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GESTÃO DA ESCOLA E PARTICIPAÇÃO ESTUDANTIL: EM
BUSCA DA DEMOCRATIZAÇÃO E DA QUALIDADE NA EDUCAÇÃO PÚBLICA
Autor: Helen Mara Silvério1
Orientador:Priscila Larocca2
Resumo
Este artigo expõe intervenção pedagógica sobre a gestão democrática da escola pública, tal como difundida pela Constituição Federal e pela Lei de diretrizes e Bases da Educação Nacional em vigor, bem como sobre o papel dos colegiados nesta gestão, com foco no Grêmio Estudantil. Destaca-se o papel dos movimentos estudantis, através de uma abordagem histórica e as principais manifestações dos estudantes nas esferas nacionais e locais. Embora, em esfera nacional, o movimento estudantil estivesse aliado às grandes lutas políticas no Brasil, lutavam também contra as reformas políticas na educação perpassando pelas formas de institucionalização e (re)institucionalização desses movimentos. Verifica-se uma modificação nas formas de mobilização entre as décadas finais do século XX e início do século XXI. Essas mudanças não sugerem desmobilização, mas novas formas de mobilização, em que os meios de comunicação e informação atuais influenciam grandemente. Por fim e, apesar de a instituição de ensino ter tomado o Grêmio Estudantil para si, sugere-se que os educadores utilizem desta situação de forma a desvelar o papel dos estudantes para além do assistencialismo e voluntariado instrumentalizando-os para uma participação propriamente política. Ao final, analisam-se criticamente as experiências vivenciadas durante as oficinas implementadas através do PDE – Programa de Desenvolvimento Educacional, na Escola Estadual Ana Divanir Boratto – Ensino Fundamental, salientando os avanços obtidos e as dificuldades a serem superadas.
Palavras- chave: Educação. Gestão Democrática. Grêmio Estudantil. Participação
Política
1. Introdução
1Pós-Graduação: Metodologia para o ensino da Matemática pela FACEPAL -, Graduação: Ciências:
Habilitação em Matemática pela FACEPAL, professora da educação básica na Escola Estadual Ana Divanir Boratto e Escola Estadual Medalha Milagrosa 2Pós-Graduação: Doutorado em Educação pela Universidade Estadual de Campinas – Unicamp,
Graduação: Pedagogia pela Universidade Estadual de Ponta Grossa – UEPG, professora efetiva do DEED – Departamento de Educação da Universidade Estadual de Ponta Grossa - UEPG
2
O presente artigo visa relatar e analisar criticamente a intervenção
pedagógica realizada como parte do Programa de Desenvolvimento Educacional –
PDE, que se realizou em uma escola pública no município de Ponta Grossa visando
a instrumentalização dos estudantes para a participação na gestão democrática da
escola pública.
O Programa de desenvolvimento Educacional – PDE é uma política pública
do Estado do Paraná cujo objetivo é ofertar aos docentes estaduais subsídios
teóricos e metodológicos para o redimensionamento da prática pedagógica e como
consequência a melhoria da qualidade do ensino da escola pública paranaense.
A participação dos docentes no programa tem a duração de dois anos. No
primeiro ano, os docentes da rede pública estadual aproximam-se das universidades
estaduais que tem o papel de orientá-los fornecendo bases teóricas e metodológicas
acerca dos fundamentos da educação e das especificidades das disciplinas
curriculares.
Ainda, faz parte do programa, o desenvolvimento de um projeto de
intervenção pedagógica numa escola pública estadual e a produção de materiais
didáticos pedagógicos a serem aplicados junto ao público alvo escolhido pelo
professor PDE. Para finalizar a proposta do programa cabe ainda a construção de
um artigo para expor os avanços atingidos com a intervenção pedagógica e os
limites enfrentados para a aplicação do projeto.
O projeto de intervenção pedagógica o qual este artigo faz referência
realizou-se na Escola Estadual Ana Divanir Boratto, no município de Ponta Grossa,
no segundo semestre de 2011.
A proposta do projeto teve como objeto de estudo a participação dos
estudantes nos rumos da escola através do Grêmio Estudantil, entendido este como
instância de gestão democrática com participação assegurada no Conselho Escolar.
A proposta de intervenção pedagógica foi transformada em um Projeto de
Extensão Universitária, que foi aprovada pela PROEX – Pró-Reitoria de Extensão e
Assuntos Universitários da UEPG – Universidade Estadual de Ponta Grossa,
coordenada pela professora Doutora Priscila Larocca, que atuou como orientadora
do programa PDE, junto a esta docente. O projeto contou com a participação de
vinte e seis (26) estudantes do Ensino Fundamental séries finais e teve a
3
participação do acadêmico Aldo Roberto Lemes Almeida, da quarta série de
Graduação em Pedagogia da UEPG como colaborador de sua implementação.
As atividades desenvolvidas com estudantes da Escola Ana Divanir Boratto
foram estendidas através deste projeto de extensão com a Universidade, haja vista,
a necessidade dos estudantes da educação básica chegarem à educação superior
críticos e politizados, o que pode fazer a diferença quando estes chegarem ao
mundo do trabalho tendo a clareza de como age a sociedade atual diante da massa
de trabalhadores.
Através deste projeto de extensão que relaciona a escola e a universidade
foi possível certificar os estudantes, este certificado é um instrumento que fará parte
do currículo destes estudantes.
Para se chegar à composição do Grêmio Estudantil da Escola Estadual Ana
Divanir Boratto houve a necessidade de instrumentalizar os estudantes acerca
dessa entidade e sua função na escola e na sociedade.
Assim, realizaram-se uma série de oficinas em que se desenvolveram as
atividades propostas no projeto de intervenção e descritas na produção didática
pedagógica.
O desenvolvimento das atividades do projeto contou com referencial teórico,
considerado como subsídio necessário para orientar o olhar sobre a prática
pedagógica. Neste sentido, este artigo também esclarece os autores que ofereceram
suporte ao professor PDE no seu objeto de estudo: “Gestão da escola e participação
estudantil: em busca da democratização e da qualidade na educação pública”.
Nas considerações finais deste artigo analisam-se os avanços obtidos junto
aos estudantes bem como os limites enfrentados durante intervenção pedagógica.
2. A Gestão Democrática da Escola Pública e a participação estudantil
A discussão sobre a gestão da escola pública passa por várias contribuições
que assinalam para a democratização das relações profissionais e sociais que
compreendem os sujeitos envolvidos no processo educativo. Essas contribuições
podem ser verificadas na literatura científica, as quais fazem referência às formas de
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gestão e às formas de participação na gestão escolar. Pode-se verificar essas
contribuições nas publicações de autores como Paro (2006), Oliveira (2006), Spósito
(2002), Hora (2006), entre outros.
O alicerce dessas contribuições é a Constituição Federal de 1988, em que a
gestão da escola pública é compreendida pelo viés democrático, como descreve o
artigo 206 e parágrafo VIII: “gestão democrática do ensino público, na forma desta
Lei”. (BRASIL, 1988, p.95).
Embora expressa na letra da lei, sabe-se que a gestão democrática de fato
não se tem concretizado no interior da escola pública, pois, nenhuma legislação é
capaz de garantir a efetividade das propostas, a não ser os sujeitos nela envolvidos.
A idéia de gestão democrática é complexa e requer aprofundamento teórico
e crítico, bem como assume entendimentos diversos em relação ao momento
econômico, político, social e histórico do estado.
É quase um lugar comum nas escolas, associar a compreensão de gestão
democrática à compreensão de gestão compartilhada, ou seja, proferir acerca de
gestão democrática, mas, agir de conformidade com a teoria da gestão
compartilhada. Ora, o sentido de cada uma delas é bastante diferente.
A gestão é dita democrática quando busca ampliar e aprofundar decisões
coletivas envolvendo nelas os profissionais da escola e a comunidade escolar. As
decisões democráticas são construídas na discussão entre os envolvidos e
interessados acerca daquilo que é melhor para a escola e para os estudantes,
pautadas nos objetivos educacionais e na realidade escolar.
A gestão é dita compartilhada quando reduz os processos decisórios da
participação coletiva. Estes ficam focados na escolha dos dirigentes e na busca de
parcerias, inclusive com instituições privadas, visando-se a solução dos problemas
imediatos da escola. A gestão assim pensada assume um papel eminentemente
gerencial. A participação coletiva é mínima e atém-se a adesão a decisões
anteriormente e externamente tomadas.
Para desfazer a confusão conceitual é imprescindível, como já foi dito, situar
o momento histórico do Estado, estabelecendo, entre os termos, relações com os
campos econômico, social e político. Assim, também é indispensável, aos sujeitos,
uma análise mais profunda sobre os conceitos de gestão democrática e de gestão
compartilhada, contando com referenciais teóricos.
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Além do conhecimento teórico cientifico, é necessário acrescentar, que isso
demanda dos sujeitos envolvidos no processo de gestão, uma prática que
corresponda a esses referenciais. Visto que “sem a transformação na prática das
pessoas” (PARO, 2006, p.19) à luz da teoria, as mudanças político pedagógicas não
terão consistência e tampouco serão transformadoras. De outra forma, as
possibilidades de mudanças na prática da gestão serão remotas.
A escola que almeja ser um espaço democrático precisa, antes de tudo, criar
espaços que possibilitem a participação efetiva da comunidade escolar. Uma
assembléia com os representantes de turma é um exemplo. Num primeiro momento,
talvez pareça ser uma tarefa difícil e que pode gerar muito barulho. Mas, aos
poucos, estes espaços de discussão começam a fazer parte do cotidiano da escola
e da cultura dos sujeitos envolvidos no processo educativo. A idéia é que, através da
criação desses espaços, a comunidade sinta-se parte integrante, organicamente
vinculada à escola. O que é bem diferente de simplesmente estar presente na
escola.
Nestes espaços, as informações que dizem respeito à escola podem e
devem ser socializadas como um direito de todos; são, também, nestes espaços que
decisões podem ser tomadas, sejam na criação ou na execução de programas,
projetos, enfim todas as ações que serão executadas na escola com fins
pedagógico, administrativo e financeiro (HORA, 2006).
Portanto, sem a socialização da informação e a socialização do poder
decisório, não existirão possibilidades para a criação de espaços mais democráticos.
Em conseqüência, o exercício democrático ficará comprometido e desse modo
comprometerá também a gestão democrática da escola.
A democracia, todavia, está além de uma virtude, de uma definição, de uma
origem etimológica, de algo idealístico. Para sua compreensão é imprescindível
admiti-la como um processo, como algo que se pratica, se edifica e reedifica, se
estabelece e se vivencia.
Pode-se exercitar a democracia através de uma reflexão crítica acerca da
realidade e trabalhar na criação de condições para transformar essa realidade.
Pode-se construir a democracia na criação de direitos, ou na criação de “novos
direitos” (CHAUÍ, 2001, p.11) necessários em uma sociedade dividida em classes,
condição alocada no sistema capitalista. Pode-se reedificar a democracia através do
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voto, seja para presidente da República, governador de Estado, diretor de escola.
Pode-se instalar a democracia através da ação das classes populares no controle
social do Estado e/ou da ação da comunidade no controle social na escola. Ou seja,
pode-se vivenciar a democracia participando da gestão pública e/ou da gestão da
escola.
Chauí (2001, p.10) explica que a democracia supõe “a passagem do poder
despótico privado [...] ao poder propriamente político como discussão, deliberação e
decisão coletivas realizadas em público, sob o direito e as leis”. E, sendo assim, não
se pode supor que a democracia seja um regime de consenso. Pelo contrário, a
democracia supõe trabalhar sobre os conflitos.
É nesse mesmo sentido que Coutinho (2002) compreende a democracia. No
entanto, este autor sugere o uso da expressão “democratização”, destacando-a
como processo crescente, que se difunde na socialização da participação política.
Dessa forma, segundo o autor, a democracia assume valor universal.
Ao expressar o sentido de democratização como valor universal percebe-se
que há a implicação da socialização da participação política. Esta não pode ser
agendada no sentido de que existe um determinado momento em que uma
determinada pessoa, ou mais pessoas, permitem que outras tomem decisões que
não passam por um amplo processo de discussão. A socialização da participação
política não deve ser confundida com uma reunião, onde uma ou mais pessoas
comunicam o que foi decidido e outras pessoas apenas colaboram para essa
decisão.
A socialização da participação política, do ponto de vista individual é,
prontamente, um processo dinâmico e inseparável do democrático. Somente se
realiza em sua plenitude quando está combinada com a socialização do poder. A
socialização é, ainda, instrumento que forma e transforma, proposital e
intencionalmente, a personalidade individual. Consiste em interação e integração
dos sujeitos sociais na sua totalidade.
A partir da idéia da socialização da participação política emerge a noção de
gestão democrática da escola, “significando a defesa de mecanismos mais coletivos
e participativos de planejamento escolar”. (BATISTA, 2007, p.402). Nestes
mecanismos coletivos e participativos de planejamento escolar está implícita a
participação da comunidade escolar como um todo.
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A comunidade escolar pode ser entendida como sociedade civil organizada,
pois, na esfera da escola, existem instâncias colegiadas representativas que se
organizam com o propósito de efetivar a participação no planejamento escolar nas
dimensões pedagógica, administrativa e financeira. A participação desses
colegiados, então, pode e deve ter caráter social e também caráter político. Segundo
Dore (2006, p.338), “a sociedade civil é o espaço de luta entre projetos sociais e
políticos”. Muitas vezes, os projetos são contraditórios, mas é dentro dessas
contradições, com posições conflituosas, que se faz necessária a discussão
argumentada cujo objetivo se pauta pelo bem estar da coletividade e busca de
acordos. É possível, portanto, apontar que é no conflito que os sujeitos sociais
exercem sua cidadania.
A cidadania, segundo Chauí (2001, p.12), “se constitui pela e na criação de
espaços sociais de lutas e pela instituição de formas políticas de expressão
permanente.” A cidadania, tal qual a democracia, está em constante construção,
donde se afirmam e reafirmam conquistas que contradizem a lógica social vigente: o
capitalismo, a globalização, a sociedade do consumo, a pós-modernidade, que
implicam o individualismo que impera na sociedade atual.
Ser cidadão pressupõe, portanto, que o sujeito possua conhecimentos
acerca de seus direitos e deveres civis, sociais, políticos e os exercite. Direitos e
deveres que vão além do indivíduo, que estão expressos na coletividade e nas
normas que regulam o bem comum. É a existência destas normas que permite o
funcionamento da ordem social. Todavia, conforme Chauí (2001), as normas
precisam ser reconhecidas pelos sujeitos e oferecer garantias de igualdade e de
liberdade aos cidadãos.
As noções de democracia, democratização, participação política,
socialização da informação e do poder e cidadania são alguns conceitos essenciais
para que se tenham condições de compreender a sociedade como está posta
atualmente. De outra forma, a compreensão da gestão democrática da escola não
ultrapassará os limites de uma gestão gerencial.
Sendo assim, é mister enfatizar que a idéia de Gestão Democrática está
para além da legislação, visto que a lei não é um fim, mas um meio para a
participação. Segundo Paro (2006, p.16):
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Parece faltar ainda uma maior precisão do conceito de participação. A esse respeito, quando uso esse termo, estou preocupado, no limite, com a participação propriamente dita, que é a partilha do poder, a participação na tomada de decisões. Isto não elimina, obviamente, a participação na execução; mas também não a tem como fim e sim como meio, quando necessário para a participação propriamente dita, que é a partilha do poder de participação na tomada de decisões.
O que o autor está enfatizando é que a participação na Gestão Democrática
da escola passa necessariamente pela partilha do poder. Mas, o que substancia
essa partilha de poder? A partilha de poder consiste numa participação ativa e
política ou numa participação ativa e colaborativa? Há que se ter clareza da forma
que assume a participação dos sujeitos.
Se a participação é do tipo ativa e política, então, cada uma das ações a
serem realizadas na escola, antes de serem executadas, passará por um amplo
processo de discussão, ao qual se segue a deliberação coletiva.
De outra forma, se a participação for do tipo ativa e colaborativa corre-se o
risco de formalizar as ações como mera participação na execução de tarefas,
embora a execução de tarefas não deva ser eliminada do processo de participação.
Mas, o que é mais importante, antes da execução, é a forma como se
deliberou sobre a necessidade de se executar uma ação. É essa forma que
representa a realidade da participação na tomada de decisões. E é essa forma que
vai determinar se a escola realmente é um espaço democrático ou não.
Assim, a gestão democrática escolar deve refletir a importância e a
necessidade da participação de todos os profissionais da escola e da comunidade
escolar nas decisões do seu cotidiano, sejam estas pedagógicas, administrativas ou
financeiras. O essencial é que se busque um compromisso coletivo, cujos resultados
sejam significativos para a educação. Esse compromisso efetiva-se ao levar em
consideração que “mais do que a integração da escola com a família e a
comunidade ou colaboração dos pais, é preciso entender essa presença como
mecanismo de representação política”. (SPÓSITO, 2002, p.49).
Se a gestão da escola é um processo coletivo, será no decurso desse
processo que a deliberação visará ao bem comum. Deste modo, a participação
passa a ter um caráter democrático, que irá para além do discurso, concretizando-se
em ações e decisões participativas de modo que cada envolvido se sinta
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responsável pela educação e, por conseguinte, pela sua transformação. Para tanto é
necessário ter a clareza de que:
A participação da comunidade na escola, como todo processo democrático, é um caminho que se faz ao caminhar, o que não elimina a necessidade de se refletir previamente a respeito dos obstáculos e potencialidades que a realidade apresenta para a ação. (PARO, 2006, p.17).
Ora, a comunidade escolar compreende em seu universo, entre outros, os
profissionais da escola, pais ou responsáveis e os estudantes. Os estudantes são os
sujeitos diretos e de direitos no processo educativo e tem, segundo o Estatuto da
Criança e do Adolescente, “direito de organização e participação em entidades
estudantis”. (BRASIL, 1990, p.18).
Nesse sentido, a gestão da escola, na sua expressão democrática, abrange,
entre outros elementos, a participação dos estudantes no processo de gestão, bem
como reconhece que o movimento e/ou organização dos estudantes é e está
implícito na democratização do poder decisório em suas diferentes categorias.
3. Principais expressões políticas do Movimento Estudantil na esfera Nacional
Embora o direito de organização de crianças e adolescentes em entidades
estudantis esteja exposto no Estatuto da Criança e do Adolescente a partir do ano
de 1990, anteriormente a esse período foi oficializado em 1985, o retorno legal dos
Grêmios Estudantis nas escolas, através da Lei Federal nº 7398/85.
Relacionando esta lei a outras leis, sabe-se que estas não surgiram
espontaneamente, mas fazem parte de um processo histórico de ações da
sociedade na luta pela conquista de direitos. No caso da legalização das entidades
estudantis, não foi diferente, sendo necessário proceder a uma retrospectiva
histórica destes movimentos e/ou organizações estudantis, pois, é bem marcante e
constantemente relembrada pela mídia e em diversos estudos científicos a trajetória
de movimentação estudantil na sociedade brasileira e no mundo.
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No Brasil, inicialmente, os movimentos e/ou organizações abrangiam,
sobretudo, os estudantes universitários. Posteriormente, os chamados estudantes
secundaristas, iniciaram movimentações e organizações, integradas aos primeiros.
Esta trajetória histórica compreende uma participação estudantil intensa em
momentos pontuais, como, por exemplo, na década de 1960, contra a política
imposta pelo regime militar, especialmente no ano de 1968. Conforme De Moraes
Freire (2008, p.134) “no Brasil, [...], o ano de 1968, [...] é um marco revelador do
potencial do movimento estudantil naquela época”.
Naquele momento histórico o movimento estudantil estava aliado a outros
setores da sociedade em oposição ao regime militar.
Na ocasião, houve inúmeros protestos e muitos deles motivaram ações
violentas por parte do governo militar que usou da sua força para fazer calar
estudantes e outros segmentos da sociedade. Ao constatar a força que possuíam
esses movimentos, bem como, o aumento do número de adeptos aos protestos e
temendo que as manifestações atingissem proporções incontroláveis, Costa e Silva,
no período de 1967/1969, militar e então Presidente do Brasil, instituiu o AI5 (Ato
Institucional nº 5).
O referido AI5, entre outras determinações, instituiu, arbitrariamente, as
seguintes determinações conforme De Moraes Freire (2008, p.136): “pena de morte
para os crimes políticos, prisão perpétua, fim das imunidades parlamentares,
transferência de inúmeros poderes do legislativo para o executivo”. Assim, toda
forma de manifestação contrária à política daquele momento foi considerada ilegal e
reprimida fortemente pelo AI5, durante o período do regime militar, que atingiu ao
seu ápice.
Com esse mesmo ato – AI5, conforme Gonçalves e Romagnoli citado por
González e Moura (2009, p. 377), “aumenta a repressão e a censura que resulta na
extinção das entidades estudantis, na prisão e no exílio de suas principais
lideranças”.
Dessa forma, a principal entidade de movimento de estudantes, a UNE -
União Nacional dos Estudantes, criada em 1937, foi colocada na ilegalidade. Apesar
disso, não deixou de manifestar-se. Cabe ressaltar que o movimento estudantil,
nesse período, devido às inúmeras repressões originadas no regime militar,
abrandou suas formas de combate a ditadura. A intensa repressão, o
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desaparecimento de alguns líderes, a prisão de estudantes que protestavam foram
alguns condicionantes que provocaram a desarticulação dos estudantes e de outros
segmentos da sociedade.
Todavia, conforme De Moraes Freire (2008, p.140), “Após um longo período
de paralisia forçada, o movimento estudantil parece renascer no ano de 1979,
quando as entidades estudantis começam a ser reativadas”. Mas, o movimento
estudantil não foi, a partir dali, mais o mesmo, pois após a abertura democrática no
Brasil a população testemunhou pouquíssimas manifestações advindas dos
estudantes na política nacional. Ao contrário da experiência anterior, afirma ainda a
autora, neste novo momento de mobilização e ação estudantil, grande parte de seus
participantes não foram os universitários como aconteceu na década de 1960, mas
sim estudantes do ensino médio, especialmente no movimento “Cara Pintadas” 3,
embora, segundo Cancian (2008) citado por De Moraes Freire (2008, p.141) esta
não foi “uma experiência típica do movimento estudantil brasileiro”.
Dois outros momentos contaram com a ampla participação estudantil na
política nacional brasileira. Esses momentos aconteceram nas décadas de 1980 e
1990.
A década de 1980 mostrou novamente a intensidade de força do movimento
estudantil. No ano de 1984, o movimento intitulado Diretas já!, contou com a
participação em massa dos estudantes das zonas urbanas. De modo semelhante ao
que ocorreu na década de 1960, essa movimentação esteve conjugada a outros
setores políticos e a sociedade civil. “Assim o movimento estudantil emerge para os
anos 1980 ampliando suas forças e lutas pela redemocratização do Brasil”. (DE
MORAES FREIRE, 2008, p.139).
A principal bandeira deste movimento foi sustentada por uma indispensável
democratização na escolha do principal dirigente do país: o Presidente da
República, considerando que, há vinte anos, desde o golpe militar em 1964, o
exercício democrático não era praticado pelos cidadãos brasileiros.
No entanto, a eleição direta para presidente da República viria a ser
realidade somente em 1989, embora, os militares tenham deixado o poder em 1985,
sendo o último militar presidente João Batista de Oliveira Figueiredo.
3 O movimento “Cara Pintadas” será explorado posteriormente.
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Na década de 1990, engajados às lutas nacionais, os estudantes
promoveram manifestações contra um governo corrupto. Esse movimento
denominou-se Caras Pintadas. O resultado dessa manifestação foi o Impeachment
do Presidente da República na época: Fernando Collor de Melo.
Todos estes movimentos destacam as maiores participações estudantis no
Brasil, que também foram as participações mais difundidas pela mídia. É possível
afirmar que foram momentos em que os estudantes tiveram como um dos propósitos
a luta política, que num primeiro momento voltou-se contra a Ditadura Militar, num
segundo momento a favor da democratização do país e eleições diretas para
Presidente do Brasil. E, num terceiro e último momento, contra a corrupção e a favor
do Impeachment do Presidente Fernando Collor de Melo.
Embora um dos focos, nesses momentos citados, fosse a luta política é
pertinente ressaltar que a luta pela educação foi, e ainda talvez seja, o principal
elemento mobilizador dos estudantes.
4. Educação: Objeto de mobilização e/ou ação dos estudantes
Nas lutas nacionais, ou no interior das universidades, os estudantes
manifestaram-se e manifestam-se tendo como princípio discutir a educação.
Tais manifestações envolveram várias discussões que se alternaram entre
reformas educacionais, do período anterior à Ditadura Militar até os dias atuais, bem
como, visaram realizar ações que não diziam respeito diretamente às políticas
educacionais, porém estiveram conectadas a estas devido ao objetivo de
mobilização. Objetivos como esses podem ser exemplificados, conforme indica De
Moraes Freire (2008), por “[...] uma campanha pela melhoria da alimentação
fornecida aos estudantes pobres [...]”.
Na década de 1960, um dos principais agentes mobilizadores dos
estudantes, foi, o que se chamou de crise universitária. “Esta consistia no
descontentamento dos alunos que pressionavam a universidade para dar-lhes ‘um
lugar ao sol’” (FREITAG, 1980, p.84), ou seja, havia uma demanda grande de
estudantes que queriam adentrar a universidade, porém o número reduzido de
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vagas nas diferentes graduações, juntamente como o processo altamente seletivo
do vestibular, impedia que todos tivessem acesso à continuidade dos seus estudos.
Foi um período de grandes manifestações que demandavam por vagas
educacionais.
Contudo, percebe-se nesses movimentos e/ou ações estudantis, a
existência de uma alternância entre períodos de participação intensiva e períodos de
quase inexistência de participação. Para Bringel (2009), as movimentações
promovidas pelos estudantes correspondem a ciclos participativos cujas ações, são,
às vezes, alimentadas pela ação de outros movimentos sociais.
No século XXI, ainda não houve manifestações de cunho nacional advindas
do movimento estudantil. Mas, isto não significa que estas deixaram de existir no
interior das universidades. Fatos expressivos, por exemplo, aconteceram nos anos
de 2007 e 2008.
Em 2007, conforme De Moraes Freire (2008), os estudantes ocuparam a
reitoria da Universidade de São Paulo. O contexto dessa manifestação esteve
ajustado aos rumos que a ideologia neoliberal configurou para a política educacional
nas universidades públicas. Essa ocupação desencadeou situações semelhantes
em várias outras universidades no Brasil.
No ano de 2008, os protagonistas do movimento estudantil procederam da
Universidade de Brasília – UnB. Nesse contexto, o fator predominante foi a
corrupção no interior da instituição. Inconformados com os escândalos, e tal como
os universitários da USP, os universitários da UnB, invadiram a reitoria em uma ação
que resultou na renúncia do reitor. Para De Moraes Freire (2008, p.144): “A luta dos
estudantes da UnB levantou bandeiras capazes de denunciar os efeitos perversos
do modelo privatista da Universidade Pública”.
Pode-se perceber um diferencial entre as lutas estudantis do século XX e do
século XXI. Segundo Cancian (2008) citado por De Moraes Freire (2008, p.141):
O movimento estudantil sofreu uma inflexão no final dos anos 70, quando passou a ser liderado por militantes das organizações de esquerda que priorizavam as reivindicações políticas em detrimento das demandas educacionais. Essa subordinação à agenda política conduziu aos protestos desse período em defesa das liberdades democráticas, mas provocou um longo refluxo, que persiste até hoje, em razão do distanciamento da maioria dos alunos.
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No século XX, as organizações estudantis eram fortes, possuíam líderes que
os representavam, possuíam ideologia unitária. Na década de 1960 tinham ideologia
de esquerda – socialista e estavam unidos à política nacional. Nas décadas de 1980
e 1990 muitos estudantes filiaram-se a partidos políticos e se utilizaram delas para
representarem suas ações. Ainda que o foco principal estivesse na política nacional,
não deixavam de expressar ideologias partidárias para as políticas educacionais.
Nos movimentos do início do século XXI, embora caracterizadamente locais,
houve certa inversão no que diz respeito à organização em entidades. Para Bringel
(2009), além do novo caráter das ações dos estudantes, por exemplo, a ocupação
das reitorias da USP e da UnB, neste último ciclo de movimentação estudantil
questiona as organizações e mobilizações das décadas anteriores. Nesse contexto,
a tecnologia contribuiu enormemente, socializando a informação de forma
instantânea. Além disso, existe um novo “ser” em processo alimentado pela
ideologia da pós-modernidade. Nesse sentido, pode-se dizer que a forma de
mobilização dos estudantes, na primeira década deste século, sofreu alterações
radicais em relação às que foram frequentes na década de 1960. Ou seja, há uma
nova forma de expressão do movimento estudantil. Segundo Bringel (2009, p.111-
112), esta forma de expressão caracteriza-se,
ante a centralização, hierarquização e partidarização das lutas estudantis [...] aparece um formato mais “movimentista”, no qual primam: maior democratização da informação e da comunicação [...]; Maior horizontalidade na deliberação [...]; Ausência de um líder definido [...]; Certo grau de imprevisibilidade.
Mediante tais características pode-se perceber uma maior fragilidade na
relação entre os estudantes quanto às formas de institucionalização, tanto das
entidades estudantis, quanto dos partidos políticos, um tanto mais concreto nas lutas
do século anterior. Outra diferença ocorre nos processos de informação e
comunicação entre os estudantes que são promovidos pelo uso da internet: a
rapidez com que se propagam as notícias e a rapidez com que estas promovem a
mobilização. Hoje, as lideranças desses movimentos já não estão mais
representadas apenas por “um” sujeito. Trata-se de uma liderança que varia entre os
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indivíduos envolvidos no processo de mobilização, o que de certa forma impede a
verticalização das decisões.
A despeito de todas essas mudanças, é importante observar que os
movimentos de outrora, bem como os movimentos atuais, ainda persistem no foco
mais antigo dos movimentos estudantis: A educação. Embora em contextos distintos
e formas também distintas de movimentação, organização e representação estes
movimentos não deixaram de exprimir objetivo comum de melhorar e democratizar a
educação.
5. Os movimentos estudantis e as novas formas de institucionalização
Com a progressiva abertura democrática no Brasil, nos anos finais da
década de 1970 e início da década de 1980, as entidades estudantis puderam ser
reativadas em diversos níveis: nacional, estadual e municipal incentivando-se,
assim, o retorno dos Grêmios Estudantis às escolas de ensino fundamental e médio.
O retorno dos Grêmios Estudantis foi garantido pela Lei Federal nº
7398/1985 e Lei Estadual nº 11.057/1995, no Paraná.
Tal reorganização dos estudantes em entidades representativas não se deu
ao acaso e não pode ser vista de modo desvinculado ao contexto político,
econômico e social.
Ora, uma análise linear da simples legalização das entidades estudantis,
pode ser interpretada como significativa expressão democrática. Mas, de outra
forma, se a análise se der sob outros condicionantes, tais como o momento
econômico ao final do período ditatorial e a política de reforma do Estado nos anos
1990, pode-se tratar de uma das muitas estratégias para efetivar a minimização do
papel do Estado nas políticas sociais.
É preciso entender que movimento estudantil difere de organização
estudantil. Segundo Bringel (2009), o movimento estudantil assume tal caráter
quando não estiver institucionalizado, do contrário, não será um movimento e sim
uma organização estudantil.
16
Neste sentido, quando nos referimos ao movimento estudantil, através das
instituições nacionais, estaduais e municipais e no âmbito da escola, estamos nos
referindo à organização estudantil. Estas organizações se materializam na UNE –
União Nacional dos Estudantes, na UBES – União Brasileira dos Estudantes
secundaristas e na verticalização destas entidades em níveis estadual e municipal.
Na esfera da escola, a organização dos estudantes é conferida aos Grêmios
Estudantis. Embora essa organização devesse originar-se da aspiração dos
estudantes sem influência de qualquer natureza, percebe-se que, durante a reforma
política do sistema educacional no Brasil nos anos 1990, essa ação ocorreu ao
contrário.
É possível verificar esta dinâmica na proposta do Governo do Estado de São
Paulo, por exemplo, em 1998, quando, segundo González e Moura (2008), a
Secretaria Estadual de Educação elaborou um documento incentivando a
constituição dos Grêmios Estudantis e, ainda, propondo o “papel” que deveriam
exercer, ou seja, definindo para os estudantes qual a função social que esta
entidade teria na escola. Entre outras sugestões, o documento aborda
implicitamente ações voluntárias e assistencialistas como forma de solução para
situações imediatas da escola. Não obstante, o Estado do Paraná adotou proposição
semelhante.
De certa forma, trata-se de um processo de cooptação que contradiz e
descaracteriza a trajetória histórica e política dos movimentos ou das organizações
estudantis no Brasil.
Considera-se que, sob esse contexto, houve uma (re)institucionalização do
Grêmio Estudantil, ou seja, num primeiro espaço de tempo, a organização dos
estudantes nas entidades nacionais, estaduais e municipais, já caracteriza uma
institucionalização e num outro momento a escola institui o Grêmio Estudantil como
um segmento próprio.
Tal institucionalização do Grêmio Estudantil pela escola, conforme Gonzáles
e Moura (2008), tende a um esvaziamento na construção dos sujeitos do ponto de
vista de sua humanização. Ora, e o que é o sujeito humanizado?
Para compreender isso é preciso ter em conta que o processo de educar
humaniza o homem, como afirma Saviani: “o objeto da educação diz respeito [...] à
17
identificação dos elementos culturais que precisam ser assimilados pelos indivíduos
da espécie humana para que eles se tornem humanos” (1992, p.21).
Portanto, o sujeito humanizado é aquele que assimila e identifica os
elementos culturais desenvolvidos ao longo da história da humanidade. Estes
elementos culturais são fundamentais para compreender o mundo e suas
complexidades sociais.
É possível afirmar que a institucionalização dos Grêmios Estudantis dá
suporte para contribuir com essa humanização? Ao se definir, no âmbito das
Secretarias de Educação através de documentos institucionais, a função social do
Grêmio Estudantil, se está a contribuir para a humanização dos estudantes? Ao se
incentivar os estudantes para ações voluntárias, trabalho solidário, bem como ser
“assistente” da escola tem-se contribuições para a humanização?
Uma análise crítica da atual política educacional nacional revela que os
organismos internacionais investem cada vez mais fundos e ditam as regras para a
formação de “um tipo de ser social cuja escolaridade deverá propiciar sua
adaptação, empregabilidade e as competências e habilidades necessárias para o
enfretamento da realidade em curso” (GONZÁLEZ; MOURA, 2009), permitindo
responder negativamente às questões anteriores. Implícita nesta política está,
portanto, não a humanização, mas, a manutenção da lógica de mercado, fator
fundamental do sistema capitalista.
Para Marx, (2004, p.13), “a essência do sistema capitalista está, pois, na
separação radical entre o produtor e os meios de produção”, assim, a sociedade se
divide em classes, em que predomina o poder da classe burguesa, embora em
menor número de representantes, mas, detentora dos meios de produção e da
manipulação desses meios para produzir os lucros que lhe mantém.
Do outro lado, está o produtor, pertencente à classe proletária, em maior
número de indivíduos, porém sem condições culturais e econômicas para sobrepor-
se a minoria. Estes, desprovidos dos meios de produção, tem somente a força de
trabalho para produzir sua existência. Sendo assim, aos expropriados dos meios de
produção restou submeter-se aos expropriadores. Nessa relação, os lucros ficam
nas mãos de quem não produz e não são divididos entre os assalariados. Aos
produtores resta o salário, que não faz parte da divisão do lucro.
18
Dessa forma, prevalece a lógica mercadológica que se estende para as
diferentes organizações e instituições na sociedade de forma que esta passa a crer
nesta lógica como se fosse um processo natural. Esta naturalização das relações de
trabalho é um dos muitos objetivos do sistema capitalista.
Assim sendo, a escola, que compõe a estrutura social, também reproduz a
lógica do mercado nas concepções pedagógicas das políticas educacionais.
5. O que fazer diante da Institucionalização do Grêmio Estudantil?
A institucionalização dos Grêmios Estudantis é um acontecimento e está
cada vez mais disseminada no Brasil.
No entanto, crer que a institucionalização dos Grêmios Estudantis e a
naturalização do voluntariado e do assistencialismo provocada, em partes, pela
ideologia neoliberal muito presente na sociedade e, em outra parcela, na política
educacional regulamentada pelas reformas educacionais na década de 1990, sejam
imutáveis e cristalizadas, estará se considerando que a “alienação”, provocada e
construída no sistema capitalista e atualmente reforçada em bases neoliberais, é
parte orgânica do jovem.
Para Silva (2005, p.101), “a idéia de alienação consiste em um mundo do
fetiche, do manipulado, da falsa realidade e da aparência, em contraposição ao
mundo da essência”, isto é, a realidade objetiva é manipulada convertendo-se em
uma pseudo-realidade, em que o que parece real e natural é, na verdade, forjado.
A alienação também pode ser entendida como uma das diversas facetas da
política neoliberal aliada à ideologia pós-moderna. Trata-se de transferir para a
sociedade a resolução imediata de problemas sociais. Entre tais soluções estariam
ações assistencialistas e voluntárias como forma de minimizar as mazelas sociais.
Dessa forma, as desigualdades sociais passam a ser vistas como processos
naturais, desviando assim, a atenção dos sujeitos sociais, do real agente promotor
dessas desigualdades: o sistema capitalista.
De outra forma, pode-se avaliar que, embora a alienação seja realidade no
contexto social, necessariamente, não é permanente, basta que se tome consciência
19
dela, conforme Chauí (1999, p.512) citada por De Moraes Freire (2008, p.145) “algo
que os homens fazem em condições determinadas, ainda que não o saibam e que
podem deixar de fazer se, tomando consciência delas, decidirem-se organizar contra
elas”.
Isto significa que, apesar da institucionalização dos Grêmios Estudantis,
apesar de os instrumentos fornecidos pelas Secretarias de Educação estabelecendo
a função social dos alunos, apesar da ideologia pós-moderna estar extremamente
presente na sociedade, estas situações não são permanentes ou imutáveis. A
situação social atual só poderá ser mudada se se desvelarem as formas de
ocultação da realidade concreta.
Embora a institucionalização do Grêmio Estudantil seja um acontecimento e
o fato de existirem instrumentos que, de certa forma, reforçam as ações da entidade
enquanto “mera ajudante” da escola, é possível que essas ações assumam outras
configurações. Nesse sentido, defende-se que é possível proporcionar espaços e
elementos que instrumentalizem os estudantes e que neles desenvolvam melhores
condições para olhar a realidade mais criticamente.
Um desses espaços é o Grêmio Estudantil, espaço que, teoricamente,
oferece condições para participação política na escola.
Assim, cabe ressaltar que a participação política é um exercício democrático,
de transformação social e de práticas de cidadania. A participação política é também
papel e objetivo da escola democrática. Todavia é imprescindível que os
profissionais da educação igualmente as tenham desenvolvido, pois, “ninguém dá o
que não tem” (CHAUÍ, 2001, P.12). Em outras palavras, se o educador ambiciona
alunos críticos, tem que sê-lo também; se espera alunos participativos, deve sê-lo
também. Só há conquista democrática, cidadã, na medida em que se convive com
sujeitos que tragam consigo atitudes democráticas e atitudes cidadãs.
Entretanto, apesar da existência desse espaço estar garantida de forma
legal, visto que o estatuto do Conselho Escolar (PARANÁ, 2008) garante assento ao
Grêmio Estudantil em sua composição, parece faltar uma visão crítica dos fatos que
provoca alienação dos sujeitos envolvidos no processo educativo para que isto se
torne uma realidade. É esta alienação que o Projeto aqui apresentado pretendeu
romper.
20
6. As intervenções diante das reflexões teóricas
O referencial teórico contido neste artigo contribuiu para a construção da
metodologia e dos temas a serem colocados em discussão junto aos estudantes
durante a intervenção pedagógica como uma das muitas formas de desenvolver a
criticidade diante dos aspectos econômico, social, político e cultural nos quais a
escola está inserida, pois, esta reflete a sociedade.
Sendo assim, a intervenção foi feita na forma de oficinas em contraturno. Os
estudantes de toda a escola foram convidados a inscrever-se nas mesmas.
Foram realizadas oito oficinas obedecendo as seguintes temáticas:
Apresentação da proposta, objetivos, dois episódios do filme Crianças Invisíveis;
Democracia e Cidadania: Criança e Adolescente também são cidadãos?; História do
Movimento Estudantil; Estatuto da Criança e do Adolescente – Exposição;
Conhecendo o Estatuto do Conselho Escolar e o lugar do Estudante nesta Instância
Colegiada; O Grêmio Estudantil e a participação política na Gestão Democrática da
Escola; Construindo o estatuto do Grêmio Estudantil e definindo propostas para o
Grêmio Estudantil da Escola Estadual Ana Divanir Boratto; Montagem de chapas
para eleição e síntese das ideias desenvolvidas no curso.
Finalizando os trabalhos houve a eleição para o Grêmio Estudantil.
Iniciou-se os trabalhos com a oficina um (1) em que se apresentou a
proposta do projeto de intervenção, a qual discrimina a importância da participação
dos estudantes na gestão da escola e as consequências dessa participação na
sociedade e os objetivos desse trabalho, dentre os quais está a constituição do
Grêmio Estudantil na escola.
Esclarecidas a proposta de trabalho e os objetivos, deu-se continuidade à
oficina. Nesta continuidade os estudantes assistiram a dois episódios do filme
Crianças Invisíveis. Os vídeos nortearam as discussões acerca da problemática
social que se estende para além do Brasil. Partindo dessa problemática foi possível
colocar em discussão problemas sociais, econômicos e políticos que afetam a
sociedade. Após as discussões foram lançadas questões para debate como:
Em algum momento do vídeo, João e Bilú estiveram na escola? Explique.
Que atividade tomava o tempo das crianças? Justifique.
21
Em sua opinião, as crianças deveriam estar onde? Para quê? Por quê?
Ciro é um menino italiano. Que papel ele desempenha no vídeo?
Observando Ciro podemos saber que é um adolescente. A atividade dele no
vídeo é atividade de um adolescente? Por quê?
Onde ele deveria estar? Explique.
Em resposta a esses questionamentos os estudantes, em síntese,
responderam que lugar de criança e adolescente é na escola, mas que por via de
forças contrárias como problemas com a família, baixo poder econômico,
adolescentes como os personagens dos dois episódios acabam por tomar outros
rumos, rumos estes que distanciam cada vez mais o cidadão adolescente da escola.
Num segundo momento, a discussão permeou conceitos de cidadão,
cidadania e democracia partindo de conceitos construídos historicamente os quais
dependem de orientação teórica e posição filosófica diante da atual conjuntura da
sociedade.
A partir desta exposição e das várias contribuições dos estudantes em
referência ao assunto tratado foi lançada o seguinte questionamento: Criança e
adolescentes também são cidadãos?
Pode-se dizer que houve compreensão a respeito da questão, pois se
obteve algumas respostas como: “Sim. Porque eles nascem no meio de uma
comunidade e não estão sozinhos”, ou então, “Sim, pois adolescentes e crianças
também tem direitos e deveres a cumprir. Em todos os lugares há regras a cumprir,
sem essas regras o mundo vira bagunça”. Outra resposta que se conseguiu foi:
“Sim, porque todos nós somos cidadãos e temos o direito e o dever de fazer um
mundo melhor”, ou “Sim, porque eles também têm seu direito de liberdade e também
de dever”. Ainda, “Sim, porque têm direitos e deveres que devem ser respeitados.
Todos são cidadãos. Todo mundo que vive em sociedade tem deveres para cumprir
e direitos para serem respeitados”. Em síntese as crianças e os adolescentes que
participaram das oficinas se reconhecem como cidadãos.
O terceiro momento de encontro com os estudantes para a implementação
do projeto foi uma aula expositiva sobre a História do Movimento Estudantil no
Brasil. Essa aula contou a história das principais expressões do movimento
estudantil no Brasil e que foi foco da mídia. Porém, não foram descartados desse
22
histórico, momentos pontuais de movimentação dos estudantes dentro das
Universidades.
Discutiu-se nesta oficina, além da história das manifestações estudantis
junto à sociedade organizada, as músicas4 que foram criadas por artistas tendo
como foco principal a Ditadura Militar imposta à sociedade brasileiro da década de
1964.
Ao final da oficina assistiu-se a um vídeo sobre a História do Movimento
Estudantil. Através do vídeo foi possível visualizar as cenas e os personagens que
fizeram parte daqueles momentos históricos.
A quarta oficina, através de exposição dialogada teve como objeto de
discussão o Estatuto da Criança e do Adolescente – capítulo IV Do Direito à
Educação, à Cultura, ao Esporte e ao Lazer.
Procedeu-se a leitura dos artigos do capítulo IV do Estatuto da Criança e do
Adolescente observando o direito, o acesso e a permanência na educação bem
como ao direito de organizar-se e participar de entidades estudantis.
Cabe destacar que nos momentos de diálogo foi imprescindível alertar aos
estudantes que todos têm direito de estar na escola, no entanto o direito de um
estudante confronta-se com o direito de outro estudante.
O quinto encontro dispôs-se a debater sobre o Estatuto de Conselho Escolar
considerando este como a instância de gestão com poder decisório nos rumos da
escola e situando o estudante neste colegiado como um dos personagens de
deliberação.
O Conselho Escolar é um órgão deliberativo, consultivo, avaliativo e
fiscalizador que, teoricamente, atua sobre a organização e realização do trabalho
pedagógico e administrativo da escola para o cumprimento da sua função social
(PARANÁ, 2008). Este colegiado é constituído pelos seguintes conselheiros que o
compõem:
o diretor, um representante da equipe pedagógica, um representante da equipe técnico-administrativa, um representante da equipe auxiliar operacional, um representante dos pais de alunos e/ou responsáveis, um representante do Grêmio Estudantil e/ou alunos, um representante da APMF e um representante dos movimentos sociais organizados da comunidade (PARANÁ, 2008, p.14).
4 Músicas de Chico Buarque de Holanda: Cálice, Apesar de você. Música de Geraldo Vandré: Prá não dizer que não falei das flores.
23
Destaca-se assim, que como instância de gestão, o Conselho Escolar
garante assento aos estudantes e se a escola possuir um Grêmio Estudantil
constituído legalmente, o presidente da entidade é o representante legal do
segmento dos estudantes no Conselho.
A partir destas informações solicitou-se aos estudantes que respondessem
às seguintes perguntas:
Os alunos podem influir para mudar alguma coisa na escola? Como?
Alguns retornos a esse questionamento foram: “Sim, montando Grêmios
Estudantis e dando suas opiniões”, “Sim, conversar com o Conselho Escolar e
escutar outras pessoas”. Outras respostas foram similares a estas.
Deste modo, é possível afirmar que os estudantes conseguiram
compreender a mensagem, cuja intenção era exatamente de despertar o interesse
para uma participação mais efetiva no Grêmio Estudantil e no Conselho Escolar.
Com a participação dos alunos nas decisões, será que a escola será um
local melhor? Por quê? Em resposta a essa questão, selecionaram-se algumas, tais
como: “Sim, porque eles vão opinar e dizer o que está bom e o que está ruim na
escola”, Sim, porque eles podem fiscalizar e ver o que precisa melhorar”, ou “Sim,
porque os alunos também tem o direito de dar suas opiniões e os alunos convivem
no local”. Há dois retornos interessantes para se destacar, pois remetem ao caráter
democrático na forma de gerir a escola: “Sim, porque seria democrático e justo ouvir
os alunos” e “Sim, porque nós participaríamos melhor das decisões e nos
comunicaríamos melhor com a diretora”.
Diante das respostas dos alunos foi possível verificar que os
esclarecimentos acerca de documentos que norteiam a gestão da escola são
importantes para construir a gestão democrática na escola com a participação
efetiva dos estudantes. Sem que isso onere os profissionais da escola. Tal
participação não deve ser vista como um contraponto e sim como um elemento vital
para que a escola dialogue com todos os seus segmentos. É esse diálogo que,
talvez possa ser conflituoso em certos momentos, que permite o desenvolver de
uma consciência política dos sujeitos envolvidos no processo educativo. Mas, Qual é
a participação dos alunos nas decisões da escola?
Esse ponto dos questionamentos foi unanimidade entre os participantes das
oficinas, pois todos afirmaram que os alunos não participam das decisões, ou seja,
24
são apenas comunicados sobre elas. Ainda que em tempos atuais, através da mídia
veem-se diversas formas de participação nas decisões nas mais diversas
organizações, é, ainda uma realidade presente nas escolas, a ausência da
participação efetiva dos estudantes na gestão democrática da escola pública.
Para ilustrar tal constatação, em resposta à questão os estudantes
colocaram que: “Geralmente os alunos não participam de certas decisões”, “Hoje
ainda não, mas se tudo der certo pretendemos participar”.
Na sexta oficina o objeto de discussão passou propriamente pelo Grêmio
Estudantil, ou seja, discutir o papel do Grêmio Estudantil e a participação política na
gestão democrática da escola. Nesta oficina foram necessários esclarecimentos
sobre o que é o Grêmio Estudantil, como formar um Grêmio Estudantil, quem pode
participar do Grêmio Estudantil, quais os possíveis objetivos de um Grêmio
Estudantil, qual a finalidade de a escola possuir um Grêmio estudantil.
Nesse processo, foi possível verificar os estudantes participantes do projeto
desconheciam quase completamente a função de um Grêmio Estudantil, ou tinham
apenas uma ideia superficial da entidade.
Para verificar os avanços nesta oficina foi solicitado aos estudantes que
respondessem à questão: Quais as possibilidades de ação dos Grêmios para qual
escola, qual sociedade, qual mundo e para quais jovens?
Com o intuito de verificar um avanço na politização dos estudantes, haja
vista, as temáticas anteriores trabalhadas, verificou-se que ainda há muito que se
esclarecer, pois as respostas giraram em torno de promoções culturais, eventos
esportivos, informações a direção sobre determinados problemas que ocorrem na
esfera da escola, entre outros, no entanto com a mesma similaridade.
É claro que não se pode descartar tais possibilidades de ação, todavia não
devem ser o único foco da atuação de um Grêmio Estudantil. Ilustra-se essa
afirmação com os seguintes relatos: “Sim, promovendo eventos culturais, palestras,
reuniões, festas, eventos e etc., assim tiram as pessoas de confusões, brigas” ou
“promovendo reuniões, promovendo eventos para tirar as crianças e adolescentes
da rua e convidando-os para a escola”.
Apesar dessa constatação, deu-se continuidade aos trabalhos e iniciou-se a
penúltima atividade proposta na intervenção pedagógica: a construção coletiva da
minuta do Estatuto do Grêmio Estudantil, utilizando-se dos subsídios para
25
elaboração do Estatuto do Grêmio Estudantil produzido pela Secretaria de Estado de
Educação.
Essa minuta foi apresentada ao corpo discente da escola durante uma
assembleia em que foi feita a leitura de cada artigo com aprovação em votação
aberta.
Ao final, obteve-se, então, o Estatuto do Grêmio Estudantil da escola
Estadual Ana Divanir Boratto.
Com o estatuto aprovado, pode-se proceder à composição das chapas para
concorrerem à eleição do Grêmio Estudantil.
Os estudantes reuniram-se com seus pares, e após um período de
discussão houve a apresentação de quatro chapas. Posteriormente procedeu-se as
inscrições dessas chapas e lançou-se a campanha eleitoral.
O prazo para efetivar a campanha foi de uma semana, durante a qual os
estudantes apresentaram-se como candidatos. É necessário destacar que as
propostas das chapas concorrentes giraram em torno da participação nas reuniões
do Conselho Escolar e na promoção de eventos na escola.
O último encontro desta proposta de trabalho foi a eleição propriamente dita
do Grêmio Estudantil. Nesse processo, a mesa eleitoral foi composta por estudantes
que não estavam envolvidos nas candidaturas. Os votos do corpo discente foram
secretos através de cédulas eleitorais e depositadas em urna construída pelos
integrantes da mesa eleitoral.
A eleição ocorreu tranquilamente em todos os turnos da escola. Ao final do
período de eleição procedeu-se à contagem dos votos pelos mesários sempre
acompanhadas por um integrante de cada chapa concorrente.
Assim, criou-se o Grêmio Estudantil da escola, obedecendo-se
rigorosamente as regras do estatuto construído coletivamente.
Paralelamente à implementação do projeto na escola, o professor PDE
atuou como tutor no Grupo de Trabalho em Rede – GTR, outro critério para
participar do Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE. No GTR,
inscrevem-se profissionais da educação para participarem das discussões acerca do
projeto proposto pelo professor PDE. Esta é considerada uma das vias de formação
continuada dos professores realizada à distância, pois a comunicação entre tutor e
alunos (outros professores da rede pública) se dá via online.
26
O GTR propiciou algumas discussões e esclarecimentos sobre participação
estudantil nos rumos da escola e da sociedade. Alguns participantes reconheceram
o quão importante é a participação dos estudantes na Gestão da escola, no entanto
também colocaram as dificuldades de obter essa participação, pois, se enfrentam
dificuldades em conscientizar estudantes como a direção da escola, que, talvez por
desconhecimento, não veem o Grêmio Estudantil como um aliado da gestão e sim
como organização de resistência à direção da escola.
Sendo assim, foi imprescindível nortear as discussões sobre esses dois
aspectos para desmistificar essa visão arraigada e assim minimizar esse ranço
construído historicamente sob bases autoritárias de senso comum.
7. Considerações finais
A partir da análise histórica da participação estudantil nos rumos da
educação brasileira percebeu-se que o “arrefecimento” dos movimentos e/ou
organizações estudantis aconteceram sob determinadas circunstâncias. Essas
circunstâncias fazem parte de um cenário amplo, porém não se podem
desconsiderar as especificidades.
Pode-se dizer que, o período da Ditadura Militar no Brasil, com o decreto do
AI5 no ano de 1968 e a intensa repressão gerada por este ato, desmobilizou tanto a
sociedade em geral quanto os estudantes, que perduraria por um período de tempo
relativamente grande. Para Bringel (2009, p.109) foi “um período de clandestinidade
e exílio, em que a repressão e o arbítrio seriam a tônica dominante”.
Por outro lado, no governo militar de Ernesto Geisel, no período de
1974/1979, houve certo relaxamento na repressão. Foi quando os movimentos
estudantis encontraram maiores possibilidades de rearticulação.
Entre os períodos dos governos militares Costa e Silva e Geisel, ou seja,
entre a profunda coerção de um governo e as possibilidades de rearticulação dos
movimentos sociais proporcionada pelo outro, pode-se apontar algumas
transformações que transitaram da aguda oposição à negociação entre os atores.
De Moraes Freire (2008, p. 138, grifo nosso) analisa essas variações:
27
No desenvolvimento da resistência democrática, esses movimentos foram ganhando características comuns e diferenciadas, conforme sua prática social e política. Saudados por alguns analistas nos anos 70 como a nova face da sociedade civil, como novos sujeitos sociais; criticados por outros, nos anos 80, bem como nos anos 90, como meros grupos de pressão articulados por lobbies com interesses político/partidários e/ou religiosos; o fato real é que os movimentos sociais inscreveram em leis e projetos institucionais suas demandas e lutaram por espaços democráticos junto aos órgãos públicos.
Ainda que os movimentos sociais, incluindo os movimentos estudantis,
tenham adotado formas diversas de enfrentamento ante as diferentes realidades
sociais, econômicas e políticas brasileiras é possível apontar avanços nas questões
pelas quais lutaram e lutam. No caso específico do movimento estudantil, ainda há
muito que se desenvolver, porém não se pode colocar no descrédito o potencial da
juventude em termos de mobilização e conquista, sejam elas pontuais ou não. O
movimento estudantil possui peculiaridades ou conforme diz Bringel (2009, p.102) é
“sui generis”.
Com base nestas argumentações, embora reconhecendo que hoje a escola
se volta para institucionalizar o Grêmio Estudantil, através das ações das
Secretarias de Educação, cogita-se que pode haver possibilidades de ampliar a
participação dos estudantes na gestão da escola, através de intervenções como a
descrita neste artigo, cuja tônica vai para além de ações voluntárias e
assistencialistas junto à direção e propondo uma participação política efetiva, em
que os alunos sejam sujeitos da Gestão Democrática escolar.
Podemos dizer que a intervenção teve resultados positivos junto ao público
que participou das atividades propostas e movimentou-se no sentido de efetivar a
constituição do Grêmio estudantil na escola. Isto, por si, já é um avanço
considerando que os alunos desconheciam totalmente os seus direitos e as formas
possíveis de exercer representatividade na gestão da escola pública.
Embora o projeto desenvolvido fosse voltado para o público dos alunos,
pode-se afirmar que o trabalho repercutiu junto aos professores e também junto à
direção da escola, movimentando o alunado para a participação mais consciente,
responsável e crítica na gestão da escola.
Notou-se, ainda, a validade e a necessidade de projetos desta natureza
voltados para professores e gestores da escola, ou para formação destes, o que
28
permite vislumbrar a possibilidade de novos projetos de extensão dentro de
temáticas envolvidas com a gestão democrática da escola (instâncias colegiadas).
Embora prevista na Constituição Federal de 1988, a gestão democrática da
escola pública ainda não é realidade em todas as escolas, pois pressupõe a
constituição de colegiados com a participação efetiva da comunidade escolar. Tal
constatação atesta a relevância acadêmica e social deste projeto que
instrumentalizou os estudantes para atuarem politicamente na gestão da escola.
Não se pode afirmar que este projeto traz diretamente uma contribuição para
o redimensionamento curricular da Universidade. Todavia, entende-se que o tema
tratado é de fundamental importância para a formação inicial e continuada de
professores e de gestores educacionais, uma vez que estes são os sujeitos
protagonistas das transformações a serem alcançadas nas escolas públicas, tendo
em vista concretizar ideias de participação política, cidadania e democracia.
Considerando que grande parte das escolas públicas não tem constituído
seus Grêmios Estudantis, entende-se que o trabalho feito no projeto representa o
atendimento de uma demanda social visto que na educação há uma lacuna acerca
da organização e da participação estudantil.
O projeto mostrou a necessidade de se trabalhar com o tema da
organização e representação estudantil nas licenciaturas e na formação continuada,
bem como colocar este tema na pauta das pesquisas nas universidades públicas,
uma vez que se identifica uma significativa carência de literatura a esse respeito,
capaz de respaldar os interessados em aprofundar os conhecimentos sobre a
importância das ações das instancias colegiadas na escola pública, sobretudo
acerca do Grêmio Estudantil.
O projeto “Da gestão democrática à constituição do Grêmio Estudantil” foi
implementado em uma escola de ensino fundamental localizada em um bairro, de
certa forma, distante do centro do município. Isto não foi um problema para que o
projeto se desenvolvesse. Porém, em relação aos limites enfrentados pode-se citar:
Desconhecimento, por parte dos estudantes, da entidade
Grêmio Estudantil.
Dificuldades na participação das reuniões. Alguns alunos
participavam de uma reunião, faltavam em outra e assim se sucedeu até a
finalização das reuniões.
29
Os encontros se deram em turno contrário ao que os estudantes
frequentavam na escola, e talvez, em virtude deste horário as faltas de
alguns alunos às reuniões tenham sido significativas.
Total desconhecimento dos alunos no que se relaciona à teoria
democrática e cidadã, bem como o desconhecimento de documentos que
norteiam a gestão da escola.
Sob base dos referenciais teóricos utilizados na construção do
projeto de intervenção e da produção didática pedagógica, ponderando as
possibilidades reais e concretas dos estudantes escola e considerando que
são de ensino fundamental, esclareceu-se o que é o grêmio estudantil e seu
papel na escola e na sociedade.
No que diz respeito aos documentos que norteiam a gestão da
escola, pode-se perceber que os conhecimentos ampliaram-se, mas, ainda
será necessário aprofundar algumas informações contidas nestes
documentos.
Em relação aos estudantes que frequentaram todas as reuniões,
foi possível observar disposição e dinamismo para constituir o Grêmio
Estudantil na escola;
As noções de democracia e cidadania na sociedade capitalista
necessitam desenvolver-se. Porém, dentro das possibilidades, observou-se
na prática, entre os estudantes, algumas atitudes democráticas e cidadãs
com os próprios colegas e para com a escola.
Com algumas dificuldades conseguiu-se escrever o Estatuto do
Grêmio Estudantil e aprová-lo em assembleia com a totalidade dos
estudantes da escola.
Com os conhecimentos obtidos foi possível a montagem de
quatro chapas para concorrerem à eleição do Grêmio Estudantil da escola.
Percebeu-se o interesse dos alunos pela entidade Grêmio
Estudantil, haja vista, a realização da campanha eleitoral, embora muitas
propostas das chapas mostrassem a necessidade de aprofundar qual é o
papel do Grêmio Estudantil na escola e na sociedade.
Finalizou-se a proposta do projeto com a eleição do Grêmio
Estudantil, é relevante destacar que o fato de ocorrerem eleições é um
30
avanço extraordinário se considerarmos que os estudantes desconheciam a
sua entidade representativa na escola.
Sendo assim, acredita-se que se devem aprofundar algumas discussões
com os estudantes. Porém, não se pode descartar que os momentos e espaços
criados por meio do PDE deveriam e devem ser parte da cultura escolar.
7. Referências
BATISTA, N. C. A formação do Estado nacional Brasileiro: Implicações para a gestão das políticas educacionais. EccoS, São Paulo, v.9, n.2, p.387-408,
jul./dez.2007.Disponível em: http://redalyc.uaemex.mx/src/inicio/ArtPdfRed.jsp?iCve=71590208.Acesso em 18 de abr. 2011.
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