250

Gelo negro - Becca Fitzpatrick.pdf

Embed Size (px)

Citation preview

  • DADOS DE COPYRIGHT

    Sobre a obra:

    A presente obra disponibilizada pela equipe Le Livros e seus diversosparceiros, com o objetivo de oferecer contedo para uso parcial em pesquisas eestudos acadmicos, bem como o simples teste da qualidade da obra, com o fimexclusivo de compra futura.

    expressamente proibida e totalmente repudavel a venda, aluguel, ouquaisquer uso comercial do presente contedo

    Sobre ns:

    O Le Livros e seus parceiros disponibilizam contedo de dominio publico epropriedade intelectual de forma totalmente gratuita, por acreditar que oconhecimento e a educao devem ser acessveis e livres a toda e qualquerpessoa. Voc pode encontrar mais obras em nosso site: LeLivros.link ou emqualquer um dos sites parceiros apresentados neste link.

    "Quando o mundo estiver unido na busca do conhecimento, e no maislutando por dinheiro e poder, ento nossa sociedade poder enfim evoluir a

    um novo nvel."

  • BECCAFITZPATRICK

    TRADUO DE VIVIANE DINIZ

  • Copyright 2015 by Becca Fitzpatrick

    TTULO ORIGINALBlack Ice

    REVISORayana FariaMarcela de Oliveira

    ARTE DE CAPA www.blacksheep-uk.com

    ADAPTAO DE CAPAJulio Moreira

    REVISO DE EPUBRodrigo Rosa

    GERAO DE EPUBIntrnseca

    E-ISBN978-85-8057-723-5

    Edio digital: 2015

    1a EDIO

    TIPOGRAFIASBembo e Courier

    Todos os direitos desta edio reservados

    Editora Intrnseca Ltda.Rua Marqus de So Vicente, 99, 3o andar22451-041 GveaRio de Janeiro RJTel./Fax: (21) 3206-7400www.intrinseca.com.br

  • Para Riley e Jace,que me contam histrias.

  • ABRIL

    A picape Chevrolet enferrujada deu um tranco e parou subitamente, e Lauren Huntsmanacordou quando bateu com a cabea na janela.

    Piscou algumas vezes, ainda meio grogue. Sua mente parecia estar cheia de lembranasfragmentadas, pedaos estilhaados que, se reunidos por ela, formariam algo inteiro. Umajanela com vista para o que aconteceu mais cedo naquela noite. Naquele momento,restavam apenas cacos dessa janela em sua cabea latejante.

    Lembrava-se da cacofonia da msica country, das gargalhadas roucas e dos melhoresmomentos da NBA passando nas TVs, que ficavam no alto da parede. Prateleiras exibindodezenas de garrafas de vidro que emitiam um brilho verde, laranja ou preto.

    Preto.Ela pedira uma dose dessa garrafa, porque a deixava tonta de um jeito bom. Algum

    com a mo firme servira a bebida em seu copo um instante antes de ela beber tudo deuma s vez.

    Mais um pedira, com a voz rouca, batendo com o copo vazio no balco.Lembrava-se de balanar o quadril junto ao corpo do caubi, em uma dana lenta.

    Tinha roubado o chapu dele; ficava melhor nela. Um chapu Stetson preto paracombinar com seu vestido preto minsculo, a bebida preta e seu mau humor sombrio que, felizmente, era difcil de manter em uma espelunca brega como aquela, uma joia raraentre os bares no mundo esnobe e pretensioso de Jackson Hole, Wyoming, onde passavaas frias com a famlia. Tinha escapado furtivamente, e, alm do mais, seus pais nunca aencontrariam ali. Aquele pensamento era uma luz brilhando no horizonte. Em poucotempo estaria to embriagada que nem lembraria como eles eram. Os olhares dereprovao riscavam suas lembranas, como tinta fresca escorrendo em uma tela.

    Pintura. Cor. Arte. Ela tentara escapar para um mundo de calas jeans respingadas detinta, dedos manchados e autoconhecimento, mas eles foram atrs dela e acabaram comseus sonhos. No queriam uma artista de esprito livre na famlia. Queriam uma filha comum diploma de Stanford.

    Se eles realmente a amassem Ela no precisaria usar vestidos baratos e apertados, quedeixavam a me enfurecida, nem se dedicar com afinco a causas que desafiavam o egosmoe a moral rgida e aristocrtica do pai.

    Ela quase desejou que a me estivesse ali para v-la danando, para v-la deslizando pelaperna do caubi. Roando o corpo no dele, quadril com quadril. Murmurando noouvido dele as coisas mais sacanas em que poderia pensar. S pararam de danar quando

  • ele foi at o bar pegar mais uma bebida para ela. Lauren podia jurar que dessa vez o gostoera diferente. Ou talvez estivesse to bbada que tenha imaginado aquele amargor.

    Ele perguntou se ela queria ir a algum lugar mais reservado.Lauren s considerou a ideia por um breve momento. Se era algo que sua me

    desaprovaria, ento a resposta era bvia.

    * * *

    A porta do passageiro se abriu e Lauren conseguiu focar a viso por tempo suficiente paraver o caubi. Pela primeira vez notou que o nariz dele parecia meio torto, provavelmenteum trofu de alguma briga de bar. Saber que ele tinha um temperamento forte deveriafaz-la gostar ainda mais dele, porm, estranhamente, Lauren se pegou desejandoencontrar um homem que conseguisse controlar os impulsos e que no fosse dado aexploses infantis. Era o tipo de coisa civilizada que sua me diria. Reprimindo aquelasensao, Lauren culpou o cansao por sua atitude irritantemente racional. Ela precisavadormir. Logo.

    O caubi pegou o chapu da cabea dela e devolveu-o ao cabelo louro curto ebagunado.

    Achado no roubado, ela quis protestar. Mas no conseguia formar as palavras.Ele a pegou do banco e a colocou sobre o ombro. A parte de trs do vestido estava

    subindo, mas ela no conseguia fazer com que as mos lhe obedecessem e puxassem otecido para baixo. Sua cabea estava to pesada e frgil quanto um dos vasos de cristal dame. Estranhamente, assim que esse pensamento lhe ocorreu, sua cabea milagrosamenteficou mais leve e pareceu sair de seu corpo, flutuando para bem longe. No conseguialembrar como tinha chegado ali. Tinham ido na picape?

    Lauren olhou para os saltos das botas do caubi deixando marcas na neve lamacenta. Ocorpo dela balanava a cada passo, e o movimento estava deixando seu estmagoembrulhado. O ar muito frio, misturado ao cheiro forte dos pinheiros, fazia suas narinasarderem. As correntes de um balano rangiam na varanda e mensageiros dos ventostocavam uma msica suave na escurido. O som a fez suspirar. E estremecer.

    Lauren ouviu o caubi destrancar uma porta. Tentou manter as plpebras abertas portempo suficiente para ter uma ligeira noo do que havia em volta. Teria que ligar para oirmo de manh e pedir que fosse busc-la. Supondo que soubesse lhe dizer onde estava,pensou, ironicamente. Seu irmo a levaria de volta para o chal, repreendendo-a por serto imprudente e autodestrutiva, mas apareceria. Ele sempre aparecia.

    O caubi a colocou de p, segurando-a pelos ombros para ajud-la a se equilibrar.Lauren olhou lentamente ao redor. Uma cabana. Ele a levara para uma cabana de madeira.A sala em que estavam tinha mveis rsticos de pinho, do tipo que pareceria brega emtodos os lugares, menos em uma cabana. Uma porta aberta do outro lado da sala levava auma pequena despensa com prateleiras de plstico nas paredes. O cmodo estava vazio,

  • exceto por uma desconcertante barra de metal que ia do cho ao teto e uma cmera emum trip, posicionada de frente para a barra.

    Mesmo em meio ao torpor em que Lauren estava, o medo a dominou. Ela tinha quesair dali. Algo ruim iria acontecer.

    Mas seus ps no se moviam.O caubi a apoiou contra a barra. Assim que a soltou, Lauren caiu no cho. Seus sapatos

    altos saram do p quando seus tornozelos deslizaram para o lado. Ela estava bbadademais para conseguir se levantar. Sua mente girava, e ela piscava desesperadamente,tentando encontrar a porta que levava para fora dali. Quanto mais tentava se concentrar,mais rpido a sala girava. Sentiu vontade de vomitar e virou para o lado para no sujar asroupas.

    Voc deixou isso no bar disse o caubi, colocando o bon de beisebol doCardinals na cabea dela.

    Tinha sido um presente do irmo quando ela fora aceita em Stanford, algumas semanasantes. Seus pais provavelmente o haviam convencido a fazer isso. De maneira muitosuspeita, o presente chegara logo depois que ela anunciara que no iria para Stanford nem para nenhuma outra faculdade. O pai tinha ficado to vermelho, to sem ar, que elateve certeza de que uma fumacinha sairia dos ouvidos dele, como nos desenhos animados.

    O caubi tirou a corrente dourada que Lauren trazia no pescoo, os dedos sperosroando o rosto dela.

    valioso? perguntou ele, examinando de perto o pingente em forma de corao. meu disse ela, de repente muito na defensiva.Ele at podia ter pegado o chapu fedido de volta, mas o pingente era dela. Um

    presente que seus pais lhe deram na noite de seu primeiro recital de bal, doze anos antes.Foi a primeira e nica vez que eles aprovaram algo que ela decidira fazer era a nicacoisa que a fazia pensar que, l no fundo, eles deviam am-la. Fora do bal, sua infnciatinha sido comandada, pressionada e moldada pela vontade deles.

    Dois anos antes, aos dezesseis, sua prpria vontade falou mais alto. Arte; teatro; bandasindie; dana contempornea instigante e improvisada; reunies com ativistas polticos eintelectuais que haviam abandonado a faculdade para buscar uma educao alternativa (oque no significa que abandonaram os estudos); e um namorado com uma mente brilhantee atormentada, que fumava maconha e escrevia poesia em muros de igreja, bancos deparque, carros e na vida alma de Lauren.

    Os pais tinham deixado claro o desgosto pelo novo estilo de vida da filha. Eresponderam com toques de recolher e cada vez mais regras, estreitando as paredes doconfinamento, sufocando-a e tirando sua liberdade. Rebelar-se contra eles foi a nicamaneira que Lauren encontrou de enfrent-los. Chorou escondido quando largou o bal,mas precisava feri-los de alguma forma. Eles no tinham o direito de escolher o que iriamamar na filha. Ou demonstrava por ela amor incondicional ou a perderiamcompletamente. Aquelas eram suas condies. Aos dezoito anos, Lauren tinha umadeterminao de ao.

    meu repetiu.

  • Precisou se concentrar o mximo que pde para falar. Tinha que conseguir seu pingentede volta, e precisava sair dali. Sabia disso. Mas uma estranha sensao havia se apoderadode seu corpo; era como se estivesse assistindo quela cena sem, no entanto, sentir qualqueremoo.

    O caubi pendurou o cordo com o pingente na maaneta da porta e, com as moslivres, amarrou os pulsos dela com uma corda spera. Lauren estremeceu quando ele deuo n. Ele no podia fazer isso com ela, pensou, distante. Lauren tinha concordado em irat ali com ele, mas no em se submeter quilo.

    Me solta disse ela com a voz arrastada, uma tentativa fraca e nada convincentede exigir alguma coisa, o que fez seu rosto arder de humilhao.

    Ela amava a linguagem, amava cada palavra que havia dentro de si, viva e pulsante,cuidadosamente escolhida, empoderadora; queria sacar essas palavras do bolso agora, mas,quando procurou l no fundo, encontrou fios soltos, um buraco. As palavras tinham cadode sua cabea confusa.

    Jogou os ombros para a frente inutilmente. Ele a amarrara barra. Como ela iriarecuperar o cordo? A ideia de perd-lo fez o pnico se instalar em seu peito. Se aomenos seu irmo tivesse retornado a ligao Ela havia deixado uma mensagem dizendoque ia sair para beber naquela noite, queria test-lo. Ela o testava constantemente quasetodos os fins de semana , mas aquela era a primeira vez que ele ignorava sua ligao.Queria saber se ele se preocupava com ela o suficiente para impedi-la de fazer umabobagem.

    Ser que tinha finalmente desistido dela?O caubi estava saindo. Quando chegou porta, levantou um pouco o chapu preto,

    revelando os olhos azuis presunosos e vorazes. Lauren percebeu ento a grandeza de seuerro. Ele nem sequer gostava dela. Ser que iria chantage-la com fotos comprometedoras?Era esse o motivo da cmera? Ele devia saber que seus pais pagariam qualquer preo porelas.

    Tenho uma surpresa para voc no barraco de ferramentas, l atrs disse ele,lentamente. No v a lugar algum, ouviu?

    A respirao dela ficou rpida e irregular. Lauren queria dizer o que achava da surpresadele, mas suas plpebras se fecharam ainda mais, e a cada tentativa levava mais tempo paraabri-las. Comeou a chorar.

    J ficara bbada antes, mas nunca daquele jeito. Ele lhe dera alguma coisa. Devia tercolocado alguma droga em sua bebida. A droga a deixava exausta e ela se sentia pesada.Roou a corda contra a barra. Ou ao menos tentou. Seu corpo todo estava pesado desono. Ela precisava lutar contra isso. Algo terrvel iria acontecer quando ele voltasse. Tinhaque convenc-lo a desistir.

    Mais rpido do que ela esperava, a silhueta dele surgiu na entrada da despensa,escurecendo o ambiente. As luzes o iluminavam por trs, projetando no cho uma sombracom o dobro de sua altura. Ele j no estava de chapu, e parecia maior do que ela selembrava, mas no era nisso que Lauren estava concentrada. Seus olhos foram direto paraas mos dele. O caubi estava esticando uma segunda corda, verificando se estava boa.

  • Ele foi em direo a Lauren e, com as mos trmulas, colocou a corda em volta dopescoo dela e o puxou para trs, contra a barra. Luzes invadiram os olhos dela. O caubiestava puxando com muita fora. Ela soube, instintivamente, que ele estava nervoso eempolgado. Sentia isso no tremor ansioso do corpo dele. Ouvia a respirao ofegante eentrecortada cada vez mais intensa, mas no pelo esforo. Pela adrenalina. Isso fez oestmago dela se revirar de pavor. Ele estava gostando daquilo. Um estranho gorgolejochegou aos seus ouvidos, e Lauren percebeu, com pavor, que era sua prpria voz. O soma assustou. Ele xingou e puxou com mais fora.

    Dentro de sua cabea, ela gritava sem parar. Gritava enquanto a presso aumentava,arrastando-a para a morte.

    Ele no queria tirar fotos. Queria mat-la.Ela no iria deixar aquele lugar horrvel ser sua ltima lembrana. Fechou bem os olhos

    e se deixou levar escurido adentro.

  • UM ANO DEPOIS

  • CAPTULOUM

    Se eu morresse, no seria de hipotermia.Conclu isso enquanto enfiava um saco de dormir de penas de ganso na parte de trs do

    meu jipe e o amarrava, junto com cinco sacolas de equipamentos, cobertores de l, sacosde dormir de seda, aquecedores para dedos do ps e tapetes para forrar o cho. Certa deque nada sairia voando do carro durante as trs horas de viagem at Idlewilde, fechei aporta traseira e limpei as mos no short jeans.

    Meu celular berrou com Rod Stewart cantando If you want my body, e demorei umpouco a atender s para soltar a voz no trecho and you think Im sexy junto com Rod. Dooutro lado da rua, a sra. Pritchard fechou a janela da sala com fora. Eu no podiadesperdiar um toque de celular como aquele, essa a verdade.

    Ei, gata disse Korbie do outro lado da linha, estourando uma bola do chiclete queestava mascando. Vamos conseguir sair na hora ou no?

    Um pequeno problema. O jipe est lotado falei, com um suspiro dramtico.Korbie e eu somos melhores amigas desde sempre, mas agimos mais como irms.Provocaes fazem parte da diverso. J guardei os sacos de dormir e os equipamentos,mas vamos ter que deixar uma das malas para trs: uma azul-marinho com alas rosa.

    Se abandonar a minha mala a, pode dar adeus minha fortuna. Eu devia ter imaginado que voc ia tentar a cartada da famlia rica. Quem tem dinheiro precisa ostentar. De qualquer forma, voc devia culpar toda essa

    gente se divorciando e contratando a minha me. Se as pessoas conseguissem simplesmentedar um beijo e fazer as pazes, ela ficaria sem trabalho.

    E a voc teria que se mudar. No que me diz respeito, acho o divrcio o mximo.Korbie riu. Acabei de ligar para o Urso. Ele ainda no comeou a arrumar as malas, mas jurou

    que vai se encontrar com a gente em Idlewilde antes de escurecer. A famlia de Korbieera dona de Idlewilde, uma pitoresca cabana no Parque Nacional Grand Teton, e, pelasemana seguinte, isso seria o mais perto da civilizao a que iramos chegar. Eu disse aele que se tivesse que tirar morcegos das calhas dos telhados, ele poderia contar com umlongo e casto recesso de primavera acrescentou Korbie.

    Ainda no acredito que seus pais deixaram voc viajar com o seu namorado. Bem comeou Korbie, hesitante. Eu sabia! Tem mais coisa a. Calvin vai tambm. O qu?

  • Ele vem para casa por causa do recesso, e meu pai o forou a ir com a gente. Aindano conversei com Calvin, mas ele no deve ter gostado nada da ideia. Ele odeia quandomeu pai lhe diz o que fazer. Principalmente agora, que est na faculdade. Ele vai estar omau humor em pessoa, e sou eu quem vai ter que aguentar.

    Sentei-me no para-choque do jipe, os joelhos de repente parecendo feitos de areia.Respirar doa. De uma hora para outra, o fantasma de Calvin parecia estar por toda parte.Eu me lembrei da primeira vez que nos beijamos. Estvamos brincando de esconde-esconde perto do rio atrs de sua casa. Ele passou os dedos pela ala do meu suti e enfioua lngua na minha boca, enquanto os mosquitos zumbiam em meus ouvidos.

    E eu tinha gastado cinco pginas do meu dirio para registrar o evento ad nauseam. Ele deve chegar cidade a qualquer minuto disse Korbie. Que saco, n? Quer

    dizer, voc j esqueceu meu irmo, certo? Com certeza falei, esperando soar blas. No quero que role um clima estranho, sabe? Nossa, claro que no. No penso no seu irmo h milnios. Ento disparei: E

    se eu ficar de olho em voc e no Urso? Diga a seus pais que no precisamos do Calvin.A verdade que eu no estava pronta para ver Calvin. Talvez eu pudesse escapar da

    viagem. Fingir que tinha ficado doente. Mas era a minha viagem. Eu tinha dado duro porisso. E no ia deixar Calvin estragar tudo. Ele j tinha estragado coisas demais.

    Eles no vo cair nessa disse Korbie. Ele vai se encontrar com a gente emIdlewilde hoje noite.

    Hoje noite? E o equipamento? Ele no vai ter tempo de arrumar tudo. Estamos nospreparando h dias.

    Estamos falando do Calvin. Ele , tipo, praticamente um montanhs. Espera OUrso est na outra linha. Ligo para voc de novo daqui a pouco.

    Desliguei e me deitei esparramada na grama. Inspire, expire. Bem quando eu tinhaconseguido seguir em frente, Calvin voltava minha vida, me arrastando para o ringue,para o segundo round. Eu poderia rir da ironia daquilo tudo. Ele sempre tinha que ter apalavra final, pensei, sem acreditar.

    claro que ele no precisava de tempo para se preparar tinha crescido fazendo trilhasnos arredores de Idlewilde. Seu equipamento devia ficar no armrio, pronto para serusado a qualquer momento.

    Rebobinei minha memria vrios meses, at chegar ao outono. Calvin era calouro emStanford fazia cinco semanas quando terminou comigo. Pelo telefone. Em uma noite emque eu realmente precisava dele ao meu lado. Eu no queria nem pensar sobre aquiloagora doa demais lembrar o que tinha acontecido naquela noite. Como tinhaterminado.

    Depois, com pena de mim, Korbie tinha, estranhamente, concordado em me deixarplanejar nosso recesso de primavera do ltimo ano, tentando me animar. Nossas duasoutras melhores amigas, Rachel e Emilie, iam para o Hava. Korbie e eu conversamossobre passar essas minifrias com elas nas praias de Oahu, mas devo adorar me castigar,porque disse adis, Hava e decidi que, em vez disso, faramos trilha pelas montanhas

  • Tetons. Se Korbie percebeu por que escolhi esse lugar, teve a sensibilidade de no tocarno assunto.

    Eu sabia que o recesso de primavera de Calvin iria coincidir com o nosso, assim comosabia que ele adorava fazer trilhas e acampar nas Tetons. Eu esperava que, quando soubesseda nossa viagem, ele se convidasse para ir junto. Desejava desesperadamente passar algumtempo com ele, e faz-lo me ver de forma diferente e se arrepender de ter sido idiota porter terminado comigo.

    Mas, aps meses sem notcias dele, eu finalmente tinha entendido: Calvin no estavainteressado na viagem, porque no estava interessado em mim. Ele no queria voltar.Desisti, ento, de nutrir qualquer esperana de ficarmos juntos e endureci meu corao.Eu no queria mais nada com Calvin. Agora aquela viagem era s para mim.

    Fechei a mente para as lembranas e tentei pensar nos meus prximos passos. Calvinestava voltando para casa. Aps oito meses, eu iria v-lo, e ele iria me ver. O que eu iadizer? Seria estranho?

    claro que seria estranho.Senti vergonha por meu pensamento seguinte ter sido to incrivelmente ftil: me peguei

    pensando se tinha engordado desde a ltima vez que ele me vira. Achava que no. Nomnimo, as corridas e o levantamento de peso que eu havia feito em preparao para nossaviagem tinham deixado minhas pernas torneadas. Tentei me agarrar ideia das pernassexy, mas aquilo no estava fazendo com que eu me sentisse nem um pouco melhor.Parecia que eu ia vomitar. No podia ver Calvin. Pensei que tivesse seguido em frente,mas toda a dor estava voltando, crescendo em meu peito.

    Procurei respirar fundo mais algumas vezes, me recompondo, e ouvi o rdio do jipe aofundo: no uma cano, mas a previso do tempo.

    fortes tempestades devem chegar regio sudeste de Idaho. Hoje noite, a probabilidade de chuvasubir para noventa por cento, com trovoadas e possibilidade de ventos fortes.

    Tirei os culos de sol e os coloquei no alto da cabea; observei, com olhos semicerrados,o cu azul que se estendia de um lado a outro do horizonte. Nem uma sombra denuvem. Ainda assim, se estava para chover, eu queria pegar a estrada antes disso. O bom que estvamos saindo de Idaho e seguindo, antes da tempestade, para Wyoming.

    Pai! gritei, uma vez que as janelas da casa estavam abertas.Um instante depois ele apareceu na porta. Coloquei a cabea para fora do carro e fiz

    meu melhor biquinho de garotinha do papai. Preciso de dinheiro para a gasolina, pai. O que aconteceu com a sua mesada? Tive que comprar coisas para a viagem expliquei. Ningum nunca lhe disse que dinheiro no cresce em rvores? brincou ele, me

    observando com ar paternal enquanto balanava a cabea.Eu me levantei bruscamente e lhe dei um beijo na bochecha. Preciso mesmo de dinheiro para a gasolina. Claro que precisa. Ele abriu a carteira com o mais suave suspiro resignado. E me

    deu quatro notas desbotadas e amassadas de vinte. No deixe o tanque de gasolina

  • baixar mais do que um quarto do volume cheio, entendido? difcil achar um posto lnas montanhas. No h nada pior do que ficar presa em algum lugar.

    Guardei o dinheiro no bolso e sorri de modo angelical. Melhor dormir com o celular e com um cabo de reboque embaixo do travesseiro,

    por garantia. Britt Estou brincando, pai falei, rindo. No vou ficar presa em lugar nenhum.Endireitei-me no banco do jipe. Eu tinha abaixado a capota, e o sol deixara o carro

    pegando fogo. Me estiquei para checar meu reflexo no espelho retrovisor. At o fim dovero, meu cabelo estaria claro como palha, e eu ganharia umas dez novas sardas. Tinhaherdado genes alemes do meu pai e suecos da minha me. Chances de ficar todavermelha por causa do sol? Cem por cento. Peguei um chapu no banco do passageiro eenfiei na cabea. Droga, eu estava descala.

    Um look perfeito para uma loja de convenincia.Dez minutos depois, eu estava na loja, enchendo um copo com raspadinha de

    framboesa. Tomei um pouco e enchi de novo. Willie Hennessey, que estava no caixa, meolhou de cara feia.

    Nossa reclamou ele. No quer pegar mais vezes, no? J que voc ofereceu falei, alegremente, e segurei o canudo com os lbios para

    encher o copo mais uma vez. Tenho que manter a lei e a ordem por aqui. Foram s dois golinhos, Willie. Ningum vai falncia por causa de dois goles.

    Quando voc ficou to ranzinza? Desde que voc comeou a furtar raspadinha e fingir que no sabe usar a bomba de

    gasolina, me obrigando a sair e encher o tanque para voc. Toda vez que voc para aqui,eu tenho vontade de morrer.

    Franzi o nariz. No quero ficar com as mos cheirando a gasolina. E voc mesmo muito bom com

    a bomba, Willie acrescentei, com um sorriso adulador. A prtica leva perfeio murmurou ele.Eu estava caminhando descala pelos corredores procura de balas e salgadinhos,

    pensando que, se Willie no gostava de colocar gasolina no meu carro, ele deveriaprocurar outro emprego, quando escutei o sininho da porta. No cheguei nem a ouvir ospassos antes de sentir mos quentes e calejadas cobrirem meus olhos.

    Adivinha quem ?Aquele cheiro familiar de sabo me fez congelar. Rezei para ele no sentir meu rosto

    ficar quente ao seu toque. Durante um bom tempo, no consegui encontrar minha voz,que pareceu se encolher dentro de mim, descendo dolorosamente pela garganta.

    Me d uma pista falei, esperando soar entediada. Ou levemente irritada. Qualquercoisa, menos magoada.

    Baixo. Gordo. Os dentes de cima terrivelmente para a frente.

  • Aquela voz suave e provocante depois de tantos meses. Soava familiar e estranha aomesmo tempo.

    Senti-lo to perto me deixou desorientada. Tive medo de comear a gritar com ele,bem ali na loja de convenincia. E, se eu o deixasse chegar perto demais, tive medo de nogritar com ele. E eu queria gritar tinha passado oito meses praticando em pensamentoo que diria, e estava pronta para colocar para fora.

    Nesse caso, eu chutaria Calvin Versteeg falei, em um tom despreocupadamenteeducado.

    O desprezo em minha voz no foi programado. E eu no poderia estar mais aliviada porisso.

    Ele parou na minha frente e apoiou o cotovelo na prateleira. Ento abriu um sorrisomalicioso. Ele desenvolvera esse charme cnico anos antes. Eu caa igual a uma idiota napoca, mas estava mais forte agora.

    Ignorei sua beleza e o olhei de cima a baixo, com ar entediado. Ao que parecia, eletinha deixado o travesseiro arrumar seu cabelo naquela manh. Estava maior do que eu melembrava. Nos dias mais quentes dos treinos de corrida, com o suor pingando das pontas,seu cabelo ficava escuro como um tronco de rvore. A lembrana provocou uma dordentro de mim. Coloquei a nostalgia de lado e procurei olhar para Calvin comdesinteresse.

    O que voc quer? perguntei.Sem pedir, ele virou o canudo da minha raspadinha de lado e se serviu. Depois limpou a

    boca com a mo. Me fale sobre essa histria de acampar.Afastei a raspadinha para que ele no pudesse pegar. Vamos fazer uma trilha. Achei importante deixar clara a diferena. Qualquer um

    podia acampar. Fazer trilha exigia habilidade e coragem. J tem tudo de que precisa? continuou ele. E umas coisinhas a mais tambm. Dei de ombros. Ei, uma garota precisa de

    brilho labial. Vamos ser sinceros. Korbie nunca vai deixar voc sair da cabana. Ela tem pavor de

    fazer qualquer coisa ao ar livre. E voc no consegue dizer no para ela. Ele bateu odedo na cabea, com ar de sabedoria. Sei como vocs, garotas, so.

    Olhei para ele com ar de indignao. Vamos fazer trilha durante uma semana inteira. Nosso percurso tem sessenta e cinco

    quilmetros.Ok, talvez eu estivesse exagerando um pouco. Na verdade, Korbie havia concordado com

    no mais do que trs quilmetros de caminhada por dia, e tinha insistido para queandssemos em crculos ao redor de Idlewilde, caso precisssemos de acesso rpido aconvenincias e TV a cabo. Embora eu nunca tivesse sinceramente esperado fazer trilha asemana inteira, tinha planejado deixar Korbie e o Urso na cabana por um dia e caminharsozinha. Queria colocar meu treinamento prova. Obviamente, agora que Calvin iriatambm, ele logo descobriria nossos verdadeiros planos, mas no momento minha maior

  • prioridade era impression-lo. Eu estava de saco cheio de aturar suas insinuaes constantesde que no tinha motivo para me levar a srio. E, mais tarde, eu poderia responder aqualquer crtica que ele fizesse argumentando que eu queria fazer trilha todos os dias eKorbie estava dando para trs; Calvin no acharia absurda aquela desculpa.

    Voc sabe que vrias trilhas ainda esto cobertas de neve, certo? E as cabanas aindano abriram para a temporada, ento no tem muita gente por aquelas bandas. At o postoda Guarda Florestal de Jenny Lake est fechado. Cada um responsvel pela prpriasegurana eles no garantem o resgate.

    Arregalei bem os olhos e o encarei. No me diga! No estou me metendo nisso completamente s cegas, Calvin

    disparei. J est tudo certo. Vamos nos sair bem.Ele esfregou a boca, disfarando um sorriso e deixando bem claro o que pensava. Voc realmente acha que eu no consigo fazer isso falei, tentando no parecer

    magoada. S acho que vocs duas vo se divertir mais se forem ao Lava Hot Springs. Podem

    ficar de molho nas piscinas de gua mineral e passar um dia fazendo compras em SaltLake.

    Passei o ano todo treinando para esta viagem rebati. Voc no sabe como meesforcei, porque no esteve por perto. Voc no me v h oito meses. No sou maisaquela garota que voc deixou para trs. Voc no me conhece mais.

    Entendido disse ele, levantando as palmas das mos para mostrar que era apenasuma sugesto inocente. Mas por que Idlewilde? No tem nada para fazer l em cima.Voc e Korbie vo ficar entediadas na primeira noite.

    Eu no compreendia por que Calvin estava to determinado a me fazer desistir. Eleadorava Idlewilde. E sabia to bem quanto eu que havia muito o que fazer por l. Ento aficha finalmente caiu. Aquilo no tinha nada a ver comigo ou com o lugar. Ele no queriater que ir junto. No queria desperdiar seu precioso tempo comigo. Se ele me fizessedesistir da viagem, seu pai no o obrigaria a nos acompanhar, e ele teria seu recesso deprimavera de volta.

    Procurei assimilar a informao, embora fosse doloroso. Limpei a garganta. Quanto seus pais tiveram que desembolsar para fazer voc ir com a gente?Ele me olhou com falso desdm. Obviamente no o bastante.Ento era assim que as coisas iam ser. Um flerte insignificante aqui, uma provocao ali.

    Mentalmente, peguei um marcador preto e fiz um grande X no nome Calvin. S para deixar claro, fui contra voc ir com a gente. Voc e eu juntos de novo? No

    consigo pensar em nada mais desconfortvel.Aquilo tinha soado bem melhor na minha cabea. Mas, pairando entre ns agora, as

    palavras passavam cime, mesquinharia e maldade exatamente o que se espera de umaex-namorada. Eu no queria que ele soubesse que eu ainda estava sofrendo. No quandoele estava ali, todo cheio de sorrisos e piscadelas.

  • Ah, ? Bem, esta dama de companhia aqui acabou de passar o seu toque de recolherpara uma hora mais cedo brincou.

    Acenei com a cabea em direo ao BMW X5 com trao nas quatro rodas estacionadol fora.

    seu? perguntei. Outro presente dos seus pais, ou voc arranjou algo parafazer sem ser correr atrs das garotas em Stanford como ter um trabalho respeitvel, porexemplo?

    Meu trabalho correr atrs das garotas. Um meio sorriso odioso. Mas eu no ochamaria de respeitvel.

    Nenhuma namorada sria, ento?No consegui olhar para ele, mas senti um imenso orgulho do meu tom casual. E disse a

    mim mesma que no me importaria com sua resposta, independentemente de qual fosse.Na verdade, se ele tivesse seguido em frente, seria mais um sinal verde indicando que euestava livre para fazer o mesmo.

    Ele me cutucou. Por qu? Voc tem namorado? Claro. Aham, claro. Ele bufou. Korbie teria me contado.No dei para trs, arqueando as sobrancelhas com um ar presunoso. Acredite ou no, existem coisas que Korbie no conta para voc.Ele franziu as sobrancelhas. E quem ? perguntou, com cautela, e eu percebi que ele estava analisando se

    acreditava ou no na minha histria.A melhor maneira de consertar uma mentira no contar outra. Mas fui em frente

    mesmo assim: Voc no o conhece. Ele novo na cidade.Calvin balanou a cabea. Muito conveniente. No acredito em voc.Mas seu tom sugeria que estava quase acreditando.Senti um desejo incontrolvel de provar a ele que eu tinha superado nossa histria

    com ou sem um fim propriamente dito, e, nesse caso, sem. E no s isso. Queria mostrar aele que eu tinha arrumado um cara muito, muito melhor. Enquanto Calvin estava ocupadosendo um mulherengo na Califrnia, eu no estava repito, no estava sofrendo peloscantos, olhando fotos dele.

    ele ali, est vendo? falei, sem pensar.Os olhos de Calvin seguiram meu gesto at o Volkswagen Jetta vermelho estacionado l

    fora, junto bomba de gasolina mais prxima. O cara abastecendo o Jetta devia ser unsdois anos mais velho do que eu. Seu cabelo castanho era bem curto, revelando a simetriaimpressionante de seu rosto. Com o sol batendo em suas costas, sombras marcavam asdepresses sob suas mas do rosto. No consegui ver a cor de seus olhos, mas eu esperavaque fossem castanhos, por nenhuma outra razo alm do fato de os olhos de Calvin serem

  • de um tom profundo de verde. O cara tinha ombros esculturais que me fizeram pensarque era nadador, e eu nunca o tinha visto antes.

    Aquele cara? Eu o vi quando entrei. A placa de Wyoming.Calvin no parecia convencido. Como eu disse, ele novo na cidade. Ele mais velho do que voc argumentou Calvin.Lancei para ele um olhar desafiador. E da?Ouvi o sino da porta, e meu falso namorado entrou. Ele era ainda mais bonito de perto.

    E seus olhos eram definitivamente castanhos um tom plido de castanho. Ele enfiou amo no bolso de trs para pegar a carteira, e eu agarrei o brao de Calvin e o puxei paratrs de uma prateleira cheia de biscoitos doces.

    O que est fazendo? perguntou ele, me olhando como se eu tivesse duas cabeas. No quero que ele me veja sussurrei. Porque ele no mesmo seu namorado, n? No isso. Onde estava a terceira mentira quando eu precisava dela?Cal sorriu com malcia, e, quando vi, ele havia se soltado da minha mo e estava

    caminhando devagar em direo ao balco da loja. Prendi um gemido entre os dentes eobservei, espiando entre as duas prateleiras de cima.

    Ei disse Calvin amigavelmente para o cara, que usava uma camisa xadrez deflanela, jeans e botas de escalada.

    O cara no se deu ao trabalho de erguer o olhar, e balanou a cabea para mostrar quetinha ouvido.

    Ouvi falar que voc est namorando a minha ex disse Calvin, com um tomindiscutivelmente convencido.

    Ele estava me fazendo provar um pouco do meu prprio veneno, e sabia disso.O comentrio chamou a ateno do cara, que observou Calvin com curiosidade, e senti

    minhas bochechas ficarem ainda mais quentes. Voc sabe, sua namorada provocou Calvin. Ali, escondida atrs dos biscoitos.Ele apontou para mim.Eu me empertiguei, minha cabea despontando no topo da prateleira. Estiquei a camisa

    e abri a boca, mas no saiu nada. Nada mesmo.O cara olhou na minha direo. Nossos olhares se encontraram brevemente, e, sem

    emitir som algum, balbuciei, completamente envergonhada, um eu posso explicar Mas nopodia.

    Ento, algo inesperado aconteceu. O cara encarou Calvin e disse, com uma voztranquila e serena:

    Sim. Minha namorada. Britt.Eu me encolhi, sem ao. Ele sabia meu nome?Calvin parecia igualmente espantado.

  • Ah. Ei. Me desculpe, cara. Eu pensei Ele estendeu a mo. Meu nome Calvin Versteeg gaguejou, sem jeito. O ex da Britt.

    Mason.Mason olhou para a mo estendida de Calvin, mas no o cumprimentou. Colocou trs

    notas de vinte no balco para Willie Hennessey. Ento, foi at onde eu estava e beijoumeu rosto. Foi um beijo sem emoo, mas minha pulsao acelerou mesmo assim. Elesorriu, e era um sorriso caloroso e sexy.

    Vejo que voc ainda no superou seu vcio por raspadinhas, Britt.Lentamente, retribu o sorriso. J que ele estava disposto a entrar na brincadeira, resolvi

    aproveitar minha deixa. Vi voc parar o carro, e precisava de algo para me acalmar. Olhei para ele com

    adorao, me abanando.Ele franziu o cenho. Eu tinha quase certeza de que estava rindo por dentro. Voc devia passar na minha casa mais tarde, Mason, porque comprei um novo brilho

    labial e ele precisa ser testado falei. Ah. Um jogo do beijo? disse ele, sem perder o embalo.Olhei rapidamente para Calvin para ver como ele estava lidando com a situao. Para

    meu deleite, parecia que ele tinha acabado de chupar um limo. Voc me conhece gosto de apimentar as coisas retruquei, com a voz doce.Calvin pigarreou e cruzou os braos. No melhor voc ir logo, Britt? Para chegar cabana antes de anoitecer.Algo indecifrvel enevoou os olhos de Mason. Est indo acampar? perguntou ele. Fazer trilha corrigi. Em Wyoming nas montanhas Tetons. Eu ia contar para

    voc, masDroga! Que motivo eu poderia inventar para no ter contado ao meu namorado sobre a

    viagem? Estava to perto de conseguir, e agora ia estragar tudo. Mas no parecia importante, j que vou estar fora da cidade tambm e no vamos

    poder passar a semana juntos de qualquer maneira completou Mason comtranquilidade.

    Nossos olhos se encontraram novamente. Ele no s era bonito como pensava rpido, eestava disposto a qualquer coisa at mesmo a fingir ser o namorado de uma garota quenunca tinha visto e, alm disso, mentia espantosamente bem. Quem era aquele cara?

    Isso, exatamente murmurei.Calvin inclinou a cabea na minha direo. Quando estvamos juntos, alguma vez deixei voc por uma semana sem dizer nada?Voc me deixou por oito meses, pensei, sarcasticamente. E terminou comigo na

    noite mais importante da minha vida. Jesus disse que devemos perdoar, mas h sempreuma exceo.

    A propsito, meu pai quer que voc venha jantar com a gente semana que vem falei para Mason.

  • Calvin deixou escapar um rudo sufocado. Certa vez, quando ainda namorvamos, eleme levou para casa cinco minutos depois do toque de recolher. Tnhamos acabado de sairdo carro quando vimos meu pai em p na varanda, batendo a ponta de um taco de golfena mo. Ele foi at o carro e bateu com o taco no cap do Ford F-150 preto do Calvin,deixando uma bela cratera redonda.

    Da prxima vez que a trouxer tarde para casa, vou mirar nos faris dissera meupai. No seja burro o suficiente para deixar que isso acontecer de novo.

    Ele no falava srio, no pra valer. Como eu era a caula da famlia e a nica menina,meu pai era ranzinza quando se tratava dos meninos que eu namorava. Mas, na verdade,ele era um velho urso adorvel. Mesmo assim, Calvin nunca mais desrespeitou o toque derecolher.

    E nunca foi convidado para jantar. Diga ao seu pai que eu adoraria mais algumas dicas de pesca com mosca disse

    Mason, mantendo nossa farsa. Milagrosamente, ele tambm adivinhou o esporte preferidodo meu pai. Toda aquela histria estava comeando a ficar estranha. Ah, e mais umacoisa, Britt. Ele passou a mo pelo meu cabelo, tirando-o do ombro. Fiqueicompletamente imvel, seu toque congelando o ar dentro de mim. Tome cuidado. Asmontanhas so perigosas nesta poca do ano.

    Fiquei olhando espantada at ele sair do posto de gasolina com o carro e ir embora.Ele sabia meu nome. Tinha me tirado de uma enrascada. Ele sabia meu nome.Tudo bem, estava impresso no peito da minha camisa roxa do acampamento de msica,

    mas Calvin no tinha notado isso. Pensei que voc estivesse mentindo disse Calvin, pasmo.Dei a Willie uma nota de cinco para pagar a raspadinha e guardei o troco. Por mais gratificante que essa conversa tenha sido, eu provavelmente devia fazer algo

    mais produtivo falei. Como arranhar aquele seu BMW. bonito demais. Assim como eu? Ele ergueu as sobrancelhas de forma esperanosa.Enchi minhas bochechas de raspadinha, fingindo que ia cuspir. Ele pulou e, para minha

    satisfao, finalmente tirou o sorriso arrogante do rosto. Vejo voc hoje noite em Idlewilde gritou Calvin para mim enquanto eu saa da

    loja.Levantei o polegar em resposta.O dedo do meio teria sido muito bvio.Quando passei pelo BMW de Calvin no estacionamento, notei que as portas estavam

    destrancadas. Olhei para trs para ter certeza de que ele no estava me vendo, ento tomeiuma deciso repentina. Entrei pela porta do passageiro, desalinhei seu espelho retrovisor,derramei raspadinha nos tapetes e roubei sua preciosa coleo de CDs do porta-luvas. Foium comportamento meio baixo, mas fez com que eu me sentisse um pouco melhor.

    Eu devolveria os CDs noite depois de ter arranhado alguns dos seus preferidos.

  • CAPTULODOIS

    Algumas horas depois, Korbie e eu estvamos na estrada. Calvin tinha sado antes da gente,e a culpa era toda de Korbie. Quando cheguei a sua casa para busc-la, ela estavaarrumando outra bolsa, lentamente pegando blusas no armrio e escolhendo os batons queiria levar. Eu me sentei na cama dela e tentei acelerar as coisas enfiando tudo na mala deuma vez.

    Queria muito chegar a Idlewilde antes de Calvin. Agora ele ia poder escolher o quartoprimeiro, e suas coisas estariam espalhadas pela cabana quando chegssemos. Eu o conheciamuito bem, e tinha quase certeza de que ele trancaria a porta, nos obrigando a bater,como se fssemos meras convidadas o que era irritante, uma vez que aquela era a nossaviagem, no dele.

    Korbie e eu viajamos com a capota abaixada, para desfrutar do calor do vale antes dechegarmos ao ar frio da montanha. Ouvimos msica no ltimo volume tambm. Korbietinha gravado um CD para a viagem, e estvamos ouvindo aquela msica dos anossetenta? oitenta? que dizia Get outta my dreams, get into my car. O rosto presunoso deCalvin no saa da minha cabea, e aquilo me incomodava. Eu acreditava piamente noditado Finja at que seja verdade, ento estampei um sorriso no rosto enquanto Korbietentava alcanar as notas mais agudas da msica.

    Depois de uma rpida parada para comprar mais Red Bull, deixamos para trs pastagensde cavalo e quintas verdejantes, as fileiras de mudas de milho zunindo, se transformandoem um borro, e comeamos a subir. A rodovia se estreitou, pinheiros e lamosamontoando-se no acostamento. O ar correndo pelo meu cabelo era frio e puro. Floressilvestres brancas e azuis brotavam do cho, e o mundo agora tinha um cheiro forte eterroso. Desci meus culos de sol at o nariz e sorri. Minha primeira viagem sem meu paiou meu irmo mais velho, Ian. No ia permitir que Calvin estragasse isso. No ia deix-loestragar meu humor e no ia deix-lo arruinar minhas frias nas montanhas. Ele que se dane.Ele que se dane, porque eu vou me divertir. Parecia um bom mantra para a semana.

    O cu era de um azul to ofuscante que fazia a vista doer; o sol refletia no para-brisaquando fazamos uma curva. Pisquei para conseguir enxergar melhor, e ento avistei: oscumes glaciais brancos da Cordilheira Teton projetando-se a distncia. Picos verticais epronunciados se erguiam at o cu como pirmides com neve no topo. Era fascinante eirresistvel, a vastido de rvores, encostas e cu.

    Korbie se inclinou para fora da janela com seu Iphone para tirar uma foto melhor. Ontem noite eu sonhei com a garota que foi morta por andarilhos nas montanhas

    contou ela. A guia de rafting?

  • Macie OKeeffe. Eu me recordava do nome dela aparecendo nos noticirios. Ela eramuito inteligente e tinha conseguido uma bolsa integral na Universidade de Georgetown.Havia desaparecido no incio de setembro do ano passado.

    Voc no tem medo de algo assim acontecer com a gente? No respondi, assertiva. Ela desapareceu muito longe do lugar para onde

    vamos. E no h nenhuma prova de que tenha sido mesmo morta por andarilhos. Isso s o que as pessoas acham. Talvez ela tenha se perdido. De qualquer forma, ainda muitocedo para encontrarmos vagabundos acampados perto do rio. E vamos estar l no alto dasmontanhas, ainda por cima; ningum vai at l.

    Sim, mas um pouco assustador. Isso aconteceu no ano passado. E foi s uma garota. ? E quanto a Lauren Huntsman, a socialite que apareceu em todos os jornais no ano

    passado? argumentou Korbie. Korbie. Pare com isso. Srio. Voc sabe quantos milhares de pessoas vm s montanhas

    e voltam para casa a salvo? Lauren desapareceu muito perto de onde vamos ficar insistiu Korbie. Ela estava em Jackson Hole, a quilmetros de distncia de onde vamos ficar. E estava

    bbada. Acham que ela entrou em um lago e acabou se afogando. No noticirio, falaram que algumas pessoas a viram sair de um bar com um caubi de

    chapu preto. Uma pessoa viu. E nunca encontraram o tal caubi. Ele nem deve existir. Se

    estivssemos correndo algum perigo, meu pai no me deixaria vir. , acho que sim disse Korbie, com um ar nada convencido. Felizmente, poucos

    minutos depois ela parecia ter deixado de lado a apreenso. Daqui a duas horasestaremos assando marshmallows em Idlewilde! disse, animada com a cpula azul docu.

    Os Versteeg eram donos de Idlewilde desde que eu me entendia por gente. Estava maispara uma casa do que para uma cabana. Trs chamins de pedra despontavam de umtelhado triangular. Tinha seis quartos sete, contando com o sof-cama no poro, aolado das mesas de tot e sinuca , uma varanda no segundo andar, janelas impressionantese cantinhos confortveis espalhados pela casa. Embora os Versteeg s vezes passassem oNatal em Idlewilde o sr. Versteeg tinha tirado licena de piloto e comprado umhelicptero monomotor para subir a montanha, uma vez que a maioria das estradas ficavacoberta de neve e fechada at a primavera , eles a usavam quase que exclusivamentecomo uma casa de veraneio, e tinham coberto o entorno com grama e construdo umabanheira de hidromassagem, uma quadra de badminton e um braseiro de pedra entreespreguiadeiras.

    Dois anos antes, eu tinha passado o Natal em Idlewilde com a famlia de Korbie, masisso no aconteceu ano passado. Calvin tinha ido passar o feriado na casa de um de seuscolegas da faculdade, e Korbie e os pais tinham ido esquiar no Colorado, deixando a casavazia. Eu nunca havia visitado Idlewilde sem o sr. e a sra. Versteeg. No conseguiaimaginar o lugar sem o olhar atento do sr. Versteeg nos seguindo como uma sombra.

  • Dessa vez ramos s ns, os jovens. Sem adultos e sem regras. Um ano antes, ficar a sscom Calvin por uma semana teria parecido proibido e perigoso, uma fantasia secreta quese tornava realidade. Agora eu no sabia o que esperar. No sabia o que dizer a ele quandonos esbarrssemos no corredor. E me perguntava se ele temia isso tanto quanto eu. Pelomenos nosso primeiro e incmodo desentendimento j havia ficado para trs.

    Tem algum chiclete? perguntou Korbie, e, antes que pudesse det-la, ela abriumeu porta-luvas, deixando a coleo de CDs de Calvin cair. Ela pegou os CDs e osobservou, intrigada. Isso no do meu irmo?

    Eu tinha sido pega; o melhor era confessar tudo. Peguei no carro dele hoje de manh no posto de gasolina. Ele foi um babaca. Eu

    tinha todo o direito de fazer isso. No se preocupe, vou devolver. Voc tem certeza de que est bem com essa coisa toda do Calvin? perguntou

    Korbie, claramente achando estranho eu ter roubado os CDs. Para mim ele s umman, mas fico lembrando que vocs, sei l, ficaram juntos. Ou coisa do tipo. Podemosconversar sobre isso o quanto quiser s no fale dos beijos. A ideia de algum trocandosaliva com meu irmo, principalmente voc, me d vontade de vomitar. Ela enfiou odedo na garganta para dar nfase.

    Nossa, ele passado para mim, sem dvida.O que era uma grande mentira. Eu no tinha superado Calvin. O falso namorado que

    me senti compelida a inventar provava isso. Antes daquela manh, eu realmente acreditavaque tinha deixado isso pra trs, mas, quando vi Cal, minhas emoes reprimidas vieram tona. Eu detestava ainda sentir algo por ele, mesmo que fosse uma emoo to negativa.Detestava que ele ainda tivesse o poder de me magoar. Eu tinha tantas lembranas ruinsligadas a Calvin. Ser que Korbie no se lembrava de que ele havia terminado comigo nanoite da festa de volta s aulas? Eu tinha um vestido, reservas para jantar no RubyTuesday, e havia pagado a minha parte e a dele do aluguel da limusine. E ainda estavaconcorrendo rainha do baile! Tinha sonhado milhares de vezes com isso eu, no meiodo campo de futebol, com a coroa na cabea e sorrindo, enquanto a multido aplaudia egritava. Pensava em como seria depois, danando nos braos de Calvin.

    Tnhamos combinado de nos encontrar na minha casa s oito, e, quando deu oito emeia e nada do Cal aparecer, fiquei preocupada, cogitando que talvez ele pudesse tersofrido um acidente. Eu sabia que o voo no estava atrasado tinha acompanhado otrajeto pela internet. O restante do grupo partira para o baile na limusine, e eu estavaprestes a cair no choro.

    E ento o telefone tocou. Calvin no havia nem sado da Califrnia. Tinha esperado ato ltimo minuto para ligar, e no se preocupou em sequer fingir que se sentia culpado.Com uma voz tranquila e despreocupada, me disse que no estava a caminho.

    E voc esperou at agora para me dizer? perguntei. Eu estava cheio de coisas na cabea. Isso to tpico. Voc no me liga h semanas. No retorna minhas ligaes h dias.Calvin no era mais o mesmo desde que fora para a faculdade. Era como se tivesse

    tomado gosto pela liberdade, e tudo houvesse mudado. Eu j no era prioridade para ele.

  • Eu deveria saber que voc faria algo assim disparei, segurando as lgrimas. Ele noviria. Eu no tinha um par para o baile.

    Voc est monitorando a frequncia das minhas ligaes? No sei se gosto disso, Britt. Srio? Voc est querendo inverter as coisas e me colocar no papel de vil da histria?

    Voc sabe o quanto est me desapontando agora? Voc exatamente como o meu pai, sempre reclamando, dizendo que no sou bom

    o suficiente disse ele, na defensiva. Voc um idiota! Talvez seja melhor a gente no continuar junto acrescentou ele, duramente. Talvez seja melhor mesmo!A pior parte foi ter ouvido msica alta e um programa de esportes qualquer ao fundo.

    Ele estava em um bar. Eu tinha criado tantas expectativas para aquela noite, e ele estavaenchendo a cara. Bati o telefone e comecei a chorar.

    Aquelas lembranas estavam comeando a me deixar mal-humorada. Eu realmentegostaria de no ter que falar sobre Calvin. Aquilo estava arruinando minha determinaoem ser uma pessoa mais positiva. Seria muito mais fcil fingir que estava feliz se eu notivesse que gastar todas as minhas energias para convencer o mundo inteiro de que euestava tima, incrivelmente tima.

    No vai ser estranho com ele por perto? pressionou Korbie. No seja ridcula.Ela estreitou os olhos, desconfiada. Voc no vai aproveitar a oportunidade para ficar com ele de novo, n? Credo! Por favor, nem ouse me perguntar isso outra vez.Mas a ideia tinha passado pela minha cabea. Muitas vezes.E se Calvin desse em cima de mim? No era improvvel. Korbie e o Urso ficariam se

    agarrando a todo momento, o que me deixaria sozinha com Calvin. No mesurpreenderia se ele tentasse alguma coisa. Ou seja, eu tinha que decidir logo se iria deixarque algo acontecesse.

    Talvez, se visse que ele realmente tinha seguido em frente, eu at deixasse pra l. Mas ojeito que ele havia olhado para mim na loja de convenincia quando eu estava flertandocom Mason... Se aquilo no fosse arrependimento, eu no sabia o que era.

    Mas, dessa vez, decidi que iria faz-lo lutar por mim. Ele havia me humilhado, e teriaque se esforar para me reconquistar. Eu no o aceitaria de volta at ele ter sofrido osuficiente. At ter rastejado e ido um pouco alm. Calvin sabia que eu no era de trairningum, o que iria facilitar as coisas para o meu lado. Eu me divertiria um pouco comele e depois o largaria, alegando que me sentia pssima por trair o meu falso namorado.

    Sabe o que dizem sobre vingana? Em breve, Calvin saberia tambm.Feliz por finalmente ter um plano, me afundei no banco, me sentindo presunosamente

    triunfante e pronta para a longa semana que tinha pela frente.Korbie abriu o porta-CDs, mas antes que pudesse dar uma olhada no que havia dentro,

    notou um papel dobrado na parte da frente. Uau, d uma olhada nisso.

  • Olhei para o lado. Ela estava segurando um mapa topogrfico do Parque NacionalGrand Teton do tipo que se consegue em um posto da Guarda Florestal , masaquele tinha anotaes por toda parte com a letra de Calvin. Estava dobrado uma vez aomeio, e depois outra, e a colorao estava desbotada, as bordas desgastadas. Calvinclaramente tinha usado bastante aquele mapa.

    Calvin marcou as melhores trilhas para caminhadas disse Korbie. Olhe s atonde ele j foi Tem anotaes em todos os cantos. Ele deve ter levado anos para fazerisso. Sei que eu sempre impliquei por ele ser todo nerd com essas coisas de vida ao arlivre, mas isso at que legal.

    Posso ver?Peguei o mapa, abrindo-o em cima do volante e olhando ao mesmo tempo para o papel

    e para a estrada.Calvin tinha marcado mais do que trilhas para caminhadas. O mapa estava coberto de

    anotaes detalhadas sobre trilhas de snowmobile, estradas no asfaltadas, abrigos deemergncia, uma central da Guarda Florestal, pontos pitorescos interessantes, reas de caa,lagos e riachos no poludos, e passagens de animais selvagens. Idlewilde tambm estavamarcada. Se algum se perdesse durante uma trilha, o mapa seria uma ferramenta desobrevivncia muito til.

    Ainda estvamos muito longe para encontrar nossa localizao no mapa de Calvin, maseu pensava seriamente em ficar com aquele mapa e abandonar as anotaes menos precisasdo sr. Versteeg quando chegssemos mais perto.

    Voc precisa devolver este mapa para o Calvin insistiu Korbie.Dobrei novamente o mapa e o enfiei no bolso de trs do short. Um guia

    meticulosamente detalhado como aquele devia valer alguma coisa para ele. Eu at iriadevolv-lo. Mas antes ia fazer Calvin penar um pouco.

    Trinta minutos depois, o CD que Korbie tinha gravado chegou ao fim com Every DayIs a Winding Road, da Sheryl Crow. A estrada estava mais ngreme ainda, e subamosem zigue-zague. Os acostamentos desapareciam do nada, e eu tive que chegar mais para afrente no banco para me concentrar em cada curva fechada que fazamos. Uma curvaequivocada e perderamos o controle e cairamos pela ribanceira. Perceber isso era aomesmo tempo empolgante e apavorante.

    Ser que vai chover? perguntou Korbie, franzindo a testa, enquanto apontava paraum aglomerado de nuvens escuras despontando por cima das copas das rvores. Comoisso possvel? Chequei a previso do tempo antes de sairmos. Era para chover em Idaho,no em Wyoming.

    Vai chover por alguns minutos, mas depois o cu vai ficar limpo.Se voc no gosta do clima em Wyoming, espere uns cinco minutos. Assim dizia o

    ditado. Queria que no chovesse dia nenhum enquanto estivermos aqui disse Korbie,

    bufando, indignada.Ser que ela estava pensando em Rachel e Emilie se bronzeando na praia de Waikiki?

    Eu sabia o quanto Korbie queria ir para algum lugar ensolarado no recesso de primavera.

  • Acho que o fato de ela estar fazendo aquela viagem comigo dizia muito sobre nossarelao. Tnhamos as nossas brigas, claro, mas nossa amizade era muito forte. No somuitas as amigas que abririam mo de uma praia paradisaca para fazer trilha nasmontanhas.

    Li em algum guia que a chuva tem algo a ver com o fato de o ar quente e o frioestarem sempre colidindo aqui em cima murmurei, despreocupadamente, com osolhos grudados na estrada. Nesta altitude, o vapor dgua pode se transformar em gelo,que tem uma carga positiva. Mas a chuva tem uma carga negativa. Quando as cargas seencontram, do origem aos relmpagos e temos uma tempestade.

    Korbie baixou os culos escuros at o nariz e olhou para mim com ar de espanto. Voc tambm acende fogo com gravetos e se orienta pelas estrelas?Soltei o volante rapidamente para dar um cutuco em seu ombro. Voc devia pelo menos ter dado uma olhada em alguns dos guias que seu pai

    comprou. Voc est falando dos guias que me ensinaram que um ser humano pode sobreviver

    base de dejetos de coelho em situaes extremas? Ela torceu o nariz. Essa foi aprimeira e ltima vez que li um guia. De qualquer forma, se eu tivesse lido tudo seria umdesperdcio de tempo, j que meu irmo vai assumir o controle da viagem e ficar dandoordens gente.

    Calvin no assumiria o controle. No daquela vez. Eu no tinha treinado por tantotempo para entregar tudo de mo beijada para ele.

    Rapidamente, o cu assumiu um tom cinza-escuro. A primeira gota de chuva caiucomo um pedao de gelo em meu brao. Depois, outra. Ento mais trs. Em questo desegundos, a chuva apertou, respingando o para-brisa com gotculas de gua. Parei o jipeno meio da estrada, j que no havia lugar para encostar.

    Korbie dava tapinhas nos pingos de chuva como se fossem mosquitos. Me ajude a cobrir o carro falei, saindo do jipe.Levantei a capota, fazendo sinal para Korbie prend-la. Depois abri a porta traseira,

    desenrolei a janela e prendi as correias. Quando terminei, estava ensopada, os pelos dosmeus braos arrepiados de frio. Esfreguei os olhos para enxug-los e fechei as janelaslaterais. Por fim, prendi o velcro e entrei no carro, tremendo muito.

    A est a sua carga negativa brincou Korbie.Encostei o rosto na janela fria e dei uma olhada no cu. Nuvens cinza terrveis se

    estendiam em todas as direes. J no dava para ver nenhum azul, nem mesmo umpedacinho sequer no horizonte. Esfreguei os braos para me aquecer.

    melhor eu ligar para o Urso e avis-lo da tempestade disse Korbie. Um instantedepois, ela afundou de volta no banco, frustrada. Estamos sem sinal.

    Andamos por mais alguns quilmetros antes que a chuva desabasse torrencialmente. Agua que corria pela estrada parecia um rio e chapinhava nos pneus, me deixandopreocupada com a aquaplanagem. Os limpadores de para-brisa no conseguiam remover agua rpido o bastante; a chuva batia to furiosamente no vidro que eu no conseguia veraonde estava indo. Eu queria encostar o carro, mas no havia acostamento. Em vez disso,

  • fui o mais para a direita possvel na minha pista, parei e liguei o pisca-alerta. Esperava que,se algum estivesse vindo atrs da gente, visse as luzes piscando em meio ao aguaceiro.

    Fico pensando em como deve estar o tempo l no Hava disse Korbie, usando amanga da blusa para limpar a janela embaada.

    Tamborilei as unhas no volante, me perguntando o que Calvin faria no meu lugar. Meuhumor melhoraria tremendamente se, naquela noite, eu pudesse lhe dizer que tinhapassado pela tempestade numa boa.

    Sem pnico murmurei em voz alta, pensando que parecia um bom primeiropasso em direo ao sucesso.

    O cu est desabando, nossos celulares esto sem sinal e estamos no meio dasmontanhas. Sem pnico. Claro.

  • CAPTULOTRS

    A chuva no deu trgua.Uma hora mais tarde, a gua continuava a correr pelo para-brisa, engrossando e se

    transformando em uma neve semiderretida. Ainda no era exatamente neve. No entanto,alguns graus a menos e isso iria mudar. Ainda estvamos paradas na estrada, e eu deixei omotor ligado praticamente o tempo inteiro. Toda vez que desligava para economizargasolina, eu e Korbie comevamos a tremer violentamente. Vestimos calas jeans ecolocamos as botas e nossos casacos, mas a roupa extra no conseguia deter o frio. Para obem ou para o mal, ningum tinha vindo na estrada atrs de ns.

    Est ficando mais frio falei, mordendo o lbio, nervosa. Talvez seja melhorvoltar.

    A cabana no deve estar a mais de uma hora de distncia. No podemos voltar agora. A chuva est to forte que no consigo ver as placas.Eu me curvei sobre o volante, estreitando os olhos para enxergar pelo para-brisa a placa

    em forma de losango amarelo frente. As inscries em preto estavam completamenteilegveis. Tinha escurecido muito rpido. O relgio mostrava que passava das cinco, maspodia muito bem j ter anoitecido.

    Pensei que o seu jipe fosse off-road. Tenho certeza de que ele funciona bem nachuva. Pise fundo no acelerador e a gente sobe a montanha.

    Vamos esperar mais dez minutos, para ver se a chuva para.Eu no estava acostumada a dirigir em meio a temporais, muito menos um to forte

    como aquele, e com rajadas de vento violentas. O anoitecer s piorava as coisas, pois malconseguamos ver o que estava do lado de fora. Naquele momento, dirigir, ainda quepraticamente me arrastando, parecia perigoso.

    Olhe para o cu. No vai parar. Precisamos continuar. Voc acha que os limpadoresde para-brisa vo aguentar por muito mais tempo?

    Era uma boa pergunta. A borracha estava se soltando da armao de metal, que raspava ovidro com um rudo suave.

    Seria melhor se voc tivesse visto isso antes da viagem continuou Korbie.Que maravilha ela me falar isso agora. Pensando bem, acho que estamos forando seu carro um pouco demais insistiu

    Korbie, com a voz levemente preocupada.Fiquei calada, com medo de dizer algo de que pudesse me arrepender. As alfinetadas de

    Korbie eram sempre assim: veladas. Ela dominava a arte de minar as pessoasingenuamente.

  • Os veculos off-road melhoraram muito ao longo dos anos, n? acrescentou, damesma forma falsamente educada. Quer dizer, a diferena entre seu jipe e o meuutilitrio imensa.

    Senti o sangue ferver. Ela estava transformando aquilo em uma competio, comosempre. Eu nunca contaria isto a Korbie, mas no vero anterior, quando dormi uma noitena casa dela, dei uma olhada no seu dirio. Pensei que encontraria segredos a respeito deCalvin, informaes que eu poderia usar para provoc-lo de brincadeira depois. Imagineminha surpresa quando encontrei duas listas, lado a lado, em que Korbie se comparava amim. Segundo ela, eu tinha pernas mais bonitas e uma cintura mais definida, mas meuslbios eram muito finos e eu tinha muitas sardas, e portanto era apenas genericamente bonita.Korbie ganhava no tamanho do suti, tinha as sobrancelhas mais certinhas e pesava quatroquilos a menos do que eu claro que ela se esqueceu de mencionar que era oitocentmetros mais baixa! A lista ocupava duas pginas, e dava para perceber, pelas diferentescores de caneta, que continuava sendo atualizada. Korbie dera a cada atributo umapontuao, e havia somado os totais. Na poca, ela me ganhava por uns dez pontos. Oque era ridculo, j que se dera cinco pontos a mais pelas unhas e fazamos a mesma coisano mesmo salo.

    Pensei na lista secreta dela agora, e me senti mais determinada do que nunca a defendermeu jipe. Eu iria chegar at o alto daquela montanha de qualquer jeito. Tudo para nodar a ela mais uma vitria para incluir em sua lista estpida (melhor carro? check). Eu sabiaque no deveria me importar com esse jogo, pois era tudo uma grande idiotice, e sabiaque Korbie nunca me deixaria venc-la, mas eu queria mostrar para ela que conseguia.Queria muito.

    Curiosamente, eu tinha passado pela mesma coisa na minha relao com Calvin, meesforando excessivamente para convencer todos a minha volta, principalmente Korbie,de que Calvin e eu ramos um casal perfeito. Para toda a vida. Eu nunca tinha pensado nissode forma to consciente, mas sentia uma necessidade avassaladora de mostrar a Korbiecomo minha vida era tima. Talvez por causa da lista. Talvez porque me irritasse pensarque ela mantinha uma contagem de pontos, quando esse deveria ser o tipo de coisa queacontece entre inimigas, e no entre melhores amigas.

    Voc colocou pneus de neve neste troo antes de sairmos? perguntou Korbie.Neste troo? Era em momentos como aquele que eu tinha que me esforar para lembrar

    por que Korbie e eu ramos amigas. ramos inseparveis desde pequenas, e, mesmo tendocomeado a seguir direes diferentes, principalmente no ano anterior, era difcil desistirde um relacionamento que levara anos para ser construdo. Alm disso, quando paravapara refletir, eu perdia a conta de tudo que Korbie fizera por mim. E isso no s agora,mas desde que ramos crianas, quando ela me comprava coisas que eu no tinha comopagar e choramingava at seus pais me deixarem ir junto nas frias de famlia. Ela fazia detudo para que eu nunca fosse deixada de lado. Frutos de sua personalidade forte ou no,os pequenos atos de gentileza de Korbie tinham me conquistado.

    E ainda era assim.

  • Estvamos definitivamente mais para irms do que amigas: amvamos uma a outra, emboranem sempre gostssemos uma da outra. E estvamos sempre juntas. Rachel e Emilie nohaviam desistido de viajar para a praia para fazer trilha nas montanhas, mesmo sabendo queeu precisava disso. Mas Korbie no pensara duas vezes. Bem, quase isso.

    No era para nevar retruquei. Seus pais disseram que as estradas at Idlewildeestariam limpas.

    Korbie soltou um longo suspiro, fazendo beicinho, e cruzou as pernas, impaciente. Bem, agora que estamos presas aqui, acho que vamos ter que esperar o Urso vir nos

    resgatar. Voc est insinuando que culpa minha estarmos presas aqui? No posso controlar o

    tempo.Ela se virou para mim. Tudo o que eu disse que estamos presas voc que est exagerando. Mesmo que

    eu estivesse insinuando que este jipe no foi feito para um tempo como esse, estariadizendo a verdade, certo? Voc est toda estressadinha porque eu tenho razo.

    Minha respirao acelerou. Voc quer ver o jipe subir a montanha?Ela fez um gesto exagerado com as mos em direo ao para-brisa. S acredito vendo. Ok, ento. V em frente. Fique vontade. Pisa fundo.Soprei o cabelo para tir-lo dos meus olhos e agarrei o volante com tanta fora que os

    ns dos meus dedos ficaram brancos. Eu no queria fazer aquilo. Eu no confiava no jipepara nadar rio acima; e isso era praticamente o que eu estaria pedindo que ele fizesse.

    Voc est blefando disse Korbie. No vai fazer isso.Mas eu tinha que fazer. No me restava alternativa. Engrenei o jipe, tomando coragem,

    e, hesitante, virei o carro em direo estrada, ainda tomada por gua. Eu estava comtanto medo que senti uma gota de suor escorrer pela coluna. No tnhamos nem chegadoa Idlewilde e j estvamos com problemas. Se eu estragasse tudo, Korbie nunca meperdoaria por arrast-la at l. Pior, ela contaria tudo ao irmo, para quem ficaria claro queeu no deveria tentar fazer uma trilha que exigia tanto se no conseguia controlar meucarro em meio a um temporal. Eu precisava nos tirar dali.

    Os pneus traseiros derraparam, mas finalmente conseguiram avanar, e comeamos asubir.

    Est vendo? falei, com orgulho, mas ainda sentindo um n no peito.Meu p estava congelado no acelerador, e eu temia que, se o movesse um pouquinho

    que fosse, o jipe pudesse escorregar ou deslizar ou pior, derrapar da beira da montanha. Voc pode se vangloriar quando chegarmos l em cima.Enormes flocos de neve caam no para-brisa, ento aumentei um pouco a velocidade do

    limpador, que no servia para quase mais nada. Eu s via alguns metros frente do jipe.Acendi o farol. No melhorou muito.

  • Seguimos nesse ritmo arrastado por mais uma hora. Eu j no conseguia mais ver aestrada apenas vislumbres passageiros de asfalto preto por baixo do branco ofuscante. Aintervalos de poucos metros, os pneus derrapavam e travavam. Pisei mais fundo noacelerador, mas eu sabia que no daria para subir lentamente daquele jeito para sempre.Uma coisa era defender meu orgulho. Outra era nos matar sem necessidade.

    O carro morreu. Liguei de novo e pisei no acelerador. Vamos l. Ande. Eu no sabia seestava tentando convencer o carro ou a mim mesma. O motor gemeu e morreunovamente. A subida ngreme, aliada ao fato de a estrada estar coberta de neve, tornavaimpossvel continuar dirigindo.

    Eu no conseguia sequer ver onde tinha parado, e isso me assustava. Podamos estar acentmetros de um desfiladeiro. Liguei o pisca-alerta de novo, mas nevava to forte queningum conseguiria nos ver at que fosse tarde demais.

    Peguei, ento, o mapa de Calvin e tentei me orientar. Mas era intil. No dava paraidentificar ponto de referncia algum em meio brancura da neve.

    Ficamos em silncio por vrios minutos, nossa respirao embaando as janelas. Fiqueifeliz por Korbie, pelo menos uma vez, no falar nada. No ia aguentar discutir com elanaquele momento. No parava de pensar nas nossas alternativas. No tnhamos comida s na cabana. A sra. Versteeg tinha mandado seu assistente levar a comida para l no fim desemana anterior, para que no precisssemos levar. Nossos celulares estavam sem servio.Tnhamos sacos de dormir, mas acampar na estrada noite era realmente uma opo? E seum caminho nos atingisse por trs?

    Que droga resmungou Korbie, limpando o vapor das janelas e olhando pasmapara todo aquele branco l fora.

    Eu nunca tinha visto a neve cair to forte e to rpido daquele jeito. Tinha coberto aestrada, e j estava se acumulando.

    Talvez devssemos voltar agora falei.Mas isso tambm no era exatamente uma opo. Descer a montanha coberta de neve e

    gua parecia ainda mais perigoso do que subir. E eu j estava exausta do esforo que fizerapara chegamos at ali. Uma dor de cabea infernal comeou a me importunar.

    No vamos voltar. Vamos ficar aqui disse Korbie, decidida. O Urso deve estara uma ou duas horas da gente. Ele vai nos rebocar com a picape.

    No podemos ficar no meio da estrada, Korbie. muito perigoso. Deve haver umacostamento mais frente. Saia do carro e empurre.

    Como? No podemos ficar paradas aqui falei. Estamos no meio da estrada.Eu no sabia se estvamos no meio da estrada. O cho, as rvores e o cu eram um

    grande borro branco. No havia como saber onde um terminava e o outro comeava. E,embora na verdade eu no achasse uma boa ideia mover o carro no quando noconseguamos ver nada , estava cansada das sugestes estpidas de Korbie. Queria queela acordasse.

    Saia e empurre.Os olhos dela se arregalaram, e logo depois se estreitaram.

  • Voc no pode estar falando srio. Est nevando l fora. Tudo bem. Voc dirige. Eu empurro. No sei dirigir carro com marcha.Eu sabia disso, e faz-la admitir melhorou meu humor, exatamente como eu esperava.

    Estvamos presas e eu no tinha a menor ideia de como nos tirar dali. Ento, uma sensaoestranha tomou conta de mim. De repente fiquei com medo de estarmos com problemasainda maiores do que imaginvamos. Afastei aquele pensamento assustador e sa do carro.

    Na mesma hora, o vento e a neve fustigaram minha pele. Procurei meu gorro de esquide l nos bolsos do casaco. Cinco minutos na neve e parecia um pano de prato molhado.Eu tinha um chapu reserva (um bon de beisebol que Calvin tinha me dado no ltimovero) enfiado em algum lugar no fundo da minha mochila, mas no era impermevel. Anica razo para eu t-lo trazido nesta viagem era a satisfao de devolv-lo, mandandouma mensagem clara para Calvin de que o havia superado.

    Enrolei meu cachecol vermelho no pescoo, com esperana de que se sasse melhor doque meu gorro.

    Aonde voc est indo? gritou Korbie pela porta aberta. No podemos dormir aqui. Se deixarmos o jipe ligado a noite toda, vamos ficar sem

    gasolina. Se no ligarmos o aquecedor, vamos congelar.Eu olhava bem dentro dos olhos dela, para ter certeza de que minha amiga entendia o

    que eu estava dizendo. Eu mesma mal entendia. A ideia de que podamos estar em perigoparecia vagar sem rumo no fundo da minha mente. A ficha no queria cair. Eu ficavapensando no meu pai. Ser que ele sabia que estava nevando nas montanhas? Ele podiaestar em sua picape agora, vindo nos resgatar. No estvamos correndo perigo de verdade,porque meu pai viria nos salvar mas como ele iria nos encontrar?

    Mas no era para nevar! disse Korbie com voz estridente.Se meu pai tivesse previsto isso, ele no teria me deixado sair. Eu estaria em casa agora,

    segura. Mas pensar isso era perda de tempo. Eu estava ali, estava nevando, e precisvamosencontrar um abrigo.

    Voc est sugerindo que a gente durma a fora? Korbie apontou para a floresta,que parecia escura e assombrada em meio ao redemoinho de neve.

    Cruzei os braos para manter as mo aquecidas. No devemos ser as nicas pessoas aqui em cima falei. Se andarmos por a,

    podemos encontrar uma cabana com as luzes acesas. E se a gente se perder?A pergunta me irritou. Como eu ia saber? Eu estava com fome, precisava ir ao banheiro

    e estava presa em uma montanha. Estava abandonando meu carro em busca de um abrigomelhor, e no sabia se encontraria algum. Meu telefone no funcionava, eu no tinhacomo falar com o meu pai, e meu corao batia to rpido que estava me deixando tonta.

    Fechei a porta e fingi no ter ouvido a pergunta. Procurei colocar me perder no fimda minha lista de preocupaes. Se meu pai no conseguisse subir a montanha, se Korbie eeu passssemos a noite no jipe, se no encontrssemos uma cabana, iramos congelar at amorte. Eu no dissera isto a Korbie, mas no sabia direito onde estvamos. Seu senso de

  • direo era pior do que o meu, ento ela havia me encarregado de ler as instrues do sr.Versteeg e nos levar em segurana at Idlewilde. As placas de sinalizao estavam cobertasde gelo, deixando-as ilegveis, e, embora eu tivesse fingido estar confiante, no tinhacerteza se a ltima curva que fizera estava certa. Havia uma estrada principal que subia amontanha, mas se eu tivesse sado dela muito cedo, ou tarde demais

    O Urso estava indo atrs de ns em sua picape, mas, se tivssemos feito o caminhoerrado, ele nunca nos encontraria. Idlewilde podia estar a quilmetros dali.

    Korbie saiu do carro e foi falar comigo. Talvez eu devesse ficar aqui enquanto voc vai procurar um abrigo. Assim uma de

    ns continua sabendo onde o carro est. O jipe no vai nos ajudar em nada se essa tempestade durar a noite toda ressaltei.

    A neve, que caa cada vez mais forte, se prendia ao cabelo e ao casaco dela. Eu queriaacreditar que a neve comearia a diminuir em breve. Tambm queria acreditar que oUrso estava logo atrs da gente, mas uma sensao de pnico que apertava meu peito medizia que eu no podia contar com isso. melhor ficarmos juntas falei.

    Parecia uma boa ideia. Parecia o tipo de coisa que Calvin diria. Mas e se o Urso no nos achar? protestou Korbie. Vamos caminhar por meia hora. Se no encontrarmos ningum, voltamos. Promete? Prometo falei, tentando manter a voz tranquila.No queria que Korbie soubesse o quanto eu estava preocupada. Se ela descobrisse que

    eu no tinha tudo sob controle, iria surtar.Argumentar com ela estava fora de questo. Eu a conhecia bem o bastante para saber

    que iria comear a chorar ou a gritar comigo.E ento eu no conseguiria raciocinar. E era isso que eu precisava fazer. Raciocinar.

    Raciocinar como algum que sabia como sobreviver a imprevistos como aquele. Pensarcomo Calvin.

    Peguei uma pequena lanterna que levramos conosco e comecei a nos guiar em meio tempestade.

    Avanamos lentamente pela neve por trinta minutos. Ento quarenta e cinco. Eu seguiaa estrada para no me perder, mas tinha escurecido tanto e nevava to forte que era fcilerrar a direo.

    J estvamos andando havia quase uma hora, e eu sabia que estava abusando da sorte logo, logo Korbie comearia a reclamar dizendo que queria voltar.

    S mais um pouco falei, no pela primeira vez. Vamos ver o que tem ali nafrente, depois daquelas rvores.

    Korbie no respondeu, e me perguntei se ela estava, finalmente, to assustada quanto eu.A neve feria a minha pele como dentes afiados. Cada passo doa, e meu crebro

    comeou a pensar em outro plano. Havia sacos de dormir e cobertores no jipe. Noconseguiramos dormir no carro, no enquanto ele estivesse parado na estrada, mas secolocssemos vrias camadas de roupa, escavssemos um monte de neve e dormssemosbem juntas para conservar o calor

  • Luz. L. Mais frente.No era uma miragem. Era real. Luzes! exclamei, a voz fraca devido ao frio.Korbie comeou a chorar.Agarrei a mo dela e, juntas, caminhamos com dificuldade em meio s rvores, por um

    terreno mole e encharcado. A neve se prendia s minhas botas, tornando cada passo maisdifcil. Uma cabana. Uma cabana. Ficaria tudo bem.

    As janelas projetavam luz suficiente para enxergarmos uma velha picape enferrujadaenterrada sob centmetros de neve na entrada da garagem. Havia algum em casa.

    Corremos at a porta e bati. No esperei resposta, comecei a bater mais forte. Korbie sejuntou a mim, esmurrando a porta com os punhos. Nem me permiti pensar no queaconteceria se ningum atendesse, se tivessem ido embora e deixado a picape para trs, setivssemos que invadir o lugar e eu tinha certeza que iria invadir, se fosse preciso.

    Um instante depois, ouvimos passos do outro lado. O alvio tomou conta de mim.Ouvi, ento, o som abafado de vozes conversando. Por que estavam demorando tanto?Depressa, depressa, pensei. Abram a porta. Deixem-nos entrar.

    As luzes da varanda de repente se acenderam, parecendo holofotes apontados em nossadireo. Me encolhi, tentando ajustar a viso. Vnhamos andando na escurido por tantotempo que o brilho fez meus olhos arderem.

    O ferrolho deslizou e a porta se abriu com um rangido suave. Dois homens apareceram porta, o mais alto um pouco mais para trs. Eu o reconheci imediatamente. Ele usava amesma camisa xadrez e botas pesadas com que o vira mais cedo. Nossos olhares seencontraram e, por um instante, no havia nada alm da mais completa surpresa em seurosto. Ele olhou para mim, e, quando me reconheceu, suas feies endureceram.

    Mason? falei.

  • CAPTULOQUATRO

    Duas vezes no mesmo dia comentei, sorrindo para Mason com dentes que noparavam de bater. Ou uma grande coincidncia ou o destino est tentando nos dizeralguma coisa.

    Mason continuou a me encarar, os lbios comprimidos, os olhos escuros e nadaconvidativos. A neve entrava rodopiando pela porta aberta, mas ele no nos convidoupara entrar.

    O que voc est fazendo aqui? perguntou ele.Encostado no batente da porta, o homem ao lado de Mason olhou para mim e para ele

    com ar curioso. Voc a conhece? perguntou.Ele devia ter a mesma idade de Mason, uns vinte e poucos anos. Era mais baixo, e

    parecia uma tbua, a camiseta justa revelando um peito achatado e magro. O cabelo lourobagunado caa sobre a testa, e, por trs de um par de culos de armao preta e aroredondo, seus olhos eram de um tom muito claro de azul. O que mais chamou a minhaateno foi seu nariz torto. Fiquei pensando em como ele tinha quebrado.

    Como vocs se conhecem? perguntou Korbie, me cutucando, inquieta.Eu no acreditava que tinha esquecido de contar a Korbie sobre Mason. Se no estivesse

    com tanto frio, teria rido ao me lembrar da cara de cimes de Calvin quando Mason e euo convencemos de que realmente ramos um casal. Eu teria que contar a histria a Korbieantes de chegarmos a Idlewilde, para que ela me ajudasse a manter a farsa na frente doirmo.

    Ns nos conhecemos comecei, mas Mason me interrompeu: Ns no nos conhecemos. Ela estava atrs de mim na fila quando abasteci o carro

    hoje de manh.Aqueles olhos castanhos quentes e sensuais com que eu tinha me deparado mais cedo

    pareciam frios e distantes agora. Seu tom era seco e irritado. Era difcil imaginar queaquele era o mesmo cara com quem eu tinha flertado algumas horas antes. Eu noentendia por que ele estava sendo to pouco caloroso. E por qu, de repente, no estavainteressado em manter nossa farsa. O que havia mudado?

    Nossos olhos se encontraram novamente, e, se ele notou que eu estava confusa, pareceuno se importar.

    O que voc quer? repetiu mais duramente. O que voc acha?Korbie abraou o prprio corpo para se aquecer, danando impacientemente na ponta

    dos ps.

  • Nosso carro est preso gaguejei, desconcertada pela hostilidade dele. Fomossurpreendidas pela nevasca. Estamos congelando. Ser que podemos entrar, por favor?

    Deixe as meninas entrarem disse o amigo de Mason. Olhe para elas estocompletamente encharcadas.

    Sem hesitar, Korbie entrou, e eu fui atrs dela. Quando o amigo de Mason fechou aporta, o calor encontrou minha pele, e estremeci, aliviada.

    Elas no podem ficar aqui esta noite disse Mason imediatamente, bloqueando ocorredor que levava para o interior da cabana.

    Se no ficarmos aqui esta noite, vamos virar cubos de gelo humanos disse Korbie. Voc no quer essa responsabilidade nas suas mos, quer?

    Parece srio observou o amigo de Mason, com um brilho de deleite nos olhos. Definitivamente no queremos ser responsabilizados por cubos de gelo humanos.Principalmente aqueles que ficam muito melhores em sua forma com sangue correndonas veias.

    Em resposta ao flerte, Korbie abriu os braos e fez uma reverncia, abrindo sem pudorum sorriso.

    Onde est o seu carro? perguntou Mason. Onde voc estacionou? Na estrada principal, descendo da cabana falei. Caminhamos uma hora para

    chegar aqui. O carro deve estar soterrado por um monte de neve a essa altura acrescentou

    Korbie. Inacreditvel murmurou Mason, me encarando, irritado. Como se fosse minha

    culpa. Bem, me desculpe por no controlar o tempo. Me desculpe por pedir umapequena ajuda, um pouco de hospitalidade.

    Vocs esto sozinhas? perguntou o amigo de Mason. S vocs duas? Apropsito, meu nome Shaun.

    O meu Korbie respondeu ela com a voz aveludada.Shaun apertou a mo de Korbie, depois tentou fazer o mesmo comigo. Mas eu estava

    com muito frio para tirar a mo do bolso do casaco. S o cumprimentei com um gesto decabea.

    Britt. Sim, s ns duas disse Korbie, respondendo pergunta. Vocs tm que deixar

    a gente ficar aqui. Vai ser divertido, prometo acrescentou, com um sorriso alegre etmido.

    Ignorei as insinuaes de Korbie e observei Mason atentamente. No entendia por queele estava agindo de forma to estranha. Ele tinha se empenhado tanto em me ajudar maiscedo. Olhei para dentro da cabana, para alm dos ombros largos dele, procurando umapista que explicasse sua sbita frieza. Ser que Korbie e eu tnhamos interrompido algumacoisa? Havia algo (ou algum) que ele no queria que vssemos?

    At onde eu podia ver, Mason e Shaun estavam sozinhos ali, o que ficava evidente pelosdois casacos masculinos pendurados no vestbulo.

  • Vai ser divertido, ns quatro enfurnados aqui juntos assegurou Korbie. Podemos ficar bem juntinhos para conservar o calor do corpo acrescentou ela comuma risadinha.

    Transferi minha irritao para Korbie. Que coisa mais idiota de se dizer. Ns nem sequerconhecamos aqueles caras, no de verdade. E ela parecia ter esquecido completamenteque, at poucos minutos antes, estvamos achando que morreramos congeladas nasmontanhas. Eu ainda no tinha me recuperado do susto, e tive vontade de sacudi-la ao v-la jogando charme para cima de Shaun. Eu ficara apavorada na floresta. Apavoradamesmo. Qual era o problema dela, que podia simplesmente ligar um boto e passar dochoro s risadinhas de um segundo para outro?

    Vamos ficar s por esta noite falei para Mason e Shaun. Vamos embora assimque amanhecer.

    Shaun passou o brao pelos ombros de Mason e disse: O que que voc acha, camarada? Devemos ajudar essas pobres garotas? No respondeu Mason, sem pestanejar, afastando o brao de Shaun, com uma

    expresso carrancuda no rosto. Vocs no podem ficar aqui. Tambm no podemos ficar l fora rebati.Achei irnico estar implorando por um lugar para ficar. Porque, quanto mais

    conversvamos, menos eu queria continuar na cabana com Mason. Eu no entendia. Nohavia nenhum sinal do cara tranquilo e divertido no homem diante de mim naquelemomento. Por que ele havia mudado tanto de atitude?

    s vezes voc tem que ignorar o Ace aqui explicou Shaun, com um sorrisoestranho. Ele bom em um monte de coisas, mas simpatia no uma delas.

    Deu pra notar comentou Korbie, baixinho. Vamos l, Ace. Podia ser pior disse Shaun, batendo nas costas de Mason. Por

    exemplo Ele coou o rosto, pensativo. Quer dizer, no consigo pensar em nadamelhor do que esperar a tempestade passar na companhia de duas garotas bonitas. Naverdade, elas aparecerem aqui foi a melhor coisa que poderia ter acontecido com a gente.

    Posso falar com voc a ss? perguntou Mason, com uma voz baixa e firme. Claro, depois de aquecermos um pouco essas garotas. Olhe para elas esto

    congelando. Coitadinhas. Agora. Ah, deixa disso disse Korbie, exaltada. No somos assassinas. Posso at jurar de

    dedinho acrescentou, fazendo graa para Shaun.Shaun sorriu para Mason, socando-o de leve no peito. Ouviu isso, amigo? Ela vai jurar de dedinho.Toda aquela indeciso estava acabando com a minha pacincia. Eu estava to

    entorpecida de frio que me senti tentada a passar direto por Mason em direo ao fogoardendo na lareira que projetava sombras nas paredes da sala de estar, no final do corredor.Eu me imaginei sentada ali, perto o suficiente para sentir o calor e, finalmente, meaquecer.

  • Uma noite no vai matar ningum, no mesmo, Ace? prosseguiu Shaun. Que tipo de homens ns seramos se dssemos as costas para essas meninas?

    Mason no repondeu, mas os msculos de seu rosto estavam visivelmente tensos. Ele nopoderia ter deixado mais claro. No queria a gente na cabana. Shaun, por outro lado,estava mais do que feliz em nos deixar ficar o tempo que fosse necessrio. Ser que os doistinham discutido antes de Korbie e eu chegarmos? Eu sentia a tenso entre eles crepitandocomo um fio desencapado.

    Podemos, por favor, discutir isso em frente lareira? perguntou Korbie. Boa ideia disse Shaun, mostrando o caminho.Korbie o seguiu pelo corredor em direo sala de estar, tirando o cachecol.A ss com Mason, por um segundo vi seu rosto relaxar, derrotado. Aquele olhar

    desapareceu em um instante, e ele fechou a cara de novo. De raiva? Hostilidade? Entoolhou bem nos meus olhos, e pensei que, talvez, ele estivesse tentando me dizer algumacoisa. Havia uma intensidade em seu olhar que parecia ocultar um significado maisprofundo.

    Qual o seu problema? murmurei, tentando contorn-lo e ir para perto dalareira.

    Mason estava bem na minha frente, bloqueando o corredor, e ele precisava sair para eupoder passar. Mas ele no saiu. Me manteve presa junto porta, seu corpodesconfortavelmente perto do meu.

    Obrigada pela recepo calorosa falei. To quente que quase derreti. No uma boa ideia. O que no uma boa ideia? desafiei-o, esperando que me dissesse por que estava

    agindo de forma to estranha. Vocs no deviam estar aqui. Por que no?Esperei pela resposta, mas tudo o que ele fez foi continuar me encarando daquele jeito

    sombrio e furioso. No tivemos escolha falei, tranquilamente. Acho que pedir demais esperar

    que voc me salve duas vezes em um dia. Do que voc est falando? perguntou ele, irritado. Voc me ajudou a no passar vergonha na frente do meu ex, lembra? Mas impedir

    que eu congele at a morte obviamente um fardo pesado demais. O que vocs esto sussurrando a? gritou Shaun da sala de estar. Ele e Korbie

    estavam sentados no sof de couro de dois lugares, as pernas dela cruzadas e na direo deShaun. Quase parecia que o bico da bota dela tocava a perna dele. Korbie claramentetinha cansado de esperar que o Urso aparecesse para resgat-la. Venham para c, estbem mais quente.

    Mason baixou a voz, falando com uma calma urgente: to ruim assim quanto voc disse? Seu carro est mesmo preso? Se eu for com voc

    at a estrada mais tarde, acha que conseguimos tir-lo de l?

  • Nossa, voc quer mesmo me tirar daqui a qualquer custo, hein? provoquei,irritada.

    Eu no merecia ser tratada daquela forma. No depois do que tinha acontecido maiscedo. Eu queria uma explicao. Onde estava o Mason de antes?

    Apenas responda pergunta pediu ele, ainda com a voz baixa e apressada. No. A estrada est com muito gelo e a subida muito ngreme. O carro no vai a

    lugar algum esta noite. Tem certeza? insistiu ele. Voc podia parar de ser to idiotaFinalmente, e no sem resistncia por parte dele, me encaminhei para a sala de estar. Ele

    no saiu do lugar, e nossos braos se roaram enquanto eu me espremia entre ele e aparede para passar.

    Andei at a metade do corredor e olhei para trs. Mason ainda estava de costas paramim, passando a mo pelo cabelo curto. O que o incomodava? O que quer que fosse,estava me deixando inquieta tambm.

    Mesmo que eu e Korbie estivssemos a salvo da tempestade, no me sentiacompletamente segura dentro da cabana. Fora o meu encontro com Mason naquelamanh, eu no o conhecia. Muito menos conhecia Shaun. E, apesar de Korbie e eu j nocorrermos mais o risco de morrermos congeladas, amos passar a noite com dois caras emquem no sabamos se podamos confiar. Era assustador. Por ora, eu no tinha escolha ano ser ficar alerta e esperar que parasse logo de nevar.

    Encontrei Shaun e Korbie na sala de estar. Obrigada novamente por nos deixar ficar falei. Esse tempo uma droga. Um brinde a isso disse Shaun, levantando um copo de plstico com gua. Tem telefone aqui? perguntou Korbie. Nossos celulares esto sem servio. No tem. Mas tem chili e cerveja. E uma cama extra. Para onde vocs planejavam ir

    esta noite? Quer dizer, antes da tempestade perguntou Shaun. Para a cabana da minha famlia respondeu Korbie. Idlewilde.O rosto de Shaun se mostrou indiferente ao nome. O que significava que eu

    provavelmente tinha pegado uma entrada errada e que no estvamos nem perto deIdlewilde.

    a cabana bem grande e bonita, com chamins de pedra acrescentei, na esperanade faz-lo se lembrar. Idlewilde era a nica casa perto do lago e um ponto de referncia.

    A cabana de vocs fica muito longe daqui? interrompeu Mason, a voz chegandoantes dele pelo corredor. Ele parou na entrada da sala de estar. Posso lev-las a p atl.

    Shaun lanou um olhar breve e descontente para Mason, fazendo que no com a cabeade forma firme, mas sutil. Em resposta, a boca de Mason se contraiu. Pelo olhar sombrioque os dois trocaram, senti que o clima ficou pesado.

    Talvez seja melhor verificar as condies da estrada antes de insistir nisso interrompeu Korbie. Pense em uma camada de lama com vrios centmetros de

  • profundidade. E ento imagine oito centmetros de neve se acumulando. Ningum vai alugar algum hoje.

    Voc tem razo disse Shaun, levantando-se do sof. Posso oferecer