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SALVADOR SÁBADO 7/4/2012 6 2 EDITORA-COORDENADORA: SIMONE RIBEIRO / [email protected] SÁB SALVADOR 7/4/2012 No dia em que é apanhado no chão, traz felicidade. Mas há quem diga também que faz mal apanhar alfinete na rua. E se alguém receber um, deve tocar a ponta em quem o deu, sob pena de inimizade No Brasil católico, se o padre não pronunciasse todas as palavras em latim, a criança ficaria meio pagã e veria fantasmas. Para que a sétima filha não fosse bruxa, era preciso batizá-la na primeira sexta-feira do ano, antes de o sol se pôr O BATISMO CONTRA BRUXAS E PAGÃOS Segundo a tradição católica, deve-se respeitar um morto, nunca pronunciar seu nome de batismo, para não interromper seu repouso, mas apenas dizer: o defunto, o finado, o falecido UM COSTUME ANTIGO SOBRE O NOME Para que o defunto não assombrasse a casa pela lembrança obstinada na memória dos parentes, o certo era beijar a sola dos seus sapatos, que tinham de ir com o defunto devidamente limpos, sem poeira, terra ou areia E O QUE SERÁ DA ALMA DAQUELE CADÁVER? Má ou boa sorte, o direito e o esquerdo sempre tiveram suas preferências. O lado direito era visto como o da varonilidade. O esquerdo pertencia às mulheres. Se a mulher grávida sentisse o movimento fetal à direita, nasceria menino. Menina, se à esquerda TUDO TEM SEU DIREITO E SEU ESQUERDO Em embarcação que se possa tocar a água com a mão, não se deve cantar depois de o sol desaparecer. Quem estiver no mar nadando, não deve dizer "Jesus, Maria e José", pois o mar se irrita porque não foi batizado e é pagão O MAR, UMA ENTIDADE CHEIA DE MISTÉRIOS Não dê lenço de presente, pois chama lágrimas. E a pessoa presenteada deve dar outro presente de imediato. Uma recém-casada deveria morder o lenço numa extremidade antes de usá-lo para não esfriar as relações com quem a presenteara NO TEMPO EM QUE O LENÇO TINHA HISTÓRIA ...colocar duas agulhas em bacia dágua. Se elas se juntarem, casamento à vista. Encha a boca de água e fique atrás da porta da rua: o primeiro nome que ouvir será o seu futuro noivo ou noiva EM NOITE DE SÃO JOÃO, EXPERIMENTE... Até a primeira década do século 20, os rapazes tinham de pedir permissão aos pais para fazer a primeira barba. Na primeira menstruação, a moça não poderia atravessar lugar de água corrente, nem provar fruta ácida COMO SE DAVA A INICIAÇÃO NO COMEÇO DO SÉCULO 20 Três fumantes não devem acender o cigarro no mesmo fósforo, pois um deles poderá morrer dentro de um ano. Nunca jogue um palito inteiro fora: quebre-o primeiro. Fósforo aceso e inútil na mão atrai morte A MÁ SORTE VEM COM UM SIMPLES PALITO DE FÓSFORO Quando o espelho quebra sem motivo, é anúncio da morte do dono da casa. Na primeira semana de luto, deve ser imediatamente coberto. Não se deve colocar menino de peito diante dele, sob pena de lhe retardar a fala UM CONSELHO: NÃO FALE DIANTE DE UM ESPELHO Tem sete vidas, demora a morrer, resistente. Por isso, quem mata um gato tem sete anos de atraso também, e de infelicidades. E, ao contrário do que dizem por aí, gato preto traz felicidade PISOU NO RABO DE UM GATO? ESTE ANO VOCÊ NÃO CASA... Meio-dia e meia-noite são horas misteriosas para o povo. São nessas horas que os anjos cantam hosanas a Deus. Mas, se uma praga for rogada nessa hora, tudo se sucederá E NO BALANÇO DAS HORAS... A FELICIDADE NA PONTA DO ALFINETE Em alguns lugares, refere-se a Zumbi como um negrinho que aparece nos caminhos. Amigo da Caipora, gosta de pedir fumo e bate ferozmente em quem não o satisfaz UM FEITICEIRO CHAMADO ZUMBI Superstições sobre o ovo estão ligadas ao espírito da fecundidade. Para bater ovos, é preciso ter mão boa, felicidade. Marcar ovo com uma cruz ele não gora, e tira dele galinha e não galo OVO, O MAIS EXPRESSIVO SÍMBOLO DA FERTILIDADE A mulher grávida não deveria colocar objeto sobre o seio, porque o filho o trará impresso na carne. Chave faria a criança ter lábio leporino. Grávida não deve olhar para escamas de peixes, porque não será feliz no resguardo OS TABUS DA GRAVIDEZ E DO PARTO Dizem que os meninos de poucos meses e nos adultos de temperamento sanguíneo e colérico é de maior perigo, porque nestes estão mais patentes os poros. A figa era aconselhada contra o quebranto e ainda o é MAU-OLHADO OU QUEBRANTO Nas lendas dos sonos dos rios, há uma sobre o São Francisco que diz: remeiro quando acorda de noite, se sente sede, não bebe água sem antes atirar um pedacinho de pau dentro do rio, para ver se o rio está correndo. Se estiver dormindo, não pode ser acordado RIO DORMINDO, UMA ENTIDADE VIVA Sal à porta de uma rival a obrigará a deixar o namorado. Derramar sal na mesa é agouro, assim como salgar o chão é condená-lo à improdutividade. comer sal junto com uma pessoa fará com que você a conheça de verdade CRENDICES, SUPERSTIÇÕES E UMA PITADA DE SAL O menino que brinca com fogo mija na cama, ou, se o pequeno mijar no fogo, seca as urinas. Como tabu de conduta, cuspir no fogo faz mal, porque seca o cuspo HORROR SAGRADO OU APENAS TABU? Dizia-se que o feiticeiro que bebesse urina ficaria desarmado por muito tempo. Beber urina de vaca pela manhã, em jejum, combate a malária. Lavar os pés com urina de gado cura frieiras e certas feridas AFASTADORA DE MALES, ELA, A URINA Não empreste se já tiver sido usada, sob pena de carregar a felicidade para a outra casa. Vassoura deitada é desgraça financeira. A primeira vassourada de vassoura nova pertence à mulher velha, nunca à gente moça VASSOURA, DE UM TABU INDISCUTÍVEL FONTE: Dicionário do Folclore Brasileiro com textos de Regina de Sá Arte Lorena Morais Editoria de Arte A TARDE RONALDO JACOBINA CALDO ENGROSSA COM A DISPUTA ENTRE OS SÓCIOS DOS BOTECOS DO FRANÇA E DO ZÉ 5 DICIONÁRIO DO FOLCLORE BRASILEIRO / LUÍS DA CÂMARA CASCUDO Global / 776 páginas / R$ 98 / globaleditora.com.br REGINA DE SÁ Editora O folclore brasileiro sempre esteve na boca do povo, mas uma luz acendeu um dia para o pesquisador do tema, o et- nógrafo, historiador, advoga- do e professor Luís da Câmara Cascudo: era preciso colocar em ordem os usos, costumes, gestos, modismos, lendas, su- perstições, comidas, santos e tudo mais que envolvesse o imaginário e o culto popular (veja alguns dos verbetes da obra en destaque) – isto lá pelos idos de 1939. Mas aí entrou uma outra parte da história: Cascudo iria contar com a ajuda de amigos, estudiosos e colaboradores de Norte a Sul do Brasil para dar forma a um bem-elaborado trabalho de referência sobre o folclore brasileiro, e o resul- tado foi o lançamento, em 1954, da primeira edição do Dicionário do Folclore Brasilei- ro. “Não era possível fixar o Brasil inteiro no plano folcló- rico, mas, nos limites do co- nhecimento provinciano, re- gistrar o essencial, o caracte- rístico”, escreveu o autor, na nota da primeira edição. “Hoje, nenhum homem es- creveria uma obra desta so- zinho, mas a partir de uma instituição que tenha uma equipe multidiscplinar”, res- salta o professor Severino Vi- cente, presidente da Comissão Rio-grandense-do-norte de Folclore e um estudioso de Câ- mara Cascudo. Resgate Sobre o fato de muitos con- siderarem o folclore algo ul- trapassado, o professor Vicen- te dispara: "O que falta é co- nhecimento. O folclore não tem idade, presente e futuro e se configura como uma ciência que atualiza o saber, o pensar, o sentir e o viver de um povo no seu contexto social dife- renciado. Mas aquilo que é moderno passa, e o folclore avança no tempo e no espa- ço“, considera. Este ano, a Global Editora acaba de publicar a 12ª edição do Dicionário, conforme a úl- tima edição revista pelo autor, em 1979. Nesta publicação, além de a família de Cascudo ter supervisionado todo o tra- balho de atualização da obra, vale ressaltar que foi alterada apenas a ortografia, conforme determina o Vocabulário Or- tográfico da Língua Portugue- sa (Volp). "Assim me conta- ram, assim vos contei!", es- creveu Cascudo, na nota da segunda edição, em 1959. E nada, desde então e nas edições seguintes, contou com qualquer verbete sobre o fol- clore que não tenha passado pelo crivo de Cascudo. Para o antropólogo Alberto Albergaria, não se deve deixar cair no esquecimento também estudiosos como a historiado- ra baiana Hildegardes Vianna, cujo trabalho trouxe impor- tante contribuição para a pre- servação da cultura folclorista da Bahia.“Ela era uma fonte viva que se preocupava em pesquisar sobre os costumes, crenças, tradições e folclore da Bahia”, opina o professor. 2 ENTREVISTA Daliana Cascudo “A GENTE SE MODIFICA, MAS O FOLCLORE PERMANECE” REGINA DE SÁ Editora Segundo Daliana Cascudo, ne- ta do historiador e folclorista Luís da Câmara Cascudo, co- ordenadora do Instituto Câ- mara Cascudo (www.cascu- do.org.br), a obra é um ver- dadeiro atestado da identida- de cultural de um povo. Para a senhora, o que as pes- soas entendem como folclo- re, hoje em dia, é considerado ultrapassado, acabado? O folclore não acaba nunca, é imortal. Meu avô costu- mava dizer que até mesmo as surpestições foram parar na Lua. Quando os astro- nautas pisaram em solo lu- nar, dizia, foi com o pé di- reito. A gente se modifica, mas as crenças não. Em que sentido? Por exemplo, as pessoas carregam uma figa em for- ma de um adereço chique, um olho grego. É uma “pro- teção”, mas, em alguns ca- sos, disfarçada de adereço. No fundo, a gente precisa acreditar em alguma coisa e pensar em se proteger. Sobre a nova edição do Di- cionário, que curiosidades a senhora tem conhecimento sobre a última edição, revista, inclusive, por seu avô? Esta nova edição do Dicio- nário, que é a 12ª, foi to- talmente baseada na últi- ma publicação revista pelo meu avô, que é a de 1979, da Melhoramentos. Nela, ele ressalta muito bem sua preocupação com a citação das fontes bibliográficas e de pesquisa em que se ba- seou para construir esta obra monumental. Segun- do suas próprias palavras, "não permiti a imaginação suprir o documento". A im- portância disto é vital, prin- cipalmente por se tratar de uma ciência muito nova na época de lançamento da obra (1954, 1ª edição), que não era estudada com a se- riedade e o respeito que merecia.Sua maior preocu- pação foi citar as obras e as informações dos maiores estudiosos brasileiros da cultura popular, tais como Leonardo Mota, Artur Ra- mos, Afonso Arinos, Afrâ- nio Peixoto, Alceu May- nard, dentre outros. No livro, há um escrito da fol- clorista Laura Della Monica que diz, a respeito de uma fala de Câmara Cascudo: "Um di- cionário é labor interminável e, fixando elementos da cul- tura popular, a tentação é pa- ra torná-lo enciclopédia". Houve muitas críticas a res- peito da inclusão de alguns novos verbetes no trabalho de Cascudo, o que levou a manter o Dicionário tal e qual o autor deixou em vida. Por que tal decisão? A 11ª edição, revista e atua- lizada, suscitaram diversas críticas por parte dos estu- diosos de Cascudo e da cul- tura popular. O motivo das críticas foi o fato da inclusão de novos verbetes no Di- cionário, que não tinham sido escritos pelo autor e sim pela revisora, alteran- do o texto original. Apesar de saber que a Global Edi- tora não agiu de má-fé nes- ta situação, a família Cas- cudo preferiu acatar as su- gestões advindas destas crí- ticas e solicitar à editora o retorno ao texto original cascudiano, de forma a di- rimir dúvidas sobre a ori- gem do que consta na obra. A Global, em consonância com a família Cascudo, prontamente acatou nossa sugestão e foi escolhida a última edição revista pelo autor, a de 1979, com a base para a nova edição. Quantos verbetes o Dicioná- rio registra? O dicionário contém o es- pantoso número de 2.940 verbetes, escritos e compi- lados por Câmara Cascudo, em uma época onde toda comunicação remota era realizada por correspon- dência, sem as facilidades que a internet proporciona hoje em dia. Quais regiões do País contêm maior número de registros do autor? É impossível citar uma re- gião do País. Isto deve-se ao fato de um mesmo verbete, na maior parte das vezes, conter informações sobre manifestações folclóricas e suas variantes em diversos estados e regiões do País. A preocupação maior do au- tor foi contemplar o Brasil, na sua totalidade, e realizar o que ele mesmo nos diz: "Assim, de mão ao peito, informo que encontrei no povo do Brasil o material deste dicionário e todas as coisas aqui registradas par- ticipam indissoluvelmente da existência normal do ho- mem brasileiro". Feliz é o povo que tem uma obra co- mo o Dicionário do Folclore Brasileiro, um verdadeiro atestado de sua identidade cultural. Arquivo pessoal O trabalho foi feito em uma época onde toda comunicação remota era realizada por correspondência, sem as facilidades da internet LIVRO Conheça algumas curiosidades do Dicionário do Folclore Brasileiro, publicação do escritor Luís da Câmara Cascudo que chega em sua 12ª edição Folclore está VIVO A Global, em consonância com a família Cascudo, prontamente acatou nossa sugestão e foi escolhida a última edição revista pelo autor SEG PERSONA / TER POP / QUA VISUAIS / QUI CENA SEX CINE / HOJE LETRAS DOM SHOP

FoVlclorIVOe está - Home - Ludovicus - Instituto Câmara ...cascudo.org.br/var/upload/5873b27f8907a9bcd14b27739934017798d9ad8... · LIVRO Conheça algumas curiosidades do Dicionário

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SALVADOR SÁBADO 7/4/20126 2 EDITORA-COORDENADORA: SIMONE RIBEIRO / [email protected]

SÁBSALVADOR7/4/2012

No dia em que é apanhadono chão, traz felicidade. Mashá quem diga também quefaz mal apanhar alfinete narua. E se alguém receber um,deve tocar a ponta em quemo deu, sob pena de inimizade

No Brasil católico, se o padre nãopronunciasse todas as palavras em latim, acriança ficaria meio pagã e veria fantasmas.Para que a sétima filha não fosse bruxa, erapreciso batizá-la na primeira sexta-feira doano, antes de o sol se pôr

O BATISMOCONTRA BRUXAS

E PAGÃOS

Segundo a tradição católica,deve-se respeitar um morto,nunca pronunciar seu nome debatismo, para não interromperseu repouso, mas apenas dizer:o defunto, o finado, o falecido

UM COSTUMEANTIGO SOBREO NOME

Para que o defunto não assombrasse acasa pela lembrança obstinada namemória dos parentes, o certo era beijara sola dos seus sapatos, que tinham deir com o defunto devidamente limpos,sem poeira, terra ou areia

E O QUE SERÁ DAALMA DAQUELE

CADÁVER?

Má ou boa sorte, o direito e o esquerdosempre tiveram suas preferências. O ladodireito era visto como o da varonilidade. Oesquerdo pertencia às mulheres. Se a mulhergrávida sentisse o movimento fetal à direita,nasceria menino. Menina, se à esquerda

TUDO TEM SEUDIREITO E SEU

ESQUERDO

Em embarcação que se possa tocar aágua com a mão, não se deve cantardepois de o sol desaparecer. Quemestiver no mar nadando, não deve dizer"Jesus, Maria e José", pois o mar seirrita porque não foi batizado e é pagão

OMAR, UMAENTIDADE CHEIADE MISTÉRIOS

Não dê lenço de presente, pois chamalágrimas. E a pessoa presenteada deve daroutro presente de imediato. Umarecém-casada deveria morder o lenço numaextremidade antes de usá-lo para não esfriaras relações com quem a presenteara

NO TEMPO EMQUE O LENÇOTINHA HISTÓRIA

...colocar duas agulhas em baciadágua. Se elas se juntarem,casamento à vista. Encha a bocade água e fique atrás da porta darua: o primeiro nome que ouvirserá o seu futuro noivo ou noiva

EM NOITE DE SÃOJOÃO, EXPERIMENTE...

Até a primeira década do século 20, osrapazes tinham de pedir permissãoaos pais para fazer a primeira barba.Na primeira menstruação, a moça nãopoderia atravessar lugar de águacorrente, nem provar fruta ácida

COMO SE DAVA AINICIAÇÃO NO COMEÇODO SÉCULO 20

Três fumantes não devemacender o cigarro nomesmo fósforo, pois umdeles poderá morrerdentro de um ano. Nuncajogue um palito inteirofora: quebre-o primeiro.Fósforo aceso e inútil namão atrai morte

A MÁ SORTE VEMCOM UM SIMPLESPALITO DE FÓSFORO

Quando o espelho quebrasem motivo, é anúncio damorte do dono da casa. Naprimeira semana de luto,deve ser imediatamentecoberto. Não se devecolocar menino de peitodiante dele, sob pena delhe retardar a fala

UM CONSELHO: NÃOFALE DIANTE DE UM

ESPELHO

Tem sete vidas, demora amorrer, resistente. Por isso,quem mata um gato temsete anos de atraso também,e de infelicidades. E, aocontrário do que dizem poraí, gato preto traz felicidade

PISOU NO RABO DEUM GATO? ESTE ANOVOCÊ NÃO CASA...

Meio-dia e meia-noite sãohoras misteriosas para opovo. São nessas horas queos anjos cantam hosanas aDeus. Mas, se uma pragafor rogada nessa hora,tudo se sucederá

E NO BALANÇO DASHORAS...

A FELICIDADENA PONTA

DO ALFINETE

Em alguns lugares, refere-se aZumbi como um negrinhoque aparece nos caminhos.Amigo da Caipora, gosta depedir fumo e bate ferozmenteem quem não o satisfaz

UM FEITICEIROCHAMADO ZUMBI

Superstições sobre o ovo estãoligadas ao espírito da fecundidade.Para bater ovos, é preciso ter mãoboa, felicidade. Marcar ovo comuma cruz ele não gora, e tira delegalinha e não galo

OVO, O MAISEXPRESSIVO SÍMBOLODA FERTILIDADE

A mulher grávida não deveria colocarobjeto sobre o seio, porque o filho otrará impresso na carne. Chave faria acriança ter lábio leporino. Grávida nãodeve olhar para escamas de peixes,porque não será feliz no resguardo

OS TABUS DAGRAVIDEZ E DOPARTO

Dizem que os meninos de poucosmeses e nos adultos de temperamentosanguíneo e colérico é de maior perigo,porque nestes estão mais patentes osporos. A figa era aconselhada contra oquebranto e ainda o é

MAU-OLHADO OUQUEBRANTO

Nas lendas dos sonos dos rios, há umasobre o São Francisco que diz: remeiroquando acorda de noite, se sente sede,não bebe água sem antes atirar umpedacinho de pau dentro do rio, paraver se o rio está correndo. Se estiverdormindo, não pode ser acordado

RIO DORMINDO,UMA ENTIDADE VIVA

Sal à porta de uma rival a obrigará adeixar o namorado. Derramar sal namesa é agouro, assim como salgar ochão é condená-lo à improdutividade.comer sal junto com uma pessoa farácom que você a conheça de verdade

CRENDICES,SUPERSTIÇÕES EUMA PITADA DE SAL

O menino que brinca com fogo mijana cama, ou, se o pequeno mijar nofogo, seca as urinas. Como tabu deconduta, cuspir no fogo faz mal,porque seca o cuspo

HORROR SAGRADOOU APENAS TABU?

Dizia-se que o feiticeiro que bebesseurina ficaria desarmado por muitotempo. Beber urina de vaca pelamanhã, em jejum, combate amalária. Lavar os pés com urina degado cura frieiras e certas feridas

AFASTADORA DEMALES, ELA, A URINA

Não empreste se já tiver sidousada, sob pena de carregar afelicidade para a outra casa.Vassoura deitada é desgraçafinanceira. A primeira vassouradade vassoura nova pertence àmulher velha, nunca à gente moça

VASSOURA, DE UMTABU INDISCUTÍVEL

FONTE: Dicionário do Folclore Brasileiro com textos de Regina de Sá Arte Lorena Morais Editoria de Arte A TARDE

RONALDO JACOBINA CALDO ENGROSSA COM A DISPUTAENTRE OS SÓCIOS DOS BOTECOS DO FRANÇA E DO ZÉ 5

DICIONÁRIO DO FOLCLORE BRASILEIRO /

LUÍS DA CÂMARA CASCUDO

Global / 776 páginas /R$ 98 /globaleditora.com.br

REGINA DE SÁEditora

O folclore brasileiro sempreesteve na boca do povo, masuma luz acendeu um dia parao pesquisador do tema, o et-nógrafo, historiador, advoga-do e professor Luís da CâmaraCascudo: era preciso colocarem ordem os usos, costumes,gestos, modismos, lendas, su-perstições, comidas, santos etudo mais que envolvesse oimaginário e o culto popular(veja alguns dos verbetes daobra en destaque) – isto lápelos idos de 1939.

Mas aí entrou uma outraparte da história: Cascudo iriacontar com a ajuda de amigos,estudiosos e colaboradores deNorte a Sul do Brasil para darforma a um bem-elaboradotrabalho de referência sobre ofolclore brasileiro, e o resul-tado foi o lançamento, em1954, da primeira edição doDicionário do Folclore Brasilei-ro. “Não era possível fixar oBrasil inteiro no plano folcló-rico, mas, nos limites do co-nhecimento provinciano, re-gistrar o essencial, o caracte-rístico”, escreveu o autor, nanota da primeira edição.

“Hoje, nenhum homem es-creveria uma obra desta so-zinho, mas a partir de umainstituição que tenha umaequipe multidiscplinar”, res-salta o professor Severino Vi-cente,presidentedaComissãoRio-grandense-do-norte deFolclore e um estudioso de Câ-mara Cascudo.

ResgateSobre o fato de muitos con-siderarem o folclore algo ul-trapassado, o professor Vicen-te dispara: "O que falta é co-nhecimento. O folclore nãotem idade, presente e futuro ese configura como uma ciênciaque atualiza o saber, o pensar,o sentir e o viver de um povono seu contexto social dife-renciado. Mas aquilo que émoderno passa, e o folcloreavança no tempo e no espa-ço“, considera.

Este ano, a Global Editoraacaba de publicar a 12ª ediçãodo Dicionário, conforme a úl-tima edição revista pelo autor,em 1979. Nesta publicação,além de a família de Cascudoter supervisionado todo o tra-balho de atualização da obra,vale ressaltar que foi alteradaapenasaortografia,conformedetermina o Vocabulário Or-tográfico da Língua Portugue-sa (Volp). "Assim me conta-ram, assim vos contei!", es-creveu Cascudo, na nota dasegunda edição, em 1959.

E nada, desde então e nasediçõesseguintes,contoucomqualquer verbete sobre o fol-clore que não tenha passadopelo crivo de Cascudo.

Para o antropólogo AlbertoAlbergaria, não se deve deixarcairnoesquecimentotambémestudiosos como a historiado-ra baiana Hildegardes Vianna,cujo trabalho trouxe impor-tante contribuição para a pre-servação da cultura folcloristada Bahia.“Ela era uma fonteviva que se preocupava empesquisar sobre os costumes,crenças, tradições e folclore daBahia”, opina o professor.

2ENTREVISTA Daliana Cascudo

“A GENTE SEMODIFICA, MASO FOLCLOREPERMANECE”

REGINA DE SÁEditora

SegundoDalianaCascudo,ne-ta do historiador e folcloristaLuís da Câmara Cascudo, co-ordenadora do Instituto Câ-mara Cascudo (www.cascu-do.org.br), a obra é um ver-dadeiro atestado da identida-de cultural de um povo.

Para a senhora, o que as pes-soas entendem como folclo-re, hoje em dia, é consideradoultrapassado, acabado?

O folclore não acaba nunca,é imortal. Meu avô costu-mava dizer que até mesmoas surpestições foram pararna Lua. Quando os astro-nautas pisaram em solo lu-nar, dizia, foi com o pé di-reito. A gente se modifica,mas as crenças não.

Em que sentido?Por exemplo, as pessoascarregam uma figa em for-ma de um adereço chique,um olho grego. É uma “pro-teção”, mas, em alguns ca-sos, disfarçada de adereço.No fundo, a gente precisaacreditar em alguma coisae pensar em se proteger.

Sobre a nova edição do Di-cionário, que curiosidades asenhora tem conhecimentosobreaúltimaedição,revista,inclusive, por seu avô?

Esta nova edição do Dicio-nário, que é a 12ª, foi to-talmente baseada na últi-ma publicação revista pelomeu avô, que é a de 1979,da Melhoramentos. Nela,ele ressalta muito bem suapreocupação com a citaçãodas fontes bibliográficas ede pesquisa em que se ba-seou para construir estaobra monumental. Segun-do suas próprias palavras,"não permiti a imaginaçãosuprir o documento". A im-portância disto é vital, prin-cipalmente por se tratar deuma ciência muito nova naépoca de lançamento daobra(1954,1ªedição),quenão era estudada com a se-riedade e o respeito quemerecia.Sua maior preocu-pação foi citar as obras e asinformações dos maioresestudiosos brasileiros dacultura popular, tais comoLeonardo Mota, Artur Ra-mos, Afonso Arinos, Afrâ-nio Peixoto, Alceu May-nard, dentre outros.

No livro, há um escrito da fol-clorista Laura Della Monicaquediz,arespeitodeumafalade Câmara Cascudo: "Um di-cionário é labor interminávele, fixando elementos da cul-tura popular, a tentação é pa-ra torná-lo enciclopédia".Houve muitas críticas a res-peito da inclusão de algunsnovos verbetes no trabalhode Cascudo, o que levou amanter o Dicionário tal e qualo autor deixou em vida. Porque tal decisão?

A 11ª edição, revista e atua-lizada, suscitaram diversascríticas por parte dos estu-diosos de Cascudo e da cul-tura popular. O motivo dascríticas foi o fato da inclusãode novos verbetes no Di-cionário, que não tinhamsido escritos pelo autor e

sim pela revisora, alteran-do o texto original. Apesarde saber que a Global Edi-tora não agiu de má-fé nes-ta situação, a família Cas-cudo preferiu acatar as su-gestõesadvindasdestascrí-ticas e solicitar à editora oretorno ao texto originalcascudiano, de forma a di-rimir dúvidas sobre a ori-gem do que consta na obra.A Global, em consonânciacom a família Cascudo,prontamente acatou nossasugestão e foi escolhida aúltima edição revista peloautor, a de 1979, com abase para a nova edição.

Quantos verbetes o Dicioná-rio registra?

O dicionário contém o es-pantoso número de 2.940verbetes, escritos e compi-lados por Câmara Cascudo,em uma época onde todacomunicação remota erarealizada por correspon-dência, sem as facilidadesque a internet proporcionahoje em dia.

Quais regiões do País contêmmaior número de registros doautor?

É impossível citar uma re-giãodoPaís. Istodeve-seaofato de um mesmo verbete,na maior parte das vezes,conter informações sobremanifestações folclóricas esuas variantes em diversosestados e regiões do País. Apreocupação maior do au-tor foi contemplar o Brasil,na sua totalidade, e realizaro que ele mesmo nos diz:"Assim, de mão ao peito,informo que encontrei nopovo do Brasil o materialdeste dicionário e todas ascoisas aqui registradas par-ticipam indissoluvelmenteda existência normal do ho-mem brasileiro". Feliz é opovo que tem uma obra co-mo o Dicionário do FolcloreBrasileiro, um verdadeiroatestado de sua identidadecultural.

Arquivo pessoal

O trabalho foifeito em umaépoca onde todacomunicaçãoremota erarealizada porcorrespondência,sem as facilidadesda internet

LIVRO Conheça algumas curiosidades doDicionário do Folclore Brasileiro,publicação do escritor Luís da CâmaraCascudo que chega em sua 12ª edição

Folclore está

VIVO

A Global, emconsonância coma família Cascudo,prontamenteacatou nossasugestão e foiescolhida a últimaedição revistapelo autor

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