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GRUPO DE LAZER NA ESCOLA: POSSIBILIDADES DE DESMITIFICAÇÃO DA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR Luís Cláudio Betetto Sciamana 1 Fábio Ricardo Mizuno Lemos (O) 2 Resumo No ano de 2009 foi criado em uma escola privada, localizada na cidade de Rio Claro-SP, um Grupo de Lazer tendo como participantes professoras, funcionárias, alunas, coordenação e direção. Dentro da instituição, a Educação Física sempre foi considerada sinônimo de esporte e a partir da criação do grupo e das vivências em aulas/atividades relacionadas com este, o presente trabalho teve como objetivos, compreender as aprendizagens ocorridas, assim como, se estas contribuíram/contribuem para a desmitificação do pensamento sobre a Educação Física Escolar. Para a coleta de dados, foram selecionadas seis integrantes, freqüentadoras dos encontros desde o seu início, as quais foram entrevistadas, utilizando para isso, a entrevista semi-estruturada. A análise dos resultados foi baseada na pesquisa qualitativa inspirada na fenomenologia, modalidade fenômeno situado e os resultados obtidos demonstraram aprendizagens ocorridas não só em relação ao esporte, mas também a conteúdos como: jogos, saúde e atividade física, práticas corporais alternativas. Tais considerações nos permitem afirmar que as participantes passaram a refletir e olhar a Educação Física por um outro ponto de vista, ampliando seus conhecimentos. Palavras chave: Lazer; Ensino e Aprendizagem; Educação Física Escolar. Abstract During '2009, one Leisure Team was made up in a private school located in the city of Rio Claro, state of São Paulo. That Leisure Team was compounded by teachers, employees, students and members of board of direction. At that school, Physical Education was considered as a synonym of sport and from the creation of the team and its experience in teaching and activities regarding itself, this study aims to understand lessons learned as well as if they contributed to the demystification about Physical Education thought. Six members were selected, presented since the beginning of the work, which were interviewed in a part-structured way. The analysis of the results was based on a qualitative research inspired phenomenology, placed phenomenon modality and the obtained results demonstrated learnings not only regarding sport but also contents such as: games, health and physical activity, alternative body practices. Such considerations allow us to state that the participants began to reflect to consider Physical Education from a different point of view, enlarging their knowledge. Key Words: Leisure; Learning and Teaching; Physical Education at School. INTRODUÇÃO Nas discussões realizadas e organizadas pelo terceiro grupo de pós-graduação em Educação Física Escolar da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), na disciplina Educação para o 1 Professor da rede privada de Ensino de Rio Claro, estado de São Paulo. Aluno do III Curso de Especialização em Educação Física Escolar do DEFMH/UFSCar. 2 Doutorando em Educação (PPGE/UFSCar). Mestre em Educação (PPGE/UFSCar). Sócio-fundador da Sociedade de Pesquisa Qualitativa em Motricidade Humana (SPQMH). Professor da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo (SEE/SP), do Centro Universitário Claretiano (CEUCLAR) de Batatais/SP e do Curso de Especialização em Educação Física Escolar (DEFMH/UFSCar).

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GRUPO DE LAZER NA ESCOLA: POSSIBILIDADES DE DESMITIFICAÇÃO DA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR

Luís Cláudio Betetto Sciamana1

Fábio Ricardo Mizuno Lemos (O)2

Resumo No ano de 2009 foi criado em uma escola privada, localizada na cidade de Rio Claro-SP, um Grupo de Lazer tendo como participantes professoras, funcionárias, alunas, coordenação e direção. Dentro da instituição, a Educação Física sempre foi considerada sinônimo de esporte e a partir da criação do grupo e das vivências em aulas/atividades relacionadas com este, o presente trabalho teve como objetivos, compreender as aprendizagens ocorridas, assim como, se estas contribuíram/contribuem para a desmitificação do pensamento sobre a Educação Física Escolar. Para a coleta de dados, foram selecionadas seis integrantes, freqüentadoras dos encontros desde o seu início, as quais foram entrevistadas, utilizando para isso, a entrevista semi-estruturada. A análise dos resultados foi baseada na pesquisa qualitativa inspirada na fenomenologia, modalidade fenômeno situado e os resultados obtidos demonstraram aprendizagens ocorridas não só em relação ao esporte, mas também a conteúdos como: jogos, saúde e atividade física, práticas corporais alternativas. Tais considerações nos permitem afirmar que as participantes passaram a refletir e olhar a Educação Física por um outro ponto de vista, ampliando seus conhecimentos. Palavras chave: Lazer; Ensino e Aprendizagem; Educação Física Escolar. Abstract During '2009, one Leisure Team was made up in a private school located in the city of Rio Claro, state of São Paulo. That Leisure Team was compounded by teachers, employees, students and members of board of direction. At that school, Physical Education was considered as a synonym of sport and from the creation of the team and its experience in teaching and activities regarding itself, this study aims to understand lessons learned as well as if they contributed to the demystification about Physical Education thought. Six members were selected, presented since the beginning of the work, which were interviewed in a part-structured way. The analysis of the results was based on a qualitative research inspired phenomenology, placed phenomenon modality and the obtained results demonstrated learnings not only regarding sport but also contents such as: games, health and physical activity, alternative body practices. Such considerations allow us to state that the participants began to reflect to consider Physical Education from a different point of view, enlarging their knowledge. Key Words: Leisure; Learning and Teaching; Physical Education at School.

INTRODUÇÃO

Nas discussões realizadas e organizadas pelo terceiro grupo de pós-graduação em Educação

Física Escolar da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), na disciplina Educação para o

1 Professor da rede privada de Ensino de Rio Claro, estado de São Paulo. Aluno do III Curso de Especialização em Educação Física Escolar do DEFMH/UFSCar. 2 Doutorando em Educação (PPGE/UFSCar). Mestre em Educação (PPGE/UFSCar). Sócio-fundador da Sociedade de Pesquisa Qualitativa em Motricidade Humana (SPQMH). Professor da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo (SEE/SP), do Centro Universitário Claretiano (CEUCLAR) de Batatais/SP e do Curso de Especialização em Educação Física Escolar (DEFMH/UFSCar).

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Lazer, no ano de 2008, não ficou estabelecida ou engessada apenas uma definição para o lazer. Pelo

contrário, muitas definições surgiram da necessidade de conhecer e estudar este fenômeno que

sempre existiu, mas que principalmente após a revolução industrial e cada vez mais, nos dias de

hoje, vem se tornando indispensável para todos os cidadãos.

O lazer, na Constituição da República Federativa do Brasil (BRASIL, 2010a), é considerado

um direito social de todo cidadão, assim como, a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, a

segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos

desamparados.

Segundo Camargo (2003):

o lazer é um conjunto de atividades gratuitas, prazerosas, voluntárias e liberatórias, centradas em interesses culturais, físicos, manuais, intelectuais, artísticos e associativos, realizados num tempo roubado ou conquistado historicamente sobre a jornada de trabalho profissional e doméstico e que interferem no desenvolvimento pessoal e social dos indivíduos (p.97).

Para Santos et al. (2007), o lazer é uma prática social, independente de tempo, espaço,

atividade, relacionada à intencionalidade, à relação com outros seres tendo como pano de fundo o

mundo.

É importante destacar que, a definição que venho construindo acerca do lazer, a partir da

disciplina cursada, relaciona o lazer à: necessidade/direito que o ser humano tem desde sempre de

fazer aquilo que mais aprecia. Independe de tempo, pois na atualidade (mundo capitalista) cada um

busca dentro do seu dia/ semana seu momento de lazer. Também não depende de espaço, pois é

possível encontrar momentos de lazer em espaços sem grande infra-estrutura e não encontrar lazer

em espaços teoricamente estruturados. Entendo, ainda, que independe de condição social, pois

ter/não ter dinheiro significa/não significa encontrar mais possibilidades de lazer. O ponto principal

é a intencionalidade, ao que se quer fazer no seu momento de lazer e como aproveitá-lo.

Partindo desta reflexão, surgiu uma oportunidade interessante de trabalho/encontro/troca

dentro da Escola onde trabalho, localizada na cidade de Rio Claro/ SP.

No ano de 2008, um grupo de funcionárias, professoras e até coordenadoras ao saber da

realização do inédito campeonato de futsal feminino, organizado pelas alunas do Ensino Médio

juntamente com o torneio masculino, indagou-me a respeito da não participação de um grupo (time)

das mesmas.

Justifiquei-me alegando que havia, na época, estendido o convite, mas que não houve muitas

adeptas à idéia, deixando minha proposta um pouco de lado. Passado o final do torneio, uma das

funcionárias sugeriu a realização de um “jogo amistoso” entre o time campeão do torneio e um time

formado pelas mesmas, que treinariam algumas vezes antes do jogo. Diante da impossibilidade de

todos (professoras, funcionárias, direção e até mesmo, minha e de espaço) ficou combinado que nos

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encontraríamos duas vezes antes do amistoso. Surgiu então uma idéia que foi compartilhada por

mim a todas as participantes do grupo: formaríamos um grupo de lazer dentro da Escola, aberto a

professoras, funcionárias, coordenação e direção, que teria como objetivos:

* Identificar os locais e práticas de Lazer dos profissionais que trabalham na escola;

* Proporcionar momentos de integração, atividades em grupo, cooperação, superação da timidez,

quebra de hierarquia (participação desde os profissionais que têm as funções mais simples, até a

direção da Escola);

* Refletir sobre as possibilidades de lazer que a escola oferece, criando a consciência da

necessidade do lazer no dia-a-dia de todos e reivindicando espaços para que o grupo se expresse

corporalmente, artisticamente e que seus membros usufruam como cidadãos de seus momentos de

lazer.

A escolha do público feminino se justifica pela abertura dada pelas participantes ao

aprendizado de novos jogos e atividades, diferentemente do público masculino (professores,

funcionários, pais, coordenadores), que possuíam seu horário de Lazer dentro da instituição, porém

restringiam o mesmo à prática do esporte não dando a abertura à iniciativa proposta.

Além desses objetivos, referentes ao grupo de Lazer, quando fiz a sugestão da criação do

mesmo, estava pensando um pouco mais à frente, na busca de soluções para problemas encontrados

dentro do nosso dia-a-dia, na quebra de alguns dos paradigmas que cercavam e cercam a Educação

Física dentro da escola (tais como, componente curricular menos importante; aulas somente para

recreação; “Educação Física é sinônimo de esporte”, se restringindo ao trabalho com as

modalidades esportivas).

Particularmente, tornou-se um grande desafio, pois determinei como objetivos deste trabalho

compreender as aprendizagens ocorridas, assim como, se estas contribuíram/contribuem para a

desmitificação do pensamento sobre a Educação Física Escolar.

Com este intento, na seqüência, será apresentada a revisão de literatura, tendo como foco,

dois eixos principais:

1 - Mitos que cercam a Educação Física Escolar;

2 - O Lazer e a escola.

Estes eixos foram eleitos por sua relevância dentro da temática apresentada, assim como

com a realidade observada na escola.

1. MITOS QUE CERCAM A EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR

Neste capítulo, estabeleço uma reflexão acerca da Educação Física Escolar, componente

curricular obrigatório segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) (BRASIL,

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1996), mas que em muitos casos não é considerada desta forma. Quais seriam as possíveis causas

para o “preconceito” em relação a esta área tão importante e quase na totalidade das escolas a mais

popular entre os alunos?

Em sete anos trabalhando como professor, em diferentes escolas e tendo passado por

diferentes níveis de ensino, a Educação Física se mostra cada vez mais instigante e apaixonante por

suas características únicas enquanto componente curricular. São estas:

* Têm caráter prático (muitas vezes o único utilizado pelos professores) o que torna as aulas

extremamente interessantes, pois quase sempre é realizada na “maior sala de aula da escola”: a

quadra, o pátio, campo ou em outras escolas nenhuma dessas áreas ou com possibilidade de

utilização de todas essas áreas. Possibilita aos alunos a saída de um ambiente no qual passam uma

grande parcela de seu período escolar sendo, conforme constatado por mim em algumas escolas, um

dos únicos momentos em que isso acontece;

* Trabalha com o movimento humano, podendo através de atividades lúdicas integrar, aproximar,

incluir e educar um grupo/classe completamente heterogêneo. Particularmente na escola onde

trabalho a possibilidade de fazer um planejamento participativo, levantamento de conteúdos

presentes na cultura de determinada escola/bairro sem a cobrança tão grande em atropelar

conteúdos presentes nos livros, é talvez a única, entre todos os componentes curriculares.

Porém, nem tudo na Educação Física é perfeito e por outro lado, questões como o

distanciamento deste componente curricular em reuniões pedagógicas, o comodismo apresentado

por alguns diretores, coordenadores negando o oferecimento da infra-estrutura adequada para os

professores que muitas vezes acabam se conformando com as dificuldades e o aparente

distanciamento de alguns alunos das aulas depois de determinada série (5º ano), faz com que seja

criado um preconceito e desprestígio em relação à nossa profissão.

Na seqüência, apresento algumas características que considero essenciais para o

entendimento de minha inquietação no que se refere a esses mitos que cercam a Educação Física

Escolar: a infra-estrutura e o papel do professor.

1.1 Infra-estrutura

Talvez pelo fato da Educação Física não ser muitas vezes considerada como uma aula como

as demais, o material necessário às aulas é sempre o último a ser adquirido e, geralmente, os

diretores das escolas gostariam que este fosse eterno, não compreendendo que é um material que

possui um tempo de vida útil, como acontece com cadernos, lápis e canetas (BETTI, 1992).

No que se refere ao espaço, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) (BRASIL, 1998a)

apontam que na realidade das escolas brasileiras os espaços disponíveis para a prática e a

aprendizagem de jogos, lutas, danças, esportes e ginásticas não apresentam a adequação e a

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qualidade necessárias. Além disso, para Betti (1992), as quadras deixam a desejar, sem

conservação, sem pintura de linhas ou sem aros.

Alterar esse quadro implica uma conjugação de esforços de comunidade e de poderes

públicos. Nesse sentido, muitas escolas têm recebido benefícios de prefeituras e do governo do

estado para realizarem obras de cobertura em suas quadras, porém uma grande parcela ainda

agoniza com a falta dos mesmos e no que isso acarreta.

As condições materiais acabam, conseqüentemente, interferindo seriamente na satisfação da

aula e de forma geral, no desenvolvimento da mesma. Ainda, segundo Betti (1992), o fato de faltar,

ora espaço, ora material, ou as duas coisas, ou ainda uma falta de visão do professor para que

enquanto alguns alunos estiverem na quadra, outros estejam fazendo uma atividade diferente em

outro espaço, faz com que haja uma falta de motivação à participação. Isto sem contar que a divisão

de equipes não proporciona oportunidades iguais. Quando as turmas são compostas por alunos de

idades diferentes, e com níveis de habilidades diferentes, o problema é ainda maior.

Quanto à duração da aula, Betti (1992) afirma que muitos alunos demonstraram que não

estão contentes com o pouco tempo para as aulas de Educação Física. Preferem quando a aula é

dupla, pois parece haver uma melhor divisão desta. Quando a aula é de 50 minutos torna-se, na

realidade, um pouco mais da metade, porque entre a chamada, as explicações, e a divisão de grupos,

no caso de jogos, são passados preciosos minutos, isto sem contar o aquecimento, quando ocorre, e

o grande número de equipes formadas para jogar, no caso das turmas numerosas.

1.2 O papel do professor

Betti (1999) ressalta que muitas escolas não possuem espaço para a Educação Física, porém,

enfatiza que muitas vezes quando nos referimos ao espaço consideramos a quadra, bolas oficiais

etc. Para a autora a falta dessas condições não significa que a Educação Física está agonizando. É aí

que entra o papel do professor como motivador e educador, procurando nessas dificuldades crescer

e criar alternativas para a Educação Física, como a improvisação de materiais (sucata) e de espaço

(não necessariamente a aula de Educação Física tem que ser realizada numa quadra). Nesta

perspectiva, as aulas podem ser ministradas dentro da sala de aula, em gramados etc.

Segundo Freire (1997), qualquer material pedagógico será mais rico se for variado. Muitos

professores de Educação Física ensinam, por exemplo, voleibol para as crianças fazendo uso apenas

de uma bola oficial, alegando que assim a aprendizagem será mais direta, rápida e eficiente. Pois, se

nem para o voleibol isso seria indicado, porque a escassez de experiências reduziria as

possibilidades do jogo, muito menos em se tratando de uma educação integral, quando seria

condenável o direcionamento exclusivo para um esporte, ainda por cima utilizando um material tão

desafiador em condições tão limitadas.

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O autor ainda descreve que as lamentações quanto à falta de material para se trabalhar são

eternamente as mesmas. O que não se pode é deixar de promover a experienciação. Para o autor a

falta de criatividade é um dos graves empecilhos para uma Educação Física de melhor qualidade. O

que falta nas escolas, na maioria das vezes, não é material, é criatividade. Ou melhor, falta o

material mais importante, pois a criatividade quase nunca é ensinada nas escolas de formação

superior.

Molina Neto (1998) ressalta as dificuldades de infra-estrutura e os baixos salários que fazem

os professores se acomodarem. Essas dificuldades, porém, oferecem a oportunidade para o

professor desenvolver um trabalho criativo. O mesmo autor também ressalta que tais problemas

ocorrem com outras disciplinas, todavia, na Educação Física tem outra dimensão porque raramente

os professores são convidados a discutir os problemas e necessidades de sua disciplina.

A partir dos autores apresentados, fica evidenciado a tendência em transferir a

responsabilidade pelos problemas encontrados única e exclusivamente para o professor que, por sua

vez, sente-se isolado, sem ter a quem recorrer. Acostuma-se a sempre operacionalizar milagres para

ministrar suas aulas e após determinado período, cansado de não conseguir apoio, após sucessivas

tentativas, tende a se acomodar, tornando suas aulas repetitivas ou em muitos casos, tendo uma

prática do “deixar a bola” para que os alunos decidam o que vão fazer naquela aula.

2. O LAZER E A ESCOLA

Em um dos documentos oficiais que tratam sobre o lazer existe uma afirmação recorrente na

Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio:

O lazer e a disponibilidade de espaços para atividades lúdicas e esportivas são necessidades básicas e, por isso, direitos do cidadão. Os alunos podem compreender que os esportes e demais atividades corporais não devem ser privilégio apenas dos esportistas ou das pessoas em condições de pagar por academias e clubes. Dar valor a essas atividades e reivindicar o acesso a elas para todos é um posicionamento que pode ser adotado a partir dos conhecimentos adquiridos nas aulas de Educação Física (BRASIL, 1998a).

Paralelamente a esta afirmação, observo na escola em que leciono, um desprestígio aos

espaços destinados ao lazer sucumbidos pela necessidade de criar ambientes nos quais o aluno

teoricamente possa se desenvolver intelectualmente, tais como: salas de aula, salas de estudo,

laboratórios e até portarias. Não que nesses locais seja impossível a obtenção de momentos de lazer,

se considerarmos a intencionalidade, como característica principal para o desenvolvimento do lazer,

porém os espaços para o lazer ficaram teoricamente restritos e confinados a uma quadra e um pátio.

Como afirmam Silva; Santos; Lemos (2009), a escola atual em seus moldes rígidos e hierárquicos,

que na maioria das vezes cala ou pelo menos não ouve os seus principais atores, busca basicamente

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o processo de inserção de seus alunos e alunas ao mundo do trabalho. Com esta valorização do

trabalho, e para o sistema capitalista tal atitude é compatível, pois trata-se de uma prática social que

é produtiva, útil e rentável, as discussões que têm como foco o lazer são desconsideradas, pois este

é visto como um tempo inútil e improdutivo, o que não entra em consonância com o sistema

mencionado. Enfim, a escola acaba reproduzindo o que ocorre em outros tempos e espaços sociais,

ao supervalorizar o trabalho em detrimento de outras práticas sociais.

Os alunos, por outro lado, mostram-se cada vez mais inquietos, desconcentrados ou, diria

até, aflitos por momentos de lazer e descontração. Então, onde encontram ou teoricamente deveriam

encontrar estes momentos de “lazer”? Os professores que ministram aulas de outros componentes

curriculares são unânimes em afirmar: aulas de Educação Física e Artes. Para Bracht (2003) não

deveríamos responsabilizar exclusivamente um ou outro componente curricular pela educação pelo

lazer, mas sim a escola como um todo, assumindo como tarefa importante, o que implica em

colocar em questão as próprias finalidades sociais da instituição escolar. O mesmo autor diz ainda

não acreditar numa concepção de cultura que isola o lazer do trabalho, da produção e da vida. Pra

ele não existem os chamados espaços e tempos de recreio (não produtivos) nos quais se encaixaria a

Educação Física, considerada por muitos, ainda, como espaço e tempo improdutivos, recreativos.

Considero, na realidade vivenciada dentro da escola onde trabalho, exatamente este aspecto:

os espaços e tempos produtivos, dos componentes curriculares que preparam o aluno para o

vestibular são cada vez mais colocados em evidência.

Por outro lado, as atividades organizadas nas aulas de Educação Física ficam restritas a

pequenos espaços, horários e momentos. Muito deste preconceito em relação à aula de Educação

Física recai pela postura de professores que diante do despreparo, desorganização e falta de

planejamento ainda têm a postura de “deixar a bola” para que os alunos se organizem e decidam o

que vão “jogar”, como ressaltado anteriormente.

Para Bracht (2003) muitas vezes os professores confundem omissão com facilidades para

liberdade de expressão, não participando do processo de desenvolvimento de atividades, encarando-

as, assim, como fins em si mesmas e não como parte de um plano de objetivos educacionais. O

professor passa a atuar como mero espectador no processo de ensino.

De encontro a isso, uma das ações pode ser iniciada na construção de planos de ensino tendo

como temática o lazer. Apresento, assim, alguns excertos dos Parâmetros Curriculares Nacionais,

importantes a serem considerados:

Na Educação Infantil, segundo o Referencial Curricular para a Educação Infantil (BRASIL,

1998b) há a orientação do ensino pautado na cultura corporal de movimento e acesso a esta através

da experimentação de movimentos, desafios e possibilidades de superação. Com isso, os alunos

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passariam a conhecer mais elementos que favoreceriam suas possibilidades de lazer e a de seus

colegas.

No Ensino Fundamental, segundo os PCN (BRASIL, 1998a), surge como destaque a

reflexão acerca de movimento no sentido anatômico, biomecânico, bioquímico, a fim de conhecer o

corpo humano como um todo e não como um monte de partes juntas. Esta reflexão é extremamente

importante para construir o senso crítico do ser humano no sentido de avaliar um programa de

treinamento físico em uma academia ou escolher a prática de um esporte/atividade somente por

prazer e satisfação; Criar repertório para a construção do senso crítico através de discussões

propostas pela mídia acerca de temas como padrão de beleza/ diferenças nas regiões do Brasil,

anorexia, bulimia, mídia, jornais, televisão e o que nos passam não são modelos a serem seguidos

por todos; Respeito à diversidade de indivíduos, de cultura, de opção, de afinidade com esta ou

aquela atividade, este ou aquele esporte, sem críticas do tipo: o meu é melhor que o seu ou vice-

versa; Desmitificar a lenda que a mídia passa sempre que a prática de jogos, lutas, esportes, dança e

ginástica, são sinônimos de saúde, de lazer, de bem estar (se entendidos desta maneira, levadas a um

extremo, podem conduzir a utilização de doping, dores musculares, lesões, entre outros problemas).

Aqui começa a retomada do processo ao qual o Grupo de Lazer da Escola foi convidado a

participar: a reflexão acerca das atividades propostas a fim de reiterar a aula de Educação Física

como componente curricular que proporciona momentos de lazer.

Uma hipótese recorrente em minhas reflexões é a que pessoas que normalmente não dão o

devido reconhecimento à Educação Física, pela experiência que tiveram com a mesma, ou seja,

experiências não tão boas nas quais eram submetidas a avaliações físicas, separadas por sexo em

todas as atividades, isoladas por suas dificuldades em relação àquela determinada “modalidade

esportiva” trabalhada e nas quais elementos da recreação, do lazer e do lúdico acabaram sendo

deixados de lado.

Muitas destas pessoas acabaram se tornando diretores, coordenadores pedagógicos,

professores, entre outras funções ligadas diretamente à Educação. Para estas seria necessária a

conscientização de que a Educação Física tem se modificado, no que se refere à seleção de

conteúdos, sistematização das aulas, avaliação, em comparação ao período em que os mesmos eram

estudantes, para a derrubada de paradigmas.

A participação no Grupo de Lazer da Escola seria uma grande oportunidade de observar o

movimento, as práticas corporais sobre outro aspecto: como responsável, mas não unicamente pela

promoção do lazer.

Rangel et al. (2005), apresentam a importância da inclusão de estudos sobre lazer escolar e

propõem ações que podem ser viabilizadas no grupo e dentro da instituição, tais como:

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- incentivar as práticas físicas e esportivas vivenciadas fora da escola e relatadas pelos alunos ao

professor;

- privilegiar os conteúdos das aulas de Educação Física escolar, a fim de contribuir com vivências

potencializadoras de hábitos saudáveis nos momentos de lazer;

- enfatizar o lúdico, ao propor as vivências de conteúdos culturais físicos e esportivos para suas

possíveis manifestações nos momentos de lazer;

- buscar uma formação crítica do grupo/alunos acerca da cultura corporal, para que possam

discernir informações veiculadas pela mídia;

- demonstrar que o lazer está também na atitude das pessoas, não dependendo somente de fatores

como acesso a equipamentos específicos e recursos financeiros para seu usufruto;

- incentivar relações humanas solidárias, respeitosas e inclusivas nas vivências físicas e esportivas.

3. CAMINHOS METODOLÓGICOS

No mês de abril de 2009, foi formado o “Grupo de Lazer” (nome provisório, substituído

posteriormente por “Norma Futebol Clube”, em homenagem a uma das funcionárias da Escola),

oferecido como componente extracurricular a todas as professoras, funcionárias e direção de uma

escola privada, localizada na cidade de Rio Claro-SP.

A priori, as vivências seriam realizadas uma vez por semana no período da noite, nas

dependências da escola ou arredores, com duração prevista de uma hora/uma hora e meia, mas logo

na segunda semana de realização das atividades ficou combinada, com a ajuda de uma das

professoras de Educação Física da escola, a realização dos encontros em dois dias na semana.

Num primeiro momento, minha função seria de mediador no processo de “formatação” do

grupo, promovendo atividades voltadas/relacionadas aos conteúdos da Educação Física, mas à

medida que outros membros do grupo manifestassem suas habilidades, sendo elas relacionadas às

suas áreas ou não, seriam muito bem-vindos e aceitos por todos os participantes. Todos teriam,

assim, oportunidade de ministrar oficinas relacionadas aos trabalhos/atividades que, por exemplo,

fazem como lazer, de acordo com os interesses: físico-esportivo, manual, intelectual, artístico e

social (DUMAZEDIER, 1980), turístico (CAMARGO, 2003) e virtual (SHWARTZ, 2003).

Logo no primeiro encontro realizado no mês de abril de 2009 foi feita uma sondagem para

que as participantes definissem através de sugestões (planejamento participativo) qual seria o

conteúdo abordado num primeiro momento. O conteúdo escolhido pela grande maioria, ainda

bastante empolgada com as atividades realizadas no ano anterior, foi o futsal.

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3.1 Descrição dos Sujeitos

Durante o ano várias pessoas passaram pelo grupo, algumas ficando por algum tempo,

outras apenas tendo uma pequena experiência em alguns encontros ou ainda participando somente

no mês de julho em virtude da mudança de horário dos encontros que favorecia a presença das

mesmas. Particularmente, no mês de julho aconteceram alguns fatos interessantes, os quais

considero pertinentes e merecedores de divulgação:

* a divulgação do Grupo de Lazer feita pelas próprias participantes com o intuito de estimular novas

participantes a se juntarem ao projeto. Considero este acontecimento importante, pois no início

sempre finalizando nossos encontros eu relembrava às participantes que estendessem o convite a

outras pessoas para que o grupo crescesse e, no mês de julho, conforme mencionado o número de

participantes aumentou consideravelmente;

* o início de outro campeonato de Futsal nos moldes do realizado no ano anterior, agora sim com a

participação do Grupo de Lazer “Norma Futebol Clube”;

* a inclusão de categorias novas de participantes. Alunas, coordenadoras e até a esposa de um dos

professores da escola começaram a freqüentar os encontros constantemente.

Como sujeitos desta pesquisa, foram selecionadas seis participantes que freqüentaram o

grupo a mais tempo, destas, duas são professoras, uma funcionária, uma antiga monitora da escola e

duas alunas que se juntaram ao grupo após convite feito pelas participantes. As mesmas foram

entrevistadas no mês de novembro de 2009 conforme será detalhado mais adiante. Suas identidades

foram preservadas por questões éticas adotadas junto às mesmas.

3.2 Descrição das atividades apresentadas/realizadas

O plano de aula/atividades tinha como característica básica a realização, no início das aulas,

de jogos cooperativos, recreativos, relacionados ou não ao conteúdo esporte. Neste momento, os

professores “orientadores” do grupo podiam criar e introduzir novos conteúdos, muitos trabalhados

nas aulas de Educação Física, para apreciação do Grupo de Lazer. Pega-pegas, corridas, caminhada,

jogo dos dez passes, atividades com corda, basquete adaptado, são exemplos de atividades

realizadas neste primeiro momento. Esta estratégia foi adotada para não limitar as aulas somente às

atividades relacionadas a determinado conteúdo, ampliando assim o leque de informações das

participantes acerca da Educação Física.

O segundo momento das aulas começava com um alongamento orientado pelos professores,

seguido pela explicação dos fundamentos do esporte a serem trabalhados naquele dia. Passe,

domínio, condução de bola, chute, posicionamento de defesa/ataque, contra-ataque foram

trabalhados sempre de maneira lúdica e ao final das atividades era feito um breve momento de

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reflexão acerca das atividades realizadas (para que serviam; quando poderia ser utilizada; que

adaptações poderiam ser feitas para otimizá-la etc.).

O próximo momento da aula era a realização do jogo, no qual os professores apresentavam

noções de posicionamento, regras, jogar com o time/jogar individualmente, porém, eram as próprias

participantes que decidiam através de uma rápida conversa quem iria jogar em cada uma das

posições. Durante o jogo era pedido para que as “alunas” trocassem de posição a fim de

experimentar todas e identificar-se mais com uma.

Finalmente, como último momento da aula, era desenvolvida a reflexão sobre as atividades

apresentadas/realizadas, o jogo, dificuldades encontradas, formas de superá-las, evolução de todos

enquanto grupo e individualmente. Neste momento, no início, enquanto professor, falava muito

mais que o grupo, porém, com o decorrer dos encontros, o diálogo evoluiu naturalmente, tornando

as trocas de informações e experiências extremamente dinâmicas.

Para este trabalho foi feita a opção pela pesquisa qualitativa, a qual daria um maior

parâmetro para a coleta e análise de informações. Para Negrine (1999), a base desse tipo de

investigação se concentra na descrição, análise e interpretação das informações recolhidas durante o

processo investigatório. Para André (1995), o principal instrumento para esse tipo de pesquisa é o

próprio relator que deverá ser muito fiel nos dados descritos, para posteriormente serem analisados

e bem interpretados.

Dentro desse tipo de pesquisa foi utilizado como instrumento para a coleta de dados a

pesquisa qualitativa com inspiração na fenomenologia, modalidade fenômeno situado (MARTINS;

BICUDO, 1989), sendo que na coleta dos discursos dos participantes do Grupo de Lazer lhes foram

propostas três interrogações apresentadas a seguir:

1- Fale sobre suas aprendizagens como participante do Grupo de Lazer. (Aprendizagens em relação

à organização da aula, ao esporte, a vida, conscientização etc.).

2- Quais as relações entre as suas aprendizagens no Grupo de Lazer e outras experiências corporais?

(Se as aprendizagens ocorridas no Grupo de Lazer ampliaram ou não suas experiências corporais).

3- Quais as relações entre as suas aprendizagens no Grupo de Lazer e a Educação Física Escolar?

(Memórias referentes à estruturação da aula na época em que as participantes eram alunas e

praticavam, ou não, Educação Física na escola em comparação com a atual fase do Grupo de

Lazer).

As questões foram as indicadas anteriormente, mas à medida que as entrevistadas

demonstraram dificuldade na compreensão das mesmas, foram feitas intervenções por parte do

entrevistador no sentido de explicitar o que havia sido perguntado. Suas falas foram gravadas em

fitas cassete magnéticas, para posterior transcrição integral. Todos os discursos coletados foram

transcritos rigorosamente na íntegra para posterior análise.

336

Observa-se que as transcrições, por vezes, possuem erros do ponto de vista da língua

portuguesa culta, pois foi mantida a fala original dos sujeitos entrevistados, conforme suas

pronúncias, ou seja, manteve-se o discurso ingênuo, no sentido de genuíno, entendido como dado

original primário (GONÇALVES JUNIOR, 2003).

Esclarece-se que, após a transcrição integral dos discursos (descrições dos sujeitos),

ocorreram as seguintes fases, descritas por Gonçalves Junior (2003):

• Identificação das Unidades de Significado

Após realizar várias vezes a leitura da descrição, fez-se o levantamento de asserções que

foram significativas, no que se refere à interrogação empreendida. Trata-se do estabelecimento de

unidades de significado, as quais aparecem sublinhadas nas descrições transcritas dos sujeitos.

• Matriz nomotética

Refere-se a uma análise do geral, na qual buscou-se uma normatividade através da

comparação dos vários discursos coletados. Envolve, através de um movimento do individual para o

geral, uma compreensão das proposições individuais como exemplo de algo mais geral, ou seja,

uma generalidade das proposições individuais nas quais se baseia.

A matriz nomotética se compõe de uma coluna à esquerda onde se expõe às categorias

provenientes dos discursos dos sujeitos interrogados. As categorias são classificações organizadas

pelo pesquisador com base nas asserções encontradas nos discursos dos sujeitos participantes da

pesquisa.

Para a construção da matriz, foi necessária também a disposição da identificação dos

discursos dos sujeitos, que foi realizada através da numeração das descrições com algarismos

romanos, dispostos na parte superior da matriz em uma seqüência horizontal.

Abaixo da seqüência dos discursos identificados e do lado direito das categorias,

estabeleceram-se as caselas, nas quais estão dispostos os números arábicos da unidade de

significado correspondente àquela categoria e discurso, não se perdendo assim, a origem da referida

unidade.

• Construção dos Resultados

Última fase da pesquisa, em que se busca uma compreensão do fenômeno, baseando-se

diretamente nos dados da matriz nomotética, a qual pode revelar idiossincrasias (individualidade de

proposições por parte de um dos sujeitos), proposições convergentes e/ou divergentes.

Independente da saturação ou não das categorias, todas as proposições foram consideradas,

pois ainda que estas perspectivas acerca da temática abordada nas três questões não estejam

saturadas, fica claro que elas existem e dão existência às diversas perspectivas devido a inesgotável

abrangência das mesmas.

337

4. ENTREVISTAS

Sujeito I – Professora:

Questão 1: Fale sobre suas aprendizagens como participante do Grupo de Lazer. (Aprendizagens

em relação à organização da aula, ao esporte, a vida, conscientização etc.).

Sujeito I: Em relação às atividades eu aprendi muito porque nunca eu joguei futebol, gosto das

atividades..., são criativas..., bem elaboradas e atingiu os meus objetivos. (1) Em relação ao pessoal

é um grupo muito unido, brincalhão, mas sempre um respeitando o outro (2) e chega a ser um Lazer

mesmo, uma recreação.

Entrevistador: Você considera estas aprendizagens que você teve no Grupo de Lazer importantes

só relacionadas assim ao futebol?

Sujeito I: Não!

Entrevistador: Relacionadas a mais o que?

Sujeito I: Ao convívio? A gente aprende, conhece mais um pouquinho dos participantes do grupo.

(3)

Questão 2: Quais as relações entre as suas aprendizagens no Grupo de Lazer e outras experiências

corporais? (Se as aprendizagens ocorridas no Grupo de Lazer ampliaram ou não suas experiências

corporais).

Entrevistador: Se as atividades eram só repetição, se as atividades em só pra você repetir um

movimento ou era mais relacionado ao jogo, desenvolvimento das habilidades através desse jogo.

Sujeito I: Tinha de desenvolvimento das habilidades, tinha de integração... tinha de recreação e era

isso aí, eram variadas. A atividade com as bolinhas de tênis também foi nova e interessante. (1)

Questão 3: Quais as relações entre as suas aprendizagens no Grupo de Lazer e a Educação Física

Escolar? (Memórias referentes à estruturação da aula na época em que as participantes eram alunas

e praticavam, ou não, Educação Física na escola em comparação com a atual fase do Grupo de

Lazer).

Entrevistador: Como você vê uma aula de Educação Física escolar. Você acha que é mais ou

menos relacionada, é mais ou menos nos moldes da aula do Grupo de Lazer ou você vê uma

diferença?

Sujeito I: Que eu vejo hoje? Ou que eu via?

Entrevistador: Através das suas experiências enquanto participante do Grupo de Lazer desde o

início. Você sabe a estrutura da aula do Grupo de Lazer. Considerando uma aula de Educação Física

escolar, você acha que é mais ou menos desse jeito.

338

Sujeito I: Eu acho que varia de professor pra professor. Eu acho que uns 70% seguem essa linha de

ter um começo, um meio e um fim. (1) Os 30% restantes não...é deixa os alunos decidirem o que

vão fazer e faz lá o que você quiser (2) E fica esperando só.

Entrevistador: E como, pelo menos dentro da sua experiência com Educação Física escolar, que

você foi aluna, como estudante de Educação Física, como participante de outros grupos, como você

pensa que seria uma aula “ideal” de Educação Física?

Sujeito I: Elaborar atividades de acordo com a idade que você for trabalhar, (3) ter um começo, um

meio e um fim. Atividades interativas pra aquecer, a principal que você for trabalhar e a mais

tranqüila no final. Eu enxergo assim!

Sujeito II – Estudante:

Questão 1: Fale sobre suas aprendizagens como participante do Grupo de Lazer. (Aprendizagens

em relação à organização da aula, ao esporte, a vida, conscientização etc.).

Sujeito II: Fiz novas amizades (1), melhorou meu desempenho no futebol (2) e ajudou no meu

condicionamento. (3)

Questão 2: Quais as relações entre as suas aprendizagens no Grupo de Lazer e outras experiências

corporais? (Se as aprendizagens ocorridas no Grupo de Lazer ampliaram ou não suas experiências

corporais).

Entrevistador: Se o Grupo de Lazer trouxe no seu cotidiano ou na sua experiência outro tipo de

aprendizagem, pois a gente sabe que o principal foco era o futebol, certo! Mas, se além do futebol,

trouxe outras experiências corporais que você lembra ou que você acha que foram importantes

desde o começo?

Sujeito II: Experiências corporais?

Entrevistador: Experiências corporais é tudo: recreação, atividades relacionadas a outros esportes.

Sujeito II: Ah, ta! Tiveram jogos diferentes que eu nunca tinha jogado, foi bem legal... (1)

Entrevistador: Você pode dar um exemplo de jogo diferente?

Sujeito II: Era rúgbi? Flagball e tiveram outros...

Entrevistador: E mesmo com relação ao foco principal, o futebol, você acha que todas as

atividades que você participou aqui, eram razoavelmente conhecidas, ou eram atividades novas,

interessantes ou não tão interessantes, você pode falar um pouquinho sobre isso?

Sujeito II: Ah, algumas eram novas e bem interessantes, eu gostei de todas, todas foram legais! (2)

Questão 3: Quais as relações entre as suas aprendizagens no Grupo de Lazer e a Educação Física

Escolar? (Memórias referentes à estruturação da aula na época em que as participantes eram alunas

339

e praticavam, ou não, Educação Física na escola em comparação com a atual fase do Grupo de

Lazer).

Entrevistador: Quais as relações entre essas aprendizagens, com relação à aula que a gente têm

aqui normalmente, o esqueminha da aula... Quais as relações que você faz entre a aula que a gente

tem aqui e a Educação Física Escolar, a sua Educação Física Escolar, não só no Ensino Médio, mas

também no Ensino Fundamental, se é parecido com o que você aqui a aula que você tinha lá?

Sujeito II: Ah, algumas coisas eram parecidas, as brincadeiras, lembra mais o Fundamental (1),

porque no Ensino Médio não é tanto, a gente só jogava, só joga (2), né?, não tem recreação e as

brincadeiras são legais porque ajuda do mesmo jeito.

Entrevistador: E, você falou que as atividades realizadas lembram as atividades do Ensino

Fundamental, você pode dar algum exemplo?

Sujeito II: Base 4!

Entrevistador: Já tinha jogado no Ensino Fundamental? Aqui mesmo nessa escola?

Sujeito 2: E, deixa eu ver, tinha outra, ah, que eu lembre é essa!

Entrevistador: Com relação à estrutura da aula, você falou que no Ensino Médio é mais chegar e

jogar, no Ensino Fundamental era diferente? E aqui como é que você vê as aulas?

Sujeito 2: No fundamental era diferente, tinha a brincadeira, muitas vezes não tinha o jogo (3). O

jogo assim futebol, vamos jogar futebol, vamos jogar basquete, podia ser só a brincadeira que era

bem legal! E, aqui também, aqui você tem um pouco dos dois, que é mais legal ainda.

Sujeito III – Funcionária:

Questão 1: Fale sobre suas aprendizagens como participante do Grupo de Lazer. (Aprendizagens

em relação à organização da aula, ao esporte, a vida, conscientização etc.).

Entrevistador: Essas aprendizagens podem ser em relação às aulas, quanto à convivência, quanto à

vida, quanto ao esporte, o futebol que era nosso principal foco, ou outras coisas.

Sujeito III: Aprendizagens... Relacionamento, se tornou um grupo muito legal, onde a gente pode

conversar sobre tudo (1), coisas pessoais, coisas cotidianas, um tira sarro do outro. Descobrimos

que nós temos capacidade, que mal sabíamos chutar e hoje em dia agente até troca passes e tenta

fazer o gol (2), quer dizer capacidade! Se me perguntasse se você sabe jogar, eu diria não, imagina!

Agora se me perguntarem: - Você quer tentar jogar handebol? Eu falo: - Quero! Porque eu acho que

eu vou ser capaz de fazer, então acabou desenvolvendo em nós uma auto-estima maior (3), eu acho.

Questão 2: Quais as relações entre as suas aprendizagens no Grupo de Lazer e outras experiências

corporais? (Se as aprendizagens ocorridas no Grupo de Lazer ampliaram ou não suas experiências

corporais).

340

Entrevistador: Eu sei que nosso foco principal aqui é o futebol, só que além do futebol, você

percebe outras atividades trabalhadas, que trabalham outras coisas que você não conhecia

anteriormente, relacionadas a condicionamento físico, recreação, conhecimento sobre outros

esportes, atividades diferentes.

Sujeito III: Eu descobri, eu acho assim, que a gente vem treinar, o nosso objetivo hoje é o futsal,

mas ao mesmo tempo nós estamos trabalhando o nosso corpo e a gente acaba fazendo uma

academia sem perceber. Todo mundo acabou percebendo que o corpo modelou, que não sei o que

aumentou, que não sei o que endureceu, então a gente acaba fazendo (1), eu que sou sedentária, não

gosto de exercício físico, se me falarem vamos na academia! Eu digo: - Não vou! A gente acaba

trabalhando o corpo de uma forma legal, que você nem percebe.

Questão 3: Quais as relações entre as suas aprendizagens no Grupo de Lazer e a Educação Física

Escolar? (Memórias referentes à estruturação da aula na época em que as participantes eram alunas

e praticavam, ou não, Educação Física na escola em comparação com a atual fase do Grupo de

Lazer).

Entrevistador: Por exemplo, se você acha que o esquema da nossa aula é legal ou que na sua época

de estudante você trabalhava mais ou menos do mesmo jeito, de uma maneira diferente sendo

melhor ou pior.

Sujeito III: Ah, o nosso esquema é melhor! Eu acho assim que acabou todo mundo falando que não

queria jogar futsal, mas era futsal que todo mundo queria jogar, então ficou meio que a maioria

venceu. Me fez lembrar a época que eu estudava, não Ensino Médio, porque eu não podia fazer

Educação Física porque eu já trabalhava, mas a época que eu fazia a minha 5ª, 6ª, 7ª série, que lá eu

gostava de fazer exercício. Aí eu falo: - Não gosto de fazer exercício, sou sedentária, mas não, estou

aqui todos os dias eu acabo vindo porque eu acho que lá no fundo faltava isso, alguém como você,

para encabeçar alguma coisa, pra incentivar a gente a formar esse grupo e agora eu não me importo

que apareça três ou quatro meninas, mas desde que elas apareçam, agora gosto do esquema e acho

que ele está muito bem estruturado. O caminho é por aí mesmo!

Entrevistador: Você lembra mais ou menos como era o esquema da sua aula de Educação Física

no Ensino Fundamental?

Sujeito III: Lembro, eu tinha uma professora que ela era muito focada no vôlei, então eu aprendi

assim que todo professor acaba gostando de alguma atividade e seus alunos acabam seguindo. (1)

Então era sempre vôlei, ela não parava pra ouvir nossa opinião, rodeava, rodeava e acabava no vôlei

(2), tanto é que nesses jogos infantis a gente só treinava vôlei, só participava do vôlei, mas eu

gostava também.

341

Sujeito IV – Professora:

Questão 1: Fale sobre suas aprendizagens como participante do Grupo de Lazer. (Aprendizagens

em relação à organização da aula, ao esporte, a vida, conscientização etc.).

Entrevistador: As aprendizagens podem ser em relação às aulas, ao esporte em si... nosso tema

principal o futebol, aprendizagens que você vai levar para a sua vida em relação a relacionamento,

convivências ou outras coisas.

Sujeito IV: Bom, em relação ao futebol eu nunca joguei, então tudo o que eu estou fazendo aqui eu

estou aprendendo (1), começando do zero. É, em relação a convivência eu estou aqui com pessoas

que eu conheço a muito tempo, mas que eu passei a ver de outro modo agora e a amizade, é lógico,

foi se ampliando. (2)

Questão 2: Quais as relações entre as suas aprendizagens no Grupo de Lazer e outras experiências

corporais? (Se as aprendizagens ocorridas no Grupo de Lazer ampliaram ou não suas experiências

corporais).

Entrevistador: Se as aulas aqui do Grupo de Lazer ampliaram um pouquinho o leque de atividades

que você conhecia em relação a Educação Física, como você tinha falado sobre o futebol e outras

experiências além do futebol se você aprendeu outras coisas relacionadas agora às atividades.

Sujeito IV: É, principalmente o futebol mesmo! Fora outras brincadeiras que a gente faz quando

tem o aquecimento, esporte em grupo (1), enfim, praticamente tudo eu tô começando agora a fazer.

Entrevistador: Eu gostaria que você falasse um pouquinho das expectativas que você tinha quando

você entrou relacionado ao futebol. Você achava que você ia dar conta, que você sente hoje?

Sujeito IV: Eu achei que eu não ia conseguir! Eu achava muito difícil e, agora eu sinto que eu

percebo quando eu erro e a cada partida para mim é uma superação. Às vezes eu tendo a recuar,

quando eu percebo que é um desafio muito grande pra mim, a minha vontade é parar, sair, que eu já

tive crise aqui que quem faz sabe! Daí eu penso que tá tão bom pra mim que eu penso que vale a

pena eu superar isso e continuar. (2) E eu acho que o grupo também acolhe muito bem, conseguindo

entender essa dificuldade.

Questão 3: Quais as relações entre as suas aprendizagens no Grupo de Lazer e a Educação Física

Escolar? (Memórias referentes à estruturação da aula na época em que as participantes eram alunas

e praticavam, ou não, Educação Física na escola em comparação com a atual fase do Grupo de

Lazer).

Entrevistador: É um pouquinho do que eu tinha falado pra você antes, gostaria que você fizesse

um paralelo entre as aulas aqui do nosso grupo e as suas aulas de Educação Física no Ensino

342

Fundamental I, Ensino Fundamental II, Ensino Médio, ou se você já era participante em outros

grupos.

Sujeito IV: Bom, posso dizer primeiro em relação aos alunos? Os alunos, os professores de

Educação Física percebem aspectos nos alunos, que às vezes a gente como professora na sala de

aula não percebe. E eu enquanto participante comecei a sentir a dificuldade que é trabalhar algo

muito mental, que você tem que entender aquilo e sentir aquela idéia e se esforçar pra conseguir

colocar na sua cabeça e compreender enfim aquilo que você está trabalhando. E, aprender com o

corpo tem um outro aspecto ainda, que além de você entender, você tem que conseguir fazer, e isso

pra mim é difícil, porque eu sempre lidei com outro aspecto que é entender e partir pra escrita, mas

entender fisicamente é difícil (1)! Eu entendo, mas não consigo fazer! Então, agora só a pratica pra

fazer com que eu consiga algumas coisas.

Entrevistador: Agora só pra terminar! Você lembra mais ou menos como era o esquema das suas

aulas de Educação Física, não precisa falar onde era, que você falasse um pouquinho se era mais ou

menos parecido com o nosso esquema de aula, se era diferente, se você acha que nós tivemos um

avanço aqui ou se era melhor lá?

Sujeito IV: Eu acho que teve um avanço grande sim, porque na minha época era muita competição

e, eu acho até que foi isso que me inibiu um pouco (2). Porque eu lembro que no começo, até a 4ª

série, eu sempre fui muito bem, participava de Olimpíada e com o tempo isso foi morrendo em

mim, foi um aspecto que eu não trabalhei muito bem (3). Depois mais velha eu fui fazer dança, mas

ficou uma coisa meio desajustada, né?, e agora que eu estou voltando a fazer eu to sentindo que

realmente foi alguma coisa que travou lá atrás, porque é assim, eu nem me lembro de fazer

alongamento e aquecimento pra começar a aula, então eu vejo o esquema que há algum tempo eu

vejo o pessoal fazer aqui no Colégio eu não me lembro de fazer naquela época. (4) Se bem que tem

gente que ainda faz! Aquela coisa do professor sentar e os alunos ficarem jogando câmbio,

queimada, né?, e quando no fim da aula dá o sinal e todo mundo vai embora (5). Então eu acho que

foi isso que me desmotivou também, na adolescência a gente já fica mais tendencioso a não fazer,

então eu parei! Parei com esportes né?, porque dança eu cheguei a fazer.

Sujeito V – Estudante:

Questão 1: Fale sobre suas aprendizagens como participante do Grupo de Lazer. (Aprendizagens

em relação à organização da aula, ao esporte, a vida, conscientização etc.).

Entrevistador: Essas aprendizagens podem ser em relação às aulas, quanto a convivência, quanto a

vida, quanto ao esporte, o futebol que era nosso principal foco, ou outras coisas.

Sujeito V: Convivência, hã, a diferença de idade é bem grande , aí... do que as minhas amigas, mas

é legal! (1) No esporte aprende as funções melhor (2), treina.

343

Questão 2: Quais as relações entre as suas aprendizagens no Grupo de Lazer e outras experiências

corporais? (Se as aprendizagens ocorridas no Grupo de Lazer ampliaram ou não suas experiências

corporais).

Entrevistador: No que as aprendizagens ocorridas aqui no Grupo de Lazer ampliaram ou não as

suas experiências corporais. Se além do futebol, as outras atividades exploradas aqui por nós

durante as aulas foram novas pra você e trouxeram alguns comentários ou algumas práticas

importantes na sua vida ou se, mesmo o que agente fez no futebol foram atividades novas ou

atividades que você já conhecia?

Sujeito V: A maioria foi novo... relacionado a futebol, jogos diferentes que a gente faz (1) e até as

outras aulas que não são relacionadas ao esporte , como futebol americano e fora da quadra também

interessante como a massagem. (2)

Questão 3: Quais as relações entre as suas aprendizagens no Grupo de Lazer e a Educação Física

Escolar? (Memórias referentes à estruturação da aula na época em que as participantes eram alunas

e praticavam, ou não, Educação Física na escola em comparação com a atual fase do Grupo de

Lazer).

Entrevistador: Se mais ou menos o esquema da nossa aula aqui é o esquema da Educação Física

que você tem atualmente no Ensino Médio, que você teve no Ensino Fundamental ou que você

pensa...como você pensa que seja uma aula de Educação Física, ela deve ter mais alguma coisa do

que nós temos aqui ou se tem alguma coisa a mais para ser melhorada. Então primeiro gostaria que

você falasse um pouquinho, fizesse uma relação um pouquinho sobre como é a nossa aula aqui e

como foi a sua aula no Ensino Fundamental ou na Educação Infantil, no Ensino Médio. Se era

parecido, se você achava mais bacana lá ou se você acha mais bacana aqui?

Sujeito V: Acho bem diferente da Educação Física, porque tem mais...hã... a gente treina mais o

futebol por exemplo, na Educação Física a gente só jogava, sem saber a regras, sem saber mais a

fundo ou em qualquer outro esporte . Acho aqui mais interessante porque a gente não aprendia

muito, que nem na Educação Física a gente só jogava. (1)

Entrevistador: Isso no Ensino Fundamental, no Ensino Médio...

Sujeito V: Nos dois!

Entrevistador: E aí, aproveitando que eu tenho conhecimento que você pretende seguir na área da

Educação Física, o que você pensa entrando agora na faculdade, como você pensa que deve ser o

esquema de uma aula... uma aula bem legal que você gostaria de dar pro seus alunos?

Sujeito V: Devia ser mais...é como chama? É...fazer habilidades, treinar mais habilidades, treinar

mais específico chute, domínio e jogo também, importante e não só voltar a dar um esporte, tipo,

344

mas colocar coisas diferentes, como por exemplo, a gente fez com futebol americano. Todo mundo

gostou, eu acho! Outros tipos de esporte pra conhecer, não só o básico basquete, vôlei e futebol (2),

porque a maioria já conhece né? Atletismo, essas coisas...

Entrevistador: E aproveitando uma coisa que você falou também, mesmo com relação aos esportes

mais tradicionais trabalhados e repetidos ano após ano, que fosse... não sei se essa é a sua idéia,

fosse mais aprofundado no sentido de exploração das regras ou adaptações a esse mesmo jogo pra

que não ficasse sempre aquela repetição...

Sujeito V: Enjoa né? Fica uma coisa chata, muita gente não gosta de jogar por isso!

Sujeito VI – Antiga monitora da escola:

Questão 1: Fale sobre suas aprendizagens como participante do Grupo de Lazer. (Aprendizagens

em relação à organização da aula, ao esporte, a vida, conscientização etc.).

Entrevistador: Essas aprendizagens podem ser em relação às aulas, quanto a convivência, quanto a

vida, quanto ao esporte, o futebol que era nosso principal foco, ou qualquer outro tipo de

aprendizagem.

Sujeito VI: Bom, participar do grupo pra mim eu acho uma atividade legal porque sai fora da

minha rotina, da minha correria do dia-a-dia (1) e eu acho interessante porque a gente passou por

uma série de atividades, desde fundamento (2), é relações de esforço físico (3), de interação, eu

acho bacana algumas atividades que tem envolvidas alguma coisa de dinâmica, de trabalhar em

grupo (4), então assim, pra mim ta sendo aprendizado em todos os sentidos principalmente, que

seria talvez o meu objetivo quando eu entrei seja fundamento mesmo do esporte futebol, mas daí eu

percebi que você mescla com uma série de outras atividades que estão evoluindo pra outras

características que eu nem buscava a princípio, mas que hoje eu já percebo que tem uma

importância muito grande porque faz uma série de interação com outros fatores (5) que não só o

futebol em si.

Questão 2: Quais as relações entre as suas aprendizagens no Grupo de Lazer e outras experiências

corporais? (Se as aprendizagens ocorridas no Grupo de Lazer ampliaram ou não suas experiências

corporais).

Entrevistador: Se as aprendizagens ocorridas aqui no Grupo de Lazer ampliaram, ou não, as suas

experiências corporais. Essas experiências corporais podem ser em relação ao nosso principal foco

o futebol, as atividades realizadas além do futebol ou as atividades realizadas por outras pessoas

como a outra professora de Educação Física, então se essas atividades foram novas, se você achou

importante ou se a maioria já eram conhecidas suas?

345

Sujeito VI: Fora o que a gente tem de... porque fundamentos eu já tinha feito em outras épocas,

então, até então não foram novidade. Fora isso, todas as atividades pra mim são novas! Essas

atividades de aquecimento que a gente faz, eu, na minha época de estudante nunca tinha feito, a

atividade que a outra professora de Educação Física deu também e são coisas que vão

acrescentando (1), pelo menos pra mim, tem dia que eu chego aqui numa pilha e vou pra casa de

boa, consigo trabalhar depois porque é realmente uma atividade de lazer, nem só um esporte que

além de tudo é bom porque é uma atividade física, mas também neste sentido de descontração. (2)

Questão 3: Quais as relações entre as suas aprendizagens no Grupo de Lazer e a Educação Física

Escolar? (Memórias referentes à estruturação da aula na época em que as participantes eram alunas

e praticavam, ou não, Educação Física na escola em comparação com a atual fase do Grupo de

Lazer).

Entrevistador: Gostaria que você fizesse uma retrospectiva para a sua época de participante das

aulas de Educação Física, como eram essas aulas, se eram parecidas com as nossas aulas, se você

achava que a Educação Física era aquilo e através do Grupo de Lazer achou que era outra coisa.

Sujeito VI: A atividade que a gente faz é bem diferente da minha época de aluna de Educação

Física quando, pelo que eu me lembro, a gente tinha só a segunda parte que era aquecimento,

fundamento e jogo em todos os esportes. (1)

Entrevistador: E era sempre esporte?

Sujeito VI: Sempre! Aí a gente tinha que escolher ou fazia futebol ou handebol, você escolhia o

módulo que você queria. Como eu gostava de um, eu só fazia futebol, então a gente não passava por

outros esportes, então eu não aprendi muito de basquete, de vôlei, só que eu fazia o que eu gostava,

então não tinha atividade de integração mesmo. (2)

Entrevistador: Ahã! E isso a partir de quando você lembra que essas atividades eram dessa

maneira, vocês faziam a escolha e vocês direcionavam mais a isso?

Sujeito VI: Isso foi no... Colegial! Quando era até a 8ª era por período, então tipo, os dois primeiros

meses era um, outros dois outro, ia mudando assim a gente fazia um pouquinho de tudo.

Entrevistador: Mas sempre relacionado a esporte?

Sujeito VI: Sempre!

Entrevistador: Você lembra mais ou menos quais esportes eram trabalhados?

Sujeito VI: Eu acho que era futebol, handebol, basquete e vôlei. Mas eu acho que o foco maior...

basquete não era muito porque menina não, eu acho que não gostava muito, no geral as meninas não

gostavam muito. E era assim, não tinha essas atividades, então eu acho que é bem interessante

porque ela trabalha mais convivência, eu acho que é o momento que sai da sala de aula e você vai

fazer outras coisas. (3) Quem não gosta, eu gostava, mas quem não gostava de esporte não gostava

346

da aula de Educação Física porque era só jogo, se tem atividade diferente acaba que faz com que

todo mundo participe melhor. (4)

5. CONSTRUÇÃO DOS RESULTADOS

Os resultados que serão apresentados a seguir foram organizados em categorias que

emergiram a partir dos discursos das participantes entrevistadas, que, por sua vez, desvelaram suas

perspectivas acerca de suas aprendizagens, relações com outras experiências corporais e com as

aulas de Educação Física.

Vale salientar, que nesta perspectiva metodológica, os discursos das participantes não

precisam ser confrontados com “falas” de autores acadêmicos, pois são relevantes e expressam a

descrição de suas compreensões acerca da temática estudada.

Em alguns casos são observadas caselas vazias na matriz construída, indicando que a

depoente não expressou asserção correspondente àquela categoria.

Quadro 1 – Matriz Nomotética – Questão 1:

Questão: Fale sobre suas aprendizagens como participante do Grupo de Lazer. (Aprendizagens em

relação à organização da aula, ao esporte, a vida, conscientização etc.).

Depoentes

Categorias I II III IV V VI

A. Aprendizagens significativas

relacionadas ao esporte futsal.

1 2 2 1 2 2

B. Aprendizagens significativas não

relacionadas diretamente com o

esporte futsal.

2 1 e 3 1 e 3 2 1 3 e 4

C. Relaxamento para a rotina de

trabalho.

1

D. Interação de fatores inerentes ao

esporte com fatores de convivência.

5

Apresentaremos, a seguir, cada uma das quatro categorias, utilizando-se de fragmentos

provenientes das unidades de significado (atribuídas por nós pesquisadores) dos discursos das seis

participantes da pesquisa, relacionados com a questão número um. Nos fragmentos retirados dos

discursos dos educadores e educadoras, e selecionados para serem expostos ao longo da construção

347

dos resultados, podemos notar letras maiúsculas que aparecem ao lado do número arábico (unidade

de significado) e correspondem à categoria que aquele discurso pertence.

A. Aprendizagens significativas relacionadas ao esporte futsal.

Conforme mencionado anteriormente, o esporte e particularmente o futsal, foi o conteúdo

escolhido pelas participantes do grupo na elaboração do planejamento participativo. Todas as

participantes mencionaram ter tido aprendizagens relacionadas ao esporte, suas regras,

fundamentos, esquema tático, visão de jogo, conforme podemos observar nos seguintes trechos:

“(...) eu aprendi muito porque nunca eu joguei futebol, gosto das atividades..., são criativas..., bem

elaboradas e atingiu os meus objetivos” (Sujeito I – 1A).

“(...) Descobrimos que nós temos capacidade, que mal sabíamos chutar e hoje em dia agente até

troca passes e tenta fazer o gol!” (Sujeito III – 2A).

Nesta categoria observou-se a evolução ocorrida por alguns membros do Grupo de Lazer de

um conteúdo/esporte desde a iniciação a modalidade até a realização de atividades/jogos mais

elaborados e complexos utilizando o futsal.

B. Aprendizagens significativas não relacionadas diretamente com o esporte futsal.

Esta categoria diz respeito às aprendizagens significativas não relacionadas diretamente com

o futsal. Uma delas tem relação com o convívio, conhecimento aprofundado das pessoas, criação de

vínculos de amizade entre todas as participantes como, por exemplo, podemos observar nos

seguintes trechos:

“(...) em relação a convivência eu estou aqui com pessoas que eu conheço a muito tempo, mas que

eu passei a ver de outro modo agora e a amizade, é lógico, foi se ampliando” (Sujeito IV – 2B).

“(...) Convivência, hã, a diferença de idade é bem grande, aí... do que as minhas amigas, mas é

legal!” (Sujeito V – 1B).

O relacionamento entre representantes de diferentes segmentos dentro da escola

(professoras, funcionárias e alunas) mostrou-se extremamente positivo estendendo-se para

encontros posteriores, confraternizações e quebra de hierarquia e timidez de algumas das

participantes.

Outra aprendizagem refere-se à evolução biológica do corpo no sentido de condicionamento

físico, fortalecimento dos músculos, melhoria do sistema respiratório, como podemos observar em:

“(...) ajudou no meu condicionamento.” (Sujeito II – 3C).

“(...) é, relações de esforço físico” (Sujeito VI – 3C).

348

Tais comentários são interessantes, pois começam a demonstrar uma tomada de consciência

em relação a fatores não só relacionados a atividade em si, ou o jogo/esporte pelo jogo/esporte, mas

sim ao exercício físico, um dos responsáveis por uma mudança na qualidade de vida das pessoas.

Também foi encontrada a referência a aspectos trabalhados pelo professor nas suas aulas,

sendo um deles, a auto-estima, como podemos observar em:

“(...) Se me perguntasse se você sabe jogar, eu diria não, imagina! Agora se me perguntarem: -

Você quer tentar jogar handebol? Eu falo: - Quero! Porque eu acho que eu vou ser capaz de fazer,

então acabou desenvolvendo em nós uma auto-estima maior...” (Sujeito III – 3D).

C. Relaxamento para a rotina de trabalho.

Esta categoria referenda as atividades realizadas pelo Grupo de Lazer como sendo um dos

responsáveis pelo relaxamento e descanso para a rotina de trabalho, como podemos observar em:

“(...) participar do grupo pra mim eu acho uma atividade legal porque sai fora da minha rotina, da

minha correria do dia-a-dia...” (Sujeito VI – 1E).

Tal reflexão nos remete a mais uma das facetas da Educação Física como componente

curricular, que é proporcionar momentos de lazer e realização de atividades prazerosas para todos.

Obviamente que não se restringe a isso, mas é inegável que sem esta característica, a Educação

Física não seria tão “popular” entre os alunos dentro da escola.

D. Interação de fatores inerentes ao esporte com fatores de convivência.

Esta categoria complementa e aprofunda o entendimento da concepção que a Educação

Física não tem fim em si só, mas também trabalha com fatores relacionados à afetividade e

fortalecimento de vínculos de amizade, como podemos observar em:

“(...) percebi que você mescla com uma série de outras atividades que estão evoluindo pra outras

características que eu nem buscava a princípio, mas que hoje eu já percebo que tem uma

importância muito grande porque faz uma série de interação com outros fatores que não só o

futebol em si...” (Sujeito VI – 5F).

Quadro 2 – Matriz Nomotética – Questão 2:

Questão: Quais as relações entre as suas aprendizagens no Grupo de Lazer e outras experiências

corporais? (Se as aprendizagens ocorridas no Grupo de Lazer ampliaram ou não suas experiências

corporais).

349

Depoentes

Categorias I II III IV V VI

A. Desenvolvimento de outros

conteúdos.

1 1 1 2 1

B. Conhecimento de atividades

relacionadas ao esporte futsal.

2 1

C. Superação de dificuldades, limites e

erros.

2

D. Interferindo na qualidade de vida. 1 2

Na seqüência, apresentaremos cada uma das quatro categorias, utilizando-se de fragmentos

provenientes das unidades de significado (atribuídas por nós pesquisadores) dos discursos das seis

participantes da pesquisa, relacionados com a questão de número dois.

A. Desenvolvimento de outros conteúdos.

Conforme citado anteriormente, um dos objetivos do trabalho com o Grupo de Lazer foi o

da apresentação de atividades e principalmente jogos relacionados a outros conteúdos. Esta

categoria foi construída a partir dos excertos de cinco das seis participantes do grupo.

“(...) Tiveram jogos diferentes que eu nunca tinha jogado, foi bem legal...” (Sujeito II – 1A).

“(...) até as outras aulas que não são relacionadas ao esporte, como futebol americano e fora da

quadra também interessante como a massagem...” (Sujeito V – 2A).

Vale salientar, que as atividades e conteúdos trabalhados com o Grupo de Lazer foram

selecionados junto aos conteúdos trabalhados pelos professores em suas aulas do Ensino

Fundamental e do Ensino Médio. Os conteúdos abordados foram: saúde e qualidade de vida,

práticas corporais alternativas, esportes adaptados e jogos de “quebra-gelo”.

B. Conhecimento de atividades relacionadas ao esporte futsal.

A maioria das participantes do Grupo de Lazer teve contato com o futsal durante as aulas

passando desde atividades/jogos de iniciação ao esporte, até atividades mais complexas

relacionadas ao entendimento mais profundo do jogo. Curiosamente as citações que nos remetem a

esta categoria foram feitas por duas das participantes que tinham maior experiência com o esporte,

tendo passado até por turmas de treinamento.

“(...) A maioria foi novo... relacionado a futebol, jogos diferentes que a gente faz...” (Sujeito V –

1B).

350

“(...) algumas eram novas e bem interessantes, eu gostei de todas, todas foram legais!” (Sujeito II –

2B).

C. Superação de dificuldades, limites e erros.

Esta categoria nos remete ao fortalecimento da auto-estima, como foi mencionado numa das

categorias da questão um, levando as participantes a experienciarem diferentes níveis de dificuldade

apresentados durante as atividades e principalmente nos jogos, objetivando a superação de

limitações pessoais e limitações impostas pela sociedade.

“(...) eu sinto que eu percebo quando eu erro e a cada partida para mim é uma superação. Às vezes

eu tendo a recuar, quando eu percebo que é um desafio muito grande pra mim, a minha vontade é

parar, sair, que eu já tive crise aqui que quem faz sabe! Daí eu penso que tá tão bom pra mim que

eu penso que vale a pena eu superar isso e continuar...” (Sujeito IV – 2C).

D. Interferindo na qualidade de vida.

Categoria que faz referência ao lazer e à prática de atividade física como necessários para a

rotina diária, seja ela de estudo ou trabalho, sendo responsáveis por uma mudança na qualidade de

vida.

“(...) porque é realmente uma atividade de lazer, nem só um esporte que além de tudo é bom porque

é uma atividade física, mas também neste sentido de descontração...” (Sujeito VI – 2D).

“(...) mas, ao mesmo tempo nós estamos trabalhando o nosso corpo e a gente acaba fazendo uma

academia sem perceber. Todo mundo acabou percebendo que o corpo modelou, que não sei o que

aumentou, que não sei o que endureceu, então a gente acaba fazendo” (Sujeito III – 1D).

As participantes demonstraram consciência das mudanças pessoais ocorridas e as associam

com as atividades realizadas pelo Grupo de Lazer.

Quadro 3 – Matriz Nomotética – Questão 3:

Questão: Quais as relações entre as suas aprendizagens no Grupo de Lazer e a Educação Física

Escolar? (Memórias referentes à estruturação da aula na época em que as participantes eram alunas

e praticavam, ou não, Educação Física na escola em comparação com a atual fase do Grupo de

Lazer).

351

Depoentes

Categorias I II III IV V VI

A. A prática da aula livre. 2 2 5 1 1

B. Estrutura da aula influenciando na

participação.

1 e 3 1 e 3 4 2 4

C. Preferências do professor

monopolizando conteúdos.

1 e 2 2

D. Outro olhar para os alunos. 1 3

E. Inibição nas aulas. 2 e 3

Abaixo apresentaremos cada uma das cinco categorias, utilizando-se de fragmentos

provenientes das unidades de significado (atribuídas por nós pesquisadores) dos discursos das seis

participantes, relacionados com a questão número três.

A. A prática da aula “livre”.

Categoria que apresenta que praticamente todas as participantes do Grupo de Lazer já

experienciaram a prática de alguns professores de “rolar a bola” e assumir o papel de organizador

de equipes, árbitro ou nem mesmo isso. Podemos verificar essas afirmações em:

“(...) a gente treina mais o futebol, por exemplo, na Educação Física a gente só jogava, sem saber a

regras, sem saber mais a fundo ou em qualquer outro esporte. Acho aqui mais interessante porque

a gente não aprendia muito, que nem na Educação Física a gente só jogava...” (Sujeito V – 1A).

“(...) Aquela coisa do professor sentar e os alunos ficarem jogando câmbio, queimada, né?, e

quando no fim da aula dá o sinal e todo mundo vai embora...” (Sujeito IV – 5A).

B. Estrutura da aula influenciando na participação.

Aulas relacionadas ao esporte, mas abrangendo formas cooperativas de desenvolvimento são

apontadas como mais interessantes e prazerosas, permitindo a participação de todos, além de

estimular habilidades e capacidades diferentes, abrangendo conceitos, valores e atitudes, como

podemos observar em:

“(...) fazer habilidades, treinar mais habilidades, treinar mais específico chute, domínio e jogo

também, importante e não só voltar a dar um esporte, tipo, mas colocar coisas diferentes como, por

exemplo, a gente fez com futebol americano. Todo mundo gostou, eu acho! Outros tipos de esporte

pra conhecer, não só o básico basquete, vôlei e futebol...” (Sujeito V – 2B).

352

“(...) quem não gostava de esporte não gostava da aula de Educação Física porque era só jogo, se

tem atividade diferente acaba que faz com que todo mundo participe melhor...” (Sujeito VI – 4B).

C. Preferências do professor monopolizando conteúdos.

Nesta categoria ficou evidenciada a influência da preferência por uma modalidade esportiva

na eleição de conteúdos. Foi observada através das falas de duas participantes que apontavam seus

professores, ou até elas mesmas com tendências a direcionar sua prática ao trabalho com uma única

modalidade esportiva, pela experiência adquirida na mesma ou por uma maior facilidade em buscar

atividades e jogos relacionados ao esporte. Podemos observar estas características nos seguintes

trechos:

“(...) Lembro, eu tinha uma professora que ela era muito focada no vôlei, então eu aprendi assim

que todo professor acaba gostando de alguma atividade e seus alunos acabam seguindo...” (Sujeito

III – 1C).

“(...) Como eu gostava de um, eu só fazia futebol, então a gente não passava por outros esportes,

então eu não aprendi muito de basquete, de vôlei, só que eu fazia o que eu gostava, então não tinha

atividade de integração mesmo...” (Sujeito VI – 2C).

“(...) Então era sempre vôlei, ela não parava pra ouvir nossa opinião, rodeava, rodeava e acabava

no vôlei...” (Sujeito III – 2D).

Uma das características da aula, independente do componente curricular, que desperta a

atenção dos alunos é a adequação dos conteúdos à realidade da comunidade com a qual se trabalha.

Na Educação Física esta combinação é extremamente interessante e tende ao sucesso quase sempre,

mas ainda é muito pouco explorada, talvez, devido à dificuldade do professor em abordar diferentes

conteúdos, os quais nem sempre domina. O certo é que muitas vezes o professor é que acaba por

induzir os alunos a segui-lo ministrando aulas sempre relacionadas ao mesmo conteúdo.

D. Outro olhar para os alunos.

Nesta categoria fica presente a valorização do professor de Educação Física por seu olhar

diferenciado em relação aos alunos, observando e captando dificuldades, sejam elas motoras,

cognitivas ou afetivas, as quais os professores que trabalham quase que exclusivamente em sala de

aula não conseguem observar:

“(...) os professores de Educação Física percebem aspectos nos alunos, que às vezes a gente como

professora na sala de aula não percebe. E eu enquanto participante comecei a sentir a dificuldade

que é trabalhar algo muito mental, que você tem que entender aquilo e sentir aquela idéia e se

esforçar pra conseguir colocar na sua cabeça e compreender enfim aquilo que você está

trabalhando. E, aprender com o corpo tem um outro aspecto ainda, que além de você entender,

353

você tem que conseguir fazer, e isso pra mim é difícil, porque eu sempre lidei com outro aspecto

que é entender e partir pra escrita, mas entender fisicamente é difícil...” (Sujeito IV – 1E).

E. Inibição nas aulas.

Categoria construída a partir do discurso de uma das participantes que relatou ter se afastado

das aulas de Educação Física escolar a partir do momento em que o esporte limitou-se à sua prática,

substituindo o prazer, os valores e os conceitos pela competição exacerbada e não reflexiva. A

presença da competição como elemento dominante das aulas de Educação Física aparece segundo

os relatos a partir dos últimos anos do Ensino Fundamental e no Ensino Médio:

“(...) porque na minha época era muita competição e, eu acho até que foi isso que me inibiu um

pouco...” (Sujeito IV – 2F).

Na medida em que a competição não é considerada como elemento dominante nas

aulas/atividades, estabelecem-se outros fatores, como o aprendizado, as discussões e a participação,

como os prioritários a serem desenvolvidos nas aulas de Educação Física:

“(...) eu lembro que no começo, até a 4ª série, eu sempre fui muito bem, participava de Olimpíada e

com o tempo isso foi morrendo em mim, foi um aspecto que eu não trabalhei muito bem...” (Sujeito

IV – 3F).

A não dominância da competição nas aulas de Educação Física aparece, segundo os relatos,

nas primeiras séries do Ensino Fundamental.

CONSIDERAÇÕES

O trabalho com o Grupo de Lazer foi extremamente interessante e surpreendente na medida

em que os discursos coletados, características observadas e dificuldades encontradas estreitaram as

relações dos encontros com as aulas de Educação Física dentro da escola.

O grupo apresentou-se a priori interessado em treinamento, esporte e fundamentos do

mesmo. Esta ainda é a visão da Educação Física para muitos, inclusive alguns alunos meus,

referendada pelas experiências que os mesmos tiveram até àquele momento, pela característica

esportivizada de suas aulas, competição, jogo pelo jogo, esporte pelo esporte.

Porém, será esta a Educação Física que queremos? As respostas coletadas nesta pesquisa

respondem negativamente a esta questão na medida em que a prática do professor em transformar

sua aula em esporte sem variações, privilegiando os indivíduos mais habilidosos em detrimento a

diversidade dos outros com os quais trabalha só acaba por distanciar um número cada vez maior de

alunos das aulas de Educação Física. Atestados, dispensas, atividades concomitantes começam a ser

utilizados como desculpa para a não realização das aulas ou quando isso não acontece o que

354

observamos é a presença de um aluno disperso, desinteressado ou pior ainda, apático, que não

expõe suas opiniões, dúvidas e idéias.

No primeiro encontro a discussão acerca do conteúdo trabalhado e a escolha democrática do

mesmo já demonstrou uma mudança, que para muitas das participantes, talvez nem tenha sido

percebida, mas elas tiveram o direito de serem ouvidas, propuseram suas idéias, ouviram as

sugestões das outras colegas de trabalho, agora “colegas de grupo”, chegando a um consenso.

Ao propor a realização de um planejamento participativo, entre outros aspectos, o professor

está exercitando por um lado, o respeito pelas idéias dos alunos contextualizadas com suas

diferentes realidades, por outro, restituindo o direito a que todos se manifestem sendo ouvidos e

considerados.

As atividades relacionadas a outros conteúdos que não fossem o futsal (escolhido

democraticamente pelo grupo), eram consideradas no início atividades de aquecimento e recreação

preparatórios para o esporte, dissociadas completamente do mesmo. No decorrer dos encontros

essas atividades relacionadas a outros conteúdos, os quais foram citados anteriormente, ganharam

destaque e mereceram ampliação de tempo para sua realização.

Em alguns dos encontros, o conteúdo esportivo nem chegou a ser trabalhado, mas o sucesso

da aula foi notado à medida que existiu uma grande quantidade de participantes que citaram em

suas falas as aprendizagens relacionadas a outros conteúdos.

Darido e Souza Júnior (2007) condenam a prática da Educação Física vinculada apenas a

uma parcela da cultura corporal, os esportes coletivos, especialmente àqueles mais praticados no

Brasil: futebol, voleibol e basquetebol.

Ainda segundo os autores, em virtude da ênfase esportiva, a Educação Física tem deixado de

lado importantes expressões da cultura corporal produzidas ao longo da história do ser humano,

bem como o conhecimento sobre o próprio corpo. Tais expressões – as danças, as lutas os esportes

ligados à natureza, os jogos – e conhecimentos, podem e devem constituir-se em objeto de ensino e

de aprendizagem. Por exemplo, as danças podem estar presentes, com mais freqüência, nas aulas de

Educação Física.

Neste sentido, os jogos cooperativos, esportes adaptados e conhecimento de outras

modalidades foram conteúdos abordados e apresentados ao Grupo de Lazer. As respostas do grupo

à realização das novas atividades foram semelhantes. Houve integrantes resistentes, mas a grande

maioria respondeu positivamente aos questionamentos propostos posicionando-se durante as

discussões realizadas e refletindo sobre as posturas e atitudes.

No que se refere ao conteúdo principal das aulas, o futsal, a ênfase maior no trabalho feito

com o Grupo de Lazer foi a apresentação da modalidade, seus fundamentos, regras e discussões

acerca das dificuldades encontradas pelas participantes durante o processo de aprendizagem e

355

formas de superá-las. Os encontros não abrangeram todos os componentes da modalidade como

discutir estética numa partida de futebol ou refletir sobre as obras de Nelson Rodrigues

(CASTELLANI FILHO, 1993), mas não se limitaram somente ao saber fazer.

A proposição de jogos que explorassem não só fundamentos, mas também as capacidades

físicas agilidade, equilíbrio, coordenação e ritmo foram uma constante, sendo muito bem aceitos

pelas participantes conforme também observado em suas falas.

A aprendizagem e o desenvolvimento de todas as participantes do grupo no transcorrer do

ano de 2009 ficaram evidenciados durante o campeonato de futsal, realizado no mesmo ano dentro

da escola, no qual o grupo “Norma Futebol Clube” disputou jogos equilibrados com as meninas que

cursavam o Ensino Médio, as quais tinham menos idade e quase na sua totalidade, muito mais

conhecimento da modalidade. Os comentários ouvidos pelas participantes foram extremamente

positivos e envaidecedores, incentivando ainda mais o comparecimento das mesmas aos encontros.

Seria impossível também deixar de lado neste trabalho as observações feitas acerca da

sintonia do grupo, seu comportamento e valorização do mesmo como elemento fundamental para

obtenção do sucesso alcançado nos encontros. Desde o início, todas as participantes mostraram-se

atenciosas e companheiras, auxiliando as colegas nos momentos de dificuldade, sejam elas

relacionadas às situações encontradas dentro da aula ou de fora.

Em momentos de angústia, apatia, timidez ou na recepção às novas colegas que passaram e

não permaneceram durante todo o ano, essa turma mostrou-se extremamente especial. Situações nas

quais os professores tiveram de ministrar aulas para duas, três ou quatro pessoas foram observadas

durante esta jornada, mas o esforço e a dedicação daquelas que estavam presentes faziam com que

as atividades se tornassem extremamente positivas e recompensadoras.

Na escola, trabalhando com turmas de trinta e cinco, quarenta ou quarenta e cinco alunos é

muito difícil chegar a este grau de intimidade entre os alunos. Trabalhamos com turmas

heterogêneas nas quais valores observados podem e devem ser respeitados na medida em que todos

possam encontrar seu espaço para se expressar e para amadurecer fisicamente, cognitivamente e

afetivamente.

Neste contexto, encontramos as afirmações de Darido; Souza Júnior (2007), que explicitam

um pouco do que vem a ser trabalhar as dimensões de conteúdos nas aulas de Educação Física.

Particularmente, nos atentamos a dimensão atitudinal, que segundo os autores, seria proporcionar

atividades e situações para que os alunos possam refletir sobre como o ser humano deve ser!

No que se refere à Educação Física os autores nos apresenta alguns exemplos que remetem

ao que seria trabalhar com a dimensão atitudinal na escola. Seriam eles:

� valorizar o patrimônio de jogos e brincadeiras do seu contexto;

356

� respeitar os adversários, os colegas e resolver os problemas com atitudes de diálogo e não

violência;

� predispor-se a participar de atividades em grupos, cooperando e interagindo;

� reconhecer e valorizar atitudes não-preconceituosas relacionadas a habilidade, sexo, religião

e outras;

� adotar o hábito de praticar atividades físicas visando a inserção em um estilo de vida ativo

Para finalizar, gostaria de fazer uma observação que considero extremamente pertinente em

relação às aulas de Educação Física no Ensino Fundamental II e no Ensino Médio. As falas das

participantes, minha própria experiência enquanto estudante e minhas observações acerca das aulas

realizadas na escola onde trabalho e em outras escolas, me remetem ao conteúdo esportivizado

dessas aulas e ao processo de afastamento que vai tomando conta dos alunos durante os anos.

Propostas para superar esta dificuldade? Inserção de novos conteúdos levando em

consideração a realidade da escola como: ginástica, capoeira, dança, saúde e qualidade de vida,

apresentados através de aulas mais dinâmicas, não caindo no ostracismo e no desânimo de acabar

por reproduzir comportamentos reprováveis como o “deixar a bola” para que os alunos decidam o

que vão fazer estão entre as proposições. Porém, gostaria de mencionar Darido; Souza Júnior

(2007), quando afirmam que:

(...) Transformar opiniões preconceituosas sobre a educação física constitui um enorme desafio para os professores da disciplina. No entanto, desenvolver um ensino inclusivo pode ajudar a superar o já referido histórico da disciplina – que, em muitos momentos, pautou-se por selecionar indivíduos aptos e inaptos. Deve-se levar em conta também que, mesmo alertados para a exclusão de grande parte dos alunos, muitos professores apresentam dificuldades em refletir e modificar procedimentos e atividades excludentes, devido ao enraizamento de tais práticas? Quando o professor desenvolve efetivamente uma atitude inclusiva? Quando apóia, estimula, incentiva, valoriza, promove e acolhe o estudante (p.18).

Esta é, foi e sempre será minha postura dentro do Grupo de Lazer, na busca de parcerias

para a realização de projetos que envolvam um número cada vez maior de participantes, propondo

aos poucos a modificação da estruturação da aula, na tentativa de propor alternativas para a

desmitificação da Educação Física dentro da escola.

A partir dos resultados deste trabalho, podemos afirmar que sinalizações para esta

desmitificação foram encontradas, o que acaba por incentivar uma prática comprometida com a

superação, visando favorecer a formação não fragmentada e significativa dos participantes do

processo educacional.

357

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