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1 GT 08. Drogas e adolescentes em conflito com a lei: a clinica da complexidade na socioeducação. Maria Fátima Olivier Sudbrack (Universidade de Brasília Instituto de Psicologia), Maria Aparecida Penso ( Universidade Católica de Brasíla) UMA CONTRIBUIÇAO À FORMAÇÃO DE PROFESSORES DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: A ATUAÇÃO PRÁXICA DE GRADUANDAS (OS) DE PEDAGOGIA EM UMA UNIDADE DE SEMILIBERDADE DO DF. Autora: Nirce Barbosa Castro Ferreira Universidade de Brasília Faculdade de Educação

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GT 08. Drogas e adolescentes em conflito com a lei: a clinica da complexidade

na socioeducação.

Maria Fátima Olivier Sudbrack (Universidade de Brasília – Instituto de

Psicologia), Maria Aparecida Penso ( Universidade Católica de Brasíla)

UMA CONTRIBUIÇAO À FORMAÇÃO DE PROFESSORES DA EDUCAÇÃO DE

JOVENS E ADULTOS: A ATUAÇÃO PRÁXICA DE GRADUANDAS (OS) DE

PEDAGOGIA EM UMA UNIDADE DE SEMILIBERDADE DO DF.

Autora: Nirce Barbosa Castro Ferreira

Universidade de Brasília – Faculdade de Educação

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RESUMO:

A presente tese de doutorado em andamento analisa o significado e a contribuição da

práxis pedagógica no âmbito da constituição e da formação de professores para

graduandas (os) do Curso de Pedagogia da Faculdade de Educação na Universidade

de Brasília – Distrito Federal, com os adolescentes e jovens em cumprimento de

medidas socioeducativas. O objeto da pesquisa é a formação de professores para

atuação no Sistema Socioeducativo. Os sujeitos da pesquisa serão escolhidos entre

os egressos do Curso de Pedagogia, Pedagogos do Sistema Socioeducativos e

Professores da Rede Pública de ensino do DF. O lócus da pesquisa é uma Unidade

de Semiliberdade em Brasília – Distrito Federal. A fundamentação práxica se alicerça

nos pressupostos teóricos de duas teorias de base marxista, a saber: O Materialismo

Histórico Dialético de Karl Marx e a Teoria Histórico – Cultural desenvolvida por

Vigotski. Outros autores como: Morin, Freire, Kosik também edificam o texto. Os

fundamentos metodológicos estão ancorados na pesquisa qualitativa, tendo como

centralidade a pesquisa – ação inspirada nos seguintes autores: Barbier (2007),

Triviños (2008) Ludke e André (1986) Thiollent (2008), e outros de quem a pesquisa

necessitar. A tese tem como expectativa de resultados contemplar a práxis

pedagógica, como parte relevante na formação de professores, e nela a relação

dialética teoria – prática –teoria, em experimentação há mais de oito anos por esta

pesquisadora e graduandos da FE- UnB. A pesquisa parece começar a indicar que, a

práxis pode ser um caminho transformador de novos modos de relações sociais entre

educando socioeducativo e educador. Mas, é preciso aguardar os resultados advindos

das análises finais a serem feitas. O texto de qualificação está aprovado. A pesquisa

busca complementar os seus dados em campo neste momento. A defesa da tese está

prevista para o final do ano de 2018, e a pesquisadora pretende faze-la no lócus, onde

a mesma se desenvolve.

Palavras chave: Práxis; Formação de Pedagogos; Sistema Socioeducativo.

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1 – INTRODUÇÃO

Em geral, o sujeito opta por uma formação acadêmica porque almeja colher

bons frutos em futuro próximoi. As graduandas (os) do Curso de Pedagogia e outras

licenciaturas, que estudam conosco, na Faculdade de Educação - FE, da Universidade

de Brasília também demonstram essa preocupação. Elas e eles pensam na abertura

de novos campos de trabalho, na área da educação, por ser esta a escolha de cada

um que adentra a FE. Sendo assim, alguns alunos (as), no ano de 2008 demandaram

o cumprimento do tripé ensino-pesquisa-extensão, proposto por esta Faculdade de

Educação – UnB, vendo nisso, a oportunidade de se aproximar do Sistema Prisional,

para uma prática docente formadora nesse campo de estudos.

Essa busca encontrou o Grupo de Ensino, Pesquisa e Extensão em

Educação Popular e Estudos Filosóficos e Históricos - Culturais GENPEX-FE-UnB

para uma proposta de atuação pedagógica dentro do sistema prisional como um todo

no Distrito Federal em regime de convênio ou parceria com a Universidade e assim,

contemplar o currículo do curso de Pedagogia, podendo assim atendê-los na

perspectiva da sua formação acadêmica curricular.

A atuação extensionista dentro do Curso de Pedagogia da FE/UnB na visão

do grupo Genpex, não é de forma alguma, apenas uma atuação eventista, como se

pode ver em alguns projetos dentro da universidade mas, é sim, permanente e

orgânica-processual. A manutenção e a permanência da relação acadêmica se dão

concomitantemente à intervenção e transformação da comunidade onde acontece esta

atuação extensionista. Mas, essa maneira de ver a atuação extensionista não vem do

nada ao grupo Genpex. É Jacob Gorender, in Marx, 2007, que nos chama a atenção

para aspectos importantes do materialismo histórico dialético de Marx, do qual o

grupo Genpex segue os passos, e apresenta uma “nova visão profundamente nova do

desenvolvimento da sociedade humana e um novo projeto de lutas sociais com vistas

a transformação radical da sociedade existente”. Comungando com Marx, e

percebendo que a demanda das graduandas (os) é relevante, o grupo Genpex de

Pesquisa e Extensão, se prepara para atender ao pedido solicitado pelo grupo de

graduandas (os) da época, (2008).

1.1 A origem do grupo GENPEX – Grupo de Pesquisa e Extensão e Estudos

Filosóficos Históricos - Culturais

O GENPEX/ FE-UnB completará em 2017 trinta e um anos de fundação, e

sempre trabalha na perspectiva marxista, que tem como prioridade a transformação de

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realidades. Alinhado com a teoria histórico/cultural que entende a práxis educativa

como sendo um fator fundamental para a construção do processo educativo real

concreto e significante. Sobre a práxis Vigotski afirma:

As mais complexas contradições da metodologia psicológica recaem

sobre o terreno da prática, porque somente aí podem encontrar

solução. Nesse terreno as discussões deixam de ser estéreis e

chega-se a resultados. O método, ou seja, o caminho seguido é visto

como um meio de cognição: mas o método é determinado em todos

seus pontos pelo objetivo a que conduz. Por isso, a prática

reestrutura toda a metodologia (VIGOTSKI, 2004, p. 346).

O trabalho do GENPEX inicia-se em 1986 com a parceria do Movimento

Popular na Região Administrativa do Paranoá-Distrito Federal, e seguindo a sua linha

de atuação, atende a demanda de jovens adolescentes e adultos não alfabetizados,

que no confronto diário com ações truculentas do Estado, buscam na faculdade de

Educação da Universidade de Brasília o letramento suficiente para a população não

alfabetizada, a ação pedagógica para aprender ler, escrever e contar, de forma critica

e consciente e sobretudo, que esta população pudesse fazer o enfrentamento com o

Estado e defender a ocupação das terras publicas já adquiridas por direito a moradia

daqueles que foram os pioneiros na construção de Brasília. e permanece até os dias

de hoje, com outras frentes de trabalho extensionistas dentro da Faculdade de

Educação na Universidade de Brasília. Em 2008, o Grupo GENPEX aceita o desafio

proposto pelos alunos e abre uma frente de trabalho na Socioeducação.

O trabalho é feito coletivamente por graduandas (os) em Pedagogia e outras

licenciaturas junto a adolescentesii que cumprem medidas socioeducativas em uma

Unidade de Semiliberdade no DF. Após cumprimento dos trâmites legais dessa nova

futura parceria, inicia-se então, o processo fundamentado na práxis. A

vivência/convivência do grupoiii na Unidade de Semiliberdade no DF- Casaiv, a relação

social/afetiva observada, entre graduandos (as) de diversas licenciaturas e

adolescentes/gestores da Casa, sugere o início de um trabalho pautado na

amorosidade, confiança e lealdade entre todos.

Chamo de amorosidade o desenvolvimento dessa capacidade de

escutar/ouvir/pensando no falar do outro. Levando em conta o outro que fala/

ouve/escuta. Talvez, a motivação, os desejos, necessidades, interesses e emoções

que estão por trás das palavras e do pensamento que se expressam através delas.

Esse contato inicial de construção de vínculo afetivo e de confiança entre sujeitos

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humanos torna a cada um de nós, sujeitos convictos de uma transformação. Reis

afirma: “[...] Transformações que denudam/desvelam origens e posições de classes do

sujeito: suas oscilações, ambiguidades, certezas, incertezas, dúvidas no transcorrer da

própria transformação [...]” (REIS, p. 116,2011)

Na reflexão-ação-reflexão coletiva surge a ideia de se tornar real um projeto

de trabalho envolvendo os adolescentes com a tecnologia. A tecnologia pareceu um

“prato cheiov” nesse momento, que saciaria tanto aos adolescentes, quanto os futuros

pedagogos (as). Nesse momento estávamos buscando entender ainda o que era a

socioeducação e qual seria o seu campo de estudo.

Para compreender melhor a Socioeducação na Semiliberdade, pode-se

consultar seu marco legal onde se destacam as diretrizes do Estatuto da Criança e do

Adolescente (ECA), Lei Nº 8.069/1990 e do Sistema Nacional de Socioeducação

(SINASE), Lei Nº 12.94/2012. Esses textos preveem a garantia de direitos aos

adolescentes, independente de sua condição social, cultural ou étnico-racial. O

SINASE veio regulamentar o ECA. E afirma as seguintes necessidades específicas

para entidades e/ou programas que executam a medida socioeducativa de

semiliberdade:

A ênfase do programa de semiliberdade é a participação do

adolescente em atividades externas à Unidade (família e

comunidade). A sua execução deve prever programas e espaços

diferenciados para adolescentes com progressão de medida e

adolescentes oriundos de primeira medida. Para atender até vinte

adolescentes na medida socioeducativa de semiliberdade a equipe

mínima deve ser composta por: um coordenador técnico, um

assistente social, um psicólogo, um pedagogo, um advogado

(defesa técnica), 2 socioeducadores em cada jornada, um

coordenador administrativo e demais cargos nesta área, conforme a

demanda do atendimento. Deve-se considerar nos casos de haver

mais de uma residência de atendimento em pequenos grupos de até

quinze adolescentes, poderá ser instituída uma coordenação

administrativa, uma coordenação técnica e um advogado para duas

ou três casas simultaneamente (SINASE, p. 44, 2006).

Só em observar o marco legal, a sua institucionalização e regulamentação

não “ressocializa” os adolescentes. E nem tão pouco os fazem ser reconhecidos pela

sociedade como sujeito de direitos. Apesar de ser um avanço, não é o marco legal que

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fará com que, sujeitos que na maior parte das vezes estiveram a margem, e foram

estigmatizados como “marginais” se tornem membros da “sociedade”.

O grupo atuante na Casa, logo percebe que, a exclusão e a baixa estima é a

marca em todos os adolescentes e realizar projetos de médio e longo prazo com

adolescentes dentro Semiliberdade será complexo. Além disso, os adolescentes

“podem” deixar de cumprir a medida socioeducativa quando desejarem. Mesmo

sabendo que terão que pagar essa medida, um dia. Eles “pinam”vi como eles dizem.

Isso invalida qualquer planejamento feito a “priori”. Era preciso pensar sempre em

projetos de curta duração. O grupo começou a se envolver com o fator pedagógico

dos adolescentes. Foi possível perceber que o analfabetismo ainda impera na Casa

(até hoje 2016). Apesar de, naquele ano (2008) todos estarem matriculados na escola

pública mais próxima da Casa.

Os graduandos (as) que acompanhavam os encontros semanais com os

adolescentes pressentiam que eles não gostavam da escola, mas, o que os

graduandos ainda não sabiam era que, a “escolavii” também não gostava deles. A

atividade escolar é base fundante no Sistema Socioeducativo, isso pode ser

confirmado, No art. 1°, O parágrafo 2° do SINASE que conceitua: “[...] II - a integração

social do adolescente e a garantia de seus direitos individuais e sociais” (SINASE,

2012) Como estar na escola é direito garantido ao adolescente que passa pelo

sistema socioeducativo, observamos a necessidade de investigar o porquê da maioria

desses adolescentes não avançarem no sua aprendizagem. Permanecendo em

estado de semianalfabetíssimo.

Essa investigação começou considerando a práxis aplicada no processo. A

pesquisa apresenta uma tese inicial de se compreender a dimensão da contribuição

da práxis como pré-requisito básico para a formação do profissional na educação de

adultos com a devida especificidade para trabalhar junto ao sistema socioeducativo,

bem como, á constituição dos estudos deste campo pedagógico. Para se chegar a

uma análise real sobre o assunto, a pesquisadora pretende, identificar as trajetórias de

vida dos adolescentes em formação na educação de adultos, desvendando os motivos

que fazem com que estes sujeitos não aceitem estar na escola. E com isso, contribuir

com o ensino-aprendizagem na formação de pedagogas (os), a partir da experiência e

significação desenvolvidas por meio das ações pedagógicas, de

alfabetização/educação de adolescentes e adultos que cumprem medidas

socioeducativas.

2 - PRINCIPIOS NORTEADORES E METODOLÓGICOS.

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O trabalho dos graduandos (as) na Casa está sendo norteado pela práxis

educativa. Ou seja, teoria e prática imbricadas, na esperança de se alcançar alguma

superação de desafio que possa vir a ser transformador. É preciso transformar

realidades, conceitos e consciências já cristalizados, nas várias equipes

multidisciplinares que trabalham na Casa. O tcheco Karel Kosik assevera que:

[...] O homem [...] Na práxis se descobriu o fundamento do real

centro de atividade, da real mediação histórica de espírito e matéria,

de cultura e natureza, de homem e cosmos, de teoria e ação, de ente

e existente, de epistemologia e ontologia. [...] A totalidade do mundo

pertence também ao homem com a sua relação de ser finito com o

infinito e com a sua abertura diante do ser, sobre as quais se baseia a

possibilidade da linguagem e da poesia, da pesquisa e do saber

(KOSIK, pp. 206 e 207, 1976).

Além do trabalho com os adolescentes, é intenção dos estudantes

pesquisadores colaborar também com a vida cotidiana vivida pelas pessoas que

trabalham na Casa, bem como a necessidade de se verem enquanto sujeitos de

transformação de si mesmos e dos outros. “O educador é forjado na práxis”

(FERREIRA, 2009, p. 24).

2.1 - Escola: um espaço de Inclusão ou de exclusão?

Nas primeiras observações (2008) foi possível notar que uma das primeiras

ações dos gestores da Casa, ao receber o adolescente era sempre a de efetivar a

matrícula do mesmo na Escola Pública mais próxima da Casa. Um aspecto importante

para se compreender essa atitude dos gestores é o seguinte: esse “estar na escola”

faz parte do Sistema de Garantia de Direitos, e isso está estabelecido nas disposições

finais e transitórias da Lei do SINASE, onde se estabelece:

[...] entidades de atendimento deverão garantir a inserção de

adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa na rede

pública de educação, em qualquer fase do período letivo,

contemplando as diversas faixas etárias e níveis de instrução (3)

garantir o acesso a todos os níveis de educação formal aos

adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de

internação, podendo, para tanto, haver Unidade escolar localizada no

interior do programa; Unidade vinculada à escola existente na

comunidade ou inclusão na rede pública externa; [...] (SINASE, 2012,

p. 59).

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No decorrer dos anos, percebemos que mesmo tendo a Educação garantida

e regulamentada por lei, isso não significa que, todos os adolescentes serão

matriculados na escola, e nem que essa escola cumprirá o papel a ela destinado, ou

seja, o de contribuir na “ressocialização” dos adolescentes.

A modalidade de educação que atende aos adolescentes e jovens que

cumprem medidas na Unidade de Semiliberdade é sempre a Educação de Jovens e

Adultos (EJA), na Rede Publica de ensino. Não entendíamos bem naquela época

(2008) mas, o grupo de graduandos (as) e professores coordenadores do projeto vem

percebendo a cada semestre que, há algo “não convencional” na relação dos

adolescentes com a escola e vice-versa. Percebeu-se que não há interesse no

avanço de aprendizagem dos adolescentes, nem pela escola e nem pelos gestores da

Casa.

Os adolescentes continuam em sua maioria semi, ou completamente

analfabetos. Pela fala de alguns adolescentes, a escola é um lugar ruim. Não os

acolhe. É fato, que eles também, não têm quase nenhum interesse pela escola.

Segundo fala dos adolescentes nas nossas rodas de conversa, para o corpo docente

da escola e seus servidores em geral, eles são “bandidos” com raras exceções de

acolhimento dentro do professorado. Em geral, não há avanço que se possa

considerar na educação escolar desses adolescentes. É possível afirmar que, pela

experiência vivida por nós, professores e estudantes da Faculdade de Educação não

há formação pedagógica adequada para os professores que trabalham com esses

sujeitos semi privados de liberdade.

O corpo docente que hoje se apresenta no sistema socioeducativo e nas

escolas públicas, que recebem sujeitos na semiliberdade sofre da falta de uma

formação contínua no campo da Pedagogia, ou quem sabe, de uma disciplina

especifica que possa tratar da formação pedagógica para a Socioeducação.

Segundo o relato em conversa com uma pedagoga formada na Universidade

de Brasília, e que hoje é concursada no sistema socioeducativo, a mesma afirma que:

“sobre o Sistema Socioeducativo, eu nunca nem ouvi falar na faculdade, nem sequer

eu sabia que existia, não foi falado em nenhum momento” (diário de intinerância, 9 /5 /

2016).

Relatos inflamados de ira, de alguns professores da rede pública de ensino,

que recebem os adolescentes nos alertam que, os mesmos não foram preparados

para o exercício da profissão na área prisional em todos os seguimentosviii.

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A equipe multidisciplinarix também não tem formação acadêmica continuada

constante, a não ser dentro do próprio sistema socioeducativo ou mesmo prisional,

onde nas palavras de uma servidora “a formação do sistema só ensina a autodefesa”

e a práxis exercitada na Casa pelos graduadas (os) ao longo desses anos, está

dizendo que: o caminho é pelo afeto, pelo vínculo, pela amorosidade e confiança, pelo

acolhimento. Aparentemente, para nós, parece ser a escola até esse momento, o

espaço de liberdade cotidiana desse adolescente ansioso por estar na rua. Afirmamos

isso porque, desde o primeiro dia do trabalho na Casa, até hoje, quando chegamos

para o nosso trabalho na Casa, a pergunta que não cala é essa: “Vamos sair para

passear quando “tia”x.

Podemos sentir que a Semiliberdade “aprisiona”. Semiliberdade

aprisionante? Parece paradoxal, mas é verdadeiro. A realidade dentro do sistema

continua sendo: Vigiar e Punir, como já disse Foucault (1977). Todas as portas da

instituição têm vigilantes com cadernos de anotações. Foucault assinala: “Ser olhado,

observado, contado detalhadamente, seguido dia por dia por uma escrita ininterrupta

[...]” Os procedimentos disciplinares reviraram essa relação, abaixando o limite da

individualidade descritível e fazem dessa descrição um meio de controle e método de

dominação [...]” (FOUCAULT, 1977, p. 170) O poder da vigilância é exercido

continuamente. Como compreender isso? Eles não são semi-libertos? Talvez, daqui

mais alguns anos de trabalho poderemos dar essa resposta. Nesse momento, em

uma análise mais geral pensamos que, a reinserção social deveria ser o objetivo

maior tanto da instituição governamental, quanto da escola. Mas, o que tem

importância vital aos nossos olhos, na Casa e na Escola são os mecanismos de

controle dos adolescentes.

A esperança de ver a Escola como um espaço de inclusão, desde o ano de

2008 até os dias de hoje, ainda não logrou êxito. O medo e o preconceito têm

facilitado para que a Escola se torne nesse caso, mais um espaço excludente na vida

dos adolescentes. Para explicar esse fenômeno estamos na busca de um referencial

teórico.

3- EM BUSCA DO REFERÊNCIAL PRÁXICO MÉTODOLOGICO.

Na busca de um caminho metodológico que possa auxiliar a superação e na

transformação da realidade hoje (2016) vivida pelos adolescentes que cumprem

medidas socioeducativas na Casa, foi feito um estudo inicial de duas teorias bem

conhecidas e próximas. A Teoria Histórico-Cultural de Lev S. Vigostski e o

Materialismo Histórico Dialético de Karl Marx. Na produção das ciências humanas e

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sociais o confronto entre os métodos e teorias de pesquisa, às vezes é percebido. Isto

poderá ser parte importante na produção de conhecimento. Porém, nesse trabalho, é

possível perceber não o confronto e sim contribuições entre os autores escolhidos.

Uma das maiores contribuições da teoria de Marx está na descoberta do papel

histórico, mundial, da classe operária. “[...] De todas as classes que hoje em dia

defrontam a burguesia só o proletariado é uma classe realmente revolucionária [...]”

(LENINE 1979, p. 13). É por ser essa opção de classe, ou seja, o proletariado, que

Marx se debruça e constrói a sua teoria denominada Materialismo Histórico Dialético,

onde a realidade objetiva das relações sociais tem função basilar, qual seja, as

relações do ser humano com a natureza e com os outros seres humanos.

O ser humano não tem a sua vida determinada pela natureza, é ele que produz

os meios de satisfazer as suas necessidades. “[...] O ponto de vista do novo

materialismo é a sociedade humana, ou a humanidade social” (MARX, 2007, p. 103)

Por acreditar que as relações sociais construídas por homens e mulheres em

todos os âmbitos da vida humana os constituem como sujeitos emancipados,

conscientes e livres, este estudo escolhe os pressupostos do Materialismo Histórico

Dialético de Karl Marx para contribuir com a fundamentação desse trabalho.

A atividade pedagógica práxica dentro da casa nos faz perceber que a

gênese desse problema de pesquisa, ou seja, a exclusão social e, portanto, escolar de

adolescentes e jovens socioeducandos da Semiliberdade do DF, está diretamente

ligada a duas questões a seguir: a deficiente formação inicial e continuada de

pedagogas (os) e das outras equipes multidisciplinares que atuam no sistema. E na

mesma dimensão, o modo de produção capitalista, onde o trabalho de “caráter

artesanal” que é uma produção de vida foi, como afirma Lombardi, “[...]

gradativamente substituído por uma nova organização de produção, assentado num

sistema de máquinas que impôs à produção um ritmo e regularidade de produção

independente do trabalhador [...]” (LOMBARDI, 2011, p.164). É possível afirmar que,

em muitos casos esse fator contribui muito para o afastamento das famílias dos seus

filhos, que acabam ficando sem atenção e orientação familiar.

É possível pensar que, a necessidade de existência e sobrevivência do

trabalhador pai de família ou o adolescente da Casa na Semiliberdade, ambos no

mesmo contexto histórico, os faz buscar trabalho, isso tem feito com que, a grande

maioria desses adolescentes com formação deficiente, sejam contratos com baixos

salários se tornando presas fáceis para o trafico de drogas, um inimigo sempre

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disponível nas comunidades carentes que habitam os subúrbios urbanos no distrito

federal. A ausência dos pais pode estar fazendo falta na condução da educação e

orientação de conduta dos seus filhos. Pais ausentes são uma realidade constatada

na vivência dos pesquisadores, que fazem parte desse trabalho com os adolescentes

na Casa. Em resumo, como nos afirma Marx: “[...] a simplificação da maquinaria e do

trabalho utiliza-se para transformar em trabalhador o homem que ainda está a crescer,

totalmente imaturo – a criança – da mesma maneira que o trabalhador se tornou uma

criança desprovida de todos os cuidados [...]” (MARX, 1963, p, 208).

Essa afirmação de Marx é histórica e aparece na historicidade dos

adolescentes da Semiliberdade hoje (2016) com muita clareza. Por essas, e outras

semelhanças entre a teoria de Marx e a realidade vivida na Casa, esse trabalho fez a

escolha do Materialismo Histórico Dialético para a sua fundamentação teórico práxica.

Concluo a busca de alternativa para fundamentação práxica metodológica

desta pesquisa em andamento com a afirmação de Lenine: “[...] O modo de produção

da vida material condiciona o processo da vida social, politica e intelectual, em geral.

Não é a consciência dos homens que determina o ser, mas, pelo contrário é seu ser

social que determina a sua consciência [...]” (LENINE. 1979, p.11).

3.1 Ainda sobre Referencial Teórico Práxico Metodológico.

Conhecer a historicidade desses adolescentes é fundamental no processo de

conhecimento mútuo. A nossa esperança no tocante a um futuro digno à inclusão dos

adolescentes em todos os níveis da sociedade, são as relações sociais construídas, a

partir da historicidade de cada sujeito vivida e compartilhada pelos graduandos (as)

seus professores-coordenadores nas instituições, UnB - FE/ Escola / Unidade/Casa.

Acerca disso, buscamos em Angel Pino, o entendimento dado por ele ao pensamento

de Vigotski:

[...] História é entendida por Vigotski de duas maneiras: em termos

genéricos, significa uma abordagem dialética geral das coisas; em

sentido restrito, significa a história humana. Distinção que ele,

completa com uma afirmação lapidar: a primeira historia é dialética; a

segunda é materialismo histórico [...] (PINO, 2000, p. 48).

A questão da historicidade dos estudantes graduandos (as) e da

pesquisadora, se mistura com a dos adolescentes, por vezes. Por isso, torna-se

prazeroso para os estudantes e seus professores coordenadores observarem as

pequenas transformações no grupo em virtude da atuação dentro da Casa de

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Semiliberdade, onde se desenvolve uma relação teórico-prática, em encontros

semanais com os adolescentes e servidores presentes. Cada encontro tem como tema

de discussão assunto proposto em geral, pelos adolescentes.

Dois dias da semana, desde 2008, até os dias de hoje (2017), o grupo de

graduandos (as) da Faculdade de Educação, coordenados por esta pesquisadora, se

reúne com os adolescentes e jovens na Unidade de Semiliberdade.

Estes dias da semana, são acordados, antecipadamente com a gestão da

unidade no final de cada semestre, e com graduandos (as), no inicio de cada

semestre, no ato da matricula, quando os estudantes escolhem a frente de atuação

do projeto extensionista, que desejam, neste caso a Unidade de Semiliberdade. Antes

das idas a unidade, o grupo participa de em encontro semanal, com todo o coletivo do

grupo Genpex, e a Professora da disciplina Educação de Adultos da Faculdade de

Educação na UnB, para discutir a atividade pedagógica que cada frente extencionista

do grupo realizará durante a semana.

O grupo que trabalha na unidade é muito animado. Porém, é ainda hoje,

composto de um numero pequeno de estudantes. Penso que a atividade pedagógica

ainda não é atrativa aos estudantes no ato da matricula em projetos. Mas, nos últimos

anos, vem aumentando entre os estudantes. É muito comum, depois de

experimentarem estar conosco na unidade, eles ficarem até o final do curso,

culminando com pesquisas de Trabalho de Conclusão de Curso. – TCC.

Na grande maioria, são sempre do sexo feminino. Com um numero médio de

no máximo seis pessoas, por semestre.

As atividades pedagógicas são muitas. A criatividade é imensa de todos os

lados. Adolescentes e estudantes. No semestre passado, por exemplo, tivemos a

montagem de uma arvore genealógica. Onde os estudantes levaram todo o material já

recortado e pronto para a montagem. Evitando acidentes na unidade com o uso de

ferramentas cortantes como estiletes ou tesouras. Depois de pronta a árvore,

trabalhamos os graus de parentescos dos adolescentes e dos graduandos (as).

A gestão da unidade e toda a equipe de plantão sempre estão no apoio das

atividades. Neste caso da arvore genealógica, foi cedido um espaço e o trabalho

artístico está exposto no local destinado.

As atividades envolvem a todos nós. Se fizermos uma linha do tempo, todos

são inseridos. Se construirmos letras de musicas ou poesias, todos são envolvidos. Os

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adolescentes, sempre respondem bem a toda atividade trabalhada pelos graduandos

(as). Até jogar futebol na unidade, as graduandas (os) jogam. É muito bonito.

Fazemos comemorações dos aniversários, participamos dos eventos da

unidade, como reunião com as famílias, eventos de finais de ano e confraternizações.

Sessões de filmes, com pipocas, composição de musicas, grafites, vídeos e vários

passeios culturais extra Unidade são realizados com os estudantes e adolescentes,

gerando a reflexão da ação posteriormente.

A inserção dos adolescentes no ambiente cultural, tão importante para o

sujeito em constituição, vem a se fundamentar em Vigotski e seus pressupostos, sobre

a inserção do sujeito na cultura: “[...] Vygotsky tem como um de seus pressupostos

básicos a idéia de que o ser humano constitui-se enquanto tal na relação com o outro

social. A cultura torna-se parte da natureza humana num processo histórico que, ao

longo do desenvolvimento da espécie e do individuo, molda o funcionamento

psicológico do homem.[...]” (VIGOTSKI, Apud, La Taille, Oliveira e Dantas 1992, p. 24)

Esse projeto faz parte do currículo que compõe o tripé ensino – pesquisa e

extensão dentro da Faculdade de educação desde 2008 e tem sido uma alavanca

para o desenvolvimento da pesquisa no campo da educação. Em geral, os Trabalhos

de Conclusão de Curso ( TCC) dos estudantes que fazem parte deste projeto,

abordam temas recortados e construídos, a partir das experiências vividas da teoria e

prática na Casa e tem se mostrado material fundamental de construção de

conhecimento. Esta atuação real e concreta dentro da Casa, por meio dos relatos

escritos dos estudantes, dos relatos falados dos adolescentes e de todos os

envolvidos no processo, tem nos feito observar que ao longo dos anos, o projeto

socioeducativo dentro da Casa da Semiliberdade tem apresentado resultados

transformadores.

4-Considerações finais:

Levando-se em consideração a proposta feita pelos graduandos (as) das

licenciaturas, em especial os (as) da Pedagogia da FE UnB no sentido de serem

inseridos em atividades extra classe dentro da comunidade, é possível afirmar que

esse trabalho vem obtendo êxito. Durante esses anos (2008-2017) É possível

perceber que, os graduandos (as) que passaram pelo projeto Unidade desenvolveram

aptidões e compreensões imensuráveis para a sua formação. Somos sabedores agora

de que, a reinserção dos adolescentes em uma sociedade que historicamente os

tornaram a margem, é necessária. Porém, não é isso que a lógica de uma sociedade

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preconceituosa e excludente deseja. Mas, essa é uma luta em que estamos firmados,

se de fato desejamos de alguma maneira caminhar rumo á igualdade de direitos,

cumprimento das leis e oportunidade real para todas as nossas (os) crianças e

adolescentes. Concluímos com o texto de Marx, que diz: “A classe dominante numa

determinada sociedade [...] que dispõe também dos meios da produção intelectual, de

tal modo que o pensamento daqueles aos quais são negados os meios de produção

intelectual está submetido também a classe dominante” (MARX E ENGELS, 2007,p,

48).

Esse trabalho de pesquisa, ainda em andamento, está longe de finalizar as

discussões acerca do tema proposto, apenas pretende mostrar que, a práxis aqui

exposta, a luz das teorias do Materialismo Histórico Dialético, proposto por Karl Marx,

e da teoria Histórico-Cultural de Lev S. Vigotski, a Socioeducação dentro do Sistema

de Semiliberdade no DF, vá encontrando superações e transformações possíveis que

permita a transformação da realidade hoje estabelecida.

BIBLIOGRAFIA

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Movimento Popular do Rodeador, DF: A Escola do Coração. Dissertação de mestrado.

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THIOLLENT, Michel. Metodologia da Pesquisa-ação. SP. Cortez, 2008.

VIGOTSKI, Lev Semenovitch. Teoria e método em psicologia. 3ª Edição. São Paulo, Martins Fontes, 2004.

i Trabalhar na sua área de formação.

ii Jovens do sexo masculino de idade entre 14 a 21 anos.

iii Grupo – GENPEX representado pelos graduandas (os) dos Cursos de Pedagogia e outras Licenciaturas

da Universidade de Brasília. iv Instituição de Semiliberdade onde o grupo de trabalho denominou chamar de: CASA.

v Prato cheio: Excelente oportunidade de atração para os adolescentes.

vi Pinam – Evadem.

vii Escola: aqui representada por todos os sujeitos que a compõem. Gestores, professores, vigilantes,

serviços gerais, coordenadores etc.. viii

Alguns seguimentos prisionais: prisão, cárcere, liberdade assistida, semiliberdade, semiaberto. ix Equipe multidisciplinar: pedagogos (as), psicólogos (as), assistentes sociais, especialistas

socioeducativo. ATRS-Atendente de Reintegração Socioeducativo, gerentes, supervisores, vigilantes.

serviços gerais etc... x Tia – tratamento dado pelos adolescentes á pesquisadora