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Revisão de Literatura Gestão Estratégica de Recursos Humanos Trabalho elaborado por: Dora Cristina Moreira Martins Fevereiro de 2007

Gestao Estrategica de RH

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Revisão de Literatura Gestão Estratégica de Recursos Humanos

Trabalho elaborado por: Dora Cristina Moreira Martins

Fevereiro de 2007

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Índice Introdução 1. Génese da Gestão de Recursos Humanos 2. Evolução da Gestão de Recursos Humanos ao longo do século XX 3. Os Principais Modelos Teóricos da Gestão Estratégica de Recursos Humanos 4. A Gestão de Recursos Humanos em Portugal: emergência da dimensão estratégica 5. Considerações Finais Referências Bibliográficas

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Introdução A revisão da literatura, centrada na abordagem da Gestão Estratégica de Recursos

Humanos, pretende fazer uma reflexão sobre a evolução da Gestão de Pessoas, com

principal destaque para os últimos anos.

Numa incursão mais global, procurar-se-á apresentar não só a génese como os

principais pontos de evolução da Gestão de Recursos Humanos (GRH), com maior

ênfase para a GRH em Portugal.

As profundas alterações, ocorridas no contexto económico dos últimos anos,

levaram a repensar a própria Função Recursos Humanos (FRH) que, ao longo dos anos,

tem vindo a afirmar-se num quadro conceptual e operacional cada vez mais autónomo.

Estamos numa nova Era da GRH, resultado da maior importância que o departamento

de gestão de pessoas tem vindo a conquistar no interior da empresa no desenvolvimento

das práticas de GRH. Este conceito (estratégico) da GRH instalou-se, definitivamente,

na sociedade ocidental na transição da década de 80 para a década de 90 do século

passado. Surge, desde essa altura, diversa literatura académica que define um novo

modelo teórico mais orientado para o desenvolvimento dos Recursos Humanos, como

substituto do tradicional modelo de gestão administrativa-burocrática da Administração

de Pessoal.

Os anos 1990 simbolizaram, assim, um marco importante na mudança da FRH,

agora mais adequada ao desenvolvimento das novas formas de organização do trabalho.

O facto das pessoas estarem, como se pensa, a serem vistas como vantagem

competitiva nas organizações pós-modernas atribui à GRH uma nova projecção, capaz

de lhe conferir um espaço autónomo e um papel mais activo e inter-actuante com a

estratégia organizacional. Só assim é que a GRH, como reconhece Bilhim (2002:68) “se

demarcará da sua antecessora gestão de pessoal tradicional e caminhará em direcção à

verdadeira gestão de pessoas, usando um conjunto integrado de técnicas culturais,

pessoais ou estruturais, …capazes de fazer dos recursos humanos o factor diferenciador

da empresa face à concorrência, valorizando-os como activo realmente estratégico”.

Este alargamento e enriquecimento do domínio profissional da GRH implicaram a

inevitável reconfiguração da FRH, permitindo a afirmação do modelo Soft a par do

modelo Hard de GRH, como principais modelos teóricos da Gestão Estratégica de

Recursos Humanos.

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Terminará esta revisão da literatura com uma referência específica à realidade

portuguesa, sobre a qual se pretende fazer uma reflexão comparativa face aos principais

desafios a alcançar para este domínio profissional

1. Génese da Gestão de Recursos Humanos

O conceito Gestão de Recursos Humanos é recente na literatura. Antes disso, falava-

se em Administração de Pessoal. Nos primórdios desta forma tradicional de gerir as

pessoas nas organizações não havia, ainda, a preocupação com as práticas de

relacionamento pessoal, apenas um interesse pelos aspectos técnicos dos salários,

avaliação, formação e compensação dos empregados, o que fez desta, uma função

meramente de staff nas organizações.

Cabral-Cardoso (1999:226) e Carvalho (1998:8) referem que na origem do que se

viria a designar por “Função Pessoal” estão os chamados Welfare Officers, funcionários

encarregados de zelar pela melhoria das condições de trabalho e de alojamento e pelo

apoio aos trabalhadores doentes ou mais necessitados. Logo podemos afirmar que, quer

nos Estados Unidos da América (EUA) quer na Europa, a “Gestão de Pessoal” remonta

ao século XIX, muito associada à garantia de boas condições de vida laboral e pessoal

dos trabalhadores. O papel dos Welfare Officers correspondia, segundo Cabral-Cardoso

(1999:226), em larga medida, ao de uma «almofada social», capaz de amortecer a

grande conflitualidade que caracterizava a relação entre o empregador e os seus

empregados. Numa perspectiva crítica, o seu papel pode também ser visto como uma

tentativa de garantia e manutenção de baixos salários a troco de alguns benefícios

sociais permitindo, ainda, limitar a influência sindical no interior da empresa.

Embora o aparecimento de uma secção de pessoal em empresas possa ser

referenciado ainda no século XIX, foi apenas a partir das primeiras décadas do século

XX que esta assume um carácter de maior funcionalidade.

Muitos são os autores a identificarem o início do século XX como a data provável

do surgimento do departamento de Administração de Pessoal nas Organizações. Assim,

a Administração de Pessoal surge num contexto marcado pelo paradigma dominante nas

organizações que advogavam a necessidade de controlo da força de trabalho e onde os

recursos humanos se assumiam como factor básico de competitividade das

organizações.

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No cenário organizacional, que marcou os primeiros 40 anos do século XX, tivemos

uma Administração de Pessoal que se ocupava essencialmente de questões

administrativas, como o recrutamento e os salários dos trabalhadores mas que, a partir

da II Guerra Mundial, alargou o seu campo de intervenção para outras actividades,

como a formação básica, a participação ou o aconselhamento da administração da

empresa na negociação e contratação colectivas (Cabral-Cardoso, 1999:227). De referir

que em todo este período, designado de Administração de Pessoal ou das Relações

Industriais (dada a importância dos sindicatos, na altura), a Gestão de Pessoal apenas se

limitava, como referem Price (1997:8) e Cabral-Cardoso (1999:227), a dar resposta a

problemas concretos e imediatos, sem qualquer preocupação de natureza estratégica e

sem grande fundamento teórico que enquadrasse a sua acção, essencialmente baseada

no cumprimento de normas e regulamentos de «bom senso».

Na década de 60, assistimos a uma maior afirmação do departamento de Gestão de

Pessoal, que embora assegurando as actividades de carácter administrativo e sindical

começa a preocupar-se, também, com o desenvolvimento e administração de políticas e

práticas respeitantes à gestão dos empregados. Inclui-se, pela primeira vez, a

responsabilidade pelo desenvolvimento de métodos de selecção, de programas de

formação e de sistemas de atribuição de recompensas (Tavares e Caetano, 2000:38), a

par de algum relevo que começa a ter a avaliação de desempenho, planeamento das

necessidades futuras de mão-de-obra e maior liberdade sindical (Cabral-Cardoso,

1999:228). Estas funções da Administração de Pessoal alargam-se, essencialmente,

devido ao crescente surgimento de legislação sobre a descriminação no trabalho,

sobretudo nos EUA. Uma das principais funções do Departamento de Pessoal da altura

era representar o papel da organização perspectivado pelo trabalhador, muitas vezes,

como inimigo na negociação colectiva (Torrington e Hall, 1991; Cascio, 1995; Dessler,

1997; Carvalho, 1998).

Na década de 80, resultado de diversos factores que marcaram os anos 70, como a

globalização, a desregulação e as rápidas mudanças tecnológicas exige-se, por parte das

empresas, um planeamento estratégico, ou seja, um processo de antecipação das

mudanças futuras e do alinhamento das várias componentes da organização, de forma a

promover a eficácia e eficiência organizacional (Lawler, 1999). Assim, embora os

aspectos técnicos da administração de pessoal tradicional fossem ainda uma

componente integral da GRH tradicional, a formulação e implementação estratégica

transformam-se no seu paradigma dominante.

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A GRH é vista, pela primeira vez, como um agente de ajuda às empresas para a

concretização dos seus objectivos principais. A sua função passa a ser cada vez mais

próxima da gestão de topo do que a simples administração de pessoal (Lawler, 1999).

2. Evolução da Gestão de Recursos Humanos ao longo do Século XX

A substituição do nome Gestão de Pessoal para o de Gestão de Recursos Humanos

não foi uma transição consensual por parte dos gestores de pessoal, como refere Cabral-

-Cardoso (1999). Como afirma Moura (2000:24), do ponto de vista conceptual, a

designação GRH que evoluía a partir do conceito de Gestão de Pessoal “está longe de

constituir um campo de conhecimentos estabilizado e genericamente aceite na

literatura”. Carvalho (1998:14) argumenta que a essência do processo de evolução

reside no facto dos trabalhadores passarem a ser perspectivados como um recurso a

valorizar e não apenas como um custo a minimizar, sendo considerados como um dos

factores competitivos da organização. Torrington e Hall (1995) caracterizam a Gestão

de Pessoal como sendo orientada para os empregados, enquanto a GRH seria mais

orientada para a gestão. Beaumont (1993) considera a GRH como a continuidade da

Escola das Relações Humanas, enquanto Legge (1989) e Clark (1993) argumentam que

as diferenças são mínimas entre a Gestão de Pessoal e a GRH, justificado por Singh

(1992) na natureza, ainda embrionária, dos fundamentos teóricos da GRH (in Cabral-

Cardoso, 1999:232-233).

Karen Legge (1992, 1995) ao analisar as diferenças entre a GRH e a Gestão

Administrativa de Pessoal reflecte sobre os modelos normativos das duas perspectivas,

concluindo pela existência de fortes similitudes entre ambas. No entanto, refere que

existem três diferenças fundamentais que parecem distinguir a GRH da Administração

de Pessoal, assim:

1) Enquanto a Administração de Pessoal se preocupa essencialmente com os

trabalhadores que não pertencem à gestão, a GRH considera o desenvolvimento da

gestão e das equipas de gestão como igualmente importantes, se não mesmo, mais

importantes que os restantes elementos da organização;

2) Outra diferença identificada refere-se aos diferentes papéis esperados dos

profissionais nas duas perspectivas. Enquanto os administradores de pessoal consideram

que os gestores intermédios aplicam políticas para os empregados que estão sob o seu

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controlo, a perspectiva da GRH advoga que os gestores intermédios estão a dirigir e

coordenar um conjunto de recursos de forma a activar os objectivos gerais da

organização;

3) Finalmente, enquanto a GRH pretende conferir responsabilidade aos gestores de topo

para gerir a cultura organizacional e conferir um sentido de direcção e liderança dentro

da organização, a Administração de Pessoal tradicional tende a percepcionar estas

actividades como pertencentes a departamentos específicos de desenvolvimento

organizacional.

Sistematizando os contributos de Beaumont (1993) e Price (1997), Cabral-Cardoso

(1999:231) identifica algumas oposições:

- a GRH tem uma natureza proactiva e estratégica e vê os indivíduos como activos da

organização, geridos de acordo com os objectivos de longo prazo do negócio e não pela

simples aplicação de técnicas de natureza operativa e desligada da gestão geral, como

acontecia na gestão de pessoal;

- a GRH tem uma perspectiva integrada e holística da gestão das pessoas, o que requer

uma visão mais vasta da organização e uma compreensão de todas as dimensões e

conceitos do comportamento organizacional, mesmo os de nível macro, como a cultura

e estrutura, ao invés de se limitar a um conjunto de técnicas, mais ou menos

sofisticadas, mas que não formam um corpo conceptual coerente e global, como

acontecia na gestão de pessoal;

- a GRH procura actuar sobre as atitudes, crenças e empenhamentos dos empregados,

com vista a desenvolver comportamentos consistentes e uma cultura de empenhamento;

- a GRH é vista como uma actividade de gestão e, logo, da responsabilidade de todos os

gestores e não como uma actividade de especialistas desligados do resto da gestão;

- a GRH leva em conta a individualidade de cada empregado, procurando que o

desempenho de cada um contribua para melhorar os resultados globais e reforce a

competitividade organizacional.

A GRH é objecto de uma grande atenção na década de 80. Argumentos como a

pressão da competitividade mundial, lição positiva do sistema japonês na elevação da

produtividade individual e na priorização da GRH, diminuição das taxas de

sindicalização no sector privado americano, aumento progressivo de pessoal em tarefas

administrativas e técnicas, o limitado poder e o baixo estatuto possuído pelos

profissionais da GRH que os impedia de demonstrarem o seu contributo para o aumento

da produtividade individual e organizacional, levam Caetano e Vala (2002:8) a

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explicarem a evolução da Gestão de Pessoal para a GRH, pela incapacidade daquela em

responder à crescente competitividade do mercado.

A grande novidade introduzida, na década de 80, foi a nova visão dos recursos

humanos considerados, pela primeira vez, como um investimento organizacional e não

como um custo, considerados como tal até final da década de 70. Reforçando as

convicções de muitos parceiros internacionais, Domingues (2003:222) chama-lhe

inicialmente Gestão de Pessoal ou Relações Sociais e nos anos 1980, Recursos

Humanos, isto é, a passagem da utilização das expressões Pessoal, Direcção de Pessoal

ou Função Pessoal, para Recursos Humanos, Direcção de Recursos Humanos ou FRH,

partindo do entendimento que “Recursos Humanos é estratégico; Pessoal é

operacional”. Logo estamos perante práticas distintas de gestão de pessoas. Segundo

esta distinção, a GRH passa a estar integrada na gestão estratégica, faz o alinhamento

claro com as novas concepções da gestão global e do funcionamento das organizações e

adopta uma perspectiva de individualização relativamente às pessoas na organização.

Logo está mais envolvida no negócio global, mais proactiva e integrada na gestão e não

somente implicada na satisfação dos trabalhadores, nas suas necessidades de trabalho e

na resolução dos seus problemas.

Segundo Keating (2002:107), o desenvolvimento da FRH pode ser visto, também,

como intimamente ligado à evolução das relações de trabalho na organização. A sua

legitimidade derivaria, fundamentalmente, da maior ou menor capacidade para lidar

com as incertezas oriundas das relações entre os grupos divergentes da organização.

Segundo esta corrente, até ao final dos anos 70, numa época de contenção de custos, a

FRH limitava-se a processar salários e a dar respostas de carácter administrativo às

exigências legais em vigor. As pessoas eram admitidas, geralmente sem critérios de

selecção objectivos e procurava-se enquadrá-las nas funções, valorizando-se a disciplina

e a eficiência. A partir da década de 80 estabelece-se um novo tipo de relacionamento

com os trabalhadores e muitas empresas criaram, pela primeira vez, os seus órgãos de

RH. Os processos de selecção melhoram, gerem-se as remunerações com preocupação

de equilíbrio interno e externo e a formação profissional (sobretudo na área

comportamental) começa a ter alguma expressão. Em resposta a estas reivindicações de

salário igual para função igual, começa-se a falar em avaliação de mérito e mais tarde

em avaliação de desempenho.

Progressivamente passa-se de uma concepção taylorista do trabalho, que

diferenciava os que pensam dos que executam, para uma concepção pós-taylorista onde

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cada um contribui para criar valor para o cliente com muito mais autonomia, mais

horizontal, com poucas fronteiras entre unidades, organizada em processos e projectos,

com uma hierarquia ligeira e a regulação sendo sobretudo assegurada pelo cliente

(Brilman, 2000:374). Se até à década de 60, os fenómenos que mais influenciaram a

evolução da GRH foram o movimento sindical e a legislação de natureza social, nos

anos 80, as principais influências deverão procurar-se nos fenómenos de competição

global e de estratégia de negócio. Na mesma linha de pensamento, Hendry e Pettigrew

(1990:19) referem que a tendência para a reestruturação da competitividade foi

provocada pela tecnologia, métodos de trabalho, organização e atitudes dirigidas não só

para os custos mas essencialmente para a qualidade e outros recursos intangíveis1. Estas

foram as razões que levaram à mudança da cultura que transformou as organizações

americanas tradicionais e a sua gestão de pessoal, implicando o emprego de políticas

que desenvolvessem uma estratégia de longo prazo coerente com as atitudes e valores

de gestão.

Quer a estratégia de negócio, quer a cultura organizacional são os factores mais

frequentemente referidos na literatura, como tendo uma enorme influência na

explicitação, formulação e evolução do paradigma de GRH. Schuler e Walker (1990:6)

consideram que depois de 1980 as mudanças rígidas e dramáticas, tais como,

demográficas, diminuição da competitividade, mudança nos padrões de emprego e mais

complexidade tecnológica, tiveram importantes implicações nas organizações e na sua

GRH.

Em meados da década de 80 surge uma nova concepção de GRH com diferentes

valores e mais integrada com a gestão de linha que, segundo Guest (1990:384), está

fortemente associada à inovação das políticas de GRH.

Na década de 90, a par dos factores referidos, a internacionalização dos negócios e

das actividades contribuíram, de uma forma estruturante, para a evolução conceptual do

conceito e das práticas de GRH (Caetano e Vala, 2002:7). Neste período, pressupõe-se

uma gestão estratégica das pessoas. Quer isto dizer que cada vez mais a GRH numa

organização deverá estar articulada com as suas intenções e decisões estratégicas, ou 1 Hendry e Pettigrew (1990) referem que não foram simultâneas as mudanças organizacionais no Norte da América e Europa. Consideram que na Europa, os primeiros sinais de uma nova GRH chegam a Inglaterra por volta de 1985/86 sem uma clara estratégia critica ao comportamento, valores culturais e práticas de RH. A emergência de uma nova GRH em Inglaterra surge pela necessidade de reestruturar os efeitos das pressões das indústrias inglesas, perda de competitividade e introdução de nova tecnologia, fruto do novo clima do Thatcherismo, nova legislação, permitindo a introdução de novas práticas de GRH, novas acções colectivas e os movimentos de qualidade e de excelência, introduzidos por Peter e Waterman em 1982.

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seja, o desenvolvimento e a adopção das práticas de GRH deve ser coerente com a

estratégia empresarial. Estamos numa nova era de GRH que exige, deste departamento,

a articulação dos comportamentos dos trabalhadores em contexto de trabalho com as

exigências definidas a nível estratégico. Wrigth et al (1998:23) aduzem que a natureza

crescente da competição global requer que as empresas utilizem todos os recursos

disponíveis para conseguir sobreviver e ter sucesso. Disto resultou a ênfase no

alinhamento de todas as actividades funcionais da empresa (financeiras, comerciais,

produtivas, …) para a concretização dos objectivos da organização. Esta mudança traz

como consequência um papel estratégico para a FRH. Este novo papel pressupõe que

ela providencie a contribuição dos Recursos Humanos na estratégia da empresa e

assegure programas e práticas efectivamente capazes de implementar a estratégia.

O envolvimento da GRH com a Gestão Estratégica está, segundo Wrigth et al

(1998:25) fortemente relacionado com as percepções que a gestão de linha tem da

eficácia da FRH. Esta é mais forte quando a empresa aposta na inovação estratégica dos

produtos e quando os gestores percebem as capacidades dos seus empregados como

core competences. É esta inovação nos produtos que, simultaneamente, ajuda a criar e

desenvolver o valor e potencial dos colaboradores. Estas organizações percebem que a

vantagem competitiva é criada através das pessoas.

Questiona-se, no final do século XX, a FGRH em que Guest (1998, in Cabral-

Cardoso, 1999:243) acrescenta que é o próprio conceito de empenhamento, o conceito

central do modelo de GRH que está em causa, por se revelar desajustado do novo

contexto de insegurança no emprego e dos fins de carreiras. A uma cultura de

empenhamento poderá suceder uma cultura contratual, centrada nos conceitos de

mercado, flexibilidade, contrato psicológico, comunidade e parceria. Logo, não

podemos ignorar as evoluções dramáticas, associadas à instabilidade do emprego,

verificadas no final do século passado, reclamando para a GRH um posicionamento

mais estratégico, nomeadamente pelo contributo exigido para o alcance dos objectivos

organizacionais. Esta perspectiva é, genericamente, designada Gestão Estratégica de

Recursos Humanos. Concluem Wrigth et al (1998:25) que, quando a GRH executiva é

grandemente envolvida com a estratégia e a gestão operacional, tende a ser feita uma

avaliação positiva da sua função.

Neste novo contexto, assiste-se a fortes mudanças na natureza das funções dos

gestores de pessoal, isto é, as limitadas preocupações com as actividades meramente de

natureza administrativa são alargadas para preocupações mais centradas no

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desenvolvimento dos recursos humanos da organização, nomeadamente preocupações

com a motivação, envolvimento, empenhamento, flexibilidade e competências nucleares

dos empregados. Hoje, o que destaca a Gestão Estratégica de Recursos Humanos

(GERH) da sua perspectiva mais tradicionalista é a detenção de recursos humanos

dotados de características profissionais que permitam à organização demarcar-se da

concorrência. Esta demarcação define-se pela posse de competências difíceis de imitar,

garantindo-lhe a vantagem competitiva de que necessita para se afirmar no contexto de

mercado global que caracteriza as últimas décadas do século XX. Daí a aproximação da

FRH aos centros de decisão estratégica das empresas ser cada vez mais forte. Gomes e

Cunha (2003:6-7) sintetizam que as ideias centrais da GERH poderão, deste modo, ser

agrupadas à volta dos movimentos de descentralização de tomada de decisão e de

centralização nas competências–chave, que caracterizam o mundo moderno da

actividade organizacional. Os últimos anos têm sido pródigos em produzir uma série de

práticas de gestão destinadas a, por um lado, atribuir cada vez mais tarefas e

responsabilidades aos indivíduos colocados nas bases da organização e, por outro,

concentrar os esforços da organização nas competências em que ela é realmente

especialista, libertando-se das competências periféricas. Importa, contudo, referir que se

por um lado existem vantagens que passam por uma maior implicação e motivação dos

colaboradores, pois estes são chamados a participar em algumas das decisões da sua

empresa verificam-se, igualmente, na GRH contemporânea algumas desvantagens,

nomeadamente esta ver-se destituída de algumas das suas responsabilidades

transferidas, na sua maior parte, para uma contratação em regime de outsourcing.

Refere Citeau (1997:28) que a Função Estratégica de GRH participa na procura de

uma melhor eficácia das organizações, nomeadamente:

a) promover e realizar uma melhor adequação dos recursos humanos (adequação

competência-emprego);

b) desenvolver as capacidades de cada assalariado fazendo correspondê-las à satisfação

das necessidades individuais e colectivas da organização (equidade da contribuição-

-retribuição).

Assim, a nova FRH não se pode limitar a procurar a adequação às exigências de

curto prazo mas deve visar as necessidades de médio e longo prazos, com o objectivo de

assegurar o êxito dos projectos da empresa e de se prevenir contra os riscos de uma

inadequação das competências na relação com as novas exigências de trabalho (Citeau,

1997:30). Este entendimento permite atribuir à GERH um novo papel, agora totalmente

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integrado com o resto da organização. Gomes e Cunha (2003:7) defendem que, para

além do suporte da estratégia da empresa, ela pode também ser um desenhador desses

desígnios, ou seja, um participante activo no delineamento da estratégia da organização,

uma solução de gestão que seja integrada, sistemática e com continuidade no tempo.

Globalmente, as grandes ideias associadas às transformações da FRH, nos anos 90,

foram segundo Citeau, (1997:30) e Schuler e Walker (1990:7-8):

i) acompanhar as rápidas mudanças da gestão (por ex., o crescimento da competição

multinacional);

ii) saber planificar (definir uma estratégia) para ser capaz de antecipar (gestão

previsional capaz de reduzir custos e aumentar a competitividade);

iii) saber enriquecer os projectos de uma aproximação sócio-económica global;

iv) criar organizações mais flexíveis, achatadas e mais complexas (em termos de

produção, recursos, mercados, …);

v) saber pôr em prática nas organizações o trabalho qualificante e as formações

capazes de adaptar os salários aos novos postos de trabalho;

vi) saber associar mais tempo da empresa à formação (procurar novas qualificações,

formar para as mudanças tecnológicas);

vii) gerir as mudanças demográficas que limitam o trabalho;

viii) saber criar as solidariedades da empresa.

Surgem novas formas de negociação dentro da organização que permitem o

envolvimento e participação dos trabalhadores nas decisões relacionadas com o trabalho

(favorecendo-se o trabalho de grupo); tratam-se os trabalhadores como capital social e

não como um custo variável; o foco de interesse e análise passa a centrar-se na cultura

organizacional; a ideia da formação centrada no indivíduo alarga-se a um conceito mais

vasto de aprendizagem organizacional permanente. A GRH apresenta-se como proactiva

em vez de reactiva onde, pela primeira vez, as políticas de GRH são integradas na

estratégia global da empresa. Progressivamente a FRH deixa de ter como preocupação

central e “quase única” a perspectiva administrativa e contratual, para passar a ser o

agente da mudança global gerindo pela cultura e tendo sempre presente a integração no

processo estratégico. Schuler e Walker (1990:15) consideram que a GERH permite à

empresa:

i) definir as oportunidades e barreiras dos Recursos Humanos com os objectivos da

empresa;

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ii) alertar para novos assuntos da GRH (orientações e perspectivas);

iii) criar processos e actividades específicas;

iv) planear a longo-prazo acções consideradas prioritárias nos próximos 2 a 3 anos;

v) desenvolver acções urgentes;

vi) prever estratégias de RH focadas na formação e desenvolvimento de talentos dos

colaboradores;

vii) executar a estratégia com base num efectivo consenso, comunicação e envolvimento

de todos.

Segundo Cabral-Cardoso (1999:236) “a Função RH passa a desempenhar um papel

de parceiro na definição e implementação estratégica, de arquitecto na articulação dos

vários elementos estruturais, de auditor de competências e cultura da empresa, de

especialista administrativo que introduz melhorias contínuas no funcionamento do

processo administrativo e de mobilizador do empenhamento organizacional”, passando

a serem estas as preocupações a que se dedica, actualmente, a GRH.

As novas formas de organização do trabalho que marcaram toda a década de 90,

atribuem ao responsável pelos recursos humanos não só o maior envolvimento no

desenvolvimento das políticas organizacionais em conjunto com a gestão de topo

(Caetano, 2000:42) como, igualmente, a necessidade de uma resposta rápida que impõe

maior autonomia das equipas de trabalho e a responsabilização dos níveis intermédios

da gestão2. Este autor (2000:42-49) enfatiza três perspectivas teóricas para a nova FRH

do final de século XX. Destaca 1) Torrington (1993) pela ênfase que coloca na

formação e no desenvolvimento dos trabalhadores, como um importante atributo

positivo da GRH. Afirma ainda que a ênfase no desempenho mais do que no

conformismo para com as regras e os controlos formais, tem um valor mais positivo e

significativo para a gestão de pessoas nas organizações modernas; 2) Farrance (1992)

defende que as “boas práticas de GRH assegurarão que todos os empregados saibam

que são importantes como seres humanos e como indivíduos”, enquanto para 3) Legge

(1995) “a expressão GRH é usada para referir novas ortodoxias e tem uma função de

legitimação de desenvolvimento de determinadas práticas de gestão de pessoas ligadas,

2 Esta nova filosofia de gestão tem estado a ser, ainda que lentamente, introduzida nas organizações actuais, quer através da formação profissional dos níveis intermédios e chefias directas quer através da delegação de poder (empowerment) e responsabilidade pelos níveis hierárquicos mais baixos.

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principalmente, à sobrevivência da organização num mundo que se encontra em

crescente mudança e competitividade”.

O valor da GERH dentro de uma organização actual caracteriza-se, portanto, pela

função directiva estratégia que tem vindo a desempenhar, nos últimos anos, nas

decisões nucleares das empresas aparecendo ligada à missão e objectivos da

organização contribuindo, activamente, para o alcance dos seus resultados globais. Tal

confere-lhe, pela primeira vez, um papel de parceira da organização na definição e

implementação dos objectivos estratégicos, ao nível da gestão de topo. Logo a GERH

pressupõe uma força de trabalho altamente implicada com a organização, altamente

flexível nos papéis que assume e muita qualidade nas aptidões que desenvolve. Estes

objectivos atingem-se através de elementos-chave, como sejam, a selecção, a

socialização, a formação e o desenvolvimento, a comunicação, o envolvimento dos

trabalhadores e o desenvolvimento de sistemas de recompensas (Tavares et al,

2000:52).

Há alguns indicadores de mudança nas práticas relacionadas com o trabalho e com

as relações que as organizações estabelecem com os empregados tendo-se verificado,

nomeadamente, o início do desenvolvimento de novas práticas de gestão no que respeita

ao trabalho em equipa, à flexibilidade no local de trabalho, à utilização da avaliação de

desempenho de uma forma generalizada na organização e à descentralização de algumas

tomadas de decisão para níveis de gestão hierarquicamente mais baixos.

A GRH ao evoluir no sentido da ligação das políticas e práticas de recursos humanos à

estratégia da empresa exige que as organizações dêem, cada vez mais, atenção à forma

como os seus colaboradores são geridos.

3. Os principais modelos teóricos da Gestão Estratégica de Recursos Humanos

A GRH tem sido muitas vezes perspectivada como um termo genérico e simples

para tudo o que concerne a relação organizacional entre empregadores e empregados.

Não se pode afirmar que exista, até agora, uma teoria consistente de GRH. Contudo, é

possível encontrar um conjunto de elementos intercalados que poderão constituir-se

como “pilares” do seu modelo teórico e que definem as políticas de GRH encetadas nas

empresas. Quer Beaumont (1995) quer Torrington (1992) ao reflectirem sobre o

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conceito de GRH afirmam que embora exista uma grande diversidade de investigadores

nesta área, ainda se está longe de encontrar unanimidade na definição da Gestão de

Pessoas3.

3.1. Modelos Hard e Soft Ao emergir nos anos 80 a GERH, Blyton e Turnbull (1994) classificam dois

distintos modelos de GRH:

- O modelo da “Escola de Michigan” (Jones, 2000:280; Torrington & Hall, 1995:53)

com uma perspectiva muito mais unitarista e generalista e;

- O modelo de Harvard (Jones, 2000:280; Torrington & Hall, 1995:54), muito associado

à Escola das Relações Humanas, descreve o “desenvolvimento humano”.

Esta dicotomia foi identificada por Storey (1986) como modelos Hard e Soft. O

Hard realça a visão quantitativa, calculista e estratégica da Gestão de Pessoas de um

modo racional e idêntico a qualquer factor económico. O Soft assenta a importância

fundamental no envolvimento das pessoas pela via da motivação, comunicação e

liderança, podendo ocorrer em ligação, directa ou não, com os objectivos do negócio. A

primeira representa o “instrumentalismo utilitário”, a segunda tem reminiscências no

desenvolvimento humanista (Legge, 1995).

Não é, portanto, consensual a perspectiva da Gestão de Pessoas. Por um lado, um

modelo mais quantitativo e unitário (Hard) que aparece designado na literatura por um

modelo da «Michigan School of HRM» e outra perspectiva ou modelo mais suave (Soft)

e mais pluralista, também conhecido por modelo da «Harvard School of HRM». O

primeiro realça os aspectos quantitativos, vendo as pessoas como recursos geríveis de

acordo com critérios racionais e económicos, enquanto o segundo pode considerar-se

mais inspirado na Escola das Relações Humanas e mais próximo do comportamento

organizacional. Logo o modelo “Hard” reflecte uma maior orientação para os resultados

e o modelo Soft, uma maior orientação para as pessoas (Cabral-Cardoso, 1999:233). O

modelo Hard usa a retórica de integração estratégica da GRH na gestão de linha,

enquanto o modelo Soft enfatiza as qualidades únicas dos Recursos Humanos e o facto

de ser necessário o uso de um conjunto distintivo e especial de técnicas para as poder

potencializar (Caetano, 2000:40). 3 Destacam Guest (1990), Beaumont (1993), Brewster (1994), Sparrow e Hiltrop (1994), Storey (1995), Legge (1995) como alguns dos autores que mais contribuem para uma análise crítica da definição e evolução do conceito e práticas de GRH.

Page 16: Gestao Estrategica de RH

16

Quadro 3.1.: Diferenças entre modelos “Hard” e modelos “Soft” de GRH

Modelos “Hard” de Gestão de Recursos Humanos

Modelos “Soft” de Gestão de Recursos Humanos

� Instrumentalismo Utilitarista � Humanismo desenvolvimentalista (Hendry e Pettigrew, 1990).

� Focam a necessidade de uma integração entre as políticas, os sistemas e as actividades de GRH e a estratégia de negócio da empresa. Os recursos humanos são vistos como instrumentos necessários para atingir os objectivos da organização (Fombrun, 1984).

� Os RH são vistos como uma mais valia para a organização e a maximização do seu potencial só é possível através do uso de técnicas distintivas e diferenciadas da GRH.

� As políticas, os sistemas e as actividades relacionadas com o pessoal têm de ser consistentes com os objectivos de negócio da organização, servindo de suporte a estes. Este efeito só é conseguido se houver uma coerência interna ao nível da gestão dos recursos humanos (Hendry e Pettigrew, 1986).

� O objectivo da GRH está em gerar uma implicação dos trabalhadores através de processos de “comunicação, motivação e liderança” (Storey, 1987).

� Os recursos humanos são objecto de um planeamento formal, sendo vistos como “um factor de produção conjuntamente com a propriedade e capital” (Legge, 1995:35). São despesas necessárias para que se efectue o negócio ao mais baixo preço (Torrington e Hall, 1987). Recursos Humanos passivos, mais do que uma fonte de energia criativa.

� Os trabalhadores são proactivos em vez de serem meros inputs passivos dos processos produtivos. Eles são capazes de se “desenvolverem”, merecem a “confiança” da gestão/gestores e a sua “colaboração” é conseguida através da “participação” e da “escolha informada” (Beer e Spector, 1985).

� Estes modelos enfatizam os aspectos estratégicos, quantitativos e de negócio, na GRH. Gerem os RH de um modo “racional”, tal como se estes fossem um outro factor económico qualquer (Storey, 1987).

� Nestes modelos a ênfase é posta nas políticas de recursos humanos como meio de tornar os trabalhadores uma fonte de recursos e uma mais valia para a organização.

� Em última análise, estes modelos estão centrados na GRH.

� Estes modelos estão centrados sobretudo na GRH.

Fonte: Moura (2000:41), baseado em Legge (1995).

A interpretação das diferenças, entre ambos os modelos, permite a Legge (1995)

considerar que a linguagem da GRH, no fundo, não reflecte mais do que uma resposta

pragmática às oportunidades e constrangimentos dos meios sócio-político e económico

actuais.

É por isso que se pode dizer que «é no momento da ligação estratégica da função, ou

dito de outro modo, da passagem da gestão de pessoal para a gestão de RH, que se

poderá combinar políticas Hard e Soft, consoante a ênfase da GRH seja colocada nos

“recursos” ou no “humano”» (Domingues, 2003: 294). No modelo de Michigan, a

ênfase da GRH é colocada nos recursos. O fundamento da teoria dos recursos remonta

aos trabalhos de Penrose (1959), nomeadamente, à conceptualização da empresa como

um conjunto de recursos produtivos. Segundo ele, todos os recursos são originários de

ganhos produtivos, ao mesmo tempo que considerava que era a heterogeneidade dos

recursos que conferia unicidade à empresa. Esta noção de carácter único da empresa em

função dos seus recursos, isto é, das competências distintivas da empresa, constitui a

essência da Escola dos Recursos. As pessoas são vistas pela gestão como qualquer outro

Page 17: Gestao Estrategica de RH

17

recurso, isto é, obtidas a custo tão baixo quanto possível e utilizadas de forma

optimizada na satisfação dos objectivos estratégicos da organização. As políticas de

GRH que o adoptam giram em torno da selecção, desempenho, avaliação e

desenvolvimento e a sua acção é dirigida para a promoção entre os empregados de

consistência comportamental, entre os seus modos de perceber e executar as tarefas e os

objectivos definidos pela organização.

No modelo de Harvard, cujas raízes se podem encontrar em Mayo, Maslow,

Mcgregor e Walton, as palavras-chave são comunicação, motivação, liderança,

empenhamento, envolvimento e autonomia. Este modelo reconhece que as pessoas têm

sentimentos e emoções e não podem, por isso, ser geridas como qualquer outro recurso.

Cabe à GRH encontrar os mecanismos que reconciliem a inevitável tensão entre as

expectativas dos empregados e os objectivos da gestão. Procura-se, no modelo de

Harvard, que as pessoas se identifiquem com a organização e adoptem como seus os

objectivos da organização, empenhando-se na sua concretização. Na perspectiva Soft, a

GRH é considerada uma responsabilidade de todos os gestores e não apenas dos

especialistas funcionais (espera-se, de todos, contributos para aumentar a motivação e

empenho dos trabalhadores e o desenvolvimento de uma cultura baseada na confiança e

no trabalho em equipa). Logo, as competências em GRH são necessárias a todos os

gestores (Cabral-Cardoso, 1999:233-234).

Price (1997:23) argumenta, por outro lado, que o valor e popularidade da GRH

resultam, justamente, da sua abertura a diferentes interpretações, permitindo que cada

indivíduo ou organização adapte o modelo de acordo com a sua experiência, interesses e

audiências, enquanto Brewster (1994) fala nos constrangimentos culturais e legais, bem

como nos padrões de propriedade empresarial e a influência sindical nas empresas

europeias, para justificar um modelo de GRH.

Caetano e Vala (2002:9-10) enriquecem a análise desta diferenciação ao

acrescentarem que a abordagem Hard enfatiza, na expressão GRH, a palavra Recursos,

que considera como um custo. A justificação consiste em considerar as pessoas como

um recurso organizacional que deverá, em virtude de ser um custo, ser gerido da mesma

forma que outro recurso em termos de eficiência e do lucro. Por sua vez, a abordagem

Soft enfatiza a palavra Humanos. Considera as pessoas um recurso raro e diferente dos

outros recursos, cuja criatividade, competência, qualidade e envolvimento constituem a

essência da vantagem competitiva. A designação mais habitualmente associada a esta

abordagem é a de GRH.

Page 18: Gestao Estrategica de RH

18

Mas a grande questão que se coloca é a de saber se estas abordagens são

incompatíveis. Embora teoricamente pareça haver incompatibilidade entre ambos os

modelos, Legge (1995) defende que são mais as semelhanças do que as diferenças.

Segundo a autora, ambos enfatizam a importância de integrar a GRH e estratégia

organizacional; a vantagem de envolver os gestores de linha na GRH; a importância das

pessoas desenvolverem o seu potencial; a necessidade de adequar as pessoas às tarefas,

etc. Contudo o que separa os dois modelos está mais directamente ligado à participação

dos recursos humanos na tomada de decisão e partilha de conhecimentos. Isto é,

enquanto o modelo Hard pressupõe que os colaboradores prossigam os objectivos da

organização definidos pela gestão de topo, o modelo Soft presume que as pessoas têm

um contributo directo e participativo na definição dos objectivos organizacionais, ainda

que respeitando a teia de relações de poder.

Hendry e Pettigrew (1990) defendem que a adopção de ambas as perspectivas

baseia-se na escolha entre colocar a ênfase na gestão dos “recursos” ou no “humano”.

«Humano» implica alguma ligação com as pessoas e «recursos» é um termo demasiado

ambíguo que muitos consideram difícil de relacionar. Logo, interpretar a GRH como

uma gestão estratégica dos “recursos” ou como uma extensão das teorias da Escola das

Relações Humanas, traduz duas distintas formas de assumir o papel da GRH na

organização.

A perspectiva de Harvard fornece-nos um modelo baseado num mapa estratégico da

intervenção da GRH. As políticas deste modelo resultam no empenhamento dos

trabalhadores com a missão e os valores da organização, a congruência através da

ligação dos objectivos dos RH com os objectivos organizacionais, a competência,

desenvolvendo uma mistura apropriada de capacidades, habilidades e conhecimentos e a

eficiência dos custos, distribuindo o desempenho de uma forma competitiva (Price,

1997; Carvalho, 1998). Tal implica que a GRH deva constituir-se como

responsabilidade de todos os gestores dentro da organização e não apenas dos

especialistas da área. Uma perspectiva diferente é apresentada pela Michigan Business

School que nos apresenta um modelo mais “duro”, menos humanista, argumentando que

os trabalhadores deverão ser interpretados como os outros recursos dentro da

organização. Assim sendo, estes deverão ser obtidos ao menor custo, usados

economicamente, desenvolvidos e explorados tanto quanto possível. Neste modelo, o

objectivo da GRH é muito mais apoiar a prossecução dos objectivos organizacionais.

Page 19: Gestao Estrategica de RH

19

Wernerfeld (1984) define recurso como “qualquer coisa que pode ser pensado como

um ponto forte ou uma fraqueza de uma empresa”. Cada empresa deve adquirir e

desenvolver os seus recursos de forma superior para conseguir tornar-se estratégica face

à concorrência. Teece, Pisano e Shuer (1997) definem recurso como activos específicos

de uma empresa que são difíceis, senão mesmo impossíveis, de imitar pela

concorrência. Prahalad e Hamel (1990) preferem falar em recurso como “uma

competência nuclear”. O modelo Hard identifica algumas áreas chave para o

desenvolvimento de políticas e sistemas de RH apropriados, são elas: a selecção das

pessoas certas para irem ao encontro das necessidades de negócio, desempenho na linha

dos objectivos organizacionais, avaliação que confira feedback à organização e aos

trabalhadores, remuneração de acordo com o desempenho apropriado e o

desenvolvimento de capacidades e conhecimentos exigidos para ir ao encontro dos

objectivos organizacionais (Tichy, Fombrun e Devanna, 1982).

Moura (2000:36-41), numa análise comparativa a ambos os modelos, sintetiza a sua

perspectiva defendendo que a abordagem de Michigan Business School (MBS) é uma

abordagem de contingência, já que enfatiza a importância em desenvolver sistemas

apropriados de gestão das pessoas compatíveis com grandes objectivos organizacionais

da empresa, como o aumento da qualidade e a melhoria da produtividade. Eficácia e

eficiência organizacional dependem da existência de uma boa relação entre as práticas e

políticas de Gestão de Pessoal e a estratégia de negócio. A principal finalidade da

estratégia de Recursos Humanos é a de contribuir para a concretização, com sucesso,

daquela estratégia.

A abordagem da MBS tem por base o “ciclo de RH”, uma sequência de actividades

“que são desempenhadas por todos os gestores de RH em todas as organizações”. Por

sua vez, a abordagem de Harvard Business School (HBS), abordagem multi-

-interessados, foi desenvolvida por Been, Spector, Lawrence, Mills e Walton (1985).

Defendem estes autores que, “no processo de Gestão de Pessoal estão envolvidas “todas

as decisões e acções de gestão que afectem a natureza da relação entre a organização e

os empregados, os seus recursos humanos.

Podemos concluir que ambos os modelos salientam a importância de integrar as

políticas e práticas de GRH com os objectivos organizacionais. Ambos investem na

gestão de linha, ambos salientam a importância de colocar a “pessoa certa no lugar

certo” como um meio de integrar as políticas e práticas de Pessoal/GRH com os

objectivos organizacionais, incluindo o desenvolvimento individual. Nesta perspectiva

Page 20: Gestao Estrategica de RH

20

podemos afirmar que ambos os modelos tendem a equacionar os recursos humanos, nas

organizações, como meios para atingir os objectivos organizacionais, permitindo

concluir que as interpenetrações e influências recíprocas entre ambos os modelos são

uma constante. Este pressuposto ilustra estarmos perante duas dimensões distintas na

GRH mas não opostas. Jackson (2002:471) defende mesmo a possibilidade de, em

alguns países, serem bem sucedidas as tentativas de reconciliação das abordagens Soft

(humanista) e Hard (instrumentalista). Neste sentido, a adopção das perspectivas Hard e

Soft, mais do que de uma decisão formal da organização depende, em grande medida,

das condições do meio envolvente.

4. A Gestão de Recursos Humanos em Portugal: emergê ncia da dimensão estratégica

Inquestionável parece ser o percurso desta disciplina nas organizações portuguesas,

muito à luz do que se foi fazendo a nível internacional, embora sujeita aos factores

contingenciais, nomeadamente as questões culturais, políticas e ambientais que

caracterizaram e ainda caracterizam o tecido empresarial português4.

O aparecimento de novos modelos organizacionais exige a adaptação da mão-de-

obra activa aos novos desafios produtivos. Isto pressupõe que a competitividade passe

não só pela inovação dos recursos produtivos e tecnológicos, mas sobretudo, pelo

desenvolvimento dos recursos humanos, pelas estratégias de qualificação e pela

organização qualificante (Ramos, 1995:131-132).

Este cenário económico, marcado por fortes limitações estratégicas da classe

empresarial portuguesa, determinou que o desenvolvimento da GRH, em Portugal, fosse

influenciado, segundo Rodrigues (1994) pelas:

- dificuldades de gestão e reflexão estratégica e a falta de informação sobre a evolução

tecnológica, as preferências dos consumidores e as condições da concorrência;

- resistências à evolução organizacional das empresas, nomeadamente no sentido da

profissionalização e da descentralização da gestão, muitas vezes associadas à

4 Importa destacar para o nosso país os obstáculos políticos que marcaram até aos anos 70 o fraco desenvolvimento económico (regime salazarista) dotado, até então, de gestores e empresários caracteristicamente conservadores e empiristas em matéria de GRH. Importante na altura era a rentabilização da mão-de-obra barata e de baixa qualificação como elemento dinamizador da competitividade e não o investimento nesta disciplina de gestão.

Page 21: Gestao Estrategica de RH

21

predominância de uma lógica de exploração familiar ou de defesa corporativa das

(in)competências instaladas;

- peso das relações pessoais nos processos de recrutamento e de promoção e a

resistência a recorrer a apoio técnico externo, atitudes que tendem a criar obstáculos à

criação de uma base de competências e conhecimento com a qual cada empresa deveria

contar;

- tendência para reduzir a política de estímulos à gestão de salários a qual, por seu turno,

tende a ser pautada pelo objectivo de controlo do crescimento dos níveis salariais;

- insipiência de uma gestão voltada para o desenvolvimento dos recursos humanos, para

a construção de competências, através da organização de carreiras ou da programação

da formação profissional, adaptando-se ao projecto global da empresa.

Estes exemplos não deixam de reflectir uma realidade portuguesa onde sempre

imperou uma séria necessidade do desenvolvimento das funções de gestão e a

dificuldade que a gestão de pessoal tem tido em tornar-se estratégica, nas empresas

nacionais. Para o efeito, alerta Ramos (2003:338) ser necessário reposicionar Portugal

no contexto internacional e no quadro da construção europeia, abrindo-lhe uma nova

trajectória de desenvolvimento, assente em factores competitivos ligados à qualificação,

à inovação e ao conhecimento. Refere Moura (2000:25) que “o efeito das políticas e

práticas de Gestão das Pessoas sobre o desempenho da empresa tende, no caso

português, a ser pouco valorizado tanto como factor de competitividade e como de

desenvolvimento”.

Importa não esquecer que Portugal nunca foi um dos países pioneiros em matéria

económica internacional. Só muito tardiamente (anos 40) foram introduzidos modos de

produção segundo os princípios da Organização Científica do Trabalho (OCT), ainda

que limitados, numa primeira fase, às grandes empresas com ligações internacionais

(Brandão e Parente, 1998:30). Só ao longo da década de 60 é que a Função Pessoal

começa a assumir alguma preponderância no nosso país, nomeadamente em termos de

organização do trabalho, remunerações e técnicas de selecção, orientação e formação da

mão-de-obra. Estas práticas de GRH eram desenvolvidas ainda de forma incipiente,

quando comparadas com a importância que já vinham assumindo no contexto

internacional (Brandão e Parente, 1998:31).

Este cenário define para o tecido empresarial português uma GRH muito influenciada

pelas condicionantes culturais verificando-se, inclusive, como refere Domingues

(2003:226) o predomínio da designação Gestão de Pessoal substituída

Page 22: Gestao Estrategica de RH

22

progressivamente, há pouco mais de uma década, pela de GRH, sem que tal tenha

correspondido a alterações de conteúdo.

Na década de 70 a GRH, em Portugal, assumia uma função reactiva, na dependência

do departamento administrativo-finaceiro, tendo um papel puramente administrativo-

burocrático, centrado na aproximação das pessoas à organização. Neste período e até

meados da década de 80, entra-se numa fase de turbulência política e social que permite

que se torne mais central o papel da GRH, tipicamente conduzida por advogados,

permanecendo fortemente burocrática, sem relações com a estratégia organizacional. A

GRH continua a assumir, até ao final desta década, uma posição subalterna dado a

preocupação central das empresas portuguesas ser a produtividade, seguida da melhoria

tecnológica, do crescimento equilibrado e só depois a melhoria das condições de

trabalho (Brandão e Parente, 1998:33). Só no final da década de 80 é que a Função

Pessoal consegue maior afirmação no contexto empresarial português, particularmente

no sector industrial, predominante no nosso país, nesta altura. Novos serviços são

criados nas áreas da selecção, avaliação e particularmente a formação adquire alguma

importância.

Ilona Kóvacs (1990:169) numa análise de caso às indústrias portuguesas conclui que

a introdução das novas tecnologias, em Portugal, em 1990, visava, sobretudo, aumentar

a produtividade, aumentar ou manter a quota de mercado e melhorar a qualidade de vida

no trabalho. Contudo reiterando a ideia anterior, defende que “…para as empresas

serem mais competitivas não chega adquirirem apenas novos equipamentos. É também

preciso investir em formas de organização do trabalho e formação profissional

adequadas às características das novas tecnologias de informação. O cerne da

modernização das empresas é o desenvolvimento de uma organização do trabalho e de

pessoas capazes de explorar as novas potencialidades dos equipamentos flexíveis. A

valorização do potencial de flexibilidade das novas tecnologias exige a valorização dos

recursos humanos” (Kóvacs, 1990:169). Só assim é possível antecipar a concorrência.

Os papéis profissionais tornam-se cada vez mais exigentes em conhecimento, obrigando

os que os desempenham a aprenderem continuamente. Caetano e Vala (2002:11)

reconhecem, nesta fase, uma transformação reveladora da erosão dos factores

competitivos tradicionais e, mostram a importância de se considerarem os recursos

humanos sob a forma de aptidões e de qualificações individuais e grupais, como factor

de vantagem competitiva e estratégica para a sobrevivência das organizações. Pela

primeira vez, a FRH posiciona-se nas empresas portuguesas enquanto função de apoio,

Page 23: Gestao Estrategica de RH

23

de conselho, de informação, de assessoria e prestação de serviços especializados como o

recrutamento e a selecção, análise e descrição de funções ou a formação contínua. O

termo “GRH” substitui gradualmente o de “Pessoal” aduz Cabral-Cardoso (2004:563).

Kóvacs (1990:164) refere que “em 1990, só cerca de 10% das empresas utilizavam

novas formas de organização do trabalho de modo articulado tais como: rotação dos

postos de trabalho, enriquecimento de tarefas, círculos de controlo de qualidade ou

equipas semi-autónomas de produção”. Tal mostra bem que apesar de Portugal já

integrar a União Europeia denunciava ainda, no início da década passada, grandes

dificuldades de libertação de limitações como a distância e os canais tradicionais de

comunicação, enquanto a Europa dos países mais desenvolvidos se pautava por

mudanças culturais, estilos e métodos de gestão assentes na maior autonomia, iniciativa

e responsabilidades transferidas para o nível operacional.

Hoje, numa empresa, a tónica é colocada nos aspectos comportamentais, onde as

competências relacionais são decisivas. Todos têm que ser envolvidos na prática da

qualidade na empresa, exigindo-se uma liderança muito mais responsável na definição

dos objectivos, no estabelecimento de planos de acção e o seu controlo, numa

comunicação eficaz e na própria estimulação da formação contínua e interna. Desta

forma, podemos concluir que as novas tecnologias a par do novo posicionamento da

gestão permitem dedicar mais tempo a actividades ligadas à coordenação de

responsabilidades, formação e gestão das suas equipas. Kóvacs (1990:171) afirma

mesmo que “esse reagrupamento e integração de funções possibilitam também que a

direcção se concentre na gestão estratégica da empresa, em vez de ficar absorvida por

decisões operacionais”. Actualmente, com uma perspectiva mais estratégica, a GRH

tem sido determinante na produção de contributos decisivos para o alcance dos

objectivos da organização. Porém, a sua actual dimensão, só tem sido possível resultado

da enorme mais valia das tecnologias de informação e comunicação.

Nos últimos anos, destaca-se ainda que a GRH tem assumido um papel que se

define estratégico, daí que Gomes e Cunha (2003:10) aconselhem que a GRH deverá (à

semelhança de outras realidades organizacionais internacionais mais desenvolvidas) ser

alinhada directamente com a estratégia da organização, oferecendo as soluções mais

apropriadas à estratégia particular que estiver a ser seguida. Esta perspectiva, que se

pode designar de Gestão Estratégica de Recursos Humanos (GERH) destina-se a dar

uma resposta imediata, através da mobilização dos RH, aos requisitos e necessidades

sentidas pela organização na prossecução das suas metas. Assim, se uma organização

Page 24: Gestao Estrategica de RH

24

decidir apostar fortemente no mercado europeu, então a GRH deve responder de forma

pronta através do recrutamento de novos colaboradores capazes de dominarem duas ou

mais línguas, ou da formação intensiva em línguas, aos que já trabalham na empresa.

Este entendimento postula que a GRH tem capacidade para mobilizar as competências e

conhecimentos necessários para responder a qualquer estratégia, assim como a

quaisquer processos de mudança estratégica, ocorridos no médio ou longo prazos. O

papel da GRH, neste último caso, é o de apostar, por exemplo, na construção das

chamadas meta-competências, tais como a capacidade de aprendizagem, flexibilidade

individual ou trabalho em equipas. Em alternativa, a Função GERH tem conseguido

afirmar-se com contributos relevantes para as empresas portuguesas a partir da

subcontratação de serviços no que diz respeito à componente técnica da função

(outsourcing) – recrutamento e selecção de pessoal, formação, avaliação de

desempenho, etc (Brandão e Parente, 1998:37).

Importa, contudo, situar a GRH nacional no contexto europeu. Refira-se que

Portugal integra o modelo latino de GRH. No entanto, Cabral-Cardoso (2004:567)

enumera algumas diferenças nacionais neste cluster do Oeste mediterrânico. Aduz que é

em Espanha e França que a GRH está mais integrada com a estratégia da empresa, Itália

a menos integrada, enquanto a GRH em Portugal ocupa uma posição intermédia.

O perfil do responsável de GRH parece, igualmente, explicar o desenvolvimento

desta disciplina. Em Portugal é mais forte a influência das Ciências Sociais e do Direito.

Tal como Portugal, a França, a Espanha e a Alemanha têm maior propensão para a

aplicação da Lei. Na Alemanha evidencia-se ainda o controlo de custos e os estudos de

gestão, enquanto na Inglaterra a maior influência vem das humanidades, artes e línguas.

No estudo coordenado por Cabral-Cardoso (2004) a 400 empresas a operarem em

Portugal em todos os sectores e dimensões, verifica-se que a figura do gestor de GRH

está a mudar de perfil. Ainda que maioritariamente seja uma função ocupada por

homens (59,1%) está a crescer a representatividade das mulheres sobretudo das mais

jovens (menos de 40 anos). Começa a predominar uma formação escolar de nível

superior (74,6%), se bem que na área de gestão (39,7%) e Ciências Sociais (23,8%).

Enquanto função autónoma da empresa é ainda muito recente sendo, na sua maioria,

existente há menos de 10 anos (65,3%).

Inegável é o crescente envolvimento que a GRH tem vindo a assumir nas decisões

de âmbito estratégico a nível organizacional, dotando-a de um papel mais pró-activo.

Logo, mais do que um instrumento de gestão de pessoas, a GRH em Portugal poderá

Page 25: Gestao Estrategica de RH

25

ser, actualmente, encarada como um parceiro das decisões da gestão, servindo muitos

dos propósitos organizacionais.

O desafio que se coloca aos profissionais de RH, neste âmbito, passa por um

reequacionamento profundo em termos da lógica dominante e subjacente à

implementação de uma GERH. Em vez de uma lógica limitada, por exemplo, ao ganho

económico, poderá adoptar-se uma visão integrativa e que abarque os vários detentores

de interesses na e pela actividade da empresa (Stakeholders) (Gomes e Cunha, 2003:11).

Esta perspectiva confere à GRH a necessidade de reflectir sobre o melhor modelo de

gestão que permita alinhar os interesses dos Recursos Humanos com os objectivos da

organização, quer no contexto macro quer no contexto micro.

5. Considerações Finais

Assiste-se na Era Pós-moderna ao emergir de um novo tipo de sociedade e de

economia, caracterizadas pela informação e conhecimento. Germinam novos tipos de

emprego, novos conteúdos nos sistemas, métodos, modos e ferramentas de produção e

comunicação levando ao aparecimento, nos últimos anos, de configurações estruturais e

estilos organizativos substancialmente distintos da imagem clássica.

Como consequência, surgem novas realidades para a GRH da empresa, exigindo a

adaptação e reestruturação de políticas, técnicas e práticas de GRH que acompanhem os

processos de globalização, inovação, concorrência e instabilidade dos mercados. Tal

exige formas inteiramente novas de pensar a gestão de pessoas, nomeadamente a

dinamização do potencial criativo, empreendedor e conhecimento dos colaboradores. A

adopção deste modelo de GRH, mais inovador e orientado para os objectivos globais da

organização atribui, em definitivo, a efectiva função estratégica da GRH, ao reconhecer

na dimensão humana um investimento e nunca um custo para a organização.

Os padrões internacionais da GRH perspectivam a afirmação de um novo modelo,

denominado de Gestão Estratégica de Recursos Humanos utilizado, pela primeira vez

em Inglaterra, por Fombrun, Tichy e Devanna (1984). Neste seu estádio mais recente,

“a GRH assume um novo papel, uma nova definição, nova organização e novos

resultados. Hendry e Pettigrew (1990:20-22) sintetizam as principais mudanças

estratégicas da GRH que incluem:

- Uso de planeamento;

Page 26: Gestao Estrategica de RH

26

- Relação coerente com os designers e gestão de sistemas de pessoal baseados em

políticas de GRH ajustadas com a estratégia de gestão;

- As pessoas são vistas como um recurso estratégico da organização;

- A GRH é conduzida e alinhada com a estrutura formal da empresa e com os seus

objectivos organizacionais;

- A GRH apropria-se da selecção, avaliação, formação e desenvolvimento, sistema de

recompensas, relações de emprego e aparece alinhada com a cultura organizacional.

Para Bilhim (2004:49) a GERH está centrada no pressuposto de que os empregados

são activos essenciais da organização e que o seu valor pode ser aumentado e até

potenciado através de uma abordagem sistemática e coerente de investimento na sua

formação e desenvolvimento. Tal perspectiva exige da nova GRH o desenvolvimento de

políticas e práticas5 que facilitem o envolvimento e a participação dos empregados para

o alcance dos objectivos organizacionais. Emerge, igualmente, uma crescente

preocupação com a perspectiva individual dos Recursos Humanos, isto é, valorizar e

gerir cada pessoa individualmente. Esta tendência justifica-se por estarmos numa

Sociedade de Conhecimento que tende a olhar para trabalhador como uma pessoa

portadora de competências e qualificações que são estratégicas para a organização. São

as pessoas que, nos últimos anos, diferenciam positivamente as organizações entre si.

Esta visão dos Recursos Humanos justifica a força que expressões como Gestão de

Pessoas, Gestão do Conhecimento, Gestão do Capital Intelectual ou Gestão do Capital

Humano conquistaram nos últimos anos para simbolizar a Gestão Estratégica dos

Recursos Humanos. Mais do que a competitividade valoriza-se a cooperação intra-

organização.

Inequívoca parece ser a necessidade de se verificar uma renovação da FRH, no

sentido desta se tornar mais integrada com a estratégia de negócio e resultados da

empresa (Moura, 2000). Para o efeito propõe-se, ao profissional de GRH do futuro, a

aptidão para saber articular as motivações que envolvem a mudança da força laboral e

as exigências da direcção organizativa, isto é, que ajude a alcançar a um único tempo,

os objectivos organizacionais e as metas individuais.

5 Mais do que a tradicional selecção de trabalhadores, a GERH deve estar mais orientada para a fidelização dos melhores Recursos Humanos, desenvolvendo sistemas de avaliação de desempenho, de remuneração e desenvolvimento da carreira atractivos. Por outro lado, e pela primeira vez na história da GRH, assumem maior ênfase os aspectos ligados às atitudes, emoções e características comportamentais dos trabalhadores.

Page 27: Gestao Estrategica de RH

27

Assim entendida, a GRH será certamente, num futuro próximo, uma dimensão

estratégica na criação de valor organizacional e, as novas formas de organização e

desenvolvimento dos Recursos Humanos o grande desafio!

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