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5/9/2018 Historia Da Metalografia_Brasil - slidepdf.com
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BREVE HISTÓRIA DA METALOGRAFIA
Cesar R. F. Azevedo; Beatriz A. Campos
Laboratório de Caracterização Microestrutural Prof. Hubertus Colpaert,
Departamento de Engenharia Metalúrgica e de Materiais, Escola Politécnica da
Universidade de São Paulo
Independente da defasagem entre a descoberta de materiais e o desenvolvimento teórico, a
transmissão de conhecimentos práticos e o desenvolvimento de materiais e processos
persistiram no decorrer da história da metalurgia.
Abstract
A brief description of the history of metallurgy describes some of the key advances
in experimental techniques for quality control and properties optimisation, which
ended up creating the background scenario for the discovery, development and
application of the Metallography in modern times. Finally, a succinct analysis of the
introduction of this technique in Brazil highlights the pioneering roles of Prof. Paula
Souza and Prof. Hubertus Colpaert.
--------------
Há aproximadamente 7 mil anos, começou no Oriente Médio a nossa
primeira revolução tecnológica, devido à combinação de organização social
com o uso da tecnologia. A produção de ferramentas, armas e artefatos
passou a ser realizada com o uso de diferentes materiais e processos(1). É
interessante notar que as primeiras tentativas de teorização sobre algunsdestes fenômenos surgiram mil anos depois, com os filósofos gregos.
Independente do grande descompasso entre a descoberta de novos materiais
e técnicas e o desenvolvimento dos fundamentos teóricos, persistiu no
decorrer da história tanto a transmissão de conhecimentos práticos, como o
contínuo desenvolvimento de materiais e processos(2). A metalurgia começou
com a conformação mecânica de pedaços de cobre nativo, que foram
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transformados em objetos decorativos em 9000 a.C., no Oriente Médio. Em
1200 a.C. os chineses já fundiam vasos de bronze bastante elaborados. O
uso do ferro começou em 2800 a.C., na região de Anatólia, mas seu uso
dependeu da difusão de métodos de extração; conversão de ferro em aço; e
tratamento termo -mecânico, de modo a obter um material de resistênciamecânica inigualável(2).
A metalografia, se for encarada como o uso de aspectos visuais do
metal para o controle de suas propriedades, surge no Oriente por volta de
800 d.C.. Nesta época, metalurgistas usavam materiais compósitos (aço alto
carbono altamente segregado ou uma combinação de aço e ferro) para
produção do aço por forjamento, produzindo uma macroestrutura visível a
olho nu. Consta que esta macroestrutura (figura 1a), servia não apenas
para conferir uma qualidade estética aos produtos de aço Damasco, mas
também para controle de qualidade. Supõe-se que este mesmo raciocínio era
aplicado para o controle de qualidade de espadas japonesas, constituídas de
um núcleo de ferro, cercado por aço temperável com 0,6% C, que também
foram desenvolvidas a partir de 800 d.C. (figura 1b).
A partir do século XVI, surgem na Europa os primeiros livros que
abordam os aspectos práticos da metalurgia extrativa, incluindo ensaios de
controle de qualidade através da fratura de corpos-de-prova, uma prática
importante para o rápido desenvolvimento da metalografia no início do
século XX. A primeira descrição do uso da fractografia para aferir a qualidade
do processo foi feita por Biringuccio, em 1540(3). Em 1574, Ercker(4)
descreveu um procedimento similar, mas usando ensaio de impacto em
corpos-de-prova entalhados para controle de qualidade dos lingotes de
cobre, bronze e prata. Em 1627, Savot(5) usou o aspecto granulométrico
mais refinado da fratura de corpos-de-prova como medida indireta da maior
resistência ao impacto dos sinos fundidos em liga Cu-Sn-Bi (precursor da Lei
de Hall-Petch, desenvolvida por volta de 1950).
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Outra peça chave para o desenvolvimento da metalografia foi
descoberta da microscopia óptica. Em 1665, Hook publicou (6) a primeira
imagem fractográfica obtida por microscopia de uma rocha sedimentar e
estratificada (figura 2), constituída de várias camadas concêntricas de
carbonato de cálcio. Sua descrição bastante precisa da topografia de fraturafoi associada à microestrutura desta rocha apenas no século XX(7),
reforçando a relação entre microestrutura e microfractografia. Mais um
estudo microscópico foi publicado em 1722 por De Réaumur(5,8), revelando
as superfícies de fratura em várias classes de ferro e aço; e relacionando-as
com a qualidade destes materiais ou com os estágios de conversão de ferro
em aço (figura 3).Trabalhos desenvolvidos no século XIX usaram a
fractografia para a melhoria das propriedades de produtos por otimização
microestrutural, embora o conceito de microestru tura ainda não fosse
entendido. Em 1862, Kirkaldy relacionou a alteração no aspecto da fratura de
ferro e aço forjados com tratamento térmico, enquanto, em 1868, Tschernoff
discutiu o efeito do teor de carbono e do tratamento térmico do aço no
tamanho de grão da fratura(5).
O primeiro ensaio de investigação metalográfica em metal for realizado
pelo inglês Henry Sorby em 1863. Seu grande interesse por geologia o levou,
aos 23 anos de idade, ao pioneirismo no estudo da petrografia microscópica,
embora seus interesses também incluíssem arqueologia, biologia,
meteorologia e química. Sorby adaptou o microscópio óptico para trabalhar
com a luz refletida na pesquisa da microestrutura de meteorito de ferro (já
estudado em 1820 por Widmanstätten e Screibers, usando o ataque com
ácido nítrico na superfície polida) e tornou-se o primeiro pesquisador a
estudar como a microestrutura do aço (tratado como um meteorito artificial)
variava com a sua composição química, tratamento térmico e processo de
manufatura, sendo reconhecido como o pai da metalografia (f igura 4),
apesar de seu relativo desinteresse por metalurgia (9). Sorby foi motivo do
escárnio de alguns de seus colegas, mais notoriamente do geólogo suíço
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Saussure, que não considerava apropriado estudar uma montanha com o uso
de um microscópio. Até hoje este é um tipo de uma atitude conservadora em
relação ao uso de novas técnicas metalográficas. Sorby assim respondia às
críticas(9): "No one expected astronomers to confine their observations to
what they could see with the naked eye, so why should geologists be so
restricted?". A metalografia passou a ter destaque, em detrimento da
fractografia, no final do século XIX, principalmente com os trabalhos de
Martens (1878) na Alemanha (figura 5), Osmond e Le Chatelier (1885) na
França, Arnold e Stead (1894) no Reino Unido e Howe e Sauvert (1891) nos
EUA(10-11).
No Brasil em 1888 extingue-se a escravidão e em 1889 ocorre a
transição do império para a república. Em 1894, o país apresentava 15,5
milhões de habitantes, dos quais cerca de 80% eram analfabetos, e a cidade
de S. Paulo tinha 125.000 habitantes e apresentava um “parque industrial”
incipiente e inexpressivo(12). Antônio Francisco de Paula Souza, neto do
Barão de Piracicaba, nascido em 1843 em Itú, exerceu um papel estratégico
para industrialização do estado de São Paulo. Aos 15 anos partiu para a
Alemanha, retornando para o Brasil aos 24, com o diploma de engenheiro
pela Universidade de Karlsruhe. Tornou-se encarregado da construção da
Estrada de Ferro Ituano, foi republicano, deputado estadual, presidente da
assembléia legislativa de São Paulo, ministro de Relações Exteriores e
ministro da Agricultura. Em certo ponto de sua vida, dedicou-se à formação
da Escola Politécnica, que foi inaugurada em 1894(12). Paula Souza tinha
plena convicção da necessidade do ensino científico para a industrialização
do Brasil. Para garantir o ensino prático de disciplinas tecnológicas, fundou-
se junto à escola o Gabinete de Resistência dos Materiais (1899), projetado
pelo professor suíço Ludwig von Tetmayer.
Em 1906, pensando na expansão do Gabinete, Paula Souza enviou o
engenheiro Hippolyto Pujol, com 26 anos, com a missão de visitar vários
laboratórios europeus e elaborar um plano de expansão. Nesta época, a
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metalografia microscópica já estava se consolidando na Europa e EUA, e
Paula Souza, atento às tendências, programou para o jovem Pujol uma visita
ao laboratório de metalografia do Prof. Martens, no Gross Lichterfeld de
Berlim; um curso de metalografia com o Prof. Le Chatellier, na Universidade
de Sorbonne; e um estágio com Prof. Leon Guillet, no laboratório demetalografia da Usina de Dion Bouton(13). De volta ao Brasil, em 1907, Pujol
trouxe material didático e um microscópio Zeiss do tipo Martens, permitindo
a instalação de um laboratório de metalografia microscópica no Gabinete de
Resistência de Materiais da Escola Politécnica. Em 1910 chegou ao Gabinete
um banco metalográfico do tipo Le Chatellier, até hoje em exibição no antigo
Laboratório de Metalografia e Análise de Falhas do IPT. Em 1910, o ensino
prático de metalografia fazia parte da cadeira de “Curso experimental de
Resistência dos Materiaes” da Escola Politécnica e em 1912, a Revista
Politécnica publicou os primeiros artigos de metalografia no país(14). Estes
artigos do Pujol, s ão didáticos em termos da preparação de amostras, do uso
dos microscópios Martens e Le Chatelier, do uso dos ataques químicos, e de
definições microestruturais típicas de aços, embora termos como “ferrite
amorpha”, “sorbite”, “hardenite”, “troostite” e “osmondite” possam parecer
sem sentido hoje em dia. As várias micrografias mostradas nestes artigos
foram cedidas pelo Prof. Guillet(15), seu tutor na França. Dos trabalhos de
metalografia produzidos pelo Gabinete entre as décadas de 10 e 20 e que
puderam ser recuperados, há uma indicação de que seu objetivo era o
controle de qualidade de componentes metálicos usados na construção civil.
Espera-se que, em breve, a totalidade do acervo metalográfico do Gabinete
seja encontrado, de modo a permitir uma análise ma is profunda dos
primeiros trabalhos de metalografia realizados no Brasil. A partir da década
de 30, graças ao trabalho sistemático de Hubertus Colpaert, a técnica de
metalografia se consolida no Brasil como uma importante ferramenta de
ensino e de desenvolvimento industrial, principalmente em casos de análise
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de falha, controle de qualidade, engenharia reversa e otimização
microestrutural através de tratamentos termo-mecânicos.
Referências 1- A search for structure, selected essays on science, art, and history. Cyril Stanley
Smith. The MIT Press (1982).
2- Metallurgy as a human experience. Cyril Stanley Smith. Metallurgical
Transactions, vol. 6A, april, (1975) 603-623.
3- The Pirotechnia. Vannoccio Biringuccio (1540). Traduzido por Cyril Stanley Smith
e Martha Teach Gnudi. Dover Publications (1990)
4- Treatise on Ores and Assaying. Lazarus Ercker (1580). Traduzido por Anneliese
Grunhaldt e Cyril Stanley Smith. The University of Chicago Press (1951)
5- ASM Handbook, Vol. 12: Fractography. ASM International (1989). Micrographia:
Some physiological descriptions of minute bodies made by magnifying glasses
with observations and inquiries thereupon. Robert Hook. (1665). The Project
Gutenberg, http://www.gutenberg.org/etext/15491 (2007).Fractography:
Observing, measuring and interpreting fracture surface topography . Derek Hull.
Cambridge University Press (1999).Sources for the history of the science of
steel, 1533-1786. Cyril Stanley Smith. The MIT Press (1968).
9- The Sorby centennial symposium on the history of metallurgy. Cyril Stanley
Smith. Gordon and Breach. AIME Metallurgical Society Conferences (1965).
10- Adolf Martens and his contributions to materials engineering. P.D. Portella.
Palestra. Universidade de Cambridge (2002).
http://www.msm.cam.ac.uk/phase-trans/2002/Martens.pdf
11- Metallography, an introduction to the study of the structure of metals, chiefly
by the aid of the microscope. Arthur H. Hiorns. Macmillan and Co, London
(1902).12- Antonio Francisco de Paula Souza (1843-1917): o mais antigo estudante
brasileiro em Karlsruhe. Angelo Fernando Padilha e Rodrigo Bastos Padilha.
http://www.aaa.uni-karlsruhe.de/download/PaulaSouza_0riginaltext.doc
13- Relatório de Viagem apresentado ao Prof. Antônio Francisco de Paula Souza.
Hyppolito Gustavo Pujol. Escola Politécnica, , São Paulo. (1907).
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14- Noções elementares de metallographia microscopica e analyse thermica.
Hyppolito Gustavo Pujol. Revista Politécnica, n.38 (77-90); n.39/40 (123-155) e
n.42 (287-295). 1912
15- Precis De Metallographie Microscopique Et De Macrographie . Leon Guillet.
Editions Dunod et E. Pinat , Paris. 1924.
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a
b
Figura 1. Detalhes de lâminas de espadas de aço. a) Espada persa do século XVIII
mostrando microestrutura dendrítica após trabalho mecânico do aço Damasco; b)
Espada japonesa do século XVII mostrando três regiões distintas (2).
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Figura 2. Fractografia de rocha calcárea sedimentar e estratificada após fratura
(6,7).
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Figura 3. Mudança na topografia da superfície de fratura causada pela cementação e
conversão do ferro (núcleo) em aço (superfície) (5).
Figura 4. Primeira metalografia produzida por Sorby em 1863. Aumento de 9x.
Atacado com ácido nítrico diluído (2).
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Figura 5. Microestrutura de aço “Spiegeleisen”obtida por Martens em 1878 (11)