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21 CAPÍTULO I FORMAÇÃO DO TÍTULO EXECUTIVO Marilei Fortuna Godoi Sumário: Introdução; 1. Aspectos gerais da Lei de Execuções Fiscais; 2. Formação do título executivo; 2.1. Dívida ativa tributária; 2.2. Dívida ativa não tributária; 3. Proce- dimento administrativo acerca do crédito tributário a partir de sua constituição até a inscrição em dívida ativa; 4. Certidão de Dívida Ativa e o ajuizamento da execução fiscal. INTRODUÇÃO O presente capítulo tem como objeto de estudo o título que embasa a execução fiscal, desde a sua constituição, passando pela inscrição e emissão da Certidão de Dívida Ativa (CDA), até o ajuizamento da ação executiva nele fundamentada. Analisaremos a origem dos créditos que compõem a dívida ativa, tributária e não tributária, além de questões pontuais do procedimento administrativo de constituição do título embasador da execução fiscal. Antes da análise pontual, contudo, mostra-se importante, metodologicamente, tecer algumas breves considerações sobre a Lei de Execuções Fiscais (Lei nº 6.830/80). 1. ASPECTOS GERAIS DA LEI DE EXECUÇÕES FISCAIS Dispõe o art. 1º da Lei nº 6.830/80 que a execução fiscal seguirá o procedi- mento nela descrito, com aplicação subsidiária das normas presentes no Código de Processo Civil, para cobrança da dívida ativa da Fazenda Pública, verbis: Art. 1º A execução judicial para cobrança da Dívida Ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e respectivas autarquias será regida por esta Lei e, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil. Assim, as regras processuais gerais do CPC poderão ser utilizadas no rito da LEF, desde que não sejam incompatíveis com as normas reguladoras do proce- dimento especial 1 . 1. CHIMENTI, Ricardo Cunha; ABRÃO, Carlos Henrique; ÁLVARES, Manoel; BOTTESINI, Maury Ângelo; FERNANDES, Odmir. Lei de execução fiscal comentada e anotada: lei 6.830, de 22.09.1980:

ForMAção Do título exeCutivo

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CAPítulo iForMAção Do título exeCutivo

Marilei Fortuna Godoi

sumário: Introdução; 1. Aspectos gerais da Lei de Execuções Fiscais; 2. Formação do título executivo; 2.1. Dívida ativa tributária; 2.2. Dívida ativa não tributária; 3. Proce-dimento administrativo acerca do crédito tributário a partir de sua constituição até a inscrição em dívida ativa; 4. Certidão de Dívida Ativa e o ajuizamento da execução fiscal.

IntrODuçãO

O presente capítulo tem como objeto de estudo o título que embasa a execução fiscal, desde a sua constituição, passando pela inscrição e emissão da Certidão de Dívida Ativa (CDA), até o ajuizamento da ação executiva nele fundamentada.

Analisaremos a origem dos créditos que compõem a dívida ativa, tributária e não tributária, além de questões pontuais do procedimento administrativo de constituição do título embasador da execução fiscal.

Antes da análise pontual, contudo, mostra-se importante, metodologicamente, tecer algumas breves considerações sobre a Lei de Execuções Fiscais (Lei nº 6.830/80).

1. AspECtOs gErAIs DA LEI DE ExECuçõEs FIsCAIs

Dispõe o art. 1º da Lei nº 6.830/80 que a execução fiscal seguirá o procedi-mento nela descrito, com aplicação subsidiária das normas presentes no Código de Processo Civil, para cobrança da dívida ativa da Fazenda Pública, verbis:

Art. 1º A execução judicial para cobrança da Dívida Ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e respectivas autarquias será regida por esta Lei e, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil.

Assim, as regras processuais gerais do CPC poderão ser utilizadas no rito da LEF, desde que não sejam incompatíveis com as normas reguladoras do proce-dimento especial1.

1. CHIMENTI, Ricardo Cunha; ABRÃO, Carlos Henrique; ÁLVARES, Manoel; BOTTESINI, Maury Ângelo; FERNANDES, Odmir. Lei de execução fiscal comentada e anotada: lei 6.830, de 22.09.1980:

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A cobrança do crédito fiscal, através de um procedimento próprio, foi pensada com o intuito de acelerar a satisfação coativa, em prol do interesse público que reveste a cobrança das receitas de natureza eminentemente estatal2.

Assim, “a Lei de Execução Fiscal, como o próprio nome deixa transparecer, regula a satisfação dos créditos fazendários pelo procedimento da execução”3, independentemente da natureza pública ou privada dos créditos em si, desde que possuam liquidez e certeza, confirmadas em procedimento prévio e legalmente disciplinado4.

O título que instrui a execução fiscal é denominado Certidão de Dívida Ativa (CDA), conforme a seguir estudado, todavia, antes do estudo dos requisitos e formação da CDA, mostra-se pertinente a análise da natureza e composição dos créditos públicos passíveis de inscrição em dívida ativa e cobrança judicial pelo rito da LEF.

2. FOrmAçãO DO títuLO ExECutIvONão é todo e qualquer crédito da Fazenda Pública que pode ser executado

pelo rito da Lei nº 6.830/80. Conforme consta no art. 1º da LEF, somente a de-nominada dívida ativa devidamente inscrita na forma da lei, gravada em título

doutrina, prática, jurisprudência. 5. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, p. 37 . 2. Ibid., p. 37-38.3. PORTO, Éderson Garin. Manual da execução fiscal. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005, p.19. 4. Esse é o entendimento consolidado do STJ (aplicado sob o rito dos recursos repetitivos – art. 543-C, do

CPC), extraído do julgamento que definiu a possibilidade de inscrição em Dívida Ativa e de utilização do procedimento da LEF para cobrança das cédulas rurais pignoratícias originadas da Lei nº 9.138/95, posteriormente repassadas à União, nos termos do art. 2º da MP nº 2.196/2001, conforme o seguinte trecho da ementa que trata do tema:

“1. Os créditos rurais originários de operações financeiras, alongadas ou renegociadas (cf. Lei n. 9.138/95), cedidos à União por força da Medida Provisória 2.196-3/2001, estão abarcados no conceito de Dívida Ativa da União para efeitos de execução fiscal – não importando a natureza pública ou privada dos créditos em si –, conforme dispõe o art. 2º e § 1º da Lei 6.830/90, verbis:

‘Art. 2º Constitui Dívida Ativa da Fazenda Pública aquela definida como tributária ou não-tributária na Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964, com as alterações posteriores, que estatui normas gerais de direito financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal.

§1º. Qualquer valor, cuja cobrança seja atribuída por lei às entidades de que trata o art. 1º, será considerado Dívida Ativa da Fazenda.’

2. Precedentes: REsp 1103176/RS, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 26/05/2009, DJ 08/06/2009; REsp 1086169/SC, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/03/2009, DJ 15/04/2009; AgRg no REsp 1082039/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/04/2009, DJ 13/05/2009; REsp 1086848/RS, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/12/2008, DJ 18/02/2009; REsp 991.987/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/09/2008, DJe 19/12/2008.

[...]” (grifou-se)

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executivo, nos termos do art. 585, inciso VII, do CPC5, poderá ser objeto deste procedimento executório.

A dívida ativa corretamente inscrita possui os atributos da certeza e liquidez, conforme preceitua o art. 3º da LEF:

Art. 3º – A Dívida Ativa regularmente inscrita goza da presunção de certeza e liquidez.

Parágrafo Único – A presunção a que se refere este artigo é relativa e pode ser ilidida por prova inequívoca, a cargo do executado ou de terceiro, a quem aproveite.

A presunção de certeza e liquidez, porém, é relativa, já que pode ser derrogada por prova inequívoca, cujo encargo cabe ao sujeito passivo.

A dívida ativa da Fazenda Pública cobrada judicialmente pelo rito da Lei nº 6.830/80 pode ser tributária ou não tributária, conforme exposto no art. 2º da LEF:

Art. 2º – Constitui Dívida Ativa da Fazenda Pública aquela definida como tributária ou não tributária na Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964, com as alterações poste-riores, que estatui normas gerais de direito financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal.

A dívida tributária refere-se a créditos oriundos de tributos; e a não tributá-ria, de forma residual, provém dos demais créditos públicos, por exemplo, de multa pelo exercício do poder de polícia, de contratos não cumpridos, de multas contratuais, de multa penal, entre outras espécies de créditos.

Conforme o caput do citado art. 2º da LEF, a dívida ativa é aquela definida na Lei nº 4.320/64, norma que rege as regras gerais de direito financeiro e or-çamentário. O art. 396, §§ 2º e 4º, da respectiva norma, conceitua a dívida ativa tributária e a não tributária, dispondo o seguinte:

Art. 39. Os créditos da Fazenda Pública, de natureza tributária ou não tributária, serão escriturados como receita do exercício em que forem arrecadados, nas res-pectivas rubricas orçamentárias.

STJ. 1ª Seção. Recurso Especial nº 1123539/RS. Relator: Ministro Luiz Fux. Decisão unânime. Brasília, 09 dezembro de 2009, publicação em 01.02.2010. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/Justica/>

5. “Art. 585. São títulos executivos extrajudiciais: [...] VII – a certidão de dívida ativa da Fazenda Pública da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos

Territórios e dos Municípios, correspondente aos créditos inscritos na forma da lei;”6. A classificação constante neste dispositivo legal acerca da Dívida Ativa não tributária (i) não se trata de

rol exaustivo; (ii) bem como em relação à parte que nomina os empréstimos compulsórios como Dívida Ativa não tributária foi derrogada pela Constituição Federal de 1988, que lhe deu natureza tributária. Nesse sentido a doutrina de: PAUSEN, Leandro; ÁVILA, René Bergmann; SLIWKA, Ingride Schroder. Direito Processual Tributário: processo administrativo fiscal e execução fiscal à luz da doutrina e da jurisprudência. 6. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2010, p. 159.

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[...]

§ 2º – Dívida Ativa Tributária é o crédito da Fazenda Pública dessa natureza, pro-veniente de obrigação legal relativa a tributos e respectivos adicionais e multas, e Dívida Ativa não Tributária são os demais créditos da Fazenda Pública, tais como os provenientes de empréstimos compulsórios, contribuições estabelecidas em lei, multa de qualquer origem ou natureza, exceto as tributárias, foros, laudêmios, alugueis ou taxas de ocupação, custas processuais, preços de serviços prestados por estabelecimentos públicos, indenizações, reposições, restituições, alcances dos responsáveis definitivamente julgados, bem assim os créditos decorrentes de obrigações em moeda estrangeira, de subrogação de hipoteca, fiança, aval ou outra garantia, de contratos em geral ou de outras obrigações legais.

[...]

§ 4º – A receita da Dívida Ativa abrange os créditos mencionados nos parágrafos anteriores, bem como os valores correspondentes à respectiva atualização mone-tária, à multa e juros de mora e ao encargo de que tratam o art. 1º do Decreto-lei nº 1.025, de 21 de outubro de 1969, e o art. 3º do Decreto-lei nº 1.645, de 11 de dezembro de 1978.

Conforme normativa legal, o valor do débito principal acrescido da correção monetária, dos juros e da multa de mora, além dos demais encargos previstos em lei ou contrato, resulta na denominada dívida consolidada7, que integra a dívida ativa da Fazenda Pública.

O art. 39 da Lei nº 4.320/64, além definir a origem, como tributária e não tributária, do crédito pertencente ao Ente Público, também atribui à Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN)8 a competência para gestão administrativa e judicial da Dívida Ativa da União, conforme consta em seu § 5º:

§ 5º – A Dívida Ativa da União será apurada e inscrita na Procuradoria da Fazenda Nacional.

Em conclusão, a dívida ativa representa o crédito de natureza tributária ou não tributária de titularidade de algum dos entes federativos, seja qual for a sua origem, desde que presentes os atributos de liquidez e certeza, certificados em procedimento prévio e legalmente disciplinado, contendo, inclusive, os juros, a

7. Ibid., p.166. 8. Sobre tal atribuição, cabe ainda citar os seguintes preceitos normativos que também tratam da matéria: “ Art. 131, § 3º, da Constituição Federal: “Na execução da dívida ativa de natureza tributária, a representação

da União cabe à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, observado o disposto em lei.” Lei Complementar nº 73/93: “Art. 12: À Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, órgão administrativamente subordinado ao titular

do Ministério da Fazenda, compete especialmente: Apurar a liquidez e certeza da dívida ativa da União de natureza tributária, inscrevendo-a para fins de

cobrança, amigável ou judicial;”

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atualização monetária ou quaisquer outros encargos incidentes sobre o valor do crédito.

2.1. Dívida ativa tributária

A art. 201 do CTN conceitua a dívida ativa tributária:

Art. 201. Constitui dívida ativa tributária a proveniente de crédito dessa natureza, regularmente inscrita na repartição administrativa competente, depois de esgotado o prazo fixado, para pagamento, pela lei ou por decisão final proferida em processo regular.

Parágrafo único. A fluência de juros de mora não exclui, para os efeitos deste artigo, a liquidez do crédito.

A dívida ativa tributária advém de crédito tributário não honrado pelo sujeito passivo no prazo fixado para o seu pagamento, inscrito no órgão administrativo competente para tal ato.

Quando se fala em crédito tributário e LEF, deve-se atentar para prevalência das normas gerais de direito tributário constantes no Código Tributário Nacional em relação às normas da LEF, atendendo-se, pois, ao comando do art. 146, III, da Constituição Federal, que determina à lei complementar a obrigatoriedade da regulação de normas gerais em matéria tributária.

Nesse sentido, as normas de caráter material presentes na LEF não terão aplicabilidade ao crédito tributário, que deverá seguir o CTN. Isso porque a Lei nº 6.830/80 é lei ordinária, enquanto o CTN tem status de lei complementar9.

A doutrina mais balizada classifica como de natureza tributária a dívida de-corrente de impostos, taxas, contribuições de melhoria, contribuições sociais e empréstimos compulsórios10.

O conceito de tributo encontra-se expresso no art. 3º do CTN11, cuja carac-terização exige que seja: (i) prestação pecuniária; (ii) em moeda ou cujo valor nela possa expressar; (iii) não se trate de sanção de ato ilícito; (iv) de exigência compulsória; (v) instituída por lei; cuja (vi) cobrança seja feita através de atividade administrativa plenamente vinculada à legislação posta.

9. PAUSEN, Leandro; ÁVILA, René Bergmann; SLIWKA, Ingride Schroder, op. cit., p.155.10. Ao estudo das espécies tributárias cita-se a doutrina de Leandro Pausen: Direito tributário: constituição

e código tributário à luz da doutrina e da jurisprudência. 8. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado: ESMAFE, 2006, p. 36-91.

11. Art. 3º do CTN: “Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.”

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Assim, a dívida ativa tributária pode ser conceituada como um crédito público originado pelo não pagamento de um determinado tributo pelo sujeito passivo, no prazo fixado pela norma regente de cada exação, constituída em procedimento prévio e disciplinada por lei12.

2.2. Dívida ativa não tributária

A dívida ativa não tributária, conforme o nome já esclarece, compõe-se de crédito que não possui natureza tributária, inscrita pelo setor administrativo legalmente competente para execução do ato, após a devida apuração na forma prevista em lei, cuja origem decorre do exercício do poder de império, na moda-lidade de poder de polícia, ou da atividade legalmente conferida à autoridade de direito público. Segundo explica a doutrina:

Até mesmo as obrigações contratuais, desde que submetidas ao controle da inscrição, podem ser exigida por via da execução fiscal. Segundo tal inovação, nem sequer se exige que haja previsão contratual a respeito da possibilidade de executar-se o crédito fazendário. Basta apurar-se a sua liquidez e realizar-se a devida inscrição em Dívida Ativa, para que a Fazenda Pública esteja autorizada a promover a execução fiscal.13

Conforme citado, o art. 39, §2º, da Lei nº 4320/64, mencionado no art. 2º, ca-put, da Lei nº 6.830/80, define o rol não exaustivo de créditos da Fazenda Pública de natureza não tributária. Como a respectiva lista mostra-se extensa, poder-se-ia entender que qualquer dívida de natureza não tributária enseja a inscrição em dívida ativa, porém, apenas a dívida não tributária originada de atividade típica de direito público própria da credora, baseada na lei, no poder de império ou contrato, mostra-se passível de inscrição em dívida ativa e cobrança pelo pro-cedimento da LEF.

A dívida ativa não tributária resulta dos demais créditos da Fazenda Pública, constituídos, por ato vinculado, pelo órgão administrativo legalmente encarregado de atestar a certeza e liquidez do crédito.

Mostra-se essencial para o controle da legalidade, atribuindo, pois, os predica-tivos da certeza e liquidez do crédito, que a autoridade administrativa responsável pela inscrição em dívida ativa do crédito não tributário verifique a indicação da origem do crédito, o exato valor devido, o sujeito passivo, o vencimento, bem

12. PAUSEN, Leandro, op. cit., p. 698-703.13. Nesse sentido, a doutrina de THEODORO JÚNIOR, Humberto. Lei de execução fiscal: comentários e

jurisprudência. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 15.

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como, e principalmente, a vinculação do crédito com a norma legal que regula-menta a cobrança14.

Conforme mencionado, há dispositivos da LEF que somente são aplicados à cobrança de dívida ativa não tributária, como, por exemplo, a determinação da suspensão da prescrição definida no art. 2º, § 3º, da Lei nº 6.830/80. Nesse caso, então, diferentemente do crédito não tributário, o tributário deverá seguir as determinações do Código Tributário Nacional, não da LEF.

Por sua vez, os dispositivos do CTN que regem as matérias inerentes à res-ponsabilidade e aos privilégios podem ser utilizados para disciplinar a execução da dívida ativa de natureza não tributária, diante da autorização legal contida no art. 4º, §§ 2º e 4º, da LEF.

O procedimento administrativo de constituição do crédito não tributário se-gue a mesma sistemática administrativa aplicada ao crédito tributário, devendo obedecer, portanto, a todos os princípios que orientam o procedimento fiscal tributário, em especial, o devido processo legal.

No caso dos créditos não tributários, cabe aos órgãos ou unidades responsáveis pelos créditos instruir o processo administrativo de reconhecimento da existência e quantificação do crédito a favor do Ente Público e direcioná-lo ao órgão ou unidade competente para inscrição, nos prazos definidos em lei15.

Encaminhado o processo administrativo para inscrição em dívida ativa, cabe ao órgão competente a análise da presença da certeza e liquidez do crédito, bem como das demais condições gerais que permitem a inscrição. A partir dessa análise será efetivada a inscrição em dívida ativa ou, eventualmente, a rejeição da mesma, caso em que o processo será devolvido à origem.

Por outro lado, nem todo o crédito de natureza não tributária da Fazenda Pú-blica pode ser objeto de inscrição em dívida ativa e, por conseguinte, ser cobrado pelo procedimento especial da LEF. As atividades acidentais do Ente Público ou aquelas que não se inserem dentro de suas finalidades precípuas refogem da

14. PACHECO, José da Silva. Comentários à lei de execução fiscal: lei n. 6.830, de 22-9-1980. 12 ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 43.

15. A Corte Superior, através da sistemática dos recursos repetitivos (art. 543-C, CPC), pacificou entendimento acerca do prazo prescricional de 5 (cinco) anos para cobrança de multa de natureza administrativa, crédito não tributário, nos termos do art. 1º do Decreto nº 20.910/32, a contar a partir do momento em que se torna exigível o crédito de forma definitiva.

STJ. 1ª Seção. Recurso Especial nº 1105442/RJ. Relator Ministro Hamilton Carvalhido. Decisão por maioria. Brasília, 09 de dezembro de 2009, publicação em 22.02.2011. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

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conceituação de dívida ativa não tributária, nos termos definidos pela LEF e pela Lei nº 4320/64.

O enfoque principal para exclusão de determinados créditos de natureza não tributária da Fazenda Pública da possibilidade de inscrição em dívida ativa e utili-zação do procedimento de cobrança regido pela LEF é a falta de liquidez e certeza dos respectivos créditos, como, por exemplo, vem reconhecendo a Corte Especial em relação aos créditos decorrentes de indenização por responsabilidade civil16.

Entende a Corte Superior que, nas cobranças pela Fazenda Pública dos créditos provenientes de ilícitos civis extracontratuais (como, por exemplo, aqueles origina-dos de acidente com veículos ou em razão de fraude), quando não tenha ocorrido uma ação judicial prévia buscando a apuração do montante devido, não há como, anteriormente a isso, inscrever o débito em dívida ativa e cobrá-lo pelo procedimento da Lei nº 6.830/80: “Isto porque, em tais casos, não há certeza da existência de uma relação jurídica que vai ensejar o crédito, não havendo ainda débito decorrente de obrigação vencida e prevista em lei, regulamento ou contrato”17.

16. “PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. DNER. INDENIZAÇÃO POR DANOS AO PATRIMÔNIO DECORRENTES DE ACIDENTE AUTOMOBILÍSTICO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. PRECEDENTES DO STJ.

1. Cinge-se a questão à possibilidade de cobrança, mediante inscrição em dívida ativa pelo DNER, de danos causados em Rodovia Federal.

2. Na hipótese, descabe utilizar a via da Execução Fiscal para ressarcimento de dano causado em decorrência de acidente automobilístico em via pública, por não se enquadrar no conceito de dívida ativa não tributária do art. 39 da Lei 4.320/1964. Precedentes do STJ.

3. Recurso Especial não provido.“ (STJ. 2ª Turma. Recurso Especial nº 719583/RS. Relator Ministro Herman Benjamim. Decisão unânime.

Brasília, 17 de dezembro de 2009, publicação em 02.02.2010. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>).

“TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO CONCEDIDO MEDIANTE SUPOSTA FRAUDE. INDENIZAÇÃO DECORRENTE DE ATO ILÍCITO. NÃO INCLUSÃO NO CONCEITO DE DÍVIDA ATIVA NÃO TRIBUTÁRIA.

1. Trata-se de agravo regimental interposto contra decisão que, ao negar provimento ao agravo interno, aplicou jurisprudência do STJ no sentido de que os créditos incertos e ilíquidos não integram a dívida ativa, suscetível de cobrança executivo-fiscal.

2. "No caso dos autos, cuida-se de um suposto crédito decorrente de ato ilícito (fraude). Trata-se de um nítido caso de responsabilidade civil, não se enquadrando no conceito de dívida ativa não tributária por falta do requisito da certeza" (REsp 1172126/SC, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 25/10/2010).

3. Agravo regimental não provido.” (STJ. 1ª Turma. Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 1340269/PR. Relator Ministro Benedito

Gonçalves. Decisão unânime. Brasília, 22 de março de 2011, publicação em 25.03.2011. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>).

17. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 2ª Turma. Agravo Regimental no Recurso Especial nº 800405/SC. Relator Ministro Mauro Campbell Marques. Decisão unânime. Brasília, 01 de dezembro de 2009, publicação em 26.04.2011. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

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Tal entendimento, todavia, é ressalvado pela própria jurisprudência da Corte Especial quando se trata de valores decorrentes de ilícitos administrativos come-tidos por servidores públicos. Nessas situações, entende o STJ que a apuração do ilícito advém de um processo administrativo prévio, formalizado dentro dos comandos legais e sob a proteção do manto do devido processo legal.

Assim, no entendimento jurisprudencial da Instância Especial, quando o crédito precede anterior relação jurídica entre o causador do dano (servidor ou funcionário público) e a Administração Pública mostra-se revestido dos atributos da certeza e liquidez, podendo, desta feita, ser inscrito em dívida ativa e cobrado pela via da LEF18.

Sobre o tema, cabe, todavia, uma crítica ao entendimento atual da Corte Espe-cial, que não admite a imediata inscrição em dívida ativa e cobrança pela LEF dos créditos originados de fraudes no recebimento de benefícios previdenciários, sob o fundamento de que, para estes casos, o crédito não possuiria liquidez e certeza19.

Apesar do entendimento do STJ, a apuração do montante do dano, in casu, não passa da soma atualizada das parcelas dos benefícios previdenciários pagos indevidamente, acrescidas dos encargos previstos em lei. Além disso, a verifica-ção do ilícito é antecedida por um prévio processo administrativo, embasado no contraditório e na ampla defesa.

Ademais, o § 2º do art. 39 da Lei nº 4320/64 lista como dívida ativa não tri-butária as “indenizações”, “reposições” e “restituições”. Assim, entende-se, em atenção a tal classificação, que as restituições de benefícios previdenciários pagos indevidamente, então originados de ação fraudulenta, integram a conceituação de dívida ativa não tributária e, por conseguinte, podem ser inscritas em dívida ativa e cobradas judicialmente pelo rito da LEF20.

Por fim, o respectivo crédito advém do ressarcimento de benefícios previden-ciários recebidos mediante fraude, cujos pagamentos, controle e administração

18. Id. 19. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 2ª Turma. Recurso Especial nº 1172126/SC. Relator Ministro

Humberto Martins. Decisão unânime. Brasília, 21 e setembro de 2010, publicação em 25.10.2010. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

20. “TRIBUTÁRIO. DÍVIDA ATIVA. INSCRIÇÃO. RESTITUIÇÃO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO PAGO INDEVIDAMENTE.

1. As restituições de benefícios previdenciários indevidamente pagos enquadram-se como Dívida Ativa não Tributária, sendo, portanto, passíveis de escrituração, a fim de adquirir liquidez e executividade.

2. Recurso especial provido.” (STJ. 2ª Turma. Recurso Especial nº 527143/PR. Relator Ministro João Otávio de Noronha. Decisão

unânime. Brasília, 12 de dezembro de 2006, publicação em 08.02.2007. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>).

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inserem-se no rol das atividades típicas de Estado, conforme determinado pela própria Constituição Federal do Brasil21.

Nesse sentido, em dissonância ao entendimento atual da Corte Especial sobre o tema, infere-se que estão preenchidos os atributos da certeza e liquidez da dívida originada de fraude relacionada à concessão de benefício previdenciário ou de outros benefícios sociais. Isso porque a apuração do débito advém do exercício de uma atividade típica de Estado, onde a dívida é constituída em estrita obedi-ência às exigências legais, sendo precedida por processo administrativo, no qual se insere o respeito ao devido processo legal22.

3. O prOCEDImEntO ADmInIstrAtIvO ACErCA DO CréDItO trIbutárIO A pArtIr DE suA COnstItuIçãO Até A InsCrIçãO Em DívIDA AtIvA

O crédito tributário nasce da obrigação tributária principal, que se constitui com a ocorrência do fato gerador23.

A constituição do crédito tributário é um procedimento administrativo feito através de um ato formal, o lançamento24, exigindo-se a observância dos requisitos definidos no artigo 142 do CTN25.

A constituição do crédito tributário ocorre no âmbito do Processo Administra-tivo Fiscal (PAF), o qual, na esfera federal, é regulado pelo Decreto nº 70.235, de 06.03.197226, com suas alterações promovidas pela Lei nº 8.748, de 09.12.1993, pela Lei nº 9.784, de 29.01.1999, pela Lei nº 10.522, de 19.07.2002, pela Lei nº 11.196, de 2005, e pela Lei nº 11.941, de 2009.

As normas contidas na Lei nº 9.784/99, que regula o processo administrati-vo federal em geral, conforme consta em seu art. 69, também são aplicáveis ao

21. Conforme os preceitos constitucionais dos art. 194, § único, 195 e 204.22. Nessa linha, cita-se o parecer da Advocacia-Geral da União, PARECER/CONJURIMTE/Nº 370/2008,

Processo nº 46014.000931/2008-15. Disponível em: <www.agu.gov.br/sistemas/site/PaginasInternas/NormasInternas/AtoDetalhado.aspx?idAto=258933>

23. Conforme define o art. 139 do CTN: “O crédito tributário decorre da obrigação principal e tem a mesma natureza deste.”

24. Sobre o tema ver a doutrina de Leandro Pausen, op. cit., p.1066-1100.25. “Art. 142 do CTN: Compete privativamente à autoridade administrativa constituir crédito tributário pelo

lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível.

Parágrafo único: A atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional.”

26. Tal decreto tem força de lei ordinária. Nesse sentido: PAUSEN, Leandro et al., op. cit., p.11-12.

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processo administrativo fiscal, mas apenas de forma subsidiária aos preceitos previstos no Decreto nº 70.235/72.

O procedimento administrativo fiscal federal tem início27 quando configurada uma das situações definidas no art. 7º do referido Decreto28 e segue o comando do art. 196 do CTN:

Art. 196. A autoridade administrativa que proceder ou presidir a quaisquer diligên-cias de fiscalização lavrará os termos necessários para que se documente o início do procedimento, na forma da legislação aplicável, que fixará prazo máximo para conclusão daquelas.

O processo administrativo fiscal deve obedecer, além dos princípios comuns aplicáveis à Administração Pública, contidos no art. 37 da Constituição Federal29, bem como aqueles definidos no art. 5º da CF, inúmeros outros, dos quais se des-tacam os princípios da duração razoável do processo, da motivação, do devido processo legal, da segurança jurídica, da proteção da confiança e do duplo grau de cognição30.

O PAF deve ser guiado em estrita obediência aos procedimentos descritos em lei, dando-se amplo acesso e conhecimento dos atos ali praticados ao contribuinte, sob pena de nulidade31, configurando-se, especialmente, em um instrumento de controle de legalidade32.

27. Com o inicio da ação fiscal, o sujeito passivo perde o direito à espontaneidade definida no caput do art. 138, do CTN, no qual se permitia ao contribuinte recolher o tributo sem qualquer penalidade, apenas com o acréscimo de correção monetária e juros de mora, conforme excepciona o parágrafo único do referido comando legal.

28. “Art. 7º O procedimento fiscal tem início com: I – o primeiro ato de ofício, escrito, praticado por servidor competente, cientificado o sujeito passivo da

obrigação tributária ou seu preposto; II – a apreensão de mercadorias, documentos ou livros; III – o começo de despacho aduaneiro de mercadoria importada. § 1° O início do procedimento exclui a espontaneidade do sujeito passivo em relação aos atos anteriores

e, independentemente de intimação a dos demais envolvidos nas infrações verificadas. § 2° Para os efeitos do disposto no § 1º, os atos referidos nos incisos I e II valerão pelo prazo de sessenta

dias, prorrogável, sucessivamente, por igual período, com qualquer outro ato escrito que indique o prosseguimento dos trabalhos.”

29. Art. 37, da CF: “A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência [...]”

30. ROCHA, Sergio André. Processo administrativo fiscal: controle administrativo do lançamento tributário. 4. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 47-123.

31. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 2ª Turma. Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 1022208/GO. Relator Ministro Mauro Campbell Marques. Decisão unânime. Brasília, 21 de outubro de 2008, publicação em 21.11.2008. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/Justica/>

Sobre o assunto, importante ainda destacar que o reconhecimento de nulidade do processo administrativo depende da verificação de prejuízo para a defesa do sujeito passivo, nos termos do art. 60 do Decreto nº 70.235/72, conforme doutrina de PAUSEN, Leandro et al., op. cit., p. 126-128.

32. ROCHA, Sergio André, op. cit., p. 328.

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Com a impugnação administrativa do lançamento tributário pelo contribuinte, “ocorre a suspensão da exigibilidade do crédito tributário, prevista art. 151, III, do CTN, o que impede o curso do prazo prescricional quinquenal”33, que perdurará até a decisão final do processo administrativo fiscal34.

Ressalta-se que não mais se exige apresentação de garantia, arrolamento de bens ou depósito pelo contribuinte para prosseguimento de recursos ou acesso à segunda instância de julgamento no âmbito administrativo. A Suprema Corte, na ADIN nº 1.976, considerou inconstitucional o §2º do art. 33 do Decreto nº 70.235/72, entendendo ferir a garantia constitucional da ampla defesa a exigên-cia do depósito como pressuposto de admissibilidade de recurso administrativo.

Nesse aspecto, a Lei nº 9.532/97, regulamentada pelo Decreto nº 7.573, de 30 de setembro 2011, que impõe o arrolamento de bens ainda na seara admi-nistrativa como forma de garantia dos créditos superiores a 30% do patrimônio do contribuinte quando as dívidas superarem R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais), encontra-se plenamente aplicável, pois tal normativa não foi objeto de apreciação pela Suprema Corte.

Enfatiza-se, dessa forma, que apenas as normas que condicionam o recurso administrativo a depósito ou a arrolamento de bens foram declaradas inconstitu-cionais e, portanto, são inaplicáveis ao processo administrativo35, nos termos do que foi decidido pela Corte Suprema e também pela Corte Superior36.

Nos termos do art. 38, parágrafo único, da LEF, o ajuizamento pelo contri-buinte de alguma das ações citadas no seu caput representará renúncia ao poder de recorrer no âmbito administrativo e desistência do recurso eventualmente in-terposto37. Isso porque a coexistência da mesma discussão em instâncias diversas,

33. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 2ª Turma. Recurso Especial nº 1141562/SP. Relator Ministro Mauro Campbell Marques. Decisão unânime. Brasília, 22 de fevereiro de 2008, publicação em 04.03.2011. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

34. Sobre o tema, pontua-se que não se admite prescrição intercorrente na esfera administrativa. Isso porque, além da inexistência de norma sobre matéria, a prescrição, entabulado no art. 174, do CTN, só se inicia após a constituição definitiva do crédito, e essa somente se efetiva após o julgamento, em definitivo, de recurso administrativo; enquanto isso, a exigibilidade do crédito ficará suspensa nos termos do art. 151, III, do CTN, conforme entende a Corte Especial:

STJ. 2ª Turma. Recurso Especial nº 1197885/SC. Relatora Ministra Eliana Calmon. Decisão unânime. Brasília, 02 de setembro de 2010, publicação em 22.09.2010. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>; STJ. 1ª Turma. Recurso Especial nº 1113959/RJ. Relator Ministro Luiz Fux. Decisão unânime. Brasília, 15 de dezembro de 2009, publicação em 11.03.2010. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

35. PAUSEN, Leandro; ÁVILA, René Bergmann; SLIWKA, Ingride Schroder, op. cit., p. 91.36. Súmula 373 do STJ: “É ilegítima a exigência de depósito prévio para admissibilidade de recurso

administrativo.”37. Tal preceito normativo já foi objeto de análise pela Suprema Corte, a qual firmou pela constitucionalidade

da norma, entendendo que o direito constitucional de petição e o princípio da legalidade não implicam na

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além de se mostrar contraproducente, pode ocasionar decisões contraditórias, ferindo os princípios da segurança jurídica, da eficiência, da economicidade e da proteção da confiança.

Constituído o crédito tributário de forma definitiva38, sem que tenha o con-tribuinte apresentado impugnação e/ou recurso, ou, ainda, após o julgamento definitivo de eventual irresignação interposta, com o vencimento do prazo para o pagamento do crédito definitivamente constituído39, o PAF será, no âmbito federal, direcionado à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional para apuração e inscrição do crédito tributário em dívida ativa e, se for o caso, cobrança judicial do mesmo.

No âmbito dos Estados-membros, Distrito Federal e dos Municípios, a inscrição em dívida ativa dos créditos tributários é regulada por leis estaduais, distritais e municipais, respectivamente, e deve ser uma atividade vinculada a um órgão jurídico próprio, através de procuradores com atribuição legal para o ato.

O processo administrativo fiscal, no âmbito federal, vem evoluindo para a tramitação de forma integralmente eletrônica. O denominado “e-Processo” – Pro-cesso Administrativo Fiscal Digital40 torna o tramite administrativo mais célere,

necessidade de esgotamento da via administrativa para discussão judicial da validade de crédito inscrito em Dívida Ativa da Fazenda Pública.

STF. Pleno. Recurso Extraordinário nº 234.277/RJ. Relator para o acórdão Ministro Joaquim Barbosa. Decisão por maioria. Brasília, 16 de outubro de 2007, publicação em 16.05.2008. Disponível a partir de <www.stf.jus.br/portal/processo/>

38. Quando o crédito tributário é constituído mediante declaração do contribuinte (DCTF, GFIP, GIA, declaração de rendimentos), não há necessidade de constituição formal do crédito mediante prévio processo administrativo fiscal, podendo o mesmo, de forma in continenti, ser direcionado para a inscrição em dívida ativa. O termo a quo para a prescrição, nesse caso, terá inicio a partir do vencimento do crédito declarado pelo contribuinte e não pago.

STJ. 1ª Seção. Recurso Especial nº 850423/SP. Relator Ministro Castro Meira. Decisão por maioria. Brasília, 28 de novembro de 2007, publicação em 07.02.2008. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

39. O inicio da contagem do prazo prescricional para cobrança do crédito, no caso de apresentação de impugnação e/ou recurso à constituição do crédito tributário pelo contribuinte, será a partir da data da intimação do mesmo acerca da decisão final do processo administrativo, que não caiba mais nenhum recurso. Nesse sentido o art. 42 do Dec. 70.235/72.

STJ. 1ª Turma. Recurso Especial nº 1028428/SC. Relator Ministro José Delgado. Decisão unânime. Brasília, 27 de maio de 2008, publicação em 23.06.2008. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

40. Medida Provisória nº 232, de 30 de dezembro de 2004, convalidada pela Lei nº 11.196, de 2005, alterou diversos artigos do Decreto 70.235/72, com o objetivo de tornar o processo administrativo mais rápido. Entre as alterações, incluiu-se o parágrafo único do art. 2º, e o inciso III, do art.23, as quais estão vinculadas à implantação do processo eletrônico na esfera administrativa tributária federal. A regulamentação de tais artigos encontra-se disciplina nas Portarias SRF 666, de 24/04/2008, e Portaria SRF 259/2006.

Aplicável ainda ao procedimento, no que lhe for compatível, as orientações contidas na Lei nº 11.419, de 19 de dezembro de 2006, que dispõe sobre a informatização do processo judicial.

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além de conceder maior transparência ao procedimento, possibilitando, ainda, ao contribuinte o acesso virtual ao processo pela Internet.

O contribuinte poderá, através do e-Processo, peticionar, apresentar impug-nações e recursos, obter cópia digital de inteiro teor da demanda administrativa e/ou de um determinado documento presente aos autos do processo eletrônico, entre outros atos possíveis. Ou seja, poderá acompanhar pela Internet todo o andamento dos processos administrativos do seu interesse tramitando na Receita Federal, na Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional e até no Conselho Admi-nistrativo de Recursos Fiscais41.

Nessa mesma direção de inclusão digital, os fiscos estaduais e municipais estão implantando o processo eletrônico na esfera de competência de atuação de cada ente, como é o caso do Estado de São Paulo, que através da Lei Estadual nº 13.457, de 18.03.2009, disciplinou a implantação do Processo Administrati-vo Tributário Eletrônico, denominado “ePAT”, regulamentado pelo Decreto nº 54.486/2009 e pelas Portarias CAT nº 198/2010 e nº 120/201142.

Na seara administrativa federal, com o encaminhamento do PAF à Procu-radoria Geral da Fazenda Nacional, antes da efetivação da inscrição do crédito tributário da União em dívida ativa, o Procurador da Fazenda Nacional deverá efetuar o controle de legalidade do lançamento que constituiu o crédito. Analisará a correção dos atos até então praticados pela autoridade fiscal, bem como se os prazos foram obedecidos e as intimações ao sujeito passivo foram realizadas.

Caso seja verificado eventual irregularidade ou qualquer outro vício no pro-cesso administrativo, o Procurador deve devolvê-lo para retificação. Tal controle também deve ser feito pelos demais entes públicos, no âmbito respectivo de competência de cada órgão responsável pela inscrição do crédito em dívida ativa.

O controle de legalidade, da constituição do crédito tributário até a sua inscri-ção em dívida ativa, deve ser extremamente rigoroso, pois a dívida regularmente inscrita goza da presunção relativa43 de certeza e liquidez, tendo o efeito de prova pré-constituída, nos termos do art. 204 do CTN e art. 3º da LEF.

41. Portaria MF nº 527, de 9/11/2010. Portaria RFB nº 3.182, de 29/07/2011, alterou a Portaria RFB nº 2.439, de 21/12/2010, estabelecendo procedimentos quanto à representação fiscal formalizada por processo digital.

42. Dados obtidos no site da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo. Disponível a partir de <https://www.fazenda.sp.gov.br/epat/PortalContribuinte>

43. Presunção juris tantum, ou seja, o débito é certo e é devido, até que se prove o contrário, cujo ônus da prova cabe ao devedor.

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Há que se anotar que a inscrição em dívida ativa pode prescindir de pro-cesso administrativo fiscal, podendo ser realizada com base na declaração do contribuinte que reconheceu o débito na esfera administrativa, como no caso de confissões e declarações feitas por DCTF, GFIP, GIA, depósitos judiciais, etc.44. Para esses casos, é essencial conter no termo de inscrição a informação da origem do crédito confessado45.

Quanto ao tema, mostra-se importante destacar que para aqueles casos em que o contribuinte informa quitação em Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais (DCTF), ou seja, informa o débito e ao mesmo tempo o crédito em compensação; quando tal quitação não for admitida pelo fisco, deve-se efetuar o lançamento de ofício, com intimação do contribuinte para, querendo, interpor impugnação contra a negativa da aceitação da compensação pretendida, em obediência aos princípios do contraditório e da ampla defesa. Nessa situação, a jurisprudência pacificada da Corte Especial entende pela vedação da imediata inscrição em dívida ativa, antes da intimação do devedor, das importâncias con-fessadas em DCTF que tenham sido objeto do pedido de compensação46.

A inscrição do crédito tributário em dívida ativa não suspende nem interrom-pe o prazo prescricional em curso47. Todavia, para os créditos de natureza não tributária, haverá a suspensão pelo período de 180 dias48 ou até a distribuição da

44. PAUSEN, Leandro; ÁVILA, René Bergmann; SLIWKA, Ingride Schroder, op. cit., p. 224-225. STJ. 2ª Turma. Recurso Especial nº 739910/SC. Relatora Ministra Eliana Calmon. Decisão unânime.

Brasília, 12 de junho de 2007, publicação em 29.06.2007. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

STJ. 1ª Seção. Recurso Especial nº 886462/RS. Relator Ministro Teori Albino Zavascki. Decisão unânime. Brasília, 22 de outubro de 2008, publicação em 28.10.2008. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

45. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 1ª Turma. Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial nº 88092/SP. Relator Ministro Benedito Gonçalves. Decisão unânime. Brasília, 12 de abril de 2012, publicação em 17.04.2012. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

46. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 2ª Turma. Recurso Especial nº 1179646/PR. Relator Ministro Herman Benjamin. Decisão unânime. Brasília, 17 de agosto de 2010, publicação em 22.09.2010. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 2ª Turma. Recurso Especial nº 1266967/PR. Relator Ministro Humberto Martins. Decisão unânime. Brasília, 23 de agosto de 2011, publicação em 01.09.2011. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

47. Enfatizando, as normas que tratam de prescrição, na esfera tributária, têm natureza de normas gerais, estando, assim, sob reserva de lei complementar, no caso, o art. 174 do CTN, conforme determina o art. 146, III, b, da CF. Assim, como a LEF configura-se como uma lei ordinária, entende-se que o respectivo art. 2º, § 3º, só tem aplicabilidade para os créditos de natureza não tributária. Interpretação essa extraída das decisões da Suprema Corte acerca da matéria. Precedentes, inclusive, que resultaram na edição da Súmula Vinculante nº 8: “São inconstitucionais o parágrafo único do artigo 5º do Decreto-lei nº 1.569/1977 e os artigo 45 e 46 da Lei nº 8.212/1991, que tratam da prescrição e decadência de crédito tributário.”

48. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 2ª Turma. Recurso Especial nº 1165216/SE. Relatora Ministra Eliana Calmon. Decisão unânime. Brasília, 02 de março de 2010, publicação em 10.03.2010. Disponível

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execução fiscal, se esta ocorrer antes desse prazo, nos termos definidos no § 3º do artigo 2º da LEF:

§ 3º. A inscrição, que se constitui no ato de controle administrativo da legalidade, será feita pelo órgão competente para apurara a liquidez certeza do crédito e suspen-derá a prescrição, para todos os efeitos de direito, por 180 (cento e oitenta) dias ou até a distribuição da execução fiscal, se esta ocorrer antes de findo aquele prazo. .

O Termo de Inscrição de Dívida Ativa é um documento público extremamente formal, cuja função de controle visa incluir o crédito no cadastro de dívida ativa. A formação do respectivo documento exige a presença de requisitos obrigatórios, arrolados no art. 202 do CTN e no § 5ª, do art. 2º da LEF49, quais sejam:

(1) o nome do devedor, dos corresponsáveis e, sempre que conhecido, o domicílio ou residência de um ou de outros;

(2) o valor originário da dívida, bem como o termo inicial e a forma de calcular os juros de mora e demais encargos previstos em lei;

(3) a origem, a natureza e o fundamento legal;

(4) a indicação da data da inscrição;

(5) a data e o número da inscrição no registro e Dívida Ativa; e

(6) o número do processo administrativo ou do auto de infração, se neles estiver apurado o valor da dívida50.

Ausente qualquer um dos requisitos formais no termo de inscrição, poderá o sujeito passivo invocar a nulidade do mesmo, desde que haja prejuízo compro-vado para a defesa do devedor. Não havendo prejuízo à defesa, a jurisprudência do STJ entende que se trata de mera irregularidade formal, não admitindo a nulidade da inscrição51.

Nesse mesmo sentido, conhecido o corresponsável, deverá também constar o nome dele no termo; porém, não haverá vício no termo quando o corresponsável

a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>49. O art. 202 do CTN prevalece em relação ao § 5º do art. 2º da LEF quando se trata do termo de inscrição de

Dívida Ativa Tributária. Nesse sentido: PAUSEN, Leandro; ÁVILA, René Bergmann; SLIWKA, Ingride Schroder, op. cit., p. 193.

50. Essa exigência é dispensada quando a inscrição teve origem de crédito tributário declarado pelo contribuinte, todavia, há de constar tal informação no termo de inscrição. Nesse sentido: PAUSEN, op. cit., p.1360.

51. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 1ª Turma. Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial nº 64755/MG. Relator Ministro Francisco Falcão. Decisão unânime. Brasília, 20 de março de 2012, publicação em 30.03.2012. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

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formação do título ExEcutivo

venha a ser incluído após a efetivação do ato de inscrição. Isso porque há inú-meras situações elencadas no CTN52 que permitem a responsabilização pela dívida tributária, as quais, muitas vezes, somente são identificadas no decorrer do trâmite da execução fiscal.

Assim, poderá haver o redirecionamento da execução fiscal ao corresponsá-vel, inclusive com a superveniente inclusão do mesmo no Termo de Inscrição da Dívida Ativa, mediante despacho administrativo com base na decisão judicial que deferiu o redirecionamento pedido pela Fazenda Pública, ou após a apuração em processo administrativo realizado em estrita observância do devido processo legal.

Sobre esse tema, mostra-se de suma importância destacar que a inclusão do corresponsável no Termo de Inscrição em Dívida Ativa, desde que tal vinculação com o pagamento do débito tenha substrato legal permissivo, bem como advenha de um prévio processo administrativo de apuração e vinculação do terceiro pe-rante o crédito tributário, enseja a presunção de certeza e legitimidade da correta responsabilização – presunção juris tantum, com inversão do ônus da prova ao corresponsável53.

O inciso II do art. 202 do CTN e o inciso II, § 5º, do art. 2º da LEF impõem a obrigatoriedade da fixação do valor da dívida e da forma de calcular os juros de mora e encargos no Termo de Inscrição de Dívida Ativa.

O valor original do débito ainda sofre acréscimo da correção monetária, dos juros de mora e, em relação às execuções fiscais promovidas pela União, do encargo legal definido no Decreto-Lei nº 1.025/69.

Não se constitui, todavia, requisito essencial do termo da inscrição da dívida ativa a informação específica do valor dos juros e demais encargos, devendo constar, sim, a forma de calcular tais acréscimos54.

52. Como exemplos os casos tratados nos artigos 133, 134 e 135 do CTN.53. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 1ª Seção. Recurso Especial nº 1110925/SP. Relator Ministro Teori

Albino Zavascki. Decisão unânime. Brasília, 22 de abril de 2009, publicação em 04.05.2009. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

STJ. 1ª Seção. Recurso Especial nº 1104900/ES. Relatora Ministra Denise Arruda. Decisão unânime. Brasília, 25 de março de 2009, publicação em 01.04.2009. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

54. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 1ª Turma. Recurso Especial nº 816069/RS. Relator Ministro Luiz Fux. Decisão unânime. Brasília, 02 de setembro de 2008, publicação em 22.09.2008. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

Nesse sentido a doutrina de PAUSEN, Leandro; ÁVILA, René Bergmann; SLIWKA, Ingride Schroder, op. cit., p. 199.

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Na esfera dos tributos federais, os juros de mora e a correção monetária estão jungidos à aplicação única da taxa SELIC55, a qual poderá ser utilizada pelos demais Entes da Federação, desde que possuam legislação própria nesse sentido. Caso não exista legislação local específica, segue-se, então, a regra geral determinada no art. 161, § 1º, do CTN56.

Os créditos não tributários federais inscritos em dívida ativa também são atualizados pela taxa SELIC, nos termos do art. 30 da Lei nº 10.522/2002.

A cumulação da atualização monetária, multa moratória, juros e demais encargos previstos em lei na cobrança do tributo é perfeitamente correta, já que cada um tem uma função específica, conforme explica a doutrina:

a) a atualização monetária visa recompor o valor da moeda corroído pela inflação; não representa um acréscimo. Tratando-se de dívida ativa de natureza tributária, o art. 97, § 2º, do CTN confirma que se trata de mera atualização;

b) a multa moratória constitui sanção pelo atraso no pagamento do tributo na data prevista na legislação (art. 97, V, do CTN);

c) os juros de mora remuneram o capital indevidamente retido pelo devedor e inibem a eternização do litígio, na medida em que representam um acréscimo mensal ao valor da dívida (art. 161 do CTN);

d) os demais encargos, previstos no art. 2º, § 2º, da Lei 6.830/80, abrangem as multas contratuais previstas para os casos de rompimento dos acordos de parcelamento, assim como o encargo do Dec.-lei 1.025/69, nas execuções fiscais da União, e o acréscimo do art. 2º da Lei 8.844/94, com a redação dada pela Lei 9.647/97, nas execuções fiscais relativas ao FGTS.57

As mencionadas exigências formais quanto à composição do Termo de Ins-crição em Dívida Ativa, devidamente arroladas em lei, têm o cunho de promover a mais completa transparência da higidez do crédito público cobrado. Buscam, ainda, assegurar a ampla defesa do devedor e, com isso, legitimar a presunção de liquidez e certeza do crédito inscrito em dívida ativa, diante dos privilégios concedidos à Fazenda Pública na relação obrigacional. Por fim, garantem o equilíbrio da relação Estado-particular58.

55. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 1ª Seção. Recurso Especial nº 1111175/SP. Relator Ministro Denise Arruda. Decisão unânime. Brasília, 10 de junho de 2009, publicação em 01.07.2009. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

56. Assim a decisão da Corte Especial pela sistemática do art. 543-C, do CPC: SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 1ª Seção. Recurso Especial nº 1111189/SP. Relator Ministro Teori

Albino Zavascki. Decisão unânime. Brasília, 13 de maio de 2009, publicação em 25.05.2009. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

57. CHIMENTI, Ricardo Cunha et al., op. cit., p. 55-56.58. PORTO, op. cit., p. 66-67.

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Com tal desiderato, a jurisprudência da Corte Superior pacificou o enten-dimento quanto à vedação de o termo de inscrição em dívida ativa englobar diversos exercícios, sem discriminação do valor devido em cada um, anulando as Certidões de Dívida Ativa que apresentem tais vícios, por prejudicarem a defesa do devedor, que não tem como saber o valor da dívida de cada crédito tributário supostamente em débito59. Tal entendimento também alcança aquelas inscrições que reúnam diversos tributos em um único valor60.

Tais ocorrências são visualizadas na jurisprudência com certa frequência, em especial, nas cobranças intentadas pelos Estados-membros e Municípios. Quanto às inscrições da União, tais vícios não são observados, pois as Certidões de Dívida Ativa federais separam os créditos nela cobrados por competência e por tributo devido, permitindo ao devedor a perfeita compreensão do valor originário de todos os débitos que, eventualmente, estejam reunidos em uma única inscrição61.

Conforme adiantado, os créditos da União são acrescidos de um adicional de 20% (vinte por cento) sobre o valor do débito, a título de encargo legal62, conforme determina o art. 1º do Decreto-Lei nº 1.025/6963. Tal encargo, todavia, é reduzido em 10% (dez por cento) caso o débito seja pago anteriormente ao ajuizamento da execução fiscal, conforme disposto no art. 3º do Decreto-Lei nº 1.569/7764.

59. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 2ª Turma. Recurso Especial nº 1204284/AC. Relator Ministro Mauro Campbell Marques. Decisão unânime. Brasília, 16 de setembro de 2010, publicação em 08.10.2010. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

60. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 2ª Turma. Agravo Regimental no Recurso Especial nº 1255266/RS. Relator Castro Meira. Decisão unânime. Brasília, 16 de março de 2012, publicação em 16.03.2012. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

61. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 1ª Turma. Recurso Especial nº 816069/RS. Relator Ministro Luiz Fux. Decisão unânime. Brasília, 02 de setembro de 2008, publicação em 22.09.2008. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

62. Tal encargo legal tem, por definição da jurisprudência consolidada do STJ, dupla função: (i) de custear as despesas administrativas inerentes à arrecadação dos créditos públicos da União, incluindo as despesas judiciais necessárias a persecução e concretização deste fim; (ii) bem como substituto dos honorários advocatícios devidos pelo sujeito passivo. Assim decidiu o STJ sob a sistemática dos recursos repetitivos, nos termos do art. 543-C do CPC:

STJ. 1ª Seção. Recurso Especial nº 1110924/SP. Relator Ministro Benedito Gonçalves. Decisão unânime. Brasília, 10 de junho de 2009, publicação em 19.06.2009. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

Interessante acórdão sobre o tema: STJ. 2ª Turma. Recurso Especial nº 1234893/SP. Relator Ministro Herman Benjamin. Decisão unânime. Brasília, 18 de agosto de 2011, publicação em 08.09.2011. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

63. “Art 1º É declarada extinta a participação de servidores públicos na cobrança da Dívida da União, a que se referem os artigos 21 da Lei nº 4.439, de 27 de outubro de 1964, e 1º, inciso II, da Lei nº 5.421, de 25 de abril de 1968, passando a taxa, no total de 20% (vinte por cento), paga pelo executado, a ser recolhida aos cofres públicos, como renda da União.“

64. “Art. 3º O encargo previsto no art. 1º do Decreto-lei nº 1.025, de 21 de outubro de 1969, calculado sobre montante do débito, inclusive multas, atualizado monetariamente e acrescido dos juros e multa de mora,

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Quanto aos requisitos determinados nos incisos III, IV e V do art. 202 e nos incisos III, IV, V e VI do § 5º do art. 2º da LEF não há maiores discussões. A ausência ou incompletude de qualquer uma das exigências legais do termo de inscrição, conforme determinado nos referidos preceitos normativos, importará em nulidade da inscrição, desde que a suposta ausência prejudique a defesa do devedor 65.

4. CErtIDãO DE DívIDA AtIvA E O AjuIzAmEntO DA ExECuçãO FIsCAL.

O Termo de Inscrição em Dívida Ativa antecede a Certidão de Dívida Ativa (CDA) e é com base nele que a CDA é extraída. A CDA contém os mesmos re-quisitos formais exigidos do termo de inscrição, conforme disciplina o parágrafo único66 do art. 202 do CTN e o § 6º do art. 2º da LEF. Sobre o tema, leciona a doutrina67:

A autoridade competente para proceder à inscrição da dívida ativa (art. 2ª, § 3º) poderá certificar a existência da dívida ativa inscrita, mediante reprodução dos mesmos elementos contidos no termo. Poderá, também, autenticar o próprio termo, certificando que corresponde à dívida inscrita. Assim, formalmente, é irrelevante que a certidão apresente: a) a feição clássica e tradicional: “Certifico que, no Registro da dívida ativa foi inscrita, sob o n..., em tal data, a dívida ativa do Estado, de cujo termo consta o seguinte”, reproduzindo-se o conteúdo do termo e, a final, datando e assinando a certidão; ou b) o modelo atual de cópia datilográfica, xerográfica ou fotográfica do termo, no qual se faz constar: “Certifico que o presente termo corres-ponde à dívida ativa do Município, devidamente inscrita no respectivo Registro”. Seguem-se o lugar, data e assinatura. Importantes ao os requisitos essenciais, sem os quais a certidão não preenche a sua finalidade. Dela constando o que figura do termo, e não se desviando do que estabelece o § 5º do art. 2ª, tem plena eficácia.

será reduzida para 10% (dez por cento), caso o débito, inscrito como Dívida Ativada da União, seja pago antes da remessa da respectiva certidão ao competente órgão do Ministério Público, federal ou estadual, para o devido ajuizamento.“

65. Assim, meras irregularidades formais presentes na CDA não afetam a validade do título desde que não tenham causado prejuízos à defesa do executado. Esse é o entendimento consolidado do STJ, em atenção ao princípio da instrumentalidade das formas (pas des nullités sans grief) que orienta o sistema processual brasileiro.

STJ. 1ª Turma. Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial nº 64755/MG. Relator Ministro Francisco Falcão. Decisão unânime. Brasília, 20 de março de 2012, publicação em 30.03.2012. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

STJ. 2ª Turma. Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 1153617/SC. Relator Ministro Castro Meira. Decisão unânime. Brasília, 25 de agosto de 2009, publicação em 14.09.2009. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

66. A exigência de constar na CDA a informação acerca do livro e folha da inscrição perdeu o sentido, já que não mais existem livros de inscrição em dívida ativa. Todo o procedimento de inscrição é feito de forma eletrônica, seguindo um número específico de cadastro e registro para cada inscrição realizada.

67. PACHECO, José da Silva, op. cit., p. 55.

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A Certidão de Dívida Ativa constitui-se em um título executivo extrajudi-cial, nos termos do art. 585, inciso VII, do CPC, na redação dada pela Lei nº 11.382/2006, dotado de presunção de certeza, liquidez e exigibilidade (art. 204 do CTN e art. 3º da LEF), cabendo ao sujeito passivo o ônus probatório, caso pretenda desconstituí-lo, devendo fazê-lo por prova inequívoca, nos termos do parágrafo único dos arts. 204 do CTN e 3º da LEF.

O termo de inscrição e a Certidão de Dívida Ativa poderão ser preparados e numerados por processo manual, mecânico ou eletrônico, conforme autoriza o § 7º do art. 2º da LEF. Da mesma forma, a petição inicial em processo de execução fiscal, conforme admissão da pacífica jurisprudência da Instância Superior68, bem como diante da nova redação do art. 25 da Lei nº 10.522/2002, efetivada pela Lei nº 11.941, de 27 de maio de 200969.

Verificando-se qualquer vício de nulidade na constituição da CDA, passível de correção, seja por omissão ou falha em algum dos requisitos previstos no art. 202 do CTN, até a decisão de primeira instância, ou seja, até a prolação da sentença dos embargos à execução, a certidão defeituosa poderá ser modificada ou substituída, com devolução ao sujeito passivo do prazo para defesa, conforme orientação do art. 203 do CTN e do § 8º do art. 2º da LEF70.

O art. 203 do CTN estabelece a devolução do prazo da defesa tão somente na parte modificada, enquanto o art. 2º, § 8º, da LEF não faz qualquer referência a tal delimitação.

Nesse enfoque, a reabertura do prazo para defesa do sujeito passivo deve integrar uma leitura em coordenação com os princípios da razoabilidade, instru-mentalidade, celeridade e economia processuais. Isso porque havendo alteração na CDA em que nada modifique a situação ou os elementos essenciais presentes no

68. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 2ª Turma. Recurso Especial nº 957269/RS. Relatora Ministra Eliana Calmon. Decisão unânime. Brasília, 17 de fevereiro de 2009, publicação em 24.03.2009. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

69. Lei nº 10.522/2002: “art. 25: O termo de inscrição em Dívida Ativa da União, bem como o das autarquias e fundações públicas federais, a Certidão de Dívida Ativa dele extraída e a petição inicial em processo de execução fiscal poderão ser subscritos manualmente, ou por chancela mecânica ou eletrônica, observadas as disposições legais.

Parágrafo único. O disposto no caput deste artigo aplica-se, também, à inscrição em Dívida Ativa e à cobrança judicial da contribuição, multas e demais encargos previstos na legislação respectiva, relativos ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço.”

70. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 1ª Seção. Embargos de Divergência no Recurso Especial nº 823011/RS. Relator Ministro Castro Meira. Decisão unânime. Brasília, 14 de fevereiro de 2007, publicação em 05.03.2007. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

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título, a reabertura ampla do prazo de impugnação não traria nenhum acréscimo à defesa do devedor, apenas prejudicaria a celeridade processual.

Dessa forma, entende-se como mais adequado, em atenção aos princípios citados, bem como frente à efetividade processual, que a reabertura do prazo para defesa seja limitada apenas à parte modificada, e, ainda, quando tal modificação realmente venha prejudicar a defesa já apresentada pelo sujeito passivo. Nesse sentido, já decidiu a Corte Superior71:

TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. SUBSTITUIÇÃO DA CDA. TITULARI-DADE ATIVA. REABERTURA DO PRAZO PARA EMBARGOS À EXECUÇÃO. ART. 2º, § 8º, DA LEI N. 6.830/80. LEITURA À LUZ DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA INSTRUMENTALIDADE, DA CELERIDADE E DA ECONOMIA PROCESSUAIS.

1. Diz o art. 2º, § 8º, da Lei n. 6.830/80 que "[a]té a decisão de primeira instância, a Certidão de Dívida Ativa poderá ser emendada ou substituída, assegurada ao executado a devolução do prazo para embargos".

2. Portanto, à luz da LEF, havendo substituição da Certidão de Dívida Ativa (CDA), impõe-se a devolução do prazo para ajuizamento de embargos à execução. Embora a norma seja peremptória, é preciso lê-la em conformidade com os princípios da razoabilidade, instrumentalidade, celeridade e economia processuais.

3. Se a única mudança levada a cabo com a substituição da CDA foi referente à titularidade ativa do crédito, não é razoável que a não-abertura de prazo para defesa dê causa à nulidade da execução fiscal, notadamente em face das peculiaridades do caso.

4. No caso concreto, a substituição do credor se deu em razão da Lei n. 8.029/90, a qual extinguiu o IAA e cometeu à União a responsabilidade pelos direitos e obrigações decorrentes de lei e sindicáveis em face daquela entidade (art. 23). Nota-se, portanto, que mesmo que a parte quisesse se insurgir contra a mudança de titularidade, sua pretensão não poderia ser acolhida.

5. Recurso especial não-provido.

(grifou-se)

Há de ressaltar, todavia, que inúmeros doutrinadores de renome, bem como parcela importante da jurisprudência, defendem que a devolução do prazo deve ocorrer por inteiro72.

Não havendo sentença vinculativa à ação executiva, a CDA poderá ser subs-tituía ou emendada até a lavratura do auto de arrematação ou adjudicação dos

71. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 2ª Turma. Recurso Especial nº 895615/DF. Relator Ministro Mauro Campbell Marques. Decisão unânime. Brasília, 28 de outubro de 2008, publicação em 25.11.2008. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

72. CHIMENTI, Ricardo Cunha et al., op. cit., p. 59-60. No mesmo sentido: PAUSEN, Leandro; ÁVILA, René Bergmann; SLIWKA, Ingride Schroder, op. cit., p. 213-214.

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bens73, sempre com reabertura do prazo ao devedor para eventual apresentação de defesa em relação à parte modificada no título, se o caso assim exigir.

A substituição ou emenda da CDA até a decisão de primeiro grau, quando possível, é um direito da Fazenda Pública. Dessa forma, “não é cabível a extinção da execução fiscal com base na nulidade da CDA, sem a anterior intimação da Fazenda Pública para emenda ou substituição do título executivo, quando se trata de erro material ou formal”74.

Por outro lado, não pode haver emenda ou substituição do título executivo com o intuito de corrigir vícios materiais ou formais presentes ao processo administrativo vinculado à CDA em cobrança judicial quando tais emendas ou substituições acarretarem alteração do próprio lançamento, como, por exemplo, revisão das competências lançadas e alteração do sujeito passivo75 ou da norma legal que serviu de fundamento ao lançamento tributário76.

Assim, havendo necessidade de modificar o lançamento, a alteração ou substituição da CDA será inviável, sendo caso, então, de extinção do processo de execução sem julgamento do mérito.

Por esse aspecto, tendo o sujeito passivo efetuado pagamento parcial do débito constante em CDA ajuizada, até então não considerado pela Fazenda Pública, o tratamento a ser aplicado ao caso dependerá do momento em que se efetivou o pagamento parcial, conforme explicação que segue77:

(i) se o pagamento parcial desconsiderado ocorreu antes do lançamento, a ins-crição da dívida e a respectiva CDA daí extraída serão atos nulos; já que se mostra inviável a manutenção da inscrição e a vinculada CDA quando houver necessidade de revisão do lançamento. Nesse caso, a execução fiscal será

73. CHIMENTI, Ricardo Cunha et al., id.74. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 2ª Turma. Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial

nº 96950/RS. Relator Ministro Herman Benjamin. Decisão unânime. Brasília, 20 de março de 2012, publicação em 12.04.2012. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

75. Sobre o tema, inclusive, o STJ editou a Súmula 392: “A Fazenda Pública pode substituir a certidão de dívida ativa (CDA) até a prolação da sentença de embargos, quando se tratar de correção de erro material ou formal, vedada a modificação do sujeito passivo da execução”.

Assim, se o exequente verificar que propôs a ação executiva contra parte ilegítima, ele deverá ingressar com nova execução. Para o STJ não cabe substituição da CDA, nos parâmetros definidos pelo § 8º do art. 2º da Lei nº 6.830/80, quando o caso for de erro na definição do sujeito passivo, já que isso resultaria em modificação do próprio lançamento.

76. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 1ª Seção. Recurso Especial nº 1045472/BA. Relator Ministro Luiz Fux. Decisão unânime. Brasília, 25 de novembro de 2009, publicação em 18.12.2012. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

77. PAUSEN, Leandro; ÁVILA, René Bergmann; SLIWKA, Ingride Schroder, op. cit., p. 225-226.

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extinta, com a renovação de todos os atos desde o lançamento para que seja possível cobrar o débito então remanescente;

(ii) se o pagamento se deu entre o lançamento e a inscrição, não tendo também sido computado pelo Ente Público, o caso não será de nulidade, mas sim de retificação da inscrição, com a necessidade de emenda ou substituição do título executivo, desde que não tenha ocorrido decisão de primeira instância. Caso já tenha se efetivada a decisão monocrática sentencial, então, a CDA será nula, havendo necessidade de ajuizamento de nova execução fiscal, pois tal vício material retira da CDA a presunção legal de liquidez;

(iii) por fim, se o pagamento ocorreu após a inscrição do débito em Dívida Ativa, não haverá nenhum vício de nulidade, sendo desnecessária qualquer retifica-ção na inscrição ou no título executivo. A cobrança do saldo remanescente da Dívida Ativa prosseguirá mediante a juntada de demonstrativo atualizado do débito à execução fiscal, com a subtração dos pagamentos realizados pelo devedor do montante da dívida.

O mesmo entendimento quanto à desnecessidade de alteração ou substituição da CDA, quando verificado pagamento parcial do débito já inscrito em Dívida Ativa, aplica-se aos casos em que:

(i) ocorrer remissão legal de parte da dívida78;

(ii) para aquelas circunstâncias em que se reconheceu a inconstitucionalidade de lei em sede de controle difuso que legitimava parte do débito em cobrança79; e

(iii) naquelas situações em que houve revisão do débito por decisão do Poder judiciário com exclusão de parcela indevida80.

Assim, para os casos referidos, o excesso de execução não acarretará nulidade ou alteração do título executivo extrajudicial, apenas devendo ser providenciada a redução do montante devido, desde que o saldo remanescente possa ser apurado por simples cálculo aritmético.

78. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 2ª Turma. Recurso Especial nº 51657/SP. Relator Ministro Francisco Peçanha Martins. Decisão unânime. Brasília, 21 de agosto de 1995, publicação em 25.09.1995. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

79. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 1ª Seção. Embargos de Declaração no Recurso Especial nº 1115501/SP. Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho. Decisão unânime. Brasília, 26 de outubro de 2011, publicação em 16.11.2011. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

80. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 2ª Turma. Recurso Especial nº 1247811/RS. Relator Ministro Mauro Campbell Marques. Decisão unânime. Brasília, 14 de junho de 2011, publicação em 21.06.2011. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

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formação do título ExEcutivo

Tal entendimento foi consolidado pela Corte Especial sob a sistemática do art. 543-C do CPC, concluindo-se, então, que as alterações que possam ser feitas na Certidão de Dívida Ativa mediante simples operação aritmética não ocasionarão nulidade da respectiva CDA81.

A petição inicial na execução fiscal, nos termos do art. 6º da LEF, deve indicar os seguintes dados:

Art. 6º – A petição inicial indicará apenas:

I – o Juiz a quem é dirigida;

II – o pedido; e

III – o requerimento para a citação.

§ 1º – A petição inicial será instruída com a Certidão da Dívida Ativa, que dela fará parte integrante, como se estivesse transcrita.

§ 2º – A petição inicial e a Certidão de Dívida Ativa poderão constituir um único documento, preparado inclusive por processo eletrônico.

§ 3º – A produção de provas pela Fazenda Pública independe de requerimento na petição inicial.

§ 4º – O valor da causa será o da dívida constante da certidão, com os encargos legais.

Como visto, o art. 6º da LEF simplifica a norma do art. 282 do CPC, deter-minando como requisitos obrigatórios apenas a indicação do juízo, o pedido e o requerimento de citação. Contudo, a designação do executado também se mostra imprescindível, sob pena de inépcia da petição inicial. Logicamente, não há como dar prosseguimento à execução fiscal sem saber contra quem ela é dirigida.

A Certidão de Dívida Ativa e a petição inicial podem ser formadas em um único documento, através do processamento eletrônico. Pode haver cobrança de várias CDA’s em uma única execução82, desde que seja ajuizada contra um mesmo devedor, ou seja, “a cumulação inicial de pedidos (títulos executivos) em uma única execução fiscal, por aplicação subsidiária da regras dos arts 292 e 573 do CPC, revela-se um direito subjetivo da Fazenda Pública”83.

81. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 1ª Seção. Recurso Especial nº 1115501/SP. Relator Ministro Luiz Fux. Decisão unânime. Brasília, 10 de novembro de 2010, publicação em 30.11.2010. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

82. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 1ª Seção. Recurso Especial nº 1158766/RJ. Relator Ministro Luiz Fux. Decisão unânime. Brasília, 08 de setembro de 2010, publicação em 22.09.2010. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

83. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 2ª Turma. Recurso Especial nº 1254393/RJ. Relator Ministro Mauro Campbell Marques. Decisão unânime. Brasília, 02 de agosto de 2011, publicação em 09.08.2011. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

No caso da execução ser fundada em diversos títulos executivos, reconhecida a nulidade de um deles, a execução prosseguirá em relação aos outros, conforme entendimento assentado pela Corte Superior:

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Desnecessária a indicação de provas na petição inicial da execução fiscal, em conta da presunção de liquidez e certeza de que goza a Certidão de Dívida Ativa, cujo ônus da prova incumbe a quem pretenda desconstituí-la.

Quanto ao valor da causa, é aquele constante na CDA, ou seja, o valor do crédito inscrito, monetariamente atualizado e acrescido dos encargos legais, tais como, a multa, os juros moratórios e outras cominações instituídas pela lei até a data da propositura da execução.

É perfeitamente possível a indicação de bens à penhora na petição inicial, inclusive, tal diligência, a todo o momento, é efetivada no ajuizamento das exe-cuções fiscais da União. Ocorre, por exemplo, quando se tem conhecimento de valores que serão liberados ao devedor por precatório ou requisição de pequeno valor em outro processo judicial onde o devedor litigou contra a União e foi ven-cedor. Também ocorre quando já há caução prestada pelo devedor em juízo, em demanda diversa, na qual ele se antecipou ao ajuizamento do feito executivo, a fim de obter a certidão de regularidade fiscal. Nesse último caso, no ajuizamento da execução fiscal já se inclui pedido de penhora do bem dado em caução para garantia da dívida.

Há de se referir, ainda, ser desnecessária a apresentação de memória discri-minada de cálculos em anexo à petição inicial da execução fiscal84, bem como a juntada do processo administrativo fiscal pela Fazenda Pública85. Isso porque tais documentos não se encontram arrolados na LEF como necessários para instruir a petição inicial da execução. Ademais, a CDA goza da presunção de certeza e liquidez, cuja prova em contrário, repetindo, fica a cargo do sujeito passivo ou do terceiro interessado, nos termos do art. 204 do CTN86.

Nesse aspecto, inclusive, os autos do processo administrativo fiscal que emba-sa a dívida ativa são mantidos arquivados na repartição competente, com acesso às partes, ao juiz e ao Ministério Público, conforme consta no art. 41 da LEF:

STJ. 2ª Turma. Recurso Especial nº 1221167/RS. Relator Ministro Humberto Martins. Decisão unânime. Brasília, 22 de março de 2011, publicação em 04.04.2011. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

84. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 1ª Seção. Recurso Especial nº 1138202/ES. Relator Ministro Luiz Fux. Decisão unânime. Brasília, 09 de dezembro de 2009, publicação em 01.02.2010. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

85. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 1ª Turma. Recurso Especial nº 1120219/RS. Relator Ministro Benedito Gonçalves. Decisão unânime. Brasília, 24 de novembro de 2009, publicação em 01.12.2009. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

86. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 2ª Turma. Recurso Especial nº 1239257/PR. Relator Ministro Mauro Campbell Marques. Decisão unânime. Brasília, 23 de março de 2010, publicação em 08.04.2010. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

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Art. 41 – O processo administrativo correspondente à inscrição de Dívida Ativa, à execução fiscal ou à ação proposta contra a Fazenda Pública será mantido na repartição competente, dele se extraindo as cópias autenticadas ou certidões, que forem requeridas pelas partes ou requisitadas pelo Juiz ou pelo Ministério Público.

Parágrafo Único – Mediante requisição do Juiz à repartição competente, com dia e hora previamente marcados, poderá o processo administrativo ser exibido na sede do Juízo, pelo funcionário para esse fim designado, lavrando o serventuário termo da ocorrência, com indicação, se for o caso, das peças a serem trasladadas.

Ainda que a legislação não determine a juntada do processo administrativo com a petição inicial da execução, o mesmo deverá, obrigatoriamente, permane-cer devidamente arquivado na repartição pública competente para sua guarda, à disposição do sujeito passivo.

Assim, diante da disponibilidade do processo administrativo ao sujeito passivo, não prospera eventual alegação de cerceamento de defesa fundada na não apresentação de cópia do processo administrativo junto à ação executiva, conforme uníssono entendimento do STJ87.

Por outro lado, na eventualidade de ocorrer o extravio do processo adminis-trativo, a jurisprudência da Corte Especial entende pela inexigibilidade da CDA que o instruía, sob o fundamento da impossibilidade da conferência, pelo juízo, da legalidade da constituição do crédito em execução; inviabilizando, ainda, a defesa do contribuinte, em razão da impossibilidade de ele ter acesso ao processo administrativo88.

No ato do recebimento da execução fiscal pelo juízo da causa, em relação aos créditos da União, não haverá fixação de honorários advocatícios, uma vez que já inclusos no encargo legal de 20% previsto no Decreto-lei nº 1.025/69 e integrante do montante total objeto da execução89, conforme exposto.

Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça, em recurso repetitivo, subme-tido ao rito do art. 543-C do CPC, decidiu que, opostos embargos pelo devedor, vindo esse a desistir dos mesmos, bem como naqueles casos em que tal incidente é julgado improcedente, não haverá fixação de ônus sucumbencial ao embargante. Isso porque “nos termos da Súmula 168 do extinto TRF: o encargo de 20%, do

87. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 2ª Turma. Recurso Especial nº 1180299/MG. Relatora Ministra Eliana Calmon. Decisão unânime. Brasília, 22 de março de 2011, publicação em 31.03.2011. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

88. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 1ª Turma. Recurso Especial nº 945390/ES. Relator Ministro Francisco Falcão. Decisão unânime. Brasília, 21 de agosto de 2007, publicação em 21.08.2007. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

89. PAUSEN, Leandro; ÁVILA, René Bergmann; SLIWKA, Ingride Schroder, op. cit., p.171.

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marilEi fortuna Godoi

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Decreto-Lei nº 1025, de 1969, é sempre devido nas execuções fiscais da União e substitui, nos embargos, a condenação do devedor em honorários advocatícios”90.

Nas execuções fiscais ajuizadas pelos demais entes legitimados a utilizar o rito especial da LEF, quando não aplicável o encargo de 20% previsto no art. 1º do Decreto-Lei nº 1.025/69, a cobrança de honorários advocatícios terá exi-gência dentro da sistemática processual normal, com a fixação dos honorários advocatícios no despacho que receber a inicial executiva. Depois de fixados, os honorários passam a integrar o montante total da execução91.

90. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 1ª Seção. Recurso Especial nº 1143320/RS. Relator Ministro Luiz Fux. Decisão unânime. Brasília, 12 de maio de 2010, publicação em 21.05.2010. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>

91. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 2ª Turma. Agravo Regimental no Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 1223449/SC. Relator Ministro Castro Meira. Decisão unânime. Brasília, 22 de março de 2011, publicação em 04.04.2011. Disponível a partir de <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/>