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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ INSTITUTO DE LETRAS E COMUNICAÇÃO PROGRAMA DE MESTRADO EM LETRAS (LINGÜÍSTICA) ELIAS MAURÍCIO DA SILVA RODRIGUES GLOSSÁRIO SOCIOTERMINOLÓGICO DA CULTURA DA FARINHA BELÉM PARÁ 2010

Glossários socioterminológico da cultura da farinha elias mauricio s. rodrigues

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Page 1: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ INSTITUTO DE LETRAS E COMUNICAÇÃO

PROGRAMA DE MESTRADO EM LETRAS (LINGÜÍSTICA)

ELIAS MAURÍCIO DA SILVA RODRIGUES

GLOSSÁRIO SOCIOTERMINOLÓGICO DA CULTURA DA FARINHA

BELÉM – PARÁ 2010

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ELIAS MAURÍCIO DA SILVA RODRIGUES

GLOSSÁRIO SOCIOTERMINOLÓGICO DA CULTURA DA FARINHA

Dissertação de Mestrado apresentada ao Instituto de Letras e Comunicação da Universidade Federal do Pará, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Lingüística.

Área de concentração: Descrição e análise do português da Amazônia

Orientador: Prof. Dr. Abdelhak Razky

BELÉM – PARÁ 2010

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ELIAS MAURÍCIO DA SILVA RODRIGUES

GLOSSÁRIO SOCIOTERMINOLÓGICO DA CULTURA DA FARINHA

Dissertação de Mestrado apresentada ao Instituto de Letras e Comunicação da Universidade Federal do Pará, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Lingüística.

Área de concentração: Descrição e análise do português da Amazônia

Data da aprovação:

Banca Exminadora:

Prof. Dr. Abdelhak Razky (Orientador) Universidade Federal do Pará – UFPA

Prof. Dra. Carmen Lúcia Reis Rodrigues (Examinadora) Universidade Federal do Pará – UFPA

Prof. Dr. Antônio Luciano Pontes (Examinador) Universidade Estadual do Ceará – UEC

Profa. Dra. Marilúcia Barros de Oliveira (Examinadora) Universidade Estadual do Ceará – UFPA

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Para Raimundo Elias (in memória)

e Iracema Rodrigues

Meus alicerces.

Page 5: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

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AGRADECIMENTOS

A Deus,

Ser supremo que sustenta e mantém o equilíbrio dos seres do universo, inclusive o

mais sábio: o homem. Obrigado Senhor por permitir que eu superasse todos os

momentos difíceis dessa caminhada.

Ao Prof. Dr. Abdelhak Razky,

Orientador e incentivador dos meus trabalhos de pós-graduação na Faculdade de

Letras e Comunicação da Universidade Federal do Pará, pelo apoio, atenção e amizade.

À Professora Dra. Gladis Maria de Barcellos Almeida,

Docente da Universidade Federal de São Carlos, por se disponibilizar em responder os

meus e-mails, mantendo um feedback na discussão sobre Terminologia e também pelo

incentivo, envio de livro e importantes sugestões.

A Professora M.Sc. Celiane Costa,

Com quem sempre mantive contato e trocas de idéias sobre os estudos

terminológicos. Pelo incentivo e disponibilidade em me ajudar em muitos momentos

da minha caminhada acadêmica.

À Professora Dra. Myrian Cunha,

Pelo compromisso e seriedade durante a sua gestão na Coordenação do Curso de

Mestrado em Letras.

Ao Professor Dr. Silvio Augusto de Oliveira Holanda

Atual Coordenador do Curso de Mestrado em Letras, pelo trabalho que vem

desenvolvendo em sua gestão.

Aos professores,

Dra. Fátima Pessoa, Dra. Regina Cruz, Dra. Eulália Toscano, Dra. Gessiane Picanço, Dr.

Abdelhak Razky pelas disciplinas ministradas.

Às Professoras Dra. Carmén Rodrigues e Marilúcia Rodrigues,

Por terem aceitado em participar da Banca de Qualificação deste trabalho e pelas

valiosas contribuições e sugestões.

Ao Professor M.Sc. Álvaro Araújo,

Pelas contribuições, incentivo e empéstimo de material bibliográfico.

Page 6: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

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A todos os meus colegas do Mestrado,

Janderson, Ary, Marly, Bené, Luciana, Rita, Bruno, Marisa, Eunice, Karina, Jairo, Nelma,

Rodney e especialmente a Ceiça e Ednardo pela troca de idéias e reflexões no âmbito

acadêmico e pelos laços de amizade construídos ao longo desses anos.

Ao Prof. M.Sc. Waldemar Júnior,

Pelo apoio e incentivo durante a minha vida acadêmica no Mestrado.

À Érika Michely,

Pela amizade, hospedagem e acolhida em seu apartamento durante essa fase da

minha vida acadêmica.

Ao Dr. Mauro Mendes de Almeida,

Pelo incentivo e contribuição para que eu pudesse realizar esse sonho.

Ao socioprofissionais do município de Acará,

Que muito contribuíram para o desenvolvimento desse trabalho.

Aos professores Dra. Iracilda Sampaio e Dr. Horácio Schneider,

Pela seriedade e compromisso com essa Instituição de Ensino Superior e pela grande

contribuição nos passos finais de minha jornada no curso de Mestrado... Sou muito

grato!

A minha família,

Mãe, pai (in memória), irmãos e sobrinhos que me apoiaram nessa empreitada,

principalmente pela assistência sentimental nos momentos bons e ruins durante esses

dois anos no curso de Mestrado.

Page 7: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

7

As línguas humanas são, em verdade, mas do que

excelentes instrumentos de comunicação. São,

também, reflexo da cultura de um povo. São, além

disso, parte da cultura de um povo. São ainda mais

do que isto: são mecanismos de identidade. Um

povo se individualiza, se afirma e é identificado em

função de sua língua.

Scherre (2005, p. 10)

Page 8: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

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RESUMO

Com o estudo realizado elaborou-se um glossário socioterminológico da cultura da

farinha a partir da comunicação especializada proveniente do saber dos trabalhadores

rurais, técnicos e atravessadores do município de Acará, no Estado do Pará. A nossa

pesquisa está ancorada nos procedimentos teórico-metodológicos advindos da

Socioterminologia (GAUDIN, 1993, 2003; FAULSTICH, 1995, 1996, 1999, 2006),

perspectiva que possibilitou considerar o aspecto social em que os termos se

encontram no discurso dos socioprofissionais e da Terminologia Cultural (DIKI-KIDIRI,

2000, 2002, 2007), por entendermos que o universo lingüístico oriundo da atividade

especializada estudada demarca as percepções culturais e históricas das comunidades

rurais. Considerando a dinâmica da atividade especializada em questão, organizamos

os termos em três campos semânticos, a saber: plantação, beneficiamento e

comercialização. O glossário possui 266 termos selecionados a partir da freqüência, da

pertinência temática e pragmática em seus contextos de uso. Para a extração desses

termos, utilizamos as ferramentas computacionais do software WordSmith Tools, o

que nos possibilitou um resultado mais preciso e confiável a esta descrição

socioterminológica.

Palavras-chave: Socioterminologia, Terminologia Cultural, Farinha, Saber popular.

Page 9: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

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RESUMEN

Con este estúdio elaboramos un glosario socioterminológico de la cultura del harina

desde la comunicación especializada procedente de lo saber de informantes

trabajadores rurales, técnico y vendedores de lo municipio de Acará, en el Estado del

Pará – Brasil. Nuestra investigación se basa en los procedimientos teóricos y

metodológicos derivados de Socioterminología (Gaudin, 1993, 2003; Faulstich, 1995,

1996, 1999, 2006), una posibilidad que ha permitido considerar el aspecto social en

que los términos están en el discurso de los profesionales y de la Terminología

Culturales (Diki-Kidiri, 2000, 2002, 2007), porque creemos que el universo lingüístico

venido de la actividad especializada estudiada demarca las percepciones culturales y

históricas de las comunidades rurales. Teniendo en cuenta la dinámica de la actividad

especializada de que se trate, las palabras están organizadas en tres campos

semánticos, a saber: la plantación, procesamiento y comercialización. El glosario tiene

266 términos seleccionados desde la frecuencia, de la pertinencia temática y

pragmática en sus contextos de uso. Para extraer estos términos, usamos las

herramientas informáticas del programa WordSmith Tools, lo que permitió un

resultado más exacto y confiable para esta descrición socioterminológica.

Palavras-chave: Socioterminología, Terminología Culturale, Harina, Saber popular.

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LISTA DE ESQUEMAS

Esquema 1. Fórmula que resulta na Socioterminologia ................................. 38 Esquema 2. Representação dos termos culturais .......................................... 46 Esquema 3. Percepção cultural entre três línguas africanas .......................... 48 Esquema 4. Produtos fabricados com a fécula da mandioca ......................... 57

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1. Variantes terminológicas.................................................................. 40 Quadro 2. Pontos de comparação entre a TGT e a TC ..................................... 45 Quadro 3. Comparação de perceptos culturais entre três línguas africanas .... 47 Quadro 4. Fases do ciclo produtivo da farinha ................................................. 105

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1. Países maiores produtores de mandioca ........................................ 56 Tabela 2. Produção de mandioca por região do Brasil .................................... 59 Tabela 3. Produção de mandioca no Brasil, por Estado .................................. 60 Tabela 4. População geral do município ......................................................... 80 Tabela 5. População por sexo ......................................................................... 80 Tabela 6. Perfil dos informantes ..................................................................... 86

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1. Percentual da produção de mandioca por região no Brasil ............ 59 Gráfico 2. Percentual de produção de mandioca no Brasil, por Estado .......... 60 Gráfico 3. Produção de culturas agrícolas temporárias em Acará – Pará ........ 61 Gráfico 4. Informantes da pesquisa ................................................................. 87 Gráfico 5. Distribuição dos termos por campo semântico ............................... 109 Gráfico 6. Distribuição dos termos por categoria gramatical .......................... 109 Gráfico 7. Quadro de variantes do glosssário................................................... 110

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LISTA DE FOTOGRAFIAS

Fotografia 1. Queimada realizada no terreno para o preparo da área de plantação .....................................................................................

62

Fotografia 2. Trabalhadora rural realizando o plantio de manivas ................... 63 Fotografia 3. Poço construído no igarapé ......................................................... 65 Fotografia 4. Transporte da mandioca em carroça ............................................ 66 Fotografia 5. Aturá ............................................................................................ 66 Fotografia 6. Retiro (casa de farinha) ............................................................... 68 Fotografia 7. Trabalhadora rural descascando mandiocas ............................... 69 Fotografia 8. Trabalhador rural utilizando o ralador ......................................... 70 Fotografia 9. Trabalhador rural utilizando o caititu .......................................... 70 Fotografia 10. Prensa artesanal com tipiti .......................................................... 71 Fotografia 11. Prensa com macaco hidráulico .................................................... 71 Fotografia 12. Peneira ......................................................................................... 71 Fotografia 13. Crueira ......................................................................................... 72 Fotografia 14. Trabalhador rural torrando farinha ............................................. 73 Fotografia 15. Farinha na esfriadeira .................................................................. 74 Fotografia 16. Feira do Pequeno Agricultor ........................................................ 75 Fotografia 17. Lotes de farinha comercializadas ................................................. 76 Fotografia 18. Pesagem da farinha ..................................................................... 76

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LISTA DE FLUXOGRAMA, MAPA E ORGANOGRAMA

Fluxograma. 1 Representação das etapas de produção da farinha ................. 69

Mapa 1. Localização do município de Acará .......................................... 79

Organograna 1. Árvore de domínio reduzida .................................................... 85

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1. Tela frontal do software Transana ................................................... 93 Figura 2. Janela da base de dados ................................................................... 94 Figura 3. Corpus transcrito no software ......................................................... 95 Figura 4. Janela com a lista de termos em ordem alfabética .......................... 97 Figura 5. Janela com a lista de termos em ordem de freqüência.................... 97 Figura 6. Janela com estatística simples ......................................................... 98 Figura 7. Janela com listas de termos em contexto ........................................ 99 Figura 8. WordList ........................................................................................... 100 Figura 9 Concord ............................................................................................ 101 Figura 10. Collocates ......................................................................................... 101

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 20

1. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA .......................................................................... 24

1.1 A PERSPECTIVA DOS ESTUDOS TERMINOLÓGICOS TRADICIONAIS ............... 24

1.1.1 Origens e desenvolvimento ........................................................................ 24

1.1.2 A Teoria Geral da Terminologia .................................................................. 27

1.2 A PERSPECTIVA DOS ESTUDOS TERMINOLÓGICOS CONTEMPORÂNEOS ...... 32

1.2.1 A Socioterminologia ................................................................................... 32

1.2.1.1 Objeto de estudo: o termo e a definição ................................................ 35

1.2.1.2 A variação nos estudos socioterminológicos ......................................... 38

1.2.2 A Terminologia Cultural ............................................................................. 44

1.3 A PERSPECTIVA DOS ESTUDOS TERMINOLÓGICOS NO BRASIL ..................... 50

1.3.1 Os estudos terminológicos na Amazônia paraense ................................... 52

2. MANDIOCA E FARINHA: TRADIÇÃO CULTURAL ............................................. 55

2.1 PANORAMA GERAL DA PRODUÇÃO E IMPORTÂNCIA DA MANDIOCA NO

MUNDO ...............................................................................................................

55

2.2 PANORAMA GERAL DA PRODUÇÃO E IMPORTÂNCIA DA MANDIOCA NO

BRASIL .................................................................................................................

58

2.3 A PRODUÇÃO, O BENEFICIAMENTO E A IMPORTÂNCIA CULTURAL DA

MANDIOCA NO MUNICÍPIO DE ACARÁ – PARÁ ...................................................

61

2.3.1 Preparo da área .......................................................................................... 62

2.3.2 Plantio das manivas-semente .................................................................... 63

2.3.3 Tratos culturais ........................................................................................... 64

2.3.4 Colheita ...................................................................................................... 64

2.3.5 Beneficiamento .......................................................................................... 66

2.3.6 Comercialização ......................................................................................... 75

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3. METODOLOGIA ............................................................................................... 77

3.1 PLANEJAMENTO DA PESQUISA DE CAMPO ................................................... 77

3.1.1 Área geográfica da pesquisa: aspectos históricos, geográficos e

demográficos ......................................................................................................

78

3.1.2 Objetivo geral ............................................................................................. 81

3.1.3 Objetivos específicos .................................................................................. 82

3.1.4 Público-alvo .......................................................................................... ...... 82

3.1.5 Conhecimento de área e a árvore de domínio ........................................... 83

3.1.6 Perfil dos informantes e constituição do corpus da pesquisa .................... 85

3.1.7 Instrumentos de recolha de dados ............................................................ 88

3.2 PROCEDIMENTOS UTILIZADOS PARA O TRATAMENTO DOS DADOS ........... 92

3.2.1 Ferramentas utilizadas para a transcrição dos dados: Transana ............... 92

3.2.2 Ferramentas utilizadas para a extração e seleção semi-automática dos

termos: WordSmith Tools ...................................................................................

96

3.2.3 Registros dos termos em fichas terminológicas ......................................... 102

3.3 PROCEDIMENTOS UTILIZADOS PARA A ORGANIZAÇÃO

MACROESTRUTURAL DO GLOSSÁRIO .................................................................

103

3.3.1 Delimitação e composição da nomenclatura ............................................. 103

3.3.2 Critérios para o termo-entrada .................................................................. 105

3.4 PROCEDIMENTOS UTILIZADOS PARA A ORGANIZAÇÃO MICROESTRUTURAL

DO GLOSSÁRIO ....................................................................................................

106

3.5 DISTRIBUIÇÃO DOS TERMOS NA ORGANIZAÇÃO DO GLOSSÁRIO ................. 108

3.5.1 Representação esquemática dos termos no glossário ............................... 114

3.5.4 Abreviaturas e sinais gráficos utilizados no glossário ................................ 115

4. GLOSSÁRIO SOCIOTERMINOLÓGICO DA CULTURA DA FARINHA .................. 116

5. CONSIDERAÇÕES REFLEXIVAS ....................................................................... 172

REFERÊNCIAS ...................................................................................................... 175

ANEXOS ............................................................................................................... 180

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ANEXO A – Produção de mandioca no Brasil ...................................................... 181

ANEXO B – Árvore de domínio ............................................................................ 182

ANEXO C – Questionário semi-estruturado ........................................................ 183

ANEXO D – Normas de transcrição ..................................................................... 188

ANEXO E – Modelo Ficha Terminológica ............................................................. 189

Page 20: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

20

INTRODUÇÃO

O presente trabalho é fruto de um instigante estudo sobre o discurso

especializado, em torno da produção de farinha, realizado no município de Acará,

nordeste paraense. Esse município, em nível nacional, configura-se como maior

produtor em toneladas da raiz de mandioca (IBGE, 2008). A farinha, produto derivado

dessa raiz, destaca-se na região, tanto pela sua importância econômica quanto cultural

para as populações que dela subsistem.

O léxico especializado tem sido propostas de vários trabalhos no âmbito

dos estudos terminológicos atuais. Esses trabalhos, por sua vez, são desenvolvidos em

várias perspectivas teórico-metodológicas, tendo em comum o fato de privilegiarem o

contexto social de circulação dos termos. Nessa perspectiva é que destacamos, dentre

outras, a Socioterminologia proposta por François Gaudin (1993, 2003) e defendida

por Enilde Faulstich (1995, 1996, 1999, 2006), que privilegiam a variação como ponto

fundamental do trabalho terminológico e a Terminologia Cultural, postulada por Diki-

Kidiri (2000, 2002, 2007), que concebe o termo a partir da percepção social, cultural e

histórica elucidados no contexto de produção do discurso.

A nossa pesquisa, portanto, situa-se no campo teórico e aplicado da

Socioterminologia e da Terminologia Cultural, uma vez que consideramos o aspecto

social e cultural em que a terminologia em estudo circula, ou seja, no contexto de

interação entre os socioprofissionais envolvidos (trabalhadores rurais, técnicos

agrícolas e atravessadores). Ainda, encontra-se inserida no âmbito do Projeto Atlas

Geo-Sociolingüístico do Pará (ALIPA), com o objetivo de descrever e analisar o léxico

especializado nos domínios da atividade de produção da farinha.

As pesquisas realizadas em torno dessa atividade tradicional têm se fixado,

quase que exclusivamente, no campo da Agronomia, da Administração, da Economia,

da Antropologia, da Química e da Biologia. Dessa forma, justifica-se a nossa proposta

em descrever e analisar, através do léxico, o conhecimento advindo dessa atividade

especializada, considerando-se que esse conhecimento é de suma importância para a

caracterização lingüística do português falado na Amazônia paraense.

Page 21: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

21

Por oportuno, ressaltamos ainda as considerações de pesquisadores como

Barros (2004), Cabré (2003), Krieger & Finatto (2004) e Faulstich (1995, 2006) ao

questionarem a ambigüidade do termo “terminologia” ainda nos dias atuais, problema

esse não resolvido no âmbito da disciplina. Para os autores, o termo “terminologia”

pode gerar, no mínimo, uma dupla significação relacionada ao seu objeto formal de

estudo e a disciplina na qualidade de ciência. Como disciplina, pode designar o “estudo

científico dos conceitos e dos termos em uso nas línguas de especialidade” (ISO 1087,

1990, p.12 apud BARROS, 2004, p. 34). Enquanto objeto de estudo, significa o

“conjunto de termos próprios de um domínio, de um grupo de pessoas ou de um

indivíduo” (BOUTIN-QUESNEL, 1985, p.1 apud BARROS, 2004, p.34).

Considerando a polissemia em que o termo “terminologia” se encontra,

grafa-se, comumente em trabalhos de natureza terminológica, com ( T ) maiúsculo

quando se quer referir ao estudo científico da área e com ( t ) minúsculo para

designar o conjunto de termos de uma linguagem de especialidade. Acreditamos que,

embora o contexto possa recuperar o sentido em que tais termos se encontram no

texto, seja necessário fazer essa distinção para que um leitor menos atento ou leigo no

assunto possa se familiarizar e reconhecer o uso que fazemos de tais termos no nosso

trabalho. Sendo assim, adotaremos tais diretrizes no intuito de deixar claro quando

nos referirmos a uma ou à outra acepção.

O trabalho escrito, em forma de Dissertação, além da introdução e

considerações reflexivas, divide-se em quatro capítulos, a saber:

Fundamentação Teórica;

Mandioca e farinha: tradição cultural;

Metodologia;

Glossário socioterminológico.

O primeiro capítulo, Fundamentação Teórica, trata das questões que

focalizam o desenvolvimento da Terminologia como disciplina preocupada com o

estudo do léxico especializado. Buscamos, através de uma abordagem histórico-crítica,

realizar um panorama de como os estudos em Terminologia se desenvolveram e

puderam contribuir para uma prática terminográfica que levasse em consideração uma

abordagem para além da monossemia wüsteriana, representada pela Teoria Geral da

Page 22: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

22

Terminologia – TGT. Passamos, então, a tratar da perspectiva dos estudos

terminológicos tradicionais focalizando, com um breve percurso, as origens e

desenvolvimento da área e o ponto de vista da escola clássica representada pela TGT.

Em seguida, trouxemos para o âmbito da discussão a perspectiva dos estudos

terminológicos na contemporaneidade, sobretudo a Socioterminologia e a

Terminologia Cultural enfatizadas em nosso trabalho. Fechamos esse capítulo com a

perspectiva dos estudos terminológicos no Brasil, realizando um breve percurso do

desenvolvimento dessa disciplina no âmbito da pesquisa em várias universidades

brasileiras e também no contexto amazônico por meio do Projeto ALIPA e do Programa

de Mestrado da Universidade Federal do Pará – UFPA.

No segundo capítulo, intitulado “Mandioca e farinha: tradição cultural”,

dedicamo-nos em realizar uma breve apresentação da atividade especializada

estudada, trazendo informações sobre a produção e importância da mandioca no

mundo e no Brasil. Em seguida, descrevemos como a atividade especializada em foco é

organizada pelos socioprofissionais no município pesquisado. Com isso, objetivamos

considerar o aspecto social e cultural em que os termos se encontram, pois na

atividade de plantação e cultivo da mandioca, do beneficiamento à comercialização da

farinha muitas são as práticas culturais em que os socioprofissionais encontram-se

engajados. Essas práticas são evidenciadas na linguagem desses sujeitos inseridas num

universo onde a história de cada um e da coletividade é construída. Assim, surgem, por

exemplo, termos que representam o uso regional, a presença indígena, a presença de

crendices que constroem ou ratificam a identidade cultural dos indivíduos envolvidos

no processo de produção da farinha.

O terceiro capítulo apresenta a base metodológica do trabalho começando

pelo planejamento e execução da pesquisa de campo. Dessa forma, deixamos expostos

os objetivos do trabalho, o público-alvo, os critérios usados para a seleção dos sujeitos

da pesquisa (nossos informantes), bem como os instrumentos usados na recolha dos

dados terminológicos. Ainda, nesse mesmo capítulo, demonstramos os procedimentos

utilizados para o tratamento, seleção e extração semi-automática dos termos com o

auxílio dos programas computacionais Transada e WordSmith Tools. Em seguida,

Page 23: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

23

tratamos dos procedimentos utilizados para a organização da macroestrutura e

microestrutura do glossário.

O quarto e último capítulo é o glossário socioterminológico da cultura da

farinha propriamente dito composto por 266 termos arrolados no verbete,

estruturados em ordem alfabética contínua e relacionados aos seguintes campos

semânticos: plantação, beneficiamento e comercialização. Compusemos, portanto, um

glossário com os termos que estão na fala dos socioprofissionais, na atividade

especializada de produção da farinha e que se configuram como termos culturais, uma

vez que todas as etapas dessa atividade refletem o saber oriundo do conhecimento

popular. Esperamos, assim, além de descrever e analisar uma parte do léxico de

especialidade falado na Amazônia paraense, valorizar e divulgar uma atividade tão

importante na economia e na construção da identidade cultural das populações rurais.

Page 24: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

24

1. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Neste capítulo inicial, esperamos trazer, ainda que de forma resumida,

algumas informações acerca do desenvolvimento e estabelecimento dos estudos em

Terminologia. Assim, faremos um percurso histórico objetivando mostrar a perspectiva

dos estudos terminológicos tradicionais na visão da Teoria Geral da Terminologia e

propostas de estudos na contemporaneidade como a Socioterminologia e a

Terminologia Cultural, estas defendidas como aporte teórico-metodológico em nosso

trabalho. Apresentaremos, ainda, um breve panorama da perspectiva dos estudos

terminológicos no Brasil e na Amazônia paraense, onde se localiza o foco de nosso

trabalho, desenvolvido em nível de pós-graduação e na perspectiva do Projeto Atlas

Lingüístico do Pará – ALIPA.

1.1. A PERSPECTIVA DOS ESTUDOS TERMINOLÓGICOS TRADICIONAIS

1.1.1 Origens e desenvolvimento

Antes mesmo que a Terminologia se firmasse enquanto disciplina científica

no século XX, muitos foram os trabalhos que contribuíram para o estabelecimento da

área. Conforme Krieger e Finatto (2004, p. 24) “a terminologia, compreendida como

léxico dos saberes técnicos e científicos, é inegavelmente uma prática antiga, posto

que o conhecimento especializado não é fenômeno dos tempos atuais”. Confirma

Pontes (1996, p. 8) ao dizer que “a terminologia não é um fenômeno recente. Desde

que o homem se manifesta através da linguagem, encontra-se diante de uma língua de

especialidade”.

Na antiguidade, por volta de 2.600 a 2.200 a.C., os sumérios

desenvolveram a escrita cuneiforme. Usavam placas de barro, onde registravam

variados termos produzindo, assim, dicionários temáticos monolíngües. (VAN HOOF,

1998, p. 241 apud BARROS, 2004, p. 29). Muito do que se sabe hoje sobre esse período

da história, deve-se aos registros do léxico grafados nesses tijolos de argila, que

Page 25: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

25

marcam muito do cotidiano da administração, da economia e da política social daquela

época.

O diálogo Crátilo, de Platão, escrito por volta de 427 a.C. comprova o

interesse pelo estudo do léxico na antiguidade ao apresentar pontos de reflexões

sobre o processo de denominação e a origem dos nomes. (REY, 1979, p. 4). Mas é no

século XVII, conforme Barros (2004, p. 29), que se começa delinear “os elementos

básicos de compreensão da terminologia como conjunto de termos de uma área

técnica ou científica e como disciplina de natureza lingüística que estuda esse

conjunto”.

Podemos também afirmar baseados em Barros (2004, p. 31) e Rey (1979, p.

5) que os naturalistas, principalmente botânicos e zoólogos, no século XVIII

contribuíram para o reconhecimento do léxico especializado ao se dedicarem na

elaboração de nomenclaturas de determinadas áreas do conhecimento. Karl Von

Lineau, por exemplo, propôs um sistema universal de nomenclaturas através de regras

precisas de criação de nomes científicos para designar as espécies pertencentes à

fauna e a flora do mundo inteiro.

Guyton de Morveau, magistrado francês, aeronáutico e químico, tornou-se

crítico da nomenclatura química da época e contribuiu para o desenvolvimento do

primeiro sistema de nomenclatura dessa área. Em 1787, apresentou seu trabalho à

Académie des Sciences utilizando o termo hidrogênio pela primeira vez, ano em que

também concluiu o seu Méthode de nomenclature chimique. Buscava-se, com isso, a

possibilidade de uma comunicação que garantisse a precisão terminológica. Nessa

época, terminologia ainda não era um termo usual, sendo reservado o termo

“nomenclatura”, definido como “sistema de termos empregados na descrição de

objetos da história natural” (WILLIAM WHEWELL, 1837 apud BARROS, 2004, p. 31).

A distinção entre nomenclatura e terminologia toma contornos mais claros

a partir da fixação da Terminologia como disciplina científica e com o seu objeto de

estudo delineado. Conforme Barros (2004, p. 32) o termo terminologia começa a

garantir espaço nos dicionários europeus. Na sétima edição do Dictionnaire des

sciences, des lettres et des arts de 1864, terminologia é designada como “conjunto de

termos técnicos de uma ciência ou de uma arte e das idéias que elas representam” e

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26

na terceira edição do dicionário Webster é registrado como campo de estudo. Vale

ressaltar que, apesar de o vocábulo terminologia substituir paulatinamente o vocábulo

nomenclatura, os dicionários franceses do século XVIII acabam criando resistência a

essa mudança cunhando a seguinte acepção: “conjunto de termos difíceis, sendo

referido como terminologia inútil e argot científico” (ANJOS, 2003, p. 30).

É consenso afirmar que a terminologia tenha ganhado contornos científicos

no século XX, momento em que se apresenta com uma fundamentação metodológica

precisa, a fim de resolver problemas da comunicação técnica e científica entre

profissionais. Para isso era necessário garantir a desambigüidade do termo técnico-

científico, fato que dava aos estudos terminológicos, naquele momento, um contorno

prescritivo e idealizador (GAUDIN, 1993, p. 25). Nessa conjuntura de desenvolvimento

da área três importantes núcleos surgem com perspectivas de formação do campo de

estudo (BARROS, 2004, p. 32; KRIEGER E FINATTO, 2004, p. 30):

a) A Escola de Viena;

b) A Escola Russa;

c) A Escola de Praga.

A Escola de Viena se destacou com os trabalhos desenvolvidos pelo

austríaco Eugen Wüster, considerado o pai da terminologia moderna (GAUDIN, 1993,

p. 24). Foi com a publicação de um livro baseado em sua tese de doutoramento,

intitulado “Die Internationale Sprachnormung in der Technich, besonders inder

Elektrotechnik”1 que a Terminologia se firmou como disciplina e propiciou a criação de

organizações como a Associação Internacional de Padronização – ISA (GAUDIN, 1993,

p. 25; BARROS: 2004, p. 53). Nesse momento, um dos principais objetivos da

Terminologia era a eliminação da ambigüidade na linguagem técnico-científica, por

isso tentava-se garantir uma comunicação especializada padronizada

internacionalmente, o que implicava na valorização da monossemia do termo.

A Escola Russa teve como principal fundador o russo D.S. Lotte (1898-

1950), responsável pelo Comitê de Normalização Terminológica do Instituto de

1 “Normalização Internacional Técnica, com ênfase na eletrotécnica” (nossa tradução)

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27

Normalização Soviética do Conselho de Ministros da União Soviética. Destaca-se

também Drezem, que juntamente com Lotte desenvolveu reflexões e propôs diretrizes

para o estudo das terminologias (PONTES, 1996, p. 12; KRIEGER & FINATTO, 2004, p.

31). As reflexões realizadas nessa escola terminológica divergem em alguns pontos das

propostas da Escola Terminológica de Viena. Um ponto de conflito entre essas duas

abordagens diz respeito à metodologia empregada para a construção do sistema

nocional. Enquanto Wüster propõe um sistema de definição que parte do conceito

para o termo (onomasiológico), D. S. Lotte propõe que a base definicional, ao

contrário, deve partir do termo para o conceito (PONTES, 1996, p. 13).

A escola de Praga ficou conhecida através dos trabalhos lingüísticos

desenvolvidos na antiga Checoslováquia. Conforme Pontes (1996, p. 13) Drozd foi um

eminente representante dessa escola, organizando inúmeros congressos sobre

temáticas da Terminologia. Os fundamentos teóricos dessa escola tiveram como base

a lingüística funcional e as teorias saussurianas. Conforme Anjos (2003, p. 31), também

representaram essa escola o grupo formado Horecky, Benes, Mathesius, Vachek e

Trubetskoy, os quais consideravam que “a língua das ciências é uma linguagem

funcional e estruturada para fins específicos”. Os estudos realizados por essas três

escolas terminológicas foram cruciais para o desenvolvimento e consolidação da área,

uma vez que os seus pressupostos teórico-metodológicos foram revisitados, debatidos

e refutados pelos que fazem Terminologia e contribuem para o desenvolvimento dos

estudos científicos da área.

1.1.2 A Teoria Geral da Terminologia

A Teoria Geral da Terminologia – TGT teve como expoente o engenheiro

austríaco Eugen Wüster na década de 1930. Com a sua tese de doutoramento

intitulada “Internationale Sprachnormung in der Technich”2, defendida na

Universidade de Stuttgart em 1931, já se percebe a preocupação do autor com a

padronização do léxico especializado. Mais tarde, com a publicação de um livro

baseado em sua tese, Wüster reafirma sua preocupação inaugurando as bases que

2 Normalização Internacional Técnica.

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28

sustentariam a sua proposta metodológica na TGT, momento em que a disciplina

ganha contornos científicos na Europa Ocidental. Ainda publicou, em 1968, o

dicionário especializado na área de engenharia, o The Machine Tool. (GAUDIN, 1993, p.

24-27; KRIEGER & FINATTO, 2004, p. 31; BARROS, 2004, p. 53).

A TGT surgiu com um caráter normativo, tendo como objetivo a

padronização da comunicação profissional entre especialistas. As proposições de

ordem metodológica apresentadas na teoria wüsteriana forneceram as primeiras

disposições sobre o trabalho terminológico enquanto campo aplicado. Pretendia-se,

com isso, favorecer a eficácia da comunicação técnico-científica no plano

internacional, na tentativa de desfazer a ambigüidade do léxico especializado. Dessa

forma, a TGT acaba priorizando o registro escrito de termos considerados aprovados

para determinada área de domínio do conhecimento e, portanto, recomendados para

serem usados nos vários setores técnico e científicos. Isso demonstra uma visão

bastante redutora da terminologia, pois apresenta uma linha de descrição bastante

positivista3 da linguagem, desconsiderando outras bases que poderiam trazer à tona

uma melhor compreensão do fenômeno.

Com um enfoque bastante prescritivo a TGT de Wüster apresenta certas

características que tentam favorecer uma linguagem técnica ideal. Isso o leva a

considerar os processos que envolvem as línguas de especialidade diferentes dos

processos que constituem a linguagem geral. As propostas de sua teoria, para o

tratamento da terminologia, estabelecem alguns princípios que apresentamos

resumidamente abaixo:

a) A metodologia do trabalho terminológico deve seguir o padrão

onomasiológico. Isso significa dizer que, no processo de denominação,

deve-se partir do conceito para o termo;

3 O Positivismo se inspirou no método de investigação das ciências da natureza, e a biologia foi

considerada como referência. O funcionamento do corpo humano levou os positivistas a pensarem a sociedade como um grande organismo social, constituídos de partes integradas e coesas que deveriam funcionar harmonicamente (SILVA, s/d, p. 13).

Page 29: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

29

b) Os termos científicos e técnicos, sendo objeto de estudo, devem ser

entendidos como unidades específicas de uma determinada área;

c) O valor de um termo depende do lugar que ocupa na estrutura

conceitual de uma determinada matéria;

d) A finalidade básica da Terminologia é garantir a precisão e a

univocidade da comunicação profissional no plano internacional.

Por sua vez Cabré et al (1998, p. 36) enfatizam que as mudanças operadas

na sociedade, em face aos novos paradigmas tecnológicos e sociais, têm suscitado

críticas a respeito das insuficiências do modelo de análise tradicional apresentado pela

TGT. Essas críticas podem ser resumidas nos seguintes pontos:

1) Logicismo: diz respeito ao método de análise lógica de descrição da realidade sem levar em consideração os aspectos sociais em que a terminologia se insere;

2) Universalidade: diz respeito ao método de análise que parte de uma realidade particular para generalizá-la. Na terminologia tradicional, esse método tem sido bastante recorrente, o que se reflete em normas estabelecidas pela ISO;

3) Estatismo: diz respeito à visão monorreferencial das terminologias. Neste caso, se o objetivo é a desambigüidade da comunicação técnico-científica fatores como a variação são deixados de lado. A perspectiva sincrônica também tem prioridade sobre a perspectiva diacrônica;

4) Reducionismo: o modelo aplica-se à domínios especializados reconhecidos deixando de fora outros âmbitos especializados por critérios pragmáticos, o que demonstra uma característica bastante restritiva da terminologia tradicional em detrimento de outras realidades lingüísticas;

5) Idealismo: em conseqüência aos pontos anteriores, a terminologia deixa prevalecer uma perspectiva idealizadora, pois o alvo é

Page 30: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

30

favorecer uma comunicação especializada internacional sem ambigüidades.

Embora seja inegável o pioneirismo e a contribuição dos trabalhos

desenvolvidos com base na TGT, os seus princípios acabam estabelecendo parâmetros

para uma abordagem alijada dos processos que evidenciam a complexidade

lingüístico-comunicativa. Como afirma De La Torre (2004, p. 20) a TGT “se centraba em

la idea de establecer un consenso de los términos científico-técnicos con el fin de lograr

la transferencia de conocimientos entre los especialistas a nivel internacional”4. Para a

autora, a concepção adotada por essa teoria deixa entrever que os sujeitos envolvidos

no processo comunicativo adquirem primeiramente as estruturas e classificações do

mundo para somente depois chegar à denominação, o que resulta em dizer que todas

as línguas classificam a realidade da mesma maneira, o que não é verdade.

A difusão dos trabalhos de Eugen Wüster suscitou um maior interesse pela

área de estudos terminológicos e, ainda, influenciou a criação de diversas organizações

e comissões de normalização como das quais destacamos as seguintes: International

Standardization Association – ISA; a International Eletrotechnical Comission – IEC, a

International Organization Standardization – ISO e a International Information Center

for Terminoly – INFOTERM.

Para Wüster a Terminologia deve ser concebida como disciplina autônoma,

porém situada numa relação multidisciplinar com outras matérias como a Lingüística, a

lógica, a ontologia e a informática (Krieger & Finatto, 2004, p. 20). Esse caráter

multidisciplinar e comum entre essas disciplinas está no fato de que todas elas se

deteriam da relação entre conceitos e termos.

Cabré (apud BARROS, 2004, p. 35) propõe três períodos5 como

fundamentais na evolução histórica da terminologia dos quais Barros (2004, p. 35)

acrescenta mais um período6, tendo em vista que as reflexões realizadas sobre os

estudos terminológicos propiciaram uma mudança prototípica no aspecto teórico- 4 “se centrava na idéia de estabelecer um consenso dos termos técnico-científicos com o objetivo de possibilitar a transferência dos conhecimentos entre os especialistas em nível internacional” (DE LA TORRE, 2004:20). 5 Esses períodos correspondem às origens (1930-1960), à estruturação (1960-1975) e à eclosão (1975-1985). 6 Reflexão e mudança de paradigma (1990 em diante).

Page 31: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

31

metodológico da área, exigindo do terminólogo uma posição diferente do modelo

adotado na visão tradicional de até então.

Nesse momento de reflexão e mudança de paradigma, em que surge a

necessidade de um olhar mais social e comunicativo de tratamento das terminologias,

destacam-se vários trabalhos de natureza terminológica dentre os quais os seguintes:

Teoria Comunicativa da Terminologia – desenvolvida pela professora

Maria Teresa Cabré e seu grupo no Instituto de Lingüística Aplicada –

IULA, em Barcelona;

Os trabalhos de François Gaudin, na França, expoente da

Socioterminologia na contemporaneidade, que enfatiza o aspecto social

da comunicação especializada e privilegia a variação como parte

constitutiva do discurso em que as terminologias estão inseridas;

A Terminologia Cultural defendida por Diki-Kidiri. Em seus estudos

desenvolvidos com base em línguas africanas demonstra que a

percepção cultural dos termos pelos membros de uma comunidade está

ligada a fatores de ordem histórica e social.

Gaudin (1993, p. 24) afirma que a TGT é marcada largamente pela aversão

às condições sociolingüísticas da comunicação científica e técnica. É consenso que a

TGT por privilegiar a univocidade do termo acabou desconsiderando as condições

sociais em que as terminologias se inscrevem. No entanto ela deu margem para novas

proposições e indagações que favoreceram um novo olhar nos estudos terminológicos.

Outras bases teórico-metodológicas surgiram, a partir de então, em oposição ao

modelo prescritivista de análise terminológica. Isso impulsionou o crescimento da área

que hoje tão debatida tem trazido resultados promissores para o reconhecimento do

léxico de especialidade nos mais diferentes domínios do conhecimento humano.

Page 32: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

32

1.2 A PERSPECTIVA DOS ESTUDOS TERMINOLÓGICOS CONTEMPORÂNEOS

1.2.1. A Socioterminologia

O termo Socioterminologia foi introduzido pela primeira vez no colóquio

internacional “Problèmes de la definitión et de la synonymie em terminologie” em 1982

por Jean Jaques-Boulanger (DE LA TORRE, 2004, p. 46). Conforme Auger (1993 apud

Faulstich 2006, p. 29) nesse momento observa-se o surgimento de uma nova corrente

de estudos em oposição às “escolas hipernormalizadoras desconectadas de situações

lingüísticas próprias a cada país...”.

A Socioterminologia como campo teórico e aplicado começa tomar fôlego

a partir de trabalhos desenvolvidos na França na década de 1990. Afirma Faulstich

(2006, p. 29) que Gaudin “ao publicar sua tese de doutorado – ‘Pour une

socioterminologie – des problèmes semantiques aux pratiques institutionnelles’ discute

com mais pertinência a propriedade da terminologia voltada para o social [...]”

reconhecendo que os termos são suscetíveis à variação. Nessa obra, Gaudin apresenta

os caminhos teóricos da evolução histórica da terminologia moderna fazendo uma

revisão crítica dos postulados da terminologia tradicional. Gaudin (1993, p. 17) ainda

dedica uma grande parte da sua obra para tratar do que ele mesmo chama de “Pistes

pour une socioterminologie”7 edificando as bases do planejamento terminológico por

meio de noções advindas de várias outras áreas do conhecimento como a

Sociolingüística, a Sociologia, a Glotopolítica dentre outras. Fenômenos desprezados

pela TGT como a banalização, popularização ou vulgarização do discurso técnico-

científico é amplamente estudado pela Socioterminologia, tendo em vista que a

dimensão social da comunicação especializada não pode ser desvencilhada do discurso

em que os termos emergem.

O grande mérito de Gaudin foi ter considerado os princípios

sociolingüísticos e, dessa forma, trazer para o tratamento dos dados terminológicos a

possibilidade de descrever e analisar o léxico especializado no seu contexto real de

uso. Essa atitude rompe com a tradição terminológica de não considerar a presença da

7 “Pistas para uma socioterminologia” (GAUDIN, 1993:17).

Page 33: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

33

variação e, portanto, da sinonímia e da polissemia como constitutivos dos discursos

especializados.

Gaudin (1993, p. 16) defende uma terminologia fundamentada na

observação do funcionamento da linguagem e no estudo das condições sociais de

circulação dos termos. Através de sua teoria, critica as posições das escolas clássicas ao

esquecerem que a variação é um fator universal da linguagem humana e estão

também presentes nas linguagens de especialidade.

[...] Gaudin critica a inoperância dos instrumentos de referência, glossários e dicionários técnicos que não expressam a realidade dos usos terminológicos, propondo que o artificialismo do ideal normalizador seja suplantado pelo exame do contexto de produção dos léxicos especializados. A primeira conseqüência é o reconhecimento da variação terminológica nas comunicações especializadas (Krieger & Finatto, 2004, p. 35).

Os defensores dessa nova abordagem terminológica vão de encontro ao

tratamento dado à comunicação especializada pela TGT. Para os socioterminólogos, a

comunicação deve ser observada in vivo em função do contexto social, pragmático e

discursivo em que os termos circulam. Opõem-se, portanto, veementemente ao

condicionamento in vitro imposto pela teoria wusteriana. Conforme Gaudin (1993

apud DE LA TORRE, 2004, p. 46) “el refinamiento de las especializaciones, el

incremento de la interdisciplinariedad y la rapidez de la vulgarización provocan que los

limites entre el vocabulário general y el especializado se torne más dudoso”.8 É nesse

sentido que, para o autor, a Socioterminologia problematiza a metodologia usada na

prática terminográfica.

Para Boulanger (2001, p. 13), a terminologia é uma prática cognitiva,

lingüística e social especializada. É uma prática cognitiva à medida que repousa sobre

o conhecimento; uma prática lingüística à medida que repousa sobre uma noção ou

um termo e uma prática social especializada à medida que o saber circula em todas as

sociedades humanas. Afirma o autor que a Socioterminologia surge justamente para

identificar a relação entre língua de especialidade e sociedade.

8 “o refinamento das especializações, o conhecimento da interdisciplinaridade e a rapidez da vulgarização provam que os limites entre o vocabulário geral e o especializado se tornou mais duvidoso” (GAUDIN, 1993 apud DE LA TORRE, 2004:46)

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34

Para Gaudin (1993, p. 216), o laço entre trabalho e linguagem reflete

diretamente no âmbito das práticas lingüísticas e sociais em que os termos se inserem.

Por isso, afirma o autor que

[...] la socioterminologie, pour peu qu’elle veuille dépasser les limites d’une terminologie ‘grafière’, doit replacer la gênese des termes, leur réception, leur acceptation mais aussi les causes de leur échec et les raisons de leur succès, au sein des pratiques langagières et sociales concretes des hommes qui les emploient. Ces pratiques sont essentiellement celles qui s’exercent dans dessphères d’activité. C’est pourquoi la socioterminologie devait rencontrer les reflexions sur les liens qui se nouent entre travail et langage (GAUDIN, 1993,p. 216).9

O ponto de vista de François Gaudin repercute nos trabalhos desenvolvidos

pela professora Dra. Enilde Faultich da Universidade de Brasília, que se interessa pelo

tema defendendo que o conceito de variação lingüística desenvolvido na

Sociolingüística serve de suporte para a nova interpretação da variação terminológica.

Faulstich (2006, p. 29) apresenta a Socioterminologia como um ramo da

Terminologia que “se propõe a refinar o conhecimento dos discursos especializados,

científicos e técnicos, a auxiliar na planificação lingüística e a oferecer recursos sobre

as circunstâncias da elaboração desses discursos ao explorar as ligações entre a

terminologia e a sociedade”. A autora se refere aos especialistas em Socioterminologia

dizendo que estes tem se voltado para os estudos terminológicos em seus contextos

orais considerando que os termos variam e que as variantes devem estar na

elaboração de produtos terminográficos.

O enfoque, nessa perspectiva, passa a ser descritivo em oposição à visão

prescritiva encontrada na tradição lingüística terminológica. Acentua-se, dessa forma,

a necessidade de valorização dos termos no ambiente discursivo, pragmático e social,

o que resulta em uma ruptura ao modelo tradicional e uma abertura ao diálogo com

outras áreas do saber, como a Sociolingüística. A Socioterminologia se fundamenta na

9 “*…+ a socioterminologia, pressupondo ultrapassar os limites de uma terminologia "de escrivão", deve localizar a gênese dos termos, sua recepção, sua aceitação, mais também as causas do insucesso e as do sucesso, no âmbito das práticas lingüísticas e sociais concretas dos homens que empregam tais termos. Estas práticas são essencialmente aquelas que se exercem nas esferas de atividade. Eis porque a socioterminologia devia reencontrar as reflexões nos laços que se criam entre trabalho e linguagem” (GAUDIN, 1993:216, tradução nossa).

Page 35: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

35

observação do funcionamento da linguagem e no estudo das condições de produção e

circulação dos termos. Nesse sentido diz Gaudin (1993, p. 6) que,

[...] dans le même mouvement qui a conduit de la linguistique structurale à la sociolinguistique, une socioterminologie peut prendre en compte le réel du fonctionnement du langage et restituer toute leur dimension sociale aux pratiques langagières concernées.10

Com críticas à política normalizadora conferida aos estudos da

terminologia tradicional, uma das primeiras implicações foi o reconhecimento da

variação terminológica e a conseqüente valorização do enfoque social esquecido pela

teoria clássica da terminologia. Gaudin (Ibidem, 1993), nesse caminho, lembra que a

inoperância e o artificialismo do ideal normalizador para a produção terminográfica

devam ser suplantados pelo contexto de produção discursiva em que os léxicos

especializados se encontram.

1.2.1.1 Objeto de estudo: o termo e a definição

O termo é por excelência o objeto de estudo das ciências terminológicas,

dentre as quais a Socioterminologia. Para essa teoria os termos devem ser

investigados numa dimensão pragmática, discursiva e sociolingüística. Nesse ponto já

podemos perceber a grande barreira que há entre o enfoque prescritivo, normativo da

TGT e um enfoque descritivo que observa as linguagens de especialidade num

contexto de uso.

Faulstich (2006, p. 28) considerando os postulados metodológicos que

sustentam a teoria da variação terminológica propõe uma releitura da definição do

objeto de estudo da Socioterminologia: o termo. Para a autora (Ibidem, p. 28) “uma

unidade terminológica pode ter ou assumir diferentes valores, de acordo com a função

que uma dada variável desempenha nos contextos de ocorrência”. Nos domínios da

disciplina socioterminológica os termos podem ser entendidos como:

10 “*...+ no mesmo movimento que conduziu a lingüística estrutural à sociolingüística, uma socioterminologia pode levar em conta o real do funcionamento da linguagem e restituir toda sua dimensão social às práticas linguageiras concernentes” (GAUDIN; 1993, p. 16).

Page 36: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

36

signos que encontram funcionalidade nas linguagens de

especialidade;

entidades variantes, pois se apóiam em situações sócio-

comunicativas;

itens do léxico especializado que passam por processos de

evolução, devendo ser analisados no plano sincrônico e diacrônico.

O termo encarado dessa maneira perde a característica unívoca postulada

pela TGT, passando a ser visto como fenômeno lingüístico variável. Sendo assim, as

variantes encontradas nas terminologias são resultantes dos diferentes usos que a

comunidade de falantes em sua diversidade social, lingüística e geográfica faz da

linguagem de especialidade. Aplicando o princípio da variação em toda a sua

dimensionalidade, o termo passa a ser visto como a unidade lexical que sofre todas as

implicações sistêmicas e contextuais próprias a qualquer palavra no evento

comunicativo da língua.

Para Barros (2004, p. 40), o termo, que pode ser também denominado de

unidade terminológica, é uma unidade do léxico com conteúdo específico dentro de

um domínio também específico. Ainda afirma a autora que como signo lingüístico das

línguas de especialidade, o termo pode ser descrito e analisado em diferentes aspectos

dando sustentação teórica ao trabalho de diversas ciências aplicadas:

do ponto de vista do significante e significado;

das relações que mantém com outros termos (sinônimo, homônimo,

polissemia, etc.);

do ponto de vista sociolingüístico (usos, preferências, processo de

vulgarização, etc.)

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37

Por sua vez, Krieger e Finatto (2004, p. 75) defendem que o termo, a

fraseologia e a definição constituem-se como objetos de estudo no quadro teórico-

metodológico das ciências terminológicas. Dizem as autoras, que esses três objetos

projetam de diferentes maneiras os fundamentos do conhecimento especializado.

Embora saibamos que o avanço dos estudos terminológicos demonstra

uma nova feição ao seu objeto, propomo-nos enfocar apenas o termo e a definição

uma vez que a fraseologia exigiria um recorte teórico-metodológico que fugiria aos

propósitos da nossa pesquisa. No entanto, o termo e a definição como afirma Rey

(1979, p. 40 apud KRIEGER E FINATTO, 2004, p. 75), devem ser considerados à medida

que são duas faces da mesma moeda.

As palavras definição e termo são ligadas por um traço comum: elas designam na origem o estabelecimento de um limite, de um fim (definir) e seu resultado (termo). No plano nocional, para que um nome tenha direito ao título de termo, é necessário que ele possa, enquanto elemento de um conjunto (uma terminologia), ser distinguido de outro. O único caminho para exprimir esse sistema de distinções recíprocas é a operação dita definição. (REY apud KRIEGER & FINATTO, 2004, p.75)

Gaudin (1993, p. 180) reportando-se ao objeto de estudo da

Socioterminologia defende uma aproximação discursiva dos termos. Para ele, as

unidades terminológicas devem ser observadas em sua condição de produção

discursiva, pois é na interação que se podem observar os sentidos reais que lhes são

conferidos. Nesse sentido, os limites da frase devem ser ultrapassados para se

compreender os parâmetros e padrões de funcionamento dos termos.

A noção de termo e definição como objeto de estudo que defendemos

escapa daquela privilegiada pela escola wusteriana. Nos moldes tradicionais termo e

definição possuem um valor conferido na univocidade que se orienta para um

processo estático da linguagem e, conseqüentemente, do léxico especializado.

Consideramos muito mais a condição de produção do discurso especializado, pois é

nesse contexto social de produção discursiva que o termo e a definição ganham

contornos de especialidade fazendo sentido para quem os usa. Além do mais, o termo

e a definição, como duas faces da mesma moeda, devem integrar o quadro que

constitui o objeto de investigação terminológica.

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38

1.2.1.2 A variação nos estudos socioterminológicos

Um dos princípios básicos da linguagem humana, postulado pela

Sociolingüística, é o fato de que a variação é inerente em toda manifestação

lingüística. Conforme Mollica (1998, p. 13) “as línguas naturais humanas acham-se em

permanente dinamismo, razão porque estão sujeitas a processos de variação e

mudança...”. Em Socioterminologia não é diferente, os termos são passíveis de

variação e mudança, pois são constitutivos da linguagem humana. O falante ao

interagir no meio social acaba gerando “conceitos interacionais para um mesmo termo

ou de gerar termos diferentes para um mesmo conceito” (FAULSTICH, 2006, p. 30).

Conforme Gaudin (1993, p. 212), os termos não podem ser separados do

contexto social em que circulam. É no uso da linguagem que o falante expõe

impressões, pontos de vistas e representa a realidade que o cerca. Portanto, o léxico

de especialidade é passível de variação assim como o léxico geral de um determinado

sistema lingüístico.

O autor (ibdem, p. 293) sustenta que, mesmo sendo duas abordagens

distintas, a Socioterminologia comunga dos princípios da Sociolingüística. Aquela seria,

então, o resultado matemático entre princípios da Sociolingüística, que somados aos

princípios da terminologia resultaria numa nova maneira de se olhar o termo como

objeto de estudo, conforme o seguinte esquema:

Esquema 1: Fórmula que resulta na socioterminologia. Fonte: Adaptado de Gaudin (1993, p. 293)

Sociolingüística Terminologia Socioterminologia

Page 39: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

39

Nessa nova empreitada, a Socioterminologia, considerando os princípios da

Sociolingüística, vai de encontro aos moldes tradicionais impostos pelos estudos

clássicos da Terminologia. Essa nova feição de conceber o termo leva em conta a

variação e a condição de produção das terminologias no contexto sociocultural.

Para Faulstich (1996, p. 15), as variantes terminológicas devem ser

sistematizadas nos planos vertical, horizontal e temporal da língua pela

Socioterminologia. Para isso é necessário reconhecer nos domínios da disciplina

aplicada uma metodologia que afaste os padrões prescritivistas valorizados pela

tradição. Aponta a autora (Ibidem, p. 15) que o modelo mais apropriado “é o

funcionalismo lingüístico cuja abordagem é orientada para os fenômenos lingüísticos

em si. Essa perspectiva tem como objeto científico descrever e explicar os próprios

fenômenos lingüísticos, trabalho a ser feito pelo pesquisador variacionista.”

Faulstich (1995, p. 288; 2006, p. 30) ainda caracteriza as variantes

terminológicas em concorrentes, co-ocorrentes e competitivas. Essa classificação,

porém, não pode ser observada de forma estanque, uma vez que na ordem do

discurso especializado elas podem se sobrepor. Como diz Faulstich (2006, p. 30), “essa

classificação de ordem sistêmica não impossibilita que os tipos apareçam combinados

entre si”.

É o que acontece com algumas ocorrências da terminologia que estamos

descrevendo e analisando. Assim, por exemplo, o termo “bico de gaita” representa

uma variação de nível lexical com repercussão socioprofissional uma vez que se

encontra em uso na fala dos trabalhadores rurais, enquanto o outro termo

concorrente “bisel” é usado preferencialmente na fala dos profissionais técnicos e

atuantes em órgãos que estabelecem diretrizes e metas para o incentivo à agricultura

familiar na região pesquisada.

Os tipos de variantes terminológicas previstas por Faulstich (1996, p. 16-17,

2006, p.30) são de ordem lingüística e de registro (concorrentes), decorrentes da

sinonímia terminológica (co-ocorrentes) e decorrente também de empréstimos

lingüísticos (competitivas). Tomando por base a orientação de Faulstich (1996, p. 16-

17), apresentamos o seguinte quadro de classificação das variantes nos domínios

lingüísticos e extralingüísticos:

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40

VARIANTES

CONCORRENTES CO-OCORRENTES COMPETITIVAS

Lingüísticas: - fonéticas - morfossintáticas - gráficas - lexicais

Registros: - geográficas - socioprofissionais - discursivas - temporais

Sinônimos Empréstimos lingüísticos e estrangeirismos.

Quadro 1 – Variantes Terminológicas.

Essas variantes, por sua vez, são definidas da seguinte forma:

Variantes concorrentes: São as que se encontram em constante

concorrência entre si ou para a mudança. Quando concorrem entre si não ocupam o

mesmo espaço, pois se uma estiver presente a outra estará ausente. Essas variantes

subdividem-se em lingüísticas e de registros:

Lingüísticas:

Fonéticas11: dizem respeito às alternâncias de ordem dos fonemas sem

que isso implique numa mudança de significado (crueira ~ curera).

Morfossintáticas: apresentam alternância de elementos na estrutura

morfológica e sintática na constituição do termo, sem que o conceito se

altere. Em nosso trabalho constatamos essa variante em termos como cuí

~ cuizinho. Em formações sintagmáticas, conforme Faulstich (1996, p. 16)

“a variação se apresenta em um dos formantes do termo, normalmente no

sufixo” como em lombo-d’acém ~ lombinho-do-acém. Para Vasconcelos

(2000, p. 149) ainda pode ocorrer “quando há apagamento de um dos

elementos do sintagma” como em andada do caranguejo ~ andada”.

11 Considerando que o nosso trabalho prioriza o nível lexical, optamos pela transcrição grafemática. Portanto as variações que dizem respeito ao nível fonético representam uma aproximação da fala dos entrevistados.

Page 41: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

41

Lexicais: se constituem quando a forma do item lexical sofre comutação

sem que isso implique em mudança conceitual. É o que ocorre em (retiro ~

casa de farinha ~ casa de forno) na terminologia da farinha. Ocorre a

substituição de uma parte do item terminológico entre os termos

complexos (casa de farinha ~ casa de forno) e a comutação total desses

termos complexos com o termo simples (retiro ~ casa de farinha ~ casa de

forno).

Gráficas: decorrem da forma de registro do termo na língua escrita ou

do registro de formas decalcadas da fala.

De Registro:

Geográficas: decorre de polarização de comunidades lingüísticas

geograficamente limitadas por fatores políticos, econômicos, culturais ou

de influências que cada região sofreu no processo de formação.

Socioprofissional: ocorre quando o conceito não se altera em

decorrência da mudança dos registros (cova ~ suco).

Discursiva: conforme Fausltich (1996, p.16), decorre da sintonia

estabelecida entre elaborador e usuário de textos mais ou menos formais.

Esse tipo de variante ocorre no plano vertical do discurso de especialidade,

indicando termos específicos do discurso científico, técnico e de

vulgarização.

Temporais: decorrem do plano diacrônico da língua, quando no

processo de variação e mudança duas formas se acham em concorrência

durante um tempo até que uma se fixe como forma preferida.

Variantes coocorrentes: Quando um único referente possui duas ou mais

denominações. Essas variantes são semanticamente compatíveis e pode ocorrer no

mesmo contexto:

Page 42: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

42

Sinonímia: Conforme Faulstich (1999, p.16) ocorre na relação de dois ou

mais termos num mesmo contexto e com significado idênticos, sem que isso implique

em alteração no plano do conteúdo. Freixa (2002, p. 362 apud FAULSTICH, 2006, p.

31) “interpreta a sinonímia como variação denominativa e aponta causas para essa

variação, a saber, causas estilísticas, dialetais, funcionais, sociolingüísticas e causas

cognitivas. Entende a autora que os termos variam por estarem ligados a diferentes

parâmetros sociais em que se desenvolvem os discursos especializados”.

Variantes competitivas: São as que fazem relação de significados entre

itens lexicais de línguas diferentes:

Empréstimos lingüísticos e estrangeirismos: realizam-se por meio de

pares formados por empréstimos lingüísticos e formas vernaculares.

O processo de variação não pode ser desvencilhado da prática

terminológica e essa deve ser a posição do terminólogo. Diferentemente das

postulações tradicionais da TGT, que possui uma visão basicamente cognitiva,

favorecendo os aspectos conceituais das terminologias, a Socioterminologia se embasa

em estudos teóricos do texto e do discurso considerando que não se pode mais

conceber a linguagem fora do seu contexto de interação social. Sendo assim, somente

no texto e no discurso onde as terminologias circulam se poderá melhor compreender

o sentido que lhes são empregados.

Como orienta Almeida (2006, p.95) uma prática terminológica deve ser

coerente com os pressupostos teóricos elegidos e com o alcance que o projeto

pretende ter. Tendo o nosso estudo uma base socioterminológica e cultural não

poderíamos deixar de lado a variação e, portanto, os aspectos socioculturais em que os

termos se inscrevem, pois eles refletem o uso que o falante faz, nas diversas

circunstâncias de produção, do discurso especializado. Assim, no trabalho

socioterminológico, não se podem homogeneizar as diferenças, uma vez que isso

implica na anulação das formas que se encontram em uso pelo falante.

Page 43: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

43

Ainda afirma Almeida (2006, p. 95) ser “imperativo explicitar essas

diferenças a ponto de todos os sujeitos envolvidos em determinada situação de

comunicação especializada conhecerem as formas possíveis para que a comunicação

se efetue com eficácia”. Variações de ordem lingüística, de registros sinônimos,

polissemia, homonímia e conceito conexos estão presentes no discurso especializado,

sendo necessário que se dê realce a eles. Como afirma Finatto (1996, p. 67 apud

ALMEIDA, 2006, p. 96):

As melhores perspectivas para uma comunicação especializada de melhor qualidade, em qualquer área do conhecimento, constroem-se também a partir do reconhecimento da naturalidade e inerência da variação terminológica como um tipo de variação lingüística.

Para Faulstich (2006, p. 27) “os discursos de diversas naturezas, como o

científico, o técnico e o de vulgarização, são a fonte natural de onde emergem os

termos usados nas comunicações entre profissionais”. Muitos dos termos que circulam

nesses diversos ambientes entram no léxico comum por meio de diversos recursos da

língua sem mesmo perderem os seus sentidos de base. Apresenta, então, a autora, a

título de exemplificação, o termo “embrióide andrognético” haplóide, que oriundo do

discurso científico equivale ao termo “cultura in vitro” no discurso técnico e “planta de

proveta” do discurso de vulgarização.

A variação, no conjunto das reflexões mais atuais em Terminologia, passa a

ganhar importância ímpar, uma vez que os termos começam a ser concebidos numa

perspectiva mais globalizante onde o contexto de uso passa a validar as novas formas

de denominação. Dessa forma, não se pode relegar um termo em detrimento de

outro, como se um uso lingüístico fosse melhor que outro. Na realidade o que ocorre é

um continuum onde todas as formas podem coexistir e situar as escolhas

terminológicas do falante em seus diversos contextos de uso.

Nesse sentido, o trabalho de levantamento e registro dos termos deve ser

feito a partir de situações autênticas de interação comunicativa. Atentar para quem

fala, o que fala, de onde fala, para que fala, torna-se importante para a percepção das

reais condições de produção do discurso especializado.

Page 44: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

44

1.2.2 A Terminologia Cultural

A Terminologia Cultural – TC proposta por Diki-Kidiri (2007, p. 14) é uma

abordagem que postula como ponto principal a descrição e análise dos termos no

contexto cultural de produção em que eles circulam. A cultura passa a ser o elemento

central dessa proposta e ao fazer isso, a TC, também difere, consideravelmente, da

Terminologia clássica da Escola de Viena, desenvolvida por Eugen Wüster.

Se a Socioterminologia surge em oposição à visão restrita da escola

clássica, por não considerar o aspecto social e a variação terminológica em seu

interior; a Terminologia Cultural surge comungando com essa nova perspectiva em

olhar os fatos lingüísticos no seio social, defendendo que a cultura não pode ser

encarada como um obstáculo à comunicação clara dos conceitos científicos e técnicos

como previa a visão normalizadora da terminologia.

Nessa nova corrente de estudos culturais em Terminologia, a dimensão

social é invocada e encarada como ponto de compreensão do discurso em que os

termos circulam na comunidade de falantes. A Terminologia Cultural, como já

expomos, coloca a cultura no centro da sua abordagem focalizando o termo cultural e

compreendendo-o em várias dimensões que envolvem a pessoa humana, tanto

individualmente quanto coletivamente. É uma abordagem que converge com outras

perspectivas descritivas dos estudos terminológicos. Por isso, afirma Diki-Kidiri (2000,

não paginado) que a Terminologia Cultural,

[...] se recoupe aussi bien avec la «socioterminologie» décrite par François Gaudin (1993, 1993a) de l’Université de Rouen, qu’avec la «terminologie sociocognitive » élaborée par Rita Temmermann, et bien d’autres approches convergentes. 12

Diki-Kidiri (2007, p. 15) apresenta um quadro onde compara os pontos

divergentes entre a terminologia clássica wusteriana e a terminologia cultural,

identificando como cada uma aborda o trabalho terminológico:

12 “*...+ se sobrepõe tanto com a ‘socioterminologia’ descrita por François Gaudin (1993, 1993a) da Universidade de Rouen, quanto com a ‘terminologia sociocognitiva’ elaborada por Rita Temmermann, e outras aproximações convergentes” (DIKI-KIDIRI, 2000, não paginado)

Page 45: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

45

Pontos de comparação Terminologia Clássica Terminologia Cultural

Objetivo principal A normalização internacional do termo

Apropriação do saber e das tecnologias.

Lugar da cultura Excluída do campo da terminologia

Faz parte da abordagem terminológica.

Concepção do termo Bifacial: conceito/significante Trifacial: conceito/percepto/significante

Relações semânticas Bi-univocidade estrita entre significante e conceito. Não há sinonímia absoluta.

Integração da sinonímia, da polissemia e da homonímia.

Quadro 2 – Pontos de comparação entre a TGT e a TC. Fonte: Diki-Kidiri (2007, 15)

Como se pode observar, enquanto a TGT busca a normalização

internacional do termo concebendo o seu objeto de estudo de forma estanque, a

Terminologia Cultural tem como principal objetivo a apropriação do saber e das

tecnológicas, pois o ser humano ao se apropriar do novo cria representações

simbólicas que fazem parte da sua história enquanto sujeito sócio-culturalmente

constituído. Desta forma o lugar da cultura é garantido nessa abordagem, enquanto a

TGT exclui do seu campo de estudo.

A concepção do termo para a TGT é bifacial, há apenas um conceito para

um significante, o que a leva a descartar a variação em sua abordagem. Para a

Terminologia Cultural a concepção de termo é trifacial, pois entre o conceito e o

significante há uma percepção do real simbolizado pelo falante ou pela comunidade de

falante. Na argumentação de defesa desse caráter trifacial do termo Diki-Kidiri (2002,

não paginado) estabelece uma distinção entre conceito e significado. Para o autor,

embora “conceito” e “significado” possam aludir

“los mismos productos culturales del espíritu humano, el concepto parece

remitir a más objetividad y en consecuencia a más universalidad en la

representación de las cosas, mientras que el significado parece depender más

estrechamente de las percepciones particulares a cada cultura.”13

13 “os mesmos produtos do espírito humano, o conceito parece remeter mais à objetividade e em conseqüência mais à universalidade na representação das coisas, enquanto o significado parece depender mais das percepções particulares de cada cultura”.

Page 46: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

46

Sendo assim, o conceito remeteria à idéia essencial das coisas,

representaria o arquétipo na representação do real, enquanto o significado seria uma

percepção mais particular, um ponto de vista que representa simbolicamente um

referente. Nesse sentido diz Lara (1999, p. 47) que “La percepción no se da nunca en

pureza, en una espécie de tabla rasa sensorial, sino mediada y orientada por la

actividad humana en sociedad”14. Sendo assim, podemos dizer que o termo não pode

ser desvencilhado de seu contexto de uso pelo falante em sociedade, pois é na

interação que ele ganha contornos de sentidos em que perpassam a história, a

ideologia e a construção da identidade de um povo.

Tomando por base as definições de “conceito” e “significado”, Diki-Kidiri

(2002, não paginado) cunha o termo percepto, por analogia, para designar as

representações simbólicas (esquemas, planos, imagens) que são peculiares a cada

comunidade de falantes como traços específicos de um saber. Ainda apresenta um

esquema com o intuito de deixar mais esclarecido o seu ponto de vista sobre a

concepção de termos culturais. Esse esquema é representado da seguinte maneira:

Conceito (arquétipo)

Representações Simbólicas

(esquemas, planos, imagens)

Classes de objetos

Esquema 2 – Representação dos termos culturais. Fonte: Diki-Kidiri (2002, não paginado).

O conceito de arquétipo, portanto, corresponde às características

distintivas que estruturam as classes de objetos traduzíveis em imagens mentais

14

“A percepção nunca se dá puramente, em uma espécie de tabula rasa sensorial, mas mediada e orientada pala atividade humana em sociedade”. (LARA, 199, p. 47)

Page 47: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

47

simbólicas (esquemas, planos) que particularizam as percepções do real pela

comunidade. Em nosso estudo, por exemplo, termos como “bico de gaita” utilizado

pelo trabalhador rural para se referir a um tipo de corte feito maniva, particulariza a

realidade de como o trabalhador constrói a sua percepção cultural de mundo. Sabe-se

que gaita é o nome dado a vários instrumentos musicais de palheta, sendo que essa

denominação nos leva a pensar, por analogia, que o corte feito nas manivas se parece

bastante com o bico (boquilha) de um instrumento de palheta. Termos como “aturá”

também estão inscritos numa memória coletiva que remonta a história indígena do

termo tupi “atu’ra” 15(espécie de cesto usado para transportar mandiocas), sendo o

étimo uma forma que possibilita o resgate da história em que os termos tipicamente

culturais se encontram no discurso do homem na Amazônia paraense.

Diki-Kidiri (2002, não paginado) afirma que “El estabelecimiento de la

realidad se efectua a menudo de manera diferente de una cultura a outra dando

conceptos especificos para cada cultura”16. O autor esclarece a noção de conceito e

percepto comparando exemplos do termo “bicicleta” em três línguas africanas (sängo,

bambara e lilikó). Para ele, cada língua faz um recorte cultural da realidade. Desta

forma, o termo bicicleta encontra os seguintes perceptos (percepções da realidade):

Tradução Língua

gbâzângâ rodas de borracha Sängö (África Central)

nàgàsó cavalo de ferro Bambara (Mali)

magu-mákwanganya quatro pés Lilikó (Rep. Dom. Congo) Quadro 3 – Comparação de perceptos culturais entre três línguas africanas. Fonte: Adaptado de Diki-Kidiri (2002, não paginado)

Esses termos distintos demonstram a diversidade da percepção do objeto

“bicicleta” pelas diferentes comunidades lingüísticas estudadas pelo autor. Na África

Central, o povo conhecia a roda e eram submetidos a trabalhos forçados de

recolocação de borrachas de vegetais nos primeiros anos de colonização do país. Desta

forma, as rodas da bicicleta atraíram a atenção do falante da língua sängo motivando a

15

Conforme Cunha (1982, p.83), o termo aturá, proveniente do tupi “atur’a”, registra-se de 1833 possuindo o significado de ‘cesto’. 16

“o estabelecimento da realidade se efetua de forma diferente de uma cultura à outra, dando conceitos específicos para cada cultura” (DIKI-KIDIRI, 2002, tradução nossa).

Page 48: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

48

eleição da denominação de “rodas de borracha” para esse veículo. Em Mali, os falantes

da língua bambara conheciam o cavalo e, desta forma, perceberam a semelhança

funcional entre o animal e a bicicleta, o que contribuiu para a denominação de “cavalo

de ferro”. Já na República Dominicana do Congo, a denominação “quatro pés” pode

ser entendida como “o veículo que duplica os pés” permitindo ao condutor se

movimentar duas vezes mais rápido.

Todas as ocorrências verificadas, nesses exemplos, pretendem dar conta da

estrutura esquemática (conceito arquetípico) de bicicleta. As diferentes percepções ou

denominações: “rodas de borracha”, “cavalo de ferro” e “quatro pés” são os perceptos

que se vinculam a diferentes significantes. Para Diki-Kidiri (2002, não paginado) os

perceptos são “[...] opiniones diferentes sobre el objeto, opiniones motivadas por y

dependientes del pasado cultural próprio de cada comunidad”17. Portanto, o

“percepto” não equivale à “conceito”, mas é somente um indicador até o conceito, é

“*...+ un punto de referencia que permite entender globalmente el concepto, sin tener

que reconstituir todos los elementos estructurales”18.

O esquema abaixo é utilizado por Diki-Kidiri (2002, não paginado) para

demonstrar esse movimento entre conceitos e perceptos na terminologia cultural:

RODAS DE BORRACHA SÄNGÖ

CAVALO DE FERRO BAMBARA

QUATRO PÉS LILIKÓ

CONCEITO PERCEPTOS SIGNIFICANTES

Esquema 3 - Percepção cultural entre três línguas africanas. Fonte: Diki-Kidiri (2002, não paginado)

17

“opiniões diferentes sobre o objeto, motivadas e dependentes do passado cultural de cada comunidade” (DIKI-KIDIRI, 2002, não paginado). 18 “*...+ um ponto de referencia que permite entender globalmente o conceito, sem ter que reconstituir todos os elementos estruturais” (DIKI-KIDIRI, 2002, não paginado).

c

Page 49: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

49

O conceito de cultura depreendido na Terminologia Cultural compreende,

portanto, a pessoa humana enquanto ser culturalmente construído tanto individual

quanto coletivamente. Nesse sentido, o contexto histórico passa a ser à base dos

conhecimentos adquiridos e acumulados pelo falante ou pela comunidade de falante.

Afirma Diki-Kidiri (2002, não paginado) que,

las personas, como individuos, nacen, crecen, adquieren conocimientos, habilidades, generan uma cultura individual por seus hábitos propios y desarollan una identidad. Una comunidad se comporta exactamente de la misma manera, de modo que hay un paralelismo entre estas dos entidades, el individuo y la comunidad19.

Consideramos cultura conforme o autor depreende em suas análises: como

“el conjunto de las experiencias vividas, producciones realizadas, y conocimientos

generados por una comunidad humana que vive en un mismo espacio, a un mismo

tiempo”20. Na nossa pesquisa sobre a terminologia da cultura da farinha

depreendemos que o léxico especializado ocorre num contexto sociocultural em que a

atividade de fazer farinha remonta a uma tradição cultural repassada de geração em

geração por membros da comunidade. Os termos são assim considerados “termos

culturais”, pois estão inscritos numa história e, portanto, numa memória21 coletiva que

faz parte do conhecimento de mundo acumulado pela comunidade.

Dessa forma, os termos ou unidades terminológicas considerados em

nosso trabalho são concebidos como representações simbólicas do universo cultural

do falante na atividade especializada de produção da farinha. Esses termos culturais,

por sua vez, são elucidados no discurso oral dos socioprofissionais (trabalhador rural,

atravessador e técnico) como elemento constitutivo da produção do saber e da

percepção do real por meio da linguagem.

19 “as pessoas, como indivíduos, nascem, crescem, adquirem conhecimentos, habilidades, geram uma cultura individual por seus hábitos próprios e desenvolvem uma identidade. Uma comunidade se comporta exatamente da mesma forma, de modo que há um paralelismo entre estas duas entidades, o indivíduo e a comunidade” (DIKI-KIDIRI, 2002, não paginado, tradução nossa). 20

“o conjunto das experiências vividas, produções realizadas, e conhecimentos gerados por uma comunidade humana que vive em um mesmo espaço, a um mesmo tempo” (DIKI-KIDIRI, 2002, não paginado). 21

“Conforme Diki-Kidiri (2002, não paginado) “De todas las facultades superiores del espíritu, la memória es la que permite al hombre progresar en la adquisición del conocimiento. La memoria permite explotar la base de experiencias y conocimientos acumulados con el fin de encender el juicio y por consiguiente el comportamiento”.

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50

1.3 A PERSPECTIVA DOS ESTUDOS TERMINOLÓGICOS NO BRASIL

O crescimento exponencial dos estudos terminológicos nas últimas

décadas propiciou o interesse de grupos de pesquisas de universidades brasileiras em

se lançarem nas investigações sobre o léxico especializado. Barros (2004, p. 36) afirma

que somente em meados dos anos de 1980 a Terminologia ganhou espaço como

disciplina se implantando efetivamente no Brasil. Destaca-se a importante

contribuição de pesquisadores e professores que ministravam cursos de Lexicologia e

Lexicografia na Universidade de São Paulo (USP), Universidade Federal de Brasília

(UnB) e Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) de onde se originou a

formação de diversos pólos de pesquisa que contribuíram para a expansão do campo

do estudo terminológico.

A criação em 1986 do Grupo de Trabalho Lexicologia e Lexicografia, por

exemplo, no âmbito da Associação Nacional de Pós-Graduação em Letras e Lingüística

(ANPOLL), favoreceu mais tarde, no III Encontro da ANPOLL, a inserção da

Terminologia, que já se delineava como campo de estudo teórico e aplicado. No

percurso de desenvolvimento da disciplina, no território brasileiro, podemos destacar

alguns momentos importantes para a expansão da área (ALVES, 1998, p. 8; ANJOS,

2003, p. 35; BARROS, 2004, p. 37):

1990 – Publicação do Cadastro de Fontes Bibliográficas pelo

Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia – IBICT;

1992 – Criação da Comissão de Estudo Especial Temporária de

Terminologia (CEET) em parceria com a Associação Brasileira de

Normas Técnicas (ABNT);

1994 – Criação de um banco de dados terminológico brasileiro

(BrasilTerm) com o objetivo de registrar o maior número possível de

termos técnico-científicos da língua portuguesa falada no Brasil.

Anjos (2003, p. 36) destaca que o Brasil mantém um intercâmbio com

outros centros universitários de pesquisa sobre terminologias como o Institut

Page 51: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

51

Universitari de Lingüística Aplicada – IULA, Pompeu Fabra. O projeto Bases teórico-

metodológicas para o desenvolvimento do Mercosul, coordenado pelas professoras

Maria da Graça Krieger (TERMISUL) e Guiomar Elena Ciapuscio (TERMITEX) é outro

exemplo de parceria entre dois países que comungam cientificamente propostas para

o estabelecimento e reconhecimento do léxico especializado no âmbito do Mercosul.

Este projeto foi desenvolvido conjuntamente entre pesquisadores da Universidade

Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS e pesquisadores da Universidade de Buenos

Aires e do Instituto de Desenvolvimento Humano da Universidade Nacional de General

Sarmiento.

Conforme Krieger (1998, p. 15), em nota introdutória da Revista Organon,

número 26 do Instituto de Letras da UFRGS,

[...] a constituição deste grupo bilateral, que privilegia a terminologia em sua vertente teórica e sugere orientações de tratamento terminológico, é mais uma voz que se agrega ao cenário de estratégias e ações complementares à definição da necessária e urgente política lingüística para o Mercosul.

Como afirmam Krieger e Bevilacqua (2005, p. 2-3) e Barros (2004, p. 36),

são Paulo (USP), Brasília (UnB), Rio de Janeiro (PUC-RJ), Rio Grande do sul (URFGS)

podem ser considerados eixos pioneiro da Terminologia no Brasil. Hoje, outras

instituições universitárias se lançaram na realização de pesquisas em nível de pós-

graduação contribuindo, cada vez mais, para a reflexão e consolidação da área. Alves

(1998, p. 9 apud KRIEGER & BEVILACQUA, 2005, p.4) afirma que os cursos de pós-

graduação em lingüística muito contribuíram para garantir espaço à Terminologia no

Brasil.

Atualmente são várias as universidades22 que, em diversos pontos

geográficos do Brasil, se envolvem em projetos de investigação terminológica. O mapa

terminológico tem crescido em proporção geométrica propiciando o surgimento de

grupos de pesquisas e, ainda, publicações de livros e revistas especializadas no

22

Universidade de São Paulo – USP, Universidade do Rio Grande do Sul – UFRGS, Universidade Federal de Goiás – UFG, Universidade Estadual do Ceará – UECE, Universidade Estadual de Londrina – UEL, Universidade Estadual de São Paulo – UNESP, Universidade Federal de São Carlos – UFSCAR (KRIEGER & BEVILACQUA, 2005:5-6).

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52

assunto, trazendo à tona discussões sobre o léxico especializado de variados domínios

do conhecimento e do saber humano.

1.3.1 Os estudos terminológicos na Amazônia paraense

Hodiernamente, os estudos de base terminológica têm ganhado espaço

considerável na região norte do Brasil. No contexto amazônico destacamos os

trabalhos realizados no Programa de Mestrado em Lingüística da Universidade Federal

do Pará – UFPA e do Projeto Atlas Lingüístico do Pará – ALIPA, coordenado pelo

professor Dr. Abdelhak Razky. Esse projeto vem, nos últimos anos, desenvolvendo uma

linha de pesquisa voltada para a descrição e análise do léxico especializado.

Em termos gerais, o Projeto ALIPA objetiva mapear e analisar a variação

lingüística do português falado no Estado do Pará, possibilitando a construção do Atlas

Geo-Sociolingüístico do Pará. Para isso, possui uma perspectiva de linguagem que

enfoca a dimensão social e lingüística para melhor compreensão dos mecanismos

internos que envolvem a variação. No campo lexical, o projeto ALIPA segue a tradição

geolingüística para o estudo do léxico geral e a dimensão socioterminológica para o

estudo do léxico de especialidade da região.

Os trabalhos desenvolvidos no Pará, até o momento, tem considerado a

dimensão social de circulação dos termos, trazendo um resultado prático, por meio de

glossários, em sua maioria, ancorados nos conhecimentos advindos da

Socioterminologia e dialogando com outras perspectivas.

No início dos anos 2000, surgiu o primeiro trabalho de cunho terminológico

com Vasconcelos (2000), sobre a terminologia do caranguejo, realizado junto ao

Programa de Mestrado da UFPA e no âmbito do ALIPA. Este trabalho privilegiou uma

terminologia proveniente da linguagem oral, envolvendo socioprofissionais que atuam

na atividade de tiração, catação e comercialização do caranguejo no município de

Bragança – Pará. A partir do tratamento dos dados coletados e com base nos aspectos

teórico-metodológicos da Socioterminologia foi organizado um glossário semi-

sistemático constituído com a entrada de 305 termos.

Page 53: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

53

Em seguida, Velasco (2004) apresentou a “Terminologia da pesca em

Soure-Marajó”. Numa perspectiva socioterminológica, o autor organizou um glossário

com 284 termos oriundos da linguagem oral e usados em situações sócio-

comunicativas por pescadores daquela região.

Santos (2006) pesquisou a terminologia do Sairé no município de Santarém

– Pará. Com base nos pressupostos teórico-metodológicos da Socioterminologia e da

Etno-terminologia, a autora organizou um glossário contendo 295 termos extraídos e

analisados a partir de situações orais autênticas.

Carvalho (2006) descreveu a terminologia do pescado em Santarém – Pará,

utilizando-se dos pressupostos teórico-metodológicos da Socioterminologia. O autor

inventariou 464 termos oriundos de um corpus de linguagem oral.

Martins (2007), por sua vez, propôs um trabalho no campo da Terminologia

e realizou um levantamento de termos relacionados ao domínio da indústria do

alumínio. Essa pesquisa se fixou no campo teórico da Sociotermonologia e da Teoria

Comunicativa da Terminologia (TCT), contribuindo para os estudos da área. A partir do

tratamento de dados realizado foram inventariados 640 termos provenientes de um

corpus constituído de linguagem oral e escrita, sendo que o resultado prático desse

estudo proporcionou também a publicação de um glossário eletrônico.

Costa (2009), mais recentemente, pesquisou a terminologia do cacau no

município de Medicilândia – Pará. Seguindo uma orientação teórico-metodológica da

Socioterminologia foram inventariados 231 termos provenientes do universo

lingüístico-discursivo da cultura do cacau. Chegou-se à conclusão, nesse trabalho, da

necessidade de realizar futuramente um estudo diatópico dessa terminologia

considerando que, em outros pontos geográficos, as mudanças dos processos

realizados nessa atividade especializada causariam também variações significativas

nesse domínio.

Dessa forma, acreditamos que todos esses trabalhos vêm contribuindo, ao

longo do tempo, para consolidar as bases das pesquisas terminológicas no âmbito do

ALIPA e, ainda, impulsionar o desenvolvimento de pesquisas dessa natureza na região.

Nessa perspectiva, nosso trabalho, sobre a terminologia da cultura da farinha, possui o

intuito de corroborar com o que se tem realizado até o momento, contribuindo para o

Page 54: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

54

reconhecimento do mosaico socioterminológico presente na linguagem de

especialidade falada no Estado do Pará. Buscamos também contribuir para a

consolidação, cada vez mais necessária, dessa área de estudos na região amazônica,

onde está presente uma grande biodiversidade e junto dela mitos, lendas e uma gama

do saber popular oriundos das mais diversas atividades especializadas.

Page 55: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

55

2. MANDIOCA E FARINHA: TRADIÇÃO CULTURAL

Apresentaremos, neste capítulo, algumas informações e dados

socioeconômicos acerca da importância da mandioca enquanto cultura agrícola

presente em vários países do mundo, bem como o seu uso na fabricação de

subprodutos com destaque para a farinha. A partir da nossa observação de campo,

para a coleta de dados da pesquisa, também pudemos constatar o valor cultural e

identitário que o homem do campo constrói em torno da atividade especializada de

produção da farinha. No município de Acará todo esse movimento começa na lavoura

onde o trabalhador rural inicia o preparo da área para a plantação de manivas até a

colheita da mandioca, momento em que se dá o início do beneficiamento para a

produção de farinha. Dessa forma, realizamos esse percurso na tentativa de

demonstrar que essas práticas se substanciam no léxico especializado estudado como

identidade da cultura local.

2.1. PANORAMA GERAL DA PRODUÇÃO E IMPORTÂNCIA DA MANDIOCA NO MUNDO

A mandioca é cultivada em mais de 180 países no mundo, segundo dados

da Food and Agriculture Organization – FAO23. No continente africano e nos principais

países produtores da América latina a batata da mandioca é utilizada para a

alimentação humana na forma in natura ou como farinha.

Afirmar com precisão a origem da mandioca tem sido ponto polêmico entre

especialistas da área. Conforme Albuquerque (1969, p. 11), a grande maioria dos

botânicos e ecologistas defende que ela é uma planta de origem americana tendo o

sertão brasileiro como provável berço. Outros afirmam que a África, a Ásia ou as Ilhas

do Pacífico reúnem grandes possibilidades de ser o seu provável local de origem.

Conhecida cientificamente como Manihot esculenta Crantz, planta perene,

arbustiva, pertencente à família das Euforbiáceas24, a mandioca se constitui como

garantia de alimento básico para as populações mais carentes (ALBUQUERQUE, 1969,

23 A FAO é a Organização das nações unidades para a agricultura e alimentação, composta por 189 países membros (FAO, 2010). 24 Família de plantas dicotiledóneas que se distribui por cerca de 320 gêneros e cerca de seis mil espécies. As plantas desta família são árvores, arbustos, ervas e alguns gêneros são plantas trepadoras e atingem a sua máxima densidade em regiões tropicais e subtropicais.

Page 56: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

56

p. 30). Por isso mesmo, o seu cultivo possui uma grande relevância econômica e é uma

das principais fontes energéticas de alimento para as populações que vivem nos países

em desenvolvimento.

No mercado internacional, a mandioca pode ser considerada a quarta

maior cultura agrícola do mundo (FOLEGATTI et al, 2005, p. 66). Esse fato se deve,

principalmente, pela grande produtividade dessa raiz tuberosa25 por países como a

Nigéria, a Tailândia, o Brasil, a Indonésia, a República Dominicana do Congo dentre

outros. A tabela seguinte apresenta dados da FAO sobre a produção de mandioca, em

toneladas, nos vinte países maiores produtores. A Nigéria aparece como o maior

produtor de mandioca, seguida pela Tailândia e pelo Brasil respectivamente. No

ranking de produção entre os vinte países produtores constantes na tabela 1, a Nigéria

destaca-se como o primeiro produtor respondendo por 21% do volume total

produzido, seguida pela Tailândia com 13% e pelo Brasil com 12%.

Tabela 1. Países maiores produtores de mandioca.

Nº País Produção (ton.)

01 Nigéria 43410000

02 Tailândia 26915541

03 Brasil 26541200

04 Indonésia 19988058

05 República Dominicana do Congo 15004430

06 Gana 9650000

07 Angola 8840000

08 Índia 8232300

09 Vietnã 8192800

10 Tanzânia 6600000

11 Moçambique 5038623

12 Paraguai 4800000

13 Uganda 4456000

14 China 4361573

15 Malaui 3238943

16 Madagascar 2450000

17 Costa do Marfim 2342158

18 Benin 2284056

19 Camboja 2215000

20 Camarão 2100000

Fonte: FAO, 2010.

25

As tuberosas são eminentemente calóricas rústicas, razões pelas quais são consideradas alimentos de subsistência, capazes de proporcionar energia para populações carentes (CEREDA,2005:17).

Page 57: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

57

Segundo dados do Centro de Socioeconomia e Planejamento Agrícola –

EPAGRI/CEPA26, os países africanos onde a lavoura de mandioca é explorada

apresentam formas de cultivo bastante rudimentar, além de continuar sendo

considerada como um alimento básico para importante parcela da população desse

continente.

Nos países como a Nigéria, Tailândia e o Brasil essa cultura agrícola está

presente como atividade de subsistência e, por isso mesmo, considerada o “pão do

pobre” pela sua facilidade de cultivo. São várias as utilidades que podem ser obtidas

dessa raiz tuberosa além da fabricação da farinha. Os produtos derivados da fécula da

mandioca, por exemplo, têm sido crescentes tanto no mercado alimentício quanto no

de produtos industrializados em países emergentes como o Brasil. Segundo Mattos e

Cardoso (2009, não paginado), “a fécula e seus produtos derivados têm

competitividade crescente no mercado de produtos amiláceos para a alimentação

humana, ou como insumos em diversos ramos industriais tais como o de alimentos

embutidos, embalagens, colas, mineração, têxtil e farmacêutico”.

Esquema 4 - Produtos fabricados com a fécula da mandioca.

Fonte: Mattos & Cardoso, 2009.

26 O EPAGRI/CEPA é um centro especializado em informação e planejamento para o desenvolvimento agrícola, pesqueiro e florestal de Santa Catarina, localizado junto à Secretaria de Agricultura e Desenvolvimento Rural. Tem como objetivo realizar o monitoramento e análise da produção do mercado agrícola e das políticas públicas, atuar no desenvolvimento local e regional, desenvolver estudos e pesquisas sobre o espaço rural, gerar e disseminar informações e prestar serviços para os governos do Estado, da União e municipais, iniciativa privada, organizações de produtores e universidades. (CEPA/EPAGRI, 2010)

Page 58: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

58

Como se vê, a mandioca está presente em muitos produtos que usamos ou

consumimos diariamente. Tanto as suas folhas como as raízes são utilizadas na

alimentação humana. Porém, como afirmam Almeida e Silva (apud ARAÚJO e LOPES,

2008:04) o consumo das raízes de mandioca é bastante expressivo em nível mundial,

sendo a fécula e a farinha os principais subprodutos derivados dela.

2.2. PANORAMA GERAL DA PRODUÇÃO E IMPORTÂNCIA DA MANDIOCA NO BRASIL

A mandioca é um produto bastante popular na alimentação em várias

regiões do Brasil. Ela pode se apresentar em diversas variedades e, de acordo com a

presença do ácido cianídrico, divide-se em mandioca-mansa e mandioca-brava,

variando quanto às cores das partes de folhas, caules, raiz e forma. Está também

presente em variados pratos da culinária brasileira, que vai do mais típico aos mais

sofisticados e, ainda, desempenha um importante papel na construção da identidade

cultural.

No Brasil, a raiz da mandioca é utilizada na preparação de farinhas, como a

farinha de mandioca e tapioca, além de várias receitas típicas da Amazônia paraense

como o tacacá, o molho tucupi, a maniçoba feita com as folhas das manivas cozidas e

muitas outras iguarias provenientes dessa raiz tuberosa.

Crendices, mitos e lendas sobre o cultivo da mandioca também fazem

parte do folclore brasileiro como a “Lenda da Mandioca” no acervo cultural

amazônico. Conforme Pinto (2009, p. 2), “fortemente presente no imaginário popular,

a mandioca é portadora de tradições que vão dos mitos indígenas às diferentes formas

de expressão na linguagem popular...”

A distribuição da mandioca no Brasil é bastante variada entre as regiões e

Estados produtores. Conforme os dados coletados no IBGE (2008), a região nordeste

se configura como maior produtora dessa cultura, seguida pela região norte do Brasil.

Enquanto os Estados do nordeste brasileiro tiveram uma produção de 10.092.238

toneladas numa área planta de 1.355.139 hectare, o norte apresentou uma produção

de 6.865.220 toneladas numa área plantada que chega a 477.707 hectares, conforme

Page 59: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

59

se pode observar nos dados contidos na tabela de distribuição da produção de

mandioca a seguir:

Tabela 2. Produção de mandioca por região do Brasil.

Região Produção (safra)

Área Plantada (hectare)

Área Colhida (hectare)

Rendimento Médio

Nordeste 10.092.238 1.355.139 908.871 11.104

Norte 6.865.220 477.707 464.159 14.791

Sul 5.884.760 300.302 295.874 19.889

Sudeste 2.290.073 165.676 124.793 18.351

Centro-oeste 1.466.267 102.679 88.814 16.509

Fonte: IBGE, 2008.

Considerando os dados descritos na tabela 2, construímos um gráfico

estatístico que aponta a região nordeste com um índice de 38% da produção nacional,

seguida da região norte com 26% no ano de 2008. Isso significa que essas duas regiões

juntas são responsáveis por 64% do volume de mandioca produzida no país, ou seja,

mais da metade da produção nacional.

Gráfico 1: Percentual da produção de mandioca por região do Brasil.

Fonte: IBGE, 2008.

Embora o nordeste desponte como o maior produtor de mandioca no

Brasil, o Estado do Pará, em relação aos outros Estados brasileiros, destaca-se como

maior produtor dessa cultura agrícola seguido pela Bahia, Rio Grande do Sul, São Paulo

e Ceará respectivamente, conforme dados constantes na tabela 3, a seguir (ver tabela

3 completa no anexo A):

38%

26%

22%

9%5%

Produção de Mandioca por região

Nordeste

Norte

Sul

Sudeste

Centro-oeste

Page 60: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

60

Tabela 3. Produção de mandioca no Brasil, por Estado.

Estado Produção (safra)

Área Plantada (hectare)

Área Colhida (hectare)

Rendimento Médio

Pará 4.843.039 311.504 308.804 15.683

Bahia 4.609.098 388.606 350.642 13.145

Rio Grande do Sul 1.339.653 89.751 85.323 15.701

São Paulo 991.090 57.950 40.900 24.232

Ceará 924.860 189.989 95.330 9.702

Minas Gerais 885.228 79.566 57.895 15.290

Amazonas 680.484 79.364 75.874 8.968

Fonte: IBGE, 2008.

Os Estados da Bahia e Pará juntos representam 45% da produção nacional.

Enquanto a Bahia obtém 22%, o Estado do Pará chega a 23% da produção nacional por

safra, índice que os coloca entre os maiores produtores de mandioca no Brasil.

Gráfico 2 – Percentual de produção da mandioca no Brasil, por Estado. Fonte: IBGE, 2008.

A mandioca representa para esses Estados fonte de renda e alimentação,

além de ser matéria-prima para fabricação de vários subprodutos dentre os quais a

farinha. Como afirma Ferreira Neto et al. (2005, não paginado), embora com a

industrialização da mandioca se possa ter produtos diversos, a farinha se destaca com

aproximadamente 90% do volume produzido. Ainda Vilpoux et al. (2001, p. 621) dizem

que o Brasil é o único país da América Latina que consome a farinha de mandioca de

forma bastante expressiva.

23%

22%55%

Produção de Mandioca por Estado

PA

BH

Outros

Page 61: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

61

2.3 A PRODUÇÃO, O BENEFICIAMENTO E A IMPORTÂNCIA CULTURAL DA MANDIOCA NO MUNICÍPIO DE ACARÁ – PARÁ

Podemos considerar que o sistema de produção de farinha no município de

Acará começa na lavoura, onde o trabalhador rural cultiva a mandioca para, quase

exclusivamente, fabricar esse subproduto. As propriedades dos trabalhadores rurais

têm área média de 25 hectares onde cultivam o milho, o arroz, o feijão, o açaí, o

cupuaçu, a pimenta do reino dentre outras culturas com destaque para a mandioca

como principal produto agrícola daquela região (ALVES, CARDOSO & LOPES, 2006, p.

1). Conforme os autores, 85% da mandioca do município é destinada à comercialização

enquanto 15% destinam-se ao consumo familiar. Em nossas visitas ao município,

durante a pesquisa de campo, constatamos o grande destaque que se dá para a

plantação de mandioca e a produção de farinha. É raro uma propriedade que não

tenha uma área destinada ao cultivo dessa raiz tuberosa para a produção de farinha.

Conforme os dados estatísticos coletados no IBGE (2008), constantes no

gráfico 3, dentre as várias culturas temporárias a mandioca se destaca com maior

produtividade em toneladas por safra no município de Acará – Pará.

Gráfico 3 – Produção de culturas agrícolas temporárias por tonelada em Acará – Pará. Fonte: IBGE (2008)

O plantio da mandioca no município obedece, geralmente, dois períodos:

um que se inicia no final do ano (denominado pelos trabalhadores rurais de janeiro) e

outro no meio do ano (denominado de verão). O processo que envolve o ciclo

produtivo da farinha compreende três fases: plantação, beneficiamento e

600.000t

360t

39t 6t

Mandioca

Milho

Feijão

Arroz

Page 62: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

62

comercialização. Por sua vez, essas três fases compreendem determinados processos

culturais adquiridos através do próprio conhecimento popular na lavoura e no

beneficiamento da farinha pelo trabalhador rural. Esses processos se desenvolvem em

várias etapas, a saber:

2.3.1 Preparo da área

O preparo da área para o plantio das manivas-semente ocorre com o

sistema de derruba ou queima. A primeira operação realizada nesse sistema pelo

trabalhador rural é a chamada broca ou roçagem, que consiste na eliminação da

vegetação mais baixa ou rasteira para, posteriormente, ocorrer a derruba da

vegetação de maior porte. No momento em que a área roçada estiver seca usa-se,

então, a chamada “queima”, que é a eliminação do restante da vegetação por meio de

queimadas como se observa na imagem seguinte.

Fotografia 1 – Queimada realizada no terreno para o preparo da área de plantação. Fonte: Pesquisa de campo.

Vale ressaltar que o trabalhador rural, apesar de usar constantemente a

queima para o preparo da área em que irá iniciar um plantio, mostra-se consciente de

que esse tipo de processo não deveria ocorrer em decorrência do impacto ambiental.

Em nossa visita, em algumas propriedades, os donos de terra (trabalhadores rurais)

Page 63: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

63

sempre ressaltavam que a queima apesar de prejudicar o meio ambiente é o único

recurso que mais facilita o trabalho, pois, mesmo que insustentável, tem como lógica

reduzir o gasto com mão-de-obra de outras atividades da cultura como o trabalho de

desmatamento e limpeza do terreno.

Após a operação chamada “queima” faz-se a chamada “coivara”, que

consiste em amontoar e requeimar o restante da vegetação (galhos, folhas secas, etc.)

que ainda ficam espalhados na área.

2.3.2 Plantio das manivas-semente

O próximo passo é o plantio, momento em que o agricultor prepara as

manivas-sementes para colocá-las na cova. Nessa operação é utilizada, basicamente, a

enxada para abrir as covas, um terçado para a realização do corte das manivas e um

paneiro para carregar as manivas que vão sendo colocadas em pares nas covas. Nessa

dinâmica, do cultivo da mandioca, toda família se engaja no trabalho da roça para

juntos tirarem o seu sustento. A imagem abaixo demonstra o momento em que o

trabalhador rural coloca as manivas na cova.

Fotografia 2 – Trabalhadora rural realizando o plantio de manivas. Fonte: Pesquisa de campo.

Existe uma variedade muito grande de manivas ou mandiocas cultivadas

pelos trabalhadores rurais. Essas mandiocas são classificadas por eles de acordo com o

Page 64: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

64

aspecto da planta (cor, tamanho, esgalhamento) ou pela cor da polpa da batata da

mandioca (branca, amarela ou creme). Dentre as variedades de mandioca mais

destacadas pelos agricultores estão a tachí e tachizão como sendo as melhores

espécies de serem cultivadas na região. Em relação à plantação das manivas, não há

um sistema padronizado para a realização dessa tarefa como, por exemplo, seguir um

espaçamento ou alinhamento entre uma cova e outra na área utilizada para o plantio.

Na realidade, os agricultores vão abrindo as covas aleatoriamente e realizando esse

processo que perdura durante o dia inteiro, dependendo do tamanho da roça.

2.3.3 Tratos culturais

Os tratos culturais realizados, após a plantação das manivas, resumem-se,

basicamente, entre duas a três capinas durante o ciclo da cultura conforme nos

informou os trabalhadores rurais participantes da pesquisa. Entre os primeiros seis

meses ocorre uma a duas capinas e, quando necessário, faz-se outra capina antes da

colheita.

O combate a pragas e doenças, segundo os mesmos trabalhadores rurais,

basicamente não ocorre, pois a mandioca é uma cultura que não precisa de grandes

cuidados bastando ocorrer a capina para garantir o equilíbrio natural do plantio.

Algumas lavouras, no entanto, são acometidas pelo ataque de saúvas cortadeiras e

quando isso ocorre, aplica-se formicida para o controle da praga. Dentre as pragas

referidas pelos trabalhadores rurais estão o cupim, a lagarta, a formiga e alguns tipos

de ervas daninhas que podem prejudicar o desenvolvimento das manivas, causando

doenças nas plantas.

2.3.4 Colheita

A colheita da mandioca é realizada a partir dos 12 meses, podendo ser

colhida até mesmo antes do tempo previsto. Isso ocorre, muitas vezes, pela

necessidade que o trabalhador rural tem em retirar o seu sustento da terra.

A colheita da mandioca é feita através do chamado “arranque” que

consiste na retirada manual da raiz. O trabalhador rural, para isso, segura a rama da

maniveira firmemente e a puxa para arrancar do solo. É utilizado também um facão

Page 65: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

65

para cortar o tronco da maniveira separando as raízes da rama. Somente, então, as

raízes da mandioca são transportadas para o poço onde ficarão de molho para

amolecerem num período de três a cinco dias e, posteriormente, serem beneficiadas

no retiro27 para a produção de farinha. O poço, local onde a mandioca fica de molho

para a fermentação, é geralmente um cercado feito na beira ou dentro de um igarapé.

Fotografia 3 – Poço construído no igarapé. Fonte: Pesquisa de campo.

Em todas as propriedades visitadas verificamos que o “poço” construído no

igarapé é o mais usado pelo trabalhador rural para deixar a mandioca de molho. No

entanto, conforme os nossos informantes existem outras maneiras de se realizar esse

processo como colocá-las em tanques feitos de alvenaria ou em tinas para locais onde

não há igarapé. As tinas são bacias de pneus usadas para deixar a mandioca de molho

ou para lavá-las após o descascamento.

27

Retiro é a denominação que a grande maioria dos trabalhadores rurais usam para se referir ao local onde a mandioca é processada para a produção de farinha.

Page 66: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

66

É importante frisar que o trabalhador rural, sempre que possível, constrói o

“retiro” ou a “casa de farinha” perto de um igarapé para facilitar o transporte das

mandiocas onde ocorrerá o processamento das mesmas e a produção de farinha.

Para o transporte da mandioca ao igarapé, após a colheita ou mesmo para

o transporte da mesma até o retiro, o trabalhador rural utiliza uma carroça movida à

tração animal, geralmente um cavalo ou boi búfalo. Porém, quando não possui esses

animais, considerando que a maioria das propriedades é de pequenos agricultores,

esse homem do campo produz e utiliza um cesto chamado “aturá” para encher de

mandiocas e as transportar nas costas para o igarapé ou para o retiro. Registra-se que

o termo “aturá” possui origem indígena proveniente do tupi “atu’ra”, que se refere ao

cesto produzido com cipó de timbuaçu e usado nas atividades do cultivo da terra.

Fotografia 4 – Transporte da mandioca em carroça. Fotografia 5 – Aturá. Fonte: Pesquisa de campo. Fonte: Pesquisa de campo.

2.3.5 Beneficiamento

A farinha é um produto tipicamente brasileiro, de alto valor energético,

rico em carboidratos e muito importante na alimentação da grande maioria da

população (FOLEGATTI et al., 2005, p. 63). O processamento da mandioca para a

fabricação de farinha é uma atividade que remonta aos povos indígenas. São vários os

vestígios da cultura desses povos que ainda podem ser encontrados na forma que o

trabalhador rural usa para realizar essa atividade especializada, que se presentifica

também no léxico como identidade cultural. Os instrumentos utilizados na casa de

farinha como a masseira, o cesto produzido com o cipó de timbuaçu e chamado de

Page 67: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

67

aturá, a utilização de animais para o transporte de mandiocas, a forma de se processar

a raiz são alguns resquícios da cultura indígena no processamento da mandioca. De

acordo com Cereda (2005, p. 32, grifos nosso) “seu preparo (da farinha) tem influência

indígena, onde a dificuldade de ralar a mandioca era contornada colocando-as para

‘pubar’ em água parada ou rios, até amolecer”.

O processo de beneficiamento da mandioca em Acará apresenta,

predominantemente, uma tecnologia rudimentar que exige a própria força humana

para todas as etapas de fabricação de farinha. No entanto, dentre os “retiros” ou

“casas de farinha” visitadas constatamos uma, próximo a sede do município, que

possui equipamentos semi-industriais como o forno elétrico e máquina elétrica para

ralar ou triturar a mandioca. A utilização dessa tecnologia acaba refletindo no léxico,

ocasionando o surgimento de novas unidades terminológicas. Assim, surgem termos

como, por exemplo, “casa de farinha mecanizada” e “peneira mecânica” usados

respectivamente para o local e instrumento na atividade de produção da farinha.

O retiro possui uma característica bastante simples, construído com

estacas de madeira, coberto de palha ou telha e sem paredes, o que facilita a

circulação de ar e também de animais. Nele, a produção de farinha é feita de forma

predominantemente artesanal com a mão-de-obra dos integrantes da própria família

do trabalhador rural ou com a participação de membros da comunidade. Quando

ocorre a chamada “farinhada”, ou seja, quando o trabalhador rural possui uma

quantidade grande de mandioca para ser beneficiada e transformada em farinha

solicita ajuda ao vizinho, ao amigo que também possui um roçado e uma casa de

farinha. Por sua vez, quando esse amigo ou vizinho necessitar de ajuda na sua lavoura

ou no processo de fabricação de farinha poderá contar com a ajuda desse trabalhador

rural também. Esse tipo de negociação é denominado pelos agricultores de “trocação

de dia”.

A farinha produzida no município de Acará é denominada de “farinha

d’água”, “farinha seca” e “farinha mista”. Essas denominações dizem respeito ao tipo

de processo usado para a sua produção. Assim, por exemplo, para se fabricar “farinha

d’água”, a mandioca tem que, necessariamente, passar por três ou cinco dias de molho

na água do poço construído no igarapé. Já para fabricar farinha seca, a mandioca não

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68

precisa amolecer no poço, bastando apenas ser triturada no “caititu” (instrumento

movido a motor elétrico que tritura a mandioca) ou no “ralador” (instrumento feito de

chapa de lata em que a mandioca é ralada manualmente). A farinha mista, por sua vez,

a mais fabricada pelos trabalhadores rurais, é o resultado da mistura da massa da

mandioca fermentada de três a cinco dias no poço e da mandioca que não passa por

esse processo de fermentação.

Após o processo de fermentação, as mandiocas são transportadas para o

retiro em carroças puxadas por animais ou no aturá, como descrevemos

anteriormente. É no retiro que ocorre a recepção das batatas da mandioca para o

início das etapas de fabricação da farinha. A fotografia seguinte é de um retiro

construído próximo a um igarapé no município de Acará, localizado à beira de um

ramal que dá acesso a comunidade de Papaquara. O retiro opera com dois fornos, uma

masseira, uma esfriadeira além de outros instrumentos usados no beneficiamento da

mandioca para a produção de farinha.

Fotografia 6 – Retiro (casa de farinha). Fonte: Pesquisa de campo.

O fluxograma seguinte ilustra as etapas, do processo de beneficiamento

das raízes de mandioca utilizadas na fabricação de farinha no município de Acará. Essa

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69

atividade especializada tem início com a recepção das raízes no chamado retiro ou

casa de farinha até o resfriamento da mesma após o processo de torração pelo

trabalhador rural.

Fluxograma 1 – Fases de produção da farinha.

Após o recebimento das raízes, as mesmas são descascadas com a

utilização de uma faca. Geralmente, nessa atividade, os trabalhadores rurais ficam

sentados no chão ou em troncos de árvores. As mandiocas são descascadas até que

fiquem bem brancas e limpas. Observamos que essa é uma atividade realizada,

principalmente, pelas mulheres.

Fotografia 7 - Trabalhadora rural descascando mandiocas. Fonte: Pesquisa de campo.

Recepção das raízes

Descascamento Lavagem Ralamento Amassamento

Prensagem Peneiramento Escaldamento Torração Resfriamento

Page 70: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

70

Após o descascamento das mandiocas procede-se à lavagem das mesmas

em uma bacia ou tina cheia de água para, então, ocorrer o ralamento ou trituração e

serem transformadas em massa. Utiliza-se para esse processo um ralador ou um

caititu. Conforme informações dos trabalhadores rurais o ralo é feito com a utilização

de folhas-de-flandres. Essas folhas são feitas a partir de latas vazias de manteiga

cortadas, furadas e moldadas em pedaços de madeira transformando-as nesse

instrumento. Porém, a vantagem da utilização do caititu na trituração da mandioca é

que não exige um grande esforço do trabalhador rural, uma vez que esse instrumento

é elétrico, tendo um motor acoplado a uma peça chamada rodete que tritura a

mandioca transformando-a em massa. As imagens seguintes demonstram a utilização

de um ralador manual e de um caititu pelo trabalhador rural.

Fotografia 8 - Trabalhador rural utilizando o ralador. Fotografia 9 -Trabalhador rural utilizando o caititu. Fonte: Pesquisa de campo. Fonte: Pesquisa de campo.

Após a mandioca ser transformada em massa, passa-se então ao processo

de prensagem, que consiste em retirar todos os resíduos tóxicos e a extração do

chamado tucupi. Apesar de ser essa etapa realizada com a utilização de prensas

artesanais, construídas em madeira onde se coloca o tipiti cheio de massa para ser

espremida, já existem as prensas hidráulicas em decorrência da entrada de

equipamentos semi-industriais. No entanto, no município pesquisado, o que se

verificou foi uma prensa feita de madeira com a utilização de macaco hidráulico para

fazer a prensagem da massa colocada em sacos de estopa, sendo uma espécie de

Page 71: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

71

adaptação feita pelo trabalhador rural que não possui recurso suficiente para adquirir

um maquinário de maior porte.

Fotografia 10 - Prensa artesanal com tipiti. Fotografia 11 - Prensa com macaco hidráulico. Fonte: Pesquisa de campo. Fonte: Pesquisa de campo.

Ao sair da prensa, a massa apresenta-se em forma de blocos compactos,

sendo necessário realizar o peneiramento ou coação para que fique esfarelada. A

massa em blocos é colocada em uma caixa de madeira que possui duas divisões. De

um lado colocam-se os blocos de massa e do outro lado realiza-se o peneiramento da

massa com a utilização de uma peneira.

Fotografia 12 - Peneira. Fonte: Pesquisa de campo.

Page 72: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

72

No peneiramento, o trabalhador rural faz a separação de frações grosseiras

como pedaços de raízes que não foram trituradas por completo. Essas frações

grosseiras são chamadas de “crueira”, utilizadas na alimentação de animais ou na

alimentação humana em forma de mingau.

Fotografia 13 - Crueira. Fonte: Pesquisa de campo

Após a massa ser esfarelada na peneira o trabalhador rural a coloca no

forno para ser escaldada. Esse escaldamento serve para deixá-la bem seca para depois

ser, finalmente, torrada. A torração da farinha dura em média 40 a 50 minutos, sendo

mexida com auxílio de um rodo feito de madeira. Essa operação é repetida até que

toda a massa seja transformada em farinha. Por se tratar de um serviço que exige

bastante força é executado quase que exclusivamente pelos homens.

No serviço de torração da farinha o calor é intenso, o que justifica ser o

retiro totalmente aberto para a circulação de ar. Na atividade de torração da farinha, o

trabalhador rural, geralmente, faz revezamento com outro a cada fornada, facilitando,

assim, o serviço que dura praticamente o dia inteiro.

Page 73: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

73

O forno ou a chapa são colocados em cima de uma fornalha construída de

barro. São vários os instrumentos que compõem o retiro para a fabricação de farinha:

o forno, o rodo, a caixa, a peneira, o ralo, o caititu, o porrete, o tipiti dentre outros.

Fotografia 14 - Trabalhador rural torrando farinha. Fonte: Pesquisa de campo.

O retiro, local em que o trabalhador rural também obtém a sua renda e o

seu sustento, é o espaço em que se reúnem os membros da família que vão se

revezando nas tarefas. Após a torração, a farinha é levada para um cocho feito de

madeira e denominado pelo trabalhador rural de esfriadeira. Esse instrumento serve

para se colocar a farinha por um bom tempo até que a temperatura diminua. Somente

após o esfriamento ela será embalada em saco plástico de 30 quilos, saco de estopa ou

colocada dentro de camburões de latas. A fotografia 15 demonstra o momento em

que o trabalhador coloca a farinha torrada na esfriadeira para que a temperatura

Page 74: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

74

diminua. Isso evita que ela seja colocada ainda quente no saco plástico e perca a

característica crocante.

Fotografia 15 - Farinha na esfriadeira. Fonte: Pesquisa de campo.

No município de Acará a farinha não é classificada pela granulometria ou

de acordo com um mercado consumidor que exija um determinado padrão de

qualidade. Segundo os trabalhadores rurais, não compensaria produzir uma farinha de

melhor qualidade (mais homogênea, mais cuidada), pois o custo de produção é alto e

o retorno pela venda da farinha parece, segundo os mesmos, não compensar todo o

esforço gasto na produção.

Após todo o processo de beneficiamento, finalmente a farinha fica pronta

para o consumo e para a comercialização. Na região, observamos que uma parte da

farinha é utilizada para o próprio consumo da família e outra serve para a

comercialização. No entanto, é interessante atentar para o fato de que o surgimento

da indústria de extração de fécula na região tem propiciado ao trabalhador rural uma

Page 75: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

75

nova forma de geração de renda, o que poderá interferir na cultura de produção da

farinha, mudando hábitos e formas de se utiliza a mandioca.

2.3.6 Comercialização

A farinha é vendida para os chamados atravessadores na feira do pequeno

agricultor, na sede do município. Essa comercialização começa bem cedo à medida que

os transportes (ônibus) vão chegando com farinhas trazidas pelos trabalhadores rurais

de suas propriedades. Por sua vez, os atravessadores ficam à espera dos ônibus que ao

chegarem à feira correm para negociar com os trabalhadores rurais. Essas farinhas

comercializadas são vendidas para outros mercados como Belém e Macapá, conforme

informações dos entrevistados.

Fotografia 16 - Feira do pequeno agricultor. Fonte: Pesquisa de campo.

O atravessador, ao comprar a farinha do trabalhador rural faz uma nova

pesagem da mesma para ser embalada e comercializada com o mercado externo. Toda

Page 76: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

76

essa farinha, oriunda de diversos locais do município e comprada pelo atravessador, é

vendida em lote. Conforme as entrevistas realizadas com os informantes, vender em

lote é mais garantia de lucro, pois não importa, nesse caso, o tipo de farinha que está

sendo comercializada (se ela é fina ou grossa, amarela ou escura). Daí resulta o que

eles denominam de “farinha de lote”. Essa farinha, comprada pelo atravessador,

possui mercado garantido em outros Estados como no Maranhão e Macapá, além de

ser vendida também para a cidade de Belém – Pará.

Fotografia 17 - Lotes de farinhas comercializados. Fotografia 18 - Pesagem da farinha.

Podemos dizer que o complexo sistema que envolve o ciclo produtivo da

farinha abrange um conjunto articulado de aspectos econômicos e socioculturais que

confere a esse tipo de atividade uma posição peculiar entre os vários produtos

agrícolas produzidos na região. A mandioca é um produto de subsistência para boa

parte da população rural em Acará, é um importante componente do sistema culinário

(produção de farinha, mingau, comidas típicas, etc.), além de revelar uma tradição

histórica e valores culturais observados no léxico por meio dessa cultura.

Page 77: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

77

3. METODOLOGIA

Este capítulo reserva-se em apresentar as escolhas e objetivos, bem como

as etapas metodológicas seguidas na pesquisa de campo e na construção da obra

terminográfica. Situaremos a área geográfica da pesquisa e demonstraremos os

instrumentos de recolha de dados usados na constituição do corpus descrito e

analisado. Quanto aos procedimentos utilizados na transcrição e extração dos termos

recorremos as ferramentas computacionais do Transana e do WordSmith Tools

respectivamente, repassando os termos, posteriormente, para uma ficha

terminológica. Os procedimentos usados na organização da macroestrutura e

microestrutura também serão demonstrados no intuito de deixar claras as escolhas

feitas na organização dos termos do glossário. Por fim, apresentaremos alguns dados

estatísticos e descritivos quanto à distribuição dos termos na organização do glosário

no que diz respeito aos campos semânticos, categorias gramaticais e variantes

registradas.

3.1. PLANEJAMENTO DA PESQUISA DE CAMPO

A execução de um projeto terminológico deve obedecer a um

planejamento de pesquisa previamente definido. Isso garante ao pesquisador

condições para prevenir possíveis contratempos que possam aparecer durante todo o

processo da pesquisa e elaboração do produto terminográfico. Desta forma,

estabelecemos alguns passos que melhor encaminhasse nossa proposta de recolha e

tratamento dos dados coletados e, assim, tivéssemos a possibilidade de descrever e

analisar a terminologia em foco com mais segurança, oferecendo um resultado prático

mais confiável.

Barros (2004, p. 190), após apresentar uma série de questionamentos

sobre a viabilidade de uma obra terminográfica pontua os principais itens que devem

ser observados na sua execução, a saber:

Objetivo da obra;

Público-alvo;

Page 78: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

78

Conhecimento da área;

Limites da pesquisa;

Princípios metodológicos;

Delimitação da nomenclatura;

Organização interna da obra;

Cronograma de atividades

Considerando os quesitos apresentados pela autora tivemos a

oportunidade de refletir sobre o andamento da nossa pesquisa, os primeiros passos

que deveríamos dar e a meta que nos propúnhamos chegar. Tendo em vista tais

parâmetros, buscamos determinar com precisão os objetivos de nossa pesquisa para

que tivéssemos claramente a abrangência e o alcance que o glossário se propõe.

Algumas variáveis externas, no entanto, devem ser consideradas nesse tipo de

pesquisa, dentre as quais os recursos materiais e o fator tempo, uma vez que, para o

desenvolvimento de um trabalho dessa natureza, em nível de mestrado, dispúnhamos

de um prazo de dois anos para a sua total execução. Por esse motivo o objetivo e as

escolhas que fizemos, ao longo do percurso da pesquisa, tiveram por base tais

variáveis, desde que não comprometesse a qualidade do glossário.

O corpus da nossa pesquisa é proveniente do discurso oral. Privilegiamos

tal modalidade da língua no intuito de focalizar em nossa descrição e análise, da

terminologia em foco, a comunicação especializada oriunda do discurso dos

socioprofissionais envolvidos na atividade de produção da farinha do município de

Acará – Pará, sobretudo dos trabalhadores rurais. Ademais, as unidades terminológicas

que se encontram na fala desses socioprofissionais são constituídas também como

termos culturais, pois marcam a percepção do real que a comunidade de falantes

possui do mundo em que se acha integrado.

3.1.1 Área geográfica da pesquisa: aspectos históricos, geográficos e demográficos

O Município de Acará tem como marco histórico o período da exploração

portuguesa, em direção ao interior do Estado do Pará, através dos cursos dos rios. As

facilidades das terras e a abundância da madeira de lei foram de grande influência

Page 79: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

79

para a fundação, em 1.858 pelo governador Francisco Xavier de Mendonça Furtado, da

freguesia originalmente batizada de São José do Acará. São José do Acará foi mantido

durante o período de independência e em 1.833, com a divisão do Estado em termos

de comarca, ficou pertencente à comarca da capital (ACARÁ, 2009, não paginado).

Com o mesmo nome de São José do Acará, a freguesia foi elevada à

categoria de Vila e instalada em 02 de março de 1.876 de acordo com a Lei Provincial

nº 839, promulgada em 19 de abril de 1875, que estabelece também a sua

configuração como Município. Acará é um dos treze municípios que pertence à região

do Baixo Tocantins. Está situado na mesorregião nordeste paraense e na microrregião

de Tomé-Açu. A sede municipal tem as seguintes coordenadas geográficas: 01º 57 e

48º 11 51 WGR e se encontra a 65,7 Km de distância da capital do Estado em linha reta

(PROJETO GESPAN, 2004, p. 51).

Mapa 1 – Localização do município de Acará – Pará. Fonte: Mapa fornecido pelo Laboratório de Sensoriamento Remoto da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - Embrapa Amazônia Oriental, Belém, PA.

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80

De acordo com fontes históricas o nome do Município advém de uma

expressão indígena que significa “aquele que morde”, uma alusão direta aos peixes

que existem nos cursos dos rios de água doce no município de Acará.

Destaca-se o Rio Acará por ser o mais importante da região. Nasce na serra

dos coroados, atravessa o município até a sede na sua margem esquerda, em seguida

segue até a foz do rio Mojú. Pela margem direita, o seu afluente de maior importância

é o rio Acará Miriti Pitanga que deságua em frente à sede do município. Ao sul, ainda

pela margem direita, recebe o Rio Urucuré, limite com o Município de Tailândia.

O município, com uma área de 4.363,6 Km2, situa-se ao norte com o rio

Guamá, ao sul com os municípios de Tailândia e Tomé-Açú, a leste com os municípios

de Bujaru, Concórdia do Pará e a oeste com os municípios de Moju e Barcarena. Possui

uma população de 52.126 habitantes, sendo que a maioria está concentrada na zona

rural.

Tabela 4. População geral do município

População Urbana População Rural Total

9.745 42.381 52.126 Fonte: Atlas do Desenvolvimento Humano do Brasil, 2000.

Atualmente encontra-se no município um maior contingente de pessoas do

sexo masculino, porém não em uma proporção elevada.

Tabela 5. População por sexo

MULHERES HOMENS Total

25.062 27.064 52.126 Fonte: Atlas do Desenvolvimento Humano do Brasil, 2000.

Quanto à composição do solo no município, predomina o latossolo amarelo

álico com alta saturação em alumínio, associados com solos concrecionários de textura

argilosa. No Alto Acará (região continental) predomina a cobertura vegetal que

corresponde à floresta equatorial úmida em matas de terra firme e a floresta densa

dos baixos platôs. Também aparece a floresta secundária, capoeiras e pastagens. No

Baixo Acará (região insular) as matas de várzeas são mais freqüentes e equivalem às

regiões de baixo relevo e áreas alagáveis.

Page 81: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

81

O clima do município é tropical úmido do tipo AFI na classificação de

Koppen, com temperatura média em torno de 18ºC e precipitação acima de

60mm/mês e 2.837 mm anuais. (PROJETO GESPAN, 2004, p. 51)

O município está dividido em 03 (três) distritos legalmente constituído que

são os seguintes:

Sede do Município;

Guajará-Miri;

Jaguari.

Ainda possui duas grandes vilas conhecidas como Guarumã e Colatina,

cinco ilhas (Ilha Grande, Ilha do Combú, Ilha do Bifogó, Ilha de Piriquitaquára, Ilha de

Maracujá) e os seguintes povoados: Santa Maria I e II, Km 14, Santa Rosa, Jurupariteua,

Monte Horebe, Boa Esperança, Centro Alegre, Calmaria, Nínive, Fortaleza, São José,

Timboteua, Progresso, Natalzinho, Itacoã Miri, Ipitinga, Nazaré, Fortaleza, Vilagio

Roma, Vilagia Paz, Colônia do Açu e Fortaleza Bom Futuro. Essas localidades estão

aumentando consideravelmente em função da abertura de estradas vicinais e em

decorrência de melhorias.

Destacamos, portanto, que a escolha do município como ponto de

investigação justifica-se, dentre outros aspectos, principalmente por ser o maior

produtor da matéria-prima de fabricação da farinha: a mandioca, chegando a produzir

600.000 toneladas do produto no ano de 2007, conforme dados coletado no Instituto

Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE (2008).

3.1.2 Objetivo Geral

Produzir um glossário socioterminológico proveniente do discurso oral de

socioprofissionais envolvidos na atividade de produção da farinha no município de

Acará – Pará.

Page 82: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

82

3.1.3. Objetivos específicos

Registrar a terminologia a partir do discurso oral dos socioprofissionais

envolvidos no ciclo produtivo da farinha;

Descrever os níveis de variação terminológica presentes nesse discurso;

Identificar, no registro do discurso dos socioprofissionais, os termos que

se caracterizam como usos do domínio especializado e como expressão

do universo sociocultural.

3.1.4. Público-alvo

O objetivo de um trabalho terminológico deve estar de acordo com o

público-alvo que se deseja alcançar (GAUDIN, 1993; BARROS, 2004, p. 190). Sendo

assim, para que um repertório terminológico se torne um instrumento de consulta útil

é necessário que se delineie o perfil de seus futuros consulentes. Registrar o léxico de

uma linguagem de especialidade também é uma forma de garantir legitimidade aos

falantes que dela se utiliza.

Considerando tais parâmetros e no intuito de produzir um repertório

terminológico que sirva como fonte de pesquisa e de conhecimento dos saberes

advindos de populações rurais sobre atividade de produção da farinha, evidenciamos

esforços na produção de um glossário monolíngüe (em língua portuguesa – variante

brasileira) com base no discurso de vulgarização ou banalização (GAUDIN, 1993, p.

129; 2003, p. 105; FAULSTICH, 2006, p. 27) oriundo de dados eminentemente orais.

Com isso objetivamos construir um instrumento de consulta que possa auxiliar

especialistas e técnicos de entidades e órgãos públicos, que atuam na orientação aos

trabalhadores rurais sobre o cultivo da terra e dos recursos dela produzidos; aos

estudantes do curso técnico e superior de Agronomia e aos educadores da Educação

do Campo28, para que possam utilizar o conhecimento advindo do saber dessas

populações rurais para o desenvolvimento de suas práticas pedagógicas.

28 “O reconhecimento de que as pessoas que vivem no campo têm direito a uma educação diferenciada daquela oferecida a quem vive nas cidades é recente e inovador, e ganhou força a partir da instituição, pelo Conselho Nacional da Educação, das Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do

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83

3.1.5. Conhecimento de área e a árvore de domínio

Barros (2004, p. 192-193) entende que para o terminólogo se familiarizar

com o objeto que irá estudar é indispensável realizar leituras prévias sobre o assunto e

manter discussões com profissionais da área em questão. Portanto, antes mesmo que

nos lançássemos a observar o fenômeno proposto in loco procuramos um profissional

da EMBRAPA que nos orientou indicando algumas bibliografias sobre o assunto. Essas

bibliografias, no entanto, não serviram para extrairmos termos, mas tão somente para

conhecermos, através de leituras, a área que envolve o cultivo de mandioca e

produção de farinha.

Em novembro de 2008 fizemos o nosso primeiro contato in loco com

representantes das seguintes entidades e órgãos:

Sindicato dos Trabalhadores Rurais29;

Secretaria Municipal de Agricultura;

Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural – EMATER30;

Agência de Defesa Agropecuária do Estado do Pará – ADEPARÁ;

Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira – CEPLAC.

A partir das informações obtidas por meio desses órgãos tomamos a

decisão de receber auxílio de apenas três: do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, da

Secretaria Municipal de Agricultura e da EMATER. Isso se deve ao fato da ADEPARÁ

não possuir um programa específico para o tratamento da mandiocultura e produção

Campo. [...] Para atender a essas especificidades e oferecer uma educação de qualidade, adequada ao modo de viver, pensar e produzir das populações identificadas com o campo – agricultores, criadores, extrativistas, pescadores, ribeirinhos, caiçaras, quilombolas, seringueiros – vem sendo concebida à Educação do Campo.” (BRASIL – MEC-SECAD, 2007, p.9) 29 O sindicato dá suporte para a regularização fundiária do trabalhador rural (documentação da terra e delimitação dos limites área da mesma). Mantém um trabalho em conjunto com o Conselho Municipal, Secretaria Municipal de Agricultura e EMATER no sentido de oferecer curso básico de como manejar o solo, como é composto o solo, como se produz as mudas, como se aplicar o defensivo (adubo orgânico e químico). Capacitação dos socioprofisionais, incentivos através do PRONAF e acompanhamento na rede de comercialização. 30

A EMATER é um órgão oficial de assistência técnica e extensão rural que presta serviços especializados nas áreas de ciências agrárias e humanas, difundindo conhecimento e informações tecnológicas no meio rural. Sua missão é contribuir com soluções para a agricultura familiar baseados nos princípios éticos e ecológicos.

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84

de farinha, atuando mais no que diz respeito à inspeção e fiscalização de produtos

agropecuários. Por sua vez o representante da CEPLAC nos informou também que em

Acará não possui algum programa voltado para o desenvolvimento do cultivo da

mandioca, embora o incentivo dessa cultura esteja previsto no programa da entidade

em nível nacional. Atualmente o seu foco maior de atuação está voltado para a

pesquisa e desenvolvimento da cultura do cacau.

A partir desse primeiro contato tivemos, então, a possibilidade de prever o

mundo da atividade especializada em questão e finalmente organizar a árvore de

domínio. Krieger e Finatto (2004, p. 134) definem árvore de domínio como “um

diagrama hierárquico composto por termos-chave de uma especialidade, semelhante a

um organograma”. Uma árvore de domínio serve como meio a facilitar a compreensão

da hierarquia dos termos que serão tratados pelo pesquisador. Conforme Cabré (1999,

p. 143-144) a competência cognitiva é “una de las competencias básicas en terminología

(...). En la realidad se trata de que el terminólogo no especialista adquiera los conocimientos

suficientes para que pueda entrar en el tema”31. É no momento em que o terminólogo

adquire uma mínima competência sobre o ambiente de circulação da terminologia que

terá a possibilidade de definir o trabalho a ser realizado.

A partir dos conhecimentos adquiridos procedemos à estruturação da

árvore de domínio da terminologia da cultura da farinha. Consideramos, então, três

momentos distintos: a fase da plantação, a fase do beneficiamento e a fase da

comercialização. Conforme Antunes (2006, não paginado), a árvore de domínio pode

auxiliar em toda pesquisa terminológica ajudando para:

Delimitar a área temática do trabalho;

Fazer um plano sistemático de extração;

Controlar a pertinência dos termos;

Classificar e ordenar as fichas terminológicas;

Definir as unidades terminológicas da área de maneira lógica e

sistemática;

31 “uma das competências básicas em terminologia (...). Na realidade se trata de que o terminólogo não-especialista adquira os conhecimentos suficientes para que possa desenvolver o trabalho ” (CABRÉ, 199, p. 143-144).

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85

Distinguir os termos de tronco comum e os de áreas conexas.

Portanto, após um contato mais próximo com a realidade a qual iríamos

pesquisar, tivemos a oportunidade de representar a forma hierárquica do domínio

especializado em estudo, como se observa na árvore de domínio32 reduzida do ciclo

produtivo que envolve a terminologia da cultura da farinha no município de Acará –

Pará.

Organograma 1 - Árvore de domínio reduzida. Fonte: Dados da pesquisa.

3.1.6 Perfil dos informantes e constituição do corpus da pesquisa

Utilizamos como critério principal para a seleção dos informantes a

participação efetiva dos mesmos e o conhecimento que trazem sobre a atividade

especializada do cultivo da mandioca, produção e comercialização da farinha. Dessa

forma, consideramos os socioprofissionais envolvidos nessa atividade (trabalhadores

rurais, técnicos e atravessadores) no município de Acará para que obtivéssemos um

corpus que representasse a terminologia em estudo.

32

A árvore de domínio completa encontra-se no anexo B deste trabalho. Vale ressaltar que esse termo é denominado também como mapa conceitual.

TERMINOLOGIA DA CULTURA DA FARINHA

PLANTAÇÃO

Preparo da área

Plantio

Tratos Culturais

Colheita

BENEFICIAMENTO

Processos

COMERCIALIZAÇÃO

Venda

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86

Constituímos, então, um quadro de informantes considerando o sexo, a

idade, a naturalidade, o tempo de atividade e a escolaridade de cada um. Esses

fatores, embora não tão decisivos para uma análise estratificada nesse trabalho de

pesquisa em particular, ajudam a entender a dinâmica das relações sociais em que os

socioprofissionais estão inseridos na atividade especializada que envolve o ciclo

produtivo da farinha.

Tabela 6. Perfil dos informantes

Informantes

Sexo

Idade

Naturalidade Tempo de atividade

Escolaridade

M F 18-26

27-36

37 em diante

Acará Outros 5 anos

8 anos em

diante

Não escola-rizado

Fund. Médio Sup.

Técnicos 3 - 1 1 1 - 3 1 2 - - 2 1

Trab. Rurais 24 10 2 2 30 29 5 1 33 6 26 1 -

Atravessadores 4 - 1 1 2 4 - - 4 - 4 - -

Total 31 10 4 4 33 33 8 2 39 6 30 3 1

Fonte: Dados da pesquisa de campo.

Considerando os dados contidos na tabela 6, fizeram parte da pesquisa:

Trabalhadores rurais (homens e mulheres), que cultivam a

mandioca especificamente para produzir a farinha; técnicos

agrícolas, que orientam o processo de cultivo e produção da farinha

no município e atravessadores, que comercializam a farinha

produzida pelo trabalhador rural;

Entrevistados com, no mínimo, cinco anos de trabalho na

produção, comercialização ou na orientação do processo de

fabricação da farinha;

Informantes com idade entre 25 (vinte e cinco) a 70 (setenta) anos;

O corpus da pesquisa foi registrado em 21h (vinte e uma horas) de

gravações, através de um aparelho MP4, da marca FOSTON, modelo FS-68B. No total,

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87

foram entrevistados 41 (quarenta e um) informantes que se distribuíram da forma

seguinte:

Gráfico 4 -Informantes da pesquisa.

É necessário ratificarmos, nesse ponto, que o foco do nosso trabalho está

na linguagem utilizada pelo trabalhador rural. É na prática social de desenvolvimento

da atividade especializada que esse homem do campo cria suas representações

culturais. Por sua vez, o técnico precisa conhecer esse saber popular para garantir uma

melhor troca de experiências na interação com o trabalhador rural. No município, os

técnicos agrícolas estão em contato com os trabalhadores rurais repassando

orientações de como o agricultor deve desenvolver melhor o cultivo de mandioca para

a produção de farinha. Esse técnico se mostra também consciente em conhecer a

linguagem do agricultor para melhor desenvolver seu trabalho.

Quanto aos atravessadores são pessoas residentes na cidade que estão

diariamente em contato com trabalhadores rurais na Feira do Pequeno Agricultor para

comercializar a farinha. Existe um número expressivo de pessoas que trabalham como

atravessadores de farinha no município. Durante a nossa visita, na Feira do Pequeno

Agricultor, pudemos perceber o movimento intenso desde cedo da manhã desses

socioprofissionais. A comercialização da farinha, no entanto, não é uma atividade

complexa, pois envolve apenas a compra e venda de farinha num mercado bastante

informal.

Técnicos03

Trabalhadores Rurais

34

Atravessadores04

Informantes

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88

3.1.7. Instrumentos de recolha de dados

Quanto aos instrumentos de recolha de dados utilizamos a entrevista semi-

estruturada (BONI & QUARESMA, 2005, p. 75) e o ponto de vista etnográfico

(FAULSTICH, 1995, p. 287). Quanto àquela, as autoras dizem o seguinte:

As entrevistas semi-estruturadas combinam perguntas abertas e fechadas, onde o informante tem a possibilidade de discorrer sobre o tema proposto. O pesquisador deve seguir um conjunto de questões previamente definidas, mas ele o faz em um contexto muito semelhante ao de uma conversa informal. O entrevistador deve ficar atento para dirigir, no momento que achar oportuno, a discussão para o assunto que o interessa fazendo perguntas adicionais para elucidar questões que não ficaram claras ou ajudar a recompor o contexto da entrevista, caso o informante tenha “fugido” ao tema ou tenha dificuldades com ele. Esse tipo de entrevista é muito utilizado quando se deseja delimitar o volume das informações, obtendo assim um direcionamento maior para o tema, intervindo a fim de que os objetivos sejam alcançados. (BONI & QUARESMA, 2005, p. 75)

Para Boni e Quaresma (2005, p. 72) “a preparação da entrevista é uma das

etapas mais importantes da pesquisa...”. Afirmam as autoras que a escolha de

qualquer técnica de coleta de dados irá depender da adequação ao problema da

pesquisa. Ainda destacam os seguintes quesitos como pontos positivos para se utilizar

a entrevista semi-estruturada como instrumento de recolha de dados:

Quase sempre produz uma melhor amostra da população de interesse;

Facilita as respostas por meio da interação oral;

Possibilita a correção de possíveis enganos dos informantes, que muitas vezes

não poderão ser corrigidos no caso da utilização de questionário escrito;

Favorece a elasticidade quanto à duração do tempo, permitindo uma cobertura

mais aprofundada sobre determinados assuntos;

A interação entre o entrevistador e o entrevistado favorece as respostas mais

espontâneas;

As respostas espontâneas dos entrevistados podem propiciar o surgimento de

questões inesperadas ao entrevistador que poderão ser de grande utilidade em

sua pesquisa.

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89

Optamos por essa técnica de recolha considerando que melhor se

adaptava aos propósitos de nossa investigação. Uma vez que tratávamos de constituir

um corpus eminentemente oral, entendemos que esse tipo de técnica de recolha de

dados ajuda a fluir melhor a interação entre pesquisador e entrevistado, facilitando a

busca de informações e, conseqüentemente, possibilitando um levantamento mais

abrangente da terminologia.

A partir do conhecimento que obtivemos através de leituras sugeridas por

profissionais especialistas e do contato com trabalhadores rurais elaboramos um

questionário semi-estruturado (anexo C) para ser aplicado aos socioprofissionais

envolvidos na atividade especializada da produção de farinha. Esse tipo de

questionário contribuiu bastante pela facilidade de adaptação e aplicação a todos os

participantes da pesquisa, pois na interação com os mesmos foi surgindo questões não

previstas num primeiro momento, o que contribuiu para a ampliação do conhecimento

da área em estudo.

Faz-se necessário, ainda, um comentário do que diz Kerbrat-Orecchioni

(2006, p. 08) sobre as trocas comunicativas em uma interação face a face. Conforme a

autora “... não basta que dois falantes (ou mais) falem alternadamente; é ainda preciso

que eles se falem, ou seja, que estejam, ambos, ‘engajados’ na troca e dêem sinais

desse engajamento mútuo, recorrendo a diversos procedimentos de validação

interlocutória.” Como optamos pela entrevista semi-estruturada, como método de

recolha de dados, foi necessário atenção para a condução dessa interação. Sendo

assim, como modo de facilitar o processo comunicativo sempre que necessários

estávamos enviando sinais de entendimento e estímulo ao nosso interlocutor através

de gestos, acenos e sinais verbais procurando intervir o mínimo possível para não

quebrar a seqüência de idéias do entrevistado.

O ponto de vista etnográfico também nos auxiliou uma vez que nos

possibilitou entrar no mundo em análise e melhor entender a dinâmica das relações

sociais na perspectiva do discurso especializado. Como observa Faulstich (1995, p.

287),

A base dessa nova interpretação (Socioterminologia e etnografia) encontra respaldo na etnografia, cuja linha de conduta deriva um postulado

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90

fundamental, que é a existência de uma ordem: o engajamento entre as pessoas, a interação de uns com os outros. Assim, as atitudes interacionais precisam ser observadas e analisadas nos mais diferentes espaços e em diferentes níveis.

Para Faulstich (1995, p. 288), o procedimento etnográfico possibilita ao

pesquisador melhor entender os termos na dimensão sócio-cultural. Ao observar in

loco o movimento social em que ocorre a atividade especializada, engajamo-nos ao

mundo pesquisado para apreender o processo cultural que dele decorre. Nesse

sentido, diz a autora:

Como observadores participantes, pode-se aprender a cultura ou subcultura das pessoas em estudo e vir a interpretar o mundo da mesma forma como elas o fazem. De acordo com o naturalismo, o valor da etnografia, como método de pesquisa social, baseia-se na existência de padrões culturais variados dentro das diversas sociedades e no seu significado para a compreensão dos processos sociais. A etnografia explora a capacidade que cada ator social possui de aprender novas culturas, bem como a objetividade a que esse processo dá surgimento. O naturalismo acredita que é possível construir um relato da cultura que está sendo investigada, de forma que a descrição de culturas torna-se um objetivo primário (FAULSTICH, 1995, p. 288).

Pudemos, dessa forma, acompanhar e registrar vários momentos das

atividades desenvolvidas pelos socioprofissionais. Isso nos ajudou a entender melhor o

processo que envolve a atividade de produção de farinha no município de Acará – Pará

e a dinâmica das relações sociais na atividade especializada. A partir desse

conhecimento tivemos a oportunidade de construir a árvore de domínio, que no

trajeto da pesquisa foi sendo readaptada a partir do contato com os sujeitos da

pesquisa33.

A pesquisa em socioterminologia, como diz Faulstich (1995, p. 288)

“requer, então, procedimentos precisos, oriundos da etnografia, harmonizados com o

meio e com os fenômenos que a definem”, sendo necessário observar os seguintes

parâmetros:

as características da empresa, da instituição em que a terminologia é gerada:

tipo de atividade; divisão do trabalho; rede de comunicação; freqüência da

33 Consideramos como sujeitos da pesquisa os entrevistados (trabalhadores rurais, técnicos e atravessadores) que se dispuseram ser entrevistados para que adquiríssemos conhecimento sobre a terminologia da cultura da farinha.

Page 91: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

91

interação no plano horizontal e no plano vertical; impacto das novas

tecnologias sobre a produção e sobre a linguagem etc.;

as características do pessoal: postos que ocupam; formação profissional,

especialização, qualificação; idade; condições e freqüência de atualização etc.;

a competência e os usos lingüísticos: comunicação mais falada, escrita, lida;

domínio de terminologias; emprego de terminologias; consulta a obras de

referência, interesse pelas línguas de especialidade; desenvolvimento de

pesquisa dentro da empresa; difusão de terminologias por meio de obras

específicas etc.;

registro da variação lingüística na terminologia.

Esses parâmetros se refletem em nossa pesquisa à medida que buscamos o

conhecimento in loco da área para, assim, percebermos o tipo de atividade exercida na

produção da farinha pelos socioprofissionais. Ainda foi possível observar a divisão do

trabalho, a freqüência de interação entre os socioprofissionais e o impacto das novas

tecnologias sobre a produção e sobre a linguagem. A participação de homens e

mulheres na atividade de produção da farinha, por exemplo, dá-se em todas as etapas

do processo. No entanto, é mais freqüente o homem participar das atividades que

exigem o esforço físico maior, como é o caso do transporte das mandiocas do roçado

para o retiro e a realização do processo de escaldamento e torramento da massa da

mandioca no forno.

A freqüência de interação entre técnicos e trabalhadores rurais ocorre por

meio de entidades atuantes no município. A EMATER, por exemplo, disponibiliza um

serviço de acompanhamento e orientação aos trabalhadores rurais sobre o cultivo da

mandioca e produção da farinha em conjuntos com outras entidades.

O Sindicato dos Trabalhadores Rurais do município é uma organização que

representa a categoria do agricultor, dando suporte aos trabalhadores rurais sobre o

conhecimento da produção e da comercialização da área agrícola. Ainda dá apoio aos

agricultores na regularização fundiária (documentação da terra e delimitação dos

limites da área de terra), mantendo um trabalho em conjunto com o Conselho

Municipal do Desenvolvimento Rural, Conselho Municipal de Meio Ambiente,

Page 92: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

92

Secretaria Municipal de Agricultura e EMATER no sentido de oferecer cursos básicos

sobre composição e manejo de solo, sistemas de plantio e tratos culturais da terra.

Como já mencionamos, os nossos informantes possuem um perfil que os

caracterizam com a idade entre 25 a 70 anos, porém não é raro encontrar nas

atividades da lavoura e da produção de farinha crianças e adolescentes desenvolvendo

algumas etapas da produção. São, geralmente, membros da família que participam do

desenvolvimento das etapas de produção da farinha, momento em que os saberes

advindos de um conhecimento popular são repassados entre gerações.

3.2. PROCEDIMENTOS UTILIZADOS PARA O TRATAMENTO DOS DADOS

3.2.1. Ferramentas utilizadas para a transcrição dos dados: Transana

Optamos pela transcrição grafemática considerando mais adequada ao

tratamento dos dados terminológicos e aos objetivos da pesquisa. Baseamo-nos,

portando, nas normas de transcrição (anexo D) extraídas e adaptadas de Koch (1992,

p. 73). Para realizar a transcrição utilizamos o software Transana, versão 2.12 gratuita,

desenvolvido para análise de dados audiovisuais.

Este software pode ser encontrado em suas versões mais atuais no site

http://www.transana.org. Muruá (2006, p. 2) apresenta algumas razões para o

pesquisador, que precisa transcrever dados orais provenientes de diversas fontes:

Podem-se analisar dados orais em áudio ou vídeo digital;

Pode ser encontrado nas versões para o Windows e Mac;

Permite a conexão das partes do texto transcritos em momentos específicos

do vídeo e do áudio;

É um software criado por pesquisadores e para pesquisadores, atendendo

especialmente as necessidades dos profissionais que precisam usá-lo em seu

trabalho de campo.

Dentre as vantagens em utilizá-lo para transcrição dos dados orais da nossa

pesquisa está o fato de, o software, oferecer, ao mesmo tempo e no mesmo ambiente,

a visualização de várias janelas (áudio e vídeo, transcrição, base de dados e

visualização), o que torna o processo de transcrição mais seguro e ágil. Além do mais,

Page 93: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

93

é um software de fácil adaptação na transcrição de dados de pesquisas de diversas

áreas do conhecimento, como é o caso da nossa pesquisa de base socioterminológica

constituída de um corpus de língua oral.

Fig. 1 - Tela frontal do software Transana.

Foram realizados os seguintes procedimentos para a transcrição e

armazenamento dos dados orais:

Criamos uma base de dados para o corpus e a nomeamos de

“terminologia_da_farinha” (essa base de dados é o local onde fica

armazenado todo o áudio gravado em formato MP3 para ser transcrito e

reavaliado posteriormente, se for o caso);

Procedemos à criação da série34 nomeando-a de “informantes” onde ficam

agrupados os arquivos de áudio e de textos transcritos correspondentes às

entrevistas realizadas no trabalho de campo;

34

Corresponde aos arquivos, de áudio e transcritos dos informantes, agrupados na base de dados denominada de “terminologia_da_farinha”.

Janela de áudio e

vídeo

Janela de

visualização

Janela de entrada de dados

(corpus transcrito)

Janela da base de

dados

Page 94: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

94

Para cada áudio agrupado, na série informantes, criamos um código

correspondente à categoria profissional (I para informante, TR para

trabalhador rural, TE para técnico e AT para atravessador), sexo (M para

masculino e F para feminino) e ordem numérica da transcrição (1 para

primeira gravação, 2 para segunda gravação e assim sucessivamente).

Algumas entrevistas, de um mesmo informante, no entanto, foram gravadas

em momentos diferentes. Para representarmos isso na codificação utilizamos

a ordem alfabética (A para primeira parte da entrevista, B para segunda parte

da mesma entrevista e assim sucessivamente, caso fosse necessário).

Fig. 2 - Janela da base de dados.

Toda essa codificação foi sendo criada à medida que realizávamos as

transcrições dos dados. Vale ressaltar que o software possibilita a ativação de uma

série de recursos que facilita a transcrição dos dados. O número de turnos, por

exemplo, são abertos automaticamente, a pausa para o áudio é ativada através do

toque nas teclas CTRL + S do computador ou querendo o digitador retornar 10 (dez)

Arquivo de

áudio

Arquivo de

texto da

transcrição

Codificação

Page 95: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

95

segundos do áudio que transcreve basta acionar as teclas CTRL + A. Apresentamos

abaixo a imagem de uma transcrição realizada no Transana:

Fig.3. Corpus transcrito no software.

Após todas as transcrições do corpus oral, os arquivos foram transformados em

formato TXT. Para isso utilizamos o Microsoftware Bloco de Notas, versão 5.1 para que

os dados pudessem ser lidos posteriormente pelo software de análise lexical:

WordSmith Tools.

Coluna que

corresponde

aos turnos da

conversação

Arquivos das

transcrições

realizadas

Page 96: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

96

3.2.2. Ferramentas utilizadas para a extração e seleção semi-automática dos termos: WordSmith Tools

Conforme Fromm (2008, p.9) embora haja outros programas

computadorizados o WordSmith Tools é o mais indicado para o tratamento de grande

quantidade de dados. Para a extração e seleção dos termos da área em estudo

utilizamos o referido software de análise lexical, uma vez que o mesmo coloca a

disposição do pesquisador uma série de ferramentas que o auxilia na análise dos dados

coletados.

Conforme Sardinha (2004, p. 90), o programa WordSmith Tools funciona

com base em três princípios abstratos: ocorrência (os itens lexicais devem estar

presentes), recorrência (os itens lexicais devem estar presentes pelo menos duas

vezes, embora o programa considere a relevância de itens com a freqüência 1) e

coocorrência (os itens lexicais devem estar na presença de outros termos, pois o

contexto é essencial para a compreensão do sentido de um item lexical).

O WordSmith Tools oferece um pacote de ferramentas35 e utilitários36 que

possibilitam uma extração automática dos termos a partir do corpus transcrito. Após a

extração dos termos realiza-se uma seleção semi-automática para análise dos mesmos.

As ferramentas utilizadas para a extração, seleção e análise em nossa pesquisa foram

as seguintes:

Wordlist (lista de palavras);

Concord (concordância).

A função da ferramenta Wordlist é apresentar duas listagens de palavras

referentes ao corpus transcrito. Uma listagem é ordenada alfabeticamente

(identificada pela letra “A”) e outra em ordem de freqüência dos termos (identificada

pela letra “F”). O programa ainda oferece outra listagem de termos com estatísticas

simples a respeito dos dados que poderão ajudar o pesquisador a entender de forma

geral a constituição dos itens lexicais e a riqueza do corpus (identificada pela letra “S”).

35

As ferramentas que compõem o programa WordSmith Tools são: Wordlist, Keyword e Concord. 36

Os utilitários que compõem o programa são: Renamer, Text convert, Splitter e Viewer.

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97

(A) listagem por ordem alfabética;

Fig. 4 - Janela com a listagem de termos em ordem alfabética.

(F) listagem por ordem de freqüência da palavra (da mais para a menos

freqüente);

Fig.5 - Janela com a listagem de termos em ordem de freqüência.

Page 98: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

98

(S) listagem por meio de estatísticas simples a respeito dos dados.

Fig. 6 - Janela com estatística simples.

Dos elementos constantes da janela acima (figura 6), destacamos aqueles

que utilizamos para o tratamento do corpus constituído em nossa pesquisa:

- As colunas numeradas (2, 3, 4, 5 em diante correspondem a cada arquivo

de informantes, sendo que a coluna 1 corresponde ao total de todos os arquivos

transcritos dos informantes);

- Text File (corresponde ao nome do arquivo);

-Tokens (corresponde ao número de itens lexicais presentes no corpus);

- Types (corresponde ao número de formas não repetidas no corpus);

- Types/Tokens/Ratio (corresponde à razão forma/item, ou seja, com base

em uma fórmula matemática o programa apresenta a riqueza lexical do corpus pelo

número de palavras não repetidas. Nesse caso, quanto maior o valor, mais palavras

diferentes o corpus conterá. Da coluna 2 a 10, apresentada na figura 6, a coluna 5

apresenta a transcrição de maior riqueza lexical, ou seja, maior número de palavras

não repetidas, chegando a um peso de 39,83 encontrados no corpus transcrito desse

informante.

Page 99: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

99

A listagem estatística, após todo o corpus inserido no programa WordSmtih

Tools, apresentou um resultado de 214.786 tokens, ou seja, o número total de palavras

presentes no corpus. Esse resultado classifica o corpus de nossa pesquisa como

“pequeno-médio”, bem mais próximo de um médio, conforme a classificação Berber

Sardinha (2004, p. 26). Para o autor, pode ser classificado como médio um corpus que

apresenta um número de tokens entre 250.000 (duzentos e cinqüenta mil) a 1.000.000

(um milhão) de palavras.

Após realizarmos os procedimentos para listar todos os termos, passamos a

usar a ferramenta Concord. Essa ferramenta possui a função de produzir linhas de

concordâncias ou listagens de itens específicos de um determinado termo ou de

combinações extraídas do corpus. Essas linhas de concordâncias possibilitam ao

pesquisador analisar todas as ocorrências nos contextos de uso (figura 7).

Fig. 7 - Janela com linhas de concordância.

Linha de

concordância

do termo

farinha.

Corresponde

ao

informante

Termo

pesquisado

no concord

Page 100: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

100

Um socioterminólogo tem que considerar também a possível existência de

termos complexos (sintagmas terminológicos) nem sempre fáceis de se definir. Nesse

caso a ferramenta Concord coloca a disposição o collocates (colocados). Para Berber-

Sardinha (2004:40) collocates é a “associação entre itens lexicais, ou entre o léxico e

campos semânticos”. Os seguintes passos foram realizados a partir da Wordlist (lista

de palavras em ordem alfabética):

Primeiro verificamos, por exemplo, se a palavra “bico”, encontrada na

WordList, poderia ser um termo da área em estudo. Para isso buscamos

analisar as várias ocorrências em seu contexto de uso. Nesse caso, além de

se constituir como um termo simples era necessário considerarmos a

probabilidade de formar um sintagma terminológico (termo complexo).

Fig. 8. Wordlist.

Para sanar essa dúvida usamos a ferramenta Show Colocates, que

oferece a possibilidade de uma análise geral em torno do termo

selecionado. Como se pode conferir na imagem seguinte, o termo “bico”

ocorreu 12 vezes ladeado de outras palavras que poderiam conjuntamente

formar um termo complexo. Destaca-se, portanto, a palavra “gaita” com

Page 101: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

101

uma ocorrência significativa no corpus ao redor do termo bico, localizada

na coluna R2.

Fig.09 - Collocates.

Para afirmarmos ser o sintagma terminológico encontrado (bico de

gaita) um sintagma terminológico da área em estudo, examinamos

novamente o contexto em que estava sendo usado pelos informantes

através da ferramenta concord.

Fig. 10 - Concord.

Toda essa seqüência de análise lexical, através do WordSmith Tools, foi

realizada com todas as palavras listadas pelo programa. Desta forma, tivemos a

Page 102: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

102

oportunidade de realizar um levantamento sistemático de todas as palavras presentes

no corpus e, posteriormente, confirmar quais se configuravam como unidades

terminológicas (termos) da área em estudo.

3.2.3. Registros dos termos em fichas terminológicas

Após a coleta dos termos, realizada por meio das ferramentas do software

WordSmith Tools, passamos a registrar essas unidades terminológicas em fichas

próprias com o intuito de facilitar a produção dos verbetes e a organização da

macroestrutura do glossário.

Krieger e Finatto (2004, p. 136) definem ficha terminológica como “um

registro completo e organizado de informações referentes a um dado termo”. No dizer

de Faulstich (1995, p. 3), a ficha terminológica funciona como uma “certidão de

nascimento”. É, portanto, um dossiê onde se encontra todas as informações

necessárias para a organização das unidades terminológicas na obra terminográfica.

Para Pontes (1996, p. 47), a ficha terminológica além de consistir em “um

conjunto de informações sobre os termos próprios de um determinado domínio”

apresenta uma série de componentes necessários de natureza documental,

terminológica e lingüística.

Pontes (1996, p. 47), pontua alguns componentes que uma ficha

terminológica deve conter:

de natureza documental: domínio(s), fonte(s), nome do autor dentre

outros;

de natureza terminológica: termo-entrada, nome científico, definição,

contexto dentre outros;

de natureza lingüística: categoria gramatical, variantes, termos

remissivos, equivalentes, normalização dentre outros.

Esses componentes, no entanto, devem ser adaptados de acordo com o

objetivo da obra que se pretende produzir. Por isso afirmam Krieger e Finatto (2004,

Page 103: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

103

136, p. 136) que “cada trabalho, em suas especificidades, pode exigir um tipo distinto

de ficha terminológica que, em linhas gerais, alimentará tipos diferentes de verbetes e

dicionários”.

A ficha terminológica, ainda, é um elemento bastante importante e

fundamental para a organização e produção de glossários. Conforme Pontes (1996, p.

12), ela serve para facilitar qualquer mudança exigida durante a pesquisa, para

adicionar informações que vão surgindo, para acumular elementos no momento da

montagem do glossário, para servir de imput para o registro dos dados em bases

informatizadas dentre outros.

Considerando as características de uma ficha terminológica, os

componentes que ela deve conter e os objetivos previstos na proposta de execução do

projeto, elaboramos um modelo de ficha terminológica (em anexo E) que melhor

atendeu aos propósitos da produção do glossário.

3.3 PROCEDIMENTOS UTILIZADOS PARA A ORGANIZAÇÃO MACROESTRUTURAL DO

GLOSSÁRIO

3.3.1. Delimitação e composição da nomenclatura

Os termos devem estar de acordo com uma série de variáveis que

permitirão o alcance que a obra pretende ter. Conforme Barros (2004, p. 195), “a

própria natureza do conjunto terminológico estudado e os objetivos da obra oferecem

elementos que permitem a determinação de critérios de corte e de delimitação do

campo de análise.” O que vai ou não constituir entrada no repertório, os critérios

utilizados para organizar o glossário são pontos fundamentais que o terminólogo deve

atentar previamente.

Barros (2004, p. 194-195), Krieger e Finatto (2004, p. 138-140) sugerem

alguns critérios de ordem quantitativos e qualitativos que podem ajudar o

terminólogo, mediante o objetivo da obra, na seleção dos termos que farão parte do

glossário. Desta forma, consideramos os seguintes critérios:

Freqüência de uso do termo;

Page 104: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

104

Pertinência temática;

Pertinência pragmática.

Fiabilidade dos termos;

Embora a freqüência tenha relevância na seleção de uma unidade

terminológica, nem sempre será possível afirmar que um termo seja realmente um

termo através desse critério. O melhor, nesse caso, é unir os critérios quantitativos e

qualitativos pontuados acima, sempre que possível, pois os mesmos usados

conjuntamente melhor respondem no momento da seleção da unidade terminológica.

Krieger e Finatto (2004, p. 138) definem pertinência temática como “a

propriedade de um termo pertencer a uma terminologia stricto sensu pelo fato de

vincular-se a um conceito que faz parte do campo cognitivo do domínio inventariado”.

Podemos, com base nas autoras, afirmar que a pertinência temática se refere aos

traços semanticamente relacionados à temática do domínio repertoriado. É por esse

critério que se observa determinados termos como exclusivo de determinada

terminologia. Observam ainda as autoras que “o reconhecimento da pertinência

temática de um termo depende do nível de compreensão alcançado pelo (...)

pesquisador a respeito da estruturação da área de conhecimento em foco”. Por isso o

terminólogo deve contar com a ajuda de especialistas da área em estudo para que o

repertório possua qualidade e a sua fiabilidade seja garantida.

Entende-se por pertinência pragmática “a qualidade que permite que um

termo ‘aparentemente alheio’ a uma certa subárea faça parte de uma terminologia

lato sensu” (KRIEGER & FINATTO, 2004, p. 139). Nesse caso, justifica-se a inserção de

um termo, por exemplo, conexo a outro domínio de conhecimento, mas que adquiriu

estatuto próprio na terminologia repertoriada.

Considerando o que se expôs, o glossário compõe-se de 266 termos

oriundos do universo discursivo da cultura da farinha no município de Acará – Pará.

Todas as entradas que listamos no glossário são formadas por termos simples e

complexos (sintagmas terminológicos).

Page 105: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

105

3.3.2. Critérios para o termo-entrada

Para a constituição da entrada dos termos no glossário consideramos a

ordem alfabética contínua por acreditarmos facilitar a pesquisa do consulente. Para

Barros (2004, p. 152), essa ordem não leva em conta espaços em branco, caracteres

não-alfabéticos ou sinais diacríticos como nos exemplos, destacados abaixo e que

fazem parte do corpus da nossa pesquisa:

farinha farinha d’água farinha de mistura farinha de tapioca farinha puba

Os termos que compõem a terminologia da cultura da farinha, além de

estarem distribuídos na macroestrutura em ordem alfabética, encontram-se também

relacionados aos seus campos conceituais conforme definido na árvore de domínio

(plantação-beneficiamento-comercialização).

PLANTAÇÃO BENEFICIAMENTO COMERCIALIZAÇÃO

Termos relacionados aos processos de preparo da área, plantio das manivas-sementes, tratos culturais e colheita da mandioca para produção de farinha.

Termos relacionados a todas as operações e processos utilizados para a produção da farinha.

Termos relacionados as operações, processos e objetos utilizados na comercialização da farinha.

Quadro 4 - Fases do ciclo produtivo da farinha.

Para as remissivas do glossário utilizamos as seguintes abreviaturas:

Var. : indica remissão a todas as variantes de ordem lingüística e de

registro;

Cf. : indica os termos que estabelecem uma relação semântica de inclusão

em sua hierarquia;

Ver.: indica igualdade estabelecida na equivalência dos termos.

Page 106: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

106

Quanto aos termos polissêmicos, estes devem encabeçar o verbete do

glossário e as suas definições devem vir numeradas em ordem seqüencial. Já para os

termos homônimos decidimos que terão entradas independentes e numeradas

seqüencialmente.

3.4. PROCEDIMENTO UTILIZADOS PARA A ORGANIZAÇÃO MICROESTRUTURAL DO

GLOSSÁRIO

Enquanto a macroestrutura estabelece uma relação vertical com os termos

entradas do verbete, a microestrutura constitui uma relação horizontal, pois compõe

as informações que se dispõem na seqüência linear necessárias para coesão e a

coerência do termo no verbete. Para a organização dos verbetes consideramos o

modelo proposto por Faulstich (1995, p 10) com adaptações para a realidade do nosso

glossário.

ENTRADA + CATEGORIA GRAMATICAL + CAMPO SEMÂNTICO + DEFINIÇÃO ±

VARIANTE ± REMISSIVA + CONTEXTO + FONTE ± NOTA

Cada elemento presente na microestrutura tem uma estrita relação com o

objetivo do glossário. Sendo uma obra de orientação socioterminológica e cultural

procuramos atender o máximo possível a tudo que pudesse caracterizar e valorizar o

fenômeno da variação e dos aspectos culturais dos termos. Os possíveis consulentes

do glossário devem levar em consideração os seguintes parâmetros que se distribuem

na organização microestrutural:

O sinal diacrítico ( + ) indica obrigatoriedade, enquanto o sinal diacrítico

(±) quer dizer possibilidade de ocorrência;

Entrada: a entrada se refere ao termo no verbete e obedece a uma

seqüência alfabética contínua e sistemática composto de substantivos,

adjetivos, sintagmas terminológicos, siglas e acrônimos. O termo-entrada

deve estar em negrito com iniciais maiúsculas e fonte 14;

Page 107: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

107

Categoria gramatical: refere-se à classe gramatical do termo-entrada

em seus contextos de uso, ou seja, s.m. (para substantivo masculino); s.f.

(para substantivo feminino); s.t.m. (para sintagma terminológico

masculino); s.t.f. (para sintagma terminológico feminino); s.t.v. (para

sintagma terminológico verbal); verb. (para verbo sem, no entanto

especificar a sua transitividade); adj. (para adjetivo) e sig. (para sigla).

Devem vir em fonte 12 e em itálico.

Campo semântico: indica a fase em que o termo está inserido no ciclo

produtivo da farinha. As três fases consideradas para fins de composição

do campo semântico (plantação, beneficiamento e comercialização) serão

abreviadas e colocadas em itálico entre colchetes: [plant.] para plantação,

[ben.] para beneficiamento e [com.] para comercialização.

Variantes: este campo indica as ocorrências de variações lingüísticas

(fonética, lexical, morfossintática) e de registro (discursiva,

socioprofissional). Usaremos a abreviação “Var.” em itálico para

indicarmos a ocorrência de qualquer variação encontrada. Seguidamente

especificaremos os tipos de variação com as seguintes abreviações entre

parênteses: (fon.) para variação fonética, (Lex.) para variação lexical,

(morf.) para variação morfossintática, (soc.) para variação socioprofissional.

Definição: indica um conjunto de informações que são dadas sobre a

entrada. Utilizaremos, sempre que possível, a definição por compreensão

por ser a mais indicada para a elaboração de conceitos terminológicos

seguindo o modelo clássico (gênero próximo + diferenças específicas) e por

extensão (BARROS, 2004, p. 171) sempre que for necessário, para tornar a

definição do termo mais apreensível. Virá em fonte normal e número 12.

Remissiva: indica a relação conceitual que um termo-entrada possui

com outro termo por hiperonímia ou sinonímia. A remissão deve sempre

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108

ser feita para o termo mais difundido ou mais freqüente onde constará a

definição.

Contexto: se refere à ocorrência real de uso em que o termo se

encontra no enunciado definitório. O contexto será obrigatório para todos

os termos-entrada, sendo configurados no glossário através de trechos do

corpus em que o termo se realiza. O contexto será apresentado em fonte

10 e em itálico e o termo extraído do contexto será destacado com

parênteses angulares e em negrito como em <farinha>. Dubuc (1985 apud

ARAGÃO, 2008, p. 5) estabelece três tipos de contextos: a) o contexto

definitório que não representa uma definição propriamente dita, mas

aponta para a noção subjacente ao termo; b) o contexto explicativo que

trás indicações da natureza funcional do termo; c) o contexto associativo

que não apresenta descritores, mas situa-o dentro de um campo e mostra

as relações entre termos.

Fonte: indica a procedência do contexto, de onde foram extraídos os

termos do glossário e virá entre parênteses. Nesse caso, usaremos as

codificações dos informantes de onde extraímos os termos.

Nota: indica, sempre que possível, informações complementares

(explicações e dados gerais) que ajudarão no entendimento do termo. A

palavra nota deve vir em negrito, seguida de dois pontos e fonte 10.

3.5 DISTRIBUIÇÃO DOS TERMOS NA ORGANIZAÇÃO DO GLOSSÁRIO

Sem a pretensão de realizarmos uma discussão de maior amplitude sobre

os dados contidos no glossário, faremos apenas uma descrição dos termos no intuito

de demonstrar como se distribuem estatisticamente no glossário. Isso se faz

necessário, à medida que a terminologia em foco possui a sua especificidade nos seus

vários aspectos lingüísticos, sociais e culturais, além de se constituir como saber

oriundo das populações advindas de comunidades rurais. OS 266 termos contidos no

Page 109: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

109

glossário foram distribuídos em três campos semânticos, gerando os seguintes

resultados quantitativos:

Gráfico 5 – Distribuição dos termos por campo semântico. Fonte: Corpus da pesquisa.

Como se observa, a maioria dos termos (161) está no campo semântico da

plantação, enquanto 94 no campo do beneficiamento e 11 se encontram no campo da

comercialização.

Em relação à distribuição dos termos por categoria gramatical, obtivemos

os seguintes resultados:

Gráfico 6 – Distribuição dos termos por categoria gramatical. Fonte: Corpus da pesquisa.

A distribuição dos termos por categoria gramatical nos demonstrou que a

terminologia extraída do corpus estudado é constituída de substantivos, em sua

161

94

11

Distribuição dos termos por campo semântico

Plantação Beneficiamento Comercialização

14687

10 21 1

Distribuição dos termos por categoria gramatical

Substantivo

Sintagma Terminológico

Adjetivo

Verbo

Sigla

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110

maioria, seguidos de sintagma terminológico, verbos, adjetivos e sigla

respectivamente.

Destacamos a forte presença de formações sintagmáticas no corpus

descrito. Conforme Alves (1998, p. 11) a presença substancial de termos complexos é

característico da linguagem de especialidade. Dentre várias formações sintagmáticas

destacamos as seguintes:

Casa de farinha (substantivo + preposição + substantivo);

Mandioca mansa (Substantivo + adjetivo);

Amassar a mandioca (Verbo + determinante + substantivo);

Primeira capoeira de mata (Numeral + substantivo + preposição +

substantivo).

Sendo o nosso trabalho um estudo de base socioterminológica e cultural,

não poderíamos deixar de lado um dos princípios básicos desse tipo de pesquisa: o

fenômeno da variação e os aspectos culturais que demarcam a percepção do real pelo

falante. Na terminologia estudada as variantes se inscrevem sob as formas

concorrentes (lingüísticas e de registros) e coocorrentes (sinônimas). Assim, pudemos

registrar as variações de ordem lexical, morfossintática, fonética e socioprofissionais:

Gráfico 7 – Qadro de variantes do glossário. Fonte: Corpus da pesquisa.

55

59

2216

Quadro de variantes lingüísticas e de registro

Lexicais Morfossintáticas Fonéticas Socioprofissionais

Page 111: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

111

Quanto ao registro das variantes lexicais, podemos afirmar que são

bastante freqüentes na terminologia estudada. Faulstich (1996, p. 16-17) estabelece

que esse tipo de variante ocorre quando a forma do item lexical sofre comutação sem

que isso implique em mudança conceitual. É o que acontece nos seguintes exemplos

registrados: aturá ~ munduru, cuí ~ poeira da farinha, retiro ~ casa de farinha ~ casa

de forno, dentre outros.

As variantes morfossintáticas são também registradas com bastante

freqüência. Elas se apresentam alternando elementos na estrutura morfológica do

termo ou mesmo ocasionando apagamento na estrutura da predicação dos sintagmas

terminológicos. São exemplos dessas ocorrências os seguintes termos:

copa da maniva ~ copa ~ copinha;

destoca ~ destocar ~ destocagem;

escaldar ~ escaldação ~ escaldamento;

grelar ~ grelação;

leite da maniva ~ leite.

As variantes fonéticas e socioprofissionais tiveram poucos registros, mas

não menos importantes, pois demonstram que o fenômeno da variação pode ocorrer

também em terminologia. Quanto às variantes fonéticas, dentre outros, registramos

os seguintes exemplos:

crueira ~ curera;

igarapé ~ garapé;

feixe ~ fecho;

poço ~ puçu;

álvore da maniva ~ alvre da maniva ~ alve da maniva;

escaldar ~ escardar.

Foram poucas as ocorrências de variantes socioprofisionais, das quais

destacamos as seguintes:

cova ~ suco;

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112

esfriadeira ~ esfriador ~ cocho de resfriamento;

masseira ~ cocho de masseração;

mandioca ~ tubérbulo;

bico de gaita ~ bisel.

A sinonímia também aparece com bastante freqüência na terminologia

estudada. Dentre os vários exemplos registrados, temos os seguintes:

afofar o solo ~ arar;

amassar a mandioca ~ masseração;

área da mandioca ~ mandiocal ~ manival;

área de dezembro ~ janeiro;

munduru ~ aturá;

triturador ~ motor ~ caititu;

coadora de massa ~ caixa;

farinha puba ~ farinha d’água.

Houve, ainda, no glossário, o registro de termos homonímicos. A

homonímia ocorre quando termos idênticos e independentes possuem conceitos

diferentes no plano do conteúdo (PONTES, 1996, p. 180). Foram apenas dois termos

registrados a partir da descrição realizada:

1. Exemplo:

Broca1 (processo de preparo da área de plantação)

Broca2 (inseto que prejudica o manival)

2. Exemplo:

Lagarta1 (Inseto que prejudica o manival)

Lagarta2 (Instrumento de uso na agricultura)

Page 113: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

113

Considerando a terminologia ora estudada, podemos dizer que todos os

termos registrados fazem parte do universo sociocultural dos socioprofissionais

envolvidos nesse tipo de atividade. É importante salientar que a percepção cultural do

homem nesse contexto sociodiscursivo demonstra que o seu saber oriundo de um

conhecimento popular possui valor na história da comunidade em que vive. Portando,

como a sociedade se expressa por meio da linguagem, torna-se óbvio que essa língua

também a identifique, demarcando territórios e marcando espaços culturais.

Page 114: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

114

3.5.1 Representação esquemática dos termos no glossário

Considerando os parâmetros definidos na microestrutura, os termos

constantes no glossário possuem a seguinte configuração:

Aturá s.m. [plant.]: Cesto produzido com cipó de timbuaçu ou tala de guarumã,

utilizado no transporte das mandiocas. Var. (lex.) munduru. “L2: teçado mu/muita gente já se utiliza carrinho de mão pra ca pra trazê a mandioca né eu utilizo isso ali olha chamado <aturá> olha... L1: qual é o nome? L2: aturá... L1: aturá? é feito de que? L2: cipó de timbuaçú...” (ITRM17) Nota: Termo de origem tupi “atu’ra”, que ainda permanece na linguagem do trabalhador rural, principalmente porque cultiva a mandioca para produção de farinha, utilizando-se de instrumentos rudimentares proveniente da cultura indígena.

Termo-

entrada

Categoria

gramatical

Tipo de

variante

Definição do

termo

Contexto de

ocorrência

do termo

Identificação

do informante

Nota: Informações

adicionais sobre o

termo.

Campo

semântico do

termo

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115

3.5.2 Abreviaturas e sinais gráficos utilizados no glossário

Referências gramaticais:

s.m. (para indicar substantivo masculino;

s.f. para indicar substantivo feminino;

verb. para indicar o verbo;

adj. para indicar os adjetivos;

s.t.m. para indicar sintagma terminológico masculino;

s.t.f. (para indicar sintagma terminológico feminino;

s.t.v. (para indicar sintagma terminológico verbal;

sig. para indicar sigla.

Remissivas:

Var. (lex.) variante lexical;

Var. (fon.) variante fonética;

Var. (morf.) variante morfossintática;

Var. (soc.) variante socioprofissional;

Ver. igualdade estabelecida na equivalência dos termos;

Cf. relação semântica de inclusão na hieraquia dos termos.

Características sociais e profissionais dos informantes:

ITRM. Informante Trabalhador Rural Masculino;

ITRF. Informante Trabalhador Rural Feminino;

IATM. Informante Atravessador Masculino;

ITEM. Informante Técnico Masculino.

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116

4 – GLOSSÁRIO SOCIOTERMINOLÓGICO DA CULTURA DA FARINHA

A, a

Aceiro da roça s.m. [plant.]: Limite que divide as laterais da roça para que não

ocorra transposição de focos de incêndio para outras áreas do terreno. Var. (fon.) aceru; Var. (morf.) aceiro. “L2: olha... eh fazê como... no tempo antigo tinha gente que sabia rezá... é... chegava rezava na bêra do

acêro... na na no <acêro da roça> rezava... no ôtro dia tu só via... chega levantava urubu... morria

tudinho... isso no meu tempo de criança eu cansei de vê...” (ITRM7)

Ácido cianídrico s.t.m. [ben.]: Substância de alto teor tóxico presente na batata da

mandioca e extraída no processo de beneficiamento. “L2: ...a macaxêra... é bom que a macaxêra ela ela tem uma destinação diferente né a macaxêra é uma... num deixa de ser uma mandioca... mas que tem baixo teor de <ácido cianídrico>...” (ITEM2)

Nota: Essa substância tóxica começa a ser extraída da mandioca no processo de fermentação e depois no processo de prensagem no tipiti.

Adubação s.f. [plant.]: Processo que consiste em fertilizar o solo com a utilização de

substâncias orgânicas ou químicas para obtenção de um melhor desenvolvimento e produtividade de mandiocas. “L2: <adubação>... melhoramento de... das muda né... L1: que tipo de adubo seria no caso? L2: olha... eles falo em em calcário né pá corrigi o solo... esseé o adubo principal... e o NPK que ela desenvolve eh um ano né que a gente espera aí com adubação seis mês... ela diminui o tempo...” (ITRM16)

Adubadeira s.f. [plant.]: Instrumento agrícola utilizado para facilitar o processo de

adubação no roçado tornando o solo mais homogêneo. Var. (fon.) adubadera. “L2:... por conta de mal governo que não sabe... administrá o governo federal mandô e chegô aqui não sôbe o governo mandô plantadêra mandô tratores mandô colhedêra mandô <adubadera> mandô tudo pra e nunca funcionô um dia...” (IATM3)

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117

Adubo s.m. [plant.]: Resíduo orgânico de vegetais ou de substâncias químicas

utilizado para a fertilização da terra e aumento da produtividade da mandioca na lavoura. L2: com tratô e a grade... tá revolvê solo porque a maniva é uma... é uma a mandioca é uma raiz no caso né... e se ela encontrá um solo fofo ela cresce e desenvolve mais... e com o <adubo> necessário vai duplicá ou triplicá a produtividade...” (ITEM1)

Adubo orgânico s.t.m. [plant.]: Resíduo orgânico de vegetal utilizado na fertilização

da terra para o aumento da produtividade da mandioca. Cf. adubo. “... no feijão eh o andú o andú uma coisa assim... quase como o andú que se planta entre o alinhamento da da da da maniva e depois que ele cresce corta e joga embaixo pra servir de <adubo orgânico> uma cobertura morta chamada...” (ITRM11)

Adubo químico s.t.m. [plant.]: Produto de composição química preparado para ser

utilizado na fertilização da terra e aumentar a produtividade da mandioca na lavoura. Cf. adubo. “... L2: na terra que é preparada na terra que ela é mecanizada pode-se usá o <adubo químico>... pode-se usá o adubo químico que é que é o composto né... é o são os NPK... L1: NPK? L2: NPK...” (ITRM6)

Afofar o solo s.t.v. [plant.]: Ver. arar.

“L1: o que seria da essa gradi gradi gradiá? L2: isso eh seria você eh melhorá a sua produção principalmente <afofá o solo>...” (ITEM1).

Agricultor s.m. [plant.]: Ver. trabalhador rural.

“L2: bom nós temos a roça de verão... o <agriculto> diz eu vô fazê um verão o que é que isso... é maio junho e julho são esse período de fazê a primêra roça aonde planta a maniva solteira...” (ITRM6)

Agricultura familiar s.t.f. [plant.]: Sistema de cultivo da terra baseado em pequenas

propriedades com fins, prioritariamente, de auto-subsistência. “ L2: a maio... bem a grande maioria du du dus agricultoris aqui di mandioca são da <agricultura familiar>... bem categoria de sóciu-familiar...” (ITEM2)

Page 118: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

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Água corrente s.t.f [ben.]: Ver. água do igarapé.

“L1: em que tipo de água é colocado a mandioca para fabricá a farinha? L2: geralmente <água

corrente> esse é o esse é o receitado agora nem toda região tem um igarapé... aí as pessoas as vez faz

tanque... aproveita lá água do poço mas o certo é butá numa água corrente...” (ITRM6)

Água do igarapé s.t.f [ben.]: Pequeno curso de água corrente, onde se coloca a

batata da mandioca de molho num período de três a cinco dias para ocorrer o processo de fermentação. Var. (lex.) água corrente, água do rio; Var. (fon.) água do garapé. “L1: em que tipo de água é colocada a mandioca né para fabricá farinha ( )da farinha no caso a farinha d'água qual é o tipo de água que é colocada aonde é? L2: olha lá no meu é... é garapé corrente... a <água do garapé> ta correndo aí...” (ITRM7)

Água do rio s.t.f [ben.]: Ver. água do igarapé.

“L2: olha a gente... a gente coloca na <água do rio>... né ou a gente faz um um tanque de cimento né pode colocá também... e pode fazê também no poço né...” (ITRM15)

Alqueire s.m. [com.]: Unidade de medida correspondente a trinta quilos de farinha.

“L1: um trabalhão... era vendido em alqueire né? L2: em alqueire... L1: o que é que... o que é que correspondia alqueire? L2: <alquere> era trinta quilo antigamente trinta quilo de farinha era um alqueire né... e quinze quilo era meio alqueire que chamavo...”

Amassador s.m. [ben.]: Pessoa encarregada em realizar o processo de masseração da

mandioca. “L2: é descascá ôtro carregá do poço... lá da onde tá a mandioca pa massêra e ôtros tem que ter o <amassadô> lá... o preparadô pa pa jogá no forno... assim que a gente usa...”(ITRM2)

Amassar a mandioca s.t.v. [ben.]: Ver. masseração.

Cf. beneficiar. “L2: tem o forno que a gente faz a farinha tem o rodo que é de mexê... e o tipiti... e tem que é pra espremer ou a prensa... eh::: eh::: eh::: e a massêra lá pa gente levá daqui pa colocá lá no coisa pa <amassá a mandioca>... pa poder espremê ela pa... tem a penêra... a caixa né de de coá massa né... eh...” (ITRM2)

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119

Aradado adj. [plant.]: Área de terra em que o solo foi revolvido para o plantio das

manivas. “L1: tá pra pra fazêa plantação o que é preciso considerá no terreno? é preciso que o terreno esteja como pra... fazê esssa plantação de manivas? L2: tem que tá::: eh queimado entendeu o solo tem que tá queimado ou <aradado>....” (ITRM12)

Arado s.m. [plant.]: Instrumento agrícola utilizado para remover o solo de uma área

de terra e prepará-la para a plantação. “L1: não o que é o que seria necessário pra fazê a destoca? L2: eh teria que ter uma um um <arado>... né primêro um tratô pa destocá depois o arado pa... pa fazê a questão da...” (ITRM10)

Arar verb. [plant.]: Processo que consiste em revolver o solo com maquinário ou

enxada para o plantio das manivas. Var. (lex.) afofar o solo; Var. (fon.) aradar. “L2: ...aí tem uma base... né porque nós até aí nós num tá até agora nós num temo um um tratô pa ah ah <ará> aí uma uma área aí de quatro cinco seis tarefa pra gente fazêo prantio... a gente ainda faz braçal...” (ITRM9b)

Área da mandioca s.t.f. [plant.] Ver. manival.

“L2: bom... pode ter aí o alagamento... esse é o pior porque apodrece né... junta água dentro da <área da mandioca> e o sol esquenta e essa água fica quente e cozinha a mandioca e isso causa o apodrecimento esse é um dos probrema...” (ITRM6)

Área de areia s.t.f. [plant.]: Ver. área de argilo-arenosa.

“L2: a melhor área primêro... que não seja alagada... pra num prejudicá a mandioca... e a ôtra <área de areia> porque ela favorece tanto você cultivá cavá porque é macio né como favorece também o crescimento da da mandioca porque a terra é de areia... e também essa terra de areia ela...” (ITRM6)

Área de argilo-arenosa s.t.f. [plant.]: Extensão de terra formada de solo areento e

barro que facilita o arranque das mandiocas na época de colheita. Var. (soc.) área de areia. “L2: não a o o pra mandioca é como pra ôtro to todas as ôtra a cultura né a o o argilo arenoso né... <área de argilo arenosas> assim são adequadas por se tratá de áreas de de... de terras fofinhas a gente chama fofinhas fofa né...” (ITEM3)

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Área de dezembro s.t.f. [plant.]: Ver janeiro.

“L2: ...começa prepará a área de novembro a <área de dezembro>... e novembro a dezembro e planta normalmente de de dezembro para janêro....” (ITEM3)

Área de novembro s.t.f. [plant.]: Ver janeiro.

“L2: ... mandioca de verão que é aquele que é plantada de julho em diante e mandioca de inverno que é plantado de começado prepará começa prepará a <área de novembro> a área de dezembro... e novembro a dezembro e planta normalmente de de dezembro para janêro....” (ITEM3)

Área úmida s.t.f. [plant.]: Extensão de terra encharcada de água e inapropriada para

o cultivo da mandioca. “L2: olha que eu saiba não como eu tô falando assim lá na minha área por exemplo a gente tem um problema nesse caso aí da da da... da região lá que é úmida... aí nesse caso a maniva morre mesmo mas é devido a umidade... porque ela num ela num a mandioca ela num é própria pra <área úmida>... é mais pra terra seca...” (ITRF2)

Arenoso adj. [plant.]: Tipo de solo formado de areia que facilita o processo de

arranque das mandiocas. Cf. área de areia. “L1: existe algum tipo de solo assim ideal pra ser plantada a mandioca aqui é é conhecido isso é passado alguma orientação em relação a isso? [ L2: existe... é o <arenoso> que é o bom mesmo....” (ITRM16a)

Arranque s.m. [plant.]: Processo que consiste em retirar a batata da mandioca da

terra puxando-a pelo tronco. Var. (lex.) sacar. “L1: que se acostume né? L2: é... L1: tem algum nome assim que vocês dão pra atividade de colher essa mandioca ou não assim algum nome epecífico? L2: não... num num tem se trata [ L1: é o arranque né? L2: é o <arranque>... arrancá.... decotá que é separar né aqui aqui... tá...” (ITRM19)

Árvore da maniva s.t.f [plant.]: Estrutura que compreende a formação da maniveira

como a copa, o caule e a raiz. Var. (fon.) álve da maniva, álvore da maniva, álvre da maniva. “L2: a <árvore da maniva>... a manivera né que chama... corta até lá próxima da onde tá mais verde lá separa no monte e tira esse ( ) pra plantá... L1: qual pedaço? L2: o caule da da maniva a manivêra viu... ( ) o corpo que a gente chama né... L1: certo...” (ITRM15)

Page 121: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

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Atravessado adj. [plant.]: Posição horizontal e um pouco inclinada em que as

manivas são colocadas nas covas para germinar. “L2: não pode colocá ela... assim por exemplo a cova é assim... você pode colocá assim direto com a

cova pode colocá assim também de <atravessado> com aqueles olhinho pra cima...” (ITRF5b)

Nota: Diz o trabalhador rural que as manivas não podem ser colocadas de forma totalmente vertical nas covas, porque impediria uma melhor germinação.

Atravessador s.m. [com.]: Pessoa que compra a farinha produzida pelo trabalhador

rural para revendê-la em quantidade. Var. (lex.) marreteiro, puxador. “L2: <atravessadô> são pessoas que tem contato com o mercado lá fora... e ele acaba fazendo intermediando ele pega a farinha do produtor né e... em cima dessa farinha ele ganha a porcentagem... repassando pra... pro mercado ou seja pros armazém...” (ITRM6)

Aturá s.m. [plant.]: Cesto produzido com cipó de timbuaçu ou tala de guarumã,

utilizado no transporte das mandiocas. Var. (lex.) munduru. “L2: teçado mu/muita gente já se utiliza carrinho de mão pra ca pra trazê a mandioca né eu utilizo isso ali olha chamado <aturá> olha... L1: qual é o nome? L2: aturá... L1: aturá? é feito de que? L2: cipó de timbuaçú...” (ITRM17)

Nota: Termo de origem tupi “atu’ra”, que ainda permanece na linguagem do trabalhador rural, principalmente porque cultiva a mandioca para produção de farinha, utilizando-se de instrumentos rudimentares proveniente da cultura indígena.

Avulso adj. [plant.]: Sistema aleatório de plantio das manivas no roçado.

“L1: como é que o senhor... faz pra colo... pra plantá elas então? L2: olha isso lá a gente planta <avulso> né a gente cortá a terra vai tirando a... abrindo as cova e plantando só... L1: vai plantando avulso? L2: é avulso é... “ (ITRM15)

Page 122: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

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B,b Bacia de pneu s.t.f. [ben.]: Ver. tina.

“L2: ... se for fazê a farinha chamada farinha puba então é decascada a mandioca depois de decascada a mandioca se coloca no tanque ou numa <bacia de pneu> deixa passá três dias depois de três dias lava essa mandioca... quebra no motô ou no ralo rala ela depois de ralado...” (ITRM11b)

Bago s.m. [ben.]: Caroço da farinha que, de acordo com o escaldamento, poderá

possuir tamanhos diferentes. Var. (lex.) grão; Var. (morf.) bagaço. “L2: existe... num é feito com muita freqüência... não é levado muito a sério mas existe... existe inclusive um kit de penêra a penêra que sai a massa pra... farinha fina ôtra pra farinha... do <bago> bem que nós chamamo de bago é o grão dela né...” (ITRM6)

Baguda adj. [ben.]: Espessura grossa dos grãos da farinha após a torragem.

“L1: a farinha grossa qual é? L2: aquela mais grossa que fica com <baguda> né tem mais bago... L1: ah tá...” (ITRM19)

Bancada s.f. [ben.]: Peça plana de madeira preparada para servir de apoio ao caititu.

“L2: tem que ter o motor pra quebrá a mandioca... caititu...tem que ter a <bancada> feita pro caititu pra sentá o caititu... e::.. tem que ter a prensa... coxo pra peneirar a massa... e aí a sacaria pra botá a farinha” (ITRM5)

Banco s.m. [ben.]: Pequena caixa de madeira que envolve o rodete e evita o

espalhamento da massa no momento da trituração da mandioca. “L1: eh a senhora falô que que coloca num <banco> que banco é esse? L2: é uma caixa que é feito que no topo dela dá essa tarisca chamada que aí você vai apertando essa massa vai descendo embaixo n'ôtra caixa...” (ITRF4)

Barraqueiro s.m. [com.]: Pessoa que compra farinha do trabalhador rural para

revendê-la em barracas na feira livre. “L1: quem são as pessoas que compram a farinha do agricultor que faz a farinha? L2: eh lá a gente vende lá pro... pros marretêro lá os <barraqueiro>...” (ITRM2)

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Basqueta s.f. [com.]: Vasilha utilizada para colocar as mandiocas.

“L2: eu num sei porque a gente chama de mandioca amarela... a gente só conhece ela com esse nome... na lá na minha região né inclusive eh a gente planta bastante lá pra pra vendê no caso de basqueta num vende a mani... a a farinha vende a mandioca mesmo na <basqueta>...” (ITRF2)

Batata da mandioca s.t.f. [plant.]: Ver. mandioca.

Var. (morf.) batata. “L2: “... ela num grela... num grela num cria raiz... se ela num tivé leite a gente num pranta porque ela num nasce... que o que faz dá a <batata da mandioca> é o leite... que você prantá a maniva sem leite num dá batata...” (ITRM7)

Batata da maniva s.t.f. [plant.]: Ver. mandioca.

Var. (morf.) batata. “L2: daqui pra pra baixo naquele pauzinho aquelas coisa... só tira mesmo a... a <batata da maniva>... da mandioca da manivêra...” (ITRM15)

Beiju s.m. [ben.]: Tipo de bolo feito da massa de mandioca.

“L2: é no forno... tipo a farinha... aí ela fica uma uma coisa melhor pra gente tomá café... aí se quiser tirá a tapioca pra fazê <beiju> pra tomá com café... é bom...” (ITRM2)

Nota: O beiju é um alimento típico na região e bastante apreciado com café.

Beneficiar verb. [ben.]: Processo que consiste em transformar a mandioca em massa

para a produção de farinha. Var. (lex.) fazeção da farinha; Var. (morf.) beneficiamento.

“L1: não a maniva como é que vocês cortam elas? L2: a a gente puxa ela... decota ela... leva pro... po po pra casa de farinha depois coloca na água de lá que tira ela... tira as casca dela tira ela pra levá pro pra casa de farinha pra <beneficiar> pra podê torrá no forno de... assim que é...” (ITRM9b)

Bicicleta s.f. [ben.]: Veículo adaptado que serve como Instrumento para movimentar

o caititu em substituição a um motor elétrico. Var. (fon.) bicicreta.

“L2: isso aí é... onde a gente quebra é o rodete né o catitu que a gente chama aí a gente num tem motô é na pedalera mesmo na <bicicleta> aí ó...” (ITRM17)

Nota: A bicicleta é adpatada ao caititu para realizar o movimento do rodete que tritura a mandioca.

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Bico s.m. [plant.]: Ver. grelo.

“L1: se eu nunca tivesse visto uma maniva como é que senhô me diria como é uma maniva o que é que ela tem? L2: rapaz ela é uma vara cheia de... cheia de nó... de <bico>... L1: sim como é uma maniva? L2: a maniva ela é uma vara né... aí cheia daqueles olhozinho... do pé a baixo... aí dá esgalha...” (ITRM8)

Bico de gaita s.t.m. [plant.]: Corte em diagonal feito no caule da maniva para servir

de semente no plantio. Var. (lex.) chanfrado, enviezado; Var. (soc.) bisel. Cf. chanfrar “L1: na hora de prepará a maniva para o plantio como é que ela é cortada? L2: é medida aqui

praticamente um palmo com quatro olho... a gente faz o corte aqui <bico de gaita>... aí planta”

(TRM23)

Nota: O trabalhador rural utiliza o caule da maniva para produzir diversos pedaços que servirão como sementes para serem plantadas.

Bisel adj. [plant.]: Ver. bico de gaita.

Cf. chanfrar. “L1: na hora de prepará a maniva para o plantio como é que ela é cortada? L2: é medida aqui praticamente um palmo com quatro olho... a gente faz o corte aqui <bico de gaita>... aí planta” (TRM23)

Nota: O termo bisel é usado pelos técnicos dos órgãos e entidades que atuam na orientação da lavoura da mandioca no município de Acará.

Bola da massa s.t.f. [ben.]: Quantidade de massa embolada com a mão para ser

colocada no tipiti. “L2: e chega lá mestre... eh coloca o tipiti AQUI... né olha coloca o tipiti aqui... faz a <bola da massa> ó... e mete no tipiti... aí suspende ele soca... torna fazê ôtra bola mete no tipiti torna suspendê torna sucá até ele enchê...” (ITRF6)

Bolha s.f. [plant.]: Ver. grelo.

“L2: quer que eu ( )... não assim eh eh é dividido em em em folhas em folhas tem o caule o caule tem várias <bolhas>... da qual quando você planta se origina eh eh eh... como é se origina os broto que vão dá origem aos no as novas plantas... entendeu...” (ITEM3)

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Borra s.f. [ben.]: Sujeira extraída no processo de coação da goma da tapioca.

“L2: ...aí no momento quando aquilo todo senta você derrama a água de cima a goma já está embaixo... aí de lá você torna agoá ela torna a passando o pano fino que é pra crassificá tirá a <borra>... a sujêra que tivé passado né...(ITRF4) Nota: É feito uma coação com um pano fino onde sai a borra da goma.

Braça s.f. [plant.]: Unidade de medida da área de plantio das manivas.

“L2: olhe uma tarefa eh... é vinte e cinco <braça> um quadro... é uma tarefa de roça... L1: vinte e cinco... vinte e cinco braças... L2: um quadro... é:: uma tarefa... uma tarefa de roça ela dá... uns trinta pacote de farinha... pacote de trinta quilo...” (ITRM20)

Nota: Vinte e cinco braças correspondem a uma tarefa ou cem metros quadrados. Para o trabalhador rural, com vinte e cinco braças de área plantada chega-se a produzir até trinta pacotes de farinha.

Braçal adj. [plant.]: Função exercida pelo trabalhador rural nas atividades de cultivo

da terra. “L2: a função que a gente exerce... é que a gente tem que trabalhá direto nela como por exemplo prepará primêro roçá o terreno entendeu... depois vem a derriba... e depois a gente queima isso aí é a nossa função <braçal> mesmo...” (ITRM12)

Brandão s.f. [plant.]: Variedade de maniva ou mandioca de polpa amarelada e folhas

meio escuras. “L2: é porque a cha a tachí tem a folha dum modo e a copa também a qualidade é clara é branca e a <brandão> é amarela...”(ITRF4)

Branquinha s.f. [plant.]: Variedade de maniva ou mandioca de polpa esbranquiçada

tendo como característica as ramas esgalhadas. “L2: olha eu conheço o tachí... eu conheço a bruguesa... tá... eu conheço também a <branquinha>... eu conheço a branca roxa... entendeu... e... tem ôtras variedade que que eu talvez num teja lembrado agora né mas o o o que nós trabalha mesmo é com tachí pra nós a melhor... que dá mais batata é o tachí...”ITRM10)

Broca1 s.f. [plant.]: Processo que consiste no corte da vegetação baixa que compõe a

área onde é realizado o plantio de manivas para o cultivo da mandioca. Var. (lex.) roçar; Var. (morf.) brocar, brocação. L1: como é que ocorre o preparo do roçado pra podê pra podê plantá as manivas? L2: <broca>... aí derruba... aí deixa secá aí mete fogo... L1: só? L2: só...” (ITRM8)

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Broca2 s.f. [plant.]: Tipo de praga que ataca a plantação de manivas, perfurando o

interior do caule e causando perda de folhas e ressecamento das ramas. “L1: L2: <broca> é uma praga... L1: ah tá... então dá pra enxergá [ L2: é um é um não é um bicho da... por exemplo se você pegá a maniva cê racha a maniva né corta um pedaço assim dum palmo e racha assim ela tá bem ela tá no meio aquilo... (ITRM10)

Brolho s.m. [plant.]: Ver. grelo.

“L1: certo e uma maniva inteira com todas as partes que eu falo o que é que ela tem? essa parte aqui o que é isso aqui o que é? L2: é os <brolho> dela e folha né... os galho é uma alvre bonita...” (ITRM24)

Brotar verb. [plant.]: Ver. grelar.

Var. (morf.) brotamento; Var. (fon.) brolhar. “L2: eh é como eu tô dizendo ( ) o senhô vai arrancá ela por exemplo pra prantá... aí o senhô tem que... se o senhô deixá ela deitada tem que cobri pro sol num... num açá ela se não tem que encostá ela tudinha de pé no chão... que é pela poder <brotá>... aí p’ela num secá porque se deixá ela... (ITRM2)

Broto s.m. [plant.]: Ver. grelo.

“ L1: de que forma a maniva deve ser colocada na cova existe uma posição correta pra fazê isso? L2: existe... todo com os olho tudo com os <broto> pra cima... nunca pra baixo [ L1: os broto é o que? L2: aqueles olhinho de aqui... as árvore...” (ITRM17)

Buiuçu s.f. [plant.]: Variedade de maniva ou mandioca de polpa esbranquiçada, tendo

como característica a estatura baixa e os talos das folhas avermelhados. L2: é como eu lhe falei indagora tem <buiuçú> tem pretão tem branquinha tem baruí... L1: mas todas essas que o senhor ta falando elas pertence a branca? L2: pertence...”(ITRM19)

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C,c

Caçuá s.m. [plant.]: Cesto produzido com cipó de timbuaçu usado para carregar

mandiocas colhidas nas costas de um cavalo. “L2: no cavalo... é nós usa cavalo aqui... a gente decota a mandioca enche no <caçuá> e põe na costa do cavalo... e o cavalo traz pro poço...” (ITRF10)

Caititu s.m. [ben.]: Instrumento composto por um motor elétrico, uma pequena caixa

de madeira, um rodete e usado para triturar a mandioca transformando-a em massa. Var. (lex.) motor, triturador. “L2: ... a que a qoue não se coloca na água você tira a mandioca da água e traz direto pro retiro onde você vai raspá ela você vai decascá ela entendeu... e aí vai triturá ela no <catitu>... e daí espremê e fazê a farinha que é a farinha seca que a gente chama...” (ITRM1)

Caixa s.f. [ben.]: Depósito de madeira dividido ao meio e usado para aparar a massa

da mandioca coada ou peneirada. Var. (lex.) coadora de massa. “L2: tem a <caixa> com a penêra que é pra penêrá a massa ficá na caixa e depois passa pra chapa que o forno nós usa mais a chapa né...” (ITRM15)

Calcário s.m. [plant.]: Composto químico utilizado na adubação do solo para

plantação das manivas. Cf. Adubo. “L2: L1: que tipo de adubo seria no caso? L2: olha... eles falo em em <calcário> né pá corrigi o solo... esseé o adubo principal... e o NPK que ela desenvolve eh um ano né que a gente espera aí com adubação seis mes... ela diminui o tempo...” (ITRM16a)

Cambão s.m. [plant.]: Ver. tronco da maniva.

“L2: é dois dedo a gente corta aqui ó... aqui é o <cambão> né... perto da raiz você mete tem um palmo que a gente já corta lá a gente corta um palmo... da onde ela é enfiada dentro do chão que ela cresceu aqui... um palmo...” (ITRM5)

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Cambito s.m. [ben.]: Peça feita de madeira usada nas costas de um cavalo para

carregar lenha ao retiro. “...trazê mandioca da roça pá jogá na água pá depois passá quatro dias ou cinco pá amolecê de lá que vem fazê toda essa tramitação que eu tava fazen falando agora aqui... aquelas duas duas... madêra que tinha ali... isso aqui é o <cambito> falado...” (ITRF10)

Canoa s.f. [ben.]: Ver. masseira. “L1: e quais são os instrumentos utilizados para colhê essa mandioca? o que é que... que tem que levá pra lá pra fazê ( ?[ L2: olhe... olhe tem que ter... olhe tem o forno tem o forno... aí tem a <canoa> a massêra que a gente traz pra amassá aí tem...” (ITRM4)

Capim brabo s.t.m. [plant.]: Ver. erva daninha. “L1: e que tipo de mato que dá assim que prejudica a mandioca lá na na no roçado de vocês? L2: ah é diversos mato... é a tiririca isso é a o mato de lá... campim esses <capim brabo>...” (ITRF8)

Capim de rola s.t.m. [plant.]: Variedade de erva daninha com raiz profunda e

prejudicial ao desenvolvimento das manivas.

Cf. capim brabo, erva daninha. “L1: algum que tu conhece assim que faz mal se não tirá... ele do [ L2: olha tem um tal de de de <capim de rola> que a gente chama a gente chama de capim de rola né aquilo é uma praga né além de ele ser uma praga... ele tira a força da mani da da mandioca...” (ITRM10) Nota: O capim de rola é uma espécie de erva daninha difícil de ser arrancada do solo e exige bastante esforço do trabalhador rural para realizar essa operação.

Capim flor branca s.t.m. [plant.]: Variedade de erva daninha de vegetação rasteira e

prejudicial ao desenvolvimento das manivas.

Cf. capim brabo, erva daninha. “...aí tem o capim de rola que ôtra mato né que costuma dá muito da roça tem um tal de <capim flor branca> que esse que é o pior mesmo e tem um tal de... de de... que dá rasteiro tipo quecuia e o o... que eu me esqueci o nome dele agora é o... esqueci o nome dele esse lá é mais perigoso dá tipo o quecuio...” (ITRM10)

Capina s.f. [plant.]: Processo que consiste na retirada de ervas daninhas do manival

com o objetivo de melhorar as condições de desenvolvimento da mandioca.

Var. (morf.) capinar, capinação. “L2: tem que ter du du duas <capina> tem gente que dá até três capina né... quan quanto mais capina você... você der melhor é pra até pra você tirá ela é melhor....”

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Capoeira s.f. [plant.]: Área de terra roçada, que apresenta espécies vegetais rasteiras

em decorrência da regeneração do mato com o tempo.

Var. (lex.) juquira, primeira capoeira de mata; Var. (morf.) capoeirinha, capoeira fina, capoeira baixa. “L2: ...aí a gente sabe que é o segundo corte aí a partir do segundo corte pro terceiro já se chama <capoêra> porque eles já tão na estatura baixa...” (ITRF4)

Capoeira grossa s.t.f. [plant.]: Área de terra roçada, que apresenta espécies vegetais

de estatura média em decorrência da regeneração do mato com o tempo.

“L2: olhe uma roça... conforme ah a terra a capoêra e a mandioca uma roça prantada feita numa juquira dessa aqui... aí com oito mês ela tá pron... oito mês ela tá pronta pra pra começa fazê a farinha... aí se for numa <capoeira grossa> no mato grosso tem que pegá um ano que ela custa mais madurecê...” (ITRM2)

Capoeirão s.m. [plant.]: Área de terra constituída de vegetação virgem e de grande

porte. “L2: ... o <capoêrão> é onde tem já um pau so... grande né que a gente só derruba com machado.... e a mata é onde tem os maiores pau que aí só com moto-serra através de moto-serra que você consegue... (ITRM10)

Caribé s.m. [ben.]: Tipo de mingau feito com a farinha peneirada, água e sal.

“L2: bom o <caribé> ((risos)) o caribé é um mingau é um tipo de mingau que você pode colocá o açaí no

meio você pode colocá o leite leite de côco... pra fazê o caribé...” (ITRF2)

Nota: O caribé pode ser misturado a outros ingredientes dentre os quais o leite de vaca ou leite de côco.

Carregador s.m. [com.]: Pessoa encarregada de fazer o transporte das farinhas

comercializadas pelos atravessadores. “L1: mas quem é que quem que se encarrega de carregá as farinhas que vocês vendem daqui até o

barco? [ L2: são os <carregadores> carregadores... L1: eles carregam como? L2: carro-de-mão... L1:

carro-de-mão é? L2: é...”

Casa de farinha s.t.f. [ben.]: Ver. retiro.

Var. (morf.) casa da farinha. “L2: ... aí você no nosso caso nós leva pro pro igarapé bota de molho aí quatro dias a gente vai decasca

aquela mandioca... e trás pro retiro no caso na <casa da farinha> né chega na casa da farinha o que é

que a gente faz... a gente vai... triturá a mandioca... depois metê no tipiti pra espremê...” (ITRM12)

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Casa de farinha mecanizada s.t.f. [ben.]: Pequena casa tradicional com cobertura

de telha ou palha onde ocorre o processo de produção da farinha de mandioca com a utilização de equipamentos movidos a energia elétrica.

“L2: ...um bom escaldamento resolve tudo... porque que hoje a diferença do do tradicional do rodo... pra pras <casa de farinha mecanizada>... o essencial é você escaldá antes de de colocá....” (ITEM1)

Casa de forno s.t.f. [ben.]: Ver. retiro.

“L1: como é que se dá o nome daquele local onde se faz a farinha? L2: retiro... L1: tem ôtro nome ou só retiro? vocês chamam lá como é? L2: chamamo retiro... L1: retiro? L2: é... <casa de forno> né? L1: casa de forno também? L2: é...” (ITRF7)

Casca da mandioca s.t.f. [plant.]: Camada rugosa e externa de cor marrom que

envolve a batata da mandioca.

Var. (morf.) casca. “L2 ... olhando para a mandioca umas tem umas tem a <casca da mandioca> cobertura mais grossa que a ôtra ôtras é mais saliente mais arrepiada... umas cresce em forma mais redonda ôtras mais comprida...” (ITRM6)

Caule da maniva s.t.m. [plant.]: Parte aérea da maniveira de nós salientes por onde

se desenvolve a maniva.

Var. (lex.) corpo da maniva, hacha da maniva, haste da maniva, rama, pau da maniva; Var. (morf.) caule. “L1: corta o que? L2: a árvore da maniva... a manivera né que chama... corta até lá próxima da onde tá mais verde lá separa no monte e tira esse ( ) pra plantá... L1: qual pedaço? L2: o <caule da/da maniva> a manivêra viu... ( ) o corpo que a gente chama né...” (ITRM15)

Nota: É o caule da maniva cortado em pedaços pequenos para servir de sementes para a plantação.

Cavar a cova s.t.v. [plant.]: Processo que consiste em fazer pequenas aberturas rasas

na terra, com auxílio de uma enxada, para serem plantadas as manivas-semente.

“L2: da maniva é um... um teçado pra cortá a maniva... e a enxada pra <cavar a cova> pá botá o pau da maniva dentro pra tapá... são teçado e enxada... lá na hora da...” (ITRM7)

Ceará s.f. [plant.]: Variedade de maniva ou mandioca de polpa esbranquiçada que

possui a estatura baixa, os grelos roxeados e as folhas das manivas esgalhadas com talos avermelhados.

“L2: ela porque... na verdade elas elas... elas são quase igual mas nós que temo acostumado... a maniva pretinha a hacha ela é bem preta... é quase preta... e já a tachí já já tem ôtro modelo a <ceará> também que ( ) pelo menos pela folha...” (ITRM2)

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Cevar a mandioca s.t.v. [ben.]: Processo que consiste em ralar ou triturar a

mandioca para transformá-la em massa para a produção de farinha. “... L1: lá no seu Paulo ali eles fazem assim... [ L2: é:::: assim L1: catitu é um um um... [ L2: é o nome do bicho que que corta a mandioca... L1: certo... L2: conhecido aqui na região... mas ela é ela é pra <cevá a mandioca>...” (ITRM19)

Chanfrado adj. [plant.]: Ver. bico de gaita.

“L2: ... como é que se diz ((risos)) diagos/diagonal ( ) golpe né num é reto é <chanfrado> no caso né...” (ITRM17)

Chanfrar verb. [plant.]: Processo que consite em relizar um corte diagonal no caule

da maniva, produzindo vários pedaços para serem plantados no roçado. “L2: mas ( ) essa... essa senhora que fez o o curso aí com nós ela ensinô pra gente cortá direto não <chanfrá> né... o topo direto né... ( ) que ela ensinô pra gente né aqui...” (ITRM20)

Chapa s.f. [ben.]: Instrumento retangular feito de chapa de ferro com tábuas nas

laterais e utilizado para escaldar e torrar a massa da mandioca no processo de produção da farinha. “L2: não o forno a chapa porque ela é um ela é um material assim quadrado né... você você ela você compra a chapa de lá coloca duas quatro tábuas sendo duas laterais e duas ( ) e o forno já é um material já direito que você só faz fazê a parede do forno né e coloca ele lá...”

Coadora de massa s.t.f. [ben.]: Ver. caixa.

“L2: é::: muitas das vezes a gente usa as duas coisas né usa o tipiti... e usa a prensa aí a a <coadora de massa> e a esfriadêra... e ôtra área que deposita né...” (ITRF4)

Coar verb. [ben.]: Processo que consiste em afinar a massa da mandioca passando-a

em uma peneira. Var. (lex.) peneirar. Cf. beneficiar. “L2: ... feito isso a massa ta feita... ao secar a massa aí a gente vai... peneirar a massa que chamasse <coá> né em outra linguagem o pessoal fala coá coá a massa na peneira... depois de coá a massa na peneira então que a gente vai... colocar no forno pra torrar a massa...” (ITRM11a)

Page 132: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

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Cocho de masseração s.t.m. [ben.]: Ver. masseira.

Var. (morf.) cocho, cocheira. “L2: ... a limpeza do dos equipamentos principalmente os coxos e os fornos... tem que ter o <coxo de masseração> tem que ter o coxo de resfriamento da farinha entendestes... e as vezes ele num... eles chego lá eles como se tivesse ( ) a maioria pega uma vassôra... vassora assim e tá pronto...” (ITEM2)

Cocho de resfriamento s.t.m. [ben.]: Ver. esfriadeira.

“... a limpeza do dos equipamentos principalmente os coxos e os fornos... tem que ter o cocho de masseração tem que ter o <cocho de resfriamento> da farinha entendestes... e as vezes ele num... eles chego lá eles como se tivesse ( ) a maioria pega uma vassôra... vassora assim e tá pronto...” (ITEM2)

Coivara s.f. [plant.]: Processo que consiste em reunir o restante da vegetação, após a

primeira queimada, para requeimá-la e deixar o terreno limpo para a plantação das manivas. Var. (morf.) coivarar, encoivarar, encoivara, encoivaração. “L1: a coivara seria o quê? L2: a <coivara> eh eh já é juntá os pau que se não forem queimado direito pra queimá novamente... requeimá...” (ITEM1)

Consórcio s.m. [plant.]: Sistema de plantio em que se utiliza, numa mesma área, a

plantação alternada da mandioca com outras culturas. Var. (morf.) consorciado. “L2: não... não aqui no Acará... o plantio do inverno geralmente é plantado assim... o milho o arroz depois a mandioca... tá e... se for no no no plantio do verão planta o feijão e a mandioca... que é o que chamam de <consórcio>...” (ITEM1)

Nota: No plantio consorciado utiliza-se alternadamente o cultivo de mandioca, feijão, pimenta do reino e outras culturas agrícolas.

Copa da maniva s.t.f. [plant.]: Parte aérea superior da maniva onde se encontra as

folhagens. Var. (morf.) copinha, copa. “L2 ...aí você pega ela... assim ó... pera lá... aí você aí você faz assim... aí você corta... porque aqui é a <copa da maniva>... aí você pega e você vai amuntiando...”

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Corpo da maniva s.t.m. [plant.]: Ver. caule da maniva.

Var. (morf.) corpo. “L2: não eu não conheço o o eu só sei mesmo que ela de dá os galho né... mas tem o eh a gente chama o corpo o <corpo da maniva> né que é a::: começa partir de um palmo do tronco até no no nesse tripé como eu falava anteriormente esse aí é o corpo da maniva...” (ITRM11b)

Cova s.f. [plant.]: Abertura feita no solo onde se coloca pedaços de manivas para

serem germinadas.

Var. (soc.) suco; Var. (morf.) covinha. “L1: pra plantá maniva... L2: olha a gente usa...primeiramente a gente usa a enxada pra fazê as <cova> né que a gente chama... pra fazê aquela abertura na terra né que é pra colocá... maniva... depois a gente usa o o panêro pa... pa pa juntá os pau da maniva né pa sameá nos buraco e pra ir prantando né...” (ITRM10)

Crivar verb. [ben.]: Processo que consiste em passar a farinha em um crivo para obter

a parte mais fina dos grãos. “L2: o cuí de farinha é só colocá a farinha num crivo e <crivar> ela... fica só o cuizinho mesmo... L1: serve pra quê? L2: eh pra qualquer coisa pra fritá um pêxe pra tomá um mingau pa qualquer coisa...” (ITRM3)

Crueira s.f. [ben.]: Pedaços de mandioca que sobram ao se passar a massa crua na

peneira. Var. (fon.) curera. “L2: depois pega amulece vai... ( ) imprenssa... ( ) no caititu... imprensa.. penéra pra tirar as ferpas.. que eles chama de <cruêra>... e depois vai pro forno torrar... L1: e escaldar? L2: pois escaldar é torrar...” (ITRM5)

Nota: Esses A crueira é usada na alimentação animal ou humana em forma de mingau.

Cuí s.m. [ben.]: Parte fina da farinha, semelhante a um pó, obtida ao passá-la em um

crivo. Var. (lex.) poeira da farinha; Var. (morf.) cuizinho. “L1: o que é como é o cuí da farinha como é que se faz esse cuí da farinha? L2: colocá num crivo cê coá

ela... sai só aquele <cuí> fininho mesmo... bem fino igual um... um pó..” (ITRM20)

Nota: Com o cuí da farinha se faz o mingau chamado caribé.

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Cultivo da mandioca s.t.m. [plant.]: Processo que consite em realizar a plantação

de manivas para a produção de mandioca. “L1: o que que é... processo de desmatamento que o senhô entende? L2: acho que que eu entendo é é aquilo que eu tava falando indagora a roçação né... pra desmatá pra fazê a... <cultivo da mandioca> né...” (ITRM20)

Cupim s.m. [plant.] Tipo de praga que ataca a batata da mandioca fazendo com que

as folhas das manivas fiquem com aspecto amarelado. Cf. praga. “L1: o senhô já enfrentou algum tipo de problema no cultivo da mandioca assim tipo de praga ou doença

que dê que dá na mandioca na na? L2: eh geralmente a gente vem enfrentando aqui a... o <cupim>

né...” (ITRM3)

Page 135: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

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D,d

Decotar verb. [plant.]: Processo que consiste em separar a batata da mandioca do

caule da maniveira ao se fazer o arranque. “L1: é o arranque né? L2: é o arranque... arrancá.... <decotar> que é separar né aqui aqui... tá... L1: decotar é... L2: é... separa aqui ó... deixa esse ôtro galho aqui não precisa e leva esse aqui que presta... assim que é...” (ITRM19)

Dedé s.f. [plant.]: Variedade de maniva ou mandioca de polpa esbranquiçada e que se

destaca pela alta estatura do caule. “L2: olha aqui nos conhece... uma que chamo <dedé>... uma que chamo ma/marapanim que é uma amarela..” (ITRM7)

Deitada adj. [plant.]: Posição estendida e levemente inclinada em que as manivas são

colocadas na cova. “L1: de que forma que deve ser colocada na cova a maniva? L2: é é assim mesma de de <deitada> né ( ) que a cova a gente abre aqui né... a gente põe a maniva aí e puxa a terra em cima fica deitada na terra... no fundo da cova...” (ITRM15)

Derruba s.f. [plant.]: Processo que consiste em retirar de uma área de terra todas as

árvores de grande porte para preparar o terreno onde será realizada a plantação das manivas para o cultivo da mandioca.

Var. (lex.) desmatar; Var. (fon.) derriba, derroba; Var. (morf.) derrubar, derrubação, derrubada, derrubagem. “L1: como é que ocorre o preparo do roçado pra podê pra podê plantá as manivas? L2: broca... aí <derruba>... aí deixa secá aí mete fogo... L1: só? L2: só... L1: depois de colocá o fogo ( )? L2: se queimá feio o caba vai alimpá...” (ITRM8)

Descascar verb. [ben.]: Processo que consiste em retirar a casca da mandioca.

Var. (lex.) raspar; Var. (fon.) decascar; Var. (morf.) descascamento. Cf. beneficiar. L2: tá:: uma das função é arrancá a mandioca né... a gente vai pro roçado a gente arranca a mandioca usa o facão corta pra cortar tirar o pé da mandioca pra poder ele <descascá> a mandioca....” (ITRM11b)

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Desmatar verb. [plant.] Ver. derruba.

Var. (morf.) desmatamento. “L1: o que que é... processo de desmatamento que o senhô entende? L2: acho que que eu entendo é é aquilo que eu tava falando indagora a roçação né... pra <desmatar> pra fazê a... cultivo da mandioca né...” (ITRM20)

Destoca s.f. [plant.]: Processo que consiste em retirar do solo os tocos de árvores que

sobram após a queimada de uma área. Var. (morf.) destocar, destocagem. “L2: a <destoca> depois de queimado... é você destocá o que é que é... o fogo queimô as árvores que tavam no chão porém o toco que sobre tem que fazê a destocagem... tem que tirá mas geralmente se destoca quando vai se prepará com máquina..” (ITRM6)

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E,e

Embalagem s.f. [com.]: Recipiente usado para se colocar a farinha como sacos

plásticos de trinta quilos ou sacos de estopa de sessenta quilos. “L2: ela é passa é tirada no e com vindo no saco grande né de sessenta quilo... quando chega aqui na fera ela passa pra trinta quilo... <embalagem> de trinta quilo... daqui ela vai pra Macapá vai pro Marajó vai pra pra... pra pro as ilha aí as ilha né pa todas essas região a gente vende a farinha...” (ATM3a)

Empreita s.f. [plant.]: Processo que consiste em remunerar o trabalhador rural com

um valor fixo para realizar a operação de preparo da terra para o cultivo da mandioca. L2: é a gente <empreita> a roça pra capiná prantá... L1: como é fazê empreita em? L2: eh a gente empreita a gente pranta aí o cara o dono da roça paga né... (ITRF3)

Enraizar verb. [plant.]: Efeito de desenvolvimento das raízes da mandioca.

Var. (morf.) enraizamento. “L2: ... a parte técnica né o espaçamento a questão de como colocá a maniva no solo porque não é só jogá mas também tem que dá uma condição de ela <enraizar... oferecendo oportunidade de dá mais mandioca mas geralmente o agricultor aqui no Acará ele usa mesmo a questão cultural sem usá a questão técnica...” (ITRM6)

Enviezado adj. [plant.]: Ver. bico de gaita.

Var. (fon.) enviazado. “L1: e como é que é o jeito de fazer o corte de qualquer jeito? L2: é... eu eu corto assim a maniva <enviezado>... L1: ah é enviezado?...” (ITRF3)

Envira s.f. [plant.]: Espécie de vegetal usado como alça em paneiros ou outros

utensílios produzidos para carregar mandiocas ou pedaços de manivas-semente. “L2: paneiro... paneiro né/ paneiro feito de cipó ou de tala é tipo o índio fazia... fazem... que as pessoas fazem (...) num paneiro pequeno coloca uma corda nele a/aliás uma <envira>... e aí enche da dos pauzinho de maniva dentro e vai levando... aí ele vai tirando e colocando nas costa...” (ITRM11a)

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Erva daninha s.t.f. [plant.]: Qualquer espécie de planta que traz danos ao cultivo da

mandioca.

Var. (soc.) capim brabo. “L1: e quais são os tratos culturais recomendados para esses agricultores? L2: basicamente pra mandioca é a capina... é mantê a a mandioca no no... digamos livre né das <ervas daninhas> nas fase dela de crescimento...” (ITEM1)

Escaldar verb. [ben.]: Processo que consiste em mexer a massa da mandioca no forno

ou na chapa com um rodo entre quinze a vinte minutos para deixá-la no ponto de se produzir farinha com grãos finos ou grossos.

Var. (fon.) escardar; Var. (morf.) escaldação, escaldamento.

“L1: e como é que se faz farinha fina e farinha grossa dá pra se fazê uma diferença assim de farinha mais fina uma farinha mais grossa? L2: dá: depende do... do cara se ter a a disposição de de fazê uma mais fina ôtra mais grossa né... porque se ela num num <escaldar> bem no forno...” (ITRM20)

Esfriadeira s.f. [ben.]: Instrumento rústico de madeira em formato côncavo usado

para colocar a farinha para esfriar após o processo de torração.

Var. (soc.) esfriador, cocho de resfriamento. “L2: tem o rodo... tem o rodo de pu... de fazê mexê a farinhae também tem <esfriadeira> que você... depois que você tirá a farinha do forno... nós costumamos dizê que a gente joga... a farinha na esfriadêra... pra esfriá pra depois embalá a farinha... “ (ITRF2)

Esfriador s.f. [ben.]: Ver. esfriadeira.

“L2: “... aí decasca... esprême... côa... coloca no forno e passa quarenta e cinco minuto mexendo no forno né... depois dela torrada tu coloca no <esfriadô> aí traz e coloca no saco...” (ITEM3)

Espremer verb. [ben.]: Ver. imprensar.

“L2: ... aí a partir de quatro dias que as pessoa recarga ela de lá traz pra casa do da ro da farinha né que lá que a gente vai amassá... vai <espremê> penerá e pra jogá no forno pra fazê beneficiá a farinha...” (ITRF4)

Espremedor s.m. [ben.]: Instrumento rústico feito de madeira onde se coloca o tipiti

cheio de massa para ser comprimida e seca.

“L1: depois de amassá? L2: ah depois de amassá o cara tem que enchê lá no tipiti e metê ela no pau no <espremedor> que a gente chama aquela cabeça de pau ( ) se não o cara tem que ter prensa se não é com aquilo...” (ITRM21)

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F,f

Farinha s.f. [ben.]: Grãos de cor amarelado obtido no processo de beneficiamento da

massa da mandioca “L2: ...agora agora se divide por exemplo... a branca depende do do do perparo... se o senhô peraprá a mandioca branca... fazê a <farinha> escardá bem ela né... pra cá pra nossa língua a gente chama é escardá né... coloca o fogo meio quente escarda ela sai amarelo... também... num sai....” (ITRM4)

Farinhada s.f. [ben.]: Produção de farinha em grande quantidade.

“L2: <farinhada> é quando é assim... uma coisa é você fazê uma porção de farinha pra despesa pra bóia... né... a farinhada é quando se vai fazê uma quantia bem maior... essa semana nós vamo fazê uma farinhada então o... o trabalho da família vai ser na farinha...” (ITRM6)

Nota: É na farinhada que o trabalhador rural necessita de mais trabalhadores que o ajude, pois pode começar cedo da manhã e passar o dia inteiro para terminar de torrar toda a massa para produzir farinha.

Farinha d’água s.t.f. [ben.]: Farinha obtida do beneficiamento da mandioca que

passa por um período de três a cinco dias de molho na água do poço para amolecer. Var. (lex.) farinha puba; Var. (fon.) farinha da água. Cf. farinha. “L1: pois é e a farinha d'água? L2: e a <farinha d'água> é essa que nós faz coloca na água... “ (ITRF3)

Farinha de lote s.t.f. [com.]: Farinha comercializada em grande quantidade pelo

mesmo valor e sem um padrão de classificação de grãos ou de cor. Cf. farinha. “L2: farinha de lote... é a <farinha de lote> ela... a farinha que não tem classificação... ela não é classificada ela...” (IATM2)

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Farinha de mistura s.t.f. [ben.]: Farinha produzida com a utilização da mandioca

mole e a mandioca dura.

Var. (morf.) farinha misturada. Cf. farinha. “L1: como é essa farinha com mistura? L2: ela é farinha de primêra... L1: certo mas como ela é feita? a <farinha de mistura>? L2: a gente a a tira da água um pôco e tira o ôtro pôco e rala... rala no ralo mesmo aí mistura a massa uma com a ôtra...” (ITRM24)

Farinha de primeira s.t.f. [ben.]: Farinha produzida com bastante cuidado para que

fique bem torrada e bem feita.

Cf. farinha. “L2: <farinha de primêra> é farinha bem bonita mesmo... bonita... L1: o o... ela é grossa ou é fina ou como é a farinha de primêra? L2: não ela é normal...” (ITRF5b)

Farinha de tapioca s.t.f. [ben.]: Farinha de grãos brancos obtida a partir do

processo de extração da goma da mandioca.

“L1: como é o nome daquela farinha que parece um isopô que tem um grão... parece um granulinho de isopô branca? L2: <farinha de tapioca>... L1: como é que ela é feita? L2: aí você já tem que fazê o seguinte tira a mandioca não leva pra água você raspa e quebra ela...” (ITRM6)

Farinha fina s.t.f. [ben.]: Farinha obtida a partir do processo de escaldamento da

massa da mandioca com o fogo brando e peneirada após o torramento.

Cf. farinha. L2: farinha grossa geralmente a gente... joga a massa com com fogo bem... grande debaixo do forno aí sai aquela farinha grossa no processo de escaldamento dela... aí a fina a gente tem que tirá do forno pá penerá quando ela tá escaldada... aí ela fica uma <farinha fina>...” (ITRM23)

Farinha grossa s.t.f. [ben.]: Farinha obtida a partir do torramento da massa da

mandioca com o forno bem quente.

Cf. farinha. L2: <farinha grossa> geralmente a gente... joga a massa com com fogo bem... grande debaixo do forno aí sai aquela farinha grossa no processo de escaldamento dela... aí a fina a gente tem que tirá do forno pá penerá quando ela tá escaldada... aí ela fica uma farinha fina...” (ITRM23)

Nota: É quando o trabalhador rural deixa o fogo esquentar bem o forno para poder colocar a massa para torrar.

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Farinha puba s.t.f. [ben.]: Ver. farinha d’água.

Cf. farinha. “L2: a <farinha puba> é a farinha que é só da mandioca da água... branca é aquela farinha bem branquinha aquela farinha...” (IATM4)

Farinha pura s.t.f. [ben.]: Ver. farinha seca.

Cf. farinha. “... esses são os passos que tem... dentro de um retiro... é essa a <farinha pura>... L1: o que seria essa farinha pura? e quanto tipo então de farinha tem se já que tem a farinha pura? L2: te a farinha pura tem a farinha seca que não passa pela pela água a mandioca ela vai direto pra... pra ser ralada aí tem que ter um aparelho que é um raladô ou um catitu....” (ITRM6)

Farinha seca s.t.f. [ben.]: Farinha obtida do processamento da mandioca que não

passa por um período de três a cinco dias de molho na água para amolecer.

Var. (lex.) farinha pura. Cf. farinha. “L1: farinha d'água? L2: a farinha d'água é dessa que a gente bota n'água rala a ôtra e e faz e mistura... porque a <farinha seca> é é essa que num vai pra água...” (ITRM7)

Farinheiro s.m. [com.]: Pessoa que compra farinha do atravessador para revendê-la

em feiras livres. “L2: pode dando nomes? L1: não num é o nome das pessoas eh eh quem são elas? são pessoas por exemplo é gerente de Banco? L2: não não não são... <farinheiros> mesmo que a gente chama aqui farinhêros...” (IATM2)

Fazeção da farinha s.t.f. [ben.]: Ver. beneficiar.

L2: são os instrumentos de trabalho utilizados na... aqui na <fazeção da farinha> né na mandioca no processo da mandioca já quando vem da pá vim da roça e depois que tão na roça pra... pra gerá farinha né.. é assim que a gente trabalha né...” (ITRF10)

Fécula s.f. [ben.]: Substância extraída da mandioca utilizada na produção de

alimentos ou na indústria para fabricação de diversos produtos. “L2: é... é bem mais popular e mais vendável inclusive a tachí a gente já tá recomendando que o pessoal plante mais porque ela é mais... ela é mais produtora de de de <fécula> mesmo...” (ITEM1)

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Feira do pequeno agricultor s.t.f. [com.]: Local onde o trabalhador rural leva sua

produção de farinha para negociar com o atravessador.

“L1: ...eh Acará vinte... e três de janêro de dois mil e nove... eh nós estamos aqui no município de Acará... aqui como é o nome desse local? L2: Feira <Feira do Pequeno Agricultor>...” (IATM2)

Feixe s.m. [plant.]: Conjunto de varas de manivas amarradas com cipó.

Var. (fon.) fecho. “L2: olha vai dependê do do do tamanho da pessoa que vai carregá depois pra levá pra dentro da roça... te até de cinquenta de cem maniva oitenta vara né depende do tamanho do <feixe>... pode ser uma de cinco pode ser de dez de quinze vinte tem que conforme o tamanho da pessoa que vai carregá....” (ITRF2)

Fermentar verb. [ben.]: Esfervescência causada pela colocação da mandioca na água

num período de três a cinco dias. Var. (fon.) afermentá. “L1: qual é o nome? L2: puba... a gente colo... descasca ela dura e coloca três dias na água só pra ela <afermentá>... a gente tira assim no caso... e é só esses dois tipo mais que a gente faz...” (ITRM17)

Fornada s.f. [ben.]: Porção de farinha produzida de cada vez.

“L2: ... né essa mesma pessoa que espremê ele cua né...e uma pessoa pra pra mexê as vez precisa de dois mexedô... tem gente que mexe o dia intêro só ele... mas eu eu num tenho muito esse costume a gente tem que arrumá duas pessoa aí o um torrá uma <fornada> vai lá o senhô torra ôtra fornada até acabá...” (ITRM10)

Forno s.m. [ben.]: Instrumento de chapa de ferro, no formato redondo, usado para

torrar a massa da mandioca na produção de farinha. “L2: e tem o forno ou a chapa... o <forno> é aquele redondo a chapa é aquela que usa a...faca de tábua... que é pra torrá...” (ITRM6)

Forno elétrico s.t.m. [ben.]: Ver. forno mecânico.

“L1: mas que tipo de casa de farinha que o senhô fala? L2: é aquela casa que tem o <forno elétrico> que tem os motores que tem o o o a coberta que tem o piso...” (IATM3a)

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Forno mecânico s.t.m. [ben.]: Instrumento de chapa de ferro, no formato redondo,

constituído de um sistema de rodo movido a energia elétrica para mexer a massa da mandioca no torramento da farinha. Var. (soc.) forno elétrico. “L1: e vocês chamam como o nome dessa.... L2: essa aí é a farinha comum né porque tem a farinha pra forofa... outros tipo de farinha aí. L1: qual é o nome desses equipamentos? L2: temos aqui o <forno mecânico>... uma peneira mecânica... esse ali é o catitu... L1: o que é o catitu? L2: que rala a mandioca lá...” (ITRM16c)

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G,g Gaiola s.f. [plant.]: Variedade de maniva e mandioca de polpa amarelada.

L2: ... eh são e tem aqui na amarela ainda tem a <gaiola> sabe na amarela... tá aqui tem agelim é branca também agelim... então esse são variedade de mandioca que a gente... conhece isso com linguagem... de uma região possa que uma ôtra região mude...” (ITRM6)

Goma s.f. [ben.]: Substância viscosa de aspecto transparente e extraída da batata da

mandioca. L2: ...aquele caudo aquele líquido que vai descendo você vai aparando na vasilha aí aquele vai saindo aquele leite né... aí no momento quando aquilo todo senta você derrama a água de cima a <goma> já está embaixo... aí de lá você torna agoá ela torna a passando o pano fino que é pra crassificá tirá a borra...” (ITRF4)

Grão s.m. [ben.]: Ver. Bago.

“L2: ... do bago bem que nós chamamo de bago é o <grão> dela né... caroço bem redondo então existe tipo de penêra tá mas também você pode classificá assim nas no escaldamento...” (ITRM6)

Grelar verb. [plant.]: Processo de desenvolvimento e formação das manivas.

Var. (lex.) brotar; Var. (morf.) grelação. “L1: de maniva o que é olho de maniva? L2: o olho da maniva aqui pra nós e pro povo que que pranta é onde vai nascê onde vai <grelar> na linguagem dele onde vai grelá pra formá nova maniva...” (ITRM11b)

Nota: As manivas possuem pequenos nós salientes envoltos do caule por onde ocorre o processo de germinação da planta.

Grelo s.m. [plant.]: Pequenos nós salientes que envolvem o caule da maniva.

Var. (lex.) bico, bolha, brolho, broto, nó, olho, rebento; Var. (morf.) grelinho. L2: isso é do <grelo> da maniva que grelô... por exemplo assim olha o grelo ele grela assim ó... é assim que ele grela ó... olha ele grela assim...” (ITRF9)

Page 145: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

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Guarumã s.m. [ben.]: Espécie de cipó em que a fibra é aproveitada na produção de

diversos instrumentos usados na roça e na casa de farinha. “L2: antigamente era um probrema viu... antigamente era muito difícil... logo quando eu me entendi o cara fazia a farinha depois fazia uma panêro de <guarumã>... tirava um::: pau que dá no mato o garumã chamado...” (ITRM3) Nota: O trabalhador rural usa o guarumã para produzir paneiros e o tipiti.

Page 146: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

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H,h

Hacha da maniva s.t.f. [plant.]: Ver. caule da maniva.

“L2: é... cortá porque a a maniva é eh... a <hacha da maniva> é cumprida uma umas vara assim... e::: aí a gente o senhô carrega em feche... aí chega lá tem que migá ela tudo assim... os pedaço assim... pa prantá fazê na cova...” (ITRM2)

Haste da maniva s.f. [plant.]: Ver. Caule da maniva.

L2: não pra colhê pra puxá da terra é é só a força só corta a <haste> e fica aquele tipo um um uma parte do caule e aquele caule serve de tipo um um uma forma assim pra puxá né... entendeu tipo um um um apoio pra puxá o que tá debaixo da terra né... (ITEM3)

Page 147: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

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I,i

Igarapé s.m. [ben.]: Pequeno rio de água corrente onde se constrói um poço para se

colocar as mandiocas de molho. Var. (fon.) garapé. L2: ele ( ) por acaso se for eh <igarapé> a gente alimpa uma área né desse igarapé pra que água seja corrente se ela é corrente pra ela ser limpa todo tempo e aí a pessoa deposita lá...” (ITRF4)

Imprensar verb. [ben.]: Processo que consiste em comprimir a massa da mandioca

com a utilização do tipiti ou a prensa. Var. (lex.) espremer; Var. (fon.) prensar. “L2: olha no momento a gente usa as duas ao mesmo tempo né... a gente põe essa pra amolecê vai buscá na roça e raspa tira a casca preta né... lava bem lavada e joga no banco e empurra junto com a mole aí no momento ela já já tão todas duas junta aí vai só... <prensar> espremê ela pra tá...” (ITRF4)

Page 148: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

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J,j

Janduí s.m. [plant.]: Tipo de erva daninha que deixa murcha as folhas das manivas.

“L1: quais são os problemas que pode surgir no cultivo da mandioca? L2: olha... L1: tipo doenças ou pragas? L2: é pode dá assim um um <janduí> né que o pessoal pranta aqui que dá na maniva fica a maniva cascuda... arreia tudinho as folha pra baixo... é isso...” (ITRF3)

Janeiro s.m. [plant.]: Roça de mandioca preparada na temporada chuvosa

compreendendo os meses de novembro a janeiro. Var. (soc.) área de novembro, área de dezembro. “L2: é a gente faz tem o verão que a gente trata aqui como a gente faz verão e o <janêro> né de duas roça... aí o verão é feito na época que tá o sol mesmo... e o janêro é feito na época da chuva já que no caso é esse aqui né... (ITRM17)

Jovença s.f. [plant.]: Variedade de maniva ou mandioca de polpa amarelada, tendo

como característica o caule cinzento e as folhas roxeadas. “L2: é ah essa <jovença> é amarela também ela é não é tanto a amarela mas ela é né...” (ITRF4)

Juquira s.f. [plant.]: Ver. capoeira.

“L2: é isso aí é uma juquira... é a capoêra fina... e ali eh como aqui que tá mais grossa ali... aí já tem que roça...brocá eh eh eh eh pra podê derrubá...” (ITRM2)

Jurubeba s.f. [plant.]: Espécie de erva daninha cheia de espinhos que dificulta o

trabalho de capina executada pelo trabalhador rural. L2: olhe mano a gente... escolhe assim onde tá muito mato a gente evita né e roça em ôtro lugá assim... porque o problema da roça é capina assim ela dá muito esse negócio de <jurubeba>... esse siri que as vez corta a gente tem que trabalhá de manga comprida né...” (ITRF3)

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L,l Lagarta1 s.f. [plant.]: Tipo de praga que rói as folhas da maniva prejudicando o seu

desenvolvimento. “L2: tem um tempo que tem um tempo que dá lagarta... quando ela tá do tamanho daquela que eu tenho ali... ela dá uma lagarta que se o cara num der jeito ela acaba... ela come tudinho deixa rés no chão... uma lagarta que dá...” (ITRM7)

Lagarta2 s.f. [plant.]: Instrumento feito de duas varas de pau utilizado para se colocar

uma caixa de madeira, onde são colocadas as mandiocas, para serem puxadas por animais, geralmente boi ou cavalo. “L2: a larga... a <largata> é ele é um material feito com duas vara colocando travessas que ela e própria pra arrastá no chão tá.. aí engata numa corda essa corda vai ser engatada numa canga no pescoço do boi... e o boi vem andando arrastando essa largata atrás...” (ITRM6)

Lavrador s.m. [plant.]: Ver. trabalhador rural.

“L1: tá... como é que se dá o nome a pessoa que trabalha... com essa atividade? L2: é o agricultô <lavrador> rocêro tem vários vários nomes que a gente dá...” (ITRM6)

Leite da maniva s.t.m. [plant.]: Líquido esbranquiçado que sai pelo caule da maniva

ao se fazer um corte. Var. (morf.) leite. “L2: ... eu não eh a gente vai colocando ela... de um jeito bom pa pa ela grelá rápido... ajeitando ela apertando ela ( ) o senhô coloco a ma/maniva na... na cova... e... e apertá ela lá... que aquele leite... ele que faz enraizá... o leite da o próprio <leite da maniva>...” (ITRM2) Nota: Esse líquido é indício de que a maniva está em boa qualidade para ser plantada e o que faz brotar novas raízes.

Lua minguante s.t.f. [plant.] Ver. quarto minguante.

“L2: ... porque se plantá na lua da quarto-crescente pra lua cheia só cresce a maniva num dá batata... e na qua.. da lua nova pa <lua minguante> a mandioca fica pequena mas a batata dá bem batata... isso aí é dos meus avô e aí passô pros meus pai e... e é uma ciência que vigora...” (ITRM7)

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M,m Macaxeira s.f. [plant.]: Variedade de mandioca com baixo teor de ácido cianídrico,

usada na alimentação humana na forma cozida ou no preparo de bolo.

“L2: ...que é mais escura que dá uma aparência escura né pôca gente gosta daquela farinha né mas tem deles alguns que já preferem mas geralmente é amarela e a branca... mas tem essa essa escurinha também... a <macaxeira>... é bom que a macaxêra ela ela tem uma destinação diferente né a macaxêra é uma...” (ITEM2)

Mandarová s.m. [plant.]: Tipo de inseto que ataca a plantação de manivas

danificando toda a plantação e trazendo sérios prejuízos à cultura. Cf. Praga. L2: olha... nós não temos... nós não temos pra... pragas né tipo assim como o <mandarová>... mas nós temos a... o que tá acontencendo uma ocorrência aqui de... num seria praticamente doença... é uma podridão mole causada pelo excesso de água... é uma é uma amolece...” (ITEM1)

Mandioca s.f. [plant.]: Parte térrea da maniveira onde se desenvolve o fruto.

Var. (lex.) batata da mandioca, batata da maniva, raiz da mandioca; Var. (soc.) tubérculo. “L2: você tem que arrancá ela né ela fica debaixo ela fica como uma batata... você cortô a maniva aparô a maniva você... você arranca ela do da do solo né... ela sai em forma de batata que ela é a <mandioca> é uma batata...” (ITRM12)

Mandioca amarela s.t.f. [plant.]: Variedade de mandioca que apresenta a polpa

amarelada. Cf. mandioca. “L2: eu num sei porque a gente chama de <mandioca amarela>... a gente só conhece ela com esse nome... na lá na minha região né inclusive eh a gente planta bastante lá pra pra vendê no caso de basqueta num vende a mani... a a farinha vende a mandioca mesmo na basqueta...” (ITRF2)

Page 151: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

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Mandioca branca s.t.f. [plant.]: Variedade de mandioca que apresenta a polpa

esbranquiçada.

Cf. mandioca. “L2: ... aí dentro da água ela vai levá de de quatro cinco de quatro dia três dia pra frente ela amolece... aí ne... depois que ela amolece você tira a casca dela joga a casca fora né ( ) a casca serve pr'uma ôtra coisa... aí dessa ma... a mandioca aquela a <mandioca branca> aí você tira e leva pro retiro... (ITRF2)

Mandioca d’água s.t.f. [plant.]: Ver. mandioca mole.

“L2: ... mesmo ela mole... eh eh eh ela num ela... o o motô aquele ralo o catitu do do coisa come tudinho... aí destrói tudinho num fica nada... mas nós aqui... muito aqui num usa nós num usa... é só mesmo a <mandioca d’água> e... a gente amassa ela... e aí fica o talo fica a curêra...” (ITRM2)

Mandioca de verão s.t.f. [plant.]: Mandioca cuja plantação foi realizada no meio do

ano em diante, durante o período do verão. Cf. mandioca. “L2: da mandioca? porque aqui o pessoal eles co eles costumam trabalhá eles costumam trabalhá em dois em com dois tipo de mandioca <mandioca de verão> que é aquele que é plantada de julho em diante...” (ITEM3)

Mandioca dura s.t.f. [plant.]: Batata de mandiocas que não passaram por um

período na água para amolecer. Cf. mandioca. “L2: também também olha tem alguns lugá que já tiro a casca... que ele eles raspo da <mandioca dura> né... pra fazê até secá pra deixá fermentá pra fazê adubo botá em plantas... já tem lugá que faz isso... mas só no meu lugá ainda não...” (ITRM15)

Mandiocal s.m. [plant.]: Ver. manival.

“L2: eu eu chamo <mandiocal> né... eu chamo mandiocal mas o pessoal assim as vez a gente chega me leva na área é conhecido como área área de plantio mesmo....” (ITEM3)

Mandioca mansa s.t.f. [plant.]: Tipo de mandioca com baixo teor de ácido

cianídrico, que serve como alimentação humana e animal na forma in natura.

Cf. macaxeira.

“L2: dá farinha... faz farinha do mesmo jeito... <mandioca mansa> dá comida pra porco a gente cria porco... e faz farinha... ela só é macaxera seis mês.. passou de seis mês ela é mandioca igual a outra... só num/ela não amolece mais para cozinha ela vira mandioca...” (ITRM5)

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Mandioca mole s.t.f. [plant.]: Batatas que foram levadas à água para amolecer num

período de três a cinco dias. Var. (lex.) mandioca d’água; Var. (soc.) mandioca puba. Cf. mandioca. “L2: farinha... farinha com <mandioca mole> né... a gente coloca a mandioca na água... aí de lá tira a mandioca pra ralá e mistura... mistura com a mandioca mole e com a mandioca dura...” (ITRF1)

Mandioca puba s.t.f. [plant.]: Ver. mandioca mole.

“L2: ... durante durante três dias ou quatro dias... tá... e trinta por cento fica aqui aguardando e/essa... essa <mandioca puba> que eles chamam de pubá... pubá seria amolecê né... passa por aquele processo... de amolecê... pra soltá a casca facilmente... tá...” (ITEM1)

Mandioca solteira s.t.f. [plant.]: Plantação de mandiocas sem a consorciação de

outras culturas agrícolas. “L2: bom... a <mandioca solteira> sem cultura no meio... ela se destaca melhor... mas por exemplo com o milho porque que nós plantamos o milho além de tirá o milho além de aproveitá o solo a gente também usa a carrêra do milho pra demarcá espaço de limpeza por exemplo eu vou capinando numa carrêra você vai na ôtra....” (ITRM6)

Mandiocultura s.f. [plant.]: Operações que envolvem o plantio e cultivo da

mandioca. “L2: ... inclusive é desconhecido não não existem remédios pra pra pra esse problema é um problema

sério que a a <mandiocultura> tá enfrentando hoje no não só no Estado mas também no Brasil acho que

no Brasil todo...” (ITEM3)

Maniçoba s.f. [ben.]: Alimento preparado com as folhas da maniva cozidas por vários

dias acrescido de vários outros ingredientes. “L2: serve... por exemplo as folha se você por exemplo... principalmente a macaxêra né... ela serve pra fazê a <maniçoba> que é que é um prato tradicional aqui do paraense pra fazê a maniçoba porém nós usa só da macaxêra né que não amarga... das ôtras maniva pra nós amarga...” (ITRM10)

Maniva s.f. [plant.]: Espécie de planta da qual se origina a mandioca.

Var. (morf.) maniveira. “...L2: não eu considero só a ba... a mandioca só é a batata a ôtra nós nós trata <maniva>... ( ) aquilo

que cresce é a maniva...” (ITRM7)

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Manival s.f. [plant.]:: Extensão de terra onde se encontra a plantação de manivas

para o cultivo de mandioca. Var. (lex.) área da mandioca; Var. (soc.) mandiocal. “L2: primêro... a gente tira ela que se faz uma... hoje a gente já faz nem todo né muitos faz uma seleção de maniva... quer dizê vai num num <manival> onde tá o roçado tem a maniva aí a gente vai selecioná a gente olhando vai verificando aí vai cortando aquelas maniva....” (ITRM11b)

Maranhense s.f. [plant.]: Variedade de mandioca de polpa amarelada.

“L2: tem a... tem a::: a cearense tem a <maranhense>... tem a piriri... tem a::: a jovença tem a branca ôro... tem a marapanim...”(ITRM8)

Marapanim s.f. [plant.]: Variedade de mandioca de polpa amarelada.

“L2: tem no caso a tachí... que eu conheço a <marapanim>... a tapuia uma que trato como arrebenta... tem eh uma tal de vigiense que a gente tem aqui tem várias né que as vez a gente esquece as vezes né...” (ITRM17)

Marreteiro s.m. [com.]: Ver. atravessador.

“L1: quem são as pessoas que compram a farinha? L2: são os <marreteiro>...” (ITRM8)

Massa da mandioca s.t.f. [ben.]: Mandioca já sevada para ser torrada e

transformada em farinha. “L2: a partir daí se lava ela... rala... e depois de ralada espreme no tipiti... depois de espremida no tipiti pra tirar uma parte do tucupi amassa ela amassa a <massa da mandioca>... depois de amassada...” (ITRM11a)

Masseira s.f. [ben.]: Instrumento de madeira em formato côncavo usado para

depositar a massa da mandioca ralada ou triturada no caititu para ser amassada manualmente. Var. (lex.) canoa; Var. (soc.) cocho de masseração. “L2: a cocho que é a <masseira>... chamado de cocho ou masseira...” (ITRM6)

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Masseração s.f. [ben.]: Processo realizado manualmente para deixar a massa da

mandioca pastosa. Var. (soc.) amassar a mandioca. “L2: ...a limpeza do dos equipamentos principalmente os coxos e os fornos... tem que ter o coxo de <masseração> tem que ter o cocho de resfriamento da farinha entendestes... e as vezes ele num... eles chego lá eles como se tivesse ( ) a maioria pega uma vassôra... vassora assim e tá pronto...” (ITEM2)

Migar a maniva s.t.v. [plant.] Cortar o caule da maniva em pedaços para serem

plantados. “L2: eh eh eh de de preferência pra nós aqui é enxada pra... que a gente trabalha faz a cova pra... a enxada o teçado pra <migá a maniva>... e faz pra fazê a cova sabe pra pra prantá assim que a gente... na verdade... ah o nosso serviço aqui é...” (ITRM2)

Miolo s.m. [plant.]: Parte interior do caule da maniva.

“L2: é porque ela as vez dá um mal... aí a gente vai escolhê... ah a maniva... porque a maniva ela tem um negócio dum dum <miolo> por dentro né do pau aí aquela que tivé com aquela massa sadia bem branquinha tá boa e aquela que tivé... já meia querendo apodrecê num presta...” (ITRM8)

Miriti s.f. [plant.]: Variedade de mandioca de polpa amarelada, tendo como

características o caule escuro e bastante comprido. “L2: ah ah <miriti>... a miriti só cresce também uma maniva alta que só...”ITRM17)

Motor s.m. [ben.] Ver. caititu.

“L2: a gente tráz coloca na água... durante cinco dias aí descasca ela... aí leva pa... pro coxo aí amassa

ela quem tem <motor> coloca no catitu rala como eles tão fazendo ali... aí de lá tira...” (ITRM13)

Muda s.f. [plant.]: Pedaços do caule da maniva cortados para servirem de sementes.

“L2: corta lá ela pra tirá a <muda> pa pa pa passá pra ôtra... ôtro pra fazê ôtro ôtra produção...” (ITRM9b)

Munduru s.m. [plant.]: Ver. aturá.

“L2: é nesse aí ó nesse camburão aí... enche o <mundurú> que a gente no... enche lá e joga no coloca num pau e entra debaixo dele e vem... na costa... aí joga lá no rio...” (ITRM21)

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N,n Nó s.m. [plant.]: Ver. grelo.

Var. (morf.) nozinho. “L2: ela é um ela é uma árvore... ela dá eh cheia de... de <nó> né ela é toda cheia de grelos aqueles nozinho... L1: é chamado de que aquilo? L2: é::: é grelo mesmo né...”

NPK sig. [plant.]: Composto químico utilizado como adubo.

Cf. adubo químico. “L2: ... mas só que acontece muito das pessoas não pegarem esse adubo pra aplicá por por não ter hábito por não ter esse hábito então normalmente é feito né é cerca de três meses após a adubação... cerca de cinquenta gramas de <NPK>... adubo químico...” (ITEm3)

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O,o Olho s.m. [plant.]: Ver. grelo.

Var. (fon.) zolho; Var. (morf.) olhinho, olhozinho. “L2: ela é cortada por exemplo na nós plantamos assim a gente dá um espaço de de três ou quatro rebento né onde tem aquele aqueles <olho> que a gente chama o olho da mandi da maniva... aí a gente deixa um dá um espaço assim de um dois ou três até quatro aí corta aí de lá de novo...” (ITRF2)

Ouro preto s.t.f. [plant.]: Variedade de maniva e mandioca de polpa amarelada,

tendo como característica os talos das ramas avermelhados. “L2: tem... tem a suí né... tem a tachí que a gente trata né... é a... a <ôro preto> né que é amarela... tem vários tipos de maniva né... L1: qual é a melhor pra ser plantada? L2: é desse tipo aqui ó...” (ITRM14)

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P,p

Pacuí amarela s.t.f. [plant.]: Variedade de mandioca de polpa amarelada, tendo

como características o esgalhamento das ramas e a estatura alta. “L2: olha nós conhecemos aqui várias aqui nós conhecemos a::: a mitiri conhecemos a irainha conhecemos a branca roxa conhecemos a tachí conhecemos a marapanim conhecemos a pretinha... conhecemos a tucumã... conhecemos a::: <pacuí amarela> pacuí branca e conhecemos mais a...” (ITRM11b)

Pacuí branca s.t.f. [plant.]: Variedade de mandioca de polpa branca, tendo como

características o esgalhamento das ramas e a estatura alta. “L2: olha nós conhecemos aqui várias aqui nós conhecemos a::: a mitiri conhecemos a irainha conhecemos a branca roxa conhecemos a tachí conhecemos a marapanim conhecemos a pretinha... conhecemos a tucumã... conhecemos a::: pacuí amarela <pacuí branca> e conhecemos mais a...” (ITRM11b)

Palheta s.f. [ben.]: Ver. rodo.

“L2: aí vai pro forno aí do forno se usa o rodo que é pra mexê que a gente chama aqui que alguns chamam <palheta> mas a gente no nosso linguajá aqui é o rodo cabo do rodo mesmo... usa o rodo e leva em torno de uma hora... quarenta e cinco minuto cada fornada em cada fornada sai... a gente faz trinta quilo de farinha em cada fornada...” (ITRM12)

Pancuã s.m. [plant.]: Tipo de vegetação rasteira que sufoca a plantação de manivas

prejudicando o deenvolvimento da mandioca. Cf. erva daninha. “L1: e que tipo de mato é que sufocaé que dá mais problemas assim... que nasce no meio da mandioca

que tem que capiná? L2: olha tem vários tipo de mato né inclusive o <pancuã>... é um dos mato que

ele... ele sufoca mais a maniva... a mandioca...” (ITRM20)

Pau d’arco s.t.f. [plant.]: Variedade de mandioca de polpa amarelada.

“L1: aquela ali olha essa cor essa grande aí já é diferente... L2: essa aqui é <pau d'arco>... L1: a pau d'arco ela ela * L2: amarela... L1: ela é amarela é? L2: é...” (ITRM13)

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Pau da maniva s.t.m. [plant.]: Ver. caule da maniva.

“L2: a gente faz a famosa eh cova pra nós é cová né a gente pega a enxada corta assim... e fazê uma fala bastante... eh digamo assim grande né que é pra cabi os dois pau <pau da maniva> tem essa coisa por exemplo... tem um pessoal que dizem que a gente prantando um pau de maniva né...” (ITRM10)

Pé da mandioca s.t.m. [plant.]: Ver. tronco da maniva.

“L2: arranca com a mão mesmo... que a a terra tando mole... é o o costume da gente é assim todo tempo arrancado com a mão pega... o <pé da mandioca> e arranca...” (ITRM20)

Pé da maniva s.t.m. [plant.] Ver. tronco da maniva.

“L2: tem... tem...colocando sempre o final do do do... do buraco pro lado do <pé da maniva> que é pra

podê mandioca crescer pra dentro da terra...” (ITRM6)

Pele s.f. [plant.]: Cobertura fina que fica entre a casca e a polpa da mandioca.

Var. (morf.) pelinha. “L2: a <pele> aí é uma é uma que dá por cima da mandioca... porque a mandioca ela tem ela ela ela tem três camada né ela tem a mandioca que é a massa ela tem a a a a pele né...” (ITRM10)

Peneira s.f. [ben.]: Instrumento em formato de tela e usado para coar a massa da

mandioca depois de prensada. “L2: ...feito isso a massa ta feita... ao secar a massa aí a gente vai... peneirar a massa que chamasse coá né em outra linguagem o pessoal fala coá coá a massa na <peneira>... depois de coá a massa na peneira então que a gente vai... colocar no forno pra torrar a massa...” (ITRM11a)

Peneira mecânica s.t.f. [ben.]: Tipo de peneira movida por motor elétrico, onde a

farinha torrada vai saindo do forno e sendo peneirada para que os grãos fiquem homogêneos.

“L2: temos aqui o forno mecânico... uma <peneira mecânica>... esse ali é o catitu... L1: o que é o catitu? L2: que rala a mandioca lá...”(ITRM16c)

Peneirar verb. [ben.]: Ver. coar.

Var. (morf.) peneiramento. Cf. beneficiar.

“L2: isso na fabricação da farinha a gente utiliza o machado... que é pra partir da lenha... a gente utiliza::: lá o forno né... utiliza o:: o rodo que é pra mexer a farinha... e utiliza o tipiti pra espremer a massa e a peneira pra <peneirar> que é coar a massa...” (ITRM11a)

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Plantio itinerante s.t.m. [plant.]: Sistema de plantio que consiste em usar o terreno

para plantação das manivas em partes. É quando o agricultor roça uma área para o plantio, depois outra e assim sucessivamente até voltar a plantar novamente na primeira. “L2: tá veja bem eh essa inda é é uma grande... a gente tem como um entrave não uma grande resistência... do produtor... porque.... porque ele tem a mandioca como <plantio itinerante>...” (ITEM1)

Plantio no toco s.t.m. [plant.]: Sistema de plantio que consiste em usar o terreno

para plantação das manivas sem a retirada dos tocos que restaram da vegetação após a queimada. “L2: é esse <plantio no toco> é... que a gente faz mesmo no... com os toco na roça né... é a roça é feita só é com queimada esse é o plantio é no toco... L1: devido a falta de máquina né... L2: de máquina isso pra tirá os toco né...” (ITRM16b)

Poço s.m. [ben.]: Pequeno cercado feito num igarapé onde as mandiocas são

colocadas de molho para amolecerem durante um período de três a cinco dias. Var. (lex.) puçu. “L1: e no quando é feito no no garapé ele... ele finca no no meio do rio mesmo? * L2: não não não * L1: ou como é feito? L2: feito <poço>... a gente chama poço aí cerca aquela... aquela lateral aí joga dentro [ L1: do rio na lateral dele * L2: é é pra num ficá... porque se não a água leva tudo...” (ITRM21)

Podridão s.f. [plant.]: Doença que atinge a mandioca devido o excesso de água no

solo. L2: olha... nós não temos... nós não temos pra... pragas né tipo assim como o mandarová... mas nós temos a... o que tá acontencendo uma ocorrência aqui de... num seria praticamente doença... é uma <podridão> mole causada pelo excesso de água... é uma é uma amolece...” (ITEM1)

Poeira da farinha s.t.f. [ben.]: Ver. cuí.

“L1: e o que é o cuí de farinha? como é que eu como é que se faz o cuí de farinha e pra que serve? L2: cuí da farinha serve pra várias coisa né... serve pra fazê um... mingau... um caribé né... é da <poêra da farinha> né...” (ITRM14)

Porrete s.m. [ben.]: Bastão de madeira de pontas grossas utilizado para socar

pedaços de mandioca que não foram triturados. “L2: tam a massêra tem o tipiti tem o machado tem... inda tem o <porrete> que a gente bate a mandioca quando ela não amu... ((risos)) quando ela não amolece direito aí você usa tipo um soque que a gente chama porrete é soque...” (ITRF2)

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Praga s.f. [plant.]: Insetos ou ervas daninhas que pejudicam a plantação de manivas e

o desenvolvimento das mandiocas. “L2: a <praga> ela as vezes ela é controlada pela... pela própria natureza né porque tem inimigos naturais dela que vão e controlam também...ou seja ela num as vezes ela num se alastra né... L1: certo... L2: acontece assim loca no localizado ( )...” (ITEM2)

Prensa s.f. [ben.]: Instrumento rústico feito de pau onde se coloca o tipiti cheio de

massa de mandioca para ser comprimida e seca. “...L2: ...a gente vai decascá... amassá ela pa botá na <prensa> ou no tipiti... pa espremê ela pa coá a massa... depois dela coado passada na penêra... aí o senhô vai jogá no forno pa mexê ela ir mexendo pa fazê a farinha...” (ITRM2)

Pretinha s.f. [plant.]: Variedade de mandioca de polpa branca e folhas escuras. “L2: é creme melhor dizendo é creme... agora branca tem a a branca roxa tem a <pretinha>... tem a a::: a branca roxa tem a a... a tachí essas umas todas são brancas eh branca... a tapioquêra é branca... tem a branquinha também que eu num citei antes é branca também...””(ITRM11b)

Primeira roça de verão s.t.f. [plant.]: Ver. verão.

Var. (morf.) primeira roça. “L2: é do mês de... ah aqui a gente usa assim a gente faz a roça de verão... a roça de verão é a do mês de maio em diante... aí a gente faz ( ) o mês sempre a gente usa... aí junho julho ...a gente queima faz uma <primêra roça de verão>... e aí... e aí já a segunda já é pa pa janêro...” (ITRM2)

Primeira capoeira de mata s.t.f. [plant.]: Ver. capoeira.

“L2: eh capoêra grossa é um um é é é uma entre a capoêrinha e o capoêrão né... que dá uma... uma média de grossa... que a gente primêra a capoêra de mata... a gente roça a mata né... derruba... e aí quando a... aquele mato levanta que chama de <primeira capoeira de mata>... é já é a é a melhor... a melhor a melhor terra pra se... se prantá a mandioca...” (ITRM10)

Produtor s.m. [plant.]: Ver. trabalhador rural.

“L1: existe assim algum tipo de sistema de plantio que é recomendado que você utiliza ah:: tem um tipo de sistema próprio pra fazê essa plantação... L2: nã:::o [ L1: de mandioca... [ L2: não oh::: esse sistema eh::: eh funciona assim... que tem gente que tem um cada <produtor> tem um sistema...” (ITRM19)

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Puxador s.m. [com.]: ver. atravessador. “L2: ah a gente somos os puxadores que no caso é os atravessadores... L1: eh... [ L2: aqui que chama <puxador> mas puxadô de farinha só que o nome certo é atravessador...” (IATM2)

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Q,q Quarto minguante s.t.f. [plant.]: Fase da lua que deixa as manivas com um menor

porte e maior produção de mandioca. Var. (lex.) lua minguante. “L2: é tem gente que ( ) que prantando a manina no quarto crescente a maniva crece mais... aí prantando em <quarto minguante> a maniva dá mais baixa... cresce menos... “ (ITRF5b)

Quebrar a mandioca s.t.v. [ben.]: Ver. triturar.

“L2: no catitu no caso vai pro catitu que é pra triturá a mandioca que pra <quebrar a mandioca> no caso... aí mete no tipiti espreme ela... aí vai pra penêra que é pra penérá pra cuá pra... desfazê a....” (ITRM12)

Quecuio s.m. [plant.]: Variedade de capim rasteiro que dá no pé da maniva

dificultando a retirada da mandioca na época do arranque. Cf. erva daninha. “L1: tipo o que? L2: o quecuio... L1: o que é isso? L2: <quecuio> é um capim que o boi come que dá rasteiro assim ( )ele tem uma...” (ITRM10)

Queimação s.f. [plant.]: Processo que consiste em colocar fogo na roça para

preparar a área do plantio das manivas. “L2: é a primêra coisa do roçado... é o primêro serviço do roçado... o segundo vem a derrubação... o segundo vem a <queimação> da queimação vem a envoivaração... da encoivaração que vem a prantação e da prantação vem a capina que é pra nós...” (ITRM21)

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R,r Raiz da mandioca s.t.f. [plant.]: Ver. mandioca.

Var. (morf.) raiz. “L2:... a podridão da <raiz da mandioca> né... leva... a produção praticamente a zero quando essa essa doe... esse mal essa doença então a escolha do eles ele o agricultô mesmo que faz né... com essas orientações que ele já ele já ele já internalizô essas orientações entendeu.... mas as vez eles num tem opção...” (ITRM13)

Ralador s.m. [ben.]: Ver. ralo.

“L2: te a farinha pura tem a farinha seca que não passa pela pela água a mandioca ela vai direto pra... pra ser ralada aí tem que ter um aparelho que é um <raladô> ou um catitu... algo que vai ralá tem também até um ralo de mão mas esse aqui é mas pra... pra pôca quantidade...” (ITRM6)

Ralar verb. [ben.]: Processo que consiste em passar a mandioca no ralo para

transformá-la em massa. Cf. sevar a mandioca. “L1: existe ôtro tipo que o senhô conhece? L2: existe que tem muitos que trabalha com essa farinha valadá que que é colocado na água eh... com três dia tira pa <ralar>... pa passá metê no catitu sabe no ralo pa... pa sevá ela... pa ralá ela... aí ela faz sai uma farinha assim quase seca...” (ITRM2)

Ralo s.m. [ben.] Instrumento feito de lata de manteiga cheio de furos utilizado para

ralar a mandioca. Var. (morf.) ralador. “L1: então são esses os objetos que o senhô... utiliza? L2: uhn? L1: são esses os objetos que o senhô

utiliza? e quem não tem um motô que o senhô fala e aí como é que faz? L2: faz no <ralo>...” (ITRM8)

Rama s.f. [plant.] Ver.caule da maniva.

“L2: ... ela num tem semente é ela mesmo é o pau da maniva que dá o que dá a <rama>... que dá o gre...

que dá a mandioca dela que sai a árvore...” (ITRM12)

Page 164: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

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Raspar verb. [ben.]: Ver. descascar.

“L2: ...a que a qoue não se coloca na água você tira a mandioca da água e traz direto pro retiro onde você vai <raspar> ela você vai decascá ela entendeu... e aí vai triturá ela no catitu... e daí espremê e fazê a farinha que é a farinha seca que a gente chama...” (ITRM12)

Rebento s.m. [plant.]: Ver. grelo.

“L2: ...então são são vários tipo tem o chapéu de sol porque são vários tipos de maniva... de nome né que que a gente conhece... chapéu de sol ele já é meio amarelo a casca da maniva... aí tem os nozinho onde brotam os <rebento> pra... formá uma nova maniva...” (ITRF2)

Retiro s.m. [ben.]: Pequena casa tradicional com cobertura de telha ou palha onde

ocorre o processo de produção da farinha de mandioca. Var. (lex.) casa de farinha, casa de forno. “L1: como se dá o nome do local onde se produz a farinha? L2: geralmente é <retiro> casa de farinha

mas mais se conhece por retiro...” (ITRM11b)

Roça s.f. [plant.]: Pequena área de terra onde o terreno foi preparado para o cultivo

da mandioca. Var. (morf.) roçado. L2: olha a gente a gente desde ( ) pa roça né... depois que queima... a gente tira alguns galho que fica né na roça aí depois começa a prantá né... pranta a <roça> depois com..” (ITRM4)

Roçar verb. [plant.] Ver. broca1.

Var. (morf.) roçação, roçagem. “L2: a função que a gente exerce... é que a gente tem que trabalhá direto nela como por exemplo prepará primêro <roçar> o terreno entendeu... depois vem a derriba... e depois a gente queima isso aí é a nossa função braçal mesmo...” (ITRM12)

Rodete s.m. [ben.]: Peça roliça do caititu que tritura a mandioca.

Var. (lex.) tarisca. “L1: o que é que só que tem lá que o senhô falô? só tem o que? L2: só tem o <rodete> lá... L1: ah tá o rodete serve pra que? L2: pá cortá a mandioca... L1: o senhô coloca ela lá e ela vai... L2: é mas só com motô num tem motô...” (ITRM24)

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Rodo s.m. [ben.]: Instrumento de madeira usado para movimentar a farinha no forno.

Var. (lex.) palheta. “L2: ... aí lá na chapa a gente precisa do do <rodo> que a gente chama pra lá nós chama rodo pra podê mexê com aquela massa dentro... aí eu ainda até que... depois que tá enxuto ( ) tá torrada a gente tira de lá e coloca numa caixa coloca em cima de um pano... aí depois ensaca pra vendê...” (ITRM4)

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S,s Sacador s.m. [plant.]: Pessoa encarregada de realizar a colheita da mandioca.

L2: é tô fazendo a raspagem [ L1: a senhora foi foi contratada pra isso? L2: é não a gente a gente é <sacadô>... nós saca a mandioca na roça pra ele aí pro fulano né...” (ITRF3)

Sacar verb. [plant..]: Ver. arranque.

“L2: ...aí tem o canto de... essa aqui eu dei três alimpa nela mas foi sacada no limpo no limpo aí... ainda... se o cara sacava mandioca aí os meninco viero <sacar> mandioca aí achava muito bom sacá mandioca... tava no limpo...” (ITRM7)

Saúva s.f. [plant.]: Tipo de formiga que corta as folhas das maniveiras causando

prejuizo à lavoura.

Var. (fon.) saúba. Cf. praga. “L2: é o cupim geralmente dá o cupim na maniva embaixo da terra entendeu... é uma das pragas que geralmente mata roça inteira entendeu é o cupim... a <saúva> também dá ataca muito a maniva mas e na maniva que ela...” (ITRM12)

Semente s.f. [plant.]: caule da maniva cortado em pedaços para serem plantados em

covas e dele germinar novos frutos. “L2: o espaçamento seria o o eh o espaço entre uma planta e ôtra que no caso pode variá de sessenta a um a um metro de sessenta centímetro a um metro... entendeu a a a escolha da <semente> que a gente fala são são as haste as parte que devem ser cortada e no caso são as parte intermediária da..” (ITEM3)

Suco s.m. [plant.]: Ver. cova. “L2: tá eles usam eles usam muito a enxada mesmo.... porque na largura da enxada eles fazem um sucuzinho... <suco> suco seria buraco...” (ITEM1)

Suí s.f. [plant.]: Variedade de maniva e mandioca de polpa amarelada, tendo como

características os grelos do caule bastante próximos. “L2: não a <suí> a gente conhece atraves da maniva né através da mandioca também porque a... a suí o o aquele olhinho dela e mais perto um do otro de que a pretinha a pretinha tem mais é mais espaçoso também ela cresce mais alta do que a suí de que a suí...” (ITRM13)

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T,t Tachí s.f. [plant.]: Variedade de maniva e mandioca de polpa amarelada, tendo como

característica não ser esgalhada. “ L2: que nós temo usando aqui é aquela a ceará e a e a e a pretinha quer dizê a <tachí>... e ama e a maniva amarela que a gente... que a gente usa aqui... que a gente vende que... a gente deixa amadurecê e é só ensacá e levá pra Belém...” (ITRM2)

Tachizão s.f. [plant.]: Variedade de maniva e mandioca de polpa amarelada, tendo

como característica ser bastante esgalhada. “L2 ... ó essa aqui essa aqui é o <tachizão>... por que que é tachizão? ela num é a tachí vovó falada que a gente chama tachí vovó ela vai esgalhando ela fica assim toda encaneladinha igualuma cobra mas ela... (ITRF10)

Tachí vovó s.t.f. [plant.]: Variedade de maniva e mandioca de polpa amarelada,

tendo como característica o caule e as folhas bem finos. “L2: a pretinha ela tem a folha bem verde e o olho dela também continua verde igual a folha... a <tachí vovó> ela é bem... bem fina o caule dá os galho incriquilhado e a folha bem fininha também estreita...” (ITRM6)

Talo s.m. [plant.]: Fibra comprida que se encontra na parte interna da mandioca.

“L2: na hora de de de amassá é mais o <talo>... o talo é jogado fora... o talo dá por dentro da da mandioca... de comprido... então é jogado fora a cru... a cruêra ela é aproveitável...” (ITRM6)

Tamatá s.f. [plant.]: Variedade de maniva utilizada para extração do tucupi, tendo

como característica o caula bastante escuro. “L2: a <tamatá> ela é mais pra tirá o... essa é feita pra tirá o tucupi né mas ela é conhecida pelo caule dela que muito escruto quase negro...” (ITRM6)

Tanque s.m. [ben.]: Reservatório de água construído de cimento para colocar a

mandioca de molho. “L2: olha a gente... a gente coloca na água do rio... né ou a gente faz um um <tanque> de cimento né pode colocá também... e pode fazê também no poço né...” (ITRM10)

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Tapuia s.f. [plant.]: Variedade de mandioca com a polpa de cor creme.

“... a <tapuia> ela num num é dizê assim amarela é creme ela ela num é totalmente amarela sabe... a:: braca roxa é branca...”(ITRM17)

Tarisca s.f. [ben.]: Ver. rodete.

“L2: <tarisca> é uma bola que é comprada... ela já vem desse tamanho assim a com aqueles ralinho tudinho aqueles bico... aí o pessoal bota no aí liga no motô com aquela pulia né aí põe a... uma coisa uma correia aí ela funciona rodando você encosta a mandioca nela ela vai cevando...” (ITRF4)

Tina s.f. [ben.]: Bacia feita de borracha de pneu utilizada para colocar água para

amolecer ou lavar a mandioca, Var. (lex.) bacia de pneu. “L1: mas para amolecê a mandioca além da água do rio você pode a gente pode utilizá um ôtro local para pra amolecê? L2: pode... a gente sempre faz <tina>... tanto que [ L1: faz o que? L2: faz uma tina de pneu né e coloca dentro... quando não a gente faz um tanque de de de cimento e pode colocá também...” (ITRM22)

Tipiti s.m. [ben.]: Espécie de cesto comprido usado para comprimir a massa da

mandioca, deixando-a seca e extraindo-se o tucupi. “L2: eh ah a mão pa descascá e a massêra pa amassá que é uma massêra grande né... a gente amassa tipo quem vai fazê o pão né... amassa e depois tem o <tipiti> chamado...” (ITRM3)

Tiririca s.f. [plant.]: Variedade de mato cortante que se desenvolve na altura das

manivas dificultando o processo de capina. Var. (morf.) tiriricão. Cf. erva daninha. “L2: olha é se for na área de... capoêra dá sempre é é vara branca né... dá muito esse negócio de

<tiririca>... são esses tipos de coisa se for na área de mata sempre dá espinho muito espinho...” (ITRF4)

Torrar s.f. [ben.]: Processo que consiste em jogar a massa da mandioca no forno

durante quarenta a cinqüenta minutos para ser remexida e transformada em farinha.

Var. (soc.) torrefação, torragem; Var. (morf.) torração, torramento. “L2: ... quando coloca no tipiti espreme tudinho ela até enxugá de lá tira coloca na penêra... aí cua ela aí faz é levar pro forno... pra <torrar> farinha...” (ITRM13)

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Torragem s.f. [ben.]: Ver. torrar.

“L1: é porque eu verifiquei ali eu tinha uns umas farinhas mais... pequenas e ôtras mais eh isso tem diferença como é que L2: não não o o produ... procu.. o consumidô quase num procura por grossura ele procura por gosto e torramento... <torragem>... (IATM3a)

Torrefação s.f. [ben.]: Ver. torrar.

“... ah então antes antes da da secagem que no caso seria o que é seria a <torrefação> lá o preparao da farinha... nada mais e do que você desidratá aquela matéria... tirá toda água dali... até torrá... até ficá no no ponto pra ser... eh comestível né...” (ITEM1)

Trabalhador rural s.t.m. [plant.]: Pessoa encarregada de realizar as tarefas

relacionadas à agricultura. Var. (lex.) agricultor, lavrador. “L1: o agricultô né? L2: é... L1: tá certo... pra o senhô o senhô se considera <trabalhador rural> ou produtô rural? L2: eu sô trabalhadô rural... L1: o senhô:: [ L2: trabalhadô ( ) na nasci lutando com enxada com os teçado e machado pá...” (ITRM21)

Triturador s.m. [ben.]: Ver. caititu.

“L2: ...você leva pro pro... pro igarapé ou pro tanque aí leva quatro dias pr'ela amolecê no momento que ela amolece você vai decascá ela... você tráz pro retiro passa no... no <triturador> que é o o catitu...” (ITRM12)

Triturar verb. [ben.]: Processo que consiste em passar a mandioca no caititu para

transformá-la em massa.

Var. (lex.) quebrar a mandioca. Cf. sevar a mandioca. “L2: ... e aí vai <triturar> ela no catitu... e daí espremê e fazê a farinha que é a farinha seca que a gente chama...” (ITRM12)

Trocação de dia s.t.f. [plant.]: Ajuda mútua entre os trabalhadores rurais para

desenvolverem os trabalhos da roça e do beneficiameto da farinha. “L2: é... existe muita <trocação de dia>... L1: a trocação de dia seria o quê então? L2: trocação de dia ( ) vem hoje um me ajudá... aí se eu num for amanhã depois eu vô ajudá ele pagá aquele dia que ele me ajudô... é assim...” (ITRM8)

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Tronco da maniva s.t.m. [plant.]: Parte baixa da maniva que divide a raiz e o caule.

É onde o trabalhador rural pega para fazer o arranque da mandioca do solo. Var. (lex.) cambão, pé da mandioca, pé da maniva, tronco da mandioca; Var. (morf.) tronco. “L2: tá mito dura... e aí se você butá ela assim deitadinha e a cova sendo cavada assim... aí você... quarqué um <tronco da maniva> cê pode pegá puxá e retirá...” (ITRF6)

Tronco da mandioca s.t.m. [plant.]: Ver. tronco da maniva.

“L2: não é a mesma coisa.. a mesma coisa porque quando se fala maniva uma roça de maniva né quando eu falo manivêra é quando eu quero separá do <tronco da mandioca>... mas a maniva é o caule... é a mesma manivêra... mesma manivêra...” (ITRM6)

Tubérculo s.m. [plant.]: Ver. mandioca.

“L1: certo... L2: várias bolhas que o pessoal inclusive chama de olhos olho né... ti eh tipo coisa como é... nós nós... e a a a a própria a a raíz né que muitos falam que é <tubérculo> não não consideram como raíz...” (ITEM3)

Tucupi s.m. [ben.]: Suco extraído da mandioca que serve como tempero ou preparo

de vários alimentos. “L2: olha a gente varia a gente pranta um bocado duma um bocado d'ôtra... que as vez o cara quer um <tucupi> a gente vai e tira da mandioca bem amarela... porque a branca num presta pra tucupi... as vez o cara quer o tucupi a gente vai e tira...”

Tutano s.m. [plant.]: Substância mole encontrada no interior do caule das manivas.

“L2: o <tutano> da maniva fica no meio dela né... então fica bem no meio é uma parte mole e nessa parte mole as vez dá da broca né tem uma broca que ela vai fura a maniva ela ela passa a convivê e se alimentá desse tutano né...” (ITRM10)

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V,v

Vassoura s.f. [ben.]: Instrumento feito de variados tipos de cipó ou de cacho de açaí

utilizado para limpar o forno de farinha. “L1: tem mais o que o tipiti? L2: é o tipiti o tipiti o senhô sabe se num tivé o tipiti você num... num vai

fazê nada... só se você tivé imprensa a imprensa ( ) impressado... L1: e eu já vi também um negócio

dumas vassorinha pra que serve ( )? L2: ah aquela <vassôra> é de varrê a farinha muita torrada varrê o

forno...” (ITRM21)

Verão s.m. [plant.]: Roça de mandioca preparada na temporada de estiagem da chuva

compreendendo os meses de junho e julho. Var. (lex.) primeira roça de verão. “L2: é a gente faz tem o <verão> que a gente trata aqui como a gente faz verão e o janêro né de duas roça... aí o verão é feito na época que tá o sol mesmo... e o janêro é feito na época da chuva já que no caso é esse aqui né... L1: eh tu conheces o que é maniva porque tu trabalhas com isso também né? L2: unhun...” (ITRM17)

Page 172: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

172

CONSIDERAÇÕES REFLEXIVAS

Qualquer trabalho no âmbito do léxico especializado requer do

pesquisador uma investigação acurada e consciente dos propósitos a serem

alcançados. No nosso caso, em particular, partimos do pressuposto de que se fazia

necessária a elaboração de um glossário socioterminológico da cultura da farinha na

Amazônia paraense, proveniente da modalidade oral, uma vez que o registro desse

léxico de especialidade poderá contribuir para a divulgação do conhecimento popular

oriundo de atividades tradicionais em nossa região.

O percurso que trilhamos, para a realização desse trabalho, encaminhou-

nos a considerar a óptica das abordagens socioterminológica (GAUDIN, 1993, 2003;

FAULSTICH, 1995, 1996, 1999, 2006) e da Terminologia Cultural (DIKI-KIDIRI, 2002,

2007), porque melhor respondia aos anseios da nossa pesquisa. Enfatizamos, então, o

princípio da variação como ponto fundamental para elaboração de uma obra

terminográfica e os termos inseridos num contexto de uso social, histórico e cultural.

Assim, realizamos a observação e a descrição dos processos que envolvem o ciclo de

produção da farinha no município de Acará – Pará, com o objetivo de resgatar o ponto

de vista sociocultural em que os termos estão imersos.

A metodologia do trabalho de campo propiciou um melhor conhecimento

da área em estudo, principalmente por termos considerado o ponto de vista

etnográfico (FAULSTICH, 1995, p. 287). No momento em que nos fizemos presente, in

loco, pudemos interagir e perceber a dinâmica pela qual o homem do campo constitui

o seu saber. O trabalho de recolha de dados, portanto, fez-nos adentrar no universo

em que se encontram os trabalhadores rurais para que melhor pudéssemos apreender

os domínios da atividade especializada em questão. Daí considerarmos que o ciclo

produtivo da farinha compreende três fases: o cultivo de mandioca (plantação), o

processo de produção da farinha (beneficiamento) e a renda que o trabalhador rural

pode gerar dessa atividade (comercialização).

Ainda pudemos perceber que o cultivo da mandioca, para a produção de

farinha, está presente no dia-a-dia do trabalhador rural acaraense. Raramente

encontra-se uma propriedade em que não haja uma área reservada para a plantação

Page 173: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

173

dessa raiz tuberosa. Em todas as propriedades visitadas sempre havia a figura de um

“retiro”, como chamam os trabalhadores rurais para “casa de farinha” ou “casa de

forno”. O retiro representa, para as comunidades rurais, uma forma de sustento e de

renda para a família, além estar no imaginário sociocultural e na construção da

identidade desses povos.

De posse dos registros orais, recolhidos na pesquisa de campo, realizamos

o tratamento dos dados por meio de recursos computacionais para esse tipo de

pesquisa. Com a utilização das ferramentas informatizadas do Transana, acreditamos

ter realizado uma transcrição mais eficaz dos dados e com a utilização do WordSmith

Tools, uma extração e análise semi-automática mais precisa e confiável dos termos.

Fizemos o possível para repertoriar os termos contextualizando-os com o

ambiente em que circulam. Para isso, nos detemos numa proposta terminográfica em

que a macroestrutura e microestrutura do glossário pudessem incluir os fenômenos

sociais, culturais e lingüísticos do domínio da atividade de produção da farinha. Dessa

forma, o fenômeno da variação se fez presente à medida que o glossário previu tal

possibilidade, necessária na obra socioterminográfica. Quanto ao tratamento às

variantes fonéticas e morfossintáticas, embora tenhamos optado em não as constituir

como entradas independentes no glossário, também não as deixamos de considerar,

pois são marcas do universo discursivo e do saber popular. Além do mais, entendemos

que essa escolha não tenha acarretado prejuízos, em decorrência do público-alvo, na

constituição do glossário.

O repertório terminológico do glossário foi composto por 266 termos, a

partir da freqüência de uso, da pertinência temática, da pertinência pragmática e da

fiabilidade (BARROS, 2004, p. 194-195; KRIEGER & FINATTO, 2004, p. 138-140), o que

nos garantiu mais segurança na seleção das unidades terminológicas. Quanto a essa

questão, a nosso ver, afirmar que um termo seja realmente um termo não é algo tão

fácil. Nesse tipo de tarefa é necessário que o pesquisador socioterminólogo tenha

parâmetros que o ajudem a entender o seu uso no contexto discursivo. Foi dessa

forma que nos propusemos a analisar os dados orais da nossa pesquisa a partir de uma

seleção semi-automática do WordSmith Tools e finalmente colocar cada unidade

terminológica a teste.

Page 174: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

174

Com tudo isso, podemos dizer que estamos conscientes de que o nosso

trabalho não se esgota nessas páginas, pois há, ainda, muito por fazer. Acreditamos ter

dado um primeiro passo em direção a um mundo fascinante que envolve a história e o

saber cultural de uma comunidade. Na realidade esse momento inicial somente aguça

as nossas idéias de que outros desdobramentos sejam necessários nesse campo de

estudo socioterminológico e cultural. A constituição de outro corpus de estudo para

contrastar com o que já exploramos, por exemplo, poderia trazer resultados

interessantes do ponto de vista da variação topoletal, já que a atividade especializada

de produção da farinha é uma cultura utilizada em toda a Amazônia paraense. Do

ponto de vista da literatura escrita, também traria grandes contribuições para os

estudos socioterminológicos, uma vez que vários outros termos poderiam ser descritos

e analisados na constituição do discurso científico, técnico e de vulgarização

(FAULSTICH, 1996, p. 16; 2006, p. 27; GAUDIN, 1993, p. 17), através de um corpus de

língua oral e escrita.

Consideramos, ainda, a possibilidade de produção de um glossário

socioterminológico eletrônico envolvendo essa primeira etapa de estudos. Para isso,

recorreremos ao software computacional Lexique Pró, versão 2.8.6 (gratuita) e

encontrado na página http://www.sil.org. Esse glossário conterá a inserção de vídeos e

imagens que retratem o ambiente da atividade especializada estudada no município

de Acará. Dessa forma, esperamos que seja útil àqueles que se interessem pelo tema e

queiram conhecer melhor o universo que envolve essa cultura popular que remonta às

tradições indígenas.

Page 175: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

175

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ANEXOS

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ANEXO A

PRODUÇÃO DE MANDIOCA NO BRASIL

Estado Produção (safra)

Área Plantada (hectare)

Área Colhida (hectare)

Rendimento Médio

Pará 4.843.039 311.504 308.804 15.683

Bahia 4.609.098 388.606 350.642 13.145

Rio Grande do Sul 1.339.653 89.751 85.323 15.701

São Paulo 991.090 57.950 40.900 24.232

Ceará 924.860 189.989 95.330 9.702

Minas Gerais 885.228 79.566 57.895 15.290

Amazonas 680.484 79.364 75.874 8.968

Pernambuco 654.526 113.035 61.239 10.688

Santa Catarina 582.481 30.546 30.546 19.069

Rio Grande do Norte 574.601 70.224 51.653 11.124

Mato Grosso 542.409 38.549 36.259 14.959

Sergipe 509.709 66.830 34.354 14.837

Piauí 500.344 55.241 55.241 9.057

Rondônia 487.956 31.460 29.432 16.579

Mato Grosso do Sul 462.687 24.978 24.963 18.535

Goiás 449.595 38.420 26.860 16.737

Acre 350.954 17.560 17.560 19.986

Tocantins 329.138 22.309 17.439 18.874

Paraíba 299.281 36.224 30.634 9.770

Espírito Santo 284.928 18.676 16.524 17.243

Alagoas 244.778 17.157 17.157 14.267

Rio de Janeiro 128.827 9.484 9.474 13.598

Amapá 96.457 9.300 9.250 10.428

Roraima 77.192 6.210 5.800 13.309

Paraná 41.800 180.005 180.005 22.014

Distrito Federal 11.576 732 732 15.814

Fonte: http://www.sidra.ibge.gov.br, em 12/10/2008.

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ANEXO B

ARVORE DE DOMÍNIO

POR ENQUANTO ESTÁ EM ARQUIVO SEPARADO DEVIDO O TAMANHO

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183

ANEXO C

QUESTIONÁRIO SEMI-ESTRUTURADO

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ

INSTITUTO DE LETRAS E COMUNICAÇÃO

PROGRAMA DE MESTRADO EM LETRAS/LINGÜÍSTICA

Pesquisador: Elias Maurício da Silva Rodrigues

Pesquisa: Glossário Socioterminológico da Cultura da Farinha

Orientador: Prof. Dr. Abdelhak Razky

______________________________________________________________________

Prezado(a) Senhor(a) informante,

A pesquisa que estamos realizando está vinculada ao Programa de Pós-Graduação em

Lingüística da Universidade Federal do Pará – UFPA, sua participação é essencial para a

concretização de nossos objetivos. Pretendemos coletar, analisar e registrar os termos

relacionados à cadeia produtiva da produção de farinha para elaboração de um glossário

socioterminológico, pois a farinha é um produto típico e muito importante no cenário

paraense. Nossa pesquisa permitirá a divulgação de conhecimentos especializados da referida

área para que a sociedade, em geral, se beneficie desses conhecimentos. Todas as informações

coletadas e aqui registradas serão utilizadas exclusivamente para esse fim.

A fim de que os objetivos que definimos para esta pesquisa sejam concretizados

necessitamos de sua colaboração.

Agradecemos a sua participação.

Elias Maurício da Silva Rodrigues

___________________________________________________________________________

QUESTIONÁRIO CÓDIGO:

1.DADOS DO INFORMANTE:

1.Nome:

2.Apelido 3.Estado civil:

4. Idade: 5. Sexo:

6. Escolaridade: 7.Naturalidade do informante: 8. Naturalidade do pai: 9. Naturalidade da mãe

10. Distância da residência para a sede do município

11.

12. Tempo que trabalha diretamente com a produção de farinha:

2. CICLO PRODUTIVO DA FARINHA

PLANTAÇÃO

2.1. Que função você exerce no trabalho com a plantação de mandioca? Você exerce outras funções (descreva cada uma delas).

2.2. Qual o nome dos instrumentos ou objetos que você utiliza nessa fase de plantação?

2.3. Qual é a finalidade de cada instrumento? Eles servem para quê?

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184

2.4. Que aspectos devem ser considerados na escolha da área para o cultivo da mandioca?

2.5. Para que serve o preparo do solo?

2.6. Qual a influencia do preparo adequado do solo no desenvolvimento da cultura?

2.7. Que cuidados são recomendados quando do preparo do solo?

2.8. Que tipo de sistema de plantio é utilizado na plantação das manivas? Descreva e defina.

2.4. Como ocorre o preparo da área (do solo) para a plantação de mandioca? 2.5. Qual é a época para plantação das manivas? Por que?

2.6. Quais as partes que compõem a maniva? Descreva e defina cada uma delas?

2.7. Qual a parte da maniva utilizada para a plantação?

2.8. Como você escolhe a maniva para ser plantada? Descreva e defina.

2.9. Como você planta a maniva? Descreva e defina. 2.10. Que problemas você encontra no cultivo da mandioca?

2.11. Existe um clima ou temperatura ideal para o cultivo da mandioca?

2.12. Qual o tipo de solo ideal para o plantio da mandioca?

2.13. Quais as variedades de mandioca que produzem melhor?

2.14. Como você consegue diferenciar as diversas variedades de mandioca?

2.14. Qual a forma de se conseguir um aumento considerável da produção de mandioca?

2.15. Que aspectos devem ser considerados no manejo e na conservação do solo da cultura da mandioca, ou seja, como você cuida do solo quando da plantação?

2.16. A mandioca é plantada juntamente com outra cultura? Se sim, qual o nome que você designa (chama) para esse tipo de plantação? Descreva e defina.

2.17. Como você faz para manter a plantação saudável? O que é utilizado?

2.18. Se você utiliza adubação química, qual tipo de matéria química é usada? Descrever e definir.

2.19 Se você utiliza adubação orgânica, qual tipo de material é usado para esse fim? Descrever e definir cada um.

2.20. Como é denominada a área em que é feita a plantação de mandioca?

2.21. Que critérios você considera na escolha das manivas? 2.22. Que parte da maniva pode ser utilizada para plantio?

2.23. Qual a forma correta de fazer o corte das manivas?

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185

2.24. Como você armazena as manivas para posterior utilização?

2.25 Quais as épocas você utiliza para o plantio da cultura de mandioca?

2,26. De que forma você coloca a maniva no solo na época do plantio?

2.27. Como você faz para colocar as manivas no solo?

2.27. Existe alguma posição correta de se plantar a maniva?

2.28. Quais pragas você enfrenta na cultura da mandioca? Descreva e defina.

2.29. Quais doenças você enfrenta na cultura da mandioca? Descrever e definir.

2.30. Quais as práticas culturais você utiliza para o controle das doenças e pragas?

2.31 Quais os sintomas do ataque de pragas na plantação de mandioca?

2.32. Quais os sintomas de doenças na plantação de mandioca?

BENEFICIAMENTO 2.33. Como você denomina a época de colher a mandioca?

2.34. O que você faz para colher a mandioca?

2.35. Como saber a época mais indicada para colher a mandioca?

2.36. Quem são os trabalhadores envolvidos na colheita da mandioca?

2.37. Que nome você dá para a atividade de colher a mandioca?

2.38. Quais são os instrumentos utilizados para a colheita de mandioca e para que servem?

2.39. Quais são as etapas (operações e processos) utilizados para o beneficiamento da mandioca na fabricação de farinha?

2.40. Quais os instrumentos utilizados para o descascamento da mandioca?

2.41. Quem são as pessoas envolvidas no processo de descascamento? Quem faz esse trabalho?

2.42. Qual o processo (passo) após o descascamento da mandioca?

2.43. Quais os instrumentos utilizados na lavagem da mandioca?

2.44. Quem são as pessoas envolvidas no processo de lavagem?

2.45. Para que serve o processo de lavagem da mandioca?

2.46. Após o processo de lavagem qual o passo a ser seguido?

2.47. Para que serve o processo de ralamento da mandioca?

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2.48. Quais os equipamentos utilizados no ralamento da mandioca?

2.49. Quem são as pessoas envolvidas no processo de ralamento?

2.50. Qual o processo seguinte ao ralamento da mandioca?

2.51. Para que serve o processo de prensagem da mandioca?

2.52. Quais os equipamentos utilizados na prensagem da mandioca?

2.53. Quais os profissionais envolvidos nessa fase da prensagem da mandioca?

2.54. Para que serve a prensagem da mandioca?

2.55. Qual a fase seguinte a prensagem da mandioca?

2.56. Para que serve o amassamento da mandioca?

2.57. Quais os equipamentos utilizados no amassamento da mandioca)?

2.58. Quais os profissionais envolvidos na fase do amassamento da mandioca?

2.59 . Para que serve o amassamento da mandioca?

2.60. Qual a fase seguinte ao amassamento da mandioca?

2.61. Para que serve a coação ou peneiramento da mandioca?

2.62. Quais os equipamentos utilizados na coação ou peneiramento da mandioca?

2.63. Quais os profissionais envolvidos na fase da coação ou peneiramento da mandioca?

2.64 Qual a fase seguinte a coação ou peneiramento da mandioca?

2.65. Para que serve o escaldamento da mandioca?

2.66. Quais os equipamentos utilizados no escaldamento da mandioca?

2.67. Quais os profissionais envolvidos no processo de escaldamento da mandioca?

2.68. Qual a fase seguinte ao escaldamento da mandioca?

2.69. Para que serve a torração de farinha?

2.70. Quais os profissionais envolvidos no processo de torração de farinha?

Page 187: Glossários socioterminológico da cultura da farinha   elias mauricio s. rodrigues

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2.71. Quais os equipamentos utilizados na torração de farinha?

2.72. Qual o nome do lugar em que se fabrica a farinha?

2.73. Quais os nomes que se dão aos tipos de farinha que você produz?

2.74. Como você faz para diferenciar os tipos de farinha produzida?

2.75. Como você chama para aquela farinha bem fininha?

2.76. Como você chama para as farinhas mais grossas?

2.77. Você usa alguma roupa especial para trabalhar na produção de farinha?

2.78. Como você faz para, no processo de torração, saber que a farinha já está no ponto, ou seja, torrada?

COMERCIALIZAÇÃO

2.79. Onde e como é comercializada produção de farinha?

2.80. Como é feita a embalagem de farinha para a venda?

2.81. Como a farinha é pesada para a venda?

2.82. Qual o nome que se dá a pessoa que compra a produção da farinha para a venda?

2.83. Para onde a farinha é levada após a negociação?

2.18. Outras observações:

2.19. Data:

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ANEXO D

NORMAS PARA TRANSCRIÇÃO

OCORRÊNCIAS SINAIS EXEMPLIFICAÇÃO

Incompreensão de palavras e segmentos

( ) do nível de renda... ( ) nível de renda nominal

Hipóteses do que se ouviu (hipótese) (estou) meio preocupado (com o gravador)

Truncamento (havendo homografia, usa-se acento indicativo da tônica e/ou timbre)

/

e comé/ e reinicia

Entonação enfática maiúsculas porque as pessoas reTÊM moeda

Alongamento de vogal ou consoante (como s,r)

::podendo aumentar para :::: ou

mais

ao emprestarem os... éh::: ... o dinheiro

Silabação – Por motivo tran-sa-ção

Interrogação ? e o Banco... Central... certo?

Qualquer pausa ...

são três motivos... ou três razões.... que fazem com que se retenha moeda... existe uma... retenção

Comentários descritivos do transcritor

((minúsculas)) ((tossiu))

Superposição, simultaneidade de vozes

ligando as [ linhas

L1. na casa da sua irmã [ L2. sexta-feira? L1. fizeram lá... L2. [ cozinharam lá?

Observações: 1. Iniciais maiúsculas: não se usa em início de períodos, turnos e frases. 2. Fáticos: ah, éh, ahn, ehn, uhn, tá (não por está: ta? você está brava?) 3. Número por extenso. 4. Podem-se combinar sinais. 5. As reticências marcam qualquer tipo de pausa.

Fonte: Adaptado de Koch, 1992.

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ANEXO E MODELO DE FICHA TERMINOLÓGICA

FICHA TERMINOLÓGICA 1. Número:

2. Termo Entrada:

3. Categoria Gramatical:

4. Gênero:

5. Sigla ou acrônimo:

6. Variante(s):

7.1. Fonética Fonte

7.2. Lexical Fonte

7.3. Morfossintática Fonte

7.4. Socioprofissional Fonte

7.5 Discursiva Fonte

8. Campo Semântico:

9. Definição:

9.1. Fonte:

10. Contexto:

10.1. Fonte:

11. Remissivas:

11.1. Sinônimo Fonte

11.2. Hiperônimo Fonte

11.3. Hipônimo Fonte

11.4 Conceito conexo Fonte

13. Nota(s):

14. Pesquisador:

15. Instituição: 16 Projeto:

17. Data:

Fonte: Adaptado de Barros, 2004.