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1 Folhas: Profª. Sônia Aparecida B. Morski Solidão, um mal da modernidade? A solidão da vida Longo ensaio Da solidão da morte. Helena Kolody, 1964, Ensaio Combalido, desenho em grafite – Ana Cláudia Betim – T. Borba, Pr, 1993. O mundo moderno oferece inúmeros meios de socialização e integração para o ser humano, principalmente nos centros urbanos. Os meios de comunicação nunca foram tão eficientes e práticos e, ainda assim, há muitas pessoas que sofrem com a solidão, isoladas em um mundo próprio e sombrio. Antes só do que mal acompanhado ou antes mal acompanhado do que só? Qual a sua opinião? Estar só é diferente de sentir-se só. O sentimento de solidão é algo profundo e perturbador, vem do interior da pessoa, não depende de fatores externos. Constatamos isso quando nos sentimos sós, mesmo estando em meio a muitas pessoas. Como isso é possível? De acordo com o dicionário Aurélio de Língua Portuguesa: Solidão s.f – 1-Estado do que se encontra ou vive só; isolamento. [sin.poét:solitude]. 2 - Lugar ermo e despovoado. No Dicionário de Filosofia, de Nicola Abbagnano, encontramos:

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Folhas: Profª. Sônia Aparecida B. Morski

Solidão, um mal da modernidade? A solidão da vida Longo ensaio Da solidão da morte. Helena Kolody, 1964, Ensaio Combalido, desenho em grafite – Ana Cláudia Betim – T. Borba, Pr, 1993.

O mundo moderno oferece inúmeros meios de socialização e integração para o ser humano, principalmente nos centros urbanos. Os meios de comunicação nunca foram tão eficientes e práticos e, ainda assim, há muitas pessoas que sofrem com a solidão, isoladas em um mundo próprio e sombrio. Antes só do que mal acompanhado ou antes mal acompanhado do que só? Qual a sua opinião? Estar só é diferente de sentir-se só. O sentimento de solidão é algo profundo e perturbador, vem do interior da pessoa, não depende de fatores externos. Constatamos isso quando nos sentimos sós, mesmo estando em meio a muitas pessoas. Como isso é possível? De acordo com o dicionário Aurélio de Língua Portuguesa:

Solidão s.f – 1-Estado do que se encontra ou vive só; isolamento. [sin.poét:solitude]. 2 - Lugar ermo e despovoado.

No Dicionário de Filosofia, de Nicola Abbagnano, encontramos:

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Solidão: isolamento ou busca de melhor comunicação. No primeiro sentido, a solidão é a situação do sábio, que, tradicionalmente, é autárquico e por isso se isola em sua perfeição. Afora esse ideal, o isolamento é um fato patológico: é a impossibilidade de comunicação associada a todas as formas de loucura. Em sentido próprio, contudo, a solidão não é isolamento, mas busca de formas diferentes e superiores de comunicação: ”Não dispensa os laços com o ambiente e a via cotidiana, a não ser em vista de outros laços com homens do passado e do futuro, com os quais seja possível uma forma nova ou mais fecunda de comunicação. O fato de a solidão dispensar esses laços é, pois, uma tentativa de libertar-se deles e ficar disponível para outras relações sociais”.

À Filosofia interessa a reflexão , a racionalização , a busca da coerência interna para um melhor entendimento do agir humano.(GRAMSCI, 1978) Para o filósofo alemão, Martin Heidegger (1889 – 1976), estar só é a condição original de todo o ser humano e que cada um de nós é só no mundo.

Mas para seu discípulo, o Existencialista Jean Paul Sartre (1905 – 1980), filósofo francês, “O homem por si só não pode se conhecer em sua totalidade. Só através dos olhos de outras pessoas, pode reconhecer neles o que têm de igual. E cada um precisa desse reconhecimento”.

Assim temos que, se por um lado nossa condição original é estar só, por outro, necessitamos da presença de outros seres para nos conhecermos. Atividade 1: Vamos filosofar: O que é a teoria do Existencialismo? Visite o site www.wikipedia.com e descubra mais informações sobre Filosofia.

Para a Sociologia, o indivíduo em grupo é algo diferente do indivíduo isolado.

Considera que não existe indivíduo isolado ou isolável, a não ser sob formas de patologias sociais e que a formação da personalidade não é possível fora do contexto social. Viver é quase somente conviver. (DEMO, 1995) Atividade 2: Pesquise: O que é socialização? O que são patologias sociais? Há isolamentos que são desejados pelo próprio indivíduo, em alguns momentos da vida, mas há aqueles em que o indivíduo é isolado socialmente como forma de punição por alguma falta praticada contra a família, os colegas. O sentimento de solidão pode gerar uma série de transtornos psicológicos, sofrimento emocional, problemas orgânicos, prejudicando a qualidade de vida das pessoas, gerando a infelicidade. Lemos com freqüência notícias como: “Pessoas solitárias têm saúde mais precária, diz estudo da BBC Brasil.“ (Fonte UOL, 13/09/07)

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“Solitários têm mais riscos de doenças cardíacas, diz estudo.” ( Fonte UOL, 03/05/05) At Eternity’s Gate – Vicent Willem Van Gogh 1890 – oil on canvas 80x64 http://en.wigipedia.org/wiki/Ateternity’sGate

Atividade 3: Pesquise em jornais, revistas ou Internet o que são doenças psicossomáticas. Como elas surgem? Quais são os seus sintomas? O Homem é um dos seres da Natureza que não consegue sobreviver nos primeiros momentos da vida, sem os cuidados de outros, de acordo com a Biologia. Tal dependência não é apenas de ordem prática, como alimento, abrigo, água, mas também de ordem afetiva: diálogo, amor, fé, companheirismo. Já está comprovado cientificamente que o isolamento humano total (a falta de contato ou de comunicação entre grupos ou indivíduos) por um longo período, produz o chamado Homo Ferus. Tal “animal” não teria adquirido, durante os primeiros anos de vida, fatos essenciais para sua interação na sociedade: personalidade e cultura. Atividade 4: Visite o site e verifique como o isolamento pode modificar o comportamento de uma pessoa: http://noticias.bol.uol.com.br/internacional/2007/09/25/ult4740 ou 4094.jtm Pesquise, em livros de Biologia, quais são os outros seres que não conseguem sobreviver sem os cuidados dos da mesma espécie e quais seriam as dificuldades encontradas. O ambiente social, o meio familiar, o convívio com certos grupos, a pertença de classe, tudo isso influi pesadamente na formação do indivíduo e da própria sociedade. (DEMO, 1985) Atividade 5: Assista aos filmes: Um Sonho de Liberdade, (Shawshank Redemption, The) 1994, USA.142 min. Direção: Frank Darabont - Drama. Com Tim Robbins e Morgan Freeman Andy Dufresne é condenado injustamente pelo assassinato de sua esposa. É preso e dentro da prisão, utiliza suas habilidades para sobreviver num ambiente hostil e perigoso. Melhor é Impossível, (As Good as it Gets) 1997, USA.139min. Direção: James L. Brooks - Comédia/Drama. Com Jack Nicholson Jack Nicholson é Melvin Udall, um homem estranho, cheio de superstições. Sua vida muda ao precisa ajudar o vizinho acidentado, e recebendo a incumbência de cuidar de seu cão. O Náufrago, (Cast Away) 2000, USA .143min. Direção: Robert Zemeckis. Drama. Com Tom Hanks

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Um acidente de avião prende Chuck Noland em uma ilha tropical. Sua noiva e amigos consideram-no morto. Na ilha, ele terá de lutar para satisfazer suas necessidades básicas: comida, água e abrigo. www.cineplayers.com Faça um registro do conteúdo de cada filme. Em classe, discuta com seus colegas sobre o tipo de solidão vivida, quais os problemas enfrentados pelas personagens e se há pontos em comum entre eles. Apesar de toda a tecnologia disponível no mercado ter a função de agilizar a comunicação, aproximar as pessoas, economizar tempo, percebemos que muitas ficam ainda mais isoladas em casas, apartamentos, conectadas com o mundo, mas sozinhas, entre quatro paredes, numa solidão “virtual”. O tema “solidão” tem sido motivo para muitas criações artísticas, seja na Pintura, na Literatura, no Teatro, também na Música, como podemos perceber nesta canção de Cazuza:

Eu quero alguém Eu quero alguém Na areia da praia Eu quero alguém Que use calça ou saia Quero alguém É melhor que nada Quero alguém Pra ter do meu lado Pessoa rica Pessoa pobre Pessoa que ouve Pessoa surda Fria, bonita Suja, cheirosa Estou tão só Meus pais não me conhecem Meus amigos são chatos Meu cachorro não me lambe Quero alguém Eu quero alguém Que me dê um cigarro Quero alguém Que puxe o meu saco Quero alguém Pra ir no cinema Quero alguém

Não sou exigente Quero alguém Que seja gentil Quero alguém Que pareça com gente Quero alguém Na hora do jantar Quero alguém No Shopping da Barra Pessoa jovem Pessoa velha Pessoa estranha Pessoa santa Diabólica, matemática Emocionada, despreparada Estou tão só Meus pais não me conhecem Meu amigos são chatos Meu cachorro não me lambe Mas eu quero alguém Quero alguém Eu quero alguém Eu quero alguém Eu quero alguém Eu quero alguém

Composição de Cazuza e Renato Rocket. Interpretação de Cazuza, do Álbum Burguesia,2000.

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Ao pedir pela presença de alguém, seja ele quem for, nota-se que o indivíduo pode sentir-se só também quando não é compreendido pelos seus, quando precisa de algo que nem é capaz de identificar: é o sentimento de pertença, a necessidade de acolhimento, de reconhecimento, que cada ser humano carrega desde seu nascimento.

A Solidão na Literatura

“O livro traz a vantagem de a gente poder estar só e, ao mesmo tempo, acompanhado.” Mário Quintana

Através da leitura, podemos aprender algo novo, compreender o que não foi bem entendido, imaginar, encontrar eco para nossos pensamentos, ansiedades, companhia para as horas solitárias, respostas para nossas dúvidas, prazer. Dalton Trevisan, escritor paranaense, um dos mais brilhantes contistas da atualidade, trata de temas sociais com muita perspicácia e criatividade. Um dos temas abordado pelo autor com muita sensibilidade em suas narrativas, é a solidão. A solidão como conseqüência do abandono, causada pela ausência de solidariedade, gerada por exclusão social ou por opção pessoal. Observe como o autor apresenta um momento de solidão vivido por um idoso: “Tarde de verão, é levado ao jardim na cadeira de braços – sobre a palhinha dura a capa de plástico e, apesar do calor, manta xadrez no joelho. Cabeça caída no peito, um fio de baba no queixo. Sozinho, regala-se com o trino da corruíra, um cacho dourado de giesta e, ao arrepio da brisa, as folhinhas do chorão faiscando – verde, verde! Primeira vez depois do insulto cerebral aquela ânsia de viver. De novo um homem, não barata leprosa com caspa na sobrancelha – e, a sombra das folhas na cabecinha trêmula, adormece. Gritos: Recolha a roupa. Maria, feche a janela. Prendeu o Nero? Rebenta com fúria o temporal. Aos trancos, João ergue o rosto, a chuva escorre na boca torta. Revira em agonia o olho vermelho – é uma coisa, que a família esquece na confusão de recolher a roupa, fechar as janelas? TREVISAN, Dalton 111 Ais, p.25 .

Este texto provoca reflexões, tais como: 1- Quantos idosos são tratados em seus lares da mesma forma que este,

como uma “coisa” a ser lembrada? 2 - O que as pessoas com necessidades de atenção especial pensam ou

sentem quando são tratadas como “coisas”? 3 - O que pensam essas pessoas das atitudes de outras, que estão em plena

atividade, cheias de vigor? 4 - Como enfrentaríamos tal situação: sendo alguém que precisa receber

cuidados de outros em tempo integral ?

Curiosidade: Dalton Trevisan criou uma técnica inédita na Literatura Brasileira: ele reedita seus contos de forma a atualizá-los, periodicamente. Mesmo sendo um lançamento, nele estarão presentes contos selecionados de publicações anteriores. O conto acima, encontrado em 111 Ais, foi publicado, em sua totalidade, no Primeiro Livro de Contos, Antologia Pessoal, Editora Record, na página 97, intitulado “Última Corrida de Touros em Curitiba”, 1979.

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Atividade 6: Procure na biblioteca de sua escola uma das obras de Dalton Trevisan. Leia seus dados biográficos.

A solidão por abandono é um tema recorrente na obra de Dalton Trevisan, mas sempre trabalhada com habilidade e maestria, para possibilitar um novo olhar sobre o assunto e novas reflexões. Assim é que no conto abaixo, verificamos que a pessoa solitária pode encontrar meios de burlar a solidão. Leia o texto e perceba como o autor indica essa possibilidade:

DOIS VELHINHOS

Dois inválidos, bem velhinhos, esquecidos numa cela do asilo. Ao lado da janela, retorcendo os aleijões e esticando a cabeça, apenas um consegue espiar lá fora. Junto à porta, no fundo da cama, para o outro é a parede úmida, o crucifixo negro, as moscas no fio de luz. Com inveja, pergunta o que acontece. Deslumbrado, anuncia o primeiro: - Um cachorro ergue a perninha no poste. Mais tarde: - Uma menina de vestido branco pulando corda. Ou ainda: - Agora é um enterro de luxo. Sem nada ver, o amigo remorde-se no seu canto. O mais velho acaba morrendo, para alegria do segundo, instalado afinal debaixo da janela. Não dorme, antegozando a manhã. O outro, maldito, lhe roubara todo esse tempo o circo mágico do cachorro, da menina, do enterro de rico. Cochila um instante – é dia. Senta-se na cama, com dores espicha o pescoço: no beco, muros em ruína, um monte de lixo. TREVISAN, Dalton. Quem tem medo de Vampiro? S.Paulo, Editora Ática 1998. p.69)

Reflita: 1 - Qual seria, de acordo com o texto, uma forma eficaz para enganar a

solidão? 2 – Todos podem ter acesso a esse meio? 3 - Você conhece alguma história (quadrinhos, filmes, piadas, narrativas orais)

onde algo semelhante tenha acontecido? Relate para a classe. 4 – Como no texto anterior, os idosos aqui são tratados como “coisas”?

Justifique.

Curiosidade: Você sabia que em 2007 Dalton Trevisan completou 82 anos e ainda continua em plena atividade artística?

“Não há solidão onde há saber, nem aborrecimento onde há livros.” Sabedoria Oriental

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“Por que dois, ó Senhor, para fazer o amor?”

TREVISAN, Dalton. O Vampiro de Curitiba, p.57

A atividade da leitura nos permite visualizar nos textos, o que pensam e sentem as pessoas em determinadas situações de solidão, sentir seus dramas, compreender seus sentimentos, entender os desconcertos do relacionamento humano. Leia o conto e comprove as afirmações:

ÀS TRÊS DA MANHÃ

Ei-la que borda ao clarão do abajur. Se pudesse aquela noite acabar o trabalho... Olhos cansados, sabe que não deverá dormir. Protegida no quente círculo de luz – o nome chamado pelos retratos na parede. Retratos de mortos, as vozes cochicham na casa sonolenta. Já passou a roupa, escolheu o arroz, pôs água no filtro. E, quando as vozes se calam, escuta os pingos em surdina. Janelas fechadas, a garrafa do leite diante da porta. Guarda na cestinha a agulha e os fios; com a sombra atrás dela, apaga a lâmpadas da sala e do corredor. No quarto acende a lamparina sobre a cômoda: última luz do mundo. Reza de joelho, a mão no rosto. Deita-se no canto da enorme cama de casal. A essa hora por onde andam o marido e os filhos? Ergue a cabeça do travesseiro para olhar o copo iluminado. Se na penumbra do quarto ela tivesse uma sombra, não se acharia tão só... Uns dedos na vidraça: o galho do pessegueiro, com o vento, bate de leve. Assim quisesse conversar; tem dedos descarnados e derruba as folhas, é inverno. Quando se deita há passos na rua, apitos de trem de longe, ainda na face o calor do abajur. Suspende a cabeça – os olhos mantêm acesa a lamparina. Basta dormir (e já dorme, tão cansada) que a chama se apaga. No copo o azeite, o pavio novo, mas a chama se apaga. Pode ser o vento ou o marido, o ratinho ou a morte. Desperta no meio da noite – a hora dos ladrões e que ladrão rouba a sua luzinha? Nenhum passo na calçada, vento não há, o pessegueiro se encolheu. O marido dorme a seu lado, mas ficou só. Os filhos dormem no outro quarto, mas ficou só. Tão grande sossego, reza que não estejam mortos. Nem pode chamá-los... Era doença o aflito bater do coração? Tanto medo que se senta na cama, o dedo na boca: “Por favor, Senhor. Não agora, não no escuro!” Antes de se deitar, quem sabe o marido soprou o lume. Ou o camondongo afundou o pavio, bebe gulosamente o azeite? Agora roia o silêncio: alguém alerta no mundo. Rói, meu ratinho, é a súplica da mulher. Nada contarei ao homem. Ele o prenderia na ratoeira, me deixava só. Rói, ratinho. Rói, por favor. Além do ratinho, os pingos no filtro. Os grossos pingos cada vez mais depressa: o seu coração. O bichinho pára de roer, orelha em pé, assiste a mulher em agonia. Ela sabe que venceu a crise ao escutar novamente o camondongo. Pode chorar, não há mais perigo. Que as lágrimas enxuguem por si – ergue-se, apalpando a treva. Risca um fósforo depois de outro, acende o pavio. No criado-mudo o remédio, a colher, o copo d’água. Depois que alumia a lamparina e toma as gotas, nada pode senão vigiar o clarão trêmulo, à espera dos pardais. Geme sem querer, o marido resmunga: - Não pára de gemer?

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- Uma dor no coração... - Sempre a se queixar. A voz distante, fala de costas para ela. - Que passasse a mão nos meus cabelos... O marido ouve: ... a mão nos meu cabelos, e ressona. Aquela noite estava salva: a luz brilhava no copo. O marido e os filhos dormiam. O galho do pessegueiro na vidraça: Estou aqui, eu também. Mais um dia para concluir o trabalho. Fácil dar os vestidos e os sapatos. Quem aceita um pano bordado pela metade? Cabeceava, sentada na cama. O ratinho saciado não roía, a água não gotejava, os pardais dormiam entre as folhas. Com o inverno caem as folhas do pessegueiro, os pardais hão de voar para longe. Se eles voarem, ó Deus, quem a despertará de sua morte? TREVISAN, Dalton. Novelas nada exemplares, Rio de Janeiro.Ed. Record, 2004. p.125

Neste texto temos uma personagem ocupando-se com pequenas tarefas domésticas para evitar pensar, sentir a solidão. Releia-o e procure descobrir as respostas para as seguintes questões:

1- Percebe-se que ela tem uma angústia muito grande. Por que a

preocupação com o trabalho? O que ele significa para ela? 2- Por que os retratos da parede chamariam por ela?

3- Ela não vive só na casa, tem família: marido e filhos.

O que ela realmente teme?

4- Ao final, ela diz sentir-se salva. Do que ela se salvou?

5- Por que a preocupação com os pardais, o ratinho, o pessegueiro? Qual o significado deles no texto?

Além destes belíssimos contos, podemos encontrar em outros títulos de Dalton Trevisan, narrativas com igual temática e profundidade: Novelas Nada Exemplares,1959: Penélope, p.17 Pensão Nápoles, p.46 Ponto de Crochê, p.111 Quarto de Hotel, p.120 Morte na Praça, 1964: Cena Doméstica, p.35 Cemitério dos Elefantes, 1964: Uma vela para Dario, p.38 Os Botequins, p.54 Desastres do Amor, 1968: As Marias, p.3 Memórias de um Sovina, p.21

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Tantas Mulheres, p.36 Onde estão os Natais de Antanho?, p.52 No Sétimo Dia, p.87 O Vagabundo, p.89 No Jardim, p.97 Em Família, p.131 A Faca no Coração, 1975: A Corruíra Azul, p.115 Vozes do Retrato, 1991: Eis a Primavera, p.16 Clínica de Repouso, p.36 Quem tem medo de Vampiro? ,1998: Apelo, p.11 Arte da Solidão, p.41 Dois Velhinhos, p.69 Conchego de Viúvo, p.77 111 Ais, 2000: 4, p.8 Atividade 7: Em duplas, selecionar um dos contos listados acima, realizar leitura e levantar 3 questionamentos a respeito de suas idéias. Determinar o tipo de solidão sofrida pela personagem. Para finalizarmos, observe como Fernando Pessoa, poeta Português, considerou o assunto:

Uma Maior Solidão Uma maior solidão Lentamente se aproxima Do meu triste coração Enevoa-se o meu ser Como um olhar a cegar, A cegar, a escurecer. Jazo-me sem nexo, ou fim... Tanto nada quis de nada, Que hoje o nada o quer de mim.

Fernando Pessoa, 23/10/1931

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Reflita: 1 – Há alguma relação entre o conteúdo desta poesia e a de Helena Kolody? 2 – Os autores têm a mesma opinião sobre a solidão ou não? Justifique.

“O oposto da solidão não é o estar juntos. É a intimidade.” Richard Bach, escritor americano, 1936. eferências Bibliográficas: ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. São Paulo. Editora Martins Fontes, Edição coordenada e revista por Alfredo Bosi, 2000,p.918 DEMO, Pedro. Sociologia, uma introdução crítica. São Paulo, SP. Ed. Ática, 1985. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário da Língua Portuguesa- Básico. São Paulo, SP. Ed. Nova Fronteira, 1988. p.608 -609 GRAMSCI, Antônio. Obras Escolhidas,São Paulo. Martins Fontes, 1978, p.44-45. KOLODY, Helena. Sinfonia da Vida. Curitiba, Pr. Pólo Editorial do Paraná, Organização Tereza H. de Rezende. 1997. p.50. LAKATOS, Eva Maria. MARCONI, Marina de Andrade. Sociologia Geral. São Paulo, SP. Editora Atlas.1999. Glossário, p.351 TREVISAN, Dalton. Novelas Nada Exemplares.. Rio de Janeiro, RJ. Editora Record 2004, p.120 – 125 _________________ Quem tem medo de vampiro?, São Paulo, SP. Editora Ática 1998, p.41 - 69 _________________ A Faca no Coração.. Rio de Janeiro, RJ. Editora Record 1975. p115. Internet REDE PSI (Google, Medicina) – acesso em 13/09/07. UOL Jornal Existencial On Line – Solidão e Liberdade – Psicólogo Jadir Lessa - SAEP. Edit. Sociedade de Análise Existencial e Psicomaiêutica – acesso em 13/09/07 http://cienciaesaude.uol.com.br/ultnot/bbc/2007/09/13 http://ww.secrt.com.br/jpoesia/fpessoa/146.html. www.cineplayers.com. http://www.adorocinema.com. http://pt.wikipedia.org?wiki/As_Good_as_It_Gets http://en.wikipedia.org/wiki/Ateternity”sGate http://noticias.bol.uol.com.br/internacional/2007/09/25/ult4740 ou 4094.jtm www.vagalume.com.br www.google.com.br www.geocities.com/mundodafilosofia

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Folhas: Profª. Sônia Aparecida B. Morski

Solidão, um mal da modernidade?

Validador:

Alfredo Francisco Pliessnig

RG 781358-9

Fone: 9922-8924

Disciplina: Biologia

Sabe-se que o ser humano é uma das espécies de animais que não

consegue sobreviver sozinha nos primeiros anos de vida, dependendo de alguém

que o auxilie continuamente.

Também na fase adulta, mesmo superando a dependência inicial, o ser

humano terá dificuldades em sua sobrevivência, se não estiver incluído em um

grupo quer seja familiar, comunitário ou social.

Há necessidades que só outro ser humano pode preencher: afeto,

solidariedade, companheirismo.

Não recebendo algum desses complementos, o ser humano pode adoecer ou

levar sua vida de forma incompleta, sendo infeliz.

O projeto Folhas, intitulado: Solidão, um mal da modernidade? apresenta,

através de textos selecionados, de autorias diversas, abordar o tema, provocando

questionamentos que só poderão ser elucidados através da reflexão, pesquisa e

análise da realidade, levando o educando a entender a si mesmo e aos outros.

Sou de parecer favorável à sua publicação e aplicação, visto que à Biologia

interessa toda investigação que possa melhorar a qualidade de vida do ser humano.

___________________________________

Alfredo F. Pliessnig

RG 781358-9

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Validação Folhas

Título: “Solidão, um mal da modernidade?” Disciplina: Língua Portuguesa Professor Colaborador: FRANCISCO DE ASSIS SOLAK Rg: 4007165-2 Disciplina de Validação: FILOSOFIA

1. PROBLEMA INICIAL

A proposta deste Folhas está de acordo com as Diretrizes Curriculares da

Educação Básica e instiga ao aluno a uma reflexão sobre o tema proposto.

2. DESENVOLVIMENTO TEÓRICO/DISCIPLINAR E CONTEMPORÂNEO

O Folhas está adequado aos alunos do Ensino Médio, de linguagem clara e

objetiva. Os conceitos são abordados dentro dos conteúdos estruturantes. Permite

ao aluno oportunidades de debate e reflexão uma vez que dialoga com a conjuntura

atual.

3. DESENVOLVIMENTO TEÓRICO INTERDISCIPLINAR

A disciplina de Filosofia é contemplada de forma subjetiva. Poderia explorar

mais alguns filósofos para ter um contraponto sobre o tema proposto.

Na página 02, é citado as disciplinas de filosofia e sociologia muito

superficialmente. Deve explorar mais essas questões.

4. PROPOSTA DE ATIVIDADES

As atividades são coerentes com a proposta inicial do Folhas. Estão bem

elaboradas e conduzem o aluno para uma melhor investigação do tema. São

atividades reflexivas e claras.

Na página 03, pode-se melhorar a orientação da atividade sobre os filmes. A

análise está muita dispersa.

Sugestão: você poderia numerar as atividades. Exemplo: Atividade 01, 02,

etc.

Observar no Manual Folhas sobre as Normas para Apresentação do Folhas.

Cuidado com as citações e a utilização de fotos e música.

Espero ter contribuído positivamente para o aprimoramento de sua produção.

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VALIDAÇÃO DO PROJETO FOLHAS

Professora : Sônia Aparecida B. Morski

Disciplina: Língua Portuguesa

PARECER: LÍNGUA PORTUGUESA

O Projeto Folhas “Solidão, um mal da modernidade?”apresenta um estudo literário

pautado no discurso como prática social, como orientam as Diretrizes Curriculares de Língua

Portuguesa para a Educação Básica do Estado do Paraná. Também, promove a interação entre

leitor e texto através da interdisciplinaridade e da leitura, análise e reflexão de textos

selecionados da obra de Dalton Trevisan.

O tema “solidão” está relacionado à vida, e principalmente à sociedade moderna; e

isso, certamente despertará o interesse do educando na realização de um estudo em que ele

pode contribuir com sua experiência de vida, atuando como co-autor durante o processo de

leitura. O contato com textos que proporcionem ao educando a reflexão e a construção de seu

conhecimento é de suma importância para sua formação.

A literatura foi e, enquanto existir, continuará sendo um denominador comum da

experiência humana, pois quem lê entende o outro, a si próprio, o mundo e se sente indivíduo

da mesma espécie, com sentimentos, virtudes e defeitos.

Por meio dos contos temáticos de Dalton Trevisan, divulga-se o conhecimento, a

experiência e a partir desses, a resolução de muitos conflitos existenciais.

O projeto oferece ao leitor possibilidade de atuação e reflexão sobre a condição do ser

humano no mundo contemporâneo.

O tema proposto levanta uma problemática que possibilita ao aluno relacionar o

cotidiano de toda uma sociedade com a temática proposta e desperta a necessidade de estudo,

compreensão e reflexão sobre o seu contexto.

Assim, considerando que o projeto analisado, construído de forma rizomática,

possibilitará o entendimento da Literatura como algo vivo e próximo da realidade e

enriquecerá o trabalho pedagógico dos professores do Ensino Médio, julgo o projeto apto a

ser executado.

É o parecer.

Suzete Oliveira da Silva

RG: 4.132.690-5