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76 Economia de Empresas Carmen Silvia Sanches Economista pela Unicamp, Mestre e Doutoranda em Administração de Empresas pela EAESP/FGV. E-mail: [email protected] RAE - Revista de Administração de Empresas Jan./Mar. 2000 PALAVRAS-CHAVE Auto-regulação, empresa proativa, estratégia de negócios e meio ambiente, tecnologias ambientais, instrumentos de gestão ambiental. KEY WORDS Auto-regulation, proactive company, business strategy and environment, environmental technologies, environmental management tools. GESTÃO AMBIENTAL PROATIVA ABSTRACT Industrial companies that look for a competitive advantage or to even survive and to adjust to a turbulent and unforeseeable business environment realize that they need to increasingly strike new attitudes related to environmental problems. These new attitudes include a continuous changing process on the manner to manage their business in the organizations. Thus, some industrial companies are developing new ways to deal with the environmental problems through auto-regulation mechanisms or proactive environmental management. São Paulo, v. 40 n. 1 p. 76-87 RESUMO As empresas industriais que procuram manter-se competiti- vas ou mesmo sobreviver e se ajustar a um ambiente de ne- gócios turbulento e imprevisível percebem cada vez mais que, diante das questões ambientais, são exigidas novas postu- ras, num processo de renovação contínua, seja na maneira de operar seus negócios, seja em suas organizações. Nesse sentido, as empresas industriais estão desenvolvendo novas formas de lidar com os problemas ambientais, mediante mecanismos de auto-regulação ou por meio de uma gestão ambiental proativa.

GESTÃO AMBIENTAL PROATIVA - SciELOGestão ambiental proativa RAE© 2000, RAE - Revista de Administração de Empresas / EAESP / FGV, São Paulo, Brasil. • v. 40 • n. 1 • Jan./Mar

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76 RAE • v. 40 • n. 1 • Jan./Mar. 2000

Economia de Empresas

Carmen Silvia SanchesEconomista pela Unicamp, Mestre eDoutoranda em Administração deEmpresas pela EAESP/FGV.E-mail: [email protected]

RAE - Revista de Administração de Empresas • Jan./Mar. 2000

PALAVRAS-CHAVEAuto-regulação, empresa proativa, estratégia de negócios e meio ambiente, tecnologias ambientais,

instrumentos de gestão ambiental.

KEY WORDSAuto-regulation, proactive company, business strategy and environment, environmental technologies,

environmental management tools.

GESTÃO AMBIENTALPROATIVA

ABSTRACTIndustrial companies that look for a competitive advantageor to even survive and to adjust to a turbulent andunforeseeable business environment realize that they needto increasingly strike new attitudes related to environmentalproblems. These new attitudes include a continuouschanging process on the manner to manage their businessin the organizations. Thus, some industrial companies aredeveloping new ways to deal with the environmentalproblems through auto-regulation mechanisms or proactiveenvironmental management.

São Paulo, v. 40 • n. 1 • p. 76-87

RESUMOAs empresas industriais que procuram manter-se competiti-vas ou mesmo sobreviver e se ajustar a um ambiente de ne-gócios turbulento e imprevisível percebem cada vez mais que,diante das questões ambientais, são exigidas novas postu-ras, num processo de renovação contínua, seja na maneirade operar seus negócios, seja em suas organizações. Nessesentido, as empresas industriais estão desenvolvendo novasformas de lidar com os problemas ambientais, mediantemecanismos de auto-regulação ou por meio de uma gestãoambiental proativa.

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INTRODUÇÃO

O ambiente de negócios na década de90 tem-se mostrado bastante instável e tur-bulento, verificando-se a existência de mu-danças bastante drásticas no processo eco-nômico e produtivo mundial, com implica-ções diretas para as empresas industriais.Fatos como transformações na economia in-ternacional e globalização da produção e doconsumo têm sido acompanhados de outrasmudanças como, por exemplo, um crescentegrau de exigência dos consumidores, que,por meio de seu poder de compra, estão bus-cando variedade de produtos, demonstran-do a sua preocupação pela qualidade e ma-nifestando uma constante exigência paramelhorar o binômio preço-desempenho.

A emergência desse consumidor maisagressivo e exigente reflete em grande par-te as mudanças que a própria sociedade vemsofrendo quanto a valores e ideologias e queenvolvem suas expectativas em relação àsempresas e aos negócios. Esses novos va-lores e ideologias incluem a democracia, aigualdade de oportunidades, a saúde e a se-gurança no trabalho, a proteção ao consu-midor, um meio ambiente mais limpo, en-tre outras questões. Seja como consumido-res, ou como trabalhadores, ou ainda pormeio do governo ou da mídia, a sociedadetem pressionado para que as empresas in-corporem esses valores em seus procedi-mentos operacionais. Como conseqüência,as empresas estão se deparando com umambiente externo em que cada vez mais asquestões sociais, políticas e legais, inexis-tentes ou apenas latentes em períodos an-teriores, adquirem uma nova perspectivaadministrativa.

As empresas industriais que procurammanter-se competitivas ou mesmo sobrevi-ver e se ajustar a esse novo ambiente denegócios, que já se mostra bastante concor-rido, marcado por incertezas, instabilida-des e rápidas mudanças, percebem cada vezmais que, diante das questões ambientais,são exigidas novas posturas, seja na manei-ra de operar seus negócios, seja em suas or-ganizações. Essa renovação implica contí-nuas mudanças, que podem ser dolorosas ecustosas também em termos financeiros, es-pecialmente se forem impostas, como por

meio de regulamentações ambientais, ou se pro-vierem de uma imagem pública negativa, como poratritos com comunidades locais ou um desastre am-biental . Essas mudanças podem, ainda, sergerenciadas internamente mediante mecanismos deauto-regulação ou por ações individuais, como serávisto a seguir.

A AUTO-REGULAÇÃO

A auto-regulação representa iniciativas toma-das pelas empresas ou por setores da indústria paraempreender e disseminar práticas ambientais quepromovam uma maior responsabilidade das em-presas quanto às questões ambientais, mediante aadoção de padrões, monitorações, metas de redu-ção da poluição e assim por diante. Num sentidomais amplo, pode-se dizer que é uma das diver-sas maneiras de equilibrar as forças de mercado edistribuir de maneira mais justa, em termos mo-netários, os danos que a sociedade está suportan-do como efeito da modificação da qualidade domeio ambiente.

A auto-regulação tem-se apresentado sob diver-sas formas. Uma delas são os acordos voluntários,que têm sido usados desde a década de 70, especi-almente em países desenvolvidos, algumas vezespara complementar e tornar mais fortes as regula-mentações já existentes. Trata-se de contratos en-tre autoridades públicas (por exemplo, o Ministé-rio ou a Secretaria do Meio Ambiente) e a indús-tria (uma associação industrial ou uma firma indi-vidual) ou entre uma firma e uma municipalidadeou associação de moradores locais, sob os quais asindústrias ou firmas se comprometem a alcançaruma série de objetivos ambientais. Os contratos têma força de lei privada, somente, e não acarretam

AS EMPRESAS INDUSTRIAIS

QUE PROCURAM MANTER-SE

COMPETITIVAS PERCEBEM

CADA VEZ MAIS QUE, DIANTE

DAS QUESTÕES AMBIENTAIS,

SÃO EXIGIDAS NOVAS

POSTURAS, NUM PROCESSO

DE RENOVAÇÃO CONTÍNUA.

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penalidades legais pela quebra de seus termos. Al-gumas de suas vantagens, sob o ponto de vista daindústria, relacionam-se ao fato de oferecerem umincentivo para as firmas investirem em processosde produção mais adequados, em vez de se sub-meterem aos objetivos ambientais impostos porautoridades governamentais, além de concederemuma imagem pública mais positiva da indústriapara os governos, as comunidades locais e a pró-pria sociedade (Potier, 1994).

Outra forma de auto-regulação, mais recente-mente utilizada, são os princípios e códigos de con-dutas empresariais internacionais, como o Progra-ma Atuação Responsável (Responsible Care) daindústria química, elaborado em 1985 no Canadáe disseminado em diversos outros países, inclusi-ve no Brasil, pelas associações nacionais do setor;os Princípios Ceres (antigamente chamados Prin-cípios Valdez), que datam de 1989, mas com umanova versão de 1992; o Keidaren GlobalEnvironment Charter, organizado no Japão em1991; a Carta de Princípios para o Desenvolvimen-to Sustentável, lançada pela Câmara Internacionalde Comércio (CIC) em 1991, entre outros.

Também se enquadram nas iniciativas de auto-regulação as parcerias formadas entre empresas,como, por exemplo, o Compromisso Empresarialpara a Reciclagem (Cempre), com empresas naci-onais e multinacionais voltadas para o desenvol-vimento e a capacitação da indústria brasileira nes-sa área; ou a Gemi (Global EnvironmentalManagement Initiative), uma “rede de negóciosverdes” sediada em Washington, Estados Unidos,formada por 20 empresas norte-americanas degrande porte, como a Procter & Gamble, a AT&T,

entre outras, interessadas em promover aimplementação da Carta da CIC e(com)partilhar as melhores práticas de ges-tão ambiental.

Trata-se, todas as formas de auto-regulação, de iniciativas que marcam umnovo contexto de participação do empresa-riado rumo à consciência e às responsabili-dades ambientais, também com a preocu-pação de adequar os princípios de susten-tabilidade à realidade dos mercados em queas empresas estão inseridas.

A POSTURA PROATIVA

A auto-regulação também se estende aempresas agindo por sua própria iniciativae interessadas no desempenho de seus pró-prios negócios. Nesse sentido, empresas in-dustriais adotam posturas proativas em re-lação ao meio ambiente mediante a incor-poração dos fatores ambientais nas metas,políticas e estratégias da empresa, consi-derando os riscos e os impactos ambientaisnão só de seus processos produtivos mastambém de seus produtos. Assim, a prote-ção ambiental passa a fazer parte de seusobjetivos de negócios e o meio ambientenão é mais encarado como um adicional decusto, mas como uma possibilidade de lu-cros, em um quadro de ameaças e oportu-nidades para a empresa.

Nesse contexto, o meio ambiente assu-me as características descritas por Buchholz(1992) como de uma questão estratégica paraos negócios de uma empresa, a saber: a) co-loca uma tendência ou oportunidade atual ouprospectiva; b) surge de alguma tendênciaou desenvolvimento interno ou externo; c)pode ter um impacto potencial importanteno crescimento, na rentabilidade ou na so-brevivência dos negócios; d) o curso ou im-pacto da questão podem, de alguma forma,ser influenciados pela ação da empresa.

Sob esse prisma, o meio ambiente gerauma nova perspectiva na agenda de negó-cios de empresas proativas, que pode serestabelecida sob duas óticas distintas: omeio ambiente como base de negócios oude desenvolvimento de idéias. Como basede negócios, o meio ambiente apresentaoportunidades e ameaças para os interes-ses dos negócios. A base de negócios pode

TRATA-SE, TODAS AS

FORMAS DE AUTO-

REGULAÇÃO, DE INICIATIVAS

QUE MARCAM UM NOVO

CONTEXTO DE PARTICIPAÇÃO

DO EMPRESARIADO RUMO

À CONSCIÊNCIA E ÀS

RESPONSABILIDADES

AMBIENTAIS.

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identificar novas oportunidades para o de-senvolvimento de processos, produtos emercados, assim como para influenciar ealterar as exigências de consumo nos mer-cados já existentes, podendo, ainda, obri-gar o fechamento de uma fábrica. Já comobase de desenvolvimento de idéias, o meioambiente contribui como parte de uma aná-lise crítica da forma como a sociedade e osnegócios operavam no passado, levantan-do questões acerca dos paradigmas existen-tes e a construção de novos paradigmas. Abase de desenvolvimento de idéias colocanovas formas de pensamento e questõescomo o desenvolvimento sustentável e aresponsabilidade ambiental (Roome, 1994).

Partindo dessas novas bases de negó-cios e de idéias, a empresa estabelece umaresponsabilidade ambiental por processose produtos que envolve um relacionamen-to diferente, compartilhado, com fornece-dores e consumidores, no que se refere àprevenção da poluição, à minimização dosresíduos e à proteção dos recursos natu-rais. A essa responsabilidade, adicionam-se outras, por questões ambientais maisdifusas, como o bem-estar dos trabalhado-res, da comunidade e até de gerações fu-turas. Isso obriga as empresas industriaisa usarem horizontes de longo prazo e vi-sões mais amplas de seus processos de de-senvolvimento de produto e análise de de-sempenho. Com isso, requer-se um novoconjunto de valores, incluindo políticas emetas que incorporem a dimensão ambien-tal na organização.

Verifica-se, assim, que as empresas in-dustriais que buscam uma postura proativaem relação às questões ambientais depa-ram-se com necessidades de mudanças quecomeçam por seu próprio ambiente inter-no, mudanças essas que podem ser de di-versos graus, conforme as especificidadesda organização e as pressões existentespara que se adote uma postura diferencia-da em relação ao meio ambiente. De umamaneira geral, as mudanças internas ne-cessárias envolvem o reconhecimento danatureza interdisciplinar e interfuncionaldos problemas ambientais, o que exige queas áreas funcionais da organizaçãointerajam e se integrem entre si, em ter-mos de comunicação, de autoridade e de

fluxo de trabalho. Também se requerem novas for-mas de relacionamento com os grupos de interes-ses da organização, como trabalhadores, consu-midores, fornecedores, agências governamentais,comunidades, etc., para dar-lhes sinais de que es-forços estão sendo concentrados para atender àssuas exigências e para prever demandas futuras.Conseqüentemente, é buscada uma estrutura quesuporte essa interação, integração e comunicação,interna e externa.

Uma terceira necessidade de mudanças internasidentificada é a busca de novas informações, sejasobre os impactos ambientais de processos e pro-dutos, atuais e futuros; seja sobre conceitos, ferra-mentas, técnicas, tecnologias e sistemas para cap-turar esses impactos ambientais; seja sobre as exi-gências e tendências externas. Ao mesmo tempo, épreciso acolher formas de pensamento e análise quecomportem as ambigüidades, complexidades e in-terdependências dessas informações. Requerem-se,assim, novos sistemas que comportem as novas ta-refas, assim como talentos gerenciais para lidarcom a dimensão ambiental.

Assim, uma empresa que adota uma posturaproativa diante dos imperativos ambientais preci-sa inovar não só seus produtos e processos mas tam-bém, como coloca Roome (1994), sua organização.Ao realizar essas inovações – nos processos, nosprodutos, nas estratégias e na organização –, as em-presas industriais desenvolvem uma capacidade dese antecipar às exigências externas, dos governos,dos mercados ou da própria sociedade, mais do queesperar que essas exigências se desenvolvam e setornem pressões para a adoção de práticas ambien-tais mais sustentáveis.

É interessante notar que a abordagem proativanão é restrita à gestão do meio ambiente, mas par-te de uma tendência que está emergindo na admi-

UMA EMPRESA QUE ADOTA

UMA POSTURA PROATIVA

DIANTE DOS IMPERATIVOS

AMBIENTAIS PRECISA INOVAR

NÃO SÓ SEUS PRODUTOS E

PROCESSOS MAS TAMBÉM

SUA ORGANIZAÇÃO.

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nistração em geral. Essa tendência é evidenciadanas obras e declarações de Peter Drucker (1992;Netz e Carvalho, 1995), Davidow e Malone (1993),Hamel e Prahalad (1994, 1995a, 1995b), entre ou-tros autores, que incentivam as empresas a enxer-garem mais longe e se anteciparem às mudanças,permitindo a obtenção de vantagens competitivasem seus mercados e também a criação de novosmercados. As prescrições sempre passam por re-formas na organização que incluam a alteração dasestruturas e sistemas, mudanças no pensamento ounas filosofias e aprendizado de novos comporta-mentos e práticas da empresa industrial. Sendoassim, a gestão ambiental proativa também requero tipo de reforma organizacional que é buscadapara que os negócios sejam bem-sucedidos econô-mica e comercialmente.

Tecnologias ambientais: emprego e gestãoUm elemento fundamental para assegurar o de-

sempenho econômico, produtivo e ambiental deuma empresa industrial é a utilização de tecnolo-gias ambientais. O uso da tecnologia já vem semostrando um fator importante nas últimas déca-das para assegurar a rentabilidade e a competitivi-dade da maioria das empresas industriais. No casoda proteção ambiental, as tecnologias ambientaisenvolvem:a) tecnologias de controle de poluição (end-of-

pipe), cujo principal objetivo é combater assaídas indesejáveis de resíduos do processo pro-dutivo (poluição), sem realizar intervenções nopróprio processo. Trata-se de equipamentos decontrole de emissões e efluentes, tais como fil-tros purificadores, incineradores e redes de tra-tamento de água e esgoto, entre outros, que re-movem os resíduos poluentes ou reduzem suatoxicidade;

b) tecnologias de prevenção da poluição ,centradas no processo produtivo para torná-lomais eficiente, ou seja, ampliar a taxa de utili-zação dos insumos nos produtos fabricados. Es-sas tecnologias permitem não só reduzir os re-síduos e poluentes na fonte mas tambémreutilizar ou reciclar os resíduos produzidos,preferencialmente ainda na planta industrial,voltando diretamente ao processo produtivo, e,em último caso, tratar os resíduos que não po-dem ser eliminados, reutilizados ou reciclados;

c) tecnologias de produtos e processos dentro doque foi conceituado pelo Programa das NaçõesUnidas para o Meio Ambiente (Pnuma) como aaplicação contínua de uma estratégia ambien-

tal preventiva integrada aos processos eprodutos para reduzir riscos aos sereshumanos e ao meio ambiente (What...,1994). Para os processos produtivos, aestratégia ambiental inclui a conserva-ção de matérias-primas e energia, a eli-minação de matérias-primas tóxicas e aredução da quantidade e toxicidade detodas as emissões e resíduos antes dedeixarem o processo. Para os produtos,a estratégia concentra-se na redução deimpactos por todo o ciclo de vida do pro-duto, da extração das matérias-primasaté a disposição final do produto.O emprego de tecnologias de produtos

e processos concorre para uma série de be-nefícios para uma empresa proativa ambi-entalmente, dentre os quais se podem des-tacar (Maimon, 1994; Donaire, 1994; Portere Van der Linde, 1995a, 1995b; Roome,1994; Shrivastava 1994/1995):• melhorias na eficiência produtiva com

menor utilização de energia e materiaispor unidade de produto;

• minimização da quantidade de resíduosdispostos no meio ambiente;

• desenvolvimento de tecnologias maislimpas, que se transformam em vanta-gens competitivas e até mesmo em pro-duto, com a possibilidade de auferir re-ceitas com transferência de tecnologia,como, por exemplo, o licenciamento depatentes, a prestação de assistência téc-nica, etc.;

• desenvolvimento de novos produtos paranovos mercados, seja mediante oreaproveitamento de resíduos e sua uti-lização como um novo produto, seja me-diante o desenvolvimento de produtoscom atributos ambientais;

• maior segurança pública e minimizaçãodos impactos ambientais de produtos;

• melhoria da imagem pública e das re-lações com os órgãos governamentais,com a comunidade e grupos ambienta-listas, permitindo até um maior escopopara auxiliar e influenciar os governosem novas regulamentações;

• melhoria nas condições de segurança esaúde dos trabalhadores e nas relaçõesde trabalho;

• maior comprometimento de todo o staffda empresa.

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Entretanto, não é a mera posse da tec-nologia que assegura o sucesso de sua im-plementação, mas sua apropriada gestão.Nesse sentido é que as empresas industri-ais que buscam a proteção ambiental vêmincorporando uma nova função administra-tiva em sua estrutura, com um corpo técni-co específico e um sistema gerencial espe-cializado. Essa nova função administrati-va, um departamento ambiental na estrutu-ra da organização, permite que a empresaindustrial administre adequadamente suasrelações com o meio ambiente, avaliando ecorrigindo os problemas ambientais presen-tes, minimizando os impactos negativosfuturos, integrando articuladamente todosos setores da empresa quanto aos imperati-vos ambientais e realizando um trabalho decomunicação ativo, interno e externo.

Em estudos realizados com empresasnorte-americanas de diversos setores, Hunte Auster (1995) verificaram que o departa-mento ambiental de empresas proativas éprovido de pessoal com indivíduos deter-minados, motivados, de alto nível, que têmum conceito de gestão ambiental que vaimuito além da idéia do policiamento e daprevenção da poluição. Esse departamentopromove programas preventivos que se es-tendem por toda a organização, treina osempregados e promove a conscientizaçãoe responsabilidade ambiental em todos osníveis da organização, monitora as opera-ções continuamente e trabalha rapidamen-te para corrigir problemas assim que ocor-rem. Também há uma grande ligação entrea função ambiental e os níveis mais altosde administração, por meio de relações deinformações diretas, encontros periódicosou laços informais. Assim, as exigências eas metas quanto aos ditames ambientais sãoclaras em todos os níveis da organização, esistemas que facilitam o alcance dessasmetas são constituídos em cada área daempresa. Adicionalmente, há uma forte atu-ação com os agentes reguladores, o própriogoverno e também em comunidades locais.

Enfim, empresas industriais que adotamuma postura proativa em relação ao meioambiente procuram continuamente se capa-citar melhor para enfrentar os desafios am-bientais e promover a proteção e a respon-sabilidade ambientais, tanto externamente

quanto em suas estruturas organizacionais, buscan-do também garantir que os negócios sejam bem-sucedidos econômica e comercialmente.

Resistências à adoção de posturas proativasem relação ao meio ambiente

Embora a direção da proteção e da responsabi-lidade ambientais pareça inevitável no contexto demudanças das empresas industriais e favorável aosinteresses dos negócios pelas melhorias na com-petitividade global da empresa, é ainda uma práti-ca pouco difundida, como mostram pesquisas efe-tuadas com empresas da Comunidade Européia, quedetectaram que a responsabilidade ambiental nemsempre faz parte da estratégia de uma empresa in-dustrial, a não ser que esta receba sinais claros deexigências do mercado (Maimon, 1994). Por suavez, uma pesquisa nos Estados Unidos, conduzidaem 1992 pela Associação Nacional de GerentesAmbientais, concluiu que a maioria das empresasque empregam gerentes ambientais o fazem porquestões de conformidade às regulamentações, sen-do que quase nenhuma delas pensa em termos demelhorias em projetos ou processos (Wheeler III,1992). No Brasil, o quadro é mais dramático, umavez que 75% das maiores empresas industriais dopaís nem possuem um sistema de gestão ambien-tal , segundo pesquisa realizada pela PriceWaterhouse (Gomes, 1996). A maioria das empre-sas industriais, tanto no Brasil como nos países de-senvolvidos, enfim, ainda não estão dando a devi-da importância à dimensão ambiental e a suas im-plicações para suas atividades de negócios, nãodesenvolvendo, assim, respostas adequadas.

A relutância em adotar uma postura proativa emrelação aos imperativos ambientais fica expressana profusão de reclamações quanto às políticas am-bientais governamentais, quanto à sua rigidez,

É INTERESSANTE NOTAR QUE

A ABORDAGEM PROATIVA NÃO

É RESTRITA À GESTÃO DO

MEIO AMBIENTE, MAS PARTE

DE UMA TENDÊNCIA QUE

ESTÁ EMERGINDO NA

ADMINISTRAÇÃO EM GERAL.

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quanto à sua eficiência e especialmente quanto aosaltos custos de conformidade,1 especialmente nospaíses desenvolvidos, nos quais os governos vêmintensificando sua ação nessa área. Alguma razãopode ser dada a essas críticas, se se considerar queos custos de conformidade às regulamentaçõesambientais podem ter um impacto adverso nalucratividade de setores ou empresas industriaisque já têm menor competitividade no mercado. Éo caso daqueles setores sujeitos a maiores custosde mão-de-obra, menor disponibilidade de capitalou atraso tecnológico, nos quais os custos ambien-tais representam uma compressão ainda maior dasmargens de lucro das empresas. Nesses casos, po-rém, os problemas não parecem se relacionar uni-camente ao meio ambiente, e não seria só a políti-ca ambiental que afetaria o desempenho econômi-co-financeiro dos setores ou das empresas indus-triais em questão.

Também não se pode negar que as regulamen-tações ambientais afetam a estrutura de custos dasempresas industriais, mesmo das que não têm osproblemas acima identificados. Dados da Organi-zação para a Cooperação e Desenvolvimento Eco-nômico (OCDE), porém, mostram que os custosde conformidade ambiental nos países membros –que são os que em geral praticam as políticas am-bientais mais restritivas – constituem em médiamenos de 3% dos custos totais ou de giro na maio-ria dos setores industriais (Stevens, 1993).

Uma série de iniciativas bem-sucedidas por par-te de algumas empresas industriais pode, ainda, tor-nar alguns desses argumentos defensivos uma fa-lácia. Sem discutir aqui a eficiência e efetividadedas políticas ambientais dos governos em incenti-var a busca de soluções alternativas, mais criati-

vas, para os problemas ambientais, há efe-tivamente casos que não têm consideradoa postura governamental como uma bar-reira, mas sim como uma base de lança-mento de inovações, conseguindo benefí-cios internos e vantagens sobre muitosconcorrentes que relutam ou retardam emsegui-los. Alguns desses casos que se podeapontar são:a) Forçada a obedecer a novas regulamen-

tações norte-americanas para reduzir asemissões de solvente, a 3M, do setor quí-mico, descobriu uma forma de evitar ouso dessa substância, substituindo-a porsoluções aquosas. Tal mudança resultounão só numa melhoria de produtivida-de, por se tratar de substituição de ummaterial por outro mais barato e maisseguro, mas também propiciou à empre-sa uma vantagem de liderança no desen-volvimento de produtos sobre os concor-rentes, que a seguiram só mais tarde(Porter e Van der Linde, 1995a).

b) Atenta à gestão de resíduos, que está sobuma rigorosa legislação nos EstadosUnidos, a Du Pont & Co., empresa dosetor químico, descobriu um novo pro-duto químico, conhecido como HMI. Aempresa verificou que o HMI,subproduto do processo produtivo donylon, poderia ser usado nas indústriasfarmacêutica e de tintas e, desde então,o HMI se tornou uma das principais fon-tes de lucro para a Du Pont (Wheeler III,1992).

c) Empresas européias fabricantes de pa-pel estão sujeitas a uma regulamentaçãode gestão de resíduos sólidos, que, emrelação à regulamentação norte-ameri-cana, é mais rigorosa e está em vigor hámuito mais tempo. No entanto, os fabri-cantes europeus conseguiram desenvol-ver uma infra-estrutura de gerenciamen-to de resíduos tão mais sofisticada queos norte-americanos que lhes está per-mitindo obter produtos de melhor qua-lidade, menos contaminados e conquis-tando fatias crescentes no mercado asi-ático, em detrimento dos fornecedoresnorte-americanos (Biddle, 1993).

d) Algumas pequenas destilarias indianasusavam tecnologias antigas e tradicio-nais para a produção de seus produtos,

O PAPEL DA ALTA

ADMINISTRAÇÃO É

FUNDAMENTAL PARA QUE AS

INICIATIVAS E OS ESFORÇOS

DA ORGANIZAÇÃO RUMO

À PROTEÇÃO E ÀS

RESPONSABILIDADES

AMBIENTAIS TENHAM SUCESSO.

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lançando um cheiro desagradável e subs-tâncias tóxicas no meio ambiente. Veri-ficando o enrijecimento das legislaçõesambientais em todo o mundo, essas des-tilarias buscaram uma organização inter-nacional especializada que as ajudou adesenvolver e instalar um processo detratamento que não só reduziu em 95%os resíduos tóxicos no meio ambientemas também gerou um subproduto, ometano, que passou a ser utilizado comosubstituto energético, reduzindo tambémos custos de consumo de energia nas em-presas (North, 1992).Já outras empresas lidavam com proble-

máticas ambientais muito antes do adventorecente da preocupação ambiental e daspressões regulamentares mais duras. Mui-tas questões de gestão ambiental eram abor-dadas, monitoradas e controladas por meioda produção diária, sem que fossem esta-belecidos os conceitos e termos que utili-zamos quanto aos problemas ambientaisnem as pressões externas a que as empre-sas industriais estão sujeitas atualmente.Esse é o caso da Volkswagen, que reconhe-ceu as considerações ambientais como uminteresse operacional e estratégico somen-te no final da década de 80. No entanto,desde a construção de sua primeira plantaem Wolfsburg, na Alemanha, em 1938, aempresa vem considerando os aspectos am-bientais, buscando a utilização de proces-sos de produção baseados na minimizaçãodo uso de água e de sua reciclagem, devidoà escassez de água na região próxima à fá-brica (Welford, 1994).

Também os fabricantes do setor de pa-pel inserem-se na mesma situação. Porexemplo, as norte-americanas Fort HowardWisconsin Tissue Mills e Marcal já vêmusando a reciclagem de sobras de papelcomo fonte principal de seus processos defabricação desde a década de 20. Fazendoisso, elas exploraram um recurso barato quelhes permitiu produzir produtos como len-ços de papel em posições competitivas. Aomesmo tempo, essas empresas não divul-gavam publicitariamente que seus produ-tos continham fibra reciclada porque osconsumidores no passado viam nisso umaindicação de baixa qualidade. Atualmente,ambas as empresas têm não só o apoio dos

consumidores mas também o fornecimento crescen-te de sobras de papel pós-consumidas, especialmen-te por programas de reciclagem em escritórios.Como resultado, as duas empresas estão aumen-tando suas fatias de mercado por meio do próprioposicionamento como empresas que oferecem pro-dutos ambientalmente responsáveis (Biddle, 1993).

Tais exemplos podem representar uma possibi-lidade de mudança no comportamento e nos para-digmas da concorrência industrial e tratar a quali-dade ambiental como uma fonte potencial de ren-tabilidade e vantagem competitiva. A indústria eas atividades industriais têm íntima relação comos problemas ambientais da sociedade moderna etambém com as soluções para a reversão do pro-cesso. A indústria tem mostrado que, por meio datecnologia e da racionalização, pode melhorar aeficiência em termos de uso dos recursos, substi-tuir recursos escassos e reduzir o desperdício.Como exemplo, pode-se citar a Revolução da Qua-lidade, inicialmente implementada pelas indústri-as japonesas e disseminada a partir da década de70 por toda a indústria ocidental, que permitiu osurgimento de sistemas de produção enxutos (leanproduction), altamente produtivos. Também valemencionar os “choques do petróleo” das décadasde 70 e 80, que elevaram os preços dos combustí-veis fósseis e levaram à busca e utilização de ener-gias alternativas, como o etanol produzido da cana-de-açúcar e utilizado por automóveis brasileiros.

EMBORA A DIREÇÃO DA

PROTEÇÃO E DA

RESPONSABILIDADE

AMBIENTAIS PAREÇA

INEVITÁVEL NO CONTEXTO DE

MUDANÇAS DAS EMPRESAS

INDUSTRIAIS E FAVORÁVEL AOS

INTERESSES DOS NEGÓCIOS

PELAS MELHORIAS NA

COMPETITIVIDADE GLOBAL DA

EMPRESA, É AINDA UMA

PRÁTICA POUCO DIFUNDIDA.

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Economia de Empresas

Trata-se de exemplos em que as indústrias fo-ram desafiadas a encontrar novas formas de lidarcom os problemas enfrentados. Atualmente, os de-safios envolvem problemas globais, tanto o dacrescente interdependência econômica mundialquanto o da crescente interdependência ambien-tal. A interdependência econômica é reconheci-da no processo de globalização e pelas profundasmudanças nos mercados locais e internacionaisque esse processo acarreta. Por outro lado, evi-dencia-se uma interdependência ambiental, em-butida nesse processo de globalização econômi-ca, adicionada a efeitos paralelos na forma dedanos ambientais globais, diretos e indiretos, dasatividades industriais, como o uso intensivo derecursos e o esgotamento de recursos naturais, adepreciação da camada de ozônio, a poluição, osacidentes industriais, entre outros.

Independentemente da forma que uma empre-sa industrial escolha realizar suas mudanças,engajando-se em iniciativas conjuntas de auto-regulação ou agindo individualmente, as ques-tões ambientais colocam permanentemente no-vos desafios à indústria que devem ser supera-dos para garantir o sucesso e a própria continui-dade dos negócios. Assim, faz-se necessária agestão adequada dos problemas ambientais, in-tegrando-a aos sistemas de gestão convencionaise permitindo que a organização avance para umamais ampla aceitação dos conceitos e princípiosambientais, no desenvolvimento de técnicas esistemas para capturar os impactos ambientaisde produtos e processos e no reconhecimento danecessidade de uma reforma organizacional egerencial para atingir melhores desempenhosambientais.

O papel da alta administração é funda-mental para que as iniciativas e os esforçosda organização rumo à proteção e às respon-sabilidades ambientais tenham sucesso. Nes-se sentido, novas abordagens têm surgidopara que empresas industriais proativas eseus top-executivos reforcem um compro-metimento da organização com a melhoriada qualidade do meio ambiente, como umadeclaração de princípios ambientais e umplano estratégico ambiental, instrumentosgerenciais que serão vistos a seguir.

INSTRUMENTOS GERENCIAIS DEPROMOÇÃO DA PROTEÇÃO ERESPONSABILIDADE AMBIENTAIS

Declaração de princípios ambientaisOs estudos realizados por Hunt e Auster

(1995), já citados, assim como os de North(1992) quanto à integração da dimensãoambiental na organização, constataram que,freqüentemente, é a média gerência que temtomado as primeiras iniciativas quando aempresa se defronta com problemas am-bientais, muitas vezes sem um apoio ex-presso por parte dos níveis mais altos atéque uma certa maturidade no pensamentoambiental da empresa tenha sido atingida.No entanto, especialmente nos casos emque a alta administração assume efetiva-mente um comprometimento e apoio aosesforços de melhoria da qualidade ambien-tal dos processos e produtos da empresa éque tais esforços são bem-sucedidos. Des-sa forma, o papel da alta administração éfundamental para perceber e modificar asensibilização da organização quanto aosproblemas ambientais, seja no ambienteexterno da empresa, seja no interno.

O comprometimento da alta administra-ção, na maioria dos casos, é formalizadomediante uma declaração de política cor-porativa, expressa em palavras, que inte-gra as questões ambientais aos negócios daempresa. O propósito dessa formalização énão só divulgar o envolvimento na soluçãode problemas ambientais à própria organi-zação mas também encorajar um compro-misso de toda a empresa, além de tornar pú-blica a decisão a outros grupos de interes-ses, como governos, consumidores, inves-tidores e comunidades locais.

INDEPENDENTEMENTE

DA FORMA QUE UMA

EMPRESA INDUSTRIAL

ESCOLHA REALIZAR SUAS

MUDANÇAS, AS QUESTÕES

AMBIENTAIS COLOCAM

PERMANENTEMENTE NOVOS

DESAFIOS À INDÚSTRIA.

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Não há um modelo definitivo dessa de-claração, mas algumas empresas adotam aCarta de Princípios para o DesenvolvimentoSustentável, da CIC, ou os Princípios Ceres,ou ainda os Princípios do Programa Atua-ção Responsável, especialmente se for dosetor químico, ou se espelham neles.

O conteúdo de uma declaração de prin-cípios ambientais não só menciona o com-prometimento, mas também estabelece asmetas básicas da empresa industrial em re-lação à causa ambiental. Nesse sentido, amaioria das declarações incluem a confor-midade a todas as regras e regulamentaçõesaplicáveis, assim como o comprometimen-to de cada empregado em verificar se essaconformidade é respeitada e assegurar queas operações e os produtos possam ser de-senvolvidos de uma forma ambientalmentesegura. Isso porque o gerenciamento daconformidade pode proteger uma empresade ações mais drásticas decorrentes das re-gulamentações existentes.

Já uma abordagem mais proativa envol-ve também o gerenciamento do risco, aprevenção da poluição e a comunicação, oque ajuda a organização a administrar aspolíticas ambientais também para o futu-ro. Mediante o gerenciamento do risco,uma empresa industrial identifica danospotenciais e assegura que as prioridadesestão sendo colocadas e os recursos,alocados de acordo com a prioridade derisco. Já a prevenção da poluição repre-senta a minimização ou eliminação da po-luição causada pela atividade industrial. Acomunicação é um mecanismo que parti-lha a importância do sucesso ambiental daempresa com todos os empregados e osgrupos de interesses.

Esses aspectos estão evidenciados naPolítica de Meio Ambiente da Rhodia S.A.,que declara (Rhodia, 1992):• “ Minimizar a produção de efluentes

e resíduos, por meio de tecnologiaslimpas e reciclagens: a redução deefluentes e resíduos, por meio de tecno-logias limpas e processos de reciclagens,constitui o ponto fundamental de nossapolítica. A idéia básica: preferimos pro-duzir menos efluentes e resíduos e ob-ter melhores rendimentos, em vez desuportar os custos de tratamento.

• Dominar as poluições acidentais: como respon-sáveis, devemos desenvolver os instrumentos eas medidas necessários para impedir que possamocorrer efeitos adversos ao meio ambiente devi-do ao mau funcionamento de nossas instalações.Isso é assegurado por meio de estudos de riscos,que envolvem equipes multidisciplinares de en-genheiros. Tais estudos resultam em investimen-tos que garantem a diminuição dos riscos exis-tentes. A prevenção de acidentes se faz por meiode estudos de riscos, que levam à melhoria dosprocessos de exploração, possibilitando a imple-mentação de planos de emergência e a formaçãodas pessoas envolvidas.

• Gerenciar com rigor a eliminação deefluentes e resíduos: a gestão rigorosa da eli-minação de resíduos e de efluentes líquidos egasosos deve ser feita não somente em respeitoà legislação, mas utilizando a melhor tecnolo-gia disponível e economicamente compatível.

• Desenvolver e comercializar produtos comum estrito respeito à saúde humana e ao meioambiente: o respeito à saúde humana e aoecossistema não é uma preocupação recente daRhodia. (...) Cada etapa de vida de um produto– da concepção à destruição – deve considerara proteção ao meio ambiente.

• Desenvolver a comunicação interna e exter-na: (...) Em relação ao público externo, e con-forme o conceito de ‘portas abertas’, enfatizam-se a maior integração das fábricas com as co-munidades vizinhas às suas instalações e a va-lorização do diálogo com as autoridades, os ór-gãos de controle ambiental e a imprensa. ARhodia dispõe de ferramentas de gestão – os

UMA ABORDAGEM MAIS

PROATIVA ENVOLVE TAMBÉM

O GERENCIAMENTO DO RISCO,

A PREVENÇÃO DA POLUIÇÃO E

A COMUNICAÇÃO, O QUE

AJUDA A ORGANIZAÇÃO A

ADMINISTRAR AS POLÍTICAS

AMBIENTAIS TAMBÉM

PARA O FUTURO.

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Economia de Empresas

Índices de Meio Ambiente – que permitem umamelhoria na comunicação interna de seusobjetivos e na comunicação com o públicoexterno .”No entanto, uma declaração por si mesma não

é o suficiente. A fim de que a declaração não fi-que só na formalidade, ela é traduzida para as po-líticas e práticas da empresa, o que normalmente éfeito mediante a elaboração de um plano estraté-gico ambiental.

Plano estratégico ambientalOs planos ambientais estabelecem a política es-

tratégica da empresa diante dos imperativos am-bientais, determinando as metas a serem atingidas,assim como as medidas a serem utilizadas para im-plementar a estratégia, avaliar seu resultado e es-tabelecer novos planos.

O conteúdo dos planos ambientais varia de em-presa para empresa, mas as que se voltam para osprincípios da sustentabilidade e responsabilidadeambientais geralmente utilizam requisitos internosou metas até mais restritivos que os legalmente im-postos, adotando uma abordagem integrada dasquestões ambientais em sua estratégia de negóci-os. Alguns aspectos que normalmente são observa-dos nessa abordagem integrada são os seguintes:• prioridade à saúde e segurança dos emprega-

dos, dos consumidores e da comunidade;• promoção de políticas que evitem os recursos

escassos, espécies em extinção e apoio a regi-mes opressivos;

• influência direta da política ambiental nos pro-cessos de fabricação, práticas de manutenção eemissões;

• influência da política ambiental no projeto de pro-dutos e processos de formas diretas e explícitas;

• redução, reuso e reciclagem de materiais;• monitoração e mensuração das emissões;• redução do uso e de emissão de substâncias tó-

xicas;• recuperação de produtos e embalagens após o

uso, para reuso e reciclagem;• treinamento ambiental aos empregados;• melhoria ambiental contínua;• contabilidade de custos ambientais.

Ao elaborar seu plano ambiental, muitas em-presas sentem necessidade de quantificar seus ob-jetivos e medir seu desempenho ambiental. É ocaso da fábrica da Du Pont em Paulínia, SP, que secomprometeu em reduzir em 30% o consumo deágua, mesmo não tendo custos com a água queconsome, a qual é retirada de um poço artesiano

instalado em sua própria planta (Gomes,1996). As metas quantitativas servemcomo incentivo para o esforço geral da or-ganização e são normalmente determinadasdentro de parâmetros possíveis de seremalcançados.

Para se implantar metas ambientaiscomo essa, as empresas precisam primei-ramente conhecer seu estado-atual-da-arteno campo ambiental, seja quanto às exi-gências dos grupos de interesses, sejaquanto aos seus impactos no meio ambi-ente. Em seguida, necessitam planejar suasações e estabelecer um conjunto de práti-cas e procedimentos que permita adminis-trar as relações empresa-meio ambiente,monitorando suas atividades, corrigindoproblemas, implementando novas solu-ções, avaliando riscos e adotando medidaspreventivas dentro da política e dos obje-tivos determinados pelo plano estratégicoambiental.

CONCLUSÃO

O setor industrial passa por um impor-tante período de transição e ajustes diantedos imperativos ambientais, que inclui, deum lado, o tratamento do meio ambientecomo uma questão estratégica e fonte po-tencial de rentabilidade e vantagem com-petitiva e, de outro, a busca de soluçõespara os problemas ambientais, atuais e fu-turos. As empresas industriais estão sendodesafiadas a encontrar novas formas de or-ganização e administração da produção queatendam às exigências ambientais e que re-presentem uma participação ativa doempresariado no processo de mudanças decomportamento necessário para que as ex-pectativas da sociedade relativas à melho-ria da qualidade de vida sejam atingidas.

Há uma área específica de problemáticareferente à tecnologia como solução paraos ditames ambientais, mas verifica-se ain-da a necessidade de uma gestão adequadade outras questões relacionadas ao meioambiente que permitam que uma organiza-ção industrial e a própria sociedade avan-cem rumo a uma mais ampla aceitação dosconceitos e princípios ambientais. Essasoutras questões relacionam-se à possibili-dade de se conciliar a expansão econômica

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e o avanço industrial e tecnológico com apreservação ambiental, que evidenciam opróprio conflito da sociedade atual, que éo de aliar o crescimento à qualidade de vida,de crescer sem destruir, de garantir a suafuturidade.

De fato, no que se refere ao meio ambi-ente, é exatamente o problema com o quala sociedade moderna se depara. Depois deperíodos de crescimento contínuo e explo-sivo, de adoção de modelos de desenvolvi-mento que viabilizassem o crescimento aqualquer preço, especialmente nos países

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NOTAS

Este a r t igo fo i p roduz ido a par t i r daDissertação de Mestrado A evolução daprát ica ambiental em empresasindustriais: algumas considerações sobre oestado-atual-da-arte e o caso brasileiro,apresentada à EAESP-FGV, sob a orientaçãodo Prof. Dr. José Carlos Barbieri e com apoio

em desenvolvimento, a sociedade hoje questiona opreço pago por todo esse esforço. O meio ambien-te se tornou um elemento-chave para se repensaros valores e as ideologias vigentes e se estabele-cer novas formas de pensamento e ação em todasas práticas produtivas. O meio ambiente tem-setornado um elemento vital para se estabelecer osnovos paradigmas da concorrência industrial e,por isso, aflora como importante questão para seestabelecerem os rumos futuros dos mercados eda sociedade, locais ou globais. Mesmo que soe“piegas” falar sobre meio ambiente e proteçãoambiental. �

trabalhadores e cidadãos comuns norte-americanos atacando as regras ambientais,alegando questões de custos e de direitos.Também os artigos de Walley e Whitehead(1994a , 1994b , 1994c) de fendem esseposicionamento, acrescentando os efeitosna competitividade industrial do país.

financeiro da Capes (Fundação Coordenaçãode Aper feiçoamento de Pessoal de NívelSuperior).

1. Essa postura é evidenciada em Cordtz(1994) . O au to r ap resen ta f i rmas ,