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Ficha Técnica
Organização e EdiçãoComissão Diocesana para os Bens Culturais da Igreja — Diocese de Santarém
ProduçãoComissão Diocesana para os Bens Culturais da Igreja — Diocese de SantarémApoios: Câmara Municipal de Santarém
Museu da Presidência da RepúblicaParóquia do Divino Salvador — Sé, SantarémJorge de Brito e AbreuMaria Teresa de Brito e Abreu Ribeiro TellesMaria Natália Rodrigues da SilvaParóquia de Santa Iria da Ribeira, Santarém
Coordenação ExecutivaEva Raquel NevesP. Joaquim Augusto Nunes Ganhão
ConteúdosEva Raquel NevesCada Rêgo, Alexandre Fernandes e João Ribeiro, Departamento de Arte, Conservaçãoe Restauro do Instituto Politécnico de Tomar
Legendagem e textos de apoioEva Raquel Neves
Design GráficoProgresso e Vida Lda. — Gráfica Almondina
CapaSamuel Ramos— leumasdesign.net
FotografiaSamuel RamosEva Raquel Neves
ImpressãoProgresso e Vida Lda. — Gráfica Almondina
Local e DataSantarém, 2009
Tiragem600 exemplares
ISBN978-989-96427-0-6
Depósito Legal300170/09
AgradecimentosCada Rêgo, Eva Armindo, Diogo Gaspar, João Soalheiro, Jorge de Brito e Abreu, LeonelCardigos, Marco Loja, Marco Félix, Maria Natália Rodrigues da Silva, Maria Teresa deBrito e Abreu Ribeiro Telles, Miguel Veloso, P. Aníbal Vieira, P. António Mendes,Samuel Ramos, Ricardo Martins, Rita Oliveira, Vítor Gaspar.A Diocese de Santarém agradece ainda ao Instituto Politécnico de Tomar a oferta daintervenção de conservação e restauro realizada na escultura de São Francisco Xavier.
Culturais Museu da .
Sr:rre°,e= 5.40
Paróquiado Divino I
Salvador - SéInstituto Politécnico de Tomar louro
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A Escultura de São Francisco Xavier da Sé Catedralde Santarém - Conservação e Restauro
(Departamento de Arte, Conservação e Restauro do Instituto Politécnico de Tomar)
1. INTRODUÇÃO
A intervenção de conservação erestauro da escultura policroma-da que representa São FranciscoXavier, pertencente à Sé Catedralde Santarém foi efectuada nosLaboratórios de Conservação eRestauro de Pintura e Esculturaem madeira policromada do De-partamento de Arte, Conservaçãoe Restauro do Instituto Politécni-co de Tomar. Esta intervenção foiexecutada no âmbito do protocolo,em vigor, assinado entre a Dioce-se de Santarém e o Instituto Po-litécnico de Tomar e que acorda acolaboração entre as duas institui-ções no sentido da salvaguarda dopatrimónio artístico pertencenteàquela diocese e da formação su-perior em conservação e restauroministrada no Departamento deArte, Conservação e Restauro doInstituto Politécnico de Tomar.
A escultura de São Francisco Xa-vier foi, neste contexto, objecto deestudo e intervenção, no âmbitoda unidade curricular Conservaçãoe Restauro Aplicada do mestrado
em Conservação e Restauro, poralunos que elegeram a especialida-de de escultura. O artigo aqui apre-sentado sistematiza e sintetizatodo o trabalho de intervenção queé sustentado pelo relatório técnicorealizado pelo grupo de alunos Ale-xandre Fernandes e João Ribeiro,afecto a este projecto e orientadopela a Professora Carla Rêgo.
2. MATERIAISE TÉCNICAS DE EXECUÇÃO
2.1 Suporte
Ao nível do suporte a matéria éa madeira, podendo afirmar-se queo tipo de material lenhoso variaconsoante os diferentes blocos queconstituem a escultura. Os anéisde crescimento são uniformes e,por esse facto, pode assegurar--se que a madeira predominante éuma folhosa, mais concretamente,carvalho e castanho, espécie muitousada em Portugal na produção deescultura.
Em termos de técnicas constru-tivas ao nível do suporte, podemos
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atestar que se trata de uma escul-tura entalhada, de vulto perfeito.Após a análise de raios-X — que per-mite conhecer a estrutura internado objecto dado que este tipo deradiação tem a capacidade de atra-vessar todas as camadas, desde overniz de acabamento até ao su-porte — verifica-se a existência deuma zona mais escura no sentidolongitudinal, representada pela le-tra "a" (Figura 1). Essa é uma áreade menor opacidade aos raios-X,pois existe uma menor espessu-ra em termos de suporte lenho-so, apresentando uma resistênciamínima à passagem da radiação,devido ao facto da peça ser oca noseu interior, técnica denominadade concha, e que tinha como ob-jectivo, não só diminuir o peso dapeça, mas também os movimentosnaturais da madeira (contracção edilatação), responsáveis pelo apa-recimento de fendas.
Em esculturas de grande dimen-são, como é o caso desta, torna-seimpossível que a mesma seja ela-borada num único bloco de ma-deira. Desta forma, a zona centralpertence a uma secção única de umtronco, correspondendo os braçose algumas zonas na base a blocosdistintos, ligados entre si com ade-sivo ou a partir de elementos me-
tálicos, conforme é possível obser-var na figura 2.
Algumas zonas da esculturaapresentam uma tela sobre a ma-deira, um procedimento comumna produção escultórica destetipo, que permite às camadas depreparação e policromia acompa-nhar os movimentos de oscilaçãoda madeira, reduzido assim o sur-
Figura 1: Radiografia. As zonas mais cla-ras representam zonas de resistência maiselevada à passagem da radiação, e por issozonas mais densas, enquanto as zonasmais escuras indicam menor resistência àradiação, significando uma menor espes-sura do material lenhoso.
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gimento de danos como destaca-mentos de policromia ou o apare-
cimento de fissuras.Após recolha de uma peque-
na amostra deste material têxtil,procedeu-se à sua análise atravésda observação ao microscópio óp-tico (40x), onde se identificaramfibras vegetais, possivelmente dealgodão.
2.2 Análises estratigráficas
A identificação e caracterizaçãodos estratos superficiais foramconseguidas através de montagensestratigráficas.
As amostras estratigráficas foram
recolhidas em pontos considera-dos relevantes e que acrescentas-sem informação sobre as técnicasde execução, os materiais envol-vidos e suas características, bemcomo a existência de intervençõesanteriores. Deste modo foram re-colhidas onze amostras em locaisdistintos, nomeadamente, nas car-
naçõ es (face, tonsura e mãos), no
cabelo, na estola (duas amostras),
na túnica (no repinte e no origi-nal), no hábito e na base (marmo-reado).
Após observação e interpreta-ção das amostras estratigráficas,verifica-se que correspondem nasua maioria, a uma estratigrafia
Figura 2: Esquematização das técnicas construtivas através da união de blocos
cr
Frente Lateral esquerda
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típica da escultura policromada,exceptuando nas zonas de carna-ção, onde se identifica sobre a po-licromia original uma camada derepinte. A amostra das mãos apre-senta-se algo imprecisa, revelandoníveis estratigráficos não patentesnas outras áreas de carnação, taiscomo, a existência de repintes/re-policromias integrais (números 1,2 e 3 da figura 3, sendo o a' umazona com um adesivo antigo).
Na figura 4, a zona a correspon-de a uma preparação branca deaglutinante proteico. A zona b, detextura homogénea e de reduzidaespessura, assemelha-se a uma re-sina (figura 3 - a'). Quanto à zonac, apresenta-se com uma texturaheterogénea, de tonalidade acasta-nhada e espessura superior às ca-madas anteriores. A camada d é ade maior espessura, apresentando
aspecto heterogéneo, de cor acin-zentada e granulometria grosseira.Estas duas últimas camadas cor-
respondem aos repintes patentes
na figura 3, nomeadamente, nas
zonas 2 e 3.
2.3 Técnicas de decoração
Característica neste período ar-
tístico é a riqueza das decorações
nomeadamente através da técnica
de estofado (puncionado e o es-
grafitado, que se pode observar
na estola, no hábito branco (área
superior) e negro (área inferior),
e ainda o marmoreado (imitação
de material pétreo), na base. Esta
peça é também rica em motivos
decorativos distintos consoante alocalização, e que foram esquema-
tizados segundo a figura 5.
Figura 3: Pormenor de um dedo onde os
vários níveis de destacamento permitem
perceber os vários níveis estratigráficos
da carnação. (a' — resina?; 1 — policromia
original; 2 e 3 — repintes).
Figura 4: Corte estratigráfico (carnaçãoda zona da mão esquerda). (a— prepara-ção com aglutinante proteico; b — resina;c e d — repintes).
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Extremidade esquerda
Interior da estola
Figura 5: Esquematização dos vários motivos e técnicas decorativas, e respectiva localização.
Legenda:
Puncionado
Folha de ouro
Legenda:
Puncionado
Folha de ouro
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Legenda:
Puncionado
E Policromia
O Esgrafitado
O Folha de ouro
3. ESTADO DE CONSERVAÇÃO
A intervenção foi precedida
numa primeira fase, por um le-
vantamento minucioso de todas
as patologias e danos (figura 6),
através da observação directa da
obra, reconhecendo assim o seu
estado de conservação, bem como
as intervenções anteriores. Contu-
do, numa segunda fase, o recursoa exames físicos e análises quími-
cas tornou-se imprescindível, para
a identificação da natureza de um
material ou de um dano, de modo
a formular-se convenientemente
o diagnóstico e a posterior meto-
dologia a aplicar. Foram realizados
exames físicos, tais como exame
fotográfico por luz ultravioleta e
radiografia, análises microscópicas
que incluíram as análises estrati-
gráficas, a identificação da natureza
da tela, análises químicas e identifi-
cação da espécie da madeira.Relativamente ao estado de
conservação a obra apresentava,ao nível do suporte, inúmeras fis-
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suras (figura 7), extensíveis um
pouco por toda a peça, principal-
mente, nas zonas de ligação dos
blocos, fendas com extensão va-
riável, destacando-se as exis-
tentes no verso e na base da es-
cultura. Verificou-se também a
presença de elementos metálicos
oxidados de origem ferrosa nas
zonas de reforço e união dos blo-
cos que compõem a obra, assim
como no elemento responsável
pelo suporte do resplendor. Cons-
tatou-se ainda, a existência de
lacunas ao nível do suporte, no-
meadamente, no verso da base e
em ambas as mãos (figura 8), bem
como lacunas ao nível do material
de incrustação (olhos de vidro).
A nível da superfície existiam
destacamentos pontuais das ca-
madas de preparação e policroma,
alteração da camada de protecção
(verniz), revelada pelo seu ama-
relecimento e opacidade, e ainda
a existência de sujidades superfi-
ciais, tais como poeiras, presença
de estearina (figura 11), entre ou-
tros.
A escultura apresentava inú-
meros indícios de intervenções
anteriores, tais como colagens
de fragmentos na zona da estola
(figura 10), repintes na frente da
túnica e a realização de um orifí-
cio no topo da cabeça que serviria
para acomodar o resplendor não
contemporâneo da peça (figura 9).
Figura 6: Mapeamento de patologias.
Frente Costas
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Lateral Direita Lateral Esquerda
Legertda:
▪ Estearina
• Suporte-madeira
▪ Destacamento ao nível da policromia
Destacamento ao nível da preparação
Elementos metálicos oxidados
E Fractura
II Fenda com afastamento
1:11 Abertura da junta de ligaçào de blocos
Zona carbonizadaLacuna ao nível do suporte
Repinte (intervenção anterior)
E Intervenção anterior
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Figura 7: Abertura na junção de blocos.
Figura 10: Restauro antigo na zona da
estola.
Figura 8: Lacunas ao nível do suporte,
na zona dos dedos da mão esquerda.
Figura 11: Presença de resíduos de estea-
rina.
Figura 9: Destacamentos e desgastes pon-tuais e orifício para colocação de resplen-dor não original.
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4. METODOLOGIADA INTERVENÇÃO
Toda a metodologia de inter-venção foi sustentada tendo emconta os exames, análises, pesqui-sas realizadas e suas conclusões,tendo seguido uma linha não sóconservativa como também derestauro, dado que os danos que apeça apresentava diminuíam a suaintegridade física. Exercendo estaobra uma função cultual e cultural,tornou-se imprescindível restabe-lecer assim a sua função estética.
Figura 12: Remoção do elemento metálicooxidado (intervenção anterior), que unia obloco no verso do lado direito da base.
Todos os materiais e técnicas deintervenção foram seleccionadossegundo princípios de compatibili-dade, diferenciação e reversibilida-de, tendo em conta igualmente, asua qualidade, durabilidade e futu-ra estabilidade, promovendo destemodo o sucesso da intervenção esalvaguarda da integridade física,autenticidade e historicidade daescultura.
Antes de qualquer exame oumanuseamento da obra foi realiza-da uma limpeza mecânica superfi-cial e uma pré-fixação (figura 17)nas zonas que se encontravam emrisco de destacamento, com recur-so a um adesivo vinílico em disper-são aquosa.
De seguida, procedeu-se à des-montagem dos blocos que se en-contravam deslocados, com oobjectivo de, posteriormente, seefectuar a sua união adequada. Nasequência dos tratamentos de su-porte foram removidos os adesi-vos antigos e elementos metálicosoxidados, onde a sua remoção nãocomprometia a integridade físicada peça (figura 12), bem como, adesoxidação de outros que, cum-prindo a sua função original, fo-ram mantidos.
Posteriormente, efectuou-se umaimunização do suporte, com vistaa prevenir o ataque biológico, uti-lizando um biocida cujo princípioactivo é a permetrina.
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Seguidamente, optou-se pelotratamento de fendas (figura 13)com a aplicação de balsa e umapasta de fibras de celulose, adicio-nada de água desionizada e gotasde acetato de polivinilo e posteriornivelamento após secagem, com oobjectivo de conferir maior estabi-lidade química e mecânica nestasáreas. Nesta fase foram tambémefectuadas reconstituições vo-lumétricas de partes em falta(figura 14), com o objectivo dedevolver uma leitura adequada daobra tendo em conta também a suafunção actual.
Finalizados os tratamentos desuporte iniciou-se a intervençãona superfície, pela limpeza da ca-mada policroma (figuras 15 e 18)com o auxílio de mistura de solven-tes, com a finalidade de remover overniz alterado e outras sujidades.Nesta fase, e com os testes realiza-dos, é importante referir, que naszonas de repinte, nomeadamentea zona superior da veste, esta ope-ração acarretava riscos elevados,visto que as misturas de testadas(com características decapantes)removiam igualmente a camada depolicromia original, pelo que se op-tou por não remover esta marca deintervenção anterior.
Ultimado este procedimentoexecutaram-se os preenchimen-tos ao nível da camada de prepa-ração, tendo-se elegido para estefim, um mástique sintético, acríli-
co e vinílico, que posteriormentefoi nivelado, permitindo assim aimediata reintegração cromática,funcionando ainda como materialde apoio e sustentação da matériapolicroma envolvente.
Relativamente à reintegraçãocromática, a técnica eleita foi umadiferenciada (figuras 16 e 19), trat-tegio, já que se pretendia uma dis-tinção entre a policromia originale a intervenção, utilizando mate-riais reversíveis com boa estabili-dade química.
Para concluir o tratamento apli-cou-se uma camada de protecção,indispensável à protecção da ca-mada policroma (figuras 20, 21, 22e 23).
Figura 13: Tratamento de fendas.
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Figura 14: Reconstituição volumétrica departe do dedo anelar da mão esquerda.
Figura 17: Pré-fixação pontual da ca-
mada de preparação ao suporte.
Figura 15: Limpeza da superfície (área derepinte), com recurso a solventes.
Figura 18: Limpeza da super-
fície com recurso a solventes.
Figura 16: Reintegração cromática dife-renciada na zona da base.
Figura 19: Reintegração cromáticadiferenciada realizada na mão.
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Figura 22: Fotografia documen-tal - Frente (após intervenção).
Figura 23: Fotografia docu-mental - Costas (após inter-venção).
Figura 20: Fotografia documen- Figura 21: Fotografia docu-tal - Frente (antes da interven- mental - Costas (antes da in-ção). tervenção)
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5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O trabalho desenvolvido emtorno da escultura de São Francis-co Xavier procurou retribuir-lhea dignidade cultual e estética quecertamente revestiu o momentoda sua produção, para integrar umdos altares laterais da então Igrejade Nossa Senhora da Conceição doColégio dos Jesuítas, actualmenteSé Catedral de Santarém. Grandeparte da imaginária deste localcruza-se inevitavelmente com ahagiografia jesuítica, onde não po-
deria faltar o grandioso missioná-rio natural de Espanha.
Foi sem dúvida valorizador paraas duas instituições envolvidas,Diocese de Santarém e InstitutoPolitécnico de Tomar, a iniciati-va da selecção para intervenção ea inclusão desta peça no âmbitodas unidades curriculares de mes-trado, e que permite em primeirae última instância a concretizaçãode projectos de salvaguarda dopatrimónio.
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