Hugo Chávez venceuo referendo que lhepermite candidatar--se à Presidência daVenezuela por tempoindeterminado

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ParaHugo Chávez, aconstitui-ção da Venezuela não passade um instrumento ao servi-ço da“revolução bolivariana”– de que ele é o líder. Por isso,

uma das suas primeiras medidas comoPresidente, meses depois de eleito, a6 deDezembro de 1998, foi marcar um refe-rendo para autorizar uma assembleiaconstituinte a redigir um novo docu-mento fundamental. Essa Constituição– aprovada em Dezembro de 1999 – foifeita à sua medida: autorizou-o a cum-prir dois mandatos consecutivos (esta-va limitado a um); passou os mandatosde cinco para seis anos; baptizou o paísde República Bolivariana da Venezuela;aumentou os poderes do chefe de Esta-do; eliminou uma das câmaras da As-

HUGOBOSS

EXCESSOS.COMOOPRESIDENTEDAVENEZUELAMANIPULATUDO

Jádominavaogoverno,ostribunaiseoexército.Agorapodecandidatar-seeternamenteàPresidência–sempreseopovoquiseresempresegundoalei,claro.PorNunoTiagoPinto

sembleia Nacional; e entregou-lhe a su-pervisão do exército.

Este novo documento foi transforma-do numa espécie de bíblia. Foi impressonumpequeno livro azuledistribuído pelapopulação pobre, quepassouaandarcomele na rua, a lê-lo no metro e a ser incita-da a saber de cor diversos artigos – queparafacilitaratarefaforamimpressos empacotes de bens alimentares. Mas após10 anos no poder e com o seu segundomandato a aproximar-se do fim, HugoChávez decidiu mais uma vez alterar odocumento. Em 2007, um ano após areeleição, marcouumreferendo propon-do eliminar o limite de dois mandatos.Derrotado, não desistiu: como aconstitui-ção proíbe que num período eleitoral sereferende a mesma questão duas vezes,

AFP

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apresentou a proposta em forma de emen-da. E este domingo viu satisfeita a sua von-tade: 56% dos venezuelanos votaram pelasua continuidade no poder. E ele avisou-os:quer ficar até 2049, quando terá 95 anos.

PARACONSEGUIRISSO,pareceevidentequeo filho de dois professores comascendênciaindígena,africanaeespanhola,nascidonumbairro pobre de Sabatena, no Estado de Ba-rinas, e que sonhava jogar basebol, não he-sitará em manipular a lei. Esta é, desde quefoi eleito, a sua estratégia favorita. Uma dasalterações mais graves deu-se pouco depoisdaquele que será o mais breve golpe de Es-tadodaHistória. A11deAbrilde2002,oche-fe do exército, Lucas Rincón, anunciou queCháveztinharesignadonasequênciadecon-frontos entre opositores e apoiantes em Ca-racas. No entanto, milhares de manifestan-tes exigiramoregressodeChávezemilitaresleais libertaram-no. O golpedurou40horas.

El Presidente, como é tratado, não per-doou. Pediuumainvestigaçãoaquatrogene-rais suspeitos de envolvimento narevoltae,quando o Supremo Tribunal recusou, fezaprovarumaleiquereformouamais altains-tânciajudicialdo país: afastouos juízes opo-sitores e nomeou 12 magistrados que esta-vamsobasuainfluência. Deacordocomore-latório de 2008 da Human Rights Watch(HRW),“nos anos seguintes onovotribunaldemitiriacentenas dejuízes edesignariaou-tras centenas”. Afaltadeindependênciaétãogritante que na abertura do ano judicial de

2006,quandooPresidenteentrounasala,osmagistrados levantaram-se e começaram acantar“uh,ah,Cháveznoseva”. Porisso,aor-ganização de direitos humanos consideraque “o governo neutralizou o sistema judi-cialcomo órgão independente”. Os elemen-tos daHRWqueapresentaramorelatóriofo-ram expulsos do país.

Em Dezembro de 2004, Chávez deu maisumaprovadeforça. Quando18 miltrabalha-dores dapetrolíferaestatal, aPVDSA, partici-param numa greve de dois meses, o Presi-dentedespediu-os epreencheuos seus luga-

res comapoiantes. Os dispensados passaramaconstarnumalistaqueos impediadeobterempregos no sector petrolífero. O mesmoaconteceu com os que em 2004 assinaramuma petição que convocou um referendo àpresidência: os seus nomes foram divulga-dos e durante dois anos não conseguiram

empregonafunçãopública,nemrenovardo-cumentos como a carta de condução.

Hugo Chávez temumabase de apoio real:os pobres,queovêemcomoumdeles. E ape-sar de vestir fato e gravata quando se encon-tracomempresários, cultivaessaimagem. Oseu programa semanal na TV,Alô Presidente,éo grandemeio depropaganda. Duranteho-ras,o lídervenezuelano contahistórias dein-fância,entrevistalíderesinternacionais,dáor-dens aos ministros, canta, envia mensagensparaoexterioreproclamaosbenefíciosdare-volução. Tudo em directo. Para a população

pobre– paraquemsó o queéanuncia-do no programa é tido como real – osbenefícios traduzem-se nas chamadasmissões, pagas com o petróleo.

Essas missões têm servido paratudo(vercaixa). Paraprotegeromodode vida dos indígenas, para criar uma

milíciapopulare,sobretudo,parainundarosbairros pobres com professores e médicosvindos de Cubae que prestamcuidados gra-tuitos à população. Estes profissionais che-garam à Venezuela através de um acordo deChávez com o seu amigo e ídolo do séculoXX: Fidel Castro. Em troca dos profissionaiscubanos,oGovernodeCaracas forneceaHa-vanapetróleo abaixo custo. Ao mesmo tem-po, milhares devenezuelanos foramestudare receber tratamento hospitalar na ilha.

Para Chávez, Fidel Castro está ao nível doseuheróide infância, modelo e obsessão: Si-mónBolívar,olíderrevolucionárioqueliber-tou a América Latina do domínio espanhol,no século XVIII. Em 1983, ainda estava noexército, criouo Movimento RevolucionárioBolivariano 200 – os anos que separavam afundação do grupo do nascimento de Bolí-var. O pacto foiselado debaixo de umaárvo-re, no preciso local onde o heróilatino-ame-ricano gostava de descansar.

Passariamnoveanos atéHugo Chávez teroportunidade de tomar o poder. Mas a ten-

Hugo Chávezcompara-sea SimónBolívar,o libertadorda AméricaLatina,maso primeirosonho dejovem foiser jogadorprofissionalde basebol

MissõesbolivarianasSÃO OS SISTEMAS SOCIAIS CRIADOS PORCHÁVEZ COM O DINHEIRO DO PETRÓLEO

• Bairro Adentro – fornece cuidados desaúde gratuitos nos bairros pobres

•Miranda –criou umamilícia nacionalde doismilhões de pessoas para de-fesa de uma “invasão estrangeira”

• Robinson –permitiu que 1,5milhõesde iletrados aprendessem a ler,escrever e fazer contas

• Guaicaipuro –protege omodo devida, religião, terra e cultura indígena

QuandooSupremoTribunalnãolhefezavontade,Cháveznomeou12novosjuízes

FOTOSAFP

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70 19 FEVEREIRO 2009 SÁBADO

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tativadegolpedeEstadode4deFevereirode1992 falhou. Capturado, Chávez foi à televi-são pediraos camaradas que depusessem asarmas. Mas quando proclamou que os ob-jectivos não tinham sido alcançados acres-centou um “por agora” – e a população viunele um herói. Nos meses seguintes avendade boinas vermelhas, como aque trazia, dis-

parounos bairros pobres. E estapopularida-de valeu-lhe aeleição em1998. Nas reuniõesestratégicas dessa campanha, havia sempreumacadeiravaziaperto dele, onde ninguémestavaautorizadoasentar-se. UmdiaChávezapontou para ela e disse: “Esta é a cadeira dolibertador”, Simon Bolívar.

As nacionalizações sucessivas – debancos,

Fidel CastroéograndeconselheirodeChávez.OPresidentevenezuelanovisita-ocomfrequênciae foi noseuprogramaqueFidelapareceuapósmesesdeausência

petróleo,siderugia,telecomunicações,electri-cidade e cimentos, sempre com preços fixa-dos pelo governo – atraíram-lhe inúmerosadversários. Mas, tal como Bolívar e Castro,a Chávez faltava um inimigo poderoso. Equandoos EUAreconheceramogovernosaí-dodogolpe-relâmpagode2002elegeuGeor-geW. Bushparaessepapel. Chamou-lhebur-ro,idiota,assassino,opôs-seàguerranoAfe-ganistão, visitou o Irão, criou laços com aRússiaedistribuiudinheiropelaAméricaLa-tina para contrariar a influência americana.

Os venezuelanos habituaram-se aouvir oPresidentedizerqueaguerracomosEUAestápróxima e que poderá durar 100 anos. Mas,ao mesmo tempo, Chávez continuaaserumdos principais fornecedores de petróleo dosEUA– e com esse dinheiro patrocinaos seusprogramas sociais. Se as receitas do petróleocontinuaremelevadas, serádifícilàoposiçãovenceras presidenciais de2012. Porenquan-to, Chávez obedece apenas à sua vontade. Jáeste ano decretou o dia 2 de Fevereiro feria-do nacional, para celebrar a primeira décadanopoder. Defatoegravata,oudecamisaver-melha, continuará a ser o boss. !