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Formação, proFissionalização e trabalho docente: em deFesa ...§ao... · da qualidade social da educação / Ruth Catarina Cerqueira Ribeiro de Souza, Solange Martins Oliveira

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Formação, proFissionalização e trabalho docente: em deFesa da qualidade social da educação

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Conselho Editorial Educação Nacional

Prof. Dr. Afrânio Mendes Catani – USP

Prof. Dra. Anita Helena Schlesener – UFPR/UTP

Profa. Dra. Elisabete Monteiro de Aguiar Pereira – Unicamp

Prof. Dr. João dos Reis da Silva Junior – UFSCar

Prof. Dr. José Camilo dos Santos Filho – Unicamp

Prof. Dr. Lindomar Boneti – PUC / PR

Prof. Dr. Lucidio Bianchetti – UFSC

Profa. Dra. Dirce Djanira Pacheco Zan – Unicamp

Profa. Dra. Maria de Lourdes Pinto de Almeida – Unoesc/Unicamp

Profa. Dra. Maria Eugenia Montes Castanho – PUC / Campinas

Profa. Dra. Maria Helena Salgado Bagnato – Unicamp

Profa. Dra. Margarita Victoria Rodríguez – UFMS

Profa. Dra. Marilane Wolf Paim – UFFS

Profa. Dra. Maria do Amparo Borges Ferro – UFPI

Prof. Dr. Renato Dagnino – Unicamp

Prof. Dr. Sidney Reinaldo da Silva – UTP / IFPR

Profa. Dra. Vera Jacob – UFPA

Conselho Editorial Educação Internacional

Prof. Dr. Adrian Ascolani – Universidad Nacional do Rosário

Prof. Dr. Antonio Bolívar – Facultad de Ciencias de la Educación/Granada

Prof. Dr. Antonio Cachapuz – Universidade de Aviero

Prof. Dr. Antonio Teodoro – Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias

Profa. Dra. Maria del Carmen L. López – Facultad de Ciencias de La Educación/Granada

Profa. Dra. Fatima Antunes – Universidade do Minho

Profa. Dra. María Rosa Misuraca – Universidad Nacional de Luján

Profa. Dra. Silvina Larripa – Universidad Nacional de La Plata

Profa. Dra. Silvina Gvirtz – Universidad Nacional de La Plata

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Ruth Catarina Cerqueira Ribeiro de SouzaSolange Martins Oliveira Magalhães(Organizadoras)

Formação, proFissionalização e trabalho docente: eM defeSa da qualidade SOCial da eduCaçãO

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Formação, profissionalização e trabalho docente : em defesa da qualidade social da educação / Ruth Catarina Cerqueira Ribeiro de Souza, Solange Martins Oliveira Magalhães, (organizadoras). – Campinas, SP : Mercado de Letras, 2016. (As Dimensões da Formação Humana)

Vários autores.BibliografiaISBN: 978-85-7591-406-9

1. Educação 2. Educação social 3. Educação – Qualidade 4. Pedagogia 5. Pesquisa educacional 6. Política educacional 7. Professores – Formação profissional I. Souza, Ruth Catarina Cerqueira Ribeiro de II. Magalhães, Solange Martins Oliveira III. Série.

16-00206 CDD-370.71Índices para catálogo sistemático:

1. Docentes : Formação profissional : Educação 370.71

capa e gerência editorial : Vande Rotta Gomidepreparação os originais: Editora Mercado de Letras

AS DIMENSÕES DA FORMAÇÃO HUMANAcoordenação

Wanderson Ferreira Alves – Universidade Federal de GoiásSandra Valéria Limonta Rosa – Universidade Federal de Goiás

DIREITOS RESERVADOS PARA A LÍNGUA PORTUGUESA:© MERCADO DE LETRAS®

VR GOMIDE MERua João da Cruz e Souza, 53

Telefax: (19) 3241-7514 – CEP 13070-116Campinas SP Brasil

[email protected]

1a edição2 0 1 6

IMPRESSÃO DIGITALIMPRESSO NO BRASIL

Esta obra está protegida pela Lei 9610/98.É proibida sua reprodução parcial ou totalsem a autorização prévia do Editor. O infratorestará sujeito às penalidades previstas na Lei.

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Dedicatória

Este livro é dedicado ao Professor Valter Soares Guimarães (in memorium) em reconhecimento ao trabalho incansável,

rigoroso e dedicado para a constituição consolidação e crescimento da Linha de Formação, profissionalização

docente e trabalho educativo, no Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Educação/UFG.

Agradecimentos

Agradecemos ao Programa de Pós-Graduação em Educação, da Faculdade de Educação/UFG, à Capes, à Fapeg, pelo

apoio a essa publicação e a todos que a escreveram compartilhando seus trabalhos e reflexões.

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sumÁrio

apReSentaçãO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .Norberto Fernández Lamarra

intROduçãO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

a qualidade da pROduçãO aCadêMiCa e OS diSCuRSOS pOlítiCOS: COnveRgênCiaS MeRCadOlógiCaS, epiSteMOlógiCaS Ou dialétiCaS de ReSiStênCiaS? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .Ruth Catarina Cerqueira Ribeiro de Souza e Solange Martins de Oliveira Magalhães fORMaçãO de pROfeSSOReS e avaliaçãO da qualidade da eduCaçãO SupeRiOR: O CuRSO de pedagOgia nOS CiClOS dO SinaeS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .José Vieira de Sousa

aCeRCa de la fORMaCión dOCente en aRgentina: SuMandO apORteS a Su COnfiguRaCión . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .Lydia María Albarello e Graciela María Elena Fernández fORMaCión y CaRReRa dOCente, unJu-MeRCOSuR . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .Graciela del Rosario Wayar e Clemencia Postigo de Caffe

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pROfiSSiOnalidade, pROfiSSiOnaliSMO e pROfiSSiOnalizaçãO nO planO naCiOnal de fORMaçãO de pROfeSSOReS da eduCaçãO BáSiCa (paRfOR): pOlítiCa eduCaCiOnal COntRaditóRia . . . . . . . . . . . .Iria Brzezinski

deSenvOlviMentO pROfiSSiOnal dOCente: COnCeituandO O iníCiO da CaRReiRaKátia Augusta Curado Pinheiro Cordeiro da Silva e Daniel de Freitas Nunes

O tRaBalhO dOCente e Sua dupla deteRMinaçãO: pRáxiS e alienaçãO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .Vanderleida Rosa de Freitas e Queiroz

tRaBalhO dOCente nOS anOS iniCiaiS dO enSinO fundaMental: atividade pOlitéCniCa e enSinO deSenvOlviMental . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .Sandra Valéria Limonta Rosa e Mara Cristina De Sylvio

CuRRíCulO da eduCaçãO infantil e tRaBalhO dOCente: peRSpeCtiva SóCiO-hiStóRiCO-dialétiCa . . . . . . . . . . .Ivone Garcia Barbosa e Nancy Nonato de Lima Alves

una apROxiMaCión a lOS faCtOReS peRSOnaleS en la SatiSfaCCión peRSOnal de lOS dOCenteS . . . . . . . . . . . . .Manuel Reyes-Santana

SOBRe OS autOReS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

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apresentação

Norberto Fernández Lamarra1

Es un muy satisfactorio desde lo académico y desde la perspectiva de los estudios comparados, presentar este libro que se ha construido a partir del trabajo de compilación de las profesoras Ruth Catarina Cerqueira Ribeiro de Souza y Solange Martins Oliveira Magalhães del Programa de Posgrados en Educación, de la Facultad de Educación de la Universidad Federal de Goiás.

A lo largo de sus diez capítulos, esta obra recorre diferentes problemáticas de la formación y el trabajo docente en los diferentes niveles del sistema educativo. El libro se ha construido a partir de una diversidad de aportes de profesionales de diferentes universidades y de múltiples contextos. Los autores pertenecen a universidades de Brasil, Argentina y España por lo cual la temática de la formación y trabajo docente se analiza desde perspectivas diversas y en relación con diferentes problemáticas.

Quizás el mayor aporte de esta compilación sea su espíritu crítico. Todos los aportes comparten una mirada crítica de la situación del sistema de formación docente por lo cual, en definitiva, buscan sumar reflexiones para una transformación que, a la vez,

1. El autor agradece la cooperación del colega Mg Pablo García (Untref) para la elaboración de esta Introducción. UNTREF/SAECE/SIBEC/WCCES.

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posibilite una transformación del estado del sistema educativo en los diversos contextos estudiados.

En el primer capítulo, titulado “La calidad de la producción académica y los discursos políticos: convergencias metodológicas, epistemológicas o dialécticas de resistencia?”, Ruth Catarina Cerqueira Ribeiro de Souza e Solange Martins Oliveira Magalhães – las compiladoras del libro − dan cuenta de cómo la universidad se ha reconfigurado en el contexto neoliberal. Particularmente el foco de las autoras está en analizar el impacto de las políticas de la tercera vía en la Universidad como una alternativa a la orientación al mercado. Para contextualizar en un caso su análisis hacen referencias a una investigación coordinada por la “Redecentro” referida el impacto de los discursos para regular la política pública. Desde una mirada crítica, analizan la consolidación del neoliberalismo en el ámbito académico y las formas de generar alternativas de prácticas posibles.

El Capítulo 2, de José Vieira de Sousa, de la Universidad de Brasilia, se titula “Formación de profesores en la evaluación de la calidad de la educación superior: el curso de pedagogía en los ciclos de Sinaes”. Este texto analiza la política de evaluación de carreras del Sistema Nacional de Evaluación de la Educación Superior (Sinaes) a partir de examinar uno de sus componentes: el Examen Nacional de Desempeño de los Estudiantes (Enade) en los ciclos del 2005, 2008 y 2011. El estudio busca dar cuenta del vínculo entre la formación de los profesores y la evaluación de la calidad de la Educación Superior, particularmente en los cursos de pedagogía de los mencionados años.

El capítulo 3, de Lydia María Albarello y Graciela María Elena Fernández, de la Universidad Nacional del Centro de la Provincia de Buenos Aires, Argentina, se titula “Acerca de la formación docente en Argentina: sumando aportes a su configuración”: en el mismo se pone en discusión la cuestión de la formación de profesores en Argentina y su especificidad dentro del campo de la pedagogía. Se describen, asimismo, en este capítulo alguns factores que dan cuenta de la especificidad de los profesorados que se dictan en la

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Facultad de Ciencias Humanas de la Universidad del Centro de la Provincia de Buenos Aires (Tandil – Argentina).

El capítulo 4, titulado “Formación y carrera docente, UNJu/Mercosur” fue elaborado por Graciela del Rosario Wayar de la Universidad Nacional de Jujuy y Clemencia Postigo de Caffe de la Universidad Nacional de Córdoba, ambas de Argentina. En este trabajo se presentan los resultados del Proyecto “Construcción Cooperativa de Políticas y Estrategias de Formación de Docentes Universitarios en la Región”, desarrollado durante el período 2011-2013. En este capítulo se da cuenta del desarrollo de redes de cooperación para el fortalecimiento de la formación docente universitaria a nivel regional, con un particular énfasis en relación con una experiencia de la Universidad Nacional de Jujuy.

El capítulo 5 de Iria Brzezinski, da Pontificia Universidad Católica de Goias, se titula “Profesionalidad, profesionalismo y profesionalización en el Plano Nacional de la Formación Docente de los Profesores de Educación Básica (Parfor): política educacional contradictoria”. Este capítulo analiza desde una mirada crítica la formación docente desarrollada por la Dirección de Formación de Profesores de Educación Básica de la Coordinación de Desarrollo de Personal de Educación Superior (Capes) desde 2009.

El capítulo 6, elaborado por Kátia Augusta Curado Pinheiro Cordeiro da Silva y Daniel de Freitas Nunes, de la Universidad de Brasília se titula “Desarrollo profesional docente: conceptualizando el inicio de la carrera”. Este trabajo se dedica a desarrollar un estudio conceptual de la carrera docente, con énfasis en los inicios. El capítulo da cuenta de la importancia de este momento para el resto de la formación por lo cual plantea las particularidades conceptuales de hablar de “profesor ingresante” o bien “profesor principiante”, entre otros debates de este campo.

El capítulo 7, de Vanderleida Rosa de Freitas e Queiroz, del Instituto Federal de Educación, Ciencias y Tecnología de Goiás, se titula “El trabajo docente y su doble determinación: praxis y alienación”. Desde una mirada crítica, discute el trabajo docente en el marco de la sociedad capitalista, planteando que el trabajo docente posee una doble dimensión: en tanto praxis, posibilita

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la transformación social pero en tanto alienación, reproduce relaciones sociales de dominación. Analizar cómo procesar esa doble determinación es fundamental para vincular la profesión docente con la transformación social. Al respecto podemos afirmar que éste se convierte en un importante desafío tanto para la formación docente en Brasil como en toda América Latina.

El capítulo 8, titulado “Trabajo docente en los años iniciales de la enseñanza fundamental: actividad politécnica y educación para el desarrollo”, de Sandra Valéria Limonta Rosa de la Universidade Federal de Goiás y Mara Cristina de Sylvio, profesora de Enseñanza Fundamental de la Red Municipal de Educación de Goiânia. En este capítulo se analiza cómo el trabajo docente en los años iniciales de la educación básica se ha constituido en base a múltiples determinaciones y en una relación dialéctica entre formación y práctica. Las autoras de este capítulo discuten el grado en que es necesario el conocimiento didáctico para enseñar en los años iniciales de la escolarización básica.

El capítulo 9, titulado “Curriculum de la educación infantil y trabajo docente: perspectiva socio-histórico-dialéctico”, de Ivone Garcia Barbosa e Nancy Alves Nonato de la Universidad Federal de Goiás. En este trabajo se elabora un análisis conceptual acerca del curriculum de la Educación Infantil y su relación con el trabajo docente. El análisis se realiza desde la perspectiva del materialismo histórico dialéctico y la perspectiva socio histórica dialéctica.

Finalmente, el capítulo 10 de Manuel Reyes-Santana, de Universidad de Huelva, España, se titula “Una aproximación a los factores personales en la satisfación personal de los docentes”. En el mismo se analiza el concepto satisfación laboral, de identidad docente y su impacto en la calidad del trabajo de los profesores.

Consideramos que este libro realiza un interesante aporte a la reflexión sobre la formación docente y el trabajo docente en Iberoamérica a partir de múltiples aportes y casos. Su mirada crítica y problematizadora incitan a la reflexión para pensar procesos de mejora. Resulta fundamental comenzar a encarar una profunda transformación de la formación de docente para poder realizar los grandes cambios que nuestros sistemas educativos

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contemporáneos demandan, por lo que se puede afirmar que este libro y los trabajos que lo constituyen son un excelente aporte para los necesarios debates que debemos sostener en Iberoamérica sobre la formación docente para todos los niveles y modalidades de enseñanza. Cada uno de estos niveles – la educación infantil, la primaria o básica, la media, la superior − tiene sus propias demandas y exigencias. Esto se complejiza más aún en cuanto a las exigencias de cada modalidad. Sin embargo, es importante analizar y debatir – además de las demandas específicas − las demandas comunes que la formación docente nos plantea para la formación en una sociedad en cambio permanente, con exigencias perentorias de democratización e inclusión social plena, de atención al desarrollo científico-tecnológico cada vez más acelerado y teniendo en cuenta los imprescindibles escenarios de futuro.

Esto exige reformas profundas de la educación, de sus fundamentos políticos, sociales y pedagógicos, consensuadas con todos los actores de nuestras sociedades que intervienen y deciden en el campo de la educación, particularmente con los colegas docentes. La experiencia comparada internacional muestra – desde hace ya muchas décadas − que las reformas educativas diseñadas en los escritorios ministeriales u oficiales han fracasado siempre y que quien no es consultado en el momento del diseño de los cambios y reformas se opone cuando le toca aplicarla, en su escuela, en su institución, en su aula de clase.

América Latina viene mostrando desde más de cinco décadas que la mayoría de las reformas que se intentaron implementar – algunas muy buenas y bien fundamentadas − han fracasado porque no han sido consultadas con todos los actores sociales y educativos y que se han puesto en marcha sin haberse asegurado que la formación y la capacitación de los docentes es el aspecto de mayor importancia para su implementación exitosa.

Por otra parte, teneos que tener en cuenta que formamos para el presente y el futuro inmediato pero también formamos para el largo plazo… que los docentes que formamos actualmente estarán en plena actividad dentro de 20-30 años y que los alumnos que ahora educamos serán relativamente jóvenes y en plena actividad

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social y laboral dentro de 30-40 años ¿ podemos imaginar al mundo, a América Latina, a cada uno de nuestros países, dentro de 20-30-40 años… es muy difícil… quizás imposible… pero sin embargo estamos formando profesionales de la docencia para que se sigan desempeñando dentro en esos futuros… y estamos educando a niños jóvenes que estarán plenamente activos dentro de tantos años… que nos resulta difícil imaginarlos. Además de formarlos pensando en ese futuro, cómo podemos diseñar un modelo eficiente y posible de formación y actualización permanente de los cientos de miles − y de millones − de docentes que se desempeñan en nuestros sistemas educativos. Este interrogante y su efectiva respuesta es esencial para diseñar y debatir sobre la formación docente para el presente y para el futuro.

Estos interrogantes no podemos – como ya lo he señalado − resolverlos solamente nosotros – los profesionales de la educación. Deberemos analizarlos, discutirlos, estudiarlos, conjuntamente con todos los actores sociales, políticos, académicos, científicos y tecnológicos, que nos puedan aportar ideas básicas y propuestas para comprender, reflexionar y actuar sobre ese futuro, difícil de imaginar, pero que es esencial considerarlo para poder afrontarlo exitosamente. Es decir, que la formación docente es un tema de todos.

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introdução

A temática central do livro é, como revela seu título, Formação, profissionalização e trabalho docente: em defesa da qualidade social da educação. Os estudos dessa temática têm insistido sobre a necessidade de aprofundamento e de olhares instigadores diante da realidade educacional contemporânea, quer em nosso país, quer em realidades da América Latina e de países europeus. Fruto de políticas globalizantes, essas realidades educacionais embora guardem características intrínsecas a cada contexto, demandam que se juntem esforços para compreender suas tensões e a união de forças para traçar perspectivas que ajudem a superar as atuais fragilidades nesse campo. Há necessidade, portanto, do trabalho coletivo de autores que conversem entre si, que busquem ressignificar conceitos, que estruturem um movimento interdisciplinar, capaz de aproximar as discussões que mostrem os professores que somos, e a concepção e educação que queremos efetivar.

Esse livro conta com a contribuição de pesquisadores historicamente implicados na discussão do campo teórico-conceitual da temática, o que enriquece a produção desse conhecimento. As colaborações aqui reunidas refletem importante crescimento quali-quantitativo sobre a temática, tanto no que diz respeito aos enfoques e metodologias utilizados, quanto em relação à heterogeneidade de quadros teóricos de referência. A riqueza da

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coletânea é que os(as) autores(as) coletivamente apresentam suas reflexões, colocam em evidência as diferentes bases conceituais e teóricas que sustentam suas concepções sobre a formação, profissionalização e trabalho docente e mostram as perspectivas que se constroem em seus espaços.

No campo educativo contemporâneo questiona-se a qualidade dos processos que nele se desenvolvem, apresentam-se diferentes concepções de qualidade para formação,profissionalização e trabalho dos professores tanto em documentos da política educaccional, como nos documentos de organismos multilaterais, na literatura e em debates acadêmicos. No atual cenário a qualidade social da educação está em tensão com a qualidade hegemônica, ambas refletem conotações políticas ideológicas distintas.

Organismos multilaterais, como o Banco Mundial, defendem o conceito de qualidade educativa neoliberal (mercadológica) para a formação, profissionalização e o trabalho docente. Não por acaso, essa mesma concepção vai ser apresentada nos documentos de política educacionais dos diferentes países. Ao se adotar essa ideia subtrai-se da educação e da formação sua relevância social, limitando-as às atividades técnicas, desligadas das dimensões política, ética, estética e cultural. Já o o conceito de qualidade na perspectiva contra hegemônica diz da expectativa social, da emancipação, sendo geradora de pensamento independente, crítico, que não se atrela ao processo produtivo, e nega que forças externas imponham o patamar de uma qualidade que essa formação não orientou.

Os diferentes autores caminham, em seus recortes, para esclarecer o conceito de qualidade com o qual estão trabalhando, engajados aos valores da cidadania e da ética, assumem, como professores, a autoria dos parâmetros da qualidade da educação que defendemos.

É nosso objetivo oferecer subsídios a pesquisadores, professores, estudantes, gestores e formuladores de políticas públicas, resultados de pesquisas e reflexões desenvolvidas em

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âmbito regional, nacional e internacional, para que possamos construir juntos o pensar sobre o “ser professor” nos dias atuais.

Desejamos convidar a uma leitura de múltiplas aberturas, para que as reflexões sejam apreendidas, criticadas, interpretadas, reelaboradas. Esperamos que assim sejam como composição que está sempre em (re)construção, provisória, recortada pelo colorido de tempos e espaços múltiplos que nos cercam enquanto pesquisadores e autores da temática. Ao final, a obra compõe o esforço de construção de processos compartilhados, cujas interfaces contribuem para a compreensão dos fenômenos estudados, além de ressignificar a formação e a profissionalização docente e retroalimentar nossas práticas didático-pedagógicas.

Ruth Catarina Cerqueira Ribeiro de Souza Solange Martins de Oliveira Magalhães

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a qualidade da produção acadêmica e os discursos políticos: convergências mercadológicas, epistemológicas ou dialéticas de resistências?

Ruth Catarina Cerqueira Ribeiro de Souza Solange Martins de Oliveira Magalhães

A universidade tem historicamente vivenciado mudanças profundas que se imbricam com transformações de cunho políticos e sociais. No atual contexto do neoliberalismo, essas modificações geram o que Neves (2013) denomina de a nova pedagogia da hegemonia e, Chauí (2014) localiza na reconfiguração da universidade de instituição a organização. Pode-se dizer que esses movimentos implicam, em essência, em deslocamentos que comprometem a qualidade social da educação. Propomos analisar como essas mudanças nas finalidades da educação, têm estado presentes nas políticas representativas da 3ª via, orientadoras dos documentos oficiais, como estratégia alternativa do neoliberalismo para o desenvolvimento educacional voltado ao mercado (Neves 2013, p. 2), fundamentando e difundindo concepções de qualidade educacional e, como se configura a resistência de pesquisadores contra hegemônicos a essas mutações. Há diferentes concepções do que seja qualidade educacional, de formação, profissionalização e trabalho docente, que se associam a diferentes bases

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epistemológicas e repercutem como consenso nos trabalhos investigativos da área.

Nos trabalhos desenvolvidos pela Redecentro (Rede de pesquisadores sobre professores do Centro-Oeste do Brasil), por exemplo, tem-se buscado conceituar o que sejam indicadores de qualidade social para a formação, profissionalização e trabalho dos professores. A Rede não pretende propor conceitos generalizadores, estanques e descontextualizados, mas os que sejam histórica e politicamente construídos pelos sujeitos que trabalham nas instituições a que pertencem, baseados em critérios e indicadores públicos, para a legitimação da qualidade social e não impostos exteriormente (Dias Sobrinho e Dias 2006). Esse propósito insere-se na busca para aperfeiçoar epistemologicamente nossos trabalhos, como pesquisadoras e formadoras de professores na universidade pública, pois concordamos com Santos (2012, p. 262), sobre a importância das recomendações da “Declaración de San Miguel de Tucumán”, como oposição ao modelo neoliberal de universidade, para que a busca da qualidade desligue-se de critérios que se ligam a valores de mercado como seus indicadores. Associamo-nos aos autores que se propõem a repensar um caminho para a universidade superar a submissão aos ditames da política neoliberal. Ao compartilhar com essa concepção orientamos a busca da qualidade nas produções acadêmicas, de maneira que a mesma seja construída contextualizada local, regional e nacionalmente e não imposta desde modelos externos.

Recorremos ao diálogo com a literatura atual sobre a temática, para traçarmos nossos caminhos fundamentados no método dialético, nos posicionamentos epistemológico, ético-político, ontológico e gnosiológico, correspondentes. Buscamos apreender o que nossos interlocutores constroem, como sentido da formação docente de qualidade, a partir de seus aportes teóricos, mesmo que nem todos sejam denominados explicitamente como indicadores da qualidade social, por seus autores, os articulamos na nossa arquitetura. Ainda procuramos uma confrontação com as ideias neoliberais difundidas em projetos de políticas públicas educacionais, tanto nacionais como internacionais.

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A formação de professores, em nosso caso, se realiza na universidade pública o que implica que é a partir desse lugar que vamos nos posicionar de forma crítica e contra hegemônica. A educação superior no nosso país está imersa na crise que marca a passagem das suas referências das humanidades para as técnicas e mercadológicas. Chauí (2014) se refere a que temos, atualmente, na universidade como organização, o domínio da tecnocracia, que se vê obrigada a transferir para seu interior os mesmos critérios de gestão das empresas capitalistas, num movimento que transforma a universidade de instituição em organização. Nessa a qualidade torna-se uma entidade avaliada pela eficácia, em termos da gestão de recursos e estratégias de desempenho e, cuja base de referência é a competição, a flexibilidade e o poder de adaptação às mudanças, para atender aos interesses mercadológicos. Já a universidade, como instituição social, tem como marca a autonomia em seu sentido sócio-político, aspira uma qualidade que tem a sociedade como seu princípio e sua referência normativa e valorativa, qualidade ancorada na busca do conhecimento, da reflexão, da crítica e da formação humanística, portanto social pública.

As mudanças que se abateram sobre a universidade promoveram mudanças cruciais para a educação superior, marcadas pelas demandas políticas e econômicas neoliberais, ocorridas a partir da década de 90. É importante ressaltar que as novas finalidades para a educação em geral e, para a educação superior em particular, transformaram suas finalidades para atender aos interesses do mercado capitalista. Pretendeu-se substituir as finalidades da universidade institucional, ou seja, busca pelo conhecimento, pela ciência e a formação omnilateral pela finalidades de aquisição e reprodução de conhecimentos que sirvam aos interesses econômicos. Como acrescenta Dias Sobrinho (2012), todas essas transformações atuam no sentido de construir o consenso sobre um conceito de qualidade neoliberal que despreza os significados sociais da formação humana e nega a indissociabilidade entre qualidade e relevância social.

Shiroma et al. (2008), em pesquisa realizada sobre mudanças políticas educacionais e suas repercussões no ensino, nos remetem à análise da implantação dessas mutações de finalidades visadas pelos

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Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o Banco Mundial (BM) para a reestruturação das universidades da América Latina e do Caribe, as ações visaram implementar nelas uma cultura de resultados.

Esses pesquisadores mostram que as principais recomendações do BID para o ensino superior referiam-se à expansão, diversificação, privatização, avaliação de resultados, com o objetivo de orientá-lo aos requisitos do mercado. O sistema de financiamento passa a ser dependente da avaliação, o que estabelece a competição entre instituições e entre professores, além da demanda de uma formação aligeirada, não universitária, à distância, com base na epistemologia da prática, um movimento que visa atingir as habilidades designadas pelo BID, como critividade, habilidade de comunicação, de trabalho em equipe, habilidades verbais, de matemática, de resolver problemas,entre outras.

As avaliações de acordo com o BID devem se propor a medir a qualidade da educação superior, baseadas nos resultados e não nos processos educativos. Para essa agência, os indicadores de qualidade podem ser resumidos em: expansão, diversificação, privatização, implantação de avaliação de resultados, flexibilidade, e adaptabilidade. No mesmo sentido, ideologicamente, o Banco Mundial (BM) atualiza suas estratégias para a educação para amplair suas perspectiva e maximizar sua eficácia no combate à pobreza e no impulso ao desenvolvimento econômico.

Segundo os documentos do BM, apresentados na pesquisa citada (Shiroma et al. 2008), pretende-se vincular a noção de qualidade à cultura de resultados permeando as reformas educacionais financiadas pelo BM. Assim, a educação para alcançar a qualidade almejada deve voltar-se à harmonizar políticas econômicas e educacionais, valendo-se da competitividade econômica e da coesão social, e ainda, formação em prol das demandas dos mercados locais e globais. Estes seriam pois os fundamentos dos indicadores de qualidade neoliberais defendidas pelo banco.

Cunha (2014) em pesquisa realizada com cerca de quinhentos docentes universitários, de diferentes instituições, identificou a

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convivência de duas matrizes que fundamentam indicadores de qualidade da formação superior, os referenciados em produtos e os referencidos em processos. Os primeiros dizem respeito às condições materiais como laboratórios, biblioteca, titulação docente, programas de intercâmbio nacionais e internacionais. Os segundos, aqueles que visam o processo, marcam questões de ordem pedagógica e acadêmica e de suas epistemologias. Em sua análise, a autora adverte para a importância da avaliação institucional ter como foco o trabalho docente e não os sujeitos, para assim envolver toda a comunidade universitária e as políticas públicas que definem o programas e as condições de formação. Contrariamente às indicações do BM e do BID, muitos dos docentes que participaram dessa pesquisa valorizam indicadores referendados em processos e na valorização do conhecimento como construção de discentes e docentes assumidos como sujeitos históricos.

Dias Sobrinho (2012) também se opõe à concepção de qualidade da educação relacionada às mutações das finalidades da educação em base de sustentação dos interesses mercadológicos, de instrumentaliação técnica, individual, hegemônica, como lhe é imposta pelos interesses da política de globalização neoliberal. Defende a concepção da qualidade da educação referendada às finalidades essenciais da educação superior, ou seja, fundamentadas na busca da verdade, na ética, na pertinência e na relevância social, como bem público e de direito humano, proposta associada à epistemologia da práxis. Essa concepção de qualidade, tal como a universidade como instituição (Chauí 2014) seriam referendadas socialmente. Portanto, a concepção de qualidade proposta diz respeito aos processos de emancipação, à formação crítica, integral e multidimensional dos profissionais, tal como estrutura Souza (2014), a qual define a formação como uma autêntica Bildung, cuja base epistemológica desloca o enfoque da formação do individual para o social, para o político e para o ideológico. Em seu trabalho reforça a construção e a aceitação da qualidade como social, que traz parâmetros e indicadores comprometidos com a promoção do espírito crítico, fortalece o compromisso para transformar a realidade social, a construção de sociedades mais justas, desenvolvidas econômica, cultural e humanamente.

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Pode-se sintetizar que para os autores citados, as transformações das finalidades da educação são ponto nelvrágico para a compreensão das tensões entre diferentes concepções de qualidade no mundo acadêmico. Tal como foi já referido nesse trabalho, a qualidade priorizada pelas agências financiadoras, referendada nos resultados do desenvolvimento econômico, taxas de crescimento, custos baixos e altos benefícios econômicos, tenta produzir mudança importante no ethos acadêmico, ou seja, na dimensão moral e ética do trabalho docente. A intenção é que na busca da qualidade, se abandone o compromisso com o desenvolvimento humano integral na sociedade, espera-se que a qualidade deixe de ser socialmente referendada, que não se refira ao desenvolvimento da autonomia dos sujeitos, em todas suas dimensões. Deve-se, nesse caso, substituir a dimensão formativa pela informativa, relacionar qualidade com a lógica da eficiência e de adoção consensual de posicionamento epistemológico e político condizente. A posição contra hegemônica defende a concepção de qualidade com significado social, relativo, dinâmico, contextualizado, construído pelos sujeitos do processo. Nessa concepção, a qualidade educacional refere-se à relevância científica dos processos formativos relacionada com o rigor teórico- metodológico e epistemológico.

Até aqui apresentamos algumas contribuições relevantes para a construção da concepção de qualidade e pretende-se relacioná-la ao processo de formação e profissionalização docente. Inicialmente vamos discutir a questão epistemológica presente nessa formação como um dos indicadores relevantes da qualidade que se busca construir. Apoiamo-nos nas contribuições de Tello (2013) para apresentar a concepção da epistemologia com a qual queremos trabalhar.

O autor apresenta que a epistemologia se compõe da perspectiva epistemológica - teoria geral –, do posicionamento epistemológico – cosmovisão – que, se transforma em posicionamento político ideológico, a partir do qual o pesquisador desenvolverá seu trabalho. O enfoque epistemológico, o qual implica escolha metodológica, ou o “modo de pensar o logos”. Nesse sentido a metodologia passa a ser epistemetodologia, na

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qual converge a apresentação do método e posição epistemológica do sujeito, portanto coerente com a perspectiva e a posição epistemológica. Pode-se dizer que a epistemologia assume conotação social, ética, política, cultural, didática e da pesquisa. Há uma cosmovisão delineando a ação do pesquisador que assume a ciência como práxis, e que lhe exige posicionamento epistemológico e metodológico.

A epistemologia trata do estudo das possibilidades, legitimidade, valor e limites do conhecimento científico. Para Saviani (2013), ao tratarmos epistemologicamente da ciência pedagógica não se pode deixar de considerar a mediação entre teoria e prática que a constitui e, sua capacidade de influir na práxis enquanto ciência dialética. Partiremos da perspectiva, posicionamento e enfoque epistemológico, para analisar, na área educacional, a epistemologia da prática e a epistemologia da práxis como base da produção do conhecimento e suas repercussões políticas pedagógicas.

Duarte (2000, p. 70) refere-se à epistemologia da prática como teoria do conhecimento que se caracteriza como peculiar, individual, não incorporado pela racionalidade científica. Essa se organiza a partir do conhecimento pragmático, adota a dicotomia na relação teoria e prática, privilegia o poder da prática como fonte de conhecimento, considera que a verdade somente resulta da prática.

Na perspectiva da epistemologia da prática, o conhecimento não é uma construção, mas refere-se à apropriação individual da realidade objetiva, é parcial, limita-se à percepção imediata. Nesse entendimento, a teoria não é considerada essencial para a formação do conhecimento, sendo substituída pelo senso comum, não há articulação teoria e prática, o conhecimento reveste-se de sentido utilitário. Essa concepção acadêmica, pedagógica e política, sustentada numa individualidade e numa postura alienada, contribui para o agravamento das condições sociais de desigualdade, gerados pelo capitalismo, e impede a realização da humanização e da cidadania (Kuenzer e Rodrigues 2007; Magalhães e Souza 2015).

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A partir da proposta feita por Tello (2013), para o estudo da epistemologia, podemos inferir que a perspectiva da epistemologia da prática é o positivismo. O posicionamento epistemológico e político ideológico não apresentam perspectivas de transformação social, pois as relações sociais estão dadas e não são históricas. Já o enfoque epistemológico que representa a opção metódica, gera a epistemetodologia da pesquisa filiada ao método positivista.

Em contradição à epistemologia da prática temos a epistemologia da práxis que se funda na relação dialética entre teoria e prática, como base da construção do conhecimento. Nessa é reconhecido o valor teórico da prática indissociável do valor prático da teoria e, portanto, é ressaltada a importância da unidade teória-prática para os processos de produção e reprodução do conhecimento e de compreensão da realidade.

O conceito de práxis, categoria fundante desse posicionamento epistemológico, é compreendido como atividade social humana, sendo assim fundamental para o entendimento dos processos de elaboração de conhecimentos e com a “omnilateralidade” da formação humana. A categoria práxis possibilita que as relações necessárias à produção do conhecimento não sejam dissociadas, mas ligadas e em observância da unidade dinâmica (Vázquez 1986).

Pela epistemologia da práxis são desenvolvidas mediações de caráter histórico, cultural e social, que possibilitam a construção de conhecimentos fundada na categoria trabalho, como processo basilar de desenvolvimento e humanização do ser social (Souza e Magalhães 2014). De fato, é o trabalho, posto como categoria central, que faz a mediação entre teoria e prática, é através dele que a prática se faz presente no pensamento e se transforma em teoria, do mesmo modo é através do trabalho que a teoria se faz prática, desenhando as possibilidades de transformações dialética da realidade.

Retomando a proposta feita por Tello (2013) para o estudo da epistemologia, podemos inferir que a perspectiva da epistemologia da práxis é a dialética. O posicionamento epistemológico constitutivo da cosmovisão é crítico, contra hegemônica, se vincula

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ao marxismo. O enfoque epistemológico ou epistemetodologia está ancorado no método materialista histórico dialético.

Esclarecer a epistemologia que fundamenta a formação, profissionalização e o trabalho dos professores para construir indicadores de qualidade social

Ao refletir sobre escolhas epistemológicas que fazem os professores-pesquisadores que trabalham a temática formação, profissionalização e trabalho docente, podemos desenhar, em sentido amplo, as características dos que optam pela epistemologia da prática e dos que escolhem a epistemologia da práxis. Perguntamos se essas escolhas refletem o que Tello (2013, p. 11) denomina “novo ethos” acadêmico, que marca o conhecimento produzido pela universidade a partir do interesse do privado e, imposições do mercado, onde a lógica do capital tende a agenciar a produção acadêmica.

Também nessa ordem de ideias, reconhecemos com Moraes (2004), a relevância das políticas de formação e profissionalização de professores, como suporte de reformas sociais importantes e, concordamos que as contradições geradas por essas ideias compõem o pano de fundo, para a análise tanto das propostas políticas para a educação, como das produções acadêmicas e seus pressupostos epistemológicos.

A preocupação sustentada por Moraes (2004) e Tello (2013), tem perpassado vários estudos como: Scalcon (2008), Neves (2013), Shiroma e Evangelista (2014), Souza e Magalhães (2014), no conjunto representam um alerta sobre os rumos que as políticas de formação e profissionalização de professores vêm assumindo, particularmente no que se refere ao perfil pragmático assumido que imprime caráter salvacionista à educação, além de reforçar a perspectiva da formação e prática orientadas pela lógica mercadológica. Essas propostas e suas contraposições delineiam

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opções epistemológicas, vinculadas seja à concepção da relação teoria-prática dicotômica, ou como práxis.

Relacionada à epistemologia da prática, as concepções de formação, profissionalização e trabalho docente se alinham à cosmovisão cujos aspectos técnicos e utilitários, empobrecem o ser professor; ele não se percebe como criador e transformador social, desconhece a historicidade da profissão, acomoda-se na alienação que oblitera sua consciência, adere ao consenso ativo de que nos fala Neves (2013).

Para os defensores da epistemologia da prática, a meta da formação é o professor reflexivo, que seja capaz de pensar sobre sua prática, o conhecimento é resultante da experiência no trabalho, privado de sistematização teórica, objetiva resultados. Nessa formação há a secundarização de conteúdos teóricos e científicos, em detrimento da valorização das práticas experenciadas, individualizadas e individualizantes como expõe Kuenzer e Rodrigues (2007). Nega-se a historicidade do conhecimento científico, enquanto método para aprender a conhecer.

As autoras Evangelista e Triches (2014) afirmam que as diretivas elaboradas para os cursos de formação de professores, sobretudo após a década de 1990, baseiam-se na epistemologia da prática, e se caracterizam por apresentar uma política de formação para a reconversão docente, e essa se apoia no alargamento e restrição do conceito de docência. Alargamento, pois converge à ideia de superprofessor; restrição, pois o fecha para a dimensão política do trabalho docente.

Souza e Magalhães (2014), baseadas em Marx (2006), assumem que na perspectiva neoliberal da epistemologia da prática, a premissa ontológica da educação e do trabalho, como constituidora do sujeito social é reduzida à (re)produção de riquezas, bens de consumo e de mercadorias. O conceito de qualidade da formação docente passa a relacionar-se à dilatação de competências, para agregar valor ao processo de trabalho e responder às novas exigências do capital. Para elas, embora o capitalismo destaque o trabalho como pressuposto da existência humana, o que realmente gera no processo formativo é a alienação do mesmo, ferindo seu princípio fundamental e ontológico da omnilateralidade e da transformação da realidade.

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Conforme suas análises (2014), na vida acadêmica e social atual a assimilação e defesa dessas ideias são possíveis pela construção do consenso que visa dar legitimidade à política de Terceira Via. Movimento que se fundamenta na criação e propagação de conceitos que passam a ser aceitos socialmente, compreendidos e assumidos na lógica regulatória como indicadores da qualidade hegemônica da educação e formação – como participação, eficiência, eficácia.

Em contraposição, para a visão de formação docente que se alicerça na epistemologia da práxis, o trabalho, especificamente o trabalho docente, é atividade essencial dos homens; é prática social e categoria fundamental para a compreensão e elaboração de conhecimentos. A prática é pensada a partir de posicionamentos políticos, epistemológicos, pedagógicos que contribuem para a compreensão de sociedade, homem, educação, professor, numa perspectiva crítica emancipadora.

Nessa mesma perspectiva epistemológica, portanto contra hegemônica, a Rede se propõe a construir indicadores de qualidade social que visam apoiar a produção acadêmica em seu rigor e relevância. Assim, assevera que o professor é sujeito historicamente situado, marcado pelas relações políticas, econômicas e culturais, produto e produtor da realidade social. É mediador, intelectual defensor de atitude de resistência, para provocar engajamento no processo de mudança social (Souza e Magalhães 2014). Logo, o trabalho docente oportuniza construções diversas, de maneira crítica, aberta e autônoma, o que demanda a elaboração de conhecimentos emancipatórios.

Trabalho docente como práxis propicia construções de conhecimentos e de sujeitos críticos, abertos, autônomos e emancipados. O diálogo, a reflexão, a contradição e o conflito são elementos essenciais para implicar os sujeitos em uma relação de aprendizagem na qual a internalização e construção de conhecimentos possibilita a transformação das relações e da sociedade. E a escola é parte inseparável da totalidade social, e como tal, apresenta as mesmas situações de reprodução e de mudança que caracterizam aquela totalidade. A escola representa uma possibilidade de ruptura e transformação da sociedade ao

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proporcionar a construção do conhecimento emancipador (Souza e Magalhães 2014).

A concepção de formação que é defendida refere-se a Bildung, processo integral de formação histórica, caminho da consciência e do espírito para a liberdade, Hegel (1988). Segundo Souza (2014), a ideia de Bildung relaciona-se com o desenvolvimento interior do sujeito e sua autonomia e tem como objetivo realizar o pleno desenvolvimento do ser humano, como progresso pessoal e social e de autonomia do sujeito. Implica resistência ao processo desumanizador o que exige essencialmente postura ética.

Acrescenta-se que formação de qualidade avocada como Bildung, se funda na epistemologia da práxis, aprofundar os caminhos para o docente relacionar-se dignamente consigo mesmo e com o outro, já que à formação cabe prepará-lo, em sua complexidade, a partir da reflexão e do pensamento crítico. Requer a valorização do pensamento emancipatório e de libertação, dá ênfase ao pensamento criativo e inovador (Souza 2014).

O sentido de qualidade social defendido pela Redecentro tem sido construído também, a partir do conjunto de elementos e dimensões socioeconômicas e culturais, que auxiliem na compreensão das políticas governamentais, no sentido político dos projetos sociais e na função transformadora do trabalho docente. Em termos contra hegemônicos, essa construção impõe perspectivas e conceitos pautados na epistemológica da práxis, mas também estabelece compreender como os documentos oficiais infligem processo contrário à desalienação. Compreender o viés epistemológico e político dos documentos oficiais é nosso próximo passo, com ele buscamos revelar como se cria um campo de disputas que em essência tenta descontruir as possibilidades de qualidade social para o campo da educação.

Os discursos políticos: convergências mercadológicas, epistemológicas ou confrontos ideológicos?

Ao iniciar essa seção recorre-se às palavras de Barroso (2011) para quem é necessário considerar que políticas públicas envolvem

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“construção da realidade”, ou seja, não se destinam a resolver problemas colocados fora delas, mas são, em si mesmas, processos que constroem racionalidades,“visões do mundo”,

interesses, “referenciais”, “sistemas de crenças”. Através de sua elaboração seus autores defendem valores, crenças, ideias, interesses, posicionamentos.

Essas ideias sugerem pontos de reflexão sobre os discursos presentes nos documentos basilares para as decisões políticas educacionais atuais. Souza e Magalhães (2014) ao abordar epistemologicamente o Plano Nacional de Educação PNEII (2014-2024), questionaram o conceito de qualidade da educação apresentado no plano, focado em treinamento de habilidades e competências, baseado na concepção de aprendizagem dissociada do ensino, desvalorizando a dimensão didática pedagógica do processo educativo. Para a análise epistemológica do PNEII as autoras a relacionam à temática da qualidade da formação, que é coligada à qualidade da profissionalização e do trabalho docente; incluindo as condições salariais e de carreira que se ligam à valorização social da profissão. Essa é análise decisiva, já que o alcance da qualidade da educação envolve os professores e seus trabalhos. As autoras promovem o entendimento sobre o como e no que, os discursos das políticas educacionais, suas perspectivas epistemológicas, estruturam um campo de desconstrução de indicadores de qualidade social.

O estudo do PNEII, desenvolvido pelas pesquisadoras, no que se refere às metas ligadas à formação (15 e 16) e as que dizem respeito às condições de exercício docente (17 e 18), evidencia que não asseguram a formação omnilateral, que assuma o trabalho docente e a pesquisa como princípios formativos, articulados socialmente, ancorada nas instituições públicas e, não garantem o correto desenvolvimento da profissionalização docente, não defende a concepção de formação que se funda no pensamento crítico, na relação dialética entre teoria e prática, no trabalho coletivo e interdisciplinar, no compromisso social. Quanto à questão da profissionalização dos professores, o PNE não faz sua proposta referendada na qualidade social, na garantia de condições de trabalho e salariais ao longo da carreira docente.

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A partir do estudo sobre o PNE pode-se resumir que a perspectiva epistemológica do plano, a teoria geral que o sustenta é o positivismo. Seu posicionamento político ideológico é neoliberal. O plano ignora o caráter histórico das relações sociais, a perspectiva de transformação social; seu enfoque metodológico reflete uma concepção que dissocia a relação teoria e prática. As metas voltadas para a formação e profissionalização docente seguem o mesmo roteiro que se reflete na didática. O plano não assume a concepção de qualidade social da educação.

Kuenzer e Rodrigues (2007) ao analisarem as Diretrizes Curriculares para o curso de Pedagogia identificam sua base na epistemologia da prática, já que nessas o conhecimento não é uma construção, mas refere-se à apropriação individual da realidade objetiva, é parcial, limita-se à percepção imediata. Nesse entendimento, a teoria não é considerada essencial para a formação do conhecimento; reafirma-se uma racionalidade que não articula teoria e prática; reveste-se de sentido utilitário; opõe-se à teoria, considerada desnecessária, sendo substituída pelo senso comum. Como na proposta do PNEII, nega-se a historicidade do conhecimento científico, enquanto método para aprender a conhecer.

Mais recentemente temos outro documento relacionado às políticas educacionais que é o projeto preliminar da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República intitulado “Pátria Educadora: a qualificação do ensino básico como obra de construção nacional” (2015). Sua análise mostra a orgânica relação entre as diretrizes do projeto nacional de qualificação do ensino básico, Plano Nacional de Educação e as Diretrizes Curriculares. Assim como os outros documentos, esse também se assenta na epistemologia da prática, sustenta a qualidade educacional na meritocracia empresarial, que prevê premiações e bonificações para escolas e professores que se destacam no alcance das metas de resultados fixados pelos organismos dirigentes.

O documento propõe uma nova estratégia de desenvolvimento chamada de produtivismo includente (p. 4), pautado na democratização de oportunidades econômicas e

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educacionais. Os termos usados revelam o ideal do produtivismo, da eficácia e da proposta de indissociabilidade dos objetivos mercadológicos e educacionais. A qualidade desse desenvolvimento é “produtivista, capacitadora e democratizante, baseada em requisitos do experimentalismo científico e do vanguardismo tecnológico” (p.4). Pretende um sistema de ensino que “organiza a diversidade e que privilegie as capacitações, de análise e de comportamento, como sequência de capacitações, adquiridas e exercitadas”. Propõe que o novo paradigma educacional deve dar ênfase à análise verbal e ao raciocínio matemático.

Não por acaso as capacidades a que se referem essas diretrizes estão relacionadas com as que são colocadas pelo BID e pelo BM, conforme foram apresentadas nesse artigo. É inegável que são propostas que pretendem dar corpo e concretização às exigências dessas agências financiadoras. O embasamento dessa proposta é mais uma vez a epistemologia da prática, a escolha epistemológica da separação entre teoria e prática, o ensino descontextualizado, afastado dos ideais de uma formação omnilateral, crítica ética e histórica. O documento se opõe à epistemologia da práxis, suas premissas visam impedir o pensamento emancipatório e de libertação.

Outra aberração referente à formação e ao trabalho docente presente no documento é que defende aulas sobre conteúdos curriculares a serem transmitidas via satélite, ou gravadas em vídeos por “professores de referência”, para que sejam reproduzidas nas salas de aula do país. Essa diretriz que pretende garantir a qualidade da educação, traz em si a tentativa de aniquilamento do professor, de sua formação e profissionalização, já que seu trabalho pode ser substituído por aulas transmitidas a distância, com isso pode-se diminuir artificial e drasticamente o número de professores necessários ao sistema educacional e o investimento na sua formação. Ela desmerece a formação e o trabalho dos professores, anula sua identidade e desrespeita-os enquanto profissionais ao propor substituí-los pelos chamados “professores de referência”.

Ao tratar aspectos da profissionalização, o documento salienta as premiações de escolas e de profissionais que atingirem

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as metas pré-determinadas e as punições aos que ficarem abaixo da média. Defende o empresariamento do trabalho docente, a política de bônus e gratificações que não devem ser incorporados aos salários, ignora as reivindicações históricas dos movimentos sociais, associações profissionais e produções acadêmicas de uma política sólida de carreira para os trabalhadores da educação.

O conceito de qualidade apresentado é novamente aquele voltado aos interesses do mercado, distante da qualidade socialmente referendada que se defendeu nesse artigo. Ela é fundada em quatro eixos: organização da cooperação federativa; reorientação curricular e do ensino e de aprendizagem; qualificação de diretores e de professores, aproveitamento de novas tecnologias (p.5). Em suma, também nessas diretrizes a perspectiva epistemológica, a teoria geral que o sustenta é o positivismo. Seu posicionamento político ideológico é neoliberal. O documento nega o caráter histórico das relações sociais, a perspectiva de transformação social.

A Redecentro e a qualidade da produção acadêmica: empresariamento do conhecimento ou construções de resistências?

O estudo sobre a produção acadêmica do qual resulta este trabalho é realizado por professores pesquisadores e estudantes de graduação e pós-graduação em educação de sete instituições da Região Centro-Oeste do país. Essas instituições: Universidade de Brasília (UnB), Universidade Federal de Goiás (UFG), Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Universidade Federal de Uberlândia (UFU), Universidade de Uberaba (UNIUBE); e Universidade Federal do Tocantins (UFT); organizam-se na Redecentro - Rede de Pesquisadores sobre Professores da Região Centro-Oeste - há dez anos, para coletivamente desenvolverem pesquisas sobre a produção acadêmica. É objetivo do grupo, identificar, organizar e compreender a produção, produzida desde 1999 até 2014, sobre a

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temática professores, a partir de sua epistemologia e historicidade. Tem também como objetivo contribuir na construção de parâmetros que qualifiquem a produção, no sentido do rigor e relevância, para que ocupe um papel emancipador na formação de professores. Desenvolve-se uma “pesquisa sobre pesquisas”, a partir da base teórico-metodológica da dialética. Os dados são analisados por meio de uma meta análise que busca constituir a compreensão totalizadora do objeto de estudo.

Os pesquisadores da Redecentro argumentam que a perspectiva, o posicionamento e o enfoque do trabalho formativo constroem-se fundamentados na dialética, na historicidade do homem e da construção do conhecimento, portanto, no método materialista histórico dialético.

A partir da pesquisa que analisa a produção acadêmica do conhecimento a Redecentro questiona: qual a função desse conhecimento na construção e regulação das políticas públicas? Em sua busca pretende ampliar a compreensão acerca da relação entre os discursos políticos e a produção acadêmica, analisar como o Estado regulador, esforça-se para influenciar e orientar a investigação educacional, discute como essas orientações são apropriadas pelos autores dos trabalhos acadêmicos e reinterpretadas pelos decisores políticos.

A pesquisa desenvolvida por essa Rede tem mostrado que muitas das produções acadêmicas sobre professores submetem-se aos designios das políticas educacionais pois a pós-graduação é fortemente controlada por elas. O controle pode se exercer a partir dos critérios de financiamento para pesquisas, de imposição do carater competitivo, e de exigências de um conhecimento ancorado no paradigma neoliberal, útil e com objetivos que alimentam as prioridades das políticas educativas.

Esse processo, no entanto, se é assumido por um grupo de atores nas universidades, tem provocado a reação de outros pesquisadores que as denunciam como constrangimento à autonomia do trabalho científico, cujo objetivo é atender ao apelo para uma maior aproximação das finalidades científicas, às finalidades políticas, afim de possibilitar orientar e influenciar a produção

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científica e as práticas pedagógicas. Além disso, o conhecimento acadêmico também atua como instrumento de regulação, na medida em que sua produção e disseminação dá sustentação às decisões de política educativas e sua lógica as legitimam. Também merece registro uma outra forma de controle da produção acadêmica que se explicita na maneira como os pesquisadores se adaptam às temáticas “aconselhadas”, com suas epistemologias e ontologias como demandadas pelos interesses das políticas educativas, para sustentar as reformas na área (Viseu 2014).

Mancebo et al. (2015) chamam atenção para o empresariamento do conhecimento na pós-graduação em educação, formatado para sustentar a ampliação e renovação do capitalismo. Para eles as universidade públicas tem sido induzidas a desempenhar papel de destaque na produção do conhecimento mercadoria, ou seja , há uma inclusão do seu valor de uso ao seu valor de troca e portanto o conhecimento só é valorizado se se se transforma em mercadoria.O empresariamento do conhecimento tem ideário fundamentado nessas premissas para atender às demandas do sistema capitalista de imposição ideológica e política no campo educacional, conformando o consenso ativo. Nesse sentido, na educação superior brasileira, foram induzidas importantes mudanças tanto na formação, como na produção do conhecimento que passaram a difundir o ideário hegemônico como critério de qualidade.

Os conteúdos dos discursos da produção acadêmica estão, muitas vezes, acoplados aos dos documentos oficiais explicitando vínculos de caráter econômico–ideológico,sob a tutela da ideologia neoliberal. (Silva e Diniz 2014) Os respectivos conteúdos buscam a legitimação da educação enquadrada no pensamento da 3ªvia, como responsável por todos problemas sociais e suas resoluções. Portanto há um forte componente ideológico, quer seja no trabalho pedagógico, nos liames da profissionalização e da formação docente, apresentados estreitamente ligados à lógica empresarial.Nesse sentido os discursos podem ser considerados como cenários de desenvolvimento e expansão do conteúdo ideológico da 3ª via na produção do conhecimento acadêmico.

A Redecentro ao tomar a produção acadêmica sobre professores como campo epistemológico que pode ser constituidor

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de racionalidades, que fundam as políticas públicas como o PNEII, as diretrizes curriculares para o curso de pedagogia, e o documento Pátria Educadora, reforça a importância da vigilância epistemológica para que o campo da pós-graduação não seja um terreno fértil na construção de um pensamento organicamente associado à base epistemológica neoliberal e reforçar a racionalidade que defende a educação aliada aos interesses do capital. Propõe o esforço para que a produção acadêmica defenda os princípios da qualidade contra hegemônica, capaz de fornecer elementos de resistências às imposições de uma educação empresarial e contribuir na construção e regulação das políticas públicas emancipadoras e cidadãs.

O que fica como conclusão?

A análise epistemológica aqui empreendida, diz das possibilidades, como intelectuais orgânicos, de revelar caminhos para a construção de indicadores de qualidade social, o que passa pela análise do que está posto, ou imposto, à formação, a profissionalização, ao trabalho docente, nos discursos dos documentos de política educativa. A lógica desses discursos alinhava seus objetivos em consonância com o empresariamento do conhecimento, recorre à epistemologia da prática como fundamentação teórica mantenedora de discursos alienantes, inclusive no campo da pesquisa acadêmica, que acabam mantendo, em função de muitas de suas práticas, a (re)produção do consentimento ativo.

Faz parte do trabalho investigativo compreender epistemológica e historicamente a contextualidade social, política, ética, dos discursos das políticas públicas, afim de questionar seus sentidos e significados, para poder se associar academicamente em defesa da qualidade social para a formação e práxis dos professores. Cabe aos pesquisadores das universidades se munirem teórica e epistemologicamente, estarem preparados e preparar os estudantes a confrontar–se com a concepção de qualidade mercadológica aliada aos interesses do capital, em prol de objetivos emancipadores sociais, éticos e políticos.

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2Formação de proFessores e avaliação da qualidade da educação superior: o curso de pedagogia nos ciclos do sinaes

José Vieira de Sousa

Considerações iniciais

O objetivo do presente artigo é discutir a avaliação da qualidade dos cursos de Pedagogia, no Brasil, tomando como referência a política definida pelo Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes), instituído pela Lei nº 10.861 de 14 de abril de 2004 (Brasil, 2004), focalizando um dos seus componentes – o Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade) –, nos ciclos avaliativos de 2005, 2008 e 2011. O recorte abordado no texto explora os resultados do Enade, considerando que, de todas as avaliações feitas no âmbito do Sinaes, é a única que produziu dados em série e de conhecimento público. Além disso, tais resultados têm influenciado na formulação de determinadas políticas públicas, sobretudo após 2008, para a educação superior brasileira.

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A discussão proposta insere-se no escopo de uma pesquisa mais ampla intitulada “Avaliação, expansão e qualidade da educação superior no século XXI: uma análise sobre o conceito de qualidade nos cursos de graduação no período pós-Sinaes –2004-2012”. A pesquisa decorre do projeto “Políticas da Expansão da Educação Superior no Brasil”, do Observatório da Educação/OBEDUC-Capes, sendo este vinculado à Rede Universitas/Br.

As justificativas para a escolha do curso de Pedagogia foram: (ii) trata-se de um dos quatro cursos – juntamente com Administração, Enfermagem e Engenharia –, que apresentaram maior expansão de matrículas após 2004 (Brasil 2013b), ano de criação do Sinaes; (ii) possui longa tradição na área de formação de professores; (iii) passou no início da década de 2000 – e ainda continua a passar – por numerosos e intensos debates em torno de suas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN). Particularmente, em relação à última justificativa lembramos que, entre outros, dois elementos ganharam centralidade nas discussões dessas diretrizes: as posições expressas pelos diversos grupos interessados em sua definição e a questão da qualidade do curso de Pedagogia, aspecto que ganha relevo na discussão proposta neste artigo, situando-o na política do Sinaes/Enade.

A vereda metodológica do trabalho abarcou: (a) revisão bibliográfica; (b) levantamento e análise de fontes documentais e dispositivos legais; (c) captação e análise dos dados estatísticos por meio de duas estratégias: (i) exploração de planilhas fornecidas pela Coordenação-Geral de Controle de Qualidade da Educação Superior da Diretoria de Avaliação da Educação Superior do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (CGCQES/Daes/Inep) com resultados do Enade, em série histórica desde 2004; (ii) dados sobre expansão do curso fornecidos pelo Serviço de Apoio Operacional do Conselho Nacional de Educação (CNE/SAO); (d) análise e caracterização dos cursos de Pedagogia considerados de alta “qualidade” pelo Sinaes.

Estruturalmente, o trabalho está organizado em quatro partes, além das considerações iniciais e finais. A primeira parte

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contextualiza o curso de Pedagogia no cenário mais amplo da formação de professores no país, dando destaque à definição de suas Diretrizes Nacionais Curriculares (DCN), por meio da Resolução CNE/CP nº 1/2006 e a consequente extinção gradativa do curso Normal Superior. A segunda destaca três políticas educacionais definidas na segunda metade da década de 2000 para a formação de professores no país e alguns dilemas que persistem na área. A terceira parte ressalta a polissemia do conceito de qualidade, ao mesmo tempo em que o situa em relação à política do Sinaes e como objeto de disputa no campo da educação superior. A última parte do texto apresenta o conceito Enade dos cursos de Pedagogia do Brasil nos ciclos avaliativos de 2005, 2008 e 2011, além de chamar a atenção para aqueles cursos chancelados pela política do Sinaes como de “alta” qualidade, à medida que tiraram 4 ou 5 nos três ciclos.

Curso de Pedagogia no cenário da formação de professores no país

No Brasil, o curso de Pedagogia tem sido alvo de debates polêmicos e propostas traduzidos em um grande número de estudos, notadamente a partir do proposto na Lei de Diretrizes e Bases – LDB 9.394/96 (Brasil 1996) para a formação docente (Brzezinski 1996; Veiga Sousa, Resende e Damis 1997; Silva 1999; Scheibe e Aguiar 1999; Aguiar, Brzezinski, Freitas, Silva e Pino 2006; Libâneo 2006; Franco, Libâneo e Pimenta 2007 e Gatti 2009, 2010).

Criado em 1939, esse curso passou por sua primeira reformulação no ano de 1962, por meio do Parecer CFE 251/6 (Brasil 1962), quando foi instituído o seu currículo mínimo e a duração de quatro anos. Três décadas após, é reestruturado através do Parecer CFE 252/69 (Brasil 1969) que, numa visão tecnicista, imprime-lhe a figura dos especialistas. A partir de então, continuou a passar por muitas mudanças, embora vários problemas relativos

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à sua própria natureza tenham perdurado, por muito tempo e ainda sejam pontos de reflexão na atualidade.

Analisando o contexto pré-LDB 9.394/96, Libâneo (1996) alertava para o fato de que, apesar do mérito dos debates acerca das ambiguidades e indefinições do curso de Pedagogia, intensificados desde o início da década de 1980, os resultados deixaram a esperar. Para ele, as mudanças ocorridas nesse curso teriam resultado da ênfase dada às suas matrizes curriculares, sem conseguir significativos avanços em relação a outras questões mais profundas. Dentre estas, ele destacava “a problemática epistemológica da Pedagogia, o desenvolvimento da teoria educacional e a investigação pedagógica” (p. 107).

No início da década de 2000, novamente o curso de Pedagogia passa por intensos debates que visavam construir novas matrizes paradigmáticas em torno de sua proposta curricular. Nesse contexto, além da discussão sobre o locus a ser privilegiado na formação do pedagogo – universidade –, duas outras questões ganharam centralidade nos discursos dos vários grupos envolvidos: (i) a racionalidade orientadora da formação do pedagogo; (ii) o peso da relação teoria/prática no percurso formativo e no fazer desse profissional.

No que tange à primeira questão, os debates giravam em torno da necessidade de combate e superação da racionalidade técnica/instrumental, visando à construção de outra racionalidade – a emancipatória. Eram ressaltados como elementos constitutivos dessa segunda matriz paradigmática, dentre outros: dimensão de totalidade; criatividade; emancipação tanto individual quanto social; concepção de conhecimento como algo situado historicamente, relativo e provisório; formas de produzir conhecimentos fundados nas teorias críticas de educação e na visão dialética visando à intervenção na sociedade.

Quanto à segunda questão, defendia-se que a reflexão da relação teoria/prática não poderia ser vista como mero exercício filosófico. Era subjacente a esta postura a tese de que, nessa relação, se expressa a contradição inerente à própria lógica da

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produção capitalista, revelada na organização curricular e na divisão do trabalho escolar: a arcaica oposição disciplinas teóricas versus disciplinas práticas. O combate a esta dicotomia buscava apoio na compreensão do conceito de práxis como o processo de superação do plano da interpretação do mundo para a sua efetiva transformação. Nesta lógica, compartilhava-se da tese de Vazquez (1967[1986]) de que qualquer “teoria é prática na medida em que materializa, através de uma série de mediação, o que antes só existia idealmente, como conhecimento da realidade ou antecipação ideal de sua transformação” (p. 207).

Questões como as duas citadas orientaram os calorosos debates feitos em torno do curso de Pedagogia no início da década de 2000. Todavia, na segunda metade da década, a área da formação de docentes para a educação básica, no Brasil, foi influenciada por outros importantes fatos. Um deles, de grande expressão, foi a definição das Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) do curso de Pedagogia pela Resolução CNE/CP nº 1, de 15 de maio de 2006 (Brasil 2006). A partir de então, ele passou a conviver com a gradativa extinção do curso Normal Superior, conforme previsto pela referida Resolução:

Art. 11. As instituições de educação superior que mantêm cursos autorizados como Normal Superior e que pretenderem a transformação em curso de Pedagogia e as instituições que já oferecem cursos de Pedagogia deverão elaborar novo projeto pedagógico, obedecendo ao contido nesta Resolução.

Na prática, além instituir as DCN do curso de Pedagogia, o dispositivo legal determinava que não se abrissem mais turmas de Normal Superior, o que implicou processos de reconfiguração para ambos. No caso do segundo curso citado, houve uma progressiva queda na quantidade deles, até sua extinção, como prescrito pela legislação.

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GRáFICO 1 – Evolução do curso Normal Superior entre 2004 e 2009 (Brasil)

Fonte: Planilhas com resultados Enade fornecidas pela CGCQES/DAES (Inep).

Os dados disponíveis permitem inferir que a total extinção do Normal Superior deu-se pós-2009, muito embora o prazo concedido na Resolução CNE/CP n° 1/2006 fosse até maio de 2007, pois estava assim fixado: “Art. 11. [...] §1°. O novo projeto pedagógico deverá ser protocolado no órgão competente do respectivo sistema ensino, no prazo máximo de 1 (um) ano, a contar da data da publicação desta Resolução” (Brasil 2006)

Novos tempos, novas políticas para formar professores... mas os dilemas persistem

Pouco tempo depois da aprovação das DCN do curso de Pedagogia, foram implantadas três outras políticas de formação docente com expressiva repercussão sobre a área. A primeira delas – Programa Emergencial de Segunda Licenciatura para Professores em exercício na Educação Básica Pública – teve suas Diretrizes Operacionais estabelecidas pelo Parecer CNE/CP nº 8, de 02 de dezembro de 2008 (Brasil, 2008). Esse instrumento legal estabeleceu que o referido Programa deveria ser coordenado pelo

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Ministério da Educação em regime de colaboração com os sistemas de ensino e realizado por instituições públicas de educação superior. No ano seguinte, a Resolução CNE/CP nº 1, de 11 de fevereiro de 2009 (Brasil 2009b), instituiu essas diretrizes operacionais.

A segunda política a destacar foi o Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica (Parfor), instituído pelo Decreto nº 6.755, de 29 de janeiro de 2009 (Brasil 2009a). Em termos gerais, tal dispositivo disciplinou a atuação da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) no fomento a programas de formação inicial e continuada de docentes no país. Lembramos que, ao ampliar seu raio de atuação no tocante à formação de professores para a educação básica, a Capes deixou a responsabilidade pela avaliação dos cursos para o Sinaes. A despeito disso, as licenciaturas ofertadas no âmbito do Parfor assumem como um dos seus princípios, conforme inciso IV, do art. 2º desse Decreto: “a garantia de padrão de qualidade dos cursos de formação de docentes ofertados pelas instituições formadoras nas modalidades presencial e à distância” (Brasil 2009a).

A ampliação da atuação da Capes, no tocante à formação docente, ocorreu em cenário que ainda revelar dados preocupantes, quanto aos níveis de qualificação desses profissionais, no país. Em 2009, o Brasil tinha, ao todo, 2.335.947 docentes atuando na educação básica (Brasil 2011). Desse total, 1.655.984 possuíam nível superior, sendo 1.599.281 deles licenciados, 667.191 com nível médio completo e outros 12.772 com ensino fundamental completo. Devido a fatores estruturais e apesar dos esforços governamentais, esse cenário continua a demandar políticas públicas de maior efetividade tanto na oferta quanto na avaliação da melhoria da qualidade dos cursos de formação de professores. Nesse contexto, destacam-se os de Pedagogia, focalizados no presente texto.

A crença de que melhorando a formação de professores a educação escolar melhora está presente no imaginário social e em algumas políticas públicas educacionais, reforçando a ocultação das complexas relações entre sociedade, educação e formação de professores. Essas

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ponderações não implicam em negar a importância da qualificação desses profissionais, nem implicam em valorizar o aumento da escolarização dos professores por meio do acesso ao ensino superior e à pós-graduação [...] A proposta é relativizar e buscar revelar que os professores são também fruto das mazelas deixadas por uma sociedade capitalista e excludente. (Santos 2013, p. 185)

Uma terceira importante política formulada no final da década passada para a formação de professores foi o Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica à docência (PIBID), institucionalizado pelo Decreto nº 7.219 de 24 de junho de 2010 (Brasil 2010). Com financiamento feito pela Capes e pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), tem o apoio da Secretaria de Educação Superior (SESu) do Ministério da Educação. A finalidade principal do PIBID é auxiliar os futuros professores a conhecerem a realidade escolar e as possibilidades de exercer a docência, promovendo a melhoria da educação nas escolas. Nessa direção, merece destaque disposto no inciso IV do art. 3º do referido Decreto:

[...] inserir os licenciandos no cotidiano de escolas da rede pública de educação, proporcionando-lhes oportunidades de criação e participação em experiências metodológicas, tecnológicas e práticas docentes de caráter inovador e interdisciplinar que busquem a superação de problemas identificados no processo de ensino-aprendizagem [...] (Brasil 2010)

Entretanto, apesar das finalidades das três políticas educacionais mencionadas, o campo da formação de professores para a educação básica e, consequentemente, a avaliação da qualidade de sua oferta continuam a revelar graves problemas, no país. Diante disso, diversos estudos têm sido desenvolvidos nos últimos tempos, chamando a atenção para problemas que persistem em seus currículos. No caso do curso de Pedagogia, ainda que transcorridos quase dez anos da aprovação de suas DCN,

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problemas desta natureza permanecem, demandando a avaliação de sua qualidade. Em 2010, portanto, quatro anos após dessa aprovação, Gatti (2010) apresentou resultados de pesquisas que apontavam sérias fragilidades nos currículos para a formação de professores, em geral, mas que também podem ser aplicados ao curso de Pedagogia, em particular, destacando-se:

a) o currículo proposto pelos cursos de formação de professores tem uma característica fragmentária, apresentando um conjunto disciplinar bastante disperso; [...]

c) as disciplinas referentes à formação profissional específica apresentam ementas que registram preocupação com as justificativas sobre o porquê ensinar; entretanto, só de forma muito incipiente registram o que e como ensinar; [...]

d) a proporção de horas dedicadas às disciplinas referentes à formação profissional específica fica em torno de 30%, ficando 70% para outro tipo de matérias oferecidas nas instituições formadoras [...]

e) os conteúdos das disciplinas a serem ensinadas na educação básica (Alfabetização, Língua Portuguesa, Matemática, História, Geografia, Ciências, Educação Física) comparecem apenas esporadicamente nos cursos de formação e, na grande maioria dos cursos analisados, eles são abordados de forma genérica ou superficial, sugerindo frágil associação com as práticas docentes. (p. 1371)

Em estudo anterior, a autora já havia constatado o reduzido número de disciplinas teóricas da área de educação (tais como didática) e um visível desequilíbrio entre os eixos teórico e prático nas disciplinas de formação específica para a docência. Nessa perspectiva, “as ementas registram preocupação com teorias de ensino e com justificativas sobre por que ensinar, mas só de forma muito incipiente registram o quê e como ensinar” (Gatti 2009, p. 22).

Sem dúvida, o curso de Pedagogia apresenta problemas comuns a qualquer curso que vise formar docentes, todavia, possui

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também especificidades que, durante muito tempo, ocuparam (e em alguns casos ainda ocupam) pesquisadores da área. Dentre estas, podemos citar a epistemologia/racionalidade orientadora da formação do pedagogo, o perfil do profissional a ser formado, o campo de atuação e, até mesmo, os dilemas que ainda rondam o estatuto de cientificidade do conhecimento pedagógico. Acrescentamos, a isso tudo, a avaliação da qualidade desse curso, foco de interesse do presente trabalho.

Qualidade na política do Sinaes: conceito polissêmico e objeto de disputa no campo

Ao situar o debate da avaliação da qualidade do curso de Pedagogia no âmbito da política instituída pelo Sinaes, é importante que se esclareça a compreensão do esforço de teorizar sobre o tema. Neste esforço teórico, compartilhamos da perspectiva de análise de Martins (1988), segundo a qual o processo de teorizar sobre um problema, desde o princípio, “orienta a percepção, guia a apreensão e a interpretação do objeto, fazendo com que alguns aspectos sejam ressaltados, ao passo que outros passam a ocupar um plano secundário” (p. 26). Assim, nossa intenção é analisar o objeto à luz do conceito Enade, nos ciclos avaliativos 2005, 2008 e 2011, e não fazer um debate exaustivo a respeito da epistemologia da avaliação nem tampouco a respeito dos componentes do Sinaes ou, ainda, dos diversos índices associados a esse conceito, criados ao longo dos últimos anos.

Nossa análise considera, também, que, ao invés de se apresentar prontamente rotulado, como uma constelação de significados, o mundo social é coletivamente construído, entendimento extensivo a todos os conceitos que nele ganham vida. Possuem, portanto, uma dimensão histórica. Nesta linha de raciocínio, a formação de professores e, em consequência, a qualidade dos cursos que a dinamizam não constituem processos isolados e neutros, em relação aos interesses dos diferentes atores e

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grupos de atores que procuram fazer valer, nesses mesmos cursos, suas concepções de mundo, homem e educação. Daí, a importância e necessidade da reflexão em torno da avaliação da qualidade dos cursos de Pedagogia, tendo em vista a política instituída pelo Sinaes, para todo o país.

A reflexão acerca da proposta avaliativa do Sinaes pode ser empreendida sob diferentes ângulos, perspectivas e recortes, dependendo do objetivo definido para tal. Dessa forma, é possível focalizá-los em seus três componentes – a avaliação institucional, que compreende a autoavaliação e avaliação externa; avaliação dos cursos, realizada in loco; a avaliação dos discentes, feita por meio do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade) – ou apenas um deles, mas sem perder de vista sua interdependência. No presente texto, como já ressaltamos, o foco recai sobre o conceito Enade emitido para os cursos de graduação (no caso de Pedagogia) em uma escala que vai de 1 a 5.

Convém lembrar que, de acordo com sua proposta original, o Sinaes busca fazer uma análise global da realidade da educação superior brasileira, com vistas à melhoria da qualidade, a partir da integração de seus componentes e tendo como ponto de partida a autoavaliação institucional. Sua estrutura administrativa envolve a Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior (Conaes), responsável pela coordenação e supervisão do sistema, ficando sua operacionalização a cargo do Inep, em diálogo com a SESu/MEC.

Nos últimos tempos, diferentes posições teóricas têm sido expressas em relação à atual política avaliativa definida para o complexo campo da educação superior do país. Nesse sentido, alguns autores como, por exemplo, Ristoff e Giollo (2006), sustentam a tese de que o Sinaes efetivamente se constituiu como um sistema, uma vez que integra os espaços avaliativos do Estado e os organiza em torno de uma única concepção, em estreita vinculação com as políticas para a educação superior. Os autores acrescentam que esse sistema também abrange os instrumentos de informação, tais como o cadastro de docentes, censo da educação superior e outros. Entretanto, mais recentemente, diversos outros estudos, como os coordenados por Sousa (2011, 2013) indicam a prevalência do

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Enade como componente de destaque do sistema, fazendo com que se desloque para o desempenho dos alunos a principal fonte ou indicador de qualidade dos cursos. Na mesma direção, Peixoto e Rodrigues (2009) ressalvam “uma possível inadequação do exame para a avaliação dos cursos de graduação por apresentar um viés generalista de avaliação” (p. 15). Trata-se, portanto, de um exame que tem ganhando espaço em um campo de disputas em torno do sentido e alcance da avaliação.

Para compreender melhor esta questão, recorremos aqui à noção de campo proposta por Bourdieu (1983). Para o autor, todo campo funciona a partir de relações objetivas que podem ser de aliança e/ou conflito, de concorrência e/ou de cooperação entre atores que possuem posições diferenciadas, socialmente definidas e independentes das características dos agentes que os ocupam. Com base no autor, o campo pode ser definido como um espaço social dotado de estrutura própria – relativamente autônoma sobre outros campos sociais – e de objetivos específicos que lhe garantem uma lógica particular de estruturação e funcionamento.

Entretanto, embora se relacionem entre si, os campos são dotados de uma hierarquia interna, o que faz com que seus objetos de disputas e interesses particulares sejam irredutíveis às lutas e interesses de outros campos. “Para que um campo funcione, é preciso que haja objetos de disputas e pessoas prontas para disputar o jogo, dotadas de habitus que impliquem no conhecimento e no reconhecimento das leis imanentes do jogo, dos objetos de disputas”. (Bourdieu 1983, p. 90). Partindo desta ideia, reconhecemos que a educação superior constitui um campo que, como qualquer outro campo, conta com atores que disputam determinado objeto em jogo nele. No cenário da educação superior brasileira atual, um desses objetos em disputa é, sem dúvida, o conceito de qualidade.

Efetivamente, qualidade é um termo polêmico, norteado por lógicas diversas, polissêmico e historicamente construído. Portanto, não pode ser meramente definido pelos parâmetros formais, visto que não são as leis que constroem o mundo, mas essencialmente as relações que os homens estabelecem entre

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si, tendo como referência a base material das ideias. “A condição primeira de toda história humana é, naturalmente, a existência de seres humanos vivos. [...] Ao produzir os seus meios de existência, os homens produzem indiretamente a sua própria vida material” (Marx 1846[1982, p. 45]). Mostrando-se reais e ativos no processo de construção da vida social, os homens produzem suas próprias representações, suas ideias e, portanto, sua compreensão do que vem a ser qualidade, buscando-a na essência dos fenômenos.

Do ponto de vista etimológico, qualidade corresponde à pro-priedade, atributo ou condição das coisas ou das pessoas, capazes de distingui-las das outras e/ou de lhes determinar a natureza. Por sua vez, o termo latino qualitas significa es-sência e designa o que é mais importante, o que determina algo. [...] Em razão da complexidade que esse conceito envol-ve, refletir a respeito dele significa lidar com o contraditó-rio e o provisório [...] (Sousa 2009, p. 245)

No campo da educação, a qualidade tem se mostrado um fenômeno revestido de grande complexidade, razão pela qual abrange uma variedade considerável de dimensões e possibilidades de expressão. Do ponto de vista do poder público, esse conceito tem ganhado centralidade na educação superior, notadamente nas últimas duas décadas, transformando-se, de fato, em objeto de disputa por diferentes grupos nele interessados.

Várias políticas definidas nas duas últimas décadas para a educação superior têm sido de grande impacto para o setor. Na prática, esse nível educacional passou a ser encarado pelos últimos governos brasileiros – Fernando Henrique Cardoso, em seus dois mandatos (1995-1998 e 1999-2002), Luís Inácio Lula da Silva (2003-2006 e 2007-2010) e o primeiro mandato de Dilma Vana Rousseff (2011-2014) – “como elemento estratégico para o desenvolvimento nacional” (Sousa 2013, p. 128). Dentre outras, esta é uma das justificativas para se discutir como as diretrizes da política do Sinaes vêm induzindo ou meramente controlando a qualidade da educação superior no país, notadamente no que nos interessa aqui, em relação ao curso de Pedagogia. Trata-se,

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portanto, de buscar os sentidos e alcances da avaliação para a qualidade, como nos alerta Dias Sobrinho (2008):

A avaliação educativa deve ser uma produção de sentidos sobre o cumprimento, pelos sistemas e pelas instituições, das finalidades de formação de cidadãos, aprofundamento dos valores democráticos da vida social, e elevação material e espiritual da sociedade. Avaliação é produção de sentidos, prática social, portanto, intersubjetiva, relacional, aberta, polissêmica e carregada de valores, que põe em questão os significados dos fenômenos. (p. 193 )

Na próxima seção veremos como tem sido avaliada a qualidade dos cursos de Pedagogia no país, considerando seus resultados nos ciclos avaliativos já mencionados.

Conceito Enade dos cursos de Pedagogia nos ciclos avaliativos de 2005, 2008 e 2011

Antes da apresentação e análise dos conceitos Enade do curso de Pedagogia no Brasil, nos ciclos avaliativos do Sinaes, é importante que vejamos o que dizem os números sobre a evolução desses cursos entre 2004 e 2013.

TABELA 1 – Evolução do número de cursos de Pedagogia no Brasil, no período entre 2004 e 2013, por dependência administrativa

AnoPública

Privada Total GeralFederal Estadual Municipal

2004 153 466 38 780 1.437

2005 159 484 39 842 1.524

2006 164 495 36 867 1.562

2007 167 510 40 1.050 1.767

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2008 176 350 40 1.070 1.636

2009 156 245 36 928 1.365

2010 204 315 47 1.219 1.785

2011 199 288 60 1.137 1.684

2012 208 368 82 1.066 1.724

2013 187 345 79 1.026 1.637Fonte: Censo da Educação Superior (Inep 2014).

Os dados da tabela 1 revelam um movimento inconstante em relação ao crescimento e à diminuição do número de cursos de Pedagogia no referido período. Nas instituições privadas, o aumento do número dos seus cursos mostra-se crescente entre 2004 e 2008, mas, a partir deste último ano, há uma queda se mantém até 2013, com exceção do ano de 2010, em relação a 2009. Nesse setor, a maior retração dos cursos em análise deu-se no biênio 2008/2009, quando houve uma redução de 142 (cento e quarenta) cursos, correspondendo a 13,2%. Nas IES federais, entre 2012 e 2013, houve um decréscimo de 20 (vinte) cursos (11,3%), enquanto nas estaduais a redução foi bastante expressiva – 105 (cento e cento) cursos, visto que passou de 350 para 245, no mesmo intervalo, equivalendo a 30%. No caso das municipais, a redução foi menor, passando de 40 para 36 cursos (10,0%).

Os dados permitem afirmar, também, que o quantitativo de cursos de Pedagogia ofertados no país, a partir do ano de 2004 apresenta uma oscilação, ora para mais, ora para menos, o que pode ser verificado tanto nas instituições públicas quanto naquelas vinculadas ao setor privado. Como vimos, o ano de 2009 é marcado pelo menor número de oferta de cursos, enquanto 2010 apresenta um aumento de 22,7% no setor público e 23,8% na esfera privada, o que corresponde, respectivamente a 437 e 566 cursos. Todavia, a partir daí observa-se um decréscimo consecutivo até o ano de 2013 no setor privado e uma oscilação na república de aproximadamente 13% para mais ou para menos.

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Da tabela anterior recortamos os dados relativos apenas ao número de cursos de Pedagogia que participaram do Enade nos três ciclos avaliativos de interesse para o presente estudo. Desses dados algumas revelações são importantes para a compreensão da avaliação da qualidade dos cursos de Pedagogia, como revela a próxima tabela.

TABELA 2 – Número de cursos de Pedagogia participantes do Enade 2005, 2008 e 2011 – Brasil e regiões

Brasil e RegiõesAno

2005 2008 2011

Total 891 1.176 1.149

Norte 72 85 67

Nordeste 135 237 218

Sudeste 390 503 517

Sul 180 220 229

Centro-Oeste 114 131 118Fonte: MEC/Inep/Daes – 2005, 2008, 2011 (2012).

Uma primeira constatação diz respeito à tendência de um comportamento igual nos dados, quando se comparam os resultados do Enade no ano 2005 (primeiro ciclo avaliativo) com o Enade dos dois próximos ciclos (2008 e 2011). Dentre as tendências convergentes nas cinco regiões do país, destaca-se o aumento do número dos cursos de Pedagogia, o que se explica, em grande parte, pela adesão das instituições à modalidade da educação a distância. Além disso, é importante considerar a ampliação da oferta nas instituições privadas, mediante as políticas de financiamento estudantil. No caso das públicas, isso se deve às políticas de expansão e interiorização.

Mais recentemente, ao promover um balanço das ações desenvolvidas entre os anos de 2003 e 2014 para a educação superior, o Ministério da Educação define qualidade assim:

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Pode-se definir a qualidade como o atendimento a padrões mínimos de infraestrutura, recursos humanos, conhecimentos produzidos e transmitidos e integração com a comunidade, de forma que a universidade atenda às suas finalidades nos âmbitos do ensino, pesquisa e extensão. (Brasil, 2014, pp. 26-27)

Considerando esse conceito de qualidade apresentado pelo poder público, vejamos, a seguir, um panorama mais amplo da avaliação da qualidade dos cursos de Pedagogia no período eleito para estudo. Sendo assim, embora seja importante conhecer o número de cursos de Pedagogia com conceito Enade 4/5 nos três ciclos avaliativo, é necessário chamar a atenção para a expressiva quantidade de cursos com conceito 3, bem como com conceitos 1 e 2.

TABELA 3 – Conceitos dos Cursos de Pedagogia no Enade 2005, 2008, 2011 – Brasil (2012).

Conceitos 2005 2008 2011

1 13 28 24

2 87 201 193

3 373 441 403

4 160 239 188

5 12 36 28

SC 246 231 158

Total Geral 891 1.176 994

Fonte: Planilha com resultados Enade fornecidas pela CGCQES/DAES.

Ao analisar a Tabela 3, tem-se que nos anos de 2005, 2008 e 2011, respectivamente, 100, 229 e 217 cursos com resultados 1 e 2 (insatisfatório). Diante desses resultados, é importante lembrar que o advento do Conceito Preliminar de Curso (CPC), em 2008, implicou a dispensa de avaliação in loco para os cursos com resultados 3 (satisfatório), 4 e 5. Observe-se que os cursos de Pedagogia, com conceitos Enade 1 e 2, acrescidos dos cursos Sem

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Conceito (SC), respectivamente, 231 e 16, foram obrigatoriamente submetidos à visita de avaliação.

Note-se que em 2009, após a divulgação do resultado do Conceito Enade, todos os cursos de Pedagogia com resultado insatisfatório foram submetidos a processo de supervisão. Em 2012, por meio do Despacho nº 205, de 5 de dezembro de 2013 (Brasil 2013), a Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior/Ministério da Educação, firmou Protocolo de Compromisso (PC) com todos os cursos que tiveram curso com CPC insatisfatório em 2011.

No que tange aos totais de cursos existentes nos três períodos avaliativos, cujos conceitos do Enade permaneceram em 4 e/ou 5, mostrados na mesma tabela, alguns comentários merecem ser feitos. Isto porque os dados expressam os percentuais de cursos que alcançaram esses dois conceitos respectivamente, em 2005, 2008 e 2011 – 19,3%; 23,4% e 21,7%. Outra tendência revelada na tabela é uma aproximação dos percentuais em cada conceito, período por período. Todavia, é importante destacar que do período de 2008 para 2011 houve uma queda de 21,3% de cursos de Pedagogia com conceito 4, e 22,2% com conceito 5. Nesse último caso, é razoável supor que isso foi influenciado pela redução de cursos avaliados.

Com efeito, no Brasil, o campo da educação superior é marcado pela diversidade e heterogeneidade institucionais, considerando que nele atuam estabelecimentos com perfis, vocações distintas e distribuição espacial bastante variada. Não restam dúvidas de que sua evolução no país mostra que ele “tem se constituído em um campo acadêmico de extrema complexidade, envolto por uma expressiva heterogeneidade institucional, extensiva tanto à esfera privada quanto à pública” (Sousa 2006, p. 161).

Todavia, isso não pode deixar de se considerar que o país possui uma política de avaliação de educação superior instituída para todo o Sistema Federal de Ensino (SFE), que compreende as instituições mantidas pela União e aquelas mantidas pela iniciativa privada, conforme disposto no art. 16 da LDB n° 9.394/96 (Brasil 1996).

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Por isso, ponderamos que, ainda que o total de cursos de Pedagogia seja bastante expressivo no país, torna-se preocupante o pequeno quantitativo daqueles que conseguem atingir os conceitos 4 e 5 do Enade. A qualidade dos cursos ofertados é uma questão que merece maiores investigações, diante dos resultados apresentados. Os dados do Gráfico 2, a seguir, mostram em 2005 um percentual de 10% dos cursos com melhores avaliações, no ano de 2008 um percentual de 13,2% e, no ano de 2011, uma redução para 9,3%. Dessa forma, percebe-se um visível decréscimo no total de cursos de Pedagogia supostamente com qualidade, no país.

GRáFICO 2 – Relação entre o total de cursos de Pedagogia entre 2004/2013 e cursos com Enade 4 e 5

Fonte: planilha com resultados Enade fornecidas pela CGCQES/DAES.

Os dados mostrados no Gráfico 2 permitem perceber que, entre 2008 e 2009 ocorreu diminuição de 271 (duzentos e setenta e um) cursos. É importante frisar que isso acontece exatamente quando estavam sendo executadas as recomendações da Resolução CNE/CP nº 1/2006 (Brasil 2006), no que tange ao ajustamento

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dos cursos de Pedagogia e à extinção de Normal Superior, como comentado anteriormente.

É importante destacar que Curso Normal Superior participou do Enade 2008, todavia, não há dados que permitem afirmar, ao certo, em que medida foram efetivamente transformados em cursos de Pedagogia, com base na prerrogativa fixada pela referida Resolução.

No período considerado no presente estudo, um grupo de apenas 48 (quarenta e oito) cursos de Pedagogia obtiveram conceitos Enade 4 e 5, nos três ciclos avaliativos – lembrando 2005, 2008 e 2011. Quando se aprofunda a análise da distribuição desses 48 cursos pelos critérios de natureza administrativa e organização acadêmica das instituições que os ofertam, algumas revelações merecem ser comentadas. A próxima tabela mostra a distribuição dos cursos em questão sob essa dupla perspectiva.

TABELA 4 – Distribuição dos 48 cursos de Pedagogia com Enade 4 ou 5, por organização acadêmica e dependência administrativa

Organização

Acadêmica

Público Privado Total Geral

N % N % N %

Centro Universitário 0 0 3 13,6 3 6,2

Faculdade 0 0 3 13,6 3 6,2

Universidade 26 100,0 16 72,7 42 87,5

Total geral 26 100,0 22 100,0 48 100,0

Total geral % por

dependência

administrativa

54,2 - 45,8 - 100,0 -

Fonte: planilha com resultados Enade fornecidas pela CGCQES/Daes/Inep.

Como mostra a Tabela 4, de fato, é baixo o total de cursos que, se entendidos os conceitos 4 e 5 como qualidade, podem ser considerados de qualidade, distribuídos nas várias regiões do país. Em termos percentuais, isso corresponde a apenas 2,8% dos

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ofertados no país, em 2011, quando se tem em mente que o total de cursos avaliados, nesse ano, foi de 1.684, conforme mostrado na Tabela 1.

É importante observar a predominância das instituições públicas sobre aquelas vinculadas ao setor privado. Nas públicas – todas elas universidades – se concentram 54,2% dos cursos de Pedagogia melhor conceituados (26), enquanto as instituições privadas apresentam 45,8%, corresponde a um total de 22 (vinte e dois) cursos, estando 16 deles situados em universidades, restando apenas 3 desses cursos para as faculdades e outros 3 para os centros universitários. Do ponto de vista da organização acadêmica, 42 cursos dos 48 com conceitos Enade 4/5 nos três ciclos avaliativos estão concentrados em universidades (87,5%).

Do ponto de vista da distribuição regional, dos 48 cursos de Pedagogia com conceitos 4 e 5, nos três ciclos avaliativos, verificamos que a maior parte deles se concentra na Região Sudeste (23), correspondendo a quase metade deles (47,9%), seguida da Região Sul com 15 (31,3%) e da Região Nordeste, que tem 9 desses cursos (18,8%). A Região Centro-Oeste aparece com apenas 1 (um) curso, correspondendo a 2,1% do total, enquanto a Região Norte não apresenta nenhum desses cursos (Fonte: planilha com resultados Enade fornecidas pela CGCQES/Daes/Inep).

Considerações finais

Como sinalizado no título deste trabalho, o estudo nele relatado foi realizado visando estabelecer relação entre formação de professores e avaliação da qualidade da educação superior, com foco nos cursos de Pedagogia que participaram dos ciclos avaliativos de 2005, 200 e 2011. Nessa direção, a reflexão apresentou os conceitos Enade desses cursos, mapeando aqueles considerados de alta alidade, conforme os padrões oficiais do governo, além de abordar a questão de sua distribuição por natureza acadêmica,

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organização acadêmica das instituições que os ofertam, bem como as regiões nas quais esses mesmos cursos estão distribuídos.

A reflexão partiu da tese de que, embora a política do Sinaes institua que o conceito oficial de qualidade adotado na avaliação da educação superior no Brasil deva mostrar-se associado a uma constelação de fatores, o conceito Enade tem ganhado centralidade no processo, notadamente no que diz respeitos à avaliação dos cursos. Em decorrência disso, ainda que o trabalho tenha apresentado uma visão panorâmica dos cursos com conceitos Enade do curso de Pedagogia, nos três ciclos avaliativos, identificou aqueles apontados como de alta qualidade, portanto, os que obtiveram conceitos 4 e 5.

Foram identificados apenas 48 (quarenta e oito) cursos de Pedagogia que tiraram os melhores conceitos nos três ciclos avaliativos do Enade – 4 e 5. Diante de resultados como estes, é preciso reconhecer o quanto precisamos ainda avançar na formação dos pedagogos brasileiros. Trata-se, enfim, de combater problemas históricos na realidade educacional do país, quando se focaliza a formação desses profissionais para atuar na educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental. Por outro lado, resta-nos perguntar: como aceitar que a qualidade seria a fotografia instantânea refletida pelo resultado de uma única avaliação, no caso o Enade?

Oportunamente, cabe registrar que, embora o Enade, como um dos componentes do Sinaes, venha se consolidando como métrica eficaz de qualidade, sua compreensão e validade requer associação a outros indicadores, razão pela qual sugerimos outros estudos que avancem para além do que relatamos neste artigo.

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3acerca de la Formación docente en argentina: sumando aportes a su conFiguración

Lydia María AlbarelloGraciela María Elena Fernández

Introducción

La formación de docentes se presenta como un campo − dentro de las disciplinas que se ocupan de la educación − que se ha ido construyendo con una cierta especificidad que contempla diversidad de saberes. En el caso de Argentina una de las características principales e históricas del sistema de formación docente es su naturaleza dual, es decir, la formación se desarrolla en dos subsistemas: los institutos de formación docente y las universidades. Uno de los estudios más recientes sobre la temática es el elaborado por Andrea Alliaud y Silvina Feeney, en el año 2014, y da cuenta de un análisis focalizado en un conjunto de políticas educativas recientes que buscan superar esa dualidad. Como resultado, plantean que más allá de la puesta en marcha de políticas tendientes a sortear las diferencias entre los subsistemas de formación, éstas se mantienen.

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Estos dos circuitos formativos tienen características y tradiciones diferenciadas que se asocian a lógicas fundantes y que en el caso del modelo universitario se ha caracterizado por dar prioridad a la formación académica en detrimento de la formación pedagógica que generalmente aparece en el último año de la carrera o como una orientación. En algunos casos esta característica tiende a superarse a partir de los cambios en los planes de estudio de los profesorados que se vienen dando en los últimos años.

Siguiendo a las autoras, en los últimos veinte años y a partir de los nuevos sentidos que adquieren en las sociedades actuales la construcción de ciudadanía, de acceso a los conocimientos y formación de capacidades se asiste, en numerosos países de la región, a movimientos de transformación de los sistemas educativos que posibiliten el mejoramiento de la enseñanza, el aprendizaje y las trayectorias escolares. Es así que se torna crucial tanto la relevancia de la educación como la formación inicial y permanente de los docentes y la práctica profesional.

En un breve recorrido histórico plantean el salto cualitativo de las últimas décadas,

Los años noventa fueron prolíficos en reformas y transformaciones de la formación docente. Sin embargo, al mismo tiempo que los maestros y profesores fueron considerados actores clave de dichas políticas, se nota una tendencia a la descualificación que erosionó su imagen pública. La referencia a las “carencias” de su formación, las debilidades de su desempeño y su inadecuación a los desafíos actuales de la escolarización […], fueron algunos de los componentes centrales del discurso político de la década. En este contexto de gobiernos neoliberales, crisis económicas, achicamiento de los Estados y de su rol regulador, se implementaron diversas políticas de mejora. […]. Los principales cambios operados apuntaron a profesionalizar, elevar la calidad e intensificar la duración de los estudios de la formación inicial; al mismo tiempo se planteaba “la reconversión” de los docentes en servicio. A tal fin se intervino desde una lógica instrumental, basada en la racionalización y el control técnico, que

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priorizó los objetivos de las reformas actuando de manera unidireccional “de arriba − abajo”. […]. El denominado movimiento de profesionalización del trabajo docente durante las reformas de los noventa, instaló una agenda de temas y una serie de medidas y procesos, entre los cuales se encuentran: la prolongación de la formación docente inicial; la proliferación de tipologías docentes definidas a partir de listados de competencias, dominios o habilidades profesionales; la implementación de mecanismos nacionales de evaluación del desempeño; el establecimiento de requisitos para ascender en la carrera docente; la aparición de nuevas ofertas de formación y postítulos; las políticas de fortalecimiento y mejoramiento de la calidad de las instituciones y, junto con todo ello, nuevas formas de gobierno y procedimientos de gestión de las instituciones formadoras. (Alliaud y Feeney 2014, p. 127)

En cuanto al estado de la cuestión en los países de la región diversos estudios coinciden en que en los últimos años casi todos los países latinoamericanos impulsaron transformaciones que llevaron a un escenario educativo actual bastante más favorable que el de décadas pasadas. Por su parte, Alliaud y Feeney (2014) refieren a un cambio político e institucional importante en varios países de la región, que aunque retoma algunos puntos de la agenda planteada en la década anterior, se diferencia en las orientaciones y principios que lo sustentan. En el caso de la docencia, se plantean desafíos específicos debidos, entre otras cuestiones, a la constante expansión de la cobertura, a la necesidad de apuntalar la calidad de los sistemas educativos latinoamericanos, a los imperativos de la democratización y al logro de mayores niveles de equidad educativa. Sin embargo, Vaillant (2004) sostiene desde hace algunos años que en la práctica, las realidades educativas han probado ser difíciles de transformar. Persisten las desigualdades respecto a la distribución de oportunidades educativas y el rendimiento de los alumnos sigue siendo bajo. Y una de las problemáticas principales con que se enfrenta el sector educación en la actualidad es cómo mejorar el desempeño de los docentes y profesores.

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Por otra parte, los trabajos referidos coinciden en señalar que las propuestas de formación docente tradicionales ya no alcanzan pero también evidencian que no es simple determinar cuáles son los cambios más adecuados y mucho menos cómo gestionar su puesta en práctica.

En cuanto al desarrollo del subsistema universitario, en las últimas décadas, la universidad argentina ha vivido tiempos de cambio; ha habido, y sigue habiendo, cambios en el marco normativo que rige su funcionamiento, ha habido reformas de los planes de estudio y en su organización, han surgido nuevas y variadas carreras, en parte como consecuencia de los profundos cambios sociales. En el marco de las universidades públicas, en la Facultad de Ciencias Humanas de la Universidad Nacional del Centro de la Provincia de Buenos Aires se dictan cuatro profesorados: Ciencias de la Educación, Educación Inicial, Historia y Geografía, que han ido modificando, con diferente periodicidad, sus planes de estudio y su estructura organizacional, así como sus planteos didácticos. Estas revisiones curriculares y didácticas, necesarias para adecuarse a los cambios que se han producido en la sociedad, no parecen ser lo suficientemente profundos para responder a las demandas de esta creciente sociedad del conocimiento, en la que las formas de gestionar socialmente el saber han ido modificándose.

Los procesos de enseñanza y de aprendizaje en el ámbito universitario

Las controversias que hoy enfrenta la sociedad, acerca de la calidad de los sistemas educativos y de formación docente, intensifica la preocupación por la reforma de los mismos, por la búsqueda de nuevas formas de concebir el currículo y nuevos modos de entender los procesos de enseñanza y de aprendizaje. El desafío para los profesores es preparar a los estudiantes, futuros docentes, para afrontar la sociedad actual, en la era de la información y en un tiempo de incertidumbre.

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Algunas de las cuestiones críticas que los resultados de estudios realizados en América Latina (Cámpoli 2004; Cuenca 2004; Pogré 2004) muestran que, en general, las instituciones formadoras le ofrecen al futuro docente una visión conceptual y teórica relacionada con orientaciones, corrientes y teorías pedagógicas y científicas que en su conjunto no guardan relación con el aspecto práctico de las dificultades y situaciones conflictivas que enfrentará el graduado en la cotidianidad del trabajo docente. Por esto, el verdadero aprendizaje de la profesión se produciría en el devenir del ejercicio profesional, que a veces se hace con distorsiones de los procesos pedagógicos; a ello se debe la práctica repetitiva, memorística, de dictados y de copia que proponen muchos maestros y profesores, en la que no hay un desarrollo de la inteligencia, ni de ningún proceso de aprendizaje y crecimiento personal.

En el marco de la complejidad del sistema formador seleccionamos algunos factores vinculados a la tarea articulada de profesores y alumnos que entendemos relevantes en vistas del mejoramiento de la formación docente en tanto proveedor de profesores para el sistema educativo.

El lugar del conocimiento…

La hoy llamada sociedad del conocimiento se refiere al tipo de sociedad que se necesita para competir y tener éxito frente a los cambios económicos y políticos del mundo moderno. Según la Or-ganización de Estados Americanos (2006), “el desarrollo y el acceso universal y equitativo a la Sociedad del Conocimiento constituye un desafío y una oportunidad que ayuda a alcanzar las metas sociales, económicas y políticas de los países de las Américas”. La sociedad del conocimiento tal como la estamos describiendo requiere personas con capacidades acordes a las exigencias del nuevo escenario y, por lo tanto, en este contexto también le está reclamando cambios a los siste-mas educativos. Las habilidades y competencias que se requieren

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para la creación de nuevos conocimientos, como la solución de problemas, la comunicación, la colaboración, el espíritu crítico y la expresión creativa deben considerarse dentro de los objetivos de los planes de estudios. La escuela del siglo XXI necesita docentes que organicen procesos de aprendizaje, ayuden a los estudiantes a adquirir estrategias cognitivas, y estructuren situaciones en las que éstas puedan aplicarse.

El saber es cada vez más inabarcable. Las facilidades de comunicación y distribución del saber en nuestra sociedad global, unidas a la multiplicación de los centros de producción del conocimiento, hacen muy difícil la selección de contenidos que constituyen el currículum de las diferentes materias, incluso en un ámbito de investigación específico. Cada vez es más complicado saber que conocimientos hay que incluir en una materia, seleccionar los contenidos que constituyen el currículo de las diferentes asignaturas e incluso la misma selección de esas asignaturas.

Los alumnos, como futuros profesionales de producción, distribución y gestión social del conocimiento, deberían estar en condiciones de construir criterios para decidir la validez de un saber teórico o práctico en una situación dada, es por ello que hay que formarlos para actuar con autonomía, para que dispongan de capacidades que les permitan justificar esos saberes, lo que sin duda les exige que conciban esos conocimientos en el marco de un proceso de construcción social y no como productos acabados. Sin duda, será mejor docente el que conociendo el contexto en el que le toque trabajar tome las decisiones más adecuadas.

El lugar de la enseñanza y del aprendizaje…

Los docentes de los profesorados, que tengan como objetivo formar estudiantes universitarios capaces de enseñar a aprender y a pensar a sus futuros alumnos, deberían proponerse modalidades de trabajo acordes a las que se espera que los jóvenes empleen en su futuro ejercicio profesional. Cada vez se propende más a formar

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profesionales capaces de enfrentarse a los problemas complejos de nuestro mundo a través de visiones pluridisciplinares. Sin embargo, en nuestras universidades permanece la separación radical entre los saberes teóricos de cada disciplina.

El aula universitaria, quizá como ningún otro espacio institucional, revela con claridad cómo se atraviesan en las prácticas cotidianas los aspectos intrínsecos a la formación, articulados con las otras funciones históricas de la institución, la producción del conocimiento y las relaciones que se establecen con el contexto social del que forman parte. Las acciones que desarrolla el docente en torno de la programación curricular, la enseñanza, la evaluación, sus formas relacionales con los estudiantes, manifiestan, cotidianamente, si se tiene en consideración o no, lo producido, tanto por la investigación disciplinar como por la investigación pedagógica, los problemas de la profesión y los avances en el campo profesional específico.

Por otra parte, se trata de contribuir al mejoramiento de las prácticas docentes universitarias, lo que redundará en una mejor calidad de formación del estudiante, futuro docente; contribuir a la comprensión de los factores de la enseñanza universitaria, que luego puedan ser tenidos en cuenta para el diseño de propuestas que apunten al mejoramiento de la actividad docente, y promover y mejorar los procesos de enseñanza y de aprendizaje, para la formación de recursos humanos de calidad en el ejercicio de la tarea docente.

La formación de los nuevos docentes parece requerir la transformación de un currículo disciplinar de acumulación de datos a un currículo abierto y flexible, basado en situaciones reales que reflejen la complejidad actual. La preparación del profesorado ante las actuales exigencias sociales requiere cambios en los modos tradicionales de formación en la educación superior: docentes expertos en sus respectivos ámbitos de conocimiento que sean al mismo tiempo comprometidos y competentes para acompañar el aprendizaje relevante de los estudiantes. La enseñanza que no consigue provocar aprendizajes en todos y cada uno de los alumnos pierde legitimidad social y profesional.

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Es así que, la tarea del docente no debe consistir sólo en enseñar contenidos disciplinares descontextualizados, sino en definir y plantear situaciones en las cuales los alumnos puedan formar y desarrollar sus capacidades, es decir, construir, modificar y reformular de manera crítica y creativa sus conocimientos, actitudes, creencias y habilidades.

En cuanto al aprendizaje, Díaz Barriga y Hernández (1999) sostienen que los alumnos, como futuros profesionales de producción, distribución y gestión social del conocimiento, deberían construir criterios para decidir la validez de un saber teórico o práctico en una situación dada. Es decir, hay que formarlos para actuar con autonomía, para que dispongan de criterios que les permitan justificar esos saberes, lo que sin duda exige que conciban esos conocimientos en el marco de un proceso de construcción social y no sólo como productos acabados. Asumir el carácter constructivo del conocimiento requerirá de los alumnos adoptar esa perspectiva constructivista como vía de acceso al conocimiento y, en lo posible, participar de los procesos mediante los que se construye o produce el conocimiento en nuestra sociedad; en suma, vincular el aprendizaje y la enseñanza con la investigación científica.

En la formación de los futuros docentes, el aprendizaje autónomo es la posibilidad que tienen los estudiantes para dirigir, organizar, controlar y evaluar su forma de aprender de manera consciente e intencionada, con estrategias que le permitan lograr el objetivo deseado. Esto se expresa en el saber aprender a aprender, lo que implica la capacidad de reflexionar sobre “cómo” se aprende, autoregulando el propio proceso de aprendizaje a través del uso de estrategias flexibles y apropiadas que puedan ser transferidas y adaptadas a nuevas situaciones (Díaz Barriga y Hernández 1999).

De manera similar, Monereo (1998[2000]) considera que aprender a aprender le permite al estudiante ser cada vez más consciente de su proceso de cognición, de sus propios procesos mentales, sobre “cómo” se aprende y con control del dominio cognitivo sobre su forma de aprender. La estrategia de aprender a aprender es una alternativa para enfrentarse a las complejas

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exigencias del mundo actual, que demandan a los docentes seguir aprendiendo en la formación continua, a efectos de alcanzar un ejercicio profesional cada vez más acorde con las necesidades de la sociedad.

La formación del profesorado que tenga como meta un trabajo formativo de enseñar a aprender y a pensar a sus estudiantes debería plantearse a partir de los mismos principios, empleando métodos y actividades similares a las que se espera que los futuros docentes empleen en su ejercicio profesional, capaces de enfrentarse a los problemas complejos de nuestro mundo a través de visiones pluridisciplinares. Sin embargo, en nuestras universidades permanece la separación radical de las temáticas propias de las diferentes asignaturas que se desarrollan, en general, teniendo como objetivo la adquisición del conocimiento teórico y no la forma en que es aprendido.

Asimismo, sería relevante revisar nuestras prácticas de enseñanza apuntando a la tarea de plantear problemas a los estudiantes, a partir de los cuales sea posible reelaborar los contenidos seleccionados, y brindar la información necesaria para que avancen en la reconstrucción de esos saberes, dando lugar a la producción de conceptualizaciones que se aproximen al conocimiento y a “cómo” alcanzarlo.

El lugar de la práctica…

Las indagaciones realizadas en nuestras investigaciones (Albarello, Rímoli y Spinello 2013a, 2013b), nos llevan a profundizar el estudio, por un lado, de las características y condiciones en que se desarrollan los espacios de práctica pre-profesional y por otro lado, qué es lo que la experiencia de formación está generando en los alumnos respecto a las representaciones de su futura práctica profesional docente. En general, en la universidad se tiende a aproximarse más a las cuestiones teóricas, no reparando siempre en que las conceptualizaciones tienen sentido si están arraigadas

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en las prácticas y en la reflexión sobre ellas, en la investigación y el que hacer profesional.

Se consideran importantes la articulación entre la formación teórica y la formación práctica, aunque muchas veces transiten por caminos diferentes. Parece necesario propiciar zonas que vinculen temas que se tratan en diferentes asignaturas, así como con los requerimientos sociales y con otros saberes.

Es un desafío generar en los estudiantes un reconocimiento de sus capacidades, que les permita acomodarse a las diferentes realidades de ejercicio profesional, con reglas ya instituidas, a la vez que sostener una conciencia autónoma que los ubique en un lugar de reflexión y que propicie los cambios posibles. Al respecto Schön (1991[1992]) plantea que

Quizá aprendamos a reflexionar en la acción, aprendiendo primero a reconocer y a aplicar reglas, hechos, y operaciones estándar, luego, a razonar sobre los casos problemáticos a partir de reglas generales propias de la profesión, y sólo después llegamos a desarrollar nuevas formas de conocimiento y acción, allí donde fracasan las categorías y las formas familiares de pensar. (Schön 1991[1992, pp. 47-48])

Para que la universidad pueda cumplir sus tareas académicas e investigativas en la formación de futuros docentes, requiere de profesores que no sólo sepan el contenido científico sino que sepan enseñar, de aquí la necesidad de promover en los docentes el valor de la enseñanza, para que los estudiantes aprendan a aprender, así como la relevancia de contribuir a prepararlos adecuadamente en el ejercicio responsable de su actividad docente futura. Asimismo, todo profesor universitario debería ser además de especialista en los contenidos de su materia, especialista en la mejor forma de aprender − y seguir aprendiendo en el futuro − esa materia (Pozo y Monereo 1999).

Por otra parte, al considerar que los sujetos van construyendo las representaciones que orientarán las decisiones y las prácticas

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de enseñanza donde “ponen en juego” diferentes saberes que han construido en su historia, es que creemos necesario recuperar el concepto de formación docente como trayecto. En tal sentido, Anijovich et al. (2009, p. 28) expresa:

El trayecto de formación es entendido como un proceso que se inicia mucho antes del ingreso a la institución formadora, y en el que se pueden identificar diferentes momentos o etapas de impacto, como la biografía escolar, que es producto de complejas internalizaciones realizadas en la vida del alumno, la etapa de preparación formal institucionalizada de la formación docente, la socialización profesional y la capacitación docente continua.

El proceso de formación es pensado como una tarea continua, en la que la acción docente sea un proceso de construcción individual y social que tienda a la transformación social, a través de docentes preparados, capaces de recrearse responsable y creativamente. Por ello consideramos que, más allá de formular propuestas formativas que promuevan una inclusión en la actividad práctica desde el comienzo de la carrera, es necesario articular las prácticas, con los aportes teóricos, problematizar las situaciones en el contexto escolar y revisarlas a la luz de un trabajo conceptual sistemático. No sólo es necesario que la formación tenga a la práctica como eje, sino que sea un proceso de construcción a lo largo de la carrera.

Un proceso paulatino, que inserte a los estudiantes en las instituciones educativas dotados de las herramientas necesarias para realizar un análisis fundamentado de la realidad de cada nivel educativo en el que realicen sus prácticas, para conocer y analizar esa realidad a la luz de los conocimientos que aportan las disciplinas. Y a su vez, una formación que avance en una reconceptualización del conocimiento que los futuros profesores necesitan tener como conocimiento fundamentado, es decir, redefinir qué se entiende por conocimiento profesional y cómo es utilizado; que recupere el conocimiento práctico (en la práctica, para la práctica y de la práctica) (Edelstein 2011).

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En los profesorados de la Facultad de Ciencias Humanas debido, entre otras cuestiones, a las demandas de los organismos nacionales en el proceso de acreditación de las diferentes carreras, se propende a que la inclusión de los alumnos en los espacios de la práctica pre-profesional se realice desde los primeros años de la carrera, abriendo nuevos ámbitos de interés acerca de sus previsiones, principios y reglas de actuación. Sin dejar de considerar la acción de los docentes, es necesario que los estudiantes sean capaces de internalizar, desarrollar y construir criterios propios y compartidos y utilizar los más válidos en cada una de las situaciones en que les toque actuar.

Tendencias y perspectivas que aportan a los procesos de formación en pos de la profesionalización del trabajo docente

El proceso de formación es pensado como una tarea continua, en la que la acción docente permita una construcción individual y social que tienda a la transformación social, a través de docentes preparados, capaces de recrearse responsable y creativamente. A su vez, tanto los docentes universitarios como los alumnos, futuros docentes, son y serán los encargados de impulsar y viabilizar los cambios necesarios que la sociedad demande.

Por otra parte, la formación docente se presenta como un desafío que requiere diseñar propuestas que “creen condiciones para favorecer la capacidad de los estudiantes (futuros profesionales de la educación), de reflexionar sobre sus prácticas de enseñanza, utilizando sus conocimientos prácticos” (Anijovich y Cappelletti 2014, p. 14), dotando de sentido teórico y conceptual los saberes prácticos construidos por la experiencia.

Desde la perspectiva de la enseñanza, promover la elaboración por parte de los estudiantes de herramientas conceptuales que les permitan operar con autonomía se presenta como una afirmación compartida ya que enseñar en una tarea difícil que requiere de profesionales autónomos (Lerner,

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Stella y Torres 2009). Proponer una apropiación real de los conocimientos disponibles les permitiría a los estudiantes asumir la responsabilidad de sostener y progresar en las transformaciones que se dan durante su formación y su práctica. Asimismo, resulta necesario poner en primer plano el sentido de la enseñanza generando espacios de planificación, discusión y reflexión.

Entonces, qué condiciones generar para que desde el espacio de formación los estudiantes construyan su participación dentro de una comunidad profesional. Recuperando las palabras de Lerner, Stella y Torres (2009) referidas a la formación continua coincidimos en que

para enseñar los docentes necesitan asumir un proyecto de estudio dirigido a ampliar y profundizar permanentemente sus conocimientos, necesitan reflexionar sobre la práctica (…), necesitan construir criterios para fundamentar sus decisiones al trabajar con diferentes grupos, en distintas situaciones sociales…Necesitan asumir la docencia como profesión, es decir, como una práctica que requiere previsión, reflexión, intercambio con colegas, comunicación y discusión de experiencias, estudio constante de aportes teóricos que contribuyan a enriquecerla y profundizarla. (Lerner, Stella y Torres 2009, p. 20)

Desde la perspectiva de algunos de los especialistas relevados se plantea que, si bien las políticas sobre la profesionalización de la docencia resultan prioritarias, no pueden considerarse como las responsables exclusivas de los procesos de mejora y transformación educativa. Para Alliaud (2010, p. 22),

una política educativa que no atienda en forma simultánea “distintos frentes” corre el riesgo de evadir la complejidad estructural que caracteriza a los procesos de escolarización y contribuir así, a perpetuar la situación que intenta modificar. Subiendo aún más la apuesta, podría decirse que las políticas sectoriales harán agua si no van acompañadas de decisiones que den respuesta a

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los problemas económicos y sociales que caracterizan a nuestras sociedades

Siguiendo a esta autora queda pendiente lograr un sistema formador de docentes y profesores que incluya a las distintas instituciones superiores formadoras − institutos de formación docente y universidades −, a la formación inicial o de grado, así como a la formación continua, y que considere las necesidades del sistema educativo para el que se forma, particularmente en lo vinculado con las características de los puestos de trabajo para los que forma. Otros desafíos lo constituyen el establecimiento de una carrera docente que supere las formas piramidales y verticales que la caracterizan en el presente y la articulación del sistema superior, entre la formación terciaria y universitaria.

Desde la mirada de las políticas educativas públicas, Feldfeber (2010) considera que, en los últimos años en nuestro país, la propuesta de desarrollo profesional docente toma como punto de partida el escenario heterogéneo y fragmentado que caracteriza a la formación docente, proponiendo como objetivo “construir unidad sin uniformidad” entre otros. Ahora bien, cierra su presentación preguntándose

¿Estamos asistiendo a nuevos modos de construcción de la política pública tendientes a la articulación de un sistema formador en el marco de un país formalmente federal o a la persistencia de la definición de políticas en forma centralizada y heterónoma por expertos que no logran impactar en la capacidad instalada en las jurisdicciones ni en los procesos de formación y en la cultura de las instituciones formadoras? (Feldfeber 2010, p. 29)

A modo de cierre

Al cerrar provisoriamente este trabajo es posible afirmar que asistimos a una creciente preocupación del colectivo docente

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del nivel superior por mejorar la formación de nuestros estudiantes y, en menor medida, por participar activamente de las políticas educativas.

Tal como plantea Souto (2009), “la formación requiere un proceso de autorización de nosotros mismos y del otro”. Esa autorización está vinculada con la autonomía, la responsabilidad y la convicción fundamentada del propio quehacer, siempre en relación con el otro, en una relación recíproca, que no podemos dejar de considerar desde nuestro lugar como docentes, partícipes en la formación de nuestros estudiantes. Y a su vez, desde sus propósitos la formación y el desarrollo profesional se conciben como una actividad permanente y articulada con la práctica concreta de los docentes y “orientada a responder a las necesidades del profesorado y a sus contextos de actuación, contemplando la heterogeneidad de trayectorias, necesidades, situaciones y problemas de enseñanza y aprendizaje” (Feldfeber 2010, p. 29)

Podemos construir un porvenir juntos, pensando que puede ser mejor que el presente y el pasado. Instalar el debate en torno a estos temas de la formación de docentes que nos permitan mejorar, sin evadir los dilemas a los que nos enfrentamos desde nuestra propia tarea docente, en la lucha por el reconocimiento del deseo de aprender y el poder de enseñar, fundar de otro modo la autoridad, pensar de nuevo las identidades, poner en duda la validez de nuestras representaciones, pensar la transmisión no como mera repetición sino como el espacio que dé cabida a la reflexión y la duda constructiva.

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4Formación y carrera docente UnJU-MercosUr

Graciela del Rosario Wayar Clemencia Postigo de Caffe

Introducción

En este trabajo el objetivo principal es socializar una experiencia inter-universidades llevada a cabo en el marco del Proyecto “Construcción cooperativa de políticas y estrategias de formación de docentes universitarios en la región”, el mismo fue coordinado por la Secretaría de Asuntos Académicos de la Universidad Nacional de Córdoba, con la participación de siguientes Universidades: por Argentina, Universidad Nacional de San Juan, Universidad Nacional de Jujuy, Universidad Nacional de Villa María y Universidad Nacional de Córdoba; por Paraguay, la Universidad Nacional de Asunción y la Universidad Nacional de Pilar; por Brasil, Universidad Federal de Alagoas, Universidad Federal de Paraná y Universidad Federal de Santa María; y por último, la Universidad de la República de Uruguay, en total nueve Universidades del Mercosur Educativo. El proyecto fue presentado y seleccionado en la Convocatoria abierta a las Universidades públicas y privadas

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de Argentina, Brasil, Paraguay y Uruguay para la presentación de propuestas para la creación de redes académicas en el marco del Proyecto “Apoyo al programa de Movilidad Mercosur en Educación Superior, con asistencia de la Unión Europea”. Como resultado del trabajo se logró una publicación “Construcción cooperativa de políticas y estrategias de formación de docentes universitarios en la región” (Lorenzatti 2012).

Cabe señalar que la producción de este trabajo, tiene como fuentes de información fundamentales: el libro anteriormente mencionado, el informe final presentado ante el organismo de financiamiento1 y el informe de la Universidad Nacional de Jujuy.2

1. Informe del Proyecto “Apoyo al Programa de Movilidad MERCOSUR en Educación Superior”, financiado por la Unión Europea, coordinado por Marìa del Carmen Lorenzatti de la Universidad Nacional de Córdoba, en 2012.

2. Informe de la Universidad Nacional de Jujuy presentado por Graciela del Rosario Wayar (profesora en Ciencias de la Educación y Especialista en Planificación y Políticas Sociales, actualmente se desempeña como profesora adjunta ordinaria de la Cátedra de Organización y Adminis-tración Educacional y por Extensión en la Cátedra de Teoría y Desar-rollo del Curriculum de la Carrera de profesora y licenciada en Ciencias de la Educación de la Facultad de Humanidades y Ciencias Sociales/UNJu); Clemencia Esther Postigo (profesora de Pedagogía y licencia-da en Pedagogía [Orientación Psicológica] de la Facultad de Filosofía y Humanidades de la UNC. Especialista en Psicopedagogía Clínica de la Escuela de Psicopedagogía Clínica de Bs. As. Magister en Investigación Educativa con mención Socioantropológica de la UNC. Actualmente se desempeña como profesora titular interina [prof. adjunta ordinaria] en la cátedra de Psicología Educacional de la Carrera de Licenciatura y Profesorado en Ciencias de la Educación y por extensión de funciones en el Seminario del área de Comunicación y Educación para la misma carrera y para la Licenciatura en Comunicación Social de la Facultad de Humanidades y Ciencias Sociales/UNJu) e Alvaro Fernando Zambrano (profesor en Letras; es maestrando de la con la orientación de Estudios Literarios en la UNSA. Actualmente se desempeña como Jefe de Traba-jos Prácticos de la Cátedra de Teoría y Crítica Literaria de la Carrera de Profesorado y Licenciatura en Letras de la Facultad de Humanidades

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El objetivo central del presente trabajo fue “Desarrollar redes de cooperación para el fortalecimiento de la formación docente universitaria (FDU) a nivel regional”, mientras que los objetivos específicos se focalizaron en la producción de conocimientos sobre formación docente y el lugar que ocupa en los sistemas de acceso, permanencia y promoción de los profesores de las instituciones participantes.

Metodología empleada en la investigación

Se puede decir que se inició la tarea con dos supuestos: el primero que “los docentes universitarios tienen probada idoneidad y conocimiento de su campo disciplinar y/o profesional pero, en general, no cuentan con formación en la enseñanza, constituyendo un porcentaje mínimo el que posee capacitación al respecto” y el segundo “por lo general, el ingreso a la docencia e investigación, en su mayoría es por medio de los concursos públicos y abiertos que caracterizan a las universidades, evalúan una diversidad de aspectos, entre ellos los antecedentes docentes, pero no se contempla como requisito la formación específica en enseñanza.” Por esta razón, el proyecto abordó la problemática de la formación docente universitaria.

En este marco se plantearon principalmente cinco ejes de debate y trabajo: 1. transferencia intergeneracional; 2. impacto tecnológico; 3. articulación investigación-enseñanza; 4. vinculación entre la producción de conocimiento y contexto social y 5. articulación entre la práctica de la enseñanza y la sociedad.

El proyecto combinó diversas estrategias metodológicas que se implementaron en todas las universidades participantes:

y Ciencias Sociales/UNJu. Coordinó Equipos Disciplinares por el Área Lengua en Programas de Mejora de la Calidad Educativa del Ministerio de Educación la Provincia de Jujuy).

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a. Encuesta virtual a los docentes con el objetivo recabar información cuantitativa sobre la situación de revista de docentes, la formación inicial y de posgrado recibida, y las demandas concretas en relación con su actualización profesional. Participaron 2.499 (dos mil noventa y nueve) docentes universitarios. Fue coordinada y analizada desde el Programa de Estadísticas Universitarias de la Universidad Nacional de Córdoba. La encuesta permitió sistematizar: datos demográficos (sexo, edad), una aproximación a la situación de revista de los docentes (antigüedad, cargo y dedicación), los mecanismos institucionales más frecuentes para el acceso y la permanencia de docentes en la institución (forma de ingreso a la Institución y cuál es la situación de permanencia). También se indagó sobre la formación que acredita el docente (nivel, tipo, momento en que la realiza) y la actualización de la misma, así como la importancia que asigna a determinados aspectos específicos en los que se podría formar un docente universitario. Finalmente, se buscó enfatizar el abordaje institucional de la cuestión de la formación docente: el apoyo de la institución para la capacitación, la repercusión de ésta en los procesos de enseñanza-aprendizaje, la necesidad, modalidad y responsabilidad de la formación.

Para el tratamiento de la formación se estructuraron cuatro ejes: disciplinar, pedagógico, en investigación y en extensión. La misma fue aplicada on-line. Cada universidad distribuyó dicho instrumento a los docentes, en el caso de la Universidad Nacional de Jujuy, se realizó a través de la Secretaría de Asuntos Académicos, mediante una nota y el enlace correspondiente.

Los datos recolectados, durante fines de 2011 y principios del 2012, fueron centralizados por el Programa de Estadísticas Universitarias de la Secretaría de Asuntos Académicos de la Universidad Nacional de Córdoba para un primer análisis global y luego distribuidos entre las Universidades para su correspondiente profundización

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b. Estudio de caso o en caso: en el marco de los estudios empíricos, el estudio de caso reúne características que se consideraron de interés para abordar la formación docente de las carreras de profesorado de la UNJu.

Desde este encuadre se seleccionó como estrategia metodológica el estudio de caso único o intrínseco. Stake (1995[1999]) afirma que el estudio de caso intrínseco es aquel que se constituye a partir del interés en el mismo. Al estar definido por un interés particular por estudiar y comprender, el acento se centra en la profundización y el conocimiento del caso particular, más que en la generalización de los resultados que se pueden obtener.

Desde esta perspectiva se privilegió, el tema y la problemática de la docencia universitaria en las carreras de profesorado de la UNJu.

A los efectos de esta investigación la muestra fue intencionada en tanto lo que se pretendió fue dar cuenta de la particularidad de la oferta formativa, la relación de la misma con los sistemas de acceso, permanencia y promoción de los profesores, y los dispositivos de formación continua de los docentes.

Entre las técnicas de recolección y análisis, se seleccionaron documentos y entrevistas en profundidad con la finalidad de captar y describir la complejidad del fenómeno estudiado y su contexto con la mayor riqueza posible respetando la mirada de los actores sociales estudiados: los profesores de las carreras de formación docente.

Las entrevistas fueron aplicadas a diferentes actores de la Facultad de Humanidades y Ciencias Sociales de la UNJu, entre los que se puede mencionar: la Secretaría Académica, docentes que revisten en diferentes categorías: auxiliares, adjuntos y titulares y diferentes dedicaciones: simple, semiexclusiva y exclusiva de la carrera de Profesorado en Letras y en Ciencias de la Educación.

Las entrevistas tuvieron por finalidad obtener información acerca de la situación de revista de docentes de las carreras de profesorado poniendo particular énfasis en sus formas de ingreso, permanencia y promoción.

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Los interrogantes de las entrevistas a los actores mencionados se organizaron alrededor de varios núcleos de sentido para descubrir el conocimiento que los entrevistado/as tenían respecto de la planta docente, a los planes de las carreras respectivas, la formación de grado y posgrado de los profesores y la influencia de los mismos en las acciones de docencia, investigación y extensión. Asimismo se indagó sobre el sistema de ingreso a la carrera docente, los mecanismos de promoción y permanencia con la finalidad de interpretar el significado y sentido que atribuyen a cada una de estas variables.

c. Se realizaron tres seminarios regionales, con el objetivo de desarrollar una instancia de construcción de conocimiento entre los referentes, para conformar un escenario para la comunicación y sistematización del estado de avance desarrollado por los participantes durante todo el periodo.

Otro desafío fue la escritura del libro Construcción cooperativa de políticas y estrategias de formación de docentes universitarios en la región (Lorenzatti 2012), cuyo objetivo fue socializar los resultados obtenidos de este proceso investigativo.

Características observadas en la Universidad Nacional de Jujuy

Siguiendo las pautas acordadas para el estudio se procedió a trabajar con los siguientes aspectos:

• Análisis cuantitativo: las fuentes de información en este caso, fueron los resultados de la encuestas on-line, diseñadas por el equipo central y distribuidas por el equipo de la UNJu. De un total de la planta docente de 999 (novecientos noventa y nueve) docentes, respondieron 146 (ciento cuarenta y seis) lo que significa un 15 % del total. Asimismo, se compilaron otros datos relacionados

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a: cantidad de docentes, cargos, dedicaciones y categorías, como así también los referidos a la evolución de la matrícula de los últimos tres años.

• Relevamiento bibliográfico: se realizó un trabajo de rastreo y sistematización de la información de las siguientes fuentes: Trabajos de Investigaciones registrados en la Secretaría de Ciencia, Técnica y Estudios Regionales de la UNJu. en los últimos cinco años, los trabajos de investigaciones presentados en la Jornadas de Investigaciones de Humanidades desarrolladas en los años 2005, 2008 y 2011, trabajos registrados en las sedes de otras universidades como la de la Universidad Católica de Santiago del Estero y la Católica de Salta. Del análisis realizado surgieron, entre las cuestiones más significativas, que la mayoría de las investigaciones locales (UNJu) sobre Docencia en el Nivel Superior se refieren a las temáticas atinentes al “Currículum, y las prácticas de enseñanza”, el “Rol e identidad docente”, y sobre los “Alumnos, ingresantes y formación”.

Se percibe un escaso desarrollo de investigaciones referidas a problemáticas organizacionales, de gestión y sobre el impacto de las políticas educativas en los sujetos, sus condiciones de trabajo y las instituciones.

En cuanto a las Universidades privadas, se destacan los intereses que alientan el trabajo de investigación de la Universidad Católica de Santiago del Estero (y su Delegación en San Salvador de Jujuy) relacionados con la Enseñanza de la Matemática, con la Evaluación de las Aptitudes Cognitivas en el Nivel Superior Universitario; en este caso, llevadas adelante por el Departamento de Ciencias de la Educación y Psicología. Por su parte, en la Universidad Católica de Salta es innegable la importancia que revisten las tecnologías de la información y la comunicación (TICs),

• Análisis de la normativa vigente: se llevó a cabo el análisis y la sistematización de la normativa actual de la UNJu.

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• Relevamiento de la oferta formativa: análisis de planes y programas de las dos carreras de Formación Docente, Profesorado y Licenciatura en Ciencias de la Educación (carrera creada en el año 1985, con modificatoria de Plan en los año 1987 y 1996) y Profesorado y Licenciatura en Letras (carrera creada en el año 1985, con modificatoria de Plan en los año 1992 y 2006) como así también de la carrera de posgrado Especialización en Educación Superior, en articulación con las otras Facultades de la UNJu, acreditada por Coneau por Resolución n.º 233/04 con categoría (C), carrera que actualmente también se encuentra en desarrollo. Además se concretaron entrevistas a docentes de las carreras antes mencionadas.

Algunos resultados de las encuestas a Nivel Mercosur

El tamaño de la muestra fue superior al 10% del plantel docente para todas las Universidades.

• Se puede decir que todas las universidades involucradas en el proyecto realizaron importantes esfuerzos para mejorar y expandir los sistemas de Educación Superior, ya que éstos impactan fuertemente en el desarrollo social, político y económico.

• A nivel de leyes y normativas de Educación Superior los retos se canalizaron desde distintas realidades, creencias y prácticas institucionales.

• Existen diferencias entre países no sólo respecto a las tasas netas de escolarización y de deserción en estudios universitarios sino también en la composición de las comunidades de docentes. Las características demográficas de los planteles docentes y de los mecanismos de accesoy permanencia en los cargos docentes universitarios varían incluso entre instituciones de un mismo país.

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• En relación a la conformación del plantel docente. Se observa heterogeneidad entre las Universidades. En cuanto al sexo y edad, se evidencia un predominio de mujeres, en cuanto a la edad se observa que las universidades Argentinas se caracterizan por poseer una población de mayor rango etario, mientras que las universidades de los otros países son más jóvenes; en cuanto al ingreso y permanencia se observa una marcada diferencia con los otros países, que evidencian mayor estabilidad. En general hay un predominio de ingreso por concurso a excepción de la Universidad de Uruguay que implementa otro sistema de acceso; las universidades Argentina no superan el 50% de docentes en el ingreso por concurso. En la dedicación a la docencia, se observa una gran dispersión, excepto el caso de las universidades de Alagoas (Brasil) y de Paraguay en las que el 90% de docentes tiene una dedicación superior a semiexclusiva.

• En las actividades de docencia, investigación, extensión y gestión, puede decirse que la mayoría de los docentes, entre un 60 % a 80 % de su dedicación, la centran en desarrollar tareas de docencia, le sigue a ella la tarea de investigación, en tercer orden de prioridad se registran las actividades de gestión y por último las actividades de extensión, están tomando mayor importancia en estos últimos años.

Algunos datos cuantitativos de Jujuy

La Universidad Nacional de Jujuy contaba en el año 2011 con 1.068 (mil sesenta y ocho docentes) en su planta,3 según información obtenida de la base de datos de la UNJu y proporcionados por la Secretaría de Asuntos Académicos, de la misma, los que se distribuyen del siguiente modo:

3. Datos obtenidos de la Base de Datos de la Universidad Nacional de Ju-juy, en el año 2011.

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GRAFICO 1: Condición Docente

Como se pude advertir, estos datos ponen de manifiesto la importancia y la necesidad de políticas de concurso que, en definitiva, no son sino el derivado de priorizar otras líneas de acción desde la política institucional en general.

De la Planta general, según el cargo:

GRAFICO 2: Cargos docentes

Se observa que la mayor población docente se centra en el espacio en que se inicia la carrera docente (Auxiliares Docentes), en carácter de interino, lo que genera inestabilidad y alienta la

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perduración de un espacio confuso y hasta arbitrario en el afán formativo que sustenta dicho cargo.4

Otro aspecto a destacar es la distribución de la planta según las dedicaciones:

GRAFICO 3: Dedicaciones docentes

Es significativo indicar que la mayor población docente está distribuida entre dedicaciones semiexclusivas y simples, con prevalencia de esta última. Las dedicaciones docentes se vinculan con las cargas horarias a cumplir semanales, un docente con dedicación simple tiene una carga de diez horas, uno de dedicación semiexclusiva una carga de veinte horas y uno de dedicación completa, cuarenta horas. En estas condiciones conjugar y llevar adelante las tareas de docencia, investigación y extensión no

4. La categoría de “Interino” señala varias aristas a analizar, entre ellas: las limitaciones en el ejercicio de derechos que hacen a la participación en el gobierno institucional y todo lo que ello conlleva, la precarización de la labor desarrollada etc. A los fines que perseguimos, no podemos dejar de indicar el impacto de estos índices – vale decir, de esta reali-dad − en la concepción/identificación del rol docente y, por ende, en la articulación de la tríada docencia-investigación-extensión.

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siempre resulta una aspiración fácil, la mayoría de las veces, se priorizan las dos primeras por sobre la extensión.5

Estos datos, como ya se indicó, dan cuenta de la necesidad de generar políticas de concurso, para cubrir los cargos que repercutirán en la óptima conformación de los distintos equipos de cátedra.

Conclusiones y/o reflexiones generales

Se puede decir que a pesar de la realidad diversa de las universidades hay un marco político común que, a partir de la recuperación de gobiernos democráticos en los ochenta, llevó a iniciar las discusiones sobre programas de formación docente, según los datos obtenidos de las Universidades participantes en el estudio y debido a que a partir de la década de los ochenta, se producen modificaciones en las normas de las universidades en casi todos los países involucrados en el Proyecto.

Se observa que se trataron de impulsar políticas centrales de mejoramiento, de la calidad de la enseñanza, mediante la implementación de proyectos y/o programas específicos. En el caso de la Universidad Nacional de Jujuy se efectuó el Programa de Jerarquización como así también, el Programa de Mejoramiento de la Calidad Etapas I y II. En el año 2008 comenzó la implementación del Plan General de Mejoramiento de la Calidad Docente y de aprovechamiento de los Recursos Humanos, iniciado con el Proyecto de Jerarquización Docente, en el año 2010, a través de esta Resolución donde se aprueba la I Etapa de aquél Plan destinado a Profesores Titulares, Adjuntos o Asociados Con Dedicación Semi Exclusiva en esta Universidad para obtener una mayor ampliación

5. Este dato no es menor pues habla de una no-concentración del trabajo − y rol − en la institución universitaria sino de la dispersión del trabajo devenida de la necesidad de otra fuente laboral.

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en su dedicación. Mediante la aplicación de este programa, modificaron su situación 66 (sesenta y seis) Docentes.

Con la aprobación de la II Etapa del Plan de Mejoramiento de la Calidad Docente Universitaria, destinado a Ayudantes de Primera o Jefe de Trabajos Prácticos con Dedicación Simple − aprobado por Resolución C.S. n.º 009/10, para ampliar sus dedicaciones asignadas. Mediante la ejecución de este programa, modificaron situación de 75 (setenta y cinco) docentes.

En la década del noventa, en el marco de las leyes de educación superior, se explicita la necesidad de tener procesos formativos de posgrados. Asimismo se producen nuevos marcos normativos de regulación. Hay un incremento de ofertas de posgrados a nivel de Especialización, Maestrías y Doctorados.

Se puede decir que un desafío es la relación entre la formación docente universitaria y los mecanismos o dispositivos de evaluación docente o carrera docente, debido a que hasta ese momento no existía una política de Carrera docente. En el caso de la Universidad Nacional de Córdoba, se puede decir que lleva unos pocos años de implementación y arrojan herramientas para pensar y construir estrategias de formación disciplinar y pedagógica, como por ejemplo en esta Universidad, una de las condiciones para ser docente universitario, los docentes que no poseen título docente, deben cursar un Trayecto/carrera de Formación Docente.

Otra idea a recuperar fue “pensar en la Construcción cooperativa de políticas y estrategias de formación de docentes universitarios de la región”. La que puede ser concebida como un espacio de construcción espiralada, un espacio de discusión horizontal, para abordar los nudos de discusión para la construcción interinstitucional de políticas cooperativas de formación docente, así como las líneas de trabajo y una agenda de acciones conjuntas que posibiliten avanzar en la convergencia de una perspectiva regional. Durante el desarrollo del presente trabajo, realmente esta forma de trabajo cooperativo se puede decir que se logró. La intención fue continuar con esta experiencia, con la presentación de otro Proyecto, en convocatorias Nacionales e Internacionales, similares.

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Los nudos de discusión identificados refieren fundamentalmente a los siguientes ejes:

• La necesidad de acordar las políticas y estrategias de formación docente en la perspectiva de una docencia integral, en la cual se integren las tres funciones del docente universitario: la enseñanza, la investigación y la extensión, tratando de articular trayectorias de formación y perfeccionamiento docente que integren dichas funciones.

• La jerarquización de los diferentes componentes de la formación integral: los trayectos de formación asociados a la educación permanente, las instancias de educación cuaternaria, muy particularmente de los posgrados académicos, en tanto como ámbitos determinantes dela construcción de la profesionalidad docente universitaria.

• Pensar en ampliar las ofertas de formación en las más variadas modalidades: presenciales, semipresenciales y a distancia, a los fines de avanzar en el logro de amplias coberturas del cuerpo académico con vistas a un escenario de reconocimiento pleno de la formación integral docente en la carrera.

• La proyección de un complejo de políticas de fortalecimiento de las capacidades docentes que permitan cubrir las múltiples necesidades de formación no sólo a través de estrategias formalizadas de capacitación, sino también a través del estímulo y desarrollo de estrategias de renovación, innovación e investigación de la práctica educativa.

• La discusión de la pertinencia de acompañar las políticas de formación docente con la producción de conocimiento sobre el desarrollo de las funciones docentes universitarias, fortaleciendo la investigación en educación superior.

• La necesidad de acompañar las políticas de profesionalización docente con definiciones consistentes de evaluación integral y equiparada de los

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desempeños, atendiendo los procesos de resignificación y complejización del rol que plantean los desafíos de la contemporaneidad.

Conclusiones y/o reflexiones del trabajo en la UNJu

Del trabajo desarrollado por el equipo de la UNJu, se realizan las siguientes reflexiones ¿cuánta distancia o cercanía media entre el rol docente y el rol de investigador?, ¿hasta qué punto pueden pensarse esas prácticas ya como privativas ya como articulatorias, y en qué medida?

Es evidente, a la luz de lo investigado, que estos cuestionamientos sitúan en un punto que, lejos de verlos como infranqueables, pueden ser pensados como solidarios pues, por un lado, exige volver la mirada con afán crítico sobre todas los circunstancias, procesos e instituciones que en la praxis, vale decir la cotidianeidad universitaria, intervienen directa e indirectamente en el reconocimiento y legitimación de esos roles. Entre ellos los que van desde la valoración de “antecedentes” en un Concurso Ordinario y más notoriamente en un Llamado a Inscripción de Interesados donde lo único que se evalúa es este aspecto, la categorización como investigador por las instituciones dedicadas a ello. Los elementos que se ponen a consideración y el puntaje que se les otorga, el escaso o nulo seguimiento y acompañamiento a la labor docente en el aula y, desde luego, la valoración que de esa labor realiza la institución en sus diferentes niveles y órganos, hasta la manera (cargos, categorías y dedicaciones) en que se componen los equipos de cátedra, la relación que guarda el número de docentes y el de estudiantes en ellas, entre muchos otros). En otras palabras, los requerimientos y potencialidades fácticas, y sus reservas, que se muestran como “infra-estructura” frente a y en la que el docente universitario interactúa; pero por otro lado, se puede advertir en este punto un anclaje, una coyuntura reconocida no sólo en los datos cuantitativos e interpretativos de

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la documentación explorada por el estudio en caso, que permitió poner de manifiesto inquietudes emergentes donde se contrastan cristalizaciones del imaginario y percepciones sobre el propio rol y su inscripción en la institución. Contrastación que habla de la “búsqueda”, de una observación, al mismo tiempo, refleja y reflexiva, que puede ser significada como aspiración “de cambio”; en definitiva, de una posibilidad. Visto así, aquellas preguntas señalan un campo en el que comulgan los “habitus” como forma de legitimación de una práctica, y la experiencia docente universitaria en una dinámica de tensiones y distenciones que lo proponen como espacio propicio para el debate tendiente al descubrimiento y ensayo de nuevas alternativas metodológicas y epistémicas; en síntesis, a la redefinición.

Hay otro elemento a integrar en esta especulación: la tarea de extensión. Es abundante la bibliografía que refiere a este tema y no es la intención volver sobre ella, lo que aquí interesa señalar es el grado de participación que ella comporta en el desarrollo del trabajo docente.

Se fue indicando previamente, cómo el trabajo de extensión, si bien está incorporado a la tríada docencia-investigación-extensión (signo que se patentiza en las planificaciones y programas de las materias-módulos y/o asignaturas), en la práctica se ve desplazado ante la prioridad de la tarea de docencia y de investigación, respectivamente, por lo cual su concreción está librada a contingencias de orden circunstancial-temporal y/o estrictamente académicas (las más de las veces) con lo cual va desplazándose del foco de realización hasta asumir un estatuto aleatorio cuando no aislado o prescindible.

Ante esta realidad, se puede decir que, la extensión, está moldeada en el cruce de varios factores institucionales (particularidades del perfil de la carrera, ubicación de las materias en la currícula, características de la composición de los equipos de cátedra etc.) y suprainstitucionales (principalmente políticas de gestión que regulan el acceso, la permanencia y la promoción, y esto también es válido y necesario para analizar la docencia y la investigación, se imponen dos ideas que puede ser enunciada del

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siguiente modo: 1) ¿se puede circunscribir la participación de la acción de la Extensión, su participación aleatoria o escasa, a una debilidad de tipo estrictamente procedimental/metodológica?

Desde luego, esta pregunta implica dos planos: por un lado, el reconocimiento de la importancia de las actividades de Extensión en tanto elemento integrado en el trayecto formativo e, ipso facto, la apertura de canales comunicantes que refuercen el vínculo entre universidad-sociedad. Por otro, pone el acento en la destreza o debilidad para proyectar acciones y metodologías que potencien la labor de extensión como factor aglutinador. En ambos planos, señalados a groso modo, la responsabilidad sobre la extensión recaería fuertemente sobre los equipos de cátedra como si ellos fueren no sólo unidades inconexas sino también que estuvieren desgajados de cualquier situación institucional; por lo que debemos articular, 2) ¿qué grado de participación en estas prácticas habremos de reconocer a la institución universitaria en la legitimación de un paradigma (esto es, un “punto de vista”, una “concepción” y “valoración”) sobre la Extensión, atendiendo simultáneamente a lo estatuido y a la presencia o ausencia de políticas de gestión reales a este respecto? Es innegable la correspondencia entre 1) y 2). Talvez sea iluminador recordar el decir de una docente titular de la carrera de Letras que permitirá dar luz a este análisis; refiriéndose a los mecanismos de evaluación ella advierte la preponderancia que hoy tienen aquellos elementos de orden investigativo (basados en un criterio, fundamentalmente, cuantitativos) y señala que dicha evaluación podría contemplar otros mecanismos que den cuenta de un análisis “global”: “ver qué rol cumple ese docente en la institución, desde qué puntos acompaña a la institución, de qué manera extiende los vínculos de la institución a la sociedad. Me parece que hay otras formas de evaluar al docente, no sólo frente a la cátedra y frente a la investigación, sino frente a su rol como un movilizador en la sociedad.” Es importante señalar el reconocimiento, que realiza la entrevistada sobre las prácticas de evaluación para la permanencia y promoción desde parámetros que tienden cada vez más hacia lo cuantitativo en desmedro de lo cualitativo. Queda clara la visión en la que se pretende el establecimiento de otras formas, otras metodologías

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que resulten más apropiadas o, si se prefiere, integrales. Es evidente la búsqueda – y hasta la necesidad − de proponer otros recorridos o posibilidades que incluyan la extensión, no como un elemento azaroso o aleatorio y contrapuesto a los otros elementos (docencia e investigación) sino como emergente y solidario; lo que hasta el presente pareciera perdurar, si no en la ausencia de tal extensión como elemento constituyente de la evaluación, sí, al menos, como un factor hasta aquí relegado y de valoración precaria o nula.

Esta reflexión va encausándose, entonces, hacia un aspecto que atraviesa e hilvana la tríada referida: las formas y mecanismos de ingreso, permanencia y promoción y, en ellos, puntualmente el modo que asume la evaluación.

Se ha apuntado en el análisis algunas tangentes, la historia de esta universidad, el Estatuto, los Reglamentos y Programas por una parte y, por otra, a través de las entrevistas, percepciones y pareceres devenidos de la experiencia − que denotan, más allá de los objetivos y el espíritu que alienta la legislación y normativa de la institución universitaria, una latencia, se puede decir que hay cierta incompatibilidad entre la norma y la realidad que encuentra sustento en el acaecer de la praxis misma.

Como se indicó oportunamente, hay consenso entre las entrevistadas de que el Concurso Ordinario es el instrumento − al menos hasta el presente − adecuado para arbitrar el acceso a la universidad, sin embargo y teniendo en cuenta los datos estadísticos, hay en la actualidad, esto lo señalan también las entrevistadas, ausencia o escasez de políticas de gestión a este respecto. Claro está que esta ausencia no impidió el acceso – esto es notorio en los índices − sino que motivó la articulación de otros mecanismos (y todo lo que ello implica) entre los que debemos consignas en primer lugar, el Llamado a inscripción de interesados y, en segundo, la Extensión de funciones. En esta línea de pensamiento, el Concurso como mecanismo de acceso (previsto por el Estatuto) sobrevive más en el espacio de la pretensión que en el terreno de la realidad.

Otro tanto ocurre con los mecanismos y formas previstos para la evaluación orientados a dar cuenta de la permanencia y

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promoción. En estos casos, las entrevistadas interpelan, de algún modo, la metodología de concurso (en la cual advierten una preeminencia de valores cuantitativos, cantidad de publicaciones, de trabajos de investigación, de congresos, cursos de posgrados etc., por sobre otros de carácter cualitativo) al que contraponen la necesidad de idear otros procedimientos que atiendan tanto al desempeño docente como a la actividad de extensión en tanto componentes del rol en una totalidad integradora. Como se puede observar, hay una puesta en crisis de lo estatuido por un horizonte de expectativas de reconocimiento y valoración de elementos no contemplados, o acaso indiferentes, en el método y disposición de las evaluaciones hasta el momento.6

Como se advierte, es insoslayable reconocer la importancia capital que reviste la evaluación como factor articulador de todos los aspectos que hasta aquí hemos abordado; de hecho pareciera que todos ellos se componen en base a ese factor y por lo tanto actúa como dispositivo favorecedor-potenciador y, al mismo tiempo, como obstaculizador-limitador, por cuanto toda actividad, se puede presumir que estaría de antemano orientada a cumplir con esa exigencia; más específicamente, con los elementos y características que pondera o desestima. Y aunque esta observación es, si se quiere obvia, no se debería perder de vista, puesto que resitúa la discusión en el plano ideológico, esto es, no sólo una “concepción” y un “juicio” sobre la universidad en general y la labor docente universitaria en particular, sino también advertir críticamente todo el aparato legislativo y regulatorio que diseña una cartografía devenida en políticas de gestión que los sostiene y perdura.

Luego, ¿a la luz de esta indagación, cuál es el impacto y el tipo de relación, por cierto desigual, que se entabla entre el marco normativo, las políticas de gestión y la praxis? ¿En qué medida el campo de la praxis la universidad fomenta la reflexión en torno de la formación docente universitaria?

6. Es lícito decir en este punto que nuestra universidad, en este momento, ha aprobado en Asamblea Universitaria la modificación de su Estatuto en vistas a la incorporación de la Carrera Docente, lo cual nos habla de un camino a transitar que recién empieza.

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Referencias

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LORENZATTI, M. del C. (coord.) (2012). Construcción cooperativa de políticas y estrategias de formación de docentes universitarios en la región. Córdoba: Editorial Copicentro.

STAKE, R. (1995[1999]). Investigación con estudio de casos. Traducción Roc Filella. Madrid: Morata.

UNIVERSIDAD NACIONAL DE JUJUY (2010). Resolución n.º 009, de 10 de marzo de 2010.

Nota El relevamiento de investigaciones sobre formación docente

y formación profesional en el NOA, estuvo a cargo de los

representantes del proyecto de la Universidad Nacional de Jujuy.

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5proFissionalidade, proFissionalismo e proFissionalização no plano nacional de Formação de proFessores da educação Básica (Parfor): Política edUcacional contraditória

Iria Brzezinski

Questões introdutórias

O ancoradouro deste capítulo é uma pesquisa1 de âmbito nacional, em desenvolvimento, que tem por objeto o Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica (Parfor) como política educacional de formação inicial e continuada. Essa política é fomentada desde 2009 pela Diretoria da Educação Básica

1. Financiada pelo CNPq e pela Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado de Goiás (Fapeg), com o título de “Observatório da formação e valoriza-ção docente: configurações e impactos da implementação dos Fóruns Permanentes de Apoio à Formação do Magistério”, sob a coordenação da autora do presente texto e com participação de investigadores do Núcleo de Pesquisa da Anfope.

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Presencial da Coordenação de Desenvolvimento de Pessoal da Educação Superior (Capes/EB).

A referida investigação é de abordagem qualitativa, orientada pelo materialismo histórico dialético e levada a campo com o procedimento de pesquisa participante. A opção pela dialética resulta da compreensão de que ela instiga a pensar a realidade, o objeto em movimento e, suscita tanto a ação de pensar os fatos como os elementos de uma totalidade histórica, portanto em movimento, quanto a submetê-los a uma análise crítica.

No que tange à pesquisa participante, Barbier (1977[2002]) afirma que deve ser concebida como “ciência da práxis” e desenvolvida pelos investigadores in loco, “num processo pessoal e único de reconstrução racional pelo ator social”.

Intenta-se refletir sobre concepções de profissionalidade, profissionalismo, profissionalização e trabalho docente, bem como desvelar os desafios, compromissos, as tensões e contradições que marcam o desenvolvimento dos cursos de natureza emergencial, destinados aos professores ainda leigos e atuantes na educação básica pública no Brasil.

Almeja-se também revelar o propósito governamental de implementar o regime de colaboração entre os entes federados no que diz respeito à formação e valorização de professores(as), ao criar em cada um dos 26 Estados da Federação e no Distrito Federal o Fórum Permanente de Apoio à Formação Docente (Forprof). Desde 2014, esses fóruns são conhecidos também por Fóruns Estaduais Permanentes de Apoio à Formação Docente (Fepad).

A natureza emergencial dos cursos constitui uma excepcionalidade, considerando que sua vigência deve ser limitada ao alcance do objetivo, qual seja: mediante capacitação em serviço, formar a pessoa leiga, em exercício na docência da educação básica pública. Essa excepcionalidade encontra respaldo legal no que determina o Decreto n. 6.755, de 29/1/2009, que instituiu a Política Nacional de Formação de Profissionais do Magistério da Educação Básica e disciplinou a atuação da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) no fomento a programas de formação inicial e continuada (Brasil 2009a). O

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ingresso dos professores cursistas deve ser na Primeira e Segunda Licenciatura e Formação Pedagógica, fomentados pela CapesEB/Parfor e ministrados pelas universidades públicas e comunitárias.

Também em 2009, dois outros dispositivos legais baixaram regulamentações para os Fóruns − a Portaria Normativa n. 9, de 30/6 e a Portaria Normativa n. 883, de 16/9 (Brasil 2009b, 2009c). A primeira regulamentou “a mútua cooperação técnica entre as partes, para organizar e promover a formação de professores das redes públicas de educação básica [...]”. Em consequência, dever-se-ia, por força da lei, mapear as demandas reais para a formação inicial e continuada de professores, mediante um modus operandi que articulasse as ações dos entes federativos, instituições formadoras e órgãos de Estado. A segunda Portaria instituiu as diretrizes nacionais para o funcionamento dos Forprof/Fepad, especificando sua natureza e atribuições.

Um exame minucioso desses dispositivos e a participação da coordenadora geral da pesquisa em reuniões em diferentes Estados e a avaliação das Atas das reuniões revelam que os Profor/Fepad constituem um espaço plural e promovem relações democráticas entre representantes da sociedade civil e política. Neste aspecto, todavia, identifica-se uma clara contradição entre a composição plural e democrática e a centralização da gestão dos Fóruns no(a) Secretário(a) de Estado da Educação2 e no Secretário do DF.

O Parfor caracteriza-se pela finitude, que se dará quando sua avaliação indicar, em 2016, que existem professores formados em nível superior para ocupar 651.175 funções3 docentes requeridas pelos sistemas de ensino dos 26 Estados e do Distrito Federal.

2. No Forprof do Estado de Goiás, por exemplo, quando os representantes das associações, sindicatos e IES formadoras sugeriram uma coorde-nação colegiada ou coordenação em forma de rodízio, a proposta foi terminantemente rechaçada pelos representantes do poder estatal.

3. Esse quantitativo refere-se ao número de vagas/funções a serem ocu-padas nos sistemas de ensino, entretanto, elas não correspondem ao número de docentes, pois boa parte dos professores da educação básica

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Observa-se que esta estimativa foi projetada por ocasião do diagnóstico e prognóstico, quando do Planejamento Estratégico da Formação Inicial de Professores da Educação Básica Pública (conferir Clímaco 2009), como exigência do Parfor (MEC/2009).

A seguir, serão discutidos conceitos, como direito à educação, regime de colaboração na República federativa brasileira, Fórum Permanente de Apoio à Formação Docente, profissionalidade, profissionalismo, profissionalização docente, entre outros.

Construir-se professor(a), ser professor(a) contemporâneo(a): profissionalidade, profissionalismo e profissionalização docente

A Constituição Brasileira de 5/10/1988 (CF/1988) salvaguarda o princípio da Declaração dos Direitos do Homem e estabelece, no Capítulo II, a Educação como um dos direitos sociais. A garantia desse direito está expressa no art. 205 da Carta Magna, como se lê a seguir.

Art. 205 A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercicio da cidadania e sua qualificação para o trabalho. (Brasil 1988)Art. 4º O dever do Estado com educação escolar pública será efetivado mediante a garantia de:I − educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade [...]. (Brasil 1996)

Desse modo, no ordenmenteo jurídico. a educação brasileira é definida como direito social subjetivo do(a) cidadão(ã). Perante esse direito a educação é concebida, por injunção constitucional,

ocupa duas ou até três funções docentes, em sistemas ou redes de ensi-no distintos: federal, estaduais, municipais ou no Distrito Federal.

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como dever do Estado, e a instituição escolar tem a função de atender à obrigatoriedade de oferta da educação básica, cuja finalidade é a de produzir conhecimento e retransmitir o saber sistematizado às crianças, aos jovens, adolescentes, adultos e idosos. Cabe lembrar que está explícita na LDB/1996 a concepção de educação como um processo ao longo da vida, ultrapassando os muros da escola e, efetivando-se também em espaços não escolares existentes na sociedade.

Os estudantes, protagonistas do ensino e da aprendizagem, formam um par dialético com outro protagonista − o(a) professor(a). Para atender aos primeiros, o Estado tem o dever de traçar políticas de formação de profissionais da educação e fomentá-las, preparando quantitiva e qualitativamente professores(as), a fim de que se concretize com qualidade social, tanto a educação básica como a superior no País.

Na trajetória de seu desenvolvimento profissional, os docentes devem articular a formação inicial em nível superior com a formação continuada, que precisam ser tanto amplas quanto profundas, no que tange aos aspectos epistemológicos, pedagógicos, políticos, culturais, didáticos, técnicos e tecnológicos. Em consonância com a Meta 15 do PNE/2014, os processos de formação inicial, necessitam ocorrer em instituições de ensino superior, em áreas específicas, em cursos preferencialmente presenciais. Por sua vez, a formação continuada poderá ser feita de mameira formal, como nos programas de pós-graduação. É, todavia, salutar aos(às) professores(as) refletirem contínua e coletivamente as experiências vivenciadas na práxis educacional, no interior da própria escola de educação básica onde trabalham.

Considerando a concepção de educação expressa pelos legisladores na LDB/1996, segundo a qual a sociedade é pedagógica (Brasil 1996), é preciso lembrar que a formação continuada pode ocorrer em diferentes espaços da vida social, uma vez que fora da escola também se aprende. No Brasil, não são poucos os cursos a distância do ambiente escolar que procedem “treinamento em serviço”, o que significa que o professor continua dando aulas durante seu “treinamento”. Esse, de modo geral, é precário em

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termos de qualidade e colide com o que prevê o art. 67, inciso II, da Lei nº 9.394 de 20/12/1996:

Art. 67. Os sistemas de ensino promoverão a valorização dos profissionais da educação, assegurando-lhes inclusive nos termos dos estatutos e dos planos de carreira do magistério público: I −.................................................................................................................II − aperfeicoamento profissional continuado,4 inclusive com licenciamento periódico remunerado para esse fim. (Brasil 1996)

Por meio do desenvolvimento profissional o(a) professor(a) vai se tornando professor(a), ao mesmo tempo que sua identidade coletiva vai se configurando. Arendt (1958[1989]) argumenta que toda identidade profissional constrói-se pelas mediações estabelecidas nas teias das relações sociais. Os fios iniciais dessa teia surgem do eu − identidade para si − e torna-se identidade coletiva, portanto, transmuda-se em “nossa”, por ser uma identidade ou identidade (s) engendrada (s) nas relações humanas e socialmente aceita.

A identidade coletiva pode ser entendida como “[...] produto de um processo de sucessivas socializações” (Carrolo 1997, p. 27) e é configurada por meio de dupla mediação que o sujeito realiza: uma interna, do sujeito com ele mesmo e, outra externa, do sujeito com o mundo do trabalho.

Sob o ponto de vista sociológico, “[...] toda e qualquer identidade é construída” (Carrolo 1997, pp. 22-23). O processo de construção de significado e a experiência se dão com base em

4. Alguns técnicos e gestores do MEC, por vezes, acreditam que, devido ao tempo em que a pessoa leiga exerce a docência e domina um co-nhecimento tácito da disciplina ou área de conhecimento, mesmo sem formação em nível superior, não se faz nítida distinção entre formação inicial e aperfeiçoamento profissional − este legalmente definido por formação continuada.

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atributos culturais que se inter-relacionam e que são inerentes a determinada sociedade circunscrita a um espaço e tempo históricos.

Para Lasky (2005), a identidade profissional do(a) professor(a) “inclui o compromisso pessoal, a disposição para aprender a ensinar, as crenças, os valores, o conhecimento sobre a matéria que ensinam, assim como sobre o ensino, as experiências passadas e a vulnerabilidade profissional” (Lasky 2005, p. 901).

É fato que o delineamento da identidade coletiva do(a) professor(a) se materializa em um continuum em que a formação inicial é articulada à continuada, tanto no ambiente formativo (universidades, institutos, centros de pesquisa, outros) quanto nas relações do trabalho docente − na práxis.

No pensamento marxista, a práxis é concebida como uma atividade cuja origem está na interação entre o homem e a natureza. Tal interação expressa maior significado quando a ação do homem vai modificando a natureza por meio do trabalho e pela tomada de conciência de si mediante a reflexão, uma vez que “a presença do homem impõe o emprego da razão dialética [...] exclusiva do existente humano, da sua qualidade de ser histórico” (Pinto 1969[1979, p. 186]).

A seguinte ideia de Kosik (1963[1976]) complementa a postulação de Pinto (1979), à medida que assegura que a práxis revela o homem e a mulher como seres criativos e, portanto, compreendem a realidade em movimento e em sua totalidade: “a práxis do homem não é atividade prática contraposta à teoria; é determinação da existência humana como elaboração da vida” (Kosik 1963[1976, p. 45]).

O trabalho docente, como compromisso social com a humanização de homens e mulheres, manifesta-se “no encontro ético entre os seres humanos [,,,]”, mediado pela ação educativa de formação da criança, do jovem, do adolescente, do adulto, do idoso e pela “ação política conjunta com os indivíduos com vistas a uma sociedade humana na história” (Schmied-Kowarzik 1974[1983, p. 23]).

A condição de ser docente revela-se por um movimento ininterrupto de superação inerente ao construir-se professor(a)

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e da busca de novos paradigmas do conhecimento que venham a provocar transformações qualitativas nas atividades laborais e no lócus onde o profissional trabalha. Por essa razão Reyes-Santana (2013[2014, p. 10]) assinala que ao ser docente subjaz uma acepção do “deve ser”, do devenir, do devir, dialeticamente inacabado.

Nesta perspectiva, tomam-se por base os estudos de Bourdieu (1989[2003]) que sustentam sua concepção de “habitus”. Este pode ser entendido como um paradigma gerador de comportamentos, de visões de mundo, de produção de conhecimento, de apreensão da realidade, seja em nível das práticas, seja nas capacidades ‘criadoras’, activas, inventivas” (Bourdieu 1989[2003, p. 61, grifos do autor]). Habitus, consoante o o autor, é gerado e aprendido na sociedade pelos sujetos sociais, ao mesmo tempo que neles se desenvolve e tem por princípio a cultura, a socialização, a educação.

Faz-se notar que na trajetória de constituição da identidade profissional são incorporados ao processo de construir-se professor(a) o conhecimento (episteme), os saberes (sofia) e a experiência (doxa). O(a) professor(a), sujeito social que trabalha na educação e que pretende promover a “ensinagem” com competência pedagógica e conhecimento científico internaliza no seu ethos de ser docente, a cultura de sua classe social. Esse aspecto é reconhecido por Bourdieu (1972[2000, p. 227]) como bastante significativo à construção pelo profissional de seu próprio modo de ser e agir que vai praxiologicamete constituindo-se um novo “habitus”.

Reafirma-se, então, que a formação de professores como um continuum deve articular a formação inicial à continuada como componentes da profissionalidade, do profissionalismo e da profissionalização. Salienta-se que a formação inicial e a continuada devem pautar-se pelo princípio da pesquisa como processo formativo, considerando-se que todo(a) professor(a) deve necessariamente ser pesquisador(a).

A formação inicial do docente e o desenvolvimento profissional não podem ficar aprisionados ao simples domínio de competências e à avaliação de desempenho por meio de testes estandartizados, como insistem as políticas governamentais

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brasileiras. A formação inicial e continuada tampouco devem se limitar ao exclusivo domínio de conhecimentos básicos para o exercício da profissão, como comprovam as concepções analisadas no subitem a seguir.

Profissionalização: unidade dialética da profissionalidade e profissionalismo docente

Em diversos ambientes acadêmicos de produção de conhecimento, em particular, o socializado no Grupo de Trabalho “Formação de Professores” (GT8), da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa (ANPEd), é recorrente o debate acerca da profissionalização da docência, detendo-se na complexidade e polissemia das categorias profissionalismo e profissionalidade.

No mundo acadêmico reconhece-se a importância da compreensão desses conceitos e a necessidade de eles serem explicitados. Neste trabalho, adota-se a concepção de profissionalização docente como unidade dialética entre a profissionalidade e o profissionalismo. A profissionalidade consiste no domínio de conhecimentos, de saberes, de habilidades e de competências como requisitos profissionais indispensáveis ao propósito de tornar o sujeito leigo um(a) professor(a). O profissionalismo é concebido como desempenho competente e compromissado dos deveres e assunção de responsabilidades inerentes ao exercício da profissão professor(a).

Entre complexas fundamentações, o GT 8 privilegiou essa temática associada ao tema “Formação Inicial” como orientadora dos debates e reflexões, visando ao delineamento da identidade da profissão e à delimitação do campo da formação de professores. Tais estudos abriram horizontes, para que vários pesquisadores enveredassem pela investigação deste objeto sobre este objeto – profissionalização docente.

Elegeu-se, portanto, como objetivo estudar a profissionalidade e o profissionalismo como unidade dialética da profissionalização, ao mesmo tempo em que os movimentos sociais de educadores, os sindicatos e as entidades estudantis

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intensificaram a luta em defesa da formação e valorização dos professores. Nesse movimento, as produções simbólicas, materializadas em trabalhos acadêmicos, fertilizavam a luta pela profissionalização da docência.

Nas citadas produções era consenso que os sujeitos professores(as) careciam de condições objetivas de existência, oportunidades de formação contínua com licença remunerada e dignificação de seu trabalho docente. Ademais, precisam ter ao seu alcance oportunidades de domínio da epistemologia da educação e de aportes teórico-conceituais exigidos em cursos de formação.

É pertinente considerar que as políticas educacionais decorrentes do um projeto de atrelado à ideologia neoliberal, estão distantes de favorecer a valorização do(a) professor(a) e seu digno desenvolvimento profissional ao longo da carreira. As poucas conquistas em relação a esta dimensão advêm de movimento e lutas da categoria profissional.

Nesta mesma lógica, Ianni (1992) argumenta que para o neoliberalismo a mercadoria adquire cidadania muito antes que o cidadão, condenando-o a ser “semicidadão”. Enguita (1991), Nóvoa (1991) e Estrela (1997) asseveram que a profissão docente tem sido tratada como semiprofissão. No PNE/2014, por exemplo, foi postergada para 2020 a equiparação do salário dos professores ao de outros profissionais com o mesmo nível de escolaridade. Prova disto está na Lei nº 13.005, de 25/6/2014, na Meta 175 do PNE 2014-2014 (Brasil 2014).

5. Valorizar os(as) profissionais do magistério das redes públicas de edu-cação básica de forma a equiparar seu rendimento médio ao dos(as) demais profissionais com escolaridade equivalente, até o final do sexto ano de vigência deste PNE. Os educadores reunidos nas Conferências Nacionais de Educação 2010 e 2014 e os integrantes do Fórum Nacional de Educação reivindicavam que a equiparação se realizasse imediata-mente após a aprovação do PNE (2014-2024). Assim, a partir de 2020, poderá vir-a-ser.

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Os(as) professores(as) atuantes sem a devida formação enfrentam grandes desafios para conquistar o exercício pleno da cidadania, que consiste, conforme ensinamentos de Coutinho (2000[2008, p. 50]), na apropriação “ e bens socialmente criados” [e na atualização] de “todas as potencialidades de realização humana” em determinado contexto histórico.

Na verdade, o(a) professor(a) sem a formação requerida por lei busca a superação de sua condição de semiprofissional, ao frequentar cursos, por sua própria iniciativa e sem licença remunerada, embora a LDB/1996 prescreva o contrário. Essa busca impulsiona o desenvolvimento da profissionalização docente, com o despertar de uma consciência coletiva, engendrada nas lutas concretas dos movimentos associativos e reivindicatórios.

A propósito mesmo o professor formado não está livre da estigmatização advinda da sociedade brasileira. De acordo com esta a profissão professor(a) é tida como de segunda categoria, por isso pouco atrativa de jovens talentosos. É certo que em tempos de mercantilização, a docência é desvalorizada social e economicamente, desde os primórdios da instituição do ensino elementar no país, com a Lei de 15 de outubro de 1827.

Reconhece-se que a profissionalização com qualidade não depende da exclusiva volição do(a) professor(a). No Brasil, a falta de qualidade nos processos formativos é também determinada pela inoperância da política governamental porque atrelada aos ditames das agências financiadoras internacionais.

Para que a profissionalização docente seja levada a efeito como um processo marcado por um continuum de transformações que poderão propiciar ao(à) professor(a) a atingir condições condizentes de formação e de uma práxis de qualidade socialmente referenciada, o Estado deve implementar uma política global de formação e valorização docente.

Cabe, então, indagar: Seria o Parfor um indutor da profissionalidade, do profissionalismo, enfim da profissionalização do(a) professor(a) da educação básica?

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Parfor: programa emergencial indutor da profissionalização docente?

O Plano Nacional de Formação dos Professores da Educação Básica (Parfor) foi instituído em decorrência da Política Nacional de Formação de Profissionais do Magistério da Educação Básica, por meio do mencionado Decreto de 2009. Esse estabelece que a referida política deve ser implementada com base, entre outros, nos seguintes princípios:

• formação para os docentes da educação básica como compromisso público de Estado;

• formação como compromisso com um projeto social, político e ético;

• desenvolvimento pelas instituições de ensino superior do projeto formativo n que reflita a especificidade da formação docente, assegurando organicidade ao trabalho [...];

• garantia de formação sólida de base teórica e interdisciplinar;

• valorização profissional traduzida em políticas permanentes de estímulo à profissionalização;

• efetiva colaboração entre os entes federados, tendo em vista a consecução dos objetivos dessa política.

No que tange ao campo operacional de fomento e gestão, o Decreto normatizou que a coordenação geral dos programas emergenciais é de responsabilidade do MEC/Capes/EB. Em âmbito estadual, distrital e municipal, a operacionalização deve manter consonância com o art. 4º do mencionado Decreto.

Art. 4º. A Política Nacional de Formação de Profissionais do Magistério da Educação Básica cumprirá seus objetivos por meio da criação dos Fóruns Estaduais Permanentes de Apoio à Formação Docente, em regime de colaboração entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios,

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e por meio de ações e programas específicos do Ministério da Educação. § 1º. O regime de colaboração será concretizado por meio de planos estratégicos formulados pelos Fóruns Estaduais Permanentes de Apoio à Formação Docente, a serem instituídos em cada Estado e no Distrito Federal. (Brasil 2009a)

Cury (2013) faz lembrar que a CF/1988 reafirma a configuração do Estado democrático republicano, declarada desde 1891 pela primeira Constituição da República Brasileira. Perante isso, o autor com vistas ao bem comum, remete ao “sentido de igualdade como norte da própria república”, já que instiga a projeção de ações pactuadas para a educação e conclama a participação de todos. O autor propõe a organização da Federação de tal modo que haja [...] “um maior equilíbrio entre as regiões e as unidades federativas” (Cury 2013, p. 2), induzido pelo regime de colaboração.

Além de ser uma das formas de instituir o Sistema Nacional de Educação e apontar um horizonte para minimizar assimetrias das regiões em relação aos bens culturais, educacionais e econômicos, o regime de colaboração concita a participação de todos os entes federados nesta agenda de profissionalização do magistério da educação básica. O núcleo desta agenda está nos Planos Estratégicos formulados pelos Forprof/Fepad. Esses Fóruns têm sede nas Secretarias de Estado da Educação e do Distrito Federal.

Cabe aos Forprof/Fepad o planejamento estratégico da política de formação de professores do sistema de ensino estadual, municipal e do Distrito Federal. Neste particular, foi possível detectar na maioria dos Estados e no Distrito Federal, pelo menos no período 2009-2011, que esta atribuição não foi levada a efeito. Contraditoriamente, as Secretarias que teriam oportunidade de modificar práticas conservadoras preferiram reproduzir o planejamento existente ou fazer pequenas adaptações. Tais condutas são formas explícitas de resistência às mudanças estruturais necessárias aos processos de formação inicial e

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continuada de professores cursistas em cursos emergenciais de “treinamento em serviço”.

Consoante a Portaria Normativa nº 883/2009, art. 2º, incisos IV, VI, VII são incumbências dos Forprof/Fepad:

IV − propor mecanismos de apoio complementar ao bom andamento dos programas de formação bem como a aplicação de recursos oriundos de receitas dos Estados e Municípios, segundo as possibilidades de seus orçamentos;V −................................................................................................................VI − subsidiar os sistemas de ensino na definição de diretrizes pedagógicas e critérios para o estabelecimento de prioridades para a participação dos professores em cursos de formação inicial e continuada;VII − propor ações específicas para garantir a permanência e rendimento satisfatório dos profissionais da educação nos programas de formação e estimular a instituição de grupos de professores em atividades de formação por unidade escolar. (Brasil 2009c)

Com a pesquisa se constatou que os referidos programas conseguem atender uma exigência do inciso VI, qual seja: dar suporte teórico-prático aos sistemas de ensino, mediante diretrizes pedagógicas e critérios de atendimento às demandas dos municípios, dos estados e do Distrito Federal. Avalia-se, entretanto, que tal iniciativa só veio a ocorrer depois da realização do I Encontro Nacional de Forprof/Fepad, em Brasília, em setembro de 2014.

Nesse encontro, o relato de experiência dos coordenadores dos Fóruns permitiu verificar que a maioria desses órgãos desempenhava parcela mínima de suas atribuições previstas em lei. Em diversos estados da federação, competia aos Forprof/Fepad somente validar as matrículas dos ingressantes nos cursos ministrados pelas IES formadoras.

Quanto aos incisos IV e VII, analisa-se que neles estão contidas propostas para a organização de um plano de ações dos Forpref/Fepad. Prevê-se, todavia, que essas propostas estão condenadas a não concretização, uma vez que as condições objetivas atuais não são favoráveis a:

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a) adoção de mecanismos de acompanhamento da aplicação de recursos oriundos dos estados e municípios, mediante trabalho de expertises que muitas vezes não pertencem aos Fóruns;

b) admissão de medidas que garantam a permanência dos professores nos cursos, seu bom desempenho, bem como agucem seu interesse em se transformarem em agentes de formação de grupos de estudos e de troca de experiências na própria unidade escolar.

Para tanto, é necessária a construção de uma escola de formação e uma escola básica reflexiva e emancipadora, que disponha de projeto político-pedagógico-curricular, compreendido como elemento de organização do processo educacional que nelas ocorrem.

Questiona-se, então: qual é o tempo real que os professores cursistas têm para se dedicar à prática cotidiana de uma escola reflexiva e de qualidade, em uma escola básica e superior como lugar onde o professor aprende e ensina (Canário 2000), onde realiza sua passagem do eu professor(a) solitário(a) para o eu solidário(a) (Sá-Chaves e Amaral 2000)?

No próximo item são apresentados os possíveis indicadores e resultados alcançados até dezembro de 2014, que podem revelar parcela desta parceria da Capes/EB/MEC em regime de colaboração entre entes federativos.

Parfor: a realidade sem retoques desvelada pela pesquisa

O Parfor é uma iniciativa muito recente de política educacional desenvolvida mediante capacitação em serviço. É uma prática formativa que dispõe aos professores cursistas o ingresso em turmas especiais em cursos oferecidos nas modalidades presencial e a distância. Permite também a ocupação de vagas em turmas regulares das IES formadoras. Esse modo de ingresso nas

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IES é diferenciado, apesar de essas serem instituições formadoras que mantêm modelos tradicionais de ingresso discente e o Parfor recomendar que a operacionalização dos projetos políticos pedagógicos atenham-se à metodologia dos cursos universitários regulares.

Lembra-se que os(as) professores(as) cursistas são sujeitos sociais que bem ou mal detêm um conhecimento tácito. Em síntese, são leigos, mas são professores(as) a quem a comunidade acadêmica deve reconhecimento.

A importância dos Forprof/Fepad para o desenvolvimento das políticas emergenciais de formação inicial e continuada de professores é sua configuração plural, permanente e democrática,

Não são poucos os desafios e os obstáculos enfrentados pelos professores cursistas no tocante à permanência com sucesso nos cursos de Primeira e Segunda Licenciatura presenciais diante da “promessa” de auxílio financeiro e “descumprimento” pelos municípios com a logística que engloba apoio para transporte, hospedagem, alimentação. Um dos fatores que dificulta o processo formativo em serviço é a não substituição do(a) professor(a) cursista por um docente remunerado pelo Estado ou pelo Município, como foi pactuado entre os entes federados, no momento de adesão ao Parfor. Como se trata de formação em serviço, vários docentes assumem o pagamento das aulas dos substitutos. Esses obstáculos são determinantes do abandono dos cursos do Parfor.

Marques (2002) faz uma análise a respeito do regime de colaboração e do pacto federativo nacional que talvez elucide, mas não justifica, a falta de apoio aos professores cursistas.

Embora a competência da oferta da educação básica obrigatória seja das três esferas administrativas (União, estados e municípios), as normas de relacionamentos e as condições para o cumprimento das responsabilidades não estão bem definidas e refletem-se na ausência de um sistema nacional. Não há acordo federativo claro. (Marques 2002, p. 11, grifos nossos)

Embora não haja uma cultura do regime de cooperação, em face da relativa autonomia conferida aos estados e municípios,

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esses foram compelidos a firmar um pacto de capacitação de docentes e de ofertar apoio logístico aos cursos e cursistas. Isto porque o Estado delegou-lhes a responsabilidade com respaldo na CF/1988. Sem as verbas supletivas da União, todavia, os referidos entes são desprovidos de condições materiais para tal.

Forçados pela demanda da sociedade por escolas públicas e professores qualificados, os Forprof/Fepad buscaram instaurar o regime de colaboração, ainda que marcado por heterogeneidades e conflitos. Os conflitos emergem, notadamente, da falta de diálogo diante da disputa de poder e das divergências político partidárias.

A investigação em foco com base na análise documental de 234 Atas de reuniões realizadas nos 27 fóruns, no período 2009-2014 e disponibilizadas no portal da Capes/EB constatou que os fóruns têm dinâmicas muito diversas. Essa análise permitiu classificá-los em: consolidados, em desenvolvimento e embrionários. Esses últimos raramente se reúnem, suas ações são descontínuas e, muitas vezes, não conseguem preencher as vagas destinadas pela Capes/EB. Falta-lhes um diagnóstico geral da demanda, planos estratégicos de formação de professores em nível superior, que são obrigatórios. Muitas vezes são omissos na validação de cursos e matrículas de futuros professores cursistas. Os Forprof/Fepad do Distrito Federal e do Estado de Goiás são exemplos de fóruns embrionários.

Por sua vez, os fóruns em desenvolvimento passam por dificuldades, mas realizam reuniões com certa periodicidade, programam e atendem a um cronograma de atividades, validam matrículas e acompanham o desenvolvimento dos cursos que estão sob a responsabilidade das IES formadoras. Esses correspondem a 41% do total dos 27 fóruns.

Os Forprof/Fepad consolidados apresentam como diferencial os seguintes aspectos: a) diagnóstico atualizado da demanda por formação em ensino superior; b) formulação do Plano Estratégico Estadual de Formação de Professores com abrangência de todos os municípios; c) prática do regime de colaboração e de cooperação. Eles marcam presença em todas as regiões geográficas o país. Destaca-se o Fórum do Estado do Pará como exemplo de

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fórum consolidado. Ressalta-se sua singularidade em efetuar a descentralização da sede da Secretaria de Estado realizando reuniões itinerantes nos municípios, uma vez que necessitam vencer enormes distâncias que separam os municípios e a capital Belém. Dos fóruns permanentes 14 (52%) estão consolidados.

No Gráfico 1 apresentam-se dados correspondentes aos Forprof/Fepad consolidados e distribuído por região geográfica.

GRáFICO 1: Forprof consolidados, por região e estados (2014)

Fonte: Atas publicadas no sítio eletrônico da Capes/Parfor (2013).

Outro resultado da análise das Atas é o de que, em face dos objetivos dos Forprof/Fepad serem órgãos colegiados que abrigam a diversidade de componentes tanto da sociedade política como da civil organizada, por força de lei eles têm potencial para realizar a mediação entre as políticas de Estado e os processos de formação e valorização dos professores. Sob essa lógica, poderão aperfeiçoar modos de participação dos representantes da sociedade civil na esfera pública, levando a superar práticas governamentais hegemônicas de planejamento e de execução de políticas pontuais de formação de professores. Com efeito, os fóruns consolidados terão possibilidade de fortalecer atividades do Parfor, como órgãos de política de Estado que não se limita a um mandato governamental e que privilegiam o processo democrático.

Os dados reais identificados pela pesquisa referem-se ao índice de evasão dos professores cursistas. São evidências de metas

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não cumpridas pelo Parfor os 69% de evasão dos professores cursistas na totalidade dos cursos ofertados no período 2010-2013.

Esclarece-se que pesquisa está em andamento, por essa razão os pesquisadores só tiveram acesso aos dados oficiais (Capes/EB) dos professores cursistas. Esses dados podem ser observados nos gráficos 2 e 3 apresentados a seguir, pois neles está representada a comparação entre números absolutos de professores cursistas matriculados, desistentes e formados em 2013, nos cursos de Primeira e Segunda Licenciaturas.

GRáFICO 2: Primeira Licenciatura − número absoluto matriculados, formados e desistentes (2013)

Fonte: Capes/EB/Presencial 2014; Brzezinski, 2014.

São alarmantes os resultados negativos dos cursos de Primeira Licenciatura. Alcançam apenas 4,2% de concluintes de todos os cursos fomentados pela Capes/EB Parfor. A maioria deles com três anos de duração, têm alta evasão de 95,2%. A causa de maior incidência da evasão, segundo dados da investigação é a não substituição dos professores cursistas. Na verdade, quando da celebração do Pacto do Parfor, a Capes/EB e a Secretaria de Articulação dos Sistemas de Ensino (Sase) delegaram essa responsabilidade aos estados, DF e municípios, ao evocar o regime de colaboração expresso na CF/1988. Os professores que resistiram e permaneceram concluíram seus cursos, assumindo pessoalmente o pagamento de seus substitutos. É notável o descaso

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das políticas educacionais em relação à formação e valorização dos profissionais atuantes na educação básica que tem apoio legal na já citada LDB/1996 em seu art. 67.

No Gráfico 3, os dados mostram um melhor desempenho em relação ao quantitativo de formados em cursos de Segunda Licenciatura. Nota-se um índice de 37% de aprovações, embora tenha havido 63% de evasão. Os cursos de Segunda Licenciatura são de curta duração, por isso, de acordo com os informantes da pesquisa, são mais atraentes. Há maior facilidade de professores cursistas garantirem presença tanto na educação básica onde praticam a docência como na instituição formadora onde são discentes.

GRáFICO 3: Segunda Licenciatura − número absoluto matriculados, formados e desistentes (2013)

Fonte: Capes/EB/Presencial 2014; Brzezinski 2014.

No tocante aos cursos de Formação Pedagógica observa-se no Gráfico 4, a seguir, um bom aproveitamento dos cursos, pois contam 61% de formados e 29% de evadidos. Avalia-se que os cursos de Formação Pedagógica foram bem-sucedidos, pelo menos na quantidade de concluintes.

Os professores cursistas manifestaram-se sobre esse resultado, mencionando que seu interesse acadêmico e pedagógico pelo curso é marcado pelas seguintes razões: a) são cursos atrativos porque têm curta duração, de até 12 meses; b) instigam novas aprendizagens; c) possibilitam conhecer e utilizar as inovações tecnológicas.

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Gráfico 4: Complementação pedagógica − matriculados, formados e desistentes (2013)

Fonte: Capes/EB/Presencial 2014; Brzezinski 2014.

No que diz respeito à valorização profissional do(a) professor(a) os benificiários dos cursos de Formação Pedagógica sinalizam como vantagens: a) possibilitar a regularização da situação funcional, pois exercem a docência com vínculo precário, em virtude da formação incompatível com as disciplinas que ministram na educação básica; b) abrir horizontes para o exercício da gestão escolar, por exemplo, para ocupar funções de coordenador pedagógico, de supervisor educacional, de diretor da escola da educação básica ou de gestor nos sistemas de ensino.

Em face de resultados parciais da pesquisa, alcançados até o momento tem-se a convicção de que o Parfor e os Fóruns Permanentes de Apoio à Formação Docente para atingir suas metas devem superar muitas dificuldades, entre outras:

a) falta de subsídios aos cursistas, embora tenham sido prometidas bolsas de estudos e licença remunerada;

b) fragilização do regime de colaboração e de cooperação entre os entes federados;

c) ausência de recursos suplementares e de transferências voluntárias da União para municípios carentes de verbas a serem destinados à educação;

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d) pouca qualidade da aprendizagem e de dedicação aos estudos pelos professores cursistas diante da ausência de condições materiais.

As condições desfavoráveis para se manter nos cursos são propulsoras da evasão. Os(as) professores(as), embora sintam a importância dos estudos nos cursos e os desejam, evadem-se dos programas a eles destinados. Assim, a pesquisa atestou. Ao lado disso, ficou claro que existe uma incipiente cultura do regime de colaboração entre os entes federados, deixando o professor cursista desguarnecido materialmente, o que agravou suas precárias condições de trabalho e remuneração.

Conclui-se que com tais dificuldades e outras de diversas natureza impedem o desenvolvimento do Parfor para formar professores em serviço em cursos emergenciais. Impedem também a consolidação dos Forprof/Fepad. Avalia-se que se corre o risco de essa iniciativa da Capes/EB não se sustentar como política de Estado que ultrapasse mandatos governamentais.

Ademais, os obstáculos impactam a qualidade dos cursos que poderão negligenciar a aprendizagem de fundamentos teóricos da formação de profissionais da educação, ao oferecer um curso de matriz curricular de teor mais prático do que teórico. É notória essa tendência nas políticas educacionais das últimas cinco décadas no Brasil, que atribuem grande relevância aos saberes tácitos que a pessoa leiga acumula ao longo de sua experiência docente e que tende a ser reconhecida como conhecimento. Essa concepção de formação provoca rompimento dos nexos com o projeto sócio histórico da educação brasileira, defendido pelas entidades de estudos e pesquisa em educação, como, por exemplo, a Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação (Anfope).

É ameaçadora a concepção de políticas de cunho neoliberal, porque se sustenta na premissa de que educação é mercadoria, contrapondo-se à formação para o trabalho docente com centralidade em bases ontológicas, humanistas e praxiológicas. Desafortunadamente, corre-se ainda o risco de sucumbir esse Plano tornando-se um simples instrumento de conceder certificação

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aos professores cursistas, sem qualquer respeito à qualidade referenciada no social.

Uma alternativa de superação deste contexto seria a articulação de todas as secretarias do Ministério da Educação a um único projeto de políticas educacionais, de educação, de escola básica e superior, de formação e de valorização dos profissionais da educação, objetivando propor medidas de consolidação dos Forprof/Fepad.

Em consequência, é necessário garantir-lhes a atual constituição plural e democrática e suas estratégicas atribuições de planejamento e acompanhamento das políticas estaduais e do Distrito Federal. Potencialmente, os Forprof/Fepad tem perspectiva de se transformarem em embrião do Sistema Nacional de Formação e Valorização dos Profissionais da Educação, articulado ao Sistema Nacional de Educação.

O desenvolvimento da pesquisa também demonstrou que é preciso ter cautela ao utilizar as estatísticas oficiais da Capes/EB/Parfor e os dados reais. As discrepâncias são assustadoras. São aspectos que impedem, como elucida Bourdieu (1989[2003, p. 118]), de “munir-se de um meio de explicar mais completamente a ‘realidade’, logo, de compreender e prever [com maior precisão] as potencialidades que elas encerram, ou mais precisamente, as possibilidades que ela oferece às diferentes pretensões subjetivistas”.

Faz-se ainda alusão às dificuldades enfrentadas pelo país nesta conjuntura ameaçadora de sua soberania, em face da crise na gestão do Estado; do inexpressivo desempenho da economia brasileira e do impacto que causarão os cortes no da União de recursos vinculados à educação para o ano de 2016. Esse contexto nacional de crise, por certo, afetará o desenvolvimento das políticas públicas e também o Parfor como uma política educacional

Indaga-se: seria, talvez, o prenúncio do ocaso do Parfor que sequer teve oportunidade de ser avaliado em sua plenitude?

A verdade crua e nua mostrada por um camponês anônimo e divulgada por Germano (1992[2005, p. 278]) desnuda a histórica realidade da formação de profissionais da educação brasileira em que “é preciso encontrar saída onde não tem porta”.

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6desenvolvimento proFissional docente: conceituando o início da carreira

Kátia Augusta Curado Pinheiro Cordeiro da SilvaDaniel de Freitas Nunes

Introdução

Este texto analisa conceitualmente o primeiro ciclo da carreira docente denominado “entrada na carreira” (Huberman 1992). Ao iniciar pesquisa sobre a temática em 2013, realizamos um estudo de estado do conhecimento (Curado Silva, Fideles e Rocha 2015) e constatamos que os estudos, quando analisaram o ingresso na carreira docente, especificamente na rede pública de educação básica e superior, não têm diferenciado a questão preliminar e conceitual sobre se este professor está iniciando na carreira do magistério ou se traz experiências docentes anteriores.

Num primeiro momento, tal diferenciação parece ser trivial, entretanto, a questão do “choque de realidade” (Marcelo García 2011, p. 9), no início da carreira, indica ter elementos diferenciados relacionados à experiência docente anterior. Nos primeiros anos de docência, a transição de estudantes a professores é marcada pelo princípio da sobrevivência ou pelo abandono da profissão. Essa é

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uma fase crucial do ciclo profissional porque os principiantes têm de, ao mesmo tempo, ensinar e aprender a ensinar, uma vez que há certos comportamentos que só podem ser aprendidos em situações práticas (Marcelo García 2011). As maiores taxas de evasão dos docentes ocorrem nos primeiros anos de magistério, e esse é:

um período de tensões e aprendizagens frustrantes quando tratamos das condições objetivas do trabalho docente que gera sentimentos e sensações como angústia, insegurança, fracasso, desmotivação, dialeticamente. Então há possibilidade para que este possa se reafirmar na profissão ou negar a profissão em contextos geralmente desconhecidos, durante o qual os professores iniciantes devem adquirir conhecimentos profissionais e manter um certo equilíbrio pessoal. (Marcelo García 2011, p. 9)

Entretanto, dados da pesquisa CNPq 20131 têm apontando que há diferenças significativas do início da carreira entre aqueles que têm sua primeira experiência como docente e aqueles que estão inseridos na rede, no nível ou na modalidade a partir de experiências do magistério anterior. Embora a ênfase na temática seja crescente, nota-se que é preciso ampliar as pesquisas na área, haja vista que há urgência de estudos que podem contribuir com a permanência e o apoio a jovens professores, mas também permitam indicar as especificidades.

As análises dos estudos revisitados no estado do conhecimento indicam que as descobertas estão relacionadas ao processo do trabalho docente na oferta de um serviço que contraditoriamente se reconhece e não reconhece. O trabalho pedagógico contém uma relação prazerosa com o conhecimento e com o outro, na possibilidade do encontro e da objetivação do aprender no aprender do outro, mas contraditoriamente pode ser motivo de sofrimento e frustração pela não relação estabelecida.

1. Pesquisa aprovada no edital Universal CNPq 2013.

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Além desse aspecto inerente ao trabalho imaterial, ou melhor, à oferta de serviço, há o entusiasmo na vontade de descobrir, portanto, a experimentação, a exaltação por estar, finalmente, em situação de responsabilidade (ter a sua sala de aula, seus alunos, o seu problema, o seu programa) por se sentir colega num determinado corpo profissional. Entretanto, os mesmos aspectos podem ser frustrantes quando tratamos das condições objetivas do trabalho docente, que gera sentimentos e sensações como angústia, insegurança, fracasso, desmotivação, dialeticamente. Então, há possibilidade para que esse docente possa se reafirmar na profissão ou negar a profissão.

Os dilemas e dificuldades do professor iniciante são causados pela exigência de atuação em que a contradição marca a possibilidade do reconhecimento ou da negação. Entre os aspectos, destacam-se: a relação com o aluno; a dicotomia teoria-prática; a relação com os pares; a condição material de trabalho nas escolas; o conteúdo e as metodologias frustrantes quando tratamos das condições objetivas do trabalho docente, que gera sentimentos e sensações, como angústia, insegurança, fracasso, desmotivação. Desta forma, há, dialeticamente e contraditoriamente, a possibilidade para que o docente possa se reafirmar na profissão ou negar a profissão.

Para o professor que tem experiência docente anterior, parece que dois aspectos no início da carreira se sobressaem na dificuldade: lidar com o novo cotidiano, a cultura organizacional, e as condições objetivas de trabalho. Elementos de reconhecimento, relação com os pares, relação com o aluno e a dicotomia teoria e prática podem surgir novamente, mas são situações vividas e experimentadas.

Assim, pretende-se conceituar e diferenciar termos comumente usados para o professor no início da carreira, bem como apontar para a necessidade de estudos que aprofundem os ciclos da carreira no Brasil, considerando as especificardes de idade de ingresso, experiência anterior e tempo na carreira.

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134 SÉRIE AS DIMENSÕES DA FORMAÇÃO HUMANA

A metodologia da pesquisa incluiu dois momentos. O primeiro trata-se da produção de estado do conhecimento2 sobre o tema com um recorte temporal de 2000 a 2014, justificando a continuidade de pesquisas já realizadas até o ano de 2000 (Papi e Martins 2010). Para concretizar o objetivo deste estudo, realizamos, primeiramente, uma seleção de periódicos da área de educação, relacionados no site WebQualis A e B da CAPES. Na busca por teses e dissertações, utilizamos como fonte o Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT), que coordena o projeto da Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD). Também realizamos um levantamento nos anais dos eventos da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPED), do Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino (ENDIPE) – uma escolha justificada pela relevância científica que os dois eventos possuem para a área de Formação de Professores ‒, e no Congresso Internacional sobre Professorado Principiante e Inserção Profissional à Docência (CONGREPRINCI), pelo fato de o objeto central de discussões e pesquisas do evento focar no professor iniciante/principiante e ingressante na carreira docente. Em nossa investigação, selecionou-se um total de 123 trabalhos publicados nas diferentes fontes, ficando assim distribuídos: sete teses de doutorado; 23 dissertações de mestrado; 10 artigos publicados em periódicos A1 e A2; 26 artigos publicados em periódicos qualis B; 11 trabalhos apresentados na ANPEd; oito trabalhos apresentados no ENDIPE e 38 trabalhos apresentados no CONGREPRINCI.

Num segundo momento, o trabalho apresenta o tratamento (Nunes 2015) de variáveis socioeconômicas de estudantes de licenciaturas no Brasil a partir dos microdados do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes do Ministério da Educação (ENADE/MEC). O interesse especial é na descrição e discussão de variáveis

2. O trabalho foi desenvolvido dentro do Grupo de Pesquisas e Estudo so-bre Formação e Atuação de Professores/Pedagogos (GEPFAPe) e vincu-lado ao Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) da Faculdade de Educação (FE), da Universidade de Brasília, e contou com estudantes de graduação e pós-graduação.

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fORMaçãO, pROfiSSiOnalizaçãO e tRaBalhO dOCente 135

socioeconômicas, e esse exame também lança mão da técnica estatística de análise multivariada, análise de correspondência, objetivamente, recortando para este estudo a questão da idade.

Os dados coletados permitiram localizar, em meio à complexidade e à diversidade da temática, várias nuances específicas do início da carreira no Brasil e deixaram evidentes muitos outros aspectos que necessitam de maior atenção e investimento. A seguir, apresentaremos dois aspectos relevantes à questão conceitual do campo: a idade do ingresso na licenciatura e a experiência de trabalho que antecede o ingresso efetivo na carreira de docência.

Idade de entrada na carreira docente no Brasil

Os clássicos textos de Huberman (1989a, 1989b) sobre o ciclo de vida profissional dos professores postulam, tendo como referência o contexto europeu, que o início da carreira de professor se dava por volta dos 22 anos de idade, de maneira que nessa fase da vida inaugurava-se um longo ciclo de ingresso na carreira, marcado pela dúvida, turbulência e consolidação da carreira profissional. Concebendo o ingresso e a consolidação da carreira docente como um ciclo, a idade da amostra nos cursos de licenciatura, segundo o Censo da Educação Superior – Brasil 2011 ‒, é fundamental para visualizarmos e problematizarmos este ciclo.

Diante dessa necessidade identificada no que diz respeito à amostra, muito pode ser dito com relação à idade (Tabela 10) dos nossos futuros professores. A primeira inferência a ser feita é a alta média de idade. Se considerarmos a idade ideal para ingresso no ensino superior, isto é, logo após a conclusão do Ensino Médio, na faixa dos 18 anos de idade, e a de saída em torno dos 22, a amostra nas licenciaturas foge significativamente a esse padrão: trata-se de indivíduos que entraram tardiamente no ensino superior, com médias gerais de idade na faixa dos 29,6 e 32 anos de idade (IES públicas e privadas, respectivamente, ver Tabela 1). De todo modo,

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136 SÉRIE AS DIMENSÕES DA FORMAÇÃO HUMANA

cabe registrar que essa média varia significativamente quando se considera a amostra por área de enquadramento, como evidencia a Tabela 1.

TABELA 1 – Estatística descritiva da idade da amostra por área de enquadramento e geral das IES públicas e privadas

ESTATÍSTICA DESCRITIVA

áREA DE ENQUADRAMENTO

NO ENADEESTATÍSTICA

IES

PÚBLICAS

IES

PRIVADAS

MATEMáTICA

Média 29,52 30,17

Desvio padrão 7,917 8,559

Mínimo 19 19

Máximo 68 69

LETRAS

Média 30,14 31,63

Desvio padrão 8,390 9,116

Mínimo 18 19

Máximo 78 86

FÍSICA

Média 28,36 32,13

Desvio padrão 7,025 8,550

Mínimo 19 20

Máximo 64 64

QUÍMICA

Média 26,60 27,47

Desvio padrão 5,518 6,638

Mínimo 19 19

Máximo 61 63

BIOLOGIA

Média 27,22 27,64

Desvio padrão 7,035 7,029

Mínimo 19 18

Máximo 74 67

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fORMaçãO, pROfiSSiOnalizaçãO e tRaBalhO dOCente 137

PEDAGOGIA

Média 32,26 33,80

Desvio padrão 8,947 9,235

Mínimo 19 19

Máximo 80 76

HISTÓRIA

Média 27,64 32,69

Desvio padrão 6,862 9,823

Mínimo 19 19

Máximo 74 74

ARTES VISUAIS

Média 32,25 33,54

Desvio padrão 9,630 9,877

Mínimo 20 20

Máximo 69 71

GEOGRAFIA

Média 28,82 31,22

Desvio padrão 7,413 9,009

Mínimo 19 20

Máximo 71 75

FILOSOFIA

Média 30,52 34,27

Desvio padrão 9,102 11,169

Mínimo 20 19

Máximo 67 78

ED. FÍSICA

Média 25,57 26,76

Desvio padrão 5,142 6,216

Mínimo 20 19

Máximo 58 66

COMPUTAÇÃO

Média 27,16 30,90

Desvio padrão 5,894 7,965

Mínimo 20 20

Máximo 53 52

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138 SÉRIE AS DIMENSÕES DA FORMAÇÃO HUMANA

MÚSICA

Média 29,99 30,39

Desvio padrão 8,139 9,267

Mínimo 21 20

Máximo 72 73

CIÊNCIAS SOCIAIS

Média 27,60 37,08

Desvio padrão 7,081 10,188

Mínimo 19 20

Máximo 77 67Fonte: Microdados do Enade 2011 (Nunes 2014).

As variações mais significativas, ao contrário do que poderíamos pensar de imediato, não estão associadas a determinadas áreas de enquadramento e perpassam todas as áreas do conhecimento. De qualquer maneira, tanto nas IES públicas quanto nas privadas, o curso de Química é o que apresenta uma média de idade mais distante da média geral: 26,6 e 27,5 anos, respectivamente. Se considerarmos o desvio padrão (5,5 e 6,6), podemos inferir que se trata da área de enquadramento que apresenta os pretensos professores mais jovens da amostra.

Salvo o registro da inexistência de um padrão claro quanto à idade média, a afirmação de que são indivíduos que tardiamente entram no ensino superior é totalmente corroborável, como denotam as médias de idade da amostra. Logo, para a nossa análise, esse ingresso tardio no ensino superior pode explicar muita coisa sobre a composição da classe docente no Brasil.

Comparando esses dados com outras bases disponíveis é possível inferir que o ingresso do professor na carreira não segue as proporções de alunos concluintes, como é o caso da nossa amostra. Números recentes do Teaching and Learning International Survey (TALIS), de 2013 (OECD 2014), que apresenta um extenso relatório sobre as condições do trabalho docente e da educação através do globo terrestre, permitem contributivas comparações nesse sentido, como mostra a Tabela 2.

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fORMaçãO, pROfiSSiOnalizaçãO e tRaBalhO dOCente 139

TABELA 2 – Composição da classe docente no Brasil por faixas etárias segundo o TALIS e composição da amostra por faixas etárias

FAIX

A E

TáRI

A

MEN

OS

DE

25 (%

)

25-2

9 A

NO

S (%

)

30-3

9 A

NO

S (%

)

40-4

9 A

NO

S (%

)

50-5

9 A

NO

S (%

)

60 A

NO

S O

U M

AIS

(%)

IDA

DE

MÉD

IA

BRASIL 4,6 13,0 36,2 30,2 13,7 2,3 39,2

MÉDIA OECD 1,9 10,0 29,2 28,8 23,8 6,3 42,9

AMOSTRA 29,2 24,7 28,3 13,4 3,9 0,5 31,06Fonte: OECD TALIS, 2013. Microdados do ENADE (Nunes 2014).

A primeira comparação é a discrepância entre o número de professores em determinadas faixas e o respectivo número de formandos. Isso leva a sugerir que, se levarmos em consideração que a estratificação da amostra por faixa etária tenha se repetido em anos anteriores, com variações dentro de uma flutuação amostral pouco significante, os mais jovens, aptos a entrarem na carreira, não fazem inicialmente essa escolha.

Essa inferência começa a fazer sentido quando a Tabela 2 evidencia que os 29,2% que possivelmente poderiam entrar na carreira, no ano de 2012, estavam na faixa etária abaixo dos 25 anos, apesar de, no ano de 2012, segundo o TALIS, apenas 4,6% dos professores brasileiros terem sido oriundos dessa faixa etária, o que é uma discrepância significativa.

Outro fato curioso é que quanto mais aumenta a faixa etária mais vão se estabilizando os percentuais por faixas etárias, tanto nos dados do TALIS quanto nos dados da nossa amostra. Isso permite sugerir que os jovens, sobretudo das faixas etárias abaixo de 25 anos e de 25-29 anos, podem não estar optando inicialmente pela carreira docente, ao passo que em faixas etárias mais avançadas as discrepâncias entre os aptos a entrarem no mercado e o número de professores não são tão notáveis.

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140 SÉRIE AS DIMENSÕES DA FORMAÇÃO HUMANA

Essa hipótese é afirmável quando se analisa a atratividade da carreira docente entre os mais jovens. Em estudo realizado com ingressantes do ensino superior, no âmbito da Universidade de São Paulo (USP), Leme (2012) postula que, para aqueles que estão ingressando no ensino superior, em especial na faixa etária que vai dos 20 anos até os 30, ser professor não é a primeira opção, nem mesmo para aqueles que estão ingressando em cursos de licenciatura.

Cursos como o de Física, por exemplo, que na Tabela 10 apresenta uma média de idade de 28,4 anos, a opção pela licenciatura não é a mais cogitada, e o êxodo de carreira é iminente, já que essa área oferece outras possibilidades no mercado de trabalho, como aponta Kussuda (2012). O mesmo acontece em maior ou menor grau em outras áreas do conhecimento. Fato relevante que corrobora essa afirmativa é a pesquisa coordenada pelo professor Marcelino Rezende Pinto, da USP, bastante citada na impressa nacional, que comparou o número de graduados em licenciatura e a demanda estimada de professores para concluir que não faltam professores no Brasil, eles apenas não estão sendo atraídos para a carreira.

O que se pode inferir é que seguramente os mais jovens não se sentem atraídos pela profissão docente, e os estudos são unânimes ao postularem que questões como salário, condições de trabalho e prestígio social da profissão estão entre os maiores obstáculos (Leme 2012; Kussuda 2012; Tartuce et al. 2010), e que quando o fazem é mais por forças das circunstâncias do que por opção pessoal.

Essa falta de atratividade incide, diretamente, na experiência profissional dos docentes brasileiros, e o caráter marginal da escolha pela carreira docente pode também ser inferido a partir da leitura dos dados do TALIS. De acordo com este estudo, quando o assunto é a experiência profissional medida em anos, os professores brasileiros ficam atrás apenas da Islândia (9,6 anos), do México (7,4 anos) e da Alberta (7 anos), dentre os países (ou regiões) onde os professores mais acumularam experiência fora da profissão docente (Tabela 3).

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fORMaçãO, pROfiSSiOnalizaçãO e tRaBalhO dOCente 141

TABELA 3 – Tempo médio (em anos) do professor brasileiro e média de experiência dos professores dos países participantes do estudo

Tempo médio (em

anos) de experiên-

cia como profes-

sor na escola em

que trabalha

Tempo médio

(em anos) de ex-

periência como

professor

tempo médio em (anos)

de experiência em outras

áreas profissionais

BRASIL 7,0 13,6 6,6

MÉDIA

OECD 9,8 16,2 3,8Fonte: OECD TALIS, 2013 (Nunes 2014).

Complementarmente, o que se pode afirmar, a partir da Tabela 12, é que o profissional docente no Brasil, a despeito de comportar um número maior de professores oriundos de faixas etárias mais elevadas, é em média três anos menos experientes que os professores de países participantes do estudo. Contudo, quando o assunto é experiência acumulada em outras áreas profissionais, a situação se inverte: os professores brasileiros possuem, em média, quase três anos a mais de experiência.

Logo, o caráter marginal e circunstancial da escolha pela profissão fica evidente: o professor, ou o aspirante a professor no Brasil, se aventura em outras áreas profissionais antes de ingressar na carreira docente, parecendo esta ser uma das últimas possibilidades consideradas.

Ao que parece, o ciclo de vida profissional docente se inverte quando se considera o caso brasileiro. Segundo o clássico estudo de Huberman (1989b), que se dedicou a revisar a literatura internacional sobre os ciclos profissionais dos professores, o questionamento ou momento de “dúvidas” a respeito da profissão surge entre a fase de 12-20 anos de experiência de profissão, que compreende os 32-45 anos de idade. No Brasil, todavia, esse momento de dúvida, de medo de “ser condenado a morrer com um pedaço de giz na mão em frente ao quadro negro”3 (Huberman

3. Traduzido do inglês.

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142 SÉRIE AS DIMENSÕES DA FORMAÇÃO HUMANA

1989, p. 354, tradução nossa), parece anteceder o ingresso na carreira. Esse medo de “morrer com um pedaço de giz na mão” é pelo que aponta a vasta literatura, o que retarda o ingresso na carreira, levando o pretenso professor a se aventurar, primeiro, em outras áreas profissionais.

Mas isso leva a inferir considerações bem mais além dos fatores condicionantes do ingresso na carreira docente e do perfil etário da amostra. Considerando que o perfil da nossa amostra esteja bem próximo do perfil daqueles aptos a ingressarem na carreira anualmente, podemos adicionalmente corroborar a tese de que a presença de estratos etários envelhecidos na Tabela 11 evidencia, a despeito do significativo percentual (29,2%) de jovens formados (menos de 25 anos), que há um ingresso mais significativo na carreira dos candidatos a professores mais envelhecidos dentre os habilitados a se tornarem professores. Isto fica evidente quando se analisa que a presença de professores com faixa etária mais elevada não necessariamente significa professores com maior experiência acumulada (Tabela 3).

Essa aparente pouca experiência acumulada reflete diretamente na qualidade do sistema educacional. Segundo Huberman (1989b), o início da carreira docente é, para muitos professores, um momento traumático, marcado pela sensação de opressão, experimentação pela tentativa de erro/acerto, desequilíbrio entre rigidez e permissividade e problemas com a disciplina dos alunos. Este último aspecto constitui-se, no caso brasileiro, uma característica marcante dos problemas enfrentados em sala de aula. Segundo o TALIS, os professores brasileiros gastam, em média, 20% de todo o seu tempo para manutenção da ordem em sala de aula, um percentual bem acima da média de 13% dos países participantes da pesquisa (OECD 2014).

Resumidamente, sugere-se que a composição etária da amostra impõe considerar que a conjugação de diferentes fatores apontados anteriormente leva o Brasil a formar professores com uma faixa etária elevada quando se considera o tempo ideal de ingresso e conclusão de um curso de graduação no Brasil. Todavia, esse fato representa bem mais do que formar professores mais

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envelhecidos; implica diretamente na experiência acumulada dos nossos professores e, consequentemente, na qualidade deles e em seus ciclos da carreira.

O início da carreira docente: diferentes conceitos e significados

Huberman (1992) explica que existem muitas maneiras de estruturar o ciclo de vida profissional de professores. No entanto, o autor decide-se por um aspecto mais clássico, que é o da carreira. O autor aponta que este aspecto é “mais focalizado, mais restrito que o estudo da ‘vida’ de uma série de indivíduos” (Huberman 1992, p. 38). O autor ainda se fixa na docência em nível do ensino secundário, o que para o Brasil equivale à educação básica. Conforme o estudo do autor, a carreira passa pelas seguintes fases:

1ª) Fase de entrada na carreira – compreende os três primeiros anos de docência e indica dois momentos, geralmente vividos pelo professor em início de carreira: i) estágio de sobrevivência, e ii) estágio de descoberta. O primeiro representa um momento de grande instabilidade pessoal e profissional. O segundo estágio caracteriza-se pelo entusiasmo e pela experimentação/exploração, pois o docente já se sente responsável pelo seu trabalho e parte integrante de um grupo profissional. As pesquisas indicam frequentemente que esses dois estágios são vividos juntos e variam apenas as intensidades, sendo que o estágio de descoberta contribui para o professor suportar o estágio de sobrevivência e seguir na carreira. Também pode ocorrer de professores iniciantes vivenciarem apenas um desses estágios ou ainda apresentarem os seguintes perfis: 3) indiferença ou quanto pior melhor; 4) serenidade; 5) frustração (Huberman 1992);

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144 SÉRIE AS DIMENSÕES DA FORMAÇÃO HUMANA

2ª) Fase de estabilização – constitui um período entre o 4º e o 6º ano de docência, com características de “comprometimento definitivo” e “tomada de responsabilidades”. O grau de liberdade docente aumenta significativamente em relação às suas prerrogativas e à sua maneira própria de atuar na docência. Há um sentimento de competência pedagógica, que pode ser sentido em alguns momentos ou acompanhar toda esta fase;

3ª) Fase de diversificação – caracteriza-se pelo período en-tre o 7º e o 25º ano de docência. Os professores buscam novos desafios para evitar a rotina, mostram-se moti-vados nas diversas atividades na escola, experimentam e diversificam. Entretanto, por volta do “meio da car-reira”, entre o 15º e o 25º ano de docência, os professo-res vivenciam um período de questionamento;

4ª) Fase de serenidade ‒ compreende o período entre 25 e 35 anos de docência. Representa um “estado de alma” do professor, em que as avaliações que os ou-tros fazem de si não o afetam significativamente. Há um processo de aceitação plena de si como pessoa e profissional. Em meio a esta fase, os professores po-dem passar por um período de conservadorismo e lamentações, em que suas causas variam caso a caso;

5ª) Fase de desinvestimento ‒ constitui-se no período entre 35 e 40 anos de docência. Nesta fase, o professor desenvolve um processo, geralmente, de um recuo positivo da docência (desinvestimento sereno) para dedicar-se mais a si próprio e à sua vida social para além da escola. Em alguns casos, esse processo de desinvestimento pode ser amargo quando o docente apresenta certo desgosto pela profissão e espera ansiosamente pelo término da carreira.

Ao construir uma teorização dos ciclos profissionais docentes, Huberman (1992) deixa claro que nem todos os professores vivenciam sequencialmente as mesmas fases e

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nem todos passam por todas as fases. Percebe-se, assim, que o professor, ao longo da carreira, passa por processos diferenciados e peculiares, que podem ser caracterizados por fases da trajetória profissional. Este fato impulsionou diferentes estudos e teorizações do percurso profissional docente, e alguns serão aqui abordados pela ênfase dada à fase inicial da carreira do professor.

O professor iniciante, antes de ingressar na escola como docente, já viveu inúmeras experiências que o constituiu por meio de diferentes relações sociais e de discursos que circulam na sociedade e disputam o controle das subjetividades. Como essa constituição está sempre inacabada, sempre em processo e não é vertical, mas relacional, é uma construção sempre negociada nas relações de poder.

Ao trabalharmos com os dados específicos da carreira docente no Brasil, percebemos a necessidade de conceituar o que denominamos de professor iniciante/principiante e ingressante nas pesquisas e o problema de tratar como sinônimos os léxicos descritos na carreira docente.

Os dados do INEP (Brasil 2011) sobre o estudante de licenciatura no Brasil mostram que o futuro docente trabalha em outras áreas profissionais antes de ingressarem na carreira docente, parecendo esta ser uma das últimas possibilidades consideradas, pois se trata de indivíduos que entraram tardiamente no ensino superior. Tal estatística permite inferir que é um jovem trabalhador que busca se qualificar posteriormente.

Além disso, o número de “professores leigos” no Brasil – que só concluíram o ensino fundamental ou o ensino médio regular conforme Dados do Censo Escolar 2013 ‒ mostra que 161.700 profissionais dão aulas sem a formação adequada para alunos matriculados em creches, pré-escolas, no ensino fundamental e até no ensino médio nas cinco regiões do País, representando 7,7% dos docentes que atuam nas escolas brasileiras. Assim, o total de docentes que atua hoje nas escolas brasileiras é de 2,1 milhões de professores na educação básica no Brasil.

O gráfico a seguir apresenta dados sobre o ingresso na carreira docente de 10 professoras no Distrito Federal (Duarte 2014).

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146 SÉRIE AS DIMENSÕES DA FORMAÇÃO HUMANA

GRáFICO 1 – Início do exercício profissional

Fonte: Duarte 2014.

As implicações para a pesquisa com o início da carreira são diversas e, nesse momento, destaca-se a questão conceitual. Ora, se esse professor já trabalha e tem experiência docente anterior a seu ingresso efetivo na rede pública, entende-se que este, em termos de carreira, já vivenciou um ou mais ciclos de aprendizagem profissional e, ao se vincular a uma rede, nível ou modalidade diferente, deve ser visto como ingressante, diferenciando-o do iniciante/principiante. Qual a especificidade? A fase de descoberta ou choque da realidade terá elementos distintos daqueles que iniciam a carreira docente como primeira experiência.

Conforme Duarte (2014), destacaram-se algumas4 múltiplas determinações operantes no fenômeno de tornar-se docente:

• Determinações culturais: educação e ensino como práticas sociais cotidianas e como práticas sociais não cotidianas;

• Determinações econômicas: transformações no mundo do trabalho (reestruturação produtiva,

4. Destacaremos algumas determinações, pois não seria possível abordar toda complexidade do real no limite desta pesquisa.

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fORMaçãO, pROfiSSiOnalizaçãO e tRaBalhO dOCente 147

relação qualificação/desqualificação, precarização das condições de trabalho docente);

• Determinações políticas: institucionalização da educação e da profissão docente, políticas de formação docente.

O choque da realidade como primeira fase da carreira se traduz na condição dialética de realização e desafios ou descobertas e dificuldades. No caso do professor iniciante ou principiante, palavras sinônimas que se referem à primeira experiência profissional docente, tal ciclo apresentará relação aos fenômenos culturais, políticos e econômicos, como se pode analisar no estado do conhecimento.

Entretanto, na especificidade da profissão no Brasil, que acontece tardiamente como formação profissional, apresentando-se com outras experiências profissionais em campos diversos bem como em outros espaços de atuação docente (escolas privadas), o ciclo do professor ingressante necessita ser observado, pois remete a aquele que ingressa numa rede, num nível e numa modalidade de ensino, porém, com experiência profissional na docência já acumulada. Neste caso, o “choque da realidade” ou a “fase da descoberta” tem distinção e se traduz nas formas estranhadas do trabalho quando submetido, em sua organização, às imposições de rotina em um novo cotidiano e cultura organizacional e na relação com a nova institucionalização política da profissão.

Na caracterização como professor ingressante numa rede, num nível ou numa modalidade e não iniciante na docência, assume-se que o profissional carrega elementos de experiência e reelaboração da prática docente. O momento de instabilidade pessoal e profissional foi vivido anteriormente, e a fase nova se refere a se adequar a uma nova condição objetiva de trabalho. Também o segundo estágio da primeira fase da carreira caracteriza-se pelo entusiasmo, e a experimentação/exploração já foi vivenciada, pois o docente ingressante já se sente responsável pelo seu trabalho e agora, na nova rede, busca fazer parte integrante de um grupo profissional da cultura organizacional.

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148 SÉRIE AS DIMENSÕES DA FORMAÇÃO HUMANA

O que buscamos mostrar é que parece haver novas configurações no ingresso em uma rede, modalidade ou um nível que precisam de pesquisas que identifiquem tais elementos. Ao que parece, o ciclo de vida profissional docente se inverte quando se considera o caso brasileiro, pois o momento de dúvida, de medo, parece anteceder o ingresso na carreira.

Síntese final

Admitir, no desenvolvimento da pesquisa sobre a carreira docente, a condição de que é necessário compreendermos a especificidade da fase inicial, diferenciando iniciantes/principiantes de professores ingressantes, é, no nosso entendimento, um elemento essencial na construção de uma teorização sobre o desenvolvimento profissional docente que atenda às especificidades da carreira no Brasil.

Ao assumirmos as características e necessidades dos professores ingressantes como diferentes dos professores iniciantes/principiantes, torna-se um movimento político e pedagógico que visa: compreender a questão das especificidades de formação e programas de apoio para a carreira docente; compreender que o medo de ser professor, a não atratividade da carreira e as condições socioeconômicas de quem opta pela licenciatura retardam o início da profissionalização e, consequentemente, trazem especificidades para os ciclos da docência; vislumbrar a possibilidade de estudos sobre o cotidiano e a cultura organizacional no ingresso do docente em uma rede, com vistas à permanência e vivência de uma docência com objetivações de afirmação e negação do trabalho docente e, portanto, carregada da possibilidade de reconhecer-se como professor.

Referências

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7o trabalho docente e sua dupla determinação: prÁxis e alienação

Vanderleida Rosa de Freitas e Queiroz

Introdução

O trabalho docente é uma forma específica de trabalho educativo que se concretiza como mediação na produção do humano e de sua sociabilidade, no seio das práticas sociais mais amplas. É trabalho de formação humana, que, sendo parte integrante do trabalho educativo, concorre para “produzir direta e intencionalmente, em cada indivíduo singular, a humanidade que é produzida histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens” (Saviani 1991[2005, p. 13]).

Em seu trabalho de ensinar, o professor pode realizar a práxis educativa, possibilitando a transformação tanto dos estudantes sob sua responsabilidade quanto de si mesmo. Na ação pedagógica, ele planeja e escolhe os melhores meios para o desenvolvimento dessa ação, incumbindo-se também de identificar e selecionar os “elementos culturais que precisam ser assimilados pelos indivíduos da espécie humana para que eles se tornem humanos” (Saviani 1991[2005, p. 13]). Na realização desse

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trabalho, que é por natureza trabalho de sociabilidade, interação concreta de sujeitos históricos, o professor e todos os outros envolvidos se fazem humanos.

Considerando o trabalho como categoria ontológica do humano, a práxis seria definidora do trabalho docente (Vázquez 1967[2007]). Contudo, no contexto da sociedade capitalista, há que se destacar a contradição como constitutiva do real, das relações sociais aí instauradas, da totalidade concreta, enfim. Assim, ao mesmo tempo que se constitui práxis, condição possibilitadora da transformação social e da emancipação humana, o trabalho docente, como parte do todo, constitui-se alienação, condição reprodutora das relações sociais sob o capitalismo.

A forma alienada se manifesta no modo como o trabalho se configura nas relações que se estabelecem com o próprio trabalho. Esse, nas sociedades de classes, de categoria ontológica que define o humano, passa à categoria que deforma, escraviza, desumaniza o homem, pelo processo de alienação, que materializa a dominação do homem pelo produto de seu trabalho e por outro homem.

No caso do trabalhador docente, o processo de alienação tem atingido níveis tão elevados que seus efeitos podem ser observados na desintelectualização e desprofissionalização do professor, na pauperização de seu trabalho, na perda da identidade docente, na quebra da sociabilidade de classe e na consequente negação do trabalho como processo de humanização. Como afirmam Ramos, Chaves e Maia (2010, p. 12), o professor

hoje se encontra num processo avançado de estranhamento, de alienação quanto ao seu trabalho, seja na dimensão do produto, do processo de trabalho, de si mesmo e do outro, como ser genérico. Ele se encontra alienado na sua relação com o conhecimento por ele participado na aprendizagem e no trabalho controlado externamente, por intermédio da perda do poder de decisão dos meios, do objeto e do processo em si. Consequentemente, o indivíduo não se reconhece na sua atividade e em si mesmo. O seu trabalho passa de um ato prazeroso de realização humana, de transformação de si mesmo, do outro e do meio, a um

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mister enfadonho, que mortifica, cansa, aliena, sacrifica o ser humano, por ser alheio a si mesmo, e satisfaz apenas, e às vezes precariamente, a sua necessidade física, negando a sua sociabilidade e humanidade. Deste modo, o trabalhador não se reconhece mais no outro indivíduo, passando a vê-lo como um desafeto, um patrão.

Em condições de subalternidade, o trabalhador docente, instrumentalizado pela classe dominante para a reprodução das relações sociais marcadas pela divisão e pelo antagonismo de classes, experencia o trabalho como fardo, grilhão. Como estranhado, o trabalho docente apresenta-se desfigurado e esvaziado de seu sentido transformador; torna-se atividade mecânica e irrefletida, praticismo estafante e desprezível.

Compreender como se processa a dupla determinação do trabalho docente sob as condições capitalistas é necessidade fundamental para a produção do sentido do trabalho educativo que se orienta para a transformação social. Em vista disso, propomos refletir sobre o trabalho docente e sua dupla determinação – práxis e alienação – a partir da categoria trabalho elaborada por Marx [1818-1883]. Inicialmente, revisitamos a concepção de trabalho como categoria ontológica do humano; em seguida, desenvolvemos reflexão sobre o trabalho docente em sua ambivalente constituição: como práxis, sua condição ontológica, e como trabalho alienado, sua condição histórica. Finalmente, buscamos articular a dupla determinação do trabalho docente com uma perspectiva de transformação possibilitada pela dialética do trabalho que se materializa no modo de produção capitalista.

O trabalho como categoria ontológica do humano: por uma compreensão do ser social

O trabalho, conforme encontramos nas elaborações de Marx [1818-1883], é categoria ontológica do humano, o que vale dizer

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que o trabalho funda o homem e constitui sua humanidade; é o traço distintivo do homem relativamente aos demais animais, ou seja, o homem é um animal que trabalha e, ao fazê-lo, produz a sua existência concreta e material. Em A ideologia alemã, encontramos:

Pode-se referir a consciência, a religião e tudo o que se quiser como distinção entre os homens e os animais; porém, esta distinção só começa a existir quando os homens iniciam a produção dos seus meios de vida, passo em frente que é consequência da sua organização corporal. Ao produzirem os seus meios de existência, os homens produzem indiretamente a sua própria vida material. (Marx e Engels 1845-1846[1999, p. 11])

A produção da vida material é uma exigência para a existência da espécie humana, pois os meios de subsistência humana não são garantidos pela natureza, não são dádivas naturais; ao contrário, o homem precisa produzi-los. A esse processo de produção da existência, que implica a relação entre homem e natureza, dá-se o nome trabalho. O homem, ao invés de adaptar-se à natureza, como fazem os animais, adapta a natureza a si, agindo sobre ela e transformando-a em função de suas necessidades. (Saviani 2007).

Ser de necessidades é o homem. Contudo suas necessidades não são apenas biológicas; elas podem também ser criadas pelo próprio homem. É em razão dessas necessidades, biológicas ou criadas, que o homem produz.

É verdade que o animal também produz. Constrói para si um ninho, habitações, como a abelha, castor, formiga, etc. No entanto, produz apenas aquilo de que necessita imediatamente para si ou sua cria; produz unilateral[mente], enquanto o homem produz universal[mente]; o animal produz apenas sob o domínio da carência física imediata, enquanto o homem produz mesmo livre da carência física, e só produz, primeira e verdadeiramente, na [sua] liberdade [com relação] a ela; o animal só produz a si mesmo, enquanto o homem reproduz a natureza inteira;

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[no animal], o seu produto pertence imediatamente ao seu corpo físico, enquanto o homem se defronta livre[mente] com seu produto. O animal forma apenas segundo a medida e a carência da species à qual pertence, enquanto o homem sabe produzir segundo a medida de qualquer species, e sabe considerar, por toda a parte, a medida inerente ao objeto; o homem também forma, por isso, segundo as leis da beleza. (Marx 1867[2004, p. 85])

O trabalho como forma específica da espécie humana é essencialmente criativo, é atividade vital, pensada, consciente, planejada e dirigida a um fim determinado de antemão. É universal, posto que o homem produz não só para si, mas para o outro da sua e das demais espécies, o que lhe permite elevar-se da condição de existência orgânica para a de sociabilidade fundada na solidariedade da espécie. É práxis, pois expressa a unidade de teoria e prática, isto é, ação refletida e guiada para finalidades específicas.

Por meio do trabalho, o homem produz os objetos de que necessita para viver e, ao fazê-lo, produz a si mesmo como indivíduo social e genérico. Ao agir sobre a natureza, “dando-lhe novo caráter, faz dela objetividade social. Nesse processo, o homem realiza suas potências mediante exteriorização de suas forças essenciais – realiza-se, portanto, pelo trabalho a humanização do mundo e dos indivíduos” (Moraes et al. 2010, p. 42). O trabalho humano, assim, é a ação de humanização do homem e da natureza.

Antes de tudo, o trabalho é um processo de que participam o homem e a natureza, processo em que o ser humano com sua própria ação impulsiona, regula e controla seu intercâmbio material com a natureza. Defronta-se com a natureza como uma de suas forças. Põe em movimento as forças naturais de seu corpo, braços e pernas, cabeça e mãos, a fim de apropriar-se dos recursos da natureza, imprimindo-lhes forma útil à vida humana. Atuando assim sobre a natureza externa e modificando-a, ao mesmo tempo modifica sua própria natureza. Desenvolve as potencialidades nela adormecidas e submete ao seu domínio o jogo das forças naturais. (Marx 1867[2006a])

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Com base no exposto, pode-se inferir que a essência humana não é preexistente ao homem, mas, conforme Saviani (2007, p. 154), “é produzida pelos próprios homens. O que o homem é, é-o pelo trabalho. A essência do homem é um feito humano. É um trabalho que se desenvolve, se aprofunda e se complexifica ao longo do tempo: é um processo histórico”.

A consideração do trabalho como processo histórico tem a ver com a afirmação de que os homens não nascem homens, mas se fazem homens pela sua própria ação sobre a natureza e sobre si mesmos, na produção de sua existência. É na relação com a natureza e com os demais homens, “mediada pelo trabalho, que o ser humano constrói sociedades, reconfigura a história e, simultaneamente, molda a sua essência” (Oliveira 2010, p.75). O trabalho é, dessa forma, a mediação de formação do homem; é, pois, um processo educativo.

O trabalho, como potência educativa, é ação de todos para todos. “Os homens aprendiam a produzir sua existência no próprio ato de produzi-la. Eles aprendiam a trabalhar trabalhando. Lidando com a natureza, relacionando-se uns com os outros, os homens educavam-se e educavam as novas gerações” (Saviani 2007, p. 154). Logo, a origem da educação coincide com a origem do próprio homem. A educação, a princípio, mantinha uma relação de identidade com o trabalho, consistindo “numa ação espontânea, não diferenciada das outras formas de ação desenvolvidas pelo homem, coincidindo inteiramente com o processo de trabalho que era comum a todos os membros da comunidade” (Saviani 2007, p. 155).

Contudo, ao complexificar-se o modo pelo qual os homens produziam os meios de vida, a educação também se complexificou, efetuando-se a separação entre educação e trabalho. A gênese do processo de separação entre trabalho e educação está na apropriação privada da terra, como consequência da divisão do trabalho produzida em determinado estágio do desenvolvimento da produção humana. “A apropriação privada da terra, então o principal meio de produção”, rompe a unidade vigente nas comunidades primitivas e gera a divisão dos homens em classes,

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configurando-se, “em consequência, duas classes fundamentais: a classe dos proprietários e a dos não-proprietários” (Saviani 2007, p. 155). A divisão dos homens em classes produz, por fim, a “deformação” da essência humana, ao tornar possível a determinados homens viver sem trabalhar à custa do trabalho alheio, comprometendo a compreensão ontológica do homem.

Com efeito, como já se esclareceu, é o trabalho que define a essência humana. Isso significa que não é possível ao homem viver sem trabalhar. Já que o homem não tem sua existência garantida pela natureza, sem agir sobre ela, transformando-a e adequando-a às suas necessidades, o homem perece. [...]. No entanto, o advento da propriedade privada tornou possível à classe dos proprietários viver sem trabalhar. Claro. Sendo a essência humana definida pelo trabalho, continua sendo verdade que sem trabalho o homem não pode viver. Mas o controle privado da terra onde os homens vivem coletivamente tornou possível aos proprietários viver do trabalho alheio; do trabalho dos não proprietários que passaram a ter a obrigação de, com o seu trabalho, manterem-se a si mesmos e ao dono da terra, convertido em seu senhor. (Saviani 2007, p. 155)

A divisão dos homens em classes provocou também uma divisão na educação, produzindo uma diferenciação da educação destinada à classe dominante daquela destinada à classe dominada. No que concerne à educação escolar, essa diferenciação permaneceu ao longo da história, materializando na escola1 uma dualidade

1. De acordo com Saviani (2007, p. 156), a escola em sua origem foi o lugar do “ócio”, destinado aos membros da classe que dispunha de “ócio, de lazer, de tempo livre”. Lugar para a educação dos homens livres. Hoje, ela assume a forma de instituição educativa dominante incumbida da formação de sujeitos sociais, à qual todos devem recorrer como con-dição do e para o exercício da cidadania. Essa forma a que a escola chegou não significou, como alerta Saviani, “um desenvolvimento por continuidade em que a escola teria permanecido idêntica a si mesma, conservando a mesma qualidade e desenvolvendo-se tão-somente no

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estrutural que mantém em disputa interesses antagônicos e uma separação, cada vez mais profunda, entre educação e trabalho. Tal separação reverbera no trabalho do professor, obstaculizando a efetivação do seu trabalho como práxis e estabelecendo, com contornos cada vez mais precisos e nítidos, a condição de trabalho alienado. São essas duas determinações do trabalho docente – práxis e alienação – que passaremos a analisar.

O trabalho docente como práxis: sua condição ontológica2

O trabalho docente, de um modo geral e do ponto de vista filosófico, é concebido, neste texto, como práxis – investigativa, ética e política –, na condição de mediação no seio da prática social global. Sendo uma das manifestações da educação – que, por sua vez, é uma forma específica de práxis –, o trabalho docente compartilha de sua histórica e complexa finalidade, que é a de mediar o processo de constituição do ser humano. A compreensão do trabalho docente como práxis exige o entendimento do conceito de práxis e de mediação. Segundo Vásquez (1967[2007, p. 237]),

a práxis se nos apresenta como uma atividade material, transformadora e ajustada a objetivos. Fora dela, fica a atividade teórica que não se materializa, na medida em que é atividade espiritual pura. Mas, por outro lado, não há práxis como atividade puramente material, isto é, sem a produção de finalidades e conhecimentos que caracteriza a atividade teórica.

aspecto quantitativo. As continuidades podem ser observadas, é claro, sem prejuízo, porém, de um desenvolvimento por rupturas mais ou me-nos profundas”. A escola, pois, felizmente, é condicionada pela mudan-ça, própria do movimento da realidade.

2. Esse tópico compõe parte da discussão teórica na tese de doutoramento de Queiroz (2014).

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A atividade prática é caracterizada pela realidade e objetividade da matéria-prima sobre a qual se age bem como pelos meios e instrumentos utilizados na ação e também pelos resultados alcançados. Na atividade prática, o homem atua sobre uma realidade – natural ou humana – existente independentemente de sua consciência, com a finalidade de transformá-la para satisfação de determinada necessidade. Da transformação que se opera nessa “matéria-prima” resulta nova realidade que passa a subsistir objetiva e independentemente dos sujeitos que a criaram (Vásquez 1967[2007]).

A atividade teórica, por sua vez, se distingue da atividade prática em razão de seu objeto, finalidades, meios e resultados.

Seu objeto ou matéria-prima são as sensações ou percepções – ou seja, objetos psíquicos que só têm uma existência subjetiva – ou os conceitos, teorias, representações ou hipóteses que têm uma existência real. A finalidade imediata da atividade teórica é elaborar ou transformar idealmente, e não realmente, essa matéria-prima, para obter, como produtos, teorias que expliquem uma realidade presente, ou modelos que prefigurem idealmente uma realidade futura. A atividade teórica proporciona um conhecimento indispensável para transformar a realidade, ou traça finalidades que antecipam idealmente sua transformação, mas num e noutro caso fica intacta a realidade efetiva. As transformações levadas a cabo pela atividade teórica com relação a esta – passagem de uma hipótese a uma teoria, e desta a outra teoria melhor fundamentada – são transformações ideais: das ideias sobre o mundo, mas não do mundo mesmo. (Vásquez 1967[2007, pp.232-233]).

Do exposto deriva o seguinte entendimento: a teoria tem sua autonomia, sua especificidade em relação à prática, mas seu significado, na perspectiva da práxis vasqueziana, só pode ser elaborado se tomado em relação de interdependência com a prática. Se se exclui a ação sobre o mundo, a teoria permanece apenas ideia e não práxis. A prática, por sua vez, só pode ser entendida como

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práxis se considerada a teoria como elemento indispensável para sua realização. “Toda práxis é atividade, mas nem toda atividade é práxis” (Vásquez 1967[2007, p. 219]), na medida em que esta não se realiza sem se conduzir a partir de dupla direção: teórica e prática.

Konder (1992, pp. 115-116, grifo do autor) corrobora esse entendimento ao afirmar:

A práxis é a atividade concreta pela qual os sujeitos humanos se afirmam no mundo, modificando a realidade objetiva e, para poderem alterá-la, transformando-se a si mesmos. É a ação que, para se aprofundar de maneira mais consequente, precisa de reflexão, do autoquestionamento, da teoria; é a teoria que remete à ação, que enfrenta o desafio de verificar seus acertos e desacertos, cotejando-os com a prática. [...]. A teoria é um momento necessário da práxis; e essa necessidade não é um luxo: é uma característica que distingue a práxis das atividades meramente repetitivas, cegas, mecânicas, “abstratas”. [...]. A práxis é a atividade que, para se tornar mais humana, precisa ser realizada por um sujeito mais livre e mais consciente. Quer dizer: é a atividade que precisa da teoria.

Sem esses dois “momentos” – teoria e prática –, diferenciados, mas inseparáveis, não se pode falar em práxis. Ela é compreendida, assim, como uma atividade humana teórico-prática que se realiza para operar transformações, necessitando para isso de elementos cognoscitivos e teleológicos condutores da ação, elementos tais específicos da teoria. Mas a práxis, conquanto seja atividade do homem, pode não ser “tão” humana, quando o sujeito que a realiza não seja “mais” livre e “mais” consciente: livre da necessidade física e consciente das ações que executa.

Uma atividade sem teoria, por mais sofisticada que seja – como a que as abelhas realizam, por exemplo –, é puramente mecânica, “animal”, prisioneira de certa condição biológica. A teoria, atributo do humano, vincula-se à liberdade humana numa via de mão dupla: tanto se necessita de liberdade para o exercício

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da teoria, quanto se necessita desta para se exercer liberdade. A liberdade de que se fala, obviamente, é a liberdade de consciência. Ao refletirmos, interrogarmos sobre os sentidos que damos às nossas ações, tomamos consciência da direção a que nossas práticas nos levam e avaliamos se pretendemos seguir adiante. Adorno (1969[1995]) advertia que, no âmbito dos movimentos sociais, a prática, sem o concurso da teoria, resulta “cega e arbitrária”, e se conduz pelo ativismo irrefletido das massas sem “face”, promovendo a desumanização, quando não a brutalização do homem. Logo, “a práxis é a atividade que, para se tornar mais humana, precisa [...] da teoria” (Vásquez 1967[2007, p. 116]).

O conceito de práxis remete à ideia de trabalho. O trabalho, conforme discutimos, é uma atividade eminentemente humana por meio da qual o homem transforma suas condições de existência e produz sua hominização e humanização, adequando suas ações a finalidades – que existem como produtos da consciência de um homem social, como diria Vásquez (1967[2007]) – e a objetivos que visam à transformação do mundo natural e social e da própria natureza humana.

Para o alcance dos objetivos esperados, o homem trabalha material e espiritualmente, ou seja, cria e recria objetos, formas, coisas, signos, palavras, ideias, conhecimentos, técnicas, modos de ação. Essas (re)criações, a um tempo, vêm satisfazer às suas necessidades – imediatas ou não – e, a outro, vêm se constituir na herança cultural e histórica, indispensável à produção e à sistematização de novos “produtos” materiais e espirituais, com os quais o homem vai gerando sua existência e construindo sua humanidade individual e genérica (Vásquez 1967[2007]).

A atividade humana somente se constitui como práxis à medida que promove transformação objetiva e material de uma dada realidade – mundo natural e social. A efetivação da práxis requer a concorrência das forças naturais do homem e da sua capacidade de pensar, idealizar, projetar, prever finalidades para a ação, ou seja, requer que o homem ponha em movimento sua capacidade teórico-prática. Essa capacidade é verificada nas criações que o homem produziu ao longo de sua história, sejam

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derivadas de sua atividade produtiva material ou de sua atividade científica e cultural. Essas criações, assimiladas e apropriadas pelo sujeito, possibilitam a produção do homem em homem pelo homem ou, dito de outra forma, possibilitam a humanização dos homens.

É exatamente esse processo de “produção do homem”, isto é, a formação do homem singular em homem genérico, que define o trabalho docente. A concepção de formação é assumida aqui como “o processo de o indivíduo singular tornar-se membro do gênero humano [...] pela necessária apropriação do patrimônio – material e espiritual – acumulado pela humanidade em cada momento histórico” (Tonet 2008, p. 3). Ao intervir nesse processo de formação e constituição do ser humano, mediando a relação entre o indivíduo e o saber historicamente construído e as ações que se realizam no seio da prática social global, é que o trabalho docente reveste-se do sentido de práxis.

Se tomarmos o conceito mais restrito de prática objetiva e material, não podemos situar imediatamente aí o trabalho docente, porque neste a finalidade, a matéria-prima, os instrumentos de trabalho e seu produto não têm caráter material. Sua finalidade imediata (tornar possível ao aluno a compreensão da realidade), sua matéria-prima (a consciência do aluno), seu instrumento (os conhecimentos produzidos pelo conjunto dos homens ao longo da história e sistematizados para sua apropriação), e seu produto (a consciência transformadora do aluno) são, antes, de natureza imaterial (Ribeiro 1991).

Por essa razão, o trabalho docente insere-se na categoria de trabalho produtivo não material, trabalho como mediação (Libâneo 1990). Isso porque se caracteriza mais predominantemente como atividade teórica, cuja referência não é diretamente a prática, mas o saber sistematizado – produzido pelos homens em decorrência de sua atividade prático-material – e tornado herança cultural, o qual, assimilado e apropriado pelos sujeitos, tem a potência de desenvolver e sustentar a produção de novos saberes e a própria atividade material.

Todavia, considerar o trabalho docente como trabalho não material não o reduz a uma atividade puramente teórica e, portanto,

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não prática. Ele é atividade prática, na medida em que deriva da atividade produtiva e se liga ao trabalho material – fundamento com base no qual se constituem as demais atividades humanas – e se orienta a cumprir exigências do e para o processo de trabalho, materializando, assim, a teoria, por seu trabalho de mediação.

Essa mediação se dá por meio do ensino, que, “como atividade teórica, atua na transformação de estados mentais, de ideias, de conceitos. Atua de forma indireta na transformação da realidade”. Pelo caminho do conhecimento, possibilita-se ao aluno “empreender ações materiais transformadoras” (Libâneo 1993, p. 116). Tal mediação provê o sujeito, que se relaciona com o mundo objetivo pela prática social, de elementos não materiais – conhecimentos, ideias, valores, atitudes, sentimentos, signos – que só podem ser apropriados por meio da práxis educativa e que são necessários à prática transformadora. Mas, nesse processo de transformações possibilitado pelo ensino, não somente o aluno é transformado. Conforme Guimarães (2009, p. 6, grifo do autor), o ensino afeta igualmente o professor:

[...] quando nos referimos à “mediação” do professor não significa que o ensino seja um processo formativo que exclua o professor. Entendemos que esta é uma atividade educativa, é uma prática social da qual ninguém sai imune. Nem professor, nem aluno. Enfim, trata-se de uma práxis – atividade teoricamente fundamentada (pensa-se a teoria; recria, inventa-se a prática e se pensa enquanto sujeito).

O que se evidencia desta afirmação é que o trabalho educativo entendido na perspectiva da práxis é, por definição, transformador. Transforma o aluno, transforma o professor. Isso porque o professor não é apenas “mediador”, mas é também “mediado” pelas relações que estabelece na e para a realização do seu trabalho. O professor é um sujeito histórico situado. Assim sendo, ele é, ao mesmo tempo, herdeiro de um projeto de educação em um modelo societal específico e, pela negação desse projeto, intérprete de outro projeto educativo vislumbrando a transformação da realidade social.

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Na perspectiva da práxis, a intencionalidade educativa não pode lograr outra finalidade senão a transformação, a mudança qualitativa das condições objetivas que possam servir à emancipação dos sujeitos e, consequentemente, à modificação da própria sociedade.

O trabalho docente é compreendido, assim, como práxis educativa que se situa como mediação no seio da prática social global, na forma de prática não material entre a idealização do resultado da ação e o resultado mesmo ou, ainda, entre a teoria e a prática. É o trabalho compreendido como produção humana com potencialidade para realizar transformações nas práticas sociais mais amplas.

Em que pese tal concepção de trabalho referido ao processo educativo que se desenvolve nas instituições destinadas à formação dos sujeitos, o fato é que esse trabalho, no contexto da sociedade capitalista, sofre os mesmos condicionantes – para não afirmar que, talvez, sofra mais – de que padece o trabalho de modo geral. Esse fato nos provoca as seguintes inquietações: como o trabalho educativo, de caráter humanizador e transformador, pode assumir um caráter mortificador do próprio trabalhador? Como pode tornar-se estranhado ao docente e quais as consequências de sua desefetivação como práxis?

O trabalho docente como alienação: sua condição histórica

Vimos que o trabalho, definidor da essência humana, com o advento da propriedade privada, foi perdendo, ao longo de um processo histórico de mudanças no modo de produção, sua condição de atividade vital humana e tornando-se uma atividade estranhada, ao conduzir o homem à perda de sua essência pela sujeição aos produtos de seu trabalho. Como momento constitutivo do capitalismo, o trabalho assume forma negativa. Dessa forma,

o homem trabalha não para se realizar, para efetivar-se como ser livre e criativo, mas para satisfazer os interesses

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do capital e as suas necessidades imediatas (comer, beber, agasalhar-se etc.). Isso porque a propriedade privada institui, historicamente, a separação entre trabalho e capital, isto é, entre os produtores e os produtos, entre a “essência subjetiva” da propriedade e a sua “essência objetiva”, o que origina todo o processo de perda-de-si do homem. (Oliveira 2010, p. 78, grifos do autor)

O conceito de trabalho estranhado é desenvolvido por Marx [1818-1883] para mostrar como o trabalho no modo de produção capitalista adquire caráter de coisa, mercadoria, e torna-se o fator de mortificação do homem e de sua pauperização na proporção da riqueza que produz.

O trabalhador se torna tanto mais pobre quanto mais riqueza produz, quanto mais a sua produção aumenta em poder e extensão. O trabalhador se torna uma mercadoria tão mais barata quanto mais mercadorias cria. Com a valorização do mundo das coisas (Sachenwelt) aumenta em proporção direta a desvalorização do mundo dos homens (Menschenwelt). O trabalho não produz somente mercadorias; ele produz a si mesmo e ao trabalhador como uma mercadoria, e isto na medida em que produz, de fato, mercadoria em geral. (Marx 1867[2004, p. 80, grifos do autor])

O estranhamento do trabalho ocorre no modo de produção capitalista por um processo de alienação, do qual resulta a dissolvição do trabalho e, consequentemente, do homem. Resende (2009) explicita a alienação nos seguintes termos: “A alienação descreve para Marx uma situação em que o trabalho, realização da essência humana, converte-se em pura exteriorização, objetivação” (p. 85). Mas a objetivação mesma não se confunde com a alienação, pois, enquanto “a objetivação é uma condição universal do homem”, não necessariamente alienada, a alienação “é uma forma particular, que se expressa em uma sociedade determinada [...] e só se efetiva sob determinadas condições, na dimensão ontológica

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estabelecida a partir do desenvolvimento histórico e concreto” (p. 79). A alienação se caracteriza, assim, “pela extensão universal da vendabilidade, pela conversão dos seres humanos em mercadorias e pela fragmentação do corpo social em indivíduos isolados, buscando seus objetivos limitados e individuais” (p. 143).

Esse processo de alienação envolve quatro aspectos: a) o homem se aliena dos produtos de seu trabalho; b) o homem se aliena do processo de seu trabalho; c) o homem se aliena de seu próprio ser; d) o homem se aliena dos outros homens.

No primeiro aspecto, há uma cisão entre o homem e o produto de seu trabalho. Aquilo que o homem produz não lhe pertence, “nem no sentido humano, nem no sentido econômico. Do produto do seu trabalho, o trabalhador não pode viver. Tampouco pode admirá-lo esteticamente ou dele se apropriar espiritualmente” (Resende 2009, p. 80). O produto do labor se torna inacessível ao homem no plano econômico, por pertencer a outro, e estranho no plano “espiritual”. Esse estranhamento espiritual se funda sobre o fato

de que todos os objetos produzidos pelo homem não são, para ele, fatores de desenvolvimento, constituição e reconhecimento. O produtor não pode chegar a ser o que os objetos por ele produzidos são, não pode convertê-los em elementos de sua própria vida humana, subjetiva, espiritual, moral e estética. O produto sequer o enriquece, no sentido de devolver-lhe o que, pelas suas objetivações, nele foi depositado. (Resende 2009, p. 81)

Ora, e o que foi depositado no produto? A própria humanidade do produtor. Ao perder o objeto para outro, o homem perde também sua vida, alienando-a para o trabalho transformado em objeto estranho e potência autônoma.

Na determinação de que o trabalhador se relaciona com o produto de seu trabalho como [com] um objeto estranho [...] está claro: quanto mais o trabalhador se desgasta trabalhando (ausarbeitet), tanto mais poderoso se torna

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o mundo objetivo, alheio (fremd) que ele cria diante de si, tanto mais pobre se torna ele mesmo, seu mundo interior, [e] tanto menos [o trabalhador] pertence a si próprio. [...]. O trabalhador encerra a sua vida no objeto; mas agora ela não pertence mais a ele, mas sim ao objeto. Por conseguinte, quão maior esta atividade, tanto mais sem-objeto é o trabalhador. Ele não é o que é o produto de seu trabalho. Portanto, quanto maior este produto, tanto menor ele mesmo é. A exteriorização (Entäusserung) do trabalhador em seu produto tem o significado não somente de que seu trabalho se torna um objeto, uma existência externa (äussern), mas, bem além disso, [que se torna uma existência] que existe fora dele (ausser ihm), independente dele e estranha a ele, tornando-se uma potência (Macht) autônoma diante dele, que a vida que ele concedeu ao objeto se lhe defronta hostil e estranha. (Marx 1867[2004, p. 81, grifos do autor])

No segundo aspecto, o homem se aliena do próprio trabalho, ou seja, no ato mesmo da atividade produtiva. O trabalho, de atividade vital humana, se transforma em atividade dissolutiva da vida, posto que estranhada, não pertencente ao homem. É o estranhamento do próprio homem, ao não se ver no trabalho nem o trabalho em si. O trabalho lhe é externo, não lhe é próprio, não lhe é condição de afirmação, mas de negação; motivo de infelicidade, de desenergização física e espiritual, de perda de si.

O trabalhador só se sente, por conseguinte e em primeiro lugar, junto a si [quando] fora do trabalho e fora de si [quando] no trabalho. Está em casa quando não trabalha e, quando trabalha, não está em casa. O seu trabalho não é portanto voluntário, mas forçado, trabalho obrigatório. O trabalho não é, por isso, satisfação de uma carência, mas somente um meio para satisfazer necessidades fora dele. Sua estranheza (Fremdheit) evidencia-se aqui [de forma] tão pura que, tão logo inexista coerção física ou outra qualquer, foge-se do trabalho como de uma peste. O trabalho externo, o trabalho no qual o homem se exterioriza, é um trabalho de auto-sacrifício, de mortificação. Finalmente, a

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externalidade (Äusserlichkeit) do trabalho aparece para o trabalhador como se [o trabalho] não lhe pertencesse, como se ele no trabalho não pertencesse a si mesmo, mas a um outro. (Marx 1867[2004, p. 83, grifos do autor])

O terceiro aspecto, em que o homem se aliena de seu próprio ser, diz respeito à sua essência genérica. Qual é essa essência? A capacidade de produzir sua existência, de criar meios e objetos para sua subsistência, pelo trabalho. É a “vida engendradora de vida. No modo da atividade vital encontra-se o caráter inteiro de uma species, seu caráter genérico, e a atividade livre consciente é o caráter genérico do homem” (Marx 1867[2004, p. 84]). Enquanto a atividade vital do animal confunde-se com sua vida, a atividade vital do homem é um objeto mesmo de sua vontade e consciência, o que o torna um ser genérico. Ou, porque é um ser genérico, ele é um ser consciente e sua atividade é livre de carências físicas imediatas. O sentido de sua essência está em “viver para trabalhar”, objetivar-se como vida genérica na elaboração do mundo objetivo. Ora, “o trabalho estranhado inverte a relação a tal ponto que o homem, precisamente porque é um ser consciente, faz da sua atividade vital, da sua essência, apenas um meio para sua existência” (Marx 1867[2004, p. 85]). O trabalho, que antes lhe era atividade vital, livre e consciente, passa a ser obrigatório para assegurar a vida: torna-se necessário ao homem “produzir para viver”.

Por meio da vida genérica operativa, a natureza aparece como a obra e a efetividade humana. “O objeto do trabalho é portanto a objetivação da vida genérica do homem: quando o homem se duplica não apenas na consciência, intelectual[mente], mas operativa, efetiva[mente], contemplando-se, por isso, a si mesmo num mundo criado por ele”. Ao arrancar-se do homem “o objeto de sua produção, o trabalho estranhado arranca-lhe sua vida genérica, sua efetiva objetividade genérica [...]” (Marx 1867[2004, p. 85, grifos do autor]). Ao fazê-lo, torna o homem um ser estranho a si mesmo, levando-o ao isolamento do gênero humano, daquilo que o constitui como universal.

Diretamente vinculado a esses três aspectos está o quarto aspecto: a alienação do homem dos outros homens. Consequência

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do estranhamento do produto do seu trabalho, da sua atividade vital e do seu ser genérico é o estranhamento do homem pelo próprio homem. Primeiro, porque o “vínculo real entre os homens, a verdadeira comunidade humana, só se constrói sobre a verdadeira essência da humanidade, ou seja, o trabalho produtivo, consciente e livre” (Resende 2009, p. 83). Segundo, porque “a relação do homem consigo mesmo lhe é primeiramente objetiva, efetiva, pela sua relação com o outro homem” (Marx 1867[2004, p. 86, grifo do autor]). Disso decorre:

Se ele se relaciona, portanto, com o produto do seu trabalho, com o seu trabalho objetivado, enquanto objeto estranho, hostil, poderoso, independente dele, então se relaciona com ele de forma tal que um outro homem estranho (fremd) a ele, inimigo, poderoso, independente dele, é o senhor deste objeto. Se ele se relaciona com a sua própria atividade como uma [atividade] não-livre, então ele se relaciona com ela como a atividade a serviço de, sob o domínio, a violência e o jugo de um outro homem. (Marx 1867[2004, p. 87, grifos do autor])

Estranhado do produto do seu trabalho, do próprio trabalho, de si mesmo e do outro, o homem perde sua liberdade, deixa de ser homem partícipe de uma sociabilidade, homem universal, e passa a ser indivíduo e, como tal, a ser vida como meio de vida.

Feitas essas considerações sobre o trabalho em geral, voltamos nossa atenção para o trabalho docente, em busca de situá-lo nessa problemática da alienação ou do trabalho estranhado. Na sociedade capitalista, o trabalhador docente sofre das mesmas injunções aplicadas ao trabalhador de outra categoria profissional. Passa também pelas quatro etapas de estranhamento como todo trabalhador, ainda que de modo não necessariamente idêntico.

Como dissemos, o trabalho docente é, em sua demarcação ontológica, trabalho produtivo de natureza não material, cuja referência é o saber sistematizado, construído pela experiência humana em sua atividade prático-material ao longo do tempo e cuja finalidade é potencializar os sujeitos para continuar o processo de

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criação de novos saberes e da própria atividade material. No limite, o trabalho docente é orientado para “permitir aos indivíduos a apropriação dos conhecimentos, habilidades e valores necessários para se tornarem membros do gênero humano” (Tonet 2008, p. 7). Poderíamos dizer, então, que o “produto” de seu trabalho – de natureza imaterial – é o homem tornado humano, o homem singular tornado genérico. O trabalho docente é, assim, trabalho de transformação, práxis.

Ocorre que, na sociedade capitalista, o trabalho docente é também mediado pelas forças hegemônicas que conformam a educação de acordo com os objetivos do capitalismo no tocante aos tipos sociais que requer para sua reprodução. Tais objetivos confrontam-se com os objetivos de uma formação humana emancipadora, que incluem a realização dos homens como seres de trabalho produtor e reprodutor de vida. Ao contrário dessa formação, então, na sociedade capitalista a formação resume-se a formar mão de obra para o capital. Desse modo, a transformação que a educação sob o capitalismo promove no indivíduo não é sua transformação em homem genérico, integral, mas em “mercadoria” para atender às exigências do capital.

Localiza-se nisso o estranhamento, a alienação do trabalhador docente, relativamente ao produto de seu trabalho. Como mediador do processo de formação dos homens em homens, ao servir ao capital e não à espécie humana, o trabalhador docente não pode se reconhecer no “produto” de seu trabalho, a não ser que ele mesmo seja estranhado de si. O produto também não lhe pertence, posto que, feito mercadoria, torna-se estranhado no sentido humano, não se destinando ao gênero humano, mas ao mundo das coisas.

Essa determinação vincula-se às demais de modo necessário e não hierárquico. O docente, sob tantas injunções, há tempos já vem sendo reduzido a simples força de trabalho – uma mercadoria, que (se) vende ao Estado ou ao proprietário. Marx (1849[2006b]) descreve como o trabalhador vai se tornando mercadoria, estranhado e alienado de sua atividade produtiva, no momento da produção. Seu trabalho não é manifestação de prazer e vida, mas de enfado e morte.

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Mas a força de trabalho em ação, o trabalho, é a própria atividade vital do operário, a própria manifestação da sua vida. E é essa atividade vital que ele vende a um terceiro para se assegurar dos meios de vida necessários. A sua atividade vital é para ele, portanto, apenas um meio para poder existir. Trabalha para viver. Ele, nem sequer considera o trabalho como parte da sua vida, é antes um sacrifício da sua vida. [...]. Para ele, quando termina essa atividade é que começa a sua vida, à mesa, na taberna, na cama. As doze horas de trabalho não têm de modo algum para ele o sentido de tecer, de fiar, de perfurar, etc., mas representam unicamente o meio de ganhar o dinheiro que lhe permitirá sentar-se à mesa, ir à taberna, deitar-se na cama. (Marx 1849[2006b])

As muitas atividades atribuídas ao docente para além daquilo que lhe é específico; a regulação operada pelas políticas educacionais; o excessivo controle por meio das avaliações externas e das formas de gestão apenas aparentemente democráticas; a retirada paulatina da autonomia docente por mecanismos sutis de controle institucional, impulsionado por demandas externas vinculadas ao capital; a pauperização das condições de trabalho; o enrijecimento da burocracia interna nas instituições; a deterioração salarial; a fragmentação do coletivo docente pelo desmantelamento de suas associações; tudo isso afeta a relação do docente com seu trabalho, deformando-lhe a subjetividade e minando-lhe o desejo de trabalhar, no sentido ontológico de trabalho. Sua atividade passa a ser apenas o cumprimento do horário e das metas que lhe foram estabelecidas. Seu trabalho torna-se grilhão, trabalho forçado, que só se justifica pela promessa de um dia se livrar dele pela aposentadoria.

Essa alienação quanto ao processo de seu trabalho associa-se à alienação de si mesmo, que leva ao estranhamento do outro. O docente estranhado de si mesmo não pode, assim, reconhecer como iguais aqueles com quem estabelece relações no trabalho educativo. O outro é sempre um estranho, quando não um inimigo. O docente só pode se encontrar, desse modo, sozinho e afastado de seus semelhantes. Vivendo individualmente e isoladamente,

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o trabalhador docente se encontra impotente no seu trabalho de formação humana, tanto a formação do outro quanto a de si mesmo. Ora, o trabalho docente é trabalho de mediação e de interação humana; se lhe retira o caráter coletivo, solapa-se seu edifício, a sociabilidade sobre a qual se constrói cada subjetividade.

Em que pesem todo o mal-estar e toda a desesperança que o reconhecimento da determinação de trabalho alienado gera, é possível vislumbrar a efetivação da práxis. Compreender a alienação do trabalho como condição histórica significa compreendê-la no marco do desenvolvimento das forças produtivas e das relações sociais de uma sociedade determinada: a sociedade capitalista. Compreender a história como feito humano é admitir a possibilidade de transcendência da alienação.

A análise marxista permite compreender que a alienação não está relacionada à dimensão natural e universal do homem e às suas formas abstratas de constituição, mas às condições concretas nas quais as objetivações humanas podem se processar, aos modos concretos determinados, qualitativa e quantitativamente, da existência humana. A alienação é apenas uma das formas historicamente determinadas de objetivação, e sua persistência não se refere à determinação da natureza do homem, mas à persistência e ao desenvolvimento do modo capitalista de produção. Portanto, a superação da alienação está relacionada à superação histórica dessa forma social. (Resende 2009, p. 79)

A superação da alienação, como afirma Resende (2009), está condicionada à superação das “formas mediadas da sociedade capitalista”, tais como a divisão social do trabalho e a propriedade privada. Entretanto, enquanto não se concretiza a superação dessa forma de sociabilidade pela prática social revolucionária, é possível ao trabalhador docente resistir à alienação e conduzir seu trabalho na perspectiva da práxis. Não se trata de abandonar uma condição em razão da outra. O trabalho docente é dialeticamente práxis e alienação e se efetiva pela afirmação, negação, afirmação.

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Assim sendo, algumas condições favorecem a luta pela efetivação do trabalho docente como práxis, como as que nos são dadas por Tonet (2008): a) o (re)conhecimento conscientemente sustentado sobre os fins que se buscam atingir com o trabalho de formação humana; b) o conhecimento e esclarecimento da realidade social concreta em que se realiza o trabalho; c) a adoção de um ideário pedagógico fundamentado em uma teoria que faça a crítica radical da sociabilidade que se firma nos princípios do capitalismo; d) o desenvolvimento de ações que incentivem as pessoas a participar das lutas que se comprometem com a transformação social e não apenas com a cidadania.

Considerações finais

Compreender o trabalho docente, situando-o na problemática da dialética do trabalho que se materializa no modo de produção capitalista, requer considerar sua dupla determinação ontológica e histórica. Como práxis, sua condição ontológica, o trabalho docente é atividade teórico-prática, de natureza não material, que se firma como mediação de formação humana no conjunto das práticas sociais mais amplas. É trabalho orientado para a constituição do homem e para o desenvolvimento de suas qualidades humanas. Como alienação ou trabalho estranhado, sua condição histórica, o trabalho docente se transmuta em fonte de desefetivação da práxis e desrealização do homem como ser genérico e de subjetividade.

Contudo, dado que o capitalismo engendra a contradição, esta, dialeticamente, possibilita a emergência de práticas de enfrentamento contra as formas alienantes da vida. Por isso, na contramão do movimento discursivo que aqui se fez, da práxis à alienação, é importante acentuar o caráter práxico do trabalho docente e sua potência transformadora.

A ideia de transformação que preside a compreensão buscada aqui é aquela referida à sociedade de classes em que

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se vislumbra e se persegue a mudança social em favor da classe trabalhadora, visando romper com as relações de exploração e sujeição do homem pelo homem na produção da existência humana. Realizar o trabalho docente como práxis, pois, requer o esforço de rompimento com as formas de relações sociais e de produção da existência humana regidas pelo capitalismo. No âmbito da educação em que o trabalho docente se materializa, esse esforço somente se viabiliza por um processo de formação crítica, que denuncie e conteste permanentemente as formas de exploração e de alienação presentes nesse sistema produtivo.

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8trabalho docente nos anos iniciais do ensino Fundamental: atividade politécnica e ensino desenvolvimental

Sandra Valéria Limonta Rosa Mara Cristina De Sylvio

Nos primeiros anos de escolarização dá-se o início de um processo de aprendizagem mais sistemático e intencional, rumo à apropriação de fundamentos e conceitos das áreas do conhecimento científico, o que promoverá um certo tipo de desenvolvimento psicológico impossível de acontecer de outra forma que não seja via escolarização formal. Este texto objetiva esclarecer como o trabalho docente nos anos inicias é historicamente constituído em suas múltiplas determinações e na relação dialética entre formação e trabalho; compreender a dinâmica e a complexidade do trabalho do professor dos anos iniciais e realizar uma reflexão a respeito dos conhecimentos necessários ao ensino, que aqui denominamos de conhecimento didático. As atividades de estudo e pesquisa que temos realizado no Grupo de Estudos e Pesquisas Trabalho Docente e Educação Escolar da Faculdade de Educação da UFG nos levaram à formulação do conceito de “atividade politécnica” para pensarmos criticamente o trabalho docente nos anos iniciais.

A inserção da criança no ensino fundamental implica uma série de mudanças sociais e cognitivas em seu desenvolvimento.

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A professora e o professor dos anos iniciais, responsáveis por conduzir a criança nesse processo, têm uma difícil tarefa que requer a mobilização de conhecimentos teóricos e metodológicos que permitam planejar e realizar o trabalho pedagógico com autonomia e qualidade, tentando responder aos objetivos e também à dinâmica particular da prática educativa escolar. Nessa perspectiva, entender o trabalho dos professores dos anos iniciais vai além de perceber como o docente organiza o trabalho pedagógico na escola e seus desdobramentos no processo de desenvolvimento mental da criança. Implica perceber como o trabalho docente nos anos inicias é historicamente constituído em suas múltiplas determinações, na relação dialética entre formação e trabalho.

Segundo Almeida et al. (2012), uma sólida base epistemológica construída durante a formação inicial se configura num importante conhecimento para o planejamento e a realização do ensino em suas dimensões profissional, política e epistemológica. O trabalho do professor dos anos iniciais é atravessado e constituído pelo contexto histórico em que se realiza, passa por transformações constantes conforme são transformadas e alteradas as políticas educacionais e os documentos oficiais que orientam o currículo e a organização escolar, bem como às demandas educativas que vão se constituindo histórica e socialmente.

Contudo, a atividade docente é determinada, em grande parte, pelo conhecimento que o professor possui da disciplina ou área do conhecimento curricular que se ensina. No caso dos anos iniciais, tratam-se de várias disciplinas ou áreas do conhecimento. “O trabalho do pedagogo que atua nos anos iniciais do ensino fundamental exige domínio dos núcleos conceituais das áreas de conhecimento, dado o patamar de importância dos conteúdos escolares para o desenvolvimento da criança” (Almeida et al. 2012, p. 967).

Sem a adequada formação teórico-didática (conteúdo e forma), o professor pouco pode contribuir para o desenvolvimento cultural e intelectual das crianças que estão iniciando o processo de escolarização formal. Os conhecimentos das vivências escolares durante a formação e das experiências de trabalho acumuladas

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nos anos de profissão são importantes e vão também constituindo o trabalho dos professores, mas a formação inicial, que busca constituir o conhecimento teórico do professor sobre educação e ensino é condição para a realização do trabalho.

Polivalência e interdisciplinaridade como fundamentos do trabalho docente: (des)construindo conceitos

Os pesquisadores que têm se debruçado sobre a docência e/ou o trabalho docente nos anos iniciais compartilham da ideia de que a polivalência, melhor dizendo, o ensino de diferentes áreas do conhecimento ou disciplinas para o mesmo grupo de alunos é a essência do trabalho do professor dos anos iniciais, e que a interdisciplinaridade, por sua vez, seria a maneira de realizar este ensino. De acordo com Lima (2007),

O professor polivalente dos anos iniciais vem recebendo, ao longo da história, diferentes identificações, como “mestre-escola”, “mestre régio”, “professor das primeiras letras”, “professor da instrução primária”, “professor de ensino primário”, “professor unidocente”, “professor multidisciplinar”, “professor polidisciplinar”, “professor das quatro séries iniciais do primeiro grau”, “professor das quatro séries iniciais do ensino fundamental”. (...) entendemos professor polivalente como aquele capaz de apropriar-se de conhecimentos básicos das diferentes áreas dos conhecimentos que compõem atualmente a base comum do currículo nacional dos anos iniciais do Ensino Fundamental e articulá-los desenvolvendo um trabalho interdisciplinar. Ser professor polivalente significa saber ensinar essas diferentes áreas e também se apropriar de diversos valores inerentes ao ato de ensinar “crianças pequenas”, interagir e comunicar-se qualitativamente bem com esses educandos. (Lima 2007, p. 65)

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Dados levantados por Oliveira (2004) demonstram que há poucas produções científicas sobre o trabalho do professor dos anos iniciais e, dentro destas produções, a polivalência é bastante citada como principal característica da docência nos anos iniciais, no entanto, o conceito de polivalência é pouco explicitado. Na maioria das pesquisas analisadas pela autora, a relação entre polivalência e interdisciplinaridade é frequente, porém, não se aprofundam os conceitos e suas relações e muitas vezes os dois termos são apresentados como equivalentes.

A polivalência como característica do ensino nos anos iniciais está sempre presente nas políticas e orientações oficiais. A primeira sugestão de polivalência aparece oficialmente ainda no final da década de 1960, quando o conselheiro Valnir Chagas [1921-2006] apresentou uma proposta de regulamentação da formação de professores que propiciasse conhecimentos que pudessem “(...) integrar, no processo educativo, a dimensão da preparação integral do aluno, dos conteúdos das matérias a serem ensinadas e os métodos apropriados para atender a tais especificidades” (Cruz e Batista Neto 2012, p. 2897).

O termo polivalência, segundo Cruz (2012), embora não tenha sido empregado textualmente nos documentos que orientavam as políticas educacionais para os anos iniciais na década de 1990, foi um conceito largamente empregado para se referir ao trabalho docente nos anos iniciais neste período. Em 2002, aparecerá nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica e em algumas pesquisas o termo “professor multidisciplinar”, indicando, no nosso entendimento, o caráter quantitativo do trabalho do professor dos anos iniciais, entendendo-se que este ensina diferentes disciplinas.

As Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso de Pedagogia (2006)1 mencionam a interdisciplinaridade como

1. Art. 5º VI - ensinar Língua Portuguesa, Matemática, Ciências, História, Geografia, Artes, Educação Física, de forma interdisciplinar e adequada às diferentes fases do desenvolvimento humano; Art. 3º O estudante de Pedagogia trabalhará com um repertório de informações e habili-

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forma de integrar as áreas e os conteúdos dos anos iniciais, mas os modos de alcançá-la não são suficientes discutidos nesse documento. “A própria perspectiva interdisciplinar que seria um princípio de formação para a constituição da polivalência não tem uma sustentação sólida nas discussões das políticas, configurando-se em um discurso muito genérico” (Cruz e Batista Neto 2012, p. 2906). Acreditamos que a interdisciplinaridade, assim como está mencionada nas DCNs para o curso de Pedagogia, abre precedente para que o trabalho do professor se desenvolva na base da área fronteiriça dos conhecimentos culturais e dos conteúdos e, com isso, justifica-se a superficialidade teórica no trato com os conteúdos escolares nos anos iniciais.

Para Cruz (2012), a prescrição dos documentos oficiais, somada à produção bibliográfica de teóricos que discutem a formação por meio da perspectiva da interdisciplinaridade, endossa também a noção de polivalência tanto na formação quanto na atividade dos professores que ensinam nos primeiros anos do Ensino Fundamental.

Ainda que se preconize a polivalência, a multidisciplinaridade e a interdisciplinaridade como características do trabalho docente nos anos iniciais, a instituição de um sistema nacional de avaliação em larga escala que avalia apenas língua portuguesa e matemática desconstrói a necessária polivalência e interdisciplinaridade como formas de organizar os conteúdos escolares e de ensiná-los, priorizando-se nos anos iniciais apenas o ensino destas duas áreas.

Cruz e Batista Neto (2012) observaram em sua pesquisa que há um alargamento constante das atribuições do professor polivalente dos anos iniciais e que muitas vezes estes professores têm abandonado parte dos conteúdos escolares para se dedicarem à alfabetização e à Matemática. Para nós, o que os autores denominam

dades composto por pluralidade de conhecimentos teóricos e práticos, cuja consolidação será proporcionada no exercício da profissão, funda-mentando-se em princípios de interdisciplinaridade, contextualização, democratização, pertinência e relevância social, ética e sensibilidade afetiva e estética.

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de abandono de parte dos conteúdos não significa que o professor simplifica ou minimiza o trabalho, mas que este é cada vez mais precarizado – formação insuficiente e teoricamente fragilizada, alargamento das responsabilidades educativas e ausência de condições materiais de trabalho adequadas – para atender às exigências de um sistema educativo que lhe propõe um currículo ampliado e flexível ao mesmo tempo em que lhe cobra resultados e eficiência em determinadas áreas/disciplinas (Oliveira, 2004).

Tratamos aqui especificamente da questão da interdisciplinaridade no que diz respeito à educação escolar, sem desconsiderar, é claro, que no campo da educação escolar esta questão é apresentada com base em pressupostos filosóficos e epistemológicos que buscam compreender a questão do conhecimento em sua totalidade (Moraes 2002; Morin 2000, 2005 e 2007). A interdisciplinaridade é uma concepção que tem sido apresentada como uma possibilidade de superação da fragmentação, dispersão e multiplicidade do conhecimento que deve tornar-se conhecimento escolar (Fazenda 2002 e 2014).

Contrapondo-se à ideia de conhecimento interdisciplinar, para Tonet (2013) a paulatina complexificação da realidade social resultou no que se pode considerar como a especialização crescente do conhecimento científico, filosófico, artístico e técnico; especialização que tem sua origem na divisão do trabalho, mas cuja face mais evidente é a impossibilidade de que cada sujeito se aproprie de todos os conhecimentos acumulados historicamente. Contraditoriamente, a divisão do trabalho e consequente divisão do conhecimento em disciplinas específicas permitiu o aprofundamento e o imenso e rápido avanço técnico-científico a partir da consolidação do modo de produção capitalista.

Entendemos que o problema do currículo escolar – quais conhecimentos devem ser ensinados na escola – torna-se hoje um problema que tem em sua gênese a contradição quantidade/qualidade. Na tentativa de superar esta contradição, foram se constituindo propostas de ensino que desconsideram ou desconhecem o sentido mais amplo da formação humana que deveria ser preservado naquilo que Saviani (1989, 2003b, 2005 e 2008) denomina de “conhecimento clássico” a ser transmitido pela escola.

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Também na formação dos professores os conhecimentos científicos (ou clássicos) necessários para o desenvolvimento do ensino foram paulatinamente ficando em segundo plano, em nome de uma formação mais voltada para a prática e para a realidade das escolas (Duarte 1998, 2001a, 2001b, 2003, 2010). Foram se constituindo e se consolidando em nosso país concepções interdisciplinares de ensino escolar (ou pluri, trans, multi), onde a superação da fragmentação do saber se daria pela abordagem de um mesmo objeto sob os múltiplos aspectos que envolvem as áreas do saber, “devolvendo”, por assim dizer, a totalidade perdida.

No entanto, concordamos com Tonet (2013) quando este afirma que a proposta de formação interdisciplinar “(...) é uma solução equivocada para uma um problema mal equacionado” (p. 726), pois não traz consigo uma teoria que explique o processo histórico-social que levou à complexificação e à fragmentação do saber, considerando tal complexificação e fragmentação como naturais no processo de desenvolvimento técnico e científico. Sendo assim, a totalidade seria alcançada na soma dos fragmentos outrora desconexos por meios epistêmicos ou pedagógicos, ignorando-se que a fragmentação do saber faz parte do padrão moderno de cientificidade e se origina no meio social.

O autor observa que a gênese do processo de fragmentação do saber se deu durante a ascensão da burguesia, período no qual a essência de uma ciência que pudesse ir à raiz do ser social foi substituída pela aproximação à realidade mais imediata, sobrepondo-se a técnica ao conhecimento, numa inversão ideológica, o saber fazer, o prático, se sobrepõe ao pensar, ao teórico. Note-se que se trata de uma inversão ideológica, uma vez que o conhecimento científico, filosófico e artístico continua sendo, até os dias atuais, monopólio da classe dominante. Depois que a burguesia ascendeu ao poder, a promessa de uma educação universal para todos rapidamente converte-se em educação elementar e técnica para os trabalhadores e formação de alto nível para as elites.

Portanto, para nós, compreender o trabalho docente nos anos iniciais tendo como concepção a polivalência, que por

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sua vez sustenta-se na concepção de interdisciplinaridade, é situar-se numa perspectiva conservadora desta atividade, aqui compreendida como a dialética entre formação e ensino. Dadas as exigências da atividade de ensinar, faz-se necessário proporcionar aos professores condições de formação e de trabalho que lhes permitam acesso e compreensão de um conjunto significativo de conhecimentos (científicos, pedagógicos e técnicos) muitos dos quais com um alto grau de profundidade.

Inspirado na teoria de Marx de que o trabalho é a atividade orientada a um fim e de que toda atividade é pensada, Leontiev (1978) conceitua o trabalho como sendo o processo em que o homem, utilizando-se de sua potência natural (mãos, braços pernas, cabeça) age sob a natureza a fim de transformá-la para que se torne útil à sua vida.

Para Leontiev (2004) o processo de humanização decorre da interdependência entre a atividade humana e o desenvolvimento psíquico do homem. A Teoria da Atividade elenca os elementos estruturais da atividade humana: necessidade, motivo, ações, operações e objetivos como unidade de vida do homem. A necessidade objetivada (material ou ideal) se configura como a força interna que vai conduzir a atividade, sendo, portanto a condição primeira para que a atividade se constitua. O objeto vai determinar as ações e diferenciar uma atividade de outra para que a necessidade seja satisfeita. No entanto, a necessidade e objeto isoladamente e por si só não conduzem a atividade, sendo, portanto, necessário que haja o motivo que a impulsione e que articule objeto e necessidade. “Embora a necessidade constitua-se na condição primeira de toda e qualquer atividade, o que move o sujeito para a satisfação dessa necessidade é seu motivo” (Longarezi e Franco 2013, p. 89).

O motivo é o elemento desencadeador de sentido ao conjunto de ações que, articuladas por uma necessidade, vão direcionar o sujeito às diversas formas (operações) de se relacionar ativamente no mundo. O homem, que nasce desprovido das aquisições históricas, vai intencionalmente estabelecendo conexão ativa com o mundo objetivo, exercendo as atividades que o permitem apropriar e internalizar a cultura acumulada socialmente.

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Portanto, no processo de apropriação e aquisição da cultura, a atividade externa ao sujeito vai paulatinamente se convertendo em atividade interna em um movimento que transforma o objetivo em subjetivo, tornando a consciência social em consciência individual. Assim, “(...) a atividade psíquica interna representa uma forma de atividade material externa transformada” (Longarezi e Franco 2013, p. 84).

É necessário salientar que o modo como se vê a realidade (o reflexo psíquico), de acordo com a consciência formada socialmente, regula e canaliza a atividade do sujeito, seja interna ou externa. Aquilo que, enganosamente, acreditamos ser uma particularidade individual da consciência humana é na realidade a síntese, no plano mental, das relações sociais e da atividade humana.

As atividades humanas são, portanto, exercidas de acordo com a consciência construída sócio-historicamente em atendimento às necessidades vitais que se estabelecem sob condições específicas. Por outro lado, a estrutura da consciência do homem se transforma conforme a estrutura de sua atividade, demonstrando com essa dinâmica a unidade dialética que se estabelece entre consciência e atividade. Para Leontiev (1978) é esse processo dialético que torna o homem “espécie” em homem “humano”.

Em atividade o homem vai se apropriando dos resultados da atividade cognitiva e dos conhecimentos produzidos e acumulados historicamente pelas gerações precedentes, ou seja, do sistema formulado sócio-historicamente de conceitos e significações inerentes à produção de instrumentos materiais e intelectuais expressos por meio da ciência, além, é claro, das ideologias, costumes, hábitos, modos de vida. A apropriação da cultura por meio da atividade vai desenvolvendo no sujeito funções psíquicas que se desenvolvem em novas aptidões, o que provoca “(...) uma modificação da estrutura geral dos processos de comportamento e do reflexo, além de formar novos tipos de comportamentos” (Duarte e Eidht 2007, p. 66). Esse é o processo de constituição e desenvolvimento do homem-humano, conforme Leontiev.

A atividade humana, nesta perspectiva, é um conjunto de processos psicologicamente caracterizados que promovem

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uma maneira própria de agir mediante a realidade impulsionada por um motivo rumo a um objetivo. Trata-se, portanto, em um sistema estruturado que carrega consigo as mudanças internas e transformações sócio-históricas que levam ao desenvolvimento. Sendo assim o conceito de atividade perpassa o conhecimento do reflexo psíquico, uma vez que o estudo da consciência remete ao estudo da atividade dos sujeitos em dado contexto.

A partir desta concepção de atividade como a dialética entre pensamento e ação, compreendemos o trabalho docente nos anos iniciais do ensino fundamental como atividade politécnica, uma vez que o homem se constitui e se forma quando a ele se interpõe a necessidade de prover seu próprio meio de subsistência por meio do trabalho, definidor da existência histórica humana.

Politecnia, desde uma perspectiva marxista, é compreendida de maneira geral, como o domínio consciente e cientificamente fundamentado da(s) tecnologia(s) e da(s) técnica(s) necessárias ao trabalho. Subjacente ao desenvolvimento da tecnologia e do surgimento, a partir destas, de variadas técnicas de trabalho, encontram-se princípios científicos que devem se constituir como a base da atividade laboral (Ferretti 2009; Frigotto 1991, 1993, 2009; Machado 1989, 1994; Saviani 1989, 2003a).

Politecnia representa o domínio da técnica a nível intelectual e a possibilidade de um trabalho flexível com a recomposição das tarefas a nível criativo. Supõe a ultrapassagem de um conhecimento meramente empírico, ao requerer o recurso a formas de pensamento mais abstratas. Vai além de uma formação simplesmente técnica ao pressupor um perfil amplo de trabalhador, consciente, e capaz de atuar criticamente em atividades de caráter criador e de buscar com autonomia os conhecimentos necessários ao seu progressivo aperfeiçoamento. (Machado 1994, p. 19)

No percurso da existência humana, o homem sempre trabalhou em um constante agir sobre a natureza com objetivos de transformá-la para adaptá-la a si, de modo que a cultura

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e um mundo humano vão sendo criados e, paulatinamente, ampliados e reelaborados com o passar do tempo. Conforme vai se diversificando o modo de produção da existência humana ao longo da história, muda-se também o modo como os homens existem e por consequência a sua formação.

A escola, inicialmente criada como espaço de exercer o ócio, sem qualquer elo com o trabalho, foi gradativamente forçada pelo modo de produção cada vez mais exigente dos conhecimentos não naturais e não espontâneos, constituindo-se um rol de conhecimentos como a leitura e escrita, consideradas como requisito para a inserção ou permanência no mercado de trabalho.

O domínio da ciência diz respeito, também, ao conjunto da sociedade, razão pela qual o currículo da escola elementar pressupõe, além dos dois elementos enunciados [ciências da natureza e ciências sociais], os instrumentos de expressão desses conhecimentos, ou seja, o domínio da linguagem escrita. Então, o currículo básico da escola elementar é composto pelo domínio da linguagem, da matemática, das ciências naturais e das ciências sociais. (Saviani 2003a, p. 136)

Na sociedade capitalista a ciência é incorporada ao trabalho e os conhecimentos se convertem em força produtiva, ameaçando a classe dominante no que se refere à propriedade privada dos meios de produção. Na esteira dessa proposição, desenvolvem-se mecanismos para que o trabalhador produzisse de forma parcelada e o conhecimento do conjunto do produto continuasse sendo dos donos dos meios de produção (patrão) ou de seus representantes, os trabalhadores intelectuais.

O modo de produção enseja a profissionalização baseada na fragmentação do trabalho em especialidades autônomas, implicando na divisão entre os que vão conceber e controlar o processo de trabalho – ensino científico – e os que vão executar o trabalho – ensino profissional. Nesse sentido, a atividade de ensino, mais do que resultado de um conjunto de determinantes advindas do processo de formação do professor, constrói-se sobre o modo de

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produção e organização do trabalho em geral. É nesse sentido que afirmamos o trabalho docente como atividade politécnica, valendo-nos das concepções de educação e de escola do filósofo italiano Antonio Gramsci, que enfatizava a necessidade do conhecimento científico para todos os homens, independente de sua ocupação.

Gramsci concebia a escola unitária, ou de formação humanista, na qual o nível primário deveria dedicar-se “ao ensino de noções ‘instrumentais’ de redação e escrita, aritmética, aprendizagem das leis naturais, bem como das noções de ‘direitos e deveres’, tendo em vista difundir ‘uma nova concepção do mundo’, em substituição às concepções folclóricas”. A escola secundária se ocupará de criar os valores ‘humanistas’, a autodisciplina intelectual e a autonomia moral necessária para uma posterior especialização seja de caráter científica ou prático-técnico. (Ferreti 2009, p. 122)

Nessa concepção a escola dos anos iniciais é espaço de formação inicial e apropriação da cultura geral, humanista e formativa, que é integrada ao desenvolvimento das habilidades nos trabalhos manuais e intelectuais. A segunda fase, mais precisamente, o que corresponderia ao ensino médio, partiria do consolidado na fase anterior para expandir a personalidade rumo a uma consciência moral e social sólida e à autonomia intelectual-moral.

Como Gramsci considera o trabalho como mediador por excelência da relação estabelecida entre o homem/natureza e homem-homem, o filósofo italiano propõe que a educação se volte para duas questões importantes: a primeira relativa ao desenvolvimento das noções científicas com fim na superação dos conhecimentos espontâneos e a segunda voltada aos conhecimentos da “(...) vida social e as suas determinações mediadas pelo trabalho” (Ferreti, 2009, p. 123).

Shulgin (2013) propõe o conceito de “trabalho socialmente necessário” e o desenvolve para o politecnismo, no qual se inserem os níveis de ensino que vão da educação infantil ao ensino superior.

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O trabalho socialmente necessário deve ser interessante para as crianças e se origina das necessidades/problemas da região, deverá ser cuidadosamente planejado em todas as suas etapas, sendo que cada grupo de alunos deve ficar responsável por um trabalho, não necessariamente no mesmo local.

As atividades devem fazer parte de um todo, que não será de inteira responsabilidade da escola, pois a comunidade deve estar envolvida. É um trabalho duradouro, pois ele não se extingue no final do ano letivo, mas persiste no desenvolvimento de atividade dos grupos de alunos que se sucedem enquanto houver o problema. O trabalho se realiza fora do horário escolar, mas a preparação, condução dos momentos de organização, avaliação e consulta é realizada durante o horário escolar.

Esse trabalho muda o comportamento da criança fora da escola, pois promove a autogestão, principalmente quando apaga as linhas que separam a escola da comunidade, torna a criança uma pesquisadora e executora que toma consciência dos assuntos externos à escola. Por isso permite outra postura em relação ao bem comum, pois passa a fazer parte da constituição dela. “Não é a vida para a escola, mas é a escola para a vida. A escola não é um objetivo em si mesma” (Shulgin 2013, p. 187).

Para o autor, o ensino se daria por meio do trabalho socialmente necessário articulado aos conteúdos escolares de forma que contemplasse o programa de ensino. Esse trabalho requer que antes houvesse a pesquisa que permitisse ao aluno compreender “(...) a vida, a economia, o nível cultural e político de uma determinada região, do campo, aldeia, cidade etc. Mas isso não é suficiente: ela tem que ajudar a introduzir o novo na vida, na economia, melhorá-las” (Shulgin 2013, p. 44). Tal articulação permitiria elevar o nível cultural do meio por meio dos resultados disponibilizados pelas pesquisas ou ações escolares.

Para esse autor, o trabalho socialmente necessário não é uma forma de fixar conhecimentos transmissíveis, mas, por ser essencial para a comunidade acaba por instigar as crianças à expansão e aprofundamento dos conhecimentos, não apenas por considerações abstratas, mas pela prática real. Portanto, desde que

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estivesse em conformidade com as potencialidades intelectuais e biológicas das crianças, tornava-se um trabalho pedagógico valioso.

Saviani (2003a), ao discutir a educação politécnica, afirma que esta concebe os aspectos manuais e intelectuais como aspectos indissociáveis e indissolúveis do processo de trabalho, uma característica que deve ser observada desde o início da escolarização. Trata-se de uma formação multilateral em que o desenvolvimento do estudante engloba também a prática produtiva, que não dispensa o domínio dos princípios científicos das diferentes técnicas sobre as quais as diversas modalidades de trabalho se baseiam e se caracterizam.

Tendo como referência o trabalho, a educação politécnica para Saviani (2003a) também prevê o aprofundamento da compreensão de como ele se organiza hoje, processo que se daria por meio da interferência dos conhecimentos científicos, ou seja, história, geografia e demais áreas. Assim, a organização do ensino-aprendizagem oferece condições para que o aluno não apenas se aproprie dos conhecimentos científicos, teoria, mas consiga aplicá-los, entendendo como a ciência é produzida, sempre articulando trabalho intelectual com trabalho manual.

A relação entre trabalho e escolarização que fundamenta a ideia de uma educação politécnica permite, portanto, que se entenda cada vez mais profundamente os princípios científicos que estão na base da produção produtiva. O trabalho humano é o fundamento da educação, compreendido nas suas diferentes modalidades e em sua essência; como a ciência é incorporada na produção de bens, e ainda “(...) como a sociedade está constituída, qual a natureza do trabalho nessa sociedade e, portanto, qual o sentido das diferentes especialidades em que se divide o trabalho moderno” (Saviani 2003a, p. 141).

Como já afirmamos no início deste texto, as atividades de ensino nos anos iniciais possuem uma característica bastante peculiar – a mesma professora ou o mesmo professor trabalham com diferentes áreas do conhecimento (ou disciplinas): Alfabetização e Língua Portuguesa, Artes, Ciências Naturais, História, Geografia e Matemática. Trata-se de um trabalho pedagógico complexo,

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que exige da professora ou do professor um conjunto de conhecimentos distintos destas diferentes áreas e também sobre como ensiná-las, considerando-se ainda que estes conhecimentos são constantemente articulados e reorganizados no cotidiano das aulas. Nesse sentido, é importante que o professor possua uma visão de conjunto dos processos de ensino e aprendizagem e entendemos que a didática constitui-se ao mesmo tempo, numa concepção de ensino e numa dimensão nuclear e organizadora das atividades de ensino que serão postas em prática, tal como a descreve Libâneo (2011).

A didática aqui é entendida como uma epistemologia do ensino, um corpo de conhecimentos oriundos de diferentes campos que, tomados em seu conjunto, permitem compreender as relações entre conteúdo, metodologia e aprendizagem. Para Catani (2005) se trata de uma disciplina que permite uma visão radical e ao mesmo tempo de conjunto da docência – radical porque estuda em suas particularidades os elementos que compõem a atividade de ensino (conteúdos, objetivos, metodologia, aprendizagem e avaliação) e de conjunto porque permite agregar estes elementos numa única composição, dando ao professor a visão de conjunto do ensino a que nos referimos anteriormente.

Nessa concepção de didática, ensino e aprendizagem formam uma unidade dialética e consideramos que é preciso construir formas de ajudar o professor a compreender melhor as relações entre o ensinar e o aprender, o planejar e o realizar em sala de aula. A relação ensino aprendizagem para nós está centrada no conhecimento, na formação de conceitos provenientes daquelas áreas (ou disciplinas) acima mencionadas articulando-as com o conhecimento didático.

Ensinar é proporcionar ao aluno o conteúdo cultural produzido pela humanidade e as habilidades cognitivas que possibilitam a aprendizagem da cultura: a capacidade de estabelecer relações, de fazer sínteses, de pensar teoricamente e refletir criticamente sobre a realidade – o que Vigotski (2010) denomina de funções psíquicas superiores – de forma que as crianças dos anos iniciais iniciem a trajetória escolar de forma

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consistente, para que possam aprender e prosseguir aprendendo ao longo de toda a Educação Básica.

A teoria da atividade e o conceito de politecnia tal como aqui foram expostos, no nosso entendimento, se complementam numa síntese superadora para o esclarecimento da nossa concepção de ensino nos anos iniciais, principalmente no que se refere a afirmativa de que não existe ação/trabalho/atividade sem reflexão/pensamento/trabalho intelectual. A tendência em separar a produção dos saberes científicos e pedagógicos, bem como as teorias sobre o ensino e a aprendizagem de um lado e a execução do trabalho docente de outro tem se agravado, e o que assistimos no atual momento é a quase que total destituição do controle do processo de trabalho pelo professor (Limonta e Silva 2013).

As políticas educacionais, ao mesmo tempo, buscaram em suas reformas aumentar o atendimento às crianças em idade escolar, seja no aumento do número de alunos por sala, seja na extensão das etapas e níveis de ensino. Para Assunção e Oliveira (2009), a combinação maior acesso e mais eficiência resultou na progressiva massificação do ensino e na responsabilização dos educadores (professores e gestores escolares) sobre a gestão desta eficiência, imputando-lhes cada vez mais exigências ao mesmo tempo em que as condições de trabalho nas escolas foram ficando cada vez mais precarizadas.

As orientações curriculares oficiais para a formação de professores no curso de Pedagogia e para o Ensino Fundamental colocam uma série de objetivos que se materializam num complexo rol de prescrições para o professor ao mesmo tempo em que o trabalho docente nas escolas públicas passa por um processo de intensificação e precarização (Oliveira 2004).

Entendemos a escola como espaço em que se promove intencionalmente o encontro dos alunos com os conhecimentos científicos, sua função nuclear é, pois, propiciar os conteúdos e os meios do desenvolvimento intelectual, melhor dizendo, formar o pensamento teórico dos alunos dentro de um processo maior que objetiva o pleno desenvolvimento de sua personalidade global. Assim, o professor organiza, sistematiza e orienta o ensino, buscando

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conduzir o aluno – ser concreto, dotado de particularidades socioculturais – no processo de ensino/aprendizagem dos conteúdos, dos saberes produzidos e acumulados historicamente pela humanidade.

O êxito nesse processo, além de ser considerado como possibilidade do desenvolvimento cognitivo, cultural e moral, também tem como consequência a construção de autonomia de pensamento, capaz de levar o aluno à transformação e ao desenvolvimento pessoal e das condições objetivas em que vive (Libâneo 2013).

Um conhecimento didático em construção: reflexões sobre as contribuições da teoria do ensino desenvolvimental e da didática desenvolvimental para o ensino

À título de considerações finais e ao mesmo tempo apontando uma perspectiva para o trabalho docente nos anos iniciais, finalizamos este texto trazendo algumas contribuições da teoria do ensino desenvolvimental para o desenvolvimento intelectual do professor e para a constituição do ensino como atividade politécnica. Fundamentada na concepção materialista histórico dialética de conhecimento, a teoria do ensino desenvolvimental enfatiza a importância da cultura elaborada e sistematizada socialmente para o desenvolvimento humano via formação do pensamento teórico, ou seja, afirma a necessidade dos conteúdos científicos e culturais projetados nas matérias escolares para o desenvolvimento humano.

A tese de Davídov (1982), confirmada pelos inúmeros experimentos que realizou com seu grupo de pesquisa, afirma que o ensino de determinados conteúdos escolares é fundamental no processo de formação e desenvolvimento do pensamento teórico nas crianças, inicialmente mediante a criação das abstrações e generalizações essenciais consolidados pelos conceitos cotidianos e em seguida na ascensão do abstrato ao concreto, via conceitos científicos.

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Nessa concepção, ensino e aprendizagem formam uma unidade dialética e consideramos que é preciso construir formas de ajudar o professor a compreender melhor as relações entre o ensinar e o aprender, o planejar e o realizar em sala de aula. A relação ensino aprendizagem para nós está centrada no conhecimento, na formação de conceitos provenientes daquelas áreas (ou disciplinas) acima mencionadas articulando-as com o conhecimento didático.

Baseando-se na teoria histórico-cultural de Vigotski e na teoria da atividade de Leontiev, Davídov (1999) afirma que a atividade mental interna é estruturada no indivíduo num processo de comunicação compartilhada com as outras pessoas e com os objetos culturais, enfatizando a premissa de que o desenvolvimento do pensamento individual só é possível sobre a base da experiência histórica social, que é interiorizada nesse processo.

Segundo Freitas e Limonta (2012), Davídov (1982) enfatiza em suas pesquisas que a aprendizagem dos conteúdos escolares é um tipo especial de atividade – atividade de estudo – corroborando a tese de Vigotski de que o ensino organizado e sistematizado dos conceitos científicos sob a forma de conteúdos escolares tem papel fundamental nas neoformações, melhor dizendo, na formação de novas e mais sofisticadas funções psíquicas superiores, desenvolvimento que dificilmente pode ocorrer fora desta atividade sócio-histórica que é o processo de escolarização formal.

No entanto, a formação do pensamento teórico não é a simples interiorização do conceito comunicado pelo professor, o aluno aprende realmente um conteúdo quando aprende também as ações mentais ligadas a este conteúdo, os modos mentais de proceder com os conceitos que formam o conteúdo. Em outras palavras, na atividade de aprendizagem os alunos se apropriam (também) das ações mentais que permitiram às gerações anteriores produzirem os conceitos que ele, aluno, está aprendendo agora como conteúdo escolar. Os alunos se apropriam e reproduzem em sua atividade pensante os objetos histórica e culturalmente produzidos por gerações e gerações de cientistas e que foram sendo acumulados e tornados um conhecimento coletivo (Freitas 2011).

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Embora o pensamento das crianças tenha alguns traços em comum com o pensamento dos cientistas, artistas e filósofos, os dois não são idênticos. As crianças em idade escolar não criam conceitos, imagens, valores e normas, mas apropriam-se deles no processo da atividade de aprendizagem. Mas, ao realizar esta atividade, as crianças executam ações mentais semelhantes às ações pelas quais estes produtos da cultura espiritual foram historicamente construídos. Em sua atividade de aprendizagem, as crianças reproduzem o processo real pelo qual os indivíduos vêm criando conceitos, imagens, valores e normas. Portanto, o ensino de todas as matérias na escola deve ser estruturado de modo que, como escreveu Ilenkov, seja reproduzido, de forma condensada e abreviada, o processo histórico real da gênese e desenvolvimento do conhecimento. (Davídov 1988 pp. 21-22)

A assimilação dos conhecimentos pode ocorrer em outros tipos de atividade, porém só na atividade de estudo assimilar um conceito científico é objeto e objetivo do processo. Portanto, “(...) el contenido principal de la actividad de estudio es la asimilación de los procedimientos generalizados de acción en la esfera de los conceptos científicos y los câmbios cualitativos en el desarrollo psíquico del niño, que ocurren sobre esta base” (Davídov e Markóva 1987, p. 324).

Na perspectiva da teoria desenvolvimental, o acesso à experiência socialmente elaborada ocorre especialmente por meio da atividade de estudo, e, embora haja relação entre assimilação e atividade de estudo, seus conteúdos se diferenciam. Ainda que a gênese da assimilação ocorra sempre em colaboração com o outro, relação na qual a comunicação está presente e se torna o elemento que pode elevar de um simples contato com uma pessoa concreta à comunicação com a humanidade e a tudo o que se originou de seu processo de desenvolvimento, isso não garante o desenvolvimento do pensamento teórico.

Davídov (1998) considera, portanto, a educação escolar e o desenvolvimento como indissociáveis e que a criação de condições adequadas para formar os alunos – atividades de aprendizagem

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cujo conteúdo seja o conhecimento teórico e as habilidades baseadas nele – são o fundamento do desenvolvimento omnilateral. Esse desenvolvimento se daria por meio da atividade de estudo, que para ele pode ser introduzida como atividade diretiva/guia/principal na etapa escolar inicial.

Neste breve texto apresentamos duas categorias – atividade politécnica e ensino desenvolvimental – que talvez possam contribuir para com as nossas investigações e proposições nos campos da formação e do trabalho docente, buscando articular concreta e dialeticamente a formação e o desenvolvimento dos professores à sua atividade principal – o ensino – cujo objetivo nuclear é a formação e o desenvolvimento dos alunos da educação básica.

São reflexões que apontam para a necessidade da formação intelectual do professor para que este realize a atividade de ensino como práxis, pois acreditamos que emancipando intelectualmente nossos professores estamos contribuindo enormemente para a emancipação do povo brasileiro que está nas escolas públicas. Num momento histórico em que se faz necessário (e urgente) enfrentar o “recuo da teoria” na formação docente (Moraes, 2003), esperamos ter deixado aqui uma contribuição para este enfrentamento.

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9currículo da educação inFantil e traBalho docente: PersPectiva sócio- histórico-dialética

Ivone Garcia BarbosaNancy Nonato de Lima Alves

Introdução

Entre as temáticas consideradas complexas e recentes na área educacional por professoras que atuam na Educação Infantil, destaca-se o currículo. Sua importância é reconhecida nas decisões cotidianas, sendo, no entanto, indicado como uma das barreiras durante a organização e desenvolvimento de atividades pedagógicas. Tal dificuldade se associa a limitações na própria formação profissional, que pouco discute o campo curricular, bem como às lacunas conceituais quanto à definição do currículo na educação de crianças de até seis anos de idade, o qual é entendido muitas vezes como conjunto de conteúdos e de procedimentos didáticos.

A palavra currículo etimologicamente origina-se de currere e de formas derivadas como curriculum, currus, cursus, comportando vários significados, dentre eles, lugar no qual se

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corre, carreira, percurso, caminho, jornada, ação de percorrer uma determinada trajetória. Por sua polissemia, currículo no campo educacional expressa, também, ideias de sequência ordenada; espaço físico; programa; documento; curso a ser seguido; ação; movimento; experiências de aprendizagem; totalidade de estudos e/ou da atuação profissional (Moreira 1990; Spodek e Saracho 1994[1998]; Goodson 1995[2008]). Tais ideias são referidas aos vários níveis, etapas e modalidades da educação escolar.

O presente texto aborda o currículo na Educação Infantil e suas relações com o trabalho docente, com base na perspectiva sócio-histórico-dialética. Analisa contribuições das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (Brasil 2009a; 2009b) e sua importância para constituição de uma identidade pedagógica e curricular dessa primeira etapa da Educação Básica. Discute uma concepção sócio-histórico-dialética de currículo na Educação Infantil, destacando características, demandas, avanços e desafios para o trabalho docente.

Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil: avanços e desafios na construção da identidade pedagógica a partir dos anos de 1990

O campo curricular se destaca no processo de reformas educacionais das décadas de 1990 e 2000, inclusive na Educação Infantil em seu novo contexto legal. Em relação às produções brasileiras sobre a educação infantil, é possível notar na década uma expressiva discussão sobre a pré-escola, impulsionada, inclusive, pela reação de grupos de pesquisadores a uma visão de caráter compensatório e escolarizante, hegemônica nas diferentes instituições brasileiras.

A Educação Infantil brasileira passou, desde a década de 1980, por transformações significativas, resultantes de vários determinantes históricos e do envolvimento de importantes segmentos sociais na luta pelas condições de acesso, oferta e

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qualidade do atendimento de crianças menores de sete anos em instituições educacionais. A Constituição Federal (Brasil 1988) considerou a criança como cidadã, assegurando-lhe, todos os direitos sociais, incluindo a Educação Infantil em creches e pré-escolas a partir do nascimento. Isso exigiu a revisão de concepções sobre a educação de crianças, bem como sobre as especificidades do trabalho pedagógico naqueles espaços educativos.

O marco legal e normativo enfatizou os direitos da criança e conferiu maior visibilidade à Educação Infantil ao conceituá-la como primeira etapa da Educação Básica, atribuindo-lhe uma função educativa complementar à ação familiar (Brasil 1990, 1996a). Apesar das contradições sobre as quais a legislação se estrutura, a regulamentação das obrigações do Estado favoreceu o reconhecimento das instituições educacionais como contextos de formação integral das crianças, estendendo-se a compreensão de contexto educativo para além do meio familiar, sem, no entanto, negar a importância deste último.

As novas condições de acesso e de oferta de vagas na Educação Infantil passaram a ser amplamente discutidas entre pesquisadores, professores, gestores e outras instituições e entidades interessadas no debate sobre o papel político e sociocultural assumido por aquela etapa educativa. Também ganhou destaque a questão da qualidade dos projetos educacionais e dos atendimentos cotidianos assegurados às crianças, sobretudo as de baixa renda. Importantes debates se intercruzaram nas produções científicas e contribuíram para o aprofundamento da temática curricular. Esta, aos poucos, deixou de ser proibida entre os pesquisadores, ganhando, novas conotações para o que se contou com importantes teorizações, brasileiras e de outros países, da pedagogia, da sociologia, história, psicologia, envolvendo posturas mais críticas e progressistas e, em alguns casos, de base marxista ou de orientação histórico-cultural (Kramer 2002; Campos e Haddad 1992; Oliveira 1993; Barbosa 1997; Barbosa 2007; Barbosa e Horn 2008; Faria e Dias 2007; Oliveira-Formosinho 1996[2007]; entre outros).

No cerne das discussões, revisaram-se as concepções de infância, criança, educação infantil e de currículo, este último

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muitas vezes designado como “projeto pedagógico”. Esse foco também aparece em documentos produzidos pelo Ministério da Educação, que, contando com apoio e participação de especialistas elaborou inúmeros documentos sobre a educação infantil (Brasil 1994, 1995, 1996b). Ainda que de modo controverso, marcado de contradições e limites já apontados de modo consistente por pesquisadores da área (Faria e Palhares 1999; Kuhlmann Jr. 1999; Cerisara 2002), consideramos que a produção do Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI) é um dos marcos na discussão curricular dessa etapa. Divulgado em 1998, em meio às reformas educativas, um ano antes da primeira versão das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (Brasil 1999), o RCNEI teve caráter não obrigatório (Brasil 1998), mas ganhou visibilidade em municípios brasileiros, aos quais foi enviado pelo MEC, que também propôs treinamento para sua utilização. O efeito desse movimento foi constatado, também, por uma pesquisa realizada dez anos mais tarde em cooperação técnica entre o MEC e a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), que mostrou a influência do Referencial em 42% das propostas pedagógicas analisadas (Brasil 2009c, 2009d).

No contexto dessas preocupações ocorreu a aprovação das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (DCNEI), em 1999 e sua revisão em 2009, conjugando-se ao movimento contínuo pela construção de uma identidade e qualidade social do atendimento de crianças de zero até seis anos de idade. Essa normativa é de grande importância para a educação brasileira, na medida em que define os princípios, fundamentos e procedimentos para a formulação de políticas públicas, incluindo a formação de professores, e orienta os processos de elaboração, planejamento, execução e avaliação de propostas pedagógicas e curriculares para creches e pré-escolas públicas e privadas (Brasil 2009a, 2009b).

Definida como direito da criança e dever do Estado, por ser a primeira etapa da Educação Básica, a identidade pedagógica da Educação Infantil é constituída, segundo as DCNEI/2009, por sua caracterização como atendimento institucional, não doméstico, realizado por profissionais docentes com habilitação para o magistério; sendo considerada uma das prioridades na política

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municipal que tem oferta regulamentada e avaliada no âmbito dos sistemas de ensino. As Diretrizes estabelecem princípios que políticos, éticos e estéticos devem fundamentar as propostas das instituições compromissadas com a qualidade educativa, com a finalidade de promover, o crescimento, o desenvolvimento integral, a participação e a cidadania das crianças, reafirmando a indissociabilidade entre cuidado e educação em práticas pedagógicas intencionalmente planejadas e avaliadas. A relação cuidar-educar, bem como outras dimensões apontadas nas DCNEI, foi incorporada como um dos princípios das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica (Brasil 2010a; 2010b).

O Parecer CNE/CEB nº 20/2009 reconhece que o currículo na Educação Infantil tem sido campo de controvérsias e diferentes visões de criança, família e funções da creche e da pré-escola (Brasil 2009a). Entre os aspectos discutidos no Parecer, chama a atenção o fato de assinalar o debate das décadas de 1980 e 1990, no qual se evidenciou um dissenso quanto à utilização da palavra “currículo”. Observa-se, nesse sentido, uma reserva ou recusa explícita a essa denominação, por supor sua vinculação estrita à escolaridade obrigatória, ou seja, a um modelo de escola considerado inadequado às peculiaridades da aprendizagem e do desenvolvimento na faixa etária até seis anos de idade. Essa é uma das razões apontadas para a preferência na área da Educação Infantil pela expressão “proposta pedagógica”, entendida ora como distinta ora como equivalente a currículo. Na década de 1990, outras designações foram sugeridas por pesquisadores: projeto educacional-pedagógico, proposta psicopedagógica (Brasil 1996b).

No “Projeto de cooperação técnica MEC e UFRGS para construção de orientações curriculares para a educação infantil”, citado anteriormente, foi constatada a preocupação dos municípios em manter certa especificidade no atendimento às crianças da Educação Infantil, apesar de posicionamentos ainda ambíguos e contraditórios em torno da questão curricular. Além da diversidade de documentos produzidos sobre o currículo, das diferentes naturezas de seus conteúdos e finalidades, bem como das denominações daqueles, a pesquisa evidenciou um avanço em relação à concepção de criança. Esta é apresentada como sujeito

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sócio histórico e de direitos, produtor de cultura, defendendo-se a ludicidade e o brincar como eixos curriculares de destaque, sendo menor o número de propostas voltadas à alfabetização, em relação a dados anteriores de pesquisas sobre o currículo na Educação Infantil (Brasil 1996b).

Constataram-se, no estudo referido, pontos de aproximação das propostas quanto à concepção de currículo, entretanto com significativas diferenças nas práticas cotidianas. Têm-se as definições de currículo: como resultado do entrelaçamento de saberes; orientado pela listagem de conteúdos e objetivos ou pelas áreas de conhecimento; articulado às práticas culturais; centrado na figura do professor; desenvolvido por meio da pedagogia de projetos com ou sem a participação das crianças; centrado em campos de experiências que trabalham a autonomia; concebido como movimento, como a vida, como algo que não pode ser predeterminado; baseado no desenvolvimento das linguagens (Brasil 2009c).

Os modelos curriculares ressoam, segundo aquela pesquisa, na diversidade encontrada entre as práticas pedagógicas expressas nos documentos analisados. De acordo com os dados notou-se, que há poucas referências em relação às crianças de 0 a 3 anos de idade. Porém, em contrapartida, parece haver aceitação quanto à existência de infâncias, de diferentes relações entre a criança e o mundo, envolvendo objetos e sentimentos. As crianças aparecem como protagonistas do processo educativo, coincidindo com posturas de vários pesquisadores brasileiros, que defenderam ao longo dos anos ações cotidianas fundadas nos direitos infantis, traduzidos em indicadores de qualidade (Brasil 2009d; 2009e).

Ressaltamos que, de nosso ponto de vista, os modelos curriculares encontrados durante as investigações sinalizam diferentes tendências, debates e tensões na área, que passam a ser incorporadas à organização e dinâmica do cotidiano pedagógico e de definições quanto à função social e política das instituições educativas. Alguns elementos e questões presentes nos debates educacionais envolvendo a crianças de 0 até 6 anos, sobretudo a partir dos meados da década de 1990, permaneceram como ponto

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de pauta até os dias atuais: a existência do binômio cuidado-educação; papel das interações sociais nos processos de ensino-aprendizado; apropriação de conhecimentos e desenvolvimento da criança; papel do lúdico e da brincadeira no processo educativo; a avaliação; a relação cultura, arte e educação infantil; especificidades da educação de crianças de 0 a 3 anos; qualidade educacional em creches e pré-escolas; relação entre instituições educativas e as famílias; elaboração de políticas públicas; formação de professores; o currículo e suas especificidades na Educação Infantil.

Quanto à designação oficial, constatamos que a Resolução CNE/CEB, nº 5/2009, mesmo assumindo o termo currículo, usa predominantemente, a expressão “proposta pedagógica” (Brasil 2009b). Ao definir currículo, as DCNEI/2009 entendem-no como um “conjunto de práticas que buscam articular as experiências e os saberes das crianças com os conhecimentos que fazem parte do patrimônio cultural, artístico, científico e tecnológico” (Brasil 2009a, p. 6). De acordo com Oliveira (2010), esse conceito possibilitaria superar a concepção de currículo como listas de conteúdos obrigatórios ou disciplinas compartimentalizadas, colocando a instituição de Educação Infantil “como mediadora das experiências e saberes infantis e os conhecimentos que circulam na cultura mais ampla e que despertam o interesse das crianças” (Oliveira 2010, p. 4).

Entendemos que a conceituação de currículo das Diretrizes expressa uma perspectiva de formação integral da criança, possibilitando considerá-la como sujeito ativo no seu processo de formação e desenvolvimento, ao mesmo tempo em que indica a necessidade de a instituição educacional ter em conta as apropriações que a criança realiza em outros espaços e grupos sociais dos quais ela participa. Apesar desse avanço, porém, nossa análise indica que ocorre a (re)apresentação, nas DCNEI/2009, de uma definição restrita de currículo como “conjunto de práticas”, a qual já havia sido delineada no campo curricular brasileiro nas décadas de 1920 e 1930. Nesta acepção, corre-se o risco de se reduzir a realidade social do currículo, privilegiando a dimensão subjetiva da atuação de professores e crianças no processo educativo. Com isso, perde-se a possibilidade de compreensão do

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caráter histórico do conceito, da forma e dos conteúdos curriculares (Goodson 1995[2008]). Entendemos que resulta uma versão de tendência ainda de tom pragmatista, que pode, conforme for interpretada, restringir a apropriação de conhecimentos à esfera da ação individual, do que no senso comum se poderia denominar de “saberes”, do fazer pedagógico, excluindo ou secundarizando as dimensões epistemológica, política e social do currículo.

Discutindo modelos curriculares na Educação Infantil, em pesquisa de abrangência internacional, Haddad (2012, p. 40) considerou a existência do tensionamento entre duas abordagens que, de um lado, relevam e reivindicam as especificidades da Educação Infantil e, de outro lado, que aproximam e se identificam com a cultura escolar das demais etapas de ensino. A autora explicitou tensões e dilemas em três dimensões do currículo: a) finalidade pedagógica – polarizada entre promover o desenvolvimento infantil integral ou preparar para a escola pela antecipação de conteúdos e atitudes; b) abrangência do currículo – dividida entre apresentar diretrizes gerais que definem princípios orientadores, com abertura para as opções locais, ou definir orientações prescritivas, fixando objetivos cognitivos e conteúdos detalhados; c) conteúdo do currículo – organizado em campos de experiência ou áreas de conhecimento.

As proposições das DCNEI/2009 remetem à compreensão das especificidades do trabalho pedagógico na Educação Infantil, que abrange, dentre outros processos e atividades: articulação das experiências infantis com os conhecimentos do patrimônio científico, cultural, artístico, ambiental, técnico e tecnológico; promoção do desenvolvimento físico, afetivo, cognitivo, ético e estético da criança, propiciando autoconhecimento e autonomia; ampliação das relações sociais e afetivas positivas; desenvolvimento da comunicação e expressão infantil por meio da apropriação e domínio das várias linguagens humanas; interação com o mundo físico e social; atividades ligadas às necessidades biológicas da criança; a brincadeira como uma das atividades privilegiadas para a aprendizagem e o desenvolvimento infantil (Brasil 2009a, 2009b). Nessa direção, notam-se características do que Haddad (2012) designa como “pedagogia social” na qual não há hierarquização

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entre cuidado, formação e educação, com ênfase em todas as áreas de desenvolvimento que são “trabalhadas através da brincadeira e amplo projeto de trabalho que encorajam a aprendizagem ativa e as múltiplas experiências nos maiores domínios de desenvolvimento” (Haddad 2012, p. 53). Essa perspectiva, de nosso ponto de vista, se opõe à tradição escolar dominante, que prioriza a formação cognitiva baseada em uma lógica instrumental ou, em muitos casos, a formação moralizante das crianças pobres e de suas famílias. Nesse sentido, as DCNEI sugerem novas possibilidades de pensar e constituir elementos mediadores para um currículo em creches e pré-escolas.

Ademais, o caráter obrigatório das Diretrizes e o fato de se constituírem como orientações gerais pode contribuir para a construção da identidade pedagógica da área, sem ferir a autonomia das instituições na produção de currículos locais e, ainda, sem fazer prescrições detalhadas de conteúdos ou objetivos, o que permite superar a ideia de “currículo mínimo” ou “base nacional única”. Reafirma-se, pois, a intenção de construir a autonomia curricular das instituições de Educação Infantil, em uma perspectiva de gestão democrática, envolvendo profissionais, crianças, famílias e comunidades, estando de acordo com o que indicam vários documentos e leis nacionais (Brasil 1996a, 2005, 2006, 2009b, 2009e, dentre outros). É preciso, no entanto, ressaltar, em uma análise dialética, as contradições e os limites que se colocam à participação em uma sociedade hierarquizada, desigual e excludente, na qual, muitas vezes, esse processo se restringe a uma dimensão operacional apartada da tomada de decisões (Alves 2007; Barbosa 2015). Essa compreensão suscita que se reconheçam, entre outras dimensões, as profundas intersecções entre currículo e trabalho docente.

O currículo e o trabalho docente na Educação Infantil: uma concepção sócio-histórico-dialética

O currículo se situa no campo do planejamento e da organização educacional, sendo empregado em vários setores

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sociais com usos diversos o que possibilita distintas interpretações e posições, configurando a complexidade que o caracteriza. A proposição e o desenvolvimento de um currículo resultam da tomada de decisões acerca das múltiplas dimensões que compõem o processo didático-pedagógico em cada nível, etapa e modalidade de ensino. São mobilizadas, nesse movimento, diferenciadas acepções de currículo, caracterizadas por concepções, fundamentos teóricos, políticos, epistemológicos, conforme a visão de mundo e posição de grupos e/ou pessoas que se responsabilizam pela formulação, execução e avaliação curriculares.

No campo estritamente pedagógico, o currículo encontra-se tradicionalmente revestido da ideia de organização das ações dos sujeitos nas práticas educativas, buscando tornar mais exitosa a educação escolar. É usual remeter o conceito a seus aspectos mais aparentes, abarcando entre eles: conteúdos ensinados e aprendidos; experiências de aprendizagem ou atividades que a escola ou outra instituição deve promover; planos e programas; objetivos educativos; avaliação da aprendizagem. De maneira geral, pode-se considerar a convergência entre educadores e teóricos da educação quanto à noção de que o currículo designa possibilidades de modos e recursos de organização das ações, apresentando direção que orienta o modo de agir e pensar o conhecimento pelo docente e pelas crianças, visando atingir objetivos e finalidades específicas. Desse prisma, costuma-se aproximar e igualar o currículo ao projeto político-pedagógico (PPP), transformando o currículo em unidade única e central do processo educacional.

Conforme concebemos, no entanto, projeto político-pedagógico e currículo são planos distintos e articulados, que possuem suas especificidades e não se confundem. O PPP é amplo, abarcando a totalidade da organização e da dinâmica educativa das diferentes instituições. Dentre as várias dimensões que compõem o PPP encontra-se a que se refere ao currículo, que mantém relação com o trabalho pedagógico. Freitas (1995[2000]) afirma que o trabalho pedagógico ocorre simultaneamente em dois âmbitos: em sala de aula e na organização global da instituição, norteada pelo projeto político pedagógico. Este, segundo nossa análise, possui intencionalidade e compromissos coletivos, por isso, se afirma como

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projeto político que: propõe um ideal de formação humana; define a identidade sócio-política e pedagógica da instituição; regula as formas de relação dos segmentos e sujeitos na instituição e desta com a comunidade escolar e com a sociedade ampla; estabelece princípios e forma de gestão administrativo-pedagógica; delimita a relação da instituição com a família; explicita as necessidades e condições para o desenvolvimento das atividades institucionais; determina a avaliação da instituição e do próprio projeto.

Definimos, então, o currículo na Educação Infantil como um conjunto articulado de fundamentos, princípios, concepções e de práticas socioculturais específicas. Portanto, não se restringe à listagem de disciplinas e/ou conteúdos, atividades e procedimentos (práticos) organizados sequencialmente para serem desenvolvidos com as crianças, sob a direção exclusiva do professor (Barbosa e Alves 2003). O currículo, vinculado organicamente ao PPP, é constituído e constituinte de bases teóricas e diretrizes práticas, que explicitam intenções e projetos, e direcionam o trabalho docente na instituição de educação infantil – considerado no âmbito do trabalho institucional – de modo a favorecer vivências das crianças e professores e efetivar experiências significativas de aprendizagem, conforme entendeu Vigotski (1933/1935[2010]). É, por isso, um “processo vivo, em constante movimento, constituindo-se como forma de materialização do trabalho pedagógico” (Barbosa, Alves e Martins 2010, p. 3).

A elaboração do currículo e sua conceituação articulam, assim, domínios no campo material e simbólico, determinantes e orientadores da dinâmica da relação entre os processos de educar e cuidar, demarcando a função social e política da Educação Infantil. Compõem a proposta curricular: a fundamentação teórica e os princípios que a referenciam; o perfil da instituição, dos profissionais que nela atuam e das crianças; as indicações sobre o papel do professor; o período geral e específico de sua concretização; suas finalidades e objetivos; os conhecimentos; as vivências (Vigotski 1926[2003]; 1933/1935[2010]). Também se deve explicitar no currículo a historicidade da produção e da escolha das concepções, dos conhecimentos e experiências veiculados no bojo da instituição educativa; as metodologias de trabalho que abrangem organização,

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estruturação e dinamização de atividades, interações e de ambiente e contextos de aprendizagem e desenvolvimento; a programação das atividades pedagógicas. Seguindo uma orientação dialética, uma proposta curricular para a Educação Infantil “deve voltar-se à educação multifacética das crianças, [...] integrando-as à vida social, às problemáticas da ciência, da técnica e da arte” (Barbosa 1997, p. 149). Nessa direção, entende-se que cabe às creches e pré-escolas um papel de socialização de conhecimentos produzidos e acumulados historicamente por diversificados grupos socioculturais, de modo que as crianças possam aperfeiçoar habilidades, compartilhar com adultos e entre si as informações, os valores sociais e os elementos culturais. No processo educativo a criança, enquanto protagonista e ser criador, tem o direito de “vivenciar emoções e papéis; estabelecer práticas criativas e construtivas da sociedade contemporânea, servindo à inauguração de novas formas de mediação” (Barbosa 1997, p. 149).

Diante das exigências e especificidades do trabalho pedagógico na Educação Infantil, Barbosa (2010) e Barbosa; Alves e Martins (2011) indicam práticas pedagógicas que favoreçam o desenvolvimento do movimento, da corporeidade, imaginação, criatividade, afetividade, havendo a condição de a criança, assim como o/a professor/a, reconstruir modos de viver aquilo que foi proposto, analisando e interpretando a realidade e os conflitos que nela existem. Desse prisma destacamos a visão de Vigotski (1926[2003]) quando este afirma que a criança precisa conhecer a realidade tal como ela é, sem que se omitam suas facetas, suas dificuldades e grandiosidade. É assim, inclusive, que se pode pensar a discussão sobre a práxis, debatida por diferentes teóricos, entre eles Marx (1983), Marx e Engels (1973 [1987]; s/d) e Vasquez (1967[1977]).

Com base nas teorias de Vigotski (1983[2000]; 1926[2003]; 1933/1935[2010]; 2004[2012]) e de Wallon (1973[1975]) entendemos que a docência na Educação Infantil tem por princípio a construção de um campo emocional e dialógico, ético e democrático, no qual a criança ganha vez e sua voz é ouvida, ao mesmo tempo em que o/a professor/a assume seu papel ativo e, como afirmou Wallon (1973[1975]), sempre tome partido do seu

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tempo, analisando a realidade e dela sentindo-se sujeito. Essa forma de pensar a organização dos projetos pedagógicos pressupõe tanto um domínio teórico-metodológico pelos professores como o desenvolvimento da autonomia pela criança, a qual precisa contar com um adulto que seja parceiro e sensível às suas necessidades, apoiando-a em diferentes momentos e situações. Tal concepção requer que no currículo se organizem dinamicamente os processos de cuidado e de educação, expressos em diferentes atividades humanas e momentos de troca de conhecimentos de naturezas diversas, envolvendo variadas atitudes individuais e coletivas, que de modo recíproco colocam em jogo a expressão subjetiva e a criação cultural de crianças e adultos, pautando-se pela ética nas relações, colocando-se em um campo mais amplo do que o da moralidade e do individualismo.

Assumimos, além disso, o brincar como uma das atividades humanas fundamentais na constituição e expressão da infância, podendo ter, segundo Leontiev (1959[1978]), um caráter de centralidade, definindo dimensões interativas e dos processos de aprendizagem e desenvolvimento, resultando na ampla formação sociocultural da criança. Do mesmo modo, podem-se destacar conhecimentos relacionados às diversas formas de criação e expressão estética e artística, envolvendo linguagens visuais, musicais, cênicas, corporais, literária, reafirmando-se o que já mostraram os estudos de Vigotski (1926[2003]; 2004[2012]).

O debate no campo curricular, dessa perspectiva, mantém relação com a discussão sobre a docência na educação infantil, temática extremamente desafiadora, só podendo ser analisada em função da categoria trabalho, entendido em sua acepção marxista como “uma atividade humana essencial e que deve ser conhecido enquanto atividade ampla e como atividade particular, articuladora de projetos específicos no caso da educação infantil” (Barbosa 2013, p. 122). Enquanto atividade não alienada, o trabalho na Educação Infantil exige do docente, de acordo com Barbosa (2013, p. 123) “a capacidade de reflexão e produção do conhecimento no campo educacional e, especialmente, na educação infantil”. Institucionalmente, ainda segundo a autora, implica a gestão democrática “como postura essencial na superação dos regimes

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sócio-políticos excludentes e que reforça o compromisso social, político e ético com o projeto social emancipador e transformador das relações sociais hoje excludentes” (Barbosa 2013, p. 123).

A instituição de Educação Infantil cumpre função sócio-histórica e cultural que abrange a formação de crianças pela mediação dos adultos – entre os quais se destacam os/as professores/as – e de grupos constituídos por crianças coetâneas ou idades diferentes, que podem ser mais experientes em algum aspecto do desenvolvimento ou domínio de habilidades. Nesse contexto, o professor determina e é determinado pelas relações que estabelece e projeta no seu trabalho, tanto no que se refere às finalidades e objetivos – que assume de modo claro ou não na elaboração de seu plano de trabalho – como no que efetivamente realiza do plano pelo qual se torna responsável. Entende-se, pois, que o trabalho docente se constitui práxis, na medida em que, segundo Barbosa (2010), o professor elabora e executa sua prática pedagógica como atividade interessada, isto é, consciente dos seus motivos, dirigida por finalidades e conhecimentos, relacionando a prática, o processo na atividade desenvolvida e o conjunto de suas determinações de natureza teórica, envolvendo, portanto, a reflexão crítica sobre sua ação, as ações das crianças e o conhecimento.

Consequentemente, o exercício e a vivência docentes são percebidos para além da pedagogia da prática, isto porque que incorporam o pensamento e, em alguns casos, uma consciência sobre os diferentes determinantes e elementos que compõem aquela. Essa premissa permite afirmar que a análise da historicidade na constituição social do trabalho docente requer a compreensão dialética e crítica da atuação, formação e valorização profissional, das diferentes condições de existência material e simbólica da vida do/a professor/a, que imbricam as condições socioculturais, afetivas, intelectuais e de formas de estruturação, dinâmica e organização do trabalho (Alves 2002). Quanto a este, efetivamente, abarca salário, carga-horária, relações interpessoais, formação, ambiente, recursos, entre outros (Freitas 2002). Isso tudo deve ser compreendido no conjunto das transformações que ocorrem no mundo do trabalho, o que pressupõe o reconhecimento do elo entre a ação docente e as dimensões políticas e socioculturais no

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processo de estruturação, organização e funcionamento de creches e pré-escolas.

É possível afirmar, que o trabalho docente na Educação Infantil precisa ser compreendido como relação teórico-prática, recíproca e dialética, em que a prática é referência vital para a organização do pensamento teórico de todo professor, mas que, ao mesmo tempo, não pode ocorrer isolada desse processo de análise e síntese proporcionada pelo ato cognoscitivo. A ação pedagógica do/a professor/a se caracteriza, também, por uma posição diferenciada, assumindo-se como mediador/a privilegiado/a da cultura, do conhecimento, da formação de valores, hábitos e atitudes (Vigotski 1926[2003]; Wallon 1973[1975]; Barbosa 1997). Reafirma-se, nesse caso, que o papel do professor não é de único detentor do conhecimento, mas também não é de mero expectador ou simples facilitador da aprendizagem ou, ainda, apenas de organizador das interações infantis.

Nesse sentido, o currículo na educação de crianças de zero até seis anos precisa ser entendido como processo plural, em que estão envolvidos diferentes sujeitos ativos e que determinam dialeticamente as diferentes situações e contextos educacionais mais globais e os pedagógicos, ou seja, as premissas e as metodologias eleitas por docentes na concretização curricular precisam contribuir para o processo de inserção e acolhimento das crianças e de suas famílias na instituição, respeitando a pluralidade e diversidade étnica, religiosa, de gênero, social e cultural. O trabalho docente, portanto, abrange tanto o campo da profissão, da formação, como o campo mais específico das relações inter e intrassubjetivas, na qual interferem diretamente as formações culturais e as classes e grupos sociais aos quais os sujeitos envolvidos mantêm suas pertenças.

Considerações finais

Em meio a tantas e diversas concepções e paradigmas político-pedagógicos, teóricos e epistemológicos, parece

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consensual reconhecer que a Educação Infantil é um campo em construção. De fato, desde as últimas décadas do século XX intensas mudanças ocorreram no campo, tendo como palco um terreno de lutas de forças e de projetos que configuraram e ainda configuram profundos e complexos debates sobre diversificadas temáticas referentes à infância e seus direitos, entre os quais se coloca a educação infantil de qualidade.

Nesse contexto, a discussão curricular adquire centralidade e (re)põe em cena a diversidade teórico-prática constitutiva da identidade político-social e pedagógica da educação de crianças de até seis anos de idade. Compreendemos que o currículo se articula à docência, não apenas enquanto um conjunto de práticas, mas como constituinte e constituidor de uma práxis. Esta, se de um lado permite reiterações, de outro exige como princípio o trabalho criador, no qual e pelo qual o professor e a criança tanto podem se apropriar sistematicamente – mas não só hierarquicamente – dos conhecimentos produzidos pelos diferentes grupos sociais e culturais, como se tornarem cada vez mais criativos e constituidores de pensamentos, afetos, vivências, éticas e estéticas, sendo, portanto, agentes de cultura. Os professores podem, desse modo, analisar e compreender esse processo e seus desdobramentos numa perspectiva de totalidade, vislumbrando tanto o campo curricular como sua atividade docente de uma perspectiva ampla, criativa e crítica. Tudo isso no prenúncio de constituição de outro modelo de escola, de instituições educativas das infâncias e de outra sociedade.

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10una aproximación a los Factores personales en la satisFación personal de los docentes

Manuel Reyes-Santana

Con denominaciones diferentes, la preocupación por la satisfacción laboral del profesorado es un tema recurrente en el ámbito de la investigación y de la literatura pedagógica. Aparece cada cierto tiempo y cobra auge para sufrir después un declive, quizás en función de ciertas modas o como consecuencia de que otros temas son priorizados por las convocatorias oficiales de investigación. En los últimos años, la investigación ha vuelto a focalizar el problema, como muestran muchas aportaciones recientes (Unesco 2005; Jepson y Forrest 2006; Parra 2007; Opech 2008; Reyes y Cornejo 2008; entre otras muchas) o el hecho de que la última reunión del Observatorio Internacional de la Profesión Docente (OBIPD), celebrada en Barcelona en abril de 2012, haya centrado la discusión en ese tema y en su situación en distintos países.

Como se ha constatado en la reunión científica del OBIPD, entre las apariciones sucesivas de esa preocupación por la satisfacción o el estado de los docentes, el mismo objeto de estudio ha ido variando. Si cuando emerge por primera se refiere al

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malestar, poco a poco la investigación se irá centrando, cada vez más, en el bienestar. En cierto modo, se pasa de una perspectiva de déficit a una perspectiva de desarrollo. Esa transición tiene una gran importancia: si antes eran estudiados los docentes incómodos o insatisfechos con su trabajo, ahora son estudiados los que tienen un grado elevado de satisfacción laboral. Por tanto, al variar el objeto lo hacen también las preguntas de investigación. Ya no interesa tanto cuáles son las fuentes del malestar como conocer qué factores producen bienestar. De ese cambio se deriva otro también importante: de los resultados de investigación sobre malestar se pueden deducir acciones prácticas consistentes en la evitación de los factores nocivos; de la investigación sobre bienestar se deducen acciones orientadas a promover los factores saludables. Si se me permite la extrapolación, se ha pasado de estudiar la enfermedad a estudiar la salud. De hecho, el malestar docente, tal como venía siendo considerado, es un estado de ausencia de salud, si consideramos a ésta en su acepción más integral y compleja.

Considerando la insatisfacción y la satisfacción laboral como dos extremos de una misma dimensión, durante mucho tiempo, la investigación ha desviado su atención hacia el extremo negativo (insatisfacción) y ahora lo hace, preferentemente, hacia el extremo positivo. La contraposición de ambos enfoques se hace patente en los conceptos que conforman el campo léxico de cada uno de los dos extremos considerados. Al estudio del primero se asocian términos como burnout, malestar, surmenage, estrés, depresión, ansiedad. Por el contrario, al considerar el extremo positivo aparecen términos como bienestar, satisfacción, compromiso, resiliencia etc.

Evidentemente, el cambio de enfoque debe tener una incidencia notable no sólo en los objetivos de investigación o en la terminología empleada, sino también en los programas formativos. Así, un enfoque centrado en la insatisfacción suscribe una actitud remediativa y debe proveer al profesorado en formación de herramientas de afrontamiento (coping); por el contrario, un enfoque centrado en la satisfacción adopta una actitud evolutiva, de crecimiento, y debe proveer al profesorado de herramientas para el desarrollo profesional.

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En este sentido, se puede considerar que el desarrollo profesional debería ir acompañado de un incremento en la satisfacción laboral o, lo que es lo mismo, del logro progresivo de un estado de bienestar. Esto incorpora una dimensión humanista al concepto de desarrollo profesional que lo contrapone a una conceptuación meramente técnica del mismo. Es el componente personal del desarrollo profesional.

Contra el determinismo

En líneas generales, parece cierta la afirmación de que las características del ambiente de trabajo se constituyen en causa suficiente para provocar el malestar o el bienestar de los docentes. El clima laboral, que constituye un concepto amplio en su significado, hace referencia a una amalgama de factores que incide directamente en las relaciones, las formas de comunicación, la satisfacción, la motivación y, en general, en la cultura organizativa y profesional: el clima laboral es el medio ambiente humano y físico, es el conjunto de variables, cualidades, atributos o propiedades relativamente permanentes de un ambiente de trabajo concreto (Gonçalves 1997).

Ese ambiente de trabajo incide en el grado de satisfacción y, a través de ésta, en el comportamiento de las personas que configuran la organización, favoreciendo o inhibiendo el compromiso y la dedicación personal y conductas específicas como el absentismo o la colaboración. Pero, a su vez, el clima es, al menos en parte, resultado de esas conductas y del compromiso y las actitudes de las personas que comparten ese ambiente de trabajo. Incluso cuando son analizadas las condiciones “objetivas” de trabajo, concluimos que se produce esa situación paradójica en el ámbito de la enseñanza. El nuestro es un campo laboral en el que, en gran medida, es el mismo docente el que decide una parte de las condiciones de trabajo. El grado de libertad para construir el ambiente interno del aula es muy elevado, incluso en los sistemas

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escolares centralizados. Por otro lado, el ambiente externo al aula (las relaciones con los colegas, las condiciones físicas del edificio y las dependencias etc.) depende en algunos de sus factores de las personas que trabajan en él. Así, el clima de trabajo, que tanta incidencia tiene en el grado de satisfacción y bienestar, no es más que el resultado de las relaciones que se establecen entre los colegas y entre éstos y el medio laboral.

Como decía, entre clima y satisfacción laboral se establece una relación circular, mutua. Un clima de colaboración, por ejemplo, sólo es posible si los que participan de la acción se muestran favorables a cooperar. A su vez, ese clima generado por las actitudes colaboracionistas alimentará conductas individuales de cooperación. Se establece así una relación circular entre clima y satisfacción, de forma que uno incide en la otra y viceversa. Eso supone que en situaciones con climas laborales favorables y grados positivos de satisfacción, ambas entidades mejoran progresivamente y, al contrario, con climas laborales desfavorables y estado de malestar en los trabajadores se produce un empeoramiento progresivo tanto del clima como de ese estado personal negativo, dado que ambos se realimentan. Esta posición es, sin embargo, determinista y no parece la más adecuada para el desarrollo profesional y organizativo, porque supone que la evolución de la institución educativa tenderá a la polarización y va a depender enteramente de su estado inicial. Por el contrario, hemos de considerar que, por encima de esa reciprocidad existente entre clima y satisfacción laboral, median otras variables igualmente relevantes (el compromiso, el sentido de responsabilidad...) que pueden romper la determinación causal. Eso permite que ambientes inapropiados y situaciones de malestar docente sean estados reversibles, transformables, aunque también implica la posibilidad de deterioro de ambientes favorables y el tránsito de un estado de bienestar a su opuesto. En otros términos, la relación circular entre clima de trabajo y satisfacción laboral no es inmediata, sino mediada por factores personales que, potencialmente, pueden revertir la influencia introduciendo elementos que rompen la relación causal entre ambas entidades. Cuando actúa esa potencialidad de transformar lo negativo hacia

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estadios evolutivos más satisfactorios se produce un fenómeno de resiliencia, es decir, de superación de las condiciones desfavorables mediante la incorporación del sentido de desafío. Esos factores personales han originado entonces la ruptura de la relación causal entre un clima laboral desfavorable y un estado de malestar, sea éste individual o compartido.

La resiliencia actúa como elemento de ruptura y como factor terapéutico, en el sentido de detener o prevenir el estado de malestar al que abocaba la relación negativa entre clima y satisfacción.

La experiencia personal de cualquier docente le permite reconocer situaciones de esta índole y quizás también de la opuesta: centros escolares en los que se ha producido un giro histórico positivo hacia estadios de desarrollo institucional y personal más elevados y, en el sentido opuesto, establecimientos docentes que han pasado de ser referentes en relación con ambientes favorables de trabajo y compromiso de sus componentes a ser centros mediocres y en declive. Esas transiciones pasan a formar parte de la historia institucional y, en cierta medida, pueden condicionar la evolución posterior del establecimiento. La narrativa institucional – historias de vida de los centros elaboradas a partir de los relatos de quienes participan de ellos y de los datos textuales que ofrecen sus documentos organizativos – puede poner de relieve esas transiciones y trazar tendencias y orientaciones.

En definitiva, hay que considerar al ambiente de trabajo como un elemento primordial, pero dinámico, complejo y mudable, que afecta y es afectado por los factores individuales y colectivos del personal adscrito a la institución, los cuales se sitúan en un plano jerárquico superior, de forma que éstos pueden variar las condiciones de trabajo al menos en la medida precisa para reorientar el rumbo institucional. No existe, por tanto, una determinación causal entre clima y satisfacción laboral en las instituciones escolares, puesto que, en general, los sistemas educativos otorgan a los docentes un grado de libertad suficiente para transformar el clima laboral.

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Los factores personales y la satisfacción docente

No debe parecer que las anteriores reflexiones se orientan a responsabilizar al profesorado de su propio estado de bienestar o malestar. De hecho, las condiciones de trabajo incluyen ese clima laboral en el que la acción personal y colectiva incide directamente, pero también incorpora otros factores que escapan a la acción y a las actitudes y voluntades de los docentes: el horario, el salario, el régimen administrativo… dependen de la normativa emanada de los poderes legislativos y, por delegación de éstos, de la Administración educativa. Esos factores, que no son directamente controlables, conforman el caldo de cultivo de actitudes favorables o desfavorables en el personal, de forma que la disponibilidad o el compromiso pueden verse seriamente afectados cuando esas condiciones son evaluadas negativamente. Será precisamente la evaluación que el docente hace de la situación la que dará origen a un estado más o menos satisfactorio en relación con su desempeño.

Ya Maslach y Jackson (1982) consideraron que, además de los factores contextuales, era esencial la participación de esos factores personales en el desarrollo del burnout. Se referían expresamente a cualidades de la personalidad y a las habilidades puestas en juego para afrontar las demandas del contexto. Pero no sólo serán ese tipo de factores los de origen personal que inciden en la satisfacción laboral. Será la percepción de la realidad, la forma en que el docente siente su situación, el elemento mediador más relevante en el sentimiento de satisfacción.

De hecho, la satisfacción laboral se define en la actualidad, de forma genérica, como “la actitud del trabajador frente a su propio trabajo, [que] está basada en las creencias y valores que el trabajador desarrolla de su propio trabajo” (Robbins 1988[1999, p. 151]). Por tanto, por encima de las condiciones “objetivas” de trabajo se sitúan la percepción personal que el individuo tiene de las mismas y su voluntad de que exista o no una correlación directa entre esa percepción y su desempeño. Además del dominio de las habilidades necesarias para el ejercicio profesional, esa percepción

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personal y el nivel de compromiso constituyen, posiblemente, los tres tipos de factores con mayor peso en lo que podríamos denominar “buena práctica docente”. Consideradas en conjunto, las relaciones entre esas tres variables explicarían que docentes distintos actúen de forma desigual antes situaciones similares y se sitúen en posiciones diferentes en la dimensión malestar-bienestar.

Por surgir en escenarios industriales o por estar orientados a campos laborales distintos de la enseñanza, los modelos de satisfacción laboral no contemplan normalmente esas relaciones tan complejas. En efecto, en líneas generales, se pueden distinguir tres enfoques sobre satisfacción laboral que ignoran ciertos factores que he sugerido como fundamentales. El primero de esos enfoques supone que la satisfacción es la resultante del balance entre lo esperado del trabajo (las expectativas) y lo que realmente recibe del mismo. Una segunda tendencia concibe la satisfacción como el resultado de la comparación entre lo que la persona aporta al trabajo (el desempeño, la dedicación) y lo que recibe a cambio. La tercera perspectiva considera la incidencia de dos tipos de factores, los de higiene o mantenimiento (remuneración, sistema de supervisión, condiciones materiales, relaciones interpersonales), que son extrínsecos al trabajo y producen efectos negativos sobre la motivación cuando no alcanzan un nivel apropiado, y los motivadores (posibilidades de ascenso, reconocimiento, logros personales, interés de la tarea), que son intrínsecos al trabajo e incrementan la satisfacción y la disponibilidad cuando llegan a un grado apropiado. Como se ve, en los tres tipos de teorías aparece el término recibir: lo que percibe el trabajador se constituye en moneda de cambio, en referente esencial para la satisfacción, con independencia de que lo que se compare sean lo que se espera, lo que se aporta o una mezcla heterogénea de factores. Estas posiciones materialistas no parecen aplicables enteramente a las profesiones y oficios relacionados con lo social, donde la satisfacción debe incorporar otros elementos personales muy asociados a las relaciones interpersonales, a los logros de los otros o a la mejora de las condiciones de vida de los demás. Los otros, los usuarios del servicio (educativo, sanitario, social) no forman parte de aquellos modelos, que parece necesario desechar o, al menos,

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modificar sustancialmente para que sean aplicables a nuestros ámbitos laborales.

En todo caso, sea cual sea la perspectiva adoptada, la satisfacción laboral, el estado de bienestar o malestar en el trabajo, es el resultado de la evaluación personal que el trabajador hace de los factores incidentes en el mismo. Siempre situamos, por encima de los términos comparativos, el hecho de que son factores subjetivos los que contribuyen a construir el bienestar o el malestar. Muchas de las investigaciones sobre satisfacción en el trabajo se refieren, por eso, a actitudes, emociones y percepciones. De hecho, el estilo individual con que cada persona evalúa la realidad es esencial para el bienestar docente. Sigue siendo una prueba evidente de esto el hecho de que, en ambientes similares, dos personas pueden tener sentimientos opuestos de satisfacción o insatisfacción. Lo que para unas personas es una amenaza del medio para otras constituye un reto, un estímulo, un desafío satisfactorio. Con ello se corrobora que los factores personales se sitúan por encima de los factores ambientales en el desarrollo del bienestar (o de su opuesto, el malestar), es decir, que el componente personal es esencial en el afrontamiento de las situaciones laborales.

Consideremos, a título de ejemplo, algunos de esos factores individuales, aun sabiendo que quedan otros muchos posibles fuera de este análisis.

Una situación rutinaria ocasiona tedio en las personas con más propensión al cambio y con mayor tolerancia de la incertidumbre, mientras que genera seguridad a las personas con tendencias opuestas. Esta cuestión puede constituir, de hecho, un factor limitante en el desarrollo de innovaciones. Tal vez por esa razón hallamos docentes muy innovadores y otros que prefieren la seguridad que les proporciona la rutina. De ahí deducimos que factores o situaciones opuestas (rutina y cambio) pueden ser igualmente generadoras de insatisfacción o de satisfacción laboral. El mismo sentido tiene lo que ha sido llamado “pobreza de rol”, entendida como la situación de un trabajador con escasas funciones y una relevancia nula en la organización.

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Algo similar a lo que ocasiona la rutina sucede en relación con la mayor o menor disponibilidad de recursos materiales. Ante esa falta de recursos, un docente puede reaccionar de forma negativa, limitando su repertorio didáctico, mientras que a otro la carencia lo puede estimular para la realización de recursos propios, la búsqueda de alternativas, la movilización en definitiva. Se produce, por tanto, un inconformismo generador, mientras que en el primero se producía, ante el mismo hecho, una resignación sumisa.

Esta diferenciación puede estar debida a factores personales como la orientación cognitiva de los docentes, a la que se refirieron Huber y Roth (1990), sugiriendo la existencia de dos estilos u orientaciones en el profesorado:

• Docentes orientados a la certidumbre, que prefieren situaciones claras, seguras y ciertas y que orientan su aprendizaje de forma personal, evitando exponer sus ideas a la crítica de otros para poder preservarlas.

• Docentes orientados a la incertidumbre, que prefieren comprometerse en situaciones más ambiguas, cuyos resultados no sean tan ciertos ni previstos, orientando el aprendizaje hacia tareas en las que es necesario compartir los puntos de vista y las creencias personales.

También Korthagen (1988) distinguió dos tipos de orientación del aprendizaje en el profesorado:

• Docentes con orientación interna, que prefieren aprender por sí mismos y aceptan de mal grado las directrices externas.

• Docentes con orientación externa, que prefieren aprender con el asesoramiento o la asistencia de otras personas que faciliten los contenidos, las tareas o las estrategias.

Los dos tipos de Korthagen (1988) se identifican en gran medida con los propuestos por Huber y Roth (1990) y pueden

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explicar una mayor o menor propensión a tomar las situaciones escolares como eventuales agentes estresores. Así, un docente con orientación interna normalmente se sentirá incómodo en situaciones de cooperación y trabajo en equipo, que, sin embargo, son preferidas por los que presentan una orientación externa.

Hacia la construcción de un modelo explicativo del bienestar docente

Como anuncié al inicio, no pretendo ofrecer aquí un modelo acabado de satisfacción docente, sino ofrecer algunas reflexiones previas a la construcción de un modelo y algunas pautas sobre las características esenciales de ese posible modelo.

Evidentemente, cualquier modelo explicativo del bienestar ha de incorporar los factores personales a los que vengo haciendo referencia. Como los analizados en el epígrafe anterior, podríamos considerar otras muchas variables de tipo personal. Por citar algunas de las que deberían ser analizadas en la construcción de un modelo, mencionaré el grado de madurez personal, el estadio de aprendizaje, el estilo en el uso de la experiencia como fuente de aprendizaje o sabiduría, la naturaleza intrínseca o extrínseca de las motivaciones laborales, el pensamiento y las creencias en relación con la enseñanza, el estilo de aprendizaje, el locus de control, las tendencias atribucionales… Podemos citar también el nivel de auto-exigencia (la búsqueda de la excelencia, el perfeccionismo en el caso más extremo), la percepción de dominio de las capacidades exigidas por la situación (sentimiento de competencia), la mayor o menor tolerancia del fracaso y otras entidades bien conocidas, como la motivación de logro.

El estilo cognitivo constituye uno de los factores que se antojan esenciales en la construcción del modelo, ya que, como decía antes, por encima de las características objetivas del ambiente se sitúa la apropiación que hace la persona del mismo y eso depende precisamente del estilo cognitivo. Ya Messick (1979) incluyó entre las dimensiones de los estilos de aprendizaje una

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amplia serie de factores que tienen una relación directa con esto. Entre ellas podemos recordar la dependencia o independencia de campo (comprensión de elementos del medio de forma global e integrada en su contexto o de forma aislada y separada del entorno), la articulación de campo (maneras de percibir los estímulos complejos), los estilos de conceptuación (estabilidad en la utilización de estímulos), la complejidad cognitiva (que está en la base de la construcción de diferentes conductas sociales), la nivelación (que se opone a la puesta en relieve, dos extremos de una dimensión referida a la forma en que las personas establecen el balance entre los distintos estímulos presentes en un determinado momento), el factor riesgo-precaución (dimensión relacionada con factores de motivación y la evaluación de la situación), la auscultación (diferencias individuales en relación con la intensidad de la experiencia), la tolerancia respecto a experiencias no convencionales (grado de aceptación de vivencias distintas de las habituales) o el grado de automatización (habilidad individual para ejercitar acciones repetitivas o rutinas).

En la misma línea, la aplicabilidad de los principios enunciados por Knowles (1988) en relación con el aprendizaje adulto al colectivo docente sugiere, entre otras cuestiones de interés, el fomento de la autonomía profesional y la independencia de criterio, el empleo de la experiencia como fuente de aprendizaje, la acomodación del aprendizaje a los cambios sociales del rol docente y la vinculación de éste a la práctica cotidiana y a las necesidades sentidas por las profesoras y profesores. Son estos algunos de los aspectos que pueden constituirse en factores incidentes en el bienestar del profesorado.

Decía que cualquier modelo explicativo ha de incorporar los elementos personales, pero de la misma forma ha de asumir también los elementos del medio laboral, entendiendo como tales tanto las que afectan específicamente al establecimiento educativo (grupos sociales, clima, cultura institucional y profesional, condiciones físicas…), como al conjunto de la profesión (normativa reguladora, contraprestaciones económicas y no económicas). En este sentido, parece pertinente establecer una diferenciación entre los factores correspondientes a distintos niveles contextuales

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(aula, centro, comunidad, sociedad), adoptando una concepción del medio como conjunto de entidades anidadas. Cada una de ellas está inserta en otra más amplia cuyas características le afectan y, al menos en cierta medida, la condicionan.

La concurrencia de factores personales y no personales apuntan a una relación compleja entre todos ellos. El bienestar (o el malestar) no es el producto del ambiente o de la persona, sino de la interacción entre ambos. Los modelos que pretendan explicar el bienestar y/o el malestar docente han de ser, por tanto, modelos interaccionistas o ecológicos, es decir, que basen la explicación del constructo a través de las relaciones entre las personas y los contextos de práctica.

Pero, por encima de las relaciones existentes entre la persona y su ambiente de trabajo y de las cualidades objetivas de ambos, se sitúa la forma en que esas cualidades y la interacción es evaluada por la persona. En otros términos, se produce una mediación cognitiva entre los factores incidentes en el trabajo docente y la satisfacción que se deriva de la situación. Por ello, las teorías o modelos explicativos han de ser necesariamente mediacionales, lo cual se relaciona con algunos factores ya citados, particularmente con el estilo cognitivo, principal elemento de mediación.

El carácter multifactorial ya aludido repetidamente implica, además, complejidad. El peso de los distintos factores, su naturaleza diversa y las relaciones que se establecen entre ellos no pueden ser explicados de forma simple. Esto implica que el modelo a proponer ha de asumir la complejidad como otra de sus cualidades esenciales.

Por la misma razón, el modelo idóneo ha de asumir la dinamicidad como cualidad básica. Si intervienen factores tan diversos, la satisfacción – el bienestar o el malestar – no es permanente, sino variable en el tiempo. Por otro lado, muchos de los factores incidentes incorporan, de alguna manera, el concepto de evolución, lo que incrementa ese dinamismo del concepto central.

Una nueva cualidad que ha de incorporar el modelo es el carácter relativo de los conceptos de bienestar y malestar. En ningún caso pueden ser considerados términos absolutos. Esa

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relatividad sugiere el empleo de la analogía de una dimensión bipolar en cuyos extremos se sitúan los dos conceptos antagónicos, pero entendiendo (de ahí su carácter de dimensión) que, en un momento dado, un docente puede estar situado en cualquier punto de esa dimensión continua. Por la misma razón, la satisfacción no es una magnitud discreta, sino continua. No existe posibilidad de medición cuantitativa, lo cual desacredita los instrumentos diagnósticos basados en una medición como si se tratara de una magnitud discreta. En puridad, si asumimos la concurrencia de procesos cognitivos mediacionales, habría que plantearse si existe la posibilidad de emplear instrumentos diagnósticos diferentes del autoinforme y las técnicas etnográficas.

Por otro lado, considerando lo anterior, los modelos explicativos del bienestar docente deben ser, de forma ineludible, multifactoriales, complejos, ecológicos, dinamicos y mediacionales, además de plantear el binomio malestar-bienestar como una dimensión continua bipolar.

Promover el bienestar

Pero, en la medida de lo posible, los modelos deberían incorporar, además de las cualidades ya enunciadas, las formas de transición hacia estadios de mayor bienestar.

La satisfacción constituye uno de los pilares de la calidad educativa. En ese sentido, el profesorado satisfecho se encuentra en mejores condiciones para desempeñar su trabajo que el que no lo está. Por tanto, se hace necesario orientar la teoría sobre bienestar docente hacia la promoción de grados adecuados de satisfacción laboral mediante intervenciones de carácter formativo.

Decía antes que la resiliencia es una ruptura terapéutica porque detiene un proceso de deterioro que lleva al malestar. Pues bien, desde ese mismo punto de vista, el concepto de compromiso supone un estado personal preventivo, anterior a la resiliencia. Si la resiliencia es un proceso terapéutico que se activa ante una

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situación desfavorable, el compromiso es una actitud preventiva, puesto que actúa antes de que se presente aquella relación viciosa entre clima desfavorable e insatisfacción. El compromiso es el principal componente de los procesos de cambio y, por tanto, actúa directamente sobre el clima laboral, provocando cambios favorables en el mismo y evitando riesgos. Formar en el compromiso debe constituirse en objetivo primordial de los procesos de preparación del profesorado. Pero las medidas para formar en el compromiso no difieren de las que exige una formación orientada al cambio social. En este sentido, las teorías críticas y los movimientos radicales han hecho ya aportaciones interesantes.

Entre esas propuestas radicales se encuentra la consigna ineludible de realizar un análisis de la realidad con vistas a reconocer situaciones de represión o coerción y superar las condiciones actuales en un proceso de mejora social, de emancipación o liberación. El malestar o el bienestar docente, como hemos concluido antes, proceden de la relación con el ambiente subjetivo, que es mudable, como decía. Para ese cambio, como para el cambio emancipador propuesto por las teorías críticas, se debe dotar al profesorado de herramientas para la aprehensión (observación, comprensión, interiorización), valoración y gestión del medio (capacidad para incidir en el contexto y cambiarlo). Por tanto, una formación basada en los presupuestos de los paradigmas radicales o críticos parece plausible para la consecución de capacidades que incrementen el compromiso profesional, que está en la base de la satisfacción laboral y del bienestar docente.

Por otro lado, si las relaciones con los colegas constituyen un elemento incidente en el bienestar o el malestar, se debe promover el desarrollo de habilidades interpersonales en los procesos formativos. Por la misma razón, se debe formar en estrategias de cooperación y desarrollo grupal y, para evitar efectos indeseables de los problemas naturales derivados de las relaciones interpersonales, también en estrategias de gestión del conflicto.

El conocimiento de la realidad al que vengo haciendo alusión es compatible con una de las recomendaciones que se vienen haciendo insistentemente por ciertos sectores críticos: el

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abandono de los modelos prescriptivos o normativos de docentes en la formación inicial del profesorado, en beneficio de los modelos descriptivos. Como se habrá deducido, los modelos normativos (cómo debe ser un docente) se contraponen a los modelos descriptivos (cómo son, qué hacen los docentes en realidad). Los primeros provocan desconcierto cuando los docentes noveles conocen la práctica real, al confrontar ésta con los modelos teóricos que la formación les proporcionó. Por el contrario, los modelos descriptivos constituyen una vía para el conocimiento de las prácticas profesionales reales, evitando contradicciones paradójicas entre teoría y práctica.

Precisamente en relación con la práctica y la formación inicial, el Practicum ha de ser reorientado hacia modelos alternativos que establezcan una relación recursiva entre teoría y práctica. Un mayor contacto con los centros docentes durante la formación inicial, un análisis crítico de las vivencias de práctica, la alternancia que eso implica entre la clase en la Facultad y la inmersión en la práctica docente constituyen vías de mejora de la formación inicial para evitar el llamado “choque de la realidad”. Esos modelos de alternancia son compatibles con la formación basada en modelos descriptivos y también con la formación orientada a la mejora de la práctica y la promoción del compromiso profesional. En ese sentido, la formación práctica ha de ser eminentemente participativa. Los contextos de práctica deben ofrecer oportunidades para la puesta en valor de las habilidades personales y para el contraste crítico de las prácticas establecidas.

El malestar puede ser contagioso, en el sentido de que puede constituirse en un síndrome aprendido durante los procesos de socialización o inducción profesional, particularmente durante los periodos de prácticas en centros dentro de la formación inicial, aunque también durante los primeros tiempos de ejercicio profesional, en caso de coincidir con personas que presentan conductas asociadas al síndrome. Los procesos de inducción deben contemplar ese riesgo, que ya quedaría atenuado con algunas de las medidas sugeridas.

No podemos olvidar, por otro lado, que la incidencia de los factores personales en la satisfacción docente implica la

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concurrencia de elementos sentimentales. Promover la educación emocional en la formación inicial y permanente se convierte, por tanto, en una nueva exigencia.

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sobre os autores

Clemencia Postigo de Caffe – Es profesora de Pedagogía y Licenciada en Pedagogía [Orientación Psicológica] de la Facultad de Filosofía y Humanidades de la Universidad Nacional de Córdoba (UNC). Es especialista en Psicopedagogía Clínica de la Escuela de Psicopedagogía Clínica de Buenos Aires e magister en Investigación Educativa con mención Socioantropológica de la UNC. Actualmente es profesora titular interina en la cátedra de Psicología Educacional de la carrera de Licenciatura y Profesorado en Ciencias de la Educación en la Facultad de Humanidades y Ciencias Sociales de la Universidad Nacional de Jujuy (FhyCS/UNJu) y por extensión en el seminario del área de Comunicación y Educación para la misma carrera y para la Licenciatura en Comunicación Social de la FhyCS/UNJu. E-mail: [email protected].

Daniel de Freitas Nunes – É graduado em Licenciatura Plena em História pela Universidade Federal do Tocantins, tendo atuado como bolsista do Programa Pibid. Desenvolve pesquisa na área de educação com ênfase em camadas populares e educação superior pública e formação inicial de professores. É membro do Grupo de Estudo e Pesquisa sobre Formação e Atuação de Professores/Pedagogos (GEPFAPe/UnB). Atua na rede privada de ensino do município de Palmas/TO.

José Vieira de Sousa – É professor da Universidade de Brasília, onde desenvolve estudos sobre avaliação, expansão, democratização e acesso à educação superior. Coordenou o GT 11 – Política da Educação Superior, da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em

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Educação (ANPEd) no biênio 2013-2015. É pesquisador da Rede Universitas/Br – Projeto Políticas da Expansão da Educação Superior no Brasil (Obeduc/Capes). E-mail: [email protected].

Graciela del Rosario Wayar – Es profesora adjunta ordinaria de la Cátedra de Organización y Administración Educacional y por extensión en la Cátedra de Teoría y Desarrollo del Curriculum en Ciencias de la Educación de la Facultad de Humanidades y Ciencias Sociales de la Universidad Nacional de Jujuy (FhyCS/UNJu). E-mail: [email protected].

Graciela María Elena Fernández – Es docente de grado en el Profesorado y Licenciatura en Educación Inicial de la Facultad de Ciencias Humanas de la Universidad Nacional del Centro de la Provincia de Buenos Aires (Unicen). Es docente de Posgrado de la Especialización en Nuevas Infancias y Juventudes de la Unicen. Es también investigadora en el Núcleo de Estudios Educacionales y Sociales (NEES) e directora del proyecto de investigación “Enseñar y aprender en la universidad: aportes para una didáctica de la formación inicial de docentes”.

Iria Brzezinski – É professora titular da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-Goiás) e professora aposentada da Universidade de Brasília. Atua como presidente da Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação, nesta condição agraciada com o Prêmio Paulo Freire (2015), concedido pela Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa e a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão do Ministério da Educação. É também coordenadora do Grupo de Pesquisa do CNPq ”Políticas educacionais e gestão escolar”. E-mail: [email protected].

Ivone Garcia Barbosa –É professora associada IV da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás no curso de Pedagogia e no Programa de Pós-Graduação em Educação. Atua como coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas da Infância e sua Educação em Diferentes Contextos (Nepiec) e do GT 7 da ANPEd. Suas temáticas de pesquisa e atuação são: infância, educação infantil, políticas públicas, formação de professores, aprendizagem e desenvolvimento infantil, família, didática e formação de conceitos. E-mail: [email protected]

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Kátia Augusta Curado Pinheiro Cordeiro da Silva – É professora adjunta da Universidade de Brasília na Faculdade de Educação e no Programa de Pós-Graduação em Educação. É coordenadora adjunta desse programa. Desenvolve e orienta pesquisas na área de Educação, na linha de pesquisa Desenvolvimento Profi ssional Docente. Coordena o grupo de estudo e pesquisa em formação de professores/pedagogos (GEPFAPe). E-mail:[email protected]

Lydia María Albarello – Es profesora titular de grado y de posgrado en la Facultad de Ciencias Humanas de la Universidade Nacional del Centro de la Provincia de Buenos Aires (Unicen). Es Investigadora en el Núcleo de Estudios Educacionales y Sociales (NEES). Es directora del programa de investigación “Sujetos que aprenden y sujetos que enseñan en la universidad: perspectivas actuales en la formación inicial de docentes”. E-mail: [email protected].

– Es profesor titular de Didáctica y Organización Escolar en la Universidad de Huelva y director del Museo Pedagógico de la misma universidad. Imparte docencia igualmente en másteres ofi ciales y en programas de doctorado en Educación. Es miembro Del Observatorio Internacional de a Profesión Docente, de varias redes universitarias internacionales y del Grupo de Investigación Educativa “Doce”. E-mail: [email protected].

Mara Cristina De Sylvio – É professora do Ensino Fundamental na Rede Municipal de Educação de Goiânia/GO e pesquisa os processos de ensino e a aprendizagem nos anos iniciais do Ensino Fundamental. E-mail: [email protected].

Nancy Nonato de Lima Alves – É professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás no curso de Pedagogia e no Programa de Pós-Graduação em Educação. É vice-coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas da Infância e sua Educação em Diferentes Contextos (Nepiec). Suas temáticas de pesquisa e atuação são: infância, educação infantil, políticas públicas, formação de professores, gestão, currículo, didática e estágio. E-mail: [email protected].

Norberto Fernández Lamarra – Es profesor investigador y consultor nacional e internacional en el área de las políticas, la planifi cación,

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la gestión y la evaluación de la educación. Es director de posgrados en la Universidad Nacional de Tres de Febrero (Untref) y en diversas universidades argentinas y de otros países de América Latina. Dirige la Revista Latinoamericana de Políticas y Administración de la Educación, la Revista Argentina de Educación Superior y la Revista Latinoamericana de Educación Comparada. E-mail: [email protected].

Ruth Catarina Cerqueira Ribeiro de Souza – É professora associada da Universidade Federal de Goiás. Atua no curso de Pedagogia e no Programa de Pós-Graduação em Educação dessa universidade, na Linha de pesquisa Formação, Profissionalização Docente e Trabalho Educativo. Pesquisa temas relacionados a professores(as). É coordenadora da Rede de Pesquisadores sobre Professores do Centro-Oeste (Redecentro). E-mail: [email protected].

Sandra Valéria Limonta Rosa – É professora adjunta da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás no curso de Pedagogia e no Programa de Pós-Graduação em Educação, na Linha de Pesquisa Formação, Profissionalização Docente e Trabalho Educativo. Atua nas seguintes áreas de ensino e pesquisa: trabalho docente e didática na escola pública de Educação Básica. E-mail: [email protected].

Solange Martins Oliveira Magalhães – É professora associada da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás. Atua no curso de Pedagogia e Pós-Graduação em Educação dessa universidade, na Linha de Pesquisa Formação, Profissionalização e Trabalho Educativo. Desenvolve pesquisas sobre a formação de professores(as). É coordenadora da Rede de Pesquisadores sobre Professores do Centro-Oeste (Redecentro) em Goiás. E-mail: [email protected].

Vanderleida Rosa de Freitas e Queiroz – É professora do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Goiás, com atuação na graduação e na pós-graduação. Atualmente é coordenadora da Editora IFG. Participa como pesquisadora colaboradora da Rede de Pesquisadores sobre Professores do Centro-Oeste (Redecentro) e realiza estudos sobre formação, profissionalização e trabalho docente. E-mail: [email protected].