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GESTÃO EFICIENTE DE CONFLITOS JUDICIALIZADOS. · A Mediação Familiar é um método de solução de conflito de forma consensual, adotado pelo Poder Judiciário, de forma que as

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CLAUDIA APARECIDA COSTA LOPESMIRIAM BATISTA BENEDITO

Organizadoras

CEJUSC MARINGÁ: A EXPERIÊNCIA DA AUTOCOMPOSIÇÃO NA GESTÃO EFICIENTE DE CONFLITOS JUDICIALIZADOS.

Maringá – Paraná2019

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2019 Uniedusul Editora

Copyright da Uniedusul EditoraEditor Chefe: Profº Me. Welington Junior Jorge

Diagramação e Edição de Arte: André Oliveira VazRevisão: Os autores

Conselho EditorialAlexandra Fante Nishiyama – Faculdade Maringá

Aline Rodrigues Alves Rocha – PesquisadoraAna Lúcia da Silva – UEM

André Dias Martins – Faculdade Cidade VerdeBrenda Zarelli Gatti – Pesquisadora

Carlos Antonio dos Santos – PesquisadorCleverson Gonçalves dos Santos – UTFPR

Constanza Pujals – UningáDelton Aparecido Felipe – UEMFabio Branches Xavier – UningáFábio Oliveira Vaz – Unifatecie

Gilmara Belmiro da Silva – UNESPARJoão Paulo Baliscei – UEM

Kelly Jackelini Jorge – UNIOESTELarissa Ciupa – Uningá

Lourival Domingos Zamuner – UNINGÁMarcio Antonio Jorge da Silva – UEL

Márcio de Oliveira – UFAMPâmela Vicentini Faeti – UNIR/RM

Ricardo Bortolo Vieira – UFPRRodrigo Gaspar de Almeida – Pesquisador

Sâmilo Takara – UNIR/RM

O conteúdo dos artigos e seus dados em sua forma, correção e confiabilidade são de responsabilidade exclusiva dos autores.

Permitido fazer download da obra e o compartilhamento desde que sejam atribuídos créditos aos autores, mas sem de nenhuma forma ou utilizá-la para fins comerciais.

www.uniedusul.com.br

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“O fruto do silêncio é a oração, o fruto da oração é a fé, o fruto da fé é o amor, o fruto do amor é o serviço, o fruto do serviço é a paz.”

Madre Tereza de Calcutá

Pela abertura às múltiplas portas na resolução de conflitos e pela promoção da cultura de pacificação social na cidade de Maringá, agradecemos a Excelentíssima Juíza Carmen Lúcia Rodrigues Ramajo.

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In memoriam à primeira magistrada Coordenadora do Cejusc de Maringá, Liéje Aparecida de Souza Gouveia.

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SUMÁRIO

CAPÍTULO 1 .....................................................................................................................................7A MEDIAÇÃO E SUA EFICÁCIA, VIABILIDADE E FUNÇÃO SOCIAL NA RESOLUÇÃO DOS CONFLITOS FAMILIARESLETÍCIA CARLA BAPTISTA ROSALUCIA REGINA FERNANDESMYLENE MANFRINATO DOS REIS

CAPÍTULO 2 ...................................................................................................................................20O SISTEMA MULTIPORTAS APLICADO AO CENTRO JUDICIÁRIO DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS E CIDADANIA: ENFOQUE AO ARTIGO 334 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL E A RESOLUÇÃO 125/2010 DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇAMIRIAM BATISTA BENEDITO

CAPÍTULO 3 ...................................................................................................................................32DA APLICAÇÃO DA CONSTELAÇÃO SISTÊMICA NO PODER JUDICIÁRIOLUZ MARINA CAMPOS GUERRAPAULA SILVA

CAPÍTULO 4 ...................................................................................................................................51JUSTIÇA RESTAURATIVA E SEUS DESDOBRAMENTOS NA PACIFICAÇÃO SOCIAL: UMA QUESTÃO ÉTICA FOMENTADA PELA FAMÍLIA E PELA EDUCAÇÃO DO SER HUMANOANA KATMA CREMONESICAROLINE CHRISTINE MESQUITA

CAPÍTULO 5 ..................................................................................................................................62O PODER JUDICIÁRIO E O ADVOGADO FRENTE À MEDIAÇÃO DE CONFLITOS SOCIAISCLAUDIA APARECIDA COSTA LOPESSARAH TAVARES LOPES

CAPITULO 6 ...................................................................................................................................74DA POSSIBILIDADE DA UTILIZAÇÃO DOS MEIOS AUTOCOMPOSITIVOS COMO INSTRUMENTOS PARA RESOLUÇÃO DE CONFLITOS NO ÂMBITO DO COMÉRCIO EXTERIORJOÃO PAULO SABAINE FAGUNDES

CAPÍTULO 7 ...................................................................................................................................87A AMBIENTAÇÃO DO CEJUSC NOS CASOS CÍVEIS: UMA ANÁLISE DA ESTRUTURA DE MARINGÁBEATRIZ DOS SANTOS MOURÃOCAMILA ROSA DE SOUZA

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CEJUSC Maringá: A Experiência da Autocomposição na Gestão Eficiente de Conflitos Judicializados. 7

A MEDIAÇÃO E SUA EFICÁCIA, VIABILIDADE E FUNÇÃO SOCIAL NA RESOLUÇÃO DOS CONFLITOS

FAMILIARES

CAPÍTULO 1

LETÍCIA CARLA BAPTISTA ROSA1

LUCIA REGINA FERNANDES2

MYLENE MANFRINATO DOS REIS3

INTRODUÇÃO

Este trabalho de pesquisa tem como escopo analisar o papel dos instrumentos, que incentivam o diálogo das partes, utilizados na mediação familiar, analisar a significado e importância no contexto jurídico, como forma de fortalecer a sua capacidade em implementá-lo no judiciário.

Para tanto será analisado os seus mecanismos, seu papel no direito de família, os desafios enfrentados para sua realização, a essência do mecanismo e seus reflexos no âmbito nacional, bem como as formas utilizadas como meio de garantir o respeito e aproximação em busca de sua eficácia, viabilidade e sua função social garantindo assim sua essência.

1 Advogada. Mestre em Ciências Jurídicas pelo Centro Universitário Cesumar - UNICESUMAR. Doutoranda em Função Social do Direito pela Faculdade Autônoma de Direito de São Paulo. Coordenadora dos Cursos de Pós-graduação em Direito do Centro Universitário Cesumar - UNICESUMAR. Professora do curso de graduação em Direito UNIFATE-CIE - Faculdade de Teconologia e Ciência do Norte do Paraná, professora dos cursos em Gestão Financeira e Secretariado Executivo (EAD) do Centro Universitário Cesumar - UNICESUMAR. 2 Graduanda em Direito pelo Unicesumar – Centro Universitário Cesumar. Pesquisadora do Programa de Inicia-ção Científica (PIC). Endereço Eletrônico <[email protected]>3 Graduanda em Direito pelo Unicesumar – Centro Universitário Cesumar. Pesquisadora do Programa de Inicia-ção Científica (PIC). Endereço Eletrônico <[email protected]>

Destaca-se o papel da Resolução 125 do Conselho Nacional de Justiça e o rumo tomado como potencial efetivação na pacificação social e a busca de adequação ao sistema do Estado Democrático de Direito, trazendo um caráter amigável no acesso à justiça, como meio de amenizar os conflitos de forma pacífica.

E de igual forma, o que esse instituto tem ofertado no que diz respeito a amenizar a sobrecarga do Poder Judiciário, o papel do Estado em introduzir no ordenamento jurídico o instrumento de resolução de conflitos e também, a mudança de mentalidade e paradigmas, tão necessário para o sucesso e o êxito da tão importante política pública implantada para efetividade e eficácia nas resoluções das lides.

Assim, este estudo pretende através do método teórico, por meio de análises bibliográficas, doutrinas e jurisprudências fazer ponderações a respeito da importância, efetividade, aplicabilidade e limites percorridos até o momento, na mediação no âmbito da família, identificando o caminho a ser percorrido

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Capítulo 1 8CEJUSC Maringá: A Experiência da Autocomposição na Gestão Eficiente de Conflitos Judicializados.

na busca de alcançar sua eficácia como mecanismo principal da sociedade para resolução de conflitos.

DA MEDIAÇÃO FAMILIAR

A Mediação Familiar é um método de solução de conflito de forma consensual, adotado pelo Poder Judiciário, de forma que as partes (duas ou mais pessoas) com auxilio de um mediador capacitado e imparcial é o facilitador do diálogo, busca pacificamente, alcançar a melhor solução para o problema.

Esse facilitador tem o papel relevante de fomentar o diálogo entre as partes até a resolução amigável, honesta e justa do conflito, que se transforma em acordo e com a homologação do magistrado, terá o status de titulo extrajudicial. Segundo CNJ:4

A Mediação é uma forma de solução de conflitos na qual uma terceira pessoa, neutra e imparcial, facilita o diálogo entre as partes, para que elas construam, com autonomia e solidariedade, a melhor solução para o conflito. Em regra, é utilizada em conflitos multidimensionais ou complexos. A Mediação é um procedimento estruturado, não tem um prazo definido e pode terminar ou não em acordo, pois as partes têm autonomia para buscar soluções que compatibilizem seus interesses e necessidades.

Conforme definido por Águida Arruda Barbosa:5

A Mediação, examinada sob a ótica da teoria da comunicação, é um método fundamentado, teórica e tecnicamente, por meio do qual uma terceira pessoa, neutra e especialmente treinada, ensina os mediandos a despertarem seus recursos pessoais para que consigam transformar o conflito. Essa transformação constitui oportunidade de construção de outras alternativas para o enfrentamento ou a prevenção de conflitos. O mediador não decide pelos mediandos, já que a essência dessa dinâmica é permitir que as partes envolvidas em conflito ou impasse fortaleçam-se, resgatando a responsabilidade por suas próprias escolhas.”

Onde Carlos Eduardo de Vasconcelos, complementa:6

Um meio geralmente não hierarquizado de solução de disputas em que duas ou mais pessoas, com a colaboração de um terceiro, o mediador - que deve ser apto, imparcial, independente e livremente escolhido ou aceito -, expõem o problema, são escutadas e questionadas, dialogam construtivamente e procuram identificar os interesses comuns, opções e, eventualmente, firmar um acordo.

É um desafio para o mediador à compreensão dos aspectos psicológicos em decorrência do abalo causado pela perda, sofrimento, ruptura dos envolvidos no conflito.

Visto que a separação vai além do divórcio, da pensão alimentícia, da guarda, da visita, atinge

4 CONCILIAÇÃO e Mediação. Disponível em: http://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/con ciliacao-e-media-cao-portal-da-conciliacao. Acesso em: 04 nov. 2017.5 BARBOSA, Águida Arruda. Mediação familiar: Instrumento para a reforma do judiciário. In: Anais do IV Congresso Brasileiro de Direito de Família. Belo Horizonte: Del Rey. 2004.p.3.6 VASCONCELOS, Carlos Eduardo de. Mediação de conflitos e práticas restaurativas. São Paulo: Método, 2008.p.36.

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Capítulo 1 9CEJUSC Maringá: A Experiência da Autocomposição na Gestão Eficiente de Conflitos Judicializados.

demasiadamente o aspecto emocional, sendo necessário o amparo da Psicologia Jurídica, com uso de técnicas específicas nesse campo, como meio de amenizar a dor dos envolvidos. Ademais não se pode olvidar que as relações de família, geralmente são relações continuadas.

Como dispõe Silva:7

É possível dizer que o trabalho tanto de psicólogos quanto de operadores do Direito está voltado para o sujeito em sua totalidade, “através da busca de unificação das ações no âmbito do judiciário, buscando abordar as situações jurídicas em sua integralidade, ou seja, ressituando as pessoas envolvidas nos processos jurídicos à posição central do litígio.

Estrougo ainda assevera:8

O fazer do psicólogo é, justamente, atingir uma demanda que necessita ser ouvida além dos fatos, ou seja, pessoas que precisam ter seus sentimentos acolhidos, pois, quando buscam um terceiro para resolver suas questões, é sinal de que não conseguiram fazê-lo privadamente e que precisam do auxílio do Estado-Juiz para solucionar seu conflito.

Percebe-se a importância da prática interdisciplinar quando esse modelo vem sendo desenvolvido dentro da formação acadêmica, contribuindo para experiências do futuro profissional, na prática e principalmente solucionando esses conflitos.

A mediação familiar é um método informal, passando segurança para aqueles que dela necessita, pois tem um prazo diferenciado, podendo ser resolvido dependendo do caso, num curto espaço de tempo, portanto é de grande importância para solucionar os conflitos familiares, de forma rápida e eficaz, sendo necessário avançar ainda mais para a consolidação dessa prática, já que demanda desenvolver responsabilidade aos envolvidos, tenta fazer as partes buscar a solução de forma cooperativa e principalmente com autonomia.

O fato de dar a autonomia para as partes para solução dos seus problemas, faz com que os dificuldades posteriores que possam existir num conflito de família seja diminuído, como por exemplo, em casos de guarda, onde as relações serão continuadas entre essas pessoas.

Como define Antonio Carlos Wolkmer:9

Trata-se de solução que não é nova, sempre existiu ao longo de épocas passadas, mas que agora reaparece em função da crise do sistema de jurisdição estatal moderna. É o exercício em que as partes em desavença, de forma rápida, informal e voluntária, buscam resolver suas pendências e seus interesses, com ou sem a ajuda de uma pessoa neutra, e deixando de se submeter aos princípios e às regras processuais do Direito formal. Em vez da controvérsia judicial busca-se um entendimento dialógico, construtivo e cooperativo. Por consequência, a “mediação” é “uma alternativa à autoajuda (...), é uma alternativa à violência, ao litígio em si à auto-ajuda (...), é uma alternativa à violência, ao litígio em si e à continuidade dele (...) a mediação é um processo que faz recair, na própria responsabilidade dos participantes, a tomada da decisão que influenciará suas vidas. Em outras palavras, é um processo que

7 SILVA, M .L. Mediação familiar: Em busca da preservação dos vínculos parentais. In: D. M. Arpini (Org.), Psi-cologia, família e instituição. Santa Maria: Editora UF, 2009, p. 31.8 ESTROUGO, M. G. Direito de Família: Quando a família vai ao tribunal. In: ZIMERMAN, D.; COLTRO, A.C.M. (Orgs.), Aspectos psicológicos na prática jurídica. Campinas: Millennium, 2002, p.2013-2015.9 WOLKMER, Antonio Carlos. Pluralismo Jurídico: Fundamentos de uma nova cultura no Direito. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Alfa Omega, 2001.p. 299.

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confere autoridade sobre si mesma a cada uma das partes.

O mediador é o profissional capacitado (Curso de Mediação de Família CNJ), para a prática da mediação, é a pessoa que vai participar como facilitador da comunicação das partes envolvidas, com imparcialidade, competência, e deve garantir a integridade do procedimento, portanto além de qualificado para função, deve ter vocação e gostar de colaborar e amparar o com as pessoas que estão em conflito, principalmente quando se referir ao conflito familiar.

Conforme expõe Francisco José Cahali:10

É diante deste contexto, ao mediador cabe criar um ambiente propicio à comunicação entre os mediados, de forma que, aos poucos, emoções, mágoas, ressentimentos, frustrações ou outros sentimentos sejam superados para facilitar a escuta e respeito à posição do outro.

O ideal no processo de mediação familiar é trabalhar com profissionais de áreas afins como: o assistente social, psicólogo, médico, pedagogo, advogado, dentre outros, pois esses estão ligados à natureza do conflito pelo qual as pessoas estão passando.

Há uma carga emocional que dificulta o diálogo entre as partes, e desta forma cada um pode auxiliar de acordo com sua especialidade, pois muitas vezes os assistidos, já veem com a opinião formada ao longo de toda a convivência o que impede a resolução do conflito, e carece de guarida profissional.

Como bem defende Fabiana Marion Spengler:11

A mediação familiar poderá ser uma alternativa mais vantajosa, mais próxima e menos dolorosa de tratamento desses conflitos, justamente porque é um procedimento interdisciplinar que pretende conferir aos seus envolvidos autonomização e responsabilização por suas próprias decisões, convidando-as à reflexão e ampliando escolhas alternativas. É não adversarial, pois pretende desconstruir impasses que impedem a comunicação. Especificamente no âmbito familiar a mediação é o processo que, através do uso de técnicas de facilitação, aplicadas por um terceiro interventor numa disputa, estabelece o contexto do conflito existente, identifica necessidades e interesses, mediante recursos advindos da psicologia e da assistência social, produzindo decisões consensuais, posteriormente traduzidas em um acordo levado ou não à homologação.

Nota-se que há algumas vantagens na mediação familiar, por ser constituída por etapas, e ter como objetivo principal a resolução de conflitos, há um adiamento mais rápido no procedimento. 12

Igualmente redefine e preserva os laços familiares e a vida privada, respeitando as necessidades e interesses das pessoas envolvidas, em especial das crianças, dignifica a capacidade de auto-determinação das partes, aborda o conflito no plano emocional e legal, é uma alternativa e/ou

10 CAHALI, Francisco José. Curso de Arbitragem: mediação, conciliação, resolução CNJ 125/2010 e respectiva Emenda n. 1 de 31 de dezembro de janeiro de 2003. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012. p.64.11 SPENGLER, Fabiana Marion. Da Jurisdição à Mediação: por uma outra cultura no tratamento de conflitos. Ijuí: Ed. Unijuí, 2010.p.290.12 NAZARETH, E. R. Guia de mediação familiar: Aspectos psicológicos. Em A. R. P. Netro (Org.). Mediação familiar. São Paulo: Editora Equilíbrio. 2009.p.11-26

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Capítulo 1 11CEJUSC Maringá: A Experiência da Autocomposição na Gestão Eficiente de Conflitos Judicializados.

complemento viável ao processo judicial.13

Do mesmo modo, a sociedade contemporânea tem demonstrado a necessidade e disposição para governar suas próprias vidas. Assim as pessoas buscam interesse em resolver seus próprios problemas e conflitos de forma definitiva e rápida sendo esta uma das vantagens da meditação.14

Da mesma forma, a informalidade faz com que as partes se sintam a vontade não estamos diante de normas extremamente rígidas, mas sim flexíveis direcionadas a obter agilidade.15

Observa-se que o papel da mediação para resolução de conflitos familiares já vem sendo aplicada de forma eficaz, tanto como para apoio do Poder Judiciário , como para agilizar a resolução dos conflitos com celeridade, custo reduzido, e caminha conforme o interesse e agilidade das partes, dando autonomia e preservando o vínculo através da comunicação entre os assistidos facilitando assim resolver seus próprios conflitos.

A IMPLANTAÇÃO DA PRÁTICA DA MEDIAÇÃO NO PODER JUDICIÁRIO BRASILEIRO

A implantação da prática da mediação no poder judiciário brasileiro teve como objetivo principal auxiliar a justiça como forma de estimular a autocomposição através de um método alternativo extrajudicial privativo com o objetivo de diminuir o congestionamento dos órgãos judiciários, bem como, fomentar a expansão da mediação no Brasil e criar uma cultura positiva do método16.

Em um país como o Brasil, no qual a cultura do litígio ainda é muito forte, é necessário que a população se desprenda de que a noção de que adjudicação é a resposta para todos os problemas da sociedade. Vale ressaltar que a finalidade maior da jurisdição não é a prolação de uma sentença ou a resolução de uma questão jurídica, mas sim a pacificação social17.

Como assevera Watanabe Kazuo:

Mas é, certamente, na solução dos conflitos de interesses que reside a sua função primordial, e para desempenhá-la cabe-lhe organizar não apenas os serviços de solução dos conflitos pelos mecanismos alternativos à solução adjudicada por meio de sentença, em especial dos

13 Vantagens da mediação familiar. Disponível em: http://mediatingfamilies.com/ vantagens-da-mediacao-fami-lia. Acesso em: 04 nov. 2017. 14 . RODRIGUES, Laiane Saraiva. Mediação de conflitos no contexto familiar. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 13, no 1286. Disponível em: <https://www.boletimjuridico.com.br /doutrina/texto.asp?id=4158> Acesso em: 4 nov. 2017.15 BORTOLLI, Natália Quatrini; FUNES, Gilmara Pesquero Fernandes Mohr. Mediação: vantagens e desvanta-gens. Faculdades Integradas “Antônio Eufrásio de Toledo”. Disponível em: http://intertemas.unitoledo.br/revista/index.php/ETIC/article/view/1385/1312. Acesso em: 04 nov. 2017.16 VERAS, Cristiana Vianna; FRAGALE FILHO, Roberto. A judicialização da mediação no poder judiciário brasileiro: mais do mesmo nas disputas familiares? Disponível em: https://eces.revues.org/1717#tocto1n3. Acesso em: 01 nov. 2017.17 DE PINHO, Humberto Dalla Bernardina; ALVES, Tatiana Machado. Novos desafios da mediação judicial no Brasil a preservação das garantias constitucionais e a implementação da advocacia colaborativa. Revista de Infor-mação Legislativa. Disponível em: https://www12.senado.leg.br/ril/edicoes/52/205/ril_v52_n205_p55.pdf. Acesso em: 01 nov. 2017.

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Capítulo 1 12CEJUSC Maringá: A Experiência da Autocomposição na Gestão Eficiente de Conflitos Judicializados.

meios consensuais, isto é, da mediação e da conciliação18.

Para inovar na questão referente ao acesso à justiça e instituir uma política pública de tratamento adequado de conflitos, em 29 de novembro de 2010 o Conselho Nacional de Justiça elaborou a Resolução nº 125, que estabeleceu a Política Judiciária Nacional e regulamentou a conciliação e a mediação em todo o país, estabelecendo diretrizes aos Tribunais brasileiros.19

Assim foi determinado aos Tribunais a criação permanentes de Métodos Consensuais de Resolução de Conflitos para atender Juízos, Varas denominado de CEJUSC – Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania, responsáveis em realizar as sessões de conciliação e mediação método pré-processual realizados por conciliadores e mediadores credenciados pelo Tribunal, constituindo assim, vertentes de atuação de política pública.

Daniela Monteiro Gabbay, afirma que um dos focos da resolução é:

Criar uma disciplina mínima e uniforme para a prática dos meios consensuais de solução de conflitos no Judiciário, que funcionam como um importante filtro da litigiosidade, além de estimular em nível nacional a cultura da pacificação social, estabelecendo diretrizes para a implantação de políticas públicas que tracem caminhos para um tratamento adequado de conflitos. 20

Porém no Brasil, percebe-se ainda que há obstáculos culturais na utilização mais intensa da conciliação e mediação devido a formação dos operadores de direito e áreas afins, ser voltada, fundamentalmente, para a solução contenciosa e adjudicada dos conflitos de interesses, dando ênfase, conforme expõe Kazue Watanabe, a solução de conflito, por meio de processo judicial, de forma imperativa dada pelo representante do Estado.21

Porém essa ideia de meios alternativos, aos poucos vem sendo implantada de forma acessível à população, tendo como destaque os Juizados Especiais - lei 9099/95 – onde presta de forma simples a tutela jurisdicional, com celeridade e baixo custo, visando a pacificação dos conflitos para a camada mais desprovida da sociedade, sendo um instrumento usado como exercício de cidadania.

Como determina a Lei n.º 9.099/1995, em seu Art. 2º:

O processo orientar-se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, buscando, sempre que possível a conciliação ou a transação.22

18 WATANABE Kazuo. Política Pública do Poder Judiciário Nacional para Tratamento Adequado dos Conflitos de Interesses. In: PELUSO, Antonio Cezar; RICHA, Morgana de Almeida (Orgs.). Conciliação e Mediação: Estruturação da Política Judiciária Nacional. Rio de Janeiro: Forense, 2011.19 BRASIL, Resolução nº 125, de 29 de novembro de 2010 do Conselho Nacional de Justiça. Disponível em: http://www.cnj.jus.br///images/atos_normativos/resolucao/resolucao_ 125_29112010_11032016162839.pdf.Acesso em: 01 nov. 2017. 20 GABBAY, Daniela Monteiro. Mediação & judiciário: Condições necessárias para a institucionalização dos meios autocompositivos de solução de conflitos. Tese de doutorado em direito processual, apresentada à Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, 2011, São Paulo, Brasil. p. 172. 21 WATANABE, Kazuo. Cultura de sentença e pacificação. Disponível em: https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/3079662/mod_resource/content/1/1.1.%20Kazuo%20-%20Cultura%20da%20sentenca%20e%20da%20pacificao.pdf. Acesso em: 02 nov. 2017. 22 BRASIL, Lei n. 9.099 de 26 de Setembro de 1995. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/

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Capítulo 1 13CEJUSC Maringá: A Experiência da Autocomposição na Gestão Eficiente de Conflitos Judicializados.

E acentuada por Figueira Junior, Joel Dias, sobre o Juizado Especial Civil:

Com a pretensão de prestar a tutela jurisdicional de forma simples, desprovida de formalismos, atuando de modo célere e com baixíssimo custo, visando pacificar os conflitos jurídicos e sociológicos dos jurisdicionados, principalmente em benefício das camadas menos afortunadas da sociedade.23

No entendimento de Candido Rangel Dinamarco os Juizados Especiais Cíveis têm como objetivo a diminuição a litigiosidade contida, sendo os conflitos, na grande maioria dos casos, resolvidos, e que não chegam ao Poder Judiciário.24

Percebe-se a implantação da conciliação como pacificação social, onde as partes ficam no mesmo plano como forma de viabilizar o consenso dos litígios, os que são transformados em acordos, reduzida a termo tendo eficácia de título executivo.

O Conselho Nacional de Justiça divulgou dados ao longo do ano de 2016 (com ano base 2015), onde divulga o número de processos com homologatórias de acordo fruto de Mediação e Conciliação foram de 11% das sentenças e decisões terminativas.

E estima-se que com implantação da Lei 13.105 de 16 de março de 2015, das audiências prévias de conciliação e mediação, ressaltando a obrigatoriedade para todos os processos cíveis ( com exceção o artigo 334 CPC) deverá aumentar os percentuais de acordos homologatórios. 25

Índice de Conciliação no Poder Judiciário (Fonte CNJ 2016)

O índice de acordos apresentados no Brasil demonstra o comprometimento e acometimento do Estado em efetivar a Política Nacional de Tratamento de conflitos iniciada em 2010 pelo CNJ e Consolidada pela Lei de Mediação (Lei 13.140/2015) e do Novo Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015).26

L9099.htm. Acesso em: 02 nov. 2017.23 FIGUEIRA JUNIOR, Joel Dias. Da competência nos juizados especiais cíveis. São Paulo: Revista dos Tribu-nais, 1996. V. 36, p.13. Coleção Estudos de Direito de Processo Enrico Tullio Liebman.24 DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. 5. ed. São Paulo. Malheiros, 2005.p.771-772.25 RELATÓRIO Justiça em Números traz índice de conciliação. Disponível em: http://www.cnj.jus.br /noti-cias/cnj/83676-relatorio-justica-em-numeros-traz-indice-de-conciliacao-pela-1-vez. Acesso em: 02 nov. 2017.26 RELATÓRIO Justiça em Números traz índice de conciliação. Disponível em: http://www.cnj.jus.br /noti-cias/cnj/83676-relatorio-justica-em-numeros-traz-indice-de-conciliacao-pela-1-vez. Acesso em: 02 nov. 2017.

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Capítulo 1 14CEJUSC Maringá: A Experiência da Autocomposição na Gestão Eficiente de Conflitos Judicializados.

DA EFICÁCIA E VIABILIDADEDurante muito tempo restou assentado no ordenamento jurídico brasileiro a ideia da morosidade

na resolução dos conflitos familiares, no qual processos perduravam por anos no judiciário, nem sempre com soluções satisfatórias para as partes.

Com o advento da Lei n° 13.105 de 2015, novo Código de Processo Civil, levou a aplicação obrigatória dos meios alternativos de resolução de conflitos, entre eles a modalidade de mediação.

Dispõe o novo Código de Processo Civil em relação aos métodos alternativos de resolução de conflitos:

Art. 165. Os tribunais criarão centros judiciários de solução consensual de conflitos, responsáveis pela realização de sessões e audiências de conciliação e mediação e pelo desenvolvimento de programas destinados a auxiliar, orientar e estimular a autocomposição.§ 3o O mediador, que atuará preferencialmente nos casos em que houver vínculo anterior entre as partes, auxiliará aos interessados a compreender as questões e os interesses em conflito, de modo que eles possam, pelo restabelecimento da comunicação, identificar, por si próprios, soluções consensuais que gerem benefícios mútuos.27

Diante da realidade de quem em todas as relações familiares se fazem presentes os conflitos, é certo que as famílias vem enfrentando um desequilíbrio, proporcionador de diversos conflitos capazes de destruir laços familiares.

Todavia, quando a família alcança o ponto de intolerância, causando prejuízos na relação, é corriqueiro a busca pelo judiciário, na forma litigiosa.

A mediação familiar encontra ampla aplicação em decorrência dos conflitos familiares.

A mediação como método alternativo de resolução de conflitos, tenta ser um modo de útil e eficaz de resolução dos conflitos decorrentes das relações familiares. Tal prática tende a alcançar soluções que são bem aceitas pelas partes envolvidas, uma vez que elas têm participação ativa na tomada de decisões.

De acordo com Caroline Wüst e Letícia Regina Konrad:

A mediação comunitária é uma prática comunicativa que gera participação consensuada dos conflitantes, fazendo nascer um sentimento de mudança que passa da estagnação à responsabilidade. [...] Nesse sentido, a participação oferece a possibilidade de indivíduos, em igualdade de condições e sem nenhum privilégio de um em relação ao outro, confrontarem-se e pronunciarem-se no transcorrer de uma deliberação, sem qualquer constrangimento.28

A mediação é a melhor forma mais eficaz para garantir autonomia, da cidadania, da democracia e dos direitos humanos e uma solução satisfatória.

Luiz Alberto Warat afirma que:

27 BRASIL. Código de Processo Civil: Lei no 13.105, de 16 de março de 2015. Brasília, DF: Câmara dos Depu-tados, 2015. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03 /leis/2002/L10406.htm > Acesso em: 06.nov. 2017.28 WÜST, Caroline; KONRAD, Letícia Regina. Mediação comunitária como política de acesso à justiça e de forta-lecimento da democracia participativa. In: CUSTÓDIO, André Viana; COSTA, Marli Marlene da, STAHLHÖFER, Iásin (Org). Direitos humanos, Constituição e Políticas Públicas. Curitiba: Multideia, 2013, p. 111-130.

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Capítulo 1 15CEJUSC Maringá: A Experiência da Autocomposição na Gestão Eficiente de Conflitos Judicializados.

[...] é importante considerar que as práticas sociais de mediação se configuram em um instrumento de realização da autonomia, da democracia e da cidadania, na medida em que educam, facilitam e ajudam a produzir diferenças e a realizar tomadas de decisões sem a intervenção de terceiros que decidem pelos afetados por um conflito.29

A eficácia deste método alternativo está na possibilidade do envolvimento das partes de forma que, juntas, possam encontrar uma solução que seja menos danosa tanto para o casal, quanto para os filhos, reestabelecendo assim o diálogo entre eles. Águida Arruda Barbosa revela que a mediação familiar como meio eficaz na solução de conflitos no qual define a mediação como:

(...) um acompanhamento das partes na gestão de seus conflitos, para que tomem uma decisão rápida, ponderada, eficaz, com soluções satisfatórias no interesse da criança, mas, antes, no interesse do homem e da mulher que se responsabilizam pelos variados papéis que lhe são atribuídos, inclusive de pai e mãe. 30

A viabilidade do procedimento de mediação familiar, está na motivação as partes envolvidas no conflito a dialogarem sobre seus problemas de maneira calma, afastando, os sentimentos como raiva, culpa, rancor e irracionalidade. O incentivo as partes envolvida é pensarem em conjunto para benefício dos filhos, para que ocorra a dissolução na melhor forma possível, com consequência de acordos frutíferos.

Portanto, a mediação familiar é método pelo qual a família, conquista por meio do diálogo a resolução de seus conflitos, de maneira eficaz e viável, visto que possuem de forma satisfatória e célere a resolução de suas demandas.

DA FUNÇÃO SOCIAL DA MEDIAÇÃO

O ordenamento jurídico por meio da Constituição Federal garante o acesso à justiça a todos os cidadãos31. Porém, com a evolução da sociedade tem-se uma maior demanda no judiciário. Dessa forma, é grande o desafio que o Estado possui de promover um procedimento justo para todos os indivíduos que se socorrerem da intervenção estatal.

Diante disso, é possível garantir que a mediação não somente pelos seus resultados mas pelo modo de atingir a justiça, de forma célere e eficaz é uma inovação positiva para o judiciário, inclusive nas demandas familiares.

No entendimento do jurista argentino Luis Alberto Warat é nesse sentido quando afirma que, mais que a uma decisão, a mediação aponta para uma possibilidade de melhoria na qualidade de vida

29 WARAT, Luiz Alberto. Em nome do acordo: a mediação no Direito. Buenos Aires: ALMED, 1998. p.05. 30 BARBOSA, Águida Arruda. Mediação familiar: uma vivência interdisciplinar. In: ROENINGA, Giselle Câ-mara; PEREIRA, Rodrigo da Cunha (Org.). Direito de família e psicanálise: rumo a uma nova epistemologia. Rio de Janeiro: Imago, 2003. p. 340.31 Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos es-trangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito; (BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: Texto constitucional promulgado em 5 de outubro de 1988, com alte-rações determinadas pelas Emendas Constitucionais de Revisão nº 1/92 a 73/2013 e pelo Decreto Legislativo nº 186/2008. Brasília: Senado Federal, Coordenação de Edições Técnicas, 2013. p. 10).

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Capítulo 1 16CEJUSC Maringá: A Experiência da Autocomposição na Gestão Eficiente de Conflitos Judicializados.

das partes.32

É de extrema necessidade, apontar a posição Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em relação a aplicação da mediação nos conflitos. Por meio da Resolução Nº 125, de 29 de novembro de 2010, o Conselho instituiu uma “Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário”33, tendo como primórdio:

(...) dar efetividade ao direito constitucional de acesso à justiça com o fito de alcançar a ordem jurídica justa, portanto, uma perspectiva formal e material do princípio. Com tal propósito, atribui ao Judiciário a política pública permanente de tratamento adequado aos conflitos de interesses, organizando nacionalmente mecanismos de solução alternativa de controvérsia no modelo consensual de modo a ser incentivado e aperfeiçoado.34

De acordo com art. 334 do Código de Processo Civil a mediação será designada quando:

Art. 334. Se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não for o caso de improcedência liminar do pedido, o juiz designará audiência de conciliação ou de mediação com antecedência mínima de 30 (trinta) dias, devendo ser citado o réu com pelo menos 20 (vinte) dias de antecedência.35

É evidente conforme o novo Código de Processo Civil que a mediação será equivalente a uma etapa processual. Sendo uma importante ferramenta no estímulo à autocomposição na resolução de conflitos familiares, no qual possui suma importância na celeridade de processos junto ao Poder Judiciário, uma vez que as demandas são encaminhadas ao Cejusc, que procedem com as sessões de medição.

Portanto, a mediação como forma de autocomposição possui papel primordial na sociedade, pois sua função social garante acordos frutíferos para as partes e para sociedade, diminuindo os conflitos e principalmente as más consequências de uma lide.

Nos conflitos familiares, devidos as relações continuadas, a mediação toma a máxima importância, pois fornece meios que trazem menores prejuízos às partes envolvidas no conflito.

32 WARAT, Luis Alberto. Em nome do acordo. Buenos Aires: Almed, 1998. p. 6.33 BRASIL. Resolução nº 125, de 29 de novembro de 2010 do Conselho Nacional de Justiça. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/images/atos_normativos/resolucao/resolucao_125_29112010_ compilada.pdf>. Acesso em: 06. nov.2017.34 BRITO, Gilton Batista. O acesso à justiça, a teoria da mediação e a Resolução 125/2010 do CNJ. Revista da Ejuse. Aracaju: EJUSE/TJ, n° 20, 2014. p. 113-114.35 BRASIL. Código de Processo Civil: Lei no 13.105, de 16 de março de 2015. Brasília, DF: Câmara dos Depu-tados, 2015. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm > Acesso em: 06.nov.2017.

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CONCLUSÃO

Os instrumentos alternativos de resolução de conflitos passaram a ganhar cada vez mais relevância no âmbito jurídico. Com o advento da Lei n°13.015/15 (novo) Código de Processo Civil, trouxe a mediação como a primeira fase do processo judicial, com a criação dos centros judiciários de resolução de conflitos (Cejusc).

Este mecanismo, viabiliza a pretensão do Estado em proporcionar a prestação judicial de forma célere e eficaz visto que os acordos realizados nos Cejusc são homologados judicialmente, devendo as partes cumprem o acordo pactuado.

Dessa forma, a mediação possui papel fundamental na sociedade, com a função social de ressocialização dos indivíduos em conflito, chamando-os ao diálogo a fim de restabelecer a comunicação e proporcionar acordos amigáveis entre as partes.

Enquanto instituto alternativo de resolução de conflitos, a mediação dispõe características que asseguram seu importante papel no efetivo acesso à justiça.

Tal alternativa é mais célere e democrática do que a via judiciaria comum, pois trabalha com a efetiva participação das partes, com o objetivo de tornar a convivência social viável, para que o acordo final seja o reflexo da vontade dos interessados.

Conclui-se, que a mediação familiar proporciona a satisfação dos indivíduo, diferentemente do judiciário, onde uma sentença, em tese a benéfica apenas a uma das partes do processo ou para nenhuma.

Além de incentivar a autonomia das partes em conflito, fazendo que um diálogo se restabeleça, o que é mais importante ainda quando é no seio da família. Nesse sentido, a conscientização da sociedade acerca de sua importância é necessária, no intuito da efetividade da técnica.

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Capítulo 1 18CEJUSC Maringá: A Experiência da Autocomposição na Gestão Eficiente de Conflitos Judicializados.

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CEJUSC Maringá: A Experiência da Autocomposição na Gestão Eficiente de Conflitos Judicializados. 20

O SISTEMA MULTIPORTAS APLICADO AO CENTRO JUDICIÁRIO DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS E

CIDADANIA: ENFOQUE AO ARTIGO 334 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL E A RESOLUÇÃO 125/2010 DO

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA

CAPÍTULO 2

MIRIAM BATISTA BENEDITO 1

INTRODUÇÃO

A ideia do acesso à justiça, bem como do desenvolvimento de técnicas que auxiliem as partes a solucionarem os seus conflitos no Brasil, passou por diversos momentos históricos e etapas que levaram ao que vemos hoje no Código de Processo Civil, na Lei de Mediação e nas Resoluções do Conselho Nacional de Justiça, bem como Resoluções regionais dos Tribunais.

Sem sombra de dúvidas, a grande expansão na prática do sistema multiportas no Brasil ocorreu com a publicação da Resolução 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça. Houve uma grande quebra de paradigma do que vinha sendo realizado de forma regionalizada, ou em projetos isolados pelo Brasil, reunindo as boas práticas do sistema multiportas, colocados à disposição do cidadão.

O Poder Judiciário passou a criar a partir de então políticas públicas para o tratamento adequado dos conflitos de interesses, a incentivar programas e ações de incentivo à autocomposição de litígios, à criação dos Centros Judiciários de

1 Servidora Pública do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. Mediadora Judicial. Especialista em Direito Público com ênfase em Direito Processual Civil. Instrutora de mediação Judicial Cadastrada no Conselho Nacional de Justiça.

Solução de Conflitos e Cidadania (Cejuscs) e a disseminar uma cultura do diálogo, da pacificação social e a incentivar os tribunais a se organizarem e planejarem programas de autocomposição.

Não que a autocomposição não fosse incentivada antes de novembro de 2010 com o advento da Resolução acima mencionada. Até então já existiam menções à Conciliação em Códigos e Leis esparsas, bem como a execução de autocomposição em projetos e movimentos locais ou estaduais de iniciativa do Poder Judiciário, órgãos públicos e instituições de ensino privadas e públicas.

O Código de Processo Civil (CPC), Lei 13.105, de 16.03.2015, confere um tratamento destacado e paradigmático às formas autocompositivas pois exige de todos os sujeitos processuais uma participação cooperativa nos trâmites dos processos judiciais, ao contrário da tradicional postura de competitividade, beligerância. É um grande desafio colocado pelo legislador, para que o Poder Judiciário passe cada vez mais das relações de subordinação para as relações de cooperação e a uma Justiça que incremente mais as soluções consensuais de conflitos.

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21Capítulo 2CEJUSC Maringá: A Experiência da Autocomposição na Gestão Eficiente de Conflitos Judicializados.

O Código de Processo Civil (CPC) revê as formas de se lidar com o conflito. Reconhece as dificuldades históricas dos meios adversariais e a resolução de conflitos pela via processual, com a sua pacificação através da sentença, classificado hoje de forma heterocompositiva de resolver os conflitos. Coloca em destaque as formas consensuais, do diálogo processual, do negócio jurídico processual, da cooperação e das formas autocompositivas.

Segundo Antonio Carlos Ozório2, “(...) Enquanto o CPC anterior não falava em autocomposição o novo menciona a palavra pelo menos vinte vezes ao longo do seu texto. (...)”.

As formas consensuais de solução de conflitos veem cada litígio de forma singular e coloca os interessados como protagonistas na busca de uma solução. Com base nas vontades das partes, estas buscam a justiça de forma mais célere, menos custosa e, consequentemente, alcançam a pacificação social.

Além disso, o acesso à justiça é considerado um direito fundamental necessário ao alcance de uma ordem jurídica justa.

Ante a necessidade de efetivar esse direito fundamental, objetiva-se aqui demonstrar quão essencial é dar atenção e prestígio às formas consensuais de solução de conflitos, visto que estas são eficazes para viabilizar a solução dos litígios e, consequentemente, para promover o acesso à justiça, e que o sistema multiportas precisa ser aprimorado, principalmente na etapa de agendamento da audiência ou sessão de conciliação/mediação, prevista no artigo 334 do Código de Processo Civil.

A noção de tribunal multiportas (ideia inicial desenvolvida nos países anglo - saxônicos referente à criação dos chamados Multi-door Courthouse), que tem por objetivo dar encaminhamento qualificado para cada procura do cidadão em seu acesso à justiça, que já é muito difundido na área pré-processual, mas pouco aplicada na área processual.

O ACESSO À JUSTIÇA COMO POLÍTICA PÚBLICA NO JUDICIÁRIO BRASILEIRO

O primeiro grande marco legislativo no tema de acesso à justiça no ordenamento jurídico brasileiro, e que portanto deu início a ideia de promoção da autocomposição conforme conhecemos hoje, teve como sustentáculo a Lei Complementar nº 80 e a Lei nº 1.060/50, que versa sobre assistência judiciária aos que não possuem condições financeiras de arcar com os custos do judiciário, sem prejuízo de seu próprio sustento e de sua família.

Já a segunda onda de acesso do cidadão ao judiciário ocorreu com a vigência do Código de Defesa do Consumidor (nº. 8.078/90) e na Lei da Ação Civil Pública (nº 7.347/85), ou seja, tem por necessidade o reconhecimento de representação em juízo dos direitos difusos, tendo como instrumentos a ação governamental, a técnica do procurador-geral privado e a técnica do advogado particular do interesse público.

Em sede de continuidade, surgiu a Lei dos Juizados Especiais ( n.º 9.099/95), com a sua

2 NUNES, Antonio Carlos Ozório. Manual de Mediação (livro eletrônico): guia prático para conciliadores. 1.ed., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, p.05

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22Capítulo 2CEJUSC Maringá: A Experiência da Autocomposição na Gestão Eficiente de Conflitos Judicializados.

notável relevância para a figura do Conciliador e Juiz Leigo, como novos integrantes auxiliares da Justiça, auxiliando os magistrados na árdua tarefa de buscar trâmites legais mais céleres e menos onerosos, sendo estes incorporados pela perspectiva da terceira onda. À época acreditavam que a Lei 9.099/1995 ajudaria na solução para vários males que acometiam o Sistema de Justiça. Houve inegáveis avanços, mas a jurisdição estatal brasileira continuou com excessiva judicialização dos conflitos e a lei não trouxe as transformações esperadas.

Embora algumas medidas tenham sido implementadas pela própria CF/88 para garantir os direitos ora discutidos, como a criação dos Juizados Especiais, a ampliação da Defensoria Pública, a ampliação do rol de legitimados para ações do controle concentrado, a reforma do Judiciário com a Emenda Constitucional 45 e a possibilidade de resolução prévia dos conflitos, como as Comissões de Conciliação, que visam evitar grande número de demandas ao Judiciário, dentre outras, isso não resolveu o problema, pois o Judiciário continuou com intensa dificuldade de administrar o sistema de justiça, que conta com um número cada vez maior de causas em trâmite.

No ano de 2006, o Conselho Nacional de Justiça deu início a programas e projetos que estimulassem os acordos pela via da conciliação, através da instituição, por exemplo, da Semana Nacional de Conciliação, realizada anualmente em novembro ou início de dezembro. Tal ação sem sombra de dúvidas trouxe um novo paradigma em que as próprias partes formem a transigência em suas próprias questões. Conciliar é legal é um programa que os magistrados têm focado para que as pessoas comecem a se desvincular do judiciário para decidir o que lhes é necessário, notadamente, considerando que muitas questões são de cunho existencial e não propriamente judicial.

Decorrente da necessidade de estimular a redução na judicialização de demandas, o Conselho Nacional de Justiça editou, em 2010, a Resolução nº 125 que trata da política nacional de incentivo à autocomposição e regra a atuação dos Tribunais para a concretização deste objetivo.

Na referida Resolução, o acesso à justiça proposto trouxe maiores possibilidades de efetividade e eficiência por meio de soluções alternativas, diminuindo a formalidade, burocracia, custos de tempo e financeiros resultantes dos ajuizamentos de novas ações judiciais, bem como propõe metas e planejamento aos Tribunais para que sobrevenha a pacificação social e a instauração do sentimento de solução de conflitos com a mudança das formas de gestão e capacitação dos servidores para melhor atender o cidadão, usuário do sistema, e a difusão da cultura da paz. Contudo, muitas das regras contidas na Resolução 125/2010 ficaram a cargo de cada Tribunal expandir, regulamentar e implementar as novas mudanças na área de autocomposição.

De outro turno a Lei 13.140, publicada de 26.06.2015 representou o marco legal para a mediação no Brasil, “como meio de solução de controvérsias entre particulares e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da administração pública” (LM 1.º caput). A lei dispõe sobre a mediação entre particulares como meio de solução de controvérsias e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da administração pública. As partes na mediação são as pessoas jurídicas, públicas ou privadas, e as pessoas físicas em geral.

O Código de Processo Civil (CPC), Lei 13.105, de 16.03.2015, valoriza as formas ditas como “alternativas” de solução dos conflitos. Neste aspecto aliás, muitos defendem que se trata não de

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23Capítulo 2CEJUSC Maringá: A Experiência da Autocomposição na Gestão Eficiente de Conflitos Judicializados.

“alternativa de solução de conflitos”, mas de formas de solução de conflitos. Falamos recentemente no Brasil da existência, segundo dados do próprio Conselho Nacional de Justiça que “109,1 milhões de processos tramitaram pela Justiça durante 2016. Esse número é o resultado da soma dos processos em acervo registrado no ano com o total de “processos baixados” computados pelo CNJ”3. Ou seja, tratar do conflito no Brasil não é mais uma “alternativa”, mas sim uma necessidade cruel do sistema judiciário brasileiro, imerso em milhões de processos judiciais.

O artigo 3º, §2º e §3º, do Código de Processo Civil, aponta que, sempre que possível, o Estado promoverá a solução consensual dos conflitos, inclusive, devendo esta ser estimulada por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público no curso do processo judicial.

O artigo 139, do referido diploma legal, dispõe que o juiz pode promover, a qualquer tempo, a autocomposição, preferencialmente com auxílio de conciliadores e mediadores judiciais, ou através dos centros judiciários de solução consensual de conflitos, previstos no seu artigo 165. Os Estados, então, tardiamente, começaram a criar os Centros Judiciário de Soluções de Conflitos e Cidadania (CEJUSCs).

Portanto, a autocomposição surgiu na conjuntura de uma crise, gerando grandes expectativas de ser uma das portas, juntamente com a arbitragem e jurisdição, para resolução dos conflitos.

A implantação oficial da mediação no país, conforme acima observado de toda a evolução histórica e legislativa do tema, como uma política pública séria, demorou décadas e finalmente as alterações trazidas principalmente pela Resolução 125/2010 do CNJ, Código de Processo Civil e Lei de Mediação ajudarão a trazer profundas mudanças no Sistema de Justiça e à sociedade brasileira, com novos paradigmas e com o fortalecimento das políticas para a autocomposição dos conflitos.

Conforme exposto pelo Conselho Nacional de Justiça, a atuação dos conciliadores e dos mediadores está baseada em princípios fundamentais previstos na Resolução 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça, assim como a conciliação e a mediação são norteadas por princípios. Os artigos 165, 166 e os que demais se sucedem no Código de Processo Civil, também ressalvam mais uma vez a figura dos mediadores e conciliadores:

“Art. 165. Os tribunais criarão centros judiciários de solução consensual de conflitos, responsáveis pela realização de sessões e audiências de conciliação e mediação e pelo desenvolvimento de programas destinados a auxiliar, orientar e estimular a autocomposição.§ 1o A composição e a organização dos centros serão definidas pelo respectivo tribunal, observadas as normas do Conselho Nacional de Justiça.§ 2o O conciliador, que atuará preferencialmente nos casos em que não houver vínculo anterior entre as partes, poderá sugerir soluções para o litígio, sendo vedada a utilização de qualquer tipo de constrangimento ou intimidação para que as partes conciliem.§ 3o O mediador, que atuará preferencialmente nos casos em que houver vínculo anterior entre as partes, auxiliará aos interessados a compreender as questões e os interesses em conflito, de modo que eles possam, pelo restabelecimento da comunicação, identificar, por si próprios, soluções consensuais que gerem benefícios mútuos.Art. 166. A conciliação e a mediação são informadas pelos princípios da independência, da imparcialidade, da autonomia da vontade, da confidencialidade, da oralidade, da informalidade e da decisão informada.§ 1o A confidencialidade estende-se a todas as informações produzidas no curso do

3 Disponível em: < https://www.conjur.com.br/2017-set-04/110-milhoes-processos-passaram-judiciario-2016> Acesso em: 15 set. 2018.

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procedimento, cujo teor não poderá ser utilizado para fim diverso daquele previsto por expressa deliberação das partes.§ 2o Em razão do dever de sigilo, inerente às suas funções, o conciliador e o mediador, assim como os membros de suas equipes, não poderão divulgar ou depor acerca de fatos ou elementos oriundos da conciliação ou da mediação.§ 3o Admite-se a aplicação de técnicas negociais, com o objetivo de proporcionar ambiente favorável à autocomposição.§ 4o A mediação e a conciliação serão regidas conforme a livre autonomia dos interessados, inclusive no que diz respeito à definição das regras procedimentais.”

O reconhecimento dos meios que instigam as partes a alcançarem efetivamente o acesso à justiça, eis que, nas formas consensuais de solução de conflitos, há o estímulo e o desenvolvimento do diálogo e da cooperação entre as partes para que construam uma nova visão sobre o litígio. Assim, viabiliza-se que as próprias partes cheguem à solução dos seus conflitos, sem que haja a imposição de uma decisão por um terceiro (árbitro ou juiz).

Observa-se que a conciliação e a mediação tratam cada conflito de uma forma singular, já que os interessados são protagonistas na solução do seu conflito e, com base em suas vontades, buscam a justiça de forma mais célere, menos custosa e, consequentemente, alcançam a pacificação social.

A celeridade e menos custo são resultados do fato de que a conciliação e a mediação resolvem tudo em um único ato, não sendo necessário produzir provas. Dessa forma, não há gastos com a produção de documentos nem com deslocamentos constantes aos fóruns.

Por sua vez, a pacificação social resultante da conciliação e da mediação consiste no fato de que se trata de ato espontâneo, voluntário e de comum acordo entre as partes.

O SISTEMA MULTIPORTAS NO DIREITO BRASILEIRO (MULTI-DOOR COURTHOUSE SYSTEM)

O início do que hoje chamamos de Sistema Multiportas (Multi-Door Courthouse System), que nada mais é que a criação de um sistema que disponibiliza várias opções de solução de conflitos alternativamente ao Poder Judiciário, surgiu nos Estados Unidos em 1976, em uma conferência proferida pelo professor Frank Sander, da Faculdade de Direito de Harvard. O Multi-door Courthouse System foi inspirado na insuficiência do Poder Judiciário americano em atender o crescente número de demandas.

De sistema multiportas é um conceito baseado na oferta de métodos de resolução de conflitos complementares aos serviços habitualmente oferecidos pelo judiciário.

O sistema multiportas possui inúmeras aplicabilidades, principalmente, em relação aos conflitos oriundos de questões ambientais, pois seu processo exige a combinação de diferentes métodos de resolução de conflitos.

Em grande parte, esses procedimentos já estão sendo aplicados por tribunais como forma de emprestar efetividade ao sistema. Os convênios e parcerias com o poder público revelam que a promoção das RADs (resoluções adequadas de disputas) pode e deve ser vista como política pública

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de justiça não judiciária, mas o fato de não ser judiciária não quer dizer que não possua com o Judiciário nenhuma forma de relacionamento institucionalizado.

Segundo Valeria Feriolo Lagrasta Luchiari,4

“O Fórum de Múltiplas Portas ou Tribunal Multiportas constitui uma forma de organização judiciária na qual o Poder Judiciário funciona como um centro de resolução de disputas, com vários e diversos procedimentos, cada qual com suas vantagens e desvantagens, que devem ser levadas em consideração, no momento da escolha, em função das características específicas de cada conflito e das pessoas nele envolvidas. Em outras palavras, o sistema de uma única ‘porta’, que é a do processo judicial, é substituído por um sistema composto de vários tipos de procedimento, que integram um ‘centro de resolução de disputas’, organizado pelo Estado, comporto de pessoas treinadas para receber as partes e direcioná-las ao procedimento mais adequado para o seu tipo de conflito. Nesse sentido, considerando que a orientação ao público é feita por um funcionário do Judiciário, ao magistrado cabe, além da função jurisdicional, que lhe é inerente, a fiscalização e o acompanhamento desse trabalho (função gerencial), a fim de assegurar a efetiva realização dos escopos do ordenamento jurídico e a correta atuação dos terceiros facilitadores, com a observância dos princípios constitucionais”

Faz-se imprescindível, portanto, explanar que este sistema permite que a solução de conflitos não seja mais tratada por uma única via de acesso à justiça. Ao avesso disso, as partes, ao procurarem o Poder Judiciário, passam por uma espécie de triagem para a escolha do método que melhor atenda às necessidades do litígio apresentado, considerando as suas peculiaridades.

Ainda que o sistema judiciário (com todas as suas limitações burocráticas, financeiras, institucionais e organizacionais) se esforce em modernizar os seus recursos – humanos, materiais, normativos e tecnológicos –, a dinâmica da explosão de litigiosidade ocorrida nas últimas décadas no Brasil continuará apresentando uma curva ascendente em muito superior à relativa aos avanços obtidos. Para o sistema operar com eficiência, é preciso que as instâncias judiciárias, em complementaridade à prestação jurisdicional, implementem um sistema de múltiplas portas, apto a oferecer meios de resolução de conflitos voltados à construção do consenso, dentre eles, a mediação, conciliação, justiça restaurativa, constelação sistêmica, oficinas de pais e filhos, e etc.

A POSSIBILIDADE DE APLICABILIDADE DO SISTEMA MULTIPORTAS NO CEJUSC – ARTIGO 334 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

Neste desenvolver o sistema multiportas encontra respaldo no novo Código de Processo Civil, que traz em sua amplitude uma seção pertinente aos Conciliadores e Mediadores Judiciais instituídos do artigo 165 ao 175, prestigiando os mecanismos alternativos, oferecendo espaço para a mediação e a conciliação como formas eficazes de solucionar os conflitos existentes que formam grande número de processos dentro do Judiciário, que não conseguem suprir as tutelas por falta de mecanismos acessíveis para o acesso à justiça. Neste contexto faz-se latente preconizar o art. 165 do CPC/2015 “os tribunais criarão centros judiciários de solução consensual de conflitos, responsáveis pela realização de sessões e audiências de conciliação e mediação e pelo desenvolvimento de programas destinados

4 LUCHIARI, Valeria Feriolo Lagrasta. Histórico dos métodos alternativos de solução de conflitos. In: GROS-MAN, Claudia Frankel; MANDELBAUM, Helena Gurfinkel (Org.). Mediação no judiciário: teoria na prática. São Paulo: Primavera Editorial, 2011, 283-320.

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a auxiliar, orientar e estimular a autocomposição”.

O Código de Processo Civil, em seu artigo 334, tornou obrigatória a audiência de conciliação antes da contestação da parte acionada.

O referido Código trouxe essa transformação paradigmática para a implementação da solução de conflitos: o Sistema Multiportas. A Justiça Multiportas traz um rearranjo processual e meios alternativos para a resolução dos litígios. Alguns exemplos de meios extraprocessuais que contribuem para a desjudicialização são a mediação, a conciliação, a arbitragem, a negociação, a constelação sistêmica. Assim, a Justiça passa a apresentar muitas alternativas de acesso, diversas portas, diversas justiças, para uma só finalidade, a resolução dos conflitos com mais celeridade.

O Sistema Multiportas é um modelo alternativo para solução de conflitos que prevê a integração de diversas formas de resolução dos litígios, sendo judiciais ou extrajudiciais. Por meio dele, o Estado conduz os litigantes para a melhor opção de resolver o conflito, a melhor porta, dentre as já citadas. Assim, para cada tipo de conflito, deve ser adotada a via adequada à sua abordagem a partir da consideração de fatores como as intenções das partes, o perfil da controvérsia e as possibilidades inerentes a cada meio.

Esse Sistema tem como principal qualidade, seu procedimento inicial que é a realização de uma triagem para se verificar qual a melhor alternativa para o litigio instalado.

Os meios autocompositivos de resolução de conflito se diferenciam em seus procedimentos, bem como em relação aos envolvidos, como se descreve a seguir:

A Mediação é uma intervenção construtiva de um terceiro neutro, imparcial e que tenha conhecimentos não só de mediação, mas de negociação e comunicação junto às partes em litígio, administrando a busca de solução pelas próprias partes. O mediador facilita o diálogo para que os litigantes construam, com autonomia e solidariedade, a melhor solução para o problema, visando o consenso, a realização do acordo. A técnica é indicada quando as partes possuem vínculos (de parentesco, de vizinhança, convivência/parceria empresarial, etc), ou seja, quaisquer múltiplos vínculos anteriores ao conflito. É um processo autocompositivo, conforme já mencionado em itens anteriores, assumindo diferentes direcionamentos segundo o sistema de mediação adotado.

É o método mais indicado para relações que possuem continuidade, porque possibilita a compreensão do conflito pelas partes, para que possam melhor administrá-lo e evitar novos desentendimentos no futuro. Os conflitos nesta técnica só podem envolver direitos patrimoniais disponíveis ou relativamente indisponíveis. Isso porque apenas esses direitos podem ser objeto de acordo extrajudicial. Uma mediação pode ser bem-sucedida mesmo sem culminar em um acordo, bastando que tenha facilitado o diálogo entre as partes e despertado sua capacidade de entenderem-se sozinhas.

O manual de Mediação Judicial atualizado pelo CNJ, por exemplo, utiliza como forma de Mediação a ser adotada dentro dos processos judiciais, as orientações e técnicas trazidas pela escola de

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negociação de Havard, segundo se observa das técnicas e própria bibliografia do Manual5. Entretanto, em nenhum momento do Conselho Nacional de Justiça excluiu a possibilidade de atuação por outros métodos de mediação (não só o modelo da negociação norte americana), bem como a Resolução 125/2010 do CNJ proibiu ou elencou todas as formas possíveis de solução de conflitos. De tal forma que, por exemplo, antes da edição da Resolução 225/2016 do Conselho Nacional de Justiça a qual dispõe sobre a Política Nacional de Justiça Restaurativa no âmbito do Poder Judiciário, as práticas restaurativas tinham como fundamento jurídico a Resolução 125/2010 do CNJ.6

Pelo mesmo motivo, que a Resolução 125 também é a justificativa atual para as práticas de constelação sistêmica dentro do Judiciário, já que em relação a esta técnica, já divulgada e praticada em mais de 16 estados da Federação, ainda não há resolução específica do Conselho Nacional de Justiça7.

A Justiça Restaurativa, conforme preceitua o art. 1.º da Resolução 225/2016 acima mencionada:

“constitui-se como um conjunto ordenado e sistêmico de princípios, métodos, técnicas e atividades próprias, que visa à conscientização sobre os fatores relacionais, institucionais e sociais motivadores de conflitos e violência, e por meio do qual os conflitos que geram dano, concreto ou abstrato, são solucionados de modo estruturado na seguinte forma:I – é necessária a participação do ofensor, e, quando houver, da vítima, bem como, das suas famílias e dos demais envolvidos no fato danoso, com a presença dos representantes da comunidade direta ou indiretamente atingida pelo fato e de um ou mais facilitadores restaurativos;II – as práticas restaurativas serão coordenadas por facilitadores restaurativos capacitados em técnicas autocompositivas e consensuais de solução de conflitos próprias da Justiça Restaurativa, podendo ser servidor do tribunal, agente público, voluntário ou indicado por entidades parceiras;III – as práticas restaurativas terão como foco a satisfação das necessidades de todos os envolvidos, a responsabilização ativa daqueles que contribuíram direta ou indiretamente para a ocorrência do fato danoso e o empoderamento da comunidade, destacando a necessidade da reparação do dano e da recomposição do tecido social rompido pelo conflito e as suas implicações para o futuro.”

Por sua vez, a constelação sistêmica vem sendo muito praticada dentro do Judiciário em audiências de processos de origem das Varas de Família, as quais estão conseguindo aumentar seus índices de conciliação em processos judiciais com o uso da constelação familiar.

A técnica psicoterapêutica criada pelo alemão Bert Hellinger, usada no Poder Judiciário de pelo menos 16 estados, mostra-se eficaz quando o assunto é disputa de guarda de crianças, alienação parental, inventários e pensão alimentícia. A técnica, desde que aplicada por pessoas devidamente capacitadas e preparadas para conflitos familiares, permite que a Justiça ofereça outras soluções ao litígio que não somente a sentença. Mais do que isso, permite que o conflito seja devolvido aos seus donos, para que eles próprios possam entendê-lo e buscar a pacificação.

5 AZEVEDO, André Gomma (org.). Manual de Mediação Judicial. Brasília/DF: Ministério da Justiça, 5ª ed., (Brasília/DF:CNJ), 2015.6 CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Resolução n.º 225 de 31/05/2016. Disponível em: < http://www.cnj.jus.br/busca-atos-adm?documento=3127>. Acesso em: 20/09/2018. 7 CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Disponível em: < http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/86659-constela-cao-pacifica-conflitos-de-familia-no-judiciario>. Acesso em: 20/09/2018.

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A conciliação também é realizada por um terceiro imparcial, mas seu foco não é somente melhorar a comunicação entre as partes, mas tem por objetivo chegar, se possível a uma transação. Na conciliação (nome aliás só usado no Brasil, já que em outros países só se fala em mediação). Aqui o terceiro facilitador pode sugerir às partes o que fazer, pode opinar sobre o caso8, diferentemente do mediador, que visa à comunicação entre as partes, a facilitação de seu diálogo, sem sugerir a solução, para que possam sozinhas administrar seu conflito. Esse meio é mais indicado para relações circunstanciais, ou também chamadas de relações pontuais. Exemplo: acidente de veículo ocorrido entre desconhecidos. Não há vínculo anterior entre as partes, e o foco do facilitador neste caso é ajuda-los a resolver as posições trazidas sobre o conflito.

É importante frisar que as formas de solução de litígios não são umas melhores que as outras. Cada qual possui características que as tornam mais adequadas para este ou aquele tipo de conflito. De toda sorte, vale ressaltar que a mediação pode trazer como vantagens um baixo custo, informalismo, confidencialidade e maior compromisso das partes em cumprir os acordos e respeitar a solução encontrada, já que não lhes é imposta.

O Cejusc - Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania, constante à partir do artigo 8.º da Resolução 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça9 passou a concretizar, dentro da Política Pública Judiciária, o oferecimento de mecanismos de soluções de controvérsias, em especial os chamados meios consensuais, como a mediação e a conciliação, bem como prestar atendimento e orientação ao cidadão. São incumbidos de realizarem as sessões de conciliação e mediação pré-processuais, cujas audiências são realizadas por conciliadores e mediadores credenciados junto ao Tribunal. A partir de então, um grande esforço para treinamento de conciliadores e mediadores passou a ser desenvolvido, com a multiplicação de Cursos de Capacitação, supervisionados pelo próprio CNJ e Tribunais, para o fim de treinamento dos interessados, para a nova atividade então estimulada.

Dentro de toda essa sistemática apresentada de: existência de audiências regidas pelo artigo 334 do Código de Processo Civil, as quais são realizadas pelos Cejuscs (onde houver a sua implantação); existência de diferentes técnicas de autocomposição e resolução de conflitos, nada mais prático que os Cejuscs que tiverem equipe capacitada, utilizem antes, durante a realização da audiência prevista no artigo 334, ou no decorrer do processo judicial,10 o sistema multiportas (que confere a possibilidade de aplicação de diferentes técnicas de autocomposição, de acordo com o caso concreto).

A aplicabilidade do sistema multiportas dentro do artigo 334, aproveitando a atuação dos Cejuscs, em outras palavras, viabiliza que as partes, com o auxílio de seus advogados, possam ter uma melhor visão do conflito colocado à apreciação pelo Poder Judiciário, e é uma excelente oportunidade

8 O conciliador pode sugerir soluções para o litígio, desde que sem constrangimentos ou intimidações, como lembra o CPC , art. 165, § 2.º.9 Art. 8º Os tribunais deverão criar os Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (Centros ou Cejus-cs), unidades do Poder Judiciário, preferencialmente, responsáveis pela realização ou gestão das sessões e audiências de conciliação e mediação que estejam a cargo de conciliadores e mediadores, bem como pelo atendimento e orientação ao cidadão. (Redação dada pela Emenda nº 2, de 08.03.16).10 Art. 334. Se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não for o caso de improcedência liminar do pedido, o juiz designará audiência de conciliação ou de mediação com antecedência mínima de 30 (trinta) dias, devendo ser citado o réu com pelo menos 20 (vinte) dias de antecedência.§ 1o O conciliador ou mediador, onde houver, atuará necessariamente na audiência de conciliação ou de mediação, obser-vando o disposto neste Código, bem como as disposições da lei de organização judiciária.

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para realizar não só um acordo total da disputa, mas também de resolver as questões incontroversas, deixando ao magistrado somente as questões que não puderam ser resolvidas nem pela mediação e nem por outros métodos de solução de conflitos. Ou seja, serão resolvidos por meio de provas, sentença ou recursos somente temas irreconciliáveis, ou que dependam de provas complexas (por exemplo prova pericial), ou situações em que não é possível a autocomposição (casos graves de violência doméstica, ação anulatória de casamento, por exemplo).

O desafio dos Cejuscs no Brasil, assim como da efetiva aplicabilidade com qualidade dos mecanismos trazidos pelo artigo 334 do Código de Processo Civil são grandes. Neste setor podemos utilizar um, dois, ou vários métodos de solução de conflitos, dependendo do caso e da voluntariedade das partes em participar. Há uma atual ruptura com a cultura do conflito entre as partes e favorece uma nova concepção no tratamento do judiciário com vistas inclusive a cooperação e duração razoável do processo para os casos em que há possibilidade de composição com vistas à satisfação de interesses de forma justa e efetiva.

PONDERAÇÕES FINAIS

Diante da crise do Poder Judiciário devido ao grande número de demandas, as formas ditas “alternativas” de solução dos conflitos foram valorizadas, inclusive, no Código de Processo Civil Brasileiro.

Dessa forma, o desenvolvimento do diálogo e da cooperação entre as partes na busca de uma solução para o conflito tem sido estimulado, em detrimento da heterocomposição – imposição da decisão por um árbitro ou juiz, e a Resolução 125/2010 proporcionou um grande marco regulamentar na área de Política Pública de formas de solução de conflitos.

O acesso à justiça é indispensável ao alcance de uma ordem jurídica justa e dar realce às formas consensuais de solução de conflitos é essencial à efetivação desse direito fundamental.

A possibilidade de se resolver um conflito por outros meios que não os judiciais traz mais benefícios do que problemas. E o mais importante deles consiste na adequação que os mecanismos podem proporcionar à solução da controvérsia, resultando, acima de tudo, na satisfação do jurisdicionado e na restauração da convivência social entre os envolvidos no conflito, a redução dos recursos, a facilitação da execução, dentre outros, além da possibilidade de diminuição de demandas judiciais com o advento de uma cultura de pacificação a ser fomentada na sociedade, atingindo não apenas o cidadão, mas também, o próprio Estado.

Resta claro que o Código de Processo Civil de 2015, a Lei nº 13.140/15 e a Lei nº 9.099/1995 chancelam um sistema de multiportas, que incentiva a autocomposição. Em outras palavras, há de se perceber os institutos ora expostos como equivalentes jurisdicionais que permitem novos caminhos para a resolução dos conflitos que abarrotam o Poder Judiciário, produzindo, portanto, resultados aceitáveis por um lapso temporal mais reduzido, com o mínimo de despesas processuais, além de evitar maior complexidade na relação das partes. O artigo 90 do Código de Processo Civil dá incentivo a acordos realizados antes da sentença inclusive.

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O sistema multiportas ajuda a abordar cada litígio a partir do caso, tratando cada um de forma singular e colocando os interessados como protagonistas na busca da solução.

Portanto, os operadores do direito devem se desarmar e abraçar essa nova realidade jurídica. É compreensível, pois não se muda uma cultura em pouco tempo, e os Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania ainda possuem atuação recente no Brasil, porém os precedentes mostram que é preciso romper os esquemas clássicos apresentados pelo Direito, diante de bons resultados já apresentados principalmente em divulgações do Conselho Nacional de Justiça, bem como dos próprios Tribunais Brasileiros.

Não basta filtrar a judicialização para evitar a avalanche de processos; é preciso também mudar a cultura dos profissionais do Direito, das Universidades e de toda uma sociedade para buscar mais autonomia, para e por ela mesma, resolver os seus problemas. Isso exige a simplificação do acesso às formas de autocomposição para que as partes resolvam, qualitativamente, os seus problemas. É uma política pública imprescindível que incumbirá a todo o Sistema de Justiça, com o apoio da sociedade.

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REFERÊNCIAS

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BRASIL. Lei N° 13.140, de 26 de Junho de 2015. Dispõe sobre a mediação entre particulares como meio de solução de controvérsias e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da administração pública; altera a Lei no 9.469, de 10 de julho de 1997, e o Decreto no 70.235, de 6 de março de 1972; e revoga o § 2o do art. 6o da Lei no 9.469, de 10 de julho de 1997. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13140.htm>. Acesso em 19 out. 2018.

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LUZ MARINA CAMPOS GUERRA1

PAULA SILVA2

REFLEXÕES DO PENSAMENTO COMPLEXO SISTÊMICO NA APLICAÇÃO DA CONSTELAÇÃO NO JUDICIÁRIO

Diante de uma infinidade de diversidades de sistemas e fenômenos do mundo natural que o homem passou a compartilhar entre si e com o meio ambiente, desde os primórdios, em toda sua evolução histórica como um ser social, influenciados por fatores internos e externos, que surge o contexto para o chamado pensamento complexo e sistêmico3.

Inicialmente reconhecido em meados do século XX, este pensamento sistêmico tem enfrentado um procedimento linear ao longo

1 Mediadora. Presidente da Comissão de Direito das famílias da Ordem dos Advogados do Brasil-Subseção Ma-ringá. Advogada familista em Maringá (OAB/PR15.751). Endereço eletrônico:<[email protected]>2 Graduada em Direito pela faculdade Maringá, Graduada em fisioterapia pela Universidade Unimar, Pós-gra-duada em Direito Ambiental pela Unifamma, Practitioner em programação neurolinguística, Instrutora Oficial em The-tahealing, Sócia proprietária da Câmara de Mediação e arbitragem MWD Resoluções. Facilitadora em constelação sistê-mica. Especialista em constelação Estruturais, familiar, organizacionais e jurídicas.3 MARIOTTI, Humberto. Complexidade e pensamento complexo (texto introdutório).Disponível em: <http://escoladedialogo.com.br/escoladedialogo/index.php/biblioteca/artigos/complexidade-e-pensamento-complexo/>. Acesso em: 10 set 2017.4 GOMES, Lauren Beltrão; BOLZE, Simone Dill Azeredo; BUENO, RovanaKinas; CREPALDI, Maria Apa-recida. As origens do pensamento sistêmico: das partes para o todo. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1679-494X2014000200002>. Acesso em: 10 set 2017.5 YAMAOKA, Eloi. A análise de sistema e o pensamento sistêmico. Disponível em: <http://www.egov.ufsc.br/portal/conteudo/an%C3%A1lise-de-sistema-e-o-pensamento-sist%C3%AAmico>. Acesso em: 22 set 2017.

do tempo, com retrocessos e avanços nos mais variados campos da ciência, até ser bastante disseminado nos dias atuais4, em razão do aumento constante da complexidade que se mostra inerente à atual história da humanidade, que emana “(...) do desenvolvimento constante de novos conhecimentos, a consequente introdução de novas tecnologias, a globalização, a crise moral e ética, os problemas ambientais, para citar alguns exemplos”5.

Ou seja, se apresenta como uma nova visão de mundo, que busca, acima de tudo, compreender as mudanças ocorridas e que continuam ocorrendo constantemente, a fim de conviver com a multiplicidade que nasceu na sociedade junto delas.

DA APLICAÇÃO DA CONSTELAÇÃO SISTÊMICA NO PODER JUDICIÁRIO

CAPÍTULO 3

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TEORIA GERAL DOS SISTEMAS

Considerando que há uma necessidade primária de se perceber o mundo como ele é, das experiências humanas e suas consequentes percepções, sentimentos e emoções, para então se determinar e compreender o comportamento humano na sociedade atual, é possível observar uma chamada consciência sistêmica, que constitui as forças naturais da biologia e da evolução humana, “(...) que prevalece sobre nossos sentimentos pessoais de culpa e inocência, estando a serviço de outras ordens”6.

Foi nos séculos XVI e XVII, com a Física, Astronomia e Matemática que a visão medieval foi superada por leis exatas, isto é, cedeu lugar à chamada Teoria Geral dos Sistemas, mais ampla, abarcando todas as áreas do conhecimento, das ciências empíricas como uma ciência da totalidade7, como sendo a “(...) primeira tentativa de desenvolvimento das ideias sistêmicas como um novo quadro de referência do conhecimento científico (...)”8, bem como pela Teoria Sistêmica, um conceito mais centrado, e inicialmente aplicado na área da Psicologia9.

A ideia, desde os primórdios, é a de que ao instituir uma população, uma sociedade, haverá variações genéticas e de criação, de comportamentos e pensamentos. E para evitar conclusões precipitadas e errôneas, há a busca por um raciocínio de uma teoria unificada10, capaz de compreender todo o processo evolutivo que o homem vem sofrendo ao longo dos anos.

Nesse sentido,

O objetivo da Teoria Geral dos Sistemas se constituía em estudar os princípios universais aplicáveis aos sistemas em geral, sejam eles de natureza física, biológica ou sociológica. A interação ou a relação entre os componentes torna os elementos mutuamente interdependentes e caracteriza o sistema, diferenciando-o do aglomerado de partes independentes (...). A Teoria Geral dos Sistemas combina conceitos do Pensamento Sistêmico e da Biologia (...), incidindo na generalização do Modelo Organicista, ou seja, na noção de que o universo pode ser pensado como um grande organismo vivo (...). Assim, pressupõem-se que os fenômenos não podem ser considerados isoladamente, e sim, como parte de um todo11.

Contudo, o que se verifica é que,

6 HELLINGER, Bert. A simetria oculta do amor: por que o amor faz os relacionamentos darem certo. São Pau-lo: Cultrix, p.29.7 BERTALANFFY, Ludwig V.. Teoria geral dos sistemas. Rio de Janeiro: Vozes Ltda, 1975. p. 61.8 KASPER, Humberto. O processo de pensamento sistêmico: um estudo das principais abordagens a partir de um quadro de referência proposto. Dissertação de Mestrado - Universidade Federal Do Rio Grande Do Sul Programa De Pós-Graduação Em Engenharia De Produção. Porto Alegre, 2000. p.669 GOMES, Lauren Beltrão; BOLZE, Simone Dill Azeredo; BUENO, RovanaKinas; CREPALDI, Maria Apa-recida. As origens do pensamento sistêmico: das partes para o todo. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1679-494X2014000200002>. Acesso em: 10 set 2017.10 HAWKING, Stephen W. Breve história do tempo. Disponível em: < http://www.projetovemser.com.br/blog/wp-includes/downloads/F%EDsica%20Quantica%20-%20Uma%20Breve%20Hist%F3ria%20Do%20Tempo%20-%20Stephen%20Hawking.pdf>. Acesso em: 10 set 2017.11 GOMES, Lauren Beltrão; BOLZE, Simone Dill Azeredo; BUENO, RovanaKinas; CREPALDI, Maria Apareci-da. Op.Cit.

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(...), mesmo na psicologia, o estudo da consciência tem um certo ar de vanguarda um tanto perigoso. Em uma reunião na Sociedade Britânica de psicologia a que assisti recentemente haviam acabado de criar um grupo sobre consciência e todos os membros estavam temerosos de estarem no limite e se arriscando; haviam muitas pessoas contrárias porque psicólogos falavam sobre consciência. Para as pessoas alheias à psicologia, isso pode parecer um estranho paradoxo, mas o fato é que, embora a consciência tenha se transformado em um tópico de moda e realmente importante, no campo da ciência, grande parte do pensamento sobre a consciência ainda está limitado pela visão materialista que equipara consciência ao cérebro. Como cientistas todos nós fomos criados acreditando que a consciência está localizada dentro de nossa cabeça e na ciência institucional, a maioria das pessoas acha que a consciência é apenas uma atividade do cérebro. É bom lembrar que, ao contrário, as tradições espirituais e religiosas sempre tiveram uma visão muito mais ampla da consciência e têm muito pouco contato com a visão científica muito mais restrita12.

Ou seja, influenciados desde as origens pela educação e pela cultura difundidos na sociedade por meio de um modelo mental linear, tanto no que tange ao plano individual como no social, cuja base está no empirismo, isto é, na ideia de que existe apenas uma única realidade que deve ser percebida de uma mesma maneira por todos, nos dias atuais esta percepção objetiva tem sido questionada em muitos sentidos, como por exemplo, pelo pensamento complexo13.

Isso significa dizer que a compreensão do homem e sua evolução na sociedade, juntamente com o seu desenvolvimento sustentado não bastam com o pensamento linear, e nem tampouco com o pensamento sistêmico se tratada de forma isolada, mas sim, pela complementaridade entre os dois pensamentos, posto que, o desenvolvimento sustentado exige um pensamento que lhe dê base e estrutura, tal como o pensamento complexo. E nesse sentido,

De acordo com a globalidade, todos os sistemas funcionam como um todo coeso e mudanças em uma das partes provocam mudanças no todo. O conceito de não-somatividade afirma que o sistema não é a soma das partes, devendo-se considerar o todo em sua complexidade e organização; assim, embora o indivíduo faça parte da família, ele mantém sua individualidade. A homeostase é o processo de autorregulação que mantém a estabilidade do sistema preservando seu funcionamento. A morfogênese é o processo oposto a homeostase, ou seja, é a característica dos sistemas abertos de absorver os aspectos externos do meio e mudar sua organização. A circularidade, também chamada de causalidade circular, bilateralidade ou não-unilateralidade, diz respeito à relação bilateral entre elementos, sendo que esta relação é não linear e obedece a uma sequência circular. O último conceito, equifinalidade, refere que em um sistema aberto, o resultado de seu funcionamento independe do ponto de partida, ou seja, o equilíbrio é determinado pelos parâmetros do sistema; diferentes condições iniciais geram igualdade de resultados e diferentes resultados podem ser gerados por diferentes condições iniciais. Desta forma, nos sistemas fechados o estado de equilíbrio é dado pelas condições iniciais (...)14.

O que se verifica, portanto, é que o pensamento sistêmico trata-se de um valioso instrumento do pensamento complexo que se apresentou perante as ciências empíricas, e que permite a compreensão da complexidade que o homem vive e convive com seu cotidiano, através de uma complementaridade

12 SHELDRAKE, Rubert. A mente ampliada. Disponível em: <http://destruidordedogmas.com.br/a-mente-am-pliada/>. Acesso em: 10 set 2017.13 MARIOTTI, Humberto. Complexidade e pensamento complexo (texto introdutório).Disponível em: <http://escoladedialogo.com.br/escoladedialogo/index.php/biblioteca/artigos/complexidade-e-pensamento-complexo/>. Acesso em: 10 set 2017.14 GOMES, Lauren Beltrão; BOLZE, Simone Dill Azeredo; BUENO, Rovana Kinas; CREPALDI, Maria Apa-recida. As origens do pensamento sistêmico: das partes para o todo. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1679-494X2014000200002>. Acesso em: 10 set 2017.

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entre as visões lineares e sistêmicas do mundo, e que “(...) possibilita a elaboração de saberes e práticas que permitem buscar novas formas de entender a complexidade dos sistemas naturais e lidar com ela, o que, é claro, inclui o ser humano e suas culturas. (...)”15.

DA AUTOPOIESE E A TEORIA DE GAIA

Diante do exposto, verifica-se que para compreender o pensamento complexo e suas influências no conhecimento, é necessário entender a interação entre o sujeito e objeto, isto é, as relações que são estabelecidas e a dinâmica não-linear que há entre eles. Isso porque, é possível levar em consideração que todos os seres vivos pertencem a uma mesma máquina, ou seja,

(...) É parte constitutiva da dinâmica organizadora da matéria e intrínseca à própria dinâmica da vida. Ela está presente também nos processos de construção do conhecimento e na aprendizagem. Assim, todo processo formador e/ou inovador implica mudança e, muitas vezes, transformação. Tanto a transformação de um ser como de um fazer, de um ambiente, de um fato, de um processo ou de uma situação qualquer ou mesmo de um caminho, a partir do qual ocorrem modificações de natureza qualitativa ou quantitativa. Na pesquisa, elas também podem estar presentes, tanto na maneira como interpretamos a realidade, como no modo de construir, desconstruir e reconstruir conhecimento. Isto acontece pelo fato dos processos interpretativos possuírem uma natureza dialeticamente complexa e intrinsecamente reconstrutiva, (...)16.

Nesse sentido, além do domínio da biologia, a chamada autopoiese17, ou também conhecida como autoprodução, é também um instrumento utilizado nas demais áreas do conhecimento, tais como a sociologia, psicoterapia, administração, entre outras, como um importante instrumento de investigação da realidade18, uma vez que todo conhecer e aprender implica em um processo de auto-organização, que requer a interpretação, auto-organização e criação por parte do sujeito.

Em outras palavras, utilizando-se do conhecimento e da aprendizagem para interagir com a realidade, por meio de uma causalidade considerada circular retroativa e recursiva, que:

Todos esses aspectos afetam, sobretudo, nossos esquemas lógicos de reflexão e de interpretação da realidade, devendo ser levados em consideração ao se pensar numa metodologia de pesquisa a partir do pensamento eco-sistêmico ou da complexidade. Isto porque todo paradigma apresenta consequências em termos lógicos e metodológicos, já que paradigma e método são inseparáveis. Todo paradigma, de certa maneira, dirige uma prática cognitiva, influencia os processos de construção de conhecimento e a aprendizagem. O conhecimento

15 MARIOTTI, Humberto. Complexidade e pensamento complexo (texto introdutório).Disponível em: <http://escoladedialogo.com.br/escoladedialogo/index.php/biblioteca/artigos/complexidade-e-pensamento-complexo/>. Acesso em: 10 set 2017.16 MORAES, Maria Cândida; e TORRE, Saturnino De La. Pesquisando a partir do pensamento complexo - ele-mentos para uma metodologia de desenvolvimento eco-sistêmico. In: Educação. Porto Alegre – RS, ano XXIX, n. 1 (58), p. 145 – 172, Jan./Abr. 2006. p. 155-157.17 “(...) A palavra surgiu pela primeira vez na literatura internacional em 1974, num artigo publicado por Varela, Maturana e Uribe, para definir os seres vivos como sistemas que produzem continuamente a si mesmas. Esses sistemas são autopoiéticos por definição, porque recompõem continuamente os seus componentes desgastados. Pode-se concluir, portanto, que um sistema autopoiético é ao mesmo tempo produtor e produto”. (MARIOTTI, Humberto. Autopoiese, cul-tura e sociedade. Disponível: <http://www.dbm.ufpb.br/~marques/Artigos/Autopoiese.pdf>. Acesso em: 11 set 2017).18 GOMES, Lauren Beltrão; BOLZE, Simone Dill Azeredo; BUENO, RovanaKinas; CREPALDI, Maria Apa-recida. As origens do pensamento sistêmico: das partes para o todo. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1679-494X2014000200002>. Acesso em: 10 set 2017.

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produzido é fruto de processos que envolvem interpretação e auto-organização por parte do sujeito pesquisador19.

E no mesmo sentido, destaca-se a conhecida hipótese de Gaia, do cientista inglês James Lovelock, em 1979, e fortalecida pela bióloga americana Lynn Margulis, baseada na mitologia grega, onde Gaia era a deusa da Terra e mãe dos seres vivos, e de acordo com ela:

(...), o planeta Terra é um imenso organismo vivo, capaz de obter energia para seu funcionamento, regular seu clima e temperatura, eliminar seus detritos e combater suas próprias doenças, ou seja, assim como os outros seres vivos, um organismo capaz de se autorregular. De acordo com a hipótese, os organismos bióticos controlam os organismos abióticos, de forma que a Terra se mantém em equilíbrio e em condições propícias de sustentar a vida20.

Levando em consideração esta hipótese, seus defensores afirmam que os seres vivos seriam capazes de transformar o ambiente em que vivem, de modo a adequá-lo às suas necessidades para sobrevivência, ou seja, a Terra se tornaria um planeta em que a vida controlaria a sua própria manutenção, com base nas interações diversas estabelecidas por seus seres. A exemplo da composição da atmosfera, em que, sem a presença dos seres responsáveis pela fotossíntese, a produção do gás carbônico na atmosfera seria elevada, ao passo que o nitrogênio e o oxigênio seriam escassos. Mas devido a sua existência, há uma redução do gás carbônico, principal responsável do efeito estufa, o que influencia diretamente na temperatura do planeta21.

Por outro lado, a ideia de que a Terra seja um superorganismos, capaz de interferir e adequar o meio ambiente à sobrevivência dos seres que nela vivem, há cientistas tradicionais que entendem que não são apenas os fatores biológicos que interferem no planeta, mas também “(,..) fatores geológicos, como erupções vulcânicas, glaciações, cometas se chocando contra a Terra, que modificaram e ainda modificam profundamente o aspecto do planeta”22.

Fato é que, diante dos recentes e progressivos problemas ambientais, como o aquecimento global, estes pensamentos acima expostos, demonstram a relação existentes entre os seres vivos e os impactos que são causados no planeta com suas atividades, e que merecem ser reconhecidos e levados em conta para a busca de um equilíbrio social e ambiental.

DA CONSTELAÇÃO SISTÊMICA

Desde os primórdios o homem se desenvolveu uns com os outros até se estabelecer como um ser social, e nas relações pessoais não seria diferente: de gerações em gerações adotou-se um sistema familiar, com toda sua carga morfogenética, padrões e crenças23. Relações que se iniciam com “(...)

19 MORAES, Maria Cândida; e TORRE, Saturnino De La. Op.Cit.20 LOUREDO, Paula. A hipótese Gaia. Disponível em: <http://brasilescola.uol.com.br/biologia/hipotese-gaia.htm>. Acesso em: 15 set 2017.21 Ibid.22 Ibid.23 ARAUJO, Karla de. Constelações sistêmicas. Disponível em: <http://www.alinhamento-energetico.com/cons-tela%C3%A7%C3%B5es%20sist%C3%AAmicas/>. Acesso em: 10 set 2017.

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o dar e o tomar. Do mesmo modo, com o dar e o tomar começam também nossas experiências de culpa e inocência, pois quem dá tem também direito de reivindicar, e quem toma se sente obrigado”24. Ou seja, além do homem fazer parte de uma família, de um grupo familiar, ele também convive em sociedade, estabelecendo relações com outras pessoas fora deste meio25.

Diante disso, há a chamada Constelação Sistêmica, isto é,

(...) um método psicoterápico e de coaching profissional que trabalha principalmente as emoções e energias inconscientes que influenciam nossas decisões. Seu alcance é diverso: tem sido usada tanto em tratamentos terapêuticos diversos, como também na busca de soluções profissionais e empresariais. O método sistêmico é tão versátil e abrangente que pode ser utilizado até em desenvolvimento de produtos, estratégias, soluções para criação de roteiros, divulgação e propaganda, etc.26

Assim, o que se verifica é seu uso, principalmente, nas questões de relações interpessoais, conflitos emocionais e crenças pessoais, sobretudo diante da existência de uma ligação inconsciente que interfere no convívio das pessoas que dividem um mesmo sistema, seja, por exemplo, dentro de uma família, de uma empresa, de um departamento, de uma cidade ou até mesmo dentro de um país, que deve ser respeitada para que uma harmonia seja alcançada.

NOÇÕES HISTÓRICAS

A Constelação Sistêmica tem sua base histórica na Alemanha, nos estudos do psicoterapeuta, filósofo, teólogo e pedagogo Bert Hellinger, o psiquiatra e psicoterapeuta Gunthard Weber, Matthias Varga von Kibéd e a psicoterapeuta Insa Sparrer27, com destaque ao alemão Bert Hellinger que desenvolveu a dinâmica da Constelação Sistêmica, baseada:

(...), a partir da sua observação de sistemas familiares, e tem como objetivo buscar soluções para todo tipo de questão. Hellinger constatou que podem existir dinâmicas ocultas que influenciam os membros do sistema, a relação entre eles e o próprio sistema. A constelação traz a luz essas dinâmicas, até então ocultas, nos permitindo perceber o que não está visível, revelando insights e favorecendo a solução da questão28.

Através de seus métodos,

As constelações familiares desenvolvem-se em três fases e criam duas imagens diferentes do sistema familiar: uma imagem da dinâmica destrutiva e outra da solução. A primeira fase da constelação apresenta as lembranças e imagens interiores do cliente, sendo um quadro altamente

24 HELLINGER, Bert. O amor do espírito na Hellinger Sciencia. Minas Gerais: Atman, 2009. p.15.25 HELLINGER, Bert. A simetria oculta do amor: por que o amor faz os relacionamentos darem certo. São Pau-lo: Cultrix, p.99. 26 POSSATO, Alex. Constelação Sistêmica. Disponível em: <https://constelacaosistemica.wordpress.com/>. Acesso em: 12 set 2017.27 A HISTÓRIA das Constelações. Disponível em: <http://www.s100.com.br/2016/11/historia-das-constelacoes/> Acesso em: 12 set 2017.28 WEISS, José Luiz. Constelações sistêmicas: um sucesso em empresas familiares. Disponível em: <http://exa-me.abril.com.br/blog/gestao-fora-da-caixa/constelacoes-sistemicas-um-sucesso-em-empresas-familiares/>. Acesso em 14 set 2017.

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subjetivo e pessoal das dinâmicas ocultas que operam na família. Ela fornece uma representação visual dos modos pelos quais o sistema familiar continua a influir nos sentimentos e atividades do cliente29.

E ao longo da história, as ideias definidas com os estudos da Constelação Familiares e Sistêmica passaram a ser mais difundidas e reconhecidas. Sobretudo,

“(...) referem-se ao campo anímico da família e toda representação de fenômenos de natureza mais abstrata, como uma doença ou um país, é útil aos processos de solução nas famílias”30, e que permitem trazer de volta ao convívio social os excluídos e os esquecidos, restabelecendo e consolidando a união anteriormente destruída31.

Desse modo, considerando que o sistema da família antecede o da empresa, posto que as pessoas são filhos, irmãos e membros da família antes de fazerem parte de uma organização, o contexto familiar e o histórico do relacionamento existentes entre eles refletem nas relações, na dinâmica e nos processos de tomada de decisão dentro da empresa. Portanto, as empresas familiares se destacam das demais organizações por suas características peculiares, senão vejamos:

(...) Muitas empresas são especialmente focadas na sua sustentabilidade de longo prazo porque as vezes a sobrevivência da organização como legado da família é mais importante do que o resultado financeiro de curto prazo. A hierarquia e a governança que está descrita formalmente pode ser bem diferente de como as decisões realmente são tomadas e o que efetivamente acontece. A sucessão de um líder familiar é um tema delicado e muitas vezes envolve elementos que vão além do que seria esperado em outro tipo de empresa. A exclusão de um membro da família da organização, voluntária ou involuntária, as vezes traz à tona questões desafiadoras que impactam o sentimento de pertencer tanto na família como na empresa32.

Sendo assim, a Constelação Sistêmica mostrou-se um importante instrumento alternativo social na busca pela melhor solução de um conflito que eventualmente venha a surgir do relacionamento do homem individualmente ou com o próximo, em um meio familiar ou coletivo.

EQUILÍBRIO E ORDEM

Não há dúvidas de que a “(...) família é a base fundamental sobre a qual se ergue o imenso edifício da sociedade”33. Assim, diante dos estudos concernentes à Constelação Sistêmica e do Pensamento Complexo e Sistêmico, verifica-se que o seu objetivo maior é a busca pela melhor solução dos conflitos que o homem venha a enfrentar, por meio da busca e identificação da origem dos problemas. Em outras palavras,

29 HELLINGER, Bert. A simetria oculta do amor: por que o amor faz os relacionamentos darem certo. São Pau-lo: Cultrix, p.158.30 SCHNEIDER, Jakob Robert. A prática das constelações familiares. Minas Gerais: Atman, 2007. p.94.31 HELLINGER, Bert. O amor do espírito na Hellinger Sciencia. Minas Gerais: Atman, 2009. p.65.32 WEISS, José Luiz. Constelações sistêmicas: um sucesso em empresas familiares. Disponível em: <http://exa-me.abril.com.br/blog/gestao-fora-da-caixa/constelacoes-sistemicas-um-sucesso-em-empresas-familiares/>. Acesso em 14 set 2017.33 FRANCO, Divaldo. Constelação familiar. Bahia: Leal, 2008. p.2.

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Este trabalho se baseia na existência de uma consciência familiar que “rege” nossos destinos. Cada vez que uma das ordens desta consciência é quebrada, ela age no sistema familiar, através de seus membros, “exigindo” uma compensação. Uma destas ordens é o direito ao pertencimento: todos, no sistema familiar, têm o mesmo direito de pertencer. Isto implica que, cada vez que alguém é excluído do sistema, normalmente por questões morais, a consciência familiar escolhe um membro de uma geração posterior ao excluído para que tenha um destino semelhante e difícil. Crianças abortadas, criminosos, alcoólatras, doentes mentais, prostitutas, filhos ilegítimos, todos se enquadram neste grupo de excluídos. Somente quando estas pessoas são reconhecidas e incluídas no coração da família, aquele que estava identificado com o excluído pode seguir seu próprio destino livremente34.

Sendo assim, “(...) Quando compreendemos as leis sistêmicas que permitem a efusão do amor, capacitamo-nos a ajudar famílias e pessoas em sofrimento a encontrar soluções, e mudar seus ambientes psicológicos (...)”35, isto é, o trabalho sistêmico surge com base na percepção da concepção da vida, e do seu desenvolvimento natural e inerente, de maneira que os seres vivos estão inseridos em um sistema contínuo, dotados de diversos elementos que se interagem entre si e com o meio exterior, em uma constante troca de informações em variados níveis do conhecimento. Isto é,

Nossos relacionamentos, bem como nossas experiências de culpa e inocência, começam com o dar e o receber. Nós nos sentimos credores quando damos e devedores quando recebemos. O equilíbrio entre crédito e débito é a segunda dinâmica fundamental de culpa e inocência nos relacionamentos. Favorece todos os relacionamentos, pois tanto o que dá quanto o que recebe conhecem a paz se o dar e o receber forem iguais36.

E nesse sentido, estabelece um estado de ordem, equilíbrio e de pertencimento que os campos familiares devem observar: “(...) A ordem está ligada ao direito de precedência, onde os que vêm antes tem autoridade sobre quem vem depois; o equilibro entre dar e tomar entre os que fazem parte do sistema (excluindo a relação de pais e filhos) e o pertencimento de todos, sem exceção”37.

Caso contrário,

Quando não ajustada, esta ligação exerce uma influência que traz conflito, dor, dificuldades, mantendo pessoas que criam um sentimento de co-dependência entre si. Quando ajustada, naturalmente as pessoas partem em busca de seus próprios caminhos de realização pessoal, de forma independente, respeitando os outros indivíduos, porém, sem sentir-se na obrigação de agir ou reagir devido às atitudes dos outros. A dinâmica da constelação deixa claro a necessidade da liberdade individual, do respeito aos papéis que cada um exerce e do limite entre “o dar e receber” nas relações, para que os grupos possam estar em harmonia38.

Diante disso, verifica-se que a utilização da Constelação Sistêmica permite auxiliar as pessoas

34 ARAUJO, Karla de. Constelações Sistêmicas. Disponível em: <http://www.alinhamento-energetico.com/cons-tela%C3%A7%C3%B5es%20sist%C3%AAmicas/>. Acesso em: 10 set 2017.35 HELLINGER, Bert. A simetria oculta do amor: por que o amor faz os relacionamentos darem certo. São Pau-lo: Cultrix, p.11.36 HELLINGER, Bert. A simetria oculta do amor: por que o amor faz os relacionamentos darem certo. São Pau-lo: Cultrix, p. 21.37 A BASE da Constelação Sistêmica: a ciência fenomenológica. Disponível em: <https://iperoxo.com/2016/11/19/a--base-da-constelacao-sistemica-a-ciencia-fenomenologica/>. Acesso em: 10 set 2017.38 POSSATO, Alex. Constelação Sistêmica. Disponível em: <https://constelacaosistemica.wordpress.com/>. Acesso em: 12 set 2017.

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na busca pela identificação do que pode ser feito diante de um conflito, visando a ordem e o equilíbrio dentro um sistema, seja ele familiar ou social.

DAS CIÊNCIAS DA CONSTELAÇÃO: áreas de aplicação

A aplicação da Constelação Sistêmica se faz necessária diante da realidade que o homem se desenvolveu e evoluiu como um ser social, e seu consequente desenvolvimento ético e moral diante das relações que passou a estabelecer dentro de um ambiente familiar e social39.

Em outras palavras,

Desenvolvendo-se sob a forma de “configurações sistêmicas”, as constelações sistêmicas foram adotadas como uma espécie de método universal, para representar processos sistêmicos nas relações humanas. Atualmente constela-se quase tudo o que pertence ao âmbito das relações da psique: todos os domínios das relações humanas, a conexão entre tudo o que pertence ao corpo, à alma e ao espírito do indivíduo e todas as possíveis intersecções dos processos anímicos internos e externos, inclusive as relações com o mundo material, social e espiritual. Pode-se questionar em que medida isso é conveniente, útil e estimulante para o futuro do método das constelações. Além das constelações familiares, já se consolidou a constelação de estruturas como equipes e organizações, abrangendo até mesmo o espaço político. Além disso, muita coisa interessante tem sido experimentada nos mais diversos campos40.

Portanto, observa-se que suas técnicas podem ser aplicadas em grupo ou individualmente, para conflitos familiares, entre pais, filhos, irmãos, entre casais, diante de perdas de parentes, dificuldade de relacionamento e comunicação em geral, problemas de saúde, dentro de uma empresa, financeiros, entre outros. Isto é, podem ajudar pessoas que estão vivenciando relacionamentos problemáticos, que desejam ter um relacionamento, que precisam tomar grandes decisões, que estão passando por conflitos internos e externos, que estão na busca pelo sucesso profissional, atingindo os mais diversos níveis do relacionamento social do homem41.

E com isso,

O método das constelações tem um caráter universal, pois pode ser aplicado a todos os domínios dos relacionamentos humanos. É útil para superar bloqueios no crescimento e no desenvolvimento da própria personalidade. Ajuda a pessoa a ficar em harmonia e em paz com sua própria história familiar, especialmente quando esta é particularmente confusa. Esclarece, aprofunda e facilita as relações dos pais com seus filhos, dos casais entre si e dos filhos adultos com seus pais vivos ou mortos, com seus irmãos ou com outros familiares. Engloba a vida profissional e as decisões urgentes e considera possíveis conexões entre as doenças ou sintomas negativos de comportamento, tais como medos, compulsões, adições ou psicoses e os acontecimentos familiares, aliviando o cliente e respeitando a sua dignidade. Orienta sobre o modo de proceder em famílias de adoção ou de criação, bem como em redes sociais que não pertencem à família, como asilos e repartições. Pode ser aplicado em cursos de aperfeiçoamento e de supervisão, assim como em escolas, organizações, oficinas e campos sociais maiores. O importante é descobrir, em cada caso, onde o problema do cliente está ligado a destinos alheios. Em seguida, é preciso identificar o que precisa vir à luz sobre a dinâmica dos relacionamentos, abrangendo o espaço e o tempo, para que as realidades sociais

39 FRANCO, Divaldo. Constelação familiar. Bahia: Leal, 2008. p.35.40 SCHNEIDER, Jakob Robert. A prática das constelações familiares. Minas Gerais: Atman, 2007. p.9441 CONSTELAÇÃO Familiar: áreas de aplicação segundo Bert Hellinger. Disponível em: <https://iperoxo.com/constelacao-sistemica-e-familiar/constelacao-familiar/>. Acesso em: 10 set 2017.

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sejam adequadamente configuradas. Finalmente, é preciso saber como devem ser ordenadas as relações, de modo a assegurar o florescimento da vida. Na medida em que respondem a estas questões, as constelações familiares e as outras formas de constelações beneficiam a muitos clientes, (...)42.

Sendo assim, ao longo dos anos, verifica-se que os ideais da Constelação Sistêmica passaram a ser considerados um importante instrumento social, de estudos e análises, não apenas no que tange às relações familiares, mas se ampliando às demais diversas áreas do conhecimento, como a seguir exposto.

EPIGENÉTICA

Entende-se por epigenética43 ou não-genéticas as modificações que o genoma adquire com o passar das gerações, durante a vida de um organismo, sem alterar a sequência do DNA, além das características biológicas que são passadas de uma geração à outra através dos genes. Isso porque, evidência científicas vem demonstrando que hábitos da vida e o ambiente social acabam por interferir e podem, inclusive modificar o funcionamento dos seus genes. Portanto, a “(...) epigenética tem seu efeito biológico a partir de mudanças químicas que podem ocorrer na molécula de DNA e em proteínas chamadas de histonas. Antes de abordarmos efetivamente o papel da epigenética na memória da célula, precisamos entender como a célula funciona”44.

Acredita-se que as experiências vividas pelas gerações passadas influenciam as gerações atuais e futuras não apenas por meio da herança genética, mas também por meio da herança cultural e social. Ou seja, não há uma modificação propriamente dita do DNA, “(...) mas as tendências psicológicas e de comportamento são herdadas: assim, talvez não só tenha os olhos de seu avô, senão também seu bom caráter e sua tendência à depressão ou ao alcoolismo”45.

Nesse viés, a análise de modo mais aprofundado e ampliado tanto das heranças genéticas, como das heranças culturais passam a ser um considerados um importante instrumento de entendimento e compreensão dos conflitos familiares, sobretudo, por meio do seu passado.

Neurônio Espelho

Outro campo de atuação que podem ser verificadas as técnicas da Constelação Sistêmica pode ser observado nos chamados neurônios espelho, baseado nos comportamentos humanos advindos de relacionamentos, observação e imitação, que são adquiridas por meios genéticos, bem como pela herança cultural, do emocional que a pessoa vive ao longo de sua vida.

42 SCHNEIDER, Jakob Robert. A prática das constelações familiares. Minas Gerais: Atman, 2007. P.95.43 “O termo “epigenética” tem origem do grego, onde “epi” significa “acima, perto, a seguir”, e estuda as mudan-ças nas funções dos genes, sem alterar as sequências de bases (adenina, guanina, citosina e timina) da molécula de DNA (ácido desoxirribonucleico). As modificações epigenéticas podem ser herdadas no momento da divisão celular (mitose) e irão ter um profundo efeito na biologia do organismo, definindo diferentes fenótipos (i.e. morfologia, desenvolvimento, comportamento etc)”. (FANTAPPIÉ, Marcelo. Epigenética e memória celular. Disponível em: <http://revistacarbono.com/artigos/03-epigenetica-e-memoria-celular-marcelofantappie/>. Acesso em 15 set 2017).44 FANTAPPIÉ, Marcelo. Epigenética e memória celular. Disponível em: <http://revistacarbono.com/artigos/03-epigenetica-e-memoria-celular-marcelofantappie/>. Acesso em 15 set 2017.45 HERANÇA genética. Disponível em: < http://viviansunnanda.blogspot.com.br/2015/10/heranca-genetica-cien-cia.html>. Acesso em: 15 set 2017.

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E assim,

Conhecer o funcionamento dos “neurônios espelho” nos traz luz não apenas aos processos de aprendizado e imitação, e consequentemente no desenvolvimento da inteligência, mas também nos fenômenos misteriosos das percepções dos representantes, que sempre estão conectadas a “movimentos” de uma natureza corporal, sensorial, emocional ou intelectual. Esses movimentos são necessariamente provocados pela informação. (...). Os neurônios espelho refletem ou “espelham” essa informação nos centros visuais do cérebro e a comunicam instantaneamente e imediatamente (etimologicamente, “sem intermediários”) ao centro motor dos representantes. A constelação então se torna a materialização, a manifestação da evolução passada e do estado atual do sistema familiar do cliente46.

Nesse sentido, por meio dos tais neurônios espelho permite reconhecer e compreender os motivos pelos quais uma pessoa age de certa maneira, e, consequentemente a entender sua intenção antes de ser imitada ou levada adiante, sendo de grande importância nos estudos referentes ao comportamento humano, nas patologias que dele podem surgir, tais como o autismo, esquizofrenia, bem como no que tange ao próprio desenvolvimento de uma criança até sua fase adulta47 .

CAMPOS MORFOGENÉTICOS

Outra situação encontra-se pautada nos estudos alemães do embriologista Hans Driesch, doscientistas Alexander Gurwitsch e Paul Weiss, que demonstram que a explicação da evolução da vida não se dá apenas por meio da transmissão genética, mas também pela sua integração com a denominada teoria dos campos de força, isto é, com o contato com outros campos, tais como a gravitação e do eletromagnetismo. O que deu ensejo aos estudos de Rupert Sheldrake acerca da ideia do chamado campo morfogenético, que hoje é utilizada nas áreas da biologia, Interação Social, Economia e Psicologia48.

De acordo com o autor Rupert Sheldrake, é possível afirmar que a “(...) nossa mente não está simplesmente localizada dentro de nossa cabeça. Acho que a ideia de que a mente está dentro de nossa cabeça nos dá uma idéia falsa de nosso relacionamento com nossos próprios corpos”49.

Ou seja, verifica-se que as abordagens sistêmicas estão baseadas em leis naturais, que deram origem à noção de “campo” da Física Quântica, à chamada “Teoria dos Campos Mórficos e da Ressonância Mórfica” de Rupert Sheldrake, à existência dos denominados Neurônios Espelho, e à Teoria dos Sistemas, o que permitiu o entendimento atual de que a mente não está localizada no cérebro, mas sim que ela se expande para o exterior, formando um campo holográfico, que permite o ser vivo sentir e ter sensações e pensamentos50.

46 RAMOS, Rodrigo. Neurônios espelho, física quântica, campos mórficos e constelações familiares. Disponível em: <http://rodrigoramos.org/blog/neuronios-espelho-fisica-quantica-campos-morficos-e-constelacoes-familiares/>. Acesso em 15 set 2017.47 Ibid.48 Ibid.49 SHELDRAKE, Rubert. A mente ampliada. Disponível em: <http://destruidordedogmas.com.br/a-mente-am-pliada/>. Acesso em: 10 set 2017.50 CINTRA, Lucy. Terapia sistêmica integral (ou constelação sistêmica familiar). Disponível em: <http://www.portalcmc.com.br/terapia-sistemica-integral-ou-constelacao-sistemica-familiar/>. Acesso em: 15 set 2017.

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Com isso, a ideia do trabalho sistêmico permite aos seres vivos reconhecer e perceber um sistema energético, um campo morfogenético, que possui sentimentos e sensações, inclusive inconscientes, que são capazes de gerar reflexos na vida de um ser humano e seus familiares.

SINCRONICIDADE

Outro ponto relevante, diz respeito à chamada sincronicidade, que pode ser entendida como a correspondência moderna dos conceitos de simpatia e harmonia, baseada não em termos filosóficos, mas na experimentação concreta, de modo a permitir uma internação das coincidências como algo com valor científico. Isso porque,

O inconsciente coletivo é um manancial de informações vividas pela humanidade durante toda a sua história, que permanece acessível a todos, assim como todos os bilhões de informações da internet estão acessíveis a todos os internautas. Estas informações do inconsciente coletivo nos influenciam e de certa forma, conduzem inconscientemente nossas decisões. Assim, quando você decide fazer uma constelação num determinado dia, acredita que é porque uma decisão interna em direção à resolução do seu problema o impulsionou. Isso é parte da verdade. A outra parte é que a mente inconsciente se conectou com o inconsciente coletivo, e sintonizou com o momento adequado, o lugar adequado, o terapeuta adequado. Ao mesmo tempo, outras pessoas se sintonizam neste grupo, neste momento, neste trabalho, proporcionando um encontro onde todos irão perceber razões claras do porquê estiveram ali, todos juntos. Gente que nunca se viu, descobre que suas histórias são semelhantes. E pode compartilhar as soluções, pois entende que a solução de um é solução de todos. Mas não somente entende com a cabeça: vivencia com o corpo, as emoções e a alma – e muitas vezes, ocorrem transformações profundas! Estas pessoas, pela lei da sincronicidade, estavam no lugar certo, na hora certa51.

Com isso, o campo da Constelação Sistêmica permitiu o embate desse inconsciente coletivo e da demonstração dessa tal sincronicidade, uma vez que permite entender a evolução da vida como um impulso inconsciente, de encontros de determinadas pessoas, em determinados momentos52.

Assim, a realidade atual baseia-se na junção do inconsciente coletivo e da sincronicidade da vida, que permite ao ser humano se relacionar entre si e com o mundo exterior, dentro deste campo da Constelação Familiar e Sistêmica.

TEORIA DA NÃO LOCALIDADE DE EINSTEN

Por fim, no contexto das Constelações Familiares, destaca-se a chamada Teoria da Não

51 POSSATO, Alex. O mistério de sentir algo de outra pessoa que não conhecemos…Disponível em: <https://constelacaosistemica.wordpress.com/2013/12/10/o-misterio-de-sentir-algo-de-outra-pessoa-que-nao-conhecemos/>. Acesso em: 15 set 2017.52 POSSATO, Alex. O mistério de sentir algo de outra pessoa que não conhecemos…Disponível em: <https://constelacaosistemica.wordpress.com/2013/12/10/o-misterio-de-sentir-algo-de-outra-pessoa-que-nao-conhecemos/>. Acesso em: 15 set 2017.

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Localidade de Einsten, em que novas informações são capazes de trazer mudanças ao sistema familiar, uma vez que “(...) a informação produzida em um lugar é percebida imediatamente e instantaneamente em outro lugar, sem precisar de nenhum elemento condutor entre o transmissor e o receptor”53.

Dessa forma, o princípio conhecido como da não localidade, na área da Física Quântica não é utilizado apenas espacial, mas também no plano temporal, ou seja, está continuamente no presente da vida do ser humano que possibilita a ele reconhecer a realidade da consciência e do espírito, independentemente do âmbito material do corpo, da sua forma física.

DO DIREITO SISTÊMICO

Diante dos avanços no estudo do pensamento sistêmico e complexo, assim como das Constelações Sistêmicas, o ordenamento jurídico também sofreu influências, dando origem ao chamado Direito Sistêmico, que nada mais é, antes, do que uma postura, isto é, uma inovação na forma de se buscar e fazer justiça, por meio do equilíbrio entre dar e receber em uma situação de conflito54.

Desse modo, a expressão atualmente utilizada de “Direito Sistêmico” teve como precursor dentro do ordenamento jurídico brasileiro o Juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, Dr. Samir Storch55, e surgiu com base na análise inerente das relações humanas inicialmente pré-estabelecidas, em conformidade com os moldes dos estudos difundidos pela ciência das Constelações familiares do alemão Bert Hellinger, anteriormente relatados56.

BREVE HISTÓRICO

O Direito Sistêmico surgiu dentro do ordenamento jurídico brasileiro como um método de solução de conflitos, com base terapêutica, na busca da conciliação das partes envolvidas em um conflito, mediante a análise e compreensão das causas, muitas vezes ocultas, que geraram tal problemática, a fim de estabelecer entre as pessoas a paz e o equilíbrio dos envolvidos.

Para tanto, tem sua base fundamentada na chamada Constelação Familiar, anteriormente estudada, do filósofo e pedagogo alemão Bert Hellinger, cuja experiência demonstrou que a solução de uma questão pode ser obtida através da aplicação dos princípios e leis sistêmicas baseadas na necessidade de pertencimento, compensação e hierarquia, ou seja: “(...) (i) tendo uma postura sistêmico-fenomenológica, (ii) realizando intervenções sistêmicas fenomenológicas, com frases de

53 RAMOS, Rodrigo. Neurônios espelho, física quântica, campos mórficos e constelações familiares. Disponí-vel em: <http://rodrigoramos.org/blog/neuronios-espelho-fisica-quantica-campos-morficos-e-constelacoes-familiares/>. Acesso em 15 set 2017.54 ROSA, Amilton Plácido da. Direito sistêmico e constelação familiar. Disponível em: <http://www.cartaforen-se.com.br/conteudo/entrevistas/direito-sistemico-e-constelacao-familiar/16914>. Acesso em: 20 set 2017.55 MENDES, Ana Tarna dos Santos; LIMA, Gabriela Nascimento. O que vem a ser direito sistêmico? Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/54930/o-que-vem-a-ser-direito-sistemico>. Acesso em: 20 set 2017. 56 STORCH, Samir. O que é o direito sistêmico? Disponível em: <https://direitosistemico.wordpress.com/2010/11/29/o-que-e-direito-sistemico/>. Acesso em: 20 set 2017.

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solução e exercícios e dinâmicas sistêmicas e (iii) aplicando as Constelações Familiares”57.

Diante disso, após sua aprovação em concurso público, o Juiz de Direito do Estado da Bahia, Dr. Samir Storch, influenciado pelos estudos do Bert Hellinger, iniciou e passou a utilizar no Brasil, timidamente, as técnicas apresentadas pela Constelação Sistêmica ou Familiar, uma vez que:

(...) vislumbrou na constelação um instrumento a mais para auxiliá-lo nos julgamentos dos seus processos e na condução de suas audiências, passando a verificar que as partes quando confrontadas com a verdade, com o que está oculto e com o que veio antes do conflito, passavam de uma postura litigante a uma posição consensual, com isso, o Juiz atuava como um conciliador e mediador em suas demandas judiciais, gerando sentenças pacificadoras58.

O Direito Sistêmico, portanto, vem ganhando cada vez mais reconhecimento na ordem jurídica, sobretudo, em razão da ineficiência das leis já existentes para a solução de um conflito. Isso porque, os conflitos entre grupos, pessoas, ou até mesmo individualmente, se mostram provocadas, muitas vezes, por questões mais profundas, do que um mero desentendimento. Ou seja, trata-se de uma realidade complexa que dificilmente encontra-se retratada em uma página de um processo judicial, o que, nesses casos, “(...) uma solução simplista imposta por uma lei ou por uma sentença judicial pode até trazer algum alívio momentâneo, uma trégua na relação conflituosa, mas às vezes não é capaz de solucionar verdadeiramente a questão, de trazer paz às pessoas”59.

Com isso, o Direito Sistêmico tem se mostrado um inovador instrumento na busca pela verdadeira solução de um conflito, inicialmente nas relações familiares, com base nos conceitos da Constelação Familiar, por meio da representação, onde os envolvidos se fazem representar por pessoas, que em conexão em um campo morfogenético de um sistema familiar buscam a melhor solução possível para a questão discutida.

APLICAÇÃO NO PODER JUDICIÁRIO DA COMARCA DE MARINGÁ

As soluções alcançadas com o Direito Sistêmico fizeram com que o movimento ganhasse adeptos, assim Paula Silva e Luz Marina Campos Guerra, ambas advogadas e mediadoras na comarca de Maringá, onde a primeira passou a desenvolver a técnica de constelação estrutural e a segunda com técnicas de mediação desde o início de 2017 de forma integrativa nas audiências de mediação e conciliação pelo projeto cejusc.

Desde então a técnica se tornou um importante instrumento, não apenas nas questões familiares, trazidas em audiências, bem como, o trabalho se expandiu para pautas extras, o que se mostra de grande vantagem e êxito na solução de um conflito. Para tanto,

O juiz, por sua vez, antes de decidir, deve considerar essa realidade e ter em seu coração as

57 ROSA, Amilton Plácido da. Direito sistêmico e constelação familiar. Disponível em: <http://www.cartaforen-se.com.br/conteudo/entrevistas/direito-sistemico-e-constelacao-familiar/16914>. Acesso em: 20 set 2017.58 MENDES, Ana Tarna dos Santos; LIMA, Gabriela Nascimento. O que vem a ser direito sistêmico? Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/54930/o-que-vem-a-ser-direito-sistemico>. Acesso em: 20 set 2017. 59 STORCH, Samir. O que é o direito sistêmico? Disponível em: <https://direitosistemico.wordpress.com/2010/11/29/o-que-e-direito-sistemico/>. Acesso em: 20 set 2017.

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crianças e ambos os pais, além de outras pessoas eventualmente envolvidas, sem julgamentos de qualquer tipo. Com tal postura, por si só, o juiz já estará facilitando uma conciliação entre as partes (que constituem um só sistema). E, caso se faça necessária uma solução imposta, esta será mais bem recebida por todos, pois todos sentirão que foram vistos e considerados pelo juiz60.

Sendo assim, podendo ser utilizado de forma eficiente nas demais questões trazidas ao Poder Judiciário, tais como as constelações sociais ou coletivas, como temas de interesse social quanto ao Meio Ambiente, Patrimônio Público, Cidadania, entre outros, os resultados tem se mostrados positivos quando da utilização desse método. A exemplo do Juiz de , Doutor SamPaula Silva e Luz Marina Campos Guerra que iniciou a aplicação das Constelações no Judiciário de Maringá, Segundo dados ainda em análise pelo cejusc, após o início da técnica das constelações estruturais, tem se conseguido até 95‘% de acordos durante as sessões de conciliação’” 61.

Outrossim, ainda que não haja legislação que regulamente o tema do Direito Sistêmico, há que

se destacar o Novo Código de Processo Civil, preconiza em seu artigo 3º, § 3º62, dentre outros, que

os operadores do direito busquem práticas e métodos variados de solução consensual para a solução

de conflitos, dentre os quais se inserem o Direito Sistêmico e a Constelação sistêmica.

O trabalho vivenciado na comarca de Maringá, tem como eficácia a preservação do segredo de

família, uma vez que, as constelações são realizadas de forma individual com cada parte e posteriormente

tendo a concordância das mesmas, é realizada uma mediação com as partes envolvidas no processo,

assim, podem ter uma visão com maiores possibilidades, uma vez que, a partir do momento que a raiz

do conflito é trazida a consciência, os motivos de se continuar com uma demanda desgastante, longa

e muitas vezes desnecessária passa a perder o sentido.

Nosso trabalho no judiciário vislumbra diante dos resultados até o momento alcançado,

introduzir a aplicação da técnica antes da audiência de conciliação ou mediação, considerando o

momento ideal para maior êxito nos resultados.

De modo que, importante salientar a Lei nº 9.099/9563, que regulamenta os Juizados Especiais

Cíveis, incentiva a prática da conciliação e transação, bem como a Resolução nº 125/2010 do CNJ64,

60 STORCH, Samir. O que é o direito sistêmico? Disponível em: <https://direitosistemico.wordpress.com/2010/11/29/o-que-e-direito-sistemico/>. Acesso em: 20 set 2017.61 ROSA, Amilton Plácido da. Direito Sistêmico e Constelação Familiar. Disponível em: <http://www.cartafo-rense.com.br/conteudo/entrevistas/direito-sistemico-e-constelacao-familiar/16914>. Acesso em: 20 set 2017.62 “Art. 3o Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito. (...) § 3o A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial”. (BRASIL. Lei n. 13.105, de 16 de março de 2015. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em: 20 set 2017).63 “Art. 2º O processo orientar-se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, buscando, sempre que possível, a conciliação ou a transação”. (BRASIL. Lei n. 9.099, de 26 de setembro de 1995. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9099.htm>. Acesso em: 20 set 2017).64 “Dispõe sobre a Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário e dá outras providências”. (BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Resolução 125, de 29 de novembro de 2010. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/busca-atos-adm?documento=2579>. Acesso em: 20 set 2017).

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pode ser utilizada como fundamentação legal para aplicação e utilização da Constelação sistêmica

e do Direito Sistêmico na busca pela melhor solução dos conflitos existentes. Sobretudo, em 2016,

quando houver o reconhecimento pelo Conselho Nacional de Justiça da importância e dos benefícios

trazidos pelas técnicas aplicadas do Direito Sistêmico, que ocasionou num crescente índice de acordos

em processos litigiosos65.

E assim, o que se verifica é a crescente aplicação das técnicas do Direito Sistêmico no

ordenamento jurídico brasileiro. Seguindo o exemplo do Juiz Bahiano Dr. Samir Storch, o Juiz do

Estado de Goiás, Dr. Paulo César Alves das Neves, coordenador do Núcleo Permanente de Métodos

Consensuais de Solução de Conflitos do TJGO e também idealizador do projeto66, afirma que não trata-se de uma simples conciliação, mas também envolve técnicas de terapia familiar, que desde abril de 2013, possibilitou a uma demanda de 256 famílias de Goiânia e região metropolitana em conflitos envolvendo divórcios, pensão alimentícias, guarda de filhos e regulamentação de visitas, um índice positivo de solução de cerca de 94%, reduzindo o número de ações judiciais e minimizando novas divergências67.

Isso porque,

A abordagem sistêmica do direito, portanto, propõe a aplicação prática da ciência jurídica com um viés terapêutico – desde a etapa de elaboração das leis até a sua aplicação nos casos concretos. A proposta, aqui, é utilizar as leis e o direito como mecanismo de tratamento das questões geradoras de conflito, visando à saúde do sistema “doente”, como um todo68.

Desse modo, verifica-se que cada vez mais os ideais trazidos com o Direito Sistêmico e a Constelação Familiar encontram reconhecimento e campo de atuação, inclusive, no ordenamento jurídico brasileiro, como método de solução de conflitos, ao buscar, nas origens do problema a melhor maneira de solucioná-lo, levando-se em consideração questões além da realidade, para uma consecução verdadeira e eficiente da pacificação social.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho buscou, por meio da pesquisa bibliográfica, demonstrar o chamado Direito Sistêmico como a atual ferramenta do ordenamento jurídico brasileiro, como meio alternativo de solução de conflitos, aplicando as suas técnicas dentro do procedimento judicial.

65 MENDES, Ana Tarna dos Santos; LIMA, Gabriela Nascimento. O que vem a ser direito sistêmico? Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/54930/o-que-vem-a-ser-direito-sistemico>. Acesso em: 20 set 2017. 66 “O Projeto de Mediação Familiar, desenvolvido no 3º Centro Judiciário de Soluções de Conflitos e Cidadania da comarca de Goiânia (GO), rendeu ao Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO) o primeiro lugar na categoria Tribu-nal Estadual do V Prêmio Conciliar é Legal, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). A prática consiste no exercício da mediação familiar sob uma perspectiva interdisciplinar e multidirecional e envolve profissionais e acadêmicos do Direito e da Psicologia”. (ARAUJO, Angela. TJGO é premiado por mediação baseada na técnica de constelação familiar. Disponível em: <https://cnj.jusbrasil.com.br/noticias/201158970/tjgo-e-premiado-por-mediacao-baseada-na-tecnica-de--constelacao-familiar>. Acesso em: 22 set 2017).67 ARAUJO, Angela. Op.Cit.68 STORCH, Samir. O que é o direito sistêmico? Disponível em: <https://direitosistemico.wordpress.com/2010/11/29/o-que-e-direito-sistemico/>. Acesso em: 20 set 2017.

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Para tanto, inicialmente buscou as origens do Direito Sistêmico junto ao pensamento complexo e sistêmico, que revolucionou o modo de pensar do homem em relação a si mesmo, e das relações que passou a estabelecer com o próximo com o seu desenvolvimento social, e que ocasionou na Teoria dos Sistemas, sendo ampliada a todas as áreas do conhecimento empírico.

Tal pensamento cedeu contexto para o surgimento da Constelação Sistêmica, como uma importante técnica aplicada, principalmente nas relações familiares, ao buscar entender as origens da problemática, conforme breve histórico apresentado, através de uma análise mais profunda e ampliada, não apenas superficialmente, na busca pelo equilíbrio e pela ordem, levando em consideração questões genéticas e culturais a que as partes envolvidas nos conflitos estiveram sujeitas, de modo a justificar suas atitudes.

E sendo assim, tratado como um instrumento imparcial que retrata a realidade do problema facilita a sua compreensão entre as partes, contribuindo assim, para sua utilização, inclusive, no sistema jurídico brasileiro, e que veio a ser objeto do chamado Direito Sistêmico.

Na busca, portanto, pela paz, equilíbrio e harmonia dos litigantes, o Direito Sistêmico, ao basear-se nos ensinamentos do pensamento sistêmico, se apresenta como importante instrumento alternativo dos operadores do direito, nas mais diversas demandas trazidas ao Judiciário, na intenção de se alcançar a mais efetiva justiça.

Para concluir, sabe-se que a Lei, por si só, não consegue resolver as relações conflituosas entre os envolvidos nos processos judiciais e, assim, se faz necessário um entendimento mais profundo sobre o comportamento humano, a fim de encontrar a raiz do conflito e a solução de cada caso.

Deste modo, diante do conflito das partes envolvidas em um processo judicial nesse novo modelo oferecido pelo CEJUSC através da Constelação sistêmica, terão a oportunidade de buscarem a solução para o problema longe da racionalidade das leis que regem a vida em sociedade, oportunizando-os seguirem suas vidas sem ressentimento.

Assim, O Direito Sistêmico, aplicado nas sessões de mediação, surge como uma proposta inovadora para detectar o verdadeiro conflito entre os envolvidos e construir a verdadeira solução do caso, que a Lei, por si só, não conseguirá atingir com eficácia.

Para entender melhor a importância da Constelação no Direito, basta analisar um caso onde uma pessoa que se sinta prejudicada com o rompimento de um relacionamento mova um processo contra o seu ex parceiro por puro revanchismo. Uma excelente sentença não conseguirá atender o clamor dos envolvidos, mas a Constelação aplicada na Mediação minimizará os seus sofrimentos e levará os envolvidos a buscar o entendimento racionalizado do conflito.

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JUSTIÇA RESTAURATIVA E SEUS DESDOBRAMENTOS NA PACIFICAÇÃO SOCIAL:

UMA QUESTÃO ÉTICA FOMENTADA PELA FAMÍLIA E PELA EDUCAÇÃO DO SER HUMANO

ANA KATMA CREMONESI1

CAROLINE CHRISTINE MESQUITA2

INTRODUÇÃO

Na entrada do Templo de Apolo no Santuário de Delfos na Grécia Antiga, tem-se inscrita a emblemática frase: ‘’conhece-te a ti mesmo e conhecerás o universo e os deuses’’, propagada pelo filósofo Sócrates e até hoje lembrada, principalmente pelo povo do Ocidente. Ele dizia que o verdadeiro conhecimento vem de dentro.

Tais pensamentos possuem verdadeiro sentido vez que o humano possui plena capacidade e condições de visitar o templo de sua alma, expandindo sua consciência pelo autoconhecimento e, consequentemente, tendo mais controle em relação a si mesmo por meio da compreensão consigo e com os outros.

Esta capacidade sempre lhe foi inerente, contudo, com o passar dos tempos o humano foi distanciando de seus códigos originários devido aos inúmeros eventos ocorridos de geração para geração, conforme interpretações e julgamentos traçados de acordo com as crenças obtidas ao

1 Servidora do Tribunal de Justiça do Paraná.2 Mestre em Direito pela Unicesumar. Especialista pelo Instituto de Direito Constitucional e Cidadania, bem como pela Escola da Magistratura do Paraná, núcleo de Maringá. Advogada.

longo de tais descendências, perpetuando-se nas memórias celulares.

Portanto, o aforismo grego “Conhece-te a ti mesmo” é um pressuposto necessário à convivência primária consigo mesmo e, por consequência, com os demais. A Sagrada Escritura também preceitua em Mateus: “Amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a ti mesmo” (22, 34:40), ou seja, só teremos condições de amar ao outro, quando realmente amarmos a nós mesmos, e para tal, devemos saber quem somos, o que nos constitui.

Atualmente tem-se falado no meio judiciário, acerca da utilização de processos de humanização nas conciliações judiciárias, tais processos designam-se como “Técnicas Restaurativas”, a exemplo de algumas, tem-se a da Constelação Sistêmica e a de Círculos de Justiça Restaurativa.

Estas técnicas vêm justamente propor o resgate do autoconhecimento e o conhecimento em relação ao outro, propiciando o reestabelecimento de uma comunicação não violenta entre as partes. Propiciando as partes um novo olhar, o qual reconhece o sofrimento da vítima e a culpa/arrependimento e responsabilização do ofensor,

CAPÍTULO 4

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ajudando-os na resolução dos próprios conflitos. Uma vez que, busca pacificar o conflito de forma a evitar que este volte a interferir na vida das pessoas, oportunizando desta forma, a educação e a transformação do indivíduo e da sociedade.

A FAMÍLIA E SUA CONTRIBUIÇÃO PARA A FORMAÇÃO DOS VALORES HUMANOS

A entidade familiar possui elementos fundantes que crescem de acordo com os valores e ideias predominantes em cada momento histórico. Está é a beleza maior da família, sua complexidade em absorver e retratar todas as mudanças sociais e culturais da humanidade. Nesse sentido,Cristina de Oliveira Zamberlam enxerga a família como uma espiral de teses e antíteses:

A família, em sua espiral evolutiva, entre teses e antíteses, andando de um pólo a outro, até chegar a algum ponto de equilíbrio, quebram-se pontes e aguçam-se contradições, visto que a relação dos indivíduos com um grupo modifica-se ao longo dos ciclos de vida, dos conflitos interpessoais, das mudanças que se realizam, das atividades a que se dedica e das crenças, mas sempre acaba por abrir caminhos e integrações3.

É certo que há uma herança simbólica transmitida entre as gerações, todavia o que ocorre é que modelo tradicional opera, enquanto as novas maneiras de ser família revela novos conceitos aos preestabelecidos, ocasionando certas contradições no próprio contexto familiar, balanceando o que há de prós de contra. A seu turno José Sebastião de Oliveira é preciso ao expressar que a família contemporânea é alicerçada sob as fortes bases do diálogo convergido na mútua compreensão ante o laço de afetividade dos seres4. São João Paulo II adverte, pois, que:

Aquele amor, ao qual o apóstolo Paulo dedicou um hino na Primeira Carta aos Coríntios — aquele amor que é «paciente», é «benigno», e «tudo suporta» (1 Cor 13, 4.7) — é, sem dúvida, um amor exigente. Mas nisto mesmo está a sua beleza: no facto de ser exigente, porque deste modo constrói o verdadeiro bem do homem e irradia-o também sobre os outros. Na verdade, o bem, diz S. Tomás, é por sua natureza «difusivo» (36). O amor é verdadeiro, quando cria o bem das pessoas e das comunidades, cria e dá-lo aos outros. Somente quem, em nome do amor, sabe ser exigente consigo próprio, pode também exigir o amor dos outros. Porque o amor é exigente. É-o em todas as situações humanas; ainda mais o é para quem se abre ao Evangelho. Não é isso que Cristo proclama no «seu» mandamento? É preciso que os homens de hoje descubram este amor exigente, porque nele está o alicerce verdadeiramente firme da família, um alicerce que é capaz de «tudo suportar»5.

Por tal panorama, Pietro Perlingieri aduz que a família “[...] é formação social, lugar-comunidade tendente à formação e ao desenvolvimento da personalidade de seus participantes; de maneira que exprime uma função instrumental para a melhor realização de interesses afetivos”6.

A realização pessoal da afetividade e da dignidade da pessoa humana, no ambiente de

3 ZAMBERLAM, Cristina de Oliveira. Os novos paradigmas da família contemporânea: uma perspectiva inter-disciplinar. Rio de Janeiro: Renovar, 2001. p. 41.4 OLIVEIRA, José Sebastião de. Fundamentos constitucionais do direito de família. São Paulo: Revista dos Tri-bunais, 2002. p. 269.5 PAULO II, São João. Carta do Papa João Paulo II às famílias: Gratissimam Sane 1994. Disponível em: < https://w2.vatican.va/content/john-paul-ii/pt/letters/1994/documents/hf_jp-ii_let_02021994_families.html >. Acesso em: 12 ago. 2017.6 PERLINGIERI, Pietro. Perfis do Direito Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p. 178.

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convivência e solidariedade, é a função da família de nossa época. Suas antigas funções econômica, política, religiosa e procracional feneceram, desapareceram, ou desempenham papel secundário. Até mesmo a função procracional, com a secularização crescente do direito de família e a primazia atribuída ao afeto, deixou de ser sua finalidade precípua7.

A partir dessa compreensão de que a comunidade familiar é o núcleo estruturante do sujeito observou-se que a família tem forte relação com a regulação do processo humano de dignificação. As escolhas sobre o desenho dos meios e fins para a felicidade e os papéis assumidos pelos atores envolvidos são questões que repercutem na percepção da comunidade familiar, vez que o processo, sempre inacabado, de construção da família, assume o papel de protagonista no apoio ao princípio da dignidade humana como medida de crescimento e fortificação da fraternidade humana.

O humanismo tende essencialmente a tornar o homem mais verdadeiramente humano, e a manifestar sua grandeza original, fazendo-o participar de tudo o que, na natureza e na história […] o possa enriquecer; suas exigências são exaustivas, levando o homem a desenvolver suas virtualidades intrínsecas, suas forças criativas e a vida da razão, se esforçando também a transformar as forças do mundo físico em instrumentos de sua liberdade8.

Nesse contexto que o Direito de Família está se reescrevendo, eliminando o positivismo jurídico alienante do indivíduo. Dessa maneira tem-se claro que o processo de reforma é constante e gradativo, guiado por um emaranhado de princípios que formam como no tear uma rede axiológica de sustentação sistêmica que lhe da vida.

Assim, não se pode exigir do Direito aquilo que ele não pretende se prestar, produzir conhecimento sobre a natureza das coisas enquanto coisas, mas apenas àquilo a que elas podem vir a ser instrumentalmente úteis em dado contexto que precise ser “julgado”. O texto normativo não pode perder de vista a importância das virtudes morais para conferir uma qualidade cada vez mais justa às normas jurídicas, as quais, por sua vez, supõe-se serem fundamentais para o aperfeiçoamento da sociedade, provendo a esta e aos indivíduos nesta associados, a felicidade que condiz com a dignidade da pessoa humana.

Nessa esteira Marco Zingano enfatiza que a ideia é que uma característica, assim, “[...] pode ter um valor moral em um caso, e um bem diferente em outro; em um primeiro caso, por exemplo, torna a ação muito melhor, mas, em um segundo caso, muito pior; e pode ainda não fazer diferença alguma em um terceiro caso”9.

Nessa esteira Dworkin pormenoriza:

Uma pessoa vive bem quando pressente e procura uma boa vida para si e o faz com dignidade: com respeito pela importância da vida das outras pessoas e pela responsabilidade ética não só destas, mas também dela própria. Os dois ideais éticos - viver bem e ter uma vida boa - são diferentes. Podemos viver bem sem ter uma boa vida: podemos ser afligidos pelo azar, pela

7 NETTO LÔBO, Paulo Luiz. A Repersonalização das Famílias. Revista Brasileira de Direito de Família. Porto Alegre: Síntese, v. 6, n. 24, jun/jul 2004, p.155.8 MARITAIN, Jacques. Humanismo Integral. São Paulo: Editora Nacional, 1945. p. 298.9 ZINGANO, Marco. O particularismo moral e a ética aristotélica. Disponível em: <https://periodicos.ufpel.edu.br/ojs2/index.php/dissertatio/article/viewFile/8666/5714>. Acesso em: 18 ago. 2017.

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miséria, por graves injustiças, por doença terrível ou pela morte prematura. O valor do nosso esforço é adverbial; não reside na bondade ou no impacto da vida realizada. [...] o viver não deve ser somente o ato de se deixar conduzir por hábitos irrefletidos ao longo dos caminhos batidos das expectativas e recompensas. Como nos alertaram os antigos filósofos, a vida não examinada também é má. Alguma convicção ética efetiva, posta em prática pelo menos de tempos em tempos, é essencial para a responsabilidade no viver10.

Enfim, organizar juridicamente as intrincadas e complexas relações familiares nesses novos tempos, de avanço da ciência e da história, requer dos operadores do Direito a ampliação da compreensão de que as relações jurídicas de família.

O REFORÇO DO DIREITO NA ESTRUTURAÇÃO DA ÉTICA SOCIAL

A produção do direito e sua aplicabilidade deve ser focada para uma pedagogia da conduta humana, visto que este permeia todas as manifestações sociais, regulando condutas, pacificando conflitos, resolvendo cizânias, enfim, condicionando os atos e fatos da vida humana. Nesse sentido todo processo educacional de uma sociedade se desenvolve segundo princípios jurídicos que o amoldam.

Posto que, o direito é fator de estabelecimento e conservação da ordem, servindo, ainda, como continuidade e transformação desta mesma ordem, eis que torna-se, também, fator de educação social. Pois, as normas jurídicas possuem função transformadora do meio social, quando editadas, alterando o sistema de controle social, influenciando os elementos condicionantes da relação da vida grupal. Logo, contribui direta e indiretamente para a formação ética da sociedade11.

[...] Ética definida aí como o conjunto das condições de possibilidades históricas de uma virtude individual e coletiva, voltada para a livre expressão. Era, portanto, como sempre fora, em última análise, como a possibilidade de aduzir mais valor humano à realidade socius organizado, pela formação do sentido de medida para as ações dos homens e pela atribuição de limites ao desejo de poder ilimitado dos governantes e das instituições12.

Assim, vislumbra-se que o direito não funciona sozinho, sendo preciso que o homem o movimente, pois é o homem que produz e aplica o direito. Dessa forma, se o homem não possuir uma formação ética, prescindir-se-á uma realização justa do direito. Contudo,

[...] não há receita infalível, nem remédios miraculosos. Se alguém descobrisse uma vacina para imunizar a conduta de qualquer falha ética, teria aberto uma senda para a transformação da humanidade. Humanidade que atingiu tanto progresso, mas que ainda padece de enfermidades notórias no seu processo civilizatório. Pois progresso não se confunde com civilização. [...] Cada qual pode adotar a sua própria vereda. O essencial é que todo ser humano tenha a sua diretriz ética de perfectibilidade. Ninguém nega, em sã consciência, a

10 DWORKIN, Ronald. A raposa e o porco-espinho: justiça e valor. Tradução de Marcelo Brandão Cipolla. São Paulo: Martins Fontes, 2014. p. 641-642.11 BEZERRA, Paulo Cesar Santos. Acesso à justiça: um problema ético-social no plano da realização do direito. 2. ed. rev. Rio de Janeiro: Renovar, 2008. p. 52-53.12 SODRÉ, Muniz. Existe consciência ética na imprensa? In: PAIVA, Raquel (Org.). Ética, cidadania e imprensa. Rio de Janeiro: Mauad, 2002. p. 194-195.

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vontade de viver eticamente. [...] É necessário perquirir a esse juiz interior se, em cada ato da existência, não se feriu eticamente o semelhante13.

Por conseguinte, há necessidade de se voltar os olhos para um ensino ético dos atores sociais, aplicadores e operadores do direito. Tendo em apreço que a ética depara com uma experiência histórico-social, com uma série de práticas morais já em vigor e, partindo delas, procura determinar a essência desta. Apontando sua origem, as condições objetivas e subjetivas de seu ato, suas fontes avaliadoras, sua natureza e a função de seus juízos, com base em critérios de justificação destes juízos e dos princípio que rege a mudança e a sucessão de diferentes sistemas morais14.

O dever moral está dentro de cada pessoa e se exterioriza com maior ou menor intensidade de acordo com a educação filosófica15 de cada um. Todos devem fazer o bem e evitar o mal, eis que esse dever é oriundo da lei natural. A tendência da pessoa humana é para o bem e a exceção para o mal, devendo ser levado em conta o ambiente em que vive, a educação e as necessidades16.

Na mesma linha Miguel Reale assevera que, uma característica marcante da cultura humana é a transmissibilidade de seus valores, o que demonstra a ligação fundamental que existe entre cultura e pedagogia, cultura e educação. Dado que, somente, o homem educa, porque só o homem se conduz, assim, educar liga-se ao problema da autodeterminação. Entretanto, se o homem fosse meramente conduzido, sem consciência dos motivos determinantes de seu agir, não teria título para transferir ou transmitir valores a outrem17. A vista disso, Anísio Spínola Teixeira dispara que,

[...] a educação já não é um processo de especialização de alguns para certas funções na sociedade, mas a formação de cada um e de todos para a contribuição à sociedade integrada e nacional, que está constituindo com a sua modificação do tipo de trabalho e do tipo de relações humanas18.

A seu turno Jürgen Haberma sublinha que,

[...] quando se tem presente a função coordenadora das ações que as pretensões de validez normativas desempenham na prática comunicativa quotidiana, percebe-se por que os problemas que devem ser resolvidos em argumentações morais não podem ser superados monologicamente, mas exige esforço de cooperação. Ao entrarem numa argumentação moral, os participantes prosseguem seu agir comunicativo numa atitude reflexiva com o objetivo de restaurar um consenso perturbado. As argumentações morais servem, pois para restaurar um consenso perturbado19.

13 NALINI, José Renato. Ética geral e profissional. 3. ed. rev. ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001. p. 338.14 VAZQUEZ, Adolfo Sánchez. Ética. In: DELL’ANNA, João (Trad.). 33. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasile-ira, 2012. p. 22.15 Alcantara Nogueira, neste sentido apresenta que “[...] devemos ensinar a filosofia jurídica, somente depois de termos iniciado o espírito do estudante nas complicadas minudências de todos os ramos do direito, porque, a ordem dog-mática pode, com vantagem, inverter a ordem genética e partir dedutivamente do geral para o particular, poupando aos neófitos custosas meditações e lentas peregrinações através da sucessão dos fatos”. (NOGUEIRA, Alcantara. O pensa-mento filosófico de Clóvis Bevilaqua. Rio de Janeiro: D. A. S. P. Serviço de documentação, 1959. p. 71).16 BIZATTO, José Ildefonso. Deontologia jurídica e ética profissional. 2. ed. rev. aum. atual. Leme, São Paulo: Editora de Direito, 2000. p. 28.17 REALE, Miguel. Filosofia do direito. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 378.18 TEIXEIRA, Anísio Spínola. Educação é um direito. São Paulo: Editora Nacional, 1967. p. 48.19 HABERMAS, Jürgen. Consciência moral e agir comunicativo. ALMEIDA, Guido de. (Trad.). Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1989. p. 87.

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As normas morais são, consequentemente, fontes reguladoras da conduta humana, já que auxiliam na construção e formação do organismo social. Logo, a “[...] verdadeira certeza moral é a disposição de quer aquilo que é bom em si para si. Tem ela, portanto, princípios firmes e para ela são as determinações objetivas para si e os deveres”20. Por conseguinte,

[...] A justiça é a finalidade do direito, mas essa finalidade morre tão logo tenha dado vida ao direito, e o direito continua a viver, por mais diferente que seja de seu criador. A finalidade é causa de tornar-se, mas não causa da existência do direito; como o homúnculo de Wagner, este é imediatamente emancipado com o seu nascimento, trilha seus próprios caminhos e torna-se ele próprio finalidade, fim em si mesmo21.

Chega-se, a tal conclusão tendo em consideração que a ética jurídica não é dogmática, isto é, circunscrita ao direito positivado, muito embora este seja o seu universo. “A ideia do direito é filha da ideia de justiça, mas a partir de agora ocupará um aposento próprio”22, tendo em perspectiva que ela é dikelógica, comprometida com a busca, incessante, pelo ideal de justiça. Consequentemente, uma lei injusta23 é jurídica, mas não é ética, tendo como premissa que “[…] a justiça é a virtude completa no mais próprio e pleno sentido do termo. […] Ela é completa porque a pessoa que a possui pode exercer sua virtude não só em relação a si mesmo, como também em relação ao próximo”24. A seu turno a conduta criminosa, embora tenha escapado à punição, é sempre antiética.

[...] Mas, quando criticamos o direito como injusto, suscitamos a questão de uma alternativa “melhor”. Este questionar as regulações existentes faz parte da “situação normal” da jurisprudência. Manifesta-se o direito irrenunciável de pôr sempre o novo à discussão as soluções jurídicas em nome da justiça: o direito particular nos problemas de legitimação que se põem em geral para a escolha da actuação humana25.

O sentido de que é necessário o indivíduo, a partir de seu próprio entendimento e razão, agir peremptoriamente nos rumos que definem a justiça, deve-se tomar as rédeas de como se organiza a sociedade e de como se relacionam os homens. Apesar de renegados, os filósofos do período helenista, os quais viveram a crise das cidades-estado, contribuíram imensamente para com a descoberta do indivíduo em si mesmo, desentrelaçado da pólis, do Estado, possibilitando, assim, a reflexão ética para si, válida com um sentido universalizante, deixando de ser uma mera peça de um sistema social. É na crise, a duras penas, que os indivíduos conseguiram transformar o modo como interagiam diante do coletivo.

20 HEGEL, Georg Wilhelm Friedrich. Princípios da filosofia do direito. In: VITORINO, Orlando (Trad.). São Paulo: Martins Fontes, 1997. p. 121.21 RADBRUCH, Gustav. Introdução à ciência do direito. In: MENDONÇA, Jacy de Souza (Trad.). Introdução à ciência do direito São Paulo: Martins fontes, 1999. p. 227.22 VILLEY, Michel. Filosofia do direito: definições e fins do direito: os meios do direito.AGUIAR, Márcia Valéria Martinez (Trad.). São Paulo: Martins Fontes, 2003. p. 73.23 Chaim Perelman assevera que: “Uma regra é injusta quando é arbitrária, quando constitui um desvio injustifi-cado em relação aos costumes e aos precedentes, quando introduz distinções arbitrárias. (PERELMAN, Chaim. Ética e direito. In: GALVÃO, Maria Ermantina de Almeida Prado (Trad.). São Paulo: Martins Fontes, 2005. p. 205).24 ARISTOTÉLES. Ética a Nicômaco. 5. ed. São Paulo: Martin Claret, 2011. p. 100-101.

25 ZIPPELIUS, Reinhold. Filosofia do direito.São Paulo: Saraiva, 2012. p. 122.

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A ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO PARA O ALCANCE DA JUSTIÇA RESTAURATIVA

A expansão que o Poder Judiciário vem experimentando em razão do fenômeno da judicialização da Justiça está causando uma mudança nas interpretações de regras, valorando-se mais os princípios26 e seu núcleo intangível, a dignidade da pessoa humana. Esta é fundamento do Estado Democrático de Direito, e projeta-se em todas as esferas da vida, sendo um valor fundamental que alicerça a ordem jurídica.

Desde a promulgação da Constituição República Federativa do Brasil de 198827 convola-se o exercício e aplicabilidade da Justiça e da pacificação social. Contudo, ante o descompasso entre a estrutura da burocracia pública e a crescente demanda gerada pela constitucionalização de direitos, houve a necessidade de encontrar caminhos que garantissem o Acesso à Justiça28. Neste debate, a Justiça conciliativa vem ganhando espaço e apreço, como ferramenta que garante e facilita o alcance da tão almejada Justiça.

A justiça conciliativa não atende apenas a reclames de funcionalidade e eficiência do aparelho jurisdicional. Visto que a jurisdição não tem apenas escopo jurídico (o de atuação do direito objetivo), mas também social (como a pacificação) e político (como a participação), assim também outros fundamentos podem ser vistos na adoção das vias conciliativas, alternativas ao processo. Releva, assim, o fundamento social das vias conciliativas, consistente na sua função de pacificação social. Esta, via de regra, não é alcançada pela sentença, que se limita a ditar autoritariamente a regra para o caso concreto, e que, na grande maioria dos casos, não é aceita de bom grado pelo vencido, o qual contra ela costuma insurgir-se com todos os meios na execução. Denota-se, pois, que a sentença judicial se limita a solucionar, apenas, a parcela de lide levada a juízo, sem possibilidade de pacificar a lide sociológica, em geral mais ampla, da qual aquela emergiu, como simples ponta do iceberg. Por isso mesmo, salienta-se que a justiça tradicional se volta para o passado, enquanto a justiça informal se dirige ao futuro. A primeira julga e sentencia; a segunda compõe, concilia, previne situações de tensões e rupturas, exatamente onde a coexistência é um relevante elemento valorativo, e ético.

Como o advento da Lei federal n. 13.105, de 16 de março de 2015, ocorreu um novo estímulo e fortificação aos meios alternativos de solução de conflito de interesses, como se observa da redação do art. 3o, do referido diploma legal citado supra:

26 Princípios, [...], expressam valores a serem preservados ou fins públicos a serem realizados. Designam, portanto, “estados ideais”, sem especificar a conduta a ser seguida. (BARROSO, Luís Roberto. Temas de direito constitucional: tomo III. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 83).27 PREÂMBULO: Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segu-rança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, plura-lista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDE-RATIVA DO BRASIL. (BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 8 ago. 2017).28 O Acesso à Justiça se torna a garantia do acesso do homem a sua condição digna de vida. A efetivação desse direito fundamental é a efetivação de todos os direitos fundamentais do homem, a todos os seres humanos. Não basta que existam os direitos expressos em textos constitucionais, ou que sejam efetivados para uma parcela da população. Por fim chega-se ao entendimento que enquanto existir uma só pessoa privada de sua condição humana digna, deverá haver discussões e reflexões sobre o Acesso aos Direitos e à Justiça. (ZENNI, Alessandro Severino Vallér; MESQUITA, Caro-line Christine. Crítica à justiça da atualidade: por um resgate histórico da filosofia do direito. In: Quaestio Iuris. Rio de Janeiro: UERJ, v. 7, n. 1, 2014. p. 73).

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Art. 3°. Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito.§ 1°. É permitida a arbitragem, na forma da lei.§ 2°. O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos29.

Por sua vez, cabe, por ora, ao Judiciário a responsabilidade em apoiar a solução consensual dos conflitos, que pode ser realizada nos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania, tal como definido pela Resolução nº. 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça. Para tanto, é preciso superar o debate abstrato sobre Acesso à Justiça e pensar em formas de despertar o ser humano para o universo das práticas restaurativas. Posto que, é na solução dos conflitos de interesses que reside a função primordial do Judiciário, e para desempenhá-la cabe-lhe organizar não apenas os serviços processuais como também, e com grande ênfase, os serviços de solução dos conflitos pelos mecanismos alternativos.

Denota-se, portanto, que a Justiça, como valor e conduta, se traduz como grande anseio da pessoa. Logo, um conceito de justo só pode ser submetido a uma base de formação filosófica, tendo por análise dialética o percurso da caminhada humana no fluxo histórico, uma vez que o saber filosófico, comprometido com a verdade, consubstancia em formação o próprio agente do conhecimento, por não buscar dar respostas invariáveis e determinadas, mas apenas aspira pela verdade. Nesse sentido, mais que fixar o objeto, a inquietação do verdadeiro passa a ser o interesse do sujeito e lhe transforma interiormente, para além de conhecer o objeto, a finalidade vislumbra-se em transformar o sujeito conhecedor, que, ao conhecer, constrói-se a si mesmo.

Espera-se, portanto, desenvolver com este artigo uma maior conscientização das alternativas que o cidadão brasileiro possui para resolver seus conflitos de interesses, possibilitando, desta forma, uma prática do justo mais efetiva e humana, construída a partir da união das instituições políticas, jurídicas, sócio-culturais e educacionais, um desvendar conciliativo e participativo que desponta para a Justiça. Possibilita-se, assim, ao ser, um real posicionamento no organismo social, contribuindo assim, no processo histórico da sociedade e de toda pessoa humana que a constitui, elevando-se, assim, ao caminhar na trilha do sumo bem.

29 BRASIL. Lei 13.105, de 16 de março de 2015. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em: 8 ago. 2017.

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CONCLUSÃO

O escopo foi o de apresentar à importância perene da filosofia no exercício pulsante da Justiça, consequentemente, a valoração da família na caminhada pela educação ética do ser humano. Buscando-se como isso denotar que chave de ativação para o acesso à Justiça se encontra na prática diária fundada na responsabilidade comprometida, crítica e dialética de cada ser humano que se abre como filamento vital do organismo social, o qual o homem se insere e completa.

A Justiça é trajada segundo pressupostos, pois ela decorre do emprego da razão e, leva, por conseguinte, o homem a ganhar autonomia, solicitando ao ser a tomada responsável e crítica de suas próprias decisões. Contudo, esta deve se realizar como uma busca constante e perpetua que se reforça com o diálogo com o outro, pois que, estimulará a explicitação da dignidade e iluminará o caminho da Justiça. A um impacto, portanto, da ideia da dignidade da pessoa humana como um fator nuclear de fundamentação e legitimação da Justiça.

A conscientização das alternativas que o cidadão brasileiro possui para resolver seus conflitos, em especial o uso das técnicas restaurativas, possibilitam desta forma uma prática de cidadania mais efetiva, construída a partir da união das instituições familiares, políticas, jurídicas, sócio-culturais e educacionais. Logo, possibilitar ao cidadão seu real posicionamento no organismo social, contribuindo assim, no processo histórico da nação e de sua própria identidade. A justiça restaurativa pode fortalecer os laços comunitários e o sentimento de coexistência pacífica ao estimular o diálogo e a alteridade, o difícil exercício de enxergar a posição do outro, reconhecendo que ele também tem uma história de vida, sentimentos, e uma visão particular do conflito.

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O PODER JUDICIÁRIO E O ADVOGADO FRENTE À MEDIAÇÃO DE CONFLITOS SOCIAIS

CLAUDIA APARECIDA COSTA LOPES1

SARAH TAVARES LOPES2

INTRODUÇÃO

O objetivo deste trabalho é analisar as recentes alterações legislativas que implantaram de maneira definitiva em nosso ordenamento jurídico a utilização de meios alternativos de solução de conflitos, para além do costumeiro auxílio judicial.

Centra-se, nesta pesquisa, na análise dos principais textos legais que impulsionam a criação de uma cultura menos conflitiva e mais voltada para delegação da responsabilidade pela resolução dos conflitos sociais aos próprios protagonistas dele: as partes.

Enfatiza-se como se deu a evolução legislativa, bem como as razões que levaram

1 Doutoranda da instituição de ensino Unicesumar. Mestre em Ciências Jurídicas pela pós-graduação stricto sen-su da instituição de ensino Unicesumar: Centro Universitário de Maringá (2016). Especialista em Direito Civil e Traba-lhista pelo Centro Universitário de Maringá (2015). Graduada em Direito pela Faculdade Unifoz: Faculdades Unificadas de Foz do Iguaçu (2003). Advogada (OAB/PR 50.886). Mediadora Judicial. Docente do curso de Direito na instituição de ensino Faculdade Maringá. Docente do curso de Direito na instituição de ensino Faculdade Santa Maria da Glória (SMG). 2 Mestre em Ciências Jurídicas pela pós-graduação stricto sensu da instituição de ensino Unicesumar: Centro Universitário de Maringá (2016). Especialista em Direito Civil Aplicado pela Escola da Magistratura do Paraná: Núcleo de Maringá (2013). Graduada em Direito pela instituição de ensino Faculdade Maringá (2012). Advogada (OAB/PR 65.429), sendo sócia proprietária da Advocacia Lopes & Tavares Advogados Associados, com escritório situado na cidade de Maringá, Estado do Paraná. Docente do curso de Direito na instituição de ensino Faculdade Maringá. Docente do curso de Direito na instituição de ensino Faculdade Santa Maria da Glória (SMG). Membra da Comissão de Direito de Famí-lia - OAB Maringá/PR; Membra: Comissão OAB nas Escolas - OAB Maringá/PR; Membra da Comissão de Mediação, Conciliação e Arbitragem da OAB Maringá-PR.

o poder judiciário a iniciar um movimento de conscientização e alteração da forma de entender e prestar o serviço jurisdicional.

A mediação, a conciliação entre outras formas de resolução de conflitos são abordadas levando em conta o estágio inicial de aplicabilidade de tais técnicas no cenário jurídico nacional, que, por certo, ainda terá seus contornos melhor definidos com o passar do tempo e com o amadurecimento da sociedade no tocante a aceitação de tais métodos.

Levanta-se, ainda, neste trabalho comentários sobre a postura dos advogados diante de tantas alterações que impactam de maneira tão contundente na forma de gerir controvérsias.

Espera-se que a leitura contribua com as reflexões necessárias para a evolução da aplicação de todas as formas consensuais de resolução de questões conflitivas, a fim de se aperfeiçoar e desenvolver uma cultura de paz social.

CAPÍTULO 5

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DO MÉTODO DE RESOLUÇÃO DE CONFLITOS NO CENÁRIO ATUAL

DA SOBRECARGA DE DEMANDAS NO PODER JUDICIÁRIO

Inicialmente, tem-se que o Poder Público encontra-se subdividido em três poderes: Poder Executivo, Poder Legislativo, e Poder Judiciário. Este último tem a competência para julgar por meio do “Estado–Juiz” as demandas que são levadas ao seu conhecimento, concedendo uma solução. Esta forma de resolução de conflitos é denominada de heterocomposição, vez que a solução do caso não advém do consenso entre as partes no processo, mas, sim, de uma imposição do magistrado.

Em tal modelo, observa-se uma sobrecarga do Poder Judiciário que não consegue solucionar as questões na mesma velocidade em que são impetradas novas ações, cotidianamente.

No ano de 2017, o Conselho Nacional de Justiça realizou o levantamento do número de processos que se encontravam em trâmite na seara judicial. Observou-se que a espera pela decisão de um processo aumentou em 3,6% com relação ao ano de 2016; bem como no ano de 2017, até o mês de setembro, havia 79,7 milhões de processos aguardando solução, sendo que neste período o Poder Judiciário custou aos cofres públicos 75,9 bilhões de reais.3

Embora no texto da Constituição Federal de 1988 conste, no art. 5º, inc. LIV que “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo”4; e no inc. XXXV, que: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”5, observa-se, pelos dados do CNJ entre o período de 2016 a 2017, que há um grande aumento no número de demandas judiciais ano a ano.

Por conta disso, se faz necessária adoção de sistemas ou métodos alternativos de solução de conflitos no intuito de reduzir a crescente demanda. O método utilizado, para tanto, pode ser heterecompositivo, como a arbitragem, ou autocompositivo como a mediação e a conciliação.

Por conta disso, tanto o Código de Processo Civil como a Lei de Mediação, a Lei de Arbitragem e outros instrumentos legais, incentivam uma abertura para o Sistema Multiportas de resolução de conflitos no intuito de garantir a celeridade; sigilo e eficiência das demandas judiciais e extrajudiciais.

DO DIRETO AO ACESSO À JUSTIÇA E DO SISTEMA MULTIPORTAS

A Constituição Federal de 1988, por meio do princípio previsto no art. 5º, inc. XXXV, garante o acesso à justiça a todos os brasileiros. Nesse sentido, ensina o autor José Roberto dos Santos Bedaque:

3 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Disponível em: http://dc.clicrbs.com.br/sc/noticia/2017/09/justica--tem-79-milhoes-de-processos-sem-decisao-revela-balanco-do-cnj-9888623.html. Acesso em: 13 de nov. 2017. 4 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm. Acesso em: 13 de nov. 2017. 5 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm. Acesso em: 13 de nov. 2017.

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Acesso à justiça, ou mais propriamente, acesso à ordem jurídica justa, significa proporcionar a todos, sem qualquer restrição, o direito de pleitear a tutela jurisdicional do Estado e de ter à disposição o meio constitucionalmente previsto para alcançar esse resultado. Ninguém pode ser privado do devido processo legal, ou, melhor, do devido processo constitucional. É o processo modelado em conformidade com garantias fundamentais, suficientes para torná-lo équo, correto, justo.6

No mais, dispõe Mauro Cappelletti e Bryant Garth:

A expressão “acesso à justiça” é reconhecidamente de difícil definição, mas serve para determinar duas finalidades básicas do sistema jurídico – o sistema pelo qual as pessoas podem reivindicar seus direitos e/ou resolver seus litígios sob os auspícios do Estado que, primeiro deve ser realmente acessível a todos; segundo, ele deve produzir resultados que seja individual e socialmente justos.7

O acesso à justiça deve ser garantido a todos, sendo proibido ao Estado eximir-se de tal função. Desta forma, devido a grande demanda de processos que se encontram no Poder Judiciário aguardando análise, evidencia-se a necessidade de criação de outros métodos, ou seja, outras portas, para por fim aos conflitos.

No que tange aos métodos alternativos de solução de conflitos, inovou o Novo Código de Processo Civil (Lei n. 13.105/2015) ao apresentar o modelo “multiportas” de resolução de conflitos.

Com a atualização do diploma legal no ano de 2015, passou-se a dar maior ênfase a razoável duração do processo, bem como a solução consensual de conflitos, o qual deve ser estimulado por todos os envolvidos no processo judicial (partes, advogados, juiz, promotor etc.). Veja-se o art. 1º, §3º do CPC:

Art. 1o O processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código.[...]§ 3o A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.8

Com a busca pela composição amigável entre as partes do processo, o sistema multiportas busca a pacificação dos conflitos por meio da utilização de métodos de composição, tais como a conciliação e a mediação judicial ou extrajudicial. Neste sentido, o Novo Código de Processo Civil também permite a criação de pessoas jurídicas de direito privado que tenham como intuito a resolução pacífica de conflitos antes mesmo da judicialização do caso.

Defere-se do art. 167 do CPC esta possibilidade de criação de câmaras privadas de mediação.

“Art. 167. Os conciliadores, os mediadores e as câmaras privadas de conciliação e mediação

6 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de urgência. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 71. 7 CAPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris, 1988. p. 03. 8 BRASIL. Novo Código de Processo Civil. LEI Nº 13.105, DE 16 DE MARÇO DE 2015. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm. Acesso em: 13 de nov. 2017.

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serão inscritos em cadastro nacional e em cadastro de tribunal de justiça ou de tribunal regional federal, que manterá registro de profissionais habilitados, com indicação de sua área profissional.”9

Assim, com a criação de câmaras de mediação privadas, é possível realizar a resolução de conflitos extrajudiciais em duas vertentes: primeiro, antes do início do processo judicial, quando far-se-á a mediação a fim de evitar a instauração de novos processos; segundo, em processos já em andamento, posto ser possível solicitar a suspensão da demanda judicial para que se tente a composição amigável, valendo-se de uma câmara de mediação.

Pelo exposto, tem-se que o sistema multiportas tende a ser um alívio ao sistema judiciário brasileiro, vez que este tem a capacidade para atender as demandas que a ele são levadas.

DA MEDIAÇÃO COMO MÉTODO ALTERNATIVO DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS

A mediação é um método de solução de conflitos regulado pela Lei n. 13.140, de 26 de Junho de 2015, bem como pelo no Código de Processo Civil e pela Resolução n. 125 de 2010 do Conselho Nacional de Justiça.

Como observado, a ampliação do acesso à justiça como direito fundamental do cidadão acabou por sobrecarregar o Poder Judiciário com uma vasta gama de processos sem fundamento ou amparo legal.

Para que a justiça seja aplicada, deve-se sempre analisar o binômio possibilidade/viabilidade, objetivando-se garantir igualdade de direitos entre as partes, bem como tutelar o direito verdadeiramente ameaçado e conferindo uma decisão que seja mais justa às partes.

Com este intuito a mediação de conflitos se mostra uma importante ferramenta. Neste sentido, Frederico Oliveira Freitas e Débora Bastos Sérgio lembram que:

A mediação já é utilizada há certo tempo em diversos países. No Brasil os meios consensuais são relativamente novos. Com o advento da resolução nº 125 do Conselho Nacional de Justiça foi criada a política judiciária nacional de tratamento de conflitos e, por conseguinte muitos incentivos e investimentos foram efetuados na área. Com a normatização da Lei sobre mediação, Lei 13.140/2015, regulamentou-se o procedimento da mediação e com isso a instituição da mediação como novo paradigma de justiça. Em consonância com a nova ordem jurídica, o novo Código de Processo Civil, Lei 13.105/15, reafirma essa nova ordem, a mediação como importante meio consensual de resolução de conflitos para a redução da litigiosidade desnecessária.10

Posto isso, nítido que a mediação, enquanto um dos diversos métodos autocompositivos de solução de conflitos, faz-se necessária para o processamento e finalização de demandas, judiciais ou extrajudiciais, no intuito de facilitar o diálogo entre as partes e reconstruir as relações abaladas. Como

9 BRASIL. Novo Código de Processo Civil. LEI Nº 13.105, DE 16 DE MARÇO DE 2015. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm. Acesso em: 13 de nov. 2017. 10 FREITAS, Frederico Oliveira; SÉRGIO, Débora Bastos. A aplicação da mediação no novo Código de Proces-so Civil e seus mecanismos em busca da pacificação social. Disponível em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=17824&revista_caderno=21. Acesso em: 13 de nov. 2017.

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consequência, ter-se-á a redução de processos judiciais, que são impetrados para que, apenas, o Juiz, representante do Poder Judiciário, profira sua decisão, a qual, muitas vezes, não se mostra satisfatória a uma ou, até mesmo, a todas as partes.

O mediador atua como facilitador do diálogo, auxiliando as partes a verem o problema em si, bem como possíveis soluções para os mesmos e, ao mesmo tempo, restabelecer uma comunicação entre elas. Segundo o Conselho Nacional de Justiça:

A Mediação é uma forma de solução de conflitos na qual uma terceira pessoa, neutra e imparcial, facilita o diálogo entre as parte, para que elas construam, com autonomia e solidariedade, a melhor solução par o problema. Em regra, é utilizada em conflitos multidimensionais, ou complexos. A Mediação é um procedimento estruturado, não tem um prazo definido, e pode terminar ou não em acordo, pois as partes tem autonomia para buscar soluções que compatibilizem seus interesses e necessidades.11

A Resolução n. 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça, promulgada em 29 de novembro de 2010, é um ato normativo deste órgão de fiscalização do Poder Judiciário que possui como objetivo a implantação de formas de tratamento adequadas de conflitos levados, ou não, ao Poder Judiciário, valendo-se de métodos alternativos à heterocomposição como forma de alcançar a solução amigável e não a imposição de decisão.

O texto da Resolução estabelece que o mediador deverá realizar curso promovido pelos Centros Judiciários de Solução de Conflitos (CEJUSC), os quais estão ligados ao seu respectivo Tribunal de Justiça (esfera estadual ou federal).

Por seguinte, a resolução, em seu art. 12 e seguintes, fala sobre a figura do mediador, que somente será admitido na seara judicial se devidamente capacitado para tanto.

Art. 12. Nos Centros, bem como todos os demais órgãos judiciários nos quais se realizem sessões de conciliação e mediação, somente serão admitidos mediadores e conciliadores capacitados na forma deste ato (Anexo I), cabendo aos Tribunais, antes de sua instalação, realizar o curso de capacitação, podendo fazê-lo por meio de parcerias.[...]§ 3º Os cursos de capacitação, treinamento e aperfeiçoamento de mediadores e conciliadores deverão observar as diretrizes curriculares estabelecidas pelo CNJ (Anexo I) e deverão ser compostos necessariamente de estágio supervisionado. Somente deverão ser certificados mediadores e conciliadores que tiverem concluído o respectivo estágio supervisionado.12

Em atenção à Resolução n. 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça, foi editada, em 26 de junho de 2015, a Lei de Mediação n. 13.140/2015.13 Esta lei dispõe sobre a mediação, enquanto método alternativo de solução de conflitos, a ser utilizada no âmbito da administração pública e também, por analogia, na seara privada.

A Lei de Mediação objetivou atribuir parâmetros e referências quanto à atuação judicial e

11 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/concilia-cao-mediacao>. Acesso em: 13 de nov. 2017. 12 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Resolução n. 125/2010. Disponível em: http://www.cnj.jus.br/busca-a-tos-adm?documento=2579. Acesso em: 13 de nov. 2017. 13 BRASIL. Lei de Mediação. LEI Nº 13.140, DE 26 DE JUNHO DE 2015. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/Lei/L13140.htm. Acesso em: 13 de nov. 2017.

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extrajudicial do mediador e mediandos, buscando a autocomposição dos conflitos.

A lei inicia-se com os princípios basilares da mediação, os quais devem ser de conhecimento do mediador, bem como serem levados a conhecimento das partes e de seus respectivos advogados.

A mediação pode tratar de uma vasta gama de direitos, desde origem privada, como também pública. Assim, tem-se que a mediação pode ser utilizada: em relações de consumo, relações familiares, relações contratuais, empresariais, dentre outras; pode ser utilizada em ações de origem privada ou públicas, como, por exemplo, nos contrato de licitação, quando se tratar de relação continua entre as partes.

O Novo Código de Processo Civil (Lei n. 13.105, de 16 de março de 2015) traz em sua essência a busca pela solução consensual de conflitos (art. 2º e 3º deste diploma legal). Pelo art. 139 do CPC observa-se que é obrigação do Juiz promover, a qualquer tempo, a autocomposição, por meio dos mediadores.

Ademais, o CPC traz em seu texto os princípios norteadores da mediação, assim como a própria Lei de Mediação, o que demonstra grande preocupação com a utilização dos mesmos durante o processo de mediação, devendo estes serem de conhecimento expresso do mediador, que tem o dever de informar as partes e seus respectivos advogados.

Art. 166. A conciliação e a mediação são informadas pelos princípios da independência, da imparcialidade, da autonomia da vontade, da confidencialidade, da oralidade, da informalidade e da decisão informada.

Tem-se que o Novo Código de Processo Civil busca aplicar a mediação na maioria, se não em todos, os seus processos, no intuito de promover a autocomposição, trazendo as partes diversos benefícios. Exemplificativamente, é possível lembrar da isenção de pagamento das custas processuais remanescentes sempre que for feito acordo até a primeira audiência. Assim, vê-se que a todo o momento está sendo incentivada a autocomposição para resolver questões que antes eram, apenas, dirigidas ao Poder Judiciário.

DOS PRINCÍPIOS NORTEADORES DA RELAÇÃO ADVOGADO/PARTE NA MEDIAÇÃO

A mediação de conflitos possui princípios próprios, os quais condicionam a metodologia a ser utilizada para a sua aplicação, bem como fundamentos éticos e funcionais.

No que tange aos princípios da mediação, segundo Carlos Eduardo de Vasconcelos:

[...] a mediação de conflitos, com seus valores, técnicas e habilidades, supõe princípios voltados ao asseguramento da efetiva facilitação do diálogo, em condições de igualdade de oportunidades e liberdade igual, com vistas à compreensão e ao alcance dessa justiça de caso concreto.14

14 VASCONCELOS, Carlos Eduardo de. Mediação de conflitos e práticas restaurativas. 5. ed. rev. atual e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2017. p. 227.

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No Brasil há diversas instituições que buscam a resolução ética e célere de conflitos, tais como CNJ, CONIMA e FONAME, os quais, em suas resoluções, valem-se de princípios que visam orientar as mediações, sejam em âmbito judicial ou extrajudicial.

Assim, tem-se que a Lei de Mediação (Lei n. 13.140, de 26 de junho de 2015) traz um rol de princípios a serem utilizados. São eles:

Art. 2o A mediação será orientada pelos seguintes princípios: I - imparcialidade do mediador; II - isonomia entre as partes; III - oralidade; IV - informalidade; V - autonomia da vontade das partes; VI - busca do consenso; VII - confidencialidade; VIII - boa-fé.15

Inicialmente, o consensualismo é o princípio basilar da mediação, pois considerado objetivo principal deste método, ou seja, a busca pelo consenso entre as partes. Encontra-se no art. 2º, VI da Lei de Mediação; bem como nos arts. 3º, §§ 2º e 3º; e art. 165, §3º do Novo Código de Processo Civil.

Art. 3o § 2o O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos.§ 3o A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.16

Art. 165. [...]§ 3o O mediador, que atuará preferencialmente nos casos em que houver vínculo anterior entre as partes, auxiliará aos interessados a compreender as questões e os interesses em conflito, de modo que eles possam, pelo restabelecimento da comunicação, identificar, por si próprios, soluções consensuais que gerem benefícios mútuos.17

Posto isso, observa-se que as partes da mediação se encontram em igualdade de condições e oportunidades, buscando-se, com isso, a construção de decisões consensuais, o que acarretará na autocomposição tão almejada.

Outro princípio de suma importância para o processo de mediação é a confidencialidade, devendo ser garantido o sigilo para que as partes sintam confiança em expor seus sentimentos, pontos de vista e reais pretensões.

O princípio da confidencialidade, além de estar na Lei de Mediação, também se encontra exposto na Resolução n. 125/2010 do CNJ, e no Novo Código de Processo Civil. Veja-se:

Art. 1º, anexo III, da Resolução Nº 125, CNJ- São princípios fundamentais que regem a atuação de conciliadores e mediadores judiciais: confidencialidade, decisão informada, competência, imparcialidade, independência e autonomia, respeito à ordem pública e às leis

15 BRASIL. Lei de Mediação. LEI Nº 13.140, DE 26 DE JUNHO DE 2015. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/Lei/L13140.htm. Acesso em: 12 de nov. 2017. 16 BRASIL. Novo Código de Processo Civil. LEI Nº 13.105, DE 16 DE MARÇO DE 2015. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm. Acesso em: 12 de nov. 2017. 17 BRASIL. Novo Código de Processo Civil. LEI Nº 13.105, DE 16 DE MARÇO DE 2015. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm. Acesso em: 12 de nov. 2017.

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vigentes, empoderamento e validação.I - Confidencialidade - dever de manter sigilo sobre todas as informações obtidas na sessão, salvo autorização expressa das partes, violação à ordem pública ou às leis vigentes, não podendo ser testemunha do caso, nem atuar como advogado dos envolvidos, em qualquer hipótese; [...].18

Art. 166, do CPC. A conciliação e a mediação são informadas pelos princípios da independência, da imparcialidade, da autonomia da vontade, da confidencialidade, da oralidade, da informalidade e da decisão informada.§ 1o A confidencialidade estende-se a todas as informações produzidas no curso do procedimento, cujo teor não poderá ser utilizado para fim diverso daquele previsto por expressa deliberação das partes.19

O sigilo abrange todas as informações trazidas pelas partes, não podendo o mediador atuar como testemunha, caso ocorra ação judicial futura. Porém, devido à ordem pública, havendo indícios de crime, deve o mediador comunicar a autoridade competente para que esta tome as medidas cabíveis.

O princípio da imparcialidade, previsto na Lei de Mediação; na Resolução n. 125/2010 do CNJ (anexo III, art. 1º, IV) e no Novo Código de Processo Civil (arts. 170 e 173), prevê a atuação imparcial do mediador, de modo que não haja causas impeditivas ou de suspeição, para que não beneficie ou prejudique uma das partes indevidamente; bem como não haja interesses pessoais que venham a interferir no resultado do trabalho do mediador.20

Quanto ao princípio da isonomia entre as partes, tem-se que: “A isonomia possui relação direta com o princípio da imparcialidade, pois apenas num ambiente imparcial as partes serão realmente tratadas de forma isonômica, de modo que a garantia de um princípio é salutar à garantia do outro”.21 O princípio da isonomia encontra-se na Lei de Mediação, bem como nos arts. 5º, caput, I e art. 37, caput da Constituição Federal de 1988. Significa que as partes são tratadas de forma igualitária, com as mesmas oportunidades, o que é promissor na busca da autocomposição.

Quanto ao princípio da autonomia, tem-se que está ligado às partes do processo de mediação: vontade; liberdade de expressão; ações; tomadas de decisões; dentre outros. A autonomia está presente da Lei de Mediação, bem como no art. 1º, V, anexo III da Resolução n. 125/2010 do CNJ; e art. 166, §4º do Novo Código de Processo Civil.

O princípio da informalidade apresenta-se por meio de um processo de mediação informal, ou seja, somente o termo inicial e o termo final serão escritos, sendo que as demais ações realizadas serão verbais, deixando as partes à vontade. Necessário se faz, apenas, orientações gerais no que tange a forma e procedimento do processo de mediação. Havendo um acordo verbal, este será escrito, tornando-se este título executivo extrajudicial. Porém, podem as partes, por meio de seus advogados, converter este em título executivo judicial, por meio de peticionamento em Juízo, onde se pedirá pela homologação judicial do acordo. Esse princípio encontra-se na Lei de Mediação, bem como no art.

18 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Resolução nº 125, de 29 de novembro de 2010. Disponível em: http://www.cnj.jus.br/busca-atos-adm?documento=2579. Acesso em: 12 de nov. 2017. 19 BRASIL. Novo Código de Processo Civil. LEI Nº 13.105, DE 16 DE MARÇO DE 2015. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm. Acesso em: 12 de nov. 2017. 20 GONÇALVES, Jéssica de Almeida. Princípios de mediação de conflitos civis. Disponível em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=18517. Acesso em: 12 de nov. 2017. 21 GONÇALVES, Jéssica de Almeida. Princípios de mediação de conflitos civis. Disponível em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=18517. Acesso em: 12 de nov. 2017.

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166 do Novo Código de Processo Civil.

No que tange ao princípio da oralidade, tem-se que: “a dialética da mediação é ditada pela oralidade da linguagem comum. As partes ou mediandos são os principais protagonistas do procedimento, mesmo quando constam com a assistência de seus advogados”22. No processo de mediação, é utilizada linguagem informal, e isto está ligado à informalidade do procedimento. O princípio da oralidade encontra-se na Lei de Mediação, bem como no art. 166 do Novo Código de Processo Civil.

Por seguinte, quanto ao princípio da boa-fé, tem-se que está relacionado tratados das partes que buscam uma composição em comum, no intuito de cumpri-la, em todos os seus termos. Este princípio está na Lei de Mediação, bem como no art. 5º do Novo Código de Processo Civil.

Ademais, necessário ressaltar que há princípios previstos exclusivamente na Resolução n. 125/2010 do CNJ, tais como o princípio da decisão informada; da competência; dentre outros.

Quanto ao princípio da decisão informada, tem-se que o mesmo se encontra na Resolução n. 125/2010 do CNJ, anexo III, art. 1º, II.23 Por meio deste, os mediadores devem estar informados sobre a legislação que compete à mediação, bem como sobre a condução desse processo, vindo a informar as partes quanto aos seus direitos, princípios norteadores da mediação, atuação e importância dos advogados, dentre outros.

Por meio do princípio da decisão informada, as partes adquirem conhecimento sobre o procedimento de mediação, o que facilitará sua decisão por escolher este método de resolução ou não, vez que será por meio do consenso das partes que o processo se iniciará, podendo resultar em uma autocomposição.

Quanto ao princípio da competência, o mesmo se encontra na Resolução n. 125/2010 do CNJ, anexo III, art. 1º, III.24 Este princípio está voltado para a competência do profissional que atuará como mediador, devendo possuir qualificação que o habilite para tanto. Deve-se realizar curso, por meio de entidade credenciada, conforme parâmetro do CNJ e Ministério da Justiça. Assim, se o mediador for prestar serviços à justiça, além dessas qualificações, deverá estar credenciado ao Tribunal para o qual realizará as mediações judicias (Estadual ou Federal).

Pelo exposto, tem-se que os princípios se fazem necessários e de suma importância para a norteação do procedimento de mediação, situação que conduz a atuação do mediador na busca da facilitação do diálogo entre as partes, no intuito de juntos encontrarem soluções possíveis para o conflito até então existente e, posteriormente, realizar a autocomposição, a qual tende a ser efetivada com maior êxito.

22 VASCONCELOS, Carlos Eduardo de. Mediação de conflitos e práticas restaurativas. 5. ed. rev. atual e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2017. p. 227.23 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Resolução nº 125, de 29 de novembro de 2010. Disponível em: http://www.cnj.jus.br/busca-atos-adm?documento=2579. Acesso em: 12 de nov. 2017. 24 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Resolução nº 125, de 29 de novembro de 2010. Disponível em: http://www.cnj.jus.br/busca-atos-adm?documento=2579. Acesso em: 12 de nov. 2017.

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DA ATUAÇÃO DO ADVOGADO DIANTE DA NOVA FORMA DE RESOLUÇÃO DE CONFLITOS

A par dos princípios norteadores da mediação judicial ou extrajudicial, fica evidente a relevância da participação direta das partes durante o processo mediativo.

A mudança do cenário construído pela legislação vigente exaltou o protagonismo das partes na sessão de mediação.

Por certo, que o advogado, até então, acostumado a assumir um lugar de evidência na condução do processo receia pelos caminhos que tais alterações podem tomar.

Os contornos da nova lei impõem uma busca por adequação do profissional do direito ao novo regramento. A conduta ética e de boa-fé dos advogados nunca foi tão requisitada como agora, haja vista, a legislação esperar do advogado uma postura muito mais comprometida com a resolução efetiva da lide, da causa como um todo, e não somente com a satisfação do seu cliente. Exige-se, neste momento, uma atuação orquestrada em conjunto pelos advogados a fim de cooperarem com as partes e os mediadores para a construção da melhor solução.

Assim, Sonia Cristina Fagundes Malta esclarece:

Além do respeito ao protagonismo dos mediandos, dos advogados espera-se que trabalhem colaborativamente – não como ex-adversos – auxiliando o mediador a obter dos mediandos uma conduta leal, de boa-fé, cooperativa e respeitosa, imprescindível para a boa condução da mediação que poderá, ao final, chegar a um consenso e a um acordo juridicamente válido e exequível, alcançado com a necessária informação técnica. Com efeito, o advogado traz segurança ao seu cliente de que não está, inadvertidamente, abrindo de qualquer dos seus direitos.25

Neste mesmo sentido, Águida Arruda Barbosa citado pela autora enfatiza:

Aos advogados, fica aqui a recomendação de repensar sua atuação profissional, enriquecida pelo espírito da mediação – um comportamento ético – criando espaço de fala e de escuta, permitindo que os conflitos sejam transformados, a partir do reconhecimento das emoções e do sofrimento dos sujeitos de direito. A mediação é a certeza de que o custo emocional e financeiro será bem menor, e que o advogado terá a sensação de ampla atuação pessoal na prática profissional, suportando com conhecimento teórico e treinamento técnico os desgastes da carga emocional dos clientes. Mediação é ética.26

Resta, assim, a expectativa de que todas as partes envolvidas em um conflito assumam sua parcela de responsabilidade sobre a amplitude e proporção que da lide pode tomar na maioria dos casos. Imbuídos do espírito de criação das recentes legislações, espera-se que as partes e principalmente os profissionais contratados para auxiliarem na resolução dos conflitos comprometam-se com os princípios legais que sempre nortearam a história do Direito.

25 MALTA, Sônia Cristina Fagundes. A mediação e a indispensável contribuição do advogado para o adequado tratamento dos conflitos. In: PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito das famílias e sucessões. Belo Horizonte: IBDFAM, 2017, p. 262.26 MALTA, Sônia Cristina Fagundes. A mediação e a indispensável contribuição do advogado para o adequado tratamento dos conflitos. In: PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito das famílias e sucessões. Belo Horizonte: IBDFAM, 2017, p. 262.

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CONCLUSÃO

Os números alarmantes da sobrecarga do Poder Judiciário retratam a urgente necessidade de adoção de sistemas ou métodos alternativos de solução de conflitos. É certo que o método, até então, utilizado (heterecompositivo) mostrou-se incapaz de atender à crescente demanda.

Por conta deste cenário, tanto o Código de Processo Civil como a Lei de Mediação, a Lei de Arbitragem e outros instrumentos legais, incentivaram uma abertura para o Sistema Multiportas de resolução de conflitos no intuito de garantir a celeridade, o sigilo e eficiência das demandas judiciais e extrajudiciais.

A negociação, a conciliação, a mediação, entre outras formas de gestão eficiente de conflitos tornaram-se uma saída para a situação caótica dos tribunais brasileiros.

Os métodos, já, de longa data, utilizados em outros países ganharam evidencia na legislação atual ensejando uma consubstancial mudança em todo o panorama do Direito material e processual nacional.

A mediação tem se mostrado um método de grande eficácia, vez que os mediadores tratam do caso concreto de forma específica, ouvindo e deixando as partes falarem, buscando a retomada do diálogo no intuito de restabelecer relações anteriores de convivência.

Tais meios possuem princípios próprios, os quais condicionam a metodologia a ser utilizada para a sua aplicação, bem como fundamentos éticos e funcionais.

Tendo como parâmetro os princípios norteadores do Direito e de aplicação das técnicas autocompositivas espera-se uma atuação, de todos os envolvidos em uma situação de conflito e principalmente dos advogados, compatível com os ideais da nova lei.

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REFERÊNCIAS

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BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/programas- e-acoes/conciliacao-mediacao>.

______. Conselho Nacional de Justiça. Resolução n. 125/2010. Disponível em: http://www.cnj.jus.br/busca-atos-adm?documento=2579.

______. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm.

______. Lei de Mediação. LEI No 13.140, DE 26 DE JUNHO DE 2015. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/Lei/L13140.htm.

______. Novo Código de Processo Civil. LEI No 13.105, DE 16 DE MARÇO DE 2015. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm. CAPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris, 1988.

FREITAS, Frederico Oliveira; SÉRGIO, Débora Bastos. A aplicação da mediação no novo Código de Processo Civil e seus mecanismos em busca da pacificação social. Disponível em: http://www.ambito- juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=17824&revista_cad erno=21.

GONÇALVES, Jéssica de Almeida. Princípios de mediação de conflitos civis. Disponível em: http://www.ambito- juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=18517.

MALTA, Sônia Cristina Fagundes. A mediação e a indispensável contribuição do advogado para o adequado tratamento dos conflitos. In: PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito das famílias e sucessões. Belo Horizonte: IBDFAM, 2017

VASCONCELOS, Carlos Eduardo de. Mediação de conflitos e práticas restaurativas. 5. ed. rev. atual e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2017.

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DA POSSIBILIDADE DA UTILIZAÇÃO DOS MEIOS AUTOCOMPOSITIVOS COMO INSTRUMENTOS

PARA RESOLUÇÃO DE CONFLITOS NO ÂMBITO DO COMÉRCIO EXTERIOR

JOÃO PAULO SABAINE FAGUNDES1

INTRODUÇÃO

O direito remonta desde os primórdios da humanidade como um importante instrumento de pacificação social, uma vez que com suas normas e princípios mantém a ordem social padronizando as condutas dos que compõem aquela comunidade de acordo com seus costumes e sua cultura. Neste sentido, como instrumento de controle social, o direito se apresenta como o conjunto de meios de intervenção, positivos ou negativos, afim de impedir, desestimular, ou até estimular, certos comportamentos daqueles que compõem a comunidade na qual as normas, regras e princípios do direito, aqui visto em sua faceta formal, se aplica.

Noutro giro, o direito não é a única forma de controle social, posto que há meios informais que acabam por influir no comportamento das pessoas, positiva ou negativamente, como a moda, os costumes, a vaia, a censura etc., porém aqui se dará mais enfoque ao direito e suas formas de resolução de conflito. Assim sendo, neste viés de controle social, o direito acaba por não prever algumas situações, ou até mesmo não acompanhar a velocidade das mudanças na

1 Bacharel em Direito, formado pelo Centro Universitário de Maringá - UNICESUMAR. Pós graduado em Direi-to Latu Sensu pela Escola da Magistratura do Paraná – EMAP, [email protected]

sociedade, dado isso, somado à natureza do ser humano de errar e acabar ferindo o direito dos seus próximos, temos o surgimento dos conflitos.

Diante destes conflitos, desde os primórdios da civilização, o ser humano buscou formas de resolvê-los de forma justa e eficaz, fazendo surgir os métodos de resolução de conflitos heterocompositivos e os autocompositivos, que serão analisados no presente estudo. Avançando na história, com o advento da globalização e o avanço das relações comerciais internacionais, os chamados métodos alternativos de resolução de conflitos ganharam força e destaque, como importantes instrumentos para dirimir os litígios que ultrapassam as fronteiras dos países. Assim sendo, pretende-se mostrar aqui, a possibilidade e a importância da utilização destes métodos, principalmente dos autocompostivos para resolução de conflitos no âmbito do comércio exterior.

DOS MÉTODOS ALTERNATIVOS DE RESOLUÇÃO DE CONFLITOS

A pacificação social é escopo primordial do direito, que possui métodos heterocompositvos e autocompositivos para buscar a resolução dos conflitos que surgem do dia a dia da sociedade.

CAPITULO 6

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Neste sentido, os meios heterocompositivos remontam desde as primeiras comunidades quando, do surgimento de um conflito, por terras por exemplo, os envolvidos buscavam o ancião da comunidade para que este desse a palavra final sobre quem era o verdadeiro proprietário daquelas terras. Assim, tem-se que “A heterocomposição é a solução de um conflito pela atuação de um terceiro dotado de poder para impor, por sentença, a norma aplicável ao caso que lhe é apresentado”2, conforme aduz Luiz Antonio Scavone Junior.

Como meios heterocompositivos de resolução de conflitos temos o judicial onde, através do devido processo legal, garantidos os direitos ao contraditório e ampla defesa, um juiz togado, concursado e nomeado pelo Estado, prolatará sentença com o provimento final da lide apresentada; e a arbitragem, meio extrajudicial, onde através de um procedimento arbitral, um terceiro escolhido e nomeado pelas partes, o árbitro, prolatará sentença arbitral que dará o provimento final acerca da disputa apresentada ao juízo arbitral.

Hodiernamente o que se observa no Brasil é uma grande busca pela resolução dos conflitos na esfera judicial, conforme destaca Paulo Cesar Santos Bezerra, “A realidade social dos últimos tempos tem demonstrado que os indivíduos buscam a solução de seus conflitos mais pela via judicial do que pela via extrajudicial”3. É a chamada cultura da sentença, como se o provimento jurisdicional concedido por um juízo estatal fosse a única forma de se obter justiça, conforme continua o autor supra, “(...) como se a justiça se limitasse a isso ou como se o judiciário fosse distribuidor de justiça de forma monopolizada. Isso é fruto da visão estreita de que a justiça só se consegue pela via judicial, (...)”4.

Ora, isto é diametralmente o oposto do que se têm experimentado das decisões judiciais que, ao invés de trazer a pacificação social e uma sensação de justiça às partes litigantes, traz consigo ainda mais litígios e a insatisfação de ambos os lados frente ao provimento dado pelo poder estatal.

De forma semelhante, o provimento obtido extrajudicialmente pela arbitragem, trazem os mesmos sentimentos às partes, ainda que de forma menos impactante, posto que foram os próprios litigantes que nomearam o terceiro (árbitro) para decidir sobre o conflito. Sobre a arbitragem, suas características e processamento, será oportunamente debatido no presente artigo, uma vez que este método de resolução de conflitos, atualmente, é o mais utilizado para dirimir os problemas decorrentes das relações comerciais em âmbito internacional.

Frente a estes aspectos trazidos à tona e à inflação de processos junto ao Poder Judiciário, tanto a sociedade quanto o próprio Estado começaram a se preocupar com a busca de meios alternativos que pudessem mudar o panorama de altos índices de litigiosidade e alcançar de forma efetiva o escopo primordial do direito, qual seja, a pacificação social.

Estes já vem sendo aplicados, inclusive no âmbito judicial, desde as Leis 9.099/90, que instituiu os Juizados Especiais, que consigo trouxeram o instituto da conciliação, e a Lei 9.307/96 que regulamentou o instituto da arbitragem no ordenamento jurídico brasileiro. Tem-se então que a

2 SCAVONE JUNIOR, Luiz Antonio. Manual de arbitragem. 5. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 20143 BEZERRA, Paulo Cesar Santos. Acesso à justiça: um problema ético-social no plano da realização do di-reito/Paulo Cesar Santos Bezerra. 2ª ed. revista. Rio de Janeiro: Renovar, 2008. p. 55.4 BEZERRA, Paulo Cesar Santos. Acesso à justiça: um problema ético-social no plano da realização do di-reito/Paulo Cesar Santos Bezerra. 2ª ed. revista. Rio de Janeiro: Renovar, 2008. p. 61.

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utilização de métodos alternativos para resolução de conflitos no Brasil, já data há mais de 20 anos! Porém, ainda hoje são instrumentos pouco utilizados, ou erroneamente utilizados, seja pela falta de informação e formação, principalmente dos operadores do direito, seja pelo descrédito que alguns institutos ganharam frente à má aplicação e administração.

Porém, o escopo deste trabalho não é discutir a validade e, tão pouco, a efetividade que estes institutos tem alcançado no âmbito nacional, mas sim a possibilidade, bem como as vantagens de utilizar alguns destes instrumentos na resolução de conflitos no comércio internacional. Para tanto, faz-se necessário destacar que os métodos alternativos de resolução de conflitos são basicamente os autocompositivos, que serão detalhadamente estudos no tópico que segue, com exceção da arbitragem, método heterocompositivo.

DOS MÉTODOS AUTOCOMPOSITIVOS DE RESOLUÇÃO DE CONFLITOS

DA CONCILIAÇÃO

A conciliação, trata-se do meio autocompositivo de resolução de conflitos mais comum e conhecido pela população em geral, introduzida no âmbito do Judiciário brasileiro pela Lei n° 9.099/90, que já em seu artigo 1° determina a competência dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais para aplicar este método na tentativa de resolução das causas que lhe forem submetidas. Desde então, as audiências de conciliação configuram como o primeiro ato nos processos que tramitam perante os Juizados Especiais, afim de compor acordo entre as partes buscando a pacificação social efetiva.

Nas palavras de Paulo Cesar Santos Bezerra “A conciliação é um meio informal e não estruturado, no qual um terceiro, que não tem nenhum poder coercitivo, facilita a discussão e oferece um lugar neutro seguro, onde as partes podem negociar entre si”5. Assim, na conciliação o que se preconiza é a abertura ao diálogo entre as partes, para que estas, por si mesmas, possam chegar à uma composição amigável do conflito.

Desta forma, cabe ao conciliador facilitar este diálogo fazendo ponderações e dando sugestões, que deveram sempre ser adotadas de maneira espontânea pelas partes e nunca impostas de forma compulsória, buscando sempre o acordo entre as partes. É o que assevera Luiz Antonio Scavone Junior: “Em resumo, na conciliação não existe solução sem acordo entre as partes, como ocorre nas soluções judicial e arbitral, nas quais o juiz e o árbitro são dotados de poderes para solucionar o conflito independentemente de acordo entre as partes”6.

Ocorre que, infelizmente, o que a prática deste método no âmbito dos Juizados Especiais e, também, na Justiça do Trabalho, que igualmente preconiza a conciliação, tem nos mostrado é que esta, por vezes, é forçada pelo conciliador ou pelo juiz togado, para que se encerre o processo já

5 BEZERRA, Paulo Cesar Santos. Acesso à justiça: um problema ético-social no plano da realização do di-reito/Paulo Cesar Santos Bezerra. 2ª ed. revista. Rio de Janeiro: Renovar, 2008. p. 81.6 SCAVONE JUNIOR, Luiz Antonio. Manual de arbitragem. 5. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2014. p. 21.

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nos primeiros atos. Porém tal fato vai ao contrário do que o método da conciliação busca, que é a pacificação social por meio da resolução do conflito de forma livre e espontânea pelas próprias partes, isto porque, quando forçada uma conciliação o que ocorre, na maioria das vezes, é a solução do conflito imediato, restando o conflito mediato, ou de fundo, sem resolução, o que ocasiona insatisfação das partes e baixos índices de cumprimento dos acordos lavrados.

A este respeito, Paulo Cesar Santos Bezerra alerta que “o despreparo dos conciliadores termina por afetar o direito como instituição responsável por digerir, administrar e dirimir conflitos intersubjetivos”7.

Ora, não seria muito mais eficaz se a conciliação fosse realizada de forma a buscar uma verdadeira e eficaz pacificação social? Se assim o fosse, a cultura da conciliação não seria difundida positivamente, ao ponto de diminuir o número de litígios levados ao Judiciário? Para ambas perguntas, uma reposta positiva seria a mais correta, isto porque, em uma conciliação, o que o conciliador deve buscar é identificar o conflito mediato, ou de fundo, para, através de ponderações e sugestões, possibilitar que as partes achem a solução que possa agradar a ambas, tornando-se o acordo um sistema de ganha-ganha, onde ambas saem satisfeitas com os resultados.

Assim, podemos dizer que a conciliação realizada da maneira que se espera, por profissional qualificado para tanto, mostra-se como um efetivo instrumento de pacificação social e resolução de conflitos, uma vez que busca investigar o mais profundo das origens daquele litígio, sanando tanto o conflito de fundo, quanto o conflito aparente, permitindo, inclusive, que se restabeleça as relações entre as partes.

DA NEGOCIAÇÃO

Outra forma de resolução autocompositiva de conflitos é a negociação. Mais utilizada nas relações pré contratuais, mostra-se como importante mecanismo para ajuste vontades das partes que, de comum acordo e sem intervenção de terceiros, chegam a um senso comum sobre a relação que pretendem estabelecer ou sobre o conflito que pretendem sanar. Neste rumo, Paulo Cesar Santos Bezerra conceitua negociação da seguinte forma:

“A forma básica de resolução de disputas é a negociação. Nela as partes se encontram, diretamente, e de acordo com suas próprias estratégias, procuram resolver uma disputa ou planejar uma transação mediante discussão que incluem argumentação e arrazoamento. Sem intervenção de terceiros, as partes procuram resolver suas questões, resolvendo disputas mediante discussões que podem ser conduzidas, pelas partes, autonomamente, ou por representantes”.8

A negociação, então, é aquilo de mais rotineiro o ser humano experimenta em suas relações, uma vez que esta resolução direta das divergências por meio de argumentações e persuasão é algo

7 BEZERRA, Paulo Cesar Santos. Acesso à justiça: um problema ético-social no plano da realização do di-reito/Paulo Cesar Santos Bezerra. 2ª ed. revista. Rio de Janeiro: Renovar, 2008. p. 85.8 BEZERRA, Paulo Cesar Santos. Acesso à justiça: um problema ético-social no plano da realização do di-reito/Paulo Cesar Santos Bezerra. 2ª ed. revista. Rio de Janeiro: Renovar, 2008. p. 75.

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observado desde uma pequena avença familiar, como quem é o responsável pela louça, até na composição de contratos milionários entre empresas multinacionais. A diferença nos casos ilustrados se encontra no tipo de negociação que se utiliza, no primeiro o mais sensato seria uma “negociação baseada em princípios” ou “negociação baseada em méritos”, por outro lado, no segundo caso, o que se observa nas relações comerciais diariamente é a utilização da negociação posicional.

O Manual de Mediação Judicial, produzido pela Escola Nacional de Mediação e Conciliação, ensina que na “negociação baseada em princípios” ou “negociação baseada em méritos”, “para obtenção da negociação de resultados sensatos e justos (com a vantagem de evitar a deterioração do relacionamento entre as pessoas) faz-se necessário que se abordem os interesses reais dos envolvidos (e não suas posições)” 9. Este tipo de negociação se baseia em quatro princípios/passos quais sejam: 1) separar as pessoas do problema; 2) foco nos interesses e não em posições; 3) geração de opções de ganhos mútuos; e 4) utilização de critérios objetivos.

Por outro lado, na chamada negociação posicional os interessados já têm posições, normalmente extremadas, pré-estabelecidas, a partir das quais tentarão chegar a um meio termo, sem levar em conta o mérito e as nuances que compõem a disputa, assim, em que pese não haja um terceiro envolvido, o sistema que prevalecerá é o do “perde-ganha”. O Manual de Mediação Judicial assim conceitua a negociação posicional:

“A negociação posicional, por sua vez, consiste naquela cujos negociadores se tratam como oponentes, o que implica pensar na negociação de um ganhar e outro perder (em que quanto mais um ganha mais o outro perde). Dessa forma, em vez de abordar os méritos da questão, o papel do negociador parece ser pressionar ao máximo e ceder o mínimo possível”.10

Em que pese ainda se observe diariamente a utilização negociação posicional nas relações comerciais e empresariais, a tendência é que, inclusive nestes casos, seja utilizada a “negociação baseada em princípios”, uma vez que, como acima detalhado, esta técnica proporciona um maior índice de composições amigáveis, com acordos que satisfazem ambas as partes envolvidas, se caracterizado no modelo do “ganha-ganha”, em que, em questões comerciais, é de extrema importância para manutenção e crescimento sustentável de uma empresa.

Desta forma, pode-se até concluir que a negociação pode ser utilizada como um interessante instrumento para, não só a resolução de conflitos, mas também para sua prevenção, isto porque se em uma relação pré-contratual for estabelecido um sistema de negociação baseada em princípios, o próprio contrato firmado entre as partes envolvidas será desenvolvido de forma a satisfazer a vontade de todos, baixando drasticamente a possibilidade de um eventual e futuro litígio advindo da relação estabelecida.

9 AZEVEDO, André Gomma de (Orrganizador). Manual de Mediação Judicial. Escola Nacional de Mediação e Conciliação. Brasília: Ministério da Justiça, 2013. p. 68.10 AZEVEDO, André Gomma de (Org). Manual de Mediação Judicial. Escola Nacional de Mediação e Conci-liação. Brasília: Ministério da Justiça, 2013. p. 67.

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DA MEDIAÇÃO

Por fim, tem-se a mediação como outro método de resolução autocompositiva de conflitos. Todo cidadão em algum ponto da vida, fez ou fará a experiência de mediar um conflito, seja em casa, na escola ou no trabalho, situações surgem em que se faz necessária a interferência de um terceiro para se chegar a uma solução. Aqui, porém, tratar-se-á sobre a mediação técnica, como instrumento para solução de conflitos, judicial ou extrajudicialmente. A este respeito, Paulo Cesar Santos Bezerra traz a seguinte conceituação:

“É um processo informal, voluntário, onde um terceiro interventor, neutro, assiste aos disputantes na solução de suas questões. O papel do interventor é ajudar na comunicação através de neutralização de emoções, formação de opções e negociação de acordos. Como agente fora do contexto conflituoso, funciona como catalisador de disputas, ao conduzir as partes às soluções, sem propriamente interferir na substância destas”.11

Já Adriano L. Araújo e outros tratam a mediação como “(...) um mecanismo para solução de conflitos através da gestão do mesmo pelas próprias partes, para que estas construam uma decisão rápida, ponderada, eficaz e satisfatória para os envolvidos”12. Esta construção de uma decisão só será possível com o reestabelecimento da comunicação, conforme assevera Jean-Pierre Bonafé-Schimitt:

“(...) um modo de construção e de gestão da vida social graças à intermediação de um terceiro neutro, independente, sem outro poder que não a autoridade que lhes reconhecem as partes que a escolheram ou reconheceram livremente. Sua missão fundamental é (re)estabelecer a comunicação”.13

Assim, diferente da conciliação, na mediação o terceiro intervém diretamente no processo, ainda que de maneira neutra, a fim de reestabelecer a comunicação entre as partes e neutralizar as emoções, para que estas possam compor amigavelmente uma resolução racional para o conflito em questão. Ainda que haja a intervenção de um terceiro, considera-se como método autocompositivo, uma vez que as próprias partes é que vão compor uma resolução amigável, não cabendo ao mediador interferir no mérito da questão, mas apenas apaziguar os ânimos e conduzir as partes à um caminho racional da disputa.

Importante ressaltar que, mesmo que tenha a competência para interferir a fim de apaziguar os ânimos e reestabelecer a comunicação, o mediador não poderá dar a solução diretamente às partes, mas conduzi-las a um diálogo que faça com que cheguem à uma composição por si mesmas. Para tanto, deverá observar algumas características/princípios inerentes ao processo de mediação, a fim de torna-lo eficaz e justo, como: privacidade/confidencialidade; economia financeira e de tempo; informalidade; oralidade; reaproximação das partes/busca do consenso; autonomia das decisões/das vontades das partes; equilíbrio das relações entre as partes; neutralidade/imparcialidade do mediador; boa-fé.

11 BEZERRA, Paulo Cesar Santos. Acesso à justiça: um problema ético-social no plano da realização do di-reito/Paulo Cesar Santos Bezerra. 2ª ed. revista. Rio de Janeiro: Renovar, 2008. p. 80.12 ARAUJO, Adriano L.; SILVEIRA, Anarita A.; DYTZ, Karen I. O Instituo da Mediação. In: Revista Doutrina. Rio de Janeiro: Instituto de Direito, vol. III, p. 442, 199713 BONAFÈ-SCHIMITT, Jean-Pierre. La Mediation: Une Justice Douce. Paris: Syros, 1992, pp. 16-17.

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Por fim, conforme já aludido, o processo de mediação não possui um modelo de procedimento a ser seguido, em que pese a Lei 13.140/2015 tenha trazido alguns pontos necessários como questões relativas ao início do processo (artigo 14, 15 e 17); a eventual suspensão de processo judicial ou arbitral em andamento, até o fim do processo de mediação (artigo 16) e relativas ao fim do processo (artigo 20). Assim, as partes e, principalmente, o mediador é que vão determinar os trâmites do processo de acordo com as características e nuances do caso concreto.

Neste sentido, Jose Luis Bolzan de Morais escreve:

“O processo de mediação deve ser analisado de maneira técnica. Não existe um modelo definitivo para o mesmo. Este varia de acordo com a matéria a ser mediada, as habilidade do mediador, a maneira com que se comportam as partes, a escola e a formação técnica do neutro e de acordo com qualquer outro fator externo que, porventura, venha a interferir no andamento do processo”.14

Tem-se, então, que a mediação se trata de importante mecanismo autocompositivo para a resolução de conflitos, que vem ganhando força com as políticas públicas e a tendência de “fuga” dos padrões de gastos e tempo do Poder Judiciário, com o escopo de, de forma justa e célere, buscar a resolução dos conflitos e a consequente pacificação social.

DA APLICAÇÃO DOS MÉTODOS ALTERNATIVOS DE RESOLUÇÃO DE CONFLITOS NO ÂMBITO DO COMÉRCIO EXTERIOR

Em meados do final do século XX e início do século XXI, deu-se o surgimento do fenômeno da globalização que, principalmente através da rede mundial de computadores, a Internet, interligou todo o mundo nos seus mais variados aspectos sociais, culturais e políticos. No âmbito econômico, além do advento da Internet, a redução de custos para o transporte, intensificou as relações comerciais e fortaleceu a integração regional.

Tal movimento acarretou na expansão dos mercados e ao avanço do desenvolvimento tecnológico, potencializando significativamente mudanças no setor produtivo, no sentido de atender conceitos e tendências globais, através de parcerias entre empresas de diferentes países ao redor do globo, que passaram a depender, direta e indiretamente, uma das outras. Estas parcerias, por meio de negociações, acabaram por criar complexas relações comerciais e costumes que ultrapassam os limites fronteiriços dos Estados, demandando uma maior liberdade das operações sem que uma lei estatal de determinado país colocasse barreiras e obstáculos ao desenvolvimento econômico.

Neste novo cenário econômico os contratos internacionais ganharam destaque, conforme Milena Rupiani Bonetto destaca: “Os contratos internacionais, portanto, passaram a ganhar relevância no cenário global, uma vez que trouxeram segurança e credibilidade às negociações e às partes.”.15

14 MORAIS, Jose Luis Bolzan de. Mediação e arbitragem: alternativas à jurisdição! / Jose Luis Bolzan de Morais, com a colaboração de Anarita Araujo da Silveira, Adriano Luís de Araujo. Porto Alegre: Livraria do Advo-gado, 1999. p. 164.15 BONETTO, Milena Rupiani. Aplicabilidade das regras Incoterms® 2010 aos contratos internacionais de compra e venda de mercadorias / Milena Rupiani Bonetto. São Paulo: Iglu, 2012. p. 14.

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Em que pese o contrato internacional tenha se tornado importante instrumento nas relações comerciais internacionais, frente à força que lhe é garantida pelo princípio da autonomia da vontade entre as partes, frisa-se que o mesmo deve se atrelar e seguir a Lex mercatoria, que é o conjunto de normas e princípios criada pelos próprios operadores do comércio internacional, baseada nos usos e costumes desta área do direito internacional. Assim, a Lex mercatoria seria formada dos seguintes elementos: princípios gerais do direito; usos e costumes comerciais internacionais; contratos-tipo ou Standarts; e jurisprudência arbitral, os quais se passa à análise no que segue.

Além da Lex mercatória, outras fontes do direito internacional devem ser observadas na elaboração dos contratos comerciais internacionais, como as decisões judiciais e a doutrina, ainda que somente para interpretação e inspiração; as resoluções de organizações internacionais e, principalmente as Convenções Internacionais, posto que constituem instituto com mais força coercitiva no âmbito internacional, devendo ser integralmente cumprida pelos países que a elas aderem.

Ocorre que, em que pese a existência dos tratados internacionais, da Lex mercatoria e de todos os outros institutos de proteção do comércio internacional supracitado, a ocorrência de conflitos é algo que eventualmente acontece nos contratos celebrados entre comerciantes de diferentes países. Para tanto, atualmente, como principais meios de solução de conflitos utilizados nas relações comerciais internacionais, destacam-se o judicial e o arbitral, métodos heterocompositivos que muito se assemelham em seus procedimentos, técnicas e instrumentos utilizados.

O judicial, conforme já estudado, trata-se de método legítimo e institucionalizado de resolução de conflitos de tutela e poder estatal que, por meio de um juiz togado, após o trâmite de um processo, normalmente moroso e caro, prolata sentença com o provimento dos pedidos ali elaborados, de acordo com as provas à ele apresentadas.

No âmbito do comércio internacional, o meio judicial, em que pese legítimo, apresente alguns obstáculos para sua efetividade e sensação real de justiça, posto que as empresas envolvidas em um negócio internacional, normalmente, estão submetidas a diferentes regimes jurídicos, o que traz à tona a questão de qual seria o melhor sistema aplicável para resolução de um eventual conflito. Ademais, resta a preocupação quanto à eficácia da execução de um provimento estatal na jurisdição de outro Estado, em que pese haja tratados internacionais para determinar as regras quanto à execução de sentença internacionais, a insegurança por parte dos contraentes ainda persiste frente à dificuldade com a burocracia para se obter tal provimento.

Por estas razões, atualmente, um dos métodos alternativos de resolução de conflitos mais utilizados no âmbito do comércio internacional é a arbitragem, isto porque “sua constante utilização no plano internacional atende às necessidades de um direito com normas próprias, adequadas aos usos e costumes do comércio internacional, não guardando surpresas quando da prolação do laudo arbitral”16. Por meio cláusula arbitral previamente convencionada entre as partes que, já no contrato celebrado, elegerá a arbitragem como o instrumento para resolução de eventuais conflitos, bem como determinará as regras pelas quais está ocorrerá com a seleção do juízo arbitral competente para tanto.

16 CÁRNIO, Thaís Cíntia. Contratos internacionais: teoria e prática / Thaís Cíntia Cárnio. São Paulo: Atlas, 2009. p. 132.

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Assim, em que pese as partes convencionem acerca da utilização da arbitragem como método de solução de conflitos, esta se caracteriza como meio heterocompositivo, uma vez que um terceiro eleito pelas partes é que irá dar a decisão final sobre a demanda a ele apresentada, ou seja, “o árbitro é juiz de fato e de direito e, assim como o juiz, impõe sua decisão por sentença”17, conforme destaca Luiz Antonio Scavone Junior.

No mesmo sentido, Thaís Cíntia Cárnio escreve:

“Assim, a arbitragem adquire contornos próprios, apresentando-se como uma modalidade jurisdicional privada, devidamente implantada por força de legislações internas que consolidam sua existência e judicialidade. Pode-se entende-la como um processo privado iniciado com um acordo das partes, a respeito de uma disputa já existente ou potencial, objetivando submetê-la a uma decisão emanada por um ou mais árbitros. Importante enfatizar que a decisão do tribunal é final, vinculando as partes, prolatada à luz das evidências e argumentos apresentados aos árbitros”.18

Desta forma, tem-se a arbitragem como um método heterocompositivo para solução de conflitos, pois se mostra como uma verdadeira jurisdição privada que, por força das normas e princípios do ordenamento jurídico, possui legitimidade e judicialidade para a resolução de conflitos de forma mais célere e eficaz, uma vez que as próprias partes elegem o árbitro competente para o julgamento do conflito, bem como determinam as regras processuais que serão seguidas para o melhor andamento de todo o julgamento arbitral.

Poder-se-ia, aqui, tecer inúmeras laudas sobre a arbitragem e suas características, ainda mais frente à extrema importância que este instrumento representa para a solução de conflitos no âmbito do comércio internacional, porém, como se trata de método heterocompositivo de solução de conflitos e o objeto do presente estudo são os métodos autocompositivos, encerra-se aqui os breves comentários apresentados. Ao passo que, procede-se à análise e teorização da possibilidade, e mais do que isso, da importância, da utilização dos meios autocompositivos como instrumento para resolução de conflitos no âmbito do comércio exterior.

DA POSSIBILIDADE DA UTILIZAÇÃO DOS MEIOS AUTOCOMPOSITIVOS COMO INSTRUMENTOS PARA RESOLUÇÃO DE CONFLITOS NO ÂMBITO DO COMÉRCIO EXTERIOR

Conforme já abordado, com o processo de surgimento da globalização, impulsionado pelo advento da Internet e da evolução dos meios de comunicação em geral, bem como com a diminuição dos custos para o transporte, o comércio internacional ganhou força e contornos nunca antes vivenciados por aqueles que praticavam relações comerciais com empresas de outros países, trazendo a estes novas perspectivas e desafios a serem enfrentados. Dentre os desafios, a resolução de conflitos resultantes das relações comerciais se mostrou de grande importância frente à pluralidade de jurisdições estatais

17 SCAVONE JUNIOR, Luiz Antonio. Manual de arbitragem. 5. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2014. pp. 21-22.18 CÁRNIO, Thaís Cíntia. Contratos internacionais: teoria e prática / Thaís Cíntia Cárnio. São Paulo: Atlas, 2009. pp. 137-138.

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envolvidas no processo.

Para tanto, conforme já abordado, destacam-se como principais meios de resolução de conflitos no âmbito do comércio internacional, os métodos heterocompositivos, quais sejam: o judicial e o arbitral. Por se tratarem de resolução heterocompositiva, onde um terceiro, o juiz ou árbitro, irá prolatar uma sentença arbitral, o que acaba por causar o efeito de “vencedor” e “vencido”. Assim, a experiência de justiça nos métodos heterocompositivos de resolução de conflitos se torna insatisfatória, não sendo incomum o não cumprimento da decisão dada pelo terceiro, ainda que eleito pelas partes, como na arbitragem. Noutro giro, quando as próprias partes chegam a uma resolução por si próprias, ainda que auxiliadas por terceiro, a sensação de justiça se torna mais plena e tangível, conforme destaca Rodolfo de Camargo Mancuso:

“Em contrapartida, quando a solução é encontrada entre os próprios interessados, de per si ou com a intercessão de um agente ou órgão facilitador ou ainda de uma instância decisória não estatal por eles mesmo escolhida, ou partícipes se tornam os maiores interessados em prestigiar a fórmula negociada ou fixada.”19

Desta maneira, assim como nas relações comerciais internas, vislumbra-se nos métodos autocompositivos, como a conciliação, uma ótima alternativa de resolução de conflitos pontuais durante a relação contratual de importação/exportação, posto que, por intermédio de profissionais qualificados, as partes contratantes podem chegar espontaneamente a um acordo sobre eventual conflito, sem abalar a relação contratual e a confiança mútua, alcançando a pacificação social e mantendo boas relações comerciais juntos aos seus parceiros internacionais.

Ainda em se tratando de conciliação, tem-se que no âmbito das relações privadas, principalmente entre empresas, que, por exemplo, mantém um contrato de fornecimento, é comum que hajam discordância quanto um ou outro fato que ocorra durante a relação contratual, porém é de extrema importância a manutenção do contrato para ambas. Nestes casos, os próprios advogados das partes contratantes, desde que devidamente qualificados, poderiam compor uma conciliação extrajudicial afim de sanar o eventual conflito e dar continuidade na relação, mantendo um contrato vantajoso para ambas a as partes e promovendo a pacificação social.

No mesmo trilho, a negociação pode ser utilizada como um interessante instrumento para, não só a resolução de conflitos, mas também para sua prevenção, isto porque se em uma relação pré-contratual for estabelecido um sistema de negociação baseada em princípios, o próprio contrato firmado entre as partes envolvidas será desenvolvido de forma a satisfazer a vontade de todos, baixando drasticamente a possibilidade de um eventual e futuro litígio advindo da relação estabelecida. Ademais, ainda que surja um conflito decorrente da relação contratual, estabelecendo-se uma prévia negociação baseada em princípios, é provável que probabilidade de resolução deste se dê de forma tranquila e eficaz frente ao aberto canal de comunicação estabelecido pelas partes.

Nos casos mais complexo, porém, a negociação e a própria conciliação podem se mostrar como instrumentos ineficazes, frente ao fato de que por trás do conflito imediato apresentado, exista

19 MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Acesso à justiça: condicionantes legítimas e ilegítimas / Rodolfo de Ca-margo Mancuso. São Paulo: Editora Revista do Tribunais, 2011. p. 399.

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um problema mediato ou de fundo intricado nesta relação, sendo de fundamental importância a intervenção de um mediador. Assim, poder-se-ia falar que, assim como nos casos de arbitragem, as partes pudessem já na elaboração do contrato instituir cláusula que já estabelecesse a Câmara de Mediação, ou até mesmo o Mediador, responsável pela resolução de eventuais conflitos que venha a surgir da relação comercial.

Assim, quando fosse encaminhado o litígio para a mediação, o mediador responsável pelo procedimento, através das técnicas já apresentadas, além de resolver o conflito/problema que lhe foi apresentado, poderia conduzir as partes à resolução do problema de fundo, promovendo a pacificação social e, principalmente, a relação de confiança entre as partes, que nos casos de relações comerciais internacionais é de suma importância para a manutenção de parcerias e contratos, que garantam bons e seguros negócios para os envolvidos no cenário global.

Desta forma, o primeiro ponto a se destacar a favor da aplicação dos métodos autocompositivos de solução de conflitos no âmbito do comércio internacional, é a possibilidade de manutenção e, quando for o caso de conflitos mais complexos, a restauração da relação comercial estabelecida entre os litigantes. Isto porque, Frente a agressividade atualmente imposta pelo mercado global, a manutenção de boas relações com clientes, parceiros e fornecedores é de essencial importância para assegurar a continuação das atividades empresariais e dos negócios neste âmbito. Na contramão, ser fomentador de litígios nestas relações comerciais internacionais pode ser um caminho sem volta para o fim das operações no cenário global, posto que cada vez mais as empresas têm se precavido ao contratar com o comércio exterior, fugindo daqueles vistos como “problemáticos”.

Ademais, ainda há de se destacar que os métodos autocompositivos de solução de litígios no âmbito do comércio internacional, pode representar uma economia financeira vultuosa para as empresas envolvidas na relação comercial, uma vez que os métodos heterocompositivos, ou seja, o judicial e a arbitragem, se caracterizam, apesar de suas tênues diferenças, por serem procedimentos que demandam um custo muito alto, seja com as custas processuais no primeiro caso, seja com os honorários arbitrais no segundo, que, dependendo do valor discutido, podem constituir um rombo considerável na contabilidade.

Assim, no caso da negociação, por exemplo, os custos seriam somente com os honorários dos negociadores de cada parte, isto se houvesse real necessidade da presença destes no processo, uma vez que os próprios contratantes, por meio de seus representantes, seriam capazes de chegar a um denominador comum frente ao conflito existente. Por outro lado a conciliação e mediação apresentariam os custos dos honorários do conciliador e mediador, respectivamente, mas em patamares muito inferiores aos observados nos métodos hetercompositvos, uma vez que se caracterizaram como métodos menos burocráticos e mais céleres.

Ocorre que, infelizmente, ainda são poucos os casos em que se observa a busca da resolução dos conflitos pelos meios autocompositivos de resolução de conflitos, em decorrência da própria cultura empresarial e, principalmente, pela falta de segurança jurídica que os acordos apresentam no âmbito internacional. Isto porque não há nenhum tratado ou convenção que garanta executividade e efetividade destes acordos frente à jurisdição dos Estado soberanos, diferentemente do que acontece, por exemplo, com a sentença arbitral, que possui eficácia internacional e interna de acordo com a legislação do país em que será executada.

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CONCLUSÃO

Diante de todo exposto, verificou-se que a aplicação dos métodos autocompositivos de solução de conflito no âmbito internacional é possível e seria de relevante importância para as relações comerciais uma vez que, além da economia financeira e a manutenção das relações comerciais, trazem aos envolvidos no conflito uma sensação de justiça e a consequente pacificação social. Porém, o que se depreendeu deste estudo é que, no âmbito do comércio internacional os métodos hetercompositivos, ou seja, o judicial e a arbitragem, ainda são os mais procurados.

Portanto, importante se faz o incentivo à estas práticas no comércio internacional como forma de facilitar as relações comerciais e consequentemente se fomentar a importação/exportação dos países, pelo menos no que tange à custos e segurança quando da eventualidade do surgimento de conflitos. Para tanto, a elaboração, inicialmente, de políticas públicas neste sentido e, a posteriori, a constituição de um tratado ou convenção trazendo segurança internacional para estes institutos, seria de crucial relevância para firmá-los como opções para resolução de conflitos no âmbito do comércio internacional.

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REFERÊNCIAS

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AZEVEDO, André Gomma de (Org). Manual de Mediação Judicial. Escola Nacional de Mediação e Conciliação. Brasília: Ministério da Justiça, 2013.

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BONAFÈ-SCHIMITT, Jean-Pierre. La Mediation: Une Justice Douce. Paris: Syros, 1992.

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CÁRNIO, Thaís Cíntia. Contratos internacionais: teoria e prática. São Paulo: Atlas, 2009.

MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Acesso à justiça: condicionantes legítimas e ilegítimas. São Paulo: Editora Revista do Tribunais, 2011.

MORAIS, Jose Luis Bolzan de. Mediação e arbitragem: alternativas à jurisdição!. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999.

SCAVONE JUNIOR, Luiz Antonio. Manual de arbitragem. 5. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2014.

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A AMBIENTAÇÃO DO CEJUSC NOS CASOS CÍVEIS: UMA ANÁLISE DA ESTRUTURA DE MARINGÁ

BEATRIZ DOS SANTOS MOURÃO1

CAMILA ROSA DE SOUZA2

INTRODUÇÃO

A mediação veio, com o novo CPC, como uma nova modalidade de resolução de conflito. O Conselho Nacional de Justiça regulamentou como devem ser realizadas as sessões de mediação, assim como o ambiente em que elas serão realizadas.

O presente trabalho busca analisar as salas de audiências utilizadas pelo CEJUSC de Maringá e compará-las com os moldes de sala propostos pelo Conselho Nacional de Justiça. Para isso analisar-se-á os motivos de a sala de conciliação precisar ser disposta de forma diversa do que as demais salas de audiências utilizadas no judiciário.

É de suma importância verificar a ciência por traz de cada disposição trazida pelo Conselho Nacional de Justiça no que se trata da ambientação das salas de audiência do CEJUSC.

1 Graduada em Direito pela Unicesumar - centro universitário de Maringá, advogada pela cidade de Maringá (OAB-PR 96.741). Endereço eletrônico <[email protected]>.2 Graduada em Direito pelo Centro Universitário de Maringá-Unicesumar. Pós graduanda em Direito Tributário pela instituição de ensino Damásio de Jesus.ADVOGADA EM Maringá (OAB/PR 92.409). Endereço eletrônico: <[email protected]>3 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça 2015. Guia de Conciliação e Mediação Judicial: orientação para ins-talação de CEJUSC. Brasília/DF: Conselho Nacional de Justiça.

Afinal é apenas reconhecendo a necessidade real da ambientação que se conseguirá perceber que o desamparo é prejudicial para o processo.

A MEDIAÇÃO E SEUS PRINCÍPIOS

Quando se pensa em processo judicial, há a referência de um juiz impondo sua decisão as partes envolvidas no processo, contudo, este modo de solução de conflitos não é o único. A mediação, o objeto de pesquisa deste trabalho, é um método de solução de conflitos, regulamentado pela Resolução 125 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), bem como a lei 13.140/2015, também conhecida como Lei de Mediação.

Considera-se mediação, de acordo com a Lei nº 13.140/2015:

[...] a atividade técnica exercida por terceiro imparcial sem poder decisório, que, escolhido ou aceito pelas partes, as auxilia e estimula a identificar ou desenvolver soluções consensuais para a controvérsia3.

CAPÍTULO 7

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A cartilha da mediação do Conselho Nacional de Justiça traz como conceito de mediação:

A mediação pode ser definida como uma negociação facilitada ou catalisada por um terceiro. Alguns autores preferem definições mais completas sugerindo que a mediação um processo autocompositivo segundo o qual as partes em disputa são auxiliadas por uma terceira parte neutra ao conflito ou por um painel de pessoas sem interesse na causa, para se chegar a uma composição. Trata-se de um método de resolução de disputas no qual se desenvolve um processo composto por vários atos procedimentais pelos quais o(s) terceiro(s) imparcial(is) facilita(m) a negociação entre as pessoas em conflito, habilitando-as a melhor compreender suas posições e a encontrar soluções que se compatibilizam aos seus interesses e necessidades4.

Em suma, a mediação é um método de solução de conflitos no qual as próprias partes encontram a solução para suas questões, todavia, para facilitar o processo, estas recebem o auxílio de um mediador, que apenas as auxilia a visualizarem uma solução pacifica para seus problemas.

O mediador, portanto, tem a função de reestabelecer a comunicação entre as partes que estão envolvidas no processo, agindo como um facilitador e como um condutor das negociações. Isto significa que o mediador é o responsável por fazer as partes pensarem não apenas no conflito, mas no meio de solucioná-lo de modo justo e condizente com o ordenamento jurídico. Segundo Fernanda Tartuce5, o mediador facilita a comunicação entre as pessoas propiciando, a partir de uma maior compreensão da situação, para engendrarem juntos respostas para o conflito.

Vale ressaltar que o mediador não deve interferir na lide, como dito acima, a solução deve surgir das próprias partes e não dele. Entretanto, há duas exceções a este caso, de acordo com Morais6, sendo estas, quando as partes rumem para um acordo injusto ou rumem para um acordo não aceito pelo ordenamento jurídico. Nestes casos o mediador poderá intervir para auxiliar as partes a compreenderem qual é o caminho certo e aceitável para se seguir, mas nunca o determinar.

Mauro Cappellethi7 defende, em seu livro Acesso à Justiça, que como as cortes não são a única forma de solução de conflito, os processualistas devem estudar e encorajar o uso de métodos diferentes que viabilizem o acesso à justiça. Tanto que, na mediação como as próprias partes solucionam a lide, a distância daquele que resolve o problema e daquele que convive com o problema é nula. Consequentemente, a solução provavelmente será adequada as peculiaridades daquele processo.

Na Lei de Mediação estão previstos os princípios da mediação sendo estes: a imparcialidade do mediador, a isonomia entre as partes, a oralidade, a informalidade, a autônoma da vontade das partes, a busca do consenso, a confidencialidade e a boa-fé. Isto significa que o mediador deverá ser alguém que, tal como é o magistrado, não será beneficiado ou prejudicado pela manutenção ou solução do conflito. Ademais, as partes na mediação são colocadas em níveis de igualdade, pois uma não pode sobressair à outa evitando um acordo desigual e/ou injusto.

4 AZEVEDO, André Gomma (org.). Manual de Mediação Judicial. Brasília: Ministério da Justiça e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD, 2013, p.10.5 TARTUCE, Fernanda. Técnicas de mediação. In: SILVA, Luciana Aboim Machado Gonçalves da. (Org.). Mediação de conflitos. São Paulo: Atlas, 2013. In. SILVA, Luciana Aboim Machado Gonçalves da. (Org.) Mediação de conflitos. São Paulo: Atlas, 2013, p.46.6 MORAIS, Jose Luis Bolzan. Mediação e arbitragem: alternativas à jurisdição!. Porto Alegre: Livraria do Ad-vogado, 1999, passim.7 CAPPELLETHI, Mauro. Acesso à justiça. Porto Alegre: Fabris, 1988, passim.

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A oralidade e a informalidade são necessárias, pois as partes precisam se sentis livres para debater o teor do conflito e procurarem suas respectivas soluções sem as formalidades e o rigor do procedimento judicial. Para tanto, as partes têm autonomia de escolherem estar na mediação ou não, só desta forma que podem encontrar a melhor solução.

A confidencialidade é necessária pois, o conteúdo da mediação é de conhecimento do mediador e seus auxiliares apenas, sendo inclusive vedada a revelação do que foi discutido na mediação em função de processos judiciais, de acordo com o art. 30, caput da lei da mediação.

A lei, todavia, põem a salvo os casos em que é constatado crime de ação pública, logo somente nestes casos o mediador está habilitado a falar sobre a mediação para o órgão competente.

Tendo em vista as questões legais e práticas envolvidas na resolução dos conflitos jurídicos verifica-se que a mediação proporciona o acesso à justiça as partes envolvidas na lide.

O AMBIENTE IDEAL PARA A AUTOCOMPOSIÇÃO

Trabalhar com a mediação é uma tarefa árdua, pois no momento em que as partes chegam à sala de audiência, em geral, estão resistentes ao diálogo e tentar fazer um acordo. Isto ocorre, porque até o momento as mesmas estavam em lados opostos, numa disputa processual. Esta pré-disposição ao não dialogo deve ser intermediada pelo mediador, uma vez que o dialogo agressivo ou a não vontade de dialogar interfere na solução do conflito.

Para tanto, é necessário que todo o espaço da mediação seja preparado para receber as partes, possibilitando o restabelecimento do diálogo, bem como pacificação das mesmas para que ambas escutem o outro lado e possam realizar o melhor acordo possível.

Desta forma a doutrina e a própria lei descrevem ambientes ideais para as salas de audiência de mediação. Salas que, por causa de suas disposições, levam às pessoas de forma inconsciente a sensação de tranquilidade, o que facilita o restabelecimento do diálogo.

As salas devem conter uma mesa redonda, com paredes coloridas, a presença de plantas e água. Conforme o guia de conciliação e mediação do CNJ, “a quantidade de salas deve ser estimada de acordo com a demanda local. Sugere-se a colocação de mesas redondas e ambiente agradável (plantas, cores claras, etc), computador e impressora”8.

A cor azul é um exemplo da necessidade de um ambiente diferenciado. Esta cor é importante, pois as pessoas “inconscientemente exprimem as suas emoções, utilizando-se de cromônimos”9.

As cores influenciam nos sentimentos das pessoas. Vale salientar que:

A cor azul é de todas as cores, a mais tranquilizadora. Faz com que o cérebro secrete onze

8 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça 2015. Guia de Conciliação e Mediação Judicial: orientação para ins-talação de CEJUSC. (Brasília/DF: Conselho Nacional de Justiça), p.55.9 ZAVAGALIA, Cláudia. Dicionário e cores. Alfa, revista de linguística. V.50 n.2. 2006. P.25-41. Disponível em:< http://seer.fclar.unesp.br/alfa/article/view/1409/1110>. Acesso em: 12. Out. 2017, p.26.

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hormônios neurotransmissores que possuem ação tranquilizante. Esses hormônios são sinais químicos que podem atuar acalmando todo o corpo10.

A autora Irene Dalichow também aborda o tema e associa o azul a paz e a comunicação além de demonstrar que a cor fornece segurança às pessoas11.

A presença de uma planta na sala também é extremamente importante. A cor verde trazida pelas plantas também auxilia as partes a dialogarem melhor uma vez que representa a busca pela verdade, a harmonia, a conciliação, a abertura e a generosidade. Estes fatores mostram as partes que elas podem se abrir para novas ideias, sem medo de se prejudicarem, e com isto a possibilidade de acordo aumenta consideravelmente12.

Em relação à necessidade de a mesa ser redonda, justifica-se pelo fato de que por ser redonda todas as pessoas estão em pé de igualdade. No Manual de Mediação judicial explica a importante vantagem de a mesa ser redonda, pois permite que as partes sejam dispostas equidistantes entre si e do mediador, retirando o cunho de rivalidade se as partes estivessem em lados opostos ou frente a frente13.

Na mediação, existe a necessidade de ambas as partes se sentirem empoderadas, e a igualdade as auxilia com isto, uma vez que tem intima relação com a ideia de justiça e isto influencia na forma em que o indivíduo se relaciona com os demais indivíduos da sociedade14.

Em decorrência disto, o sentimento de igualdade entre as partes, possibilita que o sujeito da lide se sinta livre para discutir de forma ampla a questão fazendo-se ser ouvido. Quando as partes conseguem expor suas visões e discutirem, a possibilidade de acordo é maior.

O AMBIENTE DISPONÍVEL AO CEJUSC NA CIDADE DE MARINGÁ

Atualmente, o Centro Judiciário de Solução de Conflito e Cidadania (CEJUSC) da Região Metropolitana de Maringá – Foro Central, localiza-se no Fórum no centro da cidade, o que facilita a locomoção das partes, uma vez que, é um local de fácil acesso por meio de transporte público e próximo ao centro comercial da cidade.

Entretanto, o local no qual as audiências são realizadas não segue o modelo ideal. Como há a necessidade de atender vários processos diariamente, o pequeno espaço destinado ao CEJUSC teve que ser partilhado em várias salas pequenas.

10 BOCCANERA, Nélio Barbosa; BOCCANERA, Sulvia Fernandes Borges; BARBOSA, Maria Alves. As cores no ambiente de terapia intensiva: percepções de pacientes e profissionais. Rev. Esc. Enferm USP. v.40. n.3. 2006. p.343-349. Disponível em:< http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v40n3/v40n3a04>. Acesso em: 12 out. 2017, p. 346.11 DALICHOW, Irene; BOOTH, Mike. Aura-soma: A cura pelas cores, plantas e energia de cristais e minerais. Tiradentes: Editora Margarita Schack, 1997, p. 75.12 Ibid. p.74.13 AZEVEDO, André Gomma (org.). Manual de Mediação Judicial. Brasília: Ministério da Justiça e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD, 2013, p.116.14 SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDEIRO, Daniel. Curso de Direito Constitucio-nal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 571.

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Trabalha-se com quatro salas de audiências cíveis e duas de famílias, sendo que estas últimas ocorrem na própria vara da família. As salas cíveis são pequenas e apertadas, não cabendo muitas pessoas quando é necessário e a cor das paredes é amarela e não azul como deveria. Já as salas de família não têm a mesa redonda, o que facilita o diálogo, são parecidas com as salas de audiência do procedimento comum.

Nas salas de mediação cíveis, mesmo quando são duas partes a sala se mostra pequena, pois não possui espaço para acomodar muitas pessoas. Várias vezes os mediadores precisam atrasar um pouco a audiência para buscar cadeiras para as partes e então se empenham a conseguir encaixar todas as cadeiras dentro da sala. Quando as audiências são volumosas dificilmente as partes ficam confortáveis.

Também, deve-se observar que não há decoração nenhuma no ambiente. Em face do baixo orçamento não há como colocar na sala objetos que transmitam tranquilidade. Toda vez que é necessário imprimir uma ata o mediador precisa se ausentar da sala para ir retirar o material impresso na única impressora disponível para o CEJUSC que se encontra na secretaria.

Este último fato é extremamente grave pois normalmente o conciliador realiza a audiência sozinho por não possuir mão-de-obra suficiente no CEJUSC para realizar a audiência nos moldes trazidos pelo CNJ.

O que acontece nestes casos é que as partes ficam sozinhas na sala de audiência em um momento extremamente delicado, em que o conciliador trabalhou pela harmonia das mesmas, o que pode ser facilmente quebrada caso durante esta ausência do conciliador as partes venham a se desentender novamente.

Esta realidade é preocupante, afinal, ao não se sentir confortável no local da mediação a parte pode acabar desistindo de qualquer tentativa de diálogo. O mediador “deve estimular as partes a falarem sobre o conflito, provocando a escuta recíproca e a identificação das posições e interesses das partes”15 mas é impossível que o mesmo cumpra com o seu dever quando as partes não estão em clima de mediação.

A mediação é um instrumento de suma importância na atualidade, tendo em vista que soluciona a lide de forma mais célere e satisfatória. Mas para que a mesma tenha a chance de efetivar a teoria é necessário que a prática observe as peculiaridades do processo.

O CEJUSC de Maringá é composto por mediadores capacitados por cursos do CNJ que se empenham de forma voluntária a facilitar o diálogo das partes. No momento percebe-se que um dos maiores obstáculos entre o acordo e a audiência infrutífera é a ausência de um espaço adequado para as audiências.

15 DUARTE, Lenita Pacheco Lemos. Mediação de conflitos na alienação parental: estudo de caso. In: SILVA, Luciana Aboim Machado Gonçalves da. (Org.). Mediação de conflitos. São Paulo: Atlas, 2013, p.49.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ante o exposto, nota-se que a mediação é sim um importante instrumento processual que auxilia a população a solucionar suas lides de forma menos agressiva quando comparado a um processo judicial. Além disso, é perceptível que a mediação deve cumprir com aquilo que foi determinado pelo próprio CNJ.

Vale salientar que as regras que ordenam a mediação não são meramente processuais. Por ser um procedimento complexo, suas regras envolvem também o desenvolvimento de espaços apropriados para a realização das mediações. Em outras palavras, o legislador se precaveu ao regulamentar a mediação em viabilizar um ambiente tranquilo pelas partes de forma a facilitar o diálogo.

Entretanto, o que vemos na prática é que o CEJUSC foi colocado em um local despreparado para recebe-lo e como consequência o ambiente das audiências é desconfortável tanto para as partes como para o próprio mediador.

O resultado deste desamparo físico é a impossibilidade de realização de mais acordos. Isto porque no momento em que se inicia a audiência as partes ainda estão incomodadas, infelizes e em disputa com o adversário. Este sentimento dificulta o trabalho do facilitador que acaba por muitas vezes dando a audiência como infrutífera sem ter tido uma real chance de auxiliar as partes.

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REFERÊNCIAS

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BRASIL. Conselho Nacional de Justiça 2015. Guia de Conciliação e Mediação Judicial: orientação para instalação de CEJUSC. (Brasília/DF: Conselho Nacional de Justiça).

CAPPELLETHI, Mauro. Acesso à justiça. Porto Alegre: Fabris, 1988.

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Guia de conciliação e mediação. Disponível em: <http://files.comunidades.net/apartamentonaplanta/GUIA_DE_CONCILIACAO_E_MEDIACAO.pdf>. acessado em: 15 nov. 2017.

DALICHOW, Irene; BOOTH, Mike. Aura-soma: A cura pelas cores, plantas e energia de cristais e minerais. Tiradentes: Editora Margarita Schack, 1997.

DUARTE, Lenita Pacheco Lemos. Mediação de conflitos na alienação parental: estudo de caso. In: SILVA, Luciana Aboim Machado Gonçalves da. (Org.). Mediação de conflitos. São Paulo: Atlas, 2013.

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