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19 ________________________________________________________ CAPÍTULO 3 FORMAÇÕES SUPERFICIAIS CENOZÓICAS Por João Cardoso Ribeiro Moraes Filho 3.1 Grupo Barreiras (Unidade 9) Coube a Branner (1902) a primeira utilização da terminologia Barreiras, para nomear as camadas se- dimentares expostas nos tabuleiros da costa atlântica nordestina. Inicialmente, essa denominação tinha apenas um caráter morfológico, adquirindo conota- ção estratigráfica a partir de Moraes Rêgo (1930), que, ao estudar sedimentos terciários da Amazônia, correlacionou-os com aqueles aflorantes no litoral do Nordeste, denominando-os de série Barreiras, termo também adotado por Oliveira & Leonardos (1943). Oliveira & Andrade Ramos (1956) nomearam esses sedimentos de formação Barreiras, nomencla- tura utilizada posteriormente por Kegel (1957), que ressaltou a presença de uma unidade basal formada por camadas caulínicas, a que chamou de formação Infra-Barreiras. Bigarella & Andrade (1964), a partir de obser- vações realizadas próximo a Recife, propuseram a elevação da formação Barreiras à categoria de gru- po, composto pelas formações Guararapes (basal) e Riacho Morno. Em seguida, Campos & Silva (1965) identificaram, sobrepostas à formação Riacho Mor- no, as formações Macaíba e Potengi. Posteriormente, em 1972, Mabesoone, Campos & Silva e Beurlen subdividiram o grupo Barreiras nas formações Serra dos Martins, Guararapes e Macaíba. Segundo os autores, essa proposta seria válida para os estados de Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte. Embora a maior parte dos informes sobre os se- dimentos do grupo Barreiras advenha de estudos na região Nordeste, diversos trabalhos realizados em outras partes do Brasil têm contribuído para o co- nhecimento dessa unidade. Em função da proximi- dade em relação à área estudada, revestem-se de es- pecial interesse os trabalhos desenvolvidos no estado do Espírito Santo, podendo-se citar dentre outros os estudos de Amador & Dias (1978), que individuali- zam a formação Pedro Canário, considerando-a como a base do grupo Barreiras na parte norte da- quele estado. Amador (1978) considera que essa formação constitui um depósito correlativo à Super- fície da Erosão Pediplano Pd 2, de Bigarella & Ab’Saber (1964), ou da Superfície Sul-Americana, de King (1956). O mesmo autor assinala, ainda, a presença de uma discordância erosiva no topo da formação Pedro Canário, no contato com o denomi- nado Barreiras Superior, unidade que correlaciona com a formação Riacho Morno de Bigarella & An- drade (1964). Na Bahia, a maior parte das informações sobre o grupo Barreiras, é proveniente de estudos realizados nas imediações de Salvador ou na porção nordeste do estado. Deve-se destacar, dentre outros, o traba- lho de Ghignone (1979), que apresenta valiosa con- tribuição para o conhecimento desses sedimentos. Segundo esse autor, no estado da Bahia a unidade permanece na categoria de formação tendo sido formalizada pelo Setor de Estratigrafia da PETRO- BRAS, que indicou como holoestratotipos os aflo- rantes em Água Comprida, à margem da BR-324, em frente ao posto da Polícia Rodoviária. Na região extremo sul do estado, são raros os estudos sobre o grupo Barreiras, podendo-se citar os trabalhos de Pedreira (1971a, b), Menezes Filho (1972), Silva Filho et al. (1974) e de Silva et al. (1987). Mais recentemente, Menezes Filho (in Ar- canjo, 1997) mostra um enfoque atual sobre a faci- ologia do grupo Barreiras no sul da Bahia, assina- lando que a grande lenticularidade das camadas e as bruscas mudanças laterais e verticais das litolo- gias inviabilizam o rastreamento de horizontes guias para correlações, mesmo em regiões circun- vizinhas. Aproximadamente 80% da área enfocada neste projeto (Figura 3.1) acham-se cobertos por sedi- mentos terciários do grupo Barreiras, que recobre discordantemente todas as unidades proterozóicas e acha-se sobreposto localmente por sedimentos qua- ternários. Sua área de ocorrência é caracterizada pela presença de extensos tabuleiros, bruscamente inter- rompidos nas proximidades da costa pela presença de falésias fósseis ou ativas. Apresenta espessura bastante variável, em função da paleomorfologia do embasamento, chegando a atingir, a partir de obser- vações de seções estratigráficas, até 70m na área em estudo. Todavia, dados de subsuperfície obtidos pela CERB, próximos a Porto Seguro, indicam espessura de até 212m, de sedimentos aparentemente dessa unidade. Apesar da ampla distribuição, boas exposi-

Formações Cenozóicas

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________________________________________________________ CAPÍTULO 3

FORMAÇÕES SUPERFICIAIS CENOZÓICAS

Por

João Cardoso Ribeiro Moraes Filho

3.1 Grupo Barreiras (Unidade 9)

Coube a Branner (1902) a primeira utilização daterminologia Barreiras, para nomear as camadas se-dimentares expostas nos tabuleiros da costa atlânticanordestina. Inicialmente, essa denominação tinhaapenas um caráter morfológico, adquirindo conota-ção estratigráfica a partir de Moraes Rêgo (1930),que, ao estudar sedimentos terciários da Amazônia,correlacionou-os com aqueles aflorantes no litoraldo Nordeste, denominando-os de série Barreiras,termo também adotado por Oliveira & Leonardos(1943).

Oliveira & Andrade Ramos (1956) nomearamesses sedimentos de formação Barreiras, nomencla-tura utilizada posteriormente por Kegel (1957), queressaltou a presença de uma unidade basal formadapor camadas caulínicas, a que chamou de formaçãoInfra-Barreiras.

Bigarella & Andrade (1964), a partir de obser-vações realizadas próximo a Recife, propuseram aelevação da formação Barreiras à categoria de gru-po, composto pelas formações Guararapes (basal) eRiacho Morno. Em seguida, Campos & Silva (1965)identificaram, sobrepostas à formação Riacho Mor-no, as formações Macaíba e Potengi. Posteriormente,em 1972, Mabesoone, Campos & Silva e Beurlensubdividiram o grupo Barreiras nas formações Serrados Martins, Guararapes e Macaíba. Segundo osautores, essa proposta seria válida para os estados dePernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte.

Embora a maior parte dos informes sobre os se-dimentos do grupo Barreiras advenha de estudos naregião Nordeste, diversos trabalhos realizados emoutras partes do Brasil têm contribuído para o co-nhecimento dessa unidade. Em função da proximi-dade em relação à área estudada, revestem-se de es-pecial interesse os trabalhos desenvolvidos no estadodo Espírito Santo, podendo-se citar dentre outros osestudos de Amador & Dias (1978), que individuali-zam a formação Pedro Canário, considerando-acomo a base do grupo Barreiras na parte norte da-quele estado. Amador (1978) considera que essaformação constitui um depósito correlativo à Super-fície da Erosão Pediplano Pd2, de Bigarella &Ab’Saber (1964), ou da Superfície Sul-Americana,de King (1956). O mesmo autor assinala, ainda, a

presença de uma discordância erosiva no topo daformação Pedro Canário, no contato com o denomi-nado Barreiras Superior, unidade que correlacionacom a formação Riacho Morno de Bigarella & An-drade (1964).

Na Bahia, a maior parte das informações sobre ogrupo Barreiras, é proveniente de estudos realizadosnas imediações de Salvador ou na porção nordestedo estado. Deve-se destacar, dentre outros, o traba-lho de Ghignone (1979), que apresenta valiosa con-tribuição para o conhecimento desses sedimentos.Segundo esse autor, no estado da Bahia a unidadepermanece na categoria de formação tendo sidoformalizada pelo Setor de Estratigrafia da PETRO-BRAS, que indicou como holoestratotipos os aflo-rantes em Água Comprida, à margem da BR-324,em frente ao posto da Polícia Rodoviária.

Na região extremo sul do estado, são raros osestudos sobre o grupo Barreiras, podendo-se citaros trabalhos de Pedreira (1971a, b), Menezes Filho(1972), Silva Filho et al. (1974) e de Silva et al.(1987). Mais recentemente, Menezes Filho (in Ar-canjo, 1997) mostra um enfoque atual sobre a faci-ologia do grupo Barreiras no sul da Bahia, assina-lando que a grande lenticularidade das camadas eas bruscas mudanças laterais e verticais das litolo-gias inviabilizam o rastreamento de horizontesguias para correlações, mesmo em regiões circun-vizinhas.

Aproximadamente 80% da área enfocada nesteprojeto (Figura 3.1) acham-se cobertos por sedi-mentos terciários do grupo Barreiras, que recobrediscordantemente todas as unidades proterozóicas eacha-se sobreposto localmente por sedimentos qua-ternários. Sua área de ocorrência é caracterizada pelapresença de extensos tabuleiros, bruscamente inter-rompidos nas proximidades da costa pela presençade falésias fósseis ou ativas. Apresenta espessurabastante variável, em função da paleomorfologia doembasamento, chegando a atingir, a partir de obser-vações de seções estratigráficas, até 70m na área emestudo. Todavia, dados de subsuperfície obtidos pelaCERB, próximos a Porto Seguro, indicam espessurade até 212m, de sedimentos aparentemente dessaunidade. Apesar da ampla distribuição, boas exposi-

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Figura 3.1 Distribuição geográfica do grupo Barreiras na área do projeto.

Grupo Barreiras

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ções ocorrem apenas nas falésias costeiras ou nosvales talhados pelas drenagens que cortam a unida-de.

Durante a execução deste trabalho, observou-seque no âmbito do grupo Barreiras é marcante a al-ternância de depósitos pelíticos e psamo-psefíticos,dando ao conjunto um aspecto grosseiramente aca-madado. Os sedimentos são predominantemente arenosos, malselecionados, com baixa maturidade tex-tural e mineralógica, evidenciando que o transporte aque foram submetidos foi curto e aparentemente tor-rencial.

Considerando-se a expressiva distribuição e afreqüente variação faciológica, é relativamente pe-quena a quantidade de litofácies presentes no grupoBarreiras, nessa área. As características das princi-pais litofácies observadas são abordadas a seguir:• Litofácies de arenitos maciços com grânulos e

seixos dispersos (Am) – trata-se de litofáciesfreqüentemente observada na área (Fotos 3.1 e3.2). Os arenitos seixosos são de coloração cre-me com tons avermelhados, granulometria mé-dia a grossa, de aspecto maciço, compostos degrãos de quartzo, e, subordinadamente, feldspa-tos caulinizados, com baixa maturidade textural.Apresentam matriz argilo-siltosa e contêm sei-xos e grânulos de quartzo esparsos. O aspectomaciço, característico dessa litofácies, evidenciaque o processo que atuou no transporte dos se-dimentos foi o fluxo de detritos. A maturidademineralógica dos seixos e a relativa homogenei-dade de tamanho, em contraste com a imaturida-de dessa rocha, sugere tratar-se de depósitos res-sedimentados.

• Litofácies de argilitos maciços (Agm) – os argi-litos maciços de colorações roxa, creme, esver-deada e avermelhada ocorrem sob a forma deníveis e camadas lenticulares, contendo fraçãosilte, às vezes mica, além de grãos e grânulos dequartzo com baixa maturidade textural. Essa li-tofácies, quando ocorre associada a depósitos defluxo de detritos, tem sua origem atribuída a flu-xo de lama, podendo também ocorrer associadaa litofácies fluviais; nesse caso pode representardepósitos de transbordamento ou ainda depósi-tos de lagos, situados numa planície aluvial.

• Litofácies de arenitos com estratificações plano-paralela e cruzada (Ae) – ocorre sob a forma decamadas de espessura métrica (Foto 3.3), sendoformada por arenito de cor creme com tons ama-relados e avermelhados, de granulometria médiaa grossa, com grãos subangulosos a subarredon-dados, composição subarcosiana, contendo aindamatriz argilosa. Exibe estratificações plano-paralelas, cruzadas tabular e acanalada. Esses areni-tos são considerados como depósitos de sistemafluvial entrelaçado.

• Litofácies de arenitos grosseiramente estratifi-cados com níveis conglomeráticos (Agec) –apresenta-se sob a forma de camadas lateral-mente persistentes mas com tendência à lenti-cularidade (Foto 3.4). Trata-se de arenitos decolorações creme e avermelhada, pouca matrizcaulínica, contendo grãos de quartzo e, subordi-nadamente, feldspatos caulinizados, de granu-lometria média a grossa, com baixa maturidadetextural. A estratificação é pouco nítida, sendoressaltada, às vezes, por películas ferruginosasou pela presença de níveis descontínuos seixo-sos, ou ainda por apresentar gradação normal dotipo cauda grossa. Essa litofácies é interpretadacomo depósitos de sistema fluvial entrelaçado, e,às vezes, como depósitos de enxurrada em len-çol.

• Litofácies de arenitos finos a médios, bimodais,com estratificações cruzadas (Ab) – é formadapor arenitos de cores creme e esbranquiçada,granulometria média a fina, com boa seleçãogranulométrica (bimodal), compostos de grãossubarredondados de quartzo, feldspatos e mine-rais pesados. Apresentam, às vezes, estratifica-ção cruzada acanalada de pequeno e médio portee raras lentes submilimétricas caulínicas. Essalitofácies exibe características da ação eólica ede correntes e pode representar porções distaisde depósitos fluviais ou de enxurrada em lençol,retrabalhados pelo vento em planície aluvial.

• Litofácies de argilitos arenosos laminados(Agal) – trata-se de litofácies de distribuiçãopouco expressiva, composta de argilitos de colo-rações variegadas, finamente laminados, local-mente físseis, contendo fração areia fina a silte,além de grânulos pingados de quartzo e às vezesmica. Intercalações de lentes de arenito fino po-dem ocorrer. Essa litofácies é considerada comode origem lacustre.

• Litofácies de arenitos arcosianos granulosos aseixosos com cimento silicoso (Aas) – ocorremsob a forma de camadas lenticulares. Trata-se dearenitos arcosianos, de colorações creme e cinza,granulometria areia média a grossa e contendosubordinadamente grânulos e pequenos seixos,mostrando baixa maturidade textural, aspectomaciço e às vezes grosseiramente estratificados,contendo cimento silicoso. Essa litofácies, queocorre associada à litofácies de argilitos areno-sos laminados e assemelha-se aos arenitos daformação Pedro Canário, é interpretada comodepósitos de sistema fluvial entrelaçado.

• Litofácies de argilitos arenosos coesos (Agac) –é formada por argilitos arenosos cinza-claro, co-esos, exibindo ora laminação planar, ora aspectomaciço (Foto 3.5). São compostos por argila egrãos de quartzo e, mais raramente, de feldspato,

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de granulometria areia média, subarredondadosa subangulosos. Apesar da grande persistêncialateral, suas camadas e níveis mostram tendênciaà lenticularidade. Essa litofácies também ocorrena formação Pedro Canário e pode representardepósitos de transbordamento em áreas interca-nais numa planície aluvial.

• Litofácies de arenitos maciços com grânulos eseixos de argilito (Amag) – apresenta-se sob aforma de camadas às vezes lenticulares, mos-trando feições erosivas na base. É formada porarenitos de cores variegadas, granulometria finaa média, exibindo baixa maturidade textural, as-pecto maciço e contendo grânulos e seixos deargilito. Intercalações lenticulares de argilitossão freqüentes. Essa litofácies é interpretada como sendo de origem fluvial de rios entrelaçados.

• Litofácies de arenitos laminados com seixos de ar-gilito(Alsag) – formada por arenitos de coloraçõescreme e avermelhada, com tênue laminação planar,granulometria fina a grossa, mostrando baixa matu-ridade textural, matriz argilosa, contendo grânulos eseixos dispersos de quartzo e argilito. Essa litofáci-es, que exibe feições erosivas na base, pode repre-sentar depósitos de sistema fluvial entrelaçado ouainda depósitos de enxurrada em lençol.Além das litofácies descritas, é freqüente a pre-

sença de níveis irregulares com impregnações ferru-ginosas, formando estruturas liezegang, carapaçaslateríticas ou ainda arenitos ferruginosos. Ao longoda costa, em algumas falésias, observa-se o carátersecundário e irregular dessa ferruginização, que sedá ora coincidindo com o acamamento, ora truncan-do-o ao longo de descontinuidades (fraturas etc.).

Durante a execução dos trabalhos, foram reali-zadas diversas seções medidas, representativas dogrupo Barreiras. Algumas dessas seções, com as res-pectivas interpretações, podem ser observadas nasFiguras 3.2 a 3.6.

Diversos autores têm interpretado que a deposi-ção dos sedimentos do grupo Barreiras deu-se a par-tir do progressivo soerguimento das áreas continen-tais e concomitante abatimento das áreas litorâneascontíguas, ao longo da costa atlântica brasileira. Ma-besoone et al. (1972) concluem que os sedimentosdo grupo Barreiras foram depositados como conse-qüência da formação do relevo, dos movimentostectônicos de abaulamento e falhamento e dos dife-rentes paleoclimas. Para esses autores, a deposiçãodas formações Serra dos Martins e Macaíba (respec-tivamente base e topo do grupo Barreiras) tiveramorigem fluvial, ao passo que a formação Guararapesé uma combinação de corrida de lama e rios indi-cando clima semi-árido na época da sedimentação.

Para Silva Filho et al. (1974), esses sedimentosforam originados a partir de variações climáticas,sendo que nos períodos de clima úmido havia a açãode intemperismo químico no embasamento, enquanto que, nos períodos de clima semi-árido, haveria adesagregação mecânica e transporte por correntesfluviais.

Para Ghignone (1979), a observação da facio-logia do Barreiras sugere tratar-se de um lençolterrígeno formado por cones aluviais coalescentes,acres centando que a formação da planície costeiranordestina, de idade pliocênica, resultou do soer-guimento continental, com erosão remontante esedimentação do material erodido em cones de de-jecção coalescentes, que causaram regressão de-positiva.

Segundo Medeiros & Ponte (1981), a forma-ção Barreiras é constituída por um complexo desistemas aluviais e fluviais. Amador (1978) consi-dera que os litótipos da formação Pedro Canário,base do grupo Barreiras no norte do Espírito San-to, foram depositados por um sistema de riosanastomosantes, sugerindo um ambiente de “ba-jada” para eles.

As diversas litofácies presentes na área sãoindicativas de ambientes de sedimentação conti-nental. Foram identificados depósitos de sistemasde leques aluviais, tipificados principalmente pelalitofácies de arenitos maciços com seixos egrânulos dispersos e pela litofácies de argilito ma-ciço, originadas por fluxos gravitacionais. Alémdisso, a litofácies de arenitos médios a grossos,com estratificações plano-paralela e cruzada, foiconsiderada como depósitos de sistema fluvialentrelaçado, e a litofácies de pelitos laminados,como de origem lacustre.

As paleocorrentes observadas mostram direçõesvariadas, não configurando um sentido preferencialde transporte dos sedimentos.

A observação das diversas litofácies e suas inter-relações conduz à mesma interpretação apresentadapor Medeiros & Ponte (1981), segundo a qual o gru-po Barreiras é formado por depósitos de leques alu-viais amalgamados, associados distalmente a depó-sitos de sistema fluvial entrelaçado.

A freqüente alternância de depósitos de lequesaluviais e sistema fluvial entrelaçado é sugestiva docontínuo soerguimento das áreas-fonte, originadopor tectonismo, propiciando o retrabalhamento eredeposição dos sedimentos.

O tipo climático vigente durante a deposiçãodesses sedimentos, como evidenciado pela baixa maturidade mineralógica, era árido a semi-árido, comchuvas torrenciais esporádicas.

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0

10 m

20 m

24 m

INTERPRETAÇÃODESCRIÇÃO

Solo areno-argiloso, avermelhado.

Arenito de coloração creme-avermelhada, granulometria média a grossa, com grânulos dispersos, composto por grãos de quartzo e, subordinadamente, feldspatos e minerais pesados, com baixa maturidade textural, matriz argilosa, aspecto maciço. Intercalações de lentes de argilito maciço, com grãos e grânulos de quartzo dispersos (Am).

Arenito creme, granulometria média a muito grossa, com grânulos de quartzo dispersos, matriz argilosa; exibe aspecto maciço com intercalações de lentes de argilito(Am).

Argilito síltico de coloração variegada, contendo minerais pesados e mica, além de grãos e grânulos de quartzo dispersos (Agm).

Arenito creme, maciço, imaturo, granulometria média a grossa, com baixa maturidade textural; apresenta matriz argilosa e minerais pesados (Am).

Argilito maciço com grãos e grânulos de quartzo dispersos (Agm).

Arenito creme-avermelhado, granulometria média a grossa, granuloso, imaturo, com baixa maturidade textural, apresentando estratificação plano-paralela ressaltada por películas ferruginosas; na base, ocorrem níveis seixosos descontínuos (Agec).

Alternância de depósitos de fluxo de detritos e fluxo de lama de leques aluviais.

Depósitos de fluxo de detritos.

Depósitos de fluxo de lama.

Depósitos de fluxo de lama.

Depósitos de enxurrada em lençol, em leques aluviais.

Figura 3.2 Seção medida do grupo Barreiras, 1km a norte de Porto Seguro (JM-1).

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Figura 3.3 Seção medida do grupo Barreiras no porto de Caraíva (JM-34).

Arenito creme, com granulometria média.

Argilito creme, maciço (Agm).

Arenito com granulometria média a grossa, maciço (Agec).

Arenito creme, granulometria média a grossa, maciço (Agec).

Argilito maciço (Agm).

Argilito arroxeado, maciço (Agm).

Arenito de granulometria fina a grossa, matriz argilosa, com seixos de argilito, feições erosivas na base (Amag).

Argilito arenoso, maciço (Agac).Arenito creme, médio a seixoso, matriz argilosa.Argilito de coloração variegada (Agm).Arenito creme, granulometria média.

Argilito de coloração variegada, com grãos de quartzo dispersos, maciço (Agm).

Arenito de granulometria média, maciço.

Depósitos de sistema fluvial entrelaçado, intercalados a depósitos lacustres.

INTERPRETAÇÃODESCRIÇÃO

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5 m

10 m

15 m

20 m

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Solo areno-argiloso creme.

Solo areno-argiloso avermelhado.

Argilito síltico, coloração arroxeada, com grãos de quartzo dispersos, aspecto maciço (Agm).

Arenito creme-avermelhado, imaturo, granulometria média a muito grossa, com níveis descontínuos seixosos, que ressaltam o acamamento, apresentando gradação normal e estratificação cruzada acanalada, de médio porte e baixo ângulo (Ae).

Argilito de coloração variegada, grãos e grânulos de quartzo, maciço, contendo fração areia fina para o topo(Agm).

Arenito feldspático de granulometria fina a média, esbranquiçado, bem selecionado, contendo matriz caulínica e minerais pesados, aspecto maciço, com estratificações cruzadas de pequeno porte próximo à base (Ab).

Arenito conglomerático, creme (Agec).

Depósitos das porções distais de sistema fluvial entrelaçado, retrabalhados pelo vento.

Argilito de coloração variegada, aspecto maciço, contendo grãos e grânulos de quartzo (Agm).

Depósitos lacustres; os grãos de quar tzo são transportados pelo vento.

Depósitos de sistema fluvialentrelaçado.

Depósitos lacustres; os grãos de quartzo dispersos são transportados pelo vento.

Canal de rios entrelaçados.

Depósitos de lagos, em planície aluvial.

Figura 3.4 Seção medida do grupo Barreiras a norte de Santo André (JM-69).

INTERPRETAÇÃODESCRIÇÃO

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20m

10 m

0

INTERPRETAÇÃODESCRIÇÃOCOLUNA

Arenito creme, granulometria média a grossa com grânulos e seixos dispersos, baixa maturidade textural, matriz argilosa, maciço (Am).

Depósito de fluxo de detritos, de leques aluviais.

Argilito de coloração variegada contendo grãos e grânulos de quartzo dispersos, maciço (Agm).

Arenito creme, granulometria média a grossa, feldspático, contendo grânulos dispersos de quartzo, com baixa maturidade textural, maciço (Am).

Argilito maciço contendo fração areia fina, de coloração variegada, contendo grânulos e grãos de quartzo e feldspato dispersos (Agm).

Arenito creme, granulometria média a grossa, contendo grânulos e seixos de quartzo dispersos, com matriz argilosa, baixa maturidade textural e aspecto maciço (Am).

Argilito arenoso, cinza e arroxeado, aspecto maciço (Agm).

Arenito creme, granulometria média a grossa contendo grânulos e seixos de quartzo dispersos, com matriz argilosa, baixa maturidade textural e aspecto maciço (Amgs).

Argilito de coloração variegada, contendo grãos de quartzo dispersos, maciço (Agm).

Arenito feldspático, creme, granulometria média a grossa, seixoso no topo, imaturo, com matriz argilosa e exibindo estratificação cruzada de médio porte (Ae).

Argilito cinza, maciço com grãos de quartzo (Agm).Arenito de granulometria média,com seixos de quartzo e argilito, com estratificação cruzada acanalada (Ae).

Depósitos de fluxo de lama, de leques aluviais.

Depósitos de fluxo de lama.

Depósito de fluxo de detritos.

Fluxo de lama.

Fluxo de detritos.

Fluxo de lama.

Depósitos de correntes cana-lizadas, em leques aluviais.

Fluxo de lama.

Leques aluviais; depósitos de correntes canalizadas.

Leques aluviais, depósitos de fluxo de detritos.

Figura 3.5 Seção medida do grupo Barreiras, 1km a sudoeste de Coroa Vermelha (JM-100).

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5 m

10 m

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INTERPRETAÇÃODESCRIÇÃOCOLUNA

Solo areno-argiloso.

Arenito arcosiano de cor creme, granulometria média a muito grossa, com matriz argilosa e baixa maturidade textural, mostrando estratificação planar (Aas).

Argilito creme-esbranquiçado, com grãos dispersos de quartzo, aspecto maciço (Agm).

Argilito arenoso, cinza-claro, com grânulos de quartzo dispersos, laminado (Agal).

Arenito arcosiano cinza-claro com tons creme, granulometria média a granulosa, com baixa maturidade textural, coeso, com cimento silicoso, maciço na base; para o topo, exibindo estratificação.

Argilito arenoso, cinza-claro, contendo grânulos disper-sos de quartzo, laminado (Agal)

Depósitos de sistema flu-vial entrelaçado, porçãodistal.

Depósitos lacustres.

Depósitos lacustres.

Depósitos de sistemafluvial entrelaçado.

Depósitos de lagos em planície aluvial.

Figura 3.6 Seção medida do grupo Barreiras na praia de Curuípe (JM-125).

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Amador (1982) ressalta que a alteração dosfeldspatos nos arenitos da formação Pedro Canário(por ele considerada base do grupo Barreiras) deve-se basicamente a processos pós-deposicionais. O referido autor, ao discorrer sobre as condições paleo-ambientais vigentes durante a deposição desses se-dimentos, conclui que a continuidade dos depósitos

na plataforma continental, em profundidades supe-riores a 100m sugere a existência, durante a deposi-ção, de nível de mar abaixo do atual, em medi dasque podem oscilar entre 100m e 200m.

As datações paleontológicas e as correlaçõesapre sentadas por diversos autores indicam para ogrupo Barreiras idade miopliocênica.

3.2 Unidades Quaternárias

Martin et al. (1980) individualizaram diversasunidades quaternárias, ao longo da costa do estadoda Bahia. Na área estudada foram identificadas oitounidades quaternárias, quatro de origem marinha equatro de ambientes continentais, dentre as quais

seis correspondem a unidades descritas pelos refe-ridos autores e as duas outras (unidades 3 e 4) fo-ram reconhecidas no presente trabalho. A distribui-ção dessas unidades pode ser visualizada na Figura3.7.

3.2.1 Unidades Quaternárias Marinhas

• Unidade 8 – equivale à unidade nomeada porMartin et al. (1980) de recifes de corais e algascoralinas. Segundo Leão (in Barbosa & Domin-guez, 1996), na região de Santa Cruz Cabrália ePorto Seguro são três os modos de ocorrênciadessa unidade: recifes superficiais alongados eparalelos à costa; bancos coralinos isolados eadjacentes à praia e bancos e/ou plataformasrecifais afastados da costa, geralmente circun-dados por colunas recifais isoladas, em águascom profundidades superiores a 10m. O topo daunidade acha-se exposto, freqüentemente, na maré baixa, podendo, às vezes, estar permanente-mente emerso. Para Martin et al. (1980), os reci-fes de corais e de algas coralinas ocorrem fixa-dos em afloramentos rochosos.

• Unidade7 – essa unidade é formada pelos are-nitos de praia encontrados ao longo da costa,entre o povoado de Arraial D’Ajuda e SantaCruz Cabrália (Foto 3.6). Segundo Leão (inBarbosa & Dominguez, 1996), as informaçõessobre arenitos de praia no litoral baiano remon-tam ao início do século passado. A referida auto-ra enfatiza os trabalhos de Hartt (1870) e Bran-ner (1904), que descrevem os arenitos de praiada região de Porto Seguro. Leão cita, ainda, otrabalho executado por Laborel (1967), que des-creve três alinhamentos desses arenitos entrePorto Seguro e Santa Cruz Cabrália, concluindoque aos arenitos mais externos estão associadasconstruções carbonáticas, servindo, às vezes,como substrato para recifes de corais. Os areni-tos são de coloração creme-clara, de granulo-

metria areia fina a grossa e, por vezes, seixosos,sendo compostos de grãos subarredondados asubangulosos de quartzo, além de fragmentos deconchas e cimento carbonático; exibem grada-ção normal, estratificação planar e, às vezes,cruzada.

• Recentemente, Klein (1999) descreveu a presen-ça de rochas vulcânicas, localizadas na praia dePitinga, no município de Porto Seguro, associa-das a esses arenitos e aflorantes na maré baixa.Segundo o autor, trata-se de uma série de fluxosde lavas pouco espessos, pequenos tubos e tú-neis com até 70cm de diâmetro bem preserva-dos. Para Klein, a idade do derrame de lavas dePitinga não pode ser determinado por métodosradiométricos, porque a composição da rocha,provavelmente um basalto, não é mais a origi-nal. O autor ressalta que a área de Pitinga estáafastada de outros derrames, embora seja con-tígua a um banco (elevado no fundo do mar) ro-choso, provavelmente de origem magmática,que bordeja a costa sul da Bahia, a baixa pro-fundidade. No entanto esse banco (denominadoRoyal Charlotte) também não tem a idade de-terminada. Segundo o referido autor, aparente-mente, as estruturas existentes na praia estãointercaladas nas rochas da formação Barreiras,o que permite estimar que teriam surgido doTerciário Superior até possivelmente o Pleisto-ceno.

• Unidade 6 – corresponde à unidade de pântanose mangues atuais de Martin et al. (op. cit.). Éformada pelos depósitos situados em pequenas

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Unidade 8 Unidade 4

Unidade 6 Unidade 2

Unidade 7 Unidade 3

Unidade 5 Unidade 1

Figura 3.7 Distribuição geográfica das unidades quaternárias na área do projeto.

Legenda

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baías e margens protegidas de rios submetidos àinfluência das marés e são constituídos essenci-almente de material argilo-siltoso com acentuadacontribuição orgânica.

• Unidade 5 – corresponde aos terraços arenososde Martin et al. (1980), cujos depósitos têm am-pla distribuição ao longo da costa. São sedimentos arenosos compostos essencialmente de grãosde quartzo e fragmentos de conchas. Segundo os

citados autores, o topo desses depósitos varia depoucos centímetros até 4m acima do nível atualdo mar, sendo que a parte superior dos terraçosapresenta, caracteristicamente, cristas de cordõeslitorâneos marcadas pelo paralelismo e acentua-da proximidade. Villas Boas (in Barbosa & Do-minguez, 1996) cita a presença de tubos fósseisOphiomorpha associados com estratificações horizontais na base desses terraços.

3.2.2 Unidades Quaternárias Continentais

• Unidade 4 – essa unidade é formada por depó-sitos detrito-lateríticos, tendo sido cartografada anorte do povoado de Vera Cruz, onde ocorrebordejando colinas alinhadas formadas por gra-nitóides e gnaisses proterozóicos. Trata-se dedepósitos eluvionares e coluvionares inconsoli-dados, de coloração avermelhada, compostos dematerial areno-argiloso com seixos e matacões,apresentando, por vezes, cimento ferruginoso.

• Unidade 3 – é caracterizada por depósitos are-nosos predominantemente residuais e podem re-presentar, localmente, depósitos de lagos pleistocênicos ou ainda de origem eólica. Ocorremfreqüentemente no topo dos tabuleiros desen-volvidos sobre o grupo Barreiras (Foto 3.7). Es-ses depósitos são correlacionáveis à unidade in-formal Barreiras 2, descrita por Pereira (in Ter-ravista Empreendimentos, 1998). São compostospor areias quartzosas, de granulometria fina agrossa, com grânulos e seixos de quartzo subor-dinados, geralmente com baixa maturidade tex-tural; minerais pesados e horizontes ricos emmatéria orgânica também podem ocorrer. Apesarde amplamente difundidos, tais depósitos foram

cartografados apenas nos locais onde apresen-tam maior expressão areal. A individualizaçãodessa unidade, mesmo quando de origem residu-al (podzóis desenvolvidos nos sedimentos dogrupo Barreiras), é justificável devido à potenci-alidade que apresenta como fonte de bens mine-rais.

• Unidade 2 – trata-se da unidade quaternária commaior distribuição areal, predominando nos va-les dos principais rios da região como o João deTiba, Buranhém, Caraíva e dos Frades. Corres-ponde aos denominados depósitos flúvio-lagunares de Martin et al. (1980). Essa unidade écomposta essencialmente por areias, siltes e ar-gilas ricas em matéria orgânica. Segundo os re-feridos autores, esses depósitos foram formadosa partir da última transgressão, não tendo sidopossível separar os depósitos de origem fluvialdaqueles correspondentes a antigas lagunas emangues.

• Unidade 1 – compõem essa unidade os depósitosfluviais arenosos, areno-argilosos e, subordina-damente, seixosos, que ocorrem nas calhas e nasmargens dos córregos e rios que drenam a área.

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Foto 3.1 — Litofácies de arenitos maciços, com grânulos eseixos dispersos(Am). Local: 2km a norte dePindorama.

Foto 3.2 — Outro aspecto da litofácies Am.Local: no povoado de Santo André.

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Foto 3.3 — Litofácies de arenito com estratificações (Ae).Local: 6km a noroeste de Trancoso.

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Foto 3.4 — Litofácies de arenito grosseiramente estratificado com níveis conglomeráticos.Local: 13km a noroeste de Porto Seguro.

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Foto 3.5 — Películas de óxidos de ferro nos planos de fraturasem argilitos e arenitos do grupo Barreiras(litofácies Aas e Agac).Local: Praia de Curuípe.

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Foto 3.6 — Exposições de arenitos de praia fraturados.Local: Santa Cruz Cabrália.

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Foto 3.7 — Aspecto da unidade 3 (depósitos arenosos).Local: Estrada que liga Ponto Central a Santo André.