situao 2.

    SITUAO 2:OBSERVAES DE UM PESQUISADORNORDESTINO AO ANALISAR AS DETERMINAESDA SADE E DA DOENA

    Nas cidades, o equipamento social mais prximo o telefone pblico e omais distante o posto policial; a unidade de sade e a escola situam-se em

    torno de 1.000 metros distante dos domiclios que integraram a amostra da pes-quisa. Nas reas rurais, o equipamento mais prximo o posto telefnico, sendoa escola e a unidade de sade os nicos elementos que evidenciam a presenado Estado nessas reas.

    A zona urbana dos municpios apresenta mais de 70% dos domiclios pesqui-sados abastecidos pelo sistema pblico de gua, enquanto a zona rural apresenta3,67% de domiclios com acesso a gua potvel. Para enfrentar esta situao, a uti-lizao de poos a alternativa para mais de 70% da populao, como tambm autilizao de cacimbas, cisternas e carros-pipa.

    Na zona urbana da amostra pesquisada, nos dois municpios, o percentual dedomiclios com acesso ao sistema de coleta de lixo semelhante, em torno de 80%

    enquanto na zona rural praticamente inexiste. Nesta situao, 72,0% dos domicliosjogam-no a cu aberto. O percentual de domiclios ligados ao sistema pblico deesgoto apresenta similitudes em relao decincia tanto na zona urbana quantona zona rural. Em um dos municpios somente 10,34% da populao tem acesso, e,no outro, esse percentual de 0,94%.

    A alternativa utilizada para a populao urbana o uso de fossas spticas e des-tinao a cu aberto na rea rural. Assim como a coleta de lixo, a pavimentao darua onde se localiza o domiclio no faz sentido para a zona rural. Entretanto, chamaateno o percentual de somente 43,26% dos domiclios da zona urbana encontra-rem-se localizados em ruas pavimentadas (PEDROSA, 2012).

    PARA REFLETIRTodos so cidados, embora algumas pessoas morem na zona rural e outras na cidade.

    Por que, h o tratamento diferente s necessidades bsicas consideradas direito de todoscomo acesso a gua, coleta de lixo, etc?

    Continuando com a reflexo ...Na situao relatada, a primeira coisa que a gente levado a pensar que se todos pa-

    gam impostos (seja na cidade, no campo, ou na oresta) a distribuio dos benefcios daspolticas pblicas (que so nanciadas pelos impostos) parece no ser justa, pois mostra

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    DA EQUIDADE NO SUS

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    que existe desigualdade entre os cidados urbanos e os rurais.Lembrando que todos ns sabemos que o que considerado justo para uns pode ser

    considerado injusto para outros, ou seja depende de muita coisa inclusive do ponto de vis-ta dos envolvidos. Assim, tambm no campo poltico, quando se trata do que se chamade justia social, depende do que a sociedade dene como justo, que por sua vez dependedas relaes entre Governo e Sociedade.

    A equidade ento pode ser entendida como o princpio que busca enfrentar a desigualdaderesultante das regras de distribuio dos benefcios das polticas pblicas.

    PARA REFLETIRA igualdade de direitos coloca todos os cidados no mesmo nvel,mas a distribuio dos direitos se faz de forma desigual denindovrios nveis de cidadania. A equidade o enfrentamento das desi-gualdades atribuindo direitos aqueles que por serem diferentes sotratados como desiguais.

    A temtica da incluso e mobilizao social e o fortalecimento dos movimentossociais trazem como agenda poltica, nas democracias modernas, aes tanto deinstituies governamentais como da sociedade civil, no sentido da formulao par-ticipativa de aes/polticas afirmativas . Principalmente nos pases latino-america-nos, onde as desigualdades, evidentes nos indicadores que demonstram diferentespadres de acesso a bens como educao, moradia e sade, se fazem presentes nocotidiano das pessoas que so excludas dos processos gerados pela globalizao.

    Se por um lado, o processo de globalizao contribui para a produo de iniquidadessociais, por outro, no dia a dia no territrio, no mbito local que as pessoas vivenciamas situaes de excluso e de expropriao de seus direitos.

    MAS O QUE CHAMAMOS DE TERRITRIO?QUAL A SUA IMPORTNCIA PARA A SADE?

    O termo Territrio pode ser associado a pelo menos duas origens: a primeira signicaterra pertencente a, ou seja, terri(terra) e torium(pertence a), de origem latina; a se-gunda, associada primeira, terreo-territor(aterrorizar - aquele que aterroriza) designoua concepo poltica de quem aterroriza para dominar e de quem aterrorizado pelodomnio de uma determinada poro do espao.

    Tendo como base esse entendimento podemos vericar como o conceito de territriotem sido trabalhado na Geograa, e de como o mesmo est sendo incorporado na prticada Estratgia Sade da Famlia. Podemos apontar quatro vertentes utilizadas na Geogra-a: poltica, cultural, econmica e naturalista.

    O olhar poltico refere-se a um espao delimitado e controlado por relaes de poder, ge-ralmente o poder do Estado, que busca organizar o territrio com determinada nalidade.

    A partir do olhar cultural ou simblico-cultural, o territrio visto como produto daapropriao, da valorizao simblica de um grupo em relao ao espao vivido. Essegrupo valoriza o espao a partir de determinado signicado individual e social.

    Na vertente econmica, o territrio concebido enquanto dimenso espacial nas re-laes econmicas. Neste caso, o territrio passa a existir quando consiste em fonte derecursos e/ou incorporado no debate entre classes sociais e na relao capital-trabalho.

    Na perspectiva integradora, observa-se o territrio como revelador de parte ou detodas as dimenses sociais apresentadas anteriormente (poltica, cultural, econmica, na-turalista). Busca-se entender esse territrio como surgido de forma articulada, conectada,

    Aes afirmativasso me-didas especiais e temporrias,

    tomadas ou determinadas peloEstado, espontnea ou compul-soriamente, com o objetivo de

    eliminar desigualdades historica-mente acumuladas, garantindo

    a igualdade de oportunidades e

    tratamento, bem como de com-pensar perdas provocadas peladiscriminao e marginalizao,decorrentes de motivos raciais,

    tnicos, religiosos, de gneroe outros. Portanto, as aes

    afirmativas visam combater osefeitos acumulados em virtude

    das discriminaes ocorridas nopassado. Extrado de: http://

    pt.wikipedia.org/wiki/A%C3%A7%-C3%A3o_afirmativa

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    integrada com outros territrios. Na perspectiva relacional, considerado que as relaessociais histricas ocorrem no espao em um determinado tempo, sendo o territrio frutode uma relao complexa entre os processos sociais e o espao material.

    Os Sistemas de Sade tambm se organizam sobre uma base territorial, o que signicaque a distribuio dos servios de sade segue a uma lgica de delimitao de reas deabrangncia, que devem ser coerentes com os nveis de complexidade das aes de aten-o. As diretrizes estratgicas do SUS (Lei 8080) tm uma forte relao com a deniodo territrio (PEREIRA & BARCELLOS, 2006, p. 49 a 51).

    Reetindo sobre o texto acima, possvel pensar os Territrios da Sade da Famliacomo lugar, onde as pessoas expressam seus desejos, projetos polticos e se constituemcomo sujeitos sociais e atores polticos. LAbbate (1994) diz que:

    o indivduo para se constituir em sujeito deve caminhar em busca de sua autono-mia, sempre aberto ao novo e disposto a correr risco, com a percepo de seu papelpessoal/prossional/social diante dos desaos cotidianos, engajado e responsvelpelo que se passa ao seu redor (p. 8).

    Assim, estar aberto ao novo, por exemplo, aceitar uma denio de sade que sejamais ampla que a situao de no estar doente, de no portar incapacidades e deci-

    ncias e que se aproxime da concepo de qualidade de vida. Uma concepo de sadeque seja resultado da construo do projeto de vida com qualidade para cada um, suasfamlias e suas comunidades.

    Os territrios so espaos vivos, dinmicos, preenchidos por objetos e aes que serelacionam por meio dos movimentos dos sujeitos sociais, onde tambm existe divisode trabalho superpostas (a convivncia entre comrcio articulado ao mercado nanceiroe comrcio informal, pessoas que trabalham e pessoas desempregadas), tripla jornadade trabalho para as mulheres (trabalho assalariado, trabalho domstico e a produo devalores de troca) e trabalho informal e ocasional para os homens.

    Nos tempos atuais, o territrio se comunica e se articula com outros territriose o mundo e, por isso, tende a ser local de privatizao dos objetos e das aes,

    reproduzindo o domnio de um espao sobre outro no mesmo territrio, definindolocais luminosos (de produo e incluso), opacos (de excluso e de marginalizaoda produo, do consumo e das pessoas) para os quais so definidas regras ticase morais de aceitao ou rejeio.

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    DA EQUIDADE NO SUS

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    Momento 2A equidade em sade

    Desconai do mais trivial, na aparncia singelo,e examinai, sobretudo, o que parece habitual.

    Suplicamos expressamente:No aceiteis o que de hbito como coisa natural.

    Pois, em tempo de desordem sangrenta, de confuso organizada, de arbitrariedade consciente, de humanida-de desumanizada, nada deve parecer natural nada deve parecer impossvel de mudar (Bertold Brecht)

    O signicado de sade e doena vai mudando na histria da Humanidade conforme ocontexto, assim como muda tambm aquilo que a gente considera adequado e sucientepara atender as nossas necessidades.

    A sade e a doena j foram naturais na vida das pessoas, pois ns, os seres humanos,ramos considerados da Natureza pelos antigos gregos; na Idade Mdia a doena foi sin -nimo de pecado, de purgao e a sade sinnimo de morticao, pois as delcias seriamvivenciadas em outro plano; na Idade Moderna a doena passa ser compreendida em duasvertentes: diluda sob a responsabilidade da sociedade e localizada em vrios agentes nosmicroorganismos, nas clulas e atualmente, no genes e cromossomas.

    Para se ter uma ideia, no incio do sculo passado a maioria das pessoas adoecia e mor -ria por doenas infecciosas e carenciais como a desnutrio; atualmente as altas causas demorte encontram-se nos cnceres, nas causas externas (violncia) e doenas crnicas comoa hipertenso e obesidade.

    Segundo Neef (1998) as necessidades essenciais a todo ser humano como subsistncia,proteo, afeto, entendimento, cio, criao, participao, liberdade e identidade sempreestiveram presentes na humanidade, o que se modica no decorrer da histria so o modoe as coisas que satisfazem essas necessidades.

    Com isso, possvel entender que o modo como a sociedade entende e dene o que sade e doena est diretamente relacionado com o modo como esta mesma socie-

    dade se organiza para cuidar da sade de seus membros. Assim, quando se acreditavaque a doena era manifestao do pecado ou de foras sobrenaturais os doenteseram isolados em lugares nos quais buscavam uma boa morte e tratados por religio-sos; quando se descobriu o microscpio e foram detectados os micrbios como sendoa causa das doenas transmissveis da poca vieram a polcia mdica, a quarentena, oexpurgo e outras medidas de controle.

    Mas, apesar de todo o conhecimento sobre os micrbios, a descoberta de antibi -ticos e o avano tecnolgico, doenas como a tuberculose, a hansenase e a malriacontinuavam aparecendo ao lado de doenas novas nas quais nunca se tinha ouvidofalar como o cncer.

    O interessante que essa situao gerou perguntas sobre o porqu deste aparente

    paradoxo, ou seja, como ainda existiam doenas infecciosas e transmissveis quandose conhecia quase tudo sobre estes agentes, na era da antibioticoterapia e da tecno-logia de diagnstico?

    Para responder a essa pergunta, comeou-se a considerar que os casos de tuberculoseque aconteciam, tomando nosso exemplo, no se distribuam por toda a sociedade da mes-ma forma, mas pesavam bem mais para um grupo de pessoas que tinham certas caracte-rsticas sociais como: baixa renda, pssimas condies de moradia etc., fazendo com que osignicado de sade comeasse a ser ampliado e articulado com as condies sociais nasquais a vida produzida e reproduzida.

    Para tornar ainda mais complexa e polmica esta discusso, em pleno sculo XXIvivemos a era da globalizao, da informtica, da diminuio da noo do tempo e dadistncia entre as coisas de modo que temos, aqui no Brasil, epidemia de gripe asiti-

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    ca, ou mal da vaca louca que veio da Inglaterra. E mais, a tuberculose, a hansenase,a dengue continuam ameaadoras, especialmente em locais com condies sociais eeconmicas desfavorveis.

    Ao mesmo tempo, surgem novos problemas como o caso da violncia que se manifestade tantas formas e sentidos, alm do uso abusivo de drogas, a obesidade, a hipertenso eos transtornos mentais, os quais tm muito mais a ver com o modo como as pessoas vivemque com qualquer microorganismo estranho ou clula diferenciada.

    Com isso, dizemos que pases como o Brasil carregam em sua situao de sade o peso

    dado pela carga das doenas infecciosas e transmissveis que ainda incidem em grandeparte da populao, somado ao peso que a carga das doenas crnicas e agravos no trans-missveis traz e ainda mais a carga das doenas emergentes e re-emergentes. Carregamos,assim, o peso da tripla carga da doena.

    Mas, se de modo geral possvel dizer que este o quadro sanitrio de muitos pases,inclusive o Brasil, com um olhar mais atento e crtico possvel tambm perceber que estasituao no igual para todo mundo que brasileiro, ou para todos os habitantes de umamesma cidade. Existem diferenas internas que inuenciam diferentes modos de viver e,consequentemente diferentes formas sob as quais estes modos de viver inuenciam nasade e na doena das pessoas, dos grupos e das comunidades.

    Diante destas evidncias, a Organizao Mundial de Sade (OMS) reconheceu as estrei-tas relaes entre a sade e as condies sob as quais as sociedades humanas se organizame elaborou uma conceituao de sade como sendo resultante da determinao social. Co-nhecido como o paradigma da Determinao Social da Doena, que de forma esquemtica

    pode ser visto no diagrama a seguir.

    PARA REFLETIRConverse com as pessoas mais idosas que vivem em seu territrio, pergunte

    como eles se divertiam, como circulavam na cidade, qual era o tipo de trabalho,como viviam as pessoas, de que adoeciam e de que morriam. Pergunte o que signi-cava ter sade e o que faziam para viver bem.

    Junto com seu grupo faa uma espcie de inventrio de tudo que tem no terri-trio e que faz parte da vida das pessoas. Identique praas, escolas, pontos de en-contro, pontos de nibus, bares, unidades de sade, igrejas, cultos, terreiros, clubes,quadras de esporte, ou seja tudo que as pessoas fazem alm de comer e respirar.Converse com as pessoas sobre o que preciso fazer para ter sade, procure sabero que elas pensam disso tudo.

    Compare as situaes e veja o quanto tudo cou mais complexo, que coisas pas-saram a ser imprescindveis para satisfazer as necessidades do dia a dia e observeque algumas necessidades so mais necessrias para uns que para outros, que algu-mas pessoas podem ter necessidades diferentes etc.

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    Olhando este desenho possvel compreender sade como o resultado de todos es-tes elementos, compreendendo desde os fatores estritamente individuais como sexo, aherana hereditria at questes como condies de habitao, desemprego, produode alimentos e questes ainda mais gerais como as condies sociais, econmicas eambientais existentes.

    PARA REFLETIR

    Leia e reflita sobre o conceito de sade que est escrito na nossaConstituio Federal.

    Certamente, essa concepo de sade, que no se limita ausncia de doena, represen-ta um grande avano e, com isso, as aes de preveno, e principalmente de promoo dasade, so desenvolvidas nos servios, so temas para estudos nas Universidades, objetivosempre presente nas aes de Educao em Sade. Inclusive, temos no Brasil uma PolticaNacional de Promoo da Sade.

    Mas, ao mesmo tempo, para ns prossionais de sade, especialmente os que trabalhammais diretamente com os problemas que envolvem os determinantes, em algumas vezes,

    camos meio atnitos sem saber o que fazer diante de tantos problemas, que parecem seacumular sobre as pessoas, como no caso da Comunidade Buraco da Ona.

    Diante disso preciso refletir e perguntar a si mesmo: onde eu me coloco nesse quadro? O que

    posso fazer para enfrentar estes determinantes?

    E ento, possvel pensar que viver com sade ter condies para enfrentar os deter-minantes sociais da sade em seus vrios nveis de determinao. Podemos imaginar umtipo de classicao para estes determinantes, tomando como referncia o que cada umpode fazer para ter sade e observar que:

    a)Existem os determinantes mais distantes de ns, que tem a ver como nosso pas se

    Para saber mais

    acessewww.sade.gov.br eleia a poltica nacio-

    nal de promoo dasade lanada em

    2006.

    Determinantes da Sade (Dahlgren e Whitehead, 2000)

    Determinantes sociais de sade (DSS)

    CONDIES DE VIDAE DE TRABALHO

    AMBIENTEDE TRABALHO

    EDUCAO

    PRODUOAGRCOLA E

    DE ALIMENTOS

    DESEMPREGO

    GUA

    E ESGOTO

    SERVIOS

    SOCIAISDE SADE

    HABITAO

    IDADE, SEXOE FATORES

    HEREDITRIOS

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    situa na relao com outros pases, com a economia mundial, com a estraticao socialentre pobres e ricos e so chamados de determinantes distais ou estruturais, pois so osque geram estraticao social e divises de classe e denem a posio socioeconmicaindividual dentro das hierarquias de poder, prestgio e acesso recursos. Estes deter-minantes se reproduzem nas instituies e mecanismos do contexto socioeconmicoe poltico, gerando efeitos que vo diferenciando as pessoas como renda, educao,ocupao, classe social, gnero e raa/etnia. Para enfrentar estes determinantes, temosque pensar em ns, como cidados do Mundo, lutando pela paz, pela igualdade entrepovos, pelo m da explorao do planeta.

    b) Existem os determinantes intermedirios que so aqueles relacionados s condiesmateriais de vida: ambiente fsico, acesso ao consumo de bens essenciais, condies detrabalho e redes de apoio e vizinhana. Ns podemos enfrentar estes determinantescomo sujeitos polticos, nos movimentando em prol das lutas por justia social e dimi-nuio das desigualdades.

    c) E existem ainda os determinantes proximais ligados a aspectos individuais, biolgi-cos e de estilos de vida, aspectos psicossociais, ambientes estressantes e a maneiracomo os servios de sade cuidam das pessoas. O enfrentamento destes determinantesexige o empenho e o compromisso do prossional de sade em estar junto no agir dos

    indivduos e dos coletivos sociais, protagonizando a construo de projetos de vida queresultem em boas condies de sade, isto , a sade integra e decorre do modo deandar a vida dos sujeitos sociais.Este nvel de enfrentamento, na maioria das vezes, ocorre no nvel local, no modo de an-dar a vida das comunidades e deixa evidente a maneira como os determinantes sociaisinuenciam a sade. necessrio, portanto, compreender sade como produo social da qual participam osindivduos, suas organizaes, suas instituies e suas vises de mundo para vislumbrarpossibilidades de protagonizar a participao nessa produo, em ato, perguntandosempre o que possvel fazer como indivduo, prossional e cidado.

    PARA REFLETIRQUAL O SEU LUGAR DE SUJEITO QUE PRODUZ SADE?

    a)Nos determinantes proximais: caractersticas intrnsecas (idade, sexo,hereditariedade) e estilos de vida?b) Nos determinantes mediais: contribuindo para melhorar as condies devida e trabalhoc)Nos determinantes distais: a excluso social, discriminao, guerras,catstrofes?

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    PARA PENSAR E AGIR

    A produo da sade nos indivduos tem por base:Potncia de produzir um modo de viver saudvel:O pensamento que o corpo no o elemento limitante, ele compe nossacorporalidade que resultado de nossa interao e aprendizagem com o mundo. Ocorpo fsico elemento potencializador de nossa energia de viver.A tica de Cuidar de si e do Outro.

    A produo da sade nos Grupos e Coletivos tem por base:Compartilhamento; Apoio;Exerccio de solidariedade; Construo coletiva;Amorosidade/Emoo; Companheirismo;Participao; Novas descobertas.

    A produo da sade nas organizaes e servios de sade inclui:Acolhimento (informaes, orientaes);Humanizao (respeito s escolhas do Outro);Aes de promoo e educao na sade autonomia diante das doenas e do

    cuidar-se melhor;Projeto teraputico singular; Avaliao permanente por parte do usurio;Respeito; Vnculo.Ecincia/efetividade/eccia;

    A produo da sade nas Polticas compreende:Polticas intersetoriais e universais; Cuidado com o ambiente;Polticas participativas; Incluso;Polticas pblicas urbanas segurana, transporte, lazer, moradia;Polticas culturais.

    Entretanto, para o epidemiologista equatoriano Jaime Breilh (2008), mais que discutir osdeterminantes de sade necessrio reetir de forma crtica sobre a determinao socialda vida, integrando a discusso sobre a sade humana luta pela defesa da vida. Isso im-plica, no apenas proteger e ampliar a vida humana, mas pensar processos, caminhos, queconstruam uma ideia de ecologia crtica para a construo de uma sociedade organizadacom base na sustentabilidade e na solidariedade.

    PENSE NISSO!

    A crise agrcola-ecolgica da modernidade caracterizada por escassez de ali-

    mento e de recursos naturais reexo do padro de consumo, distribuio e produ-o da sociedade contempornea e por uma forma de gesto de recursos que noprioriza a vida. O aprofundamento das desigualdades sociais e o aumento dos ndi-ces de explorao da natureza resultam desta racionalidade econmica e tecnolgicado modelo de desenvolvimento capitalista. Os custos scio-ambientais tambm sodistribudos desigualmente, de tal modo que determinadas regies arcam com a in-sustentabilidade ecolgica e, ainda mais, as populaes com menor poder aquisitivoe que dependem da integralidade ambiental, como as comunidades tradicionais, per-dem o potencial produtivo dos recursos naturais e culturais necessrio sustentabi-lidade do seu modo de vida peculiar local (CARNEIRO et al, 2010, p. 7).

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    VOC SABIA?Em maro de 2006, o Presidente da Repblica criou a Comisso Nacional sobre

    Determinantes Sociais da Sade (CNDSS), seguindo recomendao da OMS, que esta-beleceu uma Comisso Global, um ano antes, em maro de 2005. A CNDSS, fortemen-te inspirada pelo Art. 196 da Constituio Federal, visa mobilizar a sociedade brasileirae o prprio Governo para entender e enfrentar de forma mais efetiva as causas sociaisdas doenas e mortes que acometem a populao, e reforar o que socialmente

    benco para a sade individual e coletiva.

    ATENO!Convidamos voc e seu grupo a imaginarem e escreverem uma cena em que o ce-nrio seja uma Unidade Bsica de Sade, na qual chega um usurio, que apresentacomo queixa uma tosse que no se acaba. Mas, por trs da tosse tem a situaoque est desempregado, com a lha doente, a casa est cheia de inltrao e a luzfoi cortada. Crie os personagens como trabalhadores de sade de uma equipe e,com base em sua vivncia e do seu grupo, v criando os dilogos imaginando como

    cada prossional se posiciona diante deste caso.

    CONTINUANDO A CONVERSA...Ento, depois das reexes e exerccios que voc j fez deu para perceber que existem

    muitas necessidades que so parecidas para a maioria das pessoas. Mas, existem pessoasque alm dessas apresentam outras necessidades, como as com decincia de locomoo,cadeirantes que necessitam de rampas para se movimentar e de transporte pblico adequa-do, decientes auditivos e visuais que precisam de sinais de informaes em Braille e sinaisde trnsito sonoros, por exemplo.

    Essas situaes, resultantes de diferentes determinaes pesam de forma diferenciada na

    vida de cada um e mesmo de alguns grupos sociais, levando a diferentes condies de sade.Quando estas diferenas nas condies de sade se repetem historicamente, pensando maissobre uns que sobre outros e resulta em desiguais formas de viver se diz que existe iniquidade.

    Iniquidades so diferenas sistemticas evitveis, injustas e desnecessrias nasituao de sade de grupos populacionais que geram, desigualdades na sade(WHITEHEAD; DAHLGREEN, 2000).

    As iniquidades em sade, isto , as diferenas que resultam em desiguais e injustas for-mas de viver, so visveis em muitas aes, como no caso das comunidades rurais da pesquisacomentada, que no tm acesso gua potvel e em decorrncia disso apresentam maiorrisco de adoecer e morrer. O que no acontece em um condomnio de luxo de uma cidade.

    Essas desigualdades evidentes, quando se compara pases, estados, municpios e comu-nidades, dizem respeito s condies gerais como acesso aos servios de saneamento bsi-

    co, transporte pblico, sade, educao e outros direitos sociais, e esto muito relacionadosao manejo poltico que dene as formas de justia social na distribuio dos bens pblicos.

    No Brasil, por exemplo, a Regio Nordeste tem menor taxa de domiclios ligados redede coleta de esgotos que a Regio Sul e Sudeste e menos de 75% do lixo produzido cole-tado, assim como oportunidades de estudo e trabalho.

    Retomando o dilogo dessas questes com a realidade do Cear e olhando um poucopara territrios menos urbanos, trazemos o foco das reexes para o litoral cearense. Nele, possvel encontrar remanescentes de quilombos, caboclos, povos indgenas, e outras po-pulaes cujos modos de viver esto pautados em uma ideia de sustentabilidade caracters-tica de comunidades tradicionais.

    Esses modos de viver vm sendo ameaados, segundo Nogueira, Rigotto e Teixeira (2009),

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    por um conjunto de fatores, ligados exploso do crescimento urbano nas ltimas dcadas, industrializao e modernizao agrcola. Trata-se da expanso do capitalismo avanadono campo, reestruturando a produo na agricultura, na aquicultura com o incentivo pescaindustrial em detrimento da pesca artesanal, carcinicultura e ao turismo.

    Os modos de organizar a produo nesses espaos tm expulsado populaes locaisdos seus territrios de vida, precarizando relaes de trabalho e ameaando a seguranaalimentar dessas comunidades que, alm de exploradas, tornam-se invisveis.

    No que diz respeito s populaes do campo, a exemplo do que acontece em grande

    parte do nosso pas, a questo agrria tem como elementos principais a desigualdade,a contradio e o conito.

    Ao tomarmos como referncia a regio do Vale do Jaguaribe, segundo o Dossi elabo-rado pela Associao Brasileira de Sade Coletiva (ABRASCO), um alerta sobre os impac-tos dos Agrotxicos na Sade, os trabalhadores do campo esto expostos situaes deconitos com latifundirios em virtude do grau de explorao violenta pelo agronegcio aliinstalado, vinculado fruticultura para exportao.

    A poltica de irrigao em desenvolvimento, desde a dcada de 1980, permitiu a insta-lao de empresas na regio, voltadas exportao de melo e abacaxi, com uso intensivode agrotxicos e um grande nmero de casos de contaminao ambiental, assim como detrabalhadores e da populao exposta na regio, inclusive por pulverizaes areas.

    O dossi referenda ainda informaes do Ncleo Tramas, da Universidade Federal doCear, acerca da ocorrncia de conitos e violncia na regio, inclusive com assassinatos detrabalhadores e a ocorrncia de mortes diretamente associadas aos agrotxicos.

    Diante a essas questes, cabe-nos reetir sobre como temos nos envolvido, nos indigna-do, nos includo nas lutas dessas populaes e dessas comunidades.

    PARA REFLETIR1.Temos nos implicado de alguma forma com essas situaes, que muitas vezes,tomamos conhecimento de forma enviesada pelos interesses daqueles que promo-vem a excluso e invisibilidades dessas populaes?

    2. Elas acontecem nos espaos onde desenvolvemos nossa ao de sade?

    3.Que impactos podem gerar na sade dessas populaes?

    4.Que tal promover uma roda de conversa com a comunidade onde trabalha sobreessas questes?

    Continuando nossas reexes, podemos perceber, ento, que dentro de cada pas, esta-do, municpio e comunidade existem grupos e indivduos que por apresentarem situaesconsideradas diferentes so tratados de maneira desigual.

    Vamos encontrando, aqui, outras formas de desigualdades que no esto somente nocampo das polticas, mas se expressam no cotidiano, no dia a dia e na forma de ser e trataras pessoas que so diferentes da maioria da populao.

    Buscando mais uma vez tecer conexes entre a diversidade de territrios no estado doCear e as iniquidades que se revelam nesses espaos, nos deslocamos para a regio do Cariri.

    CRDITO

    JOSENILDO

    NASCIMENTO

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    Referenciando Carvalho e Ribeiro (2008), destacamos que os municpios de Crato, Jua-zeiro do Norte e Barbalha apresentam elevados ndices de criminalidade inclusive no quese refere violncia contra a mulher. Os autores correlacionam esses ndices a problemasdecorrentes das diculdades de acesso educao de qualidade, existncia de conitosfamiliares, machismo, impunidade e poucas oportunidades de acesso das mulheres ao es-paos formais de trabalho.

    PARA REFLETIR1.As iniquidades de gnero esto apenas nessa regio do Cear?2. Voc tem conhecimento de situaes como essas no seu territrio?

    3. Que iniciativas voc conhece para enfrentar essas iniquidades?

    Mas no so apenas as mulheres que so tratadas de forma desigual. Isso tambmacontece com pessoas negras, indgenas, ciganos, estrangeiros, pessoas do grupo LGBT(gays, lsbicas, bissexuais, travestis e transexuais), decientes, idosos e qualquer diferen-a que acaba resultando numa forma desigual de se relacionar.

    Para o Movimento Negro no Brasil, ator poltico fundamental na luta contra as iniqui-

    dades vivenciadas por esta populao e sujeito interlocutor na formulao da PolticaNacional de Sade Integral da Populao Negra:

    o racismo se rearma no dia a dia pela linguagem comum, se mantm e se alimentapela tradio e pela cultura, inuencia a vida, o funcionamento das instituies e tam-bm as relaes entre as pessoas; condio histrica e traz consigo o preconceito e adiscriminao, afetando a populao negra de todas as camadas sociais, residentes narea urbana ou rural e, de forma dupla, as mulheres negras, tambm vitimadas pelomachismo e pelos preconceitos de gnero (BRASIL, 2013, p. 16).

    Desigualdade dessa natureza ns observamos todo dia, seja no plano das institui-es e organizaes da sociedade que foram pensadas e que funcionam sem levar em

    considerao as diferenas que ocorrem na espcie humana, seja no plano de nos-so relacionamento que acabamos tambm reproduzindo, olhando para os diferentescomo se fossem desiguais.

    PARA REFLETIRSer diferente no o problema! O problema quando a diferena vista pelo olhar da de-sigualdade, gerando a iniquidade em sade que na verdade so desigualdades sistemticas,potencialmente reversveis em um ou mais aspectos de sade entre grupos populacionaisdenidos socialmente, economicamente, demogracamente ou geogracamente.

    Para sistematizar o que se diz sobre equidade e suas expresses na sade a m quepossamos entender qual o nosso lugar na luta contra as iniquidades (como cidado, pro-ssional e ser humano) vale lembrar que:

    a diferena individual e da esfera privada; diversidade coletiva e da esfera privada; adesigualdade coletiva e da esfera pblica; distino individual e coletiva (representa-es sociais) das esferas privada e pblica (ESCOREL, 2001, p. 6).

    Com isso, preciso reforar que ser diferente um direito que assiste a pessoahumana de se manifestar e viver de acordo com sua cultura, crena, etnia, gnero,nacionalidade e suas escolhas. A diversidade faz parte e contempla o desenvolvimentoda Humanidade. A distino de pessoas ou grupos em determinada sociedade dependedas pessoas e do contexto social no qual vive.

    A Poltica Nacionalde Sade Integralda Populao Negrapode ser acessada napgina www.saude.gov.br/editora

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    Quando a diferena, a diversidade e distino so consideradas desigualdade, seu en-frentamento coletivo e depende de como os movimentos sociais, que lutam em prol daequidade, participam na luta poltica pela ampliao dos direitos, promovendo a justiasocial para aqueles, que por serem diferentes so tratados de modo desigual, aumentandoa excluso, a discriminao e seus efeitos nas determinaes da sade.

    PARA REFLETIRO espao da unidade de sade pode se congurar como centro de mobilizao, in-formao, cultura e lazer para estas populaes. Ao invs da restrio de acesso doena, preciso que estas unidades se congurem como irradiadores de sade.

    Promover o encontro entre as prticas de sade tradicionais e cientcas, ampliar aestrutura das unidades para prticas esportivas e outras prticas teraputicas e utili-zar esse espao para prticas de educao e expresso cultural de crianas e jovens um passo fundamental na efetivao da sade integral.

    A unidade de sade pode funcionar como catalisador da efetivao da cidadania. Podeali expressar a importncia do indivduo e sua participao na melhoria coletiva dacomunidade. Uma unidade de sade onde h gesto participativa acontece capaz

    de desencadear novas prticas de sade, menos burocratizadas e mais anadas coma realidade da populao que a demanda.

    VOC SABIA?Vem crescendo no Brasil a proporo de pessoas que se declaram pretas. Segundo

    a Pesquisa Nacional por Amostra de Domiclios (PNAD), este nmero era de 40,0%em 1999, e 44,2% em 2009. Provavelmente, um dos fatores para esse crescimento uma recuperao da identidade racial, j comentada por diversos estudiosos do tema.

    A taxa de analfabetismo diminuiu na ltima dcada, passando de 13,3%, em 1999, para9,7%, em 2009, para o total da populao, o que representa ainda um contingente de 14,1

    milhes de analfabetos. Apesar de avanos, tanto a populao de cor preta quanto a de corparda ainda tm o dobro da incidncia de analfabetismo observado na populao branca:13,3% dos pretos e 13,4% dos pardos, contra 5,9% dos brancos, so analfabetos.

    Alm das diferenas educacionais, a PNAD desvenda fortes diferenas nos ren-dimentos. Considerando os anos de estudo, v-se que as disparidades concernem atodos os nveis. Faixa a faixa, os rendimentos-hora de pretos e de pardos so, pelomenos, 20% inferiores aos de brancos e, no total, cerca de 40% menores.

    A populao do campo e da oresta formada por povos e comunidades que tmmodos de vida relacionados predominantemente com o campo, a oresta, os am-bientes aquticos, a agropecuria e o extrativismo. Destacam-se os camponeses, osagricultores familiares, trabalhadores rurais assentados, acampados, assalariados etemporrios, que residam ou no no campo; comunidades remanescentes de quilom-bos; populaes que habitam ou usam reservas extrativistas; populaes ribeirinhas;populaes atingidas por barragens; e outras comunidades tradicionais. Somadas,estas populaes representam aproximadamente 31 milhes de pessoas que estona rea rural, ou seja, 16,5% da populao brasileira, segundo a Pesquisa Nacionalpor Amostras de Domiclio (2007).No campo brasileiro, so encontrados os maioresndices de mortalidade infantil, de incidncia de endemias, de insalubridade e de anal-fabetismo, caracterizando uma situao de enorme pobreza decorrente das restriesao acesso aos bens e servios indispensveis vida (BRASIL, 2005).

    Entre 2003 a 2005, foram relatados 360 homicdios de LGBT no Brasil. O Grupo Gayda Bahia, a mais antiga associao de defesa dos direitos humanos dos homossexuais

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    Trataremos neste Cursosobre as diversas Polticasde Promoo Sade Inte-gral das populaes Negrae Quilombola, LGBT, doCampo e da Floresta, emSituao de Rua e das di-versas aes governamen-tais chamadas de polticasde promoo da equidadeem sade.

    no Brasil, divulgou em janeiro de 2013, o Relatrio de Assassinato de LGBT de 2012.No ano, 338 homossexuais foram assassinados no pas, o que signica uma morte acada 26 horas. Os nmeros mostram um aumento de 21% em relao a 2011, ano emque houve 266 mortes, e um crescimento de 177% nos ltimos sete anos. Os homenshomossexuais lideram o nmero de mortes, com 188 (56%), seguidos de 128 travestis(37%), 19 lsbicas (5%) e dois bissexuais (1%). De acordo com o estudo, o Brasil estem primeiro lugar no ranking mundial de assassinatos homofbicos, concentrando

    44% do total de mortes de todo o planeta, cerca de 770. Nos Estados Unidos, pasque tem cerca de 100 milhes a mais de habitantes que o Brasil, foram registrados 15assassinatos de travestis em 2011, enquanto no Brasil, foram executadas 128 pessoas.

    O QUE VEM SENDO CONSTRUDO NO SUS ?O Ministrio da Sade instituiu desde 2004, Comits de Promoo da Equidade para a

    populao do campo, negra e quilombola, cigana e LGBT (Lsbicas, Gays, Bissexuais e Transg-neros) e populao em situao de rua, com o objetivo de constituir espao pblico de dilogoe construo de estratgias de incluso. So espaos onde representantes de movimentossociais dessas populaes dialogam junto s reas tcnicas de governo para a proposio denovas polticase estratgias de enfrentamento s iniquidades em sade.

    As Polticas de Promoo da Equidade em Sade passam a ser de responsabilidade daSecretaria de Gesto Estratgica e Participativa, que propicia o encontro entre as demandasdos grupos e as reas tcnicas do Ministrio da Sade na perspectiva de diminuir as desi-gualdades que se apresentam nos pers de morbi-mortalidade, no acesso aos servios desade, na qualidade da ateno humanizada, no sentimento de pertencimento ou seja nainiquidade em sade que se apresenta para os grupos sociais mais excludos.

    Estas polticas so pactuadas de forma TRIPARTITE entre Governo Federal, Estados eMunicpios e Aprovadas no Conselho Nacional de Sade.

    Os comits e grupos de trabalho para a promoo da equidade em sade so estratgiaspara a elaborao de modelos justos de ateno. Articulam diversas reas tcnicas numespao coletivo de reexo e anlise da situao de sade dos segmentos, propiciando a

    transversalizao das aes e a formulao de polticas integrais de sade.A participao social o cerne do processo, j que a enunciao dos representantes dosmovimentos sociais esclarece as especicidades dos segmentos, revertendo suas reivindi-caes em pautas a serem consideradas nas diversas reas tcnicas e no servios de sade.

    Atualmente o Brasil conta com as seguintes polticas de Promoo da Equidade em Sade:

    5 Plano Operativo de Sade Integral da Populao em Situao de Rua;

    5 Poltica Nacional de Sade Integral da Populao Negra;

    5 Poltica Nacional de Sade Integral da Populao do Campo e da Floresta;

    5 Poltica Nacional de Sade Integral da Populao LGBT;

    CRDITO

    JOSENILDO

    NASCIMENTO

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    DA EQUIDADE NO SUS

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    Momento 3Enfrentando as iniquidades

    Neste momento, vamos juntar o que vimos e reetimos sobre promoo da equidadecom os dados da realidade dos servios e a situao cotidiana das comunidades nos ter-ritrios onde atuam as Equipes e comear a indagar sobre as evidncias e as formas de

    expresso das iniquidades e as possibilidades de superao.Nas pginas anteriores, foi sugerido que voc zesse, se possvel desenhasse numacartolina ou em uma folha grande de papel um mapeamento de seu territrio e, nessemapa, fosse colocado tudo o que tem de bom e no muito bom no territrio, de creches,templos, postos de sade a pontos de prostituio, insegurana.

    Agora vamos colocar vida nesse mapa! Vamos ver qual o movimento das pessoas. E seaproximando do modo como as pessoas vivem, circulam, adoecem, sofrem, mas tambm se di-vertem, constroem projetos, cultivam relaes de amizade e solidariedade, podemos percebermelhor qual o sentido com que as pessoas se movimentam e quais sentimentos ou motiva-es levam as pessoas a se moverem em determinada direo e por determinados caminhos.

    possvel perceber o que sente um usurio do servio que no atendido, quais os sen-timentos dos adolescentes da rea, dos jovens e ainda perceber que existem diferenas nointerior dessa populao que j considerada de forma desigual pela sociedade.

    Considerando que o Territrio vivo lugar da ao e que a partir dos sentimentos, dacuriosidade, da vontade de participar das pessoas que possvel construir estratgias paraenfrentar as iniqidades do presente e um futuro com menor desigualdade entre as pessoas.

    Com os movimentos sociais populares possvel reetir sobre o que determina a situaode excluso, como as pessoas reagem a elas e quais suas apostas no futuro.

    Desse dilogo nascem e so apontadas muitas trilhas e perspectivas que incluem o re-en-cantamento da sociedade pelas lutas populares por melhores condies de vida.

    Este re-encantamento signica a adeso, a participao e efetiva na construo co-letiva de um projeto de transformao da situao que discrimina, a mobilizao e reivin-dicao dos direitos sociais alcanados, da construo dos limites e expresses objetivas

    desses direitos e de modos de viver que tenham a VIDA como valor que usamos para obem viver conosco, com os outros e com o mundo.

    Como ponto de partida para o protagonismo de cada um e cada uma de vocs na luta contraa iniquidade, citamos no quadro a seguir, saberes necessrios ao bem viver segundo a culturados ndios andinos bolivianos.

    SABERES NECESSRIOS AO BEM VIVER5 Saber alimentar-se -suma manqaa

    5 Saber beber -suma umaa

    5 Saber danar - suma thuqhua

    5 Saber dormir - suma ikia

    5 Saber trabalhar - suma irnaqaa

    5 Saber meditar - suma lupia

    5 Saber amar e ser amado - suma munaa y munayasia

    5 Saber escutar - suma istaa

    5 Saber sonhar - suma samkasia

    5 Saber expressar-se - suma aruskipasia

    5 Saber caminhar - suma sarnaqaa

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    AUGUSTO, L. G. S.; CARNEIRO, F. F; PIGNATI, W; RI-GOTTO, R. M.; FRIEDRICH, K; FARIA, N M X. BRIGO,A. C.; FREITAS, V.M.T.; GUIDUCCI FILHO, E. DossiABRASCO Um alerta sobre os impactos dos agro-txicos na sade. ABRASCO, Rio de Janeiro, junho de2012. 2 Parte. 135p.

    BRASIL. MINISTRIO DA SADE. Poltica Nacional deSade Integral da Populao Negra. Ministrio daSade: Braslia, 2013.

    BRASIL. Constituio da Repblica Federativa do Bra-sil de 1988. Disponvel em: http://www.planalto.gov.br/ ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm.

    BREILH, J. Uma Perspectiva Emancipadora da Pes-quisa e da Ao Baseadas na Determinao Social daSade. Extrado de: http://www.alames.org/docu-mentos/ponencias.pdf, pgina do Taller Latinoame-ricano de Determinantes Sociais de la Salud, de 30de setembro a 2 de outubro de 2008, na Universida-de Autnoma do Mxico, Cidade do Mxico.

    CARNEIRO, F. F.; SEGATO, R.; NOGUEIRA, R. P.; PEREI-RA, M. F. Perspectivas emancipatrias sobre a sa-de e o Bem Viver face s limitaes do processo de

    desenvolvimento brasileiro.Braslia, 2010.

    CARVALHO, E. A.; RIBEIRO R. . F. Uma AnliseHistrico-Jurdica da Violncia Contra a Mulher naRegio do Cariri. XXI Encontro Regional de Estu-dantes de Direito e Encontro Regional de Asses-soria Jurdica Universitria 20 anos de Consti-tuio. Parabns! Por qu? URCA, Crato, 2008.ISBN 978-85-61681-00-5

    ESCOREL, S. Os dilemas da equidade em sade:aspectos conceituais. 2001. Disponvel em: www.epsjv.ocruz/ br/dicionario/verbetes/equsau.html.Acesso em 07/02/2014.

    LABBATE, S.Anlise institucional e educao emsade: um dilogo produtivo? Boletim do Instituto deSade, 34: 6-9, 2004.

    MAX-NEEF, M. A. Desarrollo a escala humana:concetos, aplicaciones y algunas reexiones. 2 ed.Nordon-Comunidad-Uruguay; Icaria Editorial, Bar-celona, 1998.

    NOGUEIRA, F. N. A.; RIGOTTO, R. M.; TEIXEIRA, A. C.A. O agronegcio do camaro: processo de trabalhoe riscos sade dos trabalhadores no municpio deAracati/Cear Rev. Bras. Sade Ocup. So Paulo, 34(119): 40-50, 2009.

    PEDROSA, J.I.S. Promoo da Sade nos Territ-rios: construindo sentidos para a emancipao. In:LANDIN,F.L.P; CATRIB, A. M. F; COLLARES, P. M. C.(or-gs). Promoo da Sade na diversidade humana ena pluralidade de itinerrios teraputicos. Campi-nas-SP, Sabres, 2012, p. 25-48 .

    PEREIRA, M. P. B.; BARCELLOS, C. O Territrio noPrograma de Sade da Famlia. HYGEIA, RevistaBrasileira de Geografia Mdica e da Sade Hygeia,2(2):47-55, jun 2006 Pgina 47. Disponvel em: www.hygeia.ig.ufu.br/

    VIANA, A. L. D.; FAUSTO, M. C. R. Ateno bsicae proteo social: universalismo x focalismo e es-pao no mercantil de assistncia. In: VIANA, A.L. V.; ELIAS, P. E. M.; IBAEZ, N. (org). Proteosocial: dilemas e desafios: HUCITEC: So Paulo,2005, p. 150-167.

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    REFERNCIAS

    E, como vocs perceberam, o nal dos nossos encontros , ao mesmo tempo, o inciodo encontro de cada um com o seu territrio.

    Agora, com o olhar mais aguado para perceber nas relaes entre as pessoas, noprocesso de trabalho, na relao entre usurios e a Unidade de Sade, as situaes deiniquidades. E, nesse processo, identicar as potencialidades e possibilidades existentese juntar estas energias construindo estratgias para superar as iniquidades e promovera equidade em sade!

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    DA EQUIDADE NO SUS

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