Histórico Previdencia Social (1)

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Trata do desenvolvimento da Previdência social

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    CURSO DO PROF. DAMSIO A DISTNCIA

    MDULO I

    DIREITO PREVIDENCIRIO E DA SEGURIDADE SOCIAL

    Histrico e Organizao da

    Seguridade Social no Brasil

    __________________________________________________________________

    Rua da Glria, 195 Liberdade So Paulo SP CEP: 01510-001 Tel./Fax: (11) 3164.6624 www.damasio.com.br

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    DIREITO PREVIDENCIRIO E DA SEGURIDADE SOCIAL

    1. HISTRICO E ORGANIZAO DA SEGURIDADE SOCIAL NO BRASIL: ASPECTOS INTRODUTRIOS

    A Seguridade Social tem por finalidade assegurar, populao, proteo contra as denominadas contingncias sociais, i.e., situaes que impedem (ou dificultam) ao indivduo a manuteno de seu prprio sustento e de seus dependentes. Tal proteo exteriorizada por meio de servios e benefcios gerenciados, em conjunto, pelos Poderes Pblicos e pela sociedade.

    Diante de seu carter social, o sistema de Seguridade profundamente influenciado pelo regime poltico no qual se desenvolve. No por acaso, sua maior evoluo coincide com o surgimento do Welfare State (Estado de bem-estar social), quando se reconhece a obrigao de o Estado fazer frente s necessidades bsicas da populao, com a finalidade de promover o desenvolvimento social.

    No so de se estranhar, assim, as constantes mudanas por que passa o regime de Seguridade Social (especialmente de Previdncia Social) brasileiro. Com efeito, tal regime tende a acompanhar a alterao das condies econmicas, polticas, sociais e jurdicas ocorridas no pas, estando, por tal razo, em constante mutao.

    Assim, por exemplo, em razo de alterao das condies econmicas do sistema, o legislador brasileiro houve por bem criar, em 1999, o denominado fator previdencirio fator de reduo do valor da aposentadoria conforme a idade, expectativa de vida e tempo de contribuio do segurado, a seguir estudado. Ou, ainda, em 1982, instituiu penso especial vitalcia aos portadores da deficincia fsica conhecida como Sndrome da Talidomida (Lei n. 7.070, de 20 de dezembro de 1982).

    Independentemente da situao poltica de determinado Estado, porm, insta salientar que a Seguridade Social uma obrigao do Poder Pblico e um direito de todo cidado.

    No Brasil, a Constituio Federal de 1988 (CF/88) expressamente consagrou o sistema de Seguridade Social no Captulo II do Ttulo VIII (Da Ordem Social), especialmente nos arts. 194 a 204. Trata-se de inovao da Constituio-cidad, pois como se ver adiante essa a primeira vez em que o regime de Seguridade resta positivado pelo texto constitucional brasileiro.

    Apenas a ttulo introdutrio, insta apontar alguns aspectos essenciais do art. 194 da CF/88, que contempla o conceito da Seguridade Social:

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    Art. 194, CF/88. A seguridade social compreende um conjunto integrado de aes de iniciativa dos Poderes Pblicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos sade, previdncia e assistncia social.

    Objetivo da Seguridade Social, como dito, fazer frente s contingncias sociais, i.e., amparar os cidados nas hipteses em que no possam, sozinhos, prover as suas necessidades. No que tange especificamente Previdncia Social (a qual, como se ver a seguir, uma das reas de atuao da Seguridade), as contingncias cobertas pelo sistema vm previstas expressamente no art. 201 da CF/88.

    As aes voltadas Seguridade Social tm carter integrado: so promovidas no apenas pelos Poderes Pblicos mas tambm pela sociedade. Essa ltima participa do regime por meio de seu financiamento (pagamento de contribuies previdencirias) ou mesmo mediante prestao direta de servios de assistncia e sade (por meios de ONGs, entidades beneficentes etc.).

    A Seguridade Social contempla trs esferas de atuao, a saber:

    a) Sade;

    b) Previdncia Social;

    c) Assistncia Social.

    No mbito infraconstitucional, essencial o conhecimento das Leis n. 8.212/9, n. 8.213/91 e n. 8.742/93, bem como do Decreto n. 3.048/99 (Regulamento da Previdncia Social RPS) , portanto necessrio que o aluno tenha disposio o texto completo e atualizado dos referidos diplomas legais. Outros instrumentos normativos sero tambm mencionados no decorrer do curso , porm no necessariamente dever o aluno buscar o texto integral de tais instrumentos (sempre que isso se fizer necessrio, ser expressamente mencionado).

    Questionamento frequente dos estudantes de Direito Previdencirio e da Seguridade Social refere-se necessidade de efetuar a leitura dos diplomas legais acima mencionados. A leitura , sem sombra de dvida, parte essencial do estudo dessa matria (especialmente do RPS) , porm recomendamos que seja feita em etapas, conforme o aluno for superando os temas fundamentais do Direito Previdencirio. Assim, e.g., aps estudar contribuies, deve o aluno ler, entre outros, o art. 195 da CF/88, os arts. 16 e ss. do Plano de Custeio (Lei n. 8.212/91), os arts. 194 e ss. do RPS.

    Concludas tais consideraes iniciais, passa-se ao estudo da Seguridade Social no Brasil.

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    2. HISTRICO DA SEGURIDADE SOCIAL

    A preocupao do Estado e da prpria populao com as contingncias sociais que comprometem a subsistncia dos cidados reconhecida desde o incio do desenvolvimento das relaes humanas. Assim, j no Direito romano constata-se a existncia de espcie de aposentadoria aos militares: permitia-se que esses funcionrios a servio da nao destinassem parte de seu soldo a um fundo, o qual funcionaria como substituto de sua remunerao quando se aposentassem.

    Tambm nessa poca, registra-se o surgimento de associaes de pequenos produtores e artesos livres, que contribuam para um fundo comum destinado a custear as despesas de seus prprios funerais. Posteriormente, na Idade Mdia, tais associaes evoluem para as corporaes de ofcio, que promovem amparo aos associados no caso de velhice, doena e pobreza.

    Porm, durante um longo perodo, a preocupao primordial da populao refere-se no propriamente s contingncias sociais, e sim quelas de natureza econmica que poderiam comprometer o bom desenvolvimento dos negcios e a prpria afirmao dos Estados no cenrio econmico mundial. Nesse contexto, data de 1344 a celebrao do primeiro contrato de seguros martimos, o qual seria seguido por muitos outros instrumentos dessa natureza.

    Entretanto, nesse aspecto, constata-se, em verdade, desenvolvimento do Direito Mercantil, e no da Seguridade Social propriamente dita o que somente vem a ocorrer em 1601, com a promulgao, na Inglaterra, da primeira lei de Seguridade Social: Lei de Amparo aos Pobres (Act for the Relief of the Poor, tambm conhecida como Elizabethan Poor Law ou Poor Relief Act).

    Trata-se de lei de ntido cunho assistencial, que instituiu a obrigao de o Estado prestar amparo aos indivduos que no podiam trabalhar ou no conseguiam arrumar trabalho. Em 1793, por seu turno, a Constituio francesa consagrou a assistncia pblica como dvida sagrada, sendo seguida pela Constituio de 1848.

    Ainda, como marcos da evoluo da Seguridade Social, podem-se mencionar o Workmens Compensation Act (Inglaterra, 1897), que instituiu seguro obrigatrio contra acidentes de trabalho, a lei francesa de 1898, que estabeleceu a assistncia velhice e aos acidentes do trabalho, e Old Age Pensions (Inglaterra, 1908), que criou penses para os maiores de 70 anos.

    O primeiro sistema de Seguridade Social de que se tem registro, entretanto, surgiu na Alemanha de Otto Von Bismarck. Foi sendo gradativamente implementado, entre os anos de 1883 e 1911, ano em que foi publicado o Cdigo de Seguro Social alemo. Tal sistema introduziu uma srie de protees sociais, como o seguro contra velhice, acidentes do trabalho (custeado pelos empregadores e independente da comprovao de culpa) e doena (custeado por trabalhador, empregador e Estado).

    Questionam-se, entretanto, as verdadeiras motivaes do referido sistema: segundo a doutrina majoritria (MARTINS, 2008), este no tinha por objetivo verdadeiro

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    a melhoria das condies de vida poca, e sim a conteno dos movimentos socialistas advindos da crise industrial. A Revoluo Industrial, de fato, seria decisiva para a consolidao de tais sistemas em todo o mundo, na medida em que as pssimas condies de trabalho fizeram nascer, na massa operria, esprito de organizao para fazer frente s contingncias sociais.

    Nesse contexto, e.g., em 1898, a Frana promulga lei instituindo assistncia velhice e aos acidentes de trabalho; seguida pela Inglaterra em 1897, com o Womens Compensation Act (que institua seguro obrigatrio aos acidentes de trabalho), e em 1908, com a promulgao do Old Age Pensions Act (tratando da assistncia velhice). Porm, a efetiva consolidao dos sistemas de Seguridade Social em todo o mundo d-se a partir do movimento denominado Constitucionalismo Social, no incio do sculo XX.

    O referido movimento prega a positivao de direitos sociais nas normas fundamentais do Estado (i.e., Constituies), garantindo-lhes proteo diferenciada. Expoentes desse movimento so as Constituies do Mxico (1917), da URSS (1918) e de Weimar (Alemanha 1919), todas contemplando, em seu bojo, rol de direitos previdencirios.

    A partir de ento, verifica-se profuso legislativa no segmento da Seguridade Social, podendo-se mencionar as polticas do New Deal (EUA), o Plano Beveridge (Inglaterra), a Declarao Universal dos Direitos do Homem (1948), as Convenes da OIT sobre direitos sociais etc.

    Observao: O Plano Beveridge (elaborado em 1942, com o objetivo de trazer alternativas para a reconstruo da Inglaterra no perodo ps-guerra) considerado por muitos autores como o responsvel pelo surgimento da Seguridade Social propriamente dita, vez que consagra aes estatais nas trs esferas de tal sistema: Sade, Assistncia e Previdncia Social. So marcos relevantes de referido plano: a) pela primeira vez, estende-se a proteo social no apenas ao empregado, mas a toda espcie de trabalhador (i.e., ainda que sem vnculo empregatcio); b) cria-se o sistema trplice de custeio; c) firma-se a concepo de que a Assistncia Social tem a finalidade de preencher lacunas deixadas pela Previdncia Social; d) favorece-se a permanncia do trabalhador em atividade, atribuindo-se benefcios maiores queles que contriburem ao sistema durante mais tempo.

    No Brasil, j a Carta Imperial de 1824 continha previso sobre a Seguridade Social, especificamente no mbito da sade, ao estabelecer, no art. 179, a constituio dos socorros pblicos (embries das Santas Casas de Misericrdia). Nessa poca, ademais, leis esparsas surgiam para regulamentar contingncias sociais, como, e.g., regras contidas no Cdigo Comercial sobre acidentes do trabalho e aposentadoria aos empregados dos Correios. Algumas categorias de trabalhadores (especialmente funcionrios pblicos) organizavam-se em montepios, que asseguravam a prestao de penso por morte.

    A Constituio de 1891 a primeira a consagrar a expresso aposentadoria assegurada aos funcionrios pblicos a servio da nao que fossem acometidos de

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    invalidez para o trabalho. Posteriormente, a Lei n. 3.724, de 1919, viria a estabelecer indenizao no caso de acidente de trabalho.

    O grande marco da Seguridade Social brasileira , entretanto, a Lei Eloy Chaves (Decreto-Lei n. 4.682, de 24 de janeiro de 1923).

    A referida lei estabeleceu diversos direitos de natureza previdenciria categoria dos ferrovirios, entre os quais se destacam os benefcios de aposentadoria por invalidez, aposentadoria ordinria (atual aposentadoria por tempo de servio), penso por morte e assistncia mdica gerenciados por uma Caixa de Aposentadoria e Penso (CAP). Ademais, no mbito do Direito laboral, estabeleceu o direito estabilidade no emprego aps 10 anos de servio efetivo.

    O financiamento de tais benefcios era realizado mediante contribuies dos trabalhadores e dos usurios dos transportes como se v, ainda no fora consagrado o trplice sistema de custeio, que somente seria institudo na dcada de 1930, com a criao dos Institutos de Aposentadoria e Penso (IAPs), e positivado na Constituio Federal de 1946. Ademais, veja-se que tal sistema no era organizado pelo Estado, e sim pelas CAPs (as quais eram institudas em cada uma das empresas ferrovirias assim, a administrao do sistema era feita pelos prprios empregadores lei s apontava diretrizes gerais).

    Inicialmente restrita aos ferrovirios, a Lei Eloy Chaves foi, paulatinamente, ampliada para outras categorias de funcionrios pblicos, como professores, pessoal de empresas de servios telegrficos, de gua, portos etc. Surgem, dessa maneira, diversas outras CAPs, cada qual destinada proteo social de uma categoria de funcionrios pblicos.

    A partir da dcada de 1930, tambm o setor privado passa a se organizar em grupos para assegurar, entre seus membros, determinados benefcios sociais. Surge, ento, o conceito de mutualismo sistema em que todos os participantes envidam esforos para um fim comum.

    Da organizao do setor privado, nascem os IAPs, pioneiros na criao do sistema de trplice custeio para manuteno e concesso de benefcios sociais: colaboram, dessa maneira, empregados, empregadores e Estado. Os IAPs criados nessa poca foram, entre outros, os Institutos de Aposentadorias e Penses dos Industririos (IAPI), dos Martimos (IAPM) e dos Comercirios (IAPC).

    A partir de ento, as Constituies brasileiras passam a contemplar direitos sociais em seu corpo, positivando ainda que de maneira tmida benefcios assegurados ao cidado.

    Assim, a Constituio de 1934 contemplava diversas disposies sobre amparo social, alm de benefcios relacionados s contingncias de maternidade, velhice, invalidez, acidentes do trabalho e morte bem como a trplice forma de custeio. Na

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    Constituio de 1946, consolidada preexistncia do custeio, bem como o seguro obrigatrio contra acidentes de trabalho, custeado pelo empregador.

    O sistema de Seguridade Social ento vigente no Brasil, entretanto, no era unitrio: cada Instituto ou Caixa de Aposentadoria era responsvel pela organizao e gesto de seu prprio programa de benefcios e custeio. Coexistiam diversos regimes previdencirios no pas cada qual administrado por um determinado rgo e contendo regras prprias sobre custeio, aquisio da qualidade de segurado, benefcios etc.

    Fez-se necessria, assim, a unificao tais sistemas. Em 1960, aps tramitar no Congresso Nacional por 13 anos, foi publicada a primeira Lei Orgnica da Previdncia Social (LOPS) Lei n. 3.807, de 6 de agosto de 1960, contemplando plano nico de benefcios e servios da Seguridade Social brasileira (e unificando os diversos regimes previstos pelos IAPs uniformizao legislativa). Em 1966, ainda, o Decreto-Lei n. 72, de 21 de novembro de 1966, determinou a centralizao dos IAPs ento existentes em um nico rgo: o Instituto Nacional de Previdncia Social (INPS uniformizao institucional).

    A partir de ento, a Seguridade Social brasileira comea a tomar forma, aproximando-se do modelo atualmente vigente.

    Assim, em 1974, e.g., ocorre o desmembramento do Ministrio do Trabalho e da Previdncia Social e instituio de Ministrio especfico para tratar da Seguridade Social (Ministrio da Previdncia e Assistncia Social MPAS). Ainda, no mesmo ano, institudo o benefcio de renda mensal vitalcia, que posteriormente viria a ser substitudo pelo benefcio assistencial, a seguir estudado.

    em 1977, com a criao do Sistema Nacional de Previdncia e Assistncia Social (Sinpas), que tal aproximao se torna mais evidente (Lei n. 6.439, de 1 de setembro de 1977). Com efeito, por meio de tal sistema, tem-se a consolidao dos trs mbitos de atuao da Seguridade Social, hoje contemplados no art. 194 da CF/88: Previdncia Social (administrada pelo INPS), sade (administrada pelo Instituto Nacional de Assistncia Mdica da Previdncia Social Inamps) e assistncia social (administrada pela Fundao Legio Brasileira de Assistncia LBA). No mesmo sistema, insere-se o Instituto de Administrao Financeira da Previdncia Social (Iapas), rgo competente para promover a arrecadao, a fiscalizao e a cobrana das contribuies e outros recursos da Seguridade Social, e a Dataprev, responsvel pelo processamento de dados e realizao de pesquisas em matria de Seguridade.

    Em 1988, conforme j ressaltado, a CF expressamente consagra o sistema de Seguridade Social no Captulo II do Ttulo VIII (Da Ordem Social). Alm de estabelecer a organizao de tal sistema e seus princpios basilares, a Constituio-cidad consagra expressamente em seu texto o direito a diversos benefcios da Seguridade Social, como se extrai, e.g., do art. 7., da por que apontada como o primeiro marco constitucional em matria de Seguridade Social brasileira.

    Em 1990, da fuso do INPS com o Iapas, surge o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) autarquia federal, sediada em Braslia, responsvel pela cobrana de

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    contribuies previdencirias e administrao de benefcios. O INSS criado pela Lei n. 8.029/90 e, em seguida, entram em vigor as Leis n. 8.212 e n. 8.213 (respectivamente, plano de custeio e de benefcios da Previdncia Social).

    Em 1993, extinto o Inamps e suas funes atribudas ao Sistema nico de Sade (SUS) o qual j fora regulamentado pela Lei n. 8.080/90. Em 1993, promulgada a Lei n. 8.742, que versa sobre a assistncia social ( a denominada Lei Orgnica da Assistncia Social LOAS).

    Em 1995, extinta a LBA e suas funes, transferidas para o INSS (o qual, at hoje, congrega o gerenciamento tanto da Previdncia quanto da assistncia social). Em 1999, promulgado o atual Regulamento da Previdncia Social (RPS) Decreto n. 3.048/99.

    Em 1998, houve marcante reforma da Previdncia Social operada pela Emenda Constitucional (EC) n. 20, de 15 de dezembro de 1998; em seguida, em 1999, tal reforma foi complementada pela instituio, pela Lei n. 9.876, de 26 de novembro de 1999, do fator previdencirio. Em 2003, houve alterao sistmica do regime prprio de Previdncia Social dos servidores pblicos, tornando-se este mais prximo ao regime geral de Previdncia Social, aplicveis aos empregados do setor privado (EC n. 41, de 19 de dezembro de 2003, regulamentada pela Lei n. 10.887/2004).

    Em julho de 2005, a arrecadao, fiscalizao, lanamento e normatizao de receitas previdencirias foram unificados na Secretaria da Receita Federal do Brasil, tambm chamada de Super Receita (instituda pela Medida Provisria n. 258/2005, posteriormente convertida na Lei n. 11.457/2007). Conforme estudaremos a seguir, o INSS deixa de ter competncia para arrecadar, fiscalizar, administrar, lanar e normatizar o recolhimento das contribuies sociais das empresas, do empregador domstico e dos trabalhadores, descritas pelas alneas "a", "b" e "c" do pargrafo nico do art. 11 da Lei n. 8.212/91, alm das contribuies de terceiros, passando tal atribuio Secretaria da Receita Federal do Brasil.

    3. ESFERAS DE ATUAO

    Conforme acima salientado, trs so, nos termos do art. 194 da CF/88, as reas de atuao da Seguridade Social, a saber: sade, assistncia social e Previdncia Social. Estudaremos cada uma delas separadamente.

    3.1. Sade

    Prevista pelos arts. 196 a 200 da CF/88, a sade considerada dever do Estado e direito do cidado, sendo assegurado seu acesso universal (i.e., por parte de todas as pessoas brasileiros e estrangeiros residentes no pas) e integral (i.e., a todas as suas

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    prestaes), independentemente do pagamento de contribuies. Assim, trata-se de sistema NO CONTRIBUTIVO.

    Nos termos do art. 196, a sade envolve trs atividades distintas: preveno (que, segundo a CF/88, prioritria), proteo e recuperao.

    A sade integra uma rede regionalizada e hierarquizada, organizada de acordo com as seguintes diretrizes: descentralizao, com direo nica em cada esfera de governo; atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas; e participao da comunidade.

    Atualmente, o sistema de sade brasileiro gerenciado pelo SUS (regulamentado pela Lei n. 8.080/90). As atribuies de tal sistema que, como se ver a seguir, marcado por ampla descentralizao vm descritas no art. 200 da CF/88:

    Art. 200, CF/88. Ao sistema nico de sade compete, alm de outras atribuies, nos termos da lei:

    I controlar e fiscalizar procedimentos, produtos e substncias de interesse para a sade e participar da produo de medicamentos, equipamentos, imunobiolgicos, hemoderivados e outros insumos;

    II executar as aes de vigilncia sanitria e epidemiolgica, bem como as de sade do trabalhador;

    III ordenar a formao de recursos humanos na rea de sade;

    IV participar da formulao da poltica e da execuo das aes de saneamento bsico;

    V incrementar em sua rea de atuao o desenvolvimento cientfico e tecnolgico;

    VI fiscalizar e inspecionar alimentos, compreendido o controle de seu teor nutricional, bem como bebidas e guas para consumo humano;

    VII participar do controle e fiscalizao da produo, transporte, guarda e utilizao de substncias e produtos psicoativos, txicos e radioativos;

    VIII colaborar na proteo do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho.

    Como dito, caracterstica essencial do SUS o fato de este ser amplamente descentralizado. Portanto, h ao e financiamento conjuntos entre Unio, Estados e Municpios, com direo nica em cada esfera governamental. Ressalte-se que, embora a CF/88 preveja ampla coordenao entre as esferas governamentais na prestao da sade, no h hierarquia entre elas, mas to somente repartio de competncias. Assim, compete:

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    Unio, por meio do Ministrio da Sade, a fixao de polticas gerais (campanhas publicitrias, normas e mecanismos de controle da sade, polticas de saneamento bsico e vacinao etc.);

    Aos Estados, por meio das Secretarias de Sade, a organizao geral dos servios de sade e a instituio de polticas estaduais;

    Aos Municpios, por meio das Secretarias ou Subsecretarias de Sade, o atendimento emergencial e gerenciamento dos servios de vigilncia (sanitria, de sade do trabalhador, de saneamento bsico etc.). O Municpio o principal responsvel pela prestao dos servios de sade por tal razo, -lhe permitida a celebrao de consrcios pblicos ou organizao em distritos, para melhor atendimento da populao.

    Alm dos rgos pblicos, tambm a iniciativa privada livre para atuar na assistncia sade (mediante, por exemplo, a instalao de clnicas, consultrios, hospitais etc.). Admite-se, ainda, a atuao da iniciativa privada no SUS como atividade supletiva (mediante contrato de Direito Pblico ou convnio) caso em que, em se tratando de entidade sem fim lucrativo, poder receber auxlio financeiro do Poder Pblico. Em qualquer hiptese, porm, vedada a participao direta ou indireta, na sade, de empresas formadas por capital estrangeiro (parcial ou totalmente), salvo nos casos previstos em lei.

    A CF/88 prev, desde 2006, a possibilidade de gestores locais dos sistemas de sade admitirem agentes comunitrios de sade e agentes de combate s endemias, por meio de concurso pblico. A Lei n. 11.350/2006 contempla as regras de contratao e regime jurdico dos referidos servidores pblicos.

    Os pargrafos do art. 196 da CF/88 disciplinam o financiamento do SUS, atribuindo seu custeio aos recursos do oramento da Seguridade Social, da Unio, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municpios, alm de outras fontes (que podem ser doaes, rendimentos, alienaes de bens etc.).

    Papel importante compete aos denominados Fundos de Sade, responsveis pelo recolhimento das contribuies de cada ente da Federao, bem como pela transferncia de receitas destinadas sade entre eles (na denominada transferncia entre fundos). Os Conselhos de Sade, por seu turno, fiscalizam a aplicao de tais recursos.

    3.2. Assistncia Social

    A assistncia social, prevista nos arts. 203 e 204 da CF/88, alm de na Lei n. 8.742/93 (LOAS), tem por objetivo prestar amparo aos hipossuficientes, independentemente de contribuies Seguridade Social.

    Nesse sentido, o art. 1. da Lei n. 8.742/93 ressalta a natureza no contributiva desse ramo da Seguridade Social o qual, por tal razo, tem carter geral, destinando-se

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    a toda e qualquer pessoa que demonstrar sua incapacidade de prover a seu prprio sustento.

    Segundo ressalta Wladimir Novaes Martinez (2008), a assistncia social contempla conjunto de pequenos benefcios em dinheiro, assistncia sade, fornecimento de alimentos e outras pequenas prestaes, que complementam os servios prestados pela Previdncia Social, a seguir estudada. Para Sergio Pinto Martins um conjunto de princpios, de regras e de instituies destinado a estabelecer uma poltica social aos hipossuficientes, por meio de atividades particulares e estatais, visando concesso de pequenos benefcios e servios, independentemente de contribuio por parte do prprio interessado.

    Assim, nos termos do art. 203 da CF/88, so objetivos da assistncia social:

    A proteo famlia, maternidade, infncia, adolescncia e velhice;

    O amparo s crianas e adolescentes carentes;

    A promoo da integrao ao mercado de trabalho;

    A habilitao e reabilitao das pessoas portadoras de deficincia e a promoo de sua integrao vida comunitria;

    A garantia de um salrio mnimo de benefcio mensal pessoa portadora de deficincia e ao idoso que comprovem no possuir meios de prover prpria manuteno ou de t-la provida por sua famlia, conforme dispuser a lei (Lei n. 8.742/93).

    Atualmente, a Assistncia Social gerida pelo Sistema nico de Assistncia Social (SUAS), vinculado ao Ministrio do Desenvolvimento Social e Combate Fome. Assim como na sade, sua atuao altamente descentralizada, com a seguinte repartio de competncias:

    Unio: atua na determinao de normas gerais (institudas pelo Conselho Nacional da Assistncia Social CNAS) e na concesso e manuteno dos benefcios de prestao continuada, a seguir estudados (geridos pelo INSS);

    Estados: prestam auxlio financeiro aos Municpios e realizam atividades assistenciais em carter de emergncia;

    Municpios: prestam servios assistenciais (e.g., servio social, habilitao e qualificao profissional etc.) e efetuam o pagamento dos denominados benefcios eventuais.Tambm so responsveis pela execuo, em conjunto com entidades privadas, de projetos de enfrentamento da pobreza.

    Tal como na sade, no h hierarquia entre tais entes da Administrao. Ademais, tambm se admite a prestao da assistncia social por particulares, por meio de entidades de beneficncia e de assistncia social (ex.: ONGs). A respeito, dita o art. 204

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    da CF/88 ser indispensvel a participao da populao na prestao da assistncia social, por meio de organizaes sociais (inclusive sindicatos), assim como no controle das aes prestadas nos diferentes nveis governamentais.

    O custeio da assistncia social segue a disciplina do art. 195 da CF/88, a seguir analisado.

    a) Benefcios da Assistncia Social

    Como acima salientado, so diversos os benefcios e servios prestados pela assistncia social. A seguir, estudaremos os mais relevantes, por ordem de importncia:

    9 Benefcio de prestao continuada: tambm denominado benefcio assistencial, renda mensal vitalcia (denominao ultrapassada, no mais utilizada pela Lei n. 8.742/93), benefcio de LOAS, ou em denominao tecnicamente incorreta, mas utilizada no dia a dia simplesmente LOAS. benefcio mensal, no valor de um salrio mnimo, assegurado pessoa que, mesmo no segurada da Previdncia Social (i.e., independentemente do pagamento de contribuies previdencirias), seja idosa ou deficiente e comprove no possuir meios de prover a sua prpria subsistncia ou de t-la provida por sua famlia.

    Nos termos da lei, no possui meios de prover a sua prpria manuteno ou t-la provida por sua famlia o indivduo cuja renda familiar per capita seja inferior a um quarto do salrio mnimo.

    Idosa, para fins de recebimento do benefcio, a pessoa com idade igual ou superior a 65 anos. Por seu turno, pessoa com deficincia aquela que tem impedimentos a longo prazo (que a incapacitam para a vida independente e para o trabalho pelo prazo mnimo de 2 anos) de natureza fsica, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interao com diversas barreiras, podem obstruir sua participao plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas.

    Para clculo da renda, divide-se o total de rendimentos da famlia pelo nmero de pessoas que vivem sob o mesmo teto (grupo familiar) e que se enquadram em uma das seguintes qualificaes, em relao ao beneficirio: cnjuge, companheiro(a), pais (ou, na ausncia de um deles, a madrasta ou o padrasto), irmos solteiros, filhos e enteados solteiros e menores tutelados.

    Assim, e.g., imagine-se que Maria, de 68 anos de idade, pretenda pleitear o benefcio de prestao continuada. Em sua casa, residem com ela seu esposo, Jos, e seu neto, Pedro, de 5 anos de idade. Jos faz bicos como carpinteiro, recebendo remunerao mdia de R$ 300,00 por ms.

    Para clculo da renda per capita, sero consideradas apenas duas pessoas: Maria e Jos, j que o neto no se enquadra no conceito de grupo familiar (previsto pela Lei n. 8.742/93 e acima exposto). Assim, ao se dividir o valor de R$ 300,00 por duas pessoas, obtm-se renda per capita superior a um quarto do salrio mnimo o que afasta o direito de Maria a receber o benefcio assistencial.

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    Ateno: se a renda familiar per capita corresponder a exatamente um quarto do salrio mnimo, a rigor, pelo texto legal, no cabe a concesso do benefcio de prestao continuada. Porm, a jurisprudncia tem abrandado tal critrio, entendendo ser possvel o recebimento do benefcio nesse caso. Alis, na jurisprudncia, so comuns decises divergentes acerca desse critrio em alguns casos, e.g., deduzem-se da renda as despesas da famlia (e.g., com medicamentos, alimentao, moradia etc.), antes de efetuar-se a diviso per capita; concedido o benefcio mesmo que a renda seja um pouco superior ao critrio estabelecido em lei etc. De qualquer maneira, a lei no admite tais abrandamentos o critrio objetivo e, como tal, deve ser interpretado.

    O benefcio de prestao continuada no pode ser acumulado com qualquer outro benefcio da Seguridade Social, salvo assistncia mdica e penso especial de natureza indenizatria (e.g., penso concedida aos dependentes das vtimas da tragdia da hemodilise, em Caruaru PE).

    De outra parte, possvel que duas pessoas de uma mesma famlia venham a receber o benefcio de prestao continuada; nesse caso, segundo entendimento jurisprudencial dominante, o valor do benefcio recebido por qualquer pessoa da famlia no entrar no clculo da renda familiar.

    Em verdade, o art. 34, par. un., do Estatuto do Idoso estabeleceu que o benefcio assistencial concedido ao idoso no seria considerado para o clculo da renda familiar, o que levava a crer que, no caso de concesso do mesmo benefcio ao deficiente, este seria considerado. Porm, entendendo que tal diferenciao seria injustificada, a jurisprudncia vem interpretando o par. un. do art. 34 de maneira ampla para reconhecer que o benefcio no integra o clculo da renda familiar, seja recebido pelo idoso ou pelo deficiente.

    Assim, e.g., imagine-se uma determinada famlia composta pelos pais e um filho deficiente, que recebe LOAS (benefcio que corresponde nica renda da famlia). Se a me completa 65 anos e decide pleitear o benefcio, o valor relativo ao LOAS recebido pelo filho no integrar a renda familiar para apurao do limite de um quarto do salrio mnimo.

    O benefcio revisto pelo INSS a cada dois anos, e no gera direito penso por morte aos dependentes do beneficirio nem ao abono anual. A cessao do benefcio de prestao continuada concedido pessoa com deficincia no impede nova concesso, desde que atendidos os requisitos definidos em regulamento.

    O benefcio ser suspenso quando a pessoa com deficincia exercer atividade remunerada, inclusive na condio de microempreendedor individual. Porm, extinta referida relao trabalhista ou atividade empreendedora e, quando for o caso, encerrado o prazo de pagamento do seguro-desemprego, desde que o beneficirio no tenha adquirido direito a qualquer benefcio previdencirio, poder ser requerida a continuidade do pagamento do benefcio suspenso, sem necessidade de realizao de percia mdica ou reavaliao da deficincia e do grau de incapacidade para esse fim. A contratao de pessoa com deficincia como aprendiz, entretanto, no acarreta a suspenso do benefcio

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    de prestao continuada, sendo o recebimento concomitante da remunerao e do benefcio limitado a 2 (dois) anos.

    A condio de acolhimento em instituies de longa permanncia no prejudica o direito do idoso ou da pessoa com deficincia ao benefcio.

    9 Servio social: tem por finalidade esclarecer aos beneficirios da Seguridade Social seus direitos e as formas de exerc-los, por meio de assistentes sociais, que realizam aes de socializao das informaes previdencirias (transmitem aos beneficirios os seus direitos previdencirios e a lgica do sistema), de fortalecimento do coletivo (visam a criar a conscincia coletiva sobre os direitos dos segurados) e de assessoria. Tal servio vem regulado, especialmente, no art. 88 da Lei n. 8.213/91. Regra importante vem contemplada no 1. do referido artigo, segundo o qual, na prestao do servio social, ser dada prioridade aos segurados em benefcios por incapacidade temporria e ateno especial aos aposentados e pensionistas.

    9 Habilitao ou reabilitao profissional: conjunto de meios necessrios para a adaptao ou readaptao profissional do beneficirio em razo de sua incapacidade total ou parcialmente para o trabalho. Compreende, nos termos dos arts. 89 e ss. da Lei n. 8.213/91:

    a) O fornecimento de aparelho de prtese, rtese e instrumentos de auxlio para locomoo quando a perda ou reduo da capacidade funcional puder ser atenuada por seu uso e dos equipamentos necessrios habilitao e reabilitao social e profissional;

    b) A reparao ou a substituio dos aparelhos mencionados no item anterior, desgastados pelo uso normal ou por ocorrncia estranha vontade do beneficirio;

    c) O transporte do acidentado do trabalho, quando necessrio.

    Concludo o processo de habilitao ou reabilitao profissional, o INSS emitir certificado individual, indicando as atividades que podero ser exercidas pelo beneficirio. Mediante apresentao do referido certificado, o beneficirio poder ser contratado no mercado na condio de reabilitado da Previdncia Social.

    Entretanto, ressalte-se: o INSS no tem obrigao de recolocar o segurado no mercado de trabalho sua responsabilidade termina com a emisso do certificado.

    Obs.: importante, nesse tema, o art. 93 da Lei n. 8.213/91, que trata da insero, no mercado, de pessoas portadoras de deficincia e reabilitados da Previdncia Social. O referido dispositivo prev a obrigatoriedade de empresas com mais de 100 empregados contratarem percentual de deficientes ou reabilitados, sob pena de autuao por parte do Ministrio do Trabalho, alm de eventual fiscalizao por parte do Ministrio Pblico. Veja-se a respeito, referido dispositivo: