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Subsídio para o conhecimento da flora económica da Guiné Algumas plantas tintoriais lsatis tinctoria LINN: Crucífera produtora do celebrado pastel dos tintureiros (espécie outrora intensamente cultivada na Europa) foi até o último quartel do século XVIlI inimiga irreconciliável das plantas tinturiais asiáticas, africanas e americanas; a protecção e propaganda organizadas em quase todos os países europeus a favor daquela e contra estas levaram a chamar tinta do diabo a droga proveniente de várias espécies do género Indigofera. A Holanda, que então figurava como a principal importadora do indigo de procedência oriental, deixou de o ser a partir do século XVII como medida de protecção à Isatis. Na Alemanha, iguais medidas foram tomadas; na Inglaterra foram destruídos os produtos já armazenados. «Em Nuremberga os magistrados obrigavam os tintureiros a prestar anualmente juramento de que não empregariam o indigo. Em França, de 1598 a 1737, o uso do anil foi interdito a fim de proteger os produtores de pastel». (1) Só mais tarde; já nos fins do século XVIII ou pouco depois, é que aos tintureiros foi facultado preferir as tintas a utilizar na laboração das suas indústrias. A partir desta época, a cultura do anileiro tomou certo incremento, principalmente na América Central e Índia, cujos produtos afluíam aos mercados conjuntamente com as matérias primas congéneres das plantas cultivadas e, sobretudo, das espécies espontâneas da Africa Tropical e Subtropical. Não há dúvida que os aborígenes da Senegâmbia e Guiné conheciam de há· muito o uso do indigo ou, ao que parece, receberam dos maometa- lsatis tinctoria

Flora da Guiné

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Page 1: Flora da Guiné

Subsídio para o conhecimento da flora económica da

Guiné

Algumas plantas tintoriais

lsatis tinctoria LINN:

Crucífera produtora do celebrado pastel dos tintureiros (espécie outrora

intensamente cultivada na Europa) foi até o último quartel do século XVIlI

inimiga irreconciliável das plantas tinturiais asiáticas, africanas e americanas; a

protecção e propaganda organizadas em quase todos os países europeus a

favor daquela e contra estas levaram a chamar tinta do diabo a droga

proveniente de várias espécies do género Indigofera.

A Holanda, que então figurava como a principal importadora do indigo de

procedência oriental, deixou de o ser a partir do século XVII como medida de

protecção à Isatis.

Na Alemanha, iguais medidas foram tomadas; na Inglaterra foram

destruídos os produtos já armazenados.

«Em Nuremberga os magistrados obrigavam os tintureiros a prestar

anualmente juramento de que não empregariam o indigo. Em França, de 1598

a 1737, o uso do anil foi interdito a fim de proteger os produtores de

pastel». (1)

Só mais tarde; já nos fins do século XVIII ou pouco depois, é que aos

tintureiros foi facultado preferir as tintas a utilizar na laboração das suas

indústrias. A partir desta época, a cultura do anileiro tomou certo

incremento, principalmente na América Central e Índia, cujos produtos

afluíam aos mercados conjuntamente com as matérias primas congéneres

das plantas cultivadas e, sobretudo, das espécies espontâneas da Africa

Tropical e Subtropical.

Não há dúvida que os aborígenes da Senegâmbia e Guiné conheciam

de há· muito o uso do indigo ou, ao que parece, receberam dos maometa-

lsatis tinctoria

Page 2: Flora da Guiné

nos, desde um período bastante recuado, a arte de extracção e aplicação

deste produto.

«André Alvares de Almada - escreve FICALHO - que percorreu os rios

da Guiné a partir de 1566 fala dos panos de algodão brancos e pretos que

usavam os jalofos e mandingas, diz que os tintos são tão finos que cegam

os que vêem e explica detidamente o processo empregado na extracção da

tintas» (2).

Sabe-se que o conhecimento da técnica da extracção e o modo de

utilização do anil passou da Guiné para o arquipélago de Cabo Verde,

onde, diga-se de passagem, por certo prosperou a ponto de haver pro-

movido, nas ilhas de Santo Antão e São Tiago, a instalação de fábricas

para a sua industrialização; sabe-se também que essas fábricas se encon-

travam em completa ruina, por falta de actuação técnica eficiente, no fim do

século passado.

«Hoje - escreve FICALHo em 1884 - a extracção da tinta e sua

aplicação acham-se nas ilhas de Cabo Verde entregues à pequena indús-

tria caseira, que pelos mais rudimentares e imperfeitos processos consegue

no entanto tingir com certa perícia e graça os panos de lei, de agulha,

galans, etc.s (3).* Nessa luta desigual da Isatis contra a Indigofera ambas foram feridas de

morte com os porfiados trabalhos de HEUMAN baseados na síntese da

indigotina realizada por BAYER (4) em 1878. De então para cá, com os

aperfeiçoamentos incessantes da técnica de produção, o anil sintético tem

tomado dia a dia vulto de tal sorte que hoje o anil natural só de longe em longe

intervém como droga medicamentosa.

Entretanto, as plantas tinturiais cultivadas, ruderais e espontâneas dos

géneros Indiqofera e Lonchocorpus, principalmente deste último, ainda

representam na indústria caseira indígena um apreciável valor económico.

É curioso notar-se, ainda que pareça estranho, que os anileiros «as

arvorezinhas» de que nos fala ANDRÉ ÁLVARES DE ALMADA (5) se acham

hoje confinados num aro de utilidades bem restrictas; ou porque a extracção da

tinta da lndigofera tivesse caído em desuso, ou porque fosse preferida a lei de

menor esforço pela adopção da colheita de produtos espontâneos de

Lonchocarpus (tinta grande), os indígenas falam da Indigofera (tinta pequena)

como coisa dos «tempos idos», de utilidade meramente aparente.

Seja como for, parece que os factos até agora observados nos conduzem

naturalmente à ilacção de que as plantas produtoras do indigo-cârre, baludo,

banhepe, banô cárô e gara (6) - respectivamente dos balantas, brames,

Page 3: Flora da Guiné

manjacos, papeis, mandingas e fulas - se acham representadas na Colónia por

algumas espécies já determinadas. Todavia, é sobretudo a espécie indígena

arrecta que, largamente disseminada, quer no estado de cultura em alguns

quintais indígenas, quer no estado espontâneo e ruderal nas clareiras florestais

e nos terrenos abandonados, parece mais comum a oeste do rio Corubal.

O indigo que, sem dúvida, animou durante um largo período uma corrente

comercial relativamente importante, não só provinha da espécie indígena já

conhecida, como também das exóticas tinctoria e suffruticosa, oriundas da

índia Ocidental e da América. Sabe-se que estas duas últimas espécies se

acham hoje verdadeiramente indigenatadas, tendo a asiática vindo através do

Sudão com os maometanos e sendo a americana provavelmente introduzida

pelos portugueses no decurso do século XVI e seguintes, com a corrente de

navegação então estabelecida entre o continente americano e a África

Ocidental.

Com efeito, essa dupla corrente que, do Sudão e da América, se dirigia

para o litoral atlântico africano, foi sobremodo operosa na introdução de plantas

úteis no aro das culturas autóctones.

Não obstante a vultosa produção de anilinas, o produto tinturial do

Lonchocorpus, que hoje francamente sobrepuja aos da lndigofera, e ainda para

os indígenas um apreciável recurso económico.

O Lonchocarpus cyanescens, planta espontânea com uma vasta área de

dispersão, ocupa os territórios das Circunscrições Civis de Catió e Fulacunda,

e corre ao longo das margens do rio Corubal até às terras altas do Boé,

oferecendo aos aborígenes matéria prima para a produção de belos tintos, de

que ainda hoje nos admiramos, e alimenta de pães de folhas, simplesmente

piladas, um pequeno comércio que os cota à razão de 10$00 por quilograma.

*

A flora económica da Guiné foi, logo após os descobrimentos, objecto de

detidas informações e estudos por quantos a percorreram, observações e

estudos que eram tanto mais detalhados quanto mais se desdobrava em

valiosos produtos comerciáveis. É, porém, supérfluo notar que tais estudos

informativos vinham por vezes tão minuciosos que esclareciam as

determinações de espécies botânicas imperfeitamente conhecidas.

«O principal resgate deste rio (7) - escreve ANDRÉ ÁLVARES DE

ALMADA - são tintas, como as da Costa de que já tratámos no 1º Capítulo (8)

que se fazem do mesmo modo de que se faz o verdadeiro anil; estas deste Rio

são diferentes porque são árvores como hera, e vão trepando pelas outras

Page 4: Flora da Guiné

árvores, e têm as folhas largas. E os negros, no tempo, apanhão estas folhas e

as pisão, e fazem huns pães como de açúcar, assim grandes, enfolhados com

as folhas de cabopa (9) e vem os nossos navios carregarem - se destas tintas,

que he huma grande trato, para o Rio de S. Domingos».

Com este curioso documento, ANDRÉ ALVARES DE ALMADA dá ao

mundo a primeira notícia acerca do Lonchocarpus cyanescens e sua utilização;

e, neste particular, muitos outros exemplos poderia citar no tocante a plantas

úteis assinaladas nos escritos clássicos portugueses, se me não assaltasse o

receio de tornar demasiadamente longa esta ligeira nótula.

E, todavia, não resisto à tentação de aqui anotar que são também dele as

primeiras notícias concernentes à técnica de extracção e aplicação do indigo

relativamente à África. É, porém, de certo modo singular reparar que o método

de confecção da tinta, então noticiado (10), não corresponde aos processos

actuais empregados pelos indígenas; ou porque tivesse evoluído a prática de

extracção e utilização ou porque fosse mal interpretada a técnica do fabrico, o

que é verdade é que os aborígenes, principalmente os fulas e futa-fulas,

operam, independentemente da espécie, sobre folhas novas que são

apanhadas de Abril a Junho e de Novembro a Dezembro, isto é, nas duas

épocas em que, para o Lonchocarpus, se realiza o fenómeno de rebentação

folhear.

Estas folhas frescas e tenras são reduzidas, em almofariz de madeira, a

uma massa grosseira que é imediatamente transformada em bolas de tamanho

de punho; depois de sujeitas a secagem, estas bolas são acondicionadas em

cestos ou atados. Em devido tempo, o indigo assim preparado é

convenientemente humedecido, e depois amontoado em folhas de manganaz

(11) , onde sofre durante três dias uma primeira fermentação. Procede-se, em

seguida, à redução da massa a uma fina polpa, que é também submetida a

secagem; nesta altura o produto está pronto a ser lançado em grandes

recepientes com água, operação que corresponde a uma das fases da

confecção da tintura.

Para a preparação de 100 litros de tinta, lançam-se, num recipiente de

200 litros, 10 quilogramas de folhas piladas, 60 litros de água, 40 litros de

infusão de raiz de uanda (12) e 2,5 quilogramas de cinza, de preferência de

poilão (13) ou de colabaceira (14). Esta calda, que é de início bem agitada,

deixa-se em repouso durante 3 ou 5 dias, se a laboração se realiza na época

seca ou das chuvas, respectivamente. Esta operação, a que chamam cozer a

tinta, corresponde à última fase de fermentação.

Com efeito, a fermentação bem conduzida, quer se opere sobre Lon-

Page 5: Flora da Guiné

chocarpus, quer sobre lndigofera, proporciona o desenvolvimento dos

elementos actuantes de tal modo que permite as necessárias transformações.

Segundo DALZIEL (15), o elemento básico indol encontra-se em com-

binação nas folhas, bem como o glicosídeo indican - um composto de glucose

e indoxyl. Na fermentação, o indoxyl é liberto do açúcar e, pela sua oxidação,

operada com agitação do líquido, produz a verdadeira substância azul,

indigotina - indigo azul - assim como indirubina, - indigo vermelho. .

Estas duas substâncias - azul e vermelho - ainda que isómeras, não se

formam simultâneamente; segundo as condições do trabalho, obter-se-á uma

ou outra. Se a oxidação se opera lentamente num meio ácido produz

indirubina; se, pelo contrário, ela se realizar rapidamente num meio alcalino, o

resultado será indigotina.

«A fermentação das folhas é o resultado da acção de enzimas; o calor

acelera-a, mas a temperatura de água em ebulição destrói quaisquer

substâncias capazes de produzir azul pela oxidação». Decorrido o período da

fermentação - cozedura -, a tinta apresenta-se de cor verde ou amarelada e

com desagradável e característico cheiro; nesta altura ela está pronta para ser

utilizada depois de agitada fortemente.

O tecido a tingir sofre alternadamente imersões e exposições ao ar até

tomar a cor desejada.

Os tintureiros ou antes, as tintureiras, afirmam que quando os tintos se

apresentam de cor baça é prova de que se utilizou na preparação da tinta

folhas velhas, ou a fermentação se operou em condições pouco favoráveis.

O líquido resultante do cozimento da raiz de uanda é empregado com o

objectivo de não só reforçar o poder tinturial da droga, como ainda o de

pretender tintos brilhantes. Os tintureiros não explicam o motivo porque utilizam

a cinza; todavia, os factos anotados conduzem-nos naturalmente a conjecturar

que a cinza deve actuar com o fim de neutralizar o meio ácido nascente da

própria natureza das folhas e, consequentemente, proporcionar à fermentação

um ambiente alcalino propício à produção da indigotina.

Não se conhecem cientificamente os efeitos da actuação da infusão de

uanda.

O indigo moldado em cubos com auxílio de pequenas quantidades de

goma, pode ser obtido nas cubas de decantação nas quais se lança, às vezes,

água de cal para activar a precipitação de indigotina, que é insolúvel na água.

Na tinturaria mais aperfeiçoada, o indigo precipitado é transformado pela acção

de um alcali em anil branco solúvel e dá uma solução esverdeada. O· tecido

nela mergulhado e exposto ao ar faz-se azul com a reversão do indigo branco

Page 6: Flora da Guiné

em indigo azul pela oxidação.

O anil africano assim preparado possue a seguinte composição: (15)

Humidade - 4,8%

Cinza - 31,3%

Indigotina - 27,5 %

Indirubina - 1,5%

A percentagem de indigotina que pelo processo vulgar é de 2,50 %

aproximadamente, do peso da massa vegetal, poderá ser muito aumentada

quando a fermentação e oxidação forem bem conduzidas.

Para o Lonchocarpus cyanescens está calculado que 100 quilogramas de

folhas frescas podem produzir 67,80 a 2232 gramas de indigo, com uma

percentagem de indigotina superior a 43 %; porém, esta percentagem pode

atingir 56 % quando a colheita das folhas naturalmente coincidir com a época

de maior concentração da droga nelas contida.

COVIAU, citado por DALZIEL (16) sugere que, tratando-se do Lon-

chocarpus, a apanha das folhas deverá ser feita na altura da floração.

Esta ligeira notícia pretende chamar a atenção daqueles que, dispondo de

meios e tempo, queiram contribuir com o seu saber para a ocupação científica

das Colónias Portuguesas.

Seria interessante, quer sob o ponto de vista puramente científico, quer

sob o ponto de vista da economia indígena, proceder a investigações

exaustivas das espécies tinturiais da Colónia.

Sem a pretensão de haver acertado neste complexo problema de ta-

xionomia botânica, passo à diagnose das plantas aqui referidas - Indiqofera e

Lonchocarpus - baseada, principalmente, nos materiais do meu herbário

particular.

* lndigofera - LINN - Flores zigomórficas dispostas em espigas axilares,

racimos ou em capítulos pedunculados; sepalas 5; corola papilionácea com

5 pétalas de estivação imbricativa; estames diadelfos - 9 aderentes e um

livre - com os filetes não dilatados no cimo; estilete ligeiramente curvo e

estigma pequeno capitado; anteras uniformes, apiculadas; frutos

deiscentes, afectando diversas formas, mas, em geral, linear sub-roliça ou

sub-quadrangular e, de ordinário, polispérmicos; plantas anuais prostradas

ou arbustos perenes com folhas compostas, imparipinuladas; folíolos de

ordinário inteiros estipulados.

A) Frutos distintamente falciformes, finamente pubescentes, de cerca

Page 7: Flora da Guiné

de 2 cm. de comp., reflexos; folhas com cerca de 5-6 pares de foliolos mais

ou menos oblanciolados, finamente pubescentes, medindo 2-3,5 cm. de

comp., mucronados; racimos axilares muito mais curtos do que as folhas;

flores vermelhas; arbusto de 1,60 - 2 m. cultivado ou nos lugares ruderais

Indiqofera suffruticosa - MILL.

B) Frutos subcilíndricos de 2-2,5 cm. de comp., glabracentes; folhas

compostas de 5-8 pares de foliolos estreitamente oblanciolados, de 2-3 cm.

de comp., pubescentes; racimios mais curtos do que as folhas; flores ver-

melhas; ramos de cor cinzenta, sulcados, pubescentes; arbusto de 1-2 m.

cultivado nos quintais, no estado espontâneo nas clareiras florestais e

lugares ruderais lndigofera arrecta-HOCHST.

C) Frutos rectos ou ligeiramente curvos de 3,5 cm. de comp., ligei-

ramente pubescentes folhas com 4-7 pares de foliolos obvados, de cerca

de 2 cm. de comp., glaucos ou azulados, mais ou menos truncados e mu-

cronados; flores palidamente vermelhas; arbustos de 1,60 m. cultivado e

nos lugares ruderais lndigofera tinctoria - LINN.

Page 8: Flora da Guiné

* Lonchocarpus - H. B. & K. - Flores papilionáceas, hermafroditas, dispostas

em panículas na extremidade dos ramos novos; ramificações de panículas curtas; cálice levemente lobolado e exteriormente pubescente; corola com o estandarte unguiculado e largamente emarginado no ápice; estames 10, monodelfos; estilete curvo com estigma terminal; frutos - vagens - de 1-5 sementes, comprimidos, glabros, reticulados e com as sementes distintamente proeminentes. Folhas compostas de 4-5 pares de foliolos ovados ou elípticos, curtamente acuminados, medindo 16 cem.. de comp. por 8 cm. de larg., glabros. Arbusto sarmentoso ou robusta liana de 8-15 m. e mais altura. Flores; asas rosadas e o estandarte maculado de azul

Lonchocorpus cyanescens - BENT.

NOTAS:

(1) H. A. NICHOLS & E. RAOUL-Petit Traité d'Agriculture Tropicale- pág. 322. Paris. 1895

(2) CONDE DF. FICALHO- Plantas Úteis da A/rica Portuguesa Lisboa. 1884.

(3) Loc. cit. pág. 130.

(4) L. PLANCHON, P. BRETIN e P. MANOCEAU - Précis de Matière MédicaleTome II. pág. 902.

Paris. 1937.

(5) Tratado Breve dos Rios de Guiné e de Cabo Verde -1594-ed.1841. Porto.

(6) Alguns nomes vernáculos da lndigofera; Cárô em Biafada-Empada; banhube=anil,

banhebe=anileiro na ilha de Pecixe; córô-messem-ô e carandim-ô = tinta pequena, em mandinga; gara-

tcileudo=tinta pequena, em fula.

(7) Rio Nuno - ANDRÉ ÁLVARES DE ALMDA - Loc. cit. pág. 69.

(8) É capítulo 2.°.

(9) Cabopa é o nome vernáculo da Mitragyna stipulosa O. KUNTZE.

(10) Recolhe-se somente aquella quantidade que se ha de fazer naquelle dia, porque tanto que

seccão as folhas não prestãm para isto: e aquelles pelouros feitos fazem a tinta com que tingem os seus

panos, os quais, como fica dito, são mui formosos e tão tintos que ficão parecendo setins. - ANDRÉ

ÁLVARES DE ALMADALoc. cito pág. 13.

(11) Manganaz é o nome vernáculo da lcacina seneqalensis A. ]USS.

(12) Uanda é o nome vernáculo da .Marinda geminata D. C. .

Page 9: Flora da Guiné

(13) Poilão é o nome vernáculo da Ceiba pentandra, GAERTIl;.

(14) Calobaceira é o nome vernáculo da Adansonia digiJata LINN.

(15) TIIc Usejul Plants 01 Wcsl Tropical A/rica by J. M. DALZIEL, pág.2~. -1937. Londres.

(16) DALZIEL-Loc. cit. pág. 245

(17) Loc, cito pág. 249.

J. Espírito Santo

Page 10: Flora da Guiné

J. Espírito Santo

(

,

(1) H. A. ~ICHOLLS & E. RAOUL-Petit Traité d'Agriculture Tropicale-«

pág. 322. Paris. 189i

(2) CONDE DF. FICALHO- Plantas fIteis da A/rica Portuguesa - Lisboa.

1884. (3) Loc. cit. pág. 130.

Flora

GmlES E SOUSA (29) agrupa as plantas da Guiné em:

1.0) povoamentos sempre verdes, divididos em: a) povoamentos sempre

verdes das águas salgadas (mangais); b) povoamentos sempre verdes das

Page 11: Flora da Guiné

águas doces (galerias florestais); e c) povoamentos sempre verdes dos

terrenos secos (palmares de Elaeis guineensis e de Borassus flabellifer) ;

iO) povoamentos de folha caduca, compreendendo os povoamentos: a)

com dominância de malváceas, em particular Ceiba pentandra, na zona coteira;

b) com dominância de leguminosas (Parkia biglobosa, Daniellia thurifera e

Albizzia spp.); c) sem dominância definida (Khaya seneçolensis, Pycnanthus

Kombo, Xylopsia aethiopico, Terminalia macroptera, etc.).

Segundo EsPÍRITO SANTO (2), embora esteja ainda por fazer o estudo

da distribuição das manchas de vegetação, relativamente à sua fisionomia, nas

diferentes regiões fitogeográficas da Colónia podem, de uma maneira geral,

considerar-se os seguintes tipos fisionómicos :

I.") floresta hidrófila, 2.°) floresta mesófila, 3.°) floresta xerôjila,

4.°) mato aberto serõjilo, 5.°) capinais . • Floresta hidrófila. - Abrange toda a vegetação que acompanha os

cursos de água doce ou salgada, e as depressões de terreno, com

excepção . das lalas e bolanhas. Fazem parte desta formação os mangais (3)',

que

(1) Citado por CURASSON (1).

(2) ]. V. G. EspiRITO SANTO - Comunicação pessoal.

(3) No crioulo da Guiné, os mangais são impropriamente designados por

tarrafes, devido à sua semelhança com o verdadeiro tarrofe (Tamarix gal/ice),

muito abundante nas costas caboverdeanas.

constituem as galerias florestais dos solos salgados, e as galerias florestais

dos solos não salgados.

O primeiro estrato de vegetação dos mangais é representado pelas

espécies Rhizophora racemosa e Avicennia nítida, seguidas de um segundo

estrato de Laguncularia racemosa. Disseminadas nos terrenos mais ou menos

impregnados de sal marinho ou simplesmente influenciados pela água salgada,

encontramos as seguintes espécies: Conocorpus erectus, Termina/ia scutifero,

Phoenix reclinoto, Ecastaphillum Broumei, Drepenocarpus lunatus. Existe um

último estrato desta formação, formado de plantas herbáceas, umas

localizadas nos terrenos leves e areentos (C allavalia ohtusifolia, Ipomoea

stolonifero, Thelanthero marítima), outras nos terrenos fortes e húmidos

(Sesuvium portulacastrum, Phdoxerus uermiculotus, Banisteria leona e

Brachyspteris ovata).

Nas galerias florestais dos solos não salgados, aparecem os seguintes

tipos: Elaeis guineensis, a palmeira do azeite; Parinari excelso, o mampataz;

Picnanthus Kombo, em crioulo de S. Tomé pau-caixão; Antiaris africana, o pau-

Page 12: Flora da Guiné

bicho branco; Kloinedox« gabotlensis, em beafada bissarnbaná; lrvinja

gabunensis, em sosso cofé; Anihostema seneqalensis, em fula. bufena;

Pentaclethro macrophila, em crioulo de .S. Tomé rnuandim, etc.

Floresta mesôfila. - Caracteriza-se pelo seu duplo aspecto fisionómico em

relação com a estação em que é observada, apresentando na época das

chuvas o aspecto de floresta pluviosa, e no tempo seco o de floresta clara (sub-

xerófila). Fazem parte desta formação: Ceibo pentondro, o poilão; Khaya

seneqalensis, o bissilão; Erithrophleum guineense. o mancone; Chlorophora

excelso, o pau-bicho; Sterculia troçocamo, a rnanjanja; Alstonia conqensis, a

tagara; Albizzia sasso, a farroba de laia, etc.

Floresta xerófila. - Caracteriza-se pelos tipos biológicos de· folhas

caducas, formados por ávores e arbustos dispersos, com intervalos povoados

por grarníneas. As plantas que entram na floresta xerófila compreendem:

Parinari macrophyla, o mampataz grande; Bombax buonopoeense, o poilão

forro; Parkia biqloboso, a farroba : Terminalia macroptero, o macete; Pterocarpus

erinaceus, o pau-sangue; Daniellio thurífera. o pau-incenso; Erithrophleum

africcnus, em fula péli; Oxytenathera abyssinica, o barnbú; Prosopis africana, o

pau-carvão; Dicbrostachys glomerata, em fula tchide; Acacia albido, Acacia

machrostachya e Acacia seneqal, as acácias, etc.

Mato aberto xerájilo, - Di fere do anterior pela dominância das gramineas,

com arbustos raquíticos e rizomatosos. Nas gramineas, predominam os

géneros Andropoqon, Ponicum, Pennisetum, etc.; nos arbustos, a mambomba

(Annona seneçalensis}, o manganaz (Icacina seneçalensis ), Zizyphus

Jt,jubo, Gimnosporio seneqalensis, Colotropis procera, etc.

Capinais. - Plantas anuais dos terrenos secos ou húmidos, com alguns

arbustos esparsos, geralmente sujeitas a queimadas anuais. Os tipos desta

formação pertencem aos géneros Phraqmites, Andropogon, Ctenium,

Hyporrhemia, Leersui, Rhytachne, Echinochloa, Ronboeliio, Rtvynchelytrum,

Heteropoçon, Pennisetum, Selaria, Impera/a, Perotis, Aristida, Açrostis,

CytlOdon, Chloris, Eleusine, etc.

Nos extremos bio-ecológicos das relações entre as tsétsés e os diversos

tipos de vegetação, aliados aos restantes factores epizootol6gicos, si tua-se,

de um lado, a Glossina palpalis, espécie tipo de tsétsé higrófila, que, para

viver, necessita da humidade dos mangais e das galerias florestais dos

terrenos não salgados, e, do outro, a Glossina sub-morsitans, espécie

xerófila, mais abundante nas regiões florestais e savânicas do interior, com

passagem pelas necessidades intermediárias da Glossino /011- gipalpis e

da Glossino fusca.

Page 13: Flora da Guiné

IS-L. A. CARVALHO VIEGAs-Guiné Portuguesa. Vol. r. Lisboa, 1936.

16 - A. MONARII- Résultats de la mission scientifique du dr. Monard en

Guinée Portugaisé, 1937-1938. II. Ongulés. -Arq. do Mus. Bocage IX. 150-196.

1938. 17-F. FRADE-Distribuition géographique des éléphants d'Afrique.-C. R.

XII' Congo Intem. ZO%~~ Lisbonne 1935. II. 1191-1202. 1936-37.

18-F. COUTOULY-Gros et petit gibier en Afrique Occidentale Française (carnivores,

édentés, proboscidiens, hippopotamidés, suidés, primates, rongeurs).Bu/I.

Comité d'~ttld. Hist, et Scienti]. de I'Afrique Occid. Françoise VIII. 559-605.

1925.

19 - A. MONARD - Résultats de la mission scientifique du dr. Monard en Guinée

Portugaise, 1937-1938. I. Primates. - Arq. do MUI. Bocage IX. 121-149.

1938.

▀ A Flora da Guiné-Bissau Os primeiros levantamentos sobre a flora da Guiné-Bissau datam do período

colonial no qual se salientam sobretudo os diferentes trabalhos do Instituto de Investigação Científica de Portugal (precursor da então chamada Junta de Investigação do Ultramar), que através de diferentes missões geográficas e de investigação do Ultramar, procedeu a recolha e a identificação de várias espécies florísticas e faunísticas, e que ainda actualmente continuam a ser realizadas no quadro de cooperações específicas com o INPA, a ONG Acção para o Desenvolvimento e o Programa da Reserva da Biosfera coordenado pelo INEP. Sobretudo os resultados dos inventários realizados no período colonial, encontram-se nas diferentes publicações da então Junta de Investigação do Ultramar e na Série de Publicações “Garcia da Horta". A este processo e sobretudo no sentido de definir a superfície ocupada pelas diferentes formações foram importantes os trabalhos do SCET-Internacional, ATLANTA-Consult e por último do CIRAD-Foret. Este último enquadrou-se no processo de elaboração do Plano Director de Floresta (PAFT). Igualmente trabalhos pontuais foram entretanto desenvolvidos por investigadores nacionais e estrangeiros, como é o caso de BANCESSI, Q. que inventariou leguminosas e gramíneas da Guiné-Bissau e da Iniciativa de Cantanhez e da Universidade de Jembloux, que inventariaram variadas espécies florísticas da floresta húmida de Cantanhez, e por ONGs sobretudo no quadro da farmacopeia tradicional da Guiné-Bissau.

Uma inventariação exaustiva com base na literatura dá conta da existência de 1.186 espécies inventariadas na Guiné-Bissau, agrupadas em cerca de 160 famílias como demonstra o quadro 2, em anexo I. Destes segundo DAVIS & al. (1986) citados no "Guia da Biodiversidade" cerca de 12 espécies são endémicas, entretanto das quais só cita o nome das seguintes:

Byrsanthus brownii var. latifolius Indigofera omissa var. trifoliliolata Nesaea santoi Hyphaena santoana As Papilonaceas, com 131 especies, as Rubiaceae com 73, as gramíneas

com 97 são as famílias com maior número de espécies (vide tabela 2 em Anexo I). Saliente-se que, as plantas inferiores, as plantas aquáticas em geral, ainda

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estão pouco estudadas na Guiné-Bissau. Identificou-se em diferentes literaturas os usos seguintes para algumas das espécies recenseadas:

128 têm uso na medicina tradicional; 30 espécies fornecem madeira de construção; 76 têm usos alimentares na alimentação humana;

cerca de 86 espécies são objectos de uso diverso, entre os quais para alimentação do gado, artesanato, etc.

Designações da maioria das espécies recenseadas são conhecidas nas diferentes línguas nacionais, o que demonstra em parte o grande acervo de conhecimento tradicional sobre as espécies existentes nas diferentes formações vegetais da Guiné-Bissau.

Exemplares de várias destas espécies encontram-se depositadas de forma dispersa, nos herbários da Casa de Ambiente em Bubaque, nos centros do INPA em Contuboel, na sede da Iniciativa de Cantanhez em Iemberem. Amostras de medicamentos existem igualmente em Farim no quadro das acções da Swissaid, em Varela na Escola de Verificação Ambiental promovida pela ONG AD, na Casa de Ambiente em Bubaque coordenada pelo INEP, assim como nos diferentes centros do INPA. Uma grande colecção de amostras existe no herbário do Centro de Botânica do IICT, e exemplares vivos “ex-situ” no “antigo” Jardim e Museu Agrícola do Ultramar em Portugal.

MALAISE (1996), efectuou um estudo recente no quadro da Iniciativa de Cantanhez na qual identificou na floresta húmida com o mesmo nome, cerca de 237 espécies, entre as quais, 8 pteridófitas e 237 plantas superiores (191 dicotiledôneas e 191 monocotiledóneas). As espécies de plantas superiores foram agrupadas em 84 famílias e 197 géneros. Na Reserva da Biosfera, e no quadro dos inventários recentes efectuados em colaboração com o IICT de Portugal foram identificados cerca de 213 espécies agrupadas em cerca de 30 famílias. Das espécies identificadas em Bubaque, 65 são utilizadas de forma diferenciada na farmacopeia tradicional.

(…) Se bem que muito pouco conhecidas ainda, existem maciços consideráveis nas Ilhas de Caravela, Enú e Cute, e João Vieira no Arquipélago Bolama-Bijagós, assim como a Floresta de Ucô na zona de Calequisse e nas Ilhas de Jeta e Pecixe.

República da Guiné-Bissau Ministério de Desenvolvimento Rural e Agricultura, Recursos Naturais e Ambiente Programa de Nações Unidas para Desenvolvimento

Projecto GBS/97/G31/1G/9 - “Estratégia e Plano de Acção Nacional para a Biodiversidade