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Governo do Estado da BahiaCésar Borges

Secretaria do Planejamento Ciência e Tecnologia

Luiz Carreira

Superintendência de EstudosEconômicos e Sociais da Bahia

Cesar Vaz de Carvalho Júnior

BAHIA ANÁLISE & DADOS é uma publi-cação trimestral da Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia SEI, autarquia vinculada à Secretaria do Planejamento Ciência e Tecnologia da Ba-hia. Divulga a produção regular dos téc-nicos da SEI e de colaboradores externos. As opiniões emitidas nos textos assinados são de total responsabilidade dos autores.

Conselho EditorialCesar Vaz de Carvalho Júnior

Paulo Hermida GonzalezEdmundo Figueroa

Ângela FrancoCarlota GottschallConceição CunhaRenata Proserpio

Coordenação EditorialCarlota Gottschall

Cesar Vaz de Carvalho Júnior

NormalizaçãoGerência de Documentação

e Biblioteca GEBI

Foto CapaAlexandre Catan

EditoraçãoDesigners Associados

Tiragem: 1.000 exemplares

Av. Luiz Viana Filho, 435, 4ª Avenida CEP: 41.750-300 Salvador - Bahia Fone: (0** 71) 370-4823/370-4704

Fax: (0** 71) 371-1853

http://www.sei.ba.gov.bre-mail: [email protected]

Bahia Análise e Dados, v.1 (1991- ) Salvador: Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia, 2000.

TrimestralISSN 0103 8117 CDD 338.91 CDU 338.984

CEPO: 0110

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SUMÁRIO

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Apresentação

Mudanças no Vetor Norte de Salvador

Nova onda de industrialização poderá provocar transformações na RMS...........................

Entrevista: Marcus Suarez Alban

Mudanças à vista na Região Metropolitana de Salvador......................................................

Turismo na Bahia: a hora da profissionalização........ ..........................................................

Costa dos Coqueiros: Projeto Vetor Norte....................................................................... ....

Fundação Onda Azul

Box: Programa de Planejamento e Gerenciamento Ambiental para a APA Litoral Norte.....

.....................................................................................................

.....................................................

Momento Econômico

Economia brasileira: as fragilidades estruturais permanecem ............................................

Luiz Filgueiras

Desempenho da economia baiana no ano 2000 e tendências para 2001...........................

Bahia: uma economia em transição.....................................................................................

Reflexões sobre a Lei de Responsabilidade Fiscal: o caso da Bahia..................................

Creomar Baptista

Mercado de Trabalho e Educação

A inserção dos jovens baianos no mercado de trabalho nos anos 90.................................

Ângela Borges

Os postos de trabalho no ano 2000......................................................................................

Luiz Chateaubriand Cavalcanti dos Santos

Mudanças no mercado de trabalho da RMS........................................................................

Edson A. S. Sobrinho

Aumentam os desafios da educação na Bahia....................................................................

Marlene Hurst

Homenagem

Ciência e arte de educar.......................................................................................................

Anísio Teixeira

Fotografias .........................................................................................................................

Salvador na Globalização

Edgar Porto e Edmilson Carvalho

Considerações sobre as “vias transversais” de Salvador

Heliodório Sampaio

Equipe SEI

Vladson Menezes

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8 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.8-13 Dezembro 2000

Creio que poderemos iniciarnossa entrevista sugerindo que osenhor nos fale a respeito dacomposição das empresas queconstituem o site da Ford e dosprováveis impactos desse proje-to sobre as cidades da RegiãoMetropolitana de Salvador.

Marcus Alban – De início devoinformar que, atualmente, o siteAmazon é composto por 27 em-presas. Dentre essas, muitassão prestadoras de serviços: lim-peza, logística interna e externa,manutenção. Mas a grande maio-ria trata-se de empresas fornece-doras de produtos da primeira esegunda camadas, conforme de-nomina o mercado automotivo.Os chamados fornecedores deprimeira camada, as empresassistemistas, são as que montamos módulos e que irão receberprodutos de diversas origens, os

quais serão entregues à Ford,responsável pela montagem finaldo processo.

Em um primeiro momento, agrande maioria dos produtos quecompõem esses módulos virãode outros estados. A previsão éque apenas cerca de 30% do va-lor do veículo resulte de ativida-des desenvolvidas na Bahia.Contudo, a expectativa é queesta situação se altere com opassar do tempo, porque fabricarpeças em outros estados etransportar para Camaçari é dis-pendioso. Assim, a Ford tem umefetivo interesse em buscar inte-grar sua cadeia produtiva com osprodutores de bens intermediáriosaqui localizados. Dessa maneira,poderemos ver viabilizada a tãosonhada verticalização dos bensintermediários baianos. Até por-que, na atualidade, a indústria

Nova onda de industrializaçãopoderá provocartransformações na RMS

A Bahia Análise & Dados entrevistou o professor Marcus Suarez Alban, respon-sável pela elaboração do estudo Projeto Amazon e Seus Impactos na RMS1, como intuito de mapear os prováveis efeitos da implantação da montadora Ford naBahia. Bastante otimista com o novo empreendimento, o analista acredita que as“externalidades provocadas pelo projeto poderão promover mudanças de todo al-cance, que certamente irão influir no perfil atual da Região Metropolitana de Sal-vador”. Vamos a sua fala.

automobilística tem como princí-pio a organização de empresasem seu entorno, estas, cada vezmais “dedicadas”.

O senhor poderia explicar me-lhor como se constitui esta novalógica de processo industrial?Marcus Alban – É simples. O

sistema tradicional da indústriaautomobilística tinha como basea produção em massa, situaçãoem que não havia uma coorde-nação direta entre a montadora eas fornecedoras. A lógica atual éa da produção dedicada a umadada montadora, com referênciana produção enxuta e em um sis-tema articulado, com base noprincípio just in time. Assim, oprojeto tornou-se um conjuntocompleto: a empresa montadora,ao se fixar em uma localidade,traz consigo uma série de outras

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empresas e essas vão, paulati-namente, integrando o resto dacadeia, para trás – tanto quantopossível, todo o complexo deveoperar em um espaço o maispróximo possível.

Sabe-se que as grandes corpora-ções globais têm uma estratégiade planejamento global, na qualseus investimentos e sua produ-ção são definidos espacialmentepor uma série de fatores. Aindaque os programas estaduais e apolítica de incentivos sejam impor-tantes, esses jamais serão capa-zes de reverter a dinâmica própriade uma corporação global. Comoo senhor entende o significado dapolítica fiscal como elemento favo-rável ao adensamento industrialem torno da Ford em Camaçari?Marcus Alban – A política fis-

cal joga um papel muito impor-

tante para que se alcance o obje-tivo de completar a cadeia produ-tiva. Entretanto, a despeito deuma política de incentivos fis-cais, há um interesse da Ford emque essa seqüência efetivamenteocorra, sem o que a empresa nãoconseguirá alcançar os níveis deprodutividade e de eficiência ne-cessários à concorrência no mer-cado. Com isso não estou ne-gando a importância da políticade incentivos fiscais para essaempresa, até porque, dada amaneira como a política industri-al se estruturou no Brasil, o aces-so aos incentivos fiscais tornou-se um elemento de competiçãodo mercado.

Contudo, uma das principais hi-póteses aventadas no estudoque estamos desenvolvendo é ade que a vinda da Ford para aBahia não decorre tão-somente

dos incentivos fiscais. A localiza-ção espacial da Bahia foi um fatorcomplementar desse processo.Observa-se que todos os proje-tos da indústria automotiva re-centemente instalados no Brasilmantiveram-se na linha limite doparque industrial já existente. Agrande maioria das empresasinstalaram-se em São Paulo,Paraná e Rio Grande do Sul.Essa opção não se deu por aca-so, porque os governos dessesestados são mais frugais na con-cessão de incentivos. Havia todauma lógica espacial para a toma-da de decisão daquelas empre-sas, quando da efetivação dosinvestimentos – que ocorreram,basicamente, entre 1994 e 1997– que estava ancorada na pers-pectiva do Mercosul (essa obser-vação pode ser verificada emuma série de posições e docu-

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10 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.8-13 Dezembro 2000

mentos). No meu entender, a si-tuação atual desse bloco econô-mico encontra-se, na melhor dashipóteses, em um estágio delica-do. Pelo menos a médio prazo,tornou-se uma associação semmuita perspectiva.

A Ford, como uma das últimasempresas a tomar uma posiçãorelativamente ao local de suainstalação, pode reavaliar suadecisão em decorrência da mu-dança na política cambial, postoque ainda não havia iniciado aimobilização do seu capital. Des-sa forma, a empresa pôde redi-recionar sua análise de localiza-ção espacial. Analisando-se asmatérias que têm saído na Gaze-ta Mercantil, por exemplo, pode-se perceber que, para o setor au-tomotivo, o mercado externocontinua tendo uma grande im-portância. O que se observa éuma mudança de rota. Antes, ogrande mercado era o Mercosul;hoje os principais mercados sãoa Europa, México, Estados Uni-dos. Nesse sentido, uma plantana Bahia está muito melhor loca-lizada do que uma planta no RioGrande do Sul.

No início desta nossa entrevistao senhor referiu-se à possibilida-de de ampliar-se o número deempresas “dedicadas” à monta-dora Ford, que, a médio prazo,poderiam vir a se instalar na re-gião de Camaçari. Qual o cenárioque os senhores estão trabalhan-do para os próximos anos?

Marcus Alban – A expectativa éque a participação das empresassistêmicas seja maior a cada ano.O cenário com que estamos tra-balhando considera que estecrescimento terá início em 2001

ou 2002, situação em que pode-remos alcançar cerca de 40% dofornecimento localmente. Casoessa previsão seja confirmada,espera-se que cerca de 37% doValor Bruto da Produção seja pro-

duzido na Bahia. Crescendo nes-se ritmo até 2004, tal participaçãodeverá representar algo em tornode 55%. Não há dúvida de que,até 2004, os motores e a trans-missão, que são itens muito signi-ficativos no valor do carro (cercade 23% ), vão ser produzidos emTaubaté, estado de São Paulo.

A previsão é que, em 2006, afábrica da Ford esteja fabricandono próprio site ou em alguma lo-calidade da Região Metropolita-na de Salvador o motor e atransmissão, o que vai significarque cerca de 77% do valor agre-gado da produção dos automó-veis será gerado em territóriobaiano.

Considerando-se a perspectivade médio e longo prazos, o se-nhor arriscaria apostar na possi-bilidade de que haja, nesta novafase de industrialização, umadistribuição espacial mais hete-rogênea dos investimentos entreos diversos municípios da RMSdo que na outra, que se verificouem decorrência da instalaçãodas empresas do Pólo Petroquí-mico de Camaçari?

Marcus Alban – Acredito queaqui também haverá uma con-centração de empresas em Ca-maçari. Até porque, acompa-nhando a lógica da produçãoenxuta, quanto mais próximasestejam as empresas fornecedo-ras, melhor. Além do que, a infra-estrutura de transportes estadualnão ajuda muito. Observa-se queo governo está com planos de in-vestir pesado na reconstrução,recuperação ou modernização dasestradas, o que facilitará bastan-te a atração de novos investido-res. Mas se comparamos, porexemplo, a nossa infra-estruturacom a da Região Metropolitanade Curitiba, nós temos muito oque desenvolver. Sem dúvida, ofato dessa região apresentaruma malha rodoviária de boaqualidade possibilitou uma dis-persão espacial maior das em-presas do que possivelmenteocorrerá em torno de Salvador.Outro fator que merece ser con-siderado foi a competição entreas prefeituras municipais, que seprocessou através da doação deterrenos, condições de infra-es-trutura, diversos tipos de benefí-cios. Esse conjunto de elemen-tos terminou favorecendo umadistribuição mais espalhada dasempresas, o que é um fator posi-tivo.Com isso não quero dizer que

todas a empresas deverão locali-zar-se em Camaçari. Por exem-plo, a Pirelli, que já está em Feirade Santana, deve continuar; aSiemens, que vai produzir mate-riais elétricos, possivelmente iráse instalar também nesse muni-cípio. Outras deverão se sitiarem Simões Filho, certamente noCIA, ou em outros municípios da

A previsão é que,em 2006, cerca de

77% do valor agregadoda produção

dos automóveisserá gerado

em território baiano.

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.8-13 Dezembro 2000 11

região, mas a grande maioria de-verá ficar em Camaçari.

Quais os benefícios sociais queestão sendo esperados para aregião de Camaçari, frente àperspectiva de criação de novospostos de trabalho?Marcus Alban – Consideran-

do-se a vinda da fábrica de mo-tores e transmissão, existe aprevisão de que serão criadoscerca de 5.500 empregos diretosa médio prazo, em 2006. Des-ses, cerca de 5.000 trabalhado-res vão ganhar entre 600 e 1.100reais. Um trabalhador de “chãode fábrica” vai ganhar cerca de600 reais, e um supervisor cercade 1.100 reais. Ou seja, vai-seconfigurar uma espécie de clas-se média baixa, situação quenão é muito característica danossa realidade metropolitana.Analisemos a situação que se

conforma, por exemplo, em Ca-maçari, onde uma parcela ex-pressiva da população ganha atédois salários mínimos, diante daperspectiva de, aproximadamen-te, 5.000 chefes de família dispo-rem de uma renda familiar entrequatro e oito salários mínimos –isso vai reconfigurar completa-mente o perfil regional. Outro fa-tor que merece destaque é queesses salários representam hoje,em termos reais, cerca de 50%do ganho dos trabalhadoresautomotivos no ABC paulista.Então, isso significa que há umaexpectativa de crescimento sala-rial a curto e médio prazo, porpressões sindicais ou pelo pró-prio andamento da fábrica. Oque se tem visto em unidades re-cém-inauguradas é que os salá-rios iniciais apresentam um pata-

mar bastante baixo, mas as pes-soas vão se qualificando, ocu-pando posições de chefias inter-mediárias e, assim, a médiasalarial vai crescendo, o lequevai sendo aberto.

E os outros 500 trabalhadoresque recebem salário mais eleva-dos, como estão sendo vistos osefeitos desses novos rendimen-tos?

Marcus Alban – Para esses tra-balhadores de maior salário aanálise é outra. Nesse quadro,geralmente estão os trabalhado-res originários de outras localida-des, situação que já está existin-do. No meio do galpão de obras épossível encontrar escritóriosclean, com ar-condicionado e vá-rias pessoas de outros estadostrabalhando a todo vapor. A tôni-ca do processo, certamente, vaiser dada pelos quadros mais al-tos da hierarquia. Esses, a de-pender da dinâmica, das externa-lidades que aí se desenvolvam,talvez até possam fixar residênciana orla de Camaçari.

E os trabalhadores de menoressalários, irão seguramente morarnesse município?

Marcus Alban – O fato de aFord não fornecer transporte,

como ocorre com as empresaspetroquímicas, irá provocar umamudança no comportamento so-cial dos trabalhadores, que cer-tamente terão que morar em Ca-maçari ou Dias D’Ávila. As açõesdesenvolvidas pelas respectivasprefeituras serão decisivas nesseprocesso. Evidentemente, Ca-maçari tem maior poder de fogopara oferecer melhor infra-estru-tura – loteamentos, conjuntoshabitacionais, saneamento bási-co. Esperamos que venham aexistir ações planejadoras dosgestores públicos, no sentido deracionalmente se tentar criaruma dinâmica o mais equilibradapossível.

O projeto Amazon, em si, é im-portante, mas eu acho fundamen-tal observarmos as externalida-des que este possa vir aproporcionar. A instalação doAmazon em Camaçari está exi-gindo que os gestores públicoscriem uma infra-estrutura detransporte, uma logística regionalque não vai atender somente aoprojeto. Da mesma forma, urgeque se capacite o mercado de tra-balho, para que se possa atenderà demanda das indústrias demontagem. Esse investimento naformação de pessoal terá um al-cance além do Amazon.

Se, de um lado, as empresasque gravitam em torno da Fordsão fornecedoras “dedicadas”,as outras, as de terceira, quartacamada têm mais liberdade deatuação no mercado. Provavel-mente irão desenvolver indústri-as de embalagens, de parafu-sos, de porcas, de rebites e desuportes, uma série de produtosúteis para a produção de um car-ro, mas que também podem ser-

O fato de a Ford nãofornecer transporte

irá provocar umamudança no

comportamento socialdos trabalhadores,

que certamente terãoque morar em Camaçari

ou Dias D’Ávila.

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vir, por exemplo, para uma linhade montagem de bens duráveis deeletrodomésticos da linha branca.Esse tipo de experiência vemocorrendo com o complexo auto-motivo de Curitiba.

O senhor aposta que a partirdesse novo ciclo teremos a efeti-vação da indústria de terceira ge-ração da petroquímica?

Marcus Alban – Sim, certa-mente. E não só de terceira, ameu ver trata-se de quarta gera-ção petroquímica. Isso porque,em geral, considera-se que exis-tam três etapas no processo pe-troquímico, a partir da quarta, queseria a transformação propria-mente dita dos produtos petro-químicos e dos bens intermediá-rios em geral em bens finais.Além disso, acredito que devahaver também uma expansãodos bens intermediários já fabri-cados na RMS.

Pode-se supor que os novosprojetos que estão surgindo novetor norte de Salvador (Costa doSauípe, Ford, Monsanto) poderãopropiciar uma nova constituiçãoregional, diferente da ocorrida hácerca de 25 anos, quando a capi-tal polarizou os diversos benefíciosinstituídos pela industrialização ea introdução de serviços sofistica-dos no cenário baiano?

Marcus Alban – O fator maispositivo nesse conjunto de novosempreendimentos é a constitui-ção de uma dinâmica que poderáultrapassar a polarização regio-nal de Salvador. Na dinâmicaeconômica e social que se anun-cia, acredita-se que Camaçariserá o principal núcleo polariza-

dor de um novo setor terciário ede uma nova economia urbana,com a cidade transformando-seem uma cidade média, industrial,prestadora de serviços e respon-dendo às demandas turísticasque proliferam na orla.

Espera-se que dessa nova di-nâmica econômica regional re-sulte uma espécie de hierarquiade serviços, surgindo alguns queresponderão às necessidadesdos novos assalariados e outros,mais sofisticados, voltados paraos empregados de maior salário,que certamente continuarão sen-do oferecidos em Salvador?

Marcus Alban – O ideal é queseja esse o movimento. Dessaforma, será possível organizarSalvador em outra perspectiva,desenvolvendo segmentos queofereçam serviços mais sofistica-dos e criando demandas queextrapolem o limite regional dacapital. Esse novo momento iráimpulsionar a necessidade deum outro pensar sobre a cidade,na perspectiva de se organizarum outro tipo de espaço urbano,e não como esse vem sendopensado até então.

O senhor gostaria de mencio-nar mais algum outro aspecto im-portante que não tenha sidoabordado?

Marcus Alban – Acredito quevalha a pena falar sobre uma ou-tra questão importante, que é aseguinte: a localização da Fordem Camaçari pode apresentardiversos aspectos positivos, aexemplo de uma melhor distribui-ção regional, conforme foi co-mentado anteriormente, mas ameu ver está longe de ser a op-ção ideal. Tentando vincular oestudo que venho desenvolven-do agora com outros trabalhosque fiz no passado, acho que éfundamental que o Estado daBahia consiga, de fato, interiori-zar o processo de industrializa-ção. Se, por um lado, os desdo-bramentos regionais da Fordtendem a ser mais heterogêne-os, do ponto de vista urbano esocial, do que foram os da petro-química, acredito que, pelo me-nos à luz do que foi aqui estuda-do, as evidências indicam que osresultados poderiam ser muitomaiores se, por exemplo, esseprojeto se localizasse em Feirade Santana. A dinâmica urbana,os desdobramentos que ele en-gendraria para aquela cidade epara a Bahia como um todo, se-riam muito mais interessantes.Então, considerando-se que oProjeto Amazon venha a gerarexternalidades que poderão atrairnovos grandes projetos, vejocomo fundamental que os gesto-res públicos se antecipem a estacircunstância, criando, em outroslocais, uma infra-estrutura logís-tica que os viabilize. Eu acho queé possível e saudável deslocarparte desses projetos para Feirade Santana, por exemplo.Mais uma vez acredito ser im-

portante recorrermos à experiên-cia de Curitiba. A primeira planta

O fator mais positivonesse conjunto de novos

empreendimentos é aconstituição de umadinâmica que poderá

ultrapassar a polarizaçãoregional de Salvador.

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automotiva desse estado, que foida Volkswagen, localizou-se nacapital, as outras (Audi, Chryslere Renault) estão situadas no en-torno de Curitiba. Os resultadosdessa concentração industrialsão de duplo efeito. De um lado,a economia da Região Metropoli-tana de Curitiba está crescendoa taxas elevadas, mas, de outro,observa-se um aumento acentu-

ado da “periferização” daquelacapital. Com isso, surgem osproblemas sociais, violência, en-demias, problemas que Curitibaconhecia pouco. É preciso quetenhamos muito cuidado paraque esses novos projetos não selimitem a transferir o principalproblema de Salvador na atuali-dade – as dificuldades sociais –transformando-o em um grande

dilema para a sua região metro-politana. Defendo ser possívelnão só antever esse processocomo criar as condições paraque se possa administrar umaespacialização mais racional.

1 Estudo contratado pela Superintendên-cia de Projetos Especiais/Seplantec, em2000, realizado pelos professoresMarcus Alban (coordenação), CelinaSouza e José Roberto Ferro.

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14 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.14-16 Dezembro 2000

Os novos empreendimentos industriais eturísticos que estão aportando no vetornorte de Salvador prenunciam efetivas al-

terações no dinamismo regional da região metro-politana. É grande a expectativa que vem sendoalimentada em torno da possibilidade de Camaçarivir a se constituir em um pólo regional capaz deresponder às demandas de serviços e de suporteurbano que inevitavelmente aparecerão nesse con-texto. Essa é uma situação que exigirá, no mínimo,uma requalificação das funções regionais da ma-crorregião de Salvador.

Já era mais do que tempo de considerar a urgên-cia de uma distribuição mais homogênea das rique-zas produzidas nessa macrorregião, uma vez quehá muito espera-se que Camaçari apresente umamelhor difusão espacial e social dos benefíciosadvindos de uma posição econômica privilegiada noquadro da economia estadual. Município-sede deum dos maiores aglomerados petroquímicos daAmérica Latina, é responsável por aproximada-mente 10% do Produto Interno Bruto e por cerca de5% do total das receitas orçamentárias estaduais.Nas duas situações, perde posição tão-somentepara Salvador. Contudo, tal situação privilegiadanão se reflete nem na qualidade de vida da popula-ção nem no tratamento ambiental concedido ao pa-trimônio ecológico.

Abrigando, segundo as estimativas mais recen-tes, 150 mil habitantes no final dos anos 1990, Ca-maçari apresenta um elevado grau de urbanização,residindo na sede municipal e em suas vilas cerca

de 95% dessa população. Os problemas relaciona-dos a uma tal densidade populacional vêm-se agra-vando em decorrência do perfil do seu mercado detrabalho. Segundo informação do IBGE, em 1998,considerando-se apenas os postos de trabalhovinculados a atividades formais, foram identificados41.207 empregados, sobretudo nas atividades in-dustriais e de serviços. Contudo, é sabido que ostrabalhadores industriais, aqueles que recebem osmaiores rendimentos (12 salários mínimos em mé-dia), em sua maioria não residem nesse município.Assim, a despeito da privilegiada posição de cidadeindustrial, o rendimento médio dos trabalhadoresformais que moram em Camaçari não ultrapassa, namelhor das hipóteses, quatro salários mínimos.

A expectativa que paira no ar é que esse novoconjunto de empreendimentos que chegou à ci-dade provoque mudanças nesse quadro. A im-plantação da montadora de automóveis Ford1 edos seus fornecedores, com a política de nãodisponibilizar transporte; a instalação da Mon-santo, fabricante de herbicidas, que, além de cri-ar cerca de 300 novos empregos, acena com apossibilidade de integração da cadeia produtivae a entrada em operação do megaprojeto turísti-co do complexo hoteleiro Costa do Sauípe, que,apesar de localizado em Mata de São João, po-derá vir a buscar suporte de serviços em Cama-çari, constituem-se em elementos que, se bemconduzidos por políticas públicas adequadas, po-derão alterar inexoravelmente a realidade regio-nal da grande Salvador.

Mudanças à vista naRegião Metropolitana de Salvador

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.14-16 Dezembro 2000 15

Por uma feliz coincidência ou não, está sendoelaborado neste momento um Plano Diretor para Ca-maçari,2 trabalho que favorece a constituição deações planejadoras para o município. Na visão deGonçalves, arquiteto participante da equipe de ela-boração do referido Plano: “Essa fase de industriali-zação deverá ser diferente da outra, quando ocorreua implantação das empresas petroquímicas. Dessavez, vê-se um outro tipo de comportamento, porexemplo, nos gestores municipais”. Observa-se umapreocupação dos administradorescom a qualificação da mão-de-obralocal, visando ao aproveitamento naindústria automobilística. Ainda se-gundo Gonçalves, “esta fase tam-bém é favorecida pela diferença noperfil dessa indústria: produtora debens finais, agrega uma série de ou-tras empresas industriais e presta-doras de serviços. Assim, a possibi-lidade dessas empresas absorverema mão-de-obra regional é bem mai-or, sem falar que esse projeto irápromover uma fixação no município da populaçãotrabalhadora de forma diferenciada, sobretudo da-quela que recebe salários menores”.

E quanto ao destino residencial dos técnicos deponta, aqueles que receberão salários elevados?Esse é um aspecto que parece ser polêmico. Con-tudo, existe um consenso: a atual sede municipalnão apresenta atrativos capazes de convencer umalto executivo e seus familiares a optarem por esseendereço. Mas Camaçari não é somente a sede, omunicípio dispõe também de uma esplendorosaorla marítima, que não só inspira poetas, mas já érecanto de lazer para as camadas médias de Sal-vador e para os turistas.

O desenvolvimento de uma cidade na orla e adefinição de ações planejadas que visem melhorara qualidade de vida da população residente nasede são importantes eixos norteadores do PlanoDiretor que vem sendo discutido. Em relação à ci-dade da orla, o urbanista Neira aponta vantagensque essa alternativa poderá trazer aos trabalhado-res mais sofisticados: “Uma cidade na orla, que,além de moradia, também ofereça bons serviçosurbanos, pode servir como atrativo para aquelesque vivem nos estados do sul do País, sobretudo

pela disponibilidade de praia, que é um forte com-ponente de sedução para os sulistas”. Outra vanta-gem apontada é o fato desse núcleo urbano encon-trar-se localizado a 15 Km da sede da Ford e a 30km de Salvador. Facilidades significativas diantedas dificuldades de locomoção encontradas nasgrandes cidades brasileiras.

A idéia apresentada no projeto para o Plano Di-retor de Camaçari é a transformação do vilarejo deArembepe em uma cidade moderna. Afirma Neira:

“A constituição de um ambiente ur-bano, com os serviços que lhessão próprios – escola, assistênciamédica, shopping centers, equipa-mentos de lazer – é fundamentalpara a fixação em Camaçari detrabalhadores mais sofisticados”.

Diversos são os argumentosapresentados para justificar a viabi-lidade urbana e econômica de umaoutra sede municipal localizada naorla. A principal delas é o limite deocupação urbana registrado tanto

em Lauro de Freitas quanto no extremo norte de Sal-vador. Segundo Gonçalves, “é bem provável que,nos próximos dez anos, haja uma expansão urbananatural em direção a Camaçari. Não somente em di-reção à orla como também na da ocupação do espa-ço entre a sede municipal e a orla marítima. Aliás,esse é um movimento que já vem ocorrendo”.

Diante dos limites sociais e dos problemas ecoló-gicos que circunstanciam o município de Camaçari,seria ingênuo supor que mudanças possam ocorrer– novos complexos industriais, aumento populacio-nal, novas demandas urbanas e de serviços – sem ocorrespondente agravamento das dificuldades. Doponto de vista do equilíbrio ambiental, um dos as-pectos mais valorizados no Plano, encontra-se aproposta de recuperação de diversas áreas degra-dadas, sendo uma das metas prioritárias a recupe-ração do rio Camaçari. Também vale destacar o tra-balho que deverá ser efetivado para preservar erespeitar as Unidades de Conservação existentes:APA de Mangue Seco; APA do Litoral Norte; APA daLagoa de Guarajuba; APA da Bacia HidrográficaJoanes 1; APA do Rio Capivara; Parque Ecológicoda Reserva Garcia D’Ávila; Parque Municipal Dunasde Abrantes e Reserva de Sapiranga.

O desenvolvimento deuma cidade na orla

e a definição de açõesplanejadas que visemmelhorar a qualidadede vida da populaçãoresidente na sede são

importantes eixosnorteadores do Plano

Diretor que vemsendo discutido.

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16 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.14-16 Dezembro 2000

Também do ponto de vista social os entraves sãomuitos. Os planejadores sabem disso e estão bus-cando apresentar alternativas que se não resolvam,pelo menos minimizem os problemas existentes e osoutros que certamente surgirão no decorrer desseprocesso. O aumento da população, sobretudo da-quela desempregada em busca de oportunidade detrabalho, certamente é o mais grave de todos eles.Afirma Neira: “Estamos trabalhando com uma proje-ção demográfica de crescimento de 25 mil habitantesem Camaçari, após o cumprimentode todas as etapas previstas paraimplantação da Ford e dos seus for-necedores, em 2006. Esta projeçãotem como referência estudos indica-tivos de que, cada posto de trabalhocriado, considerando-se um empre-endimento de grande porte, implica,em média, a imigração de cinco no-vos habitantes para a localidade. O mais grave éque, desses, pelo menos metade virá como desem-pregado ou trabalhador informal”.

Nesse sentido, é importante que se pensem al-ternativas econômicas capazes de absorver nãosomente este novo contingente de pessoas, mastambém de inserir a população flutuante que existehoje no município. Uma alternativa pensada pelogrupo de planejadores “é a melhoria tanto nas con-dições de transporte quanto na malha rodoviária”,situação que facilitaria a circulação de “negócios”entre os diversos municípios vizinhos, permitindoassim uma maior integração regional. Outro impor-tante projeto que está sendo apresentado aosgestores públicos é o de constituição de núcleos deagricultura urbana.

No entender de Gonçalves, “a proposta de umPlano Diretor de Camaçari contempla intervençõesna orla, na sede municipal e no miolo, que hoje seencontra vazio”. Município pouco ocupado em suaextensão rural – apenas 5% da população resideno campo – Camaçari tem como principal atividadeagrícola a plantação de coco-da-bahia, que ocupa1.850 hectares de área plantada. Nesse sentido, “aproposta de agricultura rural tem como fundamentoresponder às novas demandas por produtos agrí-colas que certamente irão se apresentar em decor-rência dos novos projetos turísticos e do aumentoda população regional”. Isso sem falar na possibili-

dade de que essa ocupação venha a assentar par-cela significativa de trabalhadores no campo.“Acreditamos que a lógica que irá nortear a econo-mia do Vetor Norte venha a ser diferente da outraque se apoiou no tráfego da BR 101, uma econo-mia de passagem”, declara Neira.

A expectativa é que haja um aumento progressivoda demanda de serviços advindos da ocupação daorla. Aposta-se na possibilidade de que Camaçari ve-nha a se constituir em um importante pólo regional,

capaz de articular diversos tipos deatividades (industriais e de serviços)com os municípios vizinhos e, as-sim, de dividir com Salvador funçõesque, até agora, concentraram-se to-talmente na capital. Contudo, nesseprocesso é fundamental a atuaçãodos agentes públicos – posto quese torna necessário organizar uma

gestão municipal participativa, considerando-se asnecessidades das comunidades – assim como aação dos agentes privados, no sentido de estaremmais comprometidos com o bem-estar daqueles queemprestam seu espaço aos benefícios empresariais.Dessa forma, acredita-se que possa vir a ser melho-rada a qualidade ecológica, vale dizer, de vida, daRegião Metropolitana de Salvador.

Referências bibliográficas

GOTTSCHALL, Carlota. Cidade e Identidade Cultural : um estu-do de caso da convergência entre cultura de massa e culturapopular no Shopping Iguatemi. Dissertação (Mestrado deComunicação e Cultura Contemporâneas) – Faculdade deComunicação, Universidade Federal da Bahia, 2000.

GAZETA MERCANTIL, São Paulo : 30 set. 2000

GAZETA MERCANTIL, São Paulo : 18 out. 2000

INSTITUTO DE HOSPITALIDADE, Salvador, 2000

Notas

1 Ver entrevista Marcos Alban nesta edição.

2 O Plano Diretor de Camaçari vem sendo desenvolvido pelaCaires de Brito Consultoria Ambiental. Contribuíram para aelaboração deste artigo os arquitetos Eduardo Neira Alva eJoaquim Gonçalves, consultores da referida empresa deconsultoria.

Outro importanteprojeto que está sendo

apresentado aosgestores públicosé o de constituição

de núcleos deagricultura urbana.

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.17-21 Dezembro 2000 17

Os complexos hoteleiros de lazer estãosendo apresentados ao mercado turísticomundial como uma possibilidade de entre-

tenimento seguro, diversificado e confortável, alter-nativa ideal para os citadinos que buscam fugir dasatribuições do cotidiano nos momentos de descan-so. Esse produto resulta da junção de, pelo menos,três fatores: consolidação do comércio e do consu-mo como base da economia mundial, interação en-tre lazer e consumo e desenvolvimento da arquite-tura da cenografia.

Os complexos hoteleiros, a exemplo do Com-plexo Costa do Sauípe, resultam da combinaçãoda “arquitetura do lúdico – espaços construídos vi-sando provocar nos visitantes sentimento de deso-rientação, perda da referência cotidiana, através dasimulação de situações reais e fantasias futurísti-cas – com o pot-pourri eclético predominante naera global, fruto da mistura da geografia de gostos ede culturas diferenciadas. Muitas vezes, afastadosdos grandes núcleos urbanos, ocupam grandesáreas territoriais, oferecendo diversos tipos deequipamentos que proporcionam aos consumido-res o exercício de múltiplas atividades de entreteni-mento. A convivência facilitada pelo encontro deiguais, mesmo que decorrente de um reconheci-mento efêmero, em um espaço satisfatório, contro-lado e seguro, que permite a inversão de experiên-cias cotidianas, também contribui para alimentaressa expectativa idealizada” (Gottschall, 2000).

Inserido nesse padrão mundial de equipamentode lazer, portanto, visando atingir o mercado mun-

dial das cidades turísticas, o Complexo HoteleiroCosta do Sauípe, no município de Mata de SãoJoão, inaugura na Bahia um estilo de turismo sele-tivo e profissional, totalmente diferente diverso da-quele o que se assistiu verificado em Porto Seguro,nas décadas de 1980 e 1990, e que resultou emuma ocupação predatória dos recursos ambientais,acompanhada da eclosão de inúmeros problemassociais para o referido município.

Os investimentos que vêm sendo aplicados eminfra-estrutura nos diversos pólos turísticos existen-tes na Bahia (ver Tabela 1), demonstram a preocu-pação dos gestores públicos em tornar taislocalidades competitivas no mercado mundial delazer. Entre 1995/1998, na região da Costa dos Co-queiros, os investimentos públicos foram de 23,4milhões de dólares, distribuídos principalmente nosaneamento básico e na ampliação e criação deaeroportos. Para o próximo período, a expectativaé que sejam aplicados mais 87,1 milhões de dóla-res nessa região (ver Tabela 2).

As prováveis mudanças que se anunciam parao Vetor Norte de Salvador tornarão tais investimen-tos públicos mais que necessários, urgentes. No fi-nal de 2000, o Complexo Costa do Sauípe, empre-endimento do grupo Sauípe Hotels & e Resort,pertencente a à Previ – Caixa de Previdência dosFuncionários do Banco do Brasil, e apresentandoum investimento total de 340 milhões de reais, co-loca na ordem do dia um outro patamar de exigên-cia e de demanda ao até então espontâneo setorturístico baiano.

Turismo na Bahia:

a hora da profissionalização

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18 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.17-21 Dezembro 2000

Ocupando uma área de 172 hectares, localizadaentre os vilarejos de Imbassaí e de Porto Sauípe,apresenta-se uma verdadeira cidade cenográfica,nos moldes clássicos da denominada arquiteturapós-moderna. Até o final de 2000, estarão disponí-veis, ao público de elevado poder aquisitivo e que faza opção por um lazer espetacular, cinco hotéis e seispousadas, somando-se um total de 1.634 acomoda-ções. Os hotéis pertencem a redes internacionais: ojamaicano SuperClubs Breezes Costa do Sauípe, afrancesa Sofitel, ligada a à operado-ra Accor, e a americana Marriot, per-tencente à grife Renaissance, volta-da para um segmento de públicomais sofisticado. Além dos espaçoshoteleiros, o complexo também ofe-rece outras alternativas de entrete-nimento: campo de golfe, quadrasde tênis, centro de equitação, qua-dras de paddle, futebol society, cen-tro naútico e kid´s club.

Observa-se que existe entre os empreendedoresuma clara intenção de atingir prioritariamente o mer-cado internacional. Entretanto, os agentes sabemque esta é uma meta de alcance a médio prazo, umavez que estão operando com o seguinte cenário: até2001, pelo menos 75% dos visitantes deverão serbrasileiros; 10% latino-americanos; 10%, europeus e5%, americanos do norte. A expectativa é que, em2004, metade dos turistas sejam estrangeiros.

Do ponto de vista da população local, essemega empreendimento poderá, a depender dasações implementadas, constituir-se em impulsiona-dor de avanços na qualidade de vida dos morado-res. Isso porque, apesar da proximidade física deSalvador (100 Km) ou de localidades turísticas co-nhecidas internacionalmente, como é o caso daPraia do Forte, os habitantes dos vilarejos dessaregião vivem, em muitos casos, em condições pró-prias de outro tempo histórico.

Aí temos uma situação de dupla face. O referidocomplexo hoteleiro pretende empregar diretamente2.500 profissionais, e expectativa dos empresários éde que pelo menos metade destes sejam origináriosda região. Dispondo de um nível de escolaridademédio de 7a série e pouco informada a respeito dosofisticado mundo da hotelaria, esta mão-de-obraterá que, necessariamente, passar por um intenso

processo de qualificação, que lhe permita responderao nível de exigência dos clientes que estão pagan-do entre R$ 200,00 e R$ 500,00 de diárias.

Nesse sentido, vale destacar o importante tra-balho que vem sendo desenvolvido pelo Institutoda Hospitalidade. Veja-se como esta instituiçãodescreve a sua missão social:

O IH foi criado em dezembro de 1997 por 32 expressivas

entidades que atuam nas áreas de educação, trabalho, cul-

tura e turismo, entre as quais a Fundação

Odebrecht, sua instituidora. Em seu traba-

lho, visando contribuir para promover a

educação e a cultura da hospitalidade, o

Instituto consolidou uma concepção de

educação profissional que ultrapassa os li-

mites do conceito de escola como um esta-

belecimento físico. A concepção do IH

abrange todas as ações que despertam a

consciência da importância da qualificação,

aprimoram o desempenho profissional e alargam a compe-

tência coletiva, buscando a melhoria da qualidade de vida

das populações. Vem potencializando, assim, um círculo vir-

tuoso, que tem como pólos a educação e a cultura, de um

lado, e o desenvolvimento sustentável, de outro.

No caso da Costa dos Coqueiros, o Instituto daHospitalidade desenvolve ações visando integrar apopulação dessa região ao pólo turístico que estásendo formado na Linha Verde. Mais uma vez, ire-mos recorrer às definições e aos conceitos empre-gados pelo Instituto quanto à natureza e ao desen-volvimento de seu trabalho:

O Programa Costa dos Coqueiros foi montado para realizar

ações de apoio ao desenvolvimento microrregional sustenta-

do no Litoral Norte da Bahia. Tem por objetivo o fortaleci-

mento socioeducativo e econômico das comunidades exis-

tentes na região, através da integração das cadeias

produtivas regionais e da elevação dos níveis de educação,

renda e ocupação. Para tanto, atua em diferentes dimen-

sões: mobilização social, com educação básica para cidada-

nia e educação profissional; e valorização de competências

tradicionais existentes (artesanato, agricultura e pesca). Vi-

sando integrar esses cidadãos aos empreendimentos turísti-

cos ou participando de iniciativas para formação de novos e

pequenos empreendedores em negócios criados para forne-

cer bens, produtos e serviços.

As prováveismudanças que seanunciam para o

vetor norte de Salvadortornarão tais

investimentos públicosmais que necessários,

urgentes.

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.17-21 Dezembro 2000 19

Para a implementação dessas ações, até junho de 2000 já

foram aplicados recursos da ordem de R$ 2,5 milhões, cap-

tados do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), através da

Secretaria de Trabalho e Ação Social da Bahia. Tem como

parceiros executores o SENAI, SENAC, SEBRAE e a orga-

nização não-governamental AVANTE, e apoios da Funda-

ção Banco do Brasil e da Secretaria de Formação e

Desenvolvimento Profissional do Ministério do Trabalho e

Emprego – (SEFOR-MTE).

Através do seu Programa de Qualificação Profissional e das

ações voltadas para melhoria da qualidade dos serviços de

turismo, o IH vem trabalhando em consonância com as dire-

trizes de programas de desenvolvimento e com o Plano Na-

cional de Educação Profissional, que enfatiza a ampliação e

mudança do perfil da oferta, compreendendo programas

educacionais, em bases contínuas, com vistas à empregabi-

lidade da população.

Como resultado desse trabalho, espera-se que cerca de

2.750 pessoas, moradoras de sete localidades da região de

Costa dos Coqueiros, sejam contempladas com cursos de

Capacitação Profissional, de Qualificação Preparatória para

o Turismo e de Capacitação Instrumental. Para tanto, são

ministradas aulas de idiomas (inglês e espanhol) e informáti-

ca aplicada ao turismo, assim como cursos de manutenção

para hotelaria e entretenimento e lazer.

Para cumprir seus objetivos o Programa desenvolve, com o

apoio do SEBRAE, do SEFOR e da Fundação Banco do

Brasil, as seguintes iniciativas:

Programa de Qualificação Profissional – Ação que prepara,

recicla e aperfeiçoa profissionais do turismo. Inclui curso de

inglês e informática;

Programa de Apoio ao Desenvolvimento Sustentado – Tra-

balha para educar e formar o processo de desenvolvimento

sustentado;

Agricultura Familiar – Busca melhorar a produtividade do

agricultor e ensina técnicas ecologicamente corretas;

Artesanato de Palha – Aproveita a tradição local, orientando para

a produção em escala maior e mais diversificada. Esta ação des-

cobriu o trabalho das trançadeiras, que utilizam a palha de

piaçava, que possui maior elasticidade e durabilidade, para con-

fecção de bolsas, tapetes e outros acessórios de moda e decora-

ção. Não se tem notícia de aproveitamento de material seme-

lhante em qualquer outra localidade do mundo. Esta iniciativa já

acertou a instalação de um ponto de venda de produtos e de-

monstração da técnica dentro do complexo hoteleiro;

Oficina de Artesanato – Local onde podem ser realizados

trabalhos com palha de piaçava, fibras de coqueiro, cipó e

licuri, entre outros materiais da região;

Oficina de Construção Civil – Local para cursos de noções bási-

cas de construção, instalação elétrica e hidráulica de residências;

Oficina de Transformação de Alimentos – Local para produ-

ção de farinha de mandioca, polpa e compotas de frutas tro-

picais, doces, quitutes típicos, que podem ser comercializa-

dos com estabelecimentos locais e oferecidos aos turistas;

Oficina de Técnicas Agrícolas – Local para cultivo de plantas

ornamentais, incluindo orquídeas e flores regionais, além de

plantas utilizadas em chás, como medicamentos;

Oficina de Hospitalidade – Espaço com apartamento, cozi-

nha e recepção para treinamento de profissionais que traba-

lham em hotel (Instituto de Hospitalidade, 2000).

Para que o turismo na Bahia venha a se consti-tuir em uma alternativa rentável para os empresáriose satisfatória para os baianos, ações de diversos ti-pos deverão ser implementadas. Investimentos eminfra-estrutura urbana e educação em todos os ní-veis, não-somente na profissionalizante, talvez se-jam as medidas mais urgentes que os gestorespúblicos devam incentivar e promover nesses pó-los. Considerando que se esgotou a etapa do turis-mo pautado no princípio da espontaneidade, a tô-nica do momento é o turismo profissional.

Referências Bibliográficas

GAZETA Mercantil, São Paulo: 30 set. 2000.

GAZETA Mercantil, São Paulo: 18 out. 2000.

GOTTSCHALL, Carlota. Cidade e Identidade Cultural: um estu-do de caso da convergência entre cultura de massa e culturapopular no Shopping Iguatemi. Dissertação (Mestrado deComunicação e Cultura Contemporâneas) – Faculdade deComunicação, Universidade Federal da Bahia, 2000.

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20 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.17-21 Dezembro 2000

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uacaCodatsoC 151.67 792 086.42 615.88 394.311 544.102

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otnemirbocseDodatsoC 361.73 957.35 974.72 010.37 842.451 403.302

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sartuO 877.13 739.51 430.51 410.021 589.051 783.902

lanifetnatnoM 072.265 587.241 776.144 569.717 724.203.1 730.541.2

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TCS/ruteduS:etnoF

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.17-21 Dezembro 2000 21

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anitnamaiDadapahC 96 593 56 349 051 000.511 482 833.611

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TCS/ruteduS:etnoF

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22 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.22-28 Dezembro 2000

Em meados de 1999, a Fundação Ondazul deu início a uma

série de consultas ao Ministério do Meio Ambiente com o in-

tuito de levar a cabo um projeto de desenvolvimento susten-

tável na Costa dos Coqueiros, no Litoral Norte do Estado de

Bahia, zona que vem experimentando uma rápida ocupação

territorial induzida pelo eixo rodoviário BA 099, cujas primei-

ras conseqüências são a crescente degradação do meio

ambiente e da paisagem, recursos emblemáticos de um lu-

gar até aqui considerado como privilegiado para habitação e

turismo. O ministério respondeu favoravelmente e um Con-

vênio de Colaboração foi assinado em 15 de outubro de

1999, dando início ao Projeto Vetor Norte. Em 20 de dezem-

bro do mesmo ano, um acordo de colaboração foi assinado

com a Secretaria de Planejamento, Ciência e Tecnologia do

Estado da Bahia (SEPLANTEC) e a Companhia de Desen-

volvimento Urbano da Bahia (CONDER) assegurando condi-

ções de parceria para a realização de partes do estudo.

A abertura da Estrada do Coco, na década de1970, e da Linha Verde, nos primeiros anos de1990, criou novas condições de desenvolvimentopara a orla marítima dos municípios de Lauro deFreitas, Camaçari, Mata de São João, Esplanada,Entre Rios, Conde e Jandaíra. Trata-se de umafranja estreita, com 15 km de largura, em média, e200 km de comprimento, que se estende da porçãonorte de Salvador até a divisa com Sergipe, acom-panhando a BA 099. Encontram-se, nessa franja,emolduradas por uma paisagem característica, qua-tro áreas de proteção ambiental – uma delas com142 km de extensão largura – várias comunidadeslocais dedicadas à agropecuária, pesca e artesana-

to, e praias que representam um dos maiores poten-ciais turísticos do Estado.

Como uma conseqüência da criação, em poucotempo, de condições de interconexão entre Salva-dor, a Costa dos Coqueiros vem sendo intensa-mente ocupada, existindo de fato a possibilidadede que grande parte dela se transforme, nos próxi-mos 20 anos, no eixo de uma cidade linear dormitó-rio. A instalação, na década de 1970, do ComplexoPetroquímico de Camaçari e a recente implantaçãodas indústrias Ford e Monsanto, também em Ca-maçari, e do Complexo Turístico Costa do Sauípeem Mata de São João criam novas condições quevão influenciar, de modo decisivo, o desenvolvi-mento da orla marítima comum aos sete municípiosda Costa dos Coqueiros. As novas oportunidadespara investimentos econômicos e, ao mesmo tem-po, o perigo de destruição do patrimônio ambientalfazem com que o desenvolvimento da área deabrangência da BA 099 tenha de ser visto como umdesafio à capacidade das autoridades locais a ori-entar o crescimento econômico na direção do de-senvolvimento sustentável.

Como exemplo similar aos processos que estãose intensificando na orla de Camaçari, podemos ci-tar o caso da Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, queexperimentou um processo de desenvolvimento se-melhante há 30 anos. A Barra da Tijuca tem hoje ummilhão de habitantes – o mesmo que pode chegar ater a Costa dos Coqueiros no ano 2020 – e apresen-ta sérios problemas ambientais, de infra-estrutura ede serviços urbanos, trânsito e transporte, constitu-

Costa dos Coqueiros:

Projeto Vetor Norte

Fundação Ondazul*

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.22-28 Dezembro 2000 23

indo-se num dos mais graves problemas urbanos deRio de Janeiro, cidade que perdeu, ainda, uma desuas melhores reservas paisagísticas.

Vários efeitos associados à ocupação desorde-nada do território já podem ser observados na Cos-ta dos Coqueiros. O assentamento da populaçãosem infra-estrutura e serviços básicos, produto daexpansão espontânea das vilas existentes antesde 1970 e da urbanização especulativa, tem produ-zido sérios problemas ambientais, que se manifes-tam na destruição de ecossistemas e recursosnaturais. A urbanização especulativa que tem ocu-pado grandes extensões da orla com lotes desocu-pados e sem serviços ameaça estender-se à LinhaVerde. Só na vizinhança de Porto Sauípe existemmais de 10.000 lotes desocupados, sem infra-es-trutura e serviços. A ocupação efetiva desses lotesimplica sérios riscos para os ecossistemas locais,principalmente para as reservas de água subterrâ-nea e para os manguezais, purificadores naturaisda poluição hídrica. Efeitos similares à invasão doespaço público nos primeiros trechos da AvenidaSuburbana se repetem na faixa de domínio da Es-trada do Coco, em Lauro de Freitas, e avançam ra-pidamente em Camaçari. Todo isso constitui-se emperigo iminente para os recursos naturais e a pai-sagem que fazem da Costa dos Coqueiros um lu-gar privilegiado de residência e de turismo.

O Projeto Vetor Norte

A Fundação Ondazul constituiu uma equipeinterdisciplinar de trabalho, que abordou o estudo emtrês frentes, estreitamente vinculadas às possibilida-des de estabelecer uma política de desenvolvimentosustentável na Costa dos Coqueiros: a) coleta e siste-matização da informação necessária para avaliar asensibilidade biofísica da área de abrangência em fun-ção da utilização do solo; b) evolução provável no futu-ro, levando em conta as tendências atuais e as mudan-ças previsíveis, assim como as características de ummodelo desejável e viável de desenvolvimento susten-tável; c) condicionantes de eficiência da estrutura insti-tucional e política necessária para orientar o desenvol-vimento sustentável, coibir atividades degradantes daqualidade ambiental e assistir às comunidades exis-tentes dentro da área de abrangência, nos seus pro-cessos de integração cultural em face de mudanças

econômicas e sociais inerentes ao desenvolvimentosustentável. No momento atual, fins do ano 2000,como o projeto entrando na sua fase final, os estudosproduzidos podem se resumir da seguinte forma:

Sistematização da informação disponível,análise de sensibilidade biofísica e conflitosambientais

Os trabalhos fornecem informações básicas parao conhecimento, planejamento e gestão, a partir deuma macroleitura ambiental sistêmica, constituindosubsídios para a compreensão dos elementos físi-cos e ambientais que são essenciais para a avalia-ção dos impactos dos usos do solo, atuais e futuros,decorrentes das novas dinâmicas econômicas queestão se implantando. Para isso, foi produzida a pri-meira integração de dados, considerando o seu as-pecto territorial, em uma macroescala, a partir de umprotótipo de sistema de informações geográficas,que poderá ser progressivamente aprofundado nosentido de apoiar os futuros processos de desenvol-vimento e gestão. A cartografia digital existente foiintegrada de maneira a fornecer informações geor-referenciadas em diversas escalas de abordagem.

Informações necessárias para a compreensãoda base físico-ambiental da área foram processa-das a partir de mapas geo-ambientais na escala1:25 000, em que as unidades foram simplificadaspara fins de planejamento, associando-se atributosindicativos de fragilidades físicas. Foram assim ma-peados os principais usos que pudessem se consti-tuir em riscos ambientais, o que permite uma visãoterritorial das dinâmicas econômicas atuais queirão apoiar a construção de futuros cenários. A par-tir desses elementos foram individualizados quatromacrocompartimentos associados às dinâmicas ur-banas incidentes e a três níveis de risco ambientaisdiferenciados (Mapa 1).

Os riscos e conflitos ambientais apresentamuma concentração decrescente de sul para norte,indicando uma forte polarização de atividades vin-das de Salvador. Esses elementos confirmam umaconfiguração essencialmente vetorial, orientada desul para norte, que permite a adoção de medidaspreventivas para evitar que processos ambiental-mente insustentáveis verificados na parte sul dovetor possam se repetir nas áreas a norte (Mapa 2).

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Dessa maneira, verifica-se o fenômeno, já obser-vado, de uma considerável degradação da qualidadeambiental, conseqüência de usos do solo conflitantescom a natureza dos ecossistemas locais. A informa-ção coletada e processada oferece insumos para ori-entar políticas de desenvolvimento sustentável e dire-trizes de manejo do uso do solo. É interessante notarque os efeitos ambientais negativos estão diretamen-

Mapa 1 - Macrocompartimentação - distribuição dos riscos ambientais

te relacionados com altas intensidades de ocupaçãode áreas de grande fragilidade biofísica. Isso tornamais difícil conciliar a preservação da qualidade ambi-ental com as atuais características do mercado imobi-liário e com a tecnologia disponível. Não é impossível,porém, criar condições “ambientalmente corretas” nomercado da terra e adotar tecnologias construtivasadequadas aos ecossistemas, que se tornem, assim,parâmetros orientadores da ação política local. A si-nalização de terrenos de menor risco ambiental per-mitirá também orientar novas atividade produtivas ehabitacionais para áreas de menor pressão sobre osrecursos naturais

A informação processada nesta parte do trabalhooferece ainda elementos básicos para novos estudosque porventura venham a ser necessários no futuro.

Enquête de opinião sobre a Costa dosCoqueiros

A evidente precariedade das projeções socioe-conômicas num momento de mudança histórica deparadigmas e estratégias políticas levou a equipeencarregada do Projeto a escolher a opinião individu-al de muitas pessoas como fonte de cogitação do quepoderá acontecer com as forças que orientarão o ca-ráter da Costa dos Coqueiros no futuro. Para isso efe-tivou-se uma enquête com pessoas de notório saber

Mapa 2- Áreas Críticas x fragilidadebiofísica

SETOR IV – Área rural com turismo incipiente (Baixo risco): áreas nitidamenterurais, com povoados em estágio inicial de crescimento, onde grande parte dosrecursos naturais apresentam-se em elevado estado de conservação, com grandevocação para atividades turísticas ecológicas.

SETOR III – Áreas turística diversificada (Turismo espontâneo + TurismoInternacional de massa) – (Risco moderado): áreas em processo de crescimentourbano, com ambientes naturais em processo inicial de degradação decorrentes deatividades turísticas espontâneas induzidas por Salvador e por projetos turísticosinternacionais.

SETOR II – Área de expansão urbana de Salvador para residência fixa e 2a

moradia (Alto Risco): ambientes naturais fortemente pressionados, comproliferação de loteamentos em dunas e terras úmidas, com comprometimento daqualidade dos recursos hídricos superficiais e subterrâneos.

SETOR I – Área integrada a mancha urbana de Salvador (Altíssimo Risco):elevadas densidades populacionais, ambientes naturais irreversivelmente alteradoscom qualidade comprometida.

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.22-28 Dezembro 2000 25

Problemas e recomendações foram levantadosna pesquisa e, como uma síntese, pode-se dizerque a região é percebida como:• essencialmente residencial / turística / de lazer

(multicultural, multiambiental, social e economi-camente diferenciada);

• frágil em termos ambientais e ameaçada porforças econômicas diversas (agredida pela for-ma como foi ocupada e ameaçada por novosempreendimentos e formas de uso de seus re-cursos naturais e paisagísticos);

• fragmentada em termos de gestão institucionalpor estar dividida em sete prefeituras municipaiscom seus interesses peculiares;

• frágil em termos culturais diante da vinda deempreendimentos que afetam a vida das comu-nidades originais, os seus modos de vida emesmo as suas atividades produtivas;

• deficiente em estudos que possam orientar osagentes econômicos e sociais em termos desuas limitações e de suas potencialidades;

• carente em termos de infra-estrutura física e so-cial, sobretudo em relação à saúde, educação esegurança;

• desconsiderada em termos da participação so-cial e política de suas populações em relação àsdecisões tomadas pelas autoridades e por ou-tros agentes que investem na região;

• segregada em razão de empreendimentos queimpedem o livre trânsito da população, taiscomo hotéis e loteamentos que fecham o aces-so à praia;

• conflituosa em razão dos diferentes interesses emjogo, sobretudo os do setor imobiliário, envolven-do as populações locais e os loteamentos, mastambém as comunidades tradicionais e agenteseconômicos do setor de serviços: bares, restau-rantes, barracas de praia, pousadas e hotéis;

• descompensada em termos educacionais, cul-turais, econômicos e sociais, quando se con-frontam as populações locais e as de fora, queutilizam a região como moradia suburbana iso-lada ou em condomínios fechados, veranistas,visitantes e turistas formais;

• politicamente problemática em termos de ges-tão municipal por não conter nenhuma cidadenem atividades econômicas relevantes paraseus respectivos municípios;

(planejadores, urbanistas, ambientalistas, empresá-rios, comerciantes) com o objetivo de compreendero modo de pensar e de conceber a ocupação espa-cial, social, cultural, ambiental e econômica da franjalitorânea do Vetor Norte, que compreende o eixo daEstrada do Coco e da Linha Verde.

Em termos metodológicos, a enquête consistiunuma amostra aleatória de 63 questionário – den-tre os 250 enviados e os quase 90 recebidos – con-siderando o tempo limite para a realização daapuração dos resultados. Como o universo pesqui-sado foi delimitado a priori, não há registro de pro-blemas de legitimidade ligados à amostra.

A enquête apontou como predominantes: a pre-ocupação com o meio ambiente, a seletividadedessa área para a atividade turística, seu caráterresidencial para moradores de Salvador em buscade conforto, segurança e tranqüilidade e seu cará-ter de segunda moradia, de veraneio e de visitaçãoem finais de semana. Em resumo: área a ser res-guardada de efeitos perversos, sejam eles deriva-dos da industrialização, do não-ordenamento douso e da ocupação do solo, da exploração predató-ria de recursos naturais ou dos maciços florestais,da agricultura sem manejo adequado, da caça epesca predatórias.

Na sua maior parte, os entrevistados percebemessa extensa faixa costeira como constituída de lu-gares privilegiados para os tempos do não-traba-lho, como refúgio das turbulências urbanas e, aomesmo tempo, como um meio ambiente a ser res-guardado por ser capaz de ofertar prazer, segu-rança, bem-estar... enfim, valores que devem serpreservados e bem usufruídos.

A idéia de planejar, a partir da concepção de de-senvolvimento sustentável, o Vetor Norte, foi reconhe-cida, por unanimidade, como importante e necessária,assim como a concepção de VETOR, que orienta omodo de compreender essa franja litorânea comtodas as suas potencialidades: econômica (turísti-ca e produtiva com tecnologias limpas), cultural(históricas e existenciais), natural (paisagística e defruição de seus ambientes praieiros) e ambientais(natureza viva), predomínio da beleza e da diversi-dade de vida (fauna, flora, lagoas, rios, dunas emar). Tudo isso configurando um extenso espaçorepleto de lugares que proporcionam condiçõespara a vida e significado para a existência.

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• problemática politicamente para alguns municípiosem razão de algumas localidades se constituíremem potencial de desenvolvimento econômico e,com isso, postularem desmembramento político.Enfim, multifacetada, a Costa dos Coqueiros é

constituída de diferentes ambientes naturais e cul-turais, com diferentes potencialidades socioeconô-micas e culturais, porém integrada pelo sistemarodoviário Estrada do Coco/Linha Verde.

Proposta de criação doConsórcio Intermunicipal deCosta dos Coqueiros

É muito claro que para evitar osperigos ambientais que se apresen-tam na faixa litorânea da Costa dosCoqueiros é preciso dispor de meioseconômicos e políticos de maior porte que aquelesatualmente à disposição dos municípios dessa mi-crorregião. E, ainda mais, para substituir um processodesordenado de ocupação por uma estratégia de de-senvolvimento voltada para maximizar o bem-estarde uma população que possivelmente atingirá um mi-lhão de habitantes no ano 2020. Isso ocorre sobretu-do por que as políticas repressivas são pouco efica-zes se não acompanhadas de empreendimentospúblicos e estímulos à atividade privada, alinhadacom um modelo de desenvolvimento sustentável.Para tanto, a ação individual de cada um dos setemunicípios da Costa dos Coqueiros é insuficiente.Nessas condições, a concentração de poder políticoe econômico, que só uma gestão compartilhada podeoferecer, aparece como indispensável.

O Projeto Vetor Norte propõe que as sete prefei-turas municipais da Costa dos Coqueiros constituamum Consórcio Intermunicipal, nova instância políticacriada por livre determinação das autoridades muni-cipais e com autonomia suficiente para:• adotar um modelo de desenvolvimento susten-

tável limitado à área de abrangência do proje-to, definida, em princípio, por um retânguloconfigurado por uma linha paralela a cinco qui-lômetros ao oeste do eixo rodoviário Estradado Coco/ Linha Verde e 10 milhas a leste apartir da linha de costa entre Salvador e a divi-sa com Sergipe; a área de referência será de-terminada com maior precisão pelo próprio

Consórcio depois de sua formalização;• adotar um modelo de manejo territorial com indi-

cação de usos do solo e normas de conservaçãodo ambiente natural e do patrimônio cultural;

• definir projetos de interesse comum visando asua execução de forma compartilhada, com oapoio de recursos próprios e externos;

• procurar investimentos públicos e privados neces-sários à efetivação de projetos de interesse co-mum, com participação de recursos financeiros

estaduais, federais e internacionais;• adotar um modelo de gestãocompartilhada que congregue aparticipação da população, dasempresas públicas e privadas e deiniciativas comunais;• providenciar assistência técnicae institucional para o desenvolvi-

mento de comunidades locais;• levar a cabo programas de educação cívico-am-

biental nas escolas, nos centros comunitérios ecom os funcionários municipais;

• dirigir as ações de um corpo técnico encarregadoda execução de projetos de interesse comumpara o Consórcio.Para tanto, seria preciso criar um sistema institu-

cional com as seguintes características:

Colegiado Intermunicipal

O Consórcio estaria governado por um ColegiadoIntermunicipal, integrado pelos prefeitos de Lauro deFreitas, Camaçari, Mata de São João, Entre Rios,Esplanada, Conde e Jundaíra, que se constituiria nainstância superior de decisão autônoma em políticase projetos municipais de interesse comum no campodo desenvolvimento sustentável. O Colegiado Inter-municipal seria presidido de forma rotativa por umdos prefeitos consorciados com mandato de um ano.Além de presidir ao consórcio, ao prefeito-presidentecaberia dirigir as gestões financeiras dos projetos deinteresse comum do Consórcio.

Fórum permanente para odesenvolvimento sustentável

Seria uma assembléia de pessoas físicas e jurí-dicas com interesses econômicos, sociais, culturais

O Projeto Vetor Nortepropõe que as sete

prefeituras municipais daCosta dos Coqueiros

constituam um ConsórcioIntermunicipal.

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e ambientais localizados na região, tais como asso-ciações de moradores, empresas públicas e priva-das, proprietários de terras, Ongs, associaçõessetoriais, universidades, clubes de serviços e pes-soas naturais atuando como simples cidadãos.

O Fórum se reuniria periodicamente com o pro-pósito de apresentar e discutir iniciativas e propos-tas que possam ser declaradas de interesse co-mum pelo Colegiado Intermunicipal. Propostas decaráter global, tais como políticas microrregionaisde desenvolvimento sustentável e uso dos recur-sos naturais, sociais e culturais, teriam prioridadenos debates do Fórum. A apresentação e a discus-são no Fórum seriam condições necessárias paraque qualquer projeto pudesse vir a ser declaradode interesse comum pelo Colegiado Intermunici-pal. O Fórum seria convocado, periodicamente,por um presidente eleito pela Assembléia na suaprimeira reunião, devendo esta primeira assem-bléia ser convocada pelo Presidente do ColegiadoIntermunicipal.

Secretaria executiva

Órgão de apoio técnico, com capacidade parapreparar, executar, gestionar e acompanhar proje-tos de interesse comum do Consórcio; monitorar asformas de uso do solo dentro da área de abrangên-cia; identificar obras públicas e serviços necessári-os para melhorar as vantagens comparativas daregião e incentivar empreendimentos de desenvol-vimento sustentável, assim como coordenar os ser-viços técnicos e de planejamento dos municípiosconsorciados na execução e acompanhamento deprojetos de interesse comum. A Secretaria Executi-va seria também o órgão gestor de recursos inter-nos e externos para a execução de projetos de in-teresse comum do Consórcio. Os custos deadministração e operação da Secretaria Executivaseriam arcados pelos municípios consorciados,conforme contribuição a ser definida pelo colegia-do, e pelo governo do Estado.

Comentários finais

O Projeto Vetor Norte tem algumas singularida-des que poder ser destacadas:• estudo teórico, faz parte de um propósito prático,

ou seja, o conhecimento técnico é utilizado paracriar condições executivas e não inversamente;

• parte-se de uma visão realista: para aplicar odesenvolvimento sustentável, mesmo que numpequeno espaço geográfico, é necessária aconcentração de poder e recursos, materializa-da, neste caso, por um consórcio intermunicipal;

• a idéia de consórcio intermunicipal exclui qual-quer forma de cerceamento do poder político domunicípio e adota a forma de uma corporaçãode serviço com propósito de desenvolvimentomunicipal coletivo;

• amplamente utilizada no Brasil, a idéia de con-sórcio intermunicipal, neste projeto, refere-se,de forma pioneira, a um eixo ou vetor de desen-volvimento, entendido como dinâmica de de-senvolvimento canalizada por uma via de trânsi-to e transporte;

• o projeto define a priori o desenvolvimento sus-tentável como o objetivo final do consórcio. Odesenvolvimento sustentável deve adotar, toda-via, forma concreta sob forma de projetos de in-teresse comum definidos dentro dos mecanis-mos funcionais do próprio consórcio (Fórum deDesenvolvimento Sustentável);

• a estrutura institucional do consórcio incorporaa participação do setor privado e da sociedadecivil por meio da definição de projetos de inte-resse comum pelo Fórum de DesenvolvimentoSustentável, condição que deverá ser submeti-da, todavia, à aprovação pela cúpula política doConsórcio, o Colegiado Intermunicipal;

• as limitações impostas pelo caráter radical dastendências e paradigmas atuais que reduzem ovalor real das projeções convencionais são,neste projeto, compensadas pela consulta múl-tipla e simultânea a interlocutores qualificados epela contínua discussão dentro da equipe, emcondições que admitem recursos de intuição,conjetura lógica e imaginação destemida. O ris-co de erro é grande, mas deve ser consideradocomo risco calculado em face das limitações ob-servadas na prática de métodos convencionais.

* A elaboração do artigo é de Eduardo Neira Alva, arquiteto,mestre em urbanismo, professor universitário e consultor

internacional; Juca Ferreira, sociólogo, ambientalista, membroda Comissão Federal da Agenda 21 e vereador

da Cidade de Salvador.

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O Programa de Planejamento de Gerencia-mento Ambiental da APA-LN, objeto de

convênio de cooperação técnica entre os gover-nos brasileiro e britânico, com a interveniência daABC, do lado brasileiro, e do DFID, do lado britâ-nico, objetiva desenvolver aquela região litorâneado norte do Estado da Bahia, de acordo com osprincípios do desenvolvimento sustentável, ouseja, um desenvolvimento que seja economica-mente eficaz, socialmente justo e ambientalmenteequilibrado.

O Governo do Estado, ao criar a APA-LN (em1992), designou a CONDER como entidadegestora. A CONDER elaborou um Plano de Manejoe o Zoneamento Ecológico-econômico para a área(aprovados pelo CEPRAM em 1995), sempre ten-do em mente que esta APA está inserida num con-texto socioeconômico e ambiental frágil, que vemsofrendo pressões de toda sorte dadas as caracte-rísticas de seus recursos naturais, paisagísticos eculturais, e com vocação para o turismo.

A partir dos instrumentos mencionados no pa-rágrafo anterior, foi acordado o termo de coopera-ção técnica com o governo britânico (novembro1997), objetivando a implantação e atualização deum Programa de Planejamento e GerenciamentoAmbiental Integrado – PPGA da APA-LN.

Para desenvolvimento do Projeto foram pac-tuadas parcerias com órgãos do governo esta-dual e as prefeituras situadas no polígono daAPA. O sucesso do Projeto depende, além dosacordos interinstitucionais, da participação dosinteressados na área. Que são, em primeiro lu-gar, as populações residentes, que na realidadeserão as mais afetadas pelos impactos negati-vos ou positivos dos projetos de desenvolvi-mento que se estão instalando na região. Osoutros interessados são os empresários, os in-vestidores, os proprietários de terra, as organi-zações não-governamentais (ONGs) etc., osquais, em parceria com as instituições públicas,deveriam desenvolver projetos/planos de açãointegrados visando ao desenvolvimento da APALN com sustentabilidade para as atuais e futu-ras gerações.

O principal objetivo deste Projeto é, pois , auxi-liar as várias instituições governamentais e não-governamentais, com a participação das comuni-dades envolvidas, a elaborar e implementar umprograma que defina critérios para a tomada dedecisões necessárias, em busca do desenvolvi-mento econômico e social com a conservação eproteção do meio ambiente.

Programa de Planejamentoe Gerenciamento Ambiental/PPGA

para o APA Litoral NorteBahia

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.29-42 Dezembro 2000 29

Qual Salvador?

Para quem sempre esteve acostumado comuma certa imagem de Salvador, sem se dar contado alcance das imensas e abruptas transforma-ções que a cidade sofreu no decurso das últimasduas ou três décadas, cabe colocar esta pertinen-te questão: de que Salvador se trata? De que Sal-vador se fala? Porque, para começar a compre-ender a nova cidade-região-cidade ou cidade-região,faz-se necessário recorrer a uma breve análiseacerca dos movimentos mais gerais e mais deci-sivamente determinantes para a definição de seunovo elenco de papéis. É preciso, pois, abordaros grandes movimentos que se articulam nos pla-nos internacional e nacional e de que maneiraesta articulação se completa na região nestas úl-timas décadas e compreender como os ciclos dedesenvolvimento inerentes a tais movimentos fi-zeram – levando-se em conta as profundas mu-danças nos métodos e processos de organizaçãodo trabalho e da produção – a cidade pulsar, emmovimentos interligados de expansão e retração.O arcabouço inicial desta análise tem seu acaba-mento teoricamente definido nos seguintes ter-mos: o processo de mundialização dos fluxoseconômicos de um capitalismo “globalizado”, istoé, que completa seu domínio mundial sobre todosos demais modos de produção, tem produzidoprofundas transformações na estrutura e nos pa-péis de cidades e regiões.

Passos iniciais da dissolução

Quando da emergência e das investidas da in-dustrialização incentivada entre os anos 60 e 80,Salvador dividia, com vantagens, com Recife, estepapel de articulação de atividades e regiões dedentro do Nordeste e do Nordeste com outras regiõesdo País.2 O papel de articulação intra e inter-regio-nal exercido por Salvador em todo o estado daBahia e no Nordeste brasileiro estava apoiado nasatividades industriais localizadas em sua regiãometropolitana e em toda a estrutura terciária e polí-tico-administrativa, localizada no interior da cidade,que servia de apoio ao conjunto da economia in-centivada em todo o seu movimento e em todas assuas relações dentro e fora da região. À medidaque o ciclo, da indústria incentivada pela SUDENEfoi e vem sendo esvaziado, este papel, exercidopor Salvador (e, em segundo plano, por Recife)3

também tem se esvaziado. Esgota-se um ciclomas, malgrado novas tentativas, não renasce ain-da um ciclo novo observável no imediato horizonteempírico.

O papel exercido por Salvador estava respalda-do por uma estratégia, traçada e executada pelaSUDENE, que, não obstante toda crítica que lhepossa ser feita, era facilmente identificada em suafisionomia, aliás sobejamente clara – enquanto du-rou, obviamente. Mas esta estratégia, com a eco-nomia que lhe dava suporte, entrou em visívelprocesso de dissipação com a retirada, a retraçãoe a diluição da presença do governo federal (que

Salvador na “globalização”1

Edgard Porto*

Edmilson Carvalho**

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era feita com exclusividade) no Nordeste brasileiro.Em lugar daquela estratégia, assiste-se hoje aações e intervenções pautadas em promoção deincentivos e subsídios nos marcos da chamada“guerra fiscal” entre estados e municípios e a au-sência de uma política industrial nacional que en-caixe nela as especificidades regionais. Busca-sedar impulso ao turismo e à “indústria cultural” emalgumas áreas de determinados estados, noutrasatrair, com evidentes “mercados políticos” (pesa-das promoções e doações de financiamentos,infra-estrutura, renúncias fiscais etc., para baixaros custos dos novos investimentos em unidadesprodutoras de bens-salários: calçados, bebidas,confecções etc.) e, até, montadoras de automó-veis, porém, de todos modos, empreendimentos eunidades na sua maioria dispersos em vários muni-cípios, sem a garantia, outrora existente, de umacompactação industrial que poderia elevar as eco-nomias de aglomeração e pôr em evidência as eco-nomias de escala. A rigor, os investimentos atéagora realizados ou anunciados não dão qualquergarantia de que se está no limiar de um novo ciclopara a região ou para qualquer de seus estados, namagnitude daqueles realizados nas décadas de 60e 70 e que, no caso da Bahia, reconfiguraram todaa região de Salvador, com maior ênfase para a suametrópole.

Tais iniciativas não garantem a emergência deum novo ciclo para o Nordeste e a Bahia e nem de-finem, por isso mesmo, um novo papel regional cla-ramente identificável para Salvador.

Pulsação para transformação

Os mesmos caminhos (técnicos e sociais) que,a partir das grandes aglomerações urbanas, indus-triais e terciárias, irradiam fluxos de descentraliza-ção espacial de impulsos e capitais nos momentosde boom, servem também a um processo antitéti-co, nos momentos de recessão, consistente emtrazer de volta para as referidas cidades e regiões,dotadas de economias de aglomeração, impulsos efluxos de capitais e de excedentes gerados naseconomias de cidades e regiões “periféricas”, queagora vão constituir e fortalecer o processo opostode re-centralização e re-concentração. Isso equiva-le a dizer que nos momentos de refluxo, como o

que atualmente acontece no Nordeste brasileiro,onde Salvador e sua região metropolitana apare-cem como formadoras do principal complexo urba-no-industrial-terciário do estado da Bahia e de todoo Nordeste brasileiro, as regiões mais dotadas deeconomias de aglomeração minimizam os efeitosdas crises, às vezes dando até passos adiante deexpansão e diferenciação de suas estruturas co-merciais e produtivas, às expensas do esvazia-mento das cidades e regiões ditas “periféricas”. É oque com certa propriedade se pode chamar de“efeito (espacial de) sucção”.

Este efeito, pudemos observar esse traço es-trutural em várias cidades e regiões por nós mes-mos estudadas no estado da Bahia. Isso quer dizerque tais cidades e regiões passam a funcionarcomo potenciadores da centralização de capitais ede fluxos de capital-dinheiro, e da concentração darenda. Não é por outro motivo que – só para dar umexemplo entre muitos outros que poderiam ser aquievocados – a rede bancária de Salvador, num esta-do composto de mais de 400 municípios, concentramais de 86% de todos os depósitos bancários fei-tos em todo o estado. Se levarmos em considera-ção o fato óbvio de que parcela desses depósitosvai servir de meios de compra para o consumo porparte de segmentos da população, enquanto queuma outra parcela vai tornar-se capital-dinheiro,apto a entrar em função, vale dizer, agora disponí-vel, em um grande centro urbano como Salvador,para revalorização do capital no seu espaço metro-politano, concluiremos que as cidades, sobretudoas metrópoles, ao contrário do que normalmentepensam alguns (urbanistas e arquitetos em geral),não são meras justaposições ou articulações deespaços, desenhos e traçados arquitetônicos emcima de uma sociabilidade abstrata e idealizada,mas peças vivas, dotadas de eficazes meios e pa-péis, no mecanismo e movimento da reproduçãodo capital e da específica e inconfundível sociabili-dade que a ela corresponde.

As cidades, sobretudo as metrópoles, constituemelos decisivos do processo de reprodução do capi-tal. Este é exatamente o caso de Salvador e é, deresto, para este fim precípuo que servem suas insta-lações bancárias e financeiras em geral, suas insta-lações comerciais (shopping-centers, supermerca-dos etc.), suas instalações terciárias em geral

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(universidades, instalações hospitalares e de ensi-no, complexos de lazer e de desportos etc.), suasconcentrações de equipamentos de infra-estrutura ede consumo coletivo (aeroportos, rodoviárias, portose complexas unidades produtoras de meios de co-municação: TV, jornais, mídia em geral) e tudo omais – isso sem contar, no caso de Salvador, com oatraente estoque de belezas naturais e construídasnos séculos anteriores. São esses meios que exata-mente operam o “efeito sucção”, uma forma de re-forço da tendência ao monopólio também em termosespaciais. Não obstante o refluxo geral sofrido peloNordeste e pela Bahia na última década sobretudo,Salvador pôde até, por conta desse efeito, seguir umrelativo processo de diferenciação urbana, se bemque, muito naturalmente, dotado de característicasespecificamente suas, de modo restritivo e carre-gando traços de eloqüente diferenciação social,como será visto adiante.

Determinações dos fluxos mundializados

A “globalização” não é, para nós, um estágiointeiramente novo e nem, portanto, desvinculadodo anterior e longo processo de mundializaçãodas relações, formas e forças da produção capita-lista em escala planetária. Se não for vista destamaneira, o termo não passa de uma forma ideoló-gico-tecnocrática que apenas esconde a essênciada questão. Ela é, a um só tempo, continuidade eruptura de toda a evolução que a precedeu. Se sedeseja, contudo, insistir no termo, o que se chamaatualmente de “globalização” só pode ser entendi-do como o estágio mais avançado da mundializa-ção da produção e da circulação capitalistas, valedizer, a conclusão, agora em escala e na totalhorizontalização mundial, da definitiva suprema-cia e dominação do modo de produção capitalistasobre todas as demais formas remanescentes deprodução.

De outra parte, este cerco, que constitui umaunívoca e irreversível totalidade internacional,acontece num momento em que os fluxos econô-micos, financeiros e os emitidos pelos meios de co-municação se deslocam a uma velocidade inusita-da, alguns deles numa rapidez equivalente àpropagação da luz. O que significa dizer que paraalgumas atividades econômicas, cujo peso especí-

fico cresce relativamente no conjunto da economiacapitalista global, sobretudo para aquelas que sãoproduzidas e rotadas através da mídia (com desta-que para os fluxos e as operações mercantis, quejá circulam através da Internet), foram encurtadosem grande medida seus tempos de produção e cir-culação – a rotação de seus capitais portanto4 –, oque implica ainda, como desdobramento, que cres-centes massas de capitais se desloquem para asoperações financeiras e para a mídia, neste últimocaso com seus novos produtos e a veiculação cres-cente do “produto cultural” deve ser salientado queaqui não está em discussão, para o efeito útil denossa análise, a qualidade e o efeito do consumodesse produto, o produto “audio-visual” da “telinha”,do ponto de vista humano5 um problema maior, masque escapa aos desígnios específicos deste pe-queno estudo).6 De fato, com a emergência e a di-fusão da mídia, por onde rotam os referidos produ-tos na forma de valores, muitas funções erespectivos momentos de produção e movimentoscirculatórios, com seus respectivos locis, simples-mente deixaram de existir – havendo, sob tal as-pecto, que não é de modo algum irrelevante, nãosó um “enxugamento” em algumas esferas da divi-são social do trabalho como dos espaços que a taisesferas correspondiam. Como esses locis situa-vam-se e ainda se situam nas cidades antes e aci-ma de tudo, a tais mudanças no perfil da produçãoe da circulação que advêm da difusão da mídia,correspondem profundas mudanças na estruturaespacial das cidades – coisa que será vista, aindaque de modo sumário, indicativo e inicial, mais nafrente, quando tratarmos das transformações espa-ciais de Salvador.

Um outro aspecto da “globalização”, o qual,muito mais do que um mero aspecto, deve ser vis-to e considerado como um de seus componentesonto genéticos, é a substituição dos modos e pa-drões de organização estrutural e funcional do pro-cesso do trabalho e da produção iniciado a partirda crise dos anos 70 e potenciado nas duas últi-mas décadas. Referimo-nos à crise e ruptura domodelo fordista de organização do trabalho e daprodução e sua substituição por todas as formasatuais, estruturais e organizativas, que dão corpo àchamada “reestruturação produtiva” com os recur-sos da informática e da microeletrônica, da

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robótica, da “qualidade total”, do just-in-time, da“re-engenheria” em geral. A principal característicado modelo fordista era a articulação do trabalhoparcelar à linha de montagem no lastro daracionalidade iniciada por Taylor. Tal método, queconfigurava uma extensão e um avanço a partir dotaylorismo e de todo o padrão de produção fabrilque substituiu a manufatura e a cooperação sim-ples dos inícios da industrialização capitalista, am-pliou a escala de aglutinação do chamado “operá-rio-massa”, cuja visualização foi captada comgrande astúcia e sensibilidade por Charles Chaplinem seu monumental “Tempos Modernos.”

Salvador deu início a sua vultosa expansão me-tropolitana tardiamente, vale dizer, a partir das dé-cadas de 60 e 70, quando os incentivos e subsídiosfiscais e financeiros concedidos pelo governo fede-ral através da SUDENE e do BNB trouxeram o pa-drão da produção fordista para o Nordeste brasilei-ro, dando lugar, nesta região, ainda que numaescala muito menor do que a que havia sido im-plantada no Centro-Sul (São Paulo, Rio de Janeiroe Minas Gerais, principalmente) em décadas ante-riores, a concentrações industriais como o Pólo Pe-troquímico de Camaçari, o Centro Industrial deAratu, o Centro Industrial de Subaé, a RefinariaLandulfo Alves, a Usina Siderúrgica da Bahia, asatividades de exploração de petróleo no Recônca-vo baiano, o Porto de Aratu entre muitas outras ins-talações. Em tudo isso estava incluído um ramometal-mecânico que foi principiado e, evidente-mente, todo um terciário, igualmente empregadorde muitos trabalhadores, que teve de ser implanta-do no interior e nas cercanias de Salvador e decentros urbanos do porte de Feira de Santana, se-gunda cidade do estado, também dotada de umcentro industrial.

Foi a combinação do modelo fordista da indús-tria incentivada implantada na Macrorregião deSalvador com o terciário daí deduzido implantadodentro da cidade de Salvador – nos dois casospotenciados pelo alto ritmo de atividade alcançadopela construção civil, que atuou na edificação deinstalações industriais e equipamentos de infra-es-trutura, trazendo também consigo a elevação donível de emprego nas décadas de 60 e 70 – quepropiciou a Salvador o pulo de modestos 600 milhabitantes da década de 60 para os quase 2 mi-

lhões alcançados apenas duas décadas depois.7

Todavia, com a “reestruturação produtiva” (o pres-suposto estrutural) e o neoliberalismo (o corolário polí-tico do pressuposto estrutural), as fronteiras econômi-cas do Brasil (e de outros países “emergentes”)tiveram de ser mais abertas do que já estavam àsmercadorias e aos capitais externos, ambos muitomais competitivos que os nacionais, que atingiram emcheio grande parte da economia brasileira, mormenteas de regiões como o Nordeste (onde se encontra aBahia), situadas a grandes distâncias dos principaiscentros consumidores do País, dos principais centrosdo Mercosul e que agora, sem os velhos incentivos,esbarram em poderosas barreiras como os imensoscustos de circulação e tempos de rotação do capitaldevido às precárias e onerosas condições de trans-portes e infra-estrutura em geral.

Efeitos sobre Salvador

Se antes, nos tempos do fordismo e do cresci-mento espacialmente descentralizado – mesmo emtermos relativos –, a massa de salários suscitavauma inusitada expansão de bairros, com novasmoradias em Salvador, também estes bairros,numa sucessão regularíssima, entram num explíci-to processo de desgaste físico, social e humano.

Uma outra cara desta mesma e ampla meta-morfose a ser destacada é a que diz respeito à es-cala, às formas e à distribuição sócio-espacial dasatividades comerciais e terciárias em geral na Cida-de de Salvador. Por conta do “enxugamento” atrásaludido, que implicou a retração de todas as de-mandas locais (por unidades residenciais, merca-dorias, serviços de saúde, transportes,8 lazer eeducação etc.), as unidades comerciais e produto-ras de serviços tendem a uma curiosa forma de dis-tribuição espacial. Com efeito, proliferam os médi-os e pequenos “supermercados”, “mercadinhos” epequenos shopping-centers em toda a cidade, en-quanto que, no outro extremo, são erguidos osgrandes supermercados e shopping-centers. Entreos da primeira camada, a maioria tem curta dura-ção de vida, sendo muito comum encontrá-lossempre operando em regime de ociosidade; entreos da segunda camada campeia uma centralizaçãode capitais que os coloca quase em situação demonopólio, sendo que, mesmo entre estes últimos,

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encontram-se grandes unidades que operam ape-nas com parte da capacidade instalada. Não há,sem dúvida, em Salvador, espaço de realização,devido à contração social da demanda, para todasas formas de equipamentos fornecedores de servi-ços, que são constantemente inaugurados na cida-de, como uma forma sucedânea de fonte de rendacom a qual certas parcelas da população urbanabuscam compensar o desemprego. Os maioresequipamentos comerciais – os grandes supermer-cados e shopping-centers – fazem sucumbir osmenores, e os dois segmentos juntos, grandes emenores equipamentos deste gênero, fazem su-cumbir o comércio tradicional. No primeiro semes-tre de 1999, cerca de 19 cadeias de lojas foram aconcordata ou fecharam suas portas e, segundo le-vantamentos da Eletros, entidade que reúne os fa-bricantes de produtos eletroeletrônicos instaladosno Brasil, desde 1995 esse número já alcança 140.Segundo uma pesquisa da Fundação Seade e doDieese, o comércio eliminou 31 mil postos de traba-lho em junho, apenas na Grande São Paulo. EmSalvador, recentemente fecharam as portas ou es-tão em processo de venda ou fusão alguns magazi-nes tradicionais como a Mesbla, com cerca de 500funcionários em três lojas, a Arapuã e a Lobrás,que não resistem à competição dos “hipermerca-dos e grandes redes com boa saúde financeira eespecializados”9.

Não é por acaso que setores urbanos inteiros,ocupados por grandes concentrações de casas decomércio, estão sendo literalmente degradados,como o comércio da antiga área central – Baixados Sapateiros, as avenidas Sete de Setembro,Carlos Gomes, Joana Angélica, as áreas da Calça-da e do “Comércio” situadas na “Cidade Baixa”, en-tre muitas outras –, enquanto que novas avenidas,ou conjunto de avenidas (avenidas Antônio CarlosMagalhães, Paralela, Tancredo Neves etc.) assu-mem o topo da concentração espacial do comérciode ponta. Para se ter uma idéia da dimensão desteprocesso concentrador, basta lembrar, por hora,que só em determinado trecho onde se situam osshoppings Itaigara e Iguatemi, que reúne cerca demeia dúzia de ruas e avenidas, são coletados cer-ca de 12% de todo o ICMS comercial arrecadadoem todo o estado da Bahia

Um terceiro aspecto geral que também merece

destaque é o que diz respeito à destinação e às for-mas que tomam as áreas de habitação dos diversossegmentos sociais, grosso modo, as camadas pro-letárias – também as recentemente proletarizadas –e as de média e alta rendas.10 Enquanto as primei-ras, mais numerosas e econômica e socialmentecada vez mais degradadas, espicham-se e empur-ram os limites da cidade forçando a conurbaçãocom cidades próximas (Lauro de Freitas, SimõesFilho etc.) e ocupando habitações construídas semlicença oficial, invasões, encostas e palafitas, orano sentido da BR-324 (estrada que atravessa aárea industrial da região metropolitana e que ligaSalvador a Feira de Santana e ao resto do país)11,ora numa área mais central chamada de “Miolo”(conjunto de bairros proletários densamente povoa-dos que se localizam entre os dois principaisvetores de crescimento atrás ressaltados – o quesegue a BR-324 e o que se estende em demandada Orla Norte), as segundas, cada vez mais restri-tas em número e cada vez mais fortes em termoseconômicos em face do processo de concentraçãoda renda, procuram espaços segregados no senti-do da Orla marítma norte ou em “ïlhas de excelên-cia” (resorts, hortos florestais, conjuntos fechadosnas proximidades de praias de circulação pratica-mente privatizada, sujeitas a fortes esquemas desegurança, formando verdadeiras “fortalezas demoradia”.

Salvador: um conjunto de cidades e regiões

Cenários e tempos diferentes e articulados

Espacialmente, o conjunto dos fluxos econômi-cos e sociais, comentados anteriormente, articula-ram-se com o ambiente natural e construído deSalvador de forma diferenciada em cada ciclo,apropriando-se de espaços distintos e recriando aconfiguração espacial urbana, numa conjunção defatores constituídos da incorporação de novas par-celas territoriais e, ao mesmo tempo, da redefini-ção de usos e de ocupações de áreas já existentes.

É possível identificar três momentos distintos,seqüenciados e articulados, que moldaram pratica-mente três cidades diferenciadas nas últimas trêsdécadas.

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O primeiro momento é caracterizado pela for-mação do parque industrial no Centro-Sul do País,que, dentro da divisão nacional de funções espaci-ais, sugeria ao Nordeste brasileiro e suas metrópo-les o papel de mercados de consumo dos seusprodutos industrializados e alimentadores dos flu-xos de mão-de-obra para sua produção.

O segundo momento, iniciado nas décadas de60/70, já foi caracterizado como aquele no qualhouve um processo de descentralização de capi-tais no sentido do Nordeste e, em particular, para aRegião de Salvador. Naquele momento, essa me-trópole deixou de servir como mero entreposto co-mercial para assumir o papel de locus de capitaiscom perfil e porte modernos.

O terceiro momento, que é o mais importantepara o nosso caso, difere dos dois momentos ante-riores em função da escala global que assumiramos fluxos econômicos e o papel estatal na condu-ção das políticas de desenvolvimento econômico.Neste momento, encontra-se uma cidade com ochassi montado, com as nucleações de atividadescomerciais e de serviços definidas por subespaçosespecializados e complementares e uma rede viá-ria e de equipamentos capazes de articular todosos seus subespaços, como também o seu conjuntocom outras regiões do Brasil e de outros países.Esta fase se caracteriza por uma associação do pro-cesso de descentralização ocorrida na fase anterior,agora com menor ímpeto, com um adensamentodos núcleos de atividades comerciais, de serviços eresidenciais, numa espécie de enxugamento espaci-al composto de processos de transferências inter-nas e da incorporação de novos valores urbanos.Adensam-se as nucleações recentemente descen-tralizadas e esvaziam-se centros históricos e cen-tros comerciais exuberantes até a primeira fase,constituindo um movimento cuja principalidade é ade uma tendência à qualificação majestosa de flu-xos e de infra-estrutura em espaços competitivos,contrapondo-se à queda das condições de habita-bilidade na maioria da cidade. É o que se pode cha-mar de reconcentração descentralizada; é o quepromove a expansão terrritorial para almejar maio-res concentrações pontuais; é, numa palavra, o pa-radoxo criado pelos distintos meios de circulaçãodos fluxos de mercadorias e de pessoas, quebran-do espacialmente alguns laços de proximidade e

elegendo determinados eixos que concentram flu-xos econômicos estruturantes, tanto para interligarespaços, independemente deles estarem na mes-ma área urbana, quanto para rebaixar custos deprodução.

Em síntese, podemos afirmar que: da cidade deum único centro até o início da década de 70, quefuncionava como centro de articulação comercialentre mercadorias produzidas em outras regiõesdo Brasil e da Bahia, a metrópole baiana alcançouo início dos anos 90 como uma outra configuraçãofísica – várias centralidades –, para responder aseu novo papel, agora também como locus de pro-dução industrial de corte e porte moderno.

Essa passagem de uma cidade que mantinhasua estrutura e sua função – com pequenas altera-ções – por alguns séculos, para uma outra cidadeque era inserida tardiamente nos circuitos mais ele-vados de capitais, notadamente o industrial, e queteve que modernizar todos os componentes da suaestrutura interna, resultando em uma outra cidade,pode ser medida com a ajuda de alguns indicado-res. “Em 1975, a área central participava com qua-se 30% do total das viagens de transporte coletivodentro do município, enquanto em 1994 essa parti-cipação reduziu-se para 18%. Hoje, somente azona do Cabula e Pernambués participa com cercade 12% dessas viagens e a Pituba com mais de10%.” Se analisarmos o percentual de arrecadaçãode ICMS estadual, a área correspondente à Calça-da, Santo Antônio, São Pedro, Nazaré, CampoGrande e Barra, “representava, em 1985, 19,1% ...,enquanto que a zona do Iguatemi-Pituba alcançavaapenas 3,9%. Em 1993 (até o mês de novembro)estes valores passaram a ser de 10,1% e 15,1%,respectivamente.”12

Ainda como síntese podemos, de uma maneiramuito geral, identificar uma divisão espacial que di-ferencia as duas cidades nos dois tempos analisa-dos. Se tomarmos a alocação do circuito principalde capitais relativos à época, da mesma forma asnucleações de atividades estruturantes, os bairrosdiferenciados por faixas de rendimentos, os espa-ços também diferenciados pela oferta de infra-es-trutura e as terras disponíveis para a expansão decada vetor de crescimento, podemos dizer que, nametrópole de hoje, pode-se identificar uma linha di-visória compreendida entre a Orla Atlântica e o in-

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terior da região (Croqui 2), e não mais, entre a zonaNorte e Sul da Orla da Baía de Todos os Santos,como ocorria na Cidade de Salvador até meadosda década de 70, constituindo-se assim dois gran-des subespaços aqui denominados de macrozonada Orla Atlântica e macrozona Norte-Miolo da me-trópole (Croqui 1).

A macrozona da Orla Atlântica é formada pelamaior concentração das habitações de renda ele-vadas, de nucleações de atividades comerciais ede serviços modernos de apoio urbano e regional eonde foram realizados maiores investimentos nainfra-estrutura dos espaços, qualificando-os paraatender às mínimas condições de habitabilidade epara atender aos fluxos turísticos regionais. É umespaço que continua a ser adensado e a expandir-se na direção do litoral, consolidando e ampliandoo processo de conurbação com os municípios deLauro de Freitas e Camaçari, através da Estradado Coco, principal eixo de articulação entre a me-trópole e o Litoral Norte do estado, uma das regiõesde maior perspectiva de ampliação dos equipa-mentos turísticos da Bahia.

A macrozona Norte-Miolo, diferentemente da an-terior, concentra a maioria da população de rendi-mentos inferiores e regiões com baixa qualificaçãode infra-estrutura, onde estão presentes núcleos deatendimento de serviços voltados para o apoio àsatividades industriais e ao comércio atacadista regi-onal e equipamentos estratégicos de apoio ao de-senvolvimento industrial e de serviços da região –Porto de Aratú, Distrito Industrial Urbano – DINURB,Estação de Tratamento de Resíduos Sólidos de al-cance metropolitano etc. Suas perspectivas de cres-cimento permanecem com o mesmo perfil e comtendências a consolidar uma conurbação com o mu-nicípio de Simões Filho e com o Centro Industrial deAratú - CIA, ao longo do eixo de circulação da BR-324, acesso principal à metrópole.

Espacialidade Desigual dos Fluxosmundializados em Salvador

A taxa de incremento populacional de Salvador,entre 1991 e 1996, é umas das mais baixas da Re-gião Metropolitana, enquanto que os municípiosque estão no seu entorno imediato e com forte co-nurbação com sua área – o que denominamos de

Salvador Ampliada – apresentam as maiores taxasde crescimento, notadamento o município de Laurode Freitas, com 7,01%, seguido de Vera Cruz(4,53%), Camaçari (3,49%) e Simões Filho (1,53%).Esses municípios foram os que apresentaram au-mentos relativos no conjunto da população regio-nal, no período 1980/1991/1996: Camaçari – 3,95/4,55/4,98; Dias D’Ávila – 1,10/1,25/1,40; Lauro deFreitas (com maior destaque) - 1,10/2,77/3,59 eVera Cruz - 0,78/0,89/1,02 (Tabela 1).

1alebaTadsoipícinumsodotnemicsercedsaxaT

rodavlaSedanatiloporteMoãigeR6991-1991

oipícinuMedaxaT

%otnemicserC

iraçamaC 94.3

saiednaC 64.0

alivá´DsaiD 49.3

acirapatI 16.3

satierFedoruaL 10.7

sueDederdaM 46.1

rodavlaS 82.1

ednoCodocsicnarFoãS 56.3

ohliFseõmiS 35.1

zurCareV 35.4

latoT 56.1

6991edoãçalupoPedmegatnoCe1991edocifárgomeDosneC.EGBI:etnoF

Por outro lado, dentro do município de Salvador,as tendências de crescimento espacial da popula-ção obedecem a um processo mais avançado, ou

Croqui 1 – Subespaços distintos e articuladosde Salvador ampliada

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seja: as áreas da periferia apresentam as maiorestaxas de crescimento, enquanto que as áreas cen-trais apresentam taxas negativas, estão perdendopopulação, diferentemente do conjunto da cidadeque, apesar de apresentar a menor taxa regional,ainda se situa num patamar de crescimento. Issorevela como o processo em Salvador é mais com-plexo e avançado em relação aos de outros municí-pios, razão porque se trata de uma questão rele-vante para uma análise específica.

As manchas centrais que representavam gran-de parte da cidade de um só centro, até o início dadécada de 70, estão promovendo uma migraçãoconstante de sua população para outras áreas dacidade. Por outro lado, as áreas com forte presen-ça da atividade rural nesse mesmo período, que foipalco da descentralização da cidade nas últimasduas décadas, estão obtendo os maiores fluxos depessoas, com maior ênfase para os bairros maisperiféricos que correspondem aos extremos dosdois maiores vetores de expansão municipal paraas faixas de renda mais elevadas e as inferiores:Itapoan e BR-324, respectivamente (Mapa 1).

Essa crescente taxa de incremento populacio-nal já apresenta um quadro de alocação populacio-

nal em que as zonas com maior concentração selocalizam nos bairros descentralizados nas últimasduas décadas, enquanto que as zonas localizadasno antigo centro representam os mais baixos índi-ces de ocupação de pessoas. Se analisarmos adensidade de pessoas por zona, podemos verificarque as maiores taxas ainda se encontram, logica-mente, nas imediações das áreas centrais, e queas potencialidades de crescimento das zonas peri-féricas ainda são bastantes significativas.

Mas podemos também observar que o cresci-mento populacional não atende a uma lógica decontinuidade linear da ocupação do centro para aperiferia e sim, mesmo respeitando essa direção,que as tendências de ocupação ocorrem por sal-tos, onde algumas zonas periféricas tanto têm umataxa de crescimento quanto um volume maior depopulação do que em zonas localizadas nas imedi-ações da antiga área central.

Esse crescimento por saltos, próprio da valora-ção espacial diferenciada, é obtido pela conjunçãodo deslocamento das atividades comerciais e deserviços, da ampliação da infra-estrutura física, dadisponibilidade de terras, de políticas governamen-tais de investimentos, pelas possibilidades de empre-

go, pelas perspectivasembutidas no imaginá-rio da população e pe-las condições físico-ambientais e culturais.É um movimento con-junto, articulado e dife-renciado para cada es-paço urbano e, nestes,para cada segmentode renda da população(Mapa 2).

Podemos constatarque a maioria dasconstruções está situ-ada na macrozona daOrla Marítima, o quepermite inferir umatendência de solidifica-ção das faixas de ren-das mais elevadas,sendo que, dentro des-ta macrozona, há uma

Mapa 1 – Taxa geométrica de crescimento populacional por ZI1991-1996 - Salvador/Ba

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predominância absoluta para as áreas com maio-res concentrações de atividades terciárias e demaior incremento populacional. Duas áreas mere-cem destaque especial: as zonas no entorno doIguatemi, primeiro foco de descentralização co-mercial da cidade nos últimos 20 anos, e a zona deItapoan, extremidade do vetor de crescimento daOrla de Salvador e que aparece com as mais altastaxas de crescimento populacional. Somente o en-torno da zona do Iguatemi concentra cerca de 50%da área construída para residências na cidade, ba-sicamente voltadas para atender às mais altas fai-xas de renda, e 45% para construções destinadasa comércio e serviços de porte regional e, em gran-de parte, à base de edifícios modernos oushoppings centers. Com uma importância menor,mas com destaque no restante da cidade, a zonade Itapoan detém a grande maioria das constru-ções da orla marítima de Salvador, que, por suavez, detém a maior concentração de construçõesdestinadas ao setor comercial e de serviços na ci-dade, alcançando quase 40%, e uma participação

de mais de 10% para osetor residencial. Nes-sa zona, a maioria dashabitações, diferente-mente das imediaçõesdo Iguatemi, ocorreem forma de condomí-nios fechados e prote-gidos por guaritas desegurança, com todosos equipamentos deapoio, tal como tam-bém vem acontecendoao longo dos municípi-os que conformamesse vetor de expan-são e estão conurba-dos com Salvador, for-mando a metrópole. Éum vetor de expansãoque se dirige para asáreas ambientalmentemais qualificadas da re-gião, que possui, ade-mais, uma localizaçãoprivilegiada em relação

aos pólos industriais, e que é contemplado com óti-ma acessibilidade ao centro comercial e de servi-ços do Iguatemi. Do ponto de vista comercial e deserviços, nessa região a maioria das construçõesocorre em forma de shopping center com porte deatendimento local e de passagem, e com uma ten-dência a concentrar equipamentos de apoio às ativi-dades habitacionais, o que dá à zona uma certa in-dependência em relação a outras áreas da cidade.

Se tomarmos outro ângulo de análise, ou seja, aarrecadação do Imposto de Circulação de Merca-dorias e de Serviços – ICMS, que mede, basica-mente, o consumo (em que pese em alguns casostambém medir a produção), podemos identificarque, segundo a arrecadação de ICMS por atividadeeconômica entre 1995 e 1998, Salvador vem con-centrando fluxos em relação a todo o estado daBahia, passando de uma representação relativa de16,99% para 19,82% da arrecadação do ICMS deprodutos industrializados; de 53,04% para 53,14%da atividade comercial; e de 67,75% para 71,79%das atividades de serviços. Isso demonstra o pro-

Mapa 2 – População urbana por ZI1996 – Salvador/Ba

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cesso de reconcentração de fluxos para a metrópo-le e, se considerarmos a sua distribuição dentro daárea urbana, podemos verificar que esse fenôme-no também vem ocorrendo na direção dasnucleações de atividades terciárias descentraliza-das nas duas últimas.

Se considerarmos o conjunto das zonas doIguatemi e de Brotas, onde os valores tomados sereferem principalmente àqueles concentrados noentorno do denominado subcentro do Iguatemi, po-demos verificar que eles representam 53,43% dototal do ICMS industrial de todo o estado da Bahia,em 1995, passando a representar 63,69% em1998. Enquanto isso, nas antigas e únicas concen-trações terciárias da cidade, além de se ter uma re-presentação pouco significativa, ainda ocorreuuma redução relativa no período, caindo de 0,48%para 0,04% em São Pedro; de 1,98% para 1,07%na Conceição da Praia; de 0,04% para 0,03% emSanto Antônio e de 1,36% para 0,4% na Calçada.

Por seu turno, se considerarmos a arrecadaçãode ICMS do setor comercial, podemos verificar quea tendência também se apresenta da mesma formaque para o setor industrial, só que de uma maneiramais significativa. Ocorreram uma queda relativada participação na comercialização de mercadoriasem todas as áreas do antigo e único centro de co-mércio da cidade e uma tendência cada vez maiorde crescimento relativo das concentrações comer-ciais recentes da Orla-Pituba, incorporando umaparte do Iguatemi e da zona de Pirajá, onde foi ins-talado o Distrito Industrial Urbano, que concentrauma grande parte do comércio atacadista da cida-de. A zona Iguatemi-Orla representava 10,50% daarrecadação do comércio em todo o estado e19,80% de toda a cidade, em 1995, passando para12,64 e 23,78% em 1998, respectivamente. En-quanto isso, as concentrações comerciais e de ser-viços da antiga área central – Calçada, Conceiçãoda Praia, Santo Antônio e São Pedro – experimen-taram uma queda generalizada nas suas participa-ções, com o seu conjunto caindo de 31,02% para24,45% em relação ao setor dentro da cidade.

Enquanto a arrecadação da atividade comercialde Salvador apresentou um suave crescimento (de53,04%, em 1995, para 53,14% em 1998), as ativi-dades de serviços tiveram um crescimento equiva-lente às atividades industriais, passando de 67,75%,

em 1995, para 71,79% em 1998, ressaltando aindamais a forte atração de Salvador e sua tendênciade reconcentrar fluxos diante de outras cidadebaianas e até de outras regiões do Nordeste brasi-leiro. Dentro da cidade, as atividades de serviçosnão têm um comportamento diferenciado das ou-tras atividades já comentadas. Tal com nos outrascasos, houve uma elevação da participação dasáreas de Brotas e do Iguatemi-Orla diante do totalestadual e frente ao conjunto do setor na cidade,contra uma queda sistemática das outras áreas daantiga cidade. Vale ressaltar a tendência de cresci-mento elevado do setor serviços na zona da Igua-temi-Orla – que cresceu de 10,44% para 15,90%em relação ao setor na cidade –, o que se atribui aofato de que esse subespaço atrai os maiores equi-pamento do setor de serviços voltados para o aten-dimento ao turismo, lazer e recreação em toda asua borda, com crescimento significativo das ativi-dades comerciais e dos fluxos populacionais nazona de Itapoan.

Consolidação e qualificação do chassi

A intensidade dos fluxos mundializados da eco-nomia mundial, que elevou a velocidade da produ-ção, da circulação e da difusão das mercadorias,vem exigindo que tanto as atividades produtivasquanto o seu espaço de realização alcancem rapi-damente um grau de competitividade maior para asua reprodução. Patrocinado pelos avanços tecno-lógicos, notadamente na área da informática, darobótica e dos meios de comunicação, há um pro-cesso intenso de migração espacial das unidadesde produção e de comercialização, ora criando no-vos espaços infra-estruturados – que constituemestratégias especiais e pontualizadas, por se tratarde unidades que carecem de novos investimentos,de descentralização espacial para elevar sua capa-cidade competitiva com vistas à ampliação de seusmercados –, ora refluindo para concentrar-se emespaços com maior oferta de infra-estrutura – tam-bém para se tornarem mais competitivas –, só que,neste caso, por meio da redução do seus custospara assegurar as fatias do mercado já conquista-das. Como, em ambos os casos, os empreendi-mentos de porte maior e de melhor qualificação,sob variados aspectos (como vimos anteriormen-

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.29-42 Dezembro 2000 39

te), tendem a absorver os fluxos das unidades me-nores, na verdade os dois casos carregam dentrode si o mesmo resultado: a concentração espacial,que, por sua vez, leva, ao seu enxugamento nocômputo geral.

É o nexo desse movimento, que promove umaespacialização da Cidade de Salvador, que se dife-rencia das duas fases anteriores da metrópole. Ago-ra, a cidade tende a qualificar a estrutura montadana fase anterior, a fase da descentralização ocorridaentre meados da década de 70 e que completa seuchassi básico no início dos anos 90. Sem dúvida, acidade sempre foi palco de fluxos internacionaliza-dos de épocas distintas e com perfis e portes dife-renciados. Isso teve, de certo modo, uma participa-ção na formação da sua estrutura urbana, em quepese a absoluta preponderância da presença de flu-xos nacionais ou nacionalizados no seu espaço. Oque é certo é que, afora as limitações típicas de umaeconomia guarnecida, em certa medida controladapelo aparelho estatal, o nexo do movimento da eco-nomia capitalista permanece, alteradas as suas es-calas, velocidades e alguns procedimentos de re-produção, o que permite que a nova fase dos fluxosglobalizados possa encontrar os laços espaciaispreparados nas fases anteriores.

É evidente que o processo ainda é recente,mas, por outro lado, é muito veloz. Também é certoque as informações não estão sistematizadas deforma a permitir maior transparência analítica aosfatos investigados, o que dificulta o aprofundamen-to de vários aspectos que estão presentes na novafase de desenvolvimento da metrópole. Mas pare-ce correto afirmar que o que hoje ocorre é um movi-mento acelerado das inclinações espaciais mani-festadas nas últimas duas décadas, só que agoracom uma tendência dupla: a da agudização do pro-cesso de centralização espacial das atividadeseconômicas e sociais sobre os espaços recente-mente descentralizados e, concomitantemente, umatendência a uma descentralização de algumas ati-vidades de portes diferenciados para fora da me-trópole, tal como vem ocorrendo em outras cidadesde maior envergadura e estágio mais complexo dedesenvolvimento.

Em síntese, constata-se que há uma forte ten-dência ao reforço da ocupação de zonas recente-mente descentralizadas da cidade, mormente na

zona do Iguatemi e na direção de Itapoan/Lauro deFreitas, e que esse movimento é constituído pelapresença de equipamentos de grande porte, decorte moderno e articulados inter-regionalmente,portanto competitivos frente a equipamentos, e quenão resistem aos fluxos globalizadas. Por sua vez,as habitações estão cada vez mais protegidas,verticalizadas ou não, reunidas em ilhas diferencia-das das grandes manchas onde habitam as popu-lações das faixas de renda inferiores e cada vezmais numerosas.

Quem não se comunica...

As atividades e seus equipamentos de comerci-alização, que estão submetidos a fluxos realizadosem tempo real, podem alocar-se dipersamente nacidade na busca de áreas com menor custos de cir-culação, por exemplo nas áreas residenciais próxi-mas dos maiores centros comerciais e até no seuantigo e decadente centro comercial. São ativida-des que não exigem acessibilidade física para pes-soas ou fluxos de mercadorias à base de meios dedeslocamento (transporte) de grande porte. É certotambém que a área do antigo centro comercial po-derá vir a ser objeto de uma substituição de usospelo crescimento de fluxos turísticos e das suasdemandas por novos equipamentos de apoio – ho-téis, bares, restaurantes etc – e que podem encon-trar aí boas possibilidades de desenvolvimento,notadamente pela potencialidade para a explora-ção das atividades náuticas da Baía de Todos osSantos. Mas também esses fluxos turísticos ten-dem a espraiar-se na direção da Orla Norte, comojá vem ocorrendo há vários anos, ampliando a me-trópole em forma de concentrações de resorts, tor-nando-se na formada pela conjunção de partesdesiguais, completas dentro de si mesmas e commaior capacidade de articulação com outras regiõesdo planeta do que com outras áreas da própria me-trópole.

Há muito já passou a época em que as cidadesfuncionavam, preponderantemente, como pólos ur-banos regionais, onde as suas estruturas funciona-vam para atender às demandas de uma economiaem que os fluxos territoriais mais próximos sobre-pujavam os fluxos inter-regionais e exigiam que oconjunto das suas partes funcionasse de maneira

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complementar e articulada. Quando ocorria umcrescimento gradativo da economia que lhe davasustentação, crescia gradativa e homogeneamentea cidade e suas parcelas respondiam à altura. Écerto que sempre ocorreu a presença de fluxos in-ternacionais na Cidade de Salvador, como, em es-calas diferenciadas, em várias outras metrópolesdo mundo. Porém, hoje, esses fluxos assumiramuma escala que substitui determinadas articula-ções internas da metrópole por articulação de par-tes dela com outras partes do mundo, alterando oconceito de estrutura urbana e, logicamente, suaconfiguração física, em que pese ainda ocorreremas duas coisas simultânea e associadamente. Ascidades, tal como ocorre em Salvador, continuam,de certo modo, e em certa medida, a polarizar flu-xos de sua região e, por isso, a permanecerem,também em certa medida, subordinadas à aloca-ção espacial de atividades que exercem esse pa-pel. Porém, essa função foi acrescida de uma outrade maior relevância, a de articular fluxos de váriasordens e com vários outros lugares do mundo. Essanova função exibe uma nova faceta das suas par-tes, da sua espacialidade. Suas partes, seus luga-res, estão submetidos a demandas diferenciadasde lugares distintos do planeta e, sendo assim,passam a crescer também de forma diferenciada, àmedida que se altera o movimento geral e não só oda economia regional. Ou seja, o centro comercialdo Iguatemi/Pituba não serve só à Cidade de Sal-vador, mas, de forma articulada, executa serviçospara todo o interior do estado, para outros estadose, também, para outros países. Enquanto isso, oantigo Comércio (ou rua do Comércio) não conti-nuou a expandir sua capacidade, tal como aconte-cia até o início dos anos 70. A zona portuária, ago-ra com maior ênfase em Aratu, é elementoestruturante para a produção dos pólos industriaisda macrorregião de Salvador, mas também o épara o escoamento da produção de várias regiõesdo estado e até de outras regiões do País. OPelourinho, recuperado, atrai fluxos de pessoas dacidade, do País e de outros países, assumindo umpapel que extrapola a sua antiga função de umasimples parcela da área central. Hoje, é umenclave ressaltado e libertado da antiga Área Cen-tral, cuja capacidade de “globalizar-se” é muito in-ferior à de outras áreas da cidade, a não ser que

venha a assumir uma função turística, envoltanuma totalidade de investimentos feitos para estemesmo fim em todo o velho centro, numa escalamuitas vezes maior e mais ampla do que a quepossui atualmente.

Isto quer dizer que determinadas partes da cida-de estão se distanciando de outras no que se refe-re ao seu papel no processo de mundialização dosfluxos, o que favorece uma qualificação diferencia-da delas. As partes mais inseridas nos novos fluxostendem a modernizar-se com maior ímpeto, escalae rapidez do que as outras, a enxugar seu espaçode realização, a relacionar-se com maior ênfaseentre si e, no seu conjunto, com outras partes doplaneta, e tendem, finalmente, a exigir novos inves-timentos em infra-estrutura com qualificação inter-na e capacidade de articulação com as outras parteque constituem uma rede espacial protegida e comuma fluidez adequada à velocidade e à prestezaque o movimento mundial exige. As partes que sedistanciam desse processo tendem a agudizarseus problemas de infra-estrutura, aser locus demoradia de uma crescente população marginaliza-da do processo, a ter carência de equipamentosde apoio, de segurança, e tendem a criar guetosarticulados numa escala inicialmente local, mascom irradiações internacionais. É exatamente estetraço específico o que caracteriza com mais rigor eprecisão a inclusão do processo de “globalização”nas novas metrópoles a exemplo de Salvador.Referimo-nos, só para arrematar, ao efeito consis-tente, nessas metrópoles, de inserirem-se no pro-cesso atual de globalização à custa de umainclusão direta e diferenciada de suas áreas inter-nas com fluxos diretamente articulados com cen-tros mundiais de emissão – e vice-versa.

Especificamente na Cidade de Salvador, dentrode um prazo visível, porquanto os horizontes depredição geral foram reduzidos pela complexidadee velocidade dos avanços tecnológicos, não deveráhaver alterações significativas do chassi espacialformado nas duas últimas décadas. Mas será den-tro dela, ainda que se expandindo para outros mu-nicípios da Orla Norte, que ocorrerá uma requalifi-cação para tornar algumas das suas partes maiscompetitivas.

Para concluir, ligações de áreas específicas deuma cidade como Salvador com outras regiões do

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.29-42 Dezembro 2000 41

País e até de outros países podem ter acontecidosempre. Na própria Salvador sempre foi evidente,no passado, uma ligação desse tipo, mediada pelazona portuária, entre as áreas do Comércio e doPelourinho, com áreas situadas na metrópole euro-péia, através de fluxos de circulação de mercadori-as e capital-dinheiro gerados nas instâncias do co-mércio do açúcar, por exemplo. Ocorre que taisvinculações, mesmo sendo, como no caso, domi-nantes no contexto da vida econômica da cidade,eram ligações sempre específicas e unicentraliza-das, ao passo que, no contexto de uma realidadecapitalista completamente mundializada como é ade hoje, essas pontes de contato entre áreas dasmetrópoles modernas e áreas de outras regiões ede outros países se multiplicam e se difundem si-multaneamente numa mesma cidade. Isso se deve,evidentemente, à natural diferenciação da platafor-ma da produção capitalista, combinada com efica-zes e rápidos meios postos à disposição do movi-mento circulatório e disposições urbanas, como foiaté aqui demonstrado. Também deve ser ressalta-do o fato de que não bastam tais ligações, separa-das ou entrecruzadas, entre áreas específicas daCidade de Salvador com outras regiões do país oucom outros países, para definir um papel regionalpara a cidade do Salvador – até porque tais liga-ções, sempre estabelecidas sempre à base de flu-xos comerciais, podem não ter suas origens emprocessos produtivos que perpassam toda a re-gião. A redefinição de um novo papel regional paraSalvador passa pelo assentamento de premissasmais complexas e mais completas, as quais, atéaqui, não nos parecem visíveis. Esta é – e issodeve ser francamente reconhecido – uma questãonova, difícil de ser colocada, mais ainda difícil deser resolvida e que, não obstante sua pertinência,acerca da qual estamos absolutamente convenci-dos, está totalmente aberta à inspeção teórica.

Notas

1 Este artigo é uma síntese do trabalho apresentado pelos au-tores no V Seminário Iberoamericano de Investigadores emGlobalização e Metrópole, realizado na cidade de Toluca,México, em setembro de 1999.

2 A este respeito consultar, Porto, Edgard; Carvalho,Edmilson, A Macrorregião de Salvador, SEI/SEPLANTEC.

3 Neste sentido, a crise sofrida pela cidade do Recife é incom-paravelmente maior do que a sofrida por Salvador, até por-que a crise econômica do estado de Pernambuco nas duasúltimas décadas é muito mais grave do que a crise da econo-mia baiana no mesmo intervalo de tempo.

4 “... com capitais de igual composição percentual, com igualtaxa de mais-valia e mesma jornada de trabalho, as taxas delucro de dois capitais estão na razão inversa de seus temposde rotação (...) O efeito direto do encurtamento do tempo derotação sobre a produção de mais-valia, portanto também delucro, consiste na maior eficácia que ele confere à parte vari-ável do capital...” – Marx, K., in, O Capital, Livro III, Seção 1,Capítulo IV – Abril Cultural, Volume III – Tomo 1, 56.

5 A este respeito, consultar Jameson, Fredric, in, Pós-Mordernismo – A Lógica Cultural do Capitalismo Tardio. SãoPaulo : Ática, 1997.

6 Deve ser salientado, para evitar conclusões apressadas,que, a nosso juízo, este deslocamento de capitais para aprodução de “produtos audio-visuais” não é e nem pode serum absoluto, até porque as necessidades capitalistas daprodução não se esgotam nelas – e nem, por outro lado, asde consumo, produtivo ou pessoal. De outra parte também,deve ser destacado que este não é o único, e nem certamen-te o principal, motivo do deslocamento de grande massa decapital – dinheiro, que, uma vez desmobilizado das opera-ções produtivas, é desviado para as operações nos domíni-os das transações financeiras.

7 O pensamento geográfico, urbanístico e sociológico vulgar,quando fala da “atração que a cidade exerce sobre o cam-po”, procurando, com esta fórmula vazia e abstrata, explicaros movimentos migratórios do campo para a cidade, jamaisse detêm a examinar o que exatamente ocorre na cidadepara que ela – ou melhor, sua atividade produtiva, com suaorganização do trabalho e da produção e, consequentemen-te, sua capacidade de absorver, direta e indiretamente, por-tadores de força de trabalho – possa contar com esta quasemistificada e quase sempre mágica “capacidade de atração”(assim como se ela resultasse de uma espécie de “deslum-bramento” que os homens do campo experimentassem dian-te do “brilho” e o “esplendor” das cidades).

8 Em Salvador, uma parcela ponderável e crescente da popu-lação urbana que se desloca, diariamente, dos locais de mo-radia e estudo o faz a pé.

9 Jornal A TARDE, 01/09/99 – Salvador, Bahia.

10 Curioso notar que no seio da classe média, sobretudo daalta classe média, opera-se uma certa circulação. Certossegmentos dela, antes ocupados por profissionais liberais eempregados bem remunerados em unidades da “velha” in-dústria incentivada (do Pólo, do CIA, da Petrobras, etc.), sãohoje substituídos, pelo menos em parte, por “gente nova”:artistas, intelectuais e novéis empresários ligados à mídia eque exploram o mais novo e viçoso ramo industrial de Salva-dor – o ramo “cultural” ligado à chamada Axé-music, ao car-naval e a manifestações similares. Também esses segmen-

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42 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.29-42 Dezembro 2000

tos de “novos ricos” seguem os passos espaciais da maiorburguesia urbana nos seus conjuntos de moradia fechadose altamente segregados etc.

11 É exatamente nestas cercanias onde se encontram os bair-ros mais populosos de Salvador, principalmente o seu subúr-bio ferroviário, em avançado estado de decadência e repre-sentando, com seus 232.553 habitantes (dados de 1996), aárea urbana mais populosa de toda a Região Metropolitanade Salvador. Sobre esta vasta e populosa área vejamos oque nos revela uma pesquisa recente: “... verifica-se que onível de renda do Subúrbio ferroviário (...) é muito baixo,sendo a faixa de até 5 salários mínimos (equivalente a US$363,00) correspondente a cerca de 90% dos chefes de famí-lia, pelo Censo de 1991 (...) Quanto à ocupação, a maior par-te da população encontra-se inserida na economia informal”

– Bacia do Cobre – AvaliaçãoSócio-Ambiental e ProcessoHistórico. PANGEA-Salvador, abril de 1998. Deve ser ressal-tado que nesta área habitavam, cerca de duas décadasatrás, muitos trabalhadores da antiga Leste Brasileiro (ferro-via), da Petrobrás, do Pólo Petroquímico, do Centro Industrialde Aratu, etc.

12 Carta da CPE, no 25/94

* Edgard Porto é arquiteto e técnico da Superintendênciade Estudos Estratégicos/SEPLANTEC

** Edmilson Carvalho é arquiteto e professor da UFBA

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.43-44 Dezembro 2000 43

Nas cidades, o sistema viário básico é umelemento estrutural na organização do es-paço intra-urbano e também em suas arti-

culações com a região. Portanto, cada vez maisele assume um papel essencial na lógica de distri-buição espacial das atividades econômicas, paraalém daquele que dá lugar à clássica visão de su-porte físico dos fluxos de pessoas e bens no espa-ço urbano. Logo, o sistema viário é, ao mesmotempo, suporte físico para os fluxos (trânsito) e ele-mento estruturante na polarização e/ou descentra-lização das atividades no meio urbano.

Historicamente, Salvador sempre teve o seusistema viário fortemente condicionado por um sí-tio geográfico complexo, caprichoso e singular,propiciando um “desenho distante das visõesgeometrizantes e rígidas”, comuns às cidades pla-nas dominadas por retículas ou enxadrezamentomais regulares. A não ser, é claro, em situaçõesque funcionam como exceções à regra: Comércio,Pituba, etc.

Se, por um lado, o traçado radial-concêntricoherdado do EPUCS (anos 40) propiciou a expan-são, até os anos 70, baseada nas avenidas-de-vale, por outro, as ligações longitudinais com a re-gião periférica se deram numa outra lógica,não-planejada ou menos-prospectiva, com a im-plantação de dois grandes eixos (BR-324 e Av. Pa-ralela) e dois outros perimetrais, contornando aborda marinha (Av. Otávio Mangabeira e Suburba-na). No total são quatro grandes eixos viários, quepossibilitaram uma expansão urbana e uma des-

centralização de atividades para além do territórioradial-concêntrico herdado do EPUCS.

Enfim, ao sistema arterial básico do EPUCS arti-culou-se uma outra lógica, de caráter urbano-me-tropolitano, não mais pensado a partir das condicio-nantes do sítio geográfico, mas privilegiandotão-somente o caráter mercantil de um solo ex-ru-ral ou não-urbano, incorporado aos interesses deum mercado imobiliário ávido por expandir seusnegócios, retalhando o território não-urbanizado.

Não por acaso, nos anos 70/80 o planejamentourbano (PLANDURB) tenta, como proposta, rearti-cular os quatro eixos que radicalizaram uma ex-pansão urbana segregada por faixas de renda dapopulação. Explica-se: Subúrbio Ferroviário e BR-324 para as classes de menor renda; Paralela paraas classes de média e média-baixa rendas, e a orlaOcêanica para a alta e média-alta rendas.

Claro, a rearticulação dos quatro eixos citados(Suburbana, BR-324, Paralela e Otávio Mangabei-ra) não possibilitará romper com a segregação so-cioespacial. Entretanto, permitirá um rearranjo defluxos entre áreas hoje totalmente segregadas. Poroutro lado, se mantidas as diretrizes de transportede massa nas áreas de expansão em dois corredo-res ao longo da BR-324 e Av. Paralela, é de se su-por a ampliação do potencial das vias-transversais,qual seja a de rede alimentadora (por ônibus e au-tos) para as linhas-tronco do metrô.

Essa lógica, é claro, é uma proposta de planeja-mento de curto e de longo prazo, espelhando-se naexperiência do EPUCS: vias-arteriais cortando os

Considerações sobre as

“vias transversais” de Salvador

Heliodório Sampaio*

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44 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.43-44 Dezembro 2000

vales, por onde correm as águas pluviais e deverãocorrer as redes de esgotamento sanitário. Lógicateorizada, em parte, pelo Eng. Saturnino de Brito,nos anos 20, e logo depois defendida pela Semanade Urbanismo de 1935, mas só planejada peloEPUCS em 1946/1948 e retomada pelo PLANDURBnos anos 1976/1980.

Entretanto, se da perspectiva do planejamentogeral da cidade as “vias transversais” têm sua ex-plicação lógica respaldada no ponto de vista urba-nístico, no desenho urbano e nalegislação de uso-do-solo, as mes-mas merecem reflexões cuidado-sas, adicionais, sem o que podemagravar os problemas ao invés desolucioná-los.

A primeira reflexão é quanto aosítio geográfico, à morfologia dorelevo e ao impacto da implanta-ção diante de um descuidado pro-jeto geométrico. Os vales na re-gião do chamado “miolo” (entreBR-324 e Paralela) são estreitose, não raro, profundos, exigindoperícia e sensibilidade do projetis-ta. Não que se queira defender a“intocabilidade” do relevo, comosugerem alguns ideólogos de um ambientalismoradical, lendo a cidade como “obra da natureza” enão como espaço da obra-humana, ou seja, comouma forma de apropriação cultural da natureza-pri-meira, que, a rigor, não mais existe.

O que se defende é que esta apropriação sejacriteriosa, cuidadosa, e que, sempre que a interven-ção radical seja necessária, incorpore-se a idéia derecomposição ou requalificação paisagística maisadequada. Enfim, cortes e aterros criteriosamenteestudados, e cursos d’água retificados transpostosde modo a evitar impactos negativos similares aosda Av. Paralela, em franco desacordo com a me-lhor técnica e arte urbanística. O traçado geométri-co não é um problema só de engenharia, pois acomplexidade do sítio (no miolo) requer uma equi-pe multidisciplinar (engenheiro, urbanista, paisa-gista, etc.) atuando simultaneamente.

Não se trata de ligar o ponto “A” ao ponto “B”, ou avia “X” à via “Y”, mas de implantar um suporte viário quevai atrair fluxos e também atividades. Assim, o uso e a

ocupação do solo nas áreas lindeiras devem ser cuida-dosamente previstos, mais até que no sítio estudadopelo EPUCS. É notória a complexidade do “miolo”, sen-do também notória a necessidade de articulações comas cumeadas (onde fazê-las). É preciso sobretudo fixarexigências técnicas mínimas (recuos, interseções,acessos laterais) para que as vias arteriais (transver-sais) desempenhem satisfatoriamente o seu papel nacidade. Aliás, a propósito, só a Av. Centenário teveum projeto digno da concepção do EPUCS.

O risco de se vir a transformaras “vias-transversais” em merasvias coletoras da área do miolo co-lide com a lógica do planejamentogeral, por dois motivos:

1º) sendo via coletora terá me-nor capacidade de fluidez no tráfe-go e permitirá usos inadequadosdando acesso direto às pistas;

2º) como via coletora, mesmoque “classificada” como arterial – aexemplo do que acontece com al-gumas situações existentes – nãoresponderá aos objetivos mais ge-rais da estrutura urbana projetadaantes (PLANDURB) e normatizadapelo PDDU-85.

De resto, cumpre reafirmar o papel estratégicodas “vias-transversais” na circulação urbana. Maseste papel só estará assegurado se os “projetosgeométricos” estiverem alicerçados em estudos ur-banísticos mais detalhados quanto ao uso e à ocu-pação do solo lindeiro, ao paisagismo, enfim, inte-grando a via-arterial à morfologia do sítio geográficoda cidade, de modo a valorizá-lo.

Concluindo: as vias transversais respondem, si-multaneamente, a três desafios que Salvador, histori-camente, não tem por hábito ultrapassar de formapositiva. O primeiro diz respeito à infra-estrutura deáreas periféricas (como o “miolo”), melhorando aacessibilidade aos centros e subcentros da cidade; osegundo é articular as ações de curto prazo (no caso,obras) a uma visão de mais largo prazo (o Plano Di-retor); em terceiro lugar, é preciso adequar o “traça-do geométrico” das vias estruturais à morfologia dosítio da cidade. Eis os desafios a enfrentar.

* Heliodório Sampaio é professor titular da FAUFBA

Se da perspectiva doplanejamento geral da

cidade as “viastransversais” têm sua

explicação lógicarespaldada no ponto de

vista urbanístico, nodesenho urbano e na

legislação de uso-do-solo,as mesmas merecemreflexões cuidadosas,adicionais, sem o que

podem agravar osproblemas ao invés de

solucioná-los.

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46 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.46-51 Dezembro 2000

Uma vez ultrapassado o pior momento dacrise cambial de janeiro de 1999, einviabilizada a política de sobrevalorização

do real frente ao dólar – que se constituiu, durantequatro anos e meio, num dos dois pilares do PlanoReal e da política anti-inflacionária do governo –assistiu-se, surpreendentemente, a partir do se-gundo semestre daquele ano, a uma recuperaçãoda economia brasileira, de forma lenta, mas per-sistente. Essa retomada fez-se acompanhar poruma pequena redução nas taxas de desempregoe por uma queda significativa – para os padrõesadotados até então – das taxas de juros, possibili-tada pela manutenção do controle da inflação –depois de um crescimento inicial de suas taxas,logo após a desvalorização cambial – e pelo rápi-do retorno dos capitais estrangeiros, que se bene-ficiaram, antes da crise, de hedge cambial comtítulos públicos.

Por tudo isso e, principalmente, em razão daseleições municipais do presente ano, voltou-se amencionar e propagandear nos meios governa-mentais, na grande mídia e entre amplos segmen-tos de economistas, a certeza de que o Paísretomou, após duas décadas de estagnação, a rotado “crescimento sustentado” – apesar das dificul-dades evidentes do Balanço de Pagamentos e doarrocho impressionante a que vem sendo submeti-do o setor público.

Em sentido contrário, o presente artigo tem porobjetivo demonstrar que essa aparente certeza éuma mera crença e/ou vontade, de natureza políti-

co-ideológica, pois não se apóia nos fatos relevan-tes que caracterizam, de forma contundente, asfragilidades estruturais da economia brasileira. Fra-gilidades estas que tendem a passar desapercebi-das, sempre que ocorre, conjunturalmente, umapequena recuperação do nível de atividade. Isso jáse repetiu diversas vezes (pelo menos três), desdea implementação do Real (a nova moeda) em julhode 1994 – o que tem implicado, claramente, umapolítica de stop and go por parte das autoridadeseconômicas.

Antes de mais nada, contudo, é importanteesclarecer o significado do que seja um “cresci-mento sustentado”, ou auto-sustentado como pre-ferem alguns. De forma esquemática, um cresci-mento econômico dessa natureza implica pelomenos quatro circunstâncias, que devem aconte-cer simultaneamente e de forma compatível, quaissejam: 1) relativa estabilidade de preços; 2) cres-cimento do PIB em níveis satisfatórios – no casodo Brasil, em torno de 6% a 7% ao ano durantealguns anos, para se conseguir incorporar 1,5 mi-lhão de pessoas, que adentram todo ano ao mer-cado de trabalho, e reduzir estruturalmente asatuais taxas de desemprego; 3) equilíbrio dascontas do Balanço de Pagamentos, com reduçãoimportante da dependência externa; e, por fim, 4)equilíbrio das contas do governo, em particular noseu conceito operacional – com diminuição signifi-cativa do pagamento de juros das dívidas internae externa e, consequentemente, da relação dívidapública/PIB.

Economia brasileira: as fragilidades

estruturais permanecem(I)

Luiz Filgueiras*

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.46-51 Dezembro 2000 47

A idéia aqui defendida é que as dificuldades queimpedem a ocorrência simultânea dessas quatrocircunstâncias têm raízes externas e internas aoPaís.

As crises internacionais, difundidas a partir de determinado

país e/ou região, são uma realidade do capitalismo

globalizado, que independe da vontade e das ações de ou-

tros países – em especial os da periferia do sistema – e

ameaça inclusive a economia americana. No entanto, os

seus efeitos globalizados têm impactos

diferenciados nos diversos países, de

acordo com a posição de cada um nes-

sa nova (des)ordem – que se expressa

em graus distintos de competitividade e

vulnerabilidade externa dos mesmos –

e na natureza de suas respectivas polí-

ticas econômicas adotadas: cambial,

monetária e fiscal, mas também indus-

trial e de comércio exterior. (Filgueiras,

1999).

No caso do Brasil – e de todos os demais paísesda periferia do sistema capitalista, que adotarammodelo econômico e políticas de estabilização se-melhantes – as taxas de crescimento um poucomais elevadas, ao pressionarem a Balança Comer-cial e/ou o nível de preços, sempre colocam a eco-nomia na rota de uma crise cambial, com a saída decapitais e a redução das reservas cambiais do Ban-co Central – o que obriga as autoridades monetáriasa elevarem, de novo, a taxa de juros, freando-se, as-sim, a retomada do crescimento. Isso, por sua vez,deteriora as finanças do Estado e acelera o endivi-damento público, elevando ainda mais a relação dí-vida pública/PIB, o que “exige”, mais uma vez, aadoção de um ajuste fiscal draconiano – que garan-ta superávits primários expressivos e possibilite,dessa forma, o pagamento dos juros das dívidas in-terna e externa. As conseqüências para o mercadode trabalho e as políticas públicas são desastrosas,com o aumento das taxas de desemprego, aprecarização das ocupações e a redução dos gastossociais. Em resumo:

...a saída definitiva da armadilha cambial depende, entre

outras coisas, do crescimento das exportações, que

viabilize saldos positivos na Balança Comercial e, por ex-

tensão, reduza os déficits na conta de transações corren-

tes, – possibilitando uma menor dependência com relação

aos capitais externos. No entanto, os fatos estão demons-

trando que, em se mantendo o atual grau de abertura co-

mercial, a simples desvalorização cambial [ocorrida a partir

de janeiro de 1999] dificilmente conseguirá resolver o pro-

blema da Balança Comercial. Desse modo, a obtenção de

um desenvolvimento que possa ser sustentado dinamica-

mente, isto é, crescimento com estabilidade monetária e

sem risco de novas crises cambiais, exige a implementa-

ção de políticas ativas de comércio exterior,

agrícola, industrial e tecnológica – impli-

cando, obviamente, uma outra postura por

parte do Estado (idem).

Entretanto, de forma oposta,

...a atual política econômica, mesmo após a

mudança do regime cambial, apenas pro-

move uma espécie de “fuga para frente”,

que fragiliza financeiramente o Estado e exi-

ge, reiteradamente, sucessivos “ajustes fiscais”. A mesma

pode saciar, momentaneamente, em cada conjuntura, o ape-

tite dos ‘mercados’ [e um novo ciclo de consumo, de

curtíssima duração], mas para apenas recolocar, mais à

frente, os mesmos problemas e as mesmas contradições”

(idem).

A herança do projeto econômico-social liberal:1994/2000

O Plano Real, implementado desde o final de1993, constitui-se no “carro-chefe” de um projetopolítico-econômico muito mais amplo, de naturezaliberal. Apoiado na abertura comercial e financeirada economia e na sobrevalorização da nova moe-da até janeiro de 1999, foi, e continua sendo, muitomais do que um plano de estabilização. A sua im-plementação, coerentemente com o seu ideário,tem levado ao:

...avanço da internacionalização/desnacionalização da

economia brasileira, à redefinição do papel e das políticas

do Estado – reformas e privatizações – e à desregulamen-

tação dos mercados, em especial dos mercados financeiro

e de trabalho. Sob esta ótica, a ‘âncora cambial’, ao garantir

a estabilidade monetária – razão essencial da legitimação

A atual políticaeconômica apenas

promove uma espécie de“fuga para frente”, que

fragiliza financeiramenteo Estado e exige,reiteradamente,

sucessivos “ajustesfiscais”.

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48 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.46-51 Dezembro 2000

política do primeiro Governo Cardoso – cumpriu muito bem

o seu papel, pois facilitou a implementação, quase integral,

do referido projeto, bem como a reeleição do Presidente

(idem).

A herança econômico-social desse projeto, aoaprofundar a dependência externa do País e afragilização financeira do Estado, por um bomtempo ainda continuará, se mantida a atual políticaeconômica, dificultando enormemente a retomadada rota de crescimento sustentado da economiabrasileira. As suas consequências continuarão a semanifestar num baixo crescimento do produto e emsucessivas flutuações de curto prazo, no cresci-mento do desemprego e na precarização dos pos-tos de trabalho.

As tabelas e gráficos, a seguir apresentados,têm por objetivo evidenciar que, apesar da desva-lorização cambial de janeiro de 1999 ter possibilita-do um alívio momentâneo no Balanço de Paga-mentos do País – com redução do déficit na contatransações correntes – os dois problemas centraisda economia brasileira, acima mencionados, conti-nuam sem solução no âmbito da política econômi-ca atualmente implementada.

Desse modo, iniciando-se a análise pela infla-ção, verifica-se que a estabilização monetária, ob-jetivo maior (explícito) do Plano Real, e que seconstituiu na sua mais imediata, evidente e únicarealização positiva, continua sob controle. Após osalto verificado nas taxas de inflação em 1999, de-corrente da desvalorização cambial ocorrida a par-tir de janeiro, pode-se constatar uma nova reduçãodas mesmas no ano 2000 – conforme a política demetas inflacionárias adotada a partir do segundo

semestre do ano passado. De uma forma geral, es-sas taxas, medidas pelos mais diferentes índicesde diversas instituições, ficarão no presente anoem níveis semelhantes àqueles verificados nosanos de 1996 e 1997. Em particular, o IPCA, quebaliza as metas estabelecidas pelo governo, deve-rá fechar o ano dentro do previsto, isto é, em tornode 6% (Tabela 1).

Com relação à Balança Comercial, verifica-seque, após a crise cambial, com a conseqüente des-valorização do real, o seu déficit reduziu-se, em1999, de US$ 6,5 bilhões para US$ 1,2 bilhão. Noentanto, isso não ocorreu em virtude de uma reto-mada das exportações – que caíram de US$ 48para US$ 41,6 – mas sim em razão de uma quedamais acentuada das importações, de US$ 48,1 bi-lhões para US$ 40,6 bilhões. No presente ano, ape-sar das projeções iniciais do governo de um saldopositivo de US$ 6 bilhões, posteriormente sucessi-vamente revisto para menos, já se espera um novosaldo negativo na Balança Comercial, próximo ao doano passado, apesar do montante acumulado até omês de setembro ter sido positivo em US$ 754 mi-lhões. De um lado, as exportações cresceram, masnão de acordo com as expectativas do governo; deoutro, as importações, empurradas pela retomadado crescimento da economia, aumentaram mais doque o previsto (Gráfico 1). Além disso, deve-se men-cionar que as exportações foram menores do que osnúmeros indicam, uma vez que os mesmos foraminflados pela devolução de aviões da VASP, por faltade capacidade de pagamento da empresa, que tive-ram seus valores contabilizados como exportação.

A Balança de Serviços, por sua vez, tambémdiminuiu o seu déficit em 1999 – de US$ 28,8

para US$ 25,2 – apesardo crescimento em US$3,2 bilhões do montantede juros pagos. A redu-ção das viagens interna-cionais em US$ 2,7bilhões e das remessasde lucros e dividendosem US$ 3,4% bilhões,mais do que compensouo maior encargo com adívida externa. No ano2000, até o mês de se-

1alebaT0002/4991-lisarB–)%(soçerPedlaunAoãçairaV

SONASECIDNÍ

ID-PGI ID-API ID-CPI CPNI ACPI CPI VCI

4991 08,604.2 91,920.1 29,042.1 23,929 34,619 52,149 49,280.1

5991 05,76 83,6 19,52 89,12 14,22 71,32 91,64

6991 43,9 01,8 43,11 21,9 65,9 40,01 81,31

7991 84,7 08,7 32,7 43,4 22,5 38,4 11,6

8991 07,1 15,1 66,1 94,2 56,1 )87,1( 74,0

9991 99,91 09,82 21,9 34,8 49,8 46,8 75,9

teS-naJ0002 51,8 80,01 11,5 32,4 78,4 78,3 79,5

/secidni/rb.moc.ia:etnoF

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.46-51 Dezembro 2000 49

tembro, observa-se uma nova redução no déficitda Balança de Serviços, com a mesma devendofechar o ano com um saldo negativo um poucomenor do que o de 1999. No entanto, deve-se fri-sar que essa redução vem se apoiando, maisuma vez, na diminuição das remessas de lucrose dividendos, que deverão crescer nos próximosanos, segundo todas as expectativas, em funçãodas privatizações realizadas e do processo dedesnacionalização sofrido pela economia brasi-leira nos últimos anos. Por sua vez, os gastoscom as viagens internacionais voltaram a crescere ficarão maiores do que os do ano passado, en-quanto os juros pagos deverão ficar próximosaos de 1999 (Gráficos 2, 3 e 4).

O desempenho da conta de transações corren-

tes do Balanço de Pagamentos do País, após adesvalorização do real em janeiro de 1999, expres-sou-se numa redução significativa do seu déficit,que, de US$ 33,6 bilhões em 1998, passou paraUS$ 24,3 bilhões, devendo voltar a se reduzir noano de 2000 para algo próximo a US$ 20 bilhões(Gráfico 5).

O problema, entretanto, é que além desse va-lor ainda ser extremamente alto – deve ser lem-brado que esse déficit, em 1994, foi de apenas deUS$ 1,7 bilhões bilhão – correspondendo a maisde 4% do PIB, o mesmo se verificará num anosem grandes sobressaltos na economia mundial,com crescimento modesto da economia brasileira– em torno de 4% e após dois anos de estagnação(Gráfico 6).

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50 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.46-51 Dezembro 2000

Em suma, a fragilidade externa ainda é muitogrande, não permitindo taxas de crescimento maiselevadas e colocando o País numa situação extre-mamente vulnerável com relação a qualquer piorana situação internacional, como, por exemplo, oaumento do preço do petróleo, a elevação da taxade juros americana, a desvalorização do euro ou adeterioração das condições econômicas argenti-nas. O déficit acumulado na conta de transaçõescorrentes, após a desvalorização cambial, atingiu omontante de US$ 40,1 bilhões até setembro dopresente ano, conforme evidencia a Tabela 2, de-corrente, sobretudo, do déficit acumulado na Ba-lança de Serviços, que tende a crescer nos próxi-mos anos.

interna líquida, cresceu em 1999 e deve se manternesse mesmo nível no presente ano, eqüivalendo,aproximadamente, a 47% do PIB.

O crescimento e a posterior manutenção dessadívida ocorreram apesar da obtenção de superávitsprimários nas contas públicas após a crise cambialde 1999, acima de 3% do PIB, tanto em 1999 quan-to em 2000, fruto das exigências do FMI quando dopacote de empréstimo feito ao Brasil em fins de1998 (Gráfico 8). É óbvio que essa deterioraçãodas finanças públicas se reflete na queda da quali-dade dos serviços básicos prestados pelo Estado àpopulação e, juntamente com a vulnerabilidade dascontas externas do País, potencializa o risco deuma nova crise cambial.

A vulnerabilidade externa do País, pelo lado dastransações correntes, tem como contrapartida, noplano interno, a fragilização das finanças públicas, oque se agrava, sobretudo, quando o governo se vêna obrigação de elevar a taxa de juros para frear ocrescimento da economia e impedir a fuga de capi-tais do País. Conforme evidencia o Gráfico 7, a dívi-da líquida total do setor público, em especial a dívida

2alebaT)seõhlim$SU(setnerroCseõçasnarTsodoírePsonsodalumucAsetnatnoM

laeR-sóPeérP

oãçanimircsiDlaeR-érP

)49-09(laeR-sóP

)89/59(

esirC-sóP/99(

)teS-0002

laeR-sóP/59(

)teS-0002

açnalaBlaicremoC

543.06 9)883.22( )254( )048.22(

açnalaBsoçivreSed

)085.07( )811.49( )810.34( )631.731(

saicnêrefsnarT 709.8 868.01 333.3 102.41

odlaS )523.1( )736.501( )731.04( )477.541(

ATADAEPI:etnoF Por fim, os efeitos da crise cambial e, posterior-mente, da retomada do crescimento sobre as taxasde desemprego, podem ser vistos nos Gráficos 9 e10. Depois de baterem recordes em 1999, essastaxas deverão fechar o ano de 2000 com uma pe-quena redução, e de forma diferenciada, em todasas regiões metropolitanas do País, por qualquermetodologia que se adote (Pesquisa Mensal doEmprego do IBGE ou Pesquisa de Emprego e De-semprego do SEADE/DIEESE). O problema é queas mesmas continuam muito elevadas, acima mes-mo das taxas verificadas em 1998, antes da desva-lorização do real.

Em resumo, dentro das restrições impostas pelalógica dessa política de estabilização, o desempe-nho da economia brasileira no ano 2000 foi melhorque o do ano anterior, até porque se vinha de doisanos anteriores muito ruins. A sua trajetória benefi-ciou-se de uma melhora do cenário internacional,com a manutenção do fluxo de capitais internacio-nais, apesar de não ter havido novas e significati-

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.46-51 Dezembro 2000 51

vas privatizações significativas de empresas públi-cas. Com isso, a taxa de câmbio se apreciou eapresentou uma menor volatilidade, o que implicoumenores pressões sobre a taxa de inflação, quedeverá se situar dentro da nova meta inflacionáriaestabelecida (6%), mesmo com a redução da taxade juros.

Nessas circunstâncias, houve uma retomada docrescimento, uma pequena diminuição das taxasde desemprego e a estabilização do montante dadívida pública, enquanto proporção do PIB. Pelolado do setor externo, tanto as exportações quantoas importações voltaram a crescer, sendo que asprimeiras foram impulsionadas pelo maior nível daatividade econômica interna, o que inviabilizou asexpectativas do governo de um superávit comercialimportante.

No entanto, o que se quer ressaltar é que, inde-pendentemente do maior alívio no curto prazo, veri-ficado no ano 2000, as circunstâncias macroeconô-micas fundamentais, que dificultam a retomada do

crescimento auto-sutentado, continuam presentes,em virtude da natureza da abertura comercial e fi-nanceira promovida desde o início dos anos 90,quais sejam: a fragilização financeira do setor pú-blico e a enorme dependência do País relativamen-te aos fluxos de capitais internacionais. A desvalori-zação cambial, por si só, não se mostrou capaz decorrigir essa situação, que se associa às mudançasestruturais mais recentes sofridas pela estruturaprodutiva e financeira do País. Adicionalmente, nãose devem subestimar outras dificuldades, de cará-ter estrutural, para a retomada de um crescimentosustentado, como é o caso, por exemplo, da neces-sidade urgente de novos investimentos na geraçãoe distribuição de energia

Enfim, torna-se cada vez mais evidente que oBrasil não tem competitividade suficiente para sus-tentar o atual grau de abertura da economia, o quesignifica dizer que esse impasse, que coloca emoposição crescimento econômico e emprego, deum lado, e o equilíbrio das contas externas e dasfinanças públicas, de outro, só pode se resolver apartir da implementação de um outro projeto de in-serção do País na economia internacional. É óbvio,entretanto, que as elites econômicas e financeiraspodem optar por manter a atual política e continuarfugindo para frente, como foi feito até agora pelaArgentina e pelo México, só para ficar-se em doisexemplos mais notórios. Entretanto, o preço a serpago pela maioria da população se tornará cadavez maior, deteriorando-se ainda mais as já péssi-mas condições sociais do País.

(I) O conteúdo do presente artigo baseia-se em algumas idéiaspresentes em livro recentemente publicado pelo autor,intitulado História do Plano Real, originalmente escrito paraConcurso de Professor Titular na Faculdade de Economiada UFBA. A elaboração das tabelas e gráficos contou com aparticipação do estudante de mestrado Laumar Neves.

* Professor Adjunto e membro do Núcleo de EstudosConjunturais (NEC) da Faculdade de Ciências Econômicasda UFBA. Doutor em Ciências Econômicas pela UNICAMP.

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52 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.52-73 Dezembro 2000

Desempenho da economia baiana no

ano 2000 e tendências para 2001

Equipe SEI*

Com base nos principais indicadores de ten-dência, é possível afirmar que, ao se en-cerrar o ano 2000, mais uma vez será posi-

tivo o desempenho macroeconômico e social doEstado da Bahia, ressaltando-se os bons resulta-dos também em termos ambientais.

Tomando-se como referência o Produto InternoBruto (PIB), estima-se uma taxa de crescimento daordem de 2,5%, para a qual concorrem a agricultu-ra, com uma apreciável expansão de 11%, e a in-dústria e o comércio, de modo bem mais modesto eem proporções equivalentes, cerca de 1%.

No âmbito do emprego, as pesquisas que afe-rem o comportamento dessa variável revelam quea taxa de desemprego se apresenta decrescente.Esse resultado é ainda mais auspicioso quando seobserva que essa queda se deveu ao expressivocrescimento do nível de emprego, ou seja, a ofertade vagas de trabalho no mercado vem absorvendoparte do estoque de desempregados. Segundo aPesquisa de Emprego e Desemprego, foram cria-dos 71.000 novos postos de trabalho, na RMS, en-tre janeiro e outubro e, de acordo com o Ministériodo Trabalho, a Bahia teve um saldo positivo de31.531 novos postos de trabalho no emprego for-mal, no mesmo período. Convém salientar queesse saldo é maior do que o registrado entre julho/94 (implementação do Real) e dez/99.

O nível dos preços em Salvador deverá situar-se dentro das metas inflacionárias estabelecidaspelas autoridades macroeconômicas, não devendoultrapassar 8% – a taxa acumulada até outubro foi

de 5,93% e o acumulado nos últimos 12 meses(em torno de 7,9%) vem apresentando tendênciadeclinante.

No setor de turismo, os indicadores apontampara variações positivas da taxa de ocupação noshotéis classificados, da permanência média e dageração de diárias, em todo o Estado da Bahia.Somente em Salvador, entre jan-set/00 registrou-se um total de 354.041 hóspedes, o maior contin-gente de visitantes observado nos últimos dezanos, em igual período.

Resultado favorável vem sendo constatadotambém no comércio externo. Entre janeiro e se-tembro deste ano, a corrente de comércio apresen-tou incremento de 41%, com as exportações cres-cendo 33% e as importações 49,5%, estas últimasdinamizadas principalmente pelo início das impor-tações de automóveis da montadora Ford, atravésdo Porto de Salvador.

No âmbito da educação, os indicadores relati-vos à taxa de ocupação, ao número de matrículas eao processo de municipalização foram todos positi-vos. No ensino fundamental, o crescimento da ma-trícula inicial atingiu 28,8%, entre 1996/00, e 9,2%,entre 1999/00. Nesse mesmo período, o númerode matrículas no ensino médio avançou 16,8%. Atendência à municipalização no ensino fundamen-tal fica clara quando verificamos que entre 1996/00a matrícula inicial decresceu nas esferas estadual efederal, evoluindo 56,8% na instância municipal.

São favoráveis as perspectivas para a econo-mia baiana no longo prazo, com os novos investi-

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.52-73 Dezembro 2000 53

mentos que deverão aportar ao estado, estimando-se que os mesmos representem cerca de 7,5% dototal previsto para o Brasil. Com a maturação des-ses investimentos, projetam-se taxas médias de in-cremento do PIB da Bahia superiores às nacionais.Tal processo resultará num adensamento industrialem áreas do interior do estado – decorrente dos in-vestimentos em informática, calçados e produtosesportivos, turismo, cerâmica, papel e celulose eagroindústrias, dentre outras – e em um reforço daconcentração industrial na RMS,com a implantação da Ford, daMonsanto e do início da produçãode bens finais (aparelhos eletrôni-cos e produtos ligados à indústriaquímica).

Desempenho do PIBe seus principais setores

A taxa de crescimento de 2,5%esperada para o PIB confirma e dáseguimento a uma trajetória de re-sultados positivos registrados pela economia doestado, de modo ininterrupto, desde 1992. Umaconjugação de fatores diversos influenciou o alcan-ce dessa taxa, que adiciona mais de um ponto per-centual ao crescimento do PIB per capita, estimadoem cerca de 1,4%.

Contrariamente ao que ocorreu em 1998 e 1999,quando o fenômeno El niño afetou o desempenho daagropecuária estadual, que se defrontou com prolon-gada estiagem, as excelentes condições climáticasdo ano em curso vêm favorecendo o desempenhodesse setor que deverá liderar o crescimento do PIBestadual em 2000. No que concerne à agricultura, sóo segmento dos principais grãos produziu cerca de3,5 milhões de toneladas, 38% a mais do que em1999. Essa foi a maior safra já registrada na lavourabaiana em todos os tempos, propiciando um cresci-mento de 11% no conjunto do setor primário.

Não obstante ser o segmento de maior peso naestrutura da economia baiana, a indústria contribui-rá modestamente com o crescimento do PIB esta-dual em 2000. Isso se deve principalmente aocrescimento previsto para a indústria de transfor-mação, que deverá oscilar em torno de 1,0%. O fra-co desempenho industrial reflete, entre outros

fatores, as paradas para manutenção – especial-mente no segmento do refino – e a estagnação dosetor de extração mineral, especialmente no queconcerne à produção de petróleo e gás. O resulta-do previsto para este ano está aquém do nacional,no qual o setor deverá avançar cerca de 6%. Res-salte-se que o bom desempenho da indústria naci-onal está relacionado com os elevados índices deprodução da extrativa mineral – campos petrolífe-ros da Bacia de Santos – e da indústria automotiva.

Vale ressaltar que esses seg-mentos, que impulsionaram a in-dústria brasileira, serão os mesmosque, na Bahia, deverão apresentar,no próximo ano, uma forte tendên-cia à expansão, tendo em vista adescoberta de um grande poço pro-dutor de gás na Baía de Camamu.Estima-se que essa nova fonte de-verá promover a auto-suficiênciabaiana desse produto. Por outrolado, a retomada do crescimentoda indústria de transformação do

estado estará refletindo o resultado dos investi-mentos no segmento automotivo.

O setor comércio deverá registrar desempenhoda ordem de 1%. Este resultado é compatível coma tendência nacionalmente verificada, a qual,aferida sistematicamente por pesquisas específi-cas, indica uma certa estabilidade do nível de ativi-dade do setor. O resultado da atividade comercialestá intimamente relacionado com as políticas ma-croeconômicas. Se as mesmas mantiverem-seinalteradas até o final do ano, o nível de atividadedo comércio tenderá a manter-se estável.

Vale observar que, a despeito das perspectivas fa-voráveis ao bom desempenho da economia baianano ano 2000, não se devem minimizar os possíveisefeitos da mais recente crise de petróleo – choque deoferta – sobre as metas inflacionárias, nemtampouco a crise argentina, especialmente agrava-da por um problema de câmbio fixo, que contribuiupara elevar o câmbio brasileiro no último trimestre.

Produção industrial

A atividade industrial no Brasil, ao longo do ano2000, vem sendo marcada por significativas taxas

São favoráveis asperspectivas para aeconomia baiana nolongo prazo, com os

novos investimentos quedeverão aportar ao

estado, estimando-seque os mesmos

representem cerca de7,5% do total previsto

para o Brasil.

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54 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.52-73 Dezembro 2000

de crescimento, graças à desvalorização do Real, àsubstituição de importações por produtos locais, àrecuperação dos preços de commodities, ao aumen-to nas vendas externas, à recuperação da demandainterna e, principalmente, à queda na taxa de juros.

O desempenho da indústria nacional tem sidomais significativo nas indústrias de bens duráveis ebens de capital, devido à expansão do crédito àindústria. Já os setores da economia que não de-pendem do crédito – bens semiduráveis e não-du-ráveis – ainda não apresentaram os efeitos darecuperação da economia. Além do mais, o poderde compra do brasileiro está baixo, em razão daqueda do salário real.

Em paralelo, os elevados níveis de utilizaçãoda capacidade instalada na indústria, sobretudoem segmentos produtores de bens intermediários,têm estimulado o investimento direto, principal-mente em bens de capital para a siderurgia e pa-pel e celulose. Caso não ocorram investimentos,com o esgotamento da capacidade instalada, asempresas tendem a reduzir a produção e, conse-quentemente, as exportações também serão re-duzidas e compensadas por maiores importaçõesde similares. Assim, o aumento das importações,em parte, impede o surgimento de gargalos sobrea trajetória do nível de atividade, sem exercerpressão inflacionária de demanda de consumo.No entanto, por outro lado, a economia tende aapresentar perdas, tanto no mercado interno comono mercado externo.

Na Bahia, a tendência à queda da atividade in-dustrial, que vinha sendo verificada no início doano de 2000, apresentou-se mais acentuada ao fimdo terceiro trimestre. Conforme se demonstra noGráfico 1, a variação acumulada da produção física

da indústria de transformação, em 12 meses, atéagosto, foi de -0,9%, se comparada com igual perío-do do ano anterior.

Cabe destacar que, na Bahia, poucos setoresda indústria de transformação determinam o de-sempenho da indústria como um todo, conseqüên-cia do peso relativo desses gêneros no valor datransformação industrial (VTI). Assim, química, me-talurgia, papel e papelão e produtos alimentares,juntos, representam mais de 70% no VTI da indús-tria de transformação. Só a indústria química temcerca de 52% de participação no VTI.

As indústrias que mais cresceram foram: meta-lurgia, material elétrico e de comunicações, têxtil epapel e celulose. Ressalta-se, entretanto, que aqueda observada na maioria dos setores determi-nou o desempenho pouco favorável da indústria detransformação nos últimos 12 meses. Merece des-taque a queda verificada na indústria química, quejá alcança 1,3% na variação acumulada de 12 me-ses, se comparada com igual período do ano ante-rior. Os gêneros minerais não-metálicos e produtosalimentares também participaram negativamenteno desempenho da produção física da indústria detransformação (Gráfico 2).

A indústria metalúrgica apresentou taxas positi-vas durante o ano 2000, impulsionando fortementea indústria baiana de transformação. No acumula-do em 12 meses, até agosto, registrou 3,6%, com-parando-se a igual período do ano anterior. Ossegmentos de ferrocromo em formas primárias evergalhões de cobre são os responsáveis pelo de-sempenho do setor ao longo de 2000.

Entre os setores beneficiados pelo aumento nopreço das commodities destaca-se o de papel e

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.52-73 Dezembro 2000 55

celulose. A taxa anualizada desse setor foi bastan-te significativa, atingindo, em agosto, 11,3%, com-parada a igual período do ano anterior. Ossegmentos responsáveis pelos melhores resulta-dos no gênero durante esse período foram os decaixas de papelão corrugado e de papel higiênico.

Durante o primeiro semestre de 2000, a variaçãonas vendas externas no segmento de papel e celuloseatingiram 31,0%, em relação ao primeiro semestre de1999. Cabe ressaltar que esse segmento detém16,3% das exportações baianas,ocupando a segunda posição entreos segmentos exportadores.

O gênero químico tem apre-sentado sucessivas dificuldadesde ordem conjuntural que contri-buíram para um desempenho ne-gativo nos oito meses transcorri-dos durante o ano 2000. Avariação acumulada em 12 mesespara o setor já atinge -1,3%, com-parada a igual período do ano an-terior. Gasolina comum para auto-veículos e óleo combustível foramos segmentos responsáveis pelaqueda de todo o gênero.

Destacam-se, entre os fatores determinantespara essa queda, o aumento dos preços combustí-veis e uma parada de emergência para manuten-ção numa unidade da RLAM, no início do segundosemestre de 2000. O mesmo ocorreu numa unida-de petroquímica de Camaçari, que reduziu o forne-cimento de eteno e provocou queda na produção evenda de polietileno.

Entretanto, a indústria petroquímica, no primeirosemestre de 2000, apresentou boa performance,pois houve um aumento na demanda de produtospetroquímicos básicos gerados pela substituiçãode importações e pelo crescimento econômico na-cional, o que significou aumento de importações dealguns insumos. A expectativa de algumas empre-sas do segmento para os próximos meses é dedeclínio nas margens de crescimento, devido à ma-nutenção de alta no preço da nafta, a principal ma-téria-prima do segmento. De modo geral, oaumento dos custos de matérias-primas derivadasdo petróleo contribuiu negativamente para o de-sempenho do gênero químico.

Já o declínio observado na produção física daindústria de alimentos pode ser atribuído à quedada renda média do trabalho e da massa salarial naindústria, fazendo com que o trabalhador tenhauma perda do poder aquisitivo. A queda na varia-ção acumulada em 12 meses registrou, até agosto,1,6%. Os segmentos que contribuíram para esseresultado foram os de massas e concentrados detomate e açúcar cristal.

Com base nos resultados dos indicadores in-dustriais CNI, observa-se que tantoa indústria nacional de transforma-ção como a da Bahia apresenta-ram taxas positivas para ofaturamento real, sendo que, en-quanto a tendência na indústria na-cional é de alta, na baiana verifica-se uma tendência de queda, quandose observa o acumulado em 12meses relativamente a igual perío-do do ano anterior, atingindo, emagosto, 8,97% e 22, 86% para aindústria de transformação do Bra-sil e da Bahia, respectivamente(Gráfico 3).

A indústria petroquímicaapresentou boa

performance no primeirosemestre de 2000, poishouve um aumento nademanda de produtospetroquímicos básicos

gerados pela substituiçãode importações e pelo

crescimento econômiconacional, o que significouaumento de importações

de alguns insumos.

O nível de emprego industrial da Bahia, medidopela CNI (Gráfico 4), recupera-se da tendência àqueda observada no primeiro semestre de 2000,acompanhando a tendência da indústria nacional.No entanto, a taxa acumulada em 12 meses conti-nua negativa, registrando, em agosto, -2,13%, secomparada com igual período do ano anterior.

Mesmo com o resultado pouco expressivo daindústria baiana, os setores que apresentaram de-sempenhos satisfatórios, principalmente os expor-

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tadores, dependeram basicamente dos fatores ex-ternos, como a melhora nos preços de algumascommodities e a estabilidade da economia interna-cional. O aumento da demanda interna, por partede alguns bens intermediários, contribuiu positiva-mente para os resultados da indústria baiana aolongo de 2000.

Por outro lado, outros fatores de ordemconjuntural influenciaram negativamente a perfor-mance da indústria na Bahia: acidentes em unida-des de produção e, consequentemente, paradasde urgência para manutenção; baixas cotaçõesdos produtos agrícolas no mercado internacional;barreiras tarifárias; e declínio da renda média real.

Com base no quadro apresentado, espera-seuma reversão da tendência à queda da produção fí-sica da indústria de transformação para os próximosmeses. Entre os fatores que podem contribuir paraum novo impulso na indústria estão a melhora dascondições de crédito e do consumo, o desempenhodas exportações, o aumento de investimentos e,principalmente, o aumento da demanda interna. Noentanto, é necessário que não existam incertezasem relação ao cenário internacional, principalmenteno que se refere à manutenção dos preços do petró-leo, ao aumento no preço das commodities e à recu-peração da economia argentina. No caso da econo-mia nacional, são imprescindíveis: a queda na taxade inflação, a manutenção da taxa de juros numbaixo patamar e a estabilidade do câmbio.

Comércio

O ano de 2000 pode ser considerado um ano dedesempenho estável para o setor comercial varejis-

ta. As taxas registradas ao longo do ano, segundoa Pesquisa Mensal do Comércio – PMC (SEI/IBGE), traduzem essa relativa estabilidade na per-formance de suas vendas físicas, principalmentequando se observa o acumulado jan/ago de -0,7%(o ano de 1999 foi de -4,4%). Conforme analistas,as expectativas em relação ao último quadrimestredo ano são mais otimistas, se comparadas às doano anterior, devendo encerrar-se o ano com taxapositiva de 2,0%. Também é mais auspiciosa a pre-visão para o PIB comercial deste ano, o qual deve-rá crescer cerca de 1%.

A expectativa desse crescimento embasa-senas mudanças da política econômica brasileira, ar-ticuladas desde o final do ano anterior, em que sedestaca, principalmente, a queda na taxa de juros,que tem possibilitado melhores desempenhos dosetor, inclusive com o aumento das promoções.Atualmente as taxas de juros estão entre 4% e 6%,devendo baixar até o final do ano. Também estásendo ampliado, nesses últimos meses, o prazomédio de parcelamento de cinco e seis meses docrediário, vigente nos últimos dois anos, paraparcelamento em sete e oito meses. Os lojistas es-peram ter condições de ampliar ainda mais esseparcelamento, alcançando níveis próximos dospraticados logo após o Plano Real. A ampliaçãodos prazos do crediário e a maior disponibilidadede recursos para os financiamentos, esta últimamotivada pela redução do compulsório cobradopelo Banco Central nos depósitos à vista, são fato-res que têm contribuído para o incremento das ven-das. Outro fator que vem ensejando animação sãoas festas de final do ano, sobretudo o Natal, umavez que se trata do último do Milênio, o que, prova-velmente, motivará as pessoas a consumir mais.

Embora o setor dê sinais de clara recuperação,alguns fatores restritivos ainda persistem, como odesemprego e a grande perda do poder aquisitivodo consumidor, fazendo com que alguns empresá-rios se mantenham cautelosos neste final de ano.

Pela análise dos indicadores da PMC para o pe-ríodo jan-ago00/99, constata-se que os setores aapresentar melhores desempenhos foram: outrosartigos de uso pessoal (19,9%), combustíveis e lu-brificantes automotivos (11,5%), móveis e eletrodo-mésticos (6,4%), automóveis e motos, peças eacessórios (1,3%) e farmácias, drogarias e perfu-

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.52-73 Dezembro 2000 57

marias (0,7%). Por outro lado, reduziu-se o nível deatividade dos segmentos de: lojas de departamen-to (-14,3%), vestuário, calçados e tecidos (-3,0%),super e hipermercados (-2,3%), material de cons-trução (-2,1%) e mercearias, açougues e asseme-lhados (-0,4%).

Registrou-se no segmento de outros artigosde uso pessoal o acréscimo mais significativo nareceita bruta. No contexto varejista esse ramo éde pouca representatividade. A comercializaçãode determinados artigos, a exem-plo de CDs, livros, artigos des-portivos e de papelarias, telefo-nes celulares e materiais óticos efotográficos, entre outros, foiincrementada por freqüentes pro-moções, principalmente em da-tas comemorativas, quando o co-mércio intensifica o marketing devendas.

Os estabelecimentos que revendem combustí-veis e lubrificantes automotivos tiveram desempe-nho satisfatório no período. A explicação para essebom desempenho fundamenta-se nas altas dospreços dos combustíveis concedidas pelo governoem determinados meses deste ano, provocandoimpacto inclusive no cálculo dos índices que me-dem a inflação do País.

As vendas de móveis e eletrodomésticos, apósdois anos enfrentando sérias dificuldades, eleva-ram-se no período, sinalizando a retomada da in-dústria, principalmente do subsetor de eletroeletrô-nicos. A desvalorização cambial dificultou aimportação desses aparelhos, largamente comerciali-zados em anos anteriores, o que proporcionou ummelhor dinamismo na produção interna. Segundoconsiderações de alguns analistas, o segmento debens duráveis, cujas vendas são predominante-mente a prazo, tem sido um dos mais beneficiadoscom as medidas adotadas pelo governo, com o au-mento do volume de crédito decorrente da reduçãodo compulsório sobre depósito à vista de 65% para45% e com a redução da taxa de juros. A queda donível de inadimplência, conforme aponta o Serviçode Proteção ao Crédito (SPC), é também um indi-cador de que as negociações das dívidas ematraso, por parte dos lojistas, têm permitido queretornem às compras consumidores antes consi-

derados inadimplentes. Vale salientar que a ampli-ação do prazo do crediário tem facilitado o consu-midor de menor poder aquisitivo, por permitir o de-sembolso de menores prestações.

As revendedoras de automóveis e motos, pe-ças e acessórios contabilizaram no período jan-ago 00/99 incremento nas vendas. Nesse seg-mento de mercado, 70% da comercialização,principalmente a dos chamados “carros popula-res”, é financiada. No âmbito do setor automoti-

vo, a boa performance deste anoé resultante das promoções em-preendidas pelas concessionári-as, da queda nas taxas de jurospraticadas pelas instituições fi-nanceiras ligadas à indústria au-tomobilística, da ampliação dosprazos de financiamentos e da re-dução das margens de lucros dosempresários, visto que, diante de

um mercado cada vez mais competitivo, tem sidoinevitável a concessão de bônus e descontos nospreços dos automóveis. Por outro lado, tambéma expectativa na recuperação da economia doPaís vem motivando os consumidores a assumirnovos compromissos.

As constantes majorações de preços dosprodutos farmacêuticos têm sido responsáveispelo acréscimo na receita bruta do setor de far-mácias, drogarias e perfumarias. Contrariamen-te, os elevados preços dos medicamentos têminibido a demanda, uma vez que os consumido-res de mais baixa renda não têm condições deadquiri-los. Entretanto, a chegada ao mercadodos genéricos – medicamentos vendidos pelonome do princípio ativo – vem permitindo oacesso da população a produtos de preços maisbaixos. Vale destacar as recentes mudanças dosetor, transformando-se em drugstores – centrosde serviços e conveniências, oferecendo diferenci-ais competitivos à comunidade. Segundo pesqui-sas, essas linhas podem responder por até 40% dofaturamento da rede.

As lojas de departamento apresentaram, noacumulado deste ano, o mais acentuado declínionas vendas. Esse arrefecimento pode ser creditadoà concorrência imposta por outros ramos de ativi-dade, a exemplo dos super e hipermercados, que

A ampliação dos prazosdo crediário e a maior

disponibilidade derecursos para os

financiamentos sãofatores que têm

contribuído para oincremento das vendas.

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são responsáveis pela comercialização de grandeparte dos artigos antes só encontrados nessas lojas.Nem mesmo as intensas campanhas publicitárias eas constantes ofertas de produtos conseguirammotivar os consumidores. Embora o setor já sinali-ze mudanças estruturais, concentrando seu alvoem poucos segmentos e em determinados públi-cos, os resultados deste ano ainda não conseguemespelhar as novas estratégias adotadas.

Conforme avaliações dos comerciantes do ramode vestuário, calçados e tecidos, as vendas provo-cadas pelas liquidações foram muito tímidas, nãosendo capazes de reverter o resultado negativo doperíodo. O melhor desempenho do setor foi alcança-do em junho último, quando as empresas desseramo tiveram o faturamento real impulsionado pelosfestejos juninos. Como a comercialização desses ar-tigos oscila segundo as datas comemorativas, pode-se prever uma elevação na receita bruta dessaslojas nos próximos meses. Esse foi outro segmentodo varejo a beneficiar-se com as restrições às impor-tações em decorrência da maxidesvalorização cam-bial, as quais impulsionaram internamente asindústrias têxteis e de vestuário.

No segmento de material de construção, asconstantes chuvas nos primeiros meses deste ano,aliadas aos reajustes de preços dos materiais, con-tribuíram decisivamente para o recuo dofaturamento real do setor. Muito embora o segmen-to tenha sido contemplado com o programa de fi-nanciamento através da Caixa Econômica Federal,esse não conseguiu elevar a receita bruta do ramovarejista. Todavia, com a proximidade do final doano e a chegada do verão, as previsões são de queas lojas desse segmento contabilizem melhores re-sultados.

O comportamento do setor de super e hipermer-cados, nos últimos meses, tem sido de quedas nasvendas. Dentre os dez ramos do comércio varejis-ta, esse é o mais representativo, respondendo porcerca de 36% do faturamento total. Em vista disso,o constante declínio nas receitas brutas do seg-mento tem impedido um maior dinamismo do co-mércio varejista. As vantagens oferecidas pelasgrandes redes, como o parcelamento de comprasde determinados produtos através do cartão decrédito, não têm conseguido alavancar as vendas.Conforme considerações de representantes da As-

sociação Brasileira de Supermercados (ABRAS),entre os diversos fatores que explicam a má perfor-mance do ramo está a mudança do perfil do consu-midor, que, com a perda do poder de compra,passou a adquirir produtos de marcas alternativas,cujos preços são mais compatíveis com o seu orça-mento doméstico. Ainda segundo a ABRAS, a pre-visão inicial de crescimento para este ano, emrelação a 1999, era de 4%, mas diante do fraco de-sempenho deverá situar-se em torno dos 2%. Cabesalientar que o processo de concentração do capi-tal (fusões e aquisições), iniciado há algum tempo,ainda persiste, sendo que este ano o grupo holan-dês Royal Ahold adquiriu a rede Bompreço.

Mercearias, açougues e assemelhados com-põem outro setor a apresentar resultado negativono período jan-ago00/99, aí observando-se com-portamento semelhante ao registrado nas grandesredes de supermercados. As vendas de produtosde primeira necessidade, que constituem a princi-pal fonte de receitas desses estabelecimentos, fo-ram reduzidas. Por tratar-se de empreendimentosde pequeno porte não comercializam as diversasopções de produtos e marcas encontrados nosgrandes supermercados e não dispõem de instru-mentos para enfrentar a concorrência dessas em-presas.

O comércio eletrônico que, já há algum tempo,vem se destacando na Bahia, entra agora na suafase de amadurecimento. O mercado ganha novosinvestidores e, assim, maior competitividade. Os quejá estavam no setor há mais tempo procuram man-ter-se atraentes e fazem novos investimentos, des-tacando-se entre estes o Virtual Box, que está nomercado há dois anos, e só efetua suas vendas pelaInternet. Sem estrutura física, o Virtual Box vemredefinindo suas estratégias de negócios tentandoadequar-se às exigências dos seus clientes. Atual-mente esse supermercado virtual atende, em média,12 pedidos diários, situando-se o valor de cada pedi-do em torno de R$ 300,00. No setor eletrônico tam-bém vem se destacando a Best Bahia, empresacriada para comercializar produtos genuinamentebaianos como instrumentos musicais, orixás de bar-ro, lembrancinhas, livros e discos, além de comidastípicas como acarajé e vatapá em pó. Atualmente aempresa atende a uma média de 40 pedidos por dia,de clientes de diversas localidades.1

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.52-73 Dezembro 2000 59

Com base nos resultados acima comentados enas expectativas quanto à condução da economia,espera-se melhor desempenho para o setor vare-jista neste final de ano e começo do próximo. Abusca por produtos e serviços de qualidade, ematenção principalmente às exigências do consu-midor, também denota uma preocupação dosempresários em permanecerem competitivos nomercado.

Atividade agrícola

A agricultura baiana foi benefi-ciada na safra 99/00 por diversosfatores. Primeiramente, pelo com-portamento das chuvas que ocor-reram em bons níveis pluviométri-cos em praticamente todo oestado e com uma distribuição aolongo dos meses bastante razoá-vel. Em segundo lugar, devem serlevadas em conta a estiagem e asgeadas ocorridas no centro-sul,que acabaram por proporcionar ganhos relativos aacessos de mercados e melhores preços para al-guns produtos (p. ex. cana-de-açúcar).

A safra de grãos da Bahia no período 1999/2000 deve ser maior do que a anterior em pelo me-nos 47,3%. O destaque foi para o algodão, quecresceu cerca de 160% com a expansão da produ-ção mecanizada no cerrado, segundo dados doLSPA-IBGE.

Neste ano a produção de feijão deve chegar a532,5 mil toneladas, o que representa um cresci-mento de 60,7% em relação ao ano passado. Ape-sar da área plantada não apresentar expectativasmelhores, a melhoria nos tratos culturais proporcio-nou um maior rendimento para a cultura e, conse-quentemente, aumentos na produção.

A exemplo da expansão observada no feijão, omilho, que em boa parte é produzido através dosistema de consórcio com o feijão, deverá apresen-tar um crescimento da sua produção em 49,2%,segundo os dados do LSPA, chegando a 1,3 milhãode toneladas. O aumento da produção do milho, aexemplo do feijão, não é justificado apenas com oaumento da área, mas também por ganhos de pro-dutividade bastante significativos.

A expansão da área plantada no cerrado foi umdos fatores que proporcionaram o aumento daprodução da soja em 2000. Estima-se que esteano a área destinada ao plantio chegue a 628,36mil hectares, o que representa um crescimento de8,3% em relação ao ano-safra anterior. A produ-ção em 2000 deve chegar a 1,5 milhão de tonela-das, 31,1% maior do que em 1999. Os produtoresforam incentivados a expandir a área plantada,uma vez que o rendimento médio da cultura, se-

gundo os dados do LSPA, podechegar a 2.400 kg/ha contra os1.983 kg/ha apresentados em1999. Outro fator que, desde o iní-cio, influenciou a produção de sojana Bahia, foi o baixo preço da ter-ra, sobretudo se comparado ao deoutras regiões. As terras baratas eo bom rendimento médio da cultura,combinados, acabaram por atrairprodutores de outras regiões doPaís.

O Estado da Bahia é grandeprodutor de lavouras consideradas tradicionais,tais como mandioca, cana-de-açúcar, café e cacau.Os três primeiros encontram-se em ampla expan-são: a mandioca, em virtude do efeito substituiçãode áreas de outras culturas decadentes (p. ex.fumo) e das boas condições climáticas (chuvas); acana-de-açúcar, em razão dos bons preços e domaior mercado, viabilizado pela estiagem no Cen-tro-Sul. Quanto ao café, vem sendo fortemente im-plantado nos cerrados (variedade arábica) e nazona cacaueira e extremo-sul (variedade conillon);com isso, dentro de pouco tempo os saltos na suaprodução serão baseados justamente nestas no-vas áreas. Já os produtores de cacau continuambuscando financiamento e auxílio técnico para,através dos clones, alcançar a reabilitação dos ní-veis de produção relativamente a períodos anterio-res à vassoura de bruxa.

Em 1999, a produção de mandioca foi de 3,1milhões de toneladas. Para 2000 é esperado umcrescimento na produção de 22,6%, passandopara 3,8 milhões de toneladas. A estimativa de se-tembro de 2000 para a área plantada registrou umcrescimento de 16,2%, chegando a 302,7 mil hec-tares plantados. A mandioca é uma das culturas

A safra de grãos da Bahiano período 1999/2000

deve ser maior do que aanterior em pelo menos47,3%. O destaque foi

o algodão, que cresceucerca de 160% com a

expansão da produçãomecanizada no cerrado,

segundo dados doLSPA-IBGE.

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60 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.52-73 Dezembro 2000

que mais empregam e a estimativa de crescimentoda área plantada pode significar, este ano, maistrabalhadores ocupados nesta cultura.

As estimativas para a produção da cana-de-açú-car em 2000 apresentam números 4,6% maioresque os do ano passado. A produção em 1999 che-gou a 4,74 mil toneladas. Já em 2000, espera-secerca de 4,96 mil toneladas, sendo que parte desseaumento da produção é justificado pelo aumento naárea plantada. Para 2000 o crescimento deve ficarem 3,3% em relação aos 89,57 milhectares plantados em 1999.

O cultivo do cacau em 2000apresenta praticamente os mesmosnúmeros de 1999. A área é a mes-ma e a produção tem um leve cres-cimento, de 0,09%, provocado pelosaltos níveis de pluviosidade que, porsua vez, amenizam os impactos davassoura de bruxa. Apesar das difi-culdades que a cultura vem en-frentando, fruto de condições eco-nômicas estruturais e conjunturaisnegativas (falta de recursos e fi-nanciamento, preços baixos) e do-enças, o cacau ainda mantinha, em1998, o posto de principal produtoda Bahia (Tabela 1), segundo o Va-lor Bruto da Produção (VBP), para os dados daProdução Agrícola Municipal (PAM- IBGE).

As expectativas para o cultivo do café vêm sen-do norteadas pelo crescimento de 23,4% na produ-ção, relativamente a 1999. O Programa deAmpliação da Lavoura Cafeeira prevê aplicação derecursos da ordem de R$ 500 milhões e convêniono valor de R$ 290 milhões, entre o BNDES e oDesenbanco. Quanto aos produtores da regiãocacaueira, empenham-se em buscar a diversificaçãoda lavoura como forma de superar os problemas dacacauicultura. Outras áreas (diferentes da zona

cacaueira) incentivadas a produziro café, são em verdade tentativasde buscar um diferencial no setorcafeeiro do País. Com relação àárea plantada, espera-se, para oano 2000, um crescimento de2,1%, comparando-se com o anoanterior.

Contrariamente às culturas tra-dicionais, as frutas vêm represen-tando um novo mercado potencialde ganhos de renda para os pro-dutores. Se comparadas as rendasda fruticultura (além dos riscos)com as justas rendas que remune-ram a produção de commodities,as frutas certamente alcançammaior remuneração, com rendi-

mentos físicos compatíveis. Efetivamente o setorvem se desenvolvendo muito nos últimos anos,com destaque para a região de Juazeiro, que, comuma agricultura irrigada e de alta tecnologia, repre-senta um verdadeiro pool da fruticultura nordestina.A agroindústria frutícola está sendo bastante im-pulsionada localmente, o que provoca um efeitomultiplicador no emprego e renda. Com o desen-volvimento desse setor, a tendência é a ampliaçãoda cadeia produtiva e a implantação de novasagroindústrias de processamento de polpas, su-cos e doces.

Parte da produção das frutas na Bahia está vol-tada para a exportação, que é um dos vetores queimpulsionam a atividade. A evolução nas exporta-ções das frutas, a partir de 1997 (conforme gráficoabaixo), ilustra a dinâmica crescente do comérciointernacional de frutas nos últimos anos, cujas ex-portações cresceram 80% no período observado.Apesar de a categoria “Frutas e suas Preparações”

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Contrariamente àsculturas tradicionais, as

frutas vêm representandoum novo mercado

potencial de ganhos derenda para os produtores.Se comparadas as rendasda fruticultura (além dos

riscos) com as justasrendas que remuneram a

produção decommodities, as frutascertamente alcançam

maior remuneração, comrendimentos físicos

compatíveis.

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.52-73 Dezembro 2000 61

representar somente 1,9% do total exportado pelaBahia em 1999, as estimativas são cada vez maisotimistas. Para este ano, o total exportado na ca-tegoria “Frutas e suas preparações” pela Bahia,no período de jan-jun/00, foi de US$ 14,25 mi-lhões. Comparando-se o total exportado nessesmeses com o mesmo período do ano anterior,observa-se um crescimento das exportações daordem de 61,35%, segundo os dados do Infor-mativo do Comércio Exterior da Bahia, de jan-jun/00 da PROMO (Centro Internacional de Negó-cios da Bahia).

ano passado (5,92%). Por outro lado, nos últimos12 meses (out/99-set/00) este indicador alcançou8,69%, contra os 6,17% do período out/98-set/99.Esta taxa de 8,69% sinaliza que a inflação em 2000pode ficar em um patamar um pouco superior ao de1999, porém ainda se situará dentro do previstopelo FMI – que estipulou no plano de metas para2000 uma inflação anual em torno de 6,0% – po-dendo variar dois pontos percentuais para cima oupara baixo do alvo, entre 4,0% e 8,0%.

Observando o gráfico abaixo, verificou-se queo movimento das taxas mensais do IPC/SEI noprimeiro semestre deste ano foi bastante diferen-ciado em relação ao movimento do mesmo se-mestre de 1999. Naquela época a inflação estavasob os efeitos recentes do impacto da desvalori-zação cambial, que provocou uma série de au-mentos de preços, principalmente dos produtosque tinham equivalência em dólar. Nesse período,as taxas mais expressivas do IPC/SEI foramalcançadas nos meses de fevereiro (1,00%), abril(0,93%) e julho (1,27%). Em iguais meses de2000, o IPC/SEI apresentou os seguintes resulta-dos: fevereiro (0,26%), abril (0,52%) e julho(1,02%). Observa-se que todos eles ficaram abai-xo dos de 1999.

Paralelamente às atividades agrícolas, a pecuá-ria na Bahia vem preparando-se para atingir novosmercados. A vacinação de todo o rebanho bovinocontra a febre aftosa e a solicitação do certificadode zona livre (que poderá ser liberado pelo Ministé-rio da Agricultura em maio/2001) podem abrir no-vos mercados e incrementar o setor. Atualmente aBahia encontra-se na “zona tampão” e,2 caso nãoapareçam novos focos da doença e mantenha-se avacinação, poderá ser incorporada à “área livrecom vacinação”, o que representa a autorizaçãopara venda do produto em todo o mercado interno.

Índice de Preços ao Consumidor

O Índice de Preços ao Consumidor (IPC/SEI),indicador que mede a inflação na capital baianadesde 1977, acumulou um aumento de 5,60% noperíodo que abrange jan-set/00, situando-se umpouco abaixo do observado em igual período do

Neste ano, com a estabilização do câmbio, os pro-dutos administrados pelo governo são os que estãopressionando a inflação, mais precisamente os com-bustíveis que, com a crise do petróleo, vêm tendomajorações sucessivas de preços, provocando umasérie de outros aumentos. Nos meses de abril e maio

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62 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.52-73 Dezembro 2000

do corrente ano, o IPC/SEI registrou dois aumentossucessivos (por influência dos combustíveis), saltandode 0,03%, em março, para 0,52%, em abril, e para0,89% em maio. Com um novo aumento dos combus-tíveis, o IPC/SEI atingiu o patamar mais elevado doperíodo, 1,02%, em julho. Se não houver outro reajus-te desses produtos até o final do ano, as próximas ta-xas do IPC deverão ficar abaixo deste patamar.

O gráfico a seguir relaciona os produtos/servi-ços que mais pressionaram o IPC/SEI no períodojan-set/00.

Os principais produtos que contribuíram paraatenuar o crescimento do IPC/SEI no períodoenfocado (jan-set/00), foram: agasalho (-25,0%),calção (-23,0%), roupas íntimas (-19,0%), cosméti-cos (-11,0%), camisetas (10,0%), desodorantes eperfumes (-9,0%), óleo de milho (-8,0%), carne seca(-7,0%), brinquedos (-7,0%) e feijão rajado (-5,0%).

O comportamento dos grandes grupos

A tabela a seguir mostra, no âmbito de grandesgrupos componentes do IPC/SEI, aqueles quemais se elevaram no ano (jan-set/00) e nos 12 me-ses (out-99/set-00).

Vale salientar que todos estes produtos tiveramaumentos de preços bastante acima da taxa médiaacumulada do IPC/SEI (5,60%), podendo ser consi-derados como os principais responsáveis pela eleva-ção da taxa de inflação, em 2000, em Salvador. Emprimeiro lugar, destacou-se o automóvel usado, comum incremento da magnitude de 34,53%. Observou-se também que os produtos/serviços, em sua maio-ria, são administrados pelo governo federal, a saber:o reajuste expressivo ocorrido no álcool combustível(32,08%), que teve majoração mais acentuada doque a da gasolina (15,75%). Em seguida, salienta-ram-se os incrementos de assinatura de telefone fixo(19,82%); passagens aéreas (19,03%); leite pasteu-rizado – que teve majoração de 11,32% devido àentressafra –, energia elétrica (11,09%), planos desaúde (10,88%), empregados domésticos (10,85%)e mensalidade escolar (8,59%).

O gráfico a seguir relaciona os produtos/servi-ços que apresentaram os maiores decréscimos depreços, de acordo com o IPC/SEI.

2alebaTrodimusnoCoasoçerPedecidnÍ

0002rodavlaS–sadalumucAseõçairaV)%mE(

sopurGsednarGsadalumucAseõçairaV

onaoN sesem21mE

sadibeBesotnemilA.1 64,3 42,7

sogracnEeoãçatibaH.2 21,3 37,4

aicnêdiseRedsogitrA.3 50,01 12,21

oiráutseV.4 90,4 34,8

oãçacinumoCe.psnarT.5 93,01 95,41

siaosseP.diuCeedúaS.6 56,3 25,6

siaossePsasepseD.7 69,5 84,6

lareG 06,5 96,8

IES:etnoF

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.52-73 Dezembro 2000 63

Observou-se que dos sete Grandes Grupos quecompõem o IPC/SEI, dois deles ficaram acima damédia geral (5,60%), pressionando a inflação emSalvador no período jan-set/00, a saber, o deTransportes e Comunicação (10,39%) e o de Arti-gos de Residência (10,05%). Por outro lado, osgrupos Habitação e Encargos (3,12%), Alimenta-ção (3,46%), Saúde e Cuidados Pessoais (3,65%)e o de Vestuário (4,09%) pressionaram menos osresultados do IPC/SEI no período. O último grupo,Despesas Pessoais, com aumento médio de5,96%, ficou um pouco acima da média.

pação na pauta de exportação passou de 56,2%para 58,5%, contribuíram para elevar a importaçãode insumos industriais. Um desses setores é a tele-fonia celular, verificando-se que, para cada dólarexportado, o setor demanda US$ 0,70 em insumosimportados.

O comércio exterior da Bahia, que caiu 13,6% em1999, apresentou no período jan-set/00 um excelentedesempenho, com as exportações alcançando US$1,507 bilhão, o que representa crescimento de33,03% em relação a igual período de 1999. As im-portações devidas ao preço do petróleo e à internali-zação de automóveis pelo Porto de Salvador cresce-ram 49,58%, somando US$ 1,553 bilhão.

Comércio exterior

As exportações brasileiras, que não apresenta-ram bom desempenho em 1999, tendo caído 6,4%,vêm registrando excelentes resultados este ano,com recorde histórico de crescimento, no períodojan-set, de 18,2%, atingindo US$ 41,4 bilhões. Asimportações continuam em ritmo acelerado, so-mando US$ 40,6 bilhões e alcançando um cresci-mento de 13,6% para o mesmo período.

Esses resultados geraram um saldo positivo deUS$ 717 milhões, contra um déficit de 776 milhõesem relação ao ano anterior. O superávit não foimaior devido ao impacto negativo do preço do pe-tróleo, à lenta recuperação dos preços das commo-dities e ao crescimento da demanda interna quetem impulsionado as compras externas de matérias-primas e bens intermediários.

A reativação do mercado doméstico e o aumen-to das exportações de manufaturados, cuja partici-

3alebaTaihaB-laicremoCaçnalaB

seõhlim$SUorbmeteS-orienaJ

oãçanimircsiD 9991 0002 %raV

seõçatropxE 4,331.1 6,705.1 20,33

seõçatropmI 1,830.1 8,255.1 85,94

odlaS 03,59 02,54- –

oicrémoCedetnerroC 5,171.2 4,060.3 39,04

XECES/CIDM:etnoFIES/CAEG:oãçarobalE

Essa internalização de automóveis e ainda a re-cuperação da atividade econômica foram os princi-pais responsáveis, em 2000, pela transformação dosuperávit em déficit na balança comercial da Bahia.Essa situação se configura como conjuntural, pois, apartir de 2001, o segmento de automóveis deve en-trar na pauta de exportação, revertendo essa situa-ção de déficit comercial (Tabela 1).

Os segmentos que mais se destacaram nesseperíodo foram os produtos agropecuários e semi-manufaturados, cujos preços no mercado internacio-nal vêm tendo uma ligeira recuperação. Além dissoestá ocorrendo uma maior agregação de valor aosprodutos exportados, com destaque para os seg-mentos minerais e fumos e derivados. O primeiro,em razão do programa Artefato Mineral, que visaelevar as vendas no exterior de produtos beneficia-dos. Contando com quatro fábricas em operaçãovoltadas exclusivamente para o mercado internaci-onal, o segmento de fumo vem se destacando napauta de exportação pelo seu expressivo cresci-mento e pela geração de empregos no interior doEstado.

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64 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.52-73 Dezembro 2000

Em termos de participação, a liderança continuacom o segmento químicos e petroquímicos, segui-do por papel e celulose e metalúrgicos. O principaldestino das exportações baianas é o mercado nor-te-americano, que participa com 30%, vindo a se-guir a União Européia e o Mercosul, valendoobservar que 14% das vendas externas da Bahiasão feitas à Argentina.

O crescimento do comércio exterior da Bahiaque, só este ano, até setembro, foi de 40,4%, já re-flete-se nas atividades de logísticae armazenagem. As empresasdesse setor estão investindo ouampliando suas instalações, aexemplo da Estação Aduaneira,com o objetivo de atender ao volu-me exportado de sucos e frutas daregião de Juazeiro e ao aumentodos fluxos dos produtos do PóloPetroquímico de Camaçari. Outrofator responsável pela expansãoda empresa citada é a consolida-ção do pólo automotivo em Cama-çari, uma vez que essa indústriademanda um grande número decomponentes importados e as operações delogísticas devem ser altamente sincronizadas paraque não se comprometam a produtividade e o de-sempenho do setor automotivo.

As perspectivas do comércio exterior da Bahiapara o próximo ano são de continuidade da trajetó-ria de crescimento, tanto das exportações quantodas importações. Pelo lado das exportações, a en-

trada de novos segmentos vai assegurar ou atémesmo elevar a taxa média de crescimento(29,4%, ver Gráfico) verificada até setembro. Den-tre os novos segmentos destacam-se automóveis,calçados e produtos de informática. Vale ressaltarque se verifica uma maior agregação de valor aosprodutos já exportados, como sisal e pedras orna-mentais.

Para assegurar a continuidade do crescimentodas exportações, a Bahia conta com o apoio da

Agência de Promoção de Exporta-ção (Apex), subsidiária do Sebrae,que já contabiliza 35 projetos con-cluídos e 11 aprovados, com iníciode operações ainda previsto paraeste ano. O volume de recursos alo-cados para esses projetos alcançaR$ 144 milhões, que serão distribuí-dos, ao longo de quatro anos, nossetores de maior competitividade dediferencial internacional, buscandoinserir as pequenas e médias em-presas no comércio exterior.

O principal objetivo da agênciaé que o País alcance U$ 100 bi-

lhões em exportações no ano 2002, ampliando aparticipação brasileira nas exportações mundiais,que atualmente se encontra abaixo de 1%. O in-centivo às potencialidades dos estados é funda-mental para a consecução de tal objetivo. Comisso, a Bahia deve exportar US$ 3,5 bilhões em2002, se mantida a sua atual participação (3,5 %)nas vendas brasileiras ao exterior.

As importações continuarão crescendo porduas razões muito simples: o desenvolvimentoeconômico do estado e a demanda do pólo auto-motivo, esta última devendo induzir, num primeiromomento, um volume significativo de insumos im-portados e a internalização de automóveis peloPorto de Salvador.

Além da própria competitividade dos setores,outros elementos podem contribuir para um acen-tuado crescimento do volume de exportação daBahia: aumentar o número de empresas exporta-doras (em 1999, foram 28 empresas a responderpor 75% das vendas externas) através de uma re-dução dos custos tributários, simplificação financei-ra e de logística, conforme proposta da Câmara de

As perspectivas docomércio exterior da

Bahia para o próximo anosão de continuidade da

trajetória de crescimento,tanto das exportações

quanto das importações.Pelo lado das

exportações, a entrada denovos segmentos vai

assegurar ou até mesmoelevar a taxa média de

crescimento.

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.52-73 Dezembro 2000 65

Comércio Exterior (Camex). Outros pontos funda-mentais estão ligados à melhoria da infra-estruturaem geral, que permanece muito deficiente.

O crescimento das exportações e a geração desuperávits vão possibilitar ao Brasil crescer a taxasadequadas às exigências de geração de empregoe renda, afastando, portanto, essa restrição exter-na que vem impedindo uma trajetória sustentávelde crescimento da economia desde 1995.

Mercado de trabalho formal

Segundo o Cadastro Geral de Empregados eDesempregados (CAGED),3 registro administrativodo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), cujouniverso de cobertura é o de empregados regidospela Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), odesempenho do mercado de trabalho formal daBahia, durante os primeiros oito meses de 2000, foipositivo. Nesse período, verificou-se uma expansãodo estoque de assalariados (26.065 novos postosde trabalho) e um crescimento de 8.029 novos em-pregos, comparando com o total de postos de cartei-ra assinada do primeiro semestre (18.036 vagas).

Efeitos macroeconômicos específicos vêm influ-enciando a dinâmica do segmento formal celetistado mercado de trabalho nacional e, mais especifica-mente, do mercado de trabalho baiano. Dentre estesefeitos, citam-se a crise asiática e suas conseqüên-cias, a moratória deflagrada pela Rússia, responsá-vel pelo enfraquecimento do fluxo de capitais nospaíses subdesenvolvidos no ano de 1998. Em 1999,a mudança do regime macroeconômico (novo mixtaxa de câmbio/juros) viabilizou a nova fase do cicloconjuntural, ocasionando uma resposta positiva nademanda de trabalho, uma vez que a mudança doregime cambial ocorreu no início desse mesmo ano(Guimarães e Suerdieck, 2000).

De janeiro a março de 2000, observa-se umaescala descendente de geração de postos de tra-balho, inclusive com a queima de 361 vagas no últi-mo mês citado. De abril a agosto de 2000 omercado de trabalho formal na Bahia apresenta re-sultados positivos em termos de geração de novosempregos, com pequenas oscilações. Destaca-seo mês de abril como o que atingiu o pico de esto-que de assalariados no ano (4.575). A partir daí, ocomportamento do segmento formal do mercado

de trabalho baiano é similar àquele do primeiro tri-mestre do ano, não chegando, porém, à destruiçãode postos de trabalhos ali verificada.

Fato é que, pelo quinto mês consecutivo (abril aagosto), o número de empregos formais na Bahiaregistra um resultado positivo, refletindo o aqueci-mento no nível da atividade econômica no País.Entretanto, este desempenho embute um declíniona demanda de emprego, observando-se os trêsúltimos meses (junho a agosto do ano em curso).Em junho foram gerados 4.550 novos empregos naBahia, destacando-se o setor de Serviços, em que1.749 vagas foram criadas, e o setor de Comércio,com 1.008 novas oportunidades de emprego, comoos responsáveis, conjuntamente, por 60,6% do to-tal dos novos empregos do estado. Por outro lado,em julho de 2000 foram destruídos 204 postos detrabalho, sendo que ambos os setores de Comér-cio e Serviços, responsáveis pelo dinamismo dademanda de trabalho no mês anterior, registraramperdas (369 e 2.072, respectivamente). Os empre-gos gerados no mês de julho (4.346) devem-se,fundamentalmente, ao desempenho positivo dossetores da Indústria de Transformação (+1.279 em-pregos) e da Construção Civil, em que 2.051 em-pregos foram gerados, representando 76,6% doestoque total de assalariados do mês.

Em agosto de 2000, a Bahia vivencia a criaçãode novos postos de trabalho. Ao todo, foram regis-tradas 3.683 novas vagas, resultado do saldo obti-do pela diferença entre as admissões e osdesligamentos informados pelas empresas, em

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66 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.52-73 Dezembro 2000

agosto, no estado. Observou-se um acréscimo de40,6% no saldo de agosto do corrente ano em rela-ção ao saldo do mesmo mês em 1999, que foi de2.619 novas oportunidades de emprego.

Mas, em relação ao mês de junho de 2000,houve uma contração no estoque de empregosde 867 vagas (19,1% postos de trabalho assala-riado a menos) e, com referência a julho de 2000,a redução foi de 663 empregos (15,3%), confir-mando a tendência declinante apontada anterior-mente.

Distribuição espacialdo emprego formal

De acordo com o saldo acumu-lado até agosto de 2000, o total deempregos encontrado na Bahia re-presenta 61,2% do total de postosde trabalho encontrado na regiãoNordeste (42.605 vagas), vindoem seguida o Ceará, que apresen-ta 12.754 novos postos (29,9% dototal nordestino). Os demais esta-dos nordestinos, excetuando Pernambuco eAlagoas, apresentam participações bastante inferio-res. No caso de Pernambuco, o número de desliga-mentos (147.873) foi superior ao total de pessoasadmitidas (147.238), ocasionando um saldo negati-vo de -635 postos de trabalho, assim como no de

Alagoas, que apresentou um saldo negativo de-14.476 vagas no ano em curso.

Em termos nacionais, ao longo dos oito primei-ros meses de 2000 a Bahia vem se mantendocomo o oitavo estado a apresentar o maior númerode empregos criados, situando-se atrás apenasdas economias mais expressivas do País, localiza-das nos estados das regiões Sudeste-Sul (SãoPaulo, Minas Gerais, Paraná, Rio de Janeiro, RioGrande do Sul, Santa Catarina) e Goiás, único es-

tado da região Centro-Oeste adespontar nesse ranking.

Considerando a distribuição es-pacial dos novos empregos no ter-ritório baiano, para o acumuladonos oito meses do ano 2000, verifi-ca-se uma tendência à maior gera-ção de novos postos de trabalhocom carteira assinada no interiordo estado (62,3% dos novos em-pregos criados), estando os 9.846empregos restantes (37,8%) alo-cados na RMS. Esse maior assala-riamento no interior, na Bahia, ex-

plica-se pelo novo ciclo de investimentos que estãosendo implementados na economia baiana em de-corrência das estratégias empresariais e da açãoestatal na concessão de incentivos nos últimosanos.

Dos 3.683 novos empregos gerados em agos-to de 2000, estão concentrados 1.519 na Região

4alebaT0002edonaonsodalumuca*sodlaS

sonitsedroNsodatsEsatsitelecsogerpmE

oga-naj %

etsedroN 506.24 0,001

oãhnaraM 257.4 2,11

íuaiP 417.4 1,11

áraeC 457.21 9,92

etroNodednarGoiR 9134 1,01

abíaraP 8953 4,8

ocubmanreP 536- 5,1-

saogalA 674.41- 0,43-

epigreS 4151 6,3

aihaB 560.62 2,16

.TAFEDOC/TAF/ETM/DEGAC:etnoFedsêmonsodaircsogerpmesomatneserpersodlasso,DEGACoodnugeS*

.sotnemagilsedsoeseõssimdasaertneaçnerefidalepsoditbooãseaicnêrefer

Em termos nacionais, aolongo dos oito primeirosmeses de 2000 a Bahia

vem se mantendo como ooitavo estado a

apresentar o maiornúmero de empregos

criados, situando-se atrásapenas das economias

mais expressivas do País,localizadas nos estadosdas regiões Sudeste-Sul.

5alebaTroiamoodnuges,oãçaredefadsodatsE0002/oga-naJ–onaonodalumucaodlas

sodatsEodlaSodalumuca00/oga-naj

oãçacifissalC

lisarB 997.477 –

oluaPoãS 957.703 º1

siareGsaniM 444.021 º2

ánaraP 012.45 º3

orienaJedoiR 943.64 º4

luSodednarGoiR 228.34 º5

anirataCatnaS 940.33 º6

sáioG 659.13 º7

aihaB 560.62 º8

.TAFEDOC/TAF/ETM/DEGAC:etnoF

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.52-73 Dezembro 2000 67

Metropolitana de Salvador (RMS), o que repre-senta 41,2% dos novos empregos nesse mês.Aproximadamente 58,8% dos novos postos de

trabalho com carteira assinada estão distribuídosno interior baiano.

Distribuição doemprego formal

O CAGED revela,na Bahia, o setor deServiços como o maisdinâmico e sensível aoaquecimento no nívelde atividade econômi-ca no País, no períodode 1997 até 2000,quando apresentou umcrescimento de 16.275novos postos de traba-lho (45,4% do total denovos empregos cria-dos no estado). Entre-tanto, nos primeirosoito meses de 2000, osetor de Serviços (com5.380 novos postos detrabalho) é superadopela Indústria de Cons-trução Civil (5.641 no-vos postos de traba-lho), em termos dacapacidade de gera-ção de novas oportuni-dades de emprego.

Considerando ossubsetores do setor deServiços, observa-secrescimento nos oitomeses de 2000 em suaquase totalidade. Ape-nas dois subsetoresapresentaram contraçãodo estoque de assala-riados: as InstituiçõesFinanceiras (-200 va-gas) e o subsetor deTransportes e Comuni-cações (-609 vagas).Esses dois resultadosnegativos podem ser

6alebaTacimônocEedadivitAedserotesbuSeseroteSsoodnugessodlaS

*0002/7991,aihaB

edserotesbuSeseroteSacimônocEedadivitA

sodlaS

*0002 % *0002/7991odalumucA

otulosbA %

larenimavitartxE 564 8,1 959- 7,2-

oãçamrofsnarTairtsúdnI 451.5 8,91 476.5 8,51

sociláteM-oãNniM.dorP.dnI 134 7,1 272.1 6,3

acigrúlateMairtsúdnI 432 9,0 316 7,1

acinâceMairtsúdnI 421 5,0 807 0,2

.moCe.rtelE.retaM.dnI 28- 3,0- 69- 3,0-

etropsnarTed.retaM.dnI 22 1,0 061 4,0

oiráiliboMeariedaM.dnI 053 3,1 018 3,2

.farG.rotidE,oãlepaP,lepaP.dnI 841 6,0 931.1- 2,3-

oruoC,omuF,.carroB.dnI 352 0,1 831 4,0

.reteV.mraF.dorP,.miuQ.dnI 185 2,2 343.1- 8,3-

oiráutseV,litxêT.dnI 327.1 6,6 625.2 1,7

sodaçlaC.dnI 543.1 2,5 540.5 1,41

sadibeBesotnemilA.dorP.dnI 52 1,0 020.3- 4,8-

acilbúP.litU.dnI.vreS 973- 5,1- 465.5- 5,51-

liviCoãçurtsnoC 146.5 6,12 867.4 3,31

oicrémoC 073.5 6,02 758.8 7,42

atsijeraVoicrémoC 154.5 9,02 774.9 5,62

atsidacatAoicrémoC 18- 3,0- 026- 7,1-

soçivreS 083.5 6,02 572.61 4,54

sariecnaniFseõçiutitsnI 002- 8,0- 065.4- 7,21-

.forP-céT.reS.vómI.mdA.moC 111.3 9,11 561.11 2,13

seõçacinumoCesetropsnarT 906- 3,2- 371.4- 7,11-

.tunaM.peR.milA.jolA.vreS 768 3,3 341.8 7,22

.teVe.lotnodO,socidéM.vreS 780.1 2,4 513.4 1,21

onisnE 421.1 3,4 583.1 9,3

)atsitelec(acilbúP.mdA 181 7,0 574.1 1,4

.cte,arutlucivliS,arutlucirgA 865.3 7,31 473.4 2,21

sortuO 586 6,2 909 5,2

latoT 560.62 001 908.53 001

.TAFEDOC/TAF/ETM/DEGAC:etnoF.)DEGACodlevínopsid,otnemomon,oãçamrofniamitlú(otsogaedsêmoétaotsopmocéonaetsedodlasO*

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68 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.52-73 Dezembro 2000

explicados pelo processo de ajustes estruturaisprofundos a que estão submetidos esses subseto-res. No caso das Instituições Financeiras, o proces-so de reestruturação produtiva (marcado por fu-sões, aquisições e privatizações) e a adoção denovas formas de gestão/organização do trabalho(com a introdução de novas tecnologias poupado-ras de mão-de-obra) continuam afetando negativa-mente o nível de emprego, uma vez que a deman-da de trabalho apresentou saldos negativostambém nos anos de 1997, 1998 e1999, com -554, -2.701 e -1.115,respectivamente.

Devido ao processo de privati-zações nas telecomunicações, osubsetor de Transportes e Comu-nicações apresenta quedas emseus saldos (-4.117 vagas) emtodo o período – que vai de 1997até agosto de 2000 –, sendo que osaldo positivo obtido no mês deagosto de 2000 (mais oito novospostos de trabalho) é insuficientepara reverter a contração do esto-que de assalariados ocorrida no ano em curso (-609vagas) e ao longo do período de 1997 até 2000.

O setor de Comércio tem grande importância naeconomia baiana no que tange à demanda de traba-lho. Os seus resultados refletem o aquecimento dademanda final, desdobramento do aquecimento dademanda interna, estimulada pela mudança na con-dução da política econômica governamental (altera-ção do mix taxas de câmbio/juros), com queda nastaxas de juros e retomada do emprego. Representao segundo setor em expansão do estoque de assa-lariados (8.857) no período de 1997 até agosto de2000, totalizando 24,7% dos novos empregos cria-dos na Bahia nesse período. Os novos postos detrabalho do setor explicam-se pelo desempenho docomércio varejista (+9.477 vagas), na medida emque, no comércio atacadista, 620 postos de trabalhoforam desativados. O saldo acumulado nos oito pri-meiro meses de 2000, no Comércio baiano, foi de5.370 novas vagas, que, comparadas com as domesmo período do ano anterior, significam o surgi-mento de 5.004 novos empregos, colocando o Co-mércio como o terceiro setor mais importante nageração de novos empregos, atrás apenas da In-

dústria da Construção Civil e dos Serviços. Nos pró-ximos meses (agosto em diante) a participação dosetor de Comércio na demanda de trabalho do esta-do deve aumentar devido às contratações temporá-rias efetivadas com a aproximação das festas definal de ano.

De 1997 até agosto de 2000, a Indústria deTransformação destaca-se como o terceiro setordinamizador do emprego formal na economia baia-na, apresentando um saldo acumulado, no perío-

do, de 5.674 novos empregos.Dentre os seus subsetores, osmais expressivos são a IndústriaCalçadista, responsável pela gera-ção de 88,9% dos novos postos detrabalho no setor, seguindo-se aIndústria Têxtil e de Vestuário coma criação de 2.526 novos empre-gos, considerando o período referi-do. A performance da IndústriaCalçadista, na Bahia, está direta-mente associada aos novos ciclosde investimentos propostos pelogoverno, e a geração dos novos

empregos nesse segmento reflete a implantaçãode novas empresas de calçados no interior do esta-do. O subsetor industrial de Calçados é de funda-mental importância na determinação do estoqueassalariado no interior do estado e na desconcen-tração dos empregos em relação à Região Metro-politana de Salvador. Considerando os oitoprimeiros meses do ano 2000, a Indústria de Trans-formação situa-se na quarta posição em termos dequantidade de novos empregos, gerados sobretu-do pelos subsetores calçadista e têxtil/vestuário,confirmando a tendência apontada anteriormente.

O setor de Agricultura também tem um papel re-presentativo na composição dos empregos formaisdo estado, apresentando 4.374 novas oportunida-des de emprego ou 12,2% do total de vagas daBahia no período de 1997 a agosto de 2000. A evo-lução mensal do saldo na Agricultura foi positivapara todos os meses de 2000 (excetuando-se omês de março, quando houve uma redução de 11postos de trabalho) o que resultou na geração de3.568 novos empregos ao longo de 2000, isto é,81,5% das oportunidades de trabalho surgidas nosetor de 1997 para cá. Esse desempenho corres-

O setor de Agriculturatambém tem um papel

representativo nacomposição dos

empregos formais doestado, apresentando

4.374 novasoportunidades de

emprego ou 12,2% dototal de vagas da Bahia

no período de 1997 aagosto de 2000.

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.52-73 Dezembro 2000 69

ponde ao quadro mais geral da agricultura baianano ano em curso, marcada pela recuperação e/oumaior dinamização de certas culturas, moderniza-das, mas com peso relativamente significativo nautilização de mão-de-obra.

A Administração Pública4 faz parte dos setoresque apresentaram desempenho positivo na cria-ção de novos empregos celetistas. De 1997 aagosto de 2000, geraram-se 1.475 novas vagasno setor. No ano de 2000, essa performance re-sultou em apenas 181 novos postos de trabalhoassalariado.

Em contrapartida, o desempenho do setor deServiços Industriais de Utilidade Pública amorteceo crescimento de empregos formais celetistas noestado da Bahia. O saldo acumulado no períodode 1997 até agosto de 2000 representa uma perdade 5.564 novas oportunidades de emprego nessesetor. As políticas públicas de regulação imple-

mentadas, a busca de aumento de eficiência nasempresas estatais, o processo de privatizações eas parcerias entre o setor público e o setor privadoconstituem os principais ajustes estruturais que in-fluenciam o setor de Serviços Industriais de Utili-dade Pública, interferindo no seu nível de empre-go. A performance negativa do setor de ServiçosIndustriais de Utilidade Pública na Bahia acompa-nha a tendência nacional de postos desativadosno setor. No Brasil, 11.362 postos de trabalho fo-ram desativados, enquanto que na Bahia houveuma redução de 379 empregos no setor, no anode 2000.

Tendências e mudanças estruturais

Como mostrado anteriormente, no ano 2000 oPIB baiano registrará mais um resultado positivo,perfazendo nove anos de crescimento consecutivo.

7alebaT0102/0002onaiaBBIPodseõçejorP

otnemicserCedsaxaT

SEDADIVITA/SEROTES 00% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 01%

airáuceporgA 0,11 6,1 6,1 6,1 6,1 6,1 6,1 6,1 6,1 6,1 6,1

lareniMavitartxE 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0

oãçamrofsnarTedairtsúdnI 0,1 9,4 4,5 9,4 9,4 9,4 4,5 0,4 0,4 0,4 0,4

acilbúPedadilitUed.dnI.vreS 0,1 1,5 6,5 1,5 1,5 1,5 6,5 1,4 1,4 1,4 1,4

oãçurtsnoC 0,3 9,3 6,4 0,5 2,5 3,5 3,5 4,5 4,5 4,5 4,5

oãçatnemilAeotnemajolA 3,3 2,3 1,3 0,3 9,2 9,2 8,2 7,2 6,2 6,2 5,2

oicrémoC 0,1 1,3 4,3 1,3 1,3 1,3 4,3 5,2 5,2 5,2 5,2

otnemanezamrAeetropsnarT 4,5 4,5 4,5 4,5 4,5 4,5 4,5 4,5 4,5 4,5 4,5

oãçacinumoC 0,51 0,51 0,51 0,51 0,51 0,51 0,51 0,51 0,51 0,51 0,51

oriecnaniF 2,3 6,3 9,3 8,3 9,3 0,4 2,4 8,3 8,3 9,3 0,4

.tserP.vreSesievómIedleugulAsaserpmE

9,2 8,2 8,2 7,2 6,2 6,2 5,2 4,2 4,2 3,2 3,2

acilbúPoãçartsinimdA 3,1 3,1 3,1 3,1 3,1 2,1 2,1 2,1 2,1 2,1 2,1

oãçacudEeedúaS 3,1 3,1 3,1 3,1 3,1 2,1 2,1 2,1 2,1 2,1 2,1

soçivreSsortuO 3,5 5,6 1,7 3,6 3,6 2,6 7,6 8,4 8,4 8,4 7,4

socitsémoDsoçivreS 3,1 3,1 3,1 3,1 3,1 2,1 2,1 2,1 2,1 2,1 2,1

)*()1(AIHABBIP 2,3 6,3 9,3 8,3 9,3 0,4 2,4 8,3 9,3 9,3 0,4

)**()2(BIP/)DROF(BAV 6,0 2,1 9,2 4,3 6,3 7,3 9,0 2,0 0,0 0,0 0,0

)***()2+1(LATOTAIHABBIP 8,3 7,4 8,6 2,7 5,7 7,7 1,5 0,4 9,3 9,3 0,4

LISARBBIP 0,4 0,5 5,5 0,5 0,5 0,5 5,5 0,4 0,4 0,4 0,4

.ocirtémonoceoledometnaidemaihaBBIPodseõçejorP)*(.sotnemitsevnisovonedsotcapmiodnaredisnocseD

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70 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.52-73 Dezembro 2000

Nesse período, o agregado estadual acumuloucrescimento de 25%, prevendo-se um novo surtode crescimento acelerado a partir de 2001/02 até2010. Confirmado esse prognóstico, prevê-se novamodificação na estrutura do PIB baiano, em seustrês principais setores: o Industrial, o Agrícola e ode Serviços.

Vale lembrar que os mais importantes investi-mentos previstos para o estado – exemplos daFord, Monsanto, indústria calçadista e de plásticos,investimentos hoteleiros – já estãoem fase avançada de implantaçãoou, em alguns casos, em opera-ção. Nesta perspectiva, podemosafirmar que o panorama macroe-conômico dos anos 1990, caracte-rizado por processos de reestrutu-ração produtiva, pela aberturacomercial, estabilidade proporcio-nada pelo Plano Real, privatiza-ções e reforma do setor público, foibastante benéfico para o estado.Como resultado, o PIB baiano de-verá dar início a uma nova fase decrescimento sustentado, com perspectivas de ta-xas de crescimento mais expressivas.

Uma análise dos indicadores socioeconômicosda Bahia revela características marcantes do esta-do, onde se observa uma economia de estruturacompatível com áreas desenvolvidas versus estru-tura de emprego característica de áreas com poucadinâmica econômica mercantil e capitalista.

Considerando-se a previsão de taxas mais ele-vadas para o crescimento de PIB nos próximosanos, a que se aliam uma nova dinâmica demográ-fica, investimentos no setor social e um novo perfilpolítico do Brasil e, consequentemente da Bahia, aexpectativa é de que se deverão processar profun-

das transformações na estrutura econômica e socialdeste estado, a saber:

• Diversificação da agricultura – deverá sermantida a tendência a reduzir-se a condição de de-pendência de poucos produtos, tendo em vista osurgimento de outros. Até 1985, apenas cinco pro-dutos representavam quase 70% do Valor Bruto daProdução agrícola. Em 1995, essa proporção cor-responde ao valor de oito produtos e a perspectivaé de ampliação.

• Desconcentração espacial daagricultura – até 1985, a produçãoagrícola da região de Ilhéus/Itabuna representava 32% do VBPda agricultura estadual. A regiãode Porto Seguro ocupava o segun-do lugar, com 7,8%. Em 1995 é al-terado esse quadro, com a regiãode Barreiras assumindo a segundacolocação. Naquele mesmo ano omunicípio de Juazeiro passa a terdestaque no ranking.

• Modernização, diversificaçãoe integração em cadeias de agro-

indústrias – deverão promover uma menor depen-dência das condições climáticas.

• Estrutura industrial menos dependente do se-tor químico (que hoje representa cerca de 50% dovalor agregado da indústria) – o aporte de megain-vestimentos, a exemplo da Ford, Monsanto,Veracel etc. tenderá a alterar esse quadro.

• Adensamento industrial no interior e reconcen-tração na RMS - possibilidade de formação de ca-deias industriais (química e alimentar), e turismo,principalmente em Porto Seguro, Litoral Norte eBaixo Sul em um primeiro momento e, logo a se-guir, na Chapada Diamantina.

• Maior qualificação da força de trabalho – uni-versalização do ensino formal (fundamental, médioe superior) e contínua promoção de cursos de trei-namento para as novas indústrias.

Concluindo, tem-se pela frente um quadro pro-missor de mudanças econômicas, sociais e demo-gráficas que deverão melhorar os indicadoressociais (elevação da renda, queda das taxas deanalfabetismo e de mortalidade infantil, aumentoda expectativa de vida ao nascer) aumentar a arre-cadação de impostos e alterar a dinâmica espacial

Vale lembrar que osmais importantes

investimentos previstospara o estado – exemplos

da Ford, Monsanto,indústria calçadista e deplásticos, investimentos

hoteleiros – já estãoem fase avançada de

implantação ou,em alguns casos,

em operação.

8alebaTaihaBanBIPodesodapucosodaruturtsE

)%me(edadivitaedrotesrop

roteS biPsaossePsadapucO

oirámirP 3,01 2,24

oirádnuceS 4,83 8,31

oiráicreT 3,15 0,44

latoT 0,001 0,001

IES:etnoF

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.52-73 Dezembro 2000 71

do estado da Bahia, inserindo-o em novos circuitoseconômicos mundializados. A importante e funda-mental promoção de um desenvolvimento susten-tável e saudável está assim na linha de mira, masainda requer muito para concretizar-se, dada a im-plicação de uma efetiva melhoria na distribuição dariqueza, projeto na direção do qual é necessáriocaminhar.

Referências Bibliográficas

1 A Tarde,31/08/00

2 Região que compreende o entorno da área livre da doença.

3 O CAGED foi instituído pela Lei 4.923/65, sendo usado narealização do pagamento do seguro-desemprego. Possuiperiodicidade mensal, natureza censitária, e cobre as movi-mentações dos admitidos e desligados mensalmente. Tempor objetivo viabilizar a prestação de auxílio aos desempre-gados e a implementação de políticas contra o desemprego.Todas as empresas (regidas pela CLT) que realizaram movi-mentação mensal de empregados ficam, por lei, obrigadas adeclará-lo.

4 O universo deste setor, captado pelo CAGED, só incorpora osempregados públicos celetistas, excluindo os estatutários.

(*) Participaram na elaboração deste artigo os Economis-tas: Carla Janira Souza do Nascimento (Produção Industri-

al), Arno P. Schmitz e Patrícia da Silva Cerqueira (AtividadeAgropecuária), Flávia Suerdick (Mercado de Trabalho),

Zélia Góes e Maria de Loudes Caires (Comércio), VâniaMoreira (Índice de Preços), Luiz Mário Ribeiro Vieira

(Comércio Exterior), Edmundo Figueirôa e César Vaz deCarvalho Junior (Coordenação Geral)

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*0002-aihaBanalocírga

etnecsercoãçudorP % etnecsercedoãçudorP %

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2ohliM a arfaS 0,43

onier-od-atnemiP 3,13

ajoS 1,13

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EGBI-APSL:etnoF9991onaoaoãçalermE*

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72 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.52-73 Dezembro 2000

ovitucexEomuseR

serodanoislupmIsotiefE sovitirtseRsotiefE

airtsúdnI

etnemlapicnirp-serodatropxesiairtsudniserotessodoãçarepuceRsoçerpsodoãçarepuceradetnaid,-esolulecelepapotnemgeso

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an)sairaicepseeéfac,saturf(salocírgasotudorpedoãçacifisreviDoãçarepuceràesocsiredoãçazirevlupàmasiveuqarieuacacanoz

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etneicifusnilarurotidérC

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.52-73 Dezembro 2000 73

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74 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.74-83 Dezembro 2000

Bahia: uma economia

em transição1

Vladson Menezes*

Este artigo busca avaliar as mudanças re-centes e as perspectivas de comportamen-to da economia baiana nos próximos anos.

Ao longo do texto, defende-se a idéia de que aBahia está na iminência de vivenciar um processode transformação estrutural, em que o perfil deeconomia produtora de bens intermediários tendea ceder espaço a um arcabouço mais complexo,com prováveis impactos na dinâmica de comporta-mento da economia estadual – o quarto salto deacumulação de capital. Como resultado desse mo-vimento, bem como dos significativos investimen-tos que estão sendo carreados para o estado,abre-se a perspectiva de aceleração do crescimen-to nos anos vindouros, em um ritmo provavelmentesuperior ao da economia brasileira.

De fato, a Bahia já vem apresentando, na se-gunda metade da década atual, uma expansãomais significativa do que a registrada pelo PIB bra-sileiro. Na raiz desse processo, aliam-se elementoscomo a estabilização da economia brasileira, aspolíticas implementadas pelo governo estadual, al-gumas vantagens competitivas baianas e o expres-sivo volume de investimentos registrados. Mesmoassim, por razões vinculadas principalmente aospróprios e recentes percalços da economia brasilei-ra, o desempenho do estado tem sido inferior aoseu potencial, em termos de crescimento. Quandoos seus principais mercados desaceleram-se, háum natural reflexo sobre o ritmo de expansão deuma economia e, justamente por isso, a Bahia ain-da não vem apresentando a evolução desejada.

Para o futuro próximo, entretanto, mantidas asperspectivas favoráveis nos planos nacional e in-ternacional, é de se esperar uma razoável acelera-ção da economia baiana, sobretudo em função dealguns movimentos que indicam, simultaneamente,uma maior acumulação de capital e uma prováveltransformação estrutural.

Uma análise preliminar de tal processo será re-alizada em três tópicos, além desta introdução. Oprimeiro avalia a estrutura da economia baiana eos seus impactos sobre a dinâmica estadual deacumulação de capital. Em seguida, é rapidamenteavaliado o conjunto de mudanças ocorrido nos últi-mos anos, incluindo os principais condicionantesdeste processo e seus possíveis impactos sobre otecido econômico estadual.

Através das características estruturais e da evo-lução recente – elementos de nítida importância nadefinição de uma provável trajetória, posto que per-mitem a visualização dos potenciais e das limita-ções com as quais a economia da Bahia terá quese deparar em sua evolução no futuro próximo –pretende-se antever alguns dos prováveis movi-mentos da economia. É justamente este o objetivodo quarto e último tópico deste artigo, que concluiapontando as principais tendências para os próxi-mos anos, com ênfase para a possibilidade detransformações estruturais. Para tanto, além de in-corporar os elementos básicos dos tópicos anterio-res, procura-se identificar as sementes datransformação, que podem ser encontradas nos in-vestimentos previstos, sobretudo naqueles que en-

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.74-83 Dezembro 2000 75

gendram características distintas das atuais. Espe-ra-se, assim, atingir o principal objetivo deste arti-go: avaliar as transformações que ocorrem emdeterminados setores, os movimentos espaciaisque vêm se configurando em torno dos eixos dedesenvolvimento do estado, o surgimento de novasatividades e, em decorrência, ter uma idéia docomportamento global da economia baiana nospróximos anos.

Os condicionantes estruturais e os saltos deacumulação

A Bahia é, desde a década de 70, a sexta eco-nomia do país. O seu PIB, estimado pela SEI emR$ 43,2 bilhões em 1999, corresponde a aproxima-damente um terço da atividade econômica do Nor-deste. Entretanto, o real peso econômico do estadonos cenários nordestino e brasileiro e suas pers-pectivas de evolução futura não podem ser correta-mente dimensionados sem um entendimento dasprincipais características estruturais que, de certaforma, delimitam os padrões de comportamento daeconomia baiana.

Nesse sentido, destacam-se duas característi-cas, forjadas ao longo do tempo e consolidadasdurante a fase de industrialização dos anos 60 e70: a concentração setorial e a concentração espa-cial. Em termos setoriais, as décadas de 60 e 70caracterizaram-se pelo desenvolvimento da ativi-dade industrial, que gradativamente substitui aagricultura exportadora na função de injetar dina-mismo na economia baiana. Desde a instalação daRefinaria Landulfo Alves (RLAM), ainda nos anos50, passando pela implantação do Centro industrialde Aratu (CIA), na década seguinte, até a chegadado Pólo Petroquímico e da indústria sidero-metalúr-gica, já na segunda metade dos anos 70, houve umprocesso de elevação da importância da indústriana economia baiana. O setor secundário – queabrange, além da indústria de transformação, aextrativa mineral e a construção civil – passou aresponder por parcela significativa do PIB estadual,tendo ocorrido na década de 70 a principal transfor-mação estrutural do período, quando a indústriapassa a assumir proeminência similar à atual no te-cido econômico estadual, o que pode ser visto apartir dos números da Tabela 1.

O fato é que, a cada bloco de investimentos in-dustriais, mudava a economia baiana. Uma indús-tria inicialmente limitada, situada numa economiade base agrário-exportadora, transformava-se es-truturalmente à medida que os grandes investimen-tos, concentrados no tempo, ocorriam. E essesgrandes empreendimentos, por sua vez, alteravamnão apenas o ritmo de expansão do PIB, como,principalmente, através de seus impactos indiretos,traziam consigo uma demanda derivada que davaorigem a novos setores e oportunidades de investi-mento, modernizando e complexificando a econo-mia baiana – e alterando, dessa maneira, a suaforma de funcionamento e as suas relações com orestante da economia brasileira.

Desse modo, o processo de evolução da econo-mia baiana foi também um movimento de progressi-va emergência da atividade industrial.2 E essaemergência – à medida que era marcada por blocosde investimentos concentrados no tempo, no espa-ço e em setores específicos – gerou saltos de acu-mulação de capital, mudando não apenas a relaçãoda indústria com a base econômica local, mas tam-bém o modo de funcionamento desta base. Por isso,não se pode caracterizar a evolução recente da eco-nomia baiana a partir de ciclos de industrialização.Como colocado em outro trabalho:

Mais do que um comportamento cíclico, os investimentos in-

dustriais na Bahia, fortemente concentrados no tempo e em

um número relativamente restrito de empresas, caracteriza-

ram uma evolução por saltos, em que cada etapa significou

uma migração para um novo patamar de acumulação de ca-

pital. Além da expansão da estrutura industrial anterior, cada

1alebaTonaiaBBIPodlairoteSoãçisopmoC

onA)%(seroteS

oirámirP oirádnuceS oiráicreT

0691 0,04 0,21 0,84

0791 2,12 4,21 4,56

0891 4,61 6,13 0,25

5891 1,52 0,83 8,63

0991 8,21 1,83 9,84

5991 5,51 0,63 6,84

8991 3,01 4,83 3,15

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agrupamento de inversões representou uma complexifica-

ção econômica, gerando novas relações interindustriais e

impactos sobre as demais atividades.3

Isso acontece desde a segunda metade da dé-cada de 50, quando a vinda da RLAM na décadade 50 não significou apenas a implantação da in-dústria extrativa mineral na Bahia. Apenas a títulode exemplo dos efeitos de um salto de acumula-ção, cabe citar alguns impactos daquele proces-so. Azevedo (2000) aponta que os investimentosda Petrobrás chegaram a representar 7,5 % darenda interna estadual no final dos anos 50. E es-ses investimentos, além dos gastos operacionaisda empresa recém-chegada, modificaram a eco-nomia baiana, especialmente no espaço urbanodo Recôncavo e da Região Metropolitana de Sal-vador (RMS). Construindo estradas e comprandouma parcela significativa de seus insumos naRMS, a empresa gerou importantes efeitos indire-tos na economia local. Paralelamente, os gastosdos novos trabalhadores – não apenas os empre-gados da Petrobrás, mas também aqueles dasempresas fornecedoras – dinamizam o comércioda região. Apesar da existência de vazamentos(Azevedo, 2000) relacionados sobretudo à de-manda de bens de consumo duráveis provenien-tes do Sudeste do País, não se podem negar osefeitos indutores sobre uma atividade econômicaainda débil e praticada em moldes arcaicos, mes-mo para a época.

O fato é que a economia baiana sofreu de ma-neira significativa os efeitos da implantação daRLAM, não apenas em termos de expansão, mastambém no que se refere à complexificação das ati-vidades econômicas urbanas da RMS. Posterior-mente, na segunda metade dos anos 60, implan-tou-se em bloco, no CIA, uma indústria compostapor fornecedores de equipamentos e por produto-res de bens leves de consumo, alterando-se tam-bém o perfil da economia baiana. O último, e cer-tamente o mais importante, conjunto de investimentosimplantado na Bahia, foi o do Pólo Petroquímicoem Camaçari, que, além de propiciar uma significa-tiva modernização dos serviços na RMS, gerou umsubstancial crescimento do PIB estadual na segun-da metade da década de 70 e, em menor escala,no início dos anos 80.

Essa evolução em saltos foi também um pro-cesso de progressiva integração à economia nacio-nal, num movimento gerado pela necessidade deexpansão dos mercados da produção instalada noCentro-Sul, em que a construção de uma infra-es-trutura de transportes, possibilitando uma melhor li-gação entre as distintas regiões do País, desempe-nhou um papel marcante. O fato é que essaindustrialização gerou dois resultados. Em primeirolugar, fez com que a dinâmica de acumulação decapital na Bahia passasse a ser condicionada pelaatividade industrial. Em segundo, e sobretudo a par-tir da consolidação do Pólo Petroquímico de Cama-çari, reforçou os vínculos entre a economia baiana eo Sudeste do País, ocasionando uma dependênciada primeira em relação à dinâmica de comporta-mento da produção nacional.

Tudo isso deveu-se ao fato de a indústria baia-na ter-se concentrado fortemente na produção debens intermediários, assumindo um caráter clara-mente complementar à indústria instalada no Cen-tro-Sul. Dessa forma, o crescimento do mercadorepresentado pela produção industrial do Sudesteocasionava uma demanda adicional para a indús-tria baiana, induzindo, portanto, a expansão destee dos demais segmentos da economia estadual.Esse parque industrial baseado na grande empre-sa produtora de intermediários,4 fortemente apoia-do pela ação federal nos momentos iniciais de seudesenvolvimento, condicionava, por sua vez, emgrande parte o comportamento do restante da eco-nomia estadual.

A implantação em bloco da indústria, sobretudonos anos 70, que se fez acompanhar por uma pro-gressiva emergência das atividades de serviços ecomércio modernos,5 resultantes da demanda ge-rada pelos investimentos industriais, explica as cir-cunstâncias acima descritas. Reproduzindo Menezes(2000, p. 25-26):

Deve-se salientar que essa demanda provinha não apenas

das próprias necessidades do consumo industrial, mas tam-

bém, em escala considerável, do crescimento relativo das

camadas médias da população, em função dos investimen-

tos então em curso. Enquanto isso, as atividades agrícolas e

comerciais tradicionais perdiam espaço, em função do seu

reduzido dinamismo num momento em que o restante da

economia passava por transformações estruturais.

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.74-83 Dezembro 2000 77

Esse padrão de crescimento resultou na conso-lidação da outra característica estrutural da econo-mia baiana: a concentração espacial. O fato de aindústria ter se instalado principalmente na RegiãoMetropolitana de Salvador (RMS) – ou, para utilizaro conceito de eixos de desenvolvimento adotadopelo Plano Plurianual da Bahia, no eixo metropoli-tano – reforçou significativamente uma concentra-ção pré-existente. Nessa região concentraram-se,ao longo do tempo, os principais investimentos eminfra-estrutura e também as ativi-dades vinculadas, devido aos efei-tos indutores do investimentoindustrial. O fato é que, segundoinformações da SEI, a RMS eraresponsável por 62,9 % da ativida-de econômica estadual em 1996 epor 70,5 % do valor da transforma-ção industrial da Bahia em 1999.

Essa concentração, ainda quepossa ser considerada indesejá-vel do ponto de vista social, foiextremamente funcional ao pro-cesso de acumulação de capital na Bahia. A gera-ção de externalidades e economias de aglomera-ção, na medida em que atraía novas empresasauto-alimentava-se, num movimento que consoli-dava, cada vez mais, a própria concentração es-pacial. Assim é que, mais do que em qualquer ou-tra região do estado e mesmo do Nordeste,passou-se a encontrar no entorno de Salvadorvantagens relacionadas à disponibilidade de ser-viços de apoio, manutenção de equipamentos,transportes, fornecedores de uma série de insu-mos e um conjunto de atividades necessárias aofuncionamento das empresas industriais. Essasexternalidades, bem como outras atividades deri-vadas – o comércio moderno, os serviços pesso-ais, etc. – acabaram reforçando o crescimento daRMS, expandindo os efeitos inicialmente geradospela indústria.

A contrapartida desse processo foi a debilidadeda rede de cidades na Bahia. A proeminência eco-nômica de Salvador, no âmbito de uma economiarelativamente pequena, acabou criando obstáculosao desenvolvimento de pólos regionais de desen-volvimento, liderados por cidades médias. À exce-ção de Feira de Santana, importante centro de

distribuição, as demais cidades intermediárias sãodeficientes em termos de atividade econômica,infra-estrutura e prestação de serviços e, conse-qüentemente, têm dificuldades para cumprir umpapel polarizador em nível regional. Essa realidadecontribuiu, sobretudo nos anos 70 e 80, para o des-locamento significativo de migrantes em direção àRMS, resultando na formação de favelas na perife-ria e contribuindo para criar, estruturalmente, umelevado desemprego na região metropolitana.

Por outro lado, o vazio econô-mico do Semi-Árido, cujas alterna-tivas produtivas são, em geral, li-mitadas, acaba por obstaculizar aimplementação de uma estratégiasustentável de – onde predomi-nam pequenos municípios, depen-dentes de transferências estaduaise federais, e uma atividade agro-pecuária pouco produtiva, pratica-da sob padrões arcaicos.

O fato é que a evolução econô-mica da Bahia resultou na consoli-

dação de realidades bastante diferenciadas. Convi-vem uma economia dinâmica, em que surgiramatividades modernas e cuja complexidade crioucondições para a sua evolução futura, e um espaçocom reduzidas alternativas econômicas. A existên-cia de regiões intermediárias, embora seja uma re-alidade, não consegue anular a forte concentraçãoespacial do desenvolvimento.

O dinamismo da evolução recente

Além das características de ordem estrutural,devem-se buscar nos principais movimentos daevolução recente da economia baiana os condicio-nantes de seu comportamento futuro. Nos últimosanos, mais particularmente a partir de meados dadécada atual, a Bahia vem experimentando taxasde crescimento superiores às apresentadas pelaeconomia brasileira. Entre 1996 e 1999, a Bahiacresceu 15,5 %, enquanto o PIB brasileiro registrouum incremento de 7,5 %. Nos últimos três anos,enquanto o Brasil cresceu 4,6 %, o incremento daeconomia baiana foi de 12,6 %, num desempenhosignificativamente superior.

Esses números podem ser vistos na Tabela 2:

A proeminênciaeconômica de Salvador,

no âmbito de umaeconomia relativamente

pequena, acabou criandoobstáculos ao

desenvolvimento depólos regionais dedesenvolvimento,

liderados por cidadesmédias.

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tos básicos. Setores como o automotivo, o químicoe o siderúrgico, entre outros, vêm atravessando umnovo ciclo de investimentos – isso sem falar nasubstancial aplicação de recursos nos diversossegmentos da infra-estrutura.6

Esse movimento, caracterizado também poruma maior penetração do capital estrangeiro noPaís, apesar de ter refluído em 1998,7 quando aelevação da incerteza gerou o adiamento de diver-sas decisões de investimento, em nível nacional,afeta de forma diferenciada as distintas regiõesbrasileiras. Por outro lado, nesse quadro de reto-mada do investimento, têm se generalizado os me-canismos de incentivos governamentais à inversãoprivada, a conhecida guerra fiscal.

É justamente a partir daí que começam a atuaros condicionantes internos, favorecendo o desem-penho da Bahia, que aparece bem posicionada narecente retomada do investimento privado no Bra-sil. A atuação agressiva na guerra fiscal é um des-ses condicionantes. Evoluindo de um programageral como o ProBahia para programas específi-cos, como o BahiaPlast, o Procobre, os incentivosao desenvolvimento da informática no pólo de Ilhé-us, o Agrinvest e o esforço de atração da Ford, en-tre outros, a política de captação de investimentosassume visibilidade e efetividade. Houve, no âmbi-to do governo estadual, uma compreensão acercada necessidade de assumir uma postura agressivana guerra fiscal, num momento em que importantesdecisões de investimento estavam sendo tomadas.Contando com o incentivo adicional concedidopara os empreendimentos que se instalam na áreada Sudene, a Bahia tem conseguido, de fato, atrairuma gama significativa de novos projetos privadosnos últimos anos.

Entretanto, a mera disponibilização de incenti-vos fiscais e financeiros é insuficiente para a atra-ção de capitais. Nesse sentido, a realização deinvestimentos em infra-estrutura – muitas vezes es-pecífica para o atendimento aos principais empre-endimentos – a parceria com diversos municípiospara a concessão de incentivos adicionais e osacordos com as universidades e o Serviço Nacionalde Aprendizagem Industrial (SENAI) para a forma-ção e o treinamento de mão-de-obra são os princi-pais aspectos de uma política voltada não apenaspara a atração de capitais, mas também para a cri-

2alebaT)%(9991/6991BIPodoãçulovEedsaxaT

ONA AIHAB LISARB

6991 5,2 7,2

7991 7,6 6,3

8991 2,3 2,0

9991 3,2 8,0

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Na raiz desses movimentos estão elementos deordem externa e interna. No plano externo, desta-cam-se os efeitos da estabilização da economiaoperada pelo Plano Real sobre o consumo nordes-tino e sobre o nível de investimentos na economiabrasileira. Não se pode negar que, ao menos numprimeiro momento, a estabilização elevou o poten-cial de consumo dos segmentos mais carentes dapopulação brasileira, com o fim do imposto inflacio-nário. Considerando que, no Nordeste, a participa-ção percentual de tais camadas populacionais ésuperior à média nacional, esses impactos fazem-se sentir mais fortemente na região, inicialmentecom a elevação do consumo e, em seguida, com aimplantação de empreendimentos voltados paraatender a esse mercado.

O fato é que, com o crescimento do mercadoregional, adicionado ao baixo custo da mão-de-obra e a vultosos incentivos fiscais, algumas fábri-cas de calçados, alimentos, têxteis e bebidas –bens salário em geral – passaram a instalar-se naregião. O aumento do mercado propiciou a obten-ção de escalas mínimas para viabilizar a operaçãode plantas regionais, com eventual exportação doexcedente para o núcleo principal do mercado noSul-Sudeste. Assim, a conjunção de baixo custo demão-de-obra, de incentivos fiscais e de escala mí-nima do mercado regional permitiu que o produtomanufaturado no Nordeste pudesse chegar ao nú-cleo principal do mercado nacional com preçoscompetitivos. A Bahia, assim como outros estadosnordestinos, tem-se beneficiado desse processo.

Paralelamente, também como resultado da es-tabilização, verificou-se uma significativa elevaçãodo nível de investimentos na economia brasileira.Além dos já citados investimentos na indústria debens salário, ocorreram inversões significativas emsetores como bens duráveis de consumo e produ-

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ação de facilidades para os negócios privados. Re-forçando esse quadro, devem-se incluir a existên-cia de um ambiente institucional favorável aoinvestimento privado e a dotação de infra-estruturaem geral, fortalecida nos últimos anos, quando osaneamento financeiro do estado possibilitou acaptação de recursos junto a agências multilate-rais.

O fato é que essa postura por parte do setor pú-blico, aliada a uma base produtiva relativamentecomplexa, a uma infra-estrutura de razoáveis di-mensões8 e a um bom posicionamento do ponto devista logístico – posto que a Bahia é o caminho na-tural entre o Sudeste e os demais estados do nor-deste – tem resultado num significativo volume deinvestimentos. Embora persistam problemas comoa deterioração da extensa malha rodoviária federalno estado, que dificulta uma melhor fruição de suasvantagens logísticas, a Bahia é, claramente, dentreos estados menos desenvolvidos, aquele que reú-ne a maior gama de vantagens.

É justamente nos últimos anos que esse conjun-to de vantagens – algumas resultantes do salto deacumulação anterior, como a complexidade da ati-vidade produtiva e do setor de serviços na RMS,outras construídas mais recentemente, como asoriundas da política estatal – começa a atrair capi-tais, no bojo do atual ciclo de investimentos queocorre em nível nacional. Paralelamente, os setoresemergentes vinculados ao moderno agribusinesscontinuam crescendo e passam a ter uma maiorrepresentatividade.

Isso ajuda a explicar a melhora da atividadeeconômica estadual. O fato é que os últimos anossão marcados por uma série de investimentos, quepodem ser caracterizados, na indústria, com basena seguinte tipologia:

• expansão da base produtiva anterior;• bens leves de consumo; e• verticalização com adensamento e articulação

de cadeias.Evidentemente, existem empreendimentos que

podem se encaixar em mais de uma classificação,mas procura-se aqui enquadrá-los com base emsuas características e impactos mais expressivos.Isto feito, verifica-se a existência de três movimen-tos superpostos, embora comecem em momentosdistintos.

Os investimentos de expansão da base produti-va definem o primeiro movimento, ocorrendo a par-tir de 1994 e 1995 e acompanhando um movimentonacional de antecipação da capacidade produtivaem relação à demanda e busca de maior eficiênciaprodutiva, com elevação das escalas operacionais.Nessa classificação incluem-se os investimentosde ampliação da RLAM e da COPENE, além de umconjunto de empreendimentos na indústria petro-química, tanto em plantas novas quanto na amplia-ção das existentes. Em levantamento realizado em1997, Uderman e Menezes (1998a), apontam que44,3 % do valor dos investimentos previstos na-quele período destinavam-se à ampliação deplantas já instaladas. No levantamento realizadopara a publicação Tendências da economia baiana,da SEPLANTEC, o percentual de investimentos emampliação é de apenas 24 %, mostrando que essemovimento já não é tão substancial como há pou-cos anos. Afinal de contas, esses investimentosconstituem a base para a efetivação de uma maiorverticalização da indústria baiana. De todo modo, éfundamental deixar claro que a entrada em produ-ção de investimentos anunciados no início desseprocesso ainda está ocorrendo e tem sido um im-portante fator explicativo do comportamento daeconomia baiana, cujas taxas de crescimento têmsuperado as registradas para o conjunto do País.

O segundo movimento refere-se à implantaçãode bens leves de consumo, aproveitando os efeitosde um movimento já descrito, que se inicia após oPlano Real, com os primeiros anúncios acontecen-do a partir de 1996. Casos típicos são os das em-presas de calçados que começaram a vir para aBahia em busca de mão-de-obra barata e incenti-vos fiscais, beneficiadas também pela expansão domercado regional. As indústrias calçadista, têxtil ede confecções, que representavam, no levanta-mento anterior, 0,9 % do valor dos investimentos(Uderman e Menezes, 1998), atingiram, na atualtotalização, o equivalente a 6,9 %. Alguns investi-mentos nas áreas de Alimentos e Bebidas, caracte-rizados pela produção em multiplantas, também seincluem nessa classificação. Ao contrário dos seg-mentos vinculados à expansão da base produtiva,esses são menos concentrados espacialmente.Dessa forma, o estímulo a novos investimentosnesses setores deve ser incorporado em qualquer

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80 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.74-83 Dezembro 2000

política atual de desconcentração da atividade eco-nômica.

O último movimento, que se fortalece no perío-do mais recente, é a chamada verticalização comadensamento de cadeias. Embora associados a di-nâmicas distintas, podem ser classificados aqui osinvestimentos na transformação petroquímica, pro-dutos plásticos em geral, alguns empreendimentosdo agribusiness e, potencialmente, as indústriaseletrônica e automotiva. Potencialmente porque,no primeiro caso, as relações intersetoriais aindasão reduzidas, e, no segundo, os impactos de en-cadeamento resultantes da Ford ainda estão por seestabelecer, numa magnitude que depende doporcentual de insumos oriundos da Bahia.

No caso particular do agribusiness, incluem-senessa classificação aqueles investimentos relacio-nados à verticalização de cadeias produtivas, que,ao comprar insumos no campo, exercem um impor-tante papel na modernização dos padrões produti-vos na área rural. Outro exemplo importante deempreendimento que se encaixa na classificaçãode verticalização com adensamento e articulaçãode cadeias é o da Monsanto, que se beneficia deinsumos fornecidos pelo Pólo Petroquímico de Ca-maçari e deve se constituir em um importante for-necedor das atividades agrícolas estaduais –embora, logicamente, a sua escala seja bastantesuperior à magnitude do mercado baiano.

Além desses investimentos, não se pode deixarde mencionar a recente evolução do turismo e damoderna agricultura baiana. Embora com uma cla-ra concentração em determinadas áreas – o turis-mo cresce com mais força em algumas áreaslitorâneas e na Chapada Diamantina, enquanto asáreas de maior expansão agrícola são o Oeste e oSub-Médio São Francisco – essas atividades vêmdespontando e, certamente, têm contribuído para ocrescimento econômico recente.

Por tudo isso, a Bahia vem crescendo a taxasrazoáveis, embora aquém do seu potencial, atéporque persistem setores com significativa capaci-dade ociosa. Como fatores que vêm limitando ocrescimento econômico estadual, cabe citar:

• O próprio comportamento da economia brasi-leira, que, apesar de vivenciando maiores taxas deinvestimento, vem sendo afetada por sucessivasdificuldades enfrentadas por economias emergen-

tes. Como a estrutura produtiva estadual engendra,por motivos já expostos, uma dinâmica majoritaria-mente reflexa dos movimentos econômicos queocorrem em nível nacional, uma maior expansãoda economia baiana só pode acontecer no âmbitode uma aceleração da economia brasileira.

• O panorama internacional, não apenas nosseus impactos sobre a economia brasileira, mastambém, diretamente, no que diz respeito aos pre-ços das commodities, que atingiram níveis histori-camente reduzidos no decorrer dos anos 90. Maisrecentemente, algumas commodities produzidaslocalmente vêm vivenciando uma recuperação deseus preços internacionais. A confirmação dessemovimento, entretanto, ainda está por se realizar.

• As dificuldades enfrentadas por uma série delavouras tradicionais da Bahia, com destaque parao cacau, afetando diversas regiões do estado, quevêem suas alternativas econômicas significativa-mente restringidas.

Esses elementos atuam como desaceleradoresda economia baiana, dificultando a obtenção de ta-xas de crescimento ainda mais significativas. Doponto de vista estrutural, há que se ressaltar aindaas escassas alternativas de desenvolvimento eco-nômico do Semi-Árido. É justamente nessa regiãoque se concentra um elevado contingente de popu-lação rural, normalmente em ocupações precárias,sem maiores possibilidades de geração de rendaem termos sustentáveis. De todo modo, os efeitosmodernizadores dos investimentos em curso de-vem se fazer sentir nos próximos anos, com algu-mas implicações para o comportamento da econo-mia baiana. Essas possíveis transformações serãosistematizadas a seguir.

Algumas tendências

As principais tendências que podem servisualizadas para a economia baiana nos anos vin-douros devem ser divididas, para efeito de exposi-ção, em três blocos: as que se referem ao ritmo decrescimento, as de caráter estrutural e as que li-dam com a questão espacial.

No que se refere ao ritmo de crescimento, algu-mas considerações podem ser feitas. À medidaque os diversos empreendimentos previstos paraos próximos anos entrarem em operação, implican-

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.74-83 Dezembro 2000 81

do o estabelecimento de capacidade produtiva adi-cional, serão sentidos os impactos na economiabaiana. Como boa parte dos investimentos anunci-ados nos últimos anos ainda não atingiu essa fase,as taxas de crescimento do PIB estadual ainda têmsido tímidas, embora já superiores às brasileiras.Quando o fluxo de produção oriundo dos novos in-vestimentos entrar no mercado, a perspectiva éque a magnitude da evolução da economia estadualaumente.

Evidentemente, o ritmo de cres-cimento do estado, assim como aconcretização dos investimentosplanejados, dependerá também docenário esperado para as econo-mias brasileira e mundial. Emboraas expectativas de pouso suave daeconomia americana permaneçamno horizonte, fenômenos com aelevação dos preços do petróleo,as dificuldades enfrentadas pelaArgentina e, mais recentemente, afalência de uma grande empresacoreana, são empecilhos a uma maior evolução daeconomia brasileira, atingindo, logicamente, aBahia.

média nacional, à medida que a capacidade produ-tiva adicional for entrando em operação. Duas ra-zões justificam essa tendência. A primeira é amagnitude relativa de tais investimentos. Além daindústria, não se pode esquecer que a consolida-ção dos novos segmentos da agropecuária, quetambém se verticalizam, o crescimento dos servi-ços derivados desse conjunto de investimentos e ofortalecimento da atividade turística, propiciadopela estabilização econômica e fortalecido pela

ação do governo estadual, devemconfigurar um movimento de cres-cimento sustentado da economiabaiana nos próximos anos.

Cabe salientar que a Bahia, cujaparticipação no PIB brasileiro é infe-rior a 4,5 %, detém, em diversos le-vantamentos de investimentos, per-centuais sempre superiores a 7 %do total previsto para o País.Rodrigues (1999) mostra que, em1997, a Bahia atraiu 8,5 % dos in-vestimentos definidos entre os di-

versos estados,10 enquanto em 1998 o percentual foide 7,5 %. Mesmo considerando a imprecisão dessasinformações, os números apontam para um fortaleci-mento relativo da economia estadual. E deve-se ain-da registrar que esses investimentos têm um determi-nado prazo de maturação, de modo que as taxas decrescimento da Bahia, mesmo em termos relativos,devem se acelerar nos próximos anos.

A segunda razão para tal movimento é o efeitomultiplicador dos principais investimentos, particular-mente da Ford, que se concentram na RMS. Cabenotar que, após a desvalorização cambial ocorridano ano passado, tendo sido definido um novo pata-mar cambial, criaram-se condições para a substitui-ção de determinadas importações de insumos e aBahia pode ser beneficiária desse processo.

No plano estrutural, as principais modificaçõesvinculam-se aos investimentos industriais. O funda-mental é que começa a ocorrer, na Bahia, um movi-mento de verticalização, acompanhado de adensa-mento das relações intersetoriais. Não se deveesquecer que a participação dos setores relaciona-dos à implantação de bens leves de consumo e àverticalização com adensamento de cadeias nosinvestimentos previstos tem crescido substancial-

3alebaTsodanoiceleSseroteSmesotnemitsevnI

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EGBI/IES:etnoF

De todo modo, as intenções de investimentoapontam um panorama favorável. A tabela a se-guir, baseada em levantamento realizado pelaSEPLANTEC, faz um apanhado dos principais in-vestimentos previstos em alguns dos setores maisimportantes da economia baiana.9

O fato é que se espera que a concretização des-ses investimentos contribua para a continuidade daexpansão da economia baiana em nível superior à

No plano estrutural, asprincipais modificações

vinculam-se aosinvestimentos industriais.

O fundamental é quecomeça a ocorrer, naBahia, um movimento

de verticalização,acompanhado deadensamento das

relações intersetoriais.

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mente em relação às previsões dos últimos anos.Além disso, os bens finais representam 37,3 % dovalor dos investimentos industriais anunciados, en-quanto no levantamento de Uderman e Menezes(1998) eles representavam apenas 24,0 %.

Esse movimento e a própria diversificação daindústria baiana podem criar condições para que aeconomia estadual concretize o seu quarto salto deacumulação – capitaneado pela Ford – contribuin-do para uma transformação do padrão de acumula-ção, que será menos dependente da dinâmica daindústria de bens finais instalada no Sudeste. Casoesses movimentos se materializem, os ciclosconjunturais da atividade industrial poderão sermenos intensos, devido a uma maior diversidadedas fontes de acumulação. Isso deve significar, alongo prazo, uma redução da vulnerabilidade em-presarial às flutuações do mercado de commoditiese, paralelamente, uma maior exploração dos mer-cados nordestino e externo.

Esse processo de complexificação, por conse-qüência, ocasionará uma maior estabilidade docomportamento industrial, na medida em que umapossível dificuldade conjuntural de uma atividadepode ser contrabalançada pelo sucesso de outra.Conseqüentemente, devido à influência da indús-tria na dinâmica de acumulação de capital no esta-do, isso se refletirá no conjunto da economiabaiana.

Um outro efeito desse processo deriva dos inves-timentos vinculados à terceira dinâmica da tipologiaestabelecida. Um provável adensamento de cadei-as,11 com fortalecimento das relações intersetoriais,também ocasionará maiores impactos de encadea-mento em outros segmentos econômicos, abrindoespaço inclusive para o desenvolvimento de peque-nas empresas, possivelmente articuladas em rede.A produção de embalagens e a prestação de servi-ços diversos podem se encaixar nesse movimento.Uma política de fortalecimento desse processo podeocasionar uma modernização ainda maior da baseprodutiva estadual, baseada em novos padrõesoperacionais, com o surgimento de novas empresasdinâmicas cuja competitividade vincula-se ao de-sempenho da totalidade da rede, liderada pelosgrandes empreendimentos.

Um comentário final diz respeito à espacializa-ção desse processo. Percebe-se que os empreen-

dimentos vinculados ao agribusiness, à indústriacalçadista e ao turismo não seguem a tendência àconcentração na RMS. No caso dos dois primeiros,há uma predominância de padrões locacionais queprivilegiam outras áreas do estado. São setores,portanto, indutores de uma desconcentração, aindaque, sobretudo no caso dos segmentos agroali-mentares, esse processo tenda a se vincular priori-tariamente às novas regiões dinâmicas da agricul-tura baiana. Particularmente no turismo, algumasregiões vêm demonstrando um bom potencial e po-dem experimentar um desenvolvimento capitanea-do por essa atividade. De todo modo, cabe salien-tar que uma extensa parcela do território baiano, oSemi-Árido, encontra-se ausente desses movimen-tos. É justamente nessa região que se concentraum elevado contingente de população rural, nor-malmente em ocupações precárias, podendo en-grossar os fluxos migratórios.

Por outro lado, parcela significativa dos investi-mentos anunciados destina-se à RMS, reforçandoa hipótese de que as economias de aglomeraçãonessa área são um importante fator de atração decapitais, estando bem longe do esgotamento. Jus-tamente por isso, o entorno de Salvador continua-rá desempenhando um papel central e os movi-mentos migratórios em sua direção devemcontinuar, embora comecem a surgir novos pólosreceptores de migrantes.

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Notas

1 Este artigo é uma versão modificada do capítulo intitulado “Ocomportamento recente e os condicionantes da evolução fu-

tura da economia baiana”, do mesmo autor, publicado no li-vro Tendências da economia baiana, Série Estudos Estraté-gicos, Salvador: SEPLANTEC, 2000.

2 Trata-se aqui da evolução de economia baiana a partir dosanos 50. Anteriormente, havia algumas atividades industri-ais, sobretudo em bens leves de consumo (têxtil e confec-ções, alimentos, etc.), que tinham uma magnituderelativamente pequena e dinâmica, dependente do com-portamento do mercado local, em uma economia de baseagroexportadora.

3 Menezes, Vladson (2000, p.25).

4 Uma outra conseqüência do perfil voltado para a produçãode bens intermediários e commodities em geral é uma fortedependência em relação aos movimentos de oferta e de-manda no mercado. De fato, as empresas situadas no esta-do têm pouca margem de manobra na definição de seuspreços e isso deixa a economia estadual refém da situaçãodos mercados de commodities, reforçando o caráter depen-dente de seu desenvolvimento.

5 Tanto dos serviços voltados para a demanda empresarialquanto dos serviços pessoais e do comércio. Data dessaépoca a implantação do Shopping Center Iguatemi em Sal-vador, por exemplo.

6 Ver Rodrigues (1999).

7 Nesse ano, a taxa de investimento caiu pela primeira vezdesde 1993.

8 A presença de três portos, a estrutura dos distritos industriaisno interior e a relativamente recente privatização da FerroviaCentro-Atlântica, que vem melhorando as suas condiçõesoperacionais, são exemplos da situação da infra-estruturabaiana.

9 Obviamente, os investimentos anunciados funcionam ape-nas como uma tentativa de aproximação da realidade, postoque anúncio e concretização de um determinado empreendi-mento não necessariamente coincidem. Além disso, há fa-lhas na coleta de informações, sobretudo em alguns setores.

10 Considerando apenas os investimentos cuja localização foidefinida e abrange somente um estado. Mesmo adicionan-do-se os investimentos sem localização definida e aquelesque ultrapassam os limites de um estado, a Bahia obteve 5,9% do total em 1997, e 5,4 % em 1998.

11 Que dependerá também dos sistemas de produção das prin-cipais indústrias, com destaque para a Ford, cujo nível de in-tegração com o restante da economia estadual dependerásobretudo da quantidade de insumos locais e dos padrõesde relacionamento a serem estabelecidos com os fornece-dores.

* Vladson Menezes é economista e diretorde Políticas Públicas da Seplantec

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Reflexões sobre

a Lei de Responsabilidade Fiscal:

o caso da Bahia

Creomar Baptista *

Aaprovação de uma legislação que incorpo-ra os princípios de responsabilidade(accountability) e disciplina fiscal à gestão

pública no Brasil representou, sem sombra de dúvi-da, uma ofensiva categórica contra os ciclos eco-nômico-políticos (political-business cycles) que emgeral comprometiam a ação eficaz do aparelho es-tatal (nos âmbitos executivo, legislativo ou judiciário,em todos os níveis da federação) e a estabilidadedas políticas públicas.

A opção definitiva pelo “bom senso” fiscal e o ape-go a parâmetros claros de previsão e execução orça-mentárias não seriam facilmente assimiláveis pelaselites corporativas brasileiras, cujas aspirações sãovocalizadas por parcela do corpo político. Este seg-mento, presa do cálculo de curto prazo – como seatestou recentemente quando da ação direta deinconstitucionalidade movida no Supremo TribunalFederal contra o artigo da Lei de ResponsabilidadeFiscal (LRF) que fixa tetos para gastos – insiste emprocrastinar a remodelação radical da administraçãopública, sem entretanto conseguir sucesso.

O presente artigo limita-se, metodologicamente,a analisar alguns dos aspectos da lei em face docenário reformista, a um só tempo profundo eabrangente, que caraterizou os anos 90. Em segui-da, apresentam-se, no âmbito da Bahia, alguns in-dicadores que apontam a saúde financeira doEstado, alcançada ademais através de um amploprocesso de ajuste fiscal que lhe garantiu duranteos anos 90 a possibilidade de manter uma posturaagressiva na busca por novos investimentos.

Finalmente, o texto busca dar conta de possíveisrebatimentos da lei fiscal sobre a estratégia estadualde atração de investimentos, analisando matizesdos formatos usuais de operacionalização destaspolíticas que poderiam favorecer sua continuidade.

Origens – um instrumento da moderna gestãopública

As transformações que o Brasil conheceu nos90 atacam (ou tentam atacar), em seu conjunto, fa-tores de ordem tanto estritamente econômicaquanto política, consistindo em uma primeira tenta-tiva de reestruturação global do tecido socioeconô-mico do País. Esse período de reformas inicia-seefetivamente no ano de 1990, com um ousado pro-cesso de abertura comercial. No interior das refor-mas conhecidas como de “primeira geração”, aolongo do período 1990-1998, verificou-se relativoprogresso nas áreas de: a) estabilização de pre-ços, b) privatização, c) abertura ao exterior (em ter-mos comerciais ou em termos de captação derecursos) e d) regulação. Podem ainda ser arrola-das reformas corretivas de distorções da Constitui-ção de 1988.

Porém, encontram-se ainda em fase de discus-são a reforma tributária, a reforma das leis traba-lhistas, a reforma política e a reforma do judiciário.Estes quatro pontos mostram-se fundamentais noque concerne à modernização definitiva da estrutu-ra econômica do País. As duas primeiras (reformastributária e trabalhista) constituem-se em meios par

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excellence para assegurar a competitividade dopaís, via simplificação do sistema fiscal (com elimi-nação dos impostos cumulativos e “ruins”) e a ne-cessária flexibilização do mercado de trabalho, aopasso que as duas últimas (reforma política e dojudiciário) contribuiriam para garantir o funciona-mento estável do aparato estatal (aumentando a fi-delidade partidária com a criação da cláusula debarreira) e agilizar as decisões do judiciário.

De todas as iniciativas reformistas a mais recen-te foi a introdução de um instru-mento de disciplinamento da ges-tão financeira pública, através daLei de Responsabilidade Fiscal.Este instituto, meticulosamente de-batido no Legislativo Nacional, par-te de pressupostos consagradospor experiências internacionaisbem-sucedidas (das quais talvez oexemplo mais concreto seja aNova Zelândia) e visa aumentar a accountabilitydo setor público.

A Nova Zelândia, entre 1984 e 1994, submeteu-se a um programa de reformas ímpar na OCDE, noque concerne a seu campo de ação, coerência econsistência. Seu fulcro foi a aprovação da Lei deResponsabilidade Fiscal. Esta objetivava garantira alta qualidade da informação financeira produzi-da pelo setor estatal através da elaboração de umrelatório financeiro, por competências, para o go-verno como um todo, e, mais importante que isso,produzindo um balanço consolidado para todo osetor estatal. A Lei neozelandesa de 1994 estabe-leceu ainda, em caráter permanente, uma estruturaestatutária para a condução responsável da políti-ca fiscal, promovendo uma política de credibilidadee agindo como proteção contra tendências políticasque contrariassem a estabilidade fiscal.

Aspectos da Lei de Responsabilidade Fiscalno Brasil

No caso brasileiro, a despeito do quadro de in-certezas que paira sobre o período para sua efetivavigência, a LRF , sancionada em abril de 1999, inspi-rou-se em grande medida nos exemplos da Comuni-dade Econômica Européia (CEE), dos EstadosUnidos e do já mencionado case da Nova Zelândia.

O primeiro caso (CEE) foi importante por forne-cer as linhas gerais para a delimitação de um perío-do de transição para os entes da federação,baseadas nos critérios de convergência do Tratadode Maastricht. Nova Zelândia e Estados Unidos fo-ram úteis graças a experiências prévias bem-suce-didas de imposição de rigor fiscal, como o FiscalResponsability Act (Nova Zelândia) e o BudgetEnforcement Act (EUA) (Baptista, 2000).

A LRF foi delineada com a preocupação deamortecer os ciclos econômico-políticos e alcançar o equilíbriointertemporal das contas da União,Estados e Municípios. Mais abran-gente que a Lei Camata 2 (que selimitava a despesas com pessoal,deixando de lado os poderes Le-gislativo e Judiciário), a nova legis-lação visa:

a) aperfeiçoar instrumentos deprevisão de curto prazo e controlar despesas de ca-ráter permanente (o “princípio da compensação”);

b) impor tetos para gastos com pessoal e endivi-damento público;

c) controlar despesas com pessoal e contrata-ção de operações de crédito em ano eleitoral (180dias que antecedem o término do mandato).

No tocante à previsão orçamentária, a Lei pro-cura consagrar a transparência na gestão comomecanismo fundamental de controle social, com aexigência legal da apresentação de relatórios e de-monstrativos da execução orçamentária. Para tan-to, a LRF integra à Lei de Diretrizes Orçamentáriasum Anexo de Metas Fiscais, estabelecendo metasanuais em valores correntes e constantes para re-ceitas, resultado nominal e primário e montante dadívida pública para o exercício a que se referirem epara os dois próximos.

Quando aborda as questões da previsão e arre-cadação da receita pública e da geração de despe-sas, a intenção da Lei é estimular o esforçoarrecadatório das unidades federativas, enquantorequer estimativa do impacto orçamentário-finan-ceiro da despesa governamental e sua adequaçãoorçamentária à Lei Orçamentária Anual, ao planoplurianual e à Lei de Diretrizes Orçamentárias.

Uma faceta importante da LRF refere-se aosmecanismos que buscam inibir a renúncia fiscal,

No tocante à previsãoorçamentária, a LRFprocura consagrar

a transparênciana gestão como

mecanismofundamental decontrole social.

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pela concessão ou ampliação de benefício ou in-centivo, os quais passam a depender de estimativade impacto orçamentário no início de sua vigênciae no biênio seguinte. A renúncia deve atender adisposições da LDO no sentido de ser consideradana estimativa da receita orçamentária e não contra-riar as metas fiscais propostas e, ao mesmo tempo,deve ser compensada por medidas como aumentodas receitas (por elevação de alíquotas, ampliaçãoda base de cálculo e majoração ou criação de tribu-to ou contribuição).

Outros itens presentes na lei, que limitam o gas-to público, são: a) o controle de despesas de cará-ter permanente, através do “princípio da compen-sação”; b) os limites para despesa com pessoal(60% da receita corrente líquida) e despesas cominativos; c) controle do endividamento público (dívi-da mobiliária + operações de crédito + garantias)em relação à receita líquida; d) controle das finan-ças públicas em anos eleitorais, vedando a contra-tação de operações de crédito, a contração de des-pesa que não possa ser paga no mesmo ano e oaumento das despesas de pessoal nos 180 diasanteriores ao final da legislatura ou do mandato.

No tópico seguinte será apresentado o caso daBahia, que se insere entre os estados que não en-contram empecilhos no curto e médio prazo para ocumprimento da LRF, graças a um abrangente ajus-te fiscal iniciado ainda nos primeiros anos da déca-da de 90.

Bahia - modernização administrativa edisciplina fiscal

Já durante a primeira metade da década de 90,a Bahia passou a registrar significativos avançosno âmbito da reforma administrativa e do sanea-mento das finanças públicas. Como salientam al-guns autores, nos primórdios dos anos 90 surgeum conjunto de fatores de importância fundamentalpara a futura rota de expansão econômica do Esta-do. De um lado, a modernização do aparelho estatale, de outro, o saneamento das finanças públicas, fa-vorecido não obstante por alterações na Constitui-ção de 1988.

Assim é que, no início dos 90, são retomados osinvestimentos do governo estadual em infra-estru-tura, desencadeando-se uma vigorosa política de

atração de investimentos, inaugurada em 1991com o PROBAHIA, e que ganha nova dimensãonos anos posteriores com programas mais especí-ficos como o BahiaPlast, o Procobre, os incentivosfiscais para o pólo de informática de Ilhéus, o proje-to Amazon da Ford, entre outros.

Não é de se estranhar que, ao longo de aproxi-madamente uma década, a Bahia tenha avançadono sentido de lograr a responsabilidade fiscal, equi-librando o orçamento e efetuando importantes re-formas no aparelho de Estado. Ao mesmo tempo,dotada de uma boa situação orçamentária e comcrédito junto a organismos multilaterais de fomen-to, foi apta para atuar de maneira decidida na chama-da “guerra fiscal”, conduzindo sua matriz produtiva auma transformação sem precedentes.

Os números disponíveis do Ministério do Orça-mento e Gestão (MOG/Seap) já em 1997 demons-travam a adequação prematura do Estado aos dis-positivos da Lei de Responsabilidade Fiscal. Quantoaos tetos para a despesa com pessoal (60% da re-ceita corrente líquida, como na Lei Camata II) aBahia aparecia em uma das melhores posições fren-te a outros estados da Federação, com 52,50% degastos com pessoal em relação à receita corrente lí-quida, percentual superior apenas aos dos estadosdo Amazonas (42,50%), Paraíba (45,70%), Roraima(23,20%) e Tocantins (43,8%).

A figura seguinte exibe a evolução, a partir de1994, das despesas de pessoal em relação à recei-ta corrente líquida, portanto em um período de es-tabilidade monetária. Em 1999, essa relação alcan-ça aproximadamente 55%, mantendo-se, portanto,estável no biênio 1998/99, de acordo com dados doSEFAZ/DICOP de 1999 (Balanço Geral do Estadoda Bahia).

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É importante aduzir que iniciativas inovadorasdo governo baiano relacionadas às despesas cominativos anteciparam as medidas previstas na LRF.Assim como Pernambuco, Paraná e Rio de Janei-ro, o estado da Bahia foi pioneiro ao criar seu pró-prio fundo de pensão, o FUNPREV, de modo que adespesa com inativos, que representava 2,59% dareceita corrente líquida, em 1998, passou a respon-der por apenas 0,10% em 1999. O mesmo se dáem relação aos limites máximos para o endivida-mento do Estado, cuja relação dívida/receita líqui-da alcançou em 1999 apenas 9,23%.

LRF e política de atração de investimentos

A criação de mecanismos de compensação paradespesas de caráter permanente, mediante indica-ção de fonte de receita ou redução de outra despe-sa, somada aos dispositivos de controle da renúnciafiscal da LRF, poderia, em tese, limitar a capacida-de de atração de novos empreendimentos para osestados através dos instrumentos financeiros tradi-cionais. Há então que indagar sobre a possibilida-de de o Estado manter, em suas linhas gerais, aatual política de atração de investimentos com aaprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal. Emoutras palavras, seria correto o argumento de quea Bahia veria sacrificados seus instrumentos finan-ceiros para atração de investimentos? O que deveser feito, doravante, diante da imposição de meca-nismos que coíbem a renúncia da receita governa-mental, especificados na LRF?

Em relação a prováveis impactos sobre as finan-ças públicas, o papel da guerra fiscal é controvertido.Há enfoques que sustentam a neutralidade do fenô-meno para o conjunto dos Estados, uma vez que, setodos eles adotassem os mesmos instrumentos, osbenefícios fiscais seriam anulados como contribui-ção para a decisão locacional das firmas. Por outrolado, ocorreria perda generalizada de receitas paraos estados engajados na guerra fiscal, com reduçãodos investimentos e comprometimento de sua atua-ção no setor social (Piancastelli, Perobelli, 1996).

Uma abordagem mais “realista” da disputa inte-restadual para atração de empreendimentos a con-sideraria como fato “dado”, restando analisar acapacidade diferenciada dos estados em sustentá-la. A instrumentalização da guerra fiscal se daria

principalmente: a) mediante a criação de progra-mas formais, com escopo amplo e definição claradas condições de acesso a cada benefício, abertosa um amplo elenco de empresas; b) pela operacio-nalização de medidas fiscal-financeiras dedicadasa projetos específicos, em que o governo elaboraum conjunto de benefícios negociados diretamentecom o agente privado.

O primeiro formato (programas formais deapoio), como envolve a aprovação de seus termospelas assembléias legislativas, garantiria aos agen-tes privados maior grau de segurança contra even-tuais mudanças políticas. No caso extremo dosegundo formato (benefícios específicos), que se-ria o de operações fiscais dedicadas, apoiadas emgeral em acordos sem base legal, a incerteza doagente privado seria ampliada, de modo que estetenderia a preferir modelos do primeiro tipo.

A existência de fundos dessa natureza assegu-rou, ao longo do tempo, maior eficácia à política deatração de investimentos do que usualmente secrê. Na verdade, nos últimos anos acentuou-seuma tendência à criação de programas com forma-to típico dos tradicionais, mas com finalidadeprecípua de atender a projetos de grande porte, oque decorre do risco de informalidade nas opera-ções dedicadas (Prado, Cavalcanti, 2000).

Assim, a proliferação de instrumentos comple-xos de incentivos como alguns fundos estatais defomento, que contêm elementos dos dois tipos depolíticas descritos (com formato de programas ge-rais, porém voltados para fins específicos) sugeririalimitações da LRF para reduzir a disposição dosestados em engajarem-se em “guerras fiscais”.Além da manipulação da receita e arrecadação fu-turas do ICMS, a política de atração de investimen-tos de muitos deles passa pela adoção de taxasdiferenciadas e financiamento para capital de giro einfra-estrutura (terraplanagem, terminais portuári-os, ferroviários, rodoviários etc.).

É digno de nota, nesse sentido, que entre al-guns governos nordestinos – diante da possibilida-de iminente da Lei Fiscal – tenha surgido oentendimento preliminar de que ela afetaria princi-palmente benefícios concedidos a empresas já emfuncionamento. Indústrias atraídas de outros esta-dos e que fabricam produtos sem similar local esta-riam fora do seu alcance (Baptista, 2000). Meses

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após a sanção da LRF, a predisposição em ofere-cer incentivos aos agentes privados permaneceuforte, como se constata no Bahia, onde oPROBAHIA continua incentivando a migração deempresas de outros estados (sobretudo do RioGrande do Sul) para território baiano. Além disso,não é claro ainda o impacto da Lei Fiscal sobre ins-trumentos como o Fundese (Decreto no 7.798/2000), uma vez que estes, formalmente, poderiamsalientar a obtenção de receitas via amortizações ejuros dos financiamentos concedi-dos, evitando o recurso à simplesconsignação orçamentária.

Ao que tudo indica, incentivos ebenefícios fiscais continuam – econtinuarão – sendo empregadospelo governo da Bahia e de outrosestados. Sua contribuição no con-junto das políticas estaduais dedesenvolvimento deverá, por outrolado, diminuir gradativamente. Aanálise da problemática fiscal dePrado e Cavalcanti (2000) tem omérito de vislumbrar mecanismos para manuten-ção dos incentivos fiscais, apesar da queda daelasticidade receita-produto local em decorrênciade sua adoção. Com razão:

Durante o período de subsidiamento, do ponto de vista do

comportamento temporal do conjunto da arrecadação-gasto,

existe evidentemente uma redução da elasticidade da recei-

ta em relação ao produto local, em decorrência da renúncia

fiscal. A isso se soma o conjunto de gastos fiscais diretos

exigidos pelo projeto (infra-estrutura, terreno, etc). Na hipó-

tese de que a demanda por gastos correntes e de investi-

mento do governo subnacional esteja correlacionada, em

alguma medida, ao nível de produto, isso apontaria para um

agravamento da situação fiscal no médio prazo ou, alternati-

vamente, a degradação dos serviços prestados (Prado,

Cavalcanti, 2000).

Os próprios autores apontam restrições a essalógica, que atenuam o processo de deterioraçãofiscal no período de subsidiamento de projetos deinvestimento. Fatores como o “peso dos fundos departicipação” e “outras transferências” na composi-ção das receitas ou, então, os impactos locais deprojetos bem-sucedidos apoiados pelo setor gover-

namental poderiam reduzir a sensibilidade da re-ceita à perda via incentivos. Os últimos, de um pon-to de vista dinâmico, gerariam um conjunto deimpactos diretos e indiretos sobre a renda local,através de empresas subsidiárias, fornecedores decomponentes e equipamentos, prestadores de ser-viços etc (Prado, Cavalcanti, 2000).

De todo modo, a continuidade da política de pro-moção de investimentos através dos meios usuais équestionável. Além da Lei de Responsabilidade

Fiscal, a queda na arrecadação e oprovável avanço da proposta deReforma Tributária nos próximosanos comprometerão a utilizaçãode instrumentos financeiros – prin-cipalmente o ICMS – para influen-ciar decisões locacionais das fir-mas. Apesar de fatores como opeso das transferências intergo-vernamentais, o acesso a financia-mentos de organismos multilate-rais (na Bahia facilitado pela saúdefinanceira do Estado) e o efeito

multiplicador de projetos de investimento de gran-de porte garantirem certa margem de manobra aogoverno quanto à manipulação do instrumental fis-cal, é certo que novas estratégias de desenvolvi-mento devem ser construídas.

Cada vez mais se firma a necessidade de aliaruma estratégia seletiva de potencialização docrescimento econômico – focada em áreas e seg-mentos prioritários – a outra de mais longo prazo,que possa fazer a Bahia (ou algumas de suas re-giões) equiparar-se do ponto de vista sistêmico aespaços nacionais mais desenvolvidos, o que re-quer o enfrentamento dos problemas sociais e de-ficiências no terreno da infra-estrutura básica(Uderman, 2000).

Certos elementos dessa estratégia já se en-contram incorporados a políticas atuais do go-verno baiano, que tem desenvolvido inúmerosprogramas voltados para a área social e a redu-ção de desigualdades intra-regionais. A formula-ção de uma agenda sistemática, que associe me-lhoria do quadro social e capital social básico àmanutenção de taxas elevadas de crescimento doproduto é, com certeza, o maior desafio para aBahia no futuro próximo.

Incentivos e benefíciosfiscais continuam econtinuarão sendoempregados pelos

governos. Entretanto,sua contribuição no

conjunto das políticasestaduais de

desenvolvimentodeverá diminuirgradativamente.

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Conclusões

Analisou-se, ao longo deste artigo, a naturezada nova legislação fiscal, que se dá no interior deum amplo quadro de reformas econômicas e inspi-ra-se em cases de êxito em escala internacional.Na Bahia, graças a um vigoroso processo de ajusteque conduziu ao equilíbrio orçamentário do Estado,iniciado ainda nos primórdios da década de 90,componentes básicos das contas públicas como aprevisão fiscal, despesas com pessoal, inativos edívida pública estadual já se encontravam previa-mente em níveis compatíveis com as novas exigên-cias legais.

Do ponto de vista da política estadual de atra-ção de investimentos, os efeitos da LRF, somadosao provável avanço no futuro da reforma tributáriae a acordos políticos sobre concessões de incenti-vos, tratados entre diversos entes da Federação,colocam sérios empecilhos à permanência do em-prego de instrumentos financeiro-fiscais para influ-enciar a decisão locacional das firmas. É preciso, eneste artigo tentou-se demonstrar isto, firmar umnovo traçado para a política de desenvolvimentoestadual, caracterizado por uma estratégia de maislongo prazo, orientada para a área social e a cons-tituição de capital social básico (infra-estruturaeconômica), o que, na verdade, já se encontra asso-ciado, de maneira embrionária, a diversas açõesatuais do governo do Estado.

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NOTAS

1 São exemplos a ação direta de inconstitucionalidade, movi-da pelos partidos de oposição junto ao Supremo Tribunal Fe-deral, e o pleito dos prefeitos pela renegociação de suasdívidas e atenuação das sanções previstas para o gestor pú-blico em caso de descumprimento da Lei.

2 Uma decisão do Supremo derrubou recentemente parte daação direta de inconstitucionalidade.

3 CYSNE, Rubens Penha. Aspectos macro e microeconômi-cos das Reformas. In: BAUMANN, Renato. Brasil – uma dé-cada em transição. Rio de Janeiro: Campus/Cepal, 2000.

4 A reforma eleitoral atualmente encerra novos contornos.Além da “cláusula de barreira”, tende a proibir coligaçõesnas eleições proporcionais e permitir que cada partido lancecandidatos em um número três vezes superior ao número devagas a serem preenchidas. Além disso inibe o abuso dopoder econômico através do financiamento público de cam-panha, criando um fundo eleitoral para o qual serão destina-dos R$ 7 por eleitor, e que terá cerca de R$ 700 milhões.Vide: Líderes decidem votar este ano dois projetos da refor-ma política. O Globo, 31/10/00.

5 RICHARDSON, Ruth. As reformas no setor público da NovaZelândia. In: PEREIRA, Bresser, SPINK Peter (organizado-res). Reforma do Estado e administração pública gerencial.Rio de Janeiro: FGV, 1998.

6 Com o referido pleito dos prefeitos em prol da redução daspenas previstas e por empréstimos para renegociação de dí-vidas. Parece, no entanto, que está se formando um certoconsenso sobre a não-retroatividade da Lei Fiscal.

7 Esta discussão se fundamenta em BAPTISTA (2000).

8 Verificou-se a princípio alguma confusão em relação aosanexos fiscais e à metodologia para apuração do resultado

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90 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.84-90 Dezembro 2000

primário dos entes da federação. A exigência do anexo vemdo Artigo 30, §1o , inciso IV da LRF. Naturalmente, não seriaadequado conceituar superávit primário no corpo de uma leicomplementar. Ao contrário da resolução 78, em vigor, a pro-posta encaminhada ao Senado não traz a existência de su-perávit primário nos últimos 12 meses. Os limitadoresfundamentais são a relação dívida líquida/receita líquida e olimite de 11,5% de comprometimento da receita líquida comserviço da dívida. Cada estado ou município também podefixar suas respectivas metas fiscais, desde que garantam asustentabilidade das contas públicas.

9 A Receita Corrente Líquida é definida como o somatório dasreceitas tributárias, receitas de contribuições, receitaspatrimoniais, industriais, agropecuárias e de serviços, trans-ferências correntes e outras transferências correntes,deduzidas das parcelas entregues aos municípios por deter-minação constitucional, das contribuições dos servidores pú-blicos para o custeio de seu sistema de previdência social,dos repasses do FUNDEF (Fundo de Desenvolvimento doEnsino Fundamental) e dos valores decorrentes da LeiKandir.

10 MENEZES, Vladson. O comportamento recente e os condi-cionantes da evolução da economia baiana. In: Tendênciasda economia baiana. Série Estudos Estratégicos. Seplantec,Salvador, 2000.

11 Ibidem.

12 O acumulado no ano para a Bahia, no entanto, seria de 55%.

13 Além das implicações da LRF sobre esta estratégia de de-senvolvimento estadual, deve ser considerada a existênciade acordo entre 20 estados da Federação no âmbito do Con-selho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ), no qualestes se comprometem a não conceder benefícios a projetossurgidos a partir de 2000, enquanto mantêm, por um períodode 50 anos, aqueles aprovados até o final de 1999.

14 Perobelli, Piancatelli (1996).

15 No Paraná, por exemplo, a política de desenvolvimento en-contra-se assentada no programa “Paraná Mais Empre-gos”, que concede postergação do recolhimento do ICMSpor quatro anos. Segundo a Fazenda Estadual, a arrecada-ção do ICMS do Paraná irá crescer R$1,4 bi nos próximosseis anos, como resultado do início do recolhimento de im-postos pelas indústrias que ali estão se instalando (GazetaMercantil, 30/05/2000).

16 É interessante observar que empresas continuaram migrandopara a Bahia durante a vigência da LRF. Só no PROBAHIAestão inscritas 12 empresas gaúchas além da Ford, com in-vestimentos de R$291 milhões. Nos últimos três anos foramcontabilizados R$5,2 bilhões em investimentos no Estado,com a assinatura de 180 protocolos de intenção junto à inicia-tiva privada, nos setores de calçados, informática, indústria detransformação plástica, indústria automotiva e bens intermedi-ários, papel e celulose. GAZETA MERCANTIL. Bahia dá redu-ção fiscal e atrai empresas gaúchas. 24/10/00.

17 Um importante viés da ação recente do Estado relaciona-seà multiplicidade de programas existentes nas áreas de fo-mento ao desenvolvimento regional, de infra-estrutura e so-cial, os quais não se limitam apenas à região do semi-árido,mas atingem importantes contingentes populacionais da Re-gião Metropolitana de Salvador e de cidades com grande po-tencial de expansão econômica, cujas vocações produtivasdevem ser corretamente exploradas. Entre eles, têm lugar o“Sertão Forte”, o Plano de Fomento do Vale do São Francis-co, o Programa de Integração dos Corredores Ferroviários(PCR-II), o Programa de Desenvolvimento Comunitário daRegião do Rio Gavião (Pró-Gavião), o Programa de Apoioàs Comunidades Rurais (Produzir) e o “Cidades Líderes”.Voltado mais especificamente para o enfrentamento direto(investimentos públicos) e indireto (incentivo à mobilizaçãopopular) da pobreza, destaca-se o “Faz-Cidadão”, que se in-sere entre os mais importantes programas do governobaiano no terreno social.

* Creomar Baptista é economista (FEA/UFJF),mestre em Economia (CME/UFBA)

e assessor da SEPLANTEC-BA .

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92 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.92-109 Dezembro 2000

A inserção dos jovens baianos

no mercado de trabalho nos anos 901

Ângela Borges*

Um dos traços mais destacados na análisedas transformações observadas no mer-cado de trabalho brasileiro, nas últimas dé-

cadas, refere-se às mudanças no padrão de inser-ção das novas gerações neste mercado: a crescentedificuldade encontrada pelos jovens que procuramseu primeiro emprego, refletida nas elevadas taxasde desemprego de inserção, e o aumento da idadede início da vida ativa, provocado tanto por essa di-ficuldade como pela ampliação do período dedica-do à formação. Esta última tendência está associa-da ao aumento da escolaridade mínima exigida porparte dos novos postos de trabalho resultantes dareestruturação produtiva, mas é também fortemen-te influenciada pelas condições adversas do mer-cado de trabalho, que levam os jovens a buscarconquistar diplomas cada vez mais elevados com oobjetivo de melhorar suas chances de inserção.

Trata-se de mudanças que vêm sendo observa-das também em outros países – sobretudo nos pa-íses industrializados e naqueles que já atingiramuma patamar mais elevado de industrialização – eos problemas sociais que elas engendram vêm seconstituindo num desafio para governos nacionaise organismos internacionais como a OIT. No entan-to, apesar de esses problemas se manifestaremem todo o mundo, sua extensão, gravidade, alter-nativas de solução, meios disponíveis para imple-mentá-las e ações efetivamente realizadas variambastante de um país para outro.

No caso específico do Brasil, as dificuldades deinserção no mercado de trabalho da atual geração

de jovens vêm somar-se a um amplo – e estrutural– leque de problemas sociais, quase todos associa-dos aos elevados contingentes da população emsituação de extrema pobreza e à imensa desigual-dade econômica e social que marca a nossa socie-dade. Além disso, essas circunstâncias coincidemcom uma fase de crescimento expressivo do núme-ro de jovens e se deparam com um país que, em-bora mantenha a auto-imagem de um “país jovem”,pela até recentemente elevada proporção de crian-ças e adolescentes na sua população, nunca sepropôs um “problema da juventude” e também, éclaro, nunca se preparou para enfrentá-lo. Mesmoagora, quando esse problema se apresenta emtoda a sua crueza, patente na elevadíssima taxa dedesemprego juvenil e nos elevados índices de cri-minalidade, na violência e nas drogas, ele não temrecebido a atenção e o tratamento adequados àmagnitude e complexidade dos desafios em que seconstitui para a sociedade brasileira.

Pelo contrário, a centralidade adquirida pelo“ajuste da economia” na ação do governo federal,na atual década, não apenas tem relegado a umsegundo plano o enfrentamento dos problemas so-ciais como, mais que isso, o próprio caráter desseajuste vem contribuindo para ampliar, de modo dra-mático, a dimensão desses problemas e para pro-vocar outros tantos.

Assim, até a década de 80, a economia brasilei-ra vinha mostrando ser capaz de gerar oportunida-des de trabalho em proporções que acompanha-vam de perto o crescimento da oferta de trabalho.

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.92-109 Dezembro 2000 93

Embora uma parte expressiva dessas oportunida-des sempre tenha sido em ocupações de baixa pro-dutividade, com baixos rendimentos, enfim, de baixaqualidade e, muitas delas, “informais”, expandia-sea parcela do emprego dito “formal”, isto é, com vín-culo assalariado, no setor público ou no privado,com contrato de trabalho protegido pela lei.

Em conseqüência dessa performance, o merca-do de trabalho brasileiro sempre se caracterizoupor apresentar baixas taxas de desemprego aber-to, sendo o seu principal problema a extrema po-breza da maioria dos trabalhadores, decorrentedas características de boa parte das ocupaçõesexistentes.

As dificuldades de incorporação de novos con-tingentes de trabalhadores começaram a se mani-festar na recessão do início dos anos 80, quandoas taxas de desemprego aberto aumentaram, mes-mo se logo depois amenizadas com a recuperaçãoda economia. Além disso, a década de 80 já sinali-zava uma outra mudança importante no mercadode trabalho brasileiro: a precarização dos empregos,isto é, a queda no ritmo de expansão do empregoassalariado com proteção social e a multiplicaçãodos empregos sem carteira assinada, “estágios”,contratos temporários, etc.

Nos anos 90, essas tendências foram confirma-das com uma intensidade dramática e o Brasil as-sistiu a uma elevação exponencial dos vínculosprecários em detrimento do vínculo formal, conco-mitante a uma queda no ritmo de expansão daocupação e do emprego. Ademais, inaugurou-seum quadro inteiramente novo para os brasileiros –a brutal e duradoura elevação do desempregoaberto, que corresponde à situação dos trabalha-dores sem qualquer ocupação que procuram traba-lho ativamente. A isso somou-se a elevação dasformas de desemprego mais recorrentes no passa-do, casos do desemprego oculto pelo trabalho pre-cário, dos que vivem de “bicos”, e do desempregopor desalento, ou seja, daqueles que se recolhem àinatividade, provisória ou definitivamente, pela ab-soluta falta de chances de se inserirem no mercadode trabalho.

Todas essas mudanças são conseqüências di-retas tanto de transformações estruturais do capi-talismo como do modelo de gestão da economiabrasileira adotado a partir de 1990, o qual, incluin-

do uma súbita abertura da economia, forçou umadrástica reestruturação produtiva, com a adoção denovos modelos de produção “enxutos”, de novastecnologias e de novas estratégias empresariais.Essas estratégias incluem a externalização doscustos através da terceirização, que eliminou, ma-ciçamente, postos de trabalho assalariado, e crioucondições para a expansão da produção sem acorrespondente expansão do emprego, sobretudo,do emprego formal.

A destruição maciça de empregos formais e abaixa geração de outros tipos de ocupação foram,e continuam sendo, fortemente determinadas tam-bém pelas baixas taxas de crescimento da econo-mia, induzidas pela lógica do plano de estabiliza-ção monetária implementado a partir de 1994.Como demonstrado por inúmeros críticos da políti-ca macroeconômica em vigor, essa lógica condenaa economia brasileira a crescer num ritmo muito in-ferior ao observado em décadas passadas – osanos 90 registraram a menor taxa de crescimentomédio anual da economia brasileira em todo o sé-culo XX – tornando-a incapaz de garantir a incorpo-ração dos novos trabalhadores que chegam aomercado de trabalho e, até mesmo, de reabsorveros desempregados de um “ajuste” que acabou setornando permanente. O desemprego, congeladonum patamar elevadíssimo, atingiu todos os seg-mentos de trabalhadores, inclusive aqueles histori-camente mais protegidos desse risco.

Entretanto, embora mais generalizado do queantes, o desemprego não deixou de ser seletivo.Alguns segmentos sociais estão mais expostos aele do que outros e entre os mais expostos estãoos jovens. Esses buscam um lugar no mundo dotrabalho, lugar que é o alicerce sobre o qual é possí-vel cada um construir um projeto de vida (Sennett,1999), uma carreira cheia de sentido – dessa for-ma, alicerce também para a conquista de um lugarna sociedade, sobretudo numa sociedade em quea maioria da população depende unicamente dorendimento do trabalho para sobreviver.

É com base nessa compreensão da importânciado trabalho, de ter-se uma ocupação ou um empre-go, que se buscará, a seguir, com base nos dadosdisponíveis mais recentes, traçar um diagnósticoda situação dos jovens no mercado de trabalho noestado da Bahia.

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94 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.92-109 Dezembro 2000

Adianta-se que esses dados (basicamente daPNAD/IBGE), por serem muito agregados e nãoabarcando inúmeros aspectos relevantes para umaanálise minuciosa do problema, permitem apenasum diagnóstico panorâmico, que certamente deixa-rá sem respostas muitas questões importantes, asquais exigem um esforço bem maior de pesquisa.

Os jovens baianos: algumas características

Em 1999, residiam na Bahia 1.800 mil jovensentre 18 e 24 anos, representando 14% da popula-ção baiana. Esse numeroso contingente compõe,junto com os adolescentes de 15 a 17 anos, a cha-mada “onda jovem”, constituída pela última gera-ção de filhos nascidos antes do declínio das taxasde fecundidade total, acentuado, na Bahia, em me-ados dos anos 80. Tal fenômeno já é bem visível naRMS, onde os grupos qüinqüenais de 15 a 19 anose de 20 a 24 anos já são os mais numerosos daestrutura etária.

contravam, em 1999, no grupo etário de 10 a 14anos e dos adolescentes incluídos no grupo de 15a 19 anos. Nos sete anos do período coberto pelosdados aqui analisados (de 1992 a 1999), enquanto ataxa de crescimento total da população baiana ficouem apenas 1% a a, o grupo etário de 18 a 24 anoscresceu a uma taxa média anual de 2,5% a a, che-gando a alcançar o patamar de 3% a a nas áreasurbanas. Esse crescimento resultou num incremen-to absoluto de 292 mil jovens em todo o estado, dosquais 228 mil residiam nas áreas urbanas.

Os dados do Quadro 1 evidenciam que entre1992 e 1999 a composição por sexo do grupoetário de 18 a 24 anos é invertida: em 1999, os jo-vens do sexo masculino são mais numerosos doque as jovens, exatamente o contrário do que ocor-ria no início da década. Este desequilíbrio entre ossexos é determinado pela composição da popula-ção jovem da zona rural, majoritariamente masculi-na (74 mil homens a mais que mulheres), e sugereuma maior emigração de mulheres jovens, nãoapenas para as áreas urbanas da Bahia como,também, para fora do estado.

A migração feminina não é um fato novo e estáassociada, por um lado, à falta de oportunidadesde trabalho para mulheres jovens e solteiras nazona rural, um fator de expulsão já bastante estu-dado e que vem se agravando com a crise da pe-quena produção mais tradicional, de base familiar.Por outro lado, a saída das jovens da zona rural éestimulada pela maior oportunidade de inserção nomercado de trabalho urbano, sobretudo através daporta do serviço doméstico. O que talvez seja umfato novo é o fluxo migratório mais intenso de mu-lheres para fora do estado, o qual, além de indicaro esgotamento da capacidade de absorção nassuas áreas urbanas, provavelmente está relaciona-

Como mostram as pirâmides etárias (Gráficos 1a 3), nas áreas urbanas e no total do estado, o nú-mero de jovens deverá crescer bastante nos próxi-mos anos, com a entrada na juventude do grandecontingente de crianças e adolescentes que se en-

Grafico 2 – Bahia Pirâmide Etária Urbana, 1999

Grafico 3 – RMS, Pirâmide Etária, 1999

Grafico 1 – Bahia: Pirâmide Etária, 1999

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.92-109 Dezembro 2000 95

do também com mudanças no mercado de trabalhodas principais áreas de destino dos migrantes baia-nos – Sudeste e, principalmente, São Paulo – asquais têm tornado cada vez mais difícil a absorçãode migrantes jovens e pouco escolarizados do sexomasculino. Como a situação de extrema pobreza damaioria das famílias rurais do estado não dispensa abusca, por um ou mais dos seus membros, de umafonte de renda fora da região (Borges, 1993), agorasaem mais as mulheres que os homens.

Embora não estejam disponíveis informaçõesdesagregadas sobre a renda per capita das famí-lias com membros na faixa de 18 a 24 anos, adistribuição de renda familiar do estado mostraque a maioria das famílias baianas é muito po-bre. Em 1999, nada menos que 62% delas viviamcom renda mensal de até três salários mínimos eapenas 15,8% formavam uma renda superior acinco salários mínimos. Ou seja, para a maioriados jovens o trabalho remunerado é um imperati-vo da luta pela sobrevivência, sendo reduzida aparcela que dispõe de uma estrutura familiar quedispense a sua contribuição para a cobertura dasdespesas básicas.

Observe-se ainda que, em muitos casos, a contri-buição dos jovens não é secundária: em 1999, nadamenos que 8,2% das famílias baianas eram por eleschefiadas, isto é, tinham como pessoa de referência– geralmente definida como o(a) principal provedor(a) – alguém entre 18 e 24 anos. Encontravam-senessa posição 7,8% dos jovens com 18 e 19 anos e20% dos que tinham entre 20 e 24 anos.

Embora os dados sobre a situação educacio-nal dos jovens (ver Quadros 2 e 3) evidenciemuma elevação expressiva, nos anos 90, da suataxa de escolarização, o quadro que eles permi-tem traçar é extremamente preocupante. Apesarda elevação recente, essa taxa de escolarizaçãoainda é muito baixa e acompanhada de um analfa-betismo persistente e de elevada defasagem ida-de/série. Em 1999, nada menos que 10% dosjovens baianos e absurdos 18,6% dos que residi-am na zona rural eram analfabetos. Além disso,52,7% dos jovens de 18 a 24 anos que freqüenta-vam o sistema educacional ainda se encontravamno ensino fundamental, sendo que 14,8% delescursavam da 1a à 4a série.

Conclui-se que os ganhos de escolaridade, con-quistados na última década, não podem obscure-cer o fato de que a maioria dos jovens baianosainda não alcançou o patamar mínimo de escolari-dade necessária para lutar por uma inserção me-nos precária no mercado de trabalho, o qualcorresponde, hoje, ao diploma do ensino funda-mental. Observe-se que, na RMS, o diploma do en-sino médio tende a colocar-se como pré-requisitopara grande parte dos empregos.

Finalmente, no que diz respeito à distribuição es-pacial da população jovem, verifica-se que em 1999a maior parte dela (66,4%) residia nas áreas urba-nas, numa proporção superior à observada para oconjunto da população que era de 61,6%. Como ditoanteriormente, esse fenômeno é mais intenso paraas mulheres: em 1999, nada menos que 70% das

1ordauQsona42a81edoãçalupoP

9991-2991,aihaB

odoãçautiSoilícimoD

sotulosbA orenêGroP% oãçautiSroP%

latoT snemoH serehluM latoT snemoH serehluM latoT snemoH serehluM

2991

latoT 432.725.1 147.647 394.087 0,001 9,84 1,15 0,001 0,001 0,001

anabrU 220.979 043.364 286.515 0,001 3,74 7,25 1,46 0,26 1,66

laruR 212.845 104.382 118.462 0,001 7,15 3,84 9,53 0,83 9,33

9991

latoT.poP 532.918.1 179.339 462.588 0,001 3,15 7,84 0,001 0,001 0,001

anabrU 936.702.1 669.985 376.716 0,001 9,84 1,15 4,66 2,36 8,96

laruR 695.116 500.443 195.762 0,001 2,65 8,34 6,33 8,63 2,03

ADNP/EGBI:etnoF

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96 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.92-109 Dezembro 2000

jovens desse grupo etário residia nos centros urba-nos do Estado contra 63% dos rapazes.

Os jovens e o mercado de trabalho2

A combinação estudo/trabalho

Antes de analisar as informações mais detalha-das sobre a inserção dos jovens no mercado de

trabalho, é importanteobservar os dados doQuadro 4, que fornecemum panorama abran-gente da relação dosjovens com o trabalhoe com o estudo.

Em primeiro lugar,para o total do estado,observa-se que a partirdos 18 anos a maioriados jovens já trabalha,combinando ou nãoesta atividade com osestudos, e que apenas

2ordauQeiréseuargropoãçiubirtsidesnevojsodoãçaziralocseedaxaT

9991-2991,SMReaihaB

oxeSedsopurG

edadI

edaxaToãçaziralocsE

siamuosona5edsetnadutsE

latoT ralocse-érP1o uarG

2o

uarGroirepuS

meS.lceDlatoT 4a1 8a5

meS.lceD

2991–aihaB

latoT 2,32 0,001 – 2,25 0,41 3,73 3,0 3,14 5,6 –

snemoH 1,12 0,001 – 1,65 5,61 8,73 3,0 3,73 6,6 –

serehluM 3,52 0,001 – 1,94 9,11 8,63 2,0 5,44 4,6 –

9991–aihaB

latoT 0,83 0,001 – 7,25 8,41 7,53 5,0 7,93 6,7 1,0

snemoH 2,73 0,001 – 3,06 2,81 9,83 7,0 0,33 6,6 –

serehluM 8,83 0,001 – 9,44 3,11 5,23 3,0 4,64 5,8 2,0

ADNP/EGBI:etnoF

3ordauQoxeseoilícimododoãçautisrop,snevojsodomsitebaflanaedaxaT

9991-2991,aihaB

onAlatoT anabrU laruR

latoT snemoH serehluM latoT snemoH serehluM latoT snemoH serehluM

2991 8,81 7,22 0,51 9,01 6,31 4,8 9,23 6,73 8,72

9991 1,01 0,31 1,7 8,5 2,7 6,4 6,81 0,32 8,21

ADNP/EGBI:etnoF

4ordauQedadivitaedoãçidnocaodnugessnevoJ

8991,aihaB

sopurGedadIed

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latoT

)%(edadivitAedoãçidnoC

óSadutsE

ahlabarTadutsEe

óSahlabarT

serezafAsocitsémoD

azilaeRoãNamuhneNedadivitA

AIHAB

sonA91a81 776.606 7,92 8,12 5,92 4,41 5,4

sonA42a02 663.351.1 5,21 4,31 9,74 0,12 2,5

sonA42a81 340.067.1 4,81 3,61 6,14 7,81 0,5

SMR

sonA91a81 255.541 3,74 6,61 6,51 5,51 9,4

sonA42a02 745.992 4,81 2,51 0,83 5,22 9,5

sonA42a81 990.544 9,72 7,51 7,03 2,02 6,5

9991-siaicoSserodacidnIedesetníS/EGBI:ETNOF

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.92-109 Dezembro 2000 97

29,7% dos que têm 18 e 19 anos e 12,5% dos queestão entre 20 e 24 anos são exclusivamente estu-dantes. Além disso, em ambos os grupos etários,uma parcela não-desprezível nem estuda nem estáno mercado de trabalho. A maior parte dos que seencontram nessa situação, provavelmente constituí-da por mulheres, assume responsabilidades no âm-bito da família (afazeres domésticos) e o restante(5,2%), declara “não realizar nenhuma atividade”.

Já na RMS, a proporção dos que se dedicamapenas aos estudos é bem mais elevada – sobretu-do na faixa de 18 e 19 anos (47,3%) – assim comoa parcela dos que não estudam nem trabalham (nomercado de trabalho). Com isso, a proporção dejovens que exclusivamente trabalham ou combi-nam o trabalho com o estudo é bem menor nessaregião que no conjunto do estado.

Essa diferença entre a RMS e a média do esta-do pode ser explicada por vários fatores, dentre osquais a maior facilidade de acesso à escola encon-trada pelos jovens metropolitanos, sobretudo no 2oGrau e na universidade, cuja oferta é inexistenteem muitos municípios do interior.

Aliás, a concentração espacial da oferta de va-gas nos níveis de ensino acima do ciclo básico,também por outra razão, ajuda a explicar o elevadopercentual de jovens da RMS que apenas estuda:uma parte deles é constituída por jovens cujas fa-

mílias residem no interior do estado e que se deslo-cam para a capital para continuar seus estudos,por falta de opção no município de origem ou embusca de um ensino de melhor qualidade.

Além desse fator, a extensão do período de de-dicação exclusiva aos estudos para uma parcelade jovens da RMS está relacionada com a maiorproporção de famílias com renda mais elevadanesta região e com o melhor nível de informaçãodas famílias, o que lhes permite avaliar melhor aimportância da educação para o futuro dos seus fi-lhos. Mas, certamente, um outro fator importantenesse prolongamento da condição de “estudanteque não trabalha” é a reduzida chance de inserçãono mercado de trabalho metropolitano – o mais se-letivo do estado – dos que têm poucos anos de es-tudo e as elevadas taxas de desemprego vigentesnessa região.

As taxas de participação

Entre 1992 e 1999, o incremento da PEA jovemfoi da ordem de 203 mil, equivalentes a 24,3% doincremento da PEA total do período. Em 1999,1.292 mil jovens baianos de 18 a 24 anos erameconomicamente ativos e representavam 20,2% daPEA total. O peso dos jovens na PEA é mais ex-pressivo na área urbana do estado e na região me-

tropolitana (22,2% e23,5%, respectivamen-te) que na zona rural(17,3%), em decorrên-cia tanto do maior pesodeste grupo etário napopulação urbana quan-to das maiores taxasde atividade aí obser-vadas, como serámostrado.

Entre 1992 e 1999a taxa de participaçãodos jovens baianosentre 18 e 24 anosmanteve-se estável, emtorno de 71%. No en-tanto, a comparaçãodos dois subgruposetários (18 e 19 anos e

5ordauQsnevojsodedadivitaedsaxaT

9991-2991,aihaB

2991 9991

latoT snemoH serehluM latoT snemoH serehluM

2991

latoT.poP 2,16 5,67 8,64 5,16 4,47 1,94

sonA91e81 3,66 9,08 1,25 7,36 4,77 3,94

sonA42a02 6,37 6,29 5,55 6,47 7,88 8,95

sonA42a81 3,17 9,88 5,45 0,17 0,58 3,65

anabrU

sonA91e81 2,95 2,47 8,54 8,95 7,07 6,84

sonA42a02 9,17 4,09 3,55 8,27 5,68 1,06

sonA42a81 1,86 6,58 4,25 6,86 2,18 5,65

laruR

sonA91e81 8,77 5,09 6,36 0,17 4,98 5,05

sonA42a02 7,67 4,69 1,65 4,87 4,29 0,95

sonA42a81 1,77 4,49 5,85 9,57 4,19 9,55

DANP/EGBI:ETNOF

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20 a 24 anos) mostra, em primeiro lugar, que assuas taxas se encontram em patamares distintos,sendo a dos jovens com 18 e 19 anos bem inferio-res à do grupo formado pelos que têm entre 20 e24 anos. Nesse último grupo, o nível de atividadejá se aproxima do patamar das faixas etárias doauge da vida ativa, geralmente considerado comode 25 a 49 anos.

Quanto às diferenças de gênero, os dados parao conjunto do estado mostram que, entre os jo-vens, do mesmo modo que nos demais gruposetários, as taxas masculinas são muito superioresàs femininas. Em 1999, enquanto 85% dos homensentre 18 e 24 anos estavam na PEA, essa propor-ção era de apenas 56,3% para as mulheres. Noentanto, essa diferença, que é mais acentuada nocampo que na cidade, vem tornando-se cada vezmenor, tanto pelo aumento da participação femini-na na faixa de 20 a 24 anos como pela redução daparticipação dos homens jovens dos dois subgru-pos, sugerindo a protelação do momento de entra-da no mercado de trabalho dos rapazes.

Esse último fenômeno vem sendo tratado na li-teratura principalmente como um sinalizador deuma mudança cultural, decorrente das transforma-ções em curso no mercado de trabalho: em face daimportância cada vez maior da escolaridade para ainserção nesse mercado, uma proporção crescentede famílias estaria optando por manter seus filhoshomens – que, nessa idade, normalmente já estari-am trabalhando – por mais tempo no sistema edu-cacional, buscando melhor prepará-los para en-frentarem a acirrada concorrência.

No caso da Bahia, esse movimento coincidecom o aumento expressivo do número de estudan-tes matriculados no ensino médio e no curso supe-rior (respectivamente 127 mil e 29 mil entre 1992 e

1999). No entanto, dados o baixo nível de renda damaior parte das famílias e os elevados níveis dedesemprego juvenil vigentes no estado e, ainda, abaixa escolarização desse grupo etário, é prudenteconsiderar a hipótese de que a queda nas taxas deatividade dos homens jovens não esteja sendo de-terminada apenas – e, talvez, nem principalmente– por esse fator mas também por uma elevação dodesemprego disfarçado. Ou seja, o aumento dainatividade dos homens jovens seria, em parte,involuntário.

Finalmente, observa-se que o comportamentoda participação juvenil na PEA apresenta outrascaracterísticas na região metropolitana: destacam-se, nesta região, as taxas de participação femini-nas, bem mais elevadas que no conjunto do estado(66,2% das jovens de 18 a 24 anos estavam naPEA, em 1999) e, em segundo lugar, um aumentoexpressivo das taxas de participação de ambos ossexos nos anos 90, aumento que foi muito maissignificativo para as mulheres. Como resultado, em1999, apesar da elevada concentração de estudan-tes de 2o Grau e de universitários na capital, a taxade participação do grupo de 18 a 24 anos era de73,6% na RMS, acima, portanto, dos 71% do con-junto do estado.

Esses dados parecem confirmar que não é rele-vante, na RMS, o adiamento da entrada na vida ati-va em decorrência de um maior período de perma-nência na escola. Embora aumente a proporção dejovens metropolitanos que estudam, crescem tam-bém as parcelas dos que trabalham e dos que pro-curam trabalho, refletindo tanto a incapacidade damaior parte das famílias de sustentar os filhos atéesta idade como a busca pelos jovens de uma fon-te de renda que lhes dê autonomia para consumiros bens e serviços em torno dos quais se constrói,

em nossa sociedade, aidentidade do “jovem”.

Esse movimento dosjovens em direção aomercado de trabalhoteve como resultadomais marcante, nosanos 90, a explosão dataxa de desempregoaberto juvenil, a qual,desse modo, está mais

6ordauQsnevojsodedadivitaedsaxaT

9991-2991,aihaB

2991 9991

latoT snemoH serehluM latoT snemoH serehluM

latoT.poP 3,55 0,86 8,34 4,16 4,96 4,45

sonA91e81 1,84 6,85 9,83 7,26 2,96 7,65

sonA42a02 7,17 2,58 5,85 9,87 2,88 7,07

sonA42a81 6,46 6,77 5,25 6,37 9,18 2,66

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associada à acentuada elevação das suas taxas deatividade que às elevadas taxas de crescimentodesse grupo etário. Assim, caso se mantivesseconstante a taxa de participação dos jovens entre1992 e 1999, a sua taxa de desemprego aberto nofinal do período teria sido semelhante à do seu iní-cio, apesar do crescimento acentuado dos contin-gentes entre 18 e 24 anos. Constata-se, por conse-guinte, que embora a variável demográfica sejaimportante – sobretudo quando considerada a ne-cessidade de estimar a demanda para políticas pú-blicas que tenham como alvo esse grupo etário – elanão se coloca como causa da elevação do desem-prego juvenil. Tal elevação está muito mais relacio-nada à baixíssima geração de postos de trabalhonos anos 90 e às mudanças sociais e culturais relati-vas aos arranjos familiares e à posição dos jovensnas famílias e, ainda, aos níveis de renda delas.

O desemprego juvenil

Como já foi dito, a elevação do desemprego –provocada por uma reestruturação produtiva asso-ciada a políticas macroeconômicas de cunhoneoliberal – tem afetado a todos mas, especial-mente, aos trabalhadores jovens. Esses trabalha-dores, apesar de, em média, mais escolarizados do

que os trabalhadores adultos, vêm encontrando sé-rias dificuldades de inserção no mercado de traba-lho. A situação não é diferente na Bahia, onde astaxas de desemprego das pessoas entre 18 e 24anos são muito superiores às taxas médias do con-junto da PEA chegando, em alguns casos, a ultra-passar o dobro delas.

Os dados do Quadro 7 mostram a evolução dodesemprego juvenil aberto nos anos 90, estimadoa partir das informações da PNAD. Observam-se,primeiramente, os níveis já extremamente eleva-dos vigentes no início da década: em 1992, eram138 mil os jovens desempregados na Bahia, sendoas taxas femininas, já então, bem superior às mas-culinas; quanto à dos jovens de 18 e 19 anos, eramaior que a dos que se encontravam entre os 20 e24 anos. Naquele ano, os desempregados no gru-po de 18 a 24 anos representavam um terço do to-tal de desempregados do estado. Além disso, odesemprego juvenil era bem mais expressivo naRMS, onde, em 1992, o contingente de desempre-gados já ultrapassava a marca de 20% da PEA ju-venil e representava cerca de 36,6% do total dejovens desempregados na Bahia.

Sete anos depois, em 1999, a situação tornou-se bem mais grave, principalmente na RMS, ondeas taxas de desemprego juvenil alcançaram pata-

7ordauQotrebaogerpmesededaxatesodagerpmesedsnevoJ

9991-2991,SMReaihaB

edadIoxeS

aihaB SMR

2991 9991 2991 9991

sodagerpmeseD axaT sodagerpmeseD axaT sodagerpmeseD axaT sodagerpmeseD axaT

latoT.poP 580.814 5,7 576.485 1,9 610.231 8,11 903.182 2,91

sonA91e81 275.54 4,41 913.07 5,81 854.31 6,52 789.83 9,04

sonA42a02 334.29 9,11 932.531 8,41 021.73 1,02 390.76 1,72

sonA42a81 500.831 7,21 855.502 9,51 875.05 3,12 080.601 9,03

snemoH

sonA91e81 836.02 9,01 628.43 7,41 169.6 3,32 632.71 0,43

sonA42A02 223.24 9,8 030.26 1,11 027.91 2,81 551.03 4,32

sonA42A81 069.26 5,9 658.69 2,21 186.62 3,91 193.74 4,62

serehluM

sonA91e81 439.42 8,91 394.53 7,42 794.6 6,82 157.12 8,84

sonA42a02 111.05 7,61 902.37 6,02 004.71 7,22 839.63 1,13

SONA42A81 540.57 6,71 207.801 8,12 798.32 1,42 986.85 9,53

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mares explosivos, qualquer que seja a fonte de da-dos com a qual se trabalhe. Nessa região, a pro-porção de jovens de 18 e 19 anos desempregadosultrapassa os 40% da PEA dessa faixa etária, apro-ximando-se, no caso das mulheres, de 50%. Nogrupo etário seguinte (20 a 24 anos), o incrementodo desemprego é menor, mas as taxas, embora umpouco mais baixas, são também elevadíssimas(23,4% para os homens e 31,1% para as mulhe-res). Nesse ano, os jovens desempregados soma-vam 205 mil no estado, mais da metade dos quais(106 mil) concentrados na RMS.

Finalmente, a comparação dos dados do con-junto do estado com os da RMS sugere que as di-ferenças mais marcantes entre esses dois agregadossão dadas pelos movimentos entre as situações detrabalho, desemprego e inatividade.

Na RMS, os jovens que não encontram trabalho(ocupação) tendem a passar para uma situação dedesemprego aberto e os que residem em outrasáreas do estado têm maiores chances de passa-rem (ou permanecerem na) para a inatividade oude, assim, serem computados na pesquisa, pelaausência de uma procura ativa de trabalho. Ouseja, na região mais urbanizada e rica do estado –onde também é mais variado o leque de opções deinserção e, em face da elevadíssima rotatividadeda mão-de-obra, maiores as chances de conse-guir-se uma ocupação, mesmo que temporária – aexclusão juvenil do mercado de trabalho assumemais a forma de desemprego aberto que a de inati-vidade. Esta última forma (certamente involuntáriapara muitos) é mais freqüente no interior do estado,onde, sendo as alternativas de inserção em núme-ro bastante reduzido, a procura de trabalho figura-se, de início, fadada ao fracasso.

Esse fenômeno fica bem evidente no indicadorque mostra como se distribuiu o incremento dogrupo etário de 18 a 24 anos, entre 1992 e 1999.Para o conjunto do estado, em cada 1.000 jovensapenas 464 encontraram ocupação, 231 ficaramdesempregados e 305 ficaram inativos. Na RMS,em cada 1.000 o contingente que encontrou tra-balho foi um pouco maior, perfazendo 507, masapesar disso ficaram desempregados 562! A ex-plicação está em que, nesse período, a alternativade entrar (ou permanecer) na inatividade tornou-se cada vez mais difícil para os jovens de ambos

os sexos que não encontraram trabalho na RMS.Assim, no período analisado ocorreu uma reduçãoabsoluta no número de jovens inativos (menos 69em cada 1.000), parecendo ter predominado apassagem da inatividade para o desemprego demulheres jovens.

A mudança no padrão de atividade dos jovens,refletida nesses dados, configura uma situaçãobem distinta da vigente até a década passada,quando as taxas de desemprego aberto eram mui-to baixas, comparativamente às atuais, e os quenão trabalhavam – sobretudo se mulheres – tendi-am a permanecer na inatividade, ainda que essa si-tuação representasse, para muitos, uma situaçãode desemprego disfarçado.

Assim, em 1981, para cada 1.000 jovens daRMS, 537 estavam ocupados, apenas 88 estavamem desemprego aberto e 375 eram inativos. Embo-ra esses dados não sejam comparáveis com osmais recentes por causa das mudanças conceitu-ais introduzidas na PNAD, tais mudanças permitemevidenciar ainda mais a intensidade das transfor-mações observadas na atual década. De fato, apartir de 1992, a PNAD passou a utilizar um concei-to mais ampliado de ocupação, computando comoocupadas pessoas que, na conceituação anterior,teriam sido classificadas como inativas ou desem-pregadas.3 Logo, se hoje fossem adotados os cri-térios anteriores, o número de ocupados seria menore os contingentes de inativos e os de desemprega-dos seriam bem maiores.

As mudanças acima comentadas apontam cla-ramente para um agravamento da situação dessegrupo etário no mercado de trabalho, cujas conse-qüências não dizem respeito apenas aos jovensque vivenciam, em larga escala, o desemprego,mas ao conjunto da sociedade.

Primeiro, porque o desemprego juvenil, princi-palmente quando atinge os jovens pobres, os me-nos escolarizados, pertencentes às famílias maisvulneráveis e com menos recursos para protegê-los e orientá-los, constitui-se numa das principaiscausas dos elevados índices de criminalidade juve-nil e de condutas anti-sociais e/ou autodestrutivas,das quais esses jovens são também as principaisvítimas. Além disso, o desemprego juvenil é umaquestão social maior porque a exclusão de nume-rosos contingentes de jovens significa, concreta-

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mente, um desperdício da capacidade de trabalhoe de produção de riquezas, numa sociedade quecomputa elevados déficits sociais.

E, mais ainda, a subutilização das capacidadesde trabalho e de aprendizagem da atual geração dejovens, expressa nas elevadas taxas de desempre-go aberto e nas baixas taxas de escolaridade, im-plica o comprometimento da capacidade produtivafutura da sociedade baiana, que, assim, levarápara o século XXI grandes contingentes de traba-lhadores/cidadãos pouco escolarizados e com pou-ca ou nenhuma experiência de trabalho. Essescontingentes de jovens, hoje excluídos do trabalhoe/ou da escola, são os principais candidatos a re-produzirem, nas próximas décadas, o núcleo duroda exclusão social no país.

Por outro lado, os jovens que conquistaram ouestão buscando obter diplomas de nível médio ousuperior, embora tenham maiores chances de in-serção no mercado de trabalho, também não estãolivres dos riscos que ele coloca: na década de 90,embora ainda muito inferiores às taxas de desem-prego dos menos escolarizados, as taxas de de-semprego dos trabalhadores com escolaridade igualou superior ao 2o Grau completo vêm crescendoacentuadamente, indicando a fragilidade do discur-so que pretende encontrar todas as soluções parao problema do desemprego juvenil apenas na ex-pansão do sistema educacional e na dilatação dotempo de permanência na escola.

O desemprego dos jovens mais escolarizadosnega-lhes a oportunidade de utilizar, no trabalho,os conhecimentos adquiridos na escola, expondo-os ao risco de, com o tempo, perderem as compe-tências adquiridas e passarem a compor um nume-roso segmento de trabalhadores pouco preparadospara as novas exigências dos melhores postos detrabalho, ficando, portanto, fadados aos postos maisprecários e a uma trajetória marcada pelo trânsitofreqüente entre trabalho precário/desemprego/ina-tividade.

Desse modo, embora a elevação dos níveis deescolaridade seja também uma necessidade ditadapelas atuais exigências do mercado de trabalho,que tende a usar o diploma como critério de sele-ção, os seus efeitos sobre as chances de inserçãodos jovens trabalhadores serão pouco eficazes semantidas as atuais restrições à expansão da de-

manda por mão-de-obra e se não forem implemen-tadas políticas voltadas para reduzir as barreirasencontradas pelos jovens que buscam o seu pri-meiro emprego.

O trabalho dos jovens

Evolução da ocupação

No conjunto do estado, os ocupados de 18 a 24anos somavam, em 1999, 1.086 mil, representando18,6% do total de ocupados. Na RMS, eles eram237 mil e seu peso relativo na ocupação total eraum pouco maior (20,1%). Nos sete anos cobertospor esta análise, o contingente de trabalhadores jo-vens aumentou em 135 mil na Bahia, compondo-sede 95 mil homens e 40 mil mulheres. Este incre-mento absoluto do número de jovens ocupadoscorrespondeu a uma taxa de crescimento médioanual de 1,9%, bastante inferior, portanto, às taxasde crescimento da população e da PEA desse gru-po etário, que foram de 2,5% ao ano.

Na RMS, a taxa de crescimento da ocupaçãojuvenil foi significativamente mais elevada (3,4% aoano), mas, embora quase idêntica à taxa de cresci-mento da população jovem metropolitana, tambémficou muito abaixo do crescimento da PEA juvenil(5,4% ao ano e impressionantes 7,4% no caso dasmulheres), puxado, como visto, pela elevação dataxa de participação. Essas taxas traduzem um au-mento do contingente de ocupados entre 18 e 24anos da ordem de 50 mil pessoas, o que represen-tou mais de um quarto do incremento da ocupaçãona região metropolitana, entre 1992 e 1999.

Esses números mostram que as dificuldadessentidas pelos jovens no mercado de trabalho nãopodem ser apresentadas de forma simplista, comafirmações do senso comum do tipo “os jovensnunca encontram trabalho”, pois o quadro é bemmais complexo: os jovens continuam a representarum contingente importante dos ocupados, o núme-ro de ocupados nessa faixa etária cresce, mas ape-sar disso o número de desempregados cresce numritmo ainda maior (nada menos que 11,2% ao anono período analisado).

Ou seja, apesar da crise, a ocupação juvenil seexpande até mais do que a ocupação total, masesse crescimento ainda é insuficiente para garantir

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a incorporação dos numerosos contingentes de jo-vens que, cada vez mais, querem (e precisam) tra-balhar. O que nos obriga, mais uma vez, a concluirque apenas com a retomada do crescimento daeconomia (num ritmo próximo às taxas históricasde crescimento da economia brasileira, no períodoque vai do pós-guerra ao final dos anos 70) pode-se esperar a redução do desemprego para a atualgeração de jovens. Tampouco parece fazer sentidoimaginar, com base no fato de que as gerações dejovens dentro de dez anos serão menos numero-sas, que o problema do desemprego juvenil venhaassim a ser superado. Porque, apesar disso, elasirão conviver com uma PEA adulta ainda maior quea de hoje e, se mantido o ritmo de geração de no-vos postos de trabalho, estarão também expostasa elevadas taxas de desemprego.

Além da redução da capacidade de geração denovos postos de trabalho, a crise dos anos 90 temoutro componente que contribui para tornar a ex-periência da atual geração de jovens substancial-mente diversa daquela vivida pelas gerações maisvelhas: as oportunidades de trabalho por ela en-contrada tendem a apresentar, na maioria dos ca-sos, características de precariedade e de insegu-rança, sendo escassas as chances de um empregoou de um trabalho autônomo promissores. Isto é,comparativamente ao passado, os jovens de hoje,independentemente da sua escolaridade, perce-bem que está cada vez mais difícil encontrar umaalternativa de inserção que lhes acene com algumapossibilidade de carreira.

As formas de inserção dos jovens

A principal forma de inserção dos jovens nomercado de trabalho – tanto considerando o con-junto do estado, como apenas a RMS – é o empre-go assalariado, embora essa forma tenha reduzidoum pouco a sua participação na ocupação juvenil,ao longo dos anos 90.

Assim, em 1999, em cada 1.000 jovens ocupa-dos na Bahia 529 eram empregados, na iniciativaprivada ou no setor público, e, na RMS, 666 traba-lhavam nesta posição. Essa importância do assala-riamento torna-se ainda maior quando agregamosos que têm emprego doméstico (91 na Bahia e 84na RMS). Evidencia-se, portanto, que apesar das

profundas mudanças em curso, o emprego assala-riado continua a ser a porta de entrada dos jovensno mercado de trabalho, o que, aliás, contribui paraexplicar as elevadas taxas de desemprego dessegrupo etário.

Esta taxa de assalariamento dos trabalhadoresjovens, simultânea a uma elevada taxa de desem-prego, é o resultado de duas tendências opostasno que diz respeito à valorização desse segmentoda mão-de-obra pelos empregadores.

De um lado, alguns estudos têm mostrado a cla-ra preferência das empresas de determinados seto-res pelos trabalhadores mais jovens em detrimentodos trabalhadores adultos, preferência que trans-parece, sobretudo, no processo de ajuste das em-presas aos novos padrões de competitividade: tra-balhadores de meia-idade e larga experiência detrabalho têm sido substituídos por jovens, implican-do o rejuvenescimento do quadro de funcionáriosda empresa (Druck, 2000 a, 2000 b). Tal preferên-cia orienta-se por uma avaliação que considera ostrabalhadores mais antigos “viciados” nas práticase relações de trabalho passadas, ou seja, com ten-dência a resistir às mudanças, dificultando o pro-cesso de ajuste e apresentando uma limitada capa-cidade de adaptação, com implicações negativassobre a produtividade.

Essas justificativas, todavia, não conseguemobscurecer o fato – raramente explicitado no dis-curso, mas evidenciado nos dados – de que asubstituição da geração dos pais pela dos filhostraz uma expressiva redução de custos para asempresas, pois os salários pagos aos jovens con-tratados são bem menores que a remuneração queera auferida pelos trabalhadores mais velhos demi-tidos. E, além disso, essa troca assegura uma mai-or flexibilidade à empresa, pois a contratação dosjovens raramente lhes garante os mesmos benefíciosassegurados aos funcionários que eles substituem,sendo comuns os vínculos precários e o recursoabusivo aos “estágios”e outras formas atípicas deassalariamento.

Se assim tem sido em muitas empresas, por ou-tro lado os jovens à procura do primeiro empregotêm se defrontado também com a barreira da exi-gência de “experiência anterior”, critério que temjogado muitos deles num ciclo vicioso – não traba-lha porque não tem experiência e não tem experi-

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ência porque não trabalha. Essa é uma situaçãoque tem como resultado a aceitação de condiçõesabsolutamente precárias de trabalho. Assim, com asua capacidade de trabalho valorizada em algunscasos e desvalorizada em outros, os jovens aca-bam por apresentar tanto elevadas taxas de ocupa-ção como de desemprego.

Para os que não encontram emprego, as alter-nativas de trabalhar “por conta própria” ou na posi-ção de “empregador” são de mais difícil acesso,pois essas formas de inserção exi-gem pré-requisitos que a maioriados jovens trabalhadores aindanão dispõe: algum capital, domíniode um ofício ou profissão, rede derelações e toda a experiência ematuridade necessárias para dis-putar um espaço no mercado, so-bretudo no chamado “setor informal”. Esse setor,ao contrário do que imagina o senso comum, em-bora apresente menores “barreiras à entrada” doque o segmento organizado da economia, é um es-paço marcado por brutal competição, bem maisrestrito do que o imaginado, e em que as oportuni-dades de obtenção de uma renda mensal igual ousuperior à do trabalho assalariado são bastante re-duzidas (Borges e Franco, 1999).

As outras formas de inserção possíveis estãodiretamente ligadas à família, na esmagadora mai-oria dos casos: como “trabalhadores não-remune-rados”, geralmente como ajudante de negócio ouatividade familiar, ou em atividades de subsistên-cia. Trata-se de formas de inserção absolutamenteprecárias, que não asseguram o rendimento mone-tário que proporcionaria aos jovens a independên-cia econômica desejada.

Uma análise mais detalhada da inserção juvenilevidencia ainda algumas diferenças entre os sexose entre o conjunto do estado e a RMS, como serávisto a seguir.

A inserção juvenil na Bahia

Em 1999, como visto, os jovens formavam umexpressivo contingente de 1.086 trabalhadores e amaioria (64%) era do sexo masculino. O contingen-te de empregados era de 575 mil e representavaquase 24% dos ocupados que tinham emprego. O

assalariamento no setor público e privado era maisimportante para os homens (59%) que para as mu-lheres (42,1%). Em contrapartida, as jovens reina-vam absolutas no “nicho” do trabalho doméstico,onde eram encontradas 21,7% das ocupadas. Oshomens jovens encontravam mais oportunidade detrabalho por “conta própria” que as mulheres(17,5% e 9,1%, respectivamente) e, finalmente, acondição de “não-remunerado” era importante paraambos os sexos.

No entanto, a comparação dosdados de 1992 com os de 1999mostra que esse quadro resulta dealterações ocorridas no período, asquais parecem sinalizar para no-vas tendências de inserção dos jo-vens.

O assalariamento tornou-se cadavez mais importante para as mulheres e perdeuparticipação entre os homens jovens. Assim, en-quanto os empregados, em 1992, representavam61,9% dos homens jovens ocupados e 59% em1999, as empregadas, que correspondiam a 34,3% do total de jovens ocupadas no início do período,passaram a representar 42,1% deste total em1999. Além disso, as jovens responderam por51,8% do incremento do emprego do grupo etáriode 18 a 24 anos nesse período, o que sugere umapreferência dos empregadores pelas mulheres jo-vens. Tal preferência provavelmente está associa-da à expansão das atividades terciárias, em quesão mais amplos os espaços de inserção femininae a estagnação - ou mesmo retração - das ativida-des que se caracterizam por utilizarem, majoritaria-mente, mão-de-obra masculina, como é o caso daindústria e da construção civil, porta de entrada nomercado de trabalho tradicionalmente utilizada pe-los jovens do sexo masculino com menor escolari-dade.

A maior chance das jovens se inserirem comoassalariadas vem acompanhada da redução da im-portância relativa de todas as demais formas de in-serção, com exceção da posição de “empregador”,cujo peso é quase nulo no conjunto da ocupaçãofeminina nessa faixa etária. É curioso observar quetambém o trabalho doméstico perde participaçãocomo forma de inserção das jovens, embora aindarepresente um quinto das ocupadas. Essa redução

O assalariamentotornou-se cada vez

mais importante paraas mulheres e perdeuparticipação entre os

homens jovens.

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deve estar sendo determinada por vários fatores: adiminuição dos empregos domésticos que apre-sentem condições minimamente satisfatórias,provocada pela difícil situação financeira de seg-mentos cada vez mais numerosos das chamadas“classes médias”, fortemente afetadas pelas mu-danças em curso; mudanças no perfil demandadopelas famílias para trabalhadores domésticos, demaior valorização da experiência, como vem ocor-rendo em algumas empresas; e, certamente, tam-bém uma mudança cultural importante entre as

jovens de famílias pobres, que, conquistando umaescolaridade superior à das suas mães, buscamagora outro tipo de trabalho, que lhes assegure umstatus mais valorizado na sociedade.

Observe-se, finalmente, que apesar da expan-são do emprego assalariado feminino, a proporçãode mulheres jovens que trabalham sem remunera-ção, embora decrescente, ainda era muito elevadaem 1999 (21,7%).

Como visto, para os homens jovens as chances deencontrar um emprego assalariado foram bem meno-

8ordauQoãçapucoanoãçisopropsodapucosnevoJ

9991-2991,aihaB

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latoT.poP 923.561.5 3,14 9,4 0,82 3,2 8,81 5,4 2,0

sonA91e81 969.962 4,44 6,01 1,11 2,0 6,03 5,2 6,0

sonA42A02 062.186 7,45 5,8 0,71 2,1 7,51 8,2 2,0

sonA42A81 922.159 7,15 1,9 3,51 9,0 9,91 7,2 3,0

snemoH 979.081.3 8,74 4,0 3,33 1,3 4,31 7,1 2,0

sonA91e81 962.961 7,55 4,0 2,21 4,0 8,92 0,1 6,0

sonA42A02 777.134 4,46 9,0 4,02 7,1 9,11 6,0 2,0

sonA42A81 640.106 9,16 7,0 1,81 3,1 9,61 7,0 4,0

serehluM 053.489.1 0,13 1,21 5,91 9,0 4,72 8,8 2,0

sonA91e81 007.001 4,52 9,72 3,9 0,0 9,13 0,5 6,0

sonA42A02 384.942 9,73 7,12 2,11 3,0 2,22 7,6 1,0

sonA42A81 381.053 3,43 5,32 6,01 2,0 0,52 2,6 2,0

9991

latoT.poP 426.728.5 9,04 4,5 2,82 0,3 7,81 7,3 1,0

sonA91e81 021.013 8,64 0,9 8,01 2,0 1,03 0,3 1,0

sonA42A02 345.677 4,55 1,8 9,51 0,1 0,81 5,1 1,0

sonA42A81 366.680.1 9,25 4,8 5,41 8,0 4,12 9,1 1,0

snemoH 429.625.3 6,54 5,0 8,43 0,4 8,31 2,1 2,0

sonA91e81 151.202 8,25 3,0 1,31 3,0 3,23 1,1 1,0

sonA42A02 506.494 6,16 2,1 2,91 2,1 9,51 7,0 1,0

sonA42A81 657.696 0,95 9,0 5,71 0,1 7,02 8,0 1,0

serehluM 007.003.2 9,33 8,21 2,81 5,1 1,62 5,7 0,0

sonA91e81 969.701 7,53 2,52 5,6 0,0 0,62 6,6 0,0

sonA42A02 839.182 5,44 4,02 1,01 6,0 6,12 8,2 0,0

sonA42A81 709.983 1,24 7,12 1,9 4,0 8,22 9,3 0,0

DANP/EGBI:ETNOF

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.92-109 Dezembro 2000 105

res nos anos 90: apenas 40% do incremento da ocu-pação deste segmento corresponderam a um empre-go na iniciativa privada ou no setor público, restando-lhes poucas alternativas de inserção. A atividade por“conta própria”, que normalmente recebe os que nãoconseguem arranjar emprego, também abriu poucoespaço para os jovens nos anos 90, reduzindo de18,1% para 17,5% seu peso na ocupação total dos jo-vens. Restaram, portanto, o serviço doméstico, poucoexpressivo para os rapazes, que aumentou sua parti-cipação de 0,7% para 0,9%, e as formas não-remune-radas, para as quais se voltaram quase todos os quenão continuaram perseguindo ativamente um trabalhoremunerado (os desempregados). O aumento dasproporções de jovens ocupados, do sexo masculino,nas categorias dos “sem-remuneração” e nas ativida-des de subsistência – em ambos os casos, predomi-nantemente na agricultura – constitui mais um indi-cador preciso da gravidade da situação dessestrabalhadores no mercado de trabalho: em 1999, naBahia, nada menos que 33% dos rapazes com 18 e19 anos e 16% dos que tinham entre 20 e 24 anos tra-balhavam sem remuneração, sugerindo elevadíssi-mas taxas de desemprego oculto.

Conclui-se, portanto, que embora os jovens en-tre 18 e 24 anos tenham ficado com cerca de umterço dos novos empregos gerados na Bahia nosanos 90, isso foi absolutamente insuficiente paraatender à demanda juvenil. Com efeito, como o vo-lume total de empregos gerados nesse período foimuito baixo (apenas cerca de 250 mil para umcrescimento da PEA da ordem de 828 mil), a parti-cipação relativamente elevada dos jovens no con-junto dos assalariados não foi suficiente paragarantir a incorporação de todos.

Isso resultou num agravamento extraordinárioda exclusão juvenil, que afeta ambos os sexos,mas de forma distinta: as mulheres apresentam ta-xas de desemprego mais elevadas, mas as que es-tão ocupadas melhoram a sua inserção, com aampliação da proporção das que têm um emprego.Já os homens, apesar de apresentarem uma taxade desemprego aberto menor que a das mulheres(ainda que elevadíssima e crescente na década),pioram a sua inserção, na medida em que as alter-nativas que restaram para os que não encontraramum emprego corresponderam, em grande parte, auma forma de desemprego disfarçado.

Finalmente, um último indicador, que bem sinteti-za o grau de exclusão vivenciado pelos jovens baia-nos, ou seja, o percentual dos que conseguem teracesso à renda: em 1999, apenas 45,6% do total dejovens conseguiu uma inserção no mercado de tra-balho capaz de propiciar algum rendimento, sendoesse percentual de apenas 34,7% para os que ti-nham 18 e 19 anos e 50,4 para os que tinham entre20 e 24 anos; de 58,5% para os jovens do sexo mas-culino e tão- somente 32% para as jovens.

A inserção juvenil na RMS

Em 1999, eram 237 mil os jovens de 18 a 24anos ocupados na Região Metropolitana, sendoque 55,8% deles eram homens e 44,2%, mulheres.Essa predominância masculina na ocupação juve-nil, além de inferior à observada no conjunto do es-tado, vem se reduzindo: as jovens ocupam cadavez mais espaço no mercado de trabalho metropo-litano, tendo ficado com 58,5% dos novos postosde trabalho reservados a esse grupo etário na dé-cada de 90.

Na RMS, a importância do assalariamentocomo forma de inserção juvenil é ainda maismarcante que na média do estado: em 1999, eramempregados – nas atividades do setor público oudo privado – nada menos que 78,2% dos rapazes e54,3% das jovens.

Apesar disso, também na RMS os jovens dosexo masculino vêm encontrando crescente dificul-dade para se inserirem como assalariados. Entre1992 e 1999, enquanto cai a proporção dos que têmum emprego, aumentou o percentual dos que traba-lham “por conta própria” (de 15,4% para 16%), dosque são trabalhadores domésticos (de 1,2% para1,9%) e, sobretudo, o percentual dos que trabalhamsem remuneração (de 2,7% para 4,3%).

Entre as mulheres, além do já referido aumentodo contingente de assalariadas (de 49,5% para54,3%) não se observou a expansão significativade nenhuma outra forma de inserção. Pelo contrá-rio, também na RMS observa-se a redução da im-portância relativa do emprego doméstico (de33,2% para 30,6%) e, o que é mais curioso, a redu-ção do percentual de jovens ocupadas na condiçãode “trabalhador não-remunerado” o qual, em 1999,era de apenas 2,9%, inferior, portanto, ao dos rapa-

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106 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.92-109 Dezembro 2000

zes. Trata-se sem, dúvida, de mudanças importan-tes, uma vez que indicam uma acentuação da ten-dência histórica de saída das mulheres do espaçoprivado, do qual o trabalho doméstico e o trabalhonão remunerado são extensões.

Por outro lado, essa redução das formas tradi-cionais de trabalho feminino ajuda a explicar aselevadíssimas taxas de desemprego aberto dasjovens: elas têm encontrado mais oportunidadesde se inserirem como assalariadas que os ho-mens jovens, mas a baixa geração de empregosacaba por deixar um número expressivo delassem outra opção.

A precariedade do empregoe a desproteção social

Para concluir essa breve análise da inserção dojovem nos mercados de trabalho baiano e metropo-litano é importante levar em conta mais um aspec-to: trata-se do perfil da inserção juvenil em termosde proteção social.

Como dito anteriormente, a maioria dos jovensde hoje defronta-se com opções que são, todaselas, muito ruins: a) permanecer numa inatividadeforçada, que pode assumir a forma de “afazeres do-mésticos” ou de prolongamento – nem sempre vo-

9ordauQoãçapucoanoãçisopropsodapucosnevoJ

9991-2991,SMR

edadIoxeSe

sodapucO

oãçapucOanoãçisoP

latoT sodagerpmEserodahlabarT

socitsémoDatnoCairpórP

serodagerpmEoãN

sodarenumeR

.barToãçudorP

oirpórPomusnoC

.barT.tsnoC

oaraPosUoirpórP

meS.lceD

2991

sonA91e81 012.93 8,65 1,02 0,31 0,0 1,7 8,1 2,1

sonA42a02 197.741 2,96 6,21 4,41 1,1 7,1 5,0 5,0

sonA42a81 100.781 6,66 1,41 1,41 9,0 9,2 7,0 6,0

snemoH

sonA91e81 079.22 7,37 0,0 2,51 0,0 1,7 0,2 0,2

sonA42a02 826.88 3,97 6,1 4,51 6,1 6,1 0,0 5,0

sonA42a81 895.111 2,87 2,1 4,51 2,1 7,2 4,0 8,0

serehluM

sonA91e81 042.61 9,23 6,84 0,01 0,0 1,7 4,1 0,0

sonA42a02 361.95 1,45 0,92 9,21 4,0 0,2 2,1 4,0

sonA42a81 304.57 5,94 2,33 3,21 3,0 1,3 2,1 3,0

9991

sonA91e81 122.65 8,26 3,51 8,21 0,0 8,8 0,0 4,0

sonA42a02 587.081 6,76 3,41 0,41 0,1 2,2 6,0 3,0

sonA42a81 600.732 5,66 5,41 7,31 8,0 7,3 4,0 3,0

snemoH

sonA91e81 344.33 2,47 8,1 5,31 0,0 8,9 0,0 6,0

sonA42a02 509.89 8,67 9,1 8,61 2,1 5,2 2,0 6,0

sonA42a81 843.231 1,67 9,1 0,61 9,0 3,4 2,0 6,0

serehluM

sonA91e81 877.22 9,54 1,53 7,11 0,0 2,7 0,0 0,0

sonA42a02 088.18 6,65 3,92 5,01 8,0 8,1 0,1 0,0

sonA42a81 856.401 3,45 6,03 8,01 6,0 9,2 8,0 0,0

DANP/EGBI:ETNOF

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.92-109 Dezembro 2000 107

luntário – da condição de “estudante que não traba-lha” ou, simplesmente, a pior de todas: não ter ne-nhuma atividade (nem trabalha nem estuda); b)assumir o desemprego, buscando ativamente umaocupação, mesmo sabendo serem reduzidas suaschances de encontrá-la no curto prazo, e c) traba-lhar na ocupação/emprego que conseguir encontrar.

Essa última alternativa, certamente melhor queas duas primeiras para a maioria dos jovens, nãodeixa de ser também problemática. Isso porque,nos anos 90, a maior parte dos jovens que traba-lham o fazem em empregos/ocupações muitoaquém da sua expectativa, em termos de remune-ração, de conteúdo do trabalho e de perspectivasde carreira profissional. Com efeito, embora os jo-vens ocupem uma parcela expressiva dos postosde trabalho existentes, na maioria dos casos sãotrabalhos precários, que nem sempre utilizam suashabilidades e, no caso dos empregos, eles são,quase sempre, sem formalização do vínculo em-pregatício (sem carteira assinada).

A precarização do emprego vem atingindo tam-bém, em larga escala, os trabalhadores mais ve-lhos, mas os dados mostram que, nos anos 90,esse processo vem sendo particularmente mais in-tenso entre os trabalhadores jovens e, principal-mente, entre aqueles que têm 18 e 19 anos. Assim,em 1999, nada menos que 72,6% dos jovens des-se grupo etário que estavam empregados não ti-nham a carteira de trabalho assinada, sendo essaproporção surpreendentemente bem mais elevadana área urbana (78,3%) que na zona rural (56,5%).Tais dados, por si só, indicam a intensidade assu-mida pelo processo de precarização no mercadode trabalho urbano nesta década. A partir dos 20anos, a chance de encontrar um emprego “formal”aumenta, mas, apesar disso, a maioria dos quetêm entre 20 e 24 anos permanece na precarieda-de (67,2% nas áreas urbanas e 53,4% nas áreasrurais).

Na RMS, a região do estado onde são mais sig-nificativas as atividades econômicas organizadas eque, por isso mesmo, concentra a maior parte dospostos de trabalho formalizados, o percentual dejovens que têm emprego com a carteira de trabalhoassinada é, obviamente, bem mais elevado, mastambém aí ocorreu uma redução acentuada entre1992 e 1999: de 40,6% para 34,3%, no caso dos

que têm 18 e 19 anos, e de 71% para 54,4% entreos de 20 a 24 anos.

Os dados da PNAD mostram também que, em1999, a probabilidade de estar em um empregocom carteira assinada era maior para as mulheresque para os homens, entre 18 e 19 anos, e um pou-co maior para os rapazes a partir dos 20 anos.

Esses dados sobre a qualidade dos empregosocupados pelos jovens são importantes porquemostram que a desproteção social não atinge ape-nas os inativos e os desempregados, mas tambémos que conseguem trabalho. Sem a formalizaçãodo vínculo empregatício, a maioria dos jovens baia-nos que estão empregados não têm qualquer pro-teção – além da que possa obter da família – emcaso de desemprego, acidente ou doença.

Além disso, as dificuldades atualmente vivencia-das pelos jovens no mercado de trabalho dese-nham-lhes um futuro nada promissor: começandoa trabalhar mais tarde – pelo desemprego ou pelainatividade forçada – ou trabalhando em empregos/ocupações precárias, a maioria deles também re-tarda o início da contribuição para a previdênciasocial, fundamental para lhes garantir, na velhiceou no caso de invalidez precoce, o direito a umaaposentadoria. Em 1999, na Bahia, eram contribu-intes da previdência apenas 14,6% dos jovens ocu-pados de 18 e 19 anos e 24,1% dos que estavamentre os 20 e 24 anos. Na RMS, esses percentuaiseram de, respectivamente, 25,5% e 45,5%.

Tendo em vista as novas regras da previdênciasocial, que estabelece o tempo de contribuiçãocomo pré-requisito para a percepção de aposenta-doria, caso o atual quadro de precariedade do mer-cado de trabalho seja mantido por mais algunsanos, os jovens de hoje, na melhor das hipóteses,só terão direito à aposentadoria numa idade bas-tante avançada. No entanto, o risco maior e, infeliz-mente, não menos provável, é o de que grandeparte deles venha a constituir uma geração de ve-lhos absolutamente desprotegidos, sem direito àaposentadoria, por não ter tido a oportunidade decontribuir pelo tempo necessário. E com o fatoagravante de pertencerem a famílias menores, poiscertamente terão poucos filhos.

Ainda que esse seja um cenário para um futuroainda longínquo, a sua explicitação é fundamentalpara mostrar como a crise vivenciada pelos que

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108 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.92-109 Dezembro 2000

são jovens agora tem implicações muito mais am-plas e duradouras para a sociedade do que aque-las que, hoje, já se tornaram visíveis.

Conclusões

Nos anos 90, o número de jovens cresceu rapi-damente e se urbanizou. Por si só, esses fatos nãoseriam problemáticos, pois o País já vivenciou ou-tras “ondas jovens”, sem que elas se tenham colo-cado como um problema. Agora, entretanto, orápido crescimento da população jovem coincidecom um período de baixo crescimento econômico,quase estagnação, e de profundas transformaçõesno mercado de trabalho. Juntos, esses fatores es-tão trazendo à ordem do dia a questão da “exclu-são juvenil”, ou seja, a negação a uma parceladesses jovens de um lugar na sociedade, de umachance de construírem seus projetos de vida.

Essa exclusão pode ser abordada de vários ân-gulos, mas certamente o seu eixo hoje passa pelarelação dos jovens com o trabalho, uma vez que, nanossa sociedade, a integração social é, para a maio-ria da população adulta, tributária da inserção nomercado de trabalho. É a posição ocupada por cadaum nesse mercado que irá definir os níveis de vida,a posição na família, boa parte dos direitos e o reco-nhecimento social, além de se constituir na basepara a construção de uma auto-imagem positiva.

Na juventude, fase de transição entre a adoles-cência e a vida adulta, pelas normas sociais aindavigentes, o trabalho já passa a ser visto como aprincipal atividade, mesmo com o aumento da es-colaridade da população e a conseqüente exten-são da vida de estudante. A vigência dessa normavem se tornando menos rígida entre os jovens per-tencentes a famílias com renda mais elevada, masainda permanece forte para os jovens pobres, in-clusive para aqueles que continuam estudando.Deles se espera uma contribuição relevante para amanutenção do grupo familiar ou, pelo menos, acapacidade de arcar com suas despesas, principal-mente para os homens, embora, cada vez mais,também para as mulheres.

A essa expectativa da sociedade e das famíliasagrega-se, hoje, com maior intensidade que nopassado, o desejo dos jovens de conquistar umamaior autonomia no âmbito da família e de afirmar

a sua identidade de jovem, a qual, cada vez mais,supõe diferenciar o seu consumo daquele dosadultos – diferenciação esta reiteradamente refor-çada pelo mercado. A realização desse desejo exi-ge, obviamente, algum grau de autonomia financei-ra, que permita arcar com as despesas relativas àsescolhas e preferências.

Todas essas expectativas – da sociedade, dafamília e dos próprios jovens – traduzem-se numapressão permanente sobre esses. Assim, apesardas adversidades do mercado, a maioria dos jo-vens tem reagido a essa pressão com a procura in-tensa e permanente de um trabalho remunerado,como evidenciam as suas elevadíssimas taxas dedesemprego aberto. A frustração dessa procura e aimpotência dela decorrente vêm jogando contin-gentes cada vez mais numerosos de jovens em si-tuações de risco, sobretudo (mas não só) entreaqueles que pertencem a famílias pobres que, paragarantir o atendimento das necessidades básicas,precisam contar com a contribuição de todos osseus membros em condições de trabalhar. Nessasfamílias, o desemprego de um ou mais dos seuscomponentes afeta as condições de vida de todo ogrupo familiar, o qual, por sua vez, tem recursos li-mitados para se constituir num apoio efetivo paraos que caem/permanecem no desemprego.

Desse modo, a reduzida possibilidade de traba-lho remunerado com que se defronta a atual gera-ção de jovens constitui o principal desafio a ser en-frentado pela sociedade brasileira (e baiana) para oequacionamento da “questão juvenil”, já posta narealidade, mas ainda sem encontrar o lugar mereci-do na agenda política do País. Trazê-la a este lugaré tarefa urgente. Nos últimos 20 anos, com o esfor-ço conjunto da sociedade civil e do estado, o Brasilconseguiu incluir na sua pauta de problemas aquestão da infância e da adolescência em situaçãode risco. A duras penas, e muito aquém do deseja-do, avanços foram alcançados nas lutas contra otrabalho infantil e pela escolarização de crianças eadolescentes. O significado desses avanços terásido em grande parte perdido se as crianças e ado-lescentes que, nos anos 90, deles se beneficiaram,vierem a ter como destino se transformarem, naprimeira década do século XXI, em jovens excluí-dos, sem direito à juventude nem aos sonhos deuma vida adulta produtiva e integrada.

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.92-109 Dezembro 2000 109

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Notas

1 Este trabalho contou com a colaboração da UNICEF e foiapresentado na III Semana de Mobilização Científica daUCSAL, em outubro de 2000.

2 O mercado de trabalho, a rigor, restringe-se ao espaço decompra e venda de força de trabalho, incluindo apenas osempregadores, os empregados e os desempregados. Noentanto, nesta análise, assim como em grande parte dos es-tudos voltados para a questão do trabalho no Brasil, utilizar-se-á o conceito ampliado de mercado de trabalho, o qualinclui, além dessas categorias, os ocupados por conta pró-pria, os trabalhadores não-remunerados da pequena produ-ção mercantil e, por imposição da base de dados utilizada,os trabalhadores em atividades de subsistência, que passa-ram a serem computados no rol dos ocupados pela PNAD, apartir de 1992.

3 Os trabalhadores não-remunerados que trabalham menosde 15 horas semanais e as pessoas que trabalham em ativi-dades voltadas para a subsistência, na agricultura e na pro-dução de habitação para o próprio uso.

* Ângela Borges é professora na Escola de Serviço Socialda UCSAL e no curso de Ciências Sociais da UNIFACS, e

doutoranda em Ciências Sociais na UFBA.

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110 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.110-114 Dezembro 2000

Os postos de trabalho

no ano 2000

Luiz Chateaubriand Cavalcanti dos Santos*

Após um período longo de dificuldades, omercado de trabalho da Região Metropoli-tana de Salvador apresenta resultados po-

sitivos no curso do ano 2000. Esse fenômeno pare-ce associado à circunstância econômica nacional:produção em crescimento, inflação baixa, aumentoda ocupação e desempenho fiscal mais ou menosequilibrado.

A aparente melhoria nas condições gerais domercado metropolitano1 manifesta-se em:• diminuição da taxa de desemprego, que retorna

aos níveis imediatamente anteriores aos da cri-se cambial;

• crescimento da ocupação, que atinge, entre ju-nho e setembro, os níveis mais elevados desdedezembro de 1996, data de início da atual Pes-quisa de Emprego e Desemprego na RMS;

• aumento da taxa de participação, mostrandoque o crescimento do número de postos de tra-balho foi percebido pelos agentes, os quais, emface das novas oportunidades de inserção pro-dutiva, retornam ao mercado de trabalho.O aumento da participação, entretanto, não se

converteu em crescimento do desemprego. O desem-prego da RMS permanece como o maior do País, ain-da que a tendência linear pareça ser de queda dataxa, especialmente a partir de abril do ano em curso.

Enfim, podemos dizer, resumidamente, que a di-nâmica do mercado de trabalho da RMS, que vinhasendo comandada pelo trânsito da ocupação para odesemprego e para a inatividade – que, por sua vez,refletia-se em uma baixa taxa de participação, eleva-

do desemprego e ocupação estagnada ou decres-cente – passou a ser comandada pelo crescimentoda ocupação, com o trânsito dos agentes da inativi-dade para a PEA, sem que isso, todavia, se expres-sasse em aumento do desemprego, graças àabertura de novas posições de trabalho.

Esse crescimento da ocupação na RMS traz al-guns novos desafios à pesquisa. Neste artigo pro-põem-se a investigação de algumas questões e aformulação de algumas respostas: em que setoresda atividade econômica o dinamismo na criação denovas posições de trabalho é mais expressivo esignificativo? O que ele representa em termos demudanças na distribuição setorial da ocupação naárea metropolitana? Qual a qualidade dos novospostos de trabalho? Qual o peso e importância dosetor informal na estruturação das novas ocupa-ções? Quais as características pessoais dos traba-lhadores que alcançam esses postos de trabalho?

Para isso, utilizou-se a Pesquisa de Emprego eDesemprego da Região Metropolitana de Salvador,selecionando-se os ocupados que ingressaram naempresa ou no negócio nos últimos 30 dias anterio-res à pesquisa, entre os meses de janeiro e setem-bro de 2000.2 Para fins de comparação, adotou-seo mesmo procedimento com os dados de 1999.

Chamamos o grupo de agentes assim selecio-nados de “novos trabalhadores” e os postos de tra-balho de “novos postos de trabalho”. O conjuntoformado pelos ocupados que não foram seleciona-dos nessa amostra foi denominado “demais traba-lhadores”.

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.110-114 Dezembro 2000 111

Os novos postos de trabalho

A Tabela 1 mostra um quadro de crescimento donível de ocupação na RMS ao longo do ano 2000.O índice mensal é quase sempre superior aos ob-servados nos mesmos meses dos demais anos dasérie3 – i.e., dessazonalizado – e a variação em re-lação ao mesmo mês do ano anterior é continua-mente crescente entre janeiro e setembro dopresente ano. Neste último mês o nível de ocupa-ção é 7,5% superior ao de 1999.

investimentos na indústria, no comércio e na habi-tação. O Comércio só apresenta crescimento donível de ocupação em relação ao mesmo mês doano anterior a partir de maio de 2000, quando ini-cia-se a reabertura de postos fechados durante acrise do real.

Já a Indústria tem comportamento positivo apartir de junho de 1999, observando-se quedas daocupação dessazonalizada nos meses de outubrode 1999, fevereiro de 2000 e, de forma contínua, apartir de julho de 2000.

O Gráfico 1 ilustra a distribuição setorial dospostos de trabalho abertos entre janeiro/setembrode 2000. O setor da atividade econômica com mai-or participação na demanda de trabalho foi o doschamados Serviços à Produção, com quase umquarto (23,4%) das novas posições. Em segundolugar, os Serviços Pessoais, com 19,8%, seguidodos Serviços Domésticos (17,8%) e da ConstruçãoCivil (17,4%).

O Comércio respondeu por 14,1% dos novospostos de trabalho, sugerindo que o nível de em-prego do setor só começa recuperar-se da crisecambial do final de 1998 e início de 1999, a partirde maio de 2000.

O crescimento do nível de ocupação, entretanto,não é linear nem concomitante nos diferentes seg-mentos da atividade econômica. A Tabela 2 mostraque esse aumento é mais consistente e duradouronos Serviços à Produção4 – setor que representaquase um terço (32,7%) dos postos de trabalho daRMS, agrega segmentos dos mais dinâmicos e for-malizados e cuja variação dessazonalizada do nívelde ocupação é positiva desde outubro de 1999 –que na Construção Civil, Comércio, Serviços Pesso-ais e na Indústria. (Tabela 2).

A Construção Civil parece reagir à conjunturade perdas de posições de trabalho a partir de abrilde 2000, possivelmente em função das obras públi-cas de infra-estrutura (construção do Metrô, dasAvenidas Luiz Eduardo Magalhães e Manoel Dias,serviços de esgotamento sanitário, etc.) e de novos

As novas posições de trabalho têm uma distribui-ção setorial diversa da existente na RMS para os“demais trabalhadores”. A principal diferença estána expressão dos setores de Construção Civil e dosServiços Domésticos, que representam mais de umterço (35,2%) da demanda metropolitana de traba-lho, em face da participação de 14,4% na distribui-

1alebaT0002a7991–SMRadoãçapucoedsecidnÍ

)001=6991zeD(

seseM 7991 8991 9991 0002

naJ 2,001 3,201 5,101 0,301

veF 4,101 3,101 1,001 2,201

raM 9,001 1,001 5,79 2,001

rbA 1,101 8,89 9,69 2,001

iaM 9,001 5,89 6,79 6,101

nuJ 6,001 1,89 1,89 0,401

luJ 5,101 4,99 4,89 6,401

ogA 7,101 5,001 9,89 7,501

teS 8,101 9,99 6,99 1,701

tuO 2,201 4,001 2,001

voN 6,201 4,001 2,001

zeD 4,301 8,201 7,101

.EDAES/ESEEID/ABFU/SARTES/IES-SMRDEP:ETNOF

Gráfico 1 – Distribuição da ocupação por setor.RMS, jan-set 2000

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112 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.110-114 Dezembro 2000

ção setorial da ocupação existente. Nos demais se-tores, a distância entre a estrutura setorial das novasposições de trabalho e a já existente é pequena nocaso da Indústria e do Comércio, e elevada entre osServiços a Produção e nos Serviços Pessoais.

Essas diferenças nas distribuições setoriais daocupação sofrem a interveniência da instabilidadedas posições ocupacionais em alguns segmentosde atividade. Isso é visível na diferença do tempomédio de permanência dos trabalhadores segundoo segmento de atividade. A permanência média émenor na Construção Civil (2 anos e 7 meses) enos Serviços Domésticos (3 anos e 2 meses) – jus-tamente os setores mais discrepantes em relação àestrutura setorial da ocupação – e mais elevadanos Serviços à Produção (6 anos e 8 meses) e nosServiços Pessoais (6 anos e 3 meses).

Esses resultados sugerem que, embora os Ser-viços Domésticos e a Construção Civil, reunidos,

constituam a maior parcela dos novos postos detrabalho, a tendência de crescimento da ocupaçãonos Serviços à Produção faz dessa categoria amais dinâmica da conjuntura.

A Tabela 3 ilustra as diferenças nos tempos mé-dios de trabalho dos ocupados segundo o setor:

2alebaTrotesropsodapucosodroiretnaonaodsêmomsemoaoãçalermeoãçairaV

0002edorbmeteSa9991edorienaJ,SMR

onA/sêM airtsúdnI oãçurtsnoC oicrémoCsoçivreS

)1(oãçudorPsoçivreS

)2(siaossePsoçivreS

socitsémoDsortuO LATOT

99naJ )7,5( )8,0( )9,1( )3,2( 2,1 )7,2( 8,85 )7,0(

99veF 1,0 )6,4( )1,1( )6,3( )7,0( )1,3( 8,46 )1,1(

99raM )3,7( )0,6( )7,7( )6,2( 8,0 4,0 3,81 )6,2(

99rbA )9,9( )9,1( )9,1( )5,3( 4,1 )0,1( 6,4 )0,2(

99iaM )1,2( 7,4 )6,8( 3,1 0,1 )9,0(- )1,7( )9,0(

99nuJ 8,3 5,7 )2,1( 6,1 )4,0( )9,3( )0,52( 0,0

99luJ 3,01 8,0 )3,6( )9,2( 2,3 )0,3( )9,91( )1,1(

99ogA 9,0 )7,6( )1,2( )6,4( 4,3 )5,1( )7,6( )5,1(

99teS 9,0 )0,4( )2,6( )5,2( 9,5 6,2 )5,5( )3,0(

99tuO )8,3( )1,2( )3,6( 1,2 9,2 )2,0( )4,5( )2,0(

99voN 3,6 6,3 )2,9( 8,0 4,2 7,1 )2,12( )2,0(

99zeD 9,2 )3,6( )7,41( 8,4 1,3 6,4 )4,64( )0,1(

00naJ 1,8 )6,7( )6,01( 3,5 8,5 4,9 )8,04( 4,1

00veF )4,0( )0,9( )9,9( 6,9 2,6 3,01 )9,64( 1,2

00raM 7,6 )7,4( )1,4( 6,8 )3,0( 9,7 )4,51( 8,2

00rbA 0,6 3,5 )5,6( 0,21 )7,2( 5,8 )5,9( 4,3

00iaM 7,6 4,0 5,5 8,4 )5,0( 3,11 1,11 1,4

00nuJ 7,8 2,4 7,8 1,4 5,2 8,61 1,6 1,6

00luJ )4,3( 4,4 3,41 1,8 2,3 7,21 )2,13( 4,6

00ogA )1,2( 8,01 4,9 0,21 9,2 1,11 )7,04( 8,6

00teS )0,5( 7,11 6,31 0,61 3,1 5,5 )3,43( 5,7

.EDAES/ESEEID/ABFU/SARTES/IES-SMRDEP:ETNOF;oãçacinumoC;soriecnaniFesoicítiderC;aicíloPesadamrAsaçroF;acilbúPoãçartsinimdA;sodazilaicepsE;acilbúPedadilitU;meganezamrAeetropsnarTmeulcnI)1(

.azepmiLeoãçarapeRedsoçivreSsortuO;serailixuAsoçivreS;sievómIedesoiráilibomIserolaVedoãçartsinimdA;oicrémoC;oãsufideleTeoãsufidoidaR,oãsreviD.soçivreSsortuOeacinâceMoãçarapeRedsanicifO,soirátinumoCsoçivreS,edúaS,oãçacudE,oãçatnemilA,sosrevidsiaossePsoçivreSmeulcnI)2(

3alebaToãçapucoedoidémopmeT

)001=latoT(0002teS-naJ,SMR

edadivitAedroteS oidéMopmeToãçapucOed

airtsúdnI 0,001

liviCoãçurtsnoC 9,54

oicrémoC 8,08

oãçudorP.vreS 4,021

siaosseP.vreS 0,211

socitsémoD.vreS 3,65

sortuO 9,961

LATOT SONA85,5

.EDAES/ESEEID/ABFU/SARTES/IES-SMRDEP:ETNOF

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.110-114 Dezembro 2000 113

A Tabela 4 mostra o peso elevado do trabalhoassalariado sem a proteção da seguridade socialem empresas privadas, do trabalho autônomo e doemprego doméstico na estruturação da demandade trabalho na RMS.

esses setores, o trabalho assalariado protegidotem representação inferior à metade da sua ex-pressão na estrutura existente.

A precariedade dos novos postos de trabalhoaparece também nos rendimentos. A moda, que re-presenta o valor mais freqüente dos rendimentos, éa mesma para novas e demais posições de traba-lho: 1 salário mínimo. Entretanto, a média dos ren-dimentos dos “demais trabalhadores” é 2,7 vezessuperior e a mediana, que divide a distribuição aomeio, 1,8 vezes maior. Mais de um quarto das no-vas posições de trabalho tem rendimento bruto in-ferior ao salário mínimo. Entre os trabalhadorescom mais de 1 mês de trabalho, essa parcela cor-responde a cerca de 13% dos ocupados.

Por fim, vejamos as características pessoaisdos trabalhadores que estão sendo selecionadospara esses postos de trabalho.

Os dados das características pessoais requeridasnas novas posições de trabalho mostram que o mer-

Predominam posições desprotegidas nessa es-truturação. O trabalho assalariado em empresasprivadas sem proteção da previdência representaquase um terço (32,9%) dos novos postos e o em-prego doméstico, que, no máximo, só tem proteçãoparcial, 17,9%. Portanto, cerca de metade dos pos-tos criados constitui-se em empregos não-protegi-dos pela seguridade social.

Entretanto, não se pode afirmar que a baixaqualidade dos novos postos de trabalho seja ape-nas resultado da expressão dos Serviços Domésti-cos e da Construção Civil na demanda de trabalho.A Tabela 5 mostra que, mesmo quando se excluem

4alebaToãçapucoanoãçisoP

)%me(0002teS-naJ,SMR

adapucOoãçisoP*0002

sovoNserodahlabarT

siameD

**oãçetorP/codairalassA 9,81 0,05

***oãçetorP/sodairalassA 9,23 2,01

omonôtuA 3,82 0,22

ocitsémoDogerpmE 9,71 0,01

sortuO 0,2 7,7

LATOT 0,001 0,001

.EDAES/ESEEID/ABFU/SARTES/IES-SMRDEP:ETNOForbmeteSaorienaJ*

ocilbúProteSododairalassAearietraCmocodavirPodairalassA**arietraCmesodavirPodairalassA***

5alebaTsoçivreSsosodíulcxeoãçapucoanoãçisoP

liviCoãçurtsnoCaesocitsémoD)%me(–0002teS-naJ,SMR

edadivitAedroteS*0002

sovoNserodahlabarT

siameD

**oãçetorP/codairalassA 9,42 7,55

***oãçetorP/sodairalassA 7,24 2,11

omonôtuA 7,92 3,42

sortuO 8,2 8,8

LATOT 0,001 0,001

.EDAES/ESEEID/ABFU/SARTES/IES-SMRDEP:ETNOForbmeteSaorienaJ*

ocilbúProteSododairalassAearietraCmocodavirPodairalassA**arietraCmesodavirPodairalassA***

6alebaTsiamedesovonsodsiaossepsacitsíretcaraC

serodahlabart)%me(–0002teS-naJ,SMR

siaossePsacitsíretcaraCsovoN

serodahlabarTsiameD

edadI

71a01 7,21 6,3

42a81 2,53 6,81

93a52 7,53 4,34

95a04 7,41 9,03

+e06 6,1 5,3

açaR

acnarB 9,11 6,61

argeN 1,88 4,38

oxeS

onilucsaM 2,25 3,45

oninimeF 8,74 7,54

edadiralocsE

3étA a 1odeiréS o uarG 3,02 2,31

4a 1odeiréS o uarG 7,11 9,8

5a 7a a 1odeiréS o uarG 0,42 1,61

1o otelpmoCuarG 5,01 2,9

2o otelpmocnIuarG 4,8 1,7

2o otelpmoCuarG 2,81 4,03

3o otelpmocnIuarG 9,3 1,4

3o otelpmoCuarG 1,3 9,01

aicnêdiseRedopmeT

sona3edsoneM 5,01 5,4

+esona3 6,98 5,59

.EDAES/ESEEID/ABFU/SARTES/IES-SMRDEP:ETNOF

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cado tem selecionado para estes postos uma propor-ção maior de jovens, negros, pessoas do sexo femini-no, de baixa escolaridade e recém-imigrados.

Com efeito, quase metade (47,9%) dos novostrabalhadores tem menos de 24 anos, sendo que12,7% têm menos de 18 anos de idade; 88% sãonegros, 48% são mulheres e 56,0% sequer logra-ram completar o 1o Grau, quando, entre os “demaistrabalhadores”, 22,2% têm menos de 24 anos eapenas 3,6 têm menos de 17 anos; 83% são ne-gros, 45,7% são mulheres e apenas 38,2% têm atéo 1o Grau incompleto.

Considerações finais

Os dados da Pesquisa de Emprego da RMS parao ano 2000 mostram importantes mudanças na di-nâmica do mercado metropolitano de trabalho: cres-cimento da ocupação e aumento da participação.

A distribuição setorial, a qualidade dos postos eas características pessoais dos trabalhadores arre-gimentados para as posições criadas nos 30 diasanteriores à pesquisa sugerem a existência de doistipos de fenômenos relacionados à ocupação:

a) um espaço de trabalho formado por ocupa-ções precárias, com elevada rotatividade, baixosrendimentos e distribuído nos Serviços Domésti-cos, na Construção Civil e no trabalho autônomo,que é mais permeável à presença de uma popula-ção jovem, de baixa escolaridade, negra, recém-imigrada e mais diferenciados em face da condiçãode gênero;

b) outro espaço de trabalho um pouco mais es-truturado, especialmente nos chamados Serviços àProdução – que comanda setorialmente a deman-da de trabalho na RMS no ano em curso – e na In-dústria.

Embora a análise não tenha abordado o merca-do sob essa perspectiva, é possível que exista umtrânsito de ocupações informais e de baixo rendi-mento para o trabalho formal e melhor remunera-do, na medida em que os trabalhadores permane-çam por um tempo mais longo nos postos detrabalho. Essa mudança na situação ocupacional

seria mais freqüente nos segmentos mais estrutu-rados da economia – nos Serviços à Produção e naIndústria, por exemplo – e mais exeqüível em situa-ção de crescimento.

No curto prazo, as perspectivas de sustentabili-dade do crescimento da ocupação na RMS são fa-voráveis para o ano em curso. O Comércio devemanter a trajetória de crescimento da ocupação,em função da proximidade do final do ano; os in-vestimentos nos Serviços de Comunicação, deTransporte, na Indústria e na Construção Civil po-dem manter aquecida a demanda de trabalho nosServiços a Produção e o aumento do consumopessoal no final do ano pode ter repercussões posi-tivas no desempenho dos Serviços Pessoais. Ocomportamento desses setores deve compensar ofraco desempenho da ocupação na Indústria

A manutenção do desempenho do nível deocupação na setor Construção Civil pode depen-der da atuação do setor público nos três últimosmeses do ano.

Notas

1 Sobre a conjuntura do mercado de trabalho da RMS ver osartigos de SOBRINHO, Edson A. da Silva, “Mudanças nomercado de trabalho da RMS” e SUERDIECK, Flávia S.Rodrigues, “Mercado de trabalho formal na Bahia” nestaedição.

2 Para evitarem-se desvios com a sobre-representação dosmeses iniciais das séries, não se considerou o conjunto dostrabalhadores que lograram posição de trabalho entre janei-ro e setembro, mas apenas os que arranjaram trabalho nos30 dias anteriores à pesquisa.

3 A exceção ocorreu com o índice do mês de março de 2000,cujo resultado foi ligeiramente inferior ao encontrado para1997: 100,2 e 100,9 respectivamente.

4 Ver nota 1 na Tabela N 2.

*Luiz Chateaubriand C. dos Santos é economista daSuperintendência de Estudos Econômicos e Sociais da

Bahia (SEI) e pesquisador associado ao Núcleo dePesquisa da Universidade Estadual da Bahia (NUPE).

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.115-121 Dezembro 2000 115

Mudanças no mercado

de trabalho da RMS

Edson A. S. Sobrinho *

Este artigo tem como objetivo descrever atrajetória das mudanças que ocorreram nomercado de trabalho da Região Metropolita-

na de Salvador no decorrer desses últimos três anos.Para tanto, serão utilizados os dados da Pesquisa deEmprego e Desemprego (PED) na RMS, coletadosentre setembro de 1997 e setembro de 2000.

As mudanças de cunho macroeconômico, quevinham ocorrendo desde o início da década de no-venta, impuseram severas mudanças às políticasgerais das empresas ante a necessidade de adap-tação à abertura comercial e ao conseqüente au-mento da competição. O processo de reestruturaçãoprodutiva, caracterizado basicamente pelo incre-mento tecnológico e pela reestruturação organiza-cional, alterou drasticamente o mercado de traba-lho brasileiro.

Os novos paradigmas que vigoram neste fim deséculo provocaram a destruição de milhares de em-pregos em todo o mundo. No Brasil, onde a inclusãoeconômica e social está diretamente ligada a ummodelo de crescimento econômico, vivem-se nos úl-timos meses boas perspectivas de retomada docrescimento. O problema é que também vivemosnum ambiente de altas taxas de desemprego e con-centração de renda, questões a que se aliam as re-lacionadas aos enormes contingentes de pobres emiseráveis sem nenhum tipo de proteção social.

Desemprego

De um modo geral, em todas as regiões metro-

politanas essas mudanças provocaram aumentodas taxas de desemprego e redução dos empregoscom carteira de trabalho assinada e, paralelamen-te, aumento das contratações sem registro. Oacentuado crescimento urbano verificado nas gran-des cidades durante os anos oitenta e a escassezde postos de trabalho para boa parte da populaçãofizeram com que esta procurasse novas formas deocupação, fazendo surgir uma gama de atividadesinformais sem nenhum tipo de proteção social. Aausência de condições de empregabilidade foi de-terminante para a redução da qualidade de vida dafamília do trabalhador, levando mais membros dafamília a procurar emprego e, com isso, a aumentaro contingente de desempregados.1

Na Região Metropolitana de Salvador, além deserem encontradas as taxas de desemprego maiselevadas entre as regiões de atuação da pesquisa,a presença marcante da informalidade2 contribuiuainda mais para a degradação da já precária situa-ção do trabalhador.

Desde o início da pesquisa em pauta, a taxa dedesemprego na RMS vinha demonstrando tendên-cia de alta. Tendo como referência a taxa de de-semprego registrada em dezembro de 1996, marcoinicial da PED na RMS, o desemprego chegou acrescer 44,3%, levando-se em conta o maior nívelverificado no período (29,3% em julho de 1999).Nos meses em que havia intensa atividade nos se-tores de Comércio e Serviços a taxa recuava sensi-velmente e daí partia de novo para uma tendênciade crescimento.

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116 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.115-121 Dezembro 2000

A Taxa Global de Participação – indicador queexpressa a proporção da População em Idade Ati-va (PIA) incorporada no mercado de trabalho nacondição de ocupada ou desempregada – atingiu amais alta taxa média da série PED-RMS, aumen-tando de 60,1%, em setembro de 1997, para 61,6%em setembro de 2000, o que eqüivale à entrada de146 mil pessoas no mercado de trabalho. A Popu-lação em Idade Ativa apresenta taxa média decrescimento anual de 0,6%, enquanto que a popu-lação total cresce 0,4% a.a. A População Economi-camente Ativa tem crescimento superior (1,3%a.a),3 sendo estimada, no mês de setembro de2000, em 1.500 mil pessoas. Tal movimento, asso-ciado ao desempenho da ocupação, resultou naexpressiva ampliação do contingente de desem-pregados.

Como conseqüência da séria crise vivida peloPaís no ano passado, diversos postos de trabalhoforam perdidos e o nível de ocupação atingiu seuspiores níveis desde a implantação da pesquisa.Analisando-se apenas os últimos 12 meses, o mer-cado de trabalho na RMS vem apresentando resul-tados positivos após um longo período dedificuldades. Ante a incorporação de 52 mil pesso-as ao mercado de trabalho entre setembro de 1999

e setembro de 2000, aquantidade de postosde ocupação cresceu7,5%, representando acriação de 78 mil no-vos postos de trabalho.

De acordo com apesquisa, 389 mil pes-soas foram considera-das desempregadas emsetembro de 2000, en-

quanto que em setembro de 1999 eram 414 mil.Assim, o volume de desempregados diminuiu em25 mil trabalhadores, fazendo com que a taxa dedesemprego caísse de 28,6% para 25,9%. Em quepese a recuperação do mercado de trabalho naRMS nos últimos doze meses, verifica-se que oreaquecimento da economia apenas fez com que ataxa de desemprego retornasse ao nível em que seencontrava em 1998, sendo ainda bastante insufi-ciente para incorporar o contingente de desempre-gados da RMS.

Ainda em relação à taxa de desemprego, verifi-ca-se que, do total de desempregados na RMS nomês de setembro do corrente ano, 14,7% encontra-vam-se na situação de desemprego aberto4 e11,2% encontravam-se na situação de desempregooculto,5 seja pelo exercício do trabalho precário,seja pelo desalento para procurar trabalho. Des-ses, apenas os desempregados desalentados di-minuíram em relação a dezembro de 1996, data doinício da pesquisa na RMS.

Chama-se a atenção para a elevada participa-ção do desemprego oculto na composição da taxade desemprego total, ficando em média perto dos43%. É possível que isso seja reflexo de um mer-cado de trabalho caracterizado por setores pouco

estruturados e com redu-zidas condições de em-pregabilidade, forçando osdesempregados a exer-cerem diferentes ativida-des como meio de so-brevivência, geralmenteatividades informais semnenhum vínculo empre-gatício. A prática dessasatividades, precárias e de

1alebaTSMR-edadivitAedaxaTeAIP,AEP,latoToãçalupoP

0002/teS-79/teS

serodacidnI 79/teS 89/teS 99/teS 00/teS.cserCedaidéM.xT

00/79-)%(launA

*latoT.poP 837.2 287.2 728.2 278.2 4,0

*AIP 252.2 113.2 373.2 534.2 6,0

*AEP 453.1 493.1 844.1 005.1 3,1

edadivitA.xT 1,06 3,06 0,16 6,16 –

EDAES/ESEEID/ABFU/SARTES/IES-SMRDEP:etnoF

2alebaTopitrop,ogerpmeseDedsaxaT

)%me(–00/teS-79/teS-rodavlaSedanatiloporteMoãigeR

odoírePsaxaT oãçiubirtsiD

latoT otrebA otlucO otrebA otlucO

79/teS 9,12 8,21 1,9 4,85 6,14

89/teS 6,52 9,41 7,01 2,85 8,14

99/teS 6,82 7,51 9,21 9,45 1,54

00/teS 9,52 7,41 2,11 8,65 2,34

EDAES/ESEEID/ABFU/SARTES/IES-SMRDEP:etnoF

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.115-121 Dezembro 2000 117

curta duração, sem qualquer tipo de proteção soci-al, configura-se como uma alternativa de inserçãono mercado de trabalho e, de certa forma, apenascamufla formas de desemprego.

As taxas de desemprego aberto também sãomuito elevadas, sugerindo a existência de um mer-cado formal estruturado com reduzido trânsito paraas atividades informais inerentes aos setoresdesestruturados da economia. Paralelamente, asaltas taxas de desemprego oculto indicam a exis-tência, também, de um mercado informal expressi-vo, com espaço para atividades precárias e irregu-lares. Isso porque, para a PED, a subdivisão daPEA em ocupados e desempregados resulta dacombinação dos quesitos relativos à procura detrabalho com os de qualificação da situação de tra-balho, em razão da freqüente associação entre tra-balhos precários e a condição de desempregado.

Após longo período de crescimento, as taxas dedesemprego por atributos pessoais (gênero, idade,cor) têm acompanhado o melhor desempenho domercado de trabalho verificado nos últimos 12 me-ses e, gradativamente, estão diminuindo. Assim,apesar das taxas atuais se apresentarem ainda bemacima daquelas vigentes em setembro de 1997, desetembro de 1999 a setembro de 2000 manteve-sea tendência de baixa, o que, de certa forma, vemminimizando as perdas dos trabalhadores.

Quando se analisa a taxa segundo o gênero, eladecresce significativamente tanto para homensquanto para mulheres. O desemprego para os ho-mens diminuiu de 26,3% para 23,7% , enquanto ataxa para as mulheres decresceu de 31,1% para28,4%, entre setembro de 1999 e setembro de2000. Apesar de possuírem melhor média de anosde estudo do que os homens, as mulheres, por ou-tro lado, entram mais tarde e saem mais cedo do

mercado de trabalho, o que dificulta tanto sua per-manência quanto sua reinserção no rol dos ocupa-dos. De certa forma, estes dados revelam que háuma maior descontinuidade das mulheres no mer-cado de trabalho e, conseqüentemente, maiores asdificuldades para a aquisição de experiência profis-sional, ao que se soma a sua posição no contextofamiliar.

Segundo a idade, no período de setembro de1999 a setembro de 2000, a taxa de desempregocresce para todas as faixas, sobretudo para os jo-vens de 10 a 17 e de 18 a 24 anos. O desempregoé maior para as pessoas com idades entre 10 e 17anos e vai decrescendo nas faixas etárias mais ele-vadas. Observam-se os elevados números para odesemprego nas faixas mais baixas de idade, su-gerindo amplas dificuldades na conquista do pri-meiro emprego.

Quanto à distribuição do desemprego por cor, ataxa também vem decrescendo tanto para brancosquanto para a população negra, sendo que numaproporção bem menor nesta última, saltando de29,8%, em setembro de 1999, para 27,3% em se-tembro de 2000. A taxa da população branca, apóssucessivos acréscimos, decresceu significativa-mente e retornou ao mesmo nível de setembro de1997, ficando em 16,9%.

Vale a pena ressaltar que, apesar de o reaque-cimento da economia vir melhorando a situação domercado de trabalho na RMS e de os aspectos po-sitivos da conjuntura atual estarem sinalizandouma perspectiva um pouco mais favorável, há fe-nômenos estruturais que ainda impedem um me-lhor desempenho do mercado de trabalho, fazendocom que a RMS apresente taxas elevadas de de-semprego, taxas essas muito acima das vigentesem outras regiões metropolitanas. Assim, o recente

3alebaTsiaossepsotubirtasnuglaodnuges,ogerpmeseDedsaxaT

00/teS-79/teS–rodavlaSedanatiloporteMoãigeR

odoírePsaxaT )sona(edadI roC

onilucsaM oninimeF 71a01 42a81 93a52 siamuo04 sorgeN socnarB

79/teS 6,02 4,32 4,34 0,23 2,81 7,21 1,32 9,61

89/teS 7,32 8,72 9,54 6,83 8,22 3,31 6,72 9,61

99/teS 3,62 1,13 0,05 1,24 1,62 7,51 8,92 4,22

00/teS 7,32 4,82 3,94 5,93 8,22 5,41 3,72 9,61

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118 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.115-121 Dezembro 2000

bom desempenho da economia brasileira não é su-ficiente para eliminar as preocupações em torno doemprego, sobretudo na RMS.

Ocupação

Quanto à ocupação, o setor terciário exerce im-portante papel na geração de empregos. A impor-tância desse setor e as evidências de pouca estru-turação do mercado de trabalho soteropolitanoaparecem no maior peso da ocupação entre asdiversas atividades do terciário, em que os Serviçossurgem como principal fonte de postos de ocupação.

A abrupta exposição da economia à competiçãointernacional forçou as empresas à modernizaçãotecnológica e à utilização de novos métodos degestão, resultando num elevado aumento da pro-dutividade. A conseqüência direta disso foi a elimi-nação de diversos postos de trabalho, além datransferência de algumas ocupações da Indústriapara o setor de Serviços, caracterizando um pro-cesso de terciarização. A Indústria empregava, di-retamente na RMS, cerca de 89 mil pessoas emsetembro de 1999. Em um ano, foram eliminadosmais de 4 mil postos de trabalho, já que, em setem-bro de 2000, esse setor contava com apenas 84,5mil ocupados.

Ante a significativa queda na disponibilidade depostos de trabalho, a Indústria de Transformaçãovem diminuindo sua importância como setor de ati-vidade gerador de empregos. Os índices do nívelde ocupação nesse setor indicam uma queda de1,3% no número de ocupados em relação a setem-

bro de 1997 e de 5,0% em relação ao mesmo mêsdo ano passado. São postos de trabalho perdidos,de níveis salariais mais elevados e pautados pormaior estabilidade e formalização (boa parte deseus empregados são assalariados e com carteiraassinada), dando uma qualidade ao emprego bemacima daquelas oferecidas pelos setores de Co-mércio e Serviços.

Paralelamente à queda da participação do em-prego industrial, observa-se significativa expansãodo setor Terciário, no qual se encontram 75,6% dosocupados da RMS, excluindo-se os serviços do-mésticos (10,3%), enquanto que em setembro de1999 esse percentual era de 73,9%. O Comércioabsorve 16,8% do emprego e o agregado Serviços58,8%, incluindo-se aí aqueles empregos geradosna Administração Pública. A expressiva expansãodos Serviços, que ofereceram 50,5 mil novas ocu-pações nos últimos 12 meses, representou umcrescimento de 16% sobre o nível existente em se-tembro de 1999. Porém, grande parte destes novospostos de ocupação é composta por atividades dereduzida remuneração e produtividade, exercidaspor pessoas de baixa qualificação.

Dentro do agregado Serviços, pode-se obser-var os ramos de oficinas, serviços de conservaçãoe limpeza, transporte e armazenagem, serviços es-pecializados e outros serviços, atividades que têmseu desempenho diretamente ligado àquelas da In-dústria, tendo em vista estarem conectadas ao pro-cesso produtivo. São atividades resultantes daacomodação de trabalhadores oriundos do setorindustrial e bancário, que perderam seus empregos

em virtude da automa-ção e dos diversos pro-cessos de reestrutura-ção organizacional. Dototal de postos de tra-balho criados entre se-tembro de 1999 e se-tembro deste ano, 67,7%pertencem ao agrega-do Serviços; o fato deque só nas atividadesligadas aos Serviçosda Produção contabili-zem-se 57,0% sugereque a ocupação se ex-

4alebaTedadivitaedserotesodnuges,oãçapucOadaruturtsE

00/teS-79/teS–rodavlaSedanatiloporteMoãigeR

79/tes 89/tes 99/tes 00/tes

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oicrémoC 819.381 352.571 604.461 618.681 6,31

oãçudorPadsoçivreS 076.723 185.423 404.613 869.663 0,61

siaossePsoçivreS 607.272 645762 613.382 698.682 3,1

socitsémoD.vreS 990.311 477.501 075.801 635.411 5,5

*sortuO 380.02 307.91 216.81 232.21 )3,43(

latoT 000.750.1 000.730.1 000.430.1 800.211.1 5,7

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.115-121 Dezembro 2000 119

pande justamente onde a produtividade é mais bai-xa, o vínculo empregatício é mais precário e os ren-dimentos são bem inferiores.6

Considerando as formas de contratação, o as-salariamento aparece como principal vínculo em-pregatício, envolvendo 60,8% dos ocupados, con-tra 56,9% em setembro de 1999. Os autônomostêm participação expressiva, mas vêm perdendoespaço como forma de inserção, já que correspon-diam a 24,7% dos ocupados em setembro de 1999 ehoje correspondem a 21,4%, percentual ainda bas-tante expressivo. Vale a pena ressaltar que grandeparte das ocupações autônomas denota formas deassalariamento disfarçado, revelando, em conjuntocom outros fatores, o grau de informalidade domercado de trabalho. Esta afirmação é plausívelpois é de se esperar que dentro deste grupo deva-se encontrar grande parte dos indivíduos que tra-balham sozinhos ou com ajuda de familiares, o queos caracteriza como ocupantes de postos de traba-lho com vínculos precários e baixos rendimentos eprodutividade.

Quando se analisa a série da PED na RMS, en-tre setembro de 1997 e setembro de 2000, pode-seobservar uma mudança qualitativa na composiçãodo emprego na RMS, evidenciada, sobretudo, pelaredução da informalidade no período. Apesar de onúmero de assalariados do setor privado sem car-teira de trabalho assinada ter crescido 19,9%, vê-seuma clara diminuição da categoria de autônomos(5,5%). Enquanto isso, o número de assalariadoscom carteira de trabalho assinada cresceu 20,8%,indicando uma recuperação das formas legaliza-das de contratação.

Tomando-se como informalidade o conjunto dosassalariados sem carteira assinada, os autônomos,os empregados domésticos e o agregado Outros,7

podemos dizer que, em 2000, as atividades infor-mais representam 47,0% das ocupações na RMS,contra 50,4% em setembro de 1999. Esse decrés-cimo deve-se, sobretudo, à redução da proporçãode ocupados exercendo trabalho autônomo, tantopara o setor público quanto para empresas. Essesdados mostram uma tendência de mudanças naestrutura do mercado ocupacional na RMS, sejapelo decréscimo da informalidade, seja pelo avan-ço do trabalho formal.

Ao analisar a composição da ocupação por graude instrução, verifica-se sensível melhora. O núme-ro de analfabetos e indivíduos com 1o Grau incom-pleto vem se reduzindo continuamente, mas aindarepresenta um significativo contingente (37,4%contra 42,5% em setembro de 1999). Como é sabi-do, o nível de escolaridade guarda estreita relaçãocom os níveis de rendimento, estes últimos sendoaumentados conforme o tempo de estudo do indiví-duo. Um analfabeto ganha cerca de nove vezesmenos (195 reais) que um indivíduo com nível su-perior (1.697 reais), mantendo-se quase a mesmarelação daquela existente em setembro de 1999.Já um indivíduo com 2o Grau completo ou 3o incom-pleto percebe, em média, 619 reais, corresponden-do a 36,5% do rendimento de nível superior.

Em suma, pode-se observar que as característi-cas dos ocupados na RMS vêm se alterando, am-pliando-se a participação dos indivíduos em faixaetária mais elevada, com maior responsabilidadepara o orçamento familiar. O número de analfabe-

5alebaToãçapucoanoãçisopodnuges,oãçapucOadaruturtsE

00/teS-79teS–rodavlaSedanatiloporteMoãigeR

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89/teS 0,85 9,03 0,11 1,61 2,91 5,4 1,4 2,01 0,4

99/teS 9,65 9,03 4,11 6,41 6,91 1,5 0,4 5,01 8,3

00/teS 8,06 3,33 1,21 3,51 9,71 5,3 4,4 3,01 2,3

EDAES/ESEEID/ABFU/SARTES/IES-SMRDEP:etnoF.serailimafsoicógenedsonodeserodahlabarTmeulcnI)1(

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120 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.115-121 Dezembro 2000

tos e indivíduos com o 1o Grau incompleto vem sereduzindo continuamente, mas ainda representaum significativo contingente (37,4% contra 42,5%em setembro de 1999). Paralelamente, o númerode ocupados com 2o e 3o Graus completos vemcrescendo, uma conseqüência do aumento da es-colaridade da população, uma vez que esta, cadavez mais, busca um tipo de formação que lhe pos-sibilite uma inserção mais apropriada no mercadode trabalho e, também, da maior seletividade dosagentes empregadores na hora da contratação.

Quanto aos rendimentos, percebe-se que estesvêm tendo comportamento declinante, com seusníveis absolutos inferiores aos do início da pesqui-sa. Tanto para os ocupados quanto para os assala-riados os índices do rendimento real diminuemconsideravelmente no período. Os ocupados, quetinham em setembro de 1997 um rendimento8 mé-dio de 584 reais, em setembro de 2000 contavamcom um rendimento médio de apenas 538 reais, oque importa numa queda de 7,9% no nível dos ren-dimentos. Analisando-se apenas os assalariados,vê-se que percebiam um rendimento médio de 664reais e passaram a perceber apenas 585, resultan-do num decréscimo de 11,9%.

No entanto, os rendimentos vêm se recuperan-do, tanto para assalariados quanto para os ocupa-dos de um modo geral. Os ocupados tiveram umacréscimo de 6,3% nos rendimentos quando com-parados ao mesmo mês do ano anterior, enquantoos assalariados tiveram um crescimento mais mo-desto, de 1,4%.

Quando comparamos os rendimentos dos tra-balhadores do setor privado com carteira assinadaaos daqueles sem carteira, podemos chegar a da-dos conclusivos acerca do aumento das ocupa-ções no setor formal. Primeiro, os rendimentos dosassalariados com carteira assinada decresceram12,6% em razão do recuo dos salários de 629 para550 reais no período entre setembro de 1997 e se-tembro de 2000. Essa redução verificou-se sobre-tudo na Indústria e no Comércio, com quedas de11,5% e 8,6% respectivamente; nos Serviços, aqueda nos rendimentos também foi significativa, fi-cando em 8,2%. Em contrapartida, o rendimentodaqueles trabalhadores que não tinham carteiraassinada aumentou em 6,5%, ante a elevação dosrendimentos reais médios de 277 para 295 reais.

Diante da significativa queda nos rendimentos re-ais dos assalariados com carteira assinada, era deesperar-se que houvesse aumentos na oferta des-ses postos de trabalho, sendo muito mais fácil parao empregador assumir os encargos de um emprega-do com salários deprimidos. É possível que esta “fa-cilidade” possibilitada pelo recuo dos salários sejaresponsável pelo significativo aumento da formalida-de no mercado de trabalho soteropolitano, tendo emvista que vem crescendo num período relativamentelongo, inclusive nas recessões.

Considerações finais

Durante a década de noventa, diversos fatoresinternos e externos contribuíram para um fraco de-sempenho do mercado de trabalho no Brasil. Aabertura comercial e a valorização do Real frenteao Dólar, além das elevadas taxas de juros, impu-seram ao País um péssimo desempenho econômi-co, sobretudo entre os anos de 1997 e 1999.

Nesse período, as taxas de desemprego cres-ceram atingindo níveis alarmantes em todas as re-giões metropolitanas. Salvador não passou ilesapor esse processo, uma vez que muitos trabalha-dores caíram no desemprego, as relações de tra-balho tornaram-se mais precárias e as atividadesinformais serviram como escapatória para muitosdesempregados.

Com a tímida retomada do crescimento ocorridaneste ano, as expectativas dos trabalhadoresquanto ao mercado de trabalho renovaram-se. Aqueda da taxa de desemprego é contínua desde omês de fevereiro e os índices dos níveis de ocupa-ção evidenciam recuperação da ocupação em to-dos os setores, exceto na Indústria.

A série de dados da pesquisa nos mostra outrospontos importantes além dos já mencionados. Pri-meiro, há uma significativa melhoria do nível de es-colaridade dos ocupados da RMS, o que melhoraas condições de empregabilidade em face das exi-gências do mercado de trabalho. Segundo, verifi-ca-se uma redução do número de ocupados na fai-xa etária de 10 a 17 anos, sugerindo umadiminuição do trabalho infantil e dos adolescentesem busca de ocupações que complementem a ren-da familiar. A queda na taxa de participação (de21,4% para 17,5%) dessa mesma faixa etária cor-

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.115-121 Dezembro 2000 121

robora essa afirmativa. E, em terceiro, há sinais dequeda da informalidade na RMS, evidenciada pelaredução do número de autônomos, uma vez queas outras categorias que podemos classificar deinformais permaneceram praticamente constan-tes. Além disso, observa-se expressivo cresci-mento dos assalariados com carteira de trabalhoassinada, mostrando que os empregos formaisestão se recuperando simultaneamente ao cresci-mento econômico.

Por outro lado, naqueles setores que ficarammais expostos à absorção de novas tecnologias eaos novos métodos de gestão houve uma “queima”líquida de postos de trabalho (principalmente a In-dústria) acompanhada pela transferência, via tercei-rização, de trabalhadores para o agregado Serviços.O fato de 67,7% das ocupações geradas no perío-do em análise estarem ligadas ao agregado Servi-ços e de que boa parte delas trata-se de trabalhosintermitentes, de baixa qualidade e reduzida remu-neração, de que estão ausentes os mecanismos deproteção social, nos leva a acreditar que nestas ati-vidades encontra-se “disfarçada” boa parte da taxade desemprego total.

Constata-se, também, uma redução generaliza-da nos rendimentos reais dos ocupados e assalaria-dos em todos os setores de atividade. Na Indústria,onde os postos de trabalho são, em sua maioria,pautados pela formalidade, foi onde houve maiorqueda dos rendimentos reais.

Ainda que os aspectos positivos da conjunturaatual tenham contribuído para a melhoria dos índi-ces de ocupação e redução na taxa de desempre-go, a retomada do crescimento, por si só, não ésuficiente para recuperar as expectativas dos tra-balhadores em relação ao emprego. A redução dosrendimentos reais e a qualidade dos postos de tra-balho9 gerados nos últimos anos apenas reforça-ram o argumento da precarização do mercado detrabalho.

Referências bibliográficas

BRANCO, Pedro P. M. Para enfrentar o desemprego. RevistaSão Paulo em Perspectiva. Vol. 9, n. 4, out/dez. 1995.

DEDECCA, Cláudio S., RODRIGUES M., FERREIRA, SinézioP. Ferreira. Revista São Paulo em Perspectiva. Vol. 4, n. ¾,jul/dez. 1990.

FERREIRA, S. P., DEDECCA, C. S. Crescimento econômico epopulação economicamente ativa. Revista São Paulo emPerspectiva. Vol. 2/3. jul-set. 1988.

Notas

1 Ver BRANCO, Pedro P. M. Para enfrentar o desemprego. Re-vista São Paulo em Perspectiva. Vol. 9, n. 4, out/dez. 1995.

2 DEDECCA, Cláudio S., RODRIGUES M., FERREIRA, SinézioP. Ferreira. O mercado de trabalho nos centros urbanos. Revis-ta São Paulo em Perspectiva. Vol. 4, n. ¾, jul/dez. 1990.

3 Pode-se afirmar que o crescimento da PEA resulta de doiscomponentes básicos: as taxas pretérita e futura de cresci-mento da população total e a variação da taxa de participa-ção. Quanto à taxa pretérita de crescimento da população,esta manteve-se elevada durante as décadas de 70 e 80, re-sultando numa taxa potencial de crescimento para a PEA e aPIA na década atual (FERREIRA, S. P., DEDECCA, C. S.Crescimento Econômico e População Economicamente Ati-va. Revista São Paulo em Perspectiva. vol. 2/3. jul-set. 1988.

4 O desemprego aberto engloba todas as pessoas de 10 anose mais de idade que não têm trabalho e que efetivamenteprocuraram emprego ou negócio nos últimos 30 dias anterio-res à pesquisa.

5 O desemprego oculto é subdividido em duas categorias: portrabalho precário, que engloba as pessoas de 10 anos emais de idade que, simultaneamente à procura de trabalho,realizam atividades remuneradas, descontínuas e irregula-res, ou não-remuneradas, de ajuda em negócios de paren-tes; e por desalento, que engloba aquelas pessoas comdisposição e disponibilidade para trabalhar, mas que nãoprocuraram trabalho nos últimos 30 dias, dadas as circuns-tâncias do mercado de trabalho ou por circunstâncias fortui-tas, mas o fizeram nos últimos 30 dias.

6 De acordo com dados da Fundação SEADE e do DIEESE,isso acontece em todas as regiões metropolitanas de atua-ção da Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED).

7 Incluem Trabalhadores Familiares e Donos de Negócios Fa-miliares.

8 Valores em Reais (R$) de Agosto de 2000.

9 Ver SANTOS, Luís Chateaubriand, “Novos postos de ocupa-ção na RMS”, nesta mesma publicação.

*Edson A. S. Sobrinho é economista da SEIe-mail: [email protected]

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122 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.122-126 Dezembro 2000

Aumentam os desafios da

educação na Bahia

Marlene Hurst*

Osistema de Educação na Bahia vem re-gistrando, a partir da década de 90, umagrande expansão, com o aumento signifi-

cativo do acesso de crianças e jovens à educação,conforme atestam os dados levantados pela Pes-quisa Nacional de Amostra Domiciliar (PNAD), aocontabilizar uma efetiva redução da taxa de analfa-betismo, especialmente nas faixas etárias entre 10e 24 anos.

De acordo com o Censo Escolar, a Bahia possuiatualmente 4,7 milhões de alunos matriculados naescola, incluindo todos os níveis e modalidades deensino, exceto o superior. A rede estadual respon-de por 34% das matrículas do ensino fundamentale por 77,6% do ensino médio. A rede municipal,estimulada pelo Fundo de Manutenção e Desen-volvimento do Ensino Fundamental (Fundef), im-

plementado há três anos, aumentou o número devagas e atualmente responde por 60,9% do ensinofundamental e 12,0% do ensino médio.

Entre 1996-2000, o número de matrículas noensino fundamental passou de 2,9 milhões para

3,7 milhões, sendo ocrescimento de 16,6%no segmento de 1ª a 4ªséries e de 56,4% nosegmento de 5ª a 8ªséries conforme reve-lam os dados da Tabe-la 2, apresentada aseguir.

Neste ano o CensoEscolar registrou umavariação negativa, emrelação ao ano anteri-or, da matrícula do en-sino fundamental, de

1alebaTairáteaxiafropomsitebaflanaedaxaT

)%(99-0991,aihaB

airátEaxiaF 0991 6991 7991 8991 9991

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sona41a01 8,03 5,31 3,41 3,31 8,9

sona42a51 6,02 1,11 3,11 1,01 0,9

sonA91e81 079.22 7,37 0,0 2,51 0,0

sona94a52 9,92 4,12 3,32 1,32 8,12

siamesona05 3,75 5,94 0,45 3,94 5,15

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5991 270.778.2 0,3 916.730.2 3,1 354.938 6,7

6991 049.788.2 4,0 443.999.1 9,1- 695.888 9,5

7991 108.670.3 5,6 475.601.2 4,5 722.079 2,9

8991 644.355.3 5,51 011.904.2 4,41 633.441.1 9,71

9991 727.207.3 2,4 581.034.2 9,0 245.272.1 2,11

0002 329.027.3 5,0 641.133.2 1,4- 777.983.1 2,9

.serCedaxaT)%(00/49 3,33 9,51 1,87

DANP/EGBI:etnoF

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.122-126 Dezembro 2000 123

4,1% nas quatro séries iniciais, e uma variação po-sitiva de 9,2% nas quatro séries finais, apesar de oEstado ainda apresentar uma grande concentraçãode alunos, cerca de 39,2% em relação ao total dematrículas, no ensino fundamental. Espera-se,para os próximos anos, que as matrículas nas qua-tro primeiras séries iniciais continuem a reduzir-se,por conta da elevação dos índices de aprovaçãodos alunos e de uma redução dos índices dedistorção idade-série. De fato, esse foi um resulta-do bastante almejado, que se ajus-ta à tendência nacional e queindica uma melhoria da eficiênciado sistema educacional do Estado.

Vale salientar a queda de27,7% do número de matrículas narede particular de ensino, registra-da nos últimos quatro anos. Estefato é atribuído sobretudo à redu-ção da renda familiar, ocorridaapós o Plano Real, e aos altos índi-ces de evasão escolar e inadim-plência, que atinge de 20% a 30%do total de alunos dos maiores co-légios (Gazeta Mercantil, 27/07/2000). Por outro lado, a conces-são do direito do aluno de assistir aula, mesmosem pagar, e a obrigatoriedade da liberação datransferência por parte das escolas contribuem,na opinião de alguns dirigentes da rede particularde ensino, para o aumento da inadimplência epara tornar essa atividade menos rentável (Gaze-ta Mercantil, 27/07/2000).

O Censo Escolar 2000 validou as projeções deevolução da matrícula no ensino médio, que se ex-pandiu vertiginosamente nos últimos anos. Entre1996 e 2000 o número de alunos matriculados pas-

sou de 319,0 mil para 585,7 mil, correspondendo aum crescimento de 83,6%. Apenas no último ano, aexpansão foi de 16,1%. Em algumas cidades doestado, a exemplo de Lauro de Freitas, o cresci-mento das matrículas do ensino médio nos últimosquatro anos chegou a 207%. Em Camaçari, nessemesmo período, a expansão foi de 79,2%; emSimões Filho de 111,0% e, em Itabuna, de 58,4%.

Atribui-se a expansão do ensino médio ao au-mento do número de jovens concluindo o ensino

fundamental, à desconcentraçãorelativa das atividades econômi-cas no estado – beneficiando al-guns municípios fora do eixometropolitano – e à exigência demão-de-obra mais qualificada, vol-tada para um mercado de trabalhocada vez mais competitivo.

Os investimentos industriais pre-vistos para a Bahia no próximo qua-driênio somam aproximadamenteR$ 10,7 bilhões e deverão ser distri-buídos entre 60 municípios. O EixoMetropolitano será responsável porquase metade desses investimen-tos, o equivalente a R$ 5,3 bilhões,

com destaque para os municípios de Camaçari eSimões Filho (Uderman, 2000). A Secretaria da Edu-cação tem procurado ampliar a oferta de vagas parao ensino médio nos municípios com maior dinamismoeconômico, objetivando, com isso, uma maior qualifi-cação da mão-de obra local. Em Camaçari e SimõesFilho, por exemplo, o crescimento das matrículas narede estadual em 2000, em relação a 1999, foi de52,9% e 47,5% respectivamente.

A expectativa de crescimento do mercado detrabalho justifica, em parte, a maior procura peloturno noturno de ensino, que corresponde a cercade 46,6% das vagas do ensino médio. Somente arede estadual concentra 50% das vagas do ensinomédio noturno. A redução do contingente de alu-nos no ensino fundamental, resultado dos progra-mas de correção do fluxo escolar, deverá pressio-nar ainda mais a demanda por matrículas noensino médio, nos próximos anos.

A política educacional implantada, cujo objetivoé a expansão da oferta de vagas e a melhoria qua-litativa do ensino, tem surtido os resultados deseja-

Atribui-se a expansão doensino médio ao aumento

do número de jovensconcluindo o ensino

fundamental, àdesconcentração relativa

das atividadeseconômicas no estado

e à exigência demão-de-obra mais

qualificada, voltadapara um mercado de

trabalho cada vezmais competitivo.

Gráfico 1 – Matrícula inicial do ensino médioBahia, 1994-2000*

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dos. O número de docentes com formação superiorlecionando no ensino médio passou de 61,2%, em1996, para 69,4% em 2000. Já no ensino funda-mental de 1ª a 4ª série o número de professorescom grau de formação equivalente ao ensino mé-dio passou, nesse mesmo período, de 74,1% para83,3%. No caso do ensino de 5ª a 8ª série esse nú-mero passou de 55,9% para 58,2%.

Analisando-se os dados do Censo Escolar entre1994-2000, verifica-se que, em apenas quatro anos,a taxa de atendimento escolar passou de 89,2%para 96,1% – um crescimento de 7,0 pontos percen-tuais para a faixa etária de 7 a 14 anos, resultado dapolítica de expansão da oferta de vagas especial-mente na rede estadual de ensino. A redução dataxa de crescimento populacional também contri-buiu para a boa performance dessa taxa no estado.

Outra boa notícia extraída do Censo Escolar dizrespeito às taxas de escolarização bruta e líquidaque têm sido crescentes, tanto do ensino funda-mental como do ensino médio, como pode ser vistona Tabela 3, a seguir apresentada.

Não obstante os avanços alcançados, a Bahiaexibe ainda um sistema de ensino caracterizadopelas altas taxas de distorção idade/série, ou seja,o número de estudantes com mais de 15 anos cur-sando o ensino fundamental quando deveriam es-tar no ensino médio chega a aproximadamente1.428,7 mil alunos, equivalendo a uma distorçãoidade-série da ordem de 38,4% (Tabela 4).

Os dados apresentados na Tabela 5 revelam quea distorção idade-série no ensino médio é ainda maior,correspondendo a 71,4% para o total do estado. Issosignifica que 341,5 mil alunos com mais de 18 anosestão cursando o ensino médio, quando já deveriamestar fora do sistema ou no ensino superior.

Encontram-se bastante elevadas as taxas de re-provação e abandono escolar que, somadas, che-gam a 30,5% para o ensino fundamental e 29,2%para o médio. A taxa de aprovação escolar, por suavez, que em 1998 era de 71,1% para o ensino fun-damental, reduziu-se para 69,5%, em 1999. No en-sino médio esse índice caiu, no mesmo período, de76,0% para 70,0%. Os índices de repetência, se-gundo o Censo Escolar 2000, também continuamaltos.

No ensino fundamental, os repetentes corres-pondem a 16,1% dos alunos matriculados. No ensi-no médio a situação é um pouco melhor, com 7,9%de repetentes.

3alebaToãçaziralocseedsaxaT

*0002-8991,aihaB)%(mE

aturB adiuqíL

8991 9991 0002 8991 9991 0002

latnemadnuF 4,161 9,451 8,951 9,19 3,39 4,39

oidéM 2,54 3,35 2,26 3,21 2,41 5,51

PENI/CEM,CES:etnoFseranimilerPsodaD*

4alebaTeiréseedadiroplatnemadnuFonisnEonlaicinialucírtaM

onisneedsedersasadoT–*0002,aihaB

eiréS edsoneMsona7

sona7 sona8 sona9 sona01 sona11 sona21 sona31 sona4191a51sona

edsiaMsona91

latoT

eirésª1 535.47 953.081 354.531 025.37 374.74 107.23 973.32 142.71 656.41 759.55 651.69 034.157

eirésª2 870.2 846.92 967.211 004.211 445.08 183.16 527.54 679.33 489.42 447.25 182.23 035.885

eirésª3 891.1 774.41 374.27 743.78 967.57 054.46 375.25 171.24 262.501 310.76 337.285

eirésª4 567 564.7 838.84 377.86 826.26 463.55 686.54 110.19 329.72 354.804

eirésª5 864 612.6 304.44 935.26 780.26 241.06 957.491 333.09 749.025

eirésª6 824 263.5 653.63 104.15 116.74 071.341 465.43 298.813

eirésª7 945 927.4 387.23 060.44 466.081 722.38 210.643

eirésª8 173 136.3 723.62 400.731 395.63 629.302

latoT 316.67 502.112 464.362 623.662 648.072 839.882 771.003 650.903 736.503 175.069 090.864 329.027.3

PENI/CEM,CES:etnoFseranimilerPsodaD*

adauqedaedadimesonulA

eirés-edadimegasafededonamumocsonulA

eirés-edadimegasafededsiamesonasiodmocsonulA

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.122-126 Dezembro 2000 125

Segundo o Secretario da Educação, EraldoTinoco, a taxa de cobertura, sobretudo no ensinofundamental, já atingiu um patamar aceitável – o de-safio agora é a melhoria dos indicadores de movi-mento e rendimento escolar e de qualidade doensino. Espera-se, dessa forma, recolocar o ensinopúblico no padrão de qualidade existente em déca-das passadas, de forma a diminuir as diferenças de

5alebaTeiréseedadiropoidéMonisnEonlaicinialucírtaM

sedersasadoT–*0002,aihaB

eiréS edsoneMsona51

sona51 sona61 sona71 sona81 sona9191edsiaMsona

latoT

eiréSª1 523.3 889.12 800.23 577.23 165.33 154.92 383.99 194.252

eiréSª2 352 259.1 104.51 960.42 134.42 164.22 489.47 155.361

eiréSª3 604 428.1 464.31 641.02 484.91 967.17 311.721

eiréSª4 3 62 402 942 185 360.1

latoT 875.3 643.42 632.94 433.07 243.87 546.17 717.642 812.445

PENI/CEM,CES:etnoFseranimilerPsodaD*

adauqedaedadimesonulA

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7alebaTavitartsinimdAaicnêdnepeDrop)1(setnetepeRedoremúN

*0002,aihaB

aicnêdnepeDavitartsinimdA

latnemadnuFonisnE oidéMonisnE

alucírtaM setnetepeR )%( alucírtaM setnetepeR )%(

laredeF 496 36 1,9 414.6 525 2,8

laudatsE 636.152.1 332.291 4,51 092.054 773.83 5,8

lapicinuM 950.182.2 806.793 4,71 856.67 493.5 0,7

ralucitraP 805.481 632.6 4,3 552.05 145.1 1,3

latoT 798.717.3 041.695 0,61 716.385 738.54 9,7

PENI/CEM,CES:etnoFseranimilerPsodaD*

oportunidades educacio-nais hoje existentes.

Tendo em vista essanecessidade e com ointuito de corrigir asdeficiências do siste-ma educacional foi im-plementado o progra-ma Educar para Vencer,que reúne seis proje-tos educacionais, quaissejam: Correção doFluxo Escolar, de 1a a4a série e de 5a a 8a sé-rie; Fortalecimento daGestão Escolar; Forta-lecimento da GestãoMunicipal; Certificaçãode Profissionais deEducação e AvaliaçãoExterna do Ensino.

O Educar para Ven-cer foi implementadoem 1999, inicialmenteem 45 municípios doEstado, abrangendoa p r o x i m a d a m e n t e61.000 alunos e 3.700professores, que fo-ram capacitados paraesse programa. Para oestabelecimento doscritérios de escolhadesse primeiro conjun-to levaram-se em con-sideração a proximida-de geográfica e anecessidade de aten-der aos Projetos FazCidadão e Cidades Lí-

deres, do Governo do Estado. Até 2003 deverãoser atendidos os 417 municípios do Estado, com61.600 classes, beneficiando 1.848.000 alunos.

Os dois primeiros projetos de correção do fluxoescolar têm por objetivo adequar o aluno à sériecompatível com a sua idade. Estima-se uma corre-ção de 60% do fluxo escolar e um aumento signifi-cativo do número de vagas oferecidas.

6alebaTonodnabAeoãçavorpeR,oãçavorpAedaxaT

*0002-5991,aihaB

onAlatnemadnuFonisnE oidéMonisnE

oãçavorpA oãçavorpeR **onodnabA oãçavorpA oãçavorpeR **onodnabA

5991 7,85 9,71 4,32 3,16 7,01 0,82

6991 3,36 5,61 2,02 1,27 0,01 8,71

7991 0,86 2,41 7,71 4,37 1,7 6,91

8991 1,17 0,21 9,61 0,67 9,5 1,81

9991 5,96 2,41 3,61 7,07 0,8 2,12

PENI/CEM,CES:etnoFseranimilerPsodaD*

oãçavorpaedaxat-001=onodnabAedaxaT**

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126 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.122-126 Dezembro 2000

Os projetos de gestão escolar e de certificaçãode profissionais da educação visam a uma maiorautonomia e profissionalização dos dirigentes dasunidades escolares e à capacitação e qualificaçãodo corpo docente dessas escolas. Para isso já foirealizado um concurso interno envolvendo 4.606dirigentes. Desses, 2.208 foram aprovados e sub-metidos a um curso de qualificação, objetivandouma maior eficiência administrativa e financeiradas unidades escolares.

O projeto de gestão municipal, por sua vez, des-tina-se à mobilização e instrumentalização das co-munidades locais para a definição de prioridades,acompanhamento e controle dos projetos.

Por fim, o projeto de avaliação externa estádirecionado para a melhoria da qualidade do ensinooferecido e deverá avaliar regularmente o desem-penho do corpo discente. A avaliação do rendimen-to escolar, realizada recentemente pela Secretariada Educação, envolveu 1.658 escolas e 254.000mil alunos de 4a e 8a séries do ensino fundamentaldas redes estadual e municipal. O objetivo é de-senvolver ações de correção e melhoria do ensinodepois da divulgação dos resultados previstos parafevereiro de 2001.

Referências bibliográficas

GAZETA MERCANTIL. Desafios da educação na Bahia. 27. 09.2000, p.2

__________________. Rede Privada sofre com evasão eInadimplência, 27.09.2000, p.4

UDERMAN, Simone. Perspectivas Industriais. In: Tendências daeconomia baiana. Salvador, 2000. p. 93-176 (Série EstudosEstratégicos).

Notas

1 A Taxa de Atendimento identifica o percentual da populaçãoem idade escolar frequentando a escola. Define-se a faixaetária de 7 a 14 anos para que essa população frequente oensino fundamental, e de 15 a 17 para o ensino médio.

* Marlene Hurst é coordenadora de Avaliação e Informa-ções Educacionais da Secretaria de Educação.

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128 BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.128-136 Dezembro 2000

Agradeço ao amigo – e mestre – ProfessorFernando de Azevedo o privilégio de vosfalar, ao encerrar-se êste seminário de

educação, com o qual se inauguraram, em 1957,as atividades do Centro Regional de PesquisasEducacionais de São Paulo, confiado, afortunada-mente, à sua alta e sábia direção.

Êste Centro, como os seus congêneres, o Bra-sileiro e os demais centros regionais, representamelos no esfôrço continuado com que o Brasil temprocurado acompanhar o desenvolvimento da artede educar – a educação – nos últimos cinqüentaanos, desenvolvimento que se caracteriza por umarevisão de conceitos e de técnicas de estudo, àmaneira, dir-se-ia, da transformação operada naarte de curar – a medicina – quando se emancipouda tradição, do acidente, da simples “intuição” e doempirismo e se fêz, como ainda se vem fazendo,cada vez mais científica.

Todos sabemos que isto se deu com a medici-na, devido aos progressos dos métodos de investi-gação e de prova. O desenvolvimento das ciênciasque lhe iam servir de base e das técnicas científi-cas de que iria cada vez mais utilizar-se e mesmoapropriar-se, levaram a medicina a um progresso

crescente, com a aplicação cada vez mais consci-ente de métodos próprios de investigação e deprova. São dêsse tipo – claro que sob os influxosdos progressos mais recentes ainda de outras ci-ências – os desenvolvimentos que desejamos sus-citar na educação, com o cultivo, nos centros depesquisas, que se estão fundando no Brasil, den-tre os quais êste de São Paulo é o mais expressi-vo, de métodos próprios de investigação e provano campo educacional.

Como a medicina, a educação é uma arte. Earte é algo de muito mais complexo e de muitomais completo que uma ciência. Convém, portanto,deixar quanto possível claro de que modo as artesse podem fazer científicas.

Arte consiste em modos de fazer. Modos de fa-zer implicam o conhecimento da matéria com quese está lidando, em métodos de operar com ela eem um estilo pessoal de exercer a atividade artísti-ca. Nas belas-artes, ao estilo pessoal chegamos aatribuir tamanha importância que, muitas vêzes,exagerando, consideramos que a personalidadeartística é tudo que é necessário e suficiente paraproduzir arte. Não é verdade. Mesmo nas belas-ar-tes, o domínio do conhecimento e o domínio das

Ciência e arte de educar(I)

Anísio Teixeira*

A Bahia Análise & Dados, no ano comemorativo do centenário de nascimento do professor AnísioTeixeira, não poderia se eximir de prestar uma homenagem a esse ilustre pensador brasileiro, que,

durante toda a sua atuação profissional, defendeu como ninguém o verdadeiro sentido da educaçãoe do educador em sua tarefa de “guiar a formação humana na espiral sem fim do seu indefinido

desenvolvimento”. O artigo que iremos apresentar foi resultado de uma palestra proferida por AnísioTeixeira, em 1957, durante a solenidade de inauguração do Centro Regional de Pesquisas

Educacionais de São Paulo. Com a intenção de definir atribuições para esse Centro,o professor discorre sobre as diversas possibilidades inscritas na arte de educar.

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BAHIA ANÁLISE & DADOS Salvador - BA SEI v.10 n.3 p.128-136 Dezembro 2000 129

técnicas, se por si não bastam, são, contudo, im-prescindíveis à obra artística.

A educação pode, com alguns raros expoentes,atingir o nível das belas-artes, mas, em sua gene-ralidade, quase sempre, não chega a essa perfei-ção, conservando-se no nível das artes mecânicasou práticas, entendidos os têrmos no sentido hu-mano e não no sentido de maquinal, restritivo ape-nas quanto a belo e estético.

O progresso nas artes - sejam belas ou mecâni-cas – se fará um progresso científico, na medidaem que os métodos de estudo e investigação paraêste progresso se inspirem naquelas mesmas re-gras que fizeram e hão de manter o progresso nocampo das ciências, ou sejam as regras, para usarexpressão que não mais se precisa definir, do “mé-todo científico”.

A passagem, no campo dos conhecimentos hu-manos, do empirismo para a ciência foi e é umamudança de métodos de estudo, graças à qualpassamos a observar e descobrir de modo que ou-tros possam repetir o que observarmos e desco-brirmos e, assim, confirmar os nossos achados,que se irão, de tal maneira, acumulando e levandoa novas buscas e novas descobertas. Se esta foi amudança que originou os corpos sistematizados deconhecimentos a que chamamos de ciências, umoutro movimento, paralelo ao das ciências e dêleconseqüente, mas, de certo modo autônomo, foi oda mudança das “práticas” humanas pela aplica-ção do conhecimento científico. Ao conhecimentoempírico correspondiam as práticas empíricas, aoconhecimento científico passaram a corresponderas práticas científicas. As práticas, com efeito, fun-dadas no que a ciência observou, descobriu e acu-mulou, e, por seu turno, obedecendo aos mesmosmétodos científicos, se transformaram em práticastecnológicas e, dêste modo renovadas, elas própri-as se constituíram em fonte de novos problemas,novas buscas e novos progressos.

Com o desenvolvimento das ciências físicas ematemáticas e depois das ciências biológicas, as ar-tes da engenharia e da medicina, obedecendo emsuas “práticas” às regras científicas da observação,da descoberta e da prova puderam frutificar nos es-pantosos progressos modernos. Algo de semelhanteé que se terá de introduzir na arte de educar, a fim dese lhe darem as condições de desenvolvimento inte-

ligente, controlado, contínuo , e sistemático, que ca-racterizam o progresso científico.

Não se trata, pois, de criar pròpriamente uma“ciência da educação”, que, no sentido restrito dotêrmo, como ciência autônoma, não existe nem po-derá existir; mas de dar condições científicas à ati-vidade educacional, nos seus três aspectos funda-mentais – de seleção de material para o currículo,de métodos de ensino e disciplina, e de organiza-ção e administração das escolas. Por outras pala-vras: trata-se de levar a educação para o campodas grandes artes já científicas – como a engenha-ria e a medicina – e de dar aos seus métodos, pro-cessos e materiais a segurança inteligente, a eficá-cia controlada e a capacidade de progresso jáasseguradas às suas predecessoras relativamentemenos complexas.

Está claro que essa inteligência da arte de edu-car a afasta radicalmente das artes predominante-mente formais, como a do direito, por exemplo, àqual, me parece, temos, como país, uma irresistívelinclinação a identificar a educação. Com efeito,embora não caiba aqui a análise aprofundada des-sa inclinação, os sinais são muito evidentes de queainda consideramos educar antes como uma artedominantemente formal, à maneira do direito*, doque como uma arte material, à maneira da medici-na, ou da engenharia.

Fora essa tendência distorciva, mais entranha-da quiçá do que o imaginamos e que importa evitar,a introdução de métodos científicos no estudo daeducação não irá determinar nada de imediata-mente revolucionário. As artes sempre progredi-ram. Mas, antes do método científico, progredirampor tradição, por acidente, pela pressão de certasinfluências e pelo poder “criador” dos artistas. Como método científico, vamos submeter as “tradições”ou as chamadas “escolas” ao crivo do estudo obje-tivo, os acidentes às investigações e verificaçõesconfirmadoras e o poder criador do artista às análi-ses reveladoras dos seus segredos, para a multipli-cação de suas descobertas; ou seja, vamosexaminar rotinas e variações progressivas, ordená-las, sistematizá-las e promover, deliberadamente, odesenvolvimento contínuo e cumulativo da arte deeducar.

Não se diga, entretanto, que tenha sido sempreêste o entendimento do que se vem chamando de

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ciência da educação, à qual já aludimos com as de-vidas reservas. Pelo contrário, o que assistimos nasprimeiras décadas dêste século e que só ùltima-mente se vem procurando corrigir foi a aplicaçãoprecipitada ao processo educativo de experiênciascientíficas que poderiam ter sido psicológicas, ousociológicas, mas não eram educacionais, nem ha-viam sido devidamente transformadas ou elabora-das para a aplicação educacional.

De outro lado, tomaram-se de empréstimo téc-nicas de medida e experiência das ciências físicase se pretendeu aplicá-las aos fenômenos psicológi-cos e mentais, julgando-se científicos os resultadosporque as técnicas – tomadas de empréstimo –eram científicas e podiam os tais resultados ser for-mulados quantitativamente.

Houve, assim, precipitação em aplicar diretamentena escola “conhecimentos” isolados de psicologia ousociologia e, além disto, precipitação em considerarêsses “conhecimentos” verdadeiros conhecimentos.

A realidade é que não há ciência enquanto nãohouver um corpo sistemático de conhecimentos,baseados em princípios e leis gerais, que lhesdêem coerência e eficácia. Aí estão as ciênciasmatemáticas e físicas com todo o seu lento evoluiraté que pudessem florescer nas grandes searasdas tecnologias, que correspondem à sua aplica-ção às práticas humanas. Logo após vem o aindamais lento progresso das ciências biológicas e aagronomia, a veterinária e a medicina como cam-pos de aplicação tecnológica.

Para que as “práticas” educativas possam tam-bém beneficiar-se de progresso semelhante, serápreciso antes de tudo que as ciências que lhes irãoservir de fontes se desenvolvam e ganhem a matu-ridade das grandes ciências já organizadas. Até aíhá que aceitar não só que o progresso seja lento,mas que seja algo incerto e, sobretudo, não susce-tível de generalização. Mas antes progredir, assim,tateando, sentindo os problemas em tôda a suacomplexidade, mantendo em suspenso os julga-mentos, do que julgar que podemos simplificar a si-tuação, considerá-la puramente física ou biológicae aplicar métodos e técnicas aceitáveis para taiscampos, mas inadequados para o campo educativo,pela sua amplitude e complexidade.

Convém, realmente, insistir na distinção entre ocampo da ciência e do conhecimento em si e o

campo da aplicação do conhecimento e da práticaou da arte. Bastaria, talvez, dizer que a ciência éabstrata, isto é, que busca conhecer o seu objetonum sistema tão amplo de relações, que o conheci-mento científico, como tal, desborda de qualquersistema particular, para se integrar num sistematão geral, que nêle só contam as relações dos co-nhecimentos entre si; e que a “prática” é um sistemaconcreto e limitado, em que aquêles conhecimen-tos se aplicam com as modificações, alterações etransformações necessárias à sua adaptação à si-tuação. Por isto mesmo, não produz a ciência, nãoproduz o conhecimento científico, por si mesmo,uma regra de arte, ou seja, uma regra de prática.

Leis e fatos, que são os produtos das ciências,ministram ao prático não pròpriamente regras deoperação, mas, recursos intelectuais para melhorobservar e melhor guiar a sua ação no campo maisvasto, mais complexo, com maior número de variá-veis da sua indústria ou da sua arte. A velha ex-pressão: na prática é diferente, é um modo simplesde indicar essa verdade essencial de que a ciênciaé um recurso indireto, é um intermediário e nuncauma regra direta de ação e de arte. A ciência é umacondição – e mesmo uma condição básica – para adescoberta tecnológica ou artística, mas não é, ouainda não é essa descoberta. Quando se trata detecnologia das ciências físicas, o processo práticonão chega à exatidão do processo de laboratório,mas, pode chegar a graus apreciáveis de precisão.Mas, se a tecnologia é a de um processo de educa-ção, podemos bem imaginar quanto as condiçõesde laboratório são realmente impossíveis de trans-plantação para a situação infinitamente mais com-plexa da atividade educativa.

Não quer isto dizer que a ciência seja inútil, masque a sua aplicação exige cuidados e atençõestodo especiais, valendo o conhecimento científicocomo um ingrediente a ser levado em conta, semperder, porém, de vista todos os demais fatôres.

Em educação muita coisa se fêz em oposição aêsse princípio tão óbvio, com a aplicação precipita-da de conhecimentos científicos ou supostamentecientíficos diretamente como regras de práticaeducativa e a transplantação de técnicas quantitati-vas das ciências físicas para os processos mentais,quando não educativos, importando tudo isto emcerto descrédito da própria ciência.

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Para tal situação concorreu, sem dúvida, ofato de nem sempre haverem sido as “práticaseducativas” as fornecedoras dos “dados” do pro-blema, como deverá ser, se tivermos de contarcom a ciência para nos ajudar a progredir na artede educar. E em segundo lugar, concorre certaimpaciência de resultados positivos que afligetanto – nelas! – as ciências jovens que servem defonte e base a uma possível arte de educar me-nos empírica e mais científica.

Com efeito, tais ciências não nos irão dar regrasde arte, mas conhecimentos intelectuais para revere reconstruir, com mais inteligência e maior segu-rança, as nossas atuais regras de arte, criar, sepossível, outras e progredir em nossas práticaseducacionais, isto é, nas práticas mais complexasdo, mais complexa arte humana.

Tudo, na realidade, entra nessa prática. A nossafilosofia, concebida como o conjunto de valores easpirações, as ciências biológicas, psicológicas esociais, tôdas as demais ciências como conteúdodo ensino, enfim, a cultura, a civilização e o pensa-mento humano em seus métodos e em seus resul-tados. Prática desta natureza e desta amplitudenão vai buscar as suas regras em nenhuma ciênciaisolada, seja mesmo a psicologia, a antropologiaou a sociologia; mas em todo o saber humano e,por isto mesmo, será sempre uma arte em quetôdas as aplicações técnicas terão de ser transfor-madas, imaginativa e criadoramente, em algo deplástico e sensível suscetível de ser consideradoantes sabedoria do que saber – opostos taistêrmos um ao outro no sentido de que sabedoria é,antes de tudo, a subordinação do saber aointerêsse humano e não ao próprio interêsse dosaber pelo saber (ciência) e muito menos ainterêsses apenas parciais ou de certos grupos hu-manos.

Mas tôda essa dificuldade não é para que o edu-cador se entregue à rotina, ao acidente ou ao capri-cho, mas, muito pelo contrário, busque cooperar natransição da educação do seu atual empirismo paraum estado progressivamente científico.

Dois problemas diversos avultam nessa transi-ção. Primeiro, é o do desenvolvimento das ciênci-as-fonte da educação. Assim como as ciênciasmatemáticas e físicas são as ciências-fonte princi-pais da engenharia, assim como as ciências bioló-

gicas são as ciências-fonte principais da medicina,assim a psicologia, a antropologia e a sociologiasão as ciências-fonte principais da educação.

Enquanto estas últimas não se desenvolverematé um mais alto grau de maturidade e segurança,não poderão dar à educação os elementos intelec-tuais necessários para a elaboração de técnicas eprocessos que possam constituir o conteúdo deuma possível “ciência de educação”. E êste é o se-gundo problema. Porque, ainda que as ciências-fonte quanto à educação estivessem completa-mente desenvolvidas, nem por isto teríamosautomàticamente a educação renovada cientìfica-mente, pois, conforme vimos, nenhuma conclusãocientífica é diretamente transformável em regraoperatória no processo de educação. Todo um ou-tro trabalho tem de ser feito para que os fatos, prin-cípios e leis descobertos pela ciência possam seraplicados na prática educacional.

Na própria medicina, com efeito, atrevo-me aafirmar, os princípios e leis da ciência servem paraguiar e iluminar a observação, o diagnóstico e a tera-pêutica, não se impondo rìgidamente como regras àarte médica, regras de clínica, regras imperativasda arte de curar.

A ciência oferece, assim, a possibilidade de umprimeiro desenvolvimento tecnológico, fornecendoà arte melhores recursos para a investigação dosseus próprios problemas e, dêste modo, sua me-lhor solução. Num segundo desenvolvimento tam-bém tecnológico, oferece recursos novos para otratamento e a cura, mas, a arte clínica continuasendo uma arte de certo modo autônoma, a seraprendida à parte, envolvendo métodos própriosde investigação e análise, de registro dos casos, decomparações e analogias, de experiência e tirocí-nio, em que, além de um conteúdo próprio maisamplo do que os puros fatos centíficos, sobressa-em sempre o estilo pessoal do médico, a sua origi-nalidade e o seu poder criador. A ciência, aliás,longe de mecanizar o artista ou o profissional, armaa sua imaginação com os instrumentos e recursosnecessários para seus maiores vôos e audácias.

Ora, o mesmo é o que há de ocorrer no domínioda educação – da arte de educar. Neste, o campoprecípuo ou específico – “atelier”, laboratório ou ofi-cina - é a sala de classe, onde oficiam os mestres,êles próprios também investigadores, desde o jar-

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dim de infância até a universidade. São as escolaso campo de ação dos educadores, como o dos mé-dicos são os hospitais e as clínicas.

Os especialistas de ciências autônomas sãograndes contribuintes para a chamada ciência mé-dica, como serão para a que vier a se chamar deciência da educação, mas nenhum resultado cientí-fico, isto é, o conhecimento de cada ciência, mes-mo ciência básica ou ciência fonte, é por si umconhecimento educacional ou médico, nem darádiretamente uma regra de ação médica ou educaci-onal. Tais conhecimentos ajudarão o médico ou oeducador a observar melhor, a diagnosticar melhore, assim, a elaborar uma melhor arte de curar ouuma melhor arte de educar.

Tomemos uma ilustração qualquer. Sejam, porexemplo, os testes de inteligência, que se constituí-ram, por certo, um dos mais destacados recursosnovos da “ciência” para a técnica escolar. Para queservem êles? – Para diagnosticar com maior segu-rança limites da capacidade de aprender do aluno.Se o tomarmos apenas para isto, aumentaremossem dúvida os nossos recursos de observação e co-nhecimento do aluno e melhor poderemos lidar comas situações de aprendizagem, sem perder de vistaas demais condições e fatôres de tais situações.

Se, porém, ao contrário, tomarmos êsse recursoparcial de diagnóstico mental como uma regraeducativa e quisermos homogeneizar rìgidamenteos grupos de Q. I. idêntico ou aproximado e proce-der uniformemente com todos os seus componen-tes, não estaremos obedecendo à complexidadetotal da situação prática educativa e muito menos anenhuma “ciência de educação”, pois esta não re-conheceria tal classificação como válida, reconhe-cendo hoje que a situação é totalmente empírica,incluindo fatôres entre os quais o Q. I. é apenas umno complexo da situação “aluno-professor-grupo-meio” em que se encontra o aprendiz.

Nem por isto será, entretanto, inútil o conheci-mento do Q. I., pois a alteração da capacidade deaprender do aluno passa, em face dos dados do Q. I.,a ser vista e estudada sob outra luz.

A ciência, assim, como já afirmamos, não ofere-ce senão um dado básico e jamais a regra final deoperação. Esta há que ser descoberta no complexoda situação de prática educativa, em que se encon-trem professor e aluno, levando-se em conta todos

os conhecimentos científicos existentes, mas, agin-do-se autônomamente à luz dos resultados educa-tivos pròpriamente ditos, isto é, de formação eprogresso humano do indivíduo, a que visam tantoaquêles conhecimentos quanto êstes resultados.

Nesta fase é que vimos entrando ùltimamente.Há um real amadurecimento entre as ciências es-peciais, fontes da educação, superados os entusi-asmos das primeiras descobertas. Com relaçãoaos testes de inteligência, até o nome vem sendohoje evitado, preferindo-se o nome de testes deaptidões diferenciais, pois já se reconhece queestamos longe de medir o famoso g ou fator geral,mas medimos apenas uma série de aptidões decor-rentes da cultura em que se acha imersa a criança enão inteiramente independente da educação ante-rior. Não é isto nenhum descrédito para os testeschamados de inteligência, mas, pelo contrário, umprogresso, uma nova precisão.

Prejudicial, talvez, foi antes o excessivo entusi-asmo anterior. A precipitada aplicação de produtosainda incertos de “ciência” à escola parece haverexacerbado certos aspectos quantitativos e meca-nizantes, conduzindo ao tratamento do aluno comoalgo abstrato a ser manipulado por critérios declassificação em grupos supostamente homogêne-os, dando ao professor a falsa esperança de poderensinar por meio de receitas, muitas das quais decientíficas só tinham a etiquêta.

Com relação à “ciência” do ato de aprendiza-gem o mesmo novo desenvolvimento se pode ob-servar. Compreende-se melhor que “aprender” éalgo de muito mais complexo do que se poderiasupor e francamente uma atividade prática a sergovernada, se possível, por uma psico-técnicaamadurecida e não pela psicologia. Ora, quantoisto nos distancia das “leis” de aprendizagem, emque se ignoravam, além de muito mais, as relaçõesprofessor-aluno-colegas-meio e se imaginava oaprendiz como um ser isolado e especial que ope-rasse abstratamente, como abstratas haviam sidoe não podiam deixar de ser as experiências de la-boratório que haviam conduzido às supostas leisde aprendizagem!

Para essa precipitada aplicação na escola deresultados fragmentários e imaturos da ciência,concorreu também – e merece isto registro especial– uma peculiar prevenção, digamos assim, da ciên-

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cia para com a filosofia, ou um dissídio entre uma eoutra, de alcance e efeito negativos. Explico o quedesejo significar.

Como tôda ciência foi primeiro filosofia e comoseu progresso geralmente se processou com odistanciamento cada vez maior daquela filosofiaoriginária, pode parecer e parece que ciência e filo-sofia se opõem e os conhecimentos serão tantomais científicos quanto menos filosóficos.

Ora, tal êrro é grave, mesmo em domínios comoos da matemática e da física. Mas em educação ébem mais grave. Com efeito, se històricamente oprogresso das ciências se fêz com o seu distancia-mento dos métodos puramente dedutivos da filoso-fia, não quer isto dizer que as ciências não operemrealmente sôbre uma filosofia. O seu afastamentofoi antes um afastamento de determinada filosofiaexclusivamente especulativa, ou melhor, “livremen-te” especulativa, para a adesão a uma nova filoso-fia de base científica. Como esta nova filosofia foiquase sempre uma filosofia implícita e não explíci-ta, o equívoco pôde-se estabelecer e durar.

A realidade é que filosofia e ciência são dois pó-los do conhecimento humano, a filosofia represen-tando o mais alto grau de conhecimento geral e aciência tendendo para o mais alto grau de conheci-mento especial. Entre ambas tem de existir um co-mércio permanente, a ciência revendo-se à luz dospressupostos e conceitos generalizadores da filo-sofia. Nesse sentido, a filosofia nutre permanente-mente a ciência com as suas integrações e visõesde conjunto e a ciência nutre a filosofia, forçando-aa combinações e sínteses mais fundadas, menosinseguras e mais ricas.

Não se trata do quase equívoco de que a filoso-fia elabora os fins e a ciência os meios, mas da ver-dade de que ambas elaboram, criticam e refinamos fins e os meios, pois uns e outros sofrem e preci-sam sofrer tais processos de crítica e revisão, a ci-ência criando muitas vêzes novos fins com as suasdescobertas e a filosofia criticando permanente-mente os meios à luz dos fins que lhe caiba desco-brir e propor à investigação científica.

A não existência dessa cooperação ou intera-ção, entre a ciência e a filosofia, levou a chamada“ciência da educação” a não ter filosofia, o que cor-responde realmente a aceitar a filosofia do statu-quo e a trabalhar no sentido da tradição escolar, a

que efetivamente obedeceu, agravando, em muitoscasos, com a eficiência nova que lhes veio trazer,os aspectos quantitativos e mecânicos da escola,que lhe teria de parecer – e pour cause – os maiscientíficos aspectos da escola.

Hoje, felizmente, estamos bem mais amadureci-dos e os estudos de educação, que não desde-nham das contribuições que lhes terá de trazer afilosofia, também ela cada vez mais de base cientí-fica, começam a ser feitos à luz da situação globalescolar e de suas “práticas”, que urge rever e tor-nar progressivas em face dos conhecimentos quevimos adquirindo no campo das ciências especiais,ciências-fonte da educação – principalmente a an-tropologia, a psicologia e a sociologia – não já paraaplicar na escola, diretamente, os resultados da in-vestigação científica no campo destas ciências,mas para, tomando tais resultados como instru-mentos intelectuais, elaborar técnicas, processos emodos de operação apropriados à função práticade educação.

Os nossos Centros de Pesquisas Educacionaisse organizam, assim, num momento de revisão etomada de consciência dos progressos do trata-mento científico da função educativa e, por istomesmo, têm certa originalidade. Pela primeira vezbusca-se aproximar uns dos outros os trabalhado-res das ciências especiais, fontes de uma possível“ciência” da educação, e os trabalhadores de edu-cação, ou sejam os dessa possível “ciência” aplica-da da educação. Esta aproximação visa, antes detudo, levar o cientista especial, o psicólogo, o an-tropólogo, o sociólogo, a buscar no campo da “prá-tica escolar” os seus problemas. Note-se que osproblemas das ciências biológicas humanas origi-naram-se e ainda hoje se originam na medicina.

É preciso que as ciências sociais, além de ou-tros problemas que lhes sejam expressamente pró-prios, busquem nas atuais situações de práticaeducativa vários e não poucos problemas, quetambém lhes são próprios.

Como na medicina, ou na engenharia, não há,strictu-senso, uma ciência de curar nem de cons-truir, mas, artes de curar e de construir, fundadasem conhecimentos de várias ciências, assim osproblemas da arte de educar, quando constituíremproblemas de psicologia, de sociologia e de antro-pologia, serão estudados por essas ciências espe-

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ciais e as soluções encontradas irão ajudar o edu-cador a melhorar a sua arte e, dêste modo, provaro acêrto final daquelas soluções ou conhecimen-tos, ou, em caso contrário, obrigar o especialista anovos estudos ou a nova colocação do problema. Aoriginalidade dos Centros está em sublinhar espe-cialmente essa nova relação entre o cientista sociale o educador. Até ontem o educador julgava disporde uma ciência autônoma, por meio da qual iria cri-ar simultâneamente um conhecimento educacionale uma arte educacional. E o cientista social estuda-va outros problemas e nada tinha diretamente a vercom a educação. Quando resolvia cooperar com oeducador, despia-se de sua qualidade de cientistae se fazia também educador. Os Centros vêm ten-tar associá-los em uma obra conjunta, porém comuma perfeita distinção de campos de ação. O soci-ólogo, o antropólogo e o psicólogo social não sãosociólogos-educacionais, ou antropólogos-educa-cionais, ou psicólogos-educacionais, mas sociólo-gos, antropólogos e psicólogos estudando proble-mas de sua especialidade, embora originários das“práticas educacionais”.

Os educadores – sejam professôres, especialis-tas de currículo, de métodos ou de disciplina, ousejam administradores – não são, repitamos, cien-tistas, mas, artistas, profissionais, práticos (no sen-tido do practitioner inglês), exercendo, em métodose técnicas tão científicas quanto possível, a suagrande arte, o seu grande ministério. Serão cientis-tas como são cientistas os clínicos; mas sabemosque só em linguagem lata podemos efetivamentechamar o clínico de cientista.

Acreditamos que êsse encontro entre cientistassociais e educadores “científicos” – usemos otêrmo – será da maior fertilidade e, sobretudo, queevitará os equívocos ainda tão recentes da aplica-ção precipitada de certos resultados de pesquisascientíficas nas escolas, sem levar em conta o cará-ter próprio da obra educativa. Com os dados quelhe fornecerá a escola, o cientista irá colocar o pro-blema muito mais acertadamente e submeter os re-sultados à prova da prática escolar, aceitando commaior compreensão êste teste final.

Tenho confiança de que bem esclarecida e estu-dada essa posição, de que estou a tentar aqui osfundamentos teóricos, ser-nos-á possível ver surgiro sociólogo estudioso da escola, o antropólogo es-

tudioso da escola, o psicólogo estudioso do esco-lar, não já como êsses híbridos que são, tantasvêzes, os psicólogos, sociólogos e antropologistaseducacionais, nem bem cientistas nem tambémeducadores, mas como cientistas especializados,fazendo, verdadeiramente, ciência, isto é, sociolo-gia, antropologia e psicologia, e ajudando os edu-cadores, ou sejam os clínicos da educação, assimcomo os cientistas da biologia ajudam os clínicosda medicina.

Parece-me não ser uma simples nuance a dis-tinção. Por outro lado, isto é o que já se faz, sempreque se distingue o conhecimento teórico, objeto daciência, da regra prática, produto da tecnologia eda arte. A confusão entre os dois campos é que éprejudicial. É preciso que o cientista trabalhe com odesprendimento e o “desinterêsse” do cientista, quenão se julgue êle um educador espicaçado em re-solver problemas práticos, mas o investigador quevai pesquisar pelo interêsse da pesquisa. O seuproblema originou-se de uma situação de práticaeducacional, mas é um problema de ciência, nosentido de estar desligado de qualquer interêsseimediato e visar estabelecer uma teoria, isto é, oproblema é um problema abstrato, pois a abstraçãoé essencial para o estudo científico que vise a for-mulação de princípios e leis de um sistema coeren-te e integrado de relações. Os chamados estudos“desinteressados” ou “puros” não são mais do queisto. São estudos das coisas em si mesmas, isto é,nas suas mais amplas relações possíveis. As teori-as científicas do calor, da luz, da côr ou da eletrici-dade são resultados do estudo dêsses fenômenosem si mesmos, desligados de qualquer interêsseou uso imediato. No fim de contas, a teoria é, comose diz, a mais prática das coisas, porque, tendosido o resultado do estudo das coisas no aspectomais geral possível, acaba por se tornar de utilida-de universal.

Assim terão de ser e nem poderão deixar de seros estudos dos cientistas sociais destinados a con-tribuir para o progresso das práticas educativas,pois, do contrário, estariam os cientistas aplicandoconhecimentos e não buscando descobri-los. Ar-mados que sejam os problemas, originários da prá-tica educacional mas não de prática educacional,deve o pesquisador despreocupar-se de qualquerinterêsse imediato e alargar os seus estudos até os

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mais amplos limites, visando descobrir os “fatos” eas suas relações, dentro dos mais amplos contex-tos, para a eventual formulação dos “princípios” e“leis” que os rejam.

Tais “fatos”, “princípios” e “leis” não irão, porém,fornecer ao educador, repitamos, nenhuma regrade ação ou de prática, mas, idéias, conceitos, ins-trumentos intelectuais para lidar com a experiênciaeducacional em sua complexidade e variedade epermitir-lhe elaborar, por sua vez, as técnicas flexí-veis e elásticas de operação e os modos de proce-der inteligentes e plásticos, indispensáveis à con-dução da difícil e suprema arte humana – a deensinar e educar.

Cientistas e educadores trabalharão juntos, mas,uns e outros, respeitando o campo de ação de cadaum dos respectivos grupos profissionais emùtuamente se auxiliando na obra comum de des-cobrir o conhecimento e descobrir as possibilidadesde sua aplicação. O método geral de ação de uns eoutros será o mesmo, isto é, o “método científico” e,nesse sentido, é que todos se podem considerar ho-mens de ciência. O educador, com efeito, estudandoe resolvendo os problemas da prática educacional,obedecerá às regras do método científico, do mes-mo modo que o médico resolve, com disciplina cien-tífica, os problemas práticos da medicina: observan-do com inteligência e precisão, registrando essasobservações, descrevendo os procedimentos segui-dos e os resultados obtidos, para que possam serapreciados por outrem e repetidos, confirmados ounegados, de modo que a sua própria prática da me-dicina se faça também pesquisa e os resultados seacumulem e multipliquem.

Os registros escolares de professôres e admi-nistradores, as fichas de alunos, as histórias de ca-sos educativos, ou descrições de situações e depessoas constituirão o estoque, sempre em cresci-mento, de dados, devidamente observados e anota-dos, que irão permitir o desenvolvimento das práti-cas educacionais e, conforme já dissemos, suscitaros problemas para os cientistas, que aí escolherãoaquêles suscetíveis de tratamento científico, para aelaboração das futuras teorias destinadas a dar àeducação o status de prática e arte científicascomo já são hoje a medicina e a engenharia. Nocurso destas considerações, insistimos pela neces-sidade de demonstração de nossa posição, na

analogia entre medicina e educação. Não sirvaisto, contudo, para que se pense que a práticaeducativa possa alcançar a segurança científica daprática médica. Não creio que jamais se chegue atanto. A situação educativa é muito mais complexado que a médica. O número de variáveis da primei-ra ainda é mais vasto do que o da segunda. Embo-ra já haja médicos com o sentimento de que o do-ente é um todo único e, mais, que êsse todocompreende não só o doente, mas o doente e oseu “meio”, ou o seu “mundo”, o que os aproximados educadores, a situação educativa ainda é maispermanentemente ampla, envolvendo o indivíduoem sua totalidade, com tôdas as variáveis dêle pró-prio e de sua história e de sua cultura e da históriadessa cultura, e mais as da situação concreta, comos seus contemporâneos e os seus pares, seu pro-fessor e sua família. A prática educativa exige queo educador leve em conta um tão vasto e diversogrupo de variáveis, que, provàvelmente, nenhumprocedimento científico poderá jamais ser rigorosa-mente nela aplicado.

Ainda o mais perfeito método de aquisição, di-gamos, de uma habilidade, não poderá ser aplica-do rìgidamente. O educador terá de levar em contaque o aluno não aprende nunca uma habilidadeisolada; que, simultâneamente, estará aprendendooutras coisas no gênero de gostos, aversões, de-sejos, inibições, inabilidades, enfim que tôda a situ-ação é um complexo de “radiações, expansões econtrações”, na linguagem de Dewey, não permitin-do nem comportamento uniforme nem rígido.

É importante conhecer todos os métodos e re-cursos já experimentados e provados de ensinar aler, mas, a sua aplicação envolve tanta coisa amais, que o mestre, nas situações concretas, é queirá saber até que ponto poderá aplicar o que a ciên-cia lhe recomenda, não no sentido de negá-lo,mas, no sentido de coordená-lo e articulá-lo com ooutro mundo de fatôres que entram na situaçãoeducativa.

Sendo assim, podemos ver quanto a função doeducador é mais ampla do que tôda a ciência deque se possa utilizar. É que o processo educativose identifica com um processo de vida, não tendooutro fim, como insiste Dewey, senão o própriocrescimento do indivíduo, entendido êsse cresci-mento como um acréscimo, um refinamento ou

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uma modificação no seu comportamento, como serhumano. Em rigor, pois, o processo educativo nãopode ter fins elaborados fora dêle próprio. Os seusobjetivos se contêm dentro do processo e são êlesque o fazem educativo. Não podem, portanto, serelaborados senão pelas próprias pessoas que par-ticipam do processo. O educador, o mestre, é umadelas. A sua participação na elaboração dêssesobjetivos não é um privilégio, mas a conseqüênciade ser, naquele processo educativo, o participantemais experimentado, e, esperemos, mais sábio.

Dêste modo, a educação não é uma ciência au-tônoma, pois não existe um conhecimento autôno-mo de educação, mas é autônoma ela própria,como autônomas são as artes e, sobretudo, as be-las-artes, uma delas podendo ser, ouso dizer emesmo pretender – a educação.

A “ciência” da educação, usando o têrmo comtôdas as reservas já referidas, será constituída, nafrase de Dewey, de tôda e qualquer porção de co-nhecimento científico e seguro que entre no cora-ção, na cabeça e nas mãos dos educadores e,assim assimilada, torne o exercício da função edu-cacional mais esclarecida, mais humana, mais ver-dadeiramente educativa do que antes.

Os nossos Centros de Pesquisas Educacionaisforam criados para ajudar a aumentar os conheci-mentos científicos que assim possam ser utilizadospelos educadores – isto é, pelos mestres, especia-listas de educação e administradores educacionais– para melhor realizarem a sua tarefa de guiar aformação humana, na espiral sem fim do seu inde-finido desenvolvimento.

O Seminário que ora se encerra foi um primeirocontato entre os professôres e mestres que traba-lham nas classes e os que trabalham no Centro.Esta aproximação tem um sentido: o de associar àpesquisa educacional o mestre de classe. Na clas-se é que se realiza a função educativa. E dentro da

classe, na cabeça, no coração e nas mãos do alu-no. Todo o trabalho do Centro visa, em última análi-se, tornar mais rica, mais lúcida e mais eficaz essaação educativa. Nada podemos fazer sem o pro-fessor e a pesquisa educacional não pode prescin-dir do seu concurso.

Se o vosso trabalho se libertar do caráter de tra-balho de rotina, de acidente ou de capricho e co-meçardes a registrar por escrito o vosso esfôrço, amanter fichas cumulativas, descritivas e inteligen-tes, dos alunos, casos-história de experiênciaseducativas, todo êsse material poderá aqui ser es-tudado, no propósito de vos ajudar em vossa tare-fa, que continuará autônoma e, além disto, maisconsciente, mais controlada e mais suscetível deser repetida e, dêste modo, de se acumular e pro-gredir. Não, desejamos tanto ser aqui no Centro umestado-maior a elaborar planos para serem cumpri-dos por autômatos ou semi-autômatos, mas umgrupo de colegas a estudar convosco os problemasescolares, com o objetivo de conseguir conheci-mentos para que todo o magistério possa conduzircom mais autonomia a sua grande tarefa. Não tere-mos regras nem receitas a oferecer, mas buscare-mos ajudar-vos no instrumental intelectual indis-pensável à execução de uma das belas-artes e amaior: a de educar.

* Artigo transcrito da Biblioteca Virtual Anísio Teixeira,publicado no periódico Educação e Ciências Sociais. v.2,

n.5, ago. 1957. p.5-22.http:www.prossiga.br/anisioteixeira/artigo/ciencia.html

O direito de re-publicação desse trabalho foi concedido porAnna Cristina Teixeira Monteiro de Barros