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1 "FATORES DETERMINANTES DA OPINIÃO DO AUDITOR: ESTUDO EMPÍRICO DAS EMPRESAS PORTUGUESAS” Maria Rosalina da Silva Costa, rosalina [email protected] Sara Serra, [email protected] Patrícia Gomes, [email protected] Área temática: Auditoria Metodologia de investigação usada: Empirical archival Palavras-Chave: Auditoria, relatórios de auditoria, determinantes da opinião do Auditor, independência

FATORES DETERMINANTES DA OPINIÃO DO AUDITOR: … · auditores, como o seu nível de formação e os padrões éticos. Os autores argumentam que as qualidades pessoais dos sócios

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"FATORES DETERMINANTES DA OPINIÃO DO AUDITOR: ESTUDO EMPÍRICO DAS EMPRESAS PORTUGUESAS”

Maria Rosalina da Silva Costa, rosalina [email protected]

Sara Serra, [email protected]

Patrícia Gomes, [email protected]

Área temática: Auditoria

Metodologia de investigação usada: Empirical archival

Palavras-Chave: Auditoria, relatórios de auditoria, determinantes da opinião do Auditor,

independência

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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"FATORES DETERMINANTES DA OPINIÃO DO AUDITOR: ESTUDO EMPÍRICO DAS EMPRESAS PORTUGUESAS”

Resumo

As constantes mudanças que ocorrem no tecido empresarial instigam a instabilidade

e desconfiança dos utilizadores da informação financeira. Neste contexto, os stakeholders

procuram informação financeira fiável e clara para tomarem decisões ponderadas e com o

menor risco possível. No sentido de satisfazer estas necessidades, os organismos

profissionais de contabilidade têm manifestado grande preocupação em garantir a

qualidade da informação financeira.

A solução para o cumprimento dos objetivos anteriores deve passar pela realização

de uma auditoria uma vez que esta função desempenha um importante papel no seio das

empresas, quer no processo de prestação de contas, quer na redução das assimetrias de

informação. No entanto, o processo de auditoria apresenta limitações que nem sempre são

consideradas pelos utilizadores da informação financeira. Há, de facto, uma série de

determinantes que pretendemos estudar neste trabalho que são suscetíveis de influenciar a

opinião que o auditor irá emitir na certificação legal de contas (CLC). Para o efeito,

debruçamo-nos sobre os relatórios e contas, referentes ao ano de 2011, de 50 empresas

registadas na Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) para analisar a

influência dos seguintes fatores na opinião do auditor: (1) o tipo de Sociedade de Revisores

Oficiais de Contas (SROC) a que o auditor pertence, (2) o sexo, (3) a experiência

profissional do auditor, (4) os honorários recebidos pelo auditor pelos serviços de Revisão

Legal de Contas (RLC) e (5) extra RLC.

Os resultados revelaram que a opinião do auditor não é influenciada,

significativamente, por nenhum dos fatores estudados, o que pode indiciar grande

independência do auditor. Contudo, os sinais positivos e negativos das relações testadas

indicam que as variáveis “tipo de SROC”, “sexo do auditor” e “experiência profissional”

estão positivamente relacionadas com a opinião emitida pelo auditor, enquanto as variáveis

“honorários de RLC” e “honorários extra RLC” apresentam um sinal negativo.

Introdução

A opinião emitida pelo auditor resulta de decisões sobre a adequação e suficiência

da prova e das interpretações dos resultados obtidos nos seus procedimentos de auditoria.

Contudo, essas decisões podem ser influenciadas negativamente por fatores que estão

3    

relacionados com ameaças à sua independência. Neste sentido, o principal objetivo deste

estudo empírico consiste em analisar alguns fatores que podem constituir ameaças à

independência do auditor e consequentemente influenciar a opinião deste nos relatórios

que emite.

Para levar a cabo o teste de inferência estatística de associação entre as variáveis

definidas, formulamos um conjunto de hipóteses teóricas que determinarão o foco de

investigação. Com o intuito de obter evidência estatística, analisamos os relatórios e

contas, referentes a 2011, de 50 empresas do mercado secundário registadas na CMVM.

Entendemos que a pertinência deste estudo se deve, sobretudo, à ausência de

trabalhos sobre esta temática, aplicada à realidade portuguesa. Não obstante, pretendemos

também sublinhar a importância que a independência do auditor tem no contexto

empresarial, uma vez que grande parte das decisões são tomadas com base numa análise

das demonstrações financeiras. Portanto, a opinião que o auditor vai emitir na sequência do

trabalho de verificação dos elementos contabilísticos e financeiros, que são

responsabilidade da gestão, não deverá ser afetada por condicionalismos que

comprometam a sua independência.

Apesar dos resultados deste estudo terem revelado pouca significância estatística,

uma vez que nos levaram a concluir que nenhuma das variáveis exerce influência

significativa sobre a opinião do auditor, os sinais positivos e negativos das relações

indicam que as variáveis “tipo de SROC”, “sexo do auditor” e “experiência profissional”

estão positivamente relacionadas com a opinião emitida pelo auditor, enquanto as variáveis

“honorários de RLC” e “honorários extra RLC” apresentam um sinal negativo.

1. Determinantes da Opinião do Auditor

1.1 Tipo de SROC

Uma das variáveis mais estudadas pela literatura como representante da qualidade

da auditoria tem sido o tamanho da empresa de auditoria. Segundo DeAngelo (1981) e

Teoh e Wong (1993) os utilizadores confiam mais nas demonstrações financeiras auditadas

por empresas de auditoria de maior dimensão. Alguns autores apontam esta associação ao

facto de as grandes empresas possuírem mais recursos financeiros e humanos e melhores

recursos físicos, como meios tecnológicos avançados (Rodriguéz e Torres, 2005).

Adicionalmente, as grandes empresas de auditoria têm carteiras maiores de

clientes, o que lhes permite resistir à pressão dos clientes, ao passo que as empresas de

menor dimensão, devido à carteira de clientes mais reduzida, acabam por prestar serviços

4    

de forma, digamos que mais personalizada, mantendo relações de maior proximidade com

os clientes, levando-os a ceder mais facilmente às pressões dos clientes. Assim, empresas

de auditoria com grandes carteiras de clientes podem ter incentivos mais fortes para ser

diligentes nos seus exames às empresas clientes, para proteger a sua reputação e

independência (DeAngelo, 1981; Shwartz e Menon, 1985; Wallace, 1987; Chow et al.,

1988; Kothari et al., 1988; Palmrose, 1988; Lys e Watts, 1994, citados por Sori e Karbhari,

2006).

Muitos estudos têm vindo a demonstrar que a reputação do auditor tem associação

direta com a qualidade da auditoria. DeAngelo (1981) enunciou uma teoria económica,

sobre a qualidade de auditoria, segundo a qual as empresas de auditoria de maior dimensão

realizam auditorias de maior qualidade. Esta teoria é baseada nos custos em que as

empresas podem incorrer, caso realizem auditorias de baixa qualidade. Desta forma, o

autor sustenta que as grandes empresas de auditoria, por possuírem uma maior notoriedade

pública, teriam mais a perder se o seu nome fosse associado a escândalos financeiros e,

portanto, espera-se que os seus relatórios sejam mais confiáveis.

Rodriguéz (2007) apresenta alguns estudos que referem que a qualidade do serviço

prestado pelas grandes empresas de auditoria é mais visível quando o risco de incorrer em

litígios e perdas de reputação é elevado. Nestas situações, as empresas de auditoria tendem

a realizar um maior controlo das demonstrações financeiras dos seus clientes, com vista à

prestação de um serviço de maior qualidade. Por outro lado, existem estudos que referem

que esta diferenciação entre empresas de auditoria de maior ou menor dimensão

desaparece quando o risco de litígios e perda de reputação é inferior. A título de exemplo,

o autor refere que em países com baixo risco de litígio e baixo nível de proteção do

investidor, as diferenças entre grandes e pequenas empresas de auditoria são menos

visíveis, uma vez que as grandes empresas de auditoria tenderão a exercer um menor

controlo sobre os seus clientes. Os resultados destes estudos mostram que as empresas de

auditoria de maior dimensão encerram em si algum oportunismo, produzindo auditorias de

maior qualidade quando enfrentam situações de maior risco e auditorias de menor

qualidade quando o risco não é tão elevado.

Desta forma, será pertinente avaliar a relação existente entre o tipo de empresa de

auditoria e a opinião do auditor, definindo-se, para o efeito, a seguinte hipótese de

investigação:

H1 - A opinião emitida pelo auditor está diretamente relacionada com o

tipo de SROC a que o mesmo pertence.

5    

1.2 Sexo do Auditor

Ao longo dos anos, têm sido realizados estudos sobre a influência do género do

auditor na opinião emitida por estes nos relatórios de auditoria. Ittonen et al. (2012)

apresentam alguns estudos que sugerem que o sexo do auditor pode afetar o processo de

auditoria. Chung e Monroe (2001) documentam que os auditores do sexo feminino são

mais precisos e eficazes processadores de informação em tarefas de auditoria complexas.

O'Donnell e Johnson (2001) acrescentam que auditores do sexo feminino podem apresentar

maior eficiência nos julgamentos de auditoria e Gold et al. (2009) constataram que

auditores do sexo feminino são menos influenciados por explicações do cliente, podendo

desta forma ser vistos como mais independentes do que os auditores de sexo masculino.

Neste estudo realizado por Ittonen et al. (2012) os autores examinaram a relação entre os

auditores de sexo feminino e os honorários de auditoria num cenário empírico usando

dados de três países nórdicos. Os seus resultados indicam que as empresas onde os

auditores são de sexo feminino têm honorários de auditoria mais elevados, sugerindo que o

sexo do auditor pode afetar o esforço de auditoria. A este respeito, Fondas e Sassalos

(2000) argumentam que as mulheres tendem a ter maiores expetativas em relação às suas

responsabilidades, o que pode levá-las a um maior esforço nas suas tarefas e,

consequentemente, à existência de honorários mais elevados (Ittonen et al., 2012).

Hossain e Chapple (2012) elaboraram um estudo que consistiu na avaliação da

influência do sexo do auditor, especificamente no que respeita à opinião emitida. Assim, os

autores partiram de alguns estudos existentes para fomentarem as suas asserções, focando

dois dos estudos empíricos mais importantes sobre esta temática, formulados por Chin e

Chi (2008) e Hardies et al. (2010) que investigam a associação entre o sexo do auditor e a

emissão de um relatório de auditoria modificado. Os resultados destes estudos mostram

que os auditores de sexo feminino são menos suscetíveis de emitir pareceres modificados e

também menos propensos a emitir um parecer sobre a continuidade da atividade para as

empresas com maiores dificuldades financeiras. Esta descoberta fornece evidências de

diferencial de qualidade de auditoria quando o auditor é uma mulher, mas não atribui uma

causa para este resultado. Por exemplo, Hardies et al. (2010) referem que o facto de os

auditores de sexo feminino evitarem emitir opiniões modificadas é atribuído ao receio de

que o cliente rescinda o contrato de prestação de serviços caso a opinião de auditoria não

seja a que melhor lhe prouver. Alguns estudos acrescentam que os auditores do sexo

feminino podem considerar a não emissão de uma opinião modificada, porque são mais

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avessos ao risco do que os auditores do sexo masculino. A intuição predominante a partir

da literatura sobre esta temática é que os auditores do sexo feminino resistem a uma

opinião de auditoria modificada, porque isso irá influenciar a decisão do cliente de mudar

ou manter o auditor (Krishnan, 1994; Krishnan e Stephens, 1995; Lennox 2000; Gomez

Aguilar e Ruiz-Babadillo 2003; Ruiz- Babadillo et al., 2006 e Ruiz-Babadillo et al., 2006),

citados por Hossain e Chapple (2012). Inversamente, um estudo elaborado por Breesch e

Branson (2009), relata que não existe qualquer diferença na gravidade da opinião de

auditoria emitida por auditores do sexo feminino e masculino.

Com base nos resultados da investigação desenvolvida por Hardies et al. (2010), é

razoável supor que perceções sobre a competência e independência do auditor são de

preconceito de género, ou seja, o sexo funciona como um estímulo para anexar sentimento

diferente ou valor à informação. Indiscutivelmente, informações fornecidas pelos auditores

do sexo feminino e masculino não são vistas como sendo igualmente credíveis e, portanto

valiosas. No entanto, do acima exposto, não é, claro se o sexo do auditor pode ter ou não

influência sobre a qualidade da auditoria. Face ao exposto, formulamos a seguinte hipótese

de investigação:

H2 - A opinião emitida pelo auditor está diretamente relacionada com o

sexo do auditor.

1.3 Experiência do auditor

Mahdavi e Houshmand (2012) referem que as principais condicionantes da

qualidade da auditoria não são as normas de auditoria, mas antes os atributos pessoais dos

auditores, como o seu nível de formação e os padrões éticos. Os autores argumentam que

as qualidades pessoais dos sócios das empresas de auditoria e dos colaboradores das

equipas de auditoria, juntamente com a formação, são importantes fatores que determinam

a qualidade do serviço prestado pelo auditor.

Seguindo a mesma linha de pensamento, Carcello et al. (1992) apontam como

fatores importantes para a qualidade da auditoria as caraterísticas relacionadas com os

membros das equipas de auditoria. Neste sentido, são apontados como fatores a

experiência das equipas de auditoria, o conhecimento da indústria/setor, a capacidade de

resposta às necessidades do cliente e ainda a atuação em conformidade com as normas de

auditoria. Num estudo realizado pelos autores, o atributo que mais se destacou como

determinante na qualidade da auditoria foi a experiência dos membros das equipas de

auditoria.

7    

De acordo com Duff (2004), as empresas de auditoria precisam atrair colaboradores

com as necessárias competências técnicas e interpessoais para melhorar a qualidade do

serviço prestado. Esta mesma opinião é partilhada por Arruñada (2000), que salienta que a

qualidade da auditoria depende da competência técnica do auditor, ou seja, da sua

capacidade de detetar possíveis distorções materiais presentes nas demonstrações

financeiras e da independência para transmitir uma opinião objetiva sobre essas mesmas

demonstrações financeiras.

Knechel (2007) refere que a auditoria depende do julgamento do auditor e, por sua

vez, a qualidade do julgamento do auditor depende das caraterísticas deste. Assim, a

independência dos auditores está associada à liberdade no julgamento sobre os factos em

análise e na sua capacidade de formular uma opinião justa e isenta. No entendimento do

autor a probabilidade de descobrir uma distorção materialmente relevante depende, entre

outros fatores, da perícia técnica do auditor, da resolução de problemas, do perfil de risco e

experiência do auditor.

De acordo com Libby e Frederick (1990), os auditores mais experientes tendem a

detetar um maior número de erros do que os auditores com menos experiência profissional.

No entendimento dos autores, o conhecimento baseado na experiência potencia a qualidade

dos serviços prestados, podendo garantir uma auditoria de qualidade superior. Os estudos

salientam, ainda, que a experiência aumenta a probabilidade de emissão de uma opinião

positiva, o que nos leva a formular a seguinte hipótese de investigação:

H3 - A opinião emitida pelos auditores está diretamente relacionada com a

sua experiência profissional.

1.4 Valor dos Honorários

Os honorários dos auditores apresentam-se como um dos elementos que podem

colocar em causa a liberdade e capacidade de emitir uma opinião isenta, pelo que é sempre

uma questão muito delicada. Por um lado, porque não devem influenciar o esforço

depositado pelo auditor ao longo de toda a auditoria, por outro, porque se elevados

honorários podem conduzir a situações de dependência.

Em Portugal, esteve em vigor uma tabela de honorários mínimos, variável em

função da dimensão da entidade auditada. Porém, esta foi eliminada a partir de 1 de Janeiro

de 2005. Desta forma, o EOROC passou a dispor no seu artigo 60º que “os honorários são

fixados entre as partes, tendo em conta critérios de razoabilidade que atendam, em

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especial, à natureza, extensão, profundidade e tempo do trabalho necessário à execução

de um serviço de acordo com as normas de auditoria em vigor”.

Os honorários faturados pelos auditores mereceram, ainda, um destaque especial no

novo código de Ética da OROC que tece algumas considerações importantes sobre esta

problemática, clarificando alguns dos aspetos que poderão constituir ameaças à

independência dos auditores. Desde logo, tendo em conta o critério de razoabilidade

previsto no n.º 1 do artigo 60.º do EOROC e na Secção 4 do Código de Ética da OROC

clarifica-se que o facto de um auditor propor ou praticar honorários inferiores aos

praticados ou propostos por outro não é, por si só, uma falta de ética. No entanto, podem

existir ameaças ao cumprimento dos princípios fundamentais resultantes do nível de

honorários propostos ou praticados. Por exemplo, é criada uma ameaça de interesse pessoal

à competência e zelo profissional se os honorários praticados forem, excessivamente,

baixos ao ponto de constituírem uma fonte de pressão para a não execução do trabalho de

acordo com as normas técnicas e profissionais aplicáveis. Desta forma, a existência e

significado de quaisquer ameaças criadas dependerão de circunstâncias tais como o nível

dos honorários praticados e os serviços a que respeitem. Caberá ao auditor avaliar a

importância de qualquer ameaça e aplicar as salvaguardas necessárias para a eliminar ou

reduzir a um nível aceitável.

Segundo Gul et al. (1992), quando os honorários assumem um peso importante nas

receitas totais dos auditores, a perceção por parte de terceiros da capacidade destes

resistirem ao poder dos gestores é negativamente afetada, sugerindo uma ligação entre

reputação e independência. Neste contexto, parece-nos pertinente estudar a seguinte

hipótese:

H4 - A opinião emitida pelo auditor está diretamente relacionada com os

honorários recebidos pelo auditor decorrentes de serviços de RLC.

Seabrigh et al. (1992) acrescentam que perante a existência de uma forte relação

económica entre o auditor e o cliente, o auditor tem um incentivo para ignorar potenciais

problemas e emitir uma opinião limpa, violando assim um princípio genérico e inalienável

que é o princípio da independência. O facto de aumentar a probabilidade de um cliente

mudar de auditor na sequência de um relatório de auditoria desfavorável é suscetível de

reduzir a disposição do auditor para a emissão desse relatório. As evidências encontradas

por Farmer et al. (1987) vão nesse mesmo sentido, uma vez que pelos estudos realizados,

estes autores referem que os auditores tendem a concordar com as demonstrações

financeiras das suas empresas clientes se o risco de perderem esses mesmos clientes for

9    

maior. No entanto, autores como Reynolds e Francis (2001) e DeFond et al. (2002)

salientam que a proteção da reputação do auditor e o custo de litígios são suficientes para

superar a possível perda de objetividade resultante da dependência económica e, portanto,

prevalecem sobre os benefícios esperados com o comprometimento da independência.

Nos últimos anos têm-se multiplicado as preocupações relativamente às ameaças à

independência do auditor, com destaque para a intensidade crescente da concorrência no

setor da auditoria, em especial, no que diz respeito às grandes empresas de prestígio. Pese

embora, a concorrência permita uma maior dinamização do mercado, deverão ser

salvaguardados os princípios da transparência e concorrência de modo a que os auditores

não proponham uma remuneração que não lhes permita exercer a sua função de acordo

com as normas profissionais. Alguns observadores põem a hipótese de, nestas

circunstâncias, os vencedores dos concursos esperarem recuperar o diferencial face ao

custo da auditoria, através da prestação de serviços extra auditoria. Segundo Coffee (2002),

uma das principais causas das fraudes nos Estados Unidos da América (EUA), ao longo

dos anos 90, foi o aumento exponencial dos incentivos dos auditores para colaborar com os

seus clientes, à medida que as principais sociedades de auditoria (as chamadas Big Five1)

se aperceberam do quanto podiam beneficiar com a prestação simultânea de serviços de

auditoria e extra auditoria. Com efeito, muitos viam a prestação de serviços de auditoria

como uma ferramenta para atrair clientes lucrativos, a quem vendiam serviços extra

auditoria. Esta questão conduz a outro problema, isto é, o da prestação de serviços

diferentes dos da auditoria.

A questão do auditor ser autorizado a efetuar, junto de um cliente, outras funções

para além das de auditoria tem sido objeto de numerosas discussões. No entendimento de

Arruñada (1999), a prestação de serviços extra auditoria, junto de um cliente ao qual se

presta serviços de auditoria, permite ao auditor aprofundar o seu conhecimento acerca da

entidade e das atividades do seu cliente e, portanto, permite-lhe exercer melhor a sua

função de auditor. O autor acrescenta que, nada prova que a existência de outras

remunerações em relação às remunerações ligadas à missão de auditoria constitua uma

ameaça para a objetividade do auditor. Todavia, existe, também, uma convicção muito

forte de que a prestação de uma gama importante de serviços para além dos de auditoria

pode prejudicar a objetividade do auditor em relação ao seu cliente. Daqui surge uma nova

hipótese de investigação:

                                                                                                                         1 Arthur Andersen, Deloitte & Touche, Ernst & Young, KPMG e PW Coopers.

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H5 - A opinião emitida pelo auditor está diretamente relacionada com os

honorários recebidos pelo auditor decorrentes de serviços de extra RLC.

Desde o início dos anos 90, e até à entrada em vigor do Sarbanes Oxley Act,

assistia-se a uma tendência crescente para as entidades pagarem muito mais por serviços

extra auditoria do que por serviços de auditoria. Coffee (2002) refere que esta situação

gerou dois problemas. Em primeiro lugar, criou um incentivo para os auditores quererem

agradar aos seus clientes e, em segundo, permitiu aos clientes pressionar os seus auditores,

ameaçando dispensar os seus serviços extra auditoria. O primeiro problema afetava não

apenas as sociedades de auditoria, mas também o sócio responsável pela auditoria, por dois

motivos: (1) porque a remuneração deste era indexada ao valor dos serviços extra auditoria

que conseguisse vender ao seu cliente de auditoria; (2) porque os demais sócios o

pressionavam para vender esses serviços.

Na senda deste pensamento, Santos (2009) apresenta alguns estudos onde os

autores sumariam argumentos a favor e contra a prestação de serviços extra auditoria pelos

auditores aos seus clientes de auditoria. Na opinião de Carmichael e Swieringa (1968), a

prestação de serviços extra auditoria por parte dos auditores, aos seus clientes de auditoria,

inclui o facto de estes poderem estar a auditar o seu próprio trabalho. Adicionalmente

sugere que o fornecimento de serviços extra pode levar os auditores a desenvolver

interesses mútuos com as gestões das sociedades que requerem estes tipos de serviços. O

terceiro argumento contra refere que os auditores poderão sofrer conflitos de interesses

fiduciários, já que os seus clientes de auditoria seriam os acionistas da sociedade, mas o

cliente dos serviços de não auditoria seria a gestão da empresa. Craswell (1988) refere que

a evidência empírica quanto ao facto de os serviços extra auditoria deteriorarem ou não a

independência é inconclusiva, apresentando as conclusões contraditórias de estudos

australianos sobre o impacto das retribuições dos honorários dos serviços extra auditoria

nas decisões dos pareceres dos auditores, levados a cabo por Barkess e Simnett (1994) e

Wines (1994). Craswell (1988) acrescenta que enquanto os primeiros autores não

conseguiram encontrar qualquer relação, Wines (1994) conseguiu fazê-lo. Por seu turno,

Firth (2002) estudou no Reino Unido a relação existente entre os honorários dos serviços

extra auditoria e os honorários dos serviços de auditoria e a associação dos serviços extra

auditoria e a incidência nos pareceres dos auditores. Relativamente à primeira relação,

Firth (2002) concluiu pela existência de uma associação significativa entre os honorários

dos serviços de auditoria e serviços extra auditoria. Quanto à associação dos serviços extra

auditoria e a incidência nos pareceres dos auditores concluiu que, quanto mais elevados

11    

forem os honorários dos serviços extra auditoria pagos ao auditor maior probabilidade

existe de o parecer do auditor ser “limpo”. Também Li et al. (2003) chegaram a esta

conclusão num estudo realizado nas 200 maiores sociedades da Nova Zelândia, durante

três anos (1999, 2000 e 2001).

2. Metodologia

Neste artigo pretendemos, em primeiro lugar, estudar a relação existente entre a

opinião emitida pelo auditor e o tipo de SROC a que este pertence. De facto, será de

esperar que uma empresa de auditoria multinacional, quer pela sua dimensão quer pelos

recursos que possui, tenha uma atuação diferente de uma empresa representada apenas a

nível nacional e, por conseguinte, com menos reputação. Não obstante, será também

pertinente estudar algumas características intrínsecas ao próprio auditor. Assim, decidimos

estudar a relação existente entre a opinião emitida pelo auditor e o seu sexo e experiência

profissional. Pretendemos de igual modo, estudar a associação entre a opinião emitida

pelos auditores nos relatórios de auditoria e os honorários recebidos, quer pelos serviços de

RLC como pelos serviços extra RLC.

Considerando a natureza da investigação e o tipo de informação a recolher, que

deverá permitir medir os atributos que exercem influência sobre a opinião emitida pelos

auditores, pareceu-nos mais adequado recorrer ao método da análise documental. A opção

por este método deveu-se, essencialmente, ao facto deste se apresentar como um meio

flexível de obtenção de informações e útil para analisar as tendências e padrões dos

documentos, tal como assevera Stemler (2001). Lee e Guthrie (2010) consideram que este

método é uma ferramenta poderosa por ser das poucas técnicas disponíveis para a análise

de repositórios de texto, que constituem a maioria das comunicações de negócios.

Tendo por base a supracitada metodologia, esta investigação foi ministrada através

da recolha dos relatórios e contas e dos relatórios sobre o Governo das Sociedades,

referentes a 2011, das empresas com ações cotadas no mercado secundário da Euronext

Lisbon. A opção pela análise a relatórios anuais (e não outro tipo de publicação,

nomeadamente relatórios trimestrais e semestrais) justifica-se pela inserção de informações

mais completas nos relatórios publicados com informações anuais.

O período de recolha dos dados decorreu entre setembro e novembro de 2012 e

abrangeu 50 empresas, das quais 41 pertencem ao setor não financeiro e 9 ao setor

financeiro.

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Após a recolha dos dados no site da CMVM, e em alguns casos nos sites das

empresas estudadas, por não se encontrar a informação publicada no site da CMVM, estes

foram tratados com recurso ao programa informático Statiscal Package for Social Science

(SPSS), de forma a tratar e analisar os dados e testar as hipóteses formuladas.

O tratamento dos dados consistiu essencialmente numa análise univariada, cujos.

resultados serão apresentados em tabelas nos pontos seguintes. Posteriormente, para testar

as hipóteses de investigação propostas foi efetuada uma análise bivariada utilizando-se

para tal o coeficiente de correlação não paramétrico Ró de Spearman. Por fim, com o

intuito de verificar o poder preditivo das variáveis independentes sobre a nossa variável

dependente (opinião), procedeu-se à análise multivariada com a estimação do modelo de

regressão logística. A opção por este modelo, deveu-se ao facto da nossa variável

dependente ser do tipo nominal dicotómico.

3 Apresentação do Modelo

Tendo em conta estes pressupostos teóricos, a variável dependente desta

investigação é a opinião emitida pelos auditores nos relatórios de auditoria, o qual pode ser

modificado ou não modificado. Por sua vez, as variáveis independentes definidas foram, o

tipo de SROC a que o auditor pertence, o perfil do auditor, onde estudamos o sexo do

auditor e a experiência profissional como determinantes da opinião emitida por estes, os

honorários recebidos pelos auditores quer pelos serviços RLC quer por serviços extra RLC

prestados ao cliente, nomeadamente a prestação de serviços de consultoria.

A tabela seguinte apresenta uma síntese com a descrição das variáveis incluídas no modelo.

Tabela 1: Descrição das Variáveis

Descrição da variável Medida da Variável Sigla da Variável Estísticas DEPENDENTE

Opinião emitida pelo auditor

0: Opinião sem reservas nem ênfases; 1: Opinião com reservas

e/ou ênfases

OEA 0: 66% 1: 34%

INDEPENDENTE

Tipo de SROC 0: Multinacional; 1: Nacional SROC 0: 88% 1: 12%

Sexo do Auditor 0: Masculino; 1: Feminino SxAudit 0: 84% 1: 16%

Experiência Profissional 1: <10 Anos; 2: de 11-20 Anos; 3: de 21-30 Anos; 4: de 31-40 Anos ExProf

1: 20% 2: 42% 3: 32% 4: 6%

Honorários RLC 1: até 30%; 2: de 31%-50%; 3: de 51%-70%; 4: de 71%-90%; 5:>

91% HonRLC

1: 4% 2: 12% 3: 22%

13    

4: 30% 5: 32%

Honorários Extra RLC 1: até 30%; 2: de 31%-50%; 3: de 51%-70%; 4: de 71%-90%; HonExtraRLC

1: 62% 2: 22% 3: 12% 4: 4%

Do exposto, a equação que representa o modelo estimado é a seguinte:

Onde: OEA – opinião emitida pelo auditor no relatório de auditoria; SROC – tipo de sociedade de

revisores oficiais de contas; SxAudit – sexo do auditor; ExProf – experiência profissional do

auditor; HonRLC – honorários de revisão legal de contas; HonExtraRLC – honorários extra

revisão legal de contas; β0 a β7 – coeficientes estimados; ε – termo de erro.

4. Análise e discussão dos resultados 4.1. Análise Univariada

Concluído o tratamento dos dados recolhidos, apresentamos os resultados da

análise univariada, que constam na tabela seguinte:

Tabela 2: Estatísticas descritivas

Variável N Média Desvio Padrão Min. Máx.

DEPENDENTE

Opinião 50 0,34 0,479 0 1

INDEPENDENTE

Tipo de SROC 50 0,12 0,328 0 1

Sexo do Auditor 50 0,16 0,37 0 1

Experiência Profissional 50 2,24 0,847 1 4

Honorários RLC 50 3,74 1,157 1 5

Honorários Extra RLC 50 1,58 0,859 1 4

No que concerne à variável “Opinião”, verificou-se que 66% dos relatórios das

empresas auditadas são não modificados. Não obstante, embora sem afetar a opinião do

auditor, 30% das empresas receberam relatórios de auditoria com ênfases, ao passo que

apenas 4% receberam relatórios de auditoria com ênfases e com reservas, ou seja, 34% dos

OEA = �0 + �1SROC+ �2 SxAudit + �3 ExProf + �5 HonRLC + �6 HonExtraRLC + �,

 

14    

relatórios são modificados. A predominância de relatórios de auditoria não modificados

pode dever-se ao facto de se tratarem de empresas cotadas com maiores obrigações de

relato financeiro. Estas empresas são, geralmente, mais diligentes na preparação da

informação financeira, não só porque são alvo de mais exigências legais e contabilísticas,

mas porque visam atrair investidores. Por conseguinte, a receção de relatórios de auditoria

modificados poderá tornar a empresa menos atrativa aos olhos dos investidores, uma vez

que indiciará falta de fiabilidade ou transparência nas demonstrações financeiras ou

problemas de outra índole. A título de exemplo podemos referir os estudos empíricos de

Chow e Rice (1982), Choi e Jeter (1992), Cabal (2001), assim como Lin, Tang e Xiao

(2003) que concluíram que os relatórios de auditoria, principalmente com reservas, têm um

impacto significativo e negativo na cotação das ações, ou seja, a presença de relatórios de

auditoria modificados implica uma descida do valor das ações.

Relativamente à variável “Tipo de Sociedade de Revisores” (SROC) aferimos que

88% das SROC, responsáveis pela auditoria das empresas em estudo, são multinacionais,

enquanto que, apenas, 12% exercem atividade somente a nível nacional. À semelhança do

que foi referido anteriormente, este resultado pode estar relacionado com o desejo de

aumentar a reputação da entidade auditada, pois tal como refere Teoh e Wong (1993), os

stakeholders confiam mais nas demonstrações financeiras auditadas por este tipo empresas,

uma vez que nas mesmas os custos de perda de reputação são superiores. Deste modo, para

manter a sua reputação, estas empresas de auditoria tenderão a ser mais independentes.

Contrariamente, uma investigação levada a cabo por Gonçalves (2009) verificou que os

relatórios de auditoria emitidos pelas empresas de auditoria multinacionais são geralmente

mais “brandos” que os emitidos por auditores nacionais. Ou seja, tendencialmente as

empresas de auditoria multinacionais apresentam menos relatórios modificados, o que

pode explicar o facto de a maior parte das empresas estudadas optarem por SROC

multinacionais.

Em segundo lugar, apresentamos os aspetos relacionados com o perfil do auditor.

Os dados analisados indicam que num universo de 50 empresas auditadas, 42 dos sócios

responsáveis pela auditoria são de sexo masculino, os quais representam 84% da amostra

total, ao passo que apenas 8 auditores são do sexo feminino, representando 16%.

Relativamente à experiência profissional, 20% dos auditores têm menos de 10 anos

de experiência, 42% tem entre 11 e 20 anos de experiência, 32% tem entre 21 e 30 anos de

experiência, sendo que apenas 6% tem mais de 31 anos de experiência.

15    

Quanto à variável honorários de RLC, pela análise dos dados obtidos verificamos

que, em 16 das empresas auditadas, os honorários de RLC representam mais de 91% do

total de honorários pagos ao auditor e em 15 das empresas a percentagem de honorários

pagos aos auditores pelos serviços de RLC situa-se entre 71% e 90%. Em 11 empresas os

honorários de RLC representam uma percentagem entre 51% e 70%, ao passo que em 6

das empresas estudadas o valor dos honorários de RLC encontra-se entre 31% e 50% do

total de honorários pagos ao auditor. Apenas em 2 das empresas este tipo de honorários

representa uma percentagem igual ou inferior a 30% do total de honorários pagos pelos

serviços de RLC.

No que respeita a honorários de serviços extra RLC, os dados apontam que os

honorários pagos por este tipo de serviços em 31 das empresas estudadas representam uma

percentagem inferior a 30%. Em 11 das empresas estudadas verifica-se que a percentagem

de honorários pagos por serviços extra RLC se situa entre 30% e 50% ao passo que 6

empresas referem situar-se entre 51% e 70% do total de honorários pagos. Apenas em 2

empresas os honorários extra RLC representam uma percentagem entre 71% e 90% do

total de honorários pagos ao auditor.

De um modo geral, verificamos que a percentagem de honorários pagos aos

auditores pelo serviço de RLC é superior aos honorários pagos por serviços extra RLC. A

este propósito salientamos os resultados de alguns estudos que referem que a prestação de

uma gama importante de serviços para além dos de auditoria pode prejudicar a

objetividade do auditor em relação ao seu cliente. Autores, como Coffee (2002), referem

que se os honorários de serviços extra RLC forem superiores aos honorários pagos pelos

serviços de auditoria cria-se, não só um incentivo para os auditores quererem agradar aos

seus clientes, como permite aos clientes pressionar os auditores, ameaçando dispensar os

seus serviços de auditoria. Por isso, os resultados obtidos na nossa investigação levam-nos,

desde logo, a considerar que as empresas estão atentas e cumprem as exigências legais para

salvaguardar a independência.

4.2. Análise Bivariada e Multivariada

Na análise à intensidade de associação entre as variáveis usamos o coeficiente não

paramétrico Ró de Spearman e interpretamos a associação linear entre as variáveis como

sendo: associação linear muito baixa para Ró menor que 0,2. Para valores situados entre

0,2 e 0,39 a associação linear é baixa, sendo uma associação linear moderada para valores

16    

de Ró entre 0,40 e 0,69. Entre 0,7 e 0,89 a associação linear é alta e entre 0,9 e 1 é muito

alta. O sinal negativo da correlação significa uma variação em sentido contrário nas

variáveis, isto é, as categorias mais elevadas de uma variável estão associadas a categorias

mais baixas de outra variável (Pestana e Gageiro, 2008). Os resultados desta análise estão

apresentados em forma de síntese na tabela 3.

Tabela 3: Resultados da Análise Bivariada

Variáveis Rho de Spearman

Coeficiente de Correlação P-Value Tipo de SROC 0,255 0,074

Sexo do Auditor 0,032 0,824

Experiência Profissional 0,185 0,198

Honorários RLC 0,146 0,312

Honorários Extra RLC -0,120 0,407

Com vista a complementar as análises univariada e bivariada, apresentamos na

tabela 4 os resultados do modelo de regressão estimado. De referir que o coeficiente de

determinação apresenta um valor baixo (R2 = 6,532) significando um reduzido ajustamento

do modelo. Apesar da falta de significância das relações testadas neste modelo, o sinal

verificado confirma os estudos apresentados na revisão de literatura, tal como se analisa de

seguida.

Tabela 4: Resultados da Análise Multivariada

Variáveis Independentes

Hipóteses Coeficientes estimados

Significância

SROC H1(+) 1.216

0,346

SEXO H2(+) 0,598 0,542 EXPROF H3(+) 0,376 0,444 HONRLC H5(-) -0,107 0,903 HONEXTRARLC H6(-) -0,205 0,857 Constante -0,816 0,873 N 50 -2Log likelihood 60.157 R2 6.532 Nagelkerke R2 0.105

17    

De seguida, apresentamos os resultados das análises bivariada e multivariada

para cada uma das hipóteses formuladas, retirando as principais conclusões.

H1 - A opinião emitida pelo auditor está diretamente relacionada com o tipo de SROC a

que o mesmo pertence.

Na amostra usada nesta investigação 88% das SROC são multinacionais. São,

portanto, empresas de considerável dimensão, onde as Big Four2 representam uma

poderosa percentagem, o que, desde logo, poderá ser um indício de que as empresas

auditadas atribuem maior credibilidade às empresas de auditoria de maior dimensão, o que

pode ser traduzido pela objetividade e independência da opinião emitida no âmbito da

CLC. Os estudos de DeAngelo (1981) e Teoh e Wong (1993) comprovam que os próprios

utilizadores conferem mais credibilidade às empresas de auditoria multinacionais, o que

pode motivar as empresas sujeitas a auditoria a contratar este tipo de empresa. No entanto,

neste estudo não conseguimos provar que a opinião emitida pelos auditores está associada

ao tipo de SROC a que o mesmo pertence. Esta constatação deve-se ao facto do valor da

correlação de Spearman ser baixo (0,255), levando-nos a reter a hipótese nula (H0) e,

consequentemente, concluir que não há associação entre a opinião emitida pelos auditores

e o tipo de SROC a que pertencem. Não obstante, e apesar de estarmos perante um

resultado estatisticamente não significativo, este está muito próximo do ponto de corte de

0,05 (p-value = 0,074) e portanto é designado de resultado marginalmente significativo3.

Cumpre referir que, o resultado da análise multivariada com recurso ao modelo de

regressão logística reforça esta mesma conclusão (p-value = 0,346), sendo que o sinal

positivo indica que a probabilidade da opinião ser modificada é maior quando a SROC é

nacional, corroborando os resultados do estudo elaborado por Gonçalves (2009) que

conclui que as empresas de auditoria multinacionais emitem menos relatórios modificados

que as empresas de auditoria nacionais.

H2 - A opinião emitida pelo auditor está diretamente relacionada com o sexo do auditor.

                                                                                                                         2 Deloitte & Associados, SROC, S.A; PricewaterhouseCoopers & Associados, SROC, Lda.; KPMG & Associados, SROC, S.A e Ernst & Young Audit & Associados, SROC, S.A.

3 Recentemente a comunidade científica optou por distinguir, de entre os resultados não significativos, aqueles que são inferiores a 0.10, ou seja, cuja probabilidade de ocorrência devida ao acaso ser 10 em 100 vezes. Ou seja, apesar de não serem estatisticamente significativos devem ser tratados como resultados marginalmente significativos (Martins, 2011), o que acontece neste caso.

18    

Pela revisão da bibliografia verificamos a falta de uniformidade em relação à

variável sexo, uma vez que os estudos apresentados não são concordantes e, como tal, não

é claro se o sexo do auditor pode ter ou não influência sobre a qualidade da auditoria. Se

por um lado, autores como Chin e Chi (2008), citados por Hossain e Chapple (2012), e

Hardies et al. (2010) associam a opinião emitida ao sexo do auditor por outro lado, um

estudo elaborado por Breesch e Branson (2009) relata que não existe qualquer diferença na

gravidade da opinião de auditoria emitida por auditores do sexo feminino e masculino.

Na nossa investigação, a correlação encontrada entre a opinião emitida pelos

auditores e o sexo do auditor é de 0,032 com uma probabilidade associada de p = 0,824.

Estes resultados vão de encontro com os resultados obtidos por Breesch e Branson (2009),

levando-nos a verificar que estamos perante a ausência de correlação entre as variáveis em

estudo, pelo que poderemos concluir que a opinião emitida pelo auditor não está

diretamente relacionada com o sexo do auditor. Contudo, os resultados do modelo de

regressão logística revelam uma relação positiva entre estas duas variáveis (p-value =

0,542). Apesar de não ser uma relação significativa, o sinal positivo indica que a

probabilidade de emissão de um relatório de auditoria modificado pode ser maior quando o

responsável pela auditoria é do sexo feminino, contrariando, assim, os resultados obtidos

por Chin e Chi (2008) e Hardies et al. (2010).

H3 - A opinião emitida pelos auditores está diretamente relacionada com a sua

experiência profissional.

Neste caso, a correlação encontrada entre estas duas variáveis é de 0,185 (rs

=0,20)4 com uma probabilidade associada de p = 0,198. Como p-value é superior a 0,05

não rejeitamos a hipótese nula (H0), concluindo, desta forma, que não existe associação

entre a opinião emitida pelos auditores e a sua experiência profissional. Estes resultados

contrariam as ilações dos estudos empíricos efetuados pela generalidade dos autores

referidos na revisão da bibliografia. Contudo, o sinal positivo revela que há uma tendência

para que os auditores com mais experiência apresentem relatórios modificados com maior

frequência, o que contraria os estudos apresentados por Libby e Frederick (1990) que

salientam que a experiencia aumenta a probabilidade de emissão de uma opinião positiva.

                                                                                                                         4 Os resultados de testes inferenciais devem ser arredondados à segunda casa decimal. No caso do valor de p (ou significância estatística), deve ser apresentado o seu valor exato, arredondando-se à segunda ou terceira casa decimal (Martins, 2011).

19    

H4 - A opinião emitida pelo auditor está diretamente relacionada com os honorários

recebidos pelo auditor decorrentes de serviços de RLC.

A correlação encontrada entre a opinião emitida pelo auditor e os honorários

recebidos pelos serviços de RLC é 0,146 (rs =0,15) com uma probabilidade associada de p

= 0,312. Por conseguinte, não existe associação significativa entre a opinião emitida pelos

auditores e os honorários que este recebe pelos serviços de RLC. Adicionalmente, os

resultados da análise multivariada permitem-nos verificar que estas duas variáveis se

encontram negativamente relacionadas. Esta relação negativa significa que a probabilidade

de emitir relatórios modificados diminui à medida que os honorários aumentam, embora

esta relação não tenha significância estatística. Esta conclusão reforça os resultados de

autores como Farmer et al. (1987) e Seabrigh et al. (1992) que referem que quanto mais

dependente, financeiramente, estiver o auditor do cliente maior é a probabilidade deste

emitir uma opinião limpa, para não desagradar o seu cliente. Inversamente, Reynolds e

Francis (2001) e DeFond et al. (2002) defendem que a proteção da reputação do auditor e o

custo de litígios se sobrepõem aos benefícios esperados com o comprometimento da

independência.

H5 - A opinião emitida pelo auditor está diretamente relacionada com os honorários

recebidos pelo auditor decorrentes de serviços de extra RLC.

Os resultados desta investigação, ainda que revelem a inexistência de uma relação

significativa entre os honorários pagos pela prestação de serviços extra RLC e os pareceres

emitidos pelos auditores, indicam uma relação inversa entre as variáveis. Isto significa que

quanto maiores os honorários extra RLC pagos à SROC, maior a probabilidade deste emitir

um relatório não modificado. Este resultado vai de encontro ao do estudo de Firth (2002),

realizado nos Estados Unidos, que concluiu que quanto mais elevados forem os honorários

dos serviços extra auditoria pagos ao auditor, maior a probabilidade deste emitir um

parecer não modificado (Santos, 2009).

Este resultado vem, ainda, reforçar os indicadores obtidos na hipótese anterior,

onde se verificou que a probabilidade de emitir relatórios modificados diminui à medida

que os honorários aumentam. Desta forma, e tal como referem Gul et al. (1992) e Seabrigh

et al. (1992) a dependência financeira face ao cliente apresenta-se como um fator

potenciador de perda de independência do auditor, podendo influenciar a sua opinião.

20    

Conclusões

Pretendeu-se com este estudo analisar alguns fatores que podem constituir ameaças

à independência do auditor e, consequentemente, influenciar a opinião deste nos relatórios

que emite. No entanto, após a análise dos resultados obtidos, todas as hipóteses testadas

apresentaram resultados não significativos, o que nos levou a reter a hipótese nula (H0) em

todas as hipóteses que determinaram o foco da investigação, e consequentemente a

concluir que, não há associação significativa entre a opinião emitida pelos auditores e as

diferentes variáveis independentes que se pretendiam testar, o que indicia a independência

do auditor. Não obstante, os resultados revelam que as variáveis “tipo de SROC”, “sexo do

auditor” e “experiência profissional” estão positivamente relacionadas com a opinião

emitida pelo auditor, enquanto as variáveis “honorários de RLC” e “honorários extra RLC”

apresentam uma relação inversa. Desta forma, salientamos que embora os resultados não se

tenham revelado estatisticamente significativos, na maior parte das nossas conclusões os

sinais obtidos vão de encontro à literatura. Assim, tal como comprovamos na revisão da

literatura a probabilidade de emissão de relatórios modificados é maior quando a SROC é

nacional (Gonçalves 2009), diminuindo à medida que os honorários aumentam devido à

maior dependência financeira perante o cliente (Farmer et al., 1987 e Seabrigh et al. 1992).

De modo semelhante, tal como concluiu Firth (2002), comprovamos que quanto maiores os

honorários extra RLC pagos à SROC maior a probabilidade deste emitir um relatório não

modificado.

Entendemos que estes resultados se devem sobretudo ao facto de grande parte das

opiniões emitidas pelos auditores nos relatórios de CLC serem não modificadas, o que

indicia que as variáveis em estudo não exercem influência significativa sobre a opinião do

auditor. Estes resultados não deixam de ser curiosos, uma vez que nenhuma das empresas

estudadas apresenta relatórios com opiniões mais gravosas, como o caso de opinião

adversa e impossibilidade de opinião. O facto do estudo ter sido aplicado em empresas

cotadas na bolsa de valores mobiliários poderá ter sido também um importante

determinante uma vez que à partida são entidades que, por estarem sujeitas a regras mais

exigentes, estarão mais atentas às imposições legais e contabilísticas e as próprias SROC

que as auditam serão mais exigentes.

Apesar da falta de significância estatística, este estudo contribuiu para reforçar a

importância da independência do auditor, no exercício das suas funções, uma vez que o seu

papel no contexto empresarial é fundamental para conferir credibilidade às informações

21    

que servirão de suporte à tomada de decisões, por parte dos vários utentes. Por essa razão,

a opinião emitida pelo auditor deverá ser objetiva e verdadeira, sendo para tal, essencial

que este profissional não se deixe manipular pelos clientes. Adicionalmente, esperamos ter

contribuído para enriquecer a literatura académica e estimular a investigação nesta área.

Em trabalhos de investigação futura pretende-se evoluir no sentido de melhorar o

ajustamento do modelo com vista a uma melhor compreensão dos determinantes da

opinião do auditor. Para tal propõe-se alargar a amostra do estudo a outras empresas não

cotadas em bolsa, sujeitas a diferentes obrigações em termos de relato financeiro. Este

alargamento da amostra permitir-nos-ia testar o efeito da cotação em bolsa das empresas

nos relatórios de auditoria. Por outro lado, outras variáveis poderão ser introduzidas no

modelo com vista à melhoria do ajustamento do modelo e aumentar assim o contributo do

estudo para o conhecimento nesta área.

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