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Henrique Rodolfo Theobald

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Fundamentos e Metodologia

do Ensino de História

Curitiba2010

Henrique Rodolfo Theobald

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FAEL

De Acadêc Osíris Manne Bastos

De Adnsav-Fnance Cássio da Silveira Carneiro

Cdenada d Núcle de

Edcaçã a Dsânca

Vívian de Camargo Bastos

Cdenada d Cs de

Pedagga EaD

Ana Cristina Gipiela Pienta

Seceáa Geal Dirlei Werle Fávaro

SiStEmA EDuCACioNAL EADCoN

De Execv Julián RizoDees Adnsav-Fnances Armando Sakata

Júlio César Algeri

Dea de opeações Cristiane Andrea Strenske

De de ti Juarez Poletto

Cdenada Geal Dinamara Pereira Machado

EDitorA FAEL

Cdenad Edal William Marlos da Costa

Edçã Thaisa Socher

Pje Gáfc e Capa Denise Pires Pierinilsaçã da Capa Cristian Crescencio

Dagaaçã Sandro Niemicz

Ficha Catalográfica elaborada pela Fael. Bibliotecária – Cleide Cavalcanti Albuquerque CRB9/1424

Theobald, Henrique Rodolfo

T385f Fundamentos e metodologia do ensino de história / HenriqueRodolfo Theobald. – Curitiba: Editora Fael, 2010.125 p.

Nota: conforme Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.

1. História (Ensino Fundamental). 2. Professores – Formação.I. Título.

CDD 372.89

Direitos desta edição reservados à Fael.É proibida a reprodução total ou parcial desta obra sem autorização expressa da Fael.

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Dedico este livro à minha esposa Marisa e aos meus filhos Gabriel e

Mariana, que dispensaram seu apoio e torcida por oito finais de semana,um por capítulo, abdicando de atividades de lazer em família.

Dedico também ao Grupo de Pesquisa em Educação Histórica, coordenadopelas doutoras Maria Auxiliadora Schmidt e Tânia Maria Braga Garcia,da Universidade Federal do Paraná, cujas pesquisas permitiram funda-mentar teoricamente as proposições aqui apresentadas, e ao Grupo deProfessores de História do Município de Araucária, seio no qual pude darvazão aos questionamentos em torno do ensino de história.

Uma dedicação especial a todos aqueles que já foram meus alunos,que com seus rostos de inquietude, suas perguntas em sala, suasmanifestações de dificuldades e sucessos na relação com o conheci-mento, permitiram que eu desenvolvesse questionamentos em relaçãoao processo ensino-aprendizagem e instigaram a minha “curiosidadeepistemológica”, lançando-me à pesquisa sobre o ensino de história.

Por último, mas não menos importante, dedico a você leitor, formado ou em

formação, razão principal da elaboração desta obra idealizada pela Fael, aquem agradeço por ter depositado sua confiança em meu trabalho.

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    a    p  r    e   s    e    n  t    a    ç    ã    o

A formação do professor tem sido alvo de várias discussões, refle-xões e publicações. Tem integrado as propostas governamentais para aeducação e tem sido objeto de investigações que envolvem pontos es-

pecíficos à formação inicial, como aspectos inerentes à dinâmica queenvolve o dia a dia da escola e a formação continuada de professores.Nessa direção, a temática formação de professores precisa ser pensadae discutida constantemente, envolvendo principalmente aqueles que es-tão envolvidos de forma direta nesse campo.

Por meio de estudos e debates sobre questões educacionais como cur-rículo, ensino, aprendizagem, fundamentos e métodos, é possível alavancarum processo de reflexão sobre a prática desenvolvida no interior da escola,

espaço diretamente vinculado à formação dos professores.

Nesta obra, Henrique Rodolfo Theobald, professor de história doEnsino Fundamental, mestre em educação e pesquisador do grupo deinvestigação em educação histórica, propõe uma discussão voltada aosprofissionais envolvidos na formação inicial de professores da educaçãobásica, bem como aos alunos que vivenciam a experiência do processo deformação e, de forma bem particular, pretende contribuir com aspectos

voltados ao ensino de história. A obra reúne algumas das principais temá-ticas voltadas ao ensino de história: o ensino de história e a formação doprofessor; os objetivos do ensino de história; as crianças, jovens e adultose a experiência de relação com o saber na escola; a investigação de ideiashistóricas de crianças, jovens e adultos; a natureza, seleção e organiza-ção de conteúdos e conhecimentos históricos; a didática específica do en-sino de história; a produção de narrativas em história; e a metodologia doensino de história.

O autor estruturou os capítulos em seções que buscam organizaras discussões propostas, ou seja, em cada etapa do capítulo, ordenouas reflexões fazendo uso de referenciais que subsidiem a temática, bem

apresentação

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como de investigações que vêm sendo sistematizadas, e preocupou-se,fundamentalmente, com o ensino e a aprendizagem em história, tomandocomo referência a epistemologia da história.

Em cada capítulo traz uma seção intitulada “Da teoria para a prá-tica”, que remete a uma reflexão sobre como a temática sistematizadaalcança o espaço da vivência em espaço escolar. Dessa forma, convida oleitor a pensar sobre como as discussões que antecederam esta seçãopodem ser vislumbradas na relação professor-aluno.

Na “Síntese”, o autor colabora com a sistematização dos pontos devista, oferecendo ao leitor uma organização objetiva das discussões. E na

seção “Glossário”, explicita o significado de palavras e/ou expressõesque foram apresentadas no decorrer do capítulo.

A etapa da formação inicial, de forma particular, é o momento emque as reflexões sobre “ser professor” passam a ser vislumbradas. Nopresente livro, o autor contribui para a formação dos professores e defuturos professores, tornando acessível e detalhando as reflexões queestão sendo sistematizadas pelas pesquisas em educação histórica so-bre o ensino de história.

Ana Claudia Urban*

* Doutora em Educação pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Atua como professorano Instituto Superior de Educação Sant’Ana, de Ponta Grossa, e na rede estadual de ensino.É pesquisadora do Laboratório de Pesquisa em Educação Histórica – LAPEDUH/UFPR.

    a    p  r    e   s    e    n  t    a    ç    ã    o

apresentação

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sumário

  Prefácio.........................................................................................9

1  O ensino de história e a formação do professor .......................13

2  Objetivos do ensino de história ..................................................21

3  Crianças, jovens e adultos e a experiência

de relação com o saber na escola .............................................29

Investigação de ideias históricas de crianças, jovens e adultos ..........................................................................47

5  Natureza, seleção e organização de

conteúdos históricos ..................................................................59

6  Didática específica do ensino de história ..................................69

7  A produção de narrativas em história .......................................83

sumário

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8 Metodologia do ensino de história .............................................97

  Referências...............................................................................113

  Glossário ...................................................................................121

sumário

sumário

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prefácio

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Esta obra destina-se a estudantes, professores ou leigos, quede alguma forma atuam ou se interessam pelo ensino de história, e

propõe-se a aproximar o leitor de categorias e conceitos desenvolvi-dos pelas pesquisas mais recentes, relacionados aos fundamentos e àsmetodologias deste ensino.

O primeiro passo será situar o ensino e a formação do professorde história na sociedade do século XXI, caracterizada pela aceleraçãoda produção do conhecimento em bases tecnológicas informatizadas.

Parte-se do pressuposto de que, na sociedade do conhecimento, aformação inicial e continuada de qualidade é condição inerente àprofissão de professor, por constatar que esta condição não é a rea-lidade da maioria dos professores, especialmente quando se trata deuma formação continuada que lhes capacite a refletir de forma siste-mática sobre a natureza de sua profissão e sobre elementos importan-tes e fundamentais de sua prática.

Com o objetivo de contribuir para a formação inicial e conti-nuada de professores de história, buscaremos responder algumasquestões norteadoras sobre o seu ensino na sociedade do conheci-mento, por meio de um diálogo com os textos oficiais e com osestudos mais recentes em torno das temáticas que abordam, paraconhecer seus fundamentos e apontar os caminhos que eles nos su-gerem, alicerçados em suas pesquisas.

 As questões norteadoras sobre os fundamentos do ensino de his-

tória, que se buscará analisar neste trabalho, tratam de assuntos como:os desafios que o ensino de história enfrenta na sociedade do conhe-cimento; os objetivos do ensino de história para crianças, jovens e

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adultos na sociedade do conhecimento; quem são as crianças, os jo-

vens e os adultos e que tipo de relação estabelecem com a escola e osaber na sociedade do conhecimento; quais as ideias que essas crian-ças, jovens e adultos têm sobre a história e seus conteúdos; qual a na-tureza dos conteúdos de história; quais critérios utilizar para definiros conteúdos e conhecimentos históricos a serem trabalhados comcrianças, jovens e adultos.

Em relação à metodologia do ensino de história, serão abordadasas seguintes questões: se existe uma didática específica da história;

onde buscar os conteúdos e conhecimentos históricos a serem tra-balhados; qual a melhor forma para trabalhar esses conteúdos comcrianças e jovens; como a criança, o jovem e o adulto vão comunicaro que aprenderam; como avaliar a aprendizagem histórica de crian-ças, jovens e adultos.

O ponto de partida para embasar respostas a essas questões sãoalguns documentos oficiais: os Parâmetros Curriculares Nacionaisde História   – PCN, de 1998, o Currículo Nacional de História dePortugal , de 2001, e as Diretrizes Municipais de Ensino de História de Araucária , de 2004. Esses documentos propõem encaminhamentossob perspectivas diferentes e incorporam de forma distinta os resulta-dos das pesquisas em andamento neste campo.

Os documentos oficiais serão confrontados com análises de estu-diosos e com resultados de pesquisas sobre as temáticas das questões,optando-se especialmente pelas pesquisas no campo da educação

histórica . Por meio de investigações sistemáticas das ideias históricasde crianças, jovens e professores em diversos países, a educação

prefácio

prefácio

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prefácio

 histórica vem construindo uma forma de intervenção pedagógica es-

pecífica, alicerçada na ciência histórica, visando qualificar a produçãodo conhecimento histórico escolar de crianças e jovens em situaçõesde aprendizagem escolar.

 As pesquisas em educação histórica almejam a formação de umaconsciência histórica , ou seja, possibilitar ao sujeito apropriar-se dasideias e conhecimentos históricos nas suas diversas perspectivas, paraorientar seu agir no tempo, por meio do desenvolvimento da literaciahistórica, que é o domínio das ferramentas de compreensão do passa-

do e do pensar histórico.O autor.*

* Henrique Rodolfo Theobald é mestre em Educação pela Universidade Federal do Paraná

(UFPR). Atua como professor da rede municipal de ensino de Araucária e da FaculdadeEducacional de Araucária – Facear, e é pesquisador do Laboratório de Pesquisa emEducação Histórica – LAPEDUH/UFPR.

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O ensino e a formação do professor de história na sociedade

do século XXI – caracterizada pela aceleração da produção do conhe-cimento em bases tecnológicas informatizadas – passam por transfor-mações. De um lado, a produção do conhecimento histórico, comotodo conhecimento, está muito dinamizada. De outro lado, os alunoschegam à escola com uma gama cada vez maior de informações, muitasvezes fragmentadas e desconexas.

Essa realidade torna a formação inicial e continuada de qualidadecondição inerente à profissão de professor, principalmente por consta-

tar que essa formação que capacita e instrumentaliza para uma reflexãosistemática sobre a natureza de sua profissão e sobre elementos funda-mentais de sua prática, não estão ao alcance da maioria dos professorese sistemas de ensino. Isso acontece mesmo estando a formação conti-nuada apontada na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (1996) e reafir-mada nas metas do Plano Nacional de Educação (2001).

Esse professor mais qualificado tem características de professor/pesquisador, produtor de saberes, que desenvolve nos alunos compe-tências específicas da natureza da história.

Desafios do ensino de história e da formaçãodo professor

 A tarefa de ensinar história para crianças, jovens e adultos, em tem-pos de uma sociedade em transição do capitalismo industrial para um ca-pitalismo pós-industrial ainda emergente, apresenta-se como um desafiopara professores com formação e licenciatura na área de história, pois, emtese, dominam os fundamentos, as metodologias e a ciência históricas.

O ensino de história

e a formaçãodo professor   1

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 As mudanças que ocorrem em nossa sociedade e na vida daspessoas que nela vivem são históricas, e têm recebido diversas deno-minações de pesquisadores e pensadores: sociedade pós-industrial ou

pós-moderna (LYOTARD, 1989), sociedade informática (SCHAFF,1995), sociedade do conhecimento (TOFFLER, 1990), sociedadetecnizada (MACHADO, 1993) e sociedade em rede (CASTELLS,1999). Nesta obra optamos por se referir a essa sociedade como socie-dade do conhecimento.

Sobre as origens das dificuldades com que se deparam os profes-sores recém-formados na sociedade do conhecimento, Fonseca tece aseguinte consideração:

[...] a postura de perplexidade dos recém-formados diante dacomplexidade da educação escolar é atual e não exclusiva daárea de história. É resultado da concepção de formação docen-te, consagrada na literatura da área como modelo de raciona-lidade técnica e científica ou aplicacionista  (2005, p. 62).

Fonseca refere-se ao modelo de formação que privilegia a teoria,com pouca formação teórico-prática, como sendo um dos responsáveispelas dificuldades que os professores enfrentam quando assumem a sala

de aula.Para professores dos anos iniciais do Ensino Fundamental, com for-

mação generalista , sem licenciatura específica em história, ensinar histó-ria parece ser uma tarefa ainda mais desafiadora. Segundo Talamini,

Os cursos que formam pedagogos têm em sua grade curricular,em geral, disciplinas que se preocupam em instrumentalizar osprofessores para trabalhar com o conhecimento histórico; noentanto, essa formação pode ser considerada como insuficiente,

 já que a carga horária é bastante limitada para abranger a com-plexidade da formação para o ensino das disciplinas específicas. Além disso, os professores generalistas precisam se preocupartambém com os conteúdos e metodologias das outras áreas deconhecimento, já que são responsáveis pelo desenvolvimentodas aulas em todas as disciplinas escolares (2009, p. 4-5).

Se de um lado existe a questão da formação generalista, de outroo dia a dia da sala de aula traz outras preocupações que dificultam otrabalho com as disciplinas específicas, como a história.

Outra questão a ser destacada é o fato de que, nesse nível deensino, os professores estão demasiadamente preocupados – e

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Capítulo 1

Fundamentos e Metodologia do Ensino de História

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não sem motivo – com a alfabetização em língua materna e,como consequência, trabalham pouco com as outras áreas doconhecimento, dentre elas a história, como observei muitasvezes nas minhas experiências como professora e informal-

mente na relação com muitos colegas em diferentes escolas(TALAMINI, 2009, p. 5).

 A experiência de Talamini pode ser tomada como parâmetro de queensinar a ensinar história por meio de um livro pode ser uma tarefa emque o desafio toma proporções exponenciais, diante do exposto asso-ciado a pouca produção de bibliografia na área, que pode estar ligado àtradição da racionalidade técnica e científica já apontada por Fonseca.

Outro problema a ser superado pelo ensino de história é a presençade certo conservadorismo, como constata Rocha 

Não se pode, por outro lado, dissociar o professor do espaçoonde exerce suas atividades. Tanto na rede pública quanto narede privada de ensino de 1º e 2º graus observa-se a predomi-nância de atitudes conservadoras em relação à história e seuensino. Pela insistência na repetição dos mesmos conteúdose formas de transmiti-los se produziu um modelo escolar dehistória, difícil de ser superado. As inovações produzidas noconhecimento histórico que poderiam contribuir para oxi-genar a prática docente encontram uma barreira constituída,

 juntamente, por esse modelo tradicionalmente aceito comosendo “a história” (2004, p. 48).

 A trajetória do ensino de história no Brasil1 “evidencia o embateentre o que foi chamado de ‘aprendizagem tradicional’ e ‘aprendiza-gem crítica’ da história” (SCHMIDT, 2009, p. 22). Essas aprendiza-gens não têm conseguido suprir os anseios das crianças, dos jovens edos adultos da sociedade do conhecimento, lançando novos desafios aoensino de história, extensivos ao ensino como um todo. Três desafiosapresentam-se como fundamentais, o primeiro, específico do ensino dehistória, refere-se aos avanços das pesquisas em torno do ensino de his-tória. O segundo desafio refere-se às contribuições dessas pesquisas paraa formação inicial e continuada dos professores de história do EnsinoFundamental. E o terceiro desafio refere-se às condições materiais para

1 Para aprofundar sobre a trajetória do ensino de história de forma breve, consultaras obras Didática e prática do ensino de história: experiências, reflexões e aprendizados  (FONSECA, 2005) e Ensino de história: fundamentos e métodos  (BITTENCOURT, 2008).

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uma formação continuada de qualidade. Essa qualidade relaciona-se àcapacitação e instrumentalização para a reflexão sistemática sobre a na-tureza de sua profissão e sobre elementos fundamentais de sua prática.

O ensino de história tem sido objeto de diversas pesquisas, tantono Brasil2 quanto em outros países. Essas pesquisas buscam investigar eobter respostas às dúvidas e angústias com que convivem os professoresformados e em formação, quanto à eficácia de sua prática educativa emsala de aula. Sendo assim, são pesquisas voltadas ao domínio dos resul-tados de sua intervenção pedagógica, bem como buscam proporcionara eles uma aproximação de fundamentos e metodologias de ensino dehistória, desenvolvidos a partir da natureza da própria história , visan-

do uma cognição histórica situada  na ciência histórica.Schmidt (2009), ao fazer uma análise dos PCN de história, aponta

para a pedagogização e psicologização dos pressupostos didáticos doensino de história, o que provoca uma dicotomia, ou seja, um distan-ciamento entre a ciência histórica e o ensino de história, dificultandosua aprendizagem. Dessa forma, propõe a sistematização de “referen-ciais teóricos que indiquem os caminhos possíveis de uma cognição his-tórica situada na racionalidade da história (p. 32)”. A pesquisadora vaialém da constatação dessa necessidade e, junto com Garcia, coordena oLaboratório de Pesquisas em Educação Histórica, na linha de pesquisacultura, escola e ensino, do Programa de Pós-graduação em Educação,da Universidade Federal do Paraná 3.

Essas pesquisas em educação histórica buscam tomar o ensino dehistória, seus fundamentos e metodologias, como um saber especí-fico que se situa entre – no sentido de meio do caminho – os saberes

2 Em uma pesquisa feita na base de dados de dissertações e teses da Capes, em 13/03/2010,utilizando as palavras-chave “fundamentos e metodologia do ensino de história”, nenhumadissertação ou tese foi localizada. Com as palavras-chave “ensino de história”, foram loca-lizadas 52 dissertações ou teses. Já com as palavras-chave “educação histórica” foramlocalizadas dez dissertações ou teses, sendo que metade destas foram localizadas com aspalavras-chave “ensino de história”. Finalmente, com as palavras-chave “didática da histó-ria”, foram encontradas três dissertações ou teses, sendo que duas haviam sido localizadaspelos diretórios anteriores.

3 O Laboratório de Pesquisas em Educação Histórica é coordenado pelas doutoras MariaAuxiliadora Schmidt e Tânia Maria F. Braga Garcia, e pode ser acessado pelo site  <http://www.lapeduh.ufpr.br>.

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Capítulo 1

Fundamentos e Metodologia do Ensino de História

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 específicos da ciência histórica, do saber histórico escolar e dos saberespedagógicos e curriculares. Nesse sentido, o ensino de história vem seconstituindo como ciência específica no diálogo entre a ciência histó-

rica, o saber histórico escolar e o saber pedagógico, desenvolvendo ob- jetivos, fundamentos e metodologias específicos do ensino de história,alicerçados em pesquisas que privilegiam a natureza da própria história,como veremos nos capítulos que se seguem.

Essa mudança de enfoque nas pesquisas sobre o ensino de históriaprovoca alterações nos seus objetivos, na forma de considerar as ideiashistóricas de crianças, jovens e adultos e suas relações com essas ideias.Isso ocorre na forma de ver os conteúdos e nos critérios de sua seleção,

no interesse em compreender como o passado é reconstruído pela ciên-cia histórica, no desenvolvimento de uma didática específica da histó-ria, na compreensão da importância da comunicação e da avaliação daaprendizagem histórica, buscando uma educação histórica, ou seja, quecrianças, jovens e adultos pensem historicamente.

Quanto à formação do professor, em tempos recentes, vislumbrou-seuma sociedade futura com o temor de que, no processo educativo, os pro-fessores fossem substituídos gradativamente pela tecnologia, especialmente

a informatização. A realidade, porém, tem demonstrado que a tecnologiada informação está modificando tempos, espaços, relações de produção,relações de comunicação, relações interpessoais e a própria organização doensino. Mudanças reais e virtuais que atingem da vida material às formasde pensar e as ideias das pessoas, mas, além de não substituir o professor,têm evidenciado a necessidade de que este profissional esteja cada vez maispreparado para trabalhar com educação e que lance mão dessa tecnologiacomo meio, integrando-a em sua prática educativa.

 As exigências de qualificação se fazem tanto na especificidade quantona pluralidade, no domínio de um conjunto de saberes, que incluem sa-beres específicos das disciplinas, saberes pedagógicos, saberes curriculares,saberes práticos da experiência de sala de aula, saberes escolares e saberesda  tecnologia da informação, entre outros (FONSECA, 2005, p. 63).

 A sociedade do conhecimento exige um profissional mais qualifi-cado, um professor/pesquisador, um “professor de história produtor desaberes, capaz de assumir o ensino como descoberta, investigação, refle-xão e produção” (FONSECA, 2005, p. 62), que possa desenvolver nosalunos competências específicas da natureza da história. Um professor

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Fundamentos e Metodologia do Ensino de História

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que, por meio de um ensino alicerçado em elementos específicos daciência histórica, contribua para que crianças, jovens e adultos consi-gam se situar e se orientar nessa sociedade em constante transformação,

sem perder o referencial de suas raízes e sua identidade familiar, culturale social, e sentindo-se sujeito partícipe do processo histórico.

O professor que essa realidade exige está em formação em algunslugares do Brasil e do mundo, em processos de formação continuadalocalizadas ou em parceria com instituições de Ensino Superior, comoocorre e foi constatado na cidade de Araucária, no Paraná:

 A participação de professores de história de Araucária, “Grupo Araucária”, em 2003, do seminário Investigar em Ensino de

História, do curso de Mestrado em Educação da UFPR, defla-grou um processo de reflexão sistemática sobre elementos daprática docente, a partir dos trabalhos sobre os conhecimentosprévios de conceitos históricos dos alunos, planejamento daintervenção pedagógica sobre os conceitos investigados e ree-laboração dos mesmos para verificar as mudanças provocadaspela intervenção pedagógica (THEOBALD, 2007b, p. 1).

Esse professor do Ensino Fundamental, que desenvolve um pro-cesso de investigação, produção e publicação organizada, coletiva e

situada sobre elementos de sua prática,[...] pode ser tomado na dimensão do intelectual, que inves-tiga, produz e transforma por meio de experiências organi-zadas, coletivas e situadas, as relações sociais e as relações desaber em que está inserido. Investiga e transforma as concep-ções que tem em relação a si próprio, à sua função, aos alunosem suas relações com o saber, à sua formação e em relaçãoao conhecimento com o qual trabalha, sua produção e seuensino (THEOBALD, 2007b, p. 2).

Uma formação inicial e continuada por meio do conhecimentoe apropriação dos meios de produção na prática investigativa, produ-ção de conhecimento sobre elementos de sua prática, publicação dosresultados e reconhecimento da produção por encontros científicos deáreas nacionais e internacionais, seria o ideal para que os professorespudessem estar em constante processo de mudança estrutural na cons-ciência e na formação de sua identidade. A formação inicial buscadespertar esse espírito por meio dos trabalhos de conclusão de curso,mas na formação continuada, na maioria das vezes, não são criadas ascondições para que esse processo possa ter continuidade.

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Capítulo 1

Fundamentos e Metodologia do Ensino de História

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 As condições materiais necessárias estão sendo forjadas, de umlado pelo clamor dos professores e do “chão da escola”, sintetizadosnas reivindicações sindicais dos trabalhadores em educação do Brasilafora, representadas pela Confederação Nacional dos Trabalhadores emEducação – CNTE. Por outro lado, pelo clamor da sociedade por umaeducação de qualidade, contraposta pelas resistências dos que gover-nam, decidem e fazem a gestão dos recursos, que ainda estão aquém dosnecessários para implementar as condições necessárias.

Para que seja possível uma formação continuada de qualidade,faz-se necessária a implementação de algumas condições materiaismínimas: de um piso salarial digno que permita aos professores uma jornada de trabalho equilibrada; da hora-atividade de, no mínimo, umterço, como previsto em legislação federal e ainda não efetivada devi-do a resistências de governantes e sub judice ; de programas de forma-ção continuada nos sistemas de ensino em parceria com universidadesque lhes deem suporte; e licenças periódicas para estudos. A título deilustração, na Finlândia, país com o melhor índice de aproveitamentoescolar nos últimos anos, os professores trabalham quatro anos e noquinto ano licenciam-se para estudar. Essas licenças são custeadas pelosistema previdenciário, em uma espécie de adiantamento fragmentado

da aposentadoria que, além de oxigenar o processo pedagógico, possi-bilita prolongar a vida produtiva do professor.

Da teoria para a prática

O estudante, o professor e o profissional de educação, que tiverem

interesse em aprofundar seus estudos sobre o ensino de história, podemacessar vários laboratórios, revistas e livros específicos que apresentamartigos, resultados de pesquisas e atividades que podem ser consultadoscomo suporte.

UFPR – Universidade Federal do Paraná – Laboratório de Pes-●

quisa em Educação Histórica: <http://www.lapeduh.ufpr.br/>.

UEL – Universidade Estadual de Londrina: <http://www.uel.●

br/laboratorios/labhis/>.

UFMG – Universidade Federal de Minas Gerais: <http://●

www.labepeh.com.br/>.

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Educar em Revista – Dossiê: educação histórica ● , da Universi-dade Federal do Paraná: <http://ojs.c3sl.ufpr.br/ojs2/index.php/educar/issue/view/251>.

Livro● Didática e prática de ensino de história , de SelvaGuimarães Fonseca (2005): <http://books.google.com.br/books>. Para acessar, basta digitar o título do livro.

Livro● O saber histórico na sala de aula , de Circe Bittencourt(2006): <http://books.google.com.br/books>.

Teses e dissertações sobre o ensino de história: <http://www.●

dominiopublico.gov.br/pesquisa/PesquisaPeriodicoForm. jsp>. Entrar com os diretórios ou palavras-chave “ensino dehistória”, “educação histórica” ou “didática da história”.

 Além do aprofundamento dos estudos, na vida prática, cabe aoprofessor integrar-se nos movimentos que buscam melhorar as condi-ções materiais da ação educativa.

Síntese

Este capítulo procurou destacar os desafios do ensino de história eda formação dos professores na sociedade do conhecimento. O ensinode história vem se firmando como uma ciência específica, desenvol-vendo, por meio de pesquisas, formas de ensinar alicerçadas na próprianatureza da história.

 A formação inicial e continuada dos professores de história exigeatualização constante, apropriação dos meios de produção do conheci-mento histórico escolar e a incorporação da investigação contínua deelementos de sua prática. Esses elementos vão desde as ideias históricasdos alunos, passando pela relação que estabelecem com o saber histó-rico por meio das narrativas do professor, contidas nos manuais didá-ticos e na mídia, à elaboração e comunicação do que aprenderam pormeio da produção de narrativas e outras formas de semiose.

 A formação continuada exige, ainda, condições materiais mínimasque envolvem salário digno, jornada de trabalho equilibrada, progra-mas de formação continuada dos sistemas de ensino e licenças periódi-cas para aprofundamento dos estudos.

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Neste capítulo pretende-se fazer uma análise da abordagemque os PCN do Brasil fazem dos objetivos do ensino de história, comcontrapontos de pesquisadores como Schmidt e Fonseca, e de outrosdocumentos como o Currículo Nacional de História de Portugal   e asDiretrizes Municipais de Ensino de História , de Araucária. Com isso,queremos definir um objetivo fundamental: a contribuição do ensinode história para a construção da consciência histórica   de crianças, jovens e adultos e como dotá-los de ferramentas de análise do passado eorientação no presente, na perspectiva de uma literacia histórica .

Para desenvolver essa análise, faremos o seguinte movimento: osobjetivos do ensino de história nos PCN, uma análise desses objetivosà luz de pesquisadores e de pesquisas no campo do ensino de história eo que essas pesquisas propõem de avanços aos PCN.

Os objetivos do ensino de história nos PCN

Os PCN (BRASIL, 1998, p. 33) estabelecem os seguintes objeti-vos gerais para o ensino de história no Ensino Fundamental:

identificar o próprio grupo de convívio e as relações que•estabelecem com outros tempos e espaços;

organizar alguns repertórios histórico-culturais que lhes•permitam localizar acontecimentos numa multiplicidadede tempo, de modo a formular explicações para algumasquestões do presente e do passado;

conhecer e respeitar o modo de vida de diferentes grupos•

sociais, em diversos tempos e espaços, em suas manifesta-ções culturais, econômicas, políticas e sociais, reconhecen-do semelhanças e diferenças entre eles;

Objetivos do

ensino de história 2

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reconhecer mudanças e permanências nas vivências•humanas, presentes na sua realidade e em outras comuni-dades, próximas ou distantes no tempo e no espaço;questionar sua realidade, identificando alguns de seus•

problemas e refletindo sobre algumas de suas possíveissoluções, reconhecendo formas de atuação política insti-tucionais e organizações coletivas da sociedade civil;

utilizar métodos de pesquisa e de produção de textos de•conteúdo histórico, aprendendo a ler diferentes registrosescritos, iconográficos, sonoros;valorizar o patrimônio sociocultural e respeitar a diversidade,•reconhecendo-a como um direito dos povos e indivíduos ecomo um elemento de fortalecimento da democracia.

 Além desses objetivos gerais, os PCN estabelecem objetivos especí-ficos para cada um dos ciclos do Ensino Fundamental.

Organizados a partir de verbos, característicos da taxionomia deBloom, esses objetivos acompanham a vertente de fundamentaçãopsicológica dos PCN, destacando-se as contribuições da psicologia dodesenvolvimento de Piaget, da teoria da atividade de Vigotsky, Luria eLeontiev, da psicologia da cultura e da teoria da aprendizagem verbalsignificativa de Ausubel. Incorporando esses pressupostos, os PCN

utilizam, ainda, as referências da psicologia construtivista, que estavamem voga na última década do século XX (SCHMIDT, 2009).

 A recorrência aos pressupostos da psicologia construtivista é com-preensível quando analisada como parte das necessidades da escola emresponder aos indicadores de fracasso escolar. Indicadores esses queevidenciavam os problemas que o ensino enfrentava ao não conseguiracompanhar os reflexos das mudanças sociais provocadas pelos avançostecnológicos (foi a década da popularização do celular e do acesso à in-

ternet) e pela busca de novos pontos de equilíbrio entre os relativismos e fundamentalismos, que se confrontaram no final do século passado.

Esses confrontos eram expressos pelas crises em diversos setores. Pa raexemplificar: na economia entre a intervenção do estado (estado máxi-mo) e a privatização (estado mínimo); na educação pelos embates emtorno das reformulações curriculares; na axiologia  pela crise dos valoreséticos na família, na política, na religião e na sociedade, em que “o ho-mem moderno não é mais o homem que sofre a ruptura entre o passadoe o presente, o antes e o depois, mas o homem que carrega em si a rup-tura como o objeto mesmo de sua vontade” (FONSECA, 2005, p. 29),

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Capítulo 2

Fundamentos e Metodologia do Ensino de História

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ou seja, o homem que vive a mudança. Essas mudanças e a necessidadede reorientação diante delas, por si só, impõem a adoção de novos obje-tivos para o ensino de história.

O Currículo Nacional de História de Portugal  (2001, p. 87) propõeobjetivos fundamentados em pesquisas sobre cognição histórica situada,ou seja, pesquisas alicerçadas na natureza da ciência histórica, acerca dasideias sobre história de crianças e jovens e como se relacionam com elas;sobre a relação entre as ideias históricas, sua complexidade e a idade decrianças e jovens; sobre a relação que crianças e jovens estabelecem comas múltiplas narrativas históricas e como produzem narrativas e comu-nicam o que aprenderam.

Os objetivos do currículo português são de natureza palpável, ouseja, visam incorporar a história ao pensamento e à prática cotidiana, eresumem-se nos seguintes:

estabelecer referenciais históricos fundamentais que possibili-•tem a tomada de consciência social das crianças e dos jovens;

estimular a construção do saber histórico por meio da•expressão de “ideias históricas” em sua linguagem, desdeos primeiros anos de escolaridade;

construir um pensamento histórico progressivo e gradual•contextualizado e relacionado com as experiências vividas(PORTUGAL, 2001, p. 87).

 As Diretrizes Municipaisde Ensino de História de Arau-cária   propõem que “a finali-dade do ensino de história éensinar o aluno a pensar his-toricamente para a formaçãoda consciência histórica”. Paraque essa tarefa seja possível,entende que o ensino de his-tória deve considerar “o alunocomo sujeito da própria histó-ria”, e encaminhar o ensino apartir “daquilo que é significa-tivo para sua vida em socie-dade”, e levar em consideração

Circe Bittencourt (2008) analisou diversas

propostas curriculares do final do século XX

e apontou características comuns:

  implementação dos currículos

legitimada junto aos professores;

  professor com autonomia pedagógica;

 

pressupostos teóricos e metodológicos

do conhecimento histórico;

  fundamentação construtivista: aluno

sujeito do processo de aprendizagem;

  aluno possui conhecimentos históricos

prévios;

 

ensino de história nos anos iniciais.

Saiba mais

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“o que ele pensa, sabe e se preocupa, bem como a sua participação narealidade social” (ARAUCÁRIA, 2004, p. 76).

Essas diretrizes foram elaboradas por professores em fase inicial de

um processo de pesquisas sobre elementos de sua prática, mais especi-ficamente sobre as ideias históricas prévias das crianças e jovens comque trabalham. As pesquisas já influenciaram a formulação do objetivode levar o aluno a pensar historicamente e contribuir para o aprimora-mento de sua consciência histórica.

A educação histórica como objetivo do ensino

de história As pesquisas em educação histórica apontam como objetivo fun-

damental do ensino de história a contribuição com a criança, o joveme o adulto no aprimoramento de sua consciência histórica. E o que seentende por consciência histórica?

O pesquisador alemão Jorn Rüsen (1992a, p. 28-29) explica a apren-dizagem da história como sendo um processo de mudança estrutural na

consciência histórica, que opera como um modo específico de orientaçãoem situações reais da vida presente. Essa orientação só é possível median-te a compreensão das experiências passadas, mas não significa permane-cer no passado. A compreensão do passado deve “iluminar” a realidadee os movimentos de mudança do presente. Os movimentos e mudançasdo presente também sofrem as influências das expectativas de futuro, quepor sua vez são balizadas e sinalizadas pelas mudanças e permanências davida prática diária, dotando o presente de uma marca e matriz temporal.

O historiador alemão afirma, ainda, que é possível observar a mu-dança estrutural da consciência histórica. De que forma? Observandoo desenvolvimento de suas competências narrativas: as competênciasda experiência, de interpretação e de orientação  (RÜSEN, 1992a,p. 30). E como podemos conhecer as competências narrativas de umapessoa, de uma criança, de um jovem?

 A competência narrativa da experiência  se manifesta pela habili-dade com que a pessoa resgata a qualidade e a importância das experiên-cias vividas no passado e as diferencia do presente. Uma pessoa é tantomais experiente quanto mais apurada for a sua sensibilidade histórica.

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Capítulo 2

Fundamentos e Metodologia do Ensino de História

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 A competência narrativa de interpretação se manifesta pela habi-lidade que uma pessoa desenvolveu em diferenciar os tempos: passado,presente e futuro, suas dimensões e mudanças, sem perder a perspectiva

de totalidade da temporalidade. É a habilidade que uma pessoa tem dever e perceber as mudanças e as permanências.

 A competência narrativa da orientação se manifesta pela habi-lidade em utilizar o conteúdo da experiência e da interpretação paraguiar as ações na vida presente, articulando a identidade humana como conhecimento histórico em uma realidade de mudança temporal.

 A formação da consciência histórica não está dissociada da necessi-dade de uma literacia histórica. O que é a literacia histórica? A partirdos estudos de Rüsen sobre consciência histórica, o pesquisador inglêsPeter Lee (2006), fundamentado em pesquisas com crianças e jovenssobre suas ideias históricas e sobre como se orientam no tempo, consta-tou a necessidade de instrumentalizá-los para orientarem-se no tempo.Nesse sentido, propõe equipar os estudantes com dois tipos de ferra-mentas: “uma compreensão da disciplina de história e uma estruturautilizável do passado” (2006, p. 145).

 A compreensão da disciplina de história passa por uma compreen-são de como a história é construída a partir das evidências do passado,e essa construção é feita sempre distanciada do passado. A história não éo passado, mas a sua reconstrução a partir das evidências, balizada pelascompreensões possíveis e pelos interesses do momento da reconstrução.Para ilustrar essa compreensão vejamos o que escreve Lee:

Em 1920 não podíamos [...] dizer “O Tratado de Versalhes lan-çou as sementes para regras nazistas na Alemanha”, enquantoque em 1940 tal descrição era ao menos uma das possíveis. A in-vasão do Iraque não pode agora ser descrita como uma aberturade um longo período de estabilidade no meio-leste (OrienteMédio) ou o início do declínio do poder mundial dos EUA,mas ambas poderão ser uma descrição válida daqui a cem anos.

 A gama de descrições válidas aplicáveis ao passado muda com aocorrência de novos eventos e processos. As considerações histó-ricas são construções, não cópias do passado (2006, p. 140).

 Alcançar a literacia histórica caracteriza-se, ainda, pela superaçãodas ideias históricas fragmentadas e eventificadas do passado, restri-tas ao relato de poucos eventos – geralmente anacrônicos  – e mui-to comum em crianças, jovens e adultos, processo que Lee denomina

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de “ontologia  restrita ou limitada ” (2006), bem como a dificuldadeque crianças, jovens e adultos têm de compreender as mudanças queocorreram no passado e estão em processo no presente.

Para essa superação, Lee propõe instrumentalizar os estudantescom uma estrutura utilizável do passado. Essa estrutura é assim descritapor ele:

Uma estrutura permitirá aos alunos elaborá-la e diferenciá-lano encontro com novas passagens da história, consolidandosua coerência interna, fazendo conexões mais complexas entreos temas e subdividindo e recombinando temas para propó-sitos diferentes. [...] deve ser uma estrutura aberta, capaz de sermodificada, testada, aperfeiçoada e mesmo abandonada, em

favor de algo mais, de forma que os alunos sejam encorajadosa pensar e refletir sobre as suposições que fazem ao testar edesenvolver sua estrutura. Diferentes alunos sairão da escolacom diferentes estruturas (2006, p. 147).

 As pesquisas em educação histórica buscam contribuir para odesenvolvimento desses instrumentos de leitura do passado e orienta-ção no presente. Nesse sentido, Barca, na esteira da proposta de Lee,propõe que um dos componentes da literacia histórica seja o desenvol-

vimento da competência de “leitura contextualizada do passado a par-tir de evidências fornecidas por variadíssimas fontes” (2006, p. 95).

 Além de contribuir para a compreensão de que o passado não éestático e não está dado como certo, por ser constantemente suplan-tado por novas descobertas e releituras com enfoques diferentes, Barcatambém aponta para a necessidade de compreender que não é possível“aceitar apenas ‘uma grande narrativa’ acerca do passado, já que historia-dores podem produzir narrativas divergentes, fruto de perspectivas dife-

renciadas sobre as mesmas fontes ou situações” (2006, p. 95). Trata-sedo desenvolvimento de um olhar multiperspectivado do passado.

No sentido prático, os estudos de Lee e Barca apontam para anecessidade de que o ensino de história contribua com o aprimoramen-to da consciência histórica e o desenvolvimento da literacia históricade crianças, jovens e adultos. Para tanto, é fundamental a utilização dediversos tipos de fontes históricas e diferentes narrativas históricas paraproporcionar um estudo multiperspectivado, bem como desenvolveruma identidade que transite entre o local, o nacional e o global, entre ofamiliar, o social e o cultural, e entre o passado, o presente e o futuro.

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Capítulo 2

Fundamentos e Metodologia do Ensino de História

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Os tipos de fontes históricas vão desde documentos em estadode arquivo familiar, passam pelos documentos em arquivos oficiais ouexpostos em museus, ao patrimônio material e imaterial das diversas

culturas, respeitados os critérios específicos da história para o tratamen-to e a seleção das fontes como evidências históricas do passado.

 As diferentes narrativas englobam desde a narrativa do professor,passam pelas narrativas dos manuais didáticos e paradidáticos, pelasnarrativas da linguagem fílmica e dos documentários veiculados pelosmeios de comunicação e informação, pelas narrativas em forma dememórias relatadas pelos mais velhos às protonarrativas. Ainda, en-globam as narrativas expressadas e construídas pelas próprias crianças,

 jovens e adultos, quando colocados em contato direto com as fontes, nacomunicação do aprendizado.

Tanto as fontes quanto as narrativas históricas serão objetos deanálise dos capítulos 7 e 8, quando serão aprofundados elementos dametodologia do ensino de história.

Da teoria para a prática

Na elaboração dos planejamentos anuais, bimestrais, de unida-de e de aula de história, o professor pode incluir objetivos na pers-pectiva da contribuição para a formação da consciência histórica deseus alunos. Esses objetivos devem auxiliar os alunos a conhecerem ecompreenderem o seu passado, de sua família e comunidade, contri-

buindo para que possam orientar-se no presente, balizados por suasexpectativas de futuro.

No desenvolvimento das aulas de história, cabe ao professor incluiratividades que instrumentalizem os alunos na leitura sobre o passado,apresentando fontes e narrativas diversas sobre o passado a ser estuda-do, para que o estudante amplie sua compreensão sobre a forma comoo passado é reconstruído, bem como que se permita ao aluno que, apartir de diversas fontes, construa a sua narrativa sobre o passado emquestão. Essas atividades permitem aos alunos que desenvolvam umaliteracia histórica.

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Síntese

Neste capítulo foi possível constatar que os objetivos do ensinode história dos PCN são de fundamentação psicológica, de recorrên-cia construtivista. O Currículo Nacional de História de Portugal   e asDiretrizes Municipais de Ensino de História de Araucária  apontam paraobjetivos fundamentados na natureza da história, convergindo com aspesquisas em educação histórica, que apontam para a contribuição como aprimoramento da consciência histórica como objetivo fundamentaldo ensino de história.

 A consciência histórica é compreendida como um modo específicode compreensão do passado e de orientação em situações reais da vidapresente, balizada e sinalizada pelas expectativas de futuro. A consciên-cia histórica sofre mudanças estruturais a partir dos conhecimentos emanifesta-se por meio das competências narrativas das experiências vi-vidas, de interpretação dessas experiências e da utilização dessa inter-pretação na orientação da vida presente.

 A formação da consciência histórica está associada à necessidade de

uma literacia histórica, ou seja, do desenvolvimento da competência deleitura contextualizada do passado a partir de evidências fornecidas pordiversas fontes, do desenvolvimento de um olhar perspectivado sobre opassado, da não aceitação de apenas uma narrativa acerca do passado e daapropriação de uma estrutura flexível, adaptável e utilizável do passado.

O desenvolvimento da literacia histórica e a formação da cons-ciência histórica estão vinculados ao trabalho com fontes históricase narrativas diversificadas, que permitam o crescimento de um olhar

multiperspectivado sobre o passado e o desenvolvimento de uma iden-tidade histórica.

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Neste capítulo buscaremos compreender as crianças, jovens eadultos como categorias históricas e sociológicas, desenvolvidas paracompreender o ser humano nas diversas fases de desenvolvimentofísico, psicológico e sociológico, bem como em seu processo de escola-rização, mais especificamente na sua relação com a escola como lugarprivilegiado de experiência de relação com o saber.

Pretende-se aprofundar essa relação que os atores do processo deensino estabelecem com o saber na escola, relação entendida como ex-

periência humana, a partir das concepções de criança, jovem e adultoexpressas nos PCN, no Currículo Nacional de História de Portugal e nasDiretrizes Municipais de Ensino de História de Araucária , confrontadascom estudos da filosofia da história e estudos da sociologia da educação.

Concepções de criança, jovem e adulto

Criança e infância, jovem e adulto, são categorias sociais, construí-

das historicamente para designar uma fase da vida das pessoas, hojeconsolidadas nas legislações de vários países e declarações de organis-mos internacionais ligados à Organização das Nações Unidas – ONU.No Brasil, o Estatuto da Criança e do Adolescente  define a infância comosendo o período que vai do nascimento aos 12 anos e a adolescência dos12 anos à maioridade, atingida legalmente aos 18 anos (1990).

No período do Renascimento começam a surgir diferenciações entrea infância e as outras fases da vida. A criança deixou de ser vista como umadulto em “miniatura” ou um ser sem conhecimento para ser educada deacordo com as vontades do adulto. A juventude também é uma construção

Crianças, jovens eadultos e a experiência

de relação com osaber na escola

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social e historicamente situada, mas não teve um percurso de evoluçãolinear, sendo vista de forma particular e diferenciada nas diversas sociedadese nos diversos contextos históricos (SCHMIDT, 2002, p. 10-11).

Os PCN do Brasil não se constituem fonte para compreender oque se entende por criança, jovem ou adulto em sua relação com o saberna escola. As questões: quem é essa criança; quem é esse jovem; quem éesse adulto; e que tipo de relação estabelecem com o saber na escola, nãoencontram referência nos Parâmetros Curriculares Nacionais  (1998).

No livro introdutório, os PCN referem-se aos alunos em uma pers-pectiva psicológica, como alguém que deve ter uma motivação intrínseca e

ser motivado para a aprendizagem, contraponto aos que estudam “apenaspara passar de ano ou para tirar notas” (BRASIL, 1998, p. 64-65), quepode ser expressão de uma constatação superficial e aligeirada da realidade.

Outra perspectiva, também de vertente psicológica, refere-se aos alu-nos com uma autoimagem problematizada pelas relações com professorese colegas, que se reflete em repetências crônicas, fracasso escolar e evasão.

O aluno com um autoconceito negativo, que se considera fra-cassado na escola, ou admite que a culpa é sua e se convence

de que é um incapaz, ou vai buscar ao seu redor outros cul-pados: o professor é chato, as lições não servem para nada.

 Acaba por desenvolver comportamentos problemáticos e deindisciplina (BRASIL, 1998, Introdução, p. 65-66).

Quanto à relação com o saber, os PCN consideram o aluno emseus “níveis de organização do pensamento como os conhecimentose experiências prévias” (BRASIL, 1998, Introdução, p. 38) e pela suarelação com os demais agentes do processo educativo, fundamentados

na teoria interacionista de realidade real e proximal de Vigotski.Para a estruturação da intervenção educativa é fundamentaldistinguir o nível de desenvolvimento real do potencial. O ní-vel de desenvolvimento real se determina como aquilo que oaluno pode fazer sozinho em uma situação determinada, semajuda de ninguém. O nível de desenvolvimento potencial é de-terminado pelo que o aluno pode fazer ou aprender mediante ainteração com outras pessoas, conforme as observa, imitando,trocando ideias com elas, ouvindo suas explicações, sendo de-

safiado por elas ou contrapondo-se a elas, sejam essas pessoas oprofessor ou seus colegas. Existe uma zona de desenvolvimentopróximo, dada pela diferença existente entre o que um aluno

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Capítulo 3

Fundamentos e Metodologia do Ensino de História

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pode fazer sozinho e o que pode fazer ou aprender com a ajudados outros. De acordo com essa concepção, falar dos mecanis-mos de intervenção educativa equivale a falar dos mecanismosinterativos pelos quais professores e colegas conseguem ajustar

sua ajuda aos processos de construção de significados realizadospelos alunos no decorrer das atividades escolares de ensino eaprendizagem (BRASIL, 1998, Introdução, p. 38).

O Currículo Nacional de História de Portugal , em seus pressupostos,refere-se ao aluno como sujeito ativo que deve ser auxiliado pela escolano processo de desenvolvimento de sua relação com o saber histórico:

[...] a partir das vivências dentro e fora da escola: o meio fa-miliar e os media  fornecem aos alunos ideias mais ou menos

adequadas, mais ou menos fragmentadas, sobre a história.Compete à escola explorar estas ideias tácitas e ajudar o alunoa desenvolvê-las numa perspectiva de conhecimento histórico(PORTUGAL, 2001, p. 87).

Outro pressuposto do currículo português refere-se à compreen-são de que a aprendizagem ocorre em uma progressão nem linear neminvariante, fundamentada na teoria dos constructos. Assim, pode ha-ver graus de elaboração mental da aprendizagem diferenciados em

crianças e jovens de uma mesma faixa etária e graus de elaboraçãomental da aprendizagem similares em crianças e jovens de faixas etá-rias diversas:

Não existe uma progressão linear e invariante da aprendiza-gem: embora o pensamento histórico tenda a evoluir com aidade, há crianças de 7 anos que, em contextos específicos,manifestam um grau de elaboração mental semelhante às de14 anos, e vice-versa (PORTUGAL, 2001, p. 87).

Essa compreensão de que os estágios de desenvolvimento não sãoestanques, mas que pode haver uma variação dos níveis e manifestaçõesde aprendizagem dentro da mesma faixa etária ou similares em faixasetárias diversas, supera a visão estagnada da psicologia do desenvol-vimento, é fruto de pesquisas sobre as ideias históricas de crianças e jovens e será aprofundada ao se tratar das narrativas, especialmente desua produção pelos alunos, no capítulo 7.

 As Diretrizes Municipais de Ensino de História de Araucária  par-tem do pressuposto de que, para o ensino de história, o aluno deve serentendido “como sujeito da própria história, partindo daquilo que é

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significativo para sua vida em sociedade, levando-se em consideraçãoo que ele pensa, sabe e se preocupa, bem como a sua participação narealidade social” (ARAUCÁRIA, 2004, p. 78).

 As concepções de criança, jovem e adulto no processo ensi-no-aprendizagem dos documentos oficiais citados transitam entre umavisão depreciativa de sujeitado a uma visão, até certo ponto, romantiza-da de “sujeito da própria história”. Qual seria então a concepção maisaproximada do real possível? Não é pretensão responder a esta questão,mas é necessário apresentar algumas pistas de reflexão sobre essa crian-ça, esse jovem e esse adulto e suas experiências de relação com o saberna escola e com o processo ensino-aprendizagem.

Crianças, jovens e adultos como sujeitos deexperiências humanas no tempo

Para fundamentar a compreensão dessa criança, desse jovem e desseadulto, estudante ou aluno, recorre-se aos estudos da filosofia da históriae da sociologia da educação. Mais especificamente de Thompson (1981)com a categoria histórica da experiência humana no tempo, de Dubet

(1994) com a categoria da experiência de escolarização, de Dubet eMartuccelli (1997) com a categoria da experiência da ação e de Charlot(2000) com a categoria da experiência de relação com o saber.

Thompson (1981) nos auxilia a compreender a criança, o jovem e oadulto como pessoas que vivenciam experiências cotidianas, em suas famí-lias, na rua, no bairro, no trabalho, na escola, na igreja, na internet e nosmais diversos grupos sociais de que participam. Ele define a experiência  

como sendo humana , em que homens e mulheres são sujeitos que:[...] experimentam suas situações e relações produtivas deter-minadas como necessidades e interesses e como antagonismos,e em seguida “tratam” essa experiência em sua consciência esua cultura  [...] das mais complexas maneiras [...] e em segui-da [...] agem, por sua vez, sobre a sua situação determinada(THOMPSON, 1981, p. 182).

Todas as experiências são “tratadas”, elaboradas, na consciência ena cultura. Portanto, a experiência das crianças, jovens e adultos na es-cola também é elaborada em sua consciência, seja essa experiência boa,ruim, de sucesso, de fracasso, individual ou grupal, de aceitação ou de

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Capítulo 3

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rejeição, prazerosa ou sofrida. Thompson também nos ensina que essaexperiência é singular ou de grupo. Quando de grupo, singular dentrodo grupo e deve ser tomada dentro de seus limites, diferenciados para

cada pessoa (1981, p. 16).Sobre a elaboração da experiência na consciência, Thompson afir-

ma que ela surge espontaneamente nas relações sociais de homens emulheres, no caso, na experiência escolar de crianças, jovens e adultos,mas não sem a intencionalidade deles, que reflete sobre o que acontecea eles e ao seu mundo, ou seja, é racionalizada por eles.

Essa reflexão das crianças, jovens e adultos sobre a sua realidade,

e notadamente sobre a realidade escolar, provoca mudanças que origi-nam a experiência modificada, que é determinante, pois exerce pressõessobre a consciência social existente e sobre suas relações sociais, propõenovas questões e proporciona grande parte do material sobre o qualse desenvolvem os exercícios intelectuais mais elaborados. No caso, osexercícios intelectuais mais racionalizados sobre o ensino, a escola e aeducação que exercem pressão sobre a família, a comunidade escolar, obairro e a sociedade como um todo (THOMPSON, 1981, p. 16).

Os estudos de Thompson, ao considerarem a “experiência hu-mana”, gerada na “vida material”, contribuem para avançar no en-tendimento de que há uma relação dinâmica entre o “ser social” e a“consciência social”, superando a visão da determinação unilateral daestrutura sobre o sujeito. Para exemplificar essa relação dinâmica entresujeito e estrutura, ele recorre à relação entre o sujeito e sua cultura eaos valores culturais em que está inserido (1981, p. 189). Esse conceitonos permite inferir que crianças, jovens e adultos, em sua relação com

a escola, não são nem sujeitos totalmente passivos, nem totalmente ati-vos. Estabelecem uma relação histórica, situada, cultural e dinâmicacom a escola, por vezes como sujeitos, outras como sujeitados.

A escola como lugar privilegiado de experiência decrianças, jovens e adultos com o conhecimento

 A categoria da experiência de Thompson – quando relacionadaaos estudos de Dubet (1994) sobre a sociologia da experiência, e aosestudos de Dubet e Matuccelli (1997) sobre a sociologia da experiência

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escolar – auxilia a compreender a escola como lugar privilegiado deexperiência de crianças, jovens e adultos com o conhecimento.

Desenvolvendo estudos em comunidades de jovens, de trabalha-

dores e em escolas, com o auxílio de categorias da antropologia e da his-tória, Dubet (1994) constatou uma heterogeneidade de manifestaçõesde princípios e de fenômenos culturais, que formam uma unidade nadiversidade. Isso porque a experiência humana se constitui nas relaçõescom as outras pessoas por meio do trabalho, do estudo, do lazer, daconvivência familiar, das relações com a natureza e o meio.

Essa experiência, para Dubet (1994), é complexa, individual ecoletiva, e ocorre dentro das relações sociais de produção material eimaterial, que se manifestam simbolicamente na consciência e se ex-pressam a partir de fenômenos culturais. Fenômenos esses em que osujeito estabelece uma separação entre ele e o sistema social, construin-do historicamente um conjunto de imagens, linguagens, significados,símbolos e elementos à luz da cultura da sociedade e do tempo em quevive. Assim, a experiência constitui-se na construção, por meio de ope-rações cognitivas, de códigos de conduta social próprios, que ele chama

de lógicas de ação.Em relação aos alunos, um exemplo de lógica de ação é a manei-

ra com que eles lidam com a realização das atividades escolares, tantoem sala de aula, quanto àquelas direcionadas para serem realizadas emcasa. O professor, ao acompanhar sistematicamente esse processo, logoidentifica a lógica de ação que seus alunos desenvolvem no campo daexecução dessas tarefas. E mais, adaptam sua lógica de ação às lógicasde ação dos colegas – recorrendo-lhes nas dificuldades – e às do profes-

sor, percebendo rapidamente seu modus operandi  no encaminhamento,no acompanhamento e na valoração das atividades propostas.

Segundo Dubet (1994), a criança, o jovem e o adulto realizam essaexperiência de construção de códigos de conduta social em uma relaçãocom a cultura, pois dela eles incorporam – pela consciência – uma sériede códigos, símbolos, palavras e ideias para identificar objetos e sentiremoções que nela preexistem. Essa é a porta de entrada do autor paraestudar a experiência escolar, já que aqueles elementos que a culturadisponibiliza dentro da escola constituem-se na cultura escolarizada epermitem a experiência escolar.

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Capítulo 3

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E a escola? Como Dubet entende a escola?

Para Dubet (1994), a escola não é mais uma instituição com umafunção social definida de educar, selecionar e socializar, como constata-

do pela sociologia funcionalista. Tampouco é uma instituição ajustadapara reproduzir as expectativas da sociedade como compreendia a socio-logia da reprodução social. A massificação da escolarização desajustoua escola, relativizou o seu valor. Trata-se da sucumbência do modelo deorganização da escola com a função de institucionalizar valores, pois aeducação escolar não é apenas um espaço de reprodução, mas tambémde produção, apontando para os atores da escola como construtores desua própria experiência  (p. 170-181).

Dubet e Martuccelli (1997) questionam o que a escola fabrica(produz) e constatam que esta se parece cada vez mais com um mer-cado do que com uma instituição, em que há uma competição entreos diversos atores, os quais, por meio de diversas estratégias, estão embusca de qualificações cada vez mais raras, submetendo a importân-cia social das filosofias e valores educativos às expectativas e promes-sas advindas do êxito escolar. Quanto ao “produto” da escola, ela não

fabrica mais, de forma harmônica, atores e sujeitos que desempenhampapéis preestabelecidos e predefinidos na sociedade. Os papéis a seremdesempenhados – e a própria noção de papel – passam a ser redefini-dos, construídos a partir da experiência, pois os estudantes buscamuma formação que os capacite a programar e conduzir suas experiên-cias de aprendizado, não mais se submetendo à aprendizagem de pa-péis definidos e sucessivos (p. 13-14).

É possível cruzar essa visão dos sociólogos franceses com a concep-

ção de literacia histórica de Lee que, ao propor dotar os alunos de umaestrutura utilizável do passado, conclui que “diferentes alunos sairão daescola com diferentes estruturas” (2006, p. 147), pois a experiência deescolarização é singular, mesmo que em grupo.

Dubet e Martuccelli (1997) constatam que a escola era considera-da como uma instituição que transformava valores coletivos em perso-nalidades individuais, a socialização podia ser essencialmente concebi-da como um processo de interiorização de normas e valores. Assim foiconsiderada pela sociologia clássica, que postulava a identidade do atore do sistema. Se, no entanto, se admite que a integração das diversas

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“funções” da escola já não serve, o processo de socialização, especial-mente em sua dimensão de subjetivação, deve ser estudado na ativi-dade dos atores que constroem sua experiência escolar e enquanto são

formados por ela.Essa capacidade que os estudantes possuem de elaborar sua expe-

riência faz com que as crianças, os jovens e os adultos se socializempara além de uma inculcação  cultural, para além de uma visão ede uma experiência única do mundo social, mas sim diversa, semuma regulação dos papéis e das expectativas escolares. Isso força atransformação do espaço e do tempo escolar em um lugar onde asexperiências são construídas ao vivo pelos atores presentes (DUBET;

MARTUCCELLI, 1997, p. 63).É a manifestação e a vazão da vertente subjetiva do sistema escolar,

ou seja, a constatação de que os estudantes combinam e articulam as ló-gicas da integração da cultura escolar, as lógicas e estratégias do merca-do e o manejo subjetivo dos conhecimentos e das culturas que portama cultura escolar e o mercado. A educação passa da inculcação da escolaregulada a um processo de autoeducação, em que os atores trabalham

sobre si mesmos, se socializam por meio das diversas aprendizagens ese constituem como sujeitos em sua capacidade de administrar suasexperiências (DUBET; MARTUCCELLI, 1997, p. 14).

Conforme Dubet e Martuccelli, por esse trabalho sobre si mesmo,a criança, o jovem e o adulto não são somente atores sociais, mas sãotambém sujeitos: a formação desses sujeitos participa plenamente desua socialização, o que refuta a concepção da socialização como umaclonagem (1997, p. 62-63).

O processo de formação subjetiva não se realiza somente na es-cola, na relação pedagógica com professores e colegas, mas ocorre deforma mais ampla, envolvendo uma multiplicidade de relações e deesferas de ação. Os alunos são, ao mesmo tempo, alunos e crianças,alunos e adolescentes, alunos e jovens. Aprendem a crescer em todasessas dimensões de sua experiência. Esse aprendizado não se restringesomente ao ambiente escolar, amplia-se para além da escola, em queos alunos administram as amizades e os amores infantis e juvenis, osentusiasmos e as tristezas, os fracassos e os êxitos, a vida real e virtual,que são dimensões de uma mesma experiência que se transforma e que

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Capítulo 3

Fundamentos e Metodologia do Ensino de História

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tem participação na formação dos indivíduos, assim como as apren-dizagens escolares que são apenas parte dessa experiência. Essa forma-ção em etapas tem modulações diversas, segundo a posição no siste-

ma e segundo diversas situações sociais dos atores escolares (DUBET;MARTUCCELLI, 1997, p. 14).

Para compreender o que “fabrica” e produz a escola, é necessáriocompreender como se constrói a subjetividade de indivíduos, como se dáesse trabalho de construção da subjetividade na experiência. Essa com-preensão deve ser o mais objetiva possível para que a escola possa ampliaro entendimento sobre a subjetividade que hoje escapa de seu controle,ainda que “fabricada” em seu seio. Dubet e Martuccelli (1997, p. 14-15)

chamam a atenção para um fenômeno que vem ocorrendo na constru-ção da subjetividade dos alunos. Se antes a escola tinha certo controle eregulava essa construção, fazendo-a surgir naturalmente no processo declonagem educativa , hoje, com a influência dos diversos públicos esco-lares e das diversas subjetividades presentes na escola, esta já não tem maiso domínio sobre a construção das subjetividades dos alunos, ficando cadavez mais perceptível que eles se constroem ao largo e contra a escola.

 Assim como a família teve sua importância diminuída na formaçãodas subjetividades de crianças, jovens e adultos com o advento da univer-salização da escolarização e da televisão, escola e família veem diminuirainda mais a sua importância com o advento do mundo virtual na forma-ção das subjetividades. Isso aumenta a importância das disciplinas, comohistória, em atualizarem seus objetivos e contribuírem com a instrumen-talização para orientação de crianças, jovens e adultos na vida presente.

Experiência antropológica de relação com o saber Até aqui fica evidente que a experiência humana pode ser enten-

dida como processo em que homens e mulheres tornam-se sujeitos emsuas relações produtivas, afetivas, culturais e axiológicas. A escola podeser definida como um lugar social, mas não o único, da experiência dosatores escolares: crianças, jovens e adultos. Essa experiência tem umadimensão subjetiva na ação dos sujeitos no processo de socialização pelaexperiência vivida na escola e nos demais ambientes de experiência dossujeitos. No entanto, como se dá essa experiência de relação com o co-nhecimento, ou seja, a experiência de relação de sujeitos com o saber?

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Nos estudos de Charlot (2000), sobre a experiência antropológi-ca de relação com o saber, é possível buscar alguns elementos para oentendimento da experiência de relação do sujeito com o conhecimen-

to ou com o saber. Nesses estudos, o autor propõe o desenvolvimentoda sociologia do sujeito por meio de diálogos com a sociologia da ação,filosofia, psicologia, antropologia e linguística.

Charlot (2000, p. 9) parte de questões do âmbito da experiência es-colar para investigar as relações com o saber. Parte da questão sociomidia-tizada  e ideologizada  do fracasso escolar. No entanto, diferentementedos que o antecederam em estudos sobre essa temática, não busca enten-der o fracasso escolar em si, nem busca suas causas na reprodução social

das classes sociais. Seu objetivo é compreender os alunos como sujeitosem situação de fracasso. Além disso, compreender como esses sujeitos,os alunos enquanto crianças, jovens e adultos – especialmente de classesmenos favorecidas que formam a maioria dos atores da escola fundamen-tal em nosso país –, se relacionam com o saber e com a escola.

O fracasso escolar é uma noção-encruzilhada que permite muitosdebates: sobre o aprendizado, sobre a eficácia dos docentes, sobre o ser-

viço público, sobre a igualdade das oportunidades sociais, sobre os mo-dos de vida, sobre o trabalho na sociedade de amanhã e sobre as formasde cidadania. Não é essa a porta de entrada para investigar a questãopedagógica da experiência de relação com o saber, pois seria partir daconstatação ideologizada e generalizada da desigualdade social ou daineficácia pedagógica dos docentes. A porta de entrada para entenderas experiências de relação com o saber é o aluno enquanto sujeito emsituação de fracasso (CHARLOT, 2000, p. 14).

Existem alunos que não conseguem acompanhar o ensino que lhesé dispensado, que não adquirem os saberes que supostamente deveriamadquirir, que não constroem certas competências, que não são orientadospara a habilitação que desejariam, alunos que naufragam e reagem comcondutas de retração, desordem e agressão (CHARLOT, 2000, p. 16).

O fracasso escolar não existe enquanto entidade concreta, comoobjeto de investigação. Um conjunto de fenômenos pode ser assimconceituado. O que é possível investigar são “alunos fracassados, situa-ções de fracasso, histórias escolares que terminam mal” (CHARLOT,2000, p. 17), que estatística e hierarquicamente são posicionados de

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Capítulo 3

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acordo com suas diferenças em relação aos alunos que têm êxito, realça-das e justificadas pelas diferenças sociais, na perspectiva de deficiências,da falta de algo.

O fracasso escolar vai muito além de diferenças estatísticas e dife-renças sociais, têm várias dimensões:

É também uma experiência que o aluno vive e interpreta eque pode constituir-se em objeto de pesquisa. [...] designa: assituações nas quais os alunos se encontram em um momentode sua história escolar, as atividades e condutas desses alunos,seus discursos. [...] que [...] traz a marca da diferença e da falta:ele encontra dificuldades em certas situações, ou orientaçõesque lhe são impostas, ele constrói uma imagem desvalorizada

de si ou, ao contrário, consegue acalmar esse sofrimento narcí-sico que é o fracasso (CHARLOT, 2000, p. 17-18).

Para superar as investigações sociológicas do fracasso escolar comosituação social, como diferença estatística e social e como experiênciadessa diferença, Charlot (2000, p. 18-23) aponta a necessidade de su-perar as seguintes questões:

 A criança é sujeito na construção de sua posição social ao longo●

de sua história, que é singular. Essa posição é “objetiva” e “subje-tiva”, em que a primeira é a posição social efetivamente ocupadapelos pais e pela própria criança, e a segunda é a posição socialassumida, adotada no espaço social, que pode ter lugar no pen-samento e manifestar-se no comportamento. Assim, não bastasaber a posição social dos pais e dos filhos; deve-se também in-terrogar sobre o significado que eles conferem a essa posição.

 A posição social dos filhos não é “herdada”, à maneira de●

um bem que passa de uma geração a outra por uma vontadetestamental; a posição social é produzida   por um conjuntode práticas familiares que vão desde o acompanhamento e aatenção que os pais dispensam às tarefas e atividades culturaise educacionais, ao próprio esforço e trabalho como atividadeprática, dispensado pelos filhos aos estudos e às atividades cul-turais e educativas.

 A posição escolar é uma posição específica, regida por regras●

específicas, e desenvolve-se em condições específicas de apro-priação de um saber.

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 Assim, para analisar o fracasso escolar, é necessário levar em con-sideração:

O fato de que ele “tem alguma coisa a ver” com a posição social

da família – sem por isso reduzir essa posição a um lugar em umanomenclatura socioprofissional, nem a família a uma posição; asingularidade e a história dos indivíduos; o significado que essessujeitos conferem à sua posição, à sua história, às situações quevivem e à sua própria singularidade; a sua atividade efetiva, suaspráticas; e a especificidade dessa atividade, que se desenrola (ounão) no campo do saber (CHARLOT, 2000, p. 23).

Essa constatação de Charlot, de considerar o significado que osalunos conferem à sua posição, à sua história, às situações que vivem

e à sua identidade, confluem para a necessidade constatada pelas pes-quisas de considerar o que os alunos sabem e as ideias que têm sobre osconceitos e conteúdos, de forma sistemática, no encaminhamento daintervenção pedagógica, a ser aprofundado no capítulo 4.

Desconsiderar esses pontos e, simplesmente, atribuir o fracasso es-colar à origem social e à deficiência sociocultural de crianças, jovens eadultos é, segundo Charlot, fazer uma

leitura negativa da realidade social interpretada em termosde faltas ou deficiências. Faz-se necessário uma inversão nes-ta leitura, ou seja, a análise da relação com o saber implica[...] uma leitura positiva dessa realidade: liga-se à experiênciados alunos, à sua interpretação do mundo, à sua atividade(2000, p. 29-30).

Passar da leitura negativa à leitura positiva é fundamental, pois setrata de uma “postura epistemológica e metodológica” que, ao invés devalorizar as deficiências, carências e lacunas do aluno – pensando-o como

um objeto incompleto e contribuindo com o seu aniquilamento –, otrata como sujeito, por meio da valorização de sua situação, das ativida-des que desenvolve, do sentido que dá às atividades e situações de apren-dizagem e às relações com os outros (CHARLOT, 2000, p. 30).

Uma maneira metodológica de valorizar a criança, o jovem e o adul-to no processo de ensino de história, como será proposto no capítulo 7,é por meio da construção de narrativas pelos alunos, para que possamcompreender e articular suas experiências passadas de forma positiva, nosentido de uma orientação presente balizada pelas expectativas de umfuturo melhor.

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Capítulo 3

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Para fazer essa inversão de uma leitura negativa para uma leiturapositiva da situação de fracasso escolar, Charlot (2000, p. 33) propõe odesenvolvimento de uma sociologia do sujeito, pois considera o aluno

um sujeito, mesmo que sujeitado, já que é uma criança, um jovem, umadulto, um ser humano em relação com outros seres humanos, tambémsujeitos, portadores de desejos e movidos por eles.

O aluno é um ser social, com família, posição social, relações so-ciais. É um ser singular, único entre a espécie humana, com sua própriahistória, sua visão de mundo, e que dá um sentido a esse mundo, à po-sição social que ocupa nele, às suas relações com os outros, à sua própriahistória, à sua singularidade.

Como ser humano, social e singular, e para agir no e sobre o mun-do, o aluno tem a necessidade de aprender a relacionar-se com os ob- jetos, com as pessoas e com o próprio conhecimento. Por isso, comosujeito, se produz ele mesmo, e é produzido, por meio da educação.

Charlot (2000, p. 46) aponta para a necessidade de uma sociologiado sujeito dialogar com a psicologia, não apenas com a psicologia dodesenvolvimento de Piaget, desenvolvida com referência na biologia

e na lógica, sem ignorar o social, mas com os estudos da psicologiainteracionista. É interessante ter como princípio que toda relação de“mim comigo mesmo” passa pela minha relação com o outro, ou seja,que considera a relação do sujeito com ele mesmo, com os outros, como social e com as contribuições e efeitos que essas relações têm na cons-trução do sujeito e do outro.

Toda relação consigo é também relação com o outro, e toda a rela-ção com o outro é também relação consigo próprio. Há aí um princípio

essencial para a construção de uma sociologia do sujeito: é porque cada umleva em si o fantasma do outro e porque, inversamente, as relações sociaisgeram efeitos sobre os sujeitos e que é possível uma sociologia do sujeito.

Reside aí, também, um princípio fundamental para compreender aexperiência escolar e para analisar a relação com o saber: a experiência es-colar é, indissociavelmente, relação consigo, relação com os outros (profes-sores e colegas) e uma relação com o saber (CHARLOT, 2000, p. 46-47).

 As crianças, os jovens e os adultos são levados pelo desejo de relaçãocom o outro e abertos para um mundo social no qual eles ocupam umlugar, uma posição, do qual são elementos ativos e só podem tornar-se 

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sujeitos efetivos na relação obrigatória com o saber, pois só por meio doaprendizado da cultura poderão apropriar-se do mundo e ingressar nomundo do conhecimento (CHARLOT, 2000, p. 57-59).

 A relação do sujeito com o saber é mais ampla do que aquilo que osujeito sabe. O que existe não é apenas o saber em si ou sujeitos que sabem,e sim sujeitos que estão em relação com o saber, em uma dinâmica ativi-dade de relações consigo mesmo e com os outros, em que o conhecimentoé resultado: de uma experiência pessoal com primazia da subjetividade, daapropriação de informações e saberes com primazia da objetividade e noconfronto com outros sujeitos em que a primazia é da intersubjetividade.O próprio saber é relação, produto e resultado da interação de conheci-

mento do mundo por um sujeito (CHARLOT, 2000, p. 61-62).O saber implica, ainda, outras relações: é construído em uma his-

tória coletiva, é validado por comunidades científicas, é produto derelações epistemológicas, é transmitido enquanto reconhecido pela so-ciedade, sendo, essencialmente, relações sociais. Dessa forma, o sabersó é apropriado pelo sujeito, só se torna uma relação significativa como saber se ele se instalar na relação com o mundo que a constituiçãodesse saber supõe.

Essa relação significativa com o saber o sujeito transfere para ou-tras relações com o mundo. Já o sujeito que não se situa em uma relaçãosignificativa com o saber, que não se apropria das relações e formas deconstrução desse saber, é levado a uma apropriação descontextualizadado saber, uma relação negativa com o saber, pouco contribuindo para asua formação, deteriorando sua relação com o mundo.

Sob esse ponto de vista, as pesquisas em educação histórica apon-

tam para um ensino de história que tenha por objetivo contribuir como aprimoramento da consciência histórica, por meio do desenvolvi-mento de uma literacia histórica.

Na perspectiva da sociologia, é compreender a dimensão epistêmi-ca  da relação do sujeito com o saber, ou seja, que ela é mais ampla doque o sujeito de saber ou daquilo que o sujeito sabe. Essa compreensãotem consequências metodológicas, teóricas e pedagógicas.

Consequências● metodológicas  porque o ponto de partidapara o desenvolvimento de uma metodologia de ensino passaa ser a relação com o saber, e não o saber ou o sujeito.

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Capítulo 3

Fundamentos e Metodologia do Ensino de História

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Consequências● teóricas, pois o saber passa a ter sentido e valorpara além do próprio saber, passa a ter sentido e valor como saberem relação: de produção, de apropriação e de movimentos objeti-

vos e subjetivos que produz no sujeito, tanto nas relações consigomesmo, como nas relações com o mundo e com os outros.

Consequências● pedagógicas, já que o saber é relação, “o processoque leva a adotar uma relação de saber com o mundo é que deveser o objeto de uma educação intelectual e, não, a acumulação deconteúdos intelectuais” (CHARLOT, 2000, p. 64).

No caso específico do ensino de história, a compreensão da dimen-são epistêmica do saber é uma das vertentes da literacia histórica: com-preender como a história foi reconstruída. Já a compreensão do saberhistórico como saber em relação se expressa na concepção dos conteúdossubstantivos e de segunda ordem, em que os conteúdos de segunda or-dem são específicos da relação do saber histórico com os conhecimentosespecíficos do processo de produção da ciência histórica, conceitos queserão aprofundados no capítulo 5.

Outra contribuição relevante de Charlot (2000, p. 72) em seus estu-

dos sobre a relação do sujeito com o saber refere-se à compreensão do quese trata de uma relação de identidade com o saber, caracterizada comosendo a dimensão do aprender referenciado no sujeito, em sua história, emsuas expectativas, em sua concepção de vida, em suas relações com os ou-tros, na imagem que tem de si mesmo. A dimensão da identidade conferesentido ao aprender, com reflexos na construção da imagem que o sujeitoconstrói de si na relação com os outros e com o saber.

Crianças, jovens e adultos aprendem para conquistar sua indepen-

dência e para tornarem-se alguém. O sucesso escolar lhes traz segurançae age como um reforço narcísico. O fracasso provoca estragos na relaçãoconsigo mesmo, podendo levar à depressão, à dependência química, àviolência, inclusive à violência suicida. É possível ser alguém através dasdiferentes figuras do aprender, mas a sociedade e a escola impõem a fi-gura do saber-objeto como passagem obrigatória para que o sujeito sejaalguém. No entanto, toda relação com o saber comporta uma  dimensãorelacional, que é parte integrante da  dimensão identitária .

Outra dimensão da relação com o saber apontada por Charlot (2000,p. 73-74) é a dimensão social. A relação com o saber se dá por meio de

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um sujeito em relação com o mundo e com os outros, um mundo es-truturado por relações sociais. A relação com o saber é social não apenasno aspecto da posição social, mas também em relação à história. Para

compreender a relação de um indivíduo com o saber, deve-se levar emconsideração sua origem social, a evolução do mercado de trabalho, dosistema escolar, das formas culturais e das rupturas entre as gerações. Issoimplica em questões de método quanto à análise da relação com o saberque, enquanto relação social, deve ser feita através da análise das dimen-sões epistêmica e identitária e não independentemente, ocupando-se dehistórias sociais e modos de apropriação do mundo, superando o estudoapenas de posições ou trajetórias sociais e o modo de acesso a elas.

 A análise das dimensões epistêmicas, identitárias e sociais das rela-ções com o saber remetem à seguinte questão pedagógica: o que é umaaula interessante na sociedade do conhecimento?

Só é possível compreender o que é uma aula interessante enten-dendo as relações com o saber. Para Charlot (2000, p. 73), “uma aula‘interessante’ é uma aula na qual se estabeleça, em uma forma especí-fica, uma relação com o mundo, uma relação consigo mesmo e umarelação com o outro”, ou seja, em que estejam imbricadas e haja um

respeito às relações epistêmicas, identitárias e sociais que os sujeitosestabelecem com o saber.

Charlot define a relação com o saber, construída em relações so-ciais de saber, como

[...] o conjunto das relações que um sujeito mantém com umobjeto, um “conteúdo de pensamento”, uma atividade, umarelação interpessoal, um lugar, uma pessoa, uma situação, umaocasião, uma obrigação, etc., ligados de uma certa maneira

com o aprender e o saber; e, por isso mesmo, é também relaçãocom a linguagem, relação com o tempo, relação com a açãono mundo e sobre o mundo, relação com os outros e relaçãoconsigo mesmo enquanto mais ou menos capaz de aprendertal coisa, em tal situação (CHARLOT, 2000, p. 81).

Da teoria para a prática A sociologia da experiência desperta no professor a necessidade de

considerar a história de cada aluno como sendo singular. Mesmo que em

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Capítulo 3

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sala o professor tenha de trinta a quarenta alunos, cada um tem uma his-tória de experiências que marcaram sua vida e devem ser consideradas emsala de aula. A mudança começa pela chamada, em que é preferível que

os alunos sejam chamados pelo seu nome, que resume a sua história.Essa singularidade histórica também ocorre em relação à cons-trução da identidade dos alunos. Em um processo dialético subjeti-vo-objetivo, interiorizando as experiências da vida e as experiênciasescolares, os alunos desenvolvem suas lógicas de ação, seus submo-dos diante das situações. O professor também pode desenvolver umolhar antropológico para compreender esses modos, essas lógicas deação de seus alunos, e contribuir para lapidá-los em um processo de

diálogo e paciência.Cada aluno desenvolve, ainda, suas lógicas de ação epistemológica,

ou seja, são também singulares nas formas de relacionar-se com o saber.O professor que consegue prestar atenção a essas lógicas dos alunospotencializa seu aprendizado propondo atividades que permitam a elesexpressarem-se na perspectiva de seus submodos. No caso do ensino dehistória, ao solicitar que elabore um texto ou uma narrativa, o mesmopode ser em forma de crônica, diálogo, poesia, letra de “rap”, história

em quadrinhos, desenho, oral, ou outra forma possível, pois cada alunotem uma lógica de ação ao expressar o que aprendeu.

Síntese

Neste capítulo vimos que crianças, jovens e adultos vivem experiên-

cias humanas, ou seja, processos em que se tornam sujeitos em suasrelações produtivas, afetivas, culturais, axiológicas e de relação com oconhecimento. Essas experiências provocam e alimentam a reflexão,produzem mudanças conceituais e permitem relações dinâmicas entreos sujeitos e as estruturas que se manifestam pela relação com a culturae os valores da sociedade em que estão inseridos.

 As experiências humanas de crianças, jovens e adultos ocorremnas relações sociais, dentre estas, nas escolas, ou em outros lugareseducativos, lugares de experiências de relação com o saber, onde sãosujeitos, não importa sua situação ou posição social. Nas experiências

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de relação com o saber, crianças, jovens e adultos são sujeitos comações subjetivas, em relações com outros seres humanos, também su- jeitos com ações subjetivas.

Nas experiências de relação com o saber, crianças, jovens e adul-tos são seres humanos singulares, únicos entre a espécie humana, comsua própria história e visão de mundo, que dão um sentido a essemundo, à posição que ocupam nele, às suas relações com os outros,às suas próprias histórias, às suas singularidades e às suas experiênciasde relação com o saber.

 As experiências de relação com o saber são condição humana,portanto, crianças, jovens e adultos tornam-se sujeitos de seu processode humanização em suas relações com o saber pela educação. A hu-manização por meio da relação com o saber é tanto mais humanizantequanto mais significativa for.

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Os documentos oficiais consultados, PCN, Currículo Nacional

de História de Portugal  e as Diretrizes Municipais de Ensino de Históriade Araucária , enfatizam a importância de se considerar os conhecimen-tos que as crianças, jovens e adultos já possuem sobre o saber a ser estu-dado. Direta ou indiretamente, eles tomam por base as pesquisas doprojeto norte-americano “How People Learn” – HPL (como as pessoasaprendem)4, trazido para as pesquisas em educação histórica por Lee(2006) que, na Inglaterra, desenvolveu investigações que contribuírammuito para que as ideias históricas que crianças, jovens e adultos trazem

para a escola sejam sistematicamente incorporadas ao processo de inter-venção pedagógica, um dos pilares da cognição histórica situada.

Neste capítulo pretende-se fazer uma aproximação dessas pesqui-sas que incorporam na intervenção pedagógica os conhecimentos ou asideias históricas que as crianças, jovens e adultos já possuem, pesquisasque já extrapolaram a Inglaterra e estão sendo feitas em vários paísesmundo afora, inclusive no Brasil, onde Fernandes (2008) desenvolveua Unidade Temática Investigativa, que será aqui aprofundada.

As ideias históricas de crianças, jovens e adultosnos documentos oficiais e nas pesquisas

O exposto no capítulo 3 permite partir do pressuposto de quecrianças, jovens e adultos, em suas relações com o saber histórico, são su- jeitos dessa relação, pois têm ideias históricas prévias e reelaboram essas

4 O volume Como aprendem as crianças , de Stella Vosniadou (2001), pode ser lido na versãotraduzida para o português no link : <http://www.ibe.unesco.org/publications/EducationalPracticesSeriesPdf/prac07p.pdf>.

Investigação de ideias

históricas de crianças, jovens e adultos 4

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ideias na relação com o saber histórico escolarizado. Faz-se necessárioaprofundar a importância da investigação das ideias históricas de crian-ças, jovens e adultos, visando torná-los ainda mais sujeitos do processo

de aprendizagem histórica, pois, não o fazendo, corre-se o risco de estarsujeitando-os no processo e de não compreender seus atos de rebeldiaa esta sujeição.

Para aprofundar a necessidade de investigação das ideias históricasde crianças, jovens e adultos como fundamento do ensino de história,primeiro será feita uma análise do tratamento dispensado à temáticapelos documentos oficiais para, em seguida, confrontá-los com as pes-quisas e fundamentações teóricas, com o objetivo de apontar os cami-

nhos e possibilidades que apresentam.Os PCN de história, em suas orientações didáticas, apresentam

três sugestões sobre as ideias que os alunos já possuem, sugerindo acriação de momentos de troca de informações sobre estas ideias, sendonecessário o aprofundamento e as pesquisas sobre formas e métodos deinvestigação e valorização delas. As orientações dos parâmetros curricu-lares são as seguintes:

valorizar, inicialmente, os saberes que os alunos já possuem●

sobre o tema abordado, criando momentos de trocas de infor-mações e opiniões;

avaliar essas informações, identificando quais poderiam enri-●

quecer seus repertórios e suas reflexões;

propor novos questionamentos, informar sobre dados des-●

conhecidos e organizar pesquisas e investigações (BRASIL,

1998, p. 53).O Currículo Nacional de História de Portugal  trata os conhecimen-

tos que os alunos já possuem como ideias tácitas, reconhece que os alu-nos já vêm para a escola com ideias históricas mais ou menos adequadasou mais ou menos fragmentadas, construídas em suas experiências devida familiar e de relação com os meios de comunicação. Sua exploraçãoe desenvolvimento pela escola é parte integrante das referências funda-mentais do documento, sendo pressuposto do ensino de história:

O saber constrói-se a partir das vivências dentro e fora da escola:o meio familiar e os media (meios de comunicação) fornecem

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Capítulo 4

Fundamentos e Metodologia do Ensino de História

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aos alunos ideias mais ou menos adequadas, mais ou menosfragmentadas sobre a história. Compete à escola explorar essasideias tácitas e ajudar o aluno a desenvolvê-las numa perspectivade conhecimento histórico (PORTUGAL, 2001, p. 87).

 As Diretrizes Municipais de Ensino de História de Araucária  foramelaboradas em meio a um processo de pesquisa dos professores sobreos conhecimentos prévios, nome dado às ideias históricas tácitas dealunos. As angústias e as perspectivas apontadas pelas pesquisas foramrefletidas no texto das diretrizes:

 Assim, uma das alternativas é a pesquisa e sistematização queestá ocorrendo no município em relação ao trabalho com osconhecimentos prévios. Nesse sentido, têm surgido muitasproduções, mas também muitas dúvidas, tais como: a dificul-dade do professor em privilegiar os conteúdos, a partir dosconhecimentos prévios; como considerar o conhecimentoprévio como construção do conhecimento escolar, como con-siderar o conhecimento prévio e transformá-lo na intervençãopedagógica (ARAUCÁRIA, 2004, p. 80).

Entre os estudiosos da didática e da prática de ensino de históriatambém há uma compreensão de que os conhecimentos prévios são

importantes no processo de ensino-aprendizagem. Fonseca (2005) par-te da comparação com a escola tradicional para enfatizar que hoje osalunos são sujeitos do processo ensino-aprendizagem. Diz ainda que:

Os alunos são pessoas que têm histórias de vida diferentes, cul-turas e valores diversos. Por isso, não são mais considerados nosingular, meras “tábulas rasas”. Seus conhecimentos prévios,seus interesses, suas motivações, seus comportamentos e suashabilidades são importantes contribuições não apenas comoponto de partida, mas como componentes de todo o processo

educativo. Como sujeitos, os alunos não apenas contribuem,mas participam, negociam, constroem, interagem ativamen-te com os outros alunos, os professores e o conhecimento(FONSECA, 2005, p. 103).

Se os conhecimentos prévios ou as ideias que os alunos trazempara a escola são importantes como pontos de ancoragem do processoensino-aprendizagem e, mais que isso, devem ser integrados ao proces-so, qual o método a ser utilizado para alcançar este objetivo?

 As pesquisas do projeto norte-americano “How People Learn”–HPL (como as pessoas aprendem), constituem-se como um marco de

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mudança epistemológica quanto à consideração das ideias de quemaprende no processo ensino-aprendizagem. No ensino de história, PeterLee (2006), na Inglaterra, incorporou em suas pesquisas a prática de

investigar as ideias históricas que crianças, jovens e adultos trazem paraa escola, propondo que fossem sistematicamente incorporadas ao pro-cesso de intervenção pedagógica. Essa prática tornou-se um dos pilaresdo ensino de história na perspectiva da educação histórica, denominadade cognição histórica situada.

Barton (2001), ao investigar as ideias de crianças norte-americanase irlandesas do norte sobre a mudança através dos tempos, enfatizaque temos de ter uma ideia da situação dos alunos quando chegam até

nós. Se não os compreendermos, nossa mensagem não os atinge, é alie-nante. As crianças buscam entender a informação histórica ainda muitonovas, por meio de toda fonte de informação que chega até elas, masprecisamos conhecer a sua compreensão. Especificamente, em relação àcompreensão da mudança, o autor afirma que

as crianças compreendem que as coisas mudaram, mas te-mos de lhes perguntar como mudaram. A partir daí, tere-mos uma imagem mais alargada das suas ideias históricas, eo modo como aprendem a história é afetado por essas ideias

(BARTON, 2001, p. 55-56).

Ideias históricas de crianças, jovens e adultos naUnidade Temática Investigativa

 Aqui no Brasil, em um estudo desenvolvido no Programa de De-senvolvimento da Educação – PDE, da Secretaria de Estado da Edu-cação do Paraná, em parceria com o Programa de Pós-graduação emEducação da UFPR, Fernandes (2008, p. 2) desenvolveu o conceito deUnidade Temática Investigativa , a partir do texto “Aula oficina: doprojeto à avaliação”, de Barca (2004), buscando responder às seguintesquestões: como reconstruir a aula de história para que sejam valo-rizadas as ideias históricas dos alunos? Como fazer isso para que aaprendizagem da história tenha mais sentido para os alunos?

Nesse estudo de Fernandes, a investigação das ideias históricas

dos alunos não ficou isolada como um simples ponto de partida, maspassou a integrar uma Unidade Temática Investigativa, que teve seuselementos assim definidos:

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Capítulo 4

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definição de temática de estudo, conforme diretrizes curri-culares; ideias históricas iniciais dos alunos sobre a temáticadefinida; categorização, análise e problematização das ideiasiniciais para balizar a intervenção pedagógica do professor;

a intervenção pedagógica; a produção da comunicação daaprendizagem pelos alunos e aplicação/análise de instrumentode metacognição (FERNANDES, 2008, p. 3).

O detalhamento desses elementos da investigação das ideias histó-ricas que os alunos trazem para a sala de aula, propostos por Fernandessob forma de Unidade Temática Investigativa, será ilustrado a seguircom um exemplo extraído do trabalho de Talamini (2007).

Definição da temática a ser trabalhadaEssa definição se dá com base no currículo em que a escola está

circunscrita (município, estado, país ou escola particular, ou seja, osPCN, as diretrizes curriculares estaduais, municipais ou locais) e peloplanejamento do professor. A investigação das ideias históricas préviaspassa a compor o planejamento normal de aulas, mas muda a forma ea qualidade da intervenção pedagógica, da avaliação, da continuaçãodo processo de ensino de história e dos resultados, tanto para os alunos

como na concepção do professor em relação a esse processo.No trabalho de Talamini (2007), a temática curricular trabalhada

foi História do lazer em Araucária .

Planejamento de perguntas para investigar osconhecimentos prévios dos alunos

Uma vez definida a temática, é necessário criar um instrumento

para que os alunos expressem suas ideias históricas prévias. Esse ins-trumento pode ser em forma de questões que devem estar relacionadasà importância dos objetivos do ensino, possibilitando ao professor co-nhecer as ideias prévias dos alunos, relacionadas com a temática a sertrabalhada. Se essas perguntas não estiverem relacionadas aos objetivosespecíficos do ensino, permitirão respostas divagantes, dificultando otrabalho do professor, bem como podem tornar-se contraproducentes.

 A investigação dos conhecimentos prévios também pode disporde outros instrumentos, como desenhos, análise de uma estória emquadrinhos ou de pequenos textos. Ainda, é possível trabalhar por meio

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da “chuva” de ideias, em que se apresenta aos alunos alguns conceitos esolicita-se que eles escrevam um certo número de palavras que, segundoeles, estejam relacionadas ao conceito apresentado.

Essa diversificação atende à diversidade de dimensão de relaçõescom o saber de crianças, jovens e adultos. No entanto, as pesquisas têmrevelado que a elaboração do instrumento de investigação das ideiashistóricas prévias é decisivo na qualidade das informações reveladas pe-los alunos por meio do mesmo.

Exemplo de perguntas para investigar os conhecimentos históricos

prévios dos alunos

 Ao trabalhar a temática curricular História do lazer em Araucá-ria , e estudar o trabalho dessa temática a partir do livro didático comalunos de 2ª série do Ensino Fundamental (atual 3º ano no ensino denove anos), Talamini (2007, p. 57) elaborou as seguintes questões parainvestigar as ideias prévias dos alunos sobre essa temática:

Escreva o que é lazer.●

Escreva duas atividades de lazer que você faz.●

Você tem momentos de lazer com sua família? Quais mo-●

mentos?

Escreva e desenhe uma atividade de lazer de sua mãe e de seu pai.●

Desenhe a atividade de lazer que você mais gosta.●

Categorização dos conhecimentos prévios dos alunos,

visando sua análise e a tomada de decisão para aintervenção pedagógica

 Após colher as ideias históricas prévias dos alunos por meio deinstrumento próprio, elas devem ser categorizadas. Essa categorizaçãonão vem precedida de categorias previamente definidas, é na leitura ereleitura das respostas dos alunos que surgem as categorias que possi-bilitam a sua organização. Isso pode dar-se sob a forma dos níveis deideias expressas, da progressão de ideias, dos conceitos de tempo, lugar emudança que expressam, das lacunas de aprendizagem que apresentam,enfim, dependendo da temática, há uma gama de possibilidades de

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Capítulo 4

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categorização que vai depender da análise exaustiva das respostas dadas,com diferenciações de turma para turma.

 A categorização dos conhecimentos prévios abre um leque de pos-

sibilidades de intervenção pedagógica, cabendo ao professor, diante daanálise da categorização, tomar a decisão sobre o que lhe parece maisnecessário para a aprendizagem e definir os instrumentos e fontes his-tóricas que utilizará para alcançar os objetivos, agora reorientados pelaanálise dos conhecimentos históricos prévios dos alunos.

 A categorização é importante, pois é diagnóstica e processual, mastorna-se mais completa quando problematizada junto aos alunos, ou seja,seus resultados são apresentados aos alunos para que possam reconhecersuas respostas como fragmentos no todo. Além de se identificarem noprocesso, os alunos passam a ter uma percepção da diversidade da temá-tica e de que não há pensamento único nem restrito. Fernandes (2008)chama de conflito cognitivo o processo em que os alunos confrontam asua interpretação com as várias interpretações dadas pelos colegas.

Exemplo de categorização das ideias

Talamini resume a categorização das questões apresentadas noexemplo anterior:

 As respostas dadas foram bastante simplistas, a maior parterelacionou o lazer somente às brincadeiras das crianças. Estarealidade ficou bem clara na ideia de um dos alunos, que seexpressou assim: “Lazer é brincar de qualquer brincadeira”.Ou ainda na atividade de outra aluna que afirmou: “Lazeré brincadeira, as meninas gostam de brincar de boneca e osmeninos de carrinho”.

Quanto ao lazer dos pais, alguns alunos disseram não existir, jáque estes são adultos e adultos não brincam. A grande maioriados alunos disse que o lazer dos pais era trabalhar para susten-tar a casa (2007, p. 58).

A intervenção pedagógica

 A intervenção pedagógica refere-se à reorientação do planejamen-to da aula sobre a temática definida, lançando mão das mais variadasfontes históricas, documentos históricos, narrativas do livro didático,de visita orientada a museus e monumentos históricos, de explicaçõesdo próprio professor, memórias de pessoas mais velhas da própria

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família e comunidade dos alunos, filmes, entre outros. No entanto,a relação com os documentos escolhidos será orientada para atingiros objetivos de ensino reorientados pela análise das ideias históricas

prévias dos alunos.Questões específicas da intervenção pedagógica serão abordadas ao

se aprofundar o tratamento de documentos e fontes, método e didáticado ensino de história, nos capítulos 6, 7, e 8.

Exemplo de reorientação da intervenção pedagógica

Talamini (2007) resume a reorientação da intervenção pedagógi-ca a partir da categorização das ideias históricas prévias dos alunos daseguinte forma:

Com o resultado das análises sobre as atividades sobre os co-nhecimentos prévios dos alunos sobre o lazer, iniciou-se a in-tervenção didática que tinha como proposta ser desenvolvidautilizando-se apenas o livro didático. A ideia era verificar seeste seria suficiente e adequado à formação de novos conceitose à construção de conhecimentos pelos alunos (p. 58).

 Apesar dos exemplos contidos no livro, os alunos pareciam aindaestar confusos em relação ao termo lazer; por isso sentiu-se a ne-

cessidade de fazer uma comparação entre as atividades que as pes-soas faziam por obrigação e outras apenas por lhes serem agradá-veis, usando-se o quadro de giz para registrar essas comparações.Com esta intervenção os alunos demonstraram compreendermelhor a ideia que estava sendo construída (p. 58).

De maneira geral as atividades do livro foram bastante coeren-tes, sendo necessário apenas em alguns momentos adaptá-las àrealidade da turma, ou seja, trazendo exemplos que fossem doseu cotidiano e de suas famílias e, portanto, aproximando as

informações apresentadas pelo autor de elementos da culturados alunos. Com esta finalidade, também os autores do livropropuseram uma pesquisa a ser feita com os pais, investigandosobre o lazer que estes tinham na infância (p. 59).

Com o decorrer das aulas, a ideia de permanências e mudan-ças já estava construída, bastava apenas especificá-las, asso-ciando a discussão genérica trazida pelo livro didático comaspectos da cidade na qual a escola está situada. Para isso,foi necessário estruturar um trabalho em que se utilizou umlivro disponível na escola, Os espaços de lazer em Araucária

(1990), apenas analisando suas gravuras, já que a linguagemera demasiadamente técnica para crianças e não havia outromaterial mais acessível (p. 59).

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Capítulo 4

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A comunicação da aprendizagem como processo formalde avaliação

 Após a intervenção pedagógica, é importante permitir que o alu-

no comunique o que aprendeu. A comunicação da aprendizagem éimportante para o aluno, para que ele “expresse a sua interpretação ecompreensão das experiências humanas ao longo do tempo com inte-ligência e sensibilidade, utilizando a diversidade dos meios de comuni-cação disponíveis” (BARCA, 2004, p. 21). É importante também parao professor, pois ele poderá verificar se houve avanço na aprendizagem,se houve contribuição para mudança no nível de consciência históricados alunos, por meio da comparação das ideias prévias com as ideias

comunicadas, após a intervenção pedagógica. A comunicação dos alunos pode dar-se no mesmo instrumento

com o qual se buscou as ideias históricas prévias dos alunos, bem comode outras formas, como narrativas, desenhos, histórias em quadrinhos,charges, quadros comparativos, dramatizações ou outros instrumentosdesenvolvidas pelo professor.

Exemplo de comunicação da aprendizagem após a intervenção

pedagógica

Na atividade sobre o lazer com alunos do Ensino Fundamental,Talamini assim descreve o processo de comunicação da aprendizagemfeita com os alunos:

 Ao terminar o trabalho com o livro, foi solicitado aos alu-nos que escrevessem uma pequena narrativa contando o queaprenderam sobre as atividades de lazer no passado e nos dias

atuais. Nessa narrativa, os alunos apresentaram ideias maisamadurecidas sobre o tema lazer, e demonstraram um grandeavanço em relação à primeira atividade que foi realizada paraverificação dos conhecimentos prévios.

Para exemplificar, selecionou-se a narrativa produzida poruma aluna, que escreveu:

“Antigamente tinha umas roupas engraçadas as mulheresvestiam uns vestidos e os homens vestiam um macacão. Nos

 jogos de futebol os homens se vestiam de camiseta, gravata

e bermuda. Antes podia andar tranquilo na rua que não ti-nha pedrada e tiroteio, agora já tem violência nas pistas deskate . Antigamente as brincadeiras eram: tomar banho no rio,

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casinha, pega-pega, futebol. Hoje já tem computador, piscina,cinema. Também as roupas mudaram, não é mais vestido emacacão, agora é calça, camiseta, blusa, etc.” (2007, p. 59).

Dessa forma, Talamini faz a seguinte análise, fundamentando-a: Analisando a atividade final (narrativa), nota-se o avanço do con-ceito construído pelos alunos, principalmente no que diz respei-to à comparação e a compreensão de mudanças e permanênciasnas atividades de lazer ao longo do tempo. Quanto ao lazer dospais, ao final das intervenções os alunos já sabiam dizer: “o lazerda minha mãe é tomar chimarrão com a vizinha”, ou então “olazer do meu pai é jogar futebol com os amigos” (2007, p. 59).

Observa-se, ainda, que a aluna refere-se à tranquilidade no pas-

sado a partir de suas experiências no presente – pedradas e tiro-teios nas pistas de skate  – o que permite entender que houve umprocesso de construção do conhecimento na perspectiva indi-cada por Schmidt (2005): “Quando um jovem ou uma criançaprocura explicações para uma situação do passado à luz de suaprópria experiência, já está revelando um esforço de compreen-são histórica. Neste sentido, eles podem pensar de maneira maissimplista ou mais elaborada e o grau de sofisticação não dependesomente do grau do desenvolvimento lógico” (2007, p. 59-60).

Investigação da metacognição

 A metacognição é aquilo que está para além da aprendizagem.Investigar a metacognição é levar os alunos a pensarem sobre comoaprenderam, o que foi mais significativo na aprendizagem, o que maisgostariam de aprender sobre a temática. Especificamente no ensino dehistória, é possível incluir questões sobre como a temática contribuicom o presente e o futuro do aluno, quais conceitos ele revisou sobre o

passado e a forma com que interpreta as narrativas a que teve acesso.Didaticamente, a investigação da metacognição contribui com o

professor com indicativos do que ensinar, de como ensinar, de como osalunos aprendem, de como é a sua relação com o saber histórico.

Integrar a investigação sistemática dos conhecimentos históricosprévios na prática pedagógica do professor não é apenas um avanço narelação professor, aluno e saber no processo ensino-aprendizagem. É uma“revolução copernicana ” nessa relação. Se o bom professor, segundoPaulo Freire (2005), era o que conseguia, enquanto falava, trazer o alu-no até a intimidade do movimento de seu pensamento, agora, o bom

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Capítulo 4

Fundamentos e Metodologia do Ensino de História

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professor é aquele que, enquanto conduz o processo ensino-aprendiza-gem, consegue ir até a intimidade do pensamento de seus alunos. É aqueleque consegue conhecer, considerar e integrar, no processo ensino-aprendi-

zagem, as experiências de relação com o saber já elaboradas pelos alunos.Quem sabe seja isso que Freire estivesse vislumbrando ao dizer que:

O fundamental é que professor e alunos saibam que a posturadeles, do professor e dos alunos, é dialógica, aberta, curiosa,indagadora e não apassivada, enquanto fala ou enquanto ouve.O que importa é que professor e alunos se assumam epistemo-logicamente curiosos (2005, p. 86).

Da teoria para a prática

Incorporar a investigação dos conhecimentos históricos prévios dosalunos na prática rotineira exige do professor, de início, um esforço a maisnas suas tarefas. Sugere-se implementá-lo de forma paulatina, inicialmen-te com uma investigação anual, depois semestral, até haver certa segurançametodológica por parte do professor para que possa iniciar todas as unida-

des, fazendo o levantamento das ideias históricas prévias dos alunos.Toda mudança metodológica gera insegurança, assim, o professor

necessita de suportes para verificar se o caminho que está trilhando, omodo como está agindo, está no rumo certo. Para que possa estabelecercomparativos com outros exemplos, apresenta-se a seguir alguns textosdisponíveis on-line  e os respectivos endereços para acessá-los, que po-dem servir de contraponto, explicitação e fundamentação teórica.

BARCA, I. “Aula oficina: do projeto à avaliação”. 2004. Dis-●

ponível em: <http://www.nre.seed.pr.gov.br/cascavel/arquivos/File/historia/aula_oficina_barca.doc>.

BARCA, I. “Os jovens portugueses: ideias em história”. 2004.●

Disponível em: <http://www.perspectiva.ufsc.br/perspectiva_2004_02/07_artigo_isabel_barca.pdf>.

CAINELLI, M. “Educação histórica: perspectivas de aprendi-●

zagem da história no Ensino Fundamental”. 2006. Disponí-vel em: <http://ojs.c3sl.ufpr.br/ojs2/index.php/educar/article/view/5548/4061>.

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Síntese

Os conhecimentos prévios ou as ideias que os alunos trazem paraa escola são importantes como pontos de ancoragem do processo en-sino-aprendizagem. No ensino de história, estudiosos desenvolveramuma forma sistematizada de investigá-las e incorporá-las, denominadaUnidade Temática Investigativa, que consiste em: definir a temática aser trabalhada com base no currículo ao qual a escola está circunscrita;planejar as perguntas a serem aplicadas aos alunos com o objetivo deinvestigar as ideias históricas prévias, na perspectiva dos objetivos pla-nejados para a temática; categorizar as ideias prévias dos alunos, visan-

do sua análise e tomada de decisão para a intervenção pedagógica; aintervenção pedagógica reorientada pelas ideias prévias dos alunos; acomunicação do que o aluno aprendeu após a intervenção pedagógicacomo forma de avaliar os avanços em relação às ideias prévias; a inves-tigação da metacognição para levar os alunos a pensarem sobre comoaprenderam e o que foi mais significativo na aprendizagem.

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Neste capítulo serão aprofundadas questões relativas à nature-

za, seleção e organização dos conteúdos históricos, que são fundamen-tais para o ensino de história na perspectiva da educação histórica. À luzdesses elementos, será feita uma análise do tratamento que os PCN, oCurrículo Nacional de História de Portugal  e as Diretrizes Municipais deEnsino de História de Araucária dispensam à natureza, seleção e organi-zação dos conteúdos do ensino de história.

Quanto à natureza dos conteúdos do ensino de história, serão ana-

lisados à luz das ideias históricas substantivas, às quais os professoresgeralmente dispensam maior atenção, e das ideias históricas de segundaordem, específicas da natureza da história, das quais os professores porvezes nem se dão conta.

Quanto à seleção dos conteúdos curriculares, serão analisados na di-mensão de sua relação com a cultura e a pertinência dos critérios utilizadospara sua escolha quanto à relação com os objetivos do ensino de história.

Quanto à organização dos conteúdos, será analisada a prevalência

da organização cronológica e linear ou da organização temática, e comopromove os deslocamentos do presente ao passado e do passado ao pre-sente, em forma de recorrência histórica.

Natureza, seleção e organização dos conteúdoshistóricos na perspectiva da educação histórica

Inicialmente, serão definidos alguns conceitos e categorias desenvolvi-dos pelas pesquisas em educação histórica para analisar e confrontar a nature-za, seleção e organização dos conteúdos históricos nos documentos oficiais.

Natureza, seleção

e organização deconteúdos históricos

  5

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Em uma perspectiva cognitiva, ao investigar as ideias de crianças, jovens e adultos em relação à história e seu ensino, as pesquisas em edu-cação histórica buscam entender a natureza do conhecimento histórico.

 Além disso, como ele se estrutura no pensamento, alicerçado na filosofiada história, voltando sua atenção, entre outros, para as investigações dasideias históricas substantivas e de segunda ordem, que Collingwood(2001) caracteriza como ideias históricas, e Lee (2001) assim as define:

Existem conceitos substantivos, como agricultor, impos-tos, datas, eventos, que são muito importantes. Embora acompreensão dos conceitos substantivos seja muito importan-te, em Inglaterra começamos a ter em conta outro tipo deconceitos também, os “conceitos de segunda ordem”. É este

tipo de conceitos, como narrativa, relato, explicação, que dáconsistência à disciplina. [...] Conceitos substantivos são osque se referem a conteúdos da história, como por exemplo oconceito de indústria. Conceitos de segunda ordem são os quese referem à natureza da História, como por exemplo explica-ção, interpretação, compreensão (p. 15 e 20).

 Além dos conceitos históricos de segunda ordem relacionados porLee, acrescentamos como importantes para o ensino de história a tem-

poralidade, os marcos de mudança, as fontes históricas, a inferênciadas fontes, os documentos históricos, a narrativa histórica, a empatiahistórica, entre outros.

Considerar as ideias históricas de segunda ordem está referenciadona filosofia da história, especialmente em Collingwood (2001), quecontribui com o entendimento de que as ideias sobre o passado sãoelaboradas pelo pensamento humano. Para esse filósofo inglês,

O historiador não se limita a reconstituir o pensamento passa-

do, faz a sua reconstituição no contexto do seu conhecimento.Deste modo, ao reconstituí-lo, critica-o, forma um juízo pró-prio sobre o seu valor, corrige quaisquer erros que consiga dis-cernir nele. Esta crítica do pensamento, cuja história ele traça,não é de modo algum secundária em relação ao delineamentode sua história. É uma condição indispensável do próprio co-nhecimento histórico (COLLINGWOOD, 2001, p. 230).

Se o objetivo do ensino de história consiste em contribuir com aformação da consciência histórica e o desenvolvimento da literacia his-tórica, as ideias históricas de segunda ordem são tão importantes quantoas ideias substantivas para levar os alunos a pensarem historicamente.

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Capítulo 5

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 A questão da seleção dos conteúdos tem sido central nos estudossobre currículo, havendo nestes estudos certo consenso em torno daideia de seletividade cultural5, ou seja, que os conteúdos são selecio-

nados no interior da cultura, a partir de interesses da cultura escolar,que não está isenta das influências da cultura mais ampla em que estãoinseridos os atores protagonistas da seleção.

 Ao estudar a relação dos currículos com a cultura, Forquin (1993)desenvolveu os conceitos de seleção cultural e de cultura escolar, afir-mando que toda educação, em particular toda educação de tipo escolar,supõe sempre, na verdade, uma seleção no interior da cultura e umareelaboração dos conteúdos desta cultura, destinados a serem transmi-

tidos às novas gerações.Segundo Forquin (1993), nessa seleção cultural, a escola 

[...] transmite no máximo, algo da cultura, elementos de cul-tura, entre os quais não há forçosamente homogeneidade, quepodem provir de fontes diversas, ser de épocas diferentes, obe-decer a princípios de produção e lógicas de desenvolvimentoheterogêneos e não recorrer aos mesmos procedimentos delegitimação [...]. A cada geração, a cada renovação da peda-gogia e dos programas, são partes inteiras da herança que de-

saparecem da “memória escolar”, ao mesmo tempo que novoselementos surgem, novos conteúdos e novas formas de saber,novas configurações epistêmico-didáticas, novos modelos decerteza, novas definições de excelência acadêmica ou cultural,novos valores. Devemos assim reconhecer o grande poder deseleção da “memória docente”, sua capacidade de “esquecimen-to ativo”. Pode-se então perguntar quais são os determinantes,os mecanismos, os fatores desta seleção cognitiva e cultural quefaz com que uma parte da herança humana é assim mantida “asalvo do esquecimento” de geração a geração, enquanto que o

resto parece consagrado ao sepultamento definitivo (p. 15).Quanto à preocupação muito comum de professores em não estar

dando conta de “todo” o conteúdo de história, Forquin (1993) ponderaque esta seleção autoriza e legitima parte da cultura, pois a educaçãoescolar não consegue jamais incorporar em seus programas e seus cursossenão um espectro estreito de saberes, de competências, de formas deexpressão, de mitos e de símbolos socialmente mobilizadores.

5 Forquin constrói o conceito de seleção cultural a partir de Raymond Williams (La largarevolucion , 2003), que constata haver uma tradição seletiva da memória coletiva, um meca-nismo que permite conservar vivos certos aspectos do passado, e outros não.

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 A ideia de conteúdo como seleção da cultura permite organizá-lospor eixos temáticos, em que as temáticas são selecionadas, quebrandocom a tradição da organização cronológica e linear, que criava certa

ilusão de que seria possível ensinar “toda” história.Porém, não basta a organização por eixos temáticos. As pesquisas

em educação histórica têm evidenciado que os conteúdos que mais con-tribuem para a formação da consciência histórica e o desenvolvimen-to da literacia histórica são aqueles com os quais as crianças, jovens eadultos têm uma maior empatia, uma maior identificação, uma maiorproximidade geográfica, histórica, familiar ou cultural. Ainda, que pos-sam contribuir mais efetivamente para a orientação de sua vida prática,

sofrendo um novo processo de seleção interno, realizado pelo professor apartir da contribuição das investigações das ideias históricas dos alunos.

Outra contribuição das pesquisas em educação histórica é a ne-cessidade de se trabalhar com os conteúdos de forma multiperspecti-vada, ou seja, nas diversas perspectivas temporais, espaciais, culturais,ideológicas e científicas possíveis, permitindo a construção de visõeshistóricas diversas.

Natureza, seleção e organização dos conteúdoshistóricos nos documentos oficiais

Os conteúdos dos Parâmetros Curriculares Nacionais de História ,analisados na perspectiva das pesquisas no campo da educação históri-ca, têm um vício de origem, a ideia dicotômica de considerar o saberhistórico e sua produção como exclusividade dos especialistas, e o saber

histórico escolar como algo distante da produção do saber histórico(BRASIL, 1998).

O ensino e a aprendizagem de história envolvem uma distin-ção básica entre o saber histórico, como um campo de pesqui-sa e produção de conhecimento do domínio de especialistas,e o saber histórico escolar, como conhecimento produzido noespaço escolar (BRASIL, 1998, p. 24).

Dessa forma, fica implícito que os conteúdos do saber históricoescolar sejam uma forma mitigada  do saber histórico, fazendo com queas diretrizes nacionais brasileiras privilegiem as informações históricas,ou seja, os conteúdos substantivos. Faz-se isso com a intenção de dotar

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Capítulo 5

Fundamentos e Metodologia do Ensino de História

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os alunos de um repertório intelectual e cultural, para que possam con-frontar suas identidades e diferenças com pessoas e grupos sociais deoutros tempos e lugares, bem como integrar suas histórias individuais

na história nacional e de outros lugares.Esse documento curricular nacional não faz menção direta a con-

teúdos de segunda ordem, referindo-se apenas ao tempo histórico,mas como conceito fundamental. Segundo os PCN (BRASIL, 1998),o tempo histórico não pode limitar-se ao estudo do tempo cronoló-gico sequenciado dos calendários e datas, mas deve ser dimensionadoem toda sua complexidade, considerando também a ideia de diferentesníveis e ritmos de duração temporais, à percepção das mudanças e das

permanências nas vivências humanas. Quanto aos ritmos de duração,refere-se às contribuições da Escola do Annales, dos conceitos de tem-po do acontecimento breve, da conjuntura e da estrutura.

Os PCN (BRASIL, 1998) definem como critérios de seleção dosconteúdos para o ensino de história a tradição de ensino e a relevân-cia dos temas para o momento histórico da geração atual, ficandosubentendia certa tradição seletiva, fundada no conservadorismo e

não na cultura.Os conteúdos do ensino de história do Ensino Fundamental são

organizados pelos PCN por ciclos e eixos temáticos: no primeiro ciclo,o eixo temático refere-se à história local e o cotidiano; e no segundociclo, à história das organizações populacionais. Na seleção dos con-teúdos, há também a recomendação de privilegiar a história das ques-tões urbanas, das relações de trabalho, das diferenças sociais e das mino-rias, dos movimentos sociais, das relações do homem com a natureza,

da cidadania e das imagens e valores em relação ao corpo, sexualidade,família e questões de gênero (BRASIL, 1998).

 A forma como os Parâmetros Curriculares Nacionais  selecionam eorganizam seus conteúdos estão compatíveis com o objetivo de dotaros alunos de um repertório intelectual e cultural, para que possam con-frontar suas identidades e diferenças com pessoas e grupos sociais deoutros tempos e lugares, bem como integrar suas histórias individuaisna história nacional e de outros lugares. No entanto, pelo fato de nãotratarem dos conteúdos de segunda ordem, pertinentes ao saber históri-co, pouco podem contribuir com a formação da consciência histórica e

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Fundamentos e Metodologia do Ensino de História

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o desenvolvimento da literacia histórica dos alunos, tampouco levá-losa pensarem historicamente.

O Currículo Nacional de História de Portugal  (PORTUGAL, 2001)

não apresenta o vício de origem dos PCN, pois destaca em seus princí-pios a importância de considerar os conceitos substantivos e os concei-tos referentes à natureza do saber histórico, ou seja, as ideias históricasde segunda ordem. Além disso, ancora o ensino de história na perspec-tiva de dotar os alunos de ferramentas intelectuais que permitam pensara realidade historicamente.

O pensamento histórico envolve não só a compreensão de“conceitos substantivos” (por exemplo: democracia ateniense

ou Revolução Industrial), como também a compreensão im-plícita de conceitos referentes à natureza do saber histórico(por exemplo: fonte, interpretação, explicação, narrativa). Asmetodologias que os alunos experienciam veiculam uma de-terminada leitura destes conceitos: se a simples memorizaçãoda informação apresenta a História como um relato fixo dopassado, propondo uma postura passiva perante o saber, aconstrução de inferências a partir de fontes diversas indiciauma visão da História apta a fornecer ferramentas intelectuaisindispensáveis à interpretação e explicação da realidade, que é

dinâmica (PORTUGAL, 2001, p. 87).

O currículo português organiza os conteúdos por temas e subte-mas, mas privilegia o tratamento dispensado ao conteúdo e sua arti-culação  com as competências essenciais da compreensão histórica: atemporalidade, a espacialidade e a contextualização, para que os alunospossam desenvolver um conhecimento histórico que permita compreen-der criticamente a sua realidade e transformá-la por meio de uma parti-cipação consciente da vida em comunidade (PORTUGAL, 2001).

 A competência essencial da Compreensão Histórica , nos diferen-tes vectores que a constitui – a temporalidade, a espacialidade ea contextualização, sendo de base conceptual, procura traduziras dimensões fundamentais da construção do “bom conheci-mento” em História. Conhecimento esse que permita ao alu-no compreender criticamente a sua realidade, mas tambémtransformá-la através de uma participação consciente na vidada comunidade. Com uma linha de conteúdos enquadrada porum tema geral e organizada por temas e subtemas menos pres-

critivos, o que se procurou alterar foi, sobretudo, o modo comose interrogam esses conteúdos e, consequentemente, como sãogeridos (PORTUGAL, 2001, p. 89, grifos do autor).

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Capítulo 5

Fundamentos e Metodologia do Ensino de História

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 Aos professores, o currículo luso reserva a tarefa de organizarexperiências de aprendizagem específicas, que interroguem e exploremos temas e subtemas dos conteúdos e deem visibilidade às dimensões da

temporalidade, da espacialidade e da contextualização, favorecendo oseu desenvolvimento junto aos alunos.

 Assim, o professor terá, relativamente a um determinadoconteúdo que decidir de que forma poderá dar visibilidadea cada uma das dimensões referidas. O trabalho do professorserá o de desenvolver linhas de exploração dos temas e subte-mas de conteúdos indicados, na perspectiva das competênciasespecíficas tal como são formuladas, salientando os aspectosque lhe são específicos. Deste modo, torna-se indispensável a

estruturação criteriosa, por parte do professor, de actividadese estratégias que assegurem um contexto favorável ao desen-volvimento, nos alunos, dessas dimensões da CompreensãoHistórica (PORTUGAL, 2001, p. 89, grifo do autor).

Com a mobilização das dimensões da compreensão históri-ca como competências concorre a estruturação das experiências deaprendizagem específica de estudo dos temas e subtemas, de modoa contemplarem duas outras competências específicas do ensino de

história: o tratamento de informação/utilização de fontes e a comu-nicação em história.

De salientar que na exploração dos conteúdos é inevitávele imprescindível o entrosamento das três dimensões, queexpressam, de facto, uma mesma realidade que se constituicomo um todo. Por essa razão, o professor sentirá comonatural a mobilização simultânea das três dimensões daCompreensão Histórica, estruturadas com base no Trata-mento de Informação/Utilização de Fontes e na Comuni-cação em História, na abordagem de cada um dos temase subtemas, competindo-lhe a gestão equilibrada das apren-dizagens que lhes são específicas (PORTUGAL, 2001, p. 89,grifos do autor).

Em resumo, no currículo português, destaca-se a integração en-tre a natureza, a seleção, a organização e o tratamento dispensadoaos conteúdos históricos, bem como a articulação com a justificati-va da presença do ensino de história no ensino básico, uma vez que“é através dela que o aluno constrói uma visão global e organiza-da de uma sociedade complexa, plural e em permanente mudança”(PORTUGAL, 2001, p. 87).

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Fundamentos e Metodologia do Ensino de História

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O documento: Diretrizes Municipais de Ensino de Histó-ria de Araucária  (ARAUCÁRIA,

2004) organiza os conteúdos emseis eixos temáticos para todas asséries. Esses eixos temáticos sãodefinidos pelos seguintes conteú-dos substantivos: famílias, coti-diano, trabalho, cultura, podere movimentos sociais. O crité-rio para essa seleção – tanto da

organização em eixos temáticosquanto dos conteúdos substanti-vos como temáticas – deve-se asua presença e evolução nas di-versas propostas curriculares domunicípio, anteriores a 2004.

 A seleção e organização dos conteúdos a partir da tematiza-ção histórica, já anunciadas nas diferentes propostas curri-culares do município, indicam os seguintes temas a serem

explorados, de forma diferenciada em cada série: Famílias,Cotidiano, Trabalho, Cultura, Poder e Movimentos Sociais.Estes temas são trabalhados em todas as séries articulan-do conteúdos da história local, regional, nacional e global(ARAUCÁRIA, 2004, p. 83).

Quanto às ideias históricas de segunda ordem, as diretrizes de Araucária não fazem uma menção direta, mas destacam a importânciade desenvolver a empatia e a contextualização em relação ao passado.

 A primeira é a capacidade de se colocar no lugar dos outrose a última de entrelaçar acontecimentos de forma diacrôni-ca – relacionando com o passado – e sincrônica – relacio-nando com a simultaneidade dos acontecimentos do presente(ARAUCÁRIA, 2004, p. 81).

Outra ideia histórica de segunda ordem abordada pelo currículode Araucária (2004) é o tempo histórico, assumido como pressupostometodológico, que deve ser compreendido em suas diversas dimensões:sucessões cronológicas, duração, mudança, semelhanças e diferenças en-tre o passado e o presente, valorizando as experiências das crianças coma passagem do tempo.

O Currículo Nacional de História de Portugal

traz um rol de competências específicas que bus-

ca desenvolver nos alunos, em que aponta umaexperiência de aprendizagem específica para

cada competência de compreensão histórica:

a) Temporalidade: pesquisa e reconstrução do

passado de uma instituição local (escola, igre-

 ja, associação), por fontes orais e documentais.

b) Espacialidade: representação dos diferentes

espaços do bairro, relacionando suas funções

(habitação, comércio, lazer).

c) Contextualização: trabalho escrito com

fontes de diversos tipos e com múltiplas pers-

pectivas dos períodos, para conhecimento das

ideias, valores e atitudes características das

sociedades e épocas (2001, p. 87).

Saiba mais

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Capítulo 5

Fundamentos e Metodologia do Ensino de História

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O documento municipal assume, ainda, o trabalho com docu-mentos históricos e a produção de narrativas – duas ideias históricas desegunda ordem – como pressupostos metodológicos do ensino de his-

tória. Os documentos históricos são tratados como evidências do pas-sado, que permitem aos alunos que façam inferências e análises dessasfontes, tirem suas conclusões e superem a ideia de narrativas prontas,construindo suas próprias narrativas. Trabalhar com diversas formas dedocumentos valoriza as variadas vozes e perspectivas históricas e possi-bilita aos alunos produzirem suas narrativas (ARAUCÁRIA, 2004).

Da teoria para a prática

O professor de história do Ensino Fundamental, dentro dos limi-tes das diretrizes curriculares a que sua escola, seu município ou seu es-tado está circunscrito, tem autonomia de fazer uma seleção de conteú-dos que permitam atingir melhor os objetivos de dotar seus alunos deinstrumentos e ferramentas, para que adquiram os atributos da literacia

histórica e desenvolvam sua consciência histórica.

 Além da escolha dos conteúdos, é necessário dispensar-lhes umtratamento que permita desenvolver as ideias históricas de segundaordem, ou seja, trabalhar com várias fontes e organizar experiênciasde aprendizagem que permitam ao aluno desenvolver a capacidade defazer inferências sobre os documentos, desenvolver a compreensão dastemporalidades e elaborar narrativas próprias.

Como suporte para verificar atividades ou experiências de apren-dizagem significativas, articuladas com o desenvolvimento de compe-tências específicas da ciência histórica, que podem ser adaptadas aosconteúdos das diretrizes curriculares que o professor segue, acessar oCurrículo Nacional de História de Portugal , que pode ser encontrado nosseguintes endereços eletrônicos:

<http://www.netprof.pt/ImprimirTXT.jsp?id_versao=8030>.●

<http://www.dgidc.min-edu.pt/recursos/Lists/Repositrio%20●

Recursos2/Attachments/84/Curriculo_Nacional.pdf>.

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Síntese

Neste capítulo vimos que as pesquisas em educação histórica in-dicam que crianças, jovens e adultos relacionam-se cognitivamentecom ideias históricas substantivas e ideias históricas de segunda ordem.Para tanto, é importante que sejam consideradas essas naturezas dosconteúdos históricos, ou seja, sua substantividade, mais objetiva, e suanatureza histórica, não tão objetiva, de segunda ordem, mas nem porisso menos importante para desenvolver o pensamento, a literacia e aconsciência históricas.

Vimos também que há uma relação entre o currículo e a cultura, emque os conteúdos são selecionados no interior da cultura e legitimados nointerior da escola pelo professor. A escola transmite elementos da cultura,sendo ilusório querer transmitir a totalidade de um conhecimento.

 A ideia de conteúdo como seleção de elementos da cultura per-mite, no caso do ensino de história, organizá-los por eixos temáticos,em que as temáticas são selecionadas a partir de sua pertinência para odesenvolvimento do pensamento, da literacia e da consciência históri-

cas, superando a tradição da organização cronológica e linear.Nesse sentido, é necessário dispensar às temáticas um tratamento

que permita aos alunos desenvolver as ideias históricas de segunda or-dem, ou seja, trabalhar com várias fontes e organizar experiências deaprendizagem para que desenvolvam a capacidade de fazer inferênciassobre os documentos, compreendam as temporalidades e elaborem nar-rativas históricas próprias.

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Neste capítulo, será aprofundada a possibilidade do desenvol-vimento de uma didática da história. O caminho percorrido para exa-minar essa possibilidade passa pela análise do conceito de transposiçãodidática de Chevallard, muito difundido pelas teorias de ensino no fi-nal do século XX e início do século XXI.

 A partir da constatação das limitações do conceito de transpo-sição didática para o ensino de história, será analisada a proposta dodesenvolvimento de uma didática específica da história. Isso ocorrerá

fundamentando-se nas pesquisas desenvolvidas no campo da educaçãohistórica, especialmente as investigações de Urban (2009) e os resul-tados obtidos pelo Laboratório de Pesquisa em Educação Histórica –LAPEDUH, do Programa de Pós-graduação e Extensão em Educaçãoda Universidade Federal do Paraná, sobre essa possibilidade.

Da didática geral à transposição didática

 Até meados da década de 80 do século XX, todos os professores eramformados dentro dos princípios da didática geral – ancorada na pedagogiae na psicologia da aprendizagem –, disciplina fundamental nos cursos delicenciatura. Em 1985, Chevallard, na obra A transposição didática – dosaber sábio ao saber ensinado, propôs uma didática da matemática, funda-mentada na didatização do conteúdo acadêmico específico, o saber sábio,e sua transformação em conhecimento escolar, o saber a ser ensinado.

Chevallard assim caracteriza a transposição didática:

Um conteúdo de saber que tenha sido selecionado comosaber de ensino, sofre a partir de então um conjunto de

Didática específica

do ensinode história 6

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 transformações adaptativas que vão torná-lo apto a tornar-seobjeto de ensino. O “trabalho” que transforma um objeto desaber a ensinar num objeto de saber a ser ensinado, é denomi-nado de transposição didática  (2005, p. 45, grifos nossos).

Essa proposta de Chevallard de didatização do saber sábio, paraque possa ser ensinado, extrapolou os limites do ensino de matemáticae passou a ser adaptada para outras áreas de ensino.

 Aqui no Brasil, Monteiro (2002) aproxima o conceito da trans-posição didática de Chevallard do ensino de história, ao investigar aexperiência dos professores de história na mobilização dos saberes quedominam para ensiná-los. Para a pesquisadora, os professores dominam

e produzem saberes, em um contexto de autonomia relativa, em umaconstrução que apresenta uma especificidade decorrente do fato de serintegrante de uma cultura escolar, diferenciando as categorias “saberescolar” e “saber docente”.

Relacionando saber escolar  e saber docente, Monteiro (2002,p. 7) buscou investigar como professores de história mobilizam os sa-beres que dominam para lidar com os saberes que ensinam, e como sãoarticulados os saberes disciplinares, curriculares, pedagógicos e de expe-riência, em uma criação própria e significativa para seus alunos. Focali-zando os saberes ensinados, buscou compreender a síntese elaborada apartir dos subsídios dos saberes disciplinares, sua dimensão educativa,as escolhas axiológicas e o processo de didatização.

Monteiro (2002, p. 233) localiza o campo de investigação de suapesquisa em uma “região de fronteira entre os campos da história e daeducação e, dentro deste último, na confluência das áreas de didática,

currículo e formação de professores”, inserindo-o no campo do ensino dehistória e utilizando o conceito de transposição didática  para articular osaber histórico acadêmico com o saber histórico escolar. A autora apontalimites ao conceito de transposição didática, uma vez que esse conceitopropõe denunciar uma ruptura, mas como termo parece indicar apenasuma mudança do conteúdo de lugar, sem mudança conceitual.

Segundo Monteiro (2002), Chevallard refere-se ao saber acadêmicocomo única referência para elaboração do saber ensinado, e não consideraem sua análise a dimensão educativa como elemento estruturante funda-mental para compreensão do processo de constituição do saber escolar.

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Capítulo 6

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Diante dessa insuficiência do conceito de transposição didática, ainvestigadora propõe a utilização do conceito de mediação didática  deLopes, em que a mediação tem o sentido dialético de “constituição de

uma realidade através de mediações contraditórias, de relações comple-xas, não imediatas, com um profundo senso de dialogia ” (MONTEIRO,2002, p. 87).

Se existe um movimento que articula os saberes histórico acadêmi-co e histórico escolar, põe-se uma questão, ou seja, a história acadêmicaapresenta diferentes perspectivas de inteligibilidade: positivista, dos Annales, marxista e das análises macroeconômicas, nova história; e dife-rentes formas de definição e organização dos eixos de análise: temática,

geopolítica, cronológica e espacial. Diante dessa variedade de perspec-tivas, qual história utilizar como referência acadêmica para se contrastarcom o saber a ensinar? (MONTEIRO, 2002, p. 100-101).

Os professores produzem conhecimento, uma vez que, autores deseu trabalho, o dominam e o mobilizam com autonomia relativa, poisagem dentro de padrões e injunções culturais, políticas e institucionaistransitórias e transponíveis, saberes plurais e heterogêneos, para ensinar

o que ensinam. O saber que ensinam é, por sua vez, uma criação dacultura escolar que apresenta marcas dos saberes de referência e de seuscriadores. O saber escolar, os saberes ensinados ou conteúdos pedagogi-zados, estruturados a partir das finalidades educativas de forma própriae racional, vão além de meras transposições do conhecimento científicoe se expressam em suas aulas (MONTEIRO, 2002, p. 242).

Monteiro (2002) contribui com o elemento da valorização da rela-ção do professor com o saber histórico e como mobilizador deste saber,

de sua forma acadêmica, e relacionando-o com os saberes dos alunos eoutros, entre eles o saber da experiência docente, o transforma, com re-lativa autonomia, no saber histórico escolar. É o processo que ela chama,com base em Chevallard e Lopes, de transposição/mediação didática.

 A pesquisadora remete, ainda, ao professor, a responsabilidade deeleger a perspectiva do saber histórico acadêmico que vai utilizar comoreferência. No entanto, segundo a pesquisadora, com base em Moniot,o ensino de história, “diferentemente da matemática, línguas, educaçãofísica, não possui exercícios ou atividades que lhe sejam próprias” (2002,p. 107). A história utiliza como empréstimo de outras disciplinas as

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 atividades que desenvolve em seu ensino. Essa constatação de Monteiroé um limitador quando se trata de desenvolver uma didática específicada história, que se funda exatamente no desenvolvimento de experiên-

cias de aprendizagem próprias da história.

Da transposição didática à necessidade de umadidática da história

 Além das ressalvas já apontadas por Monteiro, são diversos os li-mitadores apontados pelos estudiosos do ensino de história no conceitode transposição didática. Para ilustrar, transcrevemos a preocupação de

Bittencourt (2008), de sua dependência e de seu distanciamento daciência de referência.

Essa abordagem considera a disciplina escolar dependente doconhecimento erudito ou científico, o qual, para chegar à esco-la e vulgarizar-se, necessita da didática, encarregada de realizara “transposição”. Consequentemente, uma “boa” didática tempor objetivo fundamental evitar o distanciamento entre a pro-dução científica e o que deve ser ensinado, além de criar instru-mentos metodológicos para transpor o conhecimento científi-

co para a escola da forma mais adequada possível (p. 36).

Essa preocupação com o desenvolvimento de uma didática nãodistanciada da ciência histórica, fundada em elementos da própria his-tória, é o norte da pesquisa de Urban (2009), que defende uma didáticada história que se preocupe “com um processo de ensino e aprendiza-gem, que tenha um corpo epistemológico específico, o qual poderásustentar a relação entre o ensinar e o aprender história” (p. 62).

Urban defende uma didática específica da história em sua tese dedoutorado Didática da história: percursos de um código disciplinar no Brasile na Espanha  (2009), constatando que é uma ciência embrionária, sendodesenvolvida em um campo que Prats (2001) chama de “encruzilhadade diversas disciplinas sociais entre as que, por um lado, ocupam-se tra-dicionalmente do ensino e da aprendizagem e, por outro, as que consti-tuem a base de conhecimentos que se pretende estudar” (p. 138).

Nessa perspectiva, uma didática da história não é uma mera trans-posição dos saberes da ciência histórica para um formato e um conteúdopronto e acabado, embalado em um método didático renovado que

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Capítulo 6

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possa ser ensinado na escola. Também não se trata de dispensar as con-tribuições historicamente desenvolvidas pelo campo da didática.

Urban defende

[...] a necessidade de uma didática específica, voltada ao en-sino de história, que não seja portadora, unicamente, de pro-cedimentos ou indicações metodológicas em relação à práticade ensino, mas que, somada a esses aspectos, tenha na ciênciahistória um aporte para a discussão em torno de que é ensinare aprender história. Acredita-se que essa opção não estabeleceum recorte em torno de uma nomenclatura, mas é uma opçãopor um objeto de investigação localizado num determinadocampo teórico (2009, p. 62).

O campo teórico em que Urban encontra referências para o desen-volvimento de uma didática específica, ancorada na ciência história, éo campo da educação histórica (2009).

Para analisar esses elementos, Urban estabelece um diálogo entreas tarefas da didática da história de Bergamann (1990) e elementos daeducação histórica. As tarefas de elaboração da história e sua recepçãopelos alunos na formação da consciência histórica; de investigar os

processos de ensino, aprendizagem e formação dos indivíduos a partirda e pela história; e de explicitar e desenvolver diretrizes de ensinoancoradas na ciência histórica. Essas são tarefas da didática da história,com preocupações voltadas à aprendizagem, à análise e investigaçãodo significado e à ação normativa do ensino, que coadunam-se coma educação histórica no conceito de cognição histórica e de ensinar eaprender história tendo a história como referência (2009, p. 73).

 A didática da história chama para si uma forma de pensar esse

ensino e essa aprendizagem, ou seja, procura uma forma deentender como se dá a aprendizagem em história, como o alu-no constrói a ideia sobre a história, sobre os conteúdos que sãotrabalhados na escola (URBAN, 2009, p. 74).

Em relação às pesquisas em educação histórica, Urban (2009) situaas investigações sobre as ideias históricas prévias dos alunos e a pro-gressão das ideias históricas de jovens, realizadas na Inglaterra por Leee em Portugal por Barca e Gago, como indícios do processo de desen-volvimento de uma didática que parte de questões fundamentadas nafilosofia da história: como os alunos aprendem história?; o que épensar historicamente? A busca da resposta dessas questões específicas

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da história diferencia a educação histórica das outras abordagens sobreo ensino de história, geralmente marcadas pela influência da psicologia.“Quando se traz elementos da cognição histórica, mapea-se um campode entendimento preocupado com o ensinar e aprender história quepossui como referência a filosofia da história” (URBAN, 2009, p. 77).Essa influência da psicologia sobre o ensino de história, já mencionadopor Schmidt em relação aos PCN, conforme abordado no capítulo 1,também é apontado por Barca (2000):

Durante a década de sessenta e princípios da década de se-tenta, a investigação em educação foi fortemente influenciadapela teoria piagetiana, enfatizando o desenvolvimento cogni-tivo ao longo de três estádios principais, sequenciais e inva-

riantes. Esta corrente reflectiu-se na discussão sobre o lugarda história no currículo [...] e em estudos sobre o pensamentodos alunos em história (p. 23).

Bittencourt (2004) também fala a esse respeito:

Essa teoria do desenvolvimento cognitivo (formulada por Piaget)[...], passou a sustentar muitos dos princípios da constituição deconceitos e permitiu justificar a impossibilidade de alunos dosprimeiros anos de escolarização dominarem conceitos abstratos,como os de tempo histórico, uma vez que cada fase “operatória”

depende de condicionamentos biológicos (p. 185).Quais seriam os elementos, específicos da natureza da história, que

possibilitariam a definição de um campo da didática da história?

Com base em filósofos da história e nas pesquisas em educaçãohistórica, Urban (2009, p. 79) aponta a explicação histórica, a ideia deprovisoriedade em história, a ideia de mudança, o conceito de signifi-cância histórica, a ideia de evidência histórica, a ideia de progresso, aempatia histórica e os tipos e as formas de pensar as narrativas como osprincipais elementos para delinear uma didática da história.

 A reflexão sobre esses elementos e as investigações sobre

as ideias históricas que as pessoas têm, frente a situações (ouconteúdos) específicas de ensino e aprendizagem, bem comorealizar intervenções didáticas no sentido de torná-las maiscomplexas, constituíram-se em elementos da natureza da di-dática da história (URBAN, 2009, p. 79).

 Além dos estudos no campo da educação histórica, Urban (2009)também buscou as contribuições da teoria da história para uma didá-tica da história.

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O significado da teoria da história na constituição da didáticada história está no entendimento de que, se acreditamos queuma didática específica, no caso a didática da história, precisater como referência a história, seria oportuno, se não necessá-

rio, a teoria da história assumir um papel de ancorar a formade pensar e produzir a história que, por sua vez vai se desdo-brar na forma de aprender e ensinar história (p. 80).

No pesquisador alemão Jorn Rüsen, teórico da história já referencia-do no capítulo 2, que vem subsidiando pesquisas sobre o ensino e a apren-dizagem em história, Urban (2009, p. 80-81) relata seis funções da teoriada história no pensamento sobre a própria história, que nos permitemestendê-los na reflexão sobre os elementos de uma didática da história.

1. A teoria da história tem a função de profissionalizar didatica-mente o historiador: consiste em transmitir aos historiadoresem formação uma concepção sólida da especificidade profissio-nal da ciência histórica. É a função propedêutica de preparar ocaminho da história, realizar o trabalho de uma forma a intro-duzir os estudos acerca da história. Por extensão, pode contri-buir para a profissionalização didática do professor de história.

2. A teoria da história tem uma função de coordenação: consiste

em tornar possível a especificidade da própria história, consi-derando seus princípios e evitando um compartilhamento es-tranho à própria história. Por extensão, poderá contribuir paradesenvolver a especificidade histórica do ensino de história.

3. A teoria da história tem uma função motivadora: consiste em fun-damentar as articulações da subjetividade no processo de conheci-mento histórico, geralmente descartadas ou assumidas como ten-denciosas ou não científicas. Por extensão, poderá contribuir para

articular a subjetividade dos alunos, valorizando sistematicamenteas suas ideias históricas, no processo ensino-aprendizagem.

4. A teoria da história tem uma função de organização e orien-tação das pesquisas do saber histórico diante da dificuldadeque os estudiosos enfrentam devido à quantidade de mate-riais, documentos e fontes de pesquisa. A teoria pode desen-volver um “modelo interpretativo” da diversidade e multipli-cidade dessas fontes. Por extensão, poderá contribuir com odesenvolvimento de metodologias de ensino de história quecontemplem essa multiperspectividade histórica.

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5. A teoria da história tem uma função de seleção e fundamen-tação dos procedimentos de pesquisa: consiste em fornecersubsídios para que os estudiosos estabeleçam critérios frente às

reflexões e aos encaminhamentos que se propõem desenvolvere pesquisar, reforçando o caráter argumentativo e aumentandoa qualidade científica da história. Por extensão, poderá contri-buir com a fundamentação da seleção dos conteúdos substan-tivos e de segunda ordem e o desenvolvimento de atividadesespecíficas da história no processo ensino-aprendizagem.

6. A teoria da história tem uma função de mediação: consiste emexercer o papel de ser ponte entre os conhecimentos e a apli-

cação deles no contexto social do pensamento histórico. Porextensão, poderá contribuir para estabelecer formas de tornaros conteúdos históricos conhecimentos que contribuam paradesenvolver a consciência, a literacia e o pensar histórico dosalunos no processo ensino-aprendizagem.

Esse seria um dos caminhos para desenvolver uma didática dahistória não distanciada da própria ciência histórica, apregoada porBittencourt (2004) como uma “boa didática”, e que Urban (2009)referenciou no conceito de consciência histórica de Rüsen (2001):

 A consciência histórica é, assim, o modo pelo qual a relaçãodinâmica entre experiência do tempo e intenção no tempo serealiza no processo da vida humana. [...] Para essa forma deconsciência, é determinante a operação mental com a qual ohomem articula, no processo de sua vida prática, a experiên-cia do tempo com as intenções no tempo e estas com aque-las. Essa operação pode ser descrita como orientação do agirhumano no tempo. [...] A consciência histórica é o trabalhointelectual realizado pelo homem para tornar suas intençõesde agir conformes com a experiência do tempo (RÜSEN,2001, p. 58-59).

Urban (2009) articula a didática da história com a necessidade delevar o aluno a pensar historicamente, sendo a consciência histórica oobjetivo central, ou seja, que possa estabelecer conexões entre a his-tória, a vida prática e a aprendizagem. Diante disso, faz-se necessárioprivilegiar as ideias históricas como ponto de partida para o ensino dehistória. O campo de investigação que toma como referência a formapela qual as pessoas pensam a história é a educação histórica:

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 A forma pela qual aluno e professor pensam a história sugereque a relação ensino/aprendizagem tenha como ponto dereferência a forma pela qual as pessoas pensam a história. E issopode parecer, em uma primeira impressão, como “desorgani-

zador” de todo processo ensino/aprendizagem, mas se exprimeonde reside a cognição, que é nos sujeitos nele envolvidos. Aapropriação cognitiva está na relação que é estabelecida entreos sujeitos, permeados pela sua experiência e pelos fatos quefazem parte do contexto (URBAN, 2009, p. 89).

Desenvolver uma didática da história referenciada nas ideias his-tóricas dos alunos pode significar mais do que uma nova didática,pode significar a “revolução copernicana”, de centrar o processo ensi-no-aprendizagem na cognição e, por extensão, no sujeito da cogniçãoe sua relação com a cognição, referenciados nos capítulos 3 e 4, e queUrban (2009) descreve como possibilidade de uma nova racionalidadeno ensino de história:

Na perspectiva da educação histórica, a mediação, que ocorrepor meio dos conhecimentos prévios de quem aprende, podesignificar mais do que um tratamento didático, mas uma rela-ção com o ensino que pode não estar cerceado por um docu-mento, pois leva em conta a experiência e a forma de pensar

historicamente, tanto de quem está na condição de quem en-sina, como na condição de quem aprende e essa experiênciapode evidenciar uma racionalidade que não é aquela prescritapelos documentos oficiais. Saber história não se traduz somen-te em saber um conteúdo, mas consiste em dar-lhe um senti-do. A aprendizagem em história consiste em ir além de umasimples “memorização”, pressupõe uma explicação mais com-plexa, mas que represente não uma modificação de conteúdo,mas principalmente uma outra relação com a experiência dossujeitos envolvidos (p. 89-90).

O desenvolvimento de uma didática da história é também umdos objetivos do Laboratório de Pesquisa em Educação Histórica –LAPEDUH, do Programa de Pós-graduação e Extensão em Educa-ção – PPGE, da UFPR. Schmidt (2010, p. 9-13), pesquisadora doPPGE e coordenadora do LAPEDUH, organiza essa trajetória 6  emquatro âmbitos de pesquisa:

6 Artigo publicado na revista digital espanhola Epistemología y Metodologia de Las CiênciasSociales , sob o título “Trajetórias da investigação em didática da história no Brasil: a expe-riência da Universidade Federal do Paraná”.

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a) Formação inicial de professores de história, nas disciplinas deMetodologia do Ensino de História, de Prática de Ensino ede Estágio Supervisionado em História, em uma relação entre

a universidade e escolas do Ensino Fundamental, por meiodo desenvolvimento de projetos de prática de ensino com aproposição de conteúdos e metodologia de ensino a partir deinvestigações sobre a relação dos jovens e crianças com o co-nhecimento, como no trabalho com fontes e narrativas histó-ricas. E sob a forma de produtos, como os relatórios de práticade ensino e os artigos publicados nos anais do seminário deprática de ensino, realizado, anualmente, na universidade.

b) Projetos de formação continuada em uma relação universi-dade/comunidade, desenvolvendo o projeto “Recriando ahistória”, desde 1996, em municípios da Região Metropoli-tana de Curitiba. Uma proposta de formação continuada deprofessores da escola fundamental com dois focos. O primei-ro, visando a formação continuada de professores dos anosiniciais de escolas públicas, por meio da produção e uso demanuais elaborados a partir de documentos em estado de

arquivo familiar e produzidos coletivamente por professoresdo ensino básico e superior, alunos das escolas públicas e doscursos de História, Pedagogia e Design da UFPR (projetos“Pinhais”, “Campina Grande do Sul” e “Rio Branco do Sul”).O segundo com a produção de materiais didáticos. Livros:Recriando a história de Pinhais  (1997); Recriando a história deCampina Grande do Sul   (2003); Recriando a história de RioBranco do Sul ; Recriando histórias de Araucária  (2008). Com

os professores dos outros anos do Ensino Fundamental e doEnsino Médio, esse projeto deu origem a outro: “Documen-tos guardados em estado de arquivos familiares e a produçãode um arquivo simulado”, bem como a artigos produzidospelos próprios professores do Ensino Fundamental e pelosalunos da UFPR.

c) Grupo de investigação sobre a didática da história, envolven-do professores do Ensino Fundamental e Médio de escolaspúblicas (projeto “Grupo Araucária”), resultando em reestru-turações curriculares e artigos produzidos pelos professores do

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“Grupo Araucária”, apresentados e publicados em encontrosnacionais e internacionais de ensino de história 7.

d) A criação do Laboratório de Pesquisa em Educação Histórica,

no âmbito do Programa de Pós-graduação, que reúne inves-tigações sobre a didática da história com alunos do mestradoe do doutorado, contando, atualmente, com um acervo dedissertações, teses e publicações já realizadas.

Schmidt (2010) sintetiza as pesquisas do LAPEDUH sobre a didá-tica da história enfatizando a produção coletiva, a participação de pro-fessores investigadores universitários e do Ensino Fundamental em pro- jetos de formação inicial e continuada, integrados com a universidade ecom pesquisadores estrangeiros, que visam integrar a didática da histórianos estudos e contribuir com a educação histórica de crianças e jovens.

 A explicitação destas atividades, pode ser indiciária de elemen-tos para análise e sistematização de algumas reflexões em tornode um projeto comum de constituição de uma epistemologiada didática da história, a partir da sistematização, no futuro,da produção já realizada. No entanto, cabe destacar que essaconstrução tem sido possível a partir de um projeto coletivo,que reúne professores investigadores universitários e da escolabásica brasileiros e buscando-se, numa perspectiva dialógica, oentrelaçamento entre pesquisadores brasileiros e estrangeiros,com um objetivo comum, que é o de contribuir, de um lado,para que a didática da história possa, definitivamente, ser tra-tada como parte dos estudos históricos; de outro, contribuirpara a melhor qualidade da educação histórica de crianças e

 jovens, independentemente de seus matizes étnicos, raciais,políticos ou sociais, mas certos de que um trabalho conjun-to, apoiado nas reflexões da comunidade de investigadores da

didática da história e fundamentado na defesa da democraciae dos direitos fundamentais do ser humano, só pode dar bonsfrutos (SCHMIDT, 2010, p. 11).

Nos dois últimos capítulos serão aprofundadas metodologias especí-ficas da didática da história, que vêm sendo desenvolvidas pelas pesquisasem educação histórica: a produção de narrativas históricas e o trabalho comfontes e documentos históricos. Essas metodologias são fundamentais no

7 Para conhecer mais sobre o “Grupo Araucária” ver: THEOBALD, H. R. A experiência deprofessores com ideias históricas: o caso do “Grupo Araucária”. Dissertação (Mestradoem Educação). Curitiba: UFPR, 2007. Disponível no site  Domínio Público.

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ensino de história e complementares na investigação das ideias históricasprévias de crianças, jovens e adultos, como vimos no capítulo 4.

Da teoria para a práticaO professor, em suas aulas de história, pode questionar-se sobre

os encaminhamentos didáticos que está adotando. A forma como estátrabalhando os documentos históricos, as narrativas do manual didá-tico, as próprias narrativas e as explicações, estão levando em conta osníveis de pensamento histórico dos alunos? Estão contribuindo para

que desenvolvam e aprimorem seus níveis de compreensão histórica? As atividades que desenvolve em aulas de história contribuem com odesenvolvimento da literacia histórica dos alunos? São atividades queenvolvem elementos da ciência histórica, como o domínio da tempora-lidade, a diversidade de perspectivas sobre o passado, a reconstrução denarrativas com base em diversos documentos e narrativas?

É a resposta prática a questões dessa natureza que vão configurandoe delineando os contornos de uma didática específica da história, com a

qual os professores do Ensino Fundamental podem contribuir com suasreflexões sobre os encaminhamentos em sala de aula, que é o espaço ondea didática ganha contornos práticos e testa a sua viabilidade e efetividade.

Como o desenvolvimento de uma didática da história está emestágio embrionário, cabe aos professores de história em formaçãocontinuarem acompanhando as pesquisas neste campo, por meio doslaboratórios de ensino de história das universidades, já referenciados naseção “Da teoria para a prática” do capítulo 1.

Síntese

Neste capítulo, vimos que até os anos 80 do século XX era comumàs disciplinas emprestarem da didática geral as ferramentas para seusencaminhamentos metodológicos de ensino. Chevallard desenvolveu oconceito de transposição didática no campo da matemática, fundamen-tado em uma visão estanque de saber sábio, a ser transformado, adap-tado e didatizado em saber a ser ensinado. Essa proposta extrapolou os

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Neste capítulo, será feito um percurso pelos filósofos da his-tória que fundamentam o resgate da narrativa histórica. Em seguida,será analisada a repercussão do regate da narrativa histórica no ensinoe sua incorporação à didática da história, como parte constitutiva daconsciência histórica.

 Ainda neste capítulo, serão analisadas algumas pesquisas sobre arelação que as pessoas estabelecem com as narrativas históricas, suasestruturas e os níveis de relação estabelecidos com elas, bem como sobre

o uso da narrativa histórica em sala de aula como forma de ensinar eaprender história.

Narrativa e história

 A guinada metodológica, que muda a perspectiva do ensino de his-tória e afeta todos os seus atores, especialmente professores e alunos,caracteriza-se pela passagem de um processo de memorização de infor-

mações e de relação com narrativas prontas, do manual didático, do pro-fessor e da mídia, para a necessidade da produção de narrativas a partirde inferências e leituras diretas de diversos documentos históricos e denarrativas de várias perspectivas. Essa mudança foi constatada pelas pes-quisas no campo da educação histórica e tornou necessário compreen-der, à luz das pesquisas em torno da narrativa histórica, a relação quecrianças e jovens estabelecem com a produção da narrativa histórica.

 A relação da narrativa com a história se confunde com a própria his-tória. Heródoto escrevia o que via e testemunhava, os escribas reais narra-vam os feitos da realeza, cercados dos cuidados necessários à condição de

A produção

de narrativasem história 7

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súditos. Cícero apresentava a história como a magistra vitae, concretiza-da por meio da seleção de narrativas de acontecimentos exemplares.

No século XVIII, a história passou a ser entendida como sendo o

acontecimento, o fato, o Geschichte  na perspectiva alemã, e a narrativado acontecimento e do fato passou a ser assumida como sendo a pró-pria história, expressão da realidade e da verdade. A história passou,assim, a falar por si, e o historiador foi anulado.

No século XIX, por meio da Escola Histórica Alemã, a históriabuscou ser científica, objetiva e positiva. Então, a narrativa passou aser utilizada para traduzir a evolução dos fatos históricos, buscou nosarquivos e nos documentos escritos as expressões daquilo que verdadei-ramente aconteceu, ocultando, para tal, o narrador.

No século XX, os Annales introduziram a necessidade de questio-namento dos próprios documentos e da subjetividade do historiador,passando da história-narração à história-problema, e a narrativa passoude relatos de acontecimentos em uma sequência temporal, a ser consi-derada como forma de estruturação do discurso historiográfico funda-mental. Na relação com o passado “real”, a narrativa passou a explicá-lo

a partir de questões e problemas propostos pelo historiador, a quemcabia localizar e interrogar as fontes de forma adequada.

 Ainda no século XX, são os filósofos da história que aprofundam osdebates em torno da relação entre a narrativa histórica e a história, comreflexos importantes para o ensino de história. As posições filosóficas vãodesde a negação da possibilidade da narrativa histórica, fundadas na cons-tatação da influência da subjetividade do narrador, outras se contrapondoàs tentativas de narrativas históricas totalizantes, de forte cunho doutriná-

rio e ideológico, àquelas que visam uma revitalização da visão da históriacomo um relato e a recuperação de sua racionalidade (RÜSEN, 1992b).

Um filósofo da história que contribuiu com uma questão im-portante nesse debate em torno da narrativa histórica é Collingwood(2001), ao resgatar a ideia de que são os sujeitos históricos, com ideiashistóricas próprias, que narram a história, sendo condição inerente doconhecimento histórico compreender que:

O historiador não se limita a reconstituir o pensamento passa-do, faz a sua reconstituição no contexto do seu conhecimento.Deste modo, ao reconstituí-lo, critica-o, forma um juízo próprio

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Capítulo 7

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sobre o seu valor, corrige quaisquer erros que consiga discernirnele. Esta crítica do pensamento, cuja história ele traça, não é demodo algum secundária em relação ao delineamento de sua his-tória. É uma condição indispensável do próprio conhecimento

histórico (COLLINGWOOD, 2001, p. 230).Collingwood resgata o sujeito narrador como condição do conheci-

mento histórico. Walsh (1978) acrescenta a dimensão da experiência comonecessária para que a narrativa não seja apenas imaginação idealista:

[...] a história se ocupa dos feitos e experiências dos seres hu-manos no passado. O historiador [...] tenta recompor o pen-samento do passado, mas não se interessa apenas pelas ideias,mas também pelo pano-de-fundo do sentimento e emoção

que tais ideias tinham. Quando procura descobrir o espíritode uma época, não está simplesmente esperando penetrar nasua vida intelectual, mas quer também atingir sua vida emo-cional (WALSH, 1978, p. 57).

 Walsh resgata a importância da experiência humana em uma pers-pectiva mais subjetiva, complementada por Thompson (1981), queamplia o conceito de experiência para além da dimensão emocional,incluindo as relações produtivas, afetivas, culturais e axiológicas, elabo-

radas racionalmente por homens e mulheres, no processo dinâmico deprodução do ser social. O pesquisador contribui, ainda, com a ideia deque a experiência humana se manifesta na consciência.

Essa experiência deve ser de relação com evidências da culturamaterial e imaterial do passado, para que um sujeito possa construiruma narrativa histórica. É Dray (1969, p. 20) quem contribui com essecritério, quando afirma que “os objetos da investigação histórica sãopassados e findos. O que se apresenta aos sentidos do historiador é tão

somente a evidência daqueles objetos”.

Narrativa histórica e consciência histórica

Resgatando as contribuições dos filósofos da história, váriospesquisadores se debruçaram sobre a relação que sujeitos históricosestabelecem com a narrativa histórica, bem como desenvolveram cate-gorias para analisar esta relação.

Topolski (2004), ao buscar estabelecer relações entre a estruturadas narrativas históricas e o ensino de história, parte da tese de que

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o ensino de história terá êxito se estiver atento às mudanças elucida-das pela filosofia da história. Quanto à narrativa histórica, a principalmudança em curso, para ele, é que a filosofia tradicional (positivista e

analítica) só levava em conta a estrutura lógica da historiografia, e hojehá uma nítida preocupação com a estrutura e a produção da narrativahistórica. Topolski (2004) cita os estudos de Peter Lee para exempli-ficar a importância de se voltar a atenção aos conceitos históricos desegunda ordem, entre os quais inclui a narrativa histórica, concluin-do que “[...] esses estudos descobrem a pluralidade e a evolução dosesquemas de recepção dos alunos, e, ao mesmo tempo, revelam queos professores têm distintas concepções acerca de sua tarefa ao ensinarhistória” (p. 103).

Situando a narrativa histórica no centro das atividades didáticasdo ensino de história, e de que é necessário ter em conta como se rela-cionam alunos e professores com a narrativa histórica, Topolski (2004)distingue três níveis de sua estrutura: o nível superficial ou informa-tivo, caracterizado pela lógica verbal que busca transmitir uma infor-mação; o nível  persuasivo ou retórico, caracterizado pelo estilo delinguagem do narrador, que busca persuadir os leitores de suas crenças;

e o nível teórico-ideológico ou de controle, caracterizado pelos signi-ficados de orientação ocultos da narrativa, como os mitos da evolução,do progresso e da linearidade temporal, entre outros.

Outro pesquisador que, em diálogo com Topolski e outros filóso-fos da história, aprofunda os estudos em torno da narrativa histórica éRüsen (2001), já referido no capítulo 2. Ele parte do princípio de que ahistória e o pensamento histórico são caracterizados, culturalmente, pelanarrativa. Situa a narrativa como a racionalidade que dá sentido à histó-

ria, bem como orienta o narrador, sujeito histórico, de forma prática notempo. Pela categoria do sentido, a narrativa permite que o narrador,ao articulá-la, perceba as contingências e as diferenças no tempo, a partirdisso interprete as mudanças, oriente-se no tempo e motive-se a agir,conferindo ao sujeito histórico uma identidade. Essa categoria “[...] arti-cula percepção, interpretação, orientação e motivação, de maneira que arelação do homem consigo e com o mundo possa ser pensada e realizadana perspectiva do tempo” (RÜSEN, 2001, p. 156).

 A consciência histórica se constitui a partir da “interpretação daexperiência do tempo com respeito à intenção quanto ao tempo”, e o

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Capítulo 7

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ato de constituição da consciência histórica pode ser descrito “comotransformação intelectual do tempo natural em tempo humano”(RÜSEN, 2001, p. 60).

Rüsen (1992a) relaciona, também, a narrativa histórica a umatipologia de expressão das consciências histórica e moral, ao que eledenomina competência narrativa da consciência histórica. Segundo oautor, por meio da narrativa histórica, é possível identificar os tipos deconsciência histórica e moral tradicional, exemplar, crítica e ontogené-tica , predominantes no narrador.

 As narrativas tradicionais articulam as tradições e relembram asorigens do que constitui a vida no presente. Conforme Rüsen (1993,p. 7), nessas narrativas, a consciência histórica funciona, em parte, “paramanter vivas essas tradições” e o passado é a referência para o presente.Na narrativa tradicional o tempo “ganha um sentido de eternidade”(RÜSEN, 1992a, p. 30).

 As narrativas exemplares expressam a validade de regras e princípiose generalizam experiências temporais de regras de conduta. Nessas narra-tivas, a história é vista como uma lição para o presente, como algo didáti-

co: historiae vitae maestrae  (história como mestra da vida). A consciênciahistórica exemplar revela a moralidade de um valor, ou de um sistema devalores pela demonstração de sua generalidade. A moral é compreendidacomo tendo validade atemporal. Nesse tipo de narrativa, o tempo “ganhaum senso de extensão espacial” (RÜSEN, 1992a, p. 31).

 As narrativas críticas caracterizam-se pela habilidade de negar astradições, regras e princípios, abrindo espaço para novos padrões. Essasnarrativas são consideradas anti-histórias. Rüsen (1993, p. 8-9) diz que

a consciência histórica crítica “busca e mobiliza uma classe específica deexperiência do passado: a evidência conferida pelas ‘contranarrações’”.Nesse tipo de narrativa, o tempo “ganha o senso de ser objeto de julga-mento” (RÜSEN, 1992a, p. 32).

 As narrativas ontogenéticas fundamentam, direcionam e explici-tam a mudança temporal e apresentam a continuidade como uma pos-sibilidade, ao incorporar as alterações dos modos de vida, necessáriosà sua permanência. É a “forma de pensamento histórico que vê a vidasocial em toda a sua complexidade e sua temporalidade absoluta”, emque “diferentes pontos de vista podem ser aceitos porque se integram

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em uma perspectiva que abrange a mudança temporal” (RÜSEN, 1993,p. 9). Na consciência histórica ontogenética, “os valores morais se tem-poralizam” e a moral “se despoja de sua natureza estática”. O raciocí-

nio moral depende do “argumento de mudança temporal” para poder“estabelecer a validade dos valores morais”. Nesse tipo de narrativa, otempo “ganha o senso de temporalidade” (RÜSEN, 1992a, p. 33).

 A consciência histórica funciona como uma forma específica deorientação em situações reais da vida presente, e tem como função ajudara compreender a realidade passada para compreender a realidade presen-te. A narrativa torna-se constitutiva da consciência histórica, pois é umaforma específica de significar a experiência do tempo e, para a constitui-

ção desse sentido, a narrativa deve estar vinculada à “experiência do tem-po de maneira que o passado possa tornar-se presente no quadro culturalde orientação da vida prática contemporânea” (RÜSEN, 1992a, p. 28).

A narrativa histórica e a sala de aula

 Aos estudos de Rüsen sobre a narrativa histórica, somam-se aspesquisas de Husbands (2003) sobre o trabalho com narrativas e sua

produção em sala de aula. Para ele, a narrativa histórica tem a funçãode gerar processos que permitem aos alunos buscar novas compreen-sões e significados pessoais sobre o passado, por meio da ativação dopensamento de quem aprende. Reside aí a importância de se explorar aconstrução das narrativas históricas em sala de aula.

Isto significa contar histórias, mas também pedir aos alunos queas recontem: submetê-las a um exame crítico, criando um senti-do ao que chamei de verossimilhança e à sua lógica. Envolve uma

dúvida construtivamente céptica sobre a natureza das históriasque contamos. Significa relacionar histórias com os princípiosorganizativos – as ideias de causa, continuidade, mudança – dodiscurso histórico complexo (HUSBANDS, 2003, p. 39).

Entre os pesquisadores que contribuíram para desenvolvercategorias para analisar as narrativas, destaca-se ainda Prost (1996,p. 236-259), que desenvolve alguns tipos analíticos para analisar as nar-rativas históricas: os relatos, os quadros e as tramas. O que caracterizaas narrativas como relatos é a ênfase na cronologia, ou seja, a ordena-ção dos acontecimentos no tempo, sendo necessários ao menos doiseventos seguidos para que seja possível descrever e estruturar um relato.

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Capítulo 7

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O que caracteriza a narrativa como quadro  reside na forma como ahistória é exposta, uma exposição que privilegie as particularidadesque conferem unidade e coerência entre acontecimentos e situações,

podendo ser exemplificado pelas análises de conjunturas que reúnemuma pluralidade de acontecimentos contemporâneos que se interligam,dando-lhe contornos de totalidade. A trama  como narrativa históricacaracteriza-se por privilegiar a elucidação dos conflitos, em detrimentodos acontecimentos e situações do passado. Constitui, ainda, a narra-tiva histórica como trama, a definição de uma temática central, de umaépoca, de atores e de episódios, para construção de uma narrativa par-ticular dentro de uma narrativa maior, a história.

Com base nos teóricos da história, diversas pesquisas vêm sendodesenvolvidas sobre a relação que alunos estabelecem com as narra-tivas históricas.

Em Portugal, na linha de investigação em cognição histórica situa-da, Gago (2001), partindo da pressuposição de que os alunos portu-gueses têm algum nível de pensamento histórico que precisa ser obser-vado, desenvolveu uma investigação para compreender como os alunos

pensam a narrativa histórica. Fez isso centrando seus esforços em obteras explicações dos alunos sobre “a existência de narrativas diferentessobre a mesma realidade” (p. 2).

Também em Portugal, Barca e Gago (2001, p. 38-39) analisaramnarrativas construídas por alunos a partir de três fontes históricas, edesenvolveram três categorias para ordenar a compreensão histórica dopassado de jovens portugueses:

compreensão fragmentada ●  – narrativas que expressam ideiasdispersas e falhas na compreensão e reformulação da expres-são escrita;

compreensão restrita ●  – narrativas que expressam uma com-preensão global, mas restritas às informações e expressões dasfontes, sem trabalhar com suas diferenças;

compreensão global●   – narrativas em que o aluno expres-sa uma compreensão ampla dos elementos concordantes ediscordantes presentes nas fontes, incluindo elementos de suaexperiência de vida.

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 multiperspectividade da história e seguiram a lógica dos manuais didá-ticos, predominando as narrativas fragmentadas que pouco absorveramdas explicações da professora (GEVAERD, 2009).

Esse jeito de os alunos produzirem suas narrativas indica duasquestões fundamentais. Primeiramente que, do ponto de vis-ta didático, a aula precisa ser modificada, pois é preciso trazeras ideias prévias dos alunos como elementos constitutivos daaprendizagem e da metodologia do ensino de história. Isto su-gere a necessidade de “levantar e trabalhar de forma diferenciadaas ideias iniciais que os alunos manifestam tacitamente”, mas,“tendo em atenção que estas ideias podem ser mais vagas oumais precisas, mais alternativas à ciência ou mais consentâneascom esta” (BARCA, 2004, p. 136). Esta é uma das vertentes

fundamentais ao se planejarem as atividades para uma aula naperspectiva da educação histórica (GEVAERD, 2009, p. 290).

Segundo Gevaerd (2009), outra questão importante é a necessidadede que os professores incorporem a ideia de que a narrativa histórica éconstitutiva da aprendizagem histórica, na qual ela não é um fim em simesma, mas um meio para produzir uma compreensão sobre o passado.Quando se trata do uso da narrativa no ensino de história, para Gevaerd(2009), o campo da educação histórica assume um papel importante,

uma vez que leva em consideração não só o desenvolvimentodo pensamento histórico dos alunos em relação à compreen-são de situações do passado, mas também os procedimentosmetodológicos usados pelos historiadores que são levados paraa sala de aula em situações de ensino e aprendizagem (p. 291).

O principal estudo sobre o uso da narrativa em sala de aula noBrasil é parte do projeto “Aprender a ler, aprender a escrever em histó-ria”, coordenado por Maria Auxiliadora M. S. Schmidt, que publicou

resultados parciais das pesquisas na revista Tempos históricos , da Univer-sidade do Oeste do Paraná – Unioeste, no primeiro semestre de 2008,sob o título “Perspectivas da consciência histórica e da aprendizagemem narrativas de jovens brasileiros”.

Schmidt (2008), fundamentando a análise dos resultados dainvestigação “Perspectivas da consciência histórica em jovens brasilei-ros” (COMPAGNONI et al., 2006), conclui que a narrativa históricadesempenha um duplo papel dialético na dinâmica do ensino de histó-ria, elaborando a evidência e explicitando a consciência, subjetivando oque é objetivo e objetivando o que é subjetivo:

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Capítulo 7

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aprender é um processo dinâmico, no qual a pessoa que apren-de muda porque algo é obtido, algo é adquirido, num insight ,habilidade ou a mistura de ambos. No aprendizado históricoa “história” é obtida porque fatos objetivos, coisas que acon-

teceram no tempo, tornam-se uma questão de conhecimentoconsciente, ou seja, eles tornam-se subjetivos. Eles começam afazer um papel na mente de uma pessoa, porque a aprendiza-gem de história é um processo de, conscientemente, localizarfatos entre dois polos, caracterizado como um movimentoduplo, ou seja, primeiramente é a aquisição de experiênciano decorrer do tempo (formulado de maneira abstrata: é osubjetivismo do objeto); em segundo lugar é a possibilidadedo sujeito para analisar (ou seja, o objetivismo do sujeito). Issonão significa que essa aprendizagem seja empiricamente apre-

sentada de uma forma fragmentada e seca (objetiva) e sim-plesmente reproduzida conscientemente – ou seja, simples-mente objetiva. Isso não significa também que a pessoa queestá aprendendo seja simplesmente entregue ao que a históriaestá ensinando a ele ou ela, mas que ocorre um movimentode autoconhecimento, o qual pode ser expresso por meio danarrativa histórica (SCHMIDT, 2008, p. 82-83).

Narrativa elaborada por aluna da 3ª série (4º ano do ensino denove anos) do Ensino Fundamental, a partir de três entrevistasfeitas pela turma com trabalhadores no projeto “Recriando his-tórias de Araucária”10.

“Nossa sala já fez três entrevistas e nessas três aprendemos muito. Apren-

demos algumas coisas bem importantes.

Com o seu José aprendemos que devemos ter boas relações com o nosso pa-

trão quando ficarmos maiores. Vimos uma coisa impressionante: que a gente,

 hoje, só vai trabalhar quando ficarmos maiores e o seu José começou com

apenas nove anos na lavoura de café. Também acho que devemos agradecer

 por nós termos cinco dias de aula e dois de descanso, e olha que só estamos

estudando. O seu José tinha seis dias para trabalhar e um de descanso. Tam-

 bém vimos que o trabalho não é fácil. Vimos que quando temos um sonho de

ter uma profissão, temos que batalhar porque não é fácil de conseguir; que de-

 vemos ficar felizes com a vida boa que temos porque a vida dele não era fácil.

10 Narrativa elaborada pela aluna Bruna Ferreira Padilha, da Escola Municipal ProfessoraSilda Sally Wille Ehlke (SCHMIDT; GARCIA, 2008, p. 165).

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Capítulo 7

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sobre o conteúdo e, por último, a comunicação da aprendizagem apósa intervenção pedagógica. Essa comunicação pode ser em forma deprodução de narrativas.

O trabalho com produção de narrativas históricas constitui-se emuma mudança metodológica que, implementada com crianças dos anosiniciais, permite familiarizá-las com esse tipo de instrumento. Já comalunos de etapas mais avançadas, pode haver resistências com a produ-ção de narrativas, devido à falta de familiaridade com essa prática pe-dagógica, que só será superada na prática. O que pode contribuir paradiminuir essas resistências é o trabalho com um viés significativo doconteúdo – dado que a investigação das ideias históricas prévias pode

fornecer –, bem como o estabelecimento de funções comunicativas ouaté mesmo avaliativas para a narrativa.

Síntese

Neste capítulo, vimos que a narrativa histórica se confunde com aprópria história, que é temática recorrente dos filósofos da história que já chegaram a negar sua possibilidade, devido à subjetividade do nar-rador. No entanto, a narrativa histórica foi resgatada como produçãode sujeitos históricos com ideias próprias, que reconstituem o passadono seu contexto. É uma reconstituição das experiências humanas dopassado fundamentada em evidências.

 As pessoas estabelecem relações com a narrativa histórica de diver-

sas formas, tanto com seu conteúdo quanto com sua estrutura histórica,sendo central na vida das pessoas e, por extensão, ao ensino de história,pois é instrumento para o desenvolvimento da consciência histórica, éparte constitutiva desta. A narrativa é a racionalidade que dá sentido àhistória e orienta seu narrador de forma prática no tempo, pois articulapresente, passado e futuro.

No ensino de história, a narrativa histórica em forma de rela-tos, quadros e tramas tem a função de gerar processos que permitamaos alunos buscar novas compreensões e significados pessoais sobre opassado, por meio da ativação do pensamento de quem aprende. Ao

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produzirem narrativas históricas, as crianças, os jovens e os adultospodem expressar-se de forma mais ou menos fragmentada, restrita ouglobal, dependendo do nível de compreensão e da riqueza das fontes a

que têm acesso para a produção. A narrativa histórica desempenha umduplo papel dialético na dinâmica do ensino de história, elaborando aevidência e explicitando a consciência, subjetivando o que é objetivo eobjetivando o que é subjetivo.

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Neste capítulo será aprofundado o aspecto metodológico doensino de história na perspectiva da educação histórica. Nos capítulosanteriores, 4 e 7, foram explicitados dois encaminhamentos metodoló-gicos fundamentais: a investigação das ideias históricas prévias de crian-ças, jovens e adultos e um roteiro para a incorporação metodológicadestas ideias em uma unidade temática investigativa; e a importânciado resgate da produção de narrativas históricas.

 Além desses encaminhamentos metodológicos já trabalhados, é per-tinente aprofundar o tratamento de fontes e documentos históricos comoparte do processo de ensino de história, e tecer algumas considerações sobrea avaliação, que está implícita em toda metodologia. Antes de tratar sobre otrabalho com fontes e documentos históricos, apresentaremos três concei-tos históricos de segunda ordem, importantes para o tratamento das fontese documentos: a temporalidade, a evidência e a inferência históricas.

A temporalidade

Se existe uma unanimidade entre pesquisadores da área de história,de historiadores a professores, trata-se do entendimento de que a tem-poralidade histórica é uma categoria central do pensamento histó-rico. No entanto, há uma evolução na compreensão dessa categoria esuas implicações para o ensino de história. Nessa perspectiva, Siman(2005) fez a seguinte consideração:

Para se compreender a temporalidade das ações humanas, alémde ser necessário elucidar essas relações, não se pode esquecer o

sentido do tempo, nas suas mais diferentes formas de manifes-tação e construção intelectual, varia de acordo com as socieda-des, mudando de acordo com o passar do tempo (p. 109).

Metodologia

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No ensino de história, o tempo histórico tem sido compreendidotradicionalmente como ideia de linearidade cronológica , com os fatosdo passado organizados em torno de uma linha do tempo. Essa ideia de

tempo linear sofreu diversas críticas durante o século XX, sendo nega-da, suplantada e incorporada por outras ideias de temporalidade.

O marxismo contribuiu com a ideia de tempo como processo his-tórico/historicidade, como construção de vários sujeitos em um campode múltiplas possibilidades, ela não é cíclica nem linear, mas, sim, dinâ-mica e contraditória, podendo ter avanços, recuos ou retrocessos.

 A Escola dos Annales contribuiu com duas ideias de temporalida-de, a mais conhecida é a ideia de tempo como curta, média e longaduração/multiplicidade temporal, em que o tempo curto compreen-de o tempo do indivíduo, do acontecimento, da narrativa, do fato,enquanto elemento de uma série e não pela sua unicidade. O tempomédio compreende a conjuntura, usada para designar as mudanças maisfrequentes e momentâneas. O tempo de longa duração compreende otempo das estruturas, com permanências, por vezes, seculares.

Outra contribuição da Escola dos Annales, na vertente da nova his-

tória, refere-se à ideia de tempo passado e presente como recorrênciahistórica ,  com viés mais metodológico, na perspectiva de reelaboraro conhecimento histórico produzido na relação presente/passado/pre-sente, estabelecendo relações entre a sociedade em que se vive e outrassociedades em diferentes tempos e espaços (aqui/agora, agora/em outrolugar, aqui/antigamente, outro tempo/outro lugar). A ideia de tempocomo recorrência histórica visava quebrar com a noção de tempo lineare único, e despertar a percepção das múltiplas dimensões temporais

micro no macro, para além da linearidade cronológica. Ao se tratar do passado, é pertinente considerar também as ideias

de tempo sincrônico, diacrônico e anacrônico. O primeiro refere-seà simultaneidade dos acontecimentos, o segundo ao entrelaçamento deacontecimentos com o passado e o terceiro à “mistura” de acontecimen-tos de tempos históricos diferentes.

Fazendo uma síntese que incorpora as ideias anteriores, Siman(2005, p. 110) considera o tempo histórico como central na experiên-cia humana, por ser estruturante do pensamento e da ação humana,sendo, portanto, central na história e no seu ensino. Para Rüsen (1993),

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Capítulo 8

Fundamentos e Metodologia do Ensino de História

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a  ideia de tempo histórico como categoria central da história  e doensino de história deve incorporar todas as ideias de tempo históricopara construir a ideia de tempo como consciência histórica 11, na qual

o presente e o passado são lugar de experiência humana e de gesta-ção do futuro, a consciência histórica nasce do entrelaçamento críticopresente/passado/futuro, possibilitando a dialética construção/recons-trução da identidade humana, potencializada pelo desenvolvimento daliteracia histórica.

 A ideia de tempo como consciência histórica, que incorpora asdemais ideias de tempo, manifesta-se nesse depoimento de uma profes-sora, em uma investigação sobre a ideia de professores sobre conceitos

históricos de segunda ordem: A compreensão do processo histórico de uma temática es-tudada remete a possibilidade da recorrência histórica   queimplica no domínio da cronologia . Por exemplo, a partir doestudo de uma temática como a “democracia”: é necessáriopesquisar o que o aluno entende sobre o tema, trabalhar comele o processo de construção na história  do conceito de de-mocracia (seu significado em diferentes épocas históricas –suas permanências/mudanças, semelhanças/diferenças). A

partir desses estudos, torna-se possível a recorrência histórica  no sentido de ajudar o aluno a pensar historicamente e ad-quirir uma consciência histórica  do conceito de democracia.Nesse sentido a compreensão da cronologia  torna-se um ins-trumento para a recorrência histórica  que se fez necessária(THEOBALD, 2007a, p. 178, grifos do autor).

Essa ideia de tempo histórico é referenciada por Siman (2005), aoafirmar que:

O tempo histórico é produto das ações, relações e formas depensar dos homens e essas ações variam ao longo do tempocronológico. Em cada tempo histórico – ou em cada presen-te – coexistem relações de continuidade e de rupturas como passado, bem como perspectivas diferenciadas de futuro.

 Assim, as mudanças e permanências que acontecem num de-terminado tempo não se explicam pelo que aconteceu numtempo cronológico imediatamente anterior; no entanto, nãopodemos prescindir da cronologia para construir demarcaçõesdos processos históricos (p. 111).

11 A ideia de tempo como consciência histórica é formulada a partir do conceito de cons-ciência histórica de Rüsen.

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 A ideia de temporalidade constitui-se na principal ideia histórica desegunda ordem, da especificidade da história, que está presente em todasa propostas, parâmetros e diretrizes de ensino de história consultados. A

novidade, no entanto, é o conceito de gênese crítica das temporalidadecomo manifestação de níveis de operação da consciência histórica.

A evidência e a inferência históricas

 Além da temporalidade, outras duas categorias importantes para acompreensão do passado e de sua reconstrução são a evidência e a in-ferência históricas. São categorias fundamentais para o tratamento das

fontes e dos documentos históricos, portanto, fundamentais no méto-do de ensino de história.

Os conceitos de inferência e evidência históricas foram articuladospelo filósofo da história Collingwood (2001). Esse pesquisador inglêsparte do pressuposto de que a história é

[...] uma ciência de tipo especial. É uma ciência, cujo objetivoé estudar eventos não acessíveis à nossa observação e estudarinferentemente  estes eventos, argumentando em relação a

eles, a partir de algo diverso, que é acessível à nossa observação– aquilo a que o historiador chama “provas” dos eventos quelhe interessam (p. 262, grifo nosso).

Essas “provas” dos eventos são as evidências do passado, e a possi-bilidade de fazer inferências sobre essas evidências do passado torna aciência histórica crítica e orgânica, permitindo transformar os testemu-nhos do passado em conhecimento histórico, desde que confirmadospelo tratamento e testemunho das fontes.

Para Ashby (2003), o trabalho com a inferência de evidências dopassado é o caminho “para fornecer aos alunos uma compreensão danatureza da investigação histórica ” (p. 37). A investigação histórica éfundamental no ensino de história, pois é um dos conceitos históricosque sustentam a compreensão da história como uma disciplina, juntocom a compreensão histórica , o conhecimento e compreensão deacontecimentos, povos e mudanças do passado, a interpretação his-tórica  e a organização e comunicação da aprendizagem.

Partindo do pressuposto de que os alunos, assim como os his-toriadores, podem fazer inferências diretas sobre fontes e evidências

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do passado, a pesquisadora inglesa está convencida de que a educaçãohistórica deve assegurar ao aluno a compreensão de que o conheci-mento sobre o passado está assentado “na interpretação do material

que o passado deixou para trás, que isso foi reconstruído com base naevidência, não sendo uma simples cópia do passado” (ASHBY, 2003,p. 41). Por isso, é importante que os professores desenvolvam ativi-dades de aprendizagem que permitam aos alunos o contato com vá-rios tipos de objetos, de materiais que relembrem o passado, “fazer eresponder questões que visam interrogar e avaliar fontes em relação ainvestigações particulares e no contexto da sociedade que as produziu”(ASHBY, 2003, p. 39).

Segundo Ashby (2003), o ensino da investigação histórica   visadesenvolver as seguintes aptidões nos alunos:

aproximação reflexiva do conhecimento;●

respeito pela verdade;●

respeito pela evidência;●

imparcialidade na gestão de conflitos;●

predisposição para reexaminar certezas apreendidas;●

reconhecimento de julgamentos válidos e bem fundamentados;●

admissão de controvérsia;●

predisposição para considerar o contexto no qual o discurso,●

intenção ou ação são relatados.

Um espaço privilegiado para proporcionar aos alunos a opor-

tunidade de realizar inferências sobre fontes históricas é o museu.Compagnoni (2009), em sua dissertação de mestrado Em cada museuque a gente for carrega um pedaço dele: compreensão do pensamento histó-rico de crianças em ambiente de museu, desenvolveu um estudo visandoanalisar a possibilidade do desenvolvimento da consciência históricadas crianças/alunos durante aulas-visitas a museus.

Para Compagnoni (2009), a aula-visita ao museu revelou-se umaatividade estimulante diante da falta de motivação dos alunos nas au-las de história, levando-os a produzirem narrativas históricas para alémdas costumeiras cópias, tornando-os “espertos para contar a história,

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para narrar de forma que as ideias fluam espontaneamente, sem apreocupação usual com o decorar para, em seguida, contar artificial-mente” (p. 110-111).

 A aula-visita permite, ainda, despertar nas crianças a identidadede aluno pesquisador, faltando, no entanto, uma preparação dos pro-fessores para que superem a visão dos museus como locais e espaços emque a história é estática, pronta e acabada, não reconhecendo os acervoscomo documentos e evidências históricas, que tornam possível umainvestigação racional sobre o passado (COMPAGNONI, 2009).

Pensa-se que embora os professores tenham percebido queaqueles objetos, documentos, provocavam, estimulavam as

crianças/alunos, os professores, ao elaborarem os projetosde aula-visita, consideravam que as crianças/alunos estavamdiante da história desvelada. O que parece é que os pro-fessores não possuem leituras suficientes sobre o que seja aevidência dentro do ensino de história, ou sobre como uti-lizar os museus em suas aulas, como espaços cujos objetos edocumentos constituem evidências de que há um passado, eque este não está narrado. É no trabalho todo do seu projetoque a história vai ser desvelada para as crianças/alunos, e quevai aparecer no texto, na narrativa desses sujeitos estudantes

(COMPAGNONI, 2009, p. 111-112).

Com a sua pesquisa, Compagnoni (2009) contribuiu com aconstrução desse conceito de aula-visita   ao museu como forma deestímulo de relação consciente de crianças/alunos com o passado,tornando a aprendizagem de história mais significativa, permitindouma compreensão da história de forma mais cuidadosa e satisfatória, já que, quando os alunos são “envolvidos em temas e metodologias

que respeitam a natureza da história, eles passam a considerá-la inte-ressante, aprendem, e vão ganhando uma consciência histórica cadavez mais elaborada” (p. 112).

Esse ato educativo de levar as crianças/alunos aos museus paraque estes entrem em contato com os objetos e documentosno ensino de história contribui para que os discursos diver-sos, as vozes silenciadas, sejam recuperados e valorizados pelosalunos, na construção do conhecimento histórico e na for-mação de sua consciência histórica, dando sentido à sua vida,

na perspectiva de um horizonte de lutas e sofrimentos, mastambém de conquistas de direitos e deveres como cidadãos(COMPAGNONI, 2009, p. 109).

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O trabalho com documentos e o tratamento defontes históricas

Partindo do pressuposto de que o passado, para ser compreendidonas diversas dimensões da temporalidade, deve ser inferido em suasevidências, o método mais coerente é trabalhar com os documentos eas fontes históricas.

Há diversos registros da incorporação e da utilização de documen-tos no ensino da história em manuais e livros didáticos e a defesa de seuuso em sala de aula durante todo o século XX 12. No entanto, ao finaldo século passado, há uma mudança no entendimento das finalidades

de seu uso nas aulas de história.Se antes a função dos documentos era apenas de comprovar, ilus-

trar, informar ou motivar o estudo de um conteúdo, agora tomar os do-cumentos históricos como fontes é compreendê-los como evidências desituações vividas no passado. Os documentos são portadores de signi-ficados não elucidados que necessitam de tratamento, problematizaçãoe significação do professor e dos alunos em situação de aprendizagem,para possibilitar a reconstrução do passado.

Segundo Caimi (2008), essa transformação na forma de tratar osdocumentos como fontes no ensino de história tem origem na mudan-ça de sua compreensão pelas pesquisas historiográficas. Para a pesqui-sadora, essa mudança no ensino de história pode ser constatada nosseguintes aspectos:

a) a compreensão da relatividade do conhecimento histó-rico, fruto não de verdades definitivas, mas do olhar dohistoriador – sempre seletivo –, do método e das fontes;

b) ruptura com a ordenação temporal e espacial dos conteú-dos, fundamentada na noção de múltiplas temporalidadese na perspectiva francesa da história por eixos temáticos;

c) consenso em torno da impossibilidade de estudar todaa história da humanidade, de todas as épocas e lugares,e da necessidade de fazer recortes de temáticas e proble-máticas de estudo nos programas escolares, com base em

12  Para ver um breve histórico do tratamento das fontes e documentos históricospela historiografia e sua presença nos manuais didáticos, consultar Caimi (2008).Disponível em <http://www.seer.ufrgs.br/index.php/anos90/article/download/.../475>.

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 preocupações advindas das práticas sociais e das proble-máticas do tempo presente;

d) compreensão da memória histórica como instrumento deluta, de emancipação e de transformação social, na medi-da em que contribui para o desenvolvimento de habilida-des de pensamento que permitem a desnaturalização dopassado e o questionamento das tradições herdadas;

e) incorporação de diversas linguagens de ensino, com espe-cial atenção para o cinema, a música, a imagem e docu-mentos históricos impressos em geral;

f ) tentativa de substituição da memorização pela reflexãohistórica, favorecendo a aprendizagem pela descoberta epela construção do conhecimento;

g) ênfase na produção do conhecimento pelo manuseio de fon-tes históricas, visitações a arquivos, museus, sítios arqueo-lógicos, destacando-se o esforço de promover a apropriaçãodos procedimentos da pesquisa histórica, pelos estudantes;

h) valorização da história local pelo estudo do meio e pelamemória oral (CAIMI, 2008, p. 132).

 As pesquisas em educação histórica acrescentaram a importânciado tratamento de documentos e fontes históricas pelos alunos emsituação de aprendizagem, como forma de contribuir com a instru-mentalização de ideias históricas de segunda ordem: de compreen-são do documento histórico como evidência  do passado, sobre oqual é possível fazer inferências e, a partir delas, produzir narrativas sobre o passado, diversas das narrativas do professor ou do manualdidático. É a possibilidade de dotar o aluno de uma estrutura utilizá-vel do passado, contribuindo com o desenvolvimento de sua literaciahistórica e com o aprimoramento de sua consciência histórica. Nessaperspectiva “é imprescindível que a história seja trabalhada nas aulasincorporando toda sua coerência interna e oferecendo chaves parao acesso a sua estrutura como conhecimento científico do passado”(PRATS, 2006, p. 204).

 A utilização escolar de fontes e documentos históricos é preconiza-da pelos PCN, que os tomam como

obras humanas que registram, de modo fragmentado, pe-

quenas parcelas das complexas relações coletivas. São inter-pretados, então, como exemplos de modos de viver, de vi-sões de mundo, de possibilidades construtivas, específicas de

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 contextos e épocas, estudados tanto na sua dimensão material(elementos recriados da natureza, formas, tamanhos, técni-cas empregadas), como na sua dimensão abstrata e simbólica(linguagens, usos, sentidos, mensagens, discursos) (BRASIL,

1998, p. 55).Os PCN entendem que o professor é central no trabalho com

documentos históricos, sendo necessário desenvolver uma competên-cia específica para utilizá-los pedagogicamente, pois “cabe ao professorensinar os seus alunos a realizar uma leitura crítica de produções deconteúdos históricos, distinguindo contextos, funções, estilos, argu-mentos, pontos de vista, intencionalidades” (BRASIL, 1998, p. 56).

O encaminhamento que os PCN propõem tem como pano de fun-do um misto de interpretação de texto, didática geral e didática da histó-ria, com predominância de questões específicas da ciência histórica. Issopode ser percebido nas questões a serem feitas às fontes propostas:

Podem ser criadas situações em que os alunos aprendam a ques-tionar e a dialogar com os textos: em que contexto histórico foiproduzido? Quais os fatos e os sujeitos históricos que foramprivilegiados? Existiria a possibilidade de privilegiar outros su-

 jeitos e outros fatos? Como o tempo está organizado? Quais

os argumentos defendidos pelo autor? Como está organizadoo seu ponto de vista? Existem outras pessoas que defendem asmesmas ideias? Como pensam outras pessoas? Como se podepensar de modo diferente do autor? Qual é a opinião pessoalsobre o que o autor defende? (BRASIL, 1998, p. 56).

O Currículo Nacional de História de Portugal  avança na concep-ção da utilização das fontes históricas no ensino de história, pois ascompreende como conceito referente à natureza do saber histórico, in-

tegra-as aos princípios do ensino de história por possibilitarem aos alu-nos construírem inferências e desenvolverem ferramentas intelectuaispara compreensão e interpretação da realidade:

O pensamento histórico envolve não só a compreensão de“conceitos substantivos” (por exemplo: democracia atenienseou revolução industrial), como também a compreensão implí-cita de conceitos referentes à natureza do saber histórico (porexemplo: fonte, interpretação, explicação, narrativa). As meto-dologias que os alunos experienciam veiculam uma determi-

nada leitura destes conceitos: se a simples memorização da in-formação apresenta a história como um relato fixo do passado,propondo uma postura passiva perante o saber, a construção

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de inferências a partir de fontes diversas indicia uma visãoda história apta a fornecer ferramentas intelectuais indis-pensáveis à interpretação e explicação da realidade, que édinâmica  (PORTUGAL, 2001, p. 87, grifos nossos).

O currículo de história luso também define o tratamento de in-formação/utilização de fontes como um dos eixos de competênciasespecíficas a ser desenvolvido pelo ensino de história. Como suportepara desenvolver essa competência, propõe experiências de aprendiza-gem para atingi-las, por ciclo de aprendizagem:

1º ciclo:

• Utilização de alguns processos simples de conhecimento darealidade envolvente: observar, inquirir, descrever, formularquestões e problemas, avançar possíveis respostas, confirmar.

• Distinção de fontes de informação com diferentes lingua -gens: orais, escritas, iconográficas, gráficas, monumentais.

• Interpretação de fontes diversas em torno dos conceitosessenciais para a compreensão social e histórica.

2º ciclo:

• Utilização de técnicas de investigação: observar e descreveraspectos da realidade física e social; recolher, registrar e tra-

tar diferentes tipos de informação; identificar problemas;formular hipóteses simples; elaborar conclusões simples.

• Interpretação de informação histórica diversa e com dife-rentes perspectivas. Exemplos de actividades: organizaçãoe elaboração do atlas da aula  e friso cronológico; análisede documentos escritos (adaptados); análise de documen-tação iconográfica (a privilegiar necessariamente); análisede documentação gráfica (sobretudo gráficos de barrase sectogramas); análise de documentação cartográfica(mapas com escala gráfica); organização de dossiers temá-

ticos ; organização de ficheiros temáticos, de conceitos oude referências bibliográficas.

3º ciclo:• Utilização da metodologia específica da história: participar

na selecção de informação adequada aos temas em estudo;distinguir fontes de informação histórica diversas: fontesprimárias e secundárias, historiográficas e não historiográ-ficas (ficção, propaganda...); interpretar documentos commensagens diversificadas; formular hipóteses de interpreta-

ção de factos históricos; utilizar conceitos e generalizaçõesna compreensão de situações históricas; realizar trabalhossimples de pesquisa, individualmente ou em grupo.

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documento é a forma como o aluno vai comunicar o que aprendeuem relação à análise dos dados de identificação, o que compreendeuem relação à explicação do documento, explicitando-o em ordem cro-

nológica ou temática, fundamentando suas argumentações nos dadosdo próprio documento, as impressões que ficaram sobre a importânciae o grau de empatia com o documento e as ideias e questões que elecontém e suscita.

O roteiro proposto por Schmidt e Cainelli (2004) para o uso dedocumentos históricos também pode ser utilizado para o trabalho comdocumentos em estado de arquivo familiar, conceito desenvolvido por Artiere (1997) e utilizado pelo projeto “Recriando história”, desenvol-

vido pela Universidade Federal do Paraná com professores e alunosdo Ensino Fundamental. Nesse projeto, os documentos em estado dearquivo familiar são utilizados para recriar a história local, resultadoassim descrito por Schmidt e Garcia (2008):

Um dia, professores, alunos e pesquisadores resolveram andarpelo passado através da história que as pessoas carregam, [...], foipreciso compor e recompor documentos, informações e memó-ria, tudo aquilo que trazia o gosto do longe – de outros lugares e

de outros tempos – e foi transformado em lembranças e relíquiaspessoais. Tudo o que foi juntado e guardado em caixas, baús, nofundo das gavetas e na memória de cada um (p. 6).

Quanto aos resultados desse trabalho com os documentos,

[...] alunos, professores e pesquisadores descobriram que aspessoas são mochileiras do tempo. Elas transportam, de umlugar ao outro, muitas provas de experiências que viveram oudeixaram de viver. Por isso, elas carregam a possibilidade da suahistória ser feita, contada e narrada em palavras que, como dizo poeta, vão retirando devagar o pó, a umidade das lembrançasfazendo brilhar o passado, o presente (e o futuro) de muitas vi-das apagadas pelo tempo (SCHMIDT; GARCIA, 2008, p. 6).

Do ponto de vista da metodologia do ensino de história, o depoi-mento de uma professora que participou do projeto manifesta umamudança estrutural em sua consciência, desencadeada pela experiênciadidática vivenciada: “A impressão que a gente tem é que não existe ma-terial para trabalhar história, mas ao contrário, eu é que não percebiaa qualidade do material que tinha. Comecei a gostar de história [...]”(SCHMIDT; GARCIA, 2008, p. 8).

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Capítulo 8

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Avaliação

Partindo do princípio de que o objetivo fundamental do ensino dehistória é contribuir para o desenvolvimento da literacia histórica e o apri-

moramento da consciência histórica, perceptíveis na progressão das ideiashistóricas expressas por meio da consciência narrativa, o método avaliativomais coerente passa pela análise das narrativas produzidas pelos alunos paracomunicarem as ideias históricas reelaboradas após a intervenção pedagógica.

Como o método mais coerente para compreender o passado nasdiversas dimensões da temporalidade passa pela inferência das evidên-cias por meio do trabalho com os documentos e as fontes históricas,

esse processo também deve ser avaliado por meio de atividades queprivilegiem o tratamento das fontes e documentos históricos.

Outro aspecto que não deve ser desconsiderado na avaliação é asua singularidade. A partir da investigação das ideias históricas préviasdos alunos, o parâmetro para avaliar a progressão desse conhecimento éo próprio aluno, não havendo um nível a ser alcançado por todos, mas,sim, uma progressão de ideias após a intervenção pedagógica, tomandocomo base as ideias históricas prévias.

Da teoria para a prática

 A metodologia do ensino de história na perspectiva de uma educa-ção histórica articula a teoria com a prática.

O conceito de literacia histórica envolve o desenvolvimento deinstrumentos práticos de orientação no tempo: uma compreensão dadisciplina de história por meio da leitura contextualizada do passado apartir de evidências fornecidas por diversas fontes e o desenvolvimentode uma estrutura utilizável do passado, ou seja, a competência de com-preender o passado de forma multiperspectivada.

O conceito de consciência histórica opera de forma prática comoum modo específico de orientação em situações reais da vida presente.Essa orientação só é possível mediante a compreensão das experiênciaspassadas que devem iluminar a realidade e os movimentos de mudança

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do presente. Os movimentos e mudanças do presente também sofremas influências das expectativas de futuro, que por sua vez são balizadas esinalizadas pelas mudanças e permanências da vida prática diária.

Na prática, em sala de aula, cabe ao professor investigar as ideiashistóricas prévias dos alunos para fundamentar e fornecer parâmetrospara a intervenção pedagógica, visando contribuir com a progressão dasideias, tanto com a contribuição de conteúdos históricos substantivosdiversos e conteúdos históricos de segunda ordem, da natureza da histó-ria. Ainda, deve-se buscar desenvolver a literacia, o pensar e a consciên-cia históricas, por meio do desenvolvimento das competências narrati-vas, elaborando textos a partir da inferência das evidências, do trabalho

com fontes e documentos históricos, experiência de aprendizagem quepermite articular mudanças estruturais na consciência histórica.

Para desenvolver um trabalho pedagógico utilizando o filme comodocumento histórico, a sugestão é acessar o roteiro de Santos e Schmidt(2008):  A revolta dos posseiros, através do filme documentário “1957 – aconquista do Sudoeste” , disponível no endereço: <http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/pde/arquivos/157-2.pdf>. Nesse trabalho, osautores propõem um roteiro que vai da investigação dos conhecimentos

prévios à elaboração de narrativas, utilizando o filme como documento.Para desenvolver um trabalho com histórias em quadrinhos, a

sugestão é consultar a pesquisa de Fronza (2007): O significado das his-tórias em quadrinhos na educação histórica dos jovens que estudam noEnsino Médio,  disponível em: <http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/PesquisaObraForm.do?select_action=&co_autor=44027>.

 As pesquisas em educação histórica estão desenvolvendo outras

metodologias específicas da didática da história que, com o auxílio datecnologia da informação, podem ser acompanhadas e consultadas pe-los professores e incorporadas em sua prática.

Síntese

O tempo histórico é fundamental na experiência humana, poisestrutura o pensamento e a ação humana, sendo central na história e no

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Capítulo 8

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seu ensino. A  ideia de tempo como consciência histórica  incorporatodas as noções de tempo histórico: a idéia cronológica linear; a ideia deprogresso; a ideia de curta, média e longa duração; a ideia de recorrên-

cia histórica; as ideias de diversidade e dinamicidade temporal. Além da temporalidade, a evidência e a inferência históricas são

categorias importantes para a investigação, compreensão e reconstru-ção do passado, pois são fundamentais para o tratamento das fontes edos documentos históricos, portanto, fundamentais na metodologia doensino de história.

Um espaço privilegiado para proporcionar aos alunos a oportuni-dade de realizar inferências sobre fontes históricas é o museu, por meiode aulas-visitas que motivam os alunos a produzirem narrativas históri-cas de forma espontânea, transformando-os em alunos pesquisadores.

O passado, para ser compreendido nas diversas dimensões da tem-poralidade, deve ser inferido em suas evidências por meio do trabalhocom os documentos e as fontes históricas, pois estes são portadores designificados não elucidados que necessitam de tratamento, problemati-zação e significação do professor e dos alunos em situação de aprendi-

zagem, como forma de contribuir com a instrumentalização de ideiashistóricas de segunda ordem.

Uma avaliação coerente privilegia a singularidade, toma as ideiashistóricas prévias como referência para avaliar a sua progressão com asintervenções pedagógicas.

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Anacrônicos 

Uma compreensão anacrônica é aquela que “mistura” elementos detempos históricos diferentes, muito comuns em desenhos animados(Flinstones ), no cinema e nas ideias históricas de senso comum.

Annales

Nome dado ao movimento historiográfico surgido em torno do periódico

acadêmico francês Revue des Annales   (Revista dos Annales), tendo

se destacado por incorporar métodos das ciências sociais à história.

Destacaram-se os historiadores Marc Bloch, Lucien Febvre, Fernand

Braudel, Jacques Le Goff, Pierre Nora, Philippe Ariès e Michel Vovelle.

Atlas da aula

Planta baixa da sala.

Axiologia

Ciência que estuda os valores éticos e morais.

Categorizadas

Organizadas por categorias.

Clonagem educativa

Dubet e Martuccelli (1997) utilizam esse termo para referir-se àconcepção sociológica de escola funcionalista e/ou reprodutivista.Na primeira concepção, a escola tinha a função de formar pessoaspara desenvolver papéis sociais preestabelecidos (clone aí se re-fere à forma). Na segunda concepção, a escola reproduz (clona) ojá existente.

Glossário

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FAEL

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Cognição histórica situada

A historiadora Maria Auxiliadora Schmidt (2009) resume cogniçãohistórica situada como sendo o ensino de história que incorpora de

forma sistemática as ideias históricas que crianças e jovens já pos-suem, e a partir destas planeja sua intervenção pedagógica situadana ciência da história.

Consciência histórica

É a capacidade de uma pessoa de interpretar o passado para orientarseu presente, balizado pelas expectativas de futuro, conforme defini-ção do historiador alemão Jorn Rüsen (1993).

Constructos

A teoria dos constructos pessoais foi desenvolvida por George A.Kelly (1975) a partir do alternativismo construtivo. Para essa teoria,o significado que atribuímos à experiência é resultado de uma cons-trução científica individual. Elaboramos teorias acerca do que nosrodeia e testamos estas teorias através de nossa experiência indivi-dual da realidade, adaptando-as para uma antecipação mais precisados acontecimentos, visando uma melhor interação com o meio em

que vivemos.

Desvelar

Descobrir, evidenciar, dar visibilidade, tornar público.

Dialogia

Pedagogia do diálogo.

Emergente

Aquilo que ainda está em formação. No caso, sociedade pós-indus-trial em formação.

Epistêmica

Como o saber é construído. Os componentes específicos de umaciência, de um saber.

Eventificadas

Tornadas eventos isolados.

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Ficheiros

Pastas.

Formação generalistaQuando a formação superior não é licenciatura plena, mas geral,como no caso da pedagogia, em que o professor recebe formaçãogeral em diversas ciências ou disciplinas.

Friso cronológico

Linha do tempo.

FundamentalismosCorrente de pensamento que defende princípios fundamentais, masnão os atualiza diante das mudanças históricas e culturais e dosavanços científicos.

Iconográficas

A iconografia refere-se à descrição das imagens, é uma forma de lingua-gem visual que utiliza a imagem para representar determinado tema.

Ideias tácitas

Ideias que não são expressas ou não são ditas, mas são supostas esubentendidas.

Ideologizada

Carregada de ideologias.

Imbricadas

Juntas, entrelaçadas.

Inculcação

Imposição unilateral de ideias e conceitos. No caso, refere-se a umaimposição cultural unilateral, sem filtro e participação do “receptor”.

Literacia histórica

Para o historiador inglês Peter Lee (2006), literacia histórica é acapacidade de “leitura” e compreensão do passado e a transforma-ção dessa compreensão em ferramenta utilizável no presente.

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FAEL

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Magistra vitae

Mestra da vida.

Media

Em Portugal, utiliza-se a palavra media para designar os meios decomunicação de massa.

Mitigada

Algo que foi abrandado, diminuído em relação ao original.

Multiperspectivado

No ensino de história refere-se às diversas perspectivas com queum fato histórico do passado pode ser interpretado. Exemplo: sobreo descobrimento do Brasil há vários estudos e diversas narrativas,todos ancorados em evidências do passado, mas perspectivados porinteresses do momento em que foram feitos ou escritos.

Natureza da própria história

As didáticas atuais foram desenvolvidas a partir da didática geral etêm um viés forte da pedagogia e da psicologia. A educação históri-

ca busca desenvolver uma didática própria da história, assim comoa educação matemática busca desenvolver uma didática própria damatemática, e assim por diante.

Ontogenética 

Sobre a origem e gênese do ser. No caso, o autor utiliza o termo com aideia de compreensão do presente, por meio da compreensão da origemdas permanências e mudanças e sua relação com o passado e o futuro.

Ontologia restrita ou limitada

Ontologia é o estudo ou explicação da origem das coisas. No caso, umaexplicação restrita ou limitada da história e de como ela é reconstruída.

Protonarrativas 

Narrativas dos alunos, em formação, fragmentadas ou simples.

Racionalidade técnica e científica ou aplicacionista

O filósofo alemão Habermas distingue duas racionalidades, ou seja,formas de pensar e agir do ser humano. A racionalidade técnica e

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científica que se refere à forma como o ser humano pensa e agesobre a natureza: conhece-a para dominá-la. No caso do professor, éo entendimento dominante de que, se ele conhece a ciência, sabe-rá aplicá-la, sendo relegadas ao segundo plano as disciplinas sobre

o ensino, especificamente. A outra racionalidade é a comunicativa,que se refere à relação com os outros e é caracterizada, basicamente,por uma interação simbolicamente mediada.

Relativismos 

Teorias que difundem a ideia de que não existem princípios funda-mentais a serem seguidos pelas ciências, pela ação política, pelaação das pessoas, etc. Tudo é possível e nada é válido ou verdadeiro

ao mesmo tempo.

Revolução copernicana

Costuma-se denominar de revolução copernicana uma mudança con-ceitual, como a feita por Copérnico ao propor o heliocentrismo (Solno centro do Universo) em oposição ao geocentrismo (Terra no centrodo Universo).

Sectogramas

Gráficos.

Semiose 

A maneira como a pessoa se expressa, verbalmente, por meio da escrita,do desenho, da música, da poesia, da expressão corporal, etc.

Sociomidiatizada

Difundida socialmente pela mídia.Subjetivação

Ato de interiorizar vivências, conceitos e experiências.

Tecnologia da informação

É a ciência desenvolvida em torno dos avanços da informatização,que permeia todas as outras ciências do mundo do conhecimento,

sendo imprescindível o conhecimento de seus rudimentos.

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