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GT 07 – Mercados Agroalimentares e Reconfigurações Socioeconômicas nos Territórios
Rurais
Circuito curto e construção social dos mercados: a trajetória dos alimentos dos
agricultores e agricultoras familiares da Feira Agroecológica de Mossoró-RN
Zildenice Matias Guedes Maia¹
Cimone Rozendo de Sousa²
1 Doutoranda em Ciências Sociais na Universidade Federal do Rio Grande do Norte;
[email protected] 2 PhD em Sociologia/Professora Adjunta do Departamento de Ciências da Universidade Federal
do Rio Grande do Norte, [email protected]
Resumo:
As diversas estratégias de comercialização desenvolvidas por organizações de agricultores
familiares em todo território nacional consistem na construção de espaços em que a ação dos
intermediários é minimizada. Assim, o objetivo da pesquisa é compreender o circuito curto de
comercialização na Feira Agroecológica de Mossoró-RN a partir da trajetória social dos
alimentos produzidos pelos agricultores e agricultoras familiares dos Assentamentos Favela,
Jurema, Paulo Freire e Comunidade Serra Mossoró.
Palavras-chaves: Circuito Curto de Comercialização. Produção Agroecológica.
1. Introdução
As feiras agroecológicas estão presentes em várias partes do Brasil, constituindo uma
ligação entre produção, consumo das famílias agricultoras e comercialização. Os estudos
apontam que tais experiências têm fortalecido a agricultura familiar de base ecológica,
conferindo aos agricultores e agricultoras maior autonomia à sua condição de camponês
(SCHMITT, 2013; SCHOTTZ, 2014).
Abordar sobre a importância das feiras agroecológicas na constituição da autonomia
camponesa, em especial na garantia da segurança alimentar, constitui-se um dos temas que
embora bastante discutidos, precisam ser aprofundados, perpassando, sobretudo, por conceitos
como sustentabilidade ambiental e social.
O acesso às feiras agroecológicas para os consumidores representa a possibilidade de
resgatarem a culinária e os hábitos alimentares regionais, imprimindo a valorização de tais
experiências, e assim estabelecerem laços de confiança que comumente não se fazem presentes
no modo de alimentação e agricultura convencional (POLLAN, 2008).
A venda direta a consumidores trata-se de uma prática milenar que foi secundarizada
com intensidade a partir do século XX, como consequência do modelo de modernização da
agricultura, assim como do processo intensivo de industrialização e especificação agrícola,
instituindo a agroindustrialização alimentar. Configura-se assim, o modo de comercialização
dos alimentos em cadeias longas, onde o sistema de transportes e as técnicas de conservação dos
alimentos se estabelecem como modelos “modernos”, incorrendo aos agricultores e agricultoras
a condição de trabalhadores operários para manter essa lógica de produção. Ademais, os
consumidores das cidades intensificam o consumo a alimentos comprados nas prateleiras dos
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supermercados. É a partir da década de 1990 que intensifica-se a demanda para a produção
orgânica, pois a população humana encontra-se insatisfeita com os efeitos nocivos à saúde
humana e ao meio ambiente do modelo de produção alimentar dominante (DAROLT, 2013).
De acordo com Pollan (2008), no início do século XX, médicos e profissionais
observaram que onde se abrisse mão da alimentação tradicional em prol da dieta ocidental,
haveria uma relação direta com o surgimento de doenças ocidentais, tais como obesidade,
diabetes, doenças cardiovasculares e câncer.
Assim, o autor citado propõe outra forma de pensar o alimento e de se relacionar com
ele, sobretudo em uma perspectiva sistêmica, pois o alimento está além dos compostos
químicos, diz respeito também a um conjunto de relações sociais e ecológicas. Um caminho
possível de percorrer é comprar alimentos diretamente ao produtor, nas cadeias agroalimentares
curtas, pois nesses locais os alimentos não são processados, e também não vieram de longas
distâncias. A diferença entre as cadeias alimentares curtas do pequeno produtor, e longas e
complexas da industrialização da alimentação é apontada por Pollan (2008, p. 175):
Numa cadeia alimentar longa, a história da identidade da comida
(Quem a cultivou? Onde e como foi cultivada?) desaparece na
corrente indiferenciada das mercadorias, de modo que a única
informação comunicada entre consumidores e produtores é o preço.
Numa cadeia alimentar curta, aquele que vai comer pode tornar
conhecidos do fazendeiro seus desejos e suas necessidades, e os
fazendeiros podem transmitir a quem vai comer as distinções entre
alimentos comuns e extraordinários, e as muitas razões por que os
alimentos extraordinários valem o que custam. O alimento recupera
sua história e um pouco de sua nobreza quando a pessoa que o
cultivou o entrega a você. Portanto, eis uma subdivisão da regra saia-
do-supermercado: aperte a mão que o alimenta.
A relação entre alimentos cultivados de forma ecológica sustentável e a saúde humana é
relevante. De modo que, sabe-se que solos mais saudáveis são mais nutritivos e, portanto,
resultam em alimentos mais ricos em nutrientes e indicados para a dieta humana. A valorização
dos conhecimentos tradicionais e culturais sobre os alimentos é muito importante, assim como
conhecer o contexto cultural, ideológico e ambiental de onde advém o alimento.
Frente a isso, nos últimos anos tem-se intensificado a discussão sobre soberania e
segurança alimentar, e nesse sentido, a agroecologia constitui-se como a forma de produzir que
apresenta condições favoráveis para acreditar no trabalho da agricultura familiar. Assim, a
agroecologia vai apontando para novos caminhos em que a produção de alimentos não está
voltada apenas para atender a nichos de mercado. Nesse sentido, afirma Cassarino-Perez (2013,
p. 175):
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Assim, o que se procura desenvolver são iniciativas que estruturem
processos diferenciados de desenvolvimento rural, baseados na
construção de sistemas agroalimentares alternativos em escala local,
que visem e realizem articulações regionais, nacionais e
internacionais, tendo como um dos pilares de sustentação a construção
de circuitos de proximidade de comercialização e a valorização dos
mercados locais.
Assim, o objetivo da pesquisa é compreender o circuito curto de comercialização da
Feira Agroecológica de Mossoró-RN a partir da trajetória social dos alimentos produzidos pelos
agricultores e agricultoras familiares dos Assentamentos Favela, Jurema, Paulo Freire e
Comunidade Serra Mossoró. Assim, nossas inquietações levaram-nos a buscar responder em
que medida a Feira Agroecológica de Mossoró tem se configurado como uma estratégia de
acesso ao mercado agroalimentar, e qual sentido que essa experiência de venda direta ao
consumidor tem proporcionado a esses atores sociais. De acordo com Appadurai (2008, p. 27),
para entender a mercadoria em seu sentido antropológico, é necessário ir além da visão marxista
da mercadoria, em que há um domínio da perspectiva da produção, para então, “concentrar-se
em toda a trajetória, desde a produção, passando pela troca/distribuição, até o consumo”. Desse
modo, o autor está afirmando é que a trocabilidade de qualquer coisa na situação mercantil
constitui um traço social relevante.
Para tanto, realizamos a pesquisa com uma abordagem essencialmente qualitativa. Os
dados foram obtidos mediante realização de entrevistas semiestruturadas junto aos participantes,
além de registros fotográficos e diário de campo. A coleta de dados foi realizada nos
assentamentos e comunidade, e observações nos dias de comercialização da FAM. Os dados
estão relacionados aos aspectos ambientais, produtivos e tecnológicos, a trajetória dos
agricultores e agricultoras, no sentido de compreender como se deu o contato com a
agroecologia, a dinâmica de construção da FAM, e qual sentido essa experiência tem conferido
a esses atores sociais, sobretudo, no acesso a mercados agroalimentares.
A FAM foi criada em 2007 e já era acalentada por um conjunto de agricultores e
agricultoras e entidades de assessoria, concretizando-se em junho do referido ano. Atualmente, a
feira se realiza aos sábados na Praça do Museu Lauro Escócia, iniciando na madrugada com a
chegada dos feirantes e dos consumidores. Para sua abertura, contaram com o apoio do
SEBRAE-RN, e de professores da Universidade Federal Rural do Semi-Árido. É relevante
estudar a agricultura familiar, pois no Brasil vivem mais de quatro milhões de agricultores e
agricultoras familiares e camponeses, sendo que 50% destes vivem no Nordeste, e maior parte
no Semiárido. Nessa região, a população tem sofrido ao longo da sua história com o cenário de
seca, desnutrição, e muitas dessas pessoas não tem acesso a água e alimentos básicos nos
períodos de estiagem (BAPTISTA; CAMPOS, 2014). Desse modo, compreendemos que é
relevante compreender também de que forma a agroecologia vem se conformando como uma
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prática que orienta esses atores para o processo de transição, ao mesmo tempo em que os
possibilita a construírem coletivamente mercados alternativos.
1.1 Circuitos Curtos de Comercialização: construção social de mercados
Os circuitos curtos diferem das grandes cadeias de produção, onde os países em
desenvolvimento destinam grandes áreas para a monocultura, como por exemplo, soja e milho,
e através de uma grande rede de construção de estradas e aeroportos, esses alimentos são
levados para outros países, configurando assim, o modelo agro exportador (BAVA, 2016).
Assim, abordar sobre os circuitos curtos de comercialização leva-nos a discutir sobre
aspectos que se colocam como pano de fundo para entender a abordagem socioeconômica que
tenciona agricultores e agricultoras familiares a desenvolverem estratégias de comercialização
que operam sobre valores e princípios que se distinguem das práticas econômicas
convencionais, que vem sendo refletidas sob outra lógica distinta dos impérios alimentares
(PLOEG, 2008). Nesse sentido, considera Bava (2016, p. 180) “surgem novas vozes que
defendem que o desenvolvimento nos dê vida, não produtos; que propõe produzir aquilo que
precisamos, não aquilo que as empresas querem que consumamos para atender à sua ganancia
por lucro”.
Desse modo, um número considerável de pessoas no Brasil se vê diante do desafio de
ter que desenvolver estratégias que orientem para escolhas de reprodução social que possibilite
a garantia da sua sobrevivência, além de lhes conferir empoderamento. Os circuitos curtos
podem ser compreendidos dentre as estratégias criadas pelos agricultores e agricultoras para a
construção de mercados em que a ação de intermediários é minimizada. Logo, a definição de
Circuito Curto é apresentada por Souza-Seidl e Billaud (2015) que afirmam:
Por fim, os CC emergem como um diferencial para os agricultores
ecológicos em geral. Se por um lado, os agricultores em circuitos
longos têm que se adequar à um padrão de produção e de comércio,
por outro, a conformação dos CC não somente reforça a existência de
relações positivas entre agricultores e consumidores, mas também
descortina a presença de uma diversidade de modos de produção e de
agricultores (orgânicos, agroecológicos, biologiques, etc) no sistema
agroalimentar, que em meio a regiões fortemente urbanizadas, buscam
harmonizar produção com preservação do meio ambiente (SOUZA-
SEIDEL; BILLAUD, 2015, p. 5).
Os circuitos curtos são percebidos ainda como um caminho percorrido por diversos
atores sociais, caracterizados por maior envolvimento de agricultores e agricultoras familiares,
entidades e organizações civis, com a finalidade de que o agricultor(a)/produtor(a) esteja mais
próximo aos consumidores, de modo a beneficiar o desenvolvimento local e regional,
articulando cadeias produtivas, e valorizando a mão de obra local. Assim, compreende Bava
(2016, p. 181):
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Por circuitos curtos entendemos a busca pela aproximação entre os
locais de produção e consumo de bens e serviços; a redução da escala
das distancias percorridas pelos produtos a serem transportados; a
diminuição da necessidade de uso de redes de transporte, energia e
logística; a utilização de mão de obra do território; o financiamento
em condições acessíveis aos micro e pequenos empreendedores com
novos mecanismos de intermediação financeira; a maior participação
dos atores sociais nos processos de decisão política, o maior cuidado
com o meio ambiente do lugar em que vivem.
Entende-se desse modo que, os circuitos curtos envolvem também a valorização de
saberes e práticas tradicionais e culturais nascidas na sociedade civil, que demonstram a
resistência de atores e movimentos sociais que procuram sempre voltar as suas ações para
combater a pobreza e dinamizar a prática da agricultura familiar. Ao serem fortalecidas essas
experiências, objetiva-se à longo prazo o desenvolvimento local com vistas a sustentabilidade
socioambiental e econômica (BAVA, 2016).
Para a segurança alimentar, representa acesso a um alimento produzido localmente, e
que, portanto, percorreu uma escala de distância e tempo menores, além da valorização de
espécies e produção alimentar local e regional, e a comercialização que é feita pelo agricultor
(a)/produtor(a) diretamente ao consumidor (BAVA, 2016).
No Brasil não há ainda uma definição clara de Circuito Curto, contudo na França, os
representantes do setor agroalimentar utilizam o termo para caracterizar os circuitos de
distribuição em que há a relação direta entre produtores e consumidores, ou até no máximo um
intermediário nessa relação. No Brasil, percebe-se que os agricultores que obtêm êxito com a
comercialização em circuitos curtos, vendem sua produção em pelo menos dois canais, feiras e
programas de governo. Um aspecto identificado nos circuitos curtos é a autonomia do
agricultor. E autonomia em diversos aspectos, desde a produção a comercialização, perpassando
também pela autonomia na gestão (DAROLT, 2013).
Nesse sentido, apresentamos a Feira Agroecológica de Mossoró a partir dos
Assentamentos e Comunidade investigados que pode ser identificada como um circuito curto de
comercialização e apresentamos ainda a comercialização pelos agricultores e agricultoras.
2. A Feira Agroecológica de Mossoró: agricultores e agricultoras construindo alternativas
de mercados agroalimentares
Afirma Poulain (2013) que a diversidade local não desapareceu do cenário alimentar,
assim os particularismos regionais e nacionais se constituem enquanto recursos que reivindicam
para si a característica de apresentar as peculiaridades culinárias típicas. No início dos anos
1960 surge na França uma série de iniciativas de atores locais que reivindicam a valorização dos
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pratos rústicos e artesanais, significa resgatar as práticas culinárias tradicionais no contexto
cultural do qual se originam.
Compreendemos assim que as feiras agroecológicas favorecem ao resgate da culinária
tradicional, ao passo que se configura também como um circuito curto de comercialização e
pode ser percebido ainda como um espaço de defesa da comida produzida de forma sustentável
social e ambiental.
No caso da Feira Agroecológica de Mossoró, para que esse alimento esteja disponível
aos sábados, percorre uma trajetória em que a produção nos assentamentos e comunidades é
realizada pelas famílias agricultoras, sendo válido ressaltar que as realidades de produção,
condição de solo, de recursos tecnológicos, de divisão da produção, de acesso a água e a terra,
são diversificadas em cada localidade.
Quando os agricultores e agricultoras começaram a produzir de forma agroecológica,
contaram com o SEBRAE para implantar a Produção Agroecológica Integrada e Sustentável –
PAIS¹. Em todas as unidades de produção da FAM, o PAIS encontra-se ativo. Nas figuras 1 e 2
é apresentado o PAIS do Assentamento Jurema, de responsabilidade do agricultor Irailson
Moisés.
As imagens apresentam o sistema de mandala do PAIS onde o agricultor cultiva
hortaliças que são comercializadas no Assentamento e na feira aos sábados. O agricultor feirante
chama-se Irailson Moisés da Silva, conhecido como Lilio, tem 32 anos, Ensino médio
incompleto, mora no Assentamento Jurema há 15 anos e participa da feira desde o seu início. A
família é composta por sua esposa e dois filhos de 8 e 3 anos. Atualmente é o presidente da
Associação de Produtores e Produtoras da Feira Agroecológica de Mossoró – APROFAM. O
agricultor conta com ½ hectare na Bodega do Bode, local onde está o PAIS, e é filho de
Figuras 1 e 2: Agricultor 1 do Assentamento Jurema, Mossoró-RN.
¹PAIS – Produção Agroecológica Integrada e Sustentável – é uma tecnologia social que propicia aos agricultores familiares produzir sem
o uso de agrotóxicos, com a preocupação de preservar o meio ambiente e proporcionar segurança alimentar e geração de renda por meio
da inclusão socioprodutiva. Tecnologia social porque é uma técnica reaplicável, desenvolvida na interação com a comunidade e que
representa efetiva transformação social (SEBRAE, 2013).
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assentado. No lote conta com 15 hectares para criação de abelha e conta com poucos cajueiros;
produz na área de parceiro de 15 hectares com criação de caprinos, ovinos e abelha.
No Assentamento Jurema a maior dificuldade é o acesso à água, ele não conta com esse
recurso em disponibilidade suficiente para garantir o crescimento da produção, e mesmo a
manutenção da produção que tem, sendo realizada com muita dificuldade. O acesso diário é
uma caixa de água com 5 mil/litros, mas água salgada, e por isso a necessidade de testar a
cultura para saber qual a que melhor se adapta as suas condições endafoclimáticas. Nesse
sentido ele fala “aqui eu não consigo produzir alface direito, coentro eu não produzo com água
salgada, então assim, hoje eu tenho água, mas não é suficiente ainda para o que a gente queria”.
Na feira comercializa algumas hortaliças como alface, cheio verde, pimentão, cenoura, e
também carnes de caprino e aves. O acesso a cidade não é difícil, ao contrário, dos
assentamentos e comunidades participantes, pode-se considerar que o Assentamento Jurema é o
que tem melhor acesso a cidade. O agricultor conta com transporte próprio.
É possível que a procura por alimentos agroecológicos, deve-se também aos hábitos
alimentares e suas mudanças na contemporaneidade que passaram a ser alvo de distintas
correntes teóricas que tentam de alguma forma dar conta desse novo contexto socioalimentar. O
que é evidenciado, contudo, é que embora surjam teorias que apontam para uma padronização
alimentar, como por exemplo, a Mcdonaldização, outras apresentam uma leitura que apontam
uma variedade alimentar (POULAIN, 2013).
Quando perguntamos o que o motivou para produzir de forma agroecológica, ele relatou
que desde sua infância teve contato com a agricultura através do seu avô, e esse nunca foi
adepto de insumos agrotóxicos, produzia para o consumo familiar sem insumos artificiais. Em
diversos momentos faz-se a relação de ausência de agrotóxico com a agroecologia. Nesse
sentido, ele relatou:
Assim, meu contato com a terra vem desde criança, porque meu avô,
meu bisavô eram agricultores, eles tinham um roçado muito grande e
eles botavam a gente para trabalhar, aí passou para meu pai, e meu pai
passou para mim que a gente deveria continuar com isso, com o
contato que a gente tinha com a terra.
Percebemos que nesse Assentamento, apenas uma família produz sob o enfoque da
agroecologia, e poucos produzem ao menos para a susbsistência. Irailson em seu relato
considera que o problema está no fato da produção dos demais assentados terem se voltado,
quase que exclusivamente, para o caju. Segundo Irailson, não houve estudos prévios por parte
dos órgãos governamentais competentes sobre as condições, sobretudo, de solo para orientar a
produção, assim praticamente todos os assentados acessaram a empréstimos e financiamentos
para investirem apenas nessa produção. Hoje, em sua maioria, os cajueiros não renderam, e
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assim, os agricultores desse assentamento em grande parte, estão desmotivados para acreditarem
em outra forma de produção.
Atualmente Irailson é presidente da APROFAM e também da Associação dos
Agricultores e Agricultoras no Assentamento Jurema, ocupando assim, atividades de liderança.
O local onde realiza a produção e comercialização no Assentamento é na Bodega do Bode que
trata-se de um espaço coletivo do Assentamento que foi cedido para que ele mantenha o seu
PAIS. Segundo o agricultor essa concessão foi realizada através de Assembleia e consta em Ata.
A dinâmica de produção do Assentamento Favela difere do que evidenciamos no
Assentamento Jurema, em alguns aspectos. O assentamento conta a produção agroecológica de
seis mulheres, e a maioria delas está participando da Feira Agroecológica de Mossoró desde o
seu início. A entrevistada foi Luana Clementino da Costa, tem 32 anos, nível superior
incompleto, atualmente é graduanda de Serviço Social. Integra a feira desde o seu início. O
assentamento Favela fica a 26 km de Mossoró. Para a produção agroecológica, Luana conta com
15 hectares, e além da Feira, comercializa com o PNAE² e o PAA³, faz o processamento de
popas e doces, conta com a mão de obra familiar, e só contrata mão de obra externa à família
quando precisa.
Quando perguntamos a Luana se há divisão de produtos para a comercialização na feira,
ela respondeu:
Tem alguns solos que não dá, por exemplo, para produzir a beterraba,
a cenoura, e a gente tem alguns solos que tem como produzir. Então, a
gente não proibiu ninguém de produzir o que quisesse, mas eu tenho o
compromisso de, por exemplo, trazer a cenoura. Eu não posso deixar
de ter o coentro, a alface e a rúcula.
A alimentação da família de Luana antes da feira, em relação ao que produziam era
mais das hortaliças, e ela relatou que durante boa parte da sua vida viu o seu pai produzir e
vender os produtos com preço muito abaixo do que valiam, pois nesse tempo, o atravessador era
o único meio de escoamento da produção, assim ela relata “o atravessador chegava e comprava
do preço que queria, hoje, a gente não faz isso, não faz”.
A possibilidade de acesso a outros mercados é relatada por Luana como um caminho
para a autonomia, pois afirma que a feira e o PNAE, por exemplo, possibilitam que ela tenha
locais de comercialização de seus produtos, que em sua narrativa, possibilitam melhores
condições do que as que tiveram seus pais:
Em 2014, o feijão que eu produzi deu para vender na feira e no PNAE,
enquanto o feijão estava a R$ 6,00, eu apurei mais dinheiro do que no
ano que eu vendi 30 sacos. Porque quando eu chegava na COBAL
(Companhia Brasileira de Alimentação), eu vendia à preço de banana,
porque era só o que eles tinham para me dar.
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Durante a entrevista Luana mencionou que há demanda para outro mercado para os
participantes da FAM. Trata-se da entrega a domicílio, assim ela fala “esse tem um potencial
muito grande, porque tem pessoas que não tem como ir a feira, porque é cedo, e não querem ir
em um sábado cedo demais, então a gente tem esse potencial”. As figuras 5 apresenta o dia de
comercialização na FAM.
Nesse sentido, afirmam Bové e Dufour (2001) que os camponeses diversificam suas
atividades, e nesse sentido, estabelecem relação direta com o consumidor. Essa relação pode ser
percebida de diversas formas, venda direta dos produtos agrícolas nas feiras agroecológicas,
pequenos circuitos de distribuição, dentre outros. É mister salientar que essas atividades estão
sempre relacionadas à essência da condição camponesa, além de valorizar o espaço rural,
renova as relações sociais entre campo e cidade.
No Assentamento Paulo Freire, o agricultor entrevistado foi Sueldo Vicente de Morais
(figura 8), 43 anos, ensino médio incompleto. Mora no assentamento há 15 anos, desde o
momento da ocupação. Hoje, ele e sua família moram no lote (figura 7), pois consideraram a
necessidade de estarem mais próximos da produção, além do problema do acesso a água para
produção, compreenderam que mudando-se para o outro lado da agrovila, teriam melhores
condições de sustentarem sua produção. A família de Sueldo é composta por sua esposa,
Aldeiza Ferreira da Silva, 40 anos e seus filhos, Suan Alisson da Silva Morais, 24 anos Suan,
graduando em Licenciatura em Educação no Campo na Universidade Federal Rural do Semi-
árido.; Alexsandro da Silva Morais, 19 anos, estudante, e Suziane da Silva Morais, 10 anos,
estudante. Sobre a condição de agricultor, ele ressalta que foi forte o exemplo da sua mãe:
Minhas raízes de querer morar no mato vem da minha família, da
minha mãe. Quando eu tinha a idade dessa minha menina, ela criava,
Figuras 5: A agricultora Luana comercializando na FAM.
²PNAE: Programa Nacional de Alimentação Escolar foi implantado em 1955, contribui para o crescimento, o desenvolvimento, a aprendizagem, o rendimento escolar dos estudantes e a formação de hábitos alimentares saudáveis, por meio da oferta da alimentação escolar
e de ações de educação alimentar e nutricional (BRASIL, 2015). ³ PAA: O Programa de Aquisição de Alimentos promover o acesso à alimentação e incentivar a agricultura familiar
(http://www.servicos.gov.br/servico/programa-de-aquisicao-de-alimentos-da-agricultura-familiar-paa).
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plantava (a sua mãe). O quintal da gente era a coisa mais linda, e aí eu
fui crescendo e vi que a natureza, se a gente cuidasse, preservasse com
certeza você tem do que sobreviver.
Sueldo e sua família moram no Assentamento desde o momento da ocupação em que
exerceu a função de coordenador de grupo, depois coordenador regional e em seguida estadual,
exercendo essas atividades pelo período de 2 anos. Após esse período ele foi fazer por indicação
do MST, no ano de 2003, um curso de agroecologia na Paraíba.
No momento em que se estabeleceu com a família em definitivo no Assentamento, e
que não foi possível continuar o curso de Agroecologia, passou 2 anos trabalhando na cidade
como empregado, mas sempre com a pretensão de trabalhar a produção agroecológica no
Assentamento, e assim, motivou a esposa a iniciar com outras mulheres no Assentamento a
produção agroecológica de responsabilidade das mesmas. As mulheres não prosseguiram com
essa experiência, a maioria desistiu, restando apenas Aldeiza. Diante dessas dificuldades,
Sueldo e sua esposa decidiram continuar, e nesse momento a Prefeitura e o SEBRAE
disponibilizaram o PAIS, e eles ganharam uma caixa de 5.000 lt².
Sueldo e sua família contam com 10,5 hectares, mas produzem em 1,5 hectare,
desenvolvem apenas atividades agrícolas, e considera que sua produção sempre foi isenta de
agrotóxicos. No início da produção a finalidade era observar o comportamento das plantas nos
três anéis de produção, como atenderia a utilização de composto, biofertilizante, calda nutritiva,
repelente. A mão de obra para a produção é exclusivamente da família. Apesar das dificuldades
para produzir sob os princípios agroecológicos, ele afirma que decidiu colocar os
conhecimentos em prática.
Figuras 6 e 7: Sueldo e sua família no Assentamento Paulo Freire
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Sobre o trabalho com a terra, Sueldo diz se sentir muito bem, pois “a terra e a água são
as bases da vida, porque sem a terra a gente não consegue produzir o alimento para sobreviver, a
parte de massa, e sem a água também a gente não consegue”.
Toda a família de Sueldo participa da produção agroecológica e optaram por dividir a
produção, ao passo em que há tarefas conjuntas. O agricultor apresenta uma trajetória com a
agroecologia que antecede a sua participação na FAM, inclusive ele já tinha demanda de
clientes antes de se integrar a essa forma de comercialização. Os limites da produção são
evidentes em sua narrativa, pois ele afirma que falta assistência técnica que assista ao agricultor
que produz com a agroecologia. Além da problemática ao acesso a água que tem limitado muito
a produção. Como ele já tinha clientes antes de se integrar a FAM e devido ao problema da falta
de água para produção, ele não comercializa na feira todos os sábados, tem consumidores que
compram diretamente a ele no próprio local da produção, assim como ele já tem a prática de
levar esse produto até ao consumidor. Na pesquisa realizada por Souza-Seidl e Billaud (2015)
foi evidenciado que as experiências de Circuitos Curtos são mais eficazes quando o contato
entre agricultores e consumidores é fortalecido por estratégias de organização social e de
animação da sociedade local como um todo, envolvendo agricultores, sociedade e governo.
Ferrari (2011) destacou em sua pesquisa que os empreendimentos de circuito curto são
importantes, sobretudo, porque favorecem a reprodução social e econômica dos agricultores e
agricultoras familiares catarinenses, evidenciando que as cadeias curtas se constituem como
uma dimensão chave nos processos de desenvolvimento rural contemporâneos. Assim, pode-se
considerar que a agroecologia pode duplamente favorecer a esse novo cenário. Pois, por um
lado possibilita aos agricultores orientarem suas práticas considerando os princípios de
sustentabilidade e ao mesmo tempo lhes possibilita a comercialização direta da sua produção,
aproximando-os assim dos consumidores que veem nesses espaços oportunidade de adquirir
alimentos saudáveis que trazem também a reconhecimento social do campo.
A agroecologia induz a uma visão holística sobre o campo, no sentido de reconhecer os
diversos atores sociais que estão presentes nesse espaço, e ainda a importância desses atores
assumirem sua condição de autonomia frente ao modelo hegemônico de produção alimentar.
Sabe-se ainda que nos últimos anos a agroecologia não esta mais na condição de pequena
produção, ao contrário, cada vez mais no Brasil e em diversos países as experiências de
agricultura sustentável se estabelecem com maior altivez, e se firmam como modelo sim, para a
transição agroecológica (CASSARINO-PEREZ, 2013).
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Na Comunidade Rural Serra Mossoró o agricultor entrevistado foi Francisco da Luz
França, conhecido como França. Ele tem 58 anos, ensino médio completo, e mora na
comunidade com sua esposa Maria José que trabalha com ele na produção e comercialização. A
comunidade fica localizada a 20 km de Mossoró. Francisco Luz conta com 3 hectares para a
produção (figuras 11 e 12), mas atualmente produz em 1 hectare. Em sua propriedade só realiza
atividades agrícolas e conta com mão de obra contratada que o ajuda em um horário. Além de
comercializar na FAM, ele também tem acesso aos mercados institucionais do PNAE e PAA e
não realiza processamento da sua produção. Na FAM ele comercializa hortaliças, e em especial,
o tomate cereja é um dos produtos que segundo ele, adaptam-se muito bem as condições do seu
solo.
Francisco acessou ao Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar –
PRONAF - para otimizar a produção de cabra e hortaliça. Antes de trabalhar com a
agroecologia, Francisco relatou que teve experiência de trabalhar com agricultura irrigada, o que
ele considerou uma experiência sem êxito “nós tivemos só prejuízo, deixamos de mão. O meu
pensamento era trabalhar para mim mesmo”. Dentre as culturas que Francisco trabalhou antes
da produção agroecológica, citou melancia e pimentão, nesse tempo, ele relatou que era muito
intensa a presença do atravessador. Sobre as dificuldades desse tempo, Francisco relaciona,
também, a ausência de assistência técnica. O convite para conhecer a produção agroecológica
veio do SEBRAE que estava capacitando agricultores e agricultoras para participarem de feiras
agroecológicas. Sobre essa fase, ele relembra:
Terminei o curso e eu não sabia nem se era para modificar esse tipo de
produção, nem sabia que tipo de produção era, não sabia se era para
orgânico ou o que era, se ia continuar com o convencional. Aí quando
terminou a capacitação eu fui entendendo o que era e o trabalho que
eu ia ter. Aí eu disse, meu Jesus, será que vai dar certo, mas se estou
aqui, vou continuar, porque você vem trabalhando no convencional, aí
Figuras 11 e 12: Propriedade produtiva de Francisco Luz, Comunidade Serra Mossoró.
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muda para o orgânico em que nada de veneno você vai usar, a
primeira que você acha é que não vai dar certo. Quer dizer como você
vai combater os insetos, se você já está acostumado com aquele
problema e com o sistema convencional. Mas eu disse, a gente já está,
então deixe estar. Só em eu mesmo ir direto ao consumidor já é muita
coisa já.
Francisco e sua esposa participam da FAM desde o seu início, e nesse momento inicial
a feira contava com quinze barracas, foram capacitadas vinte pessoas, mas na hora de produzir
restaram apenas cinco. No começo ele relata que tinha pouca produção, mas mesmo assim
insistia em ir, nesse sentido, ele afirmou que pensava “rapaz eu tenho que ir para ver primeiro o
que o cliente quer para eu poder produzir”. Segundo o agricultor, nesse tempo não dava nem
para custear a despesa com o transporte, tinha feirante que o aconselhava a desistir.
No que se refere às mudanças percebidas através do resgate da cultura tradicional em
relação à comida, Fonini (2014) evidenciou em sua pesquisa que estas experiências conferem
aos atores o acesso a alimentos saudáveis, aumento na renda, ampliação da autonomia,
considerando que os agricultores e agricultoras determinam o que produzem e o fazem com
propriedade, o acesso a comercialização em cadeias curtas, uma estreita relação humana com a
natureza, e com os alimentos, além do estreitamento dos laços com os consumidores.
Francisco é um dos agricultores mais conhecidos, além da trajetória na feira desde o seu
início, foi por muito tempo presidente da Associação dos Produtores e Produtoras Rurais da
Feira Agroecológica de Mossoró - APROFAM. É comum a maioria dos consumidores
comprarem a ele, ou mesmo passar em sua barraca para conversar, aos sábados. Sobre a relação
agricultor e consumidor, Francisco afirma:
Tem consumidor que entende, sabe qual é o trabalho e como é o
trabalho. Porque a gente lida com vários tipos de consumidores. Tem
os consumidores que conhecem o trabalho e sabem em que época que
ele pode ter aquele produto, e tem consumidor que não entende, ele
quer saber se tem o produto. A consciência do cliente influi. Quer
dizer, quando você está comprando a gente, da agricultura familiar,
não é só comprar, você não está comprando um produto que apenas
lhe servindo, mas que está servindo a uma cadeia de agricultura
familiar.
Ferrari (2011) evidenciou que os atores participam e acessam de diferentes mecanismos
de comercialização, e que assim re-espacializam e ressocializam os alimentos, sendo essa uma
das características mais importantes das cadeias agroalimentares curtas. Na comercialização
face-to-face percebeu-se uma economia de regard (respeito e confiança).
Quando perguntamos sobre como ele se sente ao trabalhar com a terra, em sua fala ele
traz a realização em fazer o que gosta. Sobre as tecnologias a que tem acesso para produzir, ele
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ressaltou que tem percebido que está precisando fazer algumas mudanças, como por exemplo, a
utilização de compostos, a adesão ao minhocário, pois estava tendo muitos problemas com as
mudas, e agora precisa aderir para a sua unidade produtiva sombrites, pois o sol em alta
temperatura tem prejudicado as folhas.
Sobre a relação com o espaço urbano, Francisco compreende que a procura dos
consumidores da cidade pela FAM, em sua maioria, são pessoas que já tiveram problemas de
saúde relacionados aos alimentos industrializados/convencionais.
Francisco é muito atuante na APROFAM e em outras cooperativas. Muitas vezes, ele
considera que isso é um problema, pois tem que conciliar a produção com as demais atividades
das entidades e organizações de que participa. Sobre o acesso aos mercados institucionais e a
participação na FAM, Francisco considera:
Não dá para o agricultor esperar só por Programa do Governo.
Ninguém sabe como vai ficar daqui para diante, a gente não depende
só de Programa de Governo, porque eu vou falar sincero, não existe
outra coisa melhor para a agricultora familiar do que feira, ninguém
me venha dizer que venha colocar para mercado. Isso para mim e pela
experiência que eu tenho, o sistema é esse, lhe dar diretamente com o
consumidor. Então se a feira se acabar, a gente não sabe nem que
rumo tomar.
Francisco considera que a produção agroecológica foi o acerto da sua condição de
agricultor, pois mesmo com os desafios, a possibilidade de plantar em policutivo confere maior
autonomia ao agricultor e agricultora familiar. As imersões em campo nos possibilitaram muitas
inquietações, sobretudo, as que dizem respeito às condições de produção dos agricultores e
agricultoras que integram a FAM, o pouco acesso a água e as tecnologias adequadas são uma
problemáticas constantes em todos os assentamentos e comunidades investigados.
Considerações Finais
Característica peculiar na modalidade de circuito curto, as feiras agroecológicas, é a
proximidade e estreita relação agricultor-consumidor. Pois nesses espaços, os consumidores
assumem um novo perfil, participam da feira, mas participam também dos momentos que as
antecedem, no plantio, na convivência com as comunidades rurais. Além de romper com um
perfil de consumidor meramente passivo, comum nos moldes da comercialização via grandes
redes varejistas.
Evidenciamos que a Feira Agroecológica de Mossoró é um circuito curto de
comercialização, e que de distintas formas, os alimentos que aí são comercializados percorrem
uma trajetória social que lhes confere um sentido antropológico, conforme Appadurai (2008).
Evidenciamos igualmente, que as unidades de produção encontram-se em processo de
necessárias melhorias, assim como o processo de comercialização, pois, mesmo diante dos
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avanços da FAM ao longo dos seus nove anos de existência, aspectos importantes como o da
divisão da produção ainda não foi estabelecido por parte dos agricultores e agricultoras.
Referências
APPADURAI, Arjun. A vida social das coisas: a mercadoria sob uma perspectiva cultural.
Editora da Universidade Federal Fluminense. Niterói, 2008.
BAPTISTA, Naidison; CAMPOS, Carlos H. Caracterização do Semiárido Brasileiro. In:
CONTI, Luiz; SCHROEDER, Elson; MEDAGLIA, Vicente Rah (orgs.). Construindo saberes,
cisternas e cidadania: formação para convivência com o semiárido brasileiro. IABS. Brasília,
2014.
BAVA, Silvio Caccia. Circuitos Curtos de Produção e Consumo. Disponível em:
<http://br.boell.org/sites/default/files/downloads/silvio_bava.pdf >. Acesso em: 06 mar. 2016.
CASSARINO-PEREZ, Julian; FERREIRA, Angela Duarte Damasceno. Agroecologia,
construção social de mercados e a constituição de sistemas agroalimentares alternativos: uma
leitura a partir da redeEcovida de agroecologia. In: NIERDELE, Paulo André; ALMEIDA,
Luciano de; VEZZANI, Fabiane Machado (orgs.). Agroecologia, práticas mercado e políticas
para uma nova agricultura. Curitiba: Kairós, 2013.
DAROLT, Moacir Roberto. Circuitos curtos de comercialização deAlimentosecológicos:
reconectando produtores e consumidores. In: NIERDELE, Paulo André; ALMEIDA, Luciano
de; VEZZANI, Fabiane Machado (orgs.). Agroecologia, práticas mercado e políticas para
uma nova agricultura. Curitiba: Kairós, 2013. p.138
FERRARI, Dilvan Luiz. Cadeias Agroalimentares curtas: a construção social de mercados de
qualidade pelos agricultores familiares em Santa Catarina. Tese Doutorado em
Desenvolvimento Rural – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Faculdade de Ciências
Econômicas, Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural, Porto Alegre, 2011,
345p.
FONINI, Regiane. Agrofloresta: mudanças nas práticas produtivas e hábitos alimentares. Rev.
Agriculturas, v. 11, n. 4 dez. 2014.
PLOEG, Jan D. V. D. Camponeses e Impérios Alimentares: lutas por autonomia e
sustentabilidade na Era da Globalização. Porto Alegre. UFRGS Editora, 2008.
POLLAN, Michael. Em defesa da comida: um manifesto. Rio de Janeiro: Intríseca, 2008.
POULAIN, Jean-Pierre. Sociologias da alimentação: os comedores e o espaço social
alimentar. 2. ed. Florianopólis: Ed. da UFSC, 2013.
SCHMITT, Claudia Job; GRISA, Catia. Agroecologia, mercados e políticas públicas: uma
análise a partir dos instrumentos de ação governamental. In: NIERDELE, Paulo André;
ALMEIDA, Luciano de; VEZZANI, Fabiane Machado (orgs.). Agroecologia, práticas
mercado e políticas para uma nova agricultura. Curitiba: Kairós, 2013.
SCHOTTZ, Vanessa. Em defesa da alimentação adequada. Rev. Agriculturas. v. 11, n. 4, dez.
2014.
SOUZA-SEIDL, Renata et BILLAUD, Jean-Paul. O casamento entre os circuitos curtos e a
agricultura de base ecológica como elemento chave de sustentabilidade agrícola em metrópoles.
In: SOUZA-SEIDL, Renata et BILLAUD, Jean-Paul (orgs.). Redes de Agroecologias:
experiências no Brasil e na França, 2015, p. p. 134-170.