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 Algumas notas sobre "Futuro Passado" Reinhart Koselleck, historiador alemão, trás em sua obra, “Futuro Passado – contribuições à semântica dos tempos históricos” a história dos conceitos e sua relação com a teoria. O tempo para ele é uma construção cultural que age de modo específico em cada época relacionando o passado experimentado com o horizonte de expectativas futuras, suas possibilidades. Seu livro, composto por ensaios, retrata a trajetória historiográfica do autor, estudioso das transformações que sinalizaram para a modernidade em fins do século XVIII. A tese do autor é que entre as décadas de 1750 e 1850 a linguagem europeia sofreu transformações capazes de ressignificar termos tradicionais adaptados para o momento. Pois percebe-se que a linguagem se modifica com os diversos processos. O autor inicia seu livro com a seguinte pergunta: “Que é o tempo histórico?” Ao passo que afirma ser uma das respostas mais difíceis de se contemplar no campo da historiografia. Para ele, o próprio conceito de tempo histórico deve ser posto em dúvida. Assim, o autor buscou investigar de que forma uma dimensão temporal do passado se relaciona mutuamente com a dimensão temporal do futuro em um dado presente. Para suas análises, se utiliza de conceitos da antropologia colocando experiência para passado e expectativa para o futuro. O tempo histórico para ele é constituído quando do processo determinante de distinção entre passado e futuro. Na análise dos conceitos, Geschichte (História) tem significado predominante, pensado pelos Iluministas ao observarem a co mplexidade da “história de fato” ou da “história em si”, as quais deixam crescentemente escapar pressupostos de experiência a essa mesma experiência. Dessa forma, nos dedicaremos aqui à observação dos três últimos capítulos da segunda parte do livro, intit ulado “Sobre a teoria e o método da determinação do tempo histórico”. O capítulo intitulado “Representação, evento e estrutura” nos apresenta que o problema da representação enquanto narração e descrição é direcionada para várias dimensões temporais. Sobre esses tempos históricos afirma que seus níveis de extensões temporais não se interpenetram. A sua tese consiste em que eventos só podem ser narrados ao passo que estruturas são descritas, apesar de ambos não serem analisados ou dispostos em total distancia um do outro. A estrutura, aceita pelo que foi proposto na história social, é dita pelo autor como “história estrutural”. As estruturas ultrapassam o campo das experiências registradas cronologicamente, elas são amplas, capazes de integrar as mais diversas experiências de eventos cotidianos. No campo da experiência do movimento histórico, estrutura e evento adquirem diferentes extensões temporais. A estrutura se aproxima do campo da descrição e o evento, da narração. Ambas se articulam para que o evento preceda a estrutura. De outro lado, estruturas de longo prazo permitem possibilidades para que eventos ocorram. Contudo, após analisadas e descritas, as estruturas podem virar objeto de narrativa.  Ainda neste capítulo o autor nos apresenta uma conclusão da r elação da representação com as dimensões temporais subordinas a ela afirmando: a) os planos temporais nunca se fundem por mais que se relacionem reciprocamente; b)

Futuro e Passado

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Importante obra de KOSELLECK, Reinhardt.

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  • Algumas notas sobre "Futuro Passado"

    Reinhart Koselleck, historiador alemo, trs em sua obra, Futuro Passado

    contribuies semntica dos tempos histricos a histria dos conceitos e sua

    relao com a teoria. O tempo para ele uma construo cultural que age de modo

    especfico em cada poca relacionando o passado experimentado com o horizonte

    de expectativas futuras, suas possibilidades. Seu livro, composto por ensaios,

    retrata a trajetria historiogrfica do autor, estudioso das transformaes que

    sinalizaram para a modernidade em fins do sculo XVIII. A tese do autor que

    entre as dcadas de 1750 e 1850 a linguagem europeia sofreu transformaes

    capazes de ressignificar termos tradicionais adaptados para o momento. Pois

    percebe-se que a linguagem se modifica com os diversos processos.

    O autor inicia seu livro com a seguinte pergunta: Que o tempo histrico? Ao

    passo que afirma ser uma das respostas mais difceis de se contemplar no campo

    da historiografia. Para ele, o prprio conceito de tempo histrico deve ser posto em

    dvida. Assim, o autor buscou investigar de que forma uma dimenso temporal do

    passado se relaciona mutuamente com a dimenso temporal do futuro em um dado

    presente. Para suas anlises, se utiliza de conceitos da antropologia colocando

    experincia para passado e expectativa para o futuro. O tempo histrico para ele

    constitudo quando do processo determinante de distino entre passado e futuro.

    Na anlise dos conceitos, Geschichte (Histria) tem significado predominante,

    pensado pelos Iluministas ao observarem a complexidade da histria de fato ou

    da histria em si, as quais deixam crescentemente escapar pressupostos de

    experincia a essa mesma experincia. Dessa forma, nos dedicaremos aqui

    observao dos trs ltimos captulos da segunda parte do livro, intitulado Sobre a

    teoria e o mtodo da determinao do tempo histrico.

    O captulo intitulado Representao, evento e estrutura nos apresenta que o

    problema da representao enquanto narrao e descrio direcionada para

    vrias dimenses temporais. Sobre esses tempos histricos afirma que seus nveis

    de extenses temporais no se interpenetram. A sua tese consiste em que eventos

    s podem ser narrados ao passo que estruturas so descritas, apesar de ambos

    no serem analisados ou dispostos em total distancia um do outro. A estrutura,

    aceita pelo que foi proposto na histria social, dita pelo autor como histria

    estrutural. As estruturas ultrapassam o campo das experincias registradas

    cronologicamente, elas so amplas, capazes de integrar as mais diversas

    experincias de eventos cotidianos. No campo da experincia do movimento

    histrico, estrutura e evento adquirem diferentes extenses temporais. A estrutura

    se aproxima do campo da descrio e o evento, da narrao. Ambas se articulam

    para que o evento preceda a estrutura. De outro lado, estruturas de longo prazo

    permitem possibilidades para que eventos ocorram. Contudo, aps analisadas e

    descritas, as estruturas podem virar objeto de narrativa.

    Ainda neste captulo o autor nos apresenta uma concluso da relao da

    representao com as dimenses temporais subordinas a ela afirmando: a) os

    planos temporais nunca se fundem por mais que se relacionem reciprocamente; b)

  • dependendo da investigao um evento pode ter significado estrutural; e c)

    durao pode se tornar evento. Para Koselleck a histria seria diminuda se se

    propusesse somente a narrar, sem uma anlise estrutural. Evento e estrutura

    podem ser abstratos ou concretos dependendo do nvel temporal em que se

    situam. Evento e estrutura s podem ser representados a partir da utilizao de

    conceitos histricos que permitam a compreenso e conceitualizao do passado.

    Os conceitos trazem os significados passados e suas possibilidades estruturais.

    Ao final do captulo Koselleck percebe ento mudanas na utilizao do provrbio

    Histria magistra vitae (trabalhado por ele na primeira parte do livro, captulo 2. O

    termo foi criado e utilizado por Ccero, orador helnico, no intuito de designar como

    o historiador entende o seu objeto e a sua produo). As estruturas se mostram

    cada vez mais instveis e os eventos no mais visto como podendo se repetir

    fatores que permitiram a utilizao de um novo termo para a Histria (Geschichte),

    desbancando a Histria magistra vitae.

    No segundo captulo, O acaso como resduo de motivao na historiografia,

    analisa, de modo geral, como o acaso aparecia em diversas obras historiogrficas

    e como, ao longo do tempo, foi se modificando, tanto o seu uso num texto quanto a

    maneira que o historiador se apropriava. O acaso uma categoria a-histrica, que

    se encontra prioritariamente no presente. Sua utilizao na historiografia marca

    uma inconsistncia de dados, a enunciao de algo hipottico ou uma avaliao

    pessoal sobre um evento. Acaso situado pelo autor no mesmo campo de Fortuna

    ou Sorte, dentro do campo mtico e evitados a partir do momento de surgimento da

    histria moderna.

    Para anlise do que foi o acaso num trabalho histrico, Koselleck pega a obra de

    Von Archenholtz, colocado como um dos historiadores da Prssia mais lido, mas

    que se encontra censurado desde o sculo XVIII, quando a ideia de acaso comea

    a ser banida da histria. Na sua obra, sobre a Guerra dos Sete Anos, encontramos

    diversos exemplos de acaso, os quais acabam por pressupor uma narrativa causal,

    como se estivesse destinada para tal acontecimento. Para Archenholtz a invocao

    do acaso era uma maneira de reproduzir a perspectiva de seus contemporneos.

    Dentre os trechos analisados por Koselleck, o ltimo a explicao de Archenholtz

    a respeito da derrota de Kolin. A afirmativa de que o desfecho fora decidido pelo

    acaso, era o momento, segundo Koselleck, em que se assinala a superioridade

    austraca e o ataque aos saxes.

    Com o sculo XIX, histria elimina qualquer resqucio de acaso por implicaes

    teolgicas, filosficas ou estticas, relacionadas ao novo conceito de histria.

    Humboldt, analisa Koselleck, viu que eliminar o acaso no mostrava

    especificidades na histria. Ela mpar por sua busca pelo novo, o indito, de

    foras internas associadas s externas e indissociveis das circunstncias

    presentes. Apesar dessa nova histria querer excluir tudo que tenha cunho

    teolgico ou mesmo as reflexes literrias e estticas tambm tenham feito o

    acaso ainda historicamente necessrio. Pois, como diz o autor: a motivao

    residual no mais ocultada pelo acaso; o que acontece que a teoria dessa

    histria moderna, na medida em que ela se desenvolve no sculo XVIII,

  • lentamente, exclui a priori a motivao residual. Tanto o theologuomenon [palavra

    de origem grega que significa constructo teolgico pessoal, fantasia teolgica

    particular ou idiossincracia teologia] da singularidade de tudo que terreno, sob os

    olhos de Deus, quanto a categoria esttica da unidade interna da histria foram

    integrados moderna filosofia da histria, resultando no conceito moderno de

    histria (Geschichte) (pg. 159).

    O ltimo captulo intitulado Ponto de vista, perspectiva e temporalidade

    Contribuio apreenso historiogrfica da histria. certo que a histria busca

    transmitir a verdade, porm dizer que para alcan-la preciso defender algum

    ponto de vista algo dos tempos modernos. Atualmente a histria toma algum

    ponto de vista, mas ela precisa, alm de fazer afirmaes verdadeiras, admiti-las e

    relativiz-las. A histria busca se defender apresentando xitos com seus novos

    mtodos (como por exemplo a diversidade de fontes) e criticando o subjetivismo e

    o relativismo.

    O autor mostra a partir de algumas metforas, a exemplo da do espelho, como se

    exigia uma histria capaz de mostrar a verdade intacta. A partir da expresso

    apolis mostra que o historiador deveria ser neutro, e imparcial, fato que perdura

    at o momento do surgimento da histria moderna responsvel pelo novo

    conceito de histria (Geschichte). A esse respeito afirma o autor: As metforas do

    espelho, do reflexo ou da verdade nua, todas referentes viso contempornea,

    baseavam-se no fundamento das experincias prprias da qualidade do tempo

    presente, o qual, em sua concepo historiogrfica, valia-se do recurso aos

    testemunhos oculares. O historiador foi a obrigado a interrogar, em primeira

    instncia, testemunhos oculares, e, em seguida, testemunhas auditivas

    sobreviventes, de modo a poder investigar fatos e atos verdadeiros (pg. 167). O

    historiador, portanto, auxiliado pela retrica, a potica, dentre outras, se torna um

    artista, mesmo quando colocado na posio de receptor, condutor de

    interrogatrios e capaz de se manter imparcial e distante.

    Em seguida, o autor situa a discusso a partir de Chladenius, o qual pensa a

    testemunha ocular como autntica, observando o desenvolvimento das noes de

    histrias futuras e velhas histrias a partir da multiplicidade de histrias das

    diversas geraes coexistentes. A velha histria inicia quando os testemunhos

    morrem. Assim, ambas deixam de serem pensadas a partir de uma ordem

    temporal, elas so determinadas por seus desejos e questes surgidas de hoje.

    Para o autor, portanto, Chladenius fundou a modernidade ao articular o tempo da

    histria com o ponto de vista. Para ele, a histria fragmentada por uma viso

    perspectivista que lhe rende duas concluses: a relatividade com o julgamento e

    com a experincia; e, a partir da anlise do testemunho e do comportamento social

    e poltico, uma perspectiva da investigao e da representao da histria. A partir

    de sua teoria o campo testemunhal pode se ampliar e o historiador pode passar

    produo da histria: avaliar as causas, acompanhar circunstncias de longo

    prazo, alterar a disposio do comeo e do fim de uma histria; pde esboar

    sistemas mais adequados complexidade das histrias do que a mera adio de

    conhecimento (pag. 171).

  • Chladenius coloca ainda a histria perspectivista como cada vez mais adentrando o

    tempo, fato que lhe permite articular a histria do passado, presente e futuro.

    Assim, o passado pode ser revisto de uma maneira nova e o tempo histrico pde

    ir conseguindo consolidar a experincia. Alm disso, concepes metodolgicas e

    o prprio fazer historiogrfico alteraram as dimenses temporais. O passado

    passou a ser observado por procedimentos crticos e, ao levar em conta o tempo,

    ela se tornou uma disciplina investigativa. Ao mesmo tempo, ela observa que os

    eventos so singulares e no mais possveis de repetio. A histria passou a ser

    vista, ento, como progressista e o historiador passou a poder cri-la. A verdade

    histrica no mais podia se separar da perspectiva temporal.

    O partidarismo (assunto tratado no item IV), estruturas polticas pertencentes ao

    campo cotidiano e ressignificados a partir da Revoluo Francesa e seus conflitos

    sociais, se tornaria um fator prprio da histria a partir deste momento ela no

    mais podia ser acusada de parcialidade. Muito menos, o ato de tomar partido,

    esgotaria a histria, pois era perceptvel manifestaes e processos de longa

    durao tomados adiante pela luta partidria. Alm disso, comeou a ser percebido

    por alguns pensadores, a exemplo de Perthes, que a histria cada vez se

    acelerava mais, fato que impedia ao historiador exercer o seu ofcio. Pois o ritmo

    em que a histria andava no conseguia ser acompanhado pela historiografia.

    Para finalizar o captulo, o autor traz a campo uma tenso na qual o historiador se

    encontra, em uma teoria da histria de um lado e acerca da realidade das fontes do

    outro. O conhecimento histrico mais que a fonte e a histria no idntica a

    fonte. Assim, a cincia histrica leva indagaes s suas fontes capazes de

    permitir a articulao de uma srie de eventos que se situam alm do que est

    posto do documento. Sua exegese se d quando o historiador passa a observar

    processos e estruturas de longo prazo. nesse momento que necessitamos da

    teoria, pois, afirma o autor, Decidir sobre a interpretao de uma histria sob o

    ponto de vista teolgico ou econmico no tarefa relacionada pesquisa de fontes,

    mas sim a uma questo de premissas tericas. S, a partir do estabelecimento

    dessas premissas que as fontes comeam a falar (pg. 187). Ou seja, auxiliados

    por uma referida teoria, que as nossas questes as quais possibilitam a

    construo de hipteses necessrias para a conduo da pesquisa podero ser

    respondidas nas fontes. Para finalizar sua reflexo citamos:

    Uma fonte no pode nos dizer nada daquilo que cabe a ns dizer. No entanto, ela

    nos impede de fazer afirmaes que no poderamos fazer. As fontes tem poder de

    veto. Elas nos probem de arriscar ou de admitir interpretaes as quais, sob a

    perspectiva da investigao de fontes, podem ser consideradas simplesmente

    falsas ou inadmissveis. Datas e cifras erradas, falsas justificativas, anlises de

    conscincia equivocadas: tudo isso pode ser descoberto por meio da crtica de

    fontes. As fontes nos impedem de cometer erros, mas no nos revelam o que

    devemos dizer (pg. 188).

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    comentrios(0)comente

  • minha estante

    Andr Sekkel17/07/2009

    Futuro e Passado

    Este livro uma coletnea de artigos que tratam, de modo geral, de um tema

    comum: responder a questo "o que o 'tempo histrico'"? Koselleck nos explica

    melhor seus objetivos: "Todos os testemunhos atestam a maneira como a

    experincia do passado foi elaborada em uma situao concreta, assim como a

    maneira pela qual expectativas, esperanas e prognsticos foram trazidos

    superfcie da linguagem. De maneira geral, pretendeu-se investigar a forma pela

    qual, em um determinado tempo presente, a dimenso temporal do passado entra

    em relao de reciprocidade com a dimenso temporal do futuro.

    "A hisptese que se apresenta aqui a de que, no processo de determinao da

    distino entre passado e futuro, ou, usando-se a terminologia antropolgica, entre

    experincia e expectativa, constitui-se algo como um 'tempo histrico'" (Prefcio,

    pp.15-16).

    Cada presente teve seu modo de ver o passado e o futuro, que certamente

    influenciou as tomadas de decises polticas, econmicas, blicas etc. O tempo

    cristo, escatolgico, que prev sempre o fim do mundo, o tempo de Santo

    Agostinho, um tempo que no tem nada de novo. Ou melhor, tudo novo para o

    indivduo que vive esse tempo, mas como ele apenas a experincia de deus na

    Terra nada do que ele vive indito, portanto a perspectiva de mudana, de um

    futuro, est no dia do Juzo Final, que o fim dos tempos, a volta ao Paraso.

    O assunto bem complicado, mas o primeiro artigo, "O futuro passado dos tempos

  • modernos", esclarecedor. Koselleck parte da anlise do quadro A Batalha de

    Alexandre, de Albrecht Altdorfer, pintado em 1528. O tema do quadro a Batalha

    de Issus, ocorrida no ano de 333 a.C., marco do comeo da poca helenstica. Ao

    contemplar a pintura, Koselleck nota que os persas assemelham-se aos turcos, que

    no ano da composio do quadro sitiaram Viena. "Em outras palavras, Altdorfer

    captou um acontecimento histrico que era, ao mesmo tempo, contemporneo para

    ele. Alexandre e Maximiliano (Altdorfer pintou o quadro para este ltimo)

    assemelham-se de maneira exemplar. O espao da experincia nutria-se, portanto,

    da perspectiva de uma nica gerao histrica". "No se trata de eliminar

    arbitrariamente uma diferena temporal; ela simplesmente no se manifesta como

    tal" (p.22).

    Trezentos anos depois, Schlegel, quando viu o quadro pela primeira vez, foi

    tomado por uma perplexidade sem limites. Ele capaz de distinguir o quadro tanto

    de seu tempo quanto da poca antiga, representada na pintura. "Grosso modo, nos

    trezentos anos que o separam de Altdorfer, transcorreu para Schlegel mais tempo,

    de toda maneira um tempo de natureza diferente daquele que transcorrera para

    Altdorfer, ao longo dos cerca de 1.800 anos que separam a Batalha de Issus e sua

    representao" (p.23). Agora, como fazer este estudo, como entender essa

    acelerao do tempo que, neste caso, passou mais rpido em 300 anos (de 1500

    at 1800) do que em 1.800 (300 a.C. at 1500 d.C.)?

    Papel fundamental para a pesquisa de Koselleck o campo da Histria dos

    Conceitos. esse o ramo terico que permite ao historiador captar o tempo

    histrico de cada perodo. Ao longo dos 14 artigos reunidos no livro, um conceito

    assume um papel destacado. Justamente o conceito de Histria; em alemo,

    Histria era Historie, que designava a narrativa, o relato de um evento. Ao longo do

    tempo o termo foi substitudo por Geschichte, que designava o fato em si. Porm,

    quando Geschichte passou a ser usado no lugar de Historie, o conceito juntou o

    sentido de fato, acontecimento, com o de relato, narrativa. "A histria [Geschichte]

    adquire ento uma nova dimenso que escapa narratividade dos relatos, ao

    mesmo tempo que se torna impossvel captur-la nas afirmaes que se fazem

    sobre ela" (p.49).

    Alm de desenvolver uma teoria da histria, voltada para a histria dos conceitos,

    Koselleck procura afirmar o papel positivo que esse campo da histria tem,

    podendo ajudar pesquisas em outros campos, como no da histria social (o mais

    desenvolvido). Ele explica: "Na exegese do tecxto, o interesse especial pelo

    emprego de conceitos poltico-sociais e a anlise de seuas significaes ganham,

    portanto, uma importncia de carter social e histrico. Os momentos de durao,

    alterao e futuridade contidos em uma situao poltica concreta so apreendidos

    por sua realizao no nvel lingstico. Com isso, ainda falando de modo geral, as

    situaes sociais e respectivas alteraes j so problematizadas no prprio

    instante dessa realizao lingstica" (p.101).

    Grosso modo, esse estudo dos conceitos contribui para o historiador no cair em

    anacronismos, como muitas vezes acontece com os historiadores das idias, que

    pegam um conceito, ou uma idia, e procuram ver no tempo e no espeo onde ela

  • aparece, quase sempre de maneira inalterada. Ao contrrio, a histria dos

    conceitos procura entender as mudanas das estruturas de pensamento atravs da

    exegese textual, ou seja, atravs do estudo histrico dos conceitos. Alm de dar

    uma segurana maior ao historiador, evitando o anacronismo, a histria dos

    conceitos permite chegar a problematizaes que, do ponto de vista da histria

    social, esto escondidas.

    Aqui procurei tratar de Futuro Passado com uma viso panormica, sem me deter

    nos detalhes tericos e metodologicos que o autor desenvolve em cada artigo.

    Contudo me restringi a comentar trs artigos, "O futuro passado dos tempos

    modernos", "Historia Magistra Vitae - Sobre a dissoluo do topos na histria

    moderna em movimento" e "Histria dos conceitos e histria social",

    respectivamente.