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Faculdade de Letras UFRJ PATEMIZAÇÃO E REPRESENTAÇÕES DE GÊNEROS NA PUBLICIDADE Giselle Maria Sarti Leal Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-graduação em Letras Vernáculas (Língua Portuguesa), da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Doutor em Letras (Língua Portuguesa). Orientadora: Profa. Dra. Lúcia Helena Martins Gouvêa Rio de Janeiro Maio de 2017

Giselle Maria Sarti Leal Tese de Doutorado apresentada ao ... · Aos meus chefes, Magna, Felipe, Renata, Ana Cristina, Neuza, Márcia , Eliane ... Dra. Lúcia Helena Martins Gouvêa

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Faculdade de Letras

UFRJ

PATEMIZAÇÃO E REPRESENTAÇÕES DE GÊNEROS

NA PUBLICIDADE

Giselle Maria Sarti Leal

Tese de Doutorado apresentada ao Programa de

Pós-graduação em Letras Vernáculas (Língua

Portuguesa), da Universidade Federal do Rio de

Janeiro, como parte dos requisitos necessários à

obtenção do título de Doutor em Letras (Língua

Portuguesa).

Orientadora: Profa. Dra. Lúcia Helena Martins Gouvêa

Rio de Janeiro

Maio de 2017

Faculdade de Letras

UFRJ

PATEMIZAÇÃO E REPRESENTAÇÕES DE GÊNEROS

NA PUBLICIDADE

Giselle Maria Sarti Leal

Tese de Doutorado apresentada ao Programa de

Pós-graduação em Letras Vernáculas (Língua

Portuguesa), da Universidade Federal do Rio de

Janeiro, como parte dos requisitos necessários à

obtenção do título de Doutor em Letras (Língua

Portuguesa).

Orientadora: Profa. Dra. Lúcia Helena Martins Gouvêa

Rio de Janeiro

Maio de 2017

Patemização e representações de gêneros na publicidade

Giselle Maria Sarti Leal

Orientadora: Professora Doutora Lúcia Helena Martins Gouvêa

Redação de tese submetida à Banca do Programa de Pós-Graduação em

Letras Vernáculas da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ –, como parte

dos requisitos necessários para a obtenção do título de Doutor em Letras Vernáculas

(Língua Portuguesa).

Examinada por: _________________________________________________ Presidente, Profa. Doutora Lúcia Helena Martins Gouvêa _________________________________________________ Profa. Doutora Luciana Paiva de Vilhena Leite - Unirio _________________________________________________ Profa. Doutora Rosane Santos Mauro Monnerat – UFF _________________________________________________ Profa Doutora Célia Regina de Barros Mattos - UFRJ

_________________________________________________ Profa Doutora Maria Aparecida Lino Pauliukonis – UFRJ _________________________________________________ Profa Doutora Michelle Gomes Alonso Dominguez – UERJ (suplente) _________________________________________________ Profa Doutora Mônica Tavares Orisini – UFRJ (suplente)

Rio de Janeiro

Maio de 2017

Leal, Giselle Maria Sarti.

Patemização e representações de gêneros na publicidade/ Giselle Maria

Sarti Leal Muniz Alves. – Rio de Janeiro: UFRJ/ Faculdade de Letras, 2017.

xi, 170f.: il.; 31 cm.

Orientadora: Lúcia Helena Martins Gouvêa

Tese (doutorado) – UFRJ/ Faculdade de Letras/ Programa de Pós-

graduação em Letras Vernáculas (Língua Portuguesa), 2017.

Referências Bibliográficas: f. 97-99

1. Teoria Semiolinguística do Discurso. 2. Publicidade. 3. Pathos. 4.

Efeitos patêmicos. 5. Identidades de gêneros. 6. Estereótipos. I.

Gouvêa, Lúcia Helena Martins. II. Universidade Federal do Rio de

Janeiro, Faculdade de Letras, Programa de Pós-graduação em Letras

Vernáculas (Língua Portuguesa). III. Título.

5

Agradecimentos

A Deus, pelo sopro, pelo fôlego, pelo Verbo, pela Vida.

À Professora Lúcia Helena, por confiar em mim e não desistir de mim. Muito mais do

que uma orientadora, uma amiga.

Aos meus familiares, pai, mãe, irmã, pela força, pela âncora, pelo colo, pelo apoio de

toda ordem.

Aos meus amigos, antigos e novos, que me ouviram nos meus dias mais nebulosos e

comemoraram cada etapa junto comigo.

Aos meus chefes, Magna, Felipe, Renata, Ana Cristina, Neuza, Márcia, Eliane e

Janaína, que me compreenderam e me deram o apoio necessário para continuar, sem

nunca perder a humanidade.

Ao meu ex-esposo, Jonas Muniz Alves, que acompanhou quase todo o processo de

“gestação” desta pesquisa, sendo um bom amigo e companheiro. Vivemos uma boa

parceria!

A mim mesma, pela garra que foi obrigada a aparecer e fazer acontecer.

6

A Alice, Deo e Dani.

Aos meus alunos, que foram, que são e que serão.

A Deus, honra e glória.

7

SINOPSE

Análise de marcas patêmicas em

anúncios publicitários de revistas

impressas dirigidas aos públicos

feminino e masculino com vistas à

verificação da relação entre o apelo à

emoção e a construção das identidades

de gênero.

8

RESUMO

PATEMIZAÇÃO E REPRESENTAÇÕES DE GÊNEROS NA PUBLICIDADE

Giselle Maria Sarti Leal

Orientador(a): Profa. Dra. Lúcia Helena Martins Gouvêa

Resumo da Tese de Doutorado submetida ao Programa de Pós-graduação em

Letras Vernáculas (Língua Portuguesa), da Universidade Federal do Rio de

Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Doutor

em Letras (Língua Portuguesa).

Esta pesquisa tem como proposta analisar textos publicitários de duas revistas

impressas, voltadas para os públicos masculino e feminino – Men’s Health e

Women’s Health, respectivamente. Pretende-se examinar o fenômeno

linguístico-discursivo da patemização – processo por meio do qual a emoção

pode ser estabelecida. A análise que se propõe está fundamentada, sobretudo,

na Teoria Semiolinguística do Discurso, preconizada por Patrick Charaudeau,

coadunada aos estudos em Argumentação, de Christian Plantin. Além desses

dois teóricos, buscam-se referências nos campos da Psicologia das emoções,

nos estudos sobre a Linguagem Publicitária e nos estudos acerca das

identidades de gênero. No caso do gênero de discurso publicitário, observa-se

que a dimensão patêmica do discurso se constitui como estratégia basilar da

construção da sua estrutura argumentativa. Optou-se por observar como se dá

o fenômeno discursivo da patemização em função do público-alvo dos anúncios

publicitários, mais especificamente, os públicos masculino e feminino. Buscou-

se, portanto, verificar as ocorrências de índices patêmicos diretos, em uma

análise quantitativa, bem como descrever o processo de patemização como um

todo, em uma análise qualitativa, tendo em vista a sua relação com a

representação das identidades masculina e feminina.

Palavras-chave: Semiolinguística; publicidade; pathos; emoção; identidades de

gêneros

9

ABSTRACT

PATHEMIC EFFECTS AND GENDER

REPRESENTATIONS IN ADVERTISEMENTS

Giselle Maria Sarti Leal

Orientador(a): Profa. Dra. Lúcia Helena Martins Gouvêa

Abstract da Tese de Doutorado submetida ao Programa de Pós-graduação em

Letras Vernáculas (Língua Portuguesa), da Universidade Federal do Rio de

Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Doutor

em Letras (Língua Portuguesa).

The purpose of this research is to analyse advertisements in two printed

magazines, Men’s Health and Women’s Health, respectively. It aims to examine

the linguistic phenomenum of pathemization. The analysis proposed is based,

specially, upon Discourse Semiolinguistics Theory, advocated by Patrick

Charaudeau, together with Argumentation studies, by Christian Plantin. Besides

these two theorists, there are also references to Emotion Psychology,

Adertisement studies and Gender representation. The selection of this linguistic

strategy is due to the great necessity of a more accurate study of emotion

triggering tough discourse, recognizing it as an importante means to achieve

persuasion. In comercial advertising, it has been observed that the pathemic

dimension of discourse constitutes its argumentative structure basis and that

emotion triggering is established differently, according to the target oh the texts,

whether it is male or female. Occurences of direct pathemic terms were counted

in a quantitative analysis, as well as the whole pathemizaion process was

described in a qualitative analysis, focusing its relation with gender identity

representation.

Key-words: Semiolinguistics; advertising; pathos; emotion; gender identities

10

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO 11

2. PRESSUPOSTOS TEÓRICOS 15

2.1. Emoção: delimitando o conceito 15

2.1.1. A retórica das paixões 15

2.1.2. A psicologia das emoções 21

2.2. A Teoria Semiolinguística do Discurso 31

2.2.1. O processo de semiotização do mundo 32

2.2.2. Os componentes linguístico e situacional e a teoria dos sujeitos 35

2.2.3. O contrato de comunicação, os saberes e os imaginários

sociodiscursivos

37

2.2.4. Estratégias e visadas discursivas 42

2.2.5. Os modos de organização do discurso e os comportamentos

enunciativos

51

2.3. Pathos: a presença da emoção no discurso 66

2.3.1. A emoção como objeto de análise no discurso 73

2.3.2. Argumentando emoções, segundo Plantin 84

2.4. Publicidade e multissemioses 88

2.4.1. O gênero de discurso publicitário 88

2.4.2. Multissemioses 91

3. AS REPRESENTAÇÕES DAS IDENTIDADES DE GÊNEROS NA

PUBLICIDADE

98

4. METODOLOGIA 112

5. PUBLICIDADE, PATEMIZAÇÃO E REPRESENTAÇÕES DE

GÊNEROS: A ANÁLISE

120

5.1. O corpus sob uma perspectiva qualitativa 120

5.2. O corpus sob uma perspectiva quantitativa 134

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS 163

7. REFERÊNCIAS 167

ANEXO 172

11

1. INTRODUÇÃO

Esta pesquisa tem como proposta analisar anúncios publicitários de

revistas impressas de grande circulação, voltadas para os públicos masculino e

feminino – a Men’s Health e Women’s Health, respectivamente. Pretende-se

examinar o fenômeno linguístico-discursivo da patemização – processo por meio

do qual a emoção pode ser estabelecida.

A patemização constitui-se como estratégia linguístico-discursiva cuja

finalidade é tocar na afetividade do interlocutor, provocando nele um efeito

emocional que o leve à persuasão. Trata-se de uma estratégia fundamental no

contrato de comunicação publicitário, uma vez que, mediante a referência aos

imaginários sociodiscursivos do consumidor em potencial, institui-se uma

identificação entre ele e o objeto de anúncio, ratificando-se ou propondo-se a

modificação de representações de identidades. Pretende-se, portanto,

comprovar, a tese de que o apelo à emoção, na publicidade das revistas

elencadas, é responsável por construir as representações dos gêneros

masculino e feminino que se quer sancionar ou difundir.

A análise que se propõe está fundamentada, sobretudo, na Teoria

Semiolinguística do Discurso, preconizada por Patrick Charaudeau (1992; 2004;

2007a; 2007b; 2007c; 2008a; 2008b; 2010a; 2010b), coadunada aos estudos em

Argumentação, de Christian Plantin (1998a; 1998b; 2010a; 2010b), à Psicologia

das emoções, de Daniel Goleman (2001), aos estudos sobre a Linguagem

Publicitária, de Torben Vestegaard e Kim ScrhØder (2004), Neli de Carvalho

(2007), e Rosane Monnerat (2003; 2010), ao conceito de multissemioses,

encontrado em Bill Cope e Mary Kalantzis (2000; 2012) e Gunther Kress e Theo

Van Leeuwen (2006) e aos estudos de gênero, de Conceição Nogueira e Luísa

Saavedra (2007) Luci Banks-Leite (2007), Dylia Lysardo-Dias (2007), Denise

Sant´Anna (2014) e, ainda, novamente, Vestegaard e SchrØder (2004).

Para justificar a escolha desta temática, devem-se levar em consideração

os seguintes aspectos: 1) o emprego da patemização; 2) o gênero de discurso

publicitário; e 3) as representações de gêneros.

Charaudeau afirma que, para que o ato de linguagem aconteça, faz-se

necessário que o sujeito comunicante empregue estratégias para entrar em

contato com seu interlocutor, para impor sobre ele sua imagem de enunciador,

12

captando, assim, sua atenção. Essas estratégias podem ser de diversas ordens,

e seu emprego depende da situação de comunicação na qual o evento

enunciativo se inscreve. A escolha do fenômeno da patemização, enquanto uma

dessas estratégias, justifica-se, então, em função da necessidade de seu

detalhamento na construção de diferentes cenas enunciativas, dentre as quais

se insere o discurso propagandístico.

A escolha do gênero de discurso publicitário, por seu turno, deve-se ao

fato de ele configurar-se num dispositivo comunicativo bastante propício ao

emprego de estratégias patemizantes. Por se tratar de um gênero discursivo

imerso num circuito mercadológico, não tendo um compromisso com a verdade,

a argumentação puramente lógica pode não ter força persuasiva suficiente para

levar o interlocutor ao consumo do objeto de anúncio. Dessa forma, faz-se

necessário fundamentar o discurso a partir de uma argumentação das emoções,

recorrendo-se, então, a recursos patêmicos.

Como é notório que a publicidade se vale de discursos socialmente

difundidos, dentre os quais estão os lugares comuns e os estereótipos, optou-se

por observar como se dá o fenômeno discursivo da patemização em função do

público-alvo dos anúncios publicitários, mais especificamente, os públicos

masculino e feminino. Buscou-se, portanto, verificar as ocorrências de marcas

linguístico-discursivas de patemização, analisando-se em que medida sua maior

ou menor recorrência se relaciona com as representações identitárias de

gêneros.

Quanto às contribuições desta pesquisa para o estudo da linguagem,

espera-se colaborar para: 1) o estudo do fenômeno da patemização, uma vez

que se elucida o seu funcionamento e os efeitos de sentido que podem suscitar

nos enunciados, o que se mostra adequado ao campo da Análise do Discurso e

da Argumentação; 2) o estudo do discurso publicitário, pertencente a um gênero

que acompanha as demandas e mudanças das relações sociais; 3) o estudo das

identidades de gêneros, temática que tem estado em voga nas mais diversas

esferas sociodiscursivas; e 4) o processo de ensino-aprendizagem, uma vez que

a Teoria Semiolinguística do Discurso, tendo como objeto de análise, as marcas

linguísticas da enunciação, está sempre, ainda que indiretamente, a serviço da

prática docente. Ademais, espera-se estimular a realização de novas pesquisas

na área.

13

As hipóteses que norteiam esta análise, todas, de certo modo,

relacionadas ao conceito de estereótipos, estão assim apresentadas:

(1) O fenômeno da patemização constituir-se-ia em base para a

construção do texto pertencente ao gênero discursivo publicitário.

(2) A presença das estratégias de patemização seria mais marcada nos

anúncios para o público feminino do que para o masculino.

(3) As estratégias patêmicas empregadas em anúncios para o público

masculino estariam fundamentadas predominantemente no

componente imagético do texto publicitário, enquanto as estratégias

patêmicas direcionadas ao público feminino estariam fundamentadas

predominantemente no componente verbal do texto publicitário.

(4) O percentual de palavras que descrevem de modo transparente

emoções empregado para o público feminino seria maior do que para

o masculino.

(5) Entre as palavras que descrevem de modo transparente emoções

(nomes e verbos), o percentual de verbos seria maior do que o de

nomes, nos anúncios voltados para o público feminino, enquanto o

percentual de nomes seria maior do que o de verbos, nos anúncios

voltados para o público masculino.

Eis como o texto está organizado:

Na Introdução é apresentada a temática da pesquisa, bem como se

justifica a sua escolha e a sua contribuição para o campo de conhecimento em

que se insere. No capítulo (2), os Pressupostos Teóricos, são apresentadas as

teorias que norteiam a investigação, iniciando-se pela delimitação do conceito

de emoção, a partir dos estudos de Daniel Goleman e da Retórica de Aristóteles;

em seguida, passa-se à Teoria Semiolinguística do Discurso, de Patrick

Charaudeau, seguindo-se a apresentação do fenômeno da patemização;

seguem-se, então as especificações acerca do gênero de discurso publicitário,

marcado pelas multissemioses. O capítulo (3) apresenta a noção de

representações de identidades de gêneros, com base no conceito de

estereótipos. A Metodologia, que corresponde ao capítulo (4), expõe o tipo de

14

corpus selecionado, os tipos de targets das revistas e a trajetória de análise que

se optou percorrer.

O capítulo (5) é referente à análise do corpus, em que são apresentados

os resultados obtidos, sob uma perspectiva qualitativa, através da qual são

examinadas quatro peças publicitárias, no sentido de verificar a presença da

patemização, bem como cotejar como essa estratégia é empregada para o

público masculino e feminino, dialogando-se com a tese que se procura aferir.

Já sob uma perspectiva quantitativa, foram contabilizados termos pertencentes

a duas categorias patêmicas: palavras que expressam de modo transparente

emoções, e princípio de avaliação, identificado pela presença de termos

avaliativos passíveis de provocar emoção. Foi também analisada a frequência

de anúncios em que predomina o componente imagético sobre o verbal.

Procurar-se-á comprovar, ou não, cada uma das hipóteses estabelecidas, de

modo a verificar a pertinência da tese proposta na pesquisa.

15

2. PRESSUPOSTOS TEÓRICOS

2.1. Emoção: delimitando o conceito

Esta pesquisa não objetiva analisar a emoção enquanto fenômeno

fisiológico e/ou psíquico – não sendo, portanto, de cunho neuropsicológico –;

tampouco busca analisá-la enquanto expressão de uma coletividade – não se

tratando, também, de um estudo de cunho sociológico. Apesar disso, não se

pode deixar de reconhecer a necessidade de recorrer a essas áreas do

conhecimento, no intuito de delimitar o conceito de emoção com o qual se

pretende lidar. Ainda que se compreenda tratar-se de um conceito que evoca

uma discussão antiga, ampla e bastante controversa, identificar a

intencionalidade emotiva no discurso – como aqui se pretende – depende da

especificação não apenas do que se entende por emoção, como também de um

paradigma emocional ao qual se possa remeter na análise dos dados coletados.

Desde que fundamentada, principalmente, na Teoria Semiolinguística do

Discurso, preconizada por Patrick Charaudeau (1992, 2003, 2004, 2007, 2008,

2009, 2010), o foco desta análise está voltado para o estudo dos processos

discursivos que podem desencadear as emoções na publicidade, considerando-

se estratégias linguístico-discursivas empregadas por um dado enunciador,

visando a causar efeitos patêmicos1 em seu destinatário. O autor, no entanto,

admite que, por ser uma noção central em diferentes mecanismos, “emoção”

torna-se um conceito interdisciplinar (CHARAUDEAU, 2010, p.26). A delimitação

desse conceito, portanto, será feita com base em alguns pressupostos

encontrados não só na psicologia e na sociologia, como também na filosofia.

2.1.1. A Retórica das paixões

1 Charaudeau, na esteira da retórica de Aristóteles, opta por empregar em sua teoria o termo pathos, e seus derivados, em vez de emoção, visando a ratificar que o foco de sua análise não é o sentimento desencadeado, mas a possibilidade de desencadeamento por meio do discurso – o efeito patêmico.

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No campo da filosofia, desde a antiguidade grega, corpo, mente e alma

têm sido investigados. Retomar-se-ão, contudo, nesse contexto, algumas

noções estabelecidas apenas pelo filósofo Aristóteles, uma vez que sua teoria

retórica seja considerada como o fundamento para os estudos do discurso

argumentativo e persuasivo, sendo recuperada por inúmeros estudiosos da

linguagem, dentre eles Charaudeau. Ele a menciona, ao situar sua proposta de

análise – à qual esta investigação se filia –, justificando o uso do termo “pathos”,

em vez de “emoção”: “Isso me permite, por um lado, inserir a análise do discurso

das emoções na filiação da retórica que desde Aristóteles trata os discursos em

uma perspectiva de visada e de efeitos” (CHARAUDEAU, 2010, p.35).

Aristóteles, em sua obra Retórica, delineia uma teoria da argumentação,

fundamentada em provas persuasivas. Para ele, a retórica teria por função traçar

o caminho em direção à persuasão sobre qualquer questão dada

(ARISTÓTELES, 2007).

O estagirita apresenta três tipos de provas persuasivas a que um orador

pode recorrer para construir sua argumentação, visando à adesão dos ouvintes,

quais sejam, o ethos, o logos e o pathos. Esta última prova é a que abrange o

aspecto emocional do discurso, logo, a que interessa a esta pesquisa, embora

se possa afirmar que as três sejam interdependentes, e tratar de uma implica

tratar, também, das outras, mesmo que indiretamente.

A prova persuasiva do ethos diz respeito ao caráter do orador. Ao

apresentar-se diante de sua plateia, ele deve projetar uma imagem de si mesmo

que inspire confiança. A persuasão a partir de seu caráter, por seu turno, pode

ser gerada mediante três elementos, que se constituem em três tipos de ethe:

(a) a phónesis, ou a prudência, relativa ao intelecto e à faculdade da razão; (b)

a areté, ou virtude (honestidade), relativa ao aspecto moral; e (c) a eunóia, ou

benevolência, relativa ao comportamento respeitoso perante os ouvintes.

Já a prova persuasiva do logos refere-se à produção da convicção de

verdade na plateia, por meio do ordenamento lógico do material discursivo,

valorizando-se seu caráter demonstrativo. A prova persuasiva do pathos, por fim,

diz respeito à incitação das paixões dos ouvintes, buscando-se, no movimento

persuasivo, respostas emocionais determinadas2.

2 Charaudeau, associa alguns conceitos de sua teoria semiolinguística do discurso a essas três provas persuasivas, que serão apresentados adiante.

17

Veja-se como o filósofo define, então, o aspecto patêmico do discurso:

(...) todos aqueles sentimentos que tanto alteram os homens quanto afetam seus julgamentos, e que são acompanhados também pelo prazer e pela dor, tais como a raiva, a compaixão, o medo e semelhantes, bem como seus opostos (ARISTÓTELES, 2007, Livro II, cap. 1, p.823).

Aristóteles reconhece, assim, que, ao lado do trabalho argumentativo no

qual o orador se deve engajar, no sentido de construir um “discurso

demonstrativo e confiável”, a partir do ethos e do logos, há outro componente,

igualmente importante, que se refere ao trabalho com a disposição emotiva da

plateia. Este consiste em conduzir o auditório a um “estado psicológico

adequado” ao objetivo persuasivo proposto, tendo em vista que a forma como

as pessoas se sentem pode afetar seus modos de avaliar a realidade que lhes é

apresentada:

Quando as pessoas se sentem afáveis e tolerantes, elas pensam um determinado tipo de coisa, mas quando estão furiosas e hostis, pensam essa mesma coisa numa intensidade diferente ou pensam em algo totalmente diferente. Assim, durante um julgamento, caso elas estejam afáveis para com o réu, julgam que ele cometeu um pequeno delito, se tanto. Porém, caso estejam hostis, elas assumem uma posição oposta (Livro II, cap 1, p. 81).

Como se vê, a persuasão4, ou a influência nos julgamentos dos ouvintes,

não se limita ao domínio das técnicas de oratória na elaboração de argumentos,

mas abrange também a construção da credibilidade do orador por meio de sua

postura e de sua capacidade de suscitar estados psicológicos nos ouvintes,

endossando, assim, o ponto de vista defendido por ele (MENEZES E SILVA,

2010, p.3).

As emoções, segundo Aristóteles, constituem-se em enunciados da

argumentação retórica, ao lado – e não abaixo 5 – do aspecto racional do

3 Foi utilizada a tradução de Marcelo Silvano Madeira, publicada pela editora Rideel, em 2007 (a partir da versão inglesa da obra, por John Veitch, LL. D.) p. 82. 4 Entende-se, aqui, a persuasão num sentido que difere dos sentidos de argumentação, de sedução e de retórica. Persuadir envolve o uso de técnicas para levar a crer, induzir e convencer um indivíduo de determinada ideia, afetando seu julgamento; argumentar envolve o encadeamento lógico de justificativas para uma determinada tese que se pretende provar como verdadeira; seduzir relaciona-se com a supressão do raciocínio lógico e com a adesão de uma proposta por impulso; e a Retórica relaciona-se com o uso de técnicas para o bem falar. 5 A relação entre emoção e razão será contemplada na seção 3.3.

18

discurso, sendo, portanto, o uso da linguagem afetiva uma premissa da oratória

tanto quanto o uso da demonstração (MENEZES e SILVA, 2010, p.3).

A partir dessa perspectiva, o filósofo procede a uma análise de alguns

tipos de emoções, relacionando-as em pares opositivos. Ele organiza suas

considerações em torno de três eixos, que devem ser observados por parte do

orador: (1) o estado de espírito em que a plateia se encontra; (2) a quem se dirige

esse estado de espírito; e (3) as circunstâncias desse estado de espírito. São

estas as emoções examinadas, em função desses três eixos:

Raiva Calma

Amizade Inimizade

Medo Confiança

Vergonha Cinismo

Bondade Crueldade

Compaixão Indignação

Inveja Emulação

QUADRO 1 - EMOÇÕES SEGUNDO ARISTÓTELES

Outra noção exposta por Aristóteles, relevante para a análise do discurso

patêmico, refere-se à existência de duas categorias de argumentos retóricos que

podem ser empregados – os entimemas e os exemplos. Entimemas são

espécies de silogismos, em que se deduz algo a partir de premissas já

conhecidas pela plateia.Exemplos, por seu turno, baseiam-se em fatos que já

ocorreram um determinado número de vezes ou podem ser criados pelo orador.

Interessa olhar mais de perto para o raciocínio entimemático, pois a construção

do pathos no discurso está a ele relacionada.

Argumentos baseados em entimemas guardam estreita ligação com a

noção de tópicas, também recuperada por Charaudeau (2010) em sua análise.

De acordo com Miranda (2010, p.89), as tópicas podem ser definidas como

“lugares-comuns em questões relacionadas a diferentes disciplinas que

pertencem a diferentes campos do saber”. Pode-se provocar emoção nos

ouvintes mediante a referência – direta ou indireta – a determinadas tópicas cujo

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potencial patemizante seja conhecido. Na publicidade, as tópicas da felicidade e

do prazer são predominandes.

Para ilustrar a presença das provas persuasivas no discurso publicitário,

segue-se o exemplo (1) seguinte, extraído do corpus.

FIGURA 1 - WOMEN'S HEALTH - JUL/2012

20

Quanto à prova persuasiva referente ao caráter do orador, pode-se

observar a presença de um ethos eunoico, que representa a empresa Nivea,

benevolente, respeitoso para com seu interlocutor. Isso pode ser evidenciado

pelo enunciado: “A NIVEA sempre foi fascinada por pele”. Criou o primeiro

hidratante do mundo...”

O enunciador coloca-se numa posição de benfeitor, oferecendo cuidados

para a pele da leitora do anúncio, consumidora em potencial. Procura despertar

nela, por sua vez, um sentimento de proteção e confiança. Pode-se construir o

raciocínio entimemático: Se a Nivea criou o primeiro hidratante do mundo, é a

empresa de cosméticos mais antiga no ramo, logo, deve ser confiável. Além

disso, o enunciado central – “Fascinação por todos os tipos de pele” – evoca no

destinatário da mensagem o sentimento do amor à pele, que é compartilhado

com a empresa. A Nivea produz os melhores hidratantes porque, além de ser a

mais antiga no ramo e criar tecnologias inovadoras – como a tecnologia “Hydra

QI” – sente (experimenta), acima de tudo, “fascinação”, prazer pelo que faz, o

que representa o aspecto patêmico do texto, ou a prova persuasiva do pathos.

Vale ressaltar que esse traço patêmico ganha destaque a partir dos recursos

tamanho da fonte e posição do sintagma: o enunciado “Fascinação por todos os

tipos de pele” foi escrito em letras maiores e ocupa a posição central da página.

No que diz respeito à prova persuasiva do logos, ou a disposição do

discurso, como já foi mencionado, tem-se uma argumentação baseada na

tradição da empresa no mercado. No canto superior esquerdo da página,

apresenta-se a idade da empresa – 100 anos – o que sugere um alto grau de

experiência, uma marca consolidada. Opera-se com a ideia de que quanto mais

antiga uma empresa é, mais experiente se torna e mais desenvolvidos são seus

produtos. Essa ideia é ratificada pela menção da criação do primeiro hidratante

do mundo6.

Para descartar uma possível contra-argumentação de que, por ser antiga,

a empresa poderia estar ultrapassada, há, ainda, a menção da tecnologia

inovadora – e exclusiva – “hydra QI”, que hidrata a pele de dentro para fora, por

24horas. Dessa forma, as informações destacadas colocam a Nivea no topo das

6 Sabe-se que o conteúdo imagético do anúncio muito corrobora o apelo emocional pretendido pela instância enunciadora, mas isso será tratado adiante.

21

empresas de cosméticos no quesito confiabilidade e eficácia, donde se conclui

que deva ser escolhida pelos consumidores.

2.1.2. A psicologia das emoções

Além dos conceitos oriundos do campo da Retórica, busca-se, também,

no campo da Psicologia, a definição e a categorização das emoções, tomando-

se por base a proposta de Daniel Goleman, em sua obra Inteligência emocional:

a teoria revolucionária que redefine o que é ser inteligente (2001). A teoria da

inteligência emocional foi, na verdade, desenvolvida por Peter Salovey, na

década de 90, tendo sido, então, recuperada e aperfeiçoada por Goleman.

O estudioso define “emoção”, primeiramente, como “impulsos legados

pela evolução, para uma ação imediata, para planejamentos instantâneos que

visam a lidar com a vida” (GOLEMAN, 2001, p.20). O autor faz referência,

inclusive, à raiz latina da palavra, movere – “mover” – que, como prefixo ‘e-‘ a

ela adicionado, denotador de afastamento, formaria um vocábulo com o sentido

de propensão para um agir imediato – ou mover para longe. Nessa perspectiva,

ele traz uma segunda definição em que emoção pode referir-se “a um sentimento

e seus pensamentos distintos, estados psicológicos e biológicos, e a uma gama

de tendências para agir. Há centenas de emoções, juntamente com suas

combinações, variações, mutações e matizes” (GOLEMAN, 2001, apêndice A).

Quanto às possíveis categorizações das emoções, o autor retoma uma

polêmica existente entre alguns teóricos, que diz respeito à existência ou não de

emoções primárias e secundárias, bem como quais seriam umas e outras. Ele

menciona um trabalho pioneiro realizado por Paul Ekman (1978; 2003) 7 ,

segundo o qual as expressões faciais de quatro emoções – medo, ira, tristeza e

alegria – seriam reconhecidas por culturas de todo o mundo, inclusive por povos

intocados pela cultura letrada. Seu caráter universal, então, justificaria que

fossem as quatro consideradas como emoções básicas, a partir das quais outros

estados psicológicos surgiriam e se combinariam.

7 Este pesquisador publicou, em 1978, seu trabalho acerca das expressões faciais – the Facial Action Coding System (FACS) – juntamente com W. Friesen. Em 2003, a obra foi revisada, para a qual J. Hager contribuiu como terceiro autor. Informações extraídas do site <http://www.paulekman.com/paul-ekman/> Acesso em 05/06/2015, às 11h48.

22

Goleman (2001, apêndice A), na esteira do pensamento de Ekman,

admite as emoções “em termos de famílias ou dimensões”, que, por sua vez,

teriam um núcleo básico, transmutando-se em estados de espírito (que, para ele,

são mais contidos e duradouros do que as emoções em si). Além disso,

reconhece também os temperamentos, enquanto disposições para evocar

determinadas emoções, e os distúrbios emocionais, que seriam passíveis de

tratamento clínico.

Com base na perspectiva desse autor, apresenta-se, no quadro a seguir,

uma seleção de emoções a serem consideradas na análise do discurso patêmico

na publicidade impressa em revistas. Elas estão distribuídas entre emoções

básicas e seus possíveis matizes. Ressalte-se, entretanto, que essa lista não

esgota as possibilidades de variações e combinações. São termos importantes,

na medida em que denotam explicitamente emoções, sendo, portanto,

considerados como categorias de análise dos dados, observando-se se outras

variedades de emoções são também evocadas a partir das estratégias

patêmicas empregadas nos anúncios publicitários selecionados. Serão também

observados outros termos e enunciados que possam, mesmo que indiretamente,

fazer referência a estes ou outros tipos de emoções.

Famílias de emoções

Emoções

básicas

Matizes

Ira Fúria

Revolta

Ressentimento

Raiva

Exasperação

Indignação

Vexame

Acrimônia

Animosidade

Aborrecimento

Irritabilidade

Hostilidade

Ódio

Violência

Tristeza Sofrimento

Mágoa

Desânimo

Desalento

Melancolia

Autopiedade

Solidão

Desamparo

Desespero

Depressão

Medo Ansiedade

Apreensão

Nervosismo

Preocupação

Consternação

Cautela

Escrúpulo

Inquietação

Pavor

Susto

Terror

Fobia

Pânico

23

Prazer Felicidade

Alegria

Alívio

Contentamento

Deleite

Diversão

Orgulho

Prazer sensual

Arrebatamento

Gratificação

Satisfação

Bom humor

Euforia

Êxtase

Amor Aceitação

Amizade

Confiança

Afinidade

Dedicação

Adoração

Paixão

Surpresa Choque

Espanto

Pasmo

Maravilha

Nojo Desprezo

Desdém

Antipatia

Aversão

Repugnância

Repulsa

Vergonha Culpa

Vexame

Mágoa

Remorso

Humilhação

Arrependimento

Mortificação

Contrição

QUADRO 2- EMOÇÕES SEGUNDO GOLEMAN (2001, APÊNDICE A)

Veja-se o anúncio (2) a seguir, extraído do corpus, que ilustra a presença

de termos de emoção considerados por Goleman (2001).

24

FIGURA 2 - MEN'S HEALTH - OUT/2013

Chama a atenção, no enunciado central do anúncio, o termo “paixão”, em:

“Venha conhecer produtos que inspiram sua paixão por Fitness”. Segundo a

tabela proposta por Goleman (2001), esse vocábulo seria um dos matizes da

25

emoção básica “amor”. Essa “paixão” é “inspirada” no texto, por meio da imagem

e descrição dos itens anunciados:

• O kit 10kg, “para trabalhar os músculos dos braços, ombros e peitorais”;

• A camiseta BT, que “absorve e elimina a transpiração”, além de ter “estilo

atlético”; e

• A bermuda BT, confeccionada em “moleton fino, flexível e suave”.

A descrição dos três produtos apresenta atributos que justificariam a

inspiração do leitor apaixonado por fitness, o que o levaria a buscar na loja

Decathlon a satisfação dessa “paixão”, seguindo-se, então, o esquema

argumentativo: Se você é apaixonado por fitness, logo tem de comprar na

Decathlon. O sentimento “paixão” não somente está explícito no texto, como

também é um efeito patêmico visado pela instância enunciadora no seu

interlocutor.

Confrontando-se a tabela 2 com a tabela 1, extraída do texto de

Aristóteles, pode-se observar que apenas as emoções raiva, medo e vergonha

coincidem como emoções consideradas básicas. Além disso, Goleman não

opera com a ideia de pares opositivos de emoções. Deve-se ressaltar, contudo,

conforme já foi explicitado, que as classificações apresentadas pelos dois

autores servirão de referência para a análise dos dados e, desse modo, justifica-

se a seleção dos vocábulos denotadores de estados qualitativos que, aqui, são

considerados emoções e que, portanto, correspondem ao efeito visado pela

instância de enunciação dos textos elencados.

Para melhor sistematização, nos quadros seguintes apresenta-se um

cruzamento entre ambas as categorizações de emoções, seguindo-se o princípio

descrito por Goleman (2001), em que as emoções são divididas em emoções

básicas e seus matizes. Um dicionário de sinônimos online 8 foi utilizado,

também, para ampliar o repertório de vocábulos que denotam sentimentos,

relativos àqueles contemplados por Goleman e Aristóteles. As emoções básicas

indicadas pelos autores foram reunidas seis grupos, em função de alguma

semelhança que tenham entre si. Essa proximidade é, de modo geral,

8 Disponível em http://www.sinonimos.com.br/

26

evidenciada pela recorrência de termos considerados nuances das emoções

básicas, que estão identificados com as mesmas cores9. Observou-se, assim,

por exemplo, que inimizade – emoção contemplada por Aristóteles – e nojo –

emoção contemplada por Goleman – teriam, como matizes em comum, as

emoções antipatia, aversão e ojeriza. Observem-se os quadros.

IRA EMULAÇÃO INDIGNAÇÃO INIMIZADE NOJO

aborrecimento antagonismo Aversão animosidade antipatia

acrimônia competição Desprezo antagonismo asco

animosidade concorrência Fúria antipatia aversão

arrebatamento estímulo Ira aversão desdém

cólera impulso Ódio desarmonia desprezo

enfuriamento incentivo Raiva desavença enjoo

enraivecimento rivalidade Repulsa hostilidade ojeriza

exaltação

Revolta ódio repugnância

exasperação

odiosidade repulsa

fúria ojeriza

furor rancor

gana rixa

hostilidade zanga

indignação

irritabilidade

ódio

raiva

rancor

ressentimento

revolta

sanha

vexame

violência

zanga QUADRO 3 - EMOÇÕES BÁSICAS E MATIZES 1 (ARISTÓTELES X GOLEMAN)

9 Embora se reconheça que as cores também têm valor informativo, a escolha destas, que identificam as nuances emocionais, foi motivada apenas pelo intuito de estabelecer semelhança e contraste entre os termos.

27

TRISTEZA VERGONHA COMPAIXÃO

abatimento Arrependimento piedade

aflição Aviltamento ternura

amargura Constrangimento condolência

angústia Contrição dó

autopiedade Culpa pena

consternação Demérito misericórdia

depressão Desgraça clemência

desalento Desonra pesar

desamparo Embaraço dor

desânimo Humilhação comiseração

desconsolo Mágoa

desepero Mortificação

desesperança Pudor

desgosto Recato

desolação Recolhimento

dissabor Remorso

dor Reserva

esmorecimento Retraimento

infortúnio Timidez

languidez Vexame

luto

mágoa

melancolia

pesar

sofrimento

solidão QUADRO 4 - EMOÇÕES BÁSICAS E MATIZES 2 (ARISTÓTELES X GOLEMAN)

AMOR AMIZADE BONDADE COMPAIXÃO

aceitação afeição Altruísmo clemência

admiração afeto Amabilidade comiseração

adoração amor Beleza condolência

afabilidade apego Beneficência dó

afeição apreço benevolência dor

afeto benevolência Benignidade misericórdia

28

afinidade camaradagem Caridade pena

amizade cordialidade Clemência pesar

apego estima Compaixão piedade

apreço fraternidade Cortesia ternura

ardor simpatia Delicadeza

atenção ternura Educação

atração

Filantropia

bem-querer Fineza

benevolência generosidade

carinho Gentileza

chama humanitarismo

confiança Indulgência

cuidado longanimidade

culto Piedade

dedicação Ternura

desejo

devoção

diligência

Estima

Fascínio

Fidelidade

Fraternidade

Interesse

Paixão

Respeito

Simpatia

Ternura

Veneração

Zelo QUADRO 5 - EMOÇÕES BÁSICAS E MATIZES 3 (ARISTÓTELES X GOLEMAN)

MEDO SURPRESA

amedrontamento Abalo

ansiedade admiração

apavoramento assombro

apreensão Choque

aterramento Comoção

cautela Confusão

consternação Emoção

covardia Espanto

dúvida estranheza

escrúpulo maravilha

fobia Pasmo

29

fraqueza sobressalto

frouxidão Susto

horror

incerteza

inquietação

nervosismo

pânico

pavor

preocupação

receio

susto

temor

terror QUADRO 6 - EMOÇÕES BÁSICAS E MATIZES 4 (ARISTÓTELES X GOLEMAN)

PRAZER CALMA CONFIANÇA

agrado bonança certeza

alegria calmaria convicção

alívio equilíbrio credibilidade

aprazimento mansidão esperança

arrebatamento paciência Fé

bem-estar paz firmeza

bom humor quietude força

contentamento relaxamento otimismo

deleitação remanso segurança

deleite repouso

delícia serenidade

desejo silêncio

desfastio sossego

distração tranquilidade

diversão vagar

entretenimento

entusiasmo

euforia

êxtase

exultação

felicidade

gosto

gozo

gratificação

jovialidade

júbilo

30

orgulho

prazer sensual

regalo

regozijo

satisfação QUADRO 7 - EMOÇÕES BÁSICAS E MATIZES 5 (ARISTÓTELES X GOLEMAN)

CRUELDADE CINISMO INVEJA

atrocidade arrogância ambição

brutalidade desplante avidez

desumanidade depravação ciúme

frieza descaramento cobiça

impiedade descaro desejo

mal desfaçatez ganância

maldade desrespeito invídia

malícia falsidade sofreguidão

malignidade hipocrisia

malvadeza imoralidade

perversidade Impudor

tortura Indecência

violência Insolência

Mordacidade

Perversão

Safadeza

Sarcasmo QUADRO 8 - EMOÇÕES BÁSICAS E MATIZES 6 (ARISTÓTELES X GOLEMAN)

É possível perceber, mediante a análise dos quadros acima, que algumas

emoções básicas assemelham-se muito a outras, como ocorre com amor e

amizade, cuja interseção de matizes pode ser evidenciada pela recorrência de

nove termos em comum. Essa aproximação é, também, visível entre as emoções

ira e indignação, em que se observa a sobreposição de matizes a partir da

recorrência de cinco termos em comum. No caso da emoção compaixão, notou-

se que havia interseções tanto com o grupo do amor-amizade-bondade quanto

com o agrupamento tristeza-vergonha, tendo matizes em comum com ambos,

como o termo piedade.

Cabe ressaltar, entretanto, que a sobreposição das nuances não foi o

único critério para agrupar as emoções básicas. Como se vê, no grupo medo-

surpresa há apenas uma recorrência (do matiz susto) e nos grupos prazer-

31

calma-confiança e crueldade-cinismo-inveja não há termos em comum. O

agrupamento se deu, portanto, em função dos traços seguintes: (-) conhecido,

para medo/surpresa; (+) positivo para prazer/ calma/ confiança; e (-) positivo e

(+) intencional para crueldade/ cinismo/ inveja.

Tanto medo quanto surpresa constituem-se como emoções resultantes do

trato com eventos desconhecidos, inesperados. Prazer, calma e confiança, por

seu turno, são termos que remetem a emoções que se relacionam ao bem-estar,

sendo, portanto, (+) positivas para os indivíduos que as experimentam.

Crueldade, cinismo e inveja, por fim, são termos que se referem a emoções (-)

positivas (ou negativas) e (+) intencionais, ou seja, envolvem desejo e ação

desfavoráveis e premeditados em relação a outrem.

Segue-se, assim, a exposição da Teoria Semiolinguística do Discurso, a

partir do que se esclarecerá o objeto de estudo.

2.2. A teoria semiolinguística do discurso

Nesta seção, serão apresentados os conceitos relacionados à Teoria

semiolinguística do discurso (TSD), preconizada por Patrick Charaudeau (1996,

2007a, 2007b, 2007c ,2008a, 2008b, 2009, 2010a, 2010b, 2011a, 2011b), que

norteiam majoritariamente o tratamento dado aos textos do corpus. Tratar-se-á,

portanto, dos seguintes tópicos: (i) o processo de semiotização do mundo; (ii) o

ato de linguagem como encenação; (iii) dimensões interna e externa do ato de

linguagem; (iv) os sujeitos da enunciação; (v) situação de comunicação; (vi)

contrato de comunicação; (vii) discurso; (viii) modos de organização do discurso;

(ix) comportamentos enunciativos; (x) estratégias discursivas; (xi) imaginários

sociodiscursivos(xii) visadas discursivas; (xiii) a patemização.

A TSD se constitui como uma das propostas teórico-metodológicas no

escopo da Análise do Discurso. Charaudeau (1996, p. 5) afirma que essa

proposta configura “um projeto global que tenta ligar os fatos da linguagem entre

si segundo sua dimensão linguística, psicológica e sociológica”. Todo o

delineamento da TSD, portanto, gira em torno da noção de que os significados

no discurso são construídos mediante dois componentes: o linguístico –

operando com o material verbal – e o situacional – operando com o material

32

psicossocial, definindo os interactantes como atores sociais e sujeitos

enunciativos (CHARAUDEAU, 1996, p. 6).

2.2.1. O processo de semiotização do mundo

O processo de construção dos significados é identificado por Charaudeau

(2007a, p. 13-14) como um duplo processo de semiotização do mundo,

envolvendo dois fenômenos, a saber: a transformação e a transação. O

fenômeno da transformação é aquele em que um sujeito falante representa para

si mesmo as coisas e os seres do mundo, transformando, assim, o “mundo a

significar” em “mundo significado”. Trata-se de um processo em que o sujeito

identifica e qualifica os seres, atribuindo-lhes ações e estabelecendo relações

causais entre os fatos.

O fenômeno da transação, por seu turno, é aquele em que o sujeito falante

representa para o outro, as coisas e os seres do mundo já transformados. Esse

“mundo significado” é transformado, então, em objeto de troca com outro(s)

sujeito(s), assumindo este(s) o papel de destinatário(s) do projeto de fala. Para

isso, esse projeto deve obedecer a quatro princípios, que envolvem: (a) a

alteridade, ou o reconhecimento e a legitimação do parceiro da interação como

um sujeito ao mesmo tempo semelhante – pois partilha universos de referência

e finalidades comunicativas – e diferente – pois desempenha um papel diverso

no ato comunicativo; (b) a pertinência, ou a adequação da linguagem ao contexto

e à finalidade da troca linguageira, em que os parceiros reconhecem os

universos de referência um do outro; (c) a influência, em que tanto o sujeito

falante quanto o interpretante assumem a finalidade do projeto de fala, qual seja,

motivar o outro a agir, sentir ou crer; e (d) a regulação, ou o ajuste do jogo de

influências – as estratégias discursivas empregadas pelo sujeito falante são

adaptadas às restrições situacionais impostas em função do reconhecimento do

sujeito interpretante enquanto ser psicossocial.

Para ilustrar esse duplo processo de semiotização do mundo, observe-se

o enunciado a seguir, extraído de um anúncio publicitário sobre o sabonete Dove:

33

“Sabonetes ressecam. Dove não. Dove não resseca a sua pele como os

sabonetes comuns. Contém ¼ de creme hidratante e limpa a sua pele

delicadamente, para que ela mantenha a hidratação por mais tempo.”

(Women’s Health, setembro/2012)

De acordo com os conceitos delineados por Charaudeau (2007, p.14), o

movimento de transformação pode ser evidenciado nesse enunciado, por meio

das marcas linguísticas que nomeiam, qualificam, atribuem ações e estabelecem

relações de causa entre os fatos apresentados. Os substantivos “sabonetes”,

“Dove”, “pele”, “creme”, “hidratação” e “tempo” identificam os elementos do

mundo acerca dos quais se fala, transformando-os em identidades nominais. O

pronome possessivo “sua”, os artigos “a” e “os”, os adjetivos “comuns” e

“hidratante”, por sua vez, descrevem, discriminam e especificam esses

elementos nomeados –“a sua pele”; “os sabonetes comuns”; “creme hidratante”;

“a hidratação” –, transformando-os em identidades descritivas.

Às identidades nominais (ainda que se trate de seres inanimados), são

também atribuídas ações, conferindo-lhes uma razão de ser e transformando-as

em identidades narrativas: a ação realizada pelos “sabonetes” é representada

pelo verbo “ressecam”, ao passo que “Dove” realiza a ação contrária,

representada, igualmente, pelo verbo “resseca”, mas modificado pelo advérbio

“não”, ação reforçada pela caracterização “contém ¼ de creme hidratante”, bem

como pelo verbo “limpar” (limpa); a “pele”, por seu turno, sofre a ação de ser

ressecada e realiza a ação de manter-se hidratada. As identidades nominais,

descritivas e narrativas, são também inscritas numa cadeia de causalidades,

como se pode observar na orientação argumentativa do anúncio. Deve-se usar

Dove em vez de sabonetes comuns e a causa disso é que Dove, diferentemente

dos sabonetes comuns, não resseca a pele, contém ¼ de creme hidratante e

limpa a pele delicadamente.

O movimento de transação, por seu turno, ordena e orienta o movimento

de transformação, no sentido de que, para que se tornem objeto de troca, as

marcas linguísticas do enunciado em questão devem ter uma orientação

comunicativa, inscritas num quadro situacional. Deve-se considerar, portanto, o

que o anúncio propõe como troca, bem como os entornos dessa troca.

34

Retomem-se os quatro princípios que devem compor o projeto de fala.

Quanto ao princípio de alteridade, o sujeito falante, representado pela agência

publicitária e pela empresa fabricante, coloca-se como enunciador,

reconhecendo o sujeito interpretante, representado pelo público-alvo da revista,

como semelhante e diferente. Coloca-se no papel de benfeitor, que oferece uma

solução a um beneficiário, indo, assim, ao encontro de uma (suposta)

necessidade do interlocutor: a hidratação da pele. De igual modo, o sujeito

interpretante, ao ler o anúncio, reconhece como legítimo o papel do anunciante

de indicar Dove como a solução para uma pele hidratada.

Quanto ao princípio de pertinência, observa-se um enunciado projetado

em função de uma finalidade – vender um produto. Os elementos linguísticos

que o compõem são devidamente selecionados e ordenados para levar as

leitoras de Women’s Health (WH) a crerem que Dove é a melhor opção para

limpar a pele sem deixá-la ressecada. Como elas buscam um estilo de vida

saudável, devem incorporar esse item ao seu cotidiano, pois manter a pele

hidratada faz parte do universo de referências dessas interlocutoras.

O princípio de influência é evidenciado, justamente, pelo teor persuasivo

do enunciado, que compõe um texto publicitário, cuja finalidade é transformar o

leitor do anúncio em consumidor, levando-o, portanto, à ação. Para isso,

contudo, são empregadas estratégias, que visam a orientar o pensamento e

afetar emocionalmente o público-alvo. Entre essas estratégias, pode-se

destacar, por exemplo, o contraste entre “o comum” e “o especial”, mediante a

comparação de Dove com outros sabonetes. Ao serem estes qualificados como

“comuns”, sugere-se que Dove não seria um sabonete comum, mas distinto,

exclusivo. Sua formulação com “1/4 de creme hidratante” constitui-se como a

característica que diferencia Dove dos outros e o coloca em posição de

superioridade. Utilizar esse produto será, então, uma forma de garantir essa

exclusividade – ter uma pele hidratada por mais tempo, e não ressecada, como

a pele das pessoas comuns. O objetivo do enunciado é, pois, orientar o

pensamento das leitoras para a necessidade de manter a pele hidratada,

desencadear nelas um estado emocional de insatisfação com sua pele não

hidratada e a consequente busca pela hidratação, por meio da aquisição de

Dove.

35

Essa estratégia persuasiva é, no entanto, limitada em função do princípio

de regulação. O sujeito falante, criador desse enunciado, por mais que deseje

alcançar seu objetivo – a venda do produto –, não pode exigir ou ordenar que as

leitoras de WH comprem o sabonete Dove. A situação de comunicação permite,

apenas, que isso seja sugerido, pois a relação que se estabelece entre

enunciador e interpretante não é uma relação de domínio daquele para com este.

Isso resulta numa atitude sedutora por parte do sujeito falante. Ele terá

alcançado seu objetivo comunicativo, se conseguir convencer as interlocutoras

de que Dove é melhor do que outros sabonetes.

Veja-se como Charaudeau explicita essa relação entre os sujeitos da

troca linguageira no próximo item.

2.2.2. Os componentes linguístico, situacional e a teoria dos sujeitos

Os componentes linguístico, situacional e a teoria dos sujeitos, na

condição de princípios de composição de um projeto de fala, configuram-se

como conceitos basilares da TSD. Consistem em tratar a significação discursiva

como resultante de duas dimensões – interna e externa à linguagem –, que

seriam, conforme afirma Charaudeau (1996, p.6), “simultaneamente

autônom[a]s, em sua origem, e interdependentes em seu efeito”. O autor propõe

que esses componentes sejam considerados como espaços do ato de

linguagem, interno e externo, configurando-se, assim, um duplo circuito do

processo de construção do ato de linguagem: o circuito da fala configurada, em

que os sujeitos que interagem representam o mundo e são representados

discursivamente, e o circuito situacional, em que os sujeitos que interagem

representam o mundo e são representados a partir de seus lugares psicossociais

na organização do “real” (CHARAUDEAU, 2008a). Não há como transformar os

significados em objetos de troca sem reconhecer os aspectos oriundos desses

dois espaços.

O espaço externo, ou a situação de comunicação, é um lugar de troca, no

qual o sujeito falante – seu elemento central – “se põe em relação com um

parceiro” (CHARAUDEAU, 2008a, p. 70). Forma o conjunto de dados

necessários – as restrições situacionais – para validar a troca linguageira. Nesse

espaço, são determinadas as condições de realização desse intercâmbio, a

36

saber: (a) a identidade dos parceiros que interagem; (b) a finalidade do ato de

linguagem; (c) o domínio do saber, ou o propósito, veiculado pelo objeto de troca;

(d) o dispositivo, ou as circunstâncias materiais em que se enquadra a troca

(CHARAUDEAU, 1996, p. 35). Neste item serão contempladas as duas primeiras

condições.

No que se refere à condição de identidade dos participantes da troca

linguageira, os circuitos interno e externo ao ato de linguagem são

protagonizados por dois sujeitos possuidores de uma identidade psicossocial, o

que lhes permite desempenhar papéis nos diferentes grupos sociais que

integram. Ao se engajarem na troca linguageira, essa identidade torna-se fator

determinante para que a relação entre eles e com o propósito comunicativo seja

estabelecida e mantida, pois, a partir dela, é garantido o seu direito à fala, ou sua

condição de legitimidade. Ocorre, entretanto, na construção da cena enunciativa,

um desdobramento desses sujeitos agentes, uma projeção de suas imagens

enunciativas para o interior do circuito da fala configurada, donde surgem os

sujeitos de fala. Esse procedimento é o que caracteriza o ato de linguagem como

uma encenação, uma vez que as identidades dos sujeitos enunciativos não

necessariamente correspondem às suas identidades psicossociais

(CHARAUDEAU, 2008a).

O sujeito comunicante – um ser social – pretende exercer certa influência

sobre outro sujeito – também socialmente marcado – que interpretará sua fala.

Para alcançar sua intenção comunicativa, esse sujeito comunicante (EUc)

constrói, mediante a enunciação, uma imagem de si mesmo – um sujeito

enunciador10 (EUe) –, bem como de seu interlocutor – um sujeito destinatário

ideal (TUd). Cabe, então, ao interlocutor – o sujeito interpretante (TUi) – captar

essas imagens projetadas, aceitando a proposta do EUe e identificando-se com

a imagem do TUd, de modo que os propósitos linguageiros convirjam e a

comunicação seja bem sucedida. Para que isso ocorra, então, o EUc transita, na

construção e organização dos enunciados, entre o espaço de restrições

impostas pelas circunstâncias do evento comunicativo, e o espaço de

estratégias, reveladoras da finalidade do seu ato linguageiro, da sua identidade

e do seu propósito (CHARAUDEAU, 2007a, p.19).

10 Charaudeau estabelece uma correspondência entre o Eu-enunciador e o Ethos aristotélico (CHARAUDEAU, 2010a).

37

O segundo componente envolvido na compreensão da situação de

comunicação, a condição de finalidade da troca linguageira, diz respeito à

relação que os parceiros da interação mantém entre si e diante do propósito

linguageiro, envolvendo as práticas sociais e os pontos de vistas partilhados por

eles, tendo-se em vista o tipo de contrato comunicativo no qual se inserem, o

que será tratado no próximo item, em que serão contempladas as duas outras

condições para que o intercâmbio linguageiro ocorra: (c) o propósito da

comunicação e (d) o dispositivo da comunicação.

2.2.3. O contrato de comunicação, os saberes e os imaginários sociodiscursivos

De acordo com Charaudeau, toda troca linguageira entre dois sujeitos, ou

duas instâncias, se insere em um contrato de comunicação – outro conceito

fundamental da TSD. Esse contrato funcionaria como uma espécie de acordo

tácito, acerca dos papéis linguageiros que os sujeitos da interação devem

assumir, em função da finalidade da troca. É estabelecido a partir dos

conhecimentos partilhados entre os sujeitos em torno das práticas sociais

mediadas pela linguagem, conforme o autor exemplifica, acerca do contrato de

comunicação publicitário:

No ato de linguagem de um discurso publicitário, pode-se dizer que é fabricada uma imagem de um TUd a quem falta algo; esse TUd ‘deve procurar preencher essa falta’. Então, uma hipótese é criada por parte do EU-publicitário, que supõe que o TUi se identificará com a imagem do TUd que foi proposta (CHARAUDEAU, 2008a, p.47).

O TUi, por outro lado, ao ler ou ouvir um anúncio publicitário de um

produto ou serviço, já o faz na expectativa de que o EUc lhe apresente uma

solução para uma suposta necessidade sua, ainda que ele a perceba apenas

quando entrar em contato com o texto em questão. De antemão, ele traz consigo

o conhecimento do que se espera do contrato publicitário, tanto no que se refere

à sua finalidade – oferecer um produto/ serviço – quanto à relação que se

estabelece entre ele e o EU-publicitário – uma relação de beneficiário/ benfeitor.

O terceiro componente situacional, a condição de propósito, apresentado

no item anterior, diz respeito ao o universo temático evocado na troca

linguageira. Os saberes compartilhados pelos sujeitos da interação, no circuito

38

externo à fala, não dizem respeito apenas às regras de funcionamento e à

finalidade daquele tipo de contrato comunicativo no qual estão inseridos. Está

envolvido, também, o conhecimento acerca do propósito da comunicação, ou

seja, aquele referente à temática do projeto de fala, que, consequentemente,

remete às formas de organização do “real” dos interlocutores.

Em outras palavras, a troca linguageira enquadra-se em um universo

temático, ou seja, faz referência a seres materiais ou ideais específicos, com

atributos específicos, praticantes de ações específicas, por motivos específicos.

Logo, só é efetivada, se houver um ponto de encontro de saberes, de modo que

o sentido possa ser construído conjuntamente. Faz-se necessário, assim, que as

formas de semiotizar o mundo dos sujeitos falante e destinatário coincidam, pelo

menos em certa medida.

Cabe destacar, aqui, um outro conceito proposto por Charaudeau (2015),

que visa a contemplar a questão dos sistemas de representação criados pelo

homem para apreender o mundo e atribuir valores às suas experiências em

interação nele e com ele, sistemas que, ao mesmo tempo, constroem, também,

sua identidade.

O linguista trabalha com a hipótese de que os sistemas de representação

partilhados por um mesmo grupo social formam os sistemas de saber,

constituindo, assim “maneiras de ver (discriminar e classificar) e de julgar (atribuir

um valor) o mundo, mediante discursos que engendram saberes, sendo que é

com esses últimos que se elaboram sistemas de pensamento, misturas de

conhecimento, de julgamento e de afeto” (CHARAUDEAU, 2015, p. 197). Os

saberes, para o autor, seriam categorias construídas pela linguagem, podendo

ser agrupados em saberes de conhecimento e saberes de crença.

Saberes de conhecimento são, segundo Charaudeau, discursos

pertencentes à coletividade, que “desempenharia[m], ao mesmo tempo, o papel

de referência e de verificador[es] do saber” (CHARAUDEAU, 2015, p, 198).

Trata-se de enunciados que se apresentam como verdades provadas e

incontestáveis, sendo fundados por algo que seria exterior ao sujeito, ou seja,

referem-se aos fatos do mundo e às razões e maneiras de ocorrência desses

fatos11.

11 Charaudeau enquadra esses tipos de enunciados numa atitude enunciativa delocutiva, em que há o apagamento intencional da subjetividade no discurso, reconhecendo, portanto, que não

39

Saberes de crença, em contrapartida, são sistemas de saberes que têm

por objetivo dar suporte a julgamentos sobre o mundo, ou à atribuição de valores

que a ele se fazem. Originam-se de um processo avaliativo, carregado de

subjetividade, em que “o sujeito faz uma escolha segundo uma lógica do

necessário e do verossímil, na qual pode intervir tanto a razão quanto a emoção”

(CHARAUDEAU, 2015, p. 198)12.

Charaudeau salienta que a fronteira entre esses dois saberes, que, juntos,

estruturam as representações sociais, pode ser muito tênue e que muitas

instâncias enunciadoras disso se apropriam como estratégia de persuasão,

invertendo a posição desses saberes: questionam-se as verdades que

dependem do conhecimento científico e substituem-nas por verdades que

dependem do tratamento axiológico da realidade, ou seja, das crenças. É o que

ocorre no discurso político, conforme aponta o autor (CHARAUDEAU, 2015, p.

199), característica que é partilhada com o discurso publicitário, em que as

propriedades do objeto de anúncio, bem como os benefícios que ele pode trazer

são colocados como verdades inquestionáveis.

Como partem da experiência do sujeito, deve-se admitir a existência de

vários saberes de crença que circulam em diversas esferas sociais por meio dos

discursos, sendo, então, instituídos como normas de referência entre os

membros dessas esferas, configurando-se nos diversos “imaginários

sociodiscursivos” (CHARAUDEAU, 2015, p. 202). Esses imaginários

sociodiscursivos são formas de interpretar a realidade que testemunham

identidades de uma coletividade – da forma como indivíduos e grupos percebem

e julgam os acontecimentos e as suas atividades sociais (CHARAUDEAU, 2015,

p. 207). Sendo o discurso publicitário um discurso-texto que circula em diferentes

esferas, dirigido a diferentes instâncias e que tem finalidade comercial, fará

referência aos imaginários dessas instâncias receptoras, de modo a tocar em

seus afetos.

Observa-se, assim, que as características identitárias dos sujeitos –

reveladas por meio das representações sociais nas trocas linguageiras –

condicionam suas expectativas em relação ao outro e em relação ao ato

há neutralidade na linguagem, como ele mesmo sugere: “...é consenso que esses saberes de conhecimento dependem das culturas nas quais nascem...” (CHARAUDEAU 2015, p. 198) 12 Aqui se insere o conceito de estereótipos, que será desenvolvido no capítulo 3.

40

comunicativo, bem como condicionam sua forma de semiotização do mundo,

que acarretará a forma de produzir e interpretar os enunciados.

Há, entretanto, outros fatores explícitos na situação de comunicação, ou

no circuito externo à fala, que podem influenciar a forma como o sentido é

construído pelos parceiros, a saber: as condições materiais em que se dá a troca

linguageira, ou as condições de dispositivo – o quarto componente situacional

mencionado acima, no item (2.2.2.)

Essas condições materiais dizem respeito à disposição espacial e

temporal dos parceiros da comunicação e do canal de transmissão do evento

discursivo. Nesse sentido, faz-se necessário considerar se os sujeitos estão

presentes fisicamente um diante do outro, se são sujeitos únicos ou múltiplos,

como estão dispostos no espaço, se a comunicação é oral ou gráfica, se é ou

não mediada, se ocorre ou não em tempo real e quais os códigos semiológicos

utilizados além do verbal13 (CHARAUDEAU, 2008a, p.70).

Na publicidade veiculada em revistas impressas, que é o domínio

discursivo que interessa a esta pesquisa, pode-se traçar o quadro situacional do

evento comunicativo da seguinte forma, levando-se em consideração as quatro

condições do intercâmbio linguageiro:

(a) Quanto à identidade dos parceiros da comunicação, tem-se, como instância

produtora do discurso, um EUc constituído pela junção de três entes sociais:

uma empresa fabricante ou fornecedora de determinado produto/ serviço;

uma agência de publicidade, por sua vez, representada por uma equipe de

publicitários; e uma editora de revistas, que disponibiliza o espaço onde os

anúncios são veiculados. O interesse que os une nesse processo de

produção discursiva é comercial, visando-se ao lucro. No outro polo desse

circuito, como instância receptora do discurso, tem-se um TUi coletivo,

formado pelo público-alvo (o target) do produto/ serviço oferecido, do

anúncio e da revista.

13 Esse aspecto material é bastante relevante na análise da publicidade impressa, pois entram em jogo outros códigos semiológicos – a imagem, as cores, os efeitos gráficos – que se mostram tão importantes quanto o código linguístico. Em alguns casos, até, observa-se que se sobrepujam a este.

41

No caso da revista Men’s Health, por exemplo, o target pretendido são

homens preocupados com a saúde e a boa forma física. Logo, os anúncios

veiculados nessa revista devem ser construídos a partir das características

identitárias desse público (traços físicos, psicológicos, socioeconômicos,

profissionais e relacionais). Já no caso da revista Women’s Health, embora

a temática seja a mesma, têm-se como público-alvo as mulheres. Dessa

forma, os anúncios veiculados devem harmonizar-se não só com a temática,

mas também com a identidade psicossocial desse tipo de público. Um

exemplo bastante óbvio disso é a presença da publicidade de absorventes

nestas revistas, em contrapartida com sua ausência naquelas.

(b) No contrato publicitário, a finalidade da instância de enunciação publicitária

é tornar o consumidor do anúncio – o leitor da revista – em consumidor

efetivo do produto/serviço anunciado. Dessa forma, a imagem do TUd criada

é aquela de um sujeito a quem falta algo e que busca uma forma de

preencher essa falta. Logo, a expectativa em relação ao papel do TUi é de

que ele se posicione como beneficiário, aceitando e reconhecendo como

legítima essa necessidade apresentada pelo EUe. Este, por seu turno,

coloca-se no papel de benfeitor, orientando o TU acerca de como alcançar

a satisfação dessa necessidade.

(c) O domínio temático do discurso publicitário, um contrato definido em função

da satisfação de desejos e necessidades e do prazer, girará em torno da

oferta de um produto/serviço que se destaca em relação aos outros de

mesma categoria e que, por isso, deve ser escolhido dentre uma gama de

opções. Configura-se a temática da sugestão e da sedução, mediante a

singularização e a superlativização dos atributos do objeto de anúncio, bem

como a temática da felicidade, entre outras, majoritariamente voltadas para

o campo emocional.

(d) No que tange às condições materiais de realização da troca, no texto

publicitário de revistas impressas, há instâncias múltiplas de produção da

enunciação – a empresa produtora/fornecedora, a agência de publicidade, a

equipe de publicidade – e de recepção – o grupo de leitores da revista. Essas

instâncias não interagem face a face, mas são mediadas pelo canal gráfico

– a revista. Além da linguagem verbal, outros códigos semiológicos são

42

utilizados, como as imagens e as cores, igualmente importantes na

construção dos sentidos dos textos.

Todos esses fatores constituem o campo de restrições situacionais

impostas ao evento comunicativo, responsáveis por situá-lo, no espaço externo

à linguagem, condicionando, assim, a forma e o sentido que os enunciados irão

assumir (as restrições formais). Lança-se, agora, o olhar para o espaço de

estratégias, interno à fala, que diz respeito às manobras realizadas pelo EUe no

processo de construção textual.

2.2.4. Estratégias e visadas discursivas

O contrato de comunicação, além de estabelecer restrições situacionais,

discursivas e formais à enunciação, prevê, também, um espaço de manobras ou

de estratégias, onde é permitido ao EUc organizar a matéria linguística na forma

de um texto que atenda ao seu propósito comunicativo e produza efeitos de

persuasão e de sedução desejados.

Esse espaço de estratégias é o responsável por conferir especificidade ao

evento enunciativo: é o lugar de onde o EUc se projeta discursivamente, onde

revela sua identidade discursiva e sua finalidade comunicativa, por meio do que

Charaudeau chama de estratégias de discurso. Não fosse por ele, toda

publicidade, por exemplo, seria igual, marcada apenas por aqueles traços

recorrentes, que permitem que seja identificada como pertencente ao gênero de

discurso publicitário.

As estratégias empregadas no discurso podem ser da ordem da

legitimidade, da credibilidade e da captação (CHARAUDEAU, 1995; 2007a;

2009b)14. Esses três aspectos configuram-se como condições para que o ato de

linguagem aconteça. Enquanto a legitimidade é a condição que dá o direito à

palavra ao EUc, relativa ao reconhecimento de sua identidade social, as

condições de credibilidade e de captação dizem respeito à construção de sua

identidade discursiva e sua relação com o interlocutor.

14 Esse texto, intitulado Identidade social e identidade discursiva, o fundamento da competência

comunicacional, foi publicado na obra O trabalho da tradução, organizado por Márcia

Pietrolongo. Foi acessado no site oficial do autor:

<http://www.patrick-charaudeau.com/Identidade-social-e-identidade.html>, em 17/06/2015.

43

O EUc emprega estratégias de legitimidade, para mostrar que “pode

dizer”, evocando no discurso a posição social que ocupa, esclarecendo ou

lembrando ao TU por que ele tem condições de protagonizar aquele evento

discursivo naquela situação de comunicação específica.

As estratégias de credibilidade, por sua vez, são empregadas pelo EUc,

quando ele busca provar, por meio do discurso, que ele “sabe dizer” o que diz,

projetando uma imagem de si (um EUe, ou um Ethos) que deva ser aceita pelo

TUi, no que concerne tanto ao valor de verdade de suas asserções quanto à sua

sinceridade. Essas estratégias visam à persuasão do outro, o que pode levar o

EUc a adotar: (i) uma atitude de neutralidade perante o que diz, na qual se

evidencia um esforço para apagar os vestígios de subjetividade do enunciador;

(ii) uma atitude de distanciamento perante o que diz, na qual se evidencia um

tratamento puramente analítico dos fatos, centrado em seus aspectos causais;

(iii) uma atitude de engajamento, na qual se evidencia a tomada de posição por

parte do enunciador e, consequentemente, marcas claras de sua subjetividade

no discurso.

Por fim, as estratégias de captação são aquelas que o EUc emprega

quando não está em posição de autoridade em face de seu interlocutor. Ele

recorre a elas porque precisa assegurar-se de que o TUi percebe sua

intencionalidade comunicativa, compartilhando de suas ideias, opiniões e

impressões, sendo, portanto, tocado em sua afetividade pelo que é dito. O EUc

pode, assim, assumir três tipos de atitudes para captar seu destinatário:

i) uma atitude polêmica, que o leva a questionar valores defendidos pelo

interlocutor ou por terceiros, tendo em vista descartar possíveis

objeções à ideia que ele defende;

ii) uma atitude sedutora, construindo um imaginário em que o

interlocutor seja o centro das atenções, atuando como herói ou

beneficiário das ações em torno dele; e

iii) uma atitude dramática, que o leva a utilizar relatos metafóricos e

comparativos, apoiados em valores afetivos partilhados socialmente

– os imaginários sociodiscursivos.

44

Enquanto as estratégias de credibilidade remetem à ideia de persuadir o

outro, a partir de um “saber dizer”, a captação está relacionada à sedução, a

partir do “fazer sentir”. Charaudeau (1995 15 ) explica, ainda, que o termo

“captação” não deve ser tomado no sentido estrito apresentado pelo dicionário,

mas no seu sentido mais amplo e não pejorativo:

É a atitude que consiste em tocar o afeto do seu interlocutor (seu auditório), provocando nele certo estado emocional que seja favorável à visada de influência do sujeito falante, em suma, seduzindo-o para torná-lo cativo.16

Está, assim, intimamente relacionado ao conceito de patemização, que

será desenvolvido adiante.

Pauliukonis (2006, p. 244) explica que o exame de estratégias discursivas

empregadas em um texto envolve “analisar os caminhos de que se valeu o autor

para melhor se aproximar de seus leitores e conseguir a adesão dos espíritos ao

que ele propõe”. Torna-se necessário, então, estabelecer uma relação entre

essas estratégias e a noção de visadas discursivas, visto que compõem a

finalidade do ato comunicativo. Essa relação, portanto, será explicitada e, em

seguida, associada ao conceito de imaginários sociodiscursivos.

Os efeitos de persuasão e de sedução que o EUc deseja produzir no seu

interlocutor, mediante o emprego de estratégias de discurso, são identificados

por Charaudeau como visadas discursivas. Segundo ele, tais visadas

“correspondem a uma intencionalidade psico-sócio-discursiva que determina a

expectativa (“enjeu”) do ato de linguagem do sujeito falante e por conseguinte da

própria troca linguageira” (CHARAUDEAU, 2004, p. 5). Elas são atitudes

enunciativas engendradas na instância de produção do ato de comunicação,

mas, para que o efeito pretendido seja desencadeado, devem ser reconhecidas

pela instância de recepção, implicando, portanto, um duplo movimento: a relação

de força estabelecida pelo EU em direção ao TU; e a posição ocupada por esse

TU em relação ao EU.

15 Este artigo, intitulado Ce que communiquer veut dire foi publicado na revista Revue des

Sciences humaines, n°51, Juin. No entanto, foi acessado no site oficial do autor, sem paginação.

<http://www.patrick-charaudeau.com/Ce-que-communiquer-veut-dire.html> , em 17/06/2015. 16 Il s’agit de l’attitude qui consiste à toucher l’affect de son interlocuteur (son auditoire), à provoquer chez lui un certain état émotionnel qui soit favorable à la visée d’influence du sujet parlant, bref à le séduire, à le rendre captif.

45

O autor menciona alguns tipos de visadas, que considera serem as

principais (CHARAUDEAU 2004; 2009): (a) a visada de prescrição; (b) a visada

de solicitação; (c) a visada de incitação; (d) a visada de informação; (e) a visada

de instrução; (f) a visada de demonstração; e (g) a visada do pathos. As visadas

que interessam à análise do discurso publicitário, e que serão, por isso,

detalhadas a seguir, são as incitativa, informativa, demonstrativa e patêmica.

Na visada de incitação, percebe-se uma intencionalidade semelhante à

da visada de prescrição, visto que o EU também deseja “mandar fazer”. A

relação estabelecida entre ele e o TU, porém, não é de autoridade, logo, não

pode sancionar as ações deste. O que resta ao EU, então, é incitar o outro, ou

seja, “fazer crer”, por meio da persuasão ou da sedução. O TU, é colocado,

assim, na posição de “dever crer” que ele é beneficiário do ato incitado. Anúncios

publicitários exemplificam esse tipo de visada mais claramente.

Na visada de informação, ao contrário do que ocorre na visada de

solicitação, o EU encontra-se legitimado na sua posição de saber e deseja “fazer

saber”. Dessa forma, a posição ocupada pelo TU é aquela de “dever saber” sobre

os fatos apresentados pelo EU. Um exemplo de texto com esse tipo de visada é

a notícia veiculada predominantemente em jornais.

Na visada de demonstração, há uma relação de autoridade do EU para

com o TU, bem como de superioridade de saber. O EU tem a intenção de

“esclarecer a verdade e mostrar as provas”, colocando o TU na posição de “dever

receber e avaliar” uma verdade. Um exemplo desse tipo de visada seria aquela

dominante em um artigo científico.

Na visada do pathos, por fim, o EUc pode estar ou não em posição de

autoridade em face do TU, mas deseja “fazer sentir”, ou seja, tem a intenção de

provocar no TU um determinado estado emocional. Dessa forma, este é

colocado na posição de “dever sentir”. Um discurso proferido por um candidato

à presidência pode ser citado como exemplo desse tipo de visada.

Nessa perspectiva, pode-se afirmar que as visadas determinam a

finalidade do ato enunciativo, como também a forma como o EUc constrói a mise-

en-scène da enunciação. A partir dessas visadas, que podem coexistir num

mesmo ato, o EUc assume um determinado comportamento enunciativo –

elocutivo, alocutivo ou delocutivo – e seleciona um modo de organização do

discurso – descritivo, narrativo ou argumentativo – que seja mais adequado a

46

causar os efeitos de discurso pretendidos (CHARAUDEAU, 2008). Vale

ressaltar, no entanto, que esses efeitos não podem ser garantidos, pois, estão

sujeitos à aprovação por parte do TUi.

Conforme Charaudeau (2004, p 6) destaca, é comum que mais de uma

visada seja selecionada pela situação de comunicação, embora uma delas

predomine. Dessa forma, pode-se admitir, na situação de comunicação

publicitária, a visada de informação, na medida em que a finalidade primária do

texto publicitário deva ser tornar pública a existência de determinado produto ou

serviço. Observa-se, contudo, também a presença da visada de demonstração,

quando a imagem e a fala de especialistas são evocadas para provar a eficácia

do produto, como se verá no exemplo adiante.

Pode-se notar, todavia, devido à inserção do discurso publicitário no

circuito mercadológico, que a presença dominante é a da visada de incitação,

aliada à visada do pathos. Tendo-se em vista a noção de competitividade

inerente a esse circuito, há a necessidade de alcançar o maior número de

pessoas por meio do discurso e, por isso, são empregadas estratégias de

persuasão e de sedução, de modo a “fazer-fazer” – comprar ou contratar um

produto ou serviço – a partir do “fazer crer” – acreditar que a necessidade

daquele objeto de anúncio é legítima e que ele é o mais adequado a preenchê-

la. Para ilustrar os referidos tipos de visada, veja-se o anúncio (3) a seguir,

extraído do corpus.

47

FIGURA 3 - MEN'S HEALTH, ABRIL/ 2014

A visada de informação está presente, na medida em que o produto é

apresentado visualmente e descrito verbalmente, como um creme dental que

oferece 12 benefícios e 12 horas de proteção. A visada de demonstração é

evidenciada a partir da imagem e da identificação dos dentistas: enquanto

autoridades competentes para avaliar o produto, cumprem a finalidade de

comprovar sua eficácia. A visada de incitação, por seu turno, perpassa essas

outras visadas, destacando-se, no sentido de que todo o anúncio é projetado

para fazer com que o leitor acredite que o produto é a melhor opção no mercado

na categoria de cremes dentais e, assim, passe a consumi-lo.

48

Observando-se, contudo, o exemplo acima, é possível afirmar, ainda, que

a visada do pathos está, de igual modo, fortemente presente na publicidade, visto

que, para seduzir o TUi, fazendo-o crer, o EUc se vale, também, do “fazer sentir”:

a imagem dos dentistas objetiva transmitir o sentimento de segurança para o

consumidor; a descrição do produto, por sua vez, objetiva despertar o sentimento

de desejo de compra no TUd, baseado no prazer sobre a vantagem de adquirir

um único produto que lhe proporcionará 12 benefícios.

Resta, ainda, relacionar as estratégias de discurso aos imaginários

sociodiscursivos. Charaudeau (2008, p. 57) salienta que, dentre as estratégias

às quais o EUc pode recorrer, para alcançar a adesão do TUi, está “a fabricação

de uma imagem de ficção como lugar de identificação do sujeito com um outro,

imagem essa que constitui um lugar de projeção do imaginário desse sujeito”.

Isso significa dizer que a projeção que o EUc faz do TUd, na cena enunciativa,

remete a um conjunto de valores e crenças socialmente construídas e difundidas

– um imaginário sociodiscursivo – que aquele supõe que este irá reconhecer e

com ele se identificar. Para ilustrar como essa referência ocorre no discurso

publicitário, observe-se o anúncio (4), selecionado do corpus coletado:

49

FIGURA 4 - WOMEN'S HEALTH, DEZ/ 2011

Na peça publicitária acima, veiculada pela revista Women’s Health, de

dezembro de 2011, há duas frases – pergunta e resposta – que servem de mote

para o desenvolvimento da ideia contida no texto: “Se a gente come doce?” e

“Só de vez em sempre”.

Essa ideia gira em torno da apresentação do artigo alimentício power pak

pudding, uma espécie de pudim proteico. Na primeira frase – a pergunta –, o

termo “a gente” se refere às duas moças colocadas como protagonistas e

supostas consumidoras do produto anunciado; ela é complementada pela

segunda frase – a resposta –, também associada às imagens das moças, que

se encontram em excelente forma física, segundo o atual padrão de vida e de

50

beleza exaltado pela mídia de massa17: são magras e apresentam a musculatura

definida, o que sugere que praticam atividades físicas como a musculação,

mantendo um estilo de vida fitness.

A afirmação atribuída a elas, de que comem doces “de vez em sempre” –

trocadilho que remete à locução adverbial temporal “de vez em quando” –,

estabelece um contraste com sua forma física, remetendo a um universo

discursivo socialmente difundido: aquele em que o consumo de doces não

poderia ser associado a um estilo de vida saudável e à magreza tão desejada

pelas mulheres, uma vez que doces seriam considerados inimigos da busca pela

boa forma. O produto anunciado, no entanto, quebra essa expectativa, e é

justamente esse rompimento com uma norma preestabelecida, parte do

imaginário do sujeito destinatário, a principal estratégia utilizada pelo EUc para

captar a atenção do TUi. A leitora da Women’s Health é, assim, levada a crer

que pode, sim, satisfazer seu desejo de comer doce sempre que quiser,

consumindo power pak pudding, sem abrir mão da magreza e da dieta.

Nessa perspectiva, pode-se observar o emprego de estratégias de

credibilidade e de captação, fazendo-se referência aos imaginários

sociodiscursivos pertinentes ao domínio temático da revista. O EUc projeta um

EUe que pode ser associado à imagem das moças que comem o pudding

sempre que desejam, sem prejudicar seu estilo de vida fitness; além disso, ele

também procura sugerir ao TUi que ele pode se identificar com essa imagem,

desfrutando dos sentimento de prazer e de felicidade de comer doce “de vez em

sempre” e permanecer em forma.

Cabe, ainda, neste capítulo, tratar de uma noção igualmente essencial na

TSD: os modos de organização do discurso, que muito se relacionam com o

duplo processo de semiotização do mundo. Esse processo se apoia sobre vários

aspectos que envolvem a situação de comunicação, tais como o seu dispositivo,

o projeto de fala do sujeito, os lugares em que os grupos sociais circulam, os

saberes e as visões de mundo partilhadas entre os sujeitos, bem como as

circunstâncias de troca.

17 Este conceito será explorado com maiores detalhes adiante, ao se tratar dos estereótipos masculinos e femininos.

51

2.2.5. Os modos de organização do discurso e os comportamentos enunciativos

Segundo Charaudeau (2008a), existe uma relação de influência que se

estabelece discursivamente, entre os sujeitos da troca linguageira, no momento

em que o EUc toma a palavra. Essa relação de influência, por seu turno,

pressupõe quatro processos linguageiros:

(a) um processo de regulação, que diz respeito ao ato de impor sua

presença ao outro, instaurando, assim, relações de superioridade/inferioridade

entre os interlocutores;

(b) um processo de identificação, no qual o EUc constrói uma imagem

enunciativa de si mesmo (um ethos), de modo a alcançar a credibilidade por

parte de seu destinatário;

(c) um processo de dramatização, ou patemização (pathos), relativo à

capacidade do EUc de suscitar emoções no outro, de modo que este venha a

aderir à encenação, movido por seus afetos; e

(d) um processo de racionalização (logos), referente ao modo como o

material linguístico é mobilizado e organizado, a partir de uma finalidade

discursiva: narrar/descrever ou argumentar.

Tendo em vista, assim, esse quarto processos, Charaudeau (2008b)

identifica quatro modos em que o discurso pode ser organizado: (a) o modo

enunciativo; (b) o modo descritivo; (c) o modo narrativo; (d) e o modo

argumentativo. Cada um desses modos será explicitado a seguir.

O modo de organização enunciativo é uma categoria de discurso que está

relacionada à ordenação da matéria linguística conforme o posicionamento do

sujeito falante perante o que diz, perante seu interlocutor e perante outras falas.

Envolto por uma dada situação comunicativa, ele deixará marcas linguísticas em

seu discurso que evidenciam seu ponto de vista enunciativo, revelando o seu

grau de engajamento nesse ato de linguagem, que pode configurar-se desde

certo (e aparente) afastamento até seu total envolvimento. O foco, nesse modo

de organização do discurso, está voltado para o EUe e o TUd, os protagonistas

do ato linguageiro, podendo-se considerar diferentes atitudes, ou

comportamentos enunciativos, assumidos por parte do EUe: (a) o

52

comportamento elocutivo; (b) o comportamento alocutivo; e (c) o comportamento

delocutivo.

Ao assumir um comportamento elocutivo, o EUe revela total envolvimento

com seu discurso, apresentando seu ponto de vista, aparentemente

desvinculado do interlocutor. Já ao assumir um comportamento alocutivo, o EUe

revela a maneira pela qual ele impõe sua opinião ao interlocutor, numa relação

de influência daquele sobre este, em quem a mensagem se encontra centrada.

Ao assumir um comportamento delocutivo, por seu turno, o EUe testemunha

como os discursos do mundo são a ele impostos, estando, tanto ele quanto seu

interlocutor, apagados e desvinculados da locução numa posição de

afastamento (GOUVÊA, 2016, p. 4-5).

Embora em todos os três tipos de atitude enunciativa, possa o sujeito

falante apelar às emoções do seu destinatário, a partir de diferentes estratégias

linguístico-discursivas – como será visto adiante –, pode-se afirmar que o

posicionamento alocutivo seria o que guarda maior potencial patemizante, uma

vez que é aquele cujo apelo está fortemente voltado ao interlocutor. Na

publicidade, esse comportamento é evidenciado por meio de marcas linguísticas

como verbos no modo imperativo e pronomes na segunda pessoa, que envolvem

o destinatário no espaço-tempo do evento discursivo.

Cabe ressaltar, no entanto, que, ao engajar-se no processo enunciativo,

não é possível ao sujeito falante eximir-se, de fato, de posicionar-se perante seu

discurso. Desse modo, todo e qualquer ato de linguagem conterá marcas

linguísticas que evidenciam esse posicionamento. Ainda que sejam marcas de

apagamento desse sujeito, numa aparente neutralidade ou objetividade, está aí

inscrita uma escolha que revela sua intencionalidade comunicativa. Nas palavras

de Charaudeau (2008b, p.84):

O ato de enunciação que descreve a “relação com um terceiro” é de fato peculiar. Sabemos que todo ato de linguagem depende, de um modo ou de outro, do sujeito falante e de seus diferentes pontos de vista. Trata-se, portanto, de um „jogo‟ protagonizado pelo sujeito falante, como se fosse possível a ele não ter ponto de vista, como se pudesse desaparecer por completo do ato de enunciação e deixar o discurso falar por si.

Por essa razão, Charaudeau (2008b) afirma que o modo enunciativo de

organização do discurso tem certa proeminência em face dos demais modos –

53

descritivo, narrativo e argumentativo –, que, na verdade, constituem-se como

propósitos referenciais da enunciação. O esquema a seguir resume, então, as

três funções desse modo de organização do discurso e as categorias modais

que lhes correspondem:

ILUSTRAÇÃO 1 - FUNÇÕES DO MODO ENUNCIATIVO SEGUNDO CHARAUDEAU (2008)

Tendo em vista a finalidade do discurso publicitário, a persuasão e a

sedução do leitor para que se torne um consumidor do produto/serviço

anunciado, pode-se afirmar que o EUc assume, predominantemente, um

comportamento alocutivo de sugestão e proposta, na medida em que procura

influenciar a forma de pensar, sentir e agir desse interlocutor. Podem ser

observados, no entanto, também, em certa medida, os comportamentos

elocutivo e delocutivo, ainda que não sejam predominantes, pois, como já foi

mencionado, o sujeito enunciador pode-se utilizar de diferentes estratégias

linguístico-discursivas para captar a atenção de seu destinatário. Observe-se a

peça (5) a seguir.

54

Neste anúncio, podem ser evidenciados os três tipos de comportamentos

enunciativos. Veja-se o enunciado central:

Nós entendemos você. Não importa a mulher que você é. A Abril

tem sempre uma revista para você. (WH, abril/2012)

O comportamento alocutivo, predominante, encontra-se marcado pelo uso

da segunda pessoa do singular – “você”18, repetido 4 vezes, juntamente com a

flexão verbal “puder e quiser”, “seu”, repetido 2 vezes, e “sua” –, bem como pelo

emprego do modo imperativo, em “ligue” e “acesse”. Essas marcas linguísticas

18 Considera-se, aqui, este pronome de tratamento como integrante do paradigma das pessoas do discurso, funcionando como segunda pessoa do singular, no lugar de “tu”, ainda que a flexão verbal se faça em concordância com a terceira pessoa do singular “ele(a)”.

FIGURA 5 - WOMEN'S HEALTH, ABRIL/ 2012

55

referem-se ao sujeito destinatário do anúncio, qual seja, as mulheres (não

importa o seu estilo), numa busca, por parte do EUe, de exercer influência sobre

o TUd.

O comportamento elocutivo pode ser verificado no emprego da primeira

pessoa do plural pronominal e verbal – “nós entendemos”. O termo “nós” remete

ao EUe, representado pela Editora Abril, que publica as revistas expostas nas

imagens, e aponta para a intenção desse sujeito de posicionar-se explicitamente

no evento enunciativo, com vistas à persuasão: se a Editora Abril entende a

leitora, então ela é digna de crédito, pois atenderá às suas necessidades.

O comportamento delocutivo, por fim, pode ser observado pelas seguintes

asserções: “Não importa a mulher que você é” e “A Abril tem sempre uma revista

pra você”. Em ambos os enunciados, o uso da terceira pessoa em “não

importa” e em “A Abril tem” apontam para um certo afastamento do

enunciador em relação ao dito, ou seja, não há marcas de primeira pessoa, mas

de terceira pessoa (embora o “você” esteja presente, porém não como tema do

enunciado). O que se observa, então, é o aparente apagamento da

subjetividade, embora ela se faça notar por meio de outros elementos, como a

oração “não importa”, na primeira asserção, e o advérbio “sempre”, na segunda,

que assumem função modalizadora.

O modo de organização descritivo consiste num processo linguageiro que

faz existirem os entes no mundo, mediante a sua singularização pelos seguintes

procedimentos: nomeação, localização e qualificação. (CHARAUDEAU, 2008b,

p. 111-112). Nomear, localizar e qualificar os seres resultam, também, num

processo classificatório, a serviço das visadas, ou finalidades comunicativas, tais

como a explicação, a informação ou a incitação.

O linguista afirma que nomear é trazer um ser à existência, por meio do

reconhecimento das diferenças e semelhanças desse ser em relação aos

demais, o que recai na classificação, ou categorização dos entes. Há que se

ressaltar, no entanto, que esse procedimento depende do sujeito que nele se

engaja, que “constrói e estrutura a visão do mundo” (CHARAUDEAU, 2008b, p.

112).

Charaudeau (2008b, p.113), igualmente, explicita que localizar, ou situar,

os seres, consiste em determinar o lugar que ocupam no espaço e no tempo, o

que corrobora sua classificação, uma vez que sua existência e função dependem

56

de sua posição espaciotemporal. Assim como no procedimento de nomeação, o

de localização remete à visão que um sujeito, ou um grupo de sujeitos, têm do

mundo, sobredeterminados pelas características culturais que lhes circundam.

Qualificar, por seu turno, implica a classificação dos seres, à semelhança

da nomeação. Difere desta, contudo, pelo fato de que não os agrupa

simplesmente, mas “atribui um sentido particular a esses seres, e isto de maneira

mais ou menos objetiva” (CHARAUDEAU, 2008b, p.115). Descrever por meio da

qualificação, conforme afirma o autor, é proceder à singularização do mundo,

permeada pela visão de coisas do sujeito falante, “visão que depende não só de

sua racionalidade, mas também de seus sentidos e sentimentos”

(CHARAUDEAU, 2008b, p.115).

O esquema abaixo sistematiza esses procedimentos discursivos,

juntamente com os componentes da construção descritiva, as finalidades e os

gêneros textuais a ela correspondentes.

ILUSTRAÇÃO 2 - MODO DE ORGANIZAÇÃO DESCRITIVO (CHARAUDEAU, 2008, p. 131)

57

No discurso publicitário, pode-se observar que a organização descritiva

do discurso é muito produtiva, quando há a intenção de apresentar os atributos

do objeto de anúncio, de modo a singularizá-lo e distingui-lo dos demais

concorrentes. Esse modo de organização configura-se como uma estratégia

patêmica bastante recorrente, em que se busca suscitar estados emocionais no

interlocutor. Veja-se o exemplo (6) a seguir.

58

FIGURA 6 - WOMEN'S HEALTH, DEZ/2011

Neste anúncio, as características do produto anunciado – o protetor solar

Nivea Sun – são apresentadas pelo sujeito anunciante, numa formatação tópica,

de modo a destacá-lo dos demais produtos de mesma categoria. Pode-se

observar que o discurso está organizado no modo descritivo, embora essa

59

organização esteja a serviço de um movimento argumentativo, próprio do gênero

discursivo publicitário. Os atributos do cosmético (“proteção UVB; textura leve e

rápida absorção; resistente à agua; hidratação prolongada; testado e aprovado

por 99% dos consumidores”) são listados ao leitor do anúncio, para que,

tomando conhecimento deles, conclua que se trata de um protetor solar de

qualidade superior à dos outros protetores disponíveis no mercado e, então,

decida-se por comprá-lo. A estrutura subjacente ao anúncio pode ser

representada pelo enunciado:

Se Nivea Sun oferece proteção UVB, tem textura leve e de rápida

absorção, é resistente à água, oferece hidratação prolongada, foi testado

e aprovado por quase todos os consumidores, então, você deve usar

Nivea Sun.

Percebe-se, assim, que a qualificação do objeto de anúncio funciona

como argumento para justificar que seja adquirido pelo consumidor em potencial,

engendrando nele os sentimentos de atração pelo produto, confiança e

satisfação.

O modo de organização narrativo do discurso implica que o EUc se

coloque em posição de narrador, a partir de uma intencionalidade de transmitir

a um TUi uma representação de uma experiência no mundo (CHARAUDEAU,

2008b, p. 153). Trata-se de ordenar o material linguístico, de modo a apresentar

um mundo construído no desenrolar de uma sequência de ações inter-

relacionadas e encadeadas. O sujeito que narra desempenha o papel de

testemunha dos acontecimentos.

Esse modo de organização é caracterizado por uma dupla articulação,

envolvendo: a organização da lógica narrativa, isto é, a construção da trama da

história; e a organização da encenação narrativa, ou seja, o recorte, a

transformação da história num universo narrado, a partir da sua reconstrução por

parte de um sujeito narrante (CHARAUDEAU, 2008b, p. 158).

A lógica narrativa é constituída pelos actantes, pelos processos e pelas

sequências. Actantes são aqueles que desempenham determinados papéis,

ligados às ações narradas. Eles são relacionados por meio dos processos, que

60

orientam suas ações. Os processos, por sua vez, são integrados aos actantes

por meio das sequências, constituindo, assim, a finalidade narrativa.

Na publicidade, pode-se verificar a narrativa a serviço da persuasão, no

sentido de que se procura construir um universo narrado que reflita, de algum

modo, a realidade vivida pelo público-alvo, de maneira que este se identifique e

se envolva emocionalmente com os actantes e com a narrativa. Segue-se um

exemplo (7) extraído do corpus, para que se observe esse tipo de construção

discursiva.

61

FIGURA 7 - WOMEN'S HEALTH, FEVEREIRO/12

Nesta peça publicitária, que anuncia o protetor íntimo diário Intimus Days,

pode-se perceber, mediante o enunciado principal, a construção de um universo

narrado, na forma de um depoimento, com todos os seus elementos

constituintes: actante, processo e sequência: “Para mim, viver em equilíbrio é

62

fundamental. Quando vi o novo protetor diário Intimus Days pH Balanceado, quis

logo experimentar”.

Para que se interprete devidamente esse enunciado, deve-se fazer

referência não só ao conteúdo imagético do anúncio, como também a elementos

da situação de comunicação, uma vez que apenas a análise do material verbal

não é suficiente para preencher certas lacunas do sentido. Como se trata de um

depoimento de alguém que utilizou o produto anunciado, a representação do

sujeito enunciador se dá pela marca de primeira pessoa do singular, tanto

pronominal (“mim”), quanto verbo-desinencial (morfema zero). Sendo essa

marca de natureza dêitica, deve remeter a um ente responsável pela enunciação.

Há duas imagens que poderiam servir de âncora para o pronome pessoal “eu”:

uma mulher e um homem, que parece virar-se apenas para admirá-la.

A ambiguidade dessa referência, no entanto, se desfaz, quando são

levadas em consideração algumas pistas icônicas que o texto oferece, bem

como as condições de produção desse evento discursivo. A imagem da mulher

em primeiro plano, o olhar do homem voltado para ela e a cor rosa da embalagem

do produto orientam o leitor à inferência de que o enunciador do depoimento é a

mulher. O fato de o anúncio ser voltado para o target feminino, publicado em

revista para mulheres, corrobora, semelhantemente, a mesma orientação.

Percebe-se que o actante do processo relatado é, ao mesmo tempo, o

sujeito narrante: a mulher apresentada pela imagem e pela primeira pessoa do

singular pronominal e desinencial. O processo narrado, por seu turno, refere-se

à experiência da actante: ver o produto; querer experimentar o produto. A

sequência diz respeito ao encadeamento da experiência, segundo uma

sequência lógica, neste caso, de temporalidade e de causalidade: primeiro, a

actante viu o produto, em seguida, quis experimentar o produto; a actante viu o

produto e, porque viu, quis experimentá-lo. Infere-se, ainda, a partir da

complementação imagética, como resultado, ou como desfecho dessa narrativa,

que a actante experimentou o produto e, por isso, tornou-se alvo do olhar

admirado do rapaz, cuja imagem aparece em segundo plano.

O modo de organização argumentativo do discurso, por fim, é descrito por

Charaudeau (2008b, p. 205) como a ordenação de marcas linguísticas em

função de uma proposta sobre o mundo, provocadora de questionamentos

quanto à sua autenticidade. O sujeito falante busca estabelecer uma verdade

63

referente a essa proposta, diante do questionamento de seu interlocutor,

mediante o desenvolvimento de um raciocínio, levando-o a compartilhar dessa

verdade (processo de persuasão). Esse modo viabiliza que explicações sobre

asserções acerca do mundo sejam construídas, na perspectiva de uma razão

demonstrativa e de uma razão persuasiva.

O autor reconhece que o esquema argumentativo pode estar implícito.

Aliás, para o estudioso, “o aspecto argumentativo de um discurso encontra-se,

frequentemente no que está implícito” (CHARAUDEAU, 2008b, p. 204). Isso se

aplica, majoritariamente, ao discurso publicitário, que muito raramente possui

uma estrutura patentemente argumentativa, mas que deve ser interpretado

segundo essa lógica, visto que a finalidade desse gênero é justamente a

persuasão.

A lógica argumentativa é composta por, no mínimo, três elementos que,

combinados, dão lugar a “modos de raciocínio”: uma premissa, ou asserção de

partida, que representa uma fala sobre os seres, em torno de suas definições,

propriedades, ações ou feitos; uma conclusão, ou asserção de chegada, que

representa a legitimidade da proposta; e a(s) prova(s)/ argumento(s), ou

asserção de passagem, que representa um universo de crença que, ao ser

partilhado com o interlocutor, leva-o a aceitar a proposta como verdadeira

(CHARAUDEAU, 2008b, p. 209).

Essa lógica argumentativa, da ordem da razão demonstrativa, inscreve-

se numa encenação argumentativa, da ordem da razão persuasiva. Para

alcançar a persuasão, o EUc emprega procedimentos que atendam ao seu

propósito comunicativo, de modo a provar a validade da argumentação. O

quadro a seguir resume os componentes da encenação argumentativa.

64

ILUSTRAÇÃO 3 - O MODO DE ORGANIZAÇÃO DO DISCURSO ARGUMENTATIVO (CHARAUDEAU, 2008, p. 231)

A título de ilustração, segue-se o exemplo (8) seguinte, extraído do

corpus.

65

Na peça acima, uma propaganda do Banco Itaú, com a temática da Copa

do Mundo, que aconteceria em 2014, é possível observar o emprego da estrutura

argumentativa – premissa-conclusão-provas – presente no enunciado principal,

e evidenciada pelo operador argumentativo “mas”: “No futebol são onze contra

onze. Mas isso é só até a nossa torcida entrar em campo”.

A premissa, ou asserção de partida, está representada pelo primeiro

período: “No futebol são onze contra onze”. Nele, é apresentada uma das regras

do futebol, relativa à quantidade de participantes. Parte-se, portanto, da ideia de

que, numa partida de futebol, deve haver 22 jogadores, nem mais, nem menos.

A conclusão ou asserção a que se pretende chegar, todavia, é justamente o

contrário dessa regra: não são apenas os 22 jogadores que estão escalados que

devem ser contados como participantes em uma partida de futebol. Essa

conclusão é pressuposta pelos operadores argumentativos “mas”, que denota

FIGURA 8 - MEN´S HEALTH, DEZEMBRO/13

66

uma quebra de expectativa, introduzindo um argumento mais forte; e “só”, que

aponta para a negação da totalidade – que, neste caso, seria a presença de 22

torcedores pelos 90 minutos de duração do jogo. O argumento, ou a asserção

de passagem, apresentado para que se conclua que, no futebol, não são apenas

onze contra onze, é a presença da torcida, podendo-se, então, desenvolver o

raciocínio da seguinte forma: no futebol, são onze contra onze enquanto a torcida

não entra em campo, pois, quando ela entra, os torcedores se unem aos

jogadores e tornam-se parte do time, ou seja, serão, a partir de então, doze

contra onze.

Tendo apresentado os pressupostos relativos à teoria semiolinguística do

discurso, tratar-se-á especificamente do fenômeno da patemização, à luz dos

estudos de Charaudeau e de Plantin.

2.3. Pathos: a presença de emoção no discurso

Optou-se por discorrer acerca do aspecto emocional, ou patêmico, do

discurso em uma seção destacada daquela dedicada à TSD, embora se

reconheça que Charaudeau a ele remeta em sua análise dos eventos

comunicativos, considerando-o, inclusive, uma parte importantíssima do

processo enunciativo. Essa escolha se deu, no entanto, porque a presença da

emoção no discurso se constitui como o cerne desta pesquisa, bem como porque

não se utiliza apenas a perspectiva teórica de Charaudeau (2007c, 2010, 2011)

para delinear esse fenômeno linguageiro, mas também a de Plantin (1997,

1998a, 1998b, 2010). Este estudioso prefere, por sua vez, não seguir a esteira

aristotélica em sua nomenclatura, empregando, em vez disso, um termo mais

abrangente: “emoção”, assim como na Psicologia (cf. item 2.1.). Procurar-se-á,

portanto, cotejar as perspectivas de ambos os autores, realizando-se um

cruzamento entre elas, de modo a lançar luz sobre algumas questões nos textos

publicitários a serem analisados adiante.19

Quando Charaudeau seleciona o termo pathos, e seus derivados

(patemização, patêmico, patemizante, entre outros), para referir-se à emoção,

visa a reforçar a ideia de que a trata como objeto de discurso, ou seja, como um

19 Como a pesquisa toma por base os dois autores, não se fará opção pelo uso de um só termo

– pathos ou emoção.

67

efeito visado, além de deixar clara a referência à Retórica de Aristóteles. Como

já fora mencionado na seção (2.1), a noção de pathos, utilizada por Charaudeau,

remonta à Teoria Retórica, desenvolvida por Aristóteles, enquanto “ciência que

investiga os recursos responsáveis pela persuasão no discurso” (SANTOS,

2012, p.2).

Aristóteles (2007) considera a Retórica como a forma genuína de

argumentação, fundamentada em provas, ou meios de persuasão. Essas provas

podem ser de natureza não artística – baseada em testemunhos e documentos

escritos – ou de natureza artística – baseada na capacidade do orador de

mobilizar meios persuasivos. Interessa a esta pesquisa a provas de natureza

artística, dentre as quais está o pathos, juntamente com o ethos e o logos, e que

são correlacionadas por Charaudeau às estratégias de legitimidade,

credibilidade e captação, conforme apresentadas na seção (2.2).

Conforme apresentado na seção (2.1), o ethos, enquanto prova

persuasiva, refere-se ao caráter do enunciador, que constrói discursivamente

sua credibilidade diante do seu interlocutor, de sorte que este julgue sua palavra

como digna de confiança. Corresponde, portanto, às estratégias empregadas

pelo EUc para projetar, no evento comunicativo, sua imagem enunciativa – o

EUe. Essa imagem enunciativa do orador, por seu turno, relaciona-se com uma

instância receptora, o TU, desdobrado em um TUd – ente discursivo – e em um

TUi – ente social –, instância que corresponde à prova persuasiva do pathos.

Para influenciar o sujeito que recebe e interpreta os enunciados (ou o auditório,

nas palavras de Aristóteles), o EUc recorre a estratégias discursivas de captação

de sua atenção, buscando tocá-lo em seus afetos, ou suas paixões e provocar

nele um determinado estado emocional.

O logos, por fim, constitui-se como o espaço em que o EU constrói sua

legitimidade, a partir do próprio material discursivo, em suas relações lógicas, ou

seja, do conteúdo proposicional dos enunciados, composto por argumentos

verdadeiros ou prováveis (GOUVÊA, 2016, p.4). Corresponde, assim, às

estratégias aplicadas pelo EUc, de modo a desenvolver um raciocínio mediante

a organização da matéria linguística, evidenciando, pois, as dimensões éticas

(EUe) e patéticas (TUd) do discurso. Veja-se um exemplo (9) extraído do corpus,

em que essas três dimensões são evidenciadas:

68

FIGURA 9 – MEN’S HEALTH (OUTUBRO/2012)

Conforme será verificado na análise quantitativa, há a predominância do

componente imagético nas peças voltadas para o público masculino, como se

pode observar no anúncio acima, que ocupa duas páginas da revista e em que

a figura masculina e a imagem do objeto de anúncio – o perfume Malbec, de O

Boticário – dividem a cena, proporcionalmente, em termos de tamanho. É

possível detectar a presença das três provas persuasivas, embora se possa

afirmar que a visada patêmica seja predominante, até mesmo pela prevalência

da imagem sobre o texto verbal, conforme se pode depreender nos dizeres de

Ferez (2013, p. 1001):

O signo icônico (leia-se imagético), justamente por sua constituição baseada na visualidade, revela-se bastante producente para a expressão de características, sejam elas propriedades fisicamente perceptíveis do objeto representado, sejam valores atribuídos ao signo em função daquilo que os interagentes da troca partilham socialmente. [grifo meu]

A prova persuasiva do ethos, ou a imagem do enunciador, projetada na

mise en scène discursiva, é aquela de um observador que, ao mesmo tempo,

impõe e legitima um comportamento ao seu interlocutor, unindo-se a ele pelo

69

uso da primeira pessoa do plural – “nós” –, ao tratar dos homens que não usam

o perfume Malbec, em: “Os outros, [nós] não sabemos, porque [nós] não

prestamos atenção”. Em outras palavras, tanto enunciador quanto destinatário

só observariam os homens que usam Malbec, pois estes seriam homens mais

atrativos. Ainda que, nos enunciados, possam ser identificados os

comportamentos alocutivo (1), delocutivo (2) e elocutivo (3), este último parece

prevalecer como base para a argumentação, como se verá a seguir.

A prova persuasiva do logos, ou o conteúdo proposicional do anúncio, é

o desenvolvimento de um raciocínio lógico que contrapõe homens marcantes e

homens não marcantes, associando-os com o uso ou não uso do perfume

anunciado, respectivamente. Eis os enunciados que constroem esse raciocínio:

(1) Malbec. Deixe sua marca.

(2) Homens marcantes usam Malbec.

(3) Os outros, não sabemos, porque não prestamos atenção.

Propõe-se, por meio desses enunciados, a seguinte subestrutura

argumentativa:

Homens que não usam o perfume Malbec não são notados. Ser notado é

algo bom. Não ser notado é algo ruim. Logo, se você é homem, deve usar

Malbec para ser notado.

Vale ressaltar que o comportamento elocutivo, representado pelo

enunciado (3), se sobrepõe aos outros enunciados como argumento mais forte,

como uma espécie de “cartada final”, como se não fora suficiente dizer que para

ser um homem marcante, deve-se usar Malbec. É preciso dizer, ainda, que,

mesmo optando por usar um outro tipo de perfume, esse homem sequer

receberá alguma atenção, sequer se saberá que perfume é esse, se não for

Malbec. Isso comprova, então, que o comportamento elocutivo prevalece em

relação aos outros em sua força argumentativa.

A prova persuasiva do pathos, a que interessa a esta pesquisa, perpassa

toda a construção da peça publicitária, desde a escolha do modelo a figurar nela,

seu olhar “marcante”, ou sedutor, às cores utilizadas, bem como às escolhas

lexicais e sintáticas do EUc, que têm por objetivo provocar em seu público-alvo

um efeito emocional determinado.

70

O modelo escolhido é loiro, um fenótipo que se sabe não ser maioria no

território brasileiro, ou seja, um tipo incomum. Seu olhar está voltado fixamente

para o leitor, e não apenas a cor de seus cabelos como de sua pele fazem pouco

contraste com o fundo e com a cor da letra que compõe o nome do produto – o

dourado. Essa cor, no entanto, remete ao ouro, um metal valioso, raro e que

chama a atenção. Os olhos castanhos do modelo, por seu turno, que se

pretendem marcantes, dialogam com a segunda página do anúncio, em que

aparece a imagem do produto – o frasco do perfume Malbec, marrom, sobre um

fundo de madeira, o que pode sugerir se tratar de uma essência amadeirada,

bem como remete à masculinidade, segundo os imaginários sociodiscursivos

vigentes.

Observa-se, assim, que o componente icônico do anúncio visa a produzir

um efeito de sedução e virilidade, o que é endossado pela linguagem verbal, que

afirma ao homem que ele precisa ser marcante, sedutor, viril, que precisa chamar

a atenção, ser notado e que só conseguirá isso usando o perfume Malbec. É

possível, até, perceber uma leve sugestão de constrangimento. Enquanto

aqueles que usam Malbec são identificados, nomeados como “homens”, aqueles

que não usam são apenas apontados como “os outros”, anônimos.

Em seus artigos intitulados A patemização na televisão como estratégia

de autenticidade (2010) e Las emociones como efecto de discurso (2011),

Charaudeau procura especificar, no escopo da TSD, o quadro teórico no qual se

inscreve a análise do discurso patêmico, apresentando quais são as condições

necessárias para isso.

A primeira dessas condições diz respeito ao dispositivo comunicativo no

qual se inscreve o discurso produzido. Sua finalidade e os lugares atribuídos aos

parceiros da troca linguageira devem favorecer o surgimento de efeitos

patêmicos. É o caso da publicidade, em que o apelo à emoção do interlocutor

torna-se fator preponderante para a eficácia do ato enunciativo, qual seja,

transformar o leitor do anúncio em consumidor do produto/serviço anunciado –

em especial quando se trata de mercadorias que não são de primeira

necessidade.

A segunda condição relaciona-se ao campo temático sobre o qual está

apoiado o dispositivo comunicativo, ou seja, a temática aludida pelo evento

discursivo deve prever a existência de um universo de patemização, propor

71

tópicas que remetam a efeitos patêmicos. No discurso publicitário, em particular,

as tópicas predominantes são as da felicidade e do prazer. Como afirma

Carvalho (2007, p. 12), “possuir objetos passa a ser sinônimo de alcançar a

felicidade; os artefatos e produtos proporcionam a salvação do homem,

representam bem-estar e êxito”.

A terceira e última condição apontada por Charaudeau (2004, p.23) diz

respeito à instância de enunciação, que se deve valer da mise en scène

discursiva com visada patemizante. Isto quer dizer que a enunciação discursiva

deve explorar a emoção, numa proposta de fazer crer e fazer sentir. A

publicidade se adequa, igualmente, a esta condição, uma vez que toda

encenação discursiva gira em torno de levar o TUd a crer que pode sentir-se

melhor adquirindo o objeto de anúncio. Veja-se o exemplo (10) a seguir:

72

FIGURA 10 - WOMEN´S HEALTH, OUT/2012

Como se pode notar, esta propaganda, veiculada em uma revista

feminina, tem por finalidade divulgar um produto – um creme dental que

branqueia os dentes – e coloca os parceiros da comunicação em relação de

73

benfeitor-beneficiário, conforme o contrato de comunicação publicitário.

Configura-se num dispositivo comunicativo propício ao surgimento de efeitos

patêmicos, uma vez que envolva o procedimento persuasivo na troca

linguageira, de forma que o destinatário da mensagem se identifique com a

imagem que dele é projetada no discurso e seja levado a crer que Colgate

Luminous White é um produto adequado às suas necessidades.

Quanto à temática aludida, de modo geral, na publicidade, a satisfação

pessoal, ou o prazer estão em primeiro plano na construção do evento

enunciativo, sendo, portanto, essencialmente, um discurso patemizante. Na

peça tomada como exemplo, verifica-se que a temática gira em torno do “brilho”

e da “brancura” proporcionados pelo uso do objeto de anúncio – Colgate

Luminous White. O enunciado principal simula um depoimento daquela que seria

a protagonista do anúncio – a top model Fernanda Motta –, que afirma que

Luminous White é tudo o que ela usa para brilhar. Este vocábulo, “brilhar”,

remete à ideia de chamar a atenção, atrair, destacar-se dentre outras, ser uma

estrela, o que sugere os efeitos patêmicos de poder, autoestima elevada.

Quanto à condição que diz respeito à instância de enunciação, pode-se

perceber que o texto acima está todo construído para captar a atenção e a

emoção do interlocutor, no caso, a leitora de Women´s Health, que busca cuidar

de sua saúde, mas, principalmente, de sua beleza, em todos os aspectos. A

instância enunciadora, o amálgama da agência de publicidade e da empresa

produtora do creme dental, utiliza-se da estratégia da identificação da top model

com seu target, de modo a seduzir essa leitora, levando-a a pensar e produzindo

um efeito patêmico de desejo.

Se a top model afirma que usa o creme dental e brilha, então, se eu usá-

lo, também irei brilhar.

2.3.1. A emoção como objeto de análise no discurso

Embora reconheça a importância e a utilidade das abordagens sociológica

e psicológica da emoção, como já fora mencionado no item (2.1.), a Análise do

Discurso tem por objeto de estudo a linguagem enquanto produtora de sentido

numa relação de troca. Conforme afirma Charaudeau (2010, p. 25):

74

O objeto de estudo da análise do discurso não pode ser aquilo que os

sujeitos efetivamente sentem (o que é vivenciar a cólera), nem aquilo

que os motiva a querer vivenciar ou agir (porque ou em que ocasião se

vivencia a cólera), nem tampouco as normas gerais que regulam as

relações sociais e se constituem em categorias que sobredeterminam

o comportamento dos grupos sociais.

Tratar a emoção discursivamente, por conseguinte, é tratá-la como um

sinal, ou uma figura, e o discurso emocional, como um discurso socialmente

codificado, um signo de uma coisa que não está nele, mas da qual é portador

(CHARAUDEAU, 2010, p.25-26). O linguista propõe, desse modo, uma análise

que se identifica como “uma retórica da visada de efeito que é instaurada por

categorias de discursos que pertencem a diferentes ordens (...), nas quais

haveria, entre outras coisas, uma ‘tópica’ da emoção (...) que seria constituída

por um conjunto de ‘figuras’”, sendo complementada por uma teoria dos sujeitos

e da situação de comunicação, como se viu na seção (2.2.), ao se tratar dos

conceitos basilares da TSD.

Sendo uma categoria de discurso, o estudo da emoção, portanto, pode

ser inserido na análise linguístico-discursiva. A despeito das abundantes

discussões que cercam a definição e a categorização das emoções, os estudos

linguísticos têm buscado estruturar o universo patêmico mediante a construção

de “um campo semântico e uma gramática das emoções” (BARBOSA, 2007, p.

60).

Embora bastantes imprecisões possam ser notadas nessa busca, uma

perspectiva linguístico-discursiva não deixa de considerar o campo demarcado

em torno do que seriam os “termos de emoção”, mas contempla também as

situações de interação, o propósito discursivo e as identidades dos sujeitos que

interagem, de modo a delinear as características do “discurso de emoção”

(BARBOSA, 2007, p. 65).

Charaudeau denomina, então, essa mobilização da emoção no discurso

como patemização, definindo-a como “o processo discursivo pelo qual a emoção

pode ser estabelecida” (CHARAUDEAU, 2010, p.34), tanto na instância de

produção quanto na instância de recepção do evento enunciativo, estando,

portanto, esse processo intimamente ligado aos comportamentos enunciativos

elocutivo, alocutivo e delocutivo.

75

Esse agenciamento do pathos no discurso pode dar-se a partir de uma

dupla enunciação do efeito patêmico, de acordo com o autor (CHARAUDEAU,

2010, p. 35): como enunciação da expressão patêmica e como enunciação da

descrição patêmica.

A primeira, a enunciação da expressão patêmica ocorre em função das

duas instâncias da troca linguageira, no sentido de que envolve a manifestação

ou a descrição do estado emocional do EUe – num comportamento enunciativo

elocutivo –, bem como a descrição, por parte desse mesmo EUe, de um estado

emocional no qual o TUd deveria encontrar-se – num comportamento

enunciativo alocutivo. Veja-se, como exemplo, o enunciado central do anúncio

(11) a seguir:

76

FIGURA 11 - MEN´S HEALTH, ABR/14

A peça publicitária acima constitui parte de uma campanha da revista

Playboy que tem como slogan “O homem nasceu para ser livre” e que convida

aos leitores da revista que enviem “leis” que possam compor a “Constituição do

77

homem livre”. O enunciado central da peça seria justamente uma dessas “leis”

que teria sido enviada e aprovada, o artigo 8º: Gostamos de decote. Até da

mulher do nosso melhor amigo.

Não se pode deixar de notar o cunho machista desta campanha,

ressaltando-se, no entanto, que o anúncio está voltado para o público masculino

heterossexual, que seria o público consumidor da revista Playboy, evocando-se,

assim, o estereótipo do “macho-alfa”. Observa-se, na imagem, que ocupa toda

a página, uma mulher aparentemente distraída, com os olhos voltados para algo

que não vemos, debruçada em uma mesa ou bancada, vestida com uma regata

simples. Como está debruçada, seu decote deixa mostrar parte de seu colo,

complementando o enunciado intitulado como “artigo 8º da Constituição do

homem livre”, que trata a respeito do decote.

Com relação ao conceito de enunciação da expressão patêmica, fica

claro, no comportamento elocutivo do EUe, que ele se coloca numa posição de

experienciador da emoção sugerida – o gostar do decote – que remete à

excitação, ao prazer sexual. Esse comportamento pode ser evidenciado pelo uso

da primeira pessoa do plural, presente na flexão verbal “gostamos” e pelo uso

do pronome possessivo “nosso”. Ao mesmo tempo, esse EUe implica o seu TUd,

ao inclui-lo no processo de expressão patêmica, pois não está só nesse “gostar

do decote”: ele se inclui, mas é numa relação de parceria com o seu interlocutor,

como se quisesse afirmar que compartilha do seu desejo pelo corpo feminino.

Outra forma pela qual a patemização se revela é pela enunciação da

descrição patêmica, que ocorre em função da instância de recepção da troca

linguageira, no sentido de que abrange a construção, por parte do EUe, de uma

cena dramatizante que tenha um potencial patemizante – num comportamento

delocutivo – para a qual o TUi deve se projetar, identificando nela a referência

aos seus imaginários sociodiscursivos. Veja-se o exemplo (12) seguinte.

78

FIGURA 12 - MEN´S HEALTH - FEV/2014

Esta peça publicitária, embora também esteja voltada para o público

masculino, traz uma configuração completamente diversa daquela mostrada

anteriormente. Trata-se de anúncio de uma loja de peças íntimas masculinas –

79

ES Colection – uma marca estrangeira, que teria acabado de inaugurar uma loja

no Brasil. O texto superlativiza a importância dessa chegada, afirmando que o

estilista – em pessoa – esteve em nossa terra para inaugurar a loja, bem como

afirmando que se trata de uma marca espanhola, “reconhecida em toda a Europa

por sua qualidade e estilo” e que “tem todas as suas peças desenhadas e

fabricadas em Barcelona”.

Além das estratégias de supervalorização da marca, comuns ao discurso

publicitário, pode-se observar o componente imagético, que traz um forte apelo

à emoção: dois homens considerados belos, segundo os padrões de beleza

vigentes, posando na praia, em posições potencialmente sensualizadas, usando

somente as peças da marca.

Ainda que não se tenham empregado termos explicitamente

patemizantes, pode-se perceber uma descrição de toda uma situação que leva

o leitor ao sentimento de desejo pela marca: uma marca estrangeira, de

qualidade, com modelos exclusivos, que conta com somente uma loja no país,

que veste bem, como se vê nos modelos. Toda a descrição leva a uma ideia de

conforto, status e de poder, culminando na tópica da felicidade.

Em suma, conforme Charaudeau (2007c; 2010), o fenômeno da

patemização pode ser entendido como o emprego de estratégias argumentativas

pelo EUc para influenciar o TUi, inserindo em seu projeto de fala um conteúdo

emocional, a partir do qual pretende causar um determinado estado qualitativo

no interlocutor. Tais estratégias não estão fundamentadas na identidade social

ou discursiva do sujeito comunicante (no seu ethos), tampouco no

desenvolvimento de um raciocínio lógico mediante a manipulação da linguagem

(no logos); elas se estruturam a partir de dados – conhecidos ou presumidos pelo

EUc – a respeito dos imaginários sociodiscursivos do TUi, passíveis de tocar em

sua afetividade e movê-lo em direção ao objetivo persuasivo do evento

enunciativo – o pathos.

Parte-se, nesta análise, da hipótese de que a mensagem publicitária é

construída fundamentalmente sobre a visada patêmica, no sentido de que esta

preenche uma lacuna do contrato publicitário, que diz respeito à sua não

obrigatoriedade de veracidade. Em outras palavras, um anúncio publicitário não

precisa ser verdadeiro, desde que seja verossímil. Se, por um lado, isso permite

ao publicista explorar o universo do faz-de-conta, da sedução, onde tudo é

80

possível, por outro, pode constituir-se num obstáculo à persuasão. Desse modo,

uma vez que a conexão com a realidade palpável do público-alvo possa parecer

lassa, devido à ausência de argumentos lógicos que o levem ao consumo, faz-

se necessário sustentar a argumentação por meio da patemização, atribuindo-

lhe determinados estados emocionais.

Quanto aos “efeitos patêmicos do discurso”, Charaudeau, para melhor

defini-los, reflete acerca de três aspectos: (1) a natureza intencional das

emoções; (2) a relação entre emoções e saberes de crença; e (3) a

representação psicossocial das emoções.

Quanto à natureza intencional das emoções, o estudioso reconhece que

não se pode limitá-las ao universo do irracional, tratando-as somente como

pulsões ou sensações, como se não houvesse nenhuma relação entre

processos emocionais e racionais. Admite, portanto, que há uma base cognitiva

na emoção: sua representação no discurso implica um processo de

semiotização, o que, por sua vez, envolve um duplo processo cognitivo de

transformação e de transação (CHARAUDEAU, 2007c). Além disso, para o

autor, racionalizar implica agir para atingir um objetivo, ou seja, constitui-se em

uma visada acional que, por seu turno, é desencadeada por um desejo, uma

busca, do sujeito que racionaliza. Trata-se, assim, de uma racionalidade

subjetiva, uma vez que sua motivação seja da ordem do universo afetivo.

Em outras palavras, as ações dos sujeitos no mundo são praticadas em

função de uma intenção; esta é constituída por um movimento que abrange: (a)

o desejo de alcançar um objetivo e (b) a escolha (racional) do meio mais

adequado para atingi-lo, dentre uma gama de opções. O “desejo” pode ser

considerado, por si, uma emoção, como também um desencadeador de

emoções; “e é pelo fato de as emoções se manifestarem nos sujeitos ‘a

propósito’ de algo que ele representa para si que elas podem ser nomeadas de

intencionais” (CHARAUDEAU, 2010, p. 28).

Quanto à relação entre emoções e saberes de crença, deve-se ressaltar

que, juntamente com o processo cognitivo envolvido na manifestação de uma

emoção, ocorre um processo avaliativo. Para um sujeito vivenciar ou exprimir

determinada emoção, não basta a ele ter acesso a uma informação que retrate

a realidade que o circunda; faz-se necessário que ele avalie essa realidade, que

se posicione perante essa informação, relacionando-se com ela.

81

Essa tomada de posição, segundo Charaudeau (2010), constitui-se num

saber – o saber de crença. Esse saber se opõe ao saber de conhecimento. Isso

se dá na medida em que o saber de crença se estrutura a partir de valores

subjetivos, atribuídos às informações e experiências vividas, sem, portanto, a

obrigatoriedade de serem valores verdadeiros. “Estas crenças ‘se apoiam sobre

a observação empírica da prática das trocas sociais e fabricam um discurso de

justificação que instala um sistema de valores erigidos em forma de norma de

referência’” (CHARAUDEAU, 2007c, p. 241)20 – os imaginários sociodiscursivos.

Embora haja diferentes posicionamentos sobre a relação entre emoções

e crenças (valores, julgamentos), o linguista considera inegável a associação

entre elas, tendo em vista que a modificação de uma crença pode modificar ou

apagar a emoção; e a modificação da emoção, por sua vez, também evidencia

um deslocamento de crenças. Eis porque, segundo ele, o efeito patêmico de uma

morte, por exemplo, pode variar, a depender do sujeito que a vivencia – se um

médico, ou soldado, amigo, parente ou telespectador –, pois a emoção implicada

no evento é mediada por uma representação, esta, perpassada pelo sistema de

crenças do sujeito (CHARAUDEAU, 2007c, p. 241).

Ao tratar, por fim, da problemática da representação psicossocial da

emoção, o estudioso se refere ao processo de semiotização do mundo e,

consequentemente, da emoção, que se dá por meio das atividades mentais de

transformação e de transação. A atividade de transformação, que consiste na

representação da realidade, compreende dois procedimentos: (1) a

simbolização, em que os objetos do mundo são “traduzidos” para o indivíduo por

meio de um código semiológico; e (2) a auto-apresentação, em que a

simbolização construída pelo indivíduo retorna a ele e se torna o meio pelo qual

ele define o mundo e sua própria identidade. É desse modo que se configuraria,

então, a sua consciência psíquica, bem como sua aprendizagem social.

Nessa perspectiva, Charaudeau (2010) contempla a questão das

representações patêmicas e das representações sociodiscursivas. A

representação considerada patêmica é aquela que envolve a descrição de uma

situação, por parte de um sujeito, em que um julgamento de valor coletivamente

20 Esta citação, embora tenha sido extraída do artigo Pathos e discurso político (2007), remete a outro texto do autor: Les médias et l’information. L’impossible transparence du discours, De Boeck-Ina, Bruxelles, 2005.

82

partilhado é atribuído a um actante (beneficiário ou vítima do evento

representado), com quem esse sujeito estabelece algum tipo de relação. A

relação patêmica, assim, desencadeia nos sujeitos uma reação condicionada

pelas normas sociais nas quais eles estão inscritos. Em outras palavras, o

indivíduo simboliza e autorrepresenta um comportamento reacional a partir de

sua aprendizagem social.

Uma representação pode ser considerada sociodiscursiva, por seu turno,

quando passa pelo processo de transação, ou seja, quando se torna objeto de

troca, transformada em signo por meio da enunciação. Corresponde a uma

configuração simbolizante do mundo baseada em enunciados que testemunham

“a maneira como o mundo é percebido por sujeitos que vivem em comunidade,

os valores que eles atribuem aos fenômenos recebidos, e o que são os próprios

sujeitos” (CHARAUDEAU, 2010, p. 32). Esses enunciados, circulando entre as

práticas sociais mediadas pela linguagem, formam os universos

sociodiscursivos.

A análise do discurso patêmico, contudo, diz respeito também a algumas

outras questões, colocadas por Charaudeau e por Plantin, referentes: (1) à

determinação do objeto de análise; (2) à organização do campo temático

emocional; e (3) à determinação dos índices patêmicos.

A primeira questão, a determinação do objeto de análise, já fora

prenunciada, quando sinalizado que a discursivização da emoção não se

constitui como prova de que aquele estado qualitativo realmente é experienciado

pelos sujeitos envolvidos no evento discursivo. Visto que a emoção não é apenas

resultado de uma racionalidade subjetiva, mas também é de ordem afetiva, não

é possível precisar uma correspondência entre o expresso e o vivenciado. Nesse

sentido, é que Charaudeau (2010, p. 34) propõe que a análise do discurso

emotivo se dê a partir da perspectiva da visada, de um efeito pretendido, e não

a emoção enquanto realidade manifesta, experimentada.

A segunda questão, a organização do campo temático da emoção, está

relacionada às formas possíveis de classificar as emoções, a depender dos

critérios selecionados, o que, por sua vez, depende da perspectiva adotada.

Charaudeau (2010, p. 36) observa que, apesar de haver múltiplas maneiras de

categorizar as emoções, nenhuma delas, ou nem mesmo o cruzamento delas, é

capaz de abarcar todas as especificidades. Diante disso, o autor assinala a

83

necessidade de se levar em consideração a situação social e sociocultural de

surgimento da emoção – a situação de comunicação, os universos de saber

partilhado e as estratégias discursivas –, de modo a organizar o universo

patêmico21.

A terceira questão, a determinação dos índices patêmicos, vincula-se ao

uso de recursos linguísticos e discursivos a propósito do efeito patêmico.

Charaudeau (2010, p. 37) argumenta que o efeito patêmico não é engendrado

no discurso apenas pelo uso de determinados termos que remetem ao universo

emocional. Dessa forma, torna-se necessário considerar a enunciação patêmica

direta, ou explícita, e a indireta, ou implícita. O autor categoriza esses índices

patêmicos, que serão aqui reunidos sob os seguintes rótulos: (a) palavras

explicitamente patemizantes; (b) palavras sugestivamente patemizantes; e (c)

enunciados inseridos em uma situação de comunicação potencialmente

patemizante.

Palavras explicitamente patemizantes seriam aquelas que “descrevem de

maneira transparente as emoções” (CHARAUDEAU, 2010, p. 37), embora não

sejam garantia de que o efeito patêmico se efetivará. Palavras sugestivamente

patemizantes seriam aquelas que, apesar de não descreverem emoções, estão

diretamente ligadas a elas, sugerindo-as, sendo, portanto, “boas candidatas ao

seu desencadeamento” (CHARAUDEAU, 2010, p. 38). Já os enunciados

inseridos em uma situação de comunicação potencialmente patemizante seriam

aqueles nos quais não se pode identificar marca linguística que expresse ou que

sugira emoção, mas que se encaixam em um quadro circunstancial

dramatizante, remetendo a uma determinada reação emocional.

Apesar da subdivisão sugerida, o estudioso assevera que o conhecimento

da situação de comunicação é salutar ao sucesso da visada patêmica e não

somente no caso dos enunciados aparentemente neutros. Visto que esta visada

depende do movimento inferencial operado pelos parceiros da troca linguageira,

deve-se reconhecer que nenhuma das três categorias de recursos linguísticos é

suficiente para assegurar a consumação do estado patêmico.

21 Por essa razão assumiu-se, na seção (3.1), que o arrolamento apresentado, de termos denotadores de emoção, não constitui um inventário fechado, podendo ser acrescidos outros vocábulos sinônimos e derivados.

84

2.3.2. A argumentação das emoções, segundo Plantin

Plantin (2010, p.7-58), no artigo As razões das emoções, explica ser

possível argumentar emoções, no sentido de orientar um discurso “em direção à

expressão de um afeto”, isto é, quando, por esse discurso, se é capaz de

justificar “a atribuição de um experienciado a uma pessoa”. Tal atribuição, feita

a partir do movimento argumentativo, está fundamentada em tópicas de emoção,

que ele define como uma espécie de “sistema de mapeamento do real, de coleta

de informações e de tratamento do evento com múltiplas finalidades: narrativa,

descritiva, argumentativa”. É possível afirmar que esse sistema remete à noção

de imaginários sociodiscursivos, na medida em que abrange o inventário de

dados passíveis de emocionar que, por sua vez, estão relacionados às vivências

dos sujeitos e aos conjuntos de crenças e normas sociais por ele internalizados.

Plantin (2010) trata, igualmente, da presença de índices patêmicos no

discurso, propondo uma categorização das designações de emoção. Pretende-

se, aqui, cotejar sua proposta de classificação com a de Charaudeau (2010), de

modo a obter um quadro mais amplo de possibilidades de patemização, ao qual

se possa fazer referência na análise das peças publicitárias. Aquele autor reúne

as marcas patêmicas em torno dos seguintes eixos: (a) designação direta da

emoção; (b) designação indireta da emoção sobre a base de índices linguísticos;

(c) designação indireta da emoção sobre a base de lugares comuns; (d)

enunciados psicológicos.

A designação direta da emoção se dá a partir do uso de termos de

emoção, cuja classe gramatical de base seria a dos substantivos, mas

compreende também adjetivos e verbos derivados e relacionados ao campo da

afetividade. A designação indireta da emoção, por seu turno, ocorre a partir do

emprego de termos que sugerem emoções. Sua identificação no discurso,

entretanto se dá mediante um movimento de reconstrução da emoção.

Essa reconstrução pode basear-se em índices linguísticos ou em lugares

comuns situacionais e atitudinais. Dentre os índices linguísticos que permitem

reconstruir uma emoção, Plantin cita os “termos de cores” e os “verbos que

selecionam uma emoção”. Já com relação aos lugares comuns, o autor se refere

à atribuição de emoções a enunciados cristalizados, difundidos socialmente

(“Nunca mais terei coragem de me olhar no espelho” - vergonha), ou a

85

descrições de atitudes culturalmente convencionadas (“baixar a cabeça” –

tristeza).

A última categoria apontada por Plantin diz respeito aos enunciados

psicológicos, que seriam aqueles que apresentam um verbo de sentimento ou

verbo psicológico: não se trata de um verbo que expressa claramente uma

emoção, tampouco de um que selecione uma emoção; trata-se de um verbo que

remete a uma fronteira entre o cognitivo e o emotivo e sugere um processo

mental que pode envolver uma emoção. Veja-se um exemplo citado pelo autor:

“Pedro reflete”, em que o verbo “refletir” seria um verbo psicológico.

O quadro a seguir reúne e equipara as categorizações das marcas

patêmicas arroladas por Charaudeau (2010) e por Plantin (2010). Note-se que a

correspondência não é precisa, mas procurou-se estabelecer uma relação de

complementaridade entre ambas as propostas, apresentando-se, também,

exemplos extraídos do corpus, para ilustrar cada uma dessas categorias.

CATEGORIZAÇÃO DAS MARCAS PATÊMICAS

CHARAUDEAU, 2010 PLANTIN, 2010 EXEMPLOS DO CORPUS

(1) Palavras

explicitamente

patemizantes

(1) Designação direta da

emoção

(a) Substantivos “Dove Men Care oferece mais do que

só proteção contra a transpiração”.

(MH, out/12)

(b) Adjetivos “Fique com a parte gostosa do

verão. Corte as calorias e mantenha

o sabor.” – Linea Sucralose (WH,

dez/11)

(c) Verbos “Tudo o que interessa aos homens,

este mês, nas bancas”. – revistas

club Alfa (MH, out/12)

(2) Palavras

sugestivamente

patemizantes

(2) Designação indireta

da emoção

(2.1) Sobre a base de

índices linguísticos

(a) Termos de cores “A vida é um tapete vermelho. Você

está pronta?” – Revista Estilo (WH,

set/12)

86

(b) Verbos que selecionam

uma emoção

“Venha conhecer produtos que

inspiram sua paixão por fitness”. –

Lojas Decathlon (MH, out/13)

(2.2.) Sobre a base de

lugares comuns

(a) Situacionais “Faltou às últimas reuniões na

escola do seu filho? Falta de

educação!” – campanha Educar para

crescer (WH, dez/11)

(b) Comportamentais “Cor e hidratação de dar água na

boca” – batons Clinique. (WH,

dez/11)

(2.3) Enunciados

psicológicos

“Polarize-se”. – lentes xperio (WH,

dez/11)

(3) Enunciados

“neutros” em

situação de

comunicação

potencialmente

patemizante

(MH, jun/13)

QUADRO 9 CRUZAMENTO DAS CATEGORIZAÇÕES DE MARCAS PATÊMICAS DE CHARAUDEAU E PLANTIN22

Gouvêa (2016), em sua pesquisa de pós-doutorado, fez um estudo das

marcas de subjetividade em crônicas jornalísticas. Segundo a autora, além dos

dois estudiosos acima mencionados, há outros linguistas que, semelhantemente,

fornecem contribuições importantes sobre marcas linguísticas da enunciação

que revelam a subjetividade do locutor, bem como suas intencionalidades e,

como consequência, os efeitos que deseja engendrar em seu alocutário. Dentre

esses, ela cita Anscombre e Ducrot (1977), com o estudo dos operadores

argumentativos, Koch (2011), com o estudo da modalização e Kebrat-Orecchioni

(1980), com o estudo dos modalizadores e termos avaliativos. Apresenta-se,

então, no quadro a seguir, como Gouvêa (2016) categoriza essas marcas de

22 Esse quadro foi elaborado pela pesquisadora.

87

subjetividade, que são, também, estratégias de patemização. Procurar-se-á,

igualmente, apresentar exemplos do corpus para ilustrar cada categoria.

ESTRATÉGIAS DE PATEMIZAÇÃO EXEMPLOS

Palavras ou expressões que

desencadeiam emoção

“Dirigir pode ser uma experiência fora do

comum”. – Chevrolet (MH, nov/13) –

sentimento de curiosidade, desejo, prazer

Expressões modalizadoras “Dirigir pode ser uma experiência fora do

comum”. – Chevrolet (MH, nov/13) –

sentimento de curiosidade, possibilidade

Princípio de avaliação “O melhor em conteúdo e tecnologia”. - GPS

Guia quatro rodas (MH, dez/13) – sentimento

de satisfação, vantagem

Enunciados que podem produzir efeitos

patemizantes

“1 garrafinha de ActiCol por dia ajuda a

controlar o colesterol. 120 maçãs também”.

(MH, out/13) – sentimento de deleite, bem-

estar

Princípio de classificação, enumeração

ou quantidade

“A segunda melhor forma de comer fruta.

Pensando bem, já que você não tem que

plantar e colher, essa pode ser a primeira”. –

Sucos Greenday (WH, out/14) – sentimento de

satisfação

Princípio de proximidade ou de

distanciamento

“Viva o verão de perto.” (WH, dez/11)

Palavras que descrevem de modo

transparente emoções

“Declare amor ao seu corpo”. – produtos

Sundown (WH, ago/12)

Topoi “Toda mulher deseja o fim da celulite e o

início de uma pele mais uniforme”. – Renovee

celluulisolution (WH, jan/13)

Verbos que selecionam emoção “Venha conhecer produtos que inspiram sua

paixão por fitness”. – Lojas Decathlon (MH,

out/13)

Menção a situações vividas “Para mim, viver em equilíbrio é fundamental.

Quando vi o novo protetor diário Intimus Days

Ph balanceado, quis logo experimentar”. (WH,

fev/12)

Termos de cores “A vida é um tapete vermelho. Você está

pronta?” – Revista Estilo (WH, set/12)

QUADRO 10 - ESTRATÉGIAS DE PATEMIZAÇÃO SEGUNDO GOUVÊA (2016)

88

Recorrer-se-á à categorização exposta na análise qualitativa e

quantitativa dos dados, na medida em que se pretende mostrar a relação entre

a patemização e as representações de gênero nas peças publicitárias

selecionadas. Veja-se agora, mais detidamente, antes de seguir-se a análise do

corpus, como o gênero de discurso publicitário é caracterizado.

2.4. Publicidade e multissemioses

2.4.1. O gênero de discurso publicitário

Para tratar do gênero de discurso propriamente dito, cabe um

esclarecimento quanto ao conceito de “gênero”, na forma como é utilizado por

Charaudeau. Sua perspectiva acerca do tema se mostra bastante abrangente.

Em seu artigo Visadas discursivas, gêneros situacionais e construção textual

(CHARAUDEAU, 2004), o linguista salienta que uma definição de gêneros de

discurso e de tipos de discurso deve considerar o evento comunicativo

organizado em diferentes níveis.

Ele reconhece um primeiro nível de organização, o nível dos princípios

gerais, formado pelos quatro princípios da influência (alteridade, influência,

regulação e pertinência), que regem a troca linguageira. Além deste, destaca o

nível dos mecanismos de funcionamento da troca linguageira. Este, por sua vez,

compreende os espaços situacional e discursivo da enunciação.

O espaço situacional, ou a situação de comunicação, conforme já foi

descrito, é o lugar onde se instituem as restrições advindas das circunstâncias

de discurso. Se um conjunto de situações comunicativas partilha as mesmas

características, pode-se afirmar que pertencem a um mesmo domínio

comunicativo.

O espaço discursivo é o lugar onde se instituem as maneiras de dizer,

sendo, portanto, semelhantemente, um espaço de restrições, sejam discursivas

– referentes aos modos de organização do discurso –, sejam formais – referentes

ao emprego obrigatório de maneiras de dizer específicas daquela situação de

comunicação.

89

Em todos esses níveis, de acordo com Charaudeau (2004), é possível

fazer referência à noção de gênero. Ele exemplifica essa ideia a partir das

especificidades dos títulos de imprensa: inscritos em uma situação de

comunicação jornalística, podem ser categorizados como pertencentes ao

gênero jornalístico; inseridos, por conseguinte, no domínio midiático, cuja visada

predominante é a de informação, pertencem também ao gênero informativo; as

restrições discursivas, por seu turno, inscrevem os títulos no gênero anúncio; e

as restrições formais, enfim, situam-no no gênero título.

De acordo com o exposto acima, pode-se considerar que os anúncios

publicitários impressos em revistas estão inscritos em uma situação de

comunicação publicitária, pertencendo, então ao gênero publicitário. Estão

situados no domínio propagandista, cuja visada dominante é a de incitação;

pertencem, pois, também, ao gênero propagandista incitativo. De igual modo, as

restrições discursivas inserem-nos no gênero anúncio. Já as restrições formais

enquadram-nos no gênero anúncio impresso (envolvendo, pois, o layout da

página, o apelo visual, a extensão dos enunciados, sua distribuição em blocos,

a presença de termos axiológicos, entre outros aspectos).

Observa-se, contudo, que, no artigo O discurso propagandista: uma

tipologia (2010b), Charaudeau categoriza a propaganda não como um gênero,

mas como um tipo de discurso, que se concretizaria em diferentes gêneros, tais

como o gênero de discurso publicitário, o gênero de discurso promocional

(campanhas que promovem o bem estar social) e o gênero de discurso político.

Desta forma, entende-se aqui que o termo “gênero” pode ser considerado no

sentido lato, como no artigo Visadas discursivas, gêneros situacionais e

construção textual (CHARAUDEAU, 2004).

Nessa perspectiva, o linguista define o domínio (ou tipologia)

propagandista, como um contrato de comunicação marcado pelos seguintes

aspectos:

• O “eu” se encontra numa posição de não autoridade e deve, a partir daí, usar uma estratégia de fazer crer, que atribui ao “tu” uma posição de dever crer.

• Este discurso se origina de um ato voluntário proveniente de uma instância de produção, um “eu”, que constitui uma fonte (...) coletiva, que é determinada e pode ser imputável do ponto de vista de sua responsabilidade (...).

90

• Ele tem como alvo uma instância coletiva, o que explica que ele se inscreva sempre num dispositivo de difusão; daí o qualificativo de “propagandista”, no seu sentido etimológico de difusão e circulação do discurso no espaço público, junto ao maior número possível de pessoas (propagare).

• Para conseguir o objetivo de fazer crer e colocar a instância de recepção em posição de dever crer, o discurso propagandista se organiza de acordo com um duplo esquema cognitivo, narrativo e argumentativo. (CHARAUDEAU, 2010b, p. 62-63)

Já o gênero de discurso publicitário, incluso no domínio propagandista, é

definido pelo estudioso como um subcontrato, desenvolvido num “dispositivo

triangular entre uma instância ‘publicitária’, uma instância ‘concorrência’ (a outra

marca) e uma instância ‘público’” (CHARAUDEAU, 2010, p. 64). A instância

publicitária se apresenta à instância pública como benfeitora, oferecendo-lhe a

realização de seu sonho, por meio de um objeto ideal de busca que é, ao mesmo

tempo, o único meio para essa realização. Da relação entre a instância

publicitária e a concorrência surge um discurso superlativizado, que justifica a

escolha da marca anunciada em detrimento da concorrente.

A expectativa acerca da instância pública, no âmbito individual, é a de que

desempenhe o papel de consumidor da publicidade, passando a consumidor

efetivo do produto. Enquanto comprador em potencial, o público-alvo é levado a

“dever crer” que tem uma falta a ser por ele preenchida, considerando, para isso,

o objeto de anúncio como seu auxiliar na busca que se instaura. Já enquanto

consumidor da publicidade, esse público é levado a um “dever apreciar” a

encenação que se lhe apresenta e, a partir de um procedimento meta-

enunciativo, entender que a instância publicitária necessita de sua conivência.

O circuito de troca em que se engajam essas instâncias pode ser

representado pelo esquema a seguir.

91

ILUSTRAÇÃO 4 - CONTRATO DE COMUNICAÇÃO PUBLICITÁRIO (SOULAGES, 1996, P. 146)

Nota-se que, no circuito externo à fala, os sujeitos psicossociais, são, de

um lado, a instância de comunicação, formada pela Empresa anunciante e pela

agência publicitária. De outro lado, há a instância receptora, formada pelos

consumidores da publicidade e do produto. Esses dois sujeitos são postos em

relação em função de um objeto – o produto, ou mercadoria, ou serviço que é

anunciado. Já no circuito interno à fala, tem-se um enunciador, que desempenha

o papel de benfeitor, numa relação de influência para com um destinatário ideal,

projetado por ele. Essa relação, por seu turno, é mediada por um objeto cultural,

a saber: a mensagem publicitária, que camufla o circuito mercadológico e a

intenção comercial da troca linguageira.

2.4.2. Multissemioses

Um traço fundamental na configuração do texto publicitário é a presença

da linguagem visual – ou recursos icônicos –, que compreende o emprego de

imagens, cores e componentes gráficos. Estes conferem ao texto

propagandístico um caráter multissemiótico, ou multimodal, na medida em que

envolvem outras formas de significar e de apreender significados para além da

modalidade escrita.

Vestergaard e Schroder (2004) salientam que a análise do discurso

publicitário, para que seja eficaz, deve conjugar o conteúdo imagético com o

verbal, visto que a construção dos sentidos nos anúncios apoia-se numa

92

argumentação icônico-linguística, na qual se estabelece uma relação de

complementaridade entre o verbal e o não verbal.

Monnerat, em seu artigo Imagem e cor no discurso publicitário: o

sequestro do olhar (2010, p.1067-1077), trata dessa articulação entre imagens e

cores na publicidade, advogando a ideia de que esses componentes, muitas

vezes, monopolizam a atenção do interlocutor, promovendo o “sequestro” de seu

olhar.

A autora (MONNERAT, 2010, p. 1067; 1069) assinala que a presença do

componente icônico enriquece a mensagem publicitária em seu plano simbólico

e, embora seja naturalmente polissêmico, sua interpretação é orientada pelo

componente linguístico, por meio da redundância ou do acréscimo. Nessa

perspectiva, apoiada em Barthes (1982), identifica três principais papéis dos

recursos gráficos e imagéticos nos textos desse gênero: (a) elemento de

sustentação, como uma paráfrase, uma repetição do texto verbal; (b) elemento

de complementação, fornecendo informações distintas daquelas do texto verbal;

(c) elemento de amplificação, extrapolando as informações do texto verbal. Ela

cita, ainda, Souza (2001), que aponta um quarto papel para a imagem, como (d)

elemento de dissensão, quando contraria o conteúdo proposto pelo texto verbal.

Quanto às diferenças entre a linguagem verbal, em relação à não verbal,

Monnerat (2010, p. 1067-1069) destaca as seguintes: (i) a não arbitrariedade, ou

seja, é motivada pela realidade que representa; (ii) o acesso a outros tipos de

signos para a construção dos sentidos, que não os sons da língua, tais como

gestos, cores, formas, sons musicais; (iii) a não sequencialidade quanto à

apreensão da mensagem, podendo ser interpretada a partir de diferentes

perspectivas (em bloco, por partes, sem depender da dimensão temporal; (iv) a

ausência das categorias dêiticas.

Em relação às cores, Monnerat (2010, p.1070) afirma que,

semelhantemente, são portadoras de significados, mas estes se tratam de

construtos culturais arbitrários, específicos de cada sociedade. Ela cita exemplos

de nossa cultura, em que a cor verde simboliza esperança, a azul, tranquilidade,

a amarela, riqueza e observa, ainda, que as cores, na publicidade, são,

geralmente utilizadas em relação de contraste (sombra e luz) e polaridade (azul

e rosa, por exemplo, que simbolizam o masculino e o feminino, respectivamente).

93

Charaudeau (2007a, p.25) discorre acerca do lugar que devem ocupar

outras semioses para além da linguagem verbal na TSD, ressaltando que não

se trata de uma questão simples de ser solucionada. Essa complexidade pode

ser comprovada mediante a diversidade de nomenclaturas referentes à presença

dos diferentes componentes da forma semiológica dos textos. Nota-se que se

trata de um aspecto que tem despertado cada vez mais a atenção dos analistas

do discurso de variadas escolas. O autor, assim, esclarece que, na teoria que

propõe, os recursos não verbais estão inclusos na materialidade do texto:

(...) deve-se considerar que um texto é compósito do ponto de vista de sua materialidade semiológica (logo, efetivamente “pluri-códico”), porque em sua significância ele depende de uma pluralidade de matérias semiológicas, as quais se combinam numa integração textual, remetendo-se mutuamente (em suas relações de “ancoragem” ou de “relê” tal como o propôs R. Barthes), não podendo dissociar-se umas das outras.

Ele destaca, no entanto, que, ao assumir essa pluricodicidade, ou essa

multissemiose, na composição textual, podem-se seguir duas direções

metodológicas. Uma delas seria proceder à análise dos componentes verbais e

não verbais simultaneamente. A outra, que ele advoga,

(...) consiste em estratificar o objeto em níveis de análise autônomos

correspondentes às diferentes dimensões semiológicas. O CAD 23

estuda cada uma dessas dimensões (o Verbal, o Visual, o Gestual) separadamente. A princípio, o objetivo da autonomização dos estratos é proporcionar, a cada grupo de pesquisadores que se dedicam a um dos estratos, a descoberta de suas próprias unidades, as do estrato, e seu modo de combinação. Num segundo momento, estudar as relações entre os estratos, as quais podem ser de integração ou de interação (compreendendo os contrastes, as oposições, as convergências).

Embora sejam estudiosos do campo da Linguística Aplicada, com uma

proposta de análise da língua e do discurso fundamentada na gramática

sistêmica de Halliday, um pouco diversa da proposta de Charaudeau, Cope e

Kalantzis (2000; 2012) e Kress e Van Leeuwen (2006), tecem algumas

considerações acerca das multissemioses. Tais contribuições foram

consideradas relevantes para o trato com o componente imagético do discurso

publicitário e, portanto, serão aqui sintetizadas.

23 Centro de Análise do Discurso

94

Cope e Kalantzis (2000; 2012) salientam que o corpo humano se relaciona

com o mundo, apreendendo uma enorme gama de informações por meio dos

cinco sentidos, cada um de forma muito específica, em relação de cooperação

uns com os outros. “Isso, de início, garante a multimodalidade de nosso mundo

semiótico” (p. 192)24. Os grupos sociais, entretanto, podem vir a priorizar uma(s)

forma(s) em detrimento de outra(s). No caso da sociedade ocidental, priorizou-

se a audição – os sons da fala – e a visão – as representações gráficas desses

sons por letras. Gradativamente, a leitura de textos verbais escritos, então,

sobrepujou não só outras formas de utilizar o sentido da visão como também

outros modos de construir significados utilizando outros sentidos.

Com a evolução tecnológica dos meios de comunicação, os autores

apontam para a necessidade de repensar esse sistema de construção de

significados, pois, com as novas mídias, surgem também novos gêneros

discursivos, novos textos que exigem habilidades de compreensão para além

das habilidades de leitura e escrita de palavras. Aliás, o próprio sentido de texto

e de linguagem deve ser ampliado, pluralizado, contemplando outras semioses,

como a imagem e o movimento, por exemplo.

A partir dessa concepção ampliada do ato de linguagem, Cope e Kalantzis

(2012, p.279) propõem uma análise das construções (ou designs) de significados

a partir da noção de multimodalidade, ou seja, como os modos de significar se

interligam nas práticas de representação (criação interna de sentidos) e

comunicação (compartilhamento de sentidos). Indicam, assim, sete modos de

significar (modes of meaning), a saber: o modo escrito, o modo visual

(imagético), o modo espacial, o modo tátil, o modo gestual, o modo auditivo e o

modo oral, reconhecendo que todo processo de representação e de

comunicação é, necessariamente, multimodal. O quadro a seguir sintetiza a que

se refere cada um desses modos:

24 That, from the beginning, guarantees the multimodality of our semiotic world.

95

QUADRO 11 - MODOS DE SIGNIFICAR (MODES OF MEANING) - TRADUZIDO E ADAPTADO DE

KALANTZIS; COPE (2012, P.281)

96

Kress e Van Leeuwen (2006), semelhantemente, na esteira da Linguística

Aplicada, propõem uma gramática do design visual, considerando que não se

tem dado muita atenção às regularidades com que os componentes icônicos têm

sido usados para veicular determinados sentidos. Eles acreditam que a

comunicação visual, cada vez mais, faz parte dos domínios da comunicação

pública e, portanto, pretendem dar a esse modo de significar o mesmo valor que

têm o modo escrito. Segundo esses autores,

O que é expresso na comunicação pela linguagem [verbal], por meio da escolha entre diferentes classes de palavras e estruturas de cláusulas, pode, na comunicação visual, ser expresso por meio da escolha entre diferentes usos das cores ou diferentes estruturas composicionais. E isso afetará o sentido. Expressar algo verbalmente ou visualmente faz diferença (KRESS; VAN LEEUWEN, 2006, p.2).25

Os estudiosos da gramática visual reconhecem que a própria escrita é

uma forma de comunicação visual, mas que acabou por tornar-se mais

prestigiada do que a imagem, ao longo da história da comunicação humana.

Kress e Van Leeuwen (2006, p. 18) reconhecem a importância do trabalho

realizado por Rolland Barthes (1964; 1967; 1977), e não abrem mão da

interpretação das imagens a partir da situação de comunicação, mas salientam

que “o componente visual de um texto é uma mensagem independentemente

organizada e estruturada, conectada ao texto verbal, mas de forma alguma

dependente dele – e vice-versa.26

Se a multimodalidade está presente na forma como alguém representa a

realidade, bem como na forma como é comunicada a outros, então se faz

necessário levá-la em consideração na análise do texto publicitário, tão

claramente multimodal, cujo processo de criação depende, cada vez mais, das

25 What is expressed in language communication through the choice between different word

classes and clause structures, may, in visual communication, be expressed through the choice

between different uses of colour or different compositional structures. And this will affect meaning.

Expressing something verbally or visually makes a difference.

26 ...the visual component of a text is an independently organized and structured message, connected with the verbal text, but in no way independent on it – and similarly the other way around

97

novas tecnologias de informação e comunicação. Como destacam Vestergaard

e SchrØder (2004), acerca da modalidade visual:

Trata-se de um aspecto importante de nossa cultura. O apelo visual da imagem configura-se como uma estratégia salutar na estruturação do texto publicitário: se, por um lado, a imagem é menos explícita e precisa do que a linguagem verbal, tem, por outro, a vantagem de poder conter mais informações de forma imediata e simultânea (VESTEGAARD & SCHRØDER, 2004, p. 60).

Não faz parte do objetivo desta pesquisa detalhar todos os aspectos da

gramática visual, visto que são muitos, mas vale destacar alguns comentários

feitos por Kress e Van Leeuwen (2006), que podem ser úteis à análise dos

dados, quais sejam:

• A representação visual pode, assim como a verbal, ser subjetiva, por meio

da presença do ângulo de visão, bem como pode ser objetiva, na ausência

deste (p. 19; 143).

• As imagens podem representar o mundo narrativamente, ou seja, em

termos de “fazer” e de “acontecer” (p. 73).

• O ângulo da câmera pode ser usado para superlativizar ou inferiorizar o

objeto fotografado. Um ângulo inferior ao objeto, por exemplo, tende a

representar poder, transmitindo a impressão de superioridade (p.140).

• O ângulo frontal expressa o máximo de envolvimento entre o ente

fotografado e o observador (p.136; 139).

• O ângulo de visão de cima para baixo é o que demonstra maior poder,

domínio sobre a cena, conhecimento mais objetivo, onisciência (p.143-

144).

Tendo-se tecido essas considerações, tratar-se-á das representações das

identidades de gênero na publicidade.

98

3. AS REPRESENTAÇÕES DAS IDENTIDADES DE GÊNEROS NA

PUBLICIDADE

Embora se saiba que, atualmente, a questão das identidades de gêneros

tem sido frequente nas pautas de discussão em diferentes esferas sociais, não

faz parte do escopo desta pesquisa um debate detalhado, de cunho ideológico,

em torno dessa temática. Esse direcionamento se justifica, primeiramente,

devido ao fato de já haver um quantitativo considerável de estudos que

problematizam o assunto, alguns dos quais serão aqui mencionados. Além

disso, tendo-se em vista que a análise proposta contempla as diferenças nas

estratégias de expressão patêmica em anúncios publicitários voltados para os

públicos masculino e feminino – um fenômeno linguageiro –, a descrição, e não

a argumentação, acerca das representações de gênero se coloca sob foco, para

buscar justificar as escolhas dos índices patêmicos. Dessa forma, nesta seção

considerar-se-á como se constroem as identidades de gênero no texto

publicitário, a partir do conceito de estereótipos sociais, recorrente no discurso

propagandístico, para, então, seguir-se a uma apreciação de como essas

identidades são apresentadas nas peças publicitárias coletadas.

A noção de estereótipo originou-se no campo das ciências sociais, mas é

atribuída a Putman a sua inclusão ao campo da Línguística, na década de 70

(Amossy, 2010). Trata-se de uma ideia convencional associada a uma palavra,

em uma dada cultura (BANKS-LEITE, 2007). Nogueira e Saavedra (2007)

definem estereótipos sociais, basicamente, como atributos generalizadores

acerca de determinadas coletividades, em função de traços como idade,

nacionalidade, etnia, raça, gênero, classe social, profissão, estatura física,

orientação sexual, entre outros. São efetivamente difundidos e partilhados

socialmente, com vistas à categorização simplificada de meios sociais mais

complexos, servindo, porém, muitas vezes, para justificar atitudes

discriminatórias.

Lysardo-Dias (2007) comenta que, por ser, etimologicamente, um termo

que comporta referência a algo preestabelecido, fixado e cristalizado, assumiu-

se, com o tempo, a ideia de que os estereótipos estariam distantes da realidade.

Isso lhes teria conferido, então, esse sentido pejorativo e, consequentemente,

colocado à margem de estudos discursivos. A autora reconhece, entretanto, que

99

toda atividade comunicativa mobiliza, de algum modo, representações

estereotipadas e que se faz necessário, portanto, incluir seu estudo na análise

dos eventos comunicativos, como a publicidade, em que são empregadas com

vistas ao cumprimento do projeto de fala, enquanto estratégias argumentativas,

para instaurar universos comuns de referência. Segundo ela,

Se inseridos em uma perspectiva discursiva, concebermos o estereótipo como um saber prévio partilhado socialmente, constataremos que é a partir dele que a mensagem publicitária é produzida e interpretada. Logo, ele é a ‘engrenagem’ que gera a interação, seja quando ele é reforçado, seja quando ele é subvertido (Lysardo-Dias, 2007, p. 26).

Não se pode deixar de reconhecer que a publicidade se tornou, ao longo

dos anos, uma prática de linguagem de apoio às ideologias que circulam entre

diferentes grupos sociais, especializando-se na naturalização de construções

identitárias, sendo sempre contemporânea e convergente ao momento sócio-

histórico. Os estereótipos podem, assim, ser relacionados a esse gênero

discursivo, numa dupla perspectiva: são empregados no texto publicitário para

consolidar ideologias, ao passo que são eles mesmos, ali, também, mantidos ou

desconstruídos, sendo, portanto, amplamente difundidos, renovados e

atualizados a cada situação de uso. Pode-se afirmar, inclusive, que a eficácia

argumentativa de uma peça publicitária depende do reconhecimento do sistema

de estereotipia utilizado pela instância enunciadora (LYSARDO-DIAS, 2007, p.

26). Veja-se o exemplo (13) a seguir, extraído do corpus desta pesquisa.

100

FIGURA 13 - WOMEN´S HEALTH, DEZEMBRO/ 2011

Observando-se o enunciado principal do texto acima, é possível identificar

a evocação de um sistema de valores relacionado ao padrão estético, emocional

e comportamental convencionado para público feminino: Quem nunca sonhou

com um corpo sarado e com curvas perfeitas dentro do biquíni novo?

A própria estruturação da sentença, como uma pergunta retórica, já

pressupõe que se trata de um conceito compartilhado no universo feminino, pois,

a expressão interrogativa “quem nunca?”, por si, sugere a afirmação de que

“todos sempre”. O enunciado, assim, aponta para a ideia de que toda mulher –

alvo do anúncio – deseja ter um “corpo sarado e com curvas perfeitas”,

semelhante àquele exibido pela moça esbelta e sorridente retratada na imagem,

101

em conformidade com o arquétipo – o estereótipo – da mulher considerada bela

pela sociedade hodierna.

Além de um padrão estético, um padrão comportamental é apontado

como constituinte dessa imagem estereotipada da mulher. Ela não apenas

sonha em ter um corpo belo como o da ilustração, mas também deseja exibi-lo

em um biquíni que tem de ser novo. Evoca-se, aqui, a ideia de que a mulher

cuida de sua aparência, no intuito de mostrá-la a outrem, e também a ideia da

mulher como consumidora por excelência, que terá uma roupa de banho recém-

comprada para usar.

Muitas análises já foram realizadas, observando-se as representações e

as relações de gêneros em anúncios publicitários, tendo-se em vista depreender

como as imagens do masculino e do feminino são estruturadas, enquanto

públicos-alvo da mensagem. Um exemplo bastante significativo, no âmbito da

seleção lexical, é o trabalho de Fadul (2009), que procura examinar os campos

semânticos em peças publicitárias da revista Cláudia, no período que

compreende a década de 60 até a primeira década de 2000. A autora observou,

a partir dos anúncios, uma significativa mudança nas representações dos papéis

sociais desempenhados pelas mulheres, bem como da relação estabelecida com

os homens, sempre permeadas por construções estereotipadas.

É interessante notar que, por mais variados que sejam os estudos

realizados, não parece ser possível dissociar, no processo analítico que ora se

propõe, as identidades de gêneros – masculina e feminina –, na medida em que

estão reciprocamente implicadas e, por mais que se possam tomar diferentes

caminhos – bastante controversos – na problematização dessa questão, optou-

se, aqui, por partir da perspectiva de que a relação de complementaridade entre

essas identidades se mostra inegável. Expresso de outro modo, não há como

delinear os contornos da identidade feminina sem se estabelecer um contraste

com a identidade masculina, ambas manifestas no material verbal e visual dos

textos publicitários. Vale ressaltar que, de igual modo, não se pode dissociar

essas representações de gêneros dos imaginários sociodiscursivos, propostos

por Charaudeau (2015), que refletem os padrões culturais (valores e crenças)

partilhados nos grupos sociais – onde se inserem os estereótipos.

Vestegaard e Schroder (2004) dedicam-se também a esta temática, em sua

obra A linguagem da propaganda. Os autores partem do pressuposto de que

102

(...) os anúncios devem preencher a carência de identidade de cada leitor, a necessidade que cada pessoa tem de aderir a valores e estilos de vida que confirmem seus próprios valores e estilos de vida e lhe permitam compreender o mundo e seu lugar nele. Estamos aqui em presença de um processo de significação, no qual um certo produto se torna a expressão de determinado conteúdo (estilo de vida e valores). Evidentemente, o objetivo final desse processo de significação consiste em ligar a desejada identidade a um produto específico, de modo que a carência de uma identidade se transforme na carência do produto (p. 109-110).

Em função dessa identificação é que se dá a representação de gêneros

em peças publicitárias. A mulher, leitora real, precisa enxergar, na imagem da

mulher construída no anúncio, a sua própria imagem, ou a imagem do ideal que

tem para si. O homem, igualmente, deve ver-se na imagem masculina retratada

no anúncio, ou aquela na qual gostaria de se tornar. De modo geral, a lógica do

consumo se estrutura, então, sobre dois apoios: o consumidor do anúncio torna-

se consumidor do produto anunciado, ou (i) porque este o faz ser quem ele é,

ratificando seus valores e estilo de vida, ou (ii) porque o tornará naquilo que

deseja ser, imprimindo nele os valores e estilo de vida que considera legítimos.

Dessa forma, o discurso propagandístico, segundo os estudiosos,

funciona como um “mecanismo ideológico” que reproduz as identidades de

gêneros dominantes – os estereótipos. No caso de revistas, dirigida a públicos

mais específicos, a publicidade será também segmentada e retratará o

imaginário do target a que ela atende. Anúncios veiculados em uma revista

dirigida ao público masculino homossexual27, por exemplo, embora represente a

identidade masculina, fá-lo-á sob um prisma diferente de uma revista dirigida a

homens heterossexuais.28

Deve-se salientar, ainda, a historicidade dessas representações, visto

que, para convencer, a propaganda deve acompanhar a evolução dos tempos e

das relações interpessoais. Determinados modos de vida que tinham grande

apelo junto ao público-alvo, há dez ou vinte anos, podem não ter mais nenhum

teor persuasivo atualmente.

27 Como ocorria com a revista G Magazine, que apresentava nudez masculina e matérias relacionadas ao estilo de vida homossexual. Ela parou de ser publicada em 2013. 28 Como ocorre com a revista Men’s Health, que traz fotos de mulheres seminuas, ainda que poucas, bem como matérias relativas ao universo heterossexual.

103

Diante dessas colocações, cabe responder à questão sobre os atributos

que constituiriam as identidades feminina e masculina no contexto da

publicidade. Vestegaard e Schroder (2004) apresentam seu ponto de vista,

fundamentados em análises de diversas propagandas voltadas aos dois

públicos. Uma forma de depreender as expectativas que os anunciantes têm,

segundo eles, acerca dos papéis desempenhados por homens e mulheres é

observar o perfil mercadológico das revistas, constituído pelos tipos de anúncios

nelas veiculados. Se uma revista feminina, por exemplo, contém um alto

percentual de anúncios de produtos de limpeza, isso sugere que se espera que

o target da revista se identifique com a imagem da mulher que é responsável

pela limpeza da casa.

No caso das revistas elencadas – Men’s Health e Women’s Health –, cuja

temática se relaciona com o cuidado com a saúde e com a aparência, observa-

se que os anúncios estão voltados para produtos que se colocam como

auxiliares nessa busca, em especial cosméticos, vestuário, acessórios para

atividades físicas e suplementação alimentar.

Sant’Anna (2014), em sua obra História da beleza no Brasil, observa, a

partir da publicidade, como os estereótipos masculino e feminino mudaram ao

longo dos tempos, desde os primeiros anos da República, tendo como foco a

busca pela beleza. A autora salienta que o embelezamento deixou de ser um

assunto supérfluo, tornando-se um tema seriamente tratado nas esferas

científica e midiática, tomando-se a autoestima como fator preponderante para

a manutenção do bem-estar individual e social. A indústria da beleza, que reúne

artigos alimentícios, cosméticos, de saúde e desporto, assumiu o status de

produção de itens de primeira necessidade, passando-se a considerar o corpo

como tão ou mais importante do que a alma já havia sido. Consequentemente,

as identidades de gêneros, os comportamentos, a sexualidade e as noções do

que sejam a masculinidade e a feminilidade acompanharam essa transição, e a

publicidade se mostra, então, como instrumento salutar para consolidar e

verificar esses novos padrões que se iam formando. Segundo ela, na atualidade,

Beleza implica a aquisição de supostas maravilhas em forma de cosméticos, mas também o consumo de medicamentos, a disciplina alimentar e a atividade física. Beleza é, igualmente, submissão a cirurgias, aquisição de prazer acompanhado por despesas significativas, de tempo e dinheiro (SANT’ANNA, 2014, p. 15).

104

É disso, exatamente, que tratam as revistas selecionadas, cujo público-

alvo pode ser definido como aquele(a) que deseja se tornar (mais) belo/bela e

que conseguirá isso não somente seguindo as orientações dadas nas matérias,

como também, e principalmente, adquirindo os produtos anunciados. Vale

ressaltar, ainda, que, visto que o discurso publicitário é um discurso

fundamentado no prazer e satisfação, coloca-se a beleza em status de igualdade

com a felicidade, ou seja, ser belo é ser feliz e ser feliz é ser belo.

Para a análise que se propõe, considerou-se pertinente a seleção que

Vestegaard e Schroder (2004) apresentam de alguns critérios definidores dos

traços identitários masculinos e femininos, dentre os quais se optou por destacar:

(i) o papel desempenhado na vida pública; (ii) o papel desempenhado na vida

privada; (iii) o papel desempenhado nas relações amorosas; (iv) a relação com

a aparência física; e (v) a relação com a tecnologia. Esses critérios são

responsáveis por criar uma espécie de contraste entre as figuras do homem e

da mulher na publicidade, de modo que uma se define a partir do que a outra

não é e a partir do desenho de estereótipos.

Quanto ao papel desempenhado na vida pública, retrata-se nos anúncios

publicitários o que se espera dos homens e das mulheres em relação às suas

atitudes e aptidões profissionais, bem como seu comportamento em relação ao

lazer e às amizades. Já quanto ao papel desempenhado na vida privada,

apresenta-se o que é esperado de homens e mulheres no relacionamento

familiar – a postura perante os filhos e os cônjuges –, bem como na

administração da casa e das tarefas domésticas. Os produtos anunciados são,

então, inseridos nos seus cotidianos, em ambos os contextos, de modo a facilitar

o desempenho de suas atividades. Observe-se a peça publicitária seguinte (14):

105

FIGURA 14 - MEN'S HEALTH, JUNHO/2013

De acordo com o enunciado do anúncio acima – “Você já corre o dia

inteiro” –, é possível inferir que o cotidiano do homem, na esfera pública, deva

ser corrido, ou seja, repleto de atribuições. A afirmação de que o leitor “corre o

dia inteiro” deve ser interpretada de forma figurativa e não literal: não se trata de

um ultramaratonista, mas de um homem que trabalha o dia todo sem parar e

106

que, portanto, precisa de um momento seu – “a hora da caminhada” – que, por

sua vez, ficará mais confortável com o uso do produto anunciado, os tênis Fila

Carvel.

O papel desempenhado nas relações amorosas, por seu turno, diz

respeito às representações da sexualidade masculina e da feminina, bem como

seus comportamentos diante da possibilidade de uma relação afetiva. São

bastante exploradas pela publicidade, e, nelas, entram em cena as “armas”

usadas por homens e mulheres no movimento de conquista, dentre as quais

estão inclusos os próprios produtos anunciados, como auxiliares eficazes no

jogo de sedução. Veja-se o exemplo (15).

107

FIGURA 15 - WOMEN'S HEALTH, DEZEMBRO/2011

Pode-se notar que, assim como o homem, na vida pública, espera-se que

o cotidiano da mulher seja, também, “corrido”. Em contrapartida, em vez de um

108

momento seu, a mulher terá um momento a dois, sendo, surpreendida pelo

parceiro, que se comunica com ela por meio de tweets. Embora não estivesse

preparada para o jantar, com o auxílio do produto – o absorvente de uso diário –

ela pode receber o rapaz sem precisar ter receio da intimidade, apesar de ter

tido um “dia corrido” e não ter acabado de sair do banho para encontrá-lo. No

anúncio, sugere-se que, quanto ao seu papel nas relações amorosas, a mulher

deva estar sempre “preparada” para encontros íntimos, ainda que não tenha

tempo. A fala de Pedro ratifica essa ideia, pois ele não marca um encontro,

propriamente dito, mas apenas comunica à Ana que irá vê-la: “Tô indo aí”. Sem

Carefree, ela poderia se sentir insegura quanto a sua higiene íntima.

A relação com a aparência física – um campo também demasiadamente

explorado pela propaganda comercial – refere-se à visão que homens e

mulheres têm de seus atributos naturais, no sentido de modificá-los

completamente, numa atitude de rejeição, ou de apenas destacá-los, numa

atitude de aceitação. As representações do ideal masculino e feminino nesse

âmbito se dão por meio do anúncio de produtos que auxiliarão essa busca por

uma “melhor versão” da própria aparência.

Nas revistas analisadas nesta pesquisa, observa-se que o ideal de beleza

masculino gira em torno da definição de sua musculatura, isto é, o homem belo

é o homem forte, de músculos rijos. Além disso, a preocupação com a

indumentária é colocada em evidência, mediante a grande quantidade de

anúncios de roupas, calçados, relógios, óculos escuros. Já o ideal de beleza

feminino gira em torno da temática emagrecimento. Em outras palavras, a mulher

bela é a mulher magra, sem celulites ou estrias, com o “abdômen chapado” e as

pernas torneadas. Por isso, alimentos, cosméticos e medicamentos são

anunciados como auxiliares mágicos para alcançar esse objetivo. Apreciem-se

os anúncios a seguir (16 e 17), extraídos do corpus.

109

FIGURAS 16 E 17 - WOMEN´S HEALTH, ABRIL/2013 - MEN´S HEALTH, OUTUBRO/2012

Nos anúncios acima, em que prevalece o componente imagético, é

possível verificar os estereótipos da mulher e do homem não apenas belos como

também saudáveis, o que é reforçado pelas palavras “saudável”, em um, e

“saúde”, em outro. A imagem da mulher sorridente com a fita métrica em torno

da cintura, e do homem com o halter na mão, sugerem aos respectivos leitores

que, para que se encaixem naqueles moldes, colocados como alvos a serem

atingidos, devem consumir os produtos anunciados. A ausência de cobertura em

seus corpos põe em evidência a magreza, no caso da mulher, e a definição

muscular, no caso do homem.

110

Por fim, a relação com a tecnologia ocupa um lugar de destaque na

publicidade, no que se refere ao estabelecimento dos limites entre a identidade

masculina e a feminina, na medida em que os aparatos tecnológicos

acompanham as mudanças nas formas de administrar o tempo, o espaço e,

como consequência, nas formas de estabelecer e manter relações sociais.

Nesse sentido, as representações de gênero em anúncios de aparelhos

eletroeletrônicos, e outros itens que envolvem tecnologias, ocorrem a partir do

que se espera que sejam as necessidades de homens e mulheres, retratando-

se, igualmente, as formas como esses grupos lidam com tais objetos.

Devido, provavelmente, à temática das revistas examinadas, verificou-se

poucas ocorrências de anúncios de eletroeletrônicos, no entanto, podem-se

destacar os seguintes anúncios (18 e 19):

FIGURAS 18 E 19 - WOMEN'S HEALTH, DEZEMBRO/2012; MEN’S HEALTH, JUNHO/ 2013

111

O anúncio da esquerda foi o único encontrado entre os dados coletados,

voltados para o público feminino. Trata-se de uma propaganda de um secador/

modelador de cabelos, item tipicamente pertencente ao universo feminino, usado

para embelezamento. O da direita, por seu turno, foi encontrado repetidamente

nas revistas voltadas para o público masculino, uma propaganda de um aparelho

GPS, que pode ser usado tanto por homens quanto por mulheres.

Quanto à relação estabelecida com a tecnologia, pode-se notar que,

enquanto, para mulheres, esta estaria a serviço da busca pela beleza estética,

para os homens, poderia ser empregada em seu cotidiano, para facilitar suas

atividades. Pode-se, inclusive, fazer referência a um lugar comum, de que

homens não gostam de pedir informações e que, com o aparelho GPS, essa

postura poderia permanecer, sem o risco de que não encontre o caminho. Ou

seja, enquanto o secador de cabelos é o auxiliar da mulher para destacar sua

feminilidade, o aparelho GPS é o auxiliar do homem para destacar sua

masculinidade.

Pode-se afirmar que a patemização se insere nesse contexto, na medida

em que se constitui em mais um dos critérios definidores das identidades de

gêneros, corroborando a construção dos estereótipos masculino e feminino. A

tese que se pretende comprovar com esta análise é justamente esta: a de que

os efeitos patêmicos visados nos anúncios voltados para os públicos masculino

e feminino são distintos, diferenciando-se, também, consequentemente, o

emprego de marcas patêmicas. Isso ocorreria, devido aos imaginários

sociodiscursivos que circundam esses estereótipos, no que tange às suas

manifestações emocionais: parte-se do princípio de que a mulher seria mais

emotiva do que o homem.

Segue-se, agora, a descrição da trajetória metodológica percorrida para a

realização da pesquisa.

112

4. METODOLOGIA

Nesta seção, descrever-se-á, detalhadamente, o corpus selecionado para

a pesquisa, bem como tratar-se-á dos procedimentos que viabilizaram os

resultados obtidos, desde o início da análise. Esta proposta de pesquisa surgiu

de uma inquietação inicial, referente às representações das identidades de

gênero em anúncios publicitários impressos em revistas de grande circulação.

Parte-se do pressuposto de que a publicidade se utiliza dos estereótipos

de gêneros como forma de evocar os imaginários sociodiscursivos dos públicos

masculino e feminino, de sorte que haja uma identificação desses públicos com

as imagens de si apresentadas, bem como se estabeleça a relação entre essa

imagem e o produto anunciado, ocasionando-se, assim, o consumo.

Sabendo-se que a mensagem publicitária se estrutura a partir da visada

incitativa, buscando convencer o interlocutor à compra, mediante estratégias de

persuasão e sedução, pretende-se verificar em que medida o apelo às emoções

se adequa ao público-alvo, evocando os estereótipos de gêneros.

Fundamentada nos construtos teóricos da Teoria semiolinguística do

discurso, além de conceitos relativos à Teoria da comunicação publicitária, à

Psicologia das emoções e à teoria das representações de gênero, esta análise

focaliza o fenômeno da pateminzação na publicidade veiculada em duas revistas

mensais, voltadas para os públicos masculino e feminino – Men’s Health e

Women’s Health, respectivamente – publicadas entre dezembro de 2011

dezembro de 2015.

É interessante iniciar a descrição do corpus observando o título das

revistas, escrito em inglês. Pode-se sugerir que o uso dessa língua confere certo

prestígio à publicação, embora as matérias sejam todas em português, indicando

que não se trata de uma revista para as classes sociais menos favorecidas,

senão para as mais favorecidas – as classes A/B – o que se confirma também

pelo seu valor (em média R$ 14,00).

Foram extraídas 277 peças publicitárias de cada revista, somando-se, no

total, 554 anúncios e 41 edições das revistas, sendo 26, da Women´s Health e

15, da Men´s Health. A tabela a seguir identifica cada edição e o número de

anúncios encontrados em cada uma.

113

WOMEN´S HEALTH ANÚNCIOS MEN´S HEALTH ANÚNCIOS

Dezembro de 2011 23 Outubro de 2012 35

Janeiro de 2012 14 Junho de 2013 33

Fevereiro de 2012 14 Setembro de 2013 15

Março de 2012 11 Outubro de 2013 26

Abril de 2012 16 Novembro de 2013 26

Maio de 2012 14 Dezembro de 2013 29

Julho de 2012 11 Janeiro de 2014 15

Agosto de 2012 12 Fevereiro de 2014 15

Setembro de 2012 17 Março de 2014 14

Outubro de 2012 12 Abril de 2014 21

Dezembro de 2012 17 Maio de 2015 11

Janeiro de 2013 08 Junho de 2015 11

Setembro de 2014 08 Julho de 2015 10

Novembro de 2014 15 Agosto de 2015 05

Dezembro de 2014 10 Novembro de 2015 11

Janeiro de 2015 07 --------------------------- -----------------------

Março de 2015 06 --------------------------- -----------------------

Abril de 2015 06 --------------------------- -----------------------

Maio de 2015 07 --------------------------- -----------------------

Junho de 2015 06 --------------------------- -----------------------

Julho de 2015 09 --------------------------- -----------------------

Agosto de 2015 07 --------------------------- -----------------------

Setembro de 2015 06 --------------------------- -----------------------

Outubro de 2015 08 --------------------------- -----------------------

Novembro de 2015 05 --------------------------- -----------------------

Dezembro de 2015 08 --------------------------- -----------------------

26 EDIÇÕES 277 PEÇAS 15 EDIÇÕES 277 PEÇAS

554 PEÇAS PUBLICITÁRIAS

TABELA 1 - EDIÇÕES E QUANTIDADE DE ANÚNCIOS

114

É interessante notar a disparidade na quantidade de anúncios que, de

modo geral, é maior nas revistas dirigidas ao público masculino. Isso fica

evidente pelo número de edições utilizadas para alcançar o mesmo número de

peças para o cotejo das marcas patêmicas – quase o dobro de edições voltadas

para o público feminino (26 contra 15).

Inicialmente, tentou-se uma análise que contemplasse o mesmo número

de revistas; verificou-se, porém, que essa diferença na quantidade de anúncios

dificultaria uma comparação precisa das estratégias de patemização como

estratégias de construção das identidades de gêneros. Aliás, essa desproporção

causou certo estranhamento, pois era justamente o contrário o que se esperava:

visto ser a mulher, por muito tempo, a consumidora por excelência, a

probabilidade era que houvesse maior quantitativo de publicidade voltada para

ela do que para o homem.

Essa quebra de expectativa, no entanto, fez despertar a atenção para o

tipo de homem e para o tipo de mulher que constituem os targets dessas revistas,

bem como para os tipos de produtos oferecidos nelas, para, então, tentar

compreender a razão por que isso ocorre. Buscou-se, então, identificar o perfil

de ambos os públicos-alvo, de modo a melhor compreender o estilo de

publicidade dirigido a eles.

4.1. O homem de Men´s Health

Como o nome da revista já denuncia – saúde dos homens – trata-se de

uma publicação mensal que visa a atender àqueles homens que buscam uma

vida saudável. Não se trata, porém, de uma revista que traz assuntos ligados à

saúde na acepção do termo como oposto a doença, ou seja, não se trata de uma

revista voltada para homens que buscam se curar de enfermidades.

Ao contrário, o perfil do homem que lê Men´s Health já é um homem

saudável, em geral, do jovem ao de meia idade, atleta e heterossexual. As

edições oferecem uma variedade de temáticas, tais como moda, lazer, culinária

e sexualidade, mas tem como foco a prática de atividades físicas, que envolve a

perda de peso, de gordura corporal, o ganho de massa muscular, bem como sua

definição.

115

Embora o público homossexual possa constituir-se leitor da revista, não é

contemplado com nenhum assunto específico. As últimas edições da revista,

antes de ser extinta, começaram a vir com pôsteres de homens considerados

dentro dos padrões de beleza, o que pode sugerir que esse público estaria, aos

poucos, sendo incluído como target. Como as publicações cessaram em 2015,

não há dados suficientes para comprovar essa tentativa de inclusão.

O que se percebe, nas matérias, em especial aquelas relacionadas a

sexo, é que o homem target da Men´s Health é o “macho alfa”, cuja virilidade é

exaltada. Como foi mencionado, entretanto, o foco está, mais do que em sua

saúde propriamente dita, em sua aparência e, dessa forma, a publicidade está

majoritariamente voltada para a supervalorização e otimização dessa aparência.

A tabela a seguir apresenta os tipos de produtos que são anunciados nessa

revista.

TEMÁTICAS DOS ANÚNCIOS - MEN´S HEALTH

QUANTIDADE

VESTUÁRIO/ ACESSÓRIOS 60

SUPLEMENTOS 49

REVISTAS/LIVROS 32

CALÇADOS 28

PERFUME 20

SITES/ APLICATIVOS 20

ALIMENTOS 14

ELETROELETRÔNICOS 9

LOJAS DE ESPORTES 6

PROCEDIMENTOS ESTÉTICOS 6

HIGIENE 6

EVENTOS ESPORTIVOS 6

EMPRESAS 5

EDUCAÇÃO 4

DESODORANTE 3

BEBIDAS ALCÓOLICAS 3

CARROS 2

MEDICAMENTOS 2

ACADEMIAS 1

COSMÉTICOS 1

TOTAL DE ANÚNCIOS 277

TABELA 2 - TIPOS DE PUBLICIDADE EM MH

116

Observa-se, claramente, que os tipos de anúncios mais recorrentes são

os de vestuário e acessórios (relógios, óculos) – 60 ocorrências – e os de

suplementos alimentares para atletas – 49 ocorrências. Há, também, uma

quantidade relevante de anúncios de calçados e perfumes – 28 e 20,

respectivamente. Esses tipos de anúncios dialogam com a tônica da revista, qual

seja, a aparência do homem, mais até do que sua saúde. Nota-se que a

frequência de anúncios voltados para a saúde, como de alimentos, higiene e

medicamentos, é baixa – 14, 6 e 2, respectivamente.

4.2. A mulher de Women´s Health

Semelhantemente ao perfil do homem leitor de Men´s Health, a leitora de

Women´s Health é aquela mulher que busca manter um estilo de vida saudável,

no que tange à alimentação e à prática de atividades físicas. É um público jovem,

mas independente financeiramente, formado por mulheres que já praticam

atividades físicas e querem dicas para melhorar seus treinos. Assim como na

revista masculina, também não há menção específica para o público

homossexual.

Muito mais do que nas publicações para o público masculino, nestas, a

ênfase se dá no emagrecimento, na “barriga chapada”, no “bumbum e pernas

durinhos”. Percebe-se, aí, ainda a ideia de que a mulher precisa estar magra e

bela para ser desejada pelo homem.

A revista oferece grande variedade de assuntos, dentre os quais estão

moda, make, cabelos, pele, dietas, exercícios específicos para regiões

específicas do corpo, como também sexualidade. A tônica, como na Men´s

Health, é a aparência, muito mais do que a saúde enquanto oposta a doença.

Trata-se de um conceito de saúde associado à beleza, ao prazer estético, ao

culto ao corpo. A mulher, leitora de Women´s Health é saudável se é bela, magra,

se tem peso e o tônus muscular adequados, prescritos pela revista.

A publicidade, desse modo, está voltada para a otimização e manutenção

dessa aparência saudável. Todos os artifícios, portanto, para alcançar a saúde-

beleza, serão oferecidos como itens de primeira necessidade. Veja-se, na tabela

a seguir, os tipos de produtos anunciados.

117

TEMÁTICAS DOS ANÚNCIOS – WOMEN´S HEALTH

COSMÉTICOS 49

ALIMENTOS 49

MEDICAMENTOS 26

VESTUÁRIO/ ACESSÓRIOS 22

EDUCAÇÃO 16

LIVROS/ REVISTAS 15

HIGIENE 14

SITES/ APLICATIVOS 12

CALÇADOS 10

DESODORANTES 10

LOJAS ESPORTIVAS 9

MAQUILAGEM 8

SUPLEMENTOS 7

PROCEDIMENTOS ESTÉTICOS 6

PERFUMES 6

EVENTOS ESPORTIVOS 4

TELEFONIA 4

BANCOS 3

EVENTOS CULTURAIS 2

CARROS 1

ACADEMIAS 1

ELETROELETRÔNICOS 1

UTILIDADES 1

FARMÁCIAS 1

TOTAL DE ANÚNCIOS 277

TABELA 3 - TIPOS DE PUBLICIDADE EM WH

Percebe-se que os tipos de anúncios mais recorrentes nas publicações

de Women´s Health são os de cosméticos e alimentos, com 49 ocorrências,

sendo seguidos pela publicidade de medicamentos, com 26 ocorrências e

vestuário e acessórios, com 22. Comparando-se as duas tabelas, das

publicações para os targets feminino e masculino, é possível observar uma

mudança na prioridade da publicidade bastante relevante. A primeira temática

mais recorrente para o público masculino – vestuário e acessórios – é a quarta

para o público feminino; as temáticas mais recorrentes para o público feminino –

118

cosméticos e alimentos – são pouco frequentes para o público masculino (1 e 14

ocorrências, respectivamente).

Foi a partir dessas considerações que se pensou em trabalhar com o

conceito de estereótipo, que está contido nos imaginários sociodiscursivos que

circundam os eventos enunciativos. Buscou-se, então, pensar na causa de haver

maior quantitativo de publicidade nas edições de Men´s Health do que nas de

Women´s Health e chegou-se a uma possibilidade.

Levando-se em consideração os perfis dos leitores das revistas e as

temáticas dos anúncios, tem-se que o homem que lê a revista em questão está

em busca de melhorar sua aparência, sendo ela uma, entre poucas que há no

mercado de revistas masculinas; logo o investimento na publicidade tende a ser

maior, pois esse homem não é leitor de muitas revistas desse tipo (já que não

há muitas).

A mulher que lê a revista em questão, por seu turno, é uma leitora mais

específica, que busca esta publicação dentre tantas outras que há no mercado

dirigidas a ela, enquanto público-alvo; logo, não se faz necessário tanto

investimento em publicidade para ela, uma vez que, sendo consumidora por

excelência, presume-se que consome também outros tipos de revistas em que

também há certo investimento em publicidade, ou que, até mesmo, não

precisaria de incentivo para consumir, fazendo isso naturalmente.

O tratamento dos dados coletados foi feito tanto qualitativa quanto

quantitativamente, no intuito de comprovar a tese de que o apelo à emoção, na

publicidade das revistas elencadas, é responsável por construir as

representações de gênero masculino e feminino que se querem sancionar ou

difundir.

A análise qualitativa tem por objetivo avaliar o fenômeno da patemização

em si mesmo, além de mostrar que ele constitui uma estratégia basilar sobre a

qual se erige a persuasão nesse gênero de discurso. Isso ocorre por ser a

publicidade definida por um contrato de comunicação que não tem compromisso

com a verdade, mas com a verossimilhança; não só coloca o interlocutor em uma

posição de “dever crer”, mas também em uma posição de “dever sentir” e “dever

apreciar” a cena enunciativa que se lhe apresenta. Cotejam-se dois pares de

peças publicitárias. Cada par é formado por uma peça dirigida aos públicos

masculino e feminino. Busca-se, por meio desse exame, apresentar as

119

estratégias de patemização empregadas nos anúncios, que corroboram a

construção das identidades de gênero.

A análise quantitativa, por seu turno, tem por objetivo observar as

proporções de marcas patêmicas nas peças publicitárias dirigidas aos dois

targets, de modo a verificar as hipóteses propostas.

Tendo em vista que o conceito de emoção é amplamente estudado em

diversas áreas do conhecimento, como a psicologia, a sociologia, a antropologia,

a filosofia e as ciências da linguagem, a pesquisa se vale de uma abordagem

interdisciplinar. Por isso, o referencial teórico adotado compreende autores como

Goleman (2001), estudioso do campo da Psicologia, que forneceu a definição e

categorização das emoções adotadas; no campo da Filosofia, recorreu-se a

Aristóteles, que, na Retórica, nos fornece, também, uma categorização das

emoções, complementar à de Goleman.

Em Plantin (1998a; 1998b; 2010a; 2010b), encontra-se a relação entre

argumentação e emoção; em Vestegaard e Schroder (2004), Neli de Carvalho

(2007), e Monnerat (2003; 2010) são encontrados os conceitos relativos à

construção do discurso publicitário, como também às multissemioses que o

constituem, complementados por Cope e Kalantzis (2000; 2012) e Kress e Van

Leeuwen (2006). Em Nogueira e Saavedra (2007), bem como em Banks-Leite

(2007), Lysardo-Dias (2007), Sant´Anna (2014) e, ainda, Vestegaard e Schroder

(2004), buscaram-se as considerações referentes às representações de

gêneros. Já o modelo de análise do discurso ao qual se filia é aquele preconizado

por Charaudeau (1992; 2004; 2007a; 2007b; 2007c; 2008; 2010a; 2010b).

120

5. PUBLICIDADE, PATEMIZAÇÃO E REPRESENTAÇÕES DE GÊNERO: A

ANÁLISE

5.1. O corpus sob uma perspectiva qualitativa

Serão examinadas quatro peças publicitárias, com vistas a depreender

como se dá o fenômeno da patemização. Elas serão agrupadas em pares, cada

qual dirigido a um tipo de público – o feminino e o masculino, respectivamente.

Pretende-se, com essa distribuição, possibilitar que se vislumbrem as diferenças

no apelo às emoções no discurso para cada um dos targets, de modo a

comprovar a tese que se advoga – a de que o emprego da patemização no

texto publicitário é responsável por construir as representações de gênero

que se quer ratificar ou difundir.

Como foi mencionado na seção (2.3.), a publicidade, enquanto gênero

discursivo, cumpre todas as condições necessárias à análise do discurso

patêmico, sendo, portanto, uma categoria textual propícia ao apelo às emoções

do interlocutor. Isso se dá, porque está inscrito num dispositivo comunicativo que

favorece o emprego de marcas patêmicas, já que a finalidade da publicidade é

tornar o consumidor do anúncio em consumidor do objeto de anúncio, ainda que

não seja um produto de primeira necessidade. A criação de necessidades,

portanto, num jogo de sedução com esse destinatário, faz-se fundamentalmente

presente.

De igual modo, o campo temático explorado pela publicidade viabiliza o

agenciamento das paixões do interlocutor, uma vez que se lida com o mundo do

maravilhoso, dos sonhos e desejos, incitando-se a felicidade e o prazer. Esta

seria a segunda condição para analisar o discurso patêmico. Nada é mais

importante do que proporcionar a satisfação pessoal do destinatário, embora se

saiba que, por trás desse circuito de benefícios, haja todo um circuito

mercadológico muito bem camuflado.

A terceira condição, por fim, seria aquela que diz respeito ao movimento

feito pela instância de enunciação para engendrar o pathos no discurso. O EUe

precisa valer-se da cena enunciativa para causar emoção no outro, explorando-

lhe a emoção, levando-o a crer e a sentir, a partir do uso de estratégias de

captação.

121

A análise será realizada em diálogo com os pressupostos teóricos

apresentados, contemplando-se as marcas patêmicas apresentadas por

Charaudeau (2010) e Plantin (2010), bem como a recategorização proposta por

Gouvêa (2016), em função da construção das identidades dos gêneros

masculino e feminino enquanto públicos leitores das revistas. Lida-se, portanto,

também, com o conceito de estereótipos apresentado na seção (3).

Vejam-se os anúncios, extraídos das revistas Women’s Health de julho de

2012 (A) e Men’s Health de abril de 2014 (B).

122

FIGURAS 20 E 21 - WOMEN'S HEALTH (JULHO/2012) E MEN'S HEALTH (ABRIL/ 2014)

Pode-se notar que ambos os anúncios têm a imagem da mulher como elemento

central do texto, ou seja, numa perspectiva de cena enunciativa, a mulher é a

protagonista dos dois textos, vista, contudo, sob prismas bastante distintos.

Já num primeiro olhar, é possível perceber a presença do apelo à emoção,

completamente distinto para os dois públicos, a partir do componente imagético,

o que será ratificado pelo conteúdo proposicional dos enunciados. Dessa forma,

nesses dois enunciados, a hipótese de que o fenômeno da patemização

constituir-se-ia como base para a construção do texto pertencente ao gênero

123

textual publicitário poderia ser confirmada. Primeiramente, tratar-se-á das peças

separadamente, para, então, serem cotejadas.

No texto (A), voltado para o público feminino, o produto anunciado é o

Antitranspirante Dove, em suas versões spray e roll on, conforme imagem no

canto direito inferior. A imagem feminina se mostra sorridente, de braços abertos,

sugerindo um abraço, gesto que reitera a proposta do enunciado principal:

“Abrace a vida com axilas maravilhosas, agora com mais vitamina E.”

Pode-se afirmar, assim, que a imagem cumpre o papel de repetição do

componente verbal do anúncio.

No que se refere ao papel das cores no anúncio, vê-se a predominância

do branco, que remete, em nossa cultura, a depender das circunstâncias de uso,

à paz, à pureza ou à limpeza. Essa cor está presente no fundo da página, na

vestimenta da mulher e na embalagem do produto, combinado com o azul, que

também faz referência à limpeza e à tranquilidade.

Desde que a temática do anúncio gire em torno da beleza das axilas, o

gesto da mulher pode ser interpretado em função da liberdade de mostrá-las sem

preocupações, uma vez que estão maravilhosas, num movimento

argumentativo que pode ser reconstruído da seguinte forma: Se você, mulher,

quer abraçar a vida, então tem de ter axilas maravilhosas. Se você quer ter axilas

maravilhosas, então deve usar o Antitranspirante Dove com mais vitamina E.

No que tange ao apelo às emoções da interlocutora, é possível observar

que o EUe se coloca numa posição de benfeitor, ao apresentar à leitora um

produto, cuja nova fórmula – com “o dobro de vitamina E” – deixará suas “axilas

suaves, macias e bonitas”, permitindo-lhe, assim, “abraçar a vida”, sem medo de

levantar os braços e ser constrangida com uma aparência indesejável dessa

parte de seu corpo.

É interessante notar que, como a identidade da mulher é construída em

função da rejeição do aspecto natural do seu corpo e em função da impressão a

causar no outro, o uso do produto se justifica pelo fato de que ela poderá abraçar

a vida, pois suas axilas estarão “maravilhosas”. O termo “abraçar a vida” pode

ser entendido como entregar-se inteiramente aos abraços, aos encontros que a

vida proporciona, e isso só é possível se ela não tiver vergonha de mostrar as

axilas ao estender os braços. O produto, desta forma, é colocado como auxiliar

124

nessa busca por “axilas maravilhosas”, o que, naturalmente, a mulher não

conseguiria.

A leitora é convidada, então, a se projetar na imagem retratada no

anúncio, sendo incitado nela o desejo de ter axilas tão maravilhosas, que lhe

proporcionem a liberdade, a felicidade e o prazer estampados naquele rosto. Eis

o efeito patêmico engendrado e reforçado pela cor branca – representativa de

segurança e paz – e pelo uso de determinadas marcas patêmicas. Veja-se o

texto do anúncio transcrito e as categorias de marcas patêmicas destacadas:

“Abrace a vida com axilas maravilhosas, agora com mais vitamina E. Dove

é o antitranspirante que contém ¼ de creme hidratante e agora com o dobro

de vitamina E. Sua nova fórmula deia as axilas suaves, macias e bonitas.

Vá em frente, abrace a vida”. (WH, jul/12)

Palavras que desencadeiam emoção:

• “abrace”, que evoca a afetividade, no sentido de que é uma expressão de

afeto, desencadeando sentimentos como amor, amizade, carinho,

cuidado, proteção, segurança. Pode desencadear, ainda, sensações

como liberdade e conquista, principalmente devido ao contexto linguístico

em que aparece – “abrace a vida” - em que “vida” é um substantivo

abstrato que remete a um todo, aos vários aspectos do cotidiano da

interlocutora.

Princípio de avaliação:

• “maravilhosas”, “suaves”, “macias”, “bonitas” e “lindas”, atributos que

remetem ao prazer estético, à satisfação, à autoestima elevada. Essas

são emoções que evidenciam uma preocupação da mulher com sua

autoimagem, estratégia muito produtiva na publicidade, relacionada o

conceito de estereótipo, que foi trabalhado nos pressupostos teóricos.

125

Enunciado de emoção sobre a base de lugar comum comportamental:

• “Vá em frente” constitui-se num enunciado, cujo sentido, na situação de

comunicação em que se encontra, diz mais do que apenas seguir numa

determinada direção. Trata-se de um comportamento, baseado em um

saber de crença, ou em um topos, que diz respeito a não se deixar abater

por um problema, ou tomar coragem para realizar algo. Nesse sentido, o

EUe procura suscitar no TUd coragem para “abraçar a vida”, para encarar

desafios, para fazer o que quer e precisa fazer.

No texto (B), dirigido ao público masculino, são anunciados suplementos

proteicos da marca Max Titanium, artigos bastante utilizados por pessoas que

praticam musculação, fisiculturistas, bodybuilders e modelos fitness – como é o

caso da mulher retratada, a celebridade Gracyanne Barbosa. Ela se mostra

séria, com os braços erguidos, mãos entrelaçadas nos cabelos, numa postura

patentemente sensualizada.

O componente imagético recebe destaque em relação ao componente

verbal: a figura da mulher é colocada ao centro, e ocupa quase a página inteira.

A cor preta é a cor predominante. Culturalmente, ela pode assumir sentidos

diversos, a depender da situação de seu emprego, tais como luto, mistério, ou

sensualidade. Este terceiro emprego seria o mais adequado à ocorrência,

reiterado no fundo, e na vestimenta da protagonista.

Seu físico de musculatura rígida e definida é colocado em destaque pelo

tipo de roupa com que está vestida, como também pelo jogo de luz e sombra

que ressaltam o tônus de seus braços, abdômen e coxas. Esse destaque se

coaduna com a temática do anúncio, referente à suplementação proteica, que

auxilia no ganho e na definição de massa muscular. Pode-se afirmar, portanto,

que imagem e linguagem verbal se complementam.

O enunciado central – “Qual é a sua meta?” – parece mostrar-se

sutilmente ambíguo, podendo o termo “meta” ser interpretado de duas formas.

Pode evocar uma representação do gênero masculino como aquele a quem é

atribuída a força física, evidente pela protuberância dos músculos; dessa forma,

a “meta” pode se referir ao objetivo de ter músculos como os de Gracyanne, uma

celebridade reconhecida por esse atributo “masculinizado”.

126

Semelhantemente, considerando-se a sensualidade com que a modelo se

apresenta na imagem, sendo um anúncio voltado para homens, a “meta” pode

fazer referência ao objetivo de conquistar uma mulher como Gracyanne,

evocando, também, uma representação de identidade masculina como aquela

do conquistador.

Quanto ao apelo às emoções do interlocutor, nota-se também, no

enunciado central, um teor de desafio, reforçado pela sua forma interrogativa,

num movimento argumentativo que pode ser reconstruído da seguinte forma:

Você, homem, tem de ter uma meta e, seja qual for a sua meta, você só a

alcançará se consumir os suplementos proteicos Max Titanium.

O leitor é convidado a responder à pergunta feita, projetando-se para a

cena enunciativa, em que se depara com a imagem de Gracyanne Barbosa, que

pode inspirá-lo na busca de um corpo musculoso como o dela ou para conquistar

uma mulher como ela. Os efeitos patêmicos que se pretende desencadear são

o de prazer, seja ele estético, seja ele sensual, e o de poder. Esses efeitos são

corroborados pela cor preta – representativa da sensualidade e do poder –, tanto

ao fundo como na roupa da modelo, além da sua própria imagem e postura.

Segue-se a transcrição dos enunciados do anúncio, em que se observa, ainda,

a presença das marcas patêmicas destacadas:

“Qual é a sua meta?”

“Gracyanne Barbosa. Team Max Titanium. Modelo Fitness”.

“Nas melhores lojas de suplementos do país”.

“Máximo desempenho. Máximo resultado”. (MH, abr/14)

Enunciados que podem produzir efeitos patemizantes:

• “Qual é a sua meta?”, enunciado que desafia o interlocutor, de modo a

causar nele um sentimento de competitividade, não apenas pelo uso

do termo “meta”, que remete à imagem da modelo (de seus músculos),

mas pela própria escolha da frase interrogativa, que envolve o

interlocutor, gerando nele a necessidade de resposta.

127

Princípio de avaliação:

• “Máximo”, adjetivo superlativizador, que modifica os substantivos

“desempenho” e “resultado”, remetendo a um limite de qualidade que

não se pode ultrapassar, evocando, assim, os sentimentos de

segurança e confiabilidade, já que o produto é colocado no topo dos

suplementos alimentares para atletas; já que a imagem de Gracyanne

Barbosa pressupõe que ela utilize esses produtos e chegue aos

resultados visíveis em seu corpo graças a eles.

Palavras que desencadeiam emoções:

• “Desempenho” e “resultado”, substantivos que se referem aos

benefícios oferecidos pelo produto, reforçando o sentimento de poder,

um valor muito associado ao homem na publicidade.

Comparando-se os dois anúncios, é possível observar que um contraste

é estabelecido, no que tange às representações das identidades feminina e

masculina. No primeiro anúncio, extraído da Women’s Health, a ideia de

sensualidade parece ser colocada de lado, o que fica evidente pela vestimenta

da protagonista: um vestido branco de modelo evasé, infantilizado, sem

destaque para seios ou qualquer outra parte mais “provocativa” do corpo da

mulher. Pode-se afirmar que a cor e o modelo do vestido recuperam uma certa

pureza da imagem feminina, focalizando-se sua liberdade, sua alegria por estar

bem consigo mesma.

O segundo anúncio, por seu turno, possui um teor mais “sombrio”, mais

noturno, apresentando-se a imagem feminina com traços fortes, sérios, sem a

fragilidade presente no primeiro. A cor e o modelo da roupa aludem a uma

representação da sexualidade feminina, que, com várias partes do corpo à

mostra, é colocada como objeto de desejo para o TUi – o leitor da Men’s Health.

Embora ambas as mulheres estejam de braços erguidos, o sentido desse gesto

pretende um efeito patêmico completamente diferente. Enquanto a imagem da

“mulher de branco” sugere um ideal de liberdade, a imagem da “mulher de preto”

parece sugerir uma submissão sexual ante a figura masculina.

Quanto ao comportamento enunciativo, em ambos prevalece o

comportamento alocutivo, aquele que implica o interlocutor, com o uso da

128

segunda pessoa, numa enunciação da descrição patêmica, já que não há, por

parte do EUe, a expressão de um estado emocional explícito, nem há a descrição

de um estado emocional no qual o TUd deva se encontrar. Isso apenas pode ser

concluído a partir de índices que são fornecidos pelo texto, coadunados à

situação de comunicação.

Por fim, vale destacar que, em ambos, não foram empregados termos

explicitamente patemizantes, mas apenas termos de designação indireta, ou

sugestivamente patemizantes. Observe-se, todavia, que, no anúncio para o

público feminino, há enunciados mais extensos e uma quantidade maior de

termos indiretos de emoção (“abrace”, “maravilhosas”, “suaves”, “macias”,

“bonitas” e “lindas”). Já no anúncio para o público masculino, o apelo visual se

sobrepõe ao verbal. Isso vai ao encontro da hipótese de que as estratégias

patêmicas para o público masculino estariam fundamentadas

predominantemente no componente imagético, enquanto para o público feminino

estariam fundamentadas no componente verbal. Essa hipótese se confirma na

análise quantitativa que será vista adiante.

Veja-se, agora, o próximo par de peças publicitárias, publicadas,

respectivamente, nas edições de agosto de 2015, de Women´s Health e de junho

de 2015, de Men´s Health.

129

Nestes dois anúncios (C/D), diferentemente dos anteriores, o target

pretendido está visual e verbalmente explícito. As marcas patêmicas serão,

igualmente, analisadas, em função da construção das identidades de gêneros.

A peça (C), dirigida ao público feminino, anuncia o novo modelo de tênis

da marca Skechers – o GOWALK 3. No que se refere ao conteúdo imagético do

anúncio, é interessante notar o contraste estabelecido entre cores e entre certos

elementos. No fundo da página, há um jogo de sombra e luz, numa espécie de

dégradée, da esquerda para a direita. A “garota”, protagonista da cena, encontra-

se no canto esquerdo da página, sentada, e o lugar em que ela está é a parte

mais iluminada, há uma luz azulada. No canto direito, onde se encontram os

enunciados e nome da marca, o fundo vai escurecendo, indo do azul ao preto. A

página é dividida, e abaixo há uma faixa branca, como se estivesse fora da cena

130

enunciativa, com informações sobre lojas, sites e redes sociais em que é

possível encontrar o produto.

A “garota” tem uma fisionomia séria, quase triste. Veste-se com um

vestido azul metalizado, justo, tem as pernas à mostra, usa salto alto preto, como

que estivesse arrumada para uma festa à noite. Os cabelos estão soltos,

cacheados. Esse figurino entra em contraste com o objeto de anúncio: tênis para

caminhada, que ela segura nas mãos e que são cor de rosa, contrastando,

igualmente, com a cor azul.

Pode-se afirmar que a cor azul, que, em nossa cultura, remete ao universo

masculino, em oposição à cor rosa – dos tênis –, que remete ao universo

feminino, bem como a vestimenta da protagonista, vão de encontro ao

componente verbal, cujo objetivo é anunciar um modelo de tênis para mulheres

caminharem, não para ser usado com vestidos de festa.

Olhando mais detidamente para o enunciado verbal, no entanto, vê-se

que esse contraste parece ser proposital, em especial em relação ao enunciado

central: “Porque uma garota tem que seguir sempre em frente”.

Esse enunciado justifica o lançamento do modelo GOWALK 3, com base

num imaginário sociodiscursivo, ou numa ideia que se quer difundir acerca das

“garotas” contemporâneas – elas não podem ficar presas ao passado, não

podem olhar para trás, como a garota da imagem está fazendo. Em outras

palavras, o EUe, num papel de benfeitor, oferece os tênis à garota do anúncio –

que pode ser qualquer leitora, seu TUd – e diz a ela: Pare de olhar para trás,

calce esses tênis, porque uma garota tem de seguir sempre em frente. Esquece

o que passou!

O movimento argumentativo que subjaz ao anúncio pode ser

desenvolvido da seguinte forma: Se toda garota tem de seguir sempre em frente,

e os tênis Skechers GOWALK 3 proporcionam conforto e maciez, então, toda

garota deve ter esses tênis.

Quanto ao apelo às emoções da instância de recepção, pode-se

mencionar, primeiramente, o semblante da “garota”, com certo ar de tristeza,

seriedade, ou, até, decepção, inferindo-se que “seguir em frente” se trata de um

lugar comum que remete a algum evento desapontador. Se a proposta do

anúncio é que o TUi se identifique com o TUd projetado na cena enunciativa,

que, neste caso, é a imagem da garota, depreende-se que faz parte da intenção

131

do EUc que o TUi olhe para essa imagem e se emocione, seja sentindo

compaixão, seja sentindo empatia, seja relembrando de alguma decepção

vivida.

Quanto às marcas patêmicas empregadas pela instância de enunciação,

pode-se mencionar algumas, de acordo com as categorias apresentadas nos

pressupostos teóricos. Veja-se o enunciado da peça publicitária e, em seguida,

a especificação das marcas patêmicas:

“Skechers Performance Division. Porque uma garota tem que seguir

sempre em frente. O Skechers Gowalk 3 é feito com nossa mais avançada

e inovadora tecnologia de alta resposta e conforto, Goga Mat. O solado com

Go Pillars proporcionam uma caminhada tão macia que você nem pode

imaginar. A inovação nunca foi tão boa assim”. (WH, ago/15)

Designação indireta da emoção sobre a base de lugar comum

comportamental ou topoi:

• “Porque uma garota tem que seguir sempre em frente” – este

enunciado salta aos olhos e logo remete a um imaginário

sociodiscursivo, ou seja, a um conjunto de crenças e valores

relacionados à construção do estereótipo feminino. Para ser “uma

garota”, é preciso “seguir sempre em frente”, não importa o que

aconteça – um comportamento comum a todas as pessoas que se

identificam como garotas. Esse enunciado procura suscitar, na

interlocutora, um sentimento de coragem e de poder.

Princípio de avaliação:

• “mais avançada”; “inovadora”; “alta”; “tão macia”; “tão boa” – são

expressões axiológicas voltadas para o produto, sendo empregadas

para categorizá-lo e supervalorizá-lo, bem como os resultados que

produz, engendrando o sentimento de confiança e desejo de compra.

132

Expressões modalizadoras:

• “tem que”; “sempre”; “nunca” – trata-se de termos que não deixam

margem para possibilidades, denotam obrigatoriedade, totalidade,

remetendo aos sentimentos de certeza, confiança, segurança.

O anúncio (D), dirigido ao público masculino, refere-se a um novo modelo

de calçados, da marca Pipper – a Linha Beckon Pipper Winter 15. Em relação

ao conteúdo cromático e visual da peça publicitária, pode-se mencionar que o

homem é representado metonimicamente pelos pés e uma pequena parte das

pernas, numa imagem “cortada”. Ele estaria atravessando uma ponte de

madeira, que constitui o fundo da página. A perspectiva que o leitor do texto tem

é de cima, como se o próprio “dono” dos pés tivesse tirado a foto dele mesmo

caminhando sobre a ponte. O pé esquerdo está à frente do direito, dando, assim,

a ideia de movimento. O protagonista, naturalmente, está calçado com o modelo

anunciado, numa cor que não parece possível definir, estando entre grafite, azul

marinho e preto. Há um jogo de sombra e luz, fazendo parecer que o homem

está ao ar livre e a luz do sol alcança seu pé esquerdo. De cima para baixo, a

página escurece, mas os tons permanecem pastel, dando destaque para o

calçado, que é escuro.

Em relação ao componente verbal do anúncio, pode-se afirmar que a

imagem o reitera e também o complementa. Enquanto os pés ocupam a parte

inferior e esquerda da página, os enunciados ocupam a parte central, ao longo

dela, sendo divididos em quatro porções, por tamanho de letra, que diminui

gradativamente. Vê-se o enunciado principal – “Os homens querem o mundo aos

seus pés.”; o enunciado que aponta a marca – “E os seus pés, o que querem?

Pipper”; o enunciado que apresenta o modelo – “Linha Beckon Pipper Winter 15”;

e o enunciado que recebe menor destaque, o qual apresenta os espaços virtuais

onde a marca é divulgada (site, instagram, youtube, facebook).

Com relação à argumentação subjacente ao anúncio, pode-se verificar

que ela está fundamentada no estereótipo masculino, do homem como

explorador, conquistador. Não por acaso ele está atravessando uma ponte, ao

ar livre. O movimento argumentativo dessa cena enunciativa pode ser, então,

desenvolvido da seguinte maneira: Se os homens querem o mundo aos seus

133

pés e os seus pés querem Pipper, então, eles devem conquistar o mundo

usando Pipper.

No que tange aos efeitos patêmicos engendrados no anúncio, vê-se que

o componente visual procura transmitir certa sobriedade e objetividade, com

cores neutras, atributos que remetem ao imaginário sociodiscursivo próprio do

universo masculino. É nos enunciados, no entanto, que a carga patemizante se

encontra mais forte, em função do emprego de determinadas estratégias. Veja-

se o enunciado da peça publicitária:

“Os homens querem o mundo aos seus pés. E os seus pés, o que querem?

Pipper. Linha Beckon Pipper Winter 15.” (MH, jun/15)

Designação indireta da emoção sobre a base de lugares comuns

atitudinais, ou topoi:

• “Os homens querem o mundo a seus pés” – este enunciado apresenta

uma atitude que remete ao imaginário sociodiscursivo do universo

masculino, que o caracteriza como conquistador, explorador,

procurando, assim, gerar no interlocutor o sentimento de poder.

Querer ter o mundo a seus pés constitui-se numa atitude de um

indivíduo que aprecia ter o controle de todas as situações, ser aquele

que manda, que faz o que quer sem ser questionado.

Enunciados que podem produzir efeitos patemizantes:

• “E os seus pés, o que querem? – neste enunciado, aparentemente

neutro, os pés estão personificados, a ponto de possuírem vontade

própria. Já que são tão importantes no ato de explorar, conquistar,

merecem o melhor, e o melhor é Pipper. O homem, representado

metonimicamente pelos pés, é a imagem do interlocutor projetada na

cena enunciativa. Assim, o EUc não só sugere ao TUi que ele é quem

deve desejar, querer usar o novo modelo da marca para ser dono do

mundo, mas também busca provocar nele um estado emocional de

prazer, satisfação. O enunciado, na forma interrogativa, envolve o

interlocutor, gerando nele a necessidade de resposta e, como a

134

resposta é dada – seus pés querem Pipper –, cabe a ele concordar ou

não com ela.

Cotejando-se as duas peças, (C) e (D), pode-se observar que ambas

anunciam calçados, embora para objetivos diferentes. Com relação ao

componente imagético e cromático, percebe-se que ele é mais explorado em

(C), a partir do contraste, enquanto em (D), procura-se transmitir uma ideia de

sobriedade. O semblante da mulher tem uma carga emocional bastante

relevante em (C); já em (D), o homem é representado apenas pelos pés,

explorando-se pouco o componente imagético para a visada patêmica.

Em relação à construção das identidades de gêneros, tem-se dois

enunciados centrais baseados em topoi, que procuram difundir e ratificar

saberes de crença, ou estereótipos acerca do que é ser mulher e do que é ser

homem. Ser mulher é não olhar para trás, é “seguir sempre em frente”, a despeito

das decepções. Ser homem, por seu turno, é ser conquistador e explorador,

poderoso, com “o mundo a seus pés”.

Ambos os enunciados buscam encorajar seus destinatários, mas a

motivação para esse encorajamento é diferente, e isso é percebido pelo

componente imagético. O rosto decepcionado, voltado para trás, da protagonista

de (C), sugere que ela está sendo consolada e precisa assumir aquele enunciado

como verdade; o homem em movimento sobre a ponte de madeira, ao ar livre,

em (D), sugere que o enunciado já é uma verdade para ele.

5.2. O corpus sob uma perspectiva quantitativa

A análise do corpus sob uma perspectiva quantitativa procura contemplar

as hipóteses que foram apresentadas na introdução da pesquisa, e que serão,

aqui, retomadas, para ser ou não comprovadas. São elas:

1) O fenômeno da patemização constituir-se-ia em base para a

construção do texto pertencente ao gênero de discurso publicitário.

2) A presença das estratégias de patemização seria mais marcada nos

anúncios para o público feminino do que para o masculino.

135

3) As estratégias patêmicas empregadas em anúncios para o público

masculino estariam fundamentadas predominantemente no

componente imagético do texto publicitário, enquanto as estratégias

patêmicas direcionadas ao público feminino estariam fundamentadas

predominantemente no componente verbal do texto publicitário.

4) O percentual de palavras que descrevem de modo transparente

emoções empregado em anúncios para o público feminino seria maior

do que para o público masculino.

5) Entre as palavras que descrevem de modo transparente emoções

(nomes e verbos), o percentual de verbos seria maior do que o de

nomes, nos anúncios voltados para o público feminino, enquanto o

percentual de nomes seria maior do que o de verbos, nos anúncios

voltados para o público masculino.

Tomar-se-á, como base, o quadro e a nomenclatura de estratégias

patemizantes apresentados por Gouvêa (2016), para o tratamento dos dados,

que se encontra reproduzido a seguir:

ESTRATÉGIAS DE PATEMIZAÇÃO EXEMPLOS

Palavras ou expressões que

desencadeiam emoção

“Dirigir pode ser uma experiência fora do

comum”. – Chevrolet (MH, nov/13) –

sentimento de curiosidade, desejo, prazer

Expressões modalizadoras “Dirigir pode ser uma experiência fora do

comum”. – Chevrolet (MH, nov/13) –

sentimento de curiosidade, possibilidade

Princípio de avaliação “O melhor em conteúdo e tecnologia”. - GPS

Guia quatro rodas (MH, dez/13) – sentimento

de satisfação, vantagem

Enunciados que podem produzir efeitos

patemizantes

“1 garrafinha de ActiCol por dia ajuda a

controlar o colesterol. 120 maçãs também”.

(MH, out/13) – sentimento de deleite, bem-

estar

Princípio de classificação, enumeração

ou quantidade

“A segunda melhor forma de comer fruta.

Pensando bem, já que você não tem que

plantar e colher, essa pode ser a primeira”. –

Sucos Greenday (WH, out/14) – sentimento de

satisfação

Princípio de proximidade ou de

distanciamento

“Viva o verão de perto.” (WH, dez/11)

136

Palavras que descrevem de modo

transparente emoções

“Declare amor ao seu corpo”. – produtos

Sundown (WH, ago/12)

Topoi “Toda mulher deseja o fim da celulite e o

início de uma pele mais uniforme”. – Renovee

celluulisolution (WH, jan/13)

Verbos que selecionam emoção “Venha conhecer produtos que inspiram sua

paixão por fitness”. – Lojas Decathlon (MH,

out/13)

Menção a situações vividas “Para mim, viver em equilíbrio é fundamental.

Quando vi o novo protetor diário Intimus Days

Ph balanceado, quis logo experimentar”. (WH,

fev/12)

Termos de cores “A vida é um tapete vermelho. Você está

pronta?” – Revista Estilo (WH, set/12)

QUADRO 12 - ESTRATÉGIAS DE PATEMIZAÇÃO (GOUVÊA, 2016)

A primeira hipótese diz respeito à construção dos textos pertencentes ao

gênero publicitário, que estariam fundamentados no fenômeno da patemização.

Para comprovar esta hipótese, foi necessário fazer um recorte, devido ao número

de anúncios coletados. Foram, portanto, selecionadas duas estratégias de

patemização, a saber: (1) palavras que descrevem de modo transparente

emoções; e (2) princípio de avaliação.

Quanto às palavras que descrevem de modo transparente emoções,

pode-se remeter àqueles termos listados na seção (2.1), em que se delimita o

conceito de emoção com o qual se lida. Trata-se de todos os substantivos que

fazem referência explícita a um sentimento, uma emoção, uma paixão, bem

como seus derivados, sejam eles adjetivos, sejam verbos. Já o princípio de

avaliação diz respeito àqueles termos axiológicos, que atribuem uma

característica ao objeto de anúncio, desencadeando, assim, certos tipos de

sentimentos no interlocutor que o levarão ao consumo do objeto de anúncio, mas

que não o fazem de forma direta ou transparente.

Vejam-se as tabelas que identificam esses termos em ambas as revistas.

137

(I) Palavras que descrevem de modo transparente emoções.

Men’s Heath

TABELAS 4, 5, 6 - PALAVRAS QUE EXPRESSAM DE MODO TRANSPARENTE EMOÇÕES - MH

138

TABELAS 7, 8, 9 - PALAVRAS QUE EXPRESSAM DE MODO TRANSPARENTE EMOÇÕES - MH

TABELAS 10, 11, 12 - PALAVRAS QUE EXPRESSAM DE MODO TRANSPARENTE EMOÇÕES - MH

139

TABELAS 13, 14, 15 - PALAVRAS QUE EXPRESSAM DE MODO TRANSPARENTE EMOÇÕES – MH

TABELAS 16, 17, 18 - PALAVRAS QUE EXPRESSAM DE MODO TRANSPARENTE EMOÇÕES - MH

140

Women´s Health

TABELAS 19, 20, 21 - PALAVRAS QUE EXPRESSAM DE MODO TRANSPARENTE EMOÇÕES - WH

TABELAS 22, 23,24 - PALAVRAS QUE EXPRESSAM DE MODO TRANSPARENTE EMOÇÕES - WH

141

TABELAS 25, 26, 27 - PALAVRAS QUE EXPRESSAM DE MODO TRANSPARENTE EMOÇÕES - WH

142

TABELAS 28, 29, 30 - PALAVRAS QUE EXPRESSAM DE MODO TRANSPARENTE EMOÇÕES - WH

143

TABELAS 31, 32, 33 - PALAVRAS QUE EXPRESSAM DE MODO TRANSPARENTE EMOÇÕES - WH

TABELAS 34, 35, 36 - PALAVRAS QUE EXPRESSAM DE MODO TRANSPARENTE EMOÇÕES - WH

144

TABELAS 37, 38, 39 - PALAVRAS QUE EXPRESSAM DE MODO TRANSPARENTE EMOÇÕES - WH

TABELAS 40, 41, 42 - PALAVRAS QUE EXPRESSAM DE MODO TRANSPARENTE EMOÇÕES - WH

145

TABELAS 43, 44 - PALAVRAS QUE EXPRESSAM DE MODO TRANSPARENTE EMOÇÕES - WH

Vale observar que há, entre essa categoria de palavras, não somente

substantivos que denotam um sentimento, como, por exemplo “coragem”, mas

também há adjetivos considerados como derivados dessas palavras, como

“confortável”, que provém de “conforto”, e verbos, como “aprecie”, relacionado

ao substantivo “apreciação”. Embora esses adjetivos pudessem ser

compreendidos como pertencentes à categoria do princípio de avaliação – afinal,

exprimem um julgamento, atribuem determinada valoração ao objeto ao qual

146

estão relacionados –, optou-se por considerá-los como palavras que expressam

de modo transparente emoções. A seguir, observem-se, no gráfico abaixo, os

números em percentuais, da estratégia já analisada.

GRÁFICO 1 - PALAVRAS QUE DESCREVEM DE MODO TRANSPARENTE EMOÇÕES

Pode-se observar que, nos anúncios voltados para o público masculino,

publicados nas edições de Men´s Health, há uma frequência de 37% de palavras

que descrevem de modo transparente emoções, ou, como prefere Plantin

(2010), de índices diretos de emoção (237 ocorrências). Nas peças voltadas para

o público feminino, por seu turno, há uma frequência, entre nomes e verbos, de

63% de marcas patêmicas de mesmo tipo (407 ocorrências). Somando-se todos

esses termos, tem-se uma totalidade de 644 marcas patêmicas, num corpus

constituído por 554 anúncios publicitários (277 de cada revista). Esta categoria,

por si só, já seria suficiente para comprovar a hipótese de que o fenômeno da

patemização se constituiria em base para a construção do texto pertencente ao

gênero publicitário, entretanto será examinado, ainda, com a finalidade de

confirmar a mesma hipótese, o peso da estratégia princípio de avaliação no

próximo item (II).

63%

37%

PALAVRAS QUE DESCREVEM DE MODO TRANSPARENTE EMOÇÕES

WOMEN´S HEALTH

MEN´S HEALTH

147

II. Princípio de avaliação

Há adjetivos que, embora não expressem um sentimento de forma

transparente, atribuem a determinado ser características que o distinguem de

outros seres, e são empregados para suscitar, semelhantemente, estados

patêmicos no interlocutor. Na publicidade, isso é muito comum, como estratégia

de singularização do produto, em que ele é colocado como diferente, mais eficaz,

melhor do que os demais. Por se tratar de uma estratégia muito produtiva no

gênero discursivo examinado, foi realizado apenas um recorte, com dados

considerados suficientes para comprovar a referida hipótese.

Foram selecionadas 35 peças publicitárias de uma das edições de Men´s

Health, a de outubro de 2012, bem como 35 peças publicitárias de duas edições

de Women´s Health, as de dezembro de 2011 e janeiro de 2012, totalizando,

assim, 70 anúncios. Com essa quantidade de anúncios, foram verificados 178

termos axiológicos (mais ou menos subjetivos), responsáveis por classificar os

termos aos quais foram antepostos ou pospostos, sendo 60 desses termos

encontrados em anúncios para o público masculino e 118, naqueles voltados

para o público feminino.

Dada a produtividade desses termos avaliativos – que, no contexto

linguístico e na situação de comunicação em que são empregados, provocam

certa carga emocional –, confirma-se a hipótese de que, na publicidade, o

fenômeno da patemização constitui-se em base para a construção das peças.

Como já foi explicitado nos pressupostos teóricos, isso ocorreria porque a

publicidade procura vender não apenas um produto, mas todo um imaginário que

o circunda, centrado nas tópicas do prazer, da felicidade e da satisfação pessoal.

O objeto de anúncio, portanto, precisa ser descrito como a solução para as

necessidades do leitor.

No gráfico a seguir, apresentam-se os percentuais dos termos axiológicos

que foram encontrados em ambas as revistas. Vale observar que, embora seja

bastante recorrente nos textos voltados para os dois targets, o apelo ao público

feminino segue sempre sendo maior. Isso será tratado na comprovação da

próxima hipótese.

148

GRÁFICO 2 - PRINCÍPIO DE AVALIAÇÃO

Como se pode observar, na totalidade de 35 anúncios de cada revista,

houve uma frequência de 66% de termos axiológicos na Women´s Health, contra

34% na Men´s Health. Os quadros a seguir apresentam os termos axiológicos,

ou adjetivos avaliativos, inseridos no contexto imediatamente anterior e/ou

posterior à sua ocorrência, de modo que se possa, ao menos, vislumbrar a carga

patêmica que conferem aos enunciados.

MEN´S HEALTH - OUTUBRO 2012 – total de 35 anúncios

POSPOSIÇÃO TERMO

AXIOLÓGICO

ANTEPOSIÇÃO

1 Homens Marcantes

2 creme Hidratante

3

Novo Dove men+care

4

suave Com a sua pele

5

saudável Para sua vida

6 nada melhor

7 especialmente selecionadas

8 especialmente produzidas

66%

34%

PRINCÍPIO DE AVALIAÇÃO

WOMEN´S HEALTH

MEN´S HEALTH

149

9 barra crocante

10 leve O melhor

11

A maior Loja on-line

12 opinião forte

13 opinião consistente

14 Tudo fica melhor

15

Maior Rede de hotelaria

16

inúmeras vantagens

17

A maior Linha de produtos

18

A maior Rede de suplementos

19

alto nível

20 A mais nobre Apresentação dessa proteína

21 Proteína de

absorção

lenta

22 Para suporte muscular

23 períodos maiores

24 bicho De pelúcia

25

poucas sessões

26 avaliação grátis

27 líder mundial Em foto depilação

28 método Mais moderno

29 método duradouro

30 únicos suplementos

31

líderes De qualidade

32

Insuperáveis No sabor

33 Lições de casa instigantes

34 Sabia que eram importantes

35 Ato passivo

36 Ato ativo

37 Uma coisa é certa

150

38 O conteúdo não

nasce

pronto

39 A lição de casa é Fundamental

40 notas melhores

41

Uma nova Maneira de ler

42

A maior variedade

43

O maior acervo

44 conteúdos interativos

45

alto Teor proteico

46 aminoácidos essenciais

47 nutrientes importantes

48 recuperação muscular

49 viver melhor

50 Viver melhor é fácil

51 conteúdo relevante

52 conteúdo útil

53 conteúdo multiplataforma

54

A melhor informação

55

As melhores viagens

56 atrações imperdíveis

57 Chegaram Os novos GPS

58

melhor Conteúdo e tecnologia

59

Mais diversas atrações

60 processador Mais rápido Do mercado

QUADRO 13 - PRINCÍPIO DE AVALIAÇÃO EM MH

WOMEN´S HEALTH – DEZ 2011 e JAN 2012 – total de 35 anúncios

POSPOSIÇÃO TERMO

AXIOLÓGICO

ANTEPOSIÇÃO

1 Poder Nutritivo

2 Nova Linha de produtos

151

3 Benefícios Preciosos

4 Resultados Visíveis

5 Novas Evidências

6 Nova Proteína

7 A pele é visivelmente Rejuvenescida

8 A pele é visivelmente Revitalizada

9 A pele é visivelmente Aveludada

10 Tez Uniformizada

11 Pele Radiante

12 Pele Iluminada

13 Nova Descoberta científica

14 Ótima Opção

15 Nutricionalmente Completo

16 Alto Teor de proteínas

17 Vitaminas Antioxidantes

18 Nutrientes Que auxiliam na

redução do

apetite

19 Seja Mais rápido

20 Dia corrido

21 Ser saudável

22 Viver bem pode ser fácil

23 Viver bem pode ser refrescante

24 Água gelada

25 Ótimas Fontes

26 É Cristalina

27 Suplemento Mais utilizado

28 Única Com certificado

29 Fórmula Exclusiva

30 Substâncias Nocivas

31 Tecidos Musculares

152

32 Fadiga Física e mental

33 Massa Muscular

34 Sendo Necessária

35 Atividades Musculares

36 A creatina não é Tóxica

37 Óculos Solares

38 Lentes Solares

39 Maior Nitidez

40 Melhor Percepção

41 A sobremesa Dos sonhos

42 Uma aparência Renovada

43 Uma aparência Descansada

44 Longa Durabilidade

45 Corpo Sarado

46 Curvas Perfeitas

47 Biquíni Novo

48 Imperfeições Mais temidas

49 Pequenas Cicatrizes

50 Maior Número

51 Crescimento Rápido

52 Ficam bem Visíveis

53 Tratamento Moderno e

renovador

54 Pele Mais

homogênea

55 Gás carbônico medicinal

56 Os peelings... Podem ser Químicos

57 Os peelings... Podem ser Mecânicos

58 Aspecto De casca de

laranja

59 Tecido gorduroso

153

60 Tecido Fibroso

61 Causas Mais comuns

62 Genética Familiar

63 Alterações Hormonais

64 Aplicação Localizada De enzimas

65 Forma Rápida

66 Exercícios Físicos

67 São Fundamentais

68 Regiões Específicas Do corpo

69 Difícil Tratamento

70 Grande Insatisfação

71 Um melhor Resultado

72 Massagens Modeladoras

73 Gordura Local

74 Seu corpo Saudável

75 Nova Fórmula

76 Proteção Top

77 Proteção Imediata

78 Textura Leve

79 Rápida Absorção

80 Proteção Resistente

81 Hidratação Prolongada

82 Informações Imperdíveis

83 Vida Plena e

saudável

84 Verdadeiro Aliado

85 Um bem Enorme

86 Leitura Essencial

87 Atitude Mais

participativa

88 Alimentação Saudável

154

89 Pior É a qualidade

90 Alimentos Para lá de

calóricos

91 Baixa Ingestão de frutas e legumes

92 Vida Mais saudável

93 Atividade Física que mais

agrade

94 Escolhas Nutritivas

95 Um corpo Mais bonito e

saudável

96 Mundo Verde

97 Vida Saudável

98 Mundo Sustentável

99 Nova Linha Lupo

Sport

100 Mau Hálito

101 Novo Creme

102 Creme Dental

103 Exclusiva Ilha Banana Boat

104 Exclusiva Tecnologia

105 Boca Mais saudável

106 Combinação Saudável

107 Opções Saudáveis

108 De forma Saudável

109 Cereais Integrais

110 Ingestão Diária

recomendada

111 Cereais Matinais

112 Conhecê-las Melhor

113 A melhor Rota

114 Drinks e comidinhas Mais premiados

115 Melhores Locais

155

116 Litoral Paulista

117 Corpo Mais saudável

118 Morena Rosa

QUADRO 14 - PRINCÍPIO DE AVALIAÇÃO EM MH

Conforme foi demonstrado nos quadros (13 e 14), a estratégia patêmcia

princípio de avaliação é bastante produtiva na publicidade das revistas

elencadas, totalizando-se o emprego de 178 termos avaliativos em apenas 70

anúncios. Esses números reforçam a comprovação da primeira hipótese, de que

a publicidade estaria baseada no aspecto patêmico do movimento persuasivo.

No que concerne à segunda hipótese, pretende-se confirmar que a

presença de estratégias de patemização seria mais marcada nos anúncios para

o público feminino do que para o masculino. Os dados apresentados

anteriormente, por si, já dão conta de comprová-la, pois os números

apresentados, tanto de palavras que descrevem de modo transparente

emoções, quanto daquelas que exprimem uma avaliação de determinado ser,

são sempre maiores nos anúncios voltados para o target feminino: a frequência

de palavras que descrevem emoções de modo transparente é de 63% na WH e

de 37% na MH (407 contra 237 ocorrências, respectivamente); e a frequência de

termos avaliativos é de 66% para o target feminino e de 34% para o target

masculino (118 contra 60 ocorrências, respectivamente).

Na análise qualitativa dos anúncios, foi possível apresentar essa diferença

no emprego de estratégias de patemização de forma mais evidente, pois foram

trabalhadas outras estratégias além dessas que foram elencadas para

contabilização, incluindo-se o uso da imagem como forma de suscitar emoções.

Com base no conceito de estereótipos, todavia, trabalhado no capítulo (3), pode-

se justificar essa maior presença de marcas patêmicas nos anúncios voltados

para o público-alvo feminino, visto que se parte do pressuposto de que a mulher

seria mais subjetiva, mais emotiva do que o homem.

Um outro recorte foi também realizado, e diz respeito ao conteúdo

imagético dos anúncios coletados, com a finalidade de confirmar a terceira

hipótese, segundo a qual as estratégias para o público masculino estariam

fundamentadas predominantemente no componente imagético do texto

156

publicitário, enquanto para o público feminino, estariam fundamentadas no

componente verbal. Essa hipótese também se confirmou.

Sabe-se que a publicidade se constitui num texto multissemiótico, em que

o componente verbal e o não verbal são postos em relação de

complementaridade. Ao longo dos anos, a imagem vem tomando cada vez mais

espaço, e os enunciados verbais, nas propagandas, têm acompanhado uma

tendência de serem cada vez mais objetivos, com informações curtas, rápidas,

essenciais. Pode-se afirmar, portanto, que, no discurso publicitário, o apelo

visual tem sido predominante, numa tentativa de “sequestro do olhar”, como

aponta Monnerat (2010), na esteira dos estudos de Roland Barthes.

Procurou-se, no entanto, estabelecer esse recorte, no cotejo entre as

revistas voltadas para os públicos masculino e feminino, com base nesse critério

de predomínio da imagem. Como já foi mencionado, embora o componente

imagético seja, de modo geral, predominante, na publicidade hodierna,

observou-se um certo padrão de anúncios, em que a imagem aparecia quase

que soberana. Não havia enunciado verbal, a não ser o nome da marca/ produto,

ou, ainda, se havia algum enunciado, este estaria na língua inglesa.

Tendo estabelecido esse recorte, foi contabilizado entre os anúncios das

duas revistas – Men´s Health e Women´s Health – o quantitativo e o percentual

de anúncios que seguiriam esse padrão, no intuito de comprovar a hipótese de

que o apelo visual seria uma estratégia patêmica que se sobrepujaria às outras

estratégias, no caso de anúncios voltados para o target masculino.

O padrão acima referido seria o da peça a seguir.

157

FIGURA 24 - MEN´S HEALTH, NOV/13

158

Foram verificados, nas revistas masculinas 62 anúncios em que o componente

imagético se sobrepõe ao verbal, segundo o padrão apresentado, enquanto nas

revistas femininas, verificaram-se apenas 9. Vejam-se os gráficos seguintes.

GRÁFICO 4 - COMPONENTE IMAGÉTICO - WH

0,30%;

99,70%

Predominância do componente imagéticoWomen´s Health

Imagem

Verbal e imagem

5%

95%

Predominância do componente imagético -Men´s Health

Componente imagético

Componente imagético e verbal

GRÁFICO 3 - O COMPONENTE IMAGÉTICO - MH

159

Embora, para o total quantitativo de anúncios (277), 62, no padrão

selecionado, seja pouco – apenas 5% - para o público de Men´s Health,

comparando-se com as ocorrências em Women´s Health, 9 anúncios de mesmo

padrão – 0,3% - pode-se perceber que há predominância da imagem para o

target masculino. Esse resultado comprova a hipótese proposta, que vai ao

encontro da construção de uma identidade masculina estereotipada, aquela para

quem o apelo visual seria mais incitativo do que o verbal.

A quarta hipótese que foi levantada e que foi confirmada é a de que, o

percentual de palavras que descrevem de modo transparente emoções

empregado em anúncios para o público feminino seria maior do que para o

público masculino.

Como já foi verificado anteriormente, foram encontradas 407 ocorrências

de palavras que descrevem de modo transparente emoções nas 277 peças

publicitárias extraídas das edições de Women´s Health, dentre substantivos,

adjetivos e verbos, conforme indica Plantin (2010). Já nas peças extraídas das

publicações da Men´s Health, também 277, foram encontradas 237 ocorrências

da mesma categoria, entre nomes e verbos derivados entre si. Repetir-se-á, a

seguir, o gráfico que apresenta esses números no formato percentual.

GRÁFICO 5 - REPETIÇÃO DO GRÁFICO 1

WOMEN´S HEALTH63%

MEN´S HEALTH37%

PALAVRAS QUE DESCREVEM DE MODO TRANSPARENTE EMOÇÕES

WOMEN´S HEALTH

MEN´S HEALTH

160

É possível depreender, a partir desse gráfico, que, nas publicações para

o target feminino, há 63% de palavras que descrevem de modo transparente

emoções, quase o dobro do que naquelas voltadas para o público masculino –

apenas 37%. Isso significa que substantivos, adjetivos e verbos que denotam

sentimentos são bem mais abundantes na publicidade para mulheres.

Retomando-se a hipótese anterior, que trata da predominância do

componente imagético nos anúncios para homens, é possível inferir que essa

disparidade em relação às palavras que expressam de modo transparente

emoções se dá justamente pelo movimento contrário: a predominância do

componente verbal na publicidade voltada para mulheres. Mais uma vez, o

conceito de imaginários sociodiscursivos e o de estereótipos parecem justificar

essa escolha, uma vez que se tem por pressuposto que mulheres usam mais

palavras do que homens, que seriam mais práticos, objetivos.

A quinta e última hipótese que se busca verificar, seria a que aponta que,

entre as palavras que descrevem de modo transparente emoções –

substantivos, adjetivos (nomes) e verbos – o percentual de verbos seria maior

do que o de nomes, nos anúncios dirigidos para o target feminino, enquanto o

percentual de nomes seria maior do que o de verbos, nos anúncios dirigidos ao

target masculino.

Essa hipótese foi proposta com base na noção de que os anúncios

voltados para o público masculino conteriam mais enunciados nominalizados,

tendo em vista a representação da identidade masculina como um sujeito mais

objetivo, mais prático. Ao contrário, a maior frequência de verbos sugeriria maior

prolixidade, compondo enunciados completos, remetendo a uma característica

ligada ao imaginário feminino.

Veja-se o gráfico a seguir, relacionado ao percentual de nomes e verbos

nos 277 anúncios da revista Women´s Health:

161

GRÁFICO 6 - NOMES E VERBOS WH

Como é possível notar, a hipótese não se confirmou, no que tange às

ocorrências de verbos nos anúncios dirigidos ao target feminino. Tem-se um

percentual altíssimo de nomes em face dos verbos – 83% contra 17%,

respectivamente. De fato, a frequência de verbos que expressam emoções de

modo transparente é baixa, numa perspectiva global. Veja-se, agora, o gráfico

referente à revista Men´s Health.

GRÁFICO 7 - NOMES E VERBOS MH

83%

17%

NOMES E VERBOS - WOMEN´S HEALTH

NOMES

VERBOS

75%

25%

NOMES E VERBOS - MEN´S HEALTH

NOMES

VERBOS

162

De acordo com este gráfico, a frequência de nomes segue sendo maior

do que a de verbos, também nas peças publicitárias voltadas para o público

masculino: 75% das ocorrências de palavras que expressam de modo

transparente emoções constitui-se de substantivos e de adjetivos; já a frequência

de verbos é de apenas 25%. Pode-se afirmar que, quanto à predominância dos

nomes nos anúncios para o target masculino, a hipótese se confirmou.

É interessante notar que, comparando-se os dois gráficos, tem-se um

percentual maior de verbos nos anúncios da MH, o contrário do que se esperava

– 25% contra 17%, na WH.

163

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa teve como proposta analisar 554 peças publicitárias,

extraídas das revistas Men´s Health e Women´s Health, com o objetivo de

examinar o fenômeno da patemização e sua relação com a construção das

identidades dos gêneros masculino e feminino nas respectivas publicações. Para

isso, valeu-se da Teoria Semiolinguística do Discurso, de P. Charaudeau, bem

como dos estudos sobre Argumentação, de C. Plantin, dentre outros estudos,

relacionados à emoção, à publicidade e às identidades de gêneros.

A análise se deu sob as perspectivas qualitativa e quantitativa, buscando-

se comprovar, por meio de hipóteses, que o apelo à emoção, na publicidade das

revistas elencadas, é responsável por construir as representações de gêneros

que se querem sancionar ou difundir. Foi possível, num diálogo entre teoria e

dados, chegar aos resultados que, aqui, são explicitados.

Por meio da análise qualitativa, no cotejo de dois pares de anúncios

voltados para os públicos masculino e feminino, foi possível depreender a

importância do modo visual de significação, e, principalmente da carga

emocional que ele contém e que precisa ser levada em consideração na análise

do gênero discursivo publicitário. As cores, a posição da imagem no espaço da

página, o plano de fundo, a distribuição e tamanho dos enunciados nesse

espaço, todos esses itens devem ser observados, pois têm papel preponderante

na construção dos sentidos dos textos.

No cotejo do primeiro par de anúncios – do Antitranspirante Dove, dirigido

ao público feminino, e dos Suplementos Max Titanium, dirigido ao público

masculino –, embora a mulher seja a protagonista, está representada de modo

diferente em cada um, a partir dos imaginários sociodiscursivos que perpassam

os conceitos de feminilidade e masculinidade. Os estados patêmicos visados

não são os mesmos para os dois targets: no anúncio voltado para mulheres, a

tônica é que ela se sinta segura, em paz com o próprio corpo; no anúncio voltado

para homens, o prazer sensual, representado pela figura da modelo, é o efeito

visado.

Embora nos dois anúncios não tenha sido empregada a estratégia de

patemização palavras que expressam de modo transparente emoções, foram

164

detectadas as seguintes estratégias patemizantes: palavras e expressões que

desencadeiam emoção; princípio de avaliação; enunciado de emoção sobre a

base de lugar comum comportamental; e enunciados que podem produzir efeitos

patemizantes.

No cotejo do segundo par de anúncios – dos tênis femininos e dos sapatos

masculinos a visada do pathos é clara no componente imagético de ambas as

peças, nas quais os protagonistas são a mulher e o homem, respectivamente. O

trabalho da instância de enunciação com o conceito de estereótipo fica evidente

nos enunciados centrais, que ditam, explicitamente, o tipo de comportamento

necessário para ser “uma garota” ou “um homem”, remetendo, mais uma vez,

aos imaginários sociodiscursivos que reúnem os saberes em torno do que é ser

mulher e do que é ser homem. Os sentimentos suscitados são de

encorajamento, para a mulher, e de poder, para o homem.

Quanto às marcas patêmicas empregadas em ambos os anúncios,

destacaram-se: a designação indireta da emoção sobre a base de lugar comum

comportamental e atitudinal ou topoi; o princípio de avaliação; as expressões

modalizadoras; e os enunciados que podem produzir efeitos patemizantes.

Essa análise de cunho qualitativo permitiu observar o quanto as

estratégias de patemização são salutares para a construção do texto

pertencente ao gênero publicitário. Por meio dela, confirmou-se a primeira

hipótese – segundo a qual o fenômeno da patemização se constituiria em base

para a construção do texto pertencente ao gênero de discurso publicitário –, bem

como se defendeu a tese apresentada nesta pesquisa – de acordo com a qual o

apelo à emoção, que ocorre diferentemente para os públicos feminino e

masculino, é responsável por construir as identidades de gêneros em voga.

Por intermédio da análise quantitativa, conferiram-se, porém, todas as

hipóteses levantadas.

Para comprovar a primeira hipótese, a de que o fenômeno da

patemização se constituiria em base para a construção do texto pertencente ao

gênero textual publicitário, foi feita a contabilização das duas seguintes

estratégias de patemização: (1) palavras que expressam de modo transparente

emoções (407 ocorrências nos anúncios da WH e 237, nos anúncios da MH); e

(2) princípio de avaliação (178 termos axiológicos, 118, na WH e 60, na MH).

Trata-se de estratégias bastante produtivas no discurso publicitário. Quanto à

165

estratégia palavras que descrevem de modo transparente emoções, foram

encontradas 644 ocorrências, e um percentual de 63%, na WH e 37%, na MH.

No que se refere à estratégia princípio de avaliação, dos 70 anúncios analisados,

foi contabilizado um percentual de 66%, na WH e 34%, na MH. A frequência com

que essas estratégias são empregadas torna possível afirmar que a hipótese se

confirma.

Esses mesmos dados foram utilizados para comprovar a segunda e a

quarta hipóteses – a de que a presença das estratégias de patemização seria

mais marcada nos anúncios para o público feminino do que para o masculino e

a de que o percentual de emprego da estratégia palavras que descrevem de

modo transparente emoções também seria maior para o público feminino do que

para o masculino. A justificativa para esse resultado estaria relacionada ao

conceito de estereótipo, pois a mulher, além de ser usualmente considerada

mais prolixa do que o homem, seria, também, mais emotiva, o que é refletido na

abundância de termos patemizantes.

Para comprovar a terceira hipótese, foi feito um recorte nos dados, de

um determinado padrão de anúncios, em que não há praticamente nenhum

enunciado verbal, predominando o componente imagético. Segundo essa

hipótese, as estratégias patêmicas para o público masculino estariam

fundamentadas predominantemente no componente imagético do texto

publicitário, enquanto as estratégias patêmicas para o público feminino estariam

fundamentadas predominantemente no componente verbal do texto publicitário.

De acordo com o padrão estabelecido, foi contabilizado um percentual de

5% de anúncios voltados para o target masculino (62 ocorrências), enquanto,

para o feminino, apenas 0,3%. (9 ocorrências). Embora se reconheça que a

predominância da imagem é cada vez maior na publicidade hodierna, com esse

recorte, foi possível comprovar a hipótese proposta, que remete, por sua vez, ao

estereótipo masculino de ser movido pelo que vê, mais do que pelo que ouve ou

lê, ao contrário da mulher.

A quinta e última hipótese propõe que na estratégia de patemização

palavras que descrevem de modo transparente emoções (nomes e verbos), o

percentual de verbos seria maior do que o de nomes, nos anúncios voltados para

o público feminino, enquanto o percentual de nomes seria maior do que o de

verbos, nos anúncios voltados para o público masculino. Para conferi-la, foram

166

contabilizados os nomes (substantivos e adjetivos) e os verbos que descrevem

de modo transparente emoções, tanto nas edições de MH quanto de WH. A

formulação dessa hipótese se deu a partir da ideia de que o homem seria mais

objetivo, logo, os enunciados seriam mais nominalizados. As mulheres, por seu

turno, sendo mais prolixas, demandariam enunciados mais complexos.

Trata-se de uma hipótese composta de duas etapas e que foi confirmada

somente em parte. Contabilizando-se as ocorrências nos 277 anúncios da WH,

o percentual de verbos é de 17%, enquanto o de nomes é de 83%. Já nas

ocorrências dos 277 anúncios da MH, tem-se um percentual de 25% de verbos

e 75% de nomes. Com relação ao público feminino, a hipótese não se confirmou;

com relação ao público masculino, por seu turno, houve confirmação. Observou-

se, todavia, que o próprio emprego de verbos que expressam de modo

transparente emoções não é produtivo na publicidade das revistas selecionadas.

Por fim, vale ressaltar que as emoções desencadeadas giraram em torno

da tópica do prazer e da felicidade, variando, em alguns momentos, para os

sentimentos de poder, conquista e liberdade, para o público masculino, e para

os sentimentos de segurança, confiança e autoestima, para o público feminino.

Encerra-se esta pesquisa, sabendo-se que ainda há muito a ser estudado

no universo da publicidade e das representações de gêneros, mas desejando-

se encorajar outros pesquisadores a problematizar a questão do apelo às

emoções não somente neste gênero do discurso, como também em outros

gêneros. Espera-se ter contribuído para a reflexão acerca do fenômeno da

patemização de forma consistente. Quanto à preocupação da TSD com o

processo de ensino-aprendizagem, espera-se, ainda que indiretamente, ter

lançado alguma luz acerca da escolha de marcas linguísticas patêmicas para a

composição de textos, de modo que se possa pensar sobre a forma como são

trabalhadas essas marcas em sala de aula.

167

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