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Gerente Tambem e Gente - Andre B. Barcaui

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  • Nota do Autor

    Sou obrigado a confessar que, apesar de vido leitor, nunca dei muito valor a esta "notado autor" nos livros. Isso porque sempre considerei que o que importava mesmo era ocontedo do livro em si e no as consideraes que o prprio autor fazia sobre sua obra.Essas notas sempre me soaram de alguma forma narcisistas e ao mesmo tempo cansativas.Recusava-me a acreditar que qualquer espcie de emoo pudesse ser transmitida ao passaros olhos por esta pequena introduo. Qual no foi a minha surpresa ao me depararpreparando este pequeno prembulo que agora voc est lendo, e me surpreender, aodescobrir que, em uma obra de fico, esta a nica hora em que o autor pode de fato falardireta e abertamente com seu leitor.

    Pois aqui estou, quem diria, me explicando a voc, leitor, sobre como e por que prepareieste pequeno romance. Tomei contato com projetos mais ou menos como o protagonista destelivro. No se trata de forma alguma de uma autobiografia, mas sou obrigado a revelar quemuitos dos acontecimentos que vocs tomaro conhecimento, apesar de caricaturados, foramde alguma forma, vividos. Depois de algum tempo como gerente de projetos, comecei a darconsultoria e ministrar aulas nessa rea. Tive chance de ler vrios livros magnficos a respeitodo tema e recomendar diversos deles para alunos e clientes. Mas sempre senti que existia umalacuna a ser preenchida, j que a grande maioria desses livros ou muito tcnico ou muitometodolgico. Existe o guia disso, o corpo de conhecimento daquilo, os famosos e poucoconvidativos manuais e at mesmo livros de autoajuda, estilo: "Gerncia de Projetos: seusproblemas acabaram...". Por favor no me entendam mal. No estou criticando nenhum dessesautores. Muito pelo contrrio. So grandes gurus a quem respeito e muitas vezes recorro emmeus estudos e tambm na vida profissional. So eles que tornaram possvel a vasta literaturaque temos hoje disponvel na rea de gerncia de projetos. Um campo recente sob a tica dedisciplina, mas muito antigo sob o ponto de vista de sua aplicao na histria da humanidade.

  • Esses livros que estou apelidando de tcnicos so, sem dvida, fundamentais. Inclusive vriosde seus princpios esto abordados em partes deste livro que est em suas mos.

    Alis, foi at bom mencionar isso porque importante que vocs saibam que alguns dosautores que admiro tiveram seu pensamento de alguma forma sumarizado e contextualizado emsituaes vividas pelos personagens no livro. So eles: Carl Pritchard, David Cleland,Domnico de Masi, Eliyahu Goldratt, Harry Beckwith, James Lewis, Jeremy Main, JerryWind, Patrick Lencioni, Scott Adams, Scott Thorpe, Spencer Johnson, Stanley Portny, StephenCovey, Suzanne Skiffington, Thomas Friedman, Vijay K.Verma, entre outros.

    A tcnica muito importante. Mas sempre achei que no era tudo. No podia ser tudo. Etinha que haver um jeito mais fcil de explicar isso ao leitor que quisesse introduzir-se aotema deste livro. At porque todos gerenciamos projetos. Sejam profissionais, sejam pessoais.Estamos expostos a eles at sem sentir. Portanto, quanto mais informao e pontos de vista arespeito do assunto, melhor. Mas como transformar toda essa abordagem tcnica em algo queseduza o leitor?

    Foi da que surgiu a inspirao para escrever um romance. Ousada e pretensiosa, euadmito. Mas desenvolvida com muito gosto e zelo. Agradeo muito Editora Brasport por terapostado na ideia. Sempre achei mais fcil ensinar atravs do humor. Alguns alunos j meperguntaram se fao uso de alguma tcnica de didtica especial. Adoraria dizer que sim e depreferncia com um nome bem complicado. A verdade que no sei fazer de outro jeito. Sefor possvel aprender e, ao mesmo tempo, se divertir, por que no faz-lo? Foi com essa visoe com incentivo desses mesmos alunos que percebi que existia uma possvel abertura para umlivro que abordasse gerncia de projetos de uma maneira mais solta, mais livre. Objetivandoensinar um pouco da tcnica sim, mas principalmente preocupado em passar a experincia docotidiano de um gerente de projetos. Experincia de quem j acertou, mas tambm j erroumuito, diga-se de passagem. Uma leitura mais fcil, no necessariamente doutrinadora, e queincentive voc a degustar esta rea to fascinante. Este livro ambiciona, ainda, reforar aimportncia das pessoas nos processos ligados gerncia de projetos. Tudo se resume a elas.Porm, paradoxalmente, muitas vezes somos levados a achar solues milagrosas atravsapenas da tcnica. Depois de algum tempo atuando como gerente, vejo claramente que, no

  • fundo, no gerenciamos to-somente projetos. Gerenciamos pessoas! As pessoas sosimplesmente a razo de ser de tudo. Procuro passar um pouco desta ideia tambm no decorrerdo livro.

    Vocs devem estar sentindo falta dos chamados agradecimentos. Ser que ele no vaiagradecer nada a ningum? claro que vou... Mas como tambm quase sempre ningumconhece as pessoas s quais os autores costumam agradecer, resolvi que faria minhashomenagens de uma forma diferente. Decidi que faria meus agradecimentos atravs dosprprios personagens e situaes envolvidas no enredo. Mudei alguns nomes, valores e locais,para que no se tratasse de uma exposio demasiada. Mas garanto a homenagem atravs dereferncias sutis que fiz no texto. Isso o que mais importa para mim. Os homenageados irose reconhecer quando lerem o livro. E vou garantir que lero, enviando um exemplar para cadaum deles!

    Gostaria ento de terminar parafraseando Jack Lemmon, para mim um dos maiores atoresque o cinema j teve. Falecido em 2001, mas com um legado extraordinrio de filmes a seremsaboreados eternamente. Pego emprestado uma frase sua que ficou clebre, modifico umpouco o contexto, mas mantenho vivo o sentido. Sozinha, esta frase capaz de explicar bemmelhor do que eu as razes que me levaram a escrever esta histria:

    "Existe apenas uma razo para um escritor escrever um livro, ou uma editora publicaruma obra ou uma livraria oferecer um exemplar: mexer com as emoes dos leitores."

    Espero, humildemente, que de alguma forma suas emoes tambm sejam afetadas. Boaleitura e bom divertimento.

  • Andr Barcaui

    [email protected]

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    A presente obra disponibilizada pela equipe Le Livros e seus diversosparceiros, com o objetivo de oferecer contedo para uso parcial em pesquisas eestudos acadmicos, bem como o simples teste da qualidade da obra, com o fimexclusivo de compra futura.

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    O Le Livros e seus parceiros disponibilizam contedo de dominio publico epropriedade intelectual de forma totalmente gratuita, por acreditar que oconhecimento e a educao devem ser acessveis e livres a toda e qualquerpessoa. Voc pode encontrar mais obras em nosso site: LeLivros.Net ou emqualquer um dos sites parceiros apresentados neste link.

    Quando o mundo estiver unido na busca do conhecimento, e no mais lutandopor dinheiro e poder, ento nossa sociedade poder enfim evoluir a um novo

    nvel.

  • Prefcio

    O Standish Group International (www.standishgroup.com), uma organizao quepesquisa o desenvolvimento de projetos na rea de Tecnologia da Informao, publicou no seurelatrio de 2003 o resultado de uma pesquisa realizada em 2002 que envolveu cerca de 40mil projetos de TI. Essa pesquisa apontou que 15% dos projetos fracassaram, enquanto apenas34% tiveram sucesso. Outros 51% foram concludos com algum resultado positivo, masfalharam em custo, prazo ou funcionalidades. Esses nmeros so ainda melhores do que osencontrados na pesquisa de 1994, que apontou 31% de fracassos, apenas 16% de sucessos e53% de resultados relativos. Dentre os fatores crticos de sucesso, a pesquisa aponta trs dosmais importantes: 1. Envolvimento do usurio, 2. Suporte da alta direo e 3. Gerentes deprojeto experientes.

    Para atender a necessidade de desenvolver as habilidades gerenciais para a conduo deprojetos, surgiram vrias iniciativas por parte de associaes tcnicas, governos,universidades e empresas que criaram metodologias de planejamento, execuo e controle deprojetos. Dentre essas iniciativas est o mtodo PRINCE2 (Projects in ControlledEnvironment 2), criado pelo Departamento de Comrcio do governo britnico, e o modelo doPMI (Project Management Institute - www.pmi.org), que alm de ensinar mtodos eferramentas, tambm possui um exame de certificao de profissionais em gesto de projetosque j certificou cerca de 170 mil profissionais no mundo inteiro desde 1984, dos quais cercade 50% apenas em 2005. Outras entidades, como o IPMA (International Project ManagementAssociation - www.ipma.org), tambm criaram modelos prprios, mas na essncia eles seassemelham.

  • Desde meados do sculo passado a indstria e a academia vm discutindo e aprimorandoseu conhecimento sobre gesto de projetos com significativos progressos. A vasta literaturaexistente na rea discute amplamente a metodologia e ferramentas de gesto, mas h poucaliteratura sobre o processo de acumulao de conhecimento e experincias do dia a dia de umgerente. Parodiando Crosby na sua analogia da qualidade com sexo, podemos dizer que muitosacham a gerncia de projetos parecida com sexo, pois dizem que sabem fazer, e que para darcerto basta seguir alguns procedimentos. Mas quando algo sai errado a culpa sempre dooutro, ou da outra.

    Neste livro, Andr Barcaui passa os principais conceitos sobre gesto de projetos naforma de um romance, desfilando a metodologia j consagrada e discutida em inmeros livrostcnicos, mas com largas doses de bom humor e fazendo o leitor se sentir no contexto dahistria como coadjuvante, como se fosse o copiloto de um jato. Baseado em sua experinciatanto como profissional da rea como de professor e palestrante em diversos cursos de MBA,Barcaui apresenta as diversas reas de conhecimento de gerncia de projetos, bem como dicasde planejamento, controle e administrao. No de uma forma exclusivamente tcnica, mascoloquial, vista pela tica do profissional que vivncia suas ansiedades, erros e acertos,abordando o lado humano e pessoal de um gerente. Ele aborda tambm como deve ser oprocesso de aprendizado de um gerente de projetos atravs de um mentor, da mesma formaque um mdico recm-formado orientado por um cirurgio mais experiente. Tambm discuteo que um projeto, qual o papel do patrocinador, stakeholders, caractersticas do gerente deprojeto, entre outros conceitos.

    Sinta-se na pele de um gerente de projetos e desfrute da leitura agradvel deste romancebaseado em histrias reais vivenciadas pelo autor, aprendendo sobre a teoria e a suaaplicao. Se voc um gerente de projetos experiente, vai se encontrar em muitas dassituaes descritas e se ainda est no incio da carreira vai se preparar melhor para as suasprximas misses.

    Paulo Ferrucio

  • Executivo de Projetos

  • 1. Nada do que Foi Ser

    A vida importante demais para ser levada a srio.

    OSCAR WILDE

    Meu nome Flick. Leonardo Flick. Gosto de me apresentar assim porque me faz sentircomo uma espcie de James Bond ps-industrial. Psicologia, sabe como ... Melhora minhaautoestima. Na verdade todos costumam me chamar apenas de Flick devido caractersticano-usual do sobrenome. A no ser minha mulher, que quando est nervosa, sempre me chamausando meu nome completo. Sou casado e tenho uma filha, a qual considero meu melhorprojeto. Gosto de acreditar que sou um homem de sorte. Tenho uma boa famlia, sade, umbom emprego e financeiramente.... bom, nem tudo perfeito. Trabalho em uma grande empresamultinacional na rea de tecnologia da informao. Para aqueles mais antigos como eu,tecnologia da informao significa "alguma atividade ligada a computadores". Voc sabe:criar coisas novas para resolver problemas que no se tinha antes desta coisa ser inventada,gerando ao mesmo tempo algum novo tipo de dependncia.... Calma! Claro que no pensoassim de verdade. No poderia, j que sou parte deste mundo novo que ajudo a criar. A

  • tecnologia sempre foi minha aliada e gosto de acreditar que nutrimos uma atitude de respeitoum pelo outro. Eu e a tecnologia. Mas isso uma outra estria...

    Espero que meu chefe jamais leia este livro. O enredo que estou para compartilhar comvocs verdico e diz respeito a minha prpria vida. Mais especificamente minha carreiraprofissional. Sou o que se pode chamar de um gerente de projetos. Sei que primeira vistapode parecer no muito claro do que se trata esta atividade. Para ser honesto, at para mimmesmo, durante muito tempo foi muito difcil entender. Jamais vou esquecer o dia que chegueiem casa e disse que tinha sido promovido. Minha mulher foi s alegria ao dizer:

    - Gerente, Amor?! Que timo, parabns!!! Quantos funcionrios voc vai ter?

    -Nenhum...

    Sou sempre honesto, no sei mentir. A no ser s vezes...

    -E qual o nome do seu departamento?

    -No vou ter departamento.

  • -Eu no entendi Amor. Voc no disse que foi promovido a gerente?

    -Gerente de projetos.

    -Bom, pelo menos vai ganhar mais?

    - Sim... Quero dizer, no. No de incio. Voc sabe. Primeiro vem o trabalho, depois oaumento; um processo natural dentro da reengenharia pela qual as empresas vm passando nosdias de hoje.

    incrvel como sempre que no sei como explicar algo para minha mulher acaboapelando para termos tcnicos de mercado esperando que ela engula. Historicamente,algumas vezes d certo. Outras ela finge que engoliu para no me complicar... uma dasrazes pelas quais, eu e Tnia, estamos casados at hoje....

    - Ah... Bom, estou muito orgulhosa e muito satisfeita assim mesmo. Parabns!

    Esta foi a minha primeira tentativa de explicar o que eu fazia, ou passaria a fazer. Depois

  • veio minha filha. Para ela, que pensei que seria mais simples... Bem, s o que posso dizer que subestimamos demais as crianas...

    -Caroline, papai tem uma novidade!

    -Qual, pai?

    -Seu pai agora gerente de projetos.

    -Pxa pai, muito legal! Ento voc vai passar mais tempo comigo, n?

    -Bem... No exatamente, minha filha. que papai agora vai ter mais responsabilidades.Papai foi promovido.

    -Promovido significa fazer mais coisas do que antes?

    -No Carol. Promovido significa dar um passo frente na empresa, ser reconhecido.

  • -Mas se voc vai ter menos tempo do que antes, como pode ter dado um passo frente?

    -Sei que parece estranho primeira vista, minha filha, mas pode ter certeza que vai serbom para todos ns.

    Vai ser bom para todos ns?! Eu no tinha exatamente a certeza de que isso era verdade!Queria acreditar que sim, mas no tinha certeza.

    So nessas horas que eu gostaria de ter tido uma profisso mais comum, ou pelo menosmais fcil de explicar em reunies de escola. Voc sabe, aquelas reunies onde voc rene umbando de pais e um bando de crianas e cada pai tenta explicar sua profisso para todo ogrupo. Se eu tivesse sido mdico como meu irmo ou advogado como meu primo seria muitomais fcil. Mas no adianta lamentar. O negcio curtir. Se para uma criana foi difcilexplicar o que eu fao, imagine para trinta ao mesmo tempo!

    Outro momento hilrio foi na hora em que contei para minha me. D. Lcia temaproximadamente 30 anos a mais do que eu. Uma mulher fabulosa ( claro que fabulosa, aminha me!). Foi dela que herdei duas das manias que mais admiro em mim mesmo. Aprimeira a leitura. Leio compulsivamente. Na verdade compro at mais livros do que soucapaz de consumir. Em certas pocas sou capaz de ler trs ou at mais livros ao mesmo tempo.Sem falar que adoro uma livraria. Sem dvida, um dos meus lugares prediletos. A outra maniaherdada foi o gosto pelo cinema. Como diria Fellini, "o cinema o modo mais direto de entrarem competio com Deus". A magia da telona e suas trilhas sonoras exercem profundainfluncia em meu estado de esprito, no posso negar. A vantagem do cinema sobre o livro

  • a msica. A vantagem do livro sobre o cinema que voc imagina tudo (inclusive o rosto damocinha...). Passei na casa de minha me logo aps sair do trabalho no segundo dia ps-promoo. Seu comentrio de me foi o seguinte:

    - Leo, como estou feliz por voc meu filho. Voc merece... Sempre batalhou tanto... Jfalou com sua esposa e com seu pai?

    - J, me. Com meu pai ainda no, mas vou falar com ele em seguida.

    -Voc mesmo um orgulho para todos ns. Sempre foi. Voc deve redobrar a atenoagora. Tomar cuidado com a inveja, o mau olhado. A empresa e seu chefe certamente esperammais de voc.

    - Eu sei me, obrigado. Vou me cuidar...

    Ela falou durante aproximadamente meia hora sobre todos os cuidados e preocupaesque eu deveria ter. Depois disso, tomou um gole de caf e perguntou:

    -Agora me diga, meu filho, o que diabos vem a ser um gerente de projetos?

  • Essa minha me...

    Com meu pai achei que seria diferente. Afinal de contas, podemos usar aquela linguagemmachista, "papo de homem para homem", sabe como ... Eu bem que tentei:

    -Armando, seu filho foi promovido.

    Curiosamente, meu pai nos ensinou desde pequenos a no cham-lo de pai. Isso mesmoque voc ouviu. Parece estranho, a princpio. Mas a lgica dele era que sempre achou quedevamos ser to amigos, que seria prefervel evitar qualquer tipo de formalidade. Inclusivena forma em que nos tratvamos. Em outras palavras, praticamente no usvamos a palavrapai ou filho. Era sempre Armando e Leo. Demorei um pouco a entender isso. Mas quandoentendi, passei a admir-lo ainda mais...

    -Promovido, Leo!! Parabns! E o aumento, foi bom?

    -... Mais ou menos...

  • -Por que?

    -Bem, no falamos sobre isso ainda, sabe... Como dizemos l na empresa, por enquanto oaumento s no trabalho...

    -Quer dizer que voc foi promovido, vai trabalhar mais, mas ganhar a mesma coisa?

    - ... Mais ou menos isso...

    - Leo, tem certeza que voc no quer trabalhar comigo? Nunca pensou em mudar deprofisso?

    S para registrar, meu pai mdico...

    Herdei muitas de suas caractersticas. Pelo menos o que dizem as pessoas que nosconhecem. Escolhemos profisses completamente diferentes, verdade. Mas a essncia demuitos de nossos sentimentos e pensamentos parecida. Acho que por isso que discordamostanto...

  • Estas foram algumas das situaes pelas quais passei quando tentava explicar o que umgerente de projetos fazia ou deveria fazer. Espero sinceramente que ao longo do livro vocpossa entender melhor do que se trata esta atividade to em moda nos dias de hoje. Asalegrias e tristezas de ser um gerente. E de projetos! Espero que voc se divirta e quem sabeat se identifique tentando decifrar o papel do gerente de projetos nas organizaes. E porfavor, se assim for, que depois me explique. S para garantir que no estou com a ideiaerrada...

  • 2- Virei Gerente... E Agora?

    Todos os homens tm medo. Quem no tem medo no normal; isso nada tem a ver comcoragem.

    JEAN-PAUL SARTRE

    Tudo comeou no que parecia ser mais um dia normal de trabalho. Eu estava em minhabaia (sempre detestei este nome: baia. Me sinto como um cavalo preso. Mas comochamamos os locais onde cada funcionrio da empresa trabalha e, em tese, produz...)preparando um relatrio sobre os bugs1 que descobri em nosso mais novo produto. Eu deveriater enviado ontem o relatrio para o laboratrio de nossa empresa e j estava atrasado. Minhafuno? Bem, eu era o que se pode chamar de um analista de sistemas. E at que bemcompetente, arrisco dizer. Gostava do que fazia: lidar com mquinas. Acho que para mimaquilo tudo era no fundo um grande videogame. Eu contra a mquina. Algumas vezes euganhava. Outras, perdia miseravelmente. Desde a faculdade foi assim. Formei-me emcomputao e depois de um estgio e dois empregos em empresas menores, acabei vindoparar aqui. Uma das maiores empresas de soluo de tecnologia do mundo: a HAL S/A. Alis,

  • acho esta palavra "soluo" muito interessante. Cada vez mais o mercado de informtica nofala somente em hardware (mquinas), software (programas) ou rede. Prefere a palavra"soluo", querendo indicar que no importa o seu problema, ns temos o que voc precisa.

    Ou "no importa o que voc precisa, ns criamos o seu problema...

    Mas voltemos a HAL. Sem dvida uma das maiores empresas do ramo do mundo. Umaempresa sria e de excelente reputao no mercado. Sempre me considerei um felizardo porter conseguido um emprego em uma empresa com tantos recursos e com tantas chances dedesenvolvimento profissional. Sem dvida, um sonho. Estava trabalhando como analista htrs anos e j havia sido promovido. Entrei como Analista Jnior e orgulhosamente depois deum ano e meio fui promovido a Analista Snior. A verdade que todos que ficam em ummesmo cargo e aps este perodo so promovidos automaticamente. Mas isso no importa, euestava feliz. Minha responsabilidade era testar novos programas produzidos pela matriz daempresa em situaes extremas e considerando as caractersticas regionais especficas denosso pas. Desde que entrei na empresa eu fazia isso. Mas agora eu era Snior. Tudo estavaindo muito bem em minha carreira. Sentia-me reconhecido tanto pelo chefe quanto peloscolegas de trabalho. Quando o mundo parecia perfeito (de acordo com a minha experincia,se nada parece que pode dar errado, voc que no est vendo por todos os ngulos), eisque meu chefe me liga e pede para ir sua sala. Estranhei um pouco porque ele poderia terusado o chat2, como de costume. Mas preferiu a chamada telefnica. Pedi quinze minutos parafechar o que estava fazendo e me dirigi sua sala.

    Meu chefe ficava em um escritrio de tamanho mdio, mas confortvel. Tinha uma janelaum pouco desproporcional para o tamanho da sala, um armrio com diversos livros (que euduvidava de que ele j tivesse lido todos) e alguns trofus. Tinha tambm uma mesa retangularonde ele trabalhava e despachava e uma outra, redonda, com quatro lugares para pequenasreunies. Era impossvel no reparar em uma placa amarela na parede que dizia: "Chefe no Deus. Mas trate-o como se fosse". Uma brincadeira com seus funcionrios, evidentemente,mas que acabou gerando diversas piadinhas de corredor. Enfim, uma tpica sala de chefe. Aporta estava aberta quando cheguei. Ele me viu e pediu que entrasse e me acomodasse. Seunome era Edson Pedreira. Excelente pessoa. No era de todo careca.... Ainda tinha aquela

  • penugem, uma de cada lado da cabea. Mais o meio era completamente liso. Alm disso, umabela pana que o denunciava mesmo distncia. Uma figura muito parecida com o Frei Tuck,do clssico Robin Hood. No momento em que sentei, ele se levantou e foi fechar a porta atrsde mim. Meu corao gelou. Por que meu chefe fecharia a porta para conversar comigo? Serque meu atraso no relatrio poderia ter gerado isso? No acredito... J atrasei tantas vezes...Ser esta a razo? Por ter atrasado tantas vezes? De qualquer forma, eu no tinha muito afazer. Era esperar para descobrir. Ele fechou a porta e voltou a sentar em sua mesa, bem defrente a mim. Comeou nosso dilogo:

    - Flick, voc tem alguma ideia da razo pela qual eu o chamei?

    - Se for sobre o atraso no relatrio para o laboratrio chefe, pode ter certeza de que...

    -Atraso de relatrio?! No... No nada disso. Esquea o relatrio. Chamei voc aquipor uma questo muito mais importante.

    Mais importante? Para mim isso era o mais importante! E por que me chamar paraconversar a portas fechadas?

    - Ok, chefe. Estou curioso. Vamos ter alguma mudana?

  • - Mudana? Sim, vamos ter mudana. Uma grande mudana. E a mudana em voc,Flick.

    Ser que vou ser demitido? O que diabos eu fiz de errado? Logo agora que estava indotudo to bem... Ele continuou:

    - Flick, voc sabe que o Petrcio est indo para uma nova rea. Ele vai comandar nossafbrica de software no sul do pas.

    Paulo Petrcio era um excelente profissional, pelo menos esta era a sua fama. Muitoexperiente e bom no relacionamento com pessoas. Uma verdadeira referncia na empresa. Nosomos exatamente amigos, porque, como j disse, me interesso mais por mquinas, mas seique ele estava muito bem cotado. Eu sabia de sua promoo.

    -Sim, estou sabendo. Fiquei muito feliz por ele.

    -Pois . Voc sabe o que Petrcio fazia antes de ser promovido?

    - Bem, sei que ele era gerente de alguma coisa. Confesso que no me lembro bem donome da rea que ele gerenciava.

  • - Voc no se lembra bem porque ele no tinha uma rea especfica. Ele era gerente deprojetos.

    -Ah, sim. Ok...

    Eu no tinha a menor ideia do que era aquilo, mas sabe como ... Eu estava napresena do meu chefe...E de mais a mais, o que eu tinha a ver com isso?

    - Voc deve estar se perguntando o que voc tem a ver com isso, certo? ( incrvel opoder visionrio dos chefes...). Pois bem, vou lhe dizer. Voc tem sido to bom tcnico econhece to bem nossos produtos, que pensei em lhe dar um novo desafio. Voc ser o maisnovo gerente de projetos de nosso departamento. Passar a liderar equipes em direo a umobjetivo especfico. No ficar mais preso em sua baia. Passar a interagir diretamente comnossos clientes, entregando nossas solues e garantindo sua satisfao. O que voc achadisso, hein?!

    Surreal. No tenho a menor ideia do que ser gerente, e muito menos de projetos. No seinem se quero ser isso. Pelo menos no me sinto preparado para ser gerente. Estava to bemcom as mquinas....

  • -Pxa chefe, no sei nem o que dizer (e no sabia mesmo....).

    -E ento, voc aceita o desafio?

    Ele tinha um sorriso to seguro e to largo na boca que dava para ver at suasobturaes...

    -Mas por que eu chefe? Digo... o time todo muito bom e estou s h um ano e meio comoAnalista Snior e...

    -Voc no aceita o desafio? (fim do sorriso)

    -No, no chefe... Digo, sim, claro que sim! Adorei, adorei mesmo sua confiana emmeu trabalho. Muito obrigado.

    - Ento estamos fechados (o sorriso voltou...). Quero que passe hoje mesmo tudo o queest fazendo para o Farhad e se prepare para o seu primeiro projeto.

  • Farhad Bolayan era o meu colega da baia ao lado e fazia praticamente a mesma coisaque eu...

    -E que projeto seria este, chefe?

    -Fico feliz que tenha perguntando. Estamos falando do projeto SAS501 de um de nossosprincipais clientes, a TASA. Eles esto precisando instalar uma nova rede interna para todaa empresa e ns ganhamos o projeto. A equipe ainda no est totalmente montada, mas comsua habilidade, certamente vamos ter sucesso! Vou te pedir por favor para procurar o Juvenalpara que voc possa dar incio imediatamente ao projeto. Estou colocando todas as fichas emvoc, Flick! No v me decepcionar hein?!

    - Vou fazer o melhor possvel chefe. Pode contar comigo.

    - Claro, sei que posso. Bom, boa sorte. Em breve estarei fazendo um comunicado aogrupo dizendo que voc agora o gerente do projeto SAS501. No fao agora porque estou desada para um evento muito importante no centro da cidade. E o lanamento de nosso novosistema de configurao. A propsito, como est aquele relatrio sobre os bugs do produto?

    - Ainda no acabei de fazer chefe.

  • -No tem importncia. Passe tudo para o Farhad. Voc agora um gerente.

    E assim foi.... Sa de sua sala sem saber bem se comemorava ou se chorava. Acho quesenti um misto de aflio e anestesia. A nica coisa certa era que tinha que procurar o tal doJuvenal, um de nossos gerentes de venda. Pois muito bem, pensei comigo mesmo, vou encararessa de frente. Voc um homem ou um rato?

    Mexeram no meu queijo...

    Se foi lhe dado um desafio porque voc mereceu este desafio. Afinal de contas voc foipromovido! Comemore! No se lamente! Estava ali o mais novo gerente de projetos domercado. Dizem que nasce um a cada 30 minutos...

    E a cada 15 minutos, um tambm demitido...

    A sorte estava lanada... e a aventura, apenas comeando.

  • 3- O Primeiro Projeto a Gente Nunca Esquece...

    Existe algo mais importante que a lgica: a imaginao.

    ALFRED HITCHCOCK

    Juvenal era um de nossos mais bem sucedidos gerentes de venda. Sua sala era no famosodcimo andar da empresa, mas conhecido como "olimpo", " porque era dali que saa todo ofaturamento da empresa. Logo, era ali que habitavam os "deuses" que faziam com que a HALprosperasse. Nem mesmo a presidncia ficava no dcimo. Ns, pobres mortais, ficvamos noquarto andar. Por favor, no me entenda mal. No tenho nada contra vendedores. Apenas osconsidero assim como uma espcie de "lado negro da fora"... Mas reconheo que esta umaviso errada e estereotipada. Apenas porque passei a vida inteira do outro lado do tabuleiro.Na verdade at os respeito muito. Afinal so eles que trazem o dinheiro para a empresa efazem a roda girar... E eu estava a ponto de conversar com um de seus maiores representantes;o Darth Vader em pessoa: Juvenal Cardoso.

  • Assim que sa do elevador me senti em outra empresa. No a toa que existem tantashistrias sobre o dcimo andar. At o cheiro diferente. A cor do carpete diferente. Aspessoas so diferentes... Muita agitao para o meu gosto. Procurei imediatamente a secretriado andar. Ela atendia a toda rede de vendedores e certamente poderia me dizer comoencontrar o Juvenal.

    - Bom dia. Estou procurando o Sr. Juvenal Cardoso e...

    - Um momentinho, por favor.

    O telefone dela tocou na mesma hora... incrvel...

    Dois minutos depois:

    - O Sr. Juvenal? A quem devo anunciar?

    - Meu nome Flick. Leonardo Flick. Sou do departamento de suporte. Vim falar com ele arespeito do projeto...

  • - Ok. Mais um momentinho por favor.

    O telefone tocou de novo... J estava comeando a ficar com raiva do aparelho...

    Neste meio-tempo passou um outro vendedor que eu no conhecia e comentou:

    - Ldia, por favor no esquea de ligar para o departamento de suporte para agendar umareunio sobre aquele problema com o nosso mdulo de estoque. J estou cansado de cobrar.Nunca vi departamento to ineficiente....

    Ineficiente? Era do meu departamento que ele estava falando! Quem ele pensa que ?!Enfim, foco!

    -Pois bem, o senhor dizia que queria falar com?

    -Com o Sr. Juvenal Cardoso por favor....

  • -Ah sim, o Sr. Juvenal est em reunio neste momento. Acredito que deva durar mais umameia hora. O senhor gostaria de esperar?

    - Sim, gostaria (o que mais eu poderia fazer?). Obrigado....

    Sentei-me em um sof extremamente confortvel e esperei. Acho que aqui no dcimo elesmedem o tempo de forma diferente. Uma hora no tem definitivamente 60 minutos. Enfim, ofato que esperei quase uma hora e meia para ser atendido. Finalmente aps esse tempo, asecretria me chamou e pediu que eu me dirigisse sala de Juvenal.

    A chegada a sua sala foi marcante. No sou do tipo que gosta de descrever ambientesdetalhadamente. Existem autores que gastam pginas e mais pginas em seus livrosdescrevendo o formato da "sombra de uma jarra em cima da mesa lateral inglesa, comcadeiras Luis XV, em uma sala de jantar colonial, quando bate a luz do sol do meio-dia". Elescapricham em explicar cada canto do cmodo, o teto de gesso e todos os outros detalhes quecompe o ambiente. Reconheo a importncia disso em determinados enredos. Mais ainda,reconheo o esforo do autor de tentar traduzir a sua viso para o leitor. No deve ser fcil...Infelizmente (ou no...) esse no meu estilo. Tambm no acredito que seja importante para aestria que estou lhes contando. A nica exceo que me permito no caso da sala de Juvenal.Primeiro, ela devia ter pelo menos o dobro do tamanho da sala do meu chefe. Segundo, tinhauma vista muito mais privilegiada. Juvenal tinha o imenso Parque Nacional bem sua frentecom um enorme chafariz quase que respingando em sua janela. A sala tinha quatro armrioscolossais que na hora julguei que fossem feitos de jacarand ou peroba. Uma mesa com doiscomputadores, outra de reunio, uma televiso de 42 polegadas, um aparelho de DVD, outrode vdeo, dois quadros negros e alguns vasos de planta bem cuidados. Sua mesa retangular noestava exatamente arrumada. Nela estavam dois celulares carregando, seu laptop aberto evrios papis espalhados. No chegavam a formar uma pilha, mas passavam a sensao dedesordem. Juvenal estava em p, de costas para aporta, falando ao telefone, com outro

  • telefone tocando e vrias mensagens piscando na tela do computador a sua frente. Tendo estaviso pude compreender melhor o sentido da palavra multimdia. Ele pediu apenas com umgesto que eu me sentasse e aguardasse. Neste meio-tempo continuou no telefone. Quaseningum mais usava terno na HAL. Eu mesmo usava apenas uma roupa social h anos. Aempresa, com o sinal dos tempos, tambm comeou a mudar os padres de vestimenta queexigia de seus funcionrios. Apenas gerentes e diretores que iam de gravata. Era o tipo daregra que no estava escrita em lugar nenhum, mas era facilmente perceptvel nos corredores.No meu caso, nunca fui muito f de terno e gravata mesmo... Alis, no h nada mais agressivodo que usar gravata. Meu dio tanto, que certa vez fui tentar estudar as razes histricas portrs da utilizao daquele pedao de tecido que mais parece um babador. Encontrei vriasexplicaes plausveis. Umas que atribuam sua origem ao frio, outras etiqueta. A que maisme convenceu foi a que dizia que a inveno era para cobrir os botes da camisa social. Ora, prefervel ter os botes mostra do que sujar aquilo toda vez que vou comer...

    Enfim, o terno de Juvenal era impecvel, seu cabelo tinha alguma espcie de gelgosmento, mas que, no todo, acabava se justificando. Um vendedor nato... S o nariz que eraestranho. Totalmente desproporcional ao corpo. Na minha opinio, aquele nariz deveria pagarimposto. Certamente respirava mais que os outros. Seu palavreado era uma aula de etiqueta. Acada trs palavras que dizia, uma era aos berros. No sei com quem ele estava falando, masno poderia ser com um cliente. Depois de uns dez minutos de conversa (e eu aguardando...)ele fez mais um gesto pedindo para que eu aguardasse um pouco mais. Enfim, depois de mais 8minutos, ele desligou.

    - Pois bem, meu caro (pensei que ningum mais falasse assim, mas estava enganado...).O que posso fazer por voc?

    -Bom dia, Sr. Cardoso. Meu nome Flick e eu estou aqui para...

  • -Desculpe, como seu nome?

    -Flick... Leonardo Flick. Sou do departamento de suporte.

    -Departamento de Suporte? Aquilo um horror! Ainda bem que voc est aqui. Voc veioa meu pedido para conversar sobre os problemas no mdulo de estoque no ?

    -No... Quero dizer, no exatamente... Eu sou o novo gerente do projeto SAS501 daTASA. Estou aqui porque meu chefe pediu que eu...

    -SAS501?!!?!? Finalmente algum veio me dar o status do projeto. Pois muito bem, comoestamos?

    -Na verdade eu vim aqui para poder pegar informaes sobre o projeto e sobre a TASA.Voc sabe, para poder dar incio aos trabalhos.

    -Incio?!?! Voc s pode estar brincando! Este proj eto era para ter sido iniciado h umms! Dentro de trs meses ele tem que estar terminado. Foi isso que acordamos com ocliente. No acredito no que estou ouvindo. Quem o seu chefe?

  • -O nome dele Edson Pedreira. Foi ele quem pediu que eu viesse at aqui conversar comvoc e...

    -Conversar?! No temos mais tempo!! S podia ser coisa do Pedreira mesmo... Comosempre, atrasados... Olha Lick...

    - No Lick. E Flick.

    -Que seja. Espero que este projeto esteja terminado em trs meses. Foi isso queacertamos e foi isso que foi vendido. Temos que faturar dentro deste perodo ou vamos ficarmal com este cliente, que estratgico para nossa empresa. No sei o que Pedreira lhe pediupara fazer ou deixou de pedir. O fato que quero voc e sua equipe dentro daquele clientehoje ainda. E gostaria tambm de um status semanal sobre o projeto. Quero acompanhar deperto os resultados. Estamos entendidos?

    -Mas... existe algum tipo de documento explicando o que o projeto, ou como estformada a equipe?

    -Meu Deus!! Voc no disse que era o gerente? Voc j leu o contrato? No conhece suaprpria equipe? Eu estava preocupado com o projeto. Agora estou muito preocupado! Notenho mais tempo para conversas deste tipo. Espero um relatrio semanal em minha mesa

  • todas as segundas pela manh sobre o andamento do projeto. Voc sabe, o bsico: andamentodo cronograma, quanto j entregamos, previsto x realizado, posio do oramento e comoanda o humor do cliente. E por favor, no me decepcione (j tinha ouvido issorecentemente...). No quero ter que acionar os altos escales da empresa por mais umproblema com o departamento de suporte, ok? At logo...

    -Incrvel. No momento em que me levantei e sa de sua sala me senti como uma garrafavazia jogada ao mar (boiando e esperando encontrar algum....). Se prepotncia tivesse umnome, este seria: Juvenal. Mas o fato que eu tinha que comear por algum lugar. J sabiapelo menos que tinha trs meses para acabar. Isso j era um comeo. Precisava ir at ocliente, mas no poderia ir sem antes saber de que se tratava o projeto. Em outras palavrasprecisaria ler o contrato. Tinha esperanas de que ele pudesse me dar mais pistas, mas suadelicadeza foi to grande que no tive coragem de perguntar. Tive a ideia de voltar pessoaque normalmente mais sabe sobre tudo que acontece em todos os departamentos da empresa:a secretria. Algum havia dito que seu nome era Ldia e eu guardei.

    -Perdo.... Ldia?! (falei com todo o charme que achava que tinha...)

    -Sim?! Conseguiu falar com o Sr. Juvenal?

    - Consegui sim. Obrigado. Agora eu estaria precisando de um documento e o Sr. Juvenalsugeriu que eu tentasse conseguir com voc (uma mentirinha bem colocada no faz mal aningum...). Estou falando do novo contrato que temos com a TASA. Voc por acaso sabecomo eu poderia obter uma cpia?

  • - TASA? Espere um momento, por favor...

    Ela consultou seu computador e em 1 minuto ela localizou o arquivo do contrato.

    -Est aqui! Se voc quiser, eu posso lhe enviar uma cpia eletrnica.

    -Isso seria excelente. Obrigado.

    Sa do dcimo andar com uma sensao muito interessante. Tinha um objetivo, mas nosabia direito de que se tratava. Tinha um prazo e um oramento que eu deveria respeitar, masque no fui eu que planejei. Tinha at provavelmente um time, mas no conhecia aindaningum. E j havia pelo menos trs pessoas com expectativas altssimas e me cobrando emrelao ao resultado (Juvenal, meu chefe, e, muito provavelmente, o cliente). Muito legal essenegcio de gerenciar projetos...

    Um homem ou um rato? Um homem ou um rato? Decidi que era melhor no me lamentare seguir adiante. Uma promoo no cai do cu todos os dias... Recebi a cpia do contrato pore-mail. Ldia era, sem dvida, muito eficiente. Li e reli com cuidado. Pude ter uma ideia umpouco melhor do escopo do projeto proposto. Existiam vrios detalhes que no estavam clarose outros que eu no tinha competncia tcnica suficiente para entender. Comecei a achar queno era a melhor pessoa para gerenciar aquele projeto especfico.

  • Ser que conhecer tecnicamente em detalhes a soluo oferecida no faz parte do papeldo gerente?

    Precisava conhecer minha equipe. Precisava conhecer o cliente. Liguei e marquei umareunio com a pessoa que assinou o contrato no dia seguinte. Tentei conseguir maisinformao internamente na HAL, mas foi impossvel. Todos estavam muito atarefados parapoder ajudar. Mesmo meu companheiro de baia, Farhad, no tinha ideia do projeto... No oculpo. Eu tambm no teria.... Alis, estranhei um pouco o modo como o Farhad conversoucomigo. Parecia que no estava entendendo bem meu novo papel. Ele no aceitou ficar com aparte do trabalho que me cabia (o famigerado relatrio com os bugs...) e isso acabou ficandocomigo tambm, como um ltimo legado a ser feito em paralelo.

    Nem reclamei... Na verdade era isso que eu gostava de fazer. Era isso que eu sabiafazer... Gerenciar projetos?! Quando? Onde? Como? Por qu?

    Na manh seguinte fui ao cliente. Com pouca informao, mas muita disposio. Senteipara conversar com a pessoa que assinou o contrato, mas que depois de meia hora de conversadescobri que se tratava apenas do chefe de compras da TASA. E que no tinha a menor ideiado andamento do projeto. Ele sugeriu que eu conversasse com o verdadeiro demandante. Osetor de administrao central. Por sorte ele foi muito cordial e objetivo. Levou-mediretamente pessoa certa: a secretria do departamento de administrao.

    Dona Helena era uma senhora muita bem apessoada (eu queria dizer conservada, masacho agressivo), por volta dos 60 anos de idade, mas que pareciam 55... Vestia-se muito bem,conforme meu paradigma de secretrias executivas, e usava culos da cor rosa. Ela recebeu-me de maneira muito formal e ao me apresentar, deu-me a melhor dica que algum havia dado

  • at agora:

    -Sr. Flick, posso lhe dar uma sugesto?

    -Claro que sim. E pode me chamar de Flick apenas.

    -Desculpe me meter. Mas sabe como ... Conheo este contrato desde que foi assinado. OSr. Marcondes (chefe do departamento de administrao central) est, digamos, muitoinfeliz com o andamento do projeto e no vai gostar de saber que o senhor, como gerente,no est cem por cento informado sobre a situao do mesmo. Na verdade, ele esperava umstatus atualizado do projeto hoje pela manh.

    -Ok, Dona Helena, mas ns no temos uma equipe alocada aqui trabalhando?

    -Veja bem, Sr. Flick. Vocs tm e no tm. J estiveram dois rapazes aqui analisandonossos sistemas e fazendo diversas perguntas. Mas at agora, de concreto, nada foi feito. Emesmo estes dois rapazes sumiram depois de um tempo. No sabemos nada sobre oandamento do projeto e o Sr. Marcondes est um pouco tenso a respeito. Talvez sejainteressante o senhor voltar para sua empresa, pegar mais informaes, trazer a equipe devolta e depois fazer novo contato. O que o senhor acha?

  • -D. Helena, acho que a senhora tem toda a razo. Muito obrigado por seus conselhos. Voufazer exatamente o que a senhora acabou de sugerir. S lhe peo apenas uma coisa: a senhorapoderia, por favor, informar ao Sr. Marcondes que estive aqui, que o projeto estar entrandonos trilhos e que no incio da semana fao questo de me apresentar para lhe passar umaposio?

    -Claro que sim. Pode deixar.

    -Muito obrigado.

    Incrvel... Quanto mais eu cavava, maior ficava o buraco (melhor parar de cavar? Porque mesmo aceitei este cargo?). Pelo menos tinha descoberto um novo anjo da guarda: DonaHelena....

    Voltei para a HAL da mesma forma que tinha sado. Mas desta vez sabia o que tinha quefazer. Precisava conhecer a equipe. Entender qual a situao do projeto. Fui falar com meuchefe. E com outros chefes de departamento tambm. Dois dias depois de peregrinaes emdiversos andares e departamentos (agora sei como se sente uma bola de ping-pong...),descobri que a equipe fora formada h um ms por dois profissionais de setores diferentes eque no estavam integralmente alocados no projeto. Em outras palavras, eles estavam noprojeto, mas mantinham tambm suas funes regulares em seus respectivos setores. Como oprojeto comeou sem um gerente oficial, ambos voltaram para suas atividades do cotidiano,deixando o projeto abandonado.

  • Fantstico! Que belo comeo! Agora sim eu estava satisfeito de ter aceitado este cargo!

    De posse destas constataes, minha primeira providncia foi marcar uma reunio com osdois. Mas, para isso, tinha que convencer seus chefes de que eles deveriam participar destareunio. Para tanto, decidi convocar seus chefes tambm. De forma a aproveitar o momento,achei por bem convocar tambm meu chefe (nunca demais buscar apoio...). Pois bem,marquei a reunio. Nunca havia feito isso antes. Nunca tinha precisado. No se faz reuniocom mquinas... Mas j participei de tantas reunies na vida, que organizar uma no poderiaser to diferente. Reservei uma sala para sete pessoas. Uma a mais do que necessrio. Mas sempre bom ter espao... Pedi tambm um lanche para o caso de atrasarmos um pouco emandei o convite por e-mail para todos. Ttulo: "Reunio sobre o projeto SAS501. Urgente.No faltem".

    A reunio estava marcada para comear s 14h. Tudo estava preparado, exceto eu. Nosabia exatamente o que abordar ou como abordar. Sabia que precisava decifrar o status doprojeto, precisava conseguir de volta os recursos, mas no sabia exatamente como conseguirisso.

    As 13h30 eu j estava na sala (para o caso de algum chegar mais cedo). Minhaansiedade ia crescendo medida em que os minutos iam passando. As 14h eu comecei a andarpela sala. Ningum ainda havia chegado. s 14:15h ouo um barulho na porta. Levanto-mepara receber... Era o pessoal da manuteno pedindo para ver um problema com o arcondicionado. As 14:30h chegou o lanche... Comecei a comer os biscoitos... Se voc esteveno planeta nos ltimos 10 anos, certamente viu ou pelo menos j ouviu falar da srie"Friends". Pois bem, naquele momento me senti como um mistura de Joey e Phoebe,completamente sem saber como proceder.

    At s 15:30h eu permaneci dentro daquela sala. No me levantei nem para ir ao

  • banheiro. Ningum dos cinco convocados compareceu. Simplesmente ningum.

    Ser que me enganei e marquei a reunio em outro horrio? Em outro dia? Ser que eusou de Marte? E todo o resto do mundo de Vnus?

    Fui checar o e-mail que eu havia enviado. No tinha dvida, eu marquei corretamente.Mas quem eu quero enganar? Nem meu prprio chefe apareceu.... O que poderia teracontecido? Porque ningum dava a mnima para este projeto? Eu tinha marcado uma reunioque era fundamental, tinha convocado as pessoas corretas; onde foi que eu errei? Isso nopodia continuar assim... Eu tinha que tomar uma providncia. Meu novo cargo estava em jogo,meu futuro como gerente de projetos estava em jogo (e eu ainda nem acabei aquelerelatrio....). Para o mundo que eu quero descer...

  • 4. Conhecendo Meu Guru

    Mestre no quem sempre ensina. Mas quem de repente, aprende.

    GUIMARES ROSA

    Depois do ocorrido, resolvi parar e repensar tudo que havia acontecido desde o incio.Minha pseudo-nomeao, meu encontro com Juvenal todo-poderoso, minha ida ao cliente sem-falar-com-o-cliente e finalmente a reunio-que-nunca-houve. Minha concluso era que a nicacoisa vlida, at ento, tinham sido os biscoitos que comi sozinho naquela sala. Resolviconversar com minha mulher. A nica pessoa capaz de encontrar explicaes para oinexplicvel. Foi dela a ideia mais sensata que ouvi.

    -Por que voc no pede ajuda? Por que ser to autossuficiente? um cargo novo, vocainda est aprendendo....

  • -Pedir ajuda? A quem? Deus? No um problema tcnico que tenho que resolver. Noestou decifrando um cdigo de computador. Estou praticamente em uma situao de "gameover".

    -Calma, meu Amor.... Vamos pensar juntos. Quando voc era analista e tinha uma dvidatcnica, a quem voc recorria?

    -Para um analista com mais conhecimento naquele assunto tcnico especfico... Ou atmesmo para o laboratrio do produto.

    -Pois ento... a mesma coisa... Voc tem que pedir ajuda para quem tem maisexperincia que voc em gerncia de projetos. Devem existir outros gerentes na empresa,no?

    -Espere um momento... Eu poderia conversar com o antigo gerente de projetos de nossodepartamento. Ele tambm foi recm-promovido. E todos gostam dele. Ele tem que poder meajudar a decifrar esse quebra-cabea... Obrigado, querida!

    Como que no pensei nisso antes? Tive que ouvir o bvio de minha mulher... Precisade ajuda? Pea ajuda! Foi o que fiz... No dia seguinte liguei para o Paulo Petrcio. Sabia que

  • ele ainda no tinha se mudado para o sul para assumir seu novo cargo. Apresentei-merapidamente, por telefone, e disse que precisava conversar com ele. Ele aceitou me encontrars 15h do mesmo dia. Minha sobrevida na empresa poderia depender deste encontro...

    Cheguei em sua baia no horrio marcado, ansioso e ao mesmo tempo esperanoso. Eleestava de mudana e portanto cheio de caixas de papelo sendo cuidadosamente arrumadas.Ele preparava tudo com muita calma e isso chamou minha ateno.

    Como era possvel algum trabalhar como gerente, ser recm-promovido e estar calmodaquele jeito?

    Devia ter alguma coisa por volta dos 50 anos. No mais do que isso. Era magro, tinhaalgumas mechas de cabelo branco que disfaravam uma discreta careca que comeava a seformar. O mais importante: um sorriso largo no rosto. Sugeriu que fossemos tomar caf noterceiro andar, onde fica o restaurante da empresa. Disse que era mais agradvel conversar aoar livre e tomando alguma coisa. Ele mesmo fez questo de pagar o caf. Pedi desculpas pelainterrupo em seu dia e agradeci pela gentileza. Jamais poderia imaginar naquele momento oquanto seria importante aquele encontro para minha vida. s vezes, estamos diante demomentos preciosos que s percebemos muito tempo mais tarde. Fazer o qu? assim quefunciona.... Recordo-me, como se fosse ontem, desse nosso primeiro dilogo:

    -Sr.Petrcio, muito obrigado por me receber.

    -Ora, o que isso Flick! Por favor, me chame apenas de Petrcio. Esse meu nome de

  • guerra! Estou curioso, como posso ajud-lo?

    -Voc prefere a verso simples ou completa?

    -Como achar melhor.

    -Ok, ento vamos l....

    Contei minha estria como quem conta uma novela. Na verdade, um drama. Desde domomento em que fui chamado sala do meu chefe, at minha recm-tentativa frustrada detomar o controle do projeto. Tambm falei de como o considerava um expert na rea (naverdade ainda no tinha certeza disso, mas tinha uma sincera esperana), e, portanto, capazde me ajudar. Disse-lhe que seria muito importante para mim sua opinio e que estavacomeando a lamentar o fato de ter sido promovido a gerente de projetos.

    Ele ouviu todo o meu discurso pacientemente. Sem falar nada. Apenas escutando... svezes balanava a cabea concordando e, por alguns instantes, ensaiou at um risinhoinvoluntrio de canto de boca. No de deboche, mas como que querendo expressar j terpassado por situaes semelhantes (aqueles cabelos brancos no eram toa...). Depois detodo o meu desabafo, ele comeou:

  • - Muito bom, Flick. Em primeiro lugar, meus parabns pela promoo (parabns!? Jestava achando que seria melhor receber os psames....)! Voc acaba de assumir o papel degerente de projetos. Algo que eu venho fazendo h mais de 15 anos. E posso afirmar que aatividade mais gratificante que exerci em toda a minha vida! Antes de entrar especificamentena situao que voc acaba de me descrever, gostaria de lhe fazer algumas perguntaspreliminares. Voc me permite?

    - Por favor, fique vontade.

    - Diga-me Flick, voc sabe o que um projeto? J parou para pensar a respeito?

    O que um projeto? Que tipo de pergunta essa? Todo mundo sabe o que um projeto...Mas como descrever?

    - Um projeto?! Bem... voc sabe... Um projeto alguma coisa que tem que ser feita. Algoque, em tese, teria que ser planejado.... Acho que nunca parei para pensar exatamente nadefinio... Como tcnico, apenas partia para execut-los... Voc sabe...

    - Sim, compreendo... Mas acho que importante compreendermos seu significado. Umprojeto um empreendimento com tempo determinado e com objetivo especfico e nico.Normalmente com recursos finitos tambm. Parece bvio, mas importante ressaltar. Vocpode me dizer o que eu quis dizer com tempo determinado?

  • -Tempo determinado? Ora, que tem fim... que um dia acaba...

    - mais do que isso, Flick. Um projeto no s tem um fim, como este fim tem que serconhecido, planejado, controlado e respeitado, desde o incio do projeto. Se voc tem algoque no tem fim planejado, ento no um projeto. Por definio. Pode ser um processo, umprograma, uma operao. Mas no um projeto. Voc entendeu?

    -Acho que sim. Por exemplo, este meu projeto que comentei com voc tem trs mesespara acabar. No fui eu que planejei isso, mas sei que so trs meses. Quando acabar vai virarum processo dentro do cliente. Mas at acabarmos de implementar um projeto.

    -Exato. E por que eu disse que tinha que ter um objetivo especfico e nico?

    -Porque serve para alguma coisa, certo? Ou ento no teramos um projeto....

    -Sim, e porque um projeto nunca se repete. Ele tem por natureza uma caracterstica no-repetitiva. Cada projeto nico. Por mais que dois projetos paream iguais, existe semprealgum fator que garante sua unicidade.

  • -Disso eu entendo bem... Ao instalar um sistema novo, por mais que tenha feito o mesmoprocedimento mil vezes, sempre acontece algum problema novo ou imprevisto.

    -Bom exemplo... E por qu?

    -Ora, porque assim o mundo...

    -Podemos encarar desta forma... Mas analisando a fundo, vamos perceber que algumavarivel ambiental necessariamente mudou para que tivssemos um resultado diferente. Podeter sido o material utilizado, o tempo, a equipe.... Diga-me Flick, o que voc acha que estpor trs de todo projeto?

    -Por trs de todo projeto? Ora, um cliente, custos, recursos, mquinas e tudo mais quecompe o contexto do projeto... Acho...

    -No, Flick. O que est por trs de todo e qualquer projeto so pessoas. Em cem porcento dos casos. Ns no gerenciamos mquinas. Gerenciamos seres humanos. E a queest a dificuldade, mas tambm a beleza do trabalho.

  • -Eu sei... principalmente quando estes "humanos" abandonam o projeto, no do o suportenecessrio...

    -Quando voc acha que surgiu gerncia de projetos?

    -Quando surgiu? Bom, no departamento de suporte acho que deve ter surgido h mais oumenos uns quatro ou cinco anos, quando comeamos a fazer projetos externos de maneiramais rotineira e....

    -No, Flick. Refiro-me histria da humanidade. Quando foi que surgiu gerncia deprojetos?

    timo... Excelente... Vim aqui pedir ajuda e estou tendo aula de histria... Ok, vou fazer oseu jogo...

    -Projetos.... no sei... Talvez na idade mdia?

    -Sabe Flick, projetos sempre existiram. Desde que o homem homem. Desde a pr-histria.... Talvez at antes.... Na viso dos catlicos, Deus foi o primeiro gerente de projetoque surgiu. E tinha apenas sete dias para fazer tudo....

  • Mas ele planejou bem... Tinha pelo menos um dia de descanso... Ele continuou:

    -Os egpcios ergueram grandes pirmides, os navegadores desbravaram novas terras, ohomem foi lua... Todos exemplos de projetos... Quando ento teria surgido a expresso"gerncia de projetos"?

    -No fao a menor ideia.... Sei que no fui eu que inventei... Isso com certeza...

    -Ok. Pense em pocas de grandes transformaes. Pense em pocas de grandesmudanas....

    Detesto ser testado desta forma, mas estava comeando a gostar de seu estilo "guru"de conversar...

    -Ah, no sei... Talvez nas guerras?

    -Precisamente! As guerras so eventos muito tristes na histria da humanidade. Mas ao

  • mesmo tempo elas produzem uma srie de inovaes de diversas ordens. Formas novas defazer coisas antigas... Mas, por favor, me entenda corretamente. No estou fazendo apologiaao conflito. Muito pelo contrario. Mas inevitvel notar que foi a partir destes perodos dedificuldade que surgiram muitas das invenes que hoje usamos no cotidiano.Particularmente na Segunda Guerra Mundial, onde a prpria disciplina gerncia de projetos,como a conhecemos hoje, comeou a tomar forma. Voc j ouviu falar da expresso "sala deguerra3"?

    -No, mas o nome no atraente...

    -Pois ... Este termo foi cunhado em poca da guerra. Originalmente como sala degenerais, para discusso de estratgias de guerra. A expresso foi transportada para nossosdias na forma de uma sala, literalmente, onde um grande projeto pode ser analisado eacompanhado. Tudo relativo quele especfico projeto fica exposto nesta sala. E onde ogerente de projeto se rene com sua equipe, respirando o ar do projeto e tendo mo ocronograma atualizado, mapas da soluo, especificaes, o organograma e tudo mais que dizrespeito ao projeto. Uma "sala de guerra" neste sentido. Muito utilizada para projetos longose complexos.

    -Agora que voc est falando, me lembro de uma sala assim l no quinto andar onde fuiconvocado algumas vezes para discutir um mdulo especfico de um sistema que estvamosdesenvolvendo. Pude inclusive presenciar algumas guerras de verdade, mas entre as pessoasque estavam na sala discutindo....

    -Algumas vezes isso tambm acontece... At certo ponto tambm saudvel... Masfalemos disso depois. Outros termos tambm que aprendemos muitas vezes em poca defaculdade como o diagrama PERT4 por exemplo, e muitos outros, tambm surgiram danecessidade de implementao de projetos blicos em situaes extremas.

  • -Voc acha que houve uma evoluo desse tempo at os dias de hoje?

    -Sem dvida! Basta ver as universidades. Voc muito novo e certamente no se lembra(queria que ele estivesse certo a respeito disso tambm...), mas antigamente no existiamcursos de gerncia de projeto. Hoje em dia possvel encontrar cursos de graduao, ps-graduao, certificaes, aperfeioamento, teses e tudo mais que se deseja nesta rea. Atmesmo anncios em jornais pedindo gerentes de projeto aparecem com abundncia. Asempresas comeam a formalizar o cargo em sua folha de pagamento, existem diversasassociaes dirigidas exclusivamente para o assunto, listas de discusso, sitesespecializados na Internet e muito mais! A quantidade de informao a respeito muitomaior.

    - verdade... No tinha pensado nisso... Acho que estava muito fechado em meu mundocom as mquinas...

    -No tem problema, Flick. Voc no o primeiro tcnico que foi subitamente promovidoa gerente. E provavelmente no ser o ltimo. Na grande maioria dos casos, o que acontece que se perde um bom tcnico, mas no necessariamente se ganha um gerente preparado... (eletem razo... era como estava me sentindo...). O ponto positivo disso tudo que a voc foidada uma oportunidade tima de vivenciar tudo isso de perto. Sei que algumas vezes somoschamados a fazer coisas para as quais no nos sentimos especialmente preparados (algumasvezes?). E isso nos deixa naturalmente desconfortveis. E sei tambm que nossa empresaainda tem que evoluir muito do ponto de vista estratgico para preparar seu ambiente paragerenciar tudo por projetos. Mas estamos nesta direo... Estamos todos constantementeaprendendo.... Inclusive nossos lderes e nossa organizao.

  • -Gerenciar tudo por projetos? O que voc quer dizer com isso? Nossa empresa temsetores de venda, contabilidade, recursos humanos... No d para gerenciar tudo porprojetos.

    -Bem Flick, esse um outro ponto muito importante. Mas para conversar sobre isso eupreciso de mais caf... Voc aceita?

    - Sim, aceito. S que desta vez eu pago!

    Levantei-me e entrei na fila do caf. Fiquei observando de longe aquele homem queestava comeando a me dar uma verdadeira aula sobre gerncia de projetos. Algum queresolveu dispor de seu tempo, que no deve ser muito, para dar uma luz a este pobre gerentenovo. Pela forma como falava e pelo brilho que irradiava, era impossvel no ficarinteressado. Comecei a confirmar o que, de certa forma, j sabia: tenho muito a aprender.... So que no sabia era que esse muito era muito mais do que eu imaginava...

  • 5. O Mundo Feito de Projetos

    O mundo grande e cabe nesta janela sobre o mar. O mar grande e cabe na cama e no colcho de amar. O amor grande e cabe no breve espao de beijar.

    CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE

    Mais dois cafs... Desta vez pedi o meu com um pouco de leite. Eu fao isso para evitar oacar, como uma espcie de compensao que minha dieta e meu paladar aceitam... Assimque coloquei as duas xcaras de caf na mesa ele recomeou:

    -Diga-me, Flick, voc no acha que o mundo est mais projetizado?

  • -Projetizado?! O que exatamente voc quer dizer com isso?

    -Voc no acha que as pessoas tm falado e usado mais a expresso "projeto"?

    -No sei... Acho que nunca parei para pensar a respeito.

    -Veja o exemplo de nossa prpria empresa. Tudo que se faz hoje se d o nome de projeto.Pode ser a compra de um novo equipamento, ou mesmo a mudana de um local de trabalho.

    E verdade. Ele tinha razo. Cada vez mais tenho ouvido a expresso "gerncia deprojetos" entre colegas e pessoas do mercado... Mas deixei-o continuar:

    - As empresas, de uma maneira geral, esto migrando das chamadas estruturasorganizacionais tradicionais para estruturas que trabalham cada vez mais por projetos. Emoutras palavras, estamos saindo daquela velha receita em que um departamento com um chefe,este por sua vez tem outro chefe e outro, at chegar ao presidente da empresa. Cada vez maisequipes de projeto esto sendo formadas para trabalhar em projetos internos ou externos, noimportando de que rea as pessoas so originalmente.

  • -Isso muito interessante Petrcio, mas a HAL ainda bem funcional para o meu gosto....

    -Eu sei... Mas apesar da estrutura, cada vez mais trabalhamos por projetos. Estamosgradativamente nos movendo dos silos, ou at mesmo feudos se voc preferir, para umambiente onde o que importa a produtividade da empresa como um todo e no de umdepartamento especfico. Este o nico caminho vivel para melhoria real.

    -E voc acha que isso comeou porque algum em alguma empresa percebeu que melhortrabalhar assim? Por projetos?

    Eu j comeava a fazer analogias com nosso departamento e com outras empresas queconhecia...

    - Acho que isso comeou porque era inevitvel. As coisas simplesmente mudam. Masexistem alguns fenmenos em nossos tempos que ajudam a explicar este movimento. Acabampor funcionar como verdadeiros agentes de mudanas nas organizaes e tambm nas nossasprprias vidas.

    - Como o qu, por exemplo?

    No tinha a menor ideia onde ele iria chegar, mas agora j era tarde para voltar...

  • Vamos em frente...

    - Vamos falar de alguns destes fenmenos. Voc j parou para pensar o impacto que atecnologia tem nos dias de hoje?

    - Ora, claro que sim. Afinal ns somos uma empresa de tecnologia e...

    -No, no. No estou falando somente de nossa empresa. Estou falando do mundo, daspessoas, da sociedade. Em como uma criana hoje estuda em comparao a como nsestudvamos em nossa poca de escola. Em como temos diagnsticos mdicos muito maissofisticados e menos invasivos. Em como podemos acessar e manipular nossa conta bancriafacilmente. Em como podemos falar uns com os outros, nos vendo em tempo real em qualquerlugar do mundo. Em como as tecnologias convergem e pedem mais tecnologia e...

    Como amante da tecnologia, desta vez resolvi interromper pela primeira vez...

    -Voc tem toda a razo. No sei mais se tenho um telefone com uma agenda ou umaagenda com telefone. De qualquer forma possuo tambm uma mquina fotogrfica embutidano mesmo aparelho que ainda toca msicas MP35. Minha mulher s vezes me diz que souexagerado. Que comprar tecnologia pela tecnologia e no pela necessidade....

  • -E pode ser que ela tenha razo em muitos casos. Depende... O fato que estamosvivenciando mudanas tecnolgicas com velocidades nunca antes vistas na histria.

    - Acho que o maior exemplo disso a prpria Internet, concorda? Finalmente uma reaem que eu estava confortvel para me expressar...

    -A Internet sem dvida faz parte da espinha dorsal desta revoluo da informao, mas mais interessante ainda observar as mudanas que a Internet provoca em nossa forma deinteragir com o mundo (incrvel como nunca paramos para pensar em coisas como essas...).Empresas passam a ter funcionrios espalhados pelo globo ou onde a mo de obra for maisbarata, pesquisas podem ser feitas com muito mais velocidade e at mesmo as prpriasrelaes humanas mudam.

    - verdade... Voc sabe que tenho um colega que acabou de sair de um relacionamentovia Internet em que... (senti que no era o momento apropriado para entrar em detalhes...Deixei para outra oportunidade...). H... Mas voc dizia...

    -Hoje em dia estamos to ligados tecnologia (ser que ele quis dizer dependentes?) quefica at difcil imaginar nossa vida sem ela. No nos damos conta, mas ela est l.... Presentenas coisas mais simples do nosso dia a dia.

    - Sim, mas o que isso tem a ver com a projetizao do mundo?

  • - Tem tudo a ver, meu amigo. O mundo tambm tem se transformado. Hoje em dia muitocomum falarmos em globalizao, ou efeitos da globalizao, concorda?

    - Sim. O mundo est ficando cada vez menor...

    -Mas desde os grandes primeiros conquistadores este processo j vinha acontecendo. Porque somente hoje se fala em globalizao?

    -Sei l... Acho que algum precisava encontrar um termo para explicar tudo isso.

    - O que tudo isso?

    Testado de novo.... Como que eu deixo ele me colocar nesta posio?

    - No sei. Acho que tem a ver com minha filha poder comer um mesmo tipo dehambrguer, fabricado dentro de um mesmo padro, em qualquer lugar do mundo.

  • -Exatamente.... E muito mais... Na poca dos conquistadores tnhamos pases seglobalizando. Depois passamos a ter empresas se globalizando... Hoje temos cada vez maispessoas e profissionais se globalizando. E tudo ficando interdependente entre si. E uma coisafantstica!

    Fantstica era a maneira como ele conseguia ver e transmitir isso tudo. De maneira tofcil... Ser que era mesmo caf que ele estava tomando? Comecei a me perguntar...

    -Ok. Mas ainda no entendi a relao disso com a projetizao.

    -Calma... E a sociedade como um todo? Voc acha que mudou ao longo dos anos?

    -A sociedade? Acho que sim... Claro que sim... A sociedade sofre o reflexo de todasestas mudanas, certo?

    -A sociedade o prprio agente das mudanas. Ou no seria a sociedade a prpria mola-mestra que nos faz pensar hoje com muito mais seriedade em coisas do tipo: responsabilidadesocial, meio ambiente, ecologia, sade, segurana no trabalho, reciclagem, camada de oznio,formas alternativas de combustvel... A comear pelas crianas hoje em dia, que so muitomelhor preparadas e conscientizadas sobre os problemas que enfrentaro no futuro caso nocomecemos a cuidar do mundo que nos foi presenteado.

  • - Por favor, inclua nesta lista tambm o stress... Falei brincando, mas ele levou a srio...

    - Voc tem toda a razo! O stress e suas respectivas formas de combate tambm soreflexos das mudanas e da evoluo pela qual o mundo vem passando. Hoje em dia valorescomo a boa alimentao, o repouso e a prtica de exerccios regulares j so cientificamentereconhecidos. Novas situaes geram novas medidas...

    - E por isso tudo o mundo est projetizado? No estou certo se entendi....

    - muito simples. Com tantas transformaes acontecendo, todos ns somos forados anos preparar para no ficar para trs. Quando digo todos, quero dizer todos mesmo. Ns,como cidados, sociedade, famlia, empresa, fornecedores, clientes...

    Clientes! A palavra mgica.... Sabia que uma hora ia chegar l....

    -Voc tem razo. E os clientes esto ficando cada vez mais exigentes...

  • -Com certeza! Isso timo!

    Incrvel a capacidade que ele tem de ver sempre o lado bom de tudo... Isso comeava ame irritar... Ningum poderia ser to otimista...

    - No pense como fornecedor. Pense em voc como cliente tambm. Voc gosta de ficarhoras esperando para ser atendido em uma fila de aeroporto? Voc gosta de ficar ao telefonecom algum que no est realmente preparado ou delegado para satisfazer sua necessidade?No estamos cada vez mais intolerantes? No queremos tudo melhor e mais rpido? Com maiscortesia e ateno?

    - Claro que sim, respondi!

    - E importante que nossa expectativa seja superada. Em outras palavras, viver o quechamamos de experincia positiva na aquisio de um produto ou servio. De outra forma,ficamos inevitavelmente insatisfeitos... natural... O difcil que muitas vezes nossaexpectativa no expressa. No a revelamos facilmente. Porque s vezes ns mesmos notemos certeza do que queremos... Est a o grande diferencial... Saber ouvir e entender ocliente... Penetrar em seu crebro e tentar decifrar suas expectativas explcitas e implcitas.

    Incrvel... Ele estava correto... Jamais havia pensado nisso, mas eu tambm sou difcilcomo cliente.... Acho que comeava a entender onde estava a ligao.

  • -Entendo. E quando uma empresa ou uma entidade qualquer se adapta para poderenfrentar todas estas mudanas pelas quais o mundo e a sociedade vem passando, ela evolui,correto?

    -Perfeito Flick! E esta evoluo se d atravs de mudanas. Agora me responda: comovoc acha que so implementadas essas mudanas nas empresas?

    -Atravs de.... projetos! claro!! Como que no pensei nisso antes?!

    - Exatamente! E por isso que hoje vemos este verdadeiro "boom" de projetos. Estamosvivendo em meio a uma revoluo que ns mesmos ainda no somos capazes de entendercompletamente nem de dimensionar seu impacto. Talvez tenhamos que esperar algumasgeraes para poder compreender a fundo como fomos capazes (ou no....) de lidar com tantamudana a uma velocidade to rpida. Mas como discutimos antes, o mundo no para...Projetos tm que ser empreendidos... e tambm gerenciados... a que entram os gerentescomo eu e...voc (ele estava indo to bem...).

    -Confesso que nunca tinha parado para pensar em nada nisso que acabamos de falar. Elhe agradeo muito por me fazer analisar tudo isso mas... e o meu projeto? Ser que podemosfalar um pouco sobre ele agora?

  • -E claro que sim, Flick... Me desculpe... Acho que acabei me empolgando... Mas eraimportante entendermos o contexto em que voc acaba de ser inserido. Vamos voltar aoprojeto... Acho que voc est prestes a ter a melhor fase de sua carreira...

    -Eu duvidava muito... Mas a essa altura eu j estava completamente seduzido pelaforma calma e concatenada com que meu "guru " colocava seus pontos de vista e meconduzia na conversa. Precisava de conselhos... e ele sabia passar a mensagem... Eraesperar para ver...

  • 6. Pessoas, Pessoas, Pessoas

    As pessoas entram em nossas vidas por acaso. Mas no por acaso que elas permanecem.

    LLIAN TONET

    J estvamos falando h duas horas. Sentia-me como em um daqueles episdios da antigasrie "Kung-Fu", em que o aprendiz ouvia e tentava decifrar o seu mestre. Tentava absorvertudo o que conversvamos, mas ainda assim, tinha aquela ntida sensao de no saber comoprosseguir. Comecei a me preocupar com os compromissos assumidos em relao ao projetoSAS501. A essa altura eu j devia uma posio sobre o projeto para Juvenal e tambm para ocliente. Nem sequer a equipe eu tinha certeza se teria novamente. Foi neste ponto dopensamento que resolvi retomar o assunto com Petrcio:

  • -Voc sabe, ainda no conheci o responsvel pelo projeto no cliente e minha equipe estdesmantelada. Sinto que j estou devendo uma posio sobre o andamento. A situao desesperadora...

    -Realmente sem conhecer o cliente nem sua prpria equipe fica muito mais difcil... Masvamos entender melhor isso. Voc me disse que tentou agendar uma reunio e que ningumda nossa empresa compareceu, estou certo?

    - Certo. Foi ridculo...

    - Ok. Mas vamos ver o que podemos aprender com isso. Por que voc acha que ningumapareceu?

    -Sei l.... Apesar da minha pouca experincia no agendamento de reunies, acho que fiztudo certinho, como manda o figurino. Marquei a sala, enviei e-mail para todos, explicitei oassunto... at pedi um caf caprichado!

    -Quem so as pessoas que voc convocou para esta reunio?

    -Bem, convoquei o Eric e o Fabio, componentes da equipe. Chamei seus respectivoschefes de departamento para que eles pudessem entender a importncia do projeto e tambm

  • o meu prprio chefe. Voc sabe, para dar uma fora...

    -E ningum apareceu... No me estranho.

    -No lhe estranho? Por qu?

    -Porque voc no convocou o principal interessado no projeto, Flick.

    -O principal interessado? Quem?

    -Quem voc acha que aqui na empresa, alm de voc, tem o maior interesse em que esteprojeto d certo?

    -H.... o Juvenal?

    -Exatamente. O Juvenal o principal interessado. O cliente dele e foi ele quem vendeuo projeto. Ele deveria ser o patrocinador6 da iniciativa.

  • -O patrocinador? Mas patrocinador no quem paga pelo projeto? Neste caso opatrocinador o cliente, certo?

    -Depende...

    Hum... resposta de consultor... o que ele quer dizer com isso?

    -Depende? Depende do que? O patrocinador no sempre quem patrocina? Pareciabvio para mim, mas precisava entender o ponto dele...

    -Existe essa vertente do patrocinador ligado ao dinheiro, enfim, a quem patrocinaqualquer iniciativa que seja. Mas estou me referindo ao patrocinador ideolgico. Aquele queest por trs do projeto e que garante que tudo que tem que acontecer efetivamente iracontecer para que o projeto tenha sucesso. Talvez a melhor palavra para descrev-loinclusive no seja patrocinador, mas sim padrinho.

    -Padrinho?!

  • - Sim. A pessoa por trs do gerente de projeto. Diga-me, quem voc acha que devesuportar o gerente de projeto? A quem o gerente pede ajuda em momentos de necessidade?

    -H... Deus?!

    -Tambm... Mas fisicamente a figura que pode e deve ajudar o patrocinador. Sem ele, oprojeto fica sem o apoio devido. No incomum que tenhamos um patrocinador em nossaempresa e outro do lado do cliente, para cada projeto que executamos.

    -Entendo... Para o caso de precisarmos de recursos, gente, dinheiro...

    -Isso e muito mais. O patrocinador aquele que est desde o primeiro momento doprojeto, comprando a ideia do mesmo e garantindo que vale a pena ser empreendido. Naverdade ele tambm que deveria acompanhar o projeto atravs da viso do gerente, fazer ainterface poltica entre o cliente e o projeto, atuar como rbitro em caso de problemas emuito mais...

    -Ufa! Jamais pensei que o patrocinador fosse uma figura to importante. Um projeto sempatrocinador ter muito mais dificuldades de obter sucesso, correto?

  • -Corretssimo! Inclusive existem estatsticas que comprovam isso. Porm, existempatrocinadores e.... patrocinadores. Se que voc me entende....

    -Claro que sim. Nem todos tm o mesmo perfil e entendem corretamente seu papel noprojeto, certo? Como voc acha que o perfil do Juvenal?

    -O Juvenal tem muita fora poltica na empresa. E muito bom relacionamento com a TASA tambm. Acho que tem tudo para ser um grande patrocinador.

    -Exato!!! Eu deveria t-lo convocado para aquela reunio! A todos os outros teriamcomparecido.

    -Mais do que isso. Se eu fosse voc, teria ido pessoalmente sala dele, participado doproblema, pedido sua ajuda e explicado a importncia de sua participao na reunio para odesenrolar do projeto. Alm disso teria pedido para que ele o oficializasse perante todos osoutros como o gerente do projeto, para evitar tambm qualquer dvida a respeito disso. Estasso algumas das funes de um bom patrocinador.

    -Caramba, voc tem toda a razo....

    Claro! Por que que eu no convoquei o Juvenal?! Com aquele seu jeitinho meigo e

  • aquele seu nariz de tucano, certamente ele saberia passar a importncia do projeto melhordo que eu...

    - Mas ainda h tempo... Basta que voc converse com ele. Mas por favor, no v levarapenas um problema para o seu patrocinador. No isso que ele espera de voc. Alis,nenhum superior espera que levemos apenas mais um problema a ser resolvido. Eles j tmmuitos problemas para se preocupar. Podemos at apresentar a situao como ela , masdevemos ter sempre pelo menos um plano de ao para solucion-la.

    - exatamente isso que vou fazer. Mas... e a minha equipe?

    - Sua equipe deve estar mais perdida do que voc. Eu conheo bem o Eric e o Fabio. Soexcelentes funcionrios, mas precisam, como qualquer pessoa, saber o que se espera deles.Certamente seus chefes de departamento no os esto liberando porque precisam delestambm para as tarefas do cotidiano.

    -E como convenc-los a liber-los?

    -Ora, use a fora poltica do seu patrocinador!

    -O Juvenal! isso a! Muito obrigado, Petrcio!

  • -Ok, mas voc sabe do que se trata tudo isso de que acabamos de falar?

    -Como assim? O que voc quer dizer? (estava demorando...)

    - Mais uma vez, estamos falando de pessoas. Tudo gira em torno delas. A melhor lioque posso lhe passar que um projeto feito por pessoas. Logo, quanto melhor conhecedor depessoas voc for, maiores suas chances de sucesso.

    - Conhecedor de pessoas? O que exatamente voc quer dizer com isso?

    -Conhecer pessoas, meu amigo. Saber como trat-las. Voc no pode esperar cumprirbem seu papel de gerente sem antes ter conscincia de que as pessoas so diferentes, tmeducao diferente, valores diferentes, experincias, gostos, tudo diferente. Csar o que de Csar....

    - Sim, mas como se aprende isso?

  • - S tem um jeito que eu conheo... Fazendo, se expondo, tentando. Procure "ler" aspessoas, procure penetrar nos seus ntimos, ouvir e observar ao mximo. Seu comportamento,suas aes e tambm reaes. Procure entender primeiro e depois ser entendido. Presteateno nos mnimos detalhes, sinta cada ser humano e procure desenvolv-lo. Esta uma dasprincipais misses de um gerente: desenvolver pessoas.

    - Mas ainda assim eu tenho que atingir os objetivos do projeto, certo?

    - Claro, mas quem executa o projeto no voc. So as pessoas que voc, como gerente,lidera. E o seu time. E atravs dele que est o caminho para o atingimento dos objetivos doprojeto. Portanto, trate de conhec-lo bem.

    Impressionante. Eu achava que ser gerente de projetos j era difcil s pelo fato de ser oresponsvel pela entrega de alguma coisa sem ao mesmo tempo ter autoridade sobre osrecursos que formavam a equipe. Mas estou vendo que muito mais do que isso. Ele continuafalando de pessoas, do patrocinador, do time de projeto, do cliente, da nossa prpria empresa,do governo, de fornecedores, parceiros, at de nossas famlias. So todos membrosconstituintes7 do projeto. De acordo com Petrcio, so aqueles que fazem a diferena. Aquelesque influenciam e que so influenciados pelo projeto, podendo garantir seu sucesso oufracasso, dependendo do tipo de influncia exercida. E o gerente aquele que deve saberadministrar estas pessoas, ou grupo de pessoas, a favor dos objetivos do projeto.

    Era muito mais complicado do que eu imaginava... No s no tive aumento, como a nicacoisa que me deram foi um pster com a minha prpria foto para colocar em minha baia (fotoesta que eu particularmente preferiria que fosse da Angelina Jolie...).

  • No iria ser fcil....

    -Existe alguma tcnica para fazermos isso? Quero dizer, para administrar estas pessoasem benefcio do projeto?

    -Bom, em primeiro lugar, preciso conhec-las. Saber quem tem poder de influenciar oprojeto e quem seria influenciado por ele. Entender o contexto poltico no qual o projeto estinserido. Alguns fazem um mapa, desenhando todos estes aspectos e acoplando este desenhono plano de projeto. Outros preferem uma matriz, indicando nas linhas as reas ouatividades, e nas colunas, as pessoas correspondentes. Outros fazem esta anlise de maneirainformal, dependendo do tamanho do projeto. Depende muito. Mas fundamental ter estaanlise construda antes e atualizada durante o desenvolvimento do projeto. nossaobrigao tentar prever comportamentos, administrar emoes, direcionar todo o complexoambiente de interaes humanas para o sucesso do projeto.

    -Do jeito que voc est falando est parecendo que temos que ser verdadeirospsiclogos!! Pensei que fossemos gerentes!

    -Ponto muito interessante. Diga-me Flick, qual a caracterstica mais importante que vocacha que um gerente tem que ter?

    Droga! Era a minha prxima pergunta... Mas ele a fez primeiro....

  • -Principal caracterstica? H... Liderana?

    -Liderana, sim. Liderana. Temos que ser muito mais do que gerentes. Temos queliderar. Saber organizar um time em direo a um objetivo. Mas envolve mais do que isso.Somos pagos para tomar decises, somos na verdade responsveis por elas.

    -E se no tivermos todas as informaes necessrias para a tomada de deciso?

    -Quase sempre no teremos. Devemos buscar, mas nem sempre possvel obter todas asinformaes que desejamos. Mas tenha a certeza de que mesmo uma deciso mal tomada melhor do que no tomar deciso alguma. O time espera isso de voc. O time espera serliderado. Ento... lidere.

    -Uau... E o que mais?

    -Temos que ser muito bons comunicadores. Somos dependentes de diversas pessoas,departamentos e funes. Clientes e fornecedores. Tudo formando um grande crculo a nossavolta. E no basta saber falar para ser um bom comunicador. Alias, muito melhor saberouvir. At para poder negociar.

  • -Negociar? Mas pelo que estou entendendo, temos que ser bonzinhos com as pessoas,saber compreend-las e....

    -No, Flick! De forma alguma. No ser bonzinho... Cada caso um caso. Mas, uma vezque estamos sempre lidando com pessoas, temos que saber nos impor como gerentes.Lembre-se: o sucesso da equipe. O fracasso s do gerente....

    Que timo... era tudo que eu precisava ouvir...

    -Ento o que voc est sugerindo que, dependendo do caso, eu seja mais conciliador oumais energtico, mas rigoroso. Saber bater e saber assoprar. Isso muito difcil, no no?

    -Nem tanto, Flick. Contanto que voc tenha sempre o respeito pelo indivduo em primeirolugar. Talvez eu no seja muito o exemplo neste caso. Considero-me muito passional commeus times de projeto. As vezes, quase que protetor. Mas nunca deixei que eles soubessemdisso....

    -Respeito eu tenho, mas como saber como agir em tantas possveis combinaes desituaes que podem surgir?

  • -Calma. Voc no precisa ter resposta sempre para tudo. Voc tambm humano. Nesteincio, o que posso lhe dizer : tente tratar sempre as pessoas exatamente como vocesperaria ser tratado. Passe uma energia sempre positiva e tenha certeza que receberenergia positiva em troca. Com o tempo e com mais alguns cabelos brancos como os meus,voc certamente ganhar mais confiana. At mesmo para errar. Acredite.

    -Eu acredito, eu acredito. Mas sempre achei que o gerente fosse uma pessoa ligada parte tcnica do projeto, preocupada com resultados e metodologia.

    -Tudo isso muito importante tambm, Flick. No tenha dvida. S o que estouesclarecendo para voc com base na minha experincia, que tudo isso de nada adianta seno levarmos em considerao o nosso conjunto de capacidades interpessoais.

    - O que voc est chamando de capacidades interpessoais?

    - Fique tranquilo, Flick. Voc vai aprender... Certa vez, li em um livro sobredesenvolvimento gerencial que um profissional pode ser nomeado gerente a qualquer momentoem sua carreira. Mas o mesmo livro dizia que ele s seria um gerente de fato no dia em quetivesse que demitir um funcionrio. Na hora no entendi direito a frase. Internamente atcritiquei o autor. S fui entender o significado da metfora que ele fazia muito tempo depois,quando de fato tive que demitir uma pessoa pela primeira vez na vida.

    - Deve ser difcil, no ?

  • - Muito. Muito mais do que voc imagina. Nunca fui demitido, graas a Deus. Masacredito que a sensao seja a mesma. Ou talvez at pior, dependendo do caso. Na vidatambm assim: voc vai ganhando milhagem na medida em que a vida o testa nas maisdiversas situaes... Pois prepare-se: ser gerente tambm acumula milhagem...

    Comeava a achar que no era capaz de compreender tudo exatamente e na profundidadeque ele queria me passar. Comeava a achar tambm que teria que passar por situaessemelhantes para poder traar uma analogia com o que meu "guru" falava. O tempo iria tratarde me mostrar.... Mas resolvi desafi-lo em sua prpria linha de raciocnio com algo queouvia falar o tempo todo nos corredores:

    -Acho que entendi.... Mas metodologia tambm importante, certo?

    - Certssimo! E por que voc acha que metodologia importante?

    Fez de novo. Fiz uma pergunta e ele me voltou com outra. Estou comeando a achar queele treinado nisso...

    - Bem porque.... porque... porque sim n?! Ns temos que usar uma tal de metodologiaXPM para gerenciar projetos aqui na HAL, no temos?

  • - Sim, verdade. Mas qual o real valor do emprego da metodologia?

    Sempre achei esse negcio de metodologia um saco! Uma burocracia chata que sserve para nos tomar mais tempo. Sempre fui meio rebelde, estilo Pink Floyd The Wall 8.Voc sabe... "We don't need no education.... "

    - Padronizao?

    - Padronizao, sem dvida. Mas muito mais do que isso. No podemos esperar que cadagerente ao iniciar um projeto comece a fazer um plano a partir do zero. Existem modelosprontos. Nossa metodologia prev isso e muito mais. Mas a metodologia importante tambmpara a empresa, j que conduz a uma viso mais uniformizada dos projetos, mesmo queestejam sendo tocados por pessoas diferentes. A consolidao fica mais fcil. O clientetambm v com muito bons olhos, j que a metodologia sugere organizao, experincia emtodo de trabalho. Todo projeto nico, mas os processos por trs do gerenciamento podeme devem ser reaproveitados. Alm disso, com a globalizao, independentemente dos pasesou lugares onde o projeto estiver sendo tocado, usar a mesma metodologia facilita a gerncia eo acompanhamento.

    -Viu?! Logo, deveramos estar falando sobre metodologia tambm... Alis, sobre essarea eu no conheo nada (essa e todas as outras...), j que no tive tempo de ser treinado arespeito. Voc acha que pode me ajudar?

  • - Claro que sim, Flick. Mas antes, preciso que voc d andamento ao seu projeto. J esttarde. Eis o que vou lhe pedir. Gostaria que voc tomasse aes em seu projeto, com base emtudo o que conversamos at agora. E gostaria de me encontrar com voc de novo, digamos,daqui a um ms. Neste tempo eu vou acertar as coisas no meu novo departamento no Sul evoltar aqui para uma visita a um cliente. At l quero que voc pense bastante a respeito doque conversamos e procure agir seguindo seus instintos. Este primeiro projeto como se fosseum filho.... Quero v-lo crescer e se desenvolver.

    Um filho? Meu Deus.... Nem sobre a minha filha real eu tenho domnio, quanto mais comoutro filho. Conversando to mais fcil... Agora que ele precisava ir, eu comeava a sentirum frio na espinha de novo... Agradeci e deixei que partisse... Ele precisava voltar a arrumarsua mudana e eu j o tinha segurado tempo demais... Minha sensao era de ter aprendidomais do que em todo o meu tempo de faculdade. Alis, com este novo cargo de gerente, paraque mesmo serviu minha faculdade?

  • 7- Mos Obra

    No diga s pessoas como fazer as coisas. Diga-lhes o que fazer e deixe que elas o surpreendam com os resultados obtidos.

    GEORGE PATTON

    DUAS SEMANAS TINHAM SE PASSADO APS MINHA REUNIO COM PETRCIO. TINHA IDO EM BUSCA DERESPOSTAS E DESCOBRI QUE PREC ISAVA ANTES SABER FAZER AS PERGUNTAS CERTAS. NO SABIA AINDA SE EU SERIACAPAZ DE SER E FAZER TUDO AQUILO QUE CONVERSAMOS, MAS PELO MENOS TINHA ABERTO NOVAS PERSPECTIVASSOBRE GERNCIA DE PROJETOS. S O TEMPO IRIA DIZER...

    No dia seguinte conversa com meu mestre, voltei a me reunir com Juvenal. Masprocurei ter uma outra postura. Desta vez precisava agir como verdadeiro dono da situao.

  • Precisava demonstrar preocupao, mas ao mesmo tempo mostrar que sabia o caminho para asoluo (eu sabia?). E mais ainda, precisava faz-lo entender como poderia me ajudar, econsequentemente, o projeto e o cliente. Foi o que fiz... Juvenal me recebeu da formacarinhosa de sempre, mas desta vez me ouviu de outra forma. Ou talvez eu tenha meposicionado de outra forma. No importa. O fato que, na mesma hora, ligou para os gerentesdo Eric e do Fabio pedindo a liberao de ambos em tempo integral para o projeto. No foramtelefonemas exatamente amistosos, nem rpidos. Mas pude ouvir a conversa e entender o valorde um patrocinador poderoso em um projeto. Ambos os gerentes funcionais ofereceramprofissionais substitutos, mas eu no poderia, a esta altura, aceitar outros recursos que noaqueles dois. Eric e Fabio j estiveram l, o cliente os conhecia e eles j tinham todo ohistrico da anlise que fizeram. Enfim, eram os recursos de que eu precisava. Juvenal (quemdiria...) conseguiu a liberao deles para o projeto.

    Resolvi aproveitar o momento e pedi que ele me oficializasse como gerente do projeto.No somente para esses gerentes funcionais, mas para toda a empresa. Sentia que isso eraimportante. No s para mim, do ponto de vista psicolgico, mas tambm para que eu pudesseme posicionar melhor perante os demais gerentes da HAL. Ele questionou por que meuprprio gerente no havia feito isso, mas assumindo seu papel de patrocinador, ele o fez.Enviou e-mail para todas as gerncias funcionais informando. Tudo pode ser dito a respeitodo Juvenal, menos que ele no resolve as coisas de forma rpida e objetiva. Eu agora no sera gerente, mas estava anunciado como tal. E finalmente tinha uma equipe. Meu patrocinadorfoi eficaz. Meu encontro com a equipe seria no dia seguinte.

    Ambos se apresentaram na manh do outro dia. Fiz questo de me reunir no mesmo lugaronde anteriormente eu havia conversado com meu "guru". Ou seja, no caf. Conversamoscerca de duras horas sobre a situao do projeto. Eles me contaram o que j haviam feito, asdificuldades que haviam encontrado e quais deveriam ser os prximos passos. Aproveiteipara tirar tambm algumas dvidas minhas sobre detalhes do prprio escopo do projeto.Basicamente o projeto era composto de quatro fases: uma anlise do ambiente, planejamentopara instalao do sistema SAS501, a implantao em si e um perodo de testes e ajustes dosistema. Mas era um projeto relativamente simples, visto que o cliente j tinha uma redepreviamente instalada. De acordo com eles, toda a parte fsica (cabos, topologia, etc.) poderiaser aproveitada, com pequenas alteraes. Precisvamos apenas instalar a nova rede com baseem nossa soluo. A parte tcnica do projeto parecia no estar sob risco, segundo a opiniodeles. O que mais os preocupava era o prazo. Apesar de j terem feito a primeira parte

  • relativa anlise, um relatrio ainda no havia sido produzido, conforme prometi