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GRAMÁTICA E DICIONÁRIO Luiz Francisco Dias Maria Auxiliadora Bezerra Mestranda: Aline Fernandes Disciplina: Teoria da Linguagem 9 de abril de 2009

GRAMÁTICA E DICIONÁRIO

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GRAMÁTICA E DICIONÁRIOLuiz Francisco Dias

Maria Auxiliadora Bezerra

Mestranda: Aline FernandesDisciplina: Teoria da Linguagem

9 de abril de 2009

Page 2: GRAMÁTICA E DICIONÁRIO

1. Conceito de gramatização

2. Percurso histórico da gramática

3. Parâmetros para a designação da gramática

4. Os diferentes saberes sobre a língua ao longo dos séculos

5. A gramática gerativa

6. O saber sobre a língua em gramáticas brasileiras

7. Dicionário: história

8. O que configura um dicionário

9. Os saberes sobre a língua e os dicionários

10. Conclusão

12. Bibliografia

13. Sugestão de discussão

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1. Gramatização

Auroux (1992) escrita = técnica intelectual

O processo de gramatização refere-se à produção de gramáticas de bases greco-latina dedicadas ao estudo das línguas derivadas do latim.

“Esse processo de ‘gramatização’ mudou profundamente a ecologia da comunicação humana e deu ao Ocidente um meio de conhecimento/dominação sobre as outras culturas do planeta”. (Auroux, 1992, p.8)

Processo de gramatização Revolução Tecnológica

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2. História da gramática

Panini (séc. V a.C)

Gramáticas latinas:

Varrão (séc. I a.C) Quintiliano (séc. I d.C) Donato e Prisciano (séc. V d.C)

Gramáticas gregas:

Dionísio o Trácio (entre 170 e 90 a.C) Apolônio Díscolo (séc. II d.C)

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Primeira gramática do francês:

J. Barton (1409)

Primeira gramática do espanhol:

Antonio de Nebrija (1492), Grammática de la lengua castellana

Primeira gramática da língua portuguesa:

Fernão de Oliveira (1536), Grammatica da lingoagem portugueza

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Gramáticas da língua portuguesa de destaque:

Antônio José dos Reis Lobato (1770), Arte da grammatica da lingua portugueza

Jerônimo Soares Barbosa (1822), Grammatica philosophica da lingua portugueza

Mira Mateus et al (1983) e Mario Vilela (1995), Gramática da língua portuguesa, totalmente desvinculadas do saber tradicional.

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Gramáticas brasileiras:

Júlio Ribeiro (1881), Grammatica portugueza

Eduardo Carlos Pereira (1907), Gramática expositiva

Said Ali (1924), Gramática secundária

Evanildo Bechara (1961), Moderna gramática portuguesa

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Mário Perini (1995), Gramática descritiva

Maria Helena de Moura Neves (2000), Gramática de usos do português

Celso Cunha (1970), Gramática do português contémporâneo

Celso Cunha e Lindley Cintra (1985), Nova gramática do português contémporâneo

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3. Parâmetros para a designação da gramática

Visão integral da língua, ou seja, abordar a língua nos aspectos que compõem uma representação unitária do idioma analisado. Aspectos que não são os mesmos em todas as gramáticas, como veremos na seção seguinte.

Diretriz pedagógica, ou seja, instrumentalização da gramática no ensino da língua sob duas perspectivas:

a) Informativa (de acordo com a visão de Moura Neves)

b) Da gramática como instrumento de ensino, oferecendo uma visão concisa dos estudos morfológicos e sintáticos produzidos na lingüística.

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4. Os saberes sobre a língua ao longo dos séculos

• Gramática de Fernão de Oliveira (1536) língua como instrumento de enaltecimento da pátria e de sua língua nacional e preocupação com os sons das vogais,consoantes e sílabas. Trata também das palavras quanto a sua classificação e estrutura.

• Gramática de Júlio Ribeiro (1881) estudo dos sons e da grafia, além do estudo da sintaxe constituem-se como pertinentes à visão integral da língua.

• Gramática de Mário Vilela (1995) textualidade e discurso

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Um olhar sobre as gramáticas da segunda metade do séc. XX

Cunha e Cintra, Nova Gramática do Português Contemporâneo, 1985

“Trata-se de uma tentativa de descrição do português atual na sua forma culta, isto é, da língua como a têm utilizado os escritores portugueses, brasileiros e africanos do Romantismo para cá, dando naturalmente uma situação privilegiada aos autores dos nossos dias. Não descuramos, porém, o fato da linguagem coloquial, especialmente ao analisarmos os empregos e os valores afetivos das formas idiomáticas.” (p. XXIV, prefácio)

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Mário Perini, Gramática descritiva do português, 1995

“... farei algumas considerações sobre as condições de ensino gramatical no Brasil para situar este livro no contexto em que ele pretende atuar.” (p.13)

“Esta Gramática tem objetivos muito pouco modestos: propõe uma maneira realmente nova de descrever a estrutura do português – partindo de princípios teóricos muito mais rigorosos do que aqueles em que se baseiam as gramáticas atualmente disponíveis, para chegar a uma análise bastante diferente da usual.” (p.21)

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Evanildo Bechara, Moderna Gramática Portuguesa, 1999

“A orientação aqui adotada resulta da nossa convicção de que ela (esta obra) também pode oferecer elementos de efetiva operacionalização para uma proposta de reformulação da teoria gramatical entre nós, especialmente quando aplicada a uma obra da natureza desta Moderna Gramática Portuguesa, que a alia a preocupação de uma científica descrição sincrônica e uma visão sadia da gramática normativa (...)” (p. 20)

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Moura Neves, Gramática de usos do português, 2000

“A Gramática de usos do português tem como objetivo prover uma descrição do uso efetivo dos itens da língua, compondo uma gramática referencial do português. É um produto prático, mas de orientação teórica definida, que visa permitir a recuperação da investigação não apenas como conjunto de análises, mas também como conjunto de proposições.” (p.14)

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5. A gramática gerativa

• Chomsky: A gramática como o conhecimento que o falante tem da

língua;

A capacidade de uso da língua é inata;

Teoria gerativa = como as frases são geradas na mente por combinações de itens lexicais definidas por regras sintáticas (infinitude discreta).

• Charlotte Galves, Ensaios sobre as gramáticas do português = o português brasileiro e o português europeu são constituídos de acordo com regras internalizadas diferentes.

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SABER A LÍNGUA

(GRAMÁTICA GERATIVA)

x

SABER SOBRE A LÍNGUA

(GRAMÁTICAS DESCRITIVAS E NORMATIVAS)

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6. O saber sobre a língua em gramáticas brasileiras

• A análise do pronome em gramáticas do final do século XIX

Tom avaliativo, manifestação de apreço ou desapreço

a) juízo de valor:

Ex: “Dizer tu e eu, elle e tu etc, é francezismo injustificável. (Júlio Ribeiro, p. 244)”

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b) estilização:Ex: “Quando ocorrem dous pronomes antes do verbo, o pronome

sujeito vae antes do outro: Mandou dizer que tu lhe entregasses o livro. Com a primeira pessoa, póde-se todavia dizer: Que lhe eu entregasse.Era esta a syntaxe antiga. Nos bons séculos das letras era uso da língua collocar por ultimo o pronome sujeito. Eis o que se lê na Regra de S. Bento: “a qual cousa se a tu ouvires”. Hoje dir-se-ia: se tu a ouvires.Sempre esta syntaxe foi a dos clássicos, mórmente quando occorria o pronome lhe: “Em vestir-se de lan que lhe elle desse” (F. Alvarez do Oriente, Lus. Transf.) (João Ribeiro, p. 174)”

c) idiomatização:Ex: “Uso proprio e idiomático da lingua portugueza é omitir os

pronomes sujeitos: Oh não te chamarei ingrata;Sou filho teu: meus ossos cobre ao menos. (Garret, Camões)” (João Ribeiro, p. 175)

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c.1) idiomatização: comparação português brasileiro e português europeu

Ex: “É erro vulgar no Brasil usar-se em casos taes da relação subjetiva; diz-se por exemplo, ‘Vi elle caminhar às pressas – Deixa elle ir’ (João Ribeiro, p. 255)”

“No Brasil pecca-se contra este preceito dizendo-se ‘Para MIM comer etc’. (João Ribeiro, p. 256)”

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• A análise do pronome em gramáticas de meados do século XX

O pronome como um saber legitimado; mostrar a língua como ela se apresenta

a) efeito de inerência:

Ex: “(...) O homem cortou-se. Indica pois, ao mesmo tempo, atividade e passividade. O homem cortou, mas foi cortado, pois a si próprio é que cortou. Se penetrarmos bem na inteligência das diversas frases reflexivas, veremos que a passividade chama mais a nossa atenção (...) (Bechara, p. 255)”

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b) a língua como agente de orientação do uso:

Ex: “A linguagem culta moderna insiste em distingui-los (...) (Rocha Lima, p. 301)”

“A língua padrão rejeita (...) (Bechara, p. 257)”

“Há alguns pronomes de segunda pessoa que requerem para o verbo (...) (Rocha Lima, p. 100)” (grifo meu)

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• A análise do pronome em gramáticas do final do século XX e início do século XXI

Saber sustentado (em teorias e metodologias específicas)

Ex: “ (...) As condições que governam a co-referência de pronomes com os demais SNs da oração são surpreendentemente complexas, e a tentativa de explicitá-las tem sido um dos grandes temas de pesquisa em sintaxe e semântica nos últimos anos. Nesta seção vou apresentar uma análise simplificada, que deve ser suficiente para dar conta da maioria dos casos do português. (Perini, p. 277)”

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• Gramática de usos do português, Moura Neves:

- a língua é observada na sua funcionalidade; - as ocorrências da língua são o ponto de partida para a

produção do fato gramatical; - não há a noção de regra, mas de regularidade; - o falante não é observado de fora da linguagem, como nas

gramáticas do século XIX, com a noção de valor.

• Gramática descritiva do português, Perini, 1995:

- regras de estruturação formal; - a gramática descreve a estrutura da língua partindo de

princípios teóricos rigorosos; - tentativa de construção de uma regra geral para todos os

casos.

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7. Dicionário: história

• Listas de palavras elaboradas pelos acádios, prática compartilhada pelos povos antigos: chineses, indianos, gregos:

- Appendix Probi (Roma, no século III);

- Glossário de Reichenau (século VIII);

- Glossário de Cássel (século IX);

• Glossários bilíngües:

- Catholicon ou Summa (século XIII)

- Glossários latim-francês (século XIV)

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• Dicionários:

- Thesaurus linguae latinae (Robert Estienne, 1532);

- Thesaurus graecae linguae (Henri Estienne, 1572);

- Dictionarium (Calepino, em torno de 1502);

- Dictionarium latino-gallicum e Dictionnaire français-latin (Robert Estienne, 1539);

- Thesaurus Polyglottus (Girolano Megiser, 1603)

- Thesaurus Utriusque Linguae Hispanae et Latinae Omminum Correctissimus (Requejo, 1679)

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• Alguns exemplos de dicionários da língua portuguesa, elaborados a partir do século XVIII:

- Vocabulario Portuguez e Latino (Padre Rafael Bluteau)- Novo Diccionario da Lingua Portugueza (Eduardo de

Faria, 1855)- Diccionario Contémporaneo da Lingua Portugueza

(Francisco Aulete, 1888).

• Alguns exemplos de dicionários brasileiros do séc. XX:

- Pequeno Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa (Aurélio Buarque de Holanda, 1938)

- Grande Dicionário Etimológico-Prosódico da Língua Portuguesa (Silveira Bueno, 1961)

- Dicionário da Língua Portuguesa (Antônio Houaiss, 2001)- Dicionário de Usos do Português do Brasil (Borba, 2002)

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8. O que configura um dicionário

Visão completa da língua (como nas gramáticas)

Cunho normativo, pedagógico

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9. Os saberes sobre a língua e os dicionários

Dicionários bilíngües:

- conjunto de palavras acompanhadas de sua tradução literal como pertinente ao conhecimento da língua.

Dicionários monolíngues:

Ex. 1. dicionário de Eduardo de Faria (1855):

- aspecto etimológico das palavras, sua classificação gramatical e sua definição;

2. dicionário de Silveira Bueno (1961):

- o aspecto etimológico e prosódico, o significado, a classe gramatical e os sinônimos das palavras;

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3. dicionário Michaelis (1998):- Etimologia das palavras, pronúncia, categoria gramatical,

divisão silábica, registro e variação lingüística, acepções, exemplos, formas irregulares de feminino e remissões.

- Os três exemplos são baseados em uma visão normativa da língua.

- O dicionário de Silveira Bueno explicita sua perspectiva normativa no exemplo abaixo:

“ (...) O único argumento é o hábito, o costume, a rotina, infelizmente baseada na ignorância dos princípios que presidem à cunhagem de termos novos. (p. XXXII)”

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- Por outro lado, Francisco Borba adota uma perspectiva descritiva em seu dicionário:

“Aproveitando-se dos princípios mais gerais da lingüística descritiva sincrônica, procurou-se organizar os verbetes de tal forma que o consulente tenha, de um lado, uma informação geral de como a língua se organiza e, de outro, uma série de exemplos de como a língua está sendo efetivamente usada nos textos. (p. VIII)”

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10. Conclusão

Francisco Borba (2003):

“A gramática e o dicionário são instrumentos pedagógicos de primeira linha, têm pontos em comum, mas não se superpõem. Diga-se primeiramente que o dicionário é o lugar do particular, do tópico e a gramática é do genérico, das regras.” (p. 300)

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11. Bibliografia

DIAS, L.F; BEZERRA, M. A. Gramática e dicionário. In: GUIMARÃES, E; ZOPPI-FONTANA, M. (Orgs.) Introdução às ciências da linguagem – A palavra e a frase. Campinas: Pontes, 2006, p. 11-37.

BECHARA, E. Moderna gramática portuguesa. 37. ed. – revista e ampliada. Rio de Janeiro: Lucerna, 1999.

BORBA. F.S. Organização de dicionários: uma introdução à lexicografia. São Paulo: Editora da UNESP, 2003.

CUNHA, C; CINTRA, L. Nova gramática do português contemporâneo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.

MOURA NEVES, M.H. de. Gramática de usos do português. São Paulo: Editora da UNESP, 2000.

PERINI, M. A. Gramática descritiva do português. São Paulo: Ática, 1995.

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12. Sugestão para discussão

1. Quais foram os principais parâmetros que guiaram uma nova forma de fazer gramática, principalmente pelo que vimos nas gramáticas de Perini (1999) e Moura Neves (2000)? Quais foram as conseqüências para o ensino da língua portuguesa em contexto brasileiro?

2. Discuta as noções de completude da língua e do cunho normativo-pedagógico instaurados pela gramática e pelo dicionário como instrumentos lingüísticos.