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Há vita activa à vita contemplativa · 2019-07-08 · 11 Actividade proposta por Hannah Arendt, que corresponde ao artificialismo da existência humana. A condição humana do trabalho

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Há vita activa à vita contemplativa:

o acto de pensar enquanto ergogenia

autorSimão Monteiro

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APHOMOIOO INSTITUTE

www.aphomoioo.org

TÍTULO: Há vita activa à vita contemplativa: o acto de pensar enquanto ergogenia

AUTOR: SIMÃO MONTEIRO

CAPA: APHOMOIOO INSTITUTE

PUBLICAÇÃO: APHOMOIOO INSTITUTE

ISBN 000-000-000-000-0

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ÍNDICE

1. Introdução …………………………………………………… 03

2. Todo “haver” “é” (existe) uma vogal craseável: o evento do título justificado 12

3. “Há” θεωρια theoria (visão) “à” (para a) contemplação (contemplatio) 17

4. A realidade enquanto experiência de satisfação …………… 20

5. O acto de humanizar …………………………………… 22

6. Este “acto” (pensar / este ensaio) enquanto ergogenia: conclusão 29

7. Referências Bibliográficas …………………………………………… 31

8. Glossário …………………………………………………… 34

5

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“Há” vita activa “à” vita contemplativa: o “acto de pensar” enquanto ergogenia.

1. Introdução

Neste ensaio tencionamos investigar o “acto de pensar” como um “fazer” activo – segundo

uma ergogenia1 – pretendendo descrever e argumentar acerca desta actividade (“acto de pensar”)

como uma manifestação expressiva da existência que se configura numa realidade como

decorrência de uma prática linguística2, e assim será tomado como uma “realização”, ou seja, o

“acto de pensar” como uma forma expressiva que tem a sua origem numa prática linguística. Uma

imaginação consentida por uma realidade que se “realiza” em uma conformidade3 que atravessa

uma imagem no sentido de sua existência linguística, o que nos permite afirmar que toda realidade

“faz”-se através de imagens que consubstanciam práticas linguísticas “à” experiências de

satisfação4, permitindo aos homens edificar toda conformidade das “coisas” como materialidade

alicerçada5 por uma permanente tensão entre uma realidade animal – o imaginário6 – e uma

realidade sem representação – o real7 – “realizada” como esvaziamento do imaginário. Desta

1 Ergogenia é a origem daquilo com que alguém esta ocupado.2 Representação formal da realidade a partir da projecção de uma forma (idéia) numa representação. Toda actividade

humana é considerada uma prática linguística.3 Correspondência; que possui uma relação de identidade, de compatibilidade na forma, maneira, tipo, natureza:

conformidade de opiniões, de vontades.4 Experiência sensível que qualifica a energia psíquica necessária para realização de uma determinada actividade.5 Realidade, qualidade daquilo que é material e cujas bases (fundamentos) são sólidas.6 Ver no glossário verbete correspondente.7 Idem.

6

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permanente tensão que se “faz” através de uma interacção marcadamente ambivalente (imaginário /

real), define-se a realidade (singular) na qual existem os homens e as representações – práticas

linguísticas – que, enquanto realidades (pluralidade) individuais existem em conformidade com

“algo” concedido como formalidade individual determinante8 para uma existência substancialmente

mental e linguística definidora da realidade das realidades enquanto simbólico9.

Assim, vamos avançar em nossa argumentação, afirmando que a realidade, como a

concebemos, “faz”-se enquanto manifestação mental essencialmente linguística, uma estrutura

consubstanciada que estabelece a organização linguística das práticas ideológicas (políticas, sociais

e econômicas) organizando e estruturando as sociedades humanas como formatações discursivas

(mediatização) de natureza histórica10. Salientamos contudo, que o presente ensaio não pretende

aprofundar qualquer investigação histórica acerca destas estruturas ideológicas organizativas das

sociedades. Porém, admitimos que “haverão” consequências ideológicas inerentes “à” (para a)

presente argumentação enquanto prática linguística que, inevitavelmente (des)localizará – neste

empreendimento (visto enquanto “acto de pensar”) – qualquer “coisa” (tal como este ensaio) no que

diga respeito ou faça referência a realidade como um conceito. (Des)localizando, desta maneira, a

“idéia” de real para o “acto de pensar” enquanto realidade, ou seja, a “idéia” de real que

localizamos no “haver”, (des)locar-se-á para o “acto de pensar”, tomado como “acto de pensar”

8 Regra individual ou operação obrigatória que serve para o cumprimento de uma regra. 9 Ver no glossário verbete correspondente.10 Formações que se estabelecem enquanto enunciados (pensamentos) como prática discursiva como proposto por

Michel Foucault. Aqui não interessa considerar a condição de arquivo, outrossim, os enunciados enquantoestruturas enunciativas.

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enquanto lugar antes ocupado pela “idéia” de real, que agora será ocupado pelo “acto” enquanto

acção-realidade, ou seja, o real não “é” a realidade.

Portanto, vamos argumentar de uma maneira pouco usual que os pensamentos “são”

conformidades que atravessam imagens no sentido de suas existências linguísticas, sendo assim os

responsáveis pela manutenção estruturante da mundanidade enquanto artificialização do mundo

estabelecida pela condição humana do trabalho11. Acreditando que “isto” evidencia a natureza

mental e linguística consubstanciada de nossa existência enquanto prática linguística. Permitindo-

nos defender que esta manifestação (prática linguística – “acto de pensar” – pensamentos – este

ensaio) “é” o que “faz” interagir estruturalmente um homem com outro homem através das

“coisas”, “faz”endo com que homens interajam com homens segundo formatações (mediatização).

“Esta” “bele” “cendo” uma mundanidade – “esta” (enquanto “pronome” que relaciona a “coisa” a

pessoa), “bele” (enquanto “belo” deontológico) e “cendo”12 (enquanto “designativo de tempo

continuado”) – consubstanciada por práticas linguísticas que perenizam toda existência em uma

estruturação discursiva (história – conhecimentos). Entretanto, poucas vezes nos interessamos pela

origem (ergogenia) destas formatações (mediatização) enquanto “aquilo” que perpetua uma

existência, transformando o mundo, artificializando-o ou (re)criando-o constantemente através das

“coisas”.

Dito isto, consideramos que esta inauguração de nossa existência linguística (protótipo

neonatal – representação) ocorreu através de “algo” que se “faz” como manifestação segundo uma11 Actividade proposta por Hannah Arendt, que corresponde ao artificialismo da existência humana. A condição

humana do trabalho produz um mundo artificial de coisas, nitidamente diferente de qualquer ambiente natural.Hannah Arendt em A condição humana, editora Relógio D'água, página 19.

12 Teoria segundo a qual as escolhas são necessárias, tendo o “belo” como orientador sobre o que deve ser feito.

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organização mental e dialética13 desencadeada por condutas culturais14 inerentes a vita activa e a

natureza de nosso acoplamento estrutural linguístico15, que tem a sua origem (i)memorável na

primeira representação16 de um protótipo estabelecido como a primeira visão (contemplação) de um

neonato17 – em conformidade com uma imagem, segundo uma visão, mas na forma de uma

alucinação – sendo esta condição humana de primeira representação o que enfim estabelece o que

defendemos: a realidade existe como realidades, sempre procurando atravessar uma imagem no

sentido de uma existência linguística (representação) como decorrência de um acoplamento

estrutural inerente “à” vita activa enquanto processo laborans de nossa existência linguística que

estrutura todas as nossas acções de artificialização – estabelecendo-se assim o simbólico18, o

“haver” das realidades – determinantes “à” (para a) nossa hipótese investigativa (“há” vita activa

“à” vita contemplativa) e “à” nossa prospecção psicanalítica.

Consequentemente, o problema central de nossa investigação “é” (existe) o conhecimento

da realidade que, enquanto experiência de satisfação, tem a sua matriz numa imagem tornada numa

13 Entendimento metodológico possibilitado por uma relação de oposição (idéia/matéria) que se expressa através deuma estrutura simbólica (representação) viabilizando a construção de uma realidade concreta de natureza histórica.Este pensamento tem a sua origem em Georg Wilhelm Friedrich Hegel.

14 Estabilidade transgeracional de configurações comportamentais adquiridas ontogenicamente na dinâmicacomunicacional de um meio social.

15 A linguagem entendida enquanto fenômeno decorrente das interações e relações entre representação, recalcamentoe ego.

16 Ver nota número 20.17 Relações do neonato com a mãe, onde o neonato alucina que a mãe, que representa o seu amparo e alimento, é

também o seu próprio corpo e o que lhe torna o mundo possível. Esta idéia foi proposta em 1895 por SigmundFreud em Projecto para uma Psicologia Científica, que pode ser encontrado emhttp://www.freudonline.com.br/livros/volume-01/vol-i-16-projeto-para-uma-psicologia-cientifica-1950-1895/.

18 Ver no glossário verbete correspondente.

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primeira representação que funda a linguagem através de um recalcamento19 – hipótese do par-

imagético20 – que estrutura o simbólico enquanto “haver” alicerçado por práticas linguísticas que

“são” (existe) a nossa existência linguística. E assim alicerçamos todo “haver” enquanto existência

linguística, podendo argumentar que o “acto de pensar” “é” (existe) uma prática linguística

enquanto “fazer” activo que formata (também a forma deste ensaio e desta nossa argumentação)

enquanto realidade. Oferecendo-nos, desta maneira, a linguagem como “um” recalcamento21

(evento) decorrente de uma primeira representação (protótipo neonatal), que funda a linguagem

através de um método linguístico (par-imagético) estabelecido, objectiva e manifestamente,

enquanto mundanidade (artificialização) através de uma imagem que estrutura a realidade,

determinante para os domínios da existência, tanto “à” (para a) vita activa (política) quanto “à”

(para a) vita contemplativa (contemplação), como práxis que constituem “em si” realidades

humanas (imanentes).

Consequentemente, vamos assumir a práxis nestes dois modos de existir como imagens que

se “fazem” como “idéia”(s) que transformam experiências de satisfação em estruturas linguísticas

que se expressam como representações formatadas da realidade – práticas linguísticas que

19 Recalcamento que marca uma cisão na vida anímica decorrente da primeira representação (alucinação neonatal)que delimita os tópicos real, simbólico, imaginário e possibilita a estruturação da linguagem assim como aformação dos demais níveis de recalcamento (primário e secundário) não abordados em nossa argumentação devidoa natureza formal (psíquica) não processual. Ver nos anexos o glossário correspondente.

20 Interação imagética advinda de um processo neuropsicológico iniciado numa imagem alucinada (a imagem de si-mesmo [imagem própria do neonato] fundida com a imagem da mãe) que estrutura uma primeira representaçãoiniciada no protótipo neonatal – a imagem alucinada característica de nossa condição laborans – que, ao tornar-senuma representação, estrutura-se segundo um par imagético representativo (sígno/significante) composto por umaimagem sem representação (sígno) – “ego” (si-mesmo) – e outra imagem (significante) que “é” uma representaçãoque significa todo o “haver” – imagem da “mãe”/ mundo.

21 Recalcamento originário. Ver no glossário verbete correspondente.

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atravessam “idéia”(s) (imagem) no sentido de manifestações existenciais (“realização”) de natureza

social e política (enquanto formatação discursiva – representativa) – que organiza a mundanidade

segundo acontecimentos de significação, instaurando-se como formalidade(s) (representações) que

instruem (deontologicamente “idealizam”) a realidade.

Daqui, vamos defender – em conformidade com o pensamento de Hannah Arendt e a partir

do pensamento biológico de Maturana e Varela – que “há” (existe) uma gênese linguística –

entendida como acoplamento estrutural linguístico (Maturana e Varela) – que enquanto condição

laborans22, alicerça todas as nossas interacções com o mundo, instaurando uma mundanidade de

base linguística (práticas linguísticas) que estrutura e organiza as nossas relações (interacções

sociais, políticas e econômicas) através das “coisas”, assegurando a permanência (social e

econômica) humana na mundanidade através de inter-relações produtivas (de produção) “à” (para a)

fabricação contínua de “coisa”(s) [artefacto(s)] duráveis, como “algo” (actividade) imanente

relativamente a condição humana do trabalho que, através de interacções políticas decorrentes

destas práticas linguísticas, estabelecem entre os homens, através da condição humana da acção,

um(a) πολυς polus (pluralidade enquanto semantema) que, enquanto polis (cidade), necessita de

“ser” (existir) mediada por “coisas”, mas enquanto semantema (pluralidade), “é” (existe) o que

assegura a permanência política das interacções humanas sem a necessidade das “coisas”.

Especulamos que assim se estabeleceram os primeiros grupamentos humanos (plural).

Comunidades estabelecidas e alicerçadas sobre bens comuns – produtos do labor + trabalho – que

22 Actividade proposta por Hannah Arendt, que corresponde ao processo biológico do corpo humano: crescimento,metabolismo e morte. Tendo a ver com as necessidades vitais produzidas e introduzidas pelo Labor no processo davida. Hannah Arendt em A condição humana, editora Relógio D'água, página 19.

11

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se constituíram colectivamente em comunidades aonde não “havia” distinção entre uma vida

privada e uma vida pública, apesar de já se estabelecerem as representações que permitem-nos hoje

distinguir o conceito-indivíduo, assim como o conceito-comunidade, bem como conceber uma

existência política (vita activa). Diante do que, consideramos que já estava instruído um modelo

público, entretanto, ainda consubstanciado enquanto alteridade existencial constituidora de um

modelo plural (condição humana da acção23), indispensável “à” (para a) constituição de uma

urbanidade fundamental.

Portanto, ser-humano-assim, “é” (existe) ser-humano-plural, não sendo por isso singular

(apesar de individual), porque se-“é”-um-ente-múltiplo-pontual que “é” (existe) um-ser-que-resulta,

não como consequência, mas antes-como-continuidade que “é” (existe) interrompida para que

“haja” “um” devir-a-ser-individual que precede qualquer condição própria “à” (para a) condição

humana da acção, conforme um prólogo ou um prefácio, mas a partir de uma alteridade

fundamental.

Assim “são” (existem) as demarcações culturais (enquanto condutas) dos sistemas humanos

em conformidade com a nossa condição “falante” que permitem que a vita activa transcorra em um

mundo criado como artificialidade imposta por um “fazer” (homo faber) – fabricante – que através

de instrumentos, coisifica o mundo criando representações coisificadas – mundanidade –

alicerçadas por “coisas”. Pois, “é” (existe) assim “o homem” enquanto “os homens”,

produz(em)indo e estabelecendo conhecimentos que são transmitidos de uma geração “à” (para a)

23 Actividade proposta por Hannah Arendt, que se exerce directamente entre os homens, a conditio per quam de todavida política. Corresponde a condição humana da pluralidade devido ao facto de que homens, e não o homem,vivem na Terra e habitam o mundo. Hannah Arendt em A condição humana, editora Relógio D'água, página 20.

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outra, constituindo a mundanidade como a projecção de uma “idéia” (forma – imagem) numa

representação, uma coisificação24. Uma objectivação autopoiética do protótipo neonatal25 que,

enquanto representação, preenche toda a dimensão do simbólico através de acontecimentos de

significação, ocultando aos homens o seu valor histórico enquanto “fazer” activo (“acto de pensar”

– pensamento) e revelando, através de um novo padrão semântico, um novo valor histórico

determinado enquanto acontecimento de significação, sendo isto o que altera uma tradição histórica

particular (através de uma modificação no léxico26). Portanto, pertinente aos acontecimentos

históricos enquanto estruturas sintáticas instauradas por uma culturalização determinada enquanto

vita activa. Assim acontece a πολις (polis) histórica ou a cidade como acontecimento de

significação (conhecimento), ou seja, através de um novo padrão semântico, instaura-se um novo

valor (léxico) que fica expresso semanticamente devido a uma nova organização dos estruturantes

sintáticos (linguísticos), isto é, um conhecimento que, relativamente a sua origem activa (léxica),

expressa-se no presente histórico como um semantema, definindo a palavra πολις (polis) como um

“fazer” formatado activamente que tem como ergogenia uma sobredeterminação prática linguística

– na forma de nosso acoplamento estrutural.

Mas, o que realmente tencionamos sancionar com este ensaio “é” (existe) a vita activa

(política) e a vita contemplativa (intelectual) enquanto reciprocidades, ou seja, “há” uma

interdependência entre o conhecer cognitivo (acção – vita activa) e o conhecimento filosófico

discursivo (contemplação – vita contemplativa). O primeiro, que busca através de uma experiência

24 Mundo criado pelos homens como decorrência das suas relações com as coisas mundanas, a artificialidade impostaao mundo através do Homo faber, o fazedor de instrumentos que coisifica o próprio mundo criando a mundanidade

25 Ver nos anexos o glossário correspondente. 26 Reunião de todas as palavras que existem numa língua.

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de satisfação uma forma de expressão que resulta-realidade, relacionado ao segundo (intelectual –

contemplativo) – o pensamento / “acto de pensar” – que empresta-formalidade “à” (para a)

experiência de satisfação expressando-a objectivamente como forma-realidade enquanto

formatação discursiva / representativa. Por um lado, “há” acção cognitiva expressada num objecto

“coisa” (representação) e, por outro, “há” contemplação “falação” (enquanto acontecimento de

significação) como formalidade expressiva numa formatação discursiva (mediatização), ambos os

domínios determinantes para toda acção de transformação do conhecer em conhecimento própria

“à” (para a) urbanidade imposta pela vita activa como inquietude que se tipifica no “belo”

deontológico27 (enquanto imagem – representação) configurando “um” silêncio (evento estético –

imagético) que harmoniza através de uma passividade (“belo” deontológico) uma forma activa

(acção – “acto de pensar) “à” (para a) vita contemplativa.

27 Toda experiência estética de natureza subjectiva e individual que fica expressa através de uma representaçãodiscursiva, ou seja, a beleza seductora de um discurso enquanto compreensão subjectiva e individual.

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2. Todo “haver” “é” (existe) uma vogal craseável: o evento do título justificado

Assim, do enunciado: “há” vita activa “à” vita contemplativa”, enquanto oração sem sujeito,

vamos articular, a partir do verbo impessoal (“há”) que, na primeira parte desta oração o “termo da

oração a respeito do qual se enuncia” que “há” (existe) informação na qual está focada a mensagem,

“é” (existe) invadido pelo termo vita activa. Portanto, em “há” vita activa...”, vamos tomar vita

activa como pessoa gramatical, e desta maneira vamos poder chamá-lo “sujeito”, ao qual o

predicado “...“à” vita contemplativa” apesar de ser menos que uma interrogação, interroga acerca

do “haver”28 que (“há”) enquanto afirmação predicada (vita contemplativa) através de uma

preposição aglutinada a um artigo por um acento crase (“à”), permitindo-nos “acto de pensar”

(pensamento) que, “para a” [(“à”) preposição + artigo] – preposição que une e mantém uma

interacção entre dois elementos num enunciado + artigo definido que possui a capacidade de

identificar “algo” para o qual se pressupõe conhecido enquanto assunto “falado” (que sofre a acção

do “sujeito”) – vita contemplativa existe (“há”) vita activa.

Entretanto, segundo a estrutura sintática do enunciado do título (“há” vita activa “à” vita

contemplativa”), este “fazer” activo predicado (vita contemplativa) serve como atributo para o

“sujeito” que “há” da vita activa enquanto “haver”, diante do que uma mera inversão da ordem dos

termos no enunciado permitiria maior clareza ao título (“há” vita contemplativa “à” vita activa), ou

seja, “há” pensamento (vita contemplativa) “à” (para a) acção (vita activa). O que se “faz” expresso

segundo uma visão estrutural discursiva corrente na actualidade, ou seja, “agimos porque

pensamos” (visão cartesiana), mas não o que se pretende argumentar no decorrer deste ensaio.

28 Como tudo o que existe, a existência de tudo.

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Contrariamente, o que se pretende com este ensaio “é” (existe) desenvolver uma argumentação

historicista inerente “à” (para a) historicidade estabelecida através de um “acto de pensar” contido e

estruturado numa organização sintática e semântica (neste ensaio), que pretende, desta maneira,

uma compreensão mais analítica estrutural que histórica, de como uma organização sintática numa

construção textual se expressa na actualidade (através deste ensaio), procurando situar os termos

vita activa e vita contemplativa, consoante a uma práxis, como uma e única expressão-

representativa-(enunciada)-da-realidade, não enquanto existência léxica, outrossim como

contextualizável semântico, justificando assim que este “acto de pensar” seja desenvolvido,

enquanto “acto”, a partir de um pensamento foucaultiano.

Portanto, o “acto de pensar” (pensamento) enquanto um “fazer” formatado (mediatização)

activamente (pluralidade) que une, mantendo uma correlação entre duas expressões – vita activa

(política) e vita contemplativa (filosófica) – tomadas como distintas mas semanticamente

interdependentes enquanto contexto formal-estético – através do “belo” como existência (política) e

forma (filosófica) – em um discurso (enunciado). Assim, “à” (para a) vita activa (política)

corresponderá lexicamente o πολιτης (polites) – cidadão – e “à” (para a) vita contemplativa

(filosófica) corresponderá lexicamente o φιλοσοφος (philosophos) – filósofo. O primeiro, uma

reunião de elementos unitários expresso pelo adjectivo grego πολυς (polus) – numeroso, muito,

grande – que se finaliza enquanto objecto significante na unidade explícita de um conjunto

implícito – o cidadão e a cidade – o segundo, o “querer possessivo de um outro” (cidadão)

“enquanto um” (sábio) – φιλος (philos) – aditado (adicionado a uma “coisa”) a vontade29 explicitada

29 A vontade como uma “coisa” sem representação (mas que se pode “fazer” em toda representação), um objecto dopensamento enquanto prática linguística.

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dessa possessão [política (acção de possuir)] enquanto acto iniciado (que sofre acção do

pensamento-interpretação) – σοπφος (sophos) – o filósofo. Então, o indivíduo que se inicia no

plural (vita activa), torna-se na pessoa singular (pluralidade) que existe na πολις (polis) enquanto

cidadão (condição humana da acção), ao passo que o indivíduo (cidadão) que “quer possuir um

outro” (sábio – philos) para permanecer desejante (“coisa”) de uma consequência (pensamento)

dessa possessão (“belo”) requerida (interpretação), “é” (existe) na πολις (polis) enquanto filósofo

(vita contemplativa).

Deste modo, torna-se possível definir um elo – no indivíduo – e uma fronteira – enquanto

alteridade – através dos quais, “há” um limite factual (fronteira) que se expressa em um léxico

indivídual (político – cidadão) que “é” (existe) (des)“feito” pela condição léxica da palavra philos-

sophos, através das raízes das duas palavras componentes (philos[cidadão] + sophos[sábio]), que se

instauram enquanto prática linguística sobredeterminada, uma transformação semântica acontecida

no “haver” entre a vita activa (política) e a vita contemplativa (filosófica) através de uma possessão

formal-estética – uma deontologia do “belo”30. Sendo “isto” (esta deontologia do “belo”), o que nos

permite este “acto de pensar” “feito” através de uma existência textual (neste ensaio) condicionada

enquanto “acto de pensar” semanticamente os dois termos (vita activa / vita contemplativa). Assim,

relativamente ao primeiro, enquanto “sujeito” activo (vita activa) – como “belo” objecto, “bela”

“coisa”, “bela” acção (condição política) – entretanto, relativamente ao segundo, como predicado

atribuído ao primeiro seu “sujeito” que, entretanto, em nossa argumentação, pretende-se

semanticamente contextualizável, ou seja, o “belo” enquanto “acto de pensar” [uma visão que

30 O “belo”, enquanto experiência subjectiva e individual, imputa uma necessidade pública de escolher, “orientando”como esta escolha deve se “fazer”.

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enquanto visualidade – somente “é” (existe) visível ao indivíduo sujeitado pelo “acto de pensar”

(vita contemplativa) enquanto acção-contemplativa (vita activa)]. Portanto, através de uma

existência textual (enunciado), considerada através de uma estruturação semântica finalizada, o que

pretendemos “é” (existe) argumentar que o filósofo não se liberta da polis através da σχολη schole

(escola) como pleiteavam os gregos, ou como lhes era possível pleitear, mas “é” (existe) liber-

(livre)-tado enquanto limite factual – como “aquilo” que “é” (existe) fronteira – portanto, enquanto

alteridade individual constituída factualmente na e pela polis (cidade). Assim, como uma

“possessão que segura mesmo “algo”, apegando-se ou prendendo-se”.

Nestes termos, a condição predicada (vita contemplativa) “é” (existe) “o atributo que

qualifica o “sujeito” vita activa e determina que este “sujeito” “é” (existe) uma substancialidade

para o “haver” que se tipifica no “belo” (“coisa”) enquanto atributo formalizado-(no “sujeito”)-

estético-(do predicado). Portanto, uma formatação discursiva (mediatização) predicada enquanto

“acto de pensar”, ou seja, o cidadão (“coisa”) enquanto vita activa “é” (existe) cidadão “pensador”

(“acto de pensar”) enquanto vita contemplativa, entendida a vita activa como acção (contemplação)

e a vita contemplativa como visão (contemplatio), o que estabelece que “há” acção (contemplação –

vita activa) “à” (para a) significante liberdade, enquanto estética-liber-(livre)-tadora expressa pelo

“acto de pensar” (acção – vita activa) enquanto visualidade (vita contemplativa) (in)visível (no

interior da mente).

Temos assim uma urbanidade condicionada em que cada indivíduo “é” (existe) cidadão (vita

activa) e também “pensador” (vita contemplativa), sendo esta a substancialidade (vita activa) “à”

(para a) formatação discursiva (mediatização enquanto “acto de pensar”) do “belo” enquanto

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atributo que (in)determina o que “é” (existe) caracteristicamente condicionado “à” (para a)

alteridade individual, portanto, como limite factual (fronteira) para os dois termos, estabelecido por

uma prática linguística sobredeterminada através do léxico πολις (polis) – cidade – que nos permite

concluir que “é” (existe) a formatação discursiva (mediatização) como acção do “belo” enquanto

“coisa” que estrutura toda a sintaxe do enunciado (“há” vita activa “à” vita contemplativa),

existindo assim como prática linguística (“acto de pensar”) que silencia toda inquietude do

conhecer (vita activa) enquanto experiência de satisfação (“belo” deontológico), definindo assim

um “haver” ergogênico para o pensamento (enquanto “acto de pensar”) contemporâneo, entendido

este “acto”, neste ensaio, como “algo” que se reflete condicionado “à” (para a) inerente

(re)organização histórica (super)estrutural (“acto de pensar”) do termo vita contemplativa enquanto

significante sobredeterminado (prática linguística) expresso pelo léxico liber-(livre)-tada em

conformidade “à” (para a) significante passividade, ou seja, o predicado sofre uma acção do

“sujeito” e sujeita-o (vita activa) a se sujeitar (vita activa ao “acto de pensar”) enquanto predicação

atribuída (vita contemplativa). Temos assim uma conformidade passividade que nunca “é” (existe)

passividade porque o predicado sofre uma acção do “sujeito” e sujeita-o a se sujeitar ao que se

atribui, ou seja, o “sujeito” sujeita-se (activamente) a toda contemplação (contemplatio).

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3. “Há” θεωρια theoria (visão) “à” (para a) contemplação (contemplatio)

Portanto, através do enunciado – “há” vita activa “à” vita contemplativa” – título de nosso

ensaio, procuramos examinar o “haver” com a finalidade de interrogar a realidade enquanto um

“fazer” edificante que parte da observação de uma formação discursiva (enunciado), tida como

modelo de estudo (“há” vita activa “à” vita contemplativa”). “Faz”endo assim, descobrimos que

“há” estruturas sintáticas que permitem (re)configurar a realidade em conformidade semântica com

o atributo predicado – no caso deste capítulo, da contemplação enquanto visão, e no caso deste

ensaio, da vita contemplativa enquanto vita activa – segundo uma formatação discursiva

(mediatização) estabelecida como substancialidade (conceito + essência + existência) através do

“belo” deontológico (acção / “acto de pensar”), que altera semanticamente a práxis enquanto modo

de existir de um acontecimento de significação (enunciado), “naquilo” (“belo” enquanto “coisa”)

que silencia uma inquietude do “realizável” (“fazer”), transformando a realidade de uma estrutura

sintática organizada para “algo” (representação – “coisa”) que procura expressar-se através de um

conhecimento organizado enquanto ergogenia teleológica pensante31 que se edifica através de

estruturas de formatação assimiláveis enquanto substancialização significante (substancialidade)

decorrente de uma acção-passividade.

Agora, no presente capítulo, vamos procurar entender a substancialidade passividade que

nunca “é” (existe) passividade enquanto acontecimento de significação [como uma imagem que

“eclode” de interacções realidade (interacção homens / “coisas”)] para uma representação

(simbólico) que expressa a realidade como conhecimento. Portanto, através da substancialidade de

31 Origem de um “fazer” com uma finalidade através de uma forma pensamento.

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um significante activo (visão) que representa a “coisa” – filósofo – que “é” (existe) testemunha

expressa de uma realidade activa substanciada (imagem) que virá a “ser” (existir) conhecida por

causa de uma acção (contemplação) sofrida da qual tornou-se alvo (contemplatio). Temos então a

contemplação como acção sofrida da visão que se tornou alvo enquanto contemplatio

(contemplação) – uma theoria – que através de uma relação substantivo / substantivo [(theoria) /

(contemplação)], organiza uma estrutura sintática através de uma interacção estrutural (preposição +

artigo), colocando-nos diante de um conhecer (através de um “fazer” estético – o “belo”) como

testemunhas historicizadas que buscam por “um” (evento) sentido histórico para o seu “feito”

(conhecimento), através de uma condição analítica proposta como enunciado para este capítulo.

Assim, de uma primeira essência (preposição) que “é” (existe) “algo” que une para manter uma

relação, para uma segunda essência (artigo) que possui a capacidade de identificar “algo” já suposto

conhecido, temos dois substantivos (visão / contemplação). Então, o que “há” de essencial para o

conhecimento enquanto visão (theoria) “é” (o que existe) enquanto contemplação – o “belo” – uma

deontologia estética-liber-(livre)-tadora.

Deste modo, do “aprender com os olhos” (θεαομαι – theaomai) para a visão (θεωρια theoria)

através da “contemplação” (contemplatio), concluímos que “à” (para a) contemplação “há” (existe)

visão (experiência de satisfação), portanto, do “aprender com os olhos” “à” (para a) “concentração

através da inteligência”32 (enquanto substância incorpórea / pensamento) o que temos “é” (existe) o

“acto de pensar” enquanto idealização-(formatação)-conhecimento na forma de “algo” que deve a

sua existência “à” (para a) imagem enquanto experiência de satisfação evocada por uma acção

32 “concentração através da inteligência” é uma referência à vita contemplativa.

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(visão – contemplação) atribuída “à” (para a) sensação (experiência de satisfação – contemplação)

enquanto “acto de pensar”.

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4. A realidade enquanto experiência de satisfação

Assim, descobrimos que a realidade existe semanticamente e o atributo da visão “é” (existe)

fundamental para sua formatação discursiva (mediatização) enquanto vontade (experiência de

satisfação) que se explicita através de um acontecimento de significação expressado esteticamente

numa representação enquanto prática linguística, estabelecendo que as “coisas” mundanas enquanto

mundanidade (realidade), instauram-se através do simbólico como manifestação ambivalentemente

mental e linguística (“acto de pensar” – pensamento – prática linguística).

Então, o “querer possessivo de um outro” (cidadão) “enquanto um” (sábio) – através de

φιλος (philos) – aditado (adicionado enquanto “coisa”) “à” (para a) vontade explicitada desta

possessão [política (acção de possuir)] enquanto acto iniciado (que sofre acção da interpretação) –

através de σοπφος (sophos), o filósofo – “é” (existe) “um” (evento) indivíduo que se inicia no plural

(vita activa), tornando-se num singular enquanto objecto significante, na unidade explícita (cidadão)

de um conjunto implícito (cidade) que, porque “guarda” um conceito plural (urbanidade),

condiciona a realidade enquanto “acto de pensar” (pensamento).

Deste modo, a realidade “é” (existe) uma imaginação que consente na construção de um

discurso que atravessa uma imagem no sentido de sua existência textual, permitindo-nos (re)afirmar

que toda realidade “faz”-se através de imagens transformadas em projecções discursivas de nossas

experiências de satisfação33 consoante (em conformidade com) “à” (para a) mundanidade.

33 Experiência sensível que qualifica a energia psíquica necessária para realização de uma determinada actividade.

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Toda esta conduta cultural expressa por um comportamento inerente a nossa condição

laborans (visão) – nosso acoplamento estrutural linguístico – torna também visível o devir enquanto

“acto de pensar” (pensamento), não através de uma prática linguística, mas de uma imagem

discursiva que, atravessada pelo simbólico enquanto acontecimento de significação instaura um

saber, tornando o não-visível em visível, coisificando “um” (evento) “acto de pensar” (pensamento)

em objecto (representação / projecção) através de uma acção que, devido a sua condição de

redundância, estabelece-se enquanto conduta cultural definindo, segundo uma condição léxica que,

enquanto (re)organização histórica (super)estrutural da polis – enquanto urbanidade – define-se que

todos os significantes discursivos (palavras) sintáticos e semânticos “são” (existem) léxicos.

Com a finalidade de localizar melhor tais analogias nos acontecimentos históricos ou pré-

históricos, em “o acto de humanizar” (no próximo capítulo) vamos narrar o que acreditamos ser o

evento ficcionado fundador da linguagem, acontecido no paleolítico superior, precisamente no

período das pinturas rupestres, de uma maneira que vem evoluindo até aos nossos dias. Não

defendemos com esta narração, que não houve língua antes dos acontecimentos ficcionais aqui

narrados, muito pelo contrário, acreditamos em mudanças estruturais muito gradativas na

linguagem numa longuíssima existência histórica (pré-histórica) ocorrida através da transferência

de conhecimentos de uma geração hominídea para outra, até o advento das pinturas cavernícolas.

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5. O acto de humanizar

Caverna de Altamira, treze mil anos atrás... Ontem caiu uma rocha bloqueando a entrada.

Agora ficarão preservadas as actividades refletidas nas pinturas do interior cavernícola até aos

nossos dias. E assim, impedidos de dar continuidade a ocupação da caverna, a família do Cavalo

Ocre34 prepara-se para partir. Entreolham-se os que já “são” (existem) indivíduos mundanos

“lembrando” o dia da sua própria iniciação, “aquilo” que estabelece o tempo35 da sua existência

(contemplação – passividade). Essa lembrança “é” (existe) uma imagem da mundanidade, a

imagem de uma iniciação que consentiu na existência linguística destes que já “são” (existem)

indivíduos. Agora, tomados por uma (in)satisfação causada pelo esvaziamento da possibilidade de

tornar um (des)conhecido num conhecido (inquietude), contemplam (visão) as crianças36 [os

(des)conhecidos] como a um devir, ignorando o seu (devir) existir, como a uma existência “à” (para

a) qual não sabemos como proceder, e assim, sem saber o que “fazer”, seguirão adiante estes

indivíduos, movidos por uma necessidade, um comportamento, uma conduta cultural – uma

tradição (passividade) – que afinal estão deixando para trás, olhando (visão) para adiante e seguindo

na direção dos (des)conhecidos, de um devir, de um mundo novo por (des)cobrir (inquietude). “À”

34 Família ficcional estabelecida sobre a imagem do cavalo ocre da caverna de Altamira.35 Nas línguas mais antigas a distinção entre dia (como marcador de 12 ou de 24 horas) e noite não existe através de

duas palavras distintas. Normalmente são marcados por uma única palavra significando simplesmente “tempo”,fazendo-se necessário que se descreva o início e o fim de cada “tempo” para que se possa distinguir o dia da noiteou usar outras referências descritivas tais como “luz” para o dia e “escuridão”para a noite.

36 Nesta passagem fizemos uso da palavra “criança” mas o conceito de infância ou criança é muito posterior (séculoXV). Talvez seja mais o que chamamos “relações de identidade” ou o que hoje a antropologia chama “rituais depassagem”. Assim, nos referimos as “crianças” mas a questão é o devir (tornar-se), portanto, enquanto “rituais depassagem”.

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(para a) procura de um lugar que torne novamente possível o “fazer” desta imagem que consente no

seu existir real-mente37.

(In)satisfazemo-nos diante do (des)conhecido, sendo essa a inquietude própria de nossa

existência linguística, uma sensação própria a natureza de nosso acoplamento estrutural, um

comportamento existencial que toma a maneira de uma conduta cultural. Esta permanência

linguística, expressa através de uma (in)satisfação, “é” (existe) a inquietude que consente na

construção de uma sociedade, um sinal que nos coloca diante da necessidade por um mundo

artificializado pelas nossas próprias acções e actividades que nos permita “possuí-lo”, como

maneira, através das representaçôes de edificar a realidade, tornando o mundo em mundanidade.

Assim, somos homens (cri)ativos importunados pelo viver, [uma (in)satisfação] que estabelece a

necessidade realidade através de um “fazer” activo que (re)inventa o viver redundantemente

possuído pelo mundo e possuindo-o, (re)criando-o constantemente enquanto mundanidade.

Então, apropriamo-nos do mundo através da mundanidade, manifestando-a – enquanto

(in)satisfação) artificializada (inquietude) – e vivendo, e existindo através do simbólico estabelecido

pela capacidade de representar as imagens da realidade que “eclodem” através de nós, este o nosso

comportamento que constrói as condutas culturais a que chamamos realidade. Esta a artificialização

que decorre de toda nossa (in)satisfação, esta a natureza de nosso acoplamento (inquietude), que

“faz” existir o mundo e a mundanidade enquanto existência redundante que nos sustenta e nos gera,

significando-nos a nós no mundo e a mundanidade enquanto representação.

37 Alteração visual imposta a uma palavra com a intenção de alterar o significado sem alteração do som, neste caso,leia-se “real-mente” como “realidade da mente”.

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Assim, como humanidade, procuramos justificar estas actividades praticadas nos interiores

cavernícolas através de um modelo produtivo super-estrutural, acreditando que como humanos

vamos para o fundo das cavernas praticar rituais que favoreçam as nossas actividades econômicas,

uma visão (contemplação) intelectiva.

Mas para os caçadores-poetas, caçar e recoletar “são” (existem) actividades que significam

viver. Entretanto, actualmente, como humanos conscientes de nossa humanidade38, o significado

atribuído já “é” outro, sendo interpretadas como estruturas econômicas de subsistência tornadas em

actividades artísticas pelas necessidades significantes e de significação . Entretanto, enquanto

estruturas de acoplamento linguístico, diríamos que caçar e recoletar “são” (existem) actividades

comportamentais que ritualizadas significam o homem em sua humanidade enquanto

acontecimentos de significação de sua existência individual, mas não exclusivamente para o

aprimoramento da suas capacidades de prosperar economicamente. Então, ritualizamos porque

ritualizar “é” (existe) instituir o simbólico, sendo esta a natureza de nosso acoplamento estrutural.

Representamos para conhecer – uma ergogenia39 – permanecendo (des)conhecido tudo para

o que ainda não “há” re-presentação, porque re-presentar “é” (existe) tornar numa realidade uma

imagem que “eclode” de uma interacção de unicidades para uma representação que expressa uma

realidade. Assim, estamos diante de um acontecimento de significação cuja explicação “é” (existe)

no próprio acontecimento e na natureza ergogênica de sua existência linguística.

38 Conscientes de uma nossa qualificação enquanto humanos, uma objectivação autopoiética do protótipo neonatal (veja no glossário verbete correspondente) consistente com o nosso comportamento racional.

39 Ergogenia é a origem daquilo com que alguém esta ocupado.

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Por tudo isso, entreolham-se os caçadores-poetas diante da partida iminente. Os

(des)conhecidos – “é” (existe) o (des)conhecido (“lugar”) para o qual destinam-se (devir). Estes

humanos vivem o devir-enquanto-realidade no qual existimos, sendo este o sempre (des)conhecido

inquietante que implora por um sentido e por um significado.

Levou-se milhares de anos para que o fenômeno linguístico como uma estrutura de

acoplagem se operasse no meio humano, configurando o que somos, descendentes dos caçadores-

poetas do paleolítico em busca de um caminho para uma existência através dos significados.

Defendemos que estas representações nada tem a ver com actividades mágicas, espirituais

ou religiosas. Acreditamos que “é” (existe) da natureza humana apreender o mundo e que essa

inquietude do conhecer dá-se na forma de nosso acoplamento e que esta cognição “é” (existe)

enquanto uma estrutura de existir estabelecendo o que somos e constituindo-nos como “activos”40

(seres) simbólicos.

O recalcamento funda a linguagem e a linguagem estrutura a existência simbólica. Ao

significarmos uma individualidade na imagem do animal pintado, recalcamos o protótipo (ego),

(des)cobrindo o caminho para o que somos.

Buscaremos eternamente pelo que nos significa, porque os significados “são” (existem)

ocultados pelos significantes sendo esta a natureza de uma existência simbólica enquanto estrutura

40 Idéia de que não existimos ontogenicamente (ser), outrossim, ergogenicamente (fazer). Portanto, a origem do nossofazer (ergogenia) é uma dialética interior/exterior através dos sistemas vivos humanos.

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de acoplagem. Estruturamo-nos em representações visuais ou sonoras do mundo para estabelecer o

que somos, tornando visível o mundo para nós e nos tornando in-visíveis41 no mundo.

Assim, existimos entre “actos”, entre o “acto de significar” e o “acto de viver” (des)cobrindo

que viver “é” problematizar o devir42 e fazer acontecer de uma ambivalente estrutura uma

existência linguística caracterizada pelo significar que “é” (existe) viver e pelo viver que “é”

(existe) significar.

Australopitecos lascavam pedras, eram os artífices do mundo, a existência própria do

protótipo neonatal, espaço e temporalmente inseparáveis do seu artefacto (mundo), trabalhando a

pedra, transformando-a, alucinando-a, confundindo o “ser” (existir) da realidade (uma imagem)

com o “fazer” uma realidade. Existem como artefacto-mundo num tempo-do-agora constante, um

instante, onde só “há” o viver-significar, sendo o significar “um” (evento) devir sem significado

porque viver não “é” (existe) um problema. Viver outrossim “é” (existe), existir “é” (existe) e

construir “é” (existe), sendo este o significado ocultado – a existência. Assim, significam “em-si-

mesmos” o instante redundante do devir de sua duração, afinal o que vem primeiro: o instante ou a

sua redundância (instante seguinte)? Não “são” (existem) interpretantes, nem sígnos, nem

significantes porque “são” (exietm) uma ambivalente existência desta tríade43. “São” (existem) a

natureza do acoplamento estrutural linguístico existindo.

41 Conceito de imagem visível que existe somente como significado nunca existindo como significante.42 Conceito filosófico que significa as mudanças pelas quais passam as coisas. O conceito de "tornar-se" nasceu no

leste da Grécia antiga através do filósofo Heráclito de Éfeso que no século VI a.C., disse que nada neste mundo épermanente, exceto a mudança e a transformação. Fonte: pt.wikipedia.org.

43 Estrutura do símbolo em Charles Sanders Pierce.

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O homo-sapiens-sapiens existe para o devir do simbólico e já “são” (existem) puros

interpretantes (des)”faz”endo a ambivalência da tríade originária, ou seja, o protótipo neonatal.

Procuram pela existência de tudo separando o mundo em partes através da produção de “coisas”

mundanas que estabelecem a mundanidade, transformando o mundo num enorme punhado de

objectos coisificados. Assim, vivendo para significar e significando para viver “são” (existem)

ambivalentes enquanto significantes com significados correspondentes. Quando pinta ou grava, a

imagem significante “guarda” uma sua memória ancestral, esta que “é” (existe) um sígno recalcado,

significando a alucinação do protótipo numa representação que agora existirá para o devir-do-ego,

sendo o animal pintado uma re-presentação, uma “re” presença numa memória cultural – uma

conduta – aqui agindo para nominar e re-unir o homo-sapiens-sapiens ao seu memorável ancestral

enquanto protótipo neonatal, uma alucinação que nunca será perdida, apesar de infinitamente

transformada autopoieticamente.

Ao pintarmos as cavernas, não o “faz”emos com uma pré-definição. Não temos uma “idéia”

e a tentamos representar como uma visão de mundo (pensamento). Quando pintamos as cavernas

estamos existindo na natureza de nossa existência, uma intenção somente enquanto acoplamento

estrutural linguístico. Mesmo contemporaneamente ao pintar, “fazer” arte ou diante de qualquer

necessidade criativa, não estamos – como acreditamos – representando uma “idéia” ou criando um

conceito, somos (cri)ativos porque precisamos significar para viver, sendo esta actividade –

significar para viver – o que se reflete nas actividades especializadas que desenvolvemos nas

sociedades, uma necessidade da mundanidade.

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Defendemos que o recalcamento “é” (existe) o processo que funda a linguagem sendo esta a

nossa natureza de existir, ou seja, representamos porque recalcamos crendo assim que não “são”

(existem) os significantes que significam, outrossim, que “é” (existe) o processo que estrutura a

linguagem o que possibilita uma imagem que nos significa, sendo esta a natureza de uma existência

simbólica. Enfim concluindo, acreditamos não “ser” o ego o que nos constitui indivíduos, mas o

simbólico em suas relações com o mundo implorando por significados.

Acreditamos que o ego “é” (existe) um sígno ambivalente44 tornado num pronome e

sonoramente representado na língua como um significante, sendo este o processo ao qual

chamamos autopoiese do protótipo neonatal – um deslocamento sígnico – um fenômeno inerente às

estruturas linguísticas e constituidor de toda massa recalcante enquanto culturalização45.

44 O “ego” é um sígno ambivalente porque existe como uma representação sonora nascida de uma “imagem” semrepresentação decorrente da representação da imagem alucinada do protótipo neonatal, sendo essa a naturezaambivalente deste sígno, ou seja, é o sígno de todo significante (haver) mas não é o sígno dele mesmo (“eu”pronominal) enquanto representação sonora, porque o sígno da sua representação sonora é a sua existênciapronominal (sígno), ou seja, o “eu” pronominal não é uma projecção.

45 Processo que artificializa o mundo, aumentando a massa recalcante, através das actividades humanas pelaacumulação e transferência de conhecimento de uma geração à outra.http://www.msn.com/pt-pt/?ocid=mailsignout

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6. Este “acto” (pensar / este ensaio) enquanto ergogenia: conclusão

Assim, dá-se o “acto” expresso pelo título deste ensaio, “o acto de pensar” que enquanto

“sujeito” “é” (existe) a sua ergogenia (origem – do “acto” no “acto”) enquanto atributo (predicado)

do “acto” que representa o meu próprio “fazer”. Então, o “acto de pensar” enquanto ergogenia

(atributo) “é” (existe) o próprio “acto” enquanto “sujeito”. Estabelecendo que a origem do meu

“fazer” este ensaio “é” (existe) a “origem “disto” (“daquilo”) com que estou “ocupado”, ou seja, o

meu “acto de pensar” (pensamento) enquanto “acção de pensar”.

Mas também, podemos dizer que a origem “disto” (este ensaio) “é” (existe) a filosofia,

como também podemos dizer que a origem “disto” (este ensaio) acontece enquanto tal porque “sou”

(existo) um cidadão – um polites – existindo em minha existência individual enquanto

individualizante urbanidade. “Sou” (existo) assim mais “um” e assim somos muitos “um a um”. Por

isso, “somos” (existimos) o plural de “um” “feito” em muitos “uns”.

Mas como “um”, “sou” (existo) “um” “ser” (existir) ou o “reflexo” de um “fazer”? Se “sou”

(existo) “um” “ser” (existir), “sou” (existo) “alguém” que pensa e que “faz” este ensaio (“existo

ocupado”), ou este ensaio “é” (existe) o “reflexo” do meu “fazer” este ensaio? Visto desta maneira,

“sou” uma forma “ocupada”, uma forma “alguém”, “sendo” (existindo) o próprio “fazer” desta

“coisa” “alguém”, porque estou “ocupado”, mas não “sou” (existo) a origem “daquilo” porque a

origem deste “aquilo” “é” (existe) o “acto de pensar”, uma redundância enquanto origem “daquilo”

com que “alguém” esta “ocupado”. Então, a origem “daquilo” “é” (existe) a origem deste ensaio

(pensar / pensamento), com que “alguém” esta “ocupado” (“eu”), “sendo” (existindo) “eu”

enquanto este “alguém” que se ocupa deste pensar. Consequentemente, “eu sou” “é” (existo) uma

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ontogenia enquanto ontologia, mas “eu sou” “é” (existe) uma acção, a minha acção de “ser”

(existir). Mas a minha acção de “ser” (existir) “é” (existe) uma ontogenia que enquanto acção “é”

(existe) o meu “fazer” enquanto ergogenia, sendo esta a origem de todo “ser” (existir) enquanto

ente, por isso a origem dos entes “é” (existe) a existência, “sendo” (existindo) por isso, a existência

uma ontogenia (coisificação) que tem como sua ergogenia (origem) o “haver” onde tudo “há”.

Permitindo-nos (re)enunciar que “onde tudo” “há” (existe) vita activa para a (“à”) vita

contemplativa.

Assim, a vita activa (conhecer) “é” (existe) “tudo o que” “há” enquanto origem (“fazer”) e a

vita contemplativa (conhecimento) “é” (existe) como “aquilo” (“algo” – “coisa” – vita activa) com

que “alguém” (cidadão / pensador) esta ocupado (“acto de pensar” / pensamento). Porque para

conhecer (vita activa) “é” (existe) preciso experienciar e experimentar individualmente a

mundanidade, sendo este o saber (através de sophos) que estrutura o conhecimento enquanto vita

contemplativa.

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Vol. XVII – Artigo: O Estranho, [1919]

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Vol. V – A interpretação dos sonhos

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Todas as obras de Freud em http://www.freudonline.com.br/

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LAPLANCHE, Jean e PONTALIS, Jean-Bertrand - Diccionario de Psicoanálises, Trad. Fernando

Gimeno Cervantes, 6ª ed. Buenos Aires: Paidós editora, 2004. ISBN 950-12-7321-0.

LEWIS-WILLIAMS, David - La mente en la caverna: la conciencia y los orígenes del arte, trad.

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MATURANA, Humberto e VARELA, Francisco - De máquinas y seres vivos: autopoiesis la

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Grupo editorial Lumen, 2003. ISBN 987-00-0386-9.

ROUDINESCO, Elisabeth e PLON, Michel - Dicionário de psicanálise, trad. Vera Ribeiro e Lucy

Magalhães. Rio de Janeiro: editora Zahar, 1998. ISBN 978-85-7110-444-0

SCHOPENHAUER, Arthur - O mundo como vontade e representação, trad. Wolfgang Leo Maar.

Edição Acrópolis, 2006. E-BooksBrasil.com

SEGAL, Hanna - Introducción a la Obra de Melanie Klein, trad. Hebe Friedenthal. 2ª ed.

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8. Glossário

Acoplamento estrutural linguístico

O acoplamento estrutural é uma forma de interacção entre um sistema e o meio

caracterizada pelo facto de que a interacção entre esses elementos gera fenômenos que são

particularmente recorrentes ou repetitivos e que são relevantes para a manutenção da organização

do sistema. Assim, o acoplamento estrutural é “condição de existência” dos sistemas. Essa

recorrência evidencia um padrão estável de interacção, que somente se torna possível porque as

estruturas do sistema e do meio se encontram acopladas de um modo específico, e que esse ajuste é

necessário para que o sistema vivo mantenha a sua diferenciação.

Também podemos falar de um acoplamento estrutural entre sistemas imersos no mesmo

meio. Nesse caso, o acoplamento estrutural existe quando a organização desses sistemas

desencadeia uma série de fenômenos que são necessários para a manutenção da autopoiese de

ambos. Esse é o tipo de acoplamento existente entre as diversas células que compõem os nossos

organismos. Cada uma delas tem uma estrutura individual e uma organização peculiar, e a

autopoiese de cada uma delas (e também a do organismo) é baseada no facto de que essas várias

células têm comportamentos que somados permitem que cada uma delas continue mantendo a sua

diferenciação.

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O modelo biológico de Maturana e Varela pode ser aplicado na explicação de diversos

fenômenos importantes. O conhecimento, por exemplo, pode ser definido como comportamento

adequado ou ação congruente com o mundo. Do ponto de vista do fechamento operacional, nós,

seres vivos, criamos um mundo; do ponto de vista do acoplamento estrutural, experimentamos

interações com o ambiente e corrigimos nossa imagem do mundo a partir delas.

A linguagem, por sua vez, surge a partir do acoplamento estrutural entre seres humanos. Ela

depende de uma convivência íntima e colaborativa, que gera uma rede de conversações (conjunto

de comportamentos coordenados mutuamente disparados entre os falantes). Nesta perspectiva, a

linguagem não envolve transmissão de informação, mas apenas coordenação comportamental num

domínio fechado de acoplamento estrutural. As trocas comunicativas constituem verdadeiras

coreografias refinadas de coordenação comportamental. Os nossos conceitos são todos derivados

destas interações comportamentais.

Fonte: A árvore do conhecimento, Humberto Maturana e Francisco Varela, Editorial Psy,

1995, Tradução Jonas Pereira dos Santos.

Autopoiese

Autopoiese ou autopoiesis (do grego auto "próprio", poiesis "criação") é um termo cunhado

na década de 1970 pelos biólogos e filósofos chilenos Francisco Varela e Humberto Maturana para

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designar a capacidade dos seres vivos de produzirem a si próprios. Segundo esta teoria, um ser vivo

é um sistema autopoiético, caracterizado como uma rede fechada de produções moleculares

(processos) em que as moléculas produzidas geram com suas interações a mesma rede de moléculas

que as produziu. A conservação da autopoiese e da adaptação de um ser vivo ao seu meio são

condições sistêmicas para a vida. Portanto, um sistema vivo, como sistema autônomo, está

constantemente se autoproduzindo, autorregulando, e sempre mantendo interações com o meio,

onde este apenas desencadeia no ser vivo mudanças determinadas em sua própria estrutura, e não

como um agente externo.

De origem biológica, o termo passou a ser usado em outras áreas por Steven Rose na

neurobiologia, por Niklas Luhmann na sociologia, por Gilles Deleuze e Antonio Negri na filosofia e

por Patrick Schumacher na arquitetura.

Fonte: De máquinas e seres vivos. Autopoiésis: La organization de lo vivo, Humberto

Maturana e Francisco Varela, Editorial Universitária e Grupo Editorial Lumen, Sexta Edición, 2004,

Tradução Maria Luísa Santander.

Consciência

Termo empregado em psicologia e filosofia para designar, por um lado, o pensamento em si

e a intuição que a mente tem de seus atos e seus estados, e, por outro, o conhecimento que o sujeito

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tem de seu estado e de sua relação com o mundo e consigo mesmo. Por extensão, a consciência é

também a propriedade que tem o espírito humano de emitir juízos espontâneos.

Sob certo aspecto, o termo consciência não faz parte do vocabulário da psicanálise, embora

a teoria freudiana do inconsciente esteja relacionada com a história da filosofia da consciência, da

qual é a herdeira crítica. Mas de um ponto de vista clínico, a questão da consciência encontra-se em

todas as escolas de psicoterapia que se valem da fenomenologia ou da mobilização da vontade

consciente dos pacientes no tratamento.

Fontes: Diccionario de Psicoanálises, Jean Laplanche e Jean-Bertrand Pontalis sob a direção

de Daniel Lagache, Paidós Editora, 2004, Tradução de Fernando Gimeno Cervantes. Dicionário de

Psicanálise, Elisabeth Roudinesco e Michel Plon, Editora Zahar, 1998, Tradução Vera Ribeiro e

Lucy Magalhães.

Inconsciente

Na linguagem corrente, o termo inconsciente é utilizado como adjetivo, para designar o

conjunto dos processos mentais que não são conscientemente pensados. Pode também ser

empregado como substantivo, com uma conotação pejorativa, inconsciente para falar de um

indivíduo irresponsável ou louco, incapaz de prestar contas de seus atos.

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Conceitualmente empregado em língua inglesa pela primeira vez em 1751 (com a

significação de inconsciência), pelo jurista escocês Henry Home Kames (1696-1782), o termo

inconsciente foi depois vulgarizado na Alemanha, no período romântico, e definido como um

reservatório de imagens mentais e uma fonte de paixões cujo conteúdo escapa à consciência.

Introduzido na língua francesa por volta de 1860 (com a significação de vida inconsciente)

pelo escritor suíço Henri Amiel (1821-1881), foi incluído no Dictionnaire de l’Académie Française

em 1878.

Em psicanálise, o inconsciente é um lugar desconhecido pela consciência: uma “outra cena”.

Na primeira tópica elaborada por Sigmund Freud, trata-se de uma instância ou um sistema (Ics)

constituído por conteúdos recalcados que escapam às outras instâncias, o pré-consciente e o

consciente (Pcs-Cs). Na segunda tópica, deixa de ser uma instância, passando a servir para

qualificar o isso (id) e, em grande parte, o eu (ego) e o supereu (superego).

Fontes: Diccionario de Psicoanálises, Jean Laplanche e Jean-Bertrand Pontalis sob a direção

de Daniel Lagache, Paidós Editora, 2004, Tradução de Fernando Gimeno Cervantes. Dicionário de

Psicanálise, Elisabeth Roudinesco e Michel Plon, Editora Zahar, 1998, Tradução Vera Ribeiro e

Lucy Magalhães.

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Protótipo Neonatal

Para Freud julgar é um processo que só se torna possível graças a inibição (atração) pelo ego

de algo (acção) que é evocado por uma dissemelhança entre o investimento de um desejo numa

lembrança (imagem) e um investimento perceptivo (sensível) que seja semelhante a esta lembrança.

Daí se deduz que a coincidência entre dois investimentos se converta num sinal biológico que põe

fim à uma actividade pensamento e permite iniciar uma acção. Quando os dois investimentos não

coincidem, surge o ímpeto para uma actividade pensamento que voltará a ser interrompida pela

coincidência de ambos investimentos.

Esta mesma explicação pode ser mais bem entendida quando pensamos no neonato e na sua

necessidade (desejo) de comer. A lembrança (imagem) na qual investe o neonato é a imagem do

peito da mãe. Se lhe é dado o peito da mãe há coincidência entre o “investimento de um desejo

numa lembrança” e o “investimento perceptivo desta lembrança” fazendo com que os dois

investimentos (necessidade/percepção) coincidam interrompendo uma actividade pensamento

(choro) do neonato.

Em nosso ensaio o protótipo neonatal é tratado como uma “imagem alucinada” (a imagem

própria do neonato que se funde com a imagem da mãe – primeira representação) que ao ser

representada estabelece um par representacional (sígno / significante) composto por uma imagem

sem representação (sígno) – “ego” – e uma representação que significa todo “haver” que provoca

uma cisão na vida anímica estabelecendo o homem como limite das interações tópicas real,

simbólico e imaginário (fenómeno linguístico). Verdadeiramente, a noção de “primeira

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representação” não é “a imagem própria do neonato” mas um sem fim de imagens (conhecimento)

onde “a imagem própria” é somente uma numa infinidade (culturalização).

Fontes: Diccionario de Psicoanálises, Jean Laplanche e Jean-Bertrand Pontalis sob a direção

de Daniel Lagache, Paidós Editora, 2004, Tradução de Fernando Gimeno Cervantes. Dicionário de

Psicanálise, Elisabeth Roudinesco e Michel Plon, Editora Zahar, 1998, Tradução Vera Ribeiro e

Lucy Magalhães.

Real – Simbólico – Imaginário

Na psicanálise lacaniana o processo central pelo qual o sujeito é constituído e transformado

define-se através de três categorias conceituais: real, simbólico e imaginário, sendo o registo

simbólico o lugar fundamental para a linguagem porque envolve os aspectos conscientes e

inconscientes.

Isto significa dizer que a maneira como o inconsciente se manifesta é através da linguagem,

sendo assim por meio da linguagem que o sistema de representações baseado em significantes

(simbólico) determina a forma como o sujeito vai se referir a si mesmo.

Já o registo imaginário é o lugar psíquico correspondente ao ego (eu) do indivíduo. Assim, o

indivíduo busca no Outro (pessoas, amor, imagem, objectos) uma sensação de completude, de

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unidade (alucinação). No entanto, o Outro não existe para desenvolver a imagem (alucinação) com

que o ego (eu) quer ser sustentado.

E o real é um registo psíquico que não deve ser confundido com a noção de realidade porque

o real é impossível porque representa aquilo que não pode ser simbolizado e que por isso

permanece impenetrável ao sujeito. Assim, Lacan (1955/56) aborda que o real é o que se escapa à

simbolização, pois na relação do sujeito com o símbolo há a possibilidade de uma Urverdrängung

(recalcamento) primitiva (recalcamento originário), ou seja, quando alguma coisa é simbolizada

(representada) algo desta representação vai se manifestar no real.

Assim, a noção de real é entendida como uma ideia sobre algo que articula uma coisa

(sígno) com outra (significante), sendo ambas distintas uma da outra. Portanto o real escapa à

materialização assim como também o desejo. Se o que aprendemos na cadeia significante trata-se

de uma identificação que compõe um sujeito, não podemos falar que ali se manifestou um desejo,

pois, ora manifestado (ou realizado na simbolização/representação) deixa de ser desejo, cedendo

lugar a outras reformulações do objecto “’a” (desejo). Assim, não há esgotamento da cadeia de

significantes, já que o desejo é um elemento do real e estará sempre para além da capacidade de

representação do sistema simbólico.

Cabe aqui enfatizar que para Lacan os três registos psíquicos estão juntos de tal forma que

não há formação de um sem a formação de todos, sendo que cada um destes registos tem a mesma

importância que os demais. Cada um se organiza de modo diferenciado do outro ao mesmo tempo,

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sendo esse o processo que permite que essa organização aconteça de uma maneira intercambiável,

onde cada registo pode sempre ser o outro.

Fontes: Diccionario de Psicoanálises, Jean Laplanche e Jean-Bertrand Pontalis sob a direção

de Daniel Lagache, Paidós Editora, 2004, Tradução de Fernando Gimeno Cervantes. Dicionário de

Psicanálise, Elisabeth Roudinesco e Michel Plon, Editora Zahar, 1998, Tradução Vera Ribeiro e

Lucy Magalhães.

Recalque Originário

Em 1915 Freud escreve em Recalcamento: “Temos motivos suficientes para supor que

existe um recalcamento originário, uma primeira fase de recalcamento, que consiste em negar

entrada no consciente ao representante psíquico (ideacional) da pulsão. Com isso, estabelece-se

uma fixação; a partir de então, o representante em questão continua inalterado e a pulsão permanece

ligada a ele. Isso se deve às propriedades dos processos inconscientes ...”.

O recalcamento originário (Urverdrängung) marca uma cisão da vida anímica ao expulsar da

consciência as primeiras representações intoleráveis associadas à pulsão, delimitando assim as áreas

consciente/inconsciente e possibilitando os recalcamentos posteriores. A premissa de Freud é a de

que toda representação para poder ser recalcada precisa de ser atraída por representações

originariamente recalcadas.

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Em nosso ensaio o recalcamento originário marca essa cisão na vida anímica decorrente da

primeira representação (alucinação neonatal) que delimita os tópicos real, simbólico, imaginário e

possibilita a estruturação da linguagem assim como a formação dos demais níveis de recalcamento

(primário e secundário) não abordados em nossa argumentação. O que chamamos “primeira

representação” é a idéia de que toda representação se estabelece enquanto um par representacional

(sígno / significante) mas a primeira representação é um par assimétrico porque um dos pólos é uma

imagem sígnica sem representação – ego – que esvazia o imaginário delimitanto os três tópicos e

operando como elo imagético para toda representação no real (imaginário esvaziado).

Fontes: Diccionario de Psicoanálises, Jean Laplanche e Jean-Bertrand Pontalis sob a direção

de Daniel Lagache, Paidós Editora, 2004, Tradução de Fernando Gimeno Cervantes. Dicionário de

Psicanálise, Elisabeth Roudinesco e Michel Plon, Editora Zahar, 1998, Tradução Vera Ribeiro e

Lucy Magalhães. Volume XIV das obras completas de Freud em

www.freudonline.com.br/livros/volume-14/vol-xiv-4-repressao-1915/.

Objectivação Autopoiética do Protótipo Neonatal

Este conceito foi desenvolvido pelo próprio autor deste ensaio e agrega as idéias de três

pensadores diferentes de três áreas do conhecimento diferentes. O primeiro Arthur Schopenhauer

(filósofo) com a noção de objectivação adequada da vontade, o eidos (forma / idéia) platônico, ou

seja, toda experiência de satisfação (trans)formada numa imagem na mente. Os segundos são

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Humberto Maturana e Francisco Varela (biólogos) com a noção de autopoise, a capacidade dos

seres vivos de produzirem a si próprios, a idéia de que um sistema vivo, como sistema autônomo,

está constantemente se autoproduzindo, autorregulando, e sempre mantendo interações com o meio,

onde este apenas desencadeia no ser vivo mudanças determinadas em sua própria estrutura, e não

como um agente externo. Aqui neste conceito o sistema vivo é a linguagem que também se

estabelece na mente enquanto imagem. O terceiro pensador é Sigmund Freud (médico) com a noção

de protótipo neonatal, uma imagem alucinada – imagem própria do neonato que se funde com a

imagem da mãe (primeira representação) – que ao ser representada estabelece um par

representacional (sígno / significante) composto por uma imagem sem representação (sígno) –

“ego” – e uma representação que significa todo “haver” (primeira representação).

Assim, agregando estas três noções numa única, temos: a experiência de satisfação do

protótipo neonatal (imagem alucinada) que ao ser representada sofre uma autopoiese (bi-partição

representacional) estabelecendo-se assim como uma representação. A formação dessa primeira

representação (modelo ideacional) é uma objectivação autopoiética do protótipo neonatal.

Neste nosso ensaio uma objectivação autopoiética do protótipo neonatal é a noção de que

toda existência passível de representação é uma formação autopoietizada como a fomação da

primeira representação.

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