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1 GEOPOLÍTICA DE ITAIPU: DA AMEAÇA DE GUERRA ENTRE BRASIL E PARAGUAI (1965-1966) AO PROCESSO DE INTEGRAÇÃO ENERGÉTICA REGIONAL Geopolítica de Itaipu: Da ameaça de Guerra entre Brasil e Paraguai (1965-1966) ao Processo de Cooperação e Integração Energética Regional Prof.a Me. Angela M. Ferreira Silva 1 Prof. Dr. Lucas Kerr de Oliveira 2 Nayane Camara Rosario 3 Soraya Silva Jordan 4 RESUMO Nos últimos séculos os principais conflitos e guerras sul-americanas ocorreram no Cone Sul, especialmente na Bacia Platina, envolvendo disputas diplomáticas e militares pelo controle recursos hídricos e fronteiras (hídricas e terrestres) desta importante bacia hidrográfica. Ao longo dos últimos séculos diversos conflitos marcaram as disputas pela delimitação das fronteiras e pelo controle de áreas estratégicas da Bacia Platina, geralmente evoluindo para confrontos armados, como a Guerra Cisplatina, a Guerra do Prata, a Guerra do Paraguai e a Guerra do Chaco. Contudo, a resolução dos últimos conflitos geopolíticos, envolvendo principalmente Brasil e Paraguai (1964-1966), mas também a Argentina (1973-1979), resultaram em uma inflexão em relação à tendência histórica de confronto. A resolução da disputa passou pela criação de um novo processo de cooperação em torno dos Tratados de Itaipu (1973), em seguida, o Tratado Tripartite Itaipu-Corpus (1979) e a construção das usinas binacionais de Itaipu e Yacyretá, reduziam significativamente as disputas entre Brasil e Argentina na “questão” Itaipu-Corpus e estabelecia um novo período de cooperação bilateral que, consolidado pelo apoio brasileiro às reivindicações argentinas nas Malvinas, daria grande impulso à integração regional, com a posterior criação do Mercosul. Subsequentemente, a construção da Usina de Itaipu resultou em um significativo impacto socioeconômico na região da Tríplice Fronteira, ampliando e aprofundando a complexidade das relações entre estes países, especialmente Brasil-Paraguai. Desse modo, pode-se dizer que a Usina de Itaipu, em seu formato Binacional, ajudou a resolver uma das últimas disputas territoriais da região, viabilizando um novo ciclo de cooperação em torno do aproveitamento dos recursos hídricos da Bacia Platina. Nesse contexto, a Integração Energética e da Infraestrutura (binacional e 1 Angela Maria Ferreira Silva, é Mestra em Estudos Interdisciplinares Latino-Americanos (PPG-IELA) pela UNILA, Bacharel em Turismo. Foi docente no Curso de Turismo da UDC e atualmente é Pesquisadora Colaboradora do Núcleo de Estudos Estratégicos, Geopolítica e Integração Regional (NEEGI), da UNILA. E-mail: <[email protected]> 2 Lucas Kerr Oliveira, é Doutor em Ciëncia Política, Mestre em Relações Internacionais pela UFRGS e docente de ensino superior no Bacharelado em Relações Internacionais e Integração e, também, no Programa de Pós-Graduação em Integração Contemporânea na América Latina, PPG-ICAL da UNILA. Atualmente é Coordenador do Núcleo de Estudos Estratégicos, Geopolítica e Integração Regional (NEEGI), da UNILA. E-mail: <[email protected]> 3 Nayane Camara Rosário, é Bacharel em Administração pelo Centro Universitário Dinâmica das Cataratas (UDC), Pós- Graduanda em Relações Internacionais Contemporâneas pela UNILA. É Pesquisadora Colaboradora do Núcleo de Estudos Estratégicos, Geopolítica e Integração Regional (NEEGI), da UNILA. E-mail: < [email protected] > 4 Soraya Silva Jordan, é Graduanda em Relações Internacionais e Integração pela UNILA e pesquisadora colaboradora junto ao Núcleo de Estudos Estratégicos, Geopolítica e Integração Regional (NEEGI), da UNILA.. E-mail: [email protected]

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GEOPOLÍTICA DE ITAIPU: DA AMEAÇA DE GUERRA ENTRE BRASIL E

PARAGUAI (1965-1966) AO PROCESSO DE INTEGRAÇÃO ENERGÉTICA

REGIONAL

Geopolítica de Itaipu: Da ameaça de Guerra entre Brasil e Paraguai (1965-1966) ao

Processo de Cooperação e Integração Energética Regional

Prof.a Me. Angela M. Ferreira Silva 1

Prof. Dr. Lucas Kerr de Oliveira 2

Nayane Camara Rosario 3

Soraya Silva Jordan 4

RESUMO

Nos últimos séculos os principais conflitos e guerras sul-americanas ocorreram no Cone Sul,

especialmente na Bacia Platina, envolvendo disputas diplomáticas e militares pelo controle

recursos hídricos e fronteiras (hídricas e terrestres) desta importante bacia hidrográfica. Ao

longo dos últimos séculos diversos conflitos marcaram as disputas pela delimitação das

fronteiras e pelo controle de áreas estratégicas da Bacia Platina, geralmente evoluindo para

confrontos armados, como a Guerra Cisplatina, a Guerra do Prata, a Guerra do Paraguai e a

Guerra do Chaco. Contudo, a resolução dos últimos conflitos geopolíticos, envolvendo

principalmente Brasil e Paraguai (1964-1966), mas também a Argentina (1973-1979),

resultaram em uma inflexão em relação à tendência histórica de confronto. A resolução da

disputa passou pela criação de um novo processo de cooperação em torno dos Tratados de

Itaipu (1973), em seguida, o Tratado Tripartite Itaipu-Corpus (1979) e a construção das usinas

binacionais de Itaipu e Yacyretá, reduziam significativamente as disputas entre Brasil e

Argentina na “questão” Itaipu-Corpus e estabelecia um novo período de cooperação bilateral

que, consolidado pelo apoio brasileiro às reivindicações argentinas nas Malvinas, daria grande

impulso à integração regional, com a posterior criação do Mercosul. Subsequentemente, a

construção da Usina de Itaipu resultou em um significativo impacto socioeconômico na região

da Tríplice Fronteira, ampliando e aprofundando a complexidade das relações entre estes

países, especialmente Brasil-Paraguai. Desse modo, pode-se dizer que a Usina de Itaipu, em

seu formato Binacional, ajudou a resolver uma das últimas disputas territoriais da região,

viabilizando um novo ciclo de cooperação em torno do aproveitamento dos recursos hídricos

da Bacia Platina. Nesse contexto, a Integração Energética e da Infraestrutura (binacional e

1 Angela Maria Ferreira Silva, é Mestra em Estudos Interdisciplinares Latino-Americanos (PPG-IELA) pela UNILA, Bacharel em

Turismo. Foi docente no Curso de Turismo da UDC e atualmente é Pesquisadora Colaboradora do Núcleo de Estudos Estratégicos, Geopolítica e Integração Regional (NEEGI), da UNILA. E-mail: <[email protected]> 2 Lucas Kerr Oliveira, é Doutor em Ciëncia Política, Mestre em Relações Internacionais pela UFRGS e docente de ensino

superior no Bacharelado em Relações Internacionais e Integração e, também, no Programa de Pós-Graduação em Integração Contemporânea na América Latina, PPG-ICAL da UNILA. Atualmente é Coordenador do Núcleo de Estudos Estratégicos, Geopolítica e Integração Regional (NEEGI), da UNILA. E-mail: <[email protected]> 3 Nayane Camara Rosário, é Bacharel em Administração pelo Centro Universitário Dinâmica das Cataratas (UDC), Pós-

Graduanda em Relações Internacionais Contemporâneas pela UNILA. É Pesquisadora Colaboradora do Núcleo de Estudos Estratégicos, Geopolítica e Integração Regional (NEEGI), da UNILA. E-mail: < [email protected] > 4 Soraya Silva Jordan, é Graduanda em Relações Internacionais e Integração pela UNILA e pesquisadora colaboradora junto

ao Núcleo de Estudos Estratégicos, Geopolítica e Integração Regional (NEEGI), da UNILA.. E-mail: [email protected]

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regional) tem se mostrado uma variável determinante para reduzir os conflitos e favorecer a

estabilidade dos processos de cooperação de longo prazo, assim como a consolidação da

integração regional.

Palavras-Chave: Geopolítica, Itaipu Binacional, Integração Energética Regional.

1. Conflitos pelo controle dos recursos hídricos da Bacia do Paraná: breve

descrição sob uma perspectiva de longa duração

Historicamente, as grandes disputas sul-americanas deram-se em torno da Bacia Platina

e da Bacia Amazônica. Enquanto a Bacia Amazônica acabou sendo controlada,

predominantemente, pelos portugueses, a Bacia Platina, foco das tensões e disputas mais

intensas, até o século XIX, pode ser considerada o centro das disputas do Cone Sul do

continente. No século XX, a situação das disputas de fronteira, no Cone Sul, se mantém

relativamente estável, apesar de algumas oscilações e períodos de maiores tensões na região.

As disputas fronteiriças acabaram sendo gradativamente substituídas pelas disputas

geopolíticas, especialmente disputas por influência entre Brasil e Argentina na Bacia Platina.

Comparativamente, ao menos até o século XIX, não haviam grandes tensões ou disputas

geoestratégicas tão intensas na Amazônia.

A partir dos anos 1960, essa situação começa a se inverter, na medida em que boa parte

das atenções que o Brasil brinda às suas fronteiras voltam-se para a questão da Amazônia e das

fronteiras amazônicas. Em grande medida, isso ocorre devido à intensificação dos discursos

de líderes das grandes potências em defesa da internacionalização da Amazônia. Por outro lado,

essa mudança foi resultado, também, do fim das últimas grandes disputas pelo controle dos rios

e das bacias hidrográficas que compõem a grande Bacia Platina. As disputas com o Paraguai

foram solucionadas nos anos 1960, com a assinatura da Ata das Cataratas (1966), que deu fim

ao litígio territorial entre os dois países prevendo que a área contestada seria inundada sob a

represa de Itaipu. As tensões com a Argentina, em torno da questão do uso dos recursos hídricos

da Bacia do Paraná, acabaram solucionadas através do Tratado Tripartite Itaipu-Corpus,

assinado em 1979. Esses processos acabaram por solucionar algumas das tensões regionais, ao

resolver alguns dos nossos últimos conflitos com esses países vizinhos, os quais ainda eram

ligados às questões fronteiriças, especificamente a questão do uso dos recursos hídricos

transfronteiriços.

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Nos anos 1970, tais tensões se dissiparam, especialmente devido à série de acordos

bilaterais e trilaterais firmados nos anos 1960 e 1970 entre Brasil, Paraguai e Argentina. Estes

acordos viabilizaram, por exemplo, a construção de Itaipu, que resolveu as últimas disputas

territoriais ou sobre a questão do uso dos recursos hídricos transfronteiriços que o Brasil ainda

tinha com o Paraguai e com a Argentina. O fim dessas tensões foi determinante para viabilizar

a re-aproximação entre esses países, que hoje são parceiros estratégicos do Brasil no Mercosul.

Com o fim destas disputas, ocorre uma lenta e gradativa melhoria nas relações do Brasil com

a Argentina, que se aprofunda ao longo dos anos 1980.

O processo de distensionamento das relações Brasil e Argentina se acelera ainda mais

a partir da Guerra das Malvinas (1982), apenas três anos após a assinatura do Tratado Tripartite.

A partir deste período assistimos, na prática, uma aliança entre o Brasil e a Argentina, que

permanece até hoje. Esta aliança política e estratégica viabilizou as negociações de acordos

econômicos nos anos 1980 e posteriormente sustentou a criação do MERCOSUL. É

interessante notar como esses dois países que talvez fossem os maiores rivais dentro da

América do Sul, no âmbito geopolítico, ao acordarem sobre o compartilhamento de recursos

naturais estratégicos antes disputados (água), passaram a cooperar e se tornaram aliados.

Obviamente, o apoio do Brasil à Argentina na Guerra das Malvinas teve um peso significativo,

mesmo que tenha sido um apoio bastante discreto. A cooperação no âmbito estratégico, com

acordos de cooperação na área nuclear e aeroespacial, apenas consolidaram essa aliança nos

anos 1980, que culmina, como já dito, na formação de um bloco regional incluindo os dois

vizinhos.

2. O Conflito Brasil - Paraguai em torno da questão da construção da Usina

de Itaipu nos anos 1960

A riqueza hídrica da Bacia Platina viabilizou a construção de inúmeras usinas

hidroelétricas na região ao longo do século XX. Estas hidrelétricas começaram a ser

construídas principalmente a partir dos anos 1940-1950, principalmente a partir do segundo

governo de Getúlio Vargas (1951-1954) e do governo Juscelino Kubitschek (1956-1961), que

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construíram importantes hidrelétricas como as de Furnas, Bariri, Mascarenhas de Moraes e

Engenheiro Souza Dias (na Bacia do Paraná), assim como Paulo Afonso e Três Marias, (Bacia

do São Francisco), além de viabilizarem a criação da CHESF, CEMIG e da ELETROBRÁS,

que foi efetivamente criada apenas em 1961, (BRASIL, 1961), após duas décadas de disputas

entre grupos de interesses “nacionalistas” e “entreguistas” (VIZENTINI, 1999 e 2002; KERR

OLIVEIRA, 2012).

Estes governos também deram início a uma série de estudos de aproveitamento

hidrográfico que viabilizaram dezenas de outras hidrelétricas que foram construídas nos

governos posteriores, dos anos 1960 ao período do governo militar. De forma resumida, a

construção de dezenas de hidroelétricas no país neste período dos anos 1940-1980 pode ser

considerada parte de uma política de Estado voltada para alcançar maior segurança energética

de longo prazo, com vistas a sustentar o crescimento econômico e o desenvolvimento urbano

e industrial do país com caráter desenvolvimentista (KERR OLIVEIRA, 2012), principalmente

considerando que o país tinha taxas médias de crescimento econômico que variavam de 7% a

10% ao ano nos anos 1955-1975, que representou um aumento da demanda por eletricidade de

mais de 500% no período.

Neste sentido, foi no contexto dos anos 1950 que teve início uma série de estudos sobre

o aproveitamento hidroelétrico no Paraná na região nas proximidades das Sete Quedas, que

resultaria anos depois na construção de Itaipu. A história da construção da usina é bastante

interessante e será brevemente descrita a seguir, visto que envolveu uma forte crise política

entre Brasil e Paraguai nos anos 1960 e mobilizou importantes esforços diplomáticos

brasileiros, paraguaios e envolveu inclusive a Argentina. Especificamente, entre 1960 e 1964,

desde o fim do Governo JK, e durante os governos Jânio Quadros e João Goulart, foram

realizados uma série de estudos para o aproveitamento deste potencial hidroelétrico (SOUZA,

2011; ITAIPU, 2008).

Uma das vertentes defendidas inicialmente pelo setor privado estrangeiro, que

controlava grande parte das companhias de geração e distribuição de eletricidade no país era a

construção de uma série de hidrelétricas na região ao norte das Sete Quedas, que foi defendida

abertamente pelo engenheiro brasileiro Marcondes Ferraz, posteriormente presidente da

Eletrobrás (SOUZA, 2011; ITAIPU, 2008). A sequência de pequenas hidrelétricas teria a

mesma potência total instalada que uma grande usina, mas não teriam a mesma capacidade de

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armazenamento de água para os períodos de estiagem, gerando, portanto, menor quantidade de

energia por ano. Uma segunda opção, estudada durante o governo Jânio Quadras foi a de uma

única grande usina, totalmente nacional ao norte de Guaíra, ambos os projetos sofreram críticas

do governo Paraguai, pois excluíram a participação do país em qualquer das alternativas.

Durante o governo do Presidente João Goulart, começou a ser estudada a opção de uma

usina de grande porte com apoio dos soviéticos (SOUZA, 2011; ITAIPU, 2008, IPG, 2014). A

equipe de engenheiros soviéticos que veio ao Brasil analisar a região e desenvolver o projeto

em 1963, liderada pelo engenheiro Ivan Komin, era a mesma que havia projetado a Usina de

Assuã, no Egito, para o governo do então Presidente Nasser. O projeto teria turbinas soviéticas

capazes de gerar entre 10 e 12 GW, assim como financiamento da URSS a juros baixíssimos e

facilidades para pagar os empréstimos em produtos nacionais, como café, açúcar e alimentos

industrializados (SOUZA, 2011; ITAIPU, 2008, IPG, 2014). O acordo negociado com o

governo soviético incluía, ainda, obras para a construção de uma interconexão hidroviária

interligando a Bacia Amazônica e a Bacia Platina, além do fornecimento, pela URSS de

produtos como petróleo e combustíveis. Contudo, esta aproximação como parte da Política

Externa Independente, iniciada no governo Jânio Quadros e aprofundada por Jango, acabou

interrompida com o Golpe Militar de 1º de abril de 1964.

A partir deste período, voltou a ser analisada pelo governo militar brasileiro a opção da

“Usina de Ilha Grande”, barragem totalmente nacional que seria construída ao norte de Guaíra,

na porção montante das Sete Quedas. O projeto foi debatido publicamente entre 1964 e 1965

pelo governo militar brasileiro, o que levou a uma forte crise com o Paraguai, que ficaria

completamente excluído do projeto. Além disso, a usina mais ao norte inviabilizava a

construção de outra na região das Sete Quedas, local onde sua construção seria necessariamente

binacional (BETIOL, 2008, SOUZA, 2011).

Este processo levou à crise diplomática de 1965-1966, quando o governo paraguaio do

Presidente Stroessner, voltou a reivindicar a área objeto de litígio, localizada entre as Sete

Quedas e a parte norte da Serra de Maracajú (BETIOL, 2008; CORTÊS, 2009; PAULA, 2014).

Após a instalação de presença militar brasileira na área, os trabalhos da Comissão Mista de

Demarcação da Fronteira foram interrompidos, o Paraguai protestou classificando o ato como

uma invasão de seu território e reagindo, inicialmente, com um protesto diplomático

(PARAGUAI, 1965), seguido de tensionamentos que ameaçavam escalar para uma

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confrontação militar. Para evitar um conflito armado entre os dois regimes militares, os corpos

diplomáticos dos dois países empreenderam intensos esforços para viabilizar um acordo

diplomático (BETIOL, 2008; CORTÊS, 2009).

Devido às pressões paraguaias, o governo brasileiro recuou e mudou sua estratégia,

passa a considerar novamente a opção de uma hidrelétrica binacional (BETIOL, 2008;

CORTÊS, 2009; OXÍLIA, 2009; SOUZA, 2011; PAULA, 2014). O acordo, formalizado na

Ata das Cataratas em 1966, que previa que qualquer empreendimento hidrelétrico seria

binacional e não poderia resultar na alteração da fronteira, tendo sido detalhado nos anos

seguintes, através da formação de uma Comissão Mista Técnica Brasileiro-Paraguaia, formada

por engenheiros e diplomatas dos dois países, que finalizou o relatório para a construção da

usina em 1972. Esses esforços viabilizaram o Tratado de Itaipu, assinado em 26 de abril de

1973 (BETIOL, 2008, p. 37-41; OXÍLIA, 2009), que estabelece em seu Artigo VII:

As instalações destinadas à produção de energia elétrica e as obras auxiliares

não produzirão variação alguma nos limites entre os dois países, estabelecidos

nos Tratados vigentes. (BRASIL & PARAGUAI, 1973).

Com a posterior a assinatura do Tratado Tripartite Argentina-Brasil-Paraguai em 1979

ficou acordado que a Usina de Itaipu teria seu tamanho máximo limitado a fim de não

inviabilizar a Usina de Corpus Christi, ao sul, na Argentina. Assim, a solução encontrada

acabou resultando em um lago menor do que o previsto inicialmente, não inundando toda a

área disputada entre os dois países como imaginava-se nos acordos de 1966 e 1973, e o restante

da área disputada acabou sendo transformada no Refúgio Biológico de Maracaju, administrado

pela Itaipu Binacional.

3. Transformações das relações Brasil - Paraguai nos anos 1970: do conflito

à cooperação

Claramente, é durante a década de 1960 que a dissidência e a instabilidade entre o

Brasil e Paraguai nos limites da região das Sete Quedas começou a desencadear abruptamente,

pois, com o crescente interesse sobre a hidroeletricidade e a visão do uso e aproveitamento

energético dos Saltos, este se tornaria um objeto de interesse para ambos os estados, o que

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deixou um ponto de virada entre os ministérios das Relações Exteriores de ambas as nações.

Foi assim que, em 1961, as divergências fronteiras começaram a se intensificar, com o

surgimento de uma proposta possível projeto para o uso de energia dos Saltos del Guairá,

preparado pelo engenheiro militar Pedro Henrique Rup, porém, não foi até 1962 que o

Engenheiro Octavio Marcondes Ferras, encomendado pelo Ministério de Minas e Energia,

durante o governo de João Goalart (1961-1964), retomaria a proposta de Rup, para construir

uma usina hidrelétrica totalmente brasileira. (MAZZAROLLO, 2003, p.23).

Do outro lado da fronteira, o Paraguai não se conformaria com essa situação, bem,

não faltavam apenas tratados internacionais, mas isso limitaria suas possibilidades de

aproveitar o potencial do rio em termos de produção de energia, consequentemente. No entanto

foi até 1965, quando finalmente as divergências entre Paraguai e Brasil chegaram a um nível

crítico, com a ocupação de um destacamento militar brasileiro (1965) em Puerto Renato,

território reivindicado pela República do Paraguai, localizado em o trecho de 20 quilômetros

da linha de fronteira entre o marco 341 / IV e os Saltos do Guairá, isto mais as notícias sobre a

proposta de construir um hidrelétrica localizada 5 quilômetros acima dos Saltos das Sete

Quedas, só acrescentaram as tenções entre ambos Estados. (MAZZAROLLO, 2003, p.23,24).

Tanto foi o impacto que, o próprio departamento do estado dos Estados Unidos se viu

envolvido, propondo soluções pacificas para os desacordos fronteiriços sobre a região dos

saltos, sendo assim, foi proposto um encontro entre os representantes de ambas nações.

(MAZZAROLLO, 2003, p.23). Finalmente, os conflitos foram resolvidos com a Lei de Foz de

Iguazú, assinada em 22 de junho de 1966, um documento assinado pelos Ministros das

Relações Exteriores do Paraguai e do Brasil, respectivamente, os referidos documentos

comprometeriam aos Estados que examinaram as possibilidades de uso dos recursos Hidráulica

pertencente às Salto das Sete Quedas:

As disposições da Ata Final assinadas em Foz de Iguaçu, em 22 de junho de

1966, nas quais diz respeito à divisão em partes iguais. entre os dois países,

de energia elétrica eventualmente produzido pelas encostas do rio Paraná no trecho mencionado; O disposto no artigo VI do Tratado da Bacia de Prata; As disposições da Declaração de Assunção sobre o uso de rios internacionais,

3 de junho de 1971; Os estudos da Comissão Mista. Técnica paraguaio-brasileira constituída em

12 de fevereiro de 1967;

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A identidade tradicional das posições dos dois países em relação à livre navegação dos rios internacionais da Bacia do Prata. (OPINIONES

JURIDICAS DE LA ITAIPU, 2004, p.22).

Foi o reconhecimento do uso conjunto dos recursos hídricos do rio Paraná, que marcou

o fim dos problemas de fronteira. E foi o resultado de uma decisão certa que culminou no que

seria um início para importantes cooperações na região. Dessa maneira e com objetivo claro,

em 27 de fevereiro de 1967, a Ministros das Relações Exteriores de: Argentina (Nicanor Costa

Méndez), Brasil (Juracy Magalhães), Bolívia (Alberto Crespo Gutiérrez), Paraguai (Raúl

Sapena Pastor) e Uruguai (Luís Vidal Zaglio), reuniram-se em Buenos Aires, onde assinaram

uma declaração conjunta, e os governos declararam sua decisão de realizar uma análise

integrada levando em conta o que seria mais favorável ao progresso da região (VILLELA. A,

1984).

Anos depois, em 1973, um tratado foi apresentado aos dois governos militares, sobre o

uso hidrelétrico dos recursos do rio Paraná; dando origem à Criação da Hidrelétrica Binacional

Itaipu, sendo ambos os Estados representantes condições iguais, então:

A ITAIPU Binacional é uma pessoa jurídica de direito público internacional,

nascida pela vontade soberana de dois estados, aqueles que cumprem as

disposições de seus respectivos direitos internos, criada com o objeto de realizar o aproveitamento hidroelétrico dos recursos do rio Paraná,

pertencentes aos dois países, incluindo o Salto del Guaira ou Salto Grande

Sete Quedas, até a boca do rio Yguazu (OPINIONES JURIDICAS SOBRE LA ITAIPU, 2004, p. 51).

Foram justamente o andamento das obras de Itaipu e o mesmo estabelecimento da taxa

de descargas de suas turbinas provocou que, em 1975, o governo argentino começaria com

novas objeções em relação a Itaipu, pois, consideravam que isso afetaria a capacidade do

Corpus Christi, que seria construído na barragem de Yasyreta. Devido a isto e para evitar

maiores divergências, foi proposto a realização de projetos compatíveis com o setor hidrelétrico

do Paraná; considerando isso, foram realizadas várias negociações e presentadas as diferentes

propostas, as quais culminaram em 1979. (SCAVONE, R. BREZZO, L. 2013, p.169).

Ao final e de fato, a firma do “Acordo sobre Cooperação Técnico-Operativa entre os

Aproveitamentos de Itaipu e Corpus”, assinado pelos chanceleres Ramiro Saraiva Guerreiro,

Carlos Washington Pastor (Argentina) e Alberto Nogues (Paraguai), em outubro de 1979, na

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cidade Presidente Stroessner, foi fundamenta para o novo rumo nas relações dos Estados da

tríplice fronteira; em outras palavras, as variações permitidas no acordo Corpus e Itaipu, deu

uma oportunidade na cooperação nos estados partes do próprio cenário hidripolítico da bacia

do Prata. (ALBERGARIA DE QUEIROZ, 2012, p.601.)

3.1. A construção da Usina

A Hidrelétrica de Itaipu foi construída no trecho do rio Paraná onde estavam localizadas

as Sete Quedas, mais precisamente, a 14 mm à montante da Ponte da Amizade, ponte que liga

as cidades de Foz do Iguaçu, no Brasil e Ciudad del Leste, no Paraguai. O projeto tinha por

objetivo gerar energia elétrica de fonte renovável, através do aproveitamento da energia

potencial do desnível do rio Paraná, apresentando grande potencial hidroenergético e baixo

custo do megawatt.

De acordo com Espósito Neto (2012):

“Nas primeiras décadas do século XX a eletricidade tornou-se uma mercadoria valiosa, devido ao grande incremento no consumo de energia

elétrica, em razão dos processos de urbanização e de industrialização

vivenciados pelo país nesse momento. A produção e a distribuição continuavam nas mãos das empresas privadas, principalmente as

multinacionais” (ESPÓSITO NETO, 2012 p. 24).

4

A construção da Usina teve início em 1974, logo após da criação da empresa Itaipu

Binacional, para construir e gerenciar a usina. O lago da Usina Itaipu começou a ser formado

em 13 de outubro de 1982, tendo sido inundado bem mais rapidamente do que o previsto, em

apenas duas semanas, devido às fortes chuvas daquele período. Em 1984, foi inaugurada a

primeira turbina, e teve início a geração de energia elétrica.

Em 1950 o Brasil buscava crescimento na exploração recursos naturais, uma vez que a

produção de energia elétrica era insuficiente. A realização da obra de Itaipu anseia pelo

crescimento econômico tanto dos países que constroem, tanto para os que vivem à margem da

bacia do Prata.

Segundo Alvino Silva (2014):

“A diplomacia brasileira teve que convencer os vizinhos argentinos que a obra

tecnicamente não afetaria o Rio Paraná, pois a construção da usina e a sociedade entre

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Brasil e Paraguai certamente influenciará a balança de poder no sul da América do

Sul” (ALVINO SILVA, 2014, p. 69).

Em grande medida, Itaipu marca o ciclo do capitalismo brasileiro e mundial, pois esse

projeto político e estratégico abre espaços para manter a expansão capitalista em um novo

estágio de acumulaçao de capital. Para Laércio Betiol (2008), a construção de Itaipu significou

crescimento econômico para os ambos países, primeiramente pela importância da obra e

segundo pela energia que será produzida ao longo dos anos (LAÉRCIO BETIOL p. 67, 2008).

Neste sentido o acordo binacional representa o aumento na matriz energética entre Brasil e o

Paraguai.

De acordo com Oxilia Dávalos (2009):

“O empreendimento binacional de Itaipu teve impactos profundos no setor

elétrico brasileiro, pela sua envergadura e as condições estabelecidas nos instrumentos diplomáticos que estabelecem as diretrizes de funcionamento da

entidade binacional” (OXILIA DÁVALOS, p. 110, 2009).

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Ilustração 1. Ilustração da obra de construção da barragem de Itaipu

Foto ilustrativa das obras da Barragem de Itaipu Binacional. Fonte: Itaipu (2015).

Esta imagem ilustra o início da construção da barragem, o Brasil desenvolveu uma

própria tecnologia para construção de grandes barragens, totalizando quase um quarto de todo

o consumo nacional. O abastecimento energético no Paraguai é suficiente para todo o país. O

local escolhido para a construção de Itaipu significa em tupi guarani “a pedra que canta. ” A

usina conta com 20 unidades geradoras de 700 MW cada, totalizando uma potência de 14 mil

megawatts, abastecendo 90 % do consumo de energia elétrica para o lado paraguaio e 15 %

para o lado brasileiro. Desta forma, cada país é dono de metade da geração e o Paraguai vende

a energia excedente para o Brasil (ITAIPU, 2019, sp).

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Ilustração 3. Itaipu Binacional com o vertedouro fechado

Foto ilustrativa da Itaipu Binacional vista do mirante do lado brasileiro. Autora: Ângela Maria Ferreira da Silva

O aproveitamento hidrelétrico teve uma cooperação entre os dois países utilizando-se

procedimentos geopolíticos que mudaram a estrutura da Tríplice Fronteira tanto

socioeconômico, social e ambiental.

3.2. Impactos socioeconômico na região da Tríplice Fronteira

A movimentação em torno da construção de Itaipu sofreu impactos na infraestrutura da

Tríplice Fronteira tanto para receber o contingente populacional previsto no grandioso

empreendimento e transformações no espaço geográfico ocorrido nas décadas de 1970 e 1980.

O crescimento socioeconômico foi necessário novas construções civis, comércios e serviços

públicos.

Na década de 1950, Foz do Iguaçu tinha 17 mil habitantes, e conclui a década de 1990

aproximadamente 260 mil (ALVINO SILVA, 2014). A oferta de trabalho e de mão-de-obra

qualificada ou sem qualificação atraiu várias pessoas que buscavam trabalho. Foram

construídas 9 mil moradias, no lado brasileiro foram distribuídas Vila A, Vila B e Vila C. E

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no lado paraguaio foram construídas vilas equivalentes ao lado brasileiro. Para atender as

famílias dos funcionários que trabalhavam na Itaipu foi construído o Colégio Anglo-

Americano, que chegou a reunir cerca de 16 mil alunos. Depois do término da construção de

Itaipu o ritmo de urbanização foi decrescendo progressivamente (ALVINO SILVA, 2014, p.

70).

Sendo assim, a região da Tríplice Fronteira faz parte de uma estratégia de integração,

onde ambos os países são beneficiados pela infraestrutura e a demanda de turistas que buscam

o livre comércio, lazer, hotéis e restaurantes.

Segundo Heloiza Conte (2013)

Diante do exposto, verifica-se que devido à construção da Usina Hidrelétrica

de Itaipu, um conjunto de alterações socioespaciais atingiu o município de

Foz do Iguaçu e sua rede urbana. Tais alterações contribuíram para a expansão

das atividades econômicas na área, permitindo que a partir destes

acontecimentos, advindos do início das obras de Itaipu, a cidade de Foz do

Iguaçu passasse a receber importância tanto em âmbito nacional quanto

internacional. (HELOIZA CONTE, p.188, 2013).

No Município de Foz do Iguaçu, encontra-se pontos turísticos como Cataratas do Iguaçu

considerada a 7 Maravilha do Mundo Mundial da Natureza, são localizadas entre o Parque

Nacional do Iguaçu e o Parque Nacional do Iguazú, Puerto Iguazú, Misiones, Argentina,

compras em Ciudad del Este (Paraguai), Parque das Aves, Marco das Três Fronteiras, Templo

Budista, Ecomuseu, Usina de Itaipu Binacional e outros pontos turísticos que aumentam a

geração de empregos diretos ou indiretos, que fomentam a economia da Tríplice Fronteira.

(MONSARES OLIVEIRA; BRAGA CORNELIO, 2018)

Para que os três países fossem interligados construiu-se a Ponte da Amizade que liga

Brasil e Paraguai, inaugurada em 27 de março de 1965 pelo presidente brasileiro Castelo

Branco e pelo presidente paraguaio Alfredo Stroessner. Em 1985, foi inaugurada a Ponte

Tancredo Neves que liga Brasil e Argentina, pelo presidente brasileiro José Sarney e argentino

Raul Alfonsin. Desta forma, a Tríplice Fronteira adaptou caminhos, estradas e rodovias

internacionais para que a circulação de bens e pessoas fossem realizadas. (ALVINO SILVA,

2014).

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Em 1969 foi concluída da BR-277, possui 730 Km de extensão, com início em início

ao Porto de Paranaguá e o término na Ponte da Amizade em Foz do Iguaçu. Foi inaugurada

pelo presidente brasileiro Costa e Silva e o presidente paraguaio Alfredo Strossner. Devido a

demanda de visitantes em relação aos locais turísticos, no final da década de 1990, inaugurou-

se três aeroportos, ao todo Aeroporto Guarani, no Paraguai; Iguazú, em Puerto Iguazú e

Aeroporto das Cataratas, em Foz do Iguaçu.

Com a criação da Universidade Federal da Integração Latino-Americana (Unila), é o

exemplo de integração regional para o desenvolvimento econômico, cultural e demográfico da

Tríplice Fronteira e da América Latina. A Unila está situada na cidade de Foz do Iguaçu, e em

2007 começou a estruturada pela Comissão de Implantação com a proposta de criação do

Instituto Mercosul de Estudos Avançados (IMEA), em convênio com a Universidade Federal

do Paraná (UFPR) e a Itaipu Binacional. Os dados expostos pelo site da Unila, no total são

5.231 discentes e 586 discentes na pos-graduacao e conta com 362 docentes (UNILA, 2019,

sp).

3.3. Impactos sociais e ambientais

Apesar dos impactos sociais e ambientais, a construção Itaipu seria favorável tanto para

o Brasil quando para o Paraguai. No caso do Brasil, as altas demandas de energia elétrica

precisavam ser solucionadas para evitar riscos futuros. No caso do Paraguai, passou a contar

com energia suficiente sem precisar de outro investido no setor elétrico.

Desde 1985, a Itaipu Binacional paga royalties pelo aproveitamento dos recursos

hídricos do Rio Paraná, previstos no Tratado de Itaipu Binacional (Anexo C), uma

compensação financeira pelo alagamento de uma área relativa a 6.874,47 Km2. Segundo os

dados expostos na web da empresa até 2018 pagaram cerca de US$ 11 bilhões em royalties ao

Brasil e ao Paraguai (ITAIPU, 2019, sp).

Segundos os dados divulgados pela Usina de Itaipu, a distribuição dos royalties é feita

de acordo com a legislação de cada país. No Brasil e proporcional à área alagada dos

municípios, e esses valores repassados uma vez por mês pela Agência Nacional de Energia

Elétrica (Aneel). Em 2018, entrou em vigor a Lei 13.661/2018 a distribuição é feita da seguinte

forma: 65% aos Municípios, 25% aos Estados e 10% para órgãos federais. (Ministério do Meio

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Ambiente, Ministério de Minas e Energia e Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e

Tecnológico).

Os valores pagos pelos royalties, movimenta a economia dos municípios, no total são

16 municípios do lado brasileiro: Foz do Iguaçu, Santa Terezinha de Itaipu, São Miguel do

Iguaçu, Itaipulândia, Medianeira, Missal, Santa Helena, Diamante do Oeste, São José das

Palmeiras, Marechal Cândido Rondon, Mercedes, Pato Bragado, Entre Rios do Oeste.

Em 2003, o ex-diretor brasileiro Jorge Miguel Samek, inaugurou o programa

Cultivando Água Boa que visa amenizar os impactos ambientais causados pela obra e recuperar

a qualidade dos recursos híbridos. Esse programa atende, 29 municípios da Bacia Hidrográfica

do Paraná, localizada à margem esquerda do Rio Paraná, no Oeste do Estado do Paraná. Possui

cerca de 20 subprogramas, 70 projetos e 108 ações de responsabilidade socioambiental,

visando a conservação dos recursos naturais e biodiversidade (OSTROVSKI, 2016).

Neste sentido, Ostrovski (2016) afirma que:

“As ações do programa Cultivando Água Boa visam garantir a qualidade da

água do reservatório do Lago de Itaipu, evitar seu assoreamento e

contaminação por dejetos, viabilização e desenvolvimento de práticas de

responsabilidade socioambiental por meio de parcerias junto às instituições

governamentais e não governamentais, instituições de ensino e pesquisa,

movimentos sociais, agentes ambientais, indígenas e assentados, associações

de agricultores, pescadores, suinocultores, dentre outras” (OSTROVSKI, p.

20-21, 2016).

3.4. Desenvolvimento do Turismo Local

O turismo é uma das atividades complementares da Itaipu mais importantes, pois além

de viabilizar que a Usina seja uma grande atração turística, a empresa atua na promoção da

atividade turística como forma de estimular o desenvolvimento do turismo da região tri-

nacional entre Brasil, Paraguai e Argentina.

Considerando desde a fase inicial da construção da Usina, até 2017, Itaipu Binacional

já recebeu mais de 21,78 milhões de visitantes, sendo 15,7 milhões do lado paraguaio, mais de

6 milhões de visitantes. Conforme os dados disponíveis na página de Itaipu na internet,

utilizados para a elaboração do gráfico 5, a seguir, nota-se ao menos três fases na exploração

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turística da Usina de Itaipu, que em uma primeira fase partiu de quase zero visitantes até receber

um grande número de visitantes nos seus primeiros anos de funcionamento (715.990 em 1985;

788.275 em 1986; 778.705 em 1987; 745.573 em 1988). Nos anos 1990 ocorre uma queda no

total de visitantes, predominando períodos em que a visitação se situou em torno de 500 mil

por ano (1991-1993), na faixa de 584-595 mil por ano (1994-1995) e no período seguinte

abaixo de 473 mil (1996-2000), alcançando 359 mil em 2002 (FERREIRA SILVA, 2018).

IV - Cooperação e Integração Energética e de Infraestrutura (binacional e

regional)

Os Estados latino-americanos sempre se destacaram pela basta provisão do seus

recursos naturais, destacando a presença de recursos hídricos em todo o continente que, embora

representem grandes reservas de água doce, também são considerados recursos estratégicos,

pois, muitos dessas águas são transfronteiriça, localizadas nas margens de um Estado e de

outro; É particularmente importante ter em mente que, como mencionado acima, a gestão das

águas internacionais, como recursos compartilhados, forma uma interdependência que requer

coordenação e regulamentação entre os Estados que compõem as bacias e seus rios

internacionais.

No entanto, quando se fala em relações internacionais na América do Sul, leva se em

consideração que, ao longo da história, a região enfrentou diversas situações de conflitos,

contrariedades, e dificuldades na integração. Esta região, que possui três das maiores bacias

hidrográficas do mundo, teve que superar suas instabilidades políticas e chegar a um acordo

sobre o gerenciamento de águas internacionais, uma vez que grande parte das reservas de água

é internacional; entre elas, a bacia do Prata, considerada a segunda maior estrutura hidrográfica

do continente e estrutura dos territórios de cinco estados, sendo Argentina, Bolívia, Brasil,

Paraguai e Uruguai (ALBERGARIA DE QUEIROZ, 2012, p.189); assim mesmo, ressalta o rio

Paraná, cujo afluente é um dos maiores da região e o mais influente da bacia do Prata,

destacando que:

Tanto a bacia do Prata como o rio Paraná ocupa a área mais populosa e industrializada da região, e

o rio, por sua vez, liga as duas maiores áreas econômicas do subcontinente, ao norte é o estado

de São Paulo e o eixo industrial do rio Santa Fe-La Plata localizado no sul. Isso confere ao rio

grande importância estratégica política e economicamente e, do ponto de vista internacional, torna-

se o principal meio de integração do Mercosul (COMIP).

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Resolvendo os desentendimentos que cercavam a fronteira do rio Paraná, eles

conseguiram encontrar soluções para o uso da energia hidrelétrica; então, quando se trata de

um rio do tamanho do Paraná, deve-se levar em consideração que, além do aspecto territorial,

o tributário representa um valor estratégico extremo, principalmente se for considerado seu

potencial hidrelétrico. E são precisamente os projetos de energia que desempenham um dos

papéis mais importantes no alcance da integração dos estados pelos quais o rio Paraná se

estende.

Assim, como mencionado acima, durante a década de 1970 e considerando o uso

hidrelétrico do rio Paraná, os Estados chegaram a uma decisão favorável a todos os estados da

região, sendo este o Acordo Tripartite de Cooperação Técnica e Operacional entre Itaipu e

Corpus; destacando o fato de que, o referido acordo conseguiu estabilizar o cenário geopolítico

da região e até abriu caminho para novos projetos hidrelétricos nos rios internacionais da

região, sendo um deles o mencionado Tratado da Itaipu.

Considerando o uso da hidroeletricidade, a criação de Itaipu trouxe benefícios em

diferentes campos, considerando tanto o perfil refletido no Brasil quanto no Paraguai, em um

período tão marcado; e também à evolução das relações e negociações com os demais parceiros

da região da platina, resolvendo os desafios geopolíticos regionais cheios de

desconfiança. Diante do exposto, pode-se concluir com a relevância dessa série de tratados que

procuram a solução de questões que apontam para a gestão integrada dos recursos hídricos e

seu papel estratégico nas relações internacionais da região.

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