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HÁ FLORES NO CAMINHO Pelo Espírito AMÉLIA RODRIGUES

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  • H FLORES NO CAMINHO

    Pelo Esprito AMLIA RODRIGUES

  • 3. edio Do 19 ao 21 milheiro Copyright

    DIVALDO P. FRANCO

    O homem conturbado dos nossos dias embora desfrute de comodidades, padece de hipertrofia dos sentimentos, sonhando com o Cosmo e ensangentando o solo por onde deambula.

    As Naes, que se fazem solidrias umas com as outras, quando vitimadas por cataclismos ssmicos e tragdias inesperadas, no trepidam em fomentar guerras lastimveis de destruio irracional, em que dizimam povos, arrunam cidades e economias, derruindo-se tambm...

    A prepotncia arma a audcia e o pavor campeia no mundo moderno.

    Procurando evadir-se da triste realidade terrena, em que a civilizao malogrou, desde quando a tica moral sucumbiu, soterrada sob as prprias runas, que foram produzidas pelo descalabro da cultura e a volpia dos prazeres dos sentidos exacerbados, a criatura tenta encontrar sinais de destruio nos astros que se alinham, sem dar-se conta de ser ela prpria a autora das inominveis calamidades que varrem o planeta em todas as direes.

    Os gabinetes de pesquisas extraordinrias multiplicam-se e os engenhos tcnicos enxameiam nas fbricas, enquanto robots admiravelmente equipados so colocados disposio das indstrias, substituindo os homens, que vagueiam nas vielas escuras do desemprego, a um passo da rampa da alienao.

    A supervalorizao da inteligncia tem produzido o esfriamento da solidariedade, enquanto as ruas do mundo se abarrotam de jovens desvairados, que se renem em magotes, espreita, esfaimados de po, de paz, de amor, prontos para a hecatombe, cujo caldo de cultura fermenta. ..

    Dois mil anos de Cristianismo e uma to parca messe de luz!...

    Vinte sculos de sementes abenoadas e insignificante sega de fraternidade!...

    Contrastando com os pntanos que a tecnologia transformou em searas ricas e os desertos que se tornaram pomares, multiplicam-se os jardins que se fazem ridos e os trigais que so vencidos pelo saral.

  • As estradas da esperana jazem ao abandono e as rotas da solidariedade permanecem esquecidas.

    A Boa Nova de Jesus, neste momento grave, a segura diretriz, a soluo para todos os problemas do instante que se vive.

    O homem sem Deus, que penetra na fisso nuclear, faz-se deus do horror e ameaa vida, numa anteviso apocalptica de destruio sem par.

    No obstante as aflies a apreenses existentes na conscincia humana quase generalizada, a mensagem do Cristo permanece viva, e obreiros do seu Evangelho levantam-se para proclamar a hora chegada, o amanh melhor.

    Nem todos enxergam a beleza que j reponta na Terra sofrida.

    H flores no caminho, aguardando os homens que estejam dispostos a vencer as distncias emocionais e espirituais que os separam, a conquistar os espaos morais!

    O convite o mesmo que ontem Ele nos fez e agora nos chega sob ptica nova, profunda, compatvel com a poca em que nos encontramos.

    Decisivo, penetrante; atual, libertador.

    No d margem a equvocos, nem faculta evases.

    Responsabiliza e dignifica uma abrangncia de amor capaz de sensibilizar o carter mais refratrio e o sentimento mais empedernido.

    Hoje o dia e agora o momento de decidir, de optar: Cristo ou Csar!

    Comentando acontecimentos daquele tempo em que Ele esteve na Terra, colocamos problemas da atualidade em verso evanglica, de modo a facultar enfoques modernos prprios para as necessidades vigentes.

    No tm sabor de novidade, nem poderiam possu-lo.

    A palavra de Jesus sempre atual com o mesmo tom de libertao, sem margem de interpretao dbia.

  • Nossa cooperao insignificante, no empreendimento da construo do mundo novo, objetiva participar da obra, de alguma forma com as flores do caminho por onde avanam os servidores decididos.

    Esperando haver feito o melhor ao alcance e quem faz o que pode, produzir o mximo , suplico ao Jardineiro Infatigvel que a todos nos abenoe, envolvendo-nos em paz.

    Amlia Rodrigues

    Salvador, 10 de junho de 1982.

    Autenticidade histrica do Evangelho

    Resduos da negao sistemtica ressumam periodicamente, apontando

    absurdos e discrepncias entre os narradores do Evangelho, em vs tentativas

    de negar-lhe autenticidade, quando no criticam o seu valor e o seu contedo

    que nos so credores de respeito.

    Todavia, nas diferenas dos comentrios realizados por quatro personalidades

    diversas e temperamentos prprios, em pocas diferentes, o Evangelho um

    todo harmnico, que no deixa margem a quaisquer descrditos.

    Enfocado por pessoas que viveram aqueles dias, a riqueza de detalhes em

    torno dos homens e da terra, dos hbitos e das conjunturas polticas so de

    uma irretorquvel autenticidade, quanto de relativamente fcil comprovao.

    As consideraes sobre o solo rido, a escassez de gua, as tricas e conflitos

    farisaicos, os costumes e ritos religiosos so de uma fidelidade histrica que

    supera a dvida mais sistemtica e a gratuita hostilidade a Jesus e a Sua vida.

    Acontecimentos e paisagens geogrficas so retratados com mestria e

    tranquila legitimidade, de tal forma verdadeiros que se encontram vivos, ainda

    hoje, na historiografia do povo hebreu.

    Detalhes do dia-a-dia, s margens do mar, e preocupaes em torno da f, na

    Sinagoga, comentrios irrelevantes ou graves da boca do povo ou

    registros de conversaes nas altas rodas da sociedade da poca transparecem e

  • se apresentam na linguagem dos comentaristas dos sucessos que mudaram o

    curso da Histria. . .

    Citaes botnicas e apontamentos da vida dos profissionais surgem na

    limpidez das parbolas, com sabor de verdade verdadeiras que eram as

    ocorrncias demonstrando que aqueles homens e mulheres no se

    encontravam alienados no tempo e no espao ou que foram os dados

    compilados por visionrios e sonhadores que desejaram compor o Homem e a

    Sua vida, com carismas que permitissem a fuga das conscincias para

    aspiraes espirituais ante o fracasso das suas realidades materiais. . .

    Aventam-se hipteses psicanalistas que pretendem tornar Jesus um bitipo

    fantstico, para compensar, no inconsciente das massas, em alegria e ventura,

    o que lhes pesa em misria e sofrimento.

    No obstante, o Seu chamado no alcana apenas os frustrados e falidos do

    mundo, seno quantos se detm a examinar-lhe a excelncia de contedo

    que sobrenada nos Seus ensinos, nicos, alis, capazes de sustentar o homem

    moderno combalido, que se fez vtima de si mesmo e se encontra vencido pela

    tecnologia avanada, que no logrou torn-lo mais feliz, nem mais tranqilo,

    apesar de a alguns haver conseguido propor comodidades e conforto. ..

    Israel era, ento, uma ilha de monotesmo, num convulsionado oceano de

    culturas politestas.

    Com aproximadamente 20.600 km2 desempenhou na histria da Humanidade

    um dos papis mais relevantes de todos os tempos.

    Vinculado a lima legislao austera, que vigiava e conduzia, mediante

    estatutos graves, os menores movimentos e comportamentos humanos,

    esperava um Messias para a suprema governana fsica e econmica da raa

    sobre o mundo submetido aos seus ps.

    Jesus foi a anttese do sonho hebreu da poca.

    No reformulou, porm, a Lei, antes submeteu-se-lhe, acrescentando o amor,

    como captulo essencial, sem o qual a impiedade sobrevoa o cadver dos

    vencidos que lhe tombam nas malhas apertadas e bem urdidas.

  • Seus sermes so proferidos para o Seu tempo e todos os tempos, to oportunos

    hoje, quanto o foram ao ser enunciados.

    Suas aes por muitos consideradas milagres, que violentariam as leis

    naturais e por outros como falsas, por impossveis de comprovadas recebem

    o aval dos fatos modernos, das doutrinas que estudam e comprovam a

    paranormalidade humana, em momentosos eventos que abrem perspectivas

    mais amplas para a compreenso da vida, que extrapola os limites do bero e

    do tmulo, antecipando aquele e superando este.. .

    Sua viso proftica, carregada de emoo e piedade, torna-se evidente nestes

    dias, quando os acontecimentos a confirmam em toda a inteireza, a ponto de

    poder-se prever o que vir, em face do que est sucedendo.

    Habilmente caracterizado, cada Evangelho, segundo a ptica de quem o

    escreve, ou porque ouvido por quem participou daquele perodo breve, que se

    fez longo, ou porque vividas as experincias conforme Mateus e Joo, as

    excelentes testemunhas, passa de um para o outro um fio que interliga as

    quatro histrias e exala o mesmo odor de beleza e esperana num s

    contedo de amor e paz.

    certo que no foram escritos conforme se encontram hoje.

    Das anotaes e fragmentos encontrados, tomaram corpo, na apresentao dos

    Evangelhos Sinpticos que so os de Mateus, Marcos e Lucas, em face do

    seu paralelismo, que lhes faculta ser colocados em trs colunas visveis ao

    mesmo tempo. Escritos entre os anos 60 a 70 aproximadamente.

    Mais ou menos transcorridos quase trinta anos surge o de Joo, coroando os

    anteriores.

    No se trata de uma narrao por quatro diferentes escritores, mas uma

    Revelao revolucionria que nos prope a transformao ntima, tendo por

    base o ser mais perfeito que jamais esteve na Terra, nosso *Modelo e Guia.

    Ainda se conserva o texto de Marcos, que o mais antigo, conforme as

    anotaes iniciais.

    Tudo indica que o texto de Mateus, primitivamente foi escrito em aramaico,

    antes de Marcos faz-lo, aps o que, o redigiu em grego.

  • Lucas, porm, escreveu, em grego castio desde o incio, os apontamentos que

    lhe chegaram por Paulo, dando uma ordem lgica e clara aos fatos e

    comentrios, aos discursos do Mestre. Possivelmente ouviu Maria narrando a

    infncia do filho.

    O Evangelho de Joo, igualmente redigido em grego, tambm chamado

    Espiritual, merecendo de Orgenes, o pai da Igreja do Sculo III, o seguinte

    comentrio: Ousamos proclamar que a flor de todas as Escrituras o

    Evangelho dado por Joo; no lhe pode perceber o sentido quem no tenha

    repousado no corao de Jesus ou no tenha recebido, de Jesus, Maria como

    Me!

    Os narradores mostram-nos, sem alarde, as duas naturezas de Jesus.

    Convive com os homens, demonstra as necessidades humanas, participa das

    atividades de carpinteiro, mas tambm o Filho de Deus, que interfere nos

    problemas humanos e nos seus destinos. Basta um movimento, uma palavra

    para que se modifiquem as estruturas das coisas e as vidas. . .

    Exalta as pequenas coisas, adornando-as de poesia e vive a grandeza do

    Cosmo, que no pode desvelar aos que O seguem.

    O Evangelho, em razo disso, um caminho que leva quele que se fez o

    caminho.. .

    Objetivando atingir reas humanas e culturas diferentes, escritos para atender

    a finalidades especificas, completando o trabalho apostlico oral, o fim de

    que vencessem os sculos, no perderam a homogeneidade nem o equilbrio,

    que os tornam a mais perfeita explicao de uma saga incomum e impoluta,

    qual a vida de Jesus.

    Cada pensamento que foi exteriorizado pelo Mestre, breve e profundo,

    consoante a tcnica Ungstica da poca, prprio para a memorizao, passou

    de boca a ouvido e deste a outras vozes, at que, grafado, se tornasse uma, luz

    inapagvel que libertaria os tempos das sombras que o homem gerasse para si

    mesmo. . ,

    T t *

    Recompilar e repetir os ditos do Senhor, dando aos atuais problemas as Suas

    solues, tarefa que nos cumpre a todos realizar, a benefcio prprio.

  • Muito escrita, a Sua a histria mais repetida da Histria dos tempos, no

    entanto, nova e fascinante, na rapidez com que passaram os Seus breves anos,

    naquela regio que percorreu a p de um para o outro lado, sob Sol escaldante

    ou frio cortante, com um magote de homens toscos que Ele trabalhou, deles

    fazendo, pela renncia e sacrifcios de que deram testemunhos, os argonautas

    dos dias modernos.

    Nunca houve um poeta simples e profundo como Jesus.

    Jamais surgiu um sbio eloquente e nobre qual Jesus.

    No se repetiro os Seus feitos, conforme Ele os realizou.

    Seu amor abrangente, atravs dos sculos, convocou desde Saulo que O

    hostilizava a Agostinho que O desprezou, de Francisco de Assis que queria

    gozar a Teresa dvila que ambicionava por uma vida normal e um lar, de So

    Joo da Cruz a Alberto Schweitzer, de Gandhi que O conheceu de passagem a

    Martin Lutner King Jr. que O amou na pessoa dos seus irmos estigmatizados

    pelo preconceito racial, em razo da cor da epiderme...

    Jesus ontem, Jesus hoje, Jesus sempre a rocha dos sculos e a paz da vida.

    1 A eterna primavera porvindoura

    Cada quadra do tempo caracteriza-se por expresses inconfundveis

    da prpria Natureza.

    Sucede uma outra, suavemente, e atinge o seu clmax, numa

    plenitude de fora e domnio de realizao.

    Nesta, caem as folhas, esmaece a vida, desnuda-se a paisagem;

    nestoutra, o frio enregela, as cores alvejam e h tristeza assinalando

    dores e sombras de noites demoradas. ..

    Depois, os rios voltam a correr, exulta o verde, a terra se enriquece de

    flores e os frutos amadurecem, pendentes nos ramos oscilantes ao

    vento.

  • Os gros se intumescem no solo levemente aquecido e explodem em

    poemas de cor, em sons agitados, em ddivas de vida abundante.

    Revoam os pssaros, ampliam-se os dias, e as noites, salpicadas de

    crios divinos, so espetculos convidando reflexo.

    O vale confraterniza com os altiplanos.

    Parece no haver distncias nem separaes.

    Por fim, quando esta poca estivai logra a total potncia, arde o Sol e o

    solo se resseca, o p se ergue em nuvem, a vida novamente comea a

    fenecer.. .

    O dia um todo de fogo preparando-se, ao largo das horas demoradas,

    para seguir adiante, at receber as primeiras lufadas frias...

    E repete-se a roda dos acontecimentos em movimentada orquestrao

    de ritmos. . .

    * * *

    Ventos festivos varriam os rinces gentis da Ga-lilia humilde,

    cantando esperanas para as almas em sofrimento.

    Passado o grande inverno, sem nenhuma promessa de calor ou

    qualquer perspectiva de claridade, explodiam as ddivas primaveris

    numa inesperada sementeira de amor com imediata colheita de

    bno*

    Narra Mateus (*) com eloqncia aquela mpar quadra primaveril de

    acontecimentos e bonanas.

    A paisagem a moldura do lago-espelho, em cujas bordas reflete-se o

    amor do Mestre pelas dores humanas.

    Naquelas paragens, nas cidades fronteiras e ribeirinhas, em cujo solo a

    balsamina confraterniza com os miostis e o trigo dourado espia da

    terra jovial as redes espreguiadas ao Sol, nas praias largas, Jesus viveu

    a ternura das gentes simples, sorriu com as criancinhas e abriu a boca

    para entoar a cano da esperana.

  • Por aqueles stios de pobreza e festa natural, Suas mos arrancaram

    das aflitivas conjunturas das enfermidades retificadoras os trnsfugas

    do passado, emulando-os para o crescimento moral pelas trilhas

    do futuro.

    Fez-se um suceder de fenmenos auspiciosos.

    Ainda repercutia com profunda emoo nos ouvidos das almas os

    artigos e pargrafos em luz e esperana, que foram apresentados no

    monte, ao ser proclamado o Estatuto da Era Nova da humanidade do

    futuro.

    Os ouvintes no haviam retornado ao cho das necessidades habituais,

    irrigados pela vibrao do Sublime Governador, quando Ele, descendo

    do cerro, foi solicitado por um leproso, que O adorava,

    dizendo: Senhor, se quiseres bem podes tornar-me limpo e Ele quis,

    liberando o enfermo da sua carga ptrida.

    A ao fortalecia a palavra.

    O amor era mais forte do que a voz; esta, era suave e doce, enquanto

    aquele, poderoso e vital.

    O passado jugula o criminoso algema disciplinadora, mas o amor

    libera o precito para resgatar em ao benfica o delito infeliz.

    No deseja o Senhor holocaustos, entretanto, esparze misericrdia.

    H muita dureza no mundo e terrvel crueza nos coraes.

    Ele dulcifica.

    Ningum foge culpa, nem se evade do ressarcimento.

    O Seu amor anima os ferreteados a que se reencontrem e reparem os

    erros, ajudando suas vtimas e por elas fazendo-se amar.

    H expectativas atordoantes nos comensais da Boa Nova em

    delineamento.

  • O monte seria, simbolicamente, o mastro da bandeira de paz,

    desfraldada nas insuperveis bem-aventuranas.

    Em Cafarnaum, prosseguindo com os elos da cadeia do sofrimento,

    que Ele rompe, um centurio acerca-se e intercede pelo seu criado

    paraltico.

    Uma confiana infantil numa seriedade adulta transparece naquele

    homem que comanda homens.

    Jesus prope-se a ir curar o enfermo, porm o homem, que se

    acostumou autoridade, pede-Lhe que mande um dos Seus

    subordinados e a Sua vontade se faria.

    Assim fez-se.

    Este ordena e esse obedece.

    Este quer e esse aquiesce.

    Jesus a Autoridade e os Espritos atendem.

    No h maior autoridade do que aquela que lhe prpria, a que foi

    adquirida e no a que concedida por emprstimo e pode ser retirada.

    A f energia de vital importncia, por irradiar vibraes poderosas

    que atingem os fulcros das nascentes que produzem os

    acontecimentos, a agindo.

    Vai-te disse o Amigo ao amigo confiante, e como creste, assim te

    seja feito.

    Curou-se o servo do centurio.

    No lar de Simo, onde Ele se recolhe por um pouco, a febre arde na

    velha sogra do pescador, que se aflige.

    Tocando-a, restitui-lhe o equilbrio trmico.

    Irradia-se a inapagvel Luz dos Sculos.

  • Nunca mais a noite se far total...

    A tarde, chegam os obsidiados por Espritos infelizes, suas vtimas,

    seus cobradores.

    O dio grimpa os duelistas da animosidade.

    No h separao entre mortos e vivos, unidos pelos vnculos dos

    sentimentos afins ou dos compromissos a que se atrelam no carro da

    vida.

    Sua palavra medicao que atinge as ulceraes morais e as cicatriza.

    Ampara o cobrador, antes ultrajado, e auxilia-o a ser feliz, informando

    que o calceta no fugir de si mesmo.

    Um deseja segui-10, pensando em gozos e comodidades.

    Como Ele no tem uma pedra para pr a cabea, apesar de as raposas

    terem covis e as aves do cu ninhos, o candidato, desiludido, foi-se

    embora. . .

    Outro pretende dar-se; todavia, quer antes enterrar o pai cadaverizado.

    No h tempo para simulaes.

    A vida transcende ao corpo.

    E ele no se deu. . .

    O lago-mar sereno exalta-se e todos, na barca, temem; menos Ele, que

    dorme ou parece dormir. . .

    Ante o receio geral, Sua voz acalma as ondas e os encarregados das

    foras vivas da Natureza tranquilizam as guas.

    Nada supera o Rabi, no mundo de Deus, que Ele elaborou sob a

    proteo do Pai.

    Prosseguir o ministrio, naquelas e noutras paragens. . .

  • Paralticos, endemoninhados, cegos, catalpticos, hemorrossa, mudo

    por ao obsessiva, por toda parte a dor, as provaes cedem lugar ao

    pagamento pelo trabalho do amor.

    Eram todos, ontem como hoje, doentes da alma e desejavam a cura

    para os corpos.

    O Mestre fazia cessar os efeitos dos seus erros, sarando a matria,

    entretanto, oferecia-lhes a diretriz evanglica, a verdadeira terapia

    para o Esprito, nica medicao para eliminar os sofrimentos.

    O amor de Deus, refletido em Jesus, no tem limite.

    . . . Prosseguir a msica da esperana a substituir litania da loucura e

    da misria. . .

    A responsabilidade do resgate sobrepe-se cobrana cega.

    O homem desperta para os compromissos.

    Os remotos tempos entendero, e melhor faro entender o Mestre e

    Sua mensagem.

    Somente pelo amor se libertar o homem.

    Os pecadores so o campo para a semente de vida eterna e os cados,

    sem alternativa de soerguimento, fazem-se adubo para a prpria

    recuperao ante a oportunidade feliz do Evangelho.

    Nenhum amor rentear com esse imensurvel amor.

    Aquele perodo primaveril no se repetiu, nem volver a acontecer da

    mesma forma.

    As sementes, todavia, dormem no solo da quadra outonal em que as

    almas se demoram, para emergirem, logo mais, em embrio, reflorindo

    ao claro sol da Era Nova da eterna primavera que j comea. . .

    (*) Mateus: Captulos 8 e 9. Todos os asteriscos pertencem Autora espiritual.

    Nota da Editora.

  • 2 A perene luz

    A luz o fulcro donde emergem o calor e a vida; ao mesmo tempo o

    centro para onde convergem as atenes e os interesses de todos.

    Os insetos, atrados pela sua claridade, aturdem-se, e se a chama est

    crepitante nela ardem, dominados pela sua pujana e vigor.

    Mariposas acercam-se da flama tremeluzente e nela perecem.

    Outros animais e o homem, fixados no seu fulgor, encadeiam-se,

    perdem o rumo. . .

    Todavia, a luz que aponta e aclara os caminhos.

    Fru-la com respeito, beneficiando-se com as suas ddivas, sem

    precipitar-se nela, traduz sabedoria na utilizao dos seus recursos.

    Incendiar-se por dentro, vivendo-a no calor do ideal superior que ela

    representa, deixar-se atingir, sem consumir-se. ..

    Jesus a Grande e Perene Luz que veio s sombras dos caminhos

    humanos para que jamais voltasse a predominar a treva.

    Sua trajetria fez-se assinalar pela inapagvel claridade que prossegue

    iluminando os sculos.

    Quantos se encontravam enregelados pelos sentimentos negativos ou

    abandonados ao frio da indiferena social, nEle encontraram, e ainda

    hoje encontram, o calor para a restaurao das foras.

    Os sofredores de todo porte buscavam-nO, e O procuram ainda agora,

    para aquecer-se no Seu convvio.

    O crime, porm, que urde desgraas; a astcia, que se mancomuna

    com a injustia, tecendo redes perigosas; a suspeita sistemtica, que

    conspira contra a paz; o orgulho, que degenera os sentimentos

  • nobres; a mesquinhez, que perturba; o egosmo, gerador das torpezas

    morais no aceitam a claridade, que lhes desmancha as articulaes

    perniciosas, e por isso, descontentes, investem de rijo, usando os seus

    meios tenebrosos para apag-la ou destruir seu ncleo gerador.

    Jesus no passou inclume a tais artimanhas.

    Ningum transitar sem sofrer-lhes a sanha malfazeja.

    Perseguem, picados pela inveja venenosa, e arremessam-se contra,

    dispostos a tudo.

    Porque labutando s escondidas, sem escrpulos, usam qualquer

    arma, e quando vm para defrontar a vtima, j minaram o solo,

    socapa, pressupondo vitria; ou desesperados, sem receio de perder-

    se, arrojam-se contra, desde que ponham abaixo quem ou o

    que, arbitrariamente, se propuseram destruir.

    Todos os lutadores das elevadas aspiraes provaram-lhes o ferrete em

    brasa, a perseguio gratuita, conhecendo-lhes a tenacidade.

    Tudo observam atravs das lentes escuras dos seus sentimentos

    amarfanhados.

    Recusam-se concrdia, em cujo campo encontram-se desvalorizados,

    e, no raro, preferem a perda rendio fraternal. . .

    O Mestre os defrontou vezes sem conta.

    Fariseus e saduceus, atados vilania das posies enganosas, tentaram

    perturb-10 durante todo o ministrio.

    Dominadores que se enganam, aos outros iludindo, investiram com

    armas em riste contra a aparente fragilidade dEle e odeiam-nO, porque

    no O puderam vencer nem fugir da Sua irresistvel atrao. . .

    ... E Ele, claridade viva, prosseguiu vencendo, etapa a etapa, nos

    srdidos lugares onde se homiziam os famanazes da treva infeliz.

    No somente corporificado nos homens est o adversrio vil.

  • Ei-lo fora da jaula carnal, em grupos de chacais emocionais, procurando

    vtimas que lhes padeam a sanha.

    Os endividados morais que fugiram das leis, nas vidas anteriores, mas

    no se evadiram da Grande Lei, tornam-se-lhes vtimas preferidas.

    Usaram-nas para tentar prejudicar o apostolado sublime do Mestre,

    audaciosamente supondo pertur-b-lO.

    A fora da Luz divina presente no Rabi, a irradiar-se soberana, afastou-

    os, desarmou-os, submeteu-os.

    Individualmente, petulantes e prepotentes, ou coletivamente, em

    legies, chegaram e foram repelidos.

    Jesus Paz!

    Quantos se Lhe acercam, transformam-se, harmonizando-se.

    Se fogem, volvero, pois que nunca mais perdero a impregnao do

    Seu amor.

    Conhecendo o ontem dos Espritos, o Senhor penetrava na causa

    matriz das suas aflies e sabia como atenu-la, propiciando novos

    rumos fora da dor para a recuperao moral de cada um.

    Eis porque, a este desimpede os membros hirtos na paralisia; quele

    abre os olhos fechados; a esse limpa as ulceraes; queloutro

    desamarra dos liames obsessivos; a um restitui som aos ouvidos

    moucos; a outro devolve a voz...

    O Seu amor no tem limite.

    Narra Mateus (*) que ao espocar das Suas mercs, quando as

    multides buscavam socorro para as suas mazelas, trouxeram-Lhe

    um mudo endemoninhado.

    A obsesso ultriz, de que padecia o homem, afetava-lhe o centro da

    palavra, anulando a sua capacidade de falar.

  • Nas fronteiras alm das vibraes fsicas agridem-se, desforam-se,

    algoz de ontem, vtima de hoje, em luta feroz.

    A autoridade do Mestre interfere no duelo sem palavras.

    Alivia o perseguidor, intuindo-lhe que o endividado no prosseguir

    sem justia, no lhe cabendo, no entanto, faz-la, a fim de no incidir

    em erro mais grave.

    Libera a vtima atual, concedendo-lhe, na lucidez e no verbo,

    oportunidade de reabilitao.

    O homem recuperou-se e o entusiasmo fez-se geral, num hino de

    louvor e lgrimas.

    A treva humana, porm, despeitada e vtima da prpria insipincia,

    alardeia pela boca farisaica:

    pelo prncipe dos demnios que Ele expele os demnios.

    Mesmo ante a evidncia do fato, a m f encontra argumentao.

    Como se socorre da sombra, apela para suas expresses.

    Porque se sente impura, acredita na fora da impureza.

    Desde que convive com astcias e ardis aceita a hiptese da existncia

    do prncipe do mal, em razo de sintonizar com o mal que nela mesma

    predomina.

    Jesus no lhe disse nada, nem se fazia necessrio dizer.

    Saiu a irradiar a soberana luz do amor e da esperana, que at hoje

    fulge, dominadora, no acume da montanha das humanas dificuldades,

    apontando rumos .. .

    (*) Mateus: 10:32 a 34.

    3 Jesus no comando

  • As confabulaes ntimas entre Jesus e os discpulos, quando

    terminavam as exaustivas tarefas diuturnas, ofereciam campo aos

    companheiros tmidos, que no logravam compreender a dimenso da

    sublime empresa da Boa Nova, para que se aclarassem

    questes nebulosas e mais se aprofundassem no entendimento do

    ministrio recm-abraado.

    Surpreendidos pela eloqncia mpar da palavra do Mestre, por mais

    reflexionassem, deixavam-se dominar por interrogaes sucessivas, ao

    mesmo tempo intentando mergulhar nas reminiscncias trazidas

    do Mundo Espiritual, quando se haviam preparado para o apostolado

    libertador.

    No obstante, envoltos pelo escafandro material, sentiam-se aturdidos,

    em face dos conceitos audaciosos e especiais que lhes eram

    apresentados, sem alcanarem o sentido exato nem a total extenso da

    revoluo patrocinada por Jesus. . .

    Vivendo o mundo do corpo no mundo das paixes, imantados s

    circunstncias algo ingratas, era-lhes difcil abstrair das lies

    evanglicas as conotaes humanas da sociedade em que se

    encontravam engajados.

    Por isto, permitia-lhes o Senhor os largos colquios, a convivncia

    ntima aclaradora de todas as dificuldades que lhes pairavam nos

    painis do discernimento.

    Eram aqueles os momentos da perfeita identificao, em que as almas

    se abriam ao aroma recendente do Rabi em termos de amor e de

    liberdade.

    A alocuo do Mestre sobre o perdo surpreendera Pedro, ante a

    complexidade da benevolncia que nos devemos uns para com os

    outros, a ponto da necessidade de perdoarmos sempre e sem cessar.. .

    Os companheiros tiveram reaes diferentes, cada um de acordo com a

    prpria estrutura temperamental.. .

  • O perdo indistinto colhia-os, inesperadamente, desde que, habituados

    dureza do Mosasmo, defrontavam o problema da ntima

    dulcificao, como consequncia compreenso das faltas alheias.

    As horas que se seguiram foram preenchidas pelas reflexes, mesmo

    depois que o povilu se espalhou, retornando aos deveres habituais.

    Assim, quando o Amigo se apresentava em meditao, na casa

    generosa em que se acolhia, loo, o jovem discpulo, acercou-se, e, sem

    mais delongas, exps ao Divino Benfeitor as inquietaes que o

    perturbavam.

    Narrou as dificuldades que sentia para perdoar totalmente aos

    perseguidores e comentou a inevitvel emoo de que se via possudo

    pela mgoa, quando ofendido.

    Havia honestidade e interesse no aprendiz, desejoso de receber ajuda

    no problema que o aturdia.

    Alongando as consideraes referiu-se aos testemunhos que

    aguardavam o Senhor e o estado ntimo que o dominava desde j, em

    vista da saudade que o colhia por antecipao.

    Havia uma dlcida emoo que pairava no ar. O grande silncio

    parecia sustentado por uma balada suave que se espraiava na voz da

    Natureza.

    Nesse clima de ternura, o Mestre, sentindo a alma contrita e devotada

    do discpulo fiel, respondeu-lhe:

    s jovem, e a juventude lou a quadra da fora, da intemperana

    e da coragem, que no passa de precipitao... medida em que a vida

    premia a experincia com as dores e as conquistas do conhecimento, a

    razo sucede impetuosidade e a harmonia ao tumulto perturbador.

    No obstante, a idade juvenil o perodo da ensementao, em que se

    prepara o porvir de cuja colheita ningum se eximir, cada

    um conforme o trato com a semeadura. . .

    Talvez, para permitir que Joo se deixasse penetrar pelo ensinamento,

    fez uma breve pausa, para logo aduzir:

  • A dificuldade em perdoar est na razo direta da profundidade

    do amor. Quando se ama, desinteressadamente, pela empatia do

    prprio amor, o perdo surge como efeito natural, facultando a

    perfeita compreenso dos limites e das dificuldades do ser amado.

    Se o amor, no entanto, destitudo de ampla dimenso e repousa nas

    bases falsas dos interesses mesquinhos e subalternos, ou pelo

    deslumbramento transitrio, mais difcil se faz a solidariedade pelo

    perdo aos ofensores.

    Se no h um vnculo de afetividade, claro que a revolta, que nasce

    do amor-prprio ferido, arme de animosidade a vtima, que tomba,

    inerme, na reao infeliz, esquecendo-se de que, por sua vez, um

    dia necessitar, tambm, de perdo. . .

    No silncio que se fez espontneo, o aprendiz da palavra de luz

    percebeu a razo porque o amor a alma da vida em todas as suas

    manifestaes, donde defluem todas as conquistas do esforo moral e

    das realizaes superiores.

    Meditava no contedo da lio ouvida, quando o Mestre,

    pausadamente, prosseguiu:

    Daqueles a quem amamos, jamais estaremos separados. O Filho

    do Homem dever marchar para o testemunho, comprovando a

    excelncia do Seu amor e sustentando a fraternidade entre aqueles que

    Lhe so fiis.

    "O amor um hlito vital, que se manifesta e mantm, mesmo quando

    a criatura se no d conta. Assim conosco. Estaremos unidos e

    identificados pelo ideal comum. . . Aqueles que me amam, sentir-me-

    o na presena do aflito e do necessitado, do velhinho desvalido e da

    criana em abandono, do enfermo em agonia e do desditoso em

    alucinao. .. Quantos lhes distendam as mos gentis, a mim o faro, e

    ouvir-me-o, ver-me-o nos seus apelos e lamentos, nas suas

    aparncias e desditas. Eu lhes falarei, sustent-los-ei com alento

    inusitado e entusiasmo profundo que os animaro ao prosseguimento

    do ministrio at o nosso encontro final...

  • Joo tinha os olhos orvalhados. Estranha emoo dominava-lhe as

    paisagens ntimas, dulcificando-lhe as ansiedades.

    Nesse momento, Jesus concluiu a entrevista afetuosa, afirmando:

    Onde dois ou trs se reunirem em meu nome, eu estarei entre

    eles, como a lecionar, que no aconchego fraterno, na comunho entre

    as criaturas, Ele se faria presente, sem que deixasse, no entanto,

    de estar tambm com os que O amam em soledade, os que O seguem

    em silncio e testemunham-Lhe esse amor em sacrifcio e renncia. . .

    Nos longes dos tempos as expectativas delineavam o mundo melhor

    do amor e do perdo, da fraternidade com Jesus comandando as

    conscincias e as vidas.

    4 Jesus e pacincia

    As opinies desencontradas aturdiam os mais afer-vorados

    companheiros da Mensagem Renovadora.

    Comentava-se quanto necessidade de a revoluo crist triunfar,

    derrubando a Casa Senhorial de Csar e distendendo suas foras por

    toda a parte, tornando Israel a soberana, conforme os anncios antigos.

    Ferviam as paixes entusiasmando os sentimentos e perturbando as

    mentes.

    Em todo lugar pessoas que se criam credenciadas transformavam-se

    em informantes insensatos, gerando embaraos injustificveis para o

    ministrio do amor. . .

    Enquanto a frivolidade desenfreada se encarregava de conduzir

    nimbos precursores de tempestades, o Rabi prosseguia impertrrito na

    ensementao da Mensagem no solo dos coraes.

  • Transitando pelas estradas ou nas praias formosas, entre crepsculos

    ardentes e apaixonados, Sua misericrdia distendia as mos do auxlio

    e do esclarecimento sem que Ele se deixasse impressionar pelo

    tumulto em crescimento ameaador.

    A Galilia buclica e simples fascinava-Lhe a alma sensvel.

    As pessoas modestas e afveis cujos problemas se resumiam s

    questes da sobrevivncia, ofereciam ao Rabi a alegria de diminuir-

    lhes as preocupaes.

    A Judia, no entanto, spera e adusta se repletava de problemas e

    dificuldades entre as tricas farisaicas e as conjunturas infelizes da

    poltica insensata e avara.

    Peregrinando pelas terras verdes dos galileus, Seu verbo iluminado

    cantara o Sermo da montanha e as Suas lies se fizeram repassadas

    de meiguice quanto de esperana.

    Ali levantara moribundos e mantivera viva a chama do amor, no pas

    dos sentimentos humildes, favorecendo-os com o alento em torno de

    um amanh ditoso.

    Todavia, na difcil regio dos judeus, no obstante o Seu amor

    incansvel, as ciladas armavam problemas e a astcia elaborava

    sofismas com que se pretendia surpreend-10 em algum equvoco

    diante dos dispositivos do Estatuto Legal. ..

    Continuando fiel ao programa que o Pai Lhe traara, Ele se fizera o

    apoio e a segurana dos fracos, a resistncia dos tbios, medida que a

    mensagem refulgia nas paisagens ermas dos que haviam tombado na

    descrena.

    Aps o atendimento da multido sempre vida e necessitada,

    enquanto a terra ardia, ao cair do velrio da noite, Simo buscou-O

    inquieto, certa vez, no ocultando as apreenses. . .

    A ressurreio de Lzaro levantara os nimos contra Ele e a promessa

    de que demolira o Templo e o reergueria em trs dias havia chocado

    os que buscavam motivo para a perseguio.

  • Em estado de esprito inquieto, o velho amigo acercou-se do Rabi

    sereno sob gentil prgula arrebentada em flores e foi direto ao assunto:

    Senhor, como proceder diante das ameaas que nos chegam,

    levando-nos a receios justificveis quanto ao futuro do Evangelho?

    Tendo pacincia, Simo respondeu, tranquilo, Jesus.

    Devemos, ento, aguardar a agresso, sem tomarmos qualquer

    iniciativa? voltou a inquirir o amigo.

    Sim elucidou o Mestre. Edificando a pacincia em ns

    mesmos, no nos cumpre assumir outra atitude seno aguardar. A

    pacincia dar-nos- inspirao e fora para agir com discernimento e

    sem precipitao.

    Mas, Senhor arguiu o companheiro que sobremostrava surda

    irritao, no seria lcito que se instalasse o reino de Deus de

    imediato e a revoluo

    que pregas tivesse incio? Talvez, quando se tomem providncias, seja

    tarde demais, no Te parece?

    Jesus fitou o Cu de turquesa cravejado de crios estelares e sem perder

    a serenidade esclareceu:

    Com pacincia conseguiremos provar a excelncia da nossa luta.

    Os lutadores do mundo so desesperados, passam em atroada

    ensurdecedora, destrem e ameaam, semeando dios e lutas sem

    qualquer razo. A pacincia prova o homem e comprova-lhe os

    valores ante as vicissitudes que deve superar.

    No duvido, anuiu o pescador, acrescentando parece-me

    que a resistncia pacfica levar-nos- queda, destruindo as aspiraes

    superiores que acalentamos. Como agir ante os que nos provocam

    ao combate urgente?

    Atuando com pacincia.

  • Se as circunstncias nos parecem favorveis e postergamos, no

    estaremos adiando indefinidamente o compromisso?

    Perpassavam pelos ares perfumados nos cenrios formosos as bnos

    divinas, enquanto as onomatopias murmuravam uma sinfonia

    acalentadora em derredor.

    Relanceando o olhar pela noite em triunfo o Rabi contestou:

    O Sol incansvel devora a noite cada manh, enquanto ela,

    paciente, retorna, diminuindo o calor do dia, mil vezes, sem cansao.

    Ser lcito, ento, no reagir nunca insistiu Pedro, mesmo

    que confortados pela razo, estejamos a ponto de no suportar mais?

    Sem dvida, Pedro. A pacincia harmoniza e reconforta,

    porquanto o Pai no tem pressa e prossegue trabalhando at hoje,

    enquanto eu tambm trabalho.

    Com pacincia a agresso passa, a dificuldade muda de lugar, o

    problema se resolve, o sofrimento se transfere, as incompreenses se

    aclaram, as lutas se pacificam e o amor triunfa.

    A pacincia bno de Deus pelo caminho por onde avanamos.

    Confiemos e esperemos. A pacincia nos dar a palma da paz a

    benefcio de ns mesmos.

    Silenciou o Rabi, enquanto o relgio do tempo continuava a trajetria

    da Eternidade.

    Dias aps ter entrado em triunfo em Jerusalm, paciente, Ele provou o

    fel da traio, da amargura, da soledade, e, na Cruz, com pacincia,

    alcanou a plenitude da vitria como Heri Invencvel de todos

    os tempos, esperando por ns.

    ***

    Relmpago fulgurante em noite escura, a palavra do Mestre cindia a

    noite demorada que tombava sobre Israel, desde h cinco sculos.

  • O eco da mensagem, doce e enrgica, se espraiava desde as planuras

    do Esdrelon at aos altiplanos do Hermon. . .

    Aqueles que Lhe escutavam o verbo, renovavam-se e a nobre cantilena

    das Suas palavras prosseguia

    repercutindo no dito das almas, sendo transferida de boca a ouvido,

    assinalando o incio da comunicao elevada pelo impregnar do amor.

    Aqueles dias, naquelas circunstncias, jamais se fariam repetir e o

    contedo das Suas palavras nunca mais seria ouvido da forma como

    foi enunciado e vivido.. .

    A multido j se houvera dispersado, permanecendo as estrelas

    coruscantes pontilhando o velrio da noite com os seus focos

    reluzentes.

    Sopravam as brisas trazidas pelas aragens do mar, amenizando a

    paisagem do dia que fora ardente. . .

    As criaturas atendidas, que haviam encontrado diretriz, trouxeram

    novos candidatos ao Amigo Divino, que no cessava de os socorrer.

    Aps a estafante jornada das horas passadas, o Rabi afastou-se para

    uma parte solitria da praia e mergulhou em profundo cismar.

    O silncio, que se fazia interrompido pelas onomatopeias da Natureza,

    tornara-se moldura viva na qual a figura do Mestre se destacava,

    irradiando diamantina claridade.

    Sem que fosse percebida, uma mulher acercou-se de Jesus, e, aps

    fazer-se notar por Ele, desculpou-se da imprudncia de perturb-lO.

    Sem mais delongas O interrogou:

    Sei que tu vens de Deus e posso perceber-Te a grandeza que me

    fascina e emociona. . . Tenho sede de amor e me encontro corroda pela

    vrmina da animalidade. Tenho amado e no logrei a honra de fruir o

    amor. A vida, desde h muitos anos, em que fui dilapidada nos meus

  • sentimentos de mulher, nega-me o que venho procurando: a paz, que

    parece fugir de mim, onde quer que eu me encontre.

    Que fazer, Senhor, para viver a felicidade?

    Havia na voz da estranha notas caractersticas de melancolia e de

    sofrimento demorado que as palavras no conseguiam exteriorizar.

    O Mestre relanceou o olhar transparente pela paisagem aureolada de

    paz, e indagou-lhe por sua vez:

    Que vs em derredor? Examina a terra arrebentando-se em flores,

    frutos e verdor; o rio cantante, enriquecendo as margens de vida; o

    hmus discreto renovando o subsolo e os astros fulgurando ao longe. .

    . Em tudo, a ordem, o amor, a transparncia da misericrdia do Pai,

    ensinando equilbrio e vida.

    O que parece caos transforma-se em bno, o que aparenta

    transtorno se converte em paz, porque em tudo vige a sabedoria do

    Criador.

    No relaciones dores nem apresentes mgoas.

    Levanta o olhar para cima e avana para o futuro.

    A criatura, surpreendida pela resposta amorosa, volveu interrogao:

    Compreendo, sim, a grandeza da divina criao, no obstante

    delinqi, e, do meu delito, nasceu-me um filho, que no momento

    constitui-me motivo de inquietao e desespero. . .

    Sem permitir-lhe alongar-se, o Senhor prosseguiu, imperturbvel:

    A mulher sempre me.

    A relva que cresce sobre os escombros oculta as suas deformidades e

    disfara as suas imperfeies, modificando a erma expresso dos

    destroos.

  • Abenoada pela maternidade, que sempre ddiva do Pai, honrando

    a vida, um filho, em qualquer circunstncia, uma estrela engastada

    na carne, com a oportunidade de espalhar claridade pelo caminho.

    Enquanto houver crianas e mes, na Terra, o amor divino estar

    cantando esperanas para a Humanidade.

    No h filho do pecado nem do delito, pois que todos eles so

    ddivas da vida vida.

    Esquece as circunstncias da chegada do querubim que te bate

    porta do sentimento, e levanta-te com ele, avanando no rumo do

    infinito dos astros.

    Uma imensa serenidade vestia a Natureza.

    A mulher-me, emocionada, procurou os olhos de Jesus por entre a

    viso nublada de lgrimas e fundiu-se na luminosidade que deles flua

    dlcida e pura.

    Levantou-se em discreta reverncia e preparou-se para sair.

    No saberia dizer se O ouviu falar ou se O escutou na acstica da

    alma.

    Vai, filha, e ama.

    A maternidade a mais elevada concesso de Nosso Pai,

    demonstrando que o mal jamais triunfar no mundo; porque enquanto

    houver um corao, um sentimento maternal, na Terra, o amor atear o

    fogo purificador e a esperana de felicidade jamais se fanar...

    No longe do tempo, ecoariam os conceitos do Filho de Maria, a Me

    por Excelncia, sustentando a mulher no ministrio da maternidade

    por todo o sempre.

    6 Por amor a Jesus

  • O dia fora estafante.

    As atividades da Casa tiveram incio pela Alva com a leva de

    enfermos, que chegaram, suplicando ajuda, e terminaram, noite

    adentro, com alguns obsidiados que renteavam com a loucura e foram

    deixados porta, ao relento...

    Aquela era a quadra ardente do vero e a temperatura morna

    amolentava mesmo as resistncias mais vigorosas.

    Conhecida na cidade e nos arredores como o albergue do amor e o

    recinto da esperana, para a Casa do Caminho afluam os

    desafortunados de todos os matizes.

    No obstante a escassez de cooperadores, as pessoas no tinham pejo

    em descarregar sobre os ombros cansados dos operrios de Jesus todas

    as cruzes e problemas que encontravam, encaminhando-lhes os

    aflitos e necessitados em grupos que se sucediam como

    ondas contnuas do mar. . .

    Sempre haver esse comportamento entre os homens.

    Os desobrigados com os compromissos da solidariedade

    encaminharo para os lidadores da ao extenuante novas

    contribuies de sofrimentos, indiferentes angstia e ao cansao dos

    que se empenham em minimizar a problemtica humana.

    Aquela temporada se assinalava pelas dores gerais: criancinhas rfs e

    velhinhos desvalidos, enfermos e alienados de vrio porte chegavam a

    cada hora, valendo-se dos recursos do amor, da caridade e da

    abnegao de Pedro, que jamais se escusava.

    Somando penas aos trabalhos exaustivos, sem repouso, medravam,

    aqui e ali, suspeitas infundadas, incompreenses injustificveis se

    instalavam entre os poucos colaboradores do velho pescador.

    No raro, o amigo dos infelizes sentia-se quase a ss, para atender ao

    grande nmero de necessitados ali albergados e aos sucessivos grupos

    que diariamente rogavam apoio e recolhimento.

  • Este companheiro admoestava o discpulo, acusando-o de abuso da

    caridade; aquele censurava-o s claras pelo tempo aplicado na

    assistncia aos leprosos, que, segundo ele, deveriam ser liminarmente

    arrojados morte, no vale dos imundos, em Jerusalm;

    outros queixavam-se da falta de oportunidade para os largos dilogos

    evanglicos porque Simo estava sempre a braos com os trabalhos

    cansativos; por fim, afirmavam diversos, que a Casa no sobreviveria,

    naquelas condies, considerando a possibilidade de as autoridades do

    Sindrio mandarem fech-la, por albergar mulheres de vida

    equivocada, publicamente conhecidas , . .

    Simo ouvia as insinuaes malevas, as ingratides e os sarcasmos

    indisfarados em silncio.

    Alguns o tinham na conta de covarde e demonstravam conhecer-lhe a

    fraqueza das negaes.

    Pessoas amigas no ocultavam o desagrado ante a programao

    pesada que o companheiro de Jesus se impunha, convidando sem

    palavras os demais obreiros dilatao das foras e da ao na

    caridade.

    Era como se a inconscincia e a irresponsabilidade conspirassem

    contra o bem, na Casa dedicada ao bem geral.

    O apstolo abnegado, todavia, no se deixava contaminar pelos

    vapores txicos da intriga nem das conversaes malss.

    medida, porm, que o desgaste fsico e mental lhe minava as foras,

    foi acolhendo, sem o perceber, o vrus do desnimo.

    Anotava, aqui e ali, mal-estar, e percebia-se imensamente saudoso da

    companhia do Mestre, que muito anelava por voltar a fruir.

    Quando se fez silncio nos largos pavilhes humildes onde a dor

    encontrava lenitivo e as vozes do aturdimento obsessivo silenciaram,

    Simo assentou-se sob a sombra de vetusta figueira brava

  • esparramada pelo ptio interno da Casa do Caminho e recolheu-

    se em meditao e prece.

    A noite agradvel fizera-se um lbum natural de recordaes.

    O discpulo dedicado repassou, mentalmente, as cenas da sua

    convivncia com Jesus desde o primeiro encontro at ao ltimo

    contato. . .

    Parecia-lhe que as evocaes se corporificavam, concedendo-lhe

    ntidas lembranas que lhe orvalhavam os olhos reiteradas vezes.

    Constatava, na saudade e na emoo, o quanto amava quele Amigo!

    certo que Lhe daria a vida.

    No saberia explicar ainda o motivo da fraqueza que o martirizava. . .

    No sara das ltimas recordaes em torno do momento da ascenso,

    quando viu Jesus, transparente e belo, sua frente.

    Desejou traduzir a felicidade daquela hora, explodindo de jbilos, mas

    o suave e tranqilo olhar do Amigo que o penetrou, dulcificou-o por

    dentro, harmonizando-o.

    Passado o primeiro instante, e porque no desejasse malbaratar a

    oportunidade excepcional, Pedro recordou-se das ltimas dificuldades

    experimentadas no trabalho e exp-las em breves palavras,

    concluindo, entristecido:

    No so os estranhos, Senhor, a criarem-me impedimentos para o

    labor crescente, mas, os amigos, os cooperadores. . .

    E desejando dar maior nfase aos problemas, arrematou:

    Quando a perseguio vem de fora, dos que nos no conhecem,

    mais fcil compreend-los e desculp-los, porm quando decorre

    daqueles que vivem conosco e participam da nossa f, do nosso ideal. .

    .

  • No conseguiu terminar a frase, porque a voz ficou estrangulada na

    garganta trgida.

    O Senhor, compreendendo as lutas do discpulo querido, interrogou:

    Pedro, que era o vaso delicado, antes de tomar forma?

    Argila comum, Senhor respondeu, presto, o interlocutor.

    E a esttua perfeita, volveu o Mestre antes do esforo e da

    dedicao do artista?

    Pedra bruta, Mestre apressou-se, Simo em responder.

    Tens razo, amigo aduziu Jesus. Sem o trabalho consciente

    nem a arte do oleiro o vaso no se teria formado, permanecendo

    perdido no barro mido. . . No fossem a pacincia e a habilidade do

    escultor, a esttua que dormia na pedra grosseira l permaneceria sem

    qualquer beleza ou utilidade.

    Fazendo breve pausa, o Mestre prosseguiu:

    Os homens, semelhana da argila sem forma ou pedra grosseira,

    aguardam que os cultores dos nobres ideais lhes plasmem beleza e

    forma, delicadeza e utilidade, vencendo as suas resistncias a golpes

    de pacincia, perseverana e f, at que colimem os objetivos para os

    quais foram criados pelo Pai.

    Releg-los prpria ignorncia, seria conden-los inutilidade.

    Cumpre-nos compreender-lhes a situao, o degrau em que estagiam,

    no processo da evoluo, e ampar-los, mesmo que se neguem s

    nossas mos plasmadoras de formas e cultivadoras de bnos.

    Alm disso, convm considerar que eles so hoje, o que j foste

    ontem. O tempo e o amor divino cuidaram de ti, atravs de outros que

    te alcanaram, cabendo-te, agora, a tarefa de cuidar deles, a fim de

    que cheguem at onde te encontras...

    Dando margem a que o ouvinte penetrasse o contedo profundo das

    suas palavras, o Senhor silenciou, para logo concluir:

  • Se no exercitamos o amor e a caridade com aqueles com quem

    convivemos, como provaremos os prprios valores, quando chamados

    a tolerar e a suportar os que nos so desconhecidos?

    Se no nos for possvel perseverar com os que jazem no desnimo e

    nos dificultam a marcha, qual ser o nosso comportamento em relao

    aos que se obstinam contra os nossos propsitos?

    necessrio modificar a viso, diante dos coraes e mentes enfermos

    que constituem os nossos amigos, que gostaramos se encontrassem

    em outra situao evolutiva, portanto, de entendimento.

    Auxiliemos, desse modo, aos ingratos ao nosso lado e aos difceis

    para conosco, e treinar-nos-emos para os cometimentos mais graves,

    que nos aguardam no futuro, precedendo nossa libertao gloriosa.

    Calou-se o Sublime Benfeitor e diluiu-se na noite varrida por leve,

    perfumada brisa do vale prximo, salpicada de astros fulgurantes.

    Simo Pedro compreendeu a mensagem oportuna, levantou-se, e, a

    partir dali, jamais se permitiu desnimo ou queixa, compreendendo os

    companheiros da retaguarda da evoluo, porm cumprindo com o

    seu dever at o momento da sua crucificao de cabea para baixo, em

    Roma, anos mais tarde, por integral amor a Jesus.

    7 Suaves advertncias

    O mar imenso, emoldurado pelas ridas montanhas do lado oposto a

    Cafarnaum e pelas colinas recobertas de erva verdejante por onde

    escorrem os filetes das guas das chuvas que fertilizam o cho, reflete

    o azul infinitamente transparente.

    queles dias a msica da esperana revela a grandeza da paz aos

    homens tumultuados e infelizes.

    Em toda parte surgem graves controvrsias.

  • Murmuram uns, admirados ante a audcia d Aquele pregador;

    emocionam-se outros, diante da Sua figura; surpreendem-se os

    demais, perante os Seus feitos.

    A palavra de Jesus penetra e rasga os vus da ignorncia, dividindo os

    tempos da criatura.

    O som do verbo produz uma branda luz interior que cresce de

    intensidade e jamais se apagar.

    Ali foram realizados, na regio da agradvel e fresca Cafarnaum, os

    mais numerosos milagres que, no obstante produzirem choques, no

    lograram convencer a todos.

    Sempre tem sido assim: os homens desejam ver, na expectativa de que

    no aconteam os fenmenos transcendentais e, quando ocorrem,

    atormentam-se pela dvida, ante a considerao de que seriam

    impossveis de ocorrer...

    Deseja-se o po e, aps nutrir-se, rejeitam-no, empanturrados; quer-se

    a luz e, aps clarear-se, desconsideram-na, porque se enceguecem;

    procura-se a verdade e, desde que ela ope-se iluso, detestam-na.

    A demorada imaturidade humana, atravs dos sculos, estarrece o

    pensador e o estudioso do comportamento da criatura.

    A evidncia, para quem no deseja crer, nada comprova; antes, pelo

    contrrio, desagrada e magoa, armando o observador de irritao e

    agressividade, por ver-se vencido, mas no convencido.

    Ainda so os piores, os cegos que no querem ver...

    Desprezado pelo despeito dos Seus, em Nazar, jamais Jesus tornar

    quela cidade, que lhe grata e amarga ao corao.

    Desceu pelos longos caminhos serpenteantes entre as montanhas,

    atravessou o verde vale do Esdrelon e fixou-se na buclica regio do

    mar.

  • As gentes simples, no habituadas s tricas farisaicas, amantes da

    ternura e do trabalho, sensibilizavam-no.

    Poucas vezes admoestou aqueles galileus, pobres e honrados.

    A Sua mensagem era um poema de amor que Ele tangia no alade dos

    sentimentos, com as metforas da gentileza e o ritmo da misericrdia.

    Ante a impossibilidade de ser compreendido em toda a Sua grandeza,

    vestiu o verbo de parbolas e doou-o ao futuro, confiando na chegada

    do dia triunfal, quando todos penetrariam no reino da paz interior.

    No se equivocou o Mestre.

    Para colimar o objetivo do Seu ministrio, advertiu docemente, da

    colina onde o leque de luz das bem-aventuranas continuava aberto,

    indimensional.

    A lei de amor, extrada do equilbrio csmico, elaborada pelo Pai e

    nsita em a Natureza, deveria ser o rumo por onde todos seguiriam,

    regendo as suas vidas.

    Alma da vida, permaneceria condutora dos sentimentos e ideais.

    Todavia, quanto se sabia a respeito do amor constitua permuta de

    interesses e de paixes imediatistas.

    Sua palavra reverteu a ordem ancestral como uma sinfonia cuja

    musicalidade arrebatadora exige concentrao e segurana para ser

    vivida.

    Era um violar dos antigos interesses para que o importante seja o

    prximo, o ideal torne-se o irmo.

    No foi diversa a Sua conduta.

    Ele amou at o sacrifcio total da prpria vida, sob as exulceraes

    mais cruis que se deixou sofrer.

    No obstante, fazia-se necessrio concluir as diretrizes bsicas.

    * * *

  • Ao sop do monte estava Cafarnaum beijada pelas guas, ora

    tranqilas do mar.

    .. . Cuidado quando vos louvarem os homens, porque assim agiram em

    relao aos falsos profetas.

    Sempre a mentira abonar a hipocrisia e a bajulao adornar o

    engodo.

    Os que sintonizam na mesma faixa da mesquinhez reconhecem-se e

    apiam-se.

    Quando o homem, na vivncia dos ideais de enobrecimento, no

    compreendido, inclusive, pelos que participam dos labores na mesma

    grei, no se deve entristecer, antes alegrar-se, porque ainda escasso

    o terreno para a autenticidade, para o valor moral enobrecido, para a

    autodoao.

    Os pecadores amam e doam aos pecadores, emprestam a fim de receberem

    outro tanto.

    Ajudam-se, pensando em manter-se e sobreviver nos ddalos sombrios

    ou brilhantes que os acolhem, aturdidos e complicados.

    O filho da luz desvestido de trajes complexos, e, desataviado, real,

    sem subterfgios, entre todos e no igual a eles.

    Todavia, faz-se necessrio cuidado para no ser confundido, nem

    confundir-se a si prprio.

    Pode um cego, porventura conduzir, guiar outro cego? No cairo ambos

    no barranco?

    Certamente, s algum que v tem condies de conduzir outro que

    no enxerga ou ainda no sabe discernir.

    A verdade clara, no entanto, aparece, muitas vezes, discreta, ressuma

    das frmulas e dos ritos, ascende dos vales morais aonde foi arrojada. .

    .

    A orientao sbia e prossegue:

  • O discpulo no mais do que seu mestre; mas todo discpulo, quando for

    bem instrudo, ser como seu mestre.

    Naturalmente que o aprendizado prepara, mas s a experincia d

    sabedoria.

    H falsos mestres e ftuos discpulos.

    O melhor ensino faz-se pelo conhecimento e mediante a vivncia; a

    melhor aprendizagem pelo estudo e atravs do exerccio.

    Mestre e aluno completam-se.

    Conclui a palavra superior, aps cuidados e consideraes

    entretecidos, orientando:

    O homem bom, do bom tesouro do seu corao, tira o bem; o homem mau,

    do mau tesouro tira o mal; porque a sua boca fala o de que est cheio

    o corao.

    As aragens perpassam na amplido da colina verde...

    Msica inaudvel quase, murmura uma doce cantata.

    O Sol dourado permanece vitorioso no carro do Dia.

    A cordilheira defronte, qual guardi de pedra da paisagem onde Ele

    amou, apia os seus acumes nas bases esparramadas.

    H que ouvir-se para sempre o verbo divino.

    Repeti-lo-o de boca em boca, de pgina em pgina, de sculo em

    sculo.

    Nunca mais ser ouvido como ento.

    O futuro falar dEle e os homens, aps mil vicissitudes, cansados e

    exauridos, sem roteiro nem mais esperana, am-10-o por fim pelo

    tempo de todos os tempos.. .

  • 8 A superior justia As duas faces das paixes humanas ali se configuravam,

    inconfundveis: a violncia, na sua agressividade infrene, ululante,

    destruidora, e a fuga, aodada pela fraqueza moral, batendo em

    retirada, sem dignidade.

    A praa enorme, ensolarada, estava deserta.

    O Sol dardejante se encontrava em triunfo.

    H pouco, agitava-se a mole quase assassina, sedenta de sangue,

    transferindo para uma vtima inerme as prprias debilidades e

    frustraes.

    No poucas vezes, a agresso resulta de um processo psicolgico de

    transferncia da culpa, ntima, que se v refletida noutrem, naquele

    que, em erro, caiu nas armadilhas do conhecimento pblico.

    No se sentindo encorajado para rechaar as imperfeies, lapidando

    as arestas grosseiras da personalidade enferma, o agressor descarrega

    no prximo toda a vergonha que o aturde, a imensa insnia em

    que estertora.

    Fora a ocorrncia, h pouco sucedida.

    O vozerio cedera lugar ao silncio, quase incmodo; a fria cara

    diluindo-se em modorra, em afastamento discreto.. .

    Daquele lado, se apedrejavam as adlteras, lapidando-se pelo crime a

    que foram levadas por fatores mui variados.

    * * *

    No entanto, a voz serena e grave do estranho fulminara os agressores.

    Nem sempre vige a pureza nos atos das criaturas, mas a aparncia

    puritana tem neles primazia.

  • Aos seus ouvidos ecoavam as blasfmias; no corpo cansado as

    bofetadas e os primeiros golpes sofridos agora doam.

    Pessoa alguma lhe parecia conhecer os dramas ntimos, as lceras

    purulentas em que se dilacerava. . .

    Ningum te condenou? Ele interrogara, triste e profundo.

    Nem eu tampouco te condeno...

    Ela, ento, reflexionava, emocionada.

    Depois de sentir-Lhe a compaixo e ouvir-Lhe a voz, uma fulminante

    transformao ocorria no seu mundo interior.

    Donde O conhecia? inquiriu-se. Ele no seria o esperado,

    Aquele que mudaria a dureza da Lei, substituindo-a pela benevolncia

    da recuperao?

    Passeando a memria pelas cenas de h pouco, reviu o esposo,

    espumejante, na fragilidade da sua suprema ignorncia ofendida.

    Ele jamais lhe indagara das lgrimas que tragava, salgadas, em

    silncio.

    No se deixando escusar do delito, sabia que tombara, por lhe

    faltarem os valores para a resistncia.

    No cara, no entanto, a ss.

    O esposo, soberbo, nunca lhe brindara ternura. Egosta, jamais se

    recordara de aquec-la com a solidariedade e o amor. Transitava ao

    seu lado, mais escrava do que companheira, enquanto lhe eram

    negados entendimento e amizade...

    Em soledade, deixou-se sonhar, embriagando-se sob o excesso de

    iluso, at que tombou nas garras do sedutor venal!.

    Naquele instante recordou-se do falco que a arrojara no abismo,

    despedaando-lhe a alma.

  • Evocou as palavras ardentes e as promessas vs com que ele a

    seduzira.

    No bratro que se estabelecera, pensou, triste no flagrante

    lavrado pela perfdia do prprio marido, descobriu-se mais a ss do

    que nunca...

    Sequer esperou apoio; nem se atreveu a pedi-lo.

    O ladro da sua honra se evadira, amedrontado, deixando-a no

    asprrimo testemunho.. .

    Talvez, agora estivesse apoiando os quase lapidadores, no grupo dos

    que pugnam pela dignidade e so os fomentadores dos crimes.

    Subitamente explodiu-lhe como um raio, na mente em febre, a frase

    imorredoura:

    No tornes a pecar!

    Assustou-se e espraiou o olhar pela praa ardente, em ouro solar.

    Estava a ss, como sempre: de forma, porm, diversa, como nunca

    dantes.

    Percebia que no fora condenada nem mesmo por Ele, mas

    compreendeu, que tambm no fora absolvida.

    Ele no a censurara ou punira, mas tambm no a inocentara.

    O erro sombra na luz de quem delinqe.

    A enfermidade representa distrbio no equilbrio do organismo que a

    carrega.

    A mulher adltera, emocionada, renascendo dos escombros, descobriu

    a magnitude da lio do Rabi: devia reparar o erro, a fim de quitar a

    dvida perante a prpria e a Conscincia Divina.

    Levantar-se para ser feliz, era o impositivo do momento.

  • Igualmente no lhe cumpria guardar ressentimento ou mgoa

    daqueles que, anatematizados, quiseram ferrete-la em alucinado

    desforo homicida.

    No lhe cumpria condenar os seus julgadores precipitados, os

    furibundos justiceiros carentes de equilbrio, de paz.

    * * *

    Durante as Festas dos Tabernculos, naquele outubro, descendo do

    monte das Oliveiras, na direo da cidade, Jesus demonstrou a

    grandeza da Sua mensagem, a sabedoria do Seu reino, a excelsa

    magnitude do Seu julgamento.

    Ningum que se encontre investido do direito de atirar pedras,

    malsinar, perseguir. . .

    A Boa Nova, em plenitude de ao, se instalava nos coraes do

    futuro, desde ento, em poemas de amor e perdo, de misericrdia e

    esperana em superior justia.

    9 Socorro e curiosidade

    As anmonas espocando, em cores fortes, salpicavam de festa a

    Natureza, enquanto os miostis, na gramnea verde, pontilhavam de

    azul a erva rasteira.

    Os ventos perfumados venciam as distncias, encrespando, levemente,

    as guas do Jordo, sinuoso, a correr pelos areais frescos na

    embocadura do mar da Galilia.

    A primavera cantarolava na Palestina, saudada pela orquestrao das

    aves em bandos na copa do arvoredo.

    Todas as coisas contribuam para as auspiciosas Boas Novas, que

    chegavam aos homens.

    As notcias alargavam as dimenses dos acontecimentos e estreitavam

    as distncias entre os homens.

  • As aldeias das regies ribeirinhas agitavam-se, sacudidas pelas

    emoes contnuas dos sucessos de cada dia.

    Ele apareceu, e era Vida.

    As enfermidades fsicas desapareciam ante o Seu toque e a todos

    fascinava.

    Suas palavras possuam o encantamento de responder a perguntas no

    formuladas, que se diluam ante a clareza de cada conceito.

    Os Seus silncios conseguiam aquietar as aflies, que no deviam ser

    afastadas.

    Com a limpidez do olhar transparente, identificava as mazelas

    humanas, sem amesquinhar os seus portadores.

    Naqueles dias de suaves jbilos, ningum adivinharia os

    acontecimentos porvindouros, que culminariam no sacrifcio da Cruz

    infamante!

    Terminadas as azfamas do cotidiano, era comum v-10 cercado de

    pessoas humildes, que O crivavam de interrogaes, sedentas de

    aprendizagem.

    Homens e mulheres simples ignoravam as misrias das altas rodas

    sociais, mais preocupados com os problemas comezinhos, aqueles que

    mais os afetavam.

    Entretanto, vez que outra, surgiam necessitados, sobrecarregados por

    fardos mais pesados, vtimas de enfermidades morais mais graves.

    Numa das reunies vespertinas, quase ao cair da noite, quando Ele se

    encontrava a ss, acercou-se uma mulher de distinta posio, que,

    respeitosamente, Lhe apresentou os conflitos que a inquietavam.

    Requestada, na comunidade, tinha acesso s autoridades religiosas e

    civis, desfrutando, ao lado de outras personagens, de favores especiais.

    Senhor! disse, gravemente. Tenho ouvido falar de Vs.

    Minhas servas participam das Vossas prdicas e narram-me os Vossos

  • feitos. Venho acalentando o desejo de falar-Vos, sem a coragem para

    faz-lo. Hoje, porm, no posso sopitar o anseio, a necessidade, e

    aqui me encontro.

    O Mestre olhou-a com brandura e docilidade.

    Sentindo-se estimulada, a senhora prosseguiu:

    Vivo atormentada. As dvidas sobre a Verdade me assaltam e

    padeo desassossegos que ningum imagina. No me encontro doente

    do corpo, seno, da alma, e isto me parece injusto. Invejam-me e sou

    generosa; respeitam-me de pblico, mas detestam-me no ntimo;

    sadam-me na rua e na Sinagoga, todavia, evitam-me. . .

    Lgrimas de real sofrimento moral afloraram aos olhos da visitante,

    enquanto a voz se lhe embargou na garganta.

    Com esforo, conseguiu concluir:

    Se Vs vindes de Deus e conheceis os males do corao, ajudai-

    me!

    Jesus compreendeu a dor surda que lhe solapava a aparncia, e, sem

    qualquer afetao, respondeu:

    Sim, Raquel, eu sei.

    Citada, nominalmente, a mulher surpreendeu-se, indagando, de

    pronto:

    Conheceis-me Senhor? De onde?

    Sem titubeio, o Amigo esclareceu:

    Eu te conheo desde antes deste momento. Eu sou o bom pastor e

    todas as ovelhas que o Pai me confiou, eu as identifico no dito do

    corao. No te surpreendas, portanto, por falar-te assim.

    Quem me busca, procura meu Pai; aquele que me encontra, a meu Pai

    compreende, saindo da noite para o dia e da morte para a vida. No

  • perece, porque no se acaba, transferindo-se de um para outro estado,

    porm, continuando na Vida.

    Fazendo uma pausa breve, continuou:

    H muitos males do corao que afetam a alma.

    A ambio desmedida leva loucura.

    fugaz a estada no corpo, e, almejar alm do que se pode utilizar,

    significa avanar para a alienao.

    A ambio cobia o alheio e envenena, facultando a invaso de cruis

    verdugos, na casa mental.

    A calnia punhal invisvel que retalha vidas e ceifa o caluniador.

    A inveja pedrada psquica que fere o prximo e arrebenta quem a

    atira.

    A indiferena, a seu turno, mata os sentimentos e se irradia como

    humor meftico.

    S o amor pode propiciar a paz e fomentar a sade ntima.

    necessrio, portanto, ser livre.

    Todo poder, na Terra, dado pelo Pai, que o transfere de mos,

    exceto aquele que nasce do bem e aumenta sempre.

    Se desejas a afeio dos outros, ama primeiro, repartindo os teus bens

    excedentes com os que possuem menos, observando que a melhor

    maneira de aumentar os valores amoedados ser dividindo-os, em

    considerando que todo aquele que doa investe e quem guarda, deve

    vida.

    Ante a tentao da calnia, provocada pela inveja, coloca a palavra de

    estmulo e de respeito, exercitando a amizade fraternal, a caminho da

    real afeio.

    Houve um silncio, que se fez natural.

  • Sentindo-se desnudada, mas no censurada, a interlocutora, em

    pranto, rogou:

    Amparai-me na minha incredulidade e fraqueza!

    O Mestre, condodo, ripostou, bondoso:

    Vai Raquel, e comea. A transformao tem incio no desejo ntimo

    e concretiza-se na ao renovadora.

    Tropears, vrias vezes, quase vencida pelo desnimo. Sofrers o

    hbito antigo, que se negar a ceder... No entanto, insistindo e orando,

    conseguirs o xito que te coroar o esforo. S fiel e no receies.

    A consulente ergueu-se e saiu embalada por uma cano nova, que lhe

    musicava a alma.

    Os discpulos, que estavam afastados, vendo-a retirar-se,

    aproximaram-se, curiosos, e um deles indagou:

    Mestre, qual o problema dela, rica e invejada por todos?

    O Rabi relanceou o olhar pelos companheiros inexperientes e

    respondeu:

    O reino dos Cus est reservado aos que ajudam sem interrogaes

    e atendem ao prximo sem lhe sindicar das mazelas e fraquezas que o

    afligem.

    A curiosidade mals, injustificvel, oferece elementos para males que

    podem ser evitados.

    Calando-se, mergulhou na magia da noite branda e fresca, refulgente

    de astros.

    10 A lio da pacincia

  • A noite estava coalhada de astros. O plenilnio fazia-se acompanhar

    de suave brisa que perpassava em a Natureza, encrespando levemente

    as ondas do mar gentil da Galilia.

    Tudo era uma elegante moldura para a tela luminescente da prpria

    noite.

    Como de hbito, o Rabi assentou-se defronte do mar e, perdendo-se na

    contemplao da tela viva, abstraiu-se do ambiente pelo milagre da

    meditao profunda . ..

    Os discpulos acercaram-se, tocados pelo magnetismo do Senhor e,

    Sua volta, deixaram-se inebriar pela dlcida harmonia que dEle se

    irradiava.

    J se iniciavam as primeiras dificuldades, no ministrio da Boa Nova.

    As primeiras cartas-vivas, que se faziam endereadas s criaturas,

    sofriam a agresso da pusilanimidade e do preconceito.

    A violncia e o despeito armavam os coraes, gerando dificuldades e

    produzindo receios.

    Do entusiasmo inicial, os companheiros desarmados para as lutas mais

    rduas, comearam a denunciar cansao e a somar aflies.

    Esperavam que a Mensagem os libertaria de problemas e dores, no

    aguardando maior somatrio de sofrimentos.

    Afinal, a figura do Rabi infundia-lhes nimo e os encorajava ao

    empreendimento.

    Receavam, no entanto, aqueles estranhos embates, que se delineavam

    sob o aodar da violncia.

    Feridos nos interesses imediatistas e combatidos nas paixes inferiores,

    os comensais da inrcia e da explorao expelem a vasa pestfera da

    animosidade gratuita, que disfaram sob os vernizes da sociabilidade e

    da aparncia.

  • Facilmente mudam o comportamento, quando esto em jogo as

    intrincadas iluses da posse e do destaque humano a que se agarram

    com avidez e desesperao.

    Sem a crena na sobrevivncia da alma, fruem at a exausto os

    valores alucinantes da fantasia, receosos de que o tmulo tudo devore

    e aniquile.

    Por isso, insurgiam-se contra a mensagem libertadora.

    Ante a impossibilidade de investirem contra a Mensagem, insurgiam-

    se, depredadores, contra os mensageiros.

    Respiravam-se, portanto, os primeiros receios e, socapa, as ameaas

    levantavam-se contra os companheiros simples e desataviados que O

    acompanhavam.

    Tendo em vista a situao, Andr, utilizando-se de um momento

    prprio em que o Mestre pareceu retornar das Regies Excelsas, exps,

    inquieto, a razo das suas expectativas:

    Mestre argiu com gentileza como proceder com aqueles

    que erguem apodos injustos e calnias contra ns, somente porque nos

    desejam afastar do campo a que se atribuem propriedade?

    Com pacincia, Andr redargiu o Divino Companheiro. A

    pacincia demonstra a nobreza dos nossos sentimentos e testemunha a

    elevao dos nossos propsitos.

    Se eles se levantam a agredir-nos volveu o amigo, sinceramente

    magoado e movimentam recursos para impedir-nos o trabalho

    correto?

    Pacientemente insistiu o Generoso Guia. A pacincia

    consegue demover dos propsitos inferiores aqueles que nos

    examinam atravs ds lentes escuras do culos da m vontade.

    No entanto, volveu o discpulo, revelando na voz os sintomas

    da emoo como suportar a

  • ironia e o descaso daqueles cujas falhas conhecemos, mas se atrevem a

    ferir-nos com cinismo indisfarvel?

    Persistindo na pacincia contraps Jesus, otimista. A

    pacincia efeito natural do respeito que nos devemos uns aos outros,

    compreendendo que aqueles que no concordam conosco, tm o

    direito de ajuizar-nos conforme a sua capacidade, e no mediante os

    propsitos que abraamos.

    E porque o colaborador devotado voltasse carga, revelando

    desnimo e acrimnia, sob o apoio quase geral dos demais

    cooperadores, que experimentavam os espculos da malcia que se

    generalizava e das dificuldades que repontavam, o meigo Benfeitor

    espraiou o olhar pelo velrio da noite estrelada e branda, e,

    num momento de abrangncia misericordiosa, adiu:

    O reino dos Cus comea no imo de cada corao. As claridades

    que a acendemos, no visam a iluminar seno aqueles que as

    carregam edificados pela esperana.

    Quanto mais se lhe ampliam as dimenses do esclarecimento

    libertador, melhor compreendem os limites e a estreiteza dos que

    ainda vagueiam na ignorncia.

    A escurido somente pobreza da viso de quem observa as

    sombras.

    O olhar que se amplia, sem deter-se nos detalhes, abarca a amplido,

    mas no retm a beleza da paisagem, na sua riqueza de cromos e de

    cores.

    No estamos no mundo para mutilar nem para afligir.

    Elegemos o ministrio para amar e servir, mediante cuja programao

    lograremos, com pacincia,

    modificar-nos a fim de melhorarmos a viso e o entendimento dos

    outros.

  • Por mais algum se apresse, rogando semente resposta da plntula,

    somente atravs do tempo e da pacincia contemplar o pequeno

    vegetal a enriquecer-se de fora a caminho da produo.

    A pacincia a lenificadora do sofrimento, irm da esperana e

    companheira ideal da f.

    Relanceando o olhar pelo semblante cansado dos discpulos atentos, e,

    desejando fixar, indelevelmente, nos seus coraes e mentes, a lio da

    pacincia, arrematou:

    O homem, convidado gleba spera do servio, que se no prope

    a joeirar o solo adusto, removendo os pedregulhos, adubando a aridez

    e irrigando o cho duro, jamais ter garantida a felicidade

    da ensementao.

    Aqui, insiste na lavoura; ali, persevera na manuteno das mudas;

    mais adiante, revitaliza a terra.

    Se esta vai vencida por catstrofes e pragas, repete a experincia, at

    que a vida responda em flores de primavera e ddivas de alegria o

    sacrifcio e a pacincia da espera.

    A colheita, porm, propicia tal jbilo, que, todas as expectativas e

    ansiedades, sob a bno da pacincia, parecem haver-se constitudo

    em verdadeira lio de felicidade.

    Quando se calou, os companheiros, tocados pelo Seu verbo lcido,

    entreolharam-se, em silncio, e compreenderam que se o amor a base

    da vida, a pacincia constitui uma das mais belas das suas expresses a

    en-florescer os coraes.

    11 A insupervel lio da humildade

    O entardecer, em ruborizada colorao alm dos montes, refletindo o

    leque em luz de ouro sobre a placidez transparente do lago foi o

    cenrio, no qual se apresentou a mensagem de esperana e renovao.

  • Havia murmrios no ar e expectativas diversas.

    Espraiando-se as notcias em alvssaras de singular beleza, os espritos

    simples se embalavam embevecidos, nas vises prenunciadoras dos

    tempos porvindouros.

    Acostumados monotonia dos quefazeres quotidianos, o povilu e os

    modestos trabalhadores do mar e das vinhas foram colhidos pelas

    abenoadas informaes do Reino de Deus.

    Israel esperava pela tradio o Rei que lhe restitusse o poder e a

    dominao arbitrria sobre os outros povos.

    O orgulho da raa em mafiosa ambio esperava recuperar as glrias

    terrenas e transitrias do passado.

    Mais de quatro sculos de profecias silenciadas pareciam, agora,

    quebrados, ante a voz do Messias que atendia os cultos, deslumbrando

    os pobres e ignorantes.

    Sucediam-se os comentrios desencontrados e as exageradas

    apreciaes.

    Nunca se escutaria igual quela outra qualquer voz...

    A autoridade nEle se confundia meiguice e a sabedoria se

    exteriorizava sem atavios. Sua presena infundia respeito e granjeava

    afeio.

    A modesta e colorida Cafarnaum fora aquinhoada com os ensinos e

    dentre os que O seguiam, na ntima condio de amigos, muitos eram

    daquelas bandas frescas e formosas, de todos conhecidos, tornados

    importantes, at invejados, de um para outro momento, desde que

    foram escolhidos. . .

    Que Reino, afinal, seria o dEle? interrogavam-se todos, entre

    curiosos e interessados. A verdade, que Ele se dizia Embaixador de

    Deus o Filho de Deus! em misso de reunir as ovelhas ante o Seu

    cajado!. . .

  • Confundiam-se anseios e curiosidades.

    As pequenas rodas de ouvintes alongavam-se em comentrios

    demorados, terminadas Suas explanaes.

    Nesse clima de dubiedades e de expectao, naquela tarde, enquanto

    se fizera uma pausa natural, no encontro de costume entre amigos, a

    astuta Salom, orgulhosa e dedicada me, acercou-se, traindo, na

    face, a angustiosa indagao que Lhe desejava propor.(*)

    Como o momento se fizesse prprio, a esposa de Zebedeu, sem

    delongas ou circunlquios, foi direto ao assunto: Senhor, desejaria

    que ao triunfar a Tua luta, quando seja instalado o Reino, coloques os

    meus dois filhos, um Tua direita e outro Tua esquerda. . .

    Sem dar-se conta da grave solicitao, exultava antevendo o futuro

    radioso e feliz porque anelava. Nem sequer percebeu a expresso de

    amargura e espanto desenhada nos rostos marcados dos membros do

    Colgio reunidos pelos vnculos do amor. . .

    O Mestre, que penetrava o dito dos coraes e conhecia as paisagens

    ntimas das almas, compreendendo o zeloso carinho da genitora

    apressada, obtemperou:

    Estaro eles dispostos a beber da minha taa de amargura?

    interrogao direta e ante o olhar percuciente encaminhado aos

    candidatos, estes, comovidos, redar-giram a uma s voz:

    Estamos dispostos a sorver todo o contedo da Tua taa da

    amargura.

    Havia sincera honestidade na resposta clara e decidida. Jesus,

    conhecendo os meandros complexos da alma humana e os

    mecanismos das Leis Soberanas, sem entusiasmo, esclareceu:

    certo que bebereis da minha taa; quanto, porm, a vos

    sentardes ao meu lado, ao Pai compete determin-lo, no a mim. . .

  • A resposta concisa e sem qualquer rodeio, no encontrou

    receptividade na famlia Zebedeu.

    Os discpulos, porm, tomados de ira, investiram com olhares

    furibundos e expresses agressivas contra os dois ambiciosos

    candidatos.

    Como o momento se fizesse grave, o Senhor, lcido e calmo,

    lecionando humildade, condio essencial para a vitria no Seu reino,

    props, sinttico:

    Quem desejar ser o primeiro, seja o escravo, o servo do ltimo!.. .

    * * *

    A noite tombou em crepe negro salpicado de estrelas cintilantes.

    Os ltimos revrberos do poente continuavam, a distncia, coroando

    as corcovas das montanhas altaneiras, longes...

    Um dia aqueles amigos, por enquanto desatentos, compreenderiam o

    profundo significado da lio.

    * * *

    Os reinos humanos se erguem sobre as bases da dominao odienta e

    ruem, transformando-se em escombros . . .

    Os imprios terrenos se levantam sobre os solos onde cadveres

    insepultos os transformam em pntanos, nos quais se afundam depois.

    . .

    As civilizaes grandiosas, erigidas e comandadas pelos punhos da

    guerra e do orgulho, construes de um dia, passam, convertendo-se

    em runas tristes e ermas, logo depois...

    Os povos se levantam e sucumbem no voraz perpassar dos sculos e

    dos milnios...

    O Reino de Deus, que vem sendo erguido na mente do homem com os

    alicerces nas terras dos coraes, jamais passar...

  • Seu povo se identificar pelo amor e suas caractersticas sero a

    mansido, a concrdia e a cordura.

    certo que ainda h muito equvoco a tal respeito.

    Muitas Saloms e candidatos sem nmero aspiram a posies, lugares

    e brilho.. .

    O tempo, todavia, na soberana tranqilidade de ensinar e corrigir

    lentamente, cuidar de fixar em cada ser que o primeiro ser sempre

    aquele que se fizer o servidor do ltimo.

    At esse momento, a insupervel lio da humildade acenar para

    todos, chamando, chamando...

    12 A severa litania

    O Seu, era um estranho poder.. .

    Toda a fora, porm, da Sua mensagem encontra-se no exemplo da

    vivncia de que Ele deu mostras, seguido com fidelidade pelos que O

    amavam.

    A urdidura da frase sem qualquer retoque, penetrando no mago da

    questo que deveria ser examinada, refletia, em Jesus, a Sua

    procedncia, a Sua sabedoria.

    Nunca derivava o pensamento; jamais divagava, procurando a

    sobriedade verbal sem escassez, nunca a prolixidade confusa,

    utilizando verdadeiros apotegmas.

    Recorrendo ao recurso dialtico, propunha a tese e comentava-a,

    utilizando da anttese para robustecer o ensinamento.

    Agredido pela astcia dos fariseus, mediante as inquiries habilmente

    formuladas para O confundir ou comprometer, sem fugir proposta

    mesmo desonesta, Ele devolvia a indagao, facultando ao

    interlocutor responder-se.

  • Essa tcnica revelava a Sua compaixo pelos infelizes, permitindo-os

    despertar para as realidades que buscavam ignorar.

    lcito pagar-se o tributo? inquiriram, astuciosamente.

    E Ele, pulcro e honrado, redargiu, tomando de uma moeda:

    Que vedes?

    A efgie de Csar aclamaram.

    Dai, ento, a Csar o que de Csar. . . concluiu, fundamentado

    nas palavras do interrogante.

    No poucas vezes, o fato se repetiria.

    Sua palavra era aragem abenoada e refrescante que perpassava,

    adentrando-se pelos poros do sentimento; outras vezes, alteava-se,

    vibrante, verberando o erro, o crime, como vento forte que afasta os

    miasmas da atmosfera e purifica o tempo. . .

    Quando os Seus silncios selavam-Lhe os lbios, um murmrio de

    esperanas levantava-se discreto nas vagas areas, iluminando a

    melancolia das horas com as suaves claridades do Seu amor sem

    limite.

    Porque penetrasse o cerne das necessidades humanas, o Seu era

    sempre o verbo da misericrdia e da compaixo, aplicado como

    blsamo nas feridas abertas das aflies prementes, facultando alegrias

    porvindouras.

    Nunca se detinha em frivolidades ou escavava os abismos das almas,

    aprofundando dores.

    Quando se referia s coisas simples do dia-a-dia, fazia-as fulgurar

    como arquiplagos sidreos jamais ultrapassados, nunca mais

    esquecidos.

    Jesus falava muito em poucas palavras.

  • Vestia o pensamento sem os atavios das superficialidades. Todavia,

    seus conceitos jamais foram superados, seja na beleza da forma e

    poesia ou na profundidade da ideia.

    Com o verbo em luz entreteceu as mais resistentes consideraes em

    torno da vida, consubstanciando os valores transcendentes para que a

    criatura pudesse superar-se, sublimando as aspiraes e fruindo a paz.

    Legou-nos a tcnica do amor, mediante a palavra de bondosa diretriz.

    As ocasies faziam-se propcias para que os adversrios da paz

    tentassem perturb-10.

    Convidado a um banquete, o Mestre aquiesceu e sentou-se mesa,

    para escndalo do anfitrio, que o no viu lavar-se...

    Sem perturbar-se, o Puro esclareceu:

    Limpais o exterior do copo e do prato, mas o vosso interior est cheio de

    rapina e maldade. Insensatos, porventura quem fez o exterior, no fez

    tambm o interior? Dai em esmolas o que est no copo e no prato, e eis que

    todas as coisas vos so limpas.

    De forma alguma compactuava com as convenincias sociais advindas

    da pusilanimidade, por considerar a vida integral, sem as ardilosas

    injunes do engodo terreno.

    Valorizando o esprito eterno, buscava sempre retir-lo do anestsico

    da iluso.

    No obstante, compreendia o cado e o atormentado, soerguendo-os

    com o estmulo da esperana.

    O hipcrita gerador de incontveis males para si mesmo e para os

    outros, fomentando prejuzos e desequilbrios na economia scio-

    moral da Terra.

    Terapeuta excepcional, Jesus foi severo para com eles, que no

    entenderiam outra linguagem.

  • Dedicou-lhes, por isso mesmo, a trgica litania dos ais, que ainda

    repercute na acstica do mundo e que os incursos procuram no ouvir:

    Ai de vs, fariseus!

    porque dais o dzimo da hortel, da arruda e de todas as hortalias e desprezais

    a justia e o amor de Deus!

    Estas coisas porm deveis fazer sem omitirdes aquelas.

    Ai de vs, fariseus!

    porque gostais das primeiras cadeiras nas sinagogas e das saudaes nas ruas!

    Ai de vs!

    porque sois semelhantes aos tmulos que no aparecem, sobre os quais andam

    os homens sem o saberem!

    No havia impiedade na voz, antes, compaixo no sentimento.

    E porque se apresentasse falsamente includo, pressupondo-se melhor,

    reagiu um doutor da lei, crendo-se insultado, embora no fugindo

    regra.

    Sem o temer, prosseguiu o Senhor:

    Ai de vs, tambm, doutores da lei!

    porque carregais os homens com fardos difceis de suportar, enquanto sequer

    com um dedo vosso os tocais!

    Ai de vs!

    porque erigis os tmulos dos profetas que vossos pais mataram!

    Assim dais testemunhos e consentis nas obras de vossos pais,

    porque eles os mataram,

    e vs lhes erigis os tmulos!.. .

  • ... Ai de vs, doutores da lei!

    porque tirastes a chave da cincia;

    vs mesmos no entrastes (no conhecimento perfeito) e impedistes aos que

    entravam.

    A triste melodia provocou-lhes a ira, armando-lhes a conscinci