23
Coordena<;ao de SERGE BERSTEIN e PIERRE MILZA HISTORIA DO SECULO XIX Por Gisele Berstein, Serge Berstein, Yves Gauthier, Jean Guiffan e Pierre Milza B•H PUBLICA<;OES EUROPA·AM£RICA

História do século XIX

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: História do século XIX

Coordena<;ao de

SERGE BERSTEIN e PIERRE MILZA

HISTORIA ~

DO SECULO XIX

Por Gisele Berstein, Serge Berstein, Yves Gauthier, Jean Guiffan e Pierre Milza

B•H PUBLICA<;OES EUROPA·AM£RICA

Page 2: História do século XIX

148 PIERRE MILZA e SERGE BERSTf!N

rico. No seu percurso, Sherman aplica a tactica cia «terra queimada>>, destruindo tudo o que poderia ser i.ltil ao Sui (indi.lstrias, vias ferreas. colheitas, etc .) de modo a baixar o moral dos seus adverstirios. Tomada e incendiada Atlanta, Sherman prossegue a sua ofensiva em clirec~iio ao Atliintico. Curva clcpois para none, a fim de se reunir a Grant, ponclo a Carolina do Sui a ferro e fogo.

Neste entre tanto. o general Grant trava batalhas cada vez mais sangrentas com Lee. 0 epis6dio decisivo e, no entanto, o ccrco de Petersburgo, que comancla a estrada para a capital federal. Richmond. 0 ccrco dura nove meses e, ao fim destcs. os sold ados, para se protegerem, utilizam pela primeira vez as trincheiras. Alguns elias ap6s a tomada de Petersburgo, o Sui , que percleu as csperan~as de inverter a situa~ao. capitula em Appomattox. a 9 de Abril de 1865. E a vit6riacla Uniiio. Cinco elias mais tarde , Lincoln e assassinaclo porum actor sulista.

Silo consideraveis as consequencias cia Guerra cia Secessao. 0 con !lito custou a vida a seiscemos e clezoito mil duzentos c vinte e do is amcricanos, s6 ele mai s do que toclas as guerras empreenclidas pelos Estados Uniclos de 1776 a guerra do Victname. incluinclo as duas guerras mundiais. 0 Sui, clevastado pelas tropas de Sherman. sot'J·eu muito mais do que o Norte, que ficou praticamente intacto. A Guerra cia Secessiio assinala o lim de uma epoca. 0 Sui, que dominara polftica e socialmente os Estaclos Unidos ap6s a independencia, perdeu a sua supremacia. Termina a guerra arruinado. ao passo que o conflito estimulou a economia do Norte, que. se fortaleceu. Vencedor em termos militares , e preciso empreencler agora a reconstru~iio econ6mica e polftica do pafs. Abre-se uma nova pagina na hist6ria clos Estaclos Uniclos.

CAPITULO 10

........ OS PRIMEIROS EXITOS DOS MOVIMENTOS NACIONAIS

Enquanto clecorre. em prejufzo dos Espanhois c clos Portugueses. uma vaga de clcscoloniza~iio na America Latina c sc acelcra o cleclfnio do Imperio Otomano, as aspira~<ies liberais e nacionais clos povos europeus ciao Iugar, por volta d~ 1830. a uma agita~ao revolucionaria que permite que a Bclgicac a Grecia alcancem a incle­penclencia.

Toclavia, os movimentos nacionais cia Alemanha, cia Italia e cia Pol6nia sofrem duros reveses em face do bloco das potencias absolutistas que, em 1833, pro­clamam num pacto solene a sua vontade de ajuclar qualquer soberano legftimo amea~aclo pelas correntes liberais e nacionais.

........ A EMANCIPA~AO DA AMERICA LATINA

A revolta das col6nias inglcsas da America do Norte no seculo xv1 11 , seguicla do nas\: imento clos Estados Uniclos constitufra a prime ira vag a de clescoloniza<;ao. A seguncla c a que at'ccta o conjunto do espai,'O latino-americano durante o primeiro quartel do seculo XIX e que se deve principalmente aos <<crioulos».

Estes colonos hrancos. nascidos na America. mas de origem europeia, cons­tituem uma cspecie de aristocracia cia riqueza- cere a de trcs mil hoes de pessoas numa popula~ao global de vintc milh<ies de hahitantes - dctcnt(lra de gran des do­mfnios e se nho1·a do ncg6cio e das actividades portu<irias. !\lui to apcgada as suas prerrogatiYas c ao seu modo de 1·ida. domina as outras categorias sociais. estrati­ficaclas cle acorclo com critcrios raciais: os cloi s milhoes de escravos cujo destino e comp;miYel ao dos s<!us hom<ilo~os da America do None. os dcz milht'>es de Indios que vi1·cm miscravclmcme ~clos trahalhos duros cia terra c das minas. os quatro ou cinco milh<ies de «mcsti<;tlS >> . que formam uma cspccic declasse inter-

Page 3: História do século XIX

150 PIERRE MILZA " SERGI: lii:.RSTEIN

media de oncle sao recruiados os intenclentcs. os mon.lomos, os anesiios. etc. Mas aceita mal a sua suhorclina~ao aos reprcsentantes da metr6pole: os trczcntos miles­panh6is e portugueses que dctem os altos cargos aclministrativos e religiosos e mantem os crioulos afastaclos do poder politico.

Ora. nos finais do seculo XV III. as icleias lihcrais encontram-sc bastantc difun­clidas emtodas as camadas eta burguesia crioula, que rcclama em particular a abo­Jic;iio do sistema colonial do << Exclusi' O>•, que gurante a mctr6pole o monop61io do comercio com os territ6rios ultramarinos. A R.evolw:;ao Francesa foi igualmente acolhida com entusiasmo pel a cam ada intelectual crioula. 0 venezuclano Miranda combateu na Belgica sob as orclens de Dumouriez. Discfpulo de Rousseau, o seu cornpatriota Bolivar fez em Paris os cursos da Escola Normal e eta Politccnica.

Foram as grandes agita<;oes provocadus na Europa pel as guerrus imperiuis 4ue transformarum estas tendencias liberais em vontade de independencia. Mais que de «clescoloniza~iio», no sentido contemporaneo do termo. tratu-se etc uma se­ccssao. com pad vel a clas col6nias americanas, qucr clizer, de uma rotura com a metr6pole pretend ida pclos clesce ndcntcs clos colonos ibcricos que nao se mistura­rum com as popula~oes aut6ctoncs, constituindo uma classc dominantc. Ora, esta seccssiio vai efecwar-se em me nos de um quano de scculo sabre uma massa terri­torial imensa que se estende eta California e eta Fl6ricla ao cabo Horn c oncle vivem apenus vinte milhoes de babitantes, reuniclos na sua maior pane nos planaltos elevados e em alguns pontos do litoral pacifica c atlantico. Exceptuanclo o Brasil. colonizado pclos Ponuguescs, todos estes territ6rios dcpenclem da Espanha, que levou para 1<1 a sua linguae a sua civiliza;;ao (catolicismo, ciclacles ricamentc ornu­mentadas de ediffcios barrocos, etc.), mas apenas conseguiu instituir neste Impe­rio gigantesco um controlo administrative muito frouxo.

A prime ira telllativucleemancipa<;ao fracassaem 1816. A interven~ao de Napo­leiio em Espanha cleu o sinal da revolla. Mas a auscncia de uma estratcgia concer­tada entre os movimentos de rebcliao, a dissidencia clos lidcres- na Venezuela, Bolivar niio hesitara em entregar Miranda ao inimigo- a apatia etas massas inclias (excepto no Mexico, onde pegam em arm as. instigaclos por sacerdotes como Hidal­go e Morelos). sobretudo o lcalismo do clero e de uma parte dos notavcis crioulos isolam os putriotas. Estes niio conseguem resistir aos clez mil soldaclos ugucrridos que o rei de Espanha, Fernando Vll, en via como refor<;o para esmagar os rebcldes. Em 1816. apenas a Argentina, libena por Sun Martin , se mantem inclcpenclente.

Toclavia. a forte repressiio excrcicla pelos Espanh6is- mais uma vcz parali­saclos pclos acontecimcntos de 1820-1823 na mctr6polc - volta ..:ontra eles a grande nwioria clos crioulos. sustcntados pclos.fnclios e mesti<;os. e apoiaclos pclos inglcses. que lhcs cnvimn armas e barcos. Enquanto que a inclependcncia do Brasil clecorre de forma pacifica- e1n I 822. o rei de Portugal. que esti\-cra algumtempo exilaclo neste pals e regressara dcpois :1 Europa. reconhece ao seu lilho D. Pedro o titulo de imperaclor constitucional do Brasi l-. Bolivar. que partiu do None. e San rvlartin. vindo do Sui, juntallt-5>C no Peru. oncle o general Sucre esmaga. em ll\24. em A~ acucho. as ultima, for~· as cspanholas.

A atitudc eta Gra-Bretanha e clos Estaclos Unidos ra,•on:ceu a enwncipm;ao cia America Latina. As potencia, con»en·adoras curopcias haviam, na ,·erdadc:. so-

HIST6J?IA DO SECULO XIX

A DIVISAO POLITICA DA AMERICA LATINA EM 1840

1830 Ano da Aquisiyao da lndependimcia

D Col6nias francesas

- Col6nias inglesas

[JlOJ Colonia holandesa

§ :::::-2§ lmpeno colonial espanhol

c::J lmpeno colonial portugu~s

e aerm\idls

151

nbaclo intervir do outro !acto do AtHintico para ajudar Fernando VII a repor a sua autoriclade. Mas veem-se confrontad6S como Rei no Uniclo. cujo comercio c indus­tria nao podiam seniio bencficiar da liquida~iio clos C1ilimos vestfgios do <<pacta colonial>>. 0 ministro Canning da-o claramente a saber aos seus parceiros euro­peus. desferindo um rude golpc sabre a polftica de manuten~iio da Santa Alianr;a.

Por seu !ado. numa cleclarar;ao feita em Dezembro etc !823. o prcsiclentc clos Estaclos Unidos. Monroe, afinna que tocla e qualquer interven<;ao etas potcncias contra uma nac;ao livre do continente americana seria consiclerada pclo seu pais como um acto de hostiliclade. Contudo. nem Washington ncm Lone! res viam com bons olhos a constitui~ao de um Estaclo pocleroso que reunisse todos os territ6rio> reccm-libenos c. desdc logo. me nos penne<1vel a sua inrlucncia econ6mica do 4uc: lllll:.l America Latina esmi~alhada c eli vic! ida.

Niio tiveram. alii\s , qu;lquer problema em rcjeitar o projecto de uniiio pan­-americana elaboraclo por Bolivar. perante o qual San Martin sc cximira em I ~22. A imensiclao do munclo Jatino-americano. as dificulclacles nas comunica~iic:s. a di versidade de: climas. de popula~·iies. de traclir;oes hist6ricas antcriorcs a coloniza­<;iio iberica, tuclo isto tornava quasc impossin: l a tarera dos dcfensorcs da conic-

Page 4: História do século XIX

/52 PIERRE MJLZA e SERGE BERSTUN

dera<;:ao. 0 congn::sso rcunido no Panama, em 1826, limita-se a constata<;ao e tennina no maior dos fracassos. Nasceram do antigo Imperio Espanhol cerca de vinte Estaclos de regime politico instdvel. sobre os quais iria ser exercida ate finais do secu lo a inlluencia preponderante eta Gra-Bretanha.

OS PRINCIPIOS DA «QUESTAO DO ORIENTE»

Jniciaclm, cb,cle finais do scculo xv111. a decadencia co recuo do Imperio Oto­mano acelcram-se na primeira metade do se<.:ulo XIX. Nao obstante as refonnas efectuaclas a partir Lie 1808 pelo sultao Mahmoud. o Governo de Constantinopla tem cada vez maiores diJ'iculdades em fazer respeitar a sua autoridacle sobre Lllll tcrrit6rio imcnso LJL~e engloba os Baldis. a Asia Menor. o Mcdio Oriente c a maior parte do Norte de Africa. A incapacidade dos soberanos, a corrup~iio do seu sc­CJUito. a clesordem clas finan'<as e cia aclministra<;:iio. a anar4uia mantida pelos gover­n adores clas provincias (pax<1s) e pelos chefes de um exercito constituiclo essencial­mente por 1nercen<irius (janfzaros). levam o pocler turco a um clcsmembramento ineviu1vel.

Esta situm;ao vai alimentar. como e 16gico, a cobi<;:a etas potencias europeias. A Russia ambiciona. clepois de Pedro, o Gmnde. instalar-se em Constan tinopla e acecler aos mares quentes. A Gra-Bretanha baseia tocla a sua politic ana protec'<iio do caminhu para as fndias. constituinclo o Estado otomano um entra1·e a ambi<;ao clus czarcs. Oeste modo. vai opor-se vigorosamentc ao ,;cu desmembramento du­rante todu o seculo x1x . Por seu !ado, a Fran<;:a. que se estabelcccu na Argelia em 1830 e exen:e urna influencia importante no Egipto e na Siria. entenclt; que clevc es1a1· pre!>enle na regiao e vigia os seus clois aclvers<irios. enquanto que a Austria de­fen de a liberdacle de navegar,:i'io no Danubio c ambiciona igualmente multiplicar as suas cxpona,:oes mariti mas.

Ora, como aumento do poder no Egipto. a <<questao clo Oriente» rcvcstc clesde logo um can:\cter explosive. A partir de 180-t este paise govern ado pelo pax a Mo­hamed Ali. que conseguiu conquistar nos poucos a sua independcncia em rcla<;:iio ao sultao e come~ou a transfurmar o Egipto. como auxilio clos conselheiros e clos tecnicos estrangeiros. dos gregos. mas tam bern de inumcros rrancese;,. Modemi­LOU o seu exercito e a sua marinha clc guerra. autorizou a irriga<;iio das planta~oe> de algodiio e de cana-do-a~Lkar. d~scnvolvcu a indu>tria eo comcrciu e decidiu alargar <b >uas pos;,ess<ies para o sui (Nubia) c u Jcste (Arabia). Fortail:cido L·om e'-lc 1101 o pouer. ambiciona govcrnar a Sfria.

Aquamlo da rc1 olta greg a de I g2 I. o sult1io tivera de apelar para i\ lohamcd AI i. Atravcs do Tratauo de Anclrinopla ( 1829). que reconhecia a indcpenclcncia hclc­niL·a. J'oi concedicla it Grccia a Moreia. Emtroca. Mohamed AI i rcclama a Siria. que Mahmoud !he rccusou.

A ucupw;iio da Sfria pclo paxa do Egipto. em I l:L'\ I. cl<i infcio a unw Jonga ;;eric de cri\es no i\ lediterrilnco oric1Hal. Tendo u >CU cxercito >ido esmagado em Konich

HJST6RJA DO SECULU XIX

~ U1J Proteclorado russo

I:'T7l Zona control ada bCLJ pelo Egiplo

de Mohamed Ali

/53

( 1832 ). o sui tao vi u-se obrigado a apelar as potencias para salvar o ,eu Imperio. A rim cle impedir que os Russos, que enviaram uma frota e tropas em auxflio de Mahmoud. bcneficiem exageradamente eta situa<;:ao, Lonclres e Paris conscguem que o pax<1 assine a paz como seu suserano ( 1833). Paz essa. nitidamente favora­vel a Mohamed Ali, que recebe a Siria, e ao czar. que vc ser-lhe <.:nncedido o cn­cerramento dos estreitos em caso clc guerra.

A guerra de clesforra emprecnclicla pelo sultao em 1839 reel uncia rapiclamente num dcsastre. Preocupada com a integridacle do Imperio Otomano. a Inglaterra re­solve aliar-se its outras potencias paraobrigar Mohamed Ali a rccuar, pois cste con­tava como forte apoio cia Fran<;:a. Em Julho de 1840. a Gra-Bretanha, a Russia. a Austria e a Prussia intimam o pax ado Egiplo a evacuar algumas clas 'uas conquistas e amea<;:am dep6-lo se clcntro de vinte elias nao tiverdaclo respusta ao seu ultimato. Re;,ulta claqui uma forte ten sao entre a Inglaterra e a Fran~a. acompanhacla de unw amear,:a de guerra europeia. Chel'ianclo a cliplumacia francesa. Thiers cuncebe a 1)1'01 a de for~a. fonilica Paris c proceclc a uma mobiliza~ao parcial. enquanto que. na Alcmanha, as manifestar;ocs belicas eta Franr;a provocam um viulento dcspcr­tar do espirito lhH:ionalista.

A substituir;ao de Thier, por GuizOL. mais con~cicntc que o ~cu anteccs~nr do i~olamcnto Ja Fran~a c da rc,olur;iio Jo ministro ingles Palmerston. vai. toda,·i<t. acalmar a tensao . Mohamed Ali niio podc scnan cun·ar->e. Con>cn·a apeml\ o Egipto na qualidacle de pax;\ heredit<irio. Em Julho de I X-II. as cinco principab po­tcncias europeias assinam a convcnc.;::io dus Estrcit<J:o. qu..: cncerra estes ultimos a todo e qualquer navio de guc1Ta cstrangeiro. mesmo em tempo de pa1.. A; rcht~·oe>

Page 5: História do século XIX

/54 PIERRE MILZA e SERGE BERSTEJN

franco-inglesas conhecern desde logo urna nova acalmia, pretendida por Guizot. mas vivamente comhatida em Fran'<a pel a oposi'riiO. Nao ira resistir ao reg res so de Palmerston ao poder em 1846. Converticlo por razoes de ordem tactica as posi<;5es conservacloras de Metternich, o ministro frances asp ira, en tao, ao que parece, a uma alian9a clos BoUJ·hons de Fran'<a, de Espanha e de Napoles, susceptive! de exercer uma inlluenciadominante no Mecliterraneo. Projecto que aRevolu<;ao de 1848 vai recluzir a nada.

........ 0 DESPERTAR DAS «NACOES» NA EUROPA

0 movimemo clas <<nacionaliclades», visanclo fazcr coincidir a <<na'<ao»- is to c, uma aglomenl'riiO de homens que aspiram a vivcr sob a mesma lei. em virtuclc de origens. de tradi'r6es e de interesses comuns-. eo Estado provem de duns fonres clistintas.

A primeira e a Revolu<;ao Francesa, que deu aos cidadaos o sentimento de que formavam livrememe uma comunidade nacional , detentora da soberania, e que substituiu a fidelidade ao rei pelo am or a Patria. Ora, a Fran<;a revoluciomlria espa­lhou por toda a Europa esta concep<;ao liberal da na<;ao.

Proclamou em primeiro Iugar o <<direito dos povos a dispor de si mesmos», um principio que. ao fazer intcrvir a no<;ao de vontacle dos povos, se opoe a iclcia, vigente no Antigo Regime, que pretendia que a dura<;ao seja geradora de legitimi­dade.

Propos depois. impos mesmo, uma reorganiza<;ao da Europa assente teorica­mente nestes principios e que deu Iugar a cria<;ao de «rcpublicas-irmiis», depois Estados dependcntes do sistema napole6nico.

Por ultimo, suscitou junto dos povos <dibertOS» , depois sujeitos a tutela da Fran<;a, uma reac<;iio nacional que os levou a tomar consciencia de si pr6prios e, logo, a pretender sacuclir o dominio da «Grande Na<;1iO>> conquistadora.

Mas o rnovirnento das nacionalidades encontra igualmente a sua origem numa filosoria polftica que se inspira no regresso as tradi<;oes. Deste modo. para os re­presentantes cia corrente reaccionaria e romiintica que triunfa na Alemanha, ana­<;iio e uma realidacle viva. anterior a consciencia que del a tem os inclivicluos que a com poem e que mergulha as suas rafzes no passado cia comuniclacle gennanica. 0 folclore, os rnitos lendarios, o passaclo nacional consagrado c rnuitas vezes idea­li zaclo (das cateclrais g6ticas ao Santo Imperio e aos cavaleiros teut6nicos) , ali men­tam es tc conccito de espirito popular (Vo//.:geisT) que vai constituir o fundamento do naciotwlismo alemiio. enquanto que juristas c filc\sofos (como Hegel) afinnam que e ao Estado. c n:io its comunidades. que inc:umbe unilicar a na~ao.

Alias. na Boemia. na Hungria. na Croc\cia, na Pol6nia enos Balcas, por toclo o !ado oncle a hurguesia nao for suficiememcnte forte para dominar a corrente na­cional e onclc impcrarem as for~as tradicionais. o movimento das nacionalicladcs e>.primc-se com frequencia au·aves cia clefcsa da lingua, cujos aspectos originais

HJST6RJA DO StCULO XIX 155

os ni6logos e os gramaticos procuram encontrar. Os escritores dedicam-se a demonstra<;ao e clivulga<;ao da hist6ria, vi vida como uma realidade mistica, cujos epis6clios her6icos procururam exaltar, tomando alguma liberclade em rela<;ao aos factos. Por ultimo, a religiao clcsempenha tambem um papel importante, sobretudo quando a potencia ocupante pratica uma confissao cliferentc da nacionaliclade suhmetida. 0 que e, por exemplo. o caso cia Pol6nia e dos Balcas, oncle os povos cristaos (Gregos. Bulgaros, etc.) sao submetidos ao jugo clos turcos mw;ulmanos.

AGITACAO SERVIA E INDEPENDENCIA GREGA

Se, porum !ado, suscita o interesse ou o receio das grancles potencias, a deca­dencia do Imperio Otomano clcsperta, por outro. a esperan~a clos povos cristaos clos Bakas. Sujeitos ha tres seculos, OS Servios, OS Romenos, OS Bulgaros. OS Mace­d6nios, os Gregos, etc., conservaram a sua especificicladc, clcsignaclamente em materia religiosa. Se bem que o dominio turco se tenha revelado tolerante nesta materia, nao deixaram de sofrcr com o regime que lhes foi aplicaclo e que lhes proihia a posse de terras, montara cavalo e treinar exercitos. Receiam sobretudo a arhitrariedade e os rigores clos paxas provinciais- por vezes acompanhaclos de atrocidades e massacres- cometidos pelos janizaros. Conjugado com os efeitos do enfraquecimento do Imperio, este clominio ferreo mantem uma agita<;ao latente, sohretudo entre os povos fronteiric;os- Servios ou Rom enos-, que podem espe­rar receber o apoio dos Estados cristaos vizinhos, e sobretuclo o do czar, protector tradiciomil clos ortodoxos.

Em 1804, um motim agrario contra os janfzaros transforma-se, sob a au tori­dade de um rico negociante de porcos , Kara George, em insurrci<;ao geral dos Scrvios, clepois em guerra contra a Turquia. Durante varios anos, Kara George mul­tiplicou os exitos, ocupando a fortaleza de Belgraclo em 1806 e juntando-se aos russos que invadiram os principados. Mas, em 1812, quando Napoleao se mostrou amea<;aclor, o czar apressou-se a celehrar a paz com o sultiio (Tratado de Buca­reste), submetenclo os Servios a uma terri vel repressao. Tres anos mais tarde. uma nova insurrei<;ao concluzida porum outro negociantc de porcos, Miloch Ohreno­vitch, obriga o sultiio a reconhecereste ultimo como /.:ne: supremo clos Servios. mas somente em 1829, por ocasiiio dos problemas com a Grecia. e que a Servia con se­gue uma verclacleira autonomia.

As revoltas servias s6 pocliam encorajar os outros povos dos Balciis a sacudir o jugo otnmano: a comec;ar pelos Gregos, que ocupavam um Iugar privilegiado no se io do Imperio Turco. As guerras da revolu~ao c do Imperio, ao proibirem o comercio frances em aguas mecliterranicas. haviam. na verclacle. siclo lucrativas para as populac;oes helenicas. Marinhciros e armaclores tinham. a pouco e pouco, monopolizado o comcrcio mediterranico. implantaclo as suas col6nias em todo o Oriente e reuniclo imensas riquezas. que haviam originaclo uma burguesia for­tunada que niio tardou a aderir as ideias liberais . E do seu seio 4ue saem o poeta

Page 6: História do século XIX

156 PIERRE MILZA <' SLRGE BERSTEIN

Solomos eo escritor Corais, que. exilado durante bastantc tempo em Paris, csta­beleceu as regras da lingua grega modcrna. E igualmente nest a categoria soc ial que se constitui nos principios do seculo uma sociedade secreta, a Heteria. rcunindo re­presentantes de todos os meios sociais e contando com indmeros apoios junto dos dirigentes das gran des potencias, o do czar em particular. sen do um clos scus consc­lheiros. Capo d'lstria. originiirio de Corfu e cujo ajudante-de-campo, Ypssilanti. tambem ele de a~cendcncia helenica. cum dos princip<.~is dirigentes da Heteria.

0 primeiro acto da indepcndencia gregu cla-se em 1820. Uma tentativa abor­tada de Ypssilanti (e reprovada pclo czar) para invadir as provincias danubiana<> do Imperio Otomano constitui o sinal de subleva<;iio. lnstigados pelo arl·cbispo de Patras e por not<1veis filiados nas socicclades secretas. ajuclados pelos marinhciro' das ilhas que lan<;am sobre os n:wios turco> brulotes carregacios de p61vor<l. o<; Grcgos expulsam as tropas otomanas e proclamam. em Janeiro de 1822. em Epi­clauro. a independenciu cio pafs. Todavia. a falta de auxflio externo- o czar re­nunciou a in ten en'>iio pcrante a oposi<;iio conjugacia de Mettcrnich, dos Prussianos e dos Jngleses- e as divisocs internas dos insurrectos fazcm o jogo cios Turcos. Como apoio cie Mohamed Ali. cujo rilho, Ibrahim . ataca o Peloponeso. estes cs­magam a insurrei~fao e cntregam-sc a uma repressao reroz cujo epis6dio mais atroz, ?~massacres de Quios (Abril de 1822). provoca a inclignaf!<'iO de toda a Eu­ropa. E reconqui~tada a Moreia. Missolonghi e atacacla em Abril de I 826, ap6s uma clefesa her6ica cAtenas tetn de capitular em Junho de 1827, ap6s um cerco de nove meses.

A partir de 1821. rormam-sc sociedacles rilelenicas em diferentes pafses. com o objcctivo de dar a conheccr a causa dos insun·ectos e mobilizar os cfrculos di­rigentes. Escritores. artistas. diplomatas, militares vao, cleste modo, multiplicar os testemunhos cos npelos a favor clos Gregos. Em Frnn~fa. Delat:roix pinta os Massa­cres de Chio. Lamartine consagra a gestn de Byron na Grccia o Dernier Chaw d11 Pelerinagc de Chi/de Harold e Hugo cxclama em Les Orienrales: << Para a Grecia! Para a Grecia! Vamos. poeta, e preciso partir.»

Byron. atacado pelo esgotamento e pela cloen<;a. morre em Missolonghi , o.:m 1824. 0 coronel frances Fabvier. defensor de Atcnas, eo seu compatriota. You­tiers. o italiano Santarosa. o escoces Gordon. o ingles Cochrane. que comancla em 1827-1 828 a frota dos insurrectos, e muros ai ncla. tomam o partido dos Gregos e vem colocar-se ao servif!o cia inciependencia helenica. Portanto. nilo sao os sacriff­cios dos Yolunt<irios liberais que l'ao razer pesar a balanc;a para o lado clos Gre­gos revoltados. mas antes a iniciativa de Lllll autentico autocrara. na pcssoa de Nicolau I. que se tornou czar em 1825. Scm so.: prcocupar e>.ccssivamente como <<acorclo o.:uropcu>>. dirige. no ano seguintc, utn ultimata ao sui tao. exigindo-lhe a proclamw;ao cia indepcndcncia do> principados rome nos c da Servia. Os Gregos niio ,Cto m.:ncion<~dO> . nHt' o object i' u e claru: trata-,e de arrastar o Gm erno de Constantinopla para a guetTa e de tirar prove ito do conflito para estender a in rlucn­c·ia da RLb~ia a rcgiGn. Nao >e plKie con tar com a prcscn~a de Canning. que com­precndeu peri'cllarnente a lllanobra e se dispf>s logo a rrustn1-la. lel'ando it decisao do enl'io de uma !'rota anglo-!'ranco-russa que. em l'irtudc do Tratado de Londre' (Julho de I 827 ). tem a missao de impor a media~iio das potcncia~.

HIST6RIA DO SECUW XIX 157

Esta fon;a naval vem fundear na bafa de Navarone, proximo de Ibrahim. e, a 20 de Outubro de 1827. abre fogo sobre a frota egfpcia, afundando-a. Ap6s o que os Turcos sao atacados na Moreia por uma pequena expedi<;ao francesa, depois nu Asia Menor c na Tracia pelos exercitos russos. Em Scrembro de I 829, sao obri­gados pelo Tratado de Andrinopla a reconhecer a autonomiada Servia e ados prin­cipados rome nos- Moldavia e Valaquia- e a conceder aos Russos a passagem dos seus navios pelos Estreitos.

Entretanto. um protocolo assinado em Londres. em Marf!O de 1829. transfor-mara a Grccia- que aprovara uma Constituif!iiO e confiara a presidencia a Capo d'lstria- num territ6rio aut6nomo. Em Fevereiro de I R30, uma outra conven~ao ira estabelecer a sua indcpendencia absolura. No ano seguinrc. depois do assas­sinato de Capo d' Istria, que ~e tornou uma cspecie de ditador protegiclo pelos Russos, as potencias impor-lhe-iio um prfncipe cstrangeiro na pessoa do bavaro Otao. que vai entao governar o pais como monarquia absoluta.

A indepenclencia helenica assinala uma viragem na hist6ria do movimcnto clas nacionalidades. Tres dos membros da Santa Alianc;a haviam intervido para chegar a uma reivindicaf!iiO nacional contra um sobcrano legftimo. A Fran<;a pocle rejubi­larcom esta prime ira brecha nos tratados de 1815. Reimegrada no acordo curopeu. constata que a uniao dos venccdorcs da vcspera nao resistiu 11 crise descncadeada pel a insurrei~fiiO nacional grega. Por seulado. Metternich nao se engana quanto as conscquencias previsfveis cia sua vit6ria. A independencia grega. anunciara ele. daria o sinal cie uma imensa revolut;ao na Europa. Decorridos cscassos mcses sobre a sua realiza~ao . os Bourbon de Franc;a iri'io ser as suas primeiras viti mas.

........ A EXPLOSAO DE 1830

A rc\oluf!iiO parisiensc de Julho de !830 inaugura na Europa uma nova oncla de agitac;ao liberal e nacional. Todavia. excepto na Franf!a e na Belgica. csta brel'e cxplosao revolucionaria rcdundu em rracasso um pouco por todo o lado.

0 rei Guilhermc I nao lograra transfonnar numa na<;iio o rcino dos Paise~ Baixos. agregacio compos to por povos cujas linguas. rcligioes e interesses econ6-micos diJ'criam. Na Belgica. os Yaloes rranc6ronos e os Flamengo~ ncerland6-ronos niio conscguiam cntendcr-sc de modo algum. Mas esravam de acordo na rccusa de que os Bel gas, maioritariamente cat61icos. ficas,em soh a ale; ada cle utn ;;obe rano cail·inista e censuravam cstc Liltimo por g01 ernar o seu rei no com runcio­mirios na maior parte neerlanclcscs. Censuravam-no igualmcnte por orientar a su~t polftica ecotH\mica no scnticlo do li1 rc-ciimhio e cle ravorcccr. dcstc modo. os in­tercsses dos armaclores c dos cnmerciantes. Os de Gaml e Antuerpia ri cavct tn em 1·antagem. mas o~ inclustriai ' ,·aloes. que se prcparavam para criar uma impnnantc i ndttStria sidcrurgica c texti I. rcclama\ am alto e hom som das tax as protcctoras. Ate 1830. o movimento rcivindicativo mantem-,.,c. no en tanto. ba>tante rraco.

Ora. o anuncio cia rel'oluc;an parisiense transrorma bruscamcnte o cksconten-

Page 7: História do século XIX

158 PIERRE MILZA e SERGE BERSTEIN

tamento em embriao numa febre revolucion::\ria. Em Bruxelas , ao grito de <dmi­temos os Franceses 1» . a multiclao fica ao rubro, arma-se. hasteia a hancleira preta­-amarela-vermelha do Brahante e expulsa a guarni"ao neerlendesa. Guilherme I en ,·ta logo refon;os. mas estes apenas conseguem penetrar na parte alta cia cidade. enquanto tnn Governo Provis6rio se organiza e lan"a um apelo geral a insurrei"ao. A 4 de Outubro. uma Assembleia Constituinte proclama a independencia da Belgica e confere inst itui"6es liberais ao novo Estado.

Chamadas em auxflio. as potencias da Santa Aliam;a mantem-se impassfve is. Apcnas o czar Nicolau I se dec lara pronto a intervir. mas a revolta polaca para lisa toda e qualquer iniciativa nestc sentido. Par seu I ado. a Fran~a aplaude os aconte­cimentos de Bruxelas c nno lka im.cnsivel a Corrente de opiniiio que. nos dois paises. se pronuncia a favorda anexac;iio. Londres. cuja obsessiio c . ..:omo ,abemos. 'er Antucrpia nas miios Lie uma grande pntcncia continental , reagc vigorosamentc a este projecto. c Luis Filipe. que niio du,·ida que Lllll conllito internacional possa ser fatal ao seu trono aintla fr<\gi l. tem a astucia de rcnunciar a toda e qualqucr w­lcidadc de anexa~ao da Bclgica. Ncstas condic,:6es. o congres~o que sc reline em Londres. l'l11 Novemhro de 1830. ratifica a indcpcnclcncia helga. conferindo-lhe um estatuto de neutraliclade perpcrua garan tido por toda\ as potencias. Em Agos to de 1831. quando Guilherme ltetna reconquistar a Belgica c lan<;a as >uas tropa' ncste pats. o exerc.:ito !ranees. que imervcm para !he barrar o caminho. retira-sc logo que alcan~ada a vit6ria .

Pelo con tnirio. a revolw polaca salcla-se por um doloroso fracasso. Na pane desre pais que as panilhas J'inais do sccu lo XVIII. ap6s o Congrcsso de Vicna. atribuf­ram a Russia. a populac;ao bc:ncricia. a partir de 1815. cle tnn regime mais liberal que o das outr<l> nacionalidadcs do Imperio dos czarcs. Consena uma certa auto­nomia, possui o se u o r~amento. o seu cxcrcito. a sua asscmbleia (a Dicta) e a sua rcligiiio. maioritariamente ca t61ica. Mas a pr6pria manutcn~i'io destcs pri1·ilcgios exalta mais do que serena o senti mcnto nacional dos Polacos. Tam hem. quando em No1·cmhm de 18.11. Nicol au! p1·epara Lllll excrcito na Po16nia para ajudar o rei dos Pafses Baixos a rcprimir a insurrci<;ao helga. as tropas rcvoltam-se e c:-.pulsam o 'ice-rei Constantino. irmiio do czar. Em25 de Janeiro de 1835. a Dicta proc.:lama a inclepenclencia do pats.

Rec.:eando uma e ourra pel as suas panes cia Polonia. a Austria e a Prussia enten­dcm por bem vir em auxflio dos insu!Tectos. Em Franl,'a e em Inglaterra. I! muito vi1o o cntusiasmo pela causa polaca. As pessoas maniJ'cstam-sc nas ruas de Paris e de Lonclrc' com gritos de «Viva a Po16nia!» Ma>. pruclentes. o~ Gol'crnos re­cusam-'c a in ten ir de outra l'onna que nao seja no campo diplom~ilico. c em ,·Jo. Animaclos de Lllll intenso C tllu~iao.,mo patri6tico. OS Polacos ViiO J'a~.er Ullla rcsistcn­cia heroic a aos cxcrcitos do oar. mas opoem a pen as uma moclesta !'or.; a de oitcnta mil ~old ado-; aos ccnto c setenta mi I hon1cns hcmtrei naclos do general Paskicl'itc.:h. AI em disso. dil'iclcm-<;e entre << Vennclhos» c «Brancos». Os primciro' pretenclcm mobiliLar as ma,-;as at ra ves da conccssiio de Lllna rcJ'orma agraria c de institui~oes favonh·eis it!'. camadas populares. Os segundo:.. saiclos principal mente da nobrcza c doclcro. desconJ'iammenos docntrdo que o povo e estiio mais dispostos a hanno­nizar-sc com Nicol au I do que a dcixar ir por diante uma si tmt<;ao rc' olucionaria.

HIST6RIA DO SECUW XIX 159

Em principios de Setcmbro de 1831. o exercito russo ocupa Vars6via. Logo se a bare sobre a Pol6nia uma repressao muito dura: regime militar, supressao de todas as liberclacles, execu"oes, expulsocs. cleporta"oes para a Siberia. cncermmento das universidades. etc. Inumeros polacos refugiam-se nos Estaclos liberais do ocidente europeu.

Em finais de 1830 e no come<;o do ano segui nte. clesenvolve-se igualmcnte uma forte agita<;ao em alguns Estados a I emacs e na Italia cen tral. onclc revestc um can\cter manifestamente revolucio nario. Ecloclcm insurreic;ocs em Modena. Parma, Bolonha. contra Francisco d'Estc, a ex-imperatriz /vL.lria Lufsa co papa Greg6rio XVI, queacabadesubir ao trono pontifical. Em Frun~ao «Part ido do Movimcnto». prcssionado pelos lihcrai s italianos. instiga a interven~ao scm. no en tanto. c.:onse­guir arras taro novo soherano coo., partidarios de uma polftica conscrvaclora. Por­tanto. Mettcrnich tem as miios livrcs para restahe lecer H orclem e a soherania do;, prinr.:ipes lcgitimos na peninsula. Na Prima vern de 18.11. vintc mil so lcl aclos m~>.­triacos voltam a ocupar Parma. Modena e os Estado;, pontiricais. A lgun ;, 1ncs.:;, mais tarde, uma nova insurrcil,'iiO leva a ocupa~iio de Bolonha. enquanto que. para manter o equ ilfbrio clas potcncia;,. se instala ali uma guarnir,:ao lrancesa.

Vinclo na sequencia dos cia Po16ni3. este> do is acontecimentos lev amos monar­cas que se manti ve ram f'ieis ao espirito da Santa Alian'<a- o czar. o unperaclor da Austria eo rei cia Prussia- a concretizar. al!·avcs de urn acto so lcne. a sua von tade de vera actual si tua<;ao preservada ondc quer que csteja ameac;ada pelos liherais. Em Setembro de 1833. reunern-se em MUnchcngraetz e proclamam o seu eli rei to de auxiliar qualqucr sobcrano lcgitimo que partilhasse as suns ideias.

Enquanto que o bloco de potcncias abso luti stas reunc aqui n:, suas f'on;as para fazcr face aos movimentos liberais e nacionais. a Fran"a c ~ Inglaterra. ao ill\cs. conjugam esfor"os para f'aLer triunf'ur os princfpios constitucionais na Peninsula Iberica. 1m poem af. indo co nt ra os pretcndentcs ahsoluti>tas, os governos liberai:, da rainha l'l'!aria Cristina. em Espanha, e do rei D . Pedro. em Portugal.

Assim. nao obstame o;, obsuiculos levantudos par ocasiiio do Congresso de Viena pclos de fen sores cia ordemtrad ic10nal , a Europa da Santa Alian<;a soJ'rcu. clll

quinze anos. Llln !'one clesga>tc sob o impubo das icleias herdadas da t'ilosni'ia cia ;, Luzcs e dos principim, enunctados pelos homens de 1789. Scm clu\ ida. numa boa parrcclocontinente-emlt<iliu.naAicmanha.nal'ol6nia. on de Mettl.!rnich c oczar nao clcixaram dcscnvoh cr-sc nenhum J'crmcnto rc\'olucionano -. a rear.:~;'io rriunrou sobre as J'or.;as libera i;, c nacionnis. Emcontraparticla. csta~ levaram-na para a Fran~a . a Grer.:ia. a Belgtca e. clumntc algum tempo. a Penfnstlla lb~nca. Logo uma J'ebrc rcvolucionCiria 1aj desJ'eri r um ~wipe com outra amplitude no edt­ficin ultmconscrvaclor concebiclo pclo;, vcncedorc!. cle Napuleuo.

Page 8: História do século XIX

CAPITULO 11

........ A EXPLOSAO REVOLUCIONARIA DE 1848

Ern 1848. a Europa vive sempre de acordo com as situa~oes criadas em 1815 pelo Congrcsso de Vi en a, c a Austria do chanceler Meuernich co garantc desta or­dem. impedindo a manifesta~'ao dns novas fon;ns saidns da Revolu~ao Francesa, I iberalismo e principia das nacionalidades, que fermentamna Austria. na Hungria. na Alemanha e na ltalia.

A crise econ6mica dos anos 1844-1848 vai favorcccr uma vaga revoluciona­ria que se estende a toda a Europa. A queda de Mcucrnich, na A~stria, faz saltar a tampa e siio aprovadas Constitui<;6es na Austria. na Prussia e nos Estados ale­macs, na Ita! ia, enquanto que as aspira<;6es nacionais pareccmlevar a clesuniao, em 1815.

A ilusao ser<i bre ve. 0 exercito aus trfaco repoe a ordem no Imperio na llalia e na Alemanha. Basta a Austria intimiclar a Prussia para que ela renuncie ao seu pro­jecto de Estado alemao, criado por acordo clos principes. para que a orclem de 1815 se res tabele~a na Europa.

........ NAS ORIGENS DO MOYIMENTO REYOLUCIONARIO

Em 1848, a Europa cio Congresso de Viena mantem-sc no essencial. AJ-";enas a Belgic a e a Grecia consegucm alcan.;:ar a ~ua independencia (Capitulo I 0). E man­ticla a ordem de I R 15. em particular pel a Austr ia de Metternich. garante do sistema europeu da restnura<;iio. E.no entanto. emtocla a Europa fennemam as novas for.;: as que. em nome do> princfpios I iberai s c nacionuis hcrdacios do perfodo rcvolucio­nario. tcntam p6r em causa o:. aliccrce,., da Eumpa de 1815.

HISTORIA DO SECULO XIX 161

0 IMPERIO DA AUSTRIA, PEDRA ANGULAR DA ORDEM EUROPEIA

0 pod erda Austria nao se exerce apenas sabre os territ6rios do Imperio propria­mente ditos. 0 seu controlo e extensivo a maioria dos Estaclos italianos e a Con­feclera~ao Germanica, presiclida pelo imperaclor da Austria. Por todo o !ado oncle preclomina a inlluencia cia Austria. triunfa o absolutismo. excepto em alguns Esta­dos do sui cia Alemanha. sujeitos a intlucncia france sa e que constituem um enclave I iberal. AI em clisso. a aristocraciaconservou ou reencontrou os seus pri vi lcgios po­liticos c sociais, clominanclo um campesinato oprimiclo. A agricultura mantcm-se a actil'idacle economic a esscncial. A industria eo comercio nilo se clesenvol vem ao mcsmo ritmo que no Rei no Unicio e em Franc;a. Por esse !'acto. openirios c hurgue­ses constituem grupos menos numerosos e menos poclerosos no seio da sociecladc do que nos pafscs do noroeste cia Europa. Todavin. a burguesia tem consciencia de representar uma for~a do futuro. portuclora cia modernizar;ao da economia, factor de enriquecimento do paise motor de uma evolu~iio que as suas capaciclades in­telectuais a destinam a promover. 0 que a levu a reivinclicar os clireitos politicos aincla reservacios a aristocracia. Apoiada pclos estuclantes e os nucleos openiri os urbanos, reclama uma Constitui.;:iio. o direito de voto. as liberdaclcs de expressao c de reun iiio. Mas, como o chancelcr Mctternich estli no poder. nenhuma destas rei­vincl i ca~oes tem qualquer hip6tese de veneer. 0 regime autorit<irio que mantemno Imperio enos pafses onde a sua inlluencia e preponderante, beneficia, na verdncic, do apoio da nobreza, cia administ ra~ao, do clero, do exercito e cia polfcia. corpos que o regime favorece e que I he sao fieis.

No exterior, Metternich contu como apoio total do czar da Russia. Nicol au I, paladino clas ideias autoritarias e da autocracia. Toclavia, se no interior o regime tem pouco a reeear de uma oposic;iio liberal scm raizes rea is na sociedade, deve. no entanto. fazer face a nspira~ao clos diversos povos que eonstituem o Imperio, a alir­mac;ao cia sua iclentidacle. Tendo em conta a sua fraqueza perante o gigante aus­triaco, qualquer reivinclica.;:ao cle inciepenclencia afigura-se quimcrica, mas pod em reclamar mais autonomia e criar, assim, brechas no edirfcio imperial. 0 princfpio das nacionaliciacles surge en tiio como o fermento cia clissoluc;iio do imperio mul­tinacional dos Habsburgo. introcluzindo pela sua propria existcncia um gcrme destruidor num regime de absolutismo que niio saberia acomociar->c a seme lhant~s liberdacics locais.

A REIVINDICA~AO NACIONAL NO IMPERIO DA AUSTRIA:

HUNG RIA E BOEMIA

No Imperio cia Austria (que contava com R milhiies de alem<ies para unut po­puluc;ao total de 27 mil hoes cle habitantcs). c na Hungria que o problema rc vcstc maior acuiclacle.

Uibliot£.'<.':1 da lli<itUriu II'!- II

Page 9: História do século XIX

162 PIERRE MILZA e SERGE BF.RSTEIN

Neste pais dominado pela nobreza, o topo dahierarquia social e ocupado pela alta aristocracia dos magnatas (mile quinhentas pessoas ao todo), que monopoli­zam as altas fun9oes do Estado. Constituem a elite de uma nobreza de seiscentas mil pessoas que possuem terras que mandam cultivar por mil hoes de servos da gle­ba. A burguesia e pouco numerosa e pouco influente. Conquanto a lingua oficial do pais seja- o latim , a lingua magiar, lingua do povo, vai constituir o principal cimento da identidade nacional quando, em 1825. o conde Etienne Szechenyi funda a Academia Hdngara, para a clifunclir. A partir de en tao, passa a ser ensinada nas escolas e chega it nclministrac;ao. A sua ex ten sao favorece o nascimento de uma literatura romantica de inspirac;ao nacional e patri6tica quando ex alta Arpacl, o he­r6i lenclario cia nw;ao. Primeiro cstriramente liten\rio e sentimental , o movimento de renascimento magiar torna-se politico com a criat;1io de um partido liberal que. a partir de 1834, re<.:lama a liberdacle de imprensa, acriac;iio de um verdacleiro parla­mento eo clireito de este dirigir a economia da Hungria. Deste modo poderia cessar o clomfnio econ6mico de Viena, que obriga os Hlingaros a vender a Austria os proclutos agrfcolas e a Ia e a comprar-lhe os proclutos industriais fabricados com as materias-primas que fornecem.

IMPERIO ALEMAO

c;:;J Magrares

[Z23 Alemaes

~ Latinos (llalianos. Romenos) 0 200 km ' '

Toclavia. es ta oposir,-iio. simultaneamente ccon6mica. polftica c nacional , nan e homogcnea. Alguns , como os concles Szechcnyi e Apponyi , am bicionam uma emancipac;ao cultural e econumica ;,em reivinclicac;ocs polfticas. que assustariam Vicna. Outros liberais reclamarn um Governo de tipo ociclental com um regime parlamcnrar. Por Ctltimo. it \'Olta de Kossuth , tnn grupo de fervorosos nacionalistas

HISTORIA DO StCULO XIX 163

ousa reclamar a independencia. Este nobre hdngaro fundou em 1841 o Journal de Pest, porta-voz do Partido Liberal. Mas a convicc;ao de que uma alianc;a como campesinato daria ao movimento liberal e nacional maiores hip6teses de veneer vai leva-loa posic;oes muito mais raclicais. Rompendo com a nobreza, que retira uma grande parte dos seus meios de existencia (alias, mediocres) da propriedade dos servos, pronuncia-se a favor da elimina<;iio da servidao. Funda en tao o Partido Ra­dical , que estabelece como objectivos a emancipac;ao social do campesinato e a emancipac;ao polftica do povo magiar.

Se o nacionalismo hdngaro, que sea firma signi ficativamente a partir de 1840, reel am a a sua emancipac;ao, por outro I ado, contesta aos povos eslavos o direito de fazer o mesmo. Com efeito, a nobrcza hdngara despreza e odeia as populac;oes minoritarias dos territ6rios que domina, Eslovacos, Scrvios e Croatas. etc. , que considera pessoas inferiores, uma << turba de escravos» que clevcm continuar subju­gados. E assim que os Croatas se veem obrigaclos a substituir o latim pclo magiar nas suas relac;oes com Budapeste. Estas dissidencias sao do agrado da monarquia dos Habsburgo, chamada a arbitrar as tensoes entre os povos e nao hcsi tando em jogar uns contra os outros , a rim de manter o seu clominio.

0 senti men to nacional . muito forte na Hungria, esta igualmcme preseme entre os Eslavos, muito desprezaclos pelos Hdngaros. Na Boemia, o renascimento na­cional checo iniciou-se no seculo xvu1. att·aves de um movimento intelectual, ani­mado pelo fil6sofo amigo de Goethe, Dobrovsky. 0 romantismo imprime ai a sua marc a ao colocar a tonica no passado, atraves das obras do poeta Kollar e do his­toriador Palacky. Todavia, este renascimento nacional chcco nao e levado muito a serio, designadamente por Engels, porque e obra de uma minoria intelectual que fa Ia alemao (e muito mais dificilmentecheco), que e alimcntada pelaculturaalema e que apenas possui uma audiencia limitada. Ora, a situac;ao altera-se com a funda­c;ao, em 184 7. de La Gnzetre de Prague. que vai abranger um vasto publico urbano de burgueses e estudantes e democratizar o movimento. 0 seu principal animaclor, Havlitchek, empreende a educac;ao politica e nacional do povo << adormecido» uma vez que, afinna ele, << mai s vale agir pelo povo do que falar dele» eden uncia a aristo­cracia checa que, no pais de Jean Huss , on de o protestantismo se difunclia, cola bora com a nobreza alema e, alem cli sso, cat6lica.

AS ASPIRA~OES NACIONAIS NA ALEMANHA

Na vespera da Revolur,:ao de 1848, niio existe um Estado alemao, mas uma Con­federac;ao Germanica que reune u·inta c oito Estados sob a presidencia do impera­clor da Austria. Toclavia. a consciencia de uma nacionalidade alema encontra-se sobretudo nos meios intele<.:tuais burgueses. e vemos desenhar-sc uma oposic;iio ao clornfnio austrfaco. Esta oposic;ao nacional faz-se acompanhar de aspi rac;oes I ibe­rais que denunciam a ordem reacciom\ria mantida por Metterni<.:h.

0 dcspertur nacional alemiio. que nasceu da oposic;iio contra o domfnio napo-

Page 10: História do século XIX

164 PIERRE MILZA e SERGt; BERST£/N

le6nico, refor~ou-se ainda mais como romantismo. E a epoca em que e composto o Dewschla11d iiberalles e a filosotia de Hegel desempenha um papelmuito impor­tante no de§envolvimemo desta <dovem Alemanha», exaltando a fun<;ao hist6rica do Estado centralizado. Mas, de momento. este Estado ale mao niio passa de um so­nho eo unico elo entre os membros da Confedera~ao Germanica e a Dieta. sedia­da em Francofone. Esta assembleia niio possui quaisquer meios de fazer executar as suas decisoes, uma vez que niio ex iste nem governo federal. nem or~amento, nem exercito. nem tribunal. Est a carencia deixa, de facto, a realidade da au tori dade ao Estado mais poderoso da Confedera~ao. a Austria.

Contudo. ap6s a cria~ao do Zo/11·erei11, uniiio aduaneira organizada em redorda Prussia. surge uma outra Alemanha que se esteia nas realidades economic as e que actua em beneficio da Prussia. uma vez que quase todos os Estados alemiies estiio ai reunidos, a exccp~ao da Austria. de Hanover e clas tres cidades hanseaticas de Bremen, Lubeck c Hamburgo.

Pocleria o rei da Prussia, apoiado no Zol!l-erei11, encabe\ar uma Alemanha unit'icada'? Semelhante solu<;ao contaria como apoio dos protestantes e clos homens cle neg6cios. mas nao como dos pequenos soberanos ligados aos seus particula­ri smos e que. como os seus subditos que alcan~aram determinaclas li berdades. rccusam o ju$0 prussiano. Alem disso, nao poderia ser posta em pnitica a niio ser excluindo a Austria da enticlacle alema. Ora, os Habsburgo adquiriram ha v<irios se­culos uma autor idade consideravel, sc bem que existam na Alemanha partidarios convencidos da reconstituir;iio de um Reich unificaclo em rector do imperador da Austria.

Metternieh manteve-se hostil a este projecto de consti tui ~ao, em volta da Aus­tria, de um Estado nacional alemiio, pois , por aplicar;iio do pr6prio principio. todas as ou tras nacionalidades do Im perio reclamariam assemble ias e poderes que f'ariam perigar a au toridade do imperador sobre os seus subditos e a sua influencia na peninsula italica. tambem ela afectacla pelo fermento nacional.

........ A REIVINDICA~AO NACIONAL E LIBERAL NA IT ALIA

A peninsula iuilica encontra-se dividida em scte Estados, sem qualquer liga­<;iio con federal entre si. A Austria govern a praticamente a maior parte da !tal ia, quer directamente. como no rei no Iombardo-veneziano. cujo soberano eo irnperadorcla Austria. qucr inclirectamentc. como nos ducados de Parma. clc Modena ou da Toscana. nas miios de arquicluques austrlacos. ou no rei no cle Napoles. onde os Bourbon se esteiam nos Habsburgo. Apenas escapam a um contro lo rigoroso O>

Estauos da Igreja. que constitucm Lllll caso especial. uma vez que sao govcrnados pclo papa. chefe da catol iciclaclc (mas a Austria aprescnta-se como sua protccto­ra temporal) eo rei no do Piemontc-Sardenha, que conseguiu preservar-sc da in­rlucncia austrlaca.Mas. em todos os Estados. impera o absolutismo. Niio exi>tc em I ado nenhumuma assemblcia eleita . :\ economia manteve-sc arcaica. assl!ntando

HISTORIA DO SECULO XIX 165

essencialmente numa agricultura pouco produtiva. A miscria rein a nos campos, em particular no Centro e no Sui cia Italia. A industria da os primeiros passos noEs­tado piemontes. na Toscana e em Napoles, pelo que os burgueses e os operarios siio numerosos. Os camponeses constituem a esmagadora maim·ia da sociedade, mas siio dominados pelo clero e pela nobreza, mesmo que os direitos feudais nao tenham sido restabelecidos em todo o !ado.

Em todos os Estados da peninsula. a repressiio do movimento nacional surgido na epoca napole6nica e as pniticas absolutistas levaram a uniiio (mais for~ ada em ltalia do que nos outros paises) da oposir;iio liberal e da oposi\ao nacional que se confundem no Risorgi111enro (o despenar ou renascimento). a partir de 1830.

0 Risorgi111enro e. antes de mais. um movimento intelectual que nasce nas universidades e reune todos aquelcs que se opoem ao dominio austriaco e ao cles­potismo. Mas os mctoclos a usar para ex pulsar a Austria e a natureza clo regime que convcm instaurar provocam clivisoes intcrnas.

Sob a direc\iiO de Mazzini , um grupo cle revolucionarios resolvem cstahelecer uma Italia republicana c unitaria. Mazzini parte da ideia de que Deus confia a cada povo uma missiio, que consiste em concluzir a humanidacle pelo caminho do progresso. Considera que. nesta perspecti va, a Italia deve unificar-se para criar a «terceira Roma» que, depois da dos Cesares e da dos Papas, sera a << Roma dos Povos». Eeste oobjeetivo que atribui ao movimento porelc fundado, a <dovem lta­lia>>. a que da como eli visa «Deus e liberdade». Em seu en tender. e preciso come­c;ar a educaro povo, a fim de «clar aos vinte mil hoes de italianos consciencia da sua nacionaliclacle, de modo a que a insurreic;ao os encontre todos erguiclos contra os seus opressores». Com cf'eito. Mazzini s6 ve como solu\iiO uma insurrei~ao que ex pul se os Austriacos. ctapa anterior a unifica~iio no seio de uma federa\ao repu­blicana. Mandaclo prender pelo re i do Picmontc, em 1830. por terclivulgado as suns ideias. Mazzini vive no exflio clepois de sair da prisiio, em 1831. Durante quinze anos. ira multiplicar as tentativas de insurrei\iio, que frucassam succssivamente.

0 abadc Gioberti, que publica. em I R-D, De Ia Supre111arie Morale er Polirique des lwliens, preconiza uma outra solu<;iio: uma confedera~ao italiana colocada sob a pt·esiclencia do Papa e em que o Pic monte desempenharia um papel cle clestaque. Toduvia. a fraqueza da sua posic;iio reside na ausencia cle qualquer referencia 11 pre­sen~a da Austria na ltalia. obst:.iculo fundamental a execu\i'iO do seu projecto.

E esta lacuna que o conde Cesare Balbo vai tentar colmatar. publicando, em 18-f.f. Les Espem11ces d' Ira lie. A retirada da Austria cia peninsula iraliana podcria conseguir-se au·avcs cia via diplom:1tica. reccbenclo os Austriacos. em troca. terri­t6rios no Im perio Otomano. Esta falta de rcalismo politico e sublinhacla pelos contemporaneos. que baptilam ironic:uncntc o lino clc Balbo clc «As Esperanc;as de um Desesperado>>.

Muito mais marcacla pe lo realismo politico e a tesc de um oficial aristocruta. amigo do rei do Picmonte. Carlos Albc no. que ambicionu .:xpulsar a Austria da lu\li a atravcs de uma cruzada militar dirigida pelo rei clo PiemontL'. e que o trans­l'ormaria (c nao o Papa) no futuro sobcrano de lt tilia.

E~ta efcrwsccncia intelcL·tual em red or de u1na ideia de unidaclc italiana parecc hruscamente dever concrt'ti;.ar-'c com a nomca\iio do papa Pio IX. em I R.f6. Com

Page 11: História do século XIX

166 PIERRE lvi/LZA e SERGE BERSTEIN

efeito, este procede nos seus Estaclos a um certo numero de reformas (criac;ao clc um Conselho de Estado consultivo, criar;aocle uma Guarda Civil, censuraconfiada a Jaicos, etc.) que. niio obstante o seu caracter moclerado, originam u1n movimento de emusiasmo jumo dos liberais por contrastarem como imobilismo reaccionario que caracterizara ate entao o Governo pontifical. Tendo o Papa dado o exemplo, o rei do Piemontc, Carlos Alberto, resolve tambem efectuar reform as, eo grao-{lu­que da Toscana segue-lhe o exemplo.

A manifestac;ao cacla vez mais aberta clestas aspirac;oes nacionais e liberai s coincide, nos a nos de 1844-1848, com uma grave crise econ6mica que ;:ninge toda a Europa. Caracteriza-se por uma grave crise alimentar clevido a intemperies e a uma doenc;a cia batata. Mal esta terminou, da-sc uma crise financeira, assinalacla pela hancarrota dos especuladores sobre as acr;oes dos caminhos-Jc-ferro e dos comissionistas comerciais de Lone! res. A fait a de dinheiro lfquiclo ali ada a compra macic;a de cereais ex plica o marasmo industrial e comercial cuja consequencia eo desemprego e a baixa clos salarios. A miseria claf resultante causa um nfticlo mnl-cs­tar emre as populnc;oes. que pass am a mostrar-se atentas as exigencias de rclormas de elementos liherais e de correntes na<.:ionais. E neste contexto que se china Sici­lia. em Palermo, a 12 de Janeiro de 1848, o primeiro movimento revoluciomirio. Segue-se-lhe. em Fevereiro, a revoluc;iio parisiensc, cle muito maior alcance (Ca­pitulos 6 e 12). Impulsionaclo pel as aspirac;ocs liberais e nacionais, o movimemo revoluciomirio alastra agora como um rastilho cle p61vora, parecenclo levar para sempre a ordcm de 1815.

........ A YAGA REYOLUCIONARIA NA EUROPA

A REVOLU~AO NA AUSTRIA (MAR~O-OUTUBRO DE 1848)

E um fen<imeno complexo. que justapoe uma re vol uc;iio pol ftica liheral na Aus­tria propriameme dita a revolu~oe5 de caractcr nacionalnos povos submetidos do Imperio.

Na Austria. a agitar;ao liberal eclode em 13 de Marc;o de 1848 . ap6s a revolu­~ao parisicnse. Estudantes e burgueses manifcstam-se contra a politica de l'vle ucr­nich. o que origina confrontos com a tropa. Com a en trada em ccna do clemento popular. o 11101·imento eli runde-se . Mcttemich p1·ctendc organit.ar a repressao, mas e impcdiclo pcla oposi~i.io clos arquiduques. 0 chanccler dcmite-se entilo c abanclona Yiena. A 15 de l'vlar~o. o imperador Fcmando concede a libcruaclc de impren~a e a cria~ao de uma Gum·da Nacional. o que se rcvela insuricicnte para acalmar a agita~·ao. A 15 Lie Abril. o imperaclor resigna-se a prometer uma Cons­titui ~ao. que c puhlicaua a 25 de Abril. scm que o povo tenha sido consultaclo. Os

HISTORIA DO SECULO XIX 167

elementos radicais consideram-na insuficiente e os tumultos prosseguem durante o m~s de Maio para exigir uma assembleia unica, eleita por sufragio universal. 0 Governo decide entiio convocar um Parlamento, eleito por sufnlgio universal. e atribuir-lhe o poder constituinte, enquanto que, a 15 de Maio, a Cone troca Viena por InnsbrUck.

A queda de Meuernich e a vit6ria clos liberais, em Viena, encorajam as reivin­dicac;oes nacionais, que cliio origem a movimentos revoluciomirios, sobrellldo na Boemia e na Hungria.

Na Boemia. o; Checos nao que rem tornar-se independentes da Austria e recla­mam a pen as uma grande autonomia. A 8 de Abril, o Governo proclama a Carta da Boemia, que confere a igualdade das linguas alemii e checa no ensino e na admi­nistrac;ao. A 2 de Junho. reune-se em Praga Lllll Congresso pan-eslavo. Denuncia os projectos da «Grande Alemanha>>, que submcteriam os Eslavos aos Alemaes. e as pretensoes hegem6nicas clos Magi ares. Mas rejeita tambem a icleia, lanc;acla por Bakunine, o unico participante russo, cle uma federa<;ao pan-es lava e afasta qual­quer recurso a for~a. Mas a reuniao do Congresso ocasiona manifesta~oes de rua. Estas recruclescem de violencia a 12 de Junho, quando se sabe que o prfncipe Win­dischgratz vai chefiar o exercito da Boemia.

Na Hungria, os Magiares aproveitam a queda de Menernich para exigir um Governo aut6nomo. A 17 de Marc;o, o imperador cede. permitindo a Hungria um Governo responsavel perante a Dieta. 0 conde Bathanu, um liheral, forma cntao um ministerio, que inc lui sobreLUdo moderaclos. mas onde esta tambem Kossuth . A Hungria torna-se, en tao, um Estaclo aut6nomo da Austria, com uma nova capi­tal, Peste, uma Constituir;uo que I he confere um estatuto particular. com uma Dicta cuja camara baixa e eleita por sufn\gio censit:irio, senclo os eleitores obrigados a fa lar 0 masiar, exercito pr6prio, moeda c rcpresemar;iio no estrangciro. Ja s6 e aliada cia Austria pela pessoa do monarca. Mas este ex ito dos Hlingaros vai ser comprometido pelo problema clas nacionaliclades minoritarias que reprcsentam 54o/c cia populac;ao hungara e a quem os Magiares se recusam a conceder vantagens equi valentes as que eles pr6prios acabam de obter de Vi en a. Esta recusa resulta em protestos dos Romenos, que enviam uma dclegac;ao a Viena, e clos Scrvios. que Kossuth silencia fazendo entrar tropas magiares no seu territ6rio . Mas a agitac;iio mais perigosa e ados Croatas. 0 governador. Jellachitch. convoca a Dicta. que rc­clama a criac;iio de um Estaclo eslavo do Sui. Kossuth pede entao n Dicta ht1ngaru que aprove um recrutamenw de tropas comra os Croatas.

As nacionalidades oprimiclas pelos Hungaros viio encontrar hostilidadc por parte da Corte cle Viena. que procura rctomar a iniciativa. Em Setembro de 1848. o assassinato. pel a mulliclao hungara. do governador moclerado enviaclo por Viena. o conde Lamberg , pro\·oca a rotura entre a Corte eo Governo ht1ngaro. A 3 cle Ou­tubro. a Corte decreta o estado de sftio na Hungria c encoraja Jellachitch a pcgar em armas contra os Hungaros. Estes (dtimos. em conson<1ncia com os democrat<l> de Viena, i'omentam enti.io uma nova agita~ao na capital austrfaca. obrigando a Corte a fugircle novo dacidade. 0 Imperio Austrfaco parece em vias cle se desmcm­brar. Os Alcmaes e os Italianos iriio aproveitar esta oportuniclade.

Page 12: História do século XIX

168 PIERHE MILZA e SERCF. /JEHSTEIN

AS REVOLUCOES LIBERAlS E NACIONAIS NA IT ALIA

Napenfnsula italiana.ja agitadapelaucc;ao reJ'ormadoradePio fXe pclos movi­mcntos Iibera is do rei no de Napoles. a rcvolu9iio J'rancesa de Feverciro provoca um recrudescer da eJ'crvesccncia popular.

A 4 de Man;o. o rei do Piemonte. Carlos Alberto. contcrc um estatuto consti­tucional que se tornan'i. a partir de 1866. a Constituic;iio Jn Tt;\lia uniu\ria. A 14 de Marc;o, o Papa promulga. por sua vez. uma Constitui'<no que cria Lllll co nse lho legislativo de recrutamento censit;\rio.

Mus sobretudo a fuga de Metternich e a rel'ulur;ao de Viena viio estimular em llalia um l'asto movimento nacional antiaustrfm:o. Em Yeneza. umtumullo libena o aul'ogauo Man in. detido pel a polfcia austriaca, que chcfia um Governo proviso­rio e proclama n RepLiblica. As tropas austrfncas cvacuam emiio o Veneto. Em Miliio, de 18 a 22 de Maio (os <<Cinco DiaS >> ). as ruas em;hem-se de barricaclas. Os vi nte mil homcns do marechal Racletzky concentram-se nas pnu;as-t'ones do <<quaclrilatero», cnq uanto que os mocleraclos tomam o poclcr.

A derrotade Radetzky provoca a quecla dos principais protegidos pel a Austria. e OS duques de Parma e de Modena rogem.

Em face desta desiLKll'<iio do pocler austrfaco, o futuro pnrece pertcncer ao rei do Piemome-Sarclenha. De toclas as panes, as vozes clos patriotas italianos er­guem->c para peclir a Carlos Alberto que encabece a cruzada contra a Austria eo jornalista Cavour afinna-lhe que chegou a hora da monarquia sarda. clescle que re­ve le aud~\cia e nao recue perante a guerra. Carlos Alberto est<1 reticente. pois recc ia razcr o jogo do> republican us. co exercito austriaeo, sempre prcsente na lt;\lia, c muito rune. Dccidc-se final mente a dar o passo declarando guerra a Austria cas suas troJXb invadem a Lombardia. comando, diz ele. com a ajuda de Deu> para p6r a IL<1i ia em condir;ocs de agir por si ( lwliafaru da se). Recusa tambcm o auxilio da Franc,:a. porque e republicana c por recear que exija a Sab6ia como compensac;ao pelo scu apoio.

0 rei do Piemonte recebe o auxilio clos patriotas italianos. Vintc c cinco mil vo­lunt:irio:-. acorrem de toda a ltalia para apoiar os seis mil :-.oldaclos piemonteses. e o general Durando traz um colllingcnte de tropas pontitkais. niio obstante a opo­si~iio do Papa. que >t: rccw.a a dcclarur guerra i1 Austria cat6 1i ca. perdenclo. dcstc modo. toda a popularidade. Ape>ar da conccnt rac;ao dos Governos de ~liliio e de Vcne7a. esta resistcncia do Papa cnl"raquece o JllO\ imento nacional italiano. En­coraja o n:i de NC!pu lcs. Fernando ll.que dc:-.cncadeia. a 15 de f\1aio. a rcac~iio pol i­tica no:-. !\CU> Estado, . onck dissoil c a Cfunara e !"CLine o scu contingcntc . que :-e cnconlra na Lomb~1rdia . .!pen <~> doi' mil IHlll lC ll> ClllllJnuam a 'cguir o general Pepc.quc pros,cgue <~I uta ao ladtJdu rei do PicnHlnlc. A 3Udc f\,laio. Ca rl os Albcrtll entra Clll !'vl iliio. r\ Lombardi a c libcrtada. Jlla> a-; ror~·as austriacu> t"icam intacta,.

HISTURIA DO SECULO XIX /69

A REVOLUCAO NA ALEMANHA (MARCO-JUNHO DE 1848)

A semelhan~a cia Italia. o movimento e liberal e nacional. Os movimentos liberais part em do Sui da Alcmanha, on de a inlluenc ia do libe­

ralismo frances e forte, e ganham progressivamente o Norte. Em Baden. Wunem­berg, Hesse-Nassau. Saxe. as manilestac;oes que se seguem a revolu~ao parisien>e de Fevereiro levam i1 realizw;ao de reronnas liberais. Na Baviera. o rei Luis I. clesconsideraclo pelos escfmdalos cia sua vida privaua e a sua liga~ao com a dan~a­rina Lola Montes. que se imiscufa com desenvoltura nos assuntos do Estado. e obrigado a abdicar em favor do seu rilho. Por ultimo. na Pnhsia. os Berlinense>. muito cntusiasmaclos com os acontccimentos de Yicna, concentram-sc eli ante do Pal;\cio a I 8 de Man;o e en tram em confronto com as tropas que o guardam. Ha eli versos monos. A 19 de Mar~·o . o rei Frederico Guilherme IV ordena a retiracla das Lropas c promete uma Assemblcia Constituintc, eleita por su t·ragio universal. Esta reline-se a 22 de Maio.

Antes mesmo clos aconlecimentos Je Viena c de Berlim, os liberais e os racli­cais do Sui da Alcmanha descncaclearam um processo de rcaliza~iio Ja uniclade nacional a lema. Alguns liberais (em numero de cinquema e um) reuniclos em Hei ­clelbcrga a 5 de Mar'<o de 1848. reclamam. na l'erclade. a elei ~iio de uma Assem­bleia Nacional alema. Conriam a uma Comissao pcrmanente de sc te membros a missao de reunir um pre-parlamcnto (Vo rpar/am enf) encarregado de preparar a> elei~Ocs para es ta assembleia. A 31 de Marc,:o. o lf01parla111enr reune-se em Fran­corone. Deveria congregar todos os membros clas asscmbleias locais alemiis. Na rcalidacle , em quinhentos e quarenta e sc te delegados. trezentos e quatro sao par­I amen tares do Sui e do Oeste. enquanto que os prussianos (cento c quarenta e um ) cs tiio sub- rcpresentados e siio quasc que exclusivnmente oriundos da Rcnfmia. Quanlo aos austrfacos, sao apcnas do is. 0 Vorparla111enr propoe a e lci ~iio de uma Assembleia Constituinte alemii. i1 rnzao de um deputado para cinquenta mil ha­hilantes. se n do o eli rei to de voto confc rido a qualquer ale milo maior e indepenJente (o que pocle levar ao suJ'n\gio universal, mas pode tambcm pennitir o ara,tamento dos salariados) .

0 Parlamento de Franco rune. eleilo segundo estes moldes. rcLine-sc no dia I :5 de Maio. Dcvcria con tar com oitocentos e u·inta cum dcputados. mas o~ chccos rc­cusar;-~m-se a participar e apenas sc reuniram quinhentus e oitenta deputado,. do> quais dul'ento> pela Pnissia e ccnto c vinte e Lllll pela Au:-. tria . Elcgt? como prc­sidentc Heinrich \'On Gagen1. prussMilo natural do Hcs>c. Os dcputados tcm de enrrcn lar um problema duplo : um problema de C>trutura, to Estaclo alcmiio -.cni unil<irio ou lcderaJ·.'I cum prohlclll~J de n.:gimc trcpLihlica oumonarquia. c. ncsta Liltima hiptitcse. quem seni o Jnonarc<J'~)

Surgcm trcs tendcncias:

- 0 partido republi cano. que d.:-seja un1 Estaduunit<1rio. Lilli regime par­lamemar e a instaura~iio do sufdgio univcr-;al :

Page 13: História do século XIX

170 PIERI?£ Mll2A e SEJ?CE BERSTEIN

.. - Ao contrario, a direita defende um Estado federal e uma monarquia com poderes alargados;

- No centro, o grupo mais importante e constituido por liberais monar­quicos que pretendem um Estado fcdl!ral dirigido porum soberano e um Parlamento eleito por sufragio censitario.

A 29de Junhode 1848, o Parlamento elege um Go"' 'Provis6rioclirigido por um coadjutor do Reich. cargo para o qual e clesignado o arquicluque Joi.io ( 1782--1859). o mais popular dos Hahsburgos, dccimo terceiro lilho de Leopoldo II e tio do imperador regente Fernando I. Estc prfncipe. reputado de liberal, precipitou a queda de Metternich. de quem era adversario. A 12 de Julho de 1848, e abolicla a Dicta cia Confedera<;ao Gem1anica. Mas o arquiduqucJoao nao dis poe nem de pol i­cia, nem de exercito, que ficaram sob a autoridade dos Estados. Forma, em Franco forte. o primeiro Governo cia Alemanha uni ticacla, prcsidiclo porum prin­cipe bavaro. Karl von Leiningen ( 1804-1856), Governo em que toclos os ministros (cxcepto um) pcrtencem ao Parlamento e que nomeia funcionarios do Imperio e cmbaixadores.

Mas a fon;a do Parlamento de Francoforte assenta em grande parte nas diticul­clacles das monarquias autoritarias, em conflito com os movimentos revoluciona­rios. Ora, a partir do Yerao de 1848, a vaga revolucionaria estencle-se por toclo o !ado.

........ 0 TRIUNFO DA REACCAO

A REAC~AO NO IMPERIO DA AUSTRIA

0 Imperio cia Austria parecia conclenaclo a rebentar sob a ac~ao clas for~ as na­cionais e ao clesabamento interno face a investicla liberal. A sua salva~ao vai ser o exercito. que se manteve fie! aos Habsburgo e que nao tarcla a retomar a iniciativa.

Na Bocmia. as escaramur,:as entre guarclas nacionais chccos c solclaclos aus­triacos provocam a morte da princesa Winclischgriitz. atingicla por uma bala perclicla. 0 com andante das tropas da Boemia mancla en tao as suas tropas cvacuar Praga. bombardeia a ciclacle. que reconquista militarmente. clissoll'e o Congresso pan-eslavo e institui em tocla a Boemia uma clitaclura militar (27-28 ell! Junho de 1848).

A ckgrada~ao da situa~;}o em Yiena. em Outuhro de 18-+8. ap6s o assassinato do ministro cia Guerra. Latour. co tumulto provocaclo pclos democratas vienenses leva a Conca ahandonar a capital. indo para Olmlitz. on de sccoloca sob a protec<;iio do principe Windischgrii t7 .. Estc. depois deter reccbido refon;:os de ltalia. cnviaclos por Racletzky. marcha >obre Yiena e ocupa-a em I de Novemhro. As rcpres~ilias

HIST6RIA DO SECULO XIX 17 I

sao sangrentas. Um deputado do Parlamento de Francoforte, Robert Blum, e fuzi­lado, nao obstante a inviolabiliclacle parlamentar clccrctada pelo Parlamento.

0 principe Schwarzenberg, cunhaclo de Windischgratz, torna-se chanceler. Consegue e abclicar,:ao de Fernando I. que ceclera aos liberais e aprovara uma Cons­titui<;iio. e faz proclamar imperador o sobrinho de Fernando, filho cia arquicluquesa Soria, Francisco Jose, com 18 anos de idacle. Na verclacle, e o chanceler quem govern a. A sua intenr,:ao c restabelecer um Governo forte na Austria, tirmar a sua influencia na lt<\lia e na Alemanha e veneer os Hungaros.

A 7 de Marr,:o de 1849, o exercito ocupa a sala de sessucs do Reichsrag e dis­persa os cleputaclos. Ignorando a Constituir,:ao preparada por estes. Schwarzenberg manda proclamar, atraves do imperaclor. uma Constitui~ao outorgada que se apli­ca a totalidadc do Imperio. inclusive ao rei no Iombardo-veneziano e a Hungria. 0 scu canicter unitario soa como um clesat'io lanc;aclo aos revolucionarios hungaros e ao Parlamento de Franco forte. Permite um Parlamento eleito por sufragio restrito. mas que dispi.ie de poderes muito limitados. Na realiclade, est a Constitui<;ao apenas e consicleracla pel a monarquia austriaca como um expecliente. A partir do momcnto em que a autoriclade imperial e restabelccicla na Hungria e na Alemanha, o impe­radorcria um Conselho de Est ado que pre para um novo regime cujos princfpios sao expostos na carta de 31 de Dezembro de 1851 , a que chamaremos de o <<sistema Bach», do nome do seu principal redactor, o ministro do Interior.

A caracteristica essencial das novas instituir,:ocs e a sua centralizar,:ao. Um corpo de funcionarios clepenclentes directamente de Viena assegura a unidaclc po­litica e econ6mica do pais (sao aboliclas as alfanclegas entre os eli versos territ6rios). Ali<1s, uma vez queos camponeses conseguiram a abolir,:iio do regime feudal,toclos os habitantes do Imperio sao agora cicladaos iguais . Nao existem mais privilegios cia nobreza, nem corpos intermedios servinclo de separar,:ao entre a popular;;ao eo soberano. Por conseguinte, a monarquia sai reforr,:acla.

0 clesaparccimento clas vel has estruturas feuclais confere ao Imperio Austria­co a forma de um Estaclo moderno. mas no seio do qual as concepr;ocs polfticas sao ainda as do passaclo. Com cfeito, a autoriclacle encontra-se tocla nas maos do sobe­rano, nao existe qualquer liberdade. a aclministra~ao esteia-se na policia e no excr­cito, os funcionarios sao vigiaclos e a imprensa amorda~ada. Por outras palavras. a seguir a revolu~ao de 1848, o regime austrfaco eo nco-absoluti smo ainda mai> autoritario que antes, uma vez que se clotou de meios que o tornam mais ef'icaz. Oeste modo, e alcan9ado o primeiro objcctivo que Schwarzenberg se propuscra.

Resla restabelecer a autoridade imperialna Hung ria, na lt ~il ia e na Alcmanha. A decisiio tom ada pel a monarquia clos Habsburgo de suprimir os pri 1·i legios de que o rei no da Hungria bcncficiava antes de I 848 raclicaliza a oposi<;ao clos Hungaro>. chef'iados por Kossuth. Estc raz que a Dieta cia Hungria VOle. em 1-t de Abril de 18-t~. a quecla cia clinastia e a i ndependcncia da RepC1bl ica Hungara. Em !'ace desta dctcnnina~ao cruel de m Hungaros dcl'cnderem a sua libl!rcladc. Schwarzellhcrg decide pcdir auxflio ?1 Rus,ia. 0 ct.ar aceita c l!nvia o seumclhor gene1·a1. Pa:;kie­vitch. a caber,:a de ccnto c cinqucnta mil homens. em auxflio do cxcrcito austrfa-:o comanclado pelo general Haynan. conheciclo pela repressao atroz que cxcrceu na ltalia. Russos, auslrfacos e croatas de Jellachitch conscguem veneer a resis tcnci3

Page 14: História do século XIX

172 PIERRE MILV. e SERG/o.IJERSTUN

dos Hungaros, que capitulum em Vi lagos a 13 de Agosto de 1849. Hay nan encarre­ga-se das represalias. mnnd<~ndo fuzilar generais e homens politicos. A 17 de Ou­tubro de 1849. e nbolicla a amiga Constituir,:ao hungara. A Hungria tic a reduzida i1 categoria de provincia. Schwarzenberg restabeleceu a orclem no Imperio dos Habsburgo. Nesta data. a Italia e vencedora e a intluem:ia de Viena predomina de novo af.

A REAC~AO NA IT ALIA

A partir de 25 de J ulho de 1848. omurec.:hal austriaco Radetzky esmaga o exer­cito piemontcs em Custozza. Carlos Alberto c ?brigado a abanclonar Milao c a 9 de Agosto tem cle assinar o armistfcio com a Austria. 0 fracasso cle Carlos Al­berto leva os republ icanos. que nao haviam qucriclo ate en tao instigar o movimento nacional italiano. a tentar rctomar por sua iniciativa as aspira<;oes nacionais, ocupanclo o poder nos tres Estados. Em Vcneza. o advogaclo Manin proclama a «Republica de Sao Marcos» c, como auxflio cia populw;:ao. resistc a ofensiva aus­triaca ate 22 de Agosto de 1849. Em Florenr,:a. como o grao-duque fugiu. a Repu­blica e instaurada em Janeiro de 1849. Em Roma. o papa Pio IX chamou ao podcr um moderado, o conde Rossi. Mas este e dctestado tanto pelos cardeais, porque se recusa a abolir a Constitui<;i.io. como pelos democ.:ratas, porquc entendc clever man­ter uma ati tudc prudente em relar,:ao i1 Austria. E assassin ado em 15 de Novembro de 1848. e co sinal de uma insurrei~ao popular que ~x ige do Papa a constitui~iio de um Govern a democrata e adeclnrar,:ao de guerra a Austria. Pia IX , que nao pode aceitar f:uer o que a sua con;ciencia rejeita. foge e vai c.:olocar-se soh a protecc,:i1o de Fernando ll (que, durante o Veriio. rcstabelec.:eu o podcr pel a fore,: a. o que !he 1·a!e o cognlllnc de /?e Bo111ba) em Gaete. E en tao in stauracla uma republica em Roma, cuja dirccc,:ao e assumida por Mazzini.

0 rei do Picmonte. Carlos Albenu. resolve retumar a guerra contra a Austria. lni benel"iciar clas dilic.:uldades clc Vicna na Hungri a. scm ignorar. nn entanto. que nao c::.td em c.:ondi<;iics de venee r com um excrcito mal enquadrado e sem auxflio do exterior. Ma;,. para prcse rl'ar o ruturo da dinastia de Saboia. ace ita :1rriscar o seu truno. Venciclo em Nm ara a 23 de Marc,:o de I R-19. abclica no campo de hatalha a ra10r do SCU rilho \'ftor f\Janu<'!I]J. f\ICSillO l'encida. a clinastia piemonte;a !Cia. de,tc modu. para lt :.ilia as cspcranc;as de uma idcia nacional.

Gra<;a-; ~~ i ntcn en\iiO da Fran<;a c d:1lnglaterra. a Austria dcixa i ntacto oterrit<i­rio picmont~s c ,.\llllenta-sc comuma indemniza<;iio de guerra. Ma;, ocupa os du..:a­dos de Parn1a c tk l'vludcna. c dcpois a Tm,·an:L l"ixandn alios -,obcran<b. Entra dc seguida 110 none do:-, Est:lclo-, pont i i"ic.:ai;,. em Bolonha c na Rom ana e aprcs-.a-,c a 111arch:lr 'uhre Runu E prcccdida peltb Franceses. pois o prcsidcnte da Rcpti­blic.:a. Luis Napolcao. ,Jc,·idiu en1·iar unw cxpcdic;iio c.:untra a Reptiblica Roman:~. cmtwc.:a d.:: llllla promcssa clo Papa de: mandar c!Cc tu:~r rct"nnnas nos -,eu' E,;tado,. uma WI rccupcrado n 'cu trono. A 30 de Junho de I !->-19. o cxcrcito do general

HISTORIA 00 SECULO XIX 173

Oudinot ocupa a cidade, clepois deter venciclo as tropas republicanas comandadas por Garibaldi.

Niio obstante os protestos de Luis Napolei.io Bonaparte. Pia IX recusa toda e qualquer reform a. As tropas frances as ocupam entao Rom<L cnquanto que o secre­tario de Estaclo. o cardeal Antonelli, organiza a reprcssao e enche as prisoes. No momento em que Pio IX rec.:upera Roma, em Abril de I K50, a repressao triunfa em toda a Ita! ia, excepto no rei no do Piemonte-Sardenha on de. apesar etas pressocs austriacas. o novo rei mantem a Constitui~ao. Este rei no torna-,e. assim. o centro de reuniao clos patriotas italianos. agora con venc iclos cle que a unidade italiana nao pocleni proc.:essar-se senao gra~as a um auxflio exterior.

A REAC~AO NA ALEMANHA

Inicia-se na Prussia, onclc Frederico Guilherme IV, rcfugiado em Potsdam. aguarcla o momenta de poder rctomar as concessocs que lhe roram retiraclas. Apoia-se nos gran des proprietarios de terras que se recusam a ser integrados numa Alemanha dominadn pelos homens politicos do Oeste e do Sui e que receiam que os clemocratas de Berlim possam vir amea<;ar os seus interesses, liberalizando a proprieclacle e submetendo a nobreza ao i mposto predial. A 5 de Dezem bro de 1848. Frederico Guilherme dissolve a Assembleia e aprova uma Constitui~ao que preve um Parlamento com duas dmaras. mantendo-se, toclavia. nas suus miios o essen­cia! do pocler.

0 Parlamento de Franco fane, centro do movimento unitario. encontrn inume­ras clificuldndes. A prime ira consiste em estabelccer os limites eta co nfcdcra<;ao. 0 Pari amen to quer que sejam os maiores passive is. abrangendo todos os povos de lin ­gua alema, o que provoc.:a protestos em Fran~ a, nos Paises Baixos. no Luxemburgo. na Russia e, sobrctudo. na Dinamarca. em virtude eta vontnde do Parlamento cle incluir os ducados dinamarqueses de Sleswig e de Holste in. Devera rcnunciar fi­nalmente as suas ambir,:oes assim que a Prussia. que accdera ao auxflio politico e mil itar. ass ina em Agosto do 1848. sem sequero consul tar. a Conven<;iio de Malmo. que regulamcnta o problema clos ducaclos.

Segunda dificuldadc. o revcs sofrido no caso clos duc:~dos proporciona :~os cx­tremistas de esquerda a ocasii.io de ten tar um p111sch 1 C.:OIHra o Parlamcnto e como cste nao possui nem clinhciro, ncm pnlicia, nem excrcitn. tem de pcdir auxilio a<» Governos da Bavicra c da PrLISSia. para pGr lertno a agita~:1o. Todal·ia. 0 prcstigio moral do Parlamento sai diminuido.

Somente em J"inais de Outubro clc 18.:18 o Parlamento de Francnrone. que se rcu­nira a I X cle Maio. come<; a a abordar o debate sohrc a Colhtitui<;iio clo Reich. uma vez reso!l·idos os conllitos ,ob1·c as frontl!iras. e >uspcndc a opo-; i ~:1o de cxtrema­-csquercla. Ora. o problema cedo sc rc1·ela in,;uilhTI. Com .:rcitu. exi-;tcm duas

1 Termo alcmJo que ,ignifica uma ,ublc' ;l~Jo d~ tun grupo polflicn arm ado. IN doT. J

Page 15: História do século XIX

174 PIERRE N/JLZA e Sr7RGE BERSTEJN

concep~oes opostas. De umlado. os partidarios da <<Grande Alemanha>>, que que­rem organiza-la sob a al~ada da Austria: do outro. os da <<Pequena Alemanha». que son ham reuni-la a volta da Prussia. Como a dinastia dos Habsburgo estava emnu1 posi'<ao no Outono de 1848. sao os partidarios cia <<Pequena Alemanha» que vencem. e. quando a revolta hungara atinge o seu auge, em Mar~o de 1849. o Par­lamento de Francoforte aproveita a situa'<ao para eleger Frederico Guilherme IV , imperaclor da Alemanha. A Austria protest a. Da-se en tao um golpe de teatro: o rei da Prussia recusa esta coroa, que qualifica de <<cliadema de papel>>. Com efcito, perspectiva apenas uma coroa proposta pelos prfncipes. Eo fracasso total para o Parlamento de Franco forte.

A Austria e clepois a Prussia re(mem os seus deputados. Os cento e dez eleitos que restam refugiam-se em Estugarda. no mais democnitico clos Estaclos alemiies que, no en tanto, os faz clispcrsar pel a tropa, a 18 de Junho de 1849. 0 tim do Par­I amen to de Franco forte significa «O fim de um sonho de unificac;iio alema atraves de nH~toclos liberais e democn1ticoS >>.

Frederico Guilherme IV recusara uma coroa que I he fora oferecicla pelo povo. mas nao renunciara a ideia de a obter dos prfncipes alemaes. Para alcan<;ar este objecti vo, avam;a por etapas . Primeiramentc. a 26 de Maio de 1849, Ian<; a <<a uniao dos tres reiS>>, da Prussia, Saxe e Hanover, que prepara um projecto de Constitui­<;iio federal que de veri a ser depois submeticlo a uma assembleia cleita. A segunda etapa situa-se em Abril de 1850: e <<a Uniao restrita», reunindo os vinte e oito prfn­cipes que aceitam o projecto constitucional.

A monarquia dos Habsburgo, que recuperou os seus Estados. sente-se agora suticientemente forte para fazer reprovar um projecto cuja realiza<;iio o levaria a perder a supremacia na Alemanha. Schwarzenbcrg encarrcga-se en tao de separar os Estados alemaes da Prussia. A prova de for<;a cla-se quando o eleitor de Hesse­-Cassel e expulso do seu trono devido a uma subleva<;ilo. Quem o vai rcpor? A Prussia, em nome da Uniilo rcstrita. ou a Austria. em nome cia Confederac;ao Gcr­manica?

A Austria lan<;a lllllUltimato a Prussia. proibindo-a de intervir. 0 Primeiro-Mi­nistro prussiano dirige-se a Olmlitz. ern Novembro de 1850, para se encontrar com Schwurzenbcrg e. perante as amcu~as deste. cede em todos os nfveis. E a << renuncia de OlmlitZ>> eo fim das esperan<;as de Frederico Guilherme lV deobter a coroa dos seus sonhos. A Austria vitoriosa repoe a orclem na Alemanha. E restabclecicla a Dieta de Francoforte e. com ela, toclo o sistema que os nacionalistas alcmiies tin ham querido ubolir. E rejeitada a unidade a lema. send9 agora claro que s6 podcra reali­zar-se atraves de uma uniiio entre a Prussia e a Austria. Ap6s a tempestadc rcl'o­lucinmiria de 18-+8. e restabelecicla em toda a Europa cenn·al a ordem de 1815.

........ CAPITULO 12

A FRAN~A SOB A SEGUNDA REPUBLICA (1848-1851)

Ap6s aqueda deLufs Filipe. e constitufclo um Governo provis6rio fonnado por republicanos moderaclos e avan<;ados. AAssembleia Constituinte, eleita em Abril de 1848 e dominada pelos republicanos moderados, vai ter de enfrentar a reac'<ao dos revolucionarios, que tentam uma insurrei<;ao a 15 de Maio de 1848. A Constitui<;ao, claborada ap6s a guerra civil dos tres dias (Junho de 1848), procura conciliar os princfpios de autoridade e de liberdade. A elei~no do prfncipc Luis Napoleno Bonaparte para a presidencia da Republica, em Dezembro de 1848, e a designar;ao, em Maio de 1849, de uma Assembleia Legislativa conservadora ins­talam uma Republica conservadora. Tendo sido chumbada, durante o Verao de 1851, uma tentati vade revisao constitucional que I he pcrmitiria rcprescntar-se em 1852, o prfncipe-prcsidente rcaliza um golpe de Estado (2 de Dezembro de 1851 ), que sera aprovado por plebiscito no tina! deste mesmo mes.

........ «A ILUSAO LfRICA»

0 GO VERNO PROVISO RIO

Aqueda de Carlos X e a proclamm;ao cia Republica sao acontccimentos absolu­tamente inesperados. E tam hem na i mprovisac;ao, no meio de uma de:.ordem total e sob pressao da multicliio de Paris. que invade os Pa~os do Concelho. que >e con>­titui o Govcrno provisdrio em 2-+ de Fe1 erciro de 18-+8. Foi institufdo pel a rcuniiio de do is <<Governos». form ado um na sede do jornal clos republ icanos moderados. Le Nario11al. c que tem a presidi-lo o ,·elho Dupont de 1· Eure (de 81 a no,. antigo

Page 16: História do século XIX

?74 PIE/Ill£ MILZA e SEIICE BEIISTE!N

Vacio11al de Labrouste, e1i1 1868. Pennite de igualmodo algumas ousaclias, como > \liaduto de Gambit ( 1884) e. sobretuclo. a Torre Eiffel. atractivo cia exposi~ao ntcrnacional de 1889. Mas a maior revolw,:ao na arquitectura vGi clar-se do outro ado do Atliinrico. com a utilizac,:ao muci~a do betao-mmaclo (uma tecnica in­' entacla em Fran<; a em mcadus do scculo XIX): a partir de J'inais cia decada de 1880

· :rguem-se em Chicago os primeiros arranha--ceus de Louis Su lli van (o Audiro­·itull e u WaillltTig/11 Building. etc .). pret'igurat;ao da arquitectura americana do ;eculo xx.

0 t.lescnvulvirnento t.la urbanizac,:ao, o can\cter mais t'uncional da arquitectura : importantes prog1·cs;,o:, tct:nicos que t'avorccem a passagcm do anesanato tl nclustria duo uma maior importCtncia tb artcs clecorati\'aS a partir do primeiro JUartcl clo ;,eculo x1x. Rompcndo entiio como acaclcmismo traclicional, que con­;iste. na maior pane clas , ·ezc,, em imitar cstilos antigos, os artisws clecoraclores anc,:am-se na procura clc uma nova linguagcm. Prctenclcnclo scr simultaneamcntc ·uncional c dccorati \ 'a. ;J << Arte Nova» ou111odem sn'ie niio hcsita em recorrer a for­nus biLaiTa>. abolinclo sobrctudo as linhas rcctas em pro! de curvas e arabescos que evam a clesignar;ao cle «CStilo indolcnte>> por parte clos scus dit'amaclores. Nos fi­wis do seculo x1 x. o 111odem sryle cllega a arquitectura europeia. como poclemos 1er nas inumeras rachaclas de casas em Paris. Bruxclas, Berlim, Munique, Viena :Barcelona (o Palacio Giie/1. de Gaudi. 1885-1889). Triunro de curta clurar;ao: a '\rte Nova sera rapidameme vftima clas suas exuberancias a partir clo comer;o do ;eculo xx.

Esta grande efervescencia clas icleias c as constantes contestar;ocs t'i los6ficas. itcn\rias e esteticas. que sao uma clas grancles caractcrfsticas do seculo XIX. vao Jrosseguir ate a primeira guerra munclial. originanclo novas movimcntos de ; an guard a. como o fauvismo. o expressionismo, o cubismo, o futurismo. a pinwra 1bstracta. a musica citona. etc .. is to c. as primeiras granclcs revolu<;:oes culturais do ;eculo xx.

........ CAPITULO 19

A DESTRUI~AO DA EUROPA DO CONGRESSO DE VIENA E AS GRANDES VITORIAS NACIONAIS

A desu·uic,:ao cia Europa do Congrcsso de Viena e favorecicla pela polftica de Napoleao III. que resolve apoiar-se no movimentu clas nacionalidades para resra­bclccer a prepondcrancia cia Fran<;:a na cena intcrnacional. Depois de ter conse­guido romper a !'rente clas J~Otencias legitimistas por ocasiao cia Guerm cia Crimcia, apoia o Piemonte contra a Austria, em 1859, permit indo a criar;ao do rei no cia ll::ilia. Em contraparticla, a uniclaclc alcma realizacla por Bismarck em benelkio do rei cia Prussia terminara em guerra contra a Franr;a, « O inimigo hcreclitario» , cuja ncutra­liclaclc pcnnitira inicialmente a Prussia clerrotar a Austria.

........ A DIPLOMA CIA DE NAPOLEAO III

NAPOLEAO III E AS NACIONALIDADES

<< 0 pri meiro sobcrano que. no mcio clo primeiro grande .:om bate. abra~· arcle boa re a causa dos jJO\'OS cncontrar-se-c\ a cabcc,:a de tocla a Europa. » Dcsta !'rase. cxtrafdG do Me111orial de Saillle-Helelle, o hercleiro do t'unclador do Imperio Frances retira. comuma ccrta satisi'a.,:iio. u1na li~iio de t'ilosot'ia polftica clestinada a transfornwr o << princfpio clas nacional iclacles» na alavanca do restabeleci men to Ja

I ;I.

J

Page 17: História do século XIX

276 PIERRE MILZA <' SERGE BERSTt.IN

preponderiincia francesa. Nao o predispoe o seu pr6prio passado a ser o <diberta­dor» dos povos. como objecti vo in con fessado de destruir a obra do Congresso de Viena·J Proscrito durante muito tempo, tal como os outros membros da familia imperial. identificou a sua causa pessoal com a clos povos oprimidos pelos vencedores de Napoleilo I. A destrui<;ao dos tratados de 1815 sera o objectivo cons­tante. e continuamente aprovado pel a grande maioria dos franceses. cia sua politica com o estran!!eiro.

E vcrdacl;ira a -;ua simpatia pelos povos oprimiclos . Durante o cxflio, viveu n:1 Alem::mha e foi cspectador da agita<;:ao revolucionaria d:1 decada de 1820. Na lta­lia. esteve directamente implicaclo nos movimentos rcvoluciomirios, ligando-se, ao que parece. :1 Carbon aria e participanclo como innao. na Romanha. na revolta de I R30-1831 contra o papa Greg6rio XVI. As pi ran!, nesse caso. a encaber;at·uma cruzada pel a liberdadc. preltldio ou pretcxto para a reconquista do Imperio Napo­le6nico'? Ao inv~ s do seutio. Napoleiio [[] nao e um conquistador. Muito simples­mente. a sua I'Ontade de penurbar a orclem da Santa Alian<;a, de restituir it Fran<,:a as ;uas ,, fronteiras natura iS >> e de compcnsar com satista<;oes de prcstigio aos scus 'ubd itos a inexistencia de vida politica durante os primeiros anos do seu reinado. I'UO lev~1-lo a multiplicar as intcrven<;oes militarcs. Ambiciona um equil ibrio euro­pcu garantido par Lllll sistema de congressos que permitiria resolver pacificamcntc os pt·incipais problemas internncionais. Nao prctencle qualqucr outra vantagcm pessoal a nao scr a gloria deter instituido a paz na Europa. Quando muito. a aplica­<;ao integral do principio das nacionalidades leva-lo-a a peclir para a Fran<;a alguns territ6rios limitrofes das suas fronteiras perdidos em 1815, como Nice e a Sab6ia.

Ora. os homens que Napolcao Ill encontra pel a sua rrente. Bismarck. Cavour. etc .. sao realistas frios que apenas querem a realizw;iio clos scus esquemas de uni­ficaqao e. bem entendido. no interesse dos seus soberanos e dos seus povos. Nao precisam de transformar o impcrador numa utopia nem hesitarao em scrvir-se dele quando for necess;1rio para alcan<;arem o seu fim , correndo o ri sco de o abandona­r~m ou de sc voltarem contra ele seas obriga<;oes da Realpolitik exigirem que o fa<; am. Consciente deter sidomanipulado, Luis Napoleao receia entiio ter sac rifi­cado o interesse do seu pais ao das << nacionaliclacles>> e procura retroceder. mas demasiado tarde. cxigindu fracas compensa<;6es para a Franqa. Esta politica das <<go tjctas>>. de que o chanceler prussu escarneccni. clesacrcclita o imperador aos olhos dos Europeus e leva-a directamente as derrotas desastrosas.

Todavia. durante os primeiros anos do Imperio, a politica extcrna de Napo­leiio Ill regista algumas vit6rias espcct<\cularcs c sao os clcfcnsores do absolut ismo curopeu. primeiro a Russia c clepois a Austria. que le1·am por diante o dinamismo imprimido pclu imperadm it diplomacia france sa.

HISTCJRIA DO SECULO XIX 277

NAPOLEAO III E A QUESTAO DO ORIENTE

Os acontecimentos que afcctam o Imperio Turco estilo na origem do primeiru con!lito externo em que a Fran<;a de Napolcao Ill seve envoi vida. 0 problema surge clepois do comc<;o do seculo. com a decadencia do poder otomano e a opo­si<;ao radical do Rei no Unido c cia Russia quamo ao futuro dos territ6rios que o constituem. Protector dos Eslavos ortocloxos. o czar sonha cstendcr o seu clominio a maior parte cia Peninsula BalcJnica, e garantir o conrrolo dos estreitos, a fim de cons<:!guir esta clllrada no McditerrJneo com que os se us antecessores tanto so­nhavam desde Pedro, o Grande. Ora, est a amhi<;ao expansionista v:1i contra os in­teresses cia Grii-Bretanha. que emende clever manter o controlo cia rota clas fndias para o Proximo Oriente, preservando, assim. a imegriclacle do Imperio Otomano.

0 interesse cia Fran.;:a nesre conflito e apcnas secunclario. c imervem de forma fonuita. Em 1853. tiranclo partido da prefcrencia dada pelo sui tao aos manges <dati­nos>>. protegidos pel a Fran<; a. em detrimento dos monges <<g regos >>. apoiados pelo Imperio dos czarcs. o Governo de Sao Pctersburgo en via utn ultimato a <<Porta Su­blime >> (designa<;ao metaf6rica do poder otomano), orclenanclo-lhe a aceitaqi:io do protectoraclo russo. Como o sultan recusou curvar-se a imposi<;ao de Nico lau I, cste mancia as suas tropas invaclir as provincias romenas do Imperio.

A Inglaterra, que levou o Governo otomano ii resistencia. nao pode ncar de bra<; as cruzados perante uma agrcssao cujo tim evidente e dar a frota russa a chave do Meditcrraneo oriental. Mas nao quer agir sozinha e procura arrastar a Fran<;a para a aventura. Est a nao tem qualquer interesse imediato em entrarem guerra con­tra a Russia. Mas Napolcao III ve uma vantagem rripla na empresa. Traz-lhe, a haixo custo, pelo me nos assim o julga, a gl6ria militar de que o novo regime tanto necessita para se consolidar. Permite-lhe acabar como isolamento diplonuitico que se seguiu it proclamaqau do Imperio, a qual despertou nos soberanos a lem­bran'>a das conquistas napole6nicas. Constitui. por ultimo, uma forma de enfra­quecer uma das potencias que garantem a ordem reposta em 1815.

Porem, afigura-se possivel chegar a um consenso, quando se tcm conheci­mento, a 30 de Novembro de 1853, cia destrui<;iio de uma esq uaclra otom:111a no porto de Sinope pel a frota russa. A 12 de Mar<;odc 185-1. a Gra-Bretanhae aFranqa aliam-se a Turquia au·aves de um tratado e declaram guerra ao Imperio dos cza­res. No ana seguinte. Cavour, que acaba de scr nomeado Presidente do Conselho do pequcno rei no do Piemontt!-Sardenha e ve na empresa uma forma de colocar a <<que,tiio italiamt>> it Europa. alia-sc as ciuas potencias ocidentais e en via. por seu laclo. um pcqucno corpo expcdiciom\rio para a Russia. Parece. deste modo. de­senhar-se na Europa uma nova linha de alian~as em reclor cia Fran~a.

Enquanto que as frotas aliadas prucunun garantir-se u clominio do mar Negro. destrocm o porto de Odess<J c fecham em Cronstadt a csquaclra do Ballico. os Russos invadem os principados rome nos c cercam Silistra. r-.·la' a orensiva I<Jn~acla dcpois de Gallipoli pelo corpo expedicion<irio rranco-inglcs obriga-os a rerirar. A partir de entiio. o essencial das opcra~ocs clescnrola-sc na Crimeia. onclc Franccses

Page 18: História do século XIX

?78 PIERRE MILZA e SLRCE /JERSTEIN

e Britanicos desembarcaram em Setembro de 1854. Vao levar cen:a de um ano a tornarem-sc senhores de Sebastopol. defend ida com furor por uma guarn ir;5o rus­;,a c que caiu apenas em Setembro de 1855. na sequenc ia de sangrentos com bates. As perdas sao pesadas para am bas as panes: cento e dez milmortos do lado russo. novcnta e cinco mil entre os franceses (dos quais. tres quartos monos de tiro ou c6 lera). vin te mil inglescs c dois mil piemonrcses. Mas a queda de Sebastopol. pouco clepois da mone de Nicolau I. leva o seu sucessor, Alexandre II. a negociar.

Para por termo a l!ucrra. Napolcno lll re(tne em Paris os representantes dos Estados beligerantes. bcm como os cia Prussia c cia Austria, reali zanclo ai um con­gresso que dura de Fevereiro a Abril de 1856. Prcsiclida pelo ministro rrances dos Neg6cios Estrangeiros. Walenski. esta reuniiio aprescnta-se aos olhos da Europa como a clesrorra do Congresso de Yicna co pri ncipio da dcstruir;ao- concertacla c legitinwda -- da obm concrctizacla pelos l'encedores de 1815. A lnglaterr::t con­segue vcr garanticla pel as potencias a integridacte do Imperio Otomano. A Austria obtem uma vantag.:m considen\vcl: a liberclade de navegar;ao no delta do Danubio. cujo controlo e asscguraclo por duas comissoes intern ac ionai s. A Fran~·a. que pagou Llln pre~o caro pel a guerra. tanto em vidas hum anas como financeiramente. parcce niio ter retiruclo cla sua intcrven~iio seniio hens marais. em particular. o reconheci­menro implicito de um clireito de protec~ao sobre os cristaos clo Imperio Turco. Com efcito. a Guerra da Crimcia pennitiu a Napoleao Ill conseguir duas vantagens essenciais no prosseguimento da sua politica europeia. Conseguiu logo acabar com a frente clas potencias legitimistas. Abandonacla pela Austria. a Russia vai agora aproximar-se da Fran~a.

Por out ro laclo. o Congresso de Paris ve. pela primeira vcz, a questiio clas na­cionalidades ser apresentada com canic ter ot'icial. Associ ado aos Franceses e aos Britiinicos na coli gar;ao ociclental , o Piemonte evoca perante os representantes clas potencias o problema do clominio austriaco sobre a lt:.\lia. Por ultimo. o trataclo as­sinado no fim do encon tro preve a autonomia dos clois principaclos rorncnos- a Moldavia e a Yalaquia- que dever5o ter cada um o seu govcrnador (hospodar). Na vcrdade, forternente apoiados por Napo leao Ill . os clois principaclos escolhcm o mesmo governaclor. Alexandre Couza, um nobre rome no amigo cla Franr;a , on de passou a sua juventuclc. Apesar da hostilidaclc da Grii-Bretanha e cla Austria. a nar;~o romena triunfa, grar;as ~~ protecr;5o da Fran~ta. Durante os anos que se scgui­ram. esta ir<l continuar a exercer-se ern bencficio de Couza nas suas tentativas de unil'icar; ao politic a. Ap6s a 1norte deste Ctltimo. em 1866. vai ser ainda ela a salvar a uniclade do pais. rccomenclando a clcsigna9iio de Carlos cle Hohcnwl lern . mcmbro eta famflia real da Pnissia. como prfncipe da Romenia.

0 Congresso de Paris marca. por conseguintc . uma viragem na hist6ria clo movimento das mt.:ionalidaclcs na Europa. Ao aprcsentar a «quest5o italian a>> aos delcgados eta, polcncias. o primeiro-ministro picmontes. Cavour. acaba por dcmonstrar que esta reuni:io nao c mais do que uma prime ira etapa clo desmante­lamento dos trmaclos de l R 15. 0 arran que e dado por uma libcrtaqao dos povos ck que os ltalianos van scr os primeiros henel'iciarios.

HIST6RIA DO SECULO XIX :!79

0 TRIUNFO DAS NACIONALIDADES

0 NASCIMENTO DO REINO DA IT ALIA

0 fracasso das revolur;oes de 1848 mostrou aos patriotas italianos que agora apcnas poclem con tar com tun poder ron e. capaz de organizar o povo e de se impor aos principes.

Ora, e prccisamente cstc papel que o rei clo Pic monte. Yitor lvlanucll l. entcnde clever clesempenhar. Man tendo a Constituir;ao aprovada pelo seu pai. niio obstante as amew;as e as promessas austriat:as, vai permitirque a dinastia se apresente como palaclina das aspira"oes liberais e nacionais de tocl a a peninsula e fazer adcr ir a maioria dos defensores da unidade a «SO IUI;:5o picmontesa>> .

Vi tor Manuele apoiado nesta missiio pelo conde de Cavour. Antigo director do jornalliberal// Risorgimento, es te grande proprietario de ten·as. am ante da agrono­mia e da economia politica. e um claqueles que levaram Carlos Alberto~~ guerra, em 1848, que clepois fizeram que o seu sucessor mantivesse a Constitui<;iio liberal no Piemonte. Ministro da Agricultura do gabinete presidido por Massimo d' Aze­glio, rorna-se primeiro-ministro em 1852, grw;:as ao apoio do centro-esquerda. que aprecia o seu anticlericalismo moderaclo.

Durante os a nos seguintes. Cavour vai cledicar todas as suas energias it prepara-9ao da dcsforra contra a Austria. A rim de dar ao Picmonte meios para enfrentar o confl ito incontorm\vel como Imperio clos Habsburgo. desenvolve a agricu ltura, favorece o aparecimento de novas industrias, elora o seu pais cle uma rccle ferro via­ria muito densa, moclerniza o porto de Genova e celebra trataclos livrc-cambistas cle comercio com a Franr;a. a Belgica, a Suir;a, o Rei no Unido eo Zol/rerein. Sob o seu impulso, o general La Marmora aumenta consicleravelmente o pocler militar do rei no sardo. t'uncla o arsenal de La Spezia e forti fica a encruzilhacla cstratcgica de Alexandria. Para obter o apoio cla burguesia liberal. que censura o clero porter clesempcnhaclo tun papel essencialno triunfo cla reac9iio de 1849. cleclara-se con­trario a inlluencia da Igreja, encerrando centenas de conventos e nao autorizanclo senao as congrega96es cleclicaclas ft pregar;5o ou ao cnsi no. Em sum a. procura trans­formar o pequeno n.:ino do Picmontc-Sarclenha num Estado moclerno. autentico p6lo de atracr;iio para todo;, o:, patriotas cla peninsula sujeitos a regime, reaccion<i­rios.

A partir de Jl\50. Turim rorna-se, cleste modo. o centro de gravidacle da imi­grar;5o politica proven ientc de outros Estaclos cla peninsula. Cavourencoraja o sici­li ano La Farina a rundar a Sociedadc Nacional. cujas ram i!'icar;ocs se estendem a locla a It iii ia e cujo programa se resume em trcs palavras: <d nclepenclencia. Unidade. Casa de Sab6ia>>. Cianclestina nos outros Estaclos que nao o Piemonte. rem por

Page 19: História do século XIX

280 PIERRE MILZA e SERGE BERSTEIN

objectivo fornecer. chegado o momenta, os quadros de que a monarquia piemon­tesa necessitara para garantir o seu embargo as regioes <dibcnaclas>>.

Cavour triuni'a entao na Clitima rase de prepara~ao da uniclade italiana. En­quanto que, consciente do malogro da corrente clemocr~ilica e republicana. uma vasta fracr,:ao da pequena burguesia ace ita ligar-se a monarquia de Sab6ia. Gioberti convene-se com os scus panidarios a solw,:ao piemomesa e Daniel Man in escrevc. antes de morrcr. a Yitor !vlanuel: «Fazei a ltalia. que cu cstou. c todos os rcpubli­canos pmriotas estau. do 1·osso !ado e convosco. >>

Ca1 our e um realista. Sa be pcrt'citamcntc que, apcsar de todos os esi'on;os par ele cle>en\'Oivido:. para rnudcrnizar e armar o Piemonte. este nao tem qualquer hip6tc>e de triunt'ar sabre o pucler austriaco scm o auxil io do exterior. Tendo apren­dido uma vez a li~ao com os acontecimentos de 1848-1 g49, procura entiio inscrir a questi'io italiana num contexto intcrnacional, apoianclo-se na Inglaterra li beral. que manii'estou sempre simpatia pel a causa cia It<\lia. e na Franc;a. que surgia. ap6s a vincla de Napo lci'io Ill . como aclversario irrecom:iliavel dos trataclos de 1815. Foi para conquistar a simpatia das cluas potcncias ocidcntais aliaclas con tra a Russia que arrastou o seu pais para a Guerrada Crimein. Como vimos, o Piemontc ganhou ron;a para evocar ofic ialmente, perante os delegaclos das potencias presentes no Congresso de Paris. «a siwar;ao irregular c lament<\ vel cia lt<ilia».

Napoleao Ill hesita em arriscar. inlluenciaclo, par um I ado. pelos cat6licos, que ni.io qucrcm ver comprometiclo o pocler temporal do Papa, e pelos homcns de ne­g(\cios. que pretendem a paz. e par outro. pelos clemocratas do seu circulo, que o instigam a intcrvir. Paradoxa! mente. eo atentado de Orsini que precipita a situa~ao. A I-I de Janeiro de 1858. este patrima da Romanha tell[a. juntamente com outros dais mazzinianos, assassinar o imperador, fazenclo explodir uma «nu:iquina infer­nal>> no trajccto que Jcva\'a o conejo imperial ate it Opera. 0 atentnclo causa oito monos e dczenas de fericlos. Orsini, que censurava Napoleao Ill porter traido a causa cia unidacle italiana. e condenado a mone, mas, antes de subir ao cadafa lso. dirige uma cana ao imperador, on de I he suplica que «dcvolva a llalia a inclependen­cia que os seus filhos percleram, em 1849. par culpa dos Francescs». St:nsibilizaclo, Napoleau manda publicar a cana no Monireur Fra111;ais e no lou mal Officiel de Turim. depois entabula ncgocia<;5es com Cavour e. final mente, com·ida estc ul­timo a' ir au seu encontro em Plombicrc~ . nos Yosgos. onde esta a aguas .

Por ocasiao desta emrevista de 21 de Julho de I gs8. cujo conteuclo e dado a conheccr pel a refercncia que Cavour I he i'aL. os do is homens cstabelecem as bases de um acordo militar con tra a Austria e preveem a constitui<;ao de um grande rei no do None da lt•\lia. comprcendenclo. para alem do Picmonte, a Lombardi a e a Yene­cia. arran cad as aos Habsburgo. 0 res to da peninsula scria eli vidida emtres Estados: Estadus da lgreja. rei no cia ll<\lia central c rei no de N<ipoles. reunidm. como pri­meiro numa coni'ederar;iio presiclida pelo Papa. Emtroca do que a Fran~· a receberia a Sabuia eo conclaclo de Nice.

E>tc projecto csta Ionge de entusiasmar Cavour. Todavia. acomoda-se a estc entendimento ,;ecrctu que garante ao seu pais o auxflio militar da Fran<; a. dccidicla a tran~greclir os tcnno;, uma \'el. conseguida a ancxa<;ao do rei no Jombardo-vcne­ciano. A 26 de Fc verciro de 1859, e as>inada oi'icialmentc a •liian,:a franco-sarda.

HIST(JRIA DO SECULO XIX 281

Durant~ os meses que se seguem, o Piemonte multiplica as provoca~oes em rela<;ao a Austria, de modo a susc itar o casus belli pretendiclo pelo acordo de Plombiercs e pelo trataclo de Janeiro de 1859. Yicna e Turim mobilizam-se, para grande receio de Napoleao lll, que, logo consciente do peri go em que o mecanismo que ele proprio desencndeou colocava a paz europeia. procura, no ultimo mo­mento. travar o seu curso propondo a reuniao de Lnn congresso internacional des­tinaclo a dcciclir a questiio italiana. Mas e demasiado tarde. A 19 de Abril de 1859. a Austria inicia as hostilicladcs depois de terenviado um ultimato ao Piemonte , dan­do-l he tres elias para desmobilizar o SCU exercito.

Fie! aos compromissos assumiclos. Napoleao resolve entrar em guerra. Ap6s os com bates de Montebello c de Palestro. on de Yitor Manuele nomcado cabo pelos zuavos, travn-se uma gmnde butalha a 4 de Junho de 1859. em Magenta: ci<i a vi­t6ria aos l'ranco-sardos. abrindo-Jhes ns ponas da Lombardia. Quatro dias mais tarde. Napoleao lil e Vftor Manuel, entusiasticamente aclamados pela multidiio. fazcm a sua entrada em Miluo.

A 24 de Junho. uma seguncla batalha opoe a Solferino os exercitos das tres po­tcncias. Da-se uma terrivclmonanclacle que abala o imperadore o leva a propor aos generuis austriacos uma tregua que, assinada a 9 de Julho em Villafranca, se trans­forma logo em preliminares de paz. Com efeito, Napoleao lli temmuitas outras ra­zoes para por termo ao conllito. As vit6rias alcanc;adas sobre os Austrfacos safram caras em homens. e o mais cliffcil - a reclw;ao clas pra~as-fones do «quaclrila­tero»- ficou par fazer. Par outro I ado, a cmrada dos Franceses no None cia lli1-lia clesencadeou uma serie de subleva~oes no centro da peninsula que nao poupou os Estados eta lgreja. o que tem como resultado um agudizar. em Fran~·a , da hosti­liclacle clos catulicos. A Prussia parece, enrim. querer aproveitar-se das clit'iculcla­clcs cia Austria para controlar os clestinos da Alemanha. Mobiliza vdrios corpos do exercito e propoe a Dieta de Francot'one uma imerven~no comum dos Alemiies no Reno.

A paz assinacla em Zuriquc e~t<\ Ionge de trazer a Cavour as satisfa~oes que previa com a alian~a francesa. A Austria contenLa-se em c!evolver a Lombard in a Fran~a. que a entrega ao Piemollle, mas a Yenecia mantem-se austriaca. Os prin­cipes cia Italia centrale o Papa devem ser restituiclos nos seus direitos. enquanto que se preve a reuniiio de um congresso europeu a fim de se deciclir sabre o futuro cia llalia. Napoleiio Ill niio manteve as suas promessas e e viva a ira dos ltalianm. Cavour demite-se. clerrotado.

Ora. contrariamente its expectativas, os acomecimentos vao precipitar-sc durante o segundo semcstre de 1859. Retirado no seu clominio de Leri, Cavour foment a subleva~ocs na Juil ia central. on de os principcs san substitufdm. por <<ciita­dores»- Ricasoli na Toscana , Farini em Parma c Modena. Cipriani na Romanhu pnntirical-. que transi'ormam os territ6rios revoltados em << Prol'incias Reais da Emilia» e elegcm Asscmbleias Constituintcs que cxigem a sua anexa~iio an Picmonte. ConJ'rontaclo como facto consumaclo e desejoso de oi'erecer uma com­pcnsa~iio a Yitor Manuel. Napoleiio Ill clccicle l'inalmcnte clcixar que o clesejo de uniJ'icm;fiO clos ltalianos sc concretize. A 22 de Dezcmbro cle I ti5':1. surge urna brochura assinacla por La Gueronnicrc. na vcrdade inspirada pelo imperador c

Page 20: História do século XIX

::!81 PIL.RRE MILZA ~ S!.:.RCE BERSTE!N

intitulacla Le Pape et /e Co11gres, onde parece que Napoleao aclere a ideia de um desmemhramento parcial dos Estados pontificais. Tres meses mais tarde, e votacla em plebiscita a anexa~iio ao Piemonte cia Toscana, de Parma. da Modena e cia Romanha. em troca do que a Fran~a recehe. ap6s plehiscito. Nice e a Sab6ia.

Para dominar o rei no de Napo les. Cavour vai efectuar uma manobra hahiliclosa cujo inst rumcnto sen\ Guiscppc Garibaldi. ami go general cia Republica Romana. Este Liltimo recruta um pcquenoexercitocle l"oluntarios-os <<Mil»-que concen­tra em Geno,·a.

Descmbarc:111do a I I Lie Maio de 1860 em Marsala, Garibaldi assenhorcia-se da ilha em dois mese~ . clepoi> passa para o con tinentc e. a 6 de Setembro. entra triunfalmentc em Njpoles. enqua nto o rei Francisco II sc rerugia em Gaeta. A di­mensiio cia sua vit6ria nao cessa de inquietar Cavour. E certo que niio se clu vida cia Jea!Lladc Llaquele que acaba de se proclamar <<ditador clas Duas Sicfl ias», mas o pri­meiro-ministro pie montes n5o csta convc ncido de que, antes de transm itir os seus pockrcs a Vitor Manuel. o << her6i Llos Dois Mundos» nao possa marchar sohrc Roma para expulsar Lie J:i o Papa: o que lcvaria a guarnir;ao rrancesa a reagir. correndo o risco de ocasionar uma ruptura com Napoleao. Envia tambem dois em issdrios para junto deste ultimo. de passugem por Chambcry, que conseguem a homologa~ao da solw;ao concebida por Cavour, a saber: a ocupa~ao dos Estados da lgreja por tropas piemontesas, para apanhar Garibaldi de surpresa e proccder a ancxa,:ao destes territ6rios, a excep~ao de Roma e do Lacio. Havenclo Napoleao Ill dado o scu a val- <<fazei-o. mas razei-o depressa!», teria cleclarado aos en vi ados de Cavour-. o cxercito piemontes invade os Marchese a imbria a II de Setembro de 1860. atira para Casrelficlardo os zuavos pontiticais comandaclos por La­moricicre e raz uma entrada triunfal em Napoles. a 26 de Outubro. Primeiro plebi,citos. vo tados com csmagadoras mai01·ias. depois elei\OCS gerais em Janeiro de 186 1. confirmam o grande est"or,:o e Jegitimam a proclama~ao do rei no cia It::'ilia (23 de Mar~o). Algumas scman as mais tarde, Cavour morre. esgotado de fadiga. murmurando: <<A lt<ilia est<\ J"eita ... »

Contudo. faltam ainda cluas peifas essenciais para que se alcance a unidade polf­tica da ltali a: Roma e a sua regiao, sobre as quais o Papa mantem a sua soberania temporal. e a Venecia. semprc detida pcla Austri a.

Para Cavour e os seus succssores. e ev iclente que a questao de Rom a como capi­tal clevera scr reso!Yicla mais dia menos dia, mas a cidade e defendida por uma guarn i<;ao t"rancesa e Napoleao Ill nao pode. sob pen a de ve r o partido cat61ico vi­rar-sc contra si. <<deixar os ltalianos apoderar-sc da sede deS. Pedro e clos dltimos fragmentos do Estaclo pontifical.

De igualmodo. quando. em Julho de 1862. Garibaldi desembarca na Sicilia, pa>sa a Cal<\bria e sc aprcssa a marchar sobre Roma a !"rente clos seus <<t:am isas vcrmelhas». o Governo itali ano reso lve dete-Jo. cnviando ao scu cm:ontm um cxerc ito que o obri ga it r~ncli\aO ap6s Lllll breve combate em Aspromontc. Pcla << COn '. 'en~ao de Scrembro>> ( I ~64). NapoleJo comprometc-se a rctirar as suas tropas de Roma. cnq uanto que Vitor Manuel promcte respeitar e mesmo defender u territ6rio pontifical. Como prova da sua boa vontacle. o rei cleciclc estabelccer a

A FORMA<;ri.O DA UNIDADE ITALIANA

1860-61

D Forma~ao da ltatia

~ Aquis1~iio da Fran~a

):0 ~-.}.. Eit~·~~ "' ""<+,J.

COrs!9a C) "' r ~~ _lgr~~ \ ~C'o {'<.) ~-. ·~·

~ Romi\•.; . '"'''" -~

-I_ ' Sard Mar '-._ •

T1rreno Aeino \ l(} das ~ )

Duas Sicilias (..)

c;;J .._J

1866-70

- Expedi~iio des Mil (Garibaldi)

* Batalha 500 kill

Page 21: História do século XIX

18-1 PIERRI': MILZA e SLRGE /JCRSTEIN

sua capital em Floren\=a. marcando assim a sua aparente intenc;ao de renunciar derinitivamente a Cidade Eterna.

Desejoso de oferecer uma compensac;ao aos ltalianos no momento em que a guerra ameac;a cclodirentre a Austria c a Prussia, Napoleao 111 pro mete a Bismarck a sua neutralidadc no contlito que se avizinha. desde que accitc a ali ant; ada lt•\lia c !he conceda. em caso de vit6ria. a posse da Yeneciu. E ussumido Llln compromisso de natureza identica em relac;iio a Austria.

A guerra que ;e trava em 1866 c que vai dar l'antagem aos prussianos e desas­trosu para os ltalianos. derrowdos em terra, em Cuswzza (24 de Junho). c no mar. em Lissa (20 de Julho). S6 escaparam a um regrcsso ofensivo dos Habsburgo grac;as a vit6ria pru;sa de Sadowa (2 de JulhoJ. Mas, por ocasiao da elaborac;ii.o clo tratadu. Bismarck nada faz pelos seus aliadus derrotados, e vai ser necessaria a in­ten·enc;fio pessoal de Napoleao Ill para que a Austria ccda a Yenecia a Franc; a, que logo a cle10lve a Italia.

Em contrapartida, o imp.:rador mantem-se inflc>.fvel no que se rcl'cre a manu­ten,ao do btado pontifical. Dcpoi; deter sido o motor da unidade italiana. surge agora como grande obstaculo a sua consecuc;ao. No Outonu de Jg67, Garibaldi encabec;a em Rom a uma insurreic;ao contra o podcr temporal do Papa. Pression ado pelos cat61icos franceses. Napoleiio Ill resolve logo enviar uma divisao para o L\cio. a qual. dcsemharcando em Civitavecchia, esmaga os bandos de garibal­dianos mesmo as portas da Cidadc Eterna. E imcnsa a indignar;ao em toda a llalia. Falando das novas annas que foram experimentadas nesta ocasiao pelns tropas francesas. o general de Failly tclegrnfou: <<As espingardas fizcram sucesso.» «Mentana>> , diz-se na peninsula, «mawu Magema.»

Assim. a questao romana vai constituir, ate 1870, o ponto diffcil das rela<r5es franco-italianas. E a derrocada do Imperio. que tivera um pnpcl de destaque nas primeira' eta pas du unidade italian a, que pcrmite a sua concretizac;ao. Com efeito, ap<is o desastre de Sedan. a guarnir;iio que se instalara proximo de Mentana tem de ahandonar Roma e. a 20 de Setembro de 1870, ap6s um simulacra de com bate. as tropas reais J'azcm a sua entrada na cidacle, proclamacla capital do rei no.

A UNIDADE ALEMA

Na Alcmanha. a derrota dos libcrais dcixou u caminho livre ;,s rorc;as conscr­vadoras. nas quai, sc upoia a dinastia pru;sa, cos HohenLOIIern ambicionammais o au men to du scu prestfgio e do scu poder do que a satisfa~:ao das cbpirac;()cs dos patriota, alcmfics. Tal como Frederico Guilhcnnc IV em 1849 (Capitulo II). o rei Gui!hcrmc I da Prussia co chanceler Bisntarck detestam o libcralismo e prco­\.:Upam-;e e,,encialmeme com a grandeza da Prussia co poder do' Hohcnz.ollern. 0 imperio que prctendem criar ira. por con~cguinte, assentar na adcsao dos

f-1/ST(jRJA DO S!~CUW XIX 285

prfncipes e nao no consentimento dos povos. Sen\ prusso, conscrvador. autorita­rio e anti-austrfaco.

De 1850 a 1862. a Prussia conhcceu um dcsenvolvimento econ6mico espec­tacular. Em 1854, conseguiu. nao obstante a oposic;ao de Yiena a renova<;iio do Zo/h •erein , a uniiio aduaneira com os Estados alemaes.que clepois alargou e conso­lidou continuando a excluir os Habshurgo do Imperio. Grac;as aos seus territ6rios rcnanos c ao Sarrc. rornou-se o segundo produlOr mundial de carviio. Desen­volveu-se a rcdc J'crrovi•\ria. Aparecem tambem as primeiras grande~ firmas industriais: Krupp no Ruhr, Oppenfeld na Silcsia. A revoluc;ao industrial co dcsen­volvimento da sidcrurgia altcraram , dcste modo. o equilfbrio das forc;as em pro­vcito dos Hohenzollcrn.

Todavia, a Prussia atra1·essa graves dificuldadcs politicas. com a constitui<;ao de um partido liberal que pretendia controlur as despcsas da monarquia c obrigar esta a retomar a polftica unit<\ria. Aliiis, c com vista a clcstrui~ao da rcsi stcncia do Land tag, on de os dcputaetos burgucscs rccusam os crcclitos militares c exigcm ore­g res so ao servic;o mi I itarcle do is a nos ( o rei dccrctara a sua passagcm para tres a nos. a l'im de au men taros efecti vos do exercito ). que Gui lhermc l ape Ia para Bismarck. Para alcanc;ar os seus fins. cste nao hesita em recorrer a processos ditaroriai s. aumemando os imposws au·aves de decrctos e fazendo votar o orc;amcnto pela Camara etos Scnhores. Consagra depois todos os seus esfor<;os ao relon;o e a modernizac;ao do exercito. no qual ve o instrumcnto privilegiado da unificar,:iio da Alemanha.

Bismarck compreendeu que esta nao ~oderia dar-se sob a cgidc da Prussia scniio depois de eliminada a intluencia da Austria, e que nao haveria hip6tcses etc ganhar uma guerra a niio ser que as outras se manti vcssem neutras. A l'im de conse­guir a indulgencia da Russia. da o seu apoio a Alexandre II na repressiio da insur­reic;iio polaca de 1863 e propoe-lhe, inclusivamcnte. o scu apoio para csmagar os insurrectos. Para se conciliar com Napoleao Ill. dcclara-se favoravcl a proposta feita poreste ultimo de rcunir um congrcssocuropeu para reveros tratadosdc 1815. A «questao dos ducados >> vai pcrmitir-lhc. simultaneamente. aumentar o Estado prusso c fazcr entrar a Austria numa cngrenagcm cuja energia pod era dcpoi s apro­veitar para realizar o grande ajustc clc contas como Imperio dos Hahshurgo.

Povoaclos de alcmaes e dinamarqucses. os tres due ados etc Slesvig. Holstein e Lauenburg ficaramligados ao rei daDinamurca an·aves de uma uniaopessoal. Com a mortc do sobcrano dinamarqucs. Frederico VII. os seus habitantes pronunciam­-se. n1io a favor de um herdeiro eli recto. mas etc um prfncipe ale mao que apoic o chanccler prusso. Tambem cste ultimo toma a iniciativa de uma inter1·en<;iio COJllUill com a Austria. que leva. at raves da Convenc;Jo de Gastein ( 1865). a j)lll'­tilha da administra<;ao clos ducados. Pcssimo neg6cio para a Austria. que anexa o Holstein, territ6rio afastaclo clas ~uas fronteiras c indefcns<ivel. dado que sc cncon­tra encravaclo entre duas provincias que sc tornaram prussa' e destitufdo de unw saida maritima que constitufa todo o scu interesse c'ilratcgico. 0 porto de Kicl c. na vcrdadc. admini strado pela Prus-;ia. tendo csta o dircito de construir um canal que liguc o Mar do None ao Ballico. Para ncutralizar a Fran~a. cclebra em Biarril!.. em Setcmbro clc I i-io5. um acordo cum Napolciio Ill: em tmca do ' eu dcs interc;se

Page 22: História do século XIX

186 PIERRT: MILZA e SERGE BERSTUN

na questi'io dos ducados. pro mete arrancar a Venecia a Austria, bem como algumas vagas «compensa(fOCS>> no Reno.

No princfpio de 1866. o aparclho militar prusso esta a postos para o grande co.1fronto como exercito dos Hahshurgo. 0 ministro Von Roon eo chet'e doEs­tado-lvlaior von Moltke reorganizaram-no. dotaram-no de espingardas modern as e prepararam-no para a utiliza<;ao dos no1·os meios de comunica<;flo: o telegrafo e os cami nhos-de-ferro.

Para tcrminar. a PrCtssia multiplica as adl'enencias ao Governo austrian> sabre aadministrac;ao do Holstein. :1cusanclo-o mesmocle mamer ai uma situac;ao revolu­cion<iria. Exa>pcrada. a Austria mobiliLa-se e ape Ia a arbitragem cia Dieta. A 7 de Junho de 1866. o cxcrcito prusso invade u Holstein e a II a Dicta de Francot'one decreta a " e"xu.,:iio federal>> contra a Prussia. Nu guerra que se ;,eguc. todo;, os Estadth alemiic:,. ~~ excep<;iio clos pequenos Estados do none e do griio--Jucaclu de Baden. ;-cgucm a Austria. Qumro Lii<l> mais tarde. Bismarck anuncia a dis;,olu<;ilo da Cunfcclcra,-ao Germi\nica. 0 rcsultado do conllito sed entilo detcrminante: a Pnis,ia unificad a Alcmanlm ou sera climinada.

Dcpois de tcr esmagado os contingente> sax6nios. hanovcrianos c havaros. o excrcito prus:,o trava a batalha decisiva em Saclowa. na Bocmia. a 3 de Julho de I R66. Esmagaclo pelos prussos, o exercito do general Benedek debancla na maior confusao. deixando livre o caminho para Viena. Francisco Jose nao tem outra alter­nativa sen 5o aceitar as conclir;oes clos venceclores. Bismarck contenta-se em elimi­nar a Austria cia futura Alemanha uniticada. mas niio quer transfonnar-se num inimigo irrcconcili<ivel proeeclendo ao seu desmcmbramento, como pretendia Guilherme I. Aumentam. assim. os riscos de descncadear prcmaturamente uma guetTa contra a mediar;iio francesa. Habiliclosameme. Bismarck aceita a mccliar;ao francesa. acede ao pecliclo de Napoleiio III de autonomizar os Estados do Sui cia Alemanha c pro mete inclusivamente ao imperador uma «COmpensa<;iiO» no futuro.

A paz de Praga consagra a clissolu(fao cia Confeclera<;ao Germiinica. A Austria cede o Holstein. scm grande interesse para si, e entrega a Venecia a Fran<;a. que a devolve logo ao rei no cia ltalia. 0 Estaclo prusso anexa Hanover. Hesse-Cassel , Nassau c Francorone. e constitui com os outros Estadosdo None cia Alemanha uma Confedcrar;ao ciotacla de 6rgaos feclerais. Tendo ricaclo independentes. os do Sui assinam dua:, convcnr;oes militares com Berlim, que estipulam que, em caso de guerra. os scu:, cxcrcitos ficariam sob a alc;:acla do rei da Prussia. Por fim. o Zo/1\'(!­rein e reorganit.ado. com um «parlamcnto aduaneirO>> que reLine os represcntantes da Confedcra<;ao e os dos Estacios do Sui cia Alcmanha.

Depois de Saclowa. a Frunr;a consciencializou-se subilamente do perigo que represcnta1·a para si o autnento do pocler do Estado prusso. Napoleao l1I procura ~btcr t:llinpensw,:oes -o Sarre. o Palatinaclo. o Luxemburgo e mesmo a Bclgica. E a polftica de «gorj~UN• . ridicularintda pclo «Chancelcr de Ferro».que. ali~1s. se aprcssa a faL0-Ia fraca:,sar. tornando pLiblicas as ambic,:oes t'ranccsas. Esta guer­ri I ha diplomatica. emprecndida por Paris. acaba por convent:er Bismarck de quest\ uma guerra contra a Franr;a podc <ll.:abar com a sua obstrur;ilo f1 unidacic alema c cimentar esta nutn comlxue contra um adversario comum. Do lado frances. Lllll pcqueno convctllit:ulo rcunido a volta cia imperatril. e cle alguns bonapanistas auto-

HIST6RJA DO SECULO XIX '2i:J7

ritarios pretende igualmente uma prova de for<;a que possa rcstituir o prestigio do regime e consolidar a clinastia abalada por cliticuldaclcs internas e entraves cia po­litica externa (clesignaclameme o fracasso cia expcdir;iio do Mexico em 1867 J.

A vaciincia do trono de Espanha- a rcvolur;ao. em Setemhro de 1868. dcr­ruhou a rainha Isabel II- vai dar a Bismarck o prctexto para a ruptura. A cancli­clalllra de um principe prusso. Leopolclo de Hohenwllern. primo de Guilherme I. suscita uma forte emor;ao em Franc;a. vendo a opiniuo nesta iniciativa do gene­ral Prim. ministro espanhol da Guerra. uma amear;a de cern>. TOlht,·ia. na se­quencia de uma diligencia do >eu embaixaclor. o govcrno imperial com,cgue que Guilherme I fa(fa Leopoldo renunciar ao seu projecto.

0 assunto parcce estar resolvido. e Bismarck. furio.,u por 1·er ..:air o acordo. apressa-sc a apresentar a sua clemiss~io , quando u duquc de Gnunont. mi nistro fran­ces dos Neg6cios Estrangeiros. comete a imprucicncia de ten tar conseguir mais: a saber. a promessa t'eita pelo rei cia Prussia cie que nilo 1 ollaria a vcrificar-se sc­melhante amca~a. Tendo Guilhennc I rejeitado estc pcdido apresentado pclo cm­baixador Bcnecleui. Bismarck aproveita logo a situa~iio. di1 ulgando um rcsumo cleste texto, conferindo-lhc um tom injurioso para a Franc;a. lnstigado pelu wn­venticulo cia imperatriz e por uma opiniao pLihlica exacerbada - as pc,soas manifestam-se nas grandes aveniclas ao grilo de <<aBerlim' » -. o Governo deNa­poleao III cai na armadilha e dec lara guerra a Prussia a 19 de Julho de I R70. nilo obstame os esforc;os de alguns opositores. como Thiers e Gambeua.

Se bem que o marechal Lebouef. ministro da Guerra. tenha declarado que niio lhe t'allava <<Liln botao de polaina>> . o equilibrio das forc;as penclia nitidamcnte a favordacoliga<;iio dos Estados ale miles. 0 cxcrcito de Von Mollke era mais nutne­roso. mais bem comandaclo c mais bem instruido que o exercito imperial. A sua supcrioridacle era manifesta no domfnio cia artilharia (canhiics Krupp) e da logi;,­tica. Utilizou sobretudo para a sua mobiliza<;ao uma rede de c>trada> muito clensa e muito moderna.

Ncstas concli<;6es. a batalha das fronteiras sal dou-se numa dupla cierrotn para os Franceses: a de Mac Mahon. em Froesehwiller. a 6 de Agosto. oncle npemb conseguiu escapar gra<;as as cargas her6icas de cavalaria de Reichshollen. e a de Frossarcl, em Forbach. Tendo-se tornado comandante-chefe. o amhicioso e mediocre marechal Bazainc deixou-se bloquear em Metz pelo excrcito da Lorena. Napoleao IIJ e Mac Mahuntentaram irem seu auxilio. mas acabaram por se clcixar cercar na bacia de Sedan e viram-se obrigaclos a capitular a I de Setembro. dci­xanclo a Fran~a scm for(fa mil itar eo imperador prisioneiro. Ao anLincio desta catas­trot'c. os parisienscs puderam decretar scm resistencia a quecla clu Imperio. A 4 de Setembro. a Republica foi proclamacla no:, Pa<;os do Concelho e constituiclo tun Govcrno de Defcsa Nacional para organiLar a resistencia. para grande surpresa de Bismarck, que julgava a Fran~a clcl'initivamentc aniquilacla.

lnstigado por Gam bella. que abanclonara Paris num are6stato a II 111 de alcanr;ar Tours. o Governo de Dcfesa Nacional rccrutounovas tropas. animadas de um forte entusiasmo patri6tico. mas muito menos expericlHes que os scus advcrs<1rios. Os exereitos do Loire. do None e cin Leste conseguiram alguns cxitns locais mas nao desbloquear Paris. cercada clcscle 20 de Setemhro e sujcita i1 fome. no frio e aos

Page 23: História do século XIX

288 PIERRE N/ILZA e SERGE BERSTEIN

bombardcamentos da artilharia prussa. Os defensores da capital tentaram por di­versas vezes libcrtar-sc au·aves de surtidas em massa e que custarammuitas viclas humanas (Champigny. Buzcnval ), mas sem resultado. A 28 de Janeiro, o Govern a vi u-se obrigado a pcclir o armistfcio e a Assembleia Nacional. eleita em Fevereiro, pronunciou-se a favor cia paz.

Bismarck venceu em toclos os aspectos. Como previra. a guerra nacional em­preendicla contra a Fran~a consolidara a unidade dos Alemucs. No entusiasmo que se seguiu it vi tori a, o Saxe. o grao-clucaclo de Baden eo Wurtenberg aderem a Con­fcclerac; iio do None da Alemanha. Foi necessaria mais tempo para yuc Luis II cia Bavicra se resignasse a dar o exemplo. Para veneer as suas reticencias e as de uma popula~ao que. de maioria cat61ica. estava pouco disposta a fundir-se num con­junto alemilo clominaclo por protestantcs. Bismarck apresentou ao rei da Baviera a seguintc alternativa: ou o pais aceitava entrar na Confe~lerac;iio ou entao era ex­pulso cia Alemanha e excluido do Zollverein, como a Austria. Luis [[ aceitou a primeira soluc;ao. contra a promessa de uma grande autonomia intcrna.

So res tava proclamar Guilhcnne J «imperaclor clos Alcmiies». A cerim6nia teve Iugar na Galeria dos Espclhos do Pal;\c io de Yersalhes. a 18 de Janeiro de 187 1. Marcou. ao mesn10 tempo. o nascimento de um Estado forte e que iria passar a ter um peso decisi vo nos clestinos cia Europa. o triunfo de uma concepc;ao da nr~~ao assente. nao na aclcsiio clos povos. mas na for<;a das armas. Assim. o Trataclo de Francofone. assinado a LOde Maio de 1871. imp6s a Frant;a uma paz clraconiana, retirando-lhe, se m ter sequer em consiclera~ao a vontade clas popula<;oes interes­saclas . a Alsacia e a Lorena no None.

Realizacla pela for<;a. sem a menor preocupa~ao com a vontacle popular. a uniclacle alema an uncia uma nova concepc;ao do princfpio clas nacionaliclacles. J a se perfilava, na esteira das aspirac;ocs nacionais. o espectro de Lllllllacionalismo ex­clusivo e conquistador que nao iria tarclar a virar uns contra os outros os povos do Yel ho Continente.

CAPITULO 20

........ 0 HEINO UNIDO: APOGEU E DECLfNIO DA ERA VITORIANA

De meados do seculo x1x ate a decacla de 1870, o Rei no Uniclo encomra-sc no auge do seu poder economico e somcnte em l'inai s cia dec ada de 1880 come~ a a se1· pasta em causa a sua supremacia industrial. Um crescimento clemogrMico conti­nuo e uma forte urbani zac;ao nao vem, no cntanto, constestar a traclicional hierar­quizac;ao de uma socieclacle que se mantem muito desigualitaria, a riqucza de uma aristocracia latifuncli:.'iria e da grande burguesia que contrasta com a miscria de um sub-proletariaclo operario que apenas come<;a a organizar-se nos finais do seculo XIX. As novas rcfonnas eleitorais acentuam a democratiza<;iio eta vida publica. ou altern am no pocler conservaclores c liberais. Mas os cliferentes governos britilnicos confrontam-se sempre com a insoluvel questiio cia Irlanda que niio p<lra de se agra­var nesta seguncla metacle do seculo XIX.

........ A EVOLUCAO ECONOMICA E SOCIAL

A PROSPERIDADE ECONOMICA

Em mcados do seculo xtx. o Rei no Uniclo continua a beneficiar das vantagcns que rizeram deste pais o pioneiro da 1·evolw;ao industrial e urbana (Capitulos 2 e 7). Os no1·os progrcssos vem rcfon;:ar ainda mai s a posi<;iio clominante na econo­mia mundial ate its cl0~:aclas de I X70-18RO. Afcctaclo como os outrm pi.tiscs pel a grande dcpressao ck 1873- 1 iNS. o Rei no Uniclo conhece dcpoi> um relatiWl dec! f-

UihlitltcC'a da llis\l)ria I~- IY